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Folha de rosto
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Dedicatória
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Agradecimentos
Sobre a autora
Créditos
Para Em
Este livro não existiria se não fosse por você
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A euforia do breve acordo entre os dois não durou muito tempo. Foi
se esgotando no caminho de volta aos aposentos de Kiem, mesmo
com o príncipe mantendo seu ritmo intenso de conversa, o que
atenuava a apreensão de Jainan para um nível um pouco mais
baixo. Até Kiem parecia menos intenso, perdendo sua linha de
raciocínio enquanto abria a porta, o que provavelmente era melhor,
já que Jainan não escutara uma palavra sequer de tudo que ele
havia dito nos cinco minutos anteriores.
O problema era a esperança. Contrariando todas as expectativas,
parte de Jainan imaginava se ele poderia ser bom o bastante para
Kiem naquela noite, se os dois poderiam estabelecer a base de um
casamento feliz e estável que fosse capaz de sustentar o tratado.
Não era como se houvesse uma razão lógica para a esperança.
Pelas suas buscas sombrias nos portais de fofoca, Jainan sabia que
Kiem já tivera pelo menos meia dúzia de relacionamentos. Mais
mulheres que homens, e todas as pessoas eram lindas, confiantes e
pareciam combinar perfeitamente com Kiem, mesmo nos flagras
casuais dos paparazzi. Pessoas escolhidas por Kiem, e não
impostas a ele. Jainan não tinha como competir.
Ele soltou o braço de Kiem assim que entraram em casa. Todos
os seus movimentos pareciam desengonçados. Ele se sentou na
beirada de um sofá para evitar ficar perambulando e se deu conta
de que aquilo deixava a situação muito mais desconfortável — o que
era aquilo? Uma noite de núpcias ou uma visita educada? Ele não
sabia o que fazer com as mãos.
As imagens e os vídeos que acompanhavam as matérias nos
portais de fofoca não capturavam Kiem por completo: pessoalmente,
sua vivacidade era cativante, como se tivesse uma fração a mais de
energia do que o corpo era capaz de conter. Ele desligou a tela na
parede, deixou as luzes mais fortes e então mais fracas, abriu um
sorriso distraído para Jainan e acabou ziguezagueando até a mesa
do café.
— Beleza! O que você vai querer? A Bel alterou nossa máquina
de comida, então dá pra misturar qualquer sabor…
— Só café — disse Jainan abruptamente. Sua língua parecia
inchada dentro da boca. Não tinha sido sua intenção interrompê-lo.
Ele engoliu em seco durante o silêncio que seguiu e escutou o
som mecânico da água quente sendo servida. Kiem surgiu com uma
xícara de café em cada mão. Elas não combinavam, como se
tivessem sido herdadas de pessoas diferentes; uma era pesada e
de um marrom escuro, a outra era parte da provisão militar de uma
divisão que Jainan não reconhecia. Ele olhou para cima, tentando
ler a expressão de Kiem, e então se arrependeu. Aquele sorriso fácil
não estava mais ali.
Kiem colocou a xícara maior na frente de Jainan.
— Certo — disse ele. — Acho que algumas coisas precisam ser
ditas.
Jainan não tocou no café. Apenas encarou a mesa onde ele
estava apoiado.
— Pois não?
— Existe um limite até onde precisamos ir nesse negócio de noite
de núpcias — começou Kiem. Ele se sentou ao lado de Jainan. —
Quer dizer, não podemos ter quartos separados. A assessoria de
imprensa já vetou isso, acham que a informação vai vazar pros
portais de notícias. Mas aqui é o nosso espaço privado.
— Você não quer dormir comigo — disse Jainan. Seus lábios
pareciam dormentes.
Kiem fez um movimento brusco com o braço, derramando o café
sobre a mesa.
— Não! Não foi isso que eu… caramba. — Ele apoiou a xícara
com cuidado, esbarrando o cotovelo no de Jainan. — Não é que eu
não queira. Mas é que… este com certeza não é o melhor dos
cenários, e eu não consigo imaginar que você… hm… Não
precisamos fazer nada, é isso que eu quero dizer. Posso dormir no
sofá.
A compreensão atingiu Jainan como um soco no estômago. Ele
se comunicara tão mal que Kiem agora achava que estava sendo
rejeitado, presumindo que Jainan não estava sequer disposto a
tentar fazer o casamento funcionar. Jainan já tinha começado
arruinando tudo com seu jeito frio, rígido e contido.
Ele se virou, repousou a mão sobre a nuca de Kiem e, tentando
se lembrar de como fazer aquilo do jeito certo, o beijou.
Após um momento paralisante, Kiem retribuiu. O coração de
Jainan pulsava tão forte que o deixou tonto: ele não sabia dizer se
por alívio ou pelo beijo. Concentre-se. Ele não podia ser horrível
naquilo. Estava tão focado que quase perdeu o som de prazer que
Kiem soltou quando os dois se afastaram, e Jainan parou, em
choque, ao se dar conta do som.
Por sorte, isso não pareceu importar. Kiem respirou fundo e
inclinou a cabeça, beijando o pescoço de Jainan. Foi bom — claro
que foi, Kiem sabia o que estava fazendo —, e por um momento
peculiar, a tensão constante na cabeça de Jainan desapareceu. Foi
substituída por uma sensação estranha de vulnerabilidade, como a
luz entrando por uma janela. Será que era a bebida falando? Jainan
não se importava. Abriu os primeiros botões da camisa de Kiem,
tremendo de alívio. Estava funcionando.
As mãos de Kiem se fecharam sobre as dele. Jainan parou.
— Está tudo bem? — perguntou Kiem. Jainan levantou os olhos
até o rosto dele. O cenho de Kiem estava franzido.
O tremor. Jainan respirou fundo, se acalmando. Ele era capaz. Já
havia funcionado outras vezes.
— Sim? — Ele deixou seu tom mais suave, persuasivo. — A
gente precisa parar?
Kiem sorriu, embora aquele fosse apenas um eco do sorriso de
mais cedo. Ele tentou beijar Jainan novamente, mas o conde já
estava de pé, puxando Kiem do sofá e em direção ao quarto. Kiem
estava suscetível, o que deixava tudo ao mesmo tempo mais fácil e
mais difícil do que Jainan esperava, mas num piscar de olhos os
dois já estavam na cama. Jainan tirou a camisa de Kiem, que
balançou os braços em obediência para se livrar da roupa enquanto
alcançava os fechos na túnica de Jainan.
Os dedos de Kiem estavam quentes. Aquela era a sensação mais
desconcertante de todas. Jainan se viu apoiado sobre os cotovelos
enquanto deitava de costas na cama. Ele não tinha tempo para
racionalizar aquele sentimento estranho e repentino que não tinha
nada a ver com o casamento ou o tratado, e tudo a ver com o toque
de Kiem sobre seu peito. As batidas de seu coração começaram a
acelerar. Ele se impulsionou para cima com os cotovelos. Precisava
manter o foco, tinha que se controlar, Kiem perceberia se ele não se
concentrasse…
Kiem se afastou. O ar que estivera quente demais ao redor de
Jainan, de repente, esfriou. Jainan abriu os olhos, uma pontada de
pânico surgindo, e então viu a expressão confusa de Kiem. O pânico
se cristalizou em desespero, que corria através dele como mercúrio,
ainda mais desagradável por saber que poderia ter sido evitado.
Jainan falhara.
Ele deveria ter se sentado imediatamente e se aproximado.
Deveria ter fingido surpresa por Kiem querer parar. Em vez disso,
permaneceu deitado enquanto uma onda de apatia tomava conta
dele. E naquele momento, viu a expressão de Kiem endurecer.
— Desculpa — disse Kiem. Sua voz estava baixa.
Aparentemente, Jainan não era o único capaz de mudar o tom para
esconder seus sentimentos. — Vou embora.
Jainan abriu a boca para dizer Não!, mas a fechou em seguida.
Não podia controlar com quem Kiem desejava dormir. Havia
acreditado que poderia apressar as coisas entre os dois e esconder
toda aquela frieza que o tornava tão decepcionante, mas estava
errado. O problema não é o tipo dele. O problema é você. Não
poderia forçar Kiem a se sentir atraído por ele.
— Eu vou — foi o que Jainan disse.
— Não — rebateu Kiem, em um tom quase agressivo. Jainan
ficou imóvel, mas Kiem não estava olhando para ele. Já se pusera
de pé, abrindo gavetas aleatórias até encontrar um tipo de manta…
um lençol. — Deixa pra lá. Vamos dar um jeito. Eu não… fique à
vontade. Sinto muito.
A porta se abriu, e enquanto Jainan ainda tentava se levantar,
com os argumentos na ponta da língua, Kiem já havia saído.
A porta deslizou e se fechou antes que Jainan pudesse alcançá-
la. Ele ficou congelado na frente dela, as mãos fora do alcance do
sensor de movimento, a superfície branca e vazia a alguns
centímetros do seu rosto. Ele poderia sair. A porta não estava
trancada.
Mas o que diria? Não tinha como consertar aquilo.
Ele se virou. Kiem deixara suas intenções muito claras: Jainan
tinha o quarto inteiro pra si, e Kiem se arranjaria. Ele olhou para a
cama. Sentiu tudo se recolher dentro de si. Considerou por um
momento dormir na poltrona ou no chão, mas descartou a ideia por
ser ridícula. Ele não era uma pessoa de atitudes dramáticas. Era
prático, discreto e um parceiro fiel. Não precisava que ninguém
gostasse dele.
Deitou-se na cama e encarou o teto branco. O sono viria. Sempre
vinha.
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Não demorou muito para que o céu clareasse sobre eles. Os dois
estavam quietos e felizes, deitados lado a lado debaixo do saco de
dormir. Jainan sentia a exaustão do dia anterior em seu corpo, mas
o cilindro aquecedor enchia a tenda de calor, e nada poderia afetar
sua profunda felicidade. A cabeça de Kiem estava apoiada nos
ombros de Jainan. Ele pressionava o próprio corpo contra o braço
de Jainan — ou talvez Jainan estivesse pressionando seu corpo
contra ele, porque não queria que houvesse espaço entre os dois.
— Uhmm — murmurou Kiem, com a boca colada nos ombros de
Jainan. — Sabe, esse seu cotovelo. Perfeito.
Jainan moveu a cabeça e fez um som curioso antes de perceber
que Kiem ainda estava meio sonolento, ou talvez falando enquanto
dormia. Mas Kiem acordou de imediato e pareceu entender aquilo
como um pedido de explicação.
— Quer dizer, provavelmente os dois cotovelos são. Não consigo
ver o outro daqui. É tudo perfeito.
Jainan levou um longo momento de susto para absorver aquilo —
o que era absurdo, porque Kiem dissera um milhão de coisas
parecidas ao longo da noite. Jainan não se dera conta de que ele
poderia continuar fazendo aquilo quando amanhecesse. E ele sabia
que Kiem dizia tudo que pensava.
— Sério — disse Jainan em voz alta, sem conter os pensamentos.
— Acho que você verbaliza tudo.
— Desculpa — disse Kiem, levantando a cabeça. — Parei! Parei.
Prometo.
Jainan se virou para que os dois ficassem aninhados um no outro,
sua cabeça no espaço entre o pescoço e o ombro de Kiem. Uma
felicidade inevitável o cobria como uma aura de calor.
— Não — disse ele. — Eu gosto quando você fala.
Kiem abriu aquele sorriso ridículo e injusto de tão lindo.
— Aliás, eu te agradeci? Sabe, por ter salvado a minha vida.
Provavelmente duas vezes. Acho que já agradeci.
Jainan queria guardar aquele sorriso na memória para sempre.
Ele buscou uma resposta.
— Eu não salvei a sua vida.
— Salvou. Você lutou contra um urso.
— Aquilo foi pura sorte.
— Beleza, pode fazer pouco caso — respondeu Kiem. — Vou
vender essa história pra um roteirista e aí veremos.
A felicidade inevitável estava ficando cada vez pior. Jainan forçou
uma expressão séria.
— Isso mal daria um filme.
— Eu vou estrelar, caindo no rio. Só com a minha camisa de
baixo. Vai ser um sucesso de bilheteria.
Jainan sentiu o rosto se abrindo num sorriso.
— Vou assistir só por sua causa.
Kiem deixou a cabeça tombar, como se o sorriso de Jainan fosse
tudo de que ele precisava para sentir satisfação suprema. O tecido
da tenda estava luminoso por causa do sol do lado de fora.
— O dia está passando — anunciou Kiem com preguiça. — É
melhor a gente… sair e fazer alguma coisa.
— Alguma coisa — disse Jainan. — Você quer dizer: buscar
resgate, visto que estamos perdidos, e comparecer à assinatura do
tratado. — Ele se impulsionou para sentar. Kiem soltou um barulho
de protesto quando Jainan se moveu.
— Bom, sei lá — comentou Kiem. — Quer dizer, estar perdido não
é nada mau, né? Olha só pra gente.
— Então de repente era melhor a gente ficar aqui mesmo —
respondeu Jainan. — Só você, eu, quilômetros de neve, o urso…
— Ursos geralmente guardam pétalas de rosa para jogar nos
casais que fazem trilha. É uma curiosidade romântica que poucos
conhecem.
Jainan não conseguiu segurar a risada.
— Ainda assim — disse ele, depois de se controlar. — Eu gostaria
muito de comer alguma coisa que não tenha gosto de madeira
compensada e talvez avisar à minha irmã que eu não morri. — Ele
se esticou para pegar as roupas.
Kiem gemeu e rolou para o lado.
— Tem razão. Argh. Por que é tão difícil se mexer? — Ele passou
a camiseta pela cabeça e ficou com o braço preso no buraco da
gola. — A civilização é superestimada — disse ele com a voz
abafada. Ele balançou os braços até conseguir se desembaraçar e
fazer a cabeça sair pelo buraco certo. — Podemos recomeçar a vida
aqui.
— Vai ser bem difícil descobrir os resultados das corridas de carro
daqui — argumentou Jainan. O cabelo de Kiem estava bagunçado,
e os dedos de Jainan coçavam para arrumar. Ele não se permitiu; os
dois não estavam mais na cama.
— Eu poderia viver sem isso. — Kiem recolheu o cilindro
aquecedor e, relutando, desativou-o.
— Vou buscar água — disse Jainan. Ele calçou as botas e vestiu
o casaco. Ao sair da tenda, se viu em uma paisagem gloriosa em
que a luz do sol refletida na neve quase o cegava. Respirou fundo o
ar gelado e fresco, levantando a mão para cobrir os olhos, e apertou
a vista na direção para onde os dois estavam caminhando.
— Ah! — disse ele, surpreso. — Kiem!
— Que foi? — Kiem já estava sentado na entrada da tenda,
totalmente vestido e calçando as botas. Ele olhou para onde Jainan
apontava.
O sol da manhã dissipara a neblina. Visível na fenda entre dois
vales, pouco depois de uma pedreira, colunas se erguiam entre as
montanhas como árvores metálicas. Um fio prateado de cabos
magnetizados brilhava entre os postes. Eles haviam encontrado a
linha do trem.
19
Grafia atualizada segundo o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990, que entrou
em vigor no Brasil em 2009.
Título original
Winter’s Orbit Capa e ilustração
Jean-Michel Trauscht Preparação
Fernanda Cosenza Revisão
Bonie Santos
Natália Mori Marques Versão digital
Rafael Alt
978-65-5782-503-7
"A guerra dos tronos é a maior obra de fantasia desde que Bilbo
encontrou o Anel." — SF Reviews
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A sombra do vento
Zafón, Carlos Ruiz 9788543809526
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James Conklin não é uma criança comum: ele vê gente morta. Com
que frequência? Jamie não sabe bem; afinal, os mortos em geral se
parecem muito com os vivos. Exceto pelo fato de que eles ficam
para sempre nas roupas em que morreram, e são incapazes de
mentir.
Sua mãe implora para que ele mantenha essa habilidade em
segredo, o que não é problema na maior parte do tempo. Pelo
menos até Liz Dutton, a companheira de sua mãe e detetive do
Departamento de Polícia de Nova York, aparecer na saída da escola
e anunciar que precisa de ajuda.
É assim que Jamie embarca em uma corrida para desvendar o
último segredo de um falecido terrorista, e começa a jornada mais
assustadora de sua vida.