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RECREAÇÃO, LAZER E ESPORTES DE

AVENTURA
Bruno Allan Teixeira da Silva
,

1 LAZER
Estudar lazer dentro da Educação Física é realizar uma imersão em um nicho de
trabalho que sustenta a área da hotelaria, dos clubes, escolas, parques e espaços
sociais. Tal concepção transcende a prática esportiva por ela mesma, pois pode estar
sustentada na Educação Pelo Lazer e Para o Lazer. E é de fundamental compreensão
para o Professor de Educação Física na área do bacharelado ou licenciatura conhecer,
organizar e reconhecer espaços e políticas públicas de lazer.
Neste bloco, vamos estudar a história do lazer, suas concepções e relações com a
cultura, com os jogos, a recreação e as práticas ao ar livre. Ao final deste bloco,
esperamos que você, estudante, consiga compreender a função social do lazer, sua
origem e possibilidades dentro da Educação Física. Vamos lá?

1.1 Breve histórico e concepção do lazer


Historicamente, o ócio sempre foi uma preocupação para uma série de nomes da
Filosofia Social, sendo ele compreendido como o tempo livre e oposto às obrigações
do labor (MARCELINO, 2006). Muitas vezes, no começo do século XX era ainda mal
interpretado pela indústria, pois entendia-se que quanto mais o operário trabalhasse,
melhor seria o rendimento dele para a produtividade das indústrias da época.
Surge na Europa, motivado pelas condições do trabalho industrial, ligadas à opressão
do trabalhador e à sua dignidade, com carga horária alta de trabalho, cobranças e
baixa remuneração, o primeiro manifesto a favor do lazer que foi do militante
socialista Paul Lafargue cujo nome era O direito à preguiça (MARCELLINO, 2006).
Lafargue realiza em seu manifesto uma exposição de questões como “quem
proporciona poder para um tirano é o povo, a classe trabalhadora, os humilhados e
ofendidos, os oprimidos, os operários, que se submetem ao sistema de opressão e
consumismo (ALBORNOZ, 2008).
Mas os estudos sobre lazer cresceram no início do século XX, tanto nos Estados Unidos
como na Europa, em que foram sistematizados estudos mais profundos sobre a

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construção do lazer dentro da sociedade, tendo períodos como marcos históricos a


Revolução Industrial, a Revolução Francesa e o Pós-Guerra (MARCELLINO, 2006).
Tal fato proporciona à sociedade reflexões e manifestos sobre um tempo para
recomposição, ou tempo ócio, o qual seria fundamental para o desenvolvimento do
trabalhador. Além do que, nesse período, as mudanças das leis trabalhistas e crises
assolavam o mundo inteiro. E por volta dos anos de 1950, os estudos sobre o lazer
começam a ser mais bem sistematizados nas “modernas sociedades urbano-
industriais” (MARCELLINO, 2006).
Nesse período, surgem as pesquisas brasileiras nos estudos em lazer. Uma forte
influência é o francês e sociólogo Joffre Dumazedier, que compreende o lazer como
conjunto de valores de desenvolvimento e enriquecimento pessoal, que são
alcançados pelo indivíduo, sendo esses valores uma ação voluntária no
aproveitamento do ócio e o rompimento com as obrigações sociais ou de trabalho
(DUMAZEDIER, 1962).
Para esse autor, o lazer configura-se como um conjunto de ocupações de livre escolha,
com uma finalidade de diversão, recreação, entretenimento ou busca por uma
formação com base no desinteresse, sendo uma atitude livre das obrigações
profissionais, familiares e sociais (DUMAZEDIER, 1973). Nesse sentido, é fundamental
que o sujeito tenha uma formação crítica, voltada para a cidadania, a fim de não se
tornar apenas um “operário do sistema”, pois o lazer possui uma característica
libertadora.
Em continuidade aos estudos de lazer no Brasil, Renato Requixa foi um dos autores
que fundamentam a proposta do Serviço Social do Comércio – SESC e suas atividades
culturais, esportivas e educacionais (GOMES, 2008). Sendo que para Requixa (1980),
lazer é uma ocupação não obrigatória, de livre escolha do sujeito que visa à sua
recuperação psicossomática, o desenvolvimento social ou pessoal a partir de suas
escolhas e atividades organizadas dentro do tempo ócio.
Marcellino (1998) entende o lazer como uma cultura prática ou fruída no tempo livre,
tendo um caractere desinteressado e vinculado à satisfação própria do indivíduo.
Nesse sentido, o lazer é vinculado à cultura popular do local ou que faça sentido para o

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indivíduo; as escolhas das atividades são ligadas aos seus desejos de aproveitamento
do tempo ócio.
Nessa perspectiva, surge o lazer que pode ter um grande potencial na educação
formalizada, como na escola e dentro do currículo escolar, e na não formal, que seria o
desenvolvimento fora da escola, com atividades socioeducativas com a finalidade de
formar para a cidadania.
Assim, Marcelino (1998) propõe a educação para lazer, que é constituída de atividades
educativas que aproveitam o tempo livre das pessoas para formação de competências,
buscando formar o indivíduo de forma crítica e cultural para a cidadania a partir das
atividades de lazer.
Nessa perspectiva, os espaços e atividades esportivas, recreativas ou de aventura
devem ter uma finalidade de formação humana, levando discussões que são presentes
na sociedade para os espaços esportivos. Essa perspectiva proporciona transformar
uma atividade livre em uma atividade com finalidade educativa a partir da proposta de
“Educação Para Lazer”.
Outra vertente do lazer apontada por Marcelino (1998) é a Educação Pelo Lazer que é
constituído por programas de atividades organizados dentro do tempo livre das
pessoas para se desenvolverem como cidadãos que aproveitam as diferentes
possibilidades do lazer dentro do seu cotidiano. Respeitando as diferenças, a inclusão,
a democracia, a partilha e uma formação cultural e crítica por meio dessas atividades.
Um dos exemplos de uma proposta de Educação pelo Lazer é o projeto Curumim do
SESC, programa que visa atender jovens no contraturno escolar com atividades
culturais, esportivas, sociais, ecológicas e prazerosas (GALANTE, 2006). Sendo uma
proposta que as atividades busquem transcender a prática por ela mesmo, visando ao
desenvolvimento de uma educação, como apontado por Freire (1991), como uma
educação de corpo inteiro.
Com essas premissas, a atividade, para que ela aconteça em uma perspectiva de lazer,
é fundamental que tenha um espaço para interação e recomposição das pessoas,
atividades que estejam em consonância com a cultura e o desenvolvimento cultural da
região, que o espaço tenha profissionais que auxiliem no processo de orientação e
experiência dessas atividades e a organização das ações pode ser apenas um

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aproveitamento do tempo ócio e rompimento das obrigações sociais, familiares ou


profissionais. Ou o espaço e atividade podem ser constituídos em uma perspectiva de
Educação Pelo Lazer ou Para o Lazer.
O lazer é importante para o desenvolvimento de uma sociedade, pois possibilita
emancipação e cidadania, representando, também, uma ferramenta importante para a
Educação Física e para a manutenção da saúde (TESTA, 2020). É um conteúdo bastante
discutido dentro da formação de professores em Educação Física, pois estes trabalham
com atividades de lazer em escolas, parques, hotéis, clubes e associações esportivas
ou de classe.
Tal compreensão do lazer nos leva a refletir sobre os tipos, como agrupar esse
conjunto de atividades que têm como fim o aproveitamento do tempo livre.
Dumazedier (1980) e Requixa (1980) propõem uma organização dessas atividades
agrupando-as em grandes categorias dos tipos de lazer como:

• Artístico: em que se busca o imaginário, alcançado por meio do


envolvimento no imaginário, nas emoções e nos sentimentos e na
exploração da cultura.
Exemplo: tipo de atividades que podem envolver tocar algum
instrumento musical, apreciar uma peça de teatro, assistir a filmes,
assistir a um show de stand up comedy.
• Intelectual: aquele que busca o contato com informações objetivas,
explicações racionais, informações concretas, fontes de livros, e assim
por diante.
Exemplo: leitura de um livro, apreciação de poemas, apreciação de
filmes e documentários, participar de jogos com base em enigmas e
resoluções de problemas.
• Físico-esportivo: que tem práticas esportivas ligadas ao exercício físico e
à atividade física, passeios e práticas corporais ao ar livre ou em
ambientes fechados.

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Exemplo: participação em jogos esportivos coletivos, individuais, de


raquete, brincadeiras, atividades ligadas ao exercício e à saúde
praticadas com uma característica de lazer.
• Social: que depende do contato e da interação com o outro;
normalmente, acontece em festas, bares, restaurantes, lanchonetes.
Exemplo: atividades que visam à interação social, como ir a uma festa,
participar de eventos e feiras, buscar a apreciação de um encontro no
bar ou lanchonete com amigos ou familiares.
• Turístico: aquele que quebra a rotina temporal e estabelece o contato
com novas situações, culturas ou viagens.
Exemplo: participar de expedições com foco no turismo, ir para lugares
como parques ecológicos, praias, trilhas, viagens de carro ou moto, mas
que tem como foco conhecer e apreciar outros lugares e culturas.

Cada uma dessas categorias pode ser ampliada em muitas outras possibilidades de
atividades ou ações que são realizadas dentro do cenário do lazer. Nesse sentido, é
preciso compreender como o lazer é um direito do cidadão, que deve ser educado
desde as premissas da escola para a utilização e o aproveitamento do tempo ócio em
uma vertente de Educação Para o Lazer ou Pelo Lazer.
A necessidade de atividades pautadas na diversão, na ludicidade e nas interações
sociais faz parte da natureza humana. Desde os tempos primitivos, rituais, danças,
espaços de contemplação e de otimização do ócio surgem e desaparecem conforme as
demandas culturais de um determinado período histórico, sendo que o lazer tem um
vasto campo de estudos, produções acadêmicas feitas em livros, artigos e
documentos. Porém, é difícil encontrar estudos que descrevem ou investigam as
premissas e origem das atividades de lazer na sociedade brasileira e no mundo (DIAS,
2018).
O lazer é um direito garantido a todos os brasileiros e brasileiras pela Constituição de
1988, sendo uma obrigação de estados, municípios e governo federal fomentar
atividades ligadas à cultura, à arte, ao esporte e a outras linguagens que podem fazer
parte de ações com base no lazer dentro da sociedade atual.

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Portanto, o lazer é fundamental no desenvolvimento da sociedade contemporânea. É


preciso uma ação militante para sua manutenção dentro das comunidades em que os
sujeitos estão inseridos. Sua organização corresponde a um direito conquistado pela
classe trabalhadora e pela sociedade, em oposição à opressão do capitalismo e otimiza
a vida do trabalhador.
Como um direito, é necessária uma formação crítica e cultural nas escolas, academias,
clubes e instituições esportivas. Seja na Educação Pelo Lazer ou Para o Lazer o
profissional de Educação Física precisa organizar suas atividades com essa
sensibilidade de criar um espaço de recomposição, atividades prazerosas e que
possam formar pessoas melhores a partir de sua prática.
Existem algumas instituições que são exemplos e referências no Brasil na organização
de atividades de lazer, como o Serviço Social do Comércio – SESC e o Serviço Social da
Indústria – SESI. Essas instituições foram influenciadas pelas discussões dos
professores Renato Requixa, Joffre Dumazedier e Nelson de Carvalho Marcelino.
Eles entendem que o lazer é um direito conquistado, uma ação voluntária em busca de
uma recomposição psicossomática ou a realização de uma atividade que gere prazer
ao indivíduo. Por fim, dessa primeira parte reflexiva, o lazer não é apenas uma
atividade, e sim uma forma de pensar e organizar ações que são direitos do povo e,
principalmente, da classe trabalhadora.

1.2 Lazer e cultura

Ao refletirmos sobre o lazer e a cultura, nos deparamos com uma série de


possibilidades, tendo a ciência de que são duas tematizações bem complexas, até
mesmo em suas definições. Segundo Daolio (2018), a cultura possibilita o sentido de
um objeto, algo, ou evento para o sujeito e, ao mesmo tempo, o limita ao
desenvolvimento cultural do grupo na qual o indivíduo está inserido.
O corpo era somente visto como um conjunto de ossos e músculos e não
como como uma expressão de cultura; o esporte era apenas passatempo ou
atividade que visava ao rendimento atlético e fenômeno político; a
educação física era vista como área exclusivamente biológica e não uma
área que pode ser explicada pelas ciências humanas (DAOLIO, 2018, p. 2).

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Tal apontamento indica que a Educação Física é uma área constituída nas ciências
sociais, que transcende os limites biológicos do ser humano e realiza a intervenção
com base no desenvolvimento cultural e social desse ser. E como uma área social,
também se sustenta dentro da área do lazer e o seu desenvolvimento cultural. Nessa
perspectiva de construção de possibilidades do lazer em uma vertente cultural, ambos
estão totalmente relacionados, isto é, o desenvolvimento das atividades de lazer
acompanha o desenvolvimento social e vice-versa.
Nessa perspectiva, Gomes (2014) destaca que enquanto o lazer for uma necessidade
humana, ele pode acontecer segundo os valores e interesses dos sujeitos, dos grupos
sociais e dos significados culturais atribuídos. Para o autor, a construção de
possibilidades com base no lazer em uma vertente cultural depende do elemento
lúdico e da historicidade de cada grupo social.
Por esse fato, os espaços que estimulam ou são orientados a partir de políticas
públicas de lazer valorizam as artes, o teatro, o esporte, a história e as pessoas que
estão organizadas dentro desses espaços.
Construir espaços democráticos, para o aproveitamento do tempo livre e que sejam de
escolha do indivíduo, é algo fundamental na sociedade contemporânea. Porém,
tomando cuidado para que esses espaços não sejam tomados pela sociedade do
consumo e que o lazer com a sua essência democrática e libertadora não fique preso
ao capitalismo e às ações instrumentalizadas que não visam ao desenvolvimento da
cultura.
Na Constituição de 1988, é direito o povo ter acesso ao lazer e a cultura de qualidade.
Portanto, cada estado e cada município organizam atividades culturais como festas
folclóricas, feiras e exposições que levam à valorização da cultura popular brasileira em
toda a sua pluralidade, respeitando a essência e as características de cada região do
país.

1.3 Lazer e educação


O lazer dentro da Educação Física com uma característica educacional formal é algo
que deve ser discutido dentro das escolas, sejam privadas, sejam públicas. Pois a
escola é um espaço de formação e de compressão das práticas e atividades de lazer, já

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que formar para autonomia e protagonismo é algo fundamental dentro do ensino do


lazer no sistema de ensino.
Sendo assim, Marcelino (2015) enfatiza que a relação entre o lazer e a Educação Física
não é constituída tendo o profissional como um marcador favorável à indústria do
consumo. O autor enfatiza que o trabalho do professor ou profissional de Educação
Física nesse cenário é de um Educador, assegurando a prática do lazer como um direito
a todo cidadão em seu duplo sentido.
Portanto, esse educador, em qualquer segmento, deve buscar organizar atividades
com base na cultura corporal, mas que favoreçam o desenvolvimento do sujeito e, ao
mesmo tempo, tenham um caráter descompromissado, organizando as atividades
dentro da Educação Pelo Lazer ou Para o Lazer.
Para Marcellino (1998), a escola representa um nível de estrutura que acompanha as
tendências sociais de um determinado período histórico. Nesse sentido, o primeiro
problema é o ensino com base na reprodução de conhecimentos e informações e o
segundo problema é o “adestramento” do estudante para seguir como um operário do
sistema capitalista.
Sendo a escola um espaço crítico de reflexão e discussão sobre o lazer e os conteúdos
ligados à cultura corporal de movimento, como tal deve buscar uma formação do
estudante crítico para não se tornar um operário do sistema, mas um transformador
dele.
Tratando-se do lazer em uma vertente educacional, é necessário considerar sua
potencialidade para o desenvolvimento pessoal e social dos indivíduos,
proporcionando ao estudante oportunidades de aprender e refletir sobre questões
importantes para a sociedade, além de proporcionar interação social, práticas ligadas à
contemplação, práticas ligadas ao prazer nas atividades esportivas, atividades ligadas
às artes e outras manifestações de linguagem que possuem um caráter libertador das
obrigações sociais que são impostas aos estudantes (MARCELLINO, 1998).
Nessa perspectiva, a Base Nacional Comum Curricular, atual documento que norteia a
Educação Física dentro da Escola no Brasil inteiro, menciona o lazer não como uma
exclusividade da área, mas que aparece em outras disciplinas como Geografia,
História, Artes, entre outras, e possui uma característica multidisciplinar (FONSECA,

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2018). Tal apontamento compreende que os conteúdos e professores regentes devem


encontrar um fio condutor do lazer em suas disciplinas, ligá-los e organizar as ações
para que seja possível uma formação com base em uma Educação Para o Lazer.
Compreende-se que a escola não é um espaço de formação de um “operário do
sistema”, mas constitui um lugar de formação crítica e social, pautada em uma
perspectiva de Educação Para o Lazer e construção da criança para a cidadania. Sendo
assim, a aprendizagem com base no lazer possibilita ao estudante um olhar crítico
sobre suas possibilidades e interesses sociais, além de conhecer e explorar os
diferentes tipos de lazer e suas finalidades como o lazer artístico, físico-esportivo,
turístico, social e intelectual dentro da escola e fora dela.
Por isso, é importante uma discussão profunda de lazer para que os estudantes
procurem outras atividades fora da escola, voltadas a outros níveis de compreensão do
lazer, a fim de explorar as possibilidades esportivas, ou não, do lazer dentro das
comunidades em que estão inseridos. É evidente que a ação deve ser voluntária e
liberta das obrigações sociais nas quais ele (estudante) está inserido.

1.4 Lazer e recreação

O lazer a partir do que estudamos até este momento constitui em ter uma atitude
ligada à exploração do tempo livre, para a recomposição do indivíduo ou o seu
desenvolvimento através de atividades que gerem prazer.
O desenvolvimento das atividades recreativas depende da organização dos espaços
que são orientados em políticas públicas de lazer e utilizam jogos e brincadeiras, para
levar o sujeito à diversão, à dimensão lúdica e ao desenvolvimento de habilidades
sociais a partir dessas atividades.
A relação do Homo Ludens é a base da compreensão de que o ser humano pode
dedicar-se à atividade lúdica, o que nos permite jogar nos preparando para tarefas
sociais e de trabalho, ou nos dando um exercício de autocontrole e, às vezes,
atividades que podem ser competitivas (BARBOSA, 2015). Em reflexão, temos que
entender que um jogo ou uma brincadeira não é necessariamente uma atividade de
lazer, com finalidades para o desenvolvimento do trabalho ou algo assim.

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As atividades orientadas pelo lazer são de livre escolha do sujeito, levam-no para a
dimensão lúdica e do prazer e têm uma característica com base no rompimento das
obrigações sociais, de trabalho e familiares (MARCELLINO, 2015). Esse apontamento
nos leva a perceber que, para que a atividade recreativa seja uma atividade orientada
pelo lazer, é fundamental que ela forneça esses elementos e leve o sujeito ao
arrebatamento para a dimensão do jogo.
Assim, as propostas de animação e recreação em espaços de lazer podem acontecer
de diferentes formas, atendendo as áreas das atividades de lazer como físico-
esportiva, intelectual, social, turística e artística. Nesse sentido, compreendemos a
recreação como uma circunstância em que o indivíduo escolhe de forma espontânea e
deliberada uma atividade ligada à sua satisfação pessoal dentro do cenário do lazer
(CAVALLARI; ZACHARIAS, 2018).
Nesse sentido, as atividades recreativas podem se aproveitar dos jogos, das
brincadeiras, da animação, da cultura, para proporcionar entretenimento e
divertimento para o indivíduo. Acontecendo principalmente no momento em que o
espaço é orientado em políticas de lazer, o tempo é livre dentro da vida do sujeito e
durante a prática são rompidas as obrigações familiares e sociais.
Os espaços devem ser organizados e preparados para proporcionar a diversão ao
sujeito. Nesse sentido, encontramos espaços como:
• Acampamentos;
• Clubes;
• Praças públicas;
• Teatros;
• Escolas;
• SESC / SESI;
• Quadras esportivas;
• Espaços sociais de condomínios e associações de classe;
• Espaços virtuais de interatividade e entretenimento.

Esses espaços constituem ambientes em que as atividades de recreação podem


acontecer a partir da orientação de políticas de lazer. Porém, as atividades recreativas
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podem acontecer em qualquer cenário, como em um ambiente corporativo a partir do


momento em que se estabelece um “tempo livre” para realizar tal atividade e tenha as
orientações que mencionamos neste material didático.

1.5 Lazer e recreação nas diferentes faixas etárias

O lazer e a recreação se alteram conforme a cultura e a idade do sujeito, pois são


relacionados com suas crenças, convicções, nível de desenvolvimento motor e
crescimento, já que existem atividades que podem ser orientadas para cada faixa
etária de acordo as características motoras e cognitivas do sujeito.
Para Huizinga (2020), o jogo é algo que faz parte da natureza humana, está associado à
organização de linguagens e códigos relacionados às regras e valores sociais e
culturais. Para o autor, a atividade lúdica acontece em todas as culturas, porém possui
uma variação de acordo com os significados e rituais de um grupo social.
Isso quer dizer que as brincadeiras, jogos e atividades recreativas com base em lazer
hoje são diferentes, por exemplo, de 1950 até a atualidade, não constituindo
atividades melhores ou piores, apenas atividades diferentes que atendem as
demandas culturais e lúdicas de um determinado grupo em um período histórico e
social.
Portanto, para pontuar questões ligadas às atividades recreativas em todas as idades,
é fundamental que o professor organize suas atividades em consonância com o
processo de desenvolvimento motor de seus alunos, clientes, e assim por diante.
Nessa perspectiva, vamos utilizar como base as diretrizes de desenvolvimento de
Gallahue, Ozmun e Goodway (2013) em que os autores pontuam que o
desenvolvimento motor do sujeito é associado às experiências que ele vai
desenvolvendo ao longo da vida, dependendo das características individuais, das
interações com o ambiente e da organização da tarefa (essa, no nosso caso, atividades
recreativas).
Assim, as atividades recreativas devem respeitar os estágios de desenvolvimento
motor como:
• Fase reflexa;
• Fase rudimentar;
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• Fase fundamental;
• Fase especializada.

Por exemplo, ao criar um espaço de lazer com atividades recreativas que possuem em
sua composição contação de histórias, jogos, brincadeiras, peças e outras, devemos
entender as limitações e estimulações que devem ser feitas para cada faixa etária.
Os espaços de lazer na fase motora, reflexa e rudimentar podem respeitar a interação
de pais e filhos, constituindo atividades com base em animação e muita
experimentação motora dos jogos e atividades que serão feitas.
Normalmente, o recreador realiza cantigas, desafios, muitas brincadeiras pela baixa
complexidade de regras e grande experimentação, pois a criança nesse ciclo está
desenvolvendo a linguagem.
Na fase motora fundamental, dentro do estágio inicial, elementar e maduro, as
atividades podem aumentar a complexidade até mesmo pela apropriação do uso da
linguagem. Os jogos podem ser organizados de forma concreta, com desenvolvimento
de regras claras e objetivas, além do que, nesse período, a criança consegue realizar
habilidades motoras mais complexas e combinadas, e normalmente com grande
motivação para realizar tais atividades.
Na fase motora especializada, as gincanas, a complexidade nas regras e as discussões
sociais que podem estar presentes na estrutura das atividades recreativas, poderão ser
organizadas. Lembrando que nessa fase a criança normalmente só fará atividades que
façam sentido. Nesse contexto, a apropriação de atividades culturais e a criação de
atividades a partir delas é algo possível.
Portanto, para desenvolver atividades recreativas para cada faixa etária, é
fundamental entender sobre o processo de crescimento e desenvolvimento motor,
pois isso facilita na estruturação das atividades e na organização delas, aumentando a
competência dos alunos, clientes, sujeitos durante a prática recreativa.

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Considerações finais
Estudamos neste bloco o lazer e suas características que correspondem a uma atitude
voluntária do sujeito em algo descompromissado, aproveitando o tempo livre/ócio
para realizar tais atividades.
Mapeamos que, para que o lazer aconteça, é necessário um espaço organizado e
preparado, sendo um direito conquistado pela classe trabalhadora. Agora, você tem a
ciência de que o lazer é um direito do cidadão e deve ser fornecido por meio de
políticas públicas de lazer com práticas esportivas, artísticas, sociais, intelectuais e
turísticas.
Sendo o lazer algo oposto ao trabalho e ao mercado do consumo, suas atividades
devem acontecer de forma livre e espontânea e dependem também da construção de
uma sociedade melhor, com educação, habitação e saúde. Um cidadão crítico e com
uma formação escolar boa consegue compreender que o lazer é um direito e deve ser
algo fundamental em sua vida.
Normalmente, em uma sociedade capitalista, o lazer é oprimido pelo poder daquele
que possui capital, transformando o trabalhador em um operário do sistema. É
fundamental romper com a visão de consumo e adotar o lazer como um conjunto de
atividades que merecem cuidado da Educação Física e da Sociedade.
Também, mapeamos o duplo sentido do lazer, além do seu forte valor educativo.
Fundamentamos que as atividades recreativas devem acontecer no contexto do lazer e
estar em consonância com as características motoras, biológicas e sociais do ser
humano.

Referências

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