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CAPITULO IIL Teoria do conhecimento p i 7 z 7 av ie teoria do conhecimento de Plato nao pode ser encontrada expressa de oa BEA do stemitico e claborada em toda sta amplindeon sy? dislogo RS toade indvidualmente,Teeteto de fato dedicado a consideragao de prey g Z» _qusdoconbeiment, mas suaconlisio negara, uma ergac aes eon = § i 5 8 Sen, a be i Mais ainda, Platao jé tinha, 4 épo- = F _caque wa esreverTeeteto, ctiado sua teotia dos graus de “conhecinene, 8 y, correspondentes & hierarquia do ser em A repiiblica, Podemos assim dizer que 2 o tratamento positivo precedeu o tratamento negativo e critico, ou que Plataoy s 5 = a -derava seremfalsas:”' Em um livro como este, contudo, parece melhor primeizo z tratar do aspecto negativo e critico da epistemologia platénica, antes de passar 3 aconsiderar a sua doutrina positiva. Conseqiientemente, propomo-nos a prime’. ro sumariar 0 argumento de Teeteto antes de passar ao exame da doutrina da Repiiblica no que diz respeito ao conhecimento, Esse procedimento pareceria justifcado pelas exig@ncias do tratamento légico, bem como pelo fato de que A repiiblica de forma alguma é primariamente uma obra epistemolégica. A doutrina epistemolégica positiva esta certamente contida na Reptiblica, mas alguns dos pressupostos logicamente anteriores da doutrina estao contidos em um didlogo posterior, 0 Teeteto. A tarefa de resumir a epistemologia platnica e Ihe dar uma forma sistemé- tica se complica pelo fato de ser dificil separar a epistemologia de Platao da sua ontologia, Plato nao foi um pensador critico no sentido de Immanuel Kant, & embora seja possivel ler em seus pensamentos uma antecipagio da filosofia critica (pelo menos foi o que alguns escritores se esforcaram para fazer), cle est inclinado @ assumir que podemos alcangar 0 conhecimento ea se interessar em Primeiro lugar pela questo de qual é o verdadeiro objeto de conhecimento.1ss6 siobap ward Of Mau IDYH09 2 Ib 0 Como na Faremos uma tentativa de separar ‘epistemologia da ontologia, mas ela nao podera ser de todo bem-sucedida, €M razio do préprio carter da epistemologia platénica. | ji ns da prcepsiosesivel antes detet it sos com so der qu Plate no tins formmdo conve ston dapepic ni reat tbasta-nos ler A Repiibiea, por exemplo, ou considera gene Stmo-nos, ito sim reflex sstemtiea em exrios publicados Scanned with CamScanner 158 | FREDERICK COPLESTON, 5.) ead a ivel 1. Conhecimento nao é perceps40 sens nduta pratica; i 0.08 sofistas na co 1 Socrates, interessado com de que nao existe nenhuma norma estat ‘ento. Ele estava convencido de que; hhecimento, e de que que nao esto sujeitos &s impress, mntidos ou a opinido subjetiva, mas S40 08 mesmo, dos os povos e para todas as €pocas. Plato he, san je sen mestre essa convicgao de que pode haver conhecimento no sentidy de conhecimento objetivo € universalmente valido; mas ele queria demonstra, ce eons georicamente, ¢ assim veio a se debrucar profandamente sobre o, problemas do conhecimento, perguntando-se 0 que ¢ 0 conhecimento ¢ do que Econhecimento. Platas x Proteyforas vies __No Teeteto, o primeiro objetivo de Platao é a refutacao de teorias falsas, Em conseqiiéncia, langa-se a tarefa de desafiar a reoria de Protagoras de que . conhecimento é percepcio, de que aquilo que parece verdadeiro 20 individuo ¢ verdadeiro para o individuo4O seu método esta em extrair dialeticamente uma afirmacio clara da teoria do conhecimento imp! inte de conhecim: nenhum objeto permane! f fundada no con! conduta ética deve estar inconstantes e mutaveis dos se para todos os homens, para to! licada pela ontologia heraclitea ¢ pela epistemologia de Protégoras, exibir suas conseqliéncias e mostrar quea concepeao de “conhecimento” assim alcancada nao preenche de forma alguma uma vez que este deve ser, segundo 05 requisitos do verdadeito conhecimento, supoe Platao, (1)linfalivel & (2) conhecimento do que é. A percepcao sensivel O jovem estudante de matematica Teeteto trava um didlogo com Sécrates,e este iltimo Ihe pergunta o que pensa que seja o conhecimento. Teeteto responde mencionando a geometria, as ciéncias e oficios, mas Sécrates observa que isso nao responde a sua pergunta, pois perguntara no do que se tem conhecimento, mas o que é 0 conhecimento. Logo, a discussao se destina a ter carater epis- temoldgico, embora, como jé foi observado, as consideragdes ontolégicas nio possam ser excluidas, em razdo do préprio carater da epistemologia plat6nica. Mais ainda, de qualquer modo ¢ dificil perceber como questdes ontol6gicas podem ser evitadas em uma discussio epistemol6gica, uma vez que nao existe conhecimento in vacuo: 0 conhecimento, se é mesmo conhecimento, deve neces- sariamente ser conhecimento de alguma coisa, e pode ser que 0 conhecimento esteja necessariamente relacionado com algum tipo particular de objeto. j Teeteto, encorajado por Sécrates, faz outra tentativa de responder a questo proposta, e sugere que “o conhecimento nao é senfo percep¢ao”,”* sem davida a pensar primariamente na visio, embora a percepcdo tenha em si mesma, € claro, conotacao mais ampla. Sécrates se propde a examinar essa idéia de co” nhecimento, € |Protégorase que a percepcao significa aparéncia, e de que as aparéncias variam 215162-3, Scanned with CamScanner PARTE Mi, CAPITULO ML [159 conforme os sujeitos. Ao mesmo tempo, consegue fazer Teeteto concordar que oconhecimento é sempre de algo que é, ¢ que, sendo conhecimento, deve ser infalivel.” Estabelecido isso, Sécrates em seguida tenta mostrar que os objetos da percepgao estao sempre, como ensinou Heraclito, em estado de fluxo; nunca sio, esto sempre vindo a ser, (Platio nao aceita, é claro, a doutrina de Herd- clito de que tudo é vir a set, embora aceite a doutrina em relagio aos objetos da percepsao sensivel, daj tirando a conclusio de que a percepgao sensivel nao pode ser 0 mesmo que conhecimento). Uma vez que um objeto pode parecer branco para alguém num momento, depois parecer cinza, as vezes quente € as veres frio etc., entao “parecer para” deve significar “vir a ser para”, de modo que a percepcio é sempre daquilo que esta em proceso de vir a ser. A minha percep¢ao é verdadeira para mim, e, se sei o que aparece para mim, como ob- viamente sei, entao meu conhecimento ¢ infalivel. Assim, bem procedeu Teeteto ao dizer que percep¢ao é conhecimento. Apés ter chegado a esse ponto, Séerates se propde a examinar a idéia mais de perto. para se pOr a ensinar 0s outros e receber um bom pagamento para fazé-lo? E onde estar a nossa ignorancia, que nos faz sentar aos seus pés? Pois cada um de nés nao é a medida da sua prépria sabedoria? Mais ainda, se o conhecimento ¢a percepco sao a mesma coisa, se nao existe diferenga entre ver e saber, segue-se que um homem que veio a conhecer (ou seja, ver) uma coisa no passado e ainda se lembra dela nao a conhece de fato — embora se recorde dela —, pois no a vé. Inversamente, dado que o homem possa se lembrar de algo que percebeu anteriormente e possa conhecé-lo, mesmo quando nao mais o percebe, segue-se que o conhecimento e a percep¢ao nao podem ser igualados (mesmo no caso de a percep¢ao ser um tipo de conhecimento), Socrates depois ataca a doutrina de Protagoras com um escopo mais amplo, compreendendo a frase “o homem éa medida de todas as coisas” nao apenas em referencia a percepgao sensivel, mas também em referéncia a verdade, Observa que amaior parte dos homens acredita em conhecimento e em ignorancia, e acredita que eles ou outros podem sustentar que seja verdadeiro algo que, na verdade, nao é, Apés essas criticas, Sécrates dé cabo das alegagdes de que a percepgio é conhecimento mostrando (1) quela percepgao hao é todo 6 conhecimento ¢ (2) que, ( pois uma grande Parte do que é geralmente reconhecido como conhecimento consiste em verda- des que envolvem termos que nao sao de forma alguma objetos de percep¢io, Mines, Scanned with CamScanner 160 | FREDERICK COPLESTON, _por reflexao intelectual, eno imediatamente através da percepeio, and isténcia e a ndo-existéncia." Suponha que um homem yt comio exemplos a ex Gana miragem, Nao éa percepco sensivel imediata que pode informé-lo qua, vA Saas pa nac-existencia objetiva da miragem percebida: € s6 a relays racional que pode lhe dizer isso. De igual modo, as conclusées € arguments. aasomnitica nao sao apreendidos pelos sentidos. Pode-se acrescentar que no. conhecimento do carter de uma pessoa é algo mais do que pode ser explicads pela definigao “conhecimento é percepc20”, pois nosso conhecimento do catatey fe uma pessoa certamente nao é dado pela pura sensagao. (2) A pereepeio sensivel, mesmo em sua esfera propria, nao € conhecimen Nao podemos dizer que realmente conhecemos algo se nao tivermos alcancad, + varade 2 seu respeito, isto é, acerca de sua existéncia ou ndo-existéncia, sy semelhanca ou disparidade frente outra coisa. Mas ‘A sensagao pura pode prover, por exemplo, ung ima segunda superficie branca, mas, para julgar a simile * atividade da mente é necessaria. De maneira similar, a convergir: é na reflexo intelectual que sabemos superficie branca eu! ridade entre as duas, linhas de uma ferrovia parecem que sao realmente paralelas. i ft preciso notar 0 quanto Platao é influenciado pela conviccao de que (0s objeto uma ‘ecimento € conhecimento do que é, do estavel e permanente, a0 passo que dos objetos dos sentidos nao se pode dizer que siio — pelo menos qua ., mas apenas que vém a ser. Os objetos dos sentidos sao objetos de jaro, mas confundem a mente demais para serem ‘© qual deve ser, conforme vez que conh percebidos —, apreensio de alguma espécie, cl tomados como objetos de verdadeito conhecimento, dito, (1) infalivel e (2) conhecimento do que é. (Vale notar que Platao, ao dispor a alegacao de que a perce} oconhecimento, contrasta os objetos privados ou peculiares dos sentidos — po" exemplo, a cor, que é objeto apenas da visio — com os “termos comuns que aplicam a tudo” e que sao os objetos da mente, nao dos sentidos. Os “term comuns” correspondem as formas ou idéias que sao, ontologicamente, os objet estdveis e permanentes, contrastados aos objetos particulares ou sensibilia). pcdo perfaz todo u. Conhecimento nao é simplesmente “juizo verdadeiro” Teeteto percebe que nao pode dizer que 0 juizo tout simple é conheciment® pela razio de que juizos falsos sao possiveis. Sugere assim que o conbecimes® lexame demonstre ser verdadeira ou falsa. (A essa altura ocorre um@ digs i e de a na qual Sécrates tenta descobrir como os juizos falsos sao possivgis & — Migsc4e2. Nene Sraanor | Scanned with CamScanner PARTE I, CAPiTULO IM | 161 falsamente, que € 0 seu amigo que esta ee pes ees da confusio ‘ ivel presente! um poderd ser reduzido a isso, Chega-se ima tentativa de mostrar fps de juizo flso podem surgr, mas se deseobre ser nearing ee conclui que 0 problema do juizo falso nao pode com vantagem ser tratado ate quea natureza do conhecimento tenha sido determinada. A discussao do juizo filo foi retomada em O sofista). Na discusséo da sugestao de Teeteto de que o conhecimento é 0 juizo ver- dadeiro, observa-se que um juizo pode ser verdadeiro sem que o fato de sua verdade envolva qualquer conhecimento por parte do homem que faz 0 juizo. Pode-se apreender com facilidade a relevancia dessa observacio, Se agora mes. mo eu fizesse 0 juizo de que “O Sr, Churchill esta falando ao telefone com o Presidente Truman”, ele poderia ser verdadeiro; mas nao envolveria nenhum conhecimento de minha parte. No que diz respeito a mim seria uma conjetura ou um palpite aleat6rio, mesmo que o juizo fosse objetivamente verdadeiro. De modo similar, um homem poderia ser julgado por uma acusagao da qual ele nao fosse realmente culpado, embora as provas circunstanciais fossem muito fortes contra ele e ele nao pudesse provar sua inocéncia. Ora, se um advogado habilidoso fosse capaz durante a defesa do homem, suponhamos, de manipular as provas ou jogar com os sentimentos do jtiri de tal modo que dessem 0 veredito de “inocente”, o jufzo deles seria de fato verdadeiro; mas dificilmente se poder dizer que eles soubessem da inocéncia do prisioneiro, j4 que ex bypothesi as pro- vas esto contra ele. O veredito deles seria um juizo verdadeiro, porém baseado na persuasio e no no conhecimento. i, Mas, € Obvio, nem todos os casos de entre imagem da meméria.com um objet erro de célculo matematico dificilmente sntio ao famoso simile do “avidrio”, nu . Conhecimento nao éjuizo verdadeiro a que se soma uma “razao” Ojuizo verdadeiro, como vimos, pode significar nao mais que crenca verdadeira, ©actenca verdadeira nao é o mesmo que conhecimento. Teeteto entao sugere a adigéo de uma “razio” ou explicacaio (hbyos) que converteria a crenca verdadei- taem conhecimento. Sécrates comega por observar que, se dar uma razdo ou ¢xplicacio significa a enumeracao de suas partes, entao estas partes devem ser Conhecidas ou cognosciveis: do contrario se seguiria a conclusio absurda de que t 3 yl, él Scanned with CamScanner —_ . (62 | FREDERICK COP ESTON, $4. ‘onar a crenga verdadeira a reducio di i Mle, ignifica adic i Bata ‘oconhecimento signifc: nosciveis. ‘Mas 0 que significa dar uma waeae ee a partes desconhecidas ou incog no send fe 1. Nao pode sig em palavras, pois, se significar isso, nao haves : ira, seja expresso P eee ees deira e conhecimento- E diferenga entre crenga verda es Se “dar uma razi0” significa andlise Le nape listo 6, partes ciente a adigio de uma razdo nesse sentido para transfy,. -dadeira em conhecimento? Nao, 0 mero processo de andlise eed aremaierad renca verdadeira em conhecimento, pois assin, = ae ae alesis pe que compéem uma carroga (todas, eixo um homem que etc.) teria im conhecimento cientifico dela, eum homem que an Ihe dizer quais letras do alfabeto compoem determinada Gat teria " oa pia cientifico de um gramético a respeito dessa palavra. (wb. emo lenos dar conta de que Platdo estéfalando da simples enumeracao de partes. Por exemplo, um homem que pudesse recontar os varios passos que levaram a uma concluso em geometra, simplesmente porque 0s viu num livro ¢ os decorou, sem ter de fato percebido a necessidade das premissas ¢ a seqiiéncia légica e necessaria da deducio, seria capaz de enumerar as “partes” do teorema; mas nao teria 9 conhecimento cientifico de um matemitico). 3, Sdcrates sugere uma terceira interpretagio da “razao adicional”. Talvez signifique “ser capaz de nomear algum traco pelo qual a coisa acerca da qual se é perguntado difere de tudo mais”. Se isso estiver correto, conhecer algo sig- nifica a habilidade de elencar a caracteristica distintiva da coisa. Mas também essa interpretagio é deixada de lado, considerada inadequada como defini¢ao de conhecimento. (a) Sécrates observa que, se o conhecimento de uma coisa significa a adi¢ao de sua caracteristica distintiva a uma nogao correta dela, incorremos assim em um absurdo. Suponha-se que tenho uma nogao correta de Teeteto. Para converter essa nogao correta em conhecimento tenho de acrescentar alguma caracteristica distintiva. Mas, a menos que essa caracteristica distintiva j@ estivesse contida em minha nogao correta, como esta poderia ser correta? Nao se pode dizer que tenho uma nogio correta de Teeteto a menos que essa nocZo inclua as carac- teristicas ee ee eae se estas ne Fee incluidas, entéo minha “nogao correta” de Teeteto poderia se aplicar de igual Tics cate ie nb qu no sedatina aod cores de Tess a (b) Se, por outro lado, a minha “nogao correta” de Teeteto incluir suas caracteristicas distintivas, entio também seria absurdo dizer que converto essa ogo correta em conhecimento ao Ihe acrescentar as differentia, jé que isso seria o mesmo que dizer que converto minha nogao corteta de Teeteto em co- cognosciveis), sera sufi 8 2086 7-8 Scanned with CamScanner PARTE Mt, CArfTULO | 163, mento ao acrescentar a Tet j i nhecimento : eteto, j4 apre istinga i o que 0 distingue dos outros, 'preendido em distingao dos demais, nop. Deve-se notar que Plato nao esté 1 falando de dif if homem em particular, Teeteto.%* A thum conhecimento é alcangado por renga, e sim que o objeto individual, ima é realmente 0 objeto adequado do conclusio a ser tirada nao é a de que nen! mneio da definicZo em termos de uma dife sensivel, € indefinivel e em hipétese algu conhecimento. iv. Conhecimento verdadeiro 1, Desde 0 inicio Platao supde que o conhecimento pode ser atingido, e que 0 conhecimento deve ser (1) infalivel’e (2)/conhecimento do veal. O verdadeiro conhecimento deve possuir ambas as caracteristicas, e qualquer estado mental que nao justifique sua pretensdo a ambas as caracteristicas nao pode ser conhe- cimento verdadeiro. nenhuma das duas, portanto, pode ser igualada ao conhecimento verdadeiro. Platao acolhe de Protagoras a crenga na relatividade dos sentidos e da percepgao sensivel, mas nao acolher4 um relativismo universal: ao contrario, o conhecimento, o conhecimento absoluto e infalivel, é atingivel, mas nao pode ser o mesmo que a percep¢ao sensivel, que é relativa, enganosa e sujeita a todos os tipos de influéncias transitorias tanto da parte do sujeito como do objeto. Platao também aceita de Herdclito a visio de que os objetos da percepgao sensivel, os objetos individuais e sensiveis, esto ‘sempre em estado de vir a ser, de fluxo, ¢ por isso nao Ihes cabe ser objetos de ‘conhecimento verdadeiro. Eles vém a ser e se vao, sio de ntimero indefinido, no podem ser claramente apreendidos numa definigio ¢ no podem se tornar objetos de conhecimento cientifico. Mas disso Plato nao tira a conclusio de que nao existem objetos apropriados a um conhecimento verdadeiro, mas apenas a de que os elementos particulares sensiveis nio podem ser os objetos que se esta buscando. O objeto do conhecimento verdadeiro deve ser estavel Permanente, fixo, capaz de ser apreendido por uma definigao clara e cientifica, que éa definicdo do universal, como cré Socrates. A consideracio dos diferentes estados mentais est assim indissoluvelmente ligada a consideracao dos diferentes objetos desses estados. Se examinarmos aqueles juizos com os quais pensamos alcangar conhe- cimento do essencialmente estavel e duradouro, descobrimos que sao juizos concernentes aos universais. Se, por exemplo, examinarmos o juizo “a Consti- tuigo Ateniense é boa”, descobriremos que 0 elemento essencialmente estavel 20804 Scanned with CamScanner 164 | FREDERICK COPLESTON, 5.) ito de bondade. Afinal, a Constituicao Ateniense Pode nesse juizo € 0 conceito ae b is a qualificariamos de boa, mas de ruim, ie ser alterada de modo que nao ae permanece 0 mesmo, pois, se designarna” implica que 0 conceito de bon a > isso 56 pode ser assim porque a iulgany constituigao alterada como eae o de bondade. Mais ainda, caso se objen tendo por referéncia um conceito se possa mudar enquanto um fato empiaet que, embora a Constituicao Atenie “a Consttuigdo Ateniense é boa” se ¢°? e histérico, ainda podemos a ie particular da constituigdo que tn fa isso quisermos nos referir ae ae entio possa ter sido factualmente alterada) chamamos de boa (ainda que des se caso NOSSO penisamento tens? ento em resposta podemos observar que nes fi aaa Por referéncia nao tanto a Constituigo Ateniense como um leterminac lo fato empi. rico, mas como certo tipo de constituigado. Que esse tipo de constituigio calhe de num dado momento histérico ser corporificado pela Constituigao Ateniense € coisa mais ou menos irrelevante: o que realmente queremos dizer € que esse tipo universal de constituigao (encontre-se ele em Atenas ou em qualquer outro lugar) carrega consigo a qualidade universal do bem. Nosso juizo, na medida em que alcanga o permanente ¢ estavel, realmente diz respeito ao universal, De modo anélogo, o conhecimento cientifico, tal como Sécrates 0 vé (pre- dominantemente relacionado com valores éticos), ambiciona a definigao, ao conhecimento cristalizado e fixo numa definigao clara e univoca, Um conhe- cimento cientifico do bem, por exemplo, deve se encerrar na definicao “o bem 8 g 2 8 p. a 2 g 5 8 8 z S verdadeiro, de um lado, e © mundo “real” em elementos particulares? E, se 0 conhesj Metndo que consiste dos universais, nao se segue que o conheet abstratoe “ireal”? Quanto a esta segunis da doutrina platénica das formas ou idéing s simplesmen universal nfo é uma forma abstrata desprovide conteidor nt au © conceito tiva, mas que a cada verdadeiro conceito univers | correspon t*téncia obje- objetiva. Até que ponto a critica de Aristoteles « Plato (enna Uma realidade Ultimo hipostasiava a realidade objetiva dos Conceitos, imagen a qual este transcendente de universais “separados”) se justin ener tdo um mundo de discusséo: justificada ou injustifcada, permanes Verdade gn’, matéria teoria platdnica das idéias nao deve ser buscade na nogio de eve 2 ¢88@ncia da ada” das realidades universais, mas na crenca de que Conceitos yreia “sep: 'ersais tém mento verdadei; £0 é coy ee nhecimento do eu i i observaria que a esséncia Scanned with CamScanner D PARTE, captruto tt [165 a referincia objetva, e de que arealidade co jg alta do que a percep¢ao sensivel en ame abismo entre 0 conhecimento ve Ui, fol uma das difculdades permanentes de Patz determines a selacdo za entre o particular ¢ 0 universal; mas devemos retornara esa questo Po rata da teoria das idéias a partir de um Ponto de vista ontolégico: por ora podernas conor rrespondente é de uma ordem tanto tal. Quanto a primeira questéo tdadeiro eo mundo “real”), devemos Dou aqui o diagrama esquematico usual, que me esforcarei para explicar. Deve-se admitir que ha varios pontos importantes que Permanecem muito obscuros, mas sem diivida Platao tateava pelo caminho que tinha Por verdade; e, até onde sabemos, ele nunca esclareceu seu sentido preciso em termos inequivocos. Nao podemos, portant, deixar completamente de conjeturar. vonoig | dpyai. (noesis) (archi) émothyn vont (episteme) (ao2ta) Sravora | padnpatixé (dianoia) (mathematica) MOTI Goa, %.1.. (pistis) (20a, kt) 5 SoEaotd"* Sibu: (doxasta) inaoic: | eixdves bac (eikones) Dora. Cpisteme so O desenvolvimento da mente humana em seu trajeto/da ignoréncia 4 conhcimento se dé em dois campos principais, o da 8681 (opinigo) ¢ > ca auctiym (conhecimento). $6 este tiltimo pode ser adequadamente Chal A ? Parece claro conkeinento, Como se difreniam esas duas fungbes da mene? ates or iments. Co ; Eerie cap de objetwe: Dix] que a difers ‘a numa diferenciagao : enciagao se basci oa mori, pelo menes (opinio) esta preocupada com “imagens”, 20 Pas y, Rep, 509 46-11 es Em ambos 05 sos, 0 : ieito, os objetos correspondentes. 2 Nola equerdo da linha, os estados da mente: no Indo ditito, oF Obi rT sem evident, "siao™ et no topo. A intima conexio entre a espistemologis 0m Scanned with CamScanner 166 | FREDERICK COFLESTON. SJ. na forma de vonotc, est4 preocupada com os elementos ee OU arquét;, . apyai. Caso se pergunte a um homem o que é a justia, . aoe Pata gy pressdes imperfeitas da justia, exemplos particu fe or icam aquém do id universal, a exemplo da ago de um homem especifico, de uma consttuiga particular ou conjunto de leis, sem 0 mais vago indicio de que existe um prin cipio absoluto da justiga, uma norma ou padrao, oa ° estado mental desy homem é de 66%a: ele vé as imagens ou cOpias ¢ as confunde com 0s origina ‘Mas se o homem tem uma apreensao da justiga em si mesma, se é capaz de erguer acima das imagens e ir até a forma, a idéia, 0 universal, pelo ual todo, ‘os exemplos particulares devem ser julgados, entao_ 0 seu estado mental é d conhecimento, de émoriyn ou yviais. Mais ainda, é possivel progredir de tn estado mental até outro, ser “convertido”, digamos assim; e, quando 0 homen acaba por se dar conta de que aquilo que antes tomava como originais sig ng realidade apenas imagens ou cOpias, isto é, corporificages imperfeitas do ideal, realizagoes imperfeitas da norma ou padrao, quando acaba por apreender de algum modo o proprio ideal, entao esse estado mental nao € mais de 8éég, ele se converteu em émotrpn. A linha, contudo, nao é simplesmente dividida em duas seg6es; cada Secao é subdividida. Assim, ha dois graus de émoriyin e dois graus de 84. Como sio interpretados? i Ci Kasion objeto, em primeiro lugar; “imagens” ou “sombras”, ¢ em segundo lugar“reflexos » Isso certamente soa um tanto exético, pelo menos no caso de se pensar que Platio queira dizer que qualquer homem confunde o original com sua sombra e seus reflexos na Agua. Mas se pode com justiga ampliar 0 pensamento de Platio de modo que abarque imagens gerais de imagens, imitacdes de segunda mao. Assim, dissemos que um homem cuja tinica idéia de justica é a justiga corporificada e imperfeita da Constituigo Ateniense ou de algum individuo em particular est em geral, em estado de d6£a. Se, contudo, entra em cena um retérico, e se com Palavras ¢ raciocinios especiosos o persuade de que aquelas coisas $40 justas € corretas, as quais na realidade ndo 0 s40 mesmo segundo a justiga empirica da Constituicao Ateniense e suas leis, entdo esse estado mental é 0 da eixasia. © que ele toma por justiga nao € mais que uma sombra ou caricatura do queé em si mesmo so uma imagem, se comparada a forma universal. Por outro lado, © estado mental do homem que toma por justica a justica da lei ateniense ou justi¢a de um homem justo em Particular é de niotiG, > Pistis 3. Platao recusa explicitamente a maxima de que se deve fazer bem a0g amigos e mal aos inimigos. Fazer 0 mal jamais pode ser bom. No primeiro liyr, Polemarco apresenta a teoria de que “é justo fazer 0 bem a0 nosso amigo se le; um homem bom, e prejudicar nosso inimigo se ele é um homem mau”.'s* Socrates (compreendendo-se “prejudicar” como fazer um mal real, e nao simplesmente punir — o que ele via como um corretivo) objeta que prejudicar é tornar Pior, e, no que diz respeito exceléncia humana, isso significa tornar menos justo, de modo que assim, segundo Polemarco, cabe a0 homem justo tornar o home injusto ainda pior. Mas isso obviamente é antes papel do homem injusto do que do homem justo. constantemente alivi 187 Gorgias, 523 ss. 88 Rep. 335. 7-8. Scanned with CamScanner 225 CAPITULO VII O Estado teoria politica de Platdo se desenvolve em relagdo direta com sua ética. A vida grega era essencialmente comunal, vivida na cidade-estado e impensdvel separada da cidade, de maneira que nao ocorreria a nenhum auténtico grego que o homem pudesse ser perfeitamente bom caso passasse inteiramente 4 parte do Estado, ja que € s6 na sociedade e por meio dela que a vida s se torna possivel para o homem —€ sociedade significa cidade-estado. A andlise racional desse fato experimental resulta na doutrina de que a sociedade organizada é uma ins- itui¢do “natural”, de que o homem é essencialmente um animal social —uma (Seria, claro, uma tolice representar a consciéncia grega segundo a analogia do formigueiro ou da colméia, uma vez que o individualismo l4 era abundante, manifestando-se nas guerras auto-destrutivas tanto entre Estados como entre facgdes dentro das proprias cidades, como nas tentativas de individuos se estabelecerem como tira- nos; mas esse individualismo nao era uma rebelido contra a sociedade enquanto tal antes pressupunha a sociedade como um fato aceito). Portanto, para um filésofo como Plato, que se preocupava com a felicidade do homem, com a vida vyerdadeiramente boa do homem, era coisa imperativa determinar a verdadeira natureza e fungao do Estado, Se todos os cidadaos fossem homens moralmente mnaus, seria mesmo impossivel assegurar um bom Estado; mas, inversamente, se o Estado fosse mau, os cidadaos individuais se veriam. incapazys de levar a Jl mesma muralidede para uf ci o.dicus vida reta que deveriam levar. ne ‘oindividuoe outra para 0 Estado. O Estado é composto de homens individuais ¢ existe para guiar a vida ret: ‘a conveniéncia deve se ajoelhar diante do Certo. Platao nao via o Estado como uma personalidade ou organismo que pudesse ou devesse se desenvolver sem amarras, sem qualquer atencao para com a lei moral: nao é 0 Atbitro do certo e do errado, a fonte de seu supremo codigo moral nem a absoluta justificago de suas proprias ages, sejam quais forem. Essa verdade ganha clara expresso na Repiiblica. Os interlocutores se langam a determinar a natureza da justiga, mas a0 fim do primeiro Livro Sécrates declara: “Nio sei 0 que a justia”. Depois sugere, no segundo livro,!° que, se considerarem 0 8935461, 190366 ¢ 2-369.a3. Scanned with CamScanner 226 | FREDERICK COPLESTON, + jor tamanho eem maior escalyr e mais felt Propée., ; ica e da injustica primei . por conseguinte, “inquirir a nal ra ie Prin 0 in aparecem no Estado, ¢ depois como Obvia disso € que os pring Tanto para o menor ¢ 05 compara” A eo Esta. Se 0 individuo leva Side da justiga sio 0s mesmos para 0 1nclvl quanto i Individvo : ute i augaitos 1a constituigao ou governo concreto ma. gue a Gein mas letras “esc do “serd maior tureza da ju! aparece! Estado, verao as mes pois a justiga no Esta Ora, € bastante Sbvio que nem tod LOW terializa 0 ideal de justicas dhe tio nfo estava preocupado.em determinar Tere ti eende descobrir 0 Estadovideal, 0 padrd0 20 qual cada Estado ae ormative: de possivel. E verdade que na obra de Politica deveria se conformar, tanto quanto Ihe for pos na ticidade; mas 0 seu propOsito geral L sua velhice, As leis, ele faz concess6es 4 pra 5 opésito g ‘Ie s permaneceu o de delinear a norma ou ideal, e, se os Estados empiricos nao se lever see® PETE ao ideal, entdo tanto pior para os Estados empiricos. Platao estaia ‘ciéncia; o estadista, caso realmente 0 seja, deve saber 0 que 0 Estado é e como deve ser a vida nele; do contrario corre risco de levar 0 Estado e seus cidadaos } ruina e se mostrar ndo um estadista, mas um “politico” trapalhao. A expe- riéncia Ihe mostrou que os Estados reais eram falhos, e assim voltou as costas a vida politica prética, embora nao sem a esperanga de plantar as sementes da verdadeira arte de governar naqueles que se confiavam ao seu cuidado. Na Carta 7 Platao fala dessa triste experiéncia, primeiro com a oligarquia em 404 e depois com a democracia restaurada, e acrescenta: O resultado foi que eu, antes cheio de disposigao para a carreira publica, na medida em que fitava 0 remoinho da vida pablica e via o movimen to incessante das correntes alternadas, acabei tonteando... por fim ‘Seus Sistemas de governo sao mas. Suas constituigdes estao praticamenté além de qualquer redengao, a nao ser por meio de algum plano miracl” loso acompanhado de boa sorte. i | ‘ira ox indivi € que, por conseguinte, a raca humana nao estat seeaca males até que ou onimero daqucles que corretae verdadeiramen® a adquira autoridade politica, ow a classe que tem pode! nas cidades seja levada por alguma disposigéo da providénci rn luma classe de verdadeirosflésofos | PovMenciaa se memsnuenae 84 Fafen lina ax hanen gprs ; 9 glorsnnantiy bitim nf barron thinste, Scanned with CamScanner

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