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Modernismo e regionalismo no Brasil Entre inovacao e tradicao Maria Arminda do Nascimento Arruda enraizamento das propostas modernistas no Brasil é, como se sabe, fe ndmeno caracteristico dos anos de 1930, momento no qual se legitimou a nova gramitica das obras e dos estilos, forjada, especialmente, no interior da geragio vanguardista de Sao Paulo no decénio de 1920 (cf. Candido, 2000, pp. 181-198). Os desdobramentos ocorridos ultrapassam os significados usuais que transformagées desse vulto provocam no universo da cultura, ‘uma vez que, muito embora o modernismo tenha sido na origem um fend- meno tipicamente de Sio Paulo, e mesmo do Rio de Janeito, a fixagio dos prinefpios vanguardistas s6 se realizou integralmente com a incorporagio dde outras regides. As mettdpoles sio sempre os locais tradicionalmente de respiracio das mudangas, no entanto, no ambito da literatura, género mais cenobrecido da cultura brasileira até entéo, as inovagées do perfodo fizeram-se sob 0 compasso de princfpios diversos, embora também originais. A semelhanga do ocorrido na Europa, quando as novidades atingiram a sua radicalidade nos contextos mais resistentes a0 estilo moderno de Vida, “no Brasil aconteceu coisa parecida e, descontada a Semana de Arte Moderna ¢ suas consequéncias, foi de fora da metrépole Rio-Sio Paulo que chegou o novo. Do Nordeste, de Minas Gerais, do Rio Grande do Sul, ‘mesmo que em muitos casos a novidade viesse disfarcada de regionalismo” (L. F Verissimo, 2000, p. 21). Malgrado a presenga de certo exagero no tuccho acima reproduzido, pois o modernismo como um movimento amplo Modernismo e regionalismo no Basi: entre inovago e tradigo, pp. 191-212 aconteceu, primeiramente, nas duas capitais, o autor — que esté focalizando apenas a produgao literdria — quer enfatizar a importancia dos escritores ¢ intelectuais da década de 1930 na fxagio dos rumos da cultura no pals Com essa afirmacio, acaba por construir um problema para a reflexio, qual seja, 0 de considerar tanto os motivos responséveis por essa expansio como, a velocidade de sua dispersio, Outra questio, ainda de maior profundida- de, emerge como desenvolvimento necessétio das anteriores; refiro-me 20 deslocamento do centro da produsio literéria, que migra das capitais para outras regides do pais. Nacuralmente, 0 dimensionamento do perfodo na ética da cultura exige o tratamento das alteragGes aparecidas no conjunto das linguagens ¢ ino apenas na literatura: na poesia, no romance, na arquitetura, nas artes plisticas, na produgio intelectual, na musica popular ¢ erudita, & excegio, apenas, da dramaturgia, cuja renovasao aconteceu na década seguinte, Em. uma dezena de anos, transpirou-se nova atmosfera, igualmente tibucéria da criagio de instivuigdes centrais ao desenvolvimento da cultura, como 0 so a universidade, as editoras, as reformas do ensino, as iniciativas culturais do Governo Getilio Vargas, instalado em outubro de 1930, cuja politica dominante seré marcada por um reformismo modernizador, ainda que autoritério, Nas palavras de Antonio Candido, aquele tempo [1 foi um eixo ¢ um cataisador: um eixo em torno do qual gitou de certo modo a cculvura brasileira, catalisando elementos dispetsos para diepé-los numa configuragio nova, Neste sentido, foi um marco histérico, daqueles que fazem sencir vivamente {que houve umm “antes” diferente de um “depois”. Em grande parte porque gerow um movimento de unificagio cultural, projetando na escala da Nagio fatos que antes cocortiam no Ambito das vegies. A este aspecto integrador & preciso juntar outs, igualmente importante: 0 surgimento de condiges para realizar, difundir ¢ “nor- salizat” uma série de aspitayées, inovagSes, pressentimentos getados no devtnio de 1920, que tinha sido uma sementeira de grandes mudangas (2000, pp. 181-182). ‘Tomando-se esta passagem como referencia, é imperioso considerar que a difusio das inovagGes, se foi, sem dhivida, retumbante, nao se fez sempre no prisma dos designios anteriores, especialmente na seara da literatura, ema do presente artigo. O sentimento que ocupou Oswald de Andrade (1890- 1954) ¢ Mario de Andrade (1893-1945), os dois préceres do modernismo paulista, era de franca reserva principalmente em relagio aos romaneistas do Nordeste, os chamados escritores regionalistas. Denominados por Oswald de ‘92 Tempo Social revista de socologia da USP, v.23, n.2 Maria Arminda do Nascimento Arruda Andrade de “biifalos do Nordeste”, 0 eseritor reteve nessa expressio jocosa, para nomear a geragio dos escritores que estrearam na vida lterdtia brasileira ao longo dos anos de 1930, genericamente idensificados como pertencences a0 chamado segundo grupo modernista, todo o seu humor demolidor. Em. entrevista concedida em 1950, 20 modernista c historiador do movimento, Mario da Silva Brito, Oswald afirmou: “Eu fiquei marxista [...]. Abri alas para os biifalos do Nordeste passarem com bandeitinhas vermelhas nos chifres. Porém, com isso, as pesquisas da Semana foram paralisadas ¢ 56 vieram encontrar continuadores em Clarisse Lispector e Guimaraes Rosa” (Andrade, 1990) Singularizados pela dedicagio dominante ao género romance e, em espe- cial, por uma narrativa de cunho marcadamente social, essa geracio foi reco ahecida pelo caréter empenhado de sua escrita, pela condicio de recratistas privilegiados das injustas realidades locais ¢ regionais, pela incorporagio na narrativa dos pobres, dos trabalhadores comuns, dos marginalizados socias, das mulheres, das eriangas. Por essa raz0, 0 modernista refere-se & presenga dos enfeites de colorasio vermelha nos animais. A despeito da dcida ironia, Oswald nao consegue, todavia, esconder a esséncia de seu incmodo em re- lagio aos novos membros do cenrio literdrio brasileiro, como se percebe na alcunha por ele criada e encerrada na expressio: 0 primeito termo sugere um animal carente de leveza, porém potente, reconhecendo a importincia incon- testével dos novos; o segundo qualifica, pois situa a origem nordestina dos animais, berco dos chamados escritores regionalistas, cujas obras obtinham. grande éxito editorial, como José Ameético de Almeida (1887-1980), Gracia no Ramos (1892-1953), José Lins do Rego (1901-1957), Raquel de Queiroz (1910-2003), Jorge Amado (1912-2001), entre outros, Além de originérios da mesma regio, de pertencerem & mesma geragio literdria, de nucrirem visbes politicas assemelhadas, eram herdeitos de experiéncias sociais comuns, por serem descendentes de familias da ete agrétia em franco processo de de- clinio. Oswald ainda revelava a percepgio de que 0 momento no apenas se diferenciava do anterior como, sobretudo, se afastava das propostas construt- das pelo grupo dos modemistas de Séo Paulo, responséveis pela organizagio. da Semana de 1922, ¢, em especial, por ele préprio ¢ por Mario de Andrade. No por casualidade, Mario de Andrade expressou, anos antes, a cons- ciéncia trdgica nutrida no sentimento de superasio de suas concepsées a respeito da renovagio cultural da qual se considerava pioneiro. Em “Elegia de abril”, de 1941, o eseritor de Sao Paulo revelava plena consciéneia de que suas propostas vanguardistas, entendidas do angulo da experimentagio rrovembro. 2011 Modernismo e regionalismo no Basi: entre inovago e tradigo, pp. 191-212 da linguagem, haviam sido deslocadas pelo compromisso assumido pela nova geragio com a realidade brasileira: “Nem mesmo o nacionalismo que praticévamos com um pouco maior largueza que os regionalistas, nossos antecessores, conseguira definir em nés qualquer consciéncia da condigio intelectual, seus deveres para com a arte ¢ a humanidade, suas relagdes com a sociedade eo Estado”. E mais adiante: ‘Uma geragio de degeneragio atistocritica, amoral, gozada, e, apesar da revolugio modernista, nio muito distante das geragies de que ela era o “sorrso” final. Eteve sempre o mérito de proclamar a chegada de um mundo novo, fazendo © moder nismo e em grande parte 1930. Ao passo que as geragées seguintes, jé de outro e mais bem municiado tealismo, nada tém de gozadas, sio alevantadas mesmo, ¢ jé bbuscam o seu prazer no estudo e na discussio dos problemas humanos ¢ néo no prazer (Andrade, 1941, p. 16) Anteriormente, em 1936, em carta dirigida a Murilo Miranda, diretor da Revista Académica, praticamente justifica-se pelo no engajamento politico da sua obra: Fiz fago “arte de agio”, como bem desde mais de dez anos venho tepetindo aos ami- gos, em cartas, ¢ até jf em artigo. Mas pros amigos da minha geragio, essas palavras serio mais ficeis de compreender do que para vocés, gente do apés-guerra. Minha “aso” se confinow ao terreno da arte porque, conformado numa geragio e num fim de século dilerantes, sou um sujeito visceralmente apolitico,incapaz de acivudes poll- ticas, covarde diante de qualquer agio politica (Andrade, apud Bueno, 2006, p. 59) Na verdade, os dois mais auténticos representantes das vanguardas modernas no Brasil comungavam do sentimento comum de que os roman- cistas da década de 1930 nao s6 haviam promovido um retorno 4 ordem, distanciando-se das propostas que os primeiros haviam encarnado, como representavam a nova geracio dos consageados. Nao lhes escapa, por fim, a nostalgia da percepcio de que faziam parte de um passado. Inclusive por isso, Maio de Andrade adere a certo descompromisso de sua arte, acentu- ando a crenca na superioridade dessa condigio do artista; finalmente, dilui ‘um problema real: a viabilidade de profissionalizagio dos novos, em fungio, do processo de constituigéo do mercado cultural (cf. Miceli, 1979, cap. 2) A despeito do modo como foi reconhecida pelos seus antecessores, & certo que a gerasio modernista de 1930 se distinguiu por conseruir “uma 496 Tempo Social revista de socologia da USP, v.23, n.2 Maria Arminda do Nascimento Arruda Visio exftica das relagies socials”, manifestando-se no “romance empenhado desses anos fecundados para a prosa narrativa” (Bosi, 1977, pp. 436-437) Nesse novo contexto da literatura moderna no Brasil, ocorreu uma mudanga, de inclinagéo no modernismo, capaz de delimiar duas fases: “enquanto na primeira a énfase das discusses cai predominantemente no projeto estético (isto é, 0 que se discute principalmente é linguagem), na segunda a énfase é sobre o projeto ideolégico (isto é, discute-se a fungio da literatura, o papel do esctitor, as ligagées da ideologia com a arte)” (Lafeté, 1974, p. 17). A “vanguarda em diluigio”, para continuar no universo de reflexio de Joio Lafeté, se nio significou ruptura com os prinefpios modernistas, introduziu, segundo o autor, uma tensio no ambito do projeto estético, ou, de acordo. com seus termos: As dua fases no softem solugio de continuidade: apenas, como dissemos ards, © 0 projeto estético, a “revolusio na literatura”, éa predominante da fase heroica, “aliteratura na revolugio” (para utilizar o eficiente jogo de palavras de Cortéza, © projeto idcoldgieo, é empurrado, por certas eondigées politica especiais, para © primeito plano nos anos 30 (Idem, p. 19) A visio de Joxo Lafets filia-se & mesma vertente de interpretagio dos anos de 1930, desenvolvida por scu mestre Antonio Candido, configurada nas nogies de rotinizagio de difusio do modernismo. Segundo um registro informado por outras concepgécs, a literatura dos anos de 1930 reproduz, com tonalidades diversas, a estética naturalista que vigorou no ambiente oitocentista finissecular, cornando escritores como Oswald de Andrade ma- nifestagio pontwal de uma literatura caracteristicamente identificada com 0 naturalismo (cf. Sussckind, 1984, p. 42). Deixando de lado o distanciamento das posigées, nao hé como negar [.-] que esse aparentemente pequeno deslocamento de sentido pode ser entendido de outra forma: como demonstragao de um afastamento dos projetos de cada ge raglo, ¢ ndo de sua aproximagio. Pensar que 0 modernismo é uma arte wtépica € ‘© romance de 1930 & uma arte pés-ucdpica pode ajudar a esclarecer como isso se dé (Bueno, 2006, p. 66) Hé uma questio central, no entanto, que se refere ao tratamento dessa literatura, revisitada, como é 0 caso, em perspectiva sociolégica, A conside- rasSo da diversidade interna ao modernismo, nessa perspectiva, guia-se pela rrovembro. 2011 Modernismo e regionalismo no Basi: entre inovago e tradigo, pp. 191-212 construgio de problema de outra natureza, acentuando o Angulo da visio que busca explorar como a vida social pulsa, conforma e prefigura a produ- io literdria no periodo, Nesse sentido, essa cultura modernista identificada com bandeiras sociais,o seu “projeto ideol6gico”, espelha um modo como os intelectuais brasieiros situaram-se diante das fundas transformagées do pals, como construfram por forga de suas ages e de suas escritas novas modalida- des de exercicio da atividade, como se legitimaram, como criaram um campo proprio de praticas que pressupés a articulagio da obra com a politica. Em termos explicitas, o fendmeno da “vanguarda em diluigio” é por certo central a0 eritico da liceratura; para o socidlogo sua importéncia advém do cariter de revelar as formas pelas quais a cultura expée situagées sociais. Independentemente da maneira como se compreendem aqueles anos, se “hé um novo modernismo a partir de 1930 ~ modernismo que conclui a metamorfose para o modemno ¢ assume as suas opgées sociais [..] em lugar da gratuidade estética de que até entio tinha vivido” (Martins, 1978, p. 497), hé um cendrio renovado nas letras brasileiras, Na modelagem da cena, os chamados escritores regionalistas so as personagens principais do procénio. A nova geragio de romancistas, do Nordeste em particular, ‘mas também de outras regiées, ser4 os fautores da inovagio, revelando um deslocamento do eixo da nova produgioliterdtia modernista no Brasil. Essa €a questio central da minha reflexéo: entender deslocamento do centro criativo do movimento modernista do micleo originério— So Paulo —e da capital intelectual ~ Rio de Janeiro — para as margens do campo cultural, Pernambuco, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, regises que passaram a dara modulagao da literatura brasileira, tema a que me dediquei a partir do trata- mento da experiéncia modernista mineira (ef. Arruda, 1990); compreender os caminhos trilhados pelo modernismo no Brasil, endo em vista analisar os rumos da cultura moderna entre nés, apreendidos no prisma da capacidade desses autores em modelar futuras dieses; perseguir as relagées entre as narrativas e as experiéncias sociais nas quais esses escritores estavam imersos; revelar como construfram imagens duradouras do Brasil no transito da crise das relagées tradicionais e consequente emergéncia dos valores modernos; buscar as conexses estabelecidas entre 0 tecido cultural ¢ 0 processo de modernizagio do pais. Com isso, néo se pretende desconsiderar “o trabalho de leitura interna ou da correspondente interpretagio”, substituido por uma visada restrta as “suas condigdes pragméticas” (Altamirano, 2007, p. 14), mas pensar a produgio dos textos como uum ato de construgao situado socialmente, contornando a disjuntiva texto-contexto que diz respeito, em 496 Tempo Social revista de socologia da USP, v.23, n.2 Maria Arminda do Nascimento Arruda suma, a um falso problema. Ambos os gestos (de criagao e de interpretagio) so sempre interessados, pois derivam de matrizes construfdas pela vivencia dos sujeicos ‘A prépria afirmagio da permanéncia dos tracos modernistas originais na getagdo seguinte encontra-se embebida do projeto de uma intelectualidade ilustrada e, 20 mesmo tempo, moderna, que deitou suas rafzes na cultura da inovacio, entrelagando-se ao legado das propostas avangadas das quais se considera legitima herdeira. A continuidade pretendida a faz, assim, parti- cipante de uma tradicao sélida, mundialmente dominante e vigorosamente resistente aos impulsos passadistas que alguns teimam reviver, apesar de sew cardter relativamente recente na histéria do Ocidente. No caso especifico de realidades como a brasileira, cujo trinsito para. moderno reatualiza as relagées tradicionais, esse ¢ um dos motivos a explicar como o modernismo_ torou-se 0 cinone da cultura no Brasil, produzindo um eftito de avango ao menos no interior da producio intelectual ¢ artistica. Personalidades ilustradas ¢ marcantes como Gilberto Freyre ¢ Antonio Candido foram formuladores centrais na cristalizagio dessa imagem, nublando as contri- buigdes do passado. Todavia, néo ¢ necessario obscurecer a heranga modernista origindria de 1920, que de fato foi marcante, para apontar a diversidade ovorrida no perfodo posterior: [J 0 romance de 30 se define mesmo a partir do modernismo e certamente no poderia ter tido a abrangéncia que teve sem as condigbes que o modernismo con- {quiscou pata o ambiente literitio e intelectual do pats, No entanto, 0 afascar-se da ‘ucopia modernista, erminou por ganhar contornos préprios que, de certa forma, 6 seriam retomadas pela fics brasileira do pés-64, também dominada pelo desencanto (Bueno, 2006, p. 80) A autonomia adquirida por esse romance produaiu, nesses termos, um mo- vimento cheio de consequéncias, uma vez que, segundo 0 autor, se espraiow para os diversos ramos, num movimento que se expressou no cinema, na cangio popular, mesmo nas telenovelas da Globo, erigindo, assim, uma espécie de tradigio (cf. Idem, p. 27) Desse modo, o dimensionamento da vida intelectual e artistica no Brasil do século XX pressupée tratar desse momento, pois af se gestaram os rumos da moderna cultura brasileira, expressos na combinagio de um espirito modernista com a construgio de retratos do pais; de um pensamento ¢ uma rrovembro. 2011 Modernismo e regionalismo no Basi: entre inovago e tradigo, pp. 191-212 arte presos as amarras da formagio da nagio moderna. Nesse andamento, a linguagem das vanguardas vicejou entre nés afirmando nossas particu laridades; em sincronia com os projetos de modernizagio destacou nossas singularidades, tecendo os ligamentos entre a cultura ¢ a modernizacio. Daf a identificagéo da linguagem modernista com a expressio nativa. A chamada “construgio nacional” deu ao modernismo brasileiro “condigio particular’, expressa numa modalidade atrevesada de ser “modernista sem o set” (Baptista, 2005, pp. 60-66), evidente nas obras ensaisticas da década de 1930, dos chamados *intéxpretes do Brasil”: Gilberto Freyre (1900- 1987) com a publicagio de Casa-grande e senzala, em 1933; Caio Prado Jlinior (1907-1990) coma obra Evolugto polivica do Brasil, em 1934; Sérgio Buarque de Holanda (1902-1982) com o livo Ratzes do Brasil, em 1936. Hi nfcido enteecruzamento entte 0 romance empenhado dos anos de 1930 © 08 ensaios de interpretagio, revelando o substrato comum que permeia todas essas expressées; uma espécie de condensagio daquela histéria nas linguagens da cultura Para o tratamento desse problema de fundo, 0 romance regional da década de 1930 é fonte privilegiada. Nesse sentido, a andlise de tajetsrias, exemplares permite que se caracterize adequadamente a questo: José Lins do Rego, paraibano/pernambucano; Erico Verissimo, gaticho; Lticio Car- doso ¢ Cyro dos Anjos, mineiros. Apesar da presenca de certa liberdade inerente a todo critério de escolha, a selegao nao ¢ arbitréria, uma ver que cesses autores no apenas se situam entre os mais representativos do periodo, como sio provenientes dos estados brasileitos possuidores de construgées culturais integradas ¢ densas, correspondendo aos trés regionalismos mais claborados no Brasil e que sio formulagées culturais distintas: a pernambu- cana caracteriza-se pela introversio; a gaticha pelo isolacionismo; a mineira pela integragio & nagio (cf. Arruda, 1990, cap. 2). A sazio de serem dois mineiros ficard explicita a seguir. Trata-se, nesses termos, de indagar acerca das modalidades de relages entre esses sistemas culturais regionais e a literatura em questio. A rigor, a existéncia de certo descentramento geogréfico da cultura no Brasil resultou. da prépria formagio do pals, uma vez que a dispersio geogrifica da atividade econémica produziu a tendéncia 20 carster autérquico das regiSes; & perda de dinamismo corresponde “um lento processo de atrofiamento” que se constitui a dinamica mesma “de formacio do que no século XIX viria a sero sistema econémico do Nordeste brasileiro (..J. A estagnago da produgio agueareira no criou a necessidade ~ como ocorreria nas Antilhas — de emigracio do ‘9 Tempo Social revista de socologia da USP, v.23, n.2 Maria Arminda do Nascimento Arruda excedente da populagio livre formado pelo crescimento vegerativo desta” (Furtado, 1963, pp. 7: 0 em Minas Gerais, quando ao declinio da produgio do ouro seguiu-se )-80). O mesmo aconteceu com a crise da minera- “uma répida e geral decadéncia [..]. Todo o sistema se ia assim atrofiando, perdendo vitalidade, para facilmente desagregar-se numa economia de sub- sisténcia (Idem, p. 104). No Brasil nao se deu o movimento da substituigio da atividade dominante, ou do aprofundamento da regionalizacéo de forma a estabelecer as bases futuras de outtos paises, como foi o caso da América espanhola. “Essas distintas regiées viviam independentemente ¢ tenderiam provavelmente a desenvolver-se, num regime de subsisténcia, sem vinculos de solidariedade econémica que as articulassem. A economia mineira abriu ‘um novo ciclo de desenvolvimento para todas elas” (Idem, p. 96). Durante 0 século XVII, a sociedade mineira foi responsével pelo aparecimento de um. ciclo dinamico interno, criando condigées para a preservagio das formas de sociabilidade gestadas nas outras regides. Como nao se supcravam as antigas relagGes, elas tendiam a cristalizagao; reside justamente af a substincia social do desenvolvimento dessa literatura. Analisar © modernismo na perspectiva de seu enraizamento e difusio cexige, pois, tratar da linguagem ficcional concebida nesses contextos tradi cionais, que foram os polos de ieradiagio de uma literatura nova que matearé as letras brasileiras a0 longo do século, Dito de outra mancira, alinguagem. licerdtia € a expressio intelectual dominance dessas regides, 0 género por cexceléncia da consagragéo ilustrada, mas, ao mesmo tempo, manifestacéo da permanéncia dos estilos pretéritos. Sintoma de pouco dinamismo cultural, concomitantemente signo de cristalizagio, Se se considera que a decantagio da linguagem é principio da literatura, dado o cardter de género letrado ¢ dependente, em principio, de acesso diferenciado 4 educagio formal, os condicionamentos sociais da profissio de escritor estio dados. Os escritores modernistas nasceram, em sua grande maioria, em familias de elite, inde- pendentemente do declinio do nticleo familiar ou de serem filhos dos ramos empobrecidos das camadas dominantes. Essa condigio tipificou ambas as geraces, mas com intensidades diversas. Em Sio Paulo, Oswald de Andrade, por exemplo, era herdeiro de grande fortuna. “Embora quase todos os escritores modernistas sejam originarios de ancigas familias dirigentes elas se distinguem entre si no tanto pelo volume do capital ccondmico ou escolar, mas pela proximidade relativa de suas familias em relagio & fragdo intelectual e politica da classe dominance ¢, por conseguinte, pelo grau de conservagio ou dilapidacao de seu capital rrovembro. 2011 Modernismo e regionalismo no Basi: entre inovago e tradigo, pp. 191-212 de relagdes sociais.” Bram, na sua maioria, uma geragZo que se pensava composta por “homens sem profissio” (Miceli, 1979, pp. 24 € 35). 0 grupo seguince jé provinha de familias ambientadas na longa experiéncia de declinio, com a modorra secular de suas regides, ¢ cuja sobrevivencia encontrava-se francamente questionada pelo ritmo intenso da modernizagio. do pats, desestabilizando o antigo equilibrio. Nessa geragio, contornou-se a perda de posigio social por meio da insergéo generalizada nos quadros da bburocracia ptiblica, em franco reapatelhamento, 0 que os levou a cultivar relagées de intimidade com os circulos imediatos do poder (cf. Idem, cap. 3) © poeta mineiro Carlos Drummond de Andrade assim expressou a condicio do intelectual burocrata (© emprego do Estado concede com que viver, de ordindrio sem folga, ¢ essa é condigéo para bom nimero de esptitos:certa mediania que elimina os cuidados imediatos, porém néo abre perspectivas de écio absoluto (..]. A Organizagio buroctitica situa-o, protege-o, metancoliza-o ¢ inspira-o. Observe que quase toda literatura brasileira, no passado como no presente, é uma literatura de funciondrios piiblicos (Drummond de Andrade, 1973, pp. 841-843), Esses “cronistas da casa assassinada’, para retomar a feliz expressao de Sergio Miceli, aludindo & obra mais marcante do mineiro Liicio Cardoso, puderam. dedicar-se literatura, até porque se liberaram das constrigGes da sobrevivéncia ese libertaram de uma rotina intensa c estafante caracteristica do trabalho integral. As diferengas entte as geragbes acabavam por espelhar vivencias sociais distintas, nascidas no Ambito de experiéncias de classe que alteravam, os projetos de cada uma. Independentemente do fato de ter havido virios modernistas paulistas originados de ramos declinantes das elites, diga-se de passagem, de uma cafeicultura de nitido corte empresatial, a realidade de Sao Paulo era inequivocamente ascendente e apontava para 0 futuro; a existéncia das outras regides era ocupada pela modorra da “vista besta”, pata lembrar 0 verso drummondiano, nublando a efetividade dos projetos, No sul, centava-se o emparelhamento com a arte europea, insstindo-se na fur clamentagio basicamente estética € reprimindo-se, com isso, qualquer surto de veleidade regionalista, em principio, Buscava-se uma arte urbana, talver porque Séo Paulo quisesse se firmar como criagio deste século 20 e de outros futuros, nio de anteriores, Auroimagem pretensiosa e obnubilada, sem diivida, mas que apro veitava a vaidade dos cafeicultores transoceiicos, ao mesmo tempo em que jogava ‘200 Tempo Social revista de socologia da USP, v.23, n.2 Maria Arminda do Nascimento Arruda para baixo do tapete uma heranga hist6rica ral ot mal conhecida e trabalhada, se comparada com a do Rio para cima (Dimas, 2003, pp. 334-335). E bem verdade que 0 modernismo de Sio Paulo nao estava isento de contradigées, como bem o mostra a mescla de atraso ¢ prine(pios fututistas, embora apenas as dimensdes avangadas tivessem sido destacadas, aquelas adequadas & visio do progresso da burguesia industrial nascente (cf. Fabris 1994, p. 31). Tal contexto nao acontecia, no entanto, em outras regides, que modula- vam uma literatura diversa, respondendo por uma fiegSo regional de outro ‘matiz: ora permeada de uma cultura dos sentimentos, da meméria, como em. José Lins do Rego, e intimista, como em Liicio Cardoso e Cyro dos Anjos; ora entranhada de uma linguagem com fortes tragos sociais, como em José Américo de Almeida, Graciliano Ramos, Raquel de Queiroz ¢ Jorge Amado; ora ainda insinuada em obra que reconstitui a saga da regizo, como em Erico Verfssimo. No conjunto, a cultura letrada brasileira daquele momento vice java no solo das tradigées fatigadas, construindo um espago comum entre os ensaios e a ficcio da década de 1930. Com a chegada da linguagem moder- nista ao ensaio, sincronizou-se o problema da reflexao ~ a crise da sociedade € a viabilidade de insergio do pais no cendrio da modernidade, cuja formagio histérica escapava a0 padrio ~ com a forma da expresso, a0 se romper com. a norma culta portuguesa. Os chamados intérpretes beberam nas fontes do modernismo ao ajustarem a visio orientada para as nossas particularidades, focalizada na aceitacio da nossa diversidade, afastando-se do pensamento anterior que nos espelhava na modernidade hegeménica. Hié forte homologia entre a ficgio do perfodo ¢ a producéo intelectual, particularmente entre a obra de Gilberto Freyre eos romancistas do Nordeste. O novo momento do pals fez germinar uma cultura menos da experimentagio ¢ mais consentinea com as agudas realidades locais, revelando as relagies entre a literatura e a histéria inteleceual [Na sequéncia dos argumentos aqui explicitados, esses romancistas permi- tem analisar o curso da cultura moderna no Brasil, uma vez que combinaram. 0s tragos da linguagem criada no decénio de 1920, afinada com a oralidade do idioma portugués no Brasil, expresses nutridas no transito da crise da sociedade tradicional submetida ao impacto da modernizacao. Em termos ais explicitos, as relagGes entre o modernismo ea modernizacio no Brasi {que jé na origem das vanguardas curopeias apresentavam convi embora brotassem do mesmo chao histérico, alargaram os deslocamentos, rrovembro. 2011 Modernismo e regionalismo no Basi: entre inovago e tradigo, pp. 191-212 estabelecendo uma combinagio entre dominio social da tradigao e renova- ao cultural. Naturalmente, a histéria do perfodo entranhou diversamente as obras. Certamente hé distingdes ponderdveis entre escritores como José Lins do Rego, Lticio Cardoso, Cyro dos Anjos ¢ Erico Verissimo. Apesar dos afastamentos, as aproximagées so igualmente marcantes. A prosa de ficgfo encaminhada para o “raliemo bruto” de Jorge Amado, de José Lins do Rego, de Erico Verisime ¢, em parte, de Gracilano Ramos, beneiciow se amplamente da “descida” & inguagem oral, aos braileirisemos ¢ regionalismas léxicos ¢ sintéticos, que a prosa modernista tinha preparado. E até mesmo em diregbes que parecem expiitualmente mais afastadas de 22 (0 romance intimista de ‘Ordvio de Faria, Licio Cardoso, Comnélio Pena), sentese 0 destecalque privolégico “frcudiano-surtealista’ ou “Yreudiano-expressionista’ que também chegou até nds com as Aguas do moderismo (Bosi 1977, pp. 431-432). Ou seja, no plano das aproximagées, o modernismo criou o lastro comum a todos cles, rornando as diferengas o repositério de uma cultura comumente sedimentada. No conjunto, pode-se afirmar a cxisténcia de um universo compartilhado por um tecido histérico de grande semelhanga, manifesto nos temas retrata- dos por esses romances: a crise do Brasil adicional no curso de constitui- so da modernizagio da sociedade é apreendida no prisma da decadéncia social das familias patriarcas, A tensio resultante € agravada nos contextos de estruturas sociais enrijecidas pela falta de dinamismo da realidade local, incapaz de produzir saidas para os impasses que permanecem cm constante suspensio, Até por isso, a forma pri ilegiada da linguagem sé poderia ser © romance, género mais adequado para expressar os dilemas da formagio. dos valores modernos em sociedades como a brasileira, que convivem com padrées normativos muito heterogéneos ¢ que nao se excluem. Por essa r220, essa literatura é fonte privilegiada de acesso as transformagées transcorridas naqueles anos decisivos de gestagio do Brasil moderno, ‘O chamado romance regionalista, diga-se de passagem uma denominagio bastante imprecisa, resultou da combinagio entre © modernismo, que se forjow na assimilacdo da nossa oralidade e se legitimou no compromisso com a realidade brasileira, Nesse diapasio, as regides dos eseritores da geragio. de 1930 manifestaram com forca 0 drama em curso. Do encontro entre essa realidade repleta de material dispontvel a ser ficcionalizado e uma elite lecrada impregnada das novas propostas, emergit a literatura indelével desses ‘202 Tempo Social revista de socologia da USP, v.23, n.2 Maria Arminda do Nascimento Arruda escritores embebidos na trama de seu tempo. A partir dat, o lugar da inovagio liceréria migra do bergo do modernismo que foi Séo Paulo para alojar-se em outras paragens. A linguagem moderna em Sio Paulo desloca-se para distintos campos expressivos, como o das artes plisticas, da dramaturgia, da critica moderna, da ciéncia, fragmentando-se e especializando-se, como analisei no livro sobre a cultura paulista do pés-guerza (cf. Arruda, 2001) Colocado em xeque o passado préximo, urgia consttuir de ver a are brasileira luz de uma consciéncia politica, que punha em primeiro lugar o Brasil “real” € no mais a projegio utépica do inicio dos anos 20, na qual o futusismo havia dlesempenhado um papel fundamental como exemplo de agio ¢ como explicitagio de uma modetnidade positiva, enfeixada na imagem emblemética de Séo Paulo Cabris,1994, p. 285) |Até por isso, a linguagem literéria de Sao Paulo teria que mirar outros horizontes. Dessa forma, a renovagio literdria do decénio de 1930 nao estd isenta de ser entendida como cristalizagio modernista, até mesmo como natura- lismo, porque com cla a experimentagio da linguagem arrefeccu. Todavia, a despeito da “velha briga entre os modernistas ¢ 0 movimento regionalista de Recife”, para um autor como José Lins do Rego, “muito provavelmente nfo seria possivel a ele obter tamanha popularidade sem a existéncia de Macunaima ¢ do modernismo como um todo” (Bueno, 2006, p. 62). Os quatro romancistas selecionados sio significativos das imbricagées esta- belecidas entre sua geracio ¢ as vanguardas modernistas precedentes; si0 ilustrativos das vias convergentes entre a literatura e 0 contexto histérico. mais amplo: sio, enfim, paradigméticos dos rumos da cultura moderna no Brasil, tendo em vista que codificaram os procedimentos formais de conversio da linguagem modernista na feitura de retratos da realidade social-histérica do pats. Apesar de os escritores destacados apresentarem marcantes diferengas, como jé se assinalou, existe um taco comum a uni-los revelado nas perso: ragens que criaram, a condigio de seres impotentes ¢ tragados pela forga das circunstancias adversas. A distancia, apesar da proximidade, entre os modernistas ¢ os romancistas de 430; apesar da distancia, entre “socials” ¢ “intimistas’; ambas as coisas podem ser mais bem sentidas se projetadas numa figura a que romance de 30 dedi- rrovembro. 2011 Modernismo e regionalismo no Basi: entre inovago e tradigo, pp. 191-212 cou toda a sua energia de criagio, o fracassado, Néo & & toa que o primeira a apontar a recorténcia dessa figura, para reprovéla, seja um modernista, Métio dle Andrade (Idem, p. 74). ‘Como o autor alude, a condenacio do mestre do modernismo brotava de apostas diversas a respeito do pals; as personagens concebidas pela segunda geragio sio batidas pela derrota. No entanto, ajustaram melhor as lentes pata apanhar os conflitos e hesitagies provenientes, quer da resisténcia de modos de vida do passado, quer do impacto da mudanga sobre essa reali- dade carente de recursos para assimili-la, Daf o eixo dessa literatura girar em torno da ficcionalizaso do mundo agririo, centrando-se na decadéncia das familias patriarcais, nos deserdados daquele universo em desintegragio. privilegiamento das relagdes agrétias na construgio da cultura no Brasil caminha, como se sabe, a0 longo dos decénios seguintes, mesmo quando a sociedade brasileira jé era inequivocamente urbana e industrializada. © aparente descompasso remete & particularidade da cultura enquanto lin. guagem social, isto é, as conexdes no se traduzem de modo simples. Ao tratar da crise do Brasil tradicional, essa literatura produziu a melhor ficgéo do periodo, porque construit figuras situagées que ultrapassam o registro imediato. As obras de José Lins do Rego, Erico Verissimo, Lticio Cardoso € Cyto dos Anjos sao exemplares nesse sentido assinalado, ‘O nordestino José Lins do Rego, descendente de familia agréria em mo: vimento de descenso social, com 0s romances Menino de engenho de 1932, Doidinho de 1933, Bangué de 1934, Usina de 1936, Fogo morto de 1943, completa 0 chamado cielo da eana-de-asicar, que tata, por meio da meméria de Carlos de Melo, personagem principal que percorre 0 conjunto desde a in- fincia atéa idade adulta, da crise dos engenhos com a emergéncia da moder- nizacio introduzida pelas usinas. Narrado na primeira pessoa, o primeirolivro & sobretudo, uma espécie de autobiografia de cenas da infincia, Pertencente ao género dos romances de formasio, a narrativa memorialistica do ciclo coroa-se com Fogo morto, quando ocorre a convergéncia dos componentes essenciais de toda a obra do autor, na qual as personagens vivem o drama da impossibilidade de romper com a forga de uma realidade injusta, que se impoe a todos como se estivessem presos num citculo de ferro. Os romances de José Lins do Rego reproduzem a oralidade da cultura do Nordeste, numa obra de forte carga afetiva, permeada por uma expressividade de raiz emoti- va, nutrida no solo da meméria. Por essa raz3o, combinam as caracteristicas do romance social aos tragos de uma literatura dos sentimentos, gerados na 204 Tempo Social revista de socologia da USP, v.23, n.2 Maria Arminda do Nascimento Arruda opressio do mundo, em sineronia com um contexto de crise uma experién- cia de decadéncia social. A literatura de José Lins do Rego € triburéria da geragio reunida no ‘Movimento Regionalista ¢ Tradicionalista, organizado por Gilberto Freyre quando retornou do exterior, ¢ que promoveu o Congresso Regionalista, em fevereiro de 1926, do qual resultou o decantado Manifesto Regionalista cuja primeira publicagio ocorreu apenas em 1952. Independentemente de a edigio corresponder ao que foi de fato discutido, pois sabe-se que Freyre costumava reescrever seus textos em fungio das circunstincias, 0 mais significativo ¢ apontar 0 quanto essa iniciativa permeou a obra dos partici- pantes, como a do préprio José Lins do Rego. Chama atengio a afirmagio de fé, presente no Manifesto, de que nao hé “regio no Brasil que exceda o Nordeste em riqueza de tradigdes ilustres ¢ em nitidez de cardter. Varios dos seus valores regionais tornaram-se nacionais depois de impostos aos ‘outros brasileiros menos pela superioridade ccondmica que o agicar dew a0 Nordeste por mais de um século do que pela sedugo moral e pela fasci- nagio estética dos mesmos valores” (Freyre, 1976, p. 57). Apesar de o texto ter sido editado depois do éxito dos romancistas do Nordeste, é evidente a estetizagio da regiéo, bem como a operagéo de superar a desvantagem, econdmica por intermédio da riqueza cultural. As relagées entre Gilberto Freyre ¢ José Lins do Rego eram de franca in- timidade e de miitua cooperagio. Além de o romancista ser participante do Movimento Regionalista, era um jornalista conhecido em Recife e estavaliga- do a vitias iniciativas de renovagio literdtia quando Freyte retornous ao Brasil. Arelagio entre ambos foi central ao jovem sociélogo que aportava na cidade, depois de anos no exterior, sem lagos com a jovem intelectualidade local. © escritor nao apenas organizou, juntamente com José Amético de Almeida, a primeira viagem ao sertio nordestino do intelectual cosmopolita, como es- creveu o preficio de Ingleses livro de Freyre (cf. Butke, 2005, pp. 239 ¢ 416) Posteriormente, José Lins do Rego tinha no amigo uma fonte de exaltagio de sua obra, como se percebe anos depois na opiniso do socidlogo de que 0 considera uma “espécie de William Falkner brasileixo” (Freyte, 1947, p. 293) Essas relagGes,alids, desdobraram-se para o campo das edigées. Foi José Lins do Rego que apresentou Gilberto Freyre ao editor José Olympio, que publicou Casa-grande esenzala em edigao esmerada. © romancista apresen- tou Graciliano Ramos ¢ Raquel de Queirés 20 editor, apés estabelecer lagos de amizade com os dois escritores quando conviveu com eles em Maceis, no inicio dos anos de 1930 (cf. Chaguri, 2007, cap. 2). A editora, fundada rrovembro. 2011 Modernismo e regionalismo no Basi: entre inovagoe tradigo, pp. 191-212 em 1934, ser4 a avalista da nova geragio dos modernistas que comporio seu catélogo de langamentos, como Jorge Amado, Manuel Bandcira, Carlos Drummond de Andrade, Guimaraes Rosa ¢ tantos outros (cf. Hallewell, 2005, pp. 415-482). José Lins do Rego foi figura central de atragio dos novos, tendo, apés a transferéncia na condigao de funcionatio piblico para © Rio de Janeiro, papel de congregar o grupo, pois mantinha uma mesa cativa na livraria para a qual afluiam os escritores ¢ intelectuais da capital, para a conversa de fim do dia. Dessa forma, o chamado romance regionalista, ganhou expressio piiblica com a aposta de José Olympio na nova geragio, acrescida da promogio de José Lins do Rego, 0 primeiro a virar autor da instituigao, por eles denominada de “casa”. A ppresenga das novas editoras foi decisiva na transformagio do ambiente cultural do Brasil na época. Foi com a fundagio efetiva da Editora Globo, que em 1928 passou a publicar regularmente, que o Sul ¢ particularmente Porto Alegre ganharam cspago ¢ importincia na csfera da producio de livros ¢ de promosao de novos autores. Erico Verissimo serd figura central quando se tornou, em 1932, diretor da Revista Globo, a convite do filho do proprietério, transformando-se em editor profissional. O jover eseritos, filho de uma familia decadente do interior gaticho, reorientard a politica edivorial da casa, que passaré a waduzir os cissicos da literatura ocidental, tornando-se uma instituigio nacionalmente conhecida. Em texto escrito no fim da vida, Verissimo relembra as dificuldades de um empreendimento desse porte na provincia e as opgies de publicagSo: “os melhores escritores nacionais preferiam ser langados por editoras cariocas ¢ seria impossivel — fil! — querer ‘destronar’ o nosso amigo José Olympio, o editor que entio langava escritores brasileiros novos, muitos dos quais jé se haviam tornado famosos em todo o Brasil” (E. Verissimo, 2000, p. 307). Mas a editora péde contar com excelentes tradutores, em fungio do grande nimero de imigrantes que afluiram para o Rio Grande do Sul ede incelectuais foragidos do nazismo, como Herbert Caro (cf. Dimas, 2005-2006, pp. 282-289). Com a Revolugio de 1930, 0 Rio Grande do Sul ganha espago politico ¢, consequentemente, os intelectuais gatichos puderam galgar posigées na burocracia ilustrada do Estado (ef. Idem, pp. 389-414). O ambiente cultural de Porto Alegre projetou-se com a presenga dos conterrineos na capital, a exemplo do eseritor modernista e erftico literério Augusto Meyer (1902-1970), que foi indicado por Getilio Vargas, em 1937, para organizar © Instivuto Nacional do Livro. Apesar da origem alema, Meyer era jé co- nhecido como poeta ¢ escritor regionalista, um membro das rodas letradas 206 Tempo Social revista de socologia da USP, v.23, n.2 Maria Arminda do Nascimento Arruda da Livraria Globo e amigo dos poetas modernistas Mério Quintana e Raul Bopp: com a nomeagéo passa a frequentar as rodas letradas da capital, sendo uma figura de proa a apoiar os conterrineos no centro da cultura, A partir da profissionalizacio da atividade editorial, introduzida pela Globo, beneficiaram-se os escritores locais, herdeiros da tradigao da literatura gau- chesea, que teve sua expressio mais acabada com Contos gauchescos¢ lendas do Sul, de SimBes Lopes Neto, publicados em um tinico volume, em 1926 (cf. Martins, 1978, p. 380). Essa literatura distingue-se por recuperar a linguagem dos pampas, de dificil acesso ao leitor pouco familiarizado com os termos locais, A tradigéo gauchesca distingue-se da literatura correlata, proveniente dos escritores nordestinos ¢ mineiros, na qual a personagem éa do sertanejo €a do jagungo, figuras moldadas em realidades muito diversas. A wadicio literéria do Sul encontrou na obra de Erico Verissimo sua mais significativa expressio. Até a publicagio da tilogia O rempo e o vento, Erico Verissimo é consi- derado um “escritor popular no Brasil”, salienta em 1945 0 jovem critico Antonio Candido, quando estreava na critica literdria. Discordando do juizo corrente, o jovem exitico 0 considera “um verdadeiro romancista, um hhomem que nasceu para isto”. Mas, logo em seguida, pondera: [..] mora sossegado na sua provincia, e ngo foi para capital busear emprego nem. consagragio. O seu encanto ver muito deste aspecto provinciano, aque raramente se resignam os intelectuais e que contribui certamente para a sua simplicidade, para a naturalidade quase familiar das suas relagbes com of leitores. De certo foi este afsstamento dos grandes centtos literdtios que the permiciu a aticude desassom. brada de escritor para © povo, escitor acessivel que exprime por principio uma cerra ondem de ideias e sentimentos de que © povo, 0 seu povo, possa participar (Candide, sd, p. 75) Interessante esse trecho na sequuéncia de uma opinio positiva; o provin- cianismo joga no sentido do elogio e da concomitante restrigio. O erftico, todavia, aponta para tracos do escritor que serio fundamentais & narrativa da saga do Rio Grande do Sul, do século XVIII, quando da conquista da terra, até 1945, com a queda de Gettlio Vargas ¢ fim do Estado Novo. A trilogia — composta por O continente, que se estende de fins do século XVIII A revolusio de 1893, publicado em 1949; O retvato de 1909 1915, publicado em 1951; O arguipélago, até 1945, publicado em 1961 recom- poe a histéria da familia que sela sua decadéncia no fim do livro. Escrito rrovembro. 2011 Modernismo e regionalismo no Basi: entre inovago e tradigo, pp. 191-212 na primeira pessoa, os narradores sio escritores ittealizados. Dessa forma, a recuperagio da meméria tece a rama numa espécie de narrativa que “assemelha-se & que Marcel Proust emprega no seu romance Em busca do tempo perdide” (Zilberman, 2005-2006, p. 297). O tempo eo ventoé obra impar na literatura brasileira, pela reconstituigzo dda hist6ria regional a0 longo de dois séculos, desenrolada exatamente na Unica fronteira viva do Brasil, em uma zona que foi de indefinig: Portugal ¢ Espanha, que viveu a experiéncia exclusivamente separatista do Brasil, e cuja integracio 20 tertitério brasileiro contou com a participagio. ativa de seus habitantes. Publicada pela Editora Globo, a trilogia obteve éxito correlaco a0 das obras mais consagradas da nossa literatura, nascida da lavra de um eseritor de provincia, mas que, além de profundo conhecedor da literatura, era personalidade cosmopolita, como o atestam os anos que morou nos Estados Unidos a convite do Departamento de Estado ¢ como professor da Universidade da Califérnia, ea representagio do Brasil na OEA, tendo residido em Washington por trés anos ¢ realizado intimeras viagens. Os escritores mineiros Léicio Cardoso ¢ Cyro dos Anjos sio romancistas considerados autores intimistas, embora tenham produzido obras de funda identificagéo com sua regiéo. Crénica da casa assassinada, a obra mais im. portante de Licio Cardoso, publicada em 1959 pela Editora José Olympio, narra a decadéncia da familia Meneses, retratada no lento declinio da casa ancestral, Seus habitantes recusam-se a refazer a vida em outras paragens ou em outras circunstancias, porque gesto dessa ordem negaria a origem. ¢ a identidade da familia. Irmanados até a desapatigio final, esses setes ainda vivos tornar-se-iam mortos-vivos, caso abandonassem a casa, pois a pura permanéncia era como um esbogo saliente e espectral na paisagem, evocadoras das lembransas de outrora ressuscitando, na sua fantasmagoria, aimaginagio do esplendor e do poder primitivo da familia. Crénica da casa assassinada é wma obra jé de ultrapassagem da chamada narrativa regional, que havia marcado a estreia de Lticio Cardoso com a publicacéo, em 1934, de Maleita Liicio Cardoso, escritor, dramaturgo, jornalista e poeta, transferiu-se com a familia para o Rio de Janeiro no inicio da juventude, Era o filho temporio de um casal de fazendeiros em idade avangada, tendo sido, por isso, criado pelo irmao, o jurist e politico mineiro Adauto Liicio Cardoso, ¢ pelas irmés, todos bem mais velhos que ele. Sempre teve dificuldades de adaptacao A escola ¢ recusava-se a exercer fungdes que o obrigassem & rotina de trabalho. Dessa forma, mesmo a funsio de funcionario publico, arran 108 Tempo Social revista de socologia da USP, v.23, n.2 Maria Arminda do Nascimento Arruda jada pelo eminence irmao, Ihe era enfadonha, criando constrangimentos & familia, acrescidos por suas escolhas pouco canénicas no ambito dos afetos (cf Carelli, 1988). Pertencente & segunda geragio dos modernistas mineiros, juntamente com Jodo Guimaraes Rosa, com esse romance o escritor dissolve a prépria origem, que é também uma forma de dela se apropriat. Por essa razio, sua obra mais forte jd ultrapassa 0 tom dominante de sua geragio. Com a publicacio de O amanuense Belmiro, ivro de estteia do mineito ¢ funcionatio piblico Cyro dos Anjos, publicado em 1937 em Belo Horizonte ¢ sucessivamente republicado pela Editora José Olympio, atinge-se, com a narrativa em primeira pessoa da vida de um intelectual bissexto e funcionério piiblico na capital mineita dos anos de 1930, a expresso mais acabada da interiorizagso e da subjetividade da personagem que busca um sentido para sua existéncia, Belmiro Braga tornado amanuense, depois da perda da fazenda ancestral, vive uma procura sempre falhada para o significado do mundo, © amanuense Bebnio 0 iva de um buroctatalirco. Um homem sentimental ¢ tolhido, fortement tlh pelo exceso de vida interior, cscove seu divi conta as sas hitrias, Para cle excever de fto, evadic-se da vida; nica mancira de suportar a volta is suse decepgées, pois escrevendo-as, pensando-a,anaicando-as, « amanense etabelece uma espécie de bisulacnteataldade € 0 sonbo. “Quem que fale mal da literatura, Quanto a mins, dite que devo a ela a minha ela Venho da rua deprimid, ecrev dex linhas tomo-me olimpica.. Em verdad vos digo: quem escreve neste cadetno no &o homer faco que hi poucs entrou no cscrtério.E am homem poderoso, que espa pata dente, sori edi: ‘Ora boas (Candido, sf, p. 84) Belmiro ¢ esse homem que empreende “a busca solitéria de um sentido para avida" (Lafeté, 2004, p. 25); é principalmente a representacio alegérica do intelectual ¢ do escritor funcionétio puiblico. E a figura, nas palavras de Anconio Candido, que “nos leva a pensar no destino do intelectual na sociedade” (s/d, p. 89). O amanuense encarna, por fim, a condigao do in- telectual que encontra na cultura a possibilidade de redengio, de contornar a impoténcia diante de um mundo adverso. A novela é, assim, a metéfora da condigio daquela geracio que foi desterrada de sua origem por mudan- «as sociais que ultrapassavam suas forgas, engolfados pelo movimento da realidade emergente. A cultura transformou-se em refigio, ‘Os modernistas mineitos da geragio de 1930 foram escritores de obras que construiram retratos de sua regio submetidos a0 dominio das impres rrovembro. 2011 Modernismo e regionalismo no Basi: entre inovago e tradigo, pp. 191-212 ses subjetivas do natrador, ritmadas pelo tempo psicoldgico, Suas obras revelavam a condicéo de herdeiros de uma construgéo cultural regional extrovertida, que se concebia na expressio do conjunto. Os nordestinos cram, diversamente, origindrios de outra elaboracio cultural, firmada na ideia do isolamento, uma gradacio abaixo da autonomia presente na cultura, dda regido riograndense. Talvez por isso tenha saido da pena do minciro Joao Guimaries Rosa a construgio do jagungo Riobaldo, um sertanejo cinzelado por um sertio dilufdo na universalidade de sua existéncia Referencias Bibiograticas Avtavainano, Carlos, (2007), “Ideias para um programa de histia imtelectual”. Tempo Social, 19:1, jun AwprAbe, Mitio de, (1941), “Elegia de abril”, Clima, 1, maio, Awnrape, Oswald de, (1990), Or denter do dragio. Sio Paulo, Globo. Axj0s, Gyro dos. (1979), Oamanuense Belmiro, 10 ed. Rio de Jancito, José Olympio, ‘AanuD4, Maria Arminda do N. (1990), Mitolegia da mineridade:o imagindrio minciro na vide politica ¢ cultural do Brasil. Sto Paulo, Brasiliense. (2001), Metrdpotee cultura: Sao Paulo no meio século XX. Bauru, Eduse Barmista, Abel de Barros. 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A reflexéo, além de indagar sobre esse movimento em diregio aos estadas an- cilares & culeura moderna, propde-se a analisar a diversidade dessa literatura, vira-vis as impasses dessas regiSes no trinsito da modetnizagio. Partinda deste problema de fundo, busca-se relacionar o romance social nordestino, a literatura subjetivista mi- nicita ¢ 0 romance hist6rico guicho com a particularidade e a diversidude das tensées sociaise politicas vividas por essa elites regionais, em franca processo de declinio. © atamento privilegiado da literatura do mincito Lcio Cardoso permite iluminat os conflitos que permeiam o conjunto, pois, embora fossem particulaes, atingiram, na obra cardosiana, sua expresso mais paroxistica Palawras-chave: Modernismo; Regionalismo; Romance social © histérico; Literatura subjetivista: Licio Cardoso. Abstract ‘Modernism and regionalism in Brazil: between innovation and tradition The interpretations of modernism in Brazil have tended to concentrate on the avant gardes that emerged in the fist two decades of the 20th century in Brazil's two most important cities: Rio de Jancito and Séo Paulo, This article examines the spread of literary modernism from the 1930s onwards into three regions on the periphery of the country’s innovative impulse, but which nonetheless possessed well-established. cultures~ the Northeast, Minas Gerais and Rio Grande do Sul and which produced cover the following years Brazil's most flourishing literature, From a literary viewpoint therefore, the new ideas became radicalized precisely in the contexts most resistant to modern lifestyles. As wellas investigating this movement towards sates on the sde-lnes of modern culture, the text proposes to analyze che diversity of this literature vis-i-vis the mpasses faced by these regions during the modernization process. Setting out from. ‘his underlying problem, i explores the connections between the Northeastern social novels, the Minas G ais subjectivist literature and the gaticho (southern Brazilian) historical novel with the particularity and diversity of the social and political tensions experienced by these regional elites in clear decline. A special focus on the literacure of mineire author Licio Cardoso helps shed light on the conificts that permeated the field asa whole, since, though always particular, in Cardoso's work these tensions attain ‘heir most virulent expression, Keywords: Modernism; Regionalism; Liicio Cardoso, Social and historical fiction; Subjectvit literacure ‘m2 Tempo Social revista de socologia da USP, v.23, n.2

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