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©  Clara Gomes Moreira

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INSTITUTO BRASILEIRO DE DIREITO TRIBUTÁRIO


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Diretoria
Presidente: Ricardo Mariz de Oliveira
Vice-Presidente: Luís Eduardo Schoueri
Diretor Administrativo: João Francisco Bianco
Diretor Financeiro: Rodrigo Maito da Silveira
Diretores Executivos: Fernando Aurelio Zilveti e Luís Flávio Neto
Conselho Deliberativo: Bruno Fajersztajn, Fabiana Carsoni Alves F. da Silva, Humberto
Bergmann Ávila, José Maria Arruda de Andrade, Mara Eugênia Buonanno
Caramico, Martha Toribio Leão, Paulo Victor Vieira da Rocha, Ricardo Maitto da
Silveira e Victor Borges Polizelli
Conselho Editorial Nacional: Fernando Aurelio Zilveti (Instituto Brasileiro de Direito
Tributário/SP), Humberto Ávila (Universidade de São Paulo/SP e Universidade
Federal do Rio Grande do Sul/RS), João Francisco Bianco (Instituto Brasileiro de
Direito Tributário/SP), Luís Eduardo Schoueri (Universidade de São Paulo/SP),
Paulo Celso Bergstrom Bonilha (Universidade de São Paulo/SP), Ricardo Mariz de
Oliveira (Instituto Brasileiro de Direito Tributário/SP), Roberto Ferraz (Pontifícia
Universidade Católica do Paraná/PR), Roberto Quiroga Mosquera (Universidade de
São Paulo/SP) e Walter Piva Rodrigues (Universidade de São Paulo/SP)

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

MOREIRA, Clara Gomes


M837r    Regra constitucional de competência e tributação
de transações transfronteiriças entre partes vinculadas. – São
Paulo, SP: IBDT, 2021 (Série Doutrina Tributária, 36).

368 p. ; 14 x 21 cm.

ISBN 978-65-86252-15-6

1. Direito Tributário Internacional    2. Competência


Tributária   3. Regra Constitucional   4. Princípios
Constitucionais   5. Brasil
I. Clara Gomes Moreira   II. IBDT   III. Título.
DORIS 341.39

Índice para catálogo sistemático:


1. Direito Tributário Internacional : Brasil
2. Regra Constitucional : Brasil
3. Princípios Constitucionais : Brasil
4. Competência Tributária : Brasil

Revisão: Carolina Mihoko Massanhi / Editoração: Nelson Mitsuhashi


Impressão e acabamento: Edições Loyola
226 Regra Constitucional de Competência e Tributação de Transações Transfronteiriças entre Partes Vinculadas

nais em função dos diferentes elementos articulados para a sua in-


terpretação.

2.1. Regras de tributação em bases universais, de preços de


transferência e de limitação à dedução de juros visam a
combater a elisão fiscal internacional
Diversas linhas doutrinárias sustentam que as regras brasileiras
de tributação em bases universais240, de preços de transferência241 e

240
BIANCO, João Francisco; SANTOS, Ramon Tomazela. Brazilian Anti-Avoidan-
ce Legislation: Recent Refinements and Major Deviations from International
Practice. Bulletin for International Taxation, p. 299-306, jun./2017, p. 301.
SCHOUERI, Luís Eduardo. Imposto de renda e os lucros auferidos no exterior.
In: ROCHA, Valdir de Oliveira (coords.). Grandes questões atuais do Direito Tribu-
tário. São Paulo: Dialética, 2003, p. 304. VITA, Jonathan Barros. As formas de
consolidação de base de cálculo do imposto sobre a renda na experiência euro-
peia: desvelando pontos cegos a partir de uma visão brasileira. In: ROCHA,
Sergio André; TORRES, Heleno (coords.). Direito Tributário Internacional: ho-
menagem ao Professor Alberto Xavier. São Paulo: Quartier Latin, 2016, p. 358.
Em sentido contrário: BARRETO, Paulo Ayres. A tributação, por empresas bra-
sileiras, dos lucros auferidos no exterior por suas controladas ou coligadas. In:
ROCHA, Valdir de Oliveira. Grandes questões atuais do Direito Tributário. v. 17.
São Paulo: Dialética, 2013, p. 226. GALENDI JÚNIOR, Ricardo André;
SCHOUERI, Luís Eduardo. Brazil. In: DOURADO, Ana Paula (ed.). Tax Avoi-
dance Revisited in the EU BEPS Context. Amsterdam: IBFD, 2017, p. 222-225.
241
BARRETO, Paulo Ayres. O Tratamento Transnacional nos Preços de Transfe-
rência e seus Limites Constitucionais. In: SCHOUERI, Luís Eduardo (coord.).
Tributos e Preços de Transferência. v. 3. São Paulo: Dialética, 2009, p. 137-138.
BIANCO, João Francisco; SANTOS, Ramon Tomazela. Brazilian Anti-Avoidan-
ce Legislation: Recent Refinements and Major Deviations from International
Practice. Bulletin for International Taxation, p. 299-306, jun./2017, p. 304. CAM-
POS, Fabrício Costa Resende de; ROLIM, João Dácio. Juros, Preço de Transfe-
rência e Regras de Subcapitalização. In: SCHOUERI, Luís Eduardo (coord.).
Tributos e Preços de Transferência. v. 4. São Paulo: Dialética, 2013, p. 127. LOBA-
TO, Valter; SANTIAGO, Igor Mauler. Margens Predeterminadas: um Caso de
Confronto entre a Praticabilidade e a Capacidade Contributiva? Exigências
Constitucionais para a sua Adoção. In: SCHOUERI, Luís Eduardo (coord.). Tri-
butos e Preços de Transferência. v. 3. São Paulo: Dialética, 2009, p. 107. MOSQUE-
RA, Roberto Quiroga. O Regime Jurídico-Tributário dos Preços de Transferên-
cia e a Lei n. 9.430/96. In: ROCHA, Valdir de Oliveira (coord.). Tributos e Preços
de Transferência. São Paulo: Dialética, 1997, p. 89. OLIVEIRA, Vivian de Freitas
e Rodrigues. Preço de Transferência como Norma de Ajuste do Imposto sobre a Renda.
São Paulo: Noeses, 2015, p. 225-226. GALENDI JÚNIOR, Ricardo André;
SCHOUERI, Luís Eduardo. Brazil. In: DOURADO, Ana Paula (ed.). Tax Avoi-
dance Revisited in the EU BEPS Context. Amsterdam: IBFD, 2017, p. 217. VAS-
Clara Gomes Moreira 227

de limitação à dedução de juros242 prestam-se ao combate da elisão


fiscal internacional. Um idêntico posicionamento é defendido em
outras partes do mundo quanto às regras similares existentes nos
diversos ordenamentos jurídicos.243

CONCELOS, Roberto França de. Reflexos Financeiros e Cambiais dos Preços


de Transferência. In: SCHOUERI, Luís Eduardo (coord.). Tributos e Preços de
Transferência. v. 3. São Paulo: Dialética, 2009, p. 196. TORRES, Heleno Taveira.
Direito Tributário Internacional: planejamento tributário e operações transnacio-
nais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 168-170.
242
BARBOSA, Mateus Calicchio; SCHOUERI, Luís Eduardo. Brazil. In: LANG,
Michael; OWENS, Jeffrey; PISTONE, Pasquale; RUST, Alexander; SCHUCH,
Josef; STARINGER, Claus (eds.). GAARS – A Key Element of Tax Systems in the
Post-BEPS Tax World. Amsterdam: IBFD, 2016, p. 135-138. CAMPOS, Fabrício
Costa Resende de; ROLIM, João Dácio. Juros, Preço de Transferência e Regras
de Subcapitalização. In: SCHOUERI, Luís Eduardo (coord.). Tributos e Preços de
Transferência. v. 4. São Paulo: Dialética, 2013, p. 137-138. DINIZ, Rodrigo de
Madureira Pará; MOSQUERA, Roberto Quiroga. As Regras de Subcapitaliza-
ção no Direito Brasileiro – Questões Controversas. In: ROCHA, Valdir de Oli-
veira (coord.). Grandes Questões Atuais do Direito Tributário. v. 15. São Paulo:
Dialética, 2011, p. 393. EMERY, Renata; XAVIER, Alberto. Subcapitalização.
Revista Dialética de Direito Tributário, n. 176, p. 7-15, maio/2010, p. 8. SANTOS,
Ramon Tomazela. As Regras de Subcapitalização Introduzidas pela Lei
12.249/10. Revista Dialética de Direito Tributário, n. 184, p. 116-127, jan./2011, p.
116, 118-119. GALENDI JÚNIOR, Ricardo André; SCHOUERI, Luís Eduardo.
Brazil. In: DOURADO, Ana Paula (ed.). Tax Avoidance Revisited in the EU BEPS
Context. Amsterdam: IBFD, 2017, p. 221-222. VICENTINI, Marcelo Fonseca.
Subcapitalização no Direito Tributário Brasileiro. Dissertação de Mestrado, Univer-
sidade de São Paulo, São Paulo, 2014, p. 137-138.
Em sentido contrário: GRECO, Marco Aurélio. Planejamento Tributário. 4. ed.
São Paulo: Quartier Latin, 2019, p. 449.
243
Cf. quanto às regras de tributação em bases universais: BLETIERE, Emmanuel
Raingeard de la. France. In: DOURADO, Ana Paula (ed.). Tax Avoidance Revisi-
ted in the EU BEPS Context. Amsterdam: IBFD, 2017, p. 334-337. BROE, Luc De.
International Tax Planning and Prevention of Abuse. Amsterdam: IBDF, 2007, p.
76. BYUN, Hyejung; PARK, Soo Jean. South Korea. In: LANG, Michael;
OWENS, Jeffrey; PISTONE, Pasquale; RUST, Alexander; SCHUCH, Josef;
STARINGER, Claus (eds.). GAARS – A Key Element of Tax Systems in the Post-
-BEPS Tax World. Amsterdam: IBFD, 2016, p. 645. CAO, Bristar Mingxing; LI,
Na. China. In: LANG, Michael; OWENS, Jeffrey; PISTONE, Pasquale; RUST,
Alexander; SCHUCH, Josef; STARINGER, Claus (eds.). GAARS – A Key Element
of Tax Systems in the Post-BEPS Tax World. Amsterdam: IBFD, 2016, p. 196. DU-
BUT, Thomas. France. In: LANG, Michael; OWENS, Jeffrey; PISTONE, Pas-
quale; RUST, Alexander; SCHUCH, Josef; STARINGER, Claus (eds.). GAARS
– A Key Element of Tax Systems in the Post-BEPS Tax World. Amsterdam: IBFD,
2016, p. 280. EDEN, Sandra. United Kingdom. In: DOURADO, Ana Paula (ed.).
228 Regra Constitucional de Competência e Tributação de Transações Transfronteiriças entre Partes Vinculadas

Tax Avoidance Revisited in the EU BEPS Context. Amsterdam: IBFD, 2017, p. 758-
761. FILIPCZYK, Hanna; OLESIŃSKA, Agnieszka. Poland. In: LANG, Mi-
chael; OWENS, Jeffrey; PISTONE, Pasquale; RUST, Alexander; SCHUCH, Jo-
sef; STARINGER, Claus (eds.). GAARS – A Key Element of Tax Systems in the Post-
-BEPS Tax World. Amsterdam: IBFD, 2016, p. 496. GUSTAFSON, Charles H.;
PERONI, Robert J.; PUGH, Richard Crawford. Taxation of International Transac-
tions: Materials, text and problems. 4. ed. Saint Paul: West, 2011, p. 485-540. HAN-
SEN, Søren Friis. Denmark. In: LANG, Michael; OWENS, Jeffrey; PISTONE,
Pasquale; RUST, Alexander; SCHUCH, Josef; STARINGER, Claus (eds.).
GAARS – A Key Element of Tax Systems in the Post-BEPS Tax World. Amsterdam:
IBFD, 2016, p. 242. HAUPTMAN, Lidija; BELOGLAVEC, Sabina Taškar. Slove-
nia. In: LANG, Michael; OWENS, Jeffrey; PISTONE, Pasquale; RUST, Alexan-
der; SCHUCH, Josef; STARINGER, Claus (eds.). GAARS – A Key Element of Tax
Systems in the Post-BEPS Tax World. Amsterdam: IBFD, 2016, p. 602. HELMI-
NEN, Marjaana. Finland. In: LANG, Michael; OWENS, Jeffrey; PISTONE,
Pasquale; RUST, Alexander; SCHUCH, Josef; STARINGER, Claus (eds.).
GAARS – A Key Element of Tax Systems in the Post-BEPS Tax World. Amsterdam:
IBFD, 2016, p. 257. HERNÁNDEZ, Daniel Fuentes; JIMÉNEZ, César Alejandro
Ruiz. Mexico. In: LANG, Michael; OWENS, Jeffrey; PISTONE, Pasquale;
RUST, Alexander; SCHUCH, Josef; STARINGER, Claus (eds.). GAARS – A Key
Element of Tax Systems in the Post-BEPS Tax World. Amsterdam: IBFD, 2016, p.
424. KOLOZS, Borbála; KREVER, Richard. Hungary. In: LANG, Michael;
OWENS, Jeffrey; PISTONE, Pasquale; RUST, Alexander; SCHUCH, Josef;
STARINGER, Claus (eds.). GAARS – A Key Element of Tax Systems in the Post-
-BEPS Tax World. Amsterdam: IBFD, 2016, p. 315. KREVER, Richard; MEL-
LOR, Peter. Australia. In: LANG, Michael; OWENS, Jeffrey; PISTONE, Pas-
quale; RUST, Alexander; SCHUCH, Josef; STARINGER, Claus (eds.). GAARS
– A Key Element of Tax Systems in the Post-BEPS Tax World. Amsterdam: IBFD,
2016, p. 57-58. MITROYANNI, Ioanna. European Union. In: LANG, Michael;
OWENS, Jeffrey; PISTONE, Pasquale; RUST, Alexander; SCHUCH, Josef;
STARINGER, Claus (eds.). GAARS – A Key Element of Tax Systems in the Post-
-BEPS Tax World. Amsterdam: IBFD, 2016, p. 29. O’BRIEN, Martha. Canada.
In: LANG, Michael; OWENS, Jeffrey; PISTONE, Pasquale; RUST, Alexander;
SCHUCH, Josef; STARINGER, Claus (eds.). GAARS – A Key Element of Tax Sys-
tems in the Post-BEPS Tax World. Amsterdam: IBFD, 2016, p. 163. OGUTTU,
Annet Wanyana. South Africa. In: LANG, Michael; OWENS, Jeffrey; PISTONE,
Pasquale; RUST, Alexander; SCHUCH, Josef; STARINGER, Claus (eds.).
GAARS – A Key Element of Tax Systems in the Post-BEPS Tax World. Amsterdam:
IBFD, 2016, p. 628-629. OLSSON, Stefan. Sweden. In: LANG, Michael;
OWENS, Jeffrey; PISTONE, Pasquale; RUST, Alexander; SCHUCH, Josef;
STARINGER, Claus (eds.). GAARS – A Key Element of Tax Systems in the Post-
-BEPS Tax World. Amsterdam: IBFD, 2016, p. 696. PIANTAVIGNA, Paolo. Italy.
In: LANG, Michael; OWENS, Jeffrey; PISTONE, Pasquale; RUST, Alexander;
SCHUCH, Josef; STARINGER, Claus (eds.). GAARS – A Key Element of Tax Sys-
tems in the Post-BEPS Tax World. Amsterdam: IBFD, 2016, p. 384. REIMER, Ek-
kehart. Germany. In: DOURADO, Ana Paula (ed.). Tax Avoidance Revisited in the
EU BEPS Context. Amsterdam: IBFD, 2017, p. 371-373. TENORE, Mario. CFC
Rule. In: WEBER, Dennis (ed.). CCCTB: Selected Issues. Alphen aan den Rijn:
Clara Gomes Moreira 229

Kluwer Law International, 2012, p. 304. VAMRÅK, Ingebjørg. Norway. In:


LANG, Michael; OWENS, Jeffrey; PISTONE, Pasquale; RUST, Alexander;
SCHUCH, Josef; STARINGER, Claus (eds.). GAARS – A Key Element of Tax Sys-
tems in the Post-BEPS Tax World. Amsterdam: IBFD, 2016, p. 477. VILLENEU-
VE, Ege Berber. Turkey. In: LANG, Michael; OWENS, Jeffrey; PISTONE, Pas-
quale; RUST, Alexander; SCHUCH, Josef; STARINGER, Claus (eds.). GAARS
– A Key Element of Tax Systems in the Post-BEPS Tax World. Amsterdam: IBFD,
2016, p. 732-734. ZORNOZA, Juan José; BÁEZ, Andrés. Spain. In: LANG, Mi-
chael; OWENS, Jeffrey; PISTONE, Pasquale; RUST, Alexander; SCHUCH, Jo-
sef; STARINGER, Claus (eds.). GAARS – A Key Element of Tax Systems in the Post-
-BEPS Tax World. Amsterdam: IBFD, 2016, p. 669-670.
Em sentido contrário: CID, José Manuel Almudí. El Régimen Jurídico de Transpa-
rencia Fiscal Internacional. Madrid: Instituto de Estudios Fiscales, 2005, p. 118.
Cf. quanto às regras de preços de transferência: ADAME, Lubica. Slovak Repu-
blic. In: LANG, Michael; OWENS, Jeffrey; PISTONE, Pasquale; RUST, Alexan-
der; SCHUCH, Josef; STARINGER, Claus (eds.). GAARS – A Key Element of Tax
Systems in the Post-BEPS Tax World. Amsterdam: IBFD, 2016, p. 590. BLETIERE,
Emmanuel Raingeard de la. France. In: DOURADO, Ana Paula (ed.). Tax Avoi-
dance Revisited in the EU BEPS Context. Amsterdam: IBFD, 2017, p. 331-332.
BROE, Luc De. International Tax Planning and Prevention of Abuse. Amsterdam:
IBDF, 2007, p. 76. BUNDGAARD, Jakob; SCHMIDT, Peter Koerver. Denmark.
In: DOURADO, Ana Paula (ed.). Tax Avoidance Revisited in the EU BEPS Context.
Amsterdam: IBFD, 2017, p. 273-275. BYUN, Hyejung; PARK, Soo Jean. South
Korea. In: LANG, Michael; OWENS, Jeffrey; PISTONE, Pasquale; RUST, Ale-
xander; SCHUCH, Josef; STARINGER, Claus (eds.). GAARS – A Key Element of
Tax Systems in the Post-BEPS Tax World. Amsterdam: IBFD, 2016, p. 645. CAO,
Bristar Mingxing; LI, Na. China. In: LANG, Michael; OWENS, Jeffrey; PISTO-
NE, Pasquale; RUST, Alexander; SCHUCH, Josef; STARINGER, Claus (eds.).
GAARS – A Key Element of Tax Systems in the Post-BEPS Tax World. Amsterdam:
IBFD, 2016, p. 196. DUBUT, Thomas. France. In: LANG, Michael; OWENS,
Jeffrey; PISTONE, Pasquale; RUST, Alexander; SCHUCH, Josef; STARIN-
GER, Claus (eds.). GAARS – A Key Element of Tax Systems in the Post-BEPS Tax
World. Amsterdam: IBFD, 2016, p. 280. EDEN, Sandra. United Kingdom. In:
DOURADO, Ana Paula (ed.). Tax Avoidance Revisited in the EU BEPS Context.
Amsterdam: IBFD, 2017, p. 752-756. ELLIFFE, Craig; SMITH, Andrew. New
Zeland. In: LANG, Michael; OWENS, Jeffrey; PISTONE, Pasquale; RUST, Ale-
xander; SCHUCH, Josef; STARINGER, Claus (eds.). GAARS – A Key Element of
Tax Systems in the Post-BEPS Tax World. Amsterdam: IBFD, 2016, p. 467. FILIPC-
ZYK, Hanna; OLESIŃSKA, Agnieszka. Poland. In: LANG, Michael; OWENS,
Jeffrey; PISTONE, Pasquale; RUST, Alexander; SCHUCH, Josef; STARIN-
GER, Claus (eds.). GAARS – A Key Element of Tax Systems in the Post-BEPS Tax
World. Amsterdam: IBFD, 2016, p. 496. HAUPTMAN, Lidija; BELOGLAVEC,
Sabina Taškar. Slovenia. In: LANG, Michael; OWENS, Jeffrey; PISTONE, Pas-
quale; RUST, Alexander; SCHUCH, Josef; STARINGER, Claus (eds.). GAARS
– A Key Element of Tax Systems in the Post-BEPS Tax World. Amsterdam: IBFD,
2016, p. 602. HERNÁNDEZ, Daniel Fuentes; JIMÉNEZ, César Alejandro Ruiz.
Mexico. In: LANG, Michael; OWENS, Jeffrey; PISTONE, Pasquale; RUST, Ale-
xander; SCHUCH, Josef; STARINGER, Claus (eds.). GAARS – A Key Element of
230 Regra Constitucional de Competência e Tributação de Transações Transfronteiriças entre Partes Vinculadas

Tax Systems in the Post-BEPS Tax World. Amsterdam: IBFD, 2016, p. 424. KAPA-
DIA, Nilesh M. India. In: LANG, Michael; OWENS, Jeffrey; PISTONE, Pasqua-
le; RUST, Alexander; SCHUCH, Josef; STARINGER, Claus (eds.). GAARS – A
Key Element of Tax Systems in the Post-BEPS Tax World. Amsterdam: IBFD, 2016,
p. 334. KOSTIC, Svetislav. Serbia. In: LANG, Michael; OWENS, Jeffrey; PIS-
TONE, Pasquale; RUST, Alexander; SCHUCH, Josef; STARINGER, Claus
(eds.). GAARS – A Key Element of Tax Systems in the Post-BEPS Tax World. Amster-
dam: IBFD, 2016, p. 576-577. KREVER, Richard; MELLOR, Peter. Australia.
In: LANG, Michael; OWENS, Jeffrey; PISTONE, Pasquale; RUST, Alexander;
SCHUCH, Josef; STARINGER, Claus (eds.). GAARS – A Key Element of Tax Sys-
tems in the Post-BEPS Tax World. Amsterdam: IBFD, 2016, p. 57-58. MELOT,
Nicolas. Territorialité et mondialité de l’impôt: Étude de l’imposition des bénéfices
des sociétés de capitaux à la lumière des expériences française et américaine.
Paris: Dalloz, 2004, p. 714-715. MORAVEC, Lukáš; NERUDOVÁ, Danuše. Cze-
ch Republic. In: LANG, Michael; OWENS, Jeffrey; PISTONE, Pasquale; RUST,
Alexander; SCHUCH, Josef; STARINGER, Claus (eds.). GAARS – A Key Element
of Tax Systems in the Post-BEPS Tax World. Amsterdam: IBFD, 2016, p. 226.
O’BRIEN, Martha. Canada. In: LANG, Michael; OWENS, Jeffrey; PISTONE,
Pasquale; RUST, Alexander; SCHUCH, Josef; STARINGER, Claus (eds.).
GAARS – A Key Element of Tax Systems in the Post-BEPS Tax World. Amsterdam:
IBFD, 2016, p. 163. OGUTTU, Annet Wanyana. South Africa. In: LANG, Mi-
chael; OWENS, Jeffrey; PISTONE, Pasquale; RUST, Alexander; SCHUCH, Jo-
sef; STARINGER, Claus (eds.). GAARS – A Key Element of Tax Systems in the Post-
-BEPS Tax World. Amsterdam: IBFD, 2016, p. 628-629. OLSSON, Stefan. Swe-
den. In: LANG, Michael; OWENS, Jeffrey; PISTONE, Pasquale; RUST,
Alexander; SCHUCH, Josef; STARINGER, Claus (eds.). GAARS – A Key Element
of Tax Systems in the Post-BEPS Tax World. Amsterdam: IBFD, 2016, p. 696. PAN-
KIV, Marta. Contemporary Application of the Arm’s Length Principle in Transfer Pri-
cing. Tese de doutorado, Wirtschaftsuniversität Wien, Wien, 2016, p. 148-150.
PIANTAVIGNA, Paolo. Italy. In: LANG, Michael; OWENS, Jeffrey; PISTONE,
Pasquale; RUST, Alexander; SCHUCH, Josef; STARINGER, Claus (eds.).
GAARS – A Key Element of Tax Systems in the Post-BEPS Tax World. Amsterdam:
IBFD, 2016, p. 384. REIMER, Ekkehart. Germany. In: DOURADO, Ana Paula
(ed.). Tax Avoidance Revisited in the EU BEPS Context. Amsterdam: IBFD, 2017, p.
371-373. THEOCHAROPOULOU, Eleni. Greece. In: DOURADO, Ana Paula
(ed.). Tax Avoidance Revisited in the EU BEPS Context. Amsterdam: IBFD, 2017, p.
392-393. TYUTYURYUKOV, Vladimir. Russia. In: LANG, Michael; OWENS,
Jeffrey; PISTONE, Pasquale; RUST, Alexander; SCHUCH, Josef; STARIN-
GER, Claus (eds.). GAARS – A Key Element of Tax Systems in the Post-BEPS Tax
World. Amsterdam: IBFD, 2016, p. 557. VAMRÅK, Ingebjørg. Norway. In:
LANG, Michael; OWENS, Jeffrey; PISTONE, Pasquale; RUST, Alexander;
SCHUCH, Josef; STARINGER, Claus (eds.). GAARS – A Key Element of Tax Sys-
tems in the Post-BEPS Tax World. Amsterdam: IBFD, 2016, p. 477. VILLENEU-
VE, Ege Berber. Turkey. In: LANG, Michael; OWENS, Jeffrey; PISTONE, Pas-
quale; RUST, Alexander; SCHUCH, Josef; STARINGER, Claus (eds.). GAARS
– A Key Element of Tax Systems in the Post-BEPS Tax World. Amsterdam: IBFD,
2016, p. 732-734. ZORNOZA, Juan José; BÁEZ, Andrés. Spain. In: LANG, Mi-
chael; OWENS, Jeffrey; PISTONE, Pasquale; RUST, Alexander; SCHUCH, Jo-
Clara Gomes Moreira 231

sef; STARINGER, Claus (eds.). GAARS – A Key Element of Tax Systems in the Post-
-BEPS Tax World. Amsterdam: IBFD, 2016, p. 669-670.
Em sentido contrário: BRAUNER, Yariv. Transfer Pricing and Tax Avoidance.
In: DOURADO, Ana Paula (ed.). Tax Avoidance Revisited in the EU BEPS Context.
Amsterdam: IBFD, 2017, p. 68. COURINHA, Gustavo Lopes. Portugal. In:
DOURADO, Ana Paula (ed.). Tax Avoidance Revisited in the EU BEPS Context.
Amsterdam: IBFD, 2017, p. 595. IMMONEN, Raimo; LINDGREN, Juha. Fin-
land. In: DOURADO, Ana Paula (ed.). Tax Avoidance Revisited in the EU BEPS
Context. Amsterdam: IBFD, 2017, p. 299-300. OLESIŃSKA, Agnieszka; WIT-
KOWSKA, Joanna. Poland. In: DOURADO, Ana Paula (ed.). Tax Avoidance Re-
visited in the EU BEPS Context. Amsterdam: IBFD, 2017, p. 562-564. PEETERS,
Bart. Belgium. In: DOURADO, Ana Paula (ed.). Tax Avoidance Revisited in the
EU BEPS Context. Amsterdam: IBFD, 2017, p. 158-160. WILDE, Maarten; WIS-
MAN, Ciska. Netherlands. In: DOURADO, Ana Paula (ed.). Tax Avoidance Revi-
sited in the EU BEPS Context. Amsterdam: IBFD, 2017, p. 506-507. ZIZZO, Giu-
seppe. Italy. In: DOURADO, Ana Paula (ed.). Tax Avoidance Revisited in the EU
BEPS Context. Amsterdam: IBFD, 2017, p. 414-415.
Cf. quanto às regras de limitação à dedução de juros: BERGMANN, Sebastian.
Austria. In: DOURADO, Ana Paula (ed.). Tax Avoidance Revisited in the EU BEPS
Context. Amsterdam: IBFD, 2017, p. 158-160. BLETIERE, Emmanuel Rain-
geard de la. France. In: DOURADO, Ana Paula (ed.). Tax Avoidance Revisited in
the EU BEPS Context. Amsterdam: IBFD, 2017, p. 337-339. BONNEAU, Natacha.
Capitalisation des Sociétés en France, en Allemagne et aux Etats-Unis. Lille: Atelier
National de Reproduction des Thèses, 1998, p. 123-142. BROE, Luc De. Inter-
national Tax Planning and Prevention of Abuse. Amsterdam: IBDF, 2007, p. 76.
BYUN, Hyejung; PARK, Soo Jean. South Korea. In: LANG, Michael; OWENS,
Jeffrey; PISTONE, Pasquale; RUST, Alexander; SCHUCH, Josef; STARIN-
GER, Claus (eds.). GAARS – A Key Element of Tax Systems in the Post-BEPS Tax
World. Amsterdam: IBFD, 2016, p. 645. CAO, Bristar Mingxing; LI, Na. China.
In: LANG, Michael; OWENS, Jeffrey; PISTONE, Pasquale; RUST, Alexander;
SCHUCH, Josef; STARINGER, Claus (eds.). GAARS – A Key Element of Tax Sys-
tems in the Post-BEPS Tax World. Amsterdam: IBFD, 2016, p. 196. DOURADO,
Ana Paula. The Interest Limitation Rule in the Anti-Tax Avoidance Directive
(ATAD) and the Net Taxation Principle. EC Tax Review, n. 3, p. 112-121, 2017, p.
118. DUBUT, Thomas. France. In: LANG, Michael; OWENS, Jeffrey; PISTO-
NE, Pasquale; RUST, Alexander; SCHUCH, Josef; STARINGER, Claus (eds.).
GAARS – A Key Element of Tax Systems in the Post-BEPS Tax World. Amsterdam:
IBFD, 2016, p. 280. EDEN, Sandra. United Kingdom. In: DOURADO, Ana Pau-
la (ed.). Tax Avoidance Revisited in the EU BEPS Context. Amsterdam: IBFD, 2017,
p. 761-763. ELLIFFE, Craig; SMITH, Andrew. New Zeland. In: LANG, Mi-
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xander; SCHUCH, Josef; STARINGER, Claus (eds.). GAARS – A Key Element of
Tax Systems in the Post-BEPS Tax World. Amsterdam: IBFD, 2016, p. 557.
Clara Gomes Moreira 233

No que diz respeito às regras brasileiras, alguns elementos or-


dinariamente são levantados pela doutrina mencionada como jus-
tificadores da afirmação de que tais regras buscam o combate à
elisão fiscal internacional: (1) em primeiro lugar, o fim manifesta-
do expressamente pelo legislador244 com base nas exposições de
motivos dos atos normativos em questão; (2) em segundo lugar, as
regras alienígenas que inspiraram a sua criação, além das regras
propostas pelo movimento internacional de combate à erosão da
base tributável e à transferência dos lucros245 – a ausência de iden-
tidade entre as regras brasileiras e as regras concebidas ou defendi-
das em outras partes do mundo ou por organizações internacionais
relativiza a relevância desse elemento; (3) em terceiro lugar, a estru-
tura normativa das regras brasileiras, dado o uso de ficções legais e
de presunções legais; (4) em quarto lugar, ainda no que se refere a
sua estrutura normativa, essas regras geralmente agravariam o tra-

VAMRÅK, Ingebjørg. Norway. In: LANG, Michael; OWENS, Jeffrey; PISTO-


NE, Pasquale; RUST, Alexander; SCHUCH, Josef; STARINGER, Claus (eds.).
GAARS – A Key Element of Tax Systems in the Post-BEPS Tax World. Amsterdam:
IBFD, 2016, p. 477. VANZ, Giuseppe. The Italian Interest Limitation Rule:
Constitutional Issues. European Taxation, p. 173-175, abr./2018, p. 174. VILLE-
NEUVE, Ege Berber. Turkey. In: LANG, Michael; OWENS, Jeffrey; PISTONE,
Pasquale; RUST, Alexander; SCHUCH, Josef; STARINGER, Claus (eds.).
GAARS – A Key Element of Tax Systems in the Post-BEPS Tax World. Amsterdam:
IBFD, 2016, p. 732-734. WILDE, Maarten; WISMAN, Ciska. Netherlands. In:
DOURADO, Ana Paula (ed.). Tax Avoidance Revisited in the EU BEPS Context.
Amsterdam: IBFD, 2017, p. 516-523. ZORNOZA, Juan José; BÁEZ, Andrés.
Spain. In: LANG, Michael; OWENS, Jeffrey; PISTONE, Pasquale; RUST, Ale-
xander; SCHUCH, Josef; STARINGER, Claus (eds.). GAARS – A Key Element of
Tax Systems in the Post-BEPS Tax World. Amsterdam: IBFD, 2016, p. 669-670.
Em sentido contrário: DRÜEN, Klaus-Dieter. Germany. In: LANG, Michael;
OWENS, Jeffrey; PISTONE, Pasquale; RUST, Alexander; SCHUCH, Josef;
STARINGER, Claus (eds.). GAARS – A Key Element of Tax Systems in the Post-
-BEPS Tax World. Amsterdam: IBFD, 2016, p. 297. ZIZZO, Giuseppe. Italy. In:
DOURADO, Ana Paula (ed.). Tax Avoidance Revisited in the EU BEPS Context.
Amsterdam: IBFD, 2017, p. 423.
244
O termo ‘legislador’ empregado aqui possui sentido amplo, de forma a incluir
todos aqueles que desempenham a função legislativa.
245
Não se desconhece que grande parte das disposições jurídicas nacionais atinen-
tes a essas regras antecede esse movimento, em que pese haver uma confluência
em muitos aspectos entre as regras brasileiras e as regras defendidas por este.
Além disso, não se olvide que algumas das sugestões desse movimento consoli-
dam a experiência estrangeira no tocante ao tema e estas serviram de inspira-
ção para as regras brasileiras.
234 Regra Constitucional de Competência e Tributação de Transações Transfronteiriças entre Partes Vinculadas

tamento fiscal de certos estados ou de certos comportamentos, ou


seja, as regras gerais tributárias muitas vezes concederiam a estes
um tratamento fiscal mais benéfico do que essas regras específicas
– o caráter específico dessas regras advém do fato de o seu antece-
dente ser consentâneo com determinada transação transfronteiriça
entre partes vinculadas; (5) em quinto lugar, essas regras pressupo-
riam uma ou mais ações abusivas dos contribuintes. Todos esses
elementos merecem esclarecimentos e críticas, sendo importante
ressaltar que os doutrinadores comumente reúnem mais de um
desses elementos para a interpretação do fim de tais regras.
Considerando os dois primeiros elementos, vê-se que ambos
dizem respeito ao fim subjetivo da norma, isto é, à pretensão do
legislador com a edição de um ato normativo. Note-se que esse fim
não investiga as intenções dos indivíduos isoladamente, como se
procurasse adentrar nas mentes de um grupo de pessoas. Trata-se
de uma abordagem consistente com as principais ideias defendidas
pelos legisladores, no espaço democrático, de maneira coerente
com o contexto jurídico e fático em que os atos normativos foram
concebidos.246-247
No que tange às regras de tributação em bases universais, por
um lado, na exposição de motivos da Medida Provisória n.
627/2013248, o Ministro da Fazenda defendeu que essa medida fiscal
pretende atingir os lucros das sociedades controladoras ou das co-
ligadas residentes no Brasil, as quais “inegavel[mente]” possuiriam
um “acréscimo patrimonial no Brasil” consequente da valorização
de suas participações em sociedades controladas ou em coligadas
residentes no exterior, e expresso pelo método de registro contábil
de equivalência patrimonial. Tais regras, destarte, atenderiam a
um “fim fiscal”, em consonância com a “isonomia tributária” reve-

246
Cf. AARNIO, Aulis. The Rational as Reasonable: A Treatise on Legal Justification.
Dordrecht: D. Reidel Publishing Company, 1987, p. 99-101. DUXBURY, Neil.
Elements of Legislation. Cambridge: Cambridge University Press, 2013, p. 92-119.
PECZENIK, Aleksander. On Law and Reason. Dordrecht, Heidelberg, London,
New York: Springer, 2008, p. 282-295.
247
Não se desconhecem os debates relativos a essa perspectiva teleológica, contu-
do, o aprofundamento desse tema ultrapassa esse objeto de estudo, razão pela
qual isso não será feito aqui.
248
Convertida na Lei n. 12.973/2014.
Clara Gomes Moreira 235

lada na tributação uniforme sobre a renda. Prevalece o posiciona-


mento doutrinário, por outro lado, de que as regras estrangeiras de
tributação em bases universais almejam combater a elisão fiscal in-
ternacional, já que procuram agravar o tratamento fiscal de negó-
cios jurídicos específicos que, ao escaparem da regra geral, em
princípio sofreriam menor encargo tributário (perspectiva domés-
tica) e progressivamente erodiriam a base tributável do Estado de
residência dos contribuintes. Tal modelo de negócio jurídico nor-
malmente combina o diferimento ou a não tributação nesse Estado
com a menor ou a inexistente tributação sobre a renda no Estado
de residência das sociedades controladas ou das coligadas. Isso pro-
voca uma redução da carga fiscal total do grupo de sociedades
(perspectiva global).
No tocante às regras de preços de transferência, na exposição
de motivos da Medida Provisória n. 563/2012249, o Ministro da Fa-
zenda afirmou que estas buscam controlar os preços praticados en-
tre partes vinculadas, sob a perspectiva fiscal, “a fim de coibir [as
suas] manipulações” por meio das quais as partes “transfer[em os]
lucros para países com menor imposição tributária sobre a renda”
e, dessa forma, “avilta[m] a base de tributação no Brasil”. Quanto
aos posicionamentos doutrinários alusivos às regras estrangeiras de
preços de transferência, argumenta-se que estas dirigem-se ao
combate da elisão fiscal internacional, especialmente dentro do
contexto do movimento internacional de combate à erosão da base
tributável e à transferência dos lucros. Aqueles que discordam des-
se posicionamento alegam que essas regras, em verdade, lançam as
‘regras do jogo’250, como regras fiscais, de acordo com a diversidade
de hipóteses de incidência passíveis de positivação pelo legislador,
ao instituir o imposto sobre a renda. A adoção do critério arm’s len-
gth, nesse caso, concretiza o princípio da igualdade.251 Em outras

249
Convertida na Lei n. 12.715/2012 que, por sua vez, alterou os artigos 18 a 23 da
Lei n. 9.430/1996.
250
BRAUNER, Yariv. Transfer Pricing and Tax Avoidance. In: DOURADO, Ana
Paula (ed.). Tax Avoidance Revisited in the EU BEPS Context. Amsterdam: IBFD,
2017, p. 63-66.
251
ALMEIDA, Carlos Otávio Ferreira de. Tributação Internacional da Renda: A
Competividade Brasileira à Luz das Ordens Tributária e Econômica. São Paulo:
Quartier Latin, 2014, p. 309.
236 Regra Constitucional de Competência e Tributação de Transações Transfronteiriças entre Partes Vinculadas

palavras, nessa visão, altera-se o modo de apuração do imposto de


acordo com o seu objeto. O lucro contábil, em linha com esse posi-
cionamento, não é sempre um parâmetro ‘confiável’ para a mensu-
ração da renda. Constate-se que, nesse entender, não há um fim
imediato antielisivo.
Considerando as regras de limitação à dedução de juros, na
exposição de motivos da Medida Provisória n. 472/2009252, o Minis-
tro da Fazenda defendeu que essas regras pretendem atingir os con-
tratos de empréstimos “que reduzem, artificialmente, o resultado
tributável no Brasil e [que], ao mesmo tempo, geram lucros que não
serão tributados de maneira representativa no exterior”. A doutrina
preponderante, de igual maneira, sustenta que as regras estrangei-
ras de limitação à dedução de juros objetivam combater a elisão
fiscal internacional, sem prejuízo daqueles que divergem sobre o
tema em atenção às peculiaridades de certas legislações domésticas.
Em conformidade com a legislação alemã, e.g., essas regras abar-
cam as relações jurídicas puramente domésticas253, o que atrai po-
sições pela descaracterização de sua especialidade, com base na
ausência do elemento de estraneidade no fato jurídico-tributário.
Essas posições também afastam a sua qualificação como regras an-
tielisivas, pois as regras alemãs compreendem situações em que não
há um abuso praticado pelo contribuinte.254 No caso italiano, ain-
da, a vedação à prova em contrário do abuso, da mesma forma,
fundamenta opiniões acerca da ausência desse fim antielisivo.
A análise dos elementos relativos ao fim subjetivo, segundo o
exposto, permite inferir a priori que as regras brasileiras de tribu-
tação em bases universais, de preços de transferência e de limitação
à dedução de juros visam a promover o combate à elisão fiscal in-
ternacional, ainda que não se desconheçam as discussões com base
em ordenamentos jurídicos estrangeiros. Os demais elementos da
interpretação teleológica dessas regras – a estrutura da norma e o
tratamento fiscal prescrito para determinados negócios jurídicos –

252
Convertida na Lei n. 12.249/2010.
253
Fala-se em uma regra de limitação à dedução de juros ampla que inclui as ope-
rações de mútuo oneroso com elementos de estraneidade e aquelas puramente
domésticas.
254
Cf. item 2.1 da Introdução.
Clara Gomes Moreira 237

relacionam-se com o seu fim objetivo, o qual é definido pela inter-


pretação dos elementos jurídicos255, em oposição aos elementos ex-
trajurídicos256 mencionados quanto ao fim subjetivo.257 Diferente-
mente deste último, o fim objetivo abstrai a figura do legislador
real para procurar o legislador racional258-259 e a sua interpretação,
dentre outros critérios, segue os sentidos literais e sistemáticos dos
dispositivos jurídicos.
A doutrina, como visto, continua essa análise a partir do em-
prego das ficções legais e das presunções legais em tais regras. Esta
tese discorda, apesar disso, que a utilização de ambas as técnicas
legislativas seja uma nota distintiva do fim de combate à elisão fis-
cal em relação aos demais fins260. Apoia-se essa compreensão no
fato de as ficções legais e as presunções legais em si mesmas serem
estruturas despidas em princípio de um conteúdo próprio além de
seu fim simplificador, como se fossem ‘cascas’ preenchidas – em
certa medida – com uma substância informada por outras normas
jurídicas que pautam um fim fiscal e/ou um extrafiscal persegui-
dos. Isso revela a ausência de uma conexão necessária entre as fic-
ções legais, as presunções legais e o fim antielisivo.261-262 Atente-se,
não obstante, que não raramente as regras destinadas ao combate
à elisão fiscal internacional adotam ficções legais e/ou presunções
legais, tais como as regras de tributação em bases universais (nes-

255
LARENZ, Karl. Metodologia da Ciência do Direito. 3. ed. Lisboa: Fundação Ca-
louste Gulbenkian, 1997, p. 447-450.
256
Perceba-se que, para fins dessa análise, a inspiração em regras alienígenas qua-
lifica-se como um elemento extrajurídico, considerando o ordenamento jurídi-
co brasileiro; além das exposições de motivos.
257
Cf. PECZENIK, Aleksander. On Law and Reason. Dordrecht, Heidelberg, Lon-
don, New York: Springer, 2008, p. 330-331.
258
BARAK, Aharon. Purposive Interpretation in Law. New Jersey: Princeton Univer-
sity Press, 2005, p. 148.
259
SIBLEY, W. M. The Rational Versus the Reasonable. The Philosophical Review, n.
62, p. 554-560, 1953, p. 556-557.
260
Em sentido contrário: LANG, Joachim; TIPKE, Klaus. Direito Tributário. 18. ed.
v. I. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2008, p. 333-334. [Quanto à
ficção legal.]
261
Cf. Seção 1 deste Capítulo.
262
Em sentido contrário: HARET, Florence Cronemberger. Presunções no Direito
Tributário: Teoria e prática. Tese de doutorado, Universidade de São Paulo, São
Paulo, 2010, p. 514.
238 Regra Constitucional de Competência e Tributação de Transações Transfronteiriças entre Partes Vinculadas

tas, há ficções legais263) e as de preços de transferência (nestas, há


presunções legais264). As regras de limitação à dedução de juros,
porém, não possuem ficções legais e presunções legais, mas ado-
tam critérios objetivos que facilitam o seu modo de aplicação, em
linha com o fim simplificador referido.265

2.1.1. Significação de elisão fiscal internacional


Antes que se continue com a análise do fim – em sua dimensão
objetiva – das regras de tributação em bases universais, de preços
de transferência e de limitação à dedução de juros, em consonância
com os demais elementos mencionados pela doutrina, delimita-se o
conceito de elisão fiscal internacional e a sua relação com o abuso
de direito, porquanto ambos são fundamentais para a compreen-
são dos elementos que orientam o fim dessas regras. Atente-se tam-
bém que não se desconsidera que esse conceito é objeto de inúme-
ras controvérsias doutrinárias, consoante se enfrentará nas páginas
seguintes. Nesse cenário de divergência, antecipe-se que, para fins
deste estudo, compreende-se a elisão fiscal internacional como as
ações e as omissões lícitas dos contribuintes, que causam a redução
da carga tributária, por meio da não incidência de regra tributária
mais gravosa e/ou da incidência de uma regra tributária mais bené-
fica, e que erodem a base tributável de um Estado.

2.1.1.1. Elisão fiscal internacional como as ações e as omissões


lícitas dos contribuintes
Com base na visão de Dória266 quanto à elisão fiscal, uma ação
ou uma omissão não pode ser, ao mesmo tempo, lícita e ilícita,
como qualificações excludentes. A licitude, além disso, de acordo
com essa compreensão, é ditada por critérios jurídicos, mesmo que
elementos extrajurídicos motivem e inspirem a produção de atos
normativos e, por conseguinte, influenciem a decisão sobre as nor-

263
Cf. item 1.1.4 deste Capítulo.
264
Cf. item 1.2.4 deste Capítulo.
265
Cf. itens 1.1.4 e 1.2.3 deste Capítulo.
266
DÓRIA, Antônio Roberto Sampaio. Elisão e evasão fiscal. 2. ed. São Paulo: José
Bushatsky, 1977, p. 44-49.
Clara Gomes Moreira 239

mas – faz-se aqui referência à eleição de um dentre os sentidos pos-


síveis de um texto267. Isso é especialmente importante diante dos
posicionamentos doutrinários268 que fundamentam equivocada-
mente a eventual ilicitude da elisão fiscal na imoralidade269, na fal-
ta de eticidade ou na contrariedade da ação ou da omissão do con-
tribuinte com os padrões ético-comerciais270, como uma consciên-
cia coletiva ou social avessa à prática271 e independente de respaldo
(direto) no ordenamento jurídico. O ilícito, em verdade, opõe-se às
orientações axiológico-normativas do direito, segundo um referen-
cial interno.272
Na doutrina brasileira273, prevalece o entendimento de que a
elisão fiscal se refere às ações e às omissões lícitas, na medida em

267
GUASTINI, Riccardo. Saggi scettici sull’interpretazione. Torino: G. Giappichelli
Editore, 2017, p. 47-48.
268
BECKER, Alfredo Augusto. Teoria Geral do Direito Tributário. 6. ed. São Paulo:
Noeses, 2013, p. 158. CHRISTIANS, Allison. Distinguishing Tax Avoidance and
Evasion. In: EPIFANTSEVA, Yuliya; HASHIMZADE, Nigar (eds.). The Routledge
Companion to Tax Avoidance Research. London, New York: Routledge, 2017, p. 417.
269
ANGOT, Fleur. La Distinction de L’Habilite et de L’Abus de Droit en Droit Fiscal
Comparé (France – Allemagne). Tese de Doutorado. Université de Paris II, Paris,
2003, p. 54-55.
270
TAKANO, Caio Augusto. Limites às normas antielisivas específicas para a con-
tenção da arbitragem fiscal internacional por intermédio de instrumentos hí-
bridos no direito brasileiro. Tese de Doutorado. Universidade de São Paulo, São
Paulo, 2019, p. 200-201.
271
ATIENZA, Manuel; MANERO, Juan Ruiz. Ilícitos atípicos: sobre o abuso de di-
reito, fraude à lei e desvio de poder. São Paulo: Marcial Pons, 2014, p. 41. RO-
SEMBUJ, Tulio. El Fraude de Ley, la Simulación y el Abuso de las Formas en el Derecho
Tributario. 2. ed. Madrid: Marcial Pons, 1999, p. 187. WARAT, Luis Alberto. Abuso
del Derecho y Lagunas de la Ley. Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 1926, p. 56-69.
272
SÁ, Fernando Augusto Cunha de. Abuso do direito. Coimbra: Almedina, 2005, p.
456 e 499.
273
BARRETO, Paulo Ayres. Planejamento Tributário: Limites Normativos. São Pau-
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Tributário. 6. ed. São Paulo: Noeses, 2013, p. 145. CANTO, Gilberto de Ulhôa.
Elisão e Evasão. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva (coord.). Elisão e Evasão
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Extensão Universitária e Resenha Tributária, 1988, p. 39-50. COÊLHO, Sacha
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240 Regra Constitucional de Competência e Tributação de Transações Transfronteiriças entre Partes Vinculadas

que a priori não violam quaisquer normas jurídicas. Um idêntico


entendimento é defendido em outras partes do mundo, já que não
há uma punição dessas ações ou dessas omissões nos ordenamentos
jurídicos respectivos.274 Tais comportamentos ou o seu resultado
enquadram-se em lacunas do direito, desse modo, são casos de não
tributação por ausência de previsão legal e/ou de tributação reduzi-
da por incidência de uma regra tributária menos onerosa.275 Enfa-
tize-se que essa conclusão não se limita às hipóteses em que as re-
gras tributárias expressamente facultam aos contribuintes a adoção
de um regime tributário mais benéfico, e.g., quando há a opção
pela tributação sobre a renda pelo regime de apuração real ou pelo
de apuração presumida276, como um resultado secundum legem. Dis-

São Paulo: Dialética, 2002, p. 31. MARTINS, Ives Gandra da Silva. Elisão e
Evasão Fiscal. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva (coord.). Elisão e Evasão Fis-
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Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2008, p. 339. NOVOA, César Gar-
cía. La Cláusula Antielusiva en la Nueva Ley General Tributaria. Madrid, Barcelo-
na: Marcial Pons, 2004, p. 89. ZIMMER, Frederick. General Report. In: Inter-
national Fiscal Association. Cahiers de Droit Fiscal International. Studies on Inter-
national Fiscal Law. Subject I: Form and substance in tax law. v. LXXXVIIa. The
Hague: Kluwer, 2002, p. 54.
275
MASSON, Charles Robbez. La Notion d’Évasion Fiscale en Droit Interne Français.
Paris: Librairie Générale de Droit et de Jurisprudence, 1990, p. 124-127.
276
Cf. artigo 26 da Lei n. 9.430/1996.
Clara Gomes Moreira 241

so deriva que a ausência de autorização legal expressa não implica


per se a ilicitude das ações e/ou das omissões dos contribuintes.277
Canto278 sustenta que essa conclusão advém do direito do con-
tribuinte de escolher como exercer a sua liberdade – o direito fun-
damental de liberdade. Por assim dizer, na celebração dos negócios
jurídicos, os indivíduos devem poder optar pela forma e pelas con-
dições contratuais que lhes sejam mais econômicas em termos fis-
cais, sob a condição de que respeitem as normas jurídicas aplicá-
veis. O princípio da legalidade, nessa visão, é o limite jurídico279
aplicável – e a regra constitucional de competência tributária, como
uma concretização desse princípio, igualmente deve ser observa-
da280 –, ou seja, se não há a violação de uma norma, não há o fun-
damento jurídico para concluir pela ilicitude das ações ou das
omissões dos indivíduos. Esse raciocínio guarda, ainda, relação
com o direito fundamental de propriedade. Quanto a este, desta-
que-se a vedação ao confisco281; em linha com a qual, é proibida a
tributação para além da autorização legal, sob pena de configurar
o confisco282-283.

277
Cf., em sentido contrário: CAMPOS, Diogo Leite de; CAMPOS, Mônica Horta
Neves Leite de. Direito Tributário. 2. ed. Coimbra: Almedina, 2000, p. 161-162.
278
CANTO, Gilberto de Ulhôa. Elisão e Evasão. In: MARTINS, Ives Gandra da
Silva (coord.). Elisão e Evasão Fiscal. Caderno de Pesquisas Tributárias. v. 13. São
Paulo: Centro de Estudos de Extensão Universitária e Resenha Tributária,
1988, p. 39-50.
279
BRACEWELL-MILNES, Barry; WISSELINK, M. A. Concepts and criteria of
international tax avoidance. In: International Tax Avoidance: A Study by the Rot-
terdam Institute for Fiscal Studies. Volume A: General and Conceptual Mate-
rial. Deventer: Kluwer, 1979, p. 338. CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de
Direito Tributário. 23. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 602-603.
280
Cf. item 3.1.3 do Capítulo I do Título I.
281
Cf. artigos 5º, inciso II, e 150, incisos I e IV, da Constituição.
282
OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. Elisão e Evasão Fiscal. In: MARTINS, Ives Gan-
dra da Silva (coord.). Elisão e Evasão Fiscal. Caderno de Pesquisas Tributárias. v. 13.
São Paulo: Centro de Estudos de Extensão Universitária e Resenha Tributária,
1988, p. 148-149. PACIELLO, Gaetano; ROTHMANN, Gerd Willi. Elisão e Eva-
são Fiscal. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva (coord.). Elisão e Evasão Fiscal.
Caderno de Pesquisas Tributárias. v. 13. São Paulo: Centro de Estudos de Extensão
Universitária e Resenha Tributária, 1988, p. 396-397. XAVIER, Alberto. Direito
Tributário Internacional do Brasil. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 272.
283
Essa limitação também pode ser lida como uma decorrência do princípio da
legalidade.
242 Regra Constitucional de Competência e Tributação de Transações Transfronteiriças entre Partes Vinculadas

Em sentido contrário a essa posição explicitada (pela licitude


dos comportamentos dos contribuintes na elisão fiscal), outros au-
tores284-285 partem para a argumentação de que a elisão fiscal se
associa ao abuso de direito. De acordo com essa interpretação, na
elisão fiscal, há um ilícito objeto de uma sanção286.287-288-289 Tal abu-
so com o qual a elisão fiscal se relaciona diz respeito não à violação
frontal de uma norma pelo comportamento do contribuinte ou de
outrem, mas sim à oposição ao espírito desta.290-291 Em outras pala-
vras, no abuso de direito, as ações e as omissões dos indivíduos in-
vertem os sentidos das normas sustentados pelos princípios jurídi-
cos por estas protegidos e, como resultado, o comportamento indi-
vidual torna-se ilícito.292

284
AMATUCCI, Fabrizio. Principi e Nozioni di Diritto Tributario. 3. ed. Torino: G.
Giappichelli Editore, 2016, p. 116. FILIPCZYK, Hanna. Tax Avoidance and Ra-
tionality of Law. Warszawa: Wolters Kluwer, 2017, p. 30. PISTONE, Pasquale.
Abuso del diritto ed elusione fiscale. Padova: CEDAM, 1995, p. 64.
285
Alguns autores preferem falar em fraude à lei, mormente no caso do ordena-
mento jurídico espanhol e aqueles influenciados por este; outros preferem falar
em abuso de forma, principalmente no caso do ordenamento jurídico alemão e
aqueles influenciados por este [Cf. NETO, Luís Flávio. Teorias do “abuso” no
planejamento tributário. Dissertação de Mestrado. Universidade de São Paulo,
São Paulo, 2011, p. 171-173.]. Para fins deste estudo, porém, é desnecessário
distinguir o abuso de direito da fraude à lei e do abuso de forma. [DÓRIA, An-
tônio Roberto Sampaio. Elisão e Evasão Fiscal. 2. ed. São Paulo: José Bushatsky,
1977, p. 117-118.]. Observe-se que maiores considerações sobre esse tema ultra-
passam o objeto deste estudo.
286
ROSEMBUJ, Tulio. El Fraude de Ley, la Simulación y el Abuso de las Formas en el
Derecho Tributario. 2. ed. Madrid: Marcial Pons, 1999, p. 189. TORRES, Heleno
Taveira. Direito Tributário e Autonomia Privada: Negócios jurídicos e atitude elu-
siva na aplicação das normas tributárias. Tese para o concurso de livre-docên-
cia, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2002, p. 249.
287
TABOADA, Carlos Palao. La Aplicación de las Normas Tributarias y la Elusión
Fiscal. Valladolid: Lex Nova, 2009, p. 97.
288
Cf. ABRAHAM, Marcus. O planejamento tributário e o Direito Privado. São Paulo:
Quartier Latin, 2007, p. 233-234. [Esse autor fala em elisão fiscal lícita e ilícita.]
289
Cf. em sentido contrário: MCNAUGHTON, Charles William. Elisão e Norma
Antielisiva: Completabilidade e Sistema Tributário. São Paulo: Noeses, 2014, p. 467.
290
AVI-YONAH, Reuven S.; MARIAN, Omri; SARTORI, Nicola. Global Perspectives
on Income Taxation Law. New York: Oxford University Press, 2011, p. 101.
291
PIANTAVIGNA, Paolo. Abuso del Diritto Fiscale nell’Ordinamento Europeo. Tori-
no: G. Giappichelli Editore, 2011, p. 29.
292
ATIENZA, Manuel; MANERO, Juan Ruiz. Ilícitos atípicos: Sobre o abuso de di-
Clara Gomes Moreira 243

Para melhor compreensão do conceito de abuso de direito, re-


corre-se a um exemplo do direito francês: o caso da Princesse de
Bauffremont293. Uma vez declarada a separação de corpos (sépara-
tion de corps) entre o príncipe e a princesa de Bauffremont, esta re-
quereu a nacionalidade alemã, a qual foi obtida. Observe-se que,
em consonância com as normas vigentes à época no direito francês,
o divórcio era vedado. Este, contudo, era autorizado pelo direito
alemão. Assim sendo, com a obtenção da nacionalidade alemã, a
princesa casou-se novamente. A Corte de Cassação (Cour de Cassa-
tion) francesa, no entanto, ao ser instada a se manifestar sobre isso,
reconheceu a fraude à lei/o abuso de direito294 da ação da princesa,
já que o requerimento da nacionalidade alemã se deu com o objeti-
vo único de infringir a regra francesa e permitir o seu segundo
casamento. Vale dizer, ao pedir a nacionalidade alemã, a princesa
não pretendia exercer todos os direitos e os deveres que acompa-
nham a concessão de uma nacionalidade, mas tão somente afastar
a aplicação da lei francesa. Por essa razão, esse tribunal declarou a
inoponibilidade ao príncipe do segundo casamento da princesa.295
Em matéria tributária, no julgamento do recurso especial n.
1.143.216/RS (representativo de controvérsia infraconstitucional)296,
o Superior Tribunal de Justiça avaliou a legalidade da exclusão de
contribuinte de programa de parcelamento de débitos tributários
em consequência da desistência extemporânea de impugnação ad-
ministrativa. Nesse caso, nos mais de cinco anos anteriores à exclu-
são, o contribuinte efetuou o pagamento pontual de todas as parce-
las devidas, sem que houvesse qualquer oposição da Administração

reito, fraude à lei e desvio de poder. São Paulo: Marcial Pons, 2014, p. 27. SÁ,
Fernando Augusto Cunha de. Abuso do Direito. Coimbra: Almedina, 2005, p. 456.
293
FRANÇA. Cour de Cassation, Chambre Civile. Decisão de 18.3.1878.
294
O direito francês prefere falar em fraude à lei, mas esta é sinônima de abuso de
direito. [ANGOT, Fleur. La Distinction de L’Habilite et de L’Abus de Droit en Droit
Fiscal Comparé (France – Allemagne). Tese de doutorado, Université de Paris II,
Paris, 2003, p. 123, 146.]
295
Observe-se que maiores considerações sobre esse tema ultrapassam o objeto
deste estudo.
296
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso especial n. 1.143.216/RS. Rel.
Min. Luiz Fux, j. 24.3.2010, DJe 9.4.2010.
244 Regra Constitucional de Competência e Tributação de Transações Transfronteiriças entre Partes Vinculadas

Pública. Em face disso, esse tribunal reconheceu a ilegalidade dessa


exclusão, porquanto a Fazenda Pública abusou de seu direito. Isto
é, esta possui o direito de indeferir a habilitação de contribuinte em
um programa de parcelamento pelo descumprimento de um dos
requisitos necessários para tanto, como no caso de ausência de de-
sistência das ações judiciais e administrativas em curso. Ao deferir
a habilitação, todavia, a exclusão superveniente do contribuinte,
pois tal habilitação, em verdade, era indevida – principalmente
após o decurso de um longo período desde o seu deferimento –,
ultrapassa as faculdades do ente público. Mesmo porque, conforme
o cenário exposto, a exclusão do contribuinte contraria os fins das
regras em questão: (1) facilitar o adimplemento das obrigações tri-
butárias pelos contribuintes; e (2) conferir à Administração Pública
um meio menos árduo e menos oneroso para o recebimento do
pagamento de seus créditos. Ao encampar esse posicionamento, o
Superior Tribunal de Justiça decidiu manter o contribuinte nesse
programa.
Enfatiza-se, a partir dessa dualidade de exemplos, que a essên-
cia do abuso de direito reside no entrechoque entre um comporta-
mento individual e um fim normativo, sendo aquele, em princípio,
albergado por um direito subjetivo. Vale dizer, tal instituto cinge a
um conflito normativo, porquanto questiona-se a incidência ou a
não incidência de uma norma, em um cenário de – aparente ou
efetiva – contraposição entre a interpretação literal e a teleológica
de um dispositivo. Uma eventual resposta positiva alcançada (‘Há
abuso de direito.’), nesse caso, pode provocar a requalificação jurí-
dica dos fatos para a aplicação da norma adequada.

2.1.1.1.1. Abuso de direito em matéria tributária


Para o deslinde dessa divergência quanto à licitude da elisão
fiscal ou a sua ilicitude, este estudo segue com a investigação da
compatibilidade ou da incompatibilidade do abuso de direito com
a elisão fiscal. Registre-se, oportunamente, que há uma multiplici-
dade de posicionamentos acerca do tema. Sugere-se, assim, em um
primeiro momento, expor esses diferentes posicionamentos e, em
um segundo momento, criticá-los.
Uma leitura inicial da controvérsia indica que o abuso de direi-
to em matéria tributária deriva da celebração de um negócio jurí-
Clara Gomes Moreira 245

dico que transborda dos padrões normais297 ou típicos298, haja vista


que o contribuinte se aproveita das lacunas e das imperfeições das
regras tributárias299. Isso decorreria da interpretação literal das
disposições jurídicas300. Acrescente-se que, sob esse entendimento,
o abuso de direito versa sobre duas normas.301 A primeira regra (a
regra abusada) não seria aplicada, já que a forma jurídica302 empre-
gada pelo contribuinte afastaria a sua subsunção, na medida em
que faltariam requisitos necessários para tanto, a despeito de essa
situação concreta possuir os efeitos que essa regra almejava atingir;
ou, ainda, se trataria de uma regra menos onerosa aplicada em um
caso que não se amolda a seu fim.303 Evidencie-se que, em linha
com esse raciocínio, em ambas as hipóteses, a aplicação ou a não

297
DÓRIA, Antônio Roberto Sampaio. Elisão e Evasão Fiscal. 2. ed. São Paulo: José
Bushatsky, 1977, p. 44-107-108. TABOADA, Carlos Palao. La Aplicación de las
Normas Tributarias y la Elusión Fiscal. Valladolid: Lex Nova, 2009, p. 25. XA-
VIER, Alberto. Tipicidade da tributação, simulação e norma antielisiva. São Paulo:
Dialética, 2001, p. 88-96.
298
PISTONE, Pasquale. Abuso del diritto ed elusione fiscale. Padova: CEDAM, 1995,
p. 64.
299
NOVOA, César García. La Cláusula Antielusiva en la Nueva Ley General Tributa-
ria. Madrid, Barcelona: Marcial Pons, 2004, p. 90. SEIXAS FILHO, Aurélio
Pitanga. A Elisão Tributária e a Interpretação Econômica. Revista de Direito Tri-
butário Atual, n. 24, p. 211-220, 2010, p. 211. YAMASHITA, Douglas. Limites à
Economia de Tributos da Teoria Legal à Prática Jurisprudencial. In: YAMASHI-
TA, Douglas (coord.). Planejamento Tributário à Luz da Jurisprudência. São Paulo:
Lex Editora, 2007, p. 73.
300
BROOKS, Kim; KOLOZS, Borbala; THURONYI, Victor. Comparative Tax Law.
2. ed. Alphen aan den Rijn: Wolters Kluwer, 2016, p. 129.
301
LÓPEZ, José Manuel Tejerizo; OLLERO, Gabriel Casado; QUERALT, Juan
Martín; SERRANO, Carmelo Lozano. Curso de Derecho Financiero y Tributario.
28. ed. Madrid: Tecnos, 2017, p. 183.
302
PISTONE, Pasquale. The Meaning of Tax Avoidance and Aggressive Tax Plan-
ning in European Union Tax Law: Some Thoughts in Connection with the
Reaction to Such Practices by the European Union. In: DOURADO, Ana Paula
(ed.). Tax Avoidance Revisited in the EU BEPS Context. Amsterdam: IBFD, 2017,
p. 75.
303
ROSEMBUJ, Tulio. El Fraude de Ley, la Simulación y el Abuso de las Formas en el
Derecho Tributario. 2. ed. Madrid: Marcial Pons, 1999, p. 190. SEILER, Markus.
GAARS and Judicial Anti-Avoidance in Germany, the UK and the EU. Wien: Linde,
2016, p. 129, 270-271. TABOADA, Carlos Palao. La Aplicación de las Normas
Tributarias y la Elusión Fiscal. Valladolid: Lex Nova, 2009, p. 133.
246 Regra Constitucional de Competência e Tributação de Transações Transfronteiriças entre Partes Vinculadas

aplicação da regra tributária contraria o seu fim.304-305 A segunda


norma (a norma de amparo ou de cobertura), por sua vez, seria
aplicada em ambas as hipóteses. Essa norma refere-se ao direito
subjetivo do contribuinte, o qual albergaria em princípio o abuso
cometido.306
Observe-se que, sob a perspectiva civilista307, por sua vez, pos-
tula-se que o abuso de direito viola a boa-fé objetiva308. Os partidá-
rios desse posicionamento, porém, não se aprofundaram no escla-
recimento do porquê a elisão fiscal violaria a boa-fé objetiva, sendo
difícil para este estudo esmiuçar essa visão.
Verifique-se, ainda, que alguns doutrinadores identificam o
abuso de direito sob dois prismas: um elemento subjetivo concer-
nente à intenção de fraudar as regras tributárias dada a contrarie-
dade do comportamento do contribuinte com os fins da regra que
ele procura afastar; e um elemento objetivo relativo à incidência de
uma regra mais benéfica ou mesmo à ausência de tributação por
inexistência de previsão legal. Admita-se que os partidários desse
entendimento, no que cinge ao relacionamento entre a elisão fiscal
e o abuso de direito, acabam por defender que o elemento subjetivo

304
LANG, Joachim; TIPKE, Klaus. Direito Tributário. 18. ed. v. I. Porto Alegre:
Sergio Antonio Fabris Editor, 2008, p. 333-334. SÁ, Fernando Augusto Cunha
de. Abuso do Direito. Coimbra: Almedina, 2005, p. 437.
305
Cf. item 2.1.1.1.2 deste Capítulo.
306
ANGOT, Fleur. La Distinction de L’Habilite et de L’Abus de Droit en Droit Fiscal
Comparé (France – Allemagne). Tese de doutorado, Université de Paris II, Paris,
2003, p. 38-42. ATIENZA, Manuel; MANERO, Juan Ruiz. Ilícitos atípicos: Sobre
o abuso de direito, fraude à lei e desvio de poder. São Paulo: Marcial Pons, 2014,
p. 62. RICA, Narciso Amorós. O Conceito de Fraude à Lei no Direito Espanhol.
In: MACHADO, Brandão (coord.). Direito Tributário: Estudos em Homenagem
ao Prof. Ruy Barbosa Nogueira. São Paulo: Saraiva, 1984, p. 428-430. TABOA-
DA, Carlos Palao. La Aplicación de las Normas Tributarias y la Elusión Fiscal. Val-
ladolid: Lex Nova, 2009, p. 21-22, 28.
307
Cf. artigo 187 do Código Civil: “Também comete ato ilícito o titular de um direi-
to que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico
ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes”.
308
ATIENZA, Manuel; MANERO, Juan Ruiz. Ilícitos atípicos: Sobre o abuso de di-
reito, fraude à lei e desvio de poder. São Paulo: Marcial Pons, 2014, p. 68. VER-
SIGLIONI, Marco. Abuso del diritto, logica e costituzione: ‘imposta impossibile’
e ‘sanzione possibile’. In: FICARI, Valerio; MARINI, Giuseppe; VALLE, Euge-
nio della (coords.). Abuso del Diritto ed Elusione Fiscale. Torino: G. Giappichelli
Editore, 2016, p. 49.
Clara Gomes Moreira 247

é englobado por aquele objetivo309, uma vez que não há uma clara
distinção entre estes. Demonstra-se isso com base no fato de os
meios de prova de ambos os elementos serem comuns. Essa inter-
pretação funda-se na artificialidade do comportamento do contri-
buinte310, dado que a forma jurídica usada divergiria da razão eco-
nômica que a justificou311, e.g., quando se adota como razão úni-
ca312-313 ou predominante314 a economia de tributos.315 Pondere-se,
no entanto, que esse raciocínio pressupõe que as razões econômi-
co-comerciais para uma ação e/ou uma omissão do contribuinte
baseiem-se em um argumento outro que não o fiscal, como se a
questão tributária fosse um elemento neutro (ou de menor impor-

309
ATIENZA, Manuel; MANERO, Juan Ruiz. Ilícitos atípicos: Sobre o abuso de di-
reito, fraude à lei e desvio de poder. São Paulo: Marcial Pons, 2014, p. 64. BRA-
CEWELL-MILNES, Barry; WISSELINK, M. A. Concepts and criteria of inter-
national tax avoidance. In: International Tax Avoidance: A Study by the Rotter-
dam Institute for Fiscal Studies. Volume A: General and Conceptual Material.
Deventer: Kluwer, 1979, p. 341. PISTONE, Pasquale. Il divieto di abuso come
principio del diritto tributario comunitario e la sua influenza sulla giurispru-
denza tributaria nazionale. In: MAISTO, Guglielmo (coord.). Elusione ed Abuso
del Diritto Tributario: Orientamenti attuali in materia di elusione e abuso del
diritto ai fini dell’imposizione tributaria. Milano: Giuffrè, 2009, p. 315, 330.
310
ANGOT, Fleur. La Distinction de L’Habilite et de L’Abus de Droit en Droit Fiscal
Comparé (France – Allemagne). Tese de doutorado, Université de Paris II, Paris,
2003, p. 21, 43, 45. ZIMMER, Frederick. General Report. In: INTERNATIO-
NAL FISCAL ASSOCIATION. Cahiers de Droit Fiscal International. Studies on
International Fiscal Law. Subject I: Form and substance in tax law. v. LXXXVIIa.
The Hague: Kluwer, 2002, p. 42.
311
ALMENDRAL, Violeta Ruiz. El Fraude a la Ley Tributaria a Examen: Los proble-
mas de la aplicación práctica de la norma general anti-fraude del artículo 15 de
la LGT a los ámbitos nacional y comunitario. Cizur Menor: Aranzadi, 2006, p.
81-85. ANGOT, Fleur. La Distinction de L’Habilite et de L’Abus de Droit en Droit
Fiscal Comparé (France – Allemagne). Tese de doutorado, Université de Paris II,
Paris, 2003, p. 21, 37, 161. XAVIER, Alberto. Direito Tributário Internacional do
Brasil. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 325.
312
GUTMANN, Daniel. Droit fiscal des affaires. 8. ed. Issy-les-Moulineaux: LGDJ,
2017, p. 785. TABOADA, Carlos Palao. La Aplicación de las Normas Tributarias y
la Elusión Fiscal. Valladolid: Lex Nova, 2009, p. 92.
313
Cf., em sentido contrário: MACHADO, Hugo de Brito. Introdução ao planeja-
mento tributário. São Paulo: Malheiros, 2014, p. 116 e 118.
314
XAVIER, Alberto. Tipicidade da tributação, simulação e norma antielisiva. São Pau-
lo: Dialética, 2001, p. 87.
315
XAVIER, Alberto. Direito Tributário Internacional do Brasil. 8. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2016, p. 325.
248 Regra Constitucional de Competência e Tributação de Transações Transfronteiriças entre Partes Vinculadas

tância) nessa tomada de decisão. Isso, porém, não se sustenta na


prática.
Em linha com a defesa do abuso de direito na elisão fiscal,
convergem-se também distintas explicações relativas ao direito sub-
jetivo do contribuinte que tutelaria a sua posição. De acordo com
uma compreensão, no abuso de direito, o comportamento do con-
tribuinte ultrapassaria os limites de seu direito de liberdade316, ou
seja, haveria um agir sem direito.317 Outros preferem falar na rela-
tividade desse direito em consequência de sua ponderação com ou-
tra(s) norma(s) conflitante(s).318 Do mesmo modo, há quem suscite a
violação da função social da propriedade319 como resultado do
dano social provocado pela perda de arrecadação320 – reconheça-se
que o referencial à coletividade nessa situação equivale a uma ex-
pressão da supremacia do interesse público, a qual é incompatível
com o ordenamento jurídico brasileiro321-322. Nesse mesmo sentido,
é interessante transcrever a definição de Moreira323 ao caracterizar

316
XAVIER, Alberto. Direito Tributário Internacional do Brasil. 8. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2016, p. 273-274.
317
PERLINGIERI, Giovanni. Profili Civilistici dell’Abuso Tributario: L’inopponibilità
delle condotte elusive. Napoli: Edizioni Scientifiche Italiane, 2012, p. 20-24. PIS-
TONE, Pasquale. Abuso del diritto ed elusione fiscale. Padova: CEDAM, 1995, p. 58.
318
JOSSERAND, Louis. Relatividad y Abuso de los Derechos. In: JOSSERAND,
Louis. Del Abuso de los Derechos y Otros Ensayos. Bogotá: Editorial Temis, 2015.
LEVY, José Luiz. A Vedação ao Abuso de Direito como Princípio Jurídico. São Paulo:
Quartier Latin, 2015, p. 277, 317.
319
PERLINGIERI, Giovanni. Profili Civilistici dell’Abuso Tributario: L’inopponibilità
delle condotte elusive. Napoli: Edizioni Scientifiche Italiane, 2012, p. 18.
320
PIANTAVIGNA, Paolo. Abuso del Diritto Fiscale nell’Ordinamento Europeo. Tori-
no: G. Giappichelli Editore, 2011, p. 23.
321
SCHOUERI, Luís Eduardo. Planejamento tributário e garantias dos contri-
buintes: entre a norma geral antielisão portuguesa e seus paralelos brasileiros.
In: ALMEIDA, Daniel Freire e; CATARINO, João Ricardo; GOMES, Fabio Luiz
(coords.). Garantias dos contribuintes no sistema tributário: homenagem a Diogo
Leite de Campos. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 414.
322
Cf. item 2.1.1.1.2 deste Capítulo.
323
ALVES, José Carlos Moreira. II – Aspectos jurídicos: figuras correlatas: abuso
de forma, abuso de direito, dolo, negócios jurídicos simulados, fraude à lei, ne-
gócio indireto e dissimulação. In: Seminário Internacional sobre Elisão Fiscal
(2001: Brasília). Anais do Seminário Internacional sobre Elisão Fiscal, realizado pela
Escola de Administração Fazendária – ESAF, em Brasília, no período de 6 a 8 de agos-
to de 2001. Brasília: ESAF, 2002, p. 70.
Clara Gomes Moreira 249

o abuso de direito como o “exercício egoístico, anormal do direito,


sem motivos legítimos, com excessos intencionais ou voluntários,
dolosos ou culposos, nocivos a outrem, contrário ao critério econô-
mico e social do direito em geral”.

2.1.1.1.2. Regras de tributação em bases universais, de preços de


transferência e de limitação à dedução de juros visam a combater a
elisão fiscal internacional, mas não buscam combater o abuso de
direito
Quando se volta às regras infraconstitucionais de tributação
em bases universais, de preços de transferência e de limitação à
dedução de juros, como regras ditas largamente destinadas ao
combate da elisão fiscal internacional, percebe-se que o conceito de
abuso de direito não é compatível com o enunciado e os limites ju-
rídicos dessas regras.324 Essa ideia torna-se mais nítida caso se con-
sidere que, em um contexto de incerteza conceitual concernente a
tal abuso, as referidas regras infraconstitucionais não se destinam
às situações em que se discute a verdade dos fatos, como nos casos
de simulação ou de dissimulação, quando a vontade externalizada
diverge da realidade325 em atenção aos elementos essenciais dos ne-
gócios jurídicos326-327.328 Para fins exemplificativos, considere-se a
celebração de uma compra e venda a preço vil. Essa relação jurídica

324
Cf. NAVARRO, Aitor. Transactional Adjustments in Transfer Pricing. Amsterdam:
IBFD, 2018, p. 22-24. Disponível em: https://www.ibfd.org/. Acesso em: 1º jan.
2018.
325
Cf. ÁVILA, Humberto. Planejamento tributário. Revista de Direito Tributário, v.
98, p. 74-85, 2007, p. 76.
326
BOZZA, Fábio Piovesan. Planejamento tributário e autonomia privada. São Paulo:
Quartier Latin, 2001, p. 165. FERRAZ JUNIOR, Tercio Sampaio. Mesa de deba-
tes do IBDT de 21/03/2013, p. 6. Disponível em: http://ibdt.org.br/material/arqui-
vos/Atas/Integra_21032013.pdf. Acesso em: 1º jan. 2018.
327
Observe-se que maiores considerações sobre esse tema ultrapassam o objeto
deste estudo.
328
Cf. BÁEZ MORENO, Andrés; ZORNOZA PÉREZ, Juan. The General Anti-abu-
se Rule of the Anti-tax Avoidance Directive. In: ALMUDÍ CID, José Manuel;
FERRERAS GUTIÉRREZ, Jorge A.; HERNÁNDEZ GONZÁLEZ-BARREDA,
Pablo A (eds.). Combating Tax Avoidance in the EU: Harmonization and Coopera-
tion in Direct Taxation. Alphen aan den Rijn: Kluwer Law International, 2019,
p. 123.
250 Regra Constitucional de Competência e Tributação de Transações Transfronteiriças entre Partes Vinculadas

tem o conteúdo de outro contrato, a doação, uma vez que a vontade


externalizada é incompatível com a realidade. Nos casos de simula-
ção ou de dissimulação, alcançando os fatos verdadeiros, requalifi-
ca-se o tratamento jurídico da realidade329-330.331
As regras de tributação em bases universais, de preços de
transferência e de limitação à dedução de juros, não obstante, apli-
cam-se indistintamente a todos os negócios jurídicos que atendam
aos critérios objetivos prescritos por estas, independentemente das
particularidades concretas para além desses critérios. Não se pre-
tende com tais regras, frise-se, requalificar a realidade, mas sim
prevenir a elisão fiscal internacional por meio da introdução de um
tratamento tributário uniforme que incida sobre certos padrões de
comportamento dos contribuintes332.333-334
Enfatize-se também que, em consonância com vários dos posi-
cionamentos doutrinários descritos, no abuso de direito, o compor-
tamento do contribuinte contraria o fim de uma regra tributária
fundado em um direito subjetivo. A regra abusada prescreve, e.g.,
que ‘O lucro operacional não compreende as despesas operacio-
nais, aquelas necessárias à atividade da empresa e [à] manutenção
da respectiva fonte produtiva.’335; e a regra de amparo diz respeito
ao direito de liberdade, o qual permite que o contribuinte desenhe

329
Cf. artigo 149, inciso VII, do Código Tributário Nacional.
330
Cf. ÁVILA, Humberto. Eficácia do Novo Código Civil na Legislação Tributária.
In: GRUPENMACHER, Betina Treiger (coord.). Direito Tributário e o novo Código
Civil. São Paulo: Quartier Latin, 2004, p. 76-77. GUTMANN, Daniel. Droit fiscal
des affaires. 8. ed. Issy-les-Moulineaux: LGDJ, 2017, p. 745-747.
331
TORRES, Heleno Taveira. Direito Tributário e Autonomia Privada: Negócios jurí-
dicos e atitude elusiva na aplicação das normas tributárias. Tese para o concur-
so de livre-docência, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2002, p. 237. TOR-
RES, Ricardo Lobo. Planejamento Tributário: elisão abusiva e evasão fiscal. 2. ed.
Rio de Janeiro: Elsevier, 2013, p. 80.
332
Cf. HEY, Johanna. Spezialgesetzliche Missbrauchsgesetzgebung aus steuersys-
tematischer, verfassungs- und europarechtlicher Sicht. Steuer und Wirtschaft, p.
167-183, 2008, p. 172.
333
Cf. PISTONE, Pasquale. The Meaning of Tax Avoidance and Aggressive Tax
Planning in European Union Tax Law: Some Thoughts in Connection with the
Reaction to Such Practices by the European Union. In: DOURADO, Ana Paula
(ed.). Tax Avoidance Revisited in the EU BEPS Context. Amsterdam: IBFD, 2017, p. 78.
334
Cf. Capítulo II deste Título.
335
Cf. artigos 43 e 47 da Lei n. 4.506/1964.
Clara Gomes Moreira 251

um negócio jurídico segundo a sua autonomia da vontade, fixando


o preço devido a sua parte vinculada, desde que respeitadas as nor-
mas jurídicas aplicáveis336.
Nesse cenário, Ruiz A lmendral337 examinou o cabimento da
interpretação teleológica das regras fiscais338, considerando o seu
abuso pelo titular do direito de liberdade. O estudo dessa autora
salienta que os contribuintes, muitas vezes, procuram afastar a in-
cidência de uma regra tributária mais onerosa e reduzir a carga
tributária devida339, o que impreterivelmente conflita com o fim
dessas regras. Nessa linha de argumentação, quaisquer ações e/ou
omissões dos contribuintes que impliquem a redução da arrecada-
ção tributária configuram o abuso de direito. Para evitar essa con-
clusão, Ruiz A lmendral sugere que o abuso das regras fiscais de-
penda de uma violação do princípio da igualdade, como uma justi-
ficação ‘ética’340.341
Em que pese esta tese não discordar de que o princípio da
igualdade é um dos fundamentos das regras de tributação em bases

336
E.g., a necessidade de escritura pública para a transferência de direitos reais
relativos aos imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo
vigente no País (artigo 108 do Código Civil).
337
ALMENDRAL, Violeta Ruiz. El Fraude a la Ley Tributaria a Examen: Los proble-
mas de la aplicación práctica de la norma general anti-fraude del artículo 15 de
la LGT a los ámbitos nacional y comunitario. Cizur Menor: Aranzadi, 2006, p.
43-47.
338
Esta tese manifesta-se pela possibilidade de se estender esse raciocínio às regras
extrafiscais, na medida em que a obrigação tributária funciona como um ele-
mento de incentivo ou de desincentivo de um comportamento conforme uma
oneração ou um benefício fiscal, sendo que o contribuinte busca, em qualquer
caso, a redução de sua carga tributária.
339
SCHOUERI, Luís Eduardo. Planejamento tributário e garantias dos contri-
buintes: entre a norma geral antielisão portuguesa e seus paralelos brasileiros.
In: ALMEIDA, Daniel Freire e; CATARINO, João Ricardo; GOMES, Fabio Luiz
(coords.). Garantias dos Contribuintes no Sistema Tributário: Homenagem a Diogo
Leite de Campos. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 433-434.
340
Cf. BÁEZ MORENO, Andrés; ZORNOZA PÉREZ, Juan. The General Anti-abu-
se Rule of the Anti-tax Avoidance Directive. In: ALMUDÍ CID, José Manuel;
FERRERAS GUTIÉRREZ, Jorge A.; HERNÁNDEZ GONZÁLEZ-BARREDA,
Pablo A (eds.). Combating Tax Avoidance in the EU: Harmonization and Coopera-
tion in Direct Taxation. Alphen aan den Rijn: Kluwer Law International, 2019, p.
129-130.
341
Cf. WERNSMANN, Rainer. Verhaltenslenkung in einem rationalen Steuersystem.
Tübingen: Mohr Siebeck, 2005, p. 73.
252 Regra Constitucional de Competência e Tributação de Transações Transfronteiriças entre Partes Vinculadas

universais, de preços de transferência e de limitação à dedução de


juros342, não encontra base no sistema constitucional tributário bra-
sileiro343 o dever de recolher um imposto – como uma consequência
do princípio da capacidade contributiva e/ou de um interesse públi-
co – com base em uma obrigação tributária potencial344, ou seja,
quando o fato jurídico-tributário respectivo não ocorreu. Não se
pode olvidar que, no tocante à realização do fim fiscal intrínseco às
regras que instituem as obrigações tributárias, as normas constitu-
cionais predeterminam, em certa medida, a ponderação entre o
poder de tributar e o direito de liberdade, no sentido de autorizar
a instituição de tributos sobre algumas materialidades observados
determinados limites – há um poder normativo específico outorga-
do pela regra constitucional de competência, como visto. De tal
modo, a realização dessa ponderação não cabe (ao menos integral-
mente) ao intérprete/ao aplicador – ao legislador. O fim fiscal das
regras tributárias, com efeito, não é compatível com o abuso de di-
reito, sob pena de qualquer comportamento do contribuinte que
provoque a economia tributária ser considerado abusivo e, destar-
te, ilícito.345 Essa condição não possui guarida no aludido direito
fundamental de liberdade, sem prejuízo do desrespeito da regra
constitucional de competência.
Prossiga-se para constatar que as regras de tributação em ba-
ses universais, de preços de transferência e de limitação à dedução
de juros instituem obrigações relativas ao imposto sobre a renda
quanto a alguns negócios jurídicos.346 Lembre-se de que, em conso-
nância com o artigo 3º do Código Tributário Nacional, o tributo

342
Cf. item 1.1.1 do Capítulo II deste Título.
343
DÓRIA, Antônio Roberto Sampaio. Elisão e Evasão Fiscal. 2. ed. São Paulo: José
Bushatsky, 1977, p. 129. SCHOUERI, Luís Eduardo. Planejamento Tributário:
Limites à Norma Antielisiva. Revista de Direito Tributário Atual, n. 24, p. 345-370,
2010, p. 348.
344
FAVEIRO, Vítor António Duarte. O Estatuto do Contribuinte: a pessoa do contri-
buinte no Estado Social de Direito. Coimbra: Coimbra Editora, 2002, p. 731.
345
LEHNER, Moris. Consideração econômica e tributação conforme a capacidade
contributiva. Sobre a possibilidade de uma interpretação teleológica de normas
com finalidades arrecadatórias. In: SCHOUERI, Luís Eduardo; ZILVETI, Fer-
nando Aurelio (coords.). Direito Tributário: estudos em homenagem a Brandão
Machado. São Paulo: Dialética, 1998, p. 145-146.
346
Cf. item 1.1.2 do Capítulo II deste Título.
Clara Gomes Moreira 253

não é uma sanção. Não por outra razão se afirma que a avaliação
do arm’s length não é uma questão de abuso.347 Disso também decor-
re a impossibilidade de que essas regras se prestem a sancionar o
abuso de direito.348 Isto é, do visado agravamento do tratamento
fiscal de comportamentos específicos dos contribuintes por essas
regras – se comparado com o tratamento usualmente conferido pe-
las regras gerais tributárias349 – não resulta um fim sancionador, tal
como se esperaria de uma regra que objetivasse combater o abuso
de direito. Não se pode esquecer que não há, em princípio, um ilí-
cito na não distribuição dos lucros/dos dividendos das sociedades
controladas ou das coligadas residentes no exterior às sociedades
controladoras ou às coligadas residentes no Brasil; ou na contrata-
ção para a aquisição de bens e/ou de serviços entre partes vincula-
das em que o preço e/ou as demais condições de contratação des-
toam daqueles de mercado, inclusive nos casos de superendivida-
mento.350 Destaque-se uma característica inerente à ação de grupos
econômicos: estes são “presumidamente mais eficiente[s, por isso,]
ele[s são] capaz[es] de executar uma atividade econômica integrada
a um custo menor do que várias sociedades independentes cujos
esforços conjuntos seriam necessários para executar a mesma série
de transações”351. De tal modo, essas sociedades em suas ações con-
juntas possuem um incentivo – natural – para que não sigam as
condições de mercado e alcancem a economia tributária. Não há

347
SCHÖN, Wolfgang. Transfer Pricing, the Arm’s Length Standard and Euro-
pean Union Law. In: RICHELLE, Isabelle; SCHÖN, Wolfgang; TRAVERSA,
Edoardo (eds.). Allocating Taxing Powers within the European Union. Heidelberg:
Springer, 2013, p. 94.
348
NETO, Luís Flávio. Teorias do “abuso” no Planejamento Tributário. Dissertação de
mestrado, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2011, p. 139-143.
349
Cf. item 1.2.3 deste Capítulo.
350
Cf. em sentido contrário: OECD, Organisation for Economic Co-operation and
Development. Transfer Pricing Guidelines for Multinational Enterprises and Tax
Administrations. Paris: OECD Publishing, 2017, p. 33.
351
“Because an integrated enterprise is presumably more efficient, it should be
able to execute an integrated economic activity at a lower cost than a series of
independent firms whose joint efforts are necessary to execute the same series
of transactions” [tradução livre] KOFLER, Georg. Associated Enterprises. In:
REIMER, Ekkehart; RUST, Alexander (eds.). Klaus Vogel on Double Taxation
Conventions. 4. ed. Alphen aan den Rijn: Wolters Kluwer, 2015, p. 621.
254 Regra Constitucional de Competência e Tributação de Transações Transfronteiriças entre Partes Vinculadas

um ilícito nessas transações transfronteiriças entre partes vincula-


das em si, por conseguinte, não há um abuso de direito.
Não se pode, ainda, deixar de formular uma crítica a essa as-
sociação entre as regras infraconstitucionais mencionadas e o abu-
so de direito, considerando o plano de atuação deste. O abuso de
direito não se refere ao plano do direito positivo, mas sim à avalia-
ção casuística352. Isto é, trata-se de um juízo de reprovação concre-
to353 e independente de positivação específica354, mesmo porque a
priori há o exercício regular de um direito. Perceba-se que a positi-
vação específica não se confunde com as regras gerais que estabe-
lecem, e.g., que ‘Comete um ilícito o titular de um direito que o
exercer de maneira contrária a seu fim econômico ou social.’355. Por
positivação específica, compreenda-se a enumeração taxativa por
regras jurídicas das hipóteses em que há o abuso de direito, o que
permite a construção de regras gerais e abstratas inconciliáveis com
a análise específica e concreta desse abuso.356 Esta tese, assim, refu-
ta proposições como ‘Há o abuso de direito, visto que a lei diz que
existe.’357-358, na medida em que o caráter ilícito da ação ou da omis-
são individual nesse caso não decorre do abuso de direito, mas sim
de uma proibição contida em uma regra. Segundo a leitura aqui
proposta, o problema do abuso de direito surge depois da atividade
legislativa, já na fase de interpretação/de aplicação do direito.359 O

352
COSTA, Marco Antônio. A simulação no Direito Tributário. Dissertação de Mes-
trado. Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Belo Horizonte: 2009,
p. 88-89.
353
SÁ, Fernando Augusto Cunha de. Abuso do Direito. Coimbra: Almedina, 2005, p.
499.
354
Faz-se referência à regra geral relativa ao artigo 187 do Código Civil.
355
LEVY, José Luiz. A Vedação ao Abuso de Direito como Princípio Jurídico. São Paulo:
Quartier Latin, 2015, p. 277, 317.
356
BARRETO, Paulo Ayres. A tributação, por empresas brasileiras, dos lucros au-
feridos no exterior por suas controladas ou coligadas. In: ROCHA, Valdir de
Oliveira. Grandes Questões Atuais do Direito Tributário. v. 17. São Paulo: Dialética,
2013, p. 226.
357
BAKER, Philip. Avoidance, Evasion & Mitigation. Journal of the International Tax
Planning Association, v. I, n. I, p. 3-8, set./2000, p. 8.
358
Observe-se que maiores considerações sobre esse tema ultrapassam o objeto
deste estudo.
359
BECKER, Alfredo Augusto. Teoria Geral do Direito Tributário. 6. ed. São Paulo:
Noeses, 2013, p. 150. NETO, Luís Flávio. Teorias do “abuso” no Planejamento Tri-
Clara Gomes Moreira 255

abuso de direito, portanto, não se amolda à decisão legislativa de


tipificar determinados comportamentos dos contribuintes em
conformidade com critérios objetivos, como nas regras de tributa-
ção em bases universais, de preços de transferência e de limitação
à dedução de juros. Essas regras, por isso, não pretendem coibir
práticas abusivas360. Estas procuram instituir obrigações tributá-
rias, em consonância com o princípio da igualdade361, sem prejuí-
zo dos limites traçados pela regra constitucional de competência
tributária.

butário. Dissertação de mestrado, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2011,


p. 139-143.
360
TAKANO, Caio Augusto. Limites às Normas Antielisivas Específicas para a Conten-
ção da Arbitragem Fiscal Internacional por Intermédio de Instrumentos Híbridos no
Direito Brasileiro. Tese de doutorado, Universidade de São Paulo, São Paulo,
2019, p. 203.
361
ALMENDRAL, Violeta Ruiz. El Fraude a la Ley Tributaria a Examen: Los proble-
mas de la aplicación práctica de la norma general anti-fraude del artículo 15 de la LGT
a los ámbitos nacional y comunitario. Cizur Menor: Aranzadi, 2006, p. 82-83. BEL-
LAN, Daniel Vitor; PEREIRA, Roberto Codorniz Leite. O Método PRL e o Re-
gime Tributário dos Contratos de Produção em Longo Prazo. In: MORAES E
CASTRO, Leonardo Freitas de; MOREIRA, Francisco Lisboa (coords.). Manual
de Preço de Transferência: BEPS, Brasil & OCDE. São Paulo: Quartier Latin, 2018,
p. 105. FERNANDES, Edson Carlos. Constitucionalidade in thesis e in concreto
do Controle Fiscal dos Preços de Transferência. In: FERNANDES, Edson Car-
los (coord.). Preços de Transferência. São Paulo: Quartier Latin, 2007, p. 25-28.
MACIEL, Taísa Oliveira. Tributação dos Lucros das Controladas e Coligadas Estran-
geiras. Rio de Janeiro: Renovar, 2007, p. 107. MOSQUERA, Roberto Quiroga. O
Regime Jurídico-Tributário dos Preços de Transferência e a Lei n. 9.430/1996.
In: ROCHA, Valdir de Oliveira (coord.). Tributos e Preços de Transferência. São
Paulo: Dialética, 1997, p. 89. OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. Tributos e Preços
de Transferência. In: ROCHA, Valdir de Oliveira (coord.). Tributos e Preços de
Transferência. São Paulo: Dialética, 1997, p. 82-85. PISTONE, Pasquale. Il divie-
to di abuso come principio del diritto tributario comunitario e la sua influenza
sulla giurisprudenza tributaria nazionale. In: MAISTO, Guglielmo (coord.).
Elusione ed Abuso del Diritto Tributario: Orientamenti attuali in materia di elusio-
ne e abuso del diritto ai fini dell’imposizione tributaria. Milano: Giuffrè, 2009,
p. 327. ROCHA, Sergio André. Tributação de Lucros Auferidos por Controladas e
Coligadas no Exterior. 2. ed. São Paulo: Quartier Latin, 2016, p. 247. SCHOUE-
RI, Luís Eduardo. Arm’s Length: Beyond the Guidelines of the OECD. Bulletin
for International Taxation, v. 69, n. 12, p. 690-716, dez./2015, p. 690, 696.
SCHOUERI, Luís Eduardo. Preços de Transferência no Direito Tributário Brasilei-
ro. 3. ed. São Paulo: Dialética, 2013, p. 11-17, 50. TESAURO, Francesco. Istituzio-
ni di Diritto Tributario. Parte speciale. 9. ed. v. 2. Torino: UTET Giuridica, 2012,
p. 150.
256 Regra Constitucional de Competência e Tributação de Transações Transfronteiriças entre Partes Vinculadas

2.1.1.2. Elisão fiscal internacional como as ações e as omissões


lícitas dos contribuintes, que causam a redução da carga tributária,
por meio da não incidência de regra tributária mais gravosa e/ou da
incidência de regra tributária mais benéfica, e que erodem a base
tributável de um Estado
Uma vez demonstrado o caráter lícito da elisão fiscal, esclare-
ça-se que nesta o comportamento do contribuinte impede a sub-
sunção da situação concreta em uma regra tributária mais gravosa
e/ou provoca a incidência de uma regra tributária mais benéfica, o
que permite a economia fiscal.362 Quanto a sua perspectiva interna-
cional, soma-se a isso o fato de que, por meio desse comportamen-
to, o contribuinte desloca ou mantém uma parte ou a integralidade
de suas receitas em outro Estado. Neste, geralmente, há uma tribu-
tação sobre a renda menor do que a devida em seu Estado de resi-
dência, reduz-se, dessa maneira, a carga tributária da atividade
econômica compreendida como um todo.

2.1.2. Regras de tributação em bases universais, de preços de


transferência e de limitação à dedução de juros são regras
específicas antielisivas
Resgate-se, neste ponto de estudo, a investigação iniciada an-
tes atinente à interpretação teleológica das regras de tributação em
bases universais, de preços de transferência e de limitação à dedu-
ção de juros. Sob a perspectiva do fim subjetivo, como visto363, essas
regras a priori visam a combater a elisão fiscal internacional. Reme-
more-se, no tocante ao fim objetivo, que o fato de que haver uma
ficção legal e/ou uma presunção legal na estrutura dessas regras
não corresponde a uma nota distintiva do fim antielisivo – uma
idêntica conclusão mantém-se no caso de existirem outros critérios
objetivos prescritos que sirvam a um fim simplificador. Essas regras
infraconstitucionais, ademais, não procuram combater o abuso de
direito pelas razões já desenvolvidas aqui. Constate-se ainda que
tais regras disciplinam as obrigações tributárias concernentes a de-

362
MCNAUGHTON, Charles William. Elisão e Norma Antielisiva: Completabilida-
de e Sistema Tributário. São Paulo: Noeses, 2014, p. 238.
363
Cf. item 2.1 deste Capítulo.
Clara Gomes Moreira 257

terminadas transações transfronteiriças entre partes vinculadas.


De tal modo, essas regras afastam, parcial ou integralmente, o tra-
tamento fiscal concedido pelas regras gerais tributárias (aplicáveis
à generalidade dos casos).364
À luz da justificação das regras de tributação em bases univer-
sais, de preços de transferência e de limitação à dedução de juros,
estas não almejam onerar aquelas transações para além do quanto
seria esperado caso estas fossem celebradas entre partes indepen-
dentes, em vez de entre partes vinculadas.365 Com base nisso, essas
regras concretizam os princípios da igualdade, da livre concorrên-
cia e da neutralidade tributária, ao comumente agravarem o trata-
mento fiscal de determinados negócios jurídicos em relação ao tra-
tamento que seria dado pelas regras gerais tributárias – esta ideia
será aprofundada no capítulo subsequente366. Reconheça-se, por
fim, que a qualificação de uma regra como específica antielisiva
não depende de um modelo predeterminado de estrutura norma-
tiva, podendo inferir-se esse objetivo de inúmeros fatores, em linha
com a construção argumentativa sugerida neste estudo.367 Logo,
esta tese concorda com o posicionamento de que as regras brasilei-
ras de tributação em bases universais, de preços de transferência e
de limitação à dedução de juros são específicas antielisivas, visto
que objetivam combater a elisão fiscal internacional.
Nesse contexto, atente-se que, apesar de lícita, a elisão fiscal
internacional pode ser indesejável368 sob dois fundamentos: (1) a
erosão da base tributável; (2) a violação do princípio da igualdade,
sobretudo no que concerne ao princípio da livre concorrência. Isso
acontece porque, na inexistência dessas regras, as transações trans-

364
Cf. item 1.1.2 do Capítulo II deste Título.
365
Cf. item 1.1 do Capítulo II deste Título.
366
Cf. item 1.1.1 do Capítulo II deste Título.
367
Cf. PISTONE, Pasquale. The Meaning of Tax Avoidance and Aggressive Tax
Planning in European Union Tax Law: Some Thoughts in Connection with the
Reaction to Such Practices by the European Union. In: DOURADO, Ana Paula
(ed.). Tax Avoidance Revisited in the EU BEPS Context. Amsterdam: IBFD, 2017, p. 78.
368
BRACEWELL-MILNES, Barry; WISSELINK, M. A. Concepts and criteria of
international tax avoidance. In: International Tax Avoidance: A Study by the Rot-
terdam Institute for Fiscal Studies. Volume A: General and Conceptual Mate-
rial. Deventer: Kluwer, 1979, p. 346.
258 Regra Constitucional de Competência e Tributação de Transações Transfronteiriças entre Partes Vinculadas

fronteiriças entre partes independentes provavelmente sofreriam


um tratamento fiscal mais oneroso do que aquele conferido às tran-
sações transfronteiriças entre partes vinculadas.369-370 Enfatize-se
que essa discriminação não decorre propriamente de um vício no
conteúdo das regras tributárias, mas sim de sua não aplicação em
algumas situações que se pretendia atingir ou de sua ineficácia em
relação a estas371-372.373-374 Por essa razão, exige-se à instituição de
regras específicas antielisivas a evidenciação fática da concretiza-
ção reiterada de negócios jurídicos idênticos e responsáveis por
uma economia fiscal. A frequência da ação e/ou da omissão de uma
pluralidade de contribuintes durante um período possibilita tipifi-
cá-los como um padrão de comportamento desse grupo de contri-
buintes.375 Constroem-se, a partir disso, generalizações a seu res-
peito, em detrimento das particularidades concretas376.377 Não por
outra razão, as regras de tributação em bases universais, de preços

369
CAMPOS, Fabrício Costa Resende de; ROLIM, João Dácio. Juros, Preço de
Transferência e Regras de Subcapitalização. In: SCHOUERI, Luís Eduardo
(coord.). Tributos e Preços de Transferência. v. 4. São Paulo: Dialética, 2013, p. 126.
TORRES, Heleno Taveira. Direito Tributário Internacional: Planejamento Tribu-
tário e Operações Transnacionais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p.
168-170. SCHOUERI, Luís Eduardo. Arm’s Length: Beyond the Guidelines of
the OECD. Bulletin for International Taxation, v. 69, n. 12, p. 690-716, dez./2015,
p. 695.
370
Cf. BRASIL. Secretaria da Receita Federal do Brasil. Solução de Consulta n. 04/
COSIT. Publicação 1º.9.2006.
371
Cf. Capítulo II deste Título.
372
Cf. TIPKE, Klaus. A necessidade de igualdade na execução das leis tributárias.
In: SCHOUERI, Luís Eduardo (coord.). Direito Tributário: homenagem a Alcides
Jorge Costa. v. I. São Paulo: Quartier Latin, 2003, p. 368-370.
373
O conteúdo de uma norma conecta-se logicamente a sua extensão, porém, essa
afirmação busca enfatizar que uma discriminação fiscal pode decorrer não di-
retamente de um vício da regra, mas sim do fato de esta não ser apta a atingir
igualmente ambas as situações.
374
Cf. FILIPCZYK, Hanna. Tax Avoidance and Rationality of Law. Warszawa: Wol-
ters Kluwer, 2017, p. 90-91.
375
LARENZ, Karl. Metodologia da Ciência do Direito. 3. ed. Lisboa: Fundação Ca-
louste Gulbenkian, 1997, p. 657, 660.
376
BUTLER, Philipp J.; DRÜEN, Klaus-Dieter. Interests in Light of the Proportio-
nality Principle. In: SEER, Roman; WILMS, Anna Lena (eds.). Surcharges and
Penalties in Tax Law. 2015 EATLP Congress Milan, 28 – 30 May 2015. Amsterdam:
IBFD, 2016, p. 90-91.
377
Cf. item 1.2.3.1 deste Capítulo.
Clara Gomes Moreira 259

de transferência e de limitação à dedução de juros foram inspira-


das em padrões de comportamento dos contribuintes, não obstante
concretamente cada relação jurídica possua as suas peculiaridades.
Veja-se que a intensidade com que esses comportamentos se afir-
maram, como uma forma de funcionamento de alguns contribuin-
tes e de desencadeamento da economia fiscal, impõe ao Estado a
adoção de uma ação para a tutela dos princípios mencionados da
igualdade, da livre concorrência e da neutralidade fiscal.
Clara Gomes Moreira 269

2017 R$ 9.454.020.476,44 (7,86%) R$ 120.219.713.618,59 (100%)


2018 R$ 9.177.079.459,00 (6,45%) R$ 141.855.542.251,57 (100%)

Arrecadação das regras de Arrecadação de IRPJ pelo


preços de transferência regime de lucro real
2014 R$ 7.283.263.279,50 (9,95%) R$ 73.209 milhões (100%)
2015 R$ 11.474.649.113,35 (16,75%) R$ 68.497 milhões (100%)
2016 R$ 11.581.760.823,28 (15,93%) R$ 72.689 milhões (100%)
2017 R$ 9.454.020.476,44 (12,83%) R$ 73.676 milhões (100%)
2018 R$ 9.177.079.459,00 (9,97%) R$ 92.014 milhões (100%)

Arrecadação das Regras de Preços de


Transferência
R$ 14.000.000.000,00
R$ 12.000.000.000,00
R$ 10.000.000.000,00
R$ 8.000.000.000,00
R$ 6.000.000.000,00
R$ 4.000.000.000,00
R$ 2.000.000.000,00
R$ 0,00
2014 2015 2016 2017 2018

Por todo o exposto, em que pese não haja elementos suficien-


tes para a formulação de proposições sobre o tema – este estudo,
outrossim, não possui a expertise para prosseguir na análise de ou-
tros elementos factuais dessas regras infraconstitucionais –, há in-
dícios suficientes para comprovar que, no cenário brasileiro, as re-
gras de tributação em bases universais, de preços de transferência
e de limitação à dedução de juros tipificam padrões de comporta-
mento de um grupo restrito de contribuintes que possui elevada
capacidade econômica e que provavelmente ocupa um significativo
espaço no mercado nacional.

1.1. Regras de tributação em bases universais, de preços de


transferência e de limitação à dedução de juros como regras
fiscais
Uma vez traçado esse escopo fático, retome-se uma ideia ex-
plorada antes: as regras infraconstitucionais brasileiras de tributa-
ção em bases universais, de preços de transferência e de limitação
270 Regra Constitucional de Competência e Tributação de Transações Transfronteiriças entre Partes Vinculadas

à dedução de juros, como já defendido neste estudo18, não comba-


tem o abuso de direito nem admitem, geralmente, avaliações a res-
peito da realidade em que se subsomem para além dos critérios ob-
jetivos prescritos. Não se discute por meio dessas regras, enfatize-se,
a verdade dos fatos. Uma parcela da doutrina nacional e da estran-
geira justifica essas regras pela concretização do princípio da igual-
dade19, mormente do princípio da capacidade contributiva20, e al-

18
Cf. item 2.1.1.1.2 do Capítulo I deste Título.
19
ALMENDRAL, Violeta Ruiz. El Fraude a la Ley Tributaria a Examen: Los proble-
mas de la aplicación práctica de la norma general anti-fraude del artículo 15 de
la LGT a los ámbitos nacional y comunitario. Cizur Menor: Aranzadi, 2006, p.
82-83. BELLAN, Daniel Vitor; PEREIRA, Roberto Codorniz Leite. O Método
PRL e o Regime Tributário dos Contratos de Produção em Longo Prazo. In:
MORAES E CASTRO, Leonardo Freitas de; MOREIRA, Francisco Lisboa
(coords.). Manual de Preço de Transferência: BEPS, Brasil & OCDE. São Paulo:
Quartier Latin, 2018, p. 105. FERNANDES, Edson Carlos. Constitucionalidade
in thesis e in concreto do Controle Fiscal dos Preços de Transferência. In: FER-
NANDES, Edson Carlos (coord.). Preços de Transferência. São Paulo: Quartier La-
tin, 2007, p. 25-28. MACIEL, Taísa Oliveira. Tributação dos Lucros das Controladas
e Coligadas Estrangeiras. Rio de Janeiro: Renovar, 2007, p. 107. MOSQUERA,
Roberto Quiroga. O Regime Jurídico-Tributário dos Preços de Transferência e a
Lei n. 9.430/1996. In: ROCHA, Valdir de Oliveira (coord.). Tributos e Preços de
Transferência. São Paulo: Dialética, 1997, p. 89. OLIVEIRA, Ricardo Mariz de.
Tributos e Preços de Transferência. In: ROCHA, Valdir de Oliveira (coord.). Tri-
butos e Preços de Transferência. São Paulo: Dialética, 1997, p. 82-85. PISTONE,
Pasquale. Il divieto di abuso come principio del diritto tributario comunitario e
la sua influenza sulla giurisprudenza tributaria nazionale. In: MAISTO, Gugliel-
mo (coord.). Elusione ed Abuso del Diritto Tributario: Orientamenti attuali in mate-
ria di elusione e abuso del diritto ai fini dell’imposizione tributaria. Milano:
Giuffrè, 2009, p. 327. ROCHA, Sergio André. Tributação de Lucros Auferidos por
Controladas e Coligadas no Exterior. 2. ed. São Paulo: Quartier Latin, 2016, p. 247.
SCHOUERI, Luís Eduardo. Arm’s Length: Beyond the Guidelines of the OECD.
Bulletin for International Taxation, v. 69, n. 12, p. 690-716, dez./2015, p. 690, 696.
SCHOUERI, Luís Eduardo. Preços de Transferência no Direito Tributário Brasileiro.
3. ed. São Paulo: Dialética, 2013, p. 11-17, 50. TESAURO, Francesco. Istituzioni di
Diritto Tributario. Parte speciale. 9. ed. v. 2. Torino: UTET Giuridica, 2012, p. 150.
20
FAVEIRO, Vítor. O Estatuto do Contribuinte: A Pessoa do Contribuinte no Estado
Social de Direito. Coimbra: Coimbra Editora, 2002, p. 739. PISTONE, Pasqua-
le. Il divieto di abuso come principio del diritto tributario comunitario e la sua
influenza sulla giurisprudenza tributaria nazionale. In: MAISTO, Guglielmo
(coord.). Elusione ed Abuso del Diritto Tributario: Orientamenti attuali in materia
di elusione e abuso del diritto ai fini dell’imposizione tributaria. Milano: Giuf-
frè, 2009, p. 327. SCHOUERI, Luís Eduardo. Arm’s Length: Beyond the Guide-
lines of the OECD. Bulletin for International Taxation, v. 69, n. 12, p. 690-716,
dez./2015, p. 690, 695, 704.
Clara Gomes Moreira 271

guns doutrinadores21 prosseguem, nessa linha, para reconhecer a


natureza fiscal de tais regras infraconstitucionais22. Vale dizer, iden-
tificam, nessa hipótese, o seu fim eminentemente arrecadatório.
Para que se compreenda esse posicionamento, mais uma vez,
descreva-se a cadeia de fatos relacionados à elisão fiscal internacio-

21
BIRK, Dieter. Diritto Tributario Tedesco. Milano: Giuffrè Editore, 2006, p. 57.
CID, José Manuel Almudí. El Régimen Jurídico de Transparencia Fiscal Internacio-
nal. Madrid: Instituto de Estudios Fiscales, 2005, p. 118. COOPER, Joel; FOX,
Randall; LOEPRICK, Jan; MOHINDRA, Komal. Transfer Pricing and Develo-
ping Economies: A Handbook for Policy Makers and Practitioners. Washington:
International Bank for Reconstruction and Development/The World Bank,
2016, p. 11-12. DÓRIA, Antônio Roberto Sampaio. Distribuição Disfarçada de
Lucros e Imposto de Renda. São Paulo: Resenha Tributária, 1974, p. 38. MOS-
QUERA, Roberto Quiroga. O Regime Jurídico-Tributário dos Preços de Trans-
ferência e a Lei n. 9.430/1996. In: ROCHA, Valdir de Oliveira (coord.). Tributos
e Preços de Transferência. São Paulo: Dialética, 1997, p. 89. NEWLON, T. Scott.
Transfer Pricing and income shifting in integrating economies. In: CNOSSEN,
Sijbren (ed.). Taxing Capital Income in the European Union: Issues and Options for
Reform. New York: Oxford University Press, 2000, p. 228-229. NOVOA, César
García. El Concepto de Tributo. Lima: Tax Editor, 2009, p. 360. OLIVEIRA, Ri-
cardo Mariz de. Aspectos Inconstitucionais da Lei n. 12.973 em Matéria de Tri-
butação de Lucros de Controladas e Coligadas no Exterior (Segundo Alberto
Xavier). In: ROCHA, Sergio André; TORRES, Heleno (coords.). Direito Tributá-
rio Internacional: Homenagem ao Professor Alberto Xavier. São Paulo: Quartier
Latin, 2016, p. 774. OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. Tributos e Preços de Trans-
ferência. In: ROCHA, Valdir de Oliveira (coord.). Tributos e Preços de Transferên-
cia. São Paulo: Dialética, 1997, p. 82-85. OLLERO, Gabriel Casado. Los fines no
fiscales de los tributos. In: Comentarios a la ley general tributaria y líneas para su
reforma. Libro-homenaje al Profesor Dr. D. Fernando Sainz de Bujanda. v. I. Madrid:
Instituto de Estudios Fiscales, 1991, p. 132. ROCHA, Paulo Victor Vieira da.
Teoria dos Direitos Fundamentais em Matéria Tributária: Restrições a Direitos do
Contribuinte e Proporcionalidade. São Paulo: Quartier Latin, 2017, p. 135, 323-
327. ROCHA, Sergio André. Tributação de Lucros Auferidos por Controladas e Co-
ligadas no Exterior. 2. ed. São Paulo: Quartier Latin, 2016, p. 247. SCHOUERI,
Luís Eduardo. Arm’s Length: Beyond the Guidelines of the OECD. Bulletin for
International Taxation, v. 69, n. 12, p. 690-716, dez./2015, p. 690. SCHOUERI,
Luís Eduardo. Preços de Transferência no Direito Tributário Brasileiro. 3. ed. São
Paulo: Dialética, 2013, p. 12-13, 17. SCHOUERI, Luís Eduardo. Prefácio. In: RO-
CHA, Paulo Victor Vieira da. Teoria dos Direitos Fundamentais em Matéria Tributá-
ria: Restrições a Direitos do Contribuinte e Proporcionalidade. São Paulo: Quar-
tier Latin, 2017, p. 19-21. TORRES, Heleno Taveira. Direito Tributário Internacio-
nal: Planejamento Tributário e Operações Transnacionais. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2001, p. 170, 524.
22
Cf. HEY, Johanna. Spezialgesetzliche Missbrauchsgesetzgebung aus steuersys-
tematischer, verfassungs- und europarechtlicher Sicht. Steuer und Wirtschaft, p.
167-183, 2008, p. 171.
272 Regra Constitucional de Competência e Tributação de Transações Transfronteiriças entre Partes Vinculadas

nal23: (1) os contribuintes, ao se comportarem licitamente, por ve-


zes, impedem a subsunção de uma realidade em uma regra tribu-
tária (trata-se de um caso de não incidência) ou atraem a aplicação
de uma regra tributária mais benéfica em termos financeiros; (2)
em atenção ao princípio da legalidade, o Estado não pode cobrar
um tributo indevido, assim como não o pode cobrar em montante
superior ao devido; (3) a sucessão de comportamentos similares dos
contribuintes possui a aptidão de erodir a base tributável do Esta-
do, além de causar distúrbios na concorrência; (4) os contribuintes
que adotam esses comportamentos, sobretudo em um contexto de
transações transfronteiriças, comumente são aqueles que possuem
maior capacidade econômica – pode-se inferir isso a partir do nú-
mero de contribuintes que aplicaram as regras infraconstitucionais
antes referidas e que são submetidos ao monitoramento econômi-
co-tributário diferenciado ou especial, além da relação entre os va-
lores arrecadados em razão das regras de preços de transferência e
o número de contribuintes que os recolheram proporcionalmente à
arrecadação total apurada a título de imposto sobre a renda de
pessoas jurídicas24; (5) esses contribuintes também são aqueles que
(provavelmente) comparativamente menor carga tributária supor-
tariam no que se refere a tais comportamentos se não fosse a exis-
tência das regras de tributação em bases universais, de preços de
transferência e de limitação à dedução de juros.
Mirando nesses elementos, volta-se ao argumento atinente à
realização do princípio da igualdade por essas regras infraconstitu-
cionais. Lembre-se de que, quanto às regras que instituem um im-
posto, a identidade de tratamentos tributários entre duas situações
demanda a observância em qualquer caso da materialidade tribu-
tária definida pela regra constitucional de competência. Em outras
palavras, deve-se prescrever a obrigação tributária à generalida-
de25-26 dos contribuintes, sob a condição de que, e.g., no que tange

23
Cf. item 2.1.1.1 do Capítulo I deste Título.
24
Cf. Seção 1 deste Capítulo.
25
SUNSTEIN, Cass R. Neutrality in Constitutional Law (with Special Reference to
Pornography, Abortion, and Surrogacy). Columbia Law Review, v. 92, n. 1, p.
1-52, jan./1992, p. 52.
26
Cf. KIRCHHOF, Gregor. The Generality of the Law: The Law as a Necessary
Guarantor of Freedom, Equality and Democracy and the Differentiated Role of
the Federal Constitutional Court as a Watchdog. In: MEßERSCHMIDT, Klaus;
Clara Gomes Moreira 273

ao imposto sobre a renda, exista um acréscimo patrimonial exce-


dente ao necessário para a manutenção da fonte produtiva e dispo-
nível econômica ou juridicamente27.
Isso sucede porque, ao exercer o poder conferido por uma re-
gra de competência e instituir um imposto, o legislador deve cobrir
o maior número possível de situações que digam respeito à mate-
rialidade tributária, sob pena de violar o princípio da igualdade e,
como se verá, o princípio da livre concorrência e da neutralidade
tributária28 – escapam desse raciocínio as não incidências fundadas
em fins extrafiscais29 ou, ainda, as imunidades tributárias (quando
não há a competência para a instituição de um tributo). Destarte,
muito embora o exercício do poder outorgado pela regra de com-
petência tributária seja facultativo (‘O legislador pode instituir ou
não instituir um tributo.’), quando o legislador o utiliza, ele deve
atender às condições prescritas, inclusive a tais princípios. Mesmo
porque o exercício parcial do poder de tributar pode ensejar, e.g., a
concessão de benefícios fiscais, os quais podem ser inconstitucio-
nais, na medida em que injustificados perante o ordenamento jurí-
dico brasileiro.30

1.1.1. Regras de tributação em bases universais, de preços de


transferência e de limitação à dedução de juros e princípio da
neutralidade tributária
Para melhor compreensão dessa função da regra constitucional
de competência tributária, examina-se a sua relação com o princípio

OLIVER-LALANA, A. Daniel (eds.). Rational Lawmaking under Review: Legis-


prudence According to the German Federal Constitutional Court. Cham:
Springer, 2016, p. 97.
27
Cf. Seção 2 do Capítulo II do Título I.
28
GUTMANN, Daniel. General Report. In: GUTMANN, Daniel (ed.). Corporate
Income Tax Subjects. 2013 EATLP Congress Lisbon, 30 May – 1 June 2013. Amster-
dam: IBFD, 2015, p. 8. CÂMARA, Francisco de Sousa da; FERNANDES, José
Almeida; GARCIA, Nuno de Oliveira. Portugal. In: GUTMANN, Daniel (ed.).
Corporate Income Tax Subjects. 2013 EATLP Congress Lisbon, 30 May – 1 June 2013.
Amsterdam: IBFD, 2015, p. 426.
29
Observe-se que maiores considerações sobre esse tema ultrapassam o objeto
deste estudo.
30
QUEIROZ, Luís Cesar Souza de. Limites do planejamento tributário. In:
SCHOUERI, Luís Eduardo (coord.). Direito Tributário: homenagem a Paulo de
Barros Carvalho. São Paulo: Quartier Latin, 2008, p. 756.
274 Regra Constitucional de Competência e Tributação de Transações Transfronteiriças entre Partes Vinculadas

da neutralidade tributária. Ordinariamente, conceitua-se a neutrali-


dade como a não intervenção31 em relação a outrem ou a algo (‘Al-
guém ou algo é neutro em relação a outrem ou a algo.’)32-33. No to-
cante ao princípio da neutralidade tributária, uma parcela da dou-
trina34 parte do posicionamento de que este vedaria que a norma
tributária, mormente a regra infraconstitucional que institui a obri-
gação tributária, provocasse um distúrbio na concorrência. Como
explica Vogel35, porém, esse princípio não se presta propriamente
para assegurar que uma regra tributária não interfira nas atividades
econômicas. Isso seria despido de qualquer suporte fático, já que os
agentes econômicos sempre consideram o aspecto tributário para a
tomada de uma decisão, como um valor que os onera financeiramen-
te. Com efeito, existe uma interferência inafastável nesse sentido,
ainda que a sua relevância possa variar a depender das condicionan-
tes presentes para a consecução de uma atividade econômica.
Em face dessa explicação, uma segunda leitura se faz presente
acerca do princípio da neutralidade tributária: este, em verdade,
concretiza o direito de liberdade.36 De tal modo, impõe-se que a

31
ROTHMANN, Gerd Willi. Tributação, sonegação e livre concorrência. In: FER-
RAZ, Roberto (coord.). Princípios e limites da tributação 2: os princípios da ordem
econômica e a tributação. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 341-342.
32
NABAIS, José Casalta. Introdução ao direito fiscal das empresas. Coimbra: Almedi-
na, 2013, p. 49.
33
TORRES, Ricardo Lobo. Tratado de Direito Constitucional Financeiro e Tributário:
valores e princípios constitucionais tributários. v. II. Rio de Janeiro: Renovar,
2005, p. 145, 236.
34
HEINRICH, Johannes. Tax Neutrality between CIT and Non-CIT Subjects:
How to Improve our Systems? In: GUTMANN, Daniel (ed.). Corporate Income
Tax Subjects. 2013 EATLP Congress Lisbon, 30 May – 1 June 2013. Amsterdam:
IBFD, 2015, p. 133. KAPLOW, Louis. The Theory of Taxation and Public Economics.
Princeton: Princeton University Press, 2008, p. 224. KOURALEVA-CAZALS,
Polina. France. In: GUTMANN, Daniel (ed.). Corporate Income Tax Subjects. 2013
EATLP Congress Lisbon, 30 May – 1 June 2013. Amsterdam: IBFD, 2015, p. 255.
TORRES, Ricardo Lobo. Planejamento tributário: elisão abusiva e evasão fiscal.
2. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2013, p. 79.
35
VOGEL, Klaus. Taxation of Cross-Border Income, Harmonization, and Tax
Neutrality under European Community Law. In: VOGEL, Klaus. Taxation of
Cross-Border Income, Harmonization, and Tax Neutrality under European Community
Law: an institutional approach. Deventer, Cambridge: Kluwer, 1994, p. 28-29.
36
CELANO, Bruno. Normative Legal Positivism, Neutrality, and the Rule of Law.
In: BELTRÁN, Jordi Ferrer; MORESO, José Juan; PAPAYANNIS, Diego M.
(eds.). Neutrality and Theory of Law. Dordrecht: Springer, 2013, p. 181.
Clara Gomes Moreira 275

instituição de impostos não impeça o exercício desse direito, o que


não significa que as regras tributárias não possam afetar o escopo
deste. Vislumbra-se a interação entre essas normas do seguinte
modo: a interpretação das regras constitucionais de competência
atinentes aos impostos, sob o prisma do princípio da igualdade37-38,
exige que, uma vez que institua um imposto, o legislador prescreva,
na maior medida possível, todas as hipóteses derivadas de uma ma-
terialidade tributária.39-40 Isso acontece porque, como demonstra-
do, a omissão estatal concernente ao tema, ou seja, a não positiva-
ção de uma situação concreta equivale à outorga de um benefício
fiscal, o que pode causar a violação do princípio da igualdade, da
livre concorrência e da neutralidade tributária.
Reveja-se, por assim dizer, a relação entre as regras constitu-
cionais de competência relativas aos impostos e as regras infracons-
titucionais que instituem as obrigações tributárias.41 A primeira
define as materialidades tributárias42, mas possui maior abstração
na disciplina do tema do que a segunda. As regras infraconstitucio-
nais que prescrevem a obrigação tributária conferem às materiali-
dades maior concretude ao apresentarem os elementos das hipóte-
ses de incidência. Isso advém do princípio da segurança jurídica e
da legalidade. A concretude dessas regras infraconstitucionais e a
vedação à extensão dos sentidos possíveis destas por meio de sua
interpretação43, frente às novas manifestações de materialidades
tributárias na realidade44, ensejam a necessidade de atualização
permanente da legislação. O legislador, portanto, deve perseguir

37
ÁVILA, Humberto. Conceito de renda e compensação de prejuízos fiscais. São Paulo:
Malheiros, 2011, p. 54.
38
Cf. item 3.1.2 do Capítulo I do Título I.
39
Cf. item 1.1.1 deste Capítulo.
40
SCHREIBER, Ulrich. Das Steuerrecht der Unternehmen aus ökonomischer
Sicht: Neutralität der Besteuerung und Steuerwettbewerb. In: DROEGE, Mi-
chael; SEILER, Christian (orgs.). Eigenständigkeit des Steuerrechts. Tübingen:
Mohr Siebeck, 2019, p. 216.
41
Cf. item 1.3.1 do Capítulo II do Título I.
42
Cf. Seção 1 do Capítulo II do Título I.
43
Cf. item 3.1.3 do Capítulo I do Título I.
44
FAVEIRO, Vitor António Duarte. Noções fundamentais de Direito Fiscal português:
introdução ao estudo da realidade tributária. Teoria Geral do Direito Fiscal. v.
I. Coimbra: Coimbra Editora, 1984, p. 96.
276 Regra Constitucional de Competência e Tributação de Transações Transfronteiriças entre Partes Vinculadas

as materialidades tributárias por um processo legislativo constante,


sem prejuízo dos limites rígidos e estáveis traçados pelas regras
constitucionais de competência. Verifique-se que, nesse posiciona-
mento, a defesa de que os atos normativos precisam de atualização
não constitui uma deficiência da legalidade frente a realidade – em
que pese não se desconsidere que o processo de modificação da
legislação possa ser uma dificuldade concreta –, mas uma conse-
quência natural da mutabilidade desta em relação à estabilidade do
direito positivo.

1.1.2. Regras de tributação em bases universais, de preços de


transferência e de limitação à dedução de juros como regras
que redefinem as hipóteses de incidência e previnem a elisão
fiscal internacional
Sob a perspectiva do Estado-legislador, com efeito, quanto ao
princípio da neutralidade tributária, o exercício do poder constitu-
cionalmente conferido pela regra de competência deve ser impar-
cial45 e coerente com o sistema tributário, notadamente com o prin-
cípio da igualdade46. De maneira que, não sendo a forma jurídica
inerente à hipótese de incidência (e.g., o contrato de doação é in-

45
SUNSTEIN, Cass R. Neutrality in Constitutional Law (with Special Reference to
Pornography, Abortion, and Surrogacy). Columbia Law Review, v. 92, n. 1, p.
1-52, jan./1992, p. 1, 50.
46
HEINRICH, Johannes. Tax Neutrality between CIT and Non-CIT Subjects:
How to Improve our Systems? In: GUTMANN, Daniel (ed.). Corporate Income
Tax Subjects. 2013 EATLP Congress Lisbon, 30 May – 1 June 2013. Amsterdam:
IBFD, 2015, p. 133. GUTMANN, Daniel. General Report. In: GUTMANN, Da-
niel (ed.). Corporate Income Tax Subjects. 2013 EATLP Congress Lisbon, 30 May – 1
June 2013. Amsterdam: IBFD, 2015, p. 8. PAPIS, Marta. The Principle of Neu-
trality in EU VAT. In: BROKELIND, Cécile (ed.). Principles of Law: Function,
Status and Impact in EU Tax Law. Amsterdam: IBFD, 2014. Disponível em:
https://www.ibfd.org/. Acesso em: 1º jan. 2018, p. 2. SELICATO, Pietro. Sear-
ching for Neutrality of Corporate Income Tax in the EU Member States. In:
GUTMANN, Daniel (ed.). Corporate Income Tax Subjects. 2013 EATLP Congress
Lisbon, 30 May – 1 June 2013. Amsterdam: IBFD, 2015, p. 117. SUNSTEIN, Cass
R. Neutrality in Constitutional Law (with Special Reference to Pornography,
Abortion, and Surrogacy). Columbia Law Review, v. 92, n. 1, p. 1-52, jan./1992, p.
5, 43.
Em sentido contrário: NAVARRO, Aitor. Transactional Adjustments in Transfer
Pricing. Amsterdam: IBFD, 2018. Disponível em: https://www.ibfd.org/. Acesso
em: 1º jan. 2018, p. 14.

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