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Rajneesh:
Chidananda, a questão que você levantou tem muitas implicações. Não é uma
simples questão; ela compreende muitas questões importantes. Eu gostaria de
entrar em cada dimensão da questão e somente então você será capaz de encontrar
a resposta.
A primeira coisa para se lembrar é que o homem compreende dois mundos, um
que o leva para fora e o outro que o leva para dentro. O homem é uma dualidade:
ele é um corpo e é uma alma. E por causa desta tremenda dualidade, surgem todos
os problemas do mundo. A dualidade não é apenas uma. Ela é aquilo que chamamos
de “dualidade gestalt”. Numa dualidade gestalt você nunca vê ambos os mundos
juntos. Se você escolhe ver um, o outro fica esquecido. Como exemplo, eu tenho
falado a respeito de um pequeno livro de crianças onde existe um desenho feito com
linhas simples, mas nessas linhas existem duas possibilidades: se você fixar seus
olhos no desenho, você pode ver ou uma velha mulher ou uma bela garota. Você
consegue ver cada uma separadamente. Se você olhar fixamente para a velha
mulher, de repente você perceberá uma estranha mudança: a velha mulher
desaparecerá e uma bela garota estará diante de você.
Se você persitisse em olhar fixamente... mas em geral os olhos não olham
fixamente, eles se movem continuamente. O movimento é intrínseco aos seus olhos.
Eles ficam cansados de olhar fixamente para uma coisa. Eles estão sempre em busca
de algo novo. Por causa disso, você logo percebe a bela garota desaparecendo e a
velha mulher voltando novamente ao seu lugar. Ambas são feitas com as mesmas
linhas, apenas as combinações são diferentes, mas você não consegue ver ambas ao
mesmo tempo. Isto é impossível. Porque se você ver a garota, onde estarão as
linhas que fazem a velha mulher? E se você ver a velha mulher, você não terá linhas
extras para criar a garota. Você consegue ver cada uma separadamente, mas não
consegue vê-las juntas. Isto é dualidade gestalt, e esta é a realidade do homem.
O Oriente tem visto o homem somente como uma alma, como uma consciência,
como um ser introvertido. Mas porque foi escolhida uma gestalt, a outra foi negada.
É por isto que no Oriente, por séculos, os místicos têm negado consistentemente a
realidade do mundo. Eles dizem que ela é apenas um sonho, que é maya, uma
ilusão. Que esta realidade do mundo é feita da mesma matéria que os sonhos são
feitos. Aquilo não está verdadeiramente ali, é apenas uma miragem, uma aparência.
O Oriente tem negado o lado externo – e tem que negar devido à necessidade
interna da dualidade gestalt.
O Ocidente escolheu o mundo externo e tem que negar o mundo interno. O
homem é visto apenas como um corpo. Psicologia, biologia e quimica, mas não uma
consciência, não uma alma. A alma é apenas um epifenômeno. E porque somente o
lado externo é considerado como sendo verdadeiro, foi possível desenvolver a ciência
no Ocidente. Tecnologia, milhares de aparelhos, possibilidades de pousar na lua e no
vasto universo que circunda você. Mas mesmo conhecendo tudo isto, tem havido um
profundo vazio na mente ocidental: algo está faltando.
É difícil para a lógica ocidental localizar com precisão o que está faltando, mas é
absolutamente certo que algo está faltando. A casa está cheia de convidados, mas
está faltando o anfitrião. Você tem todas as coisas do mundo, mas você não está ali.
O resultado é uma tremenda miséria. Você tem todos os prazeres, todo o dinheiro,
tudo o que o homem jamais sonhou, e ao final de séculos de esforços, de repente
descobre que você não existe. O seu interior está oco, não há ninguém.
O Oriente também tem enfrentado sua própria miséria. Ao pensar que o mundo
externo não é verdadeiro, não há qualquer possibilidade de progresso científico. A
ciência tem que ser objetiva, mas se os objetos são apenas aparências, ilusões, qual
o sentido em dissecar ilusões para tentar descobrir os segredos da natureza?
Conseqüentemente o Oriente permaneceu pobre, faminto e submetido a todo tipo de
escravidão por séculos.
Estes dois mil anos de escravidão não foram por acaso. O Oriente estava
preparado para isto. Ele aceitou isto. O que interessa num sonho, se você é o senhor
ou o escravo? O que interessa, se no sonho você está sendo servido com um
alimento delicioso ou se você está com fome? No momento em que você acorda,
ambos os sonhos se revelarão inválidos. O Oriente consentiu em permanecer
morrendo de fome, em ser escravizado, e a razão é que ele escolheu uma gestalt
diferente: o verdadeiro é o interior.
O Oriente aprendeu como estar silencioso e em paz, para curtir a felicidade que
surge quando você mergulha fundo em sua interioridade. Mas você não consegue
compartilhar isto com outra pessoa; isto é absolutamente individual. No máximo,
você consegue falar a respeito. Assim, por milhares de anos, o Oriente tem falado a
respeito de espiritualidade, consciência, iluminação, meditação e externamente tem
permanecido um mendigo, doente, faminto e escravizado.
Quem vai querer ouvir esses escravos e suas grandes filosofias? O Ocidente
simplesmente tem rido disso. Mas o riso não tem sido só de um lado. O Oriente
também tem rido ao ver que as pessoas estão acumulando coisas e perdendo a si
mesmas.
Por milhares de anos nós temos vivido num estado de mente muito estranho e
esquizofrênico.
Stress
Chidananda, você disse, ‘No Ocidente, celebração está associada com a idéia
americana de divertimento.’ Isto traz uma outra implicação. Somente um homem
miserável necessita de divertimento. Assim como um homem doente precisa de
medicamento, um miserável necessita de divertimento. Isto é apenas uma estratégia
muito engenhosa para evitar a sua miséria.
E a miséria não é evitada; você somente se esquece por um tempo que é
miserável. Sob a influência de drogas, do sexo ou sob a influência do que você
chama de divertimento, o que na verdade você está fazendo? Você está escapando
de seu vazio interior. Você está se envolvendo em todo tipo de coisas. Uma coisa da
qual você sente medo é do seu próprio ser.
Isto tem criado uma certa loucura, mas porque no Ocidente todo mundo está
no mesmo barco, isto se torna muito difícil de ser reconhecido. Milhões de pessoas
estão assistindo futebol americano, elas estão pulando, estão gritando, estão
brigando. E porque não existem estádios suficientemente grandes para acomodar
todo o país, todo mundo está sentado grudado em sua cadeira diante da televisão.
Todos fazendo as mesmas coisas estúpidas: sentadas em suas cadeiras, gritando...
Eu conheço um homem que, porque seu time estava perdendo, ficou tão
enlouquecido que quebrou sua televisão. Eu estava com este homem e lhe disse,
‘Você está preparado para ser internado num asilo de loucos? Em primeiro lugar,
futebol americano deveria ser para crianças. Você já passou dessa idade, mas
mentalmente você não tem mais que doze ou treze anos. E o que você fez com sua
televisão me leva a suspeitar que você não é apenas retardado, mas louco também.’
(...)
As pessoas têm se tornado tão voltadas para fora que não conseguem, nem
mesmo por um simples momento, sentar em silêncio. Esta é a coisa mais difícil no
mundo. As pessoas não param quietas. Qual é o medo? O medo é que você pode
encontrar o seu vazio e uma vez que ele seja encontrado, a sua vida perde todo o
interesse, todo o sabor, todo o sentido e significado.
Todo mundo está fugindo de si mesmo. E chamam de divertimento a essa fuga
de si mesmo.
A vida do homem ocidental pode ser dividida em duas partes: a primeira é se
divertindo e a segunda… é tendo ressaca! Com o tempo, a ressaca se torna mais
prolongada que o divertimento. E ele segue, num círculo vicioso, entre essas duas
partes, desperdiçando sua vida e não chegando a lugar algum.
Não se pode dizer que chegar ao cemitério significa chegar a algum lugar. Isto
simplesmente significa que agora a roda está tão cansada e tão entediada com os
divertimentos e com as ressacas sofridas que ela quer descansar dentro de uma
sepultura.
As pessoas descansam apenas em suas sepulturas.
Fora da sepultura, não há tempo para descansar.
No Oriente, nós escolhemos a gestalt oposta. Nós descobrimos tesouros,
mistérios e segredos, mas a dificuldade com o interior é que você não consegue
materializá-lo. Você não consegue prova-lo no tribunal, você não consegue nem
mesmo ter uma testemunha. A não ser você, ninguém, mais é permitido entrar em
seu mundo interior. Naturalmente, o Oriente pouco a pouco criou indivíduos isolados.
Esses indivíduos isolados foram constantemente molestados pela multidão, pelo
mundo dos negócios. Eles queriam o silêncio interior, sua calma, sua serenidade sem
perturbação. A conclusão foi: renuncie ao mundo, mude para o Himalaia ou para o
meio da floresta onde você pode ser totalmente você mesmo.
Sorrow
Devido ao seu sucesso, o Ocidente alcançou seu maior fracasso. E este fracasso
é muito perigoso porque eles têm sob seu controle enorme poder destrutivo, bombas
nucleares. (...) Os políticos estão preparados para destruir este planeta setenta
vezes. Este é o sucesso da abordagem ocidental de tomar a dimensão externa do
homem como sendo toda a realidade. E nada melhor aconteceu com o Oriente.
Quase cinqüenta por cento da população do Oriente está faminta, morrendo,
subnutrida. E ao final do século XX a previsão é de que pelo menos quinhentos
milhões de pessoas morram, somente na Índia, sem contar as que morrerão na
China, em Taiwan, na Coréia, no Japão. Este planeta terra não consegue suportar
essa imensa humanidade que continua crescendo, a não ser que nós comecemos
também a ser científicos e tecnológicos.
A racionalidade é capaz, mesmo agora, de dar suporte a uma humanidade sete
vezes maior que a atual. Hoje existem cinco bilhões de pessoas no mundo. A razão
tem a capacidade de propiciar agora que sete vezes mais pessoas vivam
confortavelmente. Mas a ciência não consegue fazer isto por conta própria…