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TRABALHO / RESOLUÇÃO:
1. Entrevista
1.1 Caraterização básica do entrevistado
• Tempo de serviço: 20 anos de serviço;
• Idade: 44 anos de idade;
• Grupo de recrutamento: Grupo 520 – Biologia e Geologia;
• Formação académica: Licenciatura em Biologia/Geologia (ensino de) e Pós-graduação em
Vulcanologia e Riscos Geológicos;
• Situação profissional: Docente do Quadro de Escola (Docente com Contrato de Trabalho em Funções
Públicas por Tempo Indeterminado).
1.2 Na minha perspetiva, considero que, ao longo destes últimos anos, a escola (o ensino) mudou de
paradigma. Antes, a escola estava mais focada na validação das aprendizagens, valorizando mais o domínio
cognitivo (domínio dos conhecimentos e das capacidades). Entretanto, e face às novas exigências impostas
por uma sociedade diferente, o domínio socio afetivo ganhou destaque, o que se refletiu, particularmente,
na forma de encarar a avaliação dos alunos. Além disso, as estratégias adotadas no processo de ensino-
aprendizagem, assim como os instrumentos de avaliação aplicados, são cada vez mais diversificados e
diferenciados. Estas mudanças trouxeram novos desafios às escolas e aos docentes, aos quais têm exigido
mais tempo de dedicação à preparação das aulas e dos momentos de avaliação.
1.3 Para poder responder aos constantes desafios, tenho procurado frequentar formação em diferentes
áreas para atualização científica da minha especialidade, de conhecimentos da didática da minha área
específica de docência e de conhecimentos transversais. As ações de formação realizadas têm-me permitido
uma maior eficácia na minha atividade de desenvolvimento do ensino-aprendizagem e na dinamização e
participação em atividades de enriquecimento curricular.
Considero, pois, a minha participação na formação contínua como uma mais-valia para ficar a conhecer
cenários inovadores de ensino e aprendizagem, nomeadamente ferramentas necessárias para poder aplicar
os conceitos e técnicas nas minhas próprias práticas letivas.
1.4 Inicio sempre o planeamento do tópico/conteúdo programático com uma análise do(s) objetivo(s)
delineado(s) para o mesmo, bem como das respetivas orientações curriculares. A partir daí, consulto as
propostas de recursos didáticos disponibilizados pelas várias editoras, assim como o manual adotado.
Seleciono os materiais mais adequados ao perfil da turma/alunos, procedendo às adaptações necessárias e
tentando, sempre que possível, imprimir-lhes um certo cunho pessoal e original.
1.5 Começo, por norma, solicitando aos alunos que apresentem oralmente um resumo dos conteúdos
trabalhados/abordados na aula anterior. A exploração do(s) tópico(s) previsto(s) para a aula é feita,
frequentemente, com recurso a diferentes materiais e estratégias, tais como a visualização de uma
apresentação multimédia, a realização de uma ficha de trabalho ou de um exercício/atividade formativa do

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manual. Com base nos materiais utilizados, procuro sempre envolver os alunos na leitura, análise e discussão
dos textos, fotografias/esquemas interpretativos, vídeos/animações (se exibidos). Se na aula em questão é
possível concluir o tópico programático, distribuo aos alunos um resumo teórico, o qual é lido e analisado, e
solicito, na maior parte das vezes, a resolução de uma questão de aula. A aula termina com a elaboração do
sumário, redigido em conjunto com os alunos.
2. a) Em primeiro lugar quero referir que nenhuma mudança se dá sem uma adaptação lenta e progressiva
às novas mentalidades e rotinas subsequentemente necessárias, mesmo que aos olhos da maioria, as razões
para a sua efetivação, possam constituir-se claras. A minha colega, por exemplo, ao contrário de mim, está
há 20 anos a lecionar, é respeitada, tem estabilidade laboral e constato que os seus processos pedagógico-
didáticos se mostram funcionais e estáveis nos contextos em que se desenvolvem.
Concluo pelas suas respostas, que gentilmente se disponibilizou a dar para esta entrevista, que tem contato
com a informação que anuncia a chegada do bicho papão para o futuro da Escola. Quando afirma que a
escola mudou de paradigma, motivada por exigências de uma sociedade diferente e que isso se refletiu na
forma como se avalia e no tempo maior de preparação para as aulas e para a realização dessa nova forma
mais diversificada de avaliar, revela conhecimento sobre parte da mudança. Digo parte, porque, depois
quando relaciona as aprendizagens e a sua validação àquilo que chama de domínio cognitivo, acrescentando
que é o domínio dos conhecimentos e das capacidades, penso que está a referir-se aos conteúdos
disciplinares, que constituíam o grosso do curriculum sujeito a foco de avaliação, maioritariamente sumativa,
como se sabe. Revela alguma nostalgia pelo passado, porque diz que foram as exigências sociais que deram
destaque ao que chama de domínio sócio afetivo em contraponto com o que chamou de domínio cognitivo,
cujo valor definiu como “as aprendizagens”. Diz sentir necessidade de formação, que a tem feito e que tem
sido útil. Revela ainda muito pouca autonomia e diferenciação pela área investigativa da didática, na medida
em que planeia tradicionalmente, embora saiba que é incentivada a inovar. No plano de aula, há uma
quantificação dos recursos, dos materiais e das estratégias, já incorporando a tecnologia na pedagogia e nos
conteúdos, embora ainda, a meu ver, sem muita inovação, talvez porque os contextos assim não o exigem
(Shulman, 1987, 2004). Revela incentivo à interatividade na construção proativa das tarefas, proporcionando
feedback colaborativo. Como se sabe, a escola tem fundamentado a sua institucionalidade na possibilidade
que dava às classes medias de ascensão social e de manutenção de estatutos sociais adquiridos. Essa
institucionalidade permitiu durante muito tempo uma funcionalização da profissão, a construção de uma
realidade estável, unilateral, segregadora e com um conceito limitado de didática, baseado numa visão
tecnicista para satisfazer o saber requisitado pela revolução industrial. A realidade hoje é completamente
diferente, e o tipo de saber, além de tecnicista, exige multidisciplinariedade. Exige trabalho para desenvolver
cidadãos críticos e integrados com desenvolvimento metacognitivo, de forma a fazer face a uma realidade
diversa e em permanente mudança conceptual, que obriga a incluir, conceptualizando a permanente
diversidade. O Professor, sendo aquele que ensina ou possibilita alguém a aprender, tem de estar e ser o da

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linha da frente no discernimento da realidade e das realidades. Tem de orientar o seu saber para a “ação e
que se desdobra por quatro grandes domínios: o conhecimento dos conteúdos de ensino, incluindo as suas
inter-relações internas e com outras disciplinas e as suas formas de raciocínio, de argumentação e de
validação; o conhecimento do currículo, incluindo as grandes finalidades e objetivos e a sua articulação
vertical e horizontal; o conhecimento do aluno, dos seus processos de aprendizagem, dos seus interesses,
das suas necessidade e dificuldades mais frequentes, bem como dos aspetos culturais e sociais que podem
interferir positiva ou negativamente no seu desempenho escolar; e o conhecimento do processo instrucional,
no que se refere à preparação, condição e avaliação da sua prática letiva.” O desenvolvimento pessoal,
organizacional e profissional do professor estão assim interligados e têm papel central no desenvolvimento
dos processos ensino-aprendizagem. Nóvoa (1991). Para isso é preciso o professor adotar uma atitude
investigativa, reflexiva e de formação contínua. Donald Schön (1983). O professor aprende fazendo,
interagindo em contexto real, pela perspetiva vygostkiana sobre a aprendizagem conhecida por “Teoria da
Atividade” (Christiansen & Walther, 1986).
b) Na resposta à pergunta sobre o que tem desenvolvido na sua formação científica e pedagógica para
responder aos desafios, a colega distingue “formação em diferentes áreas para atualização científica da sua
especialidade”, de “conhecimentos da didática da sua área específica de docência” e ainda de
“conhecimentos transversais”. Nota-se que procurou dar uma resposta politicamente correta, mas não se
apercebeu ainda que todos esses fatores fazem parte da didática. Portanto, como já referi, na resposta à
alínea a), a colega parece mostrar interesse nas novas orientações e nos caminhos que se tentam indicar face
ao que teoricamente se diz estar a acontecer, mas não tem verdadeira preparação para perceber a
autonomia que, não só tem, como se lhe exige, na participação determinante na construção de soluções. O
professor não tem mais uma intervenção passiva no processo, limitando-se a transmitir o conhecimento,
para depois avaliar, sem responsabilidade pelo fracasso daqueles que não têm voz. E também não chega
fazer de conta que se sabe que está a acontecer uma mudança de paradigma e continuar a ter a atitude que
alimenta o professor funcionário, passivo, só com uma linguagem aparentemente adaptada aos novos
contextos. A verdade é que a Escola, com os professores na linha da frente, está a ser obrigada a emancipar-
se numa lógica de mercado. A didática, como conceito essencial ao sucesso das aprendizagens, tem de estar
na posse dos professores. A meu ver, se os professores perceberem a abrangência do conceito de didática e
de que o futuro da Escola depende da qualidade com que se interage com essas variáveis, necessitando o
professor, também ele, de aprendizagens construtivistas, estaremos a caminho de efetivar a mudança com
sucesso. Terminar com o conceito de Didática Isabel Alarcão (1989). “O objeto da Didática é o conjunto dos
fenómenos de ensino-aprendizagem das várias disciplinas e dos vários níveis de ensino, com o objetivo último
de contribuir para a melhoria do processo educativo. O seu método de investigação corresponde a um modo
de trabalho sistemático que inclui numerosas variantes, desde a investigação de cunho quantitativo baseada
em procedimentos de análise estatística e outros processos de modelação matemática, à investigação de

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cunho qualitativo que inclui estudos de caso, entrevistas clínicas e estudos etnográficos e, cada vez mais,
estudos de investigação-ação, que envolvem processos colaborativos onde se implicam docentes e
investigadores de diferentes instituições.” Alarcão (1997) designa a tripla dimensão ou
multidimensionalidade da didática: a investigativa, a curricular e a profissional. Portanto, a vertente
investigativa, a vertente da formação, “inicial ou contínua”, e a vertente prática na ação.

Bibliografia
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(7th ed.). APA

Nóvoa, A. (2012). Pensar alunos, professores, escolas, políticos. Revista Educação Cultura e Sociedade, 2 (2),
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Ponte, J. P. (1999). Didáticas específicas e construção do conhecimento profissional. In J. Tavares, A. Pereira,


A. P. Pedro, & H.A. Sá (Eds). Investigar e formar em educação: Atas do IV Congresso do SPCE, 59-72.

Roldão, M. C. (2017). Conhecimento, didática e compromisso: o triângulo virtuoso de uma profissionalidade


em risco. Cadernos De Pesquisa, 47 (166), 1134-1149. https://doi.org/10.1590/198053144367

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