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Pedra Paulo A. Funasi LIVRARIA UNIXEROX 7 Were Quant. 9 oat: LY OL) ANTIGUIDADE CLASSICA A HISTORIA E A CULTURA A PARTIR DOS DOCUMENTOS 2 ANALISE DOCUMENTAL E ANTIGUIDADE CLASSICA Qs documentos e sua selecao A teadigio historiogrfica considerava como documento histsrico textos scritos, em particular referentes 8 historia politica stricto sensu. Ainds hoje, nos cursos de letras classicas, pralelamente 20s cursos de Historia, costuma-se ignorar toda producto literéria ndo-clissica, Judith P. Hallet (1993:49) cita 0 exemplo de YValério Miximo como paradigmatico. Considerado, no inicio do século passado, or Niebuhr como importantissimo, devido ao uso da sua obra Facta et Dieta Memorabilia na Idade Média e no Renascimento, foi relegado, a partir de meados do século XIX, 20 esquecimento,seja nos curiculos, seja nas colegdes de autores antigos. O mesmo poderia ser estendido a uma imensidio de autores amigos. Desta forma, centrando-se em acontecimentos politicos da elite © nos poucos autores considerados “elissicos",excluse a maior parte da historia e da cultura antigas as nossas reflexes. No entanto, a tendéncta das ciencias humana tem sido pri vilegiae a multiplicacao de objetos, de abordagens e, conseqilentemente, de fontes de informacio (ggers 1984:195;201 et passim), rientacdo que sera seguida nes- ta coletinea Esta colegio de documentos destina-se, a um s6 tempo, a uma gama de leitores que compreende historiadores, classicistas, arquedlogos, antsop6logos, -rquitetos, istoriadores da arte, fil6sofos, ientstas policos € 0 piblico em geral Por isso serdo includes, entre os tipos de documentos, escritos diversos, como poesias,fies20, historias, inscrigdes,reflexdes filos6ficas, poiticas; sera apresen- ada, ainda, a cultura material: vas0s ceramicos, pinturas parietais. Todos esses documentos serio interpretados como discusos a serem lides como resultados da claboragio humana, evitando falsas oposigdes ene diferentes tipos de evidencias, ‘materiais e textuais (Sherratt 1990:821); sio todos, igualmente, produtos da cultura. ‘Aselegio de documentos procurou evitar a reproduc da nogao de “principas" eventos, auiores ov monumentos "superiores”. Este © principal risco de wma cole {nea induzir o leitor a considerar que ali esté reproduzido “aquilo que € mais importante®.Jé foram discutidas, nesta introdugao, a Subjetividade e parcalidade inevitiveis do trabalho cienfico e nto cabera eforcar uma falsa nocio de obje- tividade e exaustividade induzindo o leitor a crer que aqui estariam os documen- 10s indispensaveis. ‘Ao conttario, a selecio procurou abranger um grande espectro de temas, 4e tipos diversos de documentos, analisados a partir das diferentes ciéncias hu- ‘manas, Sein descuidar do erudito e do grandioso, incluirantse o corriqueiro © 0 comezinho (the recovery ofthe everyday or the munctane, nas palavras de Giddens 6 1987365), O trivial revela, em nivel do detalhe, constancias e permanéncias dificil mente acessiveis pelo estudo exclusivo dos “grandes textos" (Burke 1989-4). Seria, talvez, desnecessicio frisar que ndo € possivel estudar © corriqueiro sem o gran. ddioso, 0 popular sem o erudito, pois a interagto entre as chamadas “alta” ¢ "baixa ccuturas esté no ceme mesmo de qualquer produc2o intelectual (Strauss 1993:217), ‘A valorizagao do popular e do trivial, surgida como contraposi¢ao a uma concen- tragio exclusiva nas elites (Beik 1993:210;212), embora busque resgatar a especificidade das culturas erudita e popular utilizando-se de um modelo bipolar de anilise (Ginsburg 1986-108), nto pode ignoraca interagdo constante entre ambas (Funari 1991.19) Os documentos procurim abranger diferentes categorias documentais: extos transmitidos pela tradigdo textual, epigrafes, restos arqueol6gicos, Diversas, timbém, as abordagens: textos filos6ficos, poesias, documentos oficiais, leis. [sso permitird a0 leitor familiarizar-se com a variedade de documentos disponiveis e com as dife- rengas de andlise que cada categoria documental impbe 208 pesquisadores, Anilise documental ¢ sua diversidade Os documentos podem ser analisados de miltiplas maneiras tendo em vista, ‘em panicular, 0s niveis de profundidade do estudo, as diferentes disciplinas e os diferentes paradigmas ou modelos hermenéuticos. A profundidade de uma andlise varia segundo a especializagio do estudioso e a expectativa do piblico. Este livro, 0 voltarse para um piblico heterogéneo, composto de professores universitirios, estudantes € leigos, apresentari anilises, referentes a diferentes documentos, que satisfagam estes tr8s niveis de pro-fundidade. Isso no apenas, nem principalmente, para satisfazer os diferentes piblicos, mas para servir como exemplo e modelo de nalises aprofundadas e exeqiiveis. O mesmo pode ser estendido, muratis mutandis, para as abordagens das diferentes disciplinas: historia, flologia, arqueologia, HA muitos modelos de andlise documental. Referindo-se a textos escritos & voltando-se para estudantes, alguns procedimentos tém sido ressaltados por dife- ‘entes autores. Alguns conselhos priticos ¢ bastante simples sao lembrados em ‘manuats de amplo uso merecem ser eitados (cf. Nouschi 1980:4-9); leturas suces- sivas do texto devem ser seguidas pela constituigao de uma bibliografia pritica e precisa. Cada parigrafo deve ser resumido no seu contedde substancial. O comen- rio deve incldir detalhes sobre o autor € as circunstincias histOricas, Outros pro- Oem um roteiro mais detalhado (cf. Lozano & Mitre 1978:128-131): 1. Aspectos extemnos, com estudo da tipologia de fontes (texto de fecio, legislativo, epistolar etc), lugar de origem e datacio do texto, estilo e caracteristicas linguisticas; 2. Resumo, consistindo em uma sinopse do texto; 3. Contexto histori 9, inserindo 0 texto em quadros cronolégicos, geogriticos e temiticos (e.g. eco ‘nomia, cultura, politica, guerra) especificos 4. Explicago detalhada do documento, envolvendo um estudo minucioso dos termos utiizados em seu contexto; 5. Au: u ‘orla, inserindo 0 autor nas circunstincias eno melo cultural; 6. Conclusio, in- cluindo 0 texto no contexto das abordagens historiogrificas sobre o tema e 0 periodo; 7. Bibliografia consultada, Especialistas, contudo, levam a cabo um estudo mais aprofundado, que inclu, no caso dos documentos clissicos, a chamada erica textual (Marichal 1961), Esta visa o estabelecimento do texto a partir dos manuscritos originais, cabendo localizar os erros dos copistas, as interpolacdes posteriores, o estabelecimento da _genealogia das cépias disponiveis, a critica da proveniéncia,fixagio da data, iden- lifcagdo da origem, busca das fontes (Quellenforschung). A esta critica externa, material, do texto, segue-se a trtica interna, a partir da linguagem empregada e dos costumes sociais citados. Por fim, a critica da sinceridade, exatido.c a deter- ‘minagao dos fatos especfcos citados deve ser feta ‘A critica filol6gica textual também possui suas particularidades: morfologia, sintaxe, diacrOnica e sincronicamente estudadas, formam a base do comentario linguistico erudito. Apenas para dar 0 sabor da critica filol6gica, um exemplo do proprio verndculo basteri "Mas empero ditei vos ua rem’, frase do Cancioneiro D. Dinis (23), sera traduzida, na moderna norma culta do portugues por "Mas, contudo, dir-vos-et uma coisa"; na linguagem falada, teriamos algo como "mas vou dizer uma coisa a voces Cems palavras cairam em desuso, com a latina rem (‘coisa"), enquanto a colocagio pronominal eneltica erudita do verbo no futuro ('dir-vos-ei") coexiste, agora, com 0 uso coloquial do verbo ir, no presente, unido 20 infinitivo ("vou dizer"). Apenas © estudo filologico detalhado permite, portanto, a compreensio do texto (Ali 1966:115:143), [até aqui, tatou-se do documento enquanto texto escrito, Na verdade, também (0 vestigios materiis ¢ as artes, por exemplo, constituem documentos. Os crtérios analiticos descrtos acima, portanto, dteis para 0s textos escritos, n40 podem ser api cades, diretamente, outras formas, nao-verbais, de documentagao. No entanto, hé algumas consideragoes de caréter geral, apliciveis 2 todes os documentos, ¢ que servirio para nortear os comentirios tecidos, em diferentes niveis, nesta coletinea Em primeiro lugar, consideram-se todos os documentos, eseritos ou nao, como dis cursos: Enquanto discursos, possuem, necessariamente, autora e pdblico e, como todo discurso, tém estruturas superficiais ¢ profundas. A autoria pode ser individual ou coletiva, material ou intelectual. Um edificio pode ter sido construido, materalmente, por diversos operirios a partir de uma planta de autora individual de certo auquitero © piblico pode ser individual ou coletivo, homogéneo ou heterogéneo. Uma carta de Cicero a um amigo podia ser destinada, orjginalmente, a um Gnico individuo mas, a0 ter sido publicada, voltou-se para um pablico amplo e variado, A estrutura de superficie de um discurso correspond a sua seqdéncia ex plicita de elementos constitutivos. Pardgrafos sucessivos de um texto apresentam ideias concatenadas, enquanto um edificio apresenta uma planta, funcionalmen- te ordenada, de seus aposentos. Esses s40 0s aspectos visiveis da organizagio de ‘um discurso. Sua estrutura profunda, de acesso inditeto, mediado pelo raciocinio » do proprio observador, liga-se aos interesses e objetivos do autor ¢ do pablico. A reconstrugio desses interesses, inevitavelmente subjetiva, vaiard segundo os pontos de vista interesses e conhecimentos do proprio analista Essas observacoes, de cariter geral, aplicam-se a todo tipo de documento, escrito ou no, Em termos priticos, caberia explictar alguns procedimentos itis ¢ de cariter geral para anilise de documentos eseritos ¢ materiais, Um texto deve ser lido e entendido em sua totalidade. As palavras no compreendidas devem ser pro- ccuradas em dicionarios, assim como as informagdes ¢ 0s conceitos desconhecidos. Mesmo termos como “liberdade”, “escravidao" ou “democracia", em geral jd conhe- cidos pelo leitor, devem ser estudados no seu contexto para evitar a confusio entre conceitos modernos e antigos (Momigliano 1984:484). A liberdade de ir 20 cinema fio é a mesma liberdade de nao ser escravo! Para aqueles que Iéem 0 documento ra lingua origina, latim ou grego, cabe observar até mesmo as nuancas derivadas dias palaveas utilizadas e da propria construgio da frase. Uma fase famosa de Plat2o, ‘no Banquete (196E) mostra bem a importincia desta analise detalhada: Potetes mo thheos sophos houtos hoste kai allon poiesai (Deus & um poeta tao habil que € capaz de produzir um outro poeta). ‘0 uso do infinitive aoristo poiesai expressa a idéia de possibilidade de carder geral, como uma necessidade logica: Deus € um criador (poietes, “pocta") {Ho sibio que produz um outro criador, o homem (polein, cra, prodiizir, Humbert 1954:226). Assim, apenas o conhecimento desse uso do infintivo permitiria wma correla interpretagio da frase. Juntamente com esse estudo das palavras, deve proceder-se a um estudo dos conceitos: no caso citado, cabe investigar as diversas conotagdes do "poeta" (poietes) ¢ da *sabedoria” (sophia) citdos no documento. 'Ap6s 4 compreensio total do texto, cabe identificar a idéias centrais de cada pardgrafo © ordend-las em uma seqiéncia, Paralelamente, cabe estudar o autor do texto € 0 pablico a que se destina. O autor deve ser estudado em suas caracteris- ticas individuais Gade, sexo, formagio intelectual etc) e coletivas (epoca em que viveu, local, classe social etc). © pilblico pode ser determinado pela forma ¢ pelo contetido do texto: palavrs ficeis¢ frases coordenadas indicam um pdblico geral, tenquanto 1um vocabulirio técnico, rebuscado ¢ frases subordinadas revelam um ppblico mais especifico. Um texto de contetido religioso, como um catecismo, pode voltar-se para uim pablico de fiis, enquanto um tratado filosdfico pode dirigit-se para enuditos interessaclos em reflexOes tebricas. Ao final, seri possivel ehegar 30s interesses ¢ objetivos, ti0-somente implicitos, do texto, Um objeto arqueologico exigirl uma exegese propria. Em particular, o estudo pormenorizado da constituicio material do artefato implica a andlise da sua compo- sigdo fisica: cerimica, vidro, madeira etc. A estrutura superficial do artefato, sua constituigio como objeto arqueologico, impde yma andlise da sua funcionalidade. ‘Assim, uma casa possui aposentos que se articulam, explicitamente, de maneira funcional. Essas fungdes, contudo, encobrem wma estrutura profunda, os objetivos apenas implfcitos nas fungdes: a existéncia de aposentos para os escravos, por ‘exemplo, ¢ sua exata localizagio em uma habitacio especifica revelam intencoes » dos construtores (isolamento, controle do movimento ete). O piiblico, ou sefa, © consumidor ou usuria, de um artefato material também deve ser estudado: um anel de ouro destinava-se a tertos grupos abastados, enquanto uma infora de vinho barato era consumida por extratos sociais mais amplos. Os documentos, de diversas categorias, que serio comentados no decorter desta obra, representam uma grande variedade de discursos. Dentre 0s textos eseritos, alguns sera0 apresentados no original, permitindo que a anise filologica seja aprofundada, A maioria, no entanto, seri apresentada apenas na forma de tradugoes € os comentirios referentes a estes documentos restringir-se-io A versio, em verniculo, apresentada, A maior parte dos textos foi traduzida pelo organizador desta obra, mas algumas versbes de autoria alheia foram introduzidas, em parti- cular, quando uma recriago poética, em portugués, jd foi publicada, Os docu- mentos materiais (artefatos, pinturas) so apresentados pela primeica vez em por- twgues ¢ os comentirios mesclam analises publicadas, em linguas estrangeitas & ‘em obras especializadas de dificil acesso, com a interpretacio do organizador desta coletinea, Aos documentos comentados seguem-se diversos outros a serem utili zados pelos leitores, completacios por exercicios de andlise resolvidos ¢ a resolves Especificidades do estudo da Antiguidade Classica Georges Duby (1980:44) lembrava que “cada época constréi, mentalmente, sua propria epresentacio do passado, sui propria Roma ¢ sua prépria Atenas” Os estudiosos da Antiguidade Greco-Romana tém sido considerados pouco pro- ppensos a interpretacd0 (McDonald 1991:830), voltados, muitas vezes, para uma erudicio estéril e conservadora (Rabinowitz 1993:3 et passim). Nao ha divida de que o racismo (Haley 1993), 0 machismo Rabinowitz & Richlin 1993) e ate mesmo © fascismo aberto tem caracterizado uma parcela dos estudos classicos, A inter= pretacio ariana da Antiguidade Clissica, surgida no século XIX, viria a marcar Gefinitivamente a disciplina (Bernal 1987; cf. Ampolo 1993). Romle Visser (1992:6;8;10) descreveu, em seu artigo sobre “A doutrina fascista ¢ 0 culto da romanidade", com muita propriedade, um caso concreto dessa simbiose entre 0 estudo da cultura antiga © a justficagao racista de uma ditadura: *O culto da romanidade foi muito stl para apoiar a pretensio de que os fascistas estavam fazendo a historia. Comparando a Marcha de Mussolini sobre Roma com os golpes de estaclo de Sila e de Jalio César, a propaganda fascista queria fazer crer que a Ilia fascsta havia cruzado seu Rubicio em direcio a0 dominio mundial Aromanidade fazia paste integral da concepczo de mundo dos Itlianos educados: ca Historia Romana clissica era, em geral, considerada como Histéria Nacional It liana... € dbvio que uma tal perspectiva ideol6gica da Histéria Romana, que impli cava, 20 menos, algum contato de primeira mio com a cultura e historia classicas, no poderia exist sem a ajuda de académicos classiisias.. Em nivel nacional € politico, estudiosos da Antiguidade, orlundos ou atuantes na Universidade, eram » 08 principais formadores de opinao... Estes estudiosos da Antiguidade tiveram um papel preponderance neste processo. Sem seus esforeos, um culto fascists mais ou menos cocrente da romanidade nao seria possivel [No entanto, 0 estudo da Antiguidade Clissica nao precisa reforgar precon- cceicos nem constituir-se em elemento de opressio, mas, part tanto, & necessirio dominaro rigor ¢ a erudigdo da Altertumswissenschaft (Bernal 1993:674). Esta obra, ‘como muitas outras, parte de pressupastos diversos: 0 dominio da cultura clissica ‘em como principal objetivo “promover uma reflexto constante sobre as condigoes humanas ¢ sociais que conduza 3 eritica social contemporinea” (Nordblach. 1989:28). Se no & possivel encarar 0 passado e o presente sine ira et studio, sem ‘engajamento (Holzer 1985:23), a superagio da Hist6ria “como instrumento de poder dos vencerlores", nas palavras de Edgar de Decca (1992:133), depende, em primeiro lugar, do conliecimento aprofundado da Antiguidade. Apenas 0 conheci- mento de primeira mio fundamenta a visio critica e, nesse sentido, a leitura de Arist6tcles, assim como de outros autores clissicos, permanece indispensivel para pensar-se tanto o mundo antigo coma 0 contemporineo (Gianotti 199413) Em segundo lugar, cabe alargar 0 universo de temas e abordagens da An= tiguidade, Devem ser incluidos os camponeses e as mulheres (Ginsburg 1991:205), a familia © os rituais (Friedman 1989:53), os gestos e os monumentos (Wallace Hadrill 1990:147 et passim), a dominagio e a resistencia (Leone 1986-431). Esses {outros temas devem ser apresentados no contexto de uma pluralidade de inter- pretagdes (Ankersmit 1986:26) « um dos critérios aqui utiizados para a selegao da documentacio consist, precisamente, no potencial de proposicio de diferentes abordagens e significados, © leitor seri incentivado a tratar tanto de assuntos Ccomuns como de questdes pouco usuais, a confrontar opinides divergentes sobre ‘um mesmo documento e a formar sua propria interpretacao. No se buscar refor- ‘gar, acrticamente, os modelos e paradigmas vigentes, mas a0 conteatio, “encorajar 2 proliferscio critica” de interpretacbes (Tucker 1993:653). s textos da tidigio textual tém sido publicados em diversas colegdes diss poniveis no Brasil. As editoras Teubner e Oxford publicam os textos no original grego e latino, enquanto edigdes bilingdes de grande uso sio publicadas nas colecdes Belles Lettres e Loeb, com teadugdes em frances ¢ inglés. As inscrigdes {Gm sido publicadas em revistas e foram coligidas pela Academia de Ciéncias de Berlim, desde o século passdo, mis séries Corpus Inscriptionum Graecarura, Corpus Inscriptionum Ltinarum e Iascriptiones Graecae, A cultura material, ineluindo escavagdes arqueoldgicas, tem resultado na publicagdo de indmeros tabalhos em revistas como Revue Archéologique, Anke Kunst e American Journal of Archaeology. importantes colecdes dle monografias compoem as séries das Escolas Francesas de Atenas e de Roma, Dicionsrios enciclopédicos encontraveis no Brasil ‘si0 0 Dictionnaire des Antiquités grecques et romaines (Ch. Daremberg, E, Saglio, E, Pottier) e Real-Encyclopaedie der klassichen Altertumswissenchaft (A. Pauly € G. Wissowa), em francés ¢ alemio. As referencias completas ¢ localizaclo nas principais bibliotecas da cidade de Sio Paulo enconteam-se recolhidas por Jonatas a Batista Neto e Mara Luiza Corassin (1987), em importante iicativa da Universidade de Sto Paulo (cf. Dias 1994139). Jaime Pinsky publicow 100 textos de Histéra Antiga (Sao Paulo, Hucitec, 1972) que, embora sem comentirios, continua itil. Manuais lssicos sobre 2 Andguidade Clissica, em muitos volumes, incluem 4 Cambridge Ancient History, Histoire Ancienne (regio de Gustav lots), assim Como diversos tomos das colegdes Evolution de I#Humanité, Cio, Nouvelle Clio, Fischer, La vie quotidienne; ests cinco mas s20 disponives em tadugbes para © ports ov para 0 espanol, Diverss dciondios de latim e greg, tanto estan- feiros (e.g. Oxford Companion to the Greek Language, Thesaurus Linguae Latinae), como em portugues Gicioniios do MEC) sio disponiveis. Gamaticas classicas de autores como A. Meille,j. Humber e A. Ernou no sto diffeis de encontrar nas bibliotecas especialzadas e manus brasileros diversos,destinados 2 escola média e superior, so de facil acesso (eg Jacyntho Lins Brandi © Napoleio Mendes de Almeida) Para faclitar a eitura desta coletinea, foram incluidos apéndices, de uso pritico, destinados a apresentaro significado de abreviaturas expressoes de Uso corrente nos estudos clssicas, Nio se pretendew, com iso, esgorae 0 Uni verso de termos uiizados nos diversos campos de estudo da Antiguidade Clas- sica, ma fornecer exemplos extrapolaveis pelos proprios litres cos interesses € niveis de especializagao variados exigirio ulteriores aprofundamentos Periodizagdes tradicionais da historia, literatura e cultura classicas Aspriodeagbes adelnuls deem ser eens como dvsbes arias, Diferentes pontos de vita, a parr de vis merodologis, lsciplinesacademieas ¢ ldclogia, esullam om dlvibesshernativas, © cbjetia da presenaglo dat confpitiweagteduslsesomese Inston alagte dos lets ede wane slguma, implica a aceltagto ds euspressuposios. © caso paracigmatico refer. Serz0 uso do termo “lissico” para dein pertodos da histra pola erira€ frase, © proprio uto do term Antigua Cisse, no tui deste vo, esl den compromisso;convenclovalmente, x cvlinagbes greg e romana da Att fildade sig ehamades "astens© tsmo, quand setters caste dons co Tab amipn, poss, condo,conocpbes ambiguas 40 considera esa Arti ee pee a ane see eared eer OE eel ia abrangenia aos homens culos da elie, por oposgho 2s mulheres, 20 incu tox 4s pobre (Brown 19933247 et passin, O so do termo Aniguidade lis eal ec eer eee eee ee ace Tea ae ie gs en aeae ated ae ea tare ‘determina de perodos“dlsicos", em qualquer pertodiagio hist, ere care ep ee eee ee esse ed ent eect ces raat) ore ee tm uma progressio em dregio a0 padro clssic,sucedio pla degeneagto OU 2 decadéncia, correspondente a0 afastamento em relasio a0 modelo, Esse uso do termo “clissico" embute uma concepsao cilica da Historia: ascensio, apogeu, deca déncia, seyuidos de novas ascensdes, apogeus ¢ decadéncias. © problema surge, naturalmente, quando difeggates autores, « partir de paradigmas interpretativos € de objetos de pesquisa vagtidos, propdem diferentes pices. E comum que especia listas em periodos divers0S localizem esses apogeus ..exatamente naqueles que S10 © centro de suas atengoest “Tudo isso significa que nao € recomendavel encarar as periodizaghes sendo como instrumentos analiticas que sto dteis para 0 conhecimento. Assim, por exemglo, a Pré-Historia da Grécia costuma ser dividida em periodas arqueol6gicos (Ruchet 1975; Treuil etal. 1989), enquanto a utilizaglo da escrita difunde-se apenas com a ivilizagio micénica (séculos XIIF-XIV a.C.). Seguem-se os periodos protogeométrico (ca, 1100-900), geométrico (900-750), arcaico ou pré-cssico (ca. 750-500), clissico (ca, 500-336 a.C.), helenistico (36-196), romano (196 a.C. em dante). Essa divisdo privilegia a histéria politica de Atenas, bem como sua produsao intelectual. litera tra homérica (século IX 2.C.) € sucedida por Hesiodo (século VIID, autores arcaicos (eg, Saf0), fildsofos pré-socriticos,rragédias e comédias classicas (Euripides, Sofocles Aristofanes), Historia (Herédoto, Tuctdides), Platio, oradores do século 1V a.C., Arist6teles, poesia helenistica, literatura de época romana (cientifica, filoséfica, ficcionista, historica) (cf. The Cambridge History of Classical Literature). A arte srega tem sido dividida em periodo de formacie (1000-650 a,C.), arcaico e se- vero (650-450 a.C.), ckissico (450-326 a.C.) e helenistico (325-31 a.C.), cada um deles subdividido em estilos geométricos (até 750 a.C.), protocorintio e proto: ftico (750-680 a.C.), dedilico (680-610 a.C.), arcaico (610-530 a.C.),arcaico tardio (530-480 a.C.), severo (480-450 a.C.), fidiaco e pos-fidiaco (450-400 a.C.), do quarto século, do alto helenismo (325-230 a.C.), helenismo médio (230-170 2.C.) e tardio (270-30 aC; ef. Bandinelli 1984:4-5 er passim) A historia romana tem sido dividida, seja segundo a evolugio politica de Roma, seja por sua expansdo militar (Bornecque & Mornet 19765-18). As divisdes politics s4o particularmente claras: Monarquia (séculos VIIVI a.C.), Reptblica Patricia (SEculos V-IV a.C., Repablica Oligarquica (séculos I-I a.C), Guerras Civis (até 30 a.C), Principado (30 a.C.-193 d.C.), Dominado (193 4.C. em diante). Este lilimo pode ser dividido no periodo da crise do século Ill (235-268 4.C.), seguido do periodo do império Cristlo (séculos 1V-V) (cf. Piganiol 1976). a liceratuea latina divide-se, normalmente, em quatro fases (Cardoso 1989-10-11): primitiva (século VIN - 250 a.C_), helenistica (250-81 a.C.), clissica (republicana de 81 a 43 a.C; augustiana, de 43 a.C. a 14 AC. e filio-Cliudia, de 14 4. a 68 d.C), e pOs-clissica Atividades encaminhadas 1. Reflita sobre a predominancia, no discurso hist6rico tradicional, do relato politico-militar e, no campo dos estudos clissicos, dos chamados “grandes” autores, 3 A tistéria, desde a Antiguidade Cléssica ¢ até 0 século XX, concentrov-se nos grandes eventos militares ¢ plicos.Alguns autores ponderam que 60 refletia 0 dominio dda cultura masculia, militar, patriarcal eautoriria, do discurso sobre o pasado. Tant- bbém no cotudo da literatura cléssica, a valorzagio de alguns autores, em detrimento da maior parte dos escritos antigos, t2m sido uma constant desde meados do século XX. ‘Assim, toda a literatura grega posterior ao quarto século aC. bem como a literatura {atina posterior a0 segundo século d.C., apesar de volumosas ¢ criativas, eram, ‘cootumeiramente descartadas, A concentraglo, tanto nas vatalhas como nos autores “cléssicos", acsbava por imitar 0 observader. 2. Reflta sobre a significagio da interdisciplinaridade e sua importincia para ‘ estudo da Antiguidade Classica certo ponte de vist, a Mera de Avigudade Obosce ae vlan, para seconsir 1 eosedade antiga ou transfornagtes de fonte ores plas ic Pinas "carsarqcdol foreers os dadoo mates amumismdtca anaes" rod: 2 Naraara ab cbro heconalee asim por dant, Agno eapeialosas tesoas kes copectias como osaucbgo Leo ln (1988728), parem do preess- poste de que Mb ecpinas qu produzem eeataam fotze enquanto a Hit inte Tara a tadae los em um dlsciro expat areilada Eosesborsagem contudo 2 dino tempo deoralrza«desartieda as dcipinaso 0 conhecimeno devo da tapsctldace de cada deciplina, hdd ents produBo ae decomeros @abo- taeto de um ducureo holatice interpretative” separa priicas nasties. Cada lscipna tem ova coeciade sade eto, and cro, ANstéria dn ace. sruclogiavlizenes douma plea de sncas de orengBooondse Scuroteal qe gem um contecnentoapofrdado partilar No areano, io 6 tna » rect fatos para a ota. or otro lao itedclnaridade nose trou 3 fargo de fone de natures dees, mee consot na aria das eros abrdagensemim docwroo Inca ococeta estado do wo de acosd fo Ice rnos por sep, ee a coningdo das metodo, simutancante Ta Srqueoua,lguetic,Iaraturs,Netbn da art hota obecro snow no oe {rota sonarortevsmas de corns eaacaabardegers Nalace-Haail1990), 43, Reflita sobre as relagoes entre as informagoes textuals e matetiais. ‘pongo entre evan materi elterbria tem servi, tanto a araueb: logo ome astorbdores da Ariguade, coo uta mana de evar a neceoaia elapse doses dos spacton nests da stra Orezsran aa de ops Go entre esigios equeliiose totoe anion enccbre ra vrdade, fata de i- reese pou conto dao evidence Asé meno o ado eopnhoo da chamada”es- ‘Soto om ge rate de mae sang por itn hatraate @ ruatloges tom mutes garhar com »jungla de dado oabordaens, Sher {1390208 pce hd pooc, que eta recov da otra da Spee hamérca u sugere que cla tem um desenvolvimento paralelo aos padres de mudanga material ¢ cultural manifestada no eeglstro arqueslégica e que os dois textos — licerdrio ¢ arqueo- \6sico — podem ser lidos conjuntamente” 4. Reflita sobre a relagao entre o erudito ¢ 0 grandioso, por um lado, ¢ 0 trivial ¢ corriqueiro, por outro © quais as premissas da énfase no estudo destes times, Erudito e popular, grandioso ¢ corriqueito so partes de um todo. A busca do ‘vil, dos grupos subalternos, das culturas excluidas dos registros dominantes lg ‘96 deontologia da ciéncia moderna, Arnaldo Mommigliano (198-4:461) bem ressaltava que "0s pesquisadores contempordneos que $2 preacupam como estudo das mulheres, criangaa, escravos ¢ gente de cor...isam,.uma saciedade melhor emergente de uma Sociedade inferior que explorava as mulheres e humilhava 05 escravos Mas a consciéncia ‘ioral que leva historiador a pesquisse tendo em vista uma sociedade melhor deve Ser capaz de resistir a afirmagao de que os seus valores so to historicamente condi- lonados quanto 0 0 0 valores de um dono de escraves cruel, adulto, branco e omen Oque seria escrever Histéria sem preconceitos morals, parece-me difclimaginar.poraue nunca ov" (grifo acrescentado) 2 5. Reflita sobre os preconceitos, muitas vezes inconscientes, subjacentes 208 estudos da Antiguidade Classica Uma série de preconceitos,inconsclentemente accitos, cbscurece a compreensio das sociedades antigas. Uma supost supericridade cultural grege, sa sobre 05 ro- ‘manos seja sobre outras civlizagdes, acaba sendo introduzida coma elemento explicativo que dispensa comprovagdes. "As maneiras gregas s3o encaradas como algo que outras ‘sociedades iro adquirir por simples contato — como se fosse earampol” (Whitehouse 4 Wikins 1889:102). Conservadores, autortdrios e patriarcals, os classicistas identi- ficam, nos documentos antigos, justamente estes valores (Roze 1993 215; Passman 1993:183). Muitos estudiosos, até recentemente, eram treinados para ser adminis- tradores militares nas colbnias (Hallett 19935!) ¢ ndo deve surpreender 0 uso de con- Geitos conservadores. Cabe ao estudioso, por meio de uma ertica interna, encontrar 38 condigaes de produgio histérica dos textos antigos e modernoe, suaintencicnslidade inconsciente (Le Goff 1964:103) Mividades proposigs 1. Determine as principais caracteristcas da critica textual a partir de pre- Ceitos em livros diversos sobre a andlise documental 2, lnvestigue os passos do estabelecimento de textos em livros especializados ‘e compare as propostas de diferentes autores. 3, Procure elencat as principais colegdes de textos bilngies (originais grego ‘latino e traducao para idioma moderno) e abservar © papel do apacato critico estas série. le referéncia sobre a Anti= 4, Faga um levantamento das principais obras d an sguidade Classica, suas earacteristicas¢ utilidades (diciondrios, enciclopédias et.) cs jos manuais sobre a Antigui« 5, Procure fazer uma pesquisa bibliografica dos man dade Classica nas diversas categoras: livros paradidaticos, manuais estrangeiros, livros de colegdes histrieas,lteririas,arqueotogicas, antisticas ete. Note 3 cespeciicidade das colegdes € 4s insia no seu contexta historico literirio, 6. Compare as periodizagoes de diferentes autores sobre a Antiguidade Clis- sica, no que se relere & histéria politica, lterdria artistica, filosofica ete. Analise ‘as implicagdes tebricas de cada periodizagao.

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