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Cinema

Cinema e História têm desenvolvido relações bastante íntimas desde que os


primeiros filmes começaram a surgir por volta do alvorecer do século XX. De facto,
estes dois campos da actividade e da criação humana não cessaram de intensificar
progressivamente as suas possibilidades de interacção à medida que o Cinema se
foi firmando como a grande arte da contemporaneidade. Forma de expressão
artística para a qual concorrem diversas outras artes – como a Música, o Teatro, a
Literatura, a Fotografia e as demais Artes Visuais – o Cinema terminou por vir a
constituir a partir de si mesmo uma linguagem própria e uma indústria também
específica, e a par disto não cessou de interferir na história contemporânea ao
mesmo tempo que o seu discurso e as suas práticas se foram transformando com
esta mesma história contemporânea. Eis aqui a raiz de um complexo jogo de inter-
relações possíveis que têm permitido que o Cinema se mostre simultaneamente
como «fonte», «tecnologia», «sujeito» e «meio de representação» para a História.
No seu aspecto mais irredutível o Cinema – incluindo todo o imenso conjunto das
obras cinematográficas que já foram produzidas e também as práticas e discursos
que sobre elas se estabelecem – pode ser considerado nos dias de hoje uma fonte
primordial e inesgotável para o trabalho historiográfico. A partir de uma fonte fílmica,
e a partir da análise dos discursos e práticas cinematográficas relacionados aos
diversos contextos contemporâneos, os historiadores podem apreender de uma
nova perspectiva a própria história do século XX e da contemporaneidade. De igual
maneira, como se verá mais adiante, os historiadores políticos e culturais podem
examinar os diversos usos, recepções e apropriações dos discursos, práticas e
obras cinematográficas. Um dos fenômenos tecnológicos mais impressionantes de
nossa história é a capacidade de captação (ou captura) da “imagem-movimento”,
isto é, da apreensão de imagens dinâmicas da realidade, e não estáticas, como é o
caso da fotografia. A captura da “imagem-movimento” foi possível a partir de 1889
com a criação do cinetoscópio por William Dickson, assistente do cientista e
inventor americano Thomas Edison. Esse invento e os modelos que o sucederam
na década seguinte contribuíram para o desenvolvimento do cinema tal como o
compreendemos hoje, ou seja, a arte cinematográfica.

O cinema, portanto, teve origem no cinetoscópio, que, todavia, não projetava as


imagens em telões. O espectador do cinetoscópio tinha de observar (durante um
tempo-limite de 15 minutos) as imagens no interior de uma câmara escura por meio
de um orifício em que colocava um dos olhos. Nesse sentido, a experiência visual
proporcionada pelo cinetoscópio não podia ser feita coletivamente. Edison não
chegou a patentear o invento, o que abriu portas para outros inventores, sobretudo
da Europa, aperfeiçoarem o modelo.

Fonte de Histórica do Cinema


Se o Cinema é agente da História no sentido de que interfere directa ou
indirectamente na História, ele também é interferido todo o tempo pela História, que
o determina nos seus múltiplos aspectos. Vale dizer, o cinema é produto da História
– e, como todo o produto, um excelente meio para a observação do lugar que o
produz, isto é, a sociedade que o contextualiza, que define a sua própria linguagem
possível, que estabelece os seus fazeres, que institui as suas temáticas. Por isto,
qualquer obra cinematográfica – seja um documentário ou uma pura ficção – é
sempre portadora de retratos, de marcas e de indícios significativos da sociedade
que a produziu. É neste sentido que as obras cinematográficas devem ser tratadas
pelo historiador como fontes históricas significativas para o estudo das sociedades
que produzem filmes, o que inclui todos os géneros fílmicos possíveis. A mais
fantasiosa obra cinematográfica de ficção traz por detrás de si ideologias,
imaginários, relações de poder, padrões de cultura. Esta afirmação, que de resto
também é perfeitamente válida para as obras de Literatura, dá suporte ao facto de
que a fonte cinematográfica tem sido utilizada com cada vez mais frequência pelos
historiadores contemporâneos. O lugar que produz o Cinema é também o lugar que
o recebe, de modo que a fonte fílmica pode dar a compreender uma sociedade
simultaneamente a partir do sistema que o produz e do seu universo de recepção. O
público consumidor e a crítica inscrevem-se desde já na rede que produz o filme,
conjuntamente com os demais factores que actuam na sua produção, e isto porque
o público receptor é sempre levado em consideração nos momentos em que o filme
é elaborado. As competências e expectativas do consumo, enfim, são antecipadas
no momento em que é produzida a obra cinematográfica, de modo que analisar um
filme é analisar também o público que irá consumi-lo. Mas seria nas três primeiras
décadas do século XX que o cinema afirmar-se-ia enquanto arte. E isso ocorreu
sobretudo pela ação de artistas interessados em teatro, mágica (e ilusionismo) e
todo tipo possível de efeito cênico. Um dos principais nomes dessa fase do cinema
foi Georges Meliès, que dirigiu “Viagem à Lua”, em 1902, conseguindo com esse
filme efeitos visuais verdadeiramente impressionantes para a época.

Após os filmes de Meliès, surgiram as produções de D. W. Griffith, nos Estados


Unidos, as do expressionismo e do “Movimento de Câmera”, na Alemanha,
do surrealismo, na Espanha, e o cinema soviético, sobretudo com nomes
como Vertov e Eisenstein.

Esta Foto de Autor Desconhecido está licenciado em


CC BY-SA-NC

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