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A TEORIA CURRICULAR DE MICHAEL YOUNG E SUAS CONTRIBUIÇÕES NA

EDUCAÇÃO MARANHENSE

Ádrya D'arc Amaral Magalhães Moraes


Joselia Reis Barros
Maria Eduarda Neves Barbosa
Mariana Yolanda Silva Costa
Nayla Alves Costa1
Valéria Luiza Costa Gonçalves 1

Resumo

O presente artigo tem por objetivo apresentar a teoria curricular de Michael Young e
suas contribuições para o papel do currículo nas escolas maranhenses. A partir de
uma breve exposição sobre sua biografia e seus princípios que levam a construção
dos conhecimentos: poderoso e dos poderosos e o papel do currículo nas escolas
que em sua concepção ignora o contexto dos educandos. Prosseguindo a partir da
contextualização de sua proposta curricular, auxiliando como os sistemas de ensino,
podem estabelecer uma relação indissociável entre o conhecimento escolar e o
contexto no qual ele se desenvolve e se realiza como forma de viabilizar a
necessária criatividade para a transformação da sociedade. E no âmbito escolar
maranhense, apresentamos concepções que envolvem a região.

Palavras-chave: Escola; Currículo; Conhecimentos; Michael Young; Saberes.

Introdução
No contexto da educação, pode-se entender currículo como um texto que
abrange desde os planos de aula que o professor elabora até os documentos
curriculares de uma rede ou sistema de ensino que reflitam a visão dos educadores
e da comunidade escolar sobre aspectos políticos e sociais locais e sua inter-relação
com a educação.

De acordo com, Michael Young influente sociólogo inglês, defende que o


currículo deve ser visto para além de um instrumento com vistas ao alcance de
objetivos, centrados em questões tais como: quais os melhores métodos ou as
melhores estratégias para garantir que se atinjam os resultados esperados em
relação ao processo de escolarização e quais as melhores formas de organizar o
ensino e o currículo para esse mesma finalidade. Nessa abordagem, não havia
2

espaço para discutir o que se ensinava, possibilitando diagnosticar o que seria


desnecessário refletir.
Diante disto, com base nas leituras buscamos apresentar em partes, o
pensamento e as contribuições de Michael Young que fundamentam sua teoria
curricular.
O artigo inicia-se com a biografia do teórico e suas concepções sobre
conhecimentos que auxiliaram na sua composição teórica curricular. Em segundo e
terceiro momento, abordaremos o papel primordial da escola e a sua ligação entre
desejos emancipatórios associados com a expansão da escolarização. E a teoria
curricular baseada na perspectiva de evidenciar o campo do currículo como espaço
de luta, contestação e resistência. E que por fim, irá abordar e relacionar-se sobre a
educação maranhense e suas concepções de currículo e escola.

Os aspectos da trajetória de Michael Young e a sua estruturação teórica 

Michael Young nasceu em 1915 em Manchester, filho de um violinista e crítico


de música australiana e uma pintora e atriz irlandesa, ficou conhecido como Barão
Young de Dartington1, foi um sociólogo britânico, ativista social e político que cunhou
o termo “meritocracia”2. Durante sua vida ele foi fundamental para moldar o
pensamento do Partido Trabalhista, no qual, em meio a Segunda Guerra Mundial, foi
secretário, diretor do grupo de pesquisa do Planejamento Político e Econômico do
Partido Trabalhista, tendo por responsabilidade a elaboração do livro “Let Us Face
the Future” (Deixe-nos enfrentar o futuro) 3 e ainda foi um dos principais
protagonistas da reforma social.

Ele frequentou várias escolas, uma delas em Dartington Hall, conhecida por
ser uma nova escola progressiva em Devon na década de 1920, onde teve uma
longa associação com esta pequena escola não só como aluno, mas como

1
Um manifesto dos trabalhadores para as eleições gerais de 1945 produto de extensas discussões
dentro do partido sobre o futuro britânico no pós-guerra.
2
um tipo de advogado em jurisdições de direito comum, eles se especializam principalmente em
advocacia e litígio no tribunal, em que suas tarefas incluem a tomada de processos em tribunais e
tribunais superiores, elaborando argumentos legais, pesquisando a filosofia, hipóteses e histórico da
lei, e dando pareceres jurídicos especializados.
3
Em 1958, Young escreveu a influente sátira “The Rise of the Meritocracy”, originalmente para a
Fabian Society, que se recusou a publicá-la. Nele, ele cunhou a palavra “meritocracia”, a que deu
conotações negativas, e ficou desapontado com a forma como o conceito passou a ser visto como um
conceito viável, que vale a pena persegui r.
3

administrador, vice-presidente e historiador. Ele estudou economia na London


School of Economics, então se tornou um “Barrister” 4.

Ele começou a estudar para um doutorado na London School of Economics


em 1952, baseando seus estudos de habitação e política do governo local em East
London, que mais adiante, o deixaram desiludido com o estado das relações com a
comunidade e os conselheiros locais do trabalho, o que levou a fundar o Instituto de
Estudos Comunitários5, que foi seu principal veículo para explorar suas ideias de
reforma social.

Young promoveu as redes de parentesco de apoio da classe trabalhadora


urbana e uma concepção idealizada das relações entre as mulheres, sugerindo que
a família tinha sido negligenciada pela esquerda e deveria ser recuperada como uma
força progressiva, com o objetivo de fortalecer a família da classe trabalhadora, no
qual esta se configura como modelo para o socialismo cooperativo, o que o levou a
fundar o Centro de Assistência Mútua . A pesquisa social de Young também
contribuiu para a mudança no ensino secundário, que levou à abolição generalizada
das escolas de gramática e sua substituição por escolas abrangentes entre 1965 e
1976, bem como a abolição dos eleven-plus6.

Em 1960, iniciou o Centro de Assessoria para a Educação, o National


Extension College e, com Peter Laslett, uma universidade do amanhecer na Anglia
Television que se tornaram protótipos da Universidade Aberta. Em 1987, ele fundou
o Open College of the Arts. Ele também fundou a Language Line, um negócio de
interpretação de telefone, para permitir que pessoas, que não falassem em inglês
tivesse acesso igual a serviços públicos. Ele fomentou o trabalho de muitos
pesquisadores mais jovens e empreendedores sociais, fundando a seguir a School
for Social Entrepreneurs (Escola de Empreendedores Sociais) em 1997.

4
Conhecido como o curso ou teste de admissão do primário para o secundário.
5
Embora um igualitário, Young aceitou um “Life Peer”em 20 de março de 1978, no Reino Unido,
os“Life Peer” são nomeados membros de um sistema jurídico historicamente constituído por títulos,
que não podem ser herdados, em contraste com os títulos hereditários. Foi quando recebeu o título
de Baron Young de Dartington.
6
Seu princípio básico era dar às pessoas mais palavras ao dirigir suas vidas e instituições, baseando-
se em órgãos de pesquisa existentes em psicologia social e sociologia para destacar a relevância da
família alargada na sociedade moderna e oferecer um modelo de cidadania socialista, solidariedade e
apoio mútuo não vinculado ao trabalho produtivo.
4

Os aspectos do trabalho de Young estão sendo desenvolvidos pela Young


Foundation, criada a partir da fusão de seu Institute of Community Studies e seu
Mutual Aid Centre, sob a direção de Geoff Mulgan. De acordo com seu amigo Eric
Midwinter:

Todo o seu pensamento, toda a sua escrita incisiva, todos os seus


esquemas brilhantemente concebidos, todas as suas iniciativas
manipuladas com astúcia foram guiadas por um método notável. Ele era um
socialista utópico. Seu pensamento decorreu dos pontos de vista radicais do
século XIX com seu ódio pelo institucionalismo maciço, seja nas mãos da
autoridade pública ou da grande empresa comercial.

Fundamentação teórica de Michael Young e suas implicações no currículo

A partir de diversos movimentos sociais e culturais que emergiram


mundialmente na década 1960 (especificamente a partir de 1968), foram
desenvolvidas as primeiras teorias contestando e que se opuseram ao
pensamento e a estrutura educacional tecnicista e neutra, em específico, aqui, o
currículo e suas teorias.
As teorias do currículo consideradas críticas, no campo das teorias
curriculares, preocupavam-se com questões tais como: a desigualdade e a
justiça social, e com o papel reprodutor da escola, a qual, afirmava estar afinada
aos interesses da ideologia dominante.
Os autores estavam preocupados em desenvolver conceitos que permitissem
compreender, com base em uma análise crítica, o que efetivamente o currículo
colocava em prática.
Entre os estudiosos do campo curricular Michael Young, tem destaque, por
ser um dos primeiros a apresentar inquietações com o estudo e a análise do
currículo. Young, era um dos integrantes do Movimento chamado de Nova
Sociologia da Educação (NSE- que foi a primeira corrente sociológica de fato
voltada para o estudo do currículo.), dando o início a uma oposição à concepção
das teorias curriculares da época, que tinham o foco nos métodos e técnicas para a
organização do currículo, desprezando os conteúdos e a seleção do que se
ensinava. Young tem por interesse explicar como as questões de poder,
ideologia e controle social relacionam- se com os processos de seleção e
organização do currículo escolar.
5

Com essa preocupação, Young, como principal expoente da NSE, introduziu


uma nova forma de analisar o currículo, que incidir exatamente sobre as
escolhas que se fazia para definir o que deveria ser ensinado, afirmando que
a seleção de conhecimento definida era a expressão dos interesses dos grupos
que detinham maior poder para direcionar essa definição. Então, de uma visão de
currículo de maneira suposta neutra, que não problematiza as escolhas
realizadas em torno do conhecimento, passava-se a uma visão crítica dessas
definições, que declaradamente assumia o tom político da teoria do currículo.
Ao conjecturar sobre as questões que deveriam ser tratadas em uma teoria
do currículo, Young esboça sua preocupação por meio da pergunta: “O que os
alunos têm o direito de aprender na escola?”. O autor pondera que é uma questão
complexa, que deve ser repetida a cada nova geração, pois compreende que o
mundo está em constante mudança. Nesta primeira abordagem do currículo,
Young enfatiza que educação e conhecimento são inseparáveis e o currículo é
uma construção social. Assevera que nas sociedades modernas o propósito do
currículo não é apenas transmitir o conhecimento acumulado, mas habilitar a
próxima geração para construir sobre esse conhecimento e criar novos
conhecimentos. Desse modo, a discussão acerca do currículo ultrapassa as
questões relacionadas a metodologias e procedimentos e avança para a análise
crítica da sociedade, cenário marcado por disputas de poder e acentuadas
desigualdades sociais.

O currículo e a construção dos conhecimentos

A teoria curricular de Michael Young parte do pressuposto que para se construir um


currículo deverá responder a seguinte pergunta: “o que todos os alunos deveriam
saber ao deixar a escola”?

Segundo Thomaz Tadeu Da Silva, a pergunta “o que” está relacionada com o


processo de seleção, sendo o currículo o resultado desse processo. Logo, a teoria
curricular crítica de Michael Young vai muito além de analisar quais conhecimentos
deveriam ser transmitido e qual a melhor forma de transmiti-lo, partindo sempre de
um posição de questionamento parar saber não só por que este conhecimento
6

deverá ser ensinado, mas saber também por que tal conhecimento foi selecionado e
não o outro.
Nesses termos, entende-se portanto, que o conhecimento é um processo que
constitui o currículo, no qual deverá ser pensado no sujeito. Assim,o currículo vai
muito além do seu processo normativo, precisando está ligado com o seu papel
crítico, no qual se diferencia das demais teorias curriculares tradicionais que mantém
uma posição de neutralidade,concentrando-se em questões técnicas que visem a
reprodução de ideias para uma sociedade vigente. Assim, o currículo ligado ao seu
papel crítico e reflexivo irá ter uma concepção entre os conteúdos e a experiência de
vida de cada aluno.
Na Inglaterra, com a antiga sociologia da educação por volta nos anos de 1960, se
mantiveram fortes as idéias elitistas, tradicionais e técnicas do currículo, que viam
as escolas como fábricas, no qual costumavam tratar os professores como
trabalhadores manuais impondo o que e como deveriam ensinar nas escolas.
A NSE (nova sociologia da educação), que tinha como principal teórico Michael
Young, buscava romper com a tradição inicial da sociologia da educação, que era
voltada numa perspectiva do fracasso escolar dos alunos pertencentes à classe
operária. A NSE propunha um novo campo de investigação no qual se preocupava
com o conhecimento escolar, porém mais ligada com o processamento de cada
indivíduo do que com o processo do conhecimento. Dessa forma, essa nova
sociologia da educação tratava em responder questões sobre a distribuição do poder
na sociedade e a organização do conhecimento curricular.

Em busca de uma explicação sobre as questões que levaram ao fracasso escolar da


classe operária, nasceu-se então uma necessidade em focar-se no currículo que
visava discutir questões ligadas aos saberes socialmente construídos, buscando
uma melhor forma de organizá-los. A NSE se preocupava pouco com questões
tradicionalistas do currículo que iam além de buscar entender sobre “o que” e “como
se aprende”, mas ao invés disso se questionavam sobre as formas de organização
do currículo, no qual as relações de poder sempre eram um resultado dessa
formação curricular, buscando então um abalo nas estruturas de poder.
Para (YOUNG,2014, p.194), a visão normativa da teoria do currículo se torna uma
forma de tecnicismo-dizer aos professores o que fazer-se estiver separada de seu
papel crítico. Dessa forma, podemos compreender que se pensarmos em um
7

currículo como um processo burocrático, atrelado a diversas normas ou apenas a


uma grade de disciplinas, sem analisar a concepção de cada conteúdo com a
experiência dos aluno e suas diferentes culturas trazidas para escola, estaríamos
apenas reproduzindo os antigos modelos curriculares. Logo, um currículo pensado
no futuro, deve ser acompanhado de mudanças em sua organização, focando em
suas questões normativas, mas sem deixar de lado o seu papel crítico que garantirá
uma transformação e o acesso ao saber.
Brasil Bernstein(1924-2000) traz contribuições importantíssimas para Young ao
pensar que seria impossível ter uma teoria do currículo sem ter uma teoria do
conhecimento. Dessa forma, se torna inevitável pensar no currículo, em todo seu
processo de construção sem analisar o sujeito a qual está sendo direcionado esse
currículo, pois irá desconsiderar toda sua bagagem construída socialmente. Deve-
se analisar o sujeito como um ser que traz consigo conhecimentos mas sempre
terá o que aprender, por isso um currículo pensando no futuro deverá focar na
integração de conhecimentos diferentes das experiências anteriores dos alunos
antes da escola, que muitas vezes pode até ser conflitante com sua realidade , mas
nunca deixará de lado sua cultura individual.

A visão de Young do conhecimento dos poderosos ao conhecimento poderoso

Em meio a nova sociologia da educação na Inglaterra na década de 1970,


Young e demais sociólogos e educadores, desenvolveram o termo conhecimento
dos poderosos como uma crítica que faziam em relação ao papel da escola e do
próprio conhecimento contido no currículo, em que, para esses teóricos os
conhecimentos contidos no currículo eram decididos por pessoas ou grupos com
maior poder e baseados nos seus interesses. Como consequência, certos
conhecimentos eram legitimados, enquanto outros eram excluídos, com o que a
escola acabava por reproduzir as classes sociais e outras desigualdades. Assim, as
críticas feitas por Michael Young era de que o currículo deveria ser mudado,
defendendo que os grupos que não possuíssem poder deveriam escolher seu
próprio currículo de acordo com seus interesses (Kappke e Boufleuer, 2017).
A força de tal visão era afirmar que o currículo era uma expressão das
relações desiguais de poder que estão sempre envolvidas nas decisões
curriculares, assim como em todos os demais aspectos da educação.
8

Entretanto, com o seu foco no poder e em quem decide tudo o que essa
perspectiva aponta é a necessidade de mudar os grupos que tomam as
decisões (YOUNG, 2016, p. 32)

Tempos depois, Young assume uma nova perspectiva e o conceito de


conhecimento poderoso é construído em contraposição ao conceito de
conhecimentos dos poderosos. Young o desenvolveu a partir da compreensão de
que, apesar de existirem conhecimentos que são definidos pelos grupos de maior
poder na sociedade com vistas a servir aos seus interesses, o conhecimento escolar
não é apenas um instrumento de poder sobre algo ou alguém, visto que ele pode ser
um instrumento de poder para quem a ele tem acesso. Que, segundo Kappke e
Boufleuer, seria um poder não para ser exercido sobre alguém, mas como sendo
poderoso para a vida de quem a ele tem acesso.
Assim, esse conhecimento é especializado e teórico, trata-se de um
conhecimento que Young define como independente de contexto, em que enquanto
que nos ambientes não escolares os sujeitos vão construindo conhecimentos que
são aprendizagens construídas a partir de situações específicas (dependem de
contextos). Dessa forma, a escola é um espaço no qual os indivíduos podem adquirir
um conhecimento diferente daquele que já tiveram no espaço privado de outros
espaços, o que nos infere a diferenciação entre conhecimento escolar e
conhecimento não escolar. Logo, sobre as escolas Young afirma:
[...] minha resposta à pergunta “Para que servem as escolas?” é que elas
capacitam ou podem capacitar jovens a adquirir o conhecimento que, para a
maioria deles, não pode ser adquirido em casa ou em sua comunidade, e
para adultos, em seus locais de trabalho (YOUNG, 2007, p.1294).

Dessa forma, é esse conhecimento que permite aos estudantes ampliar seus
conhecimentos acerca de algum aspecto do mundo sobre o qual eles já possuem
algum conhecimento, construído principalmente através da experiência cotidiana. E
para que uma escola tenha sucesso em capacitar seus alunos a adquirir
conhecimento poderoso ela precisa contar, segundo Young, com um currículo
baseado nesse conhecimento poderoso, no qual no currículo estão expressas as
intenções que a sociedade ou determinado país tem para com a educação, ou seja,
“o currículo é um recurso para guiar os objetivos do professor, da escola e do país –
o que é valorizado como essencial para todos os estudantes terem acesso”
(YOUNG, 2016, p.34).
9

A escola para Michael Young

A partir das concepções de Michael Young quando voltamos a nossa atenção


“Para que servem as escolas?”, recebemos como resposta que está expressa
tensões e conflitos de interesses na sociedade mais ampla. O autor ressalta que
existe uma ligação entre desejos emancipatórios associados com a expansão da
escolarização e a oportunidade das escolas em oferecer aos alunos a aquisição do
conhecimento poderoso, discutindo a diferenciação do conhecimento como um
modo de distinção entre conhecimento escolar e não-escolar e falando sobre como
as formas contemporâneas de avaliação tendem a extinguir as fronteiras entre
conhecimento escolar e conhecimento não escolar, visto que impedem a criação de
um currículo acessível e com relevância econômica.
Young toma como base a análise de Bernstein para sugerir que seguir esse
caminho pode ser o mesmo que negar a aquisição do conhecimento para os alunos
que são desfavorecidos economicamente. Young expressa a importância das
escolas ao dizer que estas são de suma importância para a sociedade pois "sem
elas, cada geração teria que começar do zero ou, como as sociedades que existiram
antes das escolas, permanecer praticamente inalterada durante séculos" (YOUNG,
2007, p. 1288).
Para que se entenda mais sobre as escolas e seu papel, Young nos leva a
relembrar diferentes tensões enfrentadas pela escola. De acordo com Young (2007)
a luta histórica pelos propósitos da escolaridade pode ser vista em termos de duas
tensões, a primeira é entre os objetivos da emancipação e da dominação. Segundo
o autor, é possível pensar a luta histórica por objetivos educacionais em termos de
duas tensões. O primeiro é um objetivo tanto de dominação quanto de emancipação.
Desde os chartistas no século XIX e, mais recentemente, no caso da
educação bantu na África, grupos dominantes e subordinados têm tentado utilizar as
escolas para os seus diversos objetivos. Para entender que mesmo os sistemas
educacionais mais opressores podem ser usados como ferramentas de
emancipação, basta lembrar que Nelson Mandela foi um produto das escolas para
afro-americanos que antecederam a educação bantu (YOUNG, 2007).
Michael Young responde à pergunta "Para que servem as escolas?" dizendo
que as escolas permitem que jovens e adultos adquiram conhecimentos que, para a
maioria deles, não podem ser adquiridos em casa, na comunidade ou até mesmo
10

em seus locais de trabalho. O autor passa então a explorar as implicações dessa


afirmação. Young afirma que nas sociedades contemporâneas, o conhecimento
mais valioso é o conhecimento cada vez mais especializado. Nesse caso, se o
objetivo das escolas é transmitir esse tipo de conhecimento, as relações aluno-
professor assumirão as seguintes características únicas: Serão hierárquicas e
diferentes das relações entre colegas; e não irão se basear nas decisões dos
alunos porque, em muitos casos, estes não possuem o conhecimento prévio
necessário para tomar tais decisões. Isso não significa que os professores não
devam levar em conta o que os alunos lhes ensinaram ou que não devam ser
desafiados; pelo contrário, significa apenas que algumas relações de autoridade
pertencem a professores e escolas (YOUNG, 2007).
Young apresenta ainda a distinção entre conhecimento acadêmico e não
acadêmico, alegando que essa distinção engloba diferenças entre conhecimento
acadêmico e cotidiano, domínios de conhecimento e suas relações, conhecimento
especializado e conhecimento com aplicações pedagógicas, como as distinções
entre histórias acadêmicas e não acadêmicas para vários alunos (YOUNG, 2007).
Por trás dessas diferenças, o autor sugere uma diferença mais fundamental entre os
dois tipos de conhecimento. Um deles é o conhecimento dependente do contexto,
que se desenvolve quando problemas diários com um foco específico são
resolvidos. Tal conhecimento lida com especificidades ao invés de elucidar ou
generalizar.
O segundo tipo de conhecimento é o conhecimento teórico ou conhecimento
independente do contexto e desenvolvido para fornecer generalizações e buscar a
universalidade. Esse conhecimento fornece uma base para fazer julgamentos e
normalmente está ligado às ciências. Young refere-se a este último tipo de
conhecimento como sendo o conhecimento mais potente porque é tipicamente
adquirido na escola.

Michael Young e a defesa de um currículo centrado em disciplinas

Em sua participação no movimento democrático da África do Sul, Michael


Young analisou a relação que os educadores e aprendizes daquele contexto
estabeleceram com o currículo integrador que foi formulado após a queda do
apartheid. Esse currículo entendia o conhecimento como uma “construção social”,
11

que os libertaria da opressão que era imposta através da transmissão de


conhecimentos naquele regime.

Young percebeu que mudanças curriculares significativas não acontecem


apenas quando os grupos desfavorecidos assumem o poder nas formulações
curriculares, mas que é necessário haver a compreensão de que a atividade
educacional, da qual deve se ocupar o currículo, é uma atividade especializada que
deve estar fundamentada em conceitos curriculares e pedagógicos que objetivem a
emancipação dos aprendizes.

A partir de então, o teórico inglês transformou seu conceito de conhecimento


dos poderosos em conhecimento poderoso que é o conhecimento mais confiável em
cada área de conhecimento, produzido em comunidades de especialistas e que
permitem que os alunos caminhem para além das experiências que vivenciam em
seu cotidiano. Ao elaborar esse conceito, o autor defende um currículo organizado
em disciplinas que “ são um conjunto de conceitos teóricos relacionados” ( YOUNG,
2011, p. 616), pois segundo sua teoria o desenvolvimento intelectual dos estudantes
é um processo que deve ser fundamentado na transmissão de conceitos, que por
sua vez estão relacionados a alguns conteúdos.

Para Young, a escola é o lugar onde os alunos são levados a conhecer o


mundo como um “objeto de pensamento”, através da transmissão dos conceitos
teóricos ou especializados que têm finalidades específicas e por isso permitem que
o aprendiz faça generalizações confiáveis. Esses conceitos teóricos, assim como o
conhecimento curricular, não dependem de contextos e quando compreendidos e
assimilados permitem que os alunos avancem de suas experiências ao que
Vygotsky se referiu como as “formas mais elevadas de pensamento” , contribuindo
com o seu desenvolvimento intelectual.

As disciplinas escolares são, portanto, regras acordadas entre os professores


especialistas sobre os conhecimentos válidos para o desenvolvimento intelectual
dos aprendizes, essa seleção é feita a partir do uso de critérios pedagógicos e das
conexões entre professores especialistas das universidades e professores
especialistas das escolas. Essas relações formam as comunidades de especialistas,
que constituem-se como organizações sociais e são responsáveis pelo
12

fortalecimento da identidade docente. Por exemplo, através da participação em


comunidades de especialistas de professores de história, docentes que trabalham
nessas áreas do conhecimento nas escolas da cidade de São Luís podem conectar-
se com professores universitários que se ocupam dela também em sua cidade ou
também em outros lugares no país e no mundo, a fim de produzir conhecimentos
teóricos válidos para a aprendizagem de seus alunos.

Charlot (2009), acredita que o papel do professor no currículo centrado em


disciplinas é o de ajudar os alunos a administrarem os conceitos que lhes são
transmitidos pelas diferentes disciplinas, a estabelecer as relações entre os
conceitos teóricos e seus conhecimentos cotidianos e também a apresentar os
alunos conhecimentos e conceitos que não podem perceber em sua realidade.

Para os alunos, principalmente aqueles que emergem de lares


desfavorecidos, as disciplinas possibilitam a construção do senso crítico e da noção
de resistência ao senso de alienação de suas vidas fora da escola. O currículo
centrado nessa organização, levará os alunos para além de suas experiências
cotidianas e a compreensão dos conceitos teóricos transmitidos os ajudará em sua
progressão intelectual.

Quando os conhecimentos são organizados em disciplinas, eles possuem


fronteiras que delimitam seus territórios, são hierarquizados de acordo com os
acordos realizados entre os especialistas que os produzem e essas características
garantem que a educação, a escola e o próprio currículo possibilitem que seus
aprendizes possam acessar espaços, conhecimentos e compreensões que não
seriam oportunizadas se a organização curricular acontecesse de outras formas.

Para explicitar seu entendimento sobre o currículo centrado em disciplinas, o


autor faz um paralelo com um trecho da matéria do jornal The Observer :

O jornal The Observer expressou bem o ponto que desejo destacar. Ao


elogiar o notável Movimento Venezuelano para a introdução do jovem
oriundo das partes mais pobres do país à música clássica, o jornal
comentou: “Dominar um instrumento clássico requer disciplina, sensibilidade
e agilidade mental. É triste que um brilhante instrumento para a
aprendizagem seja rotineiramente colocado nas mãos de crianças
privilegiadas e não seja oferecido às mais pobres” (3 de outubro de
2010).Se você realmente dominar o violino ou o violoncelo, você tem acesso
à música que está além de seu instrumento. É isso que penso em relação
às disciplinas.(YOUNG, 2011, p. 619).
13

Resumidamente, para Young o currículo centrado em disciplinas possibilita o


acesso ao conhecimento poderoso através do acesso aos conceitos teóricos que
foram produzidos em comunidades de especialistas por professores que estão nas
universidades e também nas escolas ministrando as disciplinas em salas de aula, a
relação entre professores em diferentes níveis de docência e pesquisa através das
comunidades de especialistas que devem formular o currículo através da seleção
dos conhecimentos válidos , possibilita a progressão e o desenvolvimento intelectual
de seus aprendizes a fim de levá-los a compreender o mundo para além de suas
experiências cotidianas de forma conceitual e confiável.

As contribuições de Michael Young para a educação maranhense

A educação maranhense vem sendo ressignificada ao longo da história, pois,


no Brasil, centrou-se durante muito tempo no estudo da organização dos sistemas
de ensino e do ideário pedagógico. Porém, alguns autores questionam esse tipo de
ensino. Entre os estudiosos do campo do currículo, Young (1971, 2000) merece
destaque, por ser um dos primeiros a apresentar inquietações com o estudo e a
análise do currículo, preocupação permanente ao longo de toda sua trajetória de
pesquisa. A concepção das teorias curriculares maranhense daquela época, que
tinham o foco nos métodos e técnicas para a organização do currículo, desprezando
os conteúdos e a seleção do que se ensinava. Como já citamos anteriormente, ao
refletir sobre as questões que deveriam ser tratadas em uma teoria do currículo, o
autor esboça sua preocupação por meio da pergunta: O que os alunos têm o direito
de aprender na escola?. Considera que esta é uma questão complexa, que deve ser
repetida a cada nova geração, pois a sociedade está em constante transformação.
Nesta primeira abordagem do currículo, Young (1971), enfatiza que educação e
conhecimento são inseparáveis e que o currículo é uma construção social.

Nessa perspectiva, a escola é compreendida como a instituição que a


humanidade criou para socializar o saber sistematizado e como o lugar onde, por
princípio, veicula-se o conhecimento que a sociedade julga necessário construir e
reconstruir com as novas gerações. Dessa forma, a aprendizagem e o
desenvolvimento daqueles que se encontram na escola é responsabilidade de todos
que dela fazem parte. Assim, a Secretaria da Educação do Estado do Maranhão, as
Secretarias Municipais de Educação e a rede privada de ensino devem propiciar as
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condições básicas para que isso efetivamente aconteça, bem como assegurar a
formação continuada indispensável para o bom desempenho dos professores e o
alcance do sucesso escolar dos estudantes. Desse modo, Young defende uma
posição contrária à defesa de um currículo por resultados, instrumental e imediatista,
ressaltando a necessidade de garantir acesso ao conhecimento, em especial para
crianças e jovens ds grupos sociais desfavorecidos; e que a escola não afaste de
sua tarefa específica, disponibilizando o conhecimento especializado,o que não se
acessa na vida cotidiana e que pode oferecer generalização e base para fazer
julgamentos, fornecendo parâmetros de compreensão de mundo.

A partir dessa visão, é necessário que as ações pedagógicas sejam


realizadas partindo de uma concepção de um currículo crítico e reflexivo, que se
assemelham a teoria curricular de Young, e que aborde o conhecimento de forma
interdisciplinar fazendo a utilização de temas transversais, que seja capaz de auxiliar
na formação humana e cidadã dos estudantes maranhenses. Assim, as ações dos
professores e os conteúdos devem ir ao encontro dessa intencionalidade, ou seja,
devem ser pautadas na formação integral e cidadã dos estudantes. O currículo não
deve ser entendido apenas como uma seleção de conteúdos, mas como uma
sistematização do saber com intencionalidade de construção do conhecimento. Esse
processo não deve estar desatrelado das questões sociais que constituem a
identidade de um povo e de uma localidade. Ou seja, as instituições devem abortar
com clareza o conhecimento que deseja que as crianças aprendam. Esse é o ponto
de partida. Em segundo lugar, e isso foi dito há algum tempo por um teórico do
currículo, não há desenvolvimento de currículo que não seja desenvolvimento e
formação de professores. O currículo não tem um significado completamente
independente dos professores, que o tornam parte de seu trabalho. Então, em suma,
qualquer reforma curricular deve ser uma colaboração entre um organismo curricular
nacional e as várias associações profissionais de professores, principalmente
aquelas relacionadas às disciplinas específicas. Também deverá envolver vários
especialistas das universidades e assim por diante. Precisa ser assim. É o único
jeito de realizar uma reforma curricular uma colaboração entre um organismo
curricular nacional e as várias associações. (YOUNG, 2014, p.1122)
15

Portanto, o currículo deve representar os mais diversos aspectos sociais dos


atores envolvidos no processo de ensino, ser expressão da construção coletiva dos
saberes sociais do povo maranhense.

Considerações Finais
16

Neste trabalho, apresentamos alguns aspectos dos pensamentos de Michael


Young, que contribuem para pensarmos sobre a questão do conhecimento e suas
concepções curriculares. Para Young, o conhecimento transmitido pela escola, deve
ser o conhecimento poderoso, ou seja, o melhor conhecimento, o mais confiável,
aquele que permite que o aprendiz faça generalizações por ter um caráter
especializado.
Dessa forma, Young focaliza sua teoria curricular nas questões sobre
conhecimento, para o autor a transmissão dos conceitos teóricos elaborados pelas
comunidades de especialistas caracteriza essencialmente a atividade educativa.
Uma vez que, por meio da compreensão dos conteúdos disciplinares, os aprendizes
podem acessar o mundo como objeto de pensamento e não apenas como lugares
de experiências.

Referências
17

GALIAN, Cláudia; LOUZANO, Paula. Michael Young e o campo do currículo: dá


ênfase no “conhecimento dos poderosos” à defesa do “conhecimento
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