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ANAIS | Volume 1

Movimentos de Massas em Encostas

PROMOÇÃO REALIZAÇÃO ORGANIZAÇÃO


PATROCINADORES OURO

PATROCINADORES PRATA

PATROCINADORES BRONZE

2
APOIO EMPRESARIAL

APOIO INSTITUCIONAL

3
PROMOÇÃO REALIZAÇÃO ORGANIZAÇÃO

SECRETARIA TECNOLOGIA

4
PREFÁCIO

Prezados colegas

É com muita satisfação que saudamos os participantes da VIII Conferência


Brasileira sobre Estabilidades de Encostas - COBRAE.

Celebramos este tradicional evento onde reuniremos expoentes palestrantes e um


conteúdo científico alinhado às inovações, com destaque aos acontecimentos recentes
em nosso país, ressaltando assim, a importância do tema geral: “Estabilidade de
Encostas na Sociedade e na Infraestrutura”.

Há três anos preparamos este evento com muito afinco, embora ainda com tantas
inseguranças do novo normal. Contudo, seguimos confiantes, arregimentando colegas e
parceiros que acreditaram ser possível este desafio, e assim, juntos, montamos o evento.

O objetivo foi trazer contribuições na forma de minicursos, palestras, artigos


científicos e discussões. Foram quatro dias de intensidade científica, troca de
experiências e convívio social, além da oportunidade de desfrutar Pernambuco com seus
aromas, sabores e cores.

A VIII COBRAE recebeu 450 resumos, destes foram recebidos 235 artigos
completos que estão disponibilizados em livros digitais, separados em sete volumes:
Volume 1: Movimentos de Massa em Encostas
Volume 2: Investigações Geológico-geotécnicas
Volume 3: Mapeamento Geotécnico e Gestão de Riscos
Volume 4: Comportamento de Taludes e Aterros
Volume 5: Soluções de Engenharia
Volume 6: Instrumentação e Monitoramento
Volume 7: Taludes Submarinos e de Mineração

Roberto Quental Coutinho


Presidente VIII COBRAE

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COMISSÃO ORGANIZADORA

Roberto Quental Coutinho


UFPE - Presidente da Comissão

Olavo Francisco dos Santos Júnior


UFRN - Comitê Técnico

Joaquim Teodoro Romão de Oliveira


UNICAP/UFPE - Comitê Técnico

Kalinny Patrícia Vaz Lafayette


UPE - Comitê Técnico

Igor Fernandes Gomes


UFPE - Secretaria

Robson Ribeiro Lima


UFPE - Secretaria

Danisete Pereira de Souza Neto


UFPE - Tesouraria

Ricardo Nascimento Flores Severo


IFRN - Tesouraria

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Cód. Título do Artigo Pág.
A031 Análise de curva de correlação entre pluviosidade e movimentos de massa nas encostas de João 8
Pessoa (PB)
A034 Métodos de estabilização de encostas em áreas suscetíveis à ocorrência de movimentos de 16
massa: estudo de caso no município de Garanhuns-PE
A036 Relação entre ocorrências de movimentos de massa e pluviometria no município de Niterói (RJ) 24
entre 2014 e 2018
A057 Aplicação do Modelo Shalstab na construção de um mapa de suscetibilidade a deslizamentos 34
translacionais de terra no bairro Azambuja (Brusque, SC)
A063 Caracterização geotécnica de uma encosta de rodovia degradada por erosões 41
A064 Deslizamentos em áreas de risco geológico-geotécnico na cidade de Belo Horizonte 48
A072 Probabilidade de ocorrência de deslizamentos em função da pluviometria aplicada a bacia do rio 56
Quitandinha, Petrópolis-RJ
A084 Influência dos solos micáceos na estabilidade de encosta de solo residual de gnaisse - km 65
133+500 da Rodovia RJ 116 - Macuco/RJ
A118 Gelpolímero acrílico aplicado para prevenção de deslizamentos, em encostas urbanas no município 72
do Jaboatão dos Guararapes, PE Brasil
A165 Estudo de caso: avaliação de um movimento de massa em uma falésia localizada na Praia da 80
Pipa/RN
A201 Estudo da estabilidade de talude em área degradada no município de Itajubá/MG 88
A225 Retro-análise de estabilidade de talude com uso de modelos numéricos na BR 116 - Magé/RJ 99
A238 Avaliação do desempenho do solo após a adição de resíduos de construção e fibras de sisal 108
A266 Elaboração e considerações sobre a carta de suscetibilidade a movimentos gravitacionais de 116
massa e inundações do município de Itaóca - SP: ênfase aos processos de deslizamentos
A273 As relações da estabilidade de taludes de borda de um platô de mineração e fatores 125
condicionantes à segurança: histórico de instabilização
A285 Inventário de ocorrências de erosões e movimentos de massa em uma sub-bacia hidrográfica 133
situada na Região Metropolitana do Recife - PE
A298 Índice de Precipitação Antecedente para estimar umidade do solo e correlacionar como processo 141
desencadeador na ocorrência de movimento de massa
A315 Carta de suscetibilidade geomorfológica a movimentos de massa para as regiões administrativas 153
de São Paulo, São José dos Campos, Baixada Santista e Registro.
A374 Estabilidade de encostas e contenções: diálogo entre o Homem e a Natureza. 160
A410 Análises de deslizamentos em encosta na BR-116/RJ, km 76,4 168
A425 Análise de estabilidade de uma encosta na Zona Norte de Recife – Córrego do Jenipapo 176
A449 A influência da injeção e dos tipos de solos no desempenho de tirantes ancorados como estruturas 184
de contenção
A481 Análise da influência de perfis iniciais de sucção na estabilidade de taludes 190
A483 Avaliação de sulcos em uma encosta, utilizando o veículo não tripulado (VANT). 198
A506 Impactos ambientais gerados pela urbanização: uma revisão sistemática de literatura 205

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Análise de curva de correlação entre pluviosidade e movimentos
de massa nas encostas de João Pessoa (PB)
Larissa Ferreira da Silva
Mestranda, UFPE, João Pessoa, Brasil, larissa.ferreira@ufpe.br

Fábio Lopes Soares


Docente, UFPB, João Pessoa, Brasil, flseng@uol.com.br

RESUMO: Os movimentos gravitacionais de massa são fenômenos que ocorrem em diversas cidades do
Brasil e do mundo, provocando vários prejuízos e vítimas. Em João Pessoa (PB), o número de acidentes que
ocorrem na área urbana é preocupante, o que se deve às características geológicas e geomorfológicas da
região, ao processo de ocupação desordenado do solo e principalmente à ação da precipitação, uma vez que a
maioria desses eventos ocorre na estação chuvosa. Tendo em vista que a chuva é um dos principais agentes
deflagradores dos escorregamentos, este trabalho objetivou realizar uma extensão dos estudos realizados por
Soares e Ramos Filho (2014), a fim de analisar a curva de dispersão por eles desenvolvida para representar a
relação entre pluviosidade e movimentos de massa na cidade de João Pessoa no período de 2008 a 2013. O
intervalo de tempo analisado na corrente pesquisa foi de 2014 a 2018, com 31 ocorrências relacionadas à
chuva, distribuídas em 18 datas distintas. Como resultado, estabeleceu-se uma nova relação numérica entre
precipitação acumulada (PA) de sete dias e a precipitação diária (PD), englobando todos os dados
cadastrados a partir de 2008.

PALAVRAS-CHAVE: Correlação, Encostas, Movimentos de Massa, Pluviosidade.

ABSTRACT: Gravitational mass movements are phenomena that occur in several cities in Brazil and around
the world, causing various losses and victims. In João Pessoa (PB), the number of accidents that occur in the
urban area is worrying, which is due to the geological and geomorphological characteristics of the region, the
disorderly occupation of the soil and mainly the action of precipitation, since most of these events occurs in
the rainy season. Considering that rain is one of the main triggering agents of landslides, this work aimed to
carry out an extension of the studies carried out by Soares and Ramos Filho (2014), in order to analyze the
dispersion curve developed by them to represent the relationship between rainfall and mass movements in
the city of João Pessoa in the period from 2008 to 2013. The time interval analyzed in the current research
was from 2014 to 2018, with 31 occurrences related to rain, distributed in 18 different dates. As a result, a
new numerical relationship was established between seven-day accumulated precipitation (PA) and daily
precipitation (PD), encompassing all data recorded from 2008 onwards.

KEYWORDS: Correlation, Slopes, Mass Movements, Rainfall.

1 Introdução

Devido às características do relevo brasileiro aliadas às consequências negativas da urbanização


desordenada, um tipo de desastre natural que vem se tornando recorrente nas últimas décadas é o movimento
gravitacional de massa em encostas, que tem resultado em perdas socioeconômicas, humanas e ambientais
cada vez maiores. Os verões marcados por chuvas intensas em regiões de grandes maciços fazem com que o
país seja considerado muito suscetível à ocorrência de deslizamento de solos, rochas ou solos e rochas em
regiões íngremes, sendo os escorregamentos os processos geodinâmicos superficiais que mais acometem
cidades brasileiras, manifestando-se quase sempre nos períodos chuvosos e resultando em maior número de
acidentes com mortes.
Nesse contexto, a cidade de João Pessoa, capital paraibana, desde o fim da década de 1960, vêm
apresentando um acelerado e desordenado crescimento urbano, sem planejamento adequado em
infraestrutura e saneamento, forçando a ocupação de novas áreas nem sempre adequadas para a população
desfrutar das condições básicas de vida.
Segundo dados da Coordenadoria Municipal de Proteção e Defesa Civil de João Pessoa (COMPDEC-
JP), atualmente 27 núcleos urbanos estão situados em zonas de risco associadas à escorregamento de

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encostas na cidade. O número de acidentes que ocorrem nessa região é preocupante, o que se deve às
características geológicas e geomorfológicas da região, ao processo de ocupação desordenado do solo e
principalmente à ação da precipitação, uma vez que a maioria desses eventos ocorre na estação chuvosa.
Ao correlacionarem precipitação e movimentos gravitacionais de massa, Soares e Ramos Filho (2014)
encontraram resultados significativos para a previsão e monitoramento da ocorrência desse tipo de desastre
em João Pessoa. Porém, os autores recomendaram realizar atualizações constantes, inserindo novos casos de
deslizamentos e ampliando a amostra de dados da estação chuvosa, a fim de obter uma curva mais confiável.
Desse modo, o presente estudo tem por objetivo investigar e analisar a influência da precipitação
como agente predisponente e deflagrador dos movimentos gravitacionais de massa na cidade de João Pessoa,
buscando relacionar a ocorrência dos escorregamentos às chuvas diárias e acumuladas, atualizando o banco
de dados de movimentos gravitacionais de massa, com foco para os provocados pela ação da chuva, e
verificando se a relação numérica entre precipitação e escorregamentos estabelecida por Soares e Ramos
Filho (2014) ainda é a melhor indicação de valor-limite de chuva acumulada para o qual começam a se
deflagrar os movimentos de massa na capital paraibana.

2 Fundamentação Teórica

2.1 Movimentos Gravitacionais de Massa

O conceito de movimento gravitacional de massa pode ser entendido como o desprendimento de


material de origem diversa (solo, rocha e/ou vegetação), devido à ação da gravidade, que resulta da ruptura
ou desestabilização do talude, podendo vir a causar, dependendo do risco e vulnerabilidade envolvidos,
danos sociais, econômicos e ambientais. Quando esses fenômenos naturais atingem áreas habitadas pelo
homem, causando-lhe danos, passam a se chamar desastres naturais (TOMINAGA, 2009).
Os movimentos gravitacionais de massa são os processos geológicos responsáveis por uma grande
quantidade de problemas, que dependendo do risco e da vulnerabilidade envolvidos, resultam em perdas
materiais significativas e algumas vezes, em vítimas fatais. Cerri (1993), após análise de artigos técnicos e
notícias da imprensa, concluiu que os escorregamentos são os processos geológicos que mais causam
acidentes com mortes no Brasil.
De acordo com Castro (2006), existem diversos tipos de classificações e descrições para os
movimentos de massa. As classificações tentam agrupar o tipo de movimento a um conjunto de
características, tais como, o material envolvido, velocidade e direção do movimento, profundidade e
extensão, a geomorfologia local e ambiente climático, entre outros. Devido a sua simplicidade e fácil
entendimento, a classificação mais utilizada na área acadêmica e até mesmo nos trabalhos da defesa civil é a
de Augusto Filho (1992), que agrupa os movimentos de massa em: rastejos (creep), escorregamentos
(slides), quedas (falls) e corridas (flows).
 Rastejos (creep): Há vários planos de deslocamento (internos), as velocidades variam de muito
baixas a baixas e são decrescentes com a profundidade, os movimentos são constantes, sazonais
ou intermitentes, ocorrendo em solo, depósitos, rocha alterada/fraturada e com geometria
indefinida;
 Escorregamentos (slides): Poucos planos de deslocamento (externos), com velocidades médias a
altas, e geometria e materiais variáveis;
 Quedas (falls): Não há planos de deslocamento, as velocidades são muito altas e a geometria
variável (lascas, placas ou blocos). Envolvem pequenos a médios volumes de material rochoso.
Podem ser do tipo queda livre ou em plano inclinado;
 Corridas (flows): Muitos planos de deslocamento com movimento semelhante a um líquido
viscoso, velocidades médias a altas e extenso raio de alcance, transportando grande volume de
material (solos, rochas e detritos).
Existem diversos fatores associados à ocorrência dos movimentos gravitacionais de massa, os quais
podem ter origem geológica, morfológica, física ou antrópica. Dificilmente há um único e definitivo fator
condicionante. Entretanto, um dos agentes mais importantes na deflagração efetiva dos deslizamentos é de
natureza meteorológica: a precipitação.
Segundo Soares e Silva (2018), destacam-se como principais agentes deflagradores as características
climáticas, as propriedades e distribuição dos materiais que compõem o substrato rochoso do talude, os
aspectos geomorfológicos (principalmente inclinação, amplitude e forma do perfil das encostas), o regime
das águas de superfície e subsuperfície, além do uso e ocupação do solo (no qual se incluem cobertura
vegetal e intervenções antrópicas nas encostas).

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É importante salientar que os agentes antrópicos têm grande influência na deflagração desses
processos, podendo aumentar a incidência e a intensidade dos escorregamentos, principalmente nos períodos
chuvosos, através da remoção da cobertura vegetal, lançamento de efluentes nos taludes, execução
ineficiente de aterros, acúmulo de lixo sobre as encostas, entre outros.

2.2 Precipitação com Agente Deflagrador

Os índices pluviométricos críticos para ocorrência dos movimentos de massa variam conforme o
regime de infiltração no solo, a dinâmica das águas subterrâneas no maciço e o tipo de instabilização. Para
solos com baixa permeabilidade, a chuva antecedente acumulada apresenta grande importância, por outro
lado, para solos com alta permeabilidade as chuvas que apresentam maior importância são as chuvas de curta
duração e grande intensidade.
Em geral, os escorregamentos em rocha tendem a ser mais suscetíveis a chuvas concentradas; os
processos em solo dependem também dos índices pluviométricos acumulados nos dias anteriores; processos
tipo corridas estão associados a índices pluviométricos muito intensos; as rupturas em áreas modificadas pelo
homem, chamados de escorregamentos induzidos, podem ocorrer com valores de precipitações considerados
normais (SILVA, 2016).
A quantidade e a intensidade da precipitação, além do volume e da distribuição das chuvas em dias
anteriores às rupturas, influenciam a forma como a água se infiltra no solo e a preparação do terreno para a
ocorrência dos escorregamentos, em virtude do aumento da umidade e do avanço das linhas de saturação,
sendo as principais formas de atuação das águas provenientes da precipitação a diminuição da coesão
aparente, a redução da resistência ao cisalhamento dos solos, a alteração do perfil da encosta por erosão de
materiais, entre outras.

2.3 Correlação entre pluviosidade e movimentos gravitacionais de massa

A influência do clima tem sido definida como um dos principais deflagradores do processo de
deslizamento de solos em encostas em países tropicais devido ao volume de água infiltrado (MOLINA et al.,
2015). Por isso, a fim de encontrar valores-limites para o início da deflagração dos movimentos e criar
sistemas de alerta para informar a população, inúmeros são os estudos em diferentes locais do mundo
buscando correlacionar a pluviosidade e os eventos de deslizamento.
A correlação entre os movimentos gravitacionais de massa e a pluviosidade nas encostas de João
Pessoa (PB) foi analisada Soares e Ramos Filho (2014), que traçaram curvas de dispersão para valores
acumulados de precipitação de 1 a 10 dias, utilizando 19 datas distintas de ocorrências de escorregamentos
deflagrados pela chuva, compreendidos no período de 2008 a 2013.
Os autores verificaram que os casos de eventos isolados (apenas um escorregamento por dia) ocorriam
para precipitações diárias a partir de 151,6 mm e acumulada de 7 dias a partir de 40,9 mm, ou ainda, a partir
de uma chuva diária de 53,4 mm e acumulada de 7 dias a partir de 131,8 mm. Já para os eventos de
escorregamentos generalizados (mais de um escorregamento por dia) a deflagração ocorria a partir de chuvas
diárias de 165 mm e acumulada de 7 dias de 47,6 mm ou ainda a partir de chuva diárias de 72 mm e
acumulada de 7 dias de 174,2 mm. A relação numérica entre precipitação acumulada (PA) de 7 dias e a
precipitação diária (PD) encontrada pelos autores foi a seguinte: 𝑃𝐷 = 3161,6𝑥(𝑃𝐴)−0,823.

3 Caracterização da Área de Estudo

João Pessoa é a capital, maior centro econômico e financeiro, e o município mais populoso do Estado
da Paraíba, possuindo 817 511 habitantes, de acordo com estimativas do IBGE para o ano de 2020. Além
disso, a capital paraibana guarda o título de terceira cidade mais antiga do Brasil, fundada em 1585. Ao
longo das últimas décadas, a cidade teve um acelerado crescimento urbano, caracterizado pelo processo de
uso e ocupação do litoral. Em paralelo ao progresso que acometia os grandes bairros residenciais e
comerciais da orla marítima, as encostas e vales de rios, ocupadas pela população de baixa renda, sofriam
com o empobrecimento urbano (PEREIRA, 2017).
Quanto aos aspectos físicos, o município possui clima tropical úmido, apresentando dois regimes
climáticos. Segundo Pereira (2014), o primeiro regime é o período chuvoso, correspondendo aos meses de
fevereiro a agosto. Já o segundo regime, é o período seco, que apresenta baixos índices pluviométricos,
abarcando os meses de setembro a janeiro. A cidade é considerada uma das mais arborizadas do planeta, pois

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apesar de ter sido bastante devastada, ainda conta com importantes resquícios da Mata Atlântica original
preservados.
No tocante à geologia, a Formação Barreiras é a unidade geológica de maior exposição na extensão
geográfica do município. Com relação à geomorfologia, João Pessoa apresenta um relevo com
predominância dos Baixos Planaltos Costeiros, superfícies tabulares planas com a presença de ondulações
moderadas ou fortes, de curta a média extensão. O desenvolvimento e ocupação urbanística, interferiu na
geomorfologia da cidade, provocando alterações na Formação Barreiras e contribuindo para o surgimento de
encostas induzidas, criando um ambiente favorável a desastres.
Conforme dados fornecidos pela Coordenadoria Municipal de Proteção e Defesa Civil de João Pessoa
(COMPDEC-JP), órgão que realiza constantemente o monitoramento das áreas que apresentam característica
de vulnerabilidade social e ambiental a fim de identificar as moradias comprometidas e interditá-las,
atualmente há 27 áreas de risco de deslizamento na cidade.

4 Metodologia

A metodologia proposta para estre trabalho consistiu na coleta de dados sobre os movimentos
gravitacionais de massa e pluviosidade, atualizando o cadastro iniciado por Soares e Ramos Filho (2014)
para a cidade de João Pessoa (PB). Após o tratamento dos dados levantados, os movimentos cadastrados
foram inseridos na curva de dispersão elaborada por Soares e Ramos Filho (2014), com a finalidade de
verificar a qualidade de aplicação da equação de correlação entre precipitação e movimentos de massa por
eles estabelecida, ampliando-se o tamanho da amostra inicial. Desse modo, buscou-se examinar se o
resultado empírico obtido pelos autores supracitados, os quais utilizaram dados de escorregamentos do
período de 2008 a 2013, continua sendo representativo para eventos de deslizamentos ocorridos entre os anos
de 2014 a 2018 no município de João Pessoa.
Para o levantamento dos dados de movimentos de massa, foram realizadas consultas à Coordenadoria
Municipal de Proteção e Defesa Civil de João Pessoa (COMPDEC-JP), a qual mantém um banco de registros
de desastres, separando as ocorrências em um determinado período de tempo e selecionando apenas os
eventos ocasionados pela chuva.
Como várias causas podem estar relacionadas aos escorregamentos, para fins de realização deste
estudo, efetuou-se a filtragem das informações, eliminando-se os casos que não estavam associados à
precipitação. A análise das datas de ocorrência e dos respectivos dados pluviométricos foi um critério
utilizado, descartando-se os eventos nos quais não houve registro de precipitação no dia do deslizamento ou
no dia anterior. Outro critério utilizado foi a pesquisa na mídia, buscando saber o que foi reportado sobre os
movimentos de massa e suas possíveis causas. Ao final, a amostra a ser analisada contava com 13 eventos de
escorregamentos, distribuídos em 11 datas distintas, possivelmente deflagrados pela ação da chuva, onde os
escorregamentos isolados ocorreram em maioria, correspondendo a 81,82% dos deslizamentos cadastrados e
os escorregamentos generalizados representaram 18,18%.
Os dados de pluviosidade, por sua vez, foram coletados junto à estação 82798 do Instituto Nacional
de Meteorologia (INMET), devido à existência de dados para todo o período de interesse, de modo a
coincidir com as datas e locais dos escorregamentos, uma vez que trata-se de dados interdependentes. A
partir das medidas de chuva acumulada, que são realizadas diariamente às 12:00h, calculou-se a
precipitação acumulada nos 7 dias anteriores para todas as datas de ocorrência, a fim de inserir
esses pontos na curva de correlação elaborada por Soares e Ramos Filho (2014). Na Tabela 1, estão
dispostos os números adquiridos para os eventos selecionados após a filtragem das informações.

Tabela 1. Precipitação Diária e Acumulada de 7 dias para as datas com ocorrência. Fonte: Adaptado de Silva
(2018).

Dias com Ocorrência


Precipitação
Data do Movimento (mm)
Gravitacional de Massa Diária 7 dias
14/05/2014 75,5 25
24/03/2015 65,2 133,8
27/07/2015 59 96,2

11
29/12/2015 87,4 58,6
18/04/2016 41,4 276,1
13/04/2017 71 55,5
09/05/2017 50,8 137,6
29/06/2017 60,4 115,4
30/06/2017 45,7 174,5
21/07/2017 96,4 32,9
29/07/2017 48,8 142,2

5 Análises e Discussões

Todas as ocorrências selecionadas, durante o período de 2014 a 2018, foram inseridas na curva de
correlação para precipitação acumulada de 7 dias desenvolvida por Soares e Ramos Filho (2014), como
mostra a Figura 1. As 11 novas datas com registro correspondem aos asteriscos em vermelho, enquanto os
triângulos azuis equivalem aos dados inicialmente cadastrados pelos autores supracitados, compreendidos
entre 2008 e 2013.

Curva de Correlação para acumulada de 7 dias

240
Precipitação diária - PD (mm)

220
200
180
160
140
120
100
y = 3161,6x-0,823
80
R² = 0,9804
60
40
20
0
0 50 100 150 200 250 300 350
Precipitação acumulada - PA (mm)

Com registro Novos Registros Envoltória acumulada de 7 dias

Figura 1. Curva de correlação para acumulada de 7 dias desenvolvida por Soares e Ramos Filho (2014)
acrescida dos novos casos de ocorrência de deslizamentos. Fonte: Elaborada pelos autores.

Através da análise do resultado obtido, foi possível verificar que até um limiar de 100 mm de
precipitação acumulada de 7 dias houve uma maior dispersão dos novos registros inseridos e os mesmos
apresentaram-se abaixo da curva. Para valores acima de 100 mm de chuva acumulada, observou-se uma
maior proximidade dos pontos em relação à linha de tendência, com eventos que obedeceram à correlação
estabelecida pelos autores.
Em linhas gerais, verificou-se que enquanto 10% das ocorrências entre 2008 e 2013 situaram-se
abaixo da curva, cerca de 45% dos novos registros encontram-se na parte inferior do gráfico. As possíveis
causas para essa quantidade de novas ocorrências fora da curva podem estar associadas a erros de leitura da
precipitação na estação pluviométrica selecionada para o estudo; à predominância das ações antrópicas,
agindo a precipitação como um efeito preparatório; à defasagem entre a deflagração do processo e a
comunicação à COMPDEC-JP, de modo que a data em que foi realizado o registro e a data do
escorregamento não coincidem; e ainda, à necessidade de elaboração de uma nova curva que englobe todas
as ocorrências a partir de 2008, uma vez que a suscetibilidade a escorregamentos em algumas áreas do
município pode ter aumentado.
Destaca-se que apesar de algumas novas ocorrências terem sido observadas abaixo da curva, os casos
que obedeceram à correlação desenvolvida por Soares e Ramos Filho (2014) demonstram que poderiam ser
previstos caso a COMPDEC-JP utilizasse a curva dos autores mencionados no monitoramento de risco de

12
acidentes. Um exemplo é o evento ocorrido no dia 24/03/2015, no bairro de Cruz das Armas, que confirma
que se houvesse esse gerenciamento, seria possível quantificar a chuva necessária para provocar o
escorregamento, sendo uma forma de alerta para a população local. Na Tabela 2, pode-se observar a
precipitação acumulada de 7 dias e a quantidade de chuva diária requerida para o acontecimento de
deslizamentos, segundo a equação de correlação de Soares e Ramos Filho (2014), nas datas anteriores ao
evento do dia 24/03/2015, em Cruz das Armas, e no próprio dia da ocorrência, bem como as chuvas diárias
verificadas.

Tabela 2. Precipitação acumulada de 7 dias, quantidade de chuva diária requerida para o acontecimento do
deslizamento do dia 24/03/2015 e chuvas diárias verificadas no bairro de Cruz das Armas, em João Pessoa
(PB), desde 7 dias anteriores ao evento até o dia da ocorrência. Fonte: Adaptado de Silva (2018).

Precipitação
Chuva diária requerida Chuva diária
Data acumulada de 7 dias
(mm) verificada (mm)
(mm)
17/03/2015 1,50 2264,56 0,20
18/03/2015 0,90 3447,98 0,40
19/03/2015 1,30 2547,60 1,10
20/03/2015 1,80 1949,03 8,00
21/03/2015 9,80 483,20 11,00
22/03/2015 20,70 261,13 89,00
23/03/2015 109,70 66,19 24,10
24/03/2015 133,80 56,21 65,20

Considerando que os valores de chuva acumulada que influenciam no processo de instabilização dos
taludes podem variar ao decorrer dos anos, verificou-se a necessidade de ampliar a amostra de dados e
elaborar uma curva mais representativa, englobando todas as ocorrências a partir de 2008. A Figura 2 traz
uma nova envoltória para a acumulada de 7 dias, com os dados de deslizamento de 2008 a 2018.

Nova Curva de Correlação para acumulada de 7 dias


180
Precipitação diária - PD (mm)

160
140
120
100
y = 0,0008x2 - 0,4273x + 98,265
80
R² = 0,7966
60
40
20
0
0 50 100 150 200 250 300
Precipitação acumulada - PA (mm)

Com registro Novos Registros Nova Envoltória Acumulada de 7 dias

Figura 2. Nova curva de correlação para acumulada de 7 dias, englobando dados de 2008 a 2018. Fonte:
Elaborada pelos autores.

A nova relação numérica obtida foi a seguinte: 𝑃𝐷 = 0,0008𝑥(𝑃𝐴)2 − 0,4273𝑥(𝑃𝐴) + 98,265, onde PD
é a precipitação diária e PA é a precipitação acumulada de 7 dias. Trata-se de uma curva do tipo polinomial,
com coeficiente de correlação R² = 0,7966.
De acordo com o novo diagrama, os casos de eventos isolados ocorreram para precipitações diárias a

13
partir de 96,4 mm e acumulada de 7 dias a partir de 32,9 mm, ou ainda, a partir de uma chuva diária de 41,4
mm e acumulada de 7 dias a partir de 276,1 mm. Os eventos de escorregamentos generalizados ocorreram a
partir de chuvas diárias de 71,0 mm e acumulada de 7 dias de 55,5 mm ou ainda a partir de chuva diárias de
60,4 mm e acumulada de 7 dias de 115,4 mm.
A Figura 3 apresenta as duas envoltórias desenvolvidas para a acumulada de 7 dias. Observa-se que a
curva elaborada por Soares e Ramos Filho (2014) é do tipo potencial, enquanto a nova linha de tendência
obedece a uma função polinomial, sendo possível constatar que a nova envoltória aponta um resultado
satisfatório para todo o intervalo de tempo analisado (2008 a 2018), apesar de algumas ocorrências ainda
encontrarem-se abaixo da curva.

Curvas de Correlação para acumulada de 7 dias


Precipitação diária - PD (mm)

240
220 y = 3161,6x-0,823
200 R² = 0,9804
180
160
140
120
100
80 y = 0,0008x2 - 0,4273x + 98,265
60 R² = 0,7966
40
20
0
0 50 100 150 200 250 300 350
Precipitação acumulada - PA (mm)

Com registro Novos Registros


Envoltória acumulada de 7 dias Nova Envoltória Acumulada de 7 dias

Figura 3. Curvas de Correlação para acumulada de 7 dias. Fonte: Elaborada pelos autores.

6 Considerações Finais

A averiguação da relação entre pluviosidade e movimentos de massa em uma determinada região


fornece critérios objetivos para a avaliação de riscos, proporcionando um ganho de previsibilidade deste tipo
de acidente. Nesse contexto, os estudos realizados por Soares e Ramos Filho (2014), no período de 2008 a
2013, ressaltaram a importância da investigação da chuva acumulada nos 7 dias anteriores ao desastre para o
monitoramento e prevenção de riscos de deslizamento em João Pessoa (PB).
A ampliação da amostra inicial dos autores supracitados, com a inserção de dados do período de 2014
a 2018, demonstrou que houve uma certa alteração nos valores de precipitação que deflagram os movimentos
gravitacionais de massa na capital paraibana. Destaca-se, entretanto, que a ocupação e o uso desordenado do
solo, na cidade de João Pessoa, acabam influenciando os resultados empíricos que relacionam precipitação e
escorregamentos, pois muitos eventos podem estar mais relacionados a processos induzidos do que a naturais
e por isso apresentam-se como pontos fora da curva.
Existe a necessidade de estender este estudo ao longo dos anos, buscando estabelecer uma curva cada
vez mais representativa para auxiliar o poder público a realizar ações preventivas para os movimentos
gravitacionais de massa.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem a colaboração da equipe da Coordenadoria Municipal de Proteção e Defesa


Civil de João Pessoa (COMPDEC-JP), em especial ao coordenador adjunto Alberto Sabino (in memoriam).

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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proposta metodológica. In: Conferência Brasileira sobre Estabilidade de Encostas, Rio de Janeiro. Anais,
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Tominaga, L. K.; Santoro, J.; Amaral, R. (2009) Desastres naturais: conhecer para prevenir, 1 ed., Instituto
Geológico, São Paulo.

15
Métodos de estabilização de encostas em áreas suscetíveis à
ocorrência de movimentos de massa: estudo de caso no município
de Garanhuns-PE
José Douglas França Leite
Engenheiro Civil, Autarquia do Ensino Superior de Garanhuns, Faculdades Integradas de Garanhuns,
Garanhuns, Brasil, jose_douglas_13@hotmail.com

Maylon Dieferson Silva de Sobral


Professor, Autarquia do Ensino Superior de Garanhuns, Faculdades Integradas de Garanhuns, Garanhuns,
Brasil, maylonsobral@aesga.edu.br
Alison de Souza Norberto
Doutorando, Universidade Federal de Pernambuco, Recife, Brasil, alison.norberto@ufpe.br

RESUMO: Este trabalho apresenta as soluções para estabilização a serem implantadas para prevenir a
ocorrência de movimentos de massa em encostas no município de Garanhuns. Foram identificadas três áreas
instáveis e suscetíveis a esse fenômeno dentro do município através de estudos anteriores, onde foi possível
caracterizar os principais tipos de movimento de massa existente em cada área e seus agentes desencadeadores.
Por fim, foram apresentados métodos de estabilização, cuja tecnologia de execução encontra-se disponível na
região de estudo, visando buscar uma proposta aplicável com o intuito de reduzir os riscos de movimentação
de massa, melhorando a estabilidade dos taludes para evitar danos materiais, ambientais e humanos.

PALAVRAS-CHAVE: Movimento de massa, Estabilidade de Encostas, Estruturas de Contenções.

ABSTRACT: This work presents theretaining structures to be implemented to prevent the occurrence of mass
movements on slopes in the municipality of Garanhuns. Three unstable areas susceptible to this phenomenon
were identified within the municipality through previous studies, where it was possible to characterize the
main types of mass movement existing in each area and their triggering agents. Finally, stabilization methods
were presented, whose execution technology is available in the study region, aiming to find an applicable
proposal in order to reduce the risks of mass movement, improving the stability of the slopes to avoid material
and environmental damage and humans.

KEYWORDS: Mass Movement, Slope Stability, Retaining Structures

1 Introdução

O crescimento populacional no Brasil não foi acompanhado com projeto e ações voltados ao sistema de
habitações em áreas urbanas. Esse rápido crescimento resultou na ocupação inadequada do solo, com a
construção de habitações em áreas de taludes naturais, aumentando cada vez mais os riscos de colapso do solo.
Selby (1993 apud TOMINAGA, 2007) diz que o movimento de massa é o deslocamento do solo ou
material rochoso ao longo da encosta sob ação da gravidade, com interferência direta de outros fatores como
a água, ar e gelo. O movimento quando é provocado pela ação de um agente de transporte como a água, o gelo,
neve, ar e gases, são denominados processos de transporte de massa (Bandeira, 2003)
Conforme Tominaga, Santoro e Amaral (2009) esse processo ocorre em regiões de clima úmido e que
apresentam regiões montanhosas e serranas. Aqui no Brasil, são mais frequentes nas regiões: Sul, Sudeste e
Nordeste. As causas podem ser atribuídas ao aumento ou perda da resistência dos materiais que constituem
essas encostas. Dentre os fatores que aumentam as tensões cisalhantes pode-se citar: remoção de apoio,
sobrecarga, efeito transiente, remoção do material subjacente que promove o apoio e aumento na pressão
lateral; já os fatores associados a diminuição da resistência ao cisalhamento são: os condicionantes

16
relacionados ao estado inicial do material, mudanças provocadas pela ação física ou química no solo,
poropressão e mudança na estrutura (ABRAMSON et al., 2002 apud FERNANDES, 2016, p. 50).
O porte da vegetação situada nas áreas de encostas também pode influenciar no processo de ruptura do
material. Como, por exemplo, grandes árvores nessas áreas contribuem para o processo de colapso, pois,
aumentam os esforços quando o vento força sua copa, criando um sistema semelhante ao de braço e alavanca.
A influência da água sobre o solo é um dos fatores determinantes no processo de deslizamento de
encostas, uma vez que, a ação da água desestabiliza o material através da diminuição da resistência do solo.
Essa resistência é devido à pressão que se desenvolve no esqueleto estrutural dos solos pelo contato superficial
entre os grãos, esta pressão intergranular é denominada de tensão efetiva. Quanto maior a tensão efetiva maior
será a capacidade do solo de resistir a tensões cisalhantes, quando a tensão cisalhante supera a resistência ao
cisalhamento, ocorre o processo de ruptura do material.
Neste contexto está inserida a cidade de Garanhuns-PE, que devido a configuração de seu relevo, a
cidade está propença a movimentos de massas, os quais também sofrem influência das fortes chuvas que
ocorrem em determinadas épocas do ano. A cidade reflete o efeito de urbanização precária de
ordenamento, onde muitas moradias foram e são construídas em áreas de risco iminente de movimentos de
massa.
Portanto, é imprescendível identificar quais as áreas suscetíveis a sofrerem algum tipo de deslizamento
de encostas em Garanhuns e quais os métodos existentes para serem implantados para solucionar os efeitos do
fenômeno, minimizando os impactos negativos. Nesse contexto este trabalho avalia algumas áreas da cidade
sujeitas a movimentos de massa avaliando as possíveis soluções para estabilização com o intuito de minimizar
os riscos destas áreas.

2 Apresentação da área de estudo

O local definido para estudo foi a cidade de Garanhuns, localizada no Agreste Meridional de
Pernambuco. A escolha dessa cidade foi feita baseada nas condições topográficas que a cidade apresenta e
pelo rápido crescimento urbano que acarreta na utilização de áreas de encostas para fixação de moradias.
Segundo a Defesa civil de Garanhuns (2020), através do mapeamento de risco da cidade, as áreas com
ocupação irregular na cidade são encontradas nos bairros: São José e Heliópolis, conforme Figura 1.

Figura 1. Ocupação irregular de risco. Fonte: Defesa Civil de Garanhuns (2020)

Por apresentar boa infraestrutura em relação às cidades vizinhas, Garanhuns tornou-se um polo
regional atraindo movimentos migratórios permanentes e temporários (MELO; ALMEIDA, 2013). Esta
ocupação irregular intensifica a desastabilização do material, pois, é realizado alteração no sistema natural
das encostas para fixação de moradias com infraestrutura precária.

17
Em 2010 o município de Garanhuns sofreu com fortes chuvas, o que fez com que as áreas de encostas
tivessem um forte aumento no risco de instabilidade ou chegassem a apresentar alguma instabilidade. A
precipitação mensal atingiu 374,2 mm provocando deslizamento e afetando muitas residências, obrigando o
poder público municipal a transferir 100 famílias residentes na encosta do Vale da Liberdade para COHAB III
(SOARES, 2015).
O gráfico 1 apresenta informações da série histórica de pluviometria e temperatura ao longo de 30 anos,
onde é possível identificar quais os períodos mais chuvosos e secos e quente na cidade de Garanhuns.

Gráfico 1- Série histórica de precipitação em Garanhuns. Fonte: Climatempo (2020)

Observa-se que o período mais chuvoso em Garanhuns, geralmente, é entre os meses de Abril a Julho.
Portanto, é nessa época que os cuidados devem ser redobrados, pois, é o momento em que as encostas se
tornam mais instáveis e suscetíveis a movimento de massa pela diminuição da resistência.
Com o intuito de apronfundar Foram escolhidas três áreas: Comunidade do Vale da Liberdade,
localizada no Bairro Heliópolis, Bairro São José e Bairro Boa Vista.

2.1 Área 1 – Comunidade do Vale da Liberdade

A área de estudo fica próxima à Rua dos Operários no Vale da Liberdade, conhecida popularmente
como buracão, demarcadas pela área em vermelho. As encostas são instáveis provocadas pela remoção da
cobertura vegetal para a expansão do perímetro urbano sem nenhum tipo de intervenção estrutural adequada.
As partes mais íngremes das encostas são utilizadas para atividades agrícolas, o que aumenta a capacidade de
ocorrência de movimentos de massa, solo (MELO; ALMEIDA, 2013), conforme Figura 2.

Figura 2. Área de encostas no Vale da Liberdade. Fonte: Adaptado de Soares e Troleis (2017)

18
Foi visto, através de pesquisa pelo Google Earth, que a Rua dos Operários localizada na comunidade
do Vale da Liberdade não dispõe de escadarias eficientes para o acesso dos pedestres às suas moradias e de
canaletas para promover o escoamento das águas, conforme Figura 3.

Figura 3. Encostas íngremes. Fonte: Autor (2020)

As encostas possuem alta declividade e os aterros são feitos com o descarte de lixo da construção civil,
causando a errônea impressão de estabilidade da encosta e que o problema está resolvido. Além disso, os
dejetos orgânicos são despejados em fossas, individuais ou coletivas, nas encostas diretamente nas vertentes.
Isso provoca contaminação e saturação do solo (MELO; ALMEIDA, 2013).

2.2 Área 2 – Bairro São José

A área em estudo fica localizada em uma via que interliga a BR-424 a BR-423. Em visita ao local,
observou-se que os muros, que dividem os terrenos, estão localizados a uma distância aproximadamente 2
metros do topo da encosta, com esgoto sanitário sendo despejado na encosta, assim como o lixo, conforme
Figura 4.

Figura 4. Casas próximas ao topo do talude com descarte de lixo. Fonte: Autor (2020)

A construção de residências no bairro São José vem acontecendo de forma inadequada. Por isso, as
encostas, que tinham baixo risco para acontecimento de movimentos de massa, atualmente começam a se
apresentar na forma de quedas (MELO, ALMEIDA, 2013). Ainda conforme os autores, nessas áreas estão
sendo executados o corte retilíneo e escalonados nas encostas. Essa ação tende a potencializar a ocorrência de
movimento de massa na encosta.
Essas ações, tendem a desencadear movimentos de massa ao longo do talude. A presença de árvores, e
o porte delas, também podem ocasionar a ruptura do material através do processo semelhante ao de braço e

19
alavanca. O conjunto desses fatores pode acentuar no processo de desestabilização da encosta. Por isso, é
fundamental adotar soluções para garantir a sua estabilidade visando garantir a integridade física e às vidas
humanas que residem ali e a proteção dos bens materiais.

2.3 Área 3 – Bairro Boa Vista

É um bairro localizado em uma das partes mais íngremes de Garanhuns e apresenta densidade
populacional elevada, principalmente, próximo a taludes. Faz divisa com outro bairro, o do Aloísio Pinto. Foi
escolhido uma área específica dentro do bairro Boa Vista para ser estudada nesse trabalho, trata-se de uma
área localizada na Rua Padre Deon e tem como coordenadas geográficas 8º53’50.13”S e 3619’43.28”O.
O talude estudado está situado entre dois imóveis já construídos e no topo da encosta encontram-se
casas, aumentando a sobrecarga. Observa-se, pela Figura 5, a ingrime encosta com presença de habitações
populares no topo, em levantamento realizado na área observou-se a utilização de lonas sintéticas no intuito
de reduzir a degradação de partículas do solo por meio da chuva.

Figura 5. Talude analisado no Bairro Boa Vista. Fonte: Autor (2020)

O talude apresenta uma cobertura vegetal de médio porte fazendo a proteção da superfície e como se
trata de uma área localizada em uma das partes mais altas da cidade de Garanhuns, os taludes tendem a sofrer
efeitos pela ação da gravidade. Além disso, o solo da cidade tem características de porosidade elevada, boa
capacidade de retenção de água e alta permeabilidade o que pode ocasionar o processo de ruptura do material
por deslizamento. Portanto, estabelecer medidas de prevenção a ocorrência e deslizamento é fundamental para
garantir a estabilidade das casas situadas no topo das encostas, assim como, edificações que venham a ser
construídas.

3 Resultados e discussões

3.1 Sugestão de estabilização para área 1

Essa área, como mencionado anteriormente, sofreu com as fortes chuvas de 2010 provocando
deslizamento das encostas e afetando várias famílias que residiam nestas áreas. São áreas que sofrem com a
remoção da cobertura vegetal para serem construídas edificações. Desta forma, inicialmente, recomenda-se a
limpeza e recuperação da área através da remoção de entulhos e lixo, pois, esses tendem a acumular água,
aumentando a carga sobre o talude. É necessário que seja feito o corte das árvores de médio e grande porte que
se encontram próximas ao topo da encosta, uma vez que as mesmas estão sujeitas ao efeito alavanca
fragilizando o solo, assim como, a remoção das bananeiras que são utilizadas para a prática da atividade de
subsistência, pois, tende a acumular água.
A construção de sistema de drenagem para conduzir o caminho da água de forma correta com utilização
de canaletas, caixas de transição, dissipadores, escadas d’água e caixas de captação, que podem ser utilizados
como forma de minimizar os impactos ocasionados pelo escoamento superficial da água e da infiltração na
encosta. Pode-se construir escadarias para os pedestres, cujo objetivo é facilitar a entrada dos moradores em

20
suas residências. Além disso, recomenda-se, construir canaletas laterais para o escoamento das águas da chuva,
evitando que ocorra degradação do solo através do escoamento superficial.
Recomenda-se também a aplicação da técnica de proteção superficial com gramíneas cujo objetivo é
diminuir a infiltração, proteger a superfície da encosta e dar um aspecto visual mais agradável a área.
O conjunto dessas técnicas (proteção superficial e sistema de drenagens) apresentam vantagens, tais
como: facilidade de execução, o material pode ser encontrado facilmente e o custo é baixo, já que não será
empregado materiais sofisticados como o caso do concreto.

3.2 Sugestão de estabilização para área 2

Nesse caso é necessário a utilização de estruturas de contenção de maior poder resistivo, frente a uma condição
de sobrecarga de maior área. A utilização de muros de gravidade não seria recomendável para este caso
estudado, pois, em virtude do comprimento e da altura, tais estruturas de contenção adotariam dimensões
exageradas, elevando o custo de execução e dos materiais empregados.Desta forma, recomenda-se o emprego
de solo grampeado com face verde (geossintéticos). É uma técnica que consiste na melhoria dos solos com
execução de chumbadores, com instalação de geomantas flexíveis e biomantas de fibras de coco. Já os
chumbadores são utilizados com o objetivo de estabilizar o maciço na superfície em que pode ocorrer a ruptura
(ALMEIDA, MAIA, GUSMÃO, 2019).
Ainda conforme os autores, o conjunto desses elementos ajuda a revestir e proteger o solo da ação da
água da chuva e do vento, reduzindo a velocidade da água sobre a superfície do talude e aumentando a
rugosidade, evitando a formação de ravinas e o carregamento de partículas pelo escoamento superficial, além
de oferecer um ambiente propício para o crescimento da vegetação e diminuição da radiação solar.
Recomenda-se a utilização de plantas de pequeno porte com raízes profundas para recobrir a face do
talude. Segundo Gray e Leiser (1982 apud BANDEIRA, 2003, p.29), as raízes profundas ajudam a aumentar
a resistência ao cisalhamento do solo através do reforço mecânico, uma vez que as raízes absorvem parte da
tensão de cisalhamento do solo, e por escoramento, pois, como as raízes são profundas ajudam a dar
sustentação aos horizontes superficiais.
As vantagens em utilizar esse método estão no custo baixo, na facilidade de execução, uma vez em que
os equipamentos utilizados são leves, permitindo a execução em locais em que o acesso é complicado. É de
fundamental importância utilizar os dispositivos de drenagens como projetos complementares para aumentar
a estabilidade do talude.

3.3 Sugestão de estabilização para área 3

A área configura uma encosta onde pode-se verificar a existência de edificações, assim, recomenda-se
fazer o tratamento global em toda área da encosta. Segundo Mantovani (2016), este tratamento é feito da
seguinte forma: “as casas são dispostas em patamares pavimentados dos taludes protegidos superficialmente
com uso de vegetação e sistema de drenagem superficial que coleta a água e conduz até um canal de drenagem
localizado na base da encosta. As vias de acesso são formadas por escadarias perpendiculares às curvas de
nível e uma rua na base do talude. Quando necessárias, pode ser empregado estruturas de contenções isoladas
(muros de arrimo)”.
Esse modelo proposto para fazer a estabilização considerado a encosta totalmente é semelhante às
condições de topografia do bairro da Boa Vista. Entretanto, pode-se fazer, inicialmente, a terraplenagem para
preencher as falhas, posteriormente retaludamento individual em forma de patamares para diminuir a altura e
declividade do talude e por fim, adotar o muro de arrimo de concreto ciclópico, que utiliza o seu peso próprio
para suportar os esforços de empuxo do solo. É importante, utilizar contrafortes nesse tipo de muro para
aumentar a rigidez, consequentmente melhorando a segurança da contenção.
O muro de concreto ciclópico contém drenos de areais e barbacãs para reduzir os efeitos da água no solo. Na
base do muro, é fundamental que sejam instalados canaletas para fazer o escoamento da água da chuva. Desta
forma, garante que a estrutura não sofra danos pela falta de drenagem.
As vantagens que esse tipo de estrutura apresenta é o aspecto econômico quando utilizado para conter
alturas reduzidas e a facilidade na execução. Em relação ao ponto negativo desse método, é pela utilização de
fôrmas que necessita de mão de obra mais capacitada.
Na tabela 1 é apresentado as medidas sugestivas para garantir a estabilidade das encostas nas áreas
de estudo deste trabalho no município de Garanhuns-PE.

21
Tabela 1. Soluções sugeridas para as áreas instáveis
ÁREA MEDIDAS RECOMENDADAS
Limpeza e recuperação da área
Instalação de dispositivos de drenagem
1
Construção de escadarias e canaletas laterais
Proteção superficial com gramíneas

Limpeza e recuperação da área


2 Solo grampeado com face verde
Instalação de dispositivos de drenagem

Limpeza e recuperação da área

Execução de terraplanagem
Retaludamento em patamares
3
Estrutura de arrimo de concreto ciclópico
Dispositivos de drenagem
Proteção superficial com gramíneas

Fonte: Autor (2020)

3.4 Comparativo de custo entre estruturas de contenção

Nesta seção serão apresentados alguns dados sobre o custo de implementação de estruturas de contenção
para estabilização dos taludes. O objetivo é comprovar que as medidas de contenções recomendadas
anteriormente apresentam vantagens econômicas na sua implementação.
Em um estudo feito por Magalhães e Azevedo (2016) foi feito uma comparação de custo entre cincos
tipos de contenções em relação à altura. As estruturas de contenções utilizadas no estudo comparativo foram:
solo grampeado, cortina atirantada, gabião, tela de alta resistência e terra armada.
Esse estudo fez uma análise comparativa do custo por metro de contenção em função da altura de 3, 6
e 9 metros. Observou-se pelos resultados que o muro de gabião e o solo grampeado são estruturas que
apresentam maior viabilidade econômica em função da altura. Porém, o muro de gabião é um tipo de estrutura
que não suporta grandes carregamentos, então, torna-se inviável para grandes alturas.
Em uma altura de 5 metros aproximadamente a utilização de terra armada e solo grampeado
apresentaram-se com o mesmo custo. Entretanto, a medida em que o desnível aumentou o custo da terra armada
também aumenta. Portanto, na recomendação para estabilização da área 2 do presente trabalho, a sugestão da
utilização de solo grampeado com face verde torna-se uma escolha mais econômica levando em consideração
outros tipos de estruturas de contenção.

4 Conclusão

Este artigo teve o objetivo de apresentar as soluções de estabilização a serem implantadas para prevenir
a ocorrência de movimentos de massa em encostas no município de Garanhuns. As três áreas instáveis
apresentadas neste projeto, foram escolhidas a partir do mapeamento da Defesa Civil de Garanhuns sobre as
ocupações irregulares de risco em encostas instáveis e considerou-se casos de variados níveis de gravidade.
Nas escolhas, priorizou-se o aspecto técnico, a disponibilidade das tecnologias de implantação e a
facilidade de importação dos recursos necessários para execução das estruturas, visando garantir estruturas
executáveis, com qualidade e economia.
Ressalta-se que, as soluções mencionadas para impedir a instabilidade das áreas estudadas, no presente
trabalho, são sugestivas. Devendo ser realizado um estudo com projetos mais detalhados sobre as áreas
instáveis e propícias a sofrerem movimento de massa e o dimensionamento das estruturas de contenções.

22
Portanto, é de fundamental importância utilizar soluções, com ou sem contenções, para garantir a
estabilidade do talude e evitar danos materiais, ambientais e humanos. São várias técnicas que podem ser
empregadas, com ou sem estruturas de contenção no intuito de aumentar a segurança da encosta.

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23
Relação entre ocorrências de movimentos de massa e pluviometria
no município de Niterói (RJ) entre 2014 e 2018.
Cíntia Magda Pessin dos Reis
Universidade Federal Fluminense, Niterói, Brasil, cpessin@gmail.com

Marcos Barreto de Mendonça


Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil, mbm@poli.ufrj.br

Carla Maciel Salgado


Universidade Federal Fluminense, Niterói, Brasil, carlasalgado@id.uff.br

RESUMO: A cidade de Niterói (RJ) registra inúmeros casos de movimentos de massa todos os anos. As
chuvas, principalmente as intensas e/ou prolongadas, são os principais fatores para a deflagração destes
eventos que quando ocorrem em áreas ocupadas pelo homem constituem cenários de desastres. Uma das
medidas não estruturais que vem sendo implantada em diversas cidades do mundo com o intuito de
minimizar os efeitos nocivos dos desastres é o sistema de alerta que antecipa a população e gestores públicos
a ocorrência dos eventos danosos. No caso dos deslizamentos, a instalação de uma situação de alerta é
baseada no estudo da correlação entre deslizamentos e pluviometria. Nesse contexto, o presente trabalho visa
contribuir para o conhecimento desta correlação no município de Niterói, considerando dados de
precipitação diária e registros de ocorrência de movimentos de massa de 2014 a 2018. Foi possível observar,
principalmente, a dependência dos movimentos de massa com a pluviometria do dia de sua ocorrência
associada à pluviometria antecedente e a influência significativa das chuvas intensas, definidas pelo percentil
99, na quantidade de deslizamentos por dia de chuva.

PALAVRAS-CHAVE: Movimento de Massa, Pluviometria, Limiares Pluviométricos, Sistema de Alerta.

ABSTRACT: The city of Niterói (RJ) registers countless cases of mass movements every year. Rains,
especially as intense and / or prolonged, are the main triggering factors of these events which, normally,
become disasters when it occurs in areas occupied by humans. One of the non-structural measures that has
been implemented in several cities around the world, with the aim of minimizing the harmful effects of
disasters, is the early warning system that anticipates population and public managers of the occurrence of
harmful events. In the case of landslides, the installation of an alert situation is based on the study of the
correlation between landslides and rainfall. In this context, the present work aims to contribute to the
knowledge of this correlation in the municipality of Niterói, considering data and records of rainfalls and
mass movement occurrences from 2014 to 2018. It was observed the dependence of the movements of mass
with rainfall on the day of its occurrence associated with the antecedent rainfall and the effect of extreme
rainfall, defined by the 99th percentile, on the number of landslides per rainy day.

KEYWORDS: Mass Movements, Rainfall, Rainfall Threshold, Early Warning System.

1 Introdução

Desastres socioambientais têm ganhado destaque em pesquisas nacionais e internacionais nas


últimas décadas, em função do grande número de casos ocorridos e de pessoas atingidas todos os anos.
Entre os principais desastres associados a eventos naturais vivenciados no Brasil estão os relacionados a
movimentos de massa e inundações. Ambos estão associados a eventos pluviométricos intensos e/ou
prolongados que se repetem em cada período chuvoso. Apesar das inundações causarem grandes perdas
econômicas e impactos na saúde pública, os movimentos de massa são responsáveis pelo maior número de
vítimas fatais (CARVALHO & GALVÃO, 2006).
Sabe-se que a água é um dos mais importantes agentes deflagradores dos movimentos de massa, pois
ao se infiltrar no terreno provoca o aumento da poropressão e, consequentemente, a diminuição da

24
resistência ao cisalhamento da massa de solo e de rocha que se encontrava estável, podendo levar a ruptura
do talude (GUIDICINI & NIEBLE, 1984).
Deve-se destacar também a ação antropogênica como fator indutor desses eventos. O processo de
urbanização acelerado tem gerado a ocupação informal nas encostas que comumente é acompanhada por
ações como o desmatamento, cortes indevidos no talude, modificação das drenagens e o despejo de lixo, que
tornam os terrenos mais suscetíveis à ocorrência de movimentos de massa (FERNANDES et al, 2001).
Para tentar mitigar os riscos associados aos movimentos de massa, medidas estruturais (obras de
engenharia para estabilização de taludes) e não estruturais são constantemente utilizadas (MENDONÇA E
GUERRA, 1997). Nas ações não estruturais não há a execução direta no meio físico através de obras,
contemplando ações como planejamento de uso e ocupação do solo, educação, capacitação, a implementação
do sistema de alerta, planos preventivos de defesa civil, monitoramento de encostas, entre outras. Uma das
ações não estruturais que tem sido adotada em diversas cidades no mundo com o objetivo de avisar gestores
públicos e a população sobre a iminência de ocorrência movimentos de massa é o sistema de alerta
(SEGONI et al, 2018).
Como o principal agente deflagrador dos movimentos de massa é a água oriunda das chuvas,
especialmente em climas tropicais, a pluviosidade é o principal critério para o sistema de alerta nestas
regiões. No entanto, para se definir limiares de precipitação para a ocorrência de movimentos de massa é
necessário estudos sobre a correlação entre estes e a pluviometria (SEGONI et al, 2018). Quanto maior for a
série histórica pluviométrica e maior a quantidade e precisão dos registros de movimentos de massa (dia e
horário da ocorrência), melhor será a previsibilidade, o que é de suma importância para evitar o descrédito
do sistema pela população.
É nesse contexto que o presente trabalho se insere, visando contribuir para um melhor entendimento
da relação entre as chuvas e os movimentos de massa e, contribuir, para o estabelecimento de limiares de
pluviometria indutores deste processo no município de Niterói (RJ), considerando dados de 2014 a 2018. O
município está situado em uma área de clima tropical com chuvas concentradas nos meses mais quentes do
ano e com aspectos fisiográficos característicos, tal como topografia acidentada e ocupação informal das
encostas. Esses fatores fazem com que a Defesa Civil de Niterói registre casos de ocorrência de movimentos
de massa todos os anos, alguns capazes de gerar enormes prejuízos. O desastre mais marcante ocorrido no
município foi ocasionado por um longo período de chuvas intensas que culminou em vários deslizamentos
em abril de 2010, com mais de 160 mortos (DERECZYNSKI et al., 2011).

2 Metodologia

2.1 Dados Pluviométricos Diários

Os dados considerados na presente pesquisa referem-se ao período de 01 de janeiro 2014 a 31 de


dezembro de 2018, já que este era o período disponível durante a pesquisa que deu origem ao presente
trabalho. Foram utilizados dados pluviométricos diários de 16 pluviômetros automáticos, obtidos
inicialmente pelos arquivos digitais da Defesa Civil de Niterói e, posteriormente, através do endereço
eletrônico do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais – CEMADEN.
Após a obtenção dos dados, foi realizada uma análise para averiguar falhas (ausência) de informações
na série histórica estudada. Vale destacar que foi verificado que todos os pluviômetros automáticos possuíam
um determinado grau de ausência de registros que variaram de alguns dias até meses. A Tabela 1 aponta as
falhas de cada pluviômetro entre os anos de 2014 e 2018.

Tabela 1. Falhas de cada pluviômetro automático da cidade de Niterói.


Períodos de falhas na medição
Estações
2014 2015 2016 2017 2018
Niterói_Badu
Niterói_Barreto
Niterói_Charitas
Niterói_Fonseca
Niterói_Itaipu
Niterói_Jurujuba

25
Niterói_Largo da Batalha
Niterói_Maria Paula
Niterói_Morro do Castro
Niterói_Piratininga
Niterói_Piratininga 1
Niterói_Piratininga 2
Niterói_Praia João Caetano
Niterói_Santa Barbara
Niterói_Varzea das Moscas
Niterói_Visconde de Itaboraí

LEGENDA:
Sem 1-3 4-6 7-9 10 - 12
Falhas ao Dias
Falhas meses meses meses meses
ano

Além das ausências de registros, foi verificado que algumas medições não condiziam com o real
volume pluviométrico ocorrido no dia. Essa verificação foi realizada por meio da comparação entre os
valores de chuvas registrados pelos pluviômetros do próprio município e entre os valores registrados pelos
pluviômetros dos municípios vizinhos, Rio de Janeiro (pluviômetros de Copacabana, Saúde e Urca), São
Gonçalo (Arsenal, Pita e Rocha) e Maricá (Inoã e Itaipuaçú). Por meio dessa comparação, foi possível
verificar erros, como por exemplo, o registro de 0 mm em dias cujos dados indicavam serem realmente
chuvosos. Essas falhas foram observadas em todos os aparelhos, incluindo o pluviômetro de Charitas, que
apresentou o menor número de ausência de registros.

2.2 Dados dos Movimentos de Massa

Os dados sobre as ocorrências de movimentos de massa no município de Niterói foram obtidos junto
à Defesa Civil de Niterói, formando um conjunto de 1960 registros entre os anos de 2014 e 2018. As
informações sobre esses registros estavam dispostas em tabelas que continham as seguintes informações
(termos originais dos documentos): Tipo (ameaça/prevenção; mapeamento/a.p.; ocorrência), Motivo
(alagamento; ameaça/queda de árvore; ameaça/queda de marquise; ameaça/queda de muro; ameaça/queda de
poste; avaliação de risco; avaliação de risco ambiental; avaliação de risco estrutural; deslizamento;
deslizamento/desabamento; movimento/queda de blocos/lascas; risco de deslizamento; risco de
escorregamento; avaliação de risco geológico; avaliação pós-incêndio; avaliação técnica; desabamento;
desabamento parcial; desinterdição; deslizamento; deslizamento de encosta/talude;
deslizamento/desabamento; destelhamento; entulho – despejo de resíduos; erosão; escorregamento; evento
geológico; incêndio; infiltração; inundação; má conservação; movimento/queda de blocos/lascas; não
confirmado; queda de objeto; queda de revestimento; queda de vegetal/árvores; rachadura; risco a
movimentos gravitacionais de massa – mapeamento; risco de desabamento; risco de deslizamento; risco de
escorregamento; risco de incêndio; risco estrutural; solapamento; trinca; vazamento/material inflamável),
Bairro, Endereço, Solicitação (número), Data_solicitação, Data_ocorrência/atendimento, UTM_Est,
UTM_Nor (coordenadas UTM), Vit_não_fatal (quantidade de vítimas fatais), Vit_fatal (quantidade de
vítimas fatais), Desalojados, Desabrigados. Vale ressaltar que alguns desses campos apresentavam falhas
em alguns registros ou não possuíam informações completas, como os das coordenadas, das vítimas, dos
desalojados e desabrigados.
Após a coleta dos registros, os mesmos foram analisados para selecionar aqueles que seriam
aproveitados para a pesquisa por meio de uma filtragem dos dados. Dos registros cujo “tipo” se referia a
“amaça/prevenção” só foram utilizados aqueles que apresentavam uma confirmação da ocorrência de
movimentos de massa com a respectiva data. Os demais registros de “ameaça/prevenção” foram descartados
por não haver a certeza de que o movimento de massa realmente aconteceu. Posteriormente, foram excluídos
os registros cujo campo “motivo” apresentava uma das seguintes informações: “ameaça/queda de árvore”,
“avaliação pós-incêndio”, “destelhamento”, “infiltração”, “queda de vegetal/árvore”, “avaliação de risco

26
estrutural”, “avaliação de risco geológico”, “avaliação técnica”, “desabamento”, “desabamento parcial”,
“risco de deslizamento”, “risco de escorregamento” e “risco estrutural”, por não tratar da concretização de
evento de movimento de massa. Desta maneira, foram utilizados apenas os dados cujo “tipo” era referente à
“ocorrência” e cujo “motivo” era “deslizamento”, “deslizamento de encosta/talude”,
“deslizamento/desabamento”, “erosão”, “escorregamento”, “movimento/queda de bloco/lascas” ou
“solapamento”. Ainda quanto à organização de dados, todas as ocorrências registradas no mesmo dia e na
mesma rua com o número dos imóveis muito próximos foram unificadas por entender que faziam parte de
uma mesma ocorrência. Ao final, foram totalizadas 395 ocorrências.

2.3 Análise da Relação entre Pluviometria e Ocorrências dos Movimentos de Massa

Procurou-se, inicialmente, revelar o comportamento da precipitação ao longo dos anos estudados.


Em seguida, buscou-se relacionar os movimentos de massa com as classes de chuvas, considerando os
acumulados pluviométricos no dia de cada ocorrência e nos três dias anteriores (Figura 1). Para cada
ocorrência buscou-se utilizar as informações do pluviômetro mais próximo, porém, na ausência de registros
ou nos casos de informações dúbias foi utilizado o segundo pluviômetro mais próximo e assim
sucessivamente.
Para a análise de correlações, foram elaborados gráficos usando as seguintes classes de chuvas
diárias: igual a 0 mm; 0,1 – 5 mm; 5 – 15 mm; 15 – 25 mm; 25 – 50 mm; 50 – 100 mm; 100 – 150 mm;
acima de 150 mm. Já as classes de chuvas para acumulados de três dias de precipitação foram: igual a 0 mm;
0,1 – 25 mm; 25 – 50 mm; 50 – 100 mm; 100 – 150 mm; 150 – 200 mm. Destaca-se que para esta análise foi
considerado que os movimentos de massa ocorreram às 24h do dia do seu registro, conforme indicado na
Figura 1.

Figura 1. Indicação da consideração do momento da ocorrência de movimento de massa e dos


períodos de pluviometria acumulada com os quais a ocorrência foi relacionada.

Para que fosse analisada a influência das chuvas intensas na deflagração de movimentos de massa,
primeiramente foi determinado o valor mínimo a partir do qual uma chuva seria considerada intensa. Este
valor correspondeu ao percentil 99, tal como considerado por Dereczynski et al. (2009) no caso do município
do Rio de Janeiro. O percentil 99 é o valor tal que 99% dos elementos da amostra são menores ou iguais a
ele.
O cálculo do percentil 99 foi realizado para cada um dos 16 pluviômetros. O menor percentil 99
encontrado entre todos os pluviômetros do município foi considerado o limite inferior de pluviometria acima
do qual configura-se uma chuva intensa.
Dereczynski et al. (2009) considerou evento de chuva intensa no município do Rio de Janeiro
quando os acumulados diários em pelo menos 5 pluviômetros foram maiores que o estipulado pelo percentil
99. Procurando adaptar o procedimento deste trabalho para o município de Niterói, devido a sua extensão
territorial ser aproximadamente dez vezes menor do que a do Rio de Janeiro foi considerado evento de chuva
intensa quando o percentil 99 foi ultrapassado em, pelo menos, um pluviômetro.

27
Foi analisada a distribuição dos 395 registros de movimentos de massa selecionados para esse estudo
em dias de chuva intensa, chuva não intensa ou em dias sem chuva para verificar a influência das chuvas
intensas na deflagração de movimentos de massa.

3 Resultados

Os primeiros resultados mostram o comportamento anual e mensal da precipitação no período


analisado, de forma separada por região do município (Figura 2.), conforme mostrado na Figura 3. É possível
notar uma variabilidade espacial da chuva com valores mais elevados nas regiões litorâneas (Praias da Baía e
Oceânica) e na Região de Pendotiba e valores mais baixos nas regiões mais interiores (Norte e Leste).
A Figura 4 aponta que a quantidade dos eventos de movimentos de massa acompanhou a dinâmica
pluviométrica média no município. Quanto aos dados mensais de movimentos de massa, observa-se, como é
de se esperar, que a maior parte dos registros ocorreu nos meses de verão (Figura 5). O mês de maio teve o
menor registro de ocorrências de movimentos de massa, dando seguimento a tendência de redução em
função da diminuição da pluviometria mensal. Já em junho observa-se uma média pluviométrica alta,
fazendo elevar novamente a quantidade de movimentos de massa, porém em quantidade mais baixa do que a
média do verão.

Figura 2. Mapa de Niterói com seus respectivos bairros e Regiões Administrativas. Fonte: PREFEITURA
MUNICIPAL DE NITERÓI, 2015.

28
Figura 3. Acumulados anuais de cada pluviômetro automático de Niterói entre 2014 e 2018.

Figura 4. Acumulados médios pluviométricos anuais e ocorrências de movimentos de massa no município de


Niterói entre 2014 e 2018.

Figura 5. Médias mensais de precipitação e número mensal de ocorrências dos movimentos de massa em
Niterói no período de 2014 à 2018.

O percentual de eventos registrados em cada região administrativa está indicado na Figura 6. Os dois
bairros que apresentaram o maior número de casos, com valores muito superiores em relação aos demais,
foram os bairros Fonseca (segundo bairro mais populoso) e Caramujo com 58 e 38 registros,
respectivamente, correspondendo juntos a 24,3% das ocorrências no período estudado. Ambos estão situados
na região Norte que apresentou quase metade dos casos de movimentos de massa (46,1%). Essa elevada
porcentagem provavelmente está relacionada com o fato de ser a região com o maior número de favelas do

29
município, situadas em área de relevo acidentado e cuja ocupação se deu de forma desordenada,
potencializando a suscetibilidade das encostas.

Figura 6. Distribuição percentual de ocorrências de movimentos de massa nas regiões administrativas de


Niterói entre 2014 e 2018.

Após a verificação dos valores de precipitação no dia das ocorrências e nos três dias anteriores (vide
Figura 1), foi elaborado um gráfico com o intuito de mostrar a distribuição das ocorrências de movimentos
de massa em relação aos respectivos volumes acumulados de chuva (Figura 7). Constata-se, de uma forma
geral, uma tendência da necessidade de um maior valor de pluviometria no dia da ocorrência quando se tem
uma baixa pluviometria acumulada nos três dias anteriores para deflagrar um movimento de massa. Vale
destacar uma significativa quantidade de registros de movimentos de massa com valores muito baixos de
pluviometria tanto no dia do evento quanto nos três dias anteriores indicando, nestes casos, uma provável
falha nos registros das datas em que estes eventos efetivamente ocorreram.

Figura 7. Relação entre a pluviometria do dia da ocorrência do movimento de massa e a acumulada nos três
dias anteriores (reta indicando a tendência geral de relação), em Niterói entre 2014 e 2018.

Buscando analisar a relação entre a ocorrência de chuvas intensas e de movimentos de massa no


município, fez-se, inicialmente, o levantamento dos percentis 99 de pluviometria em cada pluviômetro, cujos
resultados estão indicados na Figura 8. Observou-se que todos os pluviômetros localizados no litoral do
município, nas regiões das Praias da Baía e Oceânica (Charitas, Itaipú, Jurujuba, Piratininga, Piratininga 1,
Piratininga 2, Praia João Caetano e Visconde de Itaboraí) e os da região de Pendotiba (Badú e Largo da
Batalha), situados em uma área mais elevada, apresentaram percentis 99 entre 54 mm e 71,3 mm. Já os
pluviômetros localizados no interior do município, nas regiões Norte e Leste (Barreto, Fonseca, Maria Paula,
Morro do Castro, Santa Bárbara e Várzea das Moças), apresentaram percentil 99 mais baixos, variando entre
39,3 mm e 46,8 mm.

30
Figura 8. Totais pluviométricos diários correspondentes ao percentil 99 para os pluviômetros ativos do
município de Niterói, entre os anos de 2014 e 2018.

O menor percentil 99 encontrado entre todos os pluviômetros do município foi de 39,3 mm. Por esta
razão, adotou-se como critério para a definição dos episódios de chuvas intensas para todo o município o
registro de pluviometria igual ou maior que 39 mm/dia em, pelo menos, um pluviômetro. Vale citar que,
Dereczynski et al. (2009) encontraram, para a cidade do Rio de Janeiro, um percentil 99 de 30 mm/dia,
sendo importante destacar que este município apresenta pluviômetros com uma série histórica maior e com
dados mais completos e com menos falhas do que os de Niterói. A diferença entre os valores entre Niterói e
Rio de Janeiro pode ser também explicada pelo fato do Rio de Janeiro apresentar maciços costeiros elevados
que interferem na pluviometria da cidade, o que não acontece em Niterói.
Em função deste critério, foi possível calcular para cada pluviômetro de Niterói o número de dias
que apresentaram chuva intensa (≥ 39 mm/dia), chuva não intensa (maior que zero e menor que 38,99
mm/dia) e dias sem chuva (0 mm). Em seguida, fez-se a distribuição das 395 ocorrências de movimentos de
massa segundo essas classes de intensidade de chuva (Tabela 2).

Tabela 2. Número de dias de chuva intensa, não intensa, sem chuva e as respectivas quantidades de
ocorrências de movimentos de massa por ano.
Ano 2014 2015 2016 2017 2018
A) Nº de dias com chuva intensa (≥ 39 mm) 4 10 18 8 13

B) Nº de dias com chuva não intensa (0,2 até 38,99 mm) 173 238 231 229 241

C) Porcentagem de dias com chuva intensa em relação ao


2,3% 4% 7,2% 3,4% 5,1%
total de dias com chuva
D) Nº de dias sem chuva (0 mm) 188 117 117 128 111

E) Nº total de ocorrências de movimento de massa no ano 5 104 172 36 78

F) Nº total de ocorrências de movimento de massa em dias


1 4 48 7 31
com chuva intensa (≥ 39 mm)

G) Nº total de ocorrências de movimento de massa em


3 83 111 24 46
dias com chuva não intensa (0,2 até 38,99 mm)

H) Porcentagem de ocorrências de movimento de massa


em dias de chuva intensa, em relação ao total de 20% 3,8% 27,9% 19,4% 39,7%
movimentos de massa

31
I) Porcentagem de ocorrências de movimentos de massa
em dias de chuva não intensa em relação ao total de 60% 79,8% 64,5% 66,6% 59%
movimentos de massa
J) Nº total de ocorrências de movimento de massa em dias
1 17 13 5 1
sem chuva (0 mm)
L) Valor médio de ocorrências de movimento de massa
0,25 0,40 2,67 0,88 2,38
em dia de chuva intensa (≥ 39 mm)
M) Valor médio de ocorrências de movimento de massa
0,02 0,35 0,48 0,10 0,19
em dia de chuva não intensa (0,2 até 38,99 mm)
N) Valor médio de ocorrências de movimentos de massa
0,01 0,15 0,11 0,04 0,01
em dia sem chuva (0 mm)
O) Valor médio de ocorrências de movimentos de massa
em dia de chuva não intensa ou sem chuva (0 mm até 0,01 0,28 0,36 0,08 0,13
38,99 mm)
P) Razão entre os valores médios de ocorrências de
movimento de massa em dia de chuva intensa e em dia 12,5 1,14 5,56 8,8 12,5
de chuva não intensa

Apesar da variação dos valores por ano, é possível notar que os valores médios de movimentos de
massa em dias de chuva intensa (item L) são, de uma forma geral, significativamente muito superiores aos
valores médios de movimentos de massa em dias de chuva não intensa ou sem chuva (item O), sendo menos
evidente no ano de 2015. É importante observar a razão entre os valores médios de movimentos de massa em
dia de chuva intensa e em dia de chuva não intensa (item P) variando de 1,14 a 12,5, com média de 8,1
(Figura 9). Também foi possível notar que o percentual de movimentos de massa em dias de chuva intensa
(item H) variou de 3,8% à 39,7%, com média de 22,2%, sendo que os dias de chuva intensa corresponderam
a uma parcela pequena do total de dias de chuva (item C), 2,3% à 7,2%, com média de 4,4%.

Figura 9. Valores médios das ocorrências de movimentos de massa de acordo com a classe de chuva e a
razão entre valores médios.

4 Conclusões e considerações finais

Os desastres associados a deslizamentos de abril de 2010, entre os quais inclui-se o do morro do


Bumba, fez com que o município de Niterói passasse a investir em melhorias em segurança e defesa civil.
Apesar dos investimentos e do significativo avanço na gestão de riscos, pode-se perceber algumas falhas
tanto nos dados pluviométricos como nos registros de movimentos de massa. Entretanto, mesmo com essas
deficiências, foi possível observar uma relação geral entre movimentos de massa e pluviometria, bem como a
influência das chuvas intensas na deflagração de tais eventos no município de Niterói, considerando os dados
de 2014 e 2018.

32
Como é de esperar, as ocorrências de movimentos de massa se concentraram nos meses de novembro
a abril, quando o volume pluviométrico é mais elevado, e a quantidade de ocorrências tiveram uma relação
crescente com a pluviométrica anual do município com uma relação crescente.
Quanto à distribuição geográfica dos movimentos de massa no município, foi possível verificar que
os registros se concentraram principalmente em dois bairros da Região Norte, Caramujo e Fonseca,
caracterizados por apresentarem um grande número de favelas, que se formaram ao longo das décadas sem o
devido planejamento urbano em áreas naturalmente suscetíveis a movimentos de massa.
Observou-se uma clara dependência do valor da pluviometria do dia da ocorrência do movimento de
massa com o da chuva acumulada nos três dias anteriores, evidenciando que um sistema de alerta quanto a
ocorrência de deslizamentos em Niterói precisa levar em consideração a pluviometria acumulada nos dias
antecedentes.
Conclui-se, também, que há uma significativa influência das chuvas intensas, definidas pelo limiar
do percentil 99 (39 mm/dia) na ocorrência dos movimentos de massa, obtendo informações importantes para
a gestão de risco no município. Apesar dos dias de chuva intensa terem correspondido a uma parcela
pequena do total de dias de chuva (2,3% à 7,2%), o percentual de deslizamentos em dias de chuvas intensas
variou de 3,8% à 39,7% em relação ao total de eventos. A razão entre os valores médios da quantidade de
movimentos de massa em dia de chuva intensa e em dia de chuva não intensa apresentou um valor médio de
8,1.

AGRADECIMENTOS

Agradecemos ao Secretário de Defesa Civil de Niterói Tenente Coronel Wallace Medeiros e ao


Diretor Operacional Eric Almeida Oliveira por permitirem e disponibilizarem os dados que foram a base
para a elaboração desse estudo.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Elaboração de Políticas Municipais. Brasília: Ministério das Cidades; Cities Alliance, 2006.

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Rio de Janeiro. Revista Brasileira de Meteorologia, v. 24, n. 1, p. 24-38, 2009.

DERECZYNSKI, C., MARENGO, J., SILVA, M. G. A. J., SANTOS, I. A. Clima e Mudanças Climáticas
na Cidade do Rio de Janeiro. In: Megacidades, Vulnerabilidades e Mudanças Climáticas: Região
Metropolitana do Rio de Janeiro (pp. 41–74). Rio de Janeiro: CST/INPE e NEPO/UNICAMP, 2011. p.
43-73.

FERNANDES, N. F., GUIMARÃES, R. F, GOMES, R. A. T., VIEIRA, B. C., MONTGOMERY, D. R.,


GREENBERG, H. Condicionantes geomorfológicos dos deslizamentos nas encostas: avaliação de
metodologias e aplicação de modelo de previsão de áreas susceptíveis. Revista Brasileira de
Geomorfologia, v. 2, n. 1, p. 51-71, 2001.

GUIDICINI, G., NIEBLE, C. Estabilidade de Taludes Naturais e de Escavação. 2.ed. São Paulo: Editora
Blucher, 1984.

MENDONÇA, M.B. e GUERRA, A.T. A Problemática dos Processos Geodinâmicos frente ao Ocupação
Encostas, Anais 2nd Panamerican Symposium on Landslides, Rio de Janeiro, vol. 2, pp. 935-940 1997.

PREFEITURA MUNICIPAL DE NITERÓI. Leitura técnica da revisão do plano diretor de


desenvolvimento urbano de Niterói: caderno de mapas. 2015. Disponível em
<http://urbanismo.niteroi.rj.gov.br/wp-content/uploads/2015/10/diagnostico-tecnico-volume-3-
3_caderno_de_mapas.pdf>. Acesso em 22 de janeiro de 2019.

SEGONI S, PICIULLO L, GARIANO SL. A review of the recent literature on rainfall thresholds for
landslide occurrence. Landslides 15:1483–1501. https://doi.org/ 10.1007/s10346-018-0966-4, 2018.

33
Aplicação do Modelo Shalstab na Construção de um Mapa de
Suscetibilidade a Deslizamentos Translacionais de Terra no Bairro
Azambuja (Brusque, SC)
André Felipe Bozio
Mestre em Gestão Territorial, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, Brasil,
andrefbozio@gmail.com

Vivian da Silva Celestino Reginato


Doutora em Engenharia Civil, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, Brasil,
vivian.celestino@ufsc.br

RESUMO: Os deslizamentos gravitacionais de terra estão entre os maiores desastres naturais com vítimas
fatais no Brasil. Na problemática de uso e ocupação desordenado do solo, falta de planejamento e gestão
territorial, as encostas suscetíveis a estes deslizamentos estão cada vez mais ocupadas. Neste contexto,
objetiva-se realizar o mapeamento de suscetibilidade a escorregamentos rasos por meio do modelo matemático
Shalstab no bairro Azambuja, município de Brusque (SC). O trabalho foi dividido em três etapas, levantamento
do material pré-existente, processamentos dos dados em ambiente SIG e aplicação do modelo matemático.
Como resultados, foram obtidos o mapeamento das unidades geotécnicas da área de estudo e o mapa de
suscetibilidade a movimentos gravitacionais de massa, evidenciado pelo alto índice de instabilidade das suas
encostas. Existe uma clara correlação entre a ocorrência de deslizamentos na região em questão e o relevo da
mesma, mostrando-se uma área com potencial elevado em número de instabilidades sofridas diante de
adversidades temporais.

PALAVRAS-CHAVE: Deslizamentos de Terra, Áreas de Risco, Modelo Shalstab, Gestão Territorial.

ABSTRACT: Gravitational landslides are among the biggest natural disasters with fatal victims in Brazil. In
the problem of disorderly land use and occupation, lack of planning and territorial management, the slopes
susceptible to these landslides are increasingly occupied. In this context, the objective is to carry out the
mapping of susceptibility to shallow landslides using the Shalstab mathematical model in the Azambuja
neighborhood, city of Brusque (SC). The work was divided into three stages, survey of pre-existing material,
data processing in a GIS environment and application of the mathematical model. As a result, the mapping of
the geotechnical units of the study area and the susceptibility map to gravitational mass movements were
obtained, evidenced by the high instability index of its slopes. There is a clear correlation between the
occurrence of landslides in the region in question and its relief, showing an area with a high potential in terms
of the number of instabilities suffered in the face of temporal adversities.

KEYWORDS: Landslides, Risk Areas, Shalstab Model, Territorial Management.

1 Introdução

A ocupação desordenada em locais suscetíveis a deslizamentos são grandes propulsores de desastres


naturais. Neste contexto, a gestão ambiental do município deve estar atenta para que áreas em expansão urbana
sejam devidamente analisadas e caracterizadas no que tange os aspectos geotécnicos e de instabilidade.
Segundo a bibliometria de Wu et al. (2015) as pesquisas relacionadas aos deslizamentos de terra veem
crescendo nas últimas duas décadas, sendo os países da America do Norte, Europa Ocidental e do Leste
Asiático os mais impulsionadores.
Com a finalidade de prever e analisar as áreas com taludes instáveis que geram riscos, diversos modelos
matemáticos aliados aos Sistemas de Informações Geográficas estão sendo utilizados. O Shalstab (Shallow
Landslide Stability) desenvolvido por Montgomery e Dietrich (1994), SINMAP (Stability Index Mapping)
(Pack et al., 1998) e o TRIGRS (Transient Rainfall Infiltratio and Grid-based Regional) (Baum, 2002) são
baseados em dados geotécnicos e hidrológicos dos taludes em que se deseja aplicar a análise.
Este trabalho optou pela utilização do modelo Shalstab visto o grande emprego do mesmo na análise de
diferentes localidades do estado de Santa Catarina (MELO E KOBYIAMA, 2018) e por sua simples interface,

34
tendo acesso direto pela internet, pequena quantidade de dados de entrada e o rápido processamento de dados
(MELO; MICHEL; KOBYIAMA, 2018).
O modelo matemático Shalstab desenvolvido por Montgomery e Dietrich (1994) e impulsionado pela
tese de doutorado de Guimarães (2000), segundo Melo e Kobiyama (2018), vincula dados topográficos
(declividade, área de contribuição), climáticos e parâmetros geotécnicos do solo (ângulo de atrito, coesão e
densidade).
Dada a aplicação deste modelo no Brasil, Santa Catarina está em primeiro lugar em relação às
publicações que utilizam este método na análise de suscetibilidade entre os anos de 2002 e 2016, seguidos pelo
Rio de Janeiro e São Paulo (MELO E KOBYIAMA, 2018), segundo os autores, as áreas de estudo mais
analisadas por meio deste método estão situadas em uma geomorfologia íngreme associada ao clima tropical,
propícios para deslizamentos de terra.
O estado de Santa Catarina apresenta um grande histórico de acidentes geológicos e geotécnicos.
Segundo o Atlas Brasileiro de Desastres Naturais (CEPED/UFSC) o estado com uma área que representa
apenas 1,2% do território nacional registrou 12% de todas as catástrofes ocorridas no Brasil entre 1991 e 2010.
Dentre os eventos naturais adversos citam-se: estiagens e secas (32%), inundações graduais e bruscas (40%),
vendavais e/ou ciclones (15%), granizos (11%), além de tornados, geadas, incêndios florestais, erosão fluvial
e marinha e dois movimentos de massa, que juntos somam 2% das ocorrências mais recorrentes.
Podem-se destacar os desastres ocorridos no ano de 2008, ocasionados por grandes deslizamentos de
encostas, corridas de lama e processos erosivos-depositivos (NASCIMENTO; DELL`AVANZI; NETO,
2009).
Embora existam diversas pesquisas realizadas na região, ainda não foram feitas análises de
suscetibilidade por meio do Shalstab na área de estudo escolhida. Desta forma, reconhecer a morfodinâmica
de uma região que se expande urbanamente gera subsídio para uma melhor gestão ambiental.
Pela carência de informações geológico-geotécnicas, falta de qualificação dos responsáveis pelo
planejamento urbano do Município com processamento de dados em ambiente SIG, há atualmente uma
escassez de subsídios técnicos sumamente importantes para o planejamento da cidade em relação ao seu uso e
ocupação na prevenção de desastres naturais. Problemática importante tendo em vista que este local já foi
campo de diversos acontecimentos relacionados ao deslizamento de terras, mau uso e ocupação do solo e falta
de planejamento urbano.
Tendo considerado a experiência do uso da cartografia na análise de ambientes suscetíveis a
deslizamentos de terra em diversos municípios brasileiros, objetiva-se no presente artigo avaliar a
suscetibilidade a escorregamentos rasos a partir do uso do modelo matemático Shalstab em um bairro do
município de Brusque (SC).
Para chegar a este objetivo foi elaborado um mapeamento geotécnico preliminar em ambiente SIG
(Sistemas de Informações Geográficas) por meio de metodologias de Davison Dias (1995) e Higashi (2006),
caracterizando os solos da área de estudo e estimando seus respectivos parâmetros geotécnicos por meio da
literatura, tendo como resultado final o mapa de suscetibilidade.

2 Materiais e Método

A metodologia adota para o entendimento do fenômeno de suscetibilidade aos deslizamentos de terra


no bairro Azambuja em Brusque (SC) foi dividida em três etapas, organizados pelo fluxograma da Figura 1.

Figura 1. Fluxograma das etapas metodológicas

2.1 Área de Estudo

A cidade de Brusque localizada na região sul do Brasil, no estado de Santa Catarina (Figura 2)
compreende uma área territorial de aproximadamente 283,223 km². Segundo a Prefeitura Municipal de
Brusque a população atual é de 134.723 habitantes.

35
É um importante destino turístico devido as suas belezas naturais e por seu grande potencial têxtil.
Conhecida como a cidade brasileira do tecido, o município é povoado por imigrantes alemães, italianos e
poloneses, desde o século 19 no ano de 1860.
Brusque teve um célere crescimento populacional, crescendo 40,62% entre 1980 a 1991, passando a
apresentar 57.971 habitantes, sendo que Santa Catarina crescia 25,20%. Em 1996 o município conquistou o 3º
lugar do estado, crescendo em dobro da média nacional (IBGE, 2014), sendo estes dados a justificativa na
escolha desta área.

Figura 2. Mapa de localização do município de Brusque (SC)

Situado no Vale do Itajaí o município é palco de uma geologia heterogênea, produto de um processo de
metamorfização. As rochas metamórficas são principalmente constituídas por xistos e filitos, e, nas partes mais
baixas da cidade, é possível encontrar sedimentos quaternários, geralmente moles, bem como, zonas de
deposição de areia e cascalho (MAFRA JR., 2007).
O relevo da cidade é formado basicamente por um grande vale, constituindo um enorme sistema natural
de drenagem, formado por grandes morros e em sua parte plana, escoa o Rio Itajaí-Mirim, onde se localiza a
parte central do município. Atualmente, a procura pela moradia se destina aos locais de maior altitude, por
conta das grandes cheias que o município sofre em suas partes mais baixas, e, consequentemente, o surgimento
de moradias em morros e áreas de encostas.
Com aproximadamente 4.173 habitantes, o bairro Azambuja contempla o principal hospital da cidade
e, diversos pontos turísticos religiosos da região.
Segundo o Plano Diretor de Brusque, o bairro Azambuja está localizado no perímetro urbano da cidade.
O local recebe emigrantes de diferentes estados no país, tornando-se um bairro altamente populoso por se tratar
de um barato mercado imobiliário. A Figura 3 localiza o bairro em relação ao município de Brusque.

36
Figura 3. Localização do bairro Azambuja

2.2 Coleta dos dados pré-existentes

A primeira etapa do trabalho foi coletar os principais mapas pré-existentes da região de Brusque
(pedológico, geológico e MDT).
O mapa pedológico teve como fonte a Embrapa Solos, em uma escala de 1:250.000 elaborado no ano
de 2005. O mapa geológico foi coletado por meio da CPRM (Serviço Geológico do Brasil) em uma escala de
1:500.000 elaborado no ano de 2014. E por fim, o Modelo Digital de Terreno foi acessado pelo SIGSC,
disponível em: sigsc.sds.sc.gov.br com resolução espacial de 1,00 metro.
Em uma análise de Gomes et al. (2004 e 2005) os autores compararam diversos produtos cartográficos
produzidos com diversas escalas de MDT e concluíram que a utilização da escala 1:50.000 com resolução de
10,00 metros é ideal para um bom resultado, ratificando o emprego da escala utilizada nesta pesquisa.

2.3 Processamento e Tratamento dos Dados em Ambiente SIG

Após o levantamento dos mapas preliminares, a sobreposição dos mapas pedológicos e geológicos foi
feita no software QGIS (10.18) conforme metodologia desenvolvida por Dias (1995) e Higashi (2006), tendo
um mapeamento das unidades geotécnicas da cidade. Foram excluídos atributos que não precisavam constar
no mapa, deixando apenas o nome do material.
Com o mapa geotécnico do bairro Azambuja construído, a pesquisa seguiu com a caracterização
geotécnica de cada unidade, incluindo para cada unidade, seus respectivos ângulos de atrito (f), coesão (c’) e
peso específico (g). Estes parâmetros foram retirados do trabalho de Schwarz (2016), onde o autor, na cidade
de Ibirama (SC) por meio do ensaio Bore Hole Shear Test (BHST) e ensaios de granulometria definiu os
parâmetros de entrada para o modelo em cada unidade geotécnica. A escolha pelo trabalho de Schwarz (2016)
justifica-se por se tratar de um tipo de solo semelhante ao da área de estudo.

2.4 Aplicação do Modelo Shalstab

O Software utilizado para a aplicação do modelo Shalstab foi o ArcMap. O modelo matemático solicita
quatro dados básicos de entrada: coesão, ângulo de atrito, peso específico e altura do solo.
Embora haja a possibilidade de desprezar o valor da coesão do solo (c’) (DIETRICH;
MONTGOMERY, 1998), segundo Melo e Kobyiama (2018) 74% das pesquisas analisadas no Brasil tem
considerado este parâmetro, sendo esta uma variável de resistência do solo, fazendo com que as classes de
estabilidade aumentem (RAMOS et al., 2003).
Estes parâmetros podem ser obtidos por três diferentes maneiras. Pelo default do software, ensaios de
campo na área de estudo e valores de ensaios realizados em material semelhante ao do local em que está sendo
aplicado o modelo.
Ramos et al. (2003) comparam os produtos derivados pelo default e por dados obtidos em outras áreas
de estudo e concluindo que os melhores resultados são provenientes desta última, justificando a escolha destes
parâmetros para este trabalho, juntamente com a viabilidade temporal e financeira do estudo.
Tendo selecionado estes parâmetros, a altura do solo (z) em que constituiu a análise foi de 1,00 metro.
Com estes valores, foi possível compor o mapa de suscetibilidade a movimentos translacionais de terra
no bairro Azambuja em Brusque (SC).

3 Resultados e Discussões

A partir do mapa de geologia e pedologia puderam-se delimitar as características relacionadas a estes


elementos compreendem o bairro de Azambuja.
A Tabela 1 traz a nomenclatura litológica e pedológica.

Tabela 1 - Nomenclatura litológica e pedológica do bairro Azambuja

Litologia Pedologia
Metapelito Argissolo vermelho-amarelo
Monzogranito Cambissolo háplico

37
Fonte: Embrapa Solos (2005) e CPRM (2014)

A litologia do bairro é formada basicamente por granitóides e rochas metamórficas. A pedologia


contempla Argissolos Vermelho-Amarelo, caracterizados segundo o Sistema Brasileiro de Classificação dos
Solos (SiBCS) em solos com acumulação de argila, com horizonte B textural nas cores vermelho e amarelo, e
Cambissolo Háplico, caracterizado no processo de formação (transformação) com horizonte B incipiente, com
simplicidade em suas características.
Com o cruzamento das cartas litológicas e pedológicas, segundo as metodologias mais usuais para solos
tropicais deste tipo, encontra-se o mapeamento geotécnico preliminar (Figura 4).

Figura 4. Mapa geotécnico preliminar do bairro Azambuja

As unidades geotécnicas foram divididas em Cambissolo Háplico e substrato Metapelito, Cambissolo


Háplico e substrato Monzogranito, Argissolo Vermelho-Amarelo e substrato Monzogranito e Argissolo
Vermelho-Amarelo e substrato Metapelito. A Tabela 2 apresenta os parâmetros geotécnicos baseados no
trabalho de Schwarz (2016) das presentes unidades geotécnicas.

Tabela 2 – Parâmetros geotécnicos das Unidades Geotécnicas (Schwarz, 2016)


Peso específico
Unidade Geotécnica Ângulo de atrito (f) Coesão (c’)
(g)
Cambissolo Háplico e
18,77º 1,60 (kg/cm2) 1811,70
substrato Metapelito
Cambissolo Háplico e
18,00º 1,50 (kg/cm2) 1581,80
substrato Monzogranito
Argissolo Vermelho-
Amarelo e substrato 26,33º 1,50 (kg/cm2) 1782,30
Monzogranito
Argissolo Vermelho-
Amarelo e substrato 22,53º 1,70 (kg/cm2) 1549,80
Metapelito

A partir destes dados, foi gerado com o auxílio do modelo Shalstab o mapa de suscetibilidade a
movimentos translacionais de terra, exibido na Figura 5.

38
Figura 5. Mapa de suscetibilidade a movimentos translacionais de terra no bairro Azambuja

O mapa é dividido em sete diferentes classes, com seus extremos em incondicionalmente estável e
incondicionalmente instável. Michel et al. (2015) propuseram em seu trabalho uma classificação entre 4
diferentes classes, sendo estas, incondicionalmente estável, estável, instável e incondicionalmente instável.
Em uma análise entre os anos de 2015, 2016 e 2017, o bairro Azambuja apresentou 22 deslizamentos
translacionais de terra, segundo a Defesa Civil de Brusque.

4 Conclusões

Existe uma clara correlação entre a ocorrência de deslizamentos na região em questão e o relevo da
mesma, mostrando-se uma área com potencial elevado em número de instabilidades sofridas diante de
adversidades temporais entre os anos de 1991 e 2010. Porém, é importante salientar que os resultados atendem
apenas de um modo geral a pré-disposição de áreas de risco. Entre outros, muito mais específicos, o modelo
Shalstab é recomendado especificamente para áreas menos urbanizadas e que não apresentem alta densidade
demográfica. Ainda, é importante que sejam feitas amostragens de análise in loco, para que se possa visualizar
as diferenças e os atuantes que o modelo empírico apresenta nos cálculos de mapa e no uso de SIG.
Portanto, essa ferramenta não é o melhor caminho a ser tomado, mas atende a proposta e entrega
um mapa de suscetibilidade de movimentos de terra e mantém aplicações na pesquisa geotécnica no
sul do país, sendo Santa Catarina o estado mais relevante em pesquisas com utilização do modelo
Shalstab para estudos de suscetibilidade.
Em vista disso, o conhecimento fica atrelado à continuidade do estudo e amostragens no bairro,
com pontos críticos de coleta para garantir uma visão mais realista dos elementos de movimento de
massa na cidade.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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da escala cartográfica no resultado de um modelo de previsão de áreas críticas a deslizamentos. Ciência
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39
Gomes, R. A. T., Guimarães, R. F., Carvalho Júnior, O. A., & Fernandes, N. F. (2005). Análise de um modelo
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Higashi, R. R. (2006). Metodologia de uso e ocupação dos solos de cidades costeiras brasileiras através de SIG
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Brusque associado a um banco de dados geotécnico em ambiente de SIG.
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bibliometric analysis. Landslides, 12(6), 1215-1226.

40
Caracterização Geotécnica de uma Encosta de Rodovia Degradada
por Erosões
Ana Patrícia Nunes Bandeira, UFCA
Professora, Universidade Federal do Cariri, Crato/CE, Brasil, ana.bandeira@ufca.edu.br

João Barbosa de Souza Neto


Professor, Universidade Federal do Cariri, Juazeiro do Norte/CE, Brasil, joao.barbosa@ufca.edu.br

Cícero Cordeiro Alexandre


Estudante, Universidade Federal do Cariri, Juazeiro do Norte/CE, Brasil, cicero_cicero@hotmail.com

Wanny Renali Oliveria Grangeiro


Estudante, Universidade Federal do Cariri, Mauriti/CE, Brasil, wanny.renali@aluno.ufca.edu.br

RESUMO: Os processos erosivos ocorrem em diversas localidades, causando impactos no meio ambiente e
por vez instabilidade de taludes, tal como vem ocorrendo na encosta da CE-292, no trecho de aclive situado
entre Crato e Nova Olinda, sul do Ceará. O presente trabalho traz um estudo do comportamento do solo
relacionado às erosões dessa área. Para o desenvolvimento deste trabalho foram realizadas visitas no campo e
coletadas amostras deformadas e indeformadas de solo para realização de ensaios geotécnicos. A
caracterização geotécnica do solo possibilitou classificá-lo como de textura areno-argilosa, com LL=14,5% e
IP=10,5%; os ensaios de resistência ao cisalhamento, realizados em corpos de prova na umidade natural
(w=5%), indicou '=37º e c’=10,1 kPa e na condição de corpo de prova inundado, indicou '=14,4º e c’= 6,4
kPa. Os resultados permitiram concluir que a característica do solo, os cortes dos taludes em declividade
acentuada, a ausência de proteção superficial e de drenagens, contribuem com as ocorrências dos processos
erosivos na área, agravando o risco de deslizamentos ao longo da rodovia.

PALAVRAS-CHAVE: Erosão, Deslizamentos, Taludes, Rodovias.

ABSTRACT: The erosive processes occur in several locations, causing impacts on the environment and at the
same time landslides, as has been occurring on the slope of CE-292, in the uphill stretch located between Crato
and Nova Olinda, southern Ceará. This work presents a study of soil behavior related to erosion in this area.
For the development of this work, field visits were carried out and deformed and undisturbed soil samples
were collected for geotechnical tests. The geotechnical characterization of the soil made it possible to classify
it as having a clayey-sand texture, with LL=14.5% and IP=10.5%; the strength shear tests, carried out on
specimens in natural moisture (5%), indicated ' =37º and c'=10.0 kPa and in the condition of flooded
specimen, indicated ' =14.4º and c' = 6.4 kPa. The results allowed us to conclude that the characteristics of
the soil and the cuts in the slopes, leaving them without surface protection and drainage, contribute to the
erosive processes, aggravating the risk of landslides along the highway.

KEYWORDS: Erosion, Landslides, Slopes, Highways.

1 Introdução

As erosões são processos do meio físico que vêm ocorrendo em diversas localidades, capazes de alterar
significativamente a paisagem, causando impactos no meio ambiente. Tais processos são consequências de
diversos fatores, desde naturais aos fatores antrópicos, que intensificam os desgastes do meio físico.
O uso e a ocupação do solo de maneira inadequada, sem estudos e avaliações técnicas preliminares, é
uma das principais causas dos problemas da degradação ambiental, fato que está ocorrendo não apenas nas
áreas urbanas. Em taludes rodoviários, por exemplo, quando os cortes dos taludes são realizados sem os
cuidados técnicos apropriados, o maciço fica exposto aos intempéries, potencializando os processos erosivos
e as instabilidades dos taludes, gerando áreas de riscos.

41
Diante do exposto, o presente trabalho tem como objetivo apresentar um estudo do comportamento do
solo relacionado às erosões de um talude de rodovia da CE-292, que interliga os municípios do Crato e Nova
Olinda, na região do Cariri, sul do Ceará (Figura 1).

Figura 1. Mapa de localização da Área de Estudo (IBGE, 2019).

2. Materiais e Métodos

2.1 Aspectos Gerais da Área de Estudo

A Região do Cariri, sul do Ceará, está inserida no clima tropical quente semiárido, com chuvas
concentradas entre os meses de janeiro a maio e pluviosidade média anual de 1090 mm (IPECE, 2017).
Geologicamente, de maneira geral, a área de estudo está inserida na Bacia Sedimentar do Araripe, cuja
componente mais destacada é a estratificação sub-paralela que condiciona a existência da Chapada do Araripe.
A Chapada do Araripe, por sua vez, é o ponto marcante da paisagem de todo o sul do Estado do Ceará, limite
com os Estados de Pernambuco e Piauí. Sobressai em relação às unidades morfológicas adjacentes, tanto por
sua massa quanto pela altitude, que pode chegar a 960 m (Ribeiro, 2004).
Com relação ao uso e ocupação do solo, nos últimos anos, a região tem apresentado um processo de
urbanização acelerada, refletindo em várias localidades com áreas degradadas por erosões. A área selecionada
para o estudo do presente trabalho trata-se do talude da CE-292, no trecho de aclive, que interliga Crato à Nova
Olinda.
Os taludes de corte oriundo da ampliação da rodovia, com extensões e alturas variadas, estão
apresentando diversos pontos com processos erosivos. A escolha do ponto para retirada de amostra levou em
consideração o local com condições de segurança que possibilitassem a retirada da amostra. Tal área tem
importância ambiental relevante, visto que o topo da encosta faz parte de uma Área de Proteção Ambiental,
denominada de Chapada do Araripe, situada na bio-região do Complexo do Araripe, criada através do Decreto
Nacional (DNN 5587), em 04 de agosto de 1997; sendo gerenciada pelo ICMBio. No entanto, apesar da
importância ambiental, o solo exposto do talude tem se mostrado cada vez mais suscetível aos processos
erosivos e de deslizamentos, aumentando o grau de risco aos citados processos do meio físico.

42
2.2 Investigação Geotécnica

Para o desenvolvimento deste trabalho, foram realizadas três atividades principais: i) vistorias de
campo; ii) ensaios de laboratório; iii) análise dos resultados.
Nas vistorias de campo, foram realizadas constantes visitas nas áreas, ao longo da CE-292, desde a
finalização da obras de ampliação da rodovia (2018) aos dias atuais. Em dezembro 2020, início do período
chuvoso da região, procedeu-se a coleta de amostras deformadas e indeformadas de solos, nos focos de erosão,
para fins de realização dos ensaios de laboratório.
No Laboratório de Mecânica do Solos da Universidade Federal do Cariri (UFCA), foram realizados
os ensaios para a caracterização geotécnica do solo, com ênfase aos fatores intervenientes nos processos
erosivos. As amostras deformadas foram utilizadas nos ensaios de caracterização través da análise
granulométrica por peneiramento e sedimentação (NBR 7181/2016 - Solo - Análise Granulométrica) e de
ensaios dos Limites de Atterberg (NBR 6459/2016: Solo – Determinação do limite de liquidez e NBR
7180/2016: Solo — Determinação do limite de plasticidade); e amostras indeformadas foram utilizadas para
obtenção dos parâmetros de resistência ao cisalhamento (ASTM D3080/D3080M-2011) e para realização do
ensaio de Crumb Test (NBR 13601/1996: Solo – Avaliação da dispersibilidade de solos argilosos pelo ensaio
de torrão.
Inicialmente as amostras foram secas, destorroadas e quarteadas, a fim de promover sua
homogeneização, sendo posteriormente submetidas aos ensaios. Os ensaios seguiram as normas
regulamentadoras. As análises granulométricas por sedimentação foram realizadas com e sem defloculante.
Para a avaliação qualitativa da erodibilidade do solo, realizou-se o ensaio de Crumb Test, em que
foram moldados três corpos de prova, de formato esférico, de uma amostra indeformada, com diâmetro de
aproximadamente medindo 18 mm. Os corpos de prova foram submersos em 150,0 ml de água destilada, por
um período de uma hora, sendo posteriormente classificado de acordo com o grau de dispersibilidade.
De acordo com Hanson (1996, apud Lafayette, 2006) a resistência ao cisalhamento pode, teoricamente,
caracterizar a erodibilidade dos solos, visto que a resistência à erosão ocorre devido às forças de ligação entre
as partículas. Os ensaios de resistência ao cisalhamento foram realizados em 06 corpos de prova, sendo 03 na
condição de umidade natural e 03 previamente inundados. Os corpos de prova foram dispostos em caixas
prismáticas, de seção quadrada com 10,0 cm de lado de 2,0 cm de altura. Os corpos de prova foram cisalhados
sob tensões normais de 24 kPa, 49 kPa e 98 kPa.

3 Resultados e Discussões

A vistoria de campo, realizada em novembro de 2019, permitiu identificar que os taludes de cortes,
anteriormente estáveis, apresentavam diversos focos de processos erosivos. A área protegida por lei, com
floresta no topo, não permitiu o avanço do corte para redução da declividade. No entanto, os taludes de corte,
praticamente verticalizados, não receberam proteção superficial, ficando suscetíveis aos processos do meio
físico. Poucos meses após a conclusão da obra foram instaladas placas de advertência, ao longo da rodovia,
sobre o risco de deslizamentos na área.
Durante as demais vistorias de campo, foi possível observar a presença de sulcos, ravinas e materiais
desprendidos (Figura 2a e 2b). Em alguns pontos as sarjetas estavam danificadas e obstruídas (Figura 2c).
Em laboratório, por meio de ensaios de peneiramento e sedimentação do solo, com e sem defloculante,
foram obtidas as curvas granulométricas, representadas na Figura 3. A análise granulométrica do solo com
defloculante indicou maiores percentuais de areia (58%) e argila (29%), seguida de silte (11%) e pedregulho
(2%). O Limite de Liquidez obtido para a amostra foi de 14,5% e o Limite de Plasticidade foi de 4%, resultando
em um Índice de Plasticidade no valor de 10,5%, caracterizando-se o solo como medianamente plástico. Esses
resultados possibilitaram classificar a amostra de solo como SC (areia-argilosa).
A análise granulométrica do solo sem defloculante indicou redução do percentual de argila, de 29%
para 9%; e aumento no percentual de silte, de 11% para 31%. Esses resultados indicam que as partículas de
argila se encontram em forma de torrões, de agregados de tamanho silte, contribuindo com o aumento da
potencialidade dos processos erosivos. A Tabela 1 sintetisa os resultados.

43
a) Sulcos erosivos e materiais b) Quedas e tombamentos de c) Sarjetas danificadas e
desprendidos árvores obstruídas

Figura 2. Processos de instabilidade de talude na CE-292, observados em novembro de 2019.

Figura 3. Análise granulométrica com e sem defloculante.

Tabela 1. Síntese dos resultados da análise granulométrica e Limites de Atterberg

Índices de Classe
% dos Materiais
Tipo de Passa Consistência
ensaio #200 A. A. A. S.U.C.S
Arg. Silte Ped. LL IP
fina média grossa
Com
42% 29 11 17 34,2 6,8 2
defloculante SC
14,5 10,5
Sem
42% 9 31 17 34,2 6,8 2
Defloculante

44
Quanto aos resultados dos ensaios de Crumb Test, as amostras foram moldadas com tamanho de 17
mm, pois ao tentar moldar com menores tamanhos, verificava-se quebra da amostra. Conforme a ABNT NBR
13601/97, o comportamento das amostras foi classificado em um dos 04 graus de dispersividade, sendo eles:
O grau 1 (não-dispersivo): o torrão pode espalhar-se no fundo do béquer, mas não há sinal de turvação no
líquido; grau 2 (levemente dispersivo): começa apresentar coloides em dispersão; grau 3 (moderadamente
dispersivo): observa-se nuvem de coloides em suspensão com finos veios; e grau 4 (fortemente dispersivo):
com presença de uma fina película no fundo do béquer e nuvem coloidal. Após o tempo de 01 hora de ensaio
as amostras ensaiadas foram classificadas como de grau 3 de dispersividade, na classe de comportamento
moderadamente dispersivo, no entanto, o tamanho das amostras utilizadas foram maiores do que o previsto em
norma, o que pode influenciar na análise.

(a) Tamanho das amostras (b) Amostras após submersas em (c) Resposta após uma hora
água destilada mostrando grau de dispersão 3.

Figura 4. Ensaio de Crumb test.

Os ensaios de resistência ao cisalhamento foram realizados em corpos de prova na umidade natural


(5%) e em corpos de prova inundados. A Tabela 2 apresenta as condições iniciais dos corpos de prova
utilizados nos ensaios de resistência ao cisalhamento, referentes aos índices físicos. Os corpos de prova CP1,
CP2 e CP3 foram ensaiados na uminade natural, enquanto os demais foram ensaiados na condição inundada.
O peso específico aparente do solo seco (d) foi, em média, de 1,73 g/cm³ e o valor médio do peso específico
natural (n) foi de 1,81 g/cm³. O peso específico real dos gãos foi de 2,56 g/cm³ e a altura inicial do corpo de
prova foi de 20 mm. O índice de vazios inicial dos corpos de prova estiveram variando de 0,46 a 0,50.

Tabela 2. Condições dos Corpos de Prova dos Ensaios de Resistência ao Cisalhamento


Umidade Índice de Grau de
Corpo Tipo de
Inicial vazios inicial Saturação inicial
de prova ensaio
(w%) (eo) (S%)
CP1 Natural 4,70 0,47 21
CP2 Natural 4,68 0,50 28
CP3 Natural 4,75 0,46 21
CP4 Inundado - 0,49 100
CP5 Inundado - 0,46 100
CP6 inundado - 0,50 100

Devido a heterogeneidade da amostra de solo, foram rompidos corpos de provas em diversas tensões.
As tensões que apresentaram os pontos mais ajustados foram as de 24 kPa, 49 kPa e 98 kPa. A Figura 5
apresenta as envoltórias de resistências do solo na umidade natural e na condição inundada. Para a condição
natural foram obtidos =37º e c’=10,10 kPa; para a condição inundada, obteve-se =14,4º e c’= 6,4 kPa. Ao
inundar a amostra observou-se uma redução de 61% no angulo de atrito do solo e de 37% no intercepto de

45
coesão. Bastos (1999) considera solos potencialmente erodíveis aqueles que apresentam variações de coesão
(∆𝑐, dada entre os resultados de amostras natural e previamente inundada) maior que 85%, no entanto a
proposta é sugerida para solos residuais, diferente do solo da área do presente estudo, que se trata de solo de
origem sedimentar. Apesar de Bastos (1999) propor aplicação para solo residual, Bandeita et al. (2021) e
Bandeita et al. (2018) utilizaram esta proposta em algumas áreas de solo sedimentar, na região do Cariri, que
se mostrou válida. Considerando esta proposta de Bastos (1999), o solo não seria enquadrado como
potencialmente erodível.

Figura 5. Envoltórias de Resistância da Amostras

4 Conclusão

De acordo com a investigação geotécnica, observou-se que o solo é predominantemente arenoso (58%)
com percentual significativo de argila (29%), sendo classificado pelo SUCS como areia argilosa (SC). Os
ensaios de resistência ao cisalhamento direto constataram que a amostra tem baixa parcela de coesão e que os
parâmetros de resistência são reduzidos quando o solo é submetido à inundação. O ensaio de Crumb Test deu
indicativo de solo moderadamente dispersivo. Os resultados desse estudo permitiram concluir que, quanto às
características geotécnicas, a suscetibilidade do solo aos processos erosivos tem potencial elevado, visto a
facilidade de desagregação e transporte. As erosões presentes na área são intensificadas decorrentes das ações
humanas inadequadas, revelada pelo retaludamento com inclinação acentuada e a ausência de proteção
superficial dos taludes e deficiência/ausência do disciplinamento das águas pluviais. A caracterização
geotécnica foi importante para o entendimento dos mecanismos dos processos, a fim de subsidiar
recomendações de soluções. Os resultados obtidos apontam para a necessidade de medidas estruturais na área
de estudo, a fim de reduzir a ação dos intempéries e o avanço das erosões, visto que alguns pontos já apresenta-
se ravinamentos profundos, sendo necessário realizar uma análise do fator de segurança, para avaliação da
estabilidade do talude e verificação da necessidade de instalação de obras de contenção.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem à Universidade Federal do Cariri, que por meio do Laboratório de Geotecnia
tornou-se possível a realização deste trabalho.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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abertura 4,8 mm - Determinação da massa específica, da massa específica aparente e da absorção de água.
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Associação Brasileira de Normas Técnicas (2016). NBR 7180. Solo — Determinação do limite de plasticidade.
Rio de Janeiro.

Associação Brasileira de Normas Técnicas (2016). NBR 7181. Solo - Análise Granulométrica. Rio de Janeiro.

46
Associação Brasileira de Normas Técnicas (1996). NBR 13601: Solo – Avaliação da dispersibilidade de solos
argilosos pelo ensaio de torrão (crumb test). Rio de Janeiro. 2p.

Associação Brasileira de Normas Técnicas (2016). NBR 6459: Solo – Determinação do limite de liquidez. Rio
de Janeiro. 5p.

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conditions. D3080/D3080M.

Bandeira, A. P. N., Macedo, C. C. A., Clarindo, G. S., Lima, M. G. de S., Neto, J. B. de S. (2021). Assessment
of potential surface degradation resulting from erosion processes in environmentally protected area. Soils and
Rocks, 44.

Bandeira, A. P. N.; Souza Neto, J. B.; Santos, G. M.; Chaves, A. M. M.; Oliveira, S. J. C.; Santos, G. R.; Lima,
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Olinda. Fortaleza/CE. Disponível em:< https://www.ipece.ce.gov.br/wp-
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geomorfológica na microbacia do Rio Grangeiro, Crato/CE. Rio de Janeiro. Dissertação de Mestrado.
Programa de Pós-Graduação em Geografia.

47
Deslizamentos em Áreas de Risco Geológico-geotécnico na
cidade de Belo Horizonte
Erisvaldo de Lima Juvêncio
Consultor, Groundtech Engenharia, Brasília, Brasil, erisvaldo@groundtech.com.br

Roney de Moura Gomes


Engenheiro Geotécnico, Groundtech Engenharia, Brasília, Brasil, roney@groundtech.com.br

Isabel Eustaquia Queiroz Volponi


Diretora de Manutenção e Áreas de Risco, URBEL, Belo Horizonte, Brasil, isabelvolponi@pbh.gov.br

Elmir Kleber Lopes Dias


Gerente de Obra, Andrade Gutierrez Engenharia, Belo Horizonte, Brasil, elmir.dias@agnet.com.br

RESUMO: Em janeiro de 2020, a cidade de Belo Horizonte foi acometida por um evento pluviométrico de
intensidade extrema. Alguns registros, segundo o Instituto Nacional de Meteorologia (INMET), superaram
recordes históricos. Este evento desencadeou, entre outros problemas, numa série de escorregamentos em
encostas, muitas delas densamente habitadas, causando perdas de vidas humanas e danos materiais. As
semanas seguintes foram de intenso trabalho de mapeamento de áreas de riscos e de realocação de milhares de
famílias. O presente trabalho descreve a atuação da GROUNDTECH – em consórcio com a GEOPHI – no
desenvolvimento de soluções e projetos de contenção de encostas em 10 (dez) pontos críticos onde ocorreram
deslizamentos. A iniciativa do trabalho foi da Construtora Andrade Gutierrez em apoio à Companhia
Urbanizadora e de Habitação de Belo Horizonte (URBEL). Os trabalhos se deram em caráter emergencial,
realizados a partir de: dados obtidos em visitas técnicas; levantamentos topográficos planialtimétricos com uso
de VANT; e retroanálises de estabilidade dos taludes utilizando o Método de Equilíbrio Limite. Os serviços
auxiliaram a URBEL na celeridade das intervenções de engenharia e, consequentemente, na redução dos
impactos sociais na cidade de Belo Horizonte.

PALAVRAS-CHAVE: Encosta, Escorregamento, Estrutura de Contenção, Retroanálise.

ABSTRACT: In January 2020, the city of Belo Horizonte was hit by a rainfall event of extreme intensity.
According to the National Institute of Meteorology (INMET), exceeded historical records. This event
triggered, among other problems, a series of landslides on slopes, many of them densely inhabited, causing
loss of life and material damage. The following weeks were spent intensively identifying risk areas and
relocating thousands of families. This paper describes GROUNDTECH's work - in consortium with
GEOPHI - in developing solutions and projects for slope containment in 10 (ten) critical points where
landslides occurred. The initiative was taken by Construtora Andrade Gutierrez in support of the Urbanizing
Company of Belo Horizonte (URBEL). The work was done on an emergency character, based on: data
obtained during technical visits; planialtimetric topographic surveys using VANT; and slope stability retro-
analysis using the Limit Equilibrium Method. The services helped URBEL to speed up the engineering
interventions and, consequently, to reduce the social impacts on the city of Belo Horizonte.

KEY WORDS: Slope, Landslides, Containment Structure, retro-analysis.

1 Introdução

A ocupação desordenada de áreas de elevada vulnerabilidade é um problema socioambiental comum


em grandes centros urbanos do Brasil há décadas. Esta problemática é agravada pela ocorrência de fortes
chuvas, muito comuns em regiões tropicais, sobretudo no verão.

48
Em janeiro de 2020 um evento pluviométrico extremo atingiu a cidade de Belo Horizonte, ocasionando
movimentos de massas e enchentes. Em diversos pontos houve registro de perdas de vidas humanas e danos
materiais. Nos dias subsequentes, milhares de famílias precisaram ser removidas de áreas de risco.
Neste contexto, a Construtora Andrade Gutierrez mobilizou um grupo de trabalho para fornecer – em
caráter emergencial – suporte técnico à Companhia Urbanizadora e de Habitação de Belo Horizonte (URBEL).
A atuação se deu em forma de soluções e projetos de contenção de encostas em 10 (dez) pontos críticos onde
ocorreram deslizamentos.
Este trabalho apresenta um breve relato destes deslizamentos, descrevendo os mecanismos, as
possíveis causas e as soluções propostas.

2 Considerações Gerais
O Instituto Nacional de Meteorologia (INMET) reportou que Belo Horizonte teve o dia mais chuvoso
da história da cidade desde o início da medição climatológica há 110 anos. A capital mineira completou 121
anos em dezembro de 2019.
Em 24 horas o acumulado diário de precipitação chegou a 171,8mm, medidos entre às 9:00h de 23/01
e às 9:00h de 24/01, sendo que choveu 117,4mm entre 19:00h e 22:00h. O acumulado em janeiro atingiu
1602,6mm, sendo o mês mais chuvoso em 110 anos e 102% acima da média histórica.
Diante deste extremo evento pluviométrico registrado, ocorreram diversos movimentos de terra em
diferentes regiões da cidade de Belo Horizonte. Os 10 (dez) pontos apresentados neste estudo se concentram
em 08 (oito) bairros/vilas, conforme apresentado na Tabela 1.

Tabela 1. Resumo dos pontos de movimentos de terra estudados.


Ponto Bairro / Vila Endereço
01 - Vila Bernadete Vila Bernadete Rua 12
02 - Santa Maria Conjunto Santa Maria Rua 4
03 - Bráz-União Vila São Jorge III* Rua Bráz / Beco União
04 - Beco Canutos Vila Leonina* Beco Canutos
05 - Campo de Futebol Vila São Jorge III* Rua Marcelo de Araújo Braga
06 - Flor do Oriente Vila Jardim Alvorada Rua Flor do Oriente
07 - Flor da Ameixa Vila Jardim Alvorada Rua Flor da Ameixa
08 - Jardim Montanhês Vila Jardim Montanhês Rua Antônio Fernandes de Melo
09 - Morro do Querosene Luxemburgo Rua Henrique Sales
10 - Vista Alegre Vila Vista Alegre Rua Jornalista João Bosco
* Vila constituintes do Aglomerado Morro das Pedras.

A cidade de Belo Horizonte tem constituição geológica predominante de rochas do Complexo Belo
Horizonte e do Grupo Sabará, conforme apresentado na Figura 1.
O Complexo Belo Horizonte agrupa as rochas gnáissicas arqueanas, parcialmente remobilizadas e
migmatizadas no Paleoproterozóico, constituindo cerca de 70% do território municipal, com área de maior
expressão a norte da calha do Ribeirão Arrudas. Os gnaisses são bandados, de cor cinza, granulação fina a
grossa. Apresentam-se saprolitizados ou muito alterados e/ou recobertos por manto de intemperismo silto-
argiloso de cor rosa claro a avermelhado.
Segundo o Plano Municipal de Redução de Riscos de Belo Horizonte (UNESP-PBH, 2006), os
processos geológicos típicos nas áreas do Complexo Belo Horizonte são
i. Escorregamentos;
ii. Erosão e assoreamento.
O Grupo Sabará é constituído predominantemente de xistos e filitos muito intemperizados, de
coloração rosa a amarela. Os clorita-xistos possuem cor verde quando frescos e marrom-avermelhados, quando
alterados. Trata-se da unidade mais espessa do Supergrupo Minas em Belo Horizonte, podendo alcançar
3.000m de espessura.
Segundo o UNESP-PBH (2006), os movimentos de massa típicos nas áreas do Grupo Sabará são:
i. Escorregamentos em cunha e erosão seguidos de escorregamentos planares e tombamentos;
ii. Tombamentos e queda de blocos;
iii. Rastejos, rupturas planares e fluxos dos depósitos de vertentes.

49
Tais processos de instabilização podem ser acelerados pelo processo de ocupação irregular, por conta
de cortes na base e sobrecargas na face das encostas, lançamento de detritos e lixo e saturação por águas
servidas.
Em relação ao clima, a região metropolitana de Belo Horizonte apresenta clima do tipo Cwa,
representado por Clima temperado ou Clima temperado quente de inverno seco e verão quente e úmido,
segundo classificação climática de Köppen. A temperatura média anual na região é de 21,1ºC, a temperatura
média máxima é de 27,1ºC e a mínima atinge 16,7ºC.

Figura 1. Mapa geológico de Belo Horizonte indicando bairros/vilas de interesse (Adapt. UNESP-PBH,
2006).

Conforme descrito anteriormente, foram avaliados 10 (dez) pontos críticos na cidade. Foram
elaborados Projetos Executivos de Contenção para os trechos listados na Tabela 1, com exceção do ponto “10
- Vista Alegre”, onde foi realizado apenas um diagnóstico preliminar.

3 Metodologia

Diante dos intensos impactos do evento pluviométrico na cidade de Belo Horizonte, foi mobilizado
um grupo de trabalho para fornecer suporte técnico à URBEL. A Companhia selecionou 10 (dez) pontos
críticos onde havia necessidade iminente de intervenções de engenharia geotécnica.
Em linhas gerais, a metodologia adotada no trabalho foi a seguinte:
a) inspeções de campo por engenheiros geotécnicos;
b) levantamento topográfico planialtimétrico com uso de Veículos Aéreos Não Tripulados (VANT);
c) diagnostico dos mecanismos de ruptura e os principais agentes deflagradores;
d) análises de estabilidade dos taludes;
e) indicação de alternativas para estabilização e mitigação de riscos geotécnicos;
f) elaboração de Projetos Executivos de Contenção.

50
Considerando o caráter emergencial das intervenções no local e o reduzido prazo disponível, não foram
executadas investigações geotécnicas. Desta forma, os parâmetros geotécnicos e perfis geológico-geotécnicos
foram estimados baseando-se na caracterização geológica da área, em informações técnicas oriundas do banco
de dados da URBEL e em resultados de retroanálises.
As análises foram realizadas pelo Método de Equilíbrio Limite, utilizando o Método de Spencer, por
meio do programa numérico Slide 2D 2018, da Rocscience.

4 Descrição das soluções desenvolvidas

Nesta sessão são descritos, de maneira resumida, os 10 (dez) pontos críticos estudados. São
apresentadas soluções de estabilização e drenagem que visaram reestabelecer a segurança à ruptura das
encostas.

4.1 Ponto 01 - Vila Bernadete

O trecho Vila Bernadete apresenta talude contínuo com altura da ordem de 35 m e inclinação de
aproximadamente 25º. O trecho está situado na unidade geológica Grupo Sabará. O maciço do talude é
composto por espessa camada de aterro lançado, com cascalho e fragmentos de filito e itabirito. O talude é
ocupado de maneira desordenada por moradias em alvenaria, de 1 a 3 pavimentos, que lançam águas servidas
no talude. O talude sofreu ruptura do tipo escorregamento rotacional profundo, provocando a destruição de
um conjunto de moradias e o descalçamento das fundações de casas junto à escarpa.
As intervenções apresentadas no projeto foram:
(i) demolição de moradias em situação de risco iminente;
(ii) remoção do material oriundo de ruptura e proteção com concreto projetado na cicatriz;
(iii) cortina atirantada na região da escarpa da ruptura com altura máxima de 5,0 m, composta por
tirantes com carga de trabalho (Qw) igual a 350 kN;
(iv) sistema de drenagem superficial em canaletas trapezoidais e escadas hidráulicas;
(v) sistema de drenagem profunda com drenos horizontais profundos (DHPs).

4.2 Ponto 02 - Santa Maria

O trecho Conjunto Santa Maria, localizado na litoestratigrafia Grupo Sabará, apresenta talude de solo
natural contínuo, residual argiloso, com altura superior a 15 m e inclinação de aproximadamente 30º, também
na crista do talude é densamente ocupada por moradias em alvenaria, de 1 a 3 pavimentos, que lançam águas
servidas e lixo na face do talude. A ruptura foi do tipo escorregamento rotacional
raso e se deve à saturação expressiva do talude, associada a uma topografia íngreme, lançamento de detritos e
lixo e ausência de sistemas de drenagem. A planta do projeto de estabilização é mostrada na Figura 2.
As intervenções apresentadas no projeto foram:
(i) cortinas atirantadas na região da escarpa da ruptura com altura máxima de 4,5 m, composta
por tirantes com Qw = 350 kN;
(ii) solo grampeado com face em concreto projetado e barras de aço com Qw = 110 kN;
(iii) sistema de drenagem superficial em canaletas trapezoidais e escadas hidráulicas;
(iv) sistema de drenagem profunda com drenos horizontais profundos (DHPs).

4.3 Ponto 03 - Bráz-União

O trecho Bráz-União, localizado no Aglomerado Morro das Pedras, pertencente à unidade geológica
Grupo Sabará, apresenta extenso talude de solo natural, residual argiloso, com altura superior a 30 m e
inclinação de aproximadamente 30º. No pé do talude há estrutura de contenção do tipo grelha atirantada
(“retangulão”) se estendendo por um longo trecho da Rua Bráz. O material rompido avançou além da
contenção existente ao pé da encosta, soterrando veículos e destruindo moradias, conforme Figura 3.

51
Figura 2. Solução de estabilização proposta para o escorregamento em Santa Maria.

Figura 3. Danos a veículos e moradias ao pé da encosta causados pelo deslizamento do talude.

As intervenções apresentadas no projeto foram:


(i) cortina atirantada com altura máxima de 2,0 m, composta por tirantes com Qw = 200 kN;
(ii) solo grampeado com face verde e barras de aço com Qw = 110 kN;
(iii) sistema de drenagem superficial em canaletas trapezoidais e escadas hidráulicas;
(iv) sistema de drenagem profunda com drenos horizontais profundos (DHPs).

4.4 Ponto 04 - Beco Canutos

O trecho Beco Canutos, localizado no Aglomerado Morro das Pedras, apresenta um talvegue de grande
extensão (aproximadamente 200 m) e expressiva declividade, com taludes de solo natural, residual argiloso, e
cobertura vegetal de pequeno porte, e ocupação desordenada de moradias no seu entorno.
No topo do talvegue houve uma ruptura do tipo rotacional profundo (expondo as fundações das
moradias), que provavelmente desencadeou uma corrida de detritos. Este movimento destruiu uma passarela,
além de moradias, árvores, sistemas de drenagem etc. A ruptura se deve principalmente à saturação expressiva
do talude, associada a topografia com declividade considerável, além da sobrecarga de detritos e de lixo.

As intervenções apresentadas no projeto foram:


(i) cortina atirantada com altura máxima de 5,5 m, e tirantes com Qw = 240 a 350 kN;
(ii) solo grampeado com face em concreto projetado e barras de aço com Qw = a 110 kN;
(iii) sistema de drenagem superficial em canaletas trapezoidais e escadas hidráulicas;
(iv) sistema de drenagem profunda com drenos horizontais profundos (DHPs).

52
4.5 Ponto 05 - Campo de Futebol

O trecho Campo de Futebol, localizado no Aglomerado Morro das Pedras, pertencente à unidade
geológica Grupo Sabará, apresenta talude com inclinação de 65º a 85º e altura de até 42 m, indicando
intemperismo com solo residual jovem sobre e entre camadas rochosas granitoides com famílias de fraturas
verticais, sub-horizontais e inclinadas, que formam blocos instáveis de diversos volumes.
O talude sofreu ruptura do tipo escorregamento rotacional, quedas de blocos rochosos e formação e
evolução de canais erosivos ao longo da extensão da encosta devido à redução dos parâmetros de resistência
do maciço provocada pelo aumento da saturação e sobrecarga de detritos e lixo.
As intervenções apresentadas no projeto foram:
(i) demolição de moradias em situação de risco iminente;
(ii) limpeza de detritos, lixo e vegetação de pequeno porte com preservação das árvores existentes;
(iii) regularização da superfície do terreno com remoção de lascas/blocos rochosos de pequenas e
médias dimensões desconfinados, remoção de material fino solto na face do talude;
(iv) estabilização com tela metálica de alta resistência fixada por chumbadores (barras de aço) com
Qw = 210 kN;
(v) estabilização de blocos grandes dimensões com tirantes com Qw = 350 kN;
(vi) execução de muro de gabião para proteção contra queda de blocos e regularização de
drenagem de águas superficiais na base do talude.

4.6 Ponto 06 - Flor do Oriente

O trecho Flor do Oriente, localizado na Vila Jardim Alvorada, pertencente à unidade geológica
Complexo Belo Horizonte, apresenta talude íngreme e contínuo com altura variando de 25 a 35 m, composto
por solo residual de gnaisse maduro a jovem. Sobre o terreno há cobertura vegetal de pequeno porte, e sinais
de lançamento de entulho e lixo. Ao longo da crista do talude foram construídas diversas moradias em alvenaria
com 1 a 3 pavimentos e arruamento asfaltado. A base da encosta apresenta baixa densidade de ocupação.
O talude sofreu erosões superficiais e ruptura do tipo escorregamento raso, resultando em trincas
abertas e danos localizados na rua asfaltada na crista da encosta. A ruptura se deve principalmente à saturação
do talude por chuvas, além do aumento de sobrecarga de detritos e lixo saturados e deficiência do sistema de
drenagem superficial e ausência de drenagem profunda.
As intervenções apresentadas no projeto foram:
(i) cortinas atirantadas na região da crista do talude, com altura máxima de 3,0 m, composta por
tirantes com Qw = 200 kN;
(ii) solo grampeado com face verde e barras de aço com Qw = 110 kN;
(iii) sistema de drenagem superficial em canaletas trapezoidais e escadas hidráulicas;
(iv) sistema de drenagem profunda com drenos horizontais profundos (DHPs).

4.7 Ponto 07 - Flor da Ameixa

O trecho Flor da Ameixa, localizado na Vila Jardim Alvorada, pertencente à unidade geológica
Complexo Belo Horizonte, apresenta talude íngreme com altura média de 25 m, composto por solo residual
de gnaisse maduro a jovem. Sobre o terreno há cobertura vegetal de médio a grande porte, e sinais de
lançamento de entulho, lixo e águas servidas. Ao longo da crista, da face e da base do talude foram construídas
diversas moradias em alvenaria com 1 a 3 pavimentos e arruamento asfaltado.
O talude sofreu ruptura do tipo escorregamento rotacional raso com grande extensão, resultando em
trincas abertas significativas na área de lazer chamada de parquinho na crista da encosta. A ruptura se deve
principalmente à saturação do talude por chuvas e águas servidas, além do aumento de sobrecarga de detritos
e lixo saturados e deficiência do sistema de drenagem superficial e ausência de drenagem profunda.
As intervenções apresentadas no projeto foram:
(i) cortinas atirantadas na região da crista do talude, com altura máxima de 3,5 m, composta por
tirantes com Qw = 350 kN;
(ii) solo grampeado com face em concreto projetado e barras de aço com Qw = 110 kN;
(iii) sistema de drenagem superficial em canaletas trapezoidais e escadas hidráulicas;
(iv) sistema de drenagem profunda com drenos horizontais profundos (DHPs).

53
4.8 Ponto 08 - Jardim Montanhês

O trecho Jardim Montanhês, localizado na unidade geológica Complexo Belo Horizonte, apresenta
talude característico de talvegue com altura da ordem de 30 m e inclinação média de 40º, composto por solo
residual argiloso. Sobre o terreno há cobertura vegetal de pequeno porte e árvores espaçadas, e sinais de
lançamento de entulho e lixo. Nas proximidades da escarpa do talude há uma passarela, e a montante existem
moradias em alvenaria, de 1 a 3 pavimentos, que possivelmente lançam águas servidas e lixo na face do talude.
Na base da encosta havia uma moradia, que foi destruída na ocasião da ruptura.
O talude sofreu ruptura com características de um fluxo de detritos provavelmente iniciado por
escorregamento translacional raso nas proximidades da crista. O acidente levou à destruição parte da passarela
e uma residência de alvenaria localizada no pé da encosta. Foram relatados óbitos no evento. A ruptura se deve
à redução dos parâmetros de resistência do maciço, decorrente da saturação expressiva do talude, associada a
uma topografia íngreme em formato de talvegue sem um sistema de drenagem adequado.
As intervenções apresentadas no projeto foram:
(i) solo grampeado com face em concreto projetado e barras de aço com Qw = 110 kN;
(ii) sistema de drenagem superficial em canaletas trapezoidais e escadas hidráulicas;
(iii) sistema de drenagem profunda com drenos horizontais profundos (DHPs).

4.9 Ponto 09 - Morro do Querosene

O trecho Morro do Querosene, pertencente à unidade geológica Grupo Sabará, apresenta talude
contínuo íngreme com altura de até 35m, composto por camada superior do tipo tout venant seguida por solo
residual jovem. Sobre o terreno há cobertura vegetal de médio porte com algumas árvores de grande porte, e
sinais de lançamento de entulho, lixo e águas servidas na face do talude. Na região da crista há concentração
de moradias da vila, e na base da encosta há ocupações de média e alta renda.
O trecho de talude vizinho à estrutura de estabilização existente - em parede ancorada e muros de peso
com banquetas - sofreu ruptura do tipo escorregamento rotacional raso na crista e erosão ao longo da face da
encosta, com exposição de camada de solo residual jovem e/ou saprólito de filito, com estruturas reliquiares
da rocha mãe. A ruptura se deve à deficiência do sistema de drenagem superficial e ausência de drenagem
profunda, que produziu escoamento desordenado pela face da encosta e saturação do talude acarretando
redução dos parâmetros de resistência do maciço.
As intervenções apresentadas no projeto foram:
(i) solo grampeado com face em concreto projetado e barras de aço com Qw = 200 kN;
(ii) sistema de drenagem superficial em canaletas trapezoidais e escadas hidráulicas;
(iii) sistema de drenagem profunda com drenos horizontais profundos (DHPs).

4.10 Ponto 10 - Vista Alegre

O trecho Vista Alegre, localizado na unidade geológica Complexo Belo Horizonte, apresenta talude
contínuo com altura variando de 10 a 15 m e composto de camada superior do tipo tout venant e aterro lançado,
seguida de camada de solo residual. Sobre o terreno há cobertura vegetal de médio porte com algumas árvores
de grande porte, e sinais de lançamento de entulho, lixo e águas servidas. Ao longo da crista do talude foram
construídas diversas moradias em alvenaria com 1 a 3 pavimentos. Junto à base da encosta não há moradias,
mas uma via férrea.
O talude sofreu 2 rupturas principais do tipo escorregamento rotacional raso, destruindo muro de
fechamento e arruamento localizados na crista. A ocorrência das rupturas se deve principalmente à redução
dos parâmetros de resistência do maciço, decorrentes da saturação expressiva do talude, além do aumento de
sobrecarga de detritos e lixo saturados e ausência de sistemas de drenagem superficial e de águas servidas.
As alternativas de intervenções de engenharia recomendadas para recuperação e estabilização da área
foram a execução de estruturas como cortina atirantada, solo grampeado, muro de solo reforçado com
terrapleno a montante e sistemas de drenagem superficial e de águas servidas.

54
4 Conclusões

Em janeiro de 2020, após evento pluviométrico de extrema intensidade, foram registrados diversos
movimentos de massas e enchentes na cidade de Belo Horizonte, ocasionando perdas de vidas humanas, danos
materiais e necessidade de remoção de milhares de famílias de áreas de risco.
De modo a fornecer suporte técnico emergencial à Companhia Urbanizadora e de Habitação de Belo
Horizonte (URBEL), foi mobilizado um grupo de trabalho que desenvolveu soluções e projetos de contenção
de encostas em 10 (dez) pontos críticos onde ocorreram deslizamentos.
Em relação ao trabalho desenvolvidos é possível fazer os seguintes comentários:
- Os 10 (dez) pontos avaliados se concentram em 08 (oito) bairros/vilas: Vila Bernadete; Conjunto
Santa Maria; Vila Jardim Alvorada; Vila Jardim Montanhês; Luxemburgo; Vista Alegre; Vila São
Jorge III e Vila Leonina. Foram elaborados Projetos Executivos de Contenção para os todos os trechos,
com exceção do ponto “10 - Vista Alegre”, onde foi realizado apenas um diagnóstico preliminar.
- A metodologia adotada foi baseada em: dados obtidos em visitas técnicas; levantamentos
topográficos planialtimétricos com uso de VANT; e retroanálises de estabilidade dos taludes utilizando
o Método de Equilíbrio Limite. Devido ao caráter emergencial das intervenções no local, não foram
executadas investigações geotécnicas. Assim, os parâmetros geotécnicos e perfis geológico-
geotécnicos foram estimados baseando-se na caracterização geológica da área, em informações
técnicas oriundas do banco de dados da URBEL e em resultados de retroanálises.
- As análises foram realizadas pelo Método de Equilíbrio Limite, utilizando o Método de Spencer.
- Foram desenvolvidas diversas soluções de contenção e drenagem, que auxiliaram a URBEL na
celeridade das intervenções de engenharia e, consequentemente, na redução dos impactos sociais na
cidade de Belo Horizonte.

AGRADECIMENTOS

Agradecemos à Companhia Urbanizadora e de Habitação de Belo Horizonte (URBEL) pelo


fornecimento de dados e pelo suporte nas visitas técnicas, e às empresas Andrade Gutierrez, Groundtech
Engenharia e Geophi Engenharia, que atuaram em conjunto no desenvolvimento dos trabalhos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Associação Brasileira de Normas Técnicas (2018) NBR 5629. Tirantes Ancorados no Terreno – Projeto e
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1:100.000. Serviço Geológico do Brasil.
CPRM (2003) Mapa Geológico do Estado de Minas Gerais - Escala 1:1.000.000.
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INMET – Site http://www.inmet.gov.br - Acessado em março de 2020.
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Geotechnique, Vol.17, pp.11-26.
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Volume 01 – TEXTO, 117p.
URBEL (2016) Diagnóstico de Risco Geológicos das Vilas, Favelas e Conjuntos Habitacionais de Belo
Horizonte, 2015/2016, 649p.

55
Probabilidade de ocorrência de deslizamentos em função da
pluviometria aplicada à bacia do rio Quitandinha, Petrópolis-RJ
Fernanda Cristina Gonçalves Gonzalez
Doutoranda, Programa de Engenharia Ambiental - UFRJ, Rio de Janeiro, Brasil, fernandacgg@poli.ufrj.br

Marcos Barreto de Mendonça


Professor, Programa de Engenharia Ambiental - UFRJ, Rio de Janeiro, Brasil, mbm@poli.ufrj.br

Glauco Valle da Silva Coelho


Professor, Instituto de Matemática - UFRJ, Rio de Janeiro, Brasil, glauco.valle@im.ufrj.br

RESUMO: Este trabalho utiliza a dependência estatística para encontrar o par de períodos de chuva mais relevante
e calcula a probabilidade de ocorrência de deslizamentos em função da pluviometria. A dependência é medida
pelo valor do coeficiente de contingencia entre o número de períodos com ou sem deslizamentos por faixa de
pluviometria. O procedimento foi realizado para a bacia do rio Quitandinha em Petrópolis-RJ, utilizando registros
de deslizamentos e pluviometrias diárias entre 2005 e 2009. Foram testados nove pares de período (24h com
múltiplos de 24h, entre 48h e 240h). A comparação dos coeficientes de contingência mostra que há um pico de
dependência no par de período 24h e 96h, de forma que este foi considerado o período mais relevante para
observação das probabilidades de ocorrência de deslizamento. Este resultado pode ser atribuído ao tempo que a
chuva usa para infiltrar e exfiltrar dos solos, e é endossado pela presença típica na região de maciços de rocha
fraturada subjacentes a uma fina camada de solo, dando origem a deslizamentos majoritariamente rasos. Os
gráficos de probabilidades gerados mostram ainda que há um ganho de precisão nos limiares de chuvas feitos
sobre dois períodos de chuva acumulada ao invés de apenas um.

PALAVRAS-CHAVE: Limiar de Chuva, Sistema de Alerta, Movimentos de Massa, Teste do Qui-Quadrado.

ABSTRACT: This work uses statistical dependence to find the most relevant pair of rain periods and calculates
the probability of landslides as a function of rainfall. Dependence is measured based on the value of the
contingency coefficient between the number of periods with or without landslides per rainfall band. The procedure
was applied for the Quitandinha river basin in Petrópolis-RJ, using records of landslides and daily rainfall between
2005 and 2009. The comparison of the contingency coefficients shows there is a dependency peak in the pair of
24h and 96h periods, therefore it was considered the most relevant period for observing the probabilities of
landslide occurrence. This result can be attributed to the time that rain takes to infiltrate and exfiltrate the soils,
and is endorsed by the typical presence in the region of fractured rock masses underlying a thin layer of soil, giving
rise to mostly shallow landslides. The generated probability graphs also show there is a gain in precision in the
rainfall thresholds made over two periods of accumulated rain instead of just one.

KEYWORDS: Rainfall Threshold, Early Warning System, Landslides, Chi-Square Test

1. Introdução

O município de Petrópolis localiza-se na região serrana do estado do Rio de Janeiro, a cerca de 65 km da


capital do estado do Rio de Janeiro, e registra a ocorrência de movimentos de massa desde a década de 1940
(NEMIROVSKY; NEVES; FERNANDES, 2018), com crescimento na quantidade de casos observados conforme
o aumento populacional levava a população a ocupar as áreas mais íngremes da cidade (DA SILVA et al., 2016).
O relevo íngreme da região (ASSIS DIAS et al., 2018), associado a altos valores de pluviometria,
sobretudo no período entre novembro e abril (CLIMATE-DATA, 2021) faz com que grande parte do município
esteja suscetível a movimentos de massa, principalmente no primeiro distrito, que é onde encontra-se a maior parte
da população. Os movimentos observados são em sua maioria deslizamento de solo tipo raso (ou translacional),
característico de áreas que possuem uma camada fina de solo sobre a rocha (AVELAR et al., 2013; ROSI et al.,
2019)

56
Os limiares de chuva são valores mínimos de chuva a partir do qual é muito provável ocorrer
deslizamentos, podendo ser definidos por métodos determinísticos, formulados por modelos físicos e/ou
hidrológicos, ou estatísticos, baseados em séries históricas de medidas de chuva e deslizamentos (ABRAHAM et
al., 2020; GUZZETTI et al., 2020). Dentre os limiares de chuva definidos estatisticamente existem quatro grupos,
baseados nos valores de chuvas usados para a formação do limiar: intensidade-duração (ID), chuva total do evento,
chuva do evento-duração (ED) e chuva do evento-intensidade (EI) (SEGONI; PICIULLO; GARIANO, 2018).
Para locais onde a resolução temporal de medição de chuva disponível é diária, o valor de intensidade fica
diluído ao longo do dia e é difícil se conhecer a duração da chuva, sendo mais adequado utilizar um limiar baseado
na chuva total do evento, também chamado de limiar do tipo chuva acumulada ou chuva antecedente, e podem ser
baseados em um ou mais períodos de observação de chuva. Considerando que as características físicas de um local
influenciam no tempo e na quantidade de chuva que é capaz de provocar um deslizamento, torna-se necessário
utilizar algum critério para determinar quais o período ou os períodos de tempo mais relevantes para medição de
chuva.
Petrópolis hoje conta com um plano de contingência contra movimentos de massa e enchentes que possui
um sistema de alerta baseado em valores de chuva acumulada em um período, com quatro níveis de alerta, em 6
períodos de chuva, conforme mostra a Tabela 1 (DEFESA CIVIL DE PETRÓPOLIS, 2021, 2014).

Tabela 1: Estágios de alerta por período de observação. Fonte: PETRÓPOLIS (2014, 2021).
Período Estágios de do sistema de alerta
Normal Atenção Alerta Alerta
(mm) (mm) (mm) máximo (mm)
15 min 5 10 15 50
1h 20 30 40 90
4h 40 50 60 130
24h 80 90 100 210
72h 120 130 140 250
96h 160 170 180 370

Este trabalho propõe uma metodologia estatística para determinar o melhor par de períodos para um limiar
de chuva do tipo chuva antecedente. O teste da metodologia foi aplicado na área da bacia do rio Quitandinha,
localizada no primeiro distrito do município de Petrópolis, onde habita cerca de 80 mil habitantes (IBGE, 2021),
e engloba a parte mais afetada por deslizamentos do município. A partir do resultado, são sugeridos limiares de
chuva em probabilidades de ocorrência de deslizamentos, para o caso da bacia do rio Quitandinha em Petrópolis,
RJ.

2. Metodologia

2.1 Dados

A área de estudo deste trabalho refere-se a bacia do Rio Quitandinha, com 12,21 km² localizada no
primeiro distrito da cidade de Petrópolis. Os dados de chuva utilizados para este trabalho foram retirados do
pluviômetro localizado no Laboratório Nacional de Computação Científica (LNCC), que registrou medições
diárias de pluviometria no período de observação, entre janeiro de 2005 e maio de 2009. Foi adotado um critério
de pluviometria mínima para se considerar um dia chuvoso: mínimo de 10 mm registrados em 24h, 20 mm
registrados em 48h e 40 mm em 72h, de forma que foram contabilizados 561 dias de chuva, de um total de 1.597
dias de medição.
A Figura 1 mostra a localização da área de estudo e do pluviômetro de onde foram coletadas as medições
de chuva.

57
Figura 1: Bacia do rio Quitandinha e localização do pluviômetro LNCC.

Os registros de deslizamentos ocorridos na bacia do rio Quitandinha, neste mesmo período, foram
coletados a partir de laudos da defesa civil do município de Petrópolis, com informação referente ao dia de
ocorrência. Foram considerados um total de 420 deslizamentos registrados, ocorridos em 133 dias diferentes.
Destes 133 dias, 32 dias tiveram pelo menos 3 deslizamentos e 19 dias pelo menos 5, apresentando uma média de
3,16 deslizamentos por dia, nos dias com deslizamentos registrados.

2.2 Determinação do par de períodos mais relevante

Considerando que este método visa proporcionar a melhor definição possível de um limiar de chuva
baseado em dois períodos de chuva antecedente, será aplicado um teste estatístico de dependência entre a
quantidade de dias com e sem deslizamentos para diferentes pares de período. Cada par de período será composto
por um período curto (24h) e um período longo de chuva acumulada (48h, 72h, 96h, 120h, 144h, 168h, 192h, 216h
ou 240h) anteriores ao dia de registro do deslizamento. Como a precisão de deslizamento e de pluviometria
disponível é apenas diária, foi considerado que os deslizamentos ocorreram às 0h do dia de registro e as chuvas
antecedentes foram consideradas até o dia anterior ao dia de registro do deslizamento (Figura 2).

Horário de
ocorrência

ocorrência
Dia de
Período
Período
longo 3
Período

Período

Período

Período
Período
Período

Período
longo 7

longo 4

longo 2

longo 1
longo 8

longo 6

longo 5
Período
longo 9

curto

240h 216h 192h 168h 144h 120h 96h 72h 48h 24h 0h
Períodos de chuva antecedente
Figura 2: Localização temporal do dia de ocorrência de deslizamentos e dos períodos de observação de
chuva antecedente.

O teste do qui-quadrado mede a dependência entre duas variáveis através da diferença entre a frequência
encontrada de um determinado evento e a frequência esperada na hipótese de independência - onde o valor do qui-
quadrado é zero - (MORETTIN; BUSSAB, 2010). Neste trabalho, as variáveis são os dias com ocorrência ou não
de deslizamentos em cada par de períodos comparando valores iguais de pluviometria, conforme a Equação 1.
Quanto maior a dependência entre as variáveis, maior o valor de qui-quadrado encontrado.

58
2
(𝑜𝑁1 ,𝑁2 (𝑟,𝑥,𝑦)−𝑒𝑁1 ,𝑁2 (𝑟,𝑥,𝑦))
2
𝜒 (𝑎−1) = ∑𝑟 ∑(x,y) 𝑒𝑁1 ,𝑁2 (𝑟,𝑥,𝑦)
, (1)

onde:
χ² é a medida qui-quadrado de dependência para o par de período (𝑥, 𝑦),
𝑎 é a quantidade de faixas de pluviometria;
𝑜𝑁1 ,𝑁2 (𝑟, 𝑥, 𝑦) são os valores observados de dias com (𝑟 = 1) ou sem (𝑟 = 0) deslizamento na faixa (𝑥, 𝑦)
para o par de período 𝑁1 , 𝑁2 ;
𝑒𝑁1 ,𝑁2 (𝑟, 𝑥, 𝑦) são os valores esperados de dias com (𝑟 = 1) ou sem (𝑟 = 0) deslizamento na faixa (𝑥, 𝑦)
para o par de período 𝑁1 , 𝑁2 , calculado pela Equação 2.

𝑜𝑁1 ,𝑁2 (𝑥,𝑦) 𝑊𝑁1 ,𝑁2 (𝑟)


𝑒𝑁1 ,𝑁2 (𝑟, 𝑥, 𝑦) = , (2)
𝑇

onde:

𝑊𝑁1 ,𝑁2 (𝑟) é a qunidade de dias com ou sem deslizamentos por par de período 𝑁1 , 𝑁2 ;
𝑇 é o total de dias por par de período considerado; e
𝑟 = 1 significa que ocorreu deslizamento, enquanto 𝑟 = 0 que não ocorreu.

Foram adotadas faixas de pluviometria para a execução dos testes, conforme mostra a Tabela 2, de forma
que foi medida a diferença de valores encontrados e esperados em 9 combinações de par de períodos (período
curto de 24h com um período múltiplo de 24h, variando de 48h a 240h), para combinações entre as 7 faixas de
pluviometria referentes a cada período.

Tabela 2: Faixas de pluviometria adotadas no teste de dependência do qui-quadrado.


Faixa Valor mínimo Valor máximo
(mm) (mm)
1 10 20
2 20 40
3 40 60
4 60 80
5 80 100
6 100 120
7 120 140

Considerando que varia a quantidade dias encontrados para as faixas de pluviometria em cada par de
períodos, o valor do qui-quadrado é corrigido pelo coeficiente contingência de Pearson (MORETTIN; BUSSAB,
2010) em relação a quantidade de dados, permitindo a comparação do resultado do teste para diferentes valores de
dias encontrados, conforme a Equação 3. Pode-se considerar, que valores de coeficiente de contingência de
Pearson maiores que 0,3 já indicam uma dependência estatisticamente relevante.

𝐶 = √ (𝜒² / 𝜒2 + T), (3)


onde:
𝜒2 é o valor do somatório do qui quadrado;
𝑇 é o total de valores de entradas da tabela somados.

2.3 Probabilidades

Para o par de períodos considerado de maior relevância pela comparação dos coeficientes de contingência
de Pearson, será calculada a probabilidade de ocorrência de deslizamentos em função das faixas pluviométricas,

59
de pelo menos um deslizamento, pelo menos 3 e pelo menos 5 deslizamentos. O cálculo da probabilidade foi feito
segundo a Equação 4.

𝑟𝑁1 ,𝑁2 (𝑥,𝑦)


𝑞𝑁1 ,𝑁2 (𝑥, 𝑦) = 𝑃 , (4)
𝑁1 ,𝑁2 (𝑥,𝑦)

onde:
𝑞𝑁1 ,𝑁2 (𝑥, 𝑦) é a probabilidade de ocorrência de deslizamentos nas faixas e nos períodos 𝑁1 , 𝑁2 ;
𝑟𝑁1 ,𝑁2 (𝑥, 𝑦) é o número de períodos 𝑁1 com chuva 𝑥 e 𝑁2 com chuva 𝑦; e
𝑃𝑁1 ,𝑁2 (𝑥, 𝑦) é o total de períodos 𝑁1 com chuva 𝑥 e 𝑁2 com chuva y.

3. Resultados

Os coeficientes de contingência encontrados dos pares de períodos são apresentados na Tabela 3, onde é
possível observar que todos os coeficientes possuem valor maior do que 0,3, mostrando que todos os períodos de
chuva possuem dependência. Destaca-se que há crescimento acentuado dos valores de 48 até 96h, onde se encontra
um pico, a partir de onde há uma queda seguida de crescimento mais suave.

Tabela 3: Coeficientes de contingência para cada de períodos 24h-período longo.


Período longo Coeficiente de
combinado com 24h (h) contingência 𝐶
48 0,629
72 0,684
96 0,771
120 0,704
144 0,716
168 0,736
192 0,754
216 0,773
240 0,776

Este resultado mostra que, juntamente com o período de 24h, o período de chuva acumulada mais relevante
é o de 96h antecedentes, mesmo se observando que após a queda de 𝐶 este volta a subir, porém de uma forma
muito suave. Apesar deste longo período de chuva acumulada não ser o que se espera para os casos de encostas
íngremes, com camadas de solo relativamente finas e para deslizamentos do tipo raso (CHEN et al., 2017), o
resultado pode ser compreendido pelas características geológicas da região que contém muitas descontinuidades
no maciço rochoso por onde a água pode ficar armazenada e percolar (COSTA NUNES; FERNANDES, 1990),
chegando tardiamente a região de exfiltração junto a capa de solo (BRÖNNIMANN et al., 2013; ROSI et al.,
2016).
Considerando as probabilidades calculadas, apresentadas nos gráficos da Figura 3 a 5, primeiramente note
que se mantendo constante em valor suficientemente alto uma das pluviometrias o valor da probabilidade sofre
uma grande variação. No gráfico de pelo menos um deslizamento, por exemplo, na faixa de 140-160 mm para 96h
há variação de cerca de 0,25 a 1 conforme a probabilidade 24h varia entre 10 e 60 mm. Isto mostra que a análise
de probabilidades de ocorrência de movimentos de massa apresenta maior precisão quando considera um par de
períodos.
Os três gráficos se diferem muito nos valores até aproximadamente 180 mm (24h) e até 200 mm (96h),
mostrando que a probabilidade varia bastante de acordo com a quantidade mínima de deslizamentos por dia
considerada. Evidencia-se, assim, a necessidade de se definir limiares para considerando diferentes cenários de
quantidade de deslizamentos. A partir dos valores de aproximadamente 180 mm (24h) e 200 mm (96h), os três
gráficos alcançam valores de probabilidades 1, pois diante de valores extremos de chuva espera-se ocorrência
generalizada de movimentos de massa.

60
Níveis de alerta
Normal 24h
Atenção 24h
Alerta 24h
Normal 96h
Atenção 96h
Alerta 96h

Figura 3: Probabilidades de ocorrência de pelo um deslizamento e níveis municipais de alerta.

Níveis de alerta
Normal 24h
Atenção 24h
Alerta 24h
Normal 96h
Atenção 96h
Alerta 96h

Figura 4: Probabilidades de ocorrência de pelo três deslizamento e níveis municipais de alerta.

61
Níveis de alerta
Normal 24h
Atenção 24h
Alerta 24h
Normal 96h
Atenção 96h
Alerta 96h

Figura 4: Probabilidades de ocorrência de pelo cinco deslizamento e níveis municipais de alerta.

Nos gráficos das Figuras 3 a 5 estão marcados também os estágios de “Normal”, “Atenção” e “Alerta” do
plano municipal de contingência para as chuvas acumuladas de 24 e 96h, citados no Item 1. Como os limiares
estão associados a um único período de chuva acumulada, podemos perceber uma grande variação de
probabilidade para um mesmo limiar, conforme observado anteriormente.
Para, pelo menos, um deslizamento os estágios do plano de contingência baseados na pluviometria de 96h
possuem diferenças de probabilidade significativas entre si (cerca de 0,4 de chance de ocorrência em “Normal”,
0,5 em “Atenção” e 0,75 em “Alerta”) para a faixa de 10 a 60 mm em 24h, enquanto os valores de probabilidade
são muito próximos nos três estágios baseados na pluviometria acumulada em 24h. As probabilidades de
ocorrência de, pelo menos, 3 deslizamentos também diferem muito pouco entre os estágios de acordo com os
limiares definidos para 24h e 96h. O mesmo também é observado os estágios definidos para 96h no caso de, pelo
menos, cinco deslizamentos. As probabilidades de pelo menos 5 deslizamentos com chuva acumulada de 24h
também apresenta diferenciação significativa de probabilidade entre os estágios (cerca de 0,35 em “Normal”, 0,5
em “Atenção” e 0,55 em “Alerta”), para a faixa de 80 a 140 mm em 96h.
Um maior detalhamento da metodologia desenvolvida no presente trabalho, dos resultados e de sua análise
associando-os com aspectos geológico-geotécnicos locais são apresentados por (MENDONÇA; GONZALEZ;
COELHO, 2020) .

4. Conclusão

Foi apresentado neste estudo uma metodologia de análise de dados de deslizamentos e a pluviometria
antecedente para a obtenção do melhor par de períodos de observação de chuvas acumuladas para a formação
limiares de chuva em função da chance de ocorrência de deslizamentos. O estudo foi feito com dados da bacia do
rio Quitandinha e apresentadas probabilidades de ocorrência de pelo menos 1, pelo menos 3 e pelo menos 5
deslizamentos na área de estudo.
O método apresentado mostra uma rotina que pode ser reproduzida, onde a partir de dados de chuva e
deslizamentos em um dado período, a comparação dos coeficientes de contingência retorna um resultado que
permite comparação entre todos os pares de períodos considerados. Pela aplicação do método observou-se que a

62
dependência mais relevante entre dois pares de períodos ocorria entre 24h e 96h e, portanto, este seria o melhor
para de períodos para se formular limiares de chuva na área de estudo.
Foi possível observar que probabilidades de ocorrência de deslizamento por níveis de pluviometria para
dois períodos de tempo ao invés de apenas um resulta em uma análise mais precisa para emprego na elaboração
de estágios de alerta. Pela comparação das probabilidades para valores mínimos de 1, 3 e 5 deslizamentos, observa-
se também que a consideração de quantidades mínimas de eventos esperados altera sensivelmente as
probabilidades. Com efeito, o método proposto possibilita a programação de diferentes ações de preparação e
resposta de acordo com a probabilidade de ocorrência de deslizamentos associada ao cenário quantitativo de tais
eventos
É importante observar também que sendo Petrópolis um município de 791,144 km² (IBGE, 2021) e com
características climáticas e físicas muito variáveis (GUERRA; LOPES; SANTOS FILHO, 2007), é uma área muito
plural para ser representada por apenas um limiar. Este trabalho analisou a aplicação dos limiares do plano de
contingência somente para uma área de 12 km2 do primeiro distrito, não sendo possível extrapolar para as demais
regiões do município. Visando uma análise mais acurada, visa-se, em trabalhos futuros, realizá-la a partir de dados
de pluviômetros com uma distribuição espacial que forneça dados mais representativos, bem como com dados de
movimentos de massa classificados de acordo com sua tipologia.

5. Referências

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64
Influência dos solos micáceos na estabilidade de encosta de solo
residual de gnaisse – km133+500 da Rodovia RJ116 - Macuco/RJ
Marina Lopes de Andrade
Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil, mlpsandrade@gmail.com

Denise Maria Soares Gerscovich


Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil, denisegerscovich@gmail.com

RESUMO: O presente trabalho apresenta o estudo da influência de solos micáceos como causa de um
escorregamento de grande volume de um caso real, que mobilizou superfície de ruptura profunda de
aproximadamente 160 m de extensão. Tal fato acarretou o levantamento do bordo da rodovia RJ116, município
de Macuco/RJ e o aparecimento de trincas de tração na parte alta da encosta. O principal objetivo da pesquisa
foi compreender o mecanismo de ruptura ocorrido no campo, já que todos os indícios apontavam para uma
ruptura localizada de pequeno volume. A encosta foi instrumentada com piezômetros e inclinômetros, que,
mesmo após a ruptura, indicavam a tendência de movimentação contínua. Para tanto, retroanalisou-se o caso
por meio de simulações numéricas em ambiente computacional, com base no Método de Equilíbrio Limite
(MEL). Os dados de campo disponíveis e os resultados da retroanálise indicam uma influência dos solos
micáceos na estabilidade do maciço.

PALAVRAS-CHAVE: Estabilidade de Taludes; Solo Residual; Solo Micáceo.

ABSTRACT: This work presents a study of the real causes of a landslide of large proportions that mobilized
a deep surface rupture of approximately 160 m of extension. A lifting of the edge of the RJ116 highway, in
the municipality of Macuco / RJ, was a result of it as well as the appearance of tensions cracks in the highest
part of the slope. The main objective of this research was to understand the rupture mechanism that occurred
on site, since all predictions pointed to a localized rupture of smaller volume. The slope was instrumented with
piezometers and inclinometers, which even after the rupture, indicated the trend of continuous movement.
Furthermore, the case was analyzed using numerical simulations in a computer environment, based on the
Limit Equilibrium Method (MEL). The field data available and the back analysis results pointed to a influence
of micaceous soils at stability of soil massif.

KEYWORDS: Slope Stability; Residual Soil; Micaceou Soil.

1 Introdução
estabilidade dos taludes (DNIT, 2010). Nela é
Agentes externos e internos ao maciço reunida o conjunto de estudos que devem ser
podem contribuir para o desencadeamento de desenvolvidos para avaliar as condições de
deslizamentos e movimentações. Dentre eles, estabilidade. A partir do estabelecimento de tais
ressalta-se principalmente a água (agente externo) condições é possível propor soluções que visem a
e a composição mineralógica do solo (agente integridade da estrutura que compõe a via e a
interno) (Ehrlich et al, 2013). A indução de proteção dos usuários.
instabilidades contribui para que a tensão A proposta deste trabalho é estudar um caso
mobilizada se aproxime da tensão resistente de real de instabilização e compreender as causas das
pico do solo, fazendo com que o estado de movimentações ocorridas através da realização de
equilíbrio limite do talude seja atingido. Assim, se retroanálises. Para tanto, é tido como objeto de
desenvolve a superfície de ruptura ao longo do estudo o talude de montante do km 133+500 sul da
maciço sobre a qual ocorre o movimento de massa RJ116, rodovia sob jurisdição do DER/RJ que
no intuito de reestabelecer o equilíbrio perdido possui trechos administrados por meio de
(Gerscovich, 2016). concessão.
Dentre as diretrizes básicas que norteiam os
projetos rodoviários cabe destacar a verificação da

65
2 Caso de Estudo Em março de 2013 foram realizadas
investigações de campo, incluindo sondagens em
15 posições do talude e mapeamento geológico,
2.1 Localização do caso
que indicou a presença de dobra geológica e
encontro de duas formações rochosas diferentes
A área selecionada para a pesquisa
(granito e gnaisse) em direção ao eixo da estrada.
corresponde ao km 133+500 sul da rodovia RJ116,
Tais evidências sugeriram a mobilização de uma
no município de Macuco, na Região Serrana do superfície de ruptura profunda. Paralelamente,
Estado do Rio de Janeiro. A Figura 1 mostra com como medida emergencial a concessionária (Rota
mais detalhes o contexto topográfico e a vista do 116 S/A) implantou na base do talude, um aterro
talude, anterior ao escorregamento. composto por rachão, uma vala drenante e a
cravação de perfis metálicos. Não foi possível
confirmar a profundidade dos mesmos (Tabela 2–
a).
Observa-se em 2015 que os perfis metálicos
cravados próximos a base do talude, indicam algum
tipo de movimentação decorrente da perda de sua
verticalidade. Na época, não foram observados
abatimentos nem sinais de soerguimento ou
fissuras na região do bordo do pavimento (Tabela
2– b).
Em 2016, visando o acompanhamento das
movimentações e o posicionamento da linha
freática no talude, foram instaladas 3 ilhas de
instrumentação, como mostra a Figura 2. O
monitoramento foi realizado mensalmente, nos
Figura 1 – Representação 3D do ponto estudado meses de setembro/2016, outubro/2016,
(Google Earth, 2020) novembro/2016, dezembro/2016, janeiro/2017 e
abril/2017. Nos meses de fevereiro e março as
2.1.1 Histórico de Movimentação leituras foram interrompidas devido a intensidade
pluviométrica do período.
Em 5 de fevereiro de 2012 ocorreu um
escorregamento, envolvendo grande volume de
terra. O ocorrido culminou na elevação do corpo Trincas de
estradal, o que comprometeu parte do tráfego local tração
na época. A canaleta existente na base do talude foi (posição
rompida em vários pontos e alguns postes das aprox.)
proximidades foram desaprumados. Após a
ruptura a concessionária realizou intervenções de
limpeza e sinalização com marcadores de
alinhamento no pavimento. A Tabela 1 – a) exibe
as condições da via antes da movimentação e a
Tabela 1 – b) a configuração dos bordo da rodovia
após o escorregamento.
Em janeiro de 2013, foi possível identificar
trincas no maciço à montante, à aproximadamente
125 m da crista do talude, além de aumento de Figura 2 - Indicação do posicionamento das ilhas de
movimentação do corpo da estrada, conforme instrumentação (Alta Engenharia, 2013;
mostra a Tabela 1 – c). As trincas resultantes desta Google Earth, 2020)
movimentação apresentaram dimensões médias de Em abril de 2019 foi realizada visita técnica pela
2,5 m de largura e por 2 m de profundidade (Alta
autora, não tendo sido identificado na ocasião
Engenharia, 2013). Com o aumento da
maiores sinais de movimentação do maciço.
movimentação do talude acarretou também o
(Tabela 2– c).
aumento das deformações na região próxima à base
do talude Tabela 1 – d).

66
Tabela 1 – Registros históricos da condição na base do talude – Sentido Itaboraí (Sul) e Laje do Muriaé
(Norte)

Item Descrição Sentido Itaboraí (Sul) Sentido Laje do Muriaé (Norte)

DEZ/2011:
Antes do
a) Escorregamento
(Google Earth,
2020)

FEV/2012:
Detalhe do
talude de
b) montante após a
movimentação
(Google Earth,
2020)

JAN/2013:
Detalhe das
trinca após
movimentação
de massa
c)
do talude de
montante
(Alta
Engenharia,
2013)

JAN/2013:
Detalhe do
levantamento de
bordo após
movimentação
d)
de massa do
talude de
montante (Alta
Engenharia,
2013)

67
Tabela 2 - Registros históricos da condição na base do talude – Sentido Itaboraí (Sul) e Laje do Muriaé
(Norte) (Continuação)

Item Descrição Sentido Itaboraí (Sul) Sentido Laje do Muriaé (Norte)

MAR/2013:
Obras na base e
detalhe da
execução da
a)
vala drenante
(Alta
Engenharia,
2013)

JAN/2015:
Talude de
montante após 2
anos da
execução
b)
de medidas
emergenciais
(Google Earth,
2020)

MAR/2019:
Base do talude
de montante do
c)
km 133+500 da
RJ116
(Andrade, 2021)

3.1 Perfil Geológico-Geotécnico


3 Metodologia
De acordo com os dados fornecidos nos
A partir do estabelecimento da seção
boletins de sondagem locais e no levantamento
transversal crítica e das informações das
topográfico do trecho foi traçado o perfil
investigações geotécnicas foi desenvolvido o
geológico-geotécnico (Figura 3). O perfil retrata
modelo geotécnico, por meio do qual foi possível a
uma seção de 195 m de comprimento por 65 m de
retroanálise do caso e o lançamento de modelagens
altura e é constituído por solo residual de gnaisse,
baseadas no Método de Equilíbrio Limite (MEL)
com camadas argilo-silto arenosas e silto-arenosas
de Morgenstern & Price (1967). Todas análises de
com presença de mica. Com base na descrição dos
estabilidade foram feitas considerando superfícies
materiais encontrados e nos valores de NSPT tal
não-circulares, usando-se a alternativa de pesquisa
perfil foi subdividido em cinco camadas.
Cuckoo Search disponível no programa de Slide.

68
A Tabela 3 resume todos os parâmetros adotados Leituras de IN-01 - Perpendicular à face do talude
nas análises por equilíbrio limite. Face a
inexistência de ensaios, os parâmetros foram Deslocamento horizontal acumulado (mm)
estabelecidos a partir de valores típicos de solo -10,00 -8,00 -6,00 -4,00 -2,00 0,00 2,00 4,00
residual, após análise estatística de dados retirados 0
da literatura (Andrade, 2021).
5

10

15

Profundidade (m)
20

25

Figura 3 - Perfil geológico-geotécnico 30

35
Tabela 3 - Parâmetros geotécnicos iniciais

c' ɸ’ 40
Nº Camada NSPT (kN
(kPa) (°)
/m³) 45
Argilo-
siltoarenosa
1 9 à 11 18 25 30
com areia Leituras de IN-03 - Perpendicular à face do talude
fina
Silto-arenosa Deslocamento horizontal acumulado (mm)
2 com areia 12 à 19 19 25 34
-20,00 -15,00 -10,00 -5,00 0,00 5,00
fina
Argilo- 0
3 arenosa com 20 à 34 20 25 39
areia fina
2
Argilo-
arenosa com
4 >35 22 15 42
areia e mica 4
Profundidade (m)

fina
Alteração de Impene-
5 trável 30 35 50
rocha/ rocha 6

8
3.2 Dados de instrumentação

Inclinômetros 10

Dos três pontos monitorados ao longo dos 12


meses de leitura, os perfis dos inclinômetros 21/04/2017 24/01/2017 19/12/2016
IN-01 e IN-03 indicaram deslocamentos
21/11/2016 25/10/2016
significativos ao longo da seção considerada na
pesquisa. O inclinômetro IN-03, localizado mais Figura 4 - Deslocamentos nos inclinômetros – IN-01
próximo à estrada, indicou um deslocamento e IN-03 (Adaptado de Alta Engenharia, 2018)
acumulado da ordem de 14 mm. Na região mais
alta do talude, o inclinômetro IN-01 registrou um Verifica-se claramente a existência de uma
deslocamento acumulado da cerca de 7 mm superfície de ruptura profunda (eventualmente
causada pela presença de material menos
(Figura 4).

69
resistente), coerente com os deslocamentos
registrados pelos inclinômetros, e com a trinca
observada no campo (Figura 5).

Figura 7 - Posição dos piezômetros (PZ-01 e PZ-03)


referentes à Abril/2017

D
Figura 5 - Indicação dos deslocamentos dos 3.3 Retroanálise do escorregamento do km
inclinômetros (IN-01 e IN-03) referentes à Abril/2017 133+500 da RJ116

Piezômetros Efeitos da resistência do material da Camada 4

Os registros piezométricos no período de Os dados obtidos a partir do programa de


setembro/2016 até abril/2017 estão mostrados na monitoramento revelaram movimentação de massa
Figura 6. Os piezômetros foram instalados à 20 m ao longo de superfície localizada à 25 m de
de profundidade. No momento da instalação, o PZ- profundidade (IN-01). Com isso, surge a hipótese
01 registrou nível d’água à 17,5 m de profundidade da presença de uma camada de menor resistência
no interior no tubo, o que indica carga piezométrica nesta região. Ao rever os boletins de sondagem,
em torno de 2,5 m. O PZ-02 registrou nível d’água observou-se na classificação dos materiais a
de aproximadamente 6 m de profundidade no indicação da presença de mica na Camada 4. Sabe-
interior no tubo, indicando em torno de 14 m de se que, dependendo do seu teor, este mineral pode
carga piezométrica. Já o PZ-03, registrou nível gerar um comportamento bastante desfavorável à
d’água à 3 m de profundidade, o que corresponde à estabilidade global. Existem relatos na literatura
uma carga piezométrica de 17 m. Com tais sobre a redução da resistência ao cisalhamento em
registros piezométricos e com as informações solos saprolíticos devido à presença da mica:
obtidas por meio dos boletins de sondagem, pode- Ehrlich et al (2013) apresentaram ângulo de atrito
se estabelecer o nível d’água no perfil geológico- na ordem de grandeza de 12° e Fonseca et al (2005)
geotécnico (Figura 7). indicaram ângulo de atrito de 10° para amostras de
solo produzidas em laboratório com 50% de
proporção de mica.
Diante desses dados, impôs-se reduções no
valor do ângulo de atrito da Camada 4 para ’ = 8o.

4 Resultados

O resultado, mostrado na Figura 8, fornece


FS = 1,00 e uma superfície de ruptura mais próxima
da observada de campo, já que seus limites
coincidem com o movimento de massa relatado
(trincas e soerguimento). Ressalta-se que ao se
fixar o trecho de entrada e saída da superfície de
ruptura, o FS foi de 0,99, com superfície de ruptura
próxima da exibida na figura supracitada.
Análises preliminares realizadas indicaram
que, para o modelo geotécnico em questão, não
considerar a diminuição da resistência da Camada
4 por influência da mica gera, necessariamente,
P-01 P-02 P-03 uma superfície de ruptura pouco profunda entre a
base e a crista do talude, próximo ao bordo da
Figura 6 - Variações piezométricas: tempo x carga
piezométrica – Set/2016 a Abr/2017
(Adaptado de Alta Engenharia, 2018)
70
rodovia, mesmo fazendo o uso de variações do de solução que objetiva a estabilidade de taludes de
nível d’água. corte, principalmente em casos de superfície
ruptura profunda, como a relatada neste trabalho.
Por fim, pode-se afirmar que o investimento
em serviços de instrumentação e investigação de
solo colaboram para a existência de intervenções
otimizadas que diminuem ou eliminam o
mecanismo instabilizantes à um melhor custo-
benefício.

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Região 01-v02. Rio de Janeiro, 2013.
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Região de Andrade, M. L. (2021) Retroanálise de
levantamento escorregamento de talude em solo residual de
de bordo gnaisse – Estudo de caso km 133+500 sul da
rodovia RJ116. Dissertação de mestrado,
Programa de Pós-Graduação em Engenharia
Civil, Universidade do Estado do Rio de
Janeiro.

Figura 8 - Superfície de ruptura considerando os Ehrlich, M..; Silva, R. C.; Saramago, R. P. (2013)
efeitos da mica –Morgenstern-Price (FS=1,00) Escavações em Solos Residuais de Gnaisse com
Falhas Geológicas. In: VI Conferência
Brasileira Sobre Estabilidade De Encostas.
5 Conclusões Angra dos Reis. p.36-44.

O objetivo desta pesquisa foi aprofundar a Fonseca, A. P.; Lacerda W. A; Futai M. M; Aguiar
compreensão das causas da movimentação V. N (2005); Influência do teor de mica na
ocorrida no talude de montante do km 133+500 da resistência ao cisalhamento residual em taludes
rodovia RJ116, de solos saprolíticos de gnaisse. In: IV
A partir das informações das investigações Conferência Brasileira Sobre Estabilidade De
geotécnicas e do programa de instrumentação Encostas. Salvador.
local, buscou-se estabelecer um perfil geológico-
geotécnico mais próximo do existente em campo, o Gerscovich, D. M. S. Estabilidade de Taludes. 2ª
que tornou a retroanálise mais acurada. O conjunto Ed. São Paulo: Oficina de Textos, 2016.
das informações obtidas favoreceram uma
estimativa mais assertiva do comportamento do Google Earth (2020). Versão 7.3.3.7699. Acesso
maciço, e tornou possível estabelecer uma relação em: 10 nov.
entre a presença de mica no solo com a região que
indicava menor resistência do maciço, indo de Manual de Implantação Básica de Rodovia.
encontro com as constatações de Ehrlich et al Departamento Nacional de Infraestrutura de
(2013) e Fonseca et al (2005) no que diz respeito à Transportes – DNIT, Rio de Janeiro, 2010.
redução da resistência ao cisalhamento em solos
saprolíticos micáceos. Morgenstern, N.R e Price V.E (1967). The
No mais, cabe ressaltar que o uso de valas Analysis of Stability of Embankments
drenantes ao longo da base do talude, perfis Assuming Parallel Interslice Force.
metálicos e aterro de rachão se apresentou como Géotechnique, London, v17. p 43-49.
medida satisfatória na estabilidade local, como
pode ser observado por meio da vistoria realizada,
após aproximadamente 7 anos de execução da obra.
Intervenções que visem a interceptação de
fluxo subsuperficial se mostram como uma forma

71
Gelpolímero acrílico aplicado para prevenção de deslizamentos,
em encostas urbanas do município do Jaboatão dos Guararapes,
PE, Brasil
Isabelle Sena Barbosa da Silva
Discente do Centro Universitário dos Guararapes, Jaboatão dos Guararapes, PE, Brasil. isabellesena21@gmail.com

Andreza Maria de Cássia Soareas Duarte


Discente do Centro Universitário dos Guararapes, Jaboatão dos Guararapes, PE, Brasil. a.deziinha@gmail.com

Sarah Elysabeth Santos de Souza


Discente do Centro Universitário dos Guararapes, Jaboatão dos Guararapes, PE, Brasil. sarahelysa.santos@gmail.com

Betânia Queiroz da Silva


Docente do Centro Universitário dos Guararapes, Doutoranda do Programa de Pós-graduação em Engenharia Civil,
Geotecnia, UFPE, Recife, PE, Brasil, bethqueiroz@gmail.com

Rejane Lucena
Gerente na Superintendência da Defesa Civil da prefeitura de Jaboatão dos Guararapes, PE, Brasil.
lucenarejane@hotmail.com

RESUMO: O aumento populacional das grandes cidades acelerou o crescimento da ocupação em áreas de
morros e encostas. No Brasil, existem 872 municípios que possuem população exposta a riscos. No município
de Jaboatão dos Guararapes, Pernambuco 29,1% do total da população convive com o risco a deslizamentos
(IBGE, 2019). As intervenções podem mitigar os riscos expostos com obras estruturadoras e obras não
estruturadoras. Este artigo objetiva demonstrar a aplicação do geopolímero acrílico em duas encostas urbanas,
afim de analisar sua eficiência como mitigador de riscos em áreas de ocupação desordenadas. A partir do
monitoramento do gelpolímero ao longo de 2020-2021, foi analisado a eficiência no período de alta
pluviométrica. A aplicação foi realizada, na Encosta em Socorro, em duas etapas: primeiramente como um
teste e segundamente como definitiva. A primeira, com uma dosagem menor de geolpolímero, onde não logo
após a aplicação, choveu e retirou pontualmente o gelpolímero da encosta, causando erosão. Na segunda,
utilizou-se a dosagem de 1 litro de gelpolímero concentrado, para cada 5 litros de água, resultando mais
satisfatoriamente com maior resistência a estabilidade da encosta. Já na Encosta Manassu foi aplicado 1:7,5l.
Os resultados permitiram observar que o gelpolímero contribui como solução de curto prazo e minimiza os
riscos de deslizamentos no período que se planeja obras definitivas.

PALAVRAS-CHAVE: Prevenção, Deslizamentos, Defesa Civil, Intervenções não-estruturantes.

ABSTRACT: The population increase in large cities accelerated the growth of occupation in areas of hills and
slopes. In Brazil, there are 872 municipalities that have a population exposed to risks. In the municipality of
Jaboatão dos Guararapes, Pernambuco, 29.1% of the total population lives with the risk of landslides (IBGE,
2019). Interventions can mitigate the risks exposed with structuring works and non-structuring works. This
paper aims to demonstrate the application of acrylic geopolymer on two urban slopes, in order to analyze its
efficiency as a risk mitigator in disorderly occupation areas. From the monitoring of the gelpolymer throughout
2020-2021, the efficiency in the period of high rainfall was analyzed. The application was carried out, at
Encosta em Socorro, in two stages: firstly as a test and secondly as definitive. The first, with a lower dosage
of geolpolymer, where not soon after application, it rained and punctually removed the gelpolymer from the
slope, causing erosion. In the second, a dosage of 1 liter of concentrated gelpolymer was used for every 5 liters
of water, resulting more satisfactorily with greater resistance to the stability of the slope. In Encosta Manassu,
1:7.5l was applied. The results allowed us to observe that the gelpolymer contributes as a short-term solution
and minimizes the risk of landslides in the period when definitive works are planned.

KEYWORDS: Prevention, Landslides, Civil Defense, Non-structuring Interventions

72
1 Introdução

O aumento populacional das grandes cidades acelerou o crescimento da ocupação em áreas de morros
e encostas. A ocupação desordenada resulta em áreas de risco a deslizamentos podendo causar prejuízos
econômicos, ambientais e até mesmo humanos. No Brasil, existem 872 municípios que possuem população
exposta a riscos. No município de Jaboatão dos Guararapes, estado de Pernambuco 29,1% do total da
população convive com o risco a deslizamentos (IBGE, 2019).
As encostas desocupadas são um atrativo à população mais pobre, que servem os com seus serviços os
bairros mais nobres, estes passam a ocupar as encostas realizando cortes em barreiras, construções irregulares,
má destinação das águas servidas, sem levar em consideração as características físicas do talude, contribuindo
para sua desestabilização.
Segundo Bandeira (2010):
“A necessidade por moradia levou a população pobre a criar o lugar através de uma ocupação
espontânea, resultado da busca individual ou coletiva pela moradia. A decisão de onde e
como morar foi estabelecida a partir da disponibilidade de terras, quase sempre encontradas
em áreas de baixo valor imobiliário.”

De acordo com o IBGE, em Jaboatão dos Guararapes, no ano de 2020 há a estimativa de 706.867 de
habitantes. Segundo o Serviço Geológico do Brasil (CPRM) em 2019 existiam aproximadamente 40.864
pessoas em áreas de riscos, sendo 10.216 imóveis distribuídos em 194 setores. Os riscos são classificados
como Baixo (R1), Médio (R2), Alto (R3) e Muito Alto (R4) de acordo com o Ministério das Cidades.
Através de métodos construtivos de maneiras estruturais e não estruturais, pode-se intervir e mitigar os
riscos causados à população. A lei 10.257 de julho de 2001 cita no Capítulo III, Artigo 42 que devem ser feitas
medidas de drenagem urbana necessárias à prevenção e à mitigação de impactos de desastres. Através do
método de classificação de riscos disposto pelo Ministério das Cidades pode-se decidir qual tipo de intervenção
será realizada no local. Apresentando um grau de risco Muito Alto (R4) é necessário que haja a realização de
obras estruturadoras, pois este tem uma maior probabilidade de que aconteça desastres. Já com um risco Alto
(R3) pode-se realizar obras não estruturais, pois irão mitigar o risco até que seja feita obra estruturadora.
Existem diversos tipos de intervenções, obtendo basicamente como intervenções não estruturais têm-se
o retaludamento, proteção superficial, drenagem e estabilização de blocos. Nestas intervenções, ocorre a
diminuição ou aumento das forças de movimento de massa, estabilizando o talude. Já as intervenções
estruturais consistem em muro de contenção ou muro de arrimo e outras soluções de contenção que, segundo
Coutinho e Severo (2009), oferecem resistência à movimentação do talude ou à sua ruptura, ou ainda
reforçando parte do maciço. O tipo de intervenção estrutural mais utilizado é o muro de contenção mais
conhecido como muro de arrimo. As intervenções estruturais têm um valor mais elevado de execução do que
as não estruturais, o que se torna comum ações não-estruturantes mais que mitigam os risco enquanto se projeta
obras estruturais.
Diversos produtos são utilizados para impermeabilização do solo na construção civil, porém pouco se
usa os polímeros. Este se dá pela polimerização de matérias primas naturais como alumínio de
aluminossilicato. De acordo com Vassalo (2013, p.26, apud Pinto, 2006) a polimerização é um processo
exotérmico, onde ocorre uma condensação de unidades tetraédricas de alumínio e a partir da difusão da
partícula, a fase do gel é ativada, em condições alcalinas o aluminossilicato se transforma em material reativo.
A utilização do gelpolímero vem tomando cada vez mais espaço na construção civil como intervenção
não estrutural de encostas. Esta classe de materiais dispõe de alto desempenho e baixo consumo energético
obtido através de reações químicas. Segundo Davidovits (1994, apud APOLONIO, 2017) esta reação ocorre
através da ativação alcalina, por meio da mistura entre uma fonte de aluminossilicatos e uma solução altamente
alcalina. Bigno (2008, apud APOLONIO, 2017) também cita que os geopolímeros são materiais promissores
devido à sua baixa retração, resistência mecânica, resistência ao fogo, resistência ao gelo e degelo, e ainda
durabilidade.
Os gelpolímeros também podem ser considerados como zeólitas artificiais, que são um grupo de
aluminossilicatos cristalinos hidratados de metais alcalinos ou alcalino-terrosos (principalmente sódio,
potássio, magnésio ou cálcio), caracterizados por uma elevada superfície interna de contato e enorme
capacidade de permuta de íons (cátions) (PINTO, 2006).
Seguindo os princípios de execução de impermeabilização da NBR 9574 que fixa as condições exigíveis
de impermeabilização, os polímeros acrílicos foram utilizados em obras de engenharia para impermeabilização
de encostas com riscos a deslizamentos. Os polímeros acrílicos já são bastantes utilizados na
impermeabilização de pisos, lajes e outras obras na Engenharia, além de recentemente aplicado para
impermeabilização de encostas.

73
Como objetivo de mitigar os riscos da população residente nas encostas, a curto prazo, as ações não
estruturadoras são alternativas da gestão do território para prevenção de deslizamentos em encostas. Este
artigo objetiva demonstrar a aplicação do geopolímero acrílico em encostas urbanas, afim de analisar sua
eficiência como mitigador de riscos em áreas de ocupação desordenadas no município.

2 Estudo de caso: Aplicação do gelpolímero em Socorro e Manassu, Jaboatão dos Guararapes

2.1 Caracterização da Área de estudo

O estudo foi realizado nas encostas localizadas nas ruas 2ª Travessa Lisboa, nº 03 e 3ª Travessa Lisboa,
nº 14 no bairro do Socorro (Encosta Socorro) e na Rua Ginástica, nº 240 no bairro de Manassu (Encosta
Manassu), ambos no Município de Jaboatão dos Guararapes, PE. As figuras (01 e 02), situadas nas coordenadas
-8.1042, -34.9888 e -8.0865, -35.0291 respectivamente.

Figura 01. Encosta em Socorro Figura 02. Encosta em Manassu.


Fonte: Google Earth (2020). Fonte: Google Earth (2021).

O solo de ambas encostas são residuais do complexo gnaisse (Figuras 03 e 04), predominantemente
argiloso. Na região de Socorro, têm-se a presença de feldspato e presença de pequenas jazidas de quartzo.
Próximo à esta encosta existem também formações rochosas provenientes de rochas graníticas (Figura 05). Já
em Manassu, o solo caracteriza-se pela presença de solo residual maduro com nítida presença de areia, silte e
argila. Existem imóveis localizados próximo à base dos taludes e as áreas apresentam com vasta vegetação
arbórea, gramíneas, etc; ocupações desordenadas; cortes irregulares; inexistência de destinação de águas
servidas e pluviais; histórico de deslizamentos; erosão (ravinas); inexistência de impermeabilização no entorno
dos imóveis; existência de construções próximo à crista do talude.

Figura 03. Solo Residual em Socorro. Figura 04. Solo residual em Manassu Figura 05. Rocha Granítica
Fonte: Sena/2020 Fonte: As autoras/2021 Fonte: Sena/2020

74
2.2 Metodologia

A partir de estudos bibliográficos, relatórios da aplicação do gelpolímero cedidos pela Prefeitura de


Jaboatão dos Guararapes, PE será demostrado em duas áreas a metodologia de aplicação do gelpolímero, na
busca de aumentar a resistência e diminuir a infiltrações no solo da encosta a curto prazo. Este processo retarda
a saturação do solo no momento de alta pluviométrica.
Os principais elementos químicos que compõe o gelpolímero serão descritos e analisados de que forma
podem contribuir no melhoramento do comportamento físico-mecânico do solo da encosta.
O gelpolímero é uma emulsão de base acrílica que age como uma cola agregando os grãos de areia para
impermeabilizar o terreno. Este permite que cresça vegetação, as raízes diminuem a impermeabilização do
solo, por isso a necessidade de manutenção e reaplicação a cada 6 meses. Será demonstrada a primeira área de
estudo as etapas de aplicação, os resultados do primeiro monitoramento, e a segunda área mostrará uma
aplicação nova mistura de componentes químicos, afim de melhorar a resistência do solo da encosta.

2.2.1 Materiais e etapas utilizadas

A aplicação do gelpolímero acrílico foi realizada com as seguintes etapas e materiais:


1º Etapa: Capinação e limpeza do local;
2º Etapa: Faz-se a escavação de 5cm para retirada da vegetação e solo superficial solto e com matéria orgânica;
3º Etapa: Para a realização da drenagem artificial superior e inferior foi utilizado cimento, areia, bloco
cerâmico de 8 furos, canaletas de concreto de 30 e/ou 60cm de diâmetro, carro de mão, colher de pedreiro;
4º Etapa: Foi realizado o plantio das sementes de braqueária;
5º Etapa: A seguir se fez a impermeabilização do solo no entorno do imóvel que faz contato com a drenagem;
6º Etapa: Aplicação do gelpolímero. Para elaboração da solução, com a bolbona de 1000l, fez-se a mistura do
gelpolímero e água; por fim foi aplicado com a bomba para lançamento o gelpolímero na encosta;
7º Etapa: Pintura e acabamento, que foi realizada com tinta azul e pincel.

2.2.2 Características do gel polímero acrílico

Os principais elementos químicos que compõe o gelpolímero estão dispostos no Tabela 1, esta
distribuição química irá contribuir para o comportamento físico-mecânico no material na estabilidade da
encosta. Sendo um composto químico de natureza polímero acrílico, tem dispersão aquosa de um copolímero
baseado em éster acrílico (TECHNOLOGY, 2016).
Deve-se evitar temperaturas extremas, como queimadas, no entanto, o material é apropriado para as
variações de temperaturas brasileiras.

Tabela 1: Quantidade dos elementos químicos na composição do gelpolímero

ELEMENTO QUANTIDADE PROPRIEDADE


Etilbenzeno 3.1 mg/L Solvente
Tolueno 10.0 mg/L Solvente
Estabilização de
Demanda de Oxigênio Bioquímico 30mg/L
oxigênio no processo
Demanda de Oxigênio Químico 120 mg/L
Sólidos em Suspensão Totais 100mg/L
Óleo e Graxa 15 mg/L Lubrificantes
Rigidez, leveza,
Acrilonitrilo (c) 7.55 mg/L flexibilidade e
resistência
Outros 16.160906 mg/L
Fonte: Technology (2020)

Este é uma emulsão de base acrílica, age como se fosse uma cola agregando os grãos de areia para
impermeabilizar o terreno. Este permite que cresça vegetação, as raízes diminuem a impermeabilização do
solo, por isso a necessidade de manutenção e reaplicação periodicamente.

75
3 Resultados

O gelpolímero foi recomendado para impermeabilização de solos em Jaboatão dos Guararapes, tendo
em vista a maleabilidade do material ao ser aplicado na encosta, que permite uma eficiência de resistência do
solo a curto prazo. A partir dessa premissa, sua aplicação contribui para que seja planejado obras definitivas
pela gestão pública e minimiza os riscos de deslizamentos da população do local.
A primeira área em estudo, Encosta Socorro, foi realizada duas aplicações, a primeira foi realizada em
forma de teste. No experimento foi aplicado uma dosagem do gelpolímero e foi analisado o nascimento das
plantas (no tempo de aproximadamente 2 semanas) para fazer uma segunda aplicação, o gel reagiria de forma
esperada. Porém, os resultados não foram recebidos de maneira satisfatória, após um evento de alta
pluviosidade ocorreu pequenos deslizamentos (Figura 06), comprometendo a resistência do solo na encosta,
sendo necessário a retirada e reaplicação de novo material. Após a avaliação da primeira aplicação, foi testado
uma nova mistura do gelpolímero, ao verificar que o período da primeira aplicação para a segunda eventos de
chuvas não podem ser controlados. Devido à pandemia as atividades de monitoramento paralizaram por um
tempo, consequentemente as erosões surgiram, após as chuvas e retiraram o gelpolímero na parte superior e
inferior da encosta (Figuras 07 e 08).

Figura 06. Erosão na encosta Figura 07. Erosão próximo à crista Figura 08. Pequenas erosões
Fonte: Sena/2020 do talude Fonte: Sena/2020
Fonte: Sena/2020

Após a avaliação da primeira aplicação, foi descartado o tipo de aplicação que fora testado, realizando
agora apenas a aplicação do gelpolímero com dosagem de 1:5, ou seja, a cada 1 litro do gelpolímero
concentrado, 5 litros de água. Onde o consumo mínimo de solução diluída é de 6l/m² de área de encosta.
Com este método de aplicação, o gelpolímero, no período seco ou de pluviosidade baixa, apresentou
resistência, impermeabilidade e escoamento superficial satisfatório (Figura 09). Este método apresenta uma
considerável rigidez, o que contribui para a impermeabilização juntamente com a vegetação que contribui na
diminuição do impacto da água com a superfície da encosta (Figuras 10 e 11).
Vale salientar, que precisa analisar o comportamento do produto aplicado na encosta, no período
chuvoso.

Figura 09. Antes da reaplicação do gel Figura 10. Início da encosta. Figura 12. Crescimento da vegetação
Fonte: Superintendência de Proteção e Defesa Civil de Jaboatão dos Guararapes/2021

A segunda encosta analisada, Encosta Manassu (Figura 13), o gelpolímero teve sua aplicação com
dosagem alterada da encosta supracitada. Sendo agora utilizado a seguinte dosagem de 1:7,5, onde para 1 litro
de gel, temos 7,5 litros de água. O qual já pode-se observar a presença de erosões e fissuras (Figura 14),

76
provenientes de períodos de alta pluviométrica nos meses de abril e maio 2021 (Gráfico 1), no entanto a
vegetação e o gelpolímero tem previnido grandes processos na encosta (Figura 15).

Figura 13. Aplicação do gel polímero. Figura 14. Erosão e fissura Figura 15. Vegetação sobre o gel.
Fonte: As autoras (2021).

Após reavaliação, foi possível observar que houve um deslizamento pontual na área aplicada decorrente
à alta pluviométrica do mês de abril de 2021, sendo necessário aplicação de lona plástica no local, devido ao
período chuvoso (Figura 15). Vale ressaltar, que estudos pluviométricos realizados por Nóbrega e Farias
(2016) com dados do município de Jaboatão, mostra variabilidade da precipitação média mensal, para o
periodo de 1995 a 2014, nos meses de abril e maio apresentam 201,6mm e 271,5mm respectivamente, no
entanto em 2021 esses meses tiveram um pico de precipitação acima do esperado, sendo no mês de abril, o dia
11, com o acumulado de chuvas de 129,8 mm, e o mês de maio, o dia 13, com a precipitação de 150,8 mm.

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Gráfico 01. Análise diária precipitação, Abril/2021


Fonte: Cemaden/2021 (Estação geotécnica)

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40
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1 2 3 4 5 6 7 8 9 10111213141516171819202122232425262728293031

Gráfico 02. Chuvas diária, maio/2021


Fonte: Cemaden/2021 (Estação geotécnica)

77
No mês de abril foi verificado precipitação, em apenas um dia, 64% do esperado para todo o mês, e o
mês de maio teve precipitação 55% do esperado para o mês inteiro, apenas no dia 13. Neste sentido, chuvas
críticas concentradas nas encostas onde foram aplicado o gelpolímero o escoamento superficial, a infiltração
da área e a drenagem não suportaram o volume de água. Verificou-se que as canaletas de 30mm aplicadas na
Encosta Manassu, não foram suficientes e a água extravasou a canaleta e a escoou diretamente sobre o talude,
o que pode ter sido mais um condicionante para o deslizamento ocorrido. No entanto, é notório o crescimento
da vegetação na maior parte da área (Figura 15).

Este tipo de obra não estruturante deve ser realizado juntamente com o monitoramento da encosta,
estudo geológico-geotécnico e acompanhamento e conscientização da população que vive no local. Tendo em
vista que, as ações como, lançar lixo nas encostas, corte e aterro, mudança na drenagem superficial, contribuem
para diminuição de resistência do solo, podendo vir a ocorrer novos deslizamentos.

4 Considerações Finais

As encostas estão em monitoramento pela Defesa Civil do município, tendo em vista que o tempo de
sua aplicação é recente. Os dados de análise de alguns anos irão contribuir para a tomada de decisão de novas
aplicações do gel polímero acrílico em encostas.
Existem poucos estudos com o gelpolímero aplicado em encostas, neste sentido deve ter cautela na sua
aplicação. Ensaios de caracterização física e erosão do solo devem preceder a sua aplicação em uma área.
Além de um monitoramento com ensaios de impermeabilidade do solo e resistência do solo temporal são
imprescindíveis para que evite novos deslizamentos a partir da análise do comportamento do solo.
Vale salientar, que precisa analisar o comportamento do produto aplicado, no período chuvoso,
principalmente em eventos de chuvas críticas acima de 100mm/dia, como ocorreu nos meses de abril e maio
de 2021, para evitar novos ocorrências de deslizamentos.

.
AGRADECIMENTOS

Agradecemos a toda equipe da Defesa Civil do município de Jaboatão dos Guararapes, PE, por toda
disponibilidade e ajuda para a execução deste artigo. Ao Superintendente da Defesa Civil o Coronel Artur
Paiva, a Gerente de Planejamento Rejane Lucena, ao Gerente de Operações Fernando Mellia, à Engenheira
responsável pelas obras do gelpolímero Edlean Brito, nosso muito obrigada a todos!

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Complementar de Sìlica. Dissertação (Mestrado) - Curso de Engenharia Civil, Departamento de Engenharia
Civil, Universidade Federal de Pernambuco, Caruaru.

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. (2008) NBR 9574: Execução de


Impermeabilização. Rio de Janeiro: Abnt, 10 p.

BANDEIRA, A.P.N. (2010) Parâmetros Técnicos para Gerenciamento de Área de Riscos de


Escorregamentos de Encostas na Região Metropolitana do Recife. Tese de doutorado, Programa de
Engenharia Civil, Universidade Federal de Pernambuco, Recife.

BRASIL. (2018) Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Ministério do Planejamento


(org.). POPULAÇÃO EM ÁREAS DE RISCO NO BRASIL. Rio de Janeiro: Ibge. 95 p.

78
BRASIL. (2019) Ministério de Minas e Energia. Serviço Geológico do Brasil - Cprm. Setorização de Áreas
em Alto e Muito Alto Risco a Movimentos de Massa, Enchentes e Inundações: jaboatão dos guararapes -
pernambuco. Brasília: Cprm, 54 p.

BRASIL. (2012) Estatuto das Cidades. LEI No 10.257, DE 10 DE JULHO DE 2001.

COUTINHO, R. Q.; SEVERO, R. N. F. (2009) Investigação Geotécnica para Projeto de Estabilidade de


Encostas. In: V Conferência Brasileira sobre Estabilidade de Encostas – COBRAE, São Paulo. Anais,
ABMS, 55p.

NÓBREGA, R. S.; FARIAS, F. R. L. (2016) Eventos Extremos Pluviais em Jaboatão dos Guararapes:
Climatologia e Estudo de Caso. Revista do Departamento de Geografia, Volume Especial, p. 70-82.

PINTO, A. T. (2006) Introdução ao Estudo dos Geopolímeros. Vila Real: Universidade de Trás-Os-Montes e
Alto Douro, 88 p.

TECHNOLOGY (2016) Global Road.: Ficha de Segurança e Propriedades Químicas e Físicas GRT: enviro
binder. São Paulo: Edição do Autor.

79
Estudo de caso: Avaliação de um movimento de massa em uma
falésia localizada na Praia da Pipa/RN
Allan Benício Silva de Medeiros
Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, Brasil, allan.medeiros.702@ufrn.edu.br

Romário Stéffano Amaro da Silva


Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, Brasil, romario.amaro.071@ufrn.edu.br

Valteson da Silva Santos


Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, Brasil, valtesomdasilva3@gmail.com

Olavo Francisco dos Santos Junior


Professor Titular, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, Brasil, olavo.santos@ufrn.br

Osvaldo de Freitas Neto


Professor Adjunto, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, Brasil, osvaldo.neto@ufrn.br

Ricardo Nascimento Flores Severo


Professor Titular, Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte, Natal, Brasil
ricardo.severo@ifrn.edu.br

RESUMO: A praia da Pipa, no município de Tibau do Sul/RN, é um ponto turístico caracterizado pela
presença de falésias íngremes. A ação das ondas pode causar erosão na base das falésias, o que pode resultar
em cavidades denominadas incisões basais, além de reduzir a resistência do solo. Movimentos de massa em
falésias são comuns e podem acarretar prejuízos financeiros e de vidas humanas. A queda de um bloco em
uma falésia localizada na praia de Pipa-RN, ocorrida em 17 de novembro de 2020, vitimou três pessoas. Esse
trabalho tem o objetivo de analisar a ruptura e discutir o acidente, apontando os potenciais efeitos
deflagradores de acordo as observações realizadas in loco e com informações disponíveis na literatura. Dada
a ausência de chuvas fortes no período, pode-se concluir que o aumento do grau de saturação do solo da base
da falésia em virtude do efeito das marés, aliado à erosão na base da falésia, foram os principais causadores
da instabilidade da falésia.

PALAVRAS-CHAVE: Incisão basal, Formação Barreiras, Estabilidade de Falésias, Erosão Costeira.

ABSTRACT: Pipa Beach, located in City of Tibau do Sul, in the northeast region of Brazil, is a tourist
destination known for its steep sea cliffs. The waves action can cause erosion in the cliffs toe, which may
create cavities called base incisions, and also decrease the soil strength. Landslides in sea cliffs are common
and can lead to financial and human life losses. A blocks fall in a sea cliff located in Pipa Beach, on
November 17, 2020, caused three deaths and, therefore, this paper aims to discuss the accident, by
identifying the potencial triggers for the cliff failure based on a field survey and the state of the art. Given the
absence of heavy rains in the period of the failure, it is possible to conclude that the increase of the degree of
saturation in the cliff bottom layer due to the effect of the tides, combined with the bottom incision, were the
main causes of the failure.

KEYWORDS: Basal Erosion, Barreiras Formation, stability, Coastal erosion.

1 Introdução

80
A ocorrência de movimentos de massa em encostas pode ser dispendiosa e causar diversos problemas,
sendo um tema recorrente na engenharia geotécnica. Regiões costeiras são pontos especialmentea esses tipos
de eventos, principalmente quando compostas por falésias, como é o caso do litoral do Rio Grande do Norte
As falésias marinhas podem ser definidas como encostas íngremes, formando desníveis abruptos, que
ocorrem no contato entre o continente e o oceano, resultantes de processos erosivos marinhos. Elas ocorrem
em todas as latitudes, ao longo de cerca de 80% das linhas costeiras do mundo (EMERY e KUHN, 1982).
Sua relevância tem motivado diversos estudos ao redor do mundo, e.g. Budetta et al. (2000), com enfoque no
entendimento dos movimentos de massa recorrentes no litoral da Itália; Collins e Sittar (2008), que
estudaram os processos erosivos ocorridos em falésias na Califórnia; e Marques (2018), que estudou os
movimentos de massa em falésias por meio de um modelo de regressão logística estatística na costa de
Portugal.
Localizado no litoral do Rio Grande do Norte, o município de Tibau do Sul, que inclui a Praia da Pipa, gera
intenso interesse turístico e comercial, relacionados principalmente às suas belezas naturais. A região foi
tema de estudo desenvolvidos por diversos pesquisadores, podendo ser destacados os realizados por
Scudelari et al. (2005) que abriram uma discussão acerca da instabilidade e dos movimentos de massa na
região, alertando para o recuo ativo identificado, e sugerindo um zoneamento de ocupação a fim de evitar
eventos catastróficos; Santos Jr et al. (2014) caracterizaram e estudaram a estabilidade de falésias pelo
método desenvolvido por Hoek e Bray (1981); e Severo (2011), que caracterizou os sedimentos de uma
falésia localizada no município. De maneira geral, os autores apontam para o risco iminente de movimentos
de massa na região, decorrentes de processos erosivos naturais e antrópicos. Tais eventos, somados ao
modelo atual de ocupação da área, podem culminar em eventos catastróficos.
No contexto brasileiro, mais especificamente na Região Nordeste, pode-se destacar trabalhos como o
desenvolvido por Silva et al. (2016) que analisaram a influência direta da erosão basal na estabilidade de
taludes nas falésias localizadas no município de Tibau do Sul/RN; Silva et al. (2020), que propuseram um
modelo para o recuo de falésias; Barbosa et al. (2020), que desenvolveram uma análise de tensões para
verificar a influência das incisões basais na estabilidade de falésias; Morais, Santos Jr. e Freitas Neto (2020),
que apresentaram os resultados experimentalmente obtidos das propriedades geotécnicas de sedimentos que
compõem uma falésia; e Medeiros (2021), que estudou os efeitos da variação do grau de saturação, das
dimensões de incisões basais e da faixa de umedecimento na estabilidade de uma falésia da região.
Diante do exposto, o presente trabalho consiste em um estudo de caso relacionado ao movimento de
massa ocorrido em uma das falésias da Praia da Pipa, em novembro de 2020, que vitimou três pessoas. Com
isso, objetiva-se apontar os potenciais efeitos deflagradores relacionados à ocorrência e discutir, de maneira
geral, a dinâmica dos movimentos de massa que se desenvolvem nas falésias da região. Nesse sentido,
pretende-se contribuir com a discussão que se desenvolve a respeito dos potenciais riscos associados ao uso e
ocupação da área. Para tanto, as considerações feitas neste trabalho derivam do conjunto de informações
existente na literatura acerca das condições geotécnicas das falésias da região e de visitas ao local do
acidente, realizadas antes e no dia seguinte à sua ocorrência.

2 Descrição da região e da falésia

A praia da Pipa se localiza na porção oriental do litoral potiguar, no Município de Tibau do Sul,
conforme demonstrado na Figura 1. Localizada a aproximadamente 100 km da capital, essa região é
composta por praias, possuindo faixas de areia normalmente seguidas de paredões naturais, com desníveis
que chegam a 50 m de altura (SEVERO, 2005).

81
Figura 1. Localização da Praia da Pipa/RN.

A área litoral do Rio Grande do Norte possui clima tropical chuvoso, apresentando temperatura
média anual de 25,7 ℃, com umidade relativa média anual variando de 74% a 80%. A estação
chuvosa está compreendida entre os meses de fevereiro a agosto, quando os totais mensais (média)
variam de 90 a 230 mm e precipitações anuais de aproximadamente 1261 mm (Diniz, 2002; Severo,
2005; Nascimento, 2009; Severo 2011; Souza Júnior, 2013; Barbosa, 2017; Silva et al, 2020).
Nesse contexto, o município de Tibau do Sul encontra-se estabelecido majoritariamente sobre
tabuleiros costeiros ocupados por uma formação sedimentar estratificada, com sedimentos depositados a
partir do Mioceno até o Plioceno, denominada Formação Barreiras. Essa formação se estende ao longo do
litoral do Brasil desde o estado do Rio de Janeiro até o estado do Amapá (BEZERRA, MELO e SUGUIO,
2006). Essa unidade geológica consiste em uma cobertura sedimentar, com camadas intercaladas de argilitos,
siltitos e arenitos, apresentando em sua composição diferentes teores de silte, argila e arenitos
conglomeráticos. (SANTOS JR, COUTINHO e SEVERO, 2015).
A falésia onde ocorreu o movimento de massa estudado, conforme esperado pela litografia do local, é
visivelmente estratificada. Pode-se subdividi-la em uma camada de material amarelado que compõe a sua
base, caracterizada pela ocorrência marcante de concreções ferruginosas de cores que variam entre vermelha
e roxa; e em uma camada de material esbranquiçado em seu topo, conforme pode ser visto na Figura 2.

Figura 2. Perfil típico das falésias da região.

Em alguns pontos do local, pode-se destacar a presença de blocos oriundos de movimentos de massa
anteriores, acumulados ao pé da encosta. A coloração escura adquirida por esses blocos está relacionada a
processos de oxidação. Esses materiais criam uma barreira natural que diminui o potencial erosivo da ação

82
marítima (Severo, 2011), como visto na Figura 3. Nesse sentido, conforme apresentado na Figura 4, nas
regiões onde não são identificados esses materiais no pé das falésias, podem ser percebidas a presença de
incisões na base das falésias, causadas pela ação das ondas. No local, verificou-se incisões basais com altura
e profundidade da ordem de 1,2 m e 2 m, respectivamente.

Figura 3. Região com material oxidado no pé da falésia.

Figura 4. Região da falésia com incisão basal.

3 Descrição do evento

Segundo relatado por testemunhas, aproximadamente ao meio dia de 17 de novembro de 2020 ocorreu
o desprendimento seguido de queda rápida, sobre o plano aproximadamente vertical, de parte do material que
compunha a camada de base da falésia, Figura 5. Ressalta-se que no local do movimento de massa, a falésia
apresentava uma incisão basal.
Durante a visita ao local, verificou-se que o material desprendido da falésia se encontrava úmido. A
amostragem para determinação precisa do teor de umidade foi impossibilitada em função do acesso restrito.
Não se verificou a ocorrência de chuvas nos dias anteriores ao evento. No dia de ocorrência do evento, bem
como nos dias anteriores, foram relatadas marés mais altas do que a média.

83
Figura 5. Local do movimento de massa sob duas perspetivas.

4 Discussão

O movimento de massa estudado, segundo a classificação de Varnes (1978), posteriormente atualizada


por Hungr et al. (2013), se enquadra como uma “queda”, causada pelo efeito da força gravitacional. A região
onde ocorreu a ruptura é amplamente marcada pela presença de incisões basais. Conforme relatado por Silva
et al. (2016) e Barbosa et al. (2020), a presença de incisões basais é um dos efeitos mais importantes para
avaliar a estabilidade de falésias íngremes. Os autores, por meio de análises de tensões, conseguiram
verificar uma relação clara entre o aumento da incisão na base de uma falésia e sua desestabilização. A
medida que o aumento das incisões ocorre, maiores tensões de tração são induzidas ao longo da face da
falésia causadas pela força gravitacional. A falésia estudada por Barbosa et al. (2019) apresenta
características similares as da falésia onde ocorreu a ruptura estudada, uma vez que ambas são formadas por
camadas de sedimentos da Formação Barreiras e possuem características geométricas parecidas. Assim,
pode-se apontar como um dos motivos para a ocorrência da ruptura da falésia estudada a presença de
incisões na base.
Conforme observado após a ruptura e relatado por testemunhas, a queda observada no evento adverso
estudado foi localizada apenas na camada denominada como de base. Pacheco, Freitas Neto e Severo (2006),
Silva (2019) e Medeiros (2021) apontam a influência da faixa de saturação na estabilidade de falésias
marinhas estratificadas. Medeiros (2021) concluiu que com o aumento do grau de saturação apenas da
camada de base pode ocasionar rupturas localizadas, deflagradas pela concentração de esforços de tração,
independente da condição de saturação das camadas superiores. Assim, devido à falta de chuvas intensas nos
dias pregressos à ruptura, estima-se que a saturação da falésia tenha ocorrido prioritariamente na camada de
base de forma ascendente, causada por capilaridade e pelo efeito da maré, no pé da falésia. Nesse sentido,
destaca-se que a falésia, como apresentado anteriormente na Figura 4, não possuía proteção natural contra
esse contato direto.
Medeiros (2021) também avaliou a influência do grau de saturação na ocorrência de movimentos de
massa. O autor indica que, para a falésia estudada em seu trabalho, em regiões sem incisões na base, seria
necessário um grau de saturação de aproximadamente 60% na camada de base para desencadear ruptura.
Porém, um grau de saturação da ordem de 40% é suficiente para deflagrar rupturas, caso exista uma incisão
basal com profundidade em torno 3 m. Ressalta-se que, na análise táctil visual do material componente da
camada de base da falésia onde ocorreu o movimento de massa estudado neste trabalho sugere teores de
umidade correspondentes à graus de saturação superiores a 40%.
A ruptura identificada, influenciada por esses fatores, vai ao encontro do mecanismo de ruptura
descrito por Silva et al. (2020) em seu modelo de recuo costeiro. A Figura 6, adaptada do trabalho dos
autores, consegue sintetizar de forma esquemática a ruptura analisada.

84
Figura 6. Modelo esquemático da Ruptura de uma falésia influenciada pela incisão basal, adaptado de Silva
et al. (2020).

5 Conclusões

O caso estudado consiste em um movimento de massa ocorrido na Praia da Pipa/RN, em


novembro de 2020, caracterizado por uma queda localizada de material componente da camada de
base da falésia, com vítimas fatais.
As observações de campo, associadas aos estudos desenvolvidos na região, apontam como
efeitos deflagradores do movimento de massa o aumento do grau de saturação, ainda que apenas na
faixa da base da falésia, causado pela ação da maré e à presença de incisões na base da falésia.
Conforme é de conhecimento comum, a condição de saturação influencia significativamente na
resistência do solo, e, o decréscimo da resistência associado ao desenvolvimento de concentração
das tensões de tração na região próxima à face do maciço podem ter sido os gatilhos para a
ocorrência da ruptura da falésia.
Ademais, pode-se afirmar que esse tipo de movimento de massas ocorre constantemente na
região estudada, entretanto, no caso em estudo, infelizmente vitimou de forma fatal 3 (três) pessoas
de uma mesma família. Assim, é relevante considerar que a estabilidade das falésias da região não
está assegurada nem em períodos de estiagem, uma vez que é sujeita ao efeito das marés.
Ressalta-se que os movimentos de massa associados a falésias são eventos naturais, relacionados
com a própria dinâmica do recuo costeiro. Dessa forma, é reiterada a necessidade da implementação
e manutenção de medidas, estruturais e não-estruturais, que visem propiciar a segurança daqueles
que ocupam de maneira contínua ou temporária as regiões do litoral com suscetibilidade para a
ocorrência desse tipo de evento.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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87
Estudo da Estabilidade de Talude em Área Degrada no Município
de Itajubá/MG
Adinele Gomes Guimarães
Professora Associada, Universidade Federal de Itajubá, Itajubá, Brasil, adinele@unifei.edu.br

Alessandra Regina de Azevedo Medeiros


Engenheira Ambiental, Universidade Federal de Itajubá, Itajubá, Brasil, alessandraramedeiros@yahoo.com

Nívea Adriana Dias Pons


Professora Associada, Universidade Federal de Itajubá, Itajubá, Brasil, npons@unifei.edu.br

Paulo César Gonçalves


Professor Adjunto, Universidade Federal de Itajubá, Itajubá, Brasil, paulocg9@unifei.edu.br

Valquíria Claret Dias dos Santos


Professora Associada, Universidade Federal de Itajubá, Itajubá, Brasil, valquiria@unifei.edu.br

RESUMO: Os deslizamentos podem ser considerados processos naturais que ocorrem devido a
desequilíbrios presentes na natureza geológica do local que são corrigidos pela movimentação dos solos.
Garantir a estabilidade de taludes em áreas urbanas impede o avanço das movimentações de massa que
podem comprometer estruturas e causar prejuízos. O objetivo deste trabalho foi identificar uma solução para
a estabilização de um talude natural degradado, localizado na zona urbana do município de Itajubá-MG.
Inicialmente realizou-se a caracterização física do local e identificação dos parâmetros dos solos, por meio
de ensaios de laboratório. Em seguida executou-se a análise da estabilidade, com apoio de software, da seção
transversal escolhida a partir do levantamento topográfico. A solução recomendada compreendeu o
retaludamento, com a construção de uma berma com o próprio solo removido do topo do talude para
estabilização da base. Concomitantemente com essa técnica indica-se a implantação de canaletas de
drenagem nas delimitações da área e na berma, bem como o uso da geomanta e de cobertura vegetal com
gramíneas e leguminosas, proporcionando proteção aos processos erosivos.

PALAVRAS-CHAVE: Movimentos de massa, Taludes urbanos, Retaludamento.

ABSTRACT: Landslides can be considered natural processes that occur due to imbalances present in the
geological nature of the site that are corrected by soil movement. Ensuring the stability of slopes in urban
areas prevents the advance of mass movements that can compromise structures and cause damage. The
objective of this work was to identify a solution for the stabilization of a degraded natural slope, located in
the urban area of the municipality of Itajubá-MG. Initially, the physical characterization of the site and
identification of soil parameters were carried out through laboratory tests. Then, the stability analysis was
performed, with software support, of the cross section chosen from the topographic survey. The
recommended solution included the re-sloping, with the construction of a berm with the soil removed from
the top of the slope to stabilize the base. Concomitantly with this technique, the implementation of drainage
channels in the boundaries of the area and on the berm is indicated, as well as the use of geomanta and
vegetation cover with grasses and legumes, providing protection to erosion processes.

KEYWORDS: Mass Movements, Urban Slopes, Stepped slope.

1 Introdução

O Brasil é um país tropical onde o verão caracteriza-se por elevados índices pluviométricos que
agravam o risco de deslizamentos de encostas íngremes, principalmente onde houve a retirada da cobertura
vegetal original.

88
O deslizamento trata-se de um processo natural que ocorre devido a desequilíbrios presentes na
natureza geológica do local que são corrigidos pela movimentação de solo e rochas, ou seja, é a natureza
geológica procurando recompor sua estabilidade.
Em períodos de chuvas intensas, a parcela de água que infiltra no solo encontra com alguns tipos de
rochas impermeáveis que dificultam a sua passagem e obrigam a sua acumulação. Esse acúmulo torna o solo
saturado, o que dificulta o seu autossuporte, levando-o ao rompimento. Esse fato, em conjunto com o intenso
escoamento superficial, caracteriza a instabilidade do talude, desencadeando a movimentação de massas de
solo e rochas do mesmo.
O problema da instabilidade de encostas naturais e dos consequentes deslizamentos é que a população
brasileira tem sido muito afetada. Basta lembrar as constantes “quedas de barreiras” em estradas, as
irrecuperáveis perdas humanas e as grandes perdas patrimoniais e financeiras, como ocorreu em 2008 em
Santa Catarina e em 2010/2011 no estado do Rio de Janeiro. Há, portanto, uma demanda crescente em se
analisar as soluções de estabilização, que possibilitam a recuperação de taludes degradados, de forma segura
e econômica.
Neste contexto, o objetivo deste trabalho foi identificar a solução mais viável, dos pontos de vista
técnico, para a estabilização de um talude natural degradado, localizado na zona urbana do município de
Itajubá-MG, por meio da caracterização física do local, identificação dos parâmetros do solo, análise da
estabilidade do talude, análise de alternativas para estabilização e dimensionamento, caracterização e estudo
econômico das alternativas propostas.
Acredita-se que esse estudo de caso contribua para a prevenção de perdas humanas, patrimoniais e
financeiras nas proximidades do talude em estudo e que possa ser estendido para outras situações de
instabilização de taludes no município.

2 Metodologia

2.1 Aspectos Gerais da Área de Estudo

A área de estudo (Figura 1) situa-se no encontro entre o meridiano 45°27’ W e o paralelo 22°25’ S,
mais precisamente dentro da área urbana no município de Itajubá-MG e dista, em linha reta, 440 m da Praça
Dr. Pereira dos Santos (Praça do Soldado) e 480 m da Praça Dr. Theodomiro Carneiro Santiago (centro de
Itajubá).

Figura 1. Localização da área de estudo na cidade de Itajubá.


Fonte: Google Earth (Acesso em 30 agosto 2013).

O talude natural de meia encosta estudado apresenta fortes evidências de processo erosivo e
degradação, como se pode observar nas imagens da Figura 2. Este fato também fica evidenciado quando
comparadas imagens obtidas pelo aplicativo Google Earth (datada de 2005) ao levantamento topográfico
realizado (datado de 2013), onde, no primeiro, a cota topográfica do limite superior do talude corresponde a
875 m e no segundo a 883 m.

89
(a) (b)
Figura 2. Fotos da área de estudo (a) visão geral e (b) detalhes dos sulcos de erosão presentes no pé do talude.

2.2 Atividades de Campo e Laboratório

A primeira fase do trabalho consistiu no levantamento topográfico e na caracterização do solo


constituinte do talude (disposição, espessura média e classificação das camadas), com coleta de amostras
para análise em laboratório.
Os ensaios de caracterização foram realizados nos laboratórios de Solos e de Geotecnia da
Universidade Federal de Itajubá (Unifei – Campus Itajubá), com supervisão e auxílio dos técnicos
responsáveis pelos mesmos. Na Tabela 1 encontra-se o resumo dos ensaios realizados com as amostras
coletadas.
Tabela 1. Ensaios realizados.
Ensaio Local de realização Bibliografia de referência
Determinação do teor de umidade de Laboratório de Solos NBR 6457 (ABNT, 1986)
solos
Textura pelo método da pipeta Laboratório de Solos Apostila de Ensaios Laboratoriais da
disciplina Introdução a Ciência dos Solos
Densidade de grãos utilizando Laboratório de Almeida (2011)
picnômetro de 50 mL Geotecnia
Massa específica aparente pelo Laboratório de Almeida (2011)
método do cilindro de cravação Geotecnia
Limite de Liquidez Laboratório de NBR 6459 (ABNT, 1984)
Geotecnia
Limite de Plasticidade Laboratório de NBR 7180 (ABNT, 1984)
Geotecnia
Granulometria conjunta Laboratório de NBR 7181 (ABNT, 1984)
Geotecnia

2.3 Análise de Estabilidade do Talude

O GeoStudio 2012 - SLOPE/W é um software CAD, usado em projetos geotécnicos, civis e até
mesmo de mineração, que faz a análise da estabilidade de encostas, computando os fatores de segurança das
mesmas. Analisa eficazmente qualquer problema (simples ou complexo), para uma variedade de formas de
superfície de ruptura (deslizamento), através dos Métodos de Equilíbrio Limite (método sueco ou das fatias)
como o de Morgenstern-Price, Bishop, Ordinary (Fellenius), Janbu, GLE, Spencer e outros (GEO-SLOPE,
2012).
Na etapa de analise de estabilidade, utilizou-se o software supracitado, na versão Student, tendo como
elemento o perfil topográfico correspondente à seção do talude mais íngreme. A análise foi feita em duas
etapas, sendo a primeira caracterizada pela criação de quatro situações com posições diferentes de entrada e
saída da superfície de ruptura e mesmo método de análise, a fim de se comparar os valores dos fatores de

90
segurança obtidos e concluir qual o nível de estabilidade atual do talude. A segunda etapa consistiu em
submeter à pior situação criada na primeira etapa à análise por os outros métodos, a fim de compará-los.

2.4 Estudo das Alternativas para Estabilização do Talude

A análise das alternativas de estabilização e a escolha das mais adequadas para solucionar o problema
em estudo foram feitas a partir da interpretação e análise da condição apresentada pela pior situação da
superfície de ruptura obtida na etapa metodológica anterior, considerando os seguintes aspectos descritos a
seguir.

2.4.1 Retaludamento

Segundo Carvalho (1991) o retaludamento é uma obra civil de terraplanagem realizada para alterar a
geometria do talude, visando a sua estabilização. Essa alteração pode ser realizada através da execução de
cortes, “contínuos (se a altura for inferior a 5m) ou escalonados (se a altura for superior a 5m)” (ALHEIROS
et al, 2004). O retaludamento foi feito para o perfil topográfico correspondente à seção do talude escolhida
no início deste trabalho, propondo-se declividades, de valores comuns, menores que 1:1,5 (H:V), pois,
conforme orientação de Alheiros et al (2004), esse é o valor máximo admitido para taludes de corte. Para
as diferentes inclinações, submeteu-se o perfil modificado à análise de sua estabilidade pelos quatro
métodos, até que se encontrou um fator de segurança superior ao considerado como valor limite (NBR
11682), identificando o perfil seguro a ser utilizado.
Carvalho (1991) também afirmou que é conveniente associar a técnica de retaludamento a obras de
drenagem e de proteção superficial para que, além da estabilização do talude, os processos de erosão possam
ser prevenidos com a redução da infiltração da água no solo e com a condução adequada do escoamento
superficial, pois, segundo Alheiros et al (2004), a exposição das novas áreas cortadas leva à fragilidade da
área retaludada. O primeiro autor ainda pontuou que, dentre as obras de estabilização de talude, o
retaludamento é o mais utilizado devido à sua simplicidade e eficácia e pode ser realizado em quaisquer tipos
de solo ou rocha, quaisquer condições de ocorrência e sob a ação de quaisquer esforços.

2.4.2 Dispositivos de drenagem

Para o dimensionamento dos dispositivos de drenagem foi realizado, previamente, um estudo


hidrológico da bacia onde o local de estudo está inserido. Este estudo envolveu três conceitos: tempo de
concentração (tempo gasto pela contribuição da bacia para com o escoamento superficial no local de estudo,
calculado através da Equação de Kirpich); intensidade da chuva de projeto (estimado através da equação
geral da chuva intensa que considera a duração da chuva igual ao tempo de concentração da bacia e um
período de retorno estipulado para um dado empreendimento) e a vazão de enchente (vazão da água
atuante no local determinado através do Método Racional). Determinada a vazão de água atuante na área de
estudo, dimensionaram-se as canaletas a serem utilizadas para suprir essa vazão através da equação de
Manning.

2.4.3 Seleção dos geossintéticos

A seleção dos geossintéticos, destinados à proteção superficial no controle de erosão, foi feita em duas
etapas. Inicialmente, escolheram-se fornecedores de nomes reconhecidos no mercado e buscaram-se, na
página virtual dos mesmos, os produtos oferecidos que são utilizados para essa finalidade, suas
especificações técnicas e seus preços. Em seguida, fez-se uma comparação crítica entre as especificações
técnicas desses produtos e os critérios básicos para a seleção de geomantas apresentados na Tabela 2, tendo
como resultado a seleção dos geossintéticos adequados para barreira de proteção superficial.

Tabela 2. Critério de seleção de geomantas para controle de erosão e revegetação (ECRM).


Propriedade Normas de referência Valor limite
Espessura ASTM D-1777 6 mm (min)
Porosidade - 95% (min)
50% (min)
Cobertura do solo -
80% (máx)
Rigidez ASTM D-1388 40.000 mg.cm (máx)

91
Resiliência - 80% (min)
Resistência à tração ASTM D-1682 1,4 kN/m (min)
Deformação ASTM D-1682 70% (máx)
Fonte: Marques in Vertematti (2004), modificado

2.4.4 Escolha da cobertura vegetal

A escolha das espécies vegetais a serem usadas para evitar novas ações erosivas foi feita por meio de
estudo bibliográfico examinando as seguintes características: porte, altura, hábito de crescimento, sistema
foliar perene ou caducifólio, tempo de formação, tipo de solo onde se desenvolve e profundidade de plantio.
Escolhidas as espécies, verificou-se em referências da área para hidrossemeadura a quantidade média
de sementes e produtos utilizados nesse processo. A partir dos valores encontrados calculou-se a quantidade
total de sementes de cada espécie e de cada produto a serem utilizados no local de estudo.

3 Resultados e Discussões

3.1 Caracterização da área de estudo

Durante o trabalho de campo determinou-se visualmente as diferentes camadas de materiais


constituintes do talude, sendo a primeira formada por Solo Orgânico (0,40 m), a segunda por Solo Residual
Maduro (6 m), a terceira por Solo Residual Jovem (1 m) e a quarta, última camada, por Saprolito (24,6 m),
como mostrado na Figura 3. Ainda na visita ao local, observou-se a presença de afloramentos rochosos do
tipo Gnaisse, com segregação de minerais escuros (biotita e, possível, piroxênio) e claros (quartzo e
feldspato) que podem ser vistos na Figura 4.

Figura 4. Afloramento rochoso encontrado


no local de estudo, constituído por Gnaisses
finamente bandados.

Figura 3. Perfil geral das camadas constituintes do talude.

Na análise de estabilidade, desconsiderou-se a camada de Solo Orgânico pelo fato do mesmo possuir
pequena espessura e localizar-se na porção superficial do terreno, que é uma zona de lixiviação e eluviação,
constantes, com matéria orgânica. Como também, a camada de Solo Residual Jovem foi desconsiderada por
duas razões: primeira, por possuir uma pequena espessura comparada à altura do talude, o que caracteriza
uma menor influência na estabilidade e, consequentemente, menor importância para a análise da
estabilidade, e, segunda, pela limitação do programa utilizado para a análise, que permite a utilização de
apenas três tipos de solos.
Na Figura 5 são mostrados o croqui da topografia do terreno e a seção escolhida para as análise de
estabilidade, escolhida por evidenciar o perfil topográfico da área. A Figura 6 mostra o perfil
correspondente a seção escolhida, o qual foi construído utilizando os softwares ArcGIS 9.3 e AutoCAD
2010.

92
(b)
(a)
Figura 5. Topografia da área de estudo (a) e perfil da seção escolhida para estudo (b).

A partir das amostras coletas em campo foi realizada a caracterização e classificação dos solos cujos
resultados são apontados na Tabela 3. De acordo com a classificação textural, o Solo Residual é uma
argila siltosa e o Saprolito uma areia siltosa.

Tabela 3. Resultados dos ensaios de caracterização dos solos.


Solo Residual Saprolito
Umidade natural (%) 16 2
Densidade de partículas (g/cm³) 2,73 2,52
Limite de Liquidez (LL) 61 27
Limite de Plasticidade (LP) 41 -
Índice de Plasticidade (IP) 20 -
Índice de Consistência (IC) 1 -
Massa específica natural (g/cm³) 1,47 1,60
Massa específica seca (g/cm³) 1,24 1,53
Granulometria
Porcentagem Areia (%) 27 68
Porcentagem Silte (%) 39 31
Porcentagem Argila (%) 34 1

3.2 Diagnóstico da estabilidade do talude na condição inicial

A imagem representativa da seção utilizada nas análises da estabilidade do talude é apresentada na


Figura 6. Como os ensaios de resistência ao cisalhamento não foram realizados, os valores de coesão (c) e
do ângulo de atrito (𝜙) dos solos foram buscados em bibliografia geotécnica reconhecida, para que pudessem
ser especificados no software. Os valores adotados são apresentados na Tabela 4, juntamente com a
justificativa de sua escolha.

Figura 6. Perfil do talude em estudo.

93
Tabela 4. Valores adotados para os parâmetros de resistência ao cisalhamento .
Solo Residual Saprolito
Coesão (c) 30,5° 35°
Valor médio retirado da Tabela 12.1 do Valor médio retirado da Tabela 12.1 do
Justificativa livro Fundamentos de Engenharia livro Fundamentos de Engenharia
Geotécnica (Das, 2011). Geotécnica (Das, 2011).
Ângulo de
0 kPa 0 kPa
atrito (𝜙)
Diante da dificuldade de encontrar o valor
desse parâmetro na bibliografia consultada, Areia é um material não coesivo.
Justificativa
adotou-se o valor correspondente à situação
favorável de segurança.

Utilizando-se o método de Morgenstern-Price, criaram-se quatro situações onde as posições de entrada


e saída das superfícies de ruptura variavam, a fim de se comparar os valores dos fatores de segurança de cada
situação e concluir sobre a situação atual do talude quanto a sua estabilidade. A Figura 7 mostra as diferentes
situações analisadas e a Tabela 5 os resultados obtidos de concentração de massa de solo no pé e no topo do
talude e os fatores de segurança correspondentes a cada situação analisada.

Figura 7. Situações analisadas para diferentes posições de entrada e saída das superfícies de ruptura

Tabela 5. Resultados obtidos de acordo com as situaçãoes de análise.


Concentração de massa de solo Concentração de massa de solo Fator de Segurança
no pé do talude no topo do talude Crítico
Situação (1) Grande Pequena 1,186
Situação (2) Média Grande 0,879
Situação (3) Média Média 0,832
Situação (4) Pequena Média 0,784

Conforme valores obtidos, verifica-se que o talude em estudo está com configuração inadequada, pois,
de acordo com a NBR 11682 (ABNT, 2009) (Tabela 3 – situação Média/Média), fatores de segurança iguais
ou menores a 1,4 caracterizam o talude como instável, ou seja, sujeito a deslizamento.
Propôs-se ainda fazer uma comparação entre as metodologias de análise. Assim, utilizando as posições
de entrada e saída da superfície de ruptura da situação (4) apresentada anteriormente, foi possível triplicá-la,
utilizando, respectivamente, as metodologias de Bishop, Fellenius e Janbu. A Figura 8 mostra as posições
analisadas para os diferentes métodos. Esses valores confirmam que, independente da metodologia de
análise, o talude em estudo requer tratamento para melhoria da sua estabilidade.

94
Figura 8. Análise de estabilidade utilizando diferentes metodologias. A = Morgenstern-Price, B = Bishop, C
= Fellenius e D = Janbu

3.3 Alternativas para garantia da estabilidade

Optou-se por testar incialmente a execução de retaludamento por corte escalonado, modificando a
geometria do talude na condição que se apresentava, a fim de amenizar a sua inclinação e aumentar o fator
de segurança, garantindo sua estabilidade. Resultado satisfatório foi obtido com a declividade 1(V):2(H),
cujo perfil final é apresentado na Figura 9. A alternativa proposta também incluiu uma berma de 1 metro de
largura visando à diminuição da velocidade de escoamento superficial da água. O retaludamento proposto
indica a remoção de grande quantidade de solo da porção superior a berma, tornando-a mais suave, pois a
inclinação diminui de 57,17° para 26,57°, assim como uma pequena adição de solo na porção inferior a
mesma, onde a inclinação é, praticamente, mantida.

Figura 9. Perfil modificado (proposta)

Os resultados das análises computacionais para o novo perfil do talude, para os diferentes métodos são
apresentados na Figura 10. Encontrou-se um fator de segurança crítico de 1,470 para a metodologia de
Morgenstern-Price, 1,467 para a de Bishop, 1,466 para a de Fellenius e 1,463 para a de Janbu. Esses valores
mostram que, independente da metodologia de análise, o talude em estudo, após passar pelo processo de
retaludamento proposto, tornar-se-á estável, o que aprova a utilização dessa técnica.

95
Figura 10. Análise de estabilidade do talude final por diferentes metodologias. A = Morgenstern-Price, B =
Bishop, C = Fellenius e D = Janbu

Em função do espaço disponível para o artigo, não será demostrado aqui os dados obtidos no estudo
hidrológico e dimensionamento das canaletas. De forma simplificada, a Figura 11 mostra a localização de
instalação das canaletas na área em estudo, com indicação do sentido do fluxo de escoamento das águas, cujo
comprimento total será de 251,35 metros.

Figura 11. Disposição das canaletas de drenagem e sentido do fluxo de escoamento

Com o objetivo de proteger o talude em relação aos processos erosivos e permitir o controle da
revegetação, propõem-se a utilização de geossintéticos. A escolha da geomanta deve ser feita comparando-
se as especificações técnicas dos produtos existentes no mercado às especificações da Tabela 2, lembrando
que espessura e a porosidade são critérios essenciais para a escolha do geossintéticos.
De modo a obter rápido recobrimento superficial e eficiente recuperação da qualidade do solo, pela
ciclagem e fixação de nutrientes, recomenda-se também o uso de cobertura vegetal. Após estudo
bibliográfico das características de diversas espécies vegetais, optou-se por selecionar gramíneas e
leguminosas, adequadas para o local de estudo. As espécies selecionadas e suas características, dadas por
Pereira (2008), são mostrados na Tabela 6.

96
Tabela 6. Espécies a serem utilizadas para execução da cobertura vegetal e suas respectivas características .
Tempo Profundi
Hábito de
Nome Nome Altura Sistema de Tipo de dade de
Porte Crescime
Popular Científico (m) Foliar Formaç solo Plantio
nto
ão (cm)
Leguminosas
Crotalária Crotalaria Baixo 0,7 a 1 Subarbust Perene 2a3 Médio 2 cm
spectabilis ivo meses
Grama - Arachis Baixo 0,3 – 0,4 Rasteiro Perene 3a4 Médio a 0,5 a 1 cm
amendoim pintoii meses fértil
Soja perene Glycine Baixo - Rasteiro- Perene 4 meses Fértil e bem 1 a 2 cm
wiightii trepador drenado
Gramínias
Brachiarão Brachiaria Baixo 1,5 Touceiras Perene 3a4 Fértil 1 a 2 cm
brizantha meses

Bhachiária Brachiaria Baixo 0,7 Cespitoso Perene 3a4 Terras 1 a 2 cm


decumbens decumbens meses fracas
Capim - Melinis Baixo 1 ou mais Ereto Perene 3a4 Baixa 0,5 a 1 cm
gordura multiflora meses fertilidade
Grama – Paspalum Baixo 0,5 a 1 Ereto Perene 3a4 Baixa 0,5 a 1 cm
comprida dilatatum meses fertilidade
Grama – Paspalum Baixo - Rasteiro Perene 3a4 Baixa 1 a 2 cm
conquista vaginatum meses fertilidade
Vetiver Vetiveria Baixo 1,5 Touceiras Perene 2a3 Qualquer 5 a 10 cm
zizanioides meses tipo

A semeadura em taludes pode ser feita à mão - por coveamento ou a lanço - ou utilizando-se
maquinaria - por hidrossemeadura ou através de helicópteros. No espaçamento entre a trincheira de
ancoragem e a canaleta da berma, deve-se realizar semeadura a lanço da espécie Grama-amendoim (Arachis
pintoii), pois a semente desta tem proporções maiores do que as indicadas para serem hidrossemeadas. Já nas
faces inclinadas e nas trincheiras de ancoragem (após preenchimento com solo), hidrossemeadura com uma
massa pastosa composta por fertilizantes, adesivos líquidos, mulch, matéria orgânica, microrganismos e um
coquetel de sementes das espécies restantes.

4 Conclusões

Mediante resultados das análises computacionais de estabilidade, após caracterização física do local e
identificação dos parâmetros do solo, comprovou-se a necessidade de readequação do talude em estudo. A
solução recomendada compreendeu a aplicação da técnica de retaludamento associada à instalação de
canaletas de drenagem, geossintético e cobertura vegetal, a fim de estabilizar o talude e prevenir novos
processos de erosão.
Conforme apresentado ao longo do trabalho, o retaludamento caracterizou-se pela construção de uma
berma de um metro de largura, exatamente no meio do talude, pela remoção de solo da porção superior a
berma, reduzindo a declividade para 1:0,5 (H:V), e pela mínima adição de solo a porção inferior a berma,
praticamente, mantendo a declividade. Quanto ao sistema de drenagem recomendou-se o uso de canaletas
pré-moldadas de meia cana em concreto, com cinquenta centímetros de diâmetro, instaladas nas delimitações
da área (crista, sopé e lateral do talude) e na berma, com uma declividade mínima de 2%, de modo a
conduzir o fluxo de água para a região mais baixa. A instalação da geomanta deve ser feita em toda a
extensão do talude, seguida pela semeadura a lanço de Grama-amendoim na berma e pela hidrossemeadura
de um coquetel de gramíneas e leguminosas no restante do talude.
Sugere-se que em trabalhos futuros seja incluída a verificação da análise da estabilidade considerando
a existência de linha piezométrica, pois o mesmo interfere intensamente nas condições de segurança do
talude, o que poderá exigir a utilização de estruturas de contenção e de outros sistemas de drenagem que não
foram dimensionados nesse trabalho. Além disso, é de grande interesse que se realize a sondagem da área,
para melhor caracterizar o perfil do solo, e a execução dos ensaios de resistência ao cisalhamento para que a
determinação mais precisa dos parâmetros, que nesse trabalho foram estimados em função da classificação
por pesquisa bibliográfica.

97
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Alheiros et al. (2004) Manual de Ocupação dos Morros da Região Metropolitana do Recife. Fundação de
Desenvolvimento Municipal – FIDEM. Recife: Ensol, 2004a. Parte D, cap. 10. Disponível em:
<http://www2.condepefidem.pe.gov.br/c/document_library/get_file?uuid=f4c9adca-a36a-46f9-b610-
e56ef00da3ca&groupId=19941>. Acesso em: 13 maio 2013.
Almeida, G. C. P. de. (2011). Caracterização física e Classificação dos Solos. Juiz de Fora: Universidade
Federal de Juiz de Fora - Faculdade de Engenharia – Departamento de Transportes, 2011.
Apostila de Ensaios Laboratoriais da disciplina Introdução a Ciência dos Solos. Itajubá: Universidade
Federal de Itajubá - Laboratório de Solos, [s.d.].
Associação Brasileira de Normas Técnicas (2003). NBR 12553. Geossintéticos – Terminologia. Rio de
Janeiro.
Associação Brasileira de Normas Técnicas (1986). NBR 6457. Amostras de Solo – Preparação para ensaios
de compactação e ensaios de caracterização. Rio de Janeiro.
Associação Brasileira de Normas Técnicas (1984). NBR 6459. Solo – Determinação do Limite de Liquidez.
Rio de Janeiro.
Associação Brasileira de Normas Técnicas (1995). NBR 6502. Rochas e solos. Rio de Janeiro, 1995.
Associação Brasileira de Normas Técnicas (1984). NBR 7180. Solo – Determinação do Limite de
Plasticidade. Rio de Janeiro.
Associação Brasileira de Normas Técnicas (1984). NBR 7181. Solo – Análise Granulométrica. Rio de
Janeiro.
Associação Brasileira de Normas Técnicas (2009). NBR 11682. Estabilidade de encostas. Rio de Janeiro.
Carvalho, P. A. S. de (coord) (1991). Manual de Geotecnia: Taludes de Rodovias: Orientação para
diagnóstico e soluções de seus problemas. São Paulo: Instituto de Pesquisas Tecnológicas, 1991.
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do Brasil - Levantamento da Geodiversidade. 2010.
Geo-Slope 2012. Slope Stability Analysis - SLOPE/W 2012 (traduzido). Disponível em: <http://www.geo-
slope.com/products/slopew.aspx>. Acesso em: 24 setembro 2013.
Moraes, A. C. (2012) Desenvolvimento de Projeto Executivo para Recuperação de Área Degradada
(trabalho final de graduação). Itajubá (MG): Universidade Federal de Itajubá, 2012.
Pereira, A. R. (2008) Como selecionar plantas para áreas degradadas e controle de erosão. 2.ed. Belo
Horizonte: Editora FAPI, 2008.
Vertematti, J.C. (2004) In: Vertematti, J.C. (Org). Manual Brasileiro de Geossintéticos. São Paulo: Blucher,
2004. Cap 4, p.63-64.

98
Retro-análise de Estabilidade de Talude com Uso de Modelos
Numéricos na BR116 – MAGÉ/RJ
Camila Amorosini Condorelli
Mestranda, COPPE-UFRJ, Rio de Janeiro, Brasil, camila.condorelli@coc.ufrj.br

Maria do Carmo Reis Cavalcanti


Professora Associada A, COPPE-UFRJ, Rio de Janeiro, Brasil, carminhacavalcanti@poli.ufrj.br

Cláudio Fernando Mahler


Professor Titular, COPPE-UFRJ, Rio de Janeiro, Brasil, mahler@coc.ufrj.br

RESUMO: Problemas que envolvem movimentos de massa em taludes de cortes e aterros de estradas são
frequentes nas rodovias brasileiras, em especial quando ocorre incidência de chuvas intensas. Problemas
econômicos e ambientais são gerados devido a falhas na previsão dos deslizamentos, podendo ser atribuídos
à complexidade dos mecanismos de ruptura e à falta de conhecimento acerca dos mesmos. Visando um
melhor entendimento da fenomenologia do problema, foram realizadas retro-análises da estabilidade de um
talude sinistrado no km 117+175m da BR116/RJ, próximo a cidade de Magé comparando os resultados por
diferentes métodos de cálculo em equilíbrio limite com os obtidos para o real estado de tensões por
elementos finitos. Os resultados indicam serem os métodos de Bishop e Morgernstern-Price suficientes nos
estudos de estabilidade e que é possível ter boa proximidade entre resultados por Elementos Finitos e
Equilíbrio Limite. Os métodos de Fellenius e Janbu na busca automática de superfície crítica resultaram em
massa instabilizada de geometria incompatível com a efetivamente ocorrida.

PALAVRAS-CHAVE: Modelos numéricos, retro-análise, estabilidade, equilíbrio limite, elementos finitos

ABSTRACT: Problems concerning mass movements are quite common along the Brazilian highways,
especially after intense raining. Environmental, and economical problems result from failing in the prediction
of mass movements, what may be caused by the complexity and limited knowledge about its mechanisms.
Aiming to explore such mechanisms, back-analyses of a slope failure were carried out making use of the
usual limit equilibrium methods as well as evaluations based on finite elements stress-strain analysis of the
critical sliding surface. The studied accident took place at km 117 + 175m of the BR116/RJ road, close to the
city of Magé. The study indicate that Bishop and Morgenstern Methods adequately represent the safety factor
and that finite elements analysis and limit equilibrium present similar results. The methods of Fellenius and
Janbu, in the automatic search of critical surface, failed to determine the real geometry.

KEYWORDS: Numerical models, back analyses, slope stability, limit equilibrium, finite elements method.

1 Introdução

Problemas que envolvem movimentos de massa em taludes de cortes e aterros de estradas são
frequentes nas rodovias brasileiras, em especial quando da incidência de chuvas intensas. Problemas
econômicos e ambientais são gerados devido a falhas na previsão dos deslizamentos, podendo ser atribuídos
à complexidade dos mecanismos de ruptura e à falta de conhecimento acerca dos mesmos.
Visando um melhor entendimento da fenomenologia do problema, foram realizadas retro-análises da
estabilidade de um talude sinistrado no km 117+175 da BR116/RJ, próximo a cidade de Magé comparando
os resultados de fator de segurança obstidos por diferentes métodos de cálculo em equilíbrio limite com os
obtidos utilizando elementos finitos com base no estado de tensões ao longo da superfície de ruptura.

99
2 Área de Estudo

O local de estudo situa-se no compartimento da Baixada da Baía de Guanabara (km104 ao km144), na


unidade pé da Serra e Baixada, dentro do seguimento geológico-geotécnico Prazeres (km 116+115 ao km
118+600). Á região é caracterizada pela predominância de planícies colúvio-alúvio-marinhas, havendo
colinas, morrotes e morros baixos isolados (formas de relevo residuais). Próximo às escarpas serranas as
superfícies planas da baixada são substituídas por um relevo de colinas, morros, rampas de colúvio ou
cortadas pelas planícies fluviais, que drenam as escarpas da Serra dos Órgãos. Nesta região, bastante
suscetível ao intemperismo e processos erosivos, é comum observar movimentos de massa, normalmente
mobilizando rupturas rotacionais que ocorrem em maciços com perfil composto por pacotes espessos e
pouco heterogêneos de solos residuais.
O caso analisado neste trabalho é de um talude de corte localizado no km 117+750m da rodovia
BR-116/RJ, no trecho que liga Gapimirim/RJ a Magé/MG. A Figura 1 apresenta croqui do rompimento e a
Figura 2 apresenta relevo atual do talude após o rompimento.

Figura 1. Croqui do rompimento. (ANTT, 2017) Figura 2. Inspeção do talude após rompimento
(foto registrada em 2012). (ANTT, 2017)

3 Metodologia

No talude em estudo se observam camadas bem definidas de diferentes litologias, cujos dados foram
obtidos no relatório de estudo da região, disponibilizado à população pela ANTT(2017), tais como perfil
geológico-geotécnico, parâmetros dos solos (ângulo de atrito, coesão e peso específico) e os boletins de
sondagem utilizados nas correlações empíricas para determinação do módulo de elasticidade e coeficiente de
Poisson.
As análises de estabilidade foram desenvolvidas utilizando os módulos Slope/W e Sigma/W do pacote
GeoStudio-2012. No Slope/W, foram efetuadas análises por equilibrio limite e avaliado o efeito das
simplificações nos métodos de Fellenius, Janbu, Bishop Simplificado e Morgenstern-Price em comparação
aos resultados obtidoscom base em análises de tensão x deformação por elementos finitos no módulo
Sigma/W.

4 Modelagem e Escolha dos Parâmetros

4.1 Geometria do Problema

O perfil geológico-geotécnico do talude estudado foi obtido do sistema de gerência


geológico-geotécnico de encostas e taludes da rodovia BR-116/RJ – km2 ao km144,5 – FASE 3, sendo
apresentado na Figura 3.

100
Figura 3. Levantamento topográfico km 117+175m. (ANTT, 2017)

4.2 Definição dos parâmetros

Os parâmetros dos solos utilizados neste trabalho foram obtidos no estudo de retroanálise do talude
disponibilizado pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT, 2017), no qual foram
disponibilizados os valores de NSPT, peso específico, coesão e ângulo de atrito.
O módulo de elasticidade (E) do solo foi estimado a partir de uma correlação com o valor NSPT para
solos residuais de origem gnáissica, como os existentes na região estudada. (SANDRONI, 1991)

1,4
𝐸 = 0, 6𝑁 (1)

O valor do coeficiente de Poisson (𝜈), conforme Teixeira & Godoy (1998), varia em geral entre 0,1 e
0,49, tendo sido adotado o valor de 0,3 para solos siltosos-arenosos.
Os parâmetros estabelecidos para análise são apresentados na Tabela 1.

Tabela 1. Tabela resumo das camadas e parâmetros adotados para o km 117+175m.


γ c’ E
Tipo de solo φ (o) 𝜈
(kN/m³) (kPa) (MPa)
Silte argilo-arenoso com SPT~8 18 8 30 11 0,3
Silte arenoso com SPT>20 20 27 34 40 0,3

4.3 Metodologia das análises

Para a definição do modelo computacional, nas análises de equilíbrio limite, foi verificado o efeito da
quantidade mínima de fatias e a variação do número de entrada e saída. Para as análises em elementos
finitos, foi realizada a avaliação da discretização e do efeito de borda, simulando uma expansão do talude
estudado.
Após o ajuste do modelo tanto para as análises em equilíbrio limite como por elementos finitos, em
ambas as simulações, foram realizadas análises de busca automática da superfície crítica de ruptura bem
como análises com a superfície de ruptura fixa para fator de segurança em torno de 1,5 uma vez que todos os
métodos convergem para a unidade na ruptura.
A Figura 4 apresenta um fluxograma das análises para melhor visualização da organização do
trabalho.

101
Figura 4- Fluxograma de sequência do trabalho.

5 Análises Preliminares

5.1 Avaliação do efeito da variação do número de fatias

Para a determinação do número mínimo de fatias a ser considerado nas análises finais, foi empregado
o método de análise em equilíbrio limite mais rigoroso (Morgenstern-price) variando o número mínimo de
fatias entre 15, 30 e 60 fatias.
Em todas as três análises foi obtido exatamente o mesmo fator de segurança de 1,043 e a mesma
superfície de crítica de ruptura. Já na avaliação da resistência mobilizada observou-se, conforme apresentado
na Figura 5, que com o aumento do número de fatias houve um aumento na precisão da curvatura: dessa
forma, foi adotado no estudo um número mínimo de 30 fatias já que sua curva mostra-se muito similar à de
60 fatias e demanda um menor esforço computacional.

Figura 5. Variação dos Números de Fatias (15,30 e 60 fatias). Gráfico resistência mobilizada por fatia.

5.2 Avaliação do efeito da variação do número de entrada e saída

Para escolha da quantidade de pontos de entrada e saída foram realizadas 4 análises tendo como
referência o modelo rigoroso de Morgenstern-Price. Os testes realizados foram 100/50, 50/25, 25/15, 15/8
como quantidade de pontos de entrada e saída respectivamente. Para as três primeiras situações foi obtido
exatamente o mesmo valor de FS de 1,043, porém quando reduzido para 15 pontos de entrada e 8 de saída

102
houve uma variação do FS para 1,062. Entretanto observou-se que quanto maior a quantidade de superfícies,
melhor a qualidade do mapa de FS. Dessa forma optou-se por utilizar 100 pontos de entrada e 50 pontos de
saída nas análises comparativas.

5.3 Avaliação do efeito da Malha

Foram efetuadas análises utilizando malhas com elementos de 2,5m, 1,5m, 1m e 0,5m visando avaliar
o efeito da discretização tanto nos deslocamentos do talude como na região plastificada e superfície crítica de
ruptura.
A Figura 6 mostra que quanto maior a discretização, maior a região com deslocamentos e
plastificação, geometricamente semelhantes à massa mobilizada na ruptura do talude destacada em lilás.
Quanto ao fator de segurança, o modelo de 1,0m de malha quando comparado com o modelo com
discretização de 0,5m de malha, apresentou variação de apenas 0,28%, o que pode ser considerado
desprezível, optando-se então pela malha de 1,0m que demanda menor esforço computacional.

FATOR DE SEGURANÇA PLASTIFICAÇÃO DESLOCAMENTOS


M
A
L
H
A
:
2
,
5
m
M
A
L
H
A
:
1
,
5
m
M
A
L
H
A
:
1
,
0
m
M
A
L
H
A
:
0
,
5
m
Figura 6. Efeito da variação do tamanho da malha no FS, Plastificação e deslocamento.

103
5.4 Avaliação do efeito da expansão do modelo

Para avaliar o efeito de borda, o modelo foi expandido em 10 metros para esquerda, direita e para
baixo. O valor do FS variou em 0,46% na comparação dos dois modelos (modelo expandido – 1,094; modelo
reduzido – 1,089). A Figura 7 apresenta a comparação do modelo expandido e do modelo reduzido.
No gráfico de deslocamento, o modelo expandido apresentou maior deformação e plastificação,
geometricamente similar à massa mobilizada na ruptura, tendo sido, portanto, o adotado nas análises.

Figura 7. Efeito da dimensão do modelo no FS, plastificação e deslocamento.

5.5 Análise de resultados

A partir das análises preliminares definiu-se o seguinte modelo computacional: Modelo expandido
com 30 fatias, 100 pontos de entrada, 50 pontos de saída e com discretização de 1,0m.

5.5.1 Comparação entre métodos das fatias x elementos finitos (superfície crítica)

Foram realizadas análises de busca automática das superfícies críticas pelos Métodos de Equilíbrio
Limite: Morgenstern-Price, Bishop, Janbu e Fellenius assim como a partir da análise por elementos finitos.
Os métodos de Morgenstern-Price e Bishop apresentaram superfície crítica similar à obtida por
elementos finitos, iniciando no topo do talude e finalizando no pé. Entretanto Bishop e Fellenius
apresentaram massa mobilizada de menor volume com superfície crítica iniciando-se na face do talude
(terceira bancada) e não na crista como efetivamente ocorrido. Adicionalmente foi possível perceber, nos
mapas de fator de segurança que à medida que os valores de FS aumentam, os métodos de equilíbrio limite
se tornam mais conservativos na distribuição do FS em relação ao método de elementos finitos. Na Figura 8
é possível perceber a diferença na espessura da faixa azul (FS>1,36). Na Tabela 2 são apresentadas as
variações dos fatores de segurança em relação ao resultado pelo método de elementos finitos.

104
Figura 8. Efeito da variação do FS e superfície crítica entre os métodos de fatia.

Tabela 2. Fator de Segurança em cada modelo e sua variação comparado ao MEF (SIGMA/W Stress)
Método de análise FS Variação do FS
(Valor Ref – Valor comparado) /Valor Ref.
Morgenstern-Price 1,043 4,66%
Bishop 1,044 4,57%
Janbu 0,999 8,68%
Fellenius 1,010 7,68%
SIGMA/W Stress 1,094 -

5.5.2 Comparação entre métodos das fatias x elementos finitos (superfície fixa de ruptura)

Para análise com a superfície fixa de ruptura foi escolhido o valor de FS próximo a 1,5, visto que
quando na proximidade da ruptura todos os métodos estudados convergem para FS igual a 1. Foram
realizadas 4 diferentes análises através dos métodos Morgenstern-Price, Bishop, Janbu e Fellenius, além de
uma análise em elementos finitos, conforme apresenta a Figura 9.
Quando comparado ao modelo de elementos finitos, Bishop e Mogenstern-Price apresentaram a menor
variação de FS, 0,73% e 1,13% respectivamente. Já os outros métodos apresentaram valores de FS
mostraram-se 7% inferiores. As variações do FS estão apresentadas na Tabela 3.

Figura 9. Efeito da variação do FS entre os métodos de fatia com a superfíe de ruptura fixa.

Tabela 3. Fator de Segurança encontrado com a superfície efetiva de ruptura em cada modelo e sua variação
comparado ao MEF (SIGMA/W Stress).

105
Método de análise FS Variação do FS
(Valor Ref – Valor comparado) /Valor Ref.
Morgenstern-Price 1,493 1,13%
Bishop 1,521 -0,73%
Janbu 1,344 10,99%
Fellenius 1,391 7,88%
SIGMA/W Stress 1,510 -

A Figura 10 apresenta gráficos de resistência mobilizada, esforço normal e resistência cisalhante na


base das fatias para os diferentes métodos estudados juntamente com o ângulo na base de cada fatia. Nos
gráficos é possível perceber no trecho inicial de 0 a 17m valores superiores de todas as grandezas para o
MEF, o que pode ser justificado por ser, neste trecho, inclinação na fatia muito próxima a horizontal (-10° à
10°), preponderando a resistência de atrito que depende do esforço normal no caso superior ao
simplificadamente determinado a partir do peso da fatia nos métodos de equilíbrio limite. Analogamente para
fatias mais verticalizadas, o MEF mostra resistência mobilizada inferior ao MEL.

Figura 10. Gráficos de comparação de valores entre os métodos de fatias e elementos finitos com a superfície
de ruptura definida.

6 Conclusões

Dos resultados obtidos com os diferentes métodos de equilíbrio limite e elementos finitos pode-se
concluir que os métodos de Bishop e Morgenstern-Price conduziram a resultados muito próximos dos
obtidos por elementos finitos. Mesmo possuindo boa representatividade, ambos os métodos por equilíbrio
limite apresentaram valores mais conservativos na distribuição de FS em relação à análise por elementos
finitos. Nos gráficos de resistência mobilizada, cisalhante e esforço normal na base da fatia é possível
perceber uma diferença significativa no trecho inicial devido a horizontalização e final devido à
verticalização das fatias.

AGRADECIMENTOS

106
O trabalho tem como base um projeto de pesquisa financiado pelo Recurso de Desenvolvimento
Tecnológico (RDT) disponibilizado pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) à
Concessionária Rio-Teresópolis (CRT) e ao público.
O primeiro autor agradece à CAPES pela bolsa de estudo. Os autores à FAPERJ, à UFRJ pelo apoio. O
terceiro autor agradece ainda o apoio do CNPq pela bolsa de produtividade.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Agência Nacional De Transportes Terrrestes (ANTT) (2017) Sistema de Gerência Geológico-Geotécnico De


Encostas E Taludes Da Rodovia BR-116/RJ – km 2 ao km 144,5 FASE 3. Rio de Janeiro.
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Geotecnia, p. 1771-1788.
Teixeira, A. I.; Godoy, N. S. (1998) “Análise, Projeto e Execução de Fundações Rasas”. In: HACHICH, W.
et al Fundações: Teoria e prática. 2nd ed, Pini, São Paulo, p. 227–264.

107
Avaliação Do Desempenho Do Solo Após A Adição De Resíduos
Da Construção E Fibras De Sisal
Suyanne Monteiro de Almeida
Mestranda em Engenharia Civil, UPE, Recife, Brasil, suyannemonteiro@gmail.com

Kalinny Patrícia Vaz Lafayette


Professora Associada, UPE, Recife, Brasil, klafayette@poli.br

Luciana Cássia Lima da Silva


Mestranda em Engenharia Civil, UPE, Recife, Brasil, lcls@poli.br

Flaviana Gomes Alves da Silva


Mestranda em Engenharia Civil, UPE, Recife, Brasil, fgas@poli.br

Rayane Gabriella Pereira da Silva


Mestranda em Engenharia Civil, UPE, Recife, Brasil, rgps@poli.br

RESUMO: A ocupação desordenada do espaço urbano, principalmente em regiões consideradas


naturalmente como áreas de risco, reduz a capacidade de resistência do solo e eleva a carga no terreno,
potencializando o risco de deslizamentos. O objetivo desse artigo consiste em avaliar o comportamento
geotécnico do solo após a adição de Resíduos da Construção Civil (RCC) e fibras de sisal, em um solo de
uma encosta localizada no município de Recife/PE, e que teve um deslizamento em 2019. A análise temporal
do local foi realizada, destacando a presença ao longo do tempo, entre 1975 e 2019, das coberturas de
mancha urbana, vegetação, solo exposto e sistema viário. Em seguida, foram realizados ensaios de
caracterização física e mecânica para os compósitos formados por solo; solo e resíduo (30%); solo, resíduo
(30%) e fibra (0,25%); e solo e fibra (0,25% e 0,50%). Os resultados mostraram que a vegetação reduziu
83,11% ao longo do tempo, e a mancha urbana cresceu drasticamente, chegando a ocupar 75% da área de
estudo em 2019. A caracterização física classificou o solo como uma argila arenosa de baixa plasticidade. O
ensaio de compactação apresentou aumento da umidade ótima e redução da densidade seca máxima para as
misturas que apresentaram maiores teores de fibras. O ensaio de compressão simples com período de cura de
7 dias revelou um aumento na resistência do material, após a adição de fibra e agregado reciclado. Para a
mistura de solo e fibra (0,50%) o aumento foi de 36,50%, em relação a mistura formada apenas por solo,
enquanto que para o compósito formado por solo, agregado reciclado (30%) e fibra (0,25%), o aumento foi
de 26,55%.

PALAVRAS-CHAVE: Urbanização; Impactos Ambientais; Reforço do Solo.

ABSTRACT: The disorderly occupation of urban space, especially in regions considered naturally as areas
of risk, reduces the resistance capacity of the soil and increases the load on the ground, increasing the risk of
landslides. The objective of this article is to evaluate the geotechnical behavior of the soil after the addition
of Civil Construction Waste (RCC) and sisal fibers, in a soil of a slope located in the municipality of
Recife/PE, which had a landslide in 2019. A temporal analysis of the site was carried out, highlighting the
presence over time, between 1975 and 2019, of urban sprawl, vegetation, exposed soil and road system
coverage. Then, physical and mechanical characterization tests were carried out for the composites formed
by soil; soil and residue (30%); soil, residue (30%) and fiber (0.25%); and soil and fiber (0.25% and 0.50%).
The results showed that the vegetation reduced by 83.11% over time, and the urban area grew dramatically,
reaching 75% of the study area in 2019. The physical characterization classified the soil as a sandy clay of
low plasticity. The compaction test showed an increase in the optimal moisture content and a reduction in the
maximum dry density for the mixtures that presented higher fiber contents. The simple compression test with
a curing period of 7 days revealed an increase in the strength of the material, after the addition of fiber and
recycled aggregate. For the mixture of soil and fiber (0.50%) the increase was 36.50%, in relation to the
mixture formed only by soil, while for the composite formed by soil, recycled aggregate (30%) and fiber (0
.25%), the increase was 26.55%.

KEYWORDS: Urbanization; Environmental impacts; Soil reinforcement.


108
1 Introdução
A inovação e o avanço tecnológico são elementos que impulsionam as diversas transformações que
vêm ocorrendo nos diversos setores da sociedade, incluindo os meios de produção e consumo (SANTOS,
2020). A indústria de materiais da construção civil atua como uma espécie de motor para a economia de
muitos países, destacando o uso de tijolos de origem argilosa e do cimento, como materiais fundamentais para
o assentamento de casas em todo o mundo (YARAS et al., 2021).
Entretanto, apesar de trazer inúmeros benefícios para a sociedade, a construção civil é uma das
indústrias que mais impacta ao meio ambiente, em decorrência da alta quantidade de matéria prima
consumida e da grande geração de Resíduos da Construção Civil (RCC) (MAGAGNIN FILHO, 2015). Para
Tavares et al. (2018), o aumento da geração dos resíduos da construção tende a aumentar com o avanço do setor,
principalmente devido ao surgimento de novos empreendimentos e pela execução de reformas e reparos.
Um dos grandes problemas ligado a essa temática consiste na escassez de áreas aptas para uso como
aterro para esses resíduos gerados nas obras de construção, demolição e manutenção de estruturas. Dessa
forma, cada vez mais as organizações, o poder público e as sociedades civis vêm se mobilizando em torno
desses problemas ambientais que prejudicam a sociedade atual e podem comprometer as gerações futuras
(VELARDO et al., 2021).
O gerenciamento de resíduos é uma ferramenta bastante presente nas discussões políticas, ambientais,
acadêmicas e sociais, sendo utilizado como um importante instrumento de planejamento urbanístico
(SANTOS; MARCHESINI, 2018). Diante desse cenário, a reciclagem de resíduos em qualquer fase da
construção é essencial para permitir o desenvolvimento sustentável do setor, contribuindo para a redução do uso
de recursos naturais e da poluição ambiental (CORDON; CAGNONI; FERREIRA, 2019).
Outro problema urbano são os deslizamentos de encostas, que são potencializados pela ocupação
antrópica em locais considerados naturalmente como áreas de risco, (OLIVEIRA et al., 2015). Para
Mantovani (2016), a urbanização acelerada ao longo dos anos mostra o quanto o espaço urbano se encontra
despreparado para absorver essa demanda populacional crescente nos itens básicos de infraestrutura.
A junção do descarte de resíduos em locais inadequados representa uma preocupação mundial com
diversos impactos negativos, do ponto de vista social, ambiental e econômico. Por isso são fundamentais
alternativas de reciclagem para o desenvolvimento sustentável (YUAN, 2017).
Sendo assim, o presente trabalho busca viabilizar uma técnica de reforço de solo em uma encosta
localizada na cidade do Recife-PE, que sofreu um deslizamento em 2019, e trouxe inúmeros danos sociais,
econômicos e ambientais ao local, além de acarretar na morte de um dos moradores (APRÍGIO, 2019).

2 Caracterização da Área

A área escolhida para estudo está localizada no município de Recife/PE, no bairro de Dois Unidos
com coordenadas 7º 59’ 52’’ S e 34º 54’ 57’’ W, e faz parte da Região Político Administrativa II – RPA 2,
conforme a Figura 1. O bairro de Dois Unidos apresenta uma extensão territorial de 3,12 km² com 32.805
habitantes (PREFEITURA MUNICIPAL DO RECIFE, 2021).

Figura 1. Localização da área


A economia da cidade pode ser representada pelo setor terciário, englobando serviços, comércio e
administração pública, (PREFEITURA MUNICIPAL DO RECIFE, 2021).
Na encosta ocorreu um deslizamento em julho/2019 devido às fortes chuvas do período. O acidente
apresentou como principal agravante a ocupação irregular em uma área de risco. Foi observada a ausência de
um sistema de esgotamento sanitário adequado, a supressão da cobertura vegetal, a deposição de resíduos em

109
locais impróprios, o adensamento populacional e os cortes irregulares realizados no terreno.

3 Metodologia

3.1 Análise Temporal

A análise temporal revelou as características da dinâmica de ocupação da encosta, possibilitando uma


compreensão mais efetiva a respeito da influência dessa ocupação no processo de estabilidade do solo. Sendo
assim, foi possível avaliar a evolução da ação antrópica no local, destacando principalmente a presença de
uma maior degradação ambiental ao longo dos anos.
A análise temporal foi realizada através da elaboração de mapas com o destaque para quatro principais
tipologias de coberturas encontradas, sendo elas: vegetação, representada pelas árvores, gramados ou plantas;
mancha urbana, correspondente aos locais que apresentam moradias ou superfícies cimentadas que
contribuem para o escoamento superficial; solo exposto, correspondente as áreas sem vegetação ou
construção; e sistema viário, representando as vias de trânsito do local.
Aortofotocartapara o ano de 1975 foi obtida junto a Agência Estadual de Planejamento e Pesquisas de
Pernambuco – CONDEPE/FIDEM, na escala de 1:10.000, com curvas de nível equidistantes em 5 metros.
Com o auxílio do Google Earth, foi obtida a imagem da área em 2019.
A vetorização das imagens foi realizada através do software livre denominado QGIS versão 10.14, que
consiste numa multiplataforma do Sistema de Informação Geográfica (SIG). O software permite a edição,
análise e visualização de dados, formando mapas com diversas camadas em diferentes projeções (SANTOS+,
2020).

3.2 Programa experimental

3.2.1 Materiais

Foi coletado cerca de 150 kg de solona encosta de estudo. O agregado reciclado (aproximadamente
250kg) foi cedido pela Usina de Beneficiamento de Resíduos da Construção Civil – Ciclo Ambiental,
localizada no município de Camaragibe-PE. As fibras de sisal foram beneficiadas manualmente, adotando um
comprimento de 30 mm e escolhidas por ser um material importante para a preservação ambiental, além de
apresentar custo reduzido, fácil obtenção e boas propriedades técnicas.

3.2.2 Definição dos compósitos e ensaios

Os compósitos foram constituídos de solo, agregado reciclado e fibras de sisal em diferentes


percentuais (solo; solo+AR 30%; solo+AR30%+F0,25; Solo+F0,50; AR100%).

3.2.3 Ensaios de caracterização física e mecânica

O ensaio de caracterização física foi realizado seguindo a diretriz da NBR 7181/2016e para os ensaios
de caracterização mecânica foram utilizadas as normas da NBR 7182/2016 e a NBR 12770/1992.

4 Resultados

4.1 Análise temporal do uso e ocupação do solo

Os resultados quantitativos da análise temporal para a encosta nos anos de 1975 e 2019 com as taxas de
variação e a evolução do percentual de cada tipologia de solo exposto, mancha urbana, vegetação e sistema
viário são mostrados na Tabela 1.
É possível observar um crescimento elevado no percentual da área de mancha urbana e uma redução
considerável no percentual de vegetação. Esse comportamento ao longo dos anos acaba por potencializar o
risco de acidentes. As Figuras 2 e 3 apresentam os resultados do sensoriamento remoto.
A modificação na área de mancha urbana é perceptível ao longo dos anos, já que a mesma praticamente
não existia no ano de 1975, e em 2019 passa a ocupar 75% da área de estudo. Essa modificação espacial está
relacionada com o processo de urbanização, com um aumento das construções. O sistema viário também
apresentou um acréscimo de 51,52% ao longo dos anos em decorrência do processo de urbanização e
necessidade de criação de novas rotas de acesso.
110
Tabela 1. Dados do uso e ocupação do solo para os anos de 1975 e 2019.
Área (m²) % da área de estudo Taxas de variação
Classe 1975 2019 1975 2019 1975-2019
(%)
Solo exposto 10000 7400 5,55 4,11 (-) 26,00
Mancha Urbana 0 135000 0 75,00 -
Vegetação 163400 27600 90,78 15,33 (-) 83,11
Sistema viário 6600 10000 3,67 5,56 (+) 51,52
Total 180000 180000 100 100

A área referente a solo exposto apresentou uma redução de 26% ao longo dos anos, passando de 10000
m² ocupados em 1975 para 7400 m² no ano de 2019. A vegetação foi a tipologia mais afetada pelo tempo,
apresentando uma redução de 83,11% de 1975 até 2019.

Figura 2. Uso e ocupação da área da encosta em 1975.

Figura 3. Uso e ocupação da área da encosta em 2019.

4.2 Granulometria

A análise granulométrica foi realizada para o solo, o RCC e os compósitos com teores de resíduos de
30% e 50%. A Figura 4 apresenta as curvas granulométricas obtidas para cada compósito e a Tabela 2 mostra
111
os percentuais de cada fração granulométrica obtida com a classificação desses materiais de acordo com o
Sistema Unificado de Classificação dos Solos (SUCS).
O solo foi classificado pelo SUCS como uma argila arenosa com baixa plasticidade (CL), enquanto que
o resíduo foi classificado como uma areia bem graduada (SW)..
A relação de silte/argila também é um parâmetro importante na avaliação do comportamento do
material frente a ação do intemperismo e na sua vulnerabilidade à erosão (SANTOS; ZARONI, 2019) e este
indicador aumentou com a adição do resíduo, mostrando a formação de um material com melhor desempenho
na atuação deletéria de agentes externos.

Figura 4. Curvas granulométricas dos materiais


Tabela 2. Granulometria do solo e classificação (SUCS).
Materiais Frações do solo (%) Relação Classificação SUCS
Argila Silte Areia Pedregulho silte/argila
Solo Argila arenosa – CL
38,30 9,70 50,26 1,74 0,25
Areia argilosa – SC
S7R3* 31,12 8,88 54,02 5,98 0,28
Areia argilosa – SC
S5R5** 23,50 8,50 59,09 8,91 0,36
Areia bem graduada
RCC 3,50 10,60 69,51 16,39 3,03
SW
Obs: S7R3* ( 70% solo+ 30% resíduo); S5R5**( 50% solo+ 50% resíduo)

4.3 Compactação

No ensaio de compactação a adição de agregado reciclado no teor de 30% nas misturas, aumentou a
densidade seca máxima e reduziu a umidade ótima, conforme apresentado na Tabela 3. De acordo com
Macedo (2013), a presença de materiais granulares, caso sejam compactados, fornecem um maior peso
específico e menores umidades ótima, em decorrência de uma melhor acomodação das partículas, originando
materiais resistentes, compactos e duráveis.

Tabela 3. Umidades ótimas e pesos específicos dos materiais


Materiais Wot γs (g/cm³)
(%)
Solo (100%) 18,35 1,680
Solo + AR 30% (SR30) 15,93 1,763
Solo + AR 30% + Fibra 0,25% (SR30F0,25) 17,01 1,756
Solo + Fibra 0,25% (SF0,25) 19,16 1,653
Solo + Fibra 0,50% (SF0,50) 19,78 1,645
AR (100%) 13,23 1,790
AR: Agregado reciclado (RCD)

4.4 Compressão simples


A determinação da resistência à compressão simples (RCS) foi realizada para o período de cura de 7
dias, conforme a Tabela 4 e Figura 5.
112
Tabela 4. Valores de resistência a compressão simples das misturas
Amostra 7 dias
(KPa)
Solo 211,80
Solo + AR 30% (SR30) 257,20
Solo + AR30% + fibra 0,25% (SR30F0,25) 268,03
Solo + fibra 0,25% (SF0,25) 278,22
Solo + fibra 0,50% (SF0,50) 289,15
A resistência máxima dos compósitos formados por resíduo e fibra foi maior que a resistência
encontrada apenas para o solo, e o compósito que apresentou melhor resultado foi o formado por solo e fibra
no teor de 0,50%, promovendo um acréscimo de resistência do material em 36,50%, quando comparadas ao
solo original. De acordo com Silveira (2019), a adição de fibras ao solo permite a formação de um intercepto
de coesão aparente e/ou aumenta o ângulo de atrito interno do material, sendo possível alcançar resultados
favoráveis, principalmente de resistência e ductibilidade dos compósitos, após a junção dos componentes.
Foi possível verificar que o compósito formado por solo e 30% de agregado rompeu antes mesmo de
atingir uma deformação de 4mm, indicando um material que apresenta comportamento frágil, com planos de
ruptura na superfície dos corpos de prova.

Figura 5. Curvas de compressão simples das misturas com período de cura de 7 dias

O compósito formado por solo e fibra no teor de 0,50% atingiu a deformação de 7mm antes de romper,
e continuou deformando após a aplicação de tensões inferiores. Esse comportamento é observado em
materiais dúcteis, em que as falhas ocorrem de forma mais lenta. Do ponto de vista geotécnico, esse
comportamento de deformação gradativa é mais interessante em encostas para a prevenção de acidentes,
devido a permitir um maior tempo para intervenções técnicas.

5 Conclusões

A análise temporal através da vetorização das ortofotocartas revelou que o percentual de vegetação
reduziu 83,11% ao longo dos anos, enquanto que o percentual de mancha urbana aumentou
consideravelmente, passando a ocupar 75% da área de estudo em 2019.
Com os ensaios de caracterização físicafoi identificado que o solo é uma argila arenosa de baixa
plasticidade, enquanto que o agregado reciclado foi classificado como uma areia bem graduada.
O ensaio de compactação mostrou um aumento de umidade ótima e redução da densidade seca dos
materiais que apresentaram maior teor de fibras. Esse fato pode ser explicado pela capacidade das fibras em
reter umidade no solo. A menor umidade ótima foi obtida para o agregado reciclado isolado, e a maior
correspondeu a mistura de solo e fibra no teor de 0,50%.
O ensaio de compressão simples apresentou eficácia para as misturas com adição de resíduo e fibras
no solo. O material que apresentou o maior acréscimo de resistência foi a mistura formada por solo e fibra no
teor de 0,50%, revelando um acréscimo de 36,50% na resistência à compressão simples do material quando
comparadas ao solo natural. A mistura de solo, agregado (30%) e fibra (0,25%) também apresentou
resultados favoráveis, com o aumento de 26,55% na resistência à compressão simples do material quando
comparadas ao solo natural.
A aplicação dos materiais ao solo apresentou resultados positivos no quesito de resistência, podendo
113
assim, representar uma solução geotécnica eficaz nos aspectos técnicos e econômicos.

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115
Elaboração e Considerações Sobre a Carta de Suscetibilidade a
Movimentos Gravitacionais de Massa e Inundações do Município
de Itaóca – SP: Ênfase aos Processos de Deslizamentos
Douglas da Silva Cabral
Geólogo, CPRM/UNICAMP, São Paulo, Brasil, douglas.cabral@cprm.gov.br

Jairo Jamerson Correa de Andrade


Geofísico, CPRM, São Paulo, Brasil, jairo.andrade@cprm.gov.br

Francisco Sérgio Bernardes Ladeira


Geógrafo, UNICAMP, Campinas, Brasil, ladeira@unicamp.br

RESUMO: O Serviço Geológico do Brasil – CPRM, atendendo as diretrizes constantes na Lei 12.608/2012,
vem elaborando as Cartas de Suscetibilidades a Movimentos Gravitacionais de Massa e Inundações, prevista
no Plano Nacional de Gestão de Riscos e Respostas a Desastres Naturais. As cartas de suscetibilidade são
documentos cartográficos geotécnicos que representam a possibilidade de ocorrência de um determinado
evento, leia-se deslizamentos, inundações, corridas de massa, enxurradas e outros processos correlatos. As
cartas de suscetibilidades são produzidas em escala 1:25.000 e 1:50.000 (para os estados da região Norte) e
consiste numa modelagem matemática feita em escritório, com posterior validação de campo, por
pesquisadores, com a classificação da suscetibilidade a movimentos de massa e inundações em alta, média e
baixa. Este trabalho, em especifico, trata da elaboração e apresentação dos resultados obtidos no município
de Itaóca, sul do Estado de São Paulo. Itaóca foi palco, em janeiro de 2014, de eventos chuvosos
catastróficos, com registros sistemáticos de deslizamentos, corridas de massa, enxurradas e inundações, que
serão confrontados com os resultados obtidos na Carta de Suscetibilidade do Município de Itaóca.

PALAVRAS-CHAVE: Desastres Naturais, Cartas de Suscetibilidade, Movimentos de massa, Inundações,


Itaóca

ABSTRACT: The Serviço Geológico do Brasil - CPRM, complying with the guidelines contained in Law
12.608/2012, has been preparing the Letters of Susceptibility to Gravitational Movements of Mass and
Floods, foreseen in the National Plan for the Management of Risks and Responses to Natural Disasters. The
susceptibility charts are geotechnical cartographic documents that represent the possibility of the occurrence
of a certain event, such as landslides, floods, debris flow, sudden flood and other related processes. The
susceptibility charts are produced in a scale of 1: 25.000 and 1: 50.000, in the case of the states of the North
region, and consists of a mathematical modeling carried out in an office, with subsequent field validation, by
researchers, with the classification of susceptibility to mass movements. and high, medium and low floods.
This work, specifically, deals with the elaboration and presentation of the results obtained in the municipality
of Itaóca, south of the State of São Paulo. Itaóca was the scene, in January 2014, of catastrophic rainy events,
with systematic records of landslides, debris flow, sudden flood and floods, which will be confronted with
the results obtained in the Letter of Susceptibility of the Municipality of Itaóca.

KEYWORDS: Natural Disasters, Susceptibility Charts, Mass Movements, Floods, Itaóca.

116
1. Introdução

As Cartas de Suscetibilidade a Movimentos Gravitacionais de Massa e Inundações são documentos


geotécnicos (1:25.000), produzidos pelo Serviço Geológico do Brasil (CPRM), em atendimento à Lei
12.608/2012 e dirigida aos municípios da federação. Tais cartas constituem instrumentos importantes nas
ações integradas às políticas de ordenamento territoriais, desenvolvimento urbano e meio ambiente. Contém
dados que auxiliam no planejamento urbano como, por exemplo, a hierarquização dos graus de
suscetibilidade (alta, média e baixa) definindo assim, os terrenos mais favoráveis à ocupação em função da
possibilidade de serem atingidos por desastres naturais – deslizamentos, inundações, corridas de massa,
enxurradas e outros processos correlatos. Nesta conjuntura, municípios de todo o Brasil tem sido atendidos
com as cartas de suscetibilidade produzidas pelo Serviço Geológico do Brasil e um destes municípios
contemplados foi Itaóca (SP), quando no ano de 2018 teve sua carta de suscetibilidade produzida.
Itaóca chama a atenção devido as ocorrências registradas em janeiro de 2014, quando chuvas
concentradas levaram a centenas de deslizamentos nas encostas localizadas na porção norte do município.
Esses deslizamentos foram condicionados pela geomorfologia da região, onde predomina o relevo serrano e
causaram corridas de detritos nas bacias dos rios Guarda-Mão e Gurutuba (afluentes do Rio Palmital). Por
consequência, essas corridas geraram grande enxurrada e inundação à jusante, atingindo a área urbana de
Itaóca. Nestes eventos, houve muitos desabrigados e desalojados, dezenas de mortes registradas e grandes
prejuízos materiais.

2. Objetivos

A produção das cartas de suscetibilidade tem como objetivo primeiro gerar conhecimento aos
munícipes sobre a possibilidade de ocorrência de um determinado evento, relacionado a movimentos
gravitacionais de massa e inundações em toda a extensão do município, área ocupada ou não. Desta forma,
esta ferramenta objetiva apoiar o planejamento municipal, consolidando e embasando a tomada de decisões a
respeito do crescimento das áreas urbanas dos municípios brasileiros.
Na esfera jurídica, as Cartas de Suscetibilidade a Movimentos Gravitacionais de Massa e
Inundações, estão previstas na Política de Proteção e Defesa Civil (PNPDEC), estabelecida pela Lei Federal
12.608/2012 (BRASIL, 2012). Com o entendimento que muitos municípios não possuem recursos
financeiros e técnicos para a elaboração das cartas de suscetibilidade, o Serviço Geológico do Brasil
desempenha o papel técnico elaborando e fornecendo tais documentos à sociedade brasileira. Neste contexto,
o município de Itaóca (SP), palco de eventos catastróficos no ano de 2014, foi agraciado com a Carta de
Suscetibilidade a Movimentos Gravitacionais de Massa e Inundações de Itaóca (SP), no ano de 2019.
Neste trabalho serão apresentados os resultados da carta de suscetibilidade de Itaóca e estes dados
serão confrontados com eventos pretéritos, com destaque para aqueles causados por chuvas torrenciais em
janeiro de 2014. Espera-se comparar e validar os resultados da carta com relação a suscetibilidade a
inundação e movimento de massa, com a possibilidade de uma análise das cicatrizes de deslizamentos
mapeados.
Adicionalmente, foram realizados estudos geofísicos que determinaram duas áreas de interesse, alvos
para a geofísica, buscando caracterizar e delimitar o perfil de solos e eventuais depósitos
aluvio/coluvionares.

3. Área de Estudo

O município de Itaóca (SP), está localizado na região denominada “Vale do Ribeira”, no extremo sul
do Estado de São Paulo, fazendo divisa com o Estado do Paraná (Figura 1). O município possui uma área de
182.495 km² e com uma população de 3.228 habitantes (IBGE, 2010).
Segundo Ross (2002), a região do município de Itaóca está inserida no sistema de morros em
superfície de cimeira do Alto Ribeira, caracterizada pelos Planaltos do Alto Ribeira, que constituem um
ambiente montanhoso (Figura 2), com topos nivelados nos divisores principais (900m), mantidos por rochas
metamórficas mais resistentes, como quartzitos ou intrusões graníticas. Ainda segundo Ross (2002), muitos
núcleos urbanos da região, inclusive Itaóca, está localizado no fundo dos vales do Rio Ribeira e de seus
afluentes, em planícies fluviais restritas e bastante suscetíveis a inundações.
Quanto aos solos, Ross (2002) expõem uma grande complexidade, havendo nas porções mais
inclinadas a prevalência dos Cambissolos Álicos, Cambissolos Distróficos em associação com Neossolos

117
Litólicos. Enquanto nas porções menos íngremes, predominam solos Argissolo Vermelho-Amarelos,
Latossolo Amarelos e Latossolo Vermelho-Amarelos Álicos, em associação com os Cambissolos.

Figura 1. Mapa de localização do Município de Figura 2. Relevo serrano no limite norte de Itaóca
Itaóca – SP. (Foto: Douglas Cabral, 2018).

4. Métodos

Há uma grande diversidade de métodos e procedimentos disponíveis na literatura acerca da produção


de zoneamentos de suscetibilidade. Porém, visando uma metodologia que fosse prática e possível de ser
aplicada em todo o território nacional em tempo diminuto e devido à grande demanda existente, o Instituto
de Pesquisas Tecnológicas (IPT) e o Serviço Geológico do Brasil (CPRM), em parceria, desenvolveram a
metodologia que foi aplicada em Itaóca. A referida metodologia foi a base para este trabalho e está expressa
no documento denominado “Cartas de Suscetibilidade a Movimentos Gravitacionais de Massa e Inundações
- 1:25.000: Nota Técnica Explicativa” (Bitar et al. 2014). Esta metodologia, por sua vez, se baseou em
estudos existentes, como o guia para zoneamento de suscetibilidade, perigo e risco a deslizamento (Fell et al.
2008), elaborado pelo Comitê Técnico de Deslizamentos e Taludes Construídos (Joint Technical Committee
on Landslides and Engineered Slopes - JTC-1).
A metodologia prevê três etapas distintas e conseguintes, a iniciar no escritório e aqui denominada
“pré-campo”. No pré-campo é realizada a compilação bibliográfica, elaboração de mapas temáticos e
estruturação da Base de Dados. Esta etapa se dá por meio da obtenção de ortofotos, modelos digitais de
elevação (MDE), limites municipais, base cartográfica com mapas viários e urbanização, mapas geológico-
estrutural e de solos, sempre na maior escala disponível. Nesta etapa foram executadas as modelagens
matemáticas que forneceram o zoneamento das suscetibilidades a movimentos gravitacionais de massa
(deslizamentos, corridas de detritos e enxurradas) e outro às inundações.
Aqui, serão apresentados, de forma concisa, informações referentes as metodologias utilizadas para a
obtenção das modelagens, porém, informações mais detalhadas constam em Bitar et al. (2014).
A modelagem matemática para deslizamentos prevê a utilização e análise de parâmetros
morfológicos, a saber: declividade, curvatura da encosta e densidade de lineamentos topográficos. Esses
parâmetros são analisados em conjunto com o mapeamento das cicatrizes existentes ou de um cadastro de
cicatrizes de áreas correlatas. Desta forma, é possível obter o Índice de Suscetibilidade a Deslizamentos
(ISD) para cada parâmetro analisado e, posteriormente, através da soma destes ISDs, obter a suscetibilidade
a deslizamentos. Esta análise se dá numa área piloto dentro do limite do município, que contenha um grande
número de cicatrizes e características geológico-geomorfológicas regionais. Posteriormente, estes resultados
são extrapolados para todo o município, resultando na modelagem de suscetibilidade a deslizamentos.
Para a modelagem de enxurradas e corridas de massa, conforme Corsi et al. (2015) e Bitar et al.
(2014), o trabalho adotou, principalmente, com base na literatura técnica específica e retroanálises de casos
históricos no país, parâmetros morfométricos da bacia de drenagem, onde critérios e parâmetros foram
estabelecidos para os estudos das bacias de drenagem, conforme a Figura 3.
Por fim, a modelagem para processos de inundação requer uma sistemática complexa. À ocorrência de
uma inundação vários fatores interferem na formação dos escoamentos e em sua propagação ao longo da
bacia de contribuição (Pinheiro, 2007). Visando prever a ocorrência de desastres naturais, a modelagem de
inundação deve se basear no objetivo e na escala. Para isso, a modelagem desenvolvida e apresentada por
Bitar et al. (2014) prevê três etapas, conforme fluxograma apresentado na Figura 4.

118
Concomitante com a produção das modelagens foram realizadas fotointerpretações para definição de
feições geológicas existentes no município. Ainda nesta etapa, pesquisadores da CPRM, seguindo a
biblioteca de padrões de relevo de Dantas (2016), desenvolveram o mapa de relevo do município.
Na etapa subsequente deu-se a ida a campo (setembro de 2018), onde foi efetuada vistoria técnica em
toda a extensão do município. Nesta etapa buscou a confrontação dos dados pré-campo com as informações
obtidas em campo, visando confirmar as modelagens e o mapa de padrões de relevo, além de atualizar as
fotointerpretações de feições e obter um relatório fotográfico de todo o município.

de drenagem a enxurradas e corridas de massa


(adaptado de Bitar et al., 2014).

Figura 3. Quadro resumo das condições


necessárias para alta suscetibilidade de uma bacia Figura 4. Fluxograma para zoneamento da
suscetibilidade a inundação (Bitar et al., 2014).

No campo foi efetuada a obtenção de dados geofísicos em locais previamente definidos. Dentro de
cada área foi realizado um Caminhamento Elétrico (CE), com extensão variando de 250 a 450 m, arranjo
dipolo-dipolo e espaçamento entre eletrodos de 5 m (os parâmetros visavam ensaios na escala de detalhe). A
técnica do CE se baseia na análise e interpretação de um parâmetro geoelétrico, obtido com base em medidas
efetuadas na superfície do terreno, com espaçamento constante entre os eletrodos AMNB (Braga, 2016).
Em última análise, na etapa pós-campo, todos os dados compilados nas etapas anteriores foram
utilizados para a produção do Sistema de Informação Geográfica (SIG). Nesta etapa foi produzida a versão
final da Carta de Suscetibilidade a Movimentos Gravitacionais e Inundações de Itaóca – SP.

5. Resultados e Discussões

Na Figura 5 e na Tabela 1 estão expressos os resultados finais obtidos por meio da carta de
suscetibilidade de Itaóca. A análise dos valores obtidos permite fazer algumas observações a respeito do
município de Itaóca e comparar estes dados com eventos pretéritos, especialmente àquele de janeiro de 2014.
Primeiramente, devido a geomorfologia do município, onde predominam relevos acidentados, como morros
altos e serranos, os cursos d’água apresentam uma condição quase sempre de enclave na topografia, com
pequena ou nenhuma planície de inundação. Essa conjuntura ocasionou numa condição de suscetibilidade a
inundação que varia de média a alta, onde aquelas áreas de baixa suscetibilidade não são representadas
cartograficamente na escala da carta. Assim e conforme a Figura 5, a principal área suscetível à inundação é
a do Rio Palmital, que cruza a sede municipal de Itaóca, onde 45,79% da área urbanizada está sob influência
do grau alto a suscetibilidade à inundação. Validando a modelagem e o apresentado na carta, a área urbana
foi bastante afetada por processos de inundação do Rio Palmital em janeiro de 2014 (Figura 6).
Quanto as corridas de massa e enxurradas, estas atingem juntas, aproximadamente 57% da área total
do município, com predomínio na zona rural. Porém, apesar das enxurradas e, principalmente das bacias de
corridas de massa, predominarem em zonas rurais, pouco habitadas, estas foram as responsáveis pela maioria
das mortes ocorridas em 2014 e por grande parte dos estragos gerados pelas chuvas daquele ano. Vilas rurais,
nas bacias dos rios Guarda-mão (Figura 7) e Gurutuba, foram fortemente atingidas por corridas de detritos,
que devido ao grande potencial destrutivo destas, ocasionaram grande destruição nestas áreas.
No que diz respeito aos movimentos gravitacionais de massa, o trabalho mostra uma grande área de
predomínio de médias e altas suscetibilidade. Em todo o município estas classes de suscetibilidade totalizam

119
80% da área total. Porém, é pouco abrangente na zona urbana de Itaóca, onde mais de 90% da área apresenta
baixa suscetibilidade a deslizamentos.

Tabela 1. Resultados da Carta de Suscetibilidade de Itaóca, com os zoneamentos segundo as áreas avaliadas.
Processos Grau Área municipal Área edificada
Km² % Km² %
Corrida de massa Alta 35,28 19,27 0,017 3,49
Enxurrada Alta 69,55 37,98 0,064 13,14
Inundação Alta 4,23 2,31 0,223 45,79
Média 0,65 0,003 0,018 3,67
Movimento de massa Alta 75,40 41,18 0,009 1,84
Média 72,12 39,39 0,044 8,21
Baixa 36,48 19,92 0,441 90,34

Figura 5. Carta de Suscetibilidade do município de Itaóca (SP).

Adicionalmente ao apresentado na Carta de Suscetibilidade, foi avaliada a presença das cicatrizes de


deslizamentos conforme sua ocorrência nas classes de suscetibilidade (Tabela 2). Esta análise mostrou que,
aproximadamente, uma em cada três cicatriz ocorreu em zonas classificadas como de baixa e média
suscetibilidade a deslizamentos. Essa condição evidencia a necessidade de estudos complementares para a
análise dos fatores que potencializaram a ocorrência destes deslizamentos em áreas de menor suscetibilidade.

Tabela 2. Análise das cicatrizes de deslizamentos mapeadas por fotointerpretação e trabalho de campo.
Grau de suscetibilidade Ocorrência de cicatrizes de deslizamento
a movimento de massa Área (Km²) % Quantidade de %
pontos
Alta 0,15476 66,6 615 64,3
Média 0,06689 28,8 319 33,3
Baixa 0,01063 4,6 23 2,4
Total 0,23244 100,0 956 100,0

120
Visando diminuir eventuais erros, a Tabela 2 também indica a quantidade de pontos referentes a cada
cicatriz de deslizamento, fazendo com que a influência da área de uma cicatriz que, por exemplo, originou
numa zona de alta suscetibilidade e teve parte de seu atingimento numa zona de média, influencie os
resultados. Desta forma, amenizou o erro e deu maior confiabilidade a análise, porém, esta avaliação mostrou
resultados percentuais parecidos com aqueles obtidos através da análise da área da cicatriz, embasando os
resultados.
Dentre os fatores que contribuem para a ocorrência dos deslizamentos em áreas de menor
suscetibilidade, os litológicos e pedológicos são os que devem indicar respostas mais expressivas. Quanto a
litologia, grande parte da área afetada pelas cicatrizes pertence a intrusão granítica Itaóca. Esta situação de
homogeneidade litológica coloca o solo como um possível ator para os resultados obtidos, pois é sabido que
a topografia é um dos principais fatores de formação dos solos. Assim, é natural que variações de tipos de
solos, segundo a declividade e a posição altimétrica possam estar influenciando a ocorrência de
deslizamentos em zonas de menor suscetibilidade.

apud G1 (2014).

Figura 6. Inundação do Rio Palmital no centro de


Itaóca (Fonte: Defesa Civil Estadual - SP, 2014 Figura 7. Corrida de detritos na bacia do Rio
Guarda-Mão (Fonte: Folha de São Paulo, 2014).

5.1 Geofísica

Os modelos inversos dos CEs apresentaram resistividade elétrica variando aproximadamente entre 1
e 3000 Ohm.m. Este intervalo de resistividade elétrica foi subclassificado em três principais domínios
geoelétricos.
 Camada Geoelétrica A: Resistividade elétrica variando aproximadamente entre 1 e 150 ohm.m. Estes
valores de resistividade elétrica estão associados a litologias argilosas saturadas, argilosas secas e
arenosas saturadas.
 Camada Geoelétrica B: Resistividade elétrica variando aproximadamente entre 151 e 800 ohm.m.
Estes valores de resistividade elétrica estão associados a litologias argilosas secas, arenosas secas, e
arenosas saturadas.
 Camada Geoelétrica C: Resistividade elétrica variando aproximadamente entre 801 e 3000 ohm.m.
Estes valores de resistividade elétrica estão associados a litologias arenosas secas, rocha cristalinas e
conjuntos de blocos rochosos.
Trata-se de uma interpretação resumida de correlações entre valores de resistividade elétrica e
litologia, determinados por valores teóricos e contexto geológico da região, segundo Telford et al., (1990).

5.1.1 Interpretações Geofísicas

A Linha 1 (Figura 8), localizada entre as coordenadas 22J 716698E; 7277291S e 22J 716938E;
7277522S, apresenta faixa de alta resistividade de até 6 m de profundidade entre as posições 0 e 70 m que

121
pode estar associada a blocos de rocha granítica concentrados na curva da drenagem, camada geoelétrica C.
Entre as posições 90 e 100 m e 270 e 290 m o CE apresenta descontinuidades que podem estar associadas a
estruturas geológicas, como uma falha. A faixa de resistividade indica que a litologia é predominantemente
arenosa e está saturada, camada geoelétrica B. Tais resultados geofísicos são associados a depósitos recentes
provenientes de corridas de detritos ocorridos na Bacia do Rio Guarda-Mão, ocasionando o acúmulo de
blocos de rocha entremeados a material arenoso heterogêneo proveniente das encostas a montante.
A Linha 2 (Figura 9), localizada entre as coordenadas 22J 714803E; 7275466S e 22J 715022E;
7275603S, apresenta modelo plano paralelo com sedimentos predominantemente argilosos e saturados,
camada geoelétrica A, perfazendo perfis de solos de alteração de rocha. A camada geoelétrica B, aparenta
estar associada a sedimentos coluvionares. Por fim, a camada geoelétrica C deve estar associada ao topo
rochoso, numa profundidade média entre 10 e 15 metros.

Figura 9 - a) Modelo inverso de resistividade, b)


Figura 8 - a) Modelo inverso de resistividade, b) Domínios Geoelétricos e c) Localizaçao da Linha
Domínios Geoelétricos e c) Localizaçao da Linha 2.
1.

6. Conclusões

O trabalho visou principalmente apresentar os resultados obtidos na Carta de Suscetibilidade a


Movimentos Gravitacionais de Massa e Inundações do Município de Itaóca (SP) e analisar estes resultados
com eventos pretéritos. Nesta análise, os resultados quanto as inundações mostraram que o Rio Palmital, que
cruza a área urbana, tem alta suscetibilidade a inundações e é bastante influenciado em eventos extremos,
como o de 2014, onde chuvas atingiram as cabeceiras de seus afluentes, ocasionando a elevação rápida do
seu nível, o que por sua vez, configurou num evento de enxurrada e consequente inundações, que atingiu
grande parte da área urbana de Itaóca.

122
Adicionalmente, as bacias de enxurradas e corridas de massa foram validadas pelos acontecimentos
de 2014. Estas foram as principais causadoras de mortes e prejuízos no município. Apesar de grande parte da
área urbana não estar sobre influência destas bacias de alta suscetibilidade, a zona rural merece atenção,
devido a presença de moradores nestas zonas suscetíveis à ocorrência de corridas de massa e enxurradas. Foi
possível confirmar uma área de atingimento da corrida de massa ocorrida na Bacia do Rio Guarda-Mão com
a aplicação de métodos geofísicos, onde a presença de blocos de rocha foi inferida.

Por fim, inúmeros deslizamentos ocorreram naquele ano, confirmando o alto grau de suscetibilidade
encontrado na carta para este evento (41,18% da área total do município). Além disso, verificou-se que mais
de 30% das cicatrizes ocorreram em zonas de baixa e média suscetibilidade a deslizamentos. Este dado
merece atenção pelo fato destas áreas serem consideradas, frequentemente, pelos planejadores urbanos como
zonas aptas à ocupação e sem a necessidade de intervenções significativas. Assim, o trabalho indica uma
necessidade maior de estudos litológicos e, principalmente, pedológicos, visando melhorar a caracterização
das encostas do município e aumentar o entendimento sobre a dinâmica dos deslizamentos ocorridos em
Itaóca.

AGRADECIMENTOS

Registram-se os agradecimentos à CPRM pela viabilização deste trabalho e aos colegas da CPRM e
da Unicamp que participaram do trabalho de campo e da revisão dos trabalhos. FSBL agradece a bolsa
produtividade em pesquisa CNPq (#307951/2018-9).

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Bitar, O.Y. (Coord.) (2014) Cartas de suscetibilidade a movimentos gravitacionais de massa e


inundações-1:25.000: Nota Técnica Explicativa. São Paulo: IPT; Brasília (DF): CPRM, 2014
(Publicação IPT 3016).
Braga, A. C. O. (2007) Métodos Geoelétricos Aplicados–Módulo Hidrogeologia. UNESP. Available on:<
http://www. rc. unesp. br/igce/aplicada/DIDATICOS/BRAGA/Geofisica/Geoeletricos-V3. pdf>. Rio
Claro (SP).
Brasil. 2012. Lei nº 12.608, de 10 de abril de 2012. Institui a Política Nacional de Proteção e Defesa Civil
- PNPDEC; dispõe sobre o Sistema Nacional de Proteção e Defesa Civil - SINPDEC e o Conselho
Nacional de Proteção e Defesa Civil - CONPDEC; autoriza a criação de sistema de informações e
monitoramento de desastres; altera as Leis nos 12.340, de 1º de dezembro de 2010, 10.257, de 10 de
julho de 2001, 6.766, de 19 de dezembro de 1979, 8.239, de 4 de outubro de 1991, e 9.394, de 20 de
dezembro de 1996; e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília (DF), 11 abr. 2012.
Corsi, A.C.; Gramani, M.F.; Ogura, A.T. (2015) Método para delimitação de bacias de drenagem
suscetíveis a corridas de massa e enxurradas. In: ABGE, Simpósio Brasileiro de Cartografia
Geotécnica e Geoambeintal, 9, Anais, Cuiabá (MT): CD-ROM.
Dantas, M.E. (2016) Biblioteca de Padrões de Relevo: Carta de Suscetibilidade a Movimentos
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123
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Pinheiro, A. (2007) Enchente e inundação. In: Santos, R. F. (Org.). Vulnerabilidade ambiental: desastres
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Ross, J. L. S. (2002) A Morfogênese da Bacia do Ribeira do Iguape e os Sistemas Ambientais. Revista
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Congresso Brasileiro de Geologia de Engenharia e Ambiental, 15, Anais, Bento Gonçalves (RS), CD-
ROM.
Telford, W. M. et al. (1990) Applied geophysics. Cambridge University Press; Cambridge (UK).

124
As relações da estabilidade de taludes de borda de um platô de
mineração e fatores condicionantes à segurança: histórico de
instabilização
Sabrina de Paula Ferreira
Engenheira Geotécnica, Pimenta de Ávila Consultoria, Belo Horizonte, Brasil
sabrina.ferreira@pimentadeavila.com.br

Guilherme Henrique da Silva Pinto


Engenheiro Geotécnico, Pimenta de Ávila Consultoria, Belo Horizonte, Brasil
guilherme.henrique@pimentadeavila.com.br

André Otávio Moreira e Silva


Engenheiro Geotécnico, Pimenta de Ávila Consultoria, Belo Horizonte, Brasil
andre.silva@pimentadeavila.com.br

João Pimenta Freire Neto


Engenheiro Geotécnico, Pimenta de Ávila Consultoria, Belo Horizonte, Brasil
joaopimentafreireneto@pimentadeavila.com.br

Rodrigo Rodrigues Vieira de Oliveira


Engenheiro Geotécnico, Pimenta de Ávila Consultoria, Belo Horizonte, Brasil
rodrigo.oliveira@pimentadeavila.com.br

RESUMO: A ocorrência de movimentos gravitacionais de massa é condicionada por diversos fatores como:
pluviosidade, condições de drenagem da região, declividade/geometria de taludes, estratigrafia, características
geológico-geotécnicas dos materiais, presença de cobertura vegetal, alterações antrópicas (taludes artificiais),
dentre outros. O objetivo deste estudo é abordar rupturas históricas (registradas desde o ano 1991) ocorridas
em platô localizado no norte do Brasil, explotado para mineração de bauxita, com ênfase nas condicionantes
que possivelmente levaram a tais rupturas. Além disso, é apresentada retroanálise de uma das rupturas
registradas no platô no intuito de obter parâmetros e condicionantes que levaram à sua instabilização.

PALAVRAS-CHAVE: Estabilidade, Escorregamento, Retroanálise.

ABSTRACT: The occurrence of gravitational movements of mass is conditioned by several factors such as:
rainfall, drainage conditions of the region, geometry of slope, stratigraphy, geological-geological
characteristics of the materials, presence of vegetation cover, anthropic changes (artificial slope), among
others. The aim of this study is to address historical ruptures (recorded since 1991) that occurred on a plateau
located in northern Brazil, exposed to bauxite mining, with emphasis on the conditions that possibly led to
such ruptures. In addition, a retroanalysis of one of the ruptures recorded in the plateau is presented in order
to obtain parameters and conditions that led to its landslide.

KEYWORDS: Stability, Landslide, Retroanalysis.

1 Introdução

A ocorrência de movimentos gravitacionais de massa é condicionada por diversos fatores, que incluem
as condições pluviométricas e de drenagem da região, configuração geométrica do talude, perfil geológico,
características geológico-geotécnicas dos materiais, presença de cobertura vegetal, alterações antrópicas
(taludes artificiais), dentre outros fatores determinantes à estabilidade do talude. Tais ocorrências têm sido
preocupação recorrente da população e das autoridades, principalmente nas últimas décadas, em que ocorreram
vários desastres associados a estes fenômenos. O objetivo deste estudo é abordar rupturas históricas
(registradas desde o ano 1991) ocorridas em platô localizado no norte do Brasil, explotado para mineração de
bauxita, com ênfase nas condicionantes que possivelmente levaram a tais rupturas.

125
Do ponto de vista geotécnico, a ruptura de um maciço ocorre quando o Fator de Segurança (F.S.) atinge
o valor 1,0, ou seja, quando os esforços solicitantes se igualam os esforços resistentes, culminando na falha do
maciço analisado (Duncan & Wright, 2005). Comumente, para a avaliação do F.S., são elaboradas análises de
estabilidade acopladas a análises de percolação, de forma a estimar a potencial superfície de falha, sendo
testadas diferentes superfícies de ruptura para o de cálculo de F.S. Dentre os métodos utilizados para a
determinação do F.S., destaca-se a metodologia proposta por Morgenstern – Price, a qual satisfaz o equilíbrio
de forças e momentos (Abramson et al. 2005).
Como descrito por Baecher & Chritian (2003), existem diversas incertezas no processo de determinação
do fator de segurança, como por exemplo os parâmetros de resistência utilizados, tendo em vista a variabilidade
natural da formação dos solos. Dentre os parâmetros com maior variação, destaca-se a coesão, chegando a
coeficientes de variação de até 40%. Além disso, existem incertezas referentes ao perfil de poropressões dos
materiais, o qual é utilizado para a determinação da tensão efetiva e resistência ao cisalhamento dos solos
(Pinto, 2016). Para contornar tal adversidade, é comum a realização de análises de sensibilidade para avaliação
do impacto no F.S. com base na alteração de cada parâmetro estudado.

2 Contextualização

2.1 Topografia e Geologia do Local

O platô de estudo é caracterizado por uma superfície plana e encostas com taludes naturais referenciados
como “taludes de borda”, de cerca de 100 m de altura e declividades variadas, podendo ser mais suaves
(1V:2H) ou mais íngremes (chegando a razões de 1V:1,2H). A existência de um talude em solo com essa
conformação pode ser considerado excepcional, já que tais condições não são muito frequentes na natureza.
Os taludes em solo, de altura semelhante, são mais recorrentes em declividades mais brandas. A Figura 1
apresenta o mapa de elevações com a delimitação da borda do platô, bem como indicação de rupturas dos
taludes de borda registradas na região.

Figura 1. Platô e delimitações de borda.

O perfil geológico natural do platô é caracterizado pelos seguintes horizontes (topo para base):

▪ Cobertura Vegetal (top soil): perfil típico de cobertura com mata densa superpondo-se a um horizonte
de terra vegetal com espessura de 0 a 50 cm;
▪ Argila Amarela: solo caulinítico de cor amarela, uniforme e permeável. A textura é finamente porosa,
podendo conter pequenos nódulos gibbsíticos e ferruginosos. A espessura média varia entre 7 a 12 m;
▪ Bauxita: material nodular, laterita ferruginosa, bauxita maciça (gibsita). Este pacote tem espessura
variável entre 6 a 20 m;
▪ Argila Variegada: trata-se de uma argila de cor clara, caulinítica. Ocorre abaixo do horizonte bauxítico.
Apresenta textura argilo-siltosa, coloração branca com manchas arroxeadas (variegada);
▪ Areia: camada drenante inferior, material de transição para o arenito na base do platô.

126
A Figura 2 apresenta perfil geológico típico do platô, segundo Hernalsteens (1982).

Figura 2. Perfil (Hernalsteens, 1982).

O platô conta com um extenso banco de dados de investigações geológico-geotécnicas, que contemplam
ensaios de campo e laboratório, bem como instalação de instrumentação (piezômetros, inclinômetros,
medidores de nível de água, dentre outros). Entretanto há uma limitação de informações no que se refere às
bordas do platô, visto ser uma região de mata densa e difícil acesso, sendo necessário licenciamento de
supressão vegetal de mata nativa para realização de investigações geológico-geotécnicas ou instalação de
qualquer tipo de monitoramento.

2.2 Histórico de Instabilidades nos Taludes de Borda

Desde o ano de 1991, foram registradas 4 rupturas significativas nas bordas do platô de estudo, que
foram alvos de projetos de recuperação, em função da ocorrência de processos de instabilização, conforme
descrito a seguir:

▪ Ruptura 1: escorregamento que ocorreu em fevereiro de 1991, posteriormente à ocorrência de altos


índices de precipitação pluviométrica. Atualmente o talude se encontra revegetado, sendo realizado o
monitoramento periódico por piezômetros do tipo casagrande instalados em 2011 e medidores de
vazão em drenos do tipo DHP (Drenos Horizontais Profundos) implantados na região, que apresentam
leituras que variam entre 0 a 5 litros/min, a depender do regime pluviométrico da região. Vale ressaltar
que a montante desta ruptura existe um lago de recuperação de água e acredita-se que esta estrutura
interfere diretamente no fluxo da região;
▪ Ruptura 2: o talude foi submetido a um processo de recuperação em 1994, devido a deslizamento
superficial, ocorrido em 1992, na camada de aterro executado sobre o talude natural. O trabalho
contemplou principalmente a estabilização da área através de retaludamento e implantação de
drenagem superficial. A montante do local existem reservatórios de disposição de rejeitos;
▪ Ruptura 3: ruptura de talude de borda que ocorreu no ano de 1995. Apesar do escasso histórico de
registro desta ruptura, foram realizados em 2020 ensaios do tipo CPTu no local, sendo uma informação
relevante da estratigrafia de borda, bem como comporamento dos materiais que compõem a geologia
do platô;

127
▪ Ruptura 4: no ano de 2005, este talude passou por um processo de recuperação, em função de erosão
ocorrida no mesmo ano. Nos dias 26 e 27 de março ocorreram chuvas intensas que resultaram no
acúmulo de água na área interna de um reservatório em construção, a montante do local desta
ocorrência. O volume acumulado vazou, erodindo o solo existente e liberando um fluxo
progressivamente maior, que acumulou-se na área de um dos extravasores da borda do platô, o qual
não teve capacidade de escoamento do volume acumulado, ocasionando o galgamento da estrada
periférica localizada nas proximidades da borda, com o escoamento do fluxo sobre o talude abaixo,
causando sua erosão.

De um modo geral, o histórico de instabilizações indica que as rupturas dos taludes de borda ocorreram
devido à alguma interferência na configuração natural dos taludes, seja pela construção de alguma estrutura
que à montante da borda, ou por interferência na geometria existente da encosta. Os altos índices
pluviométricos da região são fatores considerados preponderantes na contribuição para a ocorrência de tais
instabilizações, visto ocasionar o aumento das poropressões e consequente redução do F.S. dos maciços.

3 Metodologia - Retroanálise de Ruptura

Visto as limitações das informações da borda do platô, foi realizada uma retroanálise, considerando a
geometria anteriormente à ruptura 2, para obtenção de condições que podem ter levado à instabilização
ocorrida em 1992. À época, não havia informações suficientes para obtenção de parâmetros de resistência dos
materiais, bem como modelo de fluxo da região. Sendo assim, foi feita análise de estabilidade considerando
uma sensibilidade da linha freática, bem como do parâmetro de coesão do material de fundação denominado
areia argilosa, visto serem as maiores incertezas atuais referentes à condição de ruptura. Ressalta-se que o
material de areia argilosa é significativo na estabilidade do talude, visto que compõe a maior parte da
estratigrafia da encosta, sendo também o material com maior extensão na potencial cunha de ruptura obtida
nas análises de estabilidade. Além de determinar as condições do talude no instante da ruptura, os resultados
da retroanálise podem auxiliar na obtenção dos fatores de segurança dos taludes de borda existentes atualmente
no platô.

Tais análises foram realizadas com o software Slide2, desenvolvido pela empresa canadense
Rocscience. O programa é utilizado para se obter o fator de segurança ao escorregamento por meio de análises
de equilíbrio limite, que permitem a determinação do fator de segurança utilizando dados como as propriedades
de resistência ao cisalhamento dos materiais, poropressões e propriedades geométricas do talude, comparando
as forças ou momentos resistentes e atuantes sobre uma supefície de deslizamento. Para o cálculo do fator de
segurança, foi adotada a metodologia proposta por Morgenstern – Price, sendo utilizada a função meia senoide
para a estimativa das forças entre fatias. Foram adotadas 200.000 iterações para a determinação da potencial
superfície crítica com base em superfícies de ruptura do tipo circulares.

Nas análises foram considerados os critérios de ruptura de Mohr–Coulomb para os materiais cujo
comportamento esperado durante o cisalhamento é dilatante (areia argilosa e argila pedregulhosa); de razão de
resistência (Vertical Stress Ratio) com resistência não drenada mínima (Minimum Shear Strenght) para
materiais que apresentam comportamento contrátil localizados abaixo da linha freática (material do tipo argila
e argila amarela).

Tabela 1. Parâmetros de resistência adotados.

γnat γsat Parâmetros de Resistência


Material Cor
(kN/m³) (kN/m³)
c' (kPa) ϕ' (°) Su/σ’v0 Sumin
Areia Argilosa 18,4 18,7 7* 29 - -
Argila Pedregulhosa 18,4 - 0 38 - -
Argila Variegada 18,4 18,7 18,7 - 0,30 6
Argila Amarela 17,7 18,2 18,2 28 0,25 5
c’ – Coesão efetiva ϕ’ – Ângulo de atrito efetivo

128
Su/σ’v0 – Razão de resistência Sumin – Resistência não drenada mínima
*Parâmetro variado nas análises de sensibilidade no intervalo de 0 a 14 kPa

Tendo em vista as incertezas dos parâmetro de coesão da areia argilosa e da freática no momento anterior
a ruptura, foram elaboradas análise de sensibilidade variando o parâmetro de resistência e posição da linha
freática. A Figura 3 apresenta a estratigrafia e geometria consideradas para retroanálise, representativas da
condição anterior à ruptura. Além disso, está indicada a freática média (esperada), bem como a variação da
linha freática adotada para a analise de sensibilidade sendo realizadas análises para a freática crítica (freática
média + 50%) e a freática de estiagem (freática média - 50%).

Figura 3. Estratigrafia e Geometria do Talude de Borda.

Em resumo, foram avaliadas duas condições principais, sendo elas:

▪ Variação da linha freática entre as freáticas esperadas em: (i) período de estiagem; (ii) condição
intermediária; (iii) condição crítica; adotando-se um valor médio para a coesão da areia argilosa de 7
kPa;
▪ Alteração do valor de coesão (variando entre 0 a 14 kPa), adotando-se uma linha freática intermediária.

Além, disso, foram realizadas análises de estabilidade com a combinação da variação da freática e do
parâmetro de coesão, de forma a obter cenários intermediários para a combinação da variação simultânea das
duas propriedades estudadas. Para tal, foram elaboradas 40 análises de estabilidade, com diferentes
combinações, conforme apresentado na Figura 4.

129
Figura 4. Variação dos parâmetros da análise de sensibilidade elaborada.

4 Resultados

A Figura 5 apresenta o F.S. da seção analisada para a condição inicial do estudo, sendo a freática
intermediária e coesão igual a 7 kpa para o material areia argilosa. Como pode ser observado, para a condição
inicial têm-se F.S. = 1,30, sendo este considerado satisfatório conforme a NBR 11.682 (2009) para de nível de
segurança contra danos e vidas humanas médio, atrelado a nível de segurança baixo contra danos materiais e
ambientais.

Figura 5. Análise de estabilididade para a condição inicial (anterior a ruptura).

As Figura 6a e 6b apresentam os resultados obtidos nas análises de sensibilidade, sendo a Figura 6a a


variação da posição da linha freática considerando o valor de coesão médio do material areia argilosa (c’ = 7
kPa) e a Figura 6b a variação do F.S. com base na variação da coesão do material areia argilosa (entre 0 e 14
kPa) e freática intermediária. Nota-se que a variação da posição da linha freática tem impacto mais
significativo no fator de segurança que o valor de coesão adotado para a areia argilosa. Como esperado,
conclui-se que tal variação é preponderante na estabilidade do talude de borda do platô investigado.

130
Figura 6. Variação do F.S. em relação a: a) Posição da Linha Freática; e b) Coesão da Areia Argilosa.

A Figura 7 apresenta os resultados obtidos com a combinação das análises de estabilidade realizadas,
variando-se o parâmetro de coesão e a posição da linha freática de forma simultânea. Como pode ser observado,
existem alguns cenários que, de forma combinada, podem ter desencadeado a ruptura de borda, sendo obtidos
F.S. próximos a unidade (F.S. ≈1,00), como por exemplo, uma freática crítica (freática intermediária + 50%)
e valores de coesão do material areia argilosa próximos a nulidade. Além disso, pode-se perceber que o F.S.
varia entre 1,00 a 1,60, a depender das combinações adotadas nas análises de sensibilidade.

Figura 7. Análises Combinatórias – Variação de linha freática e coesão do material denominado Areia
Argilosa.

4 Conclusões

Como pode ser observado nas retroanálises apresentadas, a variação da linha freática é preponderante
em relação a variação da coesão do material de areia argilosa. Além disso, a modelagem de uma freática crítica
associada a baixos valores de coesão geram F.S. próximos ou iguais a 1,00, caracterizando uma codição que
levaria à uma ruptura.
Existem uma série de fatores que podem influenciar na ocorrência da ruptura de um talude de borda tais
como pluviosidade, condições de drenagem da região, declividade/geometria do talude, estratigrafia,
características geológico-geológicas dos materiais, ausência de cobertura vegetal. Sendo assim, como
próximos passos do estudo, sugere-se um mapeamento dos locais mais suscetíveis a tais ocorrências a partir
das particularidades de cada região, para auxílio na tomada de decisões do que tange à necessidade de
intervenções nas condições atuais do local de estudo.

131
Por fim, para o platô específico de estudo, recomenda-se, dentre outras providências: (i) realização de
investigações geológico geotécnicas para subsidiar estudos de estabilidade; (ii) instalação de instrumentos nos
taludes de borda para acompanhamento da piezometria e deslocamentos; (iii) obtenção de níveis de controle
associados à instrumentação e TARPs (do inglês “Trigger Action Response Plans”) associadas à estes níveis;
(iv) avaliação de uma metodologia para monitoramento de áreas com vegetação; (v) adoção de afastamento
mínimo de intervenções em relação aos taludes de borda, evitando a alteração na conformação natural destes
taludes.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Abramson, L. W.; Sharma, S.; Boyce, G. M. (2005). Slope Stability and Stabilization Methods. Hoboken:
Wiley, 2º ed.
Associação Brasileira de Normas Técnicas (2009). NBR 11682. Estabilidade de encostas. Rio de Janeiro.
Baecher, G. B.; Christian, J. T. (2005) Reliability and statistics in geotechnical engineering. John Wiley &
Sons,
Pinto, Carlos de S.. (2016) Curso básico de Mecânica dos Solos. Oficina de Textos.
Duncan, J. M.; Wright, S. G. 2005 Soil Strength and Slope Stability, Hoboken: Wiley. (2º ed)
Hernalsteens C. M. O. (1982). Bauxita de Porto Trombetas. In: SBG, Congresso Brasileiro de Geologia,
Salvador, 32, Resumos, 3:1100-1114.

132
Inventário de ocorrências de erosões e movimentos de massa em
uma sub-bacia situada na Região Metropolitana do Recife - PE
Roberto Quental Coutinho
Professor Titular, UFPE, Recife, Brasil, robertoqcoutinho@gmail.com

Manoely Souza de Oliveira


Doutoranda, UFPE, Recife, Brasil, manoely.oliveira@hotmail.com

Ana Cláudia Almeida Calado


Mestranda, UFPE, Recife, Brasil, claudiacallado9@gmail.com

RESUMO: Os processos de instabilidade de encostas estão frequentemente associados a perdas humanas e


econômicas no Brasil e no mundo. Na Região Metropolitana do Recife, o contexto não é diferente, sobretudo
no cenário em que está inserida, com seus morros ocupados inadequadamente, sem critérios técnicos definidos,
potencializando a probabilidade de ocorrência destes desastres e causando, assim, vários transtornos à
população. Desta forma, este trabalho tem como objetivo realizar um inventário de ocorrências de erosões e
movimentos de massa em uma sub-bacia hidrográfica situada no limite entre as cidades do Recife e
Camaragibe, descrevendo seus processos e características, relacionando-os à precipitação. Para tal, foram
compiladas as ocorrências de movimentos de transporte e massa no período de 2010 a 2019. Os dados foram
georreferenciados através do software ArcGIS 10.1, sendo procedida a sobreposição destes ao mapeamento
das cicatrizes, confeccionado a partir de imagens do Google Earth Pro e da ortofoto do Projeto PE-3D, sob a
responsabilidade do GEGEP/UFPE. Os processos e suas características puderam ser classificados e validados
através de levantamento em campo. Por fim, o histórico de chuvas de um pluviômetro situado nas
intermediações da área de investigação foi levantado, relacionando eventos extremos ao inventário obtido. A
análise permitiu constatar que os impactos se intensificam sobre as encostas mais densamente povoadas na
sub-bacia e se concentram no período de outono-inverno, no qual se constatam as maiores precipitações.

PALAVRAS-CHAVE: Movimentos de massa, Erosões, Mapeamento de cicatrizes.

ABSTRACT: Slope instability processes are often associated with human and economic losses in Brazil
and in the world. In the Recife Metropolitan Region, the context is not different, especially in the scenario
in which it is inserted, with its hills inadequately occupied, without technical criterias, increasing the
probability of occurrence of these disasters and causing several inconveniences to the population. Thus, this
work aims to carry out an inventory of erosion and mass movements occurrences in a sub-basin located on
the border between the cities of Recife and Camaragibe, describing its processes and characteristics, relating
them to precipitation. To this, the occurrences of transport and mass movements were compiled in the period
from 2010 to 2019. The data were georeferenced using the ArcGIS 10.1 software, and these were
superimposed on the mapping of the scars, made from Google Earth Pro images and of the orthophoto of
the PE-3D Project, under the responsibility of GEGEP/UFPE. The processes and their characteristics could
be classified and validated through field surveys. Finally, the rainfall history of a rain gauge located in the
intermediation of the investigation area was surveyed, relating extreme events to the inventory obtained.
The analysis showed that the impacts are intensified on the more densely populated slopes in the sub-basin
and are concentrated in the autumn-winter period, in which the highest rainfall is observed.

KEYWORDS: Mass movements, erosions, Scars mapping.

1 Introdução

A superfície terrestre é, por natureza, dinâmica, sendo os taludes remoldados constantemente ao longo
da sua evolução, tendendo, naturalmente, a encontrar o equilíbrio em meio aos processos neles atuantes. Desta
maneira, as encostas estão frequentemente sujeitas à ocorrência de movimentos de massa e transporte, sendo
estes fenômenos itensificados perante a ocupação antrópica.
Os processos de instabilidade de taludes estão frequentemente associados a perdas humanas e
econômicas no Brasil e no mundo. Sabe-se que o princípio fundamental da estabilidade destes está atrelada à
sua resistência ao cisalhamento e que, face ao acréscimo de forças cisalhantes, que, por alguma razão, se
igualam à resistência ao cisalhamento dos materiais que constituem o maciço e/ou à depauperação das
133
propriedades resistentes destes materiais, os processos de instabilização acontecem. Na Região Metropolitana
do Recife, chuvas intensas constituem um dos principais fatores deflagradores dos movimentos de transporte
e de massa. Isto porque, segundo Augusto Filho, Virgili e Diláscio (2018), este agente está diretamente
relacionado à dinâmica das águas de superfície e subsuperfície, causando erosões, aumento das solicitações ou
reduzindo a resistência do solo. Associadas ao crescimento urbano desordenado, em conjunto com ações
antrópicas em ocupações precárias, as precipitações intensas aceleram a ocorrência dos processos de
instabilização das encostas, agravando as situações de risco nestas áreas (COUTINHO; BANDEIRA, 2012).
A ocorrência de movimentos de massa e de transporte deixa vestígios ao longo das paisagens em forma
de cicatrizes, que são capazes de evidenciar os processos fenomenológicos que ocorreram em determinada
região. O mapa de inventário corresponde à identificação, caracterização e delimitação espacial destes
processos e das zonas afetadas podendo contribuir em estudos de suscetibilidade, vulnerabilidade, perigo ou
risco, uma vez que as condições de terreno onde ocorreram os processos passados e recentes geralmente são
as mesmas que poderão deflagrar novos eventos (GUZZETTI et al., 2012; PIZZATO; GRAMANI, 2017).
Desta maneira, este trabalho tem como objetivo realizar um inventário de ocorrências de erosões e
movimentos de massa, com o emprego de ferramentas de sensoriamento remoto e geoprocessamento, em uma
sub-bacia hidrográfica situada no limite entre as cidades do Recife e Camaragibe, descrevendo seus processos
e características através da compilação de ocorrência destes movimentos, análise de imageamento de satélite
e validação em campo. Em adição, a frequência de ocorrência destes eventos também foi relacionada à
precipitação no ano de 2019, no qual, frente às chuvas intensas que se sucederam no período em questão, foram
registrados 5 (cinco) óbitos na área de investigação.
O artigo é produto preliminar de estudos de suscetibilidade à ocorrência de erosões e movimentos de
massa baseados em modelagem matemática, integrando o banco de dados de pesquisas que vêm sendo
desenvolvidas pelo Grupo de Engenharia Geotécnica de Encostas, Planícies e Desastres (GEGEP - UFPE),
liderado pelo Professor Dr. Roberto Quental Coutinho,

2 Caracterização da área de estudo

Esta pesquisa tem como região de estudo uma sub-bacia hidrográfica que está inserida entre o Bairro
dos Estados, no município de Camaragibe, e o bairro da Várzea, a oeste do Recife – Figura 1. De acordo com
a classificação de Strahler (1954), esta sub-bacia se classifica como de 3ª ordem, abrangendo uma área de 1,28
km2 e uma amplitude altimétrica de aproximadamente 100 m.
Geomorfologicamente, o relevo predominante é o de colinas com topos arredondados e vales abertos
(68,9% da área) , com mais de 45% do seu território composto por declividades altas a extremamente altas de
acordo com a classificação da EMBRAPA (1979). Quanto à geologia, a região investigada contempla
sedimentos Flúvio-lagunares nas áreas de vales e sedimentos pertencentes à Formação Barreiras nos morros.

Figura 1. Localização da sub-bacia hidrográfica em estudo.


134
Figura 2. Histograma de precipitações no pluviômetro do Timbi / Camaragibe entre os anos de 2017 a 2021.

A Formação Barreiras é uma formação geológica que se estende ao longo da costa brasileira do Rio de
Janeiro (sudeste) ao Estado do Amapá (norte), abrangendo depósitos sedimentares mesozóicos em várias
bacias costeiras, constituindo-se de um sedimento fluvial, areno-argiloso, de coloração creme a avermelhada
dependendo da intensidade da oxidação do ferro (COUTINHO et al., 2019). De acordo com Alheiros (1998),
esta formação apresenta, pelo menos, 3 fácies distintas, sendo, na área investigada, encontrada a fácie em canal
fluvial, caracterizada por sedimentos formados sob regimes de fluxo de alta energia que permitem o transporte
de areias e cascalhos por tração e materiais finos por suspensão.
De acordo com a classificação de Koppen, o clima de ambas as cidades em que a sub-bacia se insere é
o Tropical do tipo As’, com período chuvoso concentrado no outono-inverno. A Figura 2 apresenta as
precipitações mensais ocorridas no período 2017 a 2021 no pluviômetro do Timbi/Camaragibe, que se localiza
nas coordenadas em UTM de longitude 280344.10 mE e latitude 9112294.25 mS. Consoante a análise do
histograma ilustrado na figura, pode-se constatar que as maiores precipitações são registradas entre os meses
de março a agosto, com médias mensais que superaram os 300 mm entre os meses de maio a julho.
Assim como a maior parte da Região Metropolitana do Recife, a sub-bacia investigada tem seus morros
ocupados inadequadamente, sem qualquer tipo de planejamento, pela população mais carente. A ocupação é
densa e carrega uma série de ações antrópicas como cortes e aterros sem critérios técnicos definidos;
lançamento de águas servidas nos taludes; cultivo de árvores de grande porte sobre os declives; sobrecarga das
habitações sobre o maciço; despejo de resíduos sólidos sobre as encostas, entre outros, potencializando a
probabilidade de ocorrência destes desastres e causando, assim, vários transtornos à população, sobretudo em
períodos de precipitação intensa, quando estas ocorrências se intensificam.

3 Metodologia

A fim de alcançar o objetivo principal da pesquisa, foram empregados os procedimentos metodológicos


que estão sumarizados na Figura 3. Para tal, inicialmente, foram compilados os dados necessários para
realização do trabalho, sendo estes: i. a ortofoto do Projeto PE3D, sob posse do GEGEP-UFPE; ii. o registro
de históricos de deslizamentos de 2003 a 2019 das Defesas Civis dos municípios de Recife e Camaragibe; e
iii. os dados de precipitação do pluviômetro do Timbi no Mapa Interativo disponibilizado pelo Centro Nacional
de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden, 2022).
Em seguida, foram realizados, paralelamente, a elaboração do mapa de declividade; o levantamento e
georreferenciamento das ocorrências verificadas até então; e a obtenção do histograma de precipitação. Para
elaboração do mapa de declividade, a sub-bacia hidrográfica foi, primeiramente, delimitada com o auxílio do
software ArcGIS 10.1 a partir da extensão ArcHydro, sendo, posteriormente, empregada a ferramenta Slope,
disponível no ArcToolbox, para obtenção das declividades, que foram classificadas através da classificação da
EMBRAPA (1979) em 6 diferentes categorias de relevo: plano (0º - 7º), suave ondulado (7º - 11º), ondulado
(11º - 17º), forte ondulado (17º - 27º), montanhoso (27º - 45º) e forte montanhoso (> 45º).
O levantamento das ocorrências foi concebido a partir do georreferenciamento dos dados fornecidos
pelas Defesas Civis e da análise e das imagens históricas disponíveis nos softwares Google Earth Pro e Google
Street, bem como da ortofoto do PE3D, datada do ano de 2015, nas quais as ocorrências também foram
georreferenciadas e os processos e suas características foram classificados, sendo confeccionado um
mapeamento preliminar, cujas informações foram validadas em campo.
135
Figura 3. Sumarização dos procedimentos metodológicos empregados na pesquisa.

A validação consistiu na ida à área de investigação entre os meses de novembro e dezembro de 2021
(período de estiagem) e da confirmação visual das cicatrizes dos eventos com registro fotográfico e captação
das coordenadas geográficas com GPS portátil, caso as informações do mapeamento preliminar fossem
confirmadas ou novas ocorrências fossem constatadas.
Os dados refinados foram inseridos/ajustados nas ferramentas de georreferenciamento sendo
sobrepostos ao mapa de declividade, formando, então, o inventário final confeccionado nesta pesquisa. Tais
ocorrências foram analisadas, relacionando os quantitativos dos fenômenos constatados às classes de
declividade previamente mapeadas.
Por fim, o histograma de precipitação foi obtido por meio do gerenciamento dos dados no software
Microsoft Excel, com posterior plotagem dos gráficos mensais no período de 2017 a 2021. Para relacionar as
ocorrências à precipitação no ano de 2019, os valores de precipitação diária e acumulada em um período de
72h também foram obtidos e relacionados às datas de ocorrência desses desastres.

4 Resultados

4.1. Inventário de ocorrências

No inventário de movimentos de massa e transporte obtido, foram constatadas 285 ocorrências


recorrentes e/ou recentes no total, sendo estas classificadas como deslizamentos, com 241 incidências (84,5%),
e ravinas, com 44 (15,5%). Registros fotográficos de algumas das ocorrências observadas em campo podem
ser observados na Figura 4.

Figura 4. Registros fotográficos de ocorrências observadas em campo.


136
Figura 5. Inventário de ocorrência de movimentos de massa e transporte na sub-bacia investigada.

No mapa de declividade obtido, foi constatado que a maior parte do relevo (53%) possui declividades
inferiores a 11º, porém, como esperado, sobrepondo as ocorrências a este, verificou-se que os processos se
deram em áreas com inclinações superiores a este valor – Figura 5. A maior concentração destes fenômenos
(47,4%) ocorreu em relevos classificados como forte ondulado (135 ocorrências); seguido por relevos
montanhosos (99 ocorrências, correspondendo a 34,7% dos eventos); forte montanhosos (27 ocorrências, 9,5%
dos eventos); e ondulados ( 24 ocorrências, 8,4% dos evetos), conforme sumarizado na Tabela 1.

Tabela 1. Sumarização da relação entre a declividade e as ocorrências de movimentos de massa e transporte.


Suave Forte Forte
Relevo Plano Ondulado Montanhoso Total
ondulado ondulado montanhoso
Declividade (º) 0-7 7 - 11 11 - 17 17 - 27 27 - 45 > 45 -

Área (m²) 561693 111652 19165 239674 317259 32146 1281589

Área (%) 44% 9% 1% 19% 25% 3% 100%

Deslizamentos - - 22 122 81 16 241

Ravinas - - 2 13 18 11 44
Nº total de
- - 24 135 99 27 285
processos¹
Total de
- - 0,00125 0,00056 0,00031 0,00084 -
Ocorrências/m²
Presente até
Rara /
Ocupação Presente Presente Presente Presente 35º de -
ausente
declividade
¹ Nº total de processos = Nº de deslizamentos + Nº de Ravinas
137
Figura 6. Ocupação nas classes de relevo (a) plano; (b) suave ondulado; (c) ondulado; (d)forte ondulado;
(e)montanhoso); (f) forte montanhoso.

Sabe-se que o relevo, com destaque para a inclinação, constitui um dos principais fatores condiconantes
dos movimentos de massa e dos processos erosivos, que têm sua probabilidade de ocorrência aumentada à
medida que são constatados maiores valores de declividade. Analisando os resultados obtidos, no entanto, não
se verifica um aumento proporcional entre o número de ocorrências e a declividade do terreno.
Relacionando as ocorrências/m² para cada classe de relevo, constata-se que a preponderância de
processos por metro quadradado se dá em relevos ondulados, seguidos pelos forte montanhosos, forte
ondulados e montanhosos o que implica que não se pode analisar isoladamente a declividade no acometimento
destes processos, mas também deve-se relacioná-los a outros fatores influentes.
Observando a ocupação sobre as diferentes classes de declividade, constata-se que as áreas que possuem
construções se condensam, sobretudo, em relevos planos, suave ondulados, ondulados, forte ondulados e
montanhosos, sendo neste constatado ocupações até os 35º. Para declividades superiores a estas, incluindo as
áreas cujo relevo é forte montanhoso, a ocupação é espaçada e praticamente inexistente – Figura 6.
Assim, os processos foram preponderantes em áreas densamente ocupadas, indicando que, além do
relevo em si, há a influência de fatores antrópicos no desencadeamento destes eventos. De acordo com
Coutinho e Silva (2005), a ocupação antrópica desordenada provoca, de modo geral, uma maior probabilidade
de ocorrência de processos erosivos e movimentos de massa, o que indica que há coerência nos resultados
observados.

4.2. Influência da chuva no desencadeamento dos processos


Os deslizamentos associados ao longo dos dias de chuvas acumuladas no ano de 2019 estão apresentados
na Figura 7, que mostra que aproximadamente 73% dos eventos (16 casos) foram registrados quando a chuva
acumulada ultrapassou os 750 mm. Os dados de precipitação são do pluviômetro Bairro dos Estados, inserido
na sub-bacia em investigação nas coordenadas UTM de latitude 282328.71 m E e longitude 9112303.84 m S.
No ano em questão, cinco vítimas fatais foram registradas na área de estudo no mês de junho, o qual teve um
total pluviométrico de 426,71 mm, 26% a mais que a média mensal, que é de 339 mm de acordo com a Agência
Pernambucana de Águas e Clima (APAC, 2022).

Figura 7. (a) Ocorrência de movimentos de massa e sua relação com a precipitação - jan a dez de 2019; (b)
Ocorrência de movimentos de massa devido à chuva acumulada desde 0/Jan de 2019 (mm)
138
Figura 8. Ocorrência de movimentos devido à chuva concentrada de 72h (mm).

A Figura 8 mostra a distribuição dos eventos de deslizamentos devido à chuva acumulada de 72h.
Conforme observado, a maioria dos processos teve chuva acumulada de mais de 80 mm/72h. Dois dos quatro
deslizamentos registrados com chuva acumulada abaixo de 80mm aconteceram em fevereiro, com chuva
concentrada de mais de 60 mm em 24 h. Bandeira e Coutinho (2015) verificaram maiores concentrações de
ocorrências no Bairro dos Estados (inserido na Regional II de Camaragibe) para precipitações acumuladas
superiores a 60 mm em 72 horas. Na pesquisa atual, 90% dos eventos (18 ocorrências) ocorreram para
precipitações acumuladas em 72 horas com valores iguais ou superiores a este valor, ratificando a pesquisa de
tais autores.

Tabela 2. Parâmetros de precipitação acumulada.


Parâmetro /
06/fev 20/abr 13/jun 24/jul
Data de ocorrência
Nº de ocorrências 2 2 7 9
I72h (mm) 75,32 13,00 96,94 168,73
Pac (mm) 183,34 554,2 913,06 1667,02
Rcrít (mm²) 13809,17 7204,6 88512,04 281276,3

A sumarização dos parâmetros de chuva acumulada em 72h (I72h), chuva acumulada em longo prazo
(Pac) e do parâmetro Rcrít, resultado do produto entre I72h e Pac, está apresentada na Tabela 2. Considerando a
proposta de Bandeira e Coutinho (2015) para os sistemas de alarme da Defesa Civil de Camaragibe na área de
investigação (Tabela 3), percebe-se que há o registro de alerta em três dias com registro de ocorrências, com
níveis de aviso para o dia 06/02/2019 e de alerta para os dias 13/06/19 e 24/07/19, enquanto que no dia
20/04/2019 a precipitação não demostrou ter sido a principal influência na ocorência dos eventos observados.
Desta maneira, constata-se que as chuvas intensas, tal como as acumuladas, associadas ao modelo de
ocupação desordenada potencializam a ocorrência dos movimentos na sub-bacia estudada, podendo trazer
riscos à população que nela está inserida e uma série de danos sociais, ambientais e econômicos oriundos dos
processos de instabilidade.

Tabela 3 - Parâmetros propostos de chuva acumulada para os níveis operacionais da Defesa Civil de
Camaragibe. Fonte: Bandeira e Coutinho (2015).
Área IV - Área IV – Vera
Nível / área Área I Área II Área III
Tabatinga Cruz
Observação A partir de 1º de janeiro
I72h=100 mm ou I72h = 60 mm ou I72h = 80 mm ou I72h = 60 mm ou I72h = 80 mm ou
Aviso* Pac=750 mm ou Pac=600 mm ou Pac=600 mm ou Pac=750 mm ou Pac=600 mm ou
Rcrít=75.000mm² Rcrít=36.000mm² Rcrít=48.000mm² Rcrít=45.000mm² Rcrít=48.000mm²

I72h =100 mm e I72h =60 mm e I72h = 80 mm e I72h = 60 mm e I72h = 80 mm e


Alerta
Rcrít=75.000 mm² Rcrít=36.000mm² Rcrít=48.000mm² Rcrít=45.000mm² Rcrít=48.000mm²
Alerta máximo Quando o alerta acontece em todas as áreas do município
* Neste estágio, deslizamentos isolados podem acontecer, particularmente com chuva forte acumulada em 24h
139
5 Conclusões

Este artigo teve como objetivo confeccionar um inventário de ocorrências de deslizamentos e erosões
em uma sub-bacia hidrográfica situada na Região Metropolitana do Recife. O inventário demonstrou a
existência de cicatrizes de fenômenos erosivos e de movimentos de massa recorrentes e/ou recentes na região
investigada, sendo estes identificados como deslizamentos (84,5%) e ravinamentos (15,5%), respectivamente.
Na área de estudo, que está inserida na Formação Barreiras, foi observado que há uma maior
condensação de movimentos gravitacionais e de transporte em encostas mais densamente povoadas e com
relevo forte ondulado a forte montanhoso, o que indica que a ação antrópica, bem como a geomorfológica,
podem constituir fatores importantes para deflagração destes fenômenos.
Da mesma maneira, a relação entre as precipitações mensais e a frequência de ocorrência observada
indicou que os movimentos se concentram no período de outono-inverno, tendo sido constatado através da
relação entre as precipitações acumuladas em um período de 72h e a distribuição das ocorrências destes eventos
que as chuvas intensas e acumuladas, associadas ao modelo de ocupação desordenada, potencializam a
ocorrência dos movimentos na sub-bacia estudada, podendo trazer riscos à população que nela está inserida.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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140
Índice de Precipitação Antecedente para estimar umidade do
solo e correlacionar como processo desencadeador na
ocorrência de movimento de massa
Marcio A. E. de Moraes
Pesquisador Titular, Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais, São José
dos Campos-SP, Brasil, marcio.moraes@cemaden.gov.br
Rodolfo M. Mendes
Pesquisador Titular, Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais, São José
dos Campos-SP, Brasil, marcio.moraes@cemaden.gov.br

RESUMO: Movimentos de massa são fenômenos muito perigosos que ocorrem em diferentes partes
do mundo e representam ameaças significativas para os seres humanos. Eventos de chuvas intensas é
o principal processo desencadeador de deslizamentos de terra nas regiões de encostas urbanizadas,
principalmente aquelas consideradas áreas de risco, também vários outros fatores contribuem para o
processo, portanto, é necessário analisar as causas de tais incidentes relacionados de todas as formas
possíveis. A umidade do solo desempenha um papel importante nos sistemas de interação superfície-
atmosfera da Terra, portanto medições e suas estimativas são cruciais para compreender todos os
processos envolvidos no balanço hídrico, especialmente aqueles relacionados à deslizamentos de
terra. A umidade do solo pode ser estimada a partir de medições in situ usando diferentes sensores e
técnicas, sensoriamento remoto por satélite, modelagem hidrológica e indicadores para indexar as
condições de umidade. A umidade do solo antecedente pode ser responsável por uma diferença
significante no escoamento referente ao mesmo evento de chuva em uma bacia hidrográfica. O Índice
de Precipitação Antecedente (“Antecedent Precipitation Index- API”) ou "chuva retida", juntamente
com a condição de umidade antecedente do Serviço de Conservação de Recursos Naturais, são
geralmente aplicados para a estimativa do escoamento em bacias hidrográficas onde os dados são
limitados ou não disponíveis. Este trabalho tem como objetivo explorar o API na estimativa da
umidade do solo e estabelecer limiares com base nas ocorrências de deslizamentos ocorridos. A
umidade estimada do solo será comparada e calibrada usando medições realizadas por meio de sondas
que usam multisensor por capacitância instaladas em área de risco localizada na região montanhosa
do município de Campos do Jordão pertencente a São Paulo/Brasil. A API considerada no cálculo
recebeu modificações, onde o coeficiente de recessão depende da variabilidade da temperatura do ar
como também a temperatura da média climatológica, que pode ser considerado como perdas no
balanço hídrico por evapotranspiração. Uma vez calibrado o API, ele será usado para extrapolar para
toda a bacia hidrográfica e consequentemente a umidade do solo. Usando movimentos de massa
registrados e confrontando com API e umidade do solo, será possível determinar limiares, portanto,
poderá ser usado para antecipar a ocorrência de deslizamentos.

PALAVRAS-CHAVE: Movimento de massa, índice de chuva antecedente, umidade do solo,


limiares, balanço hídrico.

ABSTRAC: Landslides are very dangerous phenomenon occurring into different parts around the
world and have posed significant threats to humans. Intense heavy rainfall is the main process
triggering landslides in the urbanized slope regions, mainly those considered risk areas, and several
other factors contribute to the process, therefore, it is necessary to analyze the causes of such related
incidents in all possible ways. Soil moisture plays important role in the Earth surface-atmosphere
interactions systems, hence, measurements to estimate is crucial to understand all process involved

141
in water balance, and especially those related to landslides. The soil moisture can be estimated from
measurements in situ using different sensors and techniques, satellite remote sensing, hydrological
modeling, and indicators to index the moisture conditions. Antecedent soil moisture can be
responsible for a difference of several times in runoff from the same storm in an identical watershed.
The Antecedent Precipitation Index (API) or “retained rainfall”, together with the Natural Resource
Conservations Service’s antecedent moisture condition are usually applied for the estimation of
runoff on watersheds where data are limited or not available. This work has the subject to explore the
API in estimating the soil moisture and establishes thresholds based on registered landslides
occurrences. Estimated soil moisture is compared with in situ measurements from multisensor
capacitance probes installed on risk area located in the mountain region of Campos do Jordão
municipality belonging to São Paulo/Brazil. The API used follow the modifications proposed by Zhao
(2019), where the recession coefficient depend on air temperature variability, which could consider
the variation of evapotranspiration process. Once the API is calibrated, it will be used to extrapolate
to entire watershed and, thereafter soil moisture. Using recorded landslides and confronting with API
it will be possible to determine threshold, hence, it could be used to anticipate landslides occurrence.

KEYWORDS: Landslides, Antecedent Precipitation Index, Soil Moisture, Threshold, Water balance.

1 Introdução

Movimentos de massa, principalmente os deslizamentos de solo são considerados desastres


naturais de grande frequência e que causam perdas de vidas humanas como também perdas
econômicas (Aditian, 2018). No Brasil, as regiões mais atingidas são as encostas densamente
urbanizadas presentes, principalmente, nos grandes centros urbanos do Sul, Sudeste e Nordeste. Nas
regiões Sul e Sudeste, a maioria das ocorrências de movimentos de massa são nas encostas ocupadas
das regiões montanhosas da costa brasileira (Coelho-Netto, 2009). Na região Nordeste, de acordo
com o atlas brasileiro de desastres naturais (2013), as ocorrências estão concentradas na Bahia e em
Pernambuco, que tem características de formação barreiras (Bandeira 2015).
A principal variável ambiental preparatória e desencadeadora do processo de deslizamento é
a chuva. Alguns índices de chuva, tais como acumulados de chuva de 24h, 48h ou 72 h, obtidos por
métodos de correlação empírica, por exemplo, são usualmente empregados em Planos Preventivos de
Defesa Civil como limiares críticos operacionais em sistemas de alertas para previsão de
deslizamentos em encostas urbanizadas. No entanto, o conhecimento e uso apenas dos limiares de
chuva não permite a emissão de alertas precisos e consistentes, pois o processo de deflagração dos
deslizamentos envolve outros fatores ou variáveis geoambientais com o mesmo grau de importância
que a chuva.
Neste contexto, destacam-se as variáveis geoambientais ou geotécnicas denominadas de
sucção matricial e umidade do solo. O conhecimento do comportamento dessas variáveis em solos
não saturados é imprescindível para compreender melhor o mecanismo de ruptura dos deslizamentos
em encostas urbanas e, consequentemente, definir limiares críticos operacionais mais precisos e
robustos, usando-os conjuntamente com limiares de chuva (acumulados e intensidade) para prever a
ocorrência deste tipo de processo.
A umidade do solo é uma variável geotécnica que pode ser obtida por meio de medição direta
in situ, a partir do uso de sensores/equipamentos de monitoramento em tempo real, ou estimada a
partir de diferentes técnicas ou métodos empíricos, inclusive utilizando dados de monitoramente para
calibração ou ajuste dos modelos de previsão (Teng et al. 2007; Zhao et al. 2011; Ma et al. 2014;
Suribabu and Sujatha 2019; Zhao et al. 2019; Schoener and Stone 2020).
Estimativas de umidade do solo com base em modelos podem cobrir uma ampla gama de
escalas espaciais e temporais como também sua complexidade. Uma abordagem amplamente
utilizada para inferir a umidade do solo é embasada no índice de precipitação antecedente

142
(“Antecedent Precipitation Index – API), que é calculado por meio da somatória da chuva diária
antecedente, ponderada por um determinado fator a ser determinado, que pode englobar toda a
complexidade das características do solo e seus processos devido a um evento de chuva.
Logo, o presente trabalho propõe estimar a umidade do solo e estabelecer limiares críticos
operacionais com base nas ocorrências de deslizamentos pretéritos, a partir de modelagem empírica
do índice de precipitação antecedente (API), usando medições de campo de umidade do solo obtidas
por meio de sensores e equipamentos que usam multisensor por capacitância instaladas em área de
risco localizada na região montanhosa do município de Campos do Jordão pertencente a São
Paulo/Brasil.

2 Área de estudo e fonte dos dados

O município de Campos de Jordão localiza-se no Estado de São Paulo, na fronteira com Minas Gerais,
precisamente na região montanhosa, denominada de Serra da Mantiqueira, que é parte do Planalto
Atlântico, possuindo altitudes que variam desde 922 metros no vale do Rio Sapucaí junto à divisa
com o Município de Piranguçu (Minas Gerais), até 2008 metros na região da Fazenda da Lavrinha no
Município de Guaratinguetá (SP). A Figura 1 mostra a localização de Campos do Jordão, o modelo
digital de elevação do terreno, como também a área específica, denominada aqui de “região de
monitoramento”.

Monitoring
region

Figura 1 – Localização do Município de Campos do Jordão, o Modelo de elevação do terreno, e a


região do Município que é objetivo de estudo desse trabalho, a “região de
monitoramento”.

A região urbana do município situa-se no compartimento do planalto conhecido como


Planalto de Campos do Jordão que apresenta relevo de morros com serras restritas, caracterizado por
topos arredondados, vertentes com perfis retilíneos, por vezes abruptas, drenagem de alta densidade,
padrão dendrítico a pinulado, vales fechados com planícies interiores restritas (PONÇANO et al,
1981).
O relevo é suportado por rochas metamórficas com intrusões graníticas que seguem uma
estruturação regional de direção NE dada por zonas de cisalhamento e foliação metamórficas das
rochas pré-cambrianas, com destaque para a Falha de Jundiuvira situada na borda do Planalto de

143
Campos de Jordão próxima à escarpa com a Serra da Mantiqueira. As rochas predominantes
correspondem gnaisses e migmatitos do Complexo Paraíba do Sul (BISTRICH ET AL, 1981). Os
materiais não consolidados são encontrados na forma de depósitos sedimentares e solos residuais.
Nas planícies fluviais em anfiteatros erosivos ocorrem pacotes de argila orgânica
significativos. Os solos residuais sobrepostos às encostas de rochas cristalinas correspondem a
cambissolos. A variação textural destes solos resulta da heterogeneidade do maciço rochoso gnaisse-
migmatítico, sendo no geral predominantemente formados por silte e areia fina, com ocorrência de
argila variável, a depender do grau de alteração do perfil. O material saprolítico formado subjacente
aos horizontes residuais, resultante da decomposição da rocha gnaisse-migmatítica, apresenta textura
predominantemente areno-argilosa, sendo que a quantidade de silte e argila pode variar em
profundidade (IG, 2014).
As temperaturas médias anuais variam em torno dos 14 °C, com mínimas abaixo do 0 °C e
máximas podendo ultrapassar os 30 °C. A pluviosidade tem grande variação atingindo totais anuais
entre 800 e 2800 mm. A distribuição das chuvas durante o ano mostra concentração superior a 80%
entre os meses de outubro a março, sendo que dezembro, janeiro e fevereiro são os meses mais
úmidos. De acordo com Delgado (2004) este período chuvoso faz parte do fenômeno de grande escala
conhecido como Zona de Convergência do Atlântico Sul – ZCAS, que é um dos fenômenos mais
importantes na escala regional do verão na América do Sul. Muitos eventos de enchentes, inundações
e movimento de massa estão associados a chuvas extremas causadas por ZCAS (Seluchi, 2009; da
Silva et. al, 2020; da Silva et al, 2018; Vasconcelos, 2010, Hirata, 2017).
Campos do Jordão, devido seu relevo bastante íngreme, com vales, anfiteatro e escarpas
acidentadas, apresenta grande recorrência em eventos de movimento de massa como também de
inundações. Em janeiro de 2000, foi registrado um dos piores deslizamento de terra, onde ocorreram
a perda de 10 vidas, mais de 100 pessoas feridas e 423 casas gravemente afetadas nas suas estruturas
(Mendes et. al 2018 a, b; Mendes e Valerio-Filho, 2015). As regiões do município que mais sofre
com movimento de massa são os bairros da Vila Albertina, Santo Antônio e Britador, que estão
inseridos na bacia do Rio Piracuama. Devido a recorrência de eventos, essa região do município
recebeu equipamentos e sensores para monitoramento em tempo real, que são sensores de umidade,
pluviômetros e sensor nível de rio. A localização dos sensores, mapeamento do grau de risco de
deslizamento, a drenagem e a delimitação da bacia são mostradas na Figura 2. Também é apresentado
a localização dos registros das ocorrências de movimentos de massa para o período de 2009 até 2020.

Sensor
Umidade
EnviroScan™

Figura 2 – Bacia do rio Piracuama e localização dos sensores para monitoramento da chuva e
umidade do solo, nível do rio, como também o mapeamento de risco para deslizamentos
e o registro das ocorrências de deslizamentos.

144
Os sensores de umidade mostrados na Figura 2, são sensores do tipo EnviroScan™ instalados
em tubos de acessos fabricados por Sentek Pty. Ltd, contendo seis sensores capacitivos (distanciados
a cada 50 cm) distribuídos ao longo de três metros inseridos no solo. Os sensores geram saídas em
conteúdo volumétrico de água no solo (milímetros de água por 100 mm de solo). Esses valores são
convertidos de uma frequência em escala usando uma equação de calibração padrão, tendo como base
dados obtidos de vários estudos científicos em uma variedade de texturas de solo (Mendes et all.,
2018). Os dados disponíveis dos sensores de umidade estão limitados ao período de 04/12/2019 até
o presente momento, mas os dados para o mês de dezembro de 2019 tiveram que ser descartados por
possuírem erros na calibração. Desta forma, definiu-se o período de 01/01/2020 até 31/12/2021 como
a base de dados para análise neste trabalho.
Na Figura 3 é apresentada as variações de temperatura diária (máximos, mínimos e médias
diárias), a temperatura diária média climatológica (calculada com base na série história da estação
meteorológica do INMET), a precipitação diária e a umidade do solo para as diferentes profundidades
(50cm a 300cm), para um dos pontos de coletas mostrados na Figura 2. Pode-se observar uma clara
distinção entre o período seco, iniciando no mês de abril, e o período úmido iniciando em outubro,
com temperaturas máximas bem acima da média climatológica. Também fica claro que a umidade do
solo, na profundidade de 50cm, tem resposta à chuva de forma bem mais rápida. Em relação a
temperatura, pode ser observado que no período seco as temperaturas atingem seus valores mínimos,
tanto para as máximas diárias quanto para as mínimas.

Figura 3 – Temperatura (máxima, mínima, média diária, e média climatológica), precipitação e a


umidade do solo registrada para diferentes profundidades.

3 Índice de Precipitação Antecedente

O índice de chuva antecedente (API) é geralmente usado para estimar escoamentos superficiais, com
base em eventos de chuvas registradas por meio de pluviômetros ou por outras técnicas de estimativa,
em bacias hidrográficas não monitoradas ou sem informações que permitam o cálculo direto, como
por exemplo dados de vazão (Ali, 2010). A precipitação antecedente é calculada com base na chuva
registrada dias antes em relação ao dia do evento que se refere, podendo também ser usada como uma

145
medida da umidade do solo. A condição inicial do solo, em relação ao seu conteúdo de água, é de
importância crucial ter conhecimento quantitativo uma vez que o solo seco responde diferentemente
de um solo úmido ou saturado. O processo físico pode ser bem complexo, mas conceitualmente pode-
se dizer que a resposta difere devido a redução da capacidade de infiltração (Heggen, 2001).

Kohler e Linsley`s (1951) apresentaram uma equação para o cálculo do API, da seguinte
forma:

𝐴𝑃𝐼 = ∑"# "!


!$"% 𝑃! 𝑘 (1)

Onde 𝑖 representa o número de dias antecedentes, 𝑘 é uma constante de decaimento, também


chamado de coeficiente de recessão, e 𝑃! é a precipitação durante o dia 𝑡. Esse modelo também pode
ser considerado como “chuva retida” (Singh, 1989).
A Equação 1, apresenta o coeficiente de recessão sendo constante, discordando dos processos
físicos que variam em diferentes escalas temporais. O coeficiente de recessão deve considerar as
perdas de água seja devido a evapotranspiração ou por drenagem. Uma vez que a evapotranspiração
depende de diversos fatores (por exemplo: temperatura, radiação solar, velocidade do vento, entre
outros), que variam ao longo do dia, o coeficiente de recessão deve ser calculado de forma a
considerar essa variabilidade. Zhao (2019) propôs uma reformulação no cálculo do coeficiente de
recessão considerando apenas a variação da temperatura diária, sendo expressa pela Equação (2).

𝑘 = 0.84 + 𝛿(20 − 𝑇&'( ) (2)

Onde 𝑇&'( é a temperatura média diária (℃) e 𝛿 é um parâmetro de sensibilidade (℃"% ). O


valor 0.84 usado na equação advém da recomendação do trabalho de Crozier e Eyles (1980), e a
temperatura de 20 ℃ é a temperatura usada quando o valor 0.84 é considerado.
Partindo da Equação (2), é proposto neste trabalho modificações que consideram variabilidade nos
dois valores constantes usados no trabalho de Zhao (2019), com o objetivo de capturar a dinâmica
local, sendo expressa pela Equação (3).

𝑘 = 𝑘)*! + 𝛿(𝑇+,! − 𝑇&'( ) (3)

Onde 𝑘)*! representa o valor otimizado, para cada ponto onde o API for calculado, do
coeficiente de recessão, a ser determinado, 𝑇+,! é a temperatura diária média climatológica calculada
com base na série histórica registrada. Com as modificações é esperado que a correlação entre API e
a umidade do solo seja melhorada, uma vez que os parâmetros serão otimizados levando em conta a
variação diária da temperatura (diferença em relação à média climatológica), como também o
coeficiente de recessão otimizado.

A estratégia utilizada para encontrar os valores ótimos de 𝑘)*! e 𝛿 partiu da construção de


uma função, 𝑘(𝑡, 𝑘)*! , 𝛿, 𝑇+,! , 𝑇&'( ), com variação diária (𝑡 ) dependente do coeficiente de
recessão padrão ( 𝑘)*! ), do parâmetro de sensibilidade(𝛿) e das temperaturas (𝑇+,! , 𝑇&'( ). Essa
função é usada para o cálculo do API (Eq. 1), onde o 𝐴𝑃𝐼(𝑃! , 𝑘, 𝑝𝑠, 𝑛𝑎𝑝𝑖) depende da precipitação
(𝑃! ), do coeficiente de recessão (𝑘), calculada para cada profundidade (𝑝𝑠) registrada nos sensores
de umidade do solo (50𝑐𝑚 𝑎 300𝑐𝑚) e para diferentes quantidade de dias antecedentes (𝑛𝑎𝑝𝑖 = 3, 7,
14, 21 e 28 dias).

Para se alcançar os valores ótimos dos parâmetros 𝑘)*! e 𝛿, comparou-se a API resultante
com os valores da umidade de solo para as diferentes profundidades e calculou-se o coeficiente de
correlação de Pearson. Diferentes combinações 𝑘)*! e 𝛿 foram utilizados para o cálculo do coeficiente

146
de recessão, com o objetivo de ajustar 𝑘 para melhor representar a taxa de infiltração de água no solo
da região estudada. A Figura 4 apresenta os intervalos de valores para 𝑘)*! e 𝛿 para as diferentes
profundidades do solo e considerando 28 dias de chuva antecedente para o cálculo do API, como
também a região onde os coeficientes de correlação atingem os melhores resultados. Pode-se observar
que as profundidades de 50𝑐𝑚 𝑒 100𝑐𝑚 se apresentam como as melhores candidatas para se
estabelecer uma relação entre o API e umidade do solo.

Figura 4 – variação dos parâmetros 𝑘)*! e 𝛿, como também os coeficientes de correlação calculados
para cada combinação entre 𝑘)*! e 𝛿, representado pela escala de cores.

Para se determinar os melhores coeficientes de correlação realizou-se uma busca em todas as


combinações para os parâmetros 𝑘)*! e 𝛿 (com os intervalos de acordo com a Figura 4), nas diferentes
profundidades como também para diferentes números de dias antecedentes do API. A Figura 5
sintetiza a busca dos melhores valores para o coeficiente de correlação entre a umidade do solo e API.
Pode-se observar que para o API de 3, 7, e 14 dias antecedentes (representado pelos números internos
aos círculos da figura), em quase todas as profundidades do solo (com exceção de 50cm), as
correlações ficaram abaixo de 0.70 e para 21 e 28 dias as correlações alcançaram os melhores
resultados ficando com valores acima de 0.7 para profundidades de 50cm e 100cm, e os piores
resultados foram paras as profundidades de 200cm e 300cm. Desta forma, para se alcançar a melhor
correlação deve ser usado o API de 28 dias e profundidade de 50cm. Cabe ressaltar que as correlações
foram obtidas com uma série histórica limitada de dois anos, que pode acarretar valores baixos para
as correlações, como também limitar para outras profundidades. O ideal seria uma boa correlação
com solos mais profundos, especialmente de 250cm, uma vez que nesta profundidade é que mais se
caracteriza com eventos de movimento de massa. O valor 0cm na Figura 5 se refere a umidade do
solo média calculada com base nas diferentes profundidades, a qual não se apresentou com boa
correlação.
No trabalho de Zhao (2019) o parâmetro 𝑘)*! tem valor fixado em 0.84, e o valor de 𝛿 foi
explorado entre 0 e 0.03, obtendo o valor ótimo em 0.012, sendo essa otimização válida para umidade
do solo na profundidade de até 10cm e API calculado para 3 dias de antecedência, usando uma série
histórica de 11 anos. Também foi explorado a limitação no valor do APImax, para expressar a
capacidade máxima de retenção da água no solo que pode superestimar a umidade do solo. Essa
limitação é imposta no cálculo do API quando este atinge um certo limiar, e em Zhao (2019) foi
definido como limiar o valor de 35mm, o qual melhorou consideravelmente a correlação entre o API
e a umidade do solo. Este procedimento também foi empregado no API proposto aqui neste trabalho,
onde o coeficiente de correlação atingiu o valor de 0.89 na profundidade de 50cm, com 𝐴𝑃𝐼-&. =
120𝑚𝑚.

147
Figura 5 – Resultados da busca dos melhores coeficientes de correlação de Pearson entre a umidade
do solo e API para as diferentes profundidades do solo e número de dias antecedentes
usados para o cálculo do API.

Com os parâmetros otimizados, 𝑘)*! e 𝛿, pôde-se chegar ao melhor API, e partindo-se deste
foi possível construir curvas ajustadas para representar a relação entre API e a umidade do solo (Θ).
A Figura 6 apresenta a dispersão dos pontos de Θ 𝑥 𝐴𝑃𝐼+ (parte superior), e a melhor curva ajustada
que tem comportamento exponencial e coeficiente de Pearson com valor igual a 0.82; e na parte
inferior, tem-se a dispersão Θ 𝑥 𝐴𝑃𝐼-&. , com curva ajustada tendo comportamento linear e
coeficiente de Pearson em 0.89. Pode-se observar que ao limitar o cálculo do API a relação com a
umidade do solo tende a ser linear, mesmo usando uma série histórica curta de dois anos.

Figura 6 – Ajuste de curva para os índices APIc e APImax calculados na profundidade do solo em
50cm.

Uma vez que a proposta é estabelecer o API para estimar a umidade do solo em pontos onde
não se tenha sensores de umidade, como também definir limiares que desencadeiam movimentos de

148
massa, fez-se um levantamento das ocorrências de deslizamentos na região de estudo os quais são
sintetizados na Tabela 1, que apresentam somente os registros para o período de dados dos sensores
de umidade (01/01/2020 – 31/12/2021). Pode-se observar que as ocorrências foram registradas no
período chuvoso do município, que abrange os meses de outubro até abril. A Figura 7 mostra a
localização dos eventos de deslizamentos registrados, sendo apresentados somente àqueles que
ocorreram próximo ao sensor de umidade. Estas informações são essenciais para verificação da
eficiência em usar o API como estimador de umidade do solo e consequentemente estabelecimento
de limiares.

Tabela 1 – Registro das ocorrências de movimentos de massa


Data Tipo Impacto
07/02/2020 Em talude de aterro lançado/natural 15 pess. / 3 moradías em risco
09/12/2020 Em talude de corte/aterro lançado 3 pess. / 2 moradías interditadas
09/12/2020 Em talude de corte/aterro lançado 16 pess. / 4 moradías interditadas
09/12/2020 Em talude de corte 4 pess. / 1 moradía em risco
09/12/2020 Em talude de corte 4 pess. / 1 moradía em risco

Figura 7 – Localização dos registros de deslizamentos ocorridos em 2020.

A verificação de performance do API como índice para prever movimentos de massa pode,
inicialmente, ser observada por meio da Figura 8, onde se observa o momento da ocorrência dos
deslizamentos e os valores para, 𝐴𝑃𝐼+ , 𝐴𝑃𝐼-&. (figura 8a), umidade do solo observado (Θ) e a
umidade calculada por meio do 𝐴𝑃𝐼-&. (figura 8b). Na Figura 8a, observa-se que no primeiro evento
de deslizamento (07/02/2020), o 𝐴𝑃𝐼+ atingiu o máximo antes do deslizamento, e no segundo evento
(09/12/2020), o valor máximo do 𝐴𝑃𝐼+ coincidiu. Dessa forma 𝐴𝑃𝐼+ não poderia ser considerado um
bom preditor uma vez que nos eventos não forneceu um comportamento padrão. Para o 𝐴𝑃𝐼-&. , em
ambos os eventos, o comportamento foi padrão, onde ao atingir um valor máximo os eventos
ocorreram acima deste, indicando uma boa performance em prever eventos de deslizamentos.
Fazendo-se análise semelhante para a umidade do solo observada e calculada por meio do 𝐴𝑃𝐼-&. ,
(Θ/01 ) (figura 8b), pode-se observar que o valor máximo foi alcançado antes da ocorrência dos
deslizamentos, também indicando ser um bom preditor de eventos.

149
Figura 8 – (a) variação ao longo do período de observação para 𝐴𝑃𝐼+ e 𝐴𝑃𝐼-&. confrontados com
os eventos de deslizamentos. (b) umidade do solo observada e umidade do solo
calculada por meio do 𝐴𝑃𝐼-&. (Θ/01 ) confrontados com os eventos de deslizamentos.

Fazendo-se uma análise mais detalhada da Figura 8, ressaltando as datas dos deslizamentos,
pode-se observar que Θ/01 atinge valor máximo de 0.29 alguns dias antes da ocorrência dos
deslizamentos nas duas datas distintas (Figura 9), e que a umidade do solo observada teve variação
em relação as ocorrências, não indicando um limite claro para o deslizamento. Desta forma, pode-se
estipular um limiar inicial, para o ponto verificado, sendo de Θ/01 = 0.29. Cabe ressaltar que a série
histórica, tanto para o registro da umidade do solo quanto para os eventos de deslizamentos, é bem
curta podendo limitar as correlações calculadas, como também a análise de performance do API como
um possível previsor de movimentos de massa.

Figura 9 – Detalhe da variação da umidade do solo observada e Θ/01 para as datas de ocorrências de
deslizamentos.

150
4 Conclusões

A proposta deste trabalho foi de estabelecer um modelo para o cálculo de índice de chuva
antecedente e com este obter umidade do solo com a finalidade de estimar um limiar crítico para
movimentos de massa. Apesar da série histórica da umidade de solo e dos eventos de deslizamentos
serem curtos, os resultados se mostraram promissores, uma vez que Θ/01 apresentou seu valor
máximo (Θ/01 = 0.29) antes da ocorrência dos deslizamentos do período verificado, indicando que
pode ser usado como limiar para a região próxima (Figura 7) do sensor de umidade. A próxima etapa
do trabalho será expandir este modelo para outras regiões do município como também para outros
períodos do passado, para que se consiga estabelecer limiares mais precisos e confiáveis e assim este
modelo poderá ser usado em um sistema de previsão e alerta de movimentos de massa.

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152
Carta de Suscetibilidade Geomorfológica a Movimentos de
Massa para as Regiões Administrarivas de São Paulo, São José
dos Campos, Baixada Santista e Registro
Tamara Vieira Pascoto
Doutoranda, Universidade Estadual Paulista (UNESP), Bauru, Brasil, tamara.pascoto@unesp.br

Julia Rodrigues
Graduanda, Universidade Estadual Paulista (UNESP), Bauru, Brasil, julia.rodrigues1@unesp.br

Anna Silvia Palcheco Peixoto


Professora, Universidade Estadual Paulista (UNESP), Bauru, Brasil, anna.peixoto@unesp.br

RESUMO: A geomorfologia é um dos fatores desencadeadores dos movimentos de massa e desenvolver


carta de suscetibilidade geomorfológica para regiões em que são frequentes esses desastres torna-se uma
maneira de auxiliar na mitigaçãode riscos. Desse modo, esse trabalho teve como objetivo desenvolver uma
carta de suscetibilidade geomorfológica a movimentos de massa para as regiões administrativas de São
Paulo, São José dos Campos, Baixada Santista e Registro. Primeiramente foi feito um inventário dos
desastres de origem geológica da região com informações contidas no banco de dados do IPMET. Com o
auxílio da carta geomorfológica do IPT, foram determinadas as frequências em que os desastres ocorreram
para cada classe geomorfológica. A classe que apresentou a maior quantidade dos desastres foram as
Colinas pequenas com espigões locais. As frequências foram normalizadas, separadas em 5 classes de
suscetibilidade e espacializadas em SIG. Em toda a área, 48,8% foi classificada como muito alta a alta
suscetibilidade, se concentrando na grande São Paulo, na região da rodovia Dutra, e ao noroeste de São
José dos Campos. Apesar de ser necessário desenvolver outras cartas de suscetibilidade que abrangem
outros fatores, isso mostra que é necessário desenvolver politicas públicas específicas para minimizar os
riscos existentes na área.

PALAVRAS-CHAVE: Suscetibilidade, Geomorfologia, Movimento de massa, SIG

ABSTRACT: Geomorphology is one of the triggering factors of mass movements and to develop a
geomorphological susceptibility map for regions where these disasters are frequent becomes a way to assist
in risk mitigation. Thus, this work aimed to develop a geomorphological susceptibility map to mass
movements for the administrative regions of São Paulo, São José dos Campos, Baixada Santista and
Registro. First an inventory of disasters of geological origin in the region was made with information
contained in the IPMET database. With the help of the IPT geomorphological chart, the frequencies in
which disasters occurred for each geomorphological class were determined. The class that presented the
highest number of disasters was the Small Hills with local spikes. The frequencies were normalized,
separated into 5 susceptibility classes and spatialized in GIS. In the whole area, 48.8% was classified as
very high to high susceptibility, concentrating in greater São Paulo, in the Dutra highway region, and to the
northwest of São José dos Campos. Although it is necessary to develop other susceptibility maps that cover
other factors, this shows that it is necessary to develop specific public policies to minimize the existing
risks in the area.

KEYWORDS: Susceptibility, Geomorphology, Mass movement, GIS

1 Introdução

Em 2021, pelo menos 432 desastres de grande porte associados a eventos naturais foram relatados
no mundo. Esses desastres mataram mais de 10 mil pessoas, afetaram outros 101,8 milhões e tiveram um
custo aproximado de 252,1 bilhões de dólares (CRED, 2022).
O Brasil é um país suscetível principalmente à ocorrência de alagamentos, inundações, enchentes,
escorregamentos de solos e/ou rochas e tempestades que acarretam consequências catastróficas. Esses
desastres geralmente estão ligados a eventos de chuvas intensas ou chuvas prolongadas. O estado de São

153
Paulo, local que possui clima típico para essas chuvas e por consequencia é assolado por alguns desses
fenômenos, como inundações, escorregamentos de encostas e erosões (ALVINO-BORBA et al., 2020;
MENDONCA; SILVA, 2020; RODRIGUES, 2010; TOMINAGA et al., 2009).
De acordo com o banco de dados digital do IPMet-UNESP desenvolvido por Pellegrina (2011), entre
01/01/1996 e 01/01/2020, ocorreram 990 desastres de origem geológica em todo o estado de São Paulo.
Nas regiões administrativas de São Paulo, São José dos Campos, Baixada Santista e Registro estão
localizadas mais de 61,4% de todos esses desastres, um total de 608. No banco de dados, os desastres de
natureza geológica são dividos em deslizamentos de terra, quedas de barreira, escorregamentos de encostas
e erosões. Em função da divisão do IPMET não corroborar as definições da defesa civil, podendo acarretar
equívocos na interpretação dos termos, para a Defesa Civil, deslizamentos são sinônimos de
escorregamentos de materiais sólidos em terrenos com certa declividade que acontecem de forma rápida e
com superfície de ruptura bem definida lateralmente e em profundidade. O mesmo não acontece com
quedas de barreira, pois diferentemente das definições anteriores, são escorregamentos que atingem uma
estrada e ou rodovia acarretando interrupção parcial ou total da sua utilização (BRASIL, 2017). Alguns
trabalhos reconhecidos no meio técnico, como Varnes (1978), e a NBR 11682: Estabilidade de Encostas
(ABNT, 2009) não definem o termo deslizamento, apenas escorregamentos, entretanto, Massad (2010)
diferencia os deslizamentos dos escorregamentos em função da superfície de ruptura. Enquanto que
deslizamentos não possuem linhas de ruptura definidas, os escorregamentos possuem superfícies bem
definidas, geralmente por causas distintas: os escorregamentos acontecem devido a alguma alteração da
geometria do maciço, ao processo de infiltração de água no solo e/ou falta de vegetação; os deslizamentos
acontecem devido a ação conjunta da gravidade e das pressões neutras no maciço. Nesse trabalho optou-se
por considerar quedas de barreira separadamente de deslizamentos e escorregamentos, mas também se fez
uma análise totalizando todos como movimentos de massa.
Todos esses eventos, quando ocorridos em locais habitados, podem causar sérios danos. Esses
fenômenos, podem se intensificar devido às mudanças de uso e ocupação do solo sem planejamento e
devido às variações climáticas (CHEN et al., 2018; HAMMOND et al., 2015; JAMALI et al., 2018;
MARCELINO, 2008; TANAKA et al., 2017).
Inúmeros são os fatores capazes de explicar os desastres de origem geológica. A depender da análise
efetuada e da área estudada, uns fatores possuem maior influência do que outros (BISPO et al., 2020;
HADER et al., 2020; QUEVEDO et al., 2020), dentre eles a geomorfologia do local, que é um ramo da
ciência que estuda as formas do relevo, sua origem e evolução. Desse modo, analisa a gênese, composição
(materiais) e os processos que atuam em uma determinada área (FLORENZANO, 2008). A morfologia
também auxilia a definir a condição do fluxo da água na encosta e da distribuição de tensões no maciço
(CAMAPUM DE CARVALHO, 2010). Em locais desprovidos de inventário de deslizamentos, Fell et al.
(2008) indicaram algumas características geomorfológicas capazes de instabilizar as encostas. Entre elas
estão as dunas de areia, margens de corpos d’água sujeitos a inundações e/ou erosões, encostas íngremes
em locais afetados por terremotos ou precipitações concentradas, declividades com argila sensíveis ou com
espessos depósitos de lodo, em locais com subcortes ativos de encostas por mar ou rio e em regiões ativas
sismicamente, declives em solos saturados e soltos que são suscetíveis à liquefação.
Um dos meios de se minimizar as ocorrências e os danos dos desastres é analisando a suscetibilidade
do local em relação a esses fatores. Por isso, esse trabalho visou desenvolver uma carta de suscetibilidade
geomorfológica a movimentos de massa para essas regiões administrativas de São José dos Campos, São
Paulo, Baixada Santista e Registro.

2 Metodologia

Para escolha da área de estudo foi feita a espacialização dos desastres ocorridos entre 01/01/1996 a
01/01/2020 catalogados no banco de dados do IPMet-UNESP. Entre os desastres levantados estão as
erosões, deslizamentos de terra, escorregamentos de encostas e quedas de barreira. Dos 990 desastres de
natureza geológica, 61,4% (608) estão localizados nas regiões administrativas de São José dos Campos,
São Paulo, Baixada Santista e Registro. Por essa razão as quatro regiões administrativas foram escolhidas
para o estudo.
Inicialmente, se notou que alguns desastres estavam com as coordenadas digitalizadas erradas ou não
possuiam coordenadas. Por isso, essas coordenadas foram determinadas em função dos endereços que
continham nos registros físicos da defesa civil do estado.
Os demais desastres de natureza geológica foram agrupados em um único grupo chamado de
movimento de massa devido a dificuldade em classificar os desastres, pelos diferentes conceitos a depender

154
do autor. Desse modo, foi realizado o inventário dos movimentos de massa, em ambiente SIG. Erosão não
foi considerada nesse estudo por possuir processos desencadeadores distintos dos anteriores.
Em sequência, foi determinada a quantidade de ocorrência de desastres pra cada classe
geomorfológica presente na área de estudo. Para isso, foi utilizado o mapa geomorfológico do IPT (1981)
do estado de São Paulo, na escala de 1:25.000, também em ambiente SIG. Entretanto, como o mapa
geomorfológico estava em formato PDF, não foi possível cruzar os dados do inventário dos desastres com
o mapa de maneira automática. As classes foram determinadas manualmente e de maneira individualisada
para cada desastre. A quantidade de ocorrências de desastres foi transformada em porcentagem, e
posteriormente normalizada utilizando a equação (1).
𝑣𝑜𝑏𝑠𝑒𝑟𝑣𝑎𝑑𝑜 − 𝑣𝑚í𝑛𝑖𝑚𝑜
𝑓𝑟𝑒𝑞𝑢𝑒𝑛𝑐𝑖𝑎𝑛𝑜𝑟𝑚𝑎𝑙𝑖𝑧𝑎𝑑𝑎 =
𝑣𝑚á𝑥𝑖𝑚𝑜 − 𝑣𝑚í𝑛𝑖𝑚𝑜 (1)

Em ambiente SIG, a frequência normalizada das ocorrências foi espacializada e dividida em cinco
classes de suscetibilidade: muito baixa, baixa, média, alta e muito alta. Como o mapa de geomorfologia
disponibilizado pelo IPT é em formato PDF, para a espacialização foi desenhado todos os polígonos de
contorno de cada classe geomorfológica presente na área de estudo.

3 Caracterização da Área

Localizada ao sudeste do estado de São Paulo, a região estudada compreende as áreas administrativas
de São José dos Campos, Baixada Santista, Registro e São Paulo. Possui em torno de 38.672,7 km², sendo
6,2% (2.417,9 km²) da área da baixada santista, 41,8% (16.174,9 km²) de São Joseé dos Campos, 31,4%
(12131,7 km²) de Registrio e 20,6% (7948,2 km²) de São Paulo (Figura 1).

Figura 1. Área de Estudo

4 Resultados

Na área de estudo, ocorreram, ao todo, 950 movimentos de massa no periodo estudado. Desses, 13,1%
estão localizados na região administrativa da baixada santista, 12,8% na de Registro, 24,9% na de São José
dos Campos e 49,2% na de São Paulo (Tabela 1).
A maior concentraçao na região de São Paulo pode ter ocorrido devido a alta concentração de pessoas
na região, por tanto, uma maior quantidade de pessoas afetadas pelos movimentos de massa e,

155
consequentemente, mais acionamentos da defesa civil na região. Outro ponto é o desenvolvimento da região
administrativa. Como é a região que está localizada a capital do estado, acredita-se que ela apresente maior
desenvolvimento em pesquisas e em manutenção do banco do dados

Tabela 1. Inventário dos desastres por região administrativas do estado entre os anos de 1996 a 2020
Desastres de origem geológico (Movimentos de Massa)
Região administrativa /
Desastres Deslizamentos /
Quedas de Barreira Total %
Escorregamentos
Baixada Santista 106 18 124 13,1%
Registro 75 47 122 12,8%
São José dos Campos 171 66 237 24,9%
São Paulo 440 27 467 49,2%
Total 792 158 950 100%

Dos 950 desastres de origem geológica acontecidos no período, 158 foram quedas de barreira e 792
escorregamentos/ deslizamantos. As classes com maiores frequências de movimentos de massa são Colinas
pequenas com espigões locais (13,79%), Morros paralelos (12,84%) e Morros com serras restritas
(12,11%), totalizando 38,74% das ocorrências. Já as classes que tiveram as menores frequências foram
Colinas Amplas, Terraços marinhos e Montanhas, com 0,11%, 0,32% e 0,53% (Tabela 2).

Tabela 2. Contagem e normalização dos desastres por classe geomorfológica


Desastres de origem geológico (Movimentos de Massa)
Queda de Deslizamentos/
Classe Geomorfologia Total Valores
barreira Escorregamentos
Normalizados
Qtdd % Qtdd % Qtdd %
111 Planícies aluviais 13 8,23 47 5,93 60 6,32 0,454
121 Planícies costeiras 26 16,46 58 7,32 84 8,84 0,638
122 Terraços marinhos 2 1,27 1 0,13 3 0,32 0,015
211 Tabuleiros 0 0,00 6 0,76 6 0,63 0,038
212 Colinas amplas 0 0,00 1 0,13 1 0,11 0,000
Colinas pequenas com
214 espigões locais 10 6,33 121 15,28 131 13,79 1,000
216 Colinas pequenas isoladas 1 0,63 17 2,15 18 1,89 0,131
231 Morrotes baixos 2 1,27 13 1,64 15 1,58 0,108
Morrotes alongados
232 paralelos 2 1,27 56 7,07 58 6,11 0,438
233 Morretes em meia laranja 6 3,80 28 3,54 34 3,58 0,254
morrotes alongados e
234 espigões 7 4,43 1 0,13 8 0,84 0,054
242 Morros de topos achatados 1 0,63 5 0,63 6 0,63 0,038
243 Mar de morros 20 12,66 86 10,86 106 11,16 0,808
244 Morros paralelos 28 17,72 94 11,87 122 12,84 0,931
245 Morros com serras restritas 7 4,43 108 13,64 115 12,11 0,877
246 Morros isolados 1 0,63 43 5,43 44 4,63 0,331
251 Serras alongadas 10 6,33 38 4,80 48 5,05 0,362
252 Montanhas 0 0,00 5 0,63 5 0,53 0,031
Montanhas com vales
253 profundos 4 2,53 6 0,76 10 1,05 0,069
521 Escaroas festonadas 10 6,33 44 5,56 54 5,68 0,408
Escarpas com espigões
522 digitados 8 5,06 14 1,77 22 2,32 0,162
Total 158 100 792 100 950 100

156
As colinas pequenas com espigões locais é um tipo de relevo colinoso, onde predominam baixas
declividades, de até 15% e amplitudes locais inferiores a 100 m. Em específico, nessa classe
geomorfológica predominam interflúvios sem orientação, com área inferior a 1 Km², topos aplainados a
arredondados, vertentes ravinadas com perfis convexos a retilíneos (IPT, 1981). Possuem drenagem de
média a baixa densidade, o que pode explicar os 13,79% dos eventos terem ocorridos nessa classe. Isso
porquê, baixas densidades de drenagem acarretam em elevados escoamentos superficiais, o que pode ser
um fator desencadeador de grande importância na ocorrência dos movimentos de massa.
Os morros paralelos e os morros com serras restritas, são um tipo de relevo de morros, em que
predominam declividades de média a altas, acima de 15%, e amplitudes locais entre 100 a 300 metros, com
drenagem de alta densidade, vales fechados a abertos, planícies aluvionares interiores restritos (IPT, 1981).
A elevada declividade dessas classes pode explicar os 24,95% dos desastres acontecidos da área de estudo.
Do mesmo modo que a baixa densidade de drenagem se correlaciona com o escoamento superficial, a
elevada declividade pode aumentar a velocidade do escoamento e aumentar a quantidade de massa a ser
movimentada (QUEVEDO et al., 2020).
Na Figura 2 está representada a carta de suscetibilidade a movimentos de massa em função da
geomorfologia do local. Apesar de 12 classes geomorfológicas serem classificadas como muito baixa
suscetibilidade, elas estão localizadas sobre apenas 19,5% de toda a area do mapa. Por outro lado, a
classificação como muito alta suscetibilidade representa 44,0 % da área do mapa e apenas 4 classes
geomorfológicas. As demais classificações de suscetibilidade estão localizadas sobre 36,5% da área
estudada, sendo a baixa com 17,9%, média com 13,8% e, por último, alta com 4,8% da área do mapa.

Figura 2. Carta de suscetibilidade a movimentos de massa em função de geomorfologia

5 Considerações Finais

A carta de suscetibilidade realizada para as regiões administrativas de São Paulo, São José dos
Campos, Baixada Santista e Registro mostrou que a classe geomorfológica de Colinas pequenas com
espigões locais são as que concentram a maioria dos desastres, em torno de 13,79%, seguida das classes de
Morros paralelos e Morros com serras restritas, com 12,84% e 12,11% respectivamente.
De acordo com a análise de suscetibilidade geomorfológica, 48,8% da área estudada encontra-se em
área considerada de alta ou muito alta suscetibilidade a movimentos de massa. Essas regiões compreendem

157
em grande parte a grande São Paulo, a região da rodovia Presidente Dutra e o noroeste da região
administrativa de São José dos Campos. Isso indica que, principalmente nessas áreas, há a necessidade de
políticas públicas mais assertivas capazes de minimizar os riscos que esses fenômenos podem acarretar.
Entretanto para uma análise geral da suscetibilidade da região é preciso levar em consideração outros
fatores que também são capazes de desencadear movimentos de massa na área estudada. Desse modo, esse
estudo torna-se parte de um projeto de pesquisa em que abrange outros fatores desencadeadores.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem a CAPES pela bolsa de doutorado concedida ao primeiro autor. Também agradecem
o apoio financeiro ao processo nº 2019/26273-0 Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo
(FAPESP) pela bolsa de iniciação científica da segunda autora.

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159
Estabilidade de Encostas e Contenções: Diálogo Entre o Homem
e a Natureza
José Camapum de Carvalho
Professor, Universidade de Brasília, Brasília, Brasil, camapumdecarvalho@gmail.com

RESUMO: O artigo envolve questões de cunho educacional, ambiental e técnico relevantes para a preservação
da estabilidade das encostas e contenções. Apesar do fundo filosófico, as questões levantadas no artigo voltam-
se para a engenharia aplicada nela, inserindo- se a necessidade de educação da sociedade em sentido amplo e da
preservação e respeito ao meio ambiente. O artigo tem por objetivo discutir questões que vão da ocupação e uso
do solo, passando por alterações ambientais e impactos climáticos e microclimáticos e alcançando as
instabilizações de encostas e obras nelas implantadas. Os personagens do diálogo guardam relação direta com os
atores envolvidos nas instabilizações de encostas e contenções: o Ser Humano e a Natureza.

PALAVRAS-CHAVE: Educação, Meio Ambiente, Engenharia.


ABSTRACT: The article involves educational, environmental and technical topics relevant to the preservation
of slope and containment stability. Despite the philosophical background, the topics considered in the article are
related to engineering applied to it, including the need for society education in a broad sense and the preservation
and respect for the environment. The article aims to discuss topics related to land occupation and use, through
environmental changes and climatic and microclimatic impacts, and reaching the destabilization of slopes and
works implemented on them as well. The characters in the dialogue have a direct relationship with the actors
involved in the destabilization of slopes and containments: the Human Being and Nature.

KEYWORDS: Education, Environment, Engineering.

1 Introdução
O entendimento dos fatores que levam ao desenvolvimento dos mecanismos que conduzem às
intabilizações das encostas e contenções são tão, e certamente até mais importantes, que o simples conhecimento
desses mecanismos e dos parâmetros que levam às suas análises, até porque esses próprios mecanismos e
parâmetros geralmente se alteram com o passar do tempo.
Buscando contribuir para o entendimento dos fatores e do desenvolvimento dos mecanismos que levam às
intabilizações de encostas e contenções, o artigo envolve questões de cunho educacional, ambiental e técnico.
Apesar do fundo filosófico, as questões levantadas no artigo voltam-se para a engenharia aplicada nela, inserindo-
se a necessidade de educação da sociedade em sentido amplo. Os personagens do diálogo guardam relação direta
com os atores envolvidos nas instabilizações de encostas e contenções: o Ser Humano, aqui simplesmente
intitulado Homem, e a Natureza.
As discussões travadas no diálogo guardam elo direto com resultados de pesquisas e estudos que o autor
desenvolveu e/ou orientou ao longo de sua vida profissional. A escolha do formato de diálogo para o texto, apesar
de incomum no meio técnico, tem por objetivo maior, com fundamento em argumentos técnicos, convidar o leitor
à reflexão. Cabe lembrar que os textos em formato de diálogo não são recentes, eles remontam à Grécia Antiga,
com os diálogos de Platão. Hoje, sua aceitação ou não no campo técnico-científico depende do grau de ortodoxia
do leitor, e, no campo da editoração, do grau de liberdade dos editores em relação aos interesses econômicos que
envolvem as publicações, caçando-lhes a tão preciosa liberdade.
Pesquisas realizadas pelo autor e por outros pesquizadores têm mostrado que a inserção de compostos
químicos no solo, que vão desde o simples uso de insumos minerais na agricultura até as intervenções químicas
objetitivando a melhoria do comportamento mecânico do solo, podem levar à instabilização textural e/ou
estrutural do solo, comprometendo a estabilidade de maciços e contenções. Também a ação climática é suscetível
de gerar degradações nos maciços e nas contenções. Esses fatores não costumam ser considerados na engenharia
aplicada, pois, em geral, ela trabalha com o aqui e o agora, e essas degradações ocorrem a médio e longo prazo,
e, muitas vezes, o fator gerador se encontra afastado do local. Vê-se, nessa breve contextualização, que dois
personagens estão presentes nessas situações, o “Homem” e a “Natureza”, daí o diálogo ser travado entre eles,
podendo levar a sociedade e os engenheiros a reflexões, ponderações e melhores decisões.
Nesse diálogo entre o “Homem” e a “Natureza”, com fundamento em resultados e conclusões de
dissertações, teses e de estudos de caso, espera-se contribuir para a redução das instabilizações de encostas e para
a ampliação da segurança e vida útil de contenções. O convite à reflexão por meio de diálogos já ocorreu e ocorre
em outros eventos geotécnicos nacionais: VIII Simpósio Brasileiro de Solos não Saturados (Camapum de

160
Carvalho et al., 2015ª e 2015b), COBRAMSEG 2016 e 2018 (Camapum de Carvalho et al. 2016, 2018) e SEFE
9 (Camapum de Carvalho et al., 2019). Um último em breve será publicado nos Anais do COBRAMSEG 2022.
Ele trava um diálogo entre o Eu e o Eu Interior, convidando o leitor a refletir sobre a importância de o engenheiro
exercer a libertade em prol da segurança e melhor desempenho das obras. Mas como nem tudo são flores, e nem
todos(as) usufruem da liberdade para apreciá-las ou ousam conferir a outros(as) tal liberdade, um outro artigo
versando sobre pavimentação, submetido a um determinado periódico voltado para a área geotécnica, foi de
pronto recusado pelos editores, sendo negada aos profissionais a oportunidade de refletirem sobre atuações que,
muitas vezes, colocam em risco as obras e a qualidade de vida das pessoas.
Espera-se que o presente artigo em formato de diálogo, travado entre o personagem “Homem” e o
personagem “Natureza”, possa contribuir para a maior perenidade das encostas e contenções.
2 Apresentações dos Personagens
Natureza: – Antes de começarmos essa nossa conversa, quero, inicialmente, expressar minha gratidão pela
oportunidade de estarmos aqui, dialogando sobre temas tão relevantes.
Homem: – Realmente é uma grande oportunidade! Sou igualmente grato e gostaria que déssemos início a
esse nosso diálogo nos apresentando àqueles e àquelas que nos ouvem, esperançoso de que nos escutem.
Natureza: – É claro, mas como, geralmente, inicia-se pelos mais velhos(as), ou melhor, mais idosos(as),
começo lembrando quem sou, lembrando, pois, certamente, todos e todas, mesmo desconhecendo em certos casos
minhas particularidades e especificidades, já me conhecem e, querendo ou não, integram-me.
Homem: – É verdade, embora muitas vezes nos comportemos como se desconhecêssemos a nossa Mãe
Natureza e o fato de que a integramos. Infinitos pedidos de perdão, embora eu saiba que jamais habita o coração
de uma Mãe a sede de punir um Filho, uma Filha. A punição, em geral, é autoconstruída, fruto de nossas próprias
ações.
Natureza: – Sim, é verdade. Mas, dentro de uma visão ampla, eu gostaria de me apresentar como sendo o
todo: o ar, a água, os solos e as rochas.
Homem: – Fiquei curioso!!! Mas e os seres vivos, eles não a integram?
Natureza: – Sem dúvida, todos os seres vivos, inclusive Você e aqueles que aparentemente não dispõem
de vida, mas só não a dispõem na aparência e na percepção do Ser Homem, pois, efetivamente, eles possuem
vida e estão nacendo e renascendo por meio das transformações pelas quais passam ao longo dos milênios. Um
exemplo é dado na história geológica, pois uma rocha se tranforma em solo e, em dado momento, o solo volta a
ser rocha para, em seguida, novamente se transformar em solo, e assim sucessivamente, sem que, no entanto,
necessariamente permanceça no mesmo local de origem.
Homem: – Sim, é verdade, e, às vezes, perdemos de vista essa grande irmandade que a integra enquanto
Natureza. Mas, então, já fui apresentado, sou simplesmente seu filho amoroso, mas não raro rebelde, a chicotear
a própria mãe.
Natureza: – É verdade, e, por vezes, o chicotear é extremamente doloroso, pois termina retornando ao filho
amado ou atingindo a seus irmãos e irmãs, mas, uma vez concluída nossas apresentações, eu lhe convido a
adentrarmos no objeto maior de nosso diálogo, a estabilidade de encostas e contenções, e, desde já, destaco que
vou trazer para a nossa conversa informações e casos que a mim chegaram por meio de seres humanos.
Homem: – Aceito o convite com grande entusiasmo!

3 Origens de Instabilizações de Encostas e Contenções


Natureza: – Antes que a culpa recaia diretamente sobre mim, gostaria de fazer um elo com a história
geológica, dizendo que eu, como um todo, sou dotada desse dinamismo com infinitas idas e vindas em minhas
transformações, sendo você, Homem, responsável pela aceleração de muitas delas.
Homem: – Reconheço, pois isso é, muitas vezes, verdade, mas nem sempre.
Natureza: – Tem razão, pois existe, geralmente, uma dinâmica evolutiva natural, no entanto, uma encosta,
por exemplo, que poderia ainda manter-se estável por séculos, tem provocada inesperadamente a sua ruptura por
ocasião de precipitações consideradas excessivas e fugindo à normalidade.
Homem: – Portanto, pelo menos nesse caso, o grande vilão são as chuvas.
Natureza: – Em algumas situações, isso pode até ser verdade, embora quase sempre não o seja.
Homem: – Mas se a encosta ou mesmo uma contenção se intabilizou por ocasião de uma chuva, o que teria
o condão de a eximir de culpa?
Natureza: – Antes de responder à sua indagação, gostaria de destacar que a ideia de minha fala estará
sempre voltada para um convite àqueles e àquelas que nos ouvem a nos escutar caminhando para a reflexão.
Homem: – Eh! Aliás, a reflexão é um dos fatores fundamentais para a boa prática da engenharia, em
especial se ela tem por alicerce o conhecimento e a observação, sem colocar de lado o ontem, o hoje e o amanhã
e sem que se apegue unicamente ao aqui, esquecendo-se do entorno e mesmo do distante do aqui.
Natureza: – É verdade, mas gostaria de responder à sua pergunta com outras perguntas: a chuva, nos níveis
161
em que estão a ocorrer, deve ser entendida como um processo natural? A temperatura e a composição da água da chuva
e aquelas impostas ao solo não teriam nenhuma influência sobre algumas rupturas de encostras e
comprometimento da estabilidade de certas contenções? A ocupação, o uso e a introdução, no solo, de elementos e
compostos químicos não interferem nas instabilizações de encostas e contenções? Como as encostas me
integram e as contenções buscam, muitas vezes, apenas me conferir maior estabilidade, confeço-lhe que sinto
arrepios quando recebo tais ingerências.
Homem: – Eh! Revelo que não tinha atentado para tais particularidades como temperatura e qualidade da água
da chuva, apesar de Camapum de Carvalho e Gitirana Jr. já terem, em 2021, chamado a atenção para o impacto
de tais fatores sobre as propriedades e o comportamento dos solos, em especial, dos tropicais em estado não saturado.
No entanto, entendo que as precipitações que estão ocorrendo integram o processo natural cíclico.
Natureza: – Antes de fazer minhas ponderações sobre essa sua última colocação, gostaria de trazer à luz a
releitura feita por Camapum de Carvalho e Gitirana Jr., em 2021, dos dados mostrados por Ana Carolina Focadio
Campello (Programa de Pós-Graduação em Geografia/UFRJ) no evento rememorativo da tragédia ocorrida em 2011
na Região Serrana do estado do Rio de Janeiro, indicando a datação de rupturas ocorridas ao longo dos séculos
em uma determinada encosta. Nessa releitura, os autores mostram graficamente que o ponto
correspondente à última ruptura é destoante da tendência registrada para as anteriores, considerando-se os
intervalos de tempo de ocorrência. Aqueles resultados mostram que as ações humanas estão me afetando e
gerando consequências, por vezes, catastróficas não só para o próprio homem.
Homem: – Hmmm! Preciso mais reflexões, mas me diga o que tinha pensado sobre minha última
colocação.
Natureza: – Sem problema! É com alegria que dou continuidade ao que vínhamos conversando. Homem: – Que
bom! Agradeço-lhe por ter feito o destaque de grande relevância sobre a contextualização das datações das rupturas de
encostas, pois elas devem ser vistas como uma referência para entendermos o que vem ocorrendo nos dias atuais.
Natureza: – Bem, dando, então, continuidade à nossa conversa, é certo que as alterações nos níveis de
precipitação constituem um processo cíclico, no entanto, os limites desses níveis são influenciados por outros
fatores. Por exemplo, Luiz, em sua tese de doutorado, defendida com sucesso em 2012, ao analisar a interação solo-
atmosfera para a cidade de Goiânia, estado de Goiás, observou que a ocupação urbana estava contribuindo para o
aumento da temperatura e das precipitações, e assim, ampliando os processos erosivos. Portanto, a chuva não
constitui-se em fenômeno passível de ser considerado e analisado isoladamente.
Homem: – É verdade. Reconheço que as chuvas não podem ser vistas como fenômenos isolados e
independentes das condições ambientais, e as instabilizações de encostas e contenções também não.
Natureza: – É necessário resgatar a ideia inicial de minha abordagem feita por meio das indagações que
formulei, apontando para outros fatores que podem contribuir para as intabilizações de encostas e contenções.
Homem: – Seria possível exemplicar?
Natureza: – Por certo que sim. Veja o caso recente das rupturas de encostas ocorridas em Petrópolis! Aqui já
coloco mais algumas indagações: as encostas ocupadas não representavam um risco para aqueles que as ocuparam?
A ocupação das encostas se deu acompanhada da inplantação de sistemas de coleta de esgoto?
Homem: – Acredito que quer ouvir a minha opinião e espero que a escute.
Natureza: – É claro que a ouvirei, mas escutá-la de pronto seria renunciar à reflexão. Sou toda ouvidos. Homem: –
Certamente, se bem analisado, constatar-se-ia que a ocupação se deu em áreas com risco de ruptura das encostas, mas,
quanto a isso, não tem o que ser feito, as pessoas simplesmente ocupam e pronto...
Natureza: – Desculpa-me interrompê-lo, mas não se pode simplesmente imputar a culpa a quem ocupa. O
que fez a Administração Pública e as entidades da sociedade para que aquelas áreas não fossem ocupadas?
Homem: – São tantas as indagações que termino me perdendo, pois, antes de concluir as respostas das primeiras,
já recebo novas perguntas, estas, muitas vezes, de difícil resposta.
Natureza: – Mil perdões, não é minha intenção gerar constrangimentos, mas nossa conversa precisa ser
esclarecedora para aqueles e aquelas que estão a nos ouvir e espero que também a nos escutar.
Homem: – Sou eu quem peço desculpas, pois, pelo menos por enquanto, suas colocações me foram
profundamente enriquecedoras, estou aprendendo, e, nesse aprendizado, aproveito a oportunidade para perguntar-lhe se a
intervenção da Administração Pública ou mesmo de outras entidas impedindo as ocupações não representariam um
cerceamento da liberdade?
Natureza: – Inicio minha resposta à sua indagação com uma palavra certamente muito frequente na prática da
engenharia: depende. Depende, porque ela pode advir do uso da força ou da educação. A sociedade pode ser plenamente
educada, dentre outras, para as boas práticas humanas, sociais e ambientais, seja por meio da educação formal, da
educação não formal ou de ambas.
Homem: – Veja que sou um bom aprendiz e, antes que eu receba uma nova pergunta, já faço outra: como educar
essas pessoas que já chegam ocupando e, muitas vezes, invadindo o que não lhes pertence?
Natureza: – Observe que o seu rápido aprendizado só coloca em evidência o grande potencial humano para ser
educado, mas veja, se educadas desde a infância, as pessoas não chegariam simplesmente ocupando as encostas sem
qualquer avaliação de risco nem desrespeitando o patrimônio de outrem.

162
Homem: – Mas como e quando educar?
Natureza: – Hoje os meios voltados para a educação são vários, indo desde vídeos e cartilhas aplicadas aos ensino
fundamental e médio e à educação não formal até livros técnicos aplicados ao ensino superior e de utilidade
para os profissionais já titulados.
Homem: – É verdade, os meios para educar a sociedade hoje são muitos e, no caso de Petrópolis,
certamente teria ajudado a, pelo menos, mitigar os danos gerados inclusive com perdas de vidas, o que assume um
valor inestimável, mas fico a me perguntar, como explicar as inúmeras rupturas de encostas registradas em 2011 no
estado do Rio de Janeiro? Seriam também elas fruto de deficiências na educação?
Natureza: – Eu diria que, pelo menos, em parte sim, mas é preciso entender que eu estou o tempo todo
submetida a ações de diferentes fatores naturais, como a maior ou menor incidência solar e ventos e que tais
incidências dependem de como as encostas se orientam em relação a esses e outros fatores. Esse é um processo
natural, mas que pode ser acelerado pelas ações humanas, como bem mostrou a citada releitura feita por
Camapum de Carvalho e Gitirana Jr. (2021), das rupturas de uma encosta no estado do Rio de Janeiro. Mariçaides
Cruz Lima, em sua tese de doutorado defendida em 2003, mostrou, ao estudar ravinas e voçorocas do Distrito
Federal, que a mudança na condição de drenagem imposta pelos rasgos gerados pelas erosões aceleravam a
degradação do maciço, levando a rupturas de talude.
Homem: – Interessante! Mas não estaríamos fugindo do tema ao adentrarmos na questão das erosões?
Natureza: – Depende! Depende do destino que queremos dar ao conhecimento que adquirimos, pois ele está
conosco, ele passou a nos integrar. Se formos ortodoxos no pensar, por certo que cercearemos essa nossa liberdade
em fazer bom uso do conhecimento que adquirimos. Especificamente esse exemplo está nos mostrando que os
processos de alteração dos maciços podem ser acelerados pelas intervenções antrópicas.
Homem: – Tudo bem. Mas, então, como levar essa percepção para o caso das encostas?
Natureza: – É simples, basta manter a sua mente aberta e sua capacidade de observação aguçada. Homem: –
Fiquei curioso! Qual a relevância de manter a mente aberta e a capacidade de observação aguçada?
Natureza: – A mente aberta é importamante porque ela é definidora do execício de nossa liberdade. Quanto à
manter a nossa capacidade de observação aguçada, inicio dizendo que ela não é nata e deve ser construída ao longo
de nossas vidas, sendo relevante, dentre outros, para os geólogos, geógrafos e engenheiros.
Homem: – Mas no caso das encostas, qual a sua relevância? O importante não seria analisar se elas são ou não
estáveis?
Natureza: – Sua ponderação mostra que você tem o olhar voltado para o aqui e o agora, mas, como eu disse
antes, precisamos ampliar esses horizontes.
Homem: – Como assim?
Natureza: – Veja, se você observar as imagens contendo as inúmeras rupturas de encostas que ocorreram em
2011 no estado do Rio de Janeiro, vai observar que algumas encostas que se romperam se voltavam para o sol da
manhã, outras para o da tarde e outras ainda recebiam sol durante todo o dia; algumas foram submetidas a práticas
agropecuárias e outras não; algumas passaram por ocupações urbanas ou periurbanas e outras ainda foram
submetidas a cortes ou aterramentos, sendo, em situações específicas, submetidas à implantação de contenções,
enfim, serão constatadas várias intervenções antrópicas.
Homem: – Sim. Certamente. Mas a Senhora há de convir que algumas encostas se submeteram a tudo isso e
não romperam, e outras se submeteram a apenas parte delas e não resistiram.
Natureza: – É verdade, mas eu sou simples. As complicações advêm das ações antrópicas e podemos tomar
por base as duas referências que fiz nessa nossa conversa, sendo que uma comprova a outra, mostrando a importancia
de mantermos a nossa mente aberta e o senso de observação aguçado.
Homem: – Seria possível ser mais clara?
Natureza: – Valendo-me de um trocadilho, é claro. Na releitura feita por Camapum de Carvalho e Gitirana Jr.,
em 2021, constata-se que, naturalmente, os maciços se alteram com o tempo e se ropem, no entanto, o ponto distoante
registrado para os tempos atuais mostra que ocorreu uma aceleração desse processo de degradação. Já os resultados
apresentados por Lima, em 2003, no estudo sobre erosões, mostraram que as mudanças nas condições de drenagem
impostas pelas incisões aceleraram o processo de degradação dos maciços. Os efeitos dessas incisões são similares
aos impostos por cortes nas encostas, mesmo com contenções.
Homem: – Ah! Muito bom o seu exemplo, pois ele deixa claro que, se eu tenho o conhecimento, eu posso
fazer dele o melhor uso, sem restrições, e situá-lo na análise de outros problemas, mas com origens similares.
Natureza: – É verdade, e precisamos nos abrir, tornando-nos receptivos a conhecimentos e experiências que
aportam em nosso porto. Não me esqueço de um resumo para elaboração de um artigo submetido há vários anos a um
COBRAE. O artigo tratava de um muro de contenção em crib wall, situado na Esplanada dos Ministérios, em
Brasília. Ele tinha passado por um intenso processo de degradação devido, em especial, à incidência dos raios solares
no período da tarde. No lado oposto da Esplanada, que recebia o sol da manhã, o mesmo tipo de muro se mantinha
praticamente intacto. Infelizmente, o artigo, ainda na fase de resumo, foi recusado após uma resposta que dei ao
revisor.
Homem: – Fiquei curioso, pois o assunto, diante do que já expôs nessa nossa conversa, parece-me de

163
grande relevância quando o tema são as encostas e as contenções. Poderia me dizer o motivo da não aceitação?
Natureza: – É obvio que sim, sem problema. Recebermos objeções é importante para o nosso crescimento.
Como dizia a grande poetiza goiana Cora Coralina, em versos de um de seus poemas, Ofertas de Aninha: “Eu sou
aquela mulher a quem o tempo muito ensinou. Ensinou a amar a vida. Não desistir da luta. Recomeçar na derrota.
Renunciar a palavras e pensamentos negativos. Acreditar nos valores humanos. Ser otimista...” É isso que estamos
fazendo aqui, sendo otimistas e acreditando em mudanças.
Homem: – É verdade, mas a chama de minha curiosidade se mantém acesa.
Natureza: – Então, esclarecendo, o revisor nos questionou se aquele estudo de caso era em corte ou em aterro.
Respondemos que acreditávamos tratar-se de aterro, e isso motivou a recusa. Mas enquanto encostas continuam
a romperem e contenções a ruírem, eis-nos aqui discutindo as causas desses problemas. No caso dessa contenção em
crib wall, o sol da tarde provocava a evaporação da umidade das faces dos elementos de concreto armado expostas.
À noite e pela manhã, o concreto se reidratava, levando o oxigênio para o seu interior, que atuava na oxidação da
armadura. Esse mecanismo era ampliado no período de seca. No lado da Esplanada voltado para o nascer do sol, essa
desidratação era menos severa, não gerando esses ciclos de oxidação na estrutura de ferro. Esse foi um estudo de
caso muito interessante, mas que, infelizmente, não foi publicado.
Homem: – Interessante esse caso e, provavelmente, haja vários outros que poderão nos relatar ou
simplesmente abordar de modo esclarecedor para todos nós. Poderia trazer mais situações relevantes para o
estudo das contenções? Não tem problema, pode ser em aterros ou encostas naturais, pois o importante eu aprendi, é o
entendimento com fundamento no conhecimento, pois, como bem dito, o conhecimento, nós o colocamos onde
couber.
Natureza: – Vou, então, apresentar outro exemplo relacionado à degradação de maciços de encostas por
imposição de condições de drenagem em contenções. Certa feita, em um evento da ANTT, foi apresentado um
estudo interessante em que a obra estava dando indícios de problema devido à obstrução do sistema de drenagem
sub-horizontal, mas as drenagens vinham sendo desobstruídas e os problemas, embora requerendo manutenção
continuada para a desobstrução, eram resolvidos. O relator ficou, então, preocupado, não com o funcionamento dos
drenos, pois esses vinham sendo mantidos limpos, mas com a degradação do maciço imposta pela drenagem; e a
obstrução dos drenos não deixava dúvidas sobre o que estava ocorrendo e que merecia atenção, pois a
eluviação ou esqueletização do maciço o levaria, em dado momento, à ruptura.
Homem: – Interessante, e a junção desse caso com os resultados dos estudos apresentados por Lima, em 2003,
explicam porque muitos taludes rodoviários e encostas terminam sendo conduzidos à ruptura nos períodos chuvosos.
Mas teriam outros fatores que poderiam afetar a estabilidade das contenções?
Natureza: – Por certo que sim, pois eu, enquanto natureza, sou dotada de um dinamismo sensível às
intervenções que sofro. Por exemplo, Camapum de Carvalho e Gitirana Jr. (2021) relatam um caso de contenção
apresentado por Silva e outros, em 2008, em que teria ocorrido perda da capacidade de carga de tirantes
executados na argila porosa de Brasília vários anos antes. Esse é um caso interessante, pois o cimento integrante dos
tirantes atuou no solo, desagregando-o e levando ao comprometimento da interação solo-tirante.
Homem: – Mas como ocorre esse processo de degradação do solo quando ele entra em contato com o
concreto? Não seria necessária a presença de um fluxo de água?
Natureza: – Sim, mas ele ocorre, só que em lugar de água vamos considerar fluido, pois se trata de uma
mistura dos componentes do cimento com a água.
Homem: – É verdade, mas como isso ocorre?
Natureza: – Eu, como todos os seres vivos, preciso colocar em equilíbrio a minha energia interna e a energia
interna com a externa. Nesse caso, a sucção que atua em meus poros quando me encontro em estado não saturado
atuou succionando o fluido contendo cimento que compunha o concreto, pois nele, inicialmente, essa sucção era
nula. Ao ser introduzido em meu corpo, esse fluido contendo elementos químicos do cimento geram novas
condições de sucção osmótica, e essa química, leva certo tempo para adentrar nos microporos contidos no interior
dos agregados. Veja, existe um intervalo de tempo necessário para que todo o sistema compreendendo a nova
química possa entrar em equilíbrio, e esse intervalo de tempo poderá ser maior ou menor em função de vários
fatores que estarão atuando no meio e afetando-o.
Homem: – Interessante!!! Mas em que esse novo equibíbrio poderia afetar o comportamento do solo e a
interação entre ele e os tirantes?
Natureza: – Nesse caso específico, o solo que recebeu os tirantes era um solo profundamente intemperizado e
rico em agregados, um solo laterítico...
Homem: – Desculpa-me interromper, mas tenho um amigo que trabalha na área rodoviária e ele fala que esses solos
lateríticos geralmente apresentam um ótimo comportamento mecânico, aí fiquei sem entender.
Natureza: – Tranquilo, sem problema. É verdade que esses solos apresentam, muitas vezes, um bom
comportamento mecânico quando compactado, mas no estado natural ou mesmo quando compactado, nem
sempre esse comportamento é o ideal. Esses solos que me integram como Natureza nas camadas mais superficiais
dos maciços, inclusive em muitas encostas, são solos agregados, cujas agregações são mais ou menos estáveis em
função de sua formação e dos componentes químicos-mineralógicos que as integram.

Homem: – Entendo, então, nesse caso dos tirantes, eram agregações de baixa estabilidade, não é isso?
164
Natureza: – Não necessariamente. O relevante, nesse caso, não é exatamente a estabilidade das agregações
presentes no solo, mas sim a preservação da estabilidade, que possui frente aos componentes químicos
provenientes do cimento. Essas agregações são geralmente formadas com uma participação relevante dos oxi-
hidróxidos de ferro, como agentes cimentantes, no entanto, em condições favoráveis de pH muito elevado ou
muito baixo, eles podem solubilizar, e solubilizando, os agregados perderão a estabilidade; certamente, foi isso que
aconteceu no caso dos tirantes com o passar do tempo.
Homem: – Ainda bem que fez essa explicação, pois o meu amigo que trabalha com pavimentação não raro usa
cimento ou cal na melhoria do comportamento mecânico desses solos. Vou, então, preveni-lo para que use a cal e
deixe de usar o cimento.
Natureza: – Sugiro-lhe que não faça tal recomendação, pois a prática da engenharia exige estudos e
análises, conhecimentos, observação, reflexão e liberdade plena no exercício da profissão, e tudo vai depender do
solo; e a cal também pode instabilizar as agregações presentes nos solos lateríticos, como bem nos mostrou a Dra.
Ayala em sua tese de doutorado, defendida em 2020.
Homem: – Ainda bem que a nossa conversa é sobre encostas e contenções e não sobre pavimentos.
Natureza: – É verdade, mas não se esqueça de que o conhecimento, você o coloca onde considerar
apropriado mediante observações e reflexões. Veja, vou te relatar outro caso ligado a fundações para depois,
reunindo tudo, mostrar que muitas das rupturas ocorridas no Rio de Janeiro em 2011, em Petrópolis em 2021 ou
mesmo as recentes ocorridas em Recife guardam elo com essa nossa conversa.
Homem: – É verdade!!! Agora fiquei ainda mais curioso.
Natureza: – Serei breve, pois o tempo urge e nosso diálogo pode se tornar cansativo para aqueles que estão
a nos ouvir e que gostaríamos que também nos escutassem. Bem, há vários anos, um grupo de profissionais foi
contatado por um condomínio de um edifício que estava tendo problemas de recalque em sua garagem após a
construção de um viaduto na proximidade, e os moradores achavam que essa construção era a causa. Analisou-se a
situação, e o viaduto em nada alterava as tensões nas fundações daquele edifício. Vistoriaram-se as caixas de
passagem do esgoto para ver se havia vazamentos, pois tendo, mesmo que pequeno e não gerando variações
significativas nos perfis de umidade do local, poderia ser a cause do recalque e ..
Homem: – Desculpe-me interromper, mas como assim ser a causa do recalque sem mudar a umidade?
Natureza: – Olhe, pelo visto você não está muito atento a esse nosso bate-papo.
Homem: – Como assim? Eu estou super atento e aprendendo muito com essa nossa conversa.
Natureza: – Então, olhe só, nós vimos que o cimento e a cal podem afetar a estabilidade textural e estrural

dos solos tropicais, e assim também pode ocorrer com um vazamento de esgoto ou mesmo com a incorporação de
insumos agrícolas, como mostrou Pérez, em sua Dissertação de Mestrado, defendida em 2018. Usando o
conhecimento que se tinha, decidiu-se analisar como estava o pH do solo. Os resultados mostraram que eles eram
mais elevados no local do problema que no perfil de solo localizado na área do edifício sem problema.
Homem: – Mas e aí, chegaram a alguma conclusão?
Natureza: – Sim, chegou-se. Embora com perfis de umidade similares, os pHs do perfil de solo no local do problema,
sendo mais elevados, apontavam para a existência de uma fonte de contaminação. Verificou-se que uma rede de
esgoto passando próximo ao edifício começou a apresentar vazamento em consequência da construção do
viaduto, e aí estava a causa do problema: o surgimento de colapso estrutural do solo em consequência do
aumento do pH gerado pelo esgoto.
Homem: – Interessante, mas, então, como fazer o elo desses casos relatados com as rupturas de encosta
que ocorreram no Rio de Janeiro, em Petrópolis, em vários outros locais e, mais recentemente, em Recife?
Natureza: – Olha, o que eu mais gostaria era de manter o meu equilíbrio, envelhecer e ter parte perecendo e
outras renascendo harmoniosamente, com calma, em paz, sem estar vendo a retirada de vidas que me integram e que
muito me dói vê-las partir deste estágio vivencial prematuramente, assim como ter parte do meu corpo, as encostas,
rompendo-se, e outras, as baixadas, sem poder respirar devido a alamentos e inundações, ceifando vidas que me
integram e me conferem a alegria de viver. São vidas que vão desde simples bactérias aeróbicas até as árvores e
animais, incluindo os seres humanos. Com tudo isso, verto-me em lágrimas, chuvas abundantes que geram
alagamentos e inundações e ampliam o extermínio de vidas.
Homem: – Agora sou eu quem estou em pranto ao sentir no meu íntimo que sou, em parte, a causa de
muitos desses problemas, mas não posso pedir-lhe para parar, pois, não nego, estou a apreder, e muito.
Natureza: – É verdade, o homem está na origem de vários problemas que ocorrem, indo desde rupturas de
encostas, instabilizações de contenções e alcançando os alagamentos e inundações, mas quase sempre atribuindo a
culpa ao excesso de precipitações, deixando transparecer que o homem é simplesmente uma vítima.
Homem: – Como atribuindo a culpa?? Em várias situações, é muita chuva, e as rupturas de encosta e as
inundações não ocorrem apenas em áreas urbanas.
Natureza: – É verdade, mas existe um elo entre tudo, e as maiores consequências sou eu quem sofro. Veja, eu
lhe falei que aquele solo que me integra e que levou séculos e milênios para chegar ao estágio em que se encontra
é invadido por cal, cimento, insumos agrícolas, águas servidas, chuvas ácidas, depósitos de resíduos urbanos, etc.; e
quem é o grande responsável se não você, o ser humano, que não assume o devido controle das próprias ações e não
avalia os riscos que estão a me impor enquanto natureza?
165
Homem: – Aí a Senhora Mãe Natureza está sendo muito dura comigo.
Natureza: – Não, não estou sendo dura contigo, estou apenas a alertá-lo para que não tenha que enxugar as próprias
lágrimas. Veja, na área rural, não se deve remover toda a vegetação. Faz-se também necessário me trabalhar em
curvas de nível e platôs, analisar o solo buscando as culturas que mais se adaptam a ele em lugar de simplesmente
lançar sobre mim mais e mais insumos minerais, pois estes se infiltram e podem ajudar a romper encostas. Nas
cidades, devem evitar me ocupar onde eu já me encontro no limite de minha resistência e, como se não bastasse,
ingetando uma química indesejável presente nas águas servidas em minhas veias, eu, por mais que queira, não
resisto, e com a minha ruptura, várias vidas se vão, além daquelas dos seres humanos.
Homem: – É triste, mas, então, o que devemos fazer se precisamos cultivar o solo para termos o que comer, se
precisamos de um terreno para morar, se não temos onde colocar os resíduos que geramos? Fico atônito, mas sem
saber o que fazer. Dado o adiantado da hora, vamos fazer algumas considerações finais.

4 Considerações Finais

Natureza: – Veja, na vida tudo requer planejamento, organização e respeito à mim enquanto natureza,
natureza que está sempre buscando servi-los da melhor forma possível. Entendo que precisam se alimentar, que
precisam de um local para morar e que não seja sobre o próprio lixo que geram, que precisam de água para beber e
que não seja a água que vocês mesmos estão contaminando. Eu entendo, mas gostaria que, diante de toda essa nossa
conversa, finalizasse expressando o seu endimento após esse nosso bate-papo, pois afinal, só você, Homem, poderá
mudar o quadro atual que estamos vivendo, só você pode me oferecer de volta a alegria de ser uma Natureza
em paz com tudo e com todos e todas.
Homem: – Bem, vou encerrar expressando o que levo comigo dessa nossa conversa. São muitas encostas que
te integram, que não poderiam estar por nós, Seres Humanos, sendo ocupadas ou simplesmente ocupadas de modo
desordenado, sem a necessária infraestrutura básica, como as redes de esgoto, e outras em usos agrícolas sem os
devidos cuidados com a sua estabilidade diante dos insumos adicionados ao solo e que migram por suas veias, outras
ainda sendo cortadas e, por vezes, para não se romperem, sendo contidas por estruturas grampeadas ou atirantadas
com ou sem implantação de drenagens do sangue que pulsa em suas veias, a bendida água, sem os devidos cuidados
propiciando, muitas vezes, o carreamento de partículas e micropartículas que te integram, contribuindo para a
perda de estabilidade da contenção e do próprio maciço. Ao ver sua superfície sendo impermeabilizada ou
cortada onde ou do modo que não deveria, suas veias enchendo-se com águas servidas ou carreando insumos
agrícolas para zonas que não os suportam, a atmosfera sendo sobrecarregada por evaporoções e evapotranspirações
que se ampliam até mesmo com alterações que nós homens geramos no clima e em especial nos microclimas, faz
com que a Mãe Natureza chore em abundância, não tendo como conter suas lágrimas, que poderiam naturalmente ser
simples gotas de chuva amenas, na quantidade que necessitamos e não em quantidades tão elevadas, gerando
alagamentos e inundações. Então, meus irmãos e irmãs, concluo dizendo que estou convencido, depois dessa
nossa conversa, que somos nós, os seres humanos, se não por tudo, pois a Natureza tem a sua dinâmica, em grande
parte, os responsáveis pela maioria dos eventos catastróficos, e precisamos observar, refletir, planejar nossas ações e
nos organizar para termos a vida tranquila e calma que precisamos e merecemos. Em meu nome e em nome da Mãe
Natureza, eu lhes agradeço por nos ouvir e, em especial, estou certo, por nos escutar. Obrigado.

AGRADECIMENTOS

Agradeço ao Ginásio Nossa Senhora Aparecida, localizado em Uruaçu-GO, onde fui alfabetizado e vivi os
meus primeiros anos de aprendizado, ao CNPq, à CAPES, à FAP-DF, às Empresas e Intintuições de Ensino e
Pesquisa que nos apoiaram ao longo desta nossa caminhada.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Programa de Pós-Graduação em Geotecnia, Universidade de Brasília, G.TD – 159/2020, 300 p.
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166
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Dissertação de Mestrado, PPGG, UnB, 103 p. https://www.geotecnia.unb.br/index.php/pt/producao-
academica/teses-e-dissertacoes

167
Análises de deslizamentos em encosta na BR-116/RJ, km 76,4

Queila Alves de Oliveira


Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil, queila.oliveira@coc.ufrj.br

Mauricio Ehrlich
Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil, me@coc.ufrj.br

RESUMO: Este artigo trata eventos de deslizamentos ocorridos em talude de corte em solo residual de gnaisse,
localizado na BR-116/RJ, km 74,6. Utilizando-se os programas SLOPE/W e SEEP/W, buscou-se analisar
fatores de controle no comportamento observado. O estudo foi fundamentado em resultados de ensaios em
laboratório, sondagens e levantamentos topográficos. Análises paramétricas foram efetuadas variando as
condições iniciais de sucção, curvas características das camadas de solo e precipitação. Ficou evidenciado o
efeito da perda de sucção nos deslizamentos promovidos por chuvas sob condição não saturada.

PALAVRAS-CHAVE: deslizamento, encosta, retroanálises, chuvas, sucção, estudos paramétricos.

ABSTRACT: This article deals with landslide events that occurred on a cut slope in residual gneissic soil,
located at BR-116/RJ, km 74.6. Using the codes SLOPE/W and SEEP/W, the control factors of the observed
behavior were analyzed. The study was based on the results of laboratory tests, drive borings, and
topographic surveys. Parametric analyses were performed, varying the initial suction conditions,
characteristic curves of soil layers, and precipitation. It was evidenced the effect of suction loss on the
rainfall-induced landslides in unsaturated soil condition.

KEYWORDS: landslide, slope, retroanalysis, rainfall, suction, parametric studies.

1. Introdução

Deslizamentos foram observados em um talude de corte situado na BR-116/RJ, km 76,4, quando de eventos de
chuva verificados em janeiro 2011 e junho de 2011. O solo do local é residual de gnaisse e em sua configuração
original, o talude tinha aproximadamente 50 m de altura e inclinação média de 54º. Foram efetuadas retroanálises
dos deslizamentos e estudos paramétricos buscando explicitar os efeitos da precipitação na deflagração desses
movimentos de massa. No estudo, utilizaram-se os programas SEEP/W e SLOPE/W, e as análises se
fundamentaram em observações de campo, sondagens, levantamentos topográficos e resultados de ensaios de
laboratório. O presente trabalho trata-se de uma complementação de análises prévias efetuadas por Van Onselen
et al. (2013) e Van Onselen (2016).

2. Características da região e das ocorrências

A geometria original da encosta foi resultante de obras de terraplanagem efetuadas quando da construção da deste
trecho da rodovia (década de 1970). Na Figura 1, apresenta-se foto do local após a primeira ruptura ocorrida em
11 de janeiro de 2011, sob chuvas intensas. O deslizamento no caso limitou-se a camada superficial de solo
residual maduro. Após este evento, obras de reconformação do talude foram realizadas, porém apesar da
intervenção verificou-se uma segunda ruptura em 06 de junho de 2011. A Figura 2 apresenta o talude após a
intervenção, o segundo evento envolveu, além da camada superficial de solo residual maduro, também camadas
inferiores de solo residual jovem. A movimentação iniciou-se com trincas no topo do talude e fortes movimentos
na base, e se completou poucos minutos após os primeiros sinais.
Após o segundo colapso, novas obras de retaludamento, drenagem superficial (escadas d’água e canaletas), e
proteção vegetal foram efetuadas. Na Figura 3, observam-se escorregamentos superficiais que se verificaram
após esta intervenção. A figura apresenta as seções analisadas e também são destacados os locais nos quais foram
retiradas amostras para ensaios em laboratório.

168
Seção I

Figura 1. Primeira ruptura Figura 2. Segunda ruptura

Figura 3. Escoregamentos superficiais

3. Materiais e métodos

Nas Tabelas 1 e 2, apresentam-se parâmetros de solo adotados nas análises. Os ensaios foram realizados em
blocos indeformados, sendo a resistência ao cisalhamento determinada através de cisalhamento direto em
amostras embebidas. Ensaios de condutividade hidráulica saturada oram também efetuados. Nas Figuras 4 e 5,
apresentam-se as curvas características obtidas através de ensaio de papel filtro em amostras de solos residuais
Maduro e Jovem 1. O solo Jovem 2 não foi ensaiado e nas análises numéricas adotou-se uma curva característica
típica de areia (Fig. 6). A modelagem proposta por Van Genuchten (1980) foi adotada para representar a variação
da condutividade hidráulica não saturada, Kr (), com a umidade volumétrica do solo, .

{1 − (α)n−1 [1 + (α)n ]−m }2 (1)


K r () =
[1 + (α)n ]m/2

Tabela 1. Parâmetros de resistência e condutividade hidráulica dos solos


Camada de solo Coesão efetiva Ângulo de atrito Permeabilidade saturada
residual c (kPa) ( )
o (m/s)
Maduro 2 23 4,8e-06
Jovem 1 44 25 9,0e-07
Jovem 2 1 35 6,3e-07

Tabela 2. Parâmetros de condutividade hidráulica não saturada (Van Genuchten, 1980)


Tipo de solo Θr Θs α n m
Maduro 0,1 0,5459 0,0001 1,7 0,411765
Jovem 1 0,02 0,5748 0,003 1,43 0,300699
Jovem 2 0,045 0,27 0,55 2,68 0,6268

169
Figura 4. Curva característica (residual Maduro) Figura 5. Curva característica (residual Jovem 1)

0,3
Umidade Volumétrica (%)

0,25
0,2
0,15
0,1
0,05
0
0,01 1 100 10000
Sucção (kPa)
Figura 6. Curva característica (residual Jovem 2)

1. Retroanálise de Estabilidade

Na Figura 7, apresentam-se as Seções I, I*, II e III correspondentes ao perfil original do talude e após as obras
de reconformação efetuadas após a primeira e segunda ruptura, respectivamente. Na figura, incluem-se também
as cunhas críticas determinadas nas análises de estabilidade utilizando o programa SLOPE/W. As Seções I*, II e
III situam-se no centro do talude, enquanto a Seção I está posicionada pouco mais à esquerda, no centro da cicatriz
de deslizamento correspondente à primeira ruptura (Figs. 1 e 3). Na Figura 8, apresenta-se a representação das
condições de contorno adotada na modelagem utilizando o programa SEEP/W. Nas análises considerou-se a
condição Pressure Head (P) para representação da sucção inicial (metros de coluna d’água), já para a taxa de
infiltração adotou-se a condição Unit flux (q).

Residual Maduro Residual Jovem 1

Residual Jovem 2

I I*

II III

Figura 7. Retroanálises de estabilidade das Seções I, I* II e III


170
Pressure Head (P) Unit Flux (q)

Pressure Head (P)

Pressure
Head (P)

Pressure Head P= 0 (Nível d’ água inicial arbitrado


considerando que a ruptura se dá por infiltração.)
Figura 8. Condições de contorno adotada nas análises utilizando o programa SEEP/W

Na Tabela 3, apresenta-se resultados das retroanálises de estabilidade correspondentes à primeira, segunda e


terceira ruptura determinados utilizando os programas SEEP/W e SLOPE/W. Considerou-se neste estudo os
parâmetros de resistência obtidos nos ensaios em laboratório (Tabela 1) e variou-se valores de sucção iniciais e
precipitação de forma a representar as rupturas observadas, ou seja, levassem ao Fator de Segurança (FS) unitário.
Nas análises, em associação a um valor de intensidade horária no momento da ocorrência, consideraram-se
acumulados de chuvas de 96 horas, visto que esse período apresentou a melhor correlação com os
escorregamentos havidos na BR116/RJ entre o km 84 e Além Paraíba, km 0 (SILVA 2014).
Nota-se que, quando da primeira ruptura ocorrida na Seção I, situada um pouco mais à esquerda, a Seção I*
manteve estável e consistentemente nas análises foi determinado para esta seção FS=1,40. Após a reconformação
(Seção II) verificou-se ser necessário um montante de chuva superior para se ter FS=1. Em sequência, a Seção
III foi retroanalisada buscando retratar os deslizamentos superficiais que aconteceram após a segunda
intervenção. No caso da Seção III, após a reconformação a camada de solo residual Jovem 2 passou a se
apresentar exposta. Note-se que, em vista da granulometria mais grosseira deste solo, o valor da sucção inicial se
apresenta mais baixo e chuvas menos expressivas podem promover perdas expressivas de sucção e levar aos
deslizamentos superficiais observados.
Tabela 3. Retroanálises de estabilidade correspondentes às rupturas observadas
Ruptura Camada de Sucção Acumulado Intensidade FS
solo envolvida (kPa) (mm/96 h) (mm/h)
Seção I I* II III
Maduro 6000
Primeira Jovem 1 500 220 80 1,00 1,40 1,42 -

Maduro 6000
Segunda Jovem 1 500 340 80 - - 1,00 -

Maduro 6000
Jovem 1 500
Terceira 10 10 - - - 1,00
Jovem 2 200

1. Análises paramétricas

5.1 Sucção inicial do solo maduro

Nas análises paramétricas variaram-se as sucções iniciais na superfície da camada de solo residual Maduro de
forma a representar épocas de seca e de chuva e manteve-se as mesmas demais condições, 500 kPa de sucção
inicial na superfície do solo residual Jovem 1, 220 mm em 96 horas e ao final deste período 80 mm/h de
precipitação. Os valores de sucção foram adotados buscando representar períodos de chuva, principalmente
dezembro a março, quando ocorre aumento de umidade na camada superficial do terreno e, consequentemente,
diminuição da sucção, e épocas mais secas, nas quais a umidade diminui e a sucção aumenta. Na análise da Seção
III, a camada de solo residual Jovem 2 passou a se apresentar também exposta e se considerou na superfície dessa
camada uma sucção inicial de 200 kPa. As análises indicaram que nesta Seção o valor inicial adotado para sucção
na superficie da camada de solo residual maduro não influencia significativamente o valor do FS da encosta, mas
171
modifica a extensão da cunha crítica que no caso dos valores de sucção mais baixos passou a abranger toda a
face do talude. A Tabela 4 apresenta um resumo dessas análises, observa-se que para as Seções I e II, sucções
elevadas na camada de solo residual maduro (12000 kPa) tem-se FS elevados, mesmo quando considerada nas
análises as chuvas.

Tabela 4. FS para diferentes sucções iniciais na camada de solo residual maduro


FS
Tipo de solo Sucção (kPa)
Seção I II III
12000 1,74 1,68 1,00
6000 1,00 1,42 1,00
Solo residual
maduro 3000 0,52 1,00 0,95
1500 0,37 0,96 0,94

Nas Figuras 9, 10 e 11, apresentam-se os valores de sucção no interior da encosta ao final da precipitação,
calculados para as diferentes condições consideradas no estudo. Nas figuras, incluem-se os valores de FS
calculados e as cunhas críticas determinadas nas análises de estabilidade utilizando o programa SLOPE/W. Na
Seção I, considerando a sucção inicial igual a 12000 kPa a estabilidade da encosta manteve estável apesar das
chuvas, mantendo poropressões negativas na superfície da camada de solo residual Maduro. Tal evidência por
que a encosta permaneceu estável por mais de 40 anos, desde sua implantação quando da construção da rodovia
na década de 70, vindo a romper somente quando das chuvas excepcionais de janeiro de 2011. Considerando
uma sucção inicial de 6000 kPa, o deslizamento viria acontecer, mesmo sem atingir a completa saturação das
camadas superficiais da encosta. Nota-se que para sucções iniciais inferiores a 6000 kPa ter-se-iam deslizamentos
e a saturação quase completa na região da cunha. Nesta condição, a umidade inicial mais elevada leva a uma
maior permeabilidade da massa de solo, favorecendo a infiltração da água da chuva e a instabilização. Na Figura
11, apresentam-se os resultados para a Seção III, note-se que a reconformação eliminou grande parte da camada
do solo residual Maduro, camada esta que pode mobilizar elevadas sucções, redundando na diminuição da
permeabilidade do solo e no avanço da frente de saturação. Nesta condição o valor da sucção inicial presente na
camada de solo residual maduro não influencia de forma importante nos resultados, isso se deve às obras de
reconformação da encosta que deixaram exposta a camada de solo residual Jovem 2, passando esta camada ter
papel relevante na infiltração da água de chuva. Além disso, essa camada é mais granular e, portanto, resulta em
sucções baixas, o que favorece ao deslizamento.

FS=1,74 1,00

a
b

0,52 0,37

c d

Figura 9: 1ª ruptura (Seção I) − FS e sucção após 220 mm/96 horas considerando diferentes sucções iniciais
para o solo residual maduro: (a) 12000 kPa; (b) 6000 kPa; (c) 3000 kPa; (d) 1500 kPa

172
FS=1,68 1,42

a
b

1,00 0,96

c d
Figura 10. 2ª ruptura (Seção II) − FS e sucção após 220 mm/96 horas considerando diferentes sucções iniciais
para o solo residual maduro: (a) 12000 kPa; (b) 6000 kPa; (c) 3000 kPa; (d) 1500 kPa

FS= 1,00 1,00

a b

0,95 0,94

c d

Figura 11. 3ª ruptura (Seção III) − FS e sucção após 220 mm/96 horas diferentes sucções iniciais para o solo
residual maduro: (a) 12000 kPa; (b) 6000 kPa; (c) 3000 kPa; (d) 1500 kPa

5.2 Variação da curva característica

De forma a explicitar o impacto da condutividade hidráulica não saturada no comportamento da encosta, foram
efetuadas análises adotando a mesma curva característica e condutividade hidráulica saturada para todas as
camadas de solo. Para isto, foram consideradas em cada análise separadamente as mesmas condições de sucção
inicial na superfície da camada do solo residual Maduro e Jovem 1, 6000 kPa e 500 kPa, respectivamente, e no
caso da Seção III, 200 kPa na superfície da camada de solo residual Jovem 2, que nesta nova conformação
também ficou exposta.
Na Tabela 5, apresentam-se, para as diferentes condições analisadas, os valores de chuva acumulados e
intensidade horária necessários a FS=1. Nas Figuras 12, 13 e 14, tem-se os valores de sucção determinados no
interior da encosta após a precipitação. Nas figuras, incluem-se também as cunhas críticas determinadas nas
análises de estabilidade utilizando o programa SLOPE/W. Observa-se que quando se modela toda a encosta com
a curva característica do solo residual maduro, para FS=1 seriam necessárias precipitações extremamente
volumosas, valores estes não representativos do que se verifica na região. Em contrapartida, considerando a do
solo residual Jovem 1, seriam necessárias chuvas menos expressivas, mais condizentes com o comumente
observado. Já a adoção da correspondente ao solo residual Jovem 2, tem-se para as Seções I e II, deslizamentos
mesmo sem chuvas, e no caso da Seção III, a mesma se mostra instável para chuvas mínimas, sendo que neste
caso grande parte da encosta estaria envolvida no deslizamento (Fig. 14c). 173
Tabela 5. Fatores de segurança considerando diferentes curvas características
Curva característica Chuva (mm/96 h e mm/h)
adotada em todas as
camadas correspondente
Sucção (kPa) Seção I Seção II Seção III
ao solo residual
1490 mm/96 h e 120 1850 mm/96 h e 980 mm/96 h e 120
Maduro 6000
mm/h 120 mm/h mm/h
200 mm/96 h e 80 300 mm/96 h e 80 125 mm/96 h e 50
Jovem 1 500
mm/h mm/h mm/h
10 mm/96h e 10
Jovem 2 200 - -
mm/h

b
Figura 12. Seção I − Sucção após precipitação considerando em toda
encosta a curva característica do solo residual: (a) Maduro; e (b) Jovem 1

Figura 13. Seção II − Sucção após precipitação considerando em toda


encosta a curva característica do solo residual: (a) Maduro; e (b) Jovem 1

174
a b

c
Figura 14. Seção III − Sucção após precipitação considerando em toda encosta a curva
característica do solo residual: (a) Maduro; (b) Jovem 1 e (c) Jovem 2

6. Conclusões

As análises efetuadas explicitaram os mecanismos envolvidos em deslizamentos de encostas sob condição não-
saturada por infiltração da água da chuva. Verificou-se que sucções elevadas podem garantir a estabilidade e que
deslizamentos podem ocorrer sem a saturação completa e o surgimento de poropressões positivas nas camadas
de solo. No caso em questão, as análises evidenciaram que o solo residual Maduro pôde mobilizar elevadas
sucções, levando à diminuição da permeabilidade do solo e do avanço da frente de saturação. A reconformação
efetuada eliminou grande parte desta camada expondo a Jovem 2, que por ser mais granular favoreceu sucções
mais baixas, maior infiltração de água e os deslizamentos superficiais observados.

AGRADECIMENTOS

À CAPES, pelo fundo de amparo concedido para o desenvolvimento deste trabalho.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
GEO-SLOPE International Ltd. (2012), Seepage Modeling with SEEP/W – An Engineering Methodology,
Alberta, Canadá
GEO-SLOPE International Ltd. (2012), Seepage Modeling with SLOPE//W – An Engineering Methodology,
Alberta, Canadá
VAN GENUCHTEN, M.T. (1980) – A closed from equation for prediction the hydraulic conductivity of
unsaturated soil. Soil sciense society of America journal, V. 44.
SILVA, G. F. (2014) Influência da Pluviometria em Movimentos de Massa nas Encostas da Rodovia BR-
116/RJ (Rodovia Rio-Teresópolis). Dissertação de mestrado, Programa de Engenharia Civil, Universidade
Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro.
VAN ONSELEN, C. C, EHRLICH, M., BECKER, L. B. (2013) Retroanálise da Ruptura de Solo Residual na
BR 116/RJ km 76,4, Conferência Brasileira de Estabilidade de Encostas – COBRAE, Angra dos Reis,
Anais, ABMS.
VAN ONSELEN, C. C. (2016) Retroanálise computacional de ruptura havida durante chuvas intensas em
talude sito à BR 116/RJ km 76,4, Dissertação de Mestrado, Programa de Engenharia Civil, Universidade
Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro.
D’Orsi, R. N. (2011) Correlação entre pluviometria e escorregamentos no trecho da Serra dos Órgãos da
Rodovia Federal BR-116 RJ (Estrada Rio-Teresópolis). Tese de doutorado, Programa de Engenharia Civil,
Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro.

175
Análise de estabilidade de uma encosta na Zona Norte de Recife -
Córrego do Jenipapo
Roberto Quental Coutinho
Professor Titular, Universidade Federal de Pernambuco, Recife, Brasil, robertoqcoutinho@gmail.com

Igor Fernandes Gomes


Professor Associado, Universidade Federal de Pernambuco, Recife, Brasil, igor.fernandes@ufpe.br

Pedro Gomes dos Santos Pereira


Doutorando, Universidade Federal de Pernambuco, Recife, Brasil, pgomes.eng@gmail.com

Danisete Pereira de Souza Neto


Doutorando, Universidade Federal de Pernambuco, Recife, Brasil, daniseteneto@gmail.com

Felipe Oliveira Tenório da Silva


Doutorando, Universidade Federal de Pernambuco, Recife, Brasil, felipetenorio2001@gmail.com

Rosane Kelen Rodrigues Delfino


Mestranda, Universidade Federal de Pernambuco, Recife, Brasil, rosanekrd@gmail.com

RESUMO: Os movimentos de massa em regiões urbanas surgem como um dos grandes problemas a serem
combatidos na atualidade. A ausência de políticas públicas de habitação em países como o Brasil aumentam
ainda mais os riscos de grandes desastres, cada vez mais constantes devido às mudanças climáticas. Os
acidentes provocados pelas chuvas de maio de 2022 na Região Metropolitana de Recife são exemplo do
potencial destruidor destes eventos, neste caso em particular totalizando 129 mortes. O presente trabalho tem
como objetivo identificar, a partir de visitas técnicas, as características geológico-geotécnicas da região de
morros no bairro de Nova Descoberta, assim como apontar os riscos de natureza antrópica ou nas condições
naturais do terreno encontrados nas encostas da região. Além disso, o trabalho visa apresentar resultados de
um estudo de estabilidade em equilíbrio limite da encosta do Córrego do Jenipapo. A partir de medições de
campo e de investigações geotécnicas previamente realizadas no local foi estabelecido o modelo geotécnico
utilizado na análise. Desta forma, foi possível concluir que as características naturais e eventos antrópicos
encontrados podem afetar a estabilidade da encosta e aumentar potencialmente os riscos de movimentos de
massa. Ademais, o estudo de estabilidade realizado apontou estabilidade da encosta para as condições
estabelecidas previamente no modelo, caso haja a manutenção das soluções encontradas em campo.

PALAVRAS-CHAVE: Estabilidade de Taludes, Modelagem Computacional, Movimentos de Massa.

ABSTRACT: Nowadays mass movements in urban areas are one of the major problems to be faced. The
absence of housing policies in countries like Brazil further increases the risks of major disasters, aggravated
due to climate change. The accidents caused by heavy rains on May 2022 in Recife’s metropolitan region are
an example of the destructive potential of these events, in this particular case causing 129 deaths. The present
work aims to identify the geological-geotechnical characteristics of the hills region in the Nova Descoberta
area, as well as pointing out the risks of natural or anthropic events noticed on the slopes of the region. In
addition, it aims to present results of a slope stability analysis (limit equilibrium method) with section located
in Córrego do Jenipapo. The geotechnical model used in the analysis was established based on field
measurements and geotechnical investigations previously carried out on the site. In this way, it was possible to
conclude that the natural characteristics and anthropic events found can affect the stability of the slope and
potentially increase the risks of mass movements. Furthermore, the stability study carried out indicated slope
safety for the conditions previously established, in case the solutions implanted in the field are maintained.

KEYWORDS: Computational Modeling, Mass Movement, Slope Stabiliy.

176
1 Introdução

Nos dias atuais, a precariedade habitacional e a universalização do saneamento básico são temas
sensíveis para o desenvolvimento social e econômico do Brasil. Grande parte da população se concentra em
áreas com potencial risco de deslizamento de terra, carecendo de infraestrutura básica para garantir a segurança
dos moradores locais. A Região Metropolitana de Recife (RMR) não foge desta problemática e ano após ano
sofre com problemas de movimentos de massa, muitas vezes terminando com vítimas fatais. Os acidentes
provocados pelas chuvas de maio de 2022 na RMR, maior desastre do século em Pernambuco com 129 mortes,
evidenciam a necessidade de um olhar mais cuidadoso para as áreas de morro.
Desta forma, de maneira a se compreender melhor a situação das áreas de morros, o amplo
conhecimento de problemas oriundos tanto de questões naturais quanto de intervenções antrópicas é
fundamental. Como composição natural do terreno, as características geológico-geotécnicas são aspectos
importantes para uma análise mais precisa da segurança do talude. Fatores predisponentes na região, como a
geologia e a geomorfologia local, contribuem sensivelmente para aumentar (ou diminuir) a suscetibilidade a
movimentos de terra de uma determinada área. Além disso, o regime de chuvas e ações intempéricas do clima
tem o poder de agravar ainda mais a situação da encosta. Dentre os fatores antrópicos agravantes das condições
das encostas é possível citar: ocupações inadequadas, remoção da vegetação nas encostas, cortes e aterros
irregulares, deposição de lixo nas encostas e obstrução do sistema de drenagem.
Neste contexto, a localidade Alto da Brasileira, situada no bairro de Nova Descoberta, é um recorte
importante para se compreender a dinâmica encontrada nas áreas de morro da Zona Norte de Recife. Composta
por três encostas (Córrego do Jenipapo, Córrego do Boleiro e Córrego do Joaquim) que avizinham um
reservatório para abastecimento de água da comunidade, localizado na cota topográfica mais alta do morro.
Esta área sofre a influência de anos de ocupação desordenada acompanhadas por constantes intervenções
antrópicas no terreno, conforme pode ser visto na encosta Córrego do Joaquim apresentada na Figura 1.

Figura 1. Ocupação desordenada na encosta do reservatório relativa ao Córrego do Joaquim.

Portanto, a partir de investigação geológico-geotécnicas e da avaliação de potenciais riscos devido às


atividades antrópicas e fenômenos naturais, torna-se imprescindível uma análise de estabilidade de taludes das
encostas da região. Neste caso em específico, devido a presença do reservatório no topo da encosta, é
importante uma avaliação criteriosa da estabilidade de forma a levar em consideração as interferências na
topografia do local, assim como os esforços produzidos pela presença do reservatório.
Cabe ressaltar que as informações / dados apresentados nesse trabalho são resultados parciais obtidos no
Projeto intitulado Plano de Segurança do Abastecimento de Água nos Morros da Zona Norte do Recife
(PSAM), coordenado pelo professor Roberto Quental Coutinho, que visa encontrar formas de melhorar as
condições de abastecimento de água nas regiões de morro da zona norte do Recife.
Este trabalho tem como objetivo, a partir das visitas técnicas ao campo na região norte da cidade de
Recife, apresentar as características geológico-geotécnicas, evidenciando problemas na condição das encostas,
tanto relativas às condições naturais do terreno quanto às ações antrópicas. Além disso, também se busca
avaliar a estabilidade da encosta do Córrego do Jenipapo, de maneira a entender seu fator de segurança de
acordo com o perfil estabelecido e dos estudos geotécnicos realizados previamente na região. A análise de
estabilidade foi realizada pelo método do equilíbrio limite com a presença das cargas relativas ao reservatório
semi-enterrado, atualmente em atividade no topo da encosta.
177
2 Caracterização geológico-geotécnica

Na região em análise é possível observar a existência de duas unidades geológicas, a saber: Formação
Barreiras e Depósitos Aluvionares (Coutinho et al, 1995). De forma predominante aflora a Formação Barreiras
associada aos tabuleiros dissecados que compõe as colinas e os morros baixos que podem atingir a altitude de
90 metros. Nas cotas mais baixas, ao longo dos vales encaixados ocorrem os Depósitos Aluvionares e sua
exposição na área de estudo é menos representativa.
A Formação Barreiras aflora em cortes, geralmente nos fundos de casas, devido a ocupação
desordenada potencializada pelo déficit habitacional do Brasil. A referida unidade apresenta-se extremamente
intemperizada, o que descaracteriza algumas estruturas sedimentares deposicionais e aumenta
consideravelmente a presença de argilominerais, podendo-se destacar a presença de caulinita. Nos pontos
visitados ao longo da área trabalhada predominam granulometrias nas frações arenosas (Figura 2.C) e
areno/argilosas e de forma secundária ocorre a fração argilo/arenosa. As composições granulométricas são,
em geral, quartzosas e alguns pontos pode-se observar composições arcoseanas. A disposição dos grãos é de
forma geral má selecionada, com grãos sub-angulosos e baixo grau de arredondamento. Também foi observada
camadas de argila maciça de até 40 centímetros de espessura. Os níveis argilosos exibem colorações
esbranquiçadas (Figura 2.A,B), avermelhadas e amarronzadas, dependendo, possivelmente, do grau de
oxidação. Camadas conglomeráticas de até 90 centímetros de espessura são observadas, sendo intercaladas
com camadas arenosas. Tais horizontes são constituídos por seixos arredondados centimétricos de quartzo,
envoltos numa matriz arenosa grossa/média (Figura 2.D). Além dos seixos, podem ocorrer também blocos
centimétricos de concreções ferruginosas. O registro geológico descrito neste parágrafo permite enquadrar as
camadas da área trabalhada nas fácies de canais fluviais da Formação Barreiras.
Cabe ressaltar que a alternância de camadas arenosas e argilosas, característica da região em análise,
pode afetar a estabilidade de encostas. Os níveis arenosos favorecem uma maior infiltração de água,
principalmente quando ocorrem nos topos das encostas. As camadas de argila por sua vez oferecem resistência
à percolação da água. A existência de uma camada arenosa acima de uma argilosa pode ocasionar a erosão do
material arenoso na crista e possíveis deslizamentos no talude. Os contatos entre os horizontes arenosos e
argilosos são plano-paralelos e não formam ângulos de mergulho concordantes com as inclinações das
encostas, o que diminui a suscetibilidade a movimentações de massa. No caso dos sedimentos
conglomeráticos, a existência de seixos centimétricos envoltos por uma matriz arenosa facilitam a percolação
da água ao longo do horizonte, diminuindo a coesão do mesmo. Tal contexto, principalmente quando
submetido a momentos de altas precipitações pode levar à desestabilização da camada, aumentando o risco de
deslizamentos.

Figura 2. A) B) C) D) Intercalações de horizontes arenosos, argilosos e conglomeráticos indicando as fácies de


canais fluviais da Formação Barreiras.

178
3 Intervenção antrópica

Ações antrópicas de grandes proporções são recorrentes em áreas de ocupação desordenada. Muitas
vezes estas áreas não apresentam condições mínimas para moradia segura e, devido ao fato de estas regiões
não serem devidamente fiscalizadas pelas autoridades competentes, continua-se a observar um crescimento
desenfreado de habitações irregulares em locais suscetíveis a deslizamento.
Muito frequente nas regiões de morros, os cortes e aterros irregulares são formas de intervenção
humana com a finalidade de tornar possível a ocupação de áreas em terrenos inclinados, como as superfícies
de encostas. Em razão disto, por falta de um estudo específico, os cortes podem atingir alturas e inclinações
muito superiores às recomendadas para que o talude esteja estável. Os aterros por sua vez são muitas vezes
mal compactados e com a presença de entulho, portanto, além conferir menor resistência ao terreno, aumentam
a sobrecarga no talude em que este foi construído.
De forma a minimizar a infiltração da água da chuva e facilitar o escoamento da água, é comum a
adoção de lonas cobrindo parcialmente o talude. A chuva é um dos fatores que agravam o risco de movimento
de massa visto que a infiltração de água no solo pode reduzir significativamente a resistência do mesmo.
Entretanto, apesar do uso de lonas ser válido como alternativa, estes devem ser utilizados de forma paliativa.
As lonas de plástico possuem pouca durabilidade e não conseguem impedir a infiltração de água por outros
caminhos preferenciais. A Figura 3 ilustra um corte realizado no Córrego do Boleiro, com residências alocadas
no topo do talude. Nesta mesma figura também é possível perceber que o corte está bastante erodido, além do
desgaste das lonas de plástico que foram utilizadas anteriormente. Cabe lembrar que no Córrego do Boleiro já
ocorreu um grande deslizamento no ano de 1996. Mais informações podem ser encontradas no trabalho de
Gusmão (1997).

Figura 3. Atividade antrópicas encontradas na encosta no Córrego do Boleiro.

Tanto na Figura 3 (indicado pela seta branca) quanto na Figura 4a é possível observar o lançamento de
águas servidas diretamente na encosta exposta, sem qualquer tipo de proteção superficial. A falta de um sistema
de drenagem adequado, associados a falta de proteção destas encostas incorre na contaminação do subsolo e pode
contribuir para o aumento de processos erosivos, redução da resistência no solo e, consequentemente, na
ocorrência de movimentos de massa.
Assim como apresentado na Figura 4b, a remoção da vegetação superficial do talude pode tornar o solo
mais vulnerável a processos erosivos e aumentar sua capacidade de absorver águas provenientes das chuvas, visto
que cobertura vegetal protege o solo da ação de agente climáticos (Gerscovich, 2016).

179
A B

Figura 4. Ações antrópicas a) mecanismos precários de drenagem da água b) remoção da vegetação superficial
do talude.

Porém, segundo Guidicini et Nieble (1983) a cobertura vegetal também pode gerar efeitos
desfavoráveis à estabilidade do talude. Além de aumentar a sobrecarga sobre este, os caules e as raízes podem
gerar caminhos preferenciais para a água precipitada, concentrando-as em determinada faixa do subsolo. Na
região de Nova Descoberta foi possível perceber presença de muitas árvores de grande/médio porte ao longo de
boa parte das encostas. O cultivo dessas árvores em locais de risco pode contribuir na ocorrência dos movimentos
de massa.
Além da preocupação quanto à expansão territorial das comunidades que residem nas áreas de risco,
também deve-se preocupar com o vertiginoso crescimento vertical destes territórios. Com a consolidação da
população nestas áreas, pode ocorrer o aumento da quantidade de andares das moradias, de forma a exercer um
acréscimo de sobrecarga na encosta.
Para que se possa evitar acidentes de grandes proporções nas áreas de morro, deve ser realizada ações
não estruturais (ex.: educação para redução de desastres) e ações estruturais (ex.: estruturas de contenção),
particularmente em áreas de risco alto e muito. Uma proteção superficial muito utilizada nas regiões de morro é
a tela argamassada. Esta tem a finalidade de proteger a encosta da infiltração de águas provenientes da chuva e
do lançamento de águas servidas, contribuindo para a redução de processos erosivos e prevenindo possíveis
deslizamentos de terra. Como outras soluções usualmente encontradas nestas regiões podemos citar: geomanta,
muros de solo-cimento, muro de arrimo de pedra rachão, entre outros.
A Figura 5 apresenta as obras de contenção e impermeabilização em andamento na encosta do Córrego
do Jenipapo. No local, além da impermeabilização por tela argamassada em boa parte dos taludes, foram
construídos muros de arrimo nos platôs de cortes previamente realizados. É importante alertar que durante as
fortes chuvas de maio de 2022 houve um deslizamento de terra com vítima fatal no Córrego do Jenipapo, próximo
a região registrada na Figura 5. Portanto, é fundamental que haja uma atenção especial nesta encosta visto que
na região afetada não havia tido obras de estabilização.

Figura 5. Encosta com obras de contenção e impermeabilização em andamento no Córrego do Jenipapo.

180
4 Modelagem Computacional

A seção bidimensional adotada neste trabalho foi baseada nas curvas de nível geradas a partir do modelo
digital de terreno (MDT). Para se traçar a seção mais crítica da encosta foram levados em consideração fatores
como: declividade, concavidade e cargas atuantes (reservatório e moradias) no perfil.
Devido à grande distância em que foram tiradas as ortofotos que geraram as curvas de nível, o
processamento dos dados possui interpolações que acabam não reproduzindo precisamente a topografia da região
modelada. Além disso, a ortofoto é datada de 2013 e as regiões de morro ocupadas desordenadamente possuem
dinâmicas de mudanças muito intensas, portanto sua topografia se encontrava desatualizada. A fim de reduzir as
imprecisões, visitas de campo foram realizadas para ajustar a seção e considerar as ações antrópicas. Desta forma,
o modelo geológico-geotécnico foi desenvolvido com a finalidade de representar o mais próximo possível as
condições encontradas na encosta.
O perfil é composto por 3 camadas de solo: argila arenosa (camada 1), areia argilosa (camada 2) e areia
argilosa com pedregulhos (camada 3). A topografia do terreno é constituída de diversos platôs em cotas diferentes
que estão associados aos taludes de corte efetuados no local. Cada corte referente aos platôs da encosta apresenta
construções de muro de arrimo (Figura 6 - detalhe 2). É importante ressaltar que não se obteve nenhum projeto
relacionado às obras de contenção realizadas no local, e com isso, assim como nas medições do platô, o modelo
geotécnico foi desenvolvido com as dimensões obtidas em campo.
O carregamento do reservatório de água (Figura 6 - detalhe 1) foi estimado de acordo com a contribuição
relativa a presença de água na altura máxima de funcionamento e com o peso da estrutura (paredes e laje de
fundo). O empuxo nas paredes do reservatório chegou a 54 kN/m² enquanto no fundo da estrutura o carregamento
utilizado foi de 63,6 kN/m². Para o carregamento relativo as residências (Figura 6 - detalhe 3) o valor utilizado foi
de 20kPa baseado na Norma de Estabilidade de Taludes NBR 11682/2009. A Figura 6 mostra o perfil adotado
para a modelagem computacional com os detalhes citados anteriormente.

Figura 6. Perfil geotécnicos adotado com a identificação dos detalhes 1,2 e 3 referentes ao reservatório, muro
de arrimo e residências respectivamente.

Os parâmetros de resistência utilizados para o modelo foram retirados do trabalho de Coutinho e Severo
(2009) e outros estudos realizados em áreas de Formação Barreira. Como explicitado anteriormente no item 2,
as fácies correspondentes à área de Nova Descoberta podem ser classificadas predominantemente como Canais
Fluviais, portanto, os parâmetros incorporados para a análise respeitaram esta especificidade.
Vale salientar que este artigo apresenta resultados parciais dos estudos realizados no Projeto PSAM,
conforme mencionado no item 1. Para o parâmetro de coesão, foi adotado valores médios representativos. No
caso do ângulo de atrito, foi possível calcular o valor médio, desvio padrão e consequentemente, adotar uma faixa
de sensibilidade das camadas 1 e 2 do modelo. Os valores médios, desvio padrão e sensibilidade adotados para
as camadas podem ser observado no Quadro 1. Dada a ausência de dados de ensaios para o solo da camada 3 e o
aumento do NSPT ao longo da profundidade, adotou-se os parâmetros geotécnicos em 10% acima do valor médio
da camada 2.

181
Quadro 1. Parâmetros de resistência para a condição natural e inundada adotados para as camadas de solo do
perfil.

Coesão Ângulo de Atrito


Condição do
Camada Valor médio
CP Valor médio (º) Desvio padrão Sensibilidade (º)
(kPa)
Argila arenosa
20 33 4 29 – 37
(Camada 1)
Areia argilosa
24 31 3 28 – 34
Natural (Camada 2)
Areia argilosa
com pedregulhos 22 33 - -
(Camada 3)
Argila arenosa
5 32 2 30 - 34
(Camada 1)
Areia argilosa
10 29 5 24 - 34
Inundado (Camada 2)
Areia argilosa
com pedregulhos 8 32 - -
(Camada 3)

5 Resultados

Os resultados obtidos são os fatores de segurança das análises realizadas com parâmetros do solo em
sua condição natural e inundado. Estes fatores de segurança calculados são associados ao estudo de sensibilidade
citado anteriormente e foram determinados pela análise de equilíbrio limite, para o método de cálculo de
Morgenstern-Price.
Está sumarizado no Quadro 2 os valores do fator de segurança para a seção em estudo, de acordo com
a sensibilidade adotada para o ângulo de atrito. Observa-se que o fator de segurança, para condição natural do
corpo de prova, apresentou valor de 1,44 para o mínimo ângulo de atrito adotado na sensibilidade, indicando que
mantendo essas condições de umidade, o risco de deslizamento é baixo. Entretanto, para a condição inundada do
corpo de prova, o fator de segurança encontrado foi de 1,03 para o valor mínimo do ângulo de atrito estabelecido
na sensibilidade. Este valor de fator de segurança indica que se permitir a saturação do solo, o talude tem chance
de romper. Entretanto, para o solo totalmente saturado, a possível superfície de deslizamento é considerada
profunda, aproximadamente 6,2 metros. Portanto, devem ser realizados trabalhos junto com a prefeitura para que
os taludes estejam impermeabilizados, incluindo um sistema de drenagem adequado com uma sistemática de
manutenção apropriada.

Quadro 2. Variação de fatores de segurança encontrados para a condição natural e inundada de acordo com o
ângulo de atrito adotado.

Sensibilidade – Ângulo de Fator de Segurança


Condição do CP Camada
atrito (◦) (FS)
Argila Arenosa (Camada 1) 29 - 37
Natural 1,44 - 1,74
Areia Argilosa (Camada 2) 28 - 34
Argila Arenosa (Camada 1) 30 - 34
Inundado 1,03 - 1,42
Areia Argilosa (Camada 2) 24 - 34

A Figura 7 mostra os resultados encontrados na modelagem computacional. A região verde do perfil


representa a superfície crítica de ruptura relativa a estes fatores de segurança. Na condição de umidade natural, a
superfície potencial de ruptura chega a aproximadamente 14,2 metros, o que não é comum na região de estudo.
Quando é observado o valor do FS e a geometria da análise de estabilidade para o corpo de prova na condição
inundado, tem-se uma superfície potencial de ruptura com aproximadamente 6,2 metros de profundidade e FS de
1,03. Apesar das fortes chuvas que caíram na região no mês de maio de 2022, não houve registro de acidente na
seção em análise devido à recente obra de estabilização que iniciou alguns meses antes do maior desastre do
século em Pernambuco.

182
A B

Figura 7. Resultados da análise de estabilidade para a condição a) natural b) saturada.

6 Considerações finais
A encosta deste trabalho apresenta suscetibilidade natural a processos de movimento de massa, o qual
são agravados devido a fatores como a ocupação desordenada, cortes irregulares, lançamento de lixo nos taludes,
lançamento de água servida, presença de fossa rudimentar, dentre outros.
A caracterização geológico-geotécnica adequada, especialmente nas áreas mais críticas, contribui para o
estudo da segurança da encosta. O conhecimento do fator de segurança permite o gestor tomar decisões em
períodos de maior risco de deslizamento, bem como direcionar recursos para mitigar o risco.
O aumento das chuvas impulsionadas pelas mudanças climáticas pode resultar na intensificação de
registros de deslizamento, caso não haja uma intervenção de engenharia e social que atua na prevenção e
mitigação do risco. As obras de contenção realizadas na área de estudo são exemplos de como a engenharia pode
atuar na mitigação de desastres. As análises de estabilidade mostram que mantida as condições atuais da encosta
(estrutura de contenção, tela argamassada e sistema de drenagem), não é esperado que haja a saturação do solo
e, consequentemente, sua ruptura.

Referências bibliográficas
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Gusmão Filho, J. A.; Ferreira, S. R. M. & Amorim Jr, W. M. (1997). Escorregamento em Morros Urbanos do
Recife: o caso Boleiro. In: 2nd Panamerican Symposium on Landslides, Rio de Janeiro, ABMS. Anais, Vol.
2, pp. 985 - 994.

183
A influência da injeção e dos tipos de solos no desempenho de
tirantes ancorados como estruturas de contenção
Lucas de Araujo Estanqueiro
Concluinte do Curso de Graduação em Eng. Civil, UFF – Universidade Federal Fluminense, Niterói, Brasil,
lucasestanqueiro@gmail.com

Dcs. Rubenei Novais Souza


Professor Efetivo do Magistério Superior, UFF – Universidade Federal Fluminense, Niterói, Brasil,
rubenei_souza@id.uff.br

RESUMO: Os tirantes ancorados representam uma das várias soluções para sistemas de taludes. Estes
representam um sistema de estabilização ativo, no qual um elemento resistente à tração é ancorado no
maciço e pré-esforçado para que a face seja empurrada contra o talude. Por ser uma técnica que permite a
verificação constante em campo, sua base teórica ainda não foi totalmente desenvolvida, apesar de ser um
método amplamente utilizado. Assim, a expertise de execução está nas mãos de projetistas e executores.
Neste artigo foram analisados os diferentes tipos de solo e sua influência no desempenho dos tirantes,
concluindo que os parâmetros executivos podem ser alterados de acordo com o tipo de terreno, levando em
consideração as características geométricas do projeto.

PALAVRAS-CHAVE: tirantes, encostas, estabilidade, geotecnia.

ABSTRACT: The anchors represent one of several solutions for slope systems. These represent an active
stabilization system, in which a traction-resistant element is anchored in the massif and prestressed so that the
face is pushed against the slope. Since it is a technique that allows constant field verification, its theoretical
basis has not been fully developed, despite being a widely used method. Thus, the execution expertise is in the
hands of designers and executors. In this article, different soil types and its inffluence
on the anchors performance were analyzed, leading to the conclusion that executive parameters can be
changed according to the type of terrain, taking into account the geometric characteristics of the project.

KEYWORDS: anchors, slopes, stability, geotechnic.

1 Introdução

A segurança de escavações e taludes em materiais geomecânicos, como solos e rochas alteradas ou


fraturadas, é um problema recorrente desde antes do início dos estudos sobre geotecnia iniciados por
Terzaghi. Seja envolvendo encostas naturais em áreas isoladas, aterros ou cortes para construção de rodovias
ou ferrovias, construção de galerias subterrâneas, contenção de pilhas de rejeitos ou escavações urbanas, a
questão da segurança geotécnica têm sido um fator controlador de projeto, definido para a implantação
destas obras, um coeficiente de segurança, chamado popularmente também de Fator de Segurança (FS),
conforme preconiza a própria ABNT NBR 11682:2009 – Estabilidade de Encostas, onde para cada critério
de verificação, há um Fator de Segurança mínimo a ser atendido.
Inicialmente, os tirantes executados em solo eram comstituídos por uma única barra de aço inserida
no furo e integralmente preenchido com calda de cimento ou argamassa, e tinham baixa capacidade de carga,
entre 100kN e 200kN.
Conforme informa Costa Nunes (1978), a primeira obra de contenção no Brasil com a utilização de
tirantes ancorados foi iniciada em 1957, na Rodovia Rio-Teresópolis. Nos anos seguintes, os tirantes em solo
tiveram sua aplicação principalmente em estabilização de encosta, com cargas máximas limitadas até cerca
de 250kN.
A partir da implantação do Metrô de São Paulo, com obras iniciando no início da década de 1970,
ocorreu um grande avanço da técnica de execução, principalmente no que diz respeito à possibilidade de
reinjeção. Diversas executoras se capacitaram a executar tirantes tirantes com cargas de trabalho de até
600kN, sendo estas cargas evidenciadas a partir de ensaio.
Em face ao impulso da técnica de execução, trabalhos técnicos foram apresentados, além da
elaboração da NB 565 “Execução de Tirantes Ancorados no Terreno”, que precedeu a NBR 5629, atual
norma técnica.
Nas décadas de 1980 e 1990 a técnica de execução de tirantes em solos no Brasil continuou se
desenvolvendo, em grande parte para atender às necessidades impostas pelo surgimento, nas grandes
184
cidades, de obras com vários subsolos. Ainda sem um conhecimento teórico significativo, por conta do
empirismo dos executores e projetistas, verificou-se tirantes com cargas de até 1000kN.
Atualmente os tirantes são executados amplamente em vários países, com eventuais variações em
relação à etapa de perfuração, injeção e o tipo de tirante, mas sempre mantendo as características presentes
na norma. Para obras urbanas comuns, as cargas de trabalho dos tirantes não costumam elutrapassar 1500kN,
e no Brasil, em linhas gerais, a maioria destes elementos são executados com fios de cordoalha de aço ou
monobarras de aço especial.

2 Os tipos de solo e suas influências

O tipo de solo como influência no comportamento de tirantes ancorados se dá pelas características


naturais, como por exemplo resistência ao cisalhamento, ângulo de atrito, deformabilidade, mas também pelo
que é definido como grau de injetabilidade. Isto é, o poder da influência de injeção do aglutinante na
melhoria das propriedades naturais do solo, e de que forma isto corrobora para um bom comportamento dos
tirantes.
Para Guimarães Filho (1984), a ação da calda de cimento injetada em altas pressões se mostra
impreterível, superando a reação do solo, deformando-o, fisurrando-o e preenchendo seus vazios. Nesta ação,
que pode ser repetida em fases consevutivas, o solo ganha um tratamento que aumenta significativamente
sua resistência junto ao trecho injetado.
O efeito benéfico das injeções de calda de cimento sob alta pressão, na execução dos bulbos ancorados
dos tirantes, baseado em experiência de obras executadas e trabalhos de alguns pesquisadores, pode ser
analisado pelos seguintes aspectos:
• Aumento quantitativo considerável da densidade do solo, com aumento do diâmetro médio do
bulbo, ângulo de atrito interno do solo adjacente e a tensão normal na interface bulbo-solo;
• Melhora das características de resistência e deformabilidade do solo a partir da penetração de
calda de cimento nos vazios e descontinuidades.
Estes dois aspectos se manifestam de forma independente de acordo com as características do solo, e
uma análise destas diferenças permite classificar os solos de acordo com o seu grau de injetabilidade.
Para solos arenosos fofos, é de se esperar que a injeção de calda de cimento sob alta pressão aumente
de maneira significativa o diãmetro médio do bulbo, além do ângulo de atrito interno do solo adjacente.
Espera-se também que a tensão normal na interface bulbo-solo aumente apenas de maneira razoável, uma
vez que em terrenos fofos arenosos o aumento da tensão confnante ocorre a partir de grande deformação. Por
fim, a quantidade grande de vazios tende a diminuir a partir do preenchimento com calda de cimento.
Já em solos arenosos, mas compactos, espera-se que a injeção sob pressão não altere tanto o diâmetro
médio do bulbo, por conta da compacidade elevada de material, mas aumente significativamente a tensão
normal na interface bulbo-solo e o ângulo de atrito interno do solo adjacente a partir do preenchimento dos
vazios criados pela injeção de calda.
Em argilas moles, é de se esperar um aumento do diâmetro médio do bulbo e da coesão do solo
adjacente, mas a tensão normal na interface bulbo-solo não terá aumentos representativos.
Em argilas de alta consistência, o aumento do diâmetro médio do bulbo a partir da injeção em pressão
será significativo, aumentando também a tensão normal na interface bulbo-solo. O ângulo de atrito interno,
que inicialmente já é baixo, tende a não ter alterações representativas..
Intuitivamente, para solos siltosos, de características intermediárias entre areias e argilas, a ação da
calda de cimento tem magnitude também intermediária entre as observadas acima, dependendo ainda mais
da heterogeneidade do terreno.
Portanto, conforme supracitado, é adequado inferir que a estrutura dos tipos de solos é o principal
fator para a determinação do grau de injetabilidade do mesmo. Como a estrutura detalhada dos solos é
missão complexa devido às diversas dificuldades encontradas na Engenharia de Solos – determinação de
índice de vazios, tamanho e forma de ocorrência dos vazios, determinação do tamanho, forma e aglutinação
dos grãos, homogeneidade, índice de resistência e deformabilidade – muito por conta das informações
superficiais retiradas das investigações geotécnicas, é recomendado utilizar dados relativos à granulometria
do solo, combinados à sua compacidade para estabelecer a Tabela 1, definindo de maneira qualitativa o grau
de injetabilidade de cada grupo de solo

185
Grau de injetabilidade parcial
Grau de
Compacidade ou Aumento do Aumento da
Tipo de solo Tratamento injetabilidade
consistência diâmetro do tensao
do solo global
bulbo normal
Areia média e grossa Fofa Alto Baixo Alto Alto
Areia média e grossa Compacta Baixo Alto Médio Médio
Areia fina Fofa Alto Baixo Médio Médio
Areia fina Compacta Baixo Alto Baixo Baixo
Silte Fofo Alto Baixo Médio Médio
Silte Compacto Baixo Alto Baixo Baixo
Argila Mole e média Alto Baixo Médio Médio
Arila Rija e dura Baixo Alto Baixo Baixo
Tabela 1. Grau de injetabilidade dos vários grupos de solo. Fonte: Souza (2001).

A tabela acima mostra que, para um tirante executado em areia fofa, por exemplo, a injeção em alta
pressão de calda de cimento tem a probabilidade grande de melhorar de forma considerável as características de
resistência natural do solo, possibilitando para este caso, ser dimensionado um bulbo de menor
comprimento, e consequentemente aplicar menos recursos de injeção Para este exemplo, por se tratar de um
material com grau de injetabilidade global entre alto e médio, a tendência é que haja um aumento do
diâmetro do bulbo com uma pressão de injeção na escala de 1000kPa. De forma contrária, para um tirante
executado em argila dura, a injeção em alta pressão de calda de cimento não tende a melhorar de maneira tão
considerável as características de resistência naturais do solo, levando a um dimensionamento de bulbos com
maiores comprimentos, uma vez que, devido ao grau de injetabilidade ser baixo, a tendência é que não há um
aumento considerável do diâmetro do bulbo, sendo necessária uma pressão de injeção bem maior do que a
supracitada para este aumento, na escala de 2000 a 3000kPa.
Para solos com grau de injetabilidade global altos, é verificado ainda a possibilidade da realização de mais
de uma fase de injeção de válvulas manchete, em caso de a pressão de injeção não atingir o valor médio para estas
injeções (no caso, 1000kPa). Em areias fofas, por exemplo, na primeira fase de injeção é possível que o diâmetro
do bulbo aumente com uma pressão de injeção abaixo da média encontrada, e desta forma, faz-se necessária
uma ou mais fases sucessivas de injeção até que este falor da pressão de injeção seja atendido.
Pode-se inferir, que a pressão de abertura das válvulas manchete é a responsável por romper a bainha de
calda de cimento, e a pressão de injeção é a responsável por realizar melhoria no tratamento do solo local,
aumentando o diâmetro do bulbo, densificando a região e aumentando a tensão normal entre bulbo-solo.
Analisando o solo local como meio resistente às cargas transferidas pelo trecho ancorado, é verificado,
conforme exposto acima, que determinadas características naturais do solo tem a capacidade de influenciar de
maneira significativa no comportamento do tirante. A consistência ou compacidade dos solos tem
influência significativa na capacidade de carga e na rigidez do tirante. Pode-se dizer que a capacidade de
carga deste elemento será maior quanto mais compacto ou consistente for o material, não considerando o
efeito da perfuração e injeção. Adiante poderá ser visto que a técnica de injeção de calda de cimento
combinada com o tipo de solo, pode determinar o comportamento do tirante.
Analogamente ao já exposto, é de se esperar que a magnitude do deslocamento relativo do bulbo-solo
também é influenciado pelo solo vizinho, levando em consideração sua rigidez, esperando-se que em solos
mais compactos ou resistentes, este trecho necessite de um menor deslocamento relativo para mobilizar a
resistência do tirante.
Já a variação da tensão tangencial mobilizada no sistema bulbo-solo, em função do deslocamento do
bulbo, após atingir o valor limite, tem chamado atenção de pesquisadores. Tal variação está diretamente
associado com o estado de tensões, e nem tanto com o tipo de solo que é solicitado.

3 A influência da injeção

A técnica de injeção adotada na execução de tirantes influencia não só no comportamento final do


elemento, mas também no valor econômico da solução, uma vez que é uma das etapas mais onerosas do
processo executivo. Por esta razão, para uma injeção eficiente, o processo deve considerar os graus de
injetabilidade parciais do solo, prazo de execução da obra e ainda, prazo e custo de eventuais reinjeções
necessárias, tal como execução de tirantes adicionais e as condições de edificações vizinhas.

Em linhas gerais, são considerados dois sistemas de injeção para execução de tirantes: injeção de

186
bainha ascendente e única, em baixa pressão; e injeção por válvulas manchetes em alta pressão e em fases
sucessivas.
Como exposto acima, o sistema de injeção do tipo ascendente e único é realizado em baixas pressões,
preenchendo basicamente o espaço anelar entre a parede do furo e o próprio tirante. É comum nesta etapa,
possíveis detritos que ainda tenha ficado retidos dentro do furo, nas estapas de perfuração e instalação, sejam
expulsos pela injeção ascendente da bainha.
Já as injeções de válvulas manchetes, como também já exposto, são feitas normalmente com pressões
elevadas e crescentes a cada fase realizada, e possibilita, levando em consideração o tipo de solo, executar
trechos ancorados com diâmetro médio significativamente maiores do que o diâmetro da perfuração,
apresentando uma melhoria considerável das características de resistência e deformabilidade do solo
adjacente.
Como as pressões de injeção das manchetes são resultantes da condição de reação do terreno – quanto
mais resistentes, maior dificuldade de penetração da calda de cimento – é possível verificar a eficiência de
cada fase em cada válvula manchete. Para além disto, nos casos em que a pressão de injeção precisa ser
controlada para evitar danos ao terreno, esta pode ser controlada a níveis operacionais aceitáveis a partir do
volume injetado em cada fase e em cada manchete.
Intuitivamente, na execução do trecho ancorado, como visto neste trabalho, é impreterível que seja
utilizado o sistema de injeção por válvulas manchetes em fases sucessivas, fato este já amplamente
conhecido e de concordância de grande parte dos profissionais da área. No entanto, os parâmetros a serem
definidos de injeção, tal como volume de calda de cimento a ser injetado em cada fase, número de fases
sucessivas e pressão de injeção desejada na execução, ainda são discutidos e sem um padrão estabelecido.
Ademais, a melhoria da condição do solo do entorno e o aumento da tensão normal entre solo e calda
de cimento, influenciam diretamente na deformabilidade do bulbo do tirante, o que interfere diretamente na
verificação do trecho ancorado efetivo. No caso de uma deformação excessiva do bulbo, oriunda de um
tratamento ineficiente do entorno na fase de injeção, a tendência é que o trecho ancorado efetivo seja cada
vez maior, culminando diretamente em um trecho livre efetivo cada vez menor. Esta condição compromete a
segurança da estrutura de contenção, uma vez que o diagrama de esforço normal estabelecido inicialmente,
em projeto, pode ser alterado, causando alongamento adicional no tirante, perda de carga incorporada e
consequentemente, o deslocamento da cortina atirantada. A verificação e confirmação de que o trecho livre
efetivo é aproximadamente igual ao trecho livre projetado é de extrema importância, estando o processo de
injeção diretamente ligado à capacidade de deformação do bulbo do tirante.
Apesar da grande dificuldade de se prever, de maneira precisa, o comportamento de propagação da
calda de cimento injetada sob pressão no solo, em cada válvula manchete, Costa Nunes (1985, 1987) relata
que a partir da conjectura de diversos autores, observações de obras e ensaios básicos realizados, é possível
inferir que o mecanismo de ação deste tipo de injeção para a execução de trechos ancorados, pode ser
analisado sob três aspectos elementares:
• Aumento da densidade do solo com o aumento do diâmetro do bulbo, ângulo de atrito interno
do solo adjacente, e a tensão normal na interface bublo-solo;
• Tratamento do solo pela penetração da calda nos vazios e descontinuidades, melhorando desta
forma as suas características de resistência e deformabilidade; e
• Expansão da calda de cimento, quando da utilização de aditivo expansivo, potencializando o
efeito do aumento do diâmetro do bulbo, para solos muito resistentes.
A Figura 1 mostra de maneira esquemática a ação da calda de cimento injetada em alta pressão,
conforme descrito acima.
Levando em consideração o mecanismo de ação da injeção de calda de cimento, o qual culminou na
definição do grau de injetabilidade de diversos grupos de solos, é possível inferir um procedimento de
injeção que consiga conciliar a melhoria das características naturais de resistência e deformabilidade de um
determinado tipo de solo, com um menor custo e prazo do serviço a ser executado, seguindo as seguintes
premissas:
• Independente do grau de injetabilidade do solo, é necessário realizar pelo menos uma fase de
injeção de válvulas manchetes, de forma a garantir o tratamento de possíveis
descontinuidades, aumento de tensão normal na interface bulbo-solo;
• Em cada fase, a cada válvula manchete, injetar ao menos 20 litros de calda de cimento até que
a pressão de injeção, inicialmente crescente, se estabilize, para espaçamento entre as válvulas
de 0,5m;
• Proceder para fases sucessivas de injeção de válvulas manchetes em solos com alto grau de
injetabilidade, até atingir altas pressões de injeção, mas limitadas a cerca de 3000kPa, pois
pressões acima deste valor, não costumam trazer melhorias adicionais na capacidade de carga
do tirante
187
Figura 1: Mecanismo de ação da injeção da calda de cimento por válvulas manchete. Fonte: Souza (2001).

4 Conclusões

Em solos arenosos, verifica-se que o procedimento de injeção é muito importante. Como o material
tem alto grau de injetabilidade, a utilização da mistura apropriada, que deve ser pouco viscosa, mas coesa, e
de um procedimento de injeção que contemple fases sucessivas com pressões crescentes, tende a resultar em
bom desempenho do tirante.
Em solos argilosos, em linhas gerais, verifica-se que o diãmetro perfurado tem grande influência na
capacidade de carga do tirante, uma vez que o grau de injetabilidade deste tipo de solo é pequeno, o que não
permite um aumento expressivo do diâmetro médio do bulbo, delegando à perfuração a necessidade de um
furo com diâmetro tanto maior quanto possível.
Em linhas gerais, nota-se a importância de uma análise criteriosa dos parâmetros apresentados na fase
de elaboração dos projetos de tirantes, bem como um controle mais detalhado dos parâmetros executivos no
momento da obra. Principalmente no que se diz respeito ao controle das pressões de abertura e de injeção das
válvulas manchete, tal como o número de fases executadas em cada um dos tirantes da obra. Além disto, é de
suma importância que seja realizado o controle de calibração dos manômetros de aferição das pressões, para
que se garanta que sejam registrados os valores corretos. Os documentos gerados são úteis para apresentar
informações confiáveis no caso de garantia da qualidade na execução dos serviços, e em casos extremos,
evidências fidedígnas para um estudo analítico sobre a possibilidade de intervenção na estrutura de
contenção já executada.

188
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Associação Brasileira de Normas Técnicas (2009). NBR 11682. Estabilidade de encostas. Rio de Janeiro.
Associação Brasileira de Normas Técnicas (2018). NBR 5629: Tirantes Ancorados no Terreno – Projeto e
Execução.
CAPUTO, H.P. “Mecânica dos Solos e suas aplicações – Mecânica das Rochas, Fundações e Obras de
Terra”. Vol.2. 2017.
COSTA NUNES, A.J. “20 anos de experiência em ancoragens”. Conferência do Instituto de Engenharia de
São Paulo. 1978.
COSTA NUNES, A.J. “Estacas injetadas: Seminário de Engenharia de Fundações Especiais. São Paulo.
1985.
COSTA NUNES, A.J. “Ground prestressing – First Casagrande Lecture”. VIII CPAMSEF. Cartagena,
Colômbia. 1987.
SOUZA, R.N. “Ancoragens reinjetáveis e protendidas em solo: previsão do comportamento e controle de
execução”. Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Departamento de Estruturas e Fundações).
São Paulo. 2001.

189
Análise da influência de perfis iniciais de sucção na estabilidade
de taludes
Elisangela do Prado Oliveira
Professora do magistério superior, UFPR CPP-CEM, Pontal do Paraná, Brasil, elisangela.oliveira@ufpr.br

Marcelo Mota Correia Junior


Graduando de Engenharia Civil, UFPR-CEM, Pontal do Paraná, Brasil, motamarcelo97@gmail.com

Pedro Henrique Grossl


Graduando de Engenharia Civil, UFPR-CEM, Pontal do Paraná, Brasil, pedroohg@outlook.com

Vitor Pereira Faro


Professor, PPGEC UFPR, Curitiba, Brasil, vitorpereirafaro@gmail.com

Alessander Christopher Morales Kormann


Professor, PPGEC UFPR, Curitiba, Brasil, alessander@ufpr.br

RESUMO: A distribuição das poropressões ao longo da profundidade de uma encosta está diretamente
relacionada à sua estabilidade. Tal distribuição é resultado da interação do tipo de solo com o histórico de
ciclos de umedecimento e secagem ao qual a encosta foi submetida. Solos mais arenosos, permeáveis,
costumam apresentar franjas capilares menores, quando não inexistentes, do que solos mais argilosos e
coesivos. Além disso, com curvas características mais íngremes, tendem a estabilizar seus valores de
poropressão mais rapidamente do que os solos argilosos. Desta forma, este trabalho avalia três condições
diferentes de perfis iniciais de poropressões, que estariam representando diferentes tipos de solo, com o
objetivo de avaliar suas respostas diante de uma chuva em termos de variação das suas poropressões ao
longo da profundidade que afetam diretamente a estabilidade final da encosta.

PALAVRAS-CHAVE: Poropressão, Influência da chuva, estabilidade de encosta.

ABSTRACT: The pore pressures distribution along the depth of a slope is directly related to its stability. Such
distribution is the result of the interaction of soil type with the history of wetting and drying cycles to which the
slope was subjected. Sandy soils, in general, have smaller capillary rising zone (when they do) comparing to
clayey soils. In addition, with steeper characteristic curves, sandy soils tend to stabilize their pore pressure values
faster than clayey soils. Thus, this work evaluates three different conditions of initial pore-pressure profiles,
which would be representing different soil types, in order to evaluate their responses to a rainfall in terms of
variation of their pore-pressures along the depth. This response directly affects the final stability of the slope.

KEYWORDS: Poropressure, rainfall influence, slope stability.

1 Introdução

Os solos estão sujeitos a diferentes tipos de deslizamentos que podem acontecer tanto pelo aumento de
tensões cisalhantes atuantes, quanto pela perda de resistência ao cisalhamento. Estes mecanismos são
decorrentes de diferentes causas que, por sua vez, provocam os diferentes tipos de escorregamento.
De Carvalho et al. (2015) associam a variação das tensões cisalhantes mobilizadas a ação antrópica,
devido a ocupação desordenada de encostas e a perda de resistência ao cisalhamento a variação de poropressão.
Enquanto a ação antrópica se dá pela execução de cortes nos terrenos naturais e construção de estruturas, a
poropressão é modificada pela infiltração da água da chuva. Existem três formas principais de alteração da
poropressão: desenvolvimento de poropressão positiva devido à elevação do nível freático, redução dos níveis de
sucção devido ao avanço da frente de infiltração e geração de fluxo preferencial através das fraturas de um
embasamento rochoso.
A distribuição das poropressões ao longo da profundidade de uma encosta, está diretamente relacionada
com a sua estabilidade diante de uma chuva, e essa distribuição, é resultado da interação do solo com o
histórico de ciclos de umedecimento e secagem ao qual a encosta foi submetida ao longo do tempo. Num
processo de secagem e umedecimento, a curva característica, indica claramente que a medida que um solo

190
perde água, existe um aumento de sua resistência, ou seja, um ganho de tensão efetiva. O contrário indica que, por
exemplo, numa situação em que se contava com determinado valor de sucção, uma chuva e,
consequentemente um aumento da umidade do solo, poderia provocar uma diminuição desta sucção
estabilizando uma encosta inicialmente estável. Em alguns perfis de sucção (como por exemplo o hong kong..)
observamos como a sucção se comporta ao longo da profundidade em diferentes estações do ano. Em períodos mais
chuvosos, os perfis iniciais de sucção apresentam valores bem inferiores do que aqueles observados em períodos
de secas. Assim, fica evidente que o perfil inicial de sucção exerce grande influência no resultado das análises de
estabilidades de taludes decorrente de chuvas intensas.
Os solos não saturados apresentam comportamentos diferentes dos saturados em relação à resistência e
percolação da água. Solos mais arenosos, permeáveis, costumam apresentar franjas capilares muito menores,
quando não inexistentes, do que solos mais argilosos e coesivos. A capilaridade e a permeabilidade juntamente com
a estrutura afetarão o comportamento do solo diante da entrada e saída de água. O modelo que representa esse
comportamento é a curva característica de retenção de água, também chamada simplesmente de curva
característica ou curva de retenção de água.
A curva característica é uma função que representa a relação entre o teor de umidade volumétrica de
água e a sucção, e determina como a sucção varia com a capacidade dos poros do solo de reter água
(FREDLUND; XING, 1994). Ela representa uma propriedade importante dos solos não saturados. Os solos
com curvas características mais íngremes, tendem a estabilizar seus valores de poropressão mais rapidamente do
que os solos argilosos.
Diversas equações de ajuste de curvas características têm sido propostas na literatura para modelar o
comportamento das entradas e saídas de água no solo. A equação de Fredlund e Xing (1994) representa curvas
unimodais e é amplamente utilizada na modelagem de curvas características de solos por se ajustarem a um
grande número deles (LEONG; RHARDJO, 1997). O modelo de Fredlund e Xing (1994) considera quatro
parâmetros aplicáveis a diversos materiais (af, nf, mf e hr). A relação proposta por eles está apresentada na
Equação 01.

𝜃𝑤 = 1 − . . (01)

Onde:
𝜃𝑤 = teor de umidade volumétrico,
𝜓 = sucção (kPa),
hr = sucção no teor de umidade residual,
𝜃s = teor de umidade volumétrico saturado,
𝛼𝑓 = parâmetro relacionado ao valor de entrada de ar (VEA) em kPa,
nf = parâmetro do solo associado com a taxa de extração de água do solo uma vez que o VEA
tenha sido ultrapassado,
mf = parâmetro do solo associado a teor de umidade residual.
O modelo de resistência do solo não saturado é um dos modelos mais utilizados em estudos recentes. Foi
desenvolvido para modelar a contribuição da resistência do solo que advém da sucção. Desta forma, o
objetivo deste trabalho é avaliar as diferentes respostas que um perfil de solo residual pode apresentar diante de
uma chuva em termos de variação das suas poropressões ao longo da profundidade.

2 Metodologia

Uma encosta de solo residual foi modelada no computador a fim de simular seu comportamento diante de
uma chuva quanto à estabilidade. A partir de parâmetros hidráulicos, propriedades mecânicas do solo e
geometria definidos, foram analisados diferentes perfis de poropressão e associados com os resultados da
análise de estabilidade, de forma a concluir sobre a influência desses perfis com a estabilidade da encosta
modelo.

2.1 Modelo

O modelo utilizado nas simulações tem dimensões consistentes com muitos casos reais já reportados na
literatura (NG; SHI, 1998, GONZÁLEZ et al., 2017; VARGAS JUNIOR et al., 1986). Na parte da geometria, sabe-
se que o ângulo de inclinação de uma encosta está diretamente associado com o comportamento da água da chuva
no que diz respeito a infiltração e runoff. Alguns autores já afirmaram que um ângulo de declividade mínimo é
necessário para que um deslizamento de terra possa iniciar (MARIN; VELÁSQUEZ 2020; COGAN; GRATCHEV,
2019; KANJI et al., 1997). O ângulo mínimo usualmente mencionado na literatura para deslizamentos de
terra varia de 20 a 30 graus (KANJI et al. 1997; CHENG et al. 2007; MEISINA
191
SCARABELLI, 2007; RAHARDJO et al., 2007; LIU et al., 2020).A encosta genérica tem 20 m de altura e sua
inclinação é de 40 graus. A FIGURA 01 (Oliveira, 2021) representa a seção do talude estudado.

Figura 01 – Geometria do modelo e condições de contorno para as análises de infiltração.

Conforme detalha a FIGURA 01, o modelo adotado para o estudo dos parâmetros é um talude
homogêneo (composto por um único material) e de geometria simples. Este modelo simplificado pode ser
bastante diferente de uma encosta natural onde a ruptura do talude pode facilmente ser dominada por feições
geológicas. Entretanto, a variação na estratigrafia do problema tornaria impossível variar todos os outros
parâmetrose não é, portanto, o objetivo deste estudo. Não foi considerada a hipótese de feições reliquiares ou
superfícies preferenciais de deslizamento que pudessem condicionar o escorregamento, o que implica uma
limitação deste trabalho.
Pelo método dos elementos finitos as simulações numéricas bidimensionais de fluxo e do avanço da
frente de infiltração foram realizadas para todas as análises envolvidas neste estudo. O software utilizado
discretiza o talude em uma série de elementos de diferentes formas e tamanhos formando assim uma malha
capaz de representar a geometria da encosta. O tempo nas simulações foi fixado em dias. Todas elas tiveram
dois dias de duração total, sendo a soma de dois estágios de tempo de um dia cada estágio. Nas análises apenas
o cenário de infiltração após 48h foi avaliado. Equações de fluxo foram então resolvidas para determinar o
fluxo de nó para nó da malha de elementos finitos e a solução final foi apresentada como uma média dos
resultados obtidos para cada elemento, ponderada pelo peso de influência de cada um deles. Uma malha de
elementos triangulares foi utilizada, a qual permite uma aplicação de refinamento local e realiza uma
interpolação linear com três pontos de integração por elemento. O tamanho dos elementos foi ajustado de forma que
o algoritmo de refinamento da malha fosse sensível a altos valores de poropressão e gradientes hidráulicos.
Condições de contorno relacionadas a interação solo-ar foram aplicadas em todas as interfaces solo-
atmosfera do modelo numérico. Em seus limites laterais, uma carga total constante foi aplicada, indicando o
nível do lençol freático na condição inicial, exceto na camada superficial de solo, onde se esperava que a carga total
pudesse variar como consequência da infiltração da chuva. A fim de calibrar o modelo e monitorar a
evolução da infiltração, foram criadas quatro seções instrumentadas no modelo. As seções são capazes de medir
toda a distribuição das poropressões ao longo da profundidade não saturada e são denominadas AA, BB, CC e DD.
A FIGURA 01 indica também as posições das seções de monitoramento AA, BB, CC e DD.

2.2 Parâmetros
Cada parâmetro empregado na análise teve um valor de referência definido a partir da literatura
existente. A inclinação do talude utilizada foi de 40° (graus), por ser muito comum em solos residuais (Cheng
et al., 2007; Rahardjo et al., 2007) . A sucção máxima na zona não saturada adotada foi de 40 kPa, que refere-se
a Zero Above Maximum, isto é, valores máximos permitidos (Smethurst et al., 2011, 2012). O teor de umidade
volumétrico saturado adotado foi de 0,36. Alguns dados de campo foram ajustados ao modelo de Fredlund e
Xing para estimar os parâmetros de ajuste da curva, os valores de referência utilizados foram: af = 20 kPa, hr =
10000 kPa, nf = 0,4, mf = 1,5 (Pretto et al., 2013). Foi adotada também uma condutividade hidráulica de
1,71𝑥10 (m/s), uma coesão efetiva de 2 (kPa), um ângulo de atrito efetivo de 34 (graus) e um peso específico
natural do solo de 16,20 (kN/m³), por serem valores de referência muito utilizados em solo deste tipo (González
et al, 2017). Já o ângulo de atrito não saturado utilizado foi de 17 (ϕ/2) (Zhang et al., 2013).
Além da geometria da encosta, dos parâmetros hidráulicos e das propriedades mecânicas do solo, o
perfil inicial de poropressões também contribui para o comportamento de uma encosta durante um episódio de
chuva. Dependendo do histórico de precipitações, a parte não saturada da encosta pode apresentar valores
192
maiores ou menores de sucção. Após um longo período de estiagem, a região acima do nível do lençol freático
pode apresentar seus poros preenchidos por água decorrente do efeito de capilaridade, o que pode significar
valores de sucção de até 60 ou 70kPa, a depender da profundidade do lençol freático e do tipo de solo. Nestes
casos, uma chuva mais intensa ou longa seria necessária para diminuir os valores de sucção até que ocorresse a
ruptura do talude. Por outro lado, durante as estações chuvosas, os valores de sucção na região acima do lençol
freático já são baixos. O que significa que uma pequena infiltração de água em função de uma precipitação
pode ser suficiente para provocar um deslizamento de terra. A condição inicial de poropressão é, portanto, um
reflexo da chuva pretérita. Tatizana et al. (1987) já afirmavam que a susceptibilidade de escorregamentos é
função do estado prévio de saturação do solo, como já haviam concluído outros autores, representado pela
acumulada de chuva e pela ação de chuvas de curta duração, que atuam como detonante do processo de
instabilização.
Baseado em dados reais de instrumentação, os perfis iniciais de sucção foram modelados de forma a
alcançarem um determinado valor máximo, pré determinado, a partir do qual retornariam para sucção nula
(SMETHURST et al., 2012; GONZÁLEZ et al., 2017), conforme ilustra a FIGURA 02 (Oliveira, 2021).
Admitiu-se nas análises que os valores de sucção poderiam atingir 30, 40 e 50 kPa para, então, retornar a zero.

Figura 02 - Condições iniciais de sucção

2.3 Precipitação

Em cada condição inicial de poropressao o modelo foi submetido a uma precipitação e um perfil de
infiltração foi atingido. A precipitação aplicada foi constante ao longo de um determinado tempo. Embora se
saiba que em um cenário mais realista, o acúmulo de água é resultado de uma distribuição não constante das
chuvas, adotou-se chuva constante para viabilizar as análises. A intensidade utilizada foi de 6,2mm/h em dois
dias, totalizando 295,5mm em 48h, de forma a avaliar as mudanças ocorridas nas poropressões ao longo da
profundidade da encosta.
A intensidade da precipitação foi escolhida para ser intensa, mas não superior ao coeficiente de
permeabilidade saturada em qualquer análise. Rahimi et al. (2010), mostraram uma relação do fator de
segurança com a intensidade pluvial para diferentes condutividades hidráulicas saturadas em solos com
capacidades boas e ruins de drenagem e ressaltam que a magnitude da intensidade da precipitação é importante
para avaliar a estabilidade de encostas com diferentes coeficientes de permeabilidade saturados. A FIGURA 03
(Oliveira, 2021) representa a forma uniformemente distribuída como foi considerada a entrada de chuva de
147,75 mm/dia.

160 147,75

140

120
Precipitação (mm/dia)

100
Precipitação (mm/dia)
80

60

40

20

0
0 0,2 0,4 0,6 0,8 1 1,2 1,4 1,6 1,8 2
Tempo (dia)

Figura 03 - Precipitação constante

2.4 Análise de estabilidade


193
O fator de segurança associado a cada uma das situações foi obtido e analisado para que se pudesse
avaliar a relação entre o perfil inicial de poropressões e a segurança da encosta em estudo. Para isso, foram
utilizados métodos do equilíbrio limite associado a uma condiçao de precipitação.
ZHANG et al., 2013 propõem uma solução analítica para o deslizamento de um talude infinito sob
condições de chuva. O efeito da infiltração das chuvas sobre o peso específico do solo é levado em
consideração e assim os autores sugerem que o fator de segurança seja calculado da seguinte forma (Equação
02).
( ( )
𝐹. 𝑆 = + (02)
( ) ∫ ( )
Onde:
𝛾𝑑 = peso específico do solo seco;
𝛾𝑤 = peso específico da água;
𝜐𝑤(𝑍) = perfil de poropressão negativa ao longo da profundidade;
𝜃(𝑍) = perfil do teor de umidade volumétrico ao longo da profundidade.
Esta equação foi utilizada na determinação dos fatores de segurança associados a cada uma das
situaçoes estudadas.

3 Resultados e Discussões

A distribuição de propressões numa encosta no início de um período de chuva gatilho é essencial para
definir o instante de ruptura para um deslizamento de terra. No modelo analisado, a profundidade inicial do
lençol freático estava localizada a 6 metros, o que implica numa análise em estado estacionário com valores
máximos de sucção correspondentes a até 60kPa na superfície (6m x 10 kN/m³). No entanto foi considerado nas
análises que os valores de sucção poderiam chegar num pico de 30, 40 e 50 kPa e depois retornariam a zero,
simulando situações reais de campo, conforme discutido anteriormente. Este comportamento pode ser
observado na Figura 04 com as séries “Máx 30 kPa”, “Máx 40 kPa” e “Máx 50 kPa”. Todos os cenários iniciais
(t0), foram submetidos a uma intensidade de precipitação de 6,2 mm/h durante 48 horas.
As linhas cheias apresentadas na Figura 04 indicam o perfil de poropressões na encosta antes da
ocorrência da precipitação (t0). As linhas tracejadas indicam o perfil de poropressões após a ocorrência da
chuva de dois dias (t2).

Figura 04 - Perfis iniciais de poropressão

Escolheu-se a seção DD para uma análise mais detalhada da variação dos níveis de poro pressão.
Conforme se observa na Figura 05(a), ao se admitir que até 30 kPa de sucção pudesse ser atingido pelo solo por
capilaridade, os valores de sucção do período antecedente a chuva chegaram em 22,6kPa a 3,6m de
profundidade. Após a chuva, este valor de sucção máxima permanece o mesmo.
Nesta simulação, sucção no instante t0 só foi registrada a partir de 3,0m de profundidade; acima disso, as
poropressões são nulas. Para 3,0 metros valores bem próximos de sucção são observados para ambos os
períodos, com 11,9 kPa em t(0) e 10,9 kPa em t(2). Também a 4,0 metros de profundidade, existe um
decréscimo pequeno de poropressão com a ocorrência da chuva. Na fase antecedente a chuva observa-se 18,2 kPa
de sucção e 17,9 kPa para período pós chuva.
194
Já a 5,0 metros, é observado um decréscimo de 36% nos valores de sucção com a ocorrência da chuva. Os
valores que, antes da chuva foram registrados em 8,4kPa, após a chuva caíram para 5,4kPa. A 6,0 metros de
profundidade, o lençol freático é atingido no tempo 0 e é observado uma poropressão positiva de 8 kPa para o tempo
2.
Admitindo-se 40 kPa como valor máximo de sucção que o solo consegue atingir por capilaridade, os
valores de sucção do período antecedente a chuva chegaram em 34,2kPa a 2,4m de profundidade, conforme
indicado na Figura 05(a). Após a chuva, este valor de sucção teve uma queda de 66%, chegando a 11,6kPa.
Nesta condição, valores de sucção já foram percebidos a 2,0m de profundidade, com um registro de 23,5kPa antes
da chuva que caiu para 8,1kPa, o que representa também uma queda de 66% nos níveis de sucção.
Para 3,0 metros, é vista uma queda menor de sucção quando comparados os períodos pré e pós chuva, de
apenas 31%. No período anterior a chuva, 28,0kPa de sucção foi registrado versus 19,3kPa no período
posterior a chuva. Já a 4,0 metros de profundidade, existe um pequeno acréscimo de poropressão com a
ocorrência da chuva. Na fase antecedente a chuva observa-se 18,2 kPa de sucção e 19,8 kPa para período pós chuva.
A 5,0 metros de profundidade é observado um decréscimo de 37% nos valores de sucção com a ocorrência
da chuva. Os valores que, antes da chuva foram registrados em 8,4kPa, após a chuva caíram para 5,3kPa. A 6,0
metros de profundidade, assim como no cenário anterior, o lençol freático é atingido no tempo 0 e é observado uma
poropressão positiva de 7,6 kPa para o tempo 2.
Finalmente, para o cenário que considera 50 kPa como valor máximo de sucção, a sucção no período
antecedente a chuva atingiu 45,8kPa a 1,2m de profundidade e caiu 74%, para 12,0kPa logo após a chuva de dois
dias (Figura 05a). Neste cenário, a poucos centímetros abaixo da superfície do terreno já são observados valores
de sucção e, a 1,0m de profundidade a sucção é de 38,6kPa. Este valor cai para 10,1kPa após a chuva de 295,5mm, o
que também representa uma queda de 74% nos níveis de sucção. A 2,0m de profundidade observa-se 37,8kPa de
sucção antes da precipitação e 31,9kPa após a precipitação. Isso representa uma diminuição de 16% nos níveis de
sucção com a ocorrência da chuva. Para 4,0 metros, é vista uma queda muito pequena de sucção quando
comparados os períodos pré e pós chuva, de apenas 2%. No período anterior a chuva, 18,2kPa de sucção foi
registrado versus 17,8kPa no período posterior a chuva. Na profundidade de 5,0 metros foi observado um
decréscimo de 32% nos valores de sucção com a ocorrência da chuva, diferença similar a observada nos
demais cenários. Os valores que, antes da chuva foram registrados em 8,4kPa, após a chuva caíram para
5,8kPa. A 6,0 metros de profundidade, assim como em ambos os cenários anteriores, o lençol freático é
atingido no tempo 0 e é observado uma poropressão positiva de 7,5 kPa para o tempo 2. Os valores aqui discutidos
estão resumidos na Tabela 01.
Máx 30kPa Máx 40kPa Máx 50kPa
prof. (m)
Sucção t(0) kPa Sucção t(2) kPa Sucção t(0) kPa Sucção t(2) kPa Sucção t(0) kPa Sucção t(2) kPa
0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 0,00 0,00
-1,0 0,0 0,0 0,0 0,3 38,6 10,1
-2,0 0,0 0,0 23,5 8,1 37,8 31,9
-3,0 11,9 10,9 28,0 19,3 28,0 31,3
-4,0 18,2 17,9 18,2 19,8 18,2 17,8
-5,0 8,4 5,4 8,4 5,3 8,4 5,8
-6,0 -0,7 -8,0 -0,7 -7,6 -0,7 -7,5
*A tabela apresenta valores de sucção. Logo, valores negativos indicam poropressão positiva.
Tabela 01 – Variação dos níveis de sucção ao longo da profundidade para as diferentes situações de poropressão
inicial avaliadas (seção DD).

Comparando as diferentes secções da encosta e analisando a influência da chuva na variação dos


valores de sucção de cada uma observa-se que as seções BB, CC e DD apresentam um comportamento similar, com
valores de sucção que aumentam mais rápido após a chuva. Enquanto a seção AA apresenta uma sucção máxima
antes dos dois metros de profundidade, nas outras seções os picos máximos de sucção só acontecem em torno
dos 2,3 metros. Após os períodos de pico de cada um, todos retornam a zero em aproximadamente 5,8 metros.
Conforme mostrado na Figura 05(b), antes da precipitação, o lençol freático não apresentou alteração na
profundidade para as condições iniciais de poropressão, estando a 5,9 metros. Após a precipitação, para o valor
de poropressão inicial de 30 kPa, o lençol freático atingiu a cota de 5,5 metros, já para o valor de
poropressão inicial de 40 kPa, a cota de 5,4 metros. Assim, o lençol freático responde de forma independente da
condição de poropressão inicial adotada.
A Figura 06 (Oliveira, 2021) apresenta o fator de segurança associado às 3 condições iniciais de
poropressão. Em condições máximas de 40 kPa, a precipitação aplicada reduz os valores de sucção em até 10
kPa nas seções BB e DD cerca de 2 m abaixo do nível do solo. Mesmo assim, a redução não foi suficiente

195
para causar a falha do talude. Valores iniciais de sucção abaixo deste podem resultar em falha na mesma
pluviosidade, conforme pode ser observado com um perfil com sucção máxima inicial de 30 kPa, perfil que
pode ser associado à uma estação chuvosa, por exemplo. Por outro lado, valores iniciais de sucção de 50 kPa,
associado à estação seca, mantêm valores de sucção maiores após a precipitação padrão aplicada, tornando o
talude mais estável.

(a) (b)
Figura 05 – Perfis iniciais de poropressão (a) Poropressão (b) Lençol freático

Na Figura 06 fica claro o efeito dos valores de sucção na zona não saturada da encosta sobre seu
comportamento em condições potencialmente instáveis. O fator de segurança associado a condição mais crítica,
a que rompeu, foi aproximadamente 18% menor do que aquele associado à condição mais conservadora. A
variação do fator de segurança foi proporcional ao aumento da espessura da regiao saturada por capilaridade
inicialmente. A relação existente encontrada é positiva, aproximadamente linear para a faixa de sucção
considerada e da ordem de 0,01. Isto significa que, para esta faixa de sucções máximas, o aumento de 1kPa no
valor de sucção máximo encontrado acima do nível do lençol freático representa um ganho no Fator de
Segurança de 0,01.

Figura 06 - Variação do fator de segurança versus condições iniciais de poropressão

4 Conclusões
Os três perfis iniciais avaliados tiveram comportamento diferente diante da chuva ocorrida. No perfil
que admitiu ate 30kPa de sucção máxima, representando solos com menor potencial de saturação por
capilaridade, os valores de sucção máximos atingidos não se alterou mesmo com a ocorrência da chuva.
Alguma alteração foi percebida apenas a 5m de profundidade com um decréscimo de 36% nos valores de
sucção com a ocorrência da chuva. Nos demais perfis, que admitiram 40 e 50kPa de sucção máxima, uma
queda de 66% e de 31% respectivamente foi observada nestes valores máximos de sucção. Também nestes
cenários, decréscimo nos valores de sucção foi percebido em diferentes profundidades. O cenário com 40kPa
máximo inicial foi menos atingido pela chuva do que o outro, o que ficou evidente nas análises de estabilidade
ao final da chuva, que registraram Fator de Segurança maior para a situação que admitiu maior sucção máxima
inicial e Fator de Segurança menor para aquela em que a sucção máxima admitida foi a menor. A relação entre
estabilidade e perfil inicial de sucção foi confirmada e se mostrou linear para as análises feitas. O lençol
freático não apresentou oscilações significativas em nenhum dos três casos, mostrando que seu nível
não foi afetado para as situações estudadas.
196
AGRADECIMENTOS

Os autores gostariam de agradecer a UFPR e em especial ao Programa de Pós-Graduação em


Engenharia Civil da UFPR (PPGEC/UFPR) pelo apoio dado a esta pesquisa. A primeira autora também
gostaria de agradecer à UFPR - Universidade Federal do Paraná (CPP-CEM/UFPR-Brasil) por
viabilizar que ela se afastasse para realização desta pesquisa..

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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197
Avaliação De Sulcos Em Uma Encosta, Utilizando O Veículo Não
Tripulado (VANT).

Jonas da Silva Bezerra


Doutorando em Engenharia Civil, UFPE, Recife, Brasil, jonas.silva.doc@gmail.com

Silvio Romero De Melo Ferreira


Professor, UFPE, Recife, Brasil, sr.mf@hotmail.com

Kalinny Patrícia Vaz Lafayette


Professora, UPE, Recife, Brasil, klafayette@poli.br

José Ramon Barros Cantalice


Professor, UFRPE, Recife, Brasil, cantalice21@hotmail.com

Luciana Cássia Lima da Silva


Mestranda em Engenharia Civil, UPE, Recife, Brasil, lcls@poli.br

Rayane Gabriella Pereira da Silva


Mestranda em Engenharia Civil, UPE, Recife, Brasil, rgps@poli.br

RESUMO: O impacto do crescimento desordenado na expansão ou surgimento das cidades, quando


não dimensionados, pode desencadear em complexos urbanos como possíveis áreas de riscos em
encostas. Essas encostas, geralmente, estão sujeitas aos processos de erosão e acarretam fenômen os
de deslizamentos de terra. Neste contexto, este trabalho apresenta um mapeamento e m sulcos por
meio da utilização VANT (veículo aéreo não tripulado) modelo PHANTOM 4-PRO, em uma
encosta em processo erosivo na Ilha de Itamaracá PE. Para determinação das taxas de perdas de
solo, foram identificadas áreas, os volumes e a densidade em cada sulco, que foram evidenciados
através do software AgisoftMetashape, correlacionando estes valores com os fatores que
desencadeiam erosão. Foram identificados quarenta e oito sulcos, divididos entre os cortes A, B e
C. Foi observado que os sulcos comprometem áreas superiores a 3 m², correspondendo a um total de
58,34%, demonstrando certa predisposição do solo a erodir. Os volumes erodidos ficaram entre 0,5
e 1 m³. De acordo com a análise dos anos entre 2007 a 2020, a encosta localizada na Ilha de
Itamaracá teve grandes impactos ambientais. Percebe-se que além de erodido o solo tem
comprimentos de sulcos elevados e não lineares, e que o uso de imagens de alta resolução, direci ona
estratégias que podem ser utilizadas pelo poder público ou privado, na tentativa de obter medidas de
controle das erosões, assim como, processos de instabilidade da encosta .

PALAVRAS-CHAVE: Erodibilidade; VANT; Áreas de risco.

ABSTRACT: The impact of disorderly growth on the expansion or emergence of cities, when not
dimensioned, can trigger urban complexes as possible risk areas on slopes. These slopes are generally subject
to erosion processes and cause landslides. In this context, this work presents a mapping in furrows through
the use of UAV (unmanned aerial vehicle) PHANTOM 4-PRO model, on a slope in erosive process on the
island of Itamaracá, PE. To determine soil loss rates, areas, volumes and density were identified in each
furrow, which were evidenced through the AgisoftMetashape software, correlating these values with the
factors that trigger erosion. Forty-eight furrows were identified, divided between sections A, B and C. It was
observed that the furrows compromise areas greater than 3 m², corresponding to a total of 58.34%,
demonstrating a certain predisposition of the soil to erode. The eroded volumes were between 0.5 and 1 m³.
According to the analysis of the years between 2007 and 2020, the slope located on the island of Itamaracá
had major environmental impacts. It is noticed that in addition to being eroded, the soil has lengths of high
and non-linear furrows, and that the use of high resolution images directs strategies that can be used by
public or private authorities, in an attempt to obtain erosion control measures, as well as slope instability
processes.
KEYWORDS: Erodibility; UAV; Risk areas
198
1 Introdução

O ambiente natural está em constante mudança, principalmente devido aos processos de expansão
antrópica e urbanização. No entanto, essas alterações causam degradação ambiental e, consequentemente,
grandes impactos ambientais negativos. Sabe-se que as mudanças consideradas antrópicas e/ou sociais do
ecossistema natural alteram as propriedades físicas, químicas e biológicas e que são aceleradas pelo manejo
inadequado (SMETANOVÁ et al., 2019).
É necessário avaliar o processo de erosão do solo em todos os aspectos. Coma ajuda da fotogrametria é
possível obter um modelo digital de elevação (DEM) de alta resolução.
A utilização de veículos aéreos não tripulados (VANT) facilita o processo de análise devido à
automação, que requer menos tempo e segundo Gamarra (2020) são mais comuns no monitoramento da
agricultura, pecuária e engenharia civil porque são flexíveis, móveis, rápidos e fáceis de obter dados e com
custo relativamente baixo
A pesquisa em questão visa analisar a erosão em áreas montanhosas, classificar os riscos dos
processos erosivos, utilizando veículos aéreos não tripulados, neste caso, drones; em conjunto com software
de computador. Para isso, serão feitos mapas de desenvolvimento da erosão e possíveis métodos de melhoria.
Vale destacar que este estudo é pioneiro na Ilha de Itamaracá, Pernambuco.

2 Caracterização da Área

A encosta está localizada no município de Ilha de Itamaracá, situado no litoral norte de Pernambuco, a
55 km do Recife, capital do estado de Pernambuco, entre as latitudes 7º 35` S e 7º 55` S e longitudes 34º 48`
W, 34º 52` W (Figura 1).

Figura 1. Mapa de localização da Ilha de Itamaracá.

A posição geográfica da Ilha de Itamaracá garante um clima tropical, com temperaturas altas e
umidade constante, Queiroz (2017). Conforme a classificação de Köppen, o clima na ilha é do tipo As` e
Am’s. Segundo a Valença (2017) a temperatura média é de 27°C e a amplitude térmica em torno dos 5°C. As
precipitações dominantes acontecem no inverno, principalmente, pelas emissões da Frente Polar Ártica-FPA,
enquanto os suprimentos do outono derivam das oscilações da Convergência Intertropical - CIT.

3 Metodologia

3.1 Modelos digitais

Para obtenção das imagens foi utilizado um modelo de VANT, PHANTOM 4-PRO. Este modelo de
drone possui um sistema GNSS embutido para gerenciar as coordenadas de cada foto tirada na
fototriangulação. A fotogrametria é realizada a uma altitude de 60 metros, aproximadamente 40 minutos.
Inicialmente foi realizado um levantamento de campo, identificando potenciais obstáculos para
mapeamento acima das principais vias de acesso. Com essas informações, foi definido o plano de voo,

199
utilizando o software DroneDeploy. As imagens que acompanham são definidas por coordenadas geográficas,
captadas pelo sistema GPS da aeronave.
Durante o uso da aeronave, foram instalados 5 pontos de controle para o processamento inicial das
imagens aéreas. Como complemento, foi instalada a marcação de localização geográfica utilizando o método
RTK, que é um sistema GPS diferenciado que melhora a precisão das imagens de metros para centímetros
(DRONE DEPLOY, 2019). Utilizando o método proposto por Batista et al. (2015) foi determinada a erosão
de canais e o seu volume. As áreas acima dos intersulcos e cristas foram trianguladas com base no relevo
próximo.

3.2 Análise da perda de solo

A perda de solo na área de estudo foi estimada entre os anos de 2007 e 2020, considerando que a
última intervenção realizada na região ocorreu no final de 2006. O método utilizado foi a Equação Universal
de Perda de Solo (USLE), que considera a perda média de solo devido à multiplicação de cinco fatores que
influenciam os processos erosivos (Equação 1).

Equação 1

Onde: A = Perda média anual do solo por unidade de área e de tempo, em t ha-1 ano-1; R = Fator de
erosividade da precipitação, em MJ mm ha-1 h-1 ano-1; K = Fator de erodibilidade do solo, em t. h MJ-1 mm-1;
LS = Fator topográfico, considerando o comprimento e o declive da encosta; C = Fator de uso e manejo do
solo; P = Fator de prática de conservação do solo.

A erosão pluvial (Fator R) foi estimada a partir de dados pluviométricos mensais e anuais obtidos pela
Agência Pernambucana de Águas e Clima (APAC-PE). A série de dados utilizada abrange o período de 2007
a 2020, onde o índice de erosão (IE) foi obtido pela Equação 2. O fator de erosividade (R) foi obtido pela
soma dos índices de erosão.

Equação 2

Onde: EI = média mensal do índice de erosão (MJ mm ha-1 h-1); p = precipitação média mensal (mm) e P =
precipitação média anual (mm).

O Fator de erodibilidade do solo (K) foi baseado por Mannigel et al. (2002), onde foram utilizadas as
médias dos percentuais das frações de areia, silte e argila de nove amostras de solo, conforme a Equação 3.

Equação 3

A feição topográfica (LS) foi determinada pelo software AgisoftMetashape a partir do modelo digital
de elevação (DEM) para modelar processos erosivos, além da determinação da altura e características do
talude. Para determinar a característica de uso e manejo da terra (C), foi realizado um estudo para avaliar a
perda de solo exposto e não tratado, onde foi obtido o valor mais adequado da verdade da área de estudo.
Por fim, foi determinado o fator P, a partir do qual foram identificados processos de controle de erosão
em fotografias aéreas e imagens de satélite utilizadas no mapeamento do uso do solo. As informações obtidas
foram classificadas de acordo com a Tabela 1.

Tabela 1. Valores do fator P para tipos de práticas conservacionistas diferentes.


Tipos de práticas conservacionistas Valor de P Referências
Plantio em nível 0,6 e 1,0 Lagrotti (2000)
Plantio morro abaixo 1,0 Bertoni e Lombardi Neto (2005)
Terraceamento 0,6 e 1,0 Lagrotti (2000)
Nenhuma prática conservacionista 1,0 Bertoni e Lombardi Neto (2005)
Açude 0 Gonçalves (2002)
Mata nativa e/ou ciliar 0,001 Gonçalves (2002)

4 Resultados

Através do mapeamento feito pelo VANT foi possível caracterizar as feições dos sulcos existentes na
200
encosta, como mostra a Figura 2. O ortomosaico mostra as dimensões dos processos erosivos em sulcos e os
cortes não apresentam regularidade, característica de uma superfície que passou por um retaludamento.

Figura 2. Mapeamento da encosta - A) Ortomosaico com a delimitação dos cortes da encosta; B)


Modelo digital de Elevação.

No corte A foram encontradas 5 erosões de trincheira, no corte B ocorreram 12 processos erosivos e


no corte C foram encontradas 31 trincheiras. A Figura 3 mostra o comprimento dos furos em cada corte.
Mais de 90% dos sulcos de erosão tinham comprimento superior a 2 m, e 37,5% apresentam valores
superiores a 5 m.

Figura 3. Comprimentos das erosões por corte.

A Figura 4 mostra áreas que foram erodidas em cada corte. Machado (2013); Batista et al (2019),
Vitorino et al. (2019) e Silva (2020) descrevem que é importante identificar as áreas que sofrem processos
erosivos para encontrar formas sustentáveis de manejar o solo e minimizar a degradação ambiental.

Figura 4. Áreas erodidas por corte. 201


Nota-se na Figura 4 que apesar do número de trincheiras ser pequeno no corte A, elas deterioram áreas
maiores que 3 m², indicando uma certa condição do solo que pode ser erodido. Observou-se áreas erodidas de
mais de 3m² (trechos B e C), correspondendo a 58,34% e 22,58%, respectivamente. Salviano et al. (2015)
explica que em áreas com erosão, há uma diminuição do crescimento da vegetação, reduzindo a fertilidade do
solo e consequentemente ocorre uma tendência ao aumento deste tipo de processo erosivo. A Figura 5
apresenta o volume de solo erodido que foi superior a 0,5 m³.

Figura 5. Volumes erodidos por corte.

Verificou-se que os canais que apresentam o maior volume de solo erodido estão no corte C e
possuem valores de 3,22 m³ e 3,60 m³. Observou-se também que no trecho A toda a erosão apresentada é
superior a 0,5 m³ com volume médio erodido de 1,4 m³ e no corte B, os volumes erodidos tiveram valores
entre 0,5 e 1 m³, exceto em um ponto que teve 2,70 m³ de solo erodido. A Figura 6 mostra os volumes
erodidos dos cortes B Ce inferiores a 0,5 m³, pois no corte A em todos os sulcos os valores foram superiores
a 0,5 m³.

Figura 6. Volumes erodidos abaixo de 0,5 m³ em cada processo erosivo por corte.

Embora o corte C tenha apresentado a maior quantidade de erosão em geral, na Figura 6 observou-se
que o volume erodido no corte foi inferior a 0,5 m³, para 90% da erosão na cava. Na Seção B, 58% de erosão
da cava também apresentou valores com esse limite de volume erodido.
Em termos de precipitação, a precipitação registada localmente nas encostas concentrou-se no outono
e inverno. Nesse período, a precipitação pluviométrica foi de 1.255,34 mm, ou 81,06% do total do ano.
A taxa de erosão do solo de março a agosto foi de 7.802,67 MJ.mm/ha.h, o que equivale a 91,06% da
erosão anual. Andrade e Maia (2018) afirmam que em períodos de chuvas acima da média proporcionam um
aumento significativo na quantidade de solo erodido. Em relação à erosão encontrada na encosta, a Tabela 2
mostra os valores para cada corte.

202
Tabela 2. Erodibilidade da encosta por corte.
Área da encosta Erodibilidade (t.ha.h/ha.Mj.mm)
Corte A 0,038307
Corte B 0,035549
Corte C 0,007379
A erosão no corte C tem uma taxa inferior a dos cortes A e B, indicando que o solo presente nos cortes
A e B tem alto potencial de erosão. Fronza (2019) ressalta a importância de identificar áreas com alto
potencial erosivo, que além de auxiliar o planejamento físico, pode identificar a eficácia de procedimentos e
programas de prevenção e conservação de solo.
De acordo com a classificação de erosão proposta por Manningel et al. (2002) o corte C tem erosão
muito baixa, considerando que seu valor é inferior a 0,009 t.ha.h/ha.MJ.mm. Os cortes A e B foram
classificados como de alta erosão por estarem entre 0,03 e 0,045 t.ha.h/ha.MJ.mm. Considerando o potencial
erosivo do talude, as perdas anuais podem continuar a ocorrer caso não haja medidas para controlar o
andamento desses processos, como a implantação de sistemas de captação de águas pluviais acima da
vegetação que cobre toda a encosta.

5 Conclusões

Em relação aos processos erosivos, pode-se concluir que o corte C possui o maior número de erosões
(31 sulcos), em relação ao corte A (5 sulcos) e corte B (12 sulcos). A partir disso, confirma-se a extensão dos
processos erosivos, onde 90% ultrapassam 2 metros e 37,5% ultrapassam 5 metros.
Em termos de áreas, o solo do corte A apresenta área erodida superior a 3 m2 e o solo dos cortes B e C
apresentam baixa variação com apenas 58,34% e 22,58%, respectivamente, dos processos acima de 3 m2
metros. Com relação ao volume, o corte C é o mais erodido, seguido do corte A e por último o corte B, com
um total de 7,01 m³; 6,52 m³ e 8,98 m³, respectivamente.
A erosão do solo varia muito devido às chuvas, principalmente no outono e inverno, correspondendo a
1255,34 mm, ou 81,06% do total anual, e uma taxa de erosão de 91,06%, 7802,67 MJ.mm/ha.h, do total
anual.
Diante do exposto, pode-se concluir que na localidade, devem ser feitas obras de controle da erosão
como medidas de prevenção e enfretamento dos problemas, além do conhecimento das causas para uma
eficaz tomada de decisão no intuito de resolução da situação.

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204
IMPACTOS AMBIENTAIS GERADOS PELA A
URBANIZAÇÃO: UMA REVISÃO SISTEMÁTICA DE
LITERATURA
Igor Silva Santos
Mestrando em Engenharia Civil, Universidade de Pernambuco, Recife-PE, Brasil, iss4@poli.br.

Kalinny Patrícia Vaz Lafayette


Professora Associada, Universidade de Pernambuco, Recife-PE, Brasil, klafayette@poli.br.

Rayane Gabriella Pereira da Silva


Mestranda em Engenharia Civil, Universidade de Pernambuco, Recife-PE, Brasil, rgps@poli.br.

RESUMO: A ocupação desordenada em ambientes naturais provoca uma intensa transformação,


principalmente com o aumento da urbanização. Estes impactos causam uma perda parcial ou total dos
ecossistemas naturais prejudicando a biodiversidade e o equilíbrio ambiental. O objetivo desta pesquisa é
realizar uma revisão sistemática de literatura (RSL) para analisar os impactos ambientais gerados e/ou
intensificados pelo avanço populacional desordenado. Realizou-se investigação bibliográfica em três bases
de dados, limitando em artigos científicos e capítulos de livros nos últimos seis anos, resultando em 55
artigos para seleção. Observa-se que o tema está sendo bastante estudado nos últimos anos e que o país que
mais aborda sobre o assunto é o Brasil. Assim, foi possível perceber os principais impactos gerados no meio
ambiente causados pela urbanização, como: intensificação de processos erosivos; supressão de vegetação;
solo exposto; diminuição da proteção dos corpos hídricos; áreas impermeáveis; despejo de efluentes e
resíduos sólidos de forma inadequada; aumento de temperatura; diminuição de sedimentos em dunas.
Concluindo que as ações antrópicas são o principal fator para ocorrência de alteração do meio ambiente.

PALAVRAS-CHAVE: Impacto Ambiental, Urbanização, Processo Erosivo, RSL.

ABSTRACT: The disorderly occupation in natural environments causes an intense transformation, mainly
with the increase in urbanization. These impacts cause a partial or total loss of natural ecosystems, harming
biodiversity and environmental balance. The objective of this research is to carry out a systematic literature
review (RSL) to analyze the environmental impacts generated and/or intensified by the disorderly population
advance. Bibliographic research was carried out in three databases, limited to scientific articles and book
chapters in the last six years, resulting in 55 articles for selection. It is observed that the subject has been
extensively studied in recent years and that the country that most addresses the subject is Brazil. Thus, it was
possible to perceive the main impacts generated in the environment caused by urbanization, such as:
intensification of erosive processes; vegetation suppression; exposed soil; decreased protection of water
bodies; impervious areas; improper disposal of effluents and solid waste; temperature increase; decrease of
sediments in dunes. Concluding that human actions are the main factor for the occurrence of environmental
change.

KEYWORDS: Environmental Impact, Urbanization, Erosive Process, RSL.

205
1 INTRODUÇÃO

A urbanização causa sérias mudanças em um ambiente provocando uma intensa transformação no


ambiente natural. As ações antrópicas resultam em uma perda do ecossistema natural prejudicando a
biodiversidade e do equilíbrio ambiental (SANTOS; SILVA; VITAL, 2022; LOPEZ, 2020). Para Pereira,
Nunes e Araújo (2021), o crescimento populacional pode levar à perda de vegetação nativa, degradação do
solo e mudanças topográficas, sendo necessário se ter um controle dos impactos gerados pela ocupação
(GONÇALVES; SILVA; LAFAYETTE, 2021).
A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária - EMBRAPA (2017) afirma que a área urbana do
Brasil equivale a 0,63% do território brasileiro, porém 84,3% dos brasileiros (160 milhões de habitantes)
estão abrigados nestas áreas (FARIAS et al. 2017). As causas naturais e avaço urbano interferem na
resistência e estabilidade do solo, pois as consequências dos impactos podem modificar áreas sensíveis e
vulneráveis (GOMES et al., 2021; VENANCIO et al. 2020).
Dinotte, Silva e Rossoni (2020) cita que a urbanização é um dos responsáveis pela alteração da
paisagem, gerando impactos ambientais significativos. Neste sentido é necessário que se tenha estudos que
apontem os principais impactos causados pela urbanização desordenada, para que sirva de experiência para
os orgãos competentes adotarem medidas antecipadamente com o intuito de amenizar os problemas
ambientais, sociais e econômicos de uma região.
Revisão sistemática da literatura (RSL) é método científico sistemático de investigação transparente
e reprodutível que identifica a bibliografía existente para uma questão de pesquisa específica, avaliando e
extraindo dados dos manuscritos encontrados (BARBOSA; PIO, 2020). Este estudo de Revisão Sistemática
da Literatura (RSL) tem como objetivo analisar e sintetizar a literatura existente sobre o desenvolvimento
dos impactos ambientais gerados pelo avanço populacional desordenado.

2 METODOLOGIA

Foi elaborado um protocolo a partir dos passos de Okoli (2019), utilizando a estratégia PICOC
(População, Interesse, Controle, Resultado e Contexto) para definição da pergunta a ser respondida: Quais os
impactos ambientais causados pelas ações antrópicas em áreas de urbanização densa?
A ferramenta utilizada para a busca dos artigos foi o Portal de Periódicos da CAPES (Coordenação
de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), biblioteca brasileira virtual pública, no qual foi possível
realizar a busca em três bases de dados: Scopus, Science Direct, Web of Science; Utilizando string de busca
formada por palavras-chave e operadores booleanos (OR, AND): (“urban development” OR “Population
growth” OR “Urban growth” OR “Urbanization”) AND (“unstable soils“ OR “erosive processes” OR
“erodible soil” OR “exposed soil”).
Aplicou-se alguns filtros/limitações na pesquisa dos artigos nas bases de dados, como: - Palavras-
chaves encontradas somente no título, resumo e palavras-chaves; - Linguagem dos artigos: Inglês, Espanhol
e Português; - Período dos artigos: 2017 a 2022 (últimos seis anos); - Tipos de artigos: Artigos de revisão,
artigos de pesquisa e capítulo de livro.
Os artigos foram selecionados adotando os seguintes: (1) O artigo traz informações de impactos
ambientais causadas pela ação antrópica; (2) Artigos com textos completos; (3) Artigos avaliados por pares.
E excluídos, utilizando os critérios: (1) Artigos duplicados; (2) Artigos que não apresentam título e resumo
relacionado ao objetivo da pesquisa.

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO

Na pesquisa foram encontrados 112 artigos nas bases de dados mencionadas. Estes manuscritos
foram submetidos a filtragem, como apresentado no fluxograma de modelo PRISMA (Figura 01).

206
Figura 01. Fluxograma da busca de artigos da pesquisa.

3.1 Análise Bibliométrica:

A Figura 02 quantifica o número de artigos encontrados em cada base de dados. A Scopus é


responsável por 58% do total de 112 manuscritos buscados. Importante mencionar que a aplicação dos filtros
foi feita diretamente nas bases de dados, resultando em um total de 55 artigos para análise de seleção.

Figura 02. Artigos por Bases de Dados.

A princípio, os artigos foram excluídos após a análise de duplicidade, leitura dos títulos e resumos. A
busca de artigos nas bases de dados não é tão eficiente (SANTOS e al. 2022), pois das 55 publicações que

207
foram selecionadas, apenas 16 estavam de acordo com o objetivo da pesquisa. Este número representa 30%
dos artigos que foram selecionados. A Figura 03, mostra o número de artigos publicados por ano das
publicações, que foram consideradas aceitas para a extração de dados, destacando-se os anos de 2019 e 2020
com 5 pesquisas publicadas.

Figura 03. Número de Artigos Publicados por Ano.

As palavras-chave que foram mencionadas no mínimo três vezes em todos os artigos na fase de
extração de dados são apresentadas na Figura 4. As que mais se destacaram foram: “erosion”,
“urbanization”, “urban area”, “coastal erosion” representando que os artigos em análise estão de acordo
com o objetivo proposto. As linhas correspondem a ligação entre as palavras nos artigos; as cores
representam os períodos da citação destas palavras indicadas na legenda.

Figura 04. Palavras-chave e Correlações.

O país que mais publicou, nos últimos seis anos, sobre a temática desta revisão foi o Brasil (Figura
05), aparecendo com 12 das 16 pesquisas analisadas. As demais foram estudadas pelo México, Irã e

208
Colômbia. O periódico que mais apresentou pesquisa sobre o tema e neste período foi o “Ocean and Coastal
Management” com dois manuscritos.

Figura 05. Artigos publicados pelos países.

3.2 Análise Descritiva:

Mokarram e Zarei (2021) verificaram o impacto causado pela urbanização em uma área situada no
sul da província de Fars, litoral do Irã. Concluíram que os parâmetros que mais afetam e intensificam a
erosão do tipo voçoroca foi a inclinação, a altitude e o uso e ocupação do solo. Verificaram que o local que
mais apresentou problemas de erosão foi na área mais urbanizada. Para evitar a progressão da erosão e
enchentes, os autores sugeriram, medidas estruturais de drenagem e plantio de vegetação.
Observa-se que o crescimento urbano afetou também a cidade de Tijuana no México. Segundo
Gudino Elizondo et al. (2018) a urbanização teve uma taxa significativa na erosão do solo da cidade,
principalmente nas vias de acesso. Concluíram que os órgãos públicos deveriam trabalhar com urgência na
implementação de pavimentação ou outras estabilizações de estradas de terra para mitigar a erosão do solo.
Verificando as falésias localizadas no litoral sul do estado do Rio Grande do Norte, Silva et al.
(2020) concluíram que o processo erosivo nestas áreas acontece por diversos fatores, tais como: resistência
dos materiais, morfologia das falésias, ação das águas das chuvas e marés, ocorrência da vegetação e ação
antrópica. Também, observaram que quanto mais inclinada for a falésia, maior é o risco de movimento de
massa.
Venancio et al. (2020) verificaram os impactos causados pela urbanização desordenada e pelo canal
de drenagem na ponta da praia localizada em Santos/SP. Concluíram que a região costeira vem sofrendo um
constante processo erosivo, diretamente relacionado a diferentes causas naturais e atividades humanas, que
foi intensificado pelo canal do porto, permitindo observar mudanças consideráveis nos padrões
hidrodinâmicos, sendo necessário intervenções para melhorar estes ocorridos, pois a praia não consegue
reverter estes impactos que levaram a um processo erosivo contínuo.
Analisando a zona costeira da cidade de Cartagena, na Colômbia, Rangel-Buitrago, Neal e de Jonge
(2020), assim como Venancio et al. (2020), afirmam que os processos erosivos acontecem de forma natural e
que são intensificados pelas ações antrópicas. Apontam também, que é importante o poder público ter
medidas que prevejam e amenizem estes impactos para evitar a perda dos ecossistemas naturais e do bem-
estar economico e social da população.
Segundo Silva e Farias Filho (2019), a urbanização da zona litorânea de cidade de São Luiz/MA
entre os anos de 1984 e 2010 ocasionou uma supressão vegetal igual a 32,18% neste período. Este
crescimento urbano de 27,01% trouxe outros impactos ambientais, tais como: especulação imobiliária,
residências em áreas de preservação, privatização das praias por barracas, despejo de efluentes e resíduos
sólidos de forma inadequada. Segundo os autores estes impactos afetam diretamente o ecossistema naturais,
tornando alguns locais impróprio para banho por conta da poluição.
A cidade de La Paz não ficou imune de crescimento populacional que ocorreram em regiões
costeiras. Segundo Lopéz (2020), a faixa costeira reflete a alteração e perda parcial ou total dos ecossistemas

209
naturais, devido as ações antrópicas atrelado ao turismo que modificaram direta e indiretamente os
ambientes, ocasionando processos erosivos, tornando assim um impacto ambiental significativo na região.
Reis et al. (2019), estudaram os impactos gerados pelo crescimento urbano no município de Gurupi
pertencente ao estado do Tocantins. Destacaram que a vegetação nativa predomina a área de estudo, tendo
um total de 53,21%, contudo foi percebido que 33,1% das áreas de preservação permanente localizadas na
área urbana foram ocupadas de forma irregular, gerando impactos ligados a cobertura do solo, proteção dos
corpos hídricos, alimentação da fauna, fluxo gênico e aumento da capacidade de infiltração de águas
pluviais.
Analisando a cidade de Araras/SP, Bernardelli e Lupinacci (2021) constataram impactos das ações
antrópicas em morfologias entre 1997 até 2016. O processo erosivo foi detectado em área de expansão
urbana, visto que são locais que apresentam modificações nos ambientes ocasionados pelo corte e aterros de
terrenos. Os autores verificaram que em locais não urbanizados também foram encontrados sulcos erosivos
contribuindo para o assoreamento do sistema fluvial da baixa bacia.
Alves et al. (2018), analisaram impactos ambientais em 30 anos (1986-2016) que foram gerados pela
expansão urbana em uma área localizada na Baixada Santista em São Paulo. Concluíram que, com o avanço
urbano, houve uma redução na vegetação densa em 91,7% e que, além desse impacto florestal, os mapas
mostraram que a temperatura da região foi subindo de acordo com o avanço populacional, chegando a um
aumento de 8ºC. Fiorio, Nakai e Batagin (2019), após uma análise temporal de 76 anos (1940-2016) de uma
microbacia em Piracicaba/SP, corroboram que o crescimento urbano tem como impacto ambiental a
supressão vegetal e modificação do ambiente.
Em uma análise temporal entre os anos 2000 e 2017 de uma área de preservação ambiental
localizada no município de Porto Nacional/TO, Oliveira, Pelúzio e Silva (2019) observaram que houve
impactos ambientais causados pela ocupação urbana desordenada, aumentando em 14 vezes a população, e
inundações motivadas pela implantação da usina hidrelétrica Luiz Eduardo Magalhães, no qual foi gerada
uma redução de 38,56% da cobertura vegetal nativa, fora a perda da biodiversidade da região. Com estes
resultados os autores concluíram que é necessário a criação de um plano de manejo para amenizar estes
impactos gerados.
Segundo Vila Nova, Gonçalves e Lima (2021), a capital de Pernambuco, em 30 anos (1989-2019),
apresentou aumento na temperatura na ordem de 5ºC. Perceberam também que houve um acréscimo de 34%
das áreas com temperaturas acima de 33ºC e redução de 44% das áreas que apresentavam temperaturas entre
24ºC e 27 ºC. Outro ponto verificado foi que houve uma redução 28% da área de vegetação e aumento de
21% da área de solo exposto. Os autores alegam que estes impactos foram causados pela densa ocupação
urbana.
Outra área que foi impactada pela urbanização foi arco praial Joaquina Morro de Pedras na zona
costeira sudeste do estado de Santa Catarina. Gomes, Filho e Moresco (2022) descrevem que esta região
apresentou crescimento urbano no perfil sul, que gerou processos erosivos na região, que antes tendiam a
aumentar a faixa de área da praia e estabilidade. O perfil norte também foi prejudicado, pois a compactação
dos sedimentos eólicos do lado sul diminuiu as cargas sedimentares das dunas, que antes avançavam
3,4m/ano e agora avançam 2,0m/ano, modificando as suas características originais. Os autores verificaram
que as medidas tomadas (contenção tradicional) por órgãos competentes, não estão sendo adequadas, visto
que os resultados apontam crescimentos dos processos erosivos.
Corrêa, Varquez e Vanzela (2018) realizaram um estudo no córrego da Aldeia em Fernandópolis/SP,
no qual analisaram os projetos de drenagem executados para amenizar alagamentos na região causados pela
urbanização densa. Concluíram que as medidas estruturais e não estruturais adotadas não foram eficientes. O
pavimento asfáltico implantado ocasionou um aumento da velocidade do curso d’água pluvial e com a
canalização de alguns trechos, a água foi despejada no córrego sem nenhum uso de dissipadores de energia,
agravando a erosão no ambiente. Não havendo a mobilização da toda a população e incentivo de órgãos
públicos, os projetos de reflorestamento e educação ambiental foram realizados em pequenas áreas,
comprometendo a manutenção da biodiversidade e do equilíbrio ambiental.

210
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Observa-se que o tema está sendo bastante estudado nos últimos anos e que o país que mais vem
estudando sobre o assunto é o Brasil.
Todas as pesquisas citadas nesta revisão destacam que a ação antrópica é o principal fator para
ocorrência de alteração do meio ambiente, causando impactos ambientais, corroborando com a conclusão do
estudo de revisão de Dinotte, Silva e Rossoni (2020).
Contudo existem outros impactos causados por uma urbanização desordenada, tais como:
intensificação de processos erosivos; supressão de vegetação; solo exposto; proteção dos corpos hídricos;
áreas impermeáveis; aumento da velocidade do curso d’água pluviais; especulação imobiliária, residências
em áreas de preservação, despejo de efluentes e resíduos sólidos de forma inadequada; aumento de
temperatura; compactação de sedimentos eólicos diminuindo as cargas sedimentares de dunas. Estes
impactos causam uma perda parcial ou total dos ecossistemas naturais prejudicando a biodiversidade e do
equilíbrio ambiental.

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