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Comunismo e gênero no Escola sem Partido: notas para não sucumbir a uma pedagogia fascista

DOI: http://dx.doi.org/10.21879/faeeba2358-0194.2020.v29.n58.p168-186

COMUNISMO E GÊNERO NO ESCOLA SEM


PARTIDO: NOTAS PARA NÃO SUCUMBIR A
UMA PEDAGOGIA FASCISTA
Cássia Cristina Furlan (UFGD)*
https://orcid.org/0000-0002-8175-9320

Fabiana Aparecida de Carvalho (DBI/UEM)**


https://orcid.org/0000-0002-6746-4200

RESUMO
Objetiva-se traçar uma genealogia do Movimento Escola sem Partido quanto à
elaboração de discursividades que vinculam os estudos de gênero aos ideários
comunistas. Via pesquisa e análise documental dos estatutos de Projetos de Lei,
de notas técnicas, de Requerimentos de Informação e de algumas publicações
em sites do Movimento, evidenciam-se os aparatos discursivos a impor uma
visão de neutralidade nas escolas, combativa da doutrinação e dos processos de
subversão moral provadas pelos debates de gênero. Critica-se a visão restritiva
do Escola sem Partido e sua promoção de uma pedagogia fascista.
Palavras-chave: Estudos de gênero. Discursividades. Escola sem Partido.

ABSTRACT
COMMUNISM AND GENDER IN UNPOLITICAL SCHOOL: NOTES NOT TO
SUCCEED TO A FASCIST PEDAGOGY
The objective is to trace a genealogy of the Unpolitical School Movement regarding
the elaboration of discursivities that link Gender Studies to Communist ideas.
Through research and documentary analysis of the statutes of Law Projects,
Technical Notes, Information Requirements and some publications on the
Movement’s websites, the discursive apparatus to impose a view of neutrality in
schools, combating indoctrination and processes, is evident. of moral subversion
proved by the Gender debates. The restrictive view of Unpolitical School is
criticized and its promotion of a fascist pedagogy.
Keywords: Gender studies. Discourse. Unpolitical school.


Doutora em Educação pela Universidade Estadual de Maringá (UEM). Professora Adjunta e Coordenadora do Curso de
Educação Física na Universidade Federal de Grande Dourados (UFGD). Líder do Grupo de estudos e pesquisas em Educação
Física e Cultura(s) (EDUCA). E-mail: cassiacfurlan@gmail.com
∗∗
Doutora em Educação para a Ciência e a Matemática pela Universidade Estadual de Maringá (UEM). Professora Adjunta
do Departamento de Biologia da Universidade Estadual de Maringá (DBI/UEM). Coordenadora do Grupo de Estudos das
Pedagogias do Corpo e da Sexualidade (GEPECOS). E-mail: facarvalho@uem.br

168 Rev. FAEEBA – Ed. e Contemp., Salvador, v. 29, n. 58, p. 168-186, abr./jun. 2020
Cássia Cristina Furlan; Fabiana Aparecida de Carvalho

RESUMEN
COMUNISMO Y GÉNERO EN LA ESCUELA SIN PARTIDO: NOTAS PARA
NO TENER ÉXITO EN UNA PEDAGOGÍA FASCISTA
El objetivo es rastrear una genealogía del movimiento Escuela Sin Partido con
respecto a la elaboración de discursividades que vinculan los estudios de género
con las ideas comunistas. A través de la investigación y el análisis documental
de los estatutos de proyectos de ley, notas técnicas, requisitos de información y
algunas publicaciones en los sitios web del Movimiento, es evidente el aparato
discursivo para imponer una visión de neutralidad en las escuelas, combatir el
adoctrinamiento y los procesos. de subversión moral demostrada por los debates
de género. Se critica la visión restrictiva de Escuela sin Partido y se promueve
una pedagogía fascista.
Palabras clave: Estudios de género. Discurso. Escuela sin Partido.

...Dos discursos e verdades


(inventadas) que se repetem...1
No dia 11 de novembro de 1970, o Coronel O Serviço de Segurança Nacional da época
Rubens Resstel proferiu, no Clube Círculo Mi- acreditava piamente que as/os comunistas
litar de São Paulo, a explanação “Infiltração coligados aos partidos políticos e às frentes de
Comunista nos meios Educacionais” (RESSTEL, influência procuravam se infiltrar nas faculda-
1970), destinada a professoras(es) e gesto- des de Ciências Sociais, de Comunicações e de
ras(es) educacionais da rede estadual e parti- Filosofia, Ciências e Letras – tidas como locais
cular e a convidadas(os) do então Secretário de formação docente e de influência intelectual
de Educação do Estado Paulo Ernesto Tolle. em outros meios estudantis – para dissemi-
O militar, munido do ideário de prestação de nar junto às/aos alunas(os) toda espécie de
serviços à causa da educação, da segurança informação tóxica e subversiva, entre elas o
nacional e de preservação do regime ditatorial amor livre, a atração sexual desenfreada, a
em vigência, tentava alertar as autoridades es- perseguição ao pudor feminino e a adoção do
colares e docentes presentes sobre os perigos pensamento crítico.
decorrentes dos métodos e táticas utilizadas Na esteira desse pensamento ideológico,
por agentes da subversão no meio estudantil. Resstel (1970) mantinha a convicção de que
Ancorado no que denominou de gravidade e a liberdade de cátedra seria um método larga-
extensão de aspectos e fatos a confrontar a mente utilizado pelos agentes doutrinadores
verdadeira natureza didático-pedagógica e no magistério, uma vez que esses se valiam
administrativa, acenara para os casos de ins- de suas posições de prestígio para conquistar
talação ideológica nas escolas secundaristas a mente de jovens imaturos e predispô-los,
e nos meios universitários, incentivando a ao manipular suas emoções, ao aliciamento,
abertura de inquéritos e denúncias de escolas, à contestação, ao protesto e à dúvida acerca
a aplicação de regulamentos disciplinares e o da seguridade do regime militar. O coronel
reestabelecimento da normalidade pautada na criticou a “exagerada autonomia didática e
ordem imperativa do já decretado Ato Institu- administrativa” de professoras(es) e direto-
cional no 5, de 1968. ras(es) como desencadeadora de proselitismos
e, consequentemente, de falhas de organização
1 De acordo com a Plataforma Brasil, o artigo está dispensado
de registro de termos de consentimento por se tratar de
escolar, de desinformação e de despreparo das
pesquisa documental, sem utilização de seres humanos. autoridades de ensino para reconhecer as suti-

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lezas psicológicas e discursivas disseminadas de guinadas ao conservadorismo e ao recru-


pelas(os) militantes nos espaços educacio- descimento do Estado quanto ao subsídio de
nais. A título de exemplificação, seu discurso políticas públicas, assistenciais e de direitos
congregou ataques aos conteúdos, técnicas humanos, o Brasil se vê a repetir a evocação
de ensino e métodos importados tidos como de dois fantasmas acionados de modo com-
perniciosos e sujeitos a propósitos ocultos; plementar ou como sinônimos. Essa evocação
o “estudo do meio”, método interdisciplinar parece ressurgir nos períodos de crises e
que favorece a imersão e o contato direto com desmandos administrativos que desestabi-
uma dada realidade a ser estudada, na acep- lizam a gestão pública e o desenvolvimento
ção de Resstel (1970), fora visto como técnica econômico. Assim sendo, na história recente
didático-pedagógica a depor sobre os aspectos do país, demarcada após o golpe de 1964,
positivos da vida social, sendo o responsável comunismo e gênero funcionaram e funcio-
por enfraquecer o poder da autoridade, por nam como disparadores de pânicos morais
atrair a adolescência para o vício, para a mar- e políticos na população e como ameaças a
ginalização social e para uma atuação política uma pretensa ordem social e a um projeto de
de esquerda. nação ancorado nos valores tradicionais das
Ao término de sua apresentação, o coronel elites dominantes.
exortou o papel de dirigentes de ensino, orien- O destaque inicial feito ao pronunciamen-
tadoras(es) educacionais e docentes para com to de Resstel (1970) não é uma recorrência
as responsabilidades do cumprimento da se- simples a um fato histórico. Em nosso en-
gurança nacional e, enfaticamente, lembrou as tendimento, trata-se, conforme apontado
pessoas presentes que máquinas subversivas por Michel Foucault (1984), de realizar uma
promovem “inocentes ou idiotas úteis”2 (RESS- operação genealógica e de trazer a discursi-
TEL, 1970) nos estabelecimentos de ensino, e vidade do que já vivemos com o intento de
que o Brasil, via militares, havia definido sua presentificar a atualidade histórica e política
opção ideológica em março de 1964, deixando e de compreender como certos enunciados,
registrado, nas entrelinhas do discurso, um rol discursos e práticas inventam-se, circulam e
de intenções para a implantação de uma peda- se estabelecem como falas, ações e posturas de
gogia de cunho fascista nas escolas. alguns grupos sociais no cerne de um processo
Cinquenta anos separam esse episódio do de reiteração de argumentos de autoridade ou
Governo Jair Bolsonaro, no entanto, as ideias do estabelecimento de uma verdade única e
pronunciadas lá, nesse passado não tão remoto, absoluta sobre os fatos.
parecem estar mais vívidas e propagadas aqui, Se apagássemos os nomes, locais e datas
na atualidade política do país e na reintegração registrados no Círculo Militar e sugeríssemos
de militares do alto e baixo escalão à frente de a associação dos encadeamentos apontados
ministérios e gabinetes do novo governo. acima ao momento histórico-político brasileiro,
Em meio ao cenário de movimentações e certamente, muitas das(os) leitoras(as) pode-
riam traçar caminhos a conectar a explanação
2 No jargão político atual, o termo “idiota útil”, originalmente
cunhado por vertentes comunistas e socialistas para se inicial desta comunicação a figuras contempo-
referir às pessoas alienadas da realidade imposta pelo râneas cujos perfis se engajam numa espécie
capitalismo, tem sido utilizado por setores sociais de
ultradireita para nomear as/os simpatizantes de posições de perseguição anticomunista. Seriam, prova-
esquerdo-partidárias ou mesmo aquelas(es) contrárias(os) velmente, citados nomes como os de: Miguel
ao neoliberalismo, às desigualdades geradas pelo regime
econômico e pelo lucro e às medidas adotadas pelo
Nagib, advogado católico, e sua confabulação
governamento atual do país. Mantemos a acepção atual acerca da doutrinação como um abuso de pro-
por ela se alinhar à explicação dada na fala de Resstel e no fessoras(es) da liberdade de ensinar e do prin-
alinhamento do Movimento Escola sem Partido, objeto de
crítica desta comunicação. cípio da imparcialidade; Rodrigo Constantino,

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Cássia Cristina Furlan; Fabiana Aparecida de Carvalho

jornalista, propagador de matérias jornalísti- penhados por pessoas e da construção de


cas deturpadas sobre a militância comunista masculinidades e de feminilidades (FURLAN;
e a ocupação de universidades e escolas por CARVALHO, 2019). Tomamos a categoria
diretórios partidários; Bia Kicis, deputada do gênero também com um dispositivo históri-
PSL-DF, que refuta as evidências científicas e co que engendra representações, normas e
estudos objetivos ao propagar supostos fatos, condutas sociais e como uma possibilidade
denúncias e postagens em rede sociais na inter- de abarcar significados nem sempre tão evi-
net com o mote de sonegação de conteúdos às/ dentes quando se intersectam posições de
aos alunas(os) em prol do comunismo, do femi- classe, de raça e de subjetividade.
nismo e das deturpações do gênero; e a família Para atingir nossa proposição, lançamos
Bolsonaro com seus discursos congregados de mão da leitura/análise documental de pro-
incentivos às violências, aos denuncismos e ao duções como: 1) Projetos de Lei (PL), entre
extermínio de militantes de esquerda. Além os quais: PL no 7.180/20143 (BRASIL, 2014a),
de suas convicções sobre sociedade e política, proposto por Erivelton Santana (PSC-BA);
essas pessoas têm em comum a associação ao PL no 867/2015 (BRASIL, 2015a), de autoria
Movimento Escola sem Partido. do Deputado Izalci Lucas (PSDB-DF); PL no
Desde 2014, após a votação dos Planos de 193/2016 (BRASIL, 2016), do Senador Mag-
Educação nas unidades federativas do país no Malta (PL-ES), já retirado de pauta; PL no
e pelo Congresso Nacional, e dos embates 246/2019 (BRASIL, 2019), apresentado pela
religiosos pela supressão das metas concer- deputada Bia Kicis (PSL-DF); 2) Notas Técnicas
nentes a igualdade e equidade de gênero nos do Escola sem Partido (NAGIB et al., 2018); 3)
documentos elaborados (TOLOMEOTTI; CAR- Publicações do site escolasempartido.org (ES-
VALHO, 2016), o Escola sem Partido (ESP) vem COLA SEM PARTIDO, 2020); e 4) o Requerimen-
sendo encampado por baluartes e políticas(os) to de Informação (RIC) no 565/2015 (BRASIL,
apropriadores da causa para a reafirmação de 2015b), redigido por Izalci Lucas (PSDB-DF),
alinhamentos mercadológicos, da redução do Cesar Souza (PSD-SC), Diego Garcia (PHS-PR)
papel do Estado e para a operacionalização de e Eduardo Cury (PSDB-SP).
uma visão moralizante da escola pública, da Nessa linha genealógica4 tentamos com-
educação básica e do pensamento crítico. preender a emergência de configurações,
Nossa intenção é traçar uma genealogia redes de interesse, dispositivos e significações
e colocar em evidência as justificativas e os atreladas aos discursos e práticas fundantes
mecanismos com os quais o Movimento Es- (FOUCAULT, 1984) do Movimento Escola sem
cola sem Partido tem dado ênfase e vincula o 3 Optamos por explorar alguns Projetos de Lei vinculados à
gênero como sinônimo de comunismo e, por defesa de uma educação baseada na pseudoneutralidade
associação, como ferramenta de perversão dos política e contra a pretensa “Ideologia de Gênero”.
No entanto, existem vários projetos tramitando (e/
ideários políticos, de supostas regras naturais ou arquivados/retirados de pauta), em conjunto e/ou
que determinam os corpos e a sociedade e dos individualmente, na Câmara dos Deputados e em outras
instâncias legislativas, visando a objetivos semelhantes.
ensinamentos escolares. Citamos alguns: PL nº 5.487/2016, apensado ao PL nº
A compreensão a guiar a linha analítica 1.859/2015; PLs nos 7.181/2014 e 867/2015, apensado
ao PL 7.180/2014; e o PL nº 1.411/2015, dentre outros.
desta comunicação está ancorada nas epis- 4 Nossa pretensão não é dispor uma análise do discurso
temologias feministas que abarcam o gênero habitual sobre o Escola sem Partido. As reflexões
como uma categoria semântica e política, aqui levantadas guiam-se pela noção de genealogia
aportada em Foucault (1984), destacando os vínculos
uma lente para se compreender a construção aos quais o Movimento associa-se, como ele emerge nos
de diferenças, de igualdade, de equidade, de acontecimentos recentes do País e sua correlação de forças
nesse momento em termos de suas estratégias, táticas
dominações ou de libertações na vida social e discursividades para se impor como um processo de
a partir de papéis atribuídos ou desem- dominação e como um projeto educacional para o Brasil.

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Partido e de como ele configura a aversão ao contestar currículos escolares e a liberdade de


comunismo e ao gênero como estratégia de cátedra de professoras(es) (CARVALHO; POLI-
convencimento tanto no campo estratégico ZEL; MAIO, 2016). Nagib forja um movimento
do poder político, quanto no domínio de uma de defesa das escolas baseado, inicialmente, na
vontade de saber imposta para escolas. Com interpretação dos princípios de imparcialida-
isso, buscamos provocar reflexões sobre os de de posições nas instituições de ensino e da
modos como tais aparatos de produção dis- corresponsabilidade Estado-Família-Escola na
cursiva, aliados a uma pretensa neutralidade educação de crianças e jovens.
e balizados pela suposição de combate a um O que seria, aparentemente, uma evocação
ensino com fins políticos, ideológicos e par- da liberdade de expressão nos espaços de en-
tidários, produzem um imaginário social de sino e a luta para que fatos históricos fossem
suposta doutrinação e subordinação aos prin- apresentados sob mais de um ponto de vista,
cípios comunistas e de subversão da moral transformou-se, pela influência de Olavo de
alicerçada aos debates de gênero, discutindo Carvalho e de seu pensamento de combate a
tais implicações para a educação e para a uma guerra cultural orquestrada por teóri-
democracia. cas(os) marxistas e socialistas reticentes ao
Trazemos uma contextualização da inven- cristianismo e aos valores morais tradicionais
ção do Movimento no Brasil seguida de nossa (PENNA; SALLES, 2017), numa cruzada a per-
compreensão sobre a atribuição de sentidos seguir explicações, conceitos e posições diver-
ao comunismo e ao gênero visando apontar gentes da versão hegemônica sobre a história,
caminhos e possibilidades para análise dos sobre a ciência e sobre aquilo que é tido como
processos de subordinação às lógicas discur- norma social.
sivas produzidas pelo ESP e suas/seus ideali- A grande explosão do Movimento, em ter-
zadoras(es). Assim, pretende-se desconstruir mos de adesão e simpatia à sua filosofia, dá-se
os caminhos discursivos que impõem medo e em 2014, quando o então Deputado Flávio
coação ao trabalho docente, caminhando para Bolsonaro protocola o primeiro Projeto de Lei
a produção de resistências aos movimentos Escola sem Partido na Assembleia Legislativa
persecutórios que têm se instalado no cená- do Estado do Rio de Janeiro. Encomendado
rio nacional, objetivando não sucumbir à uma primeiramente pelos Bolsonaros, o Projeto
pedagogia fascista. transforma-se em uma minuta disponibilizada
na internet para que políticas(os) dos Estados
Escola sem partido: breve visão e Municípios e pessoas interessadas possam
copiar e garantir a representatividade do mo-
de uma pedagogia de controle vimento em casas legislativas, em seus núcleos
Para efeito didático de contextualização, o escolares e familiares.
Movimento Escola sem Partido é inventado As/os coligadas(os) ao Escola sem Partido
em 2004, pelo advogado paulista Miguel Na- difundem em canais midiáticos de rádio, te-
gib, que se apropria de ideias reacionárias de levisão e da internet suas palestras, cartilhas
movimentos conservadores norte-americanos e explicações propagadoras de críticas ao que
e de projetos neoliberais encampados por chamam de marxismo cultural e de descons-
corporações transnacionais conhecidas como trução aos valores cristãos. Segundo Miguel
think tanks,5 especialmente com o objetivo de (2016), a posição reacionária manifesta coop-
5 Instituto Millenium e Instituto Liberal são exemplos de sistema público de ensino, pela defesa da implantação do
think tanks vinculados a Miguel Nagib e ao Escola sem homescholling, “sala de aula invertida” e ensino a distância
Partido. Essas organizações são conhecidas, entre outros como estratégias minimizadoras de investimentos e gastos
propósitos educacionais, pela ênfase na transformação da com educação e pelo incentivo à interferência de grupos
educação em mercadoria, pela defesa da privatização do privados nas escolas.

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ta ideários de libertarianismo econômico (re- lecessem como a verdade de certos grupos


dução das subvenções econômicas do Estado, e para que a reatividade do Escola sem Par-
incentivo ao empreendedorismo individual e tido pudesse povoar o imaginário de muitas
do livre mercado e regulamentação da vida pessoas. Logo, nos últimos dois anos, o Movi-
privada), de fundamentalismo religioso e de mento cresceu em representatividade, sendo
anticomunismo – este direcionado, agora, defendido por partidos como o PSC, PSL, PP e
à perseguição ao Partido do Trabalhadores PSDB, grupos empresariais ligados a sistemas
(PT) e demais frentes de centro-esquerda no de ensino privados, legisladores que defendem
país. Segundo Nagib e outros (2018), há uma interesses de igrejas e por organizações como
coleção de evidências de práticas abusivas o Movimento Brasil Livre.
nas escolas, que se presta à alimentação de O ESP está amplamente empenhado em
acervos online contendo artigos, reportagens, ditar regras para as escolas com o propósito
depoimentos gravados em áudios e vídeos, da descontaminação das instituições, das
denúncias de livros didáticos, de eventos, de doutrinações e ideologias partidárias e su-
escolas e de educadoras(es) (ESCOLA SEM bordinação à neutralidade do conhecimento
PARTIDO, 2020). (NAGIB et al., 2018). Suas proposições, mais
Em nosso ponto de vista, a base ideológica que simples códigos de preceitos afixados nas
do Escola sem Partido encontra-se assenta- paredes de colégios e universidades, visam agir
da em “discursividades” responsáveis por diretamente: a) na Lei de Diretrizes e Bases da
criar concepções enviesadas da escola e do Educação (LDB/1996), ao instaurar práticas de
processo educativo. Por “discursividades” en- vigílias e punições às/aos educadoras(es); b)
tendemos uma série de discursos, narrativas, no Programa de Distribuição do Livro Didático,
práticas e enunciados a marcar representa- extinguindo a política pública que dota a escola
ções, estereótipos, posições ideológicas que se de livros avaliados por equipes competentes
correlacionam com a criação de significados, e por padrões que se adequam aos conteúdos
com as relações de poder e com a imposição estruturantes da educação básica; e c) na liber-
de verdades. Elas emergem de contextos de dade de cátedra de professoras(es) e escolha
época, grupos, economia, de certas visões de dos conteúdos escolares.
ciência e são transitórias, logo, seus estatutos Nas premissas de coibir a livre expressão
são relacionais e dependentes de conjunturas nas escolas brasileiras, vigiar docentes em suas
acontecimentais que favorecem suas disper- liberdades de ensino e expressão, cercear os
sões e validades. conteúdos curriculares que possuem impor-
A conjuntura histórica do Brasil após as mo- tância na construção da cidadania, o Escola
vimentações de rua do ano de 2013, exigindo sem Partido, ainda que não seja Lei, mas com
melhores condições sociais e o fim da corrup- o argumento de Lei, vai se estabelecendo como
ção, o processo de afastamento da Presidenta uma perigosa política de delação, censura e pu-
Dilma Rousseff e a forja do Golpe Parlamentar nição que afetará a vida de professoras(es), de
em 2016, o fortalecimento dos setores conser- equipes gestoras e de estudantes, instaurando
vadores e de bancadas políticas religiosas nas uma pedagogia arregimentada do medo e da
casas legislativas com a representatividade do opressão.
agronegócio, das facções e milícias pró-arma- Dessa maneira, constela-se o perfil desse
mento da população e dos setores religiosos movimento social conservador que, junto a
(conformando as bancadas do “Boi” da “Bala” outros mais reativos, passa a disseminar, além
e da “Bíblia”) são exemplos de acontecimentos do pânico aos posicionamentos de esquerda,
que operaram as condições acontecimentais dispositivos de controle e negação à educação
para que os discursos antiesquerda se forta- dos gêneros e à diversidade sexual.

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Comunismo e gênero no Escola sem Partido: notas para não sucumbir a uma pedagogia fascista

A atribuição de sentidos ferência Mundial sobre a Mulher de Pequim, em


1995, e na Conferência de Direitos Humanos
ao comunismo e gênero: a de Yogyakarta, em 2006, às quais o Brasil foi
invenção da verdade escola sem país signatário e assinou uma carta de pro-
posições comprometendo-se com as medidas
partido favorecedoras da equidade para os gêneros e
As premissas do Movimento – alicerçadas com a erradicação das desigualdades para as
em enunciados falaciosos e recheados de in- mulheres e para as pessoas LGBT+.
teresses – constroem a ideia de uma escola Face às pressões de oposição derivadas de
doutrinadora e moralmente deturpada, que fundamentalistas e facções religiosas, do con-
precisa ser defendida já que sua gestão é macu- servadorismo e da amplamente disseminada
lada por educadoras(es), instituições gestoras perseguição ao termo gênero, assistimos a um
e pelo próprio Ministério da Educação (MEC), apagamento deliberado da especificação de
que congrega, na visão das(os) defensoras(es) formas mais graves de desigualdade. Por vo-
escola-apartidárias(os), uma pecha de comu- tação, opta-se pela retirada do gênero do PNE
nistas instalados nos gabinetes e secretarias original, permanecendo, no Plano em vigor
após as gestões do Presidente Luís Inácio Lula desde 2014 (Lei nº 13.005/2014, publicada
da Silva (2003-2011) e da Presidenta Dilma em 25/06/2014), apenas uma diretriz gené-
Rousseff (2011-2016). De carona com essa rica acerca da erradicação de todas as formas
concepção, órgãos governamentais e de ensino de discriminação (BRASIL, 2014b). O mesmo
subordinados ao MEC, entre os quais as Uni- aconteceu, posteriormente, e de forma mais
versidades, tornam-se alvos de generalizações acirrada, na aprovação dos Planos Estaduais,
e de reducionismos tendenciosos a corromper Municipais e Distrital de educação, deflagrando
a capacidade de gestão, de diálogo e de moral. a tomada das casas legislativas por posições
No tocante ao reconhecimento dos estudos, não laicas e por motivações antigêneros a
militâncias, proposições ou mesmo de inter- resultar em dispositivos legais a incitar uma
venções pedagógicas envolvendo debates sobre “caça às bruxas” e aos preceitos categorizados
gênero, uma série de episódios vai marcando o supostamente comunistas e de “Ideologia de
cenário das políticas e antipolíticas brasileiras. Gênero”.
Como já evidenciado, acompanhamos um pro- Percebe-se, a partir de então, uma mo-
cesso de disputa pela produção de verdades na vimentação de captura de um neologismo,
consolidação do Plano Nacional de Educação inicialmente fundado nos setores radicais
(PNE). católicos a partir do pontificado de Bento XVI
A proposição inicial do PNE, conforme des- (GABARGNOLI; PREARO, 2017) e mais tarde
tacada no Inciso II do Art. 2º do PL original (PL cooptado por posicionamentos canônicos de
nº 8.035-B/2010 – aprovada em 16/10/2012) grupos religiosos – a “Ideologia de Gênero”,6
encaminhado ao Senado pela Câmara dos De- por organizações político-partidárias ou supra-
putados, inicialmente estabelecia como uma partidárias como o Movimento Brasil Livre e o
das diretrizes do documento: “a superação próprio Escola sem Partido.
das desigualdades educacionais, com ênfase Nesse contexto, estabelecem-se redes de
na promoção da igualdade racial, regional, de apoio e agenciamento do Escola sem Partido
Gênero e de orientação sexual e na erradicação responsáveis por uma série de PLs que con-
de todas as formas de discriminação” (BRASIL, tradizem a filosofia de não vínculo a nenhum
2010). A redação proposta endossava pontos 6 O neologismo nasce na Igreja Católica Romana como
antítese das proposições das Organizações das Nações
fundamentais anteriormente debatidos pela Unidas (ONU) destinadas à exortação do papel da mulher
Organização das Nações Unidas (ONU) na Con- na sociedade.

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partido, já que no fluxo nervoso dessas redes os Por conseguinte, iniciativas parecidas foram
partidos políticos encabeçam as proposições de protocoladas e recrudesceram ainda mais as
Miguel Nagib em suas frentes de representação. proposições de controle, vigília e constrangi-
O próprio Presidente Jair Bolsonaro teve como mento das práticas docentes. O Escola sem Par-
plataforma de sua campanha o banimento do tido passou a adotar a tática de esvaziamento
pensamento crítico, o “politicamente correto” e dos princípios constitucionais já amparados
a suposta militância de esquerda das escolas e pela Carta Magna de 1988 ao tomar para si a
universidades. Dispositivos criados pelo Movi- defesa da neutralidade escolar, da valorização
mento como pareceres, notas técnicas e mesmo da diversidade de opiniões e do pluralismo de
requerimentos de informação sustentam a ideias. Nesse tocante, entre os vários projetos
tentativa de se impor constitucionalmente os apensados ao PL nº 7.180/2014 está o PL nº
PLs; e mais: demarcam preceitos, orientações 867/2015 (BRASIL, 2015a), de Izalci Lucas,
e condutas denuncistas quanto à utilização articulando, entre as propostas já apresentadas
dos termos gênero, comunismo, feminismo e no documento de 2013, a premissa de inserção
diversidade sexual em âmbito político nacional. do Programa Escola sem Partido como parte da
Nessa genealogia, uma das primeiras inves- LDB/1996. Destaca-se da redação a imposição
tidas tomou forma no PL nº 7.180/2014 (BRA- de um código de conduta para professoras(es)
SIL, 2014a), de autoria do Sr. Erivelton Santana baseado na negação das posturas docentes e na
(Patriota), propondo alterar a LDB/1996 e as censura, como se observa na descrição do Art.
diretrizes educacionais. Entre as proposições 4º e seus incisos:
estão o: No exercício de suas funções, o professor:
Art. 3 [...] - XIII – respeito às convicções do aluno,
I – não se aproveitará da audiência cativa dos
de seus pais ou responsáveis, tendo os valores
alunos, com o objetivo de cooptá-los para esta
de ordem familiar precedência sobre a educação
ou aquela corrente política, ideológica ou par-
escolar nos aspectos relacionados à educação
tidária;
moral, sexual e religiosa, vedada a transversali-
dade ou técnicas subliminares no ensino desses II - não favorecerá nem prejudicará os alunos em
temas. (BRASIL, 2014a, p. 1). razão de suas convicções políticas, ideológicas,
morais ou religiosas, ou da falta delas;
O PL se ampara nos princípios do Pacto de
São José da Costa Rica, assinado pelo Brasil III - não fará propaganda político-partidária em
sala de aula nem incitará seus alunos a participar
e outros países por ocasião da Convenção de manifestações, atos públicos e passeatas;
Americana de Direitos Humanos (1969), que
IV - ao tratar de questões políticas, sociocul-
dispõe sobre a liberdade pessoal e de direitos
turais e econômicas, apresentará aos alunos,
humanos, porém obliterando o papel do Esta- de forma justa, as principais versões, teorias,
do na educação e impondo uma interpretação opiniões e perspectivas concorrentes a respeito;
generalista baseada na liberdade da família de
V - respeitará o direito dos pais a que seus filhos
professar e divulgar sua religião ou crenças em recebam a educação moral que esteja de acordo
nível individual e também coletivo (BRASIL, com suas próprias convicções;
2014a). Sob esse princípio, ao citar temas
VI - não permitirá que os direitos assegurados
transversais ou outras técnicas subliminares, nos itens anteriores sejam violados pela ação
o PL abre um território de condenação das de terceiros, dentro da sala de aula. (BRASIL,
questões e discussões sociais que povoam a 2015a, p. 2).
escola e demoniza a ação docente, rechaçando
Nesse ínterim, começa a se delinear com
as perspectivas de debates acerca desses temas
clareza uma concepção ideológica e sexuada da
(BRASIL, 2014a).7
a formação, em dezembro de 2019, de Comissão Especial
7 O PL tramitou na Câmara dos Deputados e, entre idas e responsável pelo tema Escola sem Partido nos dispositivos
vindas, aguarda novas designações que se sucederão após arregimentados na casa.

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Comunismo e gênero no Escola sem Partido: notas para não sucumbir a uma pedagogia fascista

escola e de seus aparatos didáticos, conforme direcionado ao MEC, solicitando, prontamente,


dispõem os argumentos e justificativas defen- informações sobre a publicação do documento
didas no referido PL: derivado da CONAE 2014, sob a alegação de
É fato notório que professores e autores de li- ele ter definido uma posição contrária ao que
vros didáticos vêm-se utilizando de suas aulas fora estabelecido durante a votação do PNE,
e de suas obras para tentar obter a adesão dos optando por manter a menção ao gênero como
estudantes a determinadas correntes políticas diretriz obrigatória para o planejamento e
e ideológicas; e para fazer com que eles adotem execução de metas e de políticas educacionais
padrões de julgamento e de conduta moral –
especialmente moral sexual – incompatíveis
no Brasil.
com os que lhes são ensinados por seus pais ou Conforme atestam as proposições da solici-
responsáveis. (BRASIL, 2015a, p. 4). tação, novamente há o levante da suposta ban-
deira de luta contra pressupostos ideológicos
Esse alinhamento é o que pretexta a criação
ancorados no comunismo, ligados aos ideais
pelo PL de “[...] medidas eficazes para prevenir
marxistas e na suposta ideologia de gênero. O
a prática da doutrinação política e ideológica
RIC no 565/2015 (BRASIL, 2015b) enquadra e
nas escolas, e a usurpação do direito dos pais a
denuncia as ações do FNE e também do MEC,
que seus filhos recebam a educação moral que
interpretando-as como doutrinárias e contra-
esteja de acordo com suas próprias convicções”
riamente ligadas aos ideais da família. Cita teó-
(BRASIL, 2015a, p. 4). ricas e ativistas feministas como Judith Butler
Vale ressaltar que, em meio a esse turbilhão (propositora do conceito de performatividade
de condenações e perseguições os quais as/os das masculinidades e feminilidades a partir de
representantes dessas correntes buscam con- negociações, reiterações ou rompimentos com
solidar, há, em contraposição e resistência, a a matriz heterossexual), Kate Millet (que em
elaboração e a publicação pelo Fórum Nacional seu livro Política Sexual teceu um panorama
de Educação (FNE) – responsável por organizar histórico dos sistemas de exclusão político,
a Conferência Nacional de Educação (CONAE) jurídico e cultural de mulheres), Shulamith
– do documento final da CONAE 2014 (FÓRUM Firestone (questionadora da apropriação do
NACIONAL DE EDUCAÇÃO, 2014). Resultado trabalho reprodutivo das mulheres, da gravi-
de um amplo processo de construção coletiva dez e criação de filhos como a raiz da opressão
desencadeado pela decisão política de sub- feminina), os estudos sobre trabalho e família
meter ao debate social as ideias e proposições e indústria cultural derivados das críticas da
do PNE, tal documento constitui-se como um Escola de Frankfurt e as Conferências da ONU
importante referencial para o processo de mo- como fiéis depositários do comunismo antifa-
bilização, amparo e retomada das discussões a mília de Karl Marx e Friedrich Engels.
respeito da igualdade e identidade de gênero e Para respaldar o argumento, o requerimento
de orientação sexual, mantendo, em paralelo, vale-se de justificativas distorcidas ao explicar
algumas assertivas e determinações supri- uma suposta guerra cultural e sexual de cunho
midas na aprovação da Lei nº 13.005/2014 neomarxista:
(BRASIL, 2014b) e respaldando, ao contrário O que verdadeiramente está acontecendo é que
das denegações do Escola sem Partido, a posi- o conceito de ‘Gênero’ está sendo utilizado
ção política das(os) representantes do Fórum para promover uma revolução cultural sexual
Nacional da Educação. de orientação neomarxista com o objetivo de
extinguir da textura social a instituição familiar.
Em maio de 2015, o mesmo Izalci Lucas,
Na submissão do feminino ao masculino através
em coautoria com Cesar Souza, Diego Garcia e da família, Marx e Engels enxergaram o protóti-
Eduardo Cury, protocola o Requerimento de In- po de todos os subsequentes sistemas de poder.
formação (RIC) no 565/2015 (BRASIL, 2015b), Se esta submissão é consequência da biologia,

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Cássia Cristina Furlan; Fabiana Aparecida de Carvalho

não há nada a que se fazer. Mas se ela é uma deste texto, com a descrição das posições mi-
construção social, ou um Gênero, então, a longo litares sobre as instituições de ensino, e segue
prazo, ela poderá ser modificada até chegar-se sendo sustentada por uma vontade de saber
à uma completa igualdade onde não haverá
mais possibilidade de opressão de Gênero, mas
para governar e controlar mentes, sexualida-
também onde não haverá mais famílias, tanto as des, desejos e políticas para a população. De
heterossexuais como demais famílias alterna- acordo com Gayle Rubin (2003), os setores
tivas. Neste contexto a educação caberia como de extrema-direita sempre souberam atacar a
uma tarefa exclusiva do Estado, e não existiria educação sexual como um conspiração comu-
mais traços diferenciais entre o masculino e o nista para destruir a família e enfraquecer as
feminino. Em um mundo de genuína igualdade,
segundo esta concepção, todos teriam que ser
vontades nacionais, debilitar os tabus religio-
educados como bissexuais e a masculinidade e a sos, promover a aceitação de relações sexuais
feminilidade deixariam de ser naturais (BRASIL, anormais, distorcer os padrões normais e
2015b, p. 17, grifo do autor). destruir a coesão sexo-gênero, rebaixando as
Dessa leitura, há a produção de uma dis- pessoas (especialmente brancas) a delírios
cursividade que, por argumentos falaciosos sexuais como homossexualidade, pornografia,
aborto, sexo e relacionamentos extraconjugais.
e deturpados das teorias que produziram as
Essa discursividade vem sendo recuperada
noções e os conceitos de gênero, distorce as
e legitimada dentro de uma pseudopolítica que
proposições fundamentais alicerçadas em de-
coliga apelos econômicos aos discursos dog-
bates científicos e na voz da militância de mu-
máticos de defesa moral da honra, da tradição
lheres e de LGBT+, produzindo afirmações de
familiar e da nação brasileira, enfraquecendo
cunho generalistas e pseudouniversais, como,
as conquistas e avanços progressistas para a
por exemplo, a destruição do sexo biológico
consolidação de uma educação para os gêneros
assegurado pelo binarismo “macho-homem /
e as sexualidades. Logo, frentes com estra-
fêmea-mulher” e da família natural.
tegistas conservadores, de extrema-direita e
O grande objetivo por trás de todo este absurdo fundamentalistas religiosos (re)descobriram,
- que, de tão absurdo, é absurdamente difícil de
portanto, que estes assuntos têm apelo de
ser explicado – é a pulverização da família com
a finalidade do estabelecimento de um caos massa no Brasil.
no qual a pessoa se torne um indivíduo solto, Em revide ao requerimento de Izalci Lucas,
facilmente manipulável. A ideologia de Gênero o FNE, após os debates suscitados por propo-
é uma teoria que supõe uma visão totalitarista sições dessas frentes, publicou a 32ª Nota Pú-
do mundo. (OLIVEIRA, 2014 apud BRASIL, blica do Fórum Nacional de Educação (FÓRUM
2015b, p. 18).
NACIONAL DE EDUCAÇÃO, 2015), questionan-
Tais concepções nada representam, de fato, do os atos discriminatórios e de retirada dos
as reinvindicações feministas e LGBT+ no que debates de gênero dos documentos oficiais da
se atém à defesa pela igualdade de gênero, Educação – PNE e Base Nacional Comum Cur-
pela diversidade sexual e pelo apelo de que ricular (BNCC) –, expondo, também, o ataque
tais reflexões sejam permitidas nos ambientes dos(as) disseminadores dessa falsa premissa
escolares. ancorada no neologismo ideologia de gênero
Essa discursividade que liga o sexo não- e seus desserviços ao debate democrático
familiar ou normativo e as militâncias por para a construção das políticas educacionais
direitos sexuais e de gênero com o comunismo, de respeito ao gênero e à diversidade sexual
tecendo uma sombra de corrupção, fraqueza (FNE, 2015).
política ou deturpação do Estado, das escolas O Escola sem Partido não mais se desvin-
e da família não é novidade. Ela já insurgiu no culou dessa orquestração, via manipulação de
Brasil, conforme assinalamos na introdução mecanismos legais, de processos autoritários

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Comunismo e gênero no Escola sem Partido: notas para não sucumbir a uma pedagogia fascista

para a manipulação da massa em defesa dos bre os conteúdos e planejamentos para a vigília
valores fundamentalistas. dos enfoques adotados; c) a livre imposição de
Em 2016, em mais uma tentativa encampada ideologias específicas e de cunho religioso e
pelo então Senador Magno Malta, outro dispo- moral nas escolas confessionais e particulares;
sitivo na forma do PL no 193/2016 (BRASIL, e d) a proibição de manifestações políticas nos
2016) visa feriar a LDB/1996, reproduzindo grêmios estudantis. E mais: conforme o Art. 9º,
os aspectos elencados nas propostas anterio- aplica o Escola sem Partido:
res para caracterizar ainda mais o Movimento I – às políticas e planos educacionais;
como proposta educacional no âmbito legal e
II – aos conteúdos curriculares;
oficializar as práticas de censura e vigilância.
Entre outras premissas, o PL fundamenta suas III – aos projetos pedagógicos das escolas;
justificativas asseverando que: IV – aos materiais didáticos e paradidáticos;
O Poder Público não se imiscuirá na opção sexual V – às avaliações para o ingresso no ensino
dos alunos nem permitirá qualquer prática ca- superior;
paz de comprometer, precipitar ou direcionar o
VI – às provas de concurso para ingresso na
natural amadurecimento e desenvolvimento de
carreira docente (BRASIL, 2019, p. 2).
sua personalidade, em harmonia com a respec-
tiva identidade biológica de sexo, sendo vedada, Por esses e outros intentos, o projeto de
especialmente, a aplicação dos postulados da Bia Kicis torna-se o mais persecutório em
teoria ou ideologia de gênero. (BRASIL, 2016, termos da instalação do poder de vigilân-
p. 1-2).
cia sobre a autonomia escolar e da junção
Contundentemente, esse PL se apoia numa gênero-comunismo.
rebiologização do desenvolvimento humano e Essa eloquência também é incessantemente
da sexualidade como possível constitutivo da recobrada nas redes sociais do Escola sem Par-
LDB/1996, além de abrir precedentes para a tido. A Nota Técnica redigida por Nagib e outros
definitiva proibição das temáticas de gênero (2018) e disponibilizada em sites alega que
nas escolas. Felizmente, após pressão popular professoras(es) militantes aprenderam e acre-
no Senado, o projeto foi retirado de pauta pelo ditam na doutrinação, engajando suas/seus
pastor Magno Malta. alunas(os) no pensamento crítico que assimila
Ao final de 2019, entre idas e vindas dos as ideologias comunistas e de gênero. O mesmo
PLs, arquivamentos das proposições, pedidos ideário “impera no meio acadêmico, onde há a
de desarquivamento, manifestações pró e con- mais completa e proposital ignorância sobre
tra Escola sem Partido, a Deputada Bia Kicis os limites jurídicos da atividade docente, ig-
(ex-PSL e atualmente sem partido) apresenta, norância que deriva em parte da propositada
apensado ao PL nº 867/2015 (BRASIL, 2015a), e ilícita ausência de disciplina obrigatória de
o PL no 246/2019 (BRASIL, 2019), que institui ética do magistério nos cursos de formação de
o Programa Escola sem Partido, no formato das professores” (NAGIB et al., 2018, p. 2).
mesmas proposições aqui citadas, mas com De modo geral, os respaldos técnicos es-
maior respaldo à caçada às bruxas contra pro- critos por Nagib tentam legalizar notificações
fessoras(es) assegurando, entre as principais extrajudiciais que se aplicariam às/aos pro-
mudanças em relação aos demais PL: a) o direi- fessoras(es) que promoveriam discussões po-
to de gravação de aulas pelas/pelos estudantes líticas, intervenções pedagógicas de educação
a fim de monitorar os conteúdos escolares e de sexual, debates acerca dos direitos de minorias,
viabilizar o pleno direito da família sobre as/os críticas aos sistemas econômicos hegemônicos
educadores; b) a obrigatoriedade das escolas e ao poder estatal, além de exigir a afixação de
na entrega prévia de materiais informativos so- cartazes com deveres docentes em salas de

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Cássia Cristina Furlan; Fabiana Aparecida de Carvalho

aula. Assim, em conjunto com a apresentação feministas e da militância LGBT+ sobre os


desses dispositivos, há chamadas públicas e direitos das pessoas cujos gêneros e as sexua-
convocações do Movimento conclamando pais, lidades não coincidem com os marcadores
familiares e a sociedade civil como um todo sociais cisgêneros e heteronormativos e lutam
para que vigiem as ações docentes que possam por reconhecimento, por direitos sexuais, re-
ser contrárias aos princípios e valores instituí- produtivos e por políticas públicas de amparo
dos pela família tradicional e pelos princípios à não violência sexual e à disseminação de
neoliberais defendidos. preconceitos e sexismos. Como afirma Miguel
As chamadas conclamam: “Diga não à dou- (2016), é perceptível a presença de enunciados
trinação nas escolas e universidades. Junte-se em que a desigualdade é exaltada com discur-
ao Escola sem Partido” (ESCOLA SEM PARTIDO, sos reacionários conjugados a uma visão de
2020). E elas se defendem como uma iniciativa “libertarianismo”, fundamentalismo religioso
contra o uso das escolas e universidades para e a recuperação do antigo anticomunismo.
fins de propaganda ideológica, política e par- Nesse contexto, tal projeto de sociedade e
tidária. “Se você ou seu filho foi ou está sendo de educação impede que haja questionamentos
vítima de algum militante disfarçado de profes- quanto às diferentes desigualdades sofridas em
sor, denuncie” (ESCOLA SEM PARTIDO, 2020). relação aos papéis sexuais, às identidades de
Destarte, analisando os PLs e as manifes- gênero e às violências diversas, inclusive dentre
tações públicas das(os) defensoras(es) do e fora das instituições escolares.
Escola sem Partido, observamos a instauração A falácia da neutralidade baseia-se na ficção
de outras discursividades a buscar a conso- de um conhecimento não situado socialmente.
lidação dessa visão de educação baseada na Percepções críticas que apontam injustiças e
“neutralidade política” e livre de ideologias suas contradições não passam pelo crivo da
e o adensar de significados negativos à sua neutralidade e, nesse sentido, corroboram para
discursividade mor: descontaminação comu- invisibilizar e naturalizar as diversas formas
nista e ideóloga de gênero. Citamos, ainda que de opressões na ordem vigente, cruciais à sua
brevemente, algumas delas: a) a própria ideia reprodução.
de descontaminação, de limpeza da escola e Importa destacar e marcar sempre que, no
das universidades das posições contrárias ao seio da implantação de uma pedagogia que
poder hegemônico; b) a convicção de que exis- assume um caráter fascista de imposição de
falsas verdades, medos e perseguições, há uma
te um inimigo da educação bem regrada – no
descaracterização espúria do que é a discussão
caso, as/os próprias(os) professoras(as); c) a
sobre gênero e o papel de teorias como o mate-
ideia de estudantes “tabula rasa” como depo-
rialismo histórico dialético para a compreensão
sitárias(os) da doutrinação e da corrupção dos
da sociedade.
valores morais; e d) o incentivo para se romper
Dessa forma, o projeto de educação alme-
os limites entre a educação pública/coletiva (de
jado pelas(os) defensoras(es) do Escola sem
ordem estatal e laica) e a educação privada (de
Partido é incapaz de produzir transformações
ordem familiar e endossada por certos valores
significativas na realidade social, dado que se
de grupos particulares, entre eles, as igrejas).
torna o disseminador de ideias deturpadas que
chancelam injustiças e violências. Há em cena,
É possível ir contra à pedagogia portanto, não a valorização de uma escola que
não produzirá pessoas autônomas, críticas e
fascista do escola sem partido? pensantes, mas, sim, de sujeitos a defender
O Brasil atravessa um período de demoni- conservadorismos morais e um ultralibera-
zação dos estudos de gênero, das proposições lismo econômico, baseado nas falácias das

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Comunismo e gênero no Escola sem Partido: notas para não sucumbir a uma pedagogia fascista

conquistas individuais com base no esforço Temos a nosso favor as pressões da ONU e
(meritocracia), no empreendedorismo de si, no cobranças de posições do Brasil sobre o avanço
distanciamento dos grupos minoritários e da dessa escola antidemocrática, como, também, o
luta por seus reconhecimentos, na ausência de posicionamento do Supremo Tribunal Federal
pensamento crítico, na colonização das mentes a suspender as ações do Escola sem Partido em
e na manutenção dos problemas estruturais e alguns estados e cidades e para conscientizar
estruturantes de nossa sociedade. Esse tipo professoras(es) e políticas(os) a não consen-
de educação desconsidera todos os condicio- tirem com os dispositivos criados por Nagib e
nantes históricos do país e suas marcas de apoiadoras(es).
desigualdades. Ainda nesse contexto de reprodução e falta
Essas assunções penetram nas massas e en- de discernimento quanto aos processos de
grossam contextos políticos que (re)produzem, consolidação da censura e da valorização de
em meio ao caos e ao pânico, o medo de um alguns modelos de sociedade, é urgente pen-
comunismo latino (o bolivarismo, por exemplo) sar em estratégias para não sucumbir a uma
e de uma ditadura gay. pedagogia fascista.
Nesse contexto, mesmo dispondo de instru- Boaventura de Sousa Santos (2006) critica
mentos legais que demonstram que iniciativas o modelo de racionalidade ocidental nesse
como o Escola sem Partido nasceram eivadas tipo de empreendimento pedagógico. Para
de inconstitucionalidade, como defendeu a ele, a tradição ocidental é responsável por
Nota Técnica emitida pelo Ministério Públi- desacreditar ou esconder as alternativas de
co Federal – Nota Técnica 01/2016, PFDC, experiência social em todo o mundo. Por alter-
assinada pela Procuradora Deborah Duprat, nativas, entendemos todos os movimentos que
que dispõe sobre a inconstitucionalidade das buscam questionar padrões de dominação, de
notificações e do ESP (MINISTÉRIO PÚBLICO submissão e esgotamentos políticos gestados
FEDERAL, 2016), ainda há a insistência e a por uma ordem social que produz desigualda-
disseminação de processos persecutórios que des. Para tanto, critica o que ele chama de razão
produzem medo e censura nas(os) agentes da indolente8 pautada na tradição ocidental que
educação. contrai o presente e expande o futuro, pois gera
No entanto, não podemos minimizar a várias consequências nefastas na sociedade de
força dos dispositivos legais que temos para globalização neoliberal.
barrar os avanços conservadores. Conforme
Isso significa dizer que a indolência da razão
explicita a referida Nota Técnica, o que se re-
criticada por esse autor causa consequências
vela nesses movimentos e nos PLs do Escola
no modo como as culturas se organizam. Essa
sem Partido é:
razão, como afirma Santos (2006), não é ape-
[...] o inconformismo com a vitória das diversas nas parcial, mas internamente muito seletiva,
lutas emancipatórias no processo constituinte; tendo uma compreensão limitada de si própria.
com a formatação de uma sociedade que tem
que estar aberta a múltiplas e diferentes visões 8 A indolência da razão criticada por esse autor ocorre
de mundo; com o fato de a escola ser um lugar em quatro formas diferentes: a razão impotente, a razão
estratégico para a emancipação política e para arrogante, a razão metonímica e a razão proléptica. Santos
o fim das ideologias sexistas – que condenam (2002a) vincula sua crítica fundamentalmente a partir das
duas últimas razões, menos centradas nos estudos críticos.
a mulher a uma posição naturalmente inferior, A razão metonímica é obcecada pela ideia da totalidade
racistas – que representam os não-brancos sob a forma da ordem. Todas as dicotomias sufragadas
como os selvagens perpétuos, religiosas – que pela razão metonímica contêm uma hierarquia: “cultura
apresentam o mundo como a criação dos deuses, científica/cultura literária; conhecimento científico/
conhecimento tradicional; homem/mulher; cultura/
e de tantas outras que pretendem fulminar as natureza; civilizado/primitivo; capital/trabalho; branco/
versões contrastantes das verdades que pregam. negro; norte/sul; Ocidente/Oriente; e assim por diante.”
(MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, 2016, p. 2). (SANTOS, 2002a, p. 242).

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Cássia Cristina Furlan; Fabiana Aparecida de Carvalho

É preciso pensar os termos das dicotomias fora produtividade capitalista. Ciente dessas cinco
das articulações e relações de poder que os lógicas de produção da não-existência, a socio-
unem, revelando outras relações alternativas logia das ausências visa criar condições para
que têm estado ofuscadas pelas dicotomias ampliar o campo das experiências credíveis
hegemônicas. E é por isso que trazemos ao neste mundo, contribuindo para dilatar o pre-
centro das discussões a sociologia da ausência sente. Nesse sentido, propõe a superação das
e a sociologia da emergência. A sociologia das totalidades homogêneas e excludentes da razão
ausências trata-se, fundamentalmente, metonímica, sugerindo a permuta das cinco
[...] de uma investigação que visa demonstrar lógicas apontadas por outras denominadas:
que o que não existe é, na verdade, activamente ecologia de saberes, substituindo a monocul-
produzido como tal, isto é, como uma alternativa tura do saber científico e apontando para a
não-credível ao que existe. [...] o objectivo da necessidade de se considerar conhecimentos
sociologia das ausências é transformar objec-
não-hegemônicos e/ou naturalizados como
tos impossíveis em possíveis e com base neles
transformar as ausências em presenças. [...] Há tais; ecologia das temporalidades, libertando
produção de não-existência sempre que uma as práticas sociais do seu estatuto de resíduo,
dada entidade é desqualificada e tornada invi- possibilitando um desenvolvimento autônomo
sível, ininteligível ou descartável de um modo e reconhecendo que a história não é linear e,
irreversível. (SANTOS, 2002a, p. 246). por isso mesmo, produz diferentes narrativas e
O ESP procura desqualificar os saberes possibilidades de um outro olhar; ecologia dos
produzidos por correntes de pensamento que reconhecimentos, consistindo em uma nova
não se coadunam à lógica defendida pelas(os) articulação entre o princípio da igualdade e o
suas/seus disseminadoras(es). Dessa produ- princípio da diferença e abrindo espaço para
ção da não-existência, apresentamos cinco a possibilidade de diferenças iguais e reconhe-
monoculturas que são distinguidas por Santos cimento recíproco, valorizando o outro nesse
(2002a): a monocultura do saber e do rigor processo e reconstruindo outras lógicas não
do saber, transformando a ciência moderna e discriminatórias; a ecologia das trans-escalas,
a alta cultura em critérios únicos de verdade visando à possibilidade de uma globalização
e validade estética; a monocultura do tempo contra-hegemônica, superando o pensamento
linear, considerando a história como tendo abissal, que produz e radicaliza distinções; e a
sentido e direção únicos e conhecidos, assim a ecologia de produtividade, reconstruindo essas
modernidade ocidental produz a não-contem- formas para além da relação de subalternidade
poraneidade do contemporâneo, recuperando, da lógica produtivista (SANTOS, 2002a).
por exemplo, discursos e procedimentos de É nesses pilares que também nos apoiamos,
censura já observados ao longo da história; a considerando que é preciso haver uma dimen-
lógica da classificação social que se assenta na são desconstrutiva e uma dimensão reconstru-
monocultura da naturalização das diferenças, tiva, priorizando a modificação das lógicas que
distribuindo a população por categorias que vigoram na sociedade moderna, apresentadas
naturalizam hierarquias, como, por exemplo, por Santos (2002a). E, enquanto a dilatação do
a classificação racial e a classificação sexual, presente é feita através da sociologia das au-
enquadrando as/os sujeitos no discursos de sências, a contração do futuro se realiza através
moralidade e perversão; a lógica da escala da sociologia das emergências, produzindo um
dominante, produzindo a não-existência do futuro de possibilidades plurais e concretas
particular e do local, produzindo noções uni- simultaneamente utópicas e realistas, que se
versais e pouco representativas da diversidade vão construindo no presente, diante de um
que compõe o país; e a lógica produtivista que horizonte de possibilidades. Dessa forma, o
se assenta na monocultura dos critérios de que se nos apresenta não é tanto identificar

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Comunismo e gênero no Escola sem Partido: notas para não sucumbir a uma pedagogia fascista

novas totalidades, mas propor novas formas de Assim, das duas epistemologias, é possível
pensar, de desconstruir essas totalidades e de conceber “a emergência de um conhecimento
conceber outros sentidos. Precisamos pensar prudente para uma vida decente” (SANTOS,
que qualquer dicotomia tem uma vida para 2002b, p. 253), um conhecimento que reconhe-
além da vida dicotômica. Precisamos superar ce as experiências e as expectativas, as ações
a falsa dualidade dos campos de conhecimento, e as consequências, num saber solidário. “A
implodindo o caráter exclusivo de monopólio aspiração última é demasiado humana, uma
da produção de verdades que está no cerne aspiração que designo por normalidade avan-
da disputa epistemológica moderna vinculada çada: a aspiração de viver em tempos normais,
à produção de linhas abissais que impedem ou seja, tempos cuja normalidade não derive,
a copresença de conhecimentos e experiên- como acontece agora, da naturalização da anor-
cias no mundo. Essa negação da copresença malidade.” (SANTOS, 2002b, p. 253).
produz o desperdício de uma vasta gama de Estamos à procura de “um conhecimento
experiências, tornadas invisíveis e apartadas prudente para uma vida decente” (SANTOS,
dos processos democráticos. 2002b), um conhecimento que, por meio da
E, nesse quesito, citamos Boaventura de solidariedade, não reproduza mais os modelos
Sousa Santos (2002b), apresentando a sua discriminatórios que produzem exclusões.
epistemologia da cegueira e a epistemologia Assim, valorizamos a superação ora recu-
da visão. Propõe esse autor que a cegueira dos perada pelo ESP de uma educação meramente
outros, em especial dos outros do passado, bancária, supondo educandos(as) como seres
é tão recorrente quanto fácil de identificar. de adaptação e ajustamento, visto que tal visão
Todavia, se é assim, provavelmente o que dis- não desenvolve consciência crítica e nem inser-
sermos hoje sobre a cegueira dos outros será ção no mundo como sujeitos transformadores
visto no futuro como sinal da nossa cegueira. (FREIRE, 1987).
Esse dilema pode ser formulado desta forma: Como Paulo Freire (1996) aborda, formar
“Se somos cegos, por que vemos tão facilmente é muito mais do que puramente treinar a/o
a cegueira dos outros e por que razão é tão di- educanda(o) no desempenho de destrezas.
fícil aceitar a nossa própria cegueira? Por que A tarefa docente exige no seu exercício uma
julgamos ver plenamente o que só vemos muito responsabilidade ética.
parcialmente? E se assim é, de que vale sequer A ética de que falo é a que se sabe traída e
ver?” (SANTOS, 2002b, p. 226). negada nos comportamentos grosseiramente
imorais como na perversão hipócrita da pureza
A epistemologia da visão propõe uma forma de
em puritanismo. A ética de que falo é a que se
saber cujo momento é a solidariedade. Enquan-
sabe afrontada na manifestação discriminatória
to pela forma hegemónica de conhecimento,
de raça, de gênero, de classe. É por essa ética
conhecemos criando ordem, a epistemologia
inseparável da prática educativa, não importa
da visão levanta a questão sobre se é possível
se trabalhamos com crianças, jovens ou com
conhecer criando solidariedade. A solidariedade
adultos, que devemos lutar. E a melhor maneira
como forma de conhecimento é o reconhecimen-
de por ela lutar é vivê-la em nossa prática, é
to do outro como igual, sempre que a diferença
testemunhá-la, vivaz, aos educandos em nossas
lhe acarrete inferioridade, e como diferente,
relações com eles. (FREIRE, 1996, p. 9-10).
sempre que a igualdade lhe ponha em risco
a identidade. Tendo sido sobre-socializados Mulheres e homens se tornam seres éticos
por uma forma de conhecimento que conhece por sua capacidade de comparar, valorar, in-
impondo ordem, tanto na natureza como na
tervir, escolher, decidir e de romper, romper
sociedade, é-nos difícil por em prática, ou sequer
imaginar, uma forma de conhecimento que co- com situações que não possibilitem o respeito
nhece criando solidariedade, tanto na natureza à natureza do ser humano. Nesse contexto, toda
como na sociedade. (SANTOS, 2002b, p. 246). ação é política, mesmo aquelas travestidas de

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Cássia Cristina Furlan; Fabiana Aparecida de Carvalho

certa neutralidade. Basta saber: o direciona- assim, a neutralidade de educadoras(es) e de


mento dado à ação baseia-se na ética como livros didáticos é uma discursividade disse-
compromisso político ou na deturpação e minada pelas(os) adeptas(os) do Escola sem
reprodução dos valores consagrados por uma Partido.
racionalidade mercadológica, sexista, homo- Antes, a ideia de uma Escola sem Partido
fóbica e definitivamente pouco democrática e focava, sobretudo, no temor à doutrinação
humana? Fazer-se essa pergunta é um convite marxista. Mais tarde, encampando a bandeira
à superação das pedagogias fascistas e das es- de grupos religiosos conservadores, promove-
colas de pensamento único e totalitário. se a cruzada contra as discussões sobre papéis
de gênero e combate à homofobia e ao sexismo
nas escolas, alimentada pela ideia fantasiosa da
Considerações finais ideologia de gênero. Assim, o discurso construí-
O ESP estabelece obrigações morais, conde- do pelo Movimento Escola sem Partido passa a
nações, patrulhamento de conteúdos históri- basear-se na defesa de uma educação “neutra”
cos, socioculturais e econômicos em razão de que se consolide com a doutrina da família cris-
uma educação totalmente técnica, descontex- tã, impedindo professoras e professores de dis-
tualizada, acrítica e pseudocientífica. Também seminarem, em sala de aula, qualquer conteúdo
propõe, como um instrumento de censura, a que seja contrário aos valores do mercado e das
gravação das aulas pela(o) estudante, visando famílias “tradicionais” brasileiras.
instaurar um ambiente de coerção, persegui- Quando refletimos sobre a quem ou para
ção e vigilância ao trabalho docente. Além quê serve a escolarização nos moldes de hoje,
disso, abre fraturas para o desmantelamento percebemos que a igualdade, a democracia,
da escola pública, aumentando a interferência a garantia dos direitos tão proclamados nos
do poder privado no fórum coletivo escolar, discursos hegemônicos atendem primordial-
quebrando com a gestão comunitária dos mente às demandas dos grupos dominantes,
conteúdos e dos projetos políticos pedagógi- encampados pelo discurso da neutralidade e do
cos das instituições. Em termos de história, pluralismo de ideias, que na prática nada tem
sua aversão ao comunismo não é uma nova de plural. A escola tem contribuído de modo
discursividade e sua base de sustentação de significativo para a elaboração das identidades
caça às/aos subversivas(os) resgata as propo- sociais e culturais dos sujeitos, tornando-se
sições anteriormente usadas como estratégia um espaço onde a norma é muito mais que
de convencimento pelas(os) apoiadoras(es) necessária, ela é fundamental para a sua manu-
do regime de Ditadura Militar tenção. O discurso da inclusão e do respeito às
Nesse sentido, o movimento sustenta a diferenças, muitas vezes, passa por uma série
interferência parental nas escolas e a firme de filtros que demarcam os limites dessa trans-
posição de que nenhum docente ou conteúdo formação e que guiam as ações docentes para
escolar pode atentar contra as convicções mo- a reprodução de campos de saberes recheados
rais e religiosas das famílias, devendo a pessoa de táticas de controle e coerção social.
doutrinadora ser denunciada à direção da No domínio da produção de conhecimentos,
escola, às Secretarias de Educação e ao Minis- da apropriação de um discurso de limpeza dos
tério Público. Para serem fiéis ao pensamento vícios morais e da deturpação dos conhecimen-
do núcleo familiar, os ensinamentos escolares tos científicos, o Movimento Escola sem Partido
devem ser parciais, ou seja, são proibidos os vai instaurando uma dinâmica de conversão e
conteúdos científicos e os pontos de vistas que doutrinação aos moldes da família cristã e do
necessitam da análise crítica sobre suas cor- pensamento político neoliberal. Ao contrário
relações históricas, políticas e sociais; sendo do que o Escola sem Partido prega, há o exer-

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Comunismo e gênero no Escola sem Partido: notas para não sucumbir a uma pedagogia fascista

cício da proibição e da censura aos diferentes forma de fascismo que nunca existiu, dado que
campos de conhecimento e produção de sabe- as sociedades são politicamente democráticas
res, numa adoção forçada às normas que regem e socialmente fascistas.
as discursividades produzidas pelo movimento Para tanto, é essencial que, como educado-
em sua monocultura de saberes. Utilizando-se ras e educadores, possamos vislumbrar possi-
de aparatos legais e normativos, impõe-se uma bilidades que ultrapassem lógicas centradas na
forma particularmente complexa de persegui- monocultura de saberes baseadas na suposta
ção às/aos docentes que ultrapassam as linhas universalidade dos conhecimentos, identida-
abissais, tensionando estratégias de controle e des e subjetividades. É urgente a assunção de
regulação impostas pelas doutrinas dissemina- uma postura de combate e resistência, para
das no pensamento de uma escola única. não sucumbir à uma pedagogia fascista aliada
A linha abissal jurídica e epistemológica aos ditames de certos grupos políticos conser-
constituída pelo Movimento envolve a incorpo- vadores e ultraliberais. Sendo territórios de
ração, cooptação e assimilação de alguns mitos disputa (epistemológica, política e jurídica),
que foram marcadores históricos de subversão, precisamos estar atentas(os) aos modos como
como as ideias comunistas, a liberdade sexual e tais discursividades se infiltram nos diferentes
a adoção de práticas moralmente condenáveis, espaços, visando a produção de conhecimentos
entre elas a homoafetividade, a luta por direitos alternativos, cosmopolitas, contra-hegemôni-
sexuais e reprodutivos, o reconhecimento da di- cos e que sejam instrumentos de luta contra
versidade cultural e a luta pelo reconhecimento exclusões de ordem econômica, social, política
dos grupos identitários considerados minorias e cultural geradas pela globalização neoliberal.
sociais. O uso manipulador do direito e da au-
toridade no Escola sem Partido representam, REFERÊNCIAS
pois, um modelo de exclusão radical que, em ca-
sos representativos da atual política de Estado, BRASIL. Câmara dos Deputados. Projeto de Lei
nº 8035-C, de 2010. Substitutivo do Senado
demonstram os rumos repetidamente traçados
Federal ao Projeto de Lei Nº 8.035-B, DE 2010,
pelas(os) suas/seus representantes e por suas que “Aprova o Plano Nacional de Educação (PNE)
redes de atuação (ministérios, assessoria e e dá outras providências”. Brasília, DF, 2010.
defensoras(es) da atual lógica governamental, Disponível em: https://www2.camara.leg.br/
por exemplo). atividade-legislativa/comissoes/comissoes-
Desse modo, a complexidade desse Movi- temporarias/especiais/54a-legislatura/pl-8035-
10-plano-nacional-de-educacao/documentos/
mento é difícil de destrinchar na medida em
outros-documentos/avulso-pl-8035-10-c. Acesso
que se desenrola ante os nossos olhos. Para em: 20 fev. 2020.
captar a totalidade do que está acontecendo,
BRASIL. Câmara dos Deputados. Projeto de Lei nº
é necessário um esforço enorme de descen- 7.180, de 2014. Altera o art. 3º da Lei nº 9.394,
tramento, um movimento contra-hegemôni- de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as
co, uma análise genealógica das produções e diretrizes e bases da educação nacional. Brasília,
contraproduções discursivas que vão embasar DF, 2014a. Disponível em: https://www.camara.
o cenário de disputas que constituem o Mo- leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?cod
vimento Escola sem Partido e os seus funda- teor=1230836&filename=PL+7180/2014. Acesso
em: 11 fev. 2020.
mentalismos circundantes. Vemos delinear a
ascensão de fascismos sociais, baseados em BRASIL. Presidência da República. Casa Civil. Lei
nº 13.005, de 25 de junho de 2014. Aprova o
relações de poder extremamente desiguais que
Plano Nacional de Educação - PNE e dá outras
coexistem com a democracia política liberal. providências. Brasília, DF, 25 jun. 2014b. Disponível
Trata-se, como apontado por Santos (2017), em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-
de um fascismo pluralista e, por isso, de uma 2014/2014/lei/l13005.htm. Acesso em: 20 fev. 2020.

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Cortez, 2006.
Recebido em: 15/03/2020
Aprovado em: 09/06/2020

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