Você está na página 1de 10

A CONSTRUÇÃO DE UMA HISTÓRIA DAS MULHERES: UMA

ABORDAGEM TRANSDISCIPLINAR

Maria Cecilia Souza Pereira - UFRPE


Lyvia Tavares Felix do Carmo - URFPE

Grupo de Trabalho: Educação, Complexidade e Transdisciplinaridade


Agência Financiadora: não contou com financiamento

Resumo

Esse artigo consiste em analisar as contribuições do movimento feminista e dos estudos de


gênero no desenvolvimento da construção de uma História das Mulheres, através de uma
revisão bibliográfica, objetivando contrapor o modelo androcêntrico do fazer histórico, onde
durante vários anos a mulher foi invisibilizada. Sabemos que a historiografia oficial silenciou
e marginalizou a figura feminina e que há uma emergência de se discutir como ao longo da
história foram construídos os significados que cada sociedade atribuiu ou atribui a mulher ao
gênero e aos comportamentos sexuais. Refletir sobre a construção de uma História das
Mulheres implica perceber que os modelos de ser “homem” e ser “mulher”, os direitos
femininos e vários outros aspectos relacionados às construções de gênero e identidades,
passaram por transformações ao longo da história, e contribuíram para o aumento da
discriminação e dos preconceitos contra as mulheres e contra todos aqueles que não
correspondem a um ideal de masculinidade dominante. A naturalização de atos, atitudes,
valores e crenças atribuídas às mulheres na historiografia oficial contribuíram para uma visão
da figura feminina submissa, e que a impedem de obter acesso social e político. Procurando
nos pressupostos do paradigma transdisciplinar romper esse fazer histórico androcêntico que
impôs à mulher essa invisibilidade durante tanto tempo na história, articulando esse novo
fazer cientifico com outros campos do saber, tais como a História que abre caminho através
da Nova História Cultural, para o debate de temáticas vinculadas a grupos sociais até então
excluídos historicamente, como os operários, camponeses, mulheres, escravos, pluralizando-
se os objetos de investigação histórica.

Palavras- chave: História das Mulheres. Movimento Feminista. Gênero e


Transdisciplinaridade.

Introdução

O presente artigo objetiva fazer uma revisão bibliográfica sobre as contribuições do


movimento feminista e os estudos de gênero, na construção de uma História das Mulheres a

ISSN 2176-1396
23417

luz do paradigma da transdisciplinaridade. Sabemos que as mulheres durante vários anos


foram preteridas da historiografia oficial, e que esta constatação foi um reflexo de uma
História contada nos moldes do androcêntrismo, a História sempre foi feita por homens e para
homens, nesse contexto a mulher foi representada como sujeito histórico marginal ou
estereotipado, esse discurso ao longo do tempo deu base para se enraizar na nossa sociedade a
diferença entre os sexos, e conseqüentemente a dominação e a supremacia masculina, que
contribuiu para uma visão da figura feminina submissa, a impedindo de ter acesso social e
político.
Essa visão dicotômica entre homens e mulheres, vincula o universo masculino, à
cultura, a racionalidade e ao público, determinando a sua dita superioridade em relação ao
universo feminino. Enquadrado como, emocional, subjetivo e restrito ao âmbito privado. Não
era de se estranhar, portanto, a predominância na narrativa histórica de preocupações com o
político e com o público, aos quais exaltavam os homens em seus feitos e heroicidade,
excluindo quase que por completo, as mulheres enquanto personagens e produtoras da
História.

As mulheres foram, durante muito tempo, deixadas na sombra da História. O


desenvolvimento da Antropologia e a ênfase dada à família, a afirmação da História
das "Mentalidades", mais atenta ao quotidiano, ao privado e ao individual,
contribuíram para as fazer sair dessa sombra. E mais ainda o movimento das
próprias mulheres e as interrogações que suscitou. "Donde vimos? Para onde
vamos?", pensavam elas; e dentro e fora das Universidades levaram a cabo
investigações para encontrarem os vestígios das suas antepassadas e, sobretudo, para
compreenderem as raízes da dominação que suportavam e as relações entre os sexos
através do espaço e do tempo. DUBY, Georges e PERROT, Michelle.
(orgs.)1995:07

Essa historiografia oficial, marcada por estereótipos, preconceitos e hierarquias de


valores, é totalmente desconstruída pela abordagem do paradigma transdisciplinar, que
propõem abalar as verdades absolutas do modelo cartesiano científico dominante, trazendo
novas evidências científicas que causam dilemas no mundo androcentrico. É nesse contexto
que a mulher se insere, pois através do paradigma emergente transdisciplinar, a mulher
consegue romper a barreira do silêncio e da invisibilidade que lhe foi imposta ao longo da
história. Essas análises nos fazem perceber que a ciência clássica moderna não da mais conta
de explicar tudo, e que a verdade absoluta a que ela se propõe encontrar na realidade não
existe, fincando a partir disso uma nova base epistêmica que caminha para diferentes
possibilidades do fazer científico, entendido aqui como o paradigma emergente.
23418

A busca de um fazer histórico Transdisciplinar

Durante muito tempo, as ciências naturais, como também as ciências humanas, e nela
a história, concentrou suas atenções no espaço racional do lugar público, e o espaço privado
não era considerado relevante para explicar o os fatos históricos. Nesse contexto a mulher
mesmo presente na história torna-se invisível, já que o fazer histórico retrata o mundo
público, espaço ocupado predominantemente por homens. No século XIX, quando a
disciplina histórica se torna científica, a narrativa estava centrada na esfera pública,
contemplando as ações políticas das figuras masculinas. Nesse sentido, uma análise mais
apurada acerca das mulheres era inviável, pois as atuações das mulheres nos espaços públicos
eram esparsas e limitadas.
Em meados do século XX, Os Estudos Culturais chegam para romper com a barreira
da hierarquização das culturas, considerando nos meios acadêmicos a importância tanto da
cultura erudita, quanto da cultura popular, ao voltar seus interesses às questões teóricas e
políticas das culturas populares os estudos culturais aproximassem de questões referentes a
grupos das classes operarias de mulheres, de negros e outras minorias, abrindo espaço para se
estudar nos meios acadêmicos as chamadas subculturas.
Essa movimentação intelectual do século XX será estendida a outros campos do saber,
tais como a História que abre caminho através da Nova História Cultural, para o debate de
temáticas vinculadas a grupos sociais até então excluídos historicamente, como os operários,
camponeses, mulheres, escravos, pluralizando-se os objetos de investigação histórica. Essa
nova forma de fazer história possibilita: “a renovação das correntes da história e dos campos
de pesquisa, multiplicando o universo temático e os objetos, bem como a utilização de uma
multiplicidade de novas fontes” (PESAVENTO, 2005, p. 69).
A Nova História Cultural surge em um momento crucial do fazer cientifico, onde os
modelos cartesianos, estruturalistas e globalizantes, pautados nas explicações de recortes
macrossociais da realidade já não dão conta de colocar em cena os distintos atores que
compunham a trama social, em suas experiências cotidianas, e em suas relações entre si e com
o poder.
A aproximação da História com a Antropologia favoreceu um maior interesse pelos
estudos das relações familiares, ou seja, a pesquisa da vida privada, espaço de atuação
feminina. Outro fator responsável pela busca da construção de uma História das mulheres foi
23419

o feminismo, que coloca na ordem do dia a necessidade de se discutir sobre os vários aspectos
que englobam a vida das mulheres.
Essa nova forma de fazer História converge com o surgimento do paradigma
emergente da transdisciplinaridade, que busca em seu bojo superar a hierarquização dos
saberes.

A teoria da complexidade e da transdisciplinaridade surgem em decorrência do


avanço do conhecimento e do desafio que a globalidade coloca para o século XXI.
Seus conceitos se contrapõem aos princípios cartesianos de fragmentação do
conhecimento e dicotomia das dualidades (Descartes, 1973) e propõem outra forma
de pensar os problemas contemporâneos (SANTOS, 2009, P.15)

Diante do exposto, pensar o fazer histórico baseado no paradigma transcisciplinar,


pressupõe se desapegar a crença no progresso da ciência pautada no pensamento
racional/objetivo clássico, e se agarrar ao novo paradigma emergente, construídos através
dos estudos pós-estruturalistas que realçam a subjetividade dos sujeitos e da linguagem, que
ressaltam a impossibilidade da neutralidade científica e visualizam a importância dos
estudos qualitativos dos fenômenos, negando as leis gerais de explicação dos mesmos,
apontando para as incertezas do fazer científico.

A perspectiva feminista na construção de uma “História das Mulheres”

Com movimento feminista que teve início na ideologia política do século XIX, mas
que só se expandiu nos anos 60 através das reivindicações das mulheres e dos movimentos
políticos, é que a História das mulheres ganha espaço e se consolida no meio acadêmico. A
historiadora Mary Del Priore afirma que foram as feministas que fizeram a História das
Mulheres antes dos historiadores, lançando as bases para a criação de uma História das
Mulheres.
Nesse contexto é inegável pensar em uma História das Mulheres sem pensar na
contribuição do movimento feminista. É importante destacar uma das principais precursoras
do projeto de criação de uma História das Mulheres a historiadora francesa Michelle Perrot.
“Da História, muitas vezes a mulher é excluída”, essa afirmação feita por Perrot,
balizava a inquietação das intelectuais feministas da época, vários questionamentos eram
feitos tais como: as mulheres têm uma História? ou é possível fazer uma História das
Mulheres? essas questões aparentemente de difícil resolução basearam os primeiros estudos
sobre a História das Mulheres. Com o tempo, nos debates e nos grupos de estudo de gênero,
23420

as historiadoras constataram que as mulheres seriam sujeitos históricos possíveis de serem


apreendidos e estudados, e que essa categoria “mulheres” deveria ser entendida de acordo
com a sua amplitude e pluralidade étnica, social e cultural.
Segundo Perrot a História das Mulheres possibilitou que estas compreendessem
melhor a si mesmas, que entendessem que as identidades que hoje compartilham são fruto de
uma construção histórica e contribuiu para que essas mulheres construíssem uma consciência
maior de gênero.
O movimento feminista insere-se no que Woodward (2007) chama de novos
movimentos sociais. Estes, surgiram após o término da Guerra Fria e circunscrevem-se numa
Nova Ordem Mundial. Se antes acreditava-se que explicações amplas da realidade davam
conta de caracterizar todos os sujeitos e formar assim uma unidade de classe para uma luta
conjunta, com o fim da União Soviética e o fortalecimento do capital, essa perspectiva não dá
mais conta de explicar a realidade. O novo cenário político nos apresenta novos sujeitos, que
antes estavam “dissolvidos” dentro da unidade de classe. A construção de identidades e lutas
por direitos mais específicos, ligados às novas práticas dos movimentos sociais: Movimento
Negro, Movimento LGBTTTS (Lésbicas, Gays, Bissexuais e Trangêneros, Transexuais,
Travestis e Simpatizantes, Movimento Ambientalista entre outros, nos mostram a nova
dinâmica e as demandas de grupos que antes não tinha a visibilidade hoje proclamada.

Para além dos estudos Feministas na construção de uma “Historia das Mulheres”

A partir dos anos 80 a produção historiográfica feminina foi se desvinculando do


âmbito político marcado pela influência da teoria marxista no mundo do trabalho, e se
consolidando como uma categoria de analise das relações entre homens e mulheres na
sociedade, e com isso explicando as relações de poder e a própria invisibilidade da mulher na
história.
Os estudos de gênero vêm principalmente para fazer uma crítica à forma como as
feministas tentam construir uma História das Mulheres, pois ao tentar criar uma História das
Mulheres separada da dos homens, sem fazer questionamentos sobre o problema da
invisibilidade da mulher, o porque e como as mulheres se tornaram invisíveis na história. As
feministas incorreram no erro androcentrico do fazer histórico, excluir os homens da história
não reflete a realidade da dinâmica social histórica, pois recai na exclusão dos múltiplos
sujeitos históricos, descartando a relação entre ambos.
23421

Sabemos que a importância das feministas na construção de uma História das


Mulheres, foi um primeiro passo pra romper a barreira do silenciamento da figura feminina
durante tanto tempo na História e que essa construção foi uma forma vista pelas feministas de
“compensar” tantos anos de invisibilidade. Porém não podemos deixar de problematizar a
forma alienante como essa História foi construída, uma vez que não reflete a realidade da
dinâmica histórica.
A categoria gênero passou a ser bastante abordada na História das Mulheres, pois o
sujeito da História agora incluía homens e mulheres, descartando uma identidade única, fixa e
universal entre as mulheres, concebendo as múltiplas identidades no fazer histórico. Para Joan
Scott (1995,p.14),historiadora feminista, o gênero é visto como: “[...]um elemento
constitutivo de relações sociais fundadas sobre as diferenças percebidas entre os sexos, é o
gênero um primeiro modo de dar significado às relações de poder.” Ou seja, o gênero é um
modo de compreender mais claramente as relações existentes entre homens e mulheres e
assim diluir preconceitos, já que como categoria de análise nos fornece elementos para
questionarmos algumas normas e condutas naturalmente atribuídas ao feminino e ao
masculino.
A utilização do gênero altera o enfoque das discussões feministas, pois se inaugura
uma nova problemática nos estudos do feminismo, ao incluir tendências universais
relacionadas ao masculino e ao feminino com suas especificidades históricas e culturais, o
gênero começa a ser pensado como um dos elementos constitutivos das relações sociais, que
se articula com outras categorias importantes: classe, raça, etnia, idade, dentre outros,
configurando situações de gênero específicas, nesse contexto Woodward (2007, p.37) diz:

O reconhecimento da complexidade das divisões sociais pela política de identidade,


na qual a raça, a etnia e o gênero são centrais, tem chamado a atenção para outras
divisões sociais, sugerindo que não é mais suficiente argumentar que as identidades
podem ser deduzidas da posição de classe (especialmente quando essa própria
condição de classe está mudando) ou que as formas pelas quais elas são
representadas têm pouco impacto sobre sua definição.

Dessa forma os estudos de gênero representam o novo paradigma teórico


transdisciplinar, se colocando como o terceiro termo incluído superando as dicotomias,
perpassando todo o processo do fazer histórico.
Louro (1997) também propõe que vejamos gênero como constituinte da identidade dos
sujeitos. A identidade é construída e adquire novas significações ao longo da vida das
pessoas. Assim esse conceito permite-nos pensar na transitoriedade histórica que são as
23422

relações de gênero e como a identificação pessoal vai ser influenciada por fatores subjetivos e
objetivos. A construção da identidade dar-se na relação com o outro e por constituição
discursiva. Portanto, não há como tratar desta questão sem reconhecer que para a existência
de um, há que se ter reconhecimento do outro. E essa identidade constrói-se ainda de acordo
com o contexto. Como nos diz Ciampa (1984, 65):

Diferença e igualdade. É uma primeira noção de identidade. O conhecimento de si é


dado pelo reconhecimento recíproco dos indivíduos identificados através de um
determinado grupo social que existe objetivamente, com sua história, suas tradições,
suas normas, seus interesses etc.

A respeito da construção das identidades e a ampliação da visão dessas, é necessário


absorver o caráter plural destas. Perceber a mutabilidade que vivenciamos de acordo com os
meios de organização social. Assim, Scott apud Louro (1997) propõe a implosão da oposição
binária entre masculino e feminino. Essa desconstrução resultaria numa maneira de perceber
as relações como passíveis de transformação contrariando o pensamento que entende como
fixas as identidades.
A desconstrução da binaridade será a maneira primeira de repensarmos masculinidade
e feminilidade, pluralizando esses conceitos, abandonando a idéia singular de masculino e
feminino. Pois, se o conceito de gênero é histórico carece que o pensamos também como
passível de revisões e novas interpretações teóricas que ajudem a pluralizar os pensamentos
sobre ele e enriquecer esse campo de estudos.

Assim, a transdisciplinardade significa transgredir a lógica da não contradição,


articulando os contrários: sujeito e objeto, subjetividade e objetividade, matéria e
consciência, simplicidade e complexidade, unidade e diversidade (Nicolescu, 1999).
Ao articular esses pares binários, por meio da lógica do Terceiro Termo Incluído, a
compreensão da realidade ascende a outro nível, tomando um significado mais
abrangente e sempre em aberto para novos processos (SANTOS, 2009, p.23).

Os estudos de gênero numa perspectiva pós- estruturalista é entendido nesse artigo


como uma nova abordagem crítica da história, que se aproxima do paradigma transdisciplinar,
na medida em que promove respostas as indagações universais, fundamentadas na experiência
humana masculina e feminina.
23423

A mulher na História e o paradigma Transdisciplinar

É preciso resgatar as vozes das mulheres perdidas no passado e reconstruir as suas


trajetórias através dos vestígios que elas deixaram. É justamente com esse objetivo que nasce
a História das Mulheres, para preencher as lacunas que a Historiografia oficial até então tinha
suprimido.
De acordo com a Transdisciplinaridade (Boaventura Santos, 2010), se todo
conhecimento, é autoconhecimento, é necessário que as mulheres sejam as porta vozes de
suas próprias histórias. E sendo, o paradigma emergente auto referencial e autobiográfico,
vemos aqui a sua aproximação com a perspectiva a que se propõe a historiografia das
mulheres. Lembra-nos da máxima feminista de que o pessoal é político, logo, todas as
experiências são elas mesmas que ditam e dizem de onde falam os sujeitos políticos e sobre a
sua necessidade de tornarem-se visíveis. “Afinal, os objetos de estudo eram homens e
mulheres como aqueles que os estudavam” (Boaventura Santos, 2010, p.50). Assim, não se
nega o lugar de onde partem os sujeitos, ao contrário, no paradigma emergente é impossível
falar da construção de uma ciência não politizada, que ainda separa sujeito/objeto.
As mulheres mesmo que invisibilizada, sempre estiveram presentes em toda a
historiografia oficial. Os saberes da ordem do cotidiano, do senso comum, estiverem sempre
latentes nos acontecimentos históricos, porém vistos de forma subalterna. A construção de
uma História das Mulheres, que se propõem resgatar biografias, de eventos históricos partindo
do cotidiano da ordem do dia, aproxima-se da transdisciplinaridade na medida em que busca
mostrar a presença das excluídas da historiografia oficial, mas que sempre disseminaram seus
saberes de forma não oficial. Essa noção de divisão entre espaço publico/privado associada a
homens/mulheres, gerou uma binaridade excludente. Onde tudo que fosse e ainda é associado
ao feminino é tido como frágil, menor, da ordem do cuidado. Porém, com o Princípio da
Complementariedade dos Opostos, vemos uma nova forma de enxergar a construção das
relações sociais e históricas:

Dicotomizar e exaltar apenas uma das características dos opostos (por exemplo,
racionalidade e objetividade) como base do ensino tem levado a incompreensões do
processo de ensino e aprendizagem, justamente pela unilateralidade.Essa polaridade
igualmente provoca nas gerações que geraram e continuam a passar por tal sistema a
incapacidade de administrar e articular-se como seres humanos completos e
internamente harmônicos (AKIKO SANTOS, 2009, P.27).
23424

Dessa forma o feminismo buscou e ainda busca a articulação entre ser e fazer, estar e
ser, diz não a fragmentação do processo histórico e tem na transdisciplinaridade um campo de
saber aliado para essa empreitada. De modo que as realidades possam dialogar, e as
multiplicidades das experiências possam aparecer como algo positivo a ser valorizado na
contemporaneidade, em busca de uma sociedade com mais equidade entre os gêneros.

Considerações Finais

O androcentrismo enraizado no pensamento científico é um dos preconceitos mais


devastadores e está instalado de maneira tão arraigada em nossas concepções que nos torna
incapazes de refletir sobre elas e, assim, impede que a relação social homem-mulher se
transforme de maneira significativa. A visão androcêntrica do mundo é compartilhada por
todos, mulheres e homens, e nos passa despercebida, pois tendo sempre estado nela
submersos, encaramos como natural universal e imutável. Dessa forma há uma naturalização
da dominação e da supremacia masculina em nossa sociedade onde:

Os dominados aplicam categorias construídas do ponto de vista dos dominantes às


relações de dominação, fazendo-as assim ser vistas como naturais. O que pode levar
a uma espécie de auto depreciação ou até de auto desprezo sistemáticos,
principalmente visíveis, na representação como as mulheres fazem [...]. A violência
simbólica de institui por meio da adesão que o dominado não pode deixar de
conceder ao dominante quando ele não dispões, para pensá-la e para se pensar, ou
melhor, para pensar a sua relação com ele mais do que instrumentos de
conhecimento que ambos tem em comum e que, não sendo mais a forma
incorporada da relação de dominação, fazem esta relação ser vista como natural
(BOURDIEU, 1999, p. 47).

O paradigma transdisciplinar surge para romper com essa lógica hegemônica do


conhecimento, que tem suas bases fixas na hierarquização dos saberes, contrariando a
abordagem transdisciplinar que privilegia a democratização do conhecimento, colando todos
os saberes no mesmo patamar de importância.

Esse novo olhar da transdisciplinaridade traz ainda um desafio maior: o de transitar


pela diversidade dos conhecimentos (biologia, antropologia, física, química,
matemática, filosofia, economia, sociologia). Isso requer espírito livre de
preconceitos e de fronteiras epistemológicas rígidas. Esse é um dos problemas que a
prática da interdisciplinaridade tem enfrentado. Mudança conceitual requer mudança
de posturas. Se a atitude não acompanha as mudanças conceituais, o resultado
poderá ser uma interdisciplinaridade apenas pontual (SANTOS, 2009, p.25)
23425

Unir a pesquisa histórica na construção de uma História das Mulheres ao paradigma


emergente se faz necessário para resgatar os anos de ostracismo, que tanto violentou a mulher,
promovendo a partir dessa junção a possibilidade de uma cartase do feminino.

REFERÊNCIAS

BOURDIEU, Pierre. A dominação masculina. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1999.

CIAMPA, A. C. Identidade. In: LANE, S.T.M.: CODO, W. (org.) Psicologia Social: o


homem em movimento. São Paulo: Brasiliense, 1984. Cap.2, p.58-75.

DUBY, Georges e PERROT, Michelle. (orgs.) Escrever a História das Mulheres. In:
THÉBAUD, Françoise.História das Mulheres no Ocidente. O século XX. Porto, Edições
Afrontamento, 1995.

LOURO, G. L. Gênero, sexualidade e educação: uma perspectiva pós-estruturalista.


Petrópolis, RJ: Vozes, 1997.

PERROT, Michelle. Os excluídos da história: operários, mulheres e prisioneiros. Rio de


Janeiro: Paz e Terra, 2001 a. p.167-234

PESAVENTO, Sandra Jatahy. História & história cultural. 2ª Edição. Belo Horizonte:
Autêntica, 2005. 132p.

SANTOS, A. (2009). Complexidade e transdisciplinaridade em educação: cinco princípios


para resgatar o elo perdido. In: SANTOS, A. ; SOMMERMAN (orgs.)Complexidade e
transdisciplinaridade: em busca da totalidade perdida. Porto Alegre: Sulina,2009, p. 15-38.

SANTOS, B. Um discurso sobre as ciências. Porto: Edições Afrontamento, 1987.

SCOTT, Joan W. Gênero: uma categoria útil de análise histórica. Educação e Realidade, Vol.
2, Jul/Dez. 1995.

WOODWARD, K. Identidade e diferença: uma introdução teórica e conceitual. In: SILVA, T.


T. (org.). Identidade e diferença: a perspectiva dos Estudos Culturais. Petrópolis, RJ: Vozes,
2007.

Você também pode gostar