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ogy in Nursing and Healthcare. Nova Torque: chill Livingstone, 1997. ISBN: 0-443-05737-0. LEVY, P.; AUTHIER, M. - As drvores de conhecimentos. 2. ed. Sdo Paulo: Escuta, 2000. Chur- Falando de Metodologia de Pesquisa _hitpi// wo LmreispslvS 2. http://www. 2000-2001/mi ‘Questionatios-¥2.pot (5/11/06 - 19:15) http://www. jepaiva.net/getfile.php?cwd=ensino/ cadeiras/ meto- dol/20052006/90dad/s8fd&F-9028b#274,17,Diapo sitivo 17 (5/11/06 - 19:31) www. clovis.massaumd,nom.br/pros (5/11/06 - 19:50) http://www.adolec.br/bys/adolec/P/textocompleto, adolescente/capitulo/cap09.htm (5/11/06 - 20:16) hts sc.htm wcspeadammom>dayuee antag mand, Introdugao Y Direito ao ee » do F Enfermeiro Bruno MENDES* Revisio Séxcio DEODATO Resumo O direito a cuidados de satide é um direito uni- versal em territério nacional, uma vez que esté consagrado no artigo 64° da Constituicao da Republica Portuguesa. Este trabalho teré como principal enfoque analisar criticamente o art.83. do Cédigo Deontolégico do Enfermeiro, (Incluido na Lei n° 11/2009 de 16 de Setem- bro) no 4mbito de aprofundar a tematica dos deveres do enfermeiro em prestar cuidados de satide 4 pessoa e a forma como os fazer. Palavras-chave: Direito a0 cuidado, art.83.° do Cédigo deontoldgico do enfermeiro, cuida- dos de satide Abstract Healthcare rights are a universal right in Portu- gal, since it’s prescribed in the Portuguese Re- Public Constitution. The main focus of this as- signment is to critically analyze the 83% article of the Nurse Deontological Code, aiming at a deeper comprehension of the Nurse's duty to- wards healthcare providence and the ways to do it. Key Words: Healthcare rights, 83" article of the Nurse Deontological Code trabalho “O Direito ao Cuidado: Andlise do art.83° do Cédigo Deontolégico do Enfermeiro” visa a aplicacao das competéncias adquiridas na andlise e interpretac3o da deontologia profissional de Enfermagem. Trata-se de um tema que tem repercussées na pratica da profissdo, que com- porta varias dimensées de ordem ética, deontolé- gica e juridica, A organizacao do texto passa por uma Introdu- Go, onde o tema é apresentado, os objectivos *0 presente trabalho de indole académica foi realizado no mbito da Unidade Curricular (UC) de Deontologia Profissio- nal (DP) I, no 1° semestre do ano lectivo de 2009/2010, no 2° ano do curso de Enfermagem. Agradecimentos: a reali- 2aGSo deste trabalho deve muito aqueles que me acompa- nharam durante o percurso desta Unidade Curricular e que Contribuiram com ideias e rumos que permitiram chegar 2 esta forma estrutural. Assim sendo, fica o agradecimento 8 Professora Doutora Lucia Nunes, pelas idelas que transmi- tiv na anélise do artigo e pela paciéncia a responder as uestdes que lam surgindo, particularmente no dominio das justificagées éticas do cuidado. Ao Professor Sérgio Deoda- to, pela ajuda a encontrar fontes bibliograficas e pelos apor- {eS juridicos que acrescentam profundidade a este trabalho, 7 definidos e a organizacao exposta. Apés a intro- duo, 0 trabalho divide-se em duas partes: a primeira servira para apresentar alguns concel- tos base, analisar sucintamente a organizacdo do Cédigo Deontolégico, bem como a justifica- ‘co da escolha do artigo; a segunda parte con- siste na andlise do artigo e suas alineas, extra- Polando a sua significagao para a pratica de Enfermagem e apresentando as justificaces éticas que suportam os deveres. Na conclusso sera feita uma pequena reflex sobre as difi- culdades sentidas, a consecugdo dos objectivos, a importncia artigo 83° do Cédigo Deontolégico do Enfermeiro (CDE) na profissio e sobre os ganhos pessoais na realizac3o do trabalho. Os ‘objectivos sdo trés: apresentar o fundamento ético e juridico do artigo 83°; analisar as impli- cagées de cada alinea desse mesmo artigo, rela- cionando-as sempre que possivel com outros artigos do CDE; apresentar exemplos do exerci- cio da profisséio onde seja aplicdvel o art.83° do CDE. Artigo83. Do direito ao cuidado enfermeiro, no respeito do direito ao cui- dado na satide ou doenca, assume o dever de: a)Co-responsabilizar-se pelo atendimento do individuo em tempo util, de forma a n&o haver atrasos no diagnéstico da doenca e respectivo tratamento; b)Orientar 0 individuo para outro profissio- nal de sade mais bem colocado para responder ao problema, quando 0 pedi- do ultrapasse a sua competéncia; Respeitar e possibilitar a0 individuo a liberdade de opcao de ser cuidado por outro enfermeiro, quando tal opcdo seja viavel e no ponha em risco a sua sali- de; d)Assegurar a continuidade dos cuidados, registando fielmente as observagées & intervencées realizadas; e)Manter-se no seu posto de trabalho enquanto nao for substituido, quando a sua auséncia interferir na continuidade de cuidados. ito Etica, Deontologia e Dit Antes de iniciar a anélise do artigo 6 importante clarificar estes trés termos. De forma sucinta temos: Etica expressa pensamento Filoséfico, ndo tem caracter vinculativo, relaciona-se com a “administrag3o que cada um faz da sua vida” (NUNES et all, p. 15) Deontologia é 0 conjunto de regras direccionadas para a accdo; relaciona-se com o papel social desempenhado por um grupo profissional. A -26- Deontologia Profissional integra direitos, deveres @ incompatibilidades da profissio. Em Portugal, a Deontologia de Enfermagem interliga-se com o Direito, uma vez que esté inscrita numa lel. Di ito é 0 “sistema de normas de conduta social, assistido fr proteccdo coactiva (MENDES, p. 76). O “Direito € um dos controles sociais, nao sendo portanto o Unico, porquanto ao lado dele estdo as demais normas de conduta, como a norma mora, ‘os costumes e as normas sociais” (GUSMAO, p. 78). Consideracées iniciais © Cédigo Deontolégico do Enfermeiro é um con- Junto de 15 artigos, incluidos no Estatuto da Ordem dos Enfermeiros, alterado e republicado pela Lei n° 111/2009 de 16 de Setembro. A formulacdo de cada dever obedece a uma regra estrutural: » 2) 3) 4) 5) 6) Do artigo 79 ao 92 todos os artigos tém a mesma estrutura: Titulo—a justificacéo do dever— “Assume o dever de:” - 0 Dever, comegando por um verbo; Analisando apenas os artigos com um olhar amplo, se excluirmos dos 15 artigos 0 78° (por ser o artigo ético do CDE) e 0 92° (que diz respeito aos deveres do enfermeiro no exercicio do seu direito de cidad’o & objec- G0 de consciéncia) conseguimos identificar deveres que se reportam directamente 3 proteccéo de direitos, e outros que sao pres- critos no respeito por atributos ou caracte- risticas da pessoa. 3) Todos os artigos se ancoram em pelo Menos um principio geral enunciado no arti- go 78°, 0 Unico que néo tem deveres, expressando antes principios e valores. E por isso que se pode dizer que os principios esto previamente formulados e pode dizer- se que cada dever se reporta a pelo menos um principio: 3a) Responsabilidade, 3b) Respeito pelos direitos humanos, 3c) Exce- lencia de exercicio Dos artigos 79 ao 89 assentam ou nos deve- res para com a pessoa ou com as responsa- bilidades proprias da profissdo. Os deveres existem com a garantia da proteccéo do outro e com 0 mandato social da profisséo. Nos artigos 90° e 919, 0 foco nao é a pes- soa. No art,90° - deveres para com os cole- gas e a para com a profissao; No art.91° - deveres para com a equipa multidisciplinar, “com outros profissionais”; No art.92, os deveres do enfermeiro enquanto profissional, no exercicio do seu direito a ser objector de consciéncia Anilise do artigo O art.83° do Cédigo Deontolégico do Enfermei- ro, concere ao Direito a0 Cuidado. Antes de iniciar a andlise, parece-me pertinente Justificar a escolha deste artigo para ser estuda- do no trabalho. A dificuldade que senti de selec- cionar um artigo para estudar foi sendo ultrapas- sada aula a aula. A medida que os varios profes- sores analisavam os artigos do CDE, apercebia- me da complexidade subjacente a formulac3o dos deveres, nomeadamente a densidade ética e/ou juridica que suportava cada dever. Além do art.83° partilhar essa riqueza, o principal motivo de eu 0 ter escolhido relaciona-se com 0 facto de pensar que a prestacdo de cuidados de sade & pessoa Ser uma finalidade da prestac8o de cui- dados em enfermagem, como Nunes (2005: 105 =108) explica "o cuidado é uma actividade-fim no trabalho de enfermagem”, e ainda “a acco de cuidar apoia-se em bases cientificas, utilizando 0 pensamento racional, criativo, ético, estético e intuitivo”. Mas porque é que as pessoas tém direito a serem cuidadas? Porque é que o Enfermeiro tem de prestar cuidados as pessoas? E como é que 0 faz? Foi pensando nas respostas a estas ques- tées que decidi estudar este artigo. A anélise comeca com o “porqué?”. Porqué o direito a0 cuidado? Do ponto de vista juridico, a resposta é-nos dada por Deodato (2008), que explica que 0 direito & proteccio da satide estd previsto no art.64° da Constituicao da Repiiblica Portuguesa (CRP), que € densificado na Base II da Lei n° 48/90 de 24 de Agosto. Este direito ao cuidado é feito por profissionais, e no caso de enfermagem, esse direito é garantido com a prescricdo de deveres deontolégicos no art.83° do CDE. Importa ainda dizer que encontramos 0 direito & proteccéo da satide consagrado na Convenc3o sobre 0s direitos do Homem e Biomedicina, rati- ficada pela resoluco da AR 1/2001 de 3 de Janeiro e pelo DL do Presidente da Republica 1/2001 de 3 de Janeiro. Segundo Deodato, importa relevar que nas varias Leis em analise, 0 que vem consagrado & 0 direito a proteccéo da salide, e nao o direito a satide. Assim sendo, conclui-se que o art. 83° contém deveres que visam a protecco da satide da pessoa. Enunciado “O enfermeiro, no respeito do direito ao cuidado na satide ou doenga, assume o dever de” Este artigo tem uma ligaco a finalidade e a natureza da profisséo. Os deveres existem com duas fontes, a responsabilidade da profissaio e os direitos da pessoa (ou deontologia e Direito). © direito a0 cuidado tem a sua fundamentaco ética no respeito pela dignidade e solidariedade. A vida em comunidade pressupée solidariedade. E um contracto social que vem consagrado no art.1° da CRP. Sobre a solidariedade, Westphal nos que a solidariedade pode ser vista como “um amor altruista a0 préximo", mas a sua ori- gem etimolégica é “solidus (Jat.)*. No Direito romano, solidum representava “a responsabilida- de geral, a culpa colectiva, o dever para com 0 todo". E nesta responsabilidade do dever para com 0 todo que encontramos a ponte com Enfer- magem. Ao escolher viver em sociedade, o pacto que se estabelece é que cuidamos do Outro, que temos responsabilidades para com ele. Entre essas responsabilidades da sociedade para com (05 seus membros, esta o cuidado. Na minha visio pessoal, vejo nos enfermeiros a responsabilidade de cumprir este pacto, de pres- tar os cuidados de satide & comunidade que pro- fessémos servir. A ligacdo que estabeleco é que ao tornar-me enfermeiro, ou seja, a profissionali- zacio do licenciado, vai criar um “pacto social” no qual enfermeiro é sélido, é um ponto de apoio para necessidades de satide, com o qual a sua comunidade pode contar. Esta viso da solidez do enfermeiro vai ao encontro daquilo que penso ter aprendido até & data: a personalizacdo de cuida- dos, a atencéo dedicada a pessoa e as suas cir- cunstancias e acima de tudo a polivaléncia do cor- po de conhecimentos do enfermeiro. Por Ultimo, do posso deixar de mencionar que nao estou a fazer do enfermeiro nem super herdi, nem, “Mcgyver”, mas que dentro da sua esfera de com- peténcias € esperado que o enfermeiro saiba dar uma resposta adequada e confiante, na qual os seus clientes possam confiar a sua sauide. ‘A fundamentacSo ética para o direito ao cuidado assenta na responsabilidade profissional e tam- bém no respeito pelo direito da pessoa ao cuida- do. Fala-se de respeito pelo direito a0 cuidado, em vez do direito a0 cuidado, porque estando a falar de fundamentacao ética, 0 principio nao é 0 direito. ‘A dignidade ou autonomia ndo so principios, séo caracteristicas da pessoa. O principio em causa nao é a caracteristica da pessoa, ¢ 0 respeito por parte do profissional de satide por esse mesmo atributo do sujeito. Relembrando, para Thompson (2004: 15), um principio é "uma verdade funda- mental ou doutrina que constitui o inicio de inspi- racdo ou direcc3o para uma acco moral, ou ter- mo usado como ponto de partida para o raciocini moral.” Reforcando ainda o ponto da unio postulada pela solidariedade, a DeclaragSo Universal dos direitos do Homem, Lei n° 57/78 de 9 de Marco, que Nunes aponta como sendo uma “baliza men- =276 tal que estabelece limites ideais, que nos diz que go podemos ir para além deste ponto”, aponta no seu artigo 1°: “Todos os seres humanos nas- cem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razéo e de consciéncia, devem agir uns para com os outros em espirito de fraternida- de’. Este artigo articula-se ainda com 0 n°1 do art.4° do REPE, que determina que “Enfermagem é a profiss8o que, na area da satide tem como objec- tivo prestar cuidados de Enfermagem ao ser humano, so ou doente’ Finalmente, este cuidado deve ser isento de des- ‘criminag&o, como prescrito pela alinea a) do n°2 do art.78° do CDE. Como no podia deixar de ser, também 0 artigo 83° se relaciona com o art. 78° noutro aspecto: obedece ao principio orien- tador da “responsabilidade inerente 20 papel assumido perante a sociedade”, e do “respeito pelos direitos humanos”. Para terminar, é importante frisar alguns casos de recusa legitima de prestacdo de cuidados, sendo eles, de acordo com Deodato (2008:85): “a falta de condicées para a pratica legitima, a ‘objeccao de consciéncia, a ofensa a dignidade da pessoa do enfermeiro, a recusa do proprio clien- te, a auséncia de prescricéo, as situacées de dis- tandsia e eutandsia previstas na lei vigente”. |Alinea a) “Co-responsabilizar-se pelo aten- dimento do Individuo em tempo util, de forma a nao haver atrasos no diagnéstico da doenca e respectivo tratamento;” ‘A acco enunciada é “co-responsabilizar-se”. Em todo 0 CDE, é a tinica vez que aparece este verbo. O que estd implicado é que o enfermeiro se responsabiliza como parte de uma equipa multidisciplinar, na sua rea de intervencao deli- mitada. no atendimento em tempo util (entende- se neste contexto por “tempo til” nao haver atrasos no diagnostico da doenca e 0 respectivo tratamento). Deodato refere ainda que “hé uma particular Preocupacdo como tempo de atendimento, con- siderando 0 tempo como um elemento funda- mental na relagao de cuidado estabelecida com ‘0s clientes”. Esta alinea justifica a escolha de Prioridades aquando da gestdo do tempo: a drea do diagnéstico e tratamento sao dreas priorité- rias na prestagSo de cuidado. Exemplo 1: uma tarefa médica, como o diagnés- tico da doenca, mas na qual participam outros profissionais (por exemplo, enfermeiros, que por 'serem auténomos sao responsaveis pelas deci- ‘s6es que tomam); 0 médico é responsdvel por prescrever um exame complementar de diagnés- tico, mas € ao enfermeiro que cabe a responsa- bilidade de, entendendo ser no interesse da Pes- soa decidir fazer 0 exame prescrito, providenciar em tempo titil que esse mesmo exame seja rea- lizado. Exemplo 2: administrar os férmacos a horas é um dever que decorre igualmente desta alinea. Alinea b) “Orientar o individuo para outro profissional de satide mais bem colocado para responder ao problema, quando o pedido ultrapasse a sua competéncia;” A acgio é orientar e é dada de imediato a res- posta 3 questo “quando orientar?". Esta alinea contempla o dever do enfermeiro encaminhar 0 cliente para o profissional mais diferenciado nos Cuidados prescritos, caso entenda que os mes- mos ultrapassam as suas competéncias. ‘As competéncias do enfermeiro esto discrimina- das no art.9° do REPE, pelo que o primeiro passo para poder agir em conformidade com este dever é 0 enfermeiro conhecer a sua esfera de competéncias e saber funcionar como membro de uma equipa multidisciplinar. Existe ainda o dever de saber quem esta mais bem colocado do que eu para responder ao problema. Ou seja, quem é que esté na melhor posicio para resol- ver 0 problema, quem é a pessoa mais adequada para responder ao problema. Este artigo articula-se ainda com 0 art.91° do CDE, que prescreve o dever do enfermeiro se articular com uma equipa multidisciplinar, res- peitando a esfera de competéncias de cada um. © encaminhamento previsto na alinea b) do art.83° do CDE esté ainda em harmonia com a alinea b) do art.91° do CDE, uma vez que para que 0 encaminhamento seja eficaz e se traduza Nos cuidados que a pessoa precisa, é necessario haver uma complementaridade entre os varios profissionais de sade. Citando Nunes ‘o que estd em causa & a mais correcta assisténcia & pessoa”. A alinea b) do art.83° do CDE esta ainda em harmonia com o disposto no n°3 do art.8° do REPE, que consagra a complementaridade fun- cional como parte do exercicio profissional dos enfermeiros. Exemplo: Imagine-se um enfermeiro especialista em satide mental e psiquidtrica, actualmente a exercer numa Unidade de Satide Familiar, recebe uma grévida que pretende informagées sobre 0 parto que se avizinha. Nessa mesma USF existe um enfermeiro especialista em satide materna obstetrica. O enfermeiro especialista em Satide mental pode e deve encaminhar a gravida para 0 seu colega, se entender que a prestacdo de cui- dados a Sr. excede as suas competéncias ou se entender que existe um beneficio directo para a mesma em ser atendida pelo especialista em. obstetricia. ‘Ao abrigo desta alinea, 0 enfermeiro, no princi- pio de um turno pode, por exemplo, pedir para 28- trocar de cliente, caso reconheca que existem pessoas mais capazes para cuidar deles ou que nao esté nas melhores condicées para o fazer. No que diz respeito aos recém licenciados, a sua auto-avaliac3o das suas competéncias vai ser 0 factor decisivo na deciséo em cuidar da pessoa ‘ou encaminhar para um colega. Alinea c) “Respeitar e possibilitar ao indivi- duo a liberdade de opcao de ser cuida- do por outro enfermeiro, quando tal opso seja vidvel e no ponha em risco a sua satide;” A andlise a esta alinea comega naturalmente pelos verbos que integram a sua formulacdo. Respeitar e possibilitar. O primeiro verbo reme- te para o respeito pela autonomia do Outro. respeito pela autonomia pode ser definido como respeitar 0 que 0 outro quer para si. No entan- to, 0 CDE nao fica por aqui, uma vez que nao basta respeitar a autonomia do Outro. E ainda prescrito o dever de possibilitar, ou seja, de es para que se possa cumprir a vontade do Outro em ser cuidado por outro enfermeiro. Contudo, este dever nao é aplicavel em todas as situaces. Segundo Nunes e Deodato, existem duas condi- Cionantes a este dever: a viabilidade e que ndo ponha em risco a salide do Outro. Quanto a via~ bilidade, relaciona-se com factores tais como a gestdo de trabalho, quantidade de enfermeiros presentes, nivel de servico. Contudo, é funda- mental que a excepgdo da viabilidade néo seja vista como uma “desculpa” para negligenciar ou subvalorizar os desejos do Outro na sua vonta- de de ser tratado por outro enfermeiro. Deodato refere ainda que nao se pode perder de vista 0 disposto na alinea a), na medida em que o atendimento em tempo util é um factor de pon- derac&o aquando do exercicio do direito de ser tratado por outro enfermeiro. ‘A meu ver, cair nessa tentacéo é um dos princi- pais problemas que se podem colocar. No entanto, se nao esquecermos 0 respeito pela autonomia do Outro, ou que a Enfermagem tem como objectivo prestar cuidados de satide com © intuito de promover o bem-estar do Outro, 6 facil perceber que as rotinas do servico nao se enquadram na excepcao. Considero interessante e pertinente a ressalva feita por Nunes, quando afirma que tratando-se de um dever baseado no respeito pela liberdade do individuo, é imediatamente um dever limita- do, pois no existe liberdade absoluta, sendo o dever “balizado pela exequibilidade e garantia de ambiente seguro’. Exemplo: Individuo internado numa unidade de Medicina Interna, com religigo praticante catéli- co. Nesse servico, trabalha um enfermeiro isla~ mista. O utente solicita ser cuidado por outros enfermeiros, uma vez que Ihe causa desconforto estar na presenca do enfermeiro islamista. Com base nesta alinea, se existirem mais enfermei- ros no servigo, pode e devem ser feitos esforcos coordenativos para permitir que o utente seja acompanhado por outro enfermeiro. Contudo, numa situacéo de emergéncia, ou caso nao exista nenhum outro enfermeiro disponivel no servico, é 0 enfermeiro islamista que vai proce- der aos cuidados de satide, uma vez que existe risco para a sua satide ou no é vidvel devido falta de enfermeiros num determinado turno. Alinea d)"Assegurar a continuidade dos cuidados, registando fielmente as obser- vagées e intervencées realizadas;” O dever prescrito é claro: assegurar a continui- dade dos cuidados. Esta continuidade de cuida- dos, de acordo com Nunes, relaciona-se nao sé com 0 plano terapéutico, mas também com a comunicacao dentro da prépria equipa, entre servigos € até mesmo instituicdes, de modo a poder registar a informacao recolhida. Aalinea clarifica ainda como é que o enfermeiro age para garantir essa continuidade: o seu ins- trumento € o registo. Imputével a esses mes- mos registos estd o valor de verdade, derivado da palavra “fielmente”. A informacao deve reproduzir a prestacéo de cuidados. Como nao é possivel registar tudo, 0 artigo explica 0 que deve ser apontado: as observacies e intervencdes realizadas. Nunes levanta ainda o critério da eficdcia dos registos, considerando que sao eficazes os registos que se encontrarem “no justo meio entre 0 registado e 0 significado do registado”. Esta distinc8o surge para evitar a sobrecarga de informacBes nos registos, bem como para pro- mover a objectividade dos mesmos. A auséncia de registo pode representar a auséncia de acco, Mesmos os actos de omisséo devem ser registados. No artigo com 0 nome “Do direito a0 culdado” surge esta alinea que diz respeito & continuida- de de cuidados. A meu ver, esta alinea vem dar profundidade ao acompanhamento e a qualida- de da prestagdo de cuidados em enfermagem. Sabendo que a pessoa no vai ser sempre cui- dada pelo mesmo enfermeiro, sem os registos perdia-se a eficacia das accdes, existindo uma utilizago de recursos pouco econémica. Assim, © CDE tenta garantir que existam mecanismos de suporte ao cuidado (os registos) que salva~ guardam a pessoa, permitindo uma maximiza- 40 do potencial de servicos multidisciplinares. Se integrarmos este artigo num contexto mais amplo, podemos localizar no REPE esses mes- -29- mos registos preconizados na aliena e) do n°4 do art. 5°, bem como no n°9 do art.12° do REPE. Faco ainda a ponte para o art.85 do CDE, nomeadamente a sua alinea b), que reporta a quem pode ser passada a informacao que cons- ta nos registos. Os registos precisam de ser pro- tegidos, 0 que reporta para o art.86° do CDE. Deodato refere que entre os elementos impres- cindiveis dos registos consta a assinatura, como prova de realizacdo do acto pelo préprio. Exemplo: Numa situac3o comum, como a pres- tacdo de cuidados de higiene, o enfermeiro tem 0 dever de registar os dados relevantes que recolheu da observagio e registar 0 procedi- mento que realizou, assinando a folha de regis- to. O enfermeiro do tumno seguinte fica entao ‘com 0s dados objectivos e subjectivos da obser- vacio feita anteriormente, podendo despistar alteragdes, registar evolugées ou planear novas intervengées com base em informagées actuali- zadas pela equipa. Alinea e) “Manter-se no seu posto de tra- balho enquanto néo for substituido, quando a sua auséncia interferir na con- tinuidade de cuidados.” Este dever prescreve que 0 enfermeiro se deve manter no posto de trabalho enquanto nao for substituido, Este portanto um pré-requisito para ‘que o enfermeiro possa cessar as suas activida- des profissionais didrias, que é haver alguém que 0 possa substituir nas suas funcdes, garan- tindo a continuidade dos cuidados. A passagem de servico no pode ser feita Pressa, uma vez que a passagem inadequada de servico precisa da informacao para prestar cui- dados. E preciso fazer um juizo profissional, al da interteréncia que @ auséncia causa no servico. ‘A organizacao temporal da prestacao de cuida- ‘dos fica ao critério do prestador de cuidados. Nunes afirma que “A regra normaliza, mas n&o serve como escudo. A regra néo é um manda- mento, é um organizador do trabalho”. Uma conduta virtuosa no local de trabatho con- siste em conciliar harmoniosamente a necessi- dade da pessoa com as normas do servico, e em gerir 05 recursos humanos de forma econémica ‘com 0 minimo de prejuizo para o profissional e para o utente. Este dever deontolégico vem proteger 0 direito do utente & continuidade de cuidados. Do ponto de vista ético, 0 que considerei foi que, se a pessoa tem direito ao cuidado, e considerando que a interrupcao dos cuidados de satide afecta Negativamente a satide da pessoa, entéo o direito 20 cuidado precisa de ser complementa- do com o direito 4 continuidade desses mesmos cuidados. N3o podemos colocar 0 cuidado como um ponto no tempo, mas antes como uma acti- vidade continua ao servico das necessidades da pessoas, enquanto delas precisar. A objecciio de consciéncia e 0 direito ao cui- dado Optei por incluir no trabalho a relacéo entre a ‘objeccdo de consciéncia e 0 direito a0 cuidado de modo a poder perceber melhor a forma como estes conceitos se articulam, em vez de se anula- rem. Considero ainda que a relacdo entre o art.830 e 0 art.920 do CDE se enquadra no 4m to da anilise ao artigo 83° que tem vindo a ser desenvolvida. Antes de avancar para a relagdo entre ambos, tratarei de contextualizar a objec- 0 de consciéncia. Portugal prevé na sua consti- tuicgo 0 direito 4 objeccdo de consciéncia (art 41 CRP). De acordo com Nunes, a objeccdo de consciéncia uma forma de respé ‘meiro, reconhecendo a sua autonomia para agir de acordo com os seus principios morais. Segun- do a mesma autora, “este incumprimento deve ser executado (..) sem que haja prejuizos para terceiros”. A nao contradicéo deste direito do Enfermeiro com os seus deveres deontoldgicos e com os direitos dos cidadgos é possivel gracas a0 dever prescrito pela alinea b) do n°1 do art.92° do CDE. O que 0 art.92° vai prescrever so os deveres do enfermeiro enquanto profissional de satide, quando pretender exercer o seu direito de cidadao de ser objector de consciéncia. Deodato (2008:84-87) refere que 0 exercicio do direito 8 objeccéo de consciéncia se circunscreve a “situages particulares e que nao impliquem risco de vida para os clientes”, Assim sendo, 0 direito a0 cuidado prevalece sobre o direito 3 objeccéo de consciéncia nas situagdes em que no seja possivel assegurar “no minimo indispen- sdvel, 0S cuidados a prestar”. Se nao estiverem reunidas as condigées para o enfermeiro poder ser objector de consciéncia, 0 mesmo deve conti- nuar a prestar os culdados Consideracées finais Nesta etapa final do trabalho optei por juntar a reflexo e a conclusdo nas consideracées finais por forma a fluidificar 0 meu processo de racioci- nio e permitir uma visao integrada e complemen- tar de ambas. primeiro ponto a referir reporta-se justamente a0 suporte ético e juridico do nosso Cédigo Deontolégico. Do ponio de vista juridico, Direito ea Deontologia nem sempre se relacionam, mas no panorama nacional, a Deontologia de Enfer- magem é lei, que 0 confere mais poder aos deveres prescritos pelo mesmo. Quanto a ética, encontramos pelo menos um dos seus principios defendidos em todos os deveres prescritos. E gracas a este aporte ético que -30- podemos perceber de onde vem a necessidade de existirem aqueles deveres. ‘Algo que aprendi e achel enriquecedor foi a dar uma resposta diferente a pergunta "Porque é que as pessoas tém direito ao cuidado?” Em vez da tentadora resposta "Porque estd pre- visto na Lei que assim seja” , consigo agora vis- lumbrar os principios éticos subjacentes a esse direito. No respeito pela dignidade da pessoa, pelo valor da vida humana, pelo contrato social inerente & vida em sociedade, pela responsabil dade profissional e solidariedade, por todos estes motives encontramos sempre a recomendacao ética de que o outro é merecedor de ser alvo da prestagio de cuidados. Em segundo lugar, ¢ importante para mim refe- rir que a organizacéo do Cédigo Deontolégico do Enfermeiro é facilitadora da sua interpretacéo. A estrutura légica da formulac3o dos enunciados e dos deveres permite estabelecer um padro de anilise facilitador da aprendizagem e da apro- priacdo do seu significado. Para isso ajuda igual- mente o Cédigo Deontolégico do Enfermeiro ano- tado, uma vez que permite obter mais informa- co e fundamentacao sobre as implicacées dos deveres no exercicio da profissao. Nesse sentido, existe claramente um ganho para os cidadaos em serem protegidos pela Deontologia, uma vez que 0 grupo profissional dos enfermeiros tem uma conduta ponderada nos planos ético- Juridicos que visa proteger 0 alvo da prestacao de cuidados. Ainda seguindo a linha da organizagdo do CDE, refira-se @ sua articulacdo quer com o REPE quer com a CRP, ou até mesmo com a Lei de Bases da Satide—é importante para se poder ter uma viso mais ampla da contextualizagao dos deve- res prescritos. Quanto as dificuldades sentidas, a escassez de fontes que se reportem a deontologia de Enfer- magem poderia ter tornado a realizacdo deste trabalho exponencialmente mais dificil, caso n&o tivéssemos 0 suporte de aula dado pelos docen- tes da UC. As suas obras e a harmonia das suas conclusées, bem como a forma como percorrem caminhos diferentes para chegar a conclustes semelhantes permitem minimizar 0 impacto da escassez bibliogréfica. No que concerne aos exemplos que criei 0 final de cada anilise, considero-os como uma forma de solidificar os conhecimentos adquiridos pela andlise de cada alinea, servindo igualmente como © culminar de um raciocinio interpretative que leva 4 consecugéo de uma acco de pratica clinica baseada no respeito pela deontologia profissional. Como conclusio final do trabalho, o pensamento a veicular é que sem um conhecimento da deon- tologia profissional de Enfermagem, quer o enfer- meiro quer 0 estudante de Enfermagem pée em risco a dignificagéo da profissdo, a qualidade da prestagdo de cuidados, e aumenta 0 risco de vio- lar direitos dos clientes. Sabendo que muitas pessoas nao conhecem os seus direitos, cabe ao enfermeiro zelar pelo cum- primento dos seus deveres profissionais, que pro- tegem os direitos das pessoas. REFERENCIAS Cédigo de Processo Penal. Consultado online em: www.gnr. pt/portal/internet/legislacao/pdf/ CP.pdf , consultado online em 3de Fevereiro de 2010, as 21.57 Constituicao da Reptiblica Portuguesa, consultada on-line em —_http://www.parlamento.pt/ LEGISLACAO/Paginas/ ConstituicaoRepublicaPortuguesa.aspx , consul- tado online em 3de Fevereiro de 2010, as 21.38 Convencao sobre os direitos do Homem e Biome- icina, ratificada pela resolucdo da AR 1/2001 de 3 de Janeiro e pelo DL do Presidente da Reptiblica 1/2001 de 3 de Janeiro DEODATO, Sérgio. Responsabilidade profissional em Enfermagem: valoracéo da _sociedade. Coimbra. Edi¢des Medina. 208.194 Pégs. ISBN 978-972-40-3401-0 Estatuto da Ordem dos Enfermeiros, Let 111/09 de 16 de Dezembro. Consultado online em http://www.ordemenfermeiros.pt/index.php? 260 , dia 3 de Fevereiro de 2010, as Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa ~ Estudo em homenagem ao Prof. Doutor Marcelo Caetano no centendrio do seu aniversdrio. Vol I. Coimbra. Coimbra editora. 2006. 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