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1 author:
Érica Magi
São Paulo State University
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Making funk and making a living in Brazil: The KondZilla phenomenon View project
All content following this page was uploaded by Érica Magi on 07 November 2018.
Profa. Dra. Marcia Tosta Dias, docente da UNIFESP e autora do livro “Os donos
da voz: indústria fonográfica brasileira e mundialização da cultura“ (2008)
PREFEITURA
DE GOIÂNIA
RAINER GONÇALVES SOUSA
Cultura (ORGANIZAÇÃO)
NAS TRILHAS DO ROCK
EXPERIMENTALISMO E MERCADO MUSICAL
Rainer Gonçalves Sousa
(organização)
Editora Kelps
Rua 19 nº 100 – St. Marechal Rondon
CEP 74.560-460 – Goiânia-GO
Fone: (62) 3211-1616
E-mail: kelps@kelps.com.br
homepage: www.kelps.com.br
Programação visual
Victor Marques
Capa
Raphael Berthoud
(raphaelberthoud.com)
Revisão
Camila Ligeiro Medeiros
(camilaligeiro@gmail.com)
DIREITOS RESERVADOS
Impresso no Brasil
Printed in Brazil
2018
Prefácio
Parte 1
ROCK INTERNACIONAL
“Nasci em 62”: algumas notas sobre uma breve história social de al-
guns roqueiros brasileiros dos anos 80....................................................193
Paulo Gustavo da Encarnação
ROCK INTERNACIONAL
O Fantasma da Eletricidade:
Bob Dylan, o fim do rock and roll e
o nascimento do rock moderno.
Rodrigo Merheb *
* Graduado em Comunicação Social e autor do livro O Som da Revolução: Uma História Cultural do
Rock (1965-1969). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2012..
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dos códigos de linguagem dos negros. Não da maioria que ainda era
oprimida por uma sociedade racista, mas da parcela de jazzistas mais
arrojados que desafiavam a sociedade com sua arte e seu estilo de vida
insubmisso. Os hipsters trafegavam no submundo de onde traziam
para superfície costumes e gírias de uma fauna que a um só tempo
fascinava e horrorizava o cidadão de valores tradicionais.
O mais bem-acabado arquétipo do hipster na literatura certa-
mente foi criado por Jack Kerouac em On The Road, na figura do seu
alter ego Sal Paradise. Num dos trechos, ele resume a má consciência
que resulta de uma identificação tão latente com a cultura e o modo de
vida do oprimido enquanto tem que carregar geneticamente a culpa
do opressor:
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imprensa, por líderes políticos ou até mesmo pelo seu público. Dylan
parecia capaz de sistematizar a desordem, sempre um passo adiante
das expectativas gerais que ele notoriamente manipulava.
Se na década de 1950, a rebeldia era considerada uma fase de
desajuste intermediário entre a infância e as responsabilidades da
idade adulta, os jovens que articulavam o rock dos anos 60 não es-
condiam a pretensão de serem reconhecidos por sua arte. Vários de-
les tinham formação universitária (Jim Morrison, Janis Joplin, Paul
Simon, Lou Reed) ou, no caso dos ingleses, uma parcela considerá-
vel frequentara escolas de arte públicas, graças a uma política edu-
cacional socialdemocrata no Reino Unido estabelecida logo depois
da Segunda Guerra. Por sinal, as principais bandas inglesas daquele
período (Beatles, Rolling Stones, The Who, The Kinks, Cream, Yard-
birds, Pink Floyd) contavam com pelo menos um integrante prove-
niente destas instituições.
Quando o rock and roll se massificou em 1955, a intelectualidade
americana não lhe deu qualquer importância. Não apenas a qualidade
musical parecia rudimentar, mas seus nomes mais conhecidos eram
garotos de idade pouco maior do que seu público e vinham todos do
Sul, uma parte dos Estados Unidos que a esquerda da costa leste via
com desconfiança dado seu patriotismo, sua religiosidade e sua heran-
ça escravocrata.
Mesmos os beats que, em tese, poderiam entender a rebeldia
por trás da música, sentiam pouca afinidade com o rock and roll.
Apesar da forte musicalidade e do componente rítmico de suas po-
esias, o interesse dos beats era incorporar em sua obra aspectos do
bebop que desconstruíam formas ortodoxas com instrumentistas ex-
traordinários como Miles Davis, Charlie Parker e Dizzy Gillespie.
Depois, aquelas crônicas de ansiedade sexual e inadequação dificil-
mente teriam alguma ressonância com escritores já passados dos 30
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Eles tocavam esse tipo de música que era preta e branca. Extre-
mamente incendiária. As roupas pegavam fogo. Era uma mis-
tura de cultura negra e cultura caipira. Quando eu ouvi Chu-
ck Berry pela primeira vez eu não pensei que ele fosse negro.
Pensei que ele fosse um caipira branco. Mal sabia que ele era
um grande poeta também. (...) havia algum poder elitista que
tinha que se livrar de todos esses caras e exterminar o rock and
roll pelo que era e pelo que representava, especialmente por ser
uma coisa preta e branca. Amarrada e hermeticamente fechada.
Se você separa as peças, você mata.
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Bibliografia
CHARTERS, Ann. The Portable Beat Reader. Nova York: Penguin
Books, 1992.
MARQUESE, Mike. Wicked Messenger: Bob Dylan and the 60´s. Nova
York: Seven Stories Press, 2008.
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Rock e Vanguarda nos anos 60:
uma dialética possível
* Professor do Departamento de História – UNESP-Franca e autor do livro Nem do morro, nem da cidade:
as transformações do samba e a indústria cultural (1920-1945). São Paulo: Annablume/FAPESP, 2005.
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José Adriano Fenerick
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que não se trata de um álbum dos Beatles nos versos do refrão da faixa
título, que abre o LP:
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Neste álbum, o que antes era marginal passou para o centro, o que era
esporádico passou a ser a razão da existência do disco.
Ao longo de todo o álbum, uma série de técnicas composicio-
nais, provenientes das vanguardas musicais (desde a colagem até a mú-
sica eletroacústica) compõem um caleidoscópio de sons, perpassando
universos sonoros díspares: desde o vaudeville até a música indiana. O
show preparado pela banda do Sgt. Pepper é um verdadeiro show de
variedades: da sonoridade de vaudeville da década de 1920 (When I’m
64) às imagens “surrealistas” inspiradas em Alice no país das maravilhas
de Lewis Carroll e nos sonhos do filho de Lennon, Julian Lennon (Lucy
in the sky with diamonds); da atmosfera burlesca de circo (Being for the
benefit of Mr. Kite) à música sublime do norte da Índia (Within You Wi-
thout You); do retrato do banal, tradicional e entediante do cotidiano
suburbano da classe média britânica (Good morning, Good morning) à
descrição da jovem (drop-out) que foge da casa dos pais, demarcando
a falta de comunicação entre as gerações (She’s leaving home); sons de
cítaras e cacarejos de galinhas, harpas e guitarras elétricas pesadas, sons
de relógio despertador e violinos, o latido de cachorro e a alta frequência
inserida no fim do LP e que apenas cachorros ouvem (na prática, para
os seres humanos: o silêncio), o pulso constante e regular da canção po-
pular e o acaso e o indeterminado tomados emprestados das vanguar-
das eruditas musicais do pós-Segunda Guerra, da música eletrônica e
da música modal; o moderno rock’n’roll e as arcaicas formas clássicas
da música indiana (ragas e talas). Tudo se juntou em Sgt. Pepper’s. Esse
álbum dos Beatles alargava praticamente ao infinito o campo da canção
pop, propondo uma estética altamente inclusiva. Todo som (musical,
ruidoso ou até mesmo o próprio silêncio) passaria a ser utilizável em
uma canção popular após Sgt. Pepper’s.
Os Beatles, até então, nunca haviam gravado duas versões de
uma mesma música para o mesmo LP. A simples sugestão de Neil
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Rock e Vanguarda nos anos 60: uma dialética possível
Aspinall para que eles fizessem uma segunda gravação da canção “Sgt.
Pepper’s Lonely Hearts Club Band” como uma espécie de encerramen-
to do show “ao vivo” em que estava se transformando o álbum, os esti-
mulou enormemente. E fizeram a gravação, numa versão modificada
e mais curta. A canção, no álbum, funciona como o último número
a ser apresentado pela banda do Sgt. Pepper, colando-se à primeira
canção de forma conceitual (e entre elas, todas as outras canções do
LP, um grande show de variedades). Se na primeira canção, que abre o
LP, a banda do Sgt. Pepper esperava agradar a audiência, na “reprise”,
ela espera ter agradado, pois o show estava por terminar. Os versos
iniciais da “reprise” são semelhantes aos do refrão da canção de aber-
tura do LP, apenas o verbo “to enjoy” (gostar, apreciar, divertir-se) está
no passado, pois o concerto está em seu final. Dizem os versos iniciais
dessa canção:
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Rock e Vanguarda nos anos 60: uma dialética possível
Eu vou dormir...
Eu vou, eu vou ir para uma casa
É isso que irei fazer
Eu vou para uma casa
Onde há uma banda de rock & roll
Porque todas as bandas moram juntas
E eu irei me juntar a uma banda de rock & roll
Eu serei seu gerente nas excursões
Eu ficarei com eles
E pegar chato
Mas não me importarei
Porque...
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Rock e Vanguarda nos anos 60: uma dialética possível
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José Adriano Fenerick
WOOD, Paul. Arte Conceitual. São Paulo: Cosac & Naify, 2002.
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She’s Leaving Home:
o processo de feminilização nas canções dos Beatles, o
movimento feminista e a contracultura
Introdução
O rock dos anos 1960, que esteve ligado à contracultura jovem e
aos movimentos políticos de esquerda, foi predominantemente pautado
por práticas masculinas, reforçadas pela indústria da música. As práti-
cas machistas do rock sessentista foram herdadas de seu antecessor, o
rock’n’roll dos anos 1950, vez que a masculinidade era reafirmada nas
performances ao vivo, nas letras das canções – em sua maioria machis-
tas –, e na forma com que roqueiros se vestiam (jaqueta de couro, terno
e imagem de Teddy Boy). Ademais, pode-se perceber a exclusão das
mulheres da cena principal do rock, analisando os nomes e as bandas
que alçaram o posto de destaque no cenário musical, tornando-se ído-
los ao permearem o imaginário social como responsáveis pela ascensão
do gênero, tais como Chuck Berry, Little Richard, Jerry Lee Lewis, Fats
Domino, Elvis Presley, Beatles, Rolling Stones, entre outros.
O grau mais alto que a mulher desfrutava no universo do rock,
nos primeiros anos da década de 1960, era a de fã, expectadora de
seus ídolos masculinos – muitas vezes o símbolo sexual da juventude
* Graduada em História pela Faculdade de Ciências e Letras – FCL – UNESP/Assis (2012) e Mestra
(2015) em História pela mesma Faculdade, tendo sido bolsita do CNPq.
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“was a moment of great personal liberation for me. It gave me a taste of power – not in the sense of
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authoritarian patriarchal attitudes toward women that exist in ‘straight’ bourgeois society. Considering
that the movement is supposedly dedicated to the liberation of all people, the creation of a society
with equality for all and the dismantling of all authoritarian structures, one can only despair at the
authoritarianism exhibited by the movement itself in the objectification of those persons in the
movement […] Rock culture has evolved its own sickness: it is the Chick Groupie Consciousness. The
dehumanization of women by regarding them as sex-objects and housekeepers. (No original).
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“The only redeeming path left open to us is the path of total war against the system of oppression
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against which each succeeding generation of our people have struggled” (No original)
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“gay brothers free ourselves” e “Sisters unite! Smash sexism”. (No original)
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duas, não muito mais que isso. No artigo, ela discute o pouco espaço
dado às mulheres no universo do rock, embora elas já estivessem ocu-
pando outros espaços das artes, como pintura, literatura, teatro, etc. E,
apesar de reconhecer as mudanças que o rock trouxe para a juventude
revolucionária, como a ênfase no prazer sexual, na diversão, o rela-
xamento mental, etc., a autora não deixa de criticar a imagem reacio-
nária no que diz respeito à liberdade das mulheres e sua relação com
os homens, para quem elas deveriam servir sexualmente (BROWN,
1970, p.13).
Portanto, no início dos anos 1970, as mulheres ainda não ti-
nham seu espaço garantido no mundo do rock, ainda não estavam
confortáveis com os papéis a elas relegados, pois, como afirma David
Simonelli (2013, p.186) “o Rock, no começo dos anos 1970, ainda era
um meio dominado pelos homens e suas normas sexuais refletiam as
da sociedade que eles representavam”9. Logo, o processo de feminili-
zação do rock estava em crescente desenvolvimento e paulatinamente
as mulheres iam conquistando seus espaços, lutando contra a menta-
lidade machista da sociedade, combatendo ranços socioculturais que
naturalmente excluíam as mulheres da vida cultural, social e política.
Como observado nas análises a respeito das imagens e conteúdos dos
artigos presentes no jornal International Times, a situação das mulhe-
res, no final dos anos 1960 e início da década de 1970, ainda era dúbia.
Mesmo que fossem apresentadas em imagens de luta ou de liberdade
sexual, vários artigos, inclusive escrito por mulheres, criticavam a pos-
tura dos movimentos sociopolíticos, bem como do rock, pois continu-
avam a manter uma postura machista, excluindo as mulheres ou defi-
nindo-as como objetos sexuais. Isso demonstra que, embora tenham
conquistado espaço na sociedade pautada pelo pensamento machista,
ainda havia muito a conquistar.
“Rock in the early seventies was still male-dominated médium, and its sexual norms reflected those of
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“She loves you/Yeah, yeah, yeah/You think you’ve lost your love/Well, I saw her yesterday. It’s you she’s
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“Gives me all her time as well as loving”. (No original)
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“She’s a woman who understands/She’s a woman who loves her man”. (No original)
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“Waiting to keep the appointment she made/Meeting a man from the motor trade” (No original)
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“Take these broken wings and learn to fly” e “Blackbird, fly, blackbird, fly” (No original).
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rejeitada por grande parte da imprensa e mesmo pelos fãs, que ainda
olhavam para as mulheres por um viés doméstico, jamais aceito pela
artista, que também era japonesa, o que reforçava o preconceito da
sociedade machista ocidental.
Considerações finais
Diante do contexto histórico-cultural dos anos 1960 e das aná-
lises de algumas canções dos Beatles lançadas ao longo da carreira da
banda, percebe-se uma mudança na forma com que a mulher é retra-
tada nas canções da banda. Fato que pode ter acompanhado as modi-
ficações que ocorriam na sociedade, guiadas pelo fortalecimento das
lutas feministas, e, no caso específico dos Beatles, pela aproximação
da artista Yoko Ono, após iniciar relacionamento amoroso com John
Lennon. Seu engajamento na luta feminista, além de sua visão van-
guardista em relação à música, trouxe novas possibilidades de compo-
sição para o quarteto de Liverpool.
Ademais, quando a banda se aproximou dos ideais da contracul-
tura, que vinha assimilando as lutas feministas, sua postura foi modi-
ficada. As composições apresentaram letras menos conservadoras, e o
quarteto abriu-se para experimentos musicais, incorporando elemen-
tos vanguardistas, além da música oriental, muito por influência de
George Harrison. A forma Teddy Boy de se vestir, bem como o conser-
vadorismo dos ternos, e os cortes de cabelo todos iguais, foram subs-
tituídos por um novo visual, com roupas mais despojadas, coloridas e
individualizadas, cada um vestindo o que bem entendesse e adotando
penteados próprios. Assim, os quatro rapazes de Liverpool, de uma
forma ou de outra, passaram a questionar os padrões impostos pela
sociedade e pela indústria fonográfica. Com isso, assumiram um dis-
curso menos machista, acompanhando o coro que vinha da crescente
mobilização feminina, na luta por uma sociedade mais igualitária.
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Bibliografia
BROWN, Shelina. Scream from the Heart: Yoko Ono’s Rock and Roll
Revolution. In: WHITELEY, Sheila; SKLOWER, Jedediah (orgs). Cou-
ntercultures and popular music. Farnham; Burlington, VT: Ashgate,
2014, p. 171-186.
BROWN, Arlene. Has anyone reading this article met a woman bass
play, International Times, London, p. 13, 27 ago. – 10 set., vol. 1, Issue:
86, 1970.
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MACAN, Edgar. Rocking the classics: English progressive rock and the
counterculture. New York/Oxford: Oxford University Press, 1997.
Kobo edition.
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SIMONELLI, David. Working Class Heroes: Rock Music and British so-
ciety in the 1960s and 1970s. Plymouth: Lexington Books: 2013.
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Saltando para as montanhas sombrias:
Led Zeppelin, Tolkien e Contracultura (1966-1974)
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O álbum não possui título, pois o guitarrista e produtor da banda Jimmy Page queria que a música
falasse por si só em protesto contra as críticas de revistas especializadas como a Rolling Stone.
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Oh, throw down your plow and hoe/Rest not to lock your homes/Side by side we wait the might/Of the
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darkest of them all/I hear the horses’ thunder/Down in the valley blow/I’m waiting for the angels of
Avalon/Waiting for the eastern glow
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forget, no, no/Oh, dance in the dark of night/Sing to the morning light/The apples turn to brown and
black, the tyrant’s face is red.
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of Perception.
Autor de Alice no País das Maravilhas.
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modelo de vida alternativo hippie com questões políticas, que resultou na tentativa de levitar o Pentágono
nos EUA ou jogar notas de US$ 5,00 na Bolsa de Valores de Nova York.
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John Sinclair foi estudante e ativista político da Universidade de Berkeley, além de empresário da ban-
da MC5.
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dionisíaco da contracultura, caracterizado pela agressividade e temas ligados ao sexo, no qual há a predomi-
nância da guitarra elétrica e do blues; enquanto o Rock Progressivo ficou com o lado apolíneo, caracterizado
por uma proximidade com a música folk e com o lado mais ligado à natureza pastoril e aos mitos.
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Bibliografia
ALI, T. O poder das barricadas: uma autobiografia sobre os anos 60.
São Paulo: Boitempo, 2008.
CARPEAUX, Otto Maria. O livro de ouro da História da Música: da
Idade Média ao século XX. Rio de Janeiro: Ediouro, 2001.
CHEVALIER, Jean. Diccionario de los símbolos. Barcelona: Editorial
Herder, 1986.
CRISTELLI, Paulo. J.R.R. Tolkien e a crítica à modernidade. São Paulo:
Alameda, 2013.
CUMMING, D. Led Zeppelin and Carlo Domeniconi: Truth without
authenticity. Tese. Montreal: McGill University, 2005.
FAST, Susan. In the houses of the holy: Led Zeppelin and the power of
rock music. New York and London: Oxford University Press, 2001.
FRIEDLANDER, P. Rock and roll: Uma história social. Rio de Janeiro:
Record, 2012. 7º edição.
GAGNEBIN, J. M. Lembrar escrever esquecer. São Paulo: Editora 34,
2006.
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Black Sabbath, contracultura e teratologia (1970-1978)
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apareceram “muito tarde para o verão do amor, [e] muito cedo para o
genocídio roqueiro do glam” (2014, p. 13).
No que tange à primeira parte dessa definição temporal (“muito
tarde para o verão do amor”), verifica-se não somente uma tentativa
de contraponto da banda em relação à década de 1960, mas também a
existência de uma outra proposta para o rock. O Sabbath não só apare-
ceria depois de Woodstock, mas também seria uma banda que rompe-
ria com as mensagens de esperança e utopia transformadoras daqueles
que, por meio da estética hippie, das drogas letárgicas e do pacifismo,
até então colocavam a contracultura próxima ao rock.
Talvez, em um exercício comparativo, seria possível comungar
dessa noção pelo contraste do próprio Black Sabbath com os vários
artistas que estiveram em Woodstock. O vocal de Ozzy não lembra o
de Joe Cocker. A guitarra de Toni Iommi tem diferenças gritantes com
a de Jimi Hendrix. O baixo de Geezer Butler não contava com o swing
de um Sly Stone. E, apesar de muito vibrante, a bateria de Bill Ward
não segue o ritmo acrobático e festivo de Keith Moon.
Por meio dessas diferenças, a ideia de cisão entre o Sabbath e
os seus antecessores já poderia se sustentar e, desse modo, fortalecer
a noção de que o Black Sabbath não era mais um grupo de rock, mas
a primeira banda de heavy metal da história. No entanto, mesmo que
fosse possível ignorar todos os elementos de ordem musical, ainda as-
sim haveria como chegar à mesma conclusão sobre a banda, observan-
do as capas de seus álbuns, o visual dos integrantes do grupo e as letras
das canções que gravaram.
Os tons sombrios, a suposta bruxa da capa do primeiro disco, os
crucifixos e as menções aterradoras ao Diabo seriam os tais elemen-
tos que configurariam esse outro caminho de entendimento sobre o
Sabbath. Na obra “Heavy Metal – The music and its culture”, Deena
Weinstein faz uma demarcação ainda mais clara dessa perspectiva ao
dizer que o heavy metal
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nhum tipo de análise mais detida ao conteúdo das mesmas. Sendo assim, cabe aqui frisar que, mesmo
caracterizando inicialmente uma figura masculina que termina com sua mulher, “Paranoid” fala de
um sujeito também desconexo e incompreendido em diversas situações de sua vida, mostrando-se
visivelmente fragilizado por essa constante inadequação de si para com o mundo. Já em “Iron man”,
cabe retomar o diálogo das bandas desse período com ícones presentes na cultura pop do seu tempo.
Nesse caso, vale salientar que a canção pode ter sofrido a influência do personagem criado por Stan Lee
e Larry Lieber, dois aclamados autores de história em quadrinhos, no ano de 1963. Em sua origem, o
Iron Man aparece como um herói de comportamento moral dúbio e originado em um conflito que se
ambienta no Vietnã, luga de conflitor referenciado em outras canções da banda.
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“What is this that stands before me?”: Black Sabbath, contracultura e teratologia (1970-1978)
narrativa utiliza a figura divina para afirmar que o mundo foi feito “por
alguém lá de cima”, mas que “você escolheu o caminho do mal, ao invés
do amor” e, assim, “você me fez mestre do mundo onde você existe”.
Nessa canção, o dualismo entre “Deus” e o “Diabo” entra em
jogo para, mais uma vez, defender a ideia de que a tormenta e a agonia
do homem são frutos de suas próprias ações concretas. Apesar de falar
de um mundo criado por um ser celestial, constrói um cenário distó-
pico não em um terceiro lugar, em um inferno, mas no próprio mundo
em que o homem desenvolve as suas ações. O dilema da existência de
seres sobrenaturais ganha uma posição secundária, dando destaque
a um cenário de dor e desespero induzido pela figura humana, pelo
sujeito que se volta ao “Senhor desse mundo” (ou seja, o diabo), toda
vez que expõe “sua ganância mundana e orgulho”2.
Já na canção “Under the sun/Every day comes and goes” (1972),
as imagens de horror e a distopia são colocadas em contraponto ao
discurso salvacionista oferecido pelas instituições políticas e religio-
sas. Ainda no começo da canção, fortemente marcada por um riff
composto em trítono, a letra traz uma negação de qualquer tipo de
explicação religiosa do mundo, seja aquela oferecida pelos cristãos
(“Não quero fanáticos por Jesus me dizendo sobre as coisas da vida”),
ou pelo ocultismo (“[Não quero] Nenhum mago negro me dizendo
para jogar a minha alma fora”).
O ceticismo manifestado pela recusa de guias espirituais vem se-
guido pelo descrédito às pessoas que “tentam comandar a nação”, que
são vistas como pessoas frustradas que “escondem sua verdadeira face”.
Dado o diagnóstico, o narrador presente na letra coloca todas essas pes-
soas em uma “corrida de ratos” desprovida de sentido, já que “atrás de
cada flor nasce uma erva daninha, em seu mundo de faz de conta”.
2
A história contada nessa canção ganha maior sentido quando confrontada com “Master of Reality”
(Mestre da Realidade), título que nomeia o álbum onde a faixa foi originalmente registrada. Em certo
sentido, a canção ganha destaque por ter grande proximidade com o tema de “Lord of this World”.
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“What is this that stands before me?”: Black Sabbath, contracultura e teratologia (1970-1978)
Considerações finais
Encerrada a discussão aqui apresentada, percebe-se que o deba-
te sobre a contracultura necessita de uma série de reconsiderações que
ultrapassam a problemática do recorte temporal. Mesmo que haja um
consenso sobre seu início e seu fim, deve-se notar que existem conjun-
tos musicais e temas que merecem uma atenção maior.
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Rainer Gonçalves Sousa
130
“What is this that stands before me?”: Black Sabbath, contracultura e teratologia (1970-1978)
Bibliografia
COPE, Andrew L.. Black Sabbath and the rise of heavy metal music.
Farnham: Ashgate, 2014.
FRIEDLANDER, Paul. Rock and Roll: uma história social. Rio de Ja-
neiro: Record, 2003.
JANOTTI JR., Jeder. 666 The Number of the Beast: alguns apontamen-
tos sobre a experiência simbólica a partir das letras, crânios, demônios
e sonhos do heavy metal. In: Textos de cultura e comunicação. Salvador:
Facom/UFBA, n. 39, dez. 1998. p. 97-112.
131
Rainer Gonçalves Sousa
WALSER, Robert. Running with the Devil: power, gender and madness
in heavy metal music. Middleton: Wesleyan University Press, 1993.
WEINSTEIN, Deena. Heavy Metal: the music and its culture. Boston:
Da Capo Press, 2000.
132
Parte 2
ROCK NACIONAL
Tropicália, Rock e Experimentalismo*
(1980). Napolitano; Villaça (1998); Naves (2001); Paiano (1994; 1996); Ridenti (2000); Schwarz (1992);
Tatit (2002; 2004); Vasconcellos (1977); Veloso (1997); Calado (1997).
Sobre o caráter heterônimo do movimento tropicalista, consultar: Napolitano; Villaça, 2008.
2
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Sobre as disputas internas na MPB, ver Paiano (1994), Napolitano (2001), Ghezzi (2011). Para uma
3
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Tropicália, Rock e Experimentalismo
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Daniela Vieira dos Santos
138
Tropicália, Rock e Experimentalismo
Para uma análise sobre a MPB e a sua relação com a esquerda brasileira cf. Ridenti (2000); Napolitano
8
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Daniela Vieira dos Santos
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Tropicália, Rock e Experimentalismo
“pessoa querida”) ou abstrata (“pátria, liberdade, ideal”). Se para alguns indivíduos a perda resulta no
luto, em outros se observa a melancolia. Ao contrário da melancolia, o luto não apresenta um estado pa-
tológico, pois será superado. Dada a perda do objeto ou coisa amada, a libido se desvincula desse objeto,
“[...] as lembranças e expectativas pelas quais a libido se ligava ao objeto são focalizadas e superinvestidas
e nelas se realiza o desligamento da libido” (FREUD, 2011, p. 49), dando liberdade e desinibição ao ego. A
perda do luto é reconhecível, enquanto na melancolia não se tem consciência do que “realmente morreu”
a partir da sua perda.
12
Sobre o nacional-popular, ver: Garcia (2007); Napolitano (2001); Chauí (1984;2001); Candido
(2004); Ridenti (2000); Morelli (2008).
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Daniela Vieira dos Santos
Bibliografia
BAHIANA, A . M; WISNIK, J. M; AUTRA N, M . A n os 70. Rio de
Janeiro: Europa Empresa Gráfica e Editora Ltda, 1979-1980.
148
Tropicália, Rock e Experimentalismo
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Daniela Vieira dos Santos
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Tropicália, Rock e Experimentalismo
SANTOS, Daniela Vieira. Não vá se perder por aí: a trajetória dos Mu-
tantes. São Paulo: Annablume, 2010.
151
O caminho das pedras:
rock e MPB na revista Rolling Stone edição brasileira (1972)
Distribuidor, portanto, com a utilização de aparatos formais de distribuição; além de possuir vendedo-
res informais que circulavam por pontos do Rio de Janeiro para vendê-la.
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O caminho das pedras: rock e MPB na revista Rolling Stone edição brasileira (1972)
O número zero saiu em dezembro de 1971, como exemplar promocional, em busca de possíveis
3
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O caminho das pedras: rock e MPB na revista Rolling Stone edição brasileira (1972)
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Cleber Sberni Junior
Segundo Maria del Carmen Grillo, o nome do periódico é o “signo” do seu programa de pensamento e
7
ação, e revela a “missão da revista”. Habitualmente quando se coloca um subtítulo, existe ou sinaliza-se
para alguma mudança (2010, p. 10).
A sociedade empresarial de Rolling Stone era formada por quatro sócios estrangeiros identificados como
8
diretores e administradores: Stephen Banks, Stephane Gilles Escat, Theodore George e Michael Killin-
gbeck. O sócio-proprietário Mick Killingbeck é apontado como o mais ativo. Contudo, a Camelopar
Produções Gráficas Ltda não prosperou e ocorreu a saída de dois sócios.
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O caminho das pedras: rock e MPB na revista Rolling Stone edição brasileira (1972)
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O caminho das pedras: rock e MPB na revista Rolling Stone edição brasileira (1972)
Por estas e por outras é que, cada vez mais, acredito que as gra-
vadoras (em sua maioria) fazem o possível para atrapalhar, para
sabotar mesmo a carreira dos contratados. [...]. Atenção garo-
tos! Não marquem touca. Me procurem com seus disquinhos e
discões. Parece que o anonimato é a última coisa que vocês pre-
tendem, caso contrário não teriam batalhado pra gravar suas
canções (NEVES, RS 26 – Rio, 24 de outubro de 1972, p.02).
10
Nesse texto, Ezequiel Neves produz uma longa lista de grupos que estão fazendo show na cidade de São
Paulo e que possuem alguns compactos lançados, como Lee Jackson, Alpha Centauri, Eyes, Porão 99,
Escória, Mako Shark, Koumpha, Buttons, Memphis, Fush, Made in Brazil, Néctar, Sunday, Mona, U. S.
Mail, Strip Tease de Plantas Carnívoras, Blow-up, Urubu Roxo, Stillo Set, e Coristas do Inferno
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O caminho das pedras: rock e MPB na revista Rolling Stone edição brasileira (1972)
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Cleber Sberni Junior
Na Rolling Stone edição 35, uma nota afirma que o grupo O Faia estava nos estúdios da RCA gravando
11
um compacto com a produção de Raul Seixas (RS 35 – Rio, 29 de dezembro de 1972 – EDIÇÃO PI-
RATA, p. 7). Porém, a gravação nunca foi finalizada, e as músicas nunca saíram. Raul Seixas, em 1973,
deixaria a sua posição de produtor e se lançaria como cantor e o conjunto O Faia acaba não gravando
nenhum LP, e o seu único registro de estúdio é a gravação do compacto acompanhando Zé Rodrix em
“Casa no Campo”, lançado pela Odeon.
A banda foi formada no Rio de Janeiro e, no início da década de 1970, os integrantes eram Luis Paulo
12
Simas (órgão, piano e vocais), Eduardo José Leal Neto (guitarra solo), Daniel Cardona Romani (gui-
tarra, violão e vocais), e Candinho – Candido Souza Farias – (bateria).
Faixas do Disco: 1.Turpe Est Sine Crine Caput (Módulo 1000), 2.Não Fale com Paredes (Módulo 1000,
13
Victor Martins), 3. Espelho (Módulo 1000), 4. Lem. Ed. Êcalg (Módulo 1000), 5. Olho por Olho. Dente
por Dente (Módulo 1000), 6. Metrô Mental (Módulo 1000), 7. Teclados (Módulo 1000), 8. Salve-se
Quem Puder (Módulo 1000), 9. Animáia (Módulo 1000).
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O caminho das pedras: rock e MPB na revista Rolling Stone edição brasileira (1972)
do Baptista, Rita Lee, Liminha), 2. Vida de cachorro (Rita Lee, Arnaldo Baptista, Sérgio Dias), 3. Dune
Buggy (Rita Lee, Arnaldo Baptista, Sérgio Dias), 4. Cantor de mambo (Élcio Decário, Arnaldo Baptista,
Rita Lee), 5. Beijo exagerado (Rita Lee, Arnaldo Baptista, Sérgio Dias)/ Todo mundo pastou (Ismar S.
Andrade “Bororó”), 6. Balada do Louco (Arnaldo Baptista, Rita Lee), 7. A hora e a vez do cabelo nascer
(Liminha, Mutantes), 8. Rua Augusta (Hervé Cordovil), Mutantes e seus cometas no país dos Bauretz
(Ronaldo Leme, Liminha, Mutantes), 10. Todo mundo pastou II (Ismar S. Andrade “Bororó”).
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Cleber Sberni Junior
O Yes está fazendo escola por aqui. Já vi uns três grupos paulis-
tas tocando igualzinho a eles. Achei divertido, pois não tenho
preconceito nenhum contra esses carbonos. Confesso mesmo
que acho a coisa bem melhor que o original – mais subdesen-
volvida e mais realista. Aliás me esbaldei com as yesadas feitas
pelos Mutantes [...] (NEVES, RS 27 – Rio, 31 de outubro de
1972, p.02).
170
O caminho das pedras: rock e MPB na revista Rolling Stone edição brasileira (1972)
Hoje é o primeiro dia do resto de sua vida é bem recebido por Eze-
quiel Neves, que depois de utilizar o neologismo “yesadas” para criticar
a música dos Mutantes, referindo-se à banda Yes, agora usa o termo
Faixas do Disco: 1. Vamos tratar da saúde (Arnaldo Baptista, Rita Lee, Liminha), 2. Beija-me amor
16
(Arnaldo Baptista, Élcio Decário), 3. Hoje é o primeiro dia do resto da sua vida (Arnaldo Baptista,
Sérgio Dias), 4. Teimosia (Rita Lee, Liminha, Arnaldo Baptista), 5. Frique comigo (Arnaldo Baptista,
Ronaldo Leme, Sérgio Dias, Rita Lee), 6. Amor em Branco e Preto (Rita Lee, Arnaldo Baptista), 7.
Tiroleite (Arnaldo Baptista, Sérgio Dias, Rita Lee, Liminha), 8. Tapupukitipa (Arnaldo Baptista, Rita
Lee), 9. De novo aqui meu bom José (Arnaldo Baptista, Sérgio Dias, Rita Lee, Liminha), 10. Superfície
do Planeta (Arnaldo Baptista).
171
Cleber Sberni Junior
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O caminho das pedras: rock e MPB na revista Rolling Stone edição brasileira (1972)
Arnaldo Batista parte também para carreira solo em um período turbulento repleto de contratempos. Em
17
1974, lança o álbum Lóki?, pela Philips-Phonogran, que contou com a participação de Rogério Duprat, Limi-
nha, Dinho Leme e Rita Lee. Arnaldo receberá alcunha de “maldito” ao mesmo tempo em que suas obras serão
prestigiadas por críticos e por um grupo restrito de admiradores. Contudo, não alcançará o grande público.
173
Cleber Sberni Junior
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O caminho das pedras: rock e MPB na revista Rolling Stone edição brasileira (1972)
Bibliografia
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Cleber Sberni Junior
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A formação da identidade punk no Brasil
e o começo do fim do mundo (1976-1982)
Introdução
Nos dias onze e doze de novembro de 1982, na cidade de São
Paulo, mais precisamente nas instalações do SESC Pompéia, acontecia
um dos maiores festivais de música punk já vistos em território nacio-
nal e no mundo. Idealizado por Bivar1 e Calligari, O Começo do Fim
do Mundo reuniu 20 bandas ao longo dos dois dias de festival e levou
milhares de pessoas, ditas punks ou não, a experimentarem os valo-
res e símbolos da identidade punk, além do contato com as músicas
deste gênero, e ao final contou com a gravação e prensagem de disco
homônimo para os grupos que se apresentaram. No entanto, qualquer
possível sensação de ordem e fluência em um evento caracterizado
pela “energia” e jovialidade do público foi negada ao festival, pois, em
virtude de uma confusão que já se desencadeava nos perímetros do es-
paço do evento, ao término do último show, a polícia entrou em cena
e colocou um ponto final no já iminente Começo do Fim do Mundo.
O contato físico e verbal com os policiais gerou arranhões e
cicatrizes em muitos, o que não era diferente do que acontecia em
* Graduado em História pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita (Franca).
BIVAR, Antonio. O que é punk. São Paulo: Brasiliense, 2006.
1
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Pedro Felipe Minhoni
178
A formação da identidade punk no Brasil e o começo do fim do mundo (1976-1982)
dada por John Holmstrom, Legs McNeil e Ged Gunn em janeiro de 1976. Sem alguma explicação maior
em torno do seu surgimento, a utiliza como constante argumento de seu pioneirismo. in McNEILL, L.,
McGAIN, G. Mate-me, por favor: uma história sem censura do punk, Porto Alegre: L&PM, 1997.
Constantemente lembrado como celeiro de diversas bandas “fundadoras” do movimento e que teve mui-
4
to dos relatos de shows discorridos nos livros e nas edições da Punk. MCNEILL, L., McGAIN, G. Mate-
-me, por favor: uma história sem censura do punk, Porto Alegre: L&PM, 1997.
5
McLaren, mentor do grupo Sex Pistol’s, é associado à criação da estética punk do grupo tanto por sua
afinidade com o movimento situacionista francês como pelos seus experimentos estilísticos (e de sua
esposa) em sua loja, a SEX. in. SIMONELLI, David. Working Class Heroes Rock Music and British
Society in the 1960s and 1970s. Lexington Books. 2013.
6
Quando perguntado aos entrevistados sobre a “origem” do movimento, há briga entre eles, principal-
mente do povo de Brasília que teve um acesso mais rápido aos álbuns lançados fora do país. MOREI-
RA, Gastão Botinada: A origem do punk no Brasil. 110 minutos, 2006 – Brasil.
179
Pedro Felipe Minhoni
ESSINGER, Silvio. Punk: anarquia planetária e a cena brasileira. São Paulo: Editora 34, 1999, p. 98-100.
7
Trata-se do depoimento de João Gordo, vocalista da banda paulista Ratos de Porão, surgida em 1981 e
ainda ativa.
A fita k7 foi oficialmente lançada pela Phillips em 1963; o fanzine, por sua vez, é um formato não
8
profissional de revista, de entusiasta para entusiasta, e conta com assuntos e convenções de assunto
próprio como de super-heróis e afins.
180
A formação da identidade punk no Brasil e o começo do fim do mundo (1976-1982)
Sobre o mercado de consumo de estilo punk no Brasil ver: MILANI, Marco A. Os Fanzines na
9
divulgação do punk rock brasileiro – 1981 a 1995. In. Congresso de Estudos do Rock, 1., 2013
10
Essa “descoberta” de que não existe fórmula mágica para que as coisas aconteçam é nítida nas forma-
ções de bandas e álbuns lançados, principalmente nas cenas de São Paulo/ABC e dos Estados Unidos.
O’HARA, Craig. A filosofia do punk: mais do que barulho. Radical Livros. 2005.
11
Comumente associado ao surgimento de bandas como Discharge (Punk’s not dead 1981), Black Flag,
Dead Kennedys, dentre outras. Em tradução direta, núcleo duro, se refere ao núcleo dos ideais punk,
à crítica e ao posicionamento político, que divergiam, entre outras coisas, das atitudes recentes de
bandas como The Clash e Pistol’s, que firmaram contrato com grandes gravadoras.
181
Pedro Felipe Minhoni
182
A formação da identidade punk no Brasil e o começo do fim do mundo (1976-1982)
Pânico em SP!!
A relação entre Brasil e o material procedente dos polos “funda-
dores” do movimento punk17, em uma perspectiva globalizada, pode
vir a sofrer diversas inferências dependendo das informações distribu-
ídas. No entanto, é ingênuo esperar que houvesse qualquer espécie de
filtro ou exercício de opinião em um período marcado pela ditadura
militar. As mensagens de rebeldia e insatisfação, quando oriundas dos
grandes meios, traziam posicionamentos taxativos que delimitavam o
caráter e aglutinavam atitudes:
15
“As afirmações sobre diferença também dependem de uma cadeia, em geral, oculta, de declarações
negativas sobre (outras) identidades. Assim como a identidade depende da diferença, assim como a
diferença depende da identidade.” SILVA, Thomas Tadeu (organizador). Identidade e diferença – a
perspectiva dos estudos culturais. Petrópolis: Vozes, 2000, p. 75.
16
Tomaz Tadeu SILVA (organizador). Identidade e diferença – a perspectiva dos estudos culturais. Petró-
polis: Vozes, 2000.
17
Entenda-se por Estados Unidos e Inglaterra – Londres, mais especificamente – embora a real definição
da origem não agregue em nada a proposta da discussão.
183
Pedro Felipe Minhoni
A partir dos anos 80, os punks não cessaram de dizer que essa
explosão discursiva estaria criando uma imagem “distorcida” em
relação ao que eles seriam verdadeiramente(...)A televisão, os jor-
nais, as revistas, o rádio e, posteriormente, o mercado, tentavam
colonizar o punk dando-lhe um lugar previamente codificado,
onde ele não representaria um incômodo ou uma possibilidade
de questionamento dos modos de vida padronizados.18
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A formação da identidade punk no Brasil e o começo do fim do mundo (1976-1982)
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Pedro Felipe Minhoni
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A formação da identidade punk no Brasil e o começo do fim do mundo (1976-1982)
Agressão e Repressão!
Fica clara a diferença de tratamento quando se verifica o que
se era produzido pela mídia e o que era de origem interna do movi-
mento: percebe-se a intenção de estabelecer uma diferença perante o
que era “bom” e o que era punk. Desta forma, preparava-se o cidadão
que, em teoria não teria contato direto com o movimento, a respeito
da experiência de ser punk, ditando como seriam suas atitudes e seu
modo de vida. Em contrapartida, o jovem proveniente do movimento
continuava marginalizado. E essa marginalização, seja pelo interesse
Grande parte da revolução associada ao punk rock foi a sua simplificação do rock progressivo, a volta da
25
juventude e da rebeldia ao rock. Se em território internacional os alvos de tal crítica podem ser associados a
grupos como Deep Purple e Led Zeppelin, no Brasil, a música, ou pelo menos grande parte dela, era crista-
lizada nas vozes da MPB, sem contar a iminente ameaça da discoteca.
O compacto Grito Suburbano (Olho Seco, Inocentes e Cólera) e o álbum Violência e sobrevivência (Lixo-
26
mania) são datados como o primeiro registro do punk no país e o primeiro de uma banda solo, respecti-
vamente. O começo do fim do mundo, contudo, conta com a maior carga de bandas participantes.
27
O Made in Brazil foi considerado uma banda punk pela revista POP.
187
Pedro Felipe Minhoni
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A formação da identidade punk no Brasil e o começo do fim do mundo (1976-1982)
30
Segundo O’Hara, a mídia sempre construiu uma versão negativada do punk.
189
Pedro Felipe Minhoni
A geração abandonada
O começo do fim do mundo foi uma representação da identida-
de punk nacional. Na mesma proporção em que foi possível observar
uma organização nunca vista antes dentro do movimento punk – pelas
demonstrações de posicionamento político do grupo, pela quantidade
de bandas participantes, pela “paz” entre city/ABC, pela cobertura e
divulgação do festival, pelo material relacionado ao grupo, além do
prensado dos participantes do festival – houve o choque com sua re-
presentação cristalizada, na concepção de movimento agressivo, de-
sorganizado e nocivo à sociedade, por meio das lentes de uma mídia e
de uma ditadura militar pouco interessadas nessa manifestação.
Desse embate, o que sobrou, em grande parte, foi a dispersão do
movimento ou um amortecimento da onda punk no país, genericamen-
te representado pelo estereótipo de violência e marginalidade, levado
Como sugere Clemente: “o visual da galera da Carolina era igualzinho o visual dos Ramones ... Se eles
31
não tivessem inventado o movimento lá, nós tínhamos inventado ele aqui!” MOREIRA, Gastão Boti-
nada: A origem do punk no Brasil. 110 minutos, 2006 – Brasil.
190
A formação da identidade punk no Brasil e o começo do fim do mundo (1976-1982)
Bibliografia
BIVAR, Antonio. O que é punk. São Paulo: Brasiliense, 2006.
McNEILL, L., McGAIN, G. Mate-me, por favor: uma história sem cen-
sura do punk, Porto Alegre: L&PM, 1997, Vol.1.
191
Pedro Felipe Minhoni
SIMONELLI, David. Working Class Heroes Rock Music and British So-
ciety in the 1960s and 1970s. Lexington Books. 2013.
192
“Nasci em 62”:
algumas notas sobre uma breve história social de alguns
roqueiros brasileiros dos anos 80
Introdução
“Não tenho culpa por ser filho de pai rico, e porque as coisas
foram mais fáceis para mim. Nunca tive que vender livros na rua, fei-
to o Tavinho Paes. Ou porque não passei fome como o Léo Jaime”
(ARAUJO, 1997, p. 357), declarou em 1984 Agenor de Miranda Arau-
jo Neto, o Cazuza, então vocalista da banda Barão Vermelho. Mas será
que a condição social de Cazuza foi um caso isolado no repertório de
bandas e cantores do rock nacional dos anos 80? Qual a origem social
de alguns roqueiros oitentistas? Que escolas frequentaram? Será que
estudaram música? E qual importância da história social para com-
preensão e interpretação das canções roqueiras?
O objetivo deste texto é traçar uma breve história social dos
roqueiros dos anos 801, ou seja, buscar elementos e dados, por meio
de periódicos e de biografias de bandas, que possibilitem compreen-
der como foi o processo de formação sócio-cultural-econômico dos
* Doutor em História pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita (Assis).
1
O início do denominado rock nacional dos anos 80 é associado a partir dos lançamentos, entre 1982 e
1983, dos discos das bandas Blitz (As aventuras da Blitz) e Barão Vermelho (Barão Vermelho), e os dos
roqueiros Lobão (Cena de Cinema), Lulu Santos (Tempos modernos) e Ritchie (Vôo de Coração).
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Paulo Gustavo da Encarnação
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“Nasci em 62”: algumas notas sobre uma breve história social
de alguns roqueiros brasileiros dos anos 80
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“Nasci em 62”: algumas notas sobre uma breve história social
de alguns roqueiros brasileiros dos anos 80
montaram uma banda de rock progressivo, o Vímana, que contou com o apoio de Luiz Paulo Simas,
que conseguiu um contrato com a Som Livre, gravadora das organizações Globo. Mas o álbum ficou
engavetado e a banda se diluiu em fins da década de 1970.
Em 1978, as empresas Polydor e Phonogram se fundiram, resultando na PolyGram (DIAS, 2000, p.43).
3
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“Nasci em 62”: algumas notas sobre uma breve história social
de alguns roqueiros brasileiros dos anos 80
trador de empresas Valdir Galiano. O espaço ocupava cerca de quatrocentos metros quadrados de um
antigo depósito de móveis na Rua Teodoro Sampaio, em Pinheiros, Zona Oeste da cidade de São Paulo.
Essa rua é hoje uma referência no comércio de instrumentos musicais. O teatro foi inaugurado em
outubro de 1979 com a peça É fogo, paulista! e contou com a apresentação da orquestra Gota D’Água.
Concebido por Perfeito Fortuna, membro da trupe teatral Asdrúbal Trouxe o Trombone, mais o apoio
5
do engenheiro Márcio Galvão e do cenógrafo Maurício Sette, o centro cultural Circo Voador tinha
como objetivo incentivar e apresentar as mais diversas expressões artísticas. Depois da tentativa frus-
trada de montar a lona na Praça Nossa Senhora da Paz, em Ipanema, e de ficar quase três meses na
Praia do Arpoador, com apoio e a intercessão da então primeira do estado, Zoe Freitas Chagas, o Circo
Voador pousaria, em 23 de outubro de 1982, na Lapa, contando novamente com o intermédio da se-
nhora Chagas.
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de alguns roqueiros brasileiros dos anos 80
Brasil, 14/06/1983.
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“Nasci em 62”: algumas notas sobre uma breve história social
de alguns roqueiros brasileiros dos anos 80
7
Capital social é definido por Pierre Bourdieu (2007, p. 67) como o conjunto de recursos atuais ou
potenciais que estão ligados à posse de uma rede durável de relações mais ou menos institucionalizadas
de interconhecimento e de inter-reconhecimento ou, em outros termos, à vinculação a um grupo,
como conjunto de agentes que não somente soa dotado de propriedades comuns (passíveis de serem
percebidos pelo observador, pelos outros ou por eles mesmos), mas também soa unido por ligações
permanentes e úteis”.
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Segundo Pierre Bourdieu (2007, p. 74), “capital cultural pode existir sob três formas: no estado incor-
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porado, ou seja, sob a forma de disposições duráveis do organismo; no estado objetivado, sob a forma
de bens culturais – quadros, livros, dicionários, instrumentos, máquinas, que constituem indícios ou
a realização de teorias ou de críticas dessas teorias, de problemáticas, etc.; e, enfim, no estado institu-
cionalizado, forma de objetivação que é preciso colocar à parte porque, como se observa em relação ao
certificado escolar, ela confere ao capital cultural – de que são, supostamente, a garantia – propriedades
inteiramente originais”.
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pação rápida nos Mutantes, entre fevereiro a junho de 1978. Viria a ser músico de estúdio também,
tocando com Roberto Carlos, Chico Buarque e Tom Jobim.
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Nasci em 6212
SCANDURRA, Edgard. Nasci em 62. Intérprete: Ira!. In: IRA!. Clandestino. São Paulo: WEA, p1990.
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e suas variações de tempo. Frequentemente, os ritmos são recorrentes ou repetitivos – como o bati-
mento cardíaco – e seguem um padrão constante. Na música, os padrões rítmicos geralmente determi-
nam a carga emocional das canções, motivo pelo qual a música lenta, por exemplo, é classificada como
mais sentimental. Ver mais em SHUKER, 1999.
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1968/1970 1985
Mauá São Paulo
Suicídio Musculação
Hippies Trabalhar duro
Carreira de cocaína Carreira profissional
Andrajos Butique
Contra tudo A favor
Angústia Maior pique
Garganta Profunda Exterminador do Futuro
Viver em comunidade Morar sozinho
Grupo de teatro Carreira solo
Muito doido Careta
Droga Energia
A pomba da paz Cartão de crédito
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Considerações finais
Por meio deste texto buscou-se tratar e refletir historicamente
sobre uma breve história social de algumas bandas e cantores do rock
nacional dos anos 80, sobretudo, dos que ganharam maior destaque
no cenário midiático. A partir de perguntas chaves como sobre sua
procedência, preparação e legado, refletiu-se e construiu-se um qua-
dro social que apresenta características e informações sobre a idade
média dos roqueiros, que girava em torno dos 23 e 24 anos de idade;
e sobre a predominância de músicos do sexo masculino no universo
roqueiro; a disparidade entre roqueiros brancos em relação a afro-
descendentes, embora o rock também tivesse raízes da cultura negra,
como foi ressaltado.
Do ponto de vista social, os integrantes das bandas e cantores
roqueiros dos anos 80 se dividiam em dois segmentos sociais: um, ma-
joritário, composto por filhos de famílias de classe média alta e urbana,
ligadas, geralmente, a setores administrativos oficiais ou da iniciativa
privada; e outro, menor, integrado por filhos de núcleos familiares de
classe média baixa e urbana, ligado a setores de prestação de serviços
e cargos subalternos no funcionalismo público. Mas, vale destacar que
nem todos os roqueiros nasceram em berços esplêndidos, como al-
guns músicos da banda Ira!, por exemplo.
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de alguns roqueiros brasileiros dos anos 80
Bibliografia
ABRAMO, Helena Wendel. Cenas juvenis: punks e darks no espetáculo
urbano. São Paulo: Página Aberta, 1994.
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Paulo Gustavo da Encarnação
FRIEDLANDER, Paul. Rock and roll: uma história social. Rio de Janei-
ro: Record, 2003.
MARMO, Hérica; ALZER, Luiz André. A vida até parece uma festa:
toda a história dos Titãs. Rio de Janeiro: Record, 2003.
Fontes documentais
FRANÇA, Jamari. Os Paralamas do Sucesso: o som que veio de Brasí-
lia para ficar além do rock. Jornal do Brasil. Rio de Janeiro, 14/06/1983.
Caderno B, p. 8.
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Rock, cidades e cenas musicais
Introdução
A cidade moderna como espaço físico e fonte material da pro-
dução cultural e artística é um problema analítico debatido nas Ci-
ências Humanas em suas diferentes áreas. Música popular e erudita,
literatura, artes plásticas, vida intelectual e teatro podem ser pensados
por meio de suas relações com os espaços da cidade. Ela configura-se
como um elemento na elaboração artística e, ao mesmo tempo, uma
representação simbólica e ideológica condensada nas obras. É mate-
rial e produto no processo de feitura das obras. As grandes cidades são
cada vez mais centros de produção e de vivência cultural “singular” e
cosmopolita, com investimentos pesados em museus, festivais de ci-
nema, festivais de música popular e erudita que atraem um expressivo
contingente de turistas e tornam evidente o quão imbricada é a relação
entre cidade e cultura.
No Brasil, o debate sobre cidades e produção cultural tem cres-
cido nos últimos vinte anos e abarca trabalhos que passam por grupos
de intelectuais (PONTES, 1998, 2016), pela história da Sociologia e
suas particularidades em São Paulo e em Buenos Aires (JACKSON e
BLANCO, 2014), pelo desenvolvimento do modernismo artístico dos
* Doutora em Sociologia pela Universidade de São Paulo e autora do livro Rock and roll é o nosso traba-
lho: a Legião Urbana do underground ao mainstream. São Paulo: Alameda, 2013.
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com novas tintas em fins do século XX: como o local de uma cultura de
rock, música eletrônica, casas noturnas e de lojas de discos.
A Factory Records selecionava quais grupos seriam gravados,
tendo recusado, inclusive, a banda Smiths, do vocalista e letrista Ste-
ven Patrick Morrissey (1959-) e guitarrista Johnny Marr (1963-). Pou-
quíssimo tempo depois, entretanto, a banda atingiria os primeiros lu-
gares de execução na rádio BBC com seu o primeiro LP, lançado em
1984 pelo selo independente Rough Trade, sediado em Londres. Já o
Joy Division foi formado em 1976 por Bernard Sumner (guitarrista) e
Peter Hook (baixista) em Salford, região metropolitana de Manches-
ter, e acabou em maio de 1980 após o suicídio do vocalista Ian Curtis
(1956-1980). A banda lançou os álbuns Unknown Pleasures, em 1979,
e Closer, em 1980, ambos pela Factory Records. Os membros rema-
nescentes juntaram-se à guitarrista e tecladista Gillian Gilbert e cria-
ram a banda New Order, a qual se consagrou com uma sonoridade
que unia o pós-punk e a música eletrônica.
Straw (2013, p.15) considera ainda que Manchester, no decor-
rer dos anos 1980 e 1990, foi “uma das cidades ocidentais mais im-
portantes no campo da música popular massiva, o berço altamente
influente dos hibridismos entre o pós-punk e as formas de música
dance”. O autor canadense aponta outro dado interessante: apesar da
cidade conter uma alta concentração de estudantes universitários,
a cena musical foi criada por jovens situados fora das instituições
formais de ensino, isto é, por aqueles sujeitos “destinados” a ocu-
parem empregos de baixa qualificação num contexto de decadên-
cia da indústria e de crise da economia inglesa. O desenvolvimento
do punk rock e do pós-punk ingleses deu-se pelas mãos de filhos da
classe trabalhadora, sem acesso ao estudo superior e ao aprendizado
formal de música.
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Fonte: “Kid faz tic tic sem pudor”. Matéria assinada por Pepe Escobar na Folha de São Paulo, Caderno
Ilustrada, 22/07/1984, p. 57.
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Fonte: Fanzine SPALT. Edição: Fernanda Pacheco. Nº 06, fevereiro de 1984. p.07.
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ciar a ‘New Wave’ da música punk” (SHUKER, p. 203, 1999). De fato, musicalmente, as bandas consi-
deradas da New Wave, como B52’s e The Police, guardavam algumas diferenças em relação ao punk:
canções mais melódicas, dançantes e misturadas com o ska e o reggae.
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[...]
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Pôsteres das bandas: The Smiths, U2 e The Stone Roses. Exposição 80/80. 05 de Ju-
nho de 2015, Centro Cultural dos Correios, Niterói-RJ.
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Considerações finais
As cenas de rock de São Paulo e Rio de Janeiro eram partes visíveis
dessas metrópoles e de suas dinâmicas culturais: espaços de sociabilida-
de específicos reunindo pessoas ao redor do rock19, da audição e troca
de discos, e da composição de canções. Verifica-se, nesse contexto, a
construção de todo um aparato de atividades – cartazes, pôsteres, mú-
sicas, casas noturnas, trocas e audições de discos importados, textos na
imprensa, programas de rádio, fanzines – elaboradas cotidianamente de
maneira a expressarem formas de inserção distinta no espaço urbano.
Também pela negação da música popular brasileira20 e pelo forte apelo
do rock anglo-americano sobre uma nova parcela da juventude, viu-se
uma tentativa de fazer emergir o “diferente” e o cosmopolita no campo
da música popular urbana e na grande imprensa por meio de diversas e
complementares atividades culturais.
Tentou-se, portanto, apresentar e analisar o trabalho cultural de
uma camada muito específica da classe média e alta do eixo Rio-São
Segundo Will Straw (2015, p.408): “A scene is that cultural phenomenon which arises when any
19
purposeful activity acquires a supplement of sociability and when that supplement of sociability
becomes part of the observable effervescence of the city”.
A tradição da música popular brasileira, construída em meio a debates estéticos e disputas entre os
20
diversos agentes do campo musical no período de 1930 e 1960, formou-se a partir de três “gêneros”: o
samba, a Bossa Nova e a MPB (NAPOLITANO, 2007).
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Bibliografia
ARRUDA, Maria Arminda do Nascimento. Metrópole e Cultura – São
Paulo no meio século XX. Bauru: Edusc, 2001.
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Érica Ribeiro Magi
MAGI, Érica Ribeiro. Rock and Roll é o nosso trabalho: a Legião Ur-
bana do underground ao mainstream. 1a edição. São Paulo: Alameda
Editorial: FAPESP, 2013.
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Rock, cidades e cenas musicais
SILVA, Heitor da Luz. Rock & Rádio FM: Fluminense Maldita, Cidade
Rock e o circuito musical. 1a edição. Itajaí: Ed. Univalli; Niterói: Ed.
UFF, 2013.
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Em apoio à sustentabilidade, à preservação
ambiental, a Pronto Editora Gráfica/ Kelps
declara que este livro foi impresso com papel
produzido de florestas cultivadas em áreas
degradadas e que é inteiramente reciclável.