Você está na página 1de 131

Este arquivo

Este arquivo compõea acoletânea


compõe coletânea STC
Mega Cursos
www.trabalheemcasaoverdadeiro.com.br
– www.megacursos.com.br -

OS
GUARDIÕES
DA
SEMENTE

Sergio Pavan

1
Capítulo 1

Antônio de Azevedo entrou com o seu carro no


estacionamento que ficava bem perto da Praça Mauá, no Rio
de Janeiro. Estava muito ansioso, pois teria uma reunião com
o Dr. Roberto de Alencar, presidente e sócio majoritário da
Companhia Brasileira de Engenharia, a maior e mais forte
empresa de engenharia e obras de arte do país. A CBE, como
era chamada, nos últimos 10 anos tinha vencido as maiores
concorrências para a construção de estradas, pontes e
rodovias do governo federal. Com um patrimônio avaliado
em alguns bilhões de reais e com a tecnologia que possuía,
era a empresa ideal para financiar o seu projeto de descobrir,
no meio da grande floresta amazônica, a cidade Semente que,
segundo a lenda, era o berço e a origem da raça indígena da
América do Sul.
A lenda indígena dizia que, vários milhares de anos antes do
descobrimento do continente pelos portugueses, os deuses
desceram do céu, numa imensa nave e fundaram uma cidade
que deram o nome de Semente. Esses deuses estavam
fugindo de deuses mais poderosos ainda e escolheram o
planeta Terra como refúgio. Esconderam-se no meio da selva
amazônica.
Mas, foram descobertos e mortos. Alguns poucos
conseguiram fugir, embrenhando-se na mata e lá vivendo,
durante séculos, fundaram várias nações como os Tupis,
Guaranis e Botocudos.
A involução natural das divindades foi graças à artimanha
dos sobreviventes que deixaram de usar, propositadamente,
qualquer peça de metal, pois era através do metal que os
deuses maus conseguiam localizar os fugitivos.

2
Assim, eles perderam ao longo do tempo, toda a cultura dos
alienígenas. Com medo dos deuses maus voltarem, toda a
história da raça foi considerada tabu. A cidade nunca mais foi
visitada, ao contrário, todos fugiam dela com medo de serem
detectados e o tabu foi passando de geração a geração.
Mas, segundo essa mesma lenda, a Semente estava intacta e
com toda a parafernália de equipamentos e motores de uma
tecnologia muito mais avançada que a atual raça humana
poderia sonhar. Lá estavam em livros, aparelhos e
computadores as curas de todas as doenças, as chaves da
longevidade e, enfim, a decodificação, estruturação e
ordenação do genoma da raça humana, entre outros incríveis
avanços, como por exemplo, um motor movido à força da
gravidade que não precisava de combustível, não enguiçava e
fazia com que veículos pudessem se locomover não só em
terra, como no ar, a velocidades incríveis.
No entanto, treze sacerdotes sobreviventes, voltaram a
protegê-la. Eles não deixavam ninguém se aproximar da
cidade e guardavam com um fervor religioso toda a cultura
dos deuses bons. Eram os Guardiões da Semente.
Obviamente, não eram assim que os nativos falavam, nem
poderiam. Mas, era a tradução e a hipótese que o Antonio de
Azevedo acreditava.
Daí a ansiedade do Antônio, ele teria que convencer o
empresário que a lenda era real e conseguir o dinheiro
necessário para montar uma expedição com o objetivo de
descobrir a cidade.
A passos largos, entrou no prédio onde funcionava a CBE. O
endereço era o da Av. Rio Branco, número 2, o mais
moderno e luxuoso prédio comercial da cidade. A CBE
ocupava dez andares e a presidência ficava no vigésimo
quinto andar. Ao descer do elevador e entrar na recepção,

3
Antônio ficou deslumbrado. O chão era todo de mármore de
carrara azul claro e os acabamentos de aço escovado. No
centro ficavam as recepcionistas vestidas com um tailler azul
marinho, cercadas por vários computadores.
Antônio não estava acostumado a aquele luxo. Professor da
cadeira de paleontologia da Universidade Federal da Cidade
do Rio de Janeiro, o seu escritório era pequeno, mal
arrumado, com móveis antigos e desgastados, paredes
descascadas e ainda por cima dividido com mais dois
colegas. O ar condicionado deixara de funcionar a anos e um
imenso ventilador de teto amenizava um pouco o calor que
fazia no verão.
Antônio intimidou-se com a riqueza e opulência daquela
recepção. Quase que voltou atrás. Mas, enfim, tomou
coragem e aproximou-se da bela recepcionista que o
encarava:
- Bom dia.
- Bom dia, respondeu a moça com um sorriso nos lábios.
- Eu tenho uma reunião marcada com o Dr. Roberto de
Alencar.
- Qual é o seu nome, por favor?
- Antônio de Azevedo.
- Um minutinho, por favor.
A recepcionista ligou para a secretária do presidente.
- Bom dia, dona Rita, está aqui um senhor dizendo que tem
uma reunião marcada com o Dr. Roberto. O nome dele é
Antônio de Azevedo.
Após escutar alguns segundos, ela agradeceu, saiu do seu
lugar e voltou-se para o Antônio.
- Sr. Antônio, o Sr. pode me acompanhar?
Entraram por um longo corredor que cruzava várias salas,
todas elas com dezenas de pessoas em seus computadores,

4
até que chegaram em frente a uma grande porta onde estava
escrito Diretoria. Abriu-a e deu passagem para o Antônio.
Era uma nova recepção, ainda mais luxuosa, com vários sofás
de couro. A moça fez sinal para o Antônio sentar-se em um
deles e foi falar com uma loira exuberante, que era a
recepcionista da diretoria. Depois, voltou e passou pelo
paleontólogo, dando-lhe um largo sorriso.
- Um momento, Sr. Antônio. O Sr. será atendido
imediatamente.
Antônio pegou o jornal do dia, que estava na mesinha ao lado
do sofá e procurou pela página de esportes, para ver se tinha
alguma novidade no time de seu coração que era o Botafogo.
Ainda estava procurando as notícias quando uma mulher de
seus quarenta anos, morena, de olhos verdes, tão linda quanto
às demais, saiu da porta que dizia presidência e foi em sua
direção.
- Sr. Antônio, bom dia. O senhor pode, por favor, me seguir?
Antônio a seguiu e entraram numa imensa sala, que pelos
seus cálculos, deveria ter uns 100 metros quadrados.
No fundo da sala, numa imensa mesa de mármore, estava um
senhor, de cabelos brancos, vestindo um impecável terno azul
marinho. Ele olhou para o Antônio, como que o analisando
da cabeça aos pés, e com um largo sorriso o cumprimentou.
Apontou para um sofá, pedindo que sentasse e saindo de sua
mesa veio se sentar ao seu lado.
- Bem, Antônio, até que enfim nos encontramos.
Antônio lembrou-se que a reunião tinha sido marcada várias
semanas antes, por falta de espaço na agenda do presidente.
- Bom dia, Dr. Roberto.
- Pode me chamar de Roberto. Infelizmente tenho uma
reunião de diretoria daqui a meia hora. Por isso peço que
entremos logo no assunto.

5
- Bem, Roberto, vou tentar ser o mais sucinto possível.
- Eu lhe agradeço.
Antônio, então, contou ao Roberto toda a lenda da Semente.
- Muito interessante, disse o Roberto, mas em que posso lhe
ajudar?
- Como você sabe, o governo federal está sem verbas para a
educação. Muito menos ainda para bancar uma expedição de
descobrimento baseada em lendas. Desta forma, o meu
objetivo nesta reunião e tentar junto a CBE o patrocínio desta
expedição.
- Mas o que a CBE ganharia com isso, Antônio?
- Muitas coisas Roberto. Eu posso listá-las para você.
- Pois então comece.
- Em primeiro lugar, essa expedição, por ser cultural, contaria
com o incentivo do governo. Todo o gasto poderia ser
deduzido do imposto de renda a pagar.
Em segundo, a mídia. Uma expedição com esse vulto
ganharia espaço em todos os meios de comunicação do país,
e o nome da CBE, como patrocinadora, apareceria em todas
as reportagens a respeito. Um publicitário poderia calcular,
melhor que eu, o que valeria em dinheiro, toda a exposição
que a marca de sua empresa teria. Acho que o retorno seria
muito maior que a verba gasta na expedição.
Em terceiro, a imagem de sua marca, ganharia muito com o
êxito desta expedição.
Em quarto, por fim, o mais importante, se descobrirmos a
Semente, o senhor terá em mãos descobrimentos e por
conseqüência, tesouros arqueológicos inestimáveis e
tecnologias inimagináveis ao seu alcance. Os lucros com
patentes seriam astronômicos para a sua empresa.
- Isso se essa lenda for verdadeira - disse o Roberto.
- Eu tenho certeza, Roberto.

6
- Bem, Antônio, a sua proposta é bem interessante. Vou
passá-la aos meus diretores para analisá-la e, pode estar certo,
em no máximo uma semana lhe darei a resposta.

7
Capítulo 2

Antônio estava em sua mesa preparando a prova de fim de


ano de sua turma, quando o telefone tocou.
- Alô - atendeu.
- Sr. Antônio?
- Sim?
- Aqui é a Rita, secretária do Dr. Roberto da CBE. Ele que
falar com o senhor.
- Pode passar, dona Rita.
Antônio levantou-se da cadeira e cruzou os dedos. Apesar de
incrédulo, fez uma prece: meu Deus, por favor, faça com que
a CBE tenha aprovado a expedição.
- Bom dia Antônio. Tenho uma ótima notícia para você. A
nossa diretoria aprovou o seu plano. Você poderia, ainda
hoje, vir aqui? Gostaríamos de discutir os detalhes da
expedição.
- Claro Roberto, a que horas?
- Pode ser às seis horas? Desculpe, mas é o horário em que
poderemos reunir todos os diretores diretamente interessados
ao assunto.
- Claro que sim. Estarei aí pontualmente.
Quando o telefone foi desligado o Antônio deu um berro:
- Consegui!
Imediatamente os seus colegas o parabenizaram e o
abraçaram. Foi uma festa no pequeno e mal arrumado
escritório do paleontólogo.
Antônio não conseguia tirar os olhos de seu relógio. Tinha
calculado em sair uma hora e meia antes da reunião. Não

8
queria se atrasar de maneira alguma. Mas as horas não
andavam. Ainda faltavam três horas. Gastou esse tempo
pegando todo o material que tinha reunido, ao longo dos
anos, em suas pesquisas sobre o assunto. Queria apresentar o
projeto todo documentado.
- Antônio foi introduzido a sala de reunião da CBE. Como
tudo naquela empresa, a sala era suntuosa. A mesa de reunião
tinha 40 cadeiras. Mas estavam apenas quatro pessoas, o
Roberto e mais três diretores.
Depois das apresentações, o Roberto pediu ao Antônio que
entrasse nos detalhes da expedição.
- Bem, senhores, depois de seis anos de estudos, tendo a
colaboração da Aeronáutica, conseguimos a localização mais
provável da cidade Semente. Ela deve estar no noroeste da
Amazônia, exatamente neste ponto - disse Antônio abrindo o
mapa do Brasil na grande mesa.- é uma região ainda virgem,
intocada pelo homem civilizado. Fica a quinhentos
quilômetros, mata adentro, de uma pequena vila chamada de
Moura, que é o ponto mais perto da civilização. Para
chegarmos lá, teremos que atravessar igarapés, regiões de
areias movediças e matas virgens.
- Por que não utilizamos helicópteros? Perguntou um dos
diretores.
- Podemos utilizar até este ponto - disse mostrando
novamente o mapa. Aqui formaremos a nossa base. Mas
ainda assim ficaremos uns 50 quilômetros distantes do local.
- Mas por que temos que fazer essa base. Por que não vamos
direto ao local?
- Muito simples esta região é toda de igarapés. Ou seja, de
matas submersas. Nenhum helicóptero conseguirá pousar lá.
- Mas então a cidade fica numa região submersa?

9
- Claro que não. Ela fica numa espécie de ilha, se podemos
chamar de ilha. Mas do alto, será impossível para qualquer
helicóptero ou avião, vislumbrar se a região é seca ou
submersa. Desta forma, não temos alternativa senão a de
viajarmos por terra esses 50 quilômetros.
- E, como vocês vão entrar numa selva submersa?
- Levaremos barcos infláveis, com motor de popa. Depois,
quando atingirmos terra seca, iremos a pé.
- E quantas pessoas vocês vão levar?
- Bem, se vocês concordarem, serei o chefe da expedição.
Além de mim, precisamos de dois médicos e dois
enfermeiros. Os médicos serão um cirurgião geral e um
especialista em doenças tropicais. Teremos que ter também
um biólogo, um arqueólogo e um botânico.
- E quem mais?
- Dois navegadores especialistas em selva, que recrutaremos
na aeronáutica, dois seguranças, um cinegrafista, seu
ajudante, o cozinheiro e mais 49 carregadores, o que dá um
total de 64 pessoas.
- Mas para que tantos carregadores?
- Porque teremos que ter 12 barcos, visto que cada barco
comporta seis pessoas e são necessárias quatro pessoas para
carregá-los. Os mantimentos e aparelhos ficarão dentro dos
barcos, quando estivermos nos movendo em terra seca.
- E quanto vai custar à expedição?
- O total estimado é de 25 milhões de reais, contando com
tudo: planejamento, salários, equipamentos e mantimentos.
- Pois bem, Antônio, está verba estará à sua disposição
amanhã. Você pode começar a sua expedição. - falou o
Roberto. Vamos chamá-la de Expedição Semente - CBE.

10
Capítulo 3

Manaus, capital da Amazônia, era o ponto de partida da


expedição. Os dois primeiros helicópteros que iriam abrir a
clareira que serviria de base da expedição já tinham partido

11
no dia anterior. O local mapeado tinha sido plotado pelos
GPS e ficava a 450 quilômetros da vila chamada de Moura e
a 1050 quilômetros de Manaus. Três dias depois, pelo rádio,
Antônio teve a confirmação de que a clareira já tinha sido
aberta e que os helicópteros voltariam no dia seguinte, uma
segunda feira, para se juntar aos outros para levarem os
expedicionários. A CBE tinha alugado oito helicópteros para
o transporte da expedição. Assim, foi marcada para terça
feira o início, propriamente dita, da grande aventura.
A terça feira amanheceu, para alegria de todos, com um lindo
dia e um céu azul sem nenhuma nuvem, o que era raro na
região. A viagem decorreu sem nenhum incidente e sete
horas depois, todos estavam atarefados em erguer as suas
barracas, colocar os equipamentos em seus lugares o que
demorou até o anoitecer.
Depois do jantar, todos continuaram na barraca grande,
conversando. Claro que o tema principal era a aventura que
eles estavam participando e, como não poderia deixar de ser,
histórias sobra à selva. Raimundo, que era o chefe da
segurança, era o que mais falava. Conhecia tudo sobre a
Amazônia e suas histórias encantavam os cientistas,
especialmente a Letícia que era a bióloga da expedição.
- Vocês já ouviram falar do Chupa-Cabra, né? Perguntava o
Raimundo.
- Claro que sim, seu Raimundo - respondeu a Letícia. Essa
lenda apareceu, se não me engano, em Varginha. Disseram
inclusive, que poderiam ser extraterrestres. Eles mostravam
bichos, especialmente cabras, daí o nome, com um buraco no
pescoço e totalmente sem sangue. Mas, nada foi comprovado,
o que pareceu ser uma grande invenção do povo de lá.

12
- Lá, pode ser, dna. Letícia, mas aqui não. O bicho realmente
existe, se parece com um cachorro, mas com o focinho de um
tamanduá bandeira.
- Você já viu, seu Raimundo? Perguntou a Letícia.
- Vi sim senhora.
A Letícia então ficou quieta. Não queria desmentir o
Raimundo. Principalmente na frente dos outros.
O Raimundo também não continuou com o assunto, ao
contrário, passou para outro:
- Tem também o Aparí-Parú. A senhora conhece? Perguntou
em tom de desafio.
- Conheço não seu Raimundo. O que é isso?
- E eu espero que a senhora não o conheça. Pois ninguém que
o conheceu viveu para contar a história.
- Ué, então como o Sr. sabe da existência dele?
- Pelos crânios... Falou o Raimundo, deixando de propósito a
frase no ar, esperando pela pergunta da Letícia, que veio em
seguida:
- Como pelos crânios, seu Raimundo?
- É que o bicho só deixa o crânio de suas vítimas. O resto, ele
come tudo.
- Mas se ninguém o viu, como sabemos que o crânio foi
deixado por esse bicho? Não poderia ser por uma sucuri, por
exemplo? Essa cobra faz exatamente isso com suas vítimas.
Só deixa o crânio. O resto ela engole.
- Mas eu nunca vi uma sucuri comer um homem adulto.
Criança até pode ser.
- Mas existem relatos de sucuris de até oito metros de
comprimento. Um bicho desse tamanho poderia,
tranqüilamente, comer um homem adulto. E, não se esqueça,
seu Raimundo, que estamos nas terras delas. Essa região é de
igarapés, o habitat natural dessas grandes cobras.

13
- E como a doutora explica os rastros deixados? Pelo que eu
saiba, cobra não tem pernas.
Todo mundo riu da afirmação do Raimundo. A Letícia ficou
meio sem jeito, mas, mesmo assim, perguntou:
- Que rastros seu Raimundo?
- Ué, a senhora não sabia?
- Sei não seu Raimundo. Estou ouvindo esta história, pela
primeira vez, de sua boca.
- Pois bem, ele deixa enormes pegadas ao lado de suas
vítimas. As pegadas mais parecem de um jacaré gigante.
A bióloga ficou pensativa e, depois, perguntou:
- E de que tamanho são as pegadas?
- Enormes, doutora. Muito grandes, mesmo.
- E nunca ninguém viu esse bicho?
- Pelo menos ninguém vivo. Se alguém já o viu não está mais
vivo para contar como ele é.
- E onde essas pegadas aparecem?
- Como assim, doutora?
- Em que lugar elas foram achadas?
- Bem, as poucas pessoas que viram essas pegadas disseram
que foram na ilha do Alemão.
- E onde fica essa ilha, seu Raimundo?
- É para onde nos vamos, doutora. É a nossa ilha.
- O senhor quer dizer que a ilha que vamos é o lugar onde
fica esse seu bicho?
- Exatamente.
- Então o senhor está me dizendo que a ilha que achávamos
virgem do ser humano já foi visitada?
- Mais ou menos.
- Como mais ou menos, seu Raimundo? Perguntou muito
interessado o Antônio.

14
- Os poucos que viram as pegadas sobreviveram por que
voltaram imediatamente. Quem resolveu seguir nunca mais
voltou. Pelo menos até hoje. Inclusive o Alemão.
- Que Alemão? Perguntou, novamente o Antônio.
- O que deu o nome ao lugar.
- E cadê ele?
- Nunca mais foi visto.
- E quem era ele?
- Era um cara muito legal. Foi meu patrão. Chamava-se
Hansen Von Wolfang, mas todo o mundo o tratava como
alemão. Ele veio morar em Manaus há uns 10 anos atrás.
Tinha uma serralharia e vendia as toras de madeiras para a
sua terra. Era um exportador de madeiras. Ganhava um
dinheirão vendendo principalmente Mogno e Ipê, que eram
as madeiras que mais davam lucros. Um dia um índio veio
lhe dizer que naquelas terras haviam muitas árvores de
mognos e ipê. Ele então conseguiu uma licença do estado
para explorar aquela região. Juntou uns dez empregados da
serralharia e foi para lá. Nunca mais voltaram. Por isso é que
chamam esse lugar de a ilha do Alemão.
- Mas se você era empregado dele, por que não foi com ele?
- Por sorte, tive uma crise de malária, estava com muita febre
e calafrios e fiquei em casa para me curar. Na época fiquei
muito chateado, pois ele pagava muito bem por cada arvora
abatida, mas depois fiquei feliz por não ter ido. Se não fosse
pela doença, provavelmente não estaria aqui contando essa
história para vocês.
- Mas de qualquer forma está indo para lá agora - disse o
Antônio - não está com medo?
- Bem, com medo estou sim, mas agora é diferente.
- Por que é diferente?

15
- Porque ele foi com dez empregados e desarmados. Agora
somos mais de cinqüenta e temos seguranças armados até os
dentes. Além do mais eu trouxe a minha jurubeba para o caso
de encontrar o bicho.
- O que é a jurubeba?
- É essa aqui - disse o Raimundo mostrando e alisando a
coronha de uma espingarda calibre 12. - E ainda existe a
possibilidade de encontrarmos o alemão. Se ele estiver vivo,
deve estar cheio de madeiras. Aí vou até o final da expedição
com vocês e depois volto para ajudar o meu antigo patrão e
ganhar um bom dinheirinho extra.
- E o Aparí-Parú?
- Bem, se ele estiver vivo é que o bicho não está lá, né?
- E se acharmos só o crânio dele? Falou brincando a Letícia.
- Aí os nossos seguranças vão ter que ficar bem atentos, né?
Quando ele acabou de falar todos riram, mas notava-se que
eram risos nervosos. Afinal, todos sem exceção, estavam com
medo.
Aos poucos os participantes foram se recolhendo as suas
tendas para dormirem, expulsos pelo sono e pelos insetos que
estavam infernizando a vida deles. Afinal as tendas tinham os
mosquiteiros que os protegiam dos insetos alados.
Bem tarde da noite um urro rouco e forte fez com que os
cientistas saíssem de suas tendas apavorados e armados. Eles
estranharam que os nativos continuassem a dormir. O urro
repetiu-se mais duas vezes, o que aumentou o medo do
grupo.
O Antônio foi para a tenda dos seguranças.
- Acordem, berrou, desesperado.
- Calma, seu Antônio, esse urro é apenas de uma onça que
está caçando - falou o Raimundo.
- E ela não pode nos caçar?

16
- Caça não seu Antônio. Pode dormir sossegado. As onças
evitam os homens. Além de estar muito longe, está, com
certeza, caçando alguma anta ou porco do mato. Ela não virá
para cá, com certeza.
O Antônio voltou para o grupo de seus colegas e falou,
fazendo cara de entendido:
- Podem dormir. É apenas uma onça caçando antas ou porcos
do mato. Ela não vai nos incomodar.
- Todos voltaram para as suas barracas para dormir. Mas
nenhum deles guardou a sua arma. Todos eles, inclusive as
mulheres dormiram com suas armas bem à mão.

Capítulo 04

17
No meio da selva amazônica, onde nenhum homem branco
ainda tinha colocado os pés, entre o Rio das Mortes e o lugar
onde Antônio havia plotado em seu mapa como sendo o local
da Sementes, anoitecia.
Uma pantera, nome dado ao maior felino das Américas, uma
onça toda preta com mais de 200 quilos, preparava-se para a
sua caçada noturna. Tinha acabado de acordar e estava com
muita fome. Há mais de três dias que não tinha conseguido
caçar nada. Os animais de médios e grandes portes, como a
capivara e o porco de mato, tinham sentido a presença de seu
terrível predador e afastaram-se do local.
A pantera espreguiçou-se e pôs-se, calmamente a andar,
cheirando e olhando o chão à procura de odor ou rastros de
suas vítimas. Todos os seus sentidos estavam em alerta. A
máquina de matar estava preparada. Apesar do seu peso, não
produzia quase que nenhum som ao pisar.
De repente sentiu o cheiro característico de um índio.
Normalmente o felino desviava-se. Sabia que o encontro
poderia ser desastroso. Era o único ser que ela,
instintivamente, sabia que poderia ser perigoso. Mas, desta
vez, com a fome que estava, resolveu caçar o intruso.
Avançou rapidamente ao encontro do índio. Ele estava a
algumas centenas de metros.
A pantera, quando avistou o indígena parou. Começou a
pesquisar o local. A sua pretensa vítima estava deitada numa
rede, bem no centro de uma pequena clareira. Ao lado, no
chão uma pequena fogueira que servia, não só para esquentar
o índio, como para espantar algum animal mais afoito.
Normalmente a fera teria ido embora, mas ela estava com
muita fome. Assim, rodeou a clareira, de forma que o fogo

18
ficasse atrás do índio, deixando livre a sua investida. Parou e
olhando fixo para a sua presa ficou mais alguns minutos
observando, até ter a certeza que ele estava dormindo.
Há muito tempo atrás, quando ainda era jovem, tinha sentido
o gosto da carne humana. Mas quase morrera por isso.
Atacou e matou um jovem índio e quando estava comendo,
outro apareceu e lhe deu uma flechada. Com muitas dores
fugiu do local e durante duas semanas sofreu muito. Quase
morreu. Mas como era muito forte, acabou sobrevivendo.
Aprendeu, com isso, que não deveria enfrentar os índios,
apesar de ter gostado muito da carne, que era macia e doce.
Ainda com essa lembrança, deu outra volta na clareira
certificando-se, através do cheiro, que o índio estava sozinho.
Quando teve certeza, voltou para a posição inicial e retesou-
se. Num único salto pulou em cima do índio. Com o impacto
de seu peso a rede foi para o chão e o índio caiu para o lado.
Ainda atordoado, o índio tentou levantar-se, mas a pantera
pulou em seu pescoço e enfiou os caninos, que dilaceraram,
imediatamente, carnes, ossos e jugulares. O índio caiu morto,
com a fera em cima. Antes de comer a pantera urrou. Era o
seu grito de vitória. A selva ficou muda.
Calmamente o felino começou a satisfazer a sua fome. Nisso,
como que saindo do nada, um vulto enorme pulou em cima
da onça e, numa só dentada, comeu a metade do bicho. Em
outra dentada comeu o restante, cuspindo para fora o crânio
do animal, que rolou para onde estava o que sobrou do
cadáver do índio. Da mesma forma que tinha aparecido,
desapareceu. Só ficando no chão as marcas de suas pegadas,
enormes, como que a confirmar que ele existia.

19
O dia amanheceu chovendo muito. Parecia que o céu ia
desabar, de tanta água que caia. Para desespero do Antônio a
expedição não pôde sair. As barracas não foram
desmanchadas e todo o pessoal reuniu-se na grande barraca.
A conversa do dia, claro, era sobre os urros da onça na noite
passada. Ninguém declarou que tinha ficado com medo,
muito pelo contrário, alguns cientistas, inclusive, afirmaram
que tiveram vontade de ir caçar a onça, mas como chovia
muito desistiram.
Os nativos riam muito da suposta valentia dos cientistas, pois
tinham visto como eles ficaram com medo.
A chuva parecia que não ia acabar nunca. Era impressionante
a quantidade de água que caia. O barulho das gotas em cima
das barracas era ensurdecedor. O chão não mais conseguia
absorver tanta água e começava a empossar. Por sorte a
clareira em que eles estavam ficava num ponto um pouco
mais alto do que o restante da floresta que, a essa altura,
parecia um lago.
Os nativos começaram a ficar nervosos, o que chamou a
atenção do Antônio. Este se aproximou do Raimundo e
perguntou:
- O que está havendo, Raimundo? Estou notando que vocês
estão ficando impacientes.
- É que as águas estão subindo muito e se continuar assim os
insetos peçonhentos e as cobras virão procurar abrigo aqui,
que está seco. Temos que ficar muito atentos, principalmente
pelas cobras coral e jararaca. Mas não é só isso. Se a chuva
não abrandar nós vamos acabar perdendo todos os
equipamentos, pois tudo aqui será invadido pelas águas. Toda
a região vai virar um lago só.
O Antônio voltou aos cientistas e contou o que estava
acontecendo. Tomaram então uma decisão:

20
- Nós temos os botes infláveis. Vamos então colocar todos os
equipamentos neles.
- E as pessoas, perguntou a Letícia?
- Alguém tem uma idéia?
- Tenho sim, seu Antônio - respondeu o Raimundo.
Raimundo, apesar de ter nascido no Ceará, tinha ido com os
seus pais para Manaus, aos dois anos de idade, fugidos da
fome e da seca.
- Lá, pelo menos, não vamos morrer de sede - dizia o pai, que
se chamava Severino, para a sua mulher. Água é o que não
falta.
Raimundo serviu ao exército aos dezoito anos, tendo sido
designado para um batalhão especialista em guerrilhas na
selva. Aprendeu quase tudo sobre a sobrevivência na selva e,
quando deu baixa, foi trabalhar como guia e segurança do
Alemão.
Era um moreno alto e forte e muito inteligente. Fazia um
sucesso enorme com as mulheres e, quando não estava
trabalhando era certo encontrá-lo nos prostíbulos da cidade.
- Então, seu Raimundo, nos diga qual a sua idéia?
- Vamos cortar uns bambus e fazer uma jangada tendo como
base dois botes. Assim, colocamos os equipamentos na
jangada, cobrimos com as lonas das barracas e os outros
barcos, usamos para o pessoal. Molhados nós vamos ficar de
qualquer maneira, pelos menos assim não perderemos os
equipamentos.
- Ótima idéia, seu Raimundo - disse o Antônio.
E, assim foi feito. As águas subiram como o previsto pelos
nativos e as embarcações foram amarradas nas árvores.
A chuva durou todo o dia e parte da noite. O dia seguinte
amanheceu com um lindo sol, mas eles tiveram que continuar
nos barcos até as águas abaixarem. Estavam todos muito

21
cansados, molhados e com fome. Mas não podiam fazer nada
a não ser esperar. Só no fim da tarde é que a água abaixou,
mas o local era lama pura. Mesmo assim, completamente
sujos e enlameados, conseguiram fazer uma sopa de legumes.
Foi um manar dos deuses para eles. De noite, com a terra
mais seca, armaram de novo as barracas e foram dormir,
abençoando por estarem, de novo, em seus sacos de dormir,
sem a chuva em cima deles.
O dia seguinte veio com sol, novamente. Todo o grupo
acordou bem tarde. Mas como dormiram bem, estavam bem
humorados.
Tomaram o café da manhã, arrumaram tudo e, finalmente,
começaram a caminhada em direção a ilha do alemão. Em
fila indiana andaram seis horas seguidas até chegarem as
margens do igarapé que circundava a ilha do Alemão.
Montaram de novo os botes e empurrados pelos motores de
popa foram em direção à ilha. Quando atingiram terra firme,
abriram uma clareira com as moto-serras e montaram o novo
acampamento. As barracas foram erguidas e, num clima de
alto-astral, por estarem perto de seus objetivos, reuniram-se
na grande barraca à espera do jantar. Tinha sido um dia muito
produtivo. Os guias calcularam que tinham progredido, pelo
menos, uns 30 quilômetros.
A conversa estava animada e um dos carregadores pegou a
sua viola e começou a tocar uma música sertaneja. Todos que
conheciam a música cantaram juntos, fazendo coro. A noite
estava estrelada e com lua cheia e uma sensação gostosa
tomou conta do grupo. Parecia uma grande família. Depois
da janta, voltaram a conversar e, como sempre, Raimundo
começou uma nova história.
- Ainda bem que passamos de helicóptero pela região de
areias movediças.

22
- Elas são tão perigosas assim? - perguntou a bióloga.
- Muito, doutora. São extremamente traiçoeiras. Parece terra
firme, mas quando a gente pisa, afunda. Aí não tem mais
como sair. Se não tiver alguém por perto para socorrer, não
tem salvação, vai morrer da pior maneira possível, sendo
enterrado vivo.
- Não dá para sair mesmo?
- Dá não, doutora. E, quanto mais a gente se mexe, mais
rápido afunda. Eu mesmo vi um touro morrer em menos de
cinco minutos.
- Mas que terrível.
- Terrível mesmo. Deu muita pena e não pude fazer nada. O
animal pesava mais de 400 quilos e não tive forças para tirá-
lo de lá. No final, quando a cabeça ficou de fora e o bicho
vendo que ia morrer, chorou feito gente.
- É mesmo? Perguntou incrédula a bióloga. Ele chorava?
- Chorava, doutora. Feito gente. Pode acreditar. Não saiam
lágrimas, é verdade, mas o mugido que ele soltava era
igualzinho a um choro.
- Que triste.
- Muito. A doutora precisava ver o olhar que ele me lançou.
Fiquei dois dias sem dormir, pensando no triste fim do bicho.
- Bem, atalhou o Antônio, a conversa está muito boa, mas
amanhã vamos sair bem cedinho. Se tudo der certo,
deveremos encontrar a nossa cidade no fim do dia.
- Isso se o Aparí-Parú não nos pegar antes. Falou o
Raimundo.
- Você acredita mesmo nessa história do Aparí-Parú?
Perguntou o Antônio.
- Acredito sim, doutor.
- Isso é lenda, Raimundo.
- Não é não, doutor.

23
- Então nós vamos ver, Raimundo. Segundo você estamos
nas terras dele, né?
- Estamos sim, doutor e espero que a gente não dê de cara
com ele.
- Por que tanto medo Raimundo?
- Porque ninguém que o tenha visto sobreviveu para contar a
história.
- Mas Raimundo, esta expedição está bem armada. Nenhum
bicho vai nos meter medo. Se ele existir, o que não acredito,
nós vamos capturá-lo.
Raimundo não disse nada. Apenas olhou para a Letícia que,
instintivamente se aproximou dele.
Aos poucos, os expedicionários foram para as suas barracas.
Menos o Raimundo que armou a sua rede num dos cantos da
barraca central. Ele preferia dormir ao ar livre, em sua rede.
Principalmente, como agora, quando estava contrariado.
Achava que o Antônio não devia desacreditar dele.
- Bem, veremos - falou em voz alta antes de dormir.
De madrugada, quando todos já estavam dormindo, ouviu-se
um grito estridente. O grito parecia que tinha saído do meio
do acampamento. Imediatamente todos acordaram e saíram
de suas barracas para verem o que tinha acontecido. Todos os
homens, sem exceção, estavam com suas armas em mãos. A
confusão era geral. Ninguém se entendia.
- Calma, berrou o Raimundo, vamos nos organizar.
O grito de Raimundo teve um efeito imediato. Todos
pararam.
- O que aconteceu? - perguntou o Antônio para o Raimundo.
- Não sei doutor. Apenas ouvi o grito.
Nisso, um dos carregadores apontou para a barraca do
cozinheiro.
- Olha a barraca do Expedito.

24
O expedito era o cozinheiro da expedição. Ele era o único
que dormia sozinho. A barraca dele, que ficava numa das
extremidades do acampamento, estava destruída, toda
rasgada e no chão. De branca, estava toda pintada de
vermelho. Era sangue puro.
Os seguranças correram imediatamente para o local e
começaram a levantar os panos rasgados, em busca do
Expedito. Mas, aparentemente, não havia nada, só muito
sangue, até que um deles viu um crânio, todo ensangüentado
e ainda com o couro cabeludo e apenas um dos olhos,
esbugalhado.
- Vixi, meu Deus do céu!... Berrou o segurança, dando um
pulo para trás.
Todos se aproximaram e viram a cena: no meio da confusão
da barraca, panelas, mantimentos, panos rasgados, estava o
crânio do cozinheiro.
- É o Aparí-Parú, berrou o segurança em desespero. Vamos
todos morrer.
- Vê se acalma, Tião, berrou o Raimundo, segurando o
caboclo pelos ombros.
- É o Aparí-Parú, Raimundo. Ninguém vai sair vivo daqui,
falou o caboclo, começando a se mijar nas calças.
- Calma, Tião. Não vai acontecer nada disso. Nos todos
estamos bem armados e podemos enfrentar qualquer bicho
que apareça, inclusive, se for, o Aparí-Parú.
O caboclo começou a tremer convulsivamente.
Nisso a Letícia se aproximou e deu um calmante para o
caboclo.
- Ele agora vai se acalmar. Dei 20 miligramas de Lexotan
para ele. Daqui há uns vinte minutos, no máximo, ele estará
dormindo.
Virando-se para o Raimundo, perguntou;

25
- É o Aparí-Parú mesmo, Raimundo?
- Acho que é, Mary. Vamos ver se achamos alguma pegada
dele.
Quando viu que a Mary estava conversando com o
Raimundo, o Antônio imediatamente se acercou deles e
falou:
- Vamos procurar pelas pegadas, é o melhor que podemos
fazer agora.
Raimundo ia dizer para o Antônio que era exatamente isso
que estava falando com a Letícia, mas desistiu. Saiu de perto
dos dois, ligou a sua lanterna para poder ver melhor e
começou a rodear o local, onde antes, a barraca se erguia.
Não demorou muito.
- Doutora, venha cá, por favor, pediu.
A Letícia se aproximou, com o Antônio colado a ela.
- O que foi, Raimundo?
- Olha só. Se você estava em dúvida que esse bicho
realmente existia, poderá comprovar agora.
No chão, em frente ao Raimundo, estava uma monstruosa
pegada. Ela tinha uma circunferência de pelo menos meio
metro.
- É bem parecida com a de um jacaré gigantesco, disse o
Raimundo.
- Não pode ser, revidou a Letícia. Um jacaré que fizesse uma
pegada deste tamanho teria que ter, no mínimo,15 metros de
comprimento. Isso não existe.
- Doutora, esta floresta tem coisas que a senhora jamais
suspeitaria existir. Nós estamos praticamente em outro
mundo. Tudo aqui é possível.
- A Letícia, como bióloga, começou a estudar a pegada.
Pediu ao Raimundo que a acompanhasse e começou a

26
examinar o local, num raio de uns trinta metros. O Antônio
não largava os dois.
- Não disse, Raimundo, não é um jacaré.
- Como você pode ter tanta certeza?
- Olha só Raimundo, se fossem pegadas de um jacaré,
veríamos pegadas intercaladas, direita, esquerda, pois é um
animal que anda em quatro patas. Mas aqui, vemos duas, um
espaço e mais duas.
- O que isso quer dizer, Doutora?
- Que o animal, seja ele qual for, anda em duas pernas. E,
veja aqui, temos três dedos e mais um atrás e o de trás, fez
um sulco mais profundo na terra.
- E? - perguntou o Antônio?
- É um espigão. Não, não pode ser - exclamou aflita a
bióloga.
- O que foi? Perguntaram ao mesmo tempo os dois homens.
- Eu não sou uma paleontóloga, mas pelo que conheço, essa
pegada parece mais de um Tiranossauro Rex.
- O que é isso? Perguntou o Raimundo?
- É o mais terrível dinossauro que já viveu na terra.
- Mas isso foi na era Jurássica, há mais de 100 milhões de
anos atrás. Disse o Antônio.
- Isso mesmo, Antônio.
- Mas como um réptil desse poderia ter sobrevivido tanto
tempo? Perguntou o Antônio.
- Não poderia Antônio.
- Doutora, atalhou o Raimundo, aqui pode tudo.
- Vamos voltar para o acampamento - pediu a Letícia.
- Calma Letícia, estamos bem armados - disse o Raimundo.
- Raimundo, você não tem idéia do tamanho e da ferocidade
de um bicho desse. Nenhuma das armas que temos seria
suficiente para acabar com ele.

27
- Não posso acreditar nisso, Letícia. Nenhum bicho resistiria
a um tiro calibre doze. Mata até um elefante.
- Você apenas o feriria, Raimundo e não teria tempo de dar
outro tiro. Ele o comeria antes disso.
- O que podemos fazer então?
- Acho que de imediato, uma grande fogueira. Isso, com
certeza, não deixaria o animal se aproximar. Assim,
passamos a noite e, de manhã, vamos voltar o mais rápido
que pudermos. Temos que abortar essa expedição.
Os três, rapidamente voltaram ao acampamento.
Enquanto falavam, todos os membros da expedição se
juntaram para ouvir.
- Temos que abortar a expedição, Antônio.
- Tá maluca, Letícia? Já gastei mais de dez milhões de
dólares e cinco anos da minha vida preparando essa
expedição e não vai ser um bicho qualquer que vai me fazer
desistir dela.
- Mas não é um bicho qualquer, Antônio. É um Tiranossauro
Rex.
- De onde tirou essa idéia, menina? Falou o Antônio
começando a se exaltar. - Esse réptil não existe há mais de
milhões de anos.
- Eu também achava, Antônio.
- Letícia, olha bem o que você está dizendo - respondeu o
Antônio, alterando a voz - tem certeza absoluta disso?
- Bem, Antônio, eu sou apenas uma bióloga, não uma
paleontóloga especialista em dinossauros, mas pelo que vi,
acho que é. Mas, antes de você dar outro tiro ele o comeria.
- O que podemos fazer então?
- Acho que de imediato, uma grande fogueira. Isso, com
certeza, não deixaria o animal se aproximar. Assim,

28
passamos a noite e, de manhã, vamos voltar o mais rápido
que pudermos. Temos que abortar essa expedição.
- Pois é, Letícia, apenas por achar, você quer que eu jogue
fora todo o sonho de uma vida?
- Mas...
Antônio não deixou a Letícia terminar.
- Chega, Letícia. Deixe de sonhar a amedrontar os outros.
- Doutora, falou um dos carregadores, o seu Antônio aqui
tem toda a razão. Não é esse bicho que a senhora falou não. É
muito pior, é o Aparí-Parú.
Um murmúrio se elevou no acampamento. Os caboclos e os
índios começaram a falar alto, até que um deles, como se fora
um líder, disse.
- Seu Antônio, vamos voltar. Não dá para continuar tendo o
Aparí-Parú em nosso encalço. Eu não vou ficar aqui, de jeito
nenhum.
- Nem eu, repetiram como se fosse uma única voz, os outros.
- Calma, calma - pediu o Antônio. Eu dobro o pagamento de
vocês.
- Que adianta tanto dinheiro para morrer? Perguntou o líder.
Antônio começou a entrar em desespero.
-Tudo bem, eu triplico o pagamento.
Os nativos e índios voltaram a conversar.
- Tá certo, seu Antônio - voltou a falar o líder - mas se o
Aparí-Parú voltar a atacar, nós vamos embora e o senhor nos
paga triplicado.
- Antônio pensou um momento e respondeu:
Tudo bem está certo. Eu pago.
Virando para o Raimundo, perguntou:
- O que temos que fazer para nos livrar desse bicho?
- Bem, segundo a Doutora, o melhor é fazer uma grande
fogueira.

29
Não vamos fazer uma só, não. Vamos fazer quatro grandes
fogueiras, uma em cada canto do acampamento. E manhã,
quando seguirmos viagem, vamos caminhar bem juntos e
com as armas preparadas. Ordenou o Antônio.
E assim foi feito. Quatro grandes fogueiras foram acessas. O
Raimundo deixou um vigia em cada uma delas e todos foram
para suas camas. Mas, naquela noite, ninguém conseguiu
dormir.
Ao primeiro raio de Sol, todos já estavam prontos. Ninguém
mudou de roupa para dormir e, para todos foi um alívio
quando o dia clareou a mata. O ânimo, com a claridade,
melhorou bastante e todos ajudaram na feitura do café da
manhã. A grande mesa foi posta e os membros da expedição
começaram o desjejum. Nisso, a mata começou a se mexer,
como se estivesse viva e um grande número de pássaros
começou a revoar, como se estivessem loucos. Os homens,
imediatamente pegaram e engatilharam as suas armas e todos
ficaram de prontidão.
- É o Aparí-Parú que vem nos pegar, berrou um índio. O
acampamento começou a entrar em pânico e o Raimundo
teve que tomar uma atitude rápida, antes que todos
começassem a correr.
- O primeiro que se mexer, eu mato - falou. Vamos nos juntar
e esperar. Gritou.
O grupo todo se juntou e ficou olhando, quase que como
hipnotizado, para o local que a mata se mexia. Nesse ínterim,
o acampamento foi invadido por sapos, cobras e inúmeros
insetos, como se todos estivessem enlouquecidos.
Todas as pessoas se juntaram ainda mais. De repente,
perpendicularmente ao acampamento, uma coisa preta,
rasteira, começou a aparecer e aumentar de volume. Ao
mesmo tempo, um barulho indefinido, como se fossem

30
gravetos quebrando ao fogo, apareceu. A coisa preta
aumentou, parecendo um rio de piche, escorrendo por dentro
da floresta. Quando chegou mais perto, todos viram que eram
formigas, milhões de formigas, numa coluna de uns 50
metros de largura, que iam comendo tudo que encontravam
pela frente. Subiam pelas árvores e em minutos as
desfolhavam, só deixando intactos os galhos e troncos, como
que criando uma floresta fantasma.
- O que é isso Letícia? Perguntou o Antônio.
- Que maravilha, Antônio, eu nunca em minha vida pensei
que fosse presenciar uma coisa dessas.
- Mas o que é isso? Voltou a perguntar o Antônio.
- É a “army ants”, falou em inglês.
- Fale em português, pediu o Raimundo.
- São as formigas de correição, do gênero “Eciton burchelli”
que ocorre do Brasil ao México. Elas andam aos milhões, em
colunas de quilômetros, destruindo tudo o que encontram
pela frente. Esta colônia deve ter mais de cinco milhões de
operárias. Nada as detém. Ainda bem que não veio em nossa
direção, senão teríamos que abandonar tudo e sair correndo.
Que maravilha - Exclamou.
- Maravilha? Disse o Antônio - essa exclamação só poderia
ter saído mesmo da boca de uma bióloga.
A coluna levou mais de cinco horas para passar, todos
estavam estupefatos com o ocorrido. Até os índios,
habituados à selva.
Quando, finalmente, as formigas passaram, todos se deram
conta que estavam felizes. Felizes por não ter sido o Aparí-
Parú.
- Vamos embora, falou o Antônio. Essas formigas nos
prestaram um favor.
- Favor como? Perguntou a Mary.

31
- Ora, disse matreiramente o Antônio. Elas foram na direção
que temos que tomar e nos fizeram o favor de construir uma
estrada para nós.
Todos riram muito da observação do chefe da expedição,
pois era a pura verdade. As formigas limparam o mato e a
caminhada seria muito mais tranqüila sem a vegetação.
- Apanhem os barcos - ordenou o Raimundo – vamos seguir
caminho.
Enquanto os carregadores foram apanhar os barcos que
tinham ficado na margem da ilha, os demais começaram a
arrumar as tralhas da expedição.
Meia hora depois chegaram os carregadores.
- Mas já? Perguntou o Raimundo. Cadê os barcos?
- Foram comidos pelas formigas.
- Como assim?
- Quando chegamos lá, só tinham trapos. Elas comeram tudo
que não era de plástico ou de metal.
- Sim, mas os barcos eram de plástico.
- Mas as costuras de fibras vegetais.
Raimundo foi, imediatamente, contar o acontecido ao
Antônio. Ele em vez de ficar aborrecido, ficou alegre.
- Agora, disse, ninguém mais pode abandonar a expedição.
Um desânimo abateu a expedição. Todos eles sabiam que,
agora, não tinham mais volta. O jeito era seguir em frente.
O Antônio tinha dado uma ordem ao Raimundo:
- Raimundo, você sabe o que representa para mim o sucesso
desta expedição. Não podemos voltar ao menor desânimo.
- Mas, não podemos voltar mais, doutor.
- Podemos sim, Raimundo. Temos três rádios que podem
pedir socorro. E os GPS podem nos dar a localização exata
de onde estamos. E, em pouco tempo os helicópteros podem
chegar aqui. Assim, tenho uma missão especial para você.

32
- Qual, Doutor?
- Eu quero que você dê cabo dos três rádios.
- Mas, doutor, assim caso aconteça alguma coisa, ninguém
vai nos achar.
- Mas é isso mesmo que quero, Raimundo. Eu quero que
ninguém nos ache.
- Mas o que você está achando que vai acontecer?
- Os carregadores e os seguranças estão com muito medo
desse bicho. Se ele aparecer de novo, vai haver uma
insurreição e vão nos obrigar a pedir socorro. Eles vão
preferir fugir a enfrentar esse tal de Aparí-Parú.
- Mas se for mesmo esse tal do Tiranossauro Rex, como disse
a doutora?
- Ela está morrendo de medo Raimundo. E não sabe o que
está dizendo. Deve ser um grande jacaré, nada mais. E jacaré,
a gente mata a tiros. Além do mais, quanto mais nos
afastarmos daqui, mais longe ficaremos desse bicho que deve
viver no alagado que passamos.
- Mas essa região é cheia de rios e alagados.
- Você está com medo Raimundo?
- Tou sim, doutor
- Mas vai fazer o que pedi?
O Raimundo ficou em silêncio.
- Bem Raimundo, para aumentar a sua valentia, lhe dou um
milhão de reais quando voltarmos. Você ficará rico. Muito
rico.
Raimundo quando ouviu a cifra, não pestanejou:
- Então está feito, Doutor. Pode contar comigo.

33
Capítulo 05

Antônio reuniu todo o pessoal, na grande barraca:


- Tenho uma notícia importante para lhes dar: estamos sem
nenhuma comunicação com a nossa base.
- E os rádios? Perguntou aflita a Letícia.
- Pois é justamente isso que estou falando. Os aparelhos
sumiram. Já procuramos por toda à parte e não encontramos
nem sombra deles.
- Mas quem teria interesse em colocar a expedição sem
comunicação com a base? Perguntou a Letícia.
- Eu não sei, respondeu o Antônio.
- Pois eu sei, Antônio. A única pessoa que teria interesse no
sumiço dos rádios é você.- Respondeu a Letícia, nervosa e
muito zangada.
- Mas por que eu faria isso, Letícia?
- Muito simples Antônio. Você está obcecado com a idéia de
achar essa cidade perdida e, desta forma, aconteça o que
acontecer, não teremos outra alternativa a não ser seguir em
frente.
- Você está fazendo uma acusação muito séria Letícia. Afinal
eu estou correndo o mesmo risco que todos nós.
- Mas você é o único obcecado. Você faria qualquer coisa
para continuar a expedição.

34
- Você tem razão, em parte. Eu faria quase que qualquer
coisa. Mas, também não poria a minha vida em risco. Tenho
família, como todos nós e não pretendo morrer tão cedo. A
perda dos rádios e dos barcos nos coloca numa situação
crítica.
- Muito mais crítica do que você pensa, Antônio. Se o tal do
Aparí-Paru for, realmente, o Tiranossauro Rex, não teremos a
mínima chance de continuarmos vivo.
- Pense bem, Letícia: o Tiranossauro Rex foi à criatura mais
selvagem que a natureza criou. Ele foi o mais perfeito
predador que já viveu na Terra. Você concorda comigo?
- Claro que concordo.
- Então você acha que se fosse esse o bicho que matou o
nosso cozinheiro, ele pararia aí, ou teria atacado a todos nós?
- Realmente ele não pararia. Teria nos comido a todos.
- Então Letícia? Esse bicho deve ser um grande jacaré.
- Não é um jacaré não, Antônio. O jacaré não tem o quarto
dedo em forma de espigão.
- E que bicho temos na Terra com o espigão?
- As aves predadoras, como as águias e os gaviões.
- Então Letícia, você acha que poderia ser uma ave
gigantesca?
- Claro que não Antônio. O simples bater de asas de uma ave
com 15 metros seria ouvida num raio de vários quilômetros.
- E nós não ouvimos nada, não foi?
- Foi.
- Então só pode ser um jacaré gigante, que não conhecemos e
tem um espigão no quarto dedo. Uma espécie desconhecida.
- Não é não Antônio. Por que o jacaré andaria em duas patas?
Não faz sentido. Anatomicamente seria impossível.
- Letícia estamos, provavelmente, diante de uma nova
espécie.

35
- Ou então de frente com uma espécie que já viveu há mais
de 100 milhões de anos.
- Lá vem você novamente com o seu dinossauro. Lembre-se
que você já deu essa resposta quando afirmou que um T.Rex
não teria parado só no cozinheiro.
- Quanto a isso você tem razão.
- Então, Letícia, acalme-se. Não estamos diante de nenhum
dinossauro. Pode ser um réptil, sim, o mais provável. Mas um
bicho da nossa época, que podemos matar tranqüilamente
com um calibre 12.
- Espero que sim. Respondeu Letícia.
A discussão dos dois foi acompanhada atentamente por
todos da expedição. Como, aparentemente, os argumentos do
Antônio tinham sido mais convincentes, todos se acalmaram.
- Bem, voltou a falar o Antônio, as formigas nos fizeram um
grande favor. Vamos dormir cedo, pois amanhã de manhã,
logo quando o sol raiar, vamos seguir em direção a Semente.
A primeira providência dos carregadores foi a de arrumar as
quatro grandes fogueiras que iriam proteger o acampamento
durante a noite. Só depois disso é que eles sossegaram.
Assim que começou a escurecer as fogueiras foram acessas.
Depois do jantar, todo o grupo continuou na barraca grande a
conversar. Ninguém saíra do seu lugar. A impressão que se
tinha é que todos estavam com medo de ir para as suas
barracas.
Eles sentiam-se mais seguros juntos. Mas o sono começou a
chegar e, aos poucos, em grupos, os expedicionários foram
para suas barracas.
Eram três horas da madrugada. O bicho aproximou-se do
acampamento. Parou a uns 20 metros e olhou para o fogo que
crepitava nas quatro grandes fogueiras. Como todo animal,
tinha um medo instintivo do fogo. Levantou o grande focinho

36
e expirou o ar. Sentiu o cheiro dos humanos. O que lhe
despertou, mais ainda, a sua fome. Chegou mais perto e foi
para o lado de uma das fogueiras que estava quase que
apagada. Bem devagar, tomando o cuidado em não fazer
nenhum barulho, acercou-se da barraca que estava mais longe
do fogo. Absorveu, novamente o ar. A sua visão era muito
fraca, mas o olfato era admirável. Reconheceu o cheiro
diferente de seis humanos. Mas novamente ficou indeciso
com o cheiro do invólucro que protegia os homens. Com a
sua língua em ponta de vê, experimentou a lona da barraca. O
seu cérebro não conseguia a resposta. Não tinha nada na
floresta que se comparava a aquilo. Mas sabia, por
experiência, quando comeu o cozinheiro, que não lhe
ofereceria a mínima resistência.
Deu uma nova fungada. Pelo cheiro localizou os seis corpos
que dormiam.
Wanderlei, um dos carregadores, era um crioulo de quase
dois metros de altura. Durante uma grande parte de sua vida
fora estivador do porto de Manaus. Por isso era muito forte.
Os seus músculos cresceram a custa de muito peso que
levava nas costas, descarregando os grandes navios. Ele, com
medo, não tinha ainda conseguido dormir. Por mais que
tentasse não deixa de pensar no Aparí-Parú. Estava chateado
consigo mesmo, pois era muito valente. No entanto o medo
daquele bicho era mais forte que ele. Pela milésima vez,
mudou de posição em seu saco de dormir. De repente ouviu
um barulho esquisito. Era como o fungar de um porco, só que
muito mais alto. Imediatamente o seu cérebro mandou para o
sangue uma dose enorme de adrenalina e o seu coração,
respondendo a química, disparou.
O Wanderlei, quase sem poder respirar, todo arrepiado, olhou
para a direção do barulho. Viu uma grande sombra projetada

37
pela luz da fogueira. Instintivamente a sua mão procurou pela
espingarda que tinha deixado ao seu lado. Achou-a e levando
ao seu peito, armou-a. Nisso, a parede da barraca mexeu-se
como se fora chicoteada por fora. O susto que levou foi tão
grande, que deixou a espingarda cair no chão. Tentou
apanhá-la de volta. Foi o último movimento que fez em sua
vida.
O bicho, numa única bocada, engoliu o Wanderlei. Ao
mesmo tempo fugiu do local, cuspindo em seguida o crânio
do crioulo.
A barraca, toda rasgada, desabou em cima dos outros
ocupantes que começaram a berrar de terror. Todo o
acampamento acordou. Alguns, sem saberem o que fazer,
começaram a atirar em todas as direções. A situação caótica
durou uns cinco minutos.
A cidade era toda de pedras. As paredes formadas por
enormes paralelepípedos de granito, que a deixava meio
azulada e o chão de um mármore verde da cor da selva. Só
que as paredes, e os tetos, formados por pedras justapostas,
estavam revestidos de eras, de forma tal que, só muito de
perto é que se poderia ver que era uma construção. De longe,
mesmo aos olhos mais apurados, a cidade, que na realidade
era só um prédio, estava totalmente camuflada. Ela se
compunha tanto à vegetação que um avião, ou mesmo um
helicóptero, que passasse por cima dela, não a veria.
Ela só tinha dois andares e a sua altura não chegava ao topo
das árvores que a rodeavam. Uma única e grande entrada, em
arco romano, mas sem porta para fechá-la, dominava a sua
frente. No térreo não haviam janelas, só no segundo andar e
muitas. Eram tantas que mais pareciam flecheiras de grandes
castelos. Mas eram apenas vãos livres, sem nada que as
fechassem.

38
Quem entrasse, veria um enorme salão, ocupando toda a
extensão da construção e duas escadas que davam para o
segundo andar. Cada escada ficava ao lado oposto da outra.
No meio do salão, uma grande pedra redonda, como se fosse
um altar, com um diâmetro de 5 metros, num tom azul
marinho, brilhante, mais parecendo uma grande safira. Em
volta, seis cadeiras de pedras brancas, opacas. Apesar de não
ter nenhuma abertura para a luz entrar, o salão estava claro
como se estivesse ao ar livre, só que a luz era azul clara,
parecendo à iluminação de lâmpadas fosforescentes. O
silêncio era profundo.
Um vulto pequeno, vestindo uma túnica azul marinho, desceu
por uma das escadas e sentou-se em uma das cadeiras.
Imediatamente a cadeira acendeu-se numa brilhante cor
amarela. Um amarelo puro e totalmente transparente, como
um vidro iluminado, deixando transparecer a túnica do
ocupante.
O vulto era um ser franzinho, com braços e pernas muito
finos e uma cabeça desproporcionalmente grande em relação
ao seu corpo. As orelhas eram pequenas, assim como a sua
boca e os olhos pretos e rasgados como se fossem de um
japonês. Não havia nenhum pêlo. Nem cabelos nem
sobrancelhas. Também não tinha nada que determinasse o
sexo.
O ser, assim que se sentou, colocou as duas mãos,
espalmadas, sobre a enorme pedra e abaixou a cabeça.
Minutos depois, outro ser desceu as escadas, com a mesma
vestimenta e sentou-se na cadeira à sua frente. A cadeira
iluminou-se, da mesma forma, só que num tom verde
esmeralda. Ele ficou na mesma posição que o outro.
- Chamou-me Aba Epyak? Perguntou. Só que sem falar. Por
telepatia.

39
- Chamei, Aba Ibi. Estou muito preocupado.
Eles eram dois dos seis guardiões da Semente. Há muitos
séculos atrás, o universo tinha duas raças que predominavam
sobre todas as outras. Os Guaranis e os Zorkos. Ambas de
formas humanas e com uma tecnologia muito acima da atual
raça terrestre. Cada uma dominava uma parte do universo
conhecido e viviam numa paz extremamente nervosa, visto
que os Zorkos eram seres beligerantes. Um dia, uma princesa
Zorkoiana apaixonou-se perdidamente por um príncipe
Guaraná. O Imperador guaraná viu o fato como uma
oportunidade única de unir os dois povos e obrigou o seu
filho, que se chamava Kunumim, a se casar com a princesa
Zorkoiana.
Mas Kunumim estava apaixonado pela Yaci, filha de um
governador de um dos planetas sobre o domínio dos
Guaranis. A muito custo, depois de pedidos incessantes de
seu pai, lembrando-lhe que um príncipe tinha deveres com o
seu povo, acima dos seus pessoais, concordou em se casar
com a princesa.
No dia do casamento, no planeta sede dos guaranis, que se
chamava Tupi, o príncipe na hora de dizer o sim, olhou para
a Yaci e não teve coragem. Disse não.
O Imperador Zokorniano sentiu-se profundamente ofendido e
chegando em seu planeta declarou guerra aos guaranis.
A guerra durou mais de duzentos anos, tal o equilíbrio que
existia entre os dois povos. Mas, aos poucos, os
Zorkonianos foram vencendo, graças a uma estratégia pouco
convencional de um dos seus generais: num dos planetas
mais distantes e primitivos do domínio Zorkoniano, existia
um inseto, chamado de Aparí-Parú, extremamente voraz, que
crescia até 6 metros de altura e se reproduzia de uma forma
incrivelmente acelerada. Um único inseto, hermafrodita,

40
colocava mais de mil larvas que se desenvolviam para
adultos em apenas duas semanas, quando se tornavam em
condições de se reproduzir novamente.
Esses insetos foram introduzidos pelos Zorkonianos nos
planetas da nação guaraná e, em pouco tempo, dizimaram as
populações. Os guaranis, desesperados tentaram, em vão,
controlar a praga, mas não conseguiram. Nenhum defensivo
conseguiu ser desenvolvido que acabasse com os Aparí-Parú,
sem acabar também com os guaranis.
Como última alternativa, embarcaram em suas naves para
habitarem outros planetas, mas as larvas existentes em seus
meios de transporte, acabavam na maioria das vezes com as
tripulações. Pouquíssimas naves conseguiram chegar nos
planetas virgens. Mesmo assim, quando conseguiam, a praga
acabava, rapidamente, com as populações.
Os Zorkonianos, por sua vez, agora com grande vantagem
espacial, verificavam os mundos onde os guaranis tentavam
sobreviver - através do radar que localizava metais - e
bombardeavam os planetas. Um por um, eles foram
acabando com os guaranis.
Somente num planeta os guaranis conseguiram sobreviver: a
Terra. Por dois motivos. O primeiro é que os guaranis
abandonaram todos os metais e se adentraram na selva. O
segundo é que na terra existia um inseto, a formiga, que
comia todas as larvas que o Aparí-Parú produzia. Por mais
que colocasse. As larvas eram adocicadas e, por esse motivo,
facilmente localizadas pelas formigas. Assim, o Aparí-Parú
foi controlado nesse planeta.
A cidade primitiva dos guaranis, erguida no meio da selva
amazônica, não foi totalmente abandonada. Ficaram seis
sábios, como guardiões da cultura guaraná. Eram três homens
e três mulheres. A cidade, construída propositadamente de

41
pedra, ocultava dentro dela os instrumentos de metal dos
guaranis. Assim, geração após geração, eles continuaram se
desenvolvendo e se clonando, aperfeiçoando cada vez mais a
sua raça. O DNA responsável pelo desenvolvimento do
cérebro foi identificado e utilizado nas clonagens, obtendo-se
assim gerações cada vez mais inteligentes. O
desenvolvimento foi tão grande que, em determinado
momento, eles se tornaram mutantes, conseguindo apenas
pelo pensamento, o domínio físico. Desta forma, conseguiam
mover e transformar objetos, comunicarem-se através da
telepatia e outros poderes inimagináveis aos terrestres.
Decidiram então que cada guardião, além dos poderes
básicos, se especializasse em determinados assuntos, com o
objetivo final de derrotarem os Zorkonianos e poderem
voltar, enfim, ao seu planeta original.
Mas, precisavam de tempo. Por isso, através da meditação
pura, continuavam os desenvolvimentos de seus poderes.
Já que estavam numa ilha, cercada por igarapés, deixaram
alguns Aparí-Parú para proteger a cidade dos terrestres.
Fizeram um estoque das larvas e substituíam os grandes
insetos quando morriam, por outros, controlando dessa forma
a população dos bichos.
- O que o aflige, Aba Epyak?
Aba Epyak, na língua guaraná, significava o homem que vê.
Era o poder maior dele: conseguia ver tudo o que acontecia
num raio de 100 quilômetros ou, se fosse o caso, numa
pessoa que conhecesse, estivesse onde estivesse.
O Aba Ibi era o protetor da terra. Em sua língua significava o
homem da terra. Ele tinha poderes sobre todos os seres vivos
da terra.
- Uma expedição de terráqueos está vindo em nossa direção.
No momento eles estão à apenas 10 quilômetros da cidade.

42
- E o Aparí-Parú?
- Já os encontrou e fez duas vítimas.
- Espero que consiga afugentá-los.
- Acho que dessa vez vai ser mais difícil. Eles estão bem
armados e são pessoas de um bom nível intelectual. Creio
que acharão um meio de passarem pelo Aparí-Parú.
- Você não acha que chegou a hora de termos os primeiros
contatos com os terráqueos?
- Tenho minhas dúvidas. Eles ainda estão muito primitivos.
- Mas temos que tomar uma posição. Caso eles passem pelos
Aparí-Parú, com certeza chegarão a Semente.
- Vamos convocar o conselho.
- Vamos então.
Dois minutos depois os outros membros começaram a descer
as escadas. Todos eles com a mesma túnica.
Cada um sentou em sua cadeira. Dependendo do poder deles
as cadeiras acendiam uma cor. Quando todos estavam
sentados, cada cadeira tinha uma cor e cada cor representava
um poder específico.
Eram as cores do arco-íris, resultado da refração da luz
branca do Sol. As cores eram o violeta, o azul, o vermelho, o
laranja, o amarelo e o verde.
A grande pedra do centro, que originalmente era azul,
transformou-se numa intensa luz branca que era o resultado
da mistura de todas as cores.

43
Capítulo 06

- Calma, calma, berrava o Raimundo. Assim vamos nos


matar a todos.
O acampamento era um pandemônio. Dois dos carregadores
morreram pelas armas disparadas a esmo, por seus
companheiros. Por fim, a balburdia acalmou.
- Alguém viu o bicho? Perguntou a Letícia.
- Eu vi e consegui atirar nele, falou um dos seguranças.
- Como ele era? Perguntou aflita a bióloga.
- Era horrível.
- Eu posso imaginar. Mas, acalme-se e tente descrever-me.
- Ele era imenso e tinha a cara de uma mosca.
- Uma mosca?
- Isso mesmo. Uma mosca no corpo de um lagarto. E tinha
uma língua enorme.
- Você tem certeza?
- Tenho sim senhora. Eu atirei nele, duas vezes.
- E acertou?
- Acertei sim senhora. Mas o bicho não morreu e foi embora
com o Wanderlei em sua boca.
- Então vamos ver se o encontramos ferido ou mesmo morto.
- Eu não vou agora, não. Só quando amanhecer.
- Então está bem. Vamos esperar o dia amanhecer e quando
ficar claro, vamos atrás do bicho.
O grupo ficou junto, com as armas carregadas esperando o
sol nascer. A primeira providência foi a de enterrar os

44
companheiros mortos pelos disparos feitos pelos seus
colegas.
Depois do enterro, um grupo ficou limpando e organizando o
acampamento, que tinha sido quase que totalmente destruído,
enquanto o outro, liderado pelo Antônio, mais o Raimundo e
a Letícia, foi procurar o Aparí-Parú.
- Em que direção ele foi? Perguntou o Raimundo ao
segurança que tinha atirado.
- Nesta direção, apontou com o dedo.
Com as armas engatilhadas foram na direção apontada. A
selva era fechada com capins altos e cheia de cipós e outra
vegetações que dificultava muito o andar. Depois de andarem
uns dez metros, a Letícia encontrou um líquido branco, opaco
e viscoso em uma planta.
- Olha isso aqui! Falou para o Antônio.
- Mas que gosma, parece vômito. Será que o bicho vomitou?
Perguntou o Antônio.
O Raimundo chegou perto e examinou detalhadamente o
líquido.
- E como fede, disse ele. Parece sangue de barata.
- Isso Raimundo, disse a Letícia, acho que você acertou. Isso
não é vômito. É sangue de inseto. Acho que o nosso bicho
não é um réptil é um inseto.
- Olha outro aqui, exclamou o Antônio. Seja o que for está
muito ferido mesmo.
- Vamos seguir o sangue. Quem sabe vamos encontrá-lo?
Falou o Raimundo.
Pista atrás de pista o grupo foi avançando.
- Aqui, seu Antônio. Matei o Aparí-Parú. Berrou o André,
que era quem tinha atirado no bicho.
Todos, rapidamente, se dirigiram ao local.

45
- Meu Deus, exclamou a Letícia. Nunca vi coisa igual. Parece
um Louva-Deus com rabo.
Realmente. O Aparí-Parú era enorme. Tinha uma altura de
uns 6 metros. O corpo era totalmente verde e a pele parecida
com plástico. A cara era igual à de um Louva-Deus, com dois
grandes e salientes olhos. Os membros dianteiros eram
pequenos, em relação ao corpo, com duas garras, em vez de
dedos, e os traseiros eram compridos e fortes. O pescoço era
fino e longo, desproporcional, também, ao corpo do bicho. O
rabo era pequeno e grosso.
- É mesmo um inseto, Letícia. Exclamou o Antônio.
O bicho estava deitado, com dois enormes furos no corpo,
causados pelos tiros do André, de onde saia o sangue típico
dos insetos.
- André, pediu a Letícia, volte, por favor, ao acampamento e
apanhe uma máquina fotográfica.
O rapaz foi e voltou num pé só, trazendo com ele todos os
membros da expedição, mortos de curiosidade, de enfim
conhecerem o famoso Aparí-Parú.
O André chegou perto do Antônio e lhe fez um pedido:
- Seu Antônio, por favor, deixe-me fotografar junto com o
bicho. Eu quero provar a todo mundo que matei o Aparí-
Parú.
O bicho foi fotografado pela Letícia de todos os ângulos
possíveis e imaginários e depois, sob o riso de todos o André
fez a pose clássica do caçador, de cócoras, com a espingarda
sobre o ombro e com o bicho por trás.
- Essas fotos vão dar o que falar quando voltarmos, disse a
Letícia.
- Com certeza, confirmou o Antônio.

46
O grupo, de moral alto, voltou ao acampamento. Todos
estavam felizes e sorridentes. Afinal, o bicho que os
aterrorizavam estava morto.
Rapidamente arrumaram as suas tralhas e foram, novamente
em direção ao seu objetivo. Escolheram o caminho das
formigas e avançaram vários quilômetros, facilitados pela
limpeza dos insetos. Depois de dez horas de caminhada
chegaram em frente à Semente. O grupo parou estupefato.
- Não acredito, berrou o Antônio. Chegamos ao nosso
objetivo. Descobrimos a Semente. Sinto-me como se fosse o
Pedro Álvares Cabral descobrindo o Brasil, disse rindo e
chorando ao mesmo tempo.
Ninguém conseguia dar mais um passo. Todos, como que
paralisados, ficaram de boca aberta olhando para a
construção.
- Mas é apenas um prédio, falou a Letícia.
- O que você queria encontrar, respondeu o Antônio, Nova
Iorque?
- Não Antônio, desculpe-me. Na minha imaginação eu
achava que iria encontrar uma cidadezinha e não um prédio.
Mas é uma descoberta sensacional. Estou tão emocionada
como você.
- Mas tem uma coisa esquisita, falou o Raimundo. Não sei se
vocês repararam.
- O que foi? Perguntou o Antônio.
- O silêncio. Não escuto mais o barulho da selva.
- É mesmo, disse o Antônio, não escuto passarinhos, o gritos
dos macacos, nada. Parece que estamos numa câmara de
som.
- Vamos lá, disse a Letícia. Vamos ver o que achamos.
- Não Letícia, daqui a pouco vai escurecer. Acho melhor,
apesar da minha enorme curiosidade, acamparmos e

47
esperarmos o amanhecer. Vai ser mais prudente. Na realidade
não sabemos o que vamos encontrar e, seja o que for, prefiro
saber na clara luz do dia.
O novo acampamento foi então montado, o jantar servido e,
como sempre, o grupo ficou na barraca grande contando
histórias. Só que o ambiente era o melhor possível. Além de
terem matado o Aparí-Parú, tinham encontrado a cidade
procurada.
Raimundo então pediu a palavra:
- Vocês conhecem um bicho chamado...
Letícia não deixou ele continuar.
- Chega seu Raimundo, com esses seus bichos. Já não basta o
Aparí-Parú? Não agüento mais...
Todos riram muito. O André, eleito o herói do grupo por ter
matado o bicho, pegou a sua viola e começou a tocar as
músicas sertanejas, sendo acompanhado por todos que
sabiam as letras.
No dia seguinte, a ansiedade de todos era tão grande, que mal
o sol raiou todos já estavam de pé e prontos para a aventura
da exploração do prédio. O café da manhã foi praticamente
engolido por todos, pois ninguém queria se atrasar na entrada
da cidade.
Mas, além da ansiedade, havia uma espécie de medo no
semblante de cada um. A expectativa era grande. Estavam a
ponto de realizaram o descobrimento do século 21, como
afirmava o Antônio e, quem sabe, conhecerem técnicas e
ciências inimagináveis para a raça humana.
Com o Antônio na frente, tendo a Letícia ao seu lado, o
grupo dirigiu-se à cidade. Mas nem tinham dado dez passos e
pararam. Do grande portal da cidade apareceu um pequeno
ser, vestido de uma túnica azul marinho.

48
Todos ficaram imobilizados com a visão. Ninguém se mexia
ou falava. O silêncio era total. Os carregadores e os
seguranças, que eram as pessoas mais simplórias da
expedição, se ajoelharam.
De repente, outros seres apareceram. Todos vestidos da
mesma forma. Num total de seis.
O que pareceu primeiro falou:
- Bem vindos amigos e em paz. Já estávamos lhes esperando.
Mas, todos se deram conta que o estranho ser não falava. Eles
ouviram e compreenderam através do cérebro.
- Quem são vocês, perguntou o Antônio?
- Somos os últimos guaranis. Os sobreviventes. Mas, vamos
entrar.
Antônio chamou os cinco cientistas da expedição e mais os
dois seguranças.
- Só os cientistas, falou o ser. Vocês não vão precisar dos
seguranças. Aliás, não adiantaria nada. Além do mais o nosso
objetivo é a paz. É o nosso primeiro encontro.
Os cientistas entraram dentro do prédio e se depararam com a
grande pedra azul. Rodeada, agora, por doze cadeiras. Os
seres sentaram de um lado e os cientistas do outro.
Imediatamente cada cadeira tomou a cor de cada ser e as
cadeiras dos cientistas ficaram brancas.
Os corações dos cientistas batiam aceleradamente. A
expectativa era muito grande.
- Quem são vocês? Repetiu o Antônio.
- Como já dissemos, somos os remanescentes da raça
Guarani.
- Os índios?
- Não Antônio. Ou melhor, dizendo sim. Só que os índios são
os representantes da nossa raça que involuíram.
- Como você sabe o meu nome? Perguntou o Antônio.

49
- Nós lemos os pensamentos de vocês.
- Vocês são, então, telepatas?
- Somos Antônio. Adquirimos este dom há uns quinhentos
anos.
- Mas, por favor, pediu o Antônio, continue a sua história.
O ser contou aos cientistas toda a saga de sua raça e a luta
mortal contra os Zorkos.
- Agora entendo, disse o Antônio. Mas precisamos nos
apresentar.
- Nós já conhecemos vocês. Mas vocês precisam nos
conhecer. O meu nome é Aba Epyak. Em nossa língua quer
dizer o homem que vê. Eu tenho esse nome, pois tenho a
faculdade de ver o que está acontecendo num raio de 100
quilômetros ou então, se a pessoa for minha conhecida, onde
ela estiver, não importando a distância. Desta forma, tenho
acompanhado a expedição de vocês desde que desceram dos
helicópteros em nossa selva.
- Vocês viram então o ataque do Aparí-Parú?
- Eu vi.
- E não nos ajudaram?
- Não tínhamos certeza se era a hora certa de mantermos o
primeiro contato. Desculpe o que vamos dizer, mas vocês
ainda são muito primitivos e poderíamos ter problemas. A
nossa aparição, com certeza, vai causar muitos distúrbios em
sua sociedade. A partir de agora, tudo vai mudar,
inexoravelmente. Espero que para melhor. Vocês vão ter que
rever toda a estrutura social de sua raça.
Assim, decidimos deixar o destino resolver. E a chegada de
vocês a Semente quer dizer que chegou a hora. Nós, algum
dia, vamos voltar ao nosso planeta natal e esperamos que,
quando chegar esse dia, tenhamos contribuído para o
desenvolvimento de sua raça e que sejamos amigos.

50
Por isso é que não interferimos no caso do Aparí-Parú,
deixamos nas mãos de Tupana.
- Tupana?
- Deus.
- A minha direita, continuou Aba Epyak, o guardião Aba Ibi.
O antropólogo da expedição não se conteve e falou:
- O homem da terra.
- Isso mesmo Eliberto. O homem da terra. Ele tem poderes
sobre todos os seres da terra. Sejam eles animais ou vegetais.
- Como é que você sabia, perguntou o Antônio ao Eliberto.
- Os nomes são Tupi-Guarani.
- Exatamente, respondeu Aba Epyak. A nossa língua natal.
- Quer dizer então que a língua Tupi-Guarani é uma língua
extraterrestre? Perguntou o Antônio.
- É, respondeu Aba Epyak. Quero lhe apresentar a Kuyã Ci.
Ela é a mulher mãe. Ou seja, tem os poderes sobre os
elementos naturais da terra: o ar, o fogo, a água e o vento. Ela
é a que tem mais trabalho com vocês.
- Por que? Perguntou a Letícia.
- Porque vocês estão destruindo o planeta.
- Ela é uma mulher?
- É.
- Mas desculpe, disse a Letícia, eu não vejo nenhuma
diferença física entre ela e vocês. Melhor dizendo, não veja
nada que a identifique como uma mulher.
- Isso é muito fácil de responder. Mas, para explicar tenho
que, a contragosto, voltar a afirmar que vocês são muito
primitivos. Daí a necessidade das fêmeas de vocês terem
diferenças físicas que são, na realidade, atrativos para os
machos. Mas nós não precisamos disso.
- Vocês não fazem sexo, então?

51
- Claro que fazemos. Mas ele é bem melhor que o de vocês,
pois ele é mental, apesar de ter as conseqüências físicas que
vocês conhecem. Mas ele é muito mais intenso, pois
aprofunda no ser de cada um de nós. Nós vibramos células,
por células.
- Então tanto faz se um homem faz sexo com outra mulher ou
com outro homem.
- Engano seu. As ondas mentais são femininas ou masculinas.
E a atração corresponde às ondas cerebrais.
- Mas se vocês não tem contato físico, como que procriam.
- Há muitos séculos que a nossa procriação não é, como
vocês chamam, de natural. Nós somos clonados
artificialmente, daí os nossos genes serem puros e perfeitos.
Vocês já estão nesse caminho, apesar de, ainda inicialmente,
com animais.
- Vocês devem viver, então, muitos anos.
- A nossa idade média é de quinhentos anos.
- Vocês são diferentes, fisiologicamente, de nós?
- Somos exatamente iguais. A diferença está na pureza dos
genes e no desenvolvimento cerebral.
- Mas fisicamente são diferentes.
- A natureza adapta os corpos de acordo com a necessidade
das espécies. A teoria Darwiniana está certa. Descendemos
dos macacos. E todos viemos do mar. Mas, assim como,
quando descemos das árvores perdemos os rabos, por
inutilidade desse apêndice, os nossos corpos atrofiaram por
não dependermos tanto dos esforços físicos. E, claro, o nosso
crânio teve que aumentar para suportar o desenvolvimento
cerebral.
- Mas vocês ficaram muito feios, disse a Letícia sem pensar.
Depois tentou consertar: - desculpe é que...
Aba Epyak não deixou ela acabar de falar.

52
- Não precisa se desculpar, Letícia. Tudo é uma questão de
referência. Nós nos acostumamos a esta aparência e achamos
vocês também muito feios. Mas, como já disse, tudo é
relativo. Apenas nos acostumamos e achamos o que é
diferente, feio. Mas deixa-me continuar as apresentações: a
minha esquerda apresento-lhes a Kuyã Kuwaab. A mulher do
saber. Ela guarda todos os conhecimentos da nossa raça.
- E os computadores?
- Para que?
- Ora para guardar, com segurança, todo o conhecimento.
- Existe computador melhor que o cérebro?
- Mas se acontecer alguma coisa com ela? Se ela morrer?
- Isso não pode acontecer.
- Como não? E se a matarem, ou ficar doente? Ou tiver
algum acidente ou for picada por uma cobra, por exemplo?
- Vamos por parte: cada guardião tem, como vocês estão
começando, a saber, um dom específico. Mas, além desses
dons, a soma dos poderes de cada um de nós, nos tornam
totalmente seguros. Nós não ficamos doentes, pois os nossos
genes são perfeitos, assim como somos imunes a venenos. E
também não sofremos acidentes, pois sabemos de antemão o
que pode nos acontecer. Assim, evitamos qualquer tipo de
acidentes.
- Então vocês são invencíveis?
- Bem, não sabemos.
- Como assim?
- Aqui na Terra, podemos dizer que sim. Mas, já se fazem
mais de cinco mil anos que perdemos o contato com os
Zorkos e não sabemos como eles evoluíram. Desta forma não
sabemos. Mas em alguns anos eles estarão de volta. Aí
saberemos.

53
- E se perderam o contato com os Zorkos, como sabem que
eles voltarão?
- Os Zorkos deixaram sondas em todos os sistemas solares
que poderiam ter vida. Eles pensam que nos dizimaram. Não
sabem da existência da Ainy
- Desculpe interromper, mas quem é Ainy?
- Não é quem, mas o que é. Ainy é onde estamos. É esta casa.
- Quer dizer a Semente?
- Bem nós chamamos de Ainy, que em nossa língua quer
dizer semente. Pois este local foi uma semente da nossa raça,
que plantamos aqui na Terra.
- Agora o nome faz sentido para mim. É o recomeço de sua
raça. Mas, continue, por favor.
- Bem, a raça humana está evoluindo muito. Vocês já
deixaram, através de naves tripuladas e de sondas, o planeta
Terra. Logo, logo, a sonda Zorkoiana pegará uma destas
naves e mandará a informação para Zorkos. Eles então, com
certeza, virão aqui para destruir vocês. E nesse dia, teremos o
confronto final entre a raça Guarani e a Zorkos.
- E a nossa também, pelo visto.
- Com certeza. Por isso é que deixamos que Tupana
decidisse. Se vocês estão aqui é porque existe um motivo
para isso. Talvez o dia do confronto esteja mais perto do que
pensávamos. Infelizmente.
- Por que infelizmente? Se é inevitável, porque não logo?
- Esse é um dos grandes defeitos da raça humana. A
impaciência. Nós estamos nos esforçando para evoluir do
estado físico para o espiritual. Quando esta etapa for atingida,
que esperamos nos próximos cem anos, os Zorkos, pois mais
evoluídos que estejam, não poderão nos atingir. Aí,
voltaremos ao Tupi, nosso planeta natal.
- E nós?

54
- Antes, nós lutaremos por vocês. Por isso é que desejamos
que os Zorkos demorem a nos descobrir.
Voltando as apresentações: ao lado da Kuyã Kuwaab está a
Kuyã Aysu. É a mulher do amor. Ela tem os poderes do bem.
Ela é a mais poderosa de todos nós, pois é através dela que o
amor é difundido. Tudo que é de bom na Terra pertence a ela.
E, por fim, Aba Yuka. É o homem que mata. Ele tem o poder
do mal.
- Mas, Aba Epyak, tudo que vi de vocês até agora é bom.
Terra, elementos, amor, clarividência, saber. Agora você nos
apresenta o senhor do mal? Por que?
- O mal e o bem são absolutamente necessários. Um não
pode viver sem o outro. Como poderíamos nos defender, o
que quer dizer guerrear, dos Zorkos, sem o mal? Ficaríamos
indefesos. O mal é útil.

55
Capítulo 07

A esquadra Zorkoiana entrou no sistema Solar. O


comandante perguntou ao navegador:
- Qual deles?
- É o terceiro planeta. Aquele azul.
- E os outros?
- Não tem vida superior. Só em alguns, bactérias.
- Vamos então entrar em órbita nele.
- Em órbita de 35 quilômetros, senhor.
- Ligue o analisador, ordenou o comandante.
- Ligado, senhor.
- Vamos ver o que ele nos diz.
Na grande tela do computador da nave apareceu a seguinte
informação:
PLANETA COM ATMOSFERA TENDO O PREDOMÍNIO
DE OXIGÊNIO. SUPERFÍCIE COMPOSTA DE DOIS
TERÇO DE ÁGUA PARA UM TERÇO DE TERRA.
HABITADA POR VÍRUS, BACTÉRIAS, INSETOS,
PEIXES, BATRÁQUIOS, AVES E MAMÍFEROS. RAÇA
PREDOMINANTE: MAMÍFEROS. CLASSIFICAÇÃO
HUMANOS. ESTÁGIO DE DESENVOLVIMENTO
NÍVEL QUATRO.

56
POPULAÇÃO HUMANA: TRÊS BILHÕES E CEM
MILHÕES DE SERES.
INTELIGÊNCIA NÍVEL SETE.
- Desenvolvimento nível quatro e inteligência nível sete?
Temos que exterminá-los. É um perigo para nós. Eles estão a
um ponto acima no nível de desenvolvimento e 4 pontos
acima do nível máximo de inteligência. Não temos
alternativa, segundo a nossa Carta. Disse o comandante. -
Plote as 100 maiores cidades e as destrua. Depois mande a
sonda com 10 milhões de larvas de Aparí-Parú. Não quero
me arriscar. Esses seres, em mais 100 anos, poderiam ser um
obstáculo para a nossa raça.

CASA BRANCA - EEUU.

- Por favor, preciso falar urgente com o Secretário de


Segurança.
- Quem deseja? Perguntou a telefonista.
- Diga que é o Artur Nestein. Chefe do Observatório de
Paloma.
O Observatório de Paloma, no Novo México, era o maior
centro de pesquisas astronômicas dos Estados Unidos.
Composto de seis telescópicos e vários rádios-telescópios
sondava dia e noite o universo.
- Vou-lhe passar para o seu assistente, senhor, disse a
telefonista. Um momento.
- Pois não? Atendeu o Smith Claven.
- Quem fala?
- Smith Claven, chefe do gabinete do Secretário de
Segurança.

57
- Sr. Smith, tenho que falar urgentemente com o Secretário.
- Quem fala?
- Artur Nestein, chefe do Observatório de Paloma.
- O senhor poderia informar o assunto?
- É confidencial.
- Sinto muito senhor. O Sr. Secretário está em reunião com o
Presidente.
- Mas é urgente, muito urgente.
- Tão urgente assim que possa interromper uma reunião com
o Presidente?
- Muita, senhor Smith. Aliás, é tão grave que na realidade
devia falar diretamente com o Presidente.
- Sinto muito, senhor Artur, mas eu não devo interromper,
principalmente sem saber o assunto.
- Mas já lhe disse que é confidencial.
- Então senhor Artur mande um e-mail ou um telegrama
pedindo uma audiência.
O Artur desesperou-se.
- Você não está entendendo, Sr. Smith. O assunto é de
extrema gravidade. Preciso falar urgente com o Secretário.
- Desculpe, Sr. Artur, mas não posso fazer mais nada.
Dizendo isso o chefe do gabinete desligou o telefone. Em
seguida, discou para o número da central do FBI que, de
dentro da Casa Branca, controlava todas as ligações recebidas
no prédio do Presidente.
- Marcos?
- Sim Smith, pode falar.
- Acabo de receber uma ligação muito esquisita de um tal de
Artur, que se diz chefe do Observatório de Paloma. Podia
confirmar, por favor?
- Ligo-lhe em seguida, Smith.

58
Smith recebia, diariamente, dezenas de ligações de pessoas
que queriam falar com o Secretário de Segurança. A maioria
de pessoas malucas, falando de óvnis e outras besteiras, em
seu entender. Mas aquela o deixou intrigado. Não sabia o por
que, por isso, pediu a confirmação da origem para o FBI. Na
realidade o Secretário de Segurança estava trancado em sua
sala, falando com a sua amante, que o estava notificando da
sua gravidez. O que era um problema muito grave para o
ministro, visto que ele estava candidato a senador pelo estado
de Nova Iorque.
Amigo de infância do Secretário e seu confidente, sabia do
problema de seu chefe e não o iria interromper, de modo
algum, a não ser que fosse, realmente, um assunto muito
sério.
O telefone toca. Smith, de um salto, atende:
- Pois não?
- Smith, é o Marcos.
- Oi Marcos, identificou?
- É mesmo do Observatório. E o Artur é realmente o chefe.
- Obrigado Marcos. Você pode vir a minha sala?
- Estarei num minuto.
Smith, impaciente, ficou esperando pela vinda do Marcos.
Não sabia por que, mas intuitivamente achava que o assunto
que o astrônomo queria falar poderia ser, realmente, sério.
Marcos bateu suavemente duas vezes na porta do gabinete e
entrou na sala do Smith.
- O que você quer, Smith?
- Você escutou a gravação da minha conversa com o Artur?
- Escutei.
- Eu não sei, mas alguma coisa me diz que o cara estava
falando sério.
- Eu também acho e a ficha dele é admirável.

59
- É mesmo?
- PHD e doutorado em Harvard. Há cinco anos chefe do
Observatório, tendo descoberto vários corpos celestes. É
membro também da Academia de Ciências dos Estados
Unidos e Membro da Comissão de Estudos Astronômicos da
ONU. Não é um cara qualquer. Aliás, tem um cometa com o
seu nome, por sua descoberta.
- Que tal a gente ligar para ele e você fala como se fosse o
Secretário. Assim ele diria o que quer e nós poderíamos
avaliar se perturbamos o Secretário ou não.
- Por que você não fala diretamente com o Secretário e deixa-
o decidir? Assim você tira a responsabilidade de suas costas.
- É que o Secretário está tratando de um assunto pessoal e
pediu-me para não o interromper. A não ser que fosse
realmente muito importante ou o Presidente.
- Mas nós estaríamos cometendo um ato ilegal.
- Eu banco esse ato, Marcos.
- Então está bem.
- Dona Judith, pode, por favor, fazer-me uma ligação para o
Observatório de Paloma? Quero falar com o Sr. Artur
Nestein.
Dois minutos depois a ligação foi completada.
- Sr, Artur? Aqui quem falar é o Smith, Chefe de Gabinete do
Secretário da Defesa. Ele vai falar com o senhor.
- Até que enfim, respondeu o Artur.
- Bom dia, senhor Artur, o que o senhor deseja?
- Bom dia Secretário. O senhor vai me desculpar, mas tenho
que ir direto ao assunto: cinco naves extraterrestes entraram
em órbita na Terra.
- O senhor tem certeza disso? Perguntou o Marcos.
- Absoluta.
- Um momento, por favor.

60
Tampando o fone com a mão, o oficial do FBI falou para o
Smith:
- Ele está dizendo que cinco naves extraterrestres entraram
em órbita na Terra.
- Tem certeza?
- Ele disse que absoluta.
- Então temos que falar com o Secretário, mesmo.
- Fala que o ligamos em seguida.
- Sr. Artur, ligaremos de volta em uns minutos. Dizendo isso
desligou o telefone sem dar tempo para o Artur responder.
- Agora está em suas mãos, falou o Marcos.
Smith ligou para o Secretário.
- Andrews, desculpe interrompê-lo.
- Pode falar, Smith.
- Recebi um telefonema do chefe do Observatório de Paloma,
que diz que cinco naves extraterrestes entraram em órbita na
Terra.
- Você confirmou a veracidade do telefonema?
- Verifiquei. Aliás, estou com o Marcos aqui na minha sala.
- Dê-me, por favor, cinco minutos e venham os dois na minha
sala.
Impacientemente esperaram cinco minutos e foram para o
Gabinete do Andrews.
- Como é o nome dele, perguntou o Andrews?
- Artur.
- Ligue para ele, ordenou.
- Antes, quero lhe dizer que, em seu nome ligamos para ele,
para saber o assunto, pois ele só queria falar com você.
- Tudo bem. Complete a ligação.
- Sr. Artur? O senhor Secretário vai lhe falar.
Em seguida, entregou o telefone para o Andrews.

61
- Sr. Artur, como posso confirmar o que o senhor está
dizendo?
- Senhor Secretário, entre no nosso site www.observatorio
depaloma.org aplique a senha op1313 que o senhor verá,
pessoalmente, o que estou lhe dizendo.
Andrews digitou o endereço em seu computador. No link
foto, clicou e depois, quando pedido, aplicou a senha.
Apareceu em seu monitor a imagem de cinco naves
estranhas. Pareciam charutos cinzas.
- Muito bem, Artur, falou o Secretário, não conte isso a
ninguém e deixe a imagem no ar. Considero o assunto
extremamente confidencial. Falarei com o Presidente e em
seguida voltaremos a falar com você.
Andrews desligou o telefone, pediu aos dois que os
esperassem e foi para o Gabinete do Presidente.

NAVE ZORKONIANA

- Comandante, a principal cidade deles, Nova Iorque, já está


plotada.
- Execute.
Um raio azulado saiu da nave em direção a Nova Iorque. Não
demorou mais do que três segundos para atingi-la. A cidade
foi envolvida por uma bola azul que, em décimos de
segundos a arrasou. Não ficou pedra sobre pedra.
- Plote a segunda.
- Plotada, senhor.
- Execute.

62
CASA BRANCA

O Presidente e o Secretário de Defesa estavam conversando


sobre o aparecimento das naves extraterrestres. Estavam
ligados na internet no site do Observatório de Paloma, vendo
as imagens geradas pelo principal telescópico, quando um
raio azul intenso saiu de uma delas em direção a Terra.
- O que foi isso? Perguntou o Presidente.
Segundos depois toca o telefone. O Presidente atendeu.
- Como? Disse ele. Impossível, você tem certeza? Está certo.
Desligou.
- Nova Iorque foi riscada do mapa.
- Como assim?
- Eles estão nos atacando, Andrews. Aquele raio destruiu
Nova Iorque.
- Olha outro, falou o Andrews.
Outro raio saiu da nave principal.
Novamente o telefone toca.
- Meu Deus, Tóquio agora?
Nisso vários helicópteros do exército estavam descendo na
Casa Branca.
- Vamos Andrews, temos que nos esconder no bunker do
Arizona. Eles estão atacando as nossas cidades.
- E a minha família, Presidente?
- As nossas famílias já estão sendo deslocadas para lá, de
helicópteros. Temos que sair o mais rápido possível.
Novamente o telefone toca. O Presidente atende.
- Sim, General, pode contra-atacar. Tem a minha permissão.
Andrews olhou para o Presidente como a lhe perguntar o que
estava acontecendo.

63
- Ordenei ao General MacArtur Ponds que contra-atacasse os
miseráveis. Ainda bem que o nosso projeto Guerra nas
Estrelas já está pronto. Agora eles vão ver.

SAN DIEGO - CALIFÓRNIA

Dentro do quartel general da maior base aeronaval dos


Estados Unidos, o Almirante de Esquadra Mikie Stevens
desligou o telefone em que estivera falando com o General
MacArtur. Virou-se para o seu lugar tenente, o Contra-
Almirante Jayme Androme e ordenou:
- Lance os mísseis, Jayme.
Um a um os enormes silos que guardavam sobre a terra os
poderosos mísseis Lobos Alados, pertencentes a mais
avançada tecnologia bélica foram abertos.
Na sala de comando, os operadores trabalhavam febrilmente
nos computadores, ativando as armas de defesa.
- Número um, pronto, falou o operador principal.
- Lançar, ordenou o Almirante de Esquadra.
A contagem regressiva começou:
- dez, nove, oito...
No zero, o primeiro míssil, guiado pelos satélites artificiais,
carregando em sua ogiva uma poderosa bomba atômica, foi
lançado em direção as naves extraterrestres. Segundos
depois, um a um, todos os vinte poderosos artefatos foram
lançados.
Na enorme tela da sala, todos acompanhavam o caminho dos
mísseis.

64
NAVE ZORKOIANA

- Comandante, os humanos contra-atacaram.


- Com que armas?
- Primitivos foguetes, com primitivas armas atômicas
disse rindo o operador.
- Destrua-os.
Vários raios saíram das naves e um, por um, os foguetes
foram explodidos, ainda no meio do caminho. Enormes
explosões atômicas mancharam de vermelho a atmosfera
terrestre.
- Destruídos, informou o operador.

BUNKER DO ARIZONA

Vinte andares abaixo da terra, o Presidente dos Estados


Unidos, chamado pelos seus pares de The Fox - A raposa,
pela sua esperteza, estava reunido com todo o seu ministério,
observando na grande tela à sua frente, o lançamento dos
mísseis, que acreditava, iriam destruir os alienígenas.
Um por um, à sua vista, os mísseis foram destruídos. A
desolação foi total. Impotentes, cabisbaixos, ocupavam em
ouvir, através do rádio, as informações sobre a destruição das
principais cidades do planeta.
Nova Iorque, Tóquio, Londres, Moscou, Pequim, Cidade do
México, São Paulo, São Francisco, já tinham sido destruídos.
O Presidente ordenou a todos os navios de guerra que fossem
para o mar aberto e, principalmente, a todos os submarinos

65
nucleares que submergissem em mares profundos e ficassem
à espera de uma nova ordem.
Todos os maiores cientistas do mundo, que ainda estavam
vivos, estavam sendo encaminhados para o bunker
presidencial.
- Eles vão nos destruir. A raça humana está em perigo. Falou
o Andrews.
- O que podemos fazer? Perguntou o Presidente.
- Só esperar, disse o Andrews.
- Eles estão acabando com as nossas principais cidades e
depois?
- Provavelmente vão desembarcar.
- E aí?
- Com a tecnologia superior que eles tem, não teremos
nenhuma chance.
- Mas lutaremos até o final. Disse o presidente.
- Sem dúvida, Presidente, mas será o final da raça humana.
Não temos condições de competir com eles.
- Sempre encontraremos um jeito, Andrews.
- Senhor Presidente, acho que não. Desta vez, será o fim.
Teremos o mesmo destino dos dinossauros.
Voltando para a grande tela que ainda continuava passando
as imagens das naves, visto que os satélites artificiais ainda
funcionavam e o observatório, por estar no meio do deserto,
não tinha sido atingido, perguntou:
- Quantas cidades já foram destruídas?
- Exatamente, as 100 maiores cidades em população, senhor
Presidente. Mas eles pararam há mais de uma hora.
- Não fizeram mais nada?
- Lançaram mais de 1000 bolas, para todos os lugares da
Terra.
- Eram bombas?

66
- Acho que não, Presidente, pois não explodiram.
- Então, o que serão?
- Acho que estão desembarcando. Devem ser naves de
desembarque.
- Os satélites podem focalizar, com zoom, os locais onde as
naves caíram?
- Já fizemos isso, Presidente.
- E?
- Nada Presidente. Não saiu um alienígena sequer.
- Então para que servem essas naves?
- Não posso lhe responder, Presidente, disse o oficial
encarregado das imagens.
- Olha Presidente! Gritou um outro oficial.
As naves estavam indo embora. Uma a uma elas tomaram a
direção da estrela Ursa Maior e, aos poucos, foram
desaparecendo da vista do telescópico.
- Não entendi nada, disse o Presidente. Eles vêm aqui,
destroem as nossas maiores cidades, matam setecentos
milhões de pessoas e vão embora? Qual é o objetivo deles,
afinal?
- Não dá para entender, disse o Andrews. Mas Presidente,
ainda não acabou.
- Não acabou como, Andrews? O que você quer dizer? Afinal
eles não foram embora?
- Foram presidente. Mas e as naves que eles deixaram? Qual
é o significado delas?
- É uma boa pergunta. Vocês localizaram os lugares que elas
desceram?
- Estão todas plotadas no GPS.
- Então vamos sair e verificar o que eles deixaram.
- Ainda é cedo, Presidente, falou o General chefe do estado
maior das forças armadas.

67
- Por que, General?
- E se forem bombas relógios?
Tem razão, general. Não tinha pensado nisso e, pela lógica é
bem provável que sejam.
- O que podemos fazer então?
- Vamos mandar o exército verificar.
- Mas se forem bombas relógios, vão todos morrer.
- Presidente, se forem bombas relógios, serão, com certeza,
de uma magnitude tal, que matarão todos os seres vivos do
planeta. Senão, porque jogariam aqui?
- Tem razão general. Mande verificar. Quem sabe não
teremos a chance de mandar essas bombas para o espaço,
num foguete, antes que explodem? Por falar nisso, como está
a NASA?
- Destruída, Presidente.
- Então não tem jeito. Temos que esperar que explodem e
acabem com a humanidade?
- Temos uma saída, Presidente.
- Qual Andrews?
- Cinco dos nossos submarinos atômicos estão preparados
para a guerra nas estrelas. Eles têm mísseis capazes de
mandar objetos pequenos para o espaço, em vez da bomba
atômica.
- Bem lembrado Andrews.
Virando-se para o oficial que manipulava os satélites,
perguntou:
- Qual é o tamanho das naves que eles lançaram?
- Pequenas, Presidente.
- Pequenas como, oficial? Perguntou irritado o Presidente.
- Com uns trinta centímetros de diâmetro. Elas têm o formato
de uma bola.
- Pode calcular o peso?

68
- Impossível, Presidente.
- Bem, temos uma informação importante. Preciso de mais
uma. General, quanto pesa uma bomba atômica levada pelos
mísseis dos submarinos?
- Em torno de uns quatrocentos quilos, Presidente.
- Bem, sabemos que, pelo diâmetro podemos carregar umas
vinte bolas em cada míssil. Agora só dependemos do peso,
para saber se os mísseis comportam.
- Exatamente, Presidente.
- Então General, vamos tomar duas providências: a primeira
é mandar o exército localizar as naves. Como temos todas
plotadas, não vai ser difícil. Vamos pedir a todos os países
que nos ajudem, já que estão espalhadas em todo o planeta e
não teremos muito tempo. A segunda é mandar que os
submarinos voltem o mais rápido possível. Para que o
trabalho seja agilizado, já que corremos contra o tempo, se
for uma bomba relógio, os submarinos devem aportar em
cada um dos cinco continentes.
- Quantos mísseis temos em cada um dos nossos submarinos,
General?
- Dez, Presidente.
- Quantas naves foram lançadas, oficial?
- Mil, Presidente.
- Bem, como são cinco os submarinos que dispõem desses
mísseis, temos um total de 50 mísseis. Divididos por mil,
temos vinte naves para cada míssil. Será que dá?
- A princípio, Presidente, se a nave for pouco pesada e só
levando em consideração o tamanho, acho que cada míssil
pode levar 10 naves.
- Bem, pelo menos podemos mandar a metade para o espaço.
- Mais Presidente.
- Como assim?

69
- Devemos ter outro tanto em nosso arsenal.
- Então poderemos nos livrar de todas?
- Se tivermos tempo, Presidente.
- Então general, vamos providenciar logo.

SEMENTE
Aba Epyak tremeu em sua cadeira, que ficou mais amarela
que do costume. Ergueu seus pequenos e rasgados olhos para
o Antônio e falou:
- Eles chegaram.
- Eles quem? Perguntou aflito o Antônio, sentindo o medo no
ser.
- Os Zorkoianos.
- Estão aqui? Na Semente?
- Não, estão em órbita em torno da Terra.
- E o que eles estão fazendo?
- Destruindo a Terra.
- Meu Deus, Aba Epyak. Como?
- Destruindo as suas maiores cidades.
- E não podemos fazer nada?
- Ainda não.
- Então quando? Quando não sobrar mais ninguém?
- Antônio, eu sei que isto é terrível, mas se tentarmos alguma
coisa agora eles verão que ainda existimos e então destruirão
a Semente. O que será, aí sim, o fim de todos nós.
- Mas eles não nos acharão de qualquer maneira?
- Não Antônio. Eles não desembarcarão. A estratégia deles é
a de destruir as maiores cidades, desorganizando, desta
forma, toda a estrutura do planeta e, depois, disseminando as
larvas do Aparí-Parú em todos os lugares. Os Aparí-Parús
então, acabam com os sobreviventes.

70
- Mas os Aparí-Parús, como você mesmo disse, serão
controlados pelas formigas.
- Engano seu, Antônio. Aqui na selva isso vai acontecer. Mas
nas cidades não existem formigas suficientes para controlar
essa praga. Assim, bandos enormes desse inseto vão devorar
as populações remanescentes.
- Mas que desgraça. Mas nós temos os exércitos.
- No início, o exército vai resistir. Milhões de insetos vão ser
mortos, mas a proliferação deles é tão grande que outros
milhões aparecerão. E, pouco a pouco, eles começarão a
ganhar a luta. E o final já sabemos, o extermínio da raça
humana. Foi assim em todos os planetas.
- Mas pelo menos teremos uma chance.
- Sem dúvida. Alguns sobreviventes se refugiarão nas selvas
e ficarão escondidos e a salvo, pelas formigas. Mas, vocês
acabarão como nós. Involuindo. Esse é o objetivo dos
Zorkos. Involuir a raça humana a um ponto tal, que eles não
mais se preocuparão com vocês.
- E vocês, não podem fazer nada?
- Esta é a nossa estratégia. Daqui a alguns anos eles voltarão
para ver se os humanos estão controlados pelos insetos. Aí,
agiremos. Será a grande luta.
- Mas vocês terão condições de ganhar?
- Esperamos que sim.

71
Capítulo 08

BUNKER DO ARIZONA

- Senhor Presidente, já localizamos a primeira nave


alienígena. Falou o general.
- E?
- A bola abriu-se como uma flor, em seis partes. E é oca, não
tem nada dentro.
- Como assim? Não é uma bomba relógio?
- Presidente, já a examinamos exaustivamente. Não tem nada
dentro. Passamos o raioX e não encontramos absolutamente
nada. Não tem nenhum mecanismo. Não emite nenhum som.
- Então para que serve?
- Não sabemos senhor. A única coisa que podemos dizer é
que é feita de um material desconhecido por nós. É um metal
plastificado ou um plástico metalizado.
Tentamos cortá-la, mas não conseguimos. Aplicamos uma
broca de diamante e ela nem arranhou. Ao contrário, quebrou
o diamante. Estamos com uma equipe de físicos e químicos
estudando-a.
- Bem, qualquer novidade, me informe.
- Mais uma coisa, Presidente:
- Diga, General.
- Ela foi colocada num alto-forno siderúrgico a uma
temperatura de 20.000 graus centígrados, que derreteria o aço

72
mais duro e não aconteceu nada. E o mais incrível, o material
de que é feito, não esquentou.
- Bem General, continue com as análises. Se descobrirmos de
que é feito será muito bom para nós. O importante é
sabermos se ela oferece algum perigo. Estou ansioso para sair
desse buraco. De qualquer forma, vamos continuar o nosso
plano e mandar todas essa naves para o espaço. Vamos deixar
apenas uma para estudos.
- Claro, senhor Presidente.

DOIS DIAS DEPOIS

- Senhor Presidente, as naves já foram lançadas ao espaço.


Conforme suas ordens retemos apenas uma para estudos.
Creio que já podemos sair do bunker em segurança.
- Que bom General. Vamos enfim respirar o ar puro e ver o
sol novamente.

SAN GERMAIN DE PRÉS - PEQUENA CIDADE DO


INTERIOR DA FRANÇA.

Jean Pierre de Piró era o mais famoso arquiteto da França.


Com apenas 40 anos de idade, os seus projetos arquitetônicos
tinham inúmeros prêmios internacionais. Recém casado com
uma bela apresentadora da televisão estatal francesa, estava
inaugurando a sua casa no mais famoso bairro de sua cidade.
A mansão de 10 quartos ficava no centro de um terreno de
vinte mil metros quadrados, todo gramado e ajardinado, com
um lindo lago à sua frente. O salão principal, com trezentos
metros quadrados, estava sendo preparado para a grande festa
de inauguração. Foram convidados as pessoas mais

73
proeminentes da sociedade francesa e alguns artistas
internacionais.
Jean Pierre estava preocupado, pois os preparativos estavam
atrasados e faltavam apenas duas horas para o início da jantar
que estava marcado para as dez horas da noite. O Chef,
responsável pela comida, ainda não tinha chegado, apesar de
que os seus auxiliares já estavam preparando os pratos que
seriam servidos.
Jean Pierre, como forma de se acalmar, pegou a sua linda
mulher, Madeleine e a convidou para dar um passeio pelos
jardins. Pararam diante do lindo lago e ficaram vendo a
evolução das carpas douradas, que nadavam quase que na
superfície.
- Jean, disse ela puxando-o pela mão, quero lhe mostra uma
surpresa.
- Que surpresa, querida?
- Mandei vir do Brasil, uma planta chamada Dama da Noite,
que à noite exala um perfume maravilhoso. Conhece?
- Não, nunca ouvi falar.
- Então vamos lá. Plantei-a bem de frente ao nosso quarto
para sentirmos o perfume.
Os dois de braços dados foram caminhando em direção a
planta.
- Já está sentindo o perfume?
- Já, mas que gostoso. Como você descobriu?
- Foi uma amiga brasileira que me deu a muda. Enquanto
estávamos construindo a casa plantei-a aqui, de forma tal
que, pudéssemos sentir o perfume quando nos mudássemos.
- Eu estou muito feliz, disse o arquiteto. Inaugurando a nossa
casa, com a mulher que amo ao meu lado, nesta linda noite
toda estrelada e sentindo esse perfume maravilhoso. Que
mais um homem poderia querer da vida?

74
- Um filho, disse ela, sorrindo.
- Um filho? Seria maravilhoso.
- Pois estou grávida, querido.
Jean Pierre ficou tão emocionado que as lágrimas começaram
a correr de seus olhos. Puxou a sua mulher de encontro ao
seu peito e lhe deu um beijo apaixonado. O longo beijo
excitou os dois e Jean Pierre colocou a mão direita nas coxas
de sua mulher e começou a levantar o seu vestido.
- Agora não, Jean Pierre, os convidados devem estar
chegando.
- Que se danem eles. Quero você aqui e agora.
- Tudo bem, querido, mas vamos para trás daquelas árvores,
senão poderiam nos ver.
Jean Pierre a puxou para o local e ela pulou em seu pescoço e
se ajeitou para que ele não tivesse dificuldades em tirar as
suas calcinhas.
- Pare, Jean Pierre, disse ela em tom firme, sussurrando em
seu ouvido, ao mesmo tempo em que cravava as suas unhas
em seu ombro.
- Ui, gemeu o marido. O que aconteceu?
- Silêncio, disse ela. Olha só aquilo.
Jean Pierre olhou na direção que ela apontava e ficou
petrificado. O seu coração disparou.
- Que bicho é esse? Perguntou.
- Não sei, parece um louva-deus gigante, respondeu a mulher.
- Fica quieta, disse ele.
O bicho olhou na direção que eles estavam. Os dois gelaram,
mas não se mexeram. O bicho voltou a sua cabeça e
caminhou em direção a casa.
- Vamos nos esconder atrás das árvores, sussurrou o Jean.
Nisso, o Chief de Cousin, que tinha se atrasado, vinha
chegando a passos largos, esbaforido, pela alameda principal

75
que dava para a entrada da mansão. O Aparí-Parú, andando
ereto em suas duas patas, foi ao seu encontro. O Chief,
quando o viu, soltou um grito, que foi logo abafado pela
dentada do monstro. Não teve nem tempo de correr. O seu
corpo foi cortado ao meio.
A mulher ia soltar um grito, mas o marido rapidamente o
abafou, colocando a mão em sua boca.
Em outra bocada o inseto comeu o restante do corpo,
cuspindo em seguida o seu crânio. Não satisfeito, foi em
direção à entrada que estava cheia de serviçais nos
preparativos finais da grande festa.
Jean pegou a mão de sua mulher e puxando-a, foram
correndo para o portão de entrada da casa. Chegando à rua,
correram para a esquina à espera de algum carro que
passasse. Mas a rua estava deserta. Com medo do bicho
correram mais duas quadras quando viram um ônibus.
Jogaram-se em cima, obrigando o veículo a parar.
- Vocês estão malucos? Disse o motorista, abrindo a porta da
frente do veículo.
- Por favor, nos leve a delegacia mais próxima. Falou o Jean,
já berrando.
- Mas o que aconteceu? Estou com passageiros. Não posso
desviar do meu caminho.
- Por favor, não discuta comigo, faça o que estou pedindo.
passasse. Mas a rua estava deserta. Com medo do bicho
correram mais duas quadras quando viram um ônibus.
Jogaram-se em cima, obrigando o veículo a parar.
- Vocês estão malucos? Disse o motorista, abrindo a porta da
frente do veículo.
- Por favor, nos leve a delegacia mais próxima. Falou o Jean,
já berrando.

76
- Mas o que aconteceu? Estou com passageiros. Não posso
desviar do meu caminho.
- Por favor, não discuta comigo, faça o que estou pedindo.
- Mas o que houve, afinal? Vocês viram algum fantasma?
- Antes fosse. Por favor, nos leve a delegacia. Berrou.
Nisso, o delegado de plantão que tinha ouvido, de sua sala, os
gritos, chegou.
- O que está acontecendo aqui? Perguntou.
- Os dois estão em estado de choque, delegado, e ainda não
conseguiram falar nada.
O delegado, mais experiente, falou baixo e devagar para os
dois:
- Acalmem-se, por favor. Vocês agora estão protegidos. O
que aconteceu afinal?
Jean Pierre acalmou-se e começou a falar:
- Delegado, estávamos nos jardins de nossa casa quando
vimos um bicho que parecia com um louva-deus, mas
gigante, com uns 10 metros de altura.
- Mas esse bicho não existe, amigo.
- Existe sim, delegado e comeu o nosso Chief de Cousin, que
estava chegando para preparar o jantar que íamos dar de
inauguração de nossa casa.
- Vocês beberam? Perguntou, incrédulo, o delegado.
Jean Pierre começou a ficar nervoso, de novo.
- Delegado, eu sou o arquiteto Jean Pierre Piró, já ouviu
falar? Berrou.
- Calma, amigo. Já ouvi sim, é um famoso arquiteto.
- Pois sou eu.
- Pode me mostrar a sua carteira de identidade, por favor?
Jean Pierre não se agüentou. Soltou um palavrão.
- Merda, delegado. Um monstro está em nossa casa,
provavelmente comendo todos que lá estão e o senhor aqui

77
com essa burocracia. Dito isso, tirou e entregou a sua carteira
ao delegado.
O delegado olhou calmamente a carteira, para desespero do
Jean e pediu a um dos policiais que trouxesse o bafômetro.
O Jean exasperou-se.
- Porra, mas que merda, delegado. Enquanto o senhor brinca
de policial aqui, eu tenho como convidado dois ministros de
estado, alguns senadores, vários deputados, com suas
mulheres, que estão chegando e provavelmente serão
comidos pelo monstro. E o senhor aqui perdendo tempo.
- Calma, amigo, preciso tomar as minhas providências.
- Calma coisa nenhuma, delegado. O senhor ainda não
entendeu o que está acontecendo?
O policial chegou com o bafômetro e entregou ao Jean, que
imediatamente soprou no lugar indicado. O teste deu
negativo.
- Negativo, delegado.
- Vocês agora vão me ouvir?
- É difícil de acreditar o que você está me dizendo, amigo.
Disse o delegado.
- Então vá ver, delegado. Berrou, novamente, o Jean.
- Bem, vamos lá, mas se o senhor estiver inventado essa
história, famoso ou não, vou trancafiá-lo numa cela.
O delegado chamou seus policiais e em dois carros foram
para a casa do arquiteto. Chegando lá, encontraram o grande
portão aberto, as luzes da casa todas acessas, mas nenhum
barulho ou movimento. Entraram com as sirenes ligadas,
estacionaram os carros e, com o delegado na frente,
invadiram a casa.
O grande salão estava totalmente bagunçado, com sangue
para todos os lados. Vários crânios, ainda ensangüentados,
estavam espalhados pelo chão.

78
- Meu Deus, exclamou o delegado, o que aconteceu aqui?
- Não lhe disse, delegado? E o senhor achando que eu estava
mentindo.
- Mentindo não, amigo, delirando. Como é que poderia
acreditar que existia um bicho que estivesse comendo gente
em sua casa?
- E agora, delegado?
- Peço-lhe desculpas, amigos. Vamos ver se achamos o tal
monstro. Como é mesmo que você disse que ele se parece?
- Ele se parece com um louva-deus gigante, só que com rabo.
O delegado deu ordens para os policiais procurarem pelo
monstro. A casa foi vasculhada em todos os cantos, mas não
acharam nada. Só acharam as pegadas no terreno ao fundo da
casa e um total de vinte crânios.

HANFRED GARDEN - PEQUENA CIDADE DO


INTERIOR DA AUSTRÁLIA.

Thomas Nicks era um rico fazendeiro plantador de soja em


sua fazenda de mais de cinco mil hectares, no interior da
Austrália. Ultimamente as suas plantações tinham sido
atacadas e todos os grãos comidos por bandos de cangurus
famintos.
O governo australiano, tendo em vista o grande crescimento
da população desses bichos, autorizou e mesmo fomentou a
matança, como forma de reprimir o rápido crescimento dessa
espécie.
Assim, vários fazendeiros, como hobby, organizavam
caçadas noturnas aos cangurus.

79
Thomas Nicks não fugia a regra. Todo fim de semana ele e
mais dois amigos saiam em sua caminhonete Toyota a
procura dos marsupiais.
- Aí, Dick, berrou chamando o amigo, está atrasado!
- Desculpe, Thomas, mas custei a achar a minha munição. A
minha mulher fez uma arrumação lá em casa e escondeu as
balas.
O amigo cumprimentou os dois, pois o terceiro parceiro já
estava sentado dentro do veículo.
- Olá, Fred, tudo bem? A noite promete. Está linda. A lua
cheia vai nos ajudar.
Thomas ligou a sua Toyota e, impaciente, acelerou rumo a
estradinha que os levaria ao centro de sua fazenda onde
viviam os cangurus.
No caminho, já alegres pelas cervejas que tinham tomado,
falavam sobre mulheres, armas, soja, a classificação do time
australiano para o campeonato mundial de futebol e, como
não poderia deixar de ser, sobre o desastre que tinha abatido
a Terra pelo ataque dos alienígenas.
Depois de uma hora de viagem chegaram finalmente ao local.
Thomas diminuiu a velocidade da Toyota e, como sempre
fazia, ligou os faróis sobressalentes que os ajudavam na
caçada, localizando os bichos. Mas, apesar de rodarem por
mais de uma hora não avistaram nenhum canguru.
- Mas que coisa esquisita, disse Thomas, semana passada
tinha tanto cangurus nesta área que quase os atropelávamos.
Hoje não tem nenhum. O que será que aconteceu?
- Realmente é muito estranho, respondeu o Fred.
- Olha lá um, avisou o Dick, apontando para o lado direito
em que estavam.
- Nossa, nunca vi um canguru daquele tamanho, disse o Fred.
Meta o farol, nele, Thomas.

80
Thomas, imediatamente, apontou o carro na direção do vulto.
O que viu deixou os três amigos apavorados.
- Meu Deus, que bicho é esse?
- Mete fogo nele, Dick.
Dick apontou a sua arma e disparou. O bicho recebeu o
disparo e estremeceu, mas em vez de fugir, foi de encontro
aos três amigos.
Dick disparou mais duas vezes e o mesmo fez o Fred. O
bicho então caiu no chão.
Os três amigos, ainda assustados, desceram do carro e foram
verificar de perto.
- Eu nunca vi nada igual. Parece um louva-deus gigante.
- Olha só essas garras. Iguais a dois canivetes de corte.
- E a pele? Verde e parece de plástico.
- Vamos embora daqui pediu o Thomas, não estou gostando
nada disso. Não gostaria de dar de cara, a pé, com um bicho
desse.
Os três amigos então, se levantaram o foram em direção ao
Toyota. Nisso o Fred cai no chão.
- O que houve, perguntou o Thomas?
- Pisei em alguma coisa...
- Olha, disse o Dick, você pisou num crânio de canguru.
- Vejam, o chão está cheio de crânios de cangurus. É por isso
que não tínhamos visto nenhum aqui.
- Vamos logo para o carro, isto não está me cheirando bem.
O três, então, correram para a caminhonete.
- Liga logo isso, Thomas.
Thomas colocou a chave na ignição e deu a partida. Passou a
primeira marcha e quando ia sair, pisou no freio.
- O que houve, Thomas?
- Olha em frente, respondeu o fazendeiro. O carro está
cercado por aqueles bichos.

81
- Mete bala neles, gritou o Fred.
Os três armaram as suas espingardas e dispararam contra os
Aparí-Parú. Mas, quanto mais matavam, mais apareciam.
- E agora, o que faremos?
- Eu tenho uma cabana a uns 500 metros daqui. Vamos para
lá, assim estaremos protegidos.
- Mas como vamos passar por eles?
- Atirando. Atirem nos que estão a nossa frente. Assim
abrimos caminho e vamos nos refugiar na cabana.
E assim fizeram. Enquanto Thomas dirigia, os dois amigos
abriram caminho a balas. Thomas teve que dirigir em zique-
e-zaque, fugindo do encontro de dezenas de insetos, até
chegar na cabana. Thomas parou o Toyota bem em frente à
porta e os três, correndo se refugiaram na casa.
- Feche bem essa porta, berrou o Fred para o Thomas.
A porta foi fechada e, por precaução, empurraram um móvel
bloqueando aquela entrada. Depois correram para trancar as
duas janelas da habitação.
Quando acabaram sentaram-se nos sofás da sala.
- E agora o que faremos?
- Pegue o celular e peça socorro.
Thomas ligou para a sua casa:
- Mary, ligue imediatamente para a polícia e peça socorro.
- O que houve, Thomas? Perguntou a mulher.
- Mary, estamos cercados por uns bichos enormes, que mais
parecem louva-deus.
- Mas onde vocês estão afinal?
- Na cabana, Mary, na cabana. E, por favor, deixe de fazer
perguntas e ligue logo para a policia. Dizendo isso, desligou
o telefone.
Nisso a porta foi arrombada por um dos bichos. Os três se
ajoelharam no chão e, em posição de tiro, abriram fogo

82
contra o bicho. Mas assim que ele caiu outro apareceu. E,
quanto mais eles matavam, mais apareciam. De repente, uma
das janelas estourou e um Aparí-Parú meteu a cabeça para
dentro da casa. Aconteceu à mesma coisa com a outra janela.
Os amigos se dividiram, protegendo a porta e as duas janelas.
A luta continuou por uns quinze minutos.
- Quanto mais munição temos, Thomas?
- Está acabando Fred.
- Meus Deus, disse o Dick, nunca pensei que ia morrer
comido por um louva-deus.
- Calma, Dick. Ainda temos umas cem balas. Acho que
vamos poder agüentar até o socorro chegar.
Mais dez minutos de tiroteio e a munição chegou ao fim.
- Só temos mais seis balas, Thomas. E não quero morrer
na boca desse bicho.
- Só tem uma solução, Dick, matamos uns aos outros.
- Mas vai sobrar um.
- Bem, o que sobrar decide se suicida ou morre comido
pelo bicho.
- Então, vamos logo.
E assim fizeram.

83
Capítulo 09

FORTE FÊNIX – UM ANO DEPOIS

Os Aparí-Parús, em hordas assassinas, estavam dizimando a


população terrestre. Algumas ilhas, tanto do oceano Pacífico,
como do Atlântico e do Índico, não estavam infectadas. Essas
ilhas estavam com superpopulação, visto que as pessoas com
maior posse, tinham fugido para lá. Logo, os governos
proibiram a entrada de mais gente, visto que começou a faltar
alimentos e medicamentos para a população. Ao longo do
tempo a situação nessas ilhas piorou, havendo saques e, por
fim, guerra civil o que causou o caos e mortandade.
As grandes nações montaram zonas de refúgio, que se
chamaram de Forte Vital, fechando quarteirões inteiros de
suas cidades com muros altos, guarnecidos por artilharia e
tanques de seus exércitos. Mas, só pessoas com influência ou
dinheiro suficiente para subornar os guardas, conseguiram o
passaporte para esses refúgios. O restante da população
estava sendo, gradativamente, dizimado pelos insetos.
Logo, logo, as populações dos países que ainda tinham
florestas em seus territórios descobriram que os insetos não
conseguiam se reproduzir na selva. Assim, as populações dos
países das Américas do Sul e Central e os países asiáticos,
embrenharam-se em suas florestas, fugindo das cidades. Lá

84
montaram os seus governos. Mas os serviços básicos como
eletricidade e telefone, que necessitavam de manutenção,
entraram em colapso. Por sorte, devido as suas grandes
extensões territoriais e as suas grandes florestas, essas
populações abriram grandes clareiras na selva, protegidas por
cinturões de matas, e conseguiam através da agricultura
comida suficiente para sobreviver.
Mas a globalização acabou. Sem como se comunicar, os
países ficaram isolados e ninguém mais conseguia saber o
que estava acontecendo no restante do mundo.
Os demais países entraram em colapso total devido à falta de
comida. Mas só os países com grandes extensões de florestas
e com clima tropical conseguiam sobreviver. O Canadá, por
exemplo, que tinha grandes florestas, foi um dos primeiros a
ser dizimado, visto que a população que tinha se escondido
em suas florestas, acabava morrendo de frio no inverno. O
mundo, no que diz respeito à raça humana, virou um monte
de ilhas, através de seus Fortes Vitais. Mas esses fortes
começaram a sucumbir pela fome e também pela sede, visto
que, por falta de reparo, as grandes tubulações de água, que
abasteciam as cidades foram se rompendo. No desespero,
essas populações, sem alternativas, foram a campo aberto
lutar contra os insetos. O resultado foi que, no espaço de um
ano, nove décimos da população mundial tinha morrido. Ou
pela fome, ou pelo frio, ou pela sede ou através dos Aparí-
Parú.
Alguns tentaram comer o inseto, mas a sua carne era
extremamente venenosa e em poucas horas matavam, os que
a ingeriam, com infecções generalizadas e fortes dores.
A raça humana entrava em colapso. Em compensação, o
planeta Terra, livre da poluição, estava melhor do que nunca.
Os seus rios e mares estavam limpos e os cardumes de peixes

85
aumentavam numa proporção geométrica. Os grandes
animais tinham sido erradicados pelos insetos, mas os
pequenos e ágeis, como coelhos, castores, ratos e aves, assim
como os insetos nativos, sem o homem e os demais
predadores, prosperavam. A Terra, como que renascia, sem a
grande presença da raça humana.
Os Estados Unidos, graças às imediatas e enérgicas
providencias de seu governo, era o único país, tirando os
países tropicais de grandes florestas, que conseguia
sobreviver. A África foi o primeiro grande continente a
perecer. Depois a Europa e por fim a Oceania.
Os Estados Unidos assim que perceberam a situação e viram
que seria impossível eliminar os insetos, tomaram uma
atitude defensiva, tendo como objetivo único sobreviver.
Em primeiro lugar transferiram o seu governo para a cidade
de Las Vegas, no estado de Nevada, aproveitando toda a
infra-estrutura dos grandes hotéis. Para lá também foram
transferidos os mais proeminentes cientistas e os
grupamentos de elite da Marinha e do Exército. Protegidos
pelos batalhões de tanques e lança mísseis, os soldados
construíram, trabalhando noite e dia, num esforço incomum,
tubulações subterrâneas que ligavam, simultaneamente os
grandes poços de petróleo do Texas, as águas da represa do
Niágara e a usina termoelétrica do mesmo nome. Assim,
garantiram de uma só vez, água, energia e combustível.
Depois, ergueram uma enorme muralha de cimento em volta
da cidade. Por fim, construíram enormes silos e através da
técnica da hidrogenia cultivaram as sementes, hortaliças e
frutas necessárias à sobrevivência da população da cidade.
Quando tudo ficou pronto, a cidade fortificada, com uma
população de dez mil pessoas, tornou-se auto-suficiente.

86
Em homenagem a mitologia Grega, rebatizaram a cidade de
Fênix, como a ave que ressurgiu das cinzas.
Depois, com a ajuda dos grandes helicópteros de guerra,
reabriram os aeroportos das cidades que tinham conseguido
erguer os Fortes Vitais. Com os aeroportos limpos dos
insetos, pelo menos momentaneamente, os aviões tanques
reabasteciam os helicópteros que voavam então para o Forte
vital da cidade. Assim, conseguiram restabelecer uma
comunicação do governo dos Estados Unidos, com os fortes
que ainda resistiam.

- A situação é a seguinte, Presidente, falava o Secretário de


Defesa: os Fortes, por falta de comida não poderão resistir
mais do que 30 dias. O que vamos fazer?
- Bem, não temos comida para abastece-los, não é?
- Exatamente, Presidente. O que temos é essencial para a
Fênix.
- Mas não podemos deixá-los morrer.
- Eu tenho uma idéia, Presidente, disse o General.
- Fala, General, toda idéia é bem vinda.
- Que tal transferirmos a população dos Fortes para navios?
- Mas aí continuaremos com o problema da comida e ainda
teremos outra que é a de água doce. Disse o Secretário de
Defesa.
- Negativo Secretário. Comida é que menos falta no mar. Os
peixes estão todos lá.
- Realmente, mas e a água doce?
- Simples Secretário. Os navios podem atracar na foz dos
nossos rios. Assim, através de balsas podemos captar a água
e transferi-las para os navios. Assim, teremos água e comida.
- Grande idéia, General, disse o Presidente. Vamos fazer isso.

87
- Bem, Presidente, continuou o Secretario, mais ainda vamos
ter um problema.
- Qual Secretário?
- Ainda existem vinte e sete Fortes Vitais, nos EEUU não é?
- Exatamente. Os outros já capitularam, respondeu o General.
- Qual a média da população de cada Forte?
- Cinco mil habitantes, em média.
- O que dá uma população de cento e vinte e cinco mil
pessoas.
- É muito triste, disse o Presidente.
- O que é muito triste, Presidente? Perguntou o General.
- Saber que o nosso país, que já teve duzentos e cinqüenta
milhões de habitantes, hoje está reduzido a cento e vinte e
cinco mil, mais os dez mil de nossa cidade.
- Ainda demos sorte, Presidente. A maioria dos países já
acabou. Morreram todos.
- Sorte não, Secretário. Fomos capazes.
- Realmente Presidente.
- Mas, continue com o seu raciocínio, Secretário.
- Muito simples Presidente: Quantos navios vamos ter que
ter, para abrigar cento e vinte e cinco mil pessoas?
- Almirante, falou o Presidente, você pode nos responder a
nossa pergunta?
- Bem Presidente, tenho que confirmar os meus dados. Mas
acredito que esse plano é executável.
- Impossível, atalhou o Secretário de Defesa. Não temos
navios suficientes para abrigar essa população.
- Desculpe, secretário, mas temos sim. Disse o Almirante.
- Então o senhor pode nos explicar como vai conseguir tantos
navios? Perguntou o Secretário.
- Bem, no mundo existem trinta grandes navios de turismo,
com uma capacidade média de cinco mil turistas, cada um, o

88
que dá cento e cinqüenta mil. Só isso já resolveria o
problema.
- Mas Almirante, pelo que eu saiba os EEUU não tem tanto
navios de turismo assim.
- Eu falei o mundo. Estou contando os navios escandinavos,
suecos, gregos, etc.
- Mas não são nossos. Além do mais, não sabemos em que
condições eles estão. Provavelmente a maioria deve estar
cheia de sobreviventes de seus países de origem.
- Mas o mundo está em estado de sítio, disse o Presidente. E
a minha obrigação é com os americanos. Eu tenho o dever de
manter a minha nação viva.
- O que o senhor vai fazer então, Presidente? Atacar os
navios?
- Se for necessário, vou.
- Mas isso seria pirataria, exclamou o Secretário.
- Secretário, disse o Presidente irritado, vou repetir: a minha
obrigação é manter vivo os americanos. Farei tudo o que for
necessário para isso, inclusive à guerra.
- Pois que seja, Presidente. Concordou o Secretário.
- Almirante, quanto tempo o senhor levaria para me dar um
plano completo dessa operação e quanto tempo o senhor acha
que levaríamos para ter os navios disponíveis?
- Bem, Presidente preciso de dois dias para planejar a
operação. Acredito que a operação total levaria uns vinte
dias.
- Bem, Almirante, vamos trabalhar logo esse projeto.

89
SEMENTE

Todo o pessoal da expedição tinha se instalado no prédio da


Semente. Os quartos ficavam em cima, mas eram mais
austeros que as celas dos seminários dos padres católicos.
Não existiam camas nem armários. Nenhum móvel. Eram
cubículos de seis metros quadrados com aberturas como se
fossem janelas.
- Mas não tem cama nem móveis? Perguntou o Antônio.
- Nós não necessitamos disso. Disse o Aba Epyak.
- Mas vocês dormem no chão?
- Não, nós levitamos.
- Vocês levitam? Exclamou admirado o Antônio.
- É muito mais cômodo.
- E onde guardam as suas roupas?
- Nós só temos essa.
- E quando ficam sujas, o que vocês fazem?
- Elas nunca ficam sujas.
- Como assim?
- Elas não existem.
- Como assim? Vocês vestem uma túnica azul.
- Há muito tempo que não usamos mais roupas. O que vocês
vem, na realidade é o nosso halo de proteção.
- O que é isso?
- É difícil explicar para vocês mais é, mais ou menos, uma
força gravitacional que protege os nossos corpos.
- E de onde vem essa força?
- Do nosso cérebro.

90
- Quer dizer que é uma espécie de armadura telepática?
- Isso mesmo.
- Nada os atingem então?
- Nada físico.
- Como nada físico?
- Nada que seja matéria pode nos atingir. Só uma força
telepática maior que a nossa pode penetrar no que você
chama de nossa armadura.
- Quer dizer que se eu jogar uma pedra, por exemplo, ela não
vai lhe atingir?
- Isso.
- Não acredito.
- Você está carregando um cantil de água, né? Pois jogue ele
em cima de mim para provar.
- Não vou ser descortês com você fazendo isso.
- Pode fazer, estou pedindo.
Antônio então, meio sem jeito, atirou o seu cantil de encontro
ao guardião. Mas o cantil não o atingiu. Parou por frações de
segundo no ar e depois foi ao chão.
- Incrível disse o Antônio. Só vendo para acreditar. Se
alguém me contasse eu não acreditaria.
- Vocês vão aprender muitas coisas ainda conosco.
- Com certeza, concordou o Antônio. Só mais uma coisa, sem
querer ser indelicado, mas estou com muita fome, quando vai
ser servido o jantar?
- Nós não comemos. Nem bebemos.
- E como vocês se alimentam?
- Do ar. Tiramos do ar todos os elementos que necessitamos
para viver.
- Incrível. Mais uma coisa inacreditável. Realmente vamos
ter que aprender muitas coisas de vocês, mesmo. Bem, nesse

91
caso temos, nós mesmo, que providenciar o sustento
enquanto estivermos aqui.
- Vocês terão sim. Mas lhe pedimos uma coisa. Não comam
nada que tenha alma.
- Só vegetais, então?
- Exatamente.
- E os vegetais não têm alma?
- Não, eles vivem, mas não tem alma.
- Só mais uma pergunta?
- Pois não.
- Reparei que o prédio não tem porta nem janelas.
- Ele tem porta e janelas.
- Mas como? Não vi nada.
- Você viu algum bicho ou inseto aqui dentro?
- Não.
- Viu alguma corrente de ar?
- Também não.
- Então?
- Mas eu entrei pelo vão que seria de uma porta e não vi porta
alguma.
- A nossa porta e as nossas janelas não são físicas.
- Como assim?
- Nos só deixamos entrar o que queremos.
- Como as suas túnicas?
- Exatamente.
- Força mental?
- Isso.
- Inacreditável.
Aba Epyak sentou-se no chão e pediu que o Antônio fizesse o
mesmo.
Começou então a falar:

92
- Antônio, a raça humana está reduzida hoje há um pouco
mais de um milhão de seres. Os continentes como África,
Austrália e Europa capitularam de vez. Não existem mais
humanos vivendo naquelas terras. Só alguns países da Ásia e
das Américas do Sul e Central, que ainda tinham florestas
tropicais, sobrevivem. Mas não estão mais organizados como
governos. A população, que restou, refugiada nas florestas,
sobrevive organizada em pequenos grupos de cinco a dez mil
habitantes, como se fossem tribos. A única exceção são os
Estados Unidos, que ainda se mantêm como governo, através
da cidade de Fênix e dos poucos Fortes Vitais. Mas estes
Fortes Vitais não resistirão por muito mais tempo, nas
condições atuais. A tendência é a de só ficar, como último
baluarte de sua civilização, a cidade de Fênix. Mesmo assim,
ela sofre um risco muito grande.
- Qual Aba Epyak?
- Como eu já lhe disse, a qualquer momento os Zorkos vão
voltar. E quando voltarem, a primeira coisa que vão fazer é
destruir a Fênix. Será o fim da civilização da raça humana,
pois só restarão as tribos escondidas nas florestas, que
involuirão, como aconteceu com a nossa raça, a índios, ao
longo do tempo.
- Mas que desastre.
- Pois é. Mas tem o seu lado positivo.
- Lado positivo? A destruição da raça humana?
- Bem, em primeiro lugar, a raça humana continuará, graças
às formigas existentes nas florestas. O que será uma dádiva,
em relação aos outros planetas cujas raças nativas e mesmo
as nossas, que foram extintas. Por outro lado, o planeta Terra,
sem a poluição que vocês provocam, vai reviver. Os mares e
os rios voltarão a ser puros, beneficiando a natureza. Os
peixes, as aves, os pequenos animais terrestres e a vegetação,

93
voltarão a crescer, como era antes. E a Terra não correrá mais
o risco de acabar.
Desculpe, Antônio, mas vocês são como uma espécie de
câncer para o seu planeta. Aos poucos, vocês a estavam
destruindo. A ganância, a cobiça e o poder de vocês
desenvolveram uma tecnologia podre. Vocês não respeitam a
natureza. O dinheiro é o objetivo final. Do jeito que estão se
desenvolvendo, em mais um século, terão acabado com todos
os espécimes deste planeta e se auto-destruídos, pois os
humanos não conseguem ver que o bio-sistema é único, e
cada espécime depende da outra para sobreviver.
Quando vocês acabassem com as florestas, estariam
acabando também com a água potável. Quando acabassem
com os mares, estariam acabando com os peixes. E aí, sem
água doce e sem comida, por conseqüência, vocês também
acabariam.
Seria um desastre muito maior do que está acontecendo. Pois
não teriam a chance de recomeçar. Agora, pelo menos,
mesmo sendo a Fênix destruída, acabando com a atual
civilização, vocês terão a chance de sobreviver, recomeçando
tudo. Talvez em outra direção.
Por isso é que, a cada dia, mais certeza tenho, de que este
planeta é especial. Em relação a todos os outros do universo.
- Eu concordo com tudo o que você falou, Aba Epyak. Mas o
que podemos fazer?
- Eu estou muito indeciso, Antônio. Não sei bem o que fazer.
- Indeciso em que Aba Epyak?
- Se ajudamos vocês ou não?
- Como assim, Aba Epyak? Vai deixar os Zorkos destruir a
nossa civilização?
- Talvez seja o melhor para vocês. O ponto crucial é se
deixamos a raça humana sobreviver com a atual tecnologia

94
ou deixamos os Zorkos acabarem com a Fênix e, por
conseguinte, com a sua civilização, propiciando a raça
humana um novo recomeço, talvez em outra direção.

Capítulo 10

O submarino atômico US Califórnia entrou no mar


Mediterrâneo costeando a África, mais a frente passou ao
largo da grande ilha Siciliana, ao sul da Itália, e tomou o
rumo de vinte e cinco graus de longitude e trinta e sete e
meio graus de latitude até chegar na costa da Grécia e indo a
direção oeste situou-se no arquipélago que formava as ilhas
gregas.
- Profundidade de telescópico, gritou o imediato.
- Subir telescópico, ordenou o comandante.
O comandante Smith Lerson colocou os seus olhos nos
óculos do telescópico e, lentamente, o girou. Após um
movimento de 90 graus localizou o navio. Era o Papanaikos
GR, um dos maiores navios de turismo do mundo, com
capacidade para dez mil turistas e de bandeira grega.
- Leme a bombordo, noventa graus, falou para o seu piloto.
O gigantesco submarino, de ultima geração, o mais novo dos
EEUU, girou lentamente, apontando a sua proa para o navio.
- Um quarto à frente, ordenou o comandante.
Quando chegou a cem metros parou as suas máquinas e
emergiu. A grande nave quando chegou a superfície deslocou
uma enorme massa de água fazendo uma grande marola.

95
O Papanaikos estava poitado e quando o submarino
americano apareceu, todos os que estavam a bordo correram
para o tombadilho e se dependuraram nas grades, gritando
saudações e acenando para o barco americano.
A alegria era geral. Sujos, esfomeados e com sede, há mais
de noventa dias não tinham contato com ninguém de fora, a
simples aparição do submarino os deixavam felizes. Era um
sentimento estranho, de felicidade, por encontrarem outros
seres humanos como eles. Eram como náufragos encontrando
os seus salvadores. Depois de meses de luta com os insetos,
de fuga, finalmente, para navio, o poder bélico do submarino
os faziam sentirem fortes como raça.
O capitão do submarino, pelo rádio, pediu a presença do
comandante do navio.
- Bem vindo comandante Smith, falou.
- Para você também, comandante Sparus. Solicito a sua
presença em meu submarino.
- Com todo o prazer, respondeu feliz o comandante do navio.
Imediatamente o comandante Sparus mandou descer um dos
botes salva-vidas do Papanaikos e foi em direção a nave
americana.
- Permissão para subir a bordo.
- Permissão concedida, disse o Smith.
O comandante Sparus, junto com o seu imediato, entrou no
submarino. Após as continências de praxe, foram direto para
a cabine do comandante americano.
O comandante grego estranhou quando, além do americano,
três guardas também entraram no camarote do comandante.
A porta foi fechada. O comandante americano sentou-se e
convidou os dois gregos a também sentarem.
- Quantas pessoas o senhor tem a bordo?

96
- Tenho mil e duzentos tripulantes e mais oito mil pessoas.
Mas estamos quase que sem água e de comida só temos os
pescados. Estamos passando fome...
O comandante americano não deixou o grego terminar.
- Comandante, estamos em missão de guerra!
- Missão de guerra? Que mal pergunte, contra quem?
- Bem, contra ninguém propriamente, mas a favor do povo
americano.
- Não estou entendendo. Disse o grego.
- Em nome dos EEUU estou confiscando o seu navio.
- Como assim, comandante. O que o senhor quer dizer com
isso?
- Quero dizer que a partir de agora o seu navio pertence ao
povo dos EEUU.
- É? E que o senhor vai fazer com ele? Disse incrédulo o
comandante grego.
- Vou levá-lo para a América.
- E a minha tripulação? E os meus passageiros?
- Vão ser transferidos para um navio cargueiro que chegará
aqui em dois dias.
- O senhor tá maluco, capitão? O senhor sabe bem o que está
dizendo?
- Sinto muito, comandante, mas são minhas ordens.
- Que ordens malucas são essas? De quem afinal?
- Do governo dos EEUU. Do nosso presidente.
- Mas como o senhor acha que vamos ajeitar nove mil e
duzentas pessoas num navio cargueiro? Não tem lugar.
- Ficam no tombadilho.
- No tombadilho como, comandante? Ao ar livre? Ao sol, a
chuva? O senhor vai nos matar a todos. Como é que vamos
nos ajeitar?
- Isso é problema seu, comandante. Coloque-os nos porões.

97
- Nos porões? O senhor pensa que os gregos são ratos?
- Eu não penso nada, comandante. Sigo as minhas ordens e
vou cumpri-las, custe o que custar.
- E vai matar milhares de mulheres, crianças e homens?
- Eu não vou matar ninguém, comandante. Apenas vou
transferi-los para outro navio. A vida deles vai depender da
sua administração.
- Como é que o senhor acha que vou conseguir administrar
nove mil e duzentas pessoas jogadas nos porões e no
tombadilho de um navio cargueiro? Pode me explicar? Com a
sua permissão eu vou voltar para o meu navio.
- Permissão negada, comandante. A partir de agora o senhor
é meu prisioneiro.
O capitão grego levantou-se e fez menção de se dirigir para a
porta, mas um dos guardas encostou o fuzil em sua barriga. O
comandante grego deixou-se, abatido, cair na cadeira.
- Muito bem, comandante Smith, como é que o senhor vai
conseguir transferir mais de nove mil pessoas para um
cargueiro sem evitar um motim?
- Já está tudo planejado, comandante. Por isso é que tenho
que lhe prender. Como já lhe falei, dentro de dois dias o
cargueiro chega aqui. Vamos dizer ao seu pessoal que,
enquanto eles ficam no cargueiro, limparemos e
carregaremos o navio com mantimentos, comida e água
potável. Assim não teremos nenhuma resistência.
- Mas isso é pura pirataria.
- Apenas cumpro ordens, capitão.
- O senhor é um monstro, comandante.

FORTE FÊNIX

98
- Presidente, falou o Almirante, já arrastamos os navios
necessários à operação.
- Algum problema?
- Nenhum presidente. Os navios já foram reabastecidos e em
no máximo uma semana teremos todos eles aqui.
- Espero que a história não me trate como um assassino.
- Claro que não Presidente. O senhor será retratado como um
grande herói americano que salvou o seu povo da morte
certa.
- Assim espero. Pois esse é o meu dever.
Virando para o seu General, comandante geral das forças
armadas, falou:
- General, temos que preparar a transferência da população
dos Fortes Vitais para os navios.
- O plano já está feito, Presidente. Aqui está para a sua
aprovação. Dizendo isso, o general passou para as mãos do
presidente.

SEMENTE

Aba Epyak convocou todos os membros da expedição para a


grande sala da pedra azul.
- Antônio, disse ele, temos que recolher o sangue de todos
vocês.
- Para que? Estranhou o Antônio
- Temos que desenvolver, ou adiantar, melhor falando, os
cérebros de vocês.
- Como assim, Aba Epyak?

99
- Lembra-se da nossa última conversa? Na qual eu falava que
estávamos em duvidas se ajudávamos a vocês contra os
Zorkos ou não?
- Lembro-me bem, Aba Epyak.
- Pois bem, decidimos por três votos a dois, que vamos ajuda-
los. Decidimos também que é chegada a hora de
combatermos os Zorkos. Assim, as nossas duas raças têm que
se juntar contra os Zorkoianos. Será a batalha final. Caso
percamos, a sua raça, mesmo involuindo, permanecerá, mas a
nossa acabará.
- E para que o sangue?
- Vamos fazer com vocês o que fizemos conosco.
- E o que vocês fizeram?
- A nossa evolução, como raça, se deu através do
desenvolvimento dos nossos genes, num processo de seleção
e ou transformação dos genes.
- Como assim?
- A adaptação dos seres vivos de um planeta está na relação
direta dos problemas que ele enfrenta. Como já dissemos,
quando o macaco desceu das árvores, os nossos rabos
atrofiaram, pois não tínhamos mais necessidade deles para
nos prendermos ou equilibrarmos nos galhos. Assim como a
nossa posição ficou ereta, pois era necessário para nos
locomovermos mais rápido e deixar os nossos membros
superiores livres para outras tarefas. A transformação física
foi o resultado direto das transformações de alguns dos
nossos genes. Mas isso leva muito tempo para acontecer.
Milhares e milhares de anos.
Da mesma forma os nossos cérebros levariam milhares e
milhares de anos, para atingir o nosso desenvolvimento atual.
Então, para acelerarmos esta transformação, tivemos que

100
modificar os nossos genes relativos ao desenvolvimento
cerebral. Temos que fazer a mesma coisa com vocês.
Vamos mapear o código genético da sua raça para podermos
acelerar o desenvolvimento cerebral de vocês, a ponto de
ficarem ao mesmo nível em que estamos.
- Mas como vocês vão fazer isso? Nós levamos mais de dez
anos para mapear os nossos códigos, em nossos
computadores. E a única coisa que temos, na realidade é o
mapa, propriamente dito. Não sabemos fazer mais do que
isso.
- Mas a nossa civilização é muito mais avançada. Em poucas
horas teremos o mapa do DNA de vocês e poderemos então
injetar o gen desenvolvido do seu cérebro, em seu sangue.
Em poucos dias os seus cérebros terão um desenvolvimento
formidável.
- Mas isso é possível?
- Com certeza. Foi o que fizemos conosco.
- Seremos então iguais a vocês?
- Quase. Pois a sua raça tem algumas características que a
nossa raça não tem e vice-versa.
- Como, por exemplo?
- A agressividade.
- Mas isso, no futuro, não pode representar um perigo para
vocês?
- Não. Pois a partir do momento em que vocês ficarem mais
inteligentes, seus valores mudarão. E, com certeza, ficarão
mais pacíficos.
- Então também a nossa agressividade diminuirá, o que dará
no mesmo.
- Não, a agressividade será a mesma, só que será
encaminhada em outra direção.
- Por exemplo?

101
- Na vontade.
- Não entendi.
- Vocês serão, naturalmente, mais obstinados que nos.
Lutarão mais por seus objetivos.
- Mas, Aba Epyak, pelo que eu saiba, vocês abandonaram
toda a tecnologia física em função do desenvolvimento
cerebral. Como é que vocês farão para tirar o nosso sangue,
mapear o nosso DNA, etc., sem nenhum aparelho, como
seringa, computador...?
- A centena de anos que não precisamos mais de nenhum
aparelho, pois a nossa mente é suficiente, mas isso não quer
dizer que não o tenhamos.
- Então vocês ainda os têm?
- Claro que temos. Venham comigo.
Aba Epyak então conduziu o grupo a uma sala também
enorme, que ficava no segundo andar, em lado oposto aos
dos quartos. A sala era cheia de equipamentos que eles nunca
tinham visto. Mas, aparentemente, os aparelhos que lá
estavam não eram feitos de metal, mas sim de um material
que parecia uma mistura de plástico e cristal. E eram cheios
de luzes, de várias cores.
Aba Epyak acenou para o Antônio sentar em uma cadeira
branca que parecia de cristal. Em frente à cadeira ficava uma
tela que mais parecia de cristal líquido, igual à utilizada nos
notebooks.
A cadeira tinha apenas um encosto para o braço esquerdo. No
lado direito, em seu lugar, um tubo transparente, também do
mesmo material que parecia uma mistura de plástico e cristal.
- Por favor, pediu o Aba Epyak, enfie o seu braço no tubo.
Antonio, meio receoso, enfiou o braço. No mesmo instante o
tubo como que se acendeu. Apareceu um fio vermelho, da

102
largura de um lápis fino, que aumentou o seu cumprimento
até uns trinta centímetros.
- É o seu sangue, falou o Aba Epyak.
Depois o fio vermelho desapareceu e uma bola que ficava em
cima do tubo, aparentemente sem alguma ligação com ele,
ficou também vermelha. Imediatamente na tela a frente,
apareceram milhares de caracteres totalmente desconhecidos
para os cientistas, que rolavam de cima para baixo na tela,
num frenesi.
- Pode se levantar, Antônio, o nosso computador - disse
apontando para a tela - já está decodificando o seu DNA.

FORTE FÊNIX

O plano para a evacuação dos Fortes Vitais estava sendo


executado. Os navios, tanto nas costa do Pacífico quanto na
do Atlântico, estavam ancorados nos portos mais perto dos
fortes, à espera dos sobreviventes. Mas a tarefa era difícil,
visto que os Aparí-Parús, quando pressentiram a
movimentação dos humanos, concentraram-se ao redor dos
fortes na tentativa de come-los.
Não dava para retirar a população através dos helicópteros,
pois demandaria muito tempo e eles já estavam com falta de
água e comida. Tinha que ser por terra mesmo.
Conforme o planejamento dos generais, os oito porta-aviões
americanos se deslocaram para os portos mais perto dos
fortes. Estes porta-aviões foram abastecidos por helicópteros
de guerra. Os helicópteros, por sua vez, localizavam os
ônibus que estavam perto dos fortes e os tomavam. Os ônibus
então, dirigiam-se para os fortes, escoltados pelos
helicópteros que davam cobertura aos mesmos, atirando nos

103
Aparí-Parús que atacavam os ônibus. Era uma tarefa árdua,
pois a quantidade de insetos era enorme. Muito dos ônibus
tomados não conseguiam chegar ao forte.
Depois os sobreviventes entravam nos ônibus que saiam em
comboio de dez unidades, em direção aos portos, sempre
escoltados pelos helicópteros, que travavam uma incrível
batalha com os insetos. Nos portos, os sobreviventes eram
transferidos para os navios.
A operação durou três dias e foi um sucesso.
- A operação foi realizada com êxito, Presidente.
- Parabéns, general. Estão todos salvos?
- Bem, Presidente, tivemos uma baixa em torno de dez por
cento, o que nessas condições, foi muito boa.
- Perdemos então mais doze mil americanos?
- Foi Presidente.
O Presidente sentou em sua poltrona e ficou quieto. Dos seus
olhos desceram lágrimas.
- Bem, disse ele, não tinha outro jeito, não é? Os navios já
saíram dos portos?
- Já, Presidente, estão indo para a foz dos rios para se
reabastecerem de água. E os navios pesqueiros já estão indo à
direção deles para o abastecimento de peixes.
- Bem, pelo menos, agora, eles não correrão mais perigo.
- Mas nos estamos, Presidente.
- Como assim, General?
- Os insetos, cada dia que passa, estão com mais fome. Estão
atacando a Fênix noite e dia e a nossa munição está
acabando. Do jeito que a coisa vai, só conseguiremos resistir
por mais três meses.
- Então vamos ter que ir, também, para um navio?
- Com certeza, Presidente.
- Uma prisão flutuante...

104
- Mas eu tenho um plano, Presidente.
- Pode falar, Secretário.
- Como o senhor sabe, algumas ilhas ficaram a salvo desses
insetos. Podemos escolher uma delas e lá refazermos o nosso
país.
- Com certeza, Secretário. Uma ótima idéia. Vamos criar um
novo Estado Unidos, reunindo todos os nossos sobreviventes.
- Mas onde será essa ilha?
- Bem, tem que ser grande o suficiente para suportar uma
população de cento e vinte mil americanos e terra suficiente
para o cultivo.
- Mais, senhor presidente, falou o almirante.
- Como assim?
- Temos mais cem mil americanos nos navios de guerra que
irão se juntar a nos.
- Isso, Almirante, vamos refazer o nosso país.
A empolgação tomou conta do grupo. Finalmente eles
ficariam livres da ameaça dos insetos e poderiam
tranqüilamente, em terra, reconstruir a nação.
- Mas que ilha será essa?
- Bem, de preferência nos trópicos, pois não teremos
condições de sobreviver um inverno rigoroso.
- Tem que se grande o suficiente para suportar a nossa
população.
- E de preferência que já esteja edificada, para nos
acomodarmos.
- Mas essa ilha existe? Perguntou o Presidente.
- Claro, Presidente, e é nossa.
- Qual almirante?
- O Havaí.
- Mas ela não está infectada pelos insetos?
- Está limpa, Presidente.

105
- Então vamos para lá!
- Mas temos um problema, Presidente.
- Qual almirante?
- Como o senhor sabe, ela é habitada.
- Qual a população dela, almirante?
- Duzentos mil habitantes, originalmente. Mas quando fomos
invadidos pelos insetos, a população quase que dobrou.
- Muito bem. Originalmente, quantos americanos estavam na
ilha?
- A metade, Presidente. A outra metade é formada por
nativos e estrangeiros. Hoje, eu não sei.
- Pois muito bem, expulsamos todos os estrangeiros e
nativos. A partir de agora se chamará Novo Estados Unidos.
- E o que faremos com a população expulsa?
- Ora, almirante, colocaremos nos navios.

SEMENTES

Aba Epyak chamou o Antônio


- Antônio, o DNA de vocês já está decodificado.
Impressionante como é semelhante ao nosso. A diferença
entre as nossas duas raças é de apenas um por cento.
- E isso é bom?
- Muito, Antônio, pois facilitará a nossa tarefa na
modificação do gen relativo ao desenvolvimento cerebral. E
o processo pode ser o mesmo. Ganharemos muito tempo com
isso. Amanhã poderemos implantar o gen alterado, em vocês.
Creio que vai dar tudo certo.
- E você poderia me dizer em que esse um por cento nos faz
diferentes de vocês?
- Os neurônios, Antônio.
- Como assim, são diferentes em que?

106
- Na velocidade. O crescimento e a interação entre eles são
muito mais velozes que os nossos.
- O que isso quer dizer?
- Que em pouco tempo vocês serão mais inteligentes e, por
conseguinte, poderão desenvolver poderes maiores que os
nossos. Vocês, realmente, são privilegiados. O planeta Terra
é o único no universo conhecido que tem as formigas e, por
isso, com esse controle natural, conseguirão sobreviver aos
Aparí-Parus. E, como se isso não bastasse, vocês são os seres
que têm as maiores possibilidades de desenvolvimento
cerebral. É incrível.
- Bem, apesar de toda essa tragédia, pelo menos uma boa
notícia, não é?
- Com certeza, Antônio. Bem, amanhã, faremos a inoculação
em vocês.

FORTE FÊNIX

O presidente estava preocupado. Dali a pouco começaria a


evacuação dos habitantes do Forte Fênix para o Havaí. O
maior e mais luxuoso navio de passageiros já estava no porto
à espera deles. O presidente e as autoridades seriam
transportados diretamente ao navio pelos helicópteros. Mas
os restantes teriam que ir mesmo de ônibus e, conforme a
experiência dos fortes vitais, pelo menos dez por cento não
iriam sobreviver, acabariam nas garras dos terríveis insetos.
O que queria dizer que mais americanos iriam morrer.
Como no Forte Fênix a maioria da população era de homens,
soldados e cientistas, o presidente resolveu que, mesmo que
levasse mais tempo, as mulheres e as crianças seriam
transportadas por helicópteros. Somente os soldados e os

107
cientistas iriam de ônibus. O que, talvez, reduzisse as mortes,
pois diferentemente dos civis, eles estavam bem armados e
treinados.
O primeiro grande helicóptero pousou na grande praça em
frente ao quartel general da cidade. O presidente e seus
familiares ocuparam os seus lugares e a aeronave partiu. Do
alto, o presidente teve a noção exata da situação: centenas de
milhares de Aparí-Parús cercavam a cidade, ávidos por
comerem os seus habitantes. Seria um milagre, pensou, que
noventa por cento da população conseguisse passar pelos
bichos e chegasse, salvo, ao porto. Tomou então uma
decisão. Pediu ao piloto para falar pelo radio com o general
comandante chefe das forças armadas.
- General. A situação é muito crítica. Dificilmente
conseguiremos passar pelos insetos, por terra. Vamos
transporta-los por helicópteros.
- Mas, presidente, levaremos dias com a operação.
- General nos temos todo o tempo do mundo. E a vida dos
nossos é muito mais preciosa.
Satisfeito com a sua decisão, o presidente se acalmou e pode
apreciar com mais calma a situação. As cidades e os campos
por onde passavam, pareciam cenas de um filme de ficção.
Só se viam insetos. Milhões deles, como numa colméia de
abelhas, andando de um lado para o outro a procura de
comida. Aquela cena o deixou angustiado. A terra não era
mais deles, dos seres humanos, pertencia aos insetos. Era
incrível como, com toda a tecnologia que tinham,
principalmente no que diz respeito às armas, tivessem
capitulado aos insetos. Mas eles eram milhões, talvez bilhões.
E, se reproduziam de uma forma tão incrível que, por mais
que os matassem, a população deles crescia. Imagine,

108
pensou, se eles tivessem asas, se voassem, sem dúvida
alguma não restaria mais ninguém vivo, na Terra.

SEMENTES

Antônio e o seu grupo voltaram à sala do laboratório, como


eles chamavam, para serem inoculados com o gen de
desenvolvimento cerebral. Era a mesma máquina, se assim
poderiam chamar, que eles tinham tirado sangue. Não doeu
nada, não sentiram nada. Só depois de algumas horas, todos
eles, sem exceção, começaram a ter dor de cabeça e a sentir
uma moleza, como se estivem gripados.
Sem ter o que fazer, os humanos deitaram em seus quartos e
assim ficaram por vários dias. Não tinham fome, só muita
sede. Todos eles perderam peso e a sensação de doença
permaneceu. Eles estavam sonolentos e passavam a maior
parte dormindo. Pareciam dopados. Não tinham ânimo para
nada. Até que entraram num sono profundo. Só acordavam
para beber água.
Aba Epyak vinha visitá-los freqüentemente com um aparelho
que parecia uma pedra azul. A pedra, ao ser passada no corpo
de cada um, ficava vermelha como um rubi. Depois de várias
semanas, a pedra começou a perder a cor vermelha. De
vermelho sangue passou a rosa, depois para branco e por fim
para um verde bem claro. Dia a dia, o verde foi ficando mais
forte até que a pedra ficou verde esmeralda. Quando isso se
deu, eles começaram a sair da letargia.
- Como você está se sentindo hoje, Antônio, perguntou o Aba
Epyak?

109
- Bem melhor. Inclusive com muita fome. O que aconteceu?
- A inoculação foi um sucesso.
- Mas eu me senti muito mal. Pensei que ia morrer.
- É assim mesmo, Antônio. Houve uma transformação muito
grande no seu cérebro. O seu cérebro, com a entrada do novo
gen, teve que se reorganizar totalmente. Mas a fase crítica já
passou. Agora a mutação está em andamento. Estávamos
com medo que desse errado, mas foi tudo bem.
- O que vai nos acontecer?
- Bem, vocês ficarão muito mais inteligentes, num tempo
bastante curto, em relação ao tempo que levamos. Agora, se
vão ter outros poderes e quais serão, só com o tempo é que
saberemos. Mas, você não reparou numa coisa...
- Que coisa, Aba Epyak?
- É que estamos conversando e você não pronunciou uma
palavra. Percebeu?
- Não tinha percebido. Mas é verdade.
- Pois bem, vocês agora, como nós, são seres telepáticos.
Nesse momento Kuyã Aysu entrou no aposento, trazendo
uma vasilha com uma pasta verde.
Antônio nem perguntou o que era. Já sabia, pois tinha
sentido, que era a sua comida. Era uma sensação totalmente
nova para ele. Não precisava perguntar mais nada. Lia nos
cérebros dos Guaranis o que se passava. Tomou, em frações
de segundos, noção de tudo o que tinha acontecido.
Soube que a pasta verde era um conjunto de raízes e plantas
medicinais. Comeu avidamente. Depois agradeceu e sentou-
se a meditar, maravilhado que estava com o novo sentido que
acabara de conhecer.
De repente Antônio começou a ficar angustiado, um
sentimento estranho o acolheu. Sentia uma agonia vinda de
seus companheiros e depois, um silêncio absoluto.

110
- Letícia, chamou apavorado.
- Sim, Antônio, respondeu.
- Você está sentindo a mesma coisa que eu?
- Estou, Antônio, respondeu telepaticamente a bióloga. É um
grande sentimento de tristeza. Um vazio absoluto, como se
fosse a morte.
O Raimundo entrou no cérebro deles.
- Eu estou sentindo a mesma coisa. E não consigo me
comunicar com os nossos.
- O que está acontecendo, Aba Epyak? Perguntou aflito o
Antônio.
- Seus companheiros morreram, só sobraram vocês três.
- Morreram de que, Aba Epyak?
- Antônio, deixe-me explicar: quando nos inoculamos o gen
do desenvolvimento cerebral, a maioria morreu. Só nos seis
sobrevivemos. O mesmo aconteceu com vocês.
- Mas por que?
- Não sabemos ao certo. Parece que só alguns cérebros
privilegiados conseguem sobreviver a essa grande
transformação.
- Corremos então risco de vida?
- Vocês três, não mais. Passaram do momento crítico.
- Mas se você sabia que isso poderia acontecer, por que fez?
- Porque era necessário. Fundamental mesmo. Nós estamos
numa luta de vida e morte com os Zorkos e precisávamos de
vocês.
- Mas eles morreram.
- Não havia alternativa. Era preciso. Vocês, agora, também
são guardiões da Semente.
Os três humanos ficaram quietos. Acabavam de sentir a
aflição dos Guaranis. Era uma questão de sobrevivência. A
luta final contra os Zorkos se aproximava.

111
UM ANO DEPOIS

O planeta Terra estava reduzido há um pouco menos de um


milhão de habitantes. A maioria se concentrava no Havaí. A
ilha, com quatrocentas mil pessoas tinha se transformado no
Novo Estado Unidos. Era o único lugar onde existia um
governo organizado. Os outros habitantes sobreviviam em
grupos, como se fossem tribos, no meio das grandes florestas
tropicais e em navios de turismo, comerciais e de guerra.
Por outro lado, o planeta, sem a ação predadora do homem,
tinha como que renascido. A natureza, sem a poluição, estava
exuberante. Parecia o paraíso. Os rios voltaram a ter as suas
águas limpas, as florestas começaram a reconquistar os seus
espaços perdidos e o mar voltara ao que era. Como
conseqüência, os animais marinhos e fluviais voltaram a
abundar nas águas. Cardumes de peixes, crustáceos e outros,
recuperavam as suas populações. O mesmo se dava nas
florestas, sem a ação dos homens. O planeta voltava a se
equilibrar e a mostrar toda a sua exuberância.
Na Semente, Antônio, Letícia e Raimundo tinham se
desenvolvido velozmente a ponto de se equipararem aos
Guaranis. Eles estavam maravilhados com a nova perspectiva
que os seus, agora, poderosos cérebros, lhes davam. A
perspectiva da vida era outra. Sumiram de suas almas os
rancores, o ódio, a inveja e os demais males tão comuns à
civilização de onde vieram. As suas vidas eram muito mais
felizes. Filosofavam, muito, com os Guaranis.
Telepaticamente sentiam que os povos que tinham fugido
para as florestas estavam felizes. Uma nova ordem tinha sido
estabelecida. Eles viviam harmonicamente, sem a tecnologia.
Por mais paradoxal que fosse, a falta da tecnologia e o seu

112
conforto, só vieram beneficiar. Estavam mais magros e com
mais saúde. As grandes doenças, como o câncer, o infarto e o
derrame tinham sido reduzidas a expressões mínimas. O
strees não mais existia. Em vez de destruírem a natureza
tinham se incorporado a ela.
Ao contrário, os humanos que estavam no Havaí e nos
navios, apresentavam os mesmos problemas de antes. Nas
embarcações os problemas eram ainda maiores. Obrigados a
conviver juntos, num espaço ultra-reduzido, como se fosse
uma prisão, criaram um inferno. Um barril de pólvora.
Rebeliões acudiam a toda a hora. Facções eram formadas e a
luta pelo poder ensejava guerrilhas. Mortes, roubos e
assassinatos eram constantes. A convivência era infernal.
E era justamente sobre esse assunto que os três filosofavam
com os Guaranis.
- Aba Epyak, estou desconcertado. Disse o Antônio. A vida
inteira pensei que estávamos evoluindo, tendo como base a
nossa tecnologia. Mas na realidade estávamos involuindo.
Quanto mais avançávamos mais infelizes ficávamos e mais
problemas arranjávamos. Agora, comparando as duas
situações, podemos ver que estávamos no caminho errado.
- Sem dúvida, Antônio. Vocês confundiam tudo. O
importante não é a riqueza, o poder. O importante é a
felicidade, a tranqüilidade. Vocês estavam se matando e
matando este planeta. Vocês não viviam mais, vocês
lutavam. Lutavam até para coisas básicas como comer e ter
onde morar. A perspectiva de sua raça estava toda errada.
- Estou chegando a conclusão que este desastre todo, que se
abateu sobre nós, foi intencional.
- Nada é ocasional, Antônio. Tudo tem uma razão de ser.
Existe uma força que regula a natureza, que vocês chamam
de Deus. Quando há um desvio, seja qual for, ela

113
imediatamente toma as providencias necessárias para voltar
ao equilíbrio. Vocês estavam destruindo o planeta e, do jeito
que estava, vocês inexoravelmente teriam um fim muito pior.
Agora, pelo menos, o planeta renascerá e vocês, com certeza,
tomarão o caminho certo. Em resumo, tudo voltará ao
normal, ao que deveria ser.
- Nesse caso, Aba Epyak, fico achando que, se em vez de
lutarmos contra os Zorkos, não deveríamos deixar como está.
- Tenho pensado muito nisso Antônio. Afinal, a nossa raça
foi exterminada. Só nos seis restamos. O nosso planeta
acabou. Nele, só existem os Aparí-Parús. O que vamos fazer
lá?
- Por falar nisso, Aba Epyak, tenho uma curiosidade. Se os
Aparí-Parús comem todos os animais de médio e grande
porte, como eles sobrevivem depois que acabam com esses
animais?
- Muito simples, Antônio. Eles quando não tem o que comer
viram canibais.
- Então eles acabam se exterminando?
- Isso não acontece. Como você sabe, a proliferação é muito
grande. Assim, eles se auto-alimentam. Você se lembra da
lenda do moto-perpétuo? Pois eles assim o são.
- Voltando ao nosso assunto, Antônio, voltar ao nosso
planeta, nestas condições, seria inviável. Por duas grandes
razões: a primeira pelo lado sentimental. Sofreríamos muito
lembrando tudo o que aconteceu e como ele era. Uma coisa é
você lembrar-se de como era, daqui. Outra é voltar ao local.
Seria muito penoso para todos nós.
- Mas vocês não viveram lá, estão há séculos aqui. Nasceram
aqui.
- Aí é que está a maior diferença entre nossas raças. Nós na
realidade não morremos.

114
- Vocês não morrem?
- Bem, morremos sim, mas a diferença é que quando
nascemos voltamos com toda a memória de um de nossos
antepassados. Assim, podemos dizer que estamos revivendo
quando nascemos. Continuamos a vida. Eu, por exemplo, sou
o Aba Epyak número 3.157. E tenho a memória da vida de
todos eles. Assim, eu sou também o Aba Epyak número 1.
- Mas isso pode ser muito ruim.
- Porque?
- Se um de vocês comete uma injustiça, por exemplo, vão
viver por todas as gerações com o sentimento de
arrependimento.
- Por isso é que somos absolutamente corretos. Pois sabemos
que teremos que conviver, ad eternum, com as conseqüências
de nossas ações. O que não acontece com vocês.
A segunda grande razão, para não voltarmos ao nosso
planeta, é o Aparí-Parú. Lá não existem as formigas e eles
são incontroláveis. Desta forma, achamos que devemos ficar
aqui mesmo. Com vocês.
Mas, ao mesmo tempo, pensamos nos mais de meio milhão
de pessoas, que estão no Havaí e nos navios. Eles serão
destruídos pelos Zorkos, quando voltarem.
- Depois os Zorkos irão embora e, provavelmente, só voltarão
daqui a alguns séculos.
- E os povos das florestas evoluirão novamente.
- E criarão novas tecnologias, que serão captadas pelos
Zorkos, que voltarão e os exterminarão.
- E isso não vai ter fim. Os humanos serão sacrificados,
gradativamente, à medida que evoluírem.
- Exatamente.
- Então chegamos a conclusão que teremos que enfrenta-los.
- Não temos outra alternativa.

115
Capítulo 11

A nave de guerra Zorkoniana saiu do hiper-espaço bem perto


do sistema solar. O capitão deu ordens ao seu piloto para
dirigir-se ao terceiro planeta. Minutos depois entrou em
órbita.
- Ligue o observador, falou.
O observador era uma espécie de radar, só que muito mais
avançado. Ligado ao computador de bordo, verificava,
imediatamente, qualquer objeto de metal. O computador
analisava detalhadamente os metais encontrados e quando
reconhecia pela quantidade e tamanho, que eram tecnologias
de uma civilização mais avançada, dava o alarme e plotava
no mapa de cristal líquido, que ficava na cabine de comando,
o local.
- Impressionante, falou o comandante, a raça que habita este
planeta conseguiu, num espaço ínfimo de tempo, se
reorganizar. Eles estão concentrados numa pequena ilha num
dos oceanos.
- O que vamos fazer, comandante? Perguntou o capitão da
artilharia?
- Enquadre o local na mira e destrua-os.

SEMENTES

116
Aba Epyak, aflito, entrou em contato com os outros Guaranis
e com os humanos, habitantes da Semente.
- Vocês estão sentindo o mesmo que eu?
- Os zorkos voltaram, respondeu o Antônio.
- E já armaram os raios Z5 e os apontaram para o Havaí.
- Chegou a hora. Este é o momento por que tanto tínhamos
medo. Agora saberemos se podemos enfrentar os Zorkianos.
Uma vitória deles e será o fim de nossa raça.
- E da nossa também.
- Nem tanto Antônio. Vocês sobreviverão nas florestas.
- Até nos desenvolvermos e sermos abatidos de novo, como
já conversamos. Tantas vezes quanto eles acharem
necessário. Na realidade seremos controlados por eles,
eternamente.
Um silêncio abateu sobre eles. Todos foram para a sala da
pedra azul e sentaram nas cadeiras. Diferentemente da
primeira vez, as cadeiras dos humanos não ficaram brancas,
acenderam-se com a luz vermelha.
Todos se concentraram. Era a hora da verdade.

NAVE ZORKOIANA

- Disparar, ordenou o comandante.


Um feixe de luz branca saiu da cauda da nave em direção a
Terra. Mas, diferentemente do que os Zorkaianos esperavam
não houve nenhuma destruição. A luz branca como que se
espalhou, envolvendo a Terra e, depois, esvaeceu-se.
- O que houve? Perguntou o comandante?
- Não sei dizer. Respondeu o capitão. Parece que falhou.
- Como que falhou? O que dizem os controles?
- Que está tudo certo. Não tem nenhum erro.

117
- Então dispare, outra vez.
A ordem foi obedecida e, como da vez anterior, o mesmo
aconteceu.
- De novo? Gritou o comandante. O que está acontecendo?
- Não sei dizer senhor. Os raios partem mas não atingem os
seus objetivos. Parece que uma força desconhecida os
bloqueiam.
- Droga, berrou o comandante. Disparem de novo.
Mais cinco tentativas foram feitas. Todas sem êxito.
- Não adianta, os raios estão sendo bloqueados.
- Mas que força é esta? Vocês conseguem identificar?
- Não conseguimos. Nada está errado. No entanto não
funciona.
- Então vamos lá. Dirija a nave para o local e vamos destruí-
los pessoalmente. Mande preparar o batalhão de infantaria
para o desembarque.
A nave colossal, pelos padrões da Terra, rumou em direção
ao Havaí e, lá chegando, planou bem em cima de umas das
grandes praias da ilha. Uma grande porta se abriu e, por ela,
vários veículos escaparam e aterraram nas areias. De dentro
desses veículos saíram centenas de soldados, com as armas
em punho, todos eles vestidos de uma roupa amarela colante,
que mais parecia uma roupa de mergulho.

NOVO ESTADOS UNIDOS

O general de exército comandante em chefe das forças


armadas dos Novos estados Unidos estava sentado na mesa
de reunião do gabinete do presidente da república, discutindo
sobre as rebeliões que se sucediam na ilha, devido à fome. A

118
ilha era pequena demais para ter terras o suficiente para a
agricultura produzir o necessário para o sustento da
população. Assim, havia um grande racionamento e a quota
de alimentação passada à população era o mínimo necessário
para garantir a sobrevivência.
Enquanto discutia, o general, que se sentava em frente a
grande janela do gabinete, levantou os olhos e viu o primeiro
clarão do raio que foi desfeito.
- Veja só, presidente. Olha o que está acontecendo no céu.
- Mas que coisa. O céu de azul ficou branco e depois, se
esvaineceu, como se fosse uma neblina, voltando a sua cor
original. O que está acontecendo general?
- Não tenho a mínima idéia, presidente. Parece uma explosão.
Mas não ouvi nenhum barulho.
O fenômeno voltou a acontecer várias vezes. O presidente
ficou lívido. Uma estranha sensação apossou-se dele.
- Será que são os extra-terrestres novamente? Será que eles
voltaram?
- Meu Deus do céu, falou com medo o general. Se forem eles
estamos perdidos, presidente. Não temos como enfrenta-los.
- Reze para que não seja, general. Pois se for, seremos
exterminados, como aconteceu da primeira vez.
- Mas, o que fizemos a eles para nos destruírem dessa
maneira?
Nisso o telefone toca na mesa do presidente. A secretária
atende e passa o telefone para as mãos do governante. Ele
escuta com atenção e depois coloca o aparelho no gancho.
Vira-se para o general e, branco como uma cera, e diz:
- General, estamos sendo atacados nas praias ao sul da
cidade. Parece que uma grande nave por lá pousou e os
alienígenas desembarcaram Acho melhor você tomar o
comando.

119
O general fez uma rápida continência e saiu correndo do
gabinete para assumir o comando da situação. Já no carro, em
direção à praia, pegou o seu celular e entrou em contato com
o almirante chefe de esquadra:
- Bill, falou ele, o que está acontecendo aí?
- Estamos sendo atacados por alienígenas, na praia.
- E qual é a situação?
-Terrível, MacArthur, as nossas armas não tem o menor
efeito contra eles. Parecem balas de festim. No entanto, as
armas deles nos destroem. Para você ter uma idéia, os nossos
tanques parecem ser feitos de papelão. Eles não resistem a
um único tiro dos alienígenas.
- Não é melhor recuar?
- É o que estamos fazendo.
- Quantos eles são?
- Apenas algumas centenas.
- Já chamou reforços?
- Já general. Dentro de poucos minutos teremos todos os
nossos efetivos na praia.
- Vê se agüenta. Daqui a alguns minutos estarei chegando aí.
O general pediu ao seu chofer que aumentasse a velocidade.
Quando chegou ao local, parecia um pesadelo. Milhares de
soldados americanos mortos na praia. Dezenas de tanques
destruídos jaziam nas redondezas. Eles pareciam que tinham
sido furados por uma broca gigantesca. Ostentavam enormes
buracos redondos em suas couraças. Parecia o apocalipse. Os
batalhões tomavam as suas posições e, logo em seguida, eram
arrasados pelos raios vermelho-alaranjados que saiam das
armas de uns homens vestidos de amarelo.
Vários lança mísseis lançaram os seus petardos em direção
aos alienígenas. Os mísseis estouravam em cima, formando
grandes bolas de fogo. Em seguida, a fumaça envolvia os

120
alienígenas. Quando dissipava, os inimigos continuavam de
pé, avançando como se nada tivesse acontecido.
Foi justamente nesse momento que o general encontrou-se
com o almirante.
- Não adianta, general, as nossas armas, mesmo as mais
poderosas, como os mísseis, não surtem o menor efeito
contra eles. O que faço?
- Continue, almirante. Já que vamos morrer, pelo menos
morreremos lutando, como verdadeiros soldados.
- E os aviões, dos porta-aviões?
- Foram todos destruídos, general. De qualquer forma,
também não adiantou nada.
- Que fim vamos ter, almirante. Seremos destruídos, varridos
da face da Terra, sem ao menos sabermos quem são os
nossos inimigos e por que estão nos atacando.
- E a bomba atômica?
- Bem, é a nossa última alternativa. Será um suicídio, mas
pelos menos acabamos, também, com a raça deles. Mas essa
ordem só o presidente pode dar.
O general pegou o seu celular e ligou para o presidente.
Contou toda a situação e perguntou;
- Devemos lança-la?
- Não general. Não posso autorizar o extermínio da nossa
raça. Vamos nos render. Veremos então o que eles querem e
o que poderemos fazer. Pelo menos teremos uma alternativa.
O general voltou-se para o almirante:
- A nossa ordem é a de nos rendermos.
- Mas isso é uma loucura, general. Como vamos ter certeza
que eles aceitarão a nossa rendição? E se o fizerem, o que
vão querer de nós? Do jeito que nos atacaram, assim sem
mais nem menos, você acha que vão nos dar alguma guarita?

121
Provavelmente nos aniquilarão, sem dó nem piedade, se é
que não farão algo pior?
- O que pode ser pior que isso almirante? O que pode ser pior
que a morte?
- Eles podem nos comer vivos.
- Mas que loucura é essa almirante?
- Não é o que fazemos com as vacas?
- Mas não somos vacas!
- Será, general? Será que, para eles, não somos?
- Mas eu não posso desrespeitar uma ordem direta do
presidente e, afinal de contas estamos apenas conjeturando e
pode não ser nada disso. Eles não podem ser tão terríveis
assim.
- O que faço então, general?
- Renda-se!
O almirante, seguindo a ordem do general, mandou que as
suas tropas se rendessem. Os tiros pararam e uma grande
bandeira branca foi erguida no campo de batalha. Mas foi
como se nada tivesse acontecido. Os alienígenas continuaram
atirando e dizimando os soldados.
Os soldados então, desesperados, debandaram totalmente
desordenados, cada um fugindo a sua maneira, para o interior
da ilha.
O general voltou a ligar para o presidente, contando a
situação.
- Reuna a tropa, general. Tragam todos para cá. Vamos
resistir até o último homem.
Com muito trabalho, os soldados remanescentes foram
reagrupados e recuaram até o prédio da presidência. O
presidente, pegando uma bandeira dos Novos Estados Unidos
foi de encontro aos seus soldados e, ficando na frente, junto

122
com o general, o almirante e os demais oficiais generais,
esperou a chegada dos inimigos.
Minutos depois, chegaram os alienígenas. Eles tomaram
posição de tiro. O presidente começou a cantar o hino dos
Novos Estados Unidos, o que foi seguido por todos. Uma
lágrima desceu dos olhos dele que, instintivamente, colocou a
sua mão direita no peito, bem em cima do coração. Fechou os
olhos e esperou o tiro final.
Ninguém sentiu nada. A morte foi instantânea.
Os Zorkos então continuaram com a matança. Bairro por
bairro, rua por rua, casa por casa, os alienígenas continuavam
com a sua caçada aos seres humanos. Ninguém sobreviveu.
Como se não bastasse, todas as construções também foram
destruídas, assim como as plantações. A grande ilha do Havaí
transformou-se numa imensa fogueira. Não ficou pedra sobre
pedra.
Os Zorkos, então, voltaram para as suas naves e embarcaram
em direção à grande nave mãe.
- Missão cumprida, comandante.
- Não sobrou ninguém?
- Nenhum nativo sobreviveu.
- Tem certeza?
- Absoluta, comandante.

SEMENTE

Todos os Guardiões sentiram o holocausto. Os humanos,


mais sensíveis ao fato, começaram a chorar. Lágrimas saíram
de seus olhos.
- Aba Epyak, nós temos que enfrentar esses Zorkos. Eles nos
mataram como se fossemos animais, se dó nem piedade.

123
Mais de meio milhão de pessoas sucumbiram a esses
monstros.
- O melhor é deixar como está. A sua raça, no final,
sobreviverá. Vocês ainda têm o povo das florestas.
- Para que? Para eles voltarem daqui há uns séculos e nos
matarem novamente? Vamos deixar isso acontecer, de novo?
- Você está cheio de ódio, Antônio.
- Estou sim, Aba Epyak. Você mesmo nos disse que essa era
uma diferença fundamental entre nós. Eu quero vingança.
Quero acabar com esses assassinos.
- Mas, vamos por em risco a nossa sobrevivência. É melhor
deixar como está.
- Eu não sou covarde, Aba Epyak e estou disposto a
sacrificar-me em prol da minha raça. Não quero ver mais
mulheres e crianças serem mortas. Não agüento isso.
- Vamos votar então. E, seja qual for a decisão, que Tupana
esteja conosco. Quem quiser a guerra que o diga.
Um vazio profundo aflorou na mente de cada um. Era como
um silêncio. Quem primeiro votou foi o Aba Epyak:
- Eu prefiro deixar como está. Vamos dar tempo ao tempo.
As três mulheres Guaranis também votaram a favor da
decisão de Aba Epyak. Eram quatro votos a zero, num total
de nove. Antônio ficou preocupado. A sua sede de vingança
tomava conta de todo o seu ser. Já tinha decidido que, mesmo
que perdesse e ficasse sem os Guaranis ele iria enfrentar, de
qualquer maneira, os Zorkos.
- Eu voto na vingança, disse Aba Yuka.
Antônio tinha quase que certeza que esse voto era seu. Como
Aba Yuka era o homem do mal, estava claro que ele iria
votar no confronto.
Letícia e Raimundo votaram a favor do Antônio. Ele sabia
que isso iria acontecer. Afinal eram seres como ele. Da raça

124
humana. Estava empatado. Quatro votos a quatro. Faltava o
voto de Aba Ibi, o homem da Terra. Antônio não sabia como
ele iria votar. Ficou ansioso à espera.
- Eu, como o homem da Terra, tenho o dever de proteger
todos os seres vivos. Dessa forma, voto a favor do Antônio.
Antônio ficou aliviado. Eles iriam enfrentar os Zorkos. E ele
teria a sua vingança.
- Bem, disse o Aba Epyak, você ganhou, Antônio. Vamos ao
confronto final. Só espero que estejamos em condições de
enfrenta-los. Nos últimos séculos eles tiveram um
desenvolvimento técnico-científico muito grande. Mas
felizmente para nós, pelo que pude sentir, o desenvolvimento
espiritual foi muito pouco.
- Como você sabe? Perguntou o Antônio.
- Quando entramos em guerra, há séculos atrás, eles não
tinham as armas que têm hoje. Elas são muito mais
poderosas. Mas só pessoas primitivas, espiritualmente,
podem realizar matanças, como eles fizeram hoje. É a nossa
vantagem.
- Bem, o que temos que fazer, agora?
- Em primeiro lugar, temos que os trazer para cá.
- E como vamos fazer isso?
- Tirando a proteção dos equipamentos que guardamos. Os
sensores da nave Zorkiana imediatamente vão nos localizar.

NAVE ZORKOIANA

O comandante ordenou ao seu piloto que tomasse as


providências para voltar ao seu sistema solar. Nisso, o
observador da nave Zorkoiana deu o alarme.
- O que está acontecendo? Perguntou o comandante.

125
- O observador localizou outro grupo de nativos deste
planeta.
- Mas será possível? Não destruímos todos?
- Aparentemente sim, mas parece que descobrimos outro
grupo.
- Nós não tínhamos feito uma varredura geral nesse planeta?
- Tínhamos, comandante, não existia mais nenhum, mas de
repente apareceu outro.
- De repente?
- Foi.
- Já está localizado?
- Positivo, comandante. No meio da maior selva deles.
- Ah, eles estavam se escondendo, né? Mas que raça
obstinada é essa? Vamos destruí-los. Aponte o raio Z5 e
acabe logo com isso.
O capitão da artilharia focou o local e acionou a arma.
Novamente um raio azulado partiu da nave em direção a
Semente. Mas como da vez anterior, nada aconteceu. O raio
se desfez numa grande luz branca.
- Nada, comandante. Acho que a nossa arma está com
defeito, apesar de que, os computadores dizerem que está
tudo normal.
- Lembre-me de quando chegarmos a nossa base verificarmos
isso, disse o comandante de mau humor. Capitão prepare as
naves de embarque. Vamos acabar logo com isso. Quero
voltar logo para casa.

126
SEMENTE

Os guardiões saíram do prédio e ficaram esperando do lado


de fora. Minutos depois a primeira nave pousou em frente e
os soldados Zorkianos, de amarelo, saíram com suas armas.
Assim que viram os guardiões, atiraram. Mas, nada adiantou.
Os raios não surtiram o menor efeito, por mais que atirassem.
O capitão pegou o comunicador e falou com o comandante:
- Comandante, disse ele, alguma coisa muito estranha está
acontecendo. É melhor o senhor vir para cá.
- O que está acontecendo, capitão?
- Encontramos nove nativos e atiramos, mas as nossas armas
não os mataram.
- Como assim?
- Não acontece nada, comandante. Os raios saem das armas,
mas encontram uma espécie de barreira invisível, que não
deixa atingirmos os nativos.
- Nenhum nativo desse planeta possui uma tecnologia que
enfrente as nossas armas. Nem nós mesmos temos.
Nesse instante, um dos homens de túnica azul adiantou-se do
grupo e falou:
- Zorkos!
- Quem é você? perguntou o capitão admirado. Como você
sabe quem somos?
- Nós somos os Guardiões da Semente.
- Nunca ouvimos falar de vocês.
- Nós somos os seus maiores inimigos.
- Nós não temos inimigos. Nós somos uma raça superior e só
temos vítimas, falou em tom de deboche.
- Engano seu, Zorko. Vocês não se lembram dos Guaranis?
- Essa raça não mais existe. Foi extinta por nós a milhares de
anos.

127
- Novamente você se enganou, Zorko. Nós somos os
remanescentes da raça que vocês pensaram que tinha sido
extinta.
- Atirem neles, ordenou o capitão. Novamente o mesmo se
deu. Os raios viraram fumaça sem atingir ninguém.
O capitão, nervoso, pegou o comunicador:
- Comandante, gritou, estou diante de um homem que se diz
Guarani.
- Mate-o.
- Não consigo, comandante. O que aconteceu com os raios da
nave, acontece aqui.
- Ah, então foi por isso. Temos, de novo, os Guaranis pela
frente? Espere um pouco que vou descer. Quero acabar com
eles pelas minhas próprias mãos.
Aba Epyak e os outros Guardiões ouviram telepáticamente a
resposta do comandante.
Ambos os lados, frente a frente, ficaram a espera da nave do
comandante que não demorou mais de cinco minutos para
pousar. De dentro saiu um homem vestido com uma roupa de
cor prata, que colava no seu corpo como se fosse uma pele,
igual aos soldados de amarelo.
- Quem é você? Perguntou o comandante assim que desceu
da nave.
- Eu sou Aba Epyak.
O rosto do comandante ficou ruborizado.
- Aba Epyak está morto a mais de seis mil anos.
- Novo engano, Zorkint. Estou bem vivo. Vivo o suficiente
para acabar com você.
- Você está blefando. O príncipe Aba Epyak não mais existe.
Aba Epyak levantou uma das mãos e, um fino raio branco
azulado saiu de seu dedo indicador em direção ao céu.

128
Segundos depois uma grande explosão tingiu a atmosfera de
um vermelho vivo.
- A sua nave acaba de explodir, Zorkint. Disse Aba Epyak.
- Não é possível! Berrou o Zorkoiano olhando para o céu.
Imediatamente ele pegou o seu comunicador e tentou, em
vão, falar com a sua nave.
- Não adianta, Zorkint. Ela não mais existe.
O Zorkoiano, como um louco, pegou a sua arma e atirou
várias vezes no Aba Epyak. Mas sem resultado. Parecia que
uma barreira invisível o protegia.
Os guardiões, como que ensaiados, levantaram seus braços
em direção aos soldados Zorkoianos. Novamente raios
brancos saíram de seus dedos e atingiram a tropa alienígena.
Todos eles caíram mortos, no chão. Só restou o Zorkint.
- Agora você será o meu refém. Será a garantia que o seu
povo não mais nos importunará. Duvido que o imperador
tente alguma coisa sabendo que o seu filho é nosso
prisioneiro.

Depois da luta com os Zorkoianos, os três humanos iniciaram


uma longa peregrinação em busca dos sobreviventes.
Primeiro entraram em contato com o povo das florestas. Mas,
nenhum deles quis voltar para a civilização. Estavam muitos
felizes em sua nova situação. Finalmente tinham se livrado
dos males da civilização. Viviam em paz.
Depois saíram em busca dos povos dos mares, era como se
chamava a população que vivia nos navios. Telepaticamente
conseguiram entrar em contato com eles. Combinaram o
primeiro encontro na foz do rio Amazonas. Os povos dos
mares, depois de várias insurreições nos navios, finalmente
tinham se organizados em uma espécie de país. Isto foi

129
possível graças às comunicações por rádio. Pouco a pouco
eles foram se unindo até que formaram um governo. O navio
onde se instalou o governo era o grego Papaniakos, que tinha
sido arrastado pelo então governo do Novo Estados Unidos.
Os três Guardiões humanos explicaram tudo o que tinha
acontecido.
Os povos dos mares receberam dos Guardiões, rainhas e
machos de formigas de correição. Com todo o cuidado
conseguiram desenvolver colônias desses insetos, que foram
distribuídos pelos navios. Cada navio, democraticamente,
decidiu por onde aportar. A principio, as formigas foram
introduzidas nesses locais. Os navios ficaram ao largo por
mais cinco anos, deixando as formigas se desenvolverem e
multiplicarem. Quando as larvas dos Aparí-Parú foram
controladas, os insetos que já se canibalizavam por falta de
comida, entraram numa redução de população. Para
acelerarem esse processo, os povos dos mares realizavam
caçadas sistemáticas. Ao fim de nove anos a Terra estava
livre deles. Os povos dos mares, então, puderam voltar a
viver em terra e se concentraram em pequenas cidades
litorâneas. Mas, não quiseram viver como antigamente.
Aproveitaram o conforto de viver em casas, cultivaram
terras, mas preferencialmente, viviam da pesca.
Abandonaram por completo a tecnologia. Consideraram que
as vidas deles eram felizes o suficiente para prescindirem de
televisão, computadores, telefones e outros equipamentos da
vida antiga. Finalmente acabaram com o dinheiro. O que um
tinha a mais, distribuía para os que tinham a menos e vice e
versa. Mantinham contato via radio com as outras colônias.
Mas o governo central foi abandonado. Os Guardiões
humanos foram eleitos como uma espécie de conselheiros e

130
serviam como juízes nas pequenas causas que precisavam de
uma decisão. Eles eram respeitados e venerados como heróis.
Os Guardiões Guaranis continuaram a viver na floresta
amazônica. O gen de agressividade foi retirado de Zorkint e
ele teve o mesmo tratamento de desenvolvimento cerebral.
Cinco anos mais tarde uma nova nave Zorkaiano voltou a
Semente. Desta vez vinha em paz, querendo recuperar o
príncipe Zorkint, visto que o pai dele tinha morrido e ele
herdado o trono.
Ele, pacificamente voltou ao seu planeta e, sem o gen da
agressividade, tornou-se um imperador da paz. O universo,
como um todo, se desenvolveu em direção aos direitos e ao
amor. A guerras acabaram e o objetivo único era o conforto e
a felicidade.
Antônio e Letícia se uniram. Apesar de preferirem fazer sexo
telepáticamente, pois era muito melhor, quando queriam ter
filhos os faziam fisicamente. Desta forma, tiveram cinco
filhos que nasceram evoluídos como os pais.

Fim
Este arquivo compõe a coletânea STC
www.trabalheemcasaoverdadeiro.com.br

131

Você também pode gostar