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G. Mamedov
O. Shatalova
Em maio de 2012, durante dez noites em nosso espaço em Bishkek, organizamos, junto
com Labrys (a mais antiga organização LGBT do Quirguistão), uma “Oficina de Protesto
Inalienado”. Reunimos ativistas LGBT, artistas e outras pessoas preocupadas com a causa para
elaborar imagens e slogans contra a homofobia e a transfobia. Todos os eventos da oficina,
incluindo a apresentação final em 17 de maio, o Dia Internacional contra a Homofobia, a Bifobia
e a Transfobia (IDAHOBIT), foram abertos a uma ampla audiência e ganharam cobertura da
mídia. Foi uma experiência inspiradora, e imaginamos que no 17 de maio seguinte realizaríamos
um evento público ainda maior. No entanto, essa “Oficina de Protesto Inalienado” deveria
continuar sendo nosso maior evento público em apoio às comunidades LGBT. Em 2013, a
homofobia e a transfobia, que no ano anterior eram aparentemente apenas uma questão de
preconceito arcaico, se tornariam foco principal da política estatal contemporânea. Ainda no
mesmo ano, o parlamento russo aprovaria uma lei sobre “propaganda gay”, declarando a agenda
LGBT o principal antagonista dos “valores tradicionais”, cuja defesa e promoção se tornariam a
missão global da Rússia de Putin.
1
O Quirguistão é um dos países mais leais da Rússia da antiga União Soviética. Muitos
habitantes recebem suas informações da mídia russa, e o político mais popular no Quirguistão é
Vladimir Putin. Portanto, não surpreende que a homofobia política das telas da televisão russa
tenha mudado rapidamente para a vida real no Quirguistão. No outono de 2013, as autoridades
proibiram a exibição do filme I am Gay and Muslim no festival de direitos humanos Bir Duino
(Um Mundo)1, e, no início de 2013, os deputados quirguizes já estavam elaborando sua própria
lei sobre a “propaganda gay”. O projeto de lei ficou “preso” entre a Segunda e Terceira Leituras
no Parlamento e, portanto, não foi aprovado, mas, na fase de discussão, grupos de ultradireita,
radicalmente inclinados, já haviam começado a utilizá-lo como uma forma de validação à sua
violência contra pessoas LGBT. A manifestação mais dramática de violência homofóbica
provocada pelo projeto de lei foi o ataque dos ativistas de ultradireita ao evento fechado da
Labrys em 17 de maio de 2015. O evento ocorreu em um local privado, a portas fechadas, mas
isto não impediu que eles o interrompessem por meio de ameaças e violência. No início do
mesmo ano, pessoas desconhecidas também atacaram o escritório da Labrys, atirando várias
bombas de gasolina através da cerca. Como este ataque ocorreu à noite, não houve vítimas, mas
foi por pura sorte que nenhum incêndio se iniciou.
1
David Tilling, “Kygyzstan: Rights Activists Condemn Ban on Gay Muslim Documentary”, Eurasianet.org, 1
Oct. 2012.
2
No Quirguistão, copiando a tática das autoridades russas e da mídia de massa, as autoridades tentam criar um
estereótipo do “inimigo oculto dentro”, representado por ONGs e ativistas de direitos humanos, que supostamente
fazem o jogo do grande Outro (o Ocidente), que tenta minar a estabilidade da sociedade que opera no local por
meio de seus agentes, sob o pretexto de “direitos humanos”, “igualdade” e “valores progressistas”. Muitas vezes
o Ocidente é representado pela retórica oficial antiocidental soviética: corrompido pelo dinheiro, com maneiras
consideradas progressistas no Ocidente em desacordo com a vida modesta e a necessária pobreza doméstica. Na
Rússia, em um momento de crise política e econômica em 2014-15, foi promulgada a chamada “Lei sobre
Organizações Indesejáveis”. Entre as organizações que, de acordo com as disposições desta lei, foram obrigadas a
encerrar suas atividades na Rússia, estavam escritórios russos de várias fundações internacionais de direitos
humanos e de caridade. Sobre esses embates retóricos e as políticas internas das autoridades cf. o ensaio de Ilia
Budraitskis, “Os Espectros de Munique”.
2
legalmente a poliginia, oitenta deputados do sexo masculino desistiram de uma sessão do
parlamento quirguiz dedicada a uma discussão sobre a situação das mulheres e meninas.
Indiscutivelmente a definição mais breve e sucinta da virada conservadora seria: uma época de
respostas simples para questões complexas; sendo a mais popular dessas a xenofobia, ou seja, a
busca por um bode expiatório que solapa a unidade e a harmonia social. Esta resposta tem um
caráter universal e é aplicável a diferentes circunstâncias. Por exemplo, as autoridades
municipais de Bishkek recorreram de maneira dolorosamente familiar à onda sem precedentes
de indignação popular contra a política bárbara de derrubar árvores para o alargamento das
estradas: os que protestavam eram registrados como provocadores, como parte das chamadas
“terceiras forças”, beneficiadas pela desintegração da “estabilidade” na sociedade. Dessa forma,
basta afirmar o direito de respirar ar puro e aproveitar a sombra das árvores para se tornar um
Outro, um provocador, um quinto colunista, um pervertido.
No entanto, respostas simples nas condições da virada conservadora não são dadas
apenas pela direita. A esquerda, no sentido mais amplo, incluindo feministas e ativistas LGBT,
não é mais avessa a dar respostas simples para questões complexas. E, se para a direita a chave
para a estabilidade e a harmonia são categorias metafísicas como pureza espiritual e valores
familiares tradicionais, para a esquerda fatos científicos estabelecidos experimentalmente foram
projetados para fornecer o terreno sobre o qual ela pode se firmar. Positivismo e cientificismo
são vistos por muitos na esquerda como o único argumento contra o obscurantismo conservador.
Isso contribui para a moda de recontar o evangelho neurobiológico dando à hipótese biológica
uma certa aura de “última sensação científica”. Os neurobiólogos são as encarnações
contemporâneas de frenologistas e eugenistas, prontos para realizar tomografias
computadorizadas e para adivinhar, explicar e avaliar literalmente todas as manifestações da
natureza humana, até a “bondade”, o “amor” e a “hipocrisia”, para não falar da “orientação
sexual”3. Hoje em dia, a mídia “progressista” pós-soviética discute seriamente “os genes da
homossexualidade” e as “características neurológicas da transgeneridade”, e até mesmo
esquerdistas, feministas e ativistas LGBT se entregam ao emprego de teses essencialistas para
defender a política de identidade (aparentemente provar que a identidade é “inata”, involuntária
e, portanto, predestinada: “foi assim que Deus e os genes de nossos pais nos criaram”). Esse
discurso positivista da esquerda pós-soviética também se manifesta na busca por alguma base
3
Como ilustração, ver, por exemplo, Robert A. Burton, A Skeptic’s Guide to the Mind: What Neuroscience Can
and Cannot Tell Us About Ourselves (New York: St. Martin’s Press, 2014).
3
para mobilizar politicamente. Para muitas feministas, por exemplo, esse terreno se torna a
“separação fundamental entre homens e mulheres”, levando na prática à transfobia e à exclusão
das pessoas trans da luta feminista. Para essa esquerda, uma interpretação oposta adquire
características de uma cruzada contra o pós-modernismo, descartando quase todo pensamento
crítico da segunda metade do século XX: Baudrillard, Foucault, Butler e a Teoria Queer.
Tais respostas não nos satisfazem, por isso estamos escrevendo este texto como uma
tentativa desesperada de defender a complexidade do assunto, colocando-nos simultaneamente
contra o fanatismo de direita e um certo fundamentalismo de esquerda. Nossa resposta
“complexa” aos desafios da virada conservadora é formada na intersecção de dois campos
teóricos que, à primeira vista, não têm nada em comum: a teoria queer contemporânea (ou em
um sentido mais amplo – a ideia queer) e a filosofia soviética radical, representada pelos insights
teóricos do filósofo e dialético soviético Evald Ilienkov e seu aluno, o psicólogo, surdo e cego,
Alexander Suvorov. Basearemos essas respostas em três (na nossa opinião) aspectos-chave da
ideia queer: antiessencialismo, uma consideração sobre exclusão e estigma; e radicalismo
político e ético, que, estamos convencidos, deve fazer parte integrante do pensamento de
esquerda contemporâneo. Esses mesmos três aspectos são expressos na concepção Ilienkoviana
de personalidade, que discutiremos em detalhes. No entanto, nosso objetivo não pode ser
reduzido a simplesmente indicar essa interseção – o recurso à experiência da filosofia soviética,
indissociavelmente ligada à transformação ativa da realidade, nos permitirá conferir um
radicalismo teórico e político ao programa que propomos, ao qual, por vários anos, temos nos
referido como comunismo queer4.
Nossa compreensão de queer vai além da teoria queer acadêmica e se refere a um campo
mais amplo e heterogêneo de abordagens, práticas e políticas do corpo no contexto das relações
sociais – incluindo práticas ativistas – que chamamos de ideia queer. Apesar da ampla natureza
e heterogeneidade de suas concepções e práticas, podemos destacar uma série de características-
chave associadas à ideia queer, permitindo que todas existam sob um único termo. Em primeiro
lugar, essa ideia representa uma crítica à política de identidade, pois em sua base está um
antiessencialismo radical, ou seja, a noção de que gênero e sexualidade, assim como outras
identidades, não são naturais e inatos, mas fenômenos sociais dependentes de condições culturais
4
“Queer Communism Manifesto,” School of Theory and Activism – Bishkek (STAB), trans. Mohira Suyarkulova,
2013.
4
e históricas concretas – ou, nas palavras de David Halperin, a identidade queer “é uma identidade
sem essência”5. Em segundo lugar, para a ideia queer a conexão entre identidade com exclusão
e estigma é fundamental. O ativista e escritor queer Hugh Ryan em um texto com o título
revelador “Por que todo mundo não pode ser queer” chama a atenção para o fato de que a palavra
inglesa queer é designação coletiva para sexualidades marginais e identidades de gênero usadas
tanto como insulto quanto como rótulo reapropriado por ativistas políticos. E o termo
“marginalizado”, em sua opinião, é fundamental para a compreensão do significado político da
ideia queer: “Não se trata de seus comportamentos ou identidades sexuais específicos; em vez
disso, é sobre como essas coisas são avaliadas pela cultura ao seu redor. Esta é a essência do
queer: ser queer é ser julgado e encontrar comunidade com outros que foram julgados de forma
semelhante”6. “Você pode nem suspeitar que é um judeu, mas eles não lhe deixarão de apontar
isso”. Consequentemente, anunciar sua queeridade não significa renunciar a todas as identidades
possíveis e ser “simplesmente humano” – nessa perspectiva, a ideia queer perderia todo o seu
conteúdo político. Portanto, em um sentido político, chamar-se queer significa se opor ao sistema
social de distribuição de bens e privilégios baseado em uma política de identidade que define
aquela que é “normal”, enquanto vê outras como “desviantes”. A dependência de identidades e
exclusões em condições culturais e históricas a elas vinculadas pressupõe uma conclusão ética e
política significativa: essas condições podem e devem ser mudadas. Nesse sentido, definimos o
terceiro aspecto da ideia queer que pode ser designado em termos de seu radicalismo político e
ético, o modo máximo de pressão política, uma espécie de “grau de queeridade”, ao qual os dois
aspectos anteriores podem se construir. O horizonte político da ideia queer nesse sentido difere
radicalmente do movimento LGBT mainstream, cujo objetivo é normalizar sexualidades
heterogêneas e identidades de gênero. A normalização é alcançada acentuando a semelhança e
ao mesmo tempo suavizando as diferenças: os homossexuais não diferem em nada dos
heterossexuais porque também valorizam o amor e a família e desejam criar filhos. Para a ideia
queer, a normalização é um conceito hostil. “Queer é o grito de guerra do desvio”, declara Ryan7.
A ideia queer não enfatiza identidade e semelhança, mas diferença e particularidade, lançando
um desafio ao pensamento político estabelecido que antecipa a identidade como base da ação
coletiva. A ideia queer propõe uma política de coalizão da diferença para substituir uma política
5
David Halperin, Saint Foucault: Towards a Gay Hagiography, (New York: Oxford University Press, 1995), p.
62.
6
Hugh Ryan, “Why Everyone Can’t Be Queer,” slate.com, 14 July 2016.
7
Ibid.
5
identitária de semelhança. No entanto, a atenção às diferenças não é o mesmo que a exclusão do
comum. Na política de coalizão, o comum não é uma pré-condição, mas sim o resultado, o
horizonte de ação coletiva em que se realiza um dos principais princípios comunistas: o livre
desenvolvimento de cada um é a condição para o livre desenvolvimento de todos. O projeto
político baseado em uma dialética semelhante do particular e do universal chamamos de
comunismo queer.
Desse modo, o comunismo queer insiste que a exploração capitalista não tem apenas
um caráter universal, uma maioria absoluta sendo forçada a vender seu trabalho ao capital, mas
também um caráter particular: para mulheres, homossexuais, transgêneros, pessoas de diferentes
grupos étnicos, pessoas com habilidades limitadas e pessoas com problemas de saúde mental,
criam-se condições específicas de exclusão e exploração. E o método queer-comunista de se
opor a essa subjugação é se unir em um movimento de coalizão que não supõe a subordinação
das necessidades específicas de diferentes grupos a um objetivo universal, mas que cada
necessidade particular deve ser tomada como universal. A experiência específica de exploração
também define como diferentes grupos imaginam um futuro sem exploração, e, portanto, o
movimento de libertação da coalizão deve desenvolver uma imagem do futuro tão inclusiva
quanto possível, refletindo as necessidades e aspirações de grupos amplamente diferentes. Aqui,
é oportuno relembrarmos uma das teses-chave da feminista marxista Heidi Hartmann: “uma luta
para estabelecer o socialismo deve ser uma luta na qual grupos com interesses diferentes formam
uma aliança”, e esses grupos devem ter suas próprias “organizações e poder de base”8.
Uma importante fonte teórica e prática para o pensamento de esquerda atual poderia ser
a filosofia soviética radical. Um pensador que definitivamente pode ser considerado um
comunista queer foi o teórico marxista soviético Evald Ilienkov. Recentemente, seu legado
intelectual atraiu certa atenção tanto de teóricos quanto de estudiosos, mas esse interesse tem um
caráter amplamente acadêmico. Gostaríamos de indicar a relevância do legado teórico de
Ilienkov para a situação política atual.
8
Heidi Hartmann, “The Unhappy Marriage of Marxism and Feminism: Towards a More Progressive Union”,
Capital and Class 8 (1979): 1-33.
6
professor surdocego de psicologia, Alexander Suvorov (aluno e sucessor da linha de pensamento
teórica de Ilienkov), é precisamente o estudo do desenvolvimento multifacetado e harmonioso
da personalidade que constitui o núcleo da filosofia Ilienkoviana. A base dessa concepção é o
discurso teórico e político, referido acima como antiessencialismo, que Suvorov chama
retrospectivamente de “luta contra o reducionismo fisiológico”9. De fato, Ilienkov, durante as
décadas de 1950 e 1970, se viu no epicentro das discussões sobre questões da condicionalidade
do desenvolvimento mental humano. A discussão prosseguiu entre os proponentes das
abordagens biogenética e sociogenética, ou seja, entre adeptos do “hereditário” e defensores do
“ambiental” (natureza contra criação). Ilienkov nesta disputa era um partidário do lado da
“criação”. Hoje em dia, tais debates, ao que parece, perderam relevância contemporânea; tanto
o lado hereditário quanto o ambiental são considerados fatores igualmente influentes do
desenvolvimento mental na psicologia contemporânea. No entanto, o conflito entre princípios
biológicos e sociais não foi superado, foi “colocado em um botão de pausa”, mas não resolvido.
Para nós, esse conflito foi, e continua sendo, político (como aparentemente qualquer
“conhecimento científico neutro” é político, especialmente o conhecimento sobre a natureza
humana), que, como observamos, tem sido particularmente sentido nos últimos anos em
organizações esquerdistas, feministas dos direitos LGBT.
9
No artigo, trechos de obras de E. Ilyenkov e A. Suvorov foram retirados do projeto “Reading Ilyenkov”
(http://caute.ru/ilyenkov/index.html) e do site oficial de Alexander Suvorov.
7
através de uma atividade social concreta compartilhada historicamente, por meio de objetos
feitos por pessoas para pessoas, incluindo coisas como palavras. Ou seja, a personalidade é uma
expressão individual (uma forma de “avatar”) de um sistema social historicamente formado.
Ilienkov se baseia na definição de Marx da essência do homem como a “soma total de todas as
relações sociais”, esclarecendo que no original as coisas são enunciadas de forma mais
expressiva – não a soma total, mas o conjunto, “que não é a soma mecânica de unidades
singulares, mas a multiplicidade presente na unidade de todas as relações sociais”.
10
N. T. Trata-se do experimento da Escola de Zagorsk, encabeçada por psicólogos soviéticos como A. I.
Meshcheriakov, A. N. Leontiev, V. V. Davidov e E. V. Ilienkov.
8
formados no processo de interação entre uma criança e outras pessoas, não sendo,
correspondentemente, predestinados e maleáveis.
Esse antiessencialismo militante de Ilienkov foi ditado por uma lógica historicista
marxista – tão consistente que provocou consternação em colegas mais cautelosos: “Alguns
camaradas temem que tal posição teórica possa levar na prática a uma subestimação das
características biológicas e genéticas inatas dos indivíduos, ou mesmo ao nivelamento e
padronização [...]. Parece-me que, ao contrário, qualquer concessão – mesmo mínima – à ilusão
naturalista de explicar a mente humana e a atividade da vida humana mais cedo ou mais tarde
levará o teórico que faz essa concessão à rendição de todas as posições materialistas [...]. Aqui
pode-se dizer 'retire as garras e todo o pássaro está perdido', pois se começa com argumentos
sobre as origens genéticas de variações individuais em uma ou outra habilidade humana e se
termina concluindo que essas mesmas habilidades são naturais e inatas”, o que eventualmente
leva à “perpetuação[...] do modo historicamente moldado e herdado da divisão do trabalho
humano”.
11
Vigotski11. Um aspecto significativo dessa teoria foi sua orientação fundamental para a prática.
A concepção de personalidade de Ilienkov foi uma parte significativa desta pesquisa, cujo grande
objetivo era definir as condições sociais conducentes à realização do “desenvolvimento
multifacetado e harmonioso da personalidade”. Uma breve fórmula para essa realização seriam
aquelas noções muito Suvorovianas de “bondade, beleza e verdade”; ou ainda mais brevemente
– “liberdade”. Liberdade para Ilienkov é sinônimo de personalidade, possibilidades amplamente
variáveis do desenvolvimento da personalidade na realidade social. Disto se segue uma
conclusão que é tão contraintuitiva quanto característica da axiologia da esquerda: se levarmos
em conta que a personalidade é uma construção social, então a liberdade como sinônimo de
personalidade não é, em menor grau, uma construção; em outras palavras, a liberdade é
cultivada. A dialética da liberdade consiste nisto: para ser livre, é preciso construir
rigorosamente a liberdade por meio do esforço de toda a sociedade – o que é fundamentalmente
importante. Uma abordagem semelhante da atividade marca a distinção entre a ideia queer,
desnaturalizando as diferenças entre as pessoas, e a ideia queer-comunista, que vai um passo
além e problematiza a reconstrução das relações sociais de tal forma que as diferenças entre as
pessoas não se tornem mais motivo de exclusão e estigma.
11
Lev S. Vigotski (1896-1934) psicólogo soviético pioneiro que aumentou significativamente o número de
ferramentas científicas na Psicologia da Pedagogia e do Desenvolvimento.
12
se não for compartilhada com outros, se não for lançada e iniciada por outros. Tanto a atividade
quanto a reatividade fazem aqui parte de um processo dialético unificado, incluindo, nas palavras
de Suvorov, a “indução daqueles que lideram o processo e as próprias tentativas do sujeito; tanto
o desenvolvimento quanto o autodesenvolvimento [...]. Não o que está embutido 'nos genes da
mãe e do pai', mas na atividade compartilhada em conjunto”.
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