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A VERDADE
RESSUSCITADA
SELEÇÃO DE ARTIGOS PUBLICADOS NA REVISTA OESTE
AUGUSTO NUNES
A VERDADE
RESSUSCITADA
SELEÇÃO DE ARTIGOS PUBLICADOS NA REVISTA OESTE
WWW.REVISTAOESTE.COM
APRESENTAÇÃO | PG. 05
O ESTRANHO CASO DE
ALEXANDRE DE MORAES | PG. 95
A QUARENTENA DOS DESVALIDOS
| PG. 105
OS VIGARISTAS DA ADVERSATIVA
| PG. 117
O GENERAL DE CORDÃO
CARNAVALESCO | PG. 150
O CIRCO BRASIL VERMELHO
| PG. 161
APRESENTAÇÃO
O PRIVILÉGIO DE TER AUGUSTO NUNES
A
revista Oeste conta com as colunas de
Augusto Nunes desde seu número 1,
lançado em 27 de março de 2020. Logo
na primeira frase, Augusto arma com seu es-
tilo ao mesmo tempo arrasador e elegante:
“Quando Lula empunha o microfone,
fenômenos assombrosos se oferecem
aos olhos de quem trata o idioma com
alguma gentileza”.
Assim escreve o cidadão de Taquaritinga
quando dá sua opinião: afiado como um
bisturi e floreado como uma abertura de
romance. Augusto tem a seu favor alguns
fatores cada vez mais raros de encontrar no
jornalismo brasileiro: senso de humor, estilo
único, coragem e a experiência de quem já
fez um pouco de tudo na imprensa.
Os leitores de Oeste não têm o privilégio
de ter, como nós, da redação, a presença de
Augusto Nunes nas reuniões de pauta: alegre
como um menino, entusiasmado como um
Apresentação 06
novato, sempre à caça de uma boa piada para
resumir as mais complexas situações. Para
explicar os dilemas da profissão, Augusto
sempre tem na memória alguma situação
dramática pela qual passou em seu meio
século de experiência em redações, estúdios
de TV e de rádio. E que agora faz sucesso
com a multidão virtual das redes sociais.
Este livro reúne algumas das colunas
escritas por Augusto Nunes para a revista
Oeste em 2020 e 2021. Os assuntos que
determinaram nossa vida nesse maluco e
assustador início de década estão listados
nesta coletânea. Os heróis das esquerdas, tão
adulados na chamada imprensa velha, não
são poupados pela metralhadora de ideias de
Augusto: Dilma Rousseff, José Dirceu, Ciro
Gomes, João Pedro Stédile e, especialmente
(como define o autor), o “deus único da seita”,
Luiz Inácio Lula da Silva. Seu “Pequeno
Glossário da Novilingua Luloesquerdista”
Apresentação 07
está cada dia mais conveniente para que
a gente tenha na memória as razões pelas
quais não podemos nos dar ao luxo de insistir
num erro.
Temos neste 20/21 a tragédia da pandemia
de covid-19, que se tornou uma farsa nas mãos
de administradores, legisladores e políticos.
Para o circo da CPI da Covid, Augusto criou
a CPI da CPI. Como ele costuma dizer, o
Brasil vive o faroeste ao contrário, onde os
bandidos perseguem o xerife.
E temos também nestas páginas o outro
grande destaque de nossos tempos — o
Supremo Tribunal Federal, que se alimenta
de holofotes e autoritarismo. Deveria garantir
a Constituição, mas transformou o Brasil
num país com presos políticos. Os perfis
dos excelentíssimos juízes do STF são uma
das atrações deste livro.
Os tristes rumos da parcela da imprensa
brasileira entregue à militância estão
Apresentação 08
radiografados na verdadeira aula de redação
chamada “Os vigaristas da adversativa”.
Augusto Nunes mostra também seu lado de
cronista no patético “Duas mulheres. Ou
dois sucos de laranja”, sobre as desventuras
de dois jornalistas brasileiros num hotel de
Buenos Aires.
Assim foram os anos 2020 e 2021. 2022
chegou com novas emoções, temores e
esperanças. E o leitor da Revista Oeste já
sabe que vai contar com a escrita afiada de
Augusto Nunes para entender os fatos. E se
divertir enquanto lê.
Redação Oeste
Apresentação 09
IDEIAS
03 ABRIL 2020
DILMA JAZ
NO MAUSOLÉU
DAS BESTAS
QUADRADAS
A supergerente do Brasil foi só
um embuste vendido a multidões
de eleitores abúlicos por políticos
e jornalistas que perderam o juízo,
a sensatez ou a vergonha
FOTO: MARCELO CAMARGO/AGÊNCIA BRASIL
AUGUSTO NUNES
C
onfrontados com a notícia de que
Dilma Rousseff andava enxergando
um cachorro oculto por trás de cada
criança brasileira, os craques do duelo retó-
rico hoje sumidos da paisagem política bra-
sileira teriam destruído a usina de maluqui-
ces instalada na Presidência da República
com meia dúzia de frases de grosso calibre.
Um Carlos Lacerda, por exemplo,
provavelmente sugeriria que a chefe de
governo dedicasse ao exame dos incontáveis
problemas reais o tempo que desperdiçava em
visões mediúnicas. Um Jânio Quadros talvez
perguntasse se os cães de Dilma também
eram distribuídos de acordo com as classes
sociais. Nessa hipótese, emendaria Jânio,
acaso teria a senhora presidenta visto um
galgo afegão seguindo um pequeno favelado?
Ou uma matilha de vira-latas escoltando a
filharada da elite golpista?
Para sorte de Dilma, a Era da Mediocridade
RETRATO 3X4
(NÃO AUTORIZADO)
DE JOSÉ DIRCEU
O colecionador de fiascos agora
planeja o Brasil socialista que virá
com o fim da pandemia
AUGUSTO NUNES
FOTO: REPRODUÇÃO
AUGUSTO NUNES
J
osé Dirceu de Oliveira e Silva, o mi-
neiro de Passa Quatro que virou líder
do movimento estudantil paulista em
1968 e provocou num único dia a prisão de
mais de mil militantes, o impetuoso guerri-
lheiro diplomado em Cuba com o codinome
Daniel que nunca disparou balas de verda-
de, o intrépido revolucionário que remode-
lou o nariz, fantasiou-se de comerciante de
gado, falsificou a carteira de identidade e
passou cinco anos escondido no interior do
Paraná, o capitão do time de Lula que seria
expulso de campo por ladroagem, o consul-
tor conhecido como Jay Dee que enriqueceu
como facilitador de negociatas, o Guerreiro
do Povo Brasileiro aclamado só pelas pla-
teias amestradas do PT — ele mesmo, o Zé
Dirceu velho de guerra resolveu dar um jei-
to na pandemia que anda assustando o Bra-
sil. Boa notícia para o vírus chinês. Faz qua-
se 60 anos que Zé Dirceu sai derrotado de
CIRO BUTTON.
OU BENJAMIN
GOMES
O sessentão estacionado na primeira
infância quer brincar de Robin Hood
no gabinete presidencial
AUGUSTO NUNES
C
andidato à Presidência da Repúbli-
ca pela quarta vez, Ciro Gomes re-
solveu chegar ao Palácio do Planalto
pelo caminho do meio, o mais adequado a
quem pretende mostrar-se igualmente dis-
tante da extrema direita fiel a Jair Bolsona-
ro e da extrema ladroagem comandada por
Lula. (No Brasil, usa-se extrema ladroagem
porque, como ensinam os doutores em ideo-
logia, a antiga extrema esquerda se dissol-
veu na frente ampla composta pelos 70%
que declararam guerra ao fascismo em de-
fesa da democracia. A porcentagem inclui
os nostálgicos do stalinismo homiziados em
movimentos sociais e os órfãos do maoismo
acampados no PCdoB. Essa caricatura das
Diretas Já também sonha com a liberdade
dos corruptos, mas isso não é coisa a ser dita
em manifestos.) O problema de Ciro é que a
estrada escolhida só se pode percorrer sem
sobressaltos por homens públicos providos
LULA É A VERSÃO
DEGENERADA
DO SÃO JORGE
DE BORDEL
O ex-presidente presidiário
continua fingindo ignorar
o que aconteceu na zona do PT
AUGUSTO NUNES
N
os anos 60, sobretudo nas pequenas
cidades, não era fácil atender ao cla-
mor dos hormônios que acossavam o
corpo, a imaginação e a alma de quem che-
gava à adolescência. Antes da revolução dos
costumes desencadeada no fim daquela dé-
cada, a virgindade devia ser preservada até
o casamento, e, portanto, a esfregação dos
namorados nunca ia muito longe. Letreiro
em vermelho neon na fachada de um mo-
tel só aparecia em estradas de filme norte-
-americano e drive-in só existia num punha-
do de capitais.
O jeito era abrandar a inquietude com pe-
cados solitários e torcer pela aparição dos
primeiros fiapos de barba. A penugem inau-
gural avisava que chegara a hora de arrumar
dinheiro com o irmão mais velho, escalar
como acompanhante um amigo que já co-
nhecesse o lugar e caprichar na pose de qua-
se adulto no momento de cruzar a porta de
PEQUENO
GLOSSÁRIO DA
NOVILINGUA
LULOESQUERDISTA
Conheça o real significado
das expressões recitadas
pelos democratas mais
intolerantes do planeta
FOTO: SHUTTERSTOCK
AUGUSTO NUNES
A
nalfabetismo: 1. Deficiência promo-
vida a virtude no começo do século 21
para apressar a chegada de um envia-
do da Divina Providência ao Palácio do Pla-
nalto. 2. Qualidade depreciada por reacio-
nários preconceituosos, integrantes da elite
golpista e louros de olhos azuis.
NUNCA HAVERÁ
UMA PRIMAVERA
COMO AQUELA
Assim era a vida no Brasil que sabia
praticar o convívio dos contrários
FOTO: MONTAGEM REVISTA OESTE/ SHUTTERSTOCK
AUGUSTO NUNES
O
s assombros daquela primavera co-
meçaram com a chuva de rã que teve
como epicentro o jardim na frente da
casa de Eulália Menon Montenegro. De pé na
soleira da porta de entrada, com o semblan-
te sereno de quem já não se surpreende com
nada, ela olhava alternadamente para os pe-
quenos objetos voadores que continuavam
desabando na grama ou nas roseiras e para
o sobrinho encolhido na cadeira de balan-
ço austríaca, pálido de susto, com um gibi
do Flash Gordon na mão direita, a esquer-
da agarrada ao braço de madeira e tentando
decifrar o que estava acontecendo naquele
fim de tarde de 27 de setembro de 1957.
“Essa é a maior que já vi”, murmurou Eu-
lália. Fez uma pausa e completou: “Quando
chove rã, coisas estranhas acontecem em se-
guida”. Assim ela avisou que nunca haveria
uma primavera como a de 1957, que come-
çou com a tempestade de batráquios e pros-
AUTÓPSIA
DE UMA CHICANA
Gilmar Mendes está treinando
para ser o pior decano
da história do Supremo
FOTO: MONTAGEM REVISTA OESTE/STF/SCO
AUGUSTO NUNES
N
o recesso do lar, Gilmar Mendes usa
linguagem de gente, diz frases inte-
ligíveis e até encurta palavras. Sua
mulher, Guiomar Feitosa, por exemplo, vi-
rou simplesmente Guio. Em retribuição, ela
passou a chamá-lo de Gil. Além de economi-
zarem duas consoantes e uma vogal, os ape-
lidos têm um som mais carinhoso. Também
os trajes caseiros são singelos. O Gilmar do-
méstico gosta da linha bermudão, camisa de
mangas curtas, meias soquete e par de tênis
novinho em folha. É esse o combo popula-
rizado pelas fotos que o mostram zanzando
por Lisboa, sempre perseguido por algum
turista brasileiro com um celular na mão e
um cacho de insultos na ponta da língua.
As coisas mudam quando está em ação o
ministro do Supremo Tribunal Federal. Ter-
no escuro e gravatas sombrias, óculos de pri-
meiro da classe no grupo escolar, os instintos
mais primitivos traduzidos nas caras e bocas
DUAS MULHERES.
OU DOIS SUCOS
DE LARANJA
A derrapagem do embaixador
chinês lembrou o fiasco dos jornalistas
em Buenos Aires
FOTO: MONTAGEM REVISTA OESTE/ SHUTTERSTOCK
AUGUSTO NUNES
N
o fim da tarde, os dois jornalistas da
revista Veja desembarcaram em Bue-
nos Aires com a imaginação bailando
ao som de sensualíssimas letras de tango.
Do aeroporto foram para o hotel no centro
da cidade com a libido repartindo com Car-
los Gardel a interpretação de Por una Cabe-
za. Apressaram o check-in e subiram para o
apartamento prontos para a missão notur-
na definida já na decolagem no Brasil.
— Hoje vamos pegar mulher — repetiu o
repórter sem ter sequer desafivelado a mala.
— Vamos — endossou o fotógrafo antes
de terminar a contagem dos cabides enfilei-
rados no canto do guarda-roupa.
— Começamos pela Corrientes — ale-
grou-se o repórter, caprichando na pose de
expert em noite argentina.
— La calle que nunca duerme… — animou-
-se o fotógrafo, tentando camuflar a escassa
intimidade com o sotaque portenho.
ao fotógrafo.
Também com cara amarrada, o pai da
ideia rosnou um “buenas noches” ao cruzar
a portaria guardada por um homem de ca-
belos brancos, que pareceu intrigado com
as carrancas da dupla que, ao deixar o ho-
tel horas antes, exibia o sorriso do mais
otimista amante latino. Os dois subiram
pelo elevador em silêncio e mudos entra-
ram no apartamento. O repórter sentou-se
numa das camas de solteiro, empunhou o
telefone, discou o número da portaria e
fez a encomenda com voz de sargento que
perdeu a paciência:
— Yo quiero dos mujeres!
O homem de cabelos brancos não enten-
deu direito que o queria exatamente aque-
le brasileiro de humor instável. E pediu-lhe
que repetisse a solicitação.
— Dos mujeres! — subiu o tom o repórter.
— Dos mujeres! Dos chicas! Dos muchachas!
O ESTRANHO
CASO DE
ALEXANDRE
DE MORAES
Muita gente desconfia que
o professor e o ministro não
são uma pessoa só
FOTO: STF/SCO
AUGUSTO NUNES
Q
uem lê um livro de Alexandre de Mo-
raes e ouve um improviso de Alexan-
dre de Moraes desconfia que o pro-
fessor de Direito Constitucional e o ministro
do Supremo Tribunal Federal não são uma
pessoa só. Muita gente continua acreditan-
do na versão espalhada pelos estudantes da
Faculdade do Largo de São Francisco: os Ale-
xandres formam uma dupla de gêmeos se-
parados ao nascer, que usam o mesmo nome
só para confundir.
As dúvidas fazem sentido. Os textos que
Alexandre publica são gentis com o idioma
tratado com ferocidade pelo Alexandre que
fala (sem um papelório nas mãos). Os livros
que assinou têm sido fonte de consulta para
incontáveis advogados em gestação. Os im-
provisos são tão imprestáveis quanto as dis-
curseiras de Lula.
A espécie a que pertence Alexandre de Mo-
raes, convém ressalvar, não deve ser confun-
O estranho
caso de Alexandre
de Moraes 97
AUGUSTO NUNES
O estranho
caso de Alexandre
de Moraes 98
AUGUSTO NUNES
O estranho
caso de Alexandre
de Moraes 99
AUGUSTO NUNES
O estranho
caso de Alexandre
de Moraes 100
AUGUSTO NUNES
O estranho
caso de Alexandre
de Moraes 101
AUGUSTO NUNES
O estranho
caso de Alexandre
de Moraes 102
AUGUSTO NUNES
O estranho
caso de Alexandre
de Moraes 103
AUGUSTO NUNES
O estranho
caso de Alexandre
de Moraes 104
16 ABRIL 2021
A QUARENTENA
DOS DESVALIDOS
Os governantes fingem ignorar
a existência de um Brasil maior
e mais populoso que o conhecido
pelos loucos por lockdowns
FOTO: DIVULGAÇÃO
AUGUSTO NUNES
N
este 13 de abril, o governador João
Doria foi enfim confrontado com a
pergunta que não queria ouvir — e
nenhum jornalista havia ousado formular
nas mais de 200 entrevistas coletivas so-
bre a pandemia de coronavírus concedi-
das desde março de 2020: o que pretende
fazer para ao menos reduzir as aglomera-
ções nos ônibus, trens metropolitanos e
vagões do metrô?
O repórter tinha numa das mãos fotogra-
fias que escancaravam o tumor medonho:
amontoada em ambientes opressivos e mal
ventilados, a multidão de passageiros con-
firmava que, todos os dias, esquadrilhas de
vírus chineses sobrevoam os meios de trans-
porte público para expandir a morte e o medo
no maior conglomerado urbano do país. O
que tinha a dizer sobre isso o líder do com-
bate ao inimigo invisível na frente paulista?
Os doutores que compõem o Centro de
OS VIGARISTAS
DA ADVERSATIVA
Se aparece uma notícia boa,
os integrantes da tribo infiltram
alguma ressalva desanimadora depois
do ‘mas’ precedido pela vírgula
FOTO: SHUTTERSTOCK
AUGUSTO NUNES
A
ofensiva contra o presidente que se
instalara no Palácio do Planalto em 1º
de janeiro de 2019 não respeitou se-
quer a trégua de praxe, fixada em cem dias.
Assim que foi divulgada a queda sofrida pelo
Produto Interno Bruto no primeiro trimes-
tre, o segundo foi sitiado pela tribo dos pro-
fetas agourentos. Entre o início de abril e o
fim de junho, previram 999 em cada mil su-
midades da economia espalhadas pela im-
prensa, ocorreria outro baque — e o Brasil
mergulharia no pântano da “recessão téc-
nica”. Nenhum dos especialistas explicou
direito o que era aquilo, mas os textos em
economês castiço deixaram claro que era
coisa grave. E todos debitaram na conta de
Jair Bolsonaro o desastre em gestação nos
13 anos de desgoverno do PT e parido em
2015 por Dilma Rousseff.
Confrontados com o crescimento de 0,4%,
jornalistas sérios se renderiam aos fatos.
OS VIGARISTAS DA ADVERSATIVA
FIZERAM O POSSÍVEL PARA
MATAR DE MEDO QUEM NÃO
MORRESSE DE COVID-19
TERMO DE
DECLARAÇÕES
PRESTADAS
POR RENAN
CALHEIROS
Colunista interroga relator da CPI
FOTO: JEFFERSON RUDY/AGÊNCIA SENADO
AUGUSTO NUNES
A
os oito dias de junho de dois mil e
vinte e um, em São Paulo, às duas
horas da madrugada, numa sala des-
ta instância jornalística, compareceu José
Renan Vasconcelos Calheiros, filho de Ola-
vo Calheiros Novais e Ivanilda Vasconce-
los Calheiros, com 65 anos de idade, natural
de Murici, Alagoas, de cor branca, residen-
te em Brasília, sabendo ler e escrever; aos
costumes, disse nada; interpelado pelo sig-
natário, declarou que, embora formado em
A VERDADE
RESSUSCITADA
Documentário sobre Cuba
rasga fantasias dos devotos de ditaduras
FOTO: ZOLTAN VARGA PHOTOGRAPHER/SHUTTERSTOCK
AUGUSTO NUNES
C
om o uniforme de oficial de cordão
carnavalesco, um charuto hospedado
no canto da boca, Fidel Castro está de
saída do Congresso do Partido Comunista
Cubano promovido em 1975. No poder há 16
anos, o ditador quarentão está em boa for-
ma: depois de discursar por 20 horas segui-
das, não exibe sinais de cansaço. Só parece
intrigado com aquele carrinho de bebê ao
lado de três cinegrafistas que acompanham
a movimentação da lenda em seu apogeu.
Fidel se aproxima do carrinho que, em
vez de passageiros da primeira infância,
transporta instrumentos indispensáveis a
quem trabalha no mundo do cinema. Mira
o jovem desconhecido e pergunta quem
carrega aquilo: ele ou ela? Ele é Jon Alpert,
ainda um novato na arte que o transforma-
ria em celebridade. Ela é Keiko Tsuni, mu-
lher de Alpert. Câmeras de vídeo digital da
primeira geração são bastante pesadas, ex-
O GENERAL
DE CORDÃO
CARNAVALESCO
Se não tivesse capitulado na hora
errada, Stédile ganharia um habeas
corpus perpétuo do Supremo
FOTO: DIVULGAÇÃO
AUGUSTO NUNES
P
or tratar como caso de polícia o que
era uma questão social, o presiden-
te Washington Luís antecipou a che-
gada à senilidade precoce da República Ve-
lha, enterrada sem honras pela Revolução
de 1930. Por tratarem como questão social
o que sempre foi um caso de polícia, os pre-
sidentes Lula e Dilma Rousseff retardaram
a chegada à maioridade da democracia bra-
sileira. Os líderes do incipiente movimen-
to operário do século passado, que apre-
sentavam reivindicações elementares, não
mereciam cadeia. Mereciam de Washing-
ton Luís mais atenção. Os chefes de velha-
rias ideológicas que se arrastam pelo sé-
culo 21 berram exigências tão descabidas
quanto a restauração da monarquia. Não
mereciam a vida mansa que o PT lhes pro-
porcionou. Mereciam cadeia.
É o caso de João Pedro Stédile e seu min-
guante Movimento dos Trabalhadores Ru-
O CIRCO BRASIL
VERMELHO
Ainda não desisti de juntar no mesmo
picadeiro todas as subespécies
do comunismo à brasileira
MONTAGEM REVISTA OESTE COM ILUSTRAÇÃO SHUTTERSTOCK
AUGUSTO NUNES
P
or falta de um BNDES irresponsavel-
mente perdulário, como o que torrou
bilhões de reais nos tempos de Lula e
Dilma, jamais saberei se o Circo Brasil Verme-
lho me transferiria dos apartamentos da classe
média para as coberturas dos ricaços. A ideia
foi parida pelos eventos de dimensões side-
rais ocorridos no último quarto do século 20.
Como um personagem de Nelson Rodri-
gues, acompanhei com o olho rútilo e o lábio
trêmulo a queda do Muro de Berlim, em 1989,
o meteórico derretimento da União Soviéti-
ca, em 1991, e, num mundo redesenhado em
dois anos, o fim da Guerra Fria. Convalescia
do espanto quando constatei, assombrado, o
sumiço da espécie que proliferava desde 1848
no Velho Continente: o comunista europeu.
Nenhum desses filhotes da Mãe Rússia resis-
tira à surpreendente orfandade.
Marx, Engels, Lenin, Stalin e outros al-
vos da adoração da seita pareciam coisa de
CONCLUSÕES
DA CPI DA CPI
A Controladoria de Pilantras
e Impostores resume verdades que Renan
e seus parceiros tentam esconder
FOTO: MONTAGEM COM FOTO DE EDILSON RODRIGUES/SENADO FEDERAL DO BRASIL
AUGUSTO NUNES
N
o mesmo dia em que foram escala-
dos titulares e suplentes da Comissão
Parlamentar de Inquérito instaura-
da no Senado para investigar delinquências
ocorridas durante a pandemia de covid-19, a
direção de Oeste entendeu que aquilo me-
recia atenções especiais. A lista de convoca-
dos parecia chamada oral em pátio de cadeia.
A surpresa virou espanto com a escolha do
relator: Renan Calheiros, um notório pron-
tuário ainda em liberdade.
Sim, no faroeste à brasileira produzi-
do pela Era PT é o vilão que persegue o
xerife. Mas incumbir Renan de investigar
patifarias é algo como instalar Marcola, o
chefão do PCC, no Ministério da Justiça e
da Segurança Pública. Uma CPI desse ca-
libre exigiu a montagem na redação desta
revista de uma Controladoria de Pilantras
e Impostores, formada por jornalistas que
nunca tratam a verdade a socos e ponta-
TENTATIVAS DE INTIMIDAÇÃO
MAIS DE UMA VEZ
PROVOCARAM, EM VEZ DE TEMOR,
GARGALHADAS NACIONAIS
12 NOVEMBRO 2021
UM DEPUTADO É
O ALVO PREDILETO
DO CARCEREIRO
FORA DA LEI
Alexandre de Moraes inventou
o perseguido político meio preso
e meio solto
FOTO: MICHEL JESUS
AUGUSTO NUNES
É
improvável que a Guerra das Malvinas
tivesse acontecido se o general Leo-
poldo Galtieri, ditador da Argentina,
não fosse tão parecido fisicamente com o
ator George C. Scott, que interpretou no ci-
nema a figura do general George Patton, que
fez bonito na Segunda Guerra Mundial.
Em 2 de abril de 1982, o tirano portenho
exagerou no uísque, meteu na cabeça que
era uma reencarnação do militar america-
no, decidiu que chegara a hora de retomar
da Inglaterra o arquipélago que só o país vi-
zinho chama de Malvinas e ordenou a inva-
são das ilhas que o resto do mundo chama
de Falkland. A Marinha britânica topou o
desafio, atravessou o oceano com um filho
da rainha Elizabeth na nau capitânia e liqui-
dou a pendência a tiros de canhão. Galtieri
rendeu-se em 14 de junho, renunciou ao po-
der quatro dias depois e sumiu na poeira da
História até morrer, em 2002. Confundir o
OS IMODERADOS
NO PODER
O Supremo Tribunal Federal confessa
que resolveu governar o Brasil
FOTO: ROSINEI COUTINHO/SCO/STF
AUGUSTO NUNES
S
e tivesse mais intimidade com os as-
sombros já acontecidos, por aconte-
cer ou em andamento no colosso ao
sul de Macondo, Gabriel García Márquez
talvez ficasse tentado a alterar a abertura
de Cem Anos de Solidão, para avisar que mui-
tos anos depois, diante do pelotão de fuzi-
lamento, o coronel Aureliano Buendia lem-
braria aquele dia remoto em que seu pai
resolveu contar-lhe coisas espantosas que
só ocorrem no Brasil. E com tamanha fre-
quência que o mundo de terras e florestas,
que nunca foi para amadores, agora desafia
também os ditos especialistas e logo esta-
rá a uma distância sideral da compreensão
de sumidades estrangeiras ou aqui nascidas.
Nesta terceira década do terceiro milênio, o
Brasil decididamente não faz sentido — se
é que algum dia já fez.
É verdade que não estamos sós no sub-
continente sempre em desvario. Há mui-
AUGUSTO NUNES
Integrante do Conselho Editorial de Oeste, foi redator-
chefe da revista Veja e diretor de redação do Jornal
do Brasil, do Estado de São Paulo, do Zero Hora e da
revista Época. Atualmente, é comentarista do Jornal da
Manhã e do programa Os Pingos nos Is, ambos da Rádio
Jovem Pan. Também é colunista do R7 e comentarista
do Jornal da Record. Apresentou durante oito anos
o programa Roda Viva, da TV Cultura, e foi um dos
seis jornalistas entrevistados no livro Eles Mudaram
a Imprensa, organizado pela Fundação Getulio Vargas.
Entre outros, escreveu os livros Minha Razão de
Viver — Memórias de Samuel Wainer e A Esperança
Estilhaçada — Crônica da Crise que Abalou o PT.
LINKS
Os vigaristas da adversativa
A verdade ressuscitada
Os imoderados no poder
LE IA M A I S E M
R E V I S TA O E S T E . C O M