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N O D R A M A SATÍRICO:
AS NINFAS, AMENAS Ε SOMBRIAS*
Resumo
Pretendemos mostrar a personificação do espaço em um drama satírico
de Sófocles. Focalizaremos as grutas e as ninfas e discutiremos o espaço
dedicado a estas deidades ocupando-nos particularmente dos versos 267-8 de
Ichneutas e postulando que a leitura que subentenda a personificação provoca
ambiguidade e riso.
A fusão de imagens das ninfas, grutas e mulheres usada por outros
autores, nessa tentativa, argumentarão a nosso favor. O autor escolhido para
exemplificação juntamente com Sófocles é o romancista brasileiro, Érico
Veríssimo em Incidente em Antares.
Palavras-chave: ninfas, gruta, natureza, mulher.
Abstract
In this article, we intend to show the personification of space in a
Sophocles' satyr play and try to focus on the personification of nymphs in
caves. Specifically verses 267-8 of Ichneutae are analyzed; we propose that the
poet's finality is to provoke laugh.
The fusion of images of nymphs, caves and women is used by other
authors and help us in our attempt to affirm that the same strategy is used in
a Brazilian novel, Incidente em Antares, of Érico Veríssimo.
Keywords: nymphs, cave, nature, women.
desprezo pelo cenário não cultivado. Ruskin, na mesma linha, afirma exis-
tir intimidação, medo e repulsa diante das densas e encrespadas florestas, das
escarpadas montanhas e do descontrolado poder de adversidade de céu,
mar e terra. Nesse percurso, aprazíveis para eles seriam somente os lugares
controláveis e limitáveis: as poleis, as fontes, prados e bosques ensombrados
os quais a vista pode conter e entender sem grandes surpresas, conjectura
que é nossa vez de julgar: mais uma projeção de seu tempo.
Mas Hyde não compartilha das ideias dos colegas; seu artigo será
destinado a realçar situações poéticas que contemplam o espaço acolhedor,
sem, contudo, evitar comentar trechos que mostram a força do ambiente
que curva, dobra e ameaça, como é o caso do Cáucaso no muito conheci-
do prólogo do Prometeu, de Esquilo e de vários nomes de locais citados e
predicados por adjetivos como: hostil, selvagem, agreste e t c . Com essa
metodologia, para mostrar um relacionamento afetivo do homem com seu
espaço, Hyde arrola uma série de passagens de Homero em que nos
deleitamos com a delicadeza — e também a magnitude terrível — que
transparece no olhar do que vê a paisagem ao seu redor e manifesta seu
sentimento no fascínio das descrições.
Deixando, entretanto, Homero, e à parte o encanto científico desper-
tado já em Pausânias, Estrabão e outros geógrafos, vamos, por meio das
intuições do pesquisador inglês, observar o espaço necessário para que as
ninfas se coloquem representadas no texto do drama satírico. Vemos, po-
rém, que não seria prudente tomarmos apenas um texto de quase cem
anos como referência. Mais modernamente entendemos que a noção de
espaço é histórica (Berquist 1999); é criada, formada, transformada e apa-
gada pela cultura (Foucault 1967). Nessa complexidade de visões, conti-
nuamos a postular que o maior interesse do grego é o homem. Todavia,
nesse ponto temos um diferencial: vamos tratar o espaço que, metaforizado
no corpo de ninfas, interage com deuses e homens e, por causa de um
duplo acesso (ao divino e ao humano), se torna um espaço mágico e
epifanico, o qual, para não se manter intacto, isolado e esquecido, como sói
acontecer com o sagrado, é profanado, isto é, devolvido ao uso comum
(Agamben 2005: 105), faz parte do dia-a-dia e por isso se revela mais real,
afável, insubstituível e inalienável.
A ideia está presente em um pequeno trecho de Incidente em Atitares
(Veríssimo 1994: 44-45), romance do escritor Érico Veríssimo onde Tibé-
rio Vacariano, olhando para a pradaria gaúcha, se põe a pensar na cidade do
Rio de Janeiro. Cito o trecho:
Representações do feminino no drama satírico: as ninfas, amenas e sombrias 79
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Segundo MacLachlan, (Kore as Nymph, not Daughter, http://www.stoa.org/
diotima/essays/fc04/ MacLachlan.html) em passagens frequentes na literatura, as
ninfas habitam grutas, entradas para o mundo subterrâneo, acompanham o cortejo
fúnebre do pai de Andromaca. cf. Homero (Od. 13. 96-112; Tl. 6. 420). Moradoras
de lugares escondidos, uma especialidade dessas divindades é gerar seres que distan-
ciam da normalidade, tais como Polifemo, os silenos e os centauros, (cf. Díez Platas
1996: 73).
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Cf. trecho grego sem emendas: Z[ ]ς γ [ ] κρυφ[ ] ην Ά [ ]λαντίδος
/ Ιεύσατο-
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Seguem dois exemplos de contexto de utilização: Escutem, pois, nobres Senho-
res e belas Damas de peitos brandos, minha terrível história de amor e de culpa; de sangue e
âe justiça; de sensualidade e violência; de enigma, de morte e disparate; (...) . (A pedra do
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reino: p. 35). De fato, nobres Senhores e belas Damas de peitos macios, o escudo que acabei
de descrever era (...) (A pedra do reino: p. 47).
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De fato, os templos dedicados às ninfas, segundo Lloyd-Jones (2003: 157),
apresentavam relevos com perseguições dos sátiros a essas divindades. O helenista
inglês comenta que as proezas com a lança descritas, frequentemente, pelos sátiros
são triunfos alcançados nesse campo de batalha, o leito.
Tereza Virgínia Ribeiro Barbosa
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amado e possuído. Ε se, segundo Adrados , a ninfa é u m a menina na cabeça
e u m a m u l h e r c o r p o abaixo, a natureza, a m o n t a n h a e as grutas, sendo
ninfa, ela não deve jamais ser violada, somente profanada.
Referências