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JUDICIÁRIA E
PROVA PENAL
Diretora de Conteúdo e Operações Editoriais
J ulia na M ayumi O no
Gerente de Conteúdo
M iusa C ristine R omera
Editorial: Aline Marchesi da Silva. D ego Gare a Mendorça, Karolina de Albuquercue Araj o e Marcella Pârne>a aa Costa Silva
Produçõo Editoriol
Coordenaçõc
A ndréia R . S chneider N unes C afva lh a es
fspec/o/isfosfd/fo.do/s. Gabnel? Lais San:’Anra dos Santos e IVaria Angé iea Leite
Analista de Projetos: La' ssa Gorçalves de Moura
Anolistcs de Operações Editoriais' Caro ire Viei'a. Damares Reg ns Felicio. Daniel e Castro ce Mora s, Mariana P astire Andfade,
Mayara Maciori Pinto e Patrfcia Mel nado >Javarra
Analistas de Quolidade Editorial: Car na Xavier, Fe'nanda Lessa, Rafael Ribeiro e Thais Pereira
Capo: L notec
Analistas: Ana Paula Cavalcanti, Jonatan Scuza, luciano Guimarães e Maria Cristira Lopes Araújo
Bibliografia.
ISBN 978-85-5321-817-2
EPISTEMOLOGIA
JUDICIÁRIA E
PROVA PENAL
TH O M SO N REUTERS
REVISTA DOS
TRIBUNAIS
EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
G ustavo H enrique B adaró
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Impressão e encadernação:
DEK Comércio e Serviços Lida.. CNP) 01.036.332/0001-99
EDITORA AFILIADA
ISBN 978-85-5321-817-2
Para Professora
A da P ellegrini G rinover,
com gratidão e saudade.
NOTA D O AUTOR
A prudência recomenda não os nominar, para evitar injustas omissões. Mas meu
desejo de expressar o quão importante foram em minha formação, ao ponto de
permitir me tornar Professor Titular, exige que explicite meu muito obrigado,
ao menos para os Professores do Departamento de Processo dos quais fui aluno
na graduação e na pós-graduação: Cândido Rangel Dinamarco, Flávio Luiz Yar-
shell, Antonio Carlos Marcato, Sérgio Marcos de Moraes Pitombo, José Roberto
dos Santos Bedaque, Vicente Greco Filho, Ada Pellegrini Grinover, Antonio
Magalhães Gomes Filho, Antonio Carlos de Araújo Cintra, Rogério Lauria Tucci,
Antonio Scarance Fernandes, Carlos Alberto Carmona e Maria Thereza Rocha
de Assis Moura.
L. ma lembrança especial há de ser feita para a Professora Ada Pellegrini Grino
ver, minha professora, orientadora e grande incentivadora. Deu-me ensinamento
e carinho. Não há como exprimir em palavras meu sentimento. Com gratidão e
saudade, dedico-lhe este livro.
O Professor Antonio Magalhães Gomes Filho é meu exemplo de professor.
Mais que isso. Uma pessoa inigualável. É o Professor dos Professores. Convidou
-me para o auxiliar na disciplina Estudo Crítico da Teoria Geral da Prova Penal e,
durante mais de uma década de ensinamentos, mostrou-me a importância da prova
penal para um processo justo.
Um elogio especial merece, também, o Professor Antonio Scarance Fernandes,
a quem tive a honra de suceder na Cátedra de Direito Processo Penal. Deu-me a
primeira oportunidade de lecionar em uma sala de aula da Faculdade de Direito
do Largo de São Francisco. Há mais de duas décadas, como integrante do famoso
PAE, sua confiança e generosidade me permitiram sentir, pela primeira vez uma
sensação inigualável e inesquecível.
Foram tantos amigos e amigas que me estimularam na vida acadêmica, mas não
podería deixar de destacar e agradecer a Petrônio Calmon Filho, Adriana Beltrame,
Paulo Lucon, Marta Saad, Maurício Zanoide de Moraes, Aury LopesJ únior, Geraldo
Prado, Diogo Malan, Eduardo Talamini, Pedro Dinamarco, Mariângela Gama de
Magalhães Gomes, José Fernando Simão, Pierpaolo Cruz Bottini. Renato de Mello
Jorge Silveira, Cleunice Pitombo, Heloisa Estelita. Ricardo Donizete G u inalzjosé
Alvesjúnior, Paulo Busato, Kai Ambos, Luís Greco, Ezequiel Malarino, Paulo de
Souza Mendes e Eneas Romero de Vasconcelos.
Aos meus orientandos registro também meu agradecimento e orgulho por os
ter presentes durante os dias de concurso.
A Biblioteca da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo é uma joia
rara. Masobrilho de seus livros não resplendeceria sem umeorpode bibliotecários
sempre solícitose competentes, que foram fundamentais para minha pesquisa. Meu
muito obrigado a todos. Agradeço, também, pelo auxílio na pesquisa, ao amigo
NOTA DO AUTOR 9
Andrey Borges de Mendonça, seja pelas sugestões de artigos, seja pela ajuda em
conseguir os textos estrangeiros.
A publicação do livro Epistemologia Ju diciária c Prova Penal é também a opor
tunidade de registrar a alegria de contar, uma vez mais, com a confiança e apoio da
Editora Thomson Reuters/Revista dos Tribunais, que tem publicado meus livros
há 20 anos, desde a primeira edição da obra C orrelação entre acusação e sentença.
Deixo público, também, o meu agradecimento a Luiz Fernando Kirchner de
Magalhãesea Renato Stanziola Vieira que,apósoconcurso. ofereceram-se para lera
tese e indicar pontos a serem corrigidos para esta publicação. Mais do que aspectos
formais, também fizeram importantes sugestões sobre o conteúdo do trabalho.
Finalmente, o mais importante: agradeço e peço desculpas à minha família pelo
tempo dedicado aos estudos eà elaboração de mais uma tese. Foram irrecuperáveis
momentos de ausência e de convivência negligenciada com vocês. Se o Direito não
sai da minha mente, o amor de Jennifer, Luca, Enrico e Bárbara preenche e alegra
meu coração. Tudo na minha vida só tem sentido com vocês.
XI de agosto de 2019.
SUM A RIO
INTRODUÇÃO............................................................................................................................................ 13
CONCLUSÕES............................................................................................................................................ 275
BIBLIOGRAFIA.......................................................................................................................................... 283
IN TR O D U Ç Ã O
1. IBANEZ, Perfecto Andrés. Sobre a motivação dos fatos na sentença penal. Valoração da
prova e sentença penal. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006, p. 67. No mesmo sentido:
ABELLAS’, Marina Gasçon. La valoraeión de la prueba. In: ABEL LAN. Marina Gascon
(Coord.). Argumentación jurídica. Valencia: Tiram lo Blanch. 2014. p. 374.
14 EPISTEMOLOGIA JUDICIARIA E PROVA PENAL
S u m á r io : 1.1. Noções gerais. 1.2. Processo penal como mecanismo cie legiti
midade da punição estatal. 1.3. As garantias processuais e sua relação com a
epistemología judiciária. 1.3.1. Imparcialidade do juiz. 1.3.1.1. Os poderes
instrutórios do julgador. 1.3.1.2. A limitação dos poderes instrutórios do juiz aos
fatos imputados. 1.3.1.3. A produção de provas pelo juiz e o respeito ao contra
ditório de partes. 1.3.2. O contraditório. 1.3.2.1. O direito à prova das partes.
1.3.3. A presunção de inocência. 1.3.4. A motivação das decisões judiciais.
1.3.5. O duplo grau de jurisdição. 1.3.6. A duração razoável do processo. 1.4.
O processo acusatório e a verdade. 1.5. O objeto do processo penal. 1.5.1. Os
"fatos" como objeto da prova no processo penal. 1.5.2. Os fatos alegados pela
acusação e pela defesa. 1.5.3. A alteração do objeto do processo e as mudanças
da imputação quanto aos fatos.
1. FERRAJOLI, Luigi. Diritto e ragion: teoria ciei garantismo penale. Roma: Laterza, 1998. p. 6.
2. Corno lembra José Frederico Marques (Ensaio sobre a jurisdição voluntária. São Paulo:
Saraiva, 1959. p. 25 3 ). “o Estado, como titular do direito de punir, poderia reprimir os
delitos administrativamente, e isto ou alravés de órgãos judiciários, como acontecia no
processo inquisitorio, ou de órgãos submetidos ao Executivo".
3. Antonio Magalhães Gomes Filho (A moíivação das decisões penais. São Paulo: Ed. RT,
2001. p. 23) destaca que “a moderna concepção de Estado de dir eito traduz, basicamente
uma ideologia de limitação desse poder". E. especificamente com relação ao processo
penal. Luciano Marques Leite (O conceito de lide no processo penal: um tema de teoria
geral do processo. Justitia, n. 70,jul.-set. 1970. p. 193) lembra que "O Estado de Direito,
para maior garantia e tutela da liberdade dos cidadãos, depois de percorrer uma linha
ascensional, que é a própria história da evolução dos direitos fundamentais do homem,
autolimitou-se. Colocou à sua frente uma barreira, a proibição da autodefesa penal, isto
após ter estabelecido uma posição de equilíbrio entre o seu direito punitivo e o direito
de liberdade dos súditos”.
PROCESSO E GARANTIAS PROCESSUAIS VOLTADAS À ATIVIDADE PROBATÓRIA 19
uma acertada interpretação da lei e aplicação da norma aos fatos; e, por fim, o
funcionamento do instrumento processual, respeitando direitos e garantias das
partes, com estrita observância do rito legal. Em suma, em extrema simplificação,
uma decisão justa necessita de uma correta atividade epistêmica, para resolver a
qu aestiofacti, uma adequada atividade hermenêutica, para resolver aqu aeslioiu ris,
e fazer a subsunção dos fatos à norma aplicável, sendo tudo isso realizado em um
instrumento que respeite o devido processo legal.
Para a relevantíssima realização do juizo de fato, o processo compartilha os
problemas epistemológicos da reconstrução histórica dos fatos, comum a vários
campos do saber, como a história, a medicina diagnóstica, as ciências naturais,
entre outras. Mas, diferente da epistemologia, no processo se conhece não somente
por conhecer, mas para decidir uma questão concreta. O conhecimento é meio e
não fim. A busca da verdade se destina a permitir uma decisão correta e, portanto,
tendencialmente justa. Para tanto, a verdade é uma das condições necessárias, assim
como a correta aplicação da lei também o é. E tudo isso precisa se desenvolver por
meio de um processo disciplinado por um conjunto de normas legais que deem
concretude a garantias asseguradas em convenções internacionais e nas Consti
tuições do Estados. Logo, o processo como mecanismo cognitivo está sujeito a
limites legais e constitucionais que afetam a admissão e a produção da prova, o que
faz com que o conhecimento sobre a verdade seja limitado. Ou, como se costuma
afirmar, atingirá uma “verdade juridicamente condicionada”.H
Antes de analisarmos as garantias processuais cujo respeito é fundamental, é
preciso definir qual é o objeto da prova no processo penal, quanto ao juízo de fato.
GOLDMAN, Alvin l. Knowledge in a social world. Oxford: Oxford University Press, 1999.
p. 284; UBERT1S, Giulio. Profili di epistemologia giudiziaria. Milano: Giuffrè, 2015. p. 3;
HAACK, Susan. A respeito da verdade, na ciência e no direito. Perspectivas pragmáticas
da filosofia do direito. Trad. André de Godoy Vieira e Nélio Schneider. Sâo Leopoldo:
Editora Unisinos, 2015. p. 324.
14. IBÁNEZ, Perfecto Andrés. “Carpintaria" da sentença penal (em matéria de fato). Valo-
ração da prova e sentença penal. Trad. Lédio Rosa de Andrade. Rio de Janeiro: Lumen
Juris, 2006. p. 128.
22 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
15. Nesse sentido: CARVALHO, Luiz Gustavo Grandinetti Castanho de. Processo penal e
Constituição. 3. ed. Rio de Janeiro: Lum enjuris, 2004. p. 125.
16. Sobre a garantia do juiz natural como meio de assegurar o direito ao juiz imparcial:
BADARÓ. Gustavo Henrique. Juiz natural no processo penal. São Paulo: Ed. RT, 2014.
p. 35 e ss.
17. Analisando a interação entre defesa e contraditório. Ada Pellegrini Grinover (Defesa,
contraditório, igualdade e par conditio na ótica do processo de estrutura cooperatória.
Novas tendências do direito processual. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1990. p. 5-6)
explica: “[...] defesa, pois, que garante o contraditório, e que por ele se manifesta e é
garantida: porque a defesa, que o garante, se faz possível graças a um de seus momen
tos constitutivos - a informação - e vive e se exprime por intermédio de seu segundo
momento - a reação”.
PROCESSO E GARANTIAS PROCESSUAIS VOLTADAS A ATIVIDADE PROBATÔRLA 23
21. Nesse sentido: GRAU, Eros Roberto. Ensaio e discurso sobre a interpretação/aplicação do
direito. 4. ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 144.
22. A Declaração Universal dos Direitos Humanos, da Organização das Nações Unidas, de
10 de dezembro de 1948, prevê no item X que “Todo ser humano tem direito, em plena
igualdade, a urna justa e pública audiência por parte de um tribunal independente e
imparcial, para decidir seus direitos e deveres ou fundamento de qualquer acusação
criminal contra ele”. No âmbito das organizações regionais, a Convenção Europeia de
Direitos Humanos, de 0 4 de novembro de 1950, em seu art. 6 .1 , ao assegurar o direito
ao processo equitativo, estabelece que: “Qualquer pessoa tem direito a que a sua causa
seja examinada, equitativa e publicamente, num prazo razoável por um tribunal inde
pendente e imparcial, estabelecido pela lei. o qual decidirá, quer sobre a determinação
dos seus direitos e obrigações de caráter civil, quer sobre o fundamento de qualquer
acusação em matéria penal dirigida contra ela [...]”. O Pacto Internacional sobre Di
reitos Civis e Políticos, adotado pela Assembleia Geral das Nações Unidas, de 16 de
dezembro de 1966, em seu art. 14.1, primeira parte, estabelece que “Todas as pessoas
são iguais perante os tribunais. Toda a pessoa lerá direito a ser ouvida publicamente
e com as devidas garantias por um tribunal competente, segundo a lei, independente e
imparcial, na determinação dos fundamentos de qualquer acusação de caracter penal
contra ela formulada ou para a determinação dos seus direitos ou obrigações de caracter
civil. [...]”. A Convenção Americana sobre Direitos Humanos, adotada no âmbito da
Organização dos Estados Americanos, de 22 de dezembro de 1969, igualmente assegura,
no art. 8.1, que “Toda pessoa tem direito a ser ouvida, com as devidas garantias e dentro
de um prazo razoável, por um juiz ou tribunal competente, independente e imparcial.
estabelecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação penal formulada
contra ela, ou para que se determinem seus direitos ou obrigações de natureza civil,
trabalhista, fiscal ou de qualquer outra natureza.”
PROCESSO E GARANTIAS PROCESSUAIS VOLTADAS À ATIVIDADE PROBATÓRIA 25
23. Outra questão de grande importância diz respeito ã organização judiciária, no caso,
se o juiz deve ser um magistrado profissional, ou um julgador leigo. Além disso, essa
questão poderia se desdobrar em outras tantas em cada uma das categorias, como: se o
órgão julgador, na atividade de valoração da prova, deve ser monocrático ou colegiado?
26 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
outro lado, sempre que uma atividade tenha na busca da verdade um de seus es
copos, mediato ou imediato - como é o caso. além do juiz, do cientista ou do his
toriador se quem realiza tal função estiver psicologicamente comprometido
com o resultado da empreitada heurística, sua conclusão tenderá a ser distorci
da, seja pela supervalorizaçâo de aspectos que, a prior i, sejam considerados po
sitivos, seja pela ocultação, relativização ou busca de justificativa infundada para
eventos negativos. A imparcialidade, além de uma garantia fundamental do devido
processo legal, também é uma condição necessária da atividade epistêmica.
Duas soluções extremadas são possíveis: (i) a impossibilidade total de que o
juiz tenha qualquer poder instrutório;24 (ii) uma ampla e ilimitada iniciativa pro
batória do julgador, independentemente de qualquer atividade das partes. Ambas
as possibilidades, justamente por seus radicalismos, parecem pouco propícias à
construção de um modelo processual que seja adequado para uma boa prestação
jurisdicional, seja pensando nas garantias fundamentais do acusado, seja com vista
a uma maior eficácia da persecução penal.
Entre um juiz absolutamente passivo e inerte, no que diz respeito à produção
da prova, e um magistrado que seja o protagonista da instrução, com poderes ab
solutos e ilimitados, é preciso encontrar uma solução intermediária, que permita
o enriquecimento do material probatório por iniciativa do juiz, sem que este com
prometa a sua imparcialidade. O ponto fulcral do problema está na compatibilidade
ou não dos poderes instruto rios do juiz com um processo penal acusatório.
24. A negativa cie poderes instrutórios ao juiz, por sua incompatibilidade com o modelo
acusatório, é defendia por parte da doutrina italiana: LOMBARDO, Luigi Giovanni.
Ricerca delia verila e nuovo processo pénale. Cassazione Pcnale, 1993. p. 753; MARA-
FIOT1. Luca. Larl. 507 c.p.p. al vaglio delle Sezioni unite: un addio al processo accusa-
torio e all’imparzialitá dei giudice dibaitimentale. Rivista Italiana di Diritto e Procedura
Pcnale, 1993. p. 845. Na doutrina nacional, o mesmo posicionamento é sustentado
por: COUT1NHO, Jacinto Nelson de Miranda. O papel do novo juiz no processo penal.
In; COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda (Coord.). Crítica d teoria geral do direito
processual penal. Rio de Janeiro: Renovar, 2001. p. 31 c ss.; Idem, Glosas ao Verdade,
Dúvida c Certeza, de Francesco Carnelutii, para os operadores do Direito, In: Revista
de Estudas Criminais - Instituto Transdisciplinar de Es tudas Criminais - ITEC, Porto
Alegre, n. 14, abr.-jun., 2004, p. 8 7 ; e LOPES JR.. Aury. Introdução crítica ao processo
penal: fundamentos da instrumentalidadegarantista. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumen Júris,
2005. p. 173 e ss. Merece destaque, também, a posição intermediária de Geraldo Prado
(Sistema acusatório: a conformidade constitucional das leis processuais penais. 2. ed.
Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2001. p. 1 5 8 -159): “entre os poderes do juiz. por isso,
segundo o princípio acusatorio, não se deve encontrar aquele que pertinente à iniciativa
judicial, permitindo-se, quando muito, pela coordenação dos princípios constitucionais
da justiça material e presunção da inocência, que moderadamente intervenha, durante a
instrução, para, na implementação de poderes de assistência ao acusado, pesquisar, de
maneira supletiva, provas da inocência, conforme a(s) tese(s) esposada(s) pela defesa”.
PROCESSO E GARANTIAS PROCESSUAIS VOLTADAS À ATIVIDADE PROBATÓRIA 27
25. A observação vale, não só para os sistemas nacionais, como para os tribunais interna
cionais. Por exemplo, no caso do Tribunal Penal Internacional, Salvatore Zappalà (The
rights of the accused. In: CASSESE. Antonio; GAETA, Paola;JONES,John R. W. D. (Ed.).
The Rome Statute of the International Criminal Court: a commentary. Oxford: Oxford
University Press, 2009. v. 11. p. 1320), afirma tratar-se de um sistema essencialmente
adversarial. embora estejam presentes alguns elementos do modelo inquisitorial. De
modo semelhante, Kai Ambos (International criminal procedure: “adversarial". "in
quisitorial'’ or “mixed"? International Criminal Lcnv Revíetv, p. 1-37. 2003, consultada
versão cm português, “É o procedimento penal internacional 'adversarial’, 'inquisitivo
ou 'misto'”. In: AMBOS. Kai. Processo penal internacional. Trad. Marcellus Polastri Lima
e Margareth Velis Zaganelli. Rio de Janeiro: Lumen luris. 2012. p. 54; Idem. Derecho
procesal penal contemporáneo. San José: Editorial Jurídica Continental, 201 I. p. 70). se
refere a um processo misto adversarial-inquisitivo.
26. Na Espanha, por exemplo, embora o art. 728 da Ley de Enjuiciamiento Criminal esta
beleça. como regra geral, que “no podrán practicarse otras diligencias de prueba que las
propuestas por las partes, ni ser examinados otros testigos que los comprendidos en
las listas presentadas”, o art. 729 excepciona-a, dispondo que: "se exceptúan de lo
dispuesto en el articulo anterior: 1° Los careos de los testigos entre sí o con los proce
sados o entre éstos, que el Presidente acuerde de oficio, o a propuesta de cualquiera de
las partes; 2° Las diligencias de prueba no propuestas por ninguna de las partes, que el
Tribunal considere necesarias para la comprobación de cualquiera de los hechos que
hayan sido objeto de los escritos de calificación. 3o Las diligencias de prueba de cualquier
clase que en el acto ofrezcan las partes para acreditar alguna circunstancia que pueda
influir en el valor probatorio de la declaración de un testigo, si el Tribunal las considera
admisibles”. Também na Alemanha, o § 244, n. 1, da StPO confere ao juiz os poderes
instrutórios de caráter geral: “El tribunal tiene que extender de oficio la recepción de
las pruebas para la investigación de la verdad de todos los hechos y medios de prueba
que tienen significado para la decisión”. Com relação a Portugal, no Código de Processo
Penal de 1987, o art. 340. § 1", do CPP português estabelece um princípio geral segundo
o qual "o Tribunal ordena, oficiosamente ou a requerimento, a produção de todos os
meios de prova cujo conhecimento se lhe afigure necessário à descoberta da verdade e
á boa decisão da causa”. Segundo Jorge de Figueiredo Dias (O novo Código de Processo
Penal. Separata do Boletim do Ministerio da Justiça 369/15, Lisboa, 1987. p. 14), trata-se
de "uma estrutura acusatoria, integrada por um principio de investigação”. Quanto à
Itália, o art. 190, comma Io, do Códice di Procedura Penale, que “enuncia il principio
forse piü emblemático del nuovo rilo accusatorio” (MELCHIONDA, Achille. Prova in
gencrale (diritto processuale penale). Enciclopedia del diritto. Aggiornamento. Milano,
1997. p. 8 4 7 ), estabelece que *1. Le prove sono ammesse a richiesta di parte”. Contudo,
28 EPISTEMOLOGIA JUDICIARIA E PROVA PENAL
tal regra não é absoluta. O art. 507, comma 1°, excepciona: “Terminata 1'acquisizione
dclle prove, il giudice, se risulta assolutamente necessário, può disporre anche di
ufficio 1’assunzionc di nuovi mezzi di prove”. O Código dc Processo Penal Tipo para
a Iberoamérica também assegura ao juiz o poder de produzir provas ex officio. Como
regra geral, o art. 289 estabelece que “en la decisión, el tribunal ordenará, de oficio,
la recepción de la prueba pertinente y útil que considere conveniente, siempre que su
luente resida en las actuaciones ya practicadas”. Além disso, o art. 317 prevê que "El
tribunal podrá ordenar, aún de oficio, la recepción de nuevos médios de prueba, si en
el curso dei debate resultaren indispensables o manifiestamente útiles para esclarecer la
verdad”. Por fim. o art. 320 dispõe que "Si el tribunal estimare imprescindible, durante
la deliberación. recibir nuevas pruebas o ampliar las incorporadas, conforme al art. 317,
podrá disponer. a ese fin, la reapertura dei debate”. No Tribunal Penal Internacional é
reconhecido o direito à prova das partes, mas o juiz também dispõe de poderes para, de
ofício, determinar a produção de provas. O art. 69.3 do Estatuto de Roma, na disciplina
da prova, prevê: “69.3. As partes poderão apresentar provas que interessem ao caso,
nos termos do artigo 64. O Tribunal será competente para solicitar de ofício a produção
de todas as provas que entender necessárias para determinar a veracidade dos fatos”.
Por fim, mas não menos relevante, ate pela natureza do órgão, importante lembrar da
disciplina prevista no âmbito das Cortes internacionais de direitos humanos. O art. 59.3
do Regulamento da Corte Europeia de Direitos Humanos, que entrou em vigor no dia
Io de julho de 2014. estabelece que: "The Chamber may decide, either at lhe request
of a party or of its own motion, to hold a hearing on the merits if it considers that the
discharge of its functions under the Convention so requires”. De forma semelhante, o
art. 58 do Regulamento da Corte Interamericana de Direitos Humanos, que dispõe sobre
“Diligências probatórias de ofício”, prevê, no subitem (a) que: “A Corte poderá, em
qualquer fase da causa: a. Procurar ex officio toda prova que considere útil e necessária.
Particularmente, poderá ouvir, na qualidade de suposta vitima, de testemunha, de perilo
ou por outro título, a qualquer pessoa cuja declaração, testemunho ou parecer consi
dere pertinente”. Para uma ampla análise dos poderes insirutórios do juiz no processo
civil, cf.: TARUFFO, Vlichele. Os poderes instrutórios das partes e do juiz na Europa.
Processo civil comparado: ensaios. Trad. Daniel Mitidiero. São Paulo: Marcial Pons, 2013.
p. 57-84, em que conclui que "Não existe qualquer conexão entre a atribuição ao juiz
de mais ou menos poderes de iniciativa instruLória e a presença de regimes autoritários
e antidemocráticos”.
27. Mesmo nos países de common law, em que a iniciativa probatória é toda exercida pelas
partes, tendo o julgador um papel geralmente passivo, a lei lhe confere poderes proba
tórios em determinados casos. Por exemplo, no processo norte-americano, a rule 614
(a) do Federal Rule of Evidence estabelece que "the court may, on its own motion or
at the suggestion of a party, call witnesses, and all parties are entitled to cross-examine
witnesses thus called". De outro lado. a letra (b) dispõe que "the court may interrogate
witnesses, whether called by itself or by a party”. Também a rule 706 prevê que “the
court may appoint any expert witnesses agreed upon the parties and may appoint expert
witness of its own selection”. Também no processo penal inglês, o juiz pode chamar ex
officio testemunhas, incluindo os peritos, sem necessidade de consentimento das partes.
PROCESSO E GARANTIAS PROCESSUAIS VOLTADAS À ATIVIDADE PROBATÓRIA 29
a sua existencia. Além disso, é fundamental definir a relação entre os poderes ins
truto rios do juiz, de um lado, e o direito à prova das partes, de outro, com vistas a
estabelecer qual deverá predominar na atividade instrutória.Jí!
Porém, antes de resolver tais questões, é necessário um esclarecimento ter
minológico. A categoria “poderes instrutórios do juiz” é bastante heterogênea,
podendo incluir um amplo leque de poderes, que vão desde a busca de fontes de
provas (atividade investigativa) até a introdução em juízo de provas de cuja exis
tência já tenha conhecimento (atividade instrutória propriamente dita).
Partindo da distinção entre fontes de prova e meios de prova, percebe-se, fa
cilmente, que o perigo para a imparcialidade está no juiz que é um pesquisador, um
“buscador” de fontes de prova. Quem investiga compromete a sua imparcialidade
para o posterior julgamento.
Por outro lado, diferente de investigaré instruir. O juiz que. diante da notícia
de uma fonte de prova (p. ex.: a informação de que uma certa pessoa presenciou
os fatos), se limita a determinar a produção do meio de prova necessário (p. ex.: o
depoimento da testemunha) para incorporar ao processo as informações contidas
na fonte de prova, não está agindo comprometido com uma hipótese prévia por ele
formulada. No caso, as hipóteses fáticas a serem objeto da provajá terão sido colocadas,
na acusação, pelo Ministério Público ou pela vítima já lendo sido formulada a hipo-
tese a ser investigada, e não realizando atos de investigação, o juiz que se limitar
a determinar, de ofício, a produção de meios de prova, decorrentes de uma fonte28
28. No caso brasileiro, o Código de Processo Penal dc 1941, buscando atingir os fins alme
jados pelo Estado Novo, pressupunha um juiz forte, verdadeiro protagonista ou ator
principal do processo, que em tema probatório, era o senhor da instrução. A ele eram
reservados amplos poderes probatórios, na busca da tão almejada verdade real. Lê-se na
Exposição de Motivos do Código de Processo Penal, em seu item VII: "o juiz deixará de
ser um espectador inerte da produção de provas. Sua intervenção na atividade processual è
permitida, não somente para dirigir a marcha da ação penal e julgar a final, mas também
para ordenai; de oficio, as provas c/ne lhe parecerem uteis ao esclarecimento da verdade. Para
a indagação desta, não estará sujeito a preclusões. Enquanto não estiver averiguada a
matéria de acusação ou da defesa e houver fonte de prova ainda não explorada, o juiz não
deverã pronunciar o in dubio pro reo ou o no liquet" (destaquei). Desde então, muita
coisa mudou e, a partir da Constituição de 1988, tem havido um crescente movimento
doutrinário pela restrição dos poderes instrutórios do juiz. Todavia, ao menos no cam
po probatório, essa tendência não se refletiu no direito posto. A Lei 11.690/2008, que
alterou as regras gerais sobre prova no Código de Processo Penal, deu nova redação ao
art. 156, nos seguintes termos: “Al t. 156. A prova da alegação incumbirá a quem a fizer,
sendo, porém, facultado ao juiz de ofício: I - ordenar, mesmo antes de iniciada a ação
penal, a produção antecipada de provas consideradas urgentes e relevantes, observando
a necessidade, adequação e proporcionalidade da medida; 11 - determinar, no curso da
instrução, ou antes de proferir sentença, a realização de diligências para dirimir dúvida
sobre ponto relevante.”
30 EPISTEMOLOGIA JUDICIARIA E PROVA PENAL
29. BADARÓ. ônus da prova no processo penal..., cit., p. 119-120. Em sentido contrário,
posiciona-se Geraldo Prado ( Sistema acusatório..., cit., p. 136-137), que afirma: “Ao
tipo de prova que se pesquisa corresponde um prognóstico, mais ou menos seguro, da
real existência do thema probandum, e. sem dúvida, também das consequências jurídicas
que podem advir da positivação da questão fática. Quem procura sabe ao certo o que
pretende encontrar e isso, em termos de processo penal condenatorio, representa uma
inclinação ou tendência perigosamente comprometedora da imparcialidade do julgador”.
30. CORDERO, Franco. Guida alia procedura pénale. Torino: LTET, 1986. p. 51. Invocan
do tal passagem, cf.: COUTINHO, Glosas ao Verdade, Dúvida e Certeza, de Francesco
C arnelutti.... cit.. p. 86.
PROCESSO E GARANTIAS PROCESSUAIS VOLTADAS À ATIVIDADE PROBATORIA 31
31. Como explica Jorge de Figueiredo Dias (Direito processual penal. Coimbra: Coimbra
Ed.. 1974. v. 1. p. 136-137): "Já conhecemos o processo histórico através do qual se
operou a evolução do processo penal de um tipo inquisitório para um tipo acusatório,
bem como a consideração material que esteve na base da evolução: a imparcialidade e
objectividade que, conjuntamente com a independência, são condições indispensáveis
de uma autêntica decisão judicial só estarão asseguradas quando a entidade julgadora não
tenha também funções de investigação preliminar e acusação das infrações, mas antes possa
apenas investigar e julgar dentro dos limites que lhe são postos por uma acusação fundamen
tada e deduzida por um órgão diferenciado (em regra o VIP ou um juiz de instrução). E
precisamente com este conteúdo que modernamente se afirma o princípio da acusação'
(destaques no original) E, noutro passo, complementa o ilustre Autor português (ibi
dem. p. 143-144): "Não basta porém, para que se dê satisfação às exigências materiais
contidas no princípio da acusação, que o princípio se consagre, é ainda necessário,
como bem se compreenderá, que integralmente se respeitem as implicações que dele
substancialmente derivam [... ]: 1° O tribunal a quem cabe o julgamento não pode, por
sua iniciativa, começar uma investigação tendente ao esclarecimento de uma infracçâo
e à determinação de seus agentes; isto tem de ter lugar numa fase (processual ou pré
-processual. tanto importa) cuja iniciativa e direcção caiba a uma entidade diferente.
2o .4 dedução da acusação è pressuposto de toda a actividade jurisdicional de investigação,
conhecimento e decisão. Ela afirma publicamente que sobre alguém recai uma suspeita
tão forte de responsabilidade por uma infracçâo que impõe uma decisão judicial; é,
digamos assim, a afirmação pública e solene de que a comunidade jurídica chama um
seu membro à responsabilidade.5' (destaquei).
32. Há idêntico posicionamento na doutrina processual civil italiana. Para Bruno Cavallone
(Critica delia teoria delle prove atipiche. Rivista di Diritto Processuale, 1978. p. 723,
nota 124) o juiz não pode buscar, por si mesmo, e fora do processo “fontes materiais
32 EP1STEMOLOG IA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
Porém, uma vez reconhecido o direito à prova das partes, a atividade de ins
trução deve estar prioritariamente nas mãos do acusador e do acusado. Cabe às
partes requereras provas que considerem relevantes para demonstrar a veracidade
dos fatos por elas alegados. Somente quando, ao fim da instrução, houver a notícia
de uma fonte cuja produção do meio de prova respectivo não foi requerida pelas
partes, e o resultado probatório possa lendencialmente gerar elementos de prova
logicamente aptos a esclarecer uma alegação de fato penalmente relevante, será
possível ao juiz, supletivamente, fazer uso dos seus poderes instrutórios.
Diante da perigosa força expansiva da “tentação inquisitória”, o reconhe
cimento de poderes instrutórios exige que já tenha sido delimitada a acusação,
bem como concluída a produção de todas as provas requeridas pelas partes. Essa
demarcação do caráter subsidiário dos poderes instrutórios do ju iz é condição
para que se respeite a posição prioritária reconhecida ao direito à prova das partes.
Em suma, é possível que a atividade probatória esteja concentrada nas partes,
verdadeiros titulares do direito à prova, mas que o juiz tenha poderes instrutórios
subsidiários, sem comprometer sua imparcialidade, nas seguintes condições: a
primeira, o juiz pode determinar a produção de meios de prova no curso do pro
cesso, mas não tem poderes investigatórios para buscar fontes de prova antes de
ser formulada a acusação; a segunda, o juiz, no curso do processo, que já está com
seu objeto delimitado, deve se limitar a determinar a produção do meio de prova
correspondente a uma fonte de prova relevante já existente no processo.
de prova", que não tenham sido já identificadas e mencionadas nos autos do processo,
sob pena de violar princípios e valores relevantes, como a imparcialidade do juiz, o
contraditório, vedação da utilização de conhecimento privado do julgador e a regra de
ônus da prova.
PROCESSO E GARANTIAS PROCESSUAIS VOLTADAS À ATIVIDADE PROBATÓRIA 33
o thema probandum. Ou seja, nada poderá fazer o julgador, sendo-lhe vedado, por
iniciativa própria, determinar a produção dc meios de prova com a finalidade de
comprovar fatos não alegados pelas partes. Uma obstinada busca pela verdade, cm
que o juiz possa produzir prova sobre (atos não alegados pelas partes, comprome
terá a sua imparcialidade.
Não é de se estranhar que, nos modelos de forte cariz inquisitório, esse li
mite fosse solenementc ignorado, sob a justificativa maior da "busca da verdade
real". Citc-se, como exemplo, a doutrina de Manzini, para quem "a prova penal
é a atividade processual imediatamente voltada para o escopo de obter a certeza
judicial, segundo o critério da verdade real, sobre a imputação ou outra afirmação
ou negação que interesse a um provimento do ju iz".33345A partir de tal premissa mor,
afirmava que o juiz penal, uma vez proposta a ação penal, não podia permanecer
sujeito à iniciativa ou habilidade dc outrem, "não podendo ser constrilo a se con
vencer somente iuxta allegata et probata dos outros sujeitos processuais".’" Nada
mais propício a um sistema inquisitório, de concentração de poderes nas mãos do
julgador, que é o senhor e dono do processo, devendo buscar toda a verdade para
a defesa da sociedade e condenação dos culpados. Nesse sistema a atividade não
só probatória, mas também dc alegação fática das partes, não pode subordinar ou
mesmo limitar o julgador. O juiz é o principal e as partes são o acessório.
Por outro lado, num sistema acusatório, com a alteração da matriz para uma
predominância da atividade argumentativa e probatória das partes, em detrimento
da onipotência instrutória do juiz do sistema inquisitório, o panorama se inver
te.3’ Mais do que a atividade probatória, a própria delimitação dos fatos objeto do
processo compele à parte, e não ao juiz. O juiz não poderá exercer os seus poderes
probatórios em relação a fatos não alegados pela parte, quer estes digam respeito
a elementos do crime, quer se trate dc qualificadores, causas de aumento ou dimi
nuição de pena ou mesmo circunstâncias agravantes ou atenuantes.
Não se está, ingenuamente, acreditando que na soma das alegações das
partes o juiz terá todo o quadro fático necessário para uma visão completa dos
33. MANZINI. Vincenzo. Trattato di diritto processualepenale italiano. 6. ed. Torino: UTET,
1967. v. III. p. 231.
34. MANZINI. Trattato di diritto processuale penale italiano, cit., p. 236-237. E completava:
o juiz, assim como o Ministério Público, “deve tutelar o interesse repressivo do Estado
e, portanto, pode se convencer livremente, seja valorando os resultados das provas
fornecidas pela acusação, seja indagando por sua própria iniciativa, de ofício”. Seme
lhante é o posicionamento de Eugênio Florian (Dcllc prove penale: in generale. Milano:
Casa Ed. Doll. Francesco Vallardi, 1921. v. 1. p. 53): “o princípio da busca da verdade
material e efetiva, que rege lodo o processo, e o seu caráter altamente público, fazem
com ele incompatíveis limitações aprioristicas, ainda que porventura sejam cogitáveis
para outras espécies de processo”.
35. Sobre o sistema acusatório e a busca da verdade, cl., infra, item 1.4.
34 EPISTEMOLOGIA JUDICIARIA E PROVA PENAL
36. Michele Taruffo (Elementi per unanalisi dei giudizio di fatto. Stti confini: scriui sulla
giustizia civile. Bologna: II Mulino, 2002. p. 2 4 0 -2 4 1 , cita a obra de Norbert Elias,
Coinvoígimenio e distacco. Saggi di sociologia delia conoscenza, trad. it. Bolonha, 1988.
p. 19 aa.. 23 e ss. Preferiu-se traduzir a dicotomia para engajamento/distanciamento,
por ser mais fiel ao título original da obra: Engagement und Distanziening. Arbeiten zur
Wisse/issozíologie I. Editado por Michael Schröter. Frankfurt am Main: Suhrkamp. 1983.
37. TARUFFO, Elementi per un’analisi del giudizio di fatto..., cit., p. 240-241.
38. TARUFFO, Elementi per un'analisi del giudizio di latto..., eil., p. 240-241.
PROCESSO E GARANTIAS PROCESSUAIS VOLTADAS AATIVIDADE PROBATÓRIA 35
dessas duas partes seja igual ao todo. De qualquer modo, eventual incremento em
lermos de busca da verdade, caso se admitisse que o juiz pudesse produzir provas
de fatos não afirmados pelas partes, já que ele seria um sujeito “destacado” e sem
interesse outro que a descoberta da verdade, não compensaria o enorme o risco
de perda da imparcialidade. Logo, o ponto de equilíbrio está em admitir que o juiz
possa determinar prova tendo por objeto fatos narrados pelas parles, na imputação
ou na defesa, e que já constituam o tltema probandum. Por outro lado, ao juiz não
é permitido criar hipóteses fálicas novas, não alegadas pelas partes, e para confir
má-las, determinar a produção de prova de oficio.
Se as partes têm nos fatos imputados ou naqueles constantes da resposta à acu
sação uma baliza para requerer a produção das provas de suas alegações, é evidente
que o julgador, igualmente, não poderá ultrapassar tais limites. Iniciativas probató
rias do juiz somente podem ser aceitas em caráter excepcional. Além disso, devem
ser contidas nos limites traçados pela acusação e pela defesa em suas alegações.
Em suma, admite-se os poderes instrutórios do juiz que lhe permitem deter
minar a produção de um meio de prova correspondente a uma fonte de prova que
já se tem notícia no processo, desde que respeitado o pressuposto inafastável do
seu exercício: ao juiz somente é possível determinara produção de provas sobre
alegações dos fatos objeto do processo, definidos pelo acusador, ao realizar a impu
tação na denúncia ou queixa.'10Também poderá fazê-lo, com vista a fatos narrados
pela defesa e que ampliem o objeto de cognição do julgador, como alegações de
excludentes de ilicitude ou culpabilidade.
39. ORLAND1, Renzo. Eaitiviia argomentaiiva delle parti nel dibattimento penale. In: FER
REA, Paolo ct al. Lei provo nel dibattimento penale. Torino: G. Giappichelli, 1999. p. 14.
40. Destaque-se que a limitação dos poderes instrutórios do juiz ao perímetro traçado pelos
fatos que integram o objeto do processo é reconhecida mesmo por quem defende os
poderes instrutórios do juiz. inclusive no processo civil. Nesse sentido, na doutrina
nacional: BEDAQUE. José Roberto dos Santos. Poderes instrutórios do juiz. 4. ed. São
Paulo: Ed. RT, 2009. p. 154. Na Espanha: PICÓ I JUNOY, Juan. El juez y la prueba:
estudio de la errónea recepción del brocardo iudex indicare debe! secundum allégala el
probóte, non secundum conscientiam y su repercusión actual. Barcelona: Bosch Procesal.
2007. p. 117-118. No mesmo sentido, na doulrina argentina: VARELA, Casimiro A.
Valoración de la prueba. 2. ed. Buenos Aires: Editorial Astrea, 1999. p. 148. Na doutrina
italiana: CAVALLONE, Bruno. Critica delia teoria delle prove atipiche. Rivista di Diritto
Processuale, Milano. 1978. p. 723. nota 12; TARUFFO, Michele. Modelli di prova e di
procedimento probatorio. Rivista di Diritto Processuale, 1990. p. 434.
36 EPISTEMOLOGIA JUDICIARIA E PROVA PENAL
1.3.2. O contraditório
Mais do que uma garantia constitucional, o contraditório tem sido consi
derado como integrante do próprio conceito de processo. Aliás, é exatamente a
presença do contraditório que permite distinguir o processo do procedimento.4445
Na concepção de Fazzalari, processo c procedim ento cm contraditório,43 O Autor
41. OLIVEIRA, Carlos Alberto Álvaro de. Do formalismo no processo civil. 2. ed. Rio de
Janeiro: Forense, 2003. p. 115.
42. O art. 398 do ab-rogado Código de Processo Civil de 1973 dispunha: ' An. 398. Sempre
que uma das partes requerer a juntada de documento aos autos, o juiz ouvirá, a seu
respeito, a outra, no prazo de 5 (cinco) dias”. Se o contraditório deve ser observado em
relação à prova documental produzida pela parte contrária, com maior razão o deverá
sê-lo no caso de prova produzida, ex o/ficio. pelo juiz.
43. Como explica Giuseppe Tarzia (Lineamemi dei nuovo processo di cognizione. Milano:
Giuffrè, 1996. p. 115-116) ;‘o exercício do poder instrutório de ofício, em qualquer
momento do processo, reabrirá os lermos para uma nova instrução, se ela se tornar
após a produção das provas propostas pelas partes, mas exclusivamente sobre os fatos
admitidos como tema de prova pelo juiz e sobre os quais destinados a contestar exis
tência ou informar a relevância ".
44. Nesse sentido: D1NAMARCO, Cândido Rangel. O princípio do contraditório. Fundamen
tos do processo civil moderno. 2. ed. São Paulo: Ed. RT, 1987.. p. 95: GR1NOVER. Defesa,
contraditório, igualdade e par condido na ótica do processo de estrutura cooperatória....
d l., p. 4. nota 18.
45. FAZZALLAR1, Elio. Processo (teoria generale). Novíssimo Digesto Italiano. Torino:
UTET, 1966. v. 13. p. 1067-1076; Idem. Istiluzioni di diritto processuale. 5. ed. Padova:
PROCESSO E GARANTIAS PROCESSUAIS VOLTADAS A ATIVIDADE PROBATORIA 37
Cedam, 1989, p. 58. Deslaque-se que. no caso do processo jurisdicional, que é “o processo
por antonomásia", para Fazzalari (Processo (teoria generale) .... cii.. p. 1075), além do
contraditório entre as panes, há outras características típicas da função jurisdicional: a
independência e estraneidade do autor do provimento final, que é o juiz, em relação á
realidade substancial, que é o pressuposto do processo e é deduzida em juízo; e a irrevo-
gabilidade do provimento final do processo. Apenas nos casos em que essas características
se apresentem conjuntamente é que se pode falar em processo jurisdicional, visto que
todas elas são indispensáveis ao desenvolvimento da atividade jurisdicional.
46. FAZZALARI, Processo (teoria generale)..., cit., p. 1069.
47. FAZZALARI, Processo (teoria generale)..., cit., p. 1072.
48. GRINOVFR. Ada Pellegrini. O processo cm evolução. Rio de Janeiro: Forense Universi
tária. 1996. p. 54.
49. ALMEIDA, Joaquim Canuto Mendes de. A contrariedade na instrução criminal. São Paulo:
Saraiva. 1937. p. 110.
50. Para Sergio La China (Lesecuzioneforzata c lc disposizioni generali del Códice di Procedura
Civile. Milano: Giulfrê, 1970. p. 39 4 ) o "princípio do contraditório se articula, nas suas
38 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
penal, inais do que simplesmente possibilitada, a reação tem que ser efetiva.51 É
necessário estimular e buscar a realização da reação para que a estrutura dialética
do processo se aperfeiçoe por meio de tese e antítese com conteúdos e intensidades
equivalentes, atingindo uma símese que, apoiada em premissas simétricas, seja a
mais ju sta.52
Além disso, a garantia do contraditório tem uma função política de legitimar
o resultado do exercício do poder, por permitir que os destinatários de tal ato parti
cipem ativamente da sua construção.5’ No caso do processo, é assegurado às partes
o direito de argumentar e contra argumentar, produzir provas e contraprovas e
influenciar o convencimento do juiz que irá proferira sentença.
Todavia, com vistas à proposta de um modelo de epistemología judiciária,
apto a permitir que o processo funcione como um instrumento cognitivo que pri
vilegie como fim institucional a busca da verdade —embora não seja esse um valor
absoluto - , o aspecto mais importante do contraditório é a sua inegável função
heurística.54
O contraditório é indispensável no processo, como dizia Calamandrei, “não
para exacerbar as discussões das partes ou para dar vazão à eloquência dos advo
gados, mas no interesse da justiça e do juiz, que precisamente na oposição dialética
das defesas opostas encontra sem dificuldade o melhor meio para ver diante de si.
iluminado sob os mais diversos perfis, toda a verdade”.55
coloca como objeto do processo todos os fatos em sua inteireza. Além disso, a dialética
probatória, obviamente, nem sempre possibilita o conhecimento de “toda a verdade”.
56. DE LUCA, Giuseppe. Il sistema delle prove penali e il principio dei libero convincimento
nel nuovo rito. Rfvista Italiana di Dirilto e Procedura Pénale. 1092. p. 1261.
57. Nesse sentido: CALAMANDRE1, La dialetticità dei processo..., cit., p. 6 8 2 ; FERRAJOLI.
Diritto e ragione..., cit., p. 763; BARGI. Procedimento probatorio e giusto processo..., cit.,
p. 92; FERRUA, Contradditorio e verità nel processo penale..., cit.. p. 76; COMOGLIO,
Luigi Paolo; ZAGREBELSKY, Vladimiro. Modello accusatorio c deontologia dei compor-
tamenti processuali nella prospettiva comparatistica. Ri vis tu Italiana di Diritto e Procedura
Penale, 1993. p. 481; UBERT1S, Giulio. Diritto alia prova nel processo penale e Corte
Europea dei Diritti dell’Uomo. V'erso tin “giusto processo" penale. Torino: G. Giappichelli.
1997. p. 90; Idem. Principi di procedura penale europea: le rcgole del giusto processo.
Milano: Raffaello Cortina, 2000. p. 36; Idem, Profili di cpistemologia giudiziaria..., cit.,
p. 63; NOBILI, Esiii, errori, arbitrii dietro un'illustre formula..., cit.. p. 40; ANDRÉS
1BÁNEZ. A argumentação probatória e sua expressão na sentença, cil., p. 35. Na doutrina
pátria: GRINOVER. Ada Pellegrini. Igualdade dc partes e paridade de armas: a posição
do MP no Superior Tribunal Militar. O processo em evolução Rio de Janeiro: Forense,
1996. p. 313: TUCC1, Rogério Lauria. Considerações acerca da inadmissibilidade dc
uma teoria geral do processo. Revista do Advogado, São Paulo, n. 61, nov. 2000. p. 92;
MAGALHÃES GOMES FILHO, A motivação das decisões penais..., cit., p. 39.
58. Nesse sentido: ZAPPALÀ, Enzo. Processo penale ancora in bilico tra sistema accusato
rio e sistema inquisitório. Diritto Penale e Processo, n. 7. 1998. p. 8 8 8 ; MAGALHÃES
GOMES FILHO, A motivação da decisão penal..., cit., p. 39.
59. POPPER, Karl. A miséria do historicismo. Trad. Octany S. da Mota e Leõnidas Hegenbert.
São Paulo: Ed. Cultrix/Ed. USR 1980. p. 104-105.
40 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAI
60. Nesse seniido: HEMPEL, Carl G. Filosofia da ciência natural. Trad. Plínio Sussekind Ro
cha. 2. ed. Rio de Janeiro: Zahar Ed.. 1674. p. 32: ANDRES IBANEZ. Sobre a motivação
dos fatos na sentença penal, cit., p. 96.
61. PASTORE, Decisioni, argomenti, controlli..., cit., p. 109.
62. Delfino Siracusano. Le Prove,S1RACUSANO, D.; GALATI, A.; TRANCHINA, G.; ZAPPALÀ,
E. Diritio processuale penale. 2. cd. Milano: Giuffrè, 1996. v. 1. p. 348.
PROCESSO E GARANTIAS PROCESSUAIS VOLTADAS AATIVIDADE PROBATÓRIA 41
63. O ab-rogado Códice di Procedum Penóle de 1930. no art. 299, comrna 1° dispunha que:
‘11 giudice istruttorc ha obbligo di compiere prontamente tutti e soltanto quegli atii che
in base agli eleniemi raccolti c alio svolgimento dell’islruzione appaiono necessari per
1’accerlamento delia verità”.
64. Art. 190.1 estabelece que "lhe prove soma ammesse a richiesta di parte."
65. Códice di Procedum Penale, art. 187, Io, 2o e 3o corama, respectivamente.
66. TAORMINA, Cario. II regime delia prova nel processo penale. Torino: G. Giappichelli,
2007. p. 185.
67. Sobre as exceções a tais regras, cf., infra, cap. 3, item 3.5.2.
68. Essa posição é mais forte ainda para quem, como nós, considera que o Ministério Público
não é uma “parte imparcial”. No processo penal o Ministério Público é parte, e parle in
teressada. Ao formular a acusação, embora esteja buscado o acertamento judicial sobre a
ocorrência ou não do fato crime imputado ao acusado, o Ministério Público já se convenceu
previamente da culpabilidade e buscará prová-la. Embora para o exercício da ação penal
não se exija a certeza da autoria, o representante do Ministério Púbico, quando acusa,
certamente entende que esta é a hipótese mais provável. Mais do que isso. ao oferecer a
denúncia, o Promotor de Justiça acredita que, ao cabo da instrução, conseguirá provar,
além de qualquer dúvida razoável, a tese da acusação. Foge ao escopo da tese desenvolver
o tema. Para uma análise dos argumentos que justificam a posição, cf. BADARÓ. Gustavo
Henrique, ônus da prova no processo penal. São Paulo: Ed. RT, 2003. p. 207-225.
42 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
69. No direito Espanhol, a doutrina entende que o direito à prova é extraível do art. 24.2 da
Constituição que assegura: "Asimismo, todos tienen derecho a [...] utilizar los medios
de pruebas pertinentes para su defensa". Quanto ao conteúdo de tal direito, a doutrina
entende que o direito à prova é aquele que assegura ao litigante a utilização de todos
os meios probatorios necessários para formar a convicção do órgão julgador acerca dos
fatos debatidos no processo (PICÓ I JUNOY, Joan. El derecho a la prueba en el proceso
civil. Barcelona: José Maria Bosch Ed., 1996. p. 18-19). Na Italia, com base no art. 24 da
Constituição de 1948, que assegura o direito de defesa, chegou-se á compreensão de que
a regra constitucional não se limita a garantir as partes o direito a um defensor ou o mero
direito de expor as próprias razões ao juiz. Víais do que isso. numa definição de Vassali
que se tornou clássica, o direito de defesa assegura o “diritto di difendersi provando”, ou
seja, o direito de não ver diminuída a possibilidade de defesa através de uma restrição
arbitrária dos meios de prova oferecidos ao juiz ou do objeto da prova proposta (VASSALI,
Giuliano. 11 diritto alia prova nel processo penale. Rivista Italiana di Diritto e Proccdura
Penale, 1968. p. 12). O reconhecimento da natureza constitucional do direito à prova
passou a ser explícito com a Lei Constitucional 2. de 23 de novembro de 1999, que inse
rindo os princípios do justo processo no artigo 111 da Constituição italiana, estabeleceu
no 2° com ma, que: “Ogni processo si svolge nel contraddittorio ira le parti, in condizioni
di parità, davanti a giudice terzo e imparziale." E. o 4° comma do mesmo artigo ainda
assegura: ”11 processo penale c regolato dal principio dei contraddittorio nellaformazione
delia prova". Na Alemanha, Nicolò Trocker (Processo civile e coslituzione: problemi di
diritto tedesco e italiano, Giuffrè: Milano, 1974, p. 722 ss.) explica que o direito à prova
não se exaure na faculdade de produzir os meios representativos dos fatos deduzidos
em juízo, mas uma verdadeira pretensão de ver admitidas as provas propostas perante o
juiz (Beweiserhebungsanspruch). Em Portugal, as garantias do processo são estabelecidas
no art. 32 da Constituição, que não prevê expressamente o direito à prova. Todavia, na
doutrina, Canolilho (CANOTILHO, JoséJoaquim Gomes. O ônus da prova na jurisdição
das liberdades. Estudos sobre direitos fundamentais. Coimbra: Coimbra Ed.. 2004. p. 169
170) observa que: o direito constitucional á prova surge, a maior das vezes, ou dissolvido
nos principios de direito e processo penal constitucionalmente consagrados (‘direito de defesa',
‘direito ao contraditório’, direito de intervenção no processo', ‘proibição de provas ilícitas’)
ou associado ao direito e tutela jurisdicional”; o que implica “deslocar o direito à prova do
estrito campo jusprocessualístico para o localizar no terreno constitucional". E, quanto
ao seu conteúdo, arremata: "o direito constitucional à prova abrange o direito a prova em
sentido lato (poder de demonstrar em juízo o fundamento da própria pretensão) e o direito
a prova em sentido restrito (alegando matéria de fato e procedendo à demonstração da sua
existência)” (O ônus da prova..., cit., p. 170, destaques no original).
PROCESSO E GARANTIAS PROCESSUAIS VOLTADAS À ATIVIDADE PROBATORIA 43
70. MAGALHÃES GOMES FILHO, Antonio. Direito cl prova no processo penal. São Paulo:
Ed. RT, 1997. p. 84. Acrescenta, ainda, que o conteúdo desse direito envolve cinco mo
mentos distintos: investigação, propositura, admissão, produção e, por fim, valoraçào
da prova (Ibidem, p. 8 8 ).
71. O direito à prova è assegurado no Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos,
em seu art. 14.3.e, que garante a lodo acusado o direito “de interrogar ou fazer interrogar
as testemunhas da acusação e de obter o comparccimento e o interrogatório das testemu
nhas de defesa nas mesmas condições de que dispõe as de acusação” (destaquei). De forma
semelhante, a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, igualmente assegura
aos acusados, no art. 8.2.f: "o direito da defesa de inquirir as testemunhas presentes
no tribunal e de obter o comparecimento, como testemunhas ou peritos, de outras pessoas
que possam lançar luz sobre os fatos" (destaquei). Embora os dispositivos citados se
refiram à prova testemunhal, prevalece o entendimento de que seu âmbiio de proteção
assegura o direito à prova de qualquer natureza, e não apenas às fontes de provas orais:
MAGALHÃES GOMES FILHO, Direito á prova no processo penal..., cit., p. 74. No mesmo
sentido, na doutrina italiana, referente ao art. 6 .3 .e, da CEDH. cf. UBERT1S, Giulio.
Diritto alia prova nel processo penale e Corte Europea dei Diritti dellTJomo. Verso ti/t
“giusto processo” penale. Torino: G. Giappichelli, 1997. p. 89-90.
44 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
da atividade das partes. Isso é resultado do cambio de uma visão do processo ein
que cabia ao juiz o protagonismo, sendo o ator principal da atividade probatoria,
com um papel secundario e complementar dos sujeitos interessados, passando
para um modelo diverso, para não se dizer oposto, em que se confere às partes o
direito à prova, restando ao julgador poderes subsidiarios de produção da prova,
visando esclarecimentos fundamentais que não foram trazidos ao processo pela
atividade regulare principal dos sujeitos parciais.
Em suma, sendo reconhecido um direito à prova para as partes, como con
dição para poder demonstrar a veracidade dos fatos por elas alegados, a atividade
instrutória deve se concentrar em suas mãos, não nas do juiz. As partes são as ti
tulares do direito à prova e os sujeitos principais da sua produção. Caso se admita
que o juiz, nesse sistema, tenha poderes instrutórios para, de ofício, determinar
a produção de prova não requeridas pelas partes, eles terão que ser subsidiários e
complementares.
72. PISANI, Mario. Sulla presunzione di non colpevolezza. II Foro Penóle, 1965. p. 3.
73. CHIAV'ARIO, Mario. La presunzione d’innocenza nella giurisprudenza della Corle Eu
ropea dei Diritto DeH’uomo. Studi in riconlo di Gian Domenico Pisapia. Milano: Giuffré.
2000. v. 2. p. 76.
74. CARRARA, Francesco. 11 diritto penale e la procedura penale (prolusione al coso di
diritto crimínale dellanno accademico 1873-74. nella R. Universitá di Pisa). Opuscoli
di diritto crimínale. Lucca: Tipografía Giusti. 1874. v. V. p. 18.
PROCESSO E GARANTIAS PROCESSUAIS VOLTADAS À ATIVIDADE PROBATORIA 45
75. A Declaração Universal dos Direitos Humanos, no item X I.1, assegura: "Todo ser hu
mano acusado de um ato delituoso tem o direito de ser presumido inocente até que a
sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei [...]". O Pacto Internacional
sobre Direitos Civis e Políticos, também garante, no art. 14.1, primeira parte, que:
“Qualquer pessoa acusada de infracção penal é de direito presumido inocente até que a
sua culpabilidade tenha sido legalmente estabelecida [...1”. No âmbito regional, a Con
venção Europeia de Direitos Humanos estabelece, no art. 6.2, que: “Qualquer pessoa
acusada de uma infracção presume-se inocente enquanto a sua culpabilidade não tiver
sido legalmente provada". A Convenção Americana sobre Direitos Humanos, também
garante, no art. 8.2, que “Toda pessoa acusada de um delito tem direito a que se presumo
suo inocência, enquanto não for legalmente comprovada sua culpa.”
76. CH1AVAR10, La presunzione ddnnocenza nella giurisprudenza delia Corte Europea dei
Diritto DelPuomo..., cil., p. 76.
77. Nesse sentido: MAGALHÃES GOMES FILHO, Antonio. Presunção de inocência e prisão
cautelar. São Paulo: Saraiva, 1991. p. 3 9 ; STELLA. Federico. Ciustizio c modernítà.
Milano: Giuffrè, 2002. p. 76.
78. Nesse sentido: CHIAVARIO, Mario. Presunzione d‘innocenza e diritto di difesa nel pen-
siero di Francesco Carrara. Rivista Italiana di Diritto e Procedura Penale, 1991. p. 358;
1ACOV1ELLO, La motivazione delia sentenza penale c il suo controllo in Cassazione....
cil., p. 230.
79. PISANI, Sulla presunzione di non colpevolezza..., cit.. p. 3.
80. O princípio da presunção de inocência, segundo Pcrfecto Ibánez (Sobre a motivação dos
fatos na sentença penal, cit., p. 8 3 ) tem “um papel central na epistemologia judicial, na
qual não se limita a operar como regra de juízo, senão como verdadeiro eixo do sistema”.
46 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
81. Nesse sentido: BECCAR1A, Cesare. Dos delitos e das penas. Trad. José de Faria Costa.
4. ed. Lisboa: Fundação Calousc Gulbenkian, 2014. p. 44: MALATESTA. Nicola Fra-
marino dei. La lógica dclle prove in criminate. 3. ed. Torino: Utet, 1912. v. I. p. 126;
ILLUMINATI, La presunzione d’innocenza dell’imputato, cit., p. 82; DOM1NIONT, Oreste.
La presunzione d’innocenza. Le parti nel processo pcnale. Milano: Giuffrè, 1985. p. 220;
GIULIANI, Alessandro. Prova. (Filosofia del diritto). Enciclopédia del diritto. Milano:
Giuffrè, 1988. v. XXXVII. p. 525.
82. PIMENTA BUENO, José Antônio. Apontamentos sobre o processo criminal brasileiro. Ed.
atualizada porjosé Frederico Marques. São Paulo: Ed. RT, 1959. n. 239. p. 431.
83. Há razões endoprocessuais para o predomínio de condenações sobre as absolvições no
processo penal. Primeiro há uma investigação estatal previa dos fatos, realizada pela
polícia judiciária ou pelo Ministério Público. Além disso, a investigação tende a ser
temporalmente próxima da ocorrência dos fatos, o que facilita a obtenção de fontes de
prova e evita a dispersão ou perda de elementos, seja pelo esquecimento, em relação
a fontes pessoais, seja pela perda, destruição ou modificação natural, em se tratando
de fontes reais. Se essa investigação não fornecer um suporte probatório mínimo da
ocorrência do delito e de sua autoria, não haverá justa causa para ação penal, cabendo a
manifestação pelo arquivamento da investigação preliminar. Assim, somente se houver
fumus commissi delicti, é que a denúncia ou queixa deverá ser oferecida pelo acusador e.
depois, recebida pelo juiz. Portanto, recebida a denúncia, do ponto de vista probatório,
a imputação ja parte com um suporte probatório inicial consistente, que permita consi
derar a ocorrência do crime imputado mais provável que sua inocorrência! A instrução
servirá para robustecer as provas, que permitirão atingir um standard probatório ainda
mais elevado que, por ora, pode ser identificado, com a prova além de qualquer dúvida
razoável. Em suma, o processo penal não se inicia com base na mera asserção do autor,
mas com uma imputação já amparada em um conjunto consistente de elementos de
prova. Não poderá, pois, ser uma mera criação mental do acusador.
PROCESSO E GARANTIAS PROCESSUAIS VOLTADAS A ATIVIDADE PROBATÓRIA 47
84. MANZIN1, Vincenzo. Manuale cli procedura penale. Torino: Fratelli Bocca, 1912. p. 54.
85. MANZ1NI, Vincenzo. Trattato di diritto processuale penale italiano. 6. ed. Torino: UTET,
1967. v. 1. p. 226.
86. DOMINTONI, La presunzione dinnocenza..., cit., p. 222.
87. De modo semelhante, para Francesco Carnelutii (Prove civili e prove penali. Rivista di
Diritto Processuale Civile, 1925. p. 13) a máxima in dubio pro reo não responde a uma
exigência lógica, mas deontológica.
88. SARACENO. Pasquale. La decisione sul Jatto incerto. Padova: Cedam, 1940. p. 178.
Na doutrina italiana, llluminati (La presunzione dinnocenza delPimputato..., cit., p. 9 2)
explica que a presunção de inocência, como regra de julgamento, muito além de um
expediente técnico, "assume uma precisa conotação política”. De modo semelhante, na
doutrina portuguesa, Alessandra Vilela (Considerações acerca da presunção de inocência
em direito processual penal. Coimbra: Coimbra Ed., 2000. p. 70) lembra que “não há
qualquer fundamento lógico-jurídico para a presunção de inocência do arguido. Trata-se
tão só de um principio com fundamento político fruto de uma evolução da sociedade e
uma conquista da civilização. Princípio que se traduz no risco de se ver absolvido um
culpado, relativamente à eventualidade de se condenar um inocente".
89. Segundo llluminati (La presunzione dinnocenza delPimputato..., cit., p. 9 1) "la regola
di giudizio, in sostanza, indica di volta in volta quale sia l'inieresse sostanziale cui si
deve dar la prevalenza". No mesmo sentido: PAULESU, Pier Paolo. Presunzione di non
colpevolezza. Digesto: discipline penalistiche. 4. ed. Torino: Utet, 1995. v. IX. p. 675.
90. BADARÓ. Ônus da prova no processo penal..., cit., p. 300.
48 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
Ainda assim, ao definir como o juiz deve decidir em caso de dúvida, a garantia
da presunção de inocência é epistemológicamente neutra. Se dúvida há é porque
não foi possível obter um conhecimento verdadeiro sohre os fatos. O problema
gnoseológico já foi superado. Não se conheceu a verdade. Resta o problema ju rí
dico. E preciso decidir sempre, e para decidir, em caso dc dúvida, é necessário um
guia legal da decisão. No caso: in ditbio pro reo.
Por outro lado, para quem considera que a presunção de inocencia implica,
por si só, na adoção, no processo penal, de um standard de prova mais elevado, ou
até mesmo, o mais elevado possível, seja ele identificado como o beyond a reasonable
doubt, ou outra forma qualquer de expressá-lo, nesse caso, há urna interferencia
por razões políticas, em um tema que condiciona o atingimento da verdade.91
91. Essa relação será objeto de análise específica, no cap. 3. infra, item 3.6.2.1.
92. Para uma análise do raciocínio judicial na formação da decisão: CALAMANDREI, Piero.
La genesi lógica delia sentenza civile”. Opera Ciurídice. Napoli: Morano, 1965. v. 1. p. 1 1
e ss.
93. FOSCHINI, Gaetano. Sistema de! diritto pivcessuale penale. 2. ed. Milano: Giuffrè, 1968.
v. II. p. 539.
94. TARUFFO, Michele. La motivazione delia sentenza civile. Padova: Cedam. 1975. p. 421.
Para Magalhães Gomes Filho (A motivação das decisões penais..., cit., p. 242) trata-se de
um "discurso justificativo".
PROCESSO E GARANTIAS PROCESSUAIS VOLTADAS À ATIVIDADE PROBATÓRIA 49
95. Nesse sentido: CRUZ E TUCCI. José Rogério. A motivação da sentença no processo civil.
São Paulo: Saraiva, 1987. p. 18-21. com ampla análise doutrinária.
96. TARUFFO La motivazione delia sentenza civilc.... cit.. p. 467. A este esquema Ada Pcl-
legrini Grinover, Antonio Magalhães Gomes Filho e Antonio Scarance Fernandes (As
nulidades no processo penal, cit., p. 201) acrescentam “consideração atenta dos argumentos
e provas trazidas aos autos".
97. Nesse sentido: AMODIO. Motivazione delia sentenza..., cit., p. 188: MARCHEIS, Chiara
Besso. La sentenza civilc inesistente. Torino: G. Giappichelli, 1996. p. 265.
98. BELLAV1STA, Girolamo. Contributo alio sludio delia patologia delia motivazione delia
sentenza penale. Sítidi sul processo penale. Milano: Giuffrè, 1976. v. IV. p. 164.
99. Essa tendência é encontrada em várias constituições modernas, que preveem a garantia
da motivação no capítulo do Poder Judiciário. A Constituição italiana dc 1947, em seu
art. 111, § 1°, estabelece que “tutti i provvedimemi giurisdizionale devono essere moti-
vati". A Constituição portuguesa de 1974, no art. 205, § 1°. determina que 'as decisões
dos tribunais que não sejam de mero expediente serão fundamentadas na forma prevista
na lei ". A Constituição espanhola de 1978 prevê, no art. 120, § 3o, que “las sentencias
serán siempre motivadas".
100. Nesse sentido: COMOGLIO, Luigi Paolo. Ri forme processuali e poteri dei giudice.
Torino: G. Giappichelli, 1996. p. 124: SAMMARCO, Método probatorio e modelli di
ragionamento..., cit., p. 14.
50 EPISTEMOLOGÍA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
que poderão rever o julgado.101102É por meio da motivação que a população em geral
poderá controlar a legalidade da decisão, a imparcialidade do juiz, enfim, a justiça
do julgam ento.lo: Em suma, é a motivação uma garantia de controle democrático
sobre a administração da justiça.103
Além disso, em tempos de comunicações instantâneas em redes sociais e de
facilidade de acesso às decisões de tribunais por meio da rede mundial de compu
tadores, mormente nos últimos tempos, em que o processo penal se tornou objeto
de grande interesse dos cidadãos, mesmo que leigos, não é pouco realístico pen
sar que esse controle será efetivamente exercido. Mas, ainda que isso não venha
a ocorrer de fato, como lembra Taruffo, a respeito da finalidade extraprocessual
da motivação, é essencial que esse controle ''possa” ser exercido, devendo o juiz
se comportar sempre “como se” estivesse dando satisfação diretamente à opinião
pública das razões de sua decisão, pois exatamente nisso reside a função essencial
da garantia da motivação.104É evidente que isso não significa que o juiz deve decidir
para satisfazer ou atender a opinião pública. Muitas vezes, por exemplo, uma Corte
Constitucional necessita ser contramajoritária, paragarantirosdireitos fundamen
tais das minorias, mas essa justificação precisa ser passada para a opinião pública.
A motivação é uma garantia do processo e um potente instrumento de controle
da valoração da prova. A necessidade de motivar exige que o juiz adote critérios
racionais de valoração, pois desse modo a justificação dc suas escolhas poderá ser
explicada de maneira acessível a todos. De outro lado, se não se exige a motivação
do juízo dc fato, como no caso do tribunal do júri, o único modo de assegurar nor
mativamente que não sejam tomadas decisões com base em provas pouco ou nada
confiáveis, é determinando a sua exclusão do processo.105Em tal caso, poderá haver
106. Sobre os limites lógicos de admissão da prova, cf., infra. cap. 3, item 3 .4 .1.1.
107. Essa relação será objeto de análise especifica, infra, no cap. 3, item 3.7.
108. MAGALHÃES GOMES FILHO, A motivação cias decisões penais..., cil., p. 45.
109. SPANGHER, Giorgio. II doppio grado di giurisdizione. In: D1NACCI, Filippo Fraffaelc
(Coord.). Processo penale e Costituzione. Milano: Giuffrè, 2010. p. 495.
110. Nesse sentido: SPANGHER, II doppio grado di giurisdizione..., cit.. p. 4 9 5 ; ARAN-
GUENA FANEGO, Coral. La doble instancia en el proceso penal. Criminalia, n. 65,
jan.-abr. 1999. p. 279.
52 EPISTEMOLOGIA JUDICIARIA E PROVA PENAL
111. BARBOSA MOREIRA, José Carlos. O juízo de admissibilidade no sistema dos recursos
cíveis. Rio de Janeiro: Borsoi, 1968. p. 10.
112. Tomando em conta as regras constitucionais e processuais penais brasileiras, defi
nimos recurso como “meio voluntário de impugnação das decisões judiciais, utilizado
antes do trânsito em julgado e no próprio processo em que foi proferida a decisão,
visando â reforma, invalidação, esclarecimento ou integração da decisão judicial" (BA-
DARÓ, Gustavo Henrique. Manual dos recursos penais. 3. ed. São Paulo: Ed. RT, 2018.
p. 34). No processo penal, para Ada Pellegrini Grinover. Antonio Magalhães Gomes
Filho e Antonio Scarance Fernandes (Recursos no processo penal. 7. ed. São Paulo: Ed.
RT, 2011. p. 29), recurso é "o meio voluntário de impugnação de decisões, utilizado
antes da preclusão e na mesma relação jurídica processual, apto a propiciar a reforma,
invalidação, o esclarecimento ou a integração da decisão". De modo semelhante, no
processo civil. José Carlos Barbosa Moreira (Comentários ao Código de Processo Civil.
16. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2011. v. 5. p. 233) conceitua recurso, no
direito processual civil brasileiro, “como o remédio voluntário idôneo a ensejar, dentro
do mesmo processo, a reforma, invalidação, o esclarecimento ou a integração de decisões
judiciais que se impugna”.
113. O segundo aspecto do direito ao recurso que não será aprofundado na obra, diz
respeito âs situações de foro por prerrogativa de função e sua compatibilidade com o direito
ao recurso assegurado pelo art. 8 .2 .h da CADH. De qualquer forma, é importante ob
servar que, no Caso Barreto Leiva vs. Venezuela, julgado em 17 de novembro de 2009,
analisando o direito ao recurso do acusado condenado pela mais alta corte do Pais, a
Corte Interamericana de Direitos Humanos, considerou que o foro por prerrogativa de
função, perante o mais alto tribunal do pais. não é, em si, incompatível com o art. 8 .2 .h
da CADH, devendo a legislação interna estabelecer a possibilidade dc o acusado apelar
do julgamento condcnatorio. E a Corte exemplificou, dizendo que, para tanto o procedi
mento poderia ser conduzido, em primeira instância, pelo presidente ou por uma turma
do tribunal superior, sendo assegurado um recurso de apelação para o tribunal pleno,
excluindo-se dc tal julgamento os juízes que já tivessem proferido decisão no mesmo
caso. Como lais situações não se verificaram, a Corte entendeu que houve violação
PROCESSO E GARANTIAS PROCESSUAIS VOLTADAS A ATIVIDADE PROBATÓRIA 53
assegura que “ioda pessoa declarada culpada por um delito lerá direito de recorrer
cia sentença condenatória e da pena a uma instânc ia superior, cm conformidade com
a lei”. Regime diverso era adotado no sistema europeu de direitos humanos. A
Convenção Europeia de Direitos Humanos, de 1950. estabeleceu várias garantias
processuais, que serviram de modelo para os tratados posteriores. O art. 6o da
CEDH, considerado a síntese dos “cânones europeus do justo processo penal ’,11''
não assegurou explicitamente a garantia do acusado de recorrer da sentença con
denatória. Posteriormente, o Protocolo VII à referida Convenção, de 1984, em seu
art. 2.1, assegurou o “direito a um duplo grau de jurisdição em matéria penal”, nos
seguintes termos:
“ 1. Qualquer pessoa declarada culpada de uma infração penal por um Tribunal
tem o direito de fazer examinar por uma jurisdição superior a declaração de cul
pabilidade ou a condenação. O exercício deste direito, bem como os fundamentos
pelos quais ele pode ser exercido, são regulados pela lei.”115
Sobre o conteúdo ou as características do recurso assegurado pela CADH,
no caso de sentença condenatória, é necessário que se trate de um meio amplo de
impugnação da sentença, que admita revisão de seu conteúdo tanto sobre questões
de direito, quanto sobre questões de fato , isto é, admitindo uma nova valoração da
prova por parte do tribunal.116
ao direito ao recurso, previsto no art. 8.2.h da CADH (CoIDH, Caso Barreto Leiva vs.
Venezuela, Mérito. Reparações e Custas, sentença de L7.11.2009, Série C, 2006, §§ 9 0
9 1 ). O tema voltou a ser analisado no Caso Liakat Ali Alibux vs. Suriname, julgado pela
Corte Interamericana em 3 0 .0 1 .2 0 1 4 . Ao interpretar o conceito de “tribunal superior",
do art. 8.2.h da CADH, a Corte considerou que a superioridade do tribunal exigida no
dispositivo da CADH é satisfeita quando o plenário ou uma câmara dentro do mesmo
tribunal, mas com composição diversa, julga o recurso, possuindo competência para
revogar ou reformar a decisão condenatória (CoIDH, Caso Liakat Ali Alibux vs. Suri
name, Objeções Preliminares, Mérito, Reparações e Custos julgamento em 3 0 .0 1 .2 0 14.
Série C, 276, § 105).
114. PISAN1, Mario. Nozioni gcncrali. In: P1SANI, Mario et al. Mcmualc di Procedura
Penale. 8 ed. Bologna: Monduzzi Ed., 2008. p. 19.
115. O item 2.2 prevê que: “Este direito pode ser objeto de exceções em relação a infra
ções menores, definidas nos termos da lei, ou quando o interessado tenha sido julgado
em primeira instância pela mais alta jurisdição ou declarado culpado c condenado no
seguimento de recurso contra a sua absolvição”. Sobre o reflexo de tal exceção, entre nós,
a Corte Interamericana já decidiu que as exceções do art. 2.2 do Protocolo VII à CEDH,
não servem para interpretar o art. 8.2.h, da CADH, que diferentemente do que ocorre
no sistema europeu, não prevê exceções à garantia do direito ao recurso: CoIDH, Caso
Mohamed vs. Argentina, Objeções Preliminares, Mérito, Reparações c Custas, julgado
em 23 .1 1 .2 0 1 2 , Série C, n. 255. § 9 4 ; CoIDH, Caso Liakat Ali Alibux vs. Suriname,
Objeções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas, julgamento em 3 0 .01.2014, Série
C, n. 276; § 96.
116. Nesse sentido é a posição do TEDH, em relação ao art. 2 ” do Protocolo Adicional VII
à CEDH, e ao art. 14.5 do P1DCP: Caso Le Compt, Van Leuve e De Meyere vs. Bélgica,
54 EPISTEMOLOGIA JUDICIARIA E PROVA PENAL
de tal premissa, nem a melhor solução para resolvê-lo. O objetivo do trabalho é restrito
ao juízo de valoração da prova realizado na sentença. Para uma análise de tais ques
tões: BADARÓ, Manual dos recursos pena is..., c i l . p. 65 e ss.; VASCONCELOS, Vinicius
Gomes de. Direito ao recurso no processo penal: conteúdo e dinâmica procedimental de
um modelo de limitação do poder punitivo estatal pelo controle efetivo da sentença
condcnalória. Tese (Doutorado) - Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo,
São Paulo, 2017. p. 242 e ss.
120. Os três argumentos favoráveis ao duplo grau de jurisdição foram expostos em: BA
DARÓ, Manual dos recursos penais..., cil., p. 44-45.
121. CARNELUTTI, Francesco. Lezioni sul processo penale. Roma: Ateneo, 1949. v. IV.
p. 102.
122. BERMUDES, Sérgio. Comentários ao Código de Processo Civil. São Paulo: Ed. RT, 1075.
v. 7. p. 10. Na doutrina italiana, esse argumento já era utilizado por: BELLAV1T1S, Mario.
Sui limiti dei concetto di doppio grado di giurisdizione. Rivislci di Diritlo Processuale
Civile. II. 1931. p. 3.
123. Ou. como diz Barbosa Moreira (Comentários ao Código de Processo Civil..., cit., v. V,
p. 236): “o juízo ad quem beneficia-se da presença, nos autos, de material já trabalhado,
já submetido ao crivo do primeiro julgamento, e ao da crítica formulada pelas próprias
partes, ao arrazoarem, num sentido e noutro, o recurso".
56 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
decisão colegiada, o equívoco individual será, apenas, um voto errado, que poderá
ser superado por uma posição correta dos demais julgadores.124A colegialidadc das
decisões, afirma Pontes de Miranda, assegura diversos exames ao mesmo tempo,
“que se transforma em superioridade sempre que desejamos maior certeza".125
Do ponto de vista psicológico, de quem profere a decisão recorrida, é razoável
também acreditar que, quando alguém sabe que sua decisão poderá ser revista,
submetida a um escrutínio de outrem, tende a ser mais cuidadoso e usar métodos e
critérios que não sejam eminentemente subjetivos, mas, ao contrario, comumente
aceitos pela generalidade das pessoas. Em outras palavras, o duplo grau de juris
dição colabora para que a decisão seja tomada com base em métodos racionais de
valoraçào da prova, pois esses poderão mais facilmente ser expostos e entendidos
na fundamentação, como justificação da decisão tomada e ,126 posteriormente,
ser compreendidos e acolhidos como corretos pelo órgão revisor que poderá ser
chamado a vir atuar.
Em suma, sendo o recurso um mecanismo importante do ponto de vista
heurístico, os valores que inspiram um modelo de epistemología judiciária, tendo
na obtenção da verdade um fim institucional do processo, aconselham que possa
ser utilizado por ambas as partes. Em outras palavras, o duplo grau de jurisdição
deve ser assegurado para defesa e para acusação, pois havendo tanto condenações
injustas, quanto absolvições equivocadas, ambas poderão ser corrigidas.
Porém, do ponto de vista das garantias processuais, a questão não é tão simples
assim. Há forte debate sobre quem é o titular do direito ao recurso reconhecido
pelos tratados e convenções de direitos humanos. O direito ao recurso é exclusivo
do acusado? Ou a acusação também desfruta da garantia processual de recorrer da
sentença de mérito que lhe for desfavorável?
As garantias dos tratados de direitos humanos não são declarações de direitos
em favor do Estado, no caso, representado pelo órgão acusador oficial, mas escudos
de proteção do indivíduo, isto é, o acusado, que por ocupara posição mais fraca no
processo, necessita dc garantias minimas.127 Como explica Chiavario, no processo
124. O juízo de muitos, diz Inocêncio Borges da Rosa (Comentários ao Código dc Processo
Penal. 3. cd. São Paulo: Ed. RT, 1982. p. 6 9 6 ), “traz consigo bem fundada presunção de
superioridade sobre o de um só .”
125. PONTES DE MIRANDA. Comentários ao Código de Processo Civil Rio de Janeiro:
Forense, 1975, t. VII, p. 11. De modo semelhante, e somando os dois últimos aspectos.
Tuzet (Filosofia delia provagiurídica..., cit., p. 15) afirma que o contraditório e a colegia-
lidade são instrumentos legais de controle do critério da “certeza" obtida no processo.
126. Sobre a relação entre a fundamentação e a adoção prévia de critérios racionais de
valoração da prova, cf., infra. cap. 3. item 3.8.
127. Como explica Julio Maier (Derecho proccsal penal..., cit., I. I, p. 7 1 1 ), no art. 8.2.h.
a CADH “não se propõe - nem se pode propor - defender’ o Estado, mas sim, ao
PROCESSO E GARANTIAS PROCESSUAIS VOLTADAS À ATIVIDADE PROBATÓRIA 57
contrário, conceder uma garantia a quem sofre a coação estatal. A Convenção se refere,
precisamente, às garantias processuais frente ã ação e á força aplicada pelo Estado". No
mesmo sentido: VASCONCELOS, Vinícius Gomes. Duplo grau de jurisdição na Justiça
Criminal: o direito ao recurso como possibilidade de questionamento da motivação
da sentença condenatoria. In: GlACOMOLLI: Nereu José; VASCONCELOS, Vinicius
Gomes de (Org.). Processo penal e garantias constitucionais: estudos para um processo
penal democrático. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2015. p. 229-230.
128. CHIAVARIO. Processo e garanzie delia persona..., cit., v. 11, p. 177. E. diante disso,
admite o que denomina um “sistema extremo", no qual o acusado não tivesse contra
si recurso que pudesse prejudicá-lo, mas sendo assegurado o direito à impugnação que
lhe favorecesse.
129. Na CADH, o art. 8 .4 estabelece que “O acusado absolvido por sentença transitada
em julgado não poderá ser submetido a novo processo pelos mesmos fatos".
130. MAIER. Derecho procesal penal..., cit.. t. I. p. 599, c p. 717.
58 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
131. Há duas vertentes sobre o direito ao processo em prazo razoável. A primeira, que
importa por sua ligação forte com o tema da epistemòlogia judiciária, é o direito a um
processo penal ou de qualquer outra natureza (civil, trabalhista...), em prazo razoável
ou sem dilações indevidas. A segunda questão, de extrema relevância em lermos de
restrição de direitos fundamentais, mas que não será analisada por não ter grande in
fluência sobre o tema desta obra, é o direito ao desencarceramento do acusado preso
cautelarmente, caso não seja julgado em um tempo razoável ou sem dilações indevidas.
Sobre esse segundo aspecto, cf. LOPES JR.. Aury; BADARÓ, Gustavo Henrique. Direito
cw processo pena! no prazo razoável. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 39 e ss.
132. A Declaração Universal dos Direitos Humanos nada estabeleceu quanto à duração
do processo. O Pacto Internacional sobre Direitos Civis c Políticos, também garante, no
art. 14.3.c, que: “Toda pessoa acusada de um delito terá direito, em plena igualdade a,
pelo menos às seguintes garantias: [...1 a ser julgada sem dilações indevidas". No âmbito
regional. Convenção Europeia de Direitos Humanos estabelece, no art. 6.1. que: "Toda
pessoa tem o direito a que sua causa seja ouvida com justiça, publicamente, e dentro
de um prazo razoável por um Tribunal independente e imparcial estabelecido pela Lei,
que decidirá sobre os litígios sobre seus direitos c obrigações de caráter civil ou sobre o
fundamento de qualquer acusação em matéria penal dirigida contra ela". A Convenção
Americana sobre Direitos Humanos, também garante, no art. 8.1, que “Toda pessoa tem
direito a ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz
ou tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na
apuração de qualquer acusação penal formulada contra ela, ou para que se determinem
seus direitos ou obrigações de natureza civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer outra
natureza".
133. Nesse sentido: CRUZ E TUCCI. José Rogério. Garantia..., cit., p. 106-107; CASTRO,
Carlos Roberto de Siqueira de. O devido processo legal e a razoabilidade das leis na nova
Constituição do Brasil. Rio dejaneiro: Forense, 1989. p. 278. Já para Rogério Lauria Tucci
(Direitos egarantias individuais no processo penal brasileiro. 4. ed. São Paulo: Ed. RT, 2 0 1 1.
PROCESSO E GARANTIAS PROCESSUAIS VOLTADAS Â ATIVIDADE, PROBATORIA 59
137. Nesse sentido: CH1AVARIO, Processo e Garanzie delia persona..., cit., v. II, p. 258;
VIAGAS BARTOLOME, Plácido Fernandes. El derecho a un proceso sin dilaciones inde
bidas. Madrid: Civilas, 1994. p. 73.
138. CHIAVARIO, Processo e garanzie della persona..., cit., v. II, p. 259.
139. CONSO, Giovanni. II processo penale, Tempo e giustizia. Padova: Cedam. 1967.
p. 72.
140. LEONE, Mauro. El tempo ncl diritlo penale sostantivo e processuale. Napoli: Jovene,
1974. p. 296.
141. Por exemplo, a CADH, que no art. 8.1 assegura o julgamento no prazo razoável, por
outro lado, no art. 8 .2.c assegura que: “durante o processo, toda pessoa tem direito, em
plena igualdade, ás seguintes garantias mínimas [...] concessão ao acusado de tempo e
dos meios adequados para preparação de sua defesa”.
142. LOPES JR .; BADARÓ, Direito ao processo penal em prazo razoável..., cit., p. 65.
PROCESSO E GARANTIAS PROCESSUAIS VOLTADAS À ATIVIDADE PROBATORIA 61
143. V1EGAS BARTOLOME, El derecho a un proccso sin dilaciones indebidas..., cit., p. 78.
144. Para rem ediar esse problem a os ordenam entos jurídicos costum am prever um
incidente para a produção antecipada dc prova. No caso brasileiro, o art. 223 do CPP
admite a produção antecipada de prova se “testemunha houver de ausentar-se, ou, por
enfermidade ou por velhice, inspirar receio dc que ao lempo da instrução criminal já
não exista". Essa prova, inclusive, nos termos do art. 155, caput, parte final, poderá ser
valorada pelo juiz, sem a necessidade de prova de corroboração, para a formação dc seu
convencimento. Para uma compatibilizaçâo dc tal dispositivo, com a garaniia do direito
ao confronto, cf. BADARÓ, Gustavo Henrique. Valor probatório do inquérito policial.
In: AMBOS. Kai; MALAR1NO, Ezequiel; VASCONCELOS, Enéas Romero de (Coord ).
Policia e investigação no Brasil. Brasília: Gazeta Jurídica/Cedpal, 2016. p. 276-278.
145. Nesse sistem a, contudo, a justiça baseada em um acertam ento que permita um
conhecimento da verdade factual nem sempre é um objetivo.
146. MUSCATIELLO, Vincenzo Bruno. 11 processo senza verità. In: GAROFOL1. Vincenzo;
1NCAMPO, Antonio. Verità c processo penalc. Milano: Giuffrè, 2012. p. 93.
62 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PRO VA PENAL
consensual" a imposição da pena não é fruto de uma prévia verificação dos fatos,
mas de um acordo. Ao se conceber o processo essencialmente como um instru
mento de resolução de conflitos que assumam a forma de controvérsia jurídica
entre as partes, a finalidade da descoberta da verdade torna-se desnecessária.147 Se
a finalidade primária do processo é a solução do conflito entre as partes, a verdade
dos fatos não é uma condição necessária ou indispensável.148 A boa solução pode
ser até mesmo uma decisão baseada em premissas fálicas falsas, desde que ela seja
capaz de eliminar o conflito.149
Em suma, desde que se aceite a premissa de que a verdade é uma condição
necessária para a decisão justa, e que ela deve estar fundada cm provas, a garantia
do processo em prazo razoável protege a verdade.150 Assegurando uma razoável
duração do processo e tempo para obtenção do conhecimento verdadeiro, impe
de-se, que sob a justificativa da necessidade de soluções imediatistas e de urgência,
se aceitem decisões sem uma adequada e correta reconstrução dos fatos.
A busca por uma verdade real, uma “verdade verdadeira” como fim último do
processo, sempre serviu de justificativa para que o juiz, nos processos inquisitórios,
tivesse cada vez mais poderes, não estando limitado à iniciativa das partes quer
quanto aos fatos alegados, quer quanto às provas requeridas e produzidas.
A questão que se pretende analisar é se o processo acusatório é um processo
que também tem como fim institucional a busca da verdade e, em caso de resposta
positiva, se a verdade que se almeja no processo acusatório é diversa ou não daquela
buscada no processo inquisitório.
147. Nesse sentido: 1ACOVIELLO. Prova e accertam ento dei fatto nel processo penalc
riformato daila Corte Costituzionale..., cit.. p. 2029; LOMBARDO, Luigi Giovanni.
Ricerca delia verità e nuovo processo penalc. Cassazione Penale, 1993. p. 751. Mais
enlático, Taruffo (Os poderes instrulórios das partes e do juiz..., cit., p. 74) afirma que
“Um processo direcionado à maximização do escopo da resolução dos conflitos não
pode [...] aspirar ao mesmo tempo concomitantemente à maximização da exatidão da
verificação dos fatos".
148. TARUFFO. Michele. Note per una riforma dei diritto delle prove. Rivista cli Diritto
Processuale. Milano: Giuffrè, 1986. p. 242.
149. TARUFFO, La prova dei fa n i giuridici.... cit., p. 18. Mais enfático, para Ferrajoli
(Patteggiamento e crisi delia giurisdizione. Questione Giustizia. 1989. p. 3 8 2 ) o processo
penal consensual tem como resultado "a incerteza e a substancial extra-legalidade do
direito penal".
150. Sob outra ótica, para Gascón Abellán (Los hechos en el derecho..., cit., p. 1 3 2 -1 3 3 ),
não a garantia da razoável duração do processo em si, mas e existência de uma limi
tação temporal para que seja proferida uma decisão seria um exemplo de garantia não
epistemológica.
PROCESSO E GARANTIAS PROCESSUAIS VOLTADAS À ATIVIDADE PROBATÓRIA 63
Accusa e sistema accusatorio. Enciclopedia del diritto. Milano: Giuffrè, 1958, v. I. p. 337:
1LLUM1NATI, Giulio. Accusatorio ed inquisitorio (sistema). Enciclopedia Giuridica
Treccani. Roma: Treccani, 1988. v. 1. p. 2; AMODIO, Ennio. O modelo acusatório no
novo Código de Processo Penal italiano. Trad. Ana Cristina Boncristiano. Revista dc
Processo, n. 59, jul.-set. 1990, p. 140; NAPP1. Cuida al codici di procedura pénale, cit
p. 10; BASS1, Alessandra. Al t. 468 c.p.p.: le parti e la disponibililá dei diritto all inizia-
tiva probatoria. Cassazione Pénale, 1993. p. 4 6 1 , nota 3; PEI R1LLO, Luigi. Funzioni e
limiti dell’esercizio del polere istruttorio integrativo del giudice dei dibattimenlo. Rivisia
Italiana di Diritto e Procedura Pénale, 1992, p. 1210; SCELLA. Andrea. 1 residuali poteri
di iniziativa probatoria del giudice dibattimentale. Rivista Italiana di Diritto e Procedura
Penale, 1992. p. 1215. Igual entendimento é compartilhado pela doutrina processual
penal portugueses, como se verifica em: FIGUEIREDO DIAS, Direito processual penal...,
cit., v. 1, p. 192; PIMENTA. José da Costa. Introdução ao processo penal. Coimbra: Alme-
dina, 1989. p. 561. Na doutrina nacional, cf. GR1NOVER, Ada Pellegrini. A iniciativa
probatória do juiz no processo penal acusatório. A marcha no processo. Rio de Janeiro:
Forense, 2000. p. 82; Idem. A defesa penal e sua relação com a atividade probatória. A
vítima e o princípio de oportunidade. Relações entre juiz e Ministério Público - Seus
limites. Revista Brasileira de Ciências Criminais, n. 40, out.-dez. 2002. p. 98; SCARANCE
FERNANDES, A reação defensiva ú imputação..., cit., p. 20; BARBOSA MOREIRA, José
Carlos. Breves observaciones sobre algunas tendencias contemporáneas del proceso
penal. Temas de direito processual: sétima série. São Paulo: Saraiva. 2001. p. 220.
157. Para Giulio Illuminati (La presunzione d’innocenza dell’imputato. Bologna: Zanichelli.
1979. p. 78) o processo inquisitório é ‘reduzido a um lúgubre ritual para justificar, diante
da coletividade, uma conclusão obrigatória". Observa, ainda (Giudizio. In: CONSO;
Giovanni; GREV1, Vittorio (Org.). Profili del nuovo Códice di Procedura Penale. 4. ed.
Padova: Cedam, 1996. p. 553) que “o juiz envolvido na construção da hipótese acusa
tória a ser verificada, assim como na busca de provas que a sustentem, tem fatalmente
prejudicada a objetividade de julgamento necessária para a valoração final”.
158. CA1.AMANDRE1. Picro. II giudice e lo storico. Rivista di Diritto Processuale Chile, 1939.
p. 110. No mesmo sentido: UBERTIS, Príncipi di procedura penale europea..., cit., p. 66.
66 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
nacional: MARQUES, José Frederico. Elementos de direito processual penal. 2. ed. Rio de
Janeiro: Forense, 1965. v. II. p. 237: JARDIM. Afrânio Silva. A imputação alternativa no
processo penal. Direito processual penal. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 148:
SCARANCE FERNANDES. Antonio. A reação defensiva à imputação. São Paulo: Ed. RT.
2002. p. 154.
173. Nesse sentido: CARNELUTT1, Lezioni sul processo penale.... d l., v. IV, p. 10: SANSÒ,
La correlazione Jra imputazione conteslata e sentenza..., cit.. p. 305.
174. SANSÒ, La correlazione Jra imputazione contestata e sentenza..., cit., p. 264.
70 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
175. PASTORE. DeCisioni, argomenti, controlli..., c it.. p. 98. De modo semelhante, para
Perfecto Ibãnez, ( ‘Carpintaria" da sentença pena! (em matéria de fato)..., cit., p. 128)
entre quaestio facti e quaestio iuris “medeia uma conexão estrutural". E, portanto, nas
palavras de Ttizei (Filosofia delia prova giuridica... cit., p. 21) é “artificial e. de qualquer
modo estéril, pensar na norma e nos fatos do caso corno entidades separadas". Ou,
segundo Ubertis (Pmfili di Epistemologia Giudiziaria.... cit., p. 71), ambas questões são
componentes de uma “coppia inscindibilc”.
176. Nesse sentido: BETTIOL, Giuseppc. La correlazione frei accusa e sentenza nel processo
penale. Milano: Giuffrè, 1936: ou Sçritti giurídici. Padova: Cedam, 1966. t. 1. p. 260;
SANSÒ, La correlazione fra imputazione contestata e sentenza. .. cit.. p. 132.
177. Nesse sentido: BETTIOL. La correlazione. cit.. p. 2 4 7 ; BEL1NG, Ernest. Derecho
procesal penal. Trad. Miguel Fenech. Barcelona: Labor, 1943. p. 8;TARUFFO, Michcle.
Funzione delia prova: la funzione dimostrativa. Sui conjini: scritti sulla giustizia civile.
Bologna: 11 Mulino, 2002. p. 308. De modo semelhante, Ibãnez (Sobre a motivação dos
fatos na sentença penal, cit., p. 96) se refere à “formulação de uma hipótese acusatória".
178. Caetano Foschini (.Sistema dei diritto processuale penale. 2. ed. Milano: Giulfrè, 1965.
v. I. p. 40-4 1 ) indica entre as características do processo a ipoteticitá e a concretezza:
“Como o processo é um julgamento, ou seja, a resolução de uma dúvida, consequente
mente, o caso em questão deve ser um quid incertum. Esse caráter de incerteza, isto é,
de hipotcticidade, é essencial para o caso processual”.
179. TARUFEO, Elemenii per unanalisi dei giudizio di fatto, cit., p. 239.
180. TARUFEO, La prova deifatti giuridice..., cit.. p. 9 1 ; ldem. Elementi per un’analisi
dei giudizio di fatto. Sui confini: scrilti sulla giustizia civile. Bologna: 11 Mulino, 2002.
p. 235.
PROCESSO E GARANTIAS PROCESSUAIS VOLTADAS À ATIVIDADE PROBATORIA /
valorações.181 Aquilo que existe na realidade não pode ser verdadeiro ou falso;
simplesmente existe.182Verdadeiros ou falsos só podem ser nossos conhecimentos,
nossas percepções, nossas opiniões, nossos conceitos ou nossos juízos a respeito
de um objeto.183Os “fatos” debat idos no processo são enunciados sobre os fatos do
mundo real, isto é, aquilo que se diz em torno de um fato: é a enunciação de um fato
e não o próprio fato.184 Em consequência, o objeto da prova não é o próprio falo,14'
mas a alegação cie um fa to e não o fato em si mesmo.I8<1Os fatos não são verdadeiros
ou falsos, eles simplesmente existiram ou não. O que se prova são as alegações dos
fatos feitas pelas partes como fundamentos da acusação e da defesa. O que pode
ser verdadeiro ou falso, verídico ou inverídico, ou “probo”, são as alegações sobre
o fato, sustentadas por provas.187
181. Como observa Ubertis (Prova (in generale). Digesto delle Discipline Penalistichc....
cit.. v. X. p. 301; Idem. La ricerca.... cil., p. 10: Idem. Lu prova penale. Profili giuridici ecl
cpistemologici. Torino: LTET, 1999, p. 8-9; Idem. Profili di Epistemología Giudiziaria...,
cil., p. 14) “não existem 'fatos verdadeiros’ ou fatos falsos’: um fato 'é' o ‘não é ; somente
a sua enunciação pode ser ‘verdadeira’ ou ‘falsa’. Característica de um falo que se alirma
acontecido no passado pode ser a sua existência, mas não a sua verdade . No mesmo
sentido: CARNELUTT1, Francesco. Nuove riflessione sul giudizio giuridico. Rivista di
Diritto Processiuile, 1936. p. 101; TARUFFO, La prova deifatti giuridice..., cit.. p. 91;
DINAMARCO. Cândido Rangel. A instnmentalidade do processo. 11. ed. São Paulo:
Malheiros, 2003. p. 298. nota 68; Idem. Instituições de direito processual d\ i!. 6. ed. São
Paulo: Malheiros, 2009. v. III. p. 57.
182. Como observa Francesco Mauro Iacoviello (La motivazione delia sentenza penale e
¡1 suo contrallo in Cassazione. Milano: Giuffrè, 1997. p. 3 3) “os fatos são reais ou ima
ginários, mas não verdadeiros ou falsos".
183. BAZARIAN, Jacob. O problema da verdade: teoria do conhecimento. 4. ed. São Paulo:
Alfa-Omega, 1994. p. 133.
184. Nesse sentido: TARUFFO, Michele. La prova dei fatti giuridici. Milano: Giuffrè. 1992.
p. 92; Idem. Processo civil comparado..., cit., p. 38; UBERTIS, Giulio. Prove (in generale).
Digesto delle Discipline Penalistichc.... cit., v. X. p. 301; Idem. La ricerca delia venta giu-
diziale. In: UBERTIS, Giulio (Org.). La conoscenza dei fato ncl processo pénale. Milano:
Giuffrè, 1992. p. 9: Idem. Profili di Epistemología Giudiziaria..., cit., p. 14-13; ANDRES
1BAÑEZ, Perfecto. Sobre a motivação dos falos na sentença penal..., cit., p. 70: Idem. A
argumentação probatoria e sua expressão na sentença, cit., p. 37; GASCÓN ABELLÁN,
La valoración de la prueba..., cit., p. 378.
185. Como esclarece Francesco Carnelutli (La prova civilc. 2. cd. Roma: Edizioni Dcll’Ate-
neo, 1947. p. 50). “objeto da prova não são os fatos, titas as afirmações”.
186. Nesse sentido: SENTÍS MELENDO, Santiago. La prueba: los grandes lemas del de
recho probatorio. Buenos Aires: Ejea, 1978. p. 38; UBERTIS, Giulio. La prova penale:
profili giuridici ed epistemología. Torino: UTET, 1999. p. 12; Idem, Prova (in generale).
Digesto detic Discipline Penalistichc..., cit., v. X, p. 301; Idem, La ricerca della veritá giu-
diziale..., cit., p. 9; DINAMARCO, A instrumentalidade do processo..., cit., p. 298. nota
68; CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini: DINAMARCO,
Cándido Rangel. Teoria geral do processo. 15. cd. São Paulo: Malheiros, 1999. p. 349.
187. Nesse sentido: MENDES, Jo ão de Castro. Do conceito de prova em processo civil.
Lisboa: Atica. 1961. p. 48; SENTIS VIELENDO, La prueba.... cit.. p. 38; TARUFFO, La
72 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PRON A PENAL
Como bem explica Taruffo, ‘no processo os fatos entram sob a forma de
enunciados ou de conjunto de enunciados que descrevem as circunstâncias que foram
verificada" e, consequentemetente, “não há, pois, m o que fazer com acontecimentos
empíricos ou eventos historicamente verificados na realidade material, mas sim
com produtos linguísticos que concernem a esses eventos" l!íh
Em suma, e para os fins de delimitação do objeto da prova quanto ao juízo de
fato, é possível extrair duas conclusões, a seguir enunciadas.
A primeira: o fato que importa ao processo penal é um fato concreto, e não um
tipo penal, uma abstração. Mas esse fato concreto ou acontecimento será recortado
da realidade a partir de sua repercussão considerando um específico tipo penal e seus
elementos. Seu ingresso no processo penal se dará por meio da imputação penal.
A segunda: o fato que integra o objeto do processo não é o fato em si, mas
uma afirmação sobre os fatos. O que será provado como verdadeiro ou falso é a
afirmação do fato e não o fato em si.
prova de fatli giuridici..., cit., p. 9 5 ; FERRUA, Paolo . I poteri probatori dei giudice
dibauimentale: ragipnevolezza delle Sezioni unite e dogmatismo delia Corte costiiu-
zionalc. Ri vista italiana dl dirítto e proccdura penale. 1994 p. 1075; IACOV1ELLO, La
motivazione delia sentença penale e il suo conlrollo in Cassazione..., cit., p. 33; UBERI IS,
Prova (in generale). Digesto delle Discipline Penalistiche..., cit., v. X, p. 301; Idem, La
ricerca delia verità giudiziale..., cit., p. 9; PASTORE, Decisioni, argomenti, conimlli...
cit., p. 103; e DINAMARCO. .4 instrumentalidade do processo..., cit.. p. 298. nota 98;
ldem, Instituições dc direito processual civil..., cit.. v. Hl, p. 57. Feito tal esclarecimento,
no presente trabalho, quando houver referência a “prova da verdade de um falo , tal
qual deve ser entendida como forma abreviada de “prova da verdade dc uma afirmação
de existência de um fato ".
188. TARUFFO. Processo civil comparado..., cit.. p. 38.
189. ANDRÉS 1BANEZ. Perfecto. A argumentação probatória e sua expressão na sentença.
Valoração da prova e sentença penal. Trad. Lédio Rosa de Andrade. Rio de Janeiro: Lu-
m enjuris. 2006. p. 40. Isso não correrá, contudo, no caso em que o acusado se limite
a confessar os latos.
PROCESSO E GARANTIAS PROCESSUAIS VOLTADAS AATIVIDADE PROBATÓRIA 73
190. TUZET. Filosofía delia prova giuridica, c it, p. 41. De modo semelhante, Evio Fassone
(La valutazione delia prova nel processo penale: dogmatismi anlichi e consapevolleze
nuove. In: DESSONE, Mario; GUAST1N1, Ricardo (Coords.). La regola del caso: inateriali
sul ragionamento giuridico. Padova: Cedam. 1995. p. 320) explica que o processo “é a
disputa dialética sobre a existência de um fato passado, não reproduzível experimen
talmente, e sobre sua atribuição a um sujeito”.
191. NAPPI, Aniello. Guida ai codici di pmeedura penale. 8. ed. Milano: Giuffrè, 2001.
p. 10.
192. ALLEN. Ronald J. Los estándares de prueba y los límites del análisis jurídico. In:
VÁZQLIEZ, Carmen (Ed.). Estándares de prueba y prueba científica: ensayos de episte
mología jurídica. Madrid: Marcial Pons, 2013. p. 54.
74 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
197. Um terceiro aspecto relevante era a possibilidade de o juiz “baixar o processo” “a fim
de que o Ministério Público pudesse aditar a denúncia”, o que comprometia a impar
cialidade do julgador. Todavia, para os fins de análise da delimitação Pática do objeto do
76 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
201. A hipótese seria de aplicação do antigo capul do art. 3 8 4 , posto que o crime de
apropriação indébita é menos grave que o de estelionato.
202. Nesse caso, como o peculato é mais grave que o estelionato, aplicava-se o antigo
parágrafo único do art. 3 8 4 , sendo necessário o aditamento da denúncia.
203. Como já expusemos (BADARÓ, Correlação entre acusação c sentença..., cit., p. 156),
a regra da correlação entre acusação e sentença assegura “não apenas o direito de defesa,
mas também os poderes inerentes à acusação, evitando que o juiz usurpe as funções do
acusador, numa verdadeira ação penal ex officio. As posições de ambas as partes, defesa
e acusação, devem ser respeitadas, preservando-se o contraditório com os dois sujeitos
parciais. Se do fato novo decorre pena mais branda ou mesmo igual àquela relativa ao fato
originariamente imputado, isso pode não implicar violação do direito de defesa; mas. se o
juiz considera na sentença aspectos fãticos não imputados pelo acusador e sobre os quais
este nem mesmo leve oportunidade de debater, cerlamente serão violados os direitos da
iniciativa da ação penal e do órgão acusador de ser informado e de se manifestar sobre
78 EPISTEMOLOGIAJL'DICIÁRIA E PROVA PENAL
comido na acusação, tal aspecto fático somente poderá ser considerado pelo juiz
na sentença, se houver aditamento da denuncia. Além disso, restou claro que a
alteração da imputação, por meio do aditamento, se dará por ato exclusivo e de
iniciativa própria do Ministerio Publico, sem previsão de qualquer provocação
judicial nesse sentido.2WAssim, se a instrução indicar uma alteração fática rele
vante, independentemente da pena aplicável a tal fato diverso, deverá o acusador
aditar a denúncia ou a queixa, para incluí-la na imputação e, só assim, poderá o
juiz considerar tais fatos ao sentenciar.
Isso vale para toda e qualquer hipótese de alteração (ática. Quando se pensa
na mudança do objeto do processo, conhecida como m utatiolibelli, normalmente o
que se imagina é alteração, pela substituição, de um fato narrado na denuncia, por
outro diverso, descrito no aditamento. Essa, cornudo, não é a única possibilidade
de alteração do objeto do processo, quanto ao fato imputado. O objeto do processo
pode ser alterado por: (1) substituição; (2) acréscim o; (3) redução.
A hipótese mais comum é de substituição, isto é, alteração de um fato por ou
tro diverso. Por exemplo, a denúncia narra fatos que se subsomem ao estelionato,
porque o acusado teria, mediante um engodo, fazendo-se passar por empregado
de uma empresa de manutenção de equipamentos, retirado da casa da vítima, um
aparelho para consertá-lo. Todavia, depois, a denúncia é aditada, porque efetiva
mente o acusado era empregado da empresa de manutenção de tal equipamento,
passou a detê-lo licitamente, pois lhe foi entregue pelo titular do mesmo, mas,
num segundo momento, resolveu não mais o restituir. Nesse caso, em termos mais
simples, haverá substituição de um fato por outro. E a acusação de estelionato será
substituída pela acusação de apropriação indébita.
É possível, por outro lado, que ocorra a alteração do objeto do processo por
acréscim o: mantém-se o conjunto fático inicial, mas a ele se agregam outros ele
mentos. Seria o caso, por exemplo, de alguém que foi denunciado por subtração
de coisa alheia móvel e. depois, adiciona-se a imputação do emprego da violência.
Haverá alteração, por acréscimo da violência, com a mudança do crime de furto
para o de roubo.
todo o material processual que a sentença vai considerar. A consideração, pelo juiz, de
aspectos fáticos não imputados ao acusado, nos termos da redação originária do capul
do art. 384 do CPP, correspondia, em relação a tais dados, ã verdadeira ação penal de
oficio, o que não se coadunava com o processo penal acusatório .
204. A nova redação do caput do art. 384 dispõe que: “Encerrada a instrução probatória,
se entender cabível nova definição jurídica do fato, em consequência de prova existente
nos autos de elemento ou circunstância da infração penal não contida na acusação, o
Ministério Público deverá aditar a denúncia ou queixa, no prazo de 5 (cinco) dias. se em
virtude desta houver sido instaurado o processo em crime de ação pública, reduzindo-se
a termo o aditamento, quando feito oralmente”.
PROCESSO E GARANTIAS PROCESSUAIS VOLTADAS À ATIVIDADE PROBATÓRIA 79
Por fim, é possível a alteração por redução. É o que pode ocorrer nas situações
em que há relação de especialidade entre delitos, ou no crime complexo. Exempli
gratia: partindo de uma imputação inicial de um fato que caracterize peculato, se
no curso da instrução é descoberto que o imputado não era funcionário público, a
acusação será alterada, suprimindo-se a condição de funcionário público, e modifi
cando-se o delito de peculato para de por apropriação indébita, independentemente
de qualquer alteração da acusação.
No caso substituição do objeto do processo, há alteração, ainda que parcial,
dos fatos que serão provados. No acréscimo, o que já constituía o lh an a probandum
continuará tendo que ser provado, e a esse contexto fático se agregam novos fatos.
Por fim, na redução haverá diminuição dos fatos que serão objeto da prova. De
qualquer modo, todas essas mudanças do tema que será objeto do juízo de lato se
dará, sempre e exclusivamente, por ato do acusador. O juiz não poderá alterar o
objeto do processo.
Um segundo aspecto que precisa ser analisado diz respeito às consequências do
aditamento. Seria possível a chamada imputação alternativa superveniente? Ou,
de modo mais concreto: por exemplo, no caso de uma denúncia por estelionato, em
que haja posterior aditamento para apropriação indébita, o juiz, ao final, somente
poderá condenar ou absolver o acusado pelo crime de apropriação indébita, ou
também poderá condená-lo pela imputação originária de estelionato?
Caso se adote a posição que admite a possibilidade de condenação por ambos
crimes, a mudança do fato objeto do processo amplia o them aprobandum . que além
do fato originalmente imputado, também passará a incluir as alegações sobre falo
diverso objeto do aditamento. Diferentemente, admitindo-se apenasa possibilidade
de condenação pelo fato decorrente do aditamento, haverá uma alteração parcial
do objeto do processo, deixando de integrá-lo o aspecto fático que foi excluído pelo
aditamento, e dele passando a fazer parte a porção de fato que foi por ele acrescida. *°r>
Estabelecida a relevância da questão, para a sua resposta, novamente é impor
tante analisar a evolução da disciplina da matéria, comparando o regime originário
com o decorrente da reforma de 2008 do Código de Processo Penal. De uma maneira205
geral, a doutrina entendia que o art. 384, parágrafo único, admitia uma forma de
“denuncia alternativa superveniente”.206 Isto é, tendo havido o aditamento, o juiz
continuava livre para julgar o acusado - ou melhor, para condená-lo - tanto pela
imputação originaria, quanto pela imputação superveniente, decorrente do adita
mento. Em outras palavras, o aditamento não substituiria a imputação originaria,
mas a ela se somaria, em caráter alternativo.
Mesmo antes da reforma do Código não era possível concordar com a posi
ção prevalecente na doutrina nacional, que considerava haver, em tal caso, uma
hipótese de imputação alternativa superveniente.207 De qualquer forma, o § 4 o do
art. 384 do CPP, acrescido pela reforma de 2008, deixou claro que, urna vez recebido
o aditamento, o juiz ficará, “na sentença, adstrito aos termos do aditamento”. Ou
seja, havendo o aditamento da denuncia, o fato imputado passará a ser exclusiva
mente o fato superveniente, que substitui o fato originário. Se o juiz condenar o
acusado pelo fato originário, que fora substituido, estará proferindo uma sentença
206. A questão foi analisada sob o enfoque da imputação alternativa por Afrãnio Silva
Jardim (A imputação alternativa no processo penal. Direito processual penal. L1. ed. Rio
de Janeiro: Forense, 2002. p. 157), que conclui: "o parágrafo único do art. 384 prevê
claramente uma imputação alternativa superveniente, vez que o juiz poderá condenar
o réu, tanto pelo que consta originalmente na denúncia ou queixa, como pelo que lhe
foi imputado no aditamento”. Posteriormente, suas lições foram seguidas por Antonio
Milton de Barros (Da imputação alternativa à ausência de imputação no Código de
Processo Penal. Revista Ibero-americana de Ciências Penais, n. 2., jan.-abr. 2001. p. 49)
e Maria Cristina Faria Magalhães (A correlação entre acusação e sentença nas ações penais
condenatorias. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. p. 155-1 5 6 ). Na doutrina nacional,
de uma maneira geral, admitia-se que, diante do aditamento da denúncia, restava ín
tegra, também, a imputação originária, sendo permitido ao juiz condenar o acusado
tanto pelo crime originário, quanto pelo crime objeto do aditamento. Nesse sentido:
ESPÍNOLA FILHO. Eduardo. Código de Processo Penal brasileiro anotado. Rio de Janeiro:
Borsoi. 1965. v. IV. p. 118, GRINOVER. Ada Pellegrini; M A G A L H Ã E S GOMES FILHO,
Antonio; SCARANCE FERNANDES, Antonio. As nulidades no processo penal. 6. ed. São
Paulo: Ed. RT, 2006. p. 251. A doutrina, contudo, não chegava ao ponto de afirmar,
expressamente, que se trataria de uma hipótese de imputação alternativa. Em sentido
contrário, destaque-se a posição de Diogo Rudge Malan (A sentença incongruente no
processo penal. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003. p. 214) que, partindo da premissa
correta de que não se pode aceitar a imputação alternativa originária, contesta a posição
dominante, no sentido de que o revogado parágrafo único do art. 384 do CPP permitia
uma imputação alternativa superveniente.
207. Tratamos da questão, com os fundamentos para tal inadmissibilidade no artigo:
BADARÓ. Gustavo. Da inadmissibilidade da Imputação alternativa no processo penal
brasileiro. In: BASTOS, Marcelo Lessa; AMORIM, Pierre Souto Maior Coutinho de
(Org.). Tributo a Afrãnio Silva Jardim: escritos e estudos. Rio de Janeiro: Lumen Juris,
2011. p. 157-261. Uma exposição resumida dos argumentos pode ser encontrada em:
BADARÓ, Correlação entre acusação e sentença..., cit., p. 174-178.
PROCESSO E GARANTIAS PROCESSUAIS VOLTADAS À ATIVIDADE PROBATÓRIA 81
extra petita e, consequentemente, viciada pela nulidade absoluta, tal qual ocorre
com qualquer sentença que viole a regra da correlação entre acusação e sentença.
Portanto, retome-se o exemplo inicial, em que é formulada a denúncia por
fatos que caracterizam o crime de estelionato e, posteriormente, no curso da
instrução, fica provado que não houve emprego do meio fraudulento para o desa
possamento, mas sim que o acusado já tinha a posse da coisa da qual se apropriou.
Feito o aditamento da denúncia para o crime de apropriação indébita, não restará
mais a acusação pelo estelionato. Nesse contexto, evidentemente, o acusado não
poderá ser condenado por estelionato, se o próprio Ministério Público afirmou
no aditamento que houve outro crime, no caso, apropriação indébita. Em suma, no
caso de aditamento da denúncia, com fundamento no art. 384, capul, do CPP. não
há denúncia alternativa superveniente. O que existe é uma imputação diversa, em
substituição da imputação originária, como determina o § 4o do mesmo dispositivo.
Sumariando o conteúdo do presente tópico, há três pontos de relevo, que
demonstram a subordinação do them a probandum à alegação fática as partes, espe
cialmente do acusador, no caso de alteração do objeto do processo.
Primeiro: atualmente, a mudança do objeto do processo e, consequente
mente, do tema de prova, somente ocorrerá se houver aditamento da denúncia ou
queixa. Consequentemente, o juiz somente poderá conhecer os fatos diversos do
imputado se houver aditamento da denúncia ou queixa, pelo Ministério Público
ou qucrelante, respectivamente.
Segundo: o aditamento da denúncia ou queixa será sempre espontâneo, não
podendo o juiz determinar, instar ou mesmo sugerir a sua prática, sob pena de
comprometimento de sua imparcialidade.
Terceiro: uma vez realizado o aditamento da denúncia ou queixa, o objeto
do processo e, consequentemente, o theina probandum terão sido alterados, não
podendo mais se admitir a produção de provas sobre os aspectos fáticos que foram
alterados no aditamento. E, ao final, na sentença, o juiz somente poderá absolver
ou condenar o acusado, pelos fatos tais quais narrados no aditamento.
2
VERDADE, PROVA E EPISTEM O LO G IA JU DICIÁRIA
1. As teorias sobre a verdade são sintetizadas por Susan Haack (Filosofia das lógicas. Trad.
Cezar Augusto Mortari e Luiz Henrique de Araújo Dutra. São Paulo: Unesp, 2002. p. 127),
nos seguintes termos: “As teorias da coerência entendem que a verdade consiste em relações
de coerência em um conjunto de crenças. As teorias da correspondência entendem que a
verdade de uma proposição consiste não em suas relações com outras proposições, mas
em sua relação com o mundo, sua correspondência com os fatos. A teoria pragmatista,
desenvolvida nas obras de Peirce (ver, por exemplo, 1877), Devvey (ver 1901) e James (ver
1909), tem afinidades tanto com as teorias da coerência quanto com as da correspondência,
admitindo que a verdade de uma crença derive de sua correspondência com a realidade,
mas enfatizando também que ela é manifestada pela sobrevivência da crença ao teste da
experiência, sua coerência com outras crenças. Ao propor sua teoria semântica da verdade,
Tarski (1 9 3 1 ,1 9 4 4 ) procura explicar o sentido de ‘verdadeiro’ que esta máxima apreende.
Na explicação de Tarski, a verdade é definida em termos da relação semântica de satisfação,
uma relação entre sentenças abertas (como 'x > y ) e objetos não-linguísticos (como os
números 6 e 5). A explicação de Popper para a verdade e sua teoria da verossimilhança
ou proximidade da verdade é baseada na teoria de Tarski. que Popper considera fornecer
uma versão mais precisa das tradicionais teorias da correspondência.”
2. MAGALHÃES GOMES FILHO, A motivação das decisões penais.... cit., p. 145.
84 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
urna status mais elevado do que as questões sobre o juízo de fato. As faculdades de
Direito são, em última análise, escolas de lci.
Por outro lado, ñas mais diversas atividades diarias, todo individuo se depara
com a necessidade de realizar juízos sobre fatos passados, tendo que decidir, a
partir de constatação indireta, sobre a ocorrência ou não de acontecimentos que
não presenciou ou percebeu por seus sentidos. Por ser algo frequente ao longo de
toda a vida e realizado de modo natural, quase automático, há uma crença comum
de que valorar provas no processo é algo que se aprende quase que intuitivamente,
não sendo necessário para tanto adquirir conhecimentos específicos ou dominar
técnicas epistemológicas mais sofisticadas. Essa equivocada concepção de que “os
julgamentos sobre fatos constituem simples constatações da realidade”, muitas
vezes, leva a uma acrítica recepção e aceitação dos juízos de fatos realizados pelos
magistrados no processo.3 Se os juízes têm feito um mau uso do seu “livre con
vencimento", o remédio não será eliminar esse princípio de valoração livre, mas
estabelecer e aplicar mecanismos racionais e procedimentais que possam assegurar
um bom uso da discricionariedade nas escolhas feitas na valoração da prova.4
A valoração da prova pode ser realizada intuitivamente, mas também é possível
fazê-la de modo racional, seguindo cânones lógicos, com mecanismos de controle
intersubjetivos, que permitam verificar o erro ou o acerto do juízo de fato realizado
no processo. É na epistemología que poderão ser obtidas as ferramentas para um
aprimoramento da atividade cognitiva do juiz na valoração da prova.
No presente capítulo, se buscará expor as premissas sobre a possibilidade de
se atingir um conhecimento verdadeiro e quais os critérios de verdade adotados.
Também serão expostos, na parte preliminar do capítulo, de modo sumário - e
assumindo o risco de uma exagerada sim plificação-os tipos de raciocínios lógicos
que poderão ser desenvolvidos pelo julgador.
3. O tratamento judicial que se costuma dar aos fatos, como bem destaca Perfecto Andrés
tbáftez (Sobre ti motivação das fatos na sentença penal..., eu., p. 6 9) “sói refletir uma con
sideração dos mesmos como entidades naturais, prévia e definitivamente constituídas
desde o momento de sua produção, que só se trataria de identificar em sua objetividade .
4. TARUFFO, La prova dei fatti giuridici..., cit., p. 411.
5. BAZZARIAN, Jacob. O problema da verdade: teoria do conhecimento. 4. ed. São Paulo:
Alfa-Omega, 1994. p. 74. Para uma análise das diversas teorias sobre a impossibilidade
VERDADE. PROVA E EPISTEMOLOGIA JUDICIARIA 85
10. TARUFFO, Michele. La semplice vento. Il giudice e la costruzione dei fatti. Roma: Editori
Latcrza. 2009. p. 78. Como explica Hessen (Teoria do conhecimento..., cii., p. 150), “o
nosso conhecimento está e estará em relacâo com os objetos".
11. Nesse sentido: TARLIFFO, La prova deijatti giurídici..., cit., p. 143; Idem, La semplice
veritci..., cit., p. 78; TLZET, Filosofia delia prova giuridica..., cit., p. 71; FERRER BEL-
TRÀN, La valoración racional de la prueba.... p. 30. nota 12; ABELLÁN, Gascón. Los
hechos en cl derccho..., p. 121; LAGIER, González. Hechos y argum entos:... In: Qitaesíto
Jacti..., p. 66.
12. GONZÁLEZ LAGIER, Daniel. Hechos y argumentos: la inferência probatória. In: Quaestio
faeti. Ensavos sobre prueba, causalidady acción, México D.E: Fontamara, 2013. p. 67. E
complementa: “quando afirmamos que uma reconstrução de um fato c verdadeira não
queremos dizer (ou não apenas queremos dizer) que seja coerente, que seja aceitável,
que seja convincente ou algo parecido, mas que é uma reconstrução que provavelmente
reflete bastante aproximadamente o que realmente ocorreu".
13. Cf., supra, cap. 1, item 1.5.1.
14. FERRUA, Paolo. II libero convincimento dei giudice penale: i limiti legali. II libero con-
vincimento dei giudice penale. Vecchic e nuove esperienze, Milano: Giuffrè, 2004. p. 64.
No mesmo sentido: TUZET (Filosofia delia prova giuridica..., cit., p. 71) afirma adotar
uma interpretação correspondentista, que parece ser a mais adequada no contexto pro
cessual, considerando a correspondência com uma relação entre linguagem e mundo,
entre enunciados (com entidade linguística) e fatos (como entidade extralinguística):
"Há verdade quando um enunciado corresponde ao fato sobre o qual verte".
15. FERRUA. II ‘giusto processo'..., cit., p. 71; Idem, II libero convincimento dei giudice
penale..., cit., p. 68.
16. O escopo de Tarski quando formulou a sua teoria semântica da verdade era definir concei
to de verdade em linguagens formalizadas - i.e. linguagens que satisfazem sua condição
de correção formal —e. para tanto, apresentar sua definição de sentença verdadeira para
essas linguagens formalizadas. Foi assim no artigo de 1933, "O conceito de verdade nas
linguagens formalizada”, In: TARSKI. Alfred. A concepção semântica da verdade. Textos
VERDADE, TROVA E EPISTEMOLOGIA JUDICIARIA 87
clássicos de Tarski. Trad. Celso Reni Braida et. al. Sáo Paulo: Ed. Unesp. 2007. p 19-148,
e no escrito posterior, de 1944, A concepção semântica da verdade e os fundamentos da
semântica. In: TARSKI, Alfrcd. A concepção semântica cia verdade. Textos clássicos de Tarski.
Trad. Celso Reni Braida et. al. São Paulo: Ed. Unesp, 2007. p. 157-201.
17. O próprio Tarski esclarece que sua teoria semântica da verdade não se compromete com
o tema metafísico da existência de uma correspondência ontológica entre a tese da qual
é predicada a verdade e a realidade da qual ela diz respeito, mas se limita a elucidar, de
maneira unívoca e precisa, o significado do termo “verdadeiro” como predicado meta-
linguístico de um enunciado, não sendo uma definição real, mas uma definição nominal.
Diz ele (TARSKI, A concepção semântica da verdade e os fundamentos da semântica....
cit., p. 189-190): "podemos aceitar a concepção semântica da verdade sem abandonar
qualquer atitude epistemológica que possamos ter tido. Podemos permanecer realistas
ingênuos, realistas críticos ou idealistas, empiristas ou metafísicos - o que quer que
tenhamos sido antes. A concepção semântica é completamente neutra em relação a todas
essas questões". Sobre o tema, cf. FERRAJOL1, Diiitto e ragione..., cit., p. 22; UBERTIS,
Profili di Epistemología Giudiziaria..., cit., p. 17.
18. A concepção semântica da verdade e os fundamentos da semântica.... cit., p. 158.
19. TARSKI, Alfred. Verdade e demonstração. In: TARSKI, Alfred. A concepção semántico da
verdade. Textos clássicos de Tarski. Trad. Celso Reni Braida et. Al. São Paulo: Ed. Unesp.
2007. p. 204.
20. TARSKI, Verdade e demonstração..., cit., p. 205, acrescendo: “Algumas outras concepções
e teorias da verdade, lais como a concepção pragmática e a teoria da coerência, são
discutidas na literatura filosófica moderna. Estas concepções parecem ser de caráter
exclusivamente normativo e têm pouca conexão com o uso real do termo verdadeiro’.
Nenhuma delas foi até agora formulada com um bom grau de clareza e precisão. Nesse
artigo, essas concepções c teorias não serão discutidas”. (Ibidem, p. 205-206)
88 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PRO VA PENAL
21. Nesse sentido: FERRAJOLI, Diritto c ragione..., cit., p. 22; TARUFFO, La prova deijatti
giuriclici..., cit., p. 146; TUZET, Filosofia delia prova giuridica..., cit., p. 70.
22. FERRUA. II ‘giusto processo'..., cit., p. 71.
23. P1ZZI, Cláudio. Diriiio. abduzione e prove. Milano: Giuffrè, 2000. p. 32.
24. NANNINl, Sandro. 11 concetto di verità in una prospettiva naturalistica. In: Amoreiti. Maria
Cristina; MARSONET, Michale. Conoscenza e verita. Milano: Giuffrè, 2007. p. 55-56.
25. TARUFFO, Processo civil comparado: ensaios..., cit., p. 43.
VERDADE. PROVA E EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA 89
Além disso, a crença como estado psicológico em que se funda o consenso não
precisa ter qualquer relação com a verdade dos acontecimentos. Hã muitas crenças
que geram uma certeza subjetiva em quem crê, embora de tal sentimento não se
possa extrair qualquer conclusão a respeito da verdade do que se crê. É assim com
certos dogmas religiosos, com a ocorrência de milagres, com a existência de seres
extraterrestres, com a honestidade de alguns políticos e a desonestidade de outros etc.
Há, ainda, outro problema, não de natureza epistêmica, mas de conotação
político-processual: a concepção da verdade como consenso também coloca em
risco o escopo do processo penal de funcionar como instrumento de legitimação
do poder punitivo estatal. Ao se substituir a verdade dos fatos buscada no processo,
como uma das condições necessárias da legitimação da punição, pelo consenso,
não há como estabelecer a quantidade de consenso necessário para punir. E sem
um critério objetivo, há grande risco de que o consenso social seja identificado
com uma “verdade midiática alternativa à verdade processual”.3CI
Essa verdade é obtida rapidamente, na velocidade do interesse pela notícia
nos meios de comunicação e sem a dialética processual, que exerce uma importan
tíssima função epistemológica. Logo após um acontecimento de interesse público,
a verdade é pronta e imediatamente anunciada, pois deve atender à urgência da
notícia,Me torna-se consenso, antes de qualquer instrução processual cm contradi
tório. Contra essa verdade midiática imediatista, aquela outra verdade processual,
produzida em contraditório, e que chegará muito tempo depois, pouco ou nada
poderá fazer. Não é exagero considerar que, em tal cenário, há uma inversão da
presunção constitucional de inocência, pela presunção - ou até mais que isso. uma
efetiva verdade midiática aceita pelo consenso - de culpa previamente declarada
e aceita como verdadeira. Ao acusado, já condenado pela mídia, restará a quase
impossível missão de utilizar a instrução processual como a última oportunidade
para demonstrar a sua inocência, “além de qualquer dúvida razoável”. Ou de
monstra cabalmente ser inocente ou o consenso contrário que se formou contra
si será irreversível.
32. Por exemplo, Jacintho Nelson de Miranda COUT1NHO (Glosas ao Verdade. Dúvida e
Certeza, de Francesco Carnelutti, para os operadores do Direito. In: Revista de Estudos
Criminais - Instituto Transdisciplinar de Estudos Crimina is - 1TEC, Porto Alegre, n. 14,
abr.-jun., 2004. p. 8 1 ) afirma que “a verdade está no todo, mas ele não pode, pelo homem,
ser apreensível, ao depois, a não ser por uma. ou algumas, das partes que o compõem.
Seria, enquanto vislumbrável como figura geométrica, como um polígono, do qual só
se pode receber à percepção algumas faces”.
33. Como explica González Lagier (Hechos y argum entos:... In: Quaesíio facti..., cit.. p. 70)
“há enunciados com significado empírico absolutamente verdadeiros (no sentido de
totalmente correspondentes com a realidade), porém nos nunca poderemos ter certeza
absoluta deles, pelo que deve bastar que tenham um grau elevado de credibilidade".
34. TUZET, Filosofia delia prova g iuridica..., cit., p. 72-73.
92 I EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
38. Um dos objetivos básicos da lógica, explica Wesley C. Salmon, (Lógica. 3. ed. Trad. de
Álvaro Cabral. Rio de Janeiro: LTC, 2012. p. 2) “é fornecer métodos para distinguir
entre argumentos logicamente corretos e incorretos. .4 correção ou incorreção lógica de
tim argumento só depende da relação entre premissas e conclusão. Num argumento logica
mente correto, as premissas, quer sejam realmenle verdadeiras ou realmenle falsas, têm
a seguinte relação com a conclusão: Se as premissas forem verdadeiras, esse fato constituira
uma boa base para aceitar a conclusão como verdadeira".
39. A classificação tríplice é enfaticamente defendida por PEIRCE, Charles Sandcrs. Ilus
trações da lógica da ciência. 2. ed. Trad. Renato Rodrigues Kinouchi. Aparecida: Ideia e
Letras, 2008. p. 172, embora se referindo à “hipótese” em vez de “abdução". Todavia,
não é pacífica a consideração das três formas de raciocínios, havendo quem negue à
abdução autonomia própria. Pizzi (Diritto, abduzione e prove.... cit., p. 19-20) prefere
distinguir a dedução, de raciocínio “não-demonstrativo”, que compreende a “indução
e a abdução”. Para González Lagier (Hechos y argumentos: ... In: Quaestio facti..., cit.,
p. 77) a indução se subdivide em: (i) indução generalizadora ou indução em sentido
estrito, (ii) indução probabilística e (iii) abdução ou retrodução. Também para Manoel
Atienza (Razonamiento jurídico. In: GONZÁLEZ LAGIER, Daniel (Coord.). Conceptos
básicos dei derecho, Madrid: Marcial Pons, 2015. p. 20 7 ) o argumento abdutivo é uma
indução, que se caracteriza por sua função heurística, sendo utilizado para conjecturar
algo.
94 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
robustez das provas depende do exame de três elementos: (1) a hipótese (aquilo que
deve ser provado); (2) os meios de prova (aquilo que serve para provar a hipótese); e (3)
o critério inferencial (aquilo que relaciona os meios de prova com a hipótese). Critérios
distintos são aplicados a cada um desses elementos. Assim, enquanto os meios de prova
devem atender aos critérios da admissibilidade e da suficiência, o critério inferencial
depende da suficiência da fundamentação lógica e da provabilidade causal, ao passo
que a hipótese deve observar os critérios de refutabilidade, derivação, singularidade,
coerência e simplicidade".
43. Nesse sentido: MAT1DA; HERDY, As inferências probatórias..., cit., p. 215; ÁVILA,
Teoria da prova..., cit., p. 122.
46. Nesse sentido: GONZÁLEZ LAGIER. Hechos y argum entos:... In: Quacstio facti..., cit..
p. 58; ÁVILA, Teoria da prova..., cit.. p. 122
47. MATIDA; HERDY, As inferências probatórias..., cit., p. 218.
48. Sobre o tema, cf., infra, item 3.5.5.
49. Para Ferrua (1/ libero convincimento dei giudicepenale..., cit., p. 7 1 ), o acertamento do
juízo de fato é realizado por um método indutivo, que se desenvolve a base de três
saberes, representando-os como três círculos concêntricos, em que no círculo interior se
tem as “regras lógicas”, no de raio médio, as “regras da ciência" e. por fim, o mais amplo
deles, ocupado pelas regras da experiência. No mesmo sentido, referindo-se a regras
lógicas, da ciência c do senso comum: STELLA, Federico. Ohre il ragionevole dubbio: il
libero convincimento dei giudice e le indicazioni vincolanti delia costituzione italiana.
Il libero convincimento dei giudice penale. Vecchic e nuove esperienze, Milano: Giuffrè,
2004. p. 101. Na doutrina brasileira, Magalhães Gomes Filho (A motivação das decisões
penais..., cit., p. 163) se refere às seguintes regras de inferência: “disposições legais, re
gras técnicas e científicas, noções consagradas pela experiência comum ou mesmo regras
estabelecidas criativamente no próprio procedimento da abdução".
96 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
50. Um silogismo, explica Irving M. Copi (Introdução a lógico. Trad. de Álvaro Cabral. 2. ed.
São Paulo: Mestre Jou, 1978. p. 167) "é um argumento em que uma conclusão c inferida de
duas premissas. Um silogismo categórico c um argumento que consiste em três proposições
categóricas que contém exatamente três Lermos, cada um dos quais ocorre exatamente
em duas das proposições constituintes. Diz-se que um silogismo categórico ê uma forma
típica, quando suas premissas e conclusão são todas proposições categóricas de forma
típica e estão dispostas numa ordem específica”.
51. Esse é um silogismo positivo, em que há uma premissa maior afirmativa universal, uma
premissa menor afirmativa particular e uma conclusão afirmativa particular. Mas. como
aponta Sammarco (Método probatorio e modelli di ragionamento..., cit., p 10. nota 2), o
silogismo probatório também pode ser negativo, constituído por causa de uma premissa
maior negativa universal, uma premissa menor afirmativa particular, e uma conclusão
negativa particular: "nenhum assassino é são; Jekyll é assassino: Jekyll não é são". É
possível, também, que as proposições sejam particular afirmativa (p. ex.: alguns políticos
são mentirosos) ou particular negativa (p. ex.: alguns políticos não são mentirosos).
52. Nesse sentido: AT1ENZA, Razonamiento jurídico..., cit., p. 210: SAMMARCO. Método
probatorio e modelli di ragionamento..., cit., p. 13.
53. SAMMARCO, Método probatorio e modelli di ragionamento..., cit., p 12. Como explica
Copi (Introdução á lógica..., cit., p. 135) "um raciocínio dedutivo é válido quando suas
premissas, se verdadeiras, fornecem provas convincentes para sua conclusão, isto é,
quando as premissas e a conclusão estão de tal modo relacionadas que é absolutamente
impossível as premissas serem verdadeiras se a conclusão tampouco for verdadeira”. De
modo semelhante, para Ávila (Teoria da prova..., cit., p. 116), “o argumento dedutivo
é “inderrolável”, sendo construído para “atingir segurança ihferenrial absoluta".
VERDADE, PROVA E EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA 97
premissas também forem verdadeiras,54 porque a conclusão, a rigor, nada diz que
já não tenha sido enunciado nas premissas,55sendo impossível construir qualquer
raciocínio ampliativo.56 A dedução, portanto, é a forma de raciocínio adequada
quando é conhecida a regra geral e é conhecido caso particular que com ela se rela
ciona, e se busca encontrar o resultado.'57Justamente por isso, o método dedutivo
é particularmente apropriado em disciplinas matemáticas, em que de postulados
ou definições, com natureza de afirmações gerais, se obtém conclusões particula
res, sem criar nada de novo.5859O exemplo mais familiar é a Geometria Euclidiana
plana, em que os teoremas são demonstrados com base em axiomas e postulados.
A dedução somente permite que se obtenha a transferência da verdade parti
cular de um enunciado para outro enunciado, sendo incapaz de estabelecer uma
verdade sintética quando não seja dada uma verdade desse tipo na sua premissa
geral.54 A verdade das premissas, por sua vez, será determinada a partir o domínio
dos conhecimentos disponíveis de quem formula as premissas.60Assim, se num caso
particular não for possível assegurar que as premissas são verdadeiras, nenhuma
garantia se terá quanto à verdade da conclusão. A dedução também é adequada para
se expor, de um modo claro, a justificativa de uma decisão, ou para demonstrar
porque se aplicam certas propriedades gerais a casos particulares.61
Do ponto de vista da possibilidade de se chegará descoberta de conhecimentos
novos, o que é fundamental no raciocínio judicial, o método dedutivo não acrescenta
54. Nesse sentido: COPI. Introdução à lógica..., cit., p. 139; CARNAP, Rudolph. An introduc
tion to the philosophy o j Science. Ed. Por Martin Gardener. New York: Dover Ed., 1996.
p. 20; GONZÁLEZ LAG1ER, Heelios y argumentos: ... In: Quaestio facti..., cit., p. 46;
COMANDUCC1. Paolo. Razoncimientojurídico. Elementos para un modelo. Trad. Pablo
Larranaga, México DC: Fontamara, 1999. p. 64.
55. SALMON, Lógico..., cit., p. 8.
56. P1ZZ1, Diritto, abduzione e prove..., cit.,p. 55.
57. Nesse sentido: GONZÁLEZ LAGIER, Hechos y argumentos: ... In: Quaestio facti...,
cit., p. 46; FASSONE, Elvio. Dalla “certezza” all’“ipotesi preferi bile": un metodo per la
valutazione. Rivista Italiana di Diritto e Procedura Penalc. Milano: Giuffrè, 1995. p. 1113.
58. Nesse sentido: FERRUA, II libero convincimento del giudicc penalc..., cit., p. 69; GAMB1-
RASIO. Giorgio. Ensaios sobre a causalidade. São Paulo: Plêiade, 2009. p. 40-41.
59. REICHENBACH, Hans. La nascita della filosofia scientifica. Trad. Dominico Parisi e Al
berto Pasquinelli. Bologna: II Molino, 1961. p. 48-49. No mesmo sentido: 1ACOVIELLO.
I criteria di valutazione della prova..., cit., p. 391.
60. RAMIREZ, Juan Bonorino. Nidcducción ni inducción: abducción! In: AMADO, Juan Antonio
Garcia; BONORINO, Pablo Raul (Coords.) Pruebay razonamiento probatorio en el Derecho.
Debates sobre abducción. Granada: Cornares, 2014. p. 172. Que acrescenta: “o mesmo ocorre
com os argumentos indutivos. Quando se dão certas condições, possuem mais ou menos
força indutiva. Porem, para que isso possa ser afirmado em um caso concreto deve ocorrer
observância dessas condições, isto é, as premissas devem ser verdadeiras”.
61. GONZÁLEZ LAGIER. Hechos y argumentos: ... In: Quaestio facti..., cit.. p. 46.
98 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
nenhum dado queja não estivesse disponível nas premissas do silogismo, ao menos
implicitamente. No clássico exemplo acima utilizado, a conclusão de que Sócrates
era mortal já estava embutida nas premissas, tendo o argumento dedutivo apenas
explicitado a conclusão que já se sabia, não trazendo nada novo.62 Esse vazio de
conhecimento impede que o método dedutivo se preste a previsões sobre o futuro,
o que exige o emprego da lógica indutiva. O mesmo se diga com relação à valoração
da prova, em relação a qual não há se busca resultados de caso particulares, para os
quais não há uma regra de cobertura de caráter geral e universalmente válida, sendo
utilizadas generalizações baseadas em indução experimental de casos conhecidos.63
Num modelo de epistemología judiciária, não é correto caracterizar o raciocínio
probatório como sendo uma dedução.64 Não há uma premissa universal e verdadeira
à qual se aplica outra premissa concreta e particular, mas igualmente verdadeira, que
permi ta se obter uma conclusão também verdadeira. De um modo geral, as premissas
gerais utilizadas no raciocínio probatório não são leis universais, mas meramente
probabilísticas, o que já é suficiente para tornar inadequado o método dedutivo
como modelo de raciocínio probatório.65 O mesmo vale para as leis científicas, que
não estabelecem verdades gerais, mas somente probabilidades. Superada a visão
de mundo em que os fenômenos da natureza se reproduzem com base em uma
uniformidade absoluta, não é possível obter, em relação aos acontecimentos do dia
a dia, leis gerais que expressem verdades incontestáveis, e que possam servir como
premissas para um raciocínio dedutivo, gerando conclusões probatórias verdadeiras.
O grande fascínio que a dedução exerceu no mundo jurídico estava ligado ao
aspecto argumentativo por meio do qual se costuma expor, na fundamentação da
sentença, o processo de subsunçâo dos fatos à norma.66 Nesse contexto, a forma
de silogismo dedutivo era empregada com estilo de fundamentação: a premissa
maior era representada pela regra jurídica, a premissa menor, pelos fatos conside
rados provados, e a conclusão a subsunçâo dos fatos à norma, com a disposição da
consequência jurídica nela prevista.67
68. Ferrua (11 libero convincimenio dei giudice penale..., ciL, p. 6 9) se refere a um “enri
quecimento do conhecimento”. Para Salmón ( Lógica.... cil., p. 8) o argumento indutivo
“destina-se a ampliar o alcance de nossos conhecimentos”.
69. GONZÁLEZ LAG1ER, Hechos y argumentos: ... In: Qitaestio Jacti..., cil., p. 46.
70. SALMON, Lógica..., cit., p. 8.
71. GONZÁLEZ LAG1ER, Hechos y argumentos: ... In: QiuteslioJacti..., cit., p. 46.
72. FASSONE, Dalla “certezza” all’“ipotesi preferibile”. . . , cit., p. 1 113.
73. Nesse sentido: HEMPEL, Filosofia da ciência natural..., cit., p. 22; CARNAP, An introduc-
tioti lo lhe philosophy ojScience.... cit., p. 20; GONZÁLEZ LAG1ER. Hechos y argumentos:
... In: Quaestio facti.... cit., p. 47. Essa é mais uma diferença do raciocínio dedutivo do
indutivo, enquanto a correção dedutiva, normalmente referida como validade, é uma
questão de "tudo ou nada”, inexistindo uma graduação de validade dedutiva, em con
trapartida, “os argumentos indutivos corretos admitem graus de força, dependendo do
montante de sustentação que as premissas forneçam à conclusão” (SALMON, Lógica...,
100 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PRO VA PENAL
cit., p. 8). Ou seja, diferente dos raciocínios dedutivos, que são válidos ou inválidos, os
raciocínios indutivos, como explica Copi (Introdução à lógica..., cit., p. 35) podem “ser
avaliados como melhores ou piores, segundo o grau de verossimilhança, ou probabili
dade que as premissas confiram às respectivas conclusões".
74. Nesse sentido: HEMPEL, Filosofia cia ciência natural..., cit., p. 22; CARNAP, An intro
duction to lhe philosophy of Science..., cit., p. 2L.
75. ÁVILA, Teoria da prova..., cit., p. 117. Justamente por isso, nunca se poderá ter, do ponto
de vista racional, por mais amplo que seja o conjunto probatório e por mais forte que
seja o critério inferencial não é possível certeza absoluta, a partir de uma inferência
indutiva.
76. FERRUA, II libero convincimento dei giudice pcnale.... cit., p. 69.
77. ATIENZA. Razionamiento jurídico..., cit., p. 210.
78. COMANDUCCI, Razonamiento jurídico..., cit.. p. 111.
VERDADE, PROVA E EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA 101
de que todos os cisnes eram brancos: existia cisne negro! uA conclusão foi refutada
porum só contraexcmplo (o cisne negro),80 em razão do argumento modus tollcns.
Por maior que seja o número de resultados positivos que confirmem a regra
geral inferida na indução, logicamente, ela sempre poderá não ser verdadeira.
Tudo o que a indução pode dar é probabilidades. Isso não significa, porém, que
obter certo número de verificações de um resultado favorável seja indiferente ou
mesmo equivalente a não ter feito qualquer verificação. Como a cada experimento
realizado o resultado da verificação poderia ter sido desfavorável - o que levaria
inexoravelmente à rejeição da hipótese - um conjunto de resultados favoráveis
mostra que a hipótese foi confirmada, no que diz respeito àqueles números de
experimentos particulares. Portanto, ainda que um conjunto de resultados favo
ráveis não produza uma prova completa que confirme a hipótese, pelo menos lhe
dá algum suporte, alguma corroboração ou confirmação.81 Uma teoria sujeita a
um maior número de resultados favoráveis terá sido mais testada e, portanto, terá
um grau de suporte maior que uma com poucos experimentos de confirmação.
79. No campo das ciências, contudo, é preciso ter cuidado com o que se considera falsifica
ção da hipótese ou sua refutação por resultados empíricos. Evidente que se a hipótese
é a única premissa que tenha possibilidade de ser lalsa. ela deve ser abandonada. Pode
ocorrer, por outro lado, que o erro não esteja na hipótese. Nesse caso, deverão ser alte
radas as condições iniciais utilizadas: antes da descoberta do planeta Netuno, as órbitas
dos planetas, de Mercúrio até Urano, eram bem conhecidas. Entretanto, os cãlculos
matemáticos que aplicavam a teoria da gravitação universal e a mecânica newtoniana
não explicavam certas anomalias observadas na órbita de Urano. Os cientistas diante
de tais dados, poderiam ter rejeitado a hipótese, no caso, a teoria de Newton. Todavia,
dois cientistas, de forma independente, John Adams e jean-joseph Le Verrier postularam
que a justificativa para as mudanças da órbita de Urano poderia ser a existência de um
outro planeta. Baseado nos cálculos de Le Verrier o astrônomo alemão Johann Gottfried
Galle, no ano de 1846, apontou seu telescópio para a parte do céu indicada pelos dados
matemáticos. Com diferença de apenas um grau da posição prevista por Le Verrier, viu
um pequeno ponto brilhante e descobriu Netuno, o hipotético planeta. Sobre o tema,
cf. REICHENBACH, La nascila delia filosofia scientifica..., cit., p. 110.
80. Como observa Carnap (Alt introduetion to the philosophy of Science..., cit., p. 21), um
milhão de confirmações positivas são insuficientes para confirmar a lei indutiva; uma
negativa é suficiente para falsificá-la. E complementa: a situação é profundamente as
simétrica. É fácil refutar a lei e exLremamente difícil obter confirmações fortes.
81. HEMPEL. Filosofia da ciência natural.... cit., p. 19. No mesmo sentido, embora restrito
às leis causais por indução simples, Copi (Introdução á lógica.... cit,, p. 3 3 5 ) afirma que
“quanto maior for o número de exemplos de cònfirmatórios, maior será a probabilidade
da lei causal, desde que as outras condições sejam idênticas”.
82. Um bom exemplo é a teoria de Newton, cuja lei sobre as forças gravitacionais entre
massas foi confirmada por um grande número de observações de planetas no sistema
solar e seus satélites. Também foi confirmada por um sem número de experimentos
sobre a ação da gravidade na queda livre de objetos. Há, também, estudos sobre as marés
102 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
oceânicas, que lhe dão confirmação adicional. Mesmo diante desses e de tantos outros
experimentos realizados e que constituíram novos casos de comprovação, não se podia
dizer que havia provas suficientes em seu favor, para que ela fosse considerada literal
mente correta. E efetivamente não o era. como séculos depois viria a ser demonstrado.
A teoria gravitacional de Newton foi superada pela teoria geral da relatividade de Einstein.
Nesse sentido, em relação â prova judicial: FERRER BELTRÁN, La valoración racional
de la prueba.... cit.. p. 86.
83. Nesse sentido: IACOVIELLO, Francesco Mauro. Motivazione delia sentenza pénale.
Enciclopedia del Diritto. Aggionxamenio. Milano: Giuffrè, 2000. v. 4. p. 756, que acres
centa: se o problema do juízo probatório fosse esse, se poderia muito bem substituir o
juiz por um computador, com economia de tempo e aborrecimentos: bastaria colocar na
máquina as premissas corretas e se teria a conclusão coerente. Negando que o raciocínio
do juiz seja dedutivo: UBERTIS, Pmfili di Epistemología Giudiziaria..., cit., p. 7.
84. CALOGERO, Guido. La lógica dei giudice e il suo contrallo in Cassazíone. 2. ed. Padova:
Cedam. 1964, p. 51. No mesmo sentido: IACOVIELLO, Motivazione delia sentenza
penóle.... cit., p. 756.
85. IACOVIELLO, Motivazione delia sentenza penale..., cit., p. 756.
86. Nesse sentido: FERRAJOLI, Diritto e ragione..., cit.,p. 21; ANDRÉS IBAÑEZ. Sobre a
motivação dos fatos na sentença penal..., cit.,p. 82; Idem, “Carpintaria" da sentença penal
(em materia de fato)..., cit., p. 147; IACOVIELLO, / criteri di valutazione delia prova...,
cit., p. 398.
87. Nesse sentido: IACOVIELLO, Motivazione delia sentenza pénale..., cit., p. 755; FERRUA.
II libero convincimento dei giudice penale.... cit.. p. 69; ANDRÉS IBÁÑEZ, Sobre a motivação
dos fatos na sentença penal..., cit., p. 78; COMANDUCCl, Razonamiento Jurídico..., cit.,
p. 114.
88. Nesse sentido: FERRUA, Paolo. Método scientifico e processo penale. Diritto Penale c
Processo - Dossier - La prova scientifico nel processo penale, 2008. p. 15; PÉRSIO, Porzia
VERDADE, PROVA E EPISTEMOLOGIA JUDICIARIA 103
2.4.2. Abdução
Teresa. Brevi considerazioni sul tema delia conoscenza nel processo penale: nolizie dei
reato e contesti investigativi complessi. In: GAROFOLI, Vincenzo; INCAMPO, Antonio.
Veritô e processo penale. Milano: Giuffrè, 2012. p. 124.
89. GASCÓN ABELLÁN, ¿Lógica del descubrimiento para la prueba?..., cit., p. 151.
90. Nesse sentido: RAMÍREZ. Ni deducción ni inducción: abducción!..., cit., p. 173; GAS
CÓN ABOLLAN,¿Lógica del d escubrimiento para la prueba?..., p. 155: GONZÁLEZ
LAG1ER, Hechos y argumentos: ... ln: Quaestiofacti..., cit., p. 49. Embora seja particu
larmente útil, no caso de fatos “surpreendentes”, sua aplicação não se restringe a tais casos,
de mais difícil ou quase inexplicável solução. Como explica PEÑA Y GONZALO, Lorenzo.
(Razonamiento abduetivo y método axiomático en la lógica deóntica. Pruebay razonamiento
probatorio en el Derecho. Debates sobre abducción. Granada: Cornares. 2014. p. 256. nota
31) o método abdutivo de Peirce não necessita, em absoluto, que a primeira premissa
seja surpreendente, bastando que ela necessite de explicação, de aclaração ou de fun
damentação.
91. TUZET, Razonamiento probatorio: ¿deducción? ¿inducción? ¿abducción?..., cit., p. 123.
92. MAGALHÃES GOMES FILHO, A motivação das decisões penais..., cit., p. 161.
93. PEÑA Y GONZALO, Razonamiento abductívoy método axiomático en la lógica deóntica....
cit., p. 257.
94. FASSONE, Dalla “certezza” all'“ipotesi preferíbile"..., cit.. p. 1114.
95. ANDRÉS IBÁÑEZ, Sobre a motivação dos fatos na sentença penal..., cit.. E 85. Ou, ñas
próprias palavras de Peirce (citado por Pizzi, Diritto, abduzione e prove ..., p. 61): “a
dedução diz que alguma coisa deve ser; a indução prova que alguma coisa é efetivamente
operante; a abdução sugere que alguma coisa pode ser".
104 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
modo: “a dedução implica algo, a indução infere algo, a hipótese [abdução] explica
o porqué de a lg o ”.*9697
Para distinguir esses três modos de raciocinio, Pcirce se vale de um procedi
mento silogístico básico, alternando a ordem de seus termos. Assim, na dedução,
tem-se uma regra (premissa maior), o caso (premissa menor) e o resultado (con
clusão), para o que lança o seguinte exemplo: um pesquisador está investigando
uma saca com feijões brancos, e pega como amostra um punhado de feijões, poderá
concluir, então, dedutivamente que:
Todos os feijões desta saca são brancos Regra
O meu punhado de feijõ es é desta saca Caso
96. K1NOUCHI, Renato Rodrigues. Introdução. In: PEIRCE, Charles Sanders. Ilustrações da
lógica da ciência. 2. ed. Trad. Renato Rodrigues Kinouchi. Aparecida: Ideia e Leiras, 2008.
p. 24.
97. PEIRCE, Ilustrações da lógica da ciência..., cit., p. 171-172.
VERDADE. PROVA E EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA 105
e ate mesmo das interpretações filológicas de textos literarios, por serem, todos,
casos de “pensamento conjectural".103
Com vistas à possibilidade de utilização da abdução como raciocínio proba
tório, é de se considerar que há mais de um tipo de abdução. Umberto Eco, por
exemplo, faz a seguinte distinção: “o primeiro parte de um ou mais fatos particulares
surpreendentes e termina com a hipótese de uma lei geral (o que parece ser o caso
de todas as descobertas científicas), ao passo que o segundo parte de um ou mais
fatos particulares surpreenden tese termina com a hipó tese de outro fato particular
que se supõe seja a causa do primeiro ou dos primeiros (o que parece ser o caso da
investigação c rim in a l).104
Por sua vez, Bonorino Ramírez refere-se a abduções heurísticas, que são reali
zadas antes de se formular o problema, e abduções substantivas, que resultam em
possíveis respostas para os problemas.105Refere-se, também, a abduções de primeiro
nível, que são aquelas realizadas para explicar dados ou observações, e abduções
de segundo nível, que se propõem a explicaras primeiras abduções já realizadas.106
Semelhante ao raciocínio indutivo, na abdução também não há como garantir
que a hipótese explicativa inferida seja verdadeira.107 Além disso, a abdução apre
senta, nas palavras de Fassone, uma “insanável contradição epistemológica”: de
um lado, é o único tipo de inferência que aumenta o nosso conhecimento factual,
e portanto o único esquema argumentativo indispensável para obter o enunciado
final; de outro lado, é o instrumento inferencial dotado de menor necessidade
lógica e, por isso, de maior debilidade intrínseca.108
No campo probatório, quem investiga se vale inegavelmente de um raciocínio
abdutivo, criando hipóteses que expliquem fatos concretos, a partir das provas
disponíveis. Não há grande divergência sobre sera abdução o raciocínio utilizado
pelos investigadores, como se verá a seguir.109 O investigador diante de um crime,
por exemplo, encontrando o cadáver de quem foi morto com vários tiros, e mais
alguns indícios no local do crime, lerá que formular uma hipótese tática da causa
de tal delito. Aqui, a formulação de hipótese explicativa encaixa-se perfeitamente.
103. Nesse sentido, Umberto Eco (Chifres, cascos, sapatos: três tipos de abdução. In: Os limites
da interpretação. 2. Trad. Pérola de Carvalho. São Paulo: Perspectiva, 2004. p. 201) que
acresce: “acredito que a análise dos procedimentos conjecturais da investigação criminal
possa lançar nova luz sobre os procedimentos conjecturais das ciências”.
104. ECO, Umberto. Chifres, cascos, sapatos: três tipos de abdução. Os limites da interpre
tação.... p. 200.
105. RAMIREZ, Ni deducción ni inducción: abducción!..., cit., p. 177.
106 RAMÍREZ, Ni deducción ni inducción: abducción!..., cit., p. 177.
107. TUZET, Razonamiento probatorio: ¿deducción? ¿inducción? ¿abducción?..., cit., p. 133.
108. FASSONE, Dalla “certezza” alV'ipotesi preferibile"..., cit., p. 1114.
109. Sobre o tema, cf.. infra, cap. 3. Ítem 3.3.
VERDADE, PROVA E EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA 107
110. Sobre o tema, cf., infra, cap. 3. item 3.5.3. Em sentido contrário. Bonorino Ramírez
(Ni deducción ni inducción: abducción!..., p. cit., L80-18L) entende que a abdução
representa não só o raciocinio dos investigadores, mas, também, o juiz: "Considero
que a abdução, tal como mostramos no exemplo de Holmes, pode servir ao juiz de duas
maneiras (a) para valorar as pretensões das partes, lendo em conta também os aspectos que
os levaram a defendê-las, com fizeram, e (b) para controlar racionalmente certas atividades
que realiza, antes e durante o trabalho de justificar suas decisões na sentencia judicial".
111. A experiencia, para o homem greco-romano e para o medieval, como explica Guido
Branbilla (Itinerari deltagiustizia. Appumi per una antropologiagiuridica. ristampa. Milano:
Guerini e Associati. 2018. p. 4 6 ), era uma relação com o destino, que era uma conexão
entre o homem, seu corpo e o cosmos. Para esse homem do medievo, por outro lado,
como aponía Romano Guardini (OJim dos lempos modernos. Trad. M. S. Lourenço. Lisboa:
Liv. Moraes Editora. 1964 p. 45 -4 6 ) "a ciencia representa exclusivamente a procura do
que na autoridade das fontes é tido como verdade. Já na segunda parte do século XIV e
especialmente no século XV ocorre uma alteração. O conhecimento dirige-se diretamentc
par a realidade das coisas. Deseja ver com os próprios olhos, demonstrar com a própria
inteligencia, atingir uma opinião criticamente fundamentada, independentemente de
padrões anteriores. (...) a ciencia separa-se da unidade da vida e da obra até aqui deter
minada pela religião e constitui-se a si própria como dominio autónomo da cultura".
112. Obviamente, há urna clara diferença das leis do mundo da ciencia para as leis do
mundo do direito. Enquanto no direito a lei tem uma função prescriliva, os enunciados
ou leis científicas têm por função explicar os fenômenos, formulando as hipóteses e
possibilitando predições (TUZET, Filosofia delia prova giuridica..., cit., p. 50).
113. ENRIQUES, Federico. Causalità e determinismo nella filosofia e nella storia delia
scienza. Napoli: Edizioni Immanenza, 2017. p. 4 4 e 46.
108 EPISTEMOLOGIA JUDICIARIA E PROVA PENAL
a conexão entre os fatos do mundo sensível, com base em uma visão empírica ou
naturalista, que possibilita constatar a origem ou etimologia de um acontecimen
to. Entendia-se que a natureza era regida pela lei da causalidade, cuja expressão
mais evidente eram as leis naturais. Assim quando se constatava a existência de
uma lei natural, por exemplo, no campo da física ou da química, que explicasse a
relação entre uma ação e o seu resultado, que fosse aplicável em caráter necessário
à totalidade dos casos, considerava-se que se estava diante de uma lei causai, de
natureza universal. A constatação ou “descoberta” dessa lei se dava por método
indutivo. A reiteração de experimentos que permitissem, mediante observação dos
seus resultados concretos, afirmar que de uma determinada ação, ocorria sempre e
necessariamente um resultado, gerava um conhecimento nomológico, enunciado
nos seguintes termos “sempre que A, tem-se B”.
Todavia, no início do século passado, descobertas científicas no campo da
física e da matemática colocaram por terra o ideal de um modelo de conhecimento
fundado na causalidade. Embora ainda persista um mito sobre o caráter absoluta
mente certo do conhecimento científico, essa certeza não existe mais nas ciências
naturais. Como diz Stella, as discussões sobre o método científico do século XX
demonstraram que a ciência “é um cemitério de erros”, e se desenvolve por meio
da formulação de hipóteses cuja verdade ou falsidade é um problema destinado a
sempre restar em aberto.114
A fórmula scientia est cognitio per causas perdeu sua força. A possibilidade de
se atingir as verdades absolutas e imutáveis já havia sido contestada. Na dinâmica
clássica e na física quântica "as leis fundam entais exprimem agora possibilidades e
não mais certezas. Temos não só leis, mas também eventos que não são dedutíveis
das leis, mas atualizam as suas possibilidades”.11S
Como explica Reichenback “o ideal de um universo cujo curso segue leis rigo
rosas, de um cosmos predeterminado que procede como um relógio foi abandonado.
Juntamente foi abandonado o ideal do cientista considerado como o depositário
da verdade absoluta. Os eventos da natureza são assimiláveis a dados que caem
ao invés de astros que rodam no céu; são controlados por leis probabilísticas, não
pela causalidade, e os cientistas se assemelham mais a jogadores que a profetas.
Eles podem dizer quais são as melhores hipóteses, mas nunca sabem de antemão
se são verdadeiras”.116
A mecânica quântica, com a teoria dualística ondulatória-corpuscular da luz,
sepultou a objetividade. Como explica Bunge, “a representação habitual da teoria
dos quanta, tal como foi proposta porBohr e Heisenberg, elimina a causalidade e o
que se refere aos resultados da observação, no sentido de que uma mesma' situação
física pode ocorre de forma não previsível por um grande número (usualmente
infinito) de estados diferentes”.117
Também podem ser citados como outros avanços científicos que igualmente
contribuíram para o enfraquecimento do princípio da causalidade e da certeza
determinística das leis cientificas. O princípio da indeterminação, formulado por
Heisenberg, segundo o qual não é possível determinar, ao mesmo tempo e com
precisão, a posição e a velocidade de uma partícula atômica,11819demonstrou que a
previsão da trajetória de uma partícula subatômica é caracterizada por uma espe
cífica indeterminação, sendo impossível prevê-la de modo exato.
Por fim, a própria noção de espaço e tempo são questionadas, diante da teoria
da relatividade de Einstein.1w Nossos conceitos de tempo e de espaço podem ser
aplicados somente a fenômenos que envolvem pequenas velocidades em compara
ção com a velocidade da luz, enquanto que fenômenos que envolvem velocidades
próximas à da luz não podem ser adequadamente interpretados de acordo com o
conceito normal de espaço e tempo.120
Assim, o paradigma da certeza científica, que vigorou porséctdos, entrou em
crise, sendo assumido pela epistemología contemporânea que a ciência também
está privada da certeza.121
117. BUNGE. Mario. Causalidad: el principio de causalidad en la ciência moderna. 3. ed. Buenos
Aires: EUDEBA, 1972. p. 26. Nesse sentido, na doutrina jurídica: IACOV1ELLO, La
motivazione delia sentenza penale e ¡1 suo controllo in Cassazione .... cit., p. 34; 1ACO-
VTELLO, I crileri di valutazione delia prova..., cit., p. 395.
118. Cabe lembrar que Einstein se opôs fortemente a tal princípio. Foi a razão da famosa
frase: “Deus não joga dados com o Universo", representando, enfaticamente, sua posição
contrária a um princípio da mecânica quântica. No âmbito jurídico, para uma explica
ção: ROCHA. Ronan. A relação de causalidade no direito penal. Belo Horizonte: DPlácido,
2016. p. 34-36.
119. Sobre os reflexos da teoria da relatividade no direito penal: MAIWALD, Manlred. Cau-
salità c diritto penale: studio sul rapporto tra scienze naturali e scienza dei diritto. Trad.
de Francesca Brunctta d'Usseaux. Milano: Giuffrè, 1999. p. 91-96.
120. HEISEMBERG. Werner. A descoberta de Planck e os problemas filosóficos da física
atômica. In: BORN, Max et al. Problemas da física moderna. Trad. Gita K. Guinsburg, 3. ed.
São Paulo: Perspectiva, 2 0 1 1. p, 14.
121. NEUBURGER. Luisella de Cataldo. Gli sviluppi delia psicologia giuridica: la valu
tazione delia qualità dei contributo delfesperto, In: NEUBURGER. Luisella de Cataldo
(Org.), La prova scientifica nel processo penale. Padova: Cedam, 2007. p. 503. Não obs
tante, hã na doutrina processual penal, quem ainda faça referência a leis científicas de
caráter universal, que permitiria sua aplicação em um raciocínio dedutivo: FASSONE, La
valutazione delia prova..., cit., p. 322; GASCÓN ABELLÁN, La valoración de la prueba...,
cit., p. 379.
110 EPISTEMOLOGIA JUDICIARIA E PROVA PENAL
122. A explicação e o argumento central de Gódel pode ser consultada na obra de NA
GEL. Ernest: NEWMAN, James R. A prova cie Gõdel. São Paulo: Perspectiva, 2012. p. 82:
"Existe ao menos uma fórmula de aritmética para a qual nenhuma sequência de fórmulas
constitui uma prova". Na doutrina processual, fazendo referência à UBERT1S, La prova
penale..., cit.. p. 5; Idem, Profili di Epistemologia Giudiziaria..., cil., p. 6; IACOV1ELLO,
I criíerí di valutazione delia prova..., cit., p. 395.
123. REICHENBACH. La nascita delia filosofia scientifica..., cit., p. 136.
VERDADE, PROVA E EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA 111
124. Nesse sentido: MA1WALD. Causalità e diritto penale..;, cit., p. 93 s.; ROXIN, Claus.
Derecho Penal - Parte General, reimp. Madrid: Civitas, 2008. t. 1. p. 346-347. Na doutrina
nacional: ROCHA, A relação cie causalidade no direito penal..., cit., p. 38.
125. STELLA, Federico. Causalità c probabilità: il giudice corpuscolariano. II giudice corpus-
colariano. La cultura delle prove. Milano: Giuffrè, 2005. p. 50. Entre os penalistas. Roxin
(Derecho Penal... . cit., t. 1. p. 346) explica que "não altera o fato de que o jurista pode
seguir trabalhando com o conceito tradicional de causalidade, pois a vigência unicamente
de leis estatísticas no campo subatômico não obsta que, para o mundo da vida cotidiana,
que é aquele do qual deve cuidar o jurista, possamos seguir confiando nas leis causais
com certeza praticamente absoluta; e por outra parte, a teoria da relatividade apenas torna
inaplicáveis as tradicionais concepções causais em um pensamento de dimensões cósmicas,
enquanto que nos limitados terrenos do Direito não pode modificar mensuravelmente
as condições às quais conduz a lei causal”. No mesmo sentido, entre nós. Fábio Roberto
DÂvila (Crime culposo e teoria da imputação objetiva. São Paulo: Saraiva. 2001. p. 36-37)
observa que "a relação causa-efeito alcança profunda fragilização quando trabalhada em
padrões atômicos ou cósmicos, mas não quando o objeto é a vida cotidiana, cujas relações
formam a esfera de atuação do Direito Penal”.
126. Aliás, mesmo no campo das ciências. Hempel (Filosofia da ciência natural..., cit., p. 56)
explica que “para desalojar uma teoria bem estabelecida exigem-se razões ponderáveis:
exige-se sobretudo que os resultados experimentais adversos possam ser repetidos. E
mesmo quando ‘efeitos’ experimentalmente reproduzíveis entram em conflito com uma
teoria robusta e fecunda, esta poderá continuar a ser usada nos contextos em que não
crie dificuldades".
127. Nesse sentido: STELLA. Federico. Leggi scientifiche e spiegazione causale nel diritto
penale. Milano: Giuffrè. 1975. p. 88: BARTOLE, Roberto. II Problema delia causalitã
penale: dai modelli unitari al modello differenziato. Torino: Giappichelli, 2010. p. 13.
128. Para Hempel (Filosofia da ciência natural.... cit., p. 79) é possível a explicação científica
com base em leis probabilísticas. Isto c. em que o explanans seja uma lei probabilíslica:
“Enquanto uma explicação dedutiva mostra que pela informação contida no explanans o
112 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
Além disso, a mudança de enfoque não será somente quantitativa, mas, também,
qualitativa. Como explica Stella, "quando se enfrenta o problema do fundamento do
juízo contrafactual realizado pelo juiz. a contraposição entre explicações causais
(dedutivas) e explicações estatísticas deve ser abandonada”.129 E prossegue Stella:
o juiz penal, por meio de um juízo contrafactual “deve estabelecer se a conduta é
uma condição contingentemente necessária; o resultado ao qual chegará não será
mais dedutivamente certo, posto que a incompletude das premissas explicativas
(a incompletude das leis e das condições empíricas enunciadas) e o uso de leis es
tatísticas na explicação caracterizarão sua explicação sempre como probabilística,
ou seja, racionalmente crível”.130
De qualquer modo, as leis científicas, quando corretamente elaboradas, são
submetidas a processos de verificação, tanto prévios ao processo, por parte da
comunidade científica, quanto no curso do processo, por meio de peritos e assis
tentes técnicos.
Uma lei científica, para ser aceita como tal, deve ser submetida à verificação
mediante testes repetidos e sucessivos, passando, assim, por um método de falsea-
bilidade. Mesmo depois de justificada a sua descoberta, a lei científica é objeto de
discussão e, não raro, de contestação na comunidade científica.
Não é tudo. As leis científicas ingressam, muitas vezes, no processo, por meio
de provas técnicas, o que permite uma maior segurança do julgador para avaliar o
grau de validade e de solidez da lei científica empregada.131 Mesmo nos sistemas
em que não há perito oficial, e os conhecimentos científicos são levados ao pro
cesso pelos peritos das partes, a dialética processual será suficientemente forte,
permitindo que a posição de um perito seja verificada e sujeita a confronto com
apoio no conhecimento do perito da outra parte.
exptanandum deve ser esperado com ‘certeza dedutiva', uma explicação indutiva mostra
apenas que pela informação contida no explanans o explanandum deve ser esperado com
alia probabilidade, e talvez com certeza prática’; dessa maneira, é que o último argumento
satisfaz ao requisito da relevância explanatoria". Admitindo a possibilidade da explicação
causal com base em leis probabilísticas com probabilidade próxima de I: STELLA. Federico.
Leggiscientifíchce spiegazionecaúsale nelclirittopénale..., cit., p. 311 e ss.; STELLA, Fede
rico. Giustizia e modernità. 3. ed. Milano: Giulfrè, 2003. p. 346. Posteriormente, contudo.
Stella (Causalitã e pmbabilità: il giudice corpuscolariano..., cit., p. 5) muda de posição e
passa a afirmar que no âmbito legal, bem como no da física clássica, não há lugar para
resultados probabilísimos. Uma ampla explicação da discussão teórica sobre o emprego
de leis estatísticas para explicação causal: STELLA. Causalitã c pmbabilità: ¡I giudice cor
puscolariano..., cit.. p. 1-43: BARTOLE, Il problema delia causalitã pénale..., cit., p. 12.
129. STELLA, Federico. La nozione penalmente rilevante di causa: la condizione neces
sária. Rtvista italiana di diritto e procedura pcnale, 1988, p. 1243.
130. STELLA. La nozione penalmente rilevante di causa..., cit., p. 1243.
131. MAGALHÃES GOMES FILHO, A motivação das decisões penais..., cit., p. 164.
VERDADE, PROVA E EPISTEMOLOGIA JUDICIARIA 113
“todas aquelas noções gerais, adquiridas através da experiência das coisas, das mais
elementares às mais científicas, mediante as quais é possível considerar um dado fato,
que aconteceu, ou que foi percebido ou de cuja certeza se está, no entanto, convencido,
como argumento ou como indício da realidade de um outro fato”.
134. TARUFFO, Michele. Senso comune. esperienza e scienza nel ragionamento dei giudice.
Sai confini, Scriiti sulla giusüzia civile. Bologna: 11 Mulino, 2002. p. 136.
135. TARUFFO, Senso comune, esperienza e scienza nel ragionamento dei giudice ..., cit.,
p. 136.
136. TARUFFO, Senso comune, esperienza e scienza nel ragionamento dei giudice ..., cit.,
p. 137.
137. Em sentido contrário, para Mannarino (Lr massime d’esperienzei nel giudizio penale
e ií loro contwllo in Cassazione..., cit.. p. 7 3) o conceito de máxima de experiência
deve compreender conjuntamente leis científicas e regras da experiência comum. Esse
sentido mais amplo também é empregado por González Lagier (Hechos y argumentos:
... In: Quaestiofacti..., cit., p. 43; Idem, Hechos y conceptos: ... ln: Quacstío facti..., cit.,
p. 76, nota 4) para quem as máximas de experiência podem ser: (i) de caráter científico
ou especializado, como as aportadas por peritos; (ii) de caráter jurídico, como as deri
vadas do exercício profissional do juiz: ou (iii) de caráter privados, isto é, experiências
correntes do juiz obtidas a margem do seu exercício profissional.
138. O conceito de máxima de experiência foi construído, segundo Taruffo (Senso comune,
esperienza e scienza nel ragionamento dei giudice..., cit., p. 141), a partir da concepção
VERDADE, PROVA E EPISTEMOLOGIA JUDICIARIA 115
Somente isso, contudo, não é suficiente para negar o emprego das máximas
de experiência do raciocínio probatório, mesmo porque, como já visto, muitas
leis científicas também se baseiam em uma inferência indutiva e, portanto, são
conclusões que geram um conhecimento provável, ainda que em determinados
casos, com probabilidade elevada, muito próximo da certeza. A diferença marcante
está em que as leis cientificas, são sujeitas a mecanismos de verificação a priori de
sua validade, além poderem ser submetidas ao contraditório de parles no curso
do processo. Por sua vez, as máximas de experiência não passam por esse efetivo
controle, justamente por serem conhecimentos obtidos a partir do conhecimento
ou cultura média da sociedade, em relação às quais não se exige prova nem testes
de verificação.139
Ainda assim, a vai idade do emprego da máxima de experiência é questionada.
Por exemplo, Slella não admite o seu emprego, fazendo referência à “pretensa ra
cionalidade do senso comum, das máximas de experiência".HDTodavia, não parece
possível deixar de utilizar noções do senso comum no raciocínio probatório.1"
Embora seja muito mais seguro o emprego de regras lógicas de validade geral,
como os cânones da matemática, bem como a utilização de regras científicas que
forneçam um grau de probabilidade muito próximo da certeza, o conteúdo dos
fatos que precisam ser julgados no processo penal não é inteiramente coberto por
leis lógicas ou científicas.142 Mannarino chega mesmo a dizer que o questionamento
sobre a utilização das máximas de experiência pelo juiz é um falso problema, pois
não há como o juiz deixar de usá-las.143
tradicional no século XIX, da indução como instrumento para construir leis gerais par
tindo de uma série de dados particulares. Todavia, como já visto supra, no 2.5, a ideia
da possibilidade de se atingir as verdades absolutas e imutáveis pela ciência, fundada na
causalidade, foi afastada, no inicio do século XX.
139. MAGALHÃES GOMES FILHO, A motivação das decisões penais.... cii., p. 165.
140. Ollre ¡I ragionevole dubbio..., cit., p. 106. Também cm tom crítico, Comanducci (Razo
namiento jurídico . . ., cit., p. 114) afirma que "mediante o uso das máximas de experiência,
fundando-se no id quod plerumque accidit, o juiz pode passar na motivação-atividade
de alguns latos assumidos como conhecidos ã formulação de uma hipótese explicativa
do caso concreto. Tal hipótese resulta justificada por uma hipótese indutiva ou. ainda
pior, mediante o recurso a vagas e pouco confiáveis máximas de experiência”.
141. Mais enfático, Mannarino (Le massime d’esperienza nel giudizio pénale e il loro con
trallo iit Cassazione. . . , cit,, p. 8 7 ) afirma que, no âmbito do processo penal italiano,
posições que negam aplicação às máximas de experiência, violam o art. 192. çomma 1,
que estabelece: "O juiz valora a prova, dando conta dos resultados obtidos e os critérios
adotado”.
142. FERRUA. II libero convincimento dei giudice penale..., p. 71.
143. Le massime d’esperienza nel giudizio penale e il loro contrallo in C assazione..., cit.,
p. 73.
1 16 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
144. TARUFFO, Senso comune, esperienza e scienza nel ragionamento dei giudice..., cit.,
p. 141.
145. O próprio Taruffo explica, em outro estudo, (Funzionc delia Prova..., cit., p. 3 1 2 ),
que “a ideia de que o senso comum produza máximas ou regras gerais idôneas a fundar
deduções doladas de validade lógica e atendibilidade cognoscitiva é sem lundamento”. Os
(atos, com observa Comanducci (RazonamientoJu r íd ic o ., cit., p. 6 7) "não são suscetíveis
de tratamento lógico: a lógica clássica e também a lógica deônüca tem a ver com enuncia
dos interpretados e não com ’Tatos'". Sobre a utilização da máxima de experiência como
premissa do silogismo no juízo de lato: CALOGERO, La lógica dei giudice e il suo contrallo
in Cassazione..., cit., p. 96; CALAMANDRE1. Piero. La genesi lógica delia sentenza civile.
In: Opere Giuridiche. Napoli: Jovene, 1965. v. 1. p. 22.
146. UBERT1S, Profili di Epistemología Giudiziaria..., cit.. p. 88.
147. Para Erich Dòhring (La prueba. Su práctica y apreciación La investigación del estado
de los hechos del proceso. Trad. Tomás Banzhaf. Buenos Aires: El Foro, 1996. p. 333) um
exemplo seria a máxima de que ninguém pode estar em dois lugares ao mesmo tempo.
É possível concordar do ponto de vista prático, com o caráter absoluto de tal máxima.
Todavia, do ponto de vista científico, não se pode deixar de considerar que ela trabalha
com uma concepção de tempo e espaço que não são mais válidas, do ponto de vista da
teoria da relatividade.
148. Usa-se a expressão no sentido dado por Thomas S. Kuhn (A estrutura das revoluções
científicas. Trad. Beatriz Vianna Boeira e Nelson Boeira. São Paulo: Perspectiva, 2009.
p. 125), que destaca o caráter não cumulativo do conhecimento numa mudança de para
digma. O autor considera "revoluções científicas aqueles episódios de desenvolvimento
não cumulativo, nos quais um paradigma antigo é total ou parcialmente substituído por
um novo, incompatível com o anterior”.
VERDADE. PROVA E EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA 117
comum que passa a incorporar conceitos científicos. Nesse caso, não se trata de
um “senso comum” no sentido vulgar, mas de uma aquisição de conhecimento
científico pelo cidadão comum. Um conhecimento que antes só era acessível a
um pequeno número de cientistas ou acadêmicos, com conhecimento altamente
especializado numa área, com o tempo, torna-se acessível porque será mais facil
mente explicável e demonstrável, passando a lazer parte do conhecimento comum,
isto é, do patrimônio cognitivo dos membros de uma sociedade. Hoje, as Leis de
Newton são ensinadas nas escolas, e as pessoas conhecem o princípio da inércia, o
princípio fundamental da dinâmica e a lei e o princípio da ação e reação. 4' O juiz,
portanto, deve estar atento e ter familiaridade com todo o espectro da realidade
submetido ao seu exame, inclusive aqueles mais modernos e dinâmicos, e extrair
deste conhecimento as regras indutivas que justificam as “novas' inferências.1
Ainda assim, as máximas da experiência, como uma racionalização do senso
comum, são utilizadas e muitas vezes estão implícitas ou pressupostas no raciocí
nio judicial, sendo o seu uso indicado por expressões como: "não é crível , “não é
verossímil”, “não pode ser aceita a hipótese que”, ou expressa em sentido inverso
“é lógico que” ou “é plausível que”, “é correto dessumir” etc.141 Uma vez utilizada,
a máxima da experiência deverá ser claramente indicada na fundamentação da de
cisão, para que seja possível o seu controle posterior. Por outro lado, o juiz somente
poderá utilizar diretamente tais noções se efetivamente forem componentes do
patrimônio cognitivo comum ao nível da cultura média da população, sendo assim
considerada como pertencentes ao conhecimento geral.132 Caso sinta necessidade
de lançar mão de qualquer conhecimento especializado, deverá fazê-lo por meio de
prova pericial, e não sob o pretexto de estar se valendo do senso comum.1491502153
149. A escolha do exemplo não foi aleatória. Não deixa de ser curioso que. mesmo ten
do restadas superadas pela teoria da relatividade, as Leis de Newton continuem sendo
estudadas e aplicadas pelas pessoas comuns. Isso porque, trata-se de um método que
fornece resultados muito próximos da realidade, com simplicidade e facilidade de apli
cação, embora em um âmbito limitado, que é justamente o dos fenômenos do dia a dia.
Especificamente no campo jurídico, Stella (Causalitd c probabiliiá: il giudice corpus-
colariano..., cit., p. 51) sentencia: ‘‘A teoria da relatividade não tem consequência para
o jurista”.
150. FASSONE, La valuiazione delia prova..., cit., p. 328.
151. FASSONE, La valutazione delia prova..., cit., p. 327.
152. MANNARINO. Le massime desperienza nel g iiulizio penale e il loro controllo in Cas-
sazione..., cit., p. 77.
153. Muito menos poderá se valer de conhecim entos atualm ente obtidos, facilmente,
em mecanismos de busca de informações na rede mundial de computadores. Primeiro,
porque não há nada que garanta que esse é um conhecimento comum, no sentido de
que sua compreensão seja acessível e empregada pelo homem médio. Além disso, muitas
vezes, se procura dar ares de cientificidade e aceitabilidade geral, a posições minoritárias
ou meras posições individuais de quem defende tais conhecimentos.
118 h p is t e m o l o g i a j u d i c i A r u e p r o v a p e n a l
situação concreta. Nesse caso, noções muito vagas do senso comum, dificilmente
serão úteis para a decisão, pois tenderão a ter pouca adequação ao caso específico.
O conhecimento também não poderá ser empregado a um caso no qual não tenha
relação. Para tanto, será útil conhecer o con junto de casos semelhantes que gera
ram aquele conhecimento comum, para verificar se há ou não similitude com a
situação específica em que se pretende aplicar a regra atendível do senso comum.
Por exemplo, admitindo que seja considerada atendível a noção do senso comum de
que, num acidente automobilístico “quem bate atrás é o culpado ’, essa regra é
extraível de casos em que, pela dinâmica da colisão, o veículo que trafegava
atrás de outro, não conseguiu evitar a colisão com o que ia à sua frente, após a
frenagem deste. Esse conhecimento, contudo, é inadequado para casos em que o
veículo que se posicionava à frente, estando ambos parados, tenha dado marcha à
ré e colidido com o que estava atrás.
Normalmente, é por meio de noções do senso comum que se valoram os
indícios.157 A partir de um fato conhecido e provado, que não constitui o tema
probatório; por meio do qual se infere o fato que é o objeto do thema pwbanclum.
A ligação entre ambos os fatos se dará por regras gerais, sendo utilizadas, muitas
vezes, as máximas de experiência. Por exemplo: a testemunha T diz que viu o
suspeito A andando pelo jardim da casa em que a vítima Vfoi morta a facadas, dias
antes. No caso, com base em tal elemento concreto, e utilizando uma máxima de
natureza geral - “todo criminoso volta ao local do crime” - se chega à conclusão
de que A é o criminoso que matou V.158
Também nas chamadas provas diretas, as máximas de experiência são utiliza
das. Por exemplo, se uma testemunha presencial T narra ao juiz ter visto o acusado
A deferindo golpes de faca na vítima V. Ainda assim, haverá necessidade de um
raciocínio inferencial a ser utilizado pelo juiz, para que se chegue à conclusão de
que está provado que o acusado A foi o autor das lesões corporais causadas com
157. No sentido de que essa conexão lógica dos indícios se dá por meio das máximas de
experiência: STEIN, El conocimiento privado del ju ez.... cit., p. 44. E isso não decorre do
falo de os indicios serem considerados provas indiretas". Todo meio probatório envolve
um raciocínio inferencial e, nesse sentido, é indireto. Nos indicios, o que se tem é um
raciocínio inferencial mais complexo ou com inferências em cadeia.
158. De forma mais completa, embora pessoalmente sem acreditar na força indiciaria do
exemplo, tem-se: Premissa P l: A testemunhei T disse que viu A andando no local do crime,
dias depois de sua ocorrência. O juiz se vale, então, da máxima de experiência, como
premissa P2: As testemunhas falam a verdade em juízo. Conclusão C l: A estava andando
no local do crime, dias depois de sua ocorrência. Esse será o fato conhecido e provado que
será a base do indício. Então, na prova indiciaria, a Premissa li (Conclusão C): A estava
andado no local do crime, dias depois de sua ocorrência. Aplica-se, então, nova máxima
de experiência Premissa 2i: Todo criminoso volta ao local do crime. A conclusão C2 será:
Há indicio que A é o autor do crime.
120 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
emprego de arma branca na vítima V. O juiz apenas teve contato direto com o
depoimento da testemunha presencial T. Isso somente lite dará a certeza de que T
afirmou, em sua presença, que A esfaqueou V. O julgador empregará, então, uma
máxima de experiencia: "as pessoas, convocadas para depor em juízo, normalmente
dizem a verdade sobre o que sabem”. Essa premissa geral se liga à premissa particu
lar de que testemunha presencial T, em seu depoimento, disse ter visto o acusado
A deferindo golpes de faca na vítima V. Disso se seguirá a conclusão, meramente
provável, de que o Acusado A foi o autor dos golpes de faca que causaram as lesões
corporais na vítima V.159
E necessário ter muito cuidado com generalizações espúrias, que não são
comprovadas e que, muitas vezes, sequer constituem verdadeiro "senso comum”,
mas que são utilizadas pelas partes, com fundamento retórico-persuasivo para
defesa de suas posições em juízo, ou mesmo pelo julgador, para buscar cobrir um
vazio probatório relevante. No julgamento de O. J. Simpson,16016para demonstrar
que o acusado tinha sido o autor do crime, aacusação utilizou a seguinte “máxima de
experiência” para afastara hipótese que o assassino seria um estranho: “um cachorro,
que de noite sente a aproximação de um estranho, late”!lhl No caso, como os vizinhos
não ouviram o cachorro latir, quem teria entrado na casa em que o crime ocorreu seria
159. No sentido dc que o emprego da máxima de experiência, nesse caso, leva a um ra
ciocínio dedutivo: DOMINIONI, Oreste. La valutazione delle dichiarazioni dei pentiti.
Rh'ista di Dirilto Processuale, 1986. p. 748; MAGALHÃES GOMES FILHO, .4 motivação
das decisões penais..., cit.. p. 157. Discorda-se, justamente porque fundada em uma má
xima de experiência, que é uma generalização de caráter probabilístico, não é possível
aplicá-la a um raciocínio dedutivo. A conclusão nunca será necessária, mas somente
provável.
160. No caso The people of the State o f California vs. O. G. Simpson, de 1994, Orenthal
James Simpson foi acusado do duplo homicídio, de Nicole Brown Simpson e Ronald
Goldman, tendo o júri, ao final, declarando-o “not guilty”, por falta de provas da autoria
delitiva beyond anv reasonable doubt. Aliás, nào deixa de ser curioso que a mesma máxi
ma de experiência tenha sido utilizada em livro de Conan Doyle, cujo suspeito linha o
mesmo patronímico: Fitzroy Simpson. No livro “O estrela dc prata e outras aventuras de
Sherlock Holmes", o famoso detetive foi chamado para desvendar o desaparecimento do
cavalo "Estrela de Prata’ , que era o favorito da Taça Wessex, e o trágico assassinato
de seu treinador John Straker. O principal suspeito era o forasteiro Fitzroy Simpson.
Depois de realizar algumas diligências, Holmes explica, com base na mesma máxima
de experiência usada em seu raciocínio abdutivo, porque não lora Simpson o autor do
furto do cavalo retirado do estábulo durante a noite. "Antes de decidir essa questão,
concentrei-me no fato de o cão não ter ladrado, porque uma conclusão verdadeira sugere
sempre outras. O incidente de Simpson indicava que o cão não saíra dos estábulos e, no
entanto, não ladrara o suficiente para acordar os moços que dormiam no sótão, embora
alguém houvesse entrado e levado um dos cavalos. Torna-se assim claro que o visitante
daquela noite era uma pessoa que o animal conhecia muito bem”.
161. STELLA. Ohre ¡1 ragionevole dubbio..., cit.. p. 107.
VERDADE. PROVA E EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA 121
partes. Como diz Perfecto Ibáñes, “o ideal a que tende o processo penal no Estado
de direito é que cada vez que se faça uma afirmação do gênero: ‘Fulano fez isso’,
seja verdade porque, de fato, tenha sido assim”.165
E preciso, contudo, esclarecer de que “verdade” se está falando. Reconhecer a
importância de se buscar a verdade, entendida em um sentido correspondentista,
não significa que o conhecimento pleno e completo dessa verdade absoluta, ou com
V maiúsculo, seja atingível.166 Por outro lado, o fato de uma verdade não poder ser
conhecida com certeza “absoluta”, não deve levar à conclusão de que o conceito de
verdade deve ser relativizado,167 ou que inexistiriam verdades absolutas no sentido
de que um enunciado fático corresponda aos fatos objetivos, isto é, empiricamente
ocorridos. A premissa epistemológica adotada nesse livro aceita um conceito de
verdade como correspondência, mas com plena consciência de que o conhecimento
total e completo dessa identidade é inatingível.168
Isso não significa, por outro lado, que a “verdade objetiva” ou “verdade abso
luta” não teria, função alguma. Embora se sabendo inatingível, no sentido de que
nunca será possível conhecer tal verdade, ela sempre deverá ser buscada, procu
rando-se, na maior medida possível, dela se aproximar. Como explica Popper, “uma
grande vantagem da teoria da verdade objetiva ou absoluta é que ela nos permite
dizer que buscamos a verdade, mas podemos não saber quando a encontramos; que
não dispomos dc um critério para reconhecê-la, mas que somos orientados assim
mesmo pela ideia da verdade como um princípio regulador”.169170
No processo e no campo probatório, a noção de verdade como um princípio
regulador também é relevante. A verdade objetiva tem a função de ser um “ideal
regulativo", para o legislador, na individualização do método de acertamento, e para
o juiz, nas valorações e nas escolhas fáticas que tal método lhe imponha a realizar.1 0
Será, assim, um critério conceituai de fundo que explica e justifica a atividade
probatória.
De qualquer modo, como se defende a premissa de que a verdade é uma condi
ção da decisão justa, é preciso esclarecerem que sentido se afirma tratar-se de uma
verdade não absoluta ou, o que seria o reverso da moeda, “relativa”. A verdade é
“relativa”, no sentido de que é impossível se atingir um conhecim ento que cor
responda totalmente à realidade dos acontecimentos passados. Mas ela não é sub
jetiva, no sentido ser fruto do mero convencimento pessoal do julgador ou mesmo
de sua persuasão independentemente de dados objetivos. Ainda que não absoluta,
se trata de uma verdade “objetiva”, no sentido em que o parâmetro da correspon
dência do conhecimento é a realidade dos fatos empiricamente constatável.
Por tal motivo, a impossibilidade de se atingir o conhecimento total da ver
dade não retira a importância de trabalhar com um modelo dc aplicação da teo
ria do conhecimento ao campo do processo penal.171 A consciência da falibilidade
do acertamento judiciário - posto que baseado num método indutivo - não sig
nifica que se deva renunciar a predispor meios para reduzir ao máximo o risco de
169. POPPER, Conjectura e refutação..., cit., p. 251. De modo semelhante, para Matida
e Herdy (As inferências probatórias.... cit., p. 21 1 ) “a verdade desempenha o papel de
um ideal regulativo no direito: nem sempre possível, mas sempre desejado". Há, porém,
diferença em ambos posicionamentos, no que diz respeito à possibilidade de se atingir um
conhecimento da verdade. Nossa posição é no sentido de impossibilidade de se atingir
um conhecimento da verdade. Do ponto de vista do conhecimento, nunca será possível,
como certeza racional, dizer que se conhece a verdade.
170. Nesse sentido: FERRUA, II giuslo processo..., cit., p. 7 2 ; TARUFFO, Os poderes
instrutórios das partes e do ju iz..., cit., p. 78, nota 9 9 ; TUZET, Filosofia delia prova
giuridica..., cit., p. 76-77; ADORNO. Rossano. Lammissione delia prova in dibattimento.
Torino: G. Giappichelli, 2012. p. 18. De modo semelhante, para González Lagier (He
chos y argum entos:... In: Quaestio facti..., cit., p. 71) se a verdade absoluta inatingível
aos juízes, como para toda pessoa em geral, isso não autoriza a abandonar os esforços
para que nosso conhecimento da realidade se aproxime o máximo possível da verdade.
De modo semelhante, para Comanducci (RazonamientoJurídico. .., cit., p. 110) o conceito
semântico de verdade como correspondência só pode servir “como limite ideal” ou como
"pedra de toque”.
171. Até porque, para decidir com justiça, com observa Paolo Tonini (La prova pénale. 4. ed.
Padova: Cedam, 2000. p. 31) “non occorre che la ricostruzione dei falto storico sia
perfeita’; è sufficiente che sia ragionevole”.
124 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
erro.1' - Não será possível ao julgador afirmar, com absoluta certeza, do ponto de vista
racional, que um enunciado fático é verdadeiro, porque corresponde à realidade
dos acontecimentos.1' 5Sendo a conclusão da inferência probatória sempre apenas
provável-no sentido probabilístico-a certeza que se obtém por meio de tal infe
rência probatória nunca será um certeza lógica, sempre havendo, uma margem -
maior o menor - para o erro.1H Mas é possível, com base em uma probabilidade
lógica,1,5 considerar racionalmente que um enunciado fático é preferível a outro
com ele incompatível ou mesmo apenas divergente, diante da maior corroboração
do primeiro.176
Para Taruffo, é possível estabelecer “um conceito bastante claro de verdade
judicial, como grau adequado de confirmação racional das afirmações sobre a ver
dade dos fatos”, sendo estranho a tal conceito “qualquer conotação absolutizante,
mas, também, qualquer implicação cética sobre a possibilidade de obter um grau
adequado de certeza sobre os fatos da causa”.177 O conceito pode ser aceito com a
172. FERRUA, II libero convincimento dd giudice penale..., cit., p. 69. Para Tuzet (Filosofia
delia prova giurídica..., cit., p. 78) “a posição preferível é do falibilista, que admite uma
verdade objetiva, mas reconhece também a nossa falibilidade, convidando, portanto, à
prudência e ao controle escrupuloso das nossas crenças ou hipóteses”.
173. Usa-se a expressão “certeza” no sentido de convencimento subjetivo do julgador que,
portanto, está no homem e não no fato. Como já dizia Gaetano Filangieri (La scienza
delia legislazione. Con giunta degli opuscoli scelti. Milano: Società Tipogr. de Classici
Italiani, 1822, v. 3, p. 156), ao tratar do critério da “certeza moral”, “esta, como qualquer
outra certeza, não está na proposição, mas no ânimo. Um homem, assim, pode estar
certo da verdade de um fato que é falso; ele pode duvidar de um fato que é verdadeiro;
ele pode estar certo de um fato do qual outros duvidam; ele pode duvidar daquilo que
para um outro é certo”.
174. GONZÁLEZ LAG1ER, Hechos y argumentos: ... In: Quaestio facti..., cit., p. 70. No
mesmo seniido: FASSONE, La valutazione delia prova..., cit.. p. 333.
175. Sobre o contexto da valoração e os diferentes modelos de raciocinio judicial, cf.,
infra, cap. 3, item 3.5.3.
176. GAROFOLI, Vincenzo. Verità Storica e Verítà Processuale: Limponibile endiadi in
un processo virtualmente accusatorio. In: GAROFOLI, Vincenzo; INCAMPO, Antonio.
Verità e processo penale. Milano: Giuffrè, 2012. p. 50. No mesmo sentido: GASCÓN
ABELLÁN, Los hechos en le derecho..., cit., p. 45; FERRER BELTRÁN, La valoración
racional de ¡aprueba.... cit., p. 92. Para lacoviello (I criteri di valutazione della prova....
cit., p. 395) cabe substituir a ideía de certeza pela de probabilidade, “numa racionalidade
argumentativa que é típica de urna lógica do provável”.
177. Note per una riforma..., cit., p. 250. Essa mesma noção é adotada, no campo das cien
cias, por KarI Popper (A lógica da pesquisa cientifica. Trad. Leónidas Hegenbert e Octanny
Silveira da Mota. São Paulo: Cultrix, 2007. p. 309 - Adendo 1972) quando afirma que,
mesmo diante do problema lógico e metodológico da indução, com a impossibilidade
de justificar racionalmente uma teoria como verdadeira, complementa: “essa solução
negativa é compatível com a seguinte solução positiva, comida numa regra para preferir
VERDADE, PROVA E EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA 125
teoria mais bem corroboradas que outras. É possível, algumas vezes, justificai; de modo
racional, a preferência que manifestamos por uma teoria, lendo em conta a corroboração
que recebeu - isto é, lendo em conta, num dado momento, o ponto a que chegaram as
discussões críticas e torno de teorias rivais, sendo essas teorias criticamente examinadas
com o propósito de constatar o quanto se aproximam da verdade”.
178. GONZÁLEZ LAGIER. Hechos y argumentos: ... In: Quaestio facti..., cit., p. 70. De
modo semelhante, para Comanducci (RazonamientoJurídico..., cit., p. 110) afirmar que
um enunciado fático é verdadeiro só pode ser aceito “utilizando um sentido de Verdadeiro’
que só pode querer significar o mais provável no estado de conhecimento atual’”.
179. FERRER BELTRÁN. Prueba y verdad en el derecho..., cit., p. 29-38.
180. FERRER BELTRÁN. Prueba y verdad en el derecho..., cit., p. 30-31.
181. Nesse sentido, na doutrina nacional, é o posicionamento de Salah H. Khaled Jr. e
Gabriel Antinolfi Divani (A captura psíquica do juiz e o sentido da atividade probató
ria no processo penal contemporâneo. Revista Brasileira de Ciencias Crimináis, v. 156.
jul. 2019. p. 4 2 0 ) que defendem que a finalidade da atividade probatoria é a “captura
psíquica do juiz”. E apoma que tal perspectiva “pode contribuir para atenuar os infeliz
mente rotineiros voluntarismo e decisionismos nas práticas judiciais, assim como pode
126 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
verdadeiro, ainda que não o seja! Claro que o convencimento subjetivo do juiz
não é algo irrelevante.182 Ao contrário, é necessário e, muitas vezes, é o objetivo
das partes, ou melhor, do defensor e do Ministério Público. Mas o convencimento
psicológico do juiz é apenas uma condição necessária, mas não suficiente, à qual
se deve engajar critérios de racionalidade e regras da lógica.183 Além de convencer
o juiz, uma concepção racionalista da prova exige mais: é necessário que aquilo
que o juiz declarou provado no processo coincida com a verdade do ocorrido.184
Assim sendo, o enunciado “está provado que p" deve ser entendido como
sinônimo de “há elementos de prova suficientes a favor de p". Isso não quer dizer
que a proposição, porque está provada, seja verdadeira. Uma hipótese fática pode
resultar provada ainda que seja falsa.185Assim sendo, afirmar que “está provado que
p” denota que esse enunciado será verdadeiro quando se dispuser de elementos de
prova suficientes a favor de p, e falso quando não se dispuser de elementos de prova
a favor de p ou quando eles forem insuficientes. 186 Todavia, isso não exclui que o
193. CONDE, Francisco Munoz. La bítsqticda de la verdad en cl pwceso penal. 2. ed. Buenos
Aires: Hamurabi, 2003. p. 112.
194. MARQUES, Elementos..., cit.. v. 2. p. 293-294.
193. ILLUMINATI, La presunzione d'innocenza delVimputalo..., cit., p. 78. De forma se-
malhante, Piero Calamandrei (Processo e giustizia. Ri vista di dirítto processuale, 1950,
p. 284) já afirmava que “o processo é, antes de tudo, um método de cognição". Também
para Francesco Mauro lacoviello (Prova e accertamemo dei falto nel processo penale
riformato dalla Corte Costituzionale. Cassazione penale, 1992, p. 20 2 9 ) “o processo é
um método de conhecimento”.
196. Em sentido contrário, para Stein (Foundations of Evidence Law..., cit.. p. 118 e ss.)
em tais casos não há um conflito entre epistemologia e outros valores sociais ou morais
que o direiLo busque proteger, mas entre distintos valores que recebem proteção jurídica,
na medida em que a descoberta da verdade também é um valor tutelado pelo direito.
197 Para Ferrer Beltrán (La valoración racional de las pruebas..., cit.. p. 83; Idem, La prueba
es libcrtad__cit.. p. 31) ser a verdade um objetivo institucional do processo “não lhe
outorga um maior valor moral (...) mas mostra que no conflito entre esse objetivo do
direito e outros possíveis objetivos, o primeiro tem uma preferência estrutural que faz
com que não possa ceder sempre”. De forma semelhante, para Goldman (Knowledge
in a social world..., cit., p. 283) depois de afirmar que “a verdade é um valor primário
e central nos sistemas legais de adjudicação”, complementa, afirmando que ainda que
haja outros valores que devam ser considerados, “veritistic considerations do have pride
of place”.
VERDADE. PROVA E EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA 129
198. Por outro lado, nesta tríade de valores, não há uma posição institucionalmente pri
vilegiada de um sobre o outro. Ao contrário, deve haver um funcionamento integrado.
Por exemplo, o direito material, no caso. o direito penal somente cumprirá sua função
de mecanismo de orientador e motivador das condutas em sociedade se as consequências
jurídicas previstas no preceito sancionador de cada um dos tipos penais somente forem
aplicadas nos casos em que aquela ação ou omissão tenha sido efetivamente praticada
pelo seu autor.
3
EPISTEM O LO G IA JU D ICIÁ RIA E
C O N TEX TO S PRO BA TO RIO S
A primeira parte da obra teve por finalidade expor premissas, legais e epis
temológicas, para que se pudesse desenvolver, nessa segunda parte, o coração do
trabalho. No capítulo l foram analisados aspectos legais e jurídicos fundamentais
para a compreensão do juízo de falo no processo penal. No capítulo II foram ex
postos os fundamentos epistemológicos relevantes para a produção e, principal
mente, para a valoração da prova penal, com vistas à possibilidade de se atingir um
conhecimento verdadeiro. É chegada a hora de estreitar o relacionamento entre
ambos, propondo para o processo penal um modelo de epistemología judiciária.
132 EPISTEMOLOGIA JUDICIARIA E PROVA PENAL
1. O racionalismo, nesse sentido, não é utilizado como corrente filosófica que. quanto à
origem do conhecimento, vê no pensamento a fonte principal do conhecimento humano,
que deve ser logicamente necessário e umversalmente válido. Não se trata de raciona
lismo como corrente antagonista do empirismo. No sentido utilizado, o racionalismo
considera que a razão é a fonte do conhecimento relativo ao mundo físico, no sentido
em que é empregado no conhecimento científico como método racional que aplica a
razão aos dados sensíveis.
2. ANDERSON, Terence; SCHUM, David; TWINING, William. Análisis de la prueba. Trad.
Flávia Carbonell e Claudio Agüero. Madrid: Marcial Pons, 2015. p. 117. Essas pre
missas também variam de autor para autor. Por exemplo, Susan Haack (Epistemology
and the lavv of evidence: problems and projecLs. Evidence malters. Science, prool, and
truth in the law. Nova York: Cambridge Un. Press, 2014. p. 12) afirma que sua teoria
é "evidencialista, experiencialisia, gradualista, funderentista, quase-holística e relativa
ao mundo". Já para Ferrar Beltrán ( Prolegómenos para una teoria sobre los estándares
de prueba..., cit., p. 4 0 2 ): "1) Há uma relação teleológiea entre a prova e a verdade, de
modo que a verdade se configura como um objetivo institucional a ser alcançado pela
prova no processo judicial. 2 ) O conceito de verdade em discussão, que resulta útil para
dar conta dessa relação teleológiea, é o de verdade como correspondencia, de maneira
que se pode dizer que um enunciado fático (formulado no marco de um processo judicial
e submetido à prova) é verdadeiro se, c somente se, corresponde ao que aconteceu no
mundo (externo ao processo). .3) Nunca um conjunto de elementos de juizo, por mais
rico e confiável que seja, permitirá alcançar certezas racionais - não psicológicas ou
subjetivas - a respeito da ocorrência de um fato, de forma que todo enunciado fático é
necessariamente verdadeiro ou falso, mas as naturais limitações epistêmicas colocam
-nos sempre diante de decisões que devem ser adotadas em contextos de incerteza. 4) O
raciocinio probatorio é, portanto, necessariamente probabilístico. Ou seja, dizer que
um enunciado fático está provado é afirmar que ele é provavelmente verdadeiro (a um
nivel que deverá ser determinado), dadas as provas disponíveis?”.
3. Ferrer Beltrán (Prolegómenos para una teoría sobre los estándares de prueba..., cit.,
p. 4 0 6 , nota 12) destaca que: “A teoria geral da prova deve apontar seus esforços para
duas estratégias, para as quais dispomos de instrumentos distintos. A primeira é a redução
dos erros, para a qual, fundamentalmente, há que se conceber mecanismos processuais
que maximizem a incorporação do maior número possível de provas relevantes ao
EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E CONTEXTOS PROBATÓRIOS 133
"a justificação das proposições sobre os fatos que integram o raciocínio do julgador no
momento em que se lhe exige uma decisão sobre quem merece a tutela jurisdicional
no caso individual".
10. HAACK, Susan. Epistemology and the law of evidence: problems and projects. Evidence
matters: Science, proof, and truth in the law. Nova York: Cambridge University Press,
2014. p. 6.
11. LAUDAN, Verdaã, errory proceso pena!..., cit.. p. 23.
12. O labor do epistemólogo jurídico é, segundo Matida e Herdy (As inferências probató
rias..., cit., p. 211) “ora se ocupar de descrever as regras e práticas jurídicas que promo
vem e/ou frustram a busca pela verdade; ora prescrever a sua modificação de forma a
diminuir a distância entre o direito e a realidade externa".
13. Ferrer Beltrán (Prolegómenos para una teoria sobre los estándares de prueba..., cit.,
p. 408) esclarece que a epistemologia judiciária deve estar interessada na diminuição
dos erros, sendo que os instrumentos adequados para maximizar as probabilidade de
acerto da decisão probatória são os que buscam promover a formação de um conjunto
probatório o mais rico possível, quantitativa e qualitativamente.
14. Diversa parece ser a perspectiva de Laudan (Verdad, crm ry proceSÓ penal.... cit., p. 26)
que se propõe a elaborar um sistema hipotético que seja. “ótimo desde o ponto de vista
epistêmico".
EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E CONTEXTOS PROBATÓRIOS 135
15. TARUFFO, La prova deifatti giuridici..., cit.. p. 68. No mesmo sentido, na doutrina
nacional: MATIDA: HERDY, As inferências probatórias.... cit.. p. 210.
16. SARACENO, La decisione sulJatto incerto.... cit., p. 15. No mesmo sentido: PROCACCINO,
Angela. Non liquet, criteri di giudizio dibattimentale, e prognosi nelfudienza prelimi-
nare: 1' "oltre ¡1 ragionevole dubbio" e un ipotese di difíusività. In: GAROFOL1, Vicenzo
(Org.). Unità dei sapere giuridico ed etewgeneità dei saperi dei giudice. Milano: Giuflrè,
2005. p. 334; GASCÓN ABELLÁN, Los hcclios en el dereclw..., cit., p. 119.
17. FERRER BELTRÁN, La prueba es libertad..., cit., p. 34.
18. ANDRÉS IBÁNES, Sobre a motivação dos fatos na sentença penal..., cit.. p. 97.
136 EPISTEMOLOGIA JUDICIARIA H PROVA PENAL
19. DAMASKA, Mirjan. ll diritto delle prove alia deriva. Trad. Francesca Cuoma Ulloa e
Valentina Riva. Bologna: 11 Mulino, 2003. p. L38.
20. Como destaca Jordi Nieva Fenoll (La valoraciôn racional de la prueba. Madrid: Marcial
Pons. 2010. p. 41), as ordálias não eram um meio de prova nem um sistema de valora
ção da prova, pressupondo, ao contrário, uma total ausência de valoração, inexistindo
qualquer atividade do julgador de análise dos resultados da atividade probatória. E
conclui: "simplesmente se realiza um ato similar a laçar uma moeda para o ar, para dar
razão a uma ou outra parte”. Também para Taruffo (Os poderes instrutórios das partes
e do juiz..., cit., p. 7 6), as ordálias tinham 'tão-somente uma função marginal e sim
bólica: não seria outra coisa que uma espécie de representação ritual, que é celebrada
não porque se trata de um instrumento institucional orientado para administração da
justiça, mas porque serve para fa zer crer, às partes e à sociedade em geral, que a justiça
está sendo realizada, na esperança que desse modo as partes se convençam de terminar
com a controvérsia e a paz social seja reconstruída”.
21. O homem medieval vivia num contexto em que o seu corpo, os seus atos, os ciclos das
estações e das estrelas eram componentes da sua vida, razão pela qual se dava grande
importância para imaginação, o sonho, os gestos. Nesse contexto, explica Branbilla
(Itinerari deliagiustizia..., cit., p. 4 6 ), ”o pensamento não se distanciava da experiência,
mas a traduzia através de um sistema de signos e símbolos". Essa "racionalidade" da
época, se refletia no sistema probatório. Como explica Cario Furno ( Teoria de la prueba
legal. Trad. Sérgio Gonzalez Collado. Madrid: Ed. Revista de Derecho Privado, 1954.
p. 145-146): a antiga concepção germânica do processo era um reflexo do sentimento dc
superstição mística que governavam as mais importantes atividades daquele povo, sendo
compatível com essa visão de mundo, considerar que o poder de fazer justiça também
não era algo que pertencesse aos homens, mas um atributo da divindade, onipresente e
onisciente. A consequência disso é que “o julgamento, na sua integralidade, se configura
como uma invocação ou um convite para a divindade para que se dignasse manifestar,
por sinais tangíveis, seus inescrutáveis desígnios. Para facilitar a resposta divina (juízo
de Deus), a invocação era seguida por provas de força ou de destreza (duelo, prova do
fogo, etc.) ou pela afirmação solene do próprio direito (juramento com caráter sagrado,
prestado geralmente por terceiros, chamados conjuradores), cujo resultado simbolizava
a decisão, sem que tivesse modo de distinguir entre o fato e o direito. O juiz não tinha
outra função a não ser, com sua presença, a regularidade da prática das provas e de seu
EPISTEMOLOGIA JUDICIARIA E CONTEXTOS PROBATÓRIOS 137
resultado, adaptando a ele sua decisão e garanündo seu acatamento por meio de sua
autoridade. Portanto, não se linha em conta a convicção do juiz, mas só o êxito ou o
fracasso daqueles atos ilógicos, cujo resultado casual dependia da distribuição da razão
ou do erro entre os contendores, como se se tratasse de una admoestação reveladora
da suprema justiça divina”. Para o que interessa ao objeto principal da presente obra, a
definição de um modelo racional e controlável de valoração das provas, é de se ressaltar
que as ordálias, os duelos e os juramentos, embora fossem adequados para o espirito da
sociedade da época, não representam verdadeiros mecanismos probatórios e não exigem
uma efetiva atividade valorativa do julgador.
22. RABELAIS. François. O terceiro livro dos fatos e ditos heróicos do Bom Pantagruel. Trad.
Élide Valarin Oliver. Cotia: Ateliê; Campinas: Editora da llnicamp, 2006. cap. 39. p. 2 3 1
234. Em tal passagem, o magistrado chamado a explicar, perante a Corte Suprema, uma
sentença por ele proferida que foi considerada dúbia, contou que sempre decidia as
sentenças pela sorte, lançando os dados e, por mais de 4 0 anos, assim agiu sem jamais
ler qualquer sentença considerada equivocada, a não ser na última, que por isso mesmo
loi objeto de apelação. E, mesmo assim, o juiz Bidoyer, que já eslava velho, atribui o erro
não aos dados ou à sorte, mas ao fato de que já não enxergava bem e podia ter errado
ao tentar distinguir os números dos dados, tendo tomado um quatro por um cinco e,
por isso, ter sentenciado errado.
23. REICHENBACH. La nascita delia filosofia scientifica..., cit., p. 237.
24. REICHENBACH. La nascita delia filosofia scientifica..., cit., p. 235.
25. UBERTIS, Profili di epistemologia giudiziaria.... cit.. p. 29.
138 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
para os explicar.2'' Essa justificação de uma teoria com base nos dados observados
se faz por meio de inferencia indutiva, que confere a cada teoria investigada ou
cogitadas pelo cientista um grau de probabilidade, sendo a teoria considerada a
mais provável aceita como correta.27
Interessante observar, com vistas à utilização de aportes epistemológicos no
campo processual, que Reichenbach sustentava que a lógica indutiva utilizada no
context o f justificalion não é nada mais do que uma hipótese específica ou particular
do problema gcral da prova indi reta, ilustrando a situação com um problema de inves
tigação criminal: "Como ilustração do problema gcral se pode recordaras inferencias
realizadas por um investigador que busca descobrir o responsável por um crime.
Há alguns dados, como um lenço sujo de sangue, um cinzel e o desaparecimento de
uma viúva rica. O investigador tema determinar a explicação mais provável. Suas
considerações seguem certas regras de probabilidade; utilizando todos as pistas do
fato e todo o seu próprio conhecimen to da psicologia humana, ele subsequentemente
controla, por meio de outras observações feitas precisamente para esse propósito.
Cada controle, baseado sobre novos dados, aumenta ou diminui a probabilidade da
explicação previamente escolhida, embora esta não possa ser considerada absoluta
mente certa. Todos os elementos lógicos necessários para analisar o procedimento
diferencial do investigador podem ser encontrados no cálculo das probabilidades.
Ainda que no exemplo dado falte o material estatístico para um cômputo exato das
mesmas, seria possível aplicar ao menos as fórmulas de cálculo em sentido qualitativo.
Naturalmente, não se poderá atingir resultados numericamente precisos se o material
à disposição permite apenas valorações genéricas da probabilidade”.28
Essa dupla dimensão, do comexto da descoberta e do contexto da justificação,
comumente empregada no âmbito epistemológico-científico, tem sido transpor
tada para o mundo jurídico e, em especial, para a atividade desenvolvida sobre os
juízos de fato no processo.MA disiinção, contudo, precisa de refinamentos e, mais
30. Nesse sentido: UBERT1S, Profili di epistemologia giudiziaria..., cit., p. 26; TUZET, Filo
sofia delia prova giuridica..., cit., p. 15; MAGALHÃES GOMES FILHO. A motivação das
decisões penais..., cit., p. 113-114.
31. TUZET, Filosofia delia prova giuridica..., cit., p. 37.
32. Ibidem, p. 38.
140 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
33. Ubertis (Pmfili di epistemologíagiucliziaria..., cit., p. 30) assim sintetiza seu pensamento:
“Em conclusão, e esquematicamente, enquanto a sequência científica (em que falta um
juiz' e é quem descobre’ que deve. portanto, justificar) é l ) contexto da descoberta e
formulação da hipótese; 2) contexto de justificação e eventual convalidação; a sequên
cia judiciária é: 1) contexto de descoberta e formulação da hipótese (é o momento da
instrução primária, no que, portanto, se o seu resultado é hipótese’ para o juiz, para a
parte que a formula é já decisão': não é por acaso se sustentou que. para quem propõe
o processo, a ‘demanda’ equivale ao ‘modelo’ da desejável sentença); 2) contexto de
pesquisa (é o momento da instrução probatória ou secundária, que se desenvolve pe
rante o juiz): 3) contexto de decisão; 4 ) contexto de justificação. E parece, em qualquer
caso, adequado reiterar que existe sempre uma ligação dialética entre os contextos de
descoberta, pesquisa, decisão e justificação”.
34. UBERTIS, Profil i di epistemología giudiziaria..., cit.. p. 83-84.
35. Essa distinção é feita por Ferrer Beltrán (La valoración racional de la prueba.... cit.,
p. 41; Idem. La prueba es libertad..., cit.. p. 2 4 ). que considera haver três momentos
fundamentais no direito probatório: (i) a formação do conjunto de elementos de jul
gamento com base nos quais se proferirá a decisão; (ii) a valoração desses elementos;
(iii) propriamente a tomada da decisão. Também Gascón Abellán (La valoración de la
prueba..., cit., p. 3 8 9 -3 9 0 ) afirma que é importante distinguir duas atividades estreita
mente relacionadas, mas distintas: (i) a valoração e a (ii) decisão. Valorar consiste em
avaliar o apoio, em termos probabilísticos, que os meios cie prova conferem à hipótese
fática em consideração, enquanto que decidir consiste em determinar se a probabilidade
alcançada por essa hipótese é suficiente para a considerar verdadeira.
EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E CONTEXTOS PROBATORIOS 141
descoberta de outros elementos não cogitados, mas que igualmente também estariam
num desdobramento lógico de H. Por ou tro lado, podem ser descobertos elementos
R. RI ou R2, que refutem a hipótese H, por serem com cia logicamente incompatíveis.
Em suma, a partir dos elementos ou dados obtidos, a hipótese H preliminar
formulada poderá ser confirmada ou refutada. Neste último caso, haverá a ne
cessidade de formulação de uma nova hipótese, com nova verificação, até que se
obtenha uma hipótese suficientemente corroborada.
Todavia, no processo penal, em que a persecução se divide em uma fase de
investigação prévia, que não se dá perante o julgador, e outra de produção de pro
vas. que ocorre perante o juiz que vai decidir, é fundamental que tais momentos
sejam tratados de modo distinto. Essa distinção se justifica não só do ponto de vista
jurídico, por ser diversa a matriz principiológica de cada uma delas, mas também
por se desenvolverem com base em estruturas epistemológicas distintas.
Como já exposto, a atividade de investigação pressupõe a formulação de uma
hipótese inicial por quem investiga. Essa formulação se dá por critérios distintos,
não apenas racionais, mas também governados por processos intuitivos.41 Nesse
momento, o investigador se vale de um raciocínio ou método abdutivo. A hipótese
inicial formulada será testada pelo conjunto dos atos investigatórios posteriormente
desenvolvidos e, seja a hipótese inicial provisória, seja outra que se formule durante
a investigação, será apresentada ao final, como resultado da investigação.
Encerra-se, assim, o contexto da investigação, e terá início o contexto da instrução.
Com a conclusão da investigação propriamente dita, havendo concordância
do órgão acusador, a hipótese investigatória se transforma na hipótese acusatória.
No processo propriamente dito, também existe uma hipótese fática a ser verificada
ao longo da instrução, consistente nos fatos imputados na acusação. Mas, diferen
temente do contexto da investigação, ela já está previamente definida.4243*O objeto
do processo é posto no ato inicial, de denúncia ou queixa, consistindo na afirma
ção de um fato, penalmente relevante, atribuído ao acusado. Fica fora, portanto,
da atividade judicial, isto é, de quem vai decidir,/omudar a hipótese probatória.45
Jurídico..., cit.. p. 112) observa que, no modelo teórico garantisla de processo penal
acusatório, “o juiz não tem que dar conta na motivação do procedimento mediante o qual
'descobriu' a conclusão fática, já que não a descobriu, mas somente a encontrou: sc trata,
de fato, das hipóteses da acusação e da defesa'. E complementa: “dada a presunção de
inocência, a hipótese que terá que ser demonstrada verdadeira ou falsa é a da acusação".
44. 1ACOV1ELLO, I criteri di valutazione delia prova..., cit.. p. 399.
45. Nesse sentido: TARUFFO. La prova dei fatti giuridici..., cit., p. 4 2 0 : UBERT1S. Profili di
epistemologia giudiziaria..., cit., p. 26. Segundo a proposta da lese, trata-se de um con
texto de "decisão" em sentido lato, como gênero, que envolve as atividades de valorar
e decidir, embora cada uma dessas espécies necessite de regime próprio.
46. UBERT1S, Profili di epistemologia giudiziaria..., cit.. p. 29.
144 EPISTEMOLOGIA JUDICIARIA E PROVA PENAL
47. Filosofia da ciência natural..., cit.. p. 35. E complementa Hempel (op. cit., p. 33): “Quando
o controle experimental é impossível, quando as condições C mencionadas na implicação
EPISTEMOLOGIA JUDICIARIA E CONTEXTOS PROBATORIOS 145
não podem ser realizadas ou variadas pelos meios lecnológicos disponíveis, então a
hipótese deve ser verificada não experimentalmente, seja procurando, seja esperando
os casos em que as condições especificadas são verificadas pela natureza e observando
se E de fato ocorre". Foi o que ocorreu, por exemplo, com a teoria da relatividade geral
de Albert Einstein. que fora apresentada ao mundo em novembro de 1915, mas a efetiva
comprovação da teoria de Einstein somente ocorreu 4 anos depois, no dia 29 de maio
de 1919, quando astrônomos da Royal Astronomical Society, de Londres, na cidade de
Sobral, no Ceará, durante um eclipse solar, verificaram o desvio da luz emitida pelas
estrelas, que desenvolveu uma trajetória curva, em razão do campo gravitacional do sol.
Foi a comprovação de que a matéria e a energia distorcem a malha do espaço-tempo,
podendo desviar a trajetória da luz que viaja por ele a passar próxima de um grande
astro, no caso, o Sol.
48. SAMMARCO, Método probatorío c modelli di ragionamento..., cit., p. 17. De modo seme
lhante, Pastorc. (Decisioni, argomenti, controlli..., cit., p. 101) se refere a uma "raciona
lização a posteriori". Para Taruffo (Lu prova dei fattigiuridici..., cit., p. 4 0 8 ), trata-se de
uma “justificação racional elaborada ex post a respeito da decisão".
49. TARUFFO, Lu prova dei fatti giuridici..., cit., p. 421.
50. IACOV1ELLO, Motivazione delia sentenza penale..., cit., p. 750.
51. CRUZ E TUCC1, A motivação da sentença no processo civil..., cit., p. 15-16.
52. Nesse sentido: AMODIO, Motivazione delia sentenza penale..., cit., p. 184; PASTORE,
Decisioni, argomenti, controlli..., cit., p. 100.
146 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
60. Referências nesse sentido são encontradas em: Eco, chifres, cascos, sapatos: três tipos
de abdução. Os limites do interpretação..., cit.. p. 203 e 211; RAMIREZ, Ni deducción
ni inducción: abducción!..., cit., p. 163-176; ANDRÉS 1BAÑEZ, Sobre a motivação dos
fatos na sentença penal..., cit.. p. 84; MAGALHÃES GOMES FILHO, A motivação das
decisões penais..., cit., p. 160-161. Na literatura, também pode ser lembrado outro famoso
detetive, Auguste Dupin, criado por Adgar Alian Poe. no famoso The murders in the Rue
Morgue, explorado à luz do método abdutivo por TL'ZET, Razonamiento probatorio:
¿deducción? ¿inducción? ¿abducción?..., cit., p. 129-132.
61. Nesse sentido: FASSONE, La valutazione della prova..., cit., p. 333. Para Haack (Episte
mology legalized..., cit., p. 3 0), é obrigação do investigador procurar todas as provas que
puder e as avaliar com a máxima imparcialidade. E completa: "um investigador iscnio
e desinteressado’ é uma espécie de pleonasmo, c um ‘investigador isento e interessado’
um oxím oro’’.
62. No sentido de que, no context of discovery no processo, aplica-se um raciocínio abdutivo:
cf. TARUFFO, La prova dei fatti giuridici..., cit.. p. 41 7 -4 1 8 ; IACOV1ELLO, 1 criteri di
valutazione delia prova..., p. 399.
63. SAMMARCO, Método probatorio e model li di ragionamento..., cit., p. 170. No mesmo
sentido: ANDRÉS 1BÁÑEZ, Sobre a motivação dos fatos na sentença penal..., cit., p. 87.
64. Antes de Cordero, já Bellavista (11 processo come dubbio..., cit.. p. 4 2 ) tratando do
“processus judiei como processus dubii”, alertava que “contra o processus dubbi há ainda
148 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PRO VA PENAL
que há uma repartição de funções: quem julga não pode investigar, quem somente
investiga, sem julgar, não tem os mesmos obstáculos que o juiz.
O investigador, diante de um fato tido por criminoso, deve elaborar uma
hipótese explicativa para tal fato, mesmo que seja um acontecim ento insólito
ou invulgar. Ao formulá-la, por meio de raciocínio abdutivo, ele se compromete
psicologicamente com a hipótese por ele inventada. Isso porque, diante dos dados
disponíveis, somados a sua experiência e criatividade em os interpretar, aquela
foi considerada a melhor explicação dos fatos. Isso envolve sua própria pré-com
preensão dos fatos, pois não se pode compreender sem pré-compreender, isto é,
orientar-se por uma hipótese inicia] é uma espécie de representação antecipada do
resultado/' Logo, quem formula a hipótese o faz propondo a explicação que lhe
considera a preferível. Posteriormente, terá que a confirmar, mediante indução.
Para tanto, sairá em busca de elementos que a corrobore, mostrando o acerto de
sua formulação. Em caso positivo, a hipótese explicativa estará corroborada em
algum grau. Todavia, se encontrar elementos que infirmem a hipótese inicial, o
investigador honesto deverá abandoná-la,66 formulando uma nova hipótese que
seja apta a explicar os fatos, diante dos novos elementos disponíveis.67
Um bom exemplo é a hipótese do estupro, seguido de assassinado, do famoso
conto “Dentro do bosque”, de Akutagawa,68 em que há uma sequência de depoi
mentos, que assim podem ser resumidos:
Iniciada uma investigação, o comissário de polícia toma o depoimento de
um lenhador, que afirma ter encontrado o cadáver quando foi cortar lenha, pela
manhã, como de costume, dentro do bosque, no sopé da montanha, num lugar
ermo. E diz: “O cadáver estava deitado de costas, vestia um quimono de seda azul
c trazia um chapéu pregueado à moda da Capital. Via-se um só golpe de espada,
mas, como era muito profundo, e estava bem no meio do peito, as folhas secas de
bambu ao redor do cadáver pareciam tingidas de vermelho”.
Acrescentou que não viu a espada nem cavalo; “só um pedação de corda jogado
ao pé do cedro”; “além da corda havia um pente”. Por fim, ainda disse: “como as
A informação de que a morte fora causada com um punhal, e não com uma
espada de samurai, seria suficiente para abandonar a hipótese inicial. Todavia,
seria necessário verificara compatibilidade do ferimento no corpo da vítima, com
um ou outro tipo de instrumento perfuro-cortante. Sc uma perícia comprovasse
a compatibilidade do ferimento com um punhal, estaria descartada a hipótese do
policial corroborada pela confissão de Tojâmuru. Caso contrário, se o ferimento
tivesse sido causado por uma espada, a confissão de Masago seria falsa.
Antes disso, porém, no conto de Akitagawa, surger uma nova e decisiva prova,
a afastar aquela hipótese. O morto, por meio de uma intervenção mediúnica, dá
sua versão dos fatos: “Após violentar minha mulher, o assaltante, sentando-se ali
mesmo, pôs-se a confortá-la de várias formas [...] Naturalmente, eu não podia falar
[...1 Entretanto, lancei lhe várias vezes uns sinais com os olhos. ‘Não acredite nas
palavras dele. Tudo que ele disser será mentira'. Era isso o que eu lhe queria trans
mitir. |...| E não é que ela parecia estar absorvendo as palavras do ladrão? Eu me
contorcia de ciúmes. Mas o ladrão continuava a conversa, com muita habilidade,
passando de um argumento ao outro. Chegou até fazer essa proposta atrevida: (... 1
Em vez de continuar com seu marido, que tal ser minha esposa? Toda minha ousadia
nasceu do amor que você me inspirou.’ Ao ouvir aquelas palavras, minha esposa
ergueu a cabeça, extasiada. Nunca vi minha mulher tão bela como naquele instante!
Mas o que minha linda esposa respondeu ao ladrão, diante de mim ainda amarrado?
[...] Então leve-me para onde você for”.
E segue o espírito do samurai morto, a contar o ocorrido, informando que,
quando saíam do bosque, Masago apontou para o marido, ainda amarrado, e pediu
a Tajômaru que o matasse: “Mate este homem! Se ele continuar vivo, não poderei
viver como você!” Diante de tão inesperado pedido, o ladrão repeliu a mulher,
jogando-a ao chão; e dirigindo-se ao marido, perguntou: “O que quer que eu faça
com ela? Mato-a ou deixo-a ir?”. Diante da hesitação de Takehiro, Masago fugiu,
embrenhando-se pela floresta c não foi mais alcançada. O espirito do samurai ainda
informou que: “Depois da fuga de minha esposa, o ladrão apanhou minha espada,
arco e flechas e cortou um ponto apenas da corda que me amarrava”. Takehiro,
depois de se livrar da corda narrou, sempre por meio do espírito, o final da história:
“Levantei o corpo exausto, com dificuldade. À minha frente, brilhava o punhal
que minha esposa deixara cair. Tomando-o nas mãos, cravei-o de um só golpe no
peito. Não sentia, entretanto, doralguma [...] Senti-me tomado por um profundo
silêncio. Nesse momento, ouvi passos furtivos de alguém se aproximando. Tentei
ver quem era. Vias a escuridão já me envolvia. Alguém - esse alguém com uma
mão invisível, retirou cuidadosamente o punhal do meu peito. [...] Depois disso,
mergulhei na escuridão eterna do limbo [...]”.
Tomando as informações do espírito mediúnico como se fosse de uma in
suspeita testemunha presencial, as hipóteses anteriores, tanto de que Takehiro
152 EPISTEMOLOGIA JUDICIARIA E PROVA PENAL
fora morto por um golpe da espada do ladrão Tajômaru, quanto de que fora as
sassinado por sua esposa Masago, que lhe cravou o punhal no peito, deveriam
ser abandonadas.
Voltando ao tema do raciocínio empregado na persecução penal, conclui-se
que raciocínio abdutivo é adequado ao contexto do descobrimento69 e, no caso,
da fase de investigação preliminar. Há a formulação de hipóteses explicativas, até
que reste apenas uma hipótese ou. se restar mais de uma, será escolhida a mais
provável.70A abdução constitui a primeira parte do processo lógico e cognoscitivo,
de reconstrução dos fatos sobre os quais se realizará o julgamento, mas por outro
lado, não lhe corresponde um papel relevante no contexto da justificação, em que
a hipótese explicativa terá que ser colocada à prova, avaliada de modo a que possa
ser constatada a sua veracidade ou falsidade.71
Por outro lado, se é correto identificar o contexto da descoberta, oriundo da
filosofia da ciência, com o contexto da investigação, inserido na persecução penal,
é importante ressaltar que tal modelo é aceitável para o investigador, mas não para
o julgador, que para manter a sua imparcialidade, não pode raciocinar criando
hipótese. Seu papel é outro. Com a formulação da acusação, a "hipótese explica
tiva” obtida no contexto da investigação se transforma, por ato do acusador, na
"tese a ser demonstrada”.72 Caberá ao juiz, no processo, controlar tese acusatória,
mediante a produção de provas, que depois serão valoradas, para que se verifique
se tal enunciado fático pode ser considerado provado.
de tal fato. A defesa também poderá fornecer uma hipótese alternativa, por exem
plo, de que praticou uma infração penal diversa e menos grave.
Tudo esse enfrentamento de versões, com confrontação de hipóteses é viabi
lizado no processo e, principalmente, na instrução, pelo contraditório.
O contraditório possui um inegável valor heurístico, possibilitando o funcio
namento de uma estrutura dialética, em que há formulação de tese e verificação
de hipóteses contrárias, produção de prova e possibilidade de contraprova. 5Mais
do que uma escolha de política processual, o método dialético é uma garantia
epistemológica na busca da verdade.737475As opiniões contrapostas dos litigantes am
pliam os limites do conhecimento do juiz sobre os fatos relevantes para a decisão
e diminuem a possibilidade de erros.73
Abandonada a crença epistemológicamente ingénua da possibilidade do
atingimento da verdade, não há qualquer justificativa para se defender poderes
probatórios ilimitados do juiz na atividade probatória. Como bem pontua Nappi,
o processo inquisitório se funda num pressuposto de autossuficiência metodoló
gica do juiz-acusador, que pode pesquisar e atingir solipsisticamente a verdade
absoluta, a todos oponível.76 Num processo de partes, com direito à prova, e cuja
instrução se desenvolve em contraditório, a verdade deverá ser buscada com base
no ‘principio da divisão do conhecimento, que representa condição indispensável
para obtenção de uma verdade eticamente válida’’.'7
Embora o contraditório seja uma exigência legal para a produção de provas
a serem valoradas pelo juiz, trata-se, também, de um método com inegável im
portância epistêmica. Segundo Popper “exatamente porque nosso objetivo é o
de formular teorias tão perfeitas quanto possível, devemos submetê-las a testes
tão severos quanto possível, ou seja, devemos tentar identificar erros que nelas
se contenham, devemos tentar falseá-las. [...] Com efeito, se não formos críticos,
sempre encontraremos aquilo que desejamos: buscaremos e encontraremos con
firmações, e não procuraremos nem veremos o que possa mostrar-se ameaçador
para as teorias que nos agradam”.78
73. DE LUCA. Giuseppc. II sistema delle prove penali e i! principio dei libero convincimenio
nel nuovo rito. Rivisni Italiana cli Diritto e Procedura Penale, 1992. p. 1261.
74. Nesse sentido: UBERTIS. Principi di procedura penale europea..., cit., p. 36; MAGALHÃES
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. A motivação tias decisões penais..., cit., p. 39.
75. ZAPPALÀ, Enzo. Processo penale ancora in bilico tra sistema accusalorio e sistema
inquisitório. Diritto penale c processo. 1998. p. 888.
76. NAPPI, Aniello. Cuida al codici di procedura penale. 8. ed. Milano: Giuffrè, 2001. p. 10.
77. MAGALHÃES GOMES FILHO, Direito a prova no processo penal..., cit., p. 70.
78. POPPER, Karl A misíria do historicismo. Trad. Octany S. da Mota e Leônidas Hegenbert.
São Paulo: Cultrix/Ed. USP. 1980. p. 104-105.
154 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
79. TARUFFO, La prova deifatti giuridici..., cit., p. 337; ¡dem. La semplice veritá..., cit.,
p. 140. No mesmo sentido, considerando a regra de que toda prova relevante deve ser
admitida consiste em um filtro epistemológico: GASCÓN ABELLÁN. Los hechos en le
derecho__ cit., p. 113; FERRER BELTRAN. La valoración racional de la prueba..., cit..
p. 68; FERRER BELTRAN, La prueba es libertad..., cit.. p. 25.
80. BENT11AM. Jermías. Tratado de las pruebas judiciales. Trad. Manuel Osorio Florit. Buenos
Aires: Ejea, 1971. t. II. p. 87.
81. SENTÍS MELENDO. La prueba..., cit., p. 336.
82. lbidem. p. 336.
EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E CONTEXTOS PROBATORIOS 155
83. UBERTIS. Diritto alia prova nel processo penale e Cone Europea dei Diritti dell Uorno. ..
cit., p. 91.
84. La semplice verità..., cit., p. 150.
85. Para Laudan ( Verdad, erro ry proceso penal..., cit., p. 4 6 ), toda regra que exclui provas
relevantes é suspeita do ponto de vista epistémico.
86. Nesse sentido, DAMASKA, II diritlo deite prove alia deriva..., cit., p. 24, citando J. H.
Wigmore. Evidence in Trials at Common Law, por P. Tillers, Boston, 1983. 1 ,11. p. 689.
87. Direita à prova no processo penal..., cit., p. 93; Idetn, A motivação das decisões penais..., cit.,
p. 150-151. No mesmo sentido, na doutrina italiana: UBERTIS, La prova penale.... cit., p. 55.
156 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAI
88. A questão foi tratada, em maior profundidade, em BADARÓ, Gustavo. Direito à prova e
os limites lógicos de sua admissão: os conceitos de pertinência e relevância. In: BEDA-
QUE,José Roberto dos Santos; CINTRA, Lia Carolina Batista; EID, Elei Pierre (Coord.).
Garantismo processual. Brasília: Gazela Jurídica, 2016. p. 219-260.
89. Regra idêntica, para o procedimento tios crimes dolosos contra a vida está prevista no
§ 2° do artigo 411, incluído pela Lei 11.689/2008. Dispositivo semelhante já existia para
os Juizados Especiais Criminais, prevista no § Io do arligo 81 da Lei 9.09 9 /1 9 9 5 : "§ Io
Todas as provas serão produzidas na audiência de instrução e julgamento, podendo
q Juiz limitar ou excluir as que considerar excessivas, impertinentes ou protelatórias".
Com clara inspiração no direito italiano, o PLS 1 56/2009, prevê, nas disposições gerais
sobre a prova que: “as provas serão propostas pelas partes” (art. 162). E, completando
a regra geral que assegura um verdadeiro direito à prova, prevê os critérios de exclusão
no art. 163, caput: “Art. 163. O juiz decidirá sobre a admissão das provas, indeferindo
as vedadas pela lei e os manifestamente impertinentes ou irrelevantes” (destaquei).
90. Na doutrina processual civil, a inadmissibilidade da prova que tivesse por objetos fatos
impertinentes e fatos irrelevantes foi feita, ao que se pode apurar, pela primeira vez, por
Lopes da Costa (COSTA, Alfredo Araújo Lopes da. Direito processual civil brasileiro. 2. ed.
Rio de Janeiro: José Konfino, 1947. v. II. n. 280. p. 22 2 ). nos seguintes lermos: “Fatos
impertinentes (in-pertinere - não pertencer) são os que não pertencem à causa, nenhu
ma relação têm com ela. não lhe dizem respeito, lhe são estranhos”; “Fatos irrelevantes
ou inconcludentes são os que. embora se refiram à causa, não influem sobre a decisão,
não levam a conclusão alguma (inconcludentes), são indiferentes". Na doutrina mais
moderna, mais recentemente, o tema da relevância da prova foi tratado por Cândido
Rangel Dinamarco (Instituições de direito processual civil. 6. ed. São Paulo: Malheiros
Editores, 2009. v. 111. p. 6 4 -6 5 ), que defende a inadmissibilidade de provas irrelevantes
pois “nenhuma utilidade o seu reconhecimento poderia ter para o julgamento da causa
ou dos pedidos ou requerimentos incidentes ao processo. O fato c irrelevante quando,
com ele ou sem ele, a decisão será a mesma". E. a partir do falo afirmado pela parte, co
necta a noção de relevância como o fundamento jurídico posto em causa: “no plano do
direito material a relevância do fato depende sempre da eficácia que ele possa ter para
a constituição, impedimento, modificação ou extinção do direito alegado pelo autor”.
Por outro lado, nega utilidade na autonomia do conceito de pertinência, porque esta "é
aspecto da própria relevância e não merece tratamento autônomo". Para uma análise
da evolução do tema na doutrina, cf. BADARÓ, Direito à prova e os limites lógicos de
sua admissão.... cit., p. 233-239.
EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E CONTEXTOS PROBATORIOS 157
Nos Estados Unidos, ñas Federal Rules o f Evidence, a rule 401 define o test fo r
relevance evidcncc, estabelecendo que urna prova é relevante: "(a) se tem alguma ten
dência a tornar um fato mais ou menos provável do que seria sem a evidencia; e (b) o
fato é importante na determinação da ação". Por outro lado, segundo a rule 402, toda
prova relevante deve ser admitida, salvo se houver previsão em contrario na Consti
tuição, em lei federal ou em outra regra estabelecida pela Suprema Corte dos EUA.96
Na doutrina italiana, o tema também é objeto de análise. Para Taruffo, o
critério para valorar a relevância se divide em dois aspectos: o jurídico e o lógico.
Um fato é juridicam ente relevante quando corresponde ao fato típico definido na
regra jurídica,1'7 sendo este o jacta probanda fundamental; por outro lado. o fato é
logicamente relevante quando, não constituindo o fato principal da causa, pode ser
usado como uma premissa, como um ponto de partida para uma inferência que
possa levar à conclusão sobre a verdade ou falsidade de um enunciado relativo ao
fato principal.98
Nessa linha, a relevância exige a formulação de juízos hipotéticos, sobre a
relação entre a prova e o fato: em relação à relevância ju rídica, ou a relação do fato
a ser provado com o fato jurídico objeto do processo, é necessário considerar a
eventualidade de a prova ter um êxito positivo; no caso de relevância lógica, quando
a prova verte não sobre o fato principal, mas sobre um secundário, é necessário,
ainda, formular um segundo juízo hipotético: considerar que, demonstrada a hipó
tese de que o fato secundário seja considerado provado, ele constituirá a premissa
de uma possível inferência99 sobre o fato principal.100
96. De modo semelhante, no direito inglês. Richard May (Criminal eviclcnce..., cit., p. 8 )
explica que “a regra de ouro da admissibilidade é que toda prova que é relevante é
admissível e aquela que é irrelevante e inadmissível”.
97. Studi sulla rilevanza delia prova..., cit.. p. 85 -8 6 ; TARUFFO, La semplice veritá.. . , cit.,
p. 42. Esse conceito já era encontrado na doutrina clássica. Assim, por exemplo, Carne-
lutti (La prova civile. 2. cd. Roma: Ateneo, 1947. p. 156) afirmava: “se provam os fatos
jurídicos, no sentido de que os fatos se provam enquanto são jurídicos, isto é, enquanto
caracterizam os pressupostos da norma a ser aplicada (em substância, e com perfeita
equivalência, se diz que objeto da prova são somente os fatos relevantes)" (destaques
no original). E se mantém atual, por exemplo, em Salva to re Patti ( Le prove. Parte
generale. Milano: Giuffrè, 2010. p. 2), que afirma “é principal o fato constitutivo do
direito deduzido na ação; como também o falo impeditivo, modificativo ou extintivo
deduzido na exceção”. No mesmo sentido, ainda: PROTO PISANI, Andréa. Lezioni di
diritto processuale civile. 2. ed. Napoli: Jovene. 1996. p. 448.
98. TARUFFO, La semplice veritá..., cit., p. 42.
99. Segundo Patti (Le prove..., cit., p. 3), no caso de prova indireta, o fato alegado deve
determinar “uma probabilidade elevada" de existência do fato a ser provado (fato prin
cipal).
100. TARUFFO, La prova dei Jaiti glridici..., cit.. p. 3 3 9 -3 4 0 . No mesmo sentido, sem,
contudo, fazer a distinção entre relevância jurídica e lógica: PROTO PISANI, Lezioni
EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E CONTEXTOS PROBATORIOS 159
104. DAMASKA, II diritto clelle prove alia deriva.... cit., p. 83. No mesmo sentido: BARBOSA
MOREIRA, José Carlos. Prueba e motivación cie la sentencia. Temas de direito processual:
oitava série. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 1 12.
105. PATTI, Le prove..., cit., p. 3. De modo semelhante, para Giuseppe Bianchi (Lammis-
sione delia prova nel dibanimento pénale. Analisi deH’attivitá argomentativa delle parti.
Milano: Giuffrè, 2001. p. 128), o juízo de pertinência é um conceito essencialmente
lógico consistente na verificação da relação entre o objeto de meio de prova requerido
e a regiudicanda".
106. FERRER BELTRÁN, La valoración racional de la prueba..., cit., p. 71. nota 29.
107. Nesse sentido: BENTHAM, Tratado de las pruebas..., cit., t. II. p. 93-94: TARUFFO,
La semplice veritá..., cit., p. 143. No ordenamento jurídico brasileiro, representa uma
limitação por superfluidade ou superabundância da prova, o inciso I do art. 443 do
Código de Processo Civil, que prevê "O juiz indeferirá a inquirição de testemunhas
sobre fato: ... 1 - já provados por documento ou confissão da parte". Outro exemplo
é a limitação do número de testemunhas para cada fato a ser provado: “O número de
testemunhas arroladas não pode ser superior a 10 (dez), sendo 3 (três), no máximo,
para prova de cada fato" (art. 357, § 6o).
108. Por outro lado, não se pode confundir a prova supérflua com a prova de corrobora-
ção, esta sim. cu ja produção é epistemológicamente justificada. A indagação então seria:
“são supérfluas todas as provas redundantes"? Ferrer Beltran (La valoración racional de
la prueba .... cit., p. 75) responde, claramente, de forma negativa.
109. Porém, não se pode negar que a ideia de relevância não é estrita e exclusivamente
lógica, mas leva em conta, também, outros fatores, como os custos de tempo, pessoal
e mesmo econômico de produção da prova. Segundo Liebman (Manuale di diritto pro-
cessuale civile. Milano: Giuffré, 1959. v. II. p. 7 6 ), seria evidentemente desperdício o
tempo, o trabalho e o dinheiro empregado para provar fatos que, embora controvertidos
pelas partes, não seriam, se provados, concludenti, conferenti.
110. Do ponto de vista lógico e, especialmente, segundo a máxima de que tudo o que
é relevante deve ser admitido, é ilógico não admitir a produção de um meio de prova
porque outros meios já foram produzidos e geraram o mesmo resultado probatório que
se pretende atingir com o meio reputado supérfluo. Além disso, a vedação da prova
EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E CONTEXTOS PROBATORIOS 161
supérflua como limite lógico incidiria no mesmo erro de confundir limites lógicos com
prognóstico concreto sobre o potencial resultado probatório do meio requerido.
111. B1ANCH1, Uammissione delia prova neí dibattimento pénale..., cit.. p. 128. No mesmo
sentido, em relação ao processo civil: GOMOGLIO, Luigi Paolo. II principio dl economia
processuale. 1. Padova: CEDAM, 1980. p. 200-203. Em sentido diverso, para UBERT1S,
La prova p enale..., cit., p. 64. o caráter supérfluo da prova liga-se ao conceito de “irre
levância por redundância".
112. SIRACUSANO, Delfino. Lc prove. In: S1RACUSANO, Delfino; GALATI. Antonini;
TRANCH1NA, Giovanne; ZAPPALÀ, Enzo. Dl ria o processuale penale. 2. cd. Milano:
Giuffrè. 1996. v. I. p. 354.
1 13. GREVl. Prove. In: CONSO, Giovanni; GREVE Vittorio (Org.). Projili del nuovo Códice
di Procedían Penale. 4. cd. Padova: CEDAM, 1996. p. 243: B1ANCH1, Lammissione delia
prova nel dibattimento penale.... cit., p. 128.
I 14. SIRACUSANO, Le p ro v e..., cit., p. 345. Com razão, Ferrcr Beltrán (La valoración
racional de la prueba..., cit., p. 75) distingue a prova redundante da prova supérflua.
A prova redundante c simplesmente aquela que confirma o que já foi o resultado de
outra prova produzida. Uma segunda testemunha que diga a mesma coisa que uma
primeira já ouvida, será redundante. Isso não quer dizer que o segundo depoimento
será supérfluo, no sentido de inútil, por excesso. Uma segunda testemunha que diga
a mesma coisa que a primeira fornece um grau de corroboração ao que disse aquela.
Assim como a terceira testemunha vai corroborar o que disseram as duas anteriores.
Todavia, na medida em que aumentam as provas redundantes, o grau de corroboração
vai diminuindo, podendo se faiar em um rendimento decrescente a cada nova prova.
Assim, para evitar “perigo de iransbordamento". é aconselhável, epistemológicamente,
que a lei ponha um limite à produção de provas redundantes, a partir do ponto em que
sejam consideradas supérfluas.
162 EPISTEMOLOGIA JUDICIARIA E PROVA PENAL
115. S1RACUSANO, Le p rove..., cit., p. 345. Diversamente, para quem considera que o
juízo lógico deve envolver aspectos valorativos. o juízo de admissibilidade ficaria na
EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E CONTEXTOS PROBATORIOS 163
ser arrolada. O art. 20 L, capul, do Código de Processo Penal prevê que: "Sempre que pos
sível, o ofendido será qualificado e perguntado sobre as circunstâncias da infração, quem
seja ou presuma ser o seu autor, as provas que possa indicar, tomando-se por termo as
suas declarações” (destacamos). Mesmo em se tratando de provas constituendas, diante
da sua inquestionável relevância, posto que a vítima sempre lerá algo a esclarecer sobre
o modo. o momento ou o autor do delito, o legislador determina sua oitiva.
EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA F. CONTEXTOS PROBATORIOS I 65
119. Desse modo, atende-se à preocupação de Ferrer Beltrán (La valoración racional de la
prueba..., cit., p. 55. nota 4 0 ) de que o respeito ao direito à prova exige que o juízo de
relevância sobre as provas requeridas nào seja utilizado como mecanismo indevidamente
restritivo que impeça o exercício de tal direito.
120. MAGALHÃES GOMES FILHO, Princípios gerais da prova..., cit.. p. 40.
121. SENTÍS MELENDO, La prueba.... cit.. p. 283.
122. BARBOSA MOREIRA, Prueba e motivacion de la sentencia..., cit., p. 11 3.
123. SANTOS, Moacyr Amaral. Prova judiciária no cível e comercial. São Paulo: Max Li-
monad, 1970. v, I. p. 227.
124. ECHANDIA. Hernando Devis. Teoria general de la prueba judicial. 2. ed. Buenos
Aires: Victor P de Zavalia Ed., 1972. v. I. p. 206.
166 EPISTEMOLOGIA JUDICIAR IA E PROVA PENAL
L‘m modelo dc direito à prova forte, deve ser “inclusionistâ”, em que a regra seja
admitir a prova, permitindo-se que ela seja produzida.125126Assim, somente quando
no meio de prova requerido for manifestamente impertinente ou irrelevante, a
prova deve ser indeferida.
127. DE CONDE, Francisco Munoz; LANGE, Marcela. Presentacion. In: ROXIN, Claus. La
prohibition cle autoincriininacidn v dc las escuchas domiciliarias. Buenos Aires, Hammurabi.
2008. p. 15.
128. GRINOVER, Liberdades ptiblicas..., ciL., p. 98.
168 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
132. A análise segue o conceito que já foi proposto em: BADARÓ, Gustavo Henrique.
Processo penal. 6. ed. São Paulo: Ed. RT, 2018. p. 411-416.
133. MAGALHÃES GOMES FILHO, Provas..., cil., p. 266.
170 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
134. Segundo Marcello Daniele ( Rcgolc di esclusione e rcgole di valutazione delia prova.
Torino: G. Giappichelli Ed.. 2009. p. 3) irata-se de regra de exclusão probatória de ca
ráter geral, pois veda ao juiz empregar em sua decisão elementos cognitivos que tenham
sido produzidos violando proibições previstas em lei. O direito italiano, por exemplo,
trabalha com graus de inutilizabilidade, havendo regras absolutas e regras relativas de
exclusão de prova (Ibidem, p. 8 -9 ). As hipóteses de regras de exclusão relativas ocor
rem nos casos em que a lei declara que certos elementos probatórios são ineficazes
somente em face de um tema probatório, mas não diante de outro tema. São os casos,
por exemplo, de vedação de testemunho sobre a moralidade do acusado (CPP, art. 194,
comma 1); ou a utilização de documentos relativos a "voz corrente" da população ou a
moralidade de sujeitos que participam do processo (CPP, art. 234. comma 3) e a perícia
sobre a qualidade psíquica do acusado. (CPP, art. 220, comma 2.) Trata-se. portanto, de
regras de exclusão baseadas no objeto da prova: Cordero, II procedimento probatorío...,
cil., p. 61 e ss. No mesmo sentido: DANIELE, Rcgolc di esclusione e rcgole di valutazione
delia prova ..., cit.. p. 10; Elvira Nadia La Rocca (Le rcgolc di esclusione delia prova nel
processo penale. Roma: Aracne, 2013. p. 54-55).
135. Por outro lado, como explica Nadia La Rocca (Le regole di esclusione delia prova nel
processo penale..., cit.. p. 79-80) a vedação genérica da lei encontra sua especificação nas
normas que disciplinam cada meio de prova. E acrescenta: "Nesse aspecto, o caráter genérico
da fórmula vedações estabelecidas pela lei’ evidencia a amplitude concreta da mesma; para
a vedação da lei, com já evidenciado, deve entender-se não apenas aquela expressamente
prevista, mas também e sobretudo aquelas derivadas da constatação da lalta dc condição
ou pressupostos de operatividade da norma probatória e, mesmo na ausência de uma
expressa previsão de proibição, esta é sempre exlraível das respectivas previsões da norma
que, autorizado a produção e sucessiva valoração da prova na presença de determinados
pressuposto, consequentemente vendam sua utilização na ausência destes últimos”.
EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E CONTEXTOS PROBATORIOS 173
que trata da “Liberdade moral da pessoa na produção da prova : “Não podem ser
utilizado, nem mesmo com o consentimento da pessoa interessada, métodos ou
técnicas idôneas a influir sobre a liberdade de autodeterminação ou a alterar a
capacidade de recordar e valorar os fatos".
Tem-se entendido, também, que existem vedações implícitas, sendo consi
deradas inutilizáveis, embora não explicitamente sancionadas por uma vedação
legal, as provas obtidas com violações de princípios fundamentais.13'1 Se assim
não fosse, a adoção de um princípio rígido de taxatividade das vedações probató
rias poderia levar a hipóteses de “perigosos vácuos de tu tela"."' Assim, a vedação
probatória pode decorrer de normas de direito penal material, bem como de direitos
fundamentais do cidadão previstos na constituição.13617138139
Na Espanha, o arl. 1 1 da Ley Orgânica dei Pocln Judicial Espanhola, que prevê:
“No surtirán efecto las pruebas obtenidas, di recia o indirectamente, violentando los
derechos o libertades fundamentales”. A denominação dada a tal violação de direiios
varia: há quem se refira á prova ilícita,13y enquanto outros usam a denominação
prova proibida.14014Substancialmenie, porém, a doutrina espanhola está de acordo em
incluir, entre os direitos constitucionais cuja violação caracteriza uma prova ilícita,
os direitos processuais e. cm especial as garantais constitucionais dos acusados,
que integram o devido processo legal, entre elas: ju iz natural, contraditório, ampla
defesa, presunção de inocência, motivação, publicidade etc.1" O problema, como
136. NADIA LA ROCCA, Le rególe di esclusione delia prova nel processo penale..., cit., p. 56.
137. GALANTINI, Novella. Inutilizzabilitá (dir. proc. p en.). Enciclopedia del Diritto.
Aggiornamenti, I. Milano, 1997. p. 698.
138. Para Andrea Planehadell Gargallo (La prueba prohibida: evolución jurisprudencial.
Navarra: Aranzadi, 2014. p. 3 5), as provas produzidas com violação de direitos fun
damentais devem ser denominadas "provas proibidas”, já as expressões "prova ilícita”
ou “prova ilicitamente obtida" indicariam fenômenos de menor gravidade, de simples
infringência aos requisitos legalmente exigidos para produção de uma prova, não im
plicando sua ineficácia.
139. MIRANDA ESTRAMPES, Manuel. El concepto de prueba ilícita y su tratamiento en el
proceso penal. 2. ed. Barcelona: Bosch, 2004. p. 31-32.
140. Andrea Planehadell Gargallo (La prueba prohibida: evolución jurisprudencial. Navarra:
Aranzadi, 2014. p. 35) prefere a terminologia “prova proibida”, por considerar que “con
la expresión prueba ilícita, ilícitamente obtenida o ilegal se hace en puridad referencia
a aquella prueba que se obtiene o práctica vulnerando o infringiendo los requisitos
legalmente exigidos para ella, de forma que, cuando dicha infracción no supone una
vulneración de los derechos fundamentales, ésta prueba si que puede, dentro de los
límites legales, ser tomada en consideración”.
141. Miranda Estrampes (El concepto de prueba ilícita y su tratamiento en el proceso penal....
cit., p. 52): explica que “A vulneração dos direitos fundamentais pode ter lugar não só
no momento da obtenção da Jante de prova, mas também no momento de sua incorporação
e produção no processo. Entre estas ultimas se encontram aquelas provas cuja prática não
174 EPISTEMOLOGIA JUDICIARIA E PROVA PENAL
145. AMBOS, Kai. Las prohibiciones de utilización de pruebas en el proceso penal alemán.
In: COLOMER, Juan Luis Gómez (Coord.), Prueba y proceso penal. Análisis especial de
la prueba prohibida en el sistema español e en el derecho comparado. Valencia: Tirant
Lo Blanch, 2008. p. 32. No mesmo sentido: GÓSSEL, Karl Heinz. Las prohibiciones de
prueba como límites de la búsqueda de la verdead en el proceso penal. In: DONNA,
Edgardo Alberto (Dir.). El derecho procesal penal en el estado de derecho. Obras comple
tas. Santa Fé: Rubinzal-Culzoni, 2007. p. 151; ROXIN, Claus. Derecho procesal penal.
Trad. Gabriela E. Córdoba e Daniel R. Pastor. Buenos Aires: Del Puerto, 2000. p. 191.
Sobre o tema, podern ser consultados os profundos estudos: GÓSSEL, Karl Heinz. La
prueba ilícita en el proceso penal. In: DONNA, Edgardo Alberto (Dir.). El derecho pro
cesal penal en el estado de derecho. Obras completas. Santa Fé: Rubinzal-Culzoni. 2007.
p. 169-258 e, mais recentemente: GLESS, Sabine. Germany: balancing truth against
protected interests. In: THAMAN, Stephen C. (Ed.) Exclusionary rules in comparativo
law. Springer, 201 3. p. 113-142; AMBOS. Kai. Las prohibiciones de utilización de pru
ebas en el proceso penal alemán. In: COLOMER, Juan Luis Gómez (Coord.). Prueba
y proceso penal. Análisis especial de ia prueba prohibida en el sistema español y en el
derecho comparado. Valencia: Tirant Lo Blanch, 2008. p. 325-360.
146. BGHSt. 14, 358, 4 6 5 , citado por Góssel. Las prohibiciones de prueba como límites
de la búsqueda de la verdead en el proceso penal..., p. 148.
176 EPISTEMOLOGIA JUDICIARIA E PROVA PENAL
147. II principio dei libero convincimento dei giudice, Milano: Giuffrè, 1974. p. 24. No
mesmo sentido: GRINOVER. Liberdades públicas..., cit., p. 58.
148. No caso Hudson v. Michigan (547 U.S. 586,591 (2 0 0 6 )), a Supreme Court reconheceu
a legalidade de busca e apreensão domiciliar realizada sem observância do chamado
Knock-and-announce, que era considerado uma parte necessária da razoabilidade da
busca. No caso Kansas v. Venetris (5 5 6 U.S. 5 8 6 ,1 2 9 S.Ct 1841 (2 0 0 9 )) foram admitidas
declarações do acusado obtidas com violação do decido em Masssiah v. United States -
que assegura o direito de assistência de um advogado para que a polícia obtivesse uma
declaração incriminadora do investigado, antes do processos - foi admitida para atacar
a credibilidade do acusado. Com relação ao caso Hudson vs. Michigan, afirma Manuel
Miranda Estrampes (Concepto de prueba ilicita y stt tratamiento en el proceso penal.
Especial referencia a la exclusionary rule estadounidense. México D.C.: Ubijus, 2013.
p. 310) que se tratou de uma verdadeira reformulação do lundamento das exclusionary
rules, na progressiva intenção de afastar o seu caráter de regra constitucional.
149. CAMMACK, Mark E. The United States: the rise and de fall of the constitutional
exclusionary rule. In: THAMAN. Stephen C. (Ed.) Exclusionary rules in comparativo
law. Springer, 2013. p. 31-32.
150. Por exemplo, na Bélgica, Marie-Aude Beernaert e Philip Traest (Belgium: from cate
gorical nullities to ajudicially created balancing test, ln: THAMAN, Stephen C. (Ed.).
Exclusionary rules in comparativo Ictvv. Springer, 2013. p. 181) informam que, embora
por anos prevalecesse o entendimento de que os juízes não poderiam considerar, para
a condenação, provas obtidas por meios ilícitos, a Cour de Cassation. a partir do caso
Antigone, decidido em 14 de outubro de 2013. acabou por inverter a regra da proibição
prima facie da utilização de provas ilícitas, substituindo-a por uma autorização prima
Jacie de utilização das provas ilícitas, exceto em três casos bastante restritos: quando
EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E CONTEXTOS PROBATÓRIOS 177
154. Para Magalhães Gomes Filho (Direito á prova no processo penal.... cil., p. 9 7 -9 8 ),
outro limite de admissão da prova, de natureza epistémica, seria a regra do art. 158 do
CPP dispondo que. nos crimes que deixam vestígio, não se admite a confissão para a
comprovação da materialidade delitiva, exigindo-sc o exame de corpo de delito: "tra
ta-se de um exemplo claro de inadmissibilidade do meio de prova, com o objetivo de
evitar erros que poderiam resultar em indiscriminada admissão de qualquer prova para
demonstração da própria existência do fato que deixa rastros materiais". Discorda-se.
O dispositivo não estabelece um limite a admissão de outros meios de prova, mas sim a
valoração de meios de prova diversos do exame de corpo de delitos, para se considerar
provada a materialidade delitiva. Nesse sentido, Jacinto Nelson de Miranda Coulinho
(Glosas ao Verdade, Dúvida e Certeza, de Francesco Carnelutti ..., cil.. p. 8 9 ) explica
que tal regra e "um resquício da prova legal", que constitui ' uma garantia do cidadão,
expressão infraconstitucional do princípio do devido processo legal”. Sobre o tema, cf..
infra, item 3.5.2. De qualquer forma, como ressalva Nappi (Cuida al coiiici di pweedura
penale..., cit., p. 173) muitas vezes pode ser difícil estabelecer a diferença entre "rególe
desilusione e criteri di valutazione". No mesmo sentido, Nobili, Esiti, errori, arbitrii
dietro unillustre form ula..., cil., p. 53. nota 41.
155. O art. 401 do ab-rogado CPC de 1973 vedava a produção da prova exclusivamente
testemunhal, em relação aos contratos cujo valor excedia 10 salários-mínimos. Segundo
180 EPISTEMOLOGIA JUDICIARIA E PROVA PENAL
Moacyr Amaral Santos (Comentários ao Código dc Processo Penai Rio de Janeiro: Forense,
1976. v. IV p. 269), o dispositivo era “genuíno preceito sobre admissibilidade de prova
testemunha. Esta é admissível, embora insulada, para a prova dos contratos de valor
igual ou inferior ao décuplo do maior salário mínimo”. Outro limite dessa natureza que
pode ser lembrado, é a regra do art. 55. § 3o, da Lei 8 .2 1 3 /9 1 . sobre a prova testemunhal
para benefícios previdenciários: “A comprovação do tempo de serviço para os efeitos
desta Lei, inclusive mediante justificação administrativa ou judicial, conforme o dis
posto no art. 108, só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não
sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de
força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento”. No mesmo sentido,
inclusive, é a Súmula 149 do STJ: “A prova exclusivamente testemunhal é insuficiente
para comprovação da atividade rurícola para obtenção de benefícios previdenciários”.
156. De fato, o testemunho de ouvir dizer, ao menos em regra, não deve ser admitido.
Não pode ser aceito como verdadeira prova testemunhal, por se tratar de uma “prova
de segunda mão".
157. LEMPERT, R. O.; SALTZBLRG, S. A. A modem approach to evidence: text, problcms,
transcripts. St. Paul, Minnesota: West Publishing Co., 1982. p. 494. De modo semelhante,
para John Langbein ( The origins of adversan criminal trial. Nova York: Oxford University
Press, 2003. p. 233) trata-se da “iniciativa central do direito probatório anglo-americano
maduro”. O assim denominado “testemunho de ouvir dizer” é definido no artigo 8 0 1 (c) das
Federal Rules of Evidence: ' hearsay é uma declaração diversa daquela proferida pela teste
munha enquanto depõe no julgamento, oferecida como meio de prova para comprovar a
veracidade da questão afirmada”. Para o conceito de hearsav, uma declaração (statemant)
c definida como “uma asserção oral ou escrita ou uma conduta não verbal de uma pessoa,
caso a pessoa a pratique com a intenção de fazer uma asserção” (artigo 8501 (a)) e declarante
é conceituado como “uma pessoa que presta uma declaração” (artigo 801 (b)).
EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E CONTEXTOS PROBATÓRIOS 181
138. Como explica Diogo Malan ( Direito ao confronto no processo penal. Rio de Janeiro:
Lúmen Júris, 2008. p. 59): "Tais exceções, de uma forma geral, são justificadas por se
tratar de situações em que o legislador considera que o testemunho indireto é de boa
qualidade epistemológica, tão confiável quanto o depoimento direto. Assim, a questão
da disponibilidade da fonte informativa original não é considerada relevante, para fins
de admissibilidade do testemunho indireto”.
159. Novamente, invocando o ensinamento de Malan ( Direito ao confronto no processo pe
nal.... cil., p. 59): "aqui o fundamento é diverso: embora se reconheça que o depoimento
indireto não tem a mesma qualidade epistemológica do direto, em certas circunstâncias
entende-se preferível a admissão do testemunho indireto, ante a impossibilidade material
de produção do depoimento direto”.
160. NANCE, Dela. The best evidence principie, lowa Law Rcview. lowa City, n. 73, 1987
1988. p. 227-297.
161. NANCE, The best evidence principie..., cit.. p. 240 e ss.
182 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
162. Para Tuzet (Filosofia delia prova giuridica..., cit.. p. 5 6 ), os dois grandes problemas
da prova científica são: (i) definir se deve ser o juiz ou a comunidade cientílica que es
tabelece qual teoria ou metodologia científica é mais confiável e deve prevalecer; (ii) até
que ponto o juiz é vinculado à prova científica. Ressalte-se que esse segundo problema
é relevante nos modelos de decisão em que há motivação. Já nos modelos de júri, com
decisões imotivadas, esse problema embora muito relevante, torna-se incontrolável.
163. DOMINIONI, Oreste. La prova penale scientifica. Gli strum enti scientifico-tecnici
nuovi o controversi e di elevata specializzazione. Milano: Giuffrè, 2006. p. 147.
164. DOMINIONI, La prova penale scientifica..., cit., p. 124.
EPISTEMOLOGIA JUDICIARIA E CONTEXTOS PROBATORIOS 183
165. DOMINIONI, Oreste, In tema di nuova prova scientifica, Diritto penale e processo,
n. 9. set. 2001, p. 1061.
166. Nesse sentido: DOMINIONI, In tema di nuova prova scientifica.... p. 1061: Idem.
La prova penale scientifica..., p. 13; Canzio, Prova scientifica, ragionamento probatório
e libero convincimento dei giudice nel processo penale, Diritto Penale e Processo, 2003,
p. 1193.
167. DOMINIONI. Lei prova penale scientifica.... p. 15.
184 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
180. Nesse sentido: FA1GMAN; KAYE; SAKS; SANDERS; CHENG, Modern scientific
evidence..., cit., v. 1. p. 38-39; JASANOFF, Sheila. La scienza davanti ai giudici. La re-
golazione giuridica della scienza in America. Trad. Marta Graziadei. Milano: Giuffrè,
2001., p. 114-115. Para Taruffo (Conoscenza scientifica edecisione giudiziaria: profili
generali..., cit., p. 8 ), alguns desses critérios, como a verificabilidade do conhecimento
científico, o conhecimento de sua taxa de erro, a sua aceitação por parte da comunidade
científica de referência, e a sua relevância direta e específica a respeito dos fatos da causa
“representam condições mínimas que qualquer conhecimento deve ter para poder ser
qualificado como científico, tanto em geral, como no âmbito do processo".
181. FERRER BELTRÂN, La valoración racional de la prueba..., cit.. p. 48-49.
188 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA IZ PROVA PENAL
182. KNIJN1K, A prova pericial e seu controle no direito processual brasileiro..., cit., p. 62.
183. JASANOFF, La scienza davanti ai giudici..., cit., p. 112.
184. Nesse sentido: DOM1NION1, In tema di nuova prova scien tifiea..., cit., p. 1064;
JASANOFF La scienza davanti ai giudici..., cit., p. 112.
185. DOMINION!, La prova penale scien tifiea ..., cit., p. 169. Embora sem referência
direta ao Daubert test. Taruffo (Conoscenza scientifiea e decisione giudiziaria: profili
EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E CONTEXTOS PROBATORIOS 189
generali..., cit., p. 10) observa que não há urna única ciencia, sendo impossível adotar
um conceito de "teoria global" do conhecimento científico. Há ciências, no plural, e,
por consequência, "provas científicas", também no plural.
186. Os pontos destacados foram acrescidos aos citados artigos, pela mudança das Federal
Rules of Evidence:
Rule 701 Opinion Testimony by Lay Witnesses.
If a witness is not testifying as an expert, testimony in the form of an opinion or infe
rences is limited to those opinions or inferences which are: (a) rationally based on the
perception of the witness; (b) helpful to a clear understanding of die witness's testimony
or the determination a fact in issue; and (c) not based on scientific, technical, or other
specialized knowledge.
Rule 702. Testimony by Expert Witnesses
If scientific, technical, or other specialized knowledge will assist the trier of fact to
understand the evidence or to determine a fact in issue, a witness qualified as an expert
by knowledge, skill, experience, training, or education may testify thereto in the form
of an opinion or otherwise provided that:(l) the testimony is based upon sufficient facts or
data; (2) the testimony is the product of reliable principles and methods; and (3) the witness
has applied the principles and methods reliably to the facts of the case.
Rule 703. Bases of an Expert
The facts or data in the particular case upon which an expert bases an opinion or infe
rence may be those perceived by or made known to the expert at or before the hearing.
If of a type reasonably relied upon by expert in the particular field in forming opinion
or inferences upon the subject, the facts or data need not be admissible in evidence in
order for the opinion or inference to be admitted Facts or data that are otherwise inadmis
sible, shall not be disclosed to the jury by the proponent of the opinion or inference unless
the court determines that their probative value in assisting the jury to evaluate the expert's
opinion substantially outweighs their prejudicial effect.
Os pontos destacados foram acrescidos com as mudanças de 2000. Acrescente-se que
as mesmas regras foram posteriormente alteradas, em 2 0 1 1 , sem mudança substancial
de seu conteúdo.
187. 522 U.S. 136, 146 (1 9 9 7 ). Na doutrina: DOMINIONl. La prova penale scientifica....
cit.. p. 179-181; VÁZQUEZ ROJAS. La prueba cientifica y la prueba pericial.... c it.,
p. 96-128. Na literatura nacional: Manzano (Prova pericial..., cit., p. 2 0 6 -2 0 8 ), que as
sim resumiu o caso: tratou-se de uma ação indenizalória, em que Joiner, de 37 anos de
idade, fumante compulsivo havia muitos anos, c com um histórico familiar de câncer
de pulmão, sustentou que a exposição ao bifenil policlorinato (PCBs) e seus derivados
havia provocado o desenvolvimento de câncer de pulmão.
190 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
estendeu sua incidencia para prova não propriamente “científica”, mas também
para provas meramente técnicas ou baseadas em conhecimentos especializados.
Trata-se de um importante avanço epistemológico, porque o que importa é saber
se o testemunho é confiável, e não se é científico.192 Em tal oportunidade, decidiu
-se que os fatores Daubert podem ser aplicados ao depoimento de engenheiros c
outros peritos que não sejam cientistas, até porque não existe uma linha divisoria
clara entre o que seja conhecimento científico, conhecimento técnico ou outro
conhecimento especializado, não havendo necessidade convincente para se lazer
tal distinção. Assim, deu-se importância não só para a qualidade do conhecimento,
como também para a adequação do conhecimento científico ou especializado para
a solução do problem a concreto posto em juízo. Trata-se. pois, de dar importância
não só para a qualidade da ciência, mas para a adequação da ciência ou, no caso,
do conhecimento técnico, com o problema a ser resolvido no caso concreto. Além
disso, decidiu-se que os fatores da Daubert list poderiam ou não ser pertinentes,
dependendo do tipo de perícia envolvido, de modo que os tribunais poderiam ou
não utilizar qualquer um dos fatores, usar todos, ou não usar nenhum, o que no
entender de Haack, foi muito sensato.193
Em suma, no C asoFrye ( 1923) prevaleceu o ponto de vista de que o juiz deveria
se limitar a colher a opinião geral da comunidade científica; no Caso Daubert ( 1993),
p. 67-89. Sobre o tema, pode ser consultado, também: DOMINION!. Lu prova penale
seientiftea...,cit., p. 190-197; VÁZQUEZ ROJAS, La prueba científicay lapruebapericial....
cit.. p. 128-133. Na literatura nacional: MANZANO. Prova pericial..., cit., p. 208-212;
KNIJN1K, Prova pericial e seu controle no direito processual brasileiro..., cit., p. 98, nota
191, que assim resume o caso: "O caso tratava de uma ação indenizatória proposta por
Patrick Carmichael, proprietário de uma minivan cujo pneu estourara, causando a morte
de um passageiro e várias lesões nos demais, afirmando-sc que um defeito da fornecedora
de pneus, Kumho Tire, seria responsável pelo dano. Para tanto, os autores ofereceram
como prova substancial o parecer de um especialista no assunto. Dennis Carlson Jr., se
gundo o qual um defeito de fabricação ou design causara o estouro. A requerida, a sua vez,
instou pela exclusão dessa prova, susLentando que a metodologia utilizada por Carlson
não atendia aos critérios Daubert, tendo o magistrado acolhido a arguição, malgrado o
depoimento em questão não ser de um cientista, mas de um técnico. A decisão exami
nou os (atores de “testabilidade”, revisão pelos pares, taxa de erro e grau de aceitação
na comunidade relevante, terminando por exclui-lo (Carmichael v. Samyange Tire. Inc.,
923 E Supp. 1514 (S.D. Ala. 1996). O 11“ Circuito deu provimento à apelação do autor,
reformando a decisão do juiz singular, porque, tratando-se de um depoimento baseado na
experiência e não propriamente na ciência, não estaria sujeito ao escrutínio segundo os
fatores Daubert (Carmichael v. Samyange Tire, Inc., 131 F. 3d 1433 (1 9 9 6 7 )). A Suprema
Corte, porém, afastou esse entendimento de 526 US. 137 (1 9 9 9 ), restaurando a decisão
singular, haja vista que os critérios também deveriam ser aplicados a um técnico”.
192. HAACK. Susan. Trial and error: two confusions in Daubert. Evidente matters: Science,
proof, and truth in lhe law. Nova York: Cambridge University Press, 2014. p. 115.
193. Epistemology legalized..., cit., p. 40.
192 EPISTEMOLOGIA JUDICIARIA E PRO VA PENAL
cm que se decidiu que o juiz eleve ler papel mais ativo e controlara admissibilidade da
nova prova científica, levando em contaa opinião geral da comunidade científica, mas
também devendo verificar outros critérios como a confiabilidade da teoria científica
ou da técnica, que deve ser passível de lestes, a revisão da teoria pela comunidade
cientifica, a existência de publicações da teoria, a existência de um percentual de
erros conhecidos ou potenciais e a aceitação geral da comunidade científica.
Tal modelo exige adaptações para o sistema brasileiro ou mesmo europeu
continental. Para além de questões terminológicas dos sistemase debates entre acu
satorio ou inquisitorio, ou então entre adversarial system ou inquisitorial system, é
importante ressaltar algumas características concretas que diferenciam os processos.
A construção norte-americana tem por objetivo analisara decisão do juiz na
fase prévia do julgamento, para a admissão ou não dos esclarecimentos do expert
witness a ser feita posteriormente, perante os jurados. O problema se concentra na
admissão da prova. evitando que os jurados, que serão os triers o jfact, possam ser
induzidos a erro ou confusões, com base em uma prova derivada de uma pseudo-
ciência, mas que goze da mítica infalibilidade das ciências. Por isso, cabe ao juiz,
numa fase prévia ao julgamento pelo júri, controlara admissibilidade da prova antes
do julgamento. Com isso, os juízes de fato não terão contato com a “má ciência”,
caso essa não seja admitida.194
Um segundo aspecto relacionado à atividade judicial de admissibilidade da
nova prova científica em que há grande divergência entre o sistema adversarial e o
sistema não adversarial, é que naquele o perito é uma testemunha da parte. Cada
uma se valerá do seu expert witness,1951967não sendo incumbência do juiz nomear um
perito.1911Além disso, nem o juiz nem os jurados terão qualquer interferência na
escolha das partes sobre quem será o seu perito.
Muito diversas são as características do processo penal brasileiro.19, O procedi
mento não é concentrado nem oral. A prova passa por uma formação gradual e, no caso
194. Nesse sentido: CANZIO, Prova scienlifica, ricerca delia ‘verilà' e decisione giudiziaria
nel processo penale..., cit., p. 59.
195. Além disso, como esclarece Suzan Haack (Irreconcilable differences? The troubled
marriage of Science and law. Evidence matiers: Science, proof, and truth in lhe law. Nova
York: Cambridge University Press, 2014. p. 9 5 ), devido ao seu caráter adversarial, o
sistema jurídico norte-americano tende a atrair como peritos cientistas de certa forma
marginal, isto é, mais dispostos que a maioria de seus colegas a emitir um parecer ba
seado em provas não tão fortes, além de muitas vezes servir como testemunha pericial,
de um modo muito mais seguro de sua opinião do que estaria um cientista. No mesmo
sentido: HAACK. A respeito da verdade, na ciência e no direito..., cit., p. 338.
196. Nos Estados Unidos, embora a rule 706 da Federal Rides of Evidence permita ao juiz
nomear um perito qualificado e imparcial, esse poder não costuma ser exercido.
197. Mesmo nos casos de processos de competência do tribunal do júri. o juiz tem um
papel ativo na produção da prova; a oralidade é, infelizmente, reduzida, muitas vezes
EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E CONTEXTOS PROBATORIOS 193
se limitando a parte a ler as declarações anteriores das testemunhas. Com relação aos
peritos e à perícia, ela é realizada por peritos nomeados pelo juízes e. muitas vezes, o
que se tem no plenário é a simples leitura do laudo escrito, não se tratando de uma
prova oral e, muito menos, havendo possibilidade de examinar os conhecimentos do
perito e o resultado da perícia, em contraditório de partes perante os jurados.
198. No mesmo sentido, com relação ao processo penal italiano: CANZIO, Prova scien-
tifica, ricerca delia vcrità’ e decisione giudiziaria nel processo pcnale..., cit., p. 63.
199. TARUFFO, Luso probatorio delia scienza nel processo..., cit., p. 47
200. TARUFFO, Conoscenza scientifica e decisione giudiziaria: profili generali..., cit.. p. 8-9.
201. Nesse sentido: MANZANO, A prova pericial..., cit., p. 73: ALMEIDA, A prova peri
cial no processo civil..., cit., p. 76-77; KNIJN1K, A prova pericial c seu controle no direito
processual brasileiro..., cit., p. 69.
202. TARUFFO, La símplice verita.... cit., p. 217.
194 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
203. No sentido de que se trata uma aplicação analógica: DOMINIONI. In tema di nuova
prova scientifica..., p. 1062: UBERTIS, Giulio. La prova scientifica c la nottola di mi
nerva. In: NEUBURGER, Luisiella de Cataldo. La prova scientifica nel processo penale,
Padova: CEDAM. 2007. p. 91.
204. DOMINIONI. Lei prova penale scientifica..., cit.. p. 217-218.
205. UBERTIS, La prova scientifica e la nottola di m inerva..., cit., p. 89. De modo seme
lhante: DOMINIONI, Lti prova penale scientifica..., cit.. p. 99.
EPISTEMOLOGIA JUDICIARIA E CONTEXTOS PROBATORIOS 195
207. Com entando lai regra, Antonio Magalhães Gomes Filho (Provas: Lei 1 1 .6 9 0 de
09.0 6 .2 0 0 8 . In: MOURA. Maria Thercza Rocha de Assis (Org.). As reformas no processo
EPISTEMOLOGIA JUDICIARIA E CONTEXTOS PROBATÓRIOS 197
penal: as novas leis de 2008 e os projetos de reforma. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2008. p. 249) destaca que: "A verdadeira pedra angular da nova disciplina da prova penal
trazida pela Lei 1 1.690/2008 é a vinculação do próprio conceito de prova à observância
do contraditório" (destaques no original).
208. O tema foi tratado por nós em dois trabalhos: sobre a possibilidade de utilização
de provas decorrentes de fontes pessoais, nos tribunais internacionais, cf. BADARÓ,
Gustavo. A utilização da hearsay witness na Corte Penal Internacional: estudo sobre sua
admissibilidade e valoração. Zeitschrift ftir Internationale Strafrechtsdogmatih. 4. 2014.
p. 179-180 [www.zis-online.coml; BADARÓ. Gustavo. Valor probatório do inquérito
policial. In: AMBOS, Kai; MALARINO, Ezequiel: VASCONCELOS, Enéas Romero de
(Coord.). Brasília: Gazeta Juridica/Cedpal, 2016. p. 262-266.
209. TARUFFO, La prova dei fatti giuridici..., cit., p. 352.
210. COMOGLIO, Luigi Paolo. Le prove civile. Torino: Utei. 1998. p. 8.
198 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA C PROVA PENAL
classificação, podem ser reais e pessoais.2" As fontes reais existem antes e fora
do processo, já estando constituídas. Assim, seu regime de produção implica tão
somente introduzir no processo tais elementos. O documento, por exemplo, não
é "produzido” no processo. Ele é criado previamente e extra-autos. O que se faz.
no curso da instrução, como modalidade de produção da “prova documental”, é
tão somente ajuntada de um documento já existente. Consequentemente, eles
não são produzidos em contraditório, mas apenas submetidos ao contraditório,21212213
cuja importância não será para a formação da prova,215 mas para a sua valoração.214
Por outro lado, as provas constituendas, como o depoimento de testemunhas
ou as declarações da vítima, têm sua produção no curso do próprio processo, em
contraditório.215 Quanto a este último aspecto, Comoglio assevera que a oralidade
da produção do depoimento, em contraditório de parte, na presença do juiz, “con
figura um denominador mínimo de form a oral e de controle dialético”, que não
pode ser “substituído por uma equivalente form a dc depoimento escrito, realizado
fora do contraditório”.216
Aliás, a diferença de regime dc produção leva, também a uma diversidade
do próprio regime de admissão de tais provas. No caso dos documentos, justa
mente por se tratar dc prova pré-constituída, é desnecessário um prévio juízo de
211. Usa-se aqui a distinção tal qual exposta por Taruffo (La prova dei faili giuridici..., cit.,
p. 4 4 1 ): prova real é aquela constituída de uma coisa, documental é aquela constituída
dc um documento (mas qualquer coisa pode ser um documento) e pessoal é aquela
fornecida por uma pessoa. Como explica Cordero (Trc studi sulla prova penale.... cit.,
p. 55) quanto a estrutura do ato aquisitivo, “há provas que preexistem na realidade
extraprocessual, se contrapõem aquelas formadas no processo".
212. Cario Taormina (II regime delia prova nel processo pénale. Torino: G. Giappichelli,
2007. p. 3 9 0 ) chega mesmo a dizer que ajuntada do documento aos autos é “a forma
típica de processualização da prova documental".
213. O documento, explica Carnelutti (La prova civilc..., cit., p. 29 1 ) “é uma prova que
não se faz sobre os olhos daqueles que a usam”.
214. TARUFFO, La prova deifatti giuridici..., cit., p. 403.
215. MAGALHÃES GOMES FILHO. Antonio. Notas sobre a terminologia da prova (re
flexos no processo penal brasileiro). In: YARSHELL, Flávio Luiz; MORAES, Maurício
Zanoide (Coord.). Estudos em homenagem a Professora Ada Pellegrini Grinover. São Paulo:
DP], 2005. p. 316) afirma que, em relação à prova testemunhal, o contraditório para a
sua produção, mais do que uma simples questão de “modo" de produção representa o
“canal de informação" do meio de prova.
216. COMOGLIO. Le Prove civilc..., cit., p. 2 5 9 -2 6 0 . Tal posicionamento, contudo, não
se aplica integralmente ao processo penal brasileiro, que admite o depoimento escrito
nos casos previstos no parágrafo único do art. 221 do CPP. em que o Presidente e o
Vice-Presidente da Republica, os Presidentes do Senado Federal, da Câmara dos Depu
tados e do STF poderão optar pela prestação de depoimento por escrito. No sentido da
não recepção de tais normas: BADARÓ, Processo penal..., cit., p. 484. nota 241.
EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E CONTEXTOS PROBATORIOS 199
217. Somente quanto ao documento cuja juntada tenha sido determinada ex ojjicio pelo
juiz é que se exige o juízo lógico de relevância. O art. 234 do CPP prevê que “Se o juiz
tiver notícia da existência de documento relativo a ponto relevante da acusação ou da
defesa, providenciará, independentemente de requerimento de qualquer das partes, para
sua juntada aos autos, se possível" (destaquei).
218. No regime do Código de Processo Penal, o art. 231 prevê que: “Salvo os casos ex
pressos em lei, as partes poderão apresentar documentos em qualquer fase do processo"
(destaquei).
219. Nesse sentido. Giulio Ubertis (Giusto processo e contraddittorio in âmbito penale.
Argumenti di procedura penale II. Vlilano: Giuffrè, 2006. p. 17-18), que distingue o con
traddittorio per ¡'elemento di prova, num sentido forte, do contraddittorio suWelemento di
prova, no sentido fraco. No mesmo sentido: PASTORE, Decisioni, argomenti, controlli...,
cit., p. 107.
220. Sobre o tema. cf., supra, cap. 1, item 1.3.3.
200 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
227. Nesse senliclo: TARUFFO, Lu prova dei Jau i giuridici..., cit., p. 399; UBERT1S, Profili
di epistemologiagiudiziaria..., cit., p. 1 18.
228. Como explica Damaska (II dirillo delle prove alia deriva..., cit., p. 5 5 -5 6 ), a concep
ção holística dos processos mentais considera que não é possível separar ou decompor
o valor dc cada elemento informativo da valoraçào global, não sendo possível atribuir
valores a cada um dos elementos isoladamente, para depois somá-los.
229. Taruffo (La semplice veritd... cit.. p. 6 5) destaca que pesquisas empíricas no campo
da psicologia mostram que os jurados tendem a decidir a partir de uma concepção ho-
líslica, chegando a sua conclusão sobre os fatos valorando a plausibilidade de “histórias
completas“ sobre os fatos, sem desenvolver raciocínios analíticos sobre as circunstâncias
específicas da história e sobre cada um dos elementos de prova.
230. TARUFFO, Elcmenti per unanalisi dei giudizio di falio.... p. 238. nota 5.
EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E CONTEXTOS PROBATÓRIOS 203
231. Nesse sentido: UBERT1S, La prova penale..., cit., p. 80; ldem. Profili di epistemologia
giudiziaria..., cit.. p. 114; ANDRÉS 1B.ÁNEZ. A argumentação probatória e sua expressão
na sentença..., cit.. p. 42-44. Na doutrina nacional: MAGALHÃES GOMES FILHO, A
motivação das decisões penais..., cit., p. 154.
232. UBERT1S, Profili di Epistemologia Cindi Ziaria..., cit., p. 83-84.
233. La prova dei fatti g iu rid ici... cit., p. 4 2 1 . No mesmo sentido: UBERTIS, Profili di
epistemologia giudiziaria..., cit., p. 119.
204 EPISTEMOLOGIA JUDICIARIA E PROVA PENAL
234. TARUFFO, Michele. Libero convincimentó del giudice: 1) diritto processuale civile.
Enciclopedia giuridica treccani. Roma: Treccani, 1990. v. XVIII. p. 2.
235. Esiti, errori. arbitrii dietro un'illustre form ula.... cic, p. 34
236. FERRAJOL1. Diritto c ragione..., cit.. p. 1 16.
237. Sobre o sistema da prova legal: FURNO, Teoría de la prueba legal..., cit.. p. 160 ss.;
G1UL1AN!. II concetto di prova.... cit., p. 231 e ss.; NOB1LI. II principio del libero convin-
cimento del giudice..., cit., p. 8 1 -1 4 3 ; PALAZZOLO, Giorgia Alessi. Prova legale e pena.
Napoli: Jovene. 1979. p. 37 e s.; ESMEIN, A. History oj criminal procedure in F ranee.
Trad. John Simpson. Boston: Little. Browti 1913. p. 251-271.
238. CAPPELLETT1. Mauro. Principi fondamentali e tendenze evolutive del processo
civile nel diritto comparato, Giurisdizione italiana, 1968. v. IV. p. 79. No tnesmo sentido:
NOB1L1, II principio del libero convincimento.... cit., p. 92; TARUFFO, La prova de i fatti
giuridici...., cit., p. 363: Idem. Libero convincimento del giudice..., cit., p. 1; 1ACOBONI,
Alessandro. Prova legale e libero convincimento del giudice. Milano: Giuffré, 2006. p. 1.
EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E CONTEXTOS PROBATÓRIOS 205
244. Nesse sentido: Taruffo (Lobbligo di molivazione delia sentenza..., cil., p. 2 7 0 ), que
acrescenta na nota 22, entre esse conjunto de princípios: a introdução dos árbitros e
juízes de paz como juízes de equidade, a eletividade dos juízes, a introdução do júri
popular em matéria penal, além da instituição da Corte de Cassação, pelo Decreto de 27
de novembro-1° de dezembro de 1790, como órgão que permitia o controle da legalidade
das decisões judiciais.
245. Como explica Nobili (Esiti, errori, arbitrii dietro un’illusire form ula..., cit., p. 3 8 ),
o livre convencimento foi trazido e trouxe o método acusatório mais avançado, com
colegialidade, júri e outras garantias. E, noutra obra (NOBILI, II libero convincimento
dei giudice..., cit., p. 9 4) destaca que o júri conduziu a introdução “da oralidade, da
imediatidade e do convencimento íntimo, entendidos como princípios entre si incin-
divelmente conexos".
246. TARUFFO, Libero convincimento dei giudice..., cit., p. 1.
247. IACOVTELLO, 1 criteri di valutazione delia prova..., cit., p. 393.
EPISTEMOLOGIA JUDICIARIA E CONTEXTOS PROBATORIOS 207
com uma “nova filosofia”, que entendia a razão como instrumento de verdade, que
era atingida com a observação direta e crítica dos fatos.24l<
De qualquer forma, a fé no júri também era compatível com uma concepção
que, para decidir bem, bastava adotar a filosofia do “senso comum . Beccaria,
por exemplo, asseverava que para julgar “não c necessário senão um simples c
vulgar bom senso”.250
O livre convencimento não era, portanto, um critério positivo de decisão sobre
a verdade, mas um critério alternativo à prova legal, que pré-estabelecia o que era
suficiente e necessário para determinar a condenação e a pena.21' Como explica
Taruffo, “o primeiro e principal significado do livre convencimento’ do juiz se
define por antítese ao conceito de prova legal".252 O juiz fica livre da apriorística
hierarquia de provas estabelecidas pelo legislador, devendo ele próprio realizar uma
“valoração complessiva e comparativa para o acertamento dos fatos da causa'V '
Como se sabe, contudo, esse modelo de livre convencimento ligado ao júri
durou poucos anos, sendo substituído pelo sistema misto do Code d ’instruction
Criminelle de 1808, que adotou o chamado sistema misto,254 influenciando toda
248. Nesse sentido: NOBILI, II principio dei libero convincimento.... cit., p. 92. No mesmo
sentido: Mauro Cappelletti (Ideologie nel diritto processuale. Processo e ideologie. Bo
logna: 11 Mulino, 1969. p. 8 -1 0 ) acrescenta que segundo esse novo método, “as provas
se pesam, não se contam. Se pesam no seu concreto e individual valor e não mais com
base em prejulgamentos abstratos e computação mecanicamente predisposta".
249. NOBILI, II principio dei libero convincimento..., cit., p. 15 e 95. No mesmo sentido:
ANDRÉS 1BÁNEZ, Sobre a motivação dos fatos na sentença penal..., cit., p. 90.
250. Dos delitos c deis penas.... cit., p. 89, § XIV. E complementava: “A certeza que se re
clama para declarar um homem réu é, portanto, aquela que determina lodo o homem
nos actos mais importantes da sua vida”.
251. Outra diferença, do ponto de vista do direito probatório, destacada por lacovicllo (I
criteri di valulazione delia prova..., cit., p. 394) é que no sistema da prova legal, as regras
probatórias intervinham no momento da valoração, diante de um material probatório
virtualmente ilimitado, no sistema da intima convicção, as regras probatórias intervi
nham na seleção do material probatório, como regras de exclusão, sendo a valoração
do material produzido livre de vínculos legais.
252. TARUFFO, Libero convincimento dei giudice..., c i t , p. 1. Idem, La prova deifatti giuri-
dici.... cit., p. 369. No mesmo sentido: FERRAJOLI, Diritto e ragione..., cit., p. 117-118;
SAMMARCO. Métodoprobatorioe modelli di ragionamento..., cit., p. 1 5 5 :1ACOBONI, Prova
legalc e libero convincimento dei giudice..., cit., p. 6; DE LUCA. Giuseppe. 11 eontradittorio
nella formazione delia prova e la decisione sulla quaestio facti, II libero convincimento
dcl giudice penale. Vecchie e nuove esperienze. Milano: Giuffrè, 2004. p. 24; ANDRÉS
IBÁNEZ. ‘'Carpintaria" da sentença penal (em matéria de fato)..., cit.. p. 145; GASCÓN
ABELLÁN, La valoración de la prueba..., cit.. p. 391.
253. TARUFFO, Libero convincimento dei giudice..., cit., p. 2.
254. Como sintetiza Magalhães Gomes Filho (A motivação das decisões penais..., cit.,
p. 146, nota 4 7 ), no sistema misto, a persecução penal foi dividida cm duas fases: “a
208 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
quanto ao juízo de Tato era uma verdade intimamente atingida, “uma espécie de
momento místico e, enquanto tal, incontrolável”.260 Tinha-se, assim, um modo de
decidir que, nas palavras de Carrara, caracterizava uma “convicção autocrática”.261
Além disso, essa tendência ampliativa do livre convencimento identificada
com a total ausência de limites, acabou por levar a uma versão irracional do con
vencimento judicial, uma espécie de “anarquia cognitiva”.262 O acusado poderia
ser condenado não em razão das provas, ou somente das provas, mas também em
decorrência de paixões, emoções, antipatias, simpatias, ideologias ou outros fatores
não controláveis que influenciassem o julgador. A sentença tornou-se, nas palavras
de Nobili, “um ato imperscrutável do ponto de vista lógico racional e arbitrário do
ponto de vista ideológico".263
Em seu desenvolvimento histórico, o livre convencimento sofreu uma grande
mutação, que o transformou de uma garantia de liberdade em um instrumento de
arbítrio. Aquele que era só um princípio negativo, acabou transformando-se em
um critério discricionário de valoração da prova, sendo o livre convencimento, nas
palavras de Ferrajoli, “uma das páginas politicamente mais amargas e intelectual
mente mais deprimentes da história das instituições penais”.264Sistemas fundados
na íntima convicção ou na certeza moral do julgador,265 admitem, em última aná
lise, que o ato de decidir é o resultado de meras crenças, intuições ou opiniões do
julgador, sendo a sentença incontrolável intersubjetivamente.266
Para corrigir esses abusos, a epistemología judiciária é de grande impor
tância, por fornecer um método racional de valoração da prova, possibilitando
267. Como explica Vittorio Denti (Sdentificità delia prova e libera valutazione dei giu-
dice. Rivista di Dirilto Processuale, 1972. p. 4 3 1 ), uma decisão proferida com base em
critérios objetivos de valoraçâo poderá ser repelida mentalmente e, portanto, passível
de ser controlada na via recursal. No mesmo sentido: MAGALHÃES GOMES FILHO,
A motivação das decisões penais..., cit., p. 147.
268. Como razão, Taruffo (Libero convincimento dei giudice..., cil., p. 2) adverte que “o
primeiro e essencial problema que se coloca a propósito do livre convencimento é o da
garantia contra o arbítrio subjetivo do juiz. em consonância com a exigência de que a
decisão se funde - ainda que nos limites inevitáveis do processo - em um acertamento
verdadeiro dos fatos controvertidos". Para isso, completa Magalhães Gomes Filho (A
motivação das decisões penais..., cit., p. 158) ‘a exigência de racionalidade deve impedir
que no processo mental da decisão sejam sopesados elementos de ordem psicológica,
suspeitas, impressões, avaliações pessoais do juiz etc." Ressalte-se que, com condição
para o efetivo controle desse indevido subjetivismo será necessário exigir uma funda
mentação completa, como mecanismo de justificação das escolhas judiciais. Sobre a
fundamentação e o contexto da justificação, cf., infra, item 3.7.
269. Nesse sentido: ECHANDÍA, Devis. Teoria general de la prueba judicial..., cit.. p. 109;
GASCÓN ABELLÁN, Los hechos cn cl derecho..., cit.. p. 160; MAGALHÃES GOV1ES
FILHO, A motivação das decisões penais..., cit., p. 147.
270. Nesse sentido: TARUFFO. Libero convincimento dei giudice..., cit., p. 2; GASCÓN
ABELLÁN, Los hechos cn el derecho..., cit., p. 161. Como explica Magalhães Gomes Filho
(Princípios gerais da prova..., cit., p. 4 1 ), “Como antítese do método da prova legal.
em que o valor de cada prova era previamente estabelecido pelo legislador, o livre con
vencimento não pode ser confundido, no entanto, com permissão para uma valoraçâo
subjetiva e isenta de critérios e controles".
271. FERRER BELTRÁN, Prolegúmenos para una teoria sobre los estándares de p rueba...,
cit., p. 405.
272. CANZIO, Prova scientifica, ricerca delia ‘verità’ e decisione giudiziaria nel processo
penale..., cit., p. 67. No mesmo sentido: FERRUA, II libero convincimento dei giudice
EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E CONTEXTOS PROBATÓRIOS 211
A definição de que convencim ento judicial será livre não fecha, mas, ao
contrario, abre o critério de valoração da prova.271 Não tendo o legislador indicar
o método a ser seguido - e nem deveria assim o fazer cabera à epistemología
fornecer os mecanismos de valoração racional da prova.274 O livre convencimento
judicial, enquanto princípio processual, necessita, nas palavras de Taruffo, de uma
heterointegração, que se dará por meio do "emprego de princípios da teoria geral
do conhecimento elaborados no plano filosófico".271 Com isso, além de se saber que
o juiz decidirá livre do tarifamento da prova legal, também se poderá saber com o o
juiz decidirá. O problema é identificar essas regras epistemológicas de valoração,
que se encontram fora c além da disciplina dos códigos de processo penal.276
Todavia, no processo penal, ainda por resquícios da desconfiança com o
arbítrio provocado pela deturpação autoritária do livre convencimento, excep
cionalmente o legislador intervém, estabelecendo regras legais de valoração da
prova, em especial, com vista ao fortalecimento da presunção de inocência. Sem o
“requisito mínimo” exigido pelo legislador, o juiz não poderá, abusando do livre
convencimento, condenar o acusado com base em uma valoração da prova de fundo
irracional ou emotiva.277 A investigação judiciária não é uma pesquisa puramente
intelectual, mas o pressuposto de uma decisão sobre a liberdade do cidadão, na qual.
se não houver limites normativos, tenderá a prevalecer o poder sobre o saber.2 ”
penale..., cit., p. 61. acrescentando, ainda, que integra o livre convencimento a neces
sidade de que a imputação esteja provada “oltre ogni ragionevole dubbio”.
273. Nesse sentido: TARUFFO, Michele. Modelli di prova e di procedimento probatório.
Rivista di Diritto Processuale. 1990. p. 4 3 8 : GASCÓN ABELLAN, La valoración de la
prueba..., cit., p. 392.
274. FERRER BELTRAN, La valoración racional de la prueba.... cit.. p. 68.
275. Libero convincimento dei giudice..., cit., p. 2.
276. Antecipando a conclusão que se seguirá, cf., infra, item 3.5.3.3, mediante um racio
cínio lundado na probabilidade indutiva, de tipo baconiano, como proposto por Cohen.
277. SAMMARCO, Método probatorio e modelli di ragionamento..., cit.. p. 36.
278. FERRAJOLl, Diritto e ragione..., cit.. p. 18-20.
212 EPISTEMOLOGIA JUDICIARIA E PROVA PENAL
juiz não pode, diante de um resultado probatório, condenar o acusado ainda que,
segundo as regras lógicas do procedimento inferencial normalmente empregado,
considerasse que há prova suficiente da culpabilidade.292 O legislador não esta
belece abstratamente o que é necessário para condenar, mas apenas, em reforço à
presunção de inocência, o que é insuficiente para superar a “dúvida razoável”.293
Há, ainda, casos em que o limite ao livre convencimento não é absoluto. São
situações em que o legislador estabelece proibição de valoração relativas, isto é,
determinando que um meio de prova pode ser valorado apenas para uma determi
nada finalidade, mas não para outra.
Em suma, o livre convencimento não fecha, mas abre o problema da iden
tificação das condições probatórias que permitem que um conhecim ento seja
considerado verdadeiro, cabendo à epistemológica fornecer ao profissional do
direito os instrumentos adequados para definição do raciocínio probatório a ser
utilizado pelo juiz.294
convencimento, na medida em que num sistema da prova legal - em caráter positivo - era
o legislador que estabelecia o que era necessário, como resultado probatório, para que o
juiz considerasse um fato como verdadeiro. Ou seja, nesse modelo, a lei determinava,
positivamente, o que era necessário para que um falo fosse considerado verdadeiro, para
condenar ou absolver. Já no modelo da prova legal negativa, a lei apenas estabelecia
limites ao livre convencimento, determinando o que era insuficiente para que um fato
pudesse ser considerado verdadeiro e, assim, levasse à condenação do acusado. Era. em
última análise, um limite garantista para evitar condenações duvidosas.
292. SAMMARCO, Método probatorio e modelli di ragionamento..., cit.. p. 34.
293. AMODIO, Liberta e legalità..., cit., p. 232. No mesmo sentido: DAMASKA, II diritto
delle prove alia deriva.... cit., p. 32, nota 28; MAGALHÃES GOMES FILHO, Direito à
prova no processo penal.... cit.. p. 27.
294. FERRAJOL1, Dirítto e rugtonc.... cit.. p. 119-120.
EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E CONTEXTOS PROBATÓRIOS 215
295. Nesse sentido: LIEBMAN, Manuale di diritto processuale civile..., cit., v. II. p. 71;
ILLUMINATI, La presunzionc .... cit., p. 78; CHIARLON1, Sérgio. Riflessioni sui limiti
dei giudizio di falto nel processo civile. Rivista Trimestrale di Diritto e Procedura Civile,
1986. p. 828: VERDE, Giovanni. Prova (teoria generale e diritto processuale civile).
Enciclopédia dei dirilio. Milano: Giuffrè. 1988. v. XXXVII. p. 585: FERRUA. Conlraddit-
torio e verità..., cit.. p. 49-50; TARUFFO, Modelli di prova..., cit.. p. 43 0 -4 3 1 ; FASSONE.
Dalla “certezza" all' "ipotesi preferibile".... p. 1109; LOMBARDO, Ricerca delia verità...,
cit., p. 752; FERRER BELTRÁN, Prolegómenos para una teoria sobre los estándares de
prueba..., cit., p. 403; GASCÓN ABELLÁN, La valoración de la prueba..., cit.. p. 377.
296. Sobre Evidentiary value model ( “teoria do valor probatório"), uma vertente da proba
bilidade quantitativa proposta por Per Olof Ekelõf, e desenvolvida por Sõren Halldén e
Martin Edman (que jã analisamos em BADARÓ, Onus da prova no processo penal.... cit.,
p. 4 5 -5 0 ). nào será incluída na análise das possibilidades de raciocínio judicial para
valoração da prova, pois a elas se aplicam as mesmas críticas que serão feitas à teoria da
probabilidade quantitativa. Muito sinteticamente, a Evidentiary Value Model compartilha
das premissas fundamentais da teoria bayesiana: 1) o objeto de nossas crenças são pro
posições que exprimem hipóteses e informações sobre a verdade das hipóteses; 2) a nossa
fé na verdade das proposições é quantificável por meio de cálculos de probabilidade;
3) o cálculo de probabilidade é um sistema de lógica no qual podemos demonstrar
dedulivamente que o crer com um certo grau de probabilidade na verdade de certas
preposições implica que possamos crer com um certo grau em certas outras proposições;
4) o teorema de Bayes é a regra para calcular a probabilidade de que uma certa proposição
A seja verdadeira, dado que se conhece que é verdadeira uma outra proposição B. que
contém informações relevantes para a verdade de A. A diferença da EVM em relação à
teoria clássica bayesiana consiste na observação de que, sendo a preposição A um fa c
tum probandum c B um factum probans, o que é relevante e interessa ao juiz não é tanto
estabelecer a verdade da preposição A, mas estabelecer a existência de uma apropriada
relação probatória entre A e B. O raciocínio probatório, segundo a EVM, é composto de
três elementos: o primeiro é o tema de prova que deve ser demonstrado; o segundo são
os fatos probatórios; o terceiro e último elemento é um mecanismo probatório, que diz
que um fato probatório é causado pelo tema de prova. Uma análise mais profunda do
tema pode ser encontrada em: EKELÕF. Olof. La libera valutazione delle prove. Siudi
in onore di Antonio Segni. Milano: Giuffrè, 1967. v. II. p. 93 e ss.; GARDENFORS. Peter:
HASSON, Bengt; SAHLIN, Nils-Eric Sahlin (Org.). La teoria del valore probatório. Aspetti
filosofici, giuridici e psicologici. Trad. Paolo Garbolino. Milano: Giuffrè, 1997.
216 EPISTEMOLOGIA JUDICIARIA E PROVA PENAL
297. Uma análise da teoria da probabilidade estatística no direito, cf. TILLERS, Peter;
GREEN, Eric. Linferenza probabilistica nel diritto delle prova. Usi i limiti dei bayesiane-
simo. Trad. Alberto Mura, Milano: Giuffrè, 2003.
298. A análise bayesiana dos problemas relacionados à probabilidade tem origem na obra
póstuma do Reverendo Thomas Bayes ( 1701-1761), denominada An essay torvarás solving
a problem in the doctrine of chances, em 1763.
299. A questão, porém, muitas vezes, vai além da mera questão estatística, envolvendo
variáveis axiológicas, como se verifica no seguinte exemplo de Hempel (Filosofia da
ciência natural..., cit., p. 8 6 -8 7 ): "se a hipótese se refere à provável eficácia e seguran
ça de uma nova vacina, a decisão sobre sua aceitação terá que levar em conta o grau
de concordância dos resultados estatísticos com as probabilidades especificadas pela
hipótese, mas também quão séria seria a consequência de aceitar a hipótese e agir em
conformidade (v.g., inoculando as crianças com a vacina) quando de fato ela é falsa ou
de rejeitar a hipótese e agir em consequência (e.g., destruindo a vacina e modificando
ou interrompendo o processo de manufatura) quando de fato a hipótese é verdadeira”.
300. Sobre a probabilidade quantitativa, cf. MARQUEIS, Probabilità e prova .... cit., p. 1120
e ss.; TARUFFO, La prova ..., cit.. p. 166 e ss.: e MAGALHÃES GOMES FILHO, Direito
ci prova..., cit.. p. 47 e ss. Específicamente sobre a teoria de Bayes e suas aplicações no
campo probatório: TARUFFO, La prova defatti giuridici..., cit.. p. 171 e ss.
301. Nesse sentido: MARQUEIS, Probabilità e prova..., cit., p. 1121; 1ACOVIELLO, La
motivazione delia sentenza penale e iI suo contrallo in Cassazione..., cit., p. 120.
EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E CONTEXTOS PROBATORIOS 217
302. COHEN, Laurence Jonathan. Filosofia dell’induzione e della probability Trad. Paolo
Garbolino. Milano: Giuffrè, 1998. p. 52.
303. Nesse sentido: TARUFFO. La prova de fatti giuridici.... cit., p. 199: STEIN, Foundations
of evidence law.... cit., p. 67 e 76; COHEN, Filosofia dell'induzione e della probabilità...,
cit., p. 57; FERRER BELTRÁN, La valoración racional de la prueba..., cit., p. 98;
304. O caso real foi Smith v: Rapid Transit Inc. 58.N .e 2d 7 5 4 (1 9 5 4 ). julgado pela Corte
Suprema de Massachussetts.
305. TRIBE, Laurence, Trial by m athem atics: precision and ritual in the legal process.
Haivard Law Review, 8 4 .1 9 7 1 . p. 1340-1341. Uma análise crítica do caso, sob o enfoque
do emprego das generalizações, é feita por SCHAUER. Frederick. Di ogni erba tun fascia.
Generalizzazioni, profili, stereotipi nel mondo della giustizia. Trad. Anna Margherita
Taruffo, Bologna: 11 Mulino, 2008. p. 79-84.
218 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
306. COHEN, L. Jonathan. The probable and thc provable. Oxford: Clarendon Press, 1977,
p. 75.
307. Ibidem, p. 75. Para Schauer (Di ogni erba um fastio..., cit., p. 8 7 -8 8 ), tal distorção
decorre do faLo de o direito utilizar a ideia do "tudo ou nada”.
308. MARQUEIS. Probabilità e prova..., cit., p. 1L23.
309. Nesse sentido: UBERT1S, Giulio. Falto, prova e veritã (alia luce dei principio dell’olire
ogni ragionevole dubbio). Argomenti di procedura pcnale. Milano: Giuffrè, 2011. v. 111.
p. 180-181; MAZZA, 11 ragionevole dubbio nella teoria delia decisione..., cit., p. 360.
EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E CONTEXTOS PROBATÓRIOS 219
3 .5 .3 .2 . A p r o b a b ilid a d e subjetiva
o risco de que existe uma possibilidade em vinte (em cem, mil, ou mais) de que essa
pessoa é inocente; qualquer que seja sua medida, a dúvida deve favorecer o acusado".
Além disso, Tribe (Trial by mathematics .... cit., p. 1375-L 376) refere-se, também à
“dehumanization of Justice” provocada pelo emprego da estatística na valoração da
prova. Porém, como observa Taruffo (La prova deifatti giuridici..., cit., p. 199), negar
que o modelo do cálculo de probabilidade estatística represente o esquema lógico de
valoração da prova não significa negar que, em certos casos e de acordo com as condi
ções dadas, a probabilidade estatística possa ser utilizada para o acertamento do fato,
lendo em conta o grau de confirmação dos elementos de prova obtidos sobre a hipótese.
319. Nesse sentido: FROSINI. Benito V. Lc prove statistichc nel processo civile e ncl processo
penale. Milano: Giuffrè, 2002. p. 146; BLAIOTTA, Rocco. Causalità giuriclica. Torino:
G. Giappichelli, 2010. p. 336.
320. FERRER BELTRÁN, La valoración racional de la prueba..., cit.. p. 94.
321. Nesse sentido: FERRER BELTRÁN, La valoración racional de la prueba..., cit.. p. 95;
GASCÓN ABELLÁN, Sobre la posibilidad de formular estándares de prueba..., cit.,
p. 132, nota 5.
322. Para Richard Eggleslon (Prova, conclusione probatória e probabilitá. Trad. Donata Ro-
mizi, Milano: Giuffrè, 2004. p. 13), a probabilidade subjetiva é o tipo de probabilidade
utilizada pelos juristas, embora prefira fala em “grau de verossimilhança” ou “grau de
persuasão”, em vez de “grau de crença”.
222 EPISTEMOLOGIA JUDICIARIA H PROVA PENAL
323. Ferrer Beltrán (La valoración racional de la prueba..., cii., p. 110) explica que a pro
babilidade subjetiva utiliza o esquema da probabilidade inversa, que também se vale do
teorema de Bayes, tendo a seguinte fórmula: P(H/E) = P(E/H) x P (H) / PE/->H), que se
lê: a probabilidade condicional de que seja verdadeira a hipótese H dado o elemento de
prova E é igual à probabilidade de que se dê E se é verdadeira H multiplicado pela proba
bilidade de H (sem levar em conta E), dividido pela probabilidade de que se dê E se não
for verdadeiro H. O referido cálculo permite medir o impacto do elemento de prova E na
probabilidade de H. Quer dizer, a passagem da probabilidade de H, antes de considerar
o novo elemento de prova E (que é a príor probability de H), para a probabilidade condi
cional de que H seja verdadeira, dado que se conhece o elemento E (Ibidem, p. 109) Um
explicação detalhada sobre tal formula probabilística pode ser encontrada, também, em
GASCÓN ABELLÁN, La valoracióndela prueba..., cit., p.393-394.
324. GASCÓN ABELLÁN, La valoracióndela prueba..., cit., p. 394.
325. GASCÓN ABELLÁN, La valoracióndeIa prueba..., cit., p.394.
326. GASCÓN ABELLÁN, La valoracióndeIa prueba..., cit., p. 394.
EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E CONTEXTOS PROBATORIOS 223
336. Nesse sentido: FERRER BELTRÁN, La valoraciòn racional de la prueba..., cil., p. 97,
nota 67; TARUFFO, II libero convincimento dei giudice..., cit.. p. 3; idem. Processo civil
comparado: ensaios..., cit., p. 4 8 ; STELLA, Oltre ¡1 ragionevole dubbio..., cit., p. 101;
MAZZA, II ragionevole dubbio nella teoria delia decisione..., cil., p. 359-360; GASCÓN
ABELLÁN, La valoración de la prueba..., cit., p. 397-402.
337. MARQUEIS, Probabilità c prova..., cit., p. 1 125.
338. FERRER BELTRÁN, La valoración racional de la prueba.... cit., p. 122.
339. Hetnpel (Filosofia da ciência natural..., cit., p. 8 3) já afirmava que o conceito de pro
babilidade estatística "deve ser cuidadosamente distinguido do conceito de probabilidade
lógica ou indutiva” entendida como "uma relação lógica dentre enunciados precisos”.
340. TARUFFO, La prova dei fatli giuridici..., cit., p. 2 0 1.
341. IACOV1ELLO, La motivazione delia sentenza penale e il suo conirollo in cassazione...,
cit., p. 121.
226 EPISTEMOLOGIA JUDICIARIA E PROVA PENAL
maior capacidade de resistência maior, vez que está fundada em uma regra geral
de maior solidez.
Resta definir qual o modelo de inferência adequado para um melhorcontrole
da racionalidade da decisão sobre o juízo de fato no processo penal. Para tanto,
serão analisadas duas propostas: (i) a inferência probatória baseada no modelo
argumentativo de Toulmin; (ii) a “inferência para a melhor explicação”.
352. TOULMIN, Stephen E. The uses of argument. Update Edition. Nova York: Cambridg
Press, 2003. p. 173. O próprio Toulmin afirmou que, para ele, a questão central é saber
até que ponto a lógica pode esperar ser uma ciência formal e, ainda assim, conservar
a possibilidade de ser aplicada na avaliação crítica de argumentos que efetivamente
usamos (op. cit., p. 3)
353. TOULMIN, The uses of argument..., ciu, p. 7.
354. TOULMIN, The uses of argument..., cit.. p. 93 -9 4 . Para uma descrição simplificado
do modelo argumentativo de Toulmin, cf.: ATIENZA, Razonamiento Jurídico..., cit.,
p. 215-216; ALEXY. Roben. Teoría de la argumentación jurídica. La teoria dei discurso
racional como teoria de Ia fundamentación jurídica. Trad. Manuel Atienza. Madrid:
Centro de Estudios Políticos y Constitucionales, 2008, p. 94-103.
355. ALEXY, Teoria de la argumentación jurídica..., cit., p. 95.
356. TOULMIN, The uses of argument..., cit., p. 1 1 e 97.
EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E CONTEXTOS PROBATÓRIOS 229
conclusão. Se essa pretensão for posta em dúvida pelo oponente, o proponente tem
que fundamentar a sua pretensão. Para o fazer, deverá aduzir fatos como razões (data
ougw und) de sua pretensão. Assim, a asserção de que “Harryé um cidadão britânico ’
(C = claim ou conclusión), poderá ser justificada acrescentando como razão de tal
afirmativa o fato de que “Harry nasceu nas Bermudas” (D = data). Se o oponente não
aceitar tal argumento, poderá o atacar de dois modos: Pode questionar a verdade dos
dado (data) apresentado como razão da pretensão; ou poderá questionar a relação
de tal fato com a pretensão, isto é, questionar se tal dado D é adequado para funda
mentar a conclusão ou pretensão C. Nesse segundo caso, o proponente não poderá
continuar seu raciocínio, aduzindo um novo fato, mas deverá justificar o passo (step)
que lhe permitir ir de D para C. Para tanto, é necessário se valer de um novo elemento
lógico: uma regra de inferência (m/erence-íicence).357Toulmin denomina essas regras
de “garantia” (warrants), que têm a seguinte forma: “Dados como D nos autorizam
a extrair conclusões ou a realizar pretensões como C”.358 Voltando ao exemplo, a
regra de inferência ou a “garantia” do argumento seria: “Quem nasce das Bermudas
é cidadão britânico”. Essa garantia pode ser aceita, o que normalmente ocorre quan
do a regra de inferência é conhecida ou forte. Porém, é possível que também essa
regra de inferência seja posta em dúvida pelo oponente. Será necessário, então, que
o proponente ofereça um “apoio” (backíng, representado pela letra B).359 No nosso
exemplo, o fundamento é suficiente forte, porque decorre de uma lei que assegura a
quem nasce no território britânico a cidadania britânica.
Assim, esquematicamente, segundo a construção de Toulmin, a forma mais
simplificada da estrutura do argumento é a seguinte:
B
Esse é, porém, um modelo simplificado, a ser utilizado para que se tenha um
argumento válido ou correto.360 Porém, quando se pretende analisar a “força” de
um argumento, Toulmin acrescenta dois outros conceitos fundamentais: o deno
minado “qualificador modal” (modal qualifier = Q) e a “condição de refutação”
(condition o f rebutall = R).361
O qualificador fixa a modalidade de relação com que a conclusão C pode ser
afirmada com base no fato D e na garantia W. A conclusão pode ser afirmada com
por conta de
B 3«6
362. ATIENZA, Razonamiento jurídico..., cil., p. 216. Nesse ponto, contudo, é de se des
tacar que, no caso de aplicação do modelo argumentativo de Toulmin para a valoração
da prova em processo penal, essa função do qualificador modal será exercida pelos
standards de prova. Sobre o tema. cf.. infra, item 3.6.2.
363. TOULMIN, The uses of argument..., cit., p. 94.
364. ATIENZA, Razonamiento jurídico..., cit., p. 216.
365. TOULMIN, The uses of argument..., cit., p. 94.
366. TOULMIN, The uses of argument..., cit., p. 97.
367. TOULMIN, The uses of argument..., cit., p. 97.
EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E CONTEXTOS PROBATÓRIOS 231
que ambos foram disparados pela mesma arma”. Essa garantia pode ser aceita, o que
normalmente ocorre quando a regra de inferência é conhecida ou forte, como nesse
caso. Porém, é possível que também essa regra de inferência seja posta em dúvida
pela defesa. Será necessário, então, que o acusador ou o próprio perito ofereça um
"apoio indicando os padrões e critérios científicos utilizados no exame pericial,
que permitem afirmar com determinada probabilidade (se conhecida a taxa de erro)
que o projétil examinado pelos testes em laboratório provem da mesma arma que
efetuou o disparo do projétil que foi encontrado no corpo da vítima.
Essa, contudo, será apenas uma das inferências probatórias. Num caso con
creto, muitas outras poderão ter que ser feitas, para cada segmento da alegação de
fato que integre a imputação. Também poderá ser necessário realizar inferências
probatórias de fatos alegados pelo acusado, como ter agido em legítima defesa, em
que será necessário verificar se havia uma agressão, se tal ato agressivo era atual
ou iminente, qual o meio utilizado na reação, se havia outros meios à disposição
do acusado, como o meio foi utilizado etc.
Em suma, a inferência probatória a ser realizada no processo judicial deve
seguir o modelo de argumentação de Toulmin, adaptado para a atividade probatória.
370. HARTMAN, Gilbert H. The inference to the best explanation. The Philosophical Review.
74. 1965. p. 88-95; L1PTPON, Peter. Inference to the best explanation. 2. ed. London &
New York: Routledge. 1991: JOSEPHSON. John R. On the proof dynamics of inference
to the best explanation. Cardoso Law Review, 22, 2001. p. 1621-1643.
371. FERRER BELTRAN, La prueba es libertad.... eil., p. 36. nota 21.
372. TLIZET, Razonamiento probatorio: ¿deducción? ¿inducción? ¿abducción?..., cit., p. 142.
373. TUZET, Razonamiento probatorio: ¿deducción? ¿inducción? ¿ab d u cció n ?..., cit.,
p. 142.
EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E CONTEXTOS PROBATORIOS 233
374. Judicial proof and the best explanation. Latv tmei Philosophy. 27. 2 0 0 8 . p. 230. No
mesmo sentido, na doutrina nacional: DALLAGNOL, Deltan Martinazzo. As lógicas das
provas no processo. Prova direta, indícios e presunções. Curitiba: Livraria do Advogado.
2015. p. 124.
375. LAUDAN, Larry. Strange bedfellows: interference to the best explanation and the
criminal standard of proof. International Journal of Evidence & Proof. v. 11, Issued, 2007.
p. 295-297.
376. Em profundo estudo sobre a abdução como modelo de raciocínio judicial, conclui
Besso Marcheis (Probabilità e prova.... cit., p. 1138) que o raciocínio abdutivo pode
ser proposto como um modelo útil de descrição de momentos diversos e anteriores
ao da valoração das provas e resulta, assim, de utilidade bastante limitada para os fins
de descrever o raciocínio judicial na valoração da prova. O referido ponto de vista é
acolhido, expressamente, por Andres Ibãnez (Sobre a motivação dos fatos na sentença
penal..., cit.. 87).
234 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
propor um modelo racional de valoração da prova para o processo penal, para que
a Inference to the Best Explanation fosse adotada no campo criminal, ela tena que
ser integrada como um corretivo de reforço a ser adotado no plano do standard de
prova. Não deveria ser escolhida a explicação que fosse somente a 'm elh o r', mas,
para usar um trocadilho, “a melhor [...] além de qualquer dúvida razoável". Isso,
contudo, desnatura a essência da teoria.
pode modelar as micro-decisões sobre o peso apropriado para dar a cada um dos meios
dc prova específicos ou testemunhos".
380. STELLA, Oltre ¡1ragionevole dubbio..., cil., p. 103.
381. PASTORE, Decisioni, cvgomeiui, coturolli.... cil., p. 33.
382. Ibidetn. p. 34.
236 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
389. No sentido de que a função dos standards de prova é realizar uma distribuição dos
erros judiciais no juízo de fato: STEIX. Foundations o j evidence law..., cit., p. 133-134;
FERRER BELTRÁN, La valoradón racional de la prueba..., p. 143; Idem, Prolegómenos
para una teoria sobre los estándarcs de prueba..., cit., p. 406. Já para Laudan (Verdade,
error y processo penal..., cit.. p. 6 0), a função do standard de prova no processo penal
não é distribuir igualmente o risco de erro, mas diminuir o risco de condenações lalsas.
390. Como bem destaca Vlichelc Taruffo (Casi una introducción. In: FERRER BELTRÁN,
Jorcli; LEANDROJ., Giannini. Contra la carga de la prueba. Madrid: Marcial Pons. 2019.
p. 19) um “ônus objetivo” é um oximoro. Realmente, como já tivemos oportunidade
de destacar (BADARÓ. ônus da prova no processo penal .... cit., p. 2 3 8 ): “do ponto de
vista terminológico, não parece correto denominar a regra de julgamento, estabelecida
para o caso de dúvida, de ónus. Não há em tal situação um enfoque subjetivo, essencial
para a utilização técnica da palavra ônus, que é definida como imperativo do próprio
EPISTEMOLOGIA JUDIC1ÂRLA E CONTEXTOS PROBATÓRIOS 239
interesse. A regra cie julgamento tem com destinatário o juiz e não as partes, e inexiste
um interesse do juiz no processo, exceto o interesse de fazer justiça, de forma imparcial.
No ônus objetivo inexiste interesse direto das partes, mas uma solução para o juiz que.
somente de forma indireta irá produzir reflexos negativos sobre as partes. Ao máximo,
poderia ser um ônus remoto ou mediato”.
391. Para uma explicação da dicotom ia entre “ônus subjetivo” e “ônus objetivo”, cf.:
BADARÓ, Ônus da prova no processo penal..., cit., p. 178-183.
392. Nesse sentido: BADARÓ, Ônus da prova no processo penal..., cit., p. 2 3 7 -2 4 1 . No
mesmo sentido: SAMMARCO, Método pwbaiorio e modelli di racionamento..., cit., p. 74.
393. LAUDAN, Verdad, errory proceso penal..., cit., p. 104-105.
394. DEI VECCHI, Diego. La prueba judicial como conocim ienlo: una caracterización
poco persuasiva. In: FERRER BELTRÁNJordi: VÁZQUEZ, Carmen (Coord.). Debatiendo
con Taruffo. Madrid: Marcial Pons. 2016. p. 286.
395. Nesse sentido, mas manifestando seu ceticism o quanto à possibilidade de atingir
tais exigências: DEI VECCHI, La prueba judicial como conocimienlo.... cit.. p. 290.
240 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
de prova a ser observado pelo juiz para considerar um fato provado. Evidente que
não se trata de uma omissão por mero esquecimento ou falta de vontade de estabe
lecer legalmente um regime legal para um tema tão sensível, que pode definir- c
muitas vezes define - o resultado do processo.31'6
O art. 155 do Código de Processo Penal brasileiro apenas estabelece que “O
ju izjotm arásu a convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório
judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos
informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repe-
ttveis e antecipadas". O mesmo vazio ocorre no direito estrangeiro. Por exemplo,
na Alemanha, o § 261 da StPO prevê que: o “tribunal decide, segundo a sua livre
convicção, sobre o resultado das provas produzidas ou examinadas em audiência”.
Em Portugal, o art. 127 Código de Processo Penal estabelece que “a provaé apreciada
segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente”. Na
Espanha, a Ley de Enjuiciamiento Criminal, no art. 741, limita-se a prever que “O
tribunal, apreciando scgtino sua consciencia as provas praticadas sem definir
um standard de prova específico. Todavia, tanto o Tribunal Constitucional,397
396. No presente estudo, cabe apenas analisar a questão com vista ao julgamento final
da causa, isto é, a decisão de mérito de condenação ou absolvição no processo penal,
embora o problema dos siandards de prova não seja exclusivo da sentença, lendo lugar
ao longo de toda a persecução penal. Nesse sentido: TWIN1NG, Rethinking evidente....
cit., p. 219; FERRER BELTRÁN, La valoración racional de la prueba..., cit., p. 141; Idem,
Prolegómenos para una teoría sobre los estándares de prueba..., cit.. p. 414; LAUDAN,
Verdad, error e proceso p e n a l...,a i., p. 133-134. Na doutrina nacional: KNIJN1K, Dando.
A prova nos juizos cível, penal e tributario. Rio de Janeiro: Forense, 2007. p. 48. Apenas
a titulo exemplificativo, elencam-se alguns standards ou "modelos de constatação”,
diversos da “prova alctn da dúvida razoável”, diariamente utilizados no processo pe
nal brasileiro: para a prisão temporaria bastam “fundadas razões [...] de autoria” (Lei
7.960/89, art. Io, inc. III), enquanto que para a prisão preventiva é necessário “indicio
suficiente de autoria” (CPP, art. 3 1 2 ); já para a pronuncia não basta —no singular - in
dicio suficiente, sendo exigidos ”indicios suficientes de autoria" (CPP, art. 413, caput)\
por outro lado, para o sequestro, “indicios veementes de proveniencia ilícita dos bens”
(CPP art. 126). No incidente de insanidade mental, basta a "dúvida sobre a integridade
mental do acusado” (CPP, art. 149. caput). Assim, varia o grau de probabilidade exigida,
seja urna simples preponderância de uma hipótese sobre a outra, seja uma probabilidade
reforçada ou qualificada. Além das medidas cautelares, é necessário observar que, ao
longo da própria persecução penal, há uma formulação progressiva de juízos sobre o
mesmo tema - por exemplo, a autoria delitiva ou a materialidade delitiva - que será
objeto da investigação, da admissibilidade da denúncia até se chegar à sentença. Passa-se
de um juízo de simples possibilidade, para uma probabilidade, até se chegar à certeza.
397. O Tribunal Constitucional decidiu que o “direito à presunção de inocência compreen
de o direito a não ser condenado sem provas válidas, o que implica que toda sentença
condenatoria deve apontar as provas que sustentam a declaração de responsabilidade;
ademais, as provas devem ter sido obtidas com respeito às garantias constitucionais,
EPISTEMOLOGIA JUDICIARIA E CONTEXTOS PROBATORIOS 241
ter sido praticadas normalmente em juízo oral e haver-se valorado e motivado pelos
tribunais com respeito às regras da lógica e da experiência, de modo que se possa afir
mar que a declaração dc culpabilidade foi estabelecida acima de toda duvida razoável"
(STC 4 3/2003, § 4o).
398. Nesse sentido: GASCÓN ABELLÁN, La prueba judicial: valoración racional y mo
tivación..., cit., p. 15.
399. Da intensidade probatória: medida da prova, ónus da prova e presunções judiciais,
inédito, item 3.3. p. 6.
400. Prolegómenos para una teoria sobre los estándares de prueba..., cit.. p. 402.
401. Antes mesmo de sua previsão legal, Ferrua (11 libero convincimento del giudice pe
nale..., cit., p. 73) já se posicionava no sentido de que o princípio de que a culpabilidade
fosse provada "oltre ogni ragionevole dubbio” , embora não expresso, era considerado
implícito no ordenamento italiano. Quanto a outros países europeus, Knud Waaben
(Criminal responsabilily and thequantum ojproof. Uppsala: The Facully of Law/Stockholm
University, 1965. p. 246) informa que ordenamentos escandinavos se baseiam na regra
de que a culpa do acusado deve ser provada “beyond a reasonable doubt”.
402. Uma profunda análise da questão na doutrina nacional pode ser encontrada no
excelente trabalho de KNIJN1K, Danilo, A prova nos juízos eivei, penal e tributário. Rio
de Janeiro: Forense. 2007. p. 15-19; p. 37-45. Cf., também: BALTAZAR JÚNIOR, losé
Paulo. Sumdards probatórios no processo penal. Revista AJUFERGS. Porto Alegre, n. 4,
nov. 2007. p. 161-185. No processo civil, o tema é analisado por: MARINON1, Luiz Gui
lherme; ARENHART. Sérgio Cruz. Prova. São Paulo: Ed. RT, 2009. p. 85-90. Já Humberto
Avila (Teoria da prova..., cit., p. 1 17-118) propõe quatro sumdards de prova: (i) prova
242 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
irrefutável; (ii) prova acima de qualquer duvida razoável; (iii) prova clara e convincente;
(iv) prova convincente ou de verossimilhança razoável (balanço de probabilidades).
403. IACOV1ELLO, Motivazione delia sentenza p e n a le ..., cit.. p. 7 6 6 . também usa a
expressão “probabilidade elevadíssima”.
404. cf., infra, item 3.6.2.4.
EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E CONTEXTOS PROBATÓRIOS 243
Temis, 1985. p. 172 -173). depois de assinalar que "se entende sem dificuldade que o
método que deve existir para condenar um acusado no processo penal não pode ser o
mesmo que no caso em que uma pessoa solicita uma pensão em razão de um suposto
acidente de trabalho”, conclui: “é óbvio, pois. que quando se determina o módulo da
prova, deve se ter cm conta a matéria subjacente ao direito processual em questão, sob
pena de desvirtuar os fins que inspiram o direito maLerial”.
409. É nesse sentido que o tema é trabalhado por Knijnik (.4 prova nos juízos cível, penal
e tributário..., cit., p. 18): “A título de exemplo, em demanda indenizatória por aciden
te de trânsito, deve se raciocinar com base numa 'preponderância de provas', para que
se dê por demonstrado o fato ‘.v’: por esse critério guiar-se-ão o juiz e as partes. Já em
ação de improbidade, o modelo de constatação é outro, mais rigoroso, exigindo-se uma
prova clara e convincente': e outro deveria ser, portanto, o critério empregado pelo juiz.
pelo tribunal e pelas partes na formação do juízo de fato e sua discussão. Numa ação
penal, enfim, será necessário observar outro modelo de constatação: a prova além da
dúvida razoável', e diversamente estará orientada a construção do juízo fálico. Como se
vê, esses 'modelos de constatação’ são critérios, pautas objetivas, sujeitas ao controle
e à discussão das partes, na constatação de fatos, e auxiliam na evitação do erro ou do
arbítrio" (destaques no original).
EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E CONTEXTOS PROBATORIOS 245
410. FERRER BELTRÁX. Prolegómenos poní una teoría sobre los estándares de prueba....
cit., p. 403.
411. Sobre o tema, cf., supra, cap. 1, Item 1.3.6.
412. FERRER BELTRÁN, Prolegómenos para una teoría sobre los estándares de p ru eb a ....
cit., p. 443.
246 EPISTEMOLOGIA JUDICIARIA E PROVA PENAL
Por exemplo, Ferrua afirma que a função prioritária do standard de prova “além
de qualquer dúvida razoável” é “garantir o acusado do risco de uma condenação
injusta”.'’1’ Exatamente essa mesma finalidade foi apontada como a razão de ser
da adoção do in dubio pro rco, o que indica uma aparente convergência de escopos.
Na mesma linha, a Corte Europeia de Direitos Humanos, no caso Barberá,
Vlessegué e Jabardo vs. Espanha, ao analisar o art. 6.2 da Convenção Europeia de
Direitos Humanos, que assegura que qualquer acusado de uma infração penal
“presume-se inocente”, implica que “o ônus da prova está todo sobre a acusação e
qualquer dúvida (ctny doubt) deve beneficiar o acusado”.413414
Aliás, essa mesma conclusão foi adota pela Suprema Corte dos EDA no famoso
caso in re Winship, no ano de 1970, quando afirmou que a prova beyond a reaso
nable doubt é o standard aplicável ao processo penal, que pode ser extraído da XIV
Emenda da Constituição norte-americana, que assegura o devido processo legal.415
Importante, contudo, atentar para a diferença de tal sistema quanto ao juízo de fato.
No processo penal estadunidense, o standard de prova beyond a rcasonablc doubt
constitui uma instrução que é dadaaos jurados, sobre o nível de prova exigido para
que possam proferir um veredicto condcnatório. Trata-se, por óbvio, de veredicto
não motivado. Poroutro lado, no citado julgamento, a Suprema Corte não definiu
em que consiste a “dúvida razoável”, deixando livre para que cada estado defina
no que consiste tal standard.416
413. FERRUA, II libero convincimento del giudice pénale..., cit.. p. 73. Para Stella (Oltre
il ragionevole dubbio..., cit., p. 85) o standard de prova “oltre il ragionevole dubbio"
encontra seu fundamento constitucional no art. 27 da Constituição italiana, que asse
gura a presunção de inocência. No mesmo sentido: UBERTIS, Profit i di Epistemología
Giudiziaria..., cit., p. 175-176.
414. CoEDH, Caso Barberá, Messegué e Jabardo v. Espanha, sentença de 0 6 .1 2 .1 9 8 8 . § 77.
415. In re Winship, 397 U.S. 3 5 8 (1 9 7 0 ): “The due process clause of the Fourteenth
Amendment to the U.S. Constitution requires proof Beyond a Reasonable Doubt before
a juvenile may be adjudicated delinquent for an act that would constitute a crime were
the child an adult”. A XIV Amendment da Constituição, por sua vez, estabelece a ga
rantia do due process of law que: “All persons born or naturalized in the United States,
and subject to the jurisdiction thereof, are citizens of the United States and of the State
wherein they reside. No State shall make or enforce any law which shall abridge the
privileges or immunities of citizens ol the United Stales nor shall any State deprive any
person of life, liberty or property; without due process of law. nor deny to any person
within its jurisdiction the equal protection of the law".
416. Por exemplo, o Californian Penal Code, na Section 1096 estabelece que: “A defendant
in a criminal action is presumed to be innocent until the contrary is proved, and in
case of a reasonable doubt whether his or her guilt is satisfactorily shown, he or she is
entitled to an acquittal, but the effect of this presumption is only to place upon the stale
the burden of proving him or her guilty beyond a reasonable doubt. Reasonable doubt
is defined as follows: ‘It is not a mere possible doubt: because everything relating to
EPISTEMOLOGIA |UD1CIÁRIA E CONTEXTOS PROBATORIOS 247
human affairs is open to some possible or imaginary doubt. It is that state of the case,
which, after the entire comparison and consideration of all the evidence, leaves the
minds of jurors in that condition that they cannot say they feel an abiding conviction
of the truth of the charge”'.
417. FERRER BELTRAN, Let valoración racional de la prueba ... c il., p. 145. nota 128:
Idem, La prueba es libertad..., cit., p. 35, nota 18.
418. LAUDAN, Verdad, error e proceso penal..., cil., p. 95.
419. Com razão, afirma Stella (Oltrc il ragionevole dubbio..., cil., p. 9 3) que “o standard
probatorio exigido pelo processo penal deve ser tal que elimine qualquer dúvida”.
420. Na doutrina alemã, Gerhard Walter (Ubre apreciación de la prueba..., cit., p. 172-173)
afirma que “se entiende sin dificultad que el módulo que hay que exigir para condenar a
un acusado en proceso penal, no puede ser el mismo que en el caso en que una persona
solicita una pensión por razón de un supuesto accidente de trabajo”.
248 EPISTEMOLOGIA JUDICIARIA E PROVA PENAL
421. Tratado de las pruebas judiciales..., cit., v. II, p. 361. De modo semelhante, embora
restrito ã análise do testemunho. Beccaria (Dos delilos e das penas..., cit., p. 86. nota 2.
§ Xitl) criticava duramente a posição contraria, então aplicada: "para os criminalistas a
credibilidade de um testemunho torna-se tanto maior quanto mais grave é o delito. Eis
o duro axioma ditado pela mais cruel imbecilidade: Tn atrocissimis leviores coniecturae
sufficiunt, et licet iudicis iura trasgredí'.
422. CARM1GNAN1, Giovanni. Elementi di diritto crimínale. Milano: Francesco Sanvilo,
1863. p. 184. § 516.
423. Oltre il ragionevole dubbio..., cit.. p. 89.
EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E CONTEXTOS PROBATÓRIOS 249
424. Essa contribuição, além de epistemológica, é também política, pois, como observa
Laudan (La elemental aritmética epistêmica del derecho II: los inapropiados recurso de
la teoría moral para abordar el derecho penal. In: VÁZQUEZ. Carmen (Ed.). Estándares
de pruebay prueba científica. Ensayos de epistemología jurídica. Madrid: Marcial Pons.
2013. p. 121), setn um standard de prova que sirva como critério de decisão para o juiz
proferir sua decisão, nenhum julgamento estará justificado e qualquer declaração de
culpabilidade será injusta.
425. Como bem destaca Haack (Epistem ology legalized..., cit.. p. 3 2 ) "minha episte
mología, ao menos, tem muito a dizer sobre o que torna uma prova melhor ou pior
e uma afirmação mais ou menos justificada, mas relativamente muito pouco sobre os
graus de prova que interessam particularmente ao direito". No mesmo sentido, Ferrer
Beltrán (Prefacio a la edición em castellano, de Larry Laudan, Verdad, error y proceso
penal: un ensayo sobre epistemología jurídica (liad. Carmen Vázquez e Edgard Aguilera.
Madrid: Marcial Pons, 2013. p. 2 0 )) afirma que "a decisão sobre o nivel de exigencia
do standard é nitidamente política, mas urna vez tomada, a epistemológica jurídica deve
proporcionar os instrumentos para que possamos formulá-lo de modo preciso". Em
outro estudo (FERRER BELTRÁN, Prolegómenos para una teoría sobre los estándares
de prueba.... cit., p. 4 0 8 ), complementa "a razão principal para determinar o grau de
exigencia probatória em que situaremos o standard de prova tem a ver com a distribuição
do risco de erros (falsas condenações e falsas absolvições) que estimamos aceitáveis, o
que pressupõe, claramente, uma decisão político-moral". No mesmo sentido posiciona-se
STEIN, Foundations of Evidence Lew..., cit., p. 121-122.
426. E assim o é porque, como bem observa Haack (El probabilismo jurídico: una dimen
sión epistemológica..., cit., p. 6 9 ), há um fundamento político para o ônus da prova e
para o standard de prova.
427. LAUDAN, Larry. Por qué un estándar de prueba subjetivo y ambiguo no es un están
dar. El estándar de prueba y las garantías en el proceso penal. Buenos Aires: Hammurabi.
250 EPISTEMOLOGIA JUDICIARIA E PROVA PENAL
2011. p. 57-86; Idem, ¿Es razonable la duda razonable?. El estándar de prueba y las
garantías en el proceso penal, Buenos Aires: Hammurabi, 2011. p. 119-195.
428. Para LAUDAN, Verdad, error y proceso penal..., cit.. p. 61.
429. II ‘giusto processo’.... cit.. p. 42.
430. FERRUA, II 'giusto processo'.... cit., p. 42.
431. Verdad, error y proceso penal..., cit., p. 64.
432. LAUDAN, Verdad, error y proceso penal.... cit., p. 67.
EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E CONTEXTOS PROBATORIOS 251
condições nas quais a dúvida será razoável, não se tem um standard de decisão que
seja objetivo ou, ao menos controlável intersubjetivamente.433
Para demonstrar a inconsistência da expressão, cabe sumariar as cinco prin
cipais explicações que são dadas aos jurados norte-americanos, para os esclarecer
sobre o que seria a prova da culpa “além da dúvida razoável.434 Como se verá,
todas elas são fundadas na crença do julgador c não numa relação entre prova e o
enunciado de fato a ser demonstrado.
A primeira explicação é que “além da dúvida razoável” deve ser entendida
como “aquela segurança em crenças que consideramos apropriada para a tomada de
decisões importantes na vida". A analogia é infeliz. Há decisões muito importantes
em nossas vidas que são tomadas no contexto de grandes incertezas. Por exemplo,
na noite anterior ao casamento, a dúvida se realmente devemos comparecer à ce
rimônia ou se é melhor desistir do matrimônio; ou quando o casal decide se lhes
trará alegria ter ou não mais um filho.
A segunda explicação é que “além da dúvida razoável” deve ser compreendida
como “o tipo de dúvida que faria uma pessoa prudente vacilar em atuar". Nova
mente, tenta-se traduzir uma crença subjetiva por outro atributo subjetivo. Não
mais a dúvida sobre questões importantes, mas a dúvida de uma pessoa prudente.
As objeções que podem ser formuladas são as mesmas. Além disso, prudência ou
imprudência não se relacionam com ter mais ou menos dúvida, e sim com assumir
a posição de correr mais ou menos risco.
A terceira linha expositiva é que “além da dúvida razoável” deve ser equiva
lente a “uma convicção estável da culpabilidade do acusado”. Mesmo no âmbito
subjetivo, novamente se confunde um atributo da crença ser mais ou menos forte,
com outros fatores. Agora, trata-se da “durabilidade”da crença, isto é. a persistência
temporal da convicção. Pede-se aos jurados que façam um prognóstico de, se por
um longo tempo, se manterão convictos da culpabilidade. Evidente que se trata de
uma explicação inapropriada. Se não surgirem elementos novos, não há por que
cada jurado alterar sua crença. Caso surja uma nova prova favorável ao acusado,
parece óbvio que a crença poderá e deverá mudar após isso.
A quarta explicação é praticamente tautológica: a “dúvida razoável” é “aquela
dúvida para a qual se pode oferecer uma razão’'. Em outras palavras, uma dúvida
razoável é uma dúvida que tem uma razão de ser. Uma dúvida razoável é uma
dúvida razoável!
Por fim, a quinta e última explicação é que a convicção da culpa “além da
dúvida razoável” significa “uma crença altam ente provável". A explicação significa.
em outras palavras, que a “dúvida razoável” é traduzida como sendo uma dúvida
muito pouco provável, no sentido probabilístico do termo. A explicação se baseia,
claramente, em uma analogia com o standard de prova do processo civil, de mera
preponderância ou “probabilidade prevalecente”. Se basta ser mais provável que
não, isso significa que uma “baixa probabilidade” para os litígios civis. Por outro
lado, no caso da chamada “prova clara e convincente" haveria uma probabilidade
média. Finalmente, no caso da prova “além da dúvida razoável”, haveria uma
elevadíssima probabilidade.
O que se percebe é a dificuldade de trocar o adjetivo “razoável”, enquanto
qualificador da dúvida, por uma outra expressão que não seja vaga. Resumindo, cada
uma das cinco expl icações anteriores, em uma palavra-chave, tem-se que o razoável
foi trocadopor “importante”, “prudente”, “estável”, “razão” e “pro habilíssimo”. E
isto, sempre com vistas ao convencimento subjetivo dos jurados. A dúvida razoável
foi substituída por uma crença ou certeza “importante”, “estável”, que tem uma
“razão” ou “probabilíssima”. Ou que quem crê deve ser “prudente”. Em suma, as
tentativas de mudança em nada beneficiam a adoção de um standard de prova que
seja um critério de decisão objetivo ou, ao menos, intersubjetivamente controlável.
Por outro lado, também não parece correta a crítica que centra a preocupação
em estabelecer um patamar aceitável de dúvida a partir da gravidade dos fatos e da
relação entre quantos culpados absolvidos é aceitável em relação à proporção de
inocentes condenados. Laudan elenca seis relações distintas: é melhor dois culpados
absolvidos que um inocente condenado (Voltaire);é melhor cinco culpados absolvi
dos que um inocente condenado à morte (Hale); é melhor dez culpados absolvidos
que um inocente condenado (Blackstone); é melhor 20 culpados absolvidos que um
inocente condenado à morte (Fortescue); é melhor 100 culpados absolvidos que
um inocente condenado (Benjamin Franklin) e é melhor 1.000 culpados absolvidos
que um inocente condenado à morte (Maimonides)!'135
Essa obsessão em identificar a proporção correta traz em si a dificuldade de
quem busca a fórmula mágica para se livrar da vagueza da “dúvida razoável” subs
tituindo à por uma probabilidade em termos numéricos e, o que é pior, fundada
numa frequência de base. Utilizando a “fórmula de Blackstone”, a explicação é
dada nos termos de que, “se é melhor que dez pessoas culpadas se livrem do castigo
que um inocente sofra”, isso implica reconhecer que, a cada 100 julgamentos, dez
pessoas serão condenadas injustamente, admitindo-se de modo explícito que o
sistema gera casos de condenações falsas.
O equívoco de tal raciocínio não está em definir o número de condenações
falsas aceitáveis, mas em que o problema é falso, porque mal colocado. A questão
não é de probabilidade estatística nem de qualquer outro tipo de probabilidade.435
Trata-se de uma escolha de valor. Para superar o estado de inocência c preciso que
a hipótese acusatória tenha recebido um suporte em níveis elevados de standard
probatório e, se este umbral não for atingido, a presunção de inocência impõe a
absolvição do acusado.
Há uma deliberada escolha de resolver a dúvida não para minimizar os erros,
mas para minimizar as condenações errôneas! É resolver a dúvida cm lavor do
acusado. Para tanto, pouco importa se isso é expressado, metaforicamente, com
relaçãode 1 .0 0 0 ,ou 1 0 0 ,2 0 ,1 0 ,5 ,2 o u 1 inocente condenado a um culpado absol
vido. Repita-se, a questão não é quantitativa, mas valorativa. Prefere-se distribuir
o erro privilegiando a inocência à culpabilidade. Proteger a liberdade, mesmo que
para isso se deixe de punir quem merecia. Para ver que não se trata de uma questão
quantificável, basta pensar na proporção de iguais possibilidades. Como explica
Stella, “o princípio segundo o qual c muito pior condenar um inocente que deixar
livre um culpado deve constituir a base garanlista do edifício do processo penal em
uma ‘cidade de homens livres’”.436
440. Nesse sentido, para Haack (El probabilismo jurídico: una dimensión epistemológi
c a ..., cit., p. 71), a crença do julgador nas provas é algo secundário, o que importa c o
peso das provas.
441. Como bem destaca Ferrer Beltrán (Lu valoración racional de la prueba..., cit., p. 146),
para que um standard de prova cumpra a função de funcionar como um critério racional
de decisão sobre a prova “deve, em primeiro lugar evitar vincular a prova com as crenças,
convicções ou dúvidas do sujeito que decide sobre os fatos. O grau de corroboração de
uma hipótese não depende do julgador possuir determinadas crenças, mas das predições
verdadeiras que se podem formular a partir das hipóteses e das dificuldades para dar conta
das mesmas predições a partir de hipóteses rivais". Nesse ponto, embora a premissa de
Laudan (Verdad, a r a r e proceso penal.... cit., p. 9 1) seja voltada para o sistema de jurados,
o autor refere que: “O assunto principal não é se os membros do júri, individualmente
e em conjunto, estão convencidos pela teoria do caso da acusação. A questão é se as
provas que viram e ouviram devem ser consideradas convincentes em termos de quanto
respaldam ou corroboram a hipótese da acusação sobre a culpabilidade do acusado".
442. Para Ferrer Beltrán (Prolegómenos para una teoria sobre los estándares de prueba...,
cit., p. 4 0 5 -4 0 6 ), a formulação de um standard de prova exige a observância de dois
tipos de exigencias: primeiro, deve ser adequada do ponto de vista epistémico ou me
todológico e, em segundo lugar, deve apontar qual o fundamento do nivel de exigencia
probatória estabelecida no standard.
443. LAUDAN, Verdad, error e proceso penal..., cit., p. 126.
444. LAUDAN, Larry. Is it finallv time lo pul proof beyond a reasonable doubt’ out lo
pasture?. University oj Texas Law, Public Law Research Paper, n. 194, 2011. p. 7-8.
EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E CONTEXTOS PROBATÓRIOS 255
parte", que não necessita estar corroborada por provas. Sequer há indicação se o
critério seria quantitativo ou qualitativo. Para que um standard de prova seja com
pleto, deve exigir provas que suportem todos os fatos alegados pela acusação e que
sejam penal e processualmente relevantes. Na forma como proposta, satisfeita a
condição negativa b, seria possível a condenação sem que houvesse provas de fatos
que constituem a imputação penal, quer porque considerados não importantes,
quer porque seriam a minoria ou poucos os fatos acusatorios que não encontra
ram confirmação nas provas. Por outro lado, com relação às alegações defensivas,
basta haver prova de “hipótese fálica” que leve à inocência, sendo compatível com
a “hipótese da culpabilidade".Uma segunda formulação de standard de prova,
alternativo ao “além da dúvida razoável”, é Ronald Alien, que propõe: “Se a teoria
do caso apresentada pela acusação é plausível e você não pode conceber alguma
história plausível na qual o acusado resulte inocente”.44’
A primeira crítica a ser feita é que a acusação é tratada, novamente, com uma
história do caso. Ou seja. uma versão única dos fatos que, ou é aceita in totum, por
que plausível, ou é rechaçada, porque há outra história plausível de inocência que
a ela se opõe. Todavia, a imputação penal não é uma história única. Ao contrário,
trata-se de um conjunto de proposições fáticas teleologicamente interligadas, de
modo a preencher concretamente os elementos abstratos de um tipo penal. Admitir
que, para a condenação, baste uma história da acusação plausível, permite que o
acusador fique dispensado, indevidamente, de se desincumbirde parte de seu ónus
de demonstrar todos e cada um dos elementos do crime.
Por outro lado, em uma certa medida, a característica exigida para que a história
seja aceita é pouco precisa. Basta que seja “plausível”. Mas o adjetivo plausível tem
como um de seus significados, exatamente, ser “razoável". Em última análise, se
está trocando a “dúvida razoável” pela “história razoável”, com todas as sabidas
dificuldades inerentes à falta de referencial semântico mais objetivo e concreto
para tais adjetivos.
Em terceiro lugar, e essa é a crítica mais relevante, o grau de aval ou suporte
que se exige da prova de acusação é o mesmo da prova de defesa. Ou seja, acusa
ção plausível que não seja desmentida por defesa igualmente plausível. Com isso,
na prática, a presunção de inocência, enquanto regra de julgamento, está sendo
claramente violada. O standard proposto equivale a atribuir, a cada uma das par
les, o ônus da prova, em iguais intensidades. O acusador deve provar sua história
plausível para obter a condenação e a defesa deve provar que uma versão defensiva
é plausível, para que haja absolvição. Com isso, tem-se no processo penal algo
semelhante a um standard de prova de mera preponderância. Isso é adequado para
situações em que se busca somente minimizar os efeitos de sentenças erradas, mas45
445. ALLEN, Ronald. J. Factual ambiguity and a theory of evidence. Northwestern L-'ni-
xersity Law Review . 8 8 . 1994. p. 604.
256 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
não para o processo penal em que, por uma escolha ele valor, se eleve elesequilibrar
as chances ele erro judiciário, preferinelo-se uma absolvição equivocada a uma
condenação injusta.
Para Ferrer Beltrán, o standard dc prova adequado para o processo penal, para
que se possa considerar provada a hipeítese de culpabilidade,446exige que se deem,
conjuntamente, as seguintes condições: ( I) a hipótese deve ser capaz de explicar
os dados disponíveis, integrando-os dc forma coerente, e as predições de novos
dados que a hipótese permita formular devem ter seus resultados confirmados;
(2) devem ter sido refutadas todas as demais hipóteses plausíveis explicativas dos
446. Em estudo posterior, Ferrer Beltrán (Prolegómenos para una teoria sobre los están
dares de prueba..., cit., p. 41 6 ) afirma não ser adequado para o processo penal adotar
um único standard de prova para a decisão final sobre a hipótese acusatória” e, partindo
de tal premissa, apresenta a proposta de seis distintos standards de prova, com graus
variados de suporte probatorio: Standard de prova 1 - "Para se considerar provada
uma hipótese sobre os fatos, devem ocorrer, conjuntamente, as seguintes condições:
a) A hipótese deve ser capaz de explicar os dados disponíveis, integrando-os de forma
coerente, e as previsões de novos dados que a hipótese permite formular devem ler
sido confirmadas e aportadas como prova no processo, b) Devem ter sido rechaçadas
todas as demais hipóteses plausíveis explicativas dos mesmos dados que sejam com
patíveis com a inocência do acusado, excluídas as meras hipóteses ad Iwc": Standard
de prova 2 - “Para se considerar provada uma hipótese sobre os fatos, devem ocorrer,
conjuntamente, as seguintes condições: a) A hipótese deve ser capaz de explicar os
dados disponíveis, integrando-os de forma coerente, e as previsões de novos dados
que a hipótese permite formular devem ter sido confirmadas e aportadas como prova
no processo, b) Deve ter sido rechaçada a hipótese alternativa formulada pela defesa,
caso seja plausível, explicativa dos mesmos dados e compatível com a inocência do
acusado, salvo quando se tratar de mera hipótese ad hoc"; Standard de prova 3 - “Uma
hipótese sobre os fatos considerar-se-á provada quando ocorrerem, conjuntamente,
as seguintes condições: a) Que a hipótese seja a menor explicação disponível sobre
os fatos cuja ocorrência se trata de provar, á luz dos elementos de prova existentes no
expediente processual, b) Que o peso probatório do conjunto de elementos de prova
relevantes incorporados ao processo seja completo (excluídas as provas redundantes)”;
Standard de prova 4 - “Uma hipótese sobre os fatos considerar-se-á provada quando
ocorrerem, conjuntamente, as seguintes condições: a) Que a hipótese ofereça uma
melhor explicação sobre os fatos que se deve provar do que a hipótese da parte contrá
ria, à luz dos elementos de prova existentes no expediente processual, b) Que o peso
probatório do conjunto de elementos de prova relevantes incorporados ao processo seja
completo (excluídas as provas redundantes)"; Standard de prova 5 - “Uma hipótese
sobre os fatos se considerará provada em um processo quando: A hipótese seja a melhor
explicação sobre os fatos cuja ocorrência se deve provar à luz dos elementos de prova
existentes no expediente processual"; Standard de prova 6 — “Uma hipótese sobre os
fatos se considerará provada em um processo quando: A hipótese ofereça uma melhor
explicação sobre os latos cuja ocorrência se deve provar do que a hipótese da parte
contrária, à luz dos elementos de prova existentes no expediente processual" (op. cit.,
p. 4 1 7 -4 1 8 ).
EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E CONTEXTOS PROBATORIOS 257
447. FERRER BELTRÁN, La valoración racional dc la prueba..., cit., p. 147 e segs.; Idem,
La prueba es libertad..., cit., p. 36: Idem. Prolegómenos para una teoría sobre los están
dares de prueba..., cit., p. 417.
258 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
448. Com explica laeoviello (1 criteri di valutazione delia prova..., cit., p. 4 0 9 ) para pre
valecer, a hipótese da acusação deve infligir destaque notável em relação às hipóteses
rivais.
449. CHIOVENDA, Giuseppe. Saggi di diritta procesuale civile. Romo Foro Italiano, 1930.
v. I. p. 110.
EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E CONTEXTOS PROBATORIOS 259
perfeitamente possível que haja elementos que dão suporte a urna parte dos fatos
afirmados pela acusação, restando outros aspectos fálicos não demonstrados. Não
vigora, pois, uma lógica do tudo ou nada. Se todas proposições fáticas em que se
decompõe a imputação restarem provadas, o acusado será condenado. Se o acusado
demonstrar que algum aspecto fático da imputação é falso, será absolvido. Mas
também será absolvido, no caso de haver dúvida sobre qualquer elemento fático
que integre a imputação.
Diante de tudo o que foi exposto, a hipótese acusatoria deve ser confirmada
por um conjunto concordante de elementos de confirmação, bem como deverá tcr
resistido às hipóteses defensivas. E, para que essas tenham força para derrubar a
hipótese acusatoria com ela incompatível, basta a prova dos fatos afirmados pela
defesa, ainda que em intensidade menor. Expressando de modo mais simples,
enquanto que para confirmar a acusação é exigível uma pluralidade de provas
concordantes, para confirmar uma hipótese defensiva, hasta uma prova da hipótese
defensiva e a tese acusatória estará derrubada.430
Assim, o standard de prova no processo penal, para que haja uma condenação
deve ser: a) há elementos de prova que confirmam, com elevadíssima probabilidade,
todas as proposições fáticas que integram a imputação formulada pela acusação; e,
b) não há elementos de prova que tornem viável ter ocorrido fato concreto diverso
de qualquer proposição fálica que integre a imputação.
Além de lhe ser oponível as objeções feitas em relação às pro postas anteriores,
o modelo de standard de prova que sugerimos tem algumas vantagens.
A primeira vantagem é deixar claro que o processo de valoração consiste
em verificar provas que confirmem os fatos. Isto é, parte-se das provas para os
fatos já imputados. Portanto, o standard é formulado em lermos de provas que450
450. Nesse sentido: 1ACOVIELLO, I critcri di valutazione delia prova..., cit., p. 407; AN
DRÉS IBÁÑEZ, Sobre a motivação dos fatos na sentença penal..., cit., p. 97. Antes da
reforma legislativa italiana de 2 0 0 6 , que incorporou ao art. 530 a expressão “al di lã di
ogni ragionevole dubbio”, Ferrua (II libero convincimento dei giudicc penale..., cit.,
p. 75) defendia a aplicação do standard de prova da culpabilidade "oltre ogni ragionevole
dubbio". Mas, explicando no que ele consistia, afirmava ser necessário “que todos dados
probatórios fossem acuradamente examinados no contexto, procurando elementos de
confirmação, mas sobretudo verificando a sua resistência a toda possível falsificação". E
resumia “nada fora do contexto”. Jã Perfecto Andrés Ibáñez (A argumentação probatoria
e sua expressão na sentença..., cit., p. 5 1) parece ser um pouco menos exigente, como
se verifica do seguinte passo: “uma hipótese pode ser considerada verdadeira quando
se mostra compatível com os dados probatórios, porque os integra e explica em sua
totalidade, harmónicamente; e não resulta desmentida por nenhum deles. Isso não
quer dizer que uma boa hipótese não possa deixar algum ‘cabo solto', algum dado sem
explicar. Mas este, para tc-la por válida, nunca pode ser fundamental na economia da
mesma".
260 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PRO VA PENAL
451. Evidente que essa não será uma escolha explicada apenas por critérios racionais.
Entre uma hipótese com maior probabilidade e outra com menor probabilidade, a ra
zão determina que se opte pela de maior probabilidade. Como já exposto, a questão é
justificada por razões axiológicas, impostas pelo legislador e não por razoes puramente
lógicas. Sobre o tema. ef.. supra, item 3.6.2.2.
452. HAACK, El probabilismo jurídico: una dimensión epistem ológica..., cil.. p. 77. Tam
bém Ferrcr Beltrán (Prolegómenos para una teoria sobre los estándares de prueba.... cil.,
p. 403) afirma que se o raciocínio probatório se desenvolve por meio de uma probabi
lidade indutiva, não matemática, “os standards de prova, portanto, não poderão indicar
numericamente o grau de suficiência probabilística necessária para dar por provada
uma hipótese".
EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E CONTEXTOS PROBATORIOS 261
um dos elementos do crime, se a culpa deva ser provada além da dúvida razoável.
Toda vez que dispomos de tal lista, oua supomos, uma graduação de probabilidades
matemática parece de todo supérflua. A força da conclusão probatoria depende só
da medida em que a lista está confirmada”.4”
Além de adequado ao método de probabilidade indutiva ou lógica, busca-se
substituir a vaga e incerta expressão alcm da dúvida razoável, que é relativa à crença
do julgador, por outra, no caso, “elevadíssima probabilidade' que mais claramente
qualifica o que efetivamente importa, em termos epistemológicos: o grau de suporte
que a prova dá às hipóteses fáticas, e permite realizar, a partir de urna lei científica
ou regra geral de cobertura, a inferencia probatoria. O que se deve mensurar não é
o convencimento do julgador sobre a hipótese fálica,4” mas o grau de suporte que
as provas dão à hipótese fática posta em julgamento.
453. COHEN, The probable and lhe provable..., cit., p. 83. Embora sem tratar cia questão
sob o enfoque do standard de prova, para Ferrajoli (Diritto e ragionc..., cit., p. 131), “a
hipótese acusatória para ser aceita corno verdadeira, deve não só ser confirmada por
mais provas e não desmentida por nenhuma contraprova, mas também prevalecer sobre
todas as possíveis hipóteses com ela em conflito, que devem ser falsificadas por modus
tollens, segundo o esquema (r). Se não foram falsificadas nem a hipótese acusatória nem
a hipótese com ele concorrente, a dúvida é resolvida, com base no princípio in dubio
pro rco, em desfavor da primeira".
454. HAACK. El probabilismo jurídico: una dimensión epistemológica..., cit.. p. 66.
455. Nesse sentido: BETTIOL, Giuserppe. La regola in dubio pro reo nel diritto e nel
processo penale. Scritti Giuridici. Padova: CEDAM, 1666. t. 1. p. 315; BETTIOL, Giu
serppe. Sulle presunzioni nel diritto e nel processo penale. Scritti Giuridici. Padova:
CEDAM, 1966. t. 1. p. 355; e M1CHEL1, Gian Antonio. L'onere delia prova, reimp.
Padova: CEDAM, 1966. p. 272. Segundo Magalhães Gomes Filho (Direito à prova no
processo penal..., cit.. p. 4 7 ) “a regra de repartição do ônus da prova não se aplica ao
juízo criminal, pois neste, em virtude da presunção de inocência do réu. o encargo de
prova incumbe exclusivamente à acusação” (destaques no original). Em sentido con
trário. para ALLEX. Ronald. Los estándares de prueba y los limites dei análisis jurídico.
In. VÁZQUEZ. Carmen (E d .). Estándares de prueba y prueba cientifica. Ensayos de
epistemología jurídica. Madrid: Marcial Pons, 2013. p. 47, as cargas de persuasão são
recíprocas: “mesmo no processo penal, em que se diz, erroneamente, que os acusados
não tém ônus de persuasão sobre os elementos do delito, na realidade ele os tem. Uma
vez mais, a afirmação de que a acusação deve provar os elementos do delito mais além
de toda dúvida razoável e a afirmação de que o acusado deve mostrar que há uma
dúvida razoável são equivalentes".
262 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
456. Nesse sentido: SARACENO, La decisione sul falto incerto..., cit., p. 129; e 1LLUMINAT1,
La presunzione d’innocenza dell’imputaio..., cit., p. 107. Observa Dinamarco (A instru-
mentalidade do processo..., cit.. p. 303. nota 8 3 ) que “são coisas diferentes a distribuição
do ônus da prova (v.g., art. 333 CPC) e o próprio ônus, ou seja, o seu peso"' (destaques
no original).
457. Nesse sentido: M1CHEL1, L’onere delia prova..., cit., p. 124, nota 187; ILLUM1NATI.
La presunzione d’innocenza dell'imputaio..., cit., p. 107.
458. Segundo Micheli (L’onere delia prova..., cit.. p. 270), no processo penal, incumbe à acu
sação tanto o acertamento positivo dos fatos constitutivos como o acertamento negativo
dos fatos impeditivos, razão pela qual não há verdadeira e propriamente uma repartição
do ônus da prova. Diante de tal situação, segundo Illuminali (La presunzione d’innocenza
dellhnpuiato..., cit., p. 107) o conceito de ônus da prova torna-se redundante, porque define
uma situação que se reduz à vedação de condenar o acusado se a sua culpa não estiver com
pletamente provada. Justamente por isso. não é cabível se cogitar de aplicação do chamado
“ônus da prova dinâmico" no processo penal. Permitir ao juiz que, de acordo com qualquer
critério, altere a regra de julgamento e atribua ao acusado o ónus da prova implicará violar
a presunção de inocência em seu corolário do in dubio pro reo. Para uma crítica da chama
teoria do “ônus dinaminco da prova", cf.: FENOLL, Jordi Nieva; BELTRAN. Jordi Ferrer; e
GIANNIN1, Leandro J. Contra la angu de la prueba. Madrid: Marcial Pons, 2019.
459. Nesse sentido: BETTIOL, La regola in dubio pro reo nel diritto e nel processo pena-
te..., cit., p. 3 1 6 :1LLUM1NATI, La presunzione d’innocenza dell’imputato..., cit.. p. 105:
DELITALA, Giacomo. II fallo nella teoria genérale dei reato. Padova, 1930. p. 140. nota
2; SABATINI. Guglielmo. Principi di diritto processuale penale. 3. ed. Catania: Casa dcl
Libro, 1948. v. I. p. 473; GAITO, Alfredo. Onere delia prova e processo penale. Pros-
pettive di indagine. La giustizia penale 111/513-526. 1975. p. 513 e 522; FERRAJOL1.
Diritto c ragione..., cit., p. 626; Presunzione di non colpevolezza. Digesto delle discipline
penalistiche..., cit., v. IX. p. 688: e SILVA JARDIM, Afrânio. Ônus da prova na ação penal
condenatoria. Direito processual penal 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 214.
EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E CONTEXTOS PROBATORIOS 263
460. Essa relação de interação entre ônus da prova e standard de prova, para a distribuição
do risco de erro também é destacada por FERRER BELTRÁN, Prolegómenos para una
teoria sobre los estándares de prueba..., cit., p. 412.
264 EPISTEMOLOGIA JUDICIARIA E PROVA PENAL
461. Vicente Greco Filho (Direito processual civil brasileiro. 11. ed. São Paulo: Saraiva,
1996. v. 2. p. 208) explica que a presunção não é um meio de prova, “mas sim uma for
ma de raciocínio do juiz, o qual. de um fato provado, conclui a existência de outro que
é o relevante para produzir a consequência jurídica". No mesmo sentido posiciona-se,
também, DINAMARCO, Cândido Rangel. Ônus dc contestar e efeito da revelia. Revista
cie Processo, n. 41, jan.-mar. 1986. p. 192.
462. BETTIOL, La regola in dubio pro reo nel diritto e nel processo penale..., cit., p. 313:
Idem, Sulle presunzioni nel diritto e nel processo penale..., cit.. p. 344.
463. IACOV1ELLO, Motivazione delia sentenza p en ale..., cit.. p. 7 6 3 . De modo sem e
lhante. Alfredo Vclez Mariconde (Derecho procesal penal. Córdoba: Imprenta de la
Universidad, 1956. v. 11. p. 27) afirma que o princípio da presunção de inocência "não
consagra uma presunção, mas um estado jurídico do imputado, o qual é inocente alé que
seja declarado culpado por uma sentença firme".
464. G1ANFORMAGGIO, Letizia. Filosofia del diritto e racionamento giltriduo. Torino:
G.Giappichelli, 2018. p. 93.
465. AT1ENZA, El derecho como argumentación..., cit., p. 73.
EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E CONTEXTOS PROBATORIOS 265
466. Mesmo no caso do Tribunal do Júri, não há qualquer vedação constitucional para que a
decisão dos jurados seja fundamentada. O sigilo das votações, assegurados constitucional
mente (art. 5o, caput, XXXVIII, a alinea b), equivale ao voto secreto, ou seja, que ninguém
sabia o conteúdo do voto de cada jurado. Isto é, se o jurado votou "sim" ou "não". Evidente
que se cada jurado tiver que fundamentar os seus votos, indiretamente estará sendo revelado
o conteúdo do mesmo, e quebrado o sigilo das votações. Mas isso não impede que haja uma
motivação única, que expresse as razões de decidir pelas quais os jurados, em seu conjunto,
consideraram que a hipótese fática posta em votação por meio de quesito estava ou não
provada. Já houve razões históricas que justificavam a decisão imotivada dos jurados. O
júri que decidia por meio de veredito imperscrutável fruto da intima convicção de cada
jurado, era aceito por representar uma forma de vuv populi que, por definição, pronuncia
decisões justas. Voxpopuli, voxDei representava que o assentimento do povo era o critério
de verdade. Aliás, não é por acaso que os Tribunas do Júri eram compostos normalmente
por doze jurados, em clara alusão aos doze apóstolos a expressar a palavra de Deus. Nesse
contexto, Taruffo (La semplice verità..., cit..p. 25) explica que a noção de “verdade segundo
a consciência” do jurado era "suficientemente ampla para cobrir inclusive erros de inter
pretação das provas", sendo estabelecida “independentemente da correspondência ou não
do veredito com as provas relativas à realidade dos fatos".
467. Iacoviello (I criteri di valutazione delia prova..., cit., p. 39 6 ) afirma que o livre con
vencimento e a motivação devem ser vistos “em uma interação recíproca".
468. UBERT1S, Pro/ili di cpistemologia giudiziaria..., cit., p. 27. Não é sem razão que.
para Canzio (Prova scientifica, ricerca delia ‘verità" e decisione giudiziaria nel processo
penale..., cit., p. 69) o arquétipo do raciocínio probatório é prefigurado com clareza nos
artigos 192, corama 1°, e 546, comma 1o, letra c. do CPP italiano, que tratam justamente
do conteúdo da motivação da sentença.
469. Perfecto Andrés lbánez (Sobre a Motivação dos Fatos na Sentença Penal..., cit.. p. 63)
destaca que o dever de motivar é "uma exigência de caráter político: busca-se, com ele,
uma garantia contra o arbítrio".
470. O exemplo foi extraído de um estudo realizado, com o objetivo de considerar a
influência da atratividade física c da etnia dos réus sobre a decisão dos jurados, em
266 EPISTEMOLOGIA JUDICIARIA E PROVA PENAL
De outro lado, ao saber que terá que motivar, quem decide procura escolher a
hipótese de acordo com um método que possibilite uma posterior justificação de
suas escolhas." 1Por isso, Ferrajoli destaca corno valor fundamental da motivação
ser uma garantia cognitiva do julgamento penal, que quanto ao juízo de fato asse
gura a vinculação do julgamento à prova.'1'- A motivação é um verdadeiro limite à
liberdade do juiz c uma verdadeira garantia contra o arbítrio,473Os métodos racionais
de decisão, enquanto acessíveis aos concidadãos, posto que fundados em padrões
474. Sammarco (Método probatório e modelli di ragionamento..., cit., p. 15) observa que,
como a lógica permite a comunicação entre os seres humanos, as razões que justificam
os provimentos judiciais devem ser de natureza lógico-jurídica, ele modo a tornar com
preensível a todos os cidadãos. Se as decisões forem fundadas em razões objetiváveis,
serão suscetíveis, como afirma Perfecto Ibánez (A argumentação probatória e sua ex
pressão na sentença..., cit., p. 4 7 ) de “verbalização e dignas de serem tidas como inter
subjetivamente válidas”. Aliás. Piero Calamandrei (Proceso y democracia. Trad. H. Fix
Zamundio. Buenos Aires: EJEA. 1960. p. 115) já destacava que “a motivação constitui
o signo mais importante e típico da ‘racionalização’ da função judicial".
475. MAGALHÃES GOMES FILHO, A motivação das decisões penais..., cit., p. 148. No
mesmo sentido: TUZET, Filosofia delia prova giuridiea..., cit., p. 16. O juiz, explica
Iacoviello (1 criteri di valutazione delia prova..., cit., p. 3 9 6 ), escolhe e decide no âm
bito do motivável, decidindo aquilo que ele pode motivar. Por isso, a motivação é um
verdadeiro limite à liberdade do juiz e uma verdadeira garantia contra o arbítrio.
476. MAGALHÃES GOMES FILHO, A motivação das decisões penais..., cit., p. 11 4 -1 1 5 .
No mesmo sentido: LiBERTIS, Profili di epistemologia giudiziaria..., cit.. p. 27.
477. GONZÃLES LAGIER, Hechos y argumentos: ... In: Quaestio facti..., cit., p. 71. Como
bem destaca Gascón Abcllán (La valoración de la prueba..., cit., p. 385) a tomada de de
cisão c guiada pela expectativa de sua justificação, e quem decide não se refere seriamente
a uma hipótese como sendo verdadeira, se não tiver passado por suficientes controles.
268 EPISTEMOLOGIA JUDICIARIA E PROVA PENAL
e, como conclusão, tem-se unía norma individual e concreta que constitui o disposto
na sentença.4834856Trata-se de silogismo subsuntivo por modo tolla is: se ocorrem as
circunstancias X, então deve ocorrer a consequência jurídica ). 81
A justificação interna exige coerência entre as premissas da decisão e a própt ia
decisão,48 ’ mas se trata apenas de uma justificação formal, que não envolve a verifi
cação da solidez das premissas, sendo inadequada para representar a complexidade
da decisão judicial e permitir o scu controle institucional. ’8:'
Já a justificação externa tem um escopo muito mais amplo e diz respeito a so
lidez das próprias premissas487 utilizadas da justificação interna.488No que importa
para o presente trabalho, a justificação externada envolve a verdade ou, se preferir,
o grau de probabilidade de ser verdadeira que se atribui à premissa menor sobre
os fatos.48'1A inferência probatória realizada pelo julgador consistirá na premissa
menor do silogismo da sentença penal.490
Segundo Wóblewski, as decisões sobre os fatos são expressa em proposições
como, p. ex., “o fato F ocorreu no tempo í no local que é a forma elementar de
uma proposição existencial.491Já a demonstração da verdade ou da falsidade desse
enunciado depende da relação dele com outros enunciados a partir dos quais ele é
inferido. Esses enunciados serão “provados". A forma mais simples da decisão sobre
um enunciado estar provado é: “F ocorreu em í nol.de acordo com as provas Pl...Pn".
Ainda assim, para ligar as provas da veracidade do enunciado sobre o fato, é neces
sária uma inferência por meio de leis científicas, máximas de experiência ou mesmo
experiências comuns. Nesse caso, a fórmula da decisão será: “F ocorreu e t no I, de
acordo com as provas Pl...Pn, baseado na máxima de experiência M E 1... MEn’’.492
uma regra legal de valoração de prova. No caso de uma regra positiva, por exemplo, a
morte de alguém está provada pelo atestado de óbito, a fórmula seria: “A morte de A
ocorreu e i no I. de acordo com o atestado de óbito, baseado na regra legal sobre prova
do art. 155, par. un., c.c. art. 62, ambos do CPP'\ Também poderá ser uma conclusão
baseada em uma regra de prova legal negativa, que veda a consideração de que um fato
está provado, exclusivamente, com base em uma determinada prova. Assim, por exemplo:
“Não está provado o oferecimento de vantagem ilícita feita por A ao funcionário públi
co F, que ocorreu e ( no I, tendo sido produzida apenas a prova consistente na delação
premiada de D, baseado na regra legal sobre prova do art. 4°, § 16, da Lei 12.850/2013 .
403. Nesse sentido: TARUFFO, La motivazione delia senlenza civile..., cit., p. 107 e segs.:
idem, La prova dei jatti giuridici.... cit., p. 4 0 8 : ANDRÉS 1BÁÑEZ, A argumentação
probatória e sua expressão na sentença..., cit., 47.
404. WRÓBLEWSKI, Legal decisión and ilsjustificaiions..., cit., p. 412.
405. Razonamiento jurídico.... cit., p. 80.
EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E CONTEXTOS PROBATÓRIOS 271
496. CANZIO, Prova scientifica, ricerca delia 'veriià' e decisione giudiziaria nel processo
penale..., cit., p. 79.
497. ATIENZA, Razonamiento jurídico..., cit., p 210.
498. La prova dei fatti giuridici..., cit., p. 409.
499. Como bem observa Magalhães Gomes Filho (Princípios gerais da prova.... cit.. p. 4 3 ),
“O Código de 1 9 4 1 , ao prever que na sentença o juiz indique singelamente ‘os motivos
de fato (art. 381.111), não atende completamente ao sentido daquela garantia essencial
ao exercício da função jurisdicional, deixando pouco claro o cometido da exigência de
justificação em relação ao juízo sobre os fatos". E, noutra obra (MAGALHÃES GOMES
FILHO, A motivação das decisões peitais..., cit., p. 2 4 2 ), complementa explicando que a
motivação “não objetiva simplesmente indicar os motivos - no sentido de antecedentes
causais —para explicara decisão, mas dar razões que justifiquem a solução encontrada
num contexto intersubjetivo" (destaques no original). Por sua vez, Ávila (Teoria da
prova..., cit.. p. 126-127) refere-se ao criterio da abrangência ou completado dos meios
272 EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E PROVA PENAL
nesse sentido, deve ser completa, indicando todos os meios de prova que foram
\alorados. E insuficiente indicar apenas aqueles que, nesse conjunto total, foram
considerados como suporte ou aval das afirmações fáticas que foram consideradas
provadas.' O juiz também deverá explicitaras razões pelas quais considerou que
os elementos que davam suporte para afirmações fáticas antagônicas ou diversas
não foram suficientes para que tais hipóteses fossem consideradas provadas. Em
outras palavras, deve indicar os elementos de provas que foram a base do seu con
vencimento, bem como a razão pela qual os elementos em sentido diverso não o
convenceram.’01 Esse aspecto, inclusive, é fundamental na segunda etapa da valora-
ção da prova, consistente no juízo de falsificação da tese acusatória, em que se deve
de prova, que serve para "determinar se iodos os dados relevantes foram devidamente
selecionados, apresentados e interpretados. [...] O referido critério, pois, não apenas
investiga o que foi considerado e como foi considerado; indaga também o que não foi
considerado. Sua função precipua é a de avaliar como se situam os meios de prova
considerados perante outros meios de prova que deixaram de ser considerados, mas
que. se tivessem sido devidamente considerados, poderiam alterar ou mesmo infirmar
a conclusão havida como comprovada. Por isso se afirma: Assim, uma investigação
factual intensa não pode ser limitada à questão de saber se um dado falo é correto ou
se em razão dele a decisão parece ser coerente. Em vez disso, é preciso determinar se
a decisão que produz consequências legais é suportada pela totalidade dos fatos. Isso
inevitavelmente implica examinar não apenas os fatos em que tal decisão se baseia ou
que tenham sido por ela apresentados, mas também considerar a relevância dos fatos
que podem ter sido omitidos ou que não lhe tenham servido de base, o modo como
os latos utilizados foram selecionados, apresentados e interpretados e como seu valor
probatório pode ser comparado com o de outros fatos".
500. Evidente que não é suficiente o juiz dizer que da análise da prova se convenceu num
ou noutro sentido. Motivar é indicar o porque! Como bem explica José Carlos Barbosa
Moreira (O que deve e o que não deve figurar na sentença. Temas de direito processual:
oitava sírie. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 121) quanto à profundidade da valoração do
juízo de fato. "devem ser evitadas referência genéricas e não justificadas do tipo: "'a
prova produzida pelo autor não convence'. Com isso o juiz de maneira alguma se desin-
cumbiu do dever de motivar: ele tem de explicar por que não lhe pareceu convincente
a prova produzia pelo autor. Analogamente, quando o juiz afirma: as alegações do réu
não ficaram comprovadas’, ele precisa demonstrar que isso realmente aconteceu; se as
provas produzidas pelo réu não o convenceram, que ele exponha os motivos pelos quais
não ficou convencido”.
501. SAMMARCO, Método probatorio e modelli di ragionamento..., cit., p. 253. O CPP ita
liano, em seu art. 546, letra e elenca, entre os requisitos da sentença Tindicazione delle
prove poste a base delia dccisione stessa e Tenundazione delle razioneper lc quali il giudice
ritiene non attendibili le prove contrario'. No mesmo sentido, considerando ser essa uma
decorrência do direito à prova: FERRER BELTRAN, La valoración racional de la prueba. . .,
cit., p. 57. Na doutrina nacional, considerando que a mesma exigência decorre do art. 93,
inc. IX, da Constituição: MAGALHÃES GOMES FILHO, A motivação das decisões penais....
cit., p. 149, Idem, Princípios gerais da prova..., cit., p. 43.
EPISTEMOLOGIA JUDICIÁRIA E CONTEXTOS PROBATORIOS 273
502. Sobre as três etapas que se sucedem na atividade de valoração da prova: (i) confir
mação; (ii) falsificação; (iii) definição comparativa, cf.. supra, item 3.5.
503. SANTORIELLO, Ciro. Motivazione (controlli sulla). Digesto delle discipline penalis-
tiche. Torino: Litet, aggiornamcnto , 2008. t. II. p. 700.
504. “Carpintaria" da sentença penal (em matéria de fato)..., cit.. p. 151.
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