Você está na página 1de 7

Educação Unisinos

12(1):28-34, janeiro/abril 2008


© 2008 by Unisinos

O imaginário das mulheres negras


silenciadas: um universo de símbolos e
sentidos
The imagery of silenced black women: a universe
of symbols and meanings

Jacira Reis da Silva


jaresi@terra.com.br
Lucia Maria Vaz Peres
lvperes@terra.com.br

Resumo: O objetivo deste trabalho é entretecer dois olhares, tendo em vista os referenciais
teóricos das representações sociais (Moscovici, 1978; Faar e Moscovici, 1984), desenvolvidas
na tese de Silva (2000), e os estudos referentes ao campo do imaginário (Durand, 1989),
acerca do ser-professor, desenvolvida na tese de Peres (1999). O tema central para o
entretecimento destes dois pontos de vista tem como foco depoimentos de 15 professoras
negras sobre suas trajetórias escolares, coletados em pesquisa realizada na cidade de Pelotas-
RS, em 1999. O elemento simbólico agregador da interlocução entre os dois campos teóricos
é a “Lenda do Barro Duro” (Silveira, 1993). Portanto, este trabalho é fruto de um desejo e
de uma interlocução conjunta, no Grupo de Estudos e Pesquisa sobre Imaginário, Educação
e Memória (GEPIEM), com o intuito de trazer à luz a questão dos símbolos e sentidos
subsumidos na cultura afro-descendente, neste caso, na trajetória de professoras negras.
Nosso intento, além de mostrar a possibilidade de outras leituras acerca do tema, é apresentar
a riqueza, a diversidade e a complexidade presentes no imaginário humano, desde os recortes
das vozes destas mulheres e da lenda apresentada.

Palavras-chave: imaginário, educação, mulheres negras.

Abstract: This paper connects two perspectives, taking into account the theoretical
references of social representations (Moscovici, 1978; Faar e Moscovici, 1984), as developed
in Silva’s thesis (2000), and the studies of the field of imagery (Durand, 1989) on being a
teacher, as developed in Peres’ thesis (1999). The connection of these two points of view
focuses on the testimonies of 15 black female teachers about their schooling processes,
collected in an investigation carried out in the city of Pelotas-RS, in 1999. The symbolic
element that integrates the two theoretical fields is the “Hard Clay Legend” (Silveira, 1993).
Thus, this paper results from a collective desire and dialogue in the Study and Research
Group on Imagery, Education and Communication. It has the purpose of discussing the
symbols and meanings present in Afro-Brazilian culture, particularly in the life stories of black
teachers. Besides presenting the possibility of different interpretations of this topic, it intends
to show the richness, diversity and complexity that can be found in human imagery by using
the women’s voices and the legend.

Key words: imagery, education, black women.

028a034_ART03_Jacira e Lucia [rev_OK].pmd 28 30/4/2008, 19:54


O imaginário das mulheres negras silenciadas: um universo de símbolos e sentidos

Este trabalho busca entrecruzar se Benedito, seu marido, e Nioro, seu do Laranjal.
pontos de vista entre os silenciamen- filho. Desta forma, outros negros a Donga pescou todos os mil réis da
tos da professora/mulher negra e o seguiriam. Seria bom se levasse tam- cacimba. Nioro viajou, pegou carreta,
imaginário, tendo como “matéria-pri- bém Joaquim e Inácia, pretos de mui- navegou navio, foi longe...
ma” as reflexões oriundas da tese de ta liderança e estimados pelos outros. As negras e os negros da fazenda con-
O padre novo desviou o testamento. tinuavam suas lidas, comandados hu-
doutoramento intitulada Mulheres
Afinal, Sinhá Dona, defunta, não po- mildes de serventia braçal. Donga fa-
caladas: trajetórias escolares de dia reclamar nada. zia doces, curtia licores. Sentava pró-
professoras negras em Pelotas (Sil- Donga, alforriada e com trezentos mil ximo à escadaria da igreja e vendia seus
va, 2000), e os estudos da Antropo- réis, batia cabeça para Oxum, agrade- quitutes num tabuleiro colorido e chei-
logia do Imaginário voltada para o cia a Oxalá, rezava Ave-Maria para roso de erva-doce dos pães, dos lico-
foco da formação docente; dos ma- Nossa Senhora dos Prazeres. Donga res, das cocadas, rapaduras de leite,
triciamentos, que constituem o ser- era um todo fragmentado. De um lado, quindins e bolos de milho. Sempre a
professor (Peres, 1999). A riqueza, Terreiro, do outro, Igreja. mesma lida, transformava doce em mil
Os mil réis foram escondidos no fun- réis para os estudos de Nioro.
diversidade e complexidade dos de-
do de uma cacimba que só a Donga Quando Nioro retornou às Terras do
poimentos coletados nestes traba- conhecia, bem pertinho da vertente Laranjal, estava mais sabido e mais
lhos permitiriam realizar inúmeras re- mais límpida dos matos dos laranjais. letrado que todos os seus mestres.
flexões, que, hoje, no decurso de nos- De vez em quando, guardava mais di- Foi recebido com toque de tambor,
sas interlocuções teóricas, no GEPI- nheiro que ganhava fazendo doces para dança de mina, festa alegre de negro
EM, nos apresentam outras possibi- as Sinhás, donas das charqueadas. contente.
lidades de interpretação. Nesse sen- No fundo da cacimba, a negra Donga Não esqueciam de pedir proteção para
tido entrecruzamos olhares de dois acalentava um sonho. o padre novo que ajudara Donga. Ben-
Enquanto os dias passavam, seu filho diziam-no indo de vez em quando à
pontos de vista teóricos, a saber: as
Nioro ia crescendo bonito, amado de Igreja, ficando todos de pé, bem visí-
representações sociais (Moscovici, pai e mãe, correndo pelos laranjais, na veis.
1978; Faar e Moscovici, 1984), de- Fazenda. O menino desfrutava de toda Naquelas bandas do Laranjal de Pelotas
senvolvidas na tese de Silva (2000), aquela energia cósmica do verde das não conheciam negro professor, nem
e os estudos referentes ao campo do plantas, das águas da Lagoa dos Pa- negro doutor. Nioro era o primeiro
imaginário (Durand, 1989) acerca do tos, da brisa suave, da areia gostosa de negro professor doutor. Seria apenas
ser-professor, desenvolvidos na tese pisar. Assim, o menino ia crescendo. um negro e nada mais nas Terras do
de Peres (1999). Para tal desenvolvi- Donga desejava o filho lendo, escre- Laranjal?
vendo, seu doutor, negro senhor. Não Nioro sem escola, sem alunos, sem
mento a “Lenda do Barro Duro” (Sil-
queria ver Nioro um salgador de car- clientes, chorava sob as aroeiras.
veira, 1993) constitui-se como um ele- ne, escorrendo sangue de bicho pelas As árvores choravam juntas, goteja-
mento simbólico agregador das re- pernas, servil e maltratado. vam lágrimas do negro.
flexões neste ensaio. Eis a lenda: Dentro da cacimba, escondia-se o te- Donga desesperou-se com o sofrimen-
souro para a realização dos desejos de to do filho. Rezava para Iroko, pedin-
Nas Terras do Laranjal, na fazenda de Donga. do que fizesse passar depressa aquele
Nossa Senhora dos Prazeres, quando Foi então que apareceu o professor tempo maldito. Implorava-lhe a mu-
Sinhá Dona morreu, deixou testamen- Quintilha. dança do Odu de seu filho.
to. Donga, escrava da fazenda ficaria Não possuía escola, nem giz, nem ca- Tomada pelo desalento, consultou Ifá
alforriada. Entre outras heranças de derno, nem cadeira, nem livro, mas, e sugestionou-o a tornar melhores os
muito valor, Sinhá Dona deixava tre- mesmo assim, ensinava as primeiras dias de seu Nioro. Ifá, compadecido
zentos mil réis para repartirem com letras. Nioro aprendia a lição quase à da negra Donga, determinou obriga-
três mulheres brancas e pobres a fim beira da praia, sentado sob as aroeiras. ção. Teria de encontrar junto com o
de se vestirem decentemente para fre- Donga pagava o Quintilha, e o filho filho um lugar nas Terras do Laranjal
qüentar as missas. estudava, escondido. que fosse mais pródigo em natureza
Quem devia repartir o dinheiro era Das primeiras letras do Quintilha, o do que todos os outros lugares. Deve-
um padre novo, recém-chegado da menino passou para o Mestre ria ser um lugar verde e azul, ao mes-
Bahia. O padre, sabendo que os ne- Gonzáles. mo tempo, campos e água, matas e
gros eram mais de Batuque do que da Aprendeu Gramática, Latim, Matemá- areias divinas. Ao encontrar o lugar,
Igreja, planejou conquistar Donga tica, Geometria e Francês. Donga pa- Nioro ficaria ali deitado, aguardando
para a devoção católica. Deu-lhe de gava o Gonzáles, e o filho estudava, chover.
presente os trezentos mil réis que se- escondido. A obrigação estava marcada. Nioro
riam das brancas, em troca da sua fre- Vieram muitos professores e Nioro adormeceu em terras divinas do La- 29
qüência à igreja, aos Santos Ofícios aprendeu tudo que lhe ensinavam. Não ranjal. Recebeu chuva miúda na cabe-
Católicos. Recomendou-a que levas- havia mestres para Nioro, nas Terras ça. Eram lágrimas de Nanã, chegando

volume 12, número 1, janeiro • abril 2008

028a034_ART03_Jacira e Lucia [rev_OK].pmd 29 30/4/2008, 19:54


Jacira Reis da Silva, Lucia Maria Vaz Peres

ao Sul, mudando o destino do moço seus filhos para dias melhores. Preci-
Donga desejava o filho lendo, es-
negro. sa coragem. crevendo, seu doutor, negro senhor.
Donga aguardava, ao lado do filho, Cuidem bem das aroeiras, elas guar- Não queria ver Nioro um salgador de
tudo que fora prometido por Ifá. dam as lágrimas de Nioro. Todos os carne, escorrendo sangue de bicho
Quando Nioro despertou de cabeça la- negros devem saúda-las com bom-dia, pelas pernas, servil e maltratado4.
vada, tornou-se Mindolé-Miandombé se for noite; e com boa-noite, se esti- A valorização do conhecimento
(preto-branco). Donga não o reconhe- ver dia. É uma brincadeira dos Exus, como possibilidade de uma vida me-
ceu, e o filho não reconheceu a mãe, fazendo com que recordem de Nioro
lhor também é uma representação re-
nem seu povo. que Ifá fez parecer o que não era.
Entende? A maldição de Nioro é uma alergia que corrente nos depoimentos das pro-
Donga ficou tomada de desespero, mas dá em qualquer negro que fica choran- fessoras quando relatam o estímulo
Nioro foi ser professor, doutor, tudo do sob as aroeiras da vida, em vez de que as famílias davam aos filhos para
que sonhara para o seu filho negro. ir à luta, acreditando nas possibilida- que estudassem.
Ifá havia sido muito cruel, retirando a des de inverter posições sociais, con- Minha mãe dizia: estuda, minha
negritude de um negro, em vez de en- servando a negritude (Silveira, 1993)1. filha, se não tu vais continuar sendo
sinar-lhe a guerrear para vencer.
o que eu sou, trabalhando no pesa-
Pobre Donga! Andava pelas Terras do Ao retomarmos as “vozes” das
Laranjal em total obsessão. Encontrou do, na limpeza das casas (Quênia in
professoras negras sobre seus silen- Silva, 2000, p. 115).
Omolu, que a convidou para seguir-
ciamentos, tendo como elemento de Trabalho pesado onde, talvez, não
lhe os passos até onde Nioro havia
feito obrigação. Louca de saudade de sutura o campo simbólico que ad- escorresse sangue de bicho – e sim a
seu filho, ao ver o local tão lindo, jun- vém da “Lenda do Barro Duro” (Sil- água suja – pelas pernas, mas, da
to à praia em que ele estivera adorme- veira, 1993), percebemos a promes- mesma forma, trabalho servil, onde,
cido, jogou-se nas águas da lagoa e sa desta interlocução, onde os sím- muitas vezes, eram também maltrata-
morreu. Omolu carregou-a para o céu bolos e os sentidos poderiam dar um
de Orum para acabar de vez com seus das.
outro tom naqueles relatos. Foi pos- Donga fazia doces, curtia licores.
sofrimentos.
Contam que os pescadores encontra- sível perceber homologias2 entre os Sentava próximo à escadaria da Igre-
ram o corpo de Donga às margens da relatos das professoras e o conteú- ja e vendia seus quitutes num tabu-
praia, e que, ao tocá-lo, transformou- do arquetipológico que emerge da leiro colorido e cheiroso de erva-doce
se em BARRO DURO, escuro e bri- lenda, sobretudo no que diz respei- dos pães, dos licores, das cocadas,
lhante, espalhando-se pela orla. Gri- to à circulação de sentidos acerca rapaduras de leite, quindins e bolos
taram assustados: BARRO DURO, do conhecimento sobre o negro.
TERRA DE NEGRO. Assim batiza-
de milho. Sempre a mesma lida, trans-
Neste caso específico, trataremos formava doce em mil réis para os es-
ram o lugar em que Donga virou barro
de tanta saudade de seu filho negro- conhecimento como pertencimento tudos de Nioro.
branco. a um determinado grupo, a partir do O desejo da mãe pela ascensão do
O Barro Duro tornou-se um lugar universo individual e coletivo que filho era tão grande que fez das suas
mágico. Todos os negros são atraídos transita no imaginário das professo- lides e seduções alimentares – quitu-
para lá, porque Oxalá permitiu-lhes ras mulheres negras. tes saborosos – a porta de aceso para
consolar a Negra Donga. Por isso, o
A lenda traz como mitema (Du- manter seus estudos.
Barro Duro é uma irmandade de ne-
gros dos mais diferentes níveis rand, 1988, 1989)3 principal a ascen- Homologicamente, Anastácia re-
socioeconômicos e culturais. são do negro através do conheci- vela os esforços que sua família fazia
Preservem o Barro Duro. Donga não mento e pelo branqueamento que para que pudesse estudar; tal qual
pode ficar sozinha, sem carinho. Pre- remetia ao modus operandi dos bran- Donga fazia por seu filho Nioro.
cisa de apoio como todas as mães pre- cos: ser letrado, ser doutor, talvez Minha mãe era empregada na
tas que acreditam mudar o destino de para não ser maltratado. casa, e meu pai cuidava das planta-

1
A Lenda foi retirada de um texto digitado, sem numeração e continha apenas a indicação da fonte.
2
A homologia, diferente da analogia, caracteriza-se pela convergência de semanticidade que está na base de todo símbolo trazendo, assim, a
materialidade de elementos semelhantes mais do que apenas uma sintaxe. Sobretudo, veremos que os símbolos constelam porque são desenvolvidos
de um mesmo tema arquetipal, porque são variações sobre um arquétipo (Durand, 1989, p. 31).
30 3
Entendendo mitema como estruturas invisíveis que emerge de uma narrativa. Para Durand a “substância” dos “mitemas” não se encontra somente
na narração, senão no sentido e no simbolismo que daí emergem. Portanto, eles referem-se aos núcleos organizadores do imaginário (Durand, 1989,
p. 31), apresentando tendências permanentes e acenando para o caráter mítico de natureza estrutural – “arquetípico” no sentido junguiano e
“arquetipológico” no sentido durandiano.
4
Todos os excertos retomados ao longo do texto, referem-se a fragmentos extraídos da lenda transcrita, na íntegra, no início deste artigo.

Educação Unisinos

028a034_ART03_Jacira e Lucia [rev_OK].pmd 30 30/4/2008, 19:54


O imaginário das mulheres negras silenciadas: um universo de símbolos e sentidos

ções, da horta, do jardim. Eles fazi- beira da sanga quanto lavava a rou- só tinha o segundo grau. [...] Quan-
am aquele sacrifício todo para po- pa dos patrões. Comprou o livro do me formei em Educação Física,
der me dar os cadernos, o uniforme. escondido com o dinheiro que ga- passei a ser professora e vim para a
Para eu não parar de estudar, para nhou aparando palha de milho para cidade. Quando eu cheguei na es-
eu ter uma vida melhor que a deles fazer blocos para cigarro (Ana Ma- cola, olharam para mim e disseram:
(Anastácia in Silva, 2000, p. 115). ria, 52 anos, in Dalla Vecchia, 1993, não tem mais lugar, já tem outra
Assim como Donga, que nos mil p. 276). moça na vaga. Eu disse: mas fui
réis escondidos no fundo da cacim- Todo o esforço de Donga teve transferida, o lugar é meu! [...] Ar-
ba, acalentava um sonho – conseguir como resultado que, quando Nioro ranjaram um monte de desculpas. Aí
que suas filhas lessem e escrevessem retornou às terras do Laranjal, es- eu disse; bom, se vocês não podem
era o desejo e o sonho acalentado no tava mais sabido e mais letrado que resolver meu caso, eu vou adiante.
fundo das tinas de lavar roupa pelas todos os seus mestres. Eu fui falar com o Prefeito. Contei
mães-Dongas das professoras. Nioro era o primeiro negro pro- toda história, e ele ligou para a Se-
A lenda refere que Nioro apren- fessor doutor. Naquelas bandas do cretaria Municipal de Educação e
dia a lição quase à beira da praia, Laranjal de Pelotas não conheciam perguntou o que estava acontecen-
sentado sob as aroeiras. Donga pa- negro professor negro, nem negro do. Ele perguntou onde estava a
gava o Quintilha, e o filho estudava, doutor. Nioro era o primeiro negro professora que tinha sido contrata-
escondido. Das primeiras letras do professor doutor. da para ir para zona rural, no meu
Quintilha, o menino passou para o Mas, Nioro sem escola, sem alu- lugar. Elas disseram que ela estava
Mestre Gonzáles. Aprendeu Gramá- nos, sem clientes, chorava sob as na cidade e que não queria ir mais
tica, Latim, Matemática, Geometria aroeiras. Seria apenas um negro e para a colônia. Aí ele disse: então,
e Francês. Donga pagava o Gonzá- nada mais nas Terras do se vocês não arrumarem outra es-
les, e o filho estudava, escondido. Laranjal?As histórias de Quênia, cola para Anastácia, vocês mandem
Não estudar ou estudar escondi- primeira professora negra formada essa moça para o lugar dela e ela
do foi, durante muito tempo, o desti- em Pelotas, hoje falecida, e de Anas- fica na escola da cidade, como es-
no da maioria dos negros, no Brasil e tácia reatualizam e presentificam a tava combinado e ela tem direito.
na zona sul do Rio Grande do Sul. lenda quando contam passagens de Mesmo assim, acho que elas tenta-
Segundo Dalla Vecchia (1993), mui- suas trajetórias profissionais: ram argumentar e aí foi quando eu
tos negros conseguiam aprender a Quando eu me formei, fui desig- ouvi ele perguntar se era porque eu
ler e escrever observando as aulas nada para trabalhar fora de Pelo- era “de cor” que elas não conse-
dadas aos filhos dos senhores ou tas. Fiquei muitos anos fora. Quan- guiam resolver o problema. Para
por esforço próprio. Como Nioro, do voltei, eu encontrei de tudo. Co- mim estava claro que o motivo era
estudavam escondidos! Um dos de- meçou na escola para onde fui. Ti- esse. Aí eu aprendi que não dá para
poimentos colhidos pelo autor cita- nha uma servente que me conhecia ficar calada. Aquilo correu de boca
do acima é exemplar: porque ela tinha sido empregada na em boca e eu fiquei respeitada
A escrevê aprendi por experiên- casa da família para a qual minha (Anastácia in Silva, 2000, p. 142).
cia. [...] Isso de lê livro, eu achei mãe lavava roupa. Quando soube Anastácia e Quênia: professoras
enterrado num lugar de pedras, que eu ia para a escola, ela chegou negras que tiveram dificuldades em
muitos livros antigos. [...] Aqueles para a diretora e disse: não aceita conquistar seus lugares? Seriam elas,
livros eram de gente que morrera. essa criatura. Uma criatura que não também, apenas duas negras e nada
[...] Ficou enterrado e eu achei. Eu sabe nem se arrumar. Tinha também mais nas escolas de Pelotas? Teriam
fazia assim... quando estava solito, aquelas professoras que não queri- elas, como Nioro sem escola, sem
silencioso e ninguém me falasse, eu am relações (Quênia in Silva, 2000, alunos, sem clientes, chorado sob as
me escondia pra ler no mato, de- p. 144). aroeiras?
pois alevantava aquelas pedras e Eu já trabalhei em muitas esco- Desesperada com o sofrimento do
deixava meu livros ali (Raul, 94 anos, las em outras cidades. Mas quando filho, Donga implorou pela mudança
in Dalla Vecchia, 1993, p. 283). cheguei aqui em Pelotas foi que eu do Odu de Nioro.
O mesmo autor também refere que senti mais. Eu recém tinha iniciado, Tomada pelo desalento, consul-
uma de suas depoentes contou que era professora bem novinha, no tou Ifá e sugestionou-o a tornar me-
sua mãe nunca foi à escola. Município. Antes, eu trabalhava de lhores os dias de seu Nioro. Ifá, com- 31
Pelo que me conta aprendeu so- secretária, na zona rural. Naquela padecido da negra Donga, deter-
zinha, soletrando sua cartilha na época, eu não tinha classe porque minou obrigação [...] A obrigação

volume 12, número 1, janeiro • abril 2008

028a034_ART03_Jacira e Lucia [rev_OK].pmd 31 30/4/2008, 19:54


Jacira Reis da Silva, Lucia Maria Vaz Peres

estava marcada. Nioro adormeceu Importante, então, dizer que ain- É muito complicado e muito es-
em terras divinas do Laranjal. Re- da que os mitos, conhecidos das tranho. Parece, assim, que o profes-
cebeu chuva miúda na cabeça. Eram sociedades arcaicas, estejam “ador- sor não tem cor. Eu acho que é por-
lágrimas de Nanã, chegando ao Sul, mecidos” para o mundo urbano mo- que tu já tens um nível de escolari-
mudando o destino do moço negro. derno e inconoclasta, alguns deles dade que te sustenta. Tu não és em-
Ifá, compadecido da negra Don- coexistem no mundo “civilizado”. pregada, tu és professora! (Luanda,
ga, determinou obrigação. Quando São estas convergências com esses in Silva, 2000, p. 155).
Nioro despertou de cabeça lavada, elementos míticos que estamos exer- Quando a professora é mulata,
tornou-se Mindolé Miandombé citando nesse ensaio. segundo algumas professoras, essa
(preto-branco). Donga ficou toma- Percebemos que, na lenda. a as- negação naturalmente se acentua.
da de desespero, mas Nioro foi ser censão do negro pelo conhecimento Como eu sou assim, mais clara,
professor, doutor, tudo que sonhara inclui o branqueamento, enquanto mulata, quando eu começo a falar
para o seu filho negro. Ifá havia sido isso não ocorre da mesma forma nos sobre os negros e digo para eles que
muito cruel, retirando a negritude depoimentos das professoras. eu sou negra e que nós negros temos
de um negro, em vez de ensinar-lhe A idéia do branqueamento por par- que nos valorizar, estudar, procurar
a guerrear para vencer. te das professoras aparece nas falas saber mais da nossa história, os alu-
Nioro era professor doutor, mas onde elas criticam o currículo e con- nos dizem: mas a senhora não é bem
era negro! Para ser aceito precisava teúdos escolares, dizendo que estes, negra! A senhora já é uma mistura.
ser branco. O conhecimento, por si por serem organizados e seleciona- (Benita in Silva, 2000, p. 155).
só, não lhe garantiu aceitação e re- dos tendo como parâmetro a visão As professoras que vivenciaram
conhecimento. Precisava ser legiti- dominante branca, não ajudam o ne- estas situações levantam a hipótese de
mado pelo branqueamento. gro a se reconhecer enquanto tal. que essas atitudes podem estar ligadas
O que fizeram Anastácia e Quênia? Quanto a elas, ao contrário, dizem que à representação social (Moscovici,
Pediram pela mudança de seu Odu? foi a possibilidade de conhecer, estu- 1978) de que o estudo confere status.
Ficaram chorando sob as aroeiras? dar, esse conhecimento que lhes opor- Por outro lado, as professoras di-
Parece que não, ao que tudo indi- tunizou uma maior auto-estima, iden- zem que este olhar pode estar expres-
ca, pelas suas falas, a maldição de tificação étnica, outra posição social sando uma outra representação mais
Nioro, uma alergia que dá em qual- e, profissionalmente, experimentar preconceituosa: como uma negra
quer negro que fica chorando sob outras práticas pedagógicas. conseguiu chegar até aí?! Ou seja,
as aroeiras da vida, não as contami- Se, por um lado, as professoras se no imaginário social a idéia de
nou. Ao contrário, foram à luta, acre- valorizam o conhecimento como pos- negro está ligada à sua incapacida-
ditando nas possibilidades de in- sibilidade de ascensão, pode-se pen- de intelectual e se ela conseguiu ser
verter posições sociais, conservan- sar que Nioro também a desejava. A professora, então, não pode ser ne-
do a negritude, pois, como disse simbólica do branqueamento pode gra. O saber lhe transmutou o per-
Anastácia: “Aprendi que não dá refletir uma necessidade de perten- tencimento étnico, na visão dos alu-
para ficar calada; fiquei respeita- cimento, pois Nioro, mesmo sabido, nos, as branqueou.
da” (Silva, 2000, p. 142). continuava com a escola vazia. Di- Pois, pela parcela de saber acu-
Podemos perceber que há um con- ante disso Ifá intercede, a pedido de mulado, ser professora confere cer-
junto de imagens, tanto nos depoi- Donga, pelo caminho mais comum – to status, na medida em que, perten-
mentos quanto na lenda, apontando o caminho do branqueamento. cendo a um grupo racial/étnico visto
para o que Durand (1989, p. 18), cha- Interessante também observar como incapaz de desenvolver certas
mou de “capital pensado pelo homo que quando as professoras se refe- atividades, a cor dessas professoras
sapiens”, o qual nos aparece como rem ao modo como os alunos as passa a ser negada ao romperem, pela
um denominador fundamental onde vêem, quase todas disseram que pa- posição alcançada, com esta repre-
convergem todas as criações do nos- rece que elas não têm cor/raça. Quan- sentação estigmatizada. Se elas par-
so pensamento. Nesse sentido, como do se deparam com situações de dis- ticipam de um grupo social onde o
no dizer do antropólogo, “o imaginá- criminação entre as crianças e ten- espaço, ainda que lhes possibilite um
rio está na encruzilhada antropológi- tam resolvê-las comparando-se às maior acesso, é ocupado majoritaria-
ca que permite esclarecer um aspecto crianças negras, os alunos não as mente por pessoas brancas, negar o
32 de uma determinada ciência humana reconhecem como negras, dizendo: reconhecimento de sua cor é, de cer-
por um outro aspecto de uma outra” “não, professora, a senhora não é ta forma, negar o reconhecimento da
(Durand, 1989, p. 18). negra”. competência do negro para ocupar

Educação Unisinos

028a034_ART03_Jacira e Lucia [rev_OK].pmd 32 30/4/2008, 19:54


O imaginário das mulheres negras silenciadas: um universo de símbolos e sentidos

este espaço, a não ser que passem a mento do filho, ainda pelo caminho do nizado no tempo, cuja mítica nos re-
ser Mindolé-Miandomblé. branqueamento, reatualizam essa frag- mete ao sentido de Nanã como ma-
A ação de negação dos alunos é mentação expressa pelas professoras triz geradora de vida através do bar-
orientada por essas representações quando falam sobre algumas práticas ro. Nesse sentido, a lenda nos reme-
sociais introjetadas, no e pelo trajeto familiares como o alisamento de cabe- te ao animal simbólico (Cassirer, 1994)
do homo diabolicus, que tudo sepa- lo, o policiamento, as posturas para chamado homem, onde suas ações
ra e julga, nos regimes diurnos de pen- “manter a linha”, ou seja, comportar- estão encharcadas de conteúdo mí-
sar e ser. Ao contrário, o homo sym- se como branco (para não dar margem tico repleto de imaginário, símbolos
bolicus busca unir e eufemizar as a comentários pejorativos). e sentidos que instituem a realidade.
“querelas” deixadas por este regime Talvez esta seja uma outra roupa- A lenda é rica em expressões que re-
que tudo separa, buscando no regi- gem do branqueamento presente no velam a dramática escolha de Donga
me noturno a possibilidade de unir os imaginário destas mulheres. Sabemos em silenciar sua vida ao perceber que
aparentemente opostos. Por exemplo: que um “mundo subterrâneo” coe- seu filho Nioro silencia sua identida-
o negro e o branco, as trevas e a luz. xiste em todo o ser humano e, sobre- de de sujeito negro ao assumir como
Juntamente com o mitema da as- tudo, é parte da complexidade que marca de si, o outro: Mindolé Mian-
censão do negro através do conhe- fomenta o trajeto antropológico do dombé (preto-branco), bem como o
cimento e pelo branqueamento, per- Imaginário (Durand, 1989). Nele sub- sentido simbólico da presença do
cebemos uma forte influência do ar- siste a prenhez dos símbolos e das padre (representante da cultura bran-
quétipo matriarcal, a presença da mãe significações, muitas vezes desco- ca) e dos rituais africanos para feste-
como fomentadora de crescimento e nhecida devido a suas múltiplas ca- jar a ascensão de um negro.
ascensão de sua prole. madas e dimensões (Teves, 1994). Quando Nioro retornou às ter-
Aqui chegamos a uma das princi- A lenda, ao trazer o Barro Duro ras do Laranjal, estava mais sabido
pais características do arcabouço (localidade do município de Pelotas e mais letrado que todos os seus
mítico africano. Ao contrário do que – Balneário dos Prazeres), demarca mestres. Foi recebido com toque de
à primeira vista parece ser predomi- uma forte pregnância simbólica da tambor, dança de mina, festa alegre
nante, “a cultura africana possui va- GRANDE-MÃE TERRA. Aqui sim- de negro contente. Não esqueciam
lores matriarcais (noturnos) fundan- bolizada pela Donga que se entrega de pedir proteção para o padre novo
tes” (Ferreira Santos, 2004, p. 139). ao feminino das águas como busca que ajudara Donga. Bendiziam-no
Portanto, podemos inferir que outro da alquimia5 de seu sofrimento pelo indo de vez em quando à Igreja, fi-
grande mitema, tanto na lenda como branqueamento do filho. cando todos de pé, bem visíveis.
nos depoimentos das professoras, diz Pobre Donga! Andava pelas ter- Naquelas bandas do Laranjal de
respeito à mãe matriz de ascensão. São ras do laranjal em total obsessão. En- Pelotas, não conheciam negro pro-
muitos os sentidos e as representações controu Omolu, que a convidou para fessor, nem negro doutor. Nioro era
simbólicas deste arquétipo motriz da seguir-lhe os passos até onde Nioro o primeiro negro professor doutor.
mãe atualizada na mãe cotidiana, mas havia feito obrigação. Louca de sau- Seria apenas um negro e nada mais
cujo fio está na ancestralidade. dade de seu filho, ao ver o local tão nas terras do Laranjal?
Mães que, como Donga, trabalha- lindo, junto à praia em que ele estive- Concluindo diríamos que, ao apro-
vam, sofriam, acalentavam sonhos e ra adormecido, jogou-se nas águas ximar o foco entre as representações
desejos de uma vida melhor para suas da lagoa e morreu. Omolu carregou- e o imaginário, fundamentalmente,
filhas. a para o céu de Orum para acabar de procuramos tecer reflexões a partir
Donga, alforriada e com trezentos vez com seus sofrimentos.Contam que de uma abordagem antropológica e
mil réis, batia cabeça para Oxum, os pescadores encontraram o corpo histórica, na direção de uma “herme-
agradecia a Oxalá, rezava Ave-Maria de Donga às margens da praia, e que, nêutica instauradora” (Durand, 1988)
para Nossa Senhora dos Prazeres. De ao tocá-lo, transformou-se em BAR- de símbolos e sentidos, para além de
um lado, Terreiro, do outro, Igreja. RO DURO, escuro e brilhante, espa- um ponto de vista racionalizante. A
Donga era um todo fragmentado. lhando-se pela orla. emergência deste “outro olhar” deri-
Mães que, como Donga lutando Barro Duro, Barro Forte sedimen- va do fluxo de “outros” conhecimen-
pelo reconhecimento e o não sofri- tado na história de um espaço eter- tos e interpretações que advêm do

33
5
No sentido de transmutar, transformar um estado em outro. Donga não morre! Ela retorna a sua origem de barro, eternizando-se na grande mãe-terra,
representada, na cultura afro, por Nana.

volume 12, número 1, janeiro • abril 2008

028a034_ART03_Jacira e Lucia [rev_OK].pmd 33 30/4/2008, 19:54


Jacira Reis da Silva, Lucia Maria Vaz Peres

imaginário; do homem como animal mágico. Todos os negros são atraí-


simbólico (Cassirer, 1994). dos para lá porque Oxalá permitiu-
Ao entendermos o homem como lhes consolar a Negra Donga. Por
Cassirer o entende, buscamos refle- isso, o Barro Duro é uma irmandade
tir sobre “novos” sentidos que emer- de negros dos mais diferentes níveis
gem dos relatos das professoras socioeconômicos e culturais.
mulheres negras, apoiadas numa Assim, a construção e a organi-
concepção de cultura que compre- zação do real ocorre no próprio ima-
ende as relações humanas como uma ginário que dormita em todos nós.
“teia de significados” (Geertz, 1989),
que tramam, tecem e instituem mo- Referências
dos de ver, sentir e representar o vi-
vido da mulher negra silenciada. CASSIRER, E. 1994. Ensaio sobre o ho-
Neste sentido, o estilo da herme- mem: introdução a uma filosofia da
nêutica instauradora, preconizada cultura humana. São Paulo, Martins
Fontes, 380 p.
por Durand (1988), valoriza a inter-
DALLA VECCHIA, A.M. 1993. Os filhos
pretação na dinâmica do processo,
da escravidão: memórias de descen-
para além de resultados preconcebi- dentes de escravos da região meridio-
dos que influenciaram e instituíram nal do Rio Grande do Sul. Pelotas, Edi-
um jeito de ser/tornar-se professora. tora Universitária/UFPel, 297 p.
Portanto, pensar sobre o silencia- DURAND, G. 1988. A imaginação sim-
mento dessas professoras/mulheres bólica. São Paulo, Cultrix, 114 p.
negras, desde esta perspectiva. foi DURAND, G. 1989. As estruturas antro-
pológicas do imaginário. Lisboa, Edi-
instigador e resultante de correlações
torial Presença, 326 p.
complexas, de trocas incessantes en- FAAR, R.M e MOSCOVICI, S. 1984. So-
tre as pulsões subjetivas e as intima- cial Representations. Cambridge,
ções da cultura do branqueamento. Cambridge University Press, 50 p.
Uma perspectiva muito próxima do FERREIRA SANTOS, M. 2004.
trajeto antropológico do imaginário, Crepusculário. São Paulo, Zouk, 207 p.
preconizado por Durand (1989). GEERTZ, C. 1989. A interpretação das
culturas. Rio de Janeiro, LTC, 323 p.
O mais paradoxal é que as vozes
MOSCOVICI, S. 1978. A representação
dessas mulheres como as da lenda
social da psicanálise. Rio de Janeiro,
do Barro Duro ecoam há muito tem- Zahar, 350 p.
po, por longos espaços, através de PERES, L.M.V. 1999. Dos saberes pesso-
gerações... Elas são presentes em ais à visibilidade de uma Pedagogia
nós, embora sufocadas... Submergem Simbólica. Porto Alegre, RS. Tese de
na circulação do imaginário que nos Doutorado. Universidade Federal do Rio
afeta: BARRO DURO, TERRA DE Grande do Sul – UFRGS, 152 p.
SILVA, J.R. 2000. Mulheres caladas: tra-
NEGRO. Assim, batizaram o lugar
jetórias escolares de professoras ne-
em que Donga virou barro, de tanta
gras em Pelotas: produção/circulação
saudade de seu filho negro-branco. de representações sobre os negros na
Por isso, na religiosidade afro- Jacira Reis da Silva
escola. Porto Alegre, RS. Tese de Dou- Professora aposentada
pelotense, Barro Duro foi escolhido torado. Universidade Federal do Rio Departamento de Ensino/FaE/UFPel
para sediar a gruta e as homenagens Grande do Sul – UFRGS, 210 p. Pesquisadora do GEPIEM
a Iemanjá (Filha de Nanã). Então, SILVEIRA, M.H.V. 1993. Odara: fanta- Rua Alberto Rosa, 154
96010-770 Pelotas, RS, Brasil
num isomorfismo de homologias, sia e realidade. Porto Alegre, Texto
Donga se filia a Nanã, quando retor- digitado, 15 p. Lucia Maria Vaz Peres
TEVES, N.A. 1994. Educação e imaginá- Professora Associada I
na às suas origens arquetipais – o Departamento de Fundamentos da
rio social: revendo a escola. Em Aber-
barro como fundamento da criação. Educação/FaE/UFPel
34 Por isso, no imaginário local, Barro
to, 61:5-14.
Pesquisadora e líder do GEPIEM
Rua Alberto Rosa, 154
Duro é praia de negro! Submetido em: 15/03/2007 96010-770 Pelotas, RS, Brasil
O Barro Duro tornou-se um lugar Aceito em: 30/05/2007

Educação Unisinos

028a034_ART03_Jacira e Lucia [rev_OK].pmd 34 30/4/2008, 19:54

Você também pode gostar