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NAMOROS E LINGUIÇAS.

Leticia Cacho
É notório que relacionar-se está fundamentado na estrutura social, é a raiz base de
toda relação em sociedade porque nossos laços orientam o parentesco e a hierarquia que
permeia a base de formação do pensamento e por conseguinte todas as outras instituições.
Dessa maneira, paulatinamente vamos consolidando o inconsciente coletivo do amor, nós os
modernos, sabemos tudo sobre o amor, somos experts em debates de bar, os melhores
conselheiros do relacionamento daquela sua amiga que tá caindo num golpe, sabemos
exatamente o jogo de sete erros ao apontarmos o dedo ao amor alheio.
A expansão global do pensar se estrutura desde as comédias românticas e o se
apaixonar pelo amiguinho da escola que implica com você, quando se é mocinha deve-se
portanto cadastrar-se e esperar passivamente seu príncipe que tão somente ele e para toda
vida, cuidara de você a partir do toque dos seus lábios aos dele, sela-se a monogamia cristã e
vivemos felizes para sempre. OU NÃO. Como não somos o próximo lançamento da Disney,
nada acontece como o planejado e aí recorremos aos planos B, C , D, J , e todas as letras do
alfabeto para que em uma delas nós encontremos, não o guarda roupa de Nárnia, mas o
Espelho de Ojesed de Harry Potter para enxergarmos no reflexo o amor que sempre
sonhamos.
Mas se sonhamos, ele nasceu aonde? E se sonhamos diferente do que nos ensinaram a
sonhar, é um pesadelo? O pesadelo começa com se sentir inadaptado dentro de si mesmo,
passamos assim a buscar outros mercados de sonhos que possam nos cair melhor, como um
shopping do amor vemos as vitrines das teorias que garantem ou propõem qual amor é o de
verdade.
MAS O AMOR JÁ ERA VERDADE ANTES DISSO TUDO.
Nós, um pequeno grande grupo espalhado pelos ventos do mundo ocidental,
acreditando que alcançamos alguma espécie de elevação divina que nossos pais não tiveram,
consolidamos que no manifesto dessa geração como primeiro ato dos responsáveis pelo
futuro da nação declaramos: NÃO SEREMOS MONOGÂMICOS, E BASTA.
E como se alguém tivesse gritado no meio do auditório, daquelas peças de teatros
universitária, a plateia é toda a população dos encarregados de manterem suas instituições e
suas tradições como garantia da estabilidade, e eles gritam de la: SEREMOS
MONOGÂMICOS E ASSEGURAMOS A EXISTÊNCIA DO MUNDO.
Com tantas declarações imagéticas, esse texto já criou o enredo de uma peça de teatro
em que o protagonista do mundo moderno é o grupo da segurança do mundo enquanto seu
antagonista trabalha contra o vento para dominar o mundo. É de fato que a vida difere da arte,
ou a arte difere da vida, mas se tem uma coisa que podemos elucidar nessas imagens
supracitadas é de que mesmo nos quadrinhos, o vilão se parece bem mais com o mocinho do
que imaginamos, e há sempre um elo incomum. Nessa vida, o elo chama-se namoro.
Para elucidar tal argumento, que pode desde já, ter causado reboliços no estômago de
alguns, partiremos então de uma analogia que envolve linguiças, linguiça e namoro são duas
palavras de extrema dicotomia entre si, no entanto, ao ouvir uma ou a outra, tem-se bem claro
o significado de cada uma. Uma linguiça é um produto do porco, com formato, textura e
produção bem estruturados mas que também pode ser subjetiva, por exemplo, a linguiça
vegana. Ao imaginarmos uma linguiça a imagem se forma na nossa memória afetiva, o gosto
pode não vir na boca como um desenho animado mas também é ativado pela sinestesia, daí
então você se depara comendo uma linguiça vegana esperando o gosto, a cor, a textura do que
é uma linguiça, depois de empanturrado de tal você limpa a boca e diz “nossa, nem parece
que não era de carne” e isso é seu melhor elogio para aquela experiência gastronômica.
E é aí que o pulo do gato acontece, você por mais que tenha corrido milhas e milhas
daquela linguiça do churrasco do seu pai que não te atrai em nada, procurou na sua nova
experiência de algo totalmente desvinculado, o familiar, e o gosto de carne é lembrar sempre
que possuímos uma raiz e por mais distante que vamos dela, é quando mais nos apegamos
aos sentimentos que elas nos ensinaram. A linguiça vegana é o namoro não monogâmico, é o
criar com outros ingredientes uma receita que nos lembre de casa, que alimente aquele amor
de sessão da tarde mas que pareça que acabou-se de criar tal história.
O fato, e por conseguinte, o objetivo de tantas linhas, analogias e peças de teatro, é de
que o amor ficou em segundo plano esperando seu grande ato, nós colocamos antes de tudo
as instituições, os sabores da infância para guiar nos, e quando nos deparamos com um
namoro em que já nos desconhecemos por sermos tão conhecidos, esquecemos que nos
apegamos tanto a textura, o cheiro e o sabor parecido com o de casa, que não vimos que o
que era ofertado seriam suas diferenças.
Procuramos amar a nós mesmos em outros amores, quando isso por criação já é
impossível de alcançar, o amor vem além do familiar, vem do indescritível, vem da busca
política por amar sem instituição. E assim, tal como a linguiça vegana é um ato político de
reivindicação dos padrões tradicionais, abolir a monogamia é político, fundamental mas para
além de aboli-la, precisamos de paraquedas coloridos com seus nomes únicos que não nos
faça procurar nada de nosso em mundos tão únicos, que se apaixonar e amar seja sobre
admirar e contemplar um mundo, que por algum alinhamento órbito se alinhou ao seu, e só
isso, ou tudo isso, é o amor.

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