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A Igreja

Apostólica
Que Signif ica Lúo ?

A Bíblia tem alguma coida a dizer dobre como a Igreja Cridtã deve
der regida? Edta éuma quedtão que, raramente, recebe a atenção que
merece. Mad, edte livro a responde de form a agradável e atraente.
Thomad
Witherow edtudou o addunto profundamente; ele expõe deid
princCpiod muito decidivod, tiradod do endino e da prática dod
Apódtolod. Ele, então, analida o<f váriod didtemad de governo
eclediádtieo à luz dedted pnncLpiod bíblicod, chegando à concludão
clara e precisa de que “o Sidtema Predbiteriano de governo
eclediádtieo edtá maid próximo à form a que exidtiu na Igreja
Apodtóliea do que qualquer outro
0 autor começou o deu edtudo do addunto um tanto indeguro de que o
Sidtema Predbiteriano pudedde redidtir a um edcrutínio detalhado e
rigorodo dad Edcriturad. Mad, anted de terminar ad pedquidad, ad duad
dúvidad tinham de dedvanecido diante de uma invedtigação cabal dad
evidênciad bíblicad. E no decorrer do edtudo, ele leu todod od edcritod dod
deferutored maid capacitadod dod didtemad rivaid. Não é de admirar pois,
que Jamed Begg, ele medmo um grande edcritor, dedcreveu edte livro como
dendo “muito condidtente e datidfatório ”,
Depoid de um minidtério de 20 anod no Condado de Londonderry,
na Irlanda do Norte, Witherow (1824-1890) paddouo redtantede dua
vida como profeddor de Hidtória da Igreja na cidade de Londonderry.
Ele fo i o autor de váriod livrod, includive um volume maior dobre edte
medmo addunto, TheFormof the Chridtian Temple.

EDITORA OS PURITANOS

Facioli Gráfica e Editora Ltda


Rua Canguaretama, 18 1 — Vila Esperança CEP 03651-050 — São Paulo-SP Fone/Fax: 11
- 695 7-5111/3148 E-mail: livraria@ puritanos.com.br Web: www.puritanos.com.br
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fundamente e expõe seis princípios
muito decisivos, 1 irados do ensino
e da prática dos Apóstolos. Ao
comparar os vários siste mas de
governo eclesiástico à luz destes
princípios bíblicos ele chegou à
con clusão clara e precisa de que
“o Sistema
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eclesiástico é o que mais se
aproxim a tia forma que existiu na
Igreja
Apostólica”.
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EDITORA

O S PURITANOS

T h o m a s W it h e r o w
1' i'cc Presbyterian Publications
I .í.í Woodlands Road — Glasgow G3 6LE
First published 1856
First FPP edition 1954
This edition © Free Presbyterian Publications 1990
ISBN 0 902506 04 8

A Igreja Apostólica — Que Significa Isto?


Por Thomas Witherow
1- Edição em Português — Julho 2005
É proibida a reprodução total ou parcial desta publicação, sem
autorização por escrito dos editores, exceto citações em resenhas.

Editor Responsável
Manoel Sales Canuto
ospuritanos@uol. com. br
Tradução:
Pr. Francisco Cardoso
Revisão:
Marcos Vasconcelos
Robério Basílio
Linda Oliveira
Editoração Eletrônica e Capa:
Heraldo Almeida
heraldoa@gmail.com
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Os Puritanos
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Facioli Gráfica e Editora Ltda
Rua Canguaretama, 181 — Vila Esperança
CEP 03651-050 — São Paulo — SP
S u m á r io

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C a p í t u l o 31 — Dos S ín o d o s e C o n c í l i o s .............................. 1 0 3

A p ê n d ic e 2 .............................................................................................................1 0 4
L e it u r a s C o m p l e m e n t a r e s ................................................................ 1 0 4

I
Prefácio

A I g r e j a A p o s t ó l ic a
Q u e S ig n if ic a I s t o ?

A Bíblia tem alguma coisa a dizer sobre como a Igreja

Cristã deve ser regida? Esta é uma questão que, ra ramente,


recebe a atenção que merece. Mas, este livro a responde de
forma agradável e atraente. Thomas Witherow estudou o
assunto profundamente; ele expõe seis princí pios decisivos,
tirados do ensino e da prática dos Após tolos. Ele, então,
analisa os vários sistemas de governo eclesiástico à luz
destes princípios bíblicos, chegando à conclusão clara e
precisa de que “o Sistema Presbiteriano de governo
eclesiástico está mais próximo à form a que existiu na Igreja
Apostólica do que qualquer outro".
O autor começou o seu estudo do assunto um tanto
inseguro de que o Sistema Presbiteriano pudesse resistir a
um escrutínio detalhado e rigoroso das Escrituras. Mas, antes
de terminar as pesquisas, as suas dúvidas tinham se
desvanecido diante de uma investigação cabal das evi dências
bíblicas. E no decorrer do estudo, ele leu todos os escritos
dos defensores mais capacitados dos sistemas rivais. Não é
de admirar pois, que James Begg, ele mesmo um grande
escritor, descreveu este livro como sendo “muito consistente
e satisfatório”.
Depois de um ministério de 20 anos no Condado de
Londonderry, na Irlanda do Norte, Witherow (1824-1890)
passou o restante de sua vida como professor de História da
Igreja na cidade de Londonderry. Ele foi o autor de vários
livros, inclusive um volume maior sobre este mesmo as
sunto, The Form o f the Christian Temple.
Os Editores
Capítulo I

ApresentandoaQ uestão
E muito comum os crentes professos fazerem distinção
entre o essencial e o não essencial em religião e inferir
que, se algum fato ou doutrina pertence exatamente a esta
última classe, deve ser uma questão de pouca importância e
pode, na prática, ser seguramente relegada a um plano
secundário. A maioria das pessoas tira conclusões sem um
exame prévio; não querem pagar o preço de pensar,
pesquisar, de raciocinar sobre nada e um dos expedientes
mais freqüentemente adotados por elas para se livrarem da
responsabilidade de usar a mente e desprezar algum fato que
se julgue desagradável é dizer: “Esse problema não é
essencial para salvação; portanto, não precisamos nos
preocupar muito com isso”.
Se essa tal distinção for acertada, a conclusão dela
inferida é, certamente, perigosa. Afirmar que um fato da
revelação de Deus não é essencial para a salvação e que por
essa causa deve ser irrelevante e pode ou não ser aceito por
nós, é declarar um princípio cuja aplicação devastaria o
cristianismo. Pois, quais são as verdades essenciais para a
salvação? Não são estas: Que Deus existe; que todos os
homens são pecadores; que o Filho de Deus morreu na cruz
para salvar o pecador; e que todo aquele que crer no Senhor
Jesus Cristo será salvo? Há boas razões para acreditarmos
que não poucos gozam felicidade, por conhe cerem agora
pouco mais que essas coisas — os princípios elementares dos
oráculos de Deus — o alfabeto do Cristia-
A IGREJA APOSTÓLICA

iii si no. Isendo assim, nenhuma outra verdade da Palavra de


Deus pode ser considerada absolutamente necessária para a
salvação. No entanto, se todas as outras verdades reveladas
são irrelevantes porque não são essenciais para a salvação, o
resultado é que o que está sendo negado é a importância da
própria Palavra de Deus; porque em sua maior parte a Bíblia
contém ensinos que, considerando a situação alegada, não
são absolutamente necessários à feli cidade eterna. Isso não
altera o caso se considerarmos que
o número de verdades fundamentais é bem maior. Quem se
convencer de que só são importantes aquelas coisas a que tem
o prazer de chamar de essenciais, sejam quantas forem, irá
sem dúvida encurtar o seu credo e eliminar as raízes de
muitas controvérsias. Todavia deixará de lado praticamente
tudo exceto uma mui pequena porção das Escrituras. Se não
mutila a Bíblia, tal princípio, no míni mo, estigmatiza a sua
maior parte como irrelevante. Por sua preciosidade e pureza a
Escritura é toda ouro, mas o toque mínimo de um tal
princípio pode converter a sua maior parte em escória.
Embora nem todas as afirmações da bíblia possam ser
consideradas absolutamente necessárias para a salvação, tudo
que se encontra nela é essencial para algum outro sá bio e
importante propósito; pois, se não fosse assim, estas não
teriam lugar na perfeita Palavra de Deus. A sabedoria humana
pode errar na tentativa de especificar a intenção de cada parte
da revelação de Deus, mas na eternidade nós iremos nos
convencer de que nenhuma de suas partes era inútil e sem
propósito. Toda Escritura é proveitosa. Um ensino das
Escrituras pode não ser essencial para salvação e, no entanto,
ser altamente importante para outro grande e gracioso
propósito na economia de Deus — isso pode ser necessário
para o nosso conforto pessoal, para nos direcio nar na forma
de viver a nossa vida, para nosso crescimento
10
APRESENTANDO A QUESTÃO

em santidade e, mais ainda, ser essencial para a totalidade do


sistema da verdade divina. A lei de Deus é perfeita. Riscar da
Bíblia uma verdade que possa parecer a mais irrelevante de
todas seria o mesmo que tirar a perfeição da Lei do Senhor.
Em arquitetura, o pino que preenche uma rachadura na
parede ocupa uma posição inferior, se comparado à pedra
angular; mas o construtor reconhece a importância tanto de
um como da outra e que ambas fa zem a sua parte na
estabilidade e harmonia da casa. Numa construção naval, os
parafusos e as porcas que seguram as peças de um navio são
insignificantes se as compararmos, por exemplo, com as
vigas de carvalho e com os mastros de pinho, mas cada um
contribui totalmente para manter a segurança da embarcação
e dos passageiros. Podemos dizer que o mesmo acontece na
teologia cristã. Cada fato, grande ou pequeno, que a Deus
aprouve revelar na Bíblia é, por isso mesmo, revestido de
valor e tem razão de ser. E, conquanto talvez possa ser
apropriadamente considerado como não essencial para a
salvação, não merece ser tido como descartável.
Toda verdade divina é importante, embora nem todas as
verdades divinas sejam igualmente importantes. A afir mação
mais simples da Bíblia é, para um ser imortal, uma questão
de muito maior relevância do que o mais sublime sentimento
de um mero gênio humano. Uma carrega consigo o que a
outra não contém — o selo da aprovação de Deus. Uma vem
para nós do céu, a outra tem carac terísticas terrenas. Uma
tem para nós especial interesse, como porção integrante da
Bíblia, que é a mensagem de Deus para cada indivíduo; a
outra é a produção de uma mente meramente humana, para a
qual nós e todo nosso interesse era igualmente desconhecida.
Qualquer verdade meramente humana é insignificante em
comparação com a mais insignificante das verdades de Deus.
A fé de um
11
A IGREJA APOSTÓLICA

i i isliUi deveria levá-lo a lutar para alcançar e se apegar a


liulo que Deus honrou dando um lugar em Sua Palavra, cujo
propósito é ser luz para os nossos pés, à medida que
peregrinamos neste mundo tenebroso. Além disso, a Bíblia é
diferente de todos os outros livros. A Palavra de Deus não
deixará de existir. O céu e a terra passarão, mas as palavras
de Cristo não passarão. O selo da eternidade está estampado
em cada versículo da Bíblia. Isso é suficiente por si só para
revestir cada linha da Bíblia de especial importância.
Com isso em mente, passamos à nossa exposição sobre
a política eclesiástica. Poucas pessoas ousariam afir mar que
uma correta compreensão sobre governo de Igreja é essencial
para a salvação. Entretanto, seria insensatez tentar depreciar
este assunto. O Espírito Santo trata deste tema nas Escrituras.
O mundo cristão está dividido quanto a sua opinião sobre
este assunto, desde a Reforma. Pessoa alguma pode se filiar a
uma igreja cristã sem se colocar ao lado da verdade ou do
erro nessa questão particular. E as posições que adotamos
sobre este assunto são capazes de influenciar as nossas
opiniões no que diz respeito à fé e à prática cristãs. Diante de
tais fatos, embora não possamos considerar o governo da
Igreja Neo-Testamentária como essencial à salvação humana
não devemos, por outro lado, subestimar a sua importância.
As várias formas de governo de igreja que existem
atualmente no mundo cristão podem ser classificadas em uma
das seguintes categorias: Episcopal ou Prelado,
Congregacional ou Independente e Presbiteriano. Não
empregamos esses termos em sentido ofensivo, mas como
termos mais precisos para denotar os seus respectivos
sistemas. Episcopal é a forma de governo administrado pelos
arcebispos, bispos, deãos, arcediago e outros oficiais
eclesiásticos, dependendo de qual hierarquia; exemplos
12
APRESENTANDO A QUESTÃO

disto são a Igreja Grega, a Igreja Romana e a Igreja da


Inglaterra. Congregacional é a forma de governo cujo
princípio distintivo é a compreensão de que cada con
gregação separadamente, está sob Cristo e, portanto, não está
sujeita a nenhuma jurisdição externa qualquer que seja, pois
cada congregação tem, em seus oficiais e mem bros, todos os
elementos necessários para o exercício do governo;
exemplos disso são a Igreja Congregacional e a Igreja
Batista. Presbiteriano é a forma de governo que é regido
pelos presbíteros docentes e regentes reunidos em Conselho,
Presbitério, Sínodo ou Assembléia Geral (que no Brasil
denomina-se Supremo Concilio. N.E.); esta forma de
governo é praticada pela Igreja Presbiteriana da Irlanda,
Escócia, Inglaterra e Estados Unidos. Essas três formas de
política eclesiástica são, até este momento, pre dominantes no
mundo cristão. Na verdade, todas as outras organizações que
qualquer grupo considerável de cristãos tem adotado é
somente uma modificação ou mistura de alguns dos sistemas
mencionados acima.
Um exame muito breve nos permite ver que estes três
sistemas diferem amplamente em seus princípios
característicos. E não apenas isso, o sistema Episcopal, em
todos os seus princípios fundamentais, é oposto ao sistema
Presbiteriano. E o sistema Congregacional por sua vez, em
seus princípios fundamentais é oposto tanto ao sistema
Episcopal quanto ao Presbiteriano. Podemos estar certos de
que três sistemas que diferem tanto um do outro não podem
estar todos embasados biblicamente e não podem,
naturalmente, reivindicar que os seus res pectivos defensores
estejam igualmente certos. Está bem claro, além disso, que a
Palavra de Deus, a nossa única regra de fé e de prática, não
pode aprovar todos esses sistemas; isto porque, uma vez que
a Palavra de Deus não se contradiz, ela não pode confirmar
sistemas contra
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A IGREJA APOSTÓLICA

ilitórios. Um destes três sistemas deve estar de acordo com a vontade de Deus revelada na
Bíblia e os outros não. Saber qual dos três é o verdadeiro deve ser uma matéria que exerce
profundo interesse sobre cada filho de Deus. Entre todos os homens, os cristãos têm a
obrigação de amar a verdade; e nós não estamos errados em supor que, se um cristão se
convence sobre qual destes sistemas antagônicos tem o respaldo da Palavra de Deus,
deveria defender este sistema com todas as suas forças e não daria qualquer tipo de apoio
aos outros. Se alguém, depois de ver a diferença, continuar a defender o que não passa de
mera invenção humana com a mesma consideração do que é divino, que dê adeus ao
Cristianismo e pare de fingir que estima e ama a verdade. A religião de Jesus Cristo, a
menos que estejamos redondamente enganados, exige que todos os cristãos amem o que é
verdadeiro e desprezem o que é falso, que façam o que é certo e detestem o que é errado,
que acolham o bem e abominem o mal. De forma que, se nós assumimos posições erradas
e as estimamos como se fossem verdadeiras, isto é o mesmo que jogar na lata de lixo a
mais básica exigência do Cristianismo. Geralmente a influência do cristão neste mundo é
muito pequena mas, seja ela qual for, isso é um talento; seja o tempo, ou o dinheiro de que
dispõe, ou a sua capacidade intelectual, ele terá de prestar contas a Deus. Terá que
responder pelo fato de que deve estar ao lado da verdade e não contra ela.
Qual é, então, desses três sistemas de governo preva lecentes ao longo da história do
mundo, que o cristão tem o dever de escolher e apoiar?
Esta é uma questão de grande importância. Somos levados a considerar as situações em
que uma congrega ção dissidente se ergue e, como nova igreja, abre as suas portas. No
entanto, precisamos admitir que a maioria dos
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APRESENTANDO A QUESTÃO

cristãos conseguem passar toda a vida sem pensar nesse tema


tão interessante, sequer por uma única hora. Muitas pessoas
estão satisfeitas por seus antepassados terem es colhido uma
igreja para eles. Assim, todos os domingos vão para a igreja
seguindo as pegadas dos seus respectivos bisavós sem saber e
sem se importar com o porquê disso. Alguns não questionam
com medo de que isso os leve a reconhecer que a igreja a que
pertencem por tradição fa miliar, ou por educação ou mesmo
por hábito, é destituída de toda e qualquer autoridade bíblica
e temem passar pelo desconforto de terem que enfrentar
conflitos por causa de suas convicções e interesses. Contudo,
a principal razão por que muitas pessoas não têm disposição
para questionar sobre este assunto é que todos ou quase todos
os púlpitos são silenciosos sobre governo eclesiástico. Quanto
a isto, o problema não é com as afirmações incertas, o
problema é que normalmente, nada se diz. Estamos
convencidos de que há pouquíssimos pastore.s que sobre o
assunto em questão dizem aos membros de suas igrejas:
“jamais deixei de vos anunciar todo desígnio de Deus”. Se as
pessoas jamais tiverem a atenção chamada para aquelas
passagens que tratam do governo da igreja, jamais dedicarão
tempo ao assunto ou refletirão sobre ele. O resultado é que a
grande maioria dos membros vive na mais total ignorância,
não apenas quanto ao ensino bíblico relativo ao governo da
igreja, mas também sobre as peculiaridades da sua própria
denominação; são episcopais, congregacionais ou
presbiterianos de nascença, não por convicção; acham que
todas as formas de governo são igualmente certas, o que é o
mesmo que dizer que a forma de governo não tem
importância nenhuma; não têm idéias firmes a este respei to; e
assim, pela falta de instrução pública, são educados pelas
circunstâncias e preparados para aceitar ou não o primeiro
sistema com o qual se deparam, levando em conta
15
A IGREJA APOSTÓLICA

a|K‘iiiis ;is suas próprias conveniências ou apromoção das


ambições terrenas. De fato, muitos que a julgar pela sua
suíis
caridade são cristãos, agem para com a denominação a que
pertencem por nascimento ou por “acidente”, de uma
maneira sentimental, cega ou com uma indiferença
pecaminosa; e embora diferentes formas de governo
eclesiástico tenham representantes em cada bairro, estes
estimulam as pessoas a viverem a sua vida sem dar ne nhum
valor a este assunto e a nunca se incomodar com o fato de
que cada igreja existente sugere a pergunta: Qual destes é o
sistema de governo correto?
Muitas pessoas que deixam de freqüentar uma igreja e
vão para outra, exercitando assim o seu direito de escolher
entre várias formas de governo eclesiástico, são levadas a
fazer tais escolhas por motivos que nunca deveriam
influenciar um cristão inteligente. São mais levados pelo
sentimento que pela razão. Eles não se familiarizam primeiro
com os princípios básicos da denominação a partir de seus
livros e documentos oficiais para depois examiná-los à luz da
Palavra de Deus. A maior parte da humanidade não é educada
suficientemente para analisar princípios e julgá-los. Pelo
menos a grande maioria das pessoas não percebe os erros em
suas escolhas e, pelo con trário, são influenciados pela
autoridade de algum homem notável ou pelo valor moral de
alguém, ou mesmo pela eloqüência e piedade de um algum
pastor local. Pode-se dizer ainda que as pessoas podem ser
influenciadas por ressentimentos, por desejos mesquinhos,
amor a posições, valores do mundo, ou por alguma outra
coisa igualmente futil e medíocre. Mas, escolher entre os
sistemas Episcopal, Independente e Presbiteriano baseado em
tais coisas é re almente o cúmulo do absurdo. Se alguém tentar
escolher um sistema de governo por causa dos grandes
homens que o defenderam, é bom que se diga que, de cada um
destes
16
APRESENTANDO A QUESTÃO

sistemas, pode-se fazer uma lista enorme dos notáveis que


defenderam os seus sistemas até o último minuto de suas
vidas. Se alguém quiser basear a sua escolha no valor moral
de cada sistema, saiba que para cada um deles pode-se
apresentar um número razoável de coisas boas que dependem
da sua prática e que se refugiam à sua sombra. Se nós
perguntarmos qual destes sistemas tem pastores capazes e
piedosos para instruir o povo, encontraríamos um grande
número de pessoas com estas características ocupando o
púlpito de cada uma das igrejas que, respec tivamente,
praticam estes sistemas de governo. Se dermos um passo
adiante, não raramente podemos encontrar na mesma cidade
um pastor eloqüente e poderoso na Palavra de Deus e que
trabalha arduamente como se fosse uma abelha na colméia,
pregando os favos de mel da Santa Escritura para a edificação
do povo; enquanto na mesma denominação, pode ser que
haja, no outro lado da rua, um pobre e coitado zangão que só
faz zumbir durante todo o ano sem ser diligente no seu
trabalho. Quaisquer desses critérios para escolher um sistema
de governo, embora comuns, são imprecisos e inseguros.
Segundo nos parece, há uma forma muito mais satis
fatória de escolher um sistema de governo em vigor no
mundo atualmente, ou seja, examinar os seus princípios
peculiares tendo como critério a Palavra de Deus. A Bíblia é
suficiente para mostrar o caminho para o cristão sobre este
assunto específico, bem como sobre outras questões, pois a
intenção do Autor Divino ao nos dar a Bíblia é que esta seja a
nossa regra de fé e de prática. A Bíblia nos fornece elementos
para formar a nossa opinião sobre este assunto. A Palavra de
Deus nos fala de uma igreja que foi organizada 1800 anos
atrás.1 Os fundadores daquela Igreja

1 Tenhamos em mente que o autor escreveu este livro no século XIX. 17


A IGREJA APOSTÓLICA

Ibi iim os apóstolos e profetas, agindo pela autoridade de


l )eus. Certamente cada fato conhecido sobre a constituição
original da Igreja, está registrado na Bíblia; o que quer que
esteja preservado em algum outro lugar que não seja a Palavra
de Deus, é apenas invenção e tradição humana. Nós
encontramos nas Escrituras muitos fatos e ensinos que nos
capacitam a conhecer de uma maneira bastante acurada a
história, a doutrina, a adoração e o governo da Igreja que
existiu nos dias apostólicos. Os princípios de governo
exercidos em uma igreja que foi fundada por homens
inspirados, precisam ter, estamos convictos, a aprovação de
Deus. A corrupção tanto em governo ecle siástico quanto em
doutrina começou a surgir logo no início, mas a igreja dos
dias dos apóstolos era mais pura do que o foi nos anos
subseqüentes. O método mais óbvio, portanto, para se chegar
à verdade, é comparar os sistemas modernos de governo
eclesiástico com o modelo apresen tado nas Sagradas
Escrituras. O sistema que apresenta a maior semelhança com
o modelo neotestamentário é, mais provavelmente do que
qualquer outro, aquele que está em conformidade com a
vontade de Deus.
Os defensores mais ardorosos dos sistemas existentes na
atualidade não podem de forma honesta objetar a este teste.
Dificilmente há na terra igreja que não reivindique sua
apostolicidade. As igrejas que praticam a forma de governo
episcopal se dizem apostólicas. As igrejas cuja forma de
governo é a presbiteriana também se dizem apos tólicas. Cada
uma dessas igrejas professa manter a mesma doutrina,
liturgia e forma de governo que caracterizaram a igreja
plantada por Jesus Cristo. Quanto ao último ponto
— governo eclesiástico— nos propomos a fazer um exame
destas reivindicações usando o critério que eles mesmos
escolheram. Despindo-nos de qualquer preconceito vamos à
lei e ao testemunho, desejosos de conhecer o que Deus
18
APRESENTANDO A QUESTÃO

diz em sua Palavra sobre o assunto em questão. Devemos ir


aonde quer que as Escrituras nos digam que devemos ir. Va
mos examinar a Bíblia para ver o que ela ensina sobre este
importante tema. Se depois de examinar cuidadosamente, não
tivermos descoberto nenhum princípio claro e definido sobre
governo eclesiástico, concluiremos inevitavelmente que os
sistemas episcopal, congregacional e presbiteriano estão no
mesmo nível e que nenhum deles tem base bíbli ca. Desse
modo, os critérios para escolher um sistema de governo serão
as vantagens e conveniências de cada um. Se, por outro lado,
descobrirmos que certos princípios de governo eclesiástico
são ensinados nas Escrituras, então, quando tivermos
averiguado minuciosamente quais são estes princípios,
teremos encontrado a vontade de Deus quanto a este assunto
e o critério pelo qual poderemos julgar o valor dos sistemas
de governo existentes e, assim, saber se têm base bíblica ou
não.

S ig n if ic a d o d a P a l a v r a I g r e j a

A palavra Igreja em linguagem informal tem várias


conotações. As vezes significa o prédio construído para
cultuar a Deus; às vezes significa o povo reunido no re ferido
prédio; às vezes significa o clero em distinção com os leigos;
às vezes significa a coletividade dos cristãos professos.
Como o uso geral é a lei da linguagem, não nos opomos à
variedade de significados que são dados ao ter mo pelos
escritores; também não precisamos discutir aqui as várias
inconveniências de ordem prática que advêm des se uso
indiscriminado, visto que as circunstâncias que as
acompanham geralmente determinam o sentido específico
em que a palavra deve ser entendida. Mas, não devemos
esquecer nunca de que, quando interpretamos a Palavra de
Deus, a variedade de sentidos comumente vinculada ao
19
A IGREJA APOSTÓLICA

Ia mo c lokilincnte inadmissível e se for adotada, poderá


obscurecer e corromper o significado da Revelação Divina. A
pa Iavra Igreja tem apenas um significado nas Escrituras, ou
seja, uma assembléia do povo de Deus — uma comu nidade
de cristãos. A palavra grega ecclesia, no seu uso comum e
público significa qualquer assembléia convocada para
qualquer propósito (Atos 19:32); mas no seu melhor sentido,
que é o religioso, significa uma comunidade de
cristãos e é invariavelmente traduzida pela palavra Igre ja.
Examine as Escrituras do começo ao fim e você verá que a
palavra Igreja nunca tem outro significado além desse.
Desafio quem quer que seja a mostrar, se puder, alguma
passagem da Palavra de Deus em que o sentido
seja prejudicado se a expressão comunidade de cristãos ou
assembléia cristã for substituída pela palavra Igreja.
Estamos persuadidos de que isso seria impossível.
Embora o significado da palavra Igreja seja sempre o
mesmo nas Escrituras, é bom que observemos que as suas
aplicações são muitas. É aplicado, de acordo com o gosto do
escritor, a qualquer comunidade de cristãos seja ela pequena
ou grande. Exemplos disso são sempre auto evidentes a todos
que estão familiarizados com a Palavra de Deus. As
seguintes passagens mostram isso:
Colossenses 4:15 — “Saudai os irmãos de Laodicéia, e
Ninfa, e à igreja que ela hospeda em sua casa”. Aqui o
termo é aplicado a uma comunidade de cristãos tão peque na
que podia ser acomodada em uma casa particular.
Atos 11:22 —“A notícia a respeito deles chegou aos
ouvidos da igreja que estava em Jerusalém; e enviaram Bam
abé até Antioquia”. Neste caso, a palavra Igreja significa uma
comunidade de cristãos que vive em uma mesma cidade e,
segundo sabemos com bastante proprie dade, incluía algumas
milhares de pessoas.
Atos 7:38 — “É este Moisés quem esteve na con 20
APRESENTANDO A QUESTÃO

gregação no deserto, com o anjo que lhe falava no monte


Sinai e com os nossos pais; o qual recebeu palavras vivas
para no-las transmitir”. Agora a palavra Igreja significa uma
comunidade de crentes — uma assembléia do povo de
Deus que era tão grande a ponto de incluir uma nação inteira,
consistindo naquela época de pelo menos dois milhões de
pessoas. O termo é aplicado também ao povo de Deus dos
dias de Davi, quando o povo residia em Canaã, espalhado
por um grande território e que chegava a milhões de pessoas.
Hebreus 2:12, comparado com Salmo 22:22-25.
I Coríntios 12:28 —“A uns estabeleceu Deus na igreja,
primeiramente apóstolos; em segundo lugar, profetas; em terceiro
lugar, mestres; depois operadores de milagres; depois, dons de
curar, socorros, governos, variedades de línguas”. Aqui o termo
significa”uma comunidade de cris tãos vivendo no mundo; porque
foi entre os cristãos que Deus levantou homens possuidores dos
dons de apóstolo e de profeta, não entre os santos na glória.
Efésios 5:25 — “Maridos, amai vossa mulher, como
também Cristo amou a Igreja e a si mesmo se entregou por
ela”. A palavra aqui é usada para designar a comu nidade de
cristãos em um sentido mais amplo”— todos pelos quais
Cristo morreu — a família de Deus como um todo — todos
os santos no céu e os crentes na terra, como sendo uma
grande companhia.
Devemos notar, contudo, que no meio de toda esta
variedade de aplicação, a palavra Igreja nunca é emprega da
em outro sentido. Todas as vezes em que esta palavra é
usada, o sentido é sempre o mesmo. Contudo, em sua
aplicação ela nunca deixa de significar uma comunidade
de cristãos; no entanto a comunidade que o autor inspirado
tem em mente, se é pequena ou grande, geral ou particular, é
para ser inferido não a partir do termo, mas das circuns
tâncias em que o termo é usado. Em cada instância é a
21
A IGREJA APOSTÓLICA

p.irlii- do contexto, não a partir do termo em si mesmo, que


definimos se a comunidade de cristãos referida pelo aulor
deve ser entendida como a coletividade do povo de Deus na
terra e no céu, ou apenas aqueles vivendo na terra, em uma
nação, em uma cidade ou em uma residência particular. A
prática — na qual a maioria dos melhores expositores
bíblicos se traem — de defender uma idéia inferida apenas a
partir do contexto e considerar esta como sendo o significado
de uma dada palavra é, segundo um crítico do passado, a
origem dos inúmeros sentidos dados a uma única palavra e a
quase todas as palavras em nossos dicionários clássicos, o
que confunde pela sua variedade, tomando esta a fonte de
erros na interpretação da Palavra de Deus. Isto é, obviamente,
o que tem levado muitos a pensarem que a palavra Igreja tem
muitos sig nificados — significando uma coisa diferente
quando se refere ao conjunto universal dos crentes e
significando outra coisa quando se refere ao conjunto de
crentes de uma certa localidade. A verdade é que a palavra
Igreja
tem apenas um significado, mas tem várias aplicações. A
palavra em si mesma nunca é usada para designar outra coisa
além de uma sociedade de cristãos; é o contexto que
invariavelmente determina a sua aplicação geral ou
particular. É claramente falho e impreciso, portanto, sus tentar
que uma idéia inferida a partir do contexto, seja o real
significado da palavra; isto quando, e todos hão de convir, o
termo à parte do seu contexto não sugere nem uma aplicação
limitada nem uma aplicação universal.
Se tivéssemos oportunidade de falar dos vários grupos
cristãos de um estado ou nação, cada um em sua própria
jurisdição, estaria bem de acordo com a linguagem bíblica
designá-los como as igrejas daquela região. Ninguém pode
esquecer a forma freqüente como os apóstolos falavam das
igrejas da Síria e Acáia, da Galácia e da Ásia. De
22
APRESENTANDO A QUESTÃO

forma que, se formos requeridos a falar de congregações


particulares de cristãos na Irlanda — as comunidades de
cristãos espalhadas pelo país— nós poderemos chamá-las de
as igrejas da Irlanda sem haver nada no uso eclesiás tico que
faça tal linguagem ser unilateral ou passível de ser mal
interpretada. Mas, é bom notarmos que, quando usamos
expressões como a — “Igreja Estabelecida da Escócia”, a
“Igreja Episcopal dos Estados Unidos, ou a
“Igreja Presbiteriana da Irlanda”, o termo Igreja mantém o
mesmo sentido usado nas Escrituras. O sentido dessa pala vra
nas Escrituras é, como já vimos, invariavelmente uma
comunidade de cristãos e esse é o exato significado das
expressões acima. Pelo contexto, os cristãos designados pelo
termo são aqueles que professam certos princípios e
pertencem a um dado país. Quando empregamos, por
exemplo, uma designação como a Igreja Presbiteriana
da Irlanda, a palavra Igreja é usada precisamente no sentido
bíblico para denotar uma comunidade de cristãos que,
segundo sabemos pelo contexto, professa princípios
presbiterianos e mora na Irlanda.
O uso apropriado do termo para significar o povo cristão
de um certo país, não decorre do fato de que eles estejam
reunidos em uma congregação, seja pessoalmente ou através
de representantes, mas decorre do fato de que a lógica os
contempla como sendo um conjunto ou um corpo coletivo.
Todos os santos no céu e os crentes na terra são chamados de
Igreja, não porque eles estejam reunidos de forma literal ou
figurada mas, por causa desta lógica, eles são considerados
uma grande comunidade, separada do mundo e unida através
de princípios comuns em uma grande fraternidade. Assim
pois, os cristãos de qualquer denominação podem, em suas
respectivas jurisdições, ser propriamente chamados de Igreja;
a razão para isto não é o fato de eles estarem reunidos, mas
porque, de acordo
23
A IGREJA APOSTÓLICA

com essa lógica, nós somos levados instintivamente a


considerá-los um corpo coletivo, um conjunto, distintos uns
dos outros e ao mesmo tempo unidos pelo fato de
professarem um credo comum.
Já se duvidou que as Escrituras tivessem um exemplo da
palavra Igreja sendo aplicado aos cristãos de um país. A
ciência do criticismo bíblico tem levantado uma questão que
nunca foi ventilada em tempos passados. A verdadeira leitura
de Atos 9:31 é, “A Igreja, na verdade, tinha paz
por toda a Judéia, Galiléia e Samaria, edificando-se e ca
minhando no temor do Senhor, e, no conforto do Espírito
Santo, crescia em n ú m e r o Ninguém com pretensões de
erudição pode agora hesitar em aceitar isso como sendo a
forma original do texto — quando se sabe que a recente
descoberta do Codex Sinaiticus a sustenta, tanto quanto os
manuscritos Alexandrinus, Vaticanus e Ephaemi; são estes
quatro os manuscritos mais antigos e valiosos do Novo
Testamento agora existentes. E isto para não falar da evi
dência derivada da versão dos Pais da Igreja, a voz unida
destes quatro manuscritos é suficiente para estabelecer a
forma correta de qualquer texto; ninguém pode questionar o
testemunho destes manuscritos quanto à leitura original de
Atos 9:31; e em relação à passagem que seguramente
apontamos como sendo um exemplo claro da aplicação da
palavra Igreja aos cristãos de um determinado país, como
sendo uma comunidade unida, embora dividida em muitas
congregações.
Alguns escritores, na verdade, têm diferentes compre
ensões sobre este assunto. Eles nos dizem que a comuni dade
universal dos cristãos no céu e na terra é chamada nas
Escrituras de Igreja, não porque seja vista como uma grande
fraternidade, unida por princípios comuns, mas porque eles
“são em todos os tempos verdadeira e apro priadamente
reunidos em Jesus”. É uma mera fantasia
24
APRESENTANDO A QUESTÃO

supor que um raciocínio mais lógico nunca leve esta rea


lidade em consideração quando o termo é empregado em sua
aplicação universal. Mas, sendo assim, isso não altera o caso.
Os cristãos de um certo bairro ou de um estado ou nação
podem ser apropriadamente chamados de Igreja pe las
mesmas razões; porque eles também “são em todos os
tempos verdadeira e adequadamente reunidos em Jesus”.
Não faz nenhum sentido acreditar que todos os cristãos no
céu e na terra estão reunidos em Jesus e os cristãos de um
determinado país não possam também estar reunidos em
Jesus. Se o todo está reunido, as partes também estão. De
uma forma ou de outra, os cristãos de um bairro, de um
estado ou de uma nação que têm certos princípios em
comum, considerados como uma comunidade, são a Igreja,
exatamente no sentido em que este termo é usado nas
Escrituras. Eles são uma Comunidade de Cristãos.

GovernodaI greja

A Comunidade Cristã na terra ou, como é mais conhe


cida, a Igreja, é representada nas Escrituras como sendo um
reino. Foi à sua Igreja que o Senhor se referiu quando disse a
Pilatos, “O meu reino não é deste mundo” (João 18:36). O
fato de ser um reino, necessariamente implica em pelo
menos três coisas — primeiro, um rei ou gover nador,
segundo, súditos', terceiro, leis. Na Igreja ou Reino de Deus,
o rei é Cristo', os súditos são os crentes', as leis são as
verdades das Escrituras.
Todo rei tem oficiais debaixo de sua autoridade que
estão encarregados de executar as suas leis e que têm
autoridade da coroa para exercer justiça e julgar. Juizes e
magistrados são os oficiais de um reino e derivam o seu
poder do monarca debaixo de cujo domínio servem e põem
as leis em prática entre todos os segmentos da
25
A IGREJA APOSTÓLICA

soucdadc c entre todas as classes de pessoas. Portanto,


podemos dividir um reino em governadores e governados
aqueles cujo dever é administrar a lei e aqueles cujo dever é
obedecer à lei.
A mesma distinção pode ser feita no Reino de Cristo.
Pois esse também consiste em governadores e governados —
os oficiais encarregados do exercício da lei e o povo que tem
a obrigação de se submeter a eles. Isto é bastante claro em
Hebreus 13.17: “Obedecei aos vossos guias e sede submissos
para com eles; pois velam por vossa alma, como quem deve
prestar contas..”. Essa passagem deixa claro que há alguns
na Igreja cujo dever é governar; estes são os oficiais da
Igreja. Não é menos claro o fato de que há outros na Igreja
cujo dever é obedecer; eles são os membros que pertencem ao
reino — o povo.
Mas em toda comunidade onde se reconhece o dever de
algumas partes de exercer autoridade e de outras se subme
terem, deve existir o que se chama de governo. A essência de
todo governo consiste de tal autoridade exercida por um lado
e da submissão praticada pelo outro. Mesmo se não existisse
nenhuma outra passagem sobre este assunto além daquela
citada, é inegável que um governo foi estabelecido na Igreja
Apostólica. Se existiu governo, então, alguma forma de
governo foi indubitavelmente, adotada; assim pois, dizer que
havia governo no reino de Cristo sem uma forma de governo
é absurdo. A história nos fala de muitas coisas espantosas no
campo eclesiástico e político, mas de todas as coisas
estranhas que se têm testemunhado no mundo ou na Igreja
desde o princípio dos tempos, nunca até agora apareceu um
governo sem uma forma de governo. Isto é impossível. O
governo é em si mesmo uma abstração. A partir do momento
que passa a ser exercido e se toma uma realidade — passa a
existir diante do mundo como ■uma realidade visível —
assume uma forma.
26
APRESENTANDO A QUESTÃO

É muito fácil demonstrar que houve um governo na


Igreja Apostólica e que este governo existiu dentro de uma
certa forma. Determinar com precisão que forma era essa é
uma matéria de grande importância e que tem muitas
implicações pois é evidente para todos que um plano de
governo de Igreja instituído pelos apóstolos do Senhor,
agindo sob a direção do Espírito Santo, necessariamente tem
um peso muito grande e uma autoridade que nenhum sistema
humano, embora seja em si mesmo uma obra prima de
sabedoria — admirada no decorrer dos anos e recomenda
pela sua utilidade e conveniência — pode exi bir; e que
qualquer forma de governo existente só merece respeito se
estiver em conformidade com o modelo bíblico de governo
eclesiástico. Mas há algumas razões óbvias que tomam um
tanto difícil averiguar com muita precisão o sistema de
política eclesiástica que foi estabelecido na Igreja do Novo
Testamento.
1) Os apóstolos escrevendo para cristãos que eram
membros da Igreja apostólica, e é claro bem familiari zados
com a sua organização, não julgaram necessário fazer
descrições detalhadas da comunidade cristã. Fazer isso
poderia não ter sido natural. Eles faziam afirmações
ocasionais sobre fatos concernentes ao governo de Igreja e
fizeram alusões indiretas a práticas prevalecentes. Tais
alusões e fatos foram suficientemente sugestivos e inteligí
veis para as pessoas a quem eles escreveram originalmente.
Mas não são entendidos tão facilmente assim por nós que
vivemos em outra época, em uma nação estrangeira e entre
associações largamente diferentes.
2) Eles nem mesmo dispuseram esses fatos para teste
munharem sobre uma tal questão, de maneira sistemática. Se
o homem fosse o autor da Bíblia, ela seria um livro
completamente diferente; mas como não pudemos esco lher
isto, temos de estar contentes com o que temos. Ao
27
A IGREJA APOSTÓLICA

examiná-la vemos que a Bíblia não ensina nada em uma


ordem científica. Mesmo moralidade e doutrina não estão
dispostas em uma ordem regular, mas são registradas em
porções separadas, de forma que a nossa engenhosidade é
estimulada quando temos de juntar os fragmentos espa
lhados, compará-los uns aos outros e colocá-los em ordem
para nós mesmos. De modo que a política eclesiástica não é
ensinada na Bíblia metodicamente, mas fatos, alusões e
circunstâncias se espalham pelo campo da revelação, os
quais temos de examinar, pesquisar, relacionar e classi ficar.
Agora, nem todos concordam quanto à disposição destes
fatos, nem quanto às inferências que podemos legitimamente
fazer a partir deles e nem quanto ao modo de construir um
sistema a partir do material espalhado.
Essas coisas tomam um tanto difícil ver com clareza e
mais difícil ainda ver de modo unânime a forma de gover no
da Igreja instituída na época pelos apóstolos. Embora pareça
difícil, está provado ser bastante possível descobrir, através
de um exame cuidadoso e sem predisposições, os princípios
constitutivos mais importantes da Igreja Primitiva. Dissemos
princípios mais importantes — não devemos esperar mais do
que isso. A Palavra de Deus, excetuando-se raras instâncias,
não entra em detalhes, mas afirma princípios. Essa
peculiaridade da Palavra de Deus, que é bastante perceptível,
merece algumas considerações. Em qualquer país civilizado
pode-se observar como aque les a quem foi confiado o dever
de governar pretendem ter uma lei para cada caso especifico.
O legislador humano desce aos mínimos detalhes. O
resultado disso é que, em nosso próprio país, as leis comuns
instituídas da Inglaterra são tão volumosas que os livros que
versam sobre elas poderiam formar uma grande biblioteca. O
Parlamento se reúne todos os anos com o expresso propósito
de criar novas leis e fazer emendas nas velhas leis para
adequá
28
APRESENTANDO A QUESTÃO

las às circunstâncias dinâmicas de um país e ou de uma


época. Apesar de todo o esforço, diariamente nas cortes
públicas ocorrem casos em que os melhores juristas têm de
admitir que as leis existentes nada dizem sobre certas
situações. Mas observemos como a lei de Deus funciona de
modo bastante diferente. A lei de Deus, dificilmente entra em
detalhes específicos, mas estabelece princípios gerais, sendo
qualquer um deles suficiente para decidir uma grande
variedade de casos. Em vez de, por exemplo, tentar
prescrever cada coisa boa que os homens devem praticar para
com o seu próximo, a lei de Deus oferece um princípio
suficiente para atender cada caso e cada necessidade — ama
o teu próximo como a ti mesmo. Em vez de enumerar as
diferentes formas pelas quais os filhos devem se portar
quanto aos pais, as Escrituras prescrevem esta lei geral que
cobre cada situação — honra a teu pai e tua mãe.
Especificando cada forma de pecado que os cristãos devem
evitar, os estatutos do Senhor dizem: “Fugi da aparência do
m a l A legislação humana desce aos pormenores, mas a
legislação divina prescreve princípios gerais. O resultado é
que enquanto há talvez mais espaço para diferenças de
opinião na interpretação e aplicação das prescrições de um
código da lei construída de acordo com este último sistema (a
legislação divina), esta des vantagem é mais do que
contrabalançada pelo fato de que as leis de Deus são perfeitas
nelas mesmas; elas não mudam como as circunstâncias
sempre mutáveis de um país ou de uma época; as leis de
Deus contemplam cada situação que, possivelmente, venha a
ocorrer; e essas leis não estão escritas em um grande número
de livros como as leis humanas, estando todas elas escritas
em um livro tão pequeno que apenas uma mão o pode
levantar e que cabe até mesmo em um bolso. As Escrituras
nos ensinam governo de Igreja tanto quanto nos ensinam
moralidade.
29
A IGREJA APOSTÓLICA

As Escrituras não nos dão muitos detalhes, mas nos for necem
os mais importantes princípios norteadores que foram usados
na política da Igreja Apostólica. Verificar quais foram esses
princípios mais importantes é agora o nosso propósito.2
A prática comum dos escritores nessa importante
discussão sobre governo eclesiástico é selecionar uma de
nossas Igrejas modernas que seja a favorita, delinear as suas
características marcantes e, então, mostrar que elas são o
reflexo do modelo apresentado na Palavra de Deus. Podemos
acreditar de pronto que esse plano tem algumas vantagens,
mas não é menos óbvio que seja passível de algumas sérias
objeções. Isto parece supor logo a princípio a conclusão à
qual o pesquisador pode apenas esperar nos conduzir depois
de um processo lógico e saudável. Isto de alguma forma
produz a impressão fatal de que o escritor tem determinado
em primeiro lugar que a sua visão do assunto está certa e,
então, vai para as Escrituras procurar a base para isto. O autor
pode ser o mais imparcial e o mais ardoroso amante da
verdade entre os homens, mas o seu ponto de partida o trai ao
mostrar a sua preferência por um dado sistema e, assim,
desperta de início o pre conceito dos leitores. Além disso, ao
analisar passagens das Escrituras fora do seu contexto, os
escritores são tentados a usar apenas os textos que lhes
favorecem. Por essas razões preferimos não adotar esse
método para o presente caso.
O plano de procedimento a cuja realização nos pro
pomos é menos usual, embora, creiamos que não seja menos
satisfatório. Examinaremos as Santas Escrituras tendo em
mente averiguar os vários fatos que tenham al guma coisa a
dizer sobre o governo da Igreja Apostólica.

2 Este parágrafo foi sugerido pela leitura do sermão do Dr. Paley baseado em
Romanos 14:7.
30
APRESENTANDO A QUESTÃO

Trabalharemos nessas passagens contemplando-as em seu


contexto imediato tentando descobrir o seu significado e ver
se, pela ajuda delas, podemos chegar aos princípios mais
importantes. Voltaremos então a nossa atenção para as
Igrejas modernas para ver as diferentes formas de po lítica
eclesiástica que existem no mundo atual e verificar qual
delas incorpora todos ou quase todos estes princípios. Uma
vez feito isso, teremos encontrado a denominação que, em
termos de governo, é a mais qualificada a ser considerada a
Igreja Apostólica.
Esse processo de racionalização é tão claro e simples
que não há espaço para nos enganarmos; nem a nós nem aos
nossos leitores. A mente mais humilde poderá seguir o nosso
raciocínio até o final. Mas há dois passos até que cheguemos
à conclusão. Primeiro, temos de tirar da inerrante Palavra de
Deus os princípios que nortearam o governo da Igreja
fundada pelos apóstolos do Senhor e, em segundo lugar,
temos de concluir em qual das igrejas modernas esses
princípios são mais aceitos e aplicados. Então aplicaremos
um axioma para a resolução definitiva da questão, que irradia
através da luz da sua própria auto evidência. O axioma é, a
Igreja moderna que incorpora
mais princípios apostólicos no seu governo é a mais
próxima em seu governo à Igreja Apostólica.

31
32
Capítulo II

P r in c íp io s A p o s t ó l ic o s

A partir de um exame cuidadoso das Escrituras, en

contramos pelo menos quatro tipos de oficiais na Igreja


Apostólica: 1) Apóstolos; 2) Evangelistas; 3) Bis pos (também
chamados pastores e mestres); 4) Diáconos. Cada um desses
tinha o direito de exercer todos os ofícios inferiores ao seu;
mas quem tivesse um ofício inferior não tinha o direito de
exercer os deveres de um ofício superior. Assim, o ofício de
apóstolo incluía todos os outros; o de bispo ou presbítero
tinha o direito de atuar como diácono, contanto que, em
fazendo isso, não fosse impedido de de sempenhar as funções
do seu próprio ofício. Um diácono, por outro lado, não tinha
o direito de exercer o ofício de bispo; nem o bispo tinha o
mínimo direito de exercer o oficio de apóstolo. Cada ofício
superior incluía os que lhe estavam abaixo.
Dois desses ofícios — o de apóstolo e o de evangelista —
eram temporários, necessários ao estabelecimento da Igreja
Primitiva, mas não eram para ser perpetuados. Os apóstolos
foram testemunhas oculares da ressurreição do Senhor Jesus,
dotados de poder para operar milagres e conferir o Espírito
Santo através da imposição das mãos, eram os expositores
infalíveis da vontade de Deus e os fundadores da Igreja Cristã
que, tendo servido ao propó sito para o qual foram enviados,
saíram de cena e, como apóstolos, não deixaram sucessores.
Evangelistas eram missionários — homens que viajavam de
um lugar para
33
A IGREJA APOSTÓLICA

outro pregando o Evangelho e que agiam como assisten tes e


emissários dos apóstolos na organização das Igrejas. Destes,
Felipe, Timóteo e Tito foram os principais exem plos. Com
relação a esses ofícios temporários ou, como alguns
preferem, extraordinários, deve ser dito que sua esfera de
atuação não estava limitada a uma congregação em
particular, mas era extensiva à Igreja como um todo. Foram
membros de alguma Comunidade Cristã, dentro de cujos
limites viveram por algum tempo, mas a missão deles era
voltada para o mundo e a sua autoridade era extensiva à
Igreja Universal.
Os ofícios de bispo e diácono foram, por outro lado,
criados para serem perpétuos na Igreja. Os bispos, ou como
eles são mais comumente chamados, presbíteros, pastores e
mestres eram oficiais cujo dever era instruir e governar a
Igreja. Os diáconos tinham a obrigação de ocupar-se das
questões temporais e eram encarregados
do dever especial de suprir as necessidades dos pobres. A
Igreja sempre precisará destes dois ofícios enquanto seus
membros tiverem necessidades espirituais e temporais a
serem supridas. Devemos observar, com relação aos
presbíteros e diáconos, que eles eram primariamente oficiais
que atuavam em congregações. O raio de ação deles não era
tão amplo como o dos apóstolos, profetas e evangelistas. O
trabalho dos presbíteros e diáconos se limitava, na maioria
das vezes, a uma dada congregação ou a uma área sobre a
qual eram responsáveis.
Dr. Campell explica a necessidade especial que havia na
Igreja Primitiva tanto de ofícios temporários quanto de
ofícios perpétuos: “Comparando a partir de realidades
temporais: conquistar um reino e tomar-se o seu governante é
uma coisa; outra é governar o reino conquistado e manter a
riqueza adquirida nessa empreitada. Os mesmos agentes e
expedientes não se aplicam adequadamente a ambos os
34
PRINCÍPIOS APOSTÓLICOS

casos. Para o primeiro desses propósitos havia um grupo de


ministros ou oficiais extraordinários na Igreja que, a exemplo
de uma força militar, tinham como propósito conquistar e,
portanto não podiam estar restritos a um lugar enquanto
houvesse mais regiões para serem conquistadas. A missão
deles era, de certa forma, global e as suas funções eram
ambulantes, ou seja, não tinham paradeiro certo. Para o
segundo propósito havia um grupo de pastores e minis tros
ordinários — correspondente aos governantes civis
— ao qual era necessário atribuir obrigações e jurisdições
específicas a que estavam principalmente confinados para
que pudessem instruir o povo, presidir o culto público e as
ordenanças religiosas e lhes prestar a assistência necessária
para regular as suas condutas. Sem esse segundo grupo de
homens as conquistas realizadas não se manteriam por muito
tempo. A conseqüência inevitável da falta de líderes que
acompanhassem devidamente as igrejas recém-forma das
seria os membros se envolverem em práticas idólatras e
caírem em um estado de infidelidade. A distinção entre
ministros extraordinários e ordinários tem sido reconhecida
por polemistas de ambos os lados”.

O P r im e ir o P r in c íp io

Todos os ofícios na Igreja têm a sua origem no Senhor


Jesus. Ele mesmo é o autor e a personificação de todos eles.
Ele é o Apóstolo da nossa profissão. E o evangelista que
anuncia a paz a todos os que estão longe e perdidos e aos que
estão perto; é o grande pastor das ovelhas — o Presbítero das
almas; é o Diácono, ou servo, que veio não para ser servido,
mas para servir. Todos os ofícios na Igreja estão
personificados na pessoa de Cristo.
Os apóstolos foram os únicos oficiais escolhidos du rante
a vida terrena do Senhor. O próprio Senhor Jesus os
35
A IGREJA APOSTÓLICA

designou para o trabalho. Foram chamados para o ministério


pela voz de Jesus e comissionados pelas mãos do Senhor.
Simão e André estavam jogando suas redes ao Mar da Ga
liléia quando Jesus caminhava na praia. Contudo, ao serem
chamados por Jesus, deixaram as redes para seguirem ao
Senhor. Os filhos de Zebedeu, ao ouvirem a voz de Jesus,
imediatamente deixaram seu pai e sua mãe, ávidos por se
tomarem pescadores de homens. Quando Cristo disse
“ Segue-me!”, Levi esqueceu seus afazeres na alfândega e
deixou de ser um publicano. O chamado pessoal de Jesus era,
e é, a primeira e maior autoridade sob a qual alguém pode
legitimamente assumir um ofício na Igreja de Deus. Se tão-
somente formos convencidos por alguém de que a sua
vocação procede diretamente do Senhor — como o fizeram os
apóstolos — nada mais lhe exigiremos para sermos induzidos
a submeter-nos a ele. Todavia, depois da ascensão de Jesus ao
céu a chamada pessoal, excetuan do-se apenas o caso do
apóstolo Paulo que nasceu fora de tempo, não era o passaporte
para entrar no ministério ou no apostolado. Depois da
ascensão de Jesus, homem nenhum que tenha assumido
qualquer oficio na Igreja foi chamado pela Sua voz audível. A
partida de Jesus e a vaga aberta na lista dos apóstolos pela
morte de Judas, permitiram que um novo princípio entrasse
em operação. O primeiro capítulo do Livro de Atos coloca
toda a situação diante de nós. Va mos especialmente examinar
a passagem — Atos 1:13-26 :— na qual teremos uma
exposição completa dos fatos. É evidente que no intervalo
entre a Ascensão e o dia de Pen tecostes, os discípulos se
encontravam em um cenáculo na cidade de Jerusalém. A mãe
e os irmãos de Jesus estavam presentes juntamente com os
onze apóstolos. Todos juntos somavam cento e vinte pessoas.
Pedro se levantou e falou aos presentes. Ele os fez lembrar da
vacância no grupo dos apóstolos. Judas que traiu o Mestre
estava morto e o
36
PRINCÍPIOS APOSTÓLICOS

ofício que ele perdeu por causa da sua transgressão precisa


ser conferido a outro. Ele expõe as qualidades necessárias
que devem ser encontradas no sucessor de Judas. E obri
gatório que o candidato tenha tido muita proximidade com os
onze do começo ao fim do ministério terreno de Jesus. Pedro
também enfatiza quais devem ser as obrigações do novo
apóstolo; juntamente com os outros ele deveria ser uma
testemunha da ressurreição de Jesus. Esses foram os critérios
levantados por Pedro diante de todos os presentes àquela
reunião no cenáculo, na cidade de Jerusalém. Então, lemos
no versículo 23, — “Então, propuseram dois: José, chamado
Barsabás, cognominado Justo, e Matias'’. Em conseqüência
dessa dupla escolha tomou-se necessário decidir-se qual dos
dois seria o verdadeiro apóstolo. Isso foi feito depois de
orarem, através de lançamento de sor tes. Não esqueçamos
que, embora Pedro tenha exposto as qualificações necessárias
e os deveres peculiares ao ofício, a decisão não coube a
Pedro, mas aos irmãos a quem ele tinha dirigido a palavra.
Posteriormente, não deve ser es quecido que no versículo 20,
o ofício para o qual Matias foi escolhido, é chamado de
presbiterato (episkopen). E no versículo 25, é dito que ele foi
escolhido para “preencher a vaga neste ministério e
apostoladó". Os irmãos, ao serem estimulados por Pedro,
exerceram o direito de apontar um homem para o
presbiterado, ou seja, para o oficio de bispo e para tomar
parte no ministério. Na Igreja Apostólica o povo apontou
Matias para ser um ministro — um bispo
— um apóstolo. O caso relatado em Atos 14:23 tem a mes ma
natureza, embora, por um erro de tradução, a idéia não tenha
a mesma ênfase que tem no grego. A versão autori zada, em
inglês, fala de dois apóstolos, Bamabé e Paulo, como
ordenando presbíteros em cada igreja; enquanto o verdadeiro
significado dessa palavra no original é: “eleger
pelo levantar das mãos” — isso tem sido agora admitido 37
A IGREJA APOSTÓLICA

pelos melhores expositores.3 Não podemos admitir que um


erro de tradução obscureça o testemunho das Escrituras
sobre um fato tão importante, a saber: que os presbíteros do
Novo Testamento eram escolhidos para o oficio pelo voto
popular.
Examinemos o sexto capítulo de Atos. No período ao
qual esta narrativa se refere, o número dos discípulos em
Jerusalém havia crescido muito. Os gregos começaram a
reclamar dos judeus convertidos, dizendo que as viúvas deles
estavam sendo negligenciadas nas ministrações diárias. Até
aquele momento os doze tinham atendido as necessidades dos
pobres; mas, ao mesmo tempo, havia muitas outras
obrigações e numa multidão como aquela, não é de
surpreender que alguns estavam sendo preteridos, o que era
de se esperar considerando que a natureza huma na é propensa
à murmuração, mesmo estando os apóstolos na liderança. O
que deveria ter sido feito? A divisão dos ofícios era
claramente uma necessidade. Deveriam os apóstolos ter
assumido a responsabilidade de escolher pessoas que se
encarregassem de assistir as necessidades temporais da
comunidade? Se tivessem agido assim, pou cos questionariam
este direito deles, ou acusariam homens inspirados de terem
agido com autoridade despótica e ilegítima. Mas, em vez
disso, eles adotaram um procedi mento diferente. Trataram da
questão objetivamente de uma forma que a Igreja pudesse ter
uma base para a eleição de oficiais quando os apóstolos não
mais estivessem pre sentes. Dessa maneira abriram precedente
para as épocas futuras. Os apóstolos convocaram a multidão e
explicaram o caso. Disseram-lhes que como ministros tinham
por obrigação ir pregar a Palavra de Deus. Disseram-lhes
que não seria bom negligenciar o seu trabalho espiritual

3 Sobre esta passagem, veja Dean Alford


38
PRINCÍPIOS APOSTÓLICOS

para atender às necessidades temporais da comunidade.


Mandaram então que os irmãos escolhessem entre eles
mesmos sete homens de bom caráter, cheios de sabedoria e
do Espírito de Deus, que pudessem se encarregar das
questões seculares, deixando-os assim livres para se dedi
carem às atividades próprias do seu oficio, ou seja, orar e
ministrar a Palavra de Deus. “Oparecer agradou a toda a
comunidade; e elegeram Estevão, homem cheio d eféed o
Espírito Santo, Filipe, Prócoro, Nicanor, Timão, Párme nas
eNicolau, prosélito de Antioquia. Apresentaram-nos
perante os Apóstolos, e estes, orando, lhes impuseram as
mãos” (Atos 6:5-6). Os sete homens que foram esco lhidos
naquela ocasião foram os primeiros diàconos. A Bíblia não
os chama expressamente de diàconos, embora isso tenha sido
o que eles foram, segundo um consenso quase universal.
Portanto, mesmo os diàconos na Igreja apostólica foram
escolhidos pelo povo.
Aqui então, nós temos três fatos claros, completa mente
suficientes para basear um princípio. O primeiro capítulo de
Atos nos fornece um exemplo de uma assem bléia de irmãos
nomeando, para o oficio, um apóstolo e um ministro. O
capitulo 14 mostra que os presbíteros da congregação foram
escolhidos pelos votos dos membros. O capítulo 6 mostra
todo o conjunto dos discípulos esco lhendo sete homens para
o diaconato. Nesses três fatos, claros e incontestáveis,
encontramos o principio da Elei ção Popular. A conclusão
que tiramos dessas evidências irrefutáveis é que, na Igreja
Apostólica, os oficiais eram
escolhidos pelo povo.

O S e g u n d o P r in c íp io

Há uma classe de oficiais cuja existência na Igreja


Primitiva é mencionada freqüentemente mas, no entanto,
39
A IGREJA APOSTÓLICA

a temos citado muito ligeiramente. Nos referimos aos


presbíteros. Tais oficiais são mencionados muitas vezes no
livro de Atos e nas Epistolas, mas um leitor cuidadoso
perceberá que passagem bíblica nenhuma faz distinção entre
o ofício de presbítero e o de bispo. Um mesmo ver sículo
nunca fala de bispos e presbíteros. Quando Paulo, por
exemplo, escreve à Igreja de Filipos (1:1), ele menciona os
bispos e diáconos, mas não diz nada sobre presbíteros.
Quando Tiago orienta os doentes a chamarem os presbítros
da igreja (5:14), ele não diz nada a respeito de bispos. Se os
ofícios de bispo e presbítero fossem diferentes — se um
bispo fosse um oficial com autoridade sobre um grupo de
presbíteros, seria estranho o fato de que nenhuma passagem
bíblica fale de bispos e presbíteros ao mesmo tempo. Há
apenas uma passagem que parece fornecer base para esta
suposição. Se os dois termos são apenas diferentes termos
para o mesmo oficio, conclui-se que falar sobre bispos e
presbíteros como sendo diferentes seria uma agressão à
língua; isso seria uma tautologia — seria a mesma coisa que
falar de anciãos e presbíteros ou de bispos e bispos. O fato
significativo de que os dois termos nunca são mencio nados
juntos em uma mesma passagem bíblica é suficiente para nos
levar a entender que os dois eram usados inter
cambiavelmente, ou seja, um pelo outro. Pois se um dos
termos pode designar fielmente o oficial pretendido, não há
necessidade de usar o outro ao mesmo tempo.
A despeito disso, deve haver um argumento mais for te
do que a suposição de que os dois termos são apenas nomes
diferentes para designar a mesma realidade. Por mais
improvável que possa parecer, é possível que estes dois,
bispo e presbítero, fossem oficiais distintos, embora uma
mesma passagem nunca se refira aos dois juntos. Isto nos
obriga a consultar as Escrituras mais adiante sobre esta
questão.
40
PRINCÍPIOS APOSTÓLICOS

A primeira passagem com a qual nos deparamos é Tito 1:5-7


: “P or esta causa, te deixei em Creta, para que pusesses em
ordem as cousas restantes, bem como, em cada cidade,
constituísses presbíteros, conforme te
prescrevi: alguém que seja irrepreensível, marido de uma só
mulher, que tenha filhos crentes que não são acusados de
dissolução, nem são insubordinados. Porque é indis
pensável que o bispo seja irrepreensível como despenseiro de
Deus, não arrogante, não irascível, não dado ao vinho, nem
violento, nem cobiçoso de torpe g a n â n c ia Esta passagem
confirma, em fortes termos, a veracidade da suposição já
ventilada de que os dois termos se referem ao mesmo ofício.
Vemos que Paulo deixou Tito em Creta para a ordenação de
presbíteros em cada cidade. Para orientar Tito quanto ao
desempenho de sua tarefa, o após tolo Paulo passa a listar as
qualidades que um presbítero deve ter. Membro nenhum da
Igreja é elegível para este ofício a menos que tenha uma vida
íntegra, seja marido de uma só mulher e tenha filhos
obedientes; “porque”, ele afirma, “é indispensável que o
bispo seja irrepreensível como despenseiro de Deus”. O Dr.
King, em seu comen tário sobre esta passagem, observa
corretamente “que o termo presbítero, usado no começo, é
trocado pelo termo bispo no final, enquanto o apóstolo
continua falando so bre o mesmo oficial. Um presbítero
precisa de tais e tais qualidades. Por quê? Porque é
indispensável que o bispo seja irrepreensível como
despenseiro de Deus. Será que isto não é suficiente para
identificar presbítero com bispo e vice-versa? Se não, a
identificação é impossível. Se dissermos que é indispensável
que o prefeito de Londres dedique-se aos seus deveres
porque o chefe do magistra do de tal cidade tem grandes
responsabilidades, isso não significaria que prefeito e chefe
do magistrado se refiram à mesma função? De outra forma, a
representação seria
41
A IGREJA APOSTÓLICA

absurda; por que, então, o prefeito deveria dedicar-se aos


seus deveres devido ao fato de outra pessoa ter grandes
responsabilidades? Portanto, o prefeito e o chefe do ma
gistrado não são mais idênticos nesta passagem do que são o
presbítero e o bispo na instrução de Paulo a Tito.4 Claro
está, para qualquer pessoa, que o apóstolo nunca afirma ria
que a razão para não ordenar ao ofício de presbítero e bispo
alguém que não tenha um bom caráter é que um bispo deve
ser irrepreensível, se tal pessoa entende que presbítero e
bispo eram apenas diferentes designações para o mesmo
ofício. De outra forma, a linguagem usada pelo apóstolo não
teria qualquer coerência.
Voltaremos a nossa atenção agora para 2 João 1. Nes ta
passagem vemos que o apóstolo se intitula presbítero — “O
presbítero à senhora eleita e aos seus filhos, a quem eu amo
na verdade...” O próximo texto é 1 Pedro 5:1. Neste também
nós vemos o apóstolo Pedro se intitulando presbítero. —
“Rogo, pois, aos presbíteros que há entrè vós, eu, presbítero
como eles, e testemunha dos sofrimen tos de Cristo”. Todos
admitem o fato de que João e Pedro eram apóstolos; mas,
estas passagens mostram que, além de apóstolos, eles eram
presbíteros. Isto nos deixa à apenas um passo da conclusão.
Pode ser verdade que todo general seja um oficial, mas não é
verdadeiro que todo oficial é um general. A exemplo de João
e Pedro, um bispo pode ser um presbítero, mas disso não
resulta que um presbítero seja um bispo. Isso pode ser
verdade, mas vamos continuar a nossa pesquisa antes de
chegar a uma conclusão. Essa verdade é tão clara quanto ao
que é apresentado em Atos 20:17-28. Lemos nesta passagem
que Paulo enviou os presbíteros à Igreja de Efeso afim de se
encontrarem em

4 King, Exposition and Defense o f the Presbytcrian Form o f Church Govern ment,
páginas 176-7. Edinburg, 1853.
42
PRINCÍPIOS APOSTÓLICOS

Mileto. Ele falou sobre o seu ministério na cidade deles, e o


grande tema de sua pregação foi o arrependimento diante de
Deus e a fé em Jesus Cristo. Ele p rev iu as afli ções que o
esperavam em Jerusalém e em outros lugares. Ao dizer-lhes
que não veriam mais a sua face, Paulo os entristeceu
sobremodo. Ele os advertiu quanto a cuidarem de si mesmos e
a cuidarem do rebanho sobre o qual Deus os havia constituído
supervisores, ou seja, bispos, como a
palavra é traduzida em outras partes do Novo Testamento.
Qualquer leitor que seja versado no original grego sabe que a
palavra supervisor usada em Atos 20:28 é a mesma palavra
traduzida por bispos em Filipenses 1:1, de forma que temos
aqui uma evidência fortíssima de q u e os pres bíteros de Éfeso
eram bispos apontados pelo Espírito. Isto faz com que esta
linha de raciocínio seja contundente e conclusiva. Bispos,
como já vimos, eram presbíteros, e presbíteros, como
acabamos de ver, eram bispos. Isto nos conduz a um
princípio, a saber, na Igreja Apostólica, os
ofícios de bispo e presbítero eram a mesma coisa. Um
presbítero não era inferior a um bispo, nem era um bispo
superior a um presbítero. Era o mesmo oficial que era
conhecido por estes dois diferentes designativos. Nós não
estamos inclinados a dar muito valor à opinião de um homem
como Edward Gibbon quanto a qualquer ponto de doutrina ou
moralidade, mas aquele distinto historiador foi perspicaz o
suficiente para dar-se conta de uma reali dade muito
importante. Ele pode ser ouvido com o alguém que não
pendia para nenhuma matiz religiosa e, portanto, está em
posição de julgar imparcialmente um a questão como esta.
Falando sobre o governo e a administração da Igreja, antes do
Concilio de Nicéia, ele diz: “A s funções públicas de religião
eram confiadas somente aos ministros estabelecidos da Igreja,
bispos e presbíteros; dois epítetos
que, quando surgiram, parecem ter distinguido o mesmo 43
A IGREJA APOSTÓLICA

o/icio
c n mesma ordem de pessoas. O nome presbítero se
reloria à idade ou, mais ainda, à seriedade e à sabedoria
deles. O título de bispo denotava a supervisão deles quanto à
fé c à forma como viviam os cristãos que estavam sob seu
cuidado pastoral”.5
O T e r c e ir o P r in c íp io

Não esqueçamos de que, como já vimos, os termos


presbítero e bispo em seu uso original eram apenas dife rentes
nomes para o mesmo ofício eclesiástico. Já temos suficientes
provas escriturísticas para afirmar que pres bíteros eram
bispos e bispos eram presbíteros na Igreja Apostólica. Temos
base bíblica, portanto, para considerar este fato
completamente comprovado enquanto prosse guimos agora
para examinar o terceiro princípio.
O capítulo quatorze de Atos descreve a viagem
missionária de Paulo e Barnabé. Houve uma tentativa de
apedrejá-los em Icônio, mas eles conseguiram fugir para
Listra e Derbe. Quando Paulo fez um paralítico em Listra
levantar-se e andar, o sacerdote de Júpiter trouxe touros e
grinaldas para os portões. O povo foi com muita dificuldade
impedido de, em sua ignorância pagã, ofere cer sacrifícios aos
dois pregadores. Mas os sentimentos do povo são tão
inconstantes que, logo depois, o grande apóstolo foi
apedrejado e por pouco não morreu no mes mo lugar onde
queriam adorá-lo pensando que ele era um deus. Tendo a
duras penas escapado com vida, Paulo e seus companheiros
visitaram novamente Derbe, Listra, Icônio e Antioquia,
pregando o evangelho, confirmando as almas dos discípulos
e exortando-os a continuarem firmes na fé. O autor do livro
dos Atos nos fala sobre o

5 History o f the Decline and Fali of the Roman Empire, capítulo 15. 4 4
PRINCÍPIOS APOSTÓLICOS

importante fato de que promoveram a eleição de pres bíteros


em cada Igreja. Nas palavras exatas do escritor bíblico: llE,
promovendo-lhes, em cada Igreja, a eleição de presbíteros,
depois de orar com jejuns, os encomen daram ao Senhor em
quem haviam crido” (At. 14:23). Como já vimos, a palavra
Igreja nas Escrituras significa qualquer assembléia de
cristãos, grande ou pequena. Era uma prática na época
chamar os cristãos residentes em alguma cidade, por maior
que fosse, ou em alguma aldeia, por menor que fosse, a Igreja
daquele lugar. Muitas dessas comunidades gentias e pagãs
que foram evangelizadas por aqueles pioneiros do
Cristianismo, organizadas em meio a muitas dificuldades e
vítimas de hostilidade, eram inexpressivas em termos de
números. Mesmo assim, os dois apóstolos não estavam
satisfeitos em apenas apontar um presbítero ou um bispo em
cada uma daquelas comunidades, embora fossem pequenas;
mas, como temos sido ensinados pelo Espírito Santo, eles
promoveram a eleição de presbíteros em cada Igreja. Se,
então, o evangelista Lucas, falando movido pelo Espírito
Santo, é uma testemunha verdadeira, havia mais de um
presbítero em cada congregação da Igreja Apostólica. Nós
não somos informados sobre a quan tidade, se havia dois, três
ou mais, mas é claro que em
cada Igreja havia uma pluralidade de presbíteros. Voltaremos
a nossa atenção mais uma vez para o ca pítulo 20 de Atos.
Este capítulo fala da viagem de Paulo partindo da Grécia para
Jerusalém. Tendo passado uma semana em Troas, ele
prosseguiu em sua viagem, às vezes pelo mar e às vezes por
terra. Paulo estava se esforçando muito para chegar na capital
dos judeus antes de Pente - costes. Tendo chegado a Mileto,
um porto do mar da Jônia, que distava trinta e seis milhas ao
sul de Éfeso, ele enviou um mensageiro àquela cidade aos
presbíteros da Igreja.
45
A IGREJA APOSTÓLICA

As palavras inspiradas são: “De Mileto, mandou a Éfeso


chamar os presbíteros da Igreja” (Atos 20:17). Parece, a
partir disso, que a Igreja de Éfeso tinha não apenas um
presbítero, porém, mais de um. Vimos no versículo 28 que os
presbíteros da Igreja eram chamados de bispos. A menos que
a linguagem não tenha significado e as afirmações da Bíblia
sejam ininteligíveis, havia uma plu
ralidade de presbíteros ou bispos na Igreja de Éfeso. Filipos
era uma cidade nos limites da antiga Trácia. Para os primeiros
leitores, a Trácia era conhecida como o lugar onde Augustus e
Antônio com muito esforço venceram Brutus e Cassius numa
batalha campal e, as sim, conseguiram o império do mundo
daquela época; para os cristãos isto é notável por ter sido o
primeiro lugar na Europa onde a bandeira da cruz foi
desfraldada e os pecadores ouviram o Evangelho de Jesus. Foi
lá que o coração da vendedora de púrpura foi aberto para
prestar atenção à pregação de Paulo. Foi lá que, por ter
expulsado o espírito de adivinhação de uma jovem
adivinhadora, Paulo e Silas foram açoitados pelos ma gistrados
e tiveram seus pés colocados no tronco. Foi lá que, por volta
da meia noite, os alicerces da prisão foram sacudidos, todas as
portas se abriram e soltaram se as cadeias de todos; o
carcereiro fez a dois de seus prisioneiros a pergunta mais
importante que um pecador pode fazer a um ministro de Deus:
“Senhores, que devo fazer para que seja salvo?” Uma Igreja
foi organizada nesta cidade de Filipos, mesmo enfrentando
oposição; e dez ou doze anos depois da primeira visita de
Paulo, ele achou por bem escrever uma carta àquela Igreja.
Esta carta foi preservada e ocupa lugar na Palavra de Deus. A
referida carta é conhecida como a Epístola aos Filipen ses. As
pessoas terão mais curiosidade de ler o que um apóstolo achou
necessário escrever para uma Igreja cujo
46
PRINCÍPIOS APOSTÓLICOS

rol de membros ostenta logo no começo, os nomes de Lídia e


do carcereiro. Como era de se esperar, esta carta é cheia de
verdades preciosas e consoladoras; mas, o que é mais
importante para o nosso propósito no momento, é o que diz o
primeiro versículo do primeiro capítulo da carta em
apreciação: “Paulo e Timóteo, servos de Cristo
Jesus, a todos os santos em Cristo Jesus, inclusive bispos e
diáconos que vivem em F ilip o s Filipos era sem dúvida uma
cidade considerável, mas em termos de população e
importância, Filipos estava para Dublin e Liverpool como
uma igreja está para um presbitério, ou seja, era uma cidade
pequena e sem muita expressão; quer dizer, acredita-se que
um bispo é suficiente para uma cidade como Londres (no
sistema episcopal), onde o número de cristãos professos
chega à casa dos milhões. Ao passo que uma única
congregação formada por pessoas con vertidas de entre uma
população pagã, existindo como Igreja há apenas dez ou doze
anos, exposta a zombaria e a sofrimentos por causa de Cristo,
além de ser localizada em uma cidade desprezível nos
arredores da Macedônia, tinha uma pluralidade de bispos.
Paulo escrevendo à Igreja de Filipos, endereça a sua epístola
aos bispos e diáconos.
Que o leitor sincero possa atentar para os argumentos
que acabamos de apresentar. Um leitor honesto percebe que
a carta que Paulo escreveu à Igreja de Filipos está
endereçada aos bispos. Ele percebe que havia presbíteros
na Igreja de Éfeso, pois Paulo os chamou para Mileto. O
leitor encontra a afirmação de que Paulo e Barnabé
promoveram a eleição de presbíteros em cada Igreja. Como é
possível a um leitor sincero e honesto resistir à conclusão de
que, nos dias dos apóstolos, havia em cada Igreja uma
pluralidade de presbíteros, ou de bispos, que é a mesma
coisa? Com isso, chegamos ao terceiro princí
47
A IGREJA APOSTÓLICA

pio de governo praticado na Igreja Apostólica, ou seja, em


cada Igreja havia uma pluralidade de presbíteros.

O Q u a r t o P r in c íp io
Ordenação é a designação solene de um homem para o
oficio eclesiástico pela imposição de mãos. Cada oficial
permanente na Igreja, seja bispo ou diácono, foi separado
solenemente para este ofício pelo ato da ordenação. Em sua
forma externa, isto consistia em três coisas — jejum, oração
e imposição das mãos. A imposição das mãos era usada
quando os dons espirituais eram conferidos (Atos 8:17; 19:6);
e isso era também praticado quando o doente era curado de
maneira miraculosa (Marcos 16:18; Atos 9:17; 28:8).
Diferentemente desses casos, a imposição das mãos era usada
para a ordenação de oficiais da Igreja e, durante as
cerimônias de ordenação, nenhum dom extraordinário ou
miraculoso era concedido (Atos 6:6-; 13:1-3; e I Timóteo
4:14; 5:22). A ausência de poderes miraculosos não é,
portanto, uma razão válida para que durante as cerimônias de
ordenação, esta prática de impor as mãos seja descartada; a
imposição de mãos em casos como esses nunca é o meio
através do qual o Espírito é concedido, mas apenas a forma
de investidura de ofício eclesiástico.
A grande questão quanto à ordenação é se isto é o ato de
um indivíduo apenas ou mais, de um presbítero ou de vários
presbíteros, de um bispo ou de um presbitério. Não há dúvida
de que o Senhor Jesus pode chamar alguém de uma maneira
especial e enviá-lo para o trabalho em Sua vinha. Também
não há dificuldade em aceitar que, se um apóstolo inspirado
ainda estivesse aqui na terra, ele teria o direito de ordenar
sozinho se achasse correto fazer isso. E mais, se algum
evangelista moderno pudesse mostrar,
48
PRINCÍPIOS APOSTÓLICOS

a exemplo de Tito, que um apóstolo o deixou para este


propósito especial, ele também, em virtude do direito que lhe
foi concedido por uma autoridade maior, teria o direito de
ordenar (Tito 1:5). Qualquer um, portanto, que reivindique o
direito de fazer tudo o que um evangelista fez, se interessaria
em mostrar que, mesmo não sendo um apóstolo possui, a
exemplo de Tito, a autoridade concedida por um apóstolo.
Mas nenhum líder de igreja conseguiria passar nesse teste.
Ainda precisamos examinar as Escri turas para descobrir
quem, na ausência dos apóstolos ou daqueles delegados por
eles, poderia exercer o privilégio de, solenemente, separar
homens para o oficio eclesiástico e, mais do que isso,
precisamos descobrir se este privilégio era possuído por um
ou mais indivíduos.
Direcionemos a nossa atenção agora para 1 Timóteo
4:14. Temos aqui a ordenação de Timóteo. O apóstolo
exortou o seu filho na fé a usar corretamente o dom que tinha
sido conferido a ele. Ele afirma que este dom fora dado por
profecia, ou seja, em conseqüência do fato de os profetas,
que eram muitos naquela época onde existiam vários dons
espirituais, o terem apontado como alguém que seria um
eminente ministro. Ele acrescenta que o re ferido dom
espiritual foi conferido “com a imposição de mãos do
presbitério”— isso é, com a imposição das mãos dos
presbíteros reunidos como concilio. As palavras do apóstolo
são: “Não te faças negligente para com o dom
que há em ti, o qual te fo i concedido mediante profecia, com
a imposição de mãos do presbitério”. Estas palavras são
decisivas quanto ao apontar aqueles em quem residia a
autoridade para ordenar.
Vamos agora para Atos 13:1-3. Parece que na Igreja de
Antioquia havia certos profetas e mestres cujos nomes são
mencionados nessa passagem. Eles estavam servindo ao
Senhor e jejuavam; enquanto eles assim procediam,
49
A IGREJA APOSTÓLICA

receberam do Espírito a ordem para separar Bamabé e Saulo


para o trabalho missionário entre os gentios. Os dois tinham
servido como pregadores do Evangelho anterior mente; mas
agora deveriam entrar em uma nova esfera e se engajar em
uma nova área do trabalho. Era necessário, portanto, que os
profetas e mestres solenemente sepa rassem os dois irmãos
para o trabalho missionário pelo ato da ordenação. Lemos, de
acordo com o versículo 3, “Então, jejuando e orando, e
impondo sobre eles as mãos, os despediram”. Aqui está claro
que o ato de ordenação não era o trabalho de um mestre, mas
de vários. Havia uma pluralidade.
Outro exemplo de uma pluralidade de oficiais de Igreja
participando em uma cerimônia de ordenação está registrado
em Atos 6:6. Nesse caso, nós temos a ordenação de diáconos.
A Igreja de Jerusalém escolheu sete homens para atender as
necessidades dos pobres, “Apresentaram nos perante os
apóstolos, e estes, orando, lhes impuseram '
as mãos”. Esse texto é bastante elucidativo à medida que
prova que, sempre que possível e conveniente, os apósto los
preferiam que o ato da ordenação fosse praticado por uma
pluralidade de oficiais.
Observamos novamente a base que acabamos de
examinar. Era a prática de um apóstolo ou de alguém
diretamente designado por um apóstolo para este pro pósito
específico, realizar sozinho o ato de ordenação. Mas ninguém
fazia isto sozinho quando era possível que eles estivessem
juntos para tal objetivo. Quando possí vel, era comum mais de
um participar da cerimônia de ordenação. Na ausência dos
apóstolos, como já vimos no caso de Barnabé e Saulo, a
ordenação foi realizada por certos profetas e mestres; e que,
no caso de Timóteo, foi um ato de um presbitério. Isso nos
leva a concluir o quarto princípio, a saber, na Igreja
Apostólica, a orde
50
PRINCÍPIOS APOSTÓLICOS

nação era um ato do presbitério — de uma pluralidade de


presbíteros.

O Q u in t o P r in c íp io

O capítulo quinze de Atos é muito longo para ser


transcrito aqui. Por isso, antes de você continuar lendo este
livro, leia o referido capítulo cuidadosamente do co meço ao
fim. Se você está realmente interessado em saber a verdade e
aceitá-la em sua forma simples, uma leitura cuidadosa do
capítulo quinze o convencerá dos seguintes fatos: Parece que
alguns homens desceram da Judéia para Antioquia e
ensinaram àquela Igreja que circuncisão era necessária para a
salvação. Paulo e Bamabé se opuseram a eles, mas em vão.
Então, decidiu-se que alguns da Igreja de Antioquia, inclusive
Paulo e Bamabé, deveriam ir para Jerusalém e expor o
problema aos apóstolos e presbíteros. Quando chegaram a
Jerusalém — que era a metrópole do Cristianismo daquele
tempo — os apóstolos e presbíteros reuniram-se para
considerar a questão. No início havia consideráveis diferenças
de opinião. Pedro, finalmente, levantou-se para falar. Ele os
lembrou de como Deus o tinha honrado ao fazê-lo instrumento
da primeira prega ção do Evangelho aos gentios e de como,
sem acepção de pessoas, o Senhor tinha se agradado em
conceder o Espírito Santo não somente aos gentios, mas
também aos cristãos convertidos do judaísmo. Pedro
argumentou que tomar a circuncisão um requisito necessário
para a salvação — colocando sobre os gentios um fardo que
nem os judeus eram capazes de suportar — seria tentar a
Deus; para concluir, ele afirmou a grande verdade de que
judeus e gentios, sem distinção, são salvos pela graça de nosso
Senhor Jesus Cristo. Bamabé e Paulo se alternaram
testemunhando também que através deles Deus tinha
51
A IGREJA APOSTÓLICA

realizado milagres e maravilhas entre os gentios. Tiago 1'oi o


próximo a emitir a sua opinião. Ele mostrou que a verdade
declarada por Pedro, a saber, que Deus tinha separado para si
um povo de entre os gentios, tinha sido profetizada. Ele cita o
profeta Amós para mostrar como Deus tinha prometido
construir o tabemáculo de Davi que tinha se tomado em
ruínas, para que o restante dos homens e os Gentios chamados
pelo Seu nome pudessem procurar a face do Senhor. Ele
termina declarando o julgamento por vir e que os gentios que
já tinham se voltado para o Senhor não deveriam se preocupar
com nenhum fardo des necessário, mas que deveriam se abster
das contaminações dos ídolos, de relações sexuais ilícitas, da
carne de animais sufocados e de sangue. A opinião de Tiago
foi aprovada pela assembléia. Os apóstolos e presbíteros
juntamente com toda a igreja, concordaram em enviar Judas e
Silas para Antioquia, com Bamabé e Paulo encarregados de
anunciar o resultado. A decisão tomada naquela assem bléia
foi expressa em cartas enviadas com os nomes dos apóstolos,
presbíteros e irmãos aos gentios cristãos de Antioquia, Síria e
Cilícia. A epístola acusava aqueles que estavam ensinando
que a circuncisão era necessária para salvação de serem
perturbadores dos irmãos e de estarem subvertendo as suas
almas; a epístola também negava que eles tivessem a
autoridade dos apóstolos e presbíteros para ensinar;
mencionava ainda que Judas e Silas tinham sido encarregados
de, juntamente com Bamabé e Paulo
— homens que tinham arriscado as suas próprias vidas pelo
nome de Jesus Cristo — declarar verbalmente a decisão da
assembléia; por último a epístola afirmava que tinha parecido
bom ao Espírito Santo e a eles não impor aos gentios
convertidos nenhum fardo, exceto que se abstives sem da
carne sacrificada aos ídolos, de sangue, de carne sufocada e
de fomicação. Este era o conteúdo da epístola
52
PRINCÍPIOS APOSTÓLICOS

que foi levada a Antioquia pelos representantes da assem


bléia de Jerusalém. A multidão se reuniu para ouvir qual
tinha sido a decisão. A carta foi entregue e lida. O povo se
alegrou ao ouvir aquelas palavras consoladoras. Judas e Silas
os exortaram depois que a carta foi lida e os irmãos foram
confirmados na fé. Logo depois, Paulo, tendo tido algumas
diferenças com Barnabé, escolheu Silas como seu
companheiro de viagem e partiu para outra viagem
missionária com o objetivo de visitar os convertidos de cada
cidade onde ele tinha pregado a Palavra de Deus e ver como
eles estavam. Confiados pelos irmãos à graça de Deus, Paulo
e Silas partiram de Antioquia e foram através da Síria e
Cilícia confirmando as igrejas. Derbe e Listra e outras
cidades da Ásia Menor foram visitadas naquela ocasião e, à
medida que passavam por aquelas cidades, eles falavam o
que tinha sido ordenado pelos apóstolos e presbíteros de
Jerusalém quanto ao que deveria ser ob servado (Atos 16:4).
Qualquer homem sincero admitirá que isto é uma justa
representação de todos os fatos relacionados a este assunto,
assim como está exposto diante de nós nos capítulos 15 e 16
de Atos. Deve ser notado que, na narrativa simples, os
seguintes fatos aparecem claramente:
(1) Que Bamabé e Paulo tiveram uma disputa sobre
circuncisão com certos falsos mestres que desceram para a
Judéia;
(2) Esta disputa não foi resolvida na Igreja de Antio quia
onde isto se originou;
(3) O problema foi levado a uma assembléia ecle siástica
extema que era composta pelos apóstolos e por presbíteros
em Jerusalém;
(4) Esta assembléia reuniu-se publicamente para de
liberar sobre a questão;
(5) Eles chegaram a uma decisão;
53
A IGREJA APOSTÓLICA

U>) As igrejas de Antioquia, Síria e Cilícia se subme leram à


decisão tomada no Concilio de Jerusalém. Tais fatos estão
claros na narrativa e não podem ser negados. Seria de
estranhar que esses acontecimentos fo ram permitidos, bem
como o registro deles nas Escrituras Sagradas, se não fossem
para nos servir de exemplo. Teria sido suficiente para a Igreja
de Antioquia saber a vontade de Deus sobre aquela questão
através do apóstolo Paulo que estava presente, pois Paulo
poderia ter declarado aque la decisão do Concilio com uma
precisão infalível; e mais, ele não apenas falava movido pelo
Espírito Santo, mas freqüentemente decidia questões
igualmente importantes com apenas uma palavra dos seus
lábios ou com um traço da sua pena. E reconhecido pela
Igreja de Deus que uma única sentença do apóstolo que
estava naquele momento em Antioquia teria sido decisiva
quanto a qualquer questão relacionada à fé ou ao dever
cristãos. De forma que, se uma decisão infalível era a única
coisa requerida, alguém pode questionar por que a questão foi
levada adiante. Quando o caso foi levado a Jerusalém, se a
questão tivesse sido resolvida apenas com uma palavra
inspirada de Paulo, al guém poderia não ver razão alguma por
que os presbíteros teriam de se reunir com os apóstolos para
analisar o pro blema. Certamente os apóstolos eram capazes
de declarar a vontade de Deus sem precisar do auxílio de
homens que não eram inspirados. Se nada era necessário
senão que os apóstolos fizessem um pronunciamento
infalível, por que é que houve uma discussão na assembléia e
mesmo a aparência de decisão? Ou ainda, porque um apóstolo
após outro teve de emitir a sua opinião? Podemos supor que o
pronunciamento de um único homem inspirado seria mais do
que suficiente. Se a discussão que ocorreu na assembléia
tivesse ocorrido apenas entre os presbíteros, estes teriam sido
muito tolos para discutir sobre uma matéria que deve
54
PRINCÍPIOS APOSTÓLICOS

ria ser resolvida com uma palavra inspirada e, em relação à


questão, eles, como homens que não eram inspirados, não
tinham nada para fazer, a não ser ouvir a voz de Deus; e por
que os apóstolos permitiram a discussão, uma vez que uma
palavra dos expositores infalíveis da vontade de Deus teria
decidido a questão? E por que a decisão foi enviada em nome
dos apóstolos e presbíteros que estavam em Je rusalém? Há
apenas uma explicação satisfatória para isto, como podemos
ver. Esses eventos foram permitidos que acontecessem e
foram registrados para nossa orientação em quaisquer
situações similares a esta. Em surgindo uma questão ou um
problema que não possa ser resolvido no âmbito da
congregação onde a situação se originou, esta questão ou
problema deve ser levado à apreciação dos governantes (os
líderes — presbíteros) da Igreja reunidos em concilio. Se os
apóstolos estivessem vivos na terra para se encontrarem com
os presbíteros e fazendo uso da sua inspiração os orientasse
quanto a uma decisão inerrante, e levássemos uma questão
para a referida assembléia, isto seria obediência literal ao
exemplo colocado diante de nós pela Palavra de Deus. Mas,
na ausência pessoal deles (os apóstolos), levamos as nossas
diferenças a um concilio de presbíteros (docentes e regentes),
os quais, guiados pelos escritos inspirados dos apóstolos que
estão contidos nas Escrituras, decidem quanto a um
determinado assunto, e quando nos submetemos no Senhor à
referida decisão, isto é agir de acordo com o exemplo
apostólico.
Assim, chegamos à conclusão de que na Igreja Apos
tólica havia o privilégio de levar matérias à apreciação de
uma assembléia de homens que não estavam no âmbito da
congregação onde a discussão de uma matéria tenha se
originado, assembléia esta que era composta pelos
governantes da Igreja; e que esta assembléia eclesiástica, na
ausência dos apóstolos, sendo composta apenas pelos
55
A IGREJA APOSTÓLICA

da Igreja, tem o direito de se reunir, decidir e


)íoV L T ii;inles
exigir que a sua decisão seja obedecida no Senhor. A este
principio duplo chamamos o privilégio de apelar para o
presbitério (composto por presbíteros docentes e regen tes), e
o direito de governo exercido por seus membros em
conjunto.
Dificilmente seria necessário dizer alguma palavra na
presença dos irmãos na assembléia de Jerusalém, se tal fato
não fosse considerado a base para a resolução de situações
especiais como essa. Uma vez que são mencionados
separadamente dos apóstolos e presbíteros, parece claro que
os “irmãos” eram as pessoas que não ocupavam cargos de
oficiais na igreja ou, como seriam chamados hoje em dia, eles
eram os leigos. Que eles estavam presentes naquela
assembléia; que eles concor daram com a decisão, e que a
carta enviada para Antio quia foi escrita tanto em nomes deles
como em nome dos apóstolos e presbíteros são, em nossa
opinião, fatos inegáveis — claros em uma primeira leitura da
narrativa. Mas não temos todos os fatos do caso diante de
nós, a menos que observemos:
(1) Que a referência original de Antioquia não era em
direção aos irmãos, mas aos apóstolos e presbíteros (Atos
15:2);
(2) Que não é dito que os irmãos estavam reunidos para
deliberar sobre a questão, mas que “se reuniram os apóstolos
e presbíteros para examinar a questão” (ver sículo 6);
(3) Que nós não lemos sobre nenhum dos irmãos fa lando
sobre a questão apreciada, mas que “toda a multidão
silenciou” enquanto os outros falavam (versículo 12);
(4) Que não é dito que as decisões foram tomadas pelos
irmãos, mas “pelos apóstolos e presbíteros de Je rusalém'"
(Atos 16:4).
56
PRINCÍPIOS APOSTÓLICOS

O pesquisador sem predisposições observa que os


membros particulares da Igreja, aqui designados como
“irmãos”, não tomaram as decisões, não falaram na as
sembléia, não se reuniram para deliberar e nem recebe ram o
apelo que fora levado de Antioquia (o apelo não foi a eles
dirigido). O escritor de Atos, por outro lado, ressaltou que
eles estavam presentes na assembléia, que concordaram com
a decisão e que, para mostrar que to dos os cristãos de
Jerusalém eram unânimes quanto ao assunto, a carta contendo
as decisões foi escrita tanto em nome deles como em nome
dos apóstolos e presbíteros. Por motivos de cortesia e razões
de saudação cristã, Sil vano e Timóteo são referidos em
conexão com o apóstolo Paulo, na sua Primeira Epístola aos
Tessalonicenses, mas isto não quer dizer que Silvano e
Timóteo eram homens inspirados, muito menos que
estivessem unidos a Paulo na autoria da carta. E, do mesmo
modo, a carta endereçada aos gentios de Antioquia, Síria e
Cilícia era dos “apóstolos e presbíteros”— o nome dos
irmãos foi adicionado para mostrar, não que eles participaram
da redação da carta, mas que apenas concordaram quanto ao
teor dela. Pessoas, portanto, que desejam nos convencer que
cristãos particulares na Igreja Apostólica não esta vam
presentes nas reuniões dos governantes da Igreja apenas
como ouvintes, mas que eles participavam das decisões e
agiam como membros constituídos de tribu nais eclesiásticos,
teriam de produzir alguma coisa mais clara sobre o assunto do
que o capítulo 15 de Atos. Para nós é bastante claro que os
apóstolos e presbíteros reu nidos, apreciaram o problema e
decidiram sobre ele; os irmãos estavam presentes, ouviram e
anuíram à decisão. Os apóstolos e presbíteros eram membros
do tribunal. Os irmãos eram ouvintes que deram o seu
consentimento à decisão tomada pelos governantes da Igreja.
57
A IGREJA APOSTÓLICA

Nosso quinto princípio, portanto, pode ser resumido


nestes termos — o privilégio de apelar para o presbitério, e
o direito de governo exercido por seus membros em
conjunto.

O S extoP rincípio

Uma das características do governo apostólico é que os


governantes de Igreja não prestam obediência a ne nhum
poder temporal, nem a nenhum chefe eclesiástico. Paulo
raramente começa alguma de suas epístolas sem relembrar
aos seus leitores que ele é apóstolo pela vontade de Deus,
não pela vontade de homem. Tomemos como exemplo,
Gálatas 1:1: “Paulo, apóstolo, não da parte de
homens, nem por intermédio de homem algum, mas por Jesus
Cristo e por Deus Pai, que o ressuscitou dentre os m o r t o s
etc. Pelo que o Novo Testamento apresenta, não vemos
nenhuma instância da Igreja reconhecendo o do mínio
espiritual de um monarca terreno, ou consentindo negociar
uma parte de sua liberdade religiosa em troca de algum favor
temporal qualquer que fosse ele. Não en contramos nos
Evangelhos qualquer preocupação quanto à supremacia de um
cristão, muito menos de um pagão, reinando nas coisas de
Deus. O ensino das Escrituras é claro: “Dai a César o que é
de César e a Deus o que é de Deus” (Marcos 12:17). Em todas
as questões temporais, os membros da Igreja Apostólica
consideraram que era seu dever prestar obediência aos
governantes civis do país no qual eles viviam; em todas as
questões espirituais, eles se submetiam a um poder mais alto.
Em questões tempo rais, o apóstolo submetia-se às leis do
lugar, efetivadas por um magistrado de uma vila; em questões
espirituais, o apóstolo não cederia nem ao próprio César
sentado em seu trono.
58
PRINCÍPIOS APOSTÓLICOS

Nada seria alterado se alguém retrucasse afirmando que


nós procuraremos em vão por um exemplo das Es crituras
devido ao fato de que, na era primitiva, nenhum príncipe
temporal foi convertido ao cristianismo e, por tanto, nenhum
estava em condições de dispensar proteção eclesiástica e
exercer o papel de centralizador do poder espiritual. Deus
não está limitado à vontade dos seus ins trumentos. A mesma
graça que subjugou Saulo de Tarso quando este ainda estava
respirando ameaças e morte contra os discípulos do Senhor,
poderia ter convertido Pilatos, Agripa, ou César em Roma.
Se isto tivesse sido útil, os meios necessários para que isto
acontecesse, com a mais absoluta certeza, teriam sido
supridos por Deus. O fato de que, nos dias apostólicos, Deus
não chamou nenhum príncipe pagão para fazer parte da
Igreja para que este pudesse ocupar o cargo de cabeça
temporal da Igreja na terra, é bastante elucidativo —
chegando mesmo a conter um princípio fundamental. E não
nos esqueçamos de que as Escrituras não dão nenhum
incentivo para que isto viesse a acontecer em dias
subseqüentes. As Escritu ras não contêm nenhum princípio
autorizando príncipes que viessem a se tomar cristãos em
anos subseqüentes a reivindicarem, nem a exercerem
autoridade em questões eclesiásticas. Se há um princípio
como este, nós desco nhecemos; é necessário que todos os
que abraçam esse tipo de pensamento mostrem a base bíblica
para justificar que um rei cristão tenha o direito de exercer
supremacia na Igreja quanto a questões espirituais. Até que
isso seja feito nós não podemos acreditar que príncipes ou
gover nantes temporais tenham o direito de agir como
senhores da herança de Deus.
Também nenhum poder supremo foi conferido a nenhum
oficial da Igreja, embora este se distinguisse por seus dons,
seus sofrimentos, ou mesmo os seus abundantes
59
A IGREJA APOSTÓLICA

esforços pela causa de Cristo. Os membros comuns, na


verdade, receberam a ordem de obedecer aos governantes ou
presbíteros da Igreja; mas os presbíteros, por sua vez, foram
instruídos a agir não como dominadores da herança de Deus,
mas como exemplos do rebanho (I Pedro 5:3). Nem mesmo
os apóstolos reivindicaram ter domínio sobre a fé do povo,
mas apenas colaboradores de suas alegrias (“... não que
tenhamos domínio sobre a vossa fé, mas porque
somos cooperadores de vossa alegria” — II Co. 1:24). E,
entre esses apóstolos, não parecia que algum deles tinha a
preeminência. Pedro é o único para o qual foi reivindicada
supremacia oficial, em tempos posteriores; mas ele próprio
nunca reivindicou nenhuma supremacia para si mesmo; ele
sempre agiu com os seus companheiros apóstolos como um
simples pregador da cruz de Cristo; Pedro nunca é apresen
tado nas Escrituras reivindicando o ofício eclesiástico para si
mesmo, ou como alguém que exerce algum tipo peculiar de
controle sobre os oficiais inferiores na Igreja. Em certa
ocasião, quando ele estava tergiversando muito, um outro
apóstolo resistiu-lhe face a face, porque ele merecia repre
ensão (Gálatas 2:11). As Escrituras, portanto, não nos for
necem nenhuma base para acreditarmos que poder espiritual
supremo está depositado em algum oficial eclesiástico mais
do que em algum príncipe temporal.
As Escrituras devem ser o nosso guia quanto a isto tanto
quanto em quaisquer outras matérias religiosas. Agora
veremos algumas passagens que nos mostrarão onde reside a
fonte de todo poder espiritual:
Efésios 1:20-23: “O qual exerceu ele em Cristo, res
suscitando-o dentre os mortos e fazendo-o sentar-se à sua
direita nos lugares celestiais, acima de todo principado, e
potestade, e poder, e domínio, e todo nome que se possa
referir não só no presente século, mas também no vindouro.
Epôs todas as coisas debaixo dos pés e, para ser o cabeça
60
PRINCÍPIOS APOSTÓLICOS

sobre todas as cousas, o deu à Igreja, a qual è o seu corpo, a


plenitude daquele que a tudo enche em todas cousas”.
Efésios 5:23: “porque o marido é o cabeça da mulher, como
também Cristo é o cabeça da Igreja, sendo este mesmo o
salvador do corpo”.
Colossenses 1:18: “Ele é a cabeça do corpo, da Igreja.
Ele é o princípio, o primogênito de entre os mortos, para em
todas as coisas ter a primazia
As passagens acima transcritas são tiradas das ‘'Sa
gradas Escrituras”— a única regra cristã de fé e prática.
Temos dado a elas uma cuidadosa atenção: e elas têm nos
levado à conclusão de que a doutrina dos apóstolos era que
Cristo somente é o cabeça da Igreja. Cristo é para a Igreja o
mesmo que a cabeça é para o corpo humano; e que, assim
como o corpo não pode ter duas cabeças, a Igreja também não
pode ter duas cabeças — nem Cristo e o papa, nem Cristo e
um monarca. Parece-nos que não há meio termo nesta
questão. Das duas uma, ou nós re jeitamos a autoridade da
Bíblia, ou acreditamos no que ela ensina — a saber, que
Cristo é a cabeça suprema da
Igreja em todas as coisas. O fato de Cristo ser a cabeça é o
sexto princípio de governo que encontramos nos dias
apostólicos. Observemos as implicações deste princípio, pois,
sendo Cristo a cabeça da Igreja, os membros da Igreja estão
sujeitos a Ele; e como não temos outra forma de sondar a
mente de Cristo, exceto através das Escrituras, por
conseqüência os assuntos da Igreja são administrados pelos
oficiais aos quais ele confiou tal poder e que devem ser
regidos de acordo com a mente de Deus tal como está
expressa em sua Palavra e sem a interferência de nenhum
poder externo.
61
A IGREJA APOSTÓLICA
Capítulo III

A p l ic a ç ã o d o T e s t e

S e o leitor considerar seriam ente as evidências

apresentadas no capítulo anterior, acreditamos que ele


se convencerá de que há autoridade divina para se dizer que
os princípios, dos quais os seguintes fatos são a con
cretização, estavam em operação na Igreja Apostólica:
1) Os oficiais da Igreja eram escolhidos pelo povo; 2) O
ofício de bispo e de presbítero era o mesmo; 3) Havia uma
pluralidade de presbíteros em cada Igreja;
4) Ordenação era um ato do presbitério, ou seja, de uma
pluralidade de presbíteros;
5) Havia o privilégio de apelar para a assembléia de
presbíteros e o poder de governo exercido por eles em
conjunto;
6) A única cabeça da Igreja era o Senhor Jesus Cristo. Os
princípios contidos nestes seis fatos abrangem toda a
plataforma de governo eclesiástico, cada um sobrepon
do-se em importância acima do seu precedente, em escala
ascendente, da eleição pelo povo até o Senhor, como Ca beça
da igreja. Não chegamos a esses princípios por meio de uma
elaborada dedução lógica, mas pela aceitação das Escrituras,
o que cada filho de Deus deveria fazer, a menos que haja
razões óbvias e boas apontando o contrário, no sentido claro,
simples e natural. Até mesmo o leitor mais iletrado, se
honesto e sem preconceitos, não poderá exa minar as
passagens da Escritura que especificamos sem
63
A IGREJA APOSTÓLICA

deixar de ver que esses seis grandes princípios estavam


todos incorporados no governo da igreja apostólica.. Mas se
tais princípios estão presentes nas formas de governo
existentes hoje em dia no mundo é uma questão bastante
importante — é uma questão sobre a qual é nossa respon
sabilidade responder. Passaremos, portanto, a trazer suces
sivamente os sistemas de governo eclesiástico existentes
para o teste do modelo apostólico.

E piscopalouP relado

Como já vimos, o Episcopal ou Prelado é o sistema de


governo eclesiástico administrado por arcebispos, bispos,
padres (ou pastores, se for na Igreja Anglicana), deões, diá
conos e outros oficiais. Este tipo de governo é praticado na
Igreja Católica Romana e na Igreja da Inglaterra; tanto uma
quanto a outra são episcopais em sua forma de governo; a
diferença é que na Igreja de Roma, o papa é revestido' de
autoridade eclesiástica suprema, enquanto o chefe da Igreja
Anglicana é o monarca reinante. Apesar dessa ex ceção, as
duas igrejas, não obstante difiram amplamente em doutrina,
são, em cada aspecto importante de governo, as mesmas.
Como muitos estarão dispostos a considerar o prelado de uma
Igreja Protestante com mais brandura do que o prelado de
Roma, e, uma vez que não temos nem a necessidade nem o
desejo de levar qualquer vantagem injusta em nossa
argumentação, preferimos comparar o prelado protestante
com o modelo apostólico.
A fonte da jurisdição da Igreja da Inglaterra é o monar ca
que está ocupando o trono, é aquele que herda o trono por
descendência hereditária e que, a despeito de todo o caráter,
é, por um decreto do Parlamento, o cabeça da Igre
ja da Inglaterra e da Irlanda (Henrique VIII 37, capítulo 17).
Ninguém pode ser recebido no ministério da Igreja
64
APLICAÇÃO DO TESTE

sem subscrever este artigo: “A majestade do rei, debaixo de


Deus, é o único governante supremo desse reino e de todos
os outros paises e domínios de sua alteza, tanto em todas as
coisas ou causas espirituais e eclesiásticas quanto nas
temporais^ (Cânon 36). A indicação de todos os arcebispos e
bispos é feita pela Coroa, que é guiada na seleção pela
administração política do momento — um corpo composto
por pessoas de cada tendência ou matiz religioso, sendo
mantidos no cargo pela maioria dos vo tos que recebam no
Parlamento. Os oficiais eclesiásticos mais altos, debaixo da
Coroa, são os arcebispos, os quais são dois na Inglaterra — o
arcebispo da Cantuária e o de York, e dois na Irlanda — o
arcebispo de Armagh c o de Dublin. Cada um deles tem sob
os seus cuidados o clero inferior de sua diocese, que prega e
administra as ordenanças da religião para os membros de sua
paróquia como eles acharem conveniente. Os clérigos da
paróquia são, em alguns casos, apontados pela Coroa; há
casos também em que eles são apontados pelo bispo; em
outros ainda, por um patrono leigo e, às vezes, de uma
maneira ainda mais execrável.
Assim é o Prelado em sua forma mais favorável, como é
apresentado na Igreja da Inglaterra. Agora, comparemo lo
com o sistema de governo que, pelo que já vimos, era
praticado na Igreja Apostólica.
Na Igreja Apostólica, os oficiais eram escolhidos pelo
povo; mas, na Igreja da Inglaterra, os arcebispos e bispos são
escolhidos pela Coroa e os clérigos subordinados são
indicados para as suas obrigações ou por uma diocese ou por
algum proprietário de terra, ou mesmo por alguma
corporação civil. Os membros da Igreja Apostólica exer
ceram o privilégio de eleger um apóstolo; os membros da
Igreja Anglicana não têm o poder de eleger nem mesmo um
vigário de aldeia ou povoado.
65
A IGREJA APOSTÓLICA

deixar de ver que esses seis grandes princípios estavam


todos incorporados no governo da igreja apostólica.. Mas sc
tais princípios estão presentes nas formas de governo
existentes hoje em dia no mundo é uma questão bastante
importante — é uma questão sobre a qual é nossa respon
sabilidade responder. Passaremos, portanto, a trazer suces
sivamente os sistemas de governo eclesiástico existentes
para o teste do modelo apostólico.

E piscopalouP relado

Como já vimos, o Episcopal ou Prelado é o sistema de


governo eclesiástico administrado por arcebispos, bispos,
padres (ou pastores, se for na Igreja Anglicana), deões, diá
conos e outros oficiais. Este tipo de governo é praticado na
Igreja Católica Romana e na Igreja da Inglaterra; tanto uma
quanto a outra são episcopais em sua forma de governo; a
diferença é que na Igreja de Roma, o papa é revestido de
autoridade eclesiástica suprema, enquanto o chefe da Igreja
Anglicana é o monarca reinante. Apesar dessa ex ceção, as
duas igrejas, não obstante difiram amplamente em doutrina,
são, em cada aspecto importante de governo, as mesmas.
Como muitos estarão dispostos a considerar o prelado de uma
Igreja Protestante com mais brandura do que o prelado de
Roma, e, uma vez que não temos nem a necessidade nem o
desejo de levar qualquer vantagem injusta em nossa
argumentação, preferimos comparar o prelado protestante
com o modelo apostólico.
A fonte da jurisdição da Igreja da Inglaterra é o monar ca
que está ocupando o trono, é aquele que herda o trono por
descendência hereditária e que, a despeito de todo o caráter,
é, por um decreto do Parlamento, o cabeça da Igre
ja da Inglaterra e da Irlanda (Henrique VIII 37, capítulo 17).
Ninguém pode ser recebido no ministério da Igreja
64
APLICAÇÃO DO TESTE

sem subscrever este artigo: “A majestade do rei, debaixo de


Deus, é o único governante supremo desse reino e de todos
os outros paises e domínios de sua alteza, tanto em todas as
coisas ou causas espirituais e eclesiásticas quanto nas
temporais” (Cânon 36). A indicação de todos os arcebispos e
bispos é feita pela Coroa, que é guiada na seleção pela
administração política do momento — um corpo composto
por pessoas de cada tendência ou matiz religioso, sendo
mantidos no cargo pela maioria dos vo tos que recebam no
Parlamento. Os oficiais eclesiásticos mais altos, debaixo da
Coroa, são os arcebispos, os quais são dois na Inglaterra — o
arcebispo da Cantuária e o de York, e dois na Irlanda — o
arcebispo de Armagh c o de Dublin. Cada um deles tem sob
os seus cuidados o clero inferior de sua diocese, que prega e
administra as ordenanças da religião para os membros de sua
paróquia como eles acharem conveniente. Os clérigos da
paróquia são, em alguns casos, apontados pela Coroa; há
casos também em que eles são apontados pelo bispo; em
outros ainda, por um patrono leigo e, às vezes, de uma
maneira ainda mais execrável.
Assim é o Prelado em sua forma mais favorável, como é
apresentado na Igreja da Inglaterra. Agora, comparemo lo
com o sistema de governo que, pelo que já vimos, era
praticado na Igreja Apostólica.
Na Igreja Apostólica, os oficiais eram escolhidos pelo
povo; mas, na Igreja da Inglaterra, os arcebispos e bispos são
escolhidos pela Coroa e os clérigos subordinados são
indicados para as suas obrigações ou por uma diocese ou por
algum proprietário de terra, ou mesmo por alguma
corporação civil. Os membros da Igreja Apostólica exer
ceram o privilégio de eleger um apóstolo; os membros da
Igreja Anglicana não têm o poder de eleger nem mesmo um
vigário de aldeia ou povoado.
65
A IGREJA APOSTÓLICA

Na Igreja Apostólica, o ofício de bispo e presbítero eram


idênticos; os presbíteros de Éfeso eram os bispos do rebanho;
mas, na Igreja Anglicana, isto é muito di ferente. O presbítero
apostólico, sendo o docente e o regente de uma congregação,
assemelha-se mais a um pastor do que qualquer outro oficial
da Igreja Anglicana. Mas, é bastante claro que, naquela
Igreja, um pastor tem uma posição muito diferente em
relação à posição de bispo. O reitor exerce autoridade sobre a
jurisdição de uma paróquia; mas o bispo governa uma
diocese que, geralmente, inclui várias paróquias. Um preside
sobre uma única congregação; o outro, sobre varias
paróquias. Um exercita autoridade sobre os leigos, mas um
bispo da Igreja Anglicana exerce autoridade sobre um grupo
de clérigos. Se, então, o pastor de uma paróquia correspon de
ao presbítero dos tempos apostólicos, é muito claro que, na
Igreja Anglicana, o bispo e o presbítero não são idênticos em
termos de ofício. Na Igreja Anglicana cada presbítero está
sujeito ao bispo; mas, na Igreja Apostólica, cada presbítero
era um bispo.
Na Igreja Anglicana, cada congregação está debaixo do
cuidado de um presbítero. Quando um segundo é con vidado,
ele vai ser um simples auxiliar à disposição do outro,
destituído de qualquer jurisdição eclesiástica. Isto não é
comum e, certamente, não é essencial para o sistema ter mais
de um presbítero em cada igreja; enquanto que, conforme
vimos, em toda igreja dos dias apostólicos havia uma
pluralidade de presbíteros.
Na Igreja Anglicana, a ordenação é um ato exclusi
vamente realizado por um bispo; ele pode convidar outros
para juntarem-se a ele, mas é a sua presença, não a dos
outros, que é essencial para o ato; enquanto que, na Igreja
Apostólica, a prática era ordenar homens ao ministério pela
imposição de mãos do presbitério.
66
APLICAÇÃO DO TESTE

Na Igreja Anglicana, não importa que razão de queixa


eclesiástica possa existir, não há poder para apelar, exceto
para os tribunais de justiça, ou para o Conselho Privado da
rainha, ou para algum outro tribunal. A prática de trazer
alguma questão à apreciação da assembléia dos presbí teros
para que estes decidam sobre a matéria, de acordo com o
exemplo dos apóstolos, é desconhecida nesta deno minação.
No entanto, esse era, como está claro, o modo pelo qual as
coisas eram tratadas na Igreja Apostólica.
No nosso sistema Anglicano o monarca é por um ato do
Parlamento a cabeça da Igreja e, ao rei ou à rainha, conforme
for o caso, pertence a chefia de todos os estados do reino,
sejam estes de natureza eclesiástica ou civil, em qualquer
caso, conforme o artigo 37 nos informa; enquanto que na
Igreja Apostólica, a Igreja não tinha outra cabeça além de
Jesus.
Examinamos e comparamos as duas igrejas, apro
ximando-as uma da outra e honestamente, tanto quanto nos é
possível fazer, somos levados a concluir que, dos seis grandes
princípios de governo eclesiástico que encon tramos na Igreja
Apostólica, nem um sequer está presente no sistema
episcopal da Igreja da Inglaterra. Inferimos portanto, que,
conquanto a Igreja possa ser considerada em muitos aspectos,
como um sistema humano, mantida por um Ato do
Parlamento e contando em suas fileiras com muitas pessoas
notáveis, não há qualquer base para consi derarmos essa
denominação como uma Igreja Apostólica, em termos de seu
governo eclesiástico. Mesmo correndo o risco de sermos
excomungados, sentimo-nos impelidos a declarar a nossa
convicção de que o governo da Igreja Anglicana é
inconsistente com a Palavra de Deus.6

6 O artigo VII de Constitutions and Canons Ecclesiastical, de acordo com


autorização do rei em 1603, reeditada pelo Prayer-Book e Homily Society 67
A IGREJA APOSTÓLICA

Congregacionalismo ou Governo Independente

É difícil averiguar as particularidades da ordem


eclesiástica aprovada pelos independentes, visto que não
sabemos se eles incluíram as suas idéias sobre o que as
Escrituras ensinam a respeito deste assunto em alguma
fórmula comum e, como cada congregação existe sepa
radamente, estas podem, às vezes, diferir grandemente umas
das outras em pontos importantes. Temos, portanto, de
descobrir as suas concepções sobre política eclesiástica a
partir de práticas gerais que sabemos existir entre eles, bem
como a partir dos princípios defendidos pelos seus escritores
mais proeminentes. Esses princípios contudo, são
suficientemente conhecidos para nos permitir com parar o
Sistema de Governo Independente com o modelo apostólico.
O princípio de eleição popular existiu na Igreja Primi
tiva como já notamos, tendo sido aprovado pelos apóstolos
do Senhor. Entre os Independentes (também chamados de
congregacionais ou congregacionalistas) esse principio é
preservado em sua totalidade: entre eles cada oficial é
escolhido pelo povo.
Na Igreja Apostólica o ofício de bispo e presbítero era a
mesma coisa; o bispo não exercia qualquer autoridade sobre
o presbítero; pois, cada bispo era um presbítero, e cada
presbítero era um bispo. Acontece da mesma for ma entre os
Independentes. Cada um dos seus pastores preenche o oficio
de bispo e presbítero, e nenhum deles

(1852) reza que: “Quem quer que, daqui por diante, afirme que o governo da Igreja
da Inglaterra, exercido debaixo de Sua majestade pelos arcebispos, bispos, deões e
por todos os seus outros oficiais, é anticristão ou abominável à Palavra de Deus, seja
excomungado ipso facto, e assim continue até que se arrependa e se retrate
publicamente de seus erros ímpios.”
68
APLICAÇÃO DO TESTE

reivindica autoridade sobre os outros. Para eles, bispo e


presbítero são apenas nomes diferentes para o mesmo oficio,
a exemplo da compreensão reinante nos dias dos apóstolos.
Temos visto que na época dos apóstolos havia uma
pluralidade de presbíteros em cada Igreja. Neste ponto reside
a falha do Sistema Independente. Nos princípios desta teoria
de governo de igreja, é muito difícil ter uma pluralidade de
presbíteros e na prática é raro, se é que isto já aconteceu
alguma vez*. Para eles há apenas um único ministro, ou
bispo, em cada congregação. Praticamente o sistema deles
admite apenas um presbítero para cada Igreja. Um apóstolo,
escrevendo uma epístola para uma Igreja que pratica esse
governo Independente, não poderia nem pensar em endereçar
a sua carta para os bispos, nem para os diáconos, e isso pela
simples razão de que, para eles, comumente há apenas um
presbítero para cada Igre ja; também um apóstolo não poderia
nunca enviar uma carta para os presbíteros de uma Igreja
cujo sistema de governo é o Independente, como Paulo fez
para com os presbíteros de Éfeso, pela razão óbvia de que
uma Igreja Independente tem apenas um presbítero. Apenas
um pastor com diáconos sob a autoridade deste pastor,
regendo uma Igreja, é a característica principal que os
independentes apresentam em todos os lugares — uma
compreensão que não poderia se opor mais à realidade de que
havia uma pluralidade de presbíteros em cada congregação
na épo ca apostólica. Alguns Independentes tentam amenizar
o distanciamento deles em relação ao precedente apostólico
dizendo que a pluralidade de presbíteros é preferível, mas as
Igrejas deles não são capazes de mantê-los. Será que os

* Atualmente existem várias igrejas Batistas Reformadas que possuem um


conselho de presbíteros (Nota do Editor).
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A IGREJA APOSTÓLICA

nossos estimados irmãos não se dão conta do fato de que,


sendo assim, deve haver uma grande disparidade entre o
sistema apostólico e o deles, uma vez que as suas Igrejas
mais ricas não podem possuir o que era possuído pelas
Igrejas mais pobres dos dias dos apóstolos? É a Palavra de
Deus que diz sobre Paulo e Bamabé: “Eles ordenaram
presbíteros em cada Igreja” (Atos 14:23).
Os oficiais da Igreja Apostólica foram separados para o
exercício de seus deveres peculiares pela imposição das mãos
do presbitério. Para os Independentes, contudo, nenhum tipo
de ordenação é essencial; isto é freqüen temente considerado
desnecessário. São conhecidos alguns exemplos de pessoas
agindo como pastores por toda a sua vida sem jamais terem
sido investidos ao ofício pela imposição de mãos e oração.
Ordenação não é uma exigência deste sistema. Para eles, isto
é apenas uma questão de gosto, que cada um deve arbitrar
conforme preferir. Se um pastor recém-eleito desejar ser
ordenado,' isso pode ser feito, mas de maneira inconsistente
com os princípios Independentes. Uma vez que a
congregação é destituída de uma pluralidade de presbíteros, a
ordena ção dele só pode ser levada a efeito pelo povo que não
tem nenhum direito de fazer tal coisa, de acordo com as
Escrituras, ou pelo pastor da Igreja mais próxima. Mas quem
não percebe que esta prática está em completa de sarmonia
com o principio fundamental de Independência que ensina
que cada congregação tem em si mesma todo
o material necessário ao seu governo? Tanto este é o caso
que, enquanto alguns pedem a assistência do pastor do bairro
em alguma ocasião, aqueles que preferem prati car o seu
princípio Congregacionalista com um pouco mais de
consistência fazem pouco caso de ordenação, acham que isso
não é necessário, e acham melhor viver sem isso.
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APLICAÇÃO DO TESTE

Na Igreja Apostólica havia o privilégio de apelar para a


assembléia de presbíteros. No sistema congregacional a
decisão do pastor, dos diáconos e do povo, reunidos em as
sembléia, é a palavra final em cada caso. Não importa quão
parcial ou injusta a decisão deles seja, não há possibilidade
de apelar para que tal decisão seja reconsiderada em outra
instância em que haja menos parcialidade. O julgamento da
Igreja pode ser rigorosamente de acordo com a justiça, ou
pode resultar de preconceito ou malevolência de uns poucos
líderes da reunião, naturalmente com aparência de zelo pela
pureza da comunhão e pela causa da religião; mas, não
importa quão superficial a investigação seja, ou quão sério o
erro seja, o fato é que este sistema priva a pessoa injustiçada
do privilégio de apelar e investe os per petradores de um
poder irresponsável. Através da negação e do repúdio a um
poder participativo, isto permite que os líderes ou
governantes das Igrejas ajam como tiranos, privando assim
os prejudicados de que as decisões injustas sejam corrigidas.
“Independência,” diz o Dr. Wardlaw, “é a competência de
cada Igreja, separadamente, administrar sem apelação, suas
próprias causas ou situações”.7 Isto é um modo ingênuo de
disfarçar a característica mais repulsiva deste sistema em
apreciação. Poucas pessoas negariam que uma Igreja é
competente para lidar com seus próprios assuntos, de forma
que remova a necessi dade de apelação; porém, o que estamos
afirmando é que, quando uma Igreja necessita de sabedoria e
discrição no trato de suas questões internas não é permitido
apelar, no âmbito dos Independentes; resultado, a pessoa
injustiçada é privada do direito de recorrer e o poder, pelo
qual o seu detentor é responsável para com o homem,
degenera-se em

7 Congregational Independency, por Dr. Wardlaw. Página 232. Glasgow, 184B.


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