A Semana da Arte Moderna foi uma manifestação artístico-cultural que
ocorreu no Theatro Municipal de São Paulo entre os dias 13 a 18 de fevereiro de 1922. O evento reuniu diversas apresentações de dança, música, recital de poesias, exposição de obras - pintura e escultura - e palestras. O objetivo dos artistas que participaram dessa exposição, era propor uma nova visão de arte, a partir de uma estética inovadora inspirada nas vanguardas europeias e romper os parâmetros que vigoravam nas artes em geral. O evento impressionou muitas pessoas e atingiu a finalidade de expor essa diferente visão quanto aos processos artísticos, outras maneiras de sentir, ver e fruir a arte, trazendo também uma apresentação típica “mais brasileira”. Ocorreu uma ruptura com a arte acadêmica, o que contribuiu para uma mudança estética e para o Movimento Modernista no Brasil. Mário de Andrade foi uma das principais figuras e o principal articulador da Semana de Arte Moderna, tendo como os outros dois outros organizadores, Oswald de Andrade e o artista plástico Di Cavalcanti.
As principais características da Semana de Arte Moderna foram:
Ausência de formalismo; Ruptura com academicismo e tradicionalismo; Crítica ao modelo parnasiano; Influência das vanguardas artísticas europeias (futurismo, cubismo, dadaísmo, surrealismo, expressionismo); Valorização da identidade e cultura brasileira; Fusão de influências externas aos elementos brasileiros; Experimentações estéticas; Liberdade de expressão; Aproximação da linguagem oral, com utilização da linguagem coloquial e vulgar; Temáticas nacionalistas e cotidianas. Em 1922, no período em que a independência do Brasil estava completando cem anos, o país estava vivenciando diversas modificações sociais, políticas e econômicas (advento da industrialização, fim da Primeira Guerra Mundial). Com isso, surgiu a necessidade de instituir uma nova estética dentro da sociedade, e então foi criada a “Semana de Arte Moderna”. A maioria dos artistas integrados na manifestação eram descendentes das oligarquias cafeeiras de São Paulo, que junto aos fazendeiros de Minas, formavam uma política que ficou conhecida como “Café com Leite”. Essa foi uma razão que influenciou e motivou muito para a realização do evento, visto que, obteve apoio do governo de Washington Luís, que na época era governador do Estado de São Paulo. Inclusive, muitos dos artistas envolvidos, que já haviam viajado ou estudado na Europa, trouxeram para o Brasil diversas tendências artísticas daquela cultura, que era inovadora para o país, o que correspondia aos objetivos do movimento de transparecer artes diferenciadas. Assim foi se formando o movimento modernista no Brasil. Dessa forma, São Paulo revelava, em confronto com o Rio de Janeiro, novos horizontes e uma imagem de protagonismo na cena cultural brasileira. Para Di Cavalcante, a semana de arte: “Seria uma semana de escândalos literários e artísticos, de meter os estribos na barriga da burguesiazinha paulista”.
Então, diante de todo esse cenário, durante os dias 13, 15 e 17 de
fevereiro de 1922, foi realizada essa manifestação artística, política e cultural que reuniu jovens artistas irreverentes e contestadores. O evento foi inaugurado por intermédio de uma palestra ministrada elo escritor Graça Aranha: “A emoção estética da Arte Moderna”, onde ocorreram na sequência, uma série de apresentações musicais e exposições artísticas. O evento obteve uma grande quantidade de pessoas que foram prestigia-lo. No segundo dia de evento, ocorreu uma apresentação musical e uma palestra ministrada pelo escritor e artista plástico Menotti del Picchia. Houve também a leitura de um poema de Manuel Bandeira, chamado “Os Sapos”, porém quem realizou a leitura foi o poeta e político brasileiro Ronald de Carvalho, pois Bandeira encontrava-se em uma crise de tuberculose. Esse poema retratava a crítica à poesia parnasiana, o que gerou uma indignação do público e resultou em muitas vaias, sons de latidos e relinchos.
No terceiro e último dia de evento, o teatro estava mais vazio em
relação aos outros dias. Houve uma apresentação musical com mistura de instrumentos. A apresentação foi exibida pelo carioca Villa Lobos, que subiu ao palco vestindo casaca e calçando em um pé sapato e no outro um chinelo. Resultou também em vaias e indignação, por razão de que o público interpretou aquilo como se fosse uma afronta, entretanto após isso, foi explicado que o artista estava com um calo no pé e por isso estava trajado daquela maneira. Principais artistas da Semana de Arte Moderna:
"Arquitetos: Antonio Moya, Georg Przyrembel.
Escritores: Afonso Schmidt, Agenor Barbosa, Álvaro Moreyra, Elysio de Carvalho, Graça Aranha, Guilherme de Almeida, Luiz Aranha, Mario de Andrade, Menotti del Picchia, Oswald de Andrade, Ronald de Carvalho, Sérgio Millet, Tácito de Almeida. Escultores: Wilhelm Haarberg, Hildegardo Leão Velloso, Victor Brecheret. Músicos: Alfredo Gomes, Ernani Braga, Fructuoso Viana, Guiomar Novais, Heitor Villa-Lobos, Lucília Guimarães, Paulina de Ambrósio. Pintores: Anita Malfatti, Antonio Paim Vieira, Emiliano Di Cavalcanti, Ferrignac, John Graz, Vicente do Rego Monteiro, Yan de Almeida Prado, Zina Aita."
A Semana de Arte Moderna trouxe grande repercussão e críticas ao
movimento, por motivo de que algumas apresentações causaram desconfortos ou não foram bem claras de qual proposta queriam expressar. Os artistas envolvidos chegaram a ser comparados aos doentes mentais e loucos. Com isso, ficou evidente que faltavam alguns aspectos e uma melhor preparação para que a apresentação dos modelos artísticos fosse interpretada da maneira correta. Monteiro Lobato foi um dos escritores que atacou com bastante empenho as ações da Semana de 22. Inclusive, já havia sido publicado por ele, um artigo realizando uma crítica as obras de Anita Malfatti em uma exposição dela, exibida em 1917
Há duas espécies de artistas. Uma composta dos que vêem
normalmente as coisas (..) A outra espécie é formada pelos que vêem anormalmente a natureza e interpretam-na à luz de teorias efêmeras, sob a sugestão estrábica de escolas rebeldes, surgidas cá e lá como furúnculos da cultura excessiva. (...) Embora eles se dêem como novos, precursores de uma arte a vir, nada é mais velho do que a arte anormal ou teratológica: nasceu com a paranóia e com a mistificação(...) Essas considerações são provocadas pela exposição da senhora Malfatti onde se notam acentuadíssimas tendências para uma atitude estética forçada no sentido das extravagâncias de Picasso e companhia.
Após a Semana de Arte Moderna, período que ficou conceituado como
um dos marcos mais importantes na história cultural do Brasil, foram criadas inúmeras revistas, movimentos e manifestos.
Vários grupos de artistas se uniram com o propósito de exteriorizar esse
novo modelo. Dentre eles, os principais foram: Revista Klaxon (1922) Revista Estética (1924) Movimento Pau-Brasil (1924) Movimento Verde-Amarelo (1924) A Revista (1925) Manifesto Regionalista (1926) Terra Roxa (1927) Outras Terras (1927) Revista de Antropofagia (1928) Movimento Antropofágico (1928)
Em relação as influências dessa Semana para Santa Catarina, esses
reflexos do movimento no estado não foram imediatos, levaram cerca de 30 anos. O historiador Rodrigo Rosa, da FCC (Fundação Catarinense de Cultura), conta que o Estado era considerado referência nas artes no final do século 19. Na literatura, escritores como Virgílio Várzea, Luís Delfino e Cruz e Sousa, eram figuras nacionais, assim como Vitor Meirelles, nas artes plásticas. Porém, segundo Rosa, “Santa Catarina era um Estado provinciano e pouco aberto a novidades”. Durante as duas primeiras décadas do século XX existia uma elite intelectualizada devota às linguagens clássicas, que controlava a entrada de novas ideias em Santa Catarina. “O grupo era fechado a movimentos que pudessem romper com o classicismo. Sendo assim, a Semana de 1922 não repercute em Santa Catarina. São nomes como Altino Flores e Othon Gama d’Eça”, esclarece Rodrigo. A Semana de 1922 não influencia de forma instantânea em Santa Catarina, entretanto, por volta dessa década, surge uma nova geração que trazem maior relevância cultural e intelectual ao Estado. As ideias publicadas na Semana da Arte Moderna, chegam em Santa Catarina na década de 1950, por intermédio do “Grupo Sul”. O grupo era formado por jovens entre 25 e 30 anos, a maioria sem formação acadêmica, com o intuito de modificar os parâmetros tradicionalistas das artes. Algumas das pessoas que faziam parte do grupo eram Salim Miguel, Eglê Malheiros, Armando Carreirão, Silveira de Souza, Ody Fraga, Walmor Cardoso da Silva e Aníbal Nunes Pires. E em um segundo momento, os artistas Martinho de Haro e o escritor Guido Wilmar Sassi, Silveira de Souza e Adolfo Boos Júnior. “Eles adotam uma linguagem mais popular e vão dialogar com os conceitos do eixo Rio-São Paulo”, diz Rosa. O grupo contribuiu, inclusive, para a criação do Museu de Arte Moderna de Santa Catarina, hoje chamado Masc (Museu de Arte de Santa Catarina). Em uma entrevista realizada com Salim Miguel, o escritor constatou que “na época da Semana de 1922, Florianópolis era muito bonita, mas culturalmente estava parada no tempo”. “Os efeitos da Semana foram sentidos imediatamente no Rio de Janeiro e em Minas Gerais, mas levou muito tempo para que as ideias chegassem a Santa Catarina.”
Para Salim, a Semana de Arte Moderna foi um movimento
revolucionário não apenas no meio artístico, mas também impactou o meio político do Brasil da época. A ação do Grupo Sul em Santa Catarina foi ocasionada em vários aspectos artísticos. No teatro, com a montagem de peças de George Bernard Shaw, Pirandello e Sartre. Nas artes plásticas, com exposições de arte moderna em Florianópolis. No cinema, com a criação do Clube do Cinema de Florianópolis, que incentivaria a produção do chamado primeiro longa-metragem catarinense, o “Preço da Ilusão”, de 1958. E, principalmente, na Literatura, com a publicação da “Revista Sul”, que teve mais de 20 edições.