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Anais - I Encontro Estadual de Geografia e Ensino - XV Semana de Geografia 45

TERRITORIALIDADE ECONÔMICA E TRANSFORMAÇÕES NA PAISAGEM


PELA AÇÃO DE GRANDES EMPRESAS NO MEIO RURAL PARANAENSE

Sergio Fajardo
Professor do Departamento de Geografia da Unicentro – Guarapuava – PR
Doutorando em Geografia – FCT-UNESP – Presidente Prudente – SP
E-mail: sergiofajardo@hotmail.com

INTRODUÇÃO

A configuração territorial da economia regional paranaense e brasileira na


atualidade está envolta por elementos que se realizam nas relações entre um
lugar e fatores longínquos. Nessa ótica, a divisão do trabalho, acelerada na
lógica global das decisões produtivas de um determinado espaço, pela ordem
vigente (que é internacional) afeta diretamente as características funcionais dos
espaços. Novas e complexas territorialidades se apresentam. O espaço rural vê-
se afetado pela presença cada vez maior de grandes empresas, sobretudo
multinacionais e cooperativas organizando os mesmos a partir da indução de
culturas, tecnologias e padrões de produção. O meio rural passa a constituir-se
articulado ao conjunto econômico e os reflexos dessas ações podem ser
percebidos na paisagem objetivamente.

Com essa perspectiva, pode-se chegar ao entendimento das mesmas


como agentes de organização do espaço. No caso o Estado estaria presente ou
ausente conforme a combinação de interesses envolvidos, em termos de
preocupações com crescimento da participação produtiva desses espaços, no
âmbito do conjunto econômico. A expansão na base geográfica, por exemplo, da
atuação das cooperativas agropecuárias, significa o recebimento de uma maior
variabilidade de produtos agropecuários e diversificação nas linhas de produção
(FONSECA E COSTA, 1995, p.364). Com isso amplia-se ainda mais a
significação desse tipo de empresa para a estruturação econômica regional e
sua respectiva organização espacial. No Paraná, o importante papel das
cooperativas é evidente sobre a atividade econômica desse tipo de empresa. As
outras grandes empresas (trades) adentram o país procuram estabelecer o
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mesmo nível de participação. Fatias do mercado e do território são disputadas ou


divididas entre as empresas, conformando novas configurações.

MATERIAL E MÉTODO

Procurou-se selecionar para análise duas grandes empresas


multinacionais que atuam diretamente no espaço rural, nas atividades
agroindustriais e agrícolas, comercializando produção e insumos. Para tal, o
critério da representatividade e relevância em termos quantitativos, levou-nos a
eleger as empresas BUNGE, e CARGILL (denominadas trades) e as
cooperativas COAMO e COCAMAR. O objetivo consiste em avaliar as
implicações espaciais decorrentes da presença das cooperativas e
agropecuárias e das trades na organização e desenvolvimento do espaço
regional paranaense a partir da década de 1970, foram. Ao mesmo tempo em
que essa territorialidade a partir do processo de econômica produz uma dinâmica
regional calcada na estrutura produtiva, resulta ainda em mudanças na paisagem
rural. Tais mudanças ocorrem exemplarmente a partir da inserção das
cooperativas agropecuárias e das trades no cenário regional. A questão que se
coloca é se há uma disputa territorial significativa entre essas empresas, que vai
além da competição mercadológica? Ao caracterizar o atual quadro regional das
cadeias produtivas, esse fato pode ser sinalizado.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Em se tratando de uma reflexão ainda preliminar, a análise dos casos


não permite atingir resultados, mas por outro lado pode apontar caminhos que
levarão a compreensão da realidade investigada: o papel das grandes
cooperativas agropecuárias e das trades na organização do espaço regional
paranaense. As transformações ocorridas no espaço rural nas últimas décadas
resultam de um processo de aprofundamento das relações capitalistas no
campo. Cada vez mais, os encadeamentos inter-setoriais permeiam o a
atividades agropecuárias. Considerando que os processos econômicos, e a
economia capitalista como um todo, são responsáveis pela produção do espaço

que articula os objetos das relações sociais e de trabalho na reprodução do


capital, o espaço agrário constitui sua funcionalidade na divisão social e
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territorial do trabalho. A produção do espaço é traduzida em produção de


objetos articulados e organizados em torno de funções específicas, onde o
espaço é materialidade e mediação do trabalho (GODOY, 2004, p. 33). A
paisagem rural é, assim, o reflexo dessa materialidade. Nesse sentido, a
produção econômica (e reprodução do espaço capitalista) tem uma
abrangência geral, não podendo ser consideradas formas de acumulação
distintas as que se encontram no âmbito rural. A agricultura, enquanto
empreendimento capitalista, não é distinguida pelos investimentos (LOPES,
1981, p. 20).

As empresas multinacionais e cooperativas podem ser entendidas numa


visão geográfica. O segundo grupo como agentes de transformação espacial, na
medida em que atuam em determinadas áreas de forma regionalizada,
estabelecem também uma parcela de divisão do trabalho, colaborando para o
arranjo territorial (local e regional) e para a definição (temporal) de uma certa
dinâmica social, que resulta numa ação no espaço. Cada divisão do trabalho
muda o uso do território, onde novos objetos geográficos (como casas, silos,
etc.) são construídos ou novos valores são incorporados aos objetos
preexistentes (SANTOS, 1997, p. 114-115).

Do mesmo modo, grandes grupos empresariais internacionais,


caracterizam-se por conformar um direcionamento (externo) das atividades
produtivas regionais.S e o objeto da ciência geográfica é o espaço produzido
num determinado território e esse resulta de diversas determinações que
compõem a totalidade também chamada de paisagem, esse espaço é produzido
e organizado nas relações capitalistas da mesma maneira que pelos outros
agentes econômicos. A noção “territorial” abarca elementos teóricos que
interagem conceitualmente, e, na prática essa idéia (da territorialização na
produção do espaço enquanto totalidade) pode ser aplicada a uma visão mais
aberta,acerca do verdadeiro significado geográfico da análise, que muitas vezes
é mero estudo econômico. Como afirma Storper (1994, p. 26) essa dimensão
(territorial) deveria ser observada mesmo nas políticas de desenvolvimento. Pois
a dimensão territorial combinada com a idéia de espaço econômico constitui um
dos elementos principais de uma nova “sabedoria” das dessas mesmas políticas.
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Processos de ordem econômica afetam diretamente também esses


aspectos visíveis da paisagem além dos próprios processos naturais combinados
no interior da mesma. A paisagem possui uma organização onde elementos
naturais (como clima, solo, vegetação, hidrologia, etc.) e fatores humanos
encontram-se em permanente contato e interação. No espaço rural, essa
interação fica mais evidente, pois as atividades agrícolas não apenas usam da
paisagem enquanto suporte físico ou territorial, mas dependem dos elementos
naturais presentes como recurso vital. Na produção agrícola, a exploração dos
recursos se processa no uso do potencial ecológico pela exploração biológica.
Fatores econômicos atuam como elemento antrópico decisivo na combinação
que resulta na definição de uma paisagem rural característica.

As cooperativas agropecuárias funcionariam, teoricamente, ao mesmo


tempo como empresa e como entidade social, que unem uma relação de
interesses recíprocos, representando ideais coletivistas dos associados
(BERNARDO, 1998, p.106). E o conjunto destas representa um segmento
importante no contexto econômico. No Paraná elas representam elemento de
fundamental importância para a compreensão do processo histórico de
modernização da agricultura paranaense e consolidação do capital no campo.
Cabe avaliar o impacto nessa ação e ainda da participação de grandes
empresas de capital internacional (como as trades) no setor rural. Essas trades
representariam a materialização das relações externas como determinantes na
configuração e no direcionamento das atividades produtivas. Os papéis: forma,
função, estrutura e processo (CORRÊA, 2003, p. 28-29), são realizados pelas
empresas. A materialização dos objetos construídos na paisagem (por exemplo,
a estrutura de armazenagem e beneficiamento) constituiria as formas
concretizadas no espaço, o arranjo territorial. A existência de uma rede de
circulação e de um fluxo da produção agropecuária e agroindustrial representa
processos e funções dentro do espaço.

Resta pensar como resultaria o espaço rural numa lógica onde


predomina a agricultura global e científica. Em áreas onde a chamada
“agricultura científica globalizada” se instala, os produtos são escolhidos sob
obediência de mandamentos científicos e técnicos que impõem condições ao
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processo de plantação, colheita, armazenamento, transportes e comercialização


(SANTOS, 2002, p. 89). Esse fato introduz a uma racionalidade nas práticas e no
uso do território, o que tende a homogeneização, sentida na paisagem rural.

Diante da territorialidade de grandes empresas multinacionais e


cooperativas, alguns questionamentos são colocados: estariam as chamadas
trades, bem como as empresas ditas cooperativas, vinculadas a lógica global de
uma agricultura científica em detrimento da pequena produção? Esse é um ponto
a ser refletido. Por outro lado, se as atividades humanas podem manter, elevar
ou reduzir a qualidade da paisagem como “lar do homem”. Se o que se deseja é
a sua conservação ou seu desenvolvimento contínuo e equilibrado, obtendo do
seu uso racional um ótimo aproveitamento, é imprescindível considerar os
elementos estruturais da paisagem nas ações de planejamento que incidem
sobre ela (RIBAS VILAS, 1992, p. 255-256).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao considerar os aspectos que envolvem a atuação de grandes


empresas na busca de vantagens comparativas de um espaço (PASSOS E
MORO, 2003, p. 11) o caráter geográfico manifesta-se nas estruturas desses
espaços (modelados, remodelados e transformados). Tal realidade pode ser
percebida numa visão que integra as vertentes: econômica, social e ambiental
sob o foco regional. A articulação das cooperativas no espaço geográfico coloca
as mesmas numa posição de destaque no cenário econômico e regional; e
apesar de crises conjunturais que afetam o setor agropecuário eventualmente, a
diversificação nas atividades e a atuação no setor industrial permitem que seu
desempenho se mantenha. Fica a questão: é possível que as empresas
cooperativas encontrem formas de resistir á presença maciça de trades no seu
mercado espaço de atuação? Seria possível haver formas de ação conjunta
(monopolizando ainda mais as cadeias produtivas agroindustriais) ou existe
mesmo um diferencial desse tipo de empresa que possa ser considerado?
(capital nacional, origem e fixação regional, aliança com o Estado, etc.).
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No caso das atividades agrícolas e agroindustriais, as mesmas estão


inseridas num processo econômico que altera profundamente as características
da paisagem, por exemplo, ativando ou desencadeando erosões, modificando a
vegetação ou o solo (BERTRAND, 1971, p. 19). Propõe-se que a analise de
fatores econômicos seja conjugada à realidade ambiental da paisagem rural.

REFERÊNCIAS

BERNARDO, Elisa E. R. Repensando o cooperativismo agrícola. In: Anais da 6ª


Reunião Especial da SBPC - Sociedade Brasileira para o Progresso da
Ciência/Universidade Estadual de Maringá, p.105-109, out. 1998.
CORRÊA, Roberto L. Espaço, um conceito chave da geografia. In: CASTRO, Iná
E.; GOMES, Paulo C. da C.; CORRÊA, Roberto L. Geografia: conceitos e temas.
5ª ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2003.
FONSECA, Sandra R.; COSTA, Vera M. H. M. As transformações recentes no
setor agroindustrial brasileiro: uma abordagem da atividade cooperativista.
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LOPES, Juarez R. B. Do latifúndio à empresa: unidade e diversidade do
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PASSOS, Messias M.; MORO, Dalton A. A geografia e as lógicas regionais.
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RIBAS VÌLAS, Jordi. Planificación y gestión del paisaje rural. In: BOLÓS, Maria
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_____, Por uma outra globalização. 9ª ed. São Paulo: Record, 2002.
STORPER, Michael. Territorialização numa economia global: possibilidades de
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