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NGUA

NGE1RAS
, tarefa exigente adquirir as competências neccssanas
Martinez
para se exprimir em outra língua. As línguas represen-
tam meios tanto para a paz quanto para a guerra, e a
gestão que fizermos do plurilinguismo de nosso mundo
condicionará nosso futuro. Os avanços tecnológicos que
reconstroem o espaço didático têm um impacto cultural
que já é visível e as necessidades de comunicação entre pessoas que não
falam a mesma língua nunca foram tão intensas. É o caso, por exemplo,
da globalização dos fluxos turísticos e dos intercâmbios comerciais, das mi-
grações populacionais e das políticas linguísticas que reagem a toda essa
movimentação humana.

A didática é o conjunto de métodos que permitem ao professor otimizar os


processos de aprendizagem de uma língua estrangeira. Este volume apresenta
esses métodos, levanta o inventário da situação atual da didática de línguas e
lança luzes para uma ação de ensino que não se mantenha alheia à realidade
pessoal do aluno e à realidade do mundo no qual ele vive.

ISBN' 976 - 65 -793 4 - 007 - 9

9"788579"340079
Estratégias de Ensino
D1DI\T1CA
() (,1I~illodo ('S/lIIIIIIOIIIOBrasil, João Sedycias [org.]
I'orlll!lllc;s 110ellsillo I/lédio e jormaçõo do professor.
('I('cio Hunzcn & Márcia Mendonça [orgs.]
DE L1NGUAS
I (;c'l/aos CIltalislldores- letramento ejormaçào do professor; Inês Signorini [org.]
I. Afomlllrrio do professor de português - que língua vamos ellsinar?
Paulo Coimbra Guedes
ESTRANGE1RAS
'i. Milito aléin da gramática- por um ellsino de línguas sem pedras IlO Clllllilll1O,
lrundé Antunes
11. tillsinar o brasileiro -
Celso Ferrarezi
respostas a 50 perguntas de professores de língua materna,
Pierre Martinez
Sl'IIlârrtica para a educação IJásica, Celso Ferrarezi
X. O professor pesqllisador- introdução à pesquisa qualitativa,
Slclla Maris Bortoni-Rícardo TRADUÇÃO
9. /'etralllento em EJA, Maria Cecilia Mollica & Marisa Leal Marcos Marcionilo
10. Urrgua, texto e ensino - outra escola possível, Irandé Antunes
I I. tillsino e aprendizagem de língua inglesa - conversas com especialistas,
Diógenes Cândido de Lima (org.)
12. Da redação escolar ao texto - um manual de redação, Paulo Coimbra Guedes
I 3. Letromentos múltiplos, escola e illclusão social, Roxane Rojo
I4 . Libras? Que língua é essa?, Audrei Gesser
I 'i. Didática de línguas estrangeiras, Pierre Marlinez
I 6.A palavra e a sentença - estudo introdutório, Ronaldo de Oliveira Batista
17. Coisas que todo professor de português precisa saber, Luciano Amaral Oliveira
I H. Gêneros textuais & ensino, A. Paiva Dionisio. A. R. Machado. M. A. Bezerra (orgs.)
19 .As cadeias do texto - construindo sentidos. Cláudia Roncarali
20. Produçào textual na universidade, Désirée Motta-Roth, Graciela Rabuske Hendges
2 I . Análise de textos - fundamentos e práticas. lrandé Antunes
22. !Jieionários escolares - políticas. formas & usos, Orlene Lúcia de Sabóia Carvalho,
Marcos Bagno (orgs.)
23. lllglês ell1 escolas públicas não [uncionai, Diógenes Cândido de Lima (org.)
24. f)icionários na teoria e na prática - COIIIOe para quem são feitos.
Claudia Xatara, Cleci Regina Bevilacqua, Philippe René Marie Humblé
'i. Gêneros textuais -
Karim SiebeneicherBrito
reflexões e ensino, Acir Mário Karwoski, Beatriz Gaydeczka.
(orgs.)
26. /'etrwrrentos de reexistência- poesia, grafite, música, dança: híp-hop, Ana Lúcia Silva Souza
~1l~
7. Pesquisar no labirinto- a tese, WIl desafio possível, Francisco Pcrujo Serrano
.
@
@ @
,
1111do nrlqln,ll: La aktocuaue des /angues étronqéres
reduzido da S' edlç60 atualizada, de outubro de 2008
I'I('\W~ Unlversltalres de Franee, 1996
I~BN <)18 2 13056553-6

UI10•. M",cos
APA~PROJETO
Marcionilo
GRAFICO:
Andréia Custódio
oro OACAPA:banco de imagens Stockxpert
ON~'UtOEOITORIAl: Ana Stahl Zilles [Unisinos]
irrxno
Carlos Alberto Faraco [UFPR]
Egon de Oliveira Rangel [PUC-SP]
Gilvan Müller de Oliveira [UFSC, Ipol]
Henrique Monteagudo [Universidade de Santiago de Compostela]
Kanavillil Rajagopalan [Unicamp]
Marcos Bagno [UnB]
Maria Marta Pereira Scherre rUFES]
Rachei Gazolla de Andrade [PUC-SP]
Roxane Rojo [Unicampl
Salma Tannus Muchail [PUC-SP]
Stella Maris Bortoni-Ricardo [UnB] NOTA DO EDITOR 7
CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA FONTE
SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ
INTRODUÇÃOQ
J

M337d

Martinez, Pierre, 1948-


PALAVRAS-CHAVEDA DIDÁTICA DE LÍNGUAS ESTRANGEIRAS 13
Didática de línguas estrangeiras / Pierre Martinez; tradução Marco Mar-
clonilo. - São Paulo: Parábola Editorial, 2009.
-(Estratégias de ensino; 15)
Tradução de: La didactique des langues étranqeres CAPÍTULO I: A PROBLEMÁTICA DO ENSINO 1f'
Inclui bibliografia L O campo da comunicação . 15
ISBN 978-85-7934-007-9 2_ Representações da língua e o processo de aquisição . 21
3_ As teorias da linguagem e suas implicações . 22
1.linguagem e línguas - Estudo e ensino.2. Didática. I.Título. 11.Série.
09-5646 COO:407
4. A fixação social das línguas . 24
COU 81 5. Linguística e didática . 28
6. Um quadro de referência . 32
Direitos reservados à 7. Ensinar e aprender . 34
PARABOLA EDITORIAL 8. A cena da comunicação didática . 39
Rua Dr. Mário Vicente, 394
04270-000 São Paulo, SP 9. Conclusão . 43
PABX: [11] 5061-9262 I [11] 5061-8075 I FAX: [11] 2589-9263
home page: www.parabolaeditorial.com.br
e-mail: parabola@parabolaeditorial.com.br CAPÍTULO 11: As METODOLOGIAS 4~
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser
L Análise/elaboração de manuais e de métodos . 45
reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou quaisquer
meios (eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia e gravação) ou 2. Pré-condições para um quadro panorâmico das metodologias 48
arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem permissão
3. As metodologias chamadas tradicionais . 49
por escrito da Parábola Editorial Ltda.
4. A abordagem direta . 51
l' edição - l' reimpressão, fevereiro de 2012 - conforme o novo acordo ortográfico da Língua Portuguesa 5. A abordagem áudio-oral . 54
ISBN: 978-85-7934-007-9 6. As metodologias audiovisuais . 57
da edição: Parábola Editorial, São Paulo, novembro de 2009 7. Conclusão . 63
Ó (tI 11111,\ 1II.lI 101 I iNl,III~ I s IltlNI;I 11\I~ O I 'I!UIHI ~IIH 111\;1

(;,\I'I'J'IJLO 111: A ABORDAGEM GOMUNICATIVA&t:;



I. As origcns , , , ,., , , " .., 65
2. Originalidade dos inventários 66
3. Prioridades 68
4. Algumas linhas de força 69
5. Aprender em uma abordagem comunicativa......................... 70
6. A didática dia a dia........ 72
7. Um balanço crítico , 73
8. O quadro europeu comum de referência para as línguas 75
9. Conclusão , ,., 76

CAPíTULO IV:
-
OUESTÕES E PERSPECTIVAS 70~ ~ sta Didática de línguas estrangeiras, de Pierre Martinez, professor
1. Organização de um ensino 80
de .ciências da linguagem e de didática das línguas na Universi-
2. Oral 83
dade Paris VIII, enfrenta a problemática global dos processos de
3. Cramática 84
4. Escrito 87 li aprendizagem e de ensino de línguas e analisa as metodologias
5. Avaliação................................................................................. 90 que tiveram e continuam a ter um papel central em didática. O
6. Civilização ,............................................. 91 pano de fundo do livro são as crescentes e, por vezes, ingentes ne-
7. Dispositivos inovadores e tecnologias modernas 94 i cessidades de comunicação entre pessoas que não falam a mesma
8. Didática e gestão linguística ,.., 98 língua em um mundo globalizado.
9. Desafios atuais, pesquisa e formação 10 1
As necessidades de comunicação entre pessoas que não falam a mesma

CONCLUSÃO 10r; língua nunca foram tão intensas. É o caso, por exemplo, da globalização dos
fluxos turísticos e dos intercâmbios comerciais, das migrações populacionais,
dos avanços da União Europeia para o leste do continente.
BIBLIOGRAFIA 107
O recurso a uma língua comum está longe de alcançar a unanimidade.
INI)ICE DE NOMES 11O E dado que é muito difícil aprender uma língua estrangeira, parece necessário
e natural que nos perguntemos como melhorar seu ensino.

A escolha deste título para nosso catálogo é expressão manifesta de nosso


interesse na didática de línguas, especialmente quando encontramos um au-
tor euja reflexão sobre a didática consegue envolver "todos aqueles que se
interessam pela condição humana e por seu provável aperfeiçoamento".

Sem, em momento algum, perder de vista os três elementos do triân-


gulo didático: o professor, o aprendiz e os conteúdos, Pierre Martinez deixa
clara sua insuficiência quando se tenta dar conta da realidade do ensino de
línguas hoje.
Ú(')I)II'IIIIIIII "NI.Ii.\~'.SI"\NI;IIII\~ 01',,"", r--IIII"'"

o autor apela a uma abertura de espírito do leitor, para lcvá-lo a per- @


ccbcr as rupturas c as continuidades, decorrentes das mudanças teóricas,
díls experiências, das necessidades, dos insucessos e dos efeitos da moda em
didéít ica. Repassa os métodos tradicionais, áudio-orais e audiovisuais e iden-
tiGca a abordagem comunicativa como aquela que operou uma verdadeira
virada didática, quando, em vez de se buscar competência linguística apenas,
passa-se a buscar com o aprendiz de línguas estrangeiras a plena competência
comunicativa. A aquisição passa a se concentrar em um conjunto de noções
coucciluais e sociais, que leva em conta o mundo interior do aprendiz e
() mundo exterior à sala de aula. O currículo tem de ser interdisciplinar e
dinâmico, deixando de ser um programa restritivo e limitador a ser seguido.
s necessidades de comunicação entre pessoas que não falam (1
Neste livro, a didática se abre para o futuro, desiste de ser monopolista e
descritiva e passa a desempenhar um papel central na luta contra o fracasso
mesma língua nunca foram tão expressivas. É o que vemos, por
exemplo, no contexto geopolítico ocidental, com os avanços ela
.scolar. Livra-se de sua dependência da linguística aplicada ao ensino e se
União Europeia e a abertura de suas fronteiras para o leste do
torna uma praxiologia que tem uma tarefa complexa: elaborar saberes que
continente europeu, com os fluxos turísticos e comerciais em
sejam uma transposição de saberes científicos para saberes ensinados, apro-
uma rede de intercâmbios doravante globalizada e com as migra-
priar-se desses saberes, intervir didaticamente num campo que agora é de
ções populacionais, livres ou controladas.
lola 1 transversalidade.
O recurso a uma única língua veicular (o esperanto, o inglês ou outra)
É nesse campo que se insere este novo livro da Parábola Editorial. Es-
está longe de atingir a unanimidade e suscita objeções que não são desti tu í-
pcremos que ele faça a trajetória que desejamos vê-lo percorrer: a de renovar
das de sentido. Então, dado que é difícil aprender uma língua estrangeira,
ti reflexão sobre a didática de línguas estrangeiras, produzindo saberes que
parece natural e necessário que nos perguntemos como melhorar o ensino
levem nossos leitores a verem, por trás do método, a metodologia como ex-
de uma segunda língua. Mais que nunca, uma reflexão sobre a didática vai
pressão de uma política linguística, à qual se deve prestar atenção para evitar
se impor a todos aqueles que se interessam pela comunicação humana e seu
a armadilha fácil das panelinhas didático-pedagógicas uniformes.
provável aperfeiçoamento.
MARCOS MARCIONILO
Aqui, o termo didática evidentemente não é entendido como exclusivo
São Paulo, novembro de 2009
do campo das línguas: ele tem como significação etimológica, em sua função
de adjetivo primeiramente, "o que é próprio para instruir" (do verbo grego:
didaskein, ensinar). O substantivo abrange um conjunto de meios, técnicas e pro-
cedimentos que concorrem para a apropriação, por um sujeito determinado, de
elementos novos de todas as ordens. Entre tais elementos, podemos identificar:

• os saberes linguísticos, por exemplo: o léxico, a gramática, ou seja, os


elementos e as regras de funcionamento da língua;
• as competências comunicativas, ou habilidades, meios para agir sobre ()
real (maneiras de ordenar, de aprovar, de se apresentar, de informa r ... );
lU (1)1IIIIIIIL;\ I" II~I.I .\~ ISII\,\".I,"L\~ U 1'1111111
\1·\I\lI~1 IN"((IIIII~,,\(I (i) 11 '.@

• 11111;1maneira de ser, coiuporlumculos culturais, frequentemente ill- parti fundá-lu COIllOdisciplina teórica. I':lcs ainda nos permitem compreender
dissoci.ivcis da Iíngua, porque inscritos na própria língua: por exem- que as novas questões não podem ser respondidas com soluções estreitas, (:
plo, em todas as línguas, a ritualização das trocas linguísticas assume dessa forma que os debates contemporâneos ressaltaramque a pergunta: "O
traços Iinguísticos específicos (pergunta, falas aparentemente inúteis, que é ensinar uma língua?" pressupõe outra: "O que é saber uma língua?" Í<~
[ormas de polidez), que correspondem a valores. da definição desse "saber" que vão depender os objetivos da aprendizagem c
os meios de seu sucesso. Trata-se de levar o ato de ensino a escapar do acaso
Nl'sl<l obra, o termo "aprendiz" é utilizado onde esperaríamos ver "aluno".
e da contingência.
1': i.,s() núo para meramente aderir ao jargão pelo jargão. Acreditamos que é hora
de dvi\:I1 ele ralar de aluno, indivíduo administrativamente inscrito, e de passar a Consequentemente, a didática só pode ser concebida por meio de um
!:!i:ll'de aprendiz, alguém situado em determinada situação, em uma postura de conjunto de hipóteses e de princípios que permitam ao professor aperfeiçoar
.qHelldizélgem. Nos processos que abordaremos, o aprendiz é agente ativo. os processos de aprendizagem da língua estrangeira. Chamaremos essa condu-
ta refletida, que é resultado de hipóteses e de princípios, de método de ensino:
Portanto, é no espaço social existente que se desenvolve, entre aque-
le que ensina e aquele que passaremos a chamar de aprendiz, um "ensino/ • hipóteses, por exemplo, relativas ao modo de trabalho proposto ou
aprendizagem" do objeto em circulação: uma língua estrangeira. Uma ideia imposto. Desse modo, aprender decorando é benéfico, mas não bas-
simples, mas fundamental, é aquela segundo a qual existe uma desigualda- ta; um ensino eficiente deve ser repetitivo, deve, então, ser espiralar e
de de competência entre os parceiros do processo, com o professor sabendo retomar as aquisições feitas para reativá-las; a aquisição de automatis-
111Uito c o aprendiz sabendo menos. Mas o professor é precisamente um "faci- mos é uma boa coisa, mas não deve impedir a criatividade do sujeito
Iitudor" da apropriação, do processo que visa assimilar um objeto linguístico, falante de se manifestar etc.;
adaptando-o àquilo que se quer fazer com ele. Esse trabalho só pode ser efe- • princípios decorrentes dessas hipóteses: escolheremos organizar gru-
tuado pelo aprendiz, e o professor não é, de modo algum, o centro do proces- pos de trabalho para desenvolver a socialização e a necessidade de
so ele apropriação, qualquer que seja a metodologia de ensino adotada. comunicação, para não deixar os aprendizes isolados entre si, em uma
relação vertical com o professor; ou ainda: fases de expressão livre
Aliás, a didática se distinguirá da pedagogia, atividade que implica uma
deverão se alternar com frases centradas preferentemente na estrutu-
relação entre o professor e o aprendiz, que insiste nos aspectos psicoafetivos
ração e na fixação das aquisições ete.
e não na mera operacionalização dos meios de ensino. Contudo, essa relação
não deixa de ter determinada incidência sobre a qualidade das aquisições, mas A metodologia visará, então, determinar a arquitetura e as razões das es-
pode assumir outras finalidades. Não se trata mais da mera apropriação de ele- colhas feitas em contextos didáticos variados, em face de aprendizes diferen-
mentes linguísticos e do desenvolvimento de competências, mas também da ciados por sua personalidade, sua história, suas expectativas, seus objetivos.
construção do indivíduo, por exemplo, como adulto ou como cidadão.
Aqui, não vamos fazer uso do termo "didatologia", que foi proposto para
Por sinal, assim como o termo "educação", "pedagogia" evoca, etimo- distinguir a reflexão sobre a didática de seu campo de aplicação propriamente
logicamente, um percurso (grego: agogein, conduzir) que se deve fazer uma dito. Designaremos mais comodamente por "didática", ao mesmo tempo, os
criança (pais, paidos) cumprir, e alguns autores falam de andragogia (grego: aspectos teóricos e práticos do ensino de línguas estrangeiras.
auer, andios, homem) para designar a formação de adultos.
Finalmente, seremos levados a distinguir uma didática da língua mater-
Veremos que a pedagogia e outras ciências ou domínios científicos como na - diremos preferentemente língua primeira - e uma didática das línguas
íI Iingu ística, a psicologia, a sociologia, as ciências cognitivas, a tecnologia estrangeiras ou segundas, porque elas remetem a uma história (ou seja, a uma
ele. iluminam o campo da didática de línguas estrangeiras: eles contribuem constituição científica, a instituições, a pesquisas) e, sobretudo, a condições
d(· opc: aciona lização (um processo de aprendizagem) que só Il1Uilo pa rcial- @ @
nu-ulc são idênticos.

Nosso livro se dedica a um questionamento dessas palavras-chave. Não


~a\JfaS-cha\10.
w l'~p(,le encontrar nos capítulos a seguir nem um manual para ser usado em
.~:l1.1
dv nula, nem a defesa de um eventual pensamento dominante em didáti-
(;:1() (/lI<,' oferecemos são ferramentas para melhor entender o que representa
da ddátioa dei
() !.llo dl' ensinar uma língua estrangeira.

Pallirelllos do estudo de uma problemática global - processos de apren-


di:/.agcll1e processos de ensino em interação - para analisar, em um segundo
!fnguaseJStrmg~ias
tempo, as metodologias que tiveram importância em didática, até as correntes
atuais, inscrevendo-nos especialmente na abordagem comunicativa, no am-
bicntc tecnológico atual e no quadro europeu comum de referência. Depois,
.xaminarernos algumas questões importantes. Elas abrangem centros de inte-
ressc diversos, como a gramática, a avaliação ou a definição do currículo. As
informações apresentadas sobre essas questões darão aos leitores, é o que espe- o que você sabe a respeito disso?
ramos, meios de construírem uma opinião própria, de maneira esclarecida e
crítica, sobre as perspectivas que se abrem em um campo em plena evolução.

Ao final do volume, disponibilizaremos uma bibliografia propositada-


o Abordagem acional I Abordagem comunicativa I Aprendiz I
mente breve. Algumas contribuições serão simplesmente assinaladas (nome
Aprendizagem I Aquisição I Ato de fala I Audiovisual ]
c data) no corpo da obra. Pesquisas complementares na internet poderão ser Autonomia I Avaliação
feitas sem dificuldade a parti r de uma lista necessariamente limitada.
o Bilinguismo

o Classe I Coerência I Competência I Teste seus


Comunicação I Cultura I Currículo conhecimentos
antes e depois
o Despertar para a linguagem I Didática I
da leitura
Discurso
deste livro
o Ensino a partir de objetivos específicos I
Ensino geral I Erro I Escrita I Estratégias I
Exercício

o Fonética

o Gramática

o Imprecisão I Interação I Intercompreensão I


Intercultural ] Interlíngua
i:\\~~ ~@
o I.cxico I Língua I Língua estrangeira I Línglla pl imcira
1I .inguagcm I Linguística I Literatura
I Línglla segunda ~1' @ ,
o Mnnual ] Metalíngua
M, IIIilinguismo
I Método I Metodologia I Migração I Motivação I potlel1'lotiUJ
.,
Nt't't'ssidades

()hWI
I Nocional-ficcional
ivos I Oral

I'('dagogia
] Norma

I Política linguístiea I Pragmática I Procedimento I Professor I


ooersro
Capítulo I
I'I ograma I Progressão I Projeto I Pronúncia
o Representações

o Situação I Sociedade
o 'lccnologias da informação e da comunicação aplicadas ao ensino I
'I radução I Transposição didática
indivíduo, a sociedade e as línguas entram em jogo em
o Unidade didática uma relação didática que não escapa às regras da comu-
nicação humana. O ensino de línguas estrangeiras só
pode, com efeito, ser examinado como uma forma de
troca comunicativa: ensinar é pôr em contato, pelo pró-
prio ato, sistemas Iinguísticos, e as variáveis da situação
refletem-se tanto sobre a psicologia do indivíduo falante
quanto sobre o funcionamento social em geral. Quem começa a aprender uma
língua, adquire-a e a pratica em um contexto biológico, biográfico e histórico.

Não se tem certeza de que tudo seja objetivável e, portanto, posterior-


mente utilizável na ação. Mas a posição da didática é, em princípio, uma
busca ele informação e, na medida máxima do possível, uma consideração de
tudo o que pode ajudar a facilitar a aprendizagem. É uma posição prudente
e lúcida, mas otimista, que se impõe a todos nós.

@ 1. O ccrroo da COl')uniCOQÕO
o simples fato de comunicar pela linguagem compromete a pessoa
toda, quer dizer, um indivíduo com suas experiências anteriores, sua adesão
l'iIiiIiI~1
IIU INI -------------~-- j\ ruruu I>7M-I\II\." ,t" I';~IH"'\I

.I ('It'IH,;<lS
c valores culturais e intelectuais, suas motivações e as finalidades • a uma melhor análise do mal-entendido inerenle à comunicação hu-
til' ~II<Iinicinliva. mana, que não decorre apenas de nossos humores e de nossa vontade,
mas também de fatores variados: código apenas parcialmente comum
lllll<l comunicação no campo didático é, então, um sistema de siste-
aos interlocutores, efeito da conotação subjetiva, necessidade da re-
111,1\,11111;1 inlcração entre pessoas, conteúdos, um contexto social etc. Por isso
dundância em uma economia do discurso magistral, erros de codifica-
IUI\ p.lIC('l' oportuno lembrar como podemos representar, em suas grandes
ção ou de decodificação que afetam o dispositivo, tanto no oral como
111111,1\,
() luucionarnento da comunicação. Três formalizações - modeliza-
no escrito (essa é uma justificativa frequentemente evocada para a fixa-
lI! " 1111
('~qlll'llwlizações da realidade - foram mais frequentemente levadas
ção do código escrito, a ortografia ... ) etc. (Kerbrat-Orecchioni, 1990).
1111(0111.1pelos clidatas: o esquema de Roman Jakobson, as teorias da infor-
111,1,,10,.1
t'111()grafiada comunicação. Elas nos levarão a propor pessoalmente b) Uma corrente de influências, à qual o próprio Jakobson não é insen-
11111.1
\ iS;lOintegrada das coisas. sível, atua sobre o modo por meio do qual representamos para nós mesmos a
comunicação. Ela se inspira nas teorias de Shannon e Weaver (1939, 1948)
ti) O esquema de Jakobson foi amplamente difundido e, não obstantc
sobre "as" comunicações, na cibernética de Wiener e nas teorias da informa-
~u.l simplicidade, continua a dar conta de uma maneira talvez limitada, mas
ção. A ideia é tentar modelizar matematicamentea transmissão de informação
muilo eficiente, de uma teoria geral transponível para a didática. Jakobson es-
e visa globalmente responder às perguntas: "Quem diz o quê, a quem, por
crcvc que há transferência de informação entre um emissor (ou destinador) e quais meios e com quais resultados?" (Laswell, 1948). Em todos os casos, o
11111
Icccplor (ou destinatário) por intermédio de uma mensagem constituída
objetivo é a transmissão de uma mensagem, com o auxílio de "repertórios"
dl' sinais, emitida com uma intenção, formalizada com a ajuda de um código mais ou menos comuns, com ajustes que permitem, na troca, os retornos de
ou conjunto de regras (a língua, por exemplo) e circulando por um canal (os informação. Irregularidades técnicas, organizacionais e semânticas ("ruídos")
meios lécnicos utilizados, que permitem um contato simultaneamente físico atuam no sistema. A teoria da informação, que destaca a desigualdade entre
l' psicológico). Serão designados como referentes da mensagem da qual ele os interlocutores (em nosso caso, professor e aprendiz), também ressalta o in-
lal,) () "contexto" ou os objetos reais aos quais ele remete. teresse das noções de probabilidade e de incerteza nos efeitos produzidos pela
mensagem sobre os parceiros da troca: o processo de informação, mensurável,
A transposição didática das concepções de Jakobson pode ter dado mo-
visa reduzir uma incerteza parcial ou até mesmo total, preenchendo aqui uma
livo a severas críticas, mas ela permite enfatizar fatos interessantes, como a
ignorância por parte do aprendiz. Isso é o que torna possível uma aprendiza-
dissimctria dos parceiros na comunicação, a dificuldade de interpretar onde
gem, uma adaptação à situação com a qual o aprendiz se vê confrontado.
se localiza o observador estrangeiro e a importância do contexto. Não há nada
ti cslran har no fato de esse esquema ter suscitado uma reflexão própria em c) Mas podemos ver perfeitamente que esse tipo de modelização convi-
didática. Tal reflexão levou: da a desenvolver a reflexão em outras direções, por exemplo, as das ciências
humanas como a psicolinguística e a antropologia social. A linguagem ine-
• à descrição de situações de ensino habituais à classe. A compreensão
gavelmente vinculada a uma experiência coletiva (Sapir, 1953), a maneira
das trocas complexas que se observam ali foi beneficiada por essa des-
pessoal com a qual o indivíduo "interpreta" os signos da língua (Peirce, 1932)
crição;
são, quando menos, razões para aprofundar:
• à análise de situações externas à classe e de produções literárias ou
sociais pertencentes aos gêneros admitidos: romance autobiográfico, • a questão do sujeito na comunicação (seu quadro de referência, suas ati-
discurso político, texto científico, poesia etc. Dessa forma, esse tipo de tudes durante a troca, sua capacidade de se identificar com outro etc.);
atividade pôde caracterizar um ensino que não se abria mais exclusi- • a questão das regras e normas que regem a comunicação;
vamente ao sistema da língua, mas também à fala social; • a questão dos papéis e dos lugares de cada um na interação.
• t\.1·....,·I-:'~rli'7fI'r-f ,",',t"1t'l'f"I"It'f'I!l'tNt., rTU\"rl.llíFlflfr~"nfl'!'QIZ

p(lI i,\o o l'\llIdo dm glllpm 1IlIIIl<ll1mem \IW 1><111


iCld.llldildc cultural,
() que vai acontecer em sala de aU!.1 levar em consideração todos os dados,
</IW I' o ol>lt 10 !"'pl.'('lrl('o d<l el//ogru/ia, 1c\<Ios pcsquisaclou-, ,I dennirem ou-
11HlSnos parece impossível poder ignorar quc eles produzem efeitos.
110\ Illotll'lm rtnnunicacionai«. ldcntificamos aqui algu1llas propostas, no 1l10-
vinuuto d<ltlllela que roi chamada "a nova comunicação" (~. Winkin, 1991). Na medida em que existem claramente maneiras diferentes de aprender
segundo os indivíduos, interrogamos se essa caracterização também não de-
I;: o modelo proposto por Dell II. Hymes, em 1974, que nos ajudará a corre, pelos menos em parte, de sua cultura de origem. Com efeito, a própria
\1" IIlais clarnmculc a cena da comunicação linguística. Apresentado sob o comunicação exolíngue - aquela em que pelo menos um dos interlocutores
,li Imll('O umplamcnlc eonhecido como SI'/<:AKJNC, ele faz entrarem em ação: 1180se exprime em sua língua materna (Porquicr, 1984) - atesta uma varia-
ção cultural que assume aspectos muito diversos.
• S a si Inação, tanto em termos físicos como psicológieos (setting);
• P os participantes (participants); Essa variação certamente incide sobre o material semiótico utilizado, que
• I<: os objetivos projetados e os objetivos atingidos (Ellds); c a língua, mas também sobre o material paraverbal e sobre o não verbal: pos-
• i\ as scquências de atos (ActS), com seus conteúdos e com suas formas; tura, mímica, gestualidade e espaço. A própria representação do espaço e do
• K as cntonações, o tom adotado (Key); tempo também é duvidosa: preeminência das marcas do aspecto verbal (a ação
• I os instrumentos, códigos e canais, meios para a comunicação (ms- começa, dura no tempo, se repete etc.), inexistência do tempo passado, posição
I rumentalitiesí; do sujeito c do objeto etc. Há uma "ternatização" do real diferente, que faz di-
• N = as normas socioculturais de interação ou de interprctação (Nonns); zer, em inglês, Men at work e, em português, "Atenção, homens trabalhando",
• G = os gêneros ou tipos de atividade (Gemes): convcrsação, conto, e em várias línguas algo como "acabou para mim", em vez de "acabei".
narrativa etc.
A variação cultural afeta ainda as rotinas e os rituais (fórmulas de tra-
I':ssa ampliação do quadro conceitualleva também a ressaltar o quanto o tamento, cumprimentos envolvendo a saúde e a família, agradecimentos),
.rlo de rala é um ato social complexo, que excede uma competência gramati- os atos de linguagem (recusar algo não se marca do mesmo modo em todos
('ai e tece uma rede de dependências que devem ser analisadas e globalmente os lugares). É, em sentido amplo, todo o planejamento do discurso c sua
levadas em consideração. progressão, com sua sinalização, sua "pontuação" verbal, que seria possível
demarcar e também as regras da conversação (abertura, continuidade, sincro-
Como indicou o sociolinguista J. Fishrnan, enquanto estudava o estatu- nização, turnos de fala e sobreposições, encerramento) que aparecem como
10 de outras línguas afora o inglês em grupos étnicos e religiosos nos Estados altamente culturalizados (Kasper, Blum-Kulka [orgs.], 1993).
Unidos, essas relações vão da linguagem aos grupos de valores mais significa-
Em suma, veremos que a variação é regra. Para poder nos comunicar
tivos para uma comunidade. Elas passam pelo momento da fala, pelo lugar
em uma língua estrangeira e para aprendê-Ia, não podemos nos limitar à es-
onde a fala é pronunciada, pelas relações dc papéis que ocorrem, mais ou
trita descrição do sistema linguístico. Em sala, permanecer em silêncio e não
IIIel105 implicitamente, entre os participantes, pelo tipo de interação que eles
olhar o professor nos olhos não revela obrigatoriamente quc não saibamos ou
desenvolvem. E todos esses parâmetros estão inscritos em uma situação social
que não queiramos responder; isso pode remeter a um código implícito.
1.' são parcialmente definidos pelo comportamento da comunidade.
Com toda a certeza, conhecer todas essas "dimensões ocultas" (Hall,
I:: o que se manifesta quando observamos, por exemplo, altemâncias có-
1966) não deve nos levar a elichês, a estereótipos, fazendo-nos esquecer a
di('as, mudanças de língua em um escritório em Porto Rico, onde se falam
variação individual. A livre relação dos interlocutores, sua intersubjetividacle
inglês e espanhol; nos mercados de uma cidade africana ou em ambientes es-
deveriam excluir toda sistematização abusiva e, em todo e qualquer caso,
colares. Não estam os certos de sempre podermos - para prevenir ou corrigir
aconselhar a prudência de determinar se se trata de ensinar traços culturais
P*I,- '-\:1 \.JI 'ITl1\"Tlr'I\-nrrTI1'lfm~.."rWTJf~~·ÇJ I 'l\-'\lITTIIJT"'7' - - -
----- (' r-uruu 1!1\11\ IlfTI\ Pl' r.i"!;-tll:..j.' ,.I ~.I

uuucndos. Mas, dado quc essas dimensões prccxislcm à utilização da língua ) conjunto de lcnuos do modelo representa a complexidade da troca
(' il ~llil nprcndizagcm, um estudo sólido da comunicação, baseado em dados .xol ínguc, especialmente na cena pedagógica: distinção aprendiz/profcssor
exlcrnos sobre o aprendiz e sobre o meio, parece-nos definitivamente um pré- voluntariamente reduzida (nós nos pomos "no lugar de" ... ), desigualdadc
I ('(I' I isi 10 pa ra a elaboração de uma didática. (por exemplo, de posição hierárquica, mas sobretudo de competência dos
'I C:1110S, agora, condições de propor um modelo panóptico da comuni- parceiros), regras, atitude, papel, "face" a conservar, relação positiva (que im-
l'ilC,;ilO ('\01 ínguc, um modelo pluridisciplinar, o único que pode responder à plica a cooperação, mas que é, de fato, uma negociação permanente), objeti-
complexidade da cena pedagógica: vos da troca, eventual(is) mal-entendido(s), economia da troca (caracterizada
pela redundância, porque a comunicação pedagógica é repetitiva) etc. Não
COMUNICAÇÃO = TRANSFERÊNCIA DE UMA MENSAGEM
vamos desenvolver aqui o conjunto de termos cm jogo. Deixaremos para o
entre A e B
leitor o cuidado de exemplificá-Io com as situações de aprendizagem que ele
+ redundância
conhece ou viveu pessoalmente. De todo modo, o modelo não consegue cs-
CULTURA CULTURA

IU':CRAS lê NORMAS REGRAS E NORMAS


gotar a riqueza e a polissemia daquilo que constitui a realidade da classe.
q\l(, Icgcm a comunicação que regem a comunicação

ruidos de atitudes e de comportamentos


Atitudes Atitudes ~ 2. RepeJSentC1ÇJÕeJS da !hgua0 o p-00eJSSO
desigualdade entre os participantes
de aquisição
Informação ASSIMETRlA J n formação
No centro do modelo, se impõe o uso de uma ou de várias línguas (en-
detida por A recebida por B
papel/face papel/face tre vários sistemas de expressão como a gestualidade, o olhar ou a postura
ruidos técnicos corporal). Os linguistas distinguem, sabemos, a linguagem e as línguas. Eles
A (emissor)
Codificação
(Sustentação)
c=> I MENSAGEM I c::) [nt:rpretaçiio/Oecodificação
B (receptor)

(Indices, análise, síntese)


definem a linguagem como instrumento
uma capacidade do indivíduo e implicando
da comunicação
a existência
humana
de um dispositivo
ligado a

Código Canal Código neurofisiológico: cérebro, memória, aparelho auditivo e aparelho fonador. ..
ruídos organizacionais A língua é a manifestação dessa capacidade, enquanto sistema de signos ar-
supõe uma comunidade de código
ticulados que constituem um código admitido por todos. Isso quer dizer que
Referente ruidos semãnticos Referente
QlIadro de referência de A Quadro de referência de B esse código é uma instituição coletiva. Podemos lembrar que, desde as ori-
Correferência Correietência gens da linguística, Saussure fala expressamente da língua como

Objetivos a alcançar Mal-entendido Objetivos a alcançar produto social da faculdade de linguagem e conjunto de convenções necessá-
(hipotético?) Utilização da iniormação rias, adoradas pelo corpo social, para permitir o exercício dessa faculdade por
Sistema de relações Cooperação Sistema de relações
parte dos indivíduos.
Supõe uma comunidade de repertórios
Assim como se dá na comunicação humana, o ensino de línguas pressu-
Aprendizagem
INTERAÇÃO
põe, ao mesmo tempo, uma teoria da linguagem e uma análise dos sistemas
lnterdependências dos parceiros sociais - negociação linguísticos que se deve ensinar, porque a representação de uma e da outra
Resultado influencia, mesmo que desejássemos nos poupar de mais uma reflexão, a
MODELO PANORÂMICO DA COMUNICAÇÃO EM UMA AULA DE LÍNGUA concepção do ensino.
\!I

@ 3. As teDias da !inguagell'l e suas in'lpicaçõeJS porlamcnlo cultural têm Inudamculos naturais", ele mostra como os "csque
IIIt1S rcprcscnlacionais" são construidos na criança pela intcração com O meio
A psicologia moderna e a psicolinguística nos propõem várias maneiras
lisico, assim como os "esquemas comunicativos" são construídos no contato
<Iv nnalisar a questão da linguagem.
com o meio social. Entre os trabalhos que continuam a esclarecer essas ques-
a) As teorias mecanicístas fazem da atividade linguística "o resultado toes (Pensamento e linguagem, de Yygotsky, data de 1935), citemos também os
<Iv uma cadeia de reações materiais de causa e efeito" (Mackey, 1972), um de A. A. Leontiev (Atividade, consciência, personalidade, Moscou, 1964) e os de
produto, sem dúvida complexo, de nossa presença no mundo. Essa atividade J. Bruner (O desenvolvimento da criança: saber fazer, saber dizer, 1983).
comportamental, que foi possível esquematizar segundo a fórmula "estímu-
Geralmente também se faz referência a outro conceito elaborado por
lo resposta-reforço" (Skinner) e que evoca o famoso reflexo condicionado do
Vygotsky, o de "zona de desenvolvimento proximal". A expressão designa a "di-
cao de Pavlov, eliminaria, em sua forma extrema, a hipótese de uma fun-
lcrcnça entre o nível de resolução de problema alcançado com a ajuda de adul-
çao simbólica da linguagem humana e levaria a considerar a aprendizagem
tos e o nível atingido por si". Ela permite "rnodelizar a aquisição como uma
como uma situação perfeita para a produção de respostas automatizadas.
dialética entre um movimento autoestruturado e um movimento de heteroes-
Um estímulo provoca uma resposta (reação por associação, por exemplo: em
truturação constituído mediante as intervenções pelas quais o interlocutor na-
português, "é preciso que ... " implica o modo subjuntivo). A repetição des-
tivo se esforça para guiar o aprendiz e canalizar seu trabalho de formulação", o
se processo cria um reforço e, mediante uma verdadeira "sedimentação", o
que é uma excelente descrição dos bastidores da cena di aIética (B. Py, 1994).
nascimento de um automatismo. A apropriação de um elemento linguístico
permite, portanto, em princípio, reintroduzi-lo sem esforço. Esses trabalhos, que incidiram especialmente sobre a passagem da lin-
guagem interiorizada ao pensamento ou sobre a facilitação do desenvolvi-
b) As teorias mentalistas, ou neorracionalistas, insistem no caráter "na-
mento, permitem-nos nos aproximar de processos ainda pouco elucidados.
tural" da aquisição da língua primeira. A existência de capacidades inatas que
Exemplo: a supressão da verbalização, que é uma restrição educativa (em sala,
seriam específicas da espécie humana e da aprendizagem linguÍstica (para
não se pensa em voz alta), bem poderia frear a aprendizagem (Janitza, 1990).
Noarn Chomsky, um "dispositivo de aquisição da linguagem") autorizaria,
Contudo, é nosso conhecimento desse ambiente sociocognitivo que deveria
por indução e a partir da fala em circulação no meio externo, a emergência
determinar, pelo menos em parte, a operacionalização de uma didática.
ele uma competência, a construção de um sistema de regras interiorizado e
ele validade "universal". Mas, contudo, havemos de compreender que a didática não é, de modo
algum, uma espécie de resultado de uma teoria da linguagem, mas que ela
Duas hipóteses, menos radicalmente em conflito, também marcaram a
reflexão atual: pode extrair dessas teorias as hipóteses de que necessite. Aliás, a didática en-
contra nessas hipóteses respostas quase sempre divergentes, mas também,
c) Primeiro, a teoria "construiivista" de Jean Piaget: se existe dispositivo, tra- com muito maior frequência, novas questões. Problemas como o do condi-
ta-se de um dispositivo cognitivo geral, e o desenvolvimento da linguagem deve cionamento biológico do "processador linguístico" do aprendiz (equivalente
ser tratado como sendo o desenvolvimento da função de representação própria à "ferragem" informática, se quisermos estabelecer uma relação com os soft-
;1 espécie humana em seu conjunto. Tal dispositivo manifesta, então, ao mesmo wares; Klein, 1989), a questão das atitudes e das motivações diante da língua
tempo, a importância de fatores internos, biológicos, e uma forte integração à segunda ou até mesmo a da idade mais favorável para a aquisição são regular-
construção gradual e global do indivíduo em suas relações com seu meio. mente postas na pauta das discussões.

d) Em segundo lugar, a perspectiva sociocognitiva adotada pelos trabalhos Vamos começando a saber um pouco mais sobre o modo como se apren-
cio psicólogo bielo-russo Vygotsky: sem negar que "as formas superiores de com- de comunicando, por meio, por exemplo, daquilo que chamamos de uma
"COII(,rl'll-llcia " (compreenderemos mais rapidamente se já tivermos nos fa- mtcrcomunicaçüo entre glllpOS dotados de vernáculos específicos. O espanhol,
Illili:11izudo com o quadro conceitual) ou ainda adivinhando o pensamento () inglês, o francês, o português seguramenLe desempenham esse papel, assim
como os crioulos no Caribe, no Oceano Índice, ou como o lingala na África.
dt, '1111intcrlocutor, atribuindo-lhe um "querer dizer" (Grice, 1957), estados
.
d(' t'~píl ilo ou intenções (Sperber, Wilson, 1989 e Bourdieu, 1982). Em to- Em outra acepção, "língua segunda" assume um sentido coletivo. Isso
dm m casos, "os pressupostos culturais e os conhecimentos contextuais dos supõe, então, uma posição particular dessa língua, oficialmente ou de manei-
1I1h'docuLores criam, para cada um deles, uma espécie de filtro, por meio do ra tácita. Às vezes, falamos de estatutoespecial, de um funcionamento social
IIlIal passa a linguagem" (C. Perdue, in Noyau, Porquier, 1984). Todas essas . de uma situação cultural privilegiada (Dumont, Maurer, 1995), ligada por
questões, que permanecem abertas, não podem deixar o didata indiferente. exemplo a uma história colonial e a um ambiente Favorável: uma "logística"
midiática, escolar, administrativa, comercial, que favorece o uso ela língua
segunda (Cuq, 1989). É esse o estatuto do francês em vários países da África
@ 4 A fixação sooc das !Ír'lguas ou nos departamentos e territórios de ultramar, Antilhas, Guiana, Reunião,
As línguas têm papéis, estatutos, valores, como as moedas. Existe uma Polinésia etc. Em vários casos, a língua segunda foi alçada à classificação de
.. .conornia das trocas linguísticas" (Bourdieu, 1982), que não se deve deixar "língua oficial", ao lado ou em substituição às línguas nacionais (inglês na
de conhecer, porque ensinar ou aprender é também comercializar (o comér- África oriental, francês no Haiti). É preciso insistir no papel desempenhado
cio, no scnLido clássico, também significa as relações, a troca). Algumas defi- pela língua segunda no desenvolvimento psicológico c cognitivo dos indiví-
niçõcs se fazem necessárias: duos nesses contextos.

hamaremos língua primeira (Ll) de um indivíduo simplesmente Essas questões de estatuto serão particularmentc importantes em casos de
aquela que ele adquiriu primeiro, cronologicamente, no momenLo do desen- diglossia, nos quais a desigualdade social elas línguas ou variedades em presença
volvimento de sua capacidade de linguagem. Nesse caso, é preciso evitar esta- é grande. A insegurança linguística na qual o falante não nativo vive a troca, o
belecer qualquer relação entre a importância de que essa língua se revestiria comércio das línguas, afeta a imagem desses falares, sua aquisição e sua circu-
para a sociedade de pertença e o adjetivo: "primeira" não significa a mais útil lação até mesmo, é claro, no ensino, quando os desafios são mais importantes
ou a mais prestigiosa e "segunda" (L2) não quer dizer "secundária". Como o que em língua estrangeira e acendem debates em países como os da África do
ambiente da primeira infância em geral está ligado à mãe, a língua primeira Norte ou da África subsaariana - Argélia, Moçambique, Quênia, África do
; frequentemente chamada de materna, apesar de existirem sociedades nas Sul, África francófona (Colóquio da OlF - Organisation Internationale de Ia
quais os contatos com outros membros do grupo são determinantes. Essa de- Francophonic, Librcvillc, 2003) -, países que tinham escolhido ou aos quais
signação tem, então, um valor psicoafetivo e implica um reconhecimento, foram impostas línguas de ensino: agora, eles pretendem dar espaço a seus fala-
urna adesão, logo, uma subjetividade que não facilita seu uso. res nacionais sob novas formas de "parceria" enLrc línguas na educação.
Portanto, será língua segunda para o mesmo indivíduo toda língua que Por fim, ouviremos falar de língua segunda quando se tratar de qualificar
.lc Liver aprendido em seguida, por exemplo, na escola e não mais no meio o estatuto das línguas adotadas por recém-chegados a um meio alófono (estu-
próximo onde ele foi criado. É essa acepção a que é conservada pelos estu- dantes, imigrantes ... ), e essa questão, atualmente tão importante, deverá ser en-
dos sobre a aprendizagem (Klein, 1989). Percebamos que essa oposição língua carada em termos de gestão social do plurilinguismo, como faremos depois.
1>1imcira / língua segunda pode abranger a oposição "vernáculo" / "veicular".
() vcnuiculo é uma língua ou uma variedade, como um dialeto, utilizada no Em resumo, o que vai distinguir uma língua estrangeira é seu caráter de
It'('CSSOdo lar, em casa, ao passo que a língua veicular vai além do quadro de língua aprendida depois da língua primeira e sem que um contexto de prática
"ida de lima comunidade J inguística e responde a uma necessidade social de social cotidiana ou frequente acompanhe sua aprendizagem. Para dar um
(~X(~IIIJlI(),11111 argelillo pode ter em seu "repertório verbal" o berbere como Naturalmente. a tendência inicial do~ pl:dtlgogos 101 considcnu :I 1.1
lillgll.l JlIilllella e vcnuicu]a, o árabe dialetal, o árabe literal e o francês como como uma fonte de erros no momento da apropriação de novos sistemas. Vere-
lillgll:l~ .\l'I~lllIdas. o inglês ou O espanhol, aprendidos no decorrer do ensi- mos que duas noções, a de alvo e a de interferência, vêm apoiar essa posição.
111)médio, como línguas estrangei ras propriamente ditas. Por comodidade, Foram criadas listas para uso dos professores, repertoriando as incorreções ou,
clllt:IIIO'l a partir de agora língua "segunda" ou "estrangeira", salvo menção termo ainda mais culpabilizante e bem instalado em português, os erros mais
C!lIIII':ília. Compreenderemos, evidentemente, que a língua segunda pode ser comuns a cada grupo linguístico (sinófono, anglófono, lusófono, francófono,
li I(!Ict:i l;l 011 a quarta efetivamente aprendidas. arabófono ... ): palavras difíceis de pronunciar, incorreção quanto ao gênero
( ) estatuto social ele uma língua nova e o imaginário a ela associado in- do substantivo ou o tempo verbal, problemas morfossintáticos (inversão e so-
1I1I('lIci;lI11a aprendizagem, mesmo que se trate de um processo excessivamente breposição do verbo em alemão, discurso relatado, uso do artigo) etc. Uma
11HII\«lualizado. Como escreve Uriel Weinreich (1951): "O lugar onde as línguas autoridade em certificação da competência em línguas (Ministério da Edu-
(;1111,1111
em contato não é um lugar geográfico, e sim o indivíduo bilíngue". cação da França, 1995) chegaria a ponto de indicar: "Quanto mais complexa
é a tarefa a realizar, mais o grau de operaeionalidade em língua adquirida é
() quadro de toda aprendizagem de línguas é, primeiramente, o do bilin- elevado e menos perceptíveis são os traços da língua materna".
~lIiSIIIO(Hamcrs, Blanc, 1984; Baker, Prys [ones, 1998). Vários autores insis-
1('111em lima diferença essencial entre as línguas primeira e segunda: enquan- Na realidade, sabemos agora que um contato entre línguas não se resu-
10 ;I 1.1 é a língua mediante a qual se constrói a {unção de representação do me ao encontro de dois sistemas linguísticos, mas que ele desencadeia uma
real, também chamada de função simbólica, a língua aprendida em segunda operação individual complexa (Castellotti, 2001). Esse é o motivo pelo qual o
ponto de vista atual é mais matizado: a construção de um sistema aproximativo
ruvt.mciu (exceto no caso de uma aprendizagem precoce) frequentemente se
linulu a permitir a comunicação. Contudo, sabemos que a aprendizagem de
da língua segunda se faz por intermédio de hipóteses sobre o funcionamento
dessa língua e por um conjunto de processos mentais sofisticados. Concorda-
um.t nova língua está na origem de uma recomposição do mundo e, entre
mos na distinção de processos mais ou menos amplos, uns inscritos em uma
oulrns coisas, de uma reconstrução da imagem que alguém tem de sua língua.
estratégia imediata, outros em uma conduta permanente, alguns visando à
1);11aclvém facilmente o sentimento de que o ensino/aprendizagem de um
aquisição ou à comunicação, automatizados ou passíveis de controle etc.
II()\O sistema exerce um efcito arnpliador dos problemas fonéticos, lexicais,
.\cIlli1lltieos que antes não eram percebidos, E, claramente, essa nova apren- O aprendiz também cria para si uma representação da espeeificidade
di/agem repercute - cada um de nós tem maior ou menor experiência disso das línguas em presença e estabelece uma distância entre elas. O caso elas
sobre toda uma visão do mundo, de como as pessoas funcionam, das ideias línguas próximas, das línguas românicas, por exemplo, é atualmente objeto
c doiScoisas com as quais acreditávamos ter familiaridade. de pesquisas crescentes (Projetos Galatea, Galanet, Eurom4, ações da União
Latina ... ), assim como do papel desempenhado pela imagem de uma língua
;\ abordagem didática contribui para isso: o ensino/aprendizagem de uma
sobre o aprendiz: imagem recebida (a reputação de estrangeiridade linguísti-
lillglla estrangeira parece começar onde termina o da língua primeira, como se
ca) e produzida (o discurso dos aprendizes sobre suas dificuldades).
Ii\ csse ocorrido uma "representação a priori do funcionamento da língua". Final-
IIH'IIIl'. em língua estrangeira, a maneira absolutamente exploratória com que é Digamos, para concluir, que o modo de processamento dos dados por
.Il>clIdado o novo sistema, frequentemente apoiada em metodologias mais indu- parte do aprendiz é uma ação que se passa, simultaneamente, nele e fora
11\01\,permite demonstrar que a noção de língua está sempre em (re)construção dele, um processo intrapsíquico e interacional ao mesmo tempo, típico do
(l'dlo!cl. Porquicr, 1978). A aprendizagem de uma nova língua estrangeira Iam- indivíduo em quem sua gestão é mais ou menos conscientemente determina-
I>{;IIIc. para o cérebro humano, a oportunidade de se desembaraçar das rotinas da (escolha, organização, retenção etc.). Não resta dúvida de que o recurso
~CIII IlIali/ pejorativo - intelectuais e culturais preexistentes. à língua primeira ajuda o aprendiz a estruturar seus dois sistemas e se revela
•.......• . _o' "~. ~ ,.".~"" , '"'11\,,",,, " 11\'\·1 V I II 1\1\1. j\<I.\I;' IINI
\ l'I\t"\lI'~IAII(A "0 I.N~INO I'J

como de natureza capaz de fazer surgirem hipóteses sobre a L2 (Giacobbe, 11l'lll 111eS1110
em uma relação de complernentaridade, se rccon hCCCIIIIOS.dd
1990). É inevitável, porém, que todo o processo só possa ser examinado em .rcordo com R. Galisson, que elas
referência ao sistema da língua primeira.
não visam mais ao mesmo objetivo, porque não operam no mesmo pia 110,;\ dlll.l
tica trabalha com algo de completamente instável e inacabado, a língua l'111VI.l
de construção, e o sujeito aprendiz está no centro de suas preocupações. V('llln~
@ f\ LingLÍstiC00.ddátiw perfeitamente que, de uma disciplina a outra, há um deslocamento do l't'111IOdI'
gravidade: do objeto (a língua) para o sujeito (e do sujeito falante para () Mlj('11
A didática levou muito tempo para se desembaraçar da disciplina de refe- aprendiz, que não são sujeitos que possamos confundir) (Galisson, 1989).
rência primordial que a linguística, sem partilha e durante décadas, constituiu
Fica claro que o objeto a ensinar é exatamente uma língua, c como 'I'
para ela. Examinemos com um exemplo significativo a "visão panorâmica da
lrata do mesmo objeto da descrição linguística, o di data tem tudo a gill d 1:1
didática das línguas estrangeiras" que Robert Galisson propôs na França, ali
com esse trabalho conduzido paralelamente ao seu. Mas então o quc roi kil(
pelo final dos anos 1970:
da contribuição da linguística aplicada, que, para alguns, é a Gata BOlridllt:1

Em grandes linhas, nessa época, Galisson indica que a didática se cons- ra, para outros, a fada madrinha da didática?

trói, de um lado, a partir da metodologia das línguas estrangeiras, de outro, a De fato, a linguística, até há pouco dedicada a tarefas muito i111ccli;II:1
partir da linguística aplicada ao ensino de línguas estrangeiras. A metodologia estabelecida como um pré-requisito para a apresentação da língua (divisa:
é alimentada pela
lexical dos manuais, estudo contrastivo dos sistemas fonéticos, exercícios clc.)
sociologia, pela psicologia, pelas ciências da educação, pela ideologia, pela assume agora outra importância, a partir do momento em que ela se vê "1('<11
política, pela tecnologia da educação, pela pragmática (ou seja, pelo uso da recionada para suas novas orientações ( ... ), completamente atenta ao processo
língua efetivamente feito na enunciação), pela cinésica e pela proxêmica (a
de enunciação, à dimensão sociopsicológica da linguagem" (Galisson, 19HO),
consideração da gestualidade e do espaço físico), pela docimologia (a avaliação
de alunos), pela iconologia (estudo da imagem) etc. Em outros termos, onde seu estatuto epistemológico a faz passar ela pOSI

Quanto à "linguística aplicada ao ensino de línguas estrangeiras", ela é


ção de uma "monocultura" (a linguística, estudo das línguas naturais) à de ('I
ência da linguagem, amplamente aberta a outros domínios, porque seu objeto
irrigada pela fonética, pela gramática, pela lexicologia, pela semântica, pela
estilística etc. a língua, só pode ser concebido nas relações com o indivíduo e a sociedade. I"
a linguística de que o ensino de línguas tem necessidade é, mais que l1UII('i1
o lugar, que ainda é de destaque, concedido à linguística dificilmente instada a escapar das antigas críticas. Ela, sem dúvida, negligenciou 111 li i10,
mascara que passamos, em poucos anos, de uma relação estreita, até mesmo aspectos constitutivos da comunicação: sua dimensão acional (sua alividadc
de subordinação (como se houvesse entre a teoria científica e as práticas de en- efetiva, sua influência), interacional (toda comunicação é diálogo, adaplaçao)
sino uma situação "colonial"), a um esquema muito mais integrativo. O hori- social (por exemplo, como meio de distinção), referencial (ora, a linguística st
zonte se ampliou, uma teoria da língua se transforma em condição necessária, desligou, desde suas origens, do extralinguístico) ou ainda variacional (a I íllgll:1
mas não suficiente, para seu ensino. Chegamos quase a evocar, de passagem, a se negocia e se reconstrói permanentemente na troca) (De Pietro, 1990).
ideia, infelizmente ainda aceita em alguns meios pouco esclarecidos, segundo
Algumas teorias linguísticas de destaque dominaram os últimos qua rCIII:I
a qual bastaria saber uma língua para estar habilitado a ensiná-Ia.
anos: estruturalismo europeu e distribucionalismo americano; funciona I ixn tn
Sem entrar em um debate que vem sendo travado há muitos anos e que de Martinet e de seus alunos; perspectiva enunciativa de Jakobson, de BCI1V('
ainda não dá sinais de ter chegado ao fim, digamos que a didática das línguas niste; gramáticas gerativas com Chomsky; linguística textual, pragmática que
e a linguística não estão mais na mesma estrita dependência. Elas não estão manifestam a linguagem como atividade discursiva etc. (Bronckart, 1985), I"
r--,\O:--:n :x:r"-'!Irl1~Trr?\"I·.
ft""li(.(t"t"C"'fT'~nl\1\i(.f IR'\,(""CT~I\,n,r11It"'I"f~""H""'.~--------------------- ; - ~1·1(II;II;!\I';II,\I"'I."IrISI'I,I.~j,,-JI

em meio a essa profusão que a didática buscou os meios dc sua tríplice ativida- 111'1"(' o sislciuu se opóc ao uso, o cocligo à mensagem, a lillgl1agelll:lo c orn
de de pesquisa, de experimentação, de produção de ferramentas. 1'1111.1111('1110
verbal, as formas às [unções.

As relações entre linguística e didática foram complicadas por vários ÇJllallclo Allen c llarley publicam a obra póstuma de Stcrn, IsslIes aiu!

fatores: o estatuto científico desigual de cada um dos campos (a didática, ocu- ( )/l//ons in [,eJllguage Teaching, na qual "issues" significa, ao mCSII\O tempo.
pada com a pedagogia e com a coleta de "receitas" de aula, encontrava na lin- uvultudos e questões em debate, é outra a visão do campo quc vem :I 11I
guística um incremento de legitimidade), as necessidades dos professores, o (SIeI1I, 1992). Percebe-se, então, claramente, que a descentração COIII relaça«
custo da inovação, a dificuldade da transmissão etc. Depois da lua de mel do c't {i IIgl1 istica está completa.
aplicacionismo, nos anos 1950-1960, os didatas passaram a expressar suas re-
Depois de termos insistido na importância de fatores externos ligadm
servas aos trabalhos de linguística formal, que consideravam muito esotéricos
:1 tomada de decisão e à definição de objetivos de ensino, trata-se agor:l (\('
ou reflexo de uma visão estreita da comunicação. Ao se afastar de uma con-
p,lIl ir da noção de conteúdos para construir a arquitetura de um cnsi 110. As
cepção universalista do aprendiz, a própria didática pensou ter encontrado
escolhas relativas a esses conteúdos abarcam o oral, a gramática, a ,111<111\(,
em uma linguística mais preocupada com o indivíduo, mais antropológica,
luncional (enriquecida pela pragmática, pela análise do diseurso, pela seu \(111
respostas para suas novas indagações. Foi então que se deu um reequilíbrio,
tica, mas também pela etnografia da comunicação e pela sociolinguíslica),'\\
para não falar de uma reabilitação de sua relação [Beacco, Chevalier, in Leh-
utividades comunicativas, a civilização e as formas de educação mais gCI:lI.
mann (org.), 1988; Chis, 1995J.
\ isando à abordagem da língua (aprender a aprender, se autonomizar clc.).
Com efeito, é do conhecimento de todos que uma boa descrição da I':stando dada essa arquitetura, podemos então nos aplicar a tudo aqu ilo '1"(,
língua como sistema, sob o ângulo de seus componentes (fonética, morfo- ajuda o professor a desenvolver estratégias, ou seja, ações intencionais e ele
logia, léxico, sintaxe, semântica), só pode auxiliar o didata. Mas a questão envergadura, em sinergia com aquelas que são desenvolvidas pelo aprendiz.
é saber o que é uma boa descrição. Widdowson (1981) observa que a vali-
Sem dúvida, não existe razão alguma pela qual devamos ficar presos aqui
dade de uma descrição teórica é julgada em relação a um modelo, e uma
a um só modelo, que daria a ver ideal mente os fatores em jogo em uma problc
descrição pedagógica, em relação a sua eficácia, "ou seja, a sua incidência
málica desse tipo. Em todo caso, a evolução é clara: ela se manifesta na cunha
sobre os procedimentos de apresentação da língua em sala de aula". F. pre- gelll de novos termos, na abertura a outras contribuições e na complexificaçao
ciso mesmo distinguir, acrescentou-se, língua empregada na comunicação
do campo. Polaridades outras além do par linguística/metodologia se muni
social, língua descrita como sistema, língua ensinada e língua aprendida.
Icstararn, de onde a ideia reforçada de que a noção de escolha é central em
A coexistência, às vezes difícil, dessas imagens da língua caracteriza a fala
didática. A dinâmica do sistema, a interatividade cada vez mais evidente entre
produzida em sala de aula tendo, certamente, como pano de fundo uma
os fatores vêm, assim, contradizer a concepção de um campo da didática quase
difícil transposição didática, uma passagem do saber erudito ao saber ensi-
sempre percebido como estável, até mesmo estático, por observadores não fa
nado (Chevallard, 1985).
miliarizados com o campo ou indiferentes a ele. Aliás, podemos nos pcrguul.u
H. H. Stern (1983) nos lembra o que é uma visão da língua na linguís- se a didática atual não estaria sofrendo, sobretudo, de um excesso teórico.
tica moderna: de início, uma ausência de juízo sobre a língua e, por cxcm-
Em todas as hipóteses de trabalho, admitiremos que várias abordagens, q\le
plo, sobre o estatuto social do oral e do escrito que são, em alguns casos, tão
se impõem sem exclusividade, deveriam estar relacionadas. Em síntese:
dessemelhantes (como no caso do árabe ou do francês); consequentemente,
a tomada em consideração das variedades sociais e regionais; uma visão es- • o estudo da comunicação em todas as suas componentes, organi/,(l
trutural de um sistema no qual contrastes e oposições estão em ação; uma cionais, linguísticas, antropológicas etc. (cf., acima, nosso modelo
dualidade entre língua e fala, com suas implicações individuais e coletivas, pan-óptico, p. 20), com a vontade de nele instituir referências c de

~ J'L. 01 )IIIAIICA 111' I INLIIAS 1'.SlllANI,LlIClS

estabelecer oposições, logo valores (abordagem contrastiva ou com- logo; uma abordagem mull itliscipliuur. Mas ele também é, lllallifesl,l1l1VllIl',
parativa); o reflexo de uma concepção do sistema no qual, doravantc, os elementos d,lo
• os dados sociolinguísticos (representações e fatores sociais e institu- " impressão de se equilibrar.
cionais que agem sobre a aquisição, a prática, o lugar das línguas res-
pectivas junto a seus falantes),
o que acontece, concretamente, na classe? O professor, proveniente <ll:
lima cultura e de um sistema de formação determinados, ensina uma hngll:l
• os dados da psicologia da linguagem e da psicolinguística (tratamento
quc pode ter um estatuto (segunda ou estrangeira) e um valor de uso difen.'11Il'S,
específico da "exposição" à língua segunda, imagem individual dá
a depender dos aprendizes. Aliás, ela é proposta ou imposta por um podei <I"l'
aquisição, atitude e motivação, construção das regras em língua se-
desencadeia sua política linguística, com programas e meios definidos cxlcmn
gunda, por exemplo);
mente à escola. É, então, nesse campo que os aprendizes, com suas cspccihc
• a instauração de uma interação entre esses diferentes elementos, na
dadcs, terão de construir a própria aquisição. Vamos dar alguns exemplos:
curta duração, mas também na longa duração, algo que ultrapassa em
muito, logo compreenderemos, o que é observável na comunicação, Em um país africano no qual o francês é a língua oficial, o profcssot
tanto em sala de aula quanto exteriormente a ela, do ensino fundamental deve, às vezes, trabalhar em uma língua que 11;10t'
- nem para ele, nem para seus alunos - a língua primeira. Em países d,1
Europa oriental, a abertura das fronteiras provocou uma mudança dc csl;IIl110
~ 6. trn quadro ce rele.rêlloa radical para o russo, até bem pouco tempo obrigatório - melhor dizendo, ill-
A conclusão desse exame geral é, naturalmente, que a didática deve estar dispensável -, provocando uma redução dc sua "circulação" no mercado Ii11
situada no conjunto dos campos de referência, Vários autores trabalharam nesses guístico e uma alteração em seu ensino, inimaginável até bem pouco lCII'I)o
campos, mas vamos mencionar, entre outras, a proposta de H, H, Stem (1983, Acontece com o dispositivo de ensino/aprendizagem de uma língua o mesmo
retomada em Stern, 1992). Três níveis de apreensão serão considerados: que ocorre no jogo de xadrez: muda-se uma peça e tudo se vê alterado.

• o das "fundações": história do ensino de línguas, linguística, socio- Nessas condições, houve quem evocasse aprendizagens que dão bons
logia, sociolinguística c antropologia, psicologia e psicolinguística, resultados sem e até mesmo contra o método e o professor. Em todo caso,
teoria da educação; subscreveremos sem a menor dificuldade a idcia expressa por W. von l lum
• um nível intermediário, o dos conceitos básicos do ensino de línguas boldt, no século XIX, segundo a qual a uma língua se adquire, muilo mais
relativos à língua, à aprendizagem, ao ensino, ao contexto social. Esse do que é aprendida. Com efeito, veremos, em um histórico das práticas dl'
nível associa estreitamente teoria e prática; ensino que examinaremos adiante, que a didática é convidada a manter 11111:1
• um terceiro nível, por fim, o da prática e dos "praticantes" (professo- atitude de modéstia.
res, mas também coordenadores, pessoal administrativo, até mesmo
Mas isso não nos levaria a correr o risco de a didática vir a se transfonn.rr
figuras políticas) abrangc diretamente a metodologia (conteúdos e
em uma panacéia ou de vir a ser diluída nas contribuições das ciências 011
objetivos, estratégias, recursos, avaliação dos resultados) e a organiza-
campos a cujas contribuições ela recorre? O que observamos, na realidade, c
ção (planejamento e administração, em todos os tipos e em todos os
que os postulados ou princípios sobre os quais ela se constrói sempre vêm de
graus de formação).
fora e que ela estabelece intercâmbios com eles. E se é verdade que a traus-
o modelo de Stern, tomado aqui como um exemplo significativo entre ferência de conceitos ou de ferramentas de um campo para outro não se I"
tantos outros, tende a responder a vários critérios: sua global idade; o fato de os sem riscos, vemos perfeitamente, mesmo quc tardiamente, que as coisas C\O
elementos nele incluídos serem interativos; a mul tipl icidade dos fatores em luem por recomposições sucessivas, não obstante os efeitos de circularidaclc.
~.
@ 7. Ensinar0 ap-endel 1:111 um meio social distinlo da escola c que não existem esforços sistcuuili-
~

em mlcncionais para orientar o processo.


É preciso lembrar que uma aquisição é uma modificação da conduta do
A<; diferenças em comparação com uma situação "orientada" são sensíveis:
sujeito, que manifesta a adaptação a uma forma de necessidade. Em termos
pUI exemplo, a tarefa daquele que fala em uma língua estrangeira lhe parcce
bem simples, a diferença entre alguém que não sabe nadar e alguém que ad-
plenamente realizada se ele consegue se fazer entender, pouco importando os
quiriu relativa capacidade de manter-se à tona e de se deslocar na água é que
meios: se um meio linguístico não está assegurado, o problema será contornado
quem sabe nadar não se afoga se for lançado na água. O resultado de uma
()\I evitado pelo falante em estado de insegurança. Em outros termos, o que
aquisição é uma conduta adaptativa mensurável.
importa não é fazer progressos na língua em questão, mas servir-se dela. Nesse
Mas aprender também decorre de uma conduta voluntária e permanen- caso, podemos supor que a atenção às regras de funcionamento do código (c,
te. Uma atitude positiva diante da L2 determina o processo desde a motivação portanto, dos desvios em relação à norma) será mais marginal (Klein, 1989).
inicial, mesmo que a escolha não tenha sido verdadeiramente escolha: é o
Vamos chamar de estratégias de resolução de problema as operações in-
caso de quando quem escolhe é a família do aprendiz ou uma decisão das
lencionais que visam reduzir a distância entre o problema detectado e os meios
autoridades políticas e educativas. A família de um aprendiz, o poder político
ele que o falante não nativo dispõe para enfrentá-Io. Por sinal, essas estratégias
e a sociedade colam nas línguas e nas culturas estrangeiras imagens, repre-
podem levar o falante não nativo a abandonar os objetivos da comunicação,
sentações, desejos. Desenvolvem atitudes diante delas, mas o aprendiz tem
seja calando-se, seja refugiando-se em campos mais a seu alcance. Ele ainda
também um projeto de vida que pertence exclusivamente a ele e uma mo-
pode vir a substituir os meios de L2 por outros não previstos, como o recurso
tivação (Nuttin, 1980). Ele é quem deve descobrir os motivos e os impulsos
a sua própria língua ou à gestualidade. No melhor dos casos, ele se decide a
necessários a seus esforços no espaço que une seu eu ao mundo social.
insistir em suas competências incertas, com as quais continua o intercâmbio
Foi feita uma tentativa de distinguir uma motivação instrumental para ou amplia seu discurso, generalizando suas hipóteses sobre o funcionamenlo
a aprendizagem de uma língua, decorrente de necessidades de tipo relacio- da língua, imaginando analogias entre sua língua e a língua nova etc.
nal, técnico ou profissional, de uma motivação simbólica, por exemplo in-
Tomaremos emprestada de W. Klein uma representação do trabalho
tegrativa: o desejo de fazer parte de uma comunidade pelo domínio de sua
efetuado pelo aprendiz. As quatro tarefas do aprendiz, que dissociamos aqui
língua. Também se distinguiram motivações ligadas à coerção, à ambição de
para efeitos de exposição, seriam as seguintes:
alcançar sucesso, ao gosto de saber e ao prazer. .. Mas não se tem certeza de
que essas coisas possam ser dissociadas. As pesquisas sobre as atitudes (Card- • analisar a língua (segmentar a cadeia sonora em unidades significali-
ner, Lambert, a partir de 1972), sobre as representações, não permitem gene- vas, por exemplo);
ralizar com facilidade, nem levar em consideração em todos esses aspectos • construir o enunciado (combinar a junção de palavras, especialmente
as variações entre indivíduos ou em um mesmo indivíduo, antes, durante e para produzir falas);
depois da aprendizagem. Sabemos ainda que há dispositivos didáticos mais • contextualizar (integrar a mensagem em um contexto interpretado
favoráveis que outros. em função de informações paralelas);
• comparar sua língua com a de seu meio social (estabelecer contrastes,
É uma questão bem complexa saber como um dispositivo de aprendiza-
diferenças).
gem pode contribuir para estabelecer ou permitir alicerçar novas capacidades
ou competências, isto é, regras de funcionamento interiorizadas pelo sujeito. Uma apresentação dessas é interessante. Ela produz a sensação dc que o
No campo das línguas estrangeiras, a aquisição não orientada caracteriza-se aprendiz vai extrair seus meios de uma espécie de centro de recursos, o centro
pelo fato de que ela se produz na comunicação cotidiana - podemos dizer: das aquisições e das competências de que ele dispõe em determinado momcn
~. ",LL." .

to, para elaborar seu próprio sistema de expressão transitória. Tal sistema se apre- inglês, [ala-se de learner variety, em alemão, de Lemervarieliil
1':111 e, em fl,lll-
~

senta, ao mesmo tempo, como específico do aprendiz e revelador do processo cts, há um termo bem complicado, "leto de aprendiz", muito frcqucntcmcn-
de apropriação. Trata-se claramente de um sistema evolutivo, com sua lógica te encontrado na literatura francesa de ensino de línguas (lecte d'a{Jprel7(/Ilt).
própria, que está em constante recomposição, na medida em que o aprendiz Uma vez mais, o conhecimento das especificidades da interlíngua, a alcnçao
avança em suas experiências linguísticas e em função de uma interiorização, dispensada às realizações que seriam classificadas como defeituosas em algu
consciente e inconsciente ao mesmo tempo, das regras da língua segunda. mas pedagogias têm implicações possíveis naquilo que se refere às práticas ele
w. Klein examinou um ponto importante dessa atividade: sala de aula. Todo parceiro na conversação pode atuar como andaime para as
competências de um falante não nativo. Ele pode manifestar sua cooperação,
O aprendiz considera algumas características linguísticas do enunciado como
críticas (do mesmo modo como falamos de momento crítico) e tenta se dedicar sua cumplicidade, sob formas diversas, por exemplo, uma maneira adaptada
a elas, ao mesmo tempo em que deixará outras de lado, seja porque acha que se de falar a um estrangeiro, [oreigner talk ou "xenoleto". O professor está a Ii
trata de problemas que ele já resolveu, seja porque não os percebe. justamente para ajudar a criar esse andaime.
E, sobretudo, o autor inscreve sua observação relativa à aquisição na De todo modo, aquele que fala com um locutor nativo em uma língua
realidade da troca linguística: "O principal fator que torna uma regra crítica
segunda faz um trabalho dobrado: ele concentra duplamente sua atenção
é o fracasso comunicativo" (Klein, 1989).
(fala-se de "bifocalização"), ao mesmo tempo, sobre o desenrolar da comuni
Se o sistema transitório pode parecer errático ou instável, é sem dúvida cação e, em certa medida, sobre o código empregado, que ele deve manter
por ser o resultado de uma codificação imediata, efetuada sob a pressão de sob permanente controle. E se tivéssemos uma ideia exata das condições nas
uma necessidade de comunicação. Contudo, esse sistema apresenta regulari- quais a aquisição se desenvolve melhor, também estaríamos em condições ele
dades cuja construção decorre em parte do sistema fonte, como foi sugerido criar situações didáticas melhores, que tornassem essas condições efetivas.
acima, e também do processamento pessoal que é feito dos dados apreendi-
Partindo dessa ideia, procuramos descrever o que se chama de sequências
dos, de sua retenção e de sua organização em vista de enunciados futuros. O
potencialmente aquisicionais. O desejo de cooperação do nativo e do não nati-
enunciado permite que apareçam interferências, empréstimos momentâneos
vo (aqui, na conversação orientada entre professor e aprendiz), seu acordo em
e involuntários de uma forma do sistema fontc (um anglófono dizendo "fiz
os pratos" em vez de dizer "lavei os pratos", um hispanófono: "inversão" para torno da atividade (sua finalidade metalinguístiea) e do papel de cada um auto
dizer "investimento") ou criação de uma forma mista original. Por exemplo, rizam uma série de operações: para começar, pelo menos, uma produção hesi-
a sobregeneralização da variação verbal em inglês atrai uma conjugação de tante ou incorreta por parte do aprendiz, à qual o professor responde com uma
"to go" a partir de "to call", que pode levar a enunciados como "I goed to the irrupção no discurso do aprendiz; a essa reação "heteroestruturante" (correção,
USA last year", em vez de "I went..." etc., enquanto esse enunciado não for pedido de esclarecimento ou de retificação) sucede-se uma retomada "autocs-
invalidado pelo interlocutor em L2 sob a forma da retomada, da correção ou truturante" (autocorreção, esforço hesitante) do aprendiz, que manifesta assim
da reprovação (surpresa, riso ... ). Sejam as regras interiorizadas legítimas ou uma nova apreensão. Trata-se mesmo de verdadeiros dispositivos de auxílio ;\
não, vemos que o sistema tende a se "fossilizar" e os contatos exolíngues, ao fi- aquisição da língua segunda que os pesquisadores evocam, com "formatos" 1 i
nal, não lhe permitem mais evoluir. Aliás, o fenômeno pode não revelar uma tualizados de interação e de métodos para organizar as trocas linguísticas, C01ll

incapacidade, mas a vontade, consciente ou não, de preservar uma marca paráveis aos que os etnógrafos e os psicólogos tiveram condições de utilizar para
identitária, tal como um sotaque, do qual se pode sentir certo orgulho. descrever as relações entre mãe e filho (De Pietro, Matthey, Py, 1989).

Esse sistema transitório que acabamos de descrever recebeu vários no- A pesquisa também é orientada para várias outras direções: exisLe UIlI

mes: intetlingua (Selinker, 1972), sistema aproximado ali aproximativo etc. continuum entre as aprendizagens em LI e em L2? Podemos descrevê-Ias
\ l'IIIIIIII,.\lilll'A 11111
N~INiI l~)

como similares, até idênticas, às aprendizagens em língua primeira? Pesquisas l ('W)S individual c coletivo de apal içao de meios de comunicaçao. S:I!>('lllo\
anglo-saxônicas mostraram uma identidade entre as apropriações em língua- l.unbóm () quanto, durante muito tempo, foi vinculada ~IS línguas nasccutcs .:
fonte e em língua-alvo (esta última expressão não é exatamente feliz), por
qualificação, meio pejorativa, de baby talk (linguagem infantil).
exemplo, naquilo que se refere à ordem na qual os elementos são adquiridos.
Mas, de início, essas observações incidem sobre pontos limitados (fonemas, Várias questões suscitadas pelos casos dos crioulos parecem ser i11tCIcs
léxico, estrutura da frase), e, sobretudo, nada comprova que, para além das x.mlcs para a pesquisa sobre a aquisição:
produções observadas, os procedimentos subjacentes sejam idênticos e abar-
• o papel dos fatores sócio-históricos no seio dos quais se produz a <:1ia-
quem as mesmas operações cognitivas profundas.
ção ou a reprodução linguística;
Faz alguns anos, uma teoria marcou a pesquisa sobre a aquisição e sus-
• o lugar e o estatuto da língua-alvo;
citou muitas controvérsias. Segundo S. Krashen, o processo de aquisição de
• o papel dos fenômenos de interferência com a língua-fonte;
uma língua segunda é muito semelhante àquele que caracteriza a aquisição
• a articulação entre sistemas lcxicais c sistemas gramaticais no processo.
da primeira língua: devemos pensar que o essencial aqui não é a forma das
produções, mas a busca de uma comunicação "natural" em uma interação Conclusões primárias relatam "obstáculos metodológicos e teóricos (que)
em que a significação tem a primazia. A aprendizagem consciente surge aqui tornam casual e problemática a aproximação entre o processo de aprendizagem
para regular (monitoring) e afinar as produções que são iniciadas e possibili- dc línguas estrangeiras, até mesmo a aquisição da língua primeira, e o da criou
tadas pelas aquisições. Naturalmente, a competência dos falantes geralmente
Iização" (V éronique, 1994). O relacionamento dos fenômenos de crioul iZ<1c;f1o
não é a mesma dos falantes de uma LI, mas Krashen avança a hipótese de
com os de aquisição continua, no momento atual, uma questão aberta.
que é a atuação de um verdadeiro "filtro" afetivo, emocional, que bloqueia as
aquisições em L2. Se esse filtro não existe quando da aquisição da primeira Para concluir, as hipóteses e as pistas de pesquisa que evocamos ofcrc
língua, é porque a comunicação em LI refere-se essencialmente a um meio cem orientações, mas ainda não se sabe ao certo se elas dão aos professores ,IS
ambiente imediato e é facilitada por elementos não verbais importantes; garantias teóricas que eles, errada ou corretamente, reivindicam.
além do mais, a significação aqui é que adquire o primeiro lugar em impor-
tância, e não a forma da mensagem, diferentemente do que acontece em L2, A separação de disciplinas tais como a psicologia, a linguística, as ciên
particularmente em contextos escolares. É daqui que advérn a ideia de que cias da educação, a sociologia etc., ou a setorização da pesquisa e da formação
uma "abordagem natural" da aquisição em L2 seria muito bem-vinda, com elos professores são frequentemente denunciados, em primeiro lugar, pelos
atividades que envolvessem a afetividade e os recursos próprios do aprendiz próprios interessados ... Sem dúvida, os pesquisadores terão de se aproximar
em sua integridade de ser humano. Mas nós receamos que essa proposta tal- elos praticantes da língua se, pelo menos, acreditam que sua atividade tcn ha
vez possa parecer irrealista nos contextos sociais e institucionais que tão bem algum interesse, como é de se imaginar que acreditem.
conhecemos (Véronique, 1994).

Foram feitas outras tentativas de examinar o processo de aquisição à


luz do processo da formação dos pidgins e dos crioulos, que são línguas em
@ B. A cena da comrjcoçóo ddática
formação, sistemas que se originam em situações de intercâmbios comer- Para dar um enquadramento mais completo da cena didática, diversos
ciais (pidgins) ou ligados à colonização e à escravidão (crioulos). Evocamos dispositivos de observação ou inventários dos fatos a observar foram propostos
um termo de Claude Hagege (1985), quando ele evocava os crioulos como pelos pesquisadores (Moskowitz, 1971; Fanselow, 1977; Sinclair e Coullhnrd,
"laboratórios" de línguas em gestação, em uma tentativa de aproximar os pro- 1975; Allen, Frõhlich e Spada, 1984; Germain, 1990 etc.).
• ..
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~ "-TV ,-<,'.1111,\11\" •. \ 1/1.' 1.'<\.\.,\,., 1••11 1\.\ I ".'''H,
~

Daremos uma visão geral de um questionamento que retoma mais ou pcruiiliu,corno já foi dito, falar de estilos de aprendizagem, ou de pct fls de
menos essas grades de observação: nprcndizcs em interação. Por isso, na classe, o dispositivo didático deveria
representar "indiretamente" o que sabemos ela aprendizagem. As duas pro-
• quem é a fonte de interação: professor, aprendiz] es) voluntário(s),
blcmáticas, vinculadas, nos levam a nos perguntar, ao mesmo tempo, o que é
delegado(s), grupo, classe?
"um bom aprendiz" e um "bom professor".
• por que se faz intervenção: para estruturar, solicitar, responder. ..?
• com que meios: o oral, o escrito, o silêncio, um gesto, um esquema? o professor é, inicialmente, aquele a quem cabe a responsabilidade pela
• em CJuemomentos da interação vemos aparecerem esses meios: apre- gestão do grupo, mesmo que o dispositivo atribua primazia à iniciativa e à au-
sentação, avaliação, explicação, comentário ... ? tonomia do aprendiz, como na abordagem comunicativa. D. Nunan (1991)
• quais conteúdos são objeto da intervenção: linguísticos (gramaticais, d,í vários exemplos de maneiras de falar (teacher talk) e de agir em classe. 1':1e
Iilerários ... ), pessoais, sociais, administrativos etc.? analisa o questionamento do professor e constata que um esquema eanônico
continua a ser amplamente dominante:
Mas estaríamos errados se acreditássemos que tudo é quantificável (não
se julga o papel de um participante pelo número e pela duração de suas in- a) solicitação do professor;
tervenções). Vamos tentar dar uma ideia da complexidade e da especificidade b) resposta do aluno;
da cena didática, limitando-nos a alguns pontos. c) reação avaliativa do professor.

De início, da parte do aprendiz, o processo certamente só é observável Poderíamos insistir no fato de que a resposta, em geral, já está pré-cons-
em parte. Trata-se da operacionalização de estratégias voltadas para a apren- truída na mente do professor e que a solicitação que ele faz ao aprendiz visa,
dizagem, e podemos resumir essas estratégias, que R. Oxford (1989) classifica no fundo, reencontrar verdades que ele já detém. Sem ceder ao pessimismo,
da seguinte maneira: Nunan tende a concluir, em concordância com muitos outros pesquisadores,
que as perguntas e até mesmo as discussões assemelham-se, em muitas aulas,
• estratégias diretas: referentes à memória (por exemplo, fazer associa-
a seções de psitacisrno, nas quais se sucedem perguntas e respostas, sem que
ções mentais, esquemas, utilizar gestos ou sensações para melhor gra-
os aprendizes vejam lógica na atividade que lhes é solicitada.
var ou evocar uma lembrança); estratégias cognitivas (manipular ou
transformar a L2, por exemplo, repetir, fazer uma análise contrastiva A nosso ver, essa conclusão deveria ser reafirmada por um questiona
de Ll e L2, deduzir, anotar, sublinhar); estratégias de compensação mento da atividade metalinguística e de seu lugar na aula de língua. Não
(pedir ajuda, recorrer à Ll, evitar, inventar, parafrasear); vamos nos demorar no excesso do discurso praticado em torno da língua e,
• estratégias indiretas: metacognitivas (organizar a própria aprendi- em particular, naquilo que se refere à gramática nas metodologias tradicio
zagem, tentar praticar a L2, autoavaliar-se): afetivas (tentar relaxar, nais. Valeria mais a pena refletir sobre uma redefinição da metalinguagcm
autoencorajar-se, verbalizar as próprias dificuldades); sociais (fazer (ou metalíngua) nos termos em que [akobson (1963) considerava sua função,
perguntas, cooperar nas tarefas, desenvolver a capacidade de compre- "quando o emissor da mensagem busca torná-Ia mais acessível ao decodif
ender os outros, a cultura da L2). cador". É necessário indicar dois casos interessantes: o dos atos reguladores
como "não entendi bem, você poderia repetir?", estranhamente ausentes dos
Desse modo, a atividade do aprendiz parece remeter a seu sistema neu-
manuais (mas não dos métodos ele línguas em geral) e, justamente, () dos
rofisiológico e a suas capacidades cognitivas. Mas ela também envolve seu
exemplos dados pelo professor durante o curso.
sistema de valores e seu desejo de ter um papel social, algo que é 111<111 ifcstado,
entre outras coisas, por suas atitudes, por sua cven tual ('()11('OId:111('inem nego- Quando nos perguntamos, como P. Bange, de que maneira a classe de
ciar seu lugar no grupo e em participar da tarefa. () ('0111'11110dn\;1S variáveis língua é o lugar de aprendizagem por excelência, devemos lembrar que ela
~ 4:.:: 01 )IIIÃIII;.I 1>1 I iNI.\II~ I ~11"" •• í·II(IS 01'11 1(1(1,~I\I(lINI ,\ I'IUII!I! "1111,,1 11111 ~~I"IJ (~)'IJ
~

"permite escapar às dificuldades e aos acasos" e que "assegura a aprcndiza- '1Ii;ld" do curso que ele está seguindo c estabelece um distanciamcnlo, \1111<1

gem a partir de um horário reduzido e de um ritmo restrito". Na atividade 1111('1 prctação, até mesmo um diálogo entre os parceiros da intcração. A gra-
de ensino definida, como já dissemos, como uma facilitação do processo de \ .1,.10em vídco, já utilizada na formação de professores e na preparação dos
aquisição, Bange distingue dois tipos de estratégias de ensino: ("poli islas (técnica do gesto, jogo coletivo ...), nos parece, com toda a reflexão
uulixpcusável, um instrumento muito útil e subempregado .
• estratégias de apoio, na modulação do discurso do professor (análo-
ga a um "parentesco") e em suas respostas às estratégias positivas do
aprendiz; G) 9. Cmüusõo
• estratégias de aperfeiçoamento dos processos de aquisição: uma "ma-
nipulação da comunicação" deve levar o aluno à posição de "candi- A didática não poderia se constituir a partir de praticas observáveis em
dato-aprendiz", dar-lhe os objetivos de comunicação que ele deseja classe, mesmo mediante um modelo elaborado, sem promover um retorno
realizar, incitá-lo a desenvolver estratégias inovadoras. quc a leve daquilo "que acontece" a "como concebê-Io". Sem uma concepção
global dos processos de ensino e de aprendizagem apreendidos em sua dialé-
Consequentemente, constatamos que a classe é um ambiente fortemente
Iica, a didática volta a se encontrar face a face consigo mesma. E então passa
ritualizado, longe de ser um ambiente natural (L. Dabene et alii, 1990). Sua
a correr o risco de se ver reduzida a uma tecnologia, isto é, a um conjunto dc
organização, sua dinâmica, seus "discursos", objeto de numerosas análises,
procedimentos que constituem técnicas que, por sua vez, tomam a forma dc
fazem com que se possa destacar justamente a importância dos papéis respec-
métodos.
tivos e dos esquemas e rotinas postos em ação pelo professor: questionamento,
avaliação, reformulação, apelo a uma centralização prioritária no código etc. A noção de didática deve englobar ainda a construção dos saberes ensi-
Essa ritualização visa conceituar, melhor, dominar o funcionamento do mo- nados, de um lado, e a consideração da interação entre ensino e aprendiza-
delo de comunicação que propusemos acima (I, 1). A tendência interacionis- gem, de outro. O trabalho didático não se resume, pois, a uma transformação
ta, ou seja, aquela que insiste no desenvolvimento dos processos interpessoais de objetos (uma língua utilizada em língua ensinada, posteriormente em
em sala de aula, abriu caminho para dispositivos didáticos e pedagógicos in- língua aprendida, um ato de ensino transformado em ato de aprendizagem),
teressantes, visando criar um clima propício ao trabalho, visando desenvolver nem em um conhecimento cumulativo, mas implica uma transformação dos
o trabalho em grupo etc. (C. Kramsch, 1991). próprios agentes: o aprendiz, o professor também, em uma trama cultural,
social, histórica.
Evidentemente, o clássico triângulo didático (aprendiz, professor, con-
Consequentemente, uma definição minimalista da didática como con-
teúdos) é incapaz de dar conta da realidade do ensino das línguas em geral e
junto de meios postos a serviço da aprendizagem nos parece, definitivamente,
do funcionamento interativo da classe em particular. Esse triângulo precisa
muito limitada. Por isso, atualmente não são apenas os instrumentos didáticos
estar inscrito em um conjunto de processos cognitivos, sociais, institucionais
que precisamos interrogar, mas as próprias metodologias subjacentes, ou seja,
e ideológicos, que são a trama da aprendizagem. Aqui concordamos com
os princípios diretores desses procedimentos refletidos, apoiados em informa-
Allwright e Bailey (1991), quando eles animam os professores a se tornarem
ções e intercâmbios, em suma, em todo um mundo exterior.
observadores de suas classes, a associar a sua prática uma reflexão constante
sobre sua própria prática (exploratory teaching).

A esse respeito, devemos ressaltar o interesse de técnicas atualmente


bastante conhecidas, tais como o diário de bordo (ou de aprcndizagem) e
a gravação em vídeo. O diário de bordo exige do aprendi/o 1111"1 observação
-@
W ~ @
r.:\·
~

-~s n'10toddogias
Capítulo 11

@ 1. Anaise/eJ.ctxxOÇÕü oe n'lonuas eJ d0 rrétooos


prcsentarernos aqui uma pesquisa quc fizemos durante muitos
anos a partir da anál ise de manuais c métodos de ensino. O cor/Jus,
que constituía uma vasta amoslragem vinda ele épocas c ele lugares
os mais diversos, foi reunido por estudantes, franceses ou estrangei-
ros, quc se dedicam, no total, a mais de 80 línguas elo mundo in-
teiro. Várias grades de análise que nós utilizamos para estudar esse
corbus (Mackey, 1972; Bcrtolctti c Dahlel, 1984; Dochot, 19H9;
Ccrmain, 1993 etc.) mereceriam ser descritas, mas queremos dar aqui apenas
uma idcia do trabalho empreendido e de alguns ele seus resultados.

Tomemos, então, como exemplo uma classihcação metodologica que


propõe cinco grades de análises parciais, com descrição faclual e apreciação
que se pode fazer sobre o material de cada uma delas:

• apresentação material da ferramenta (ficha sinalética, material com


plcmentar, prefácio ou livro do professor, estrutura elo manual);
• suportes e documentos (essencialmente: tipo, apresentação, origem,
apreciação da variedade e da adequação aos objetivos);
• conteúdos linguísticos (léxico, fonética, gramática, exercícios sob ()
ângulo da operação requerida [conteúdo] e elo acompanhamento pc
dagógico):
• conteúdos nocionais/temáticos (temas, noções e funções linguÍstieils
estudadas, que caracterizam social e culturalmente o mundo represell
tado no manual, com suas relações humanas, seus estereótipos ctc.):
I--'II~---'\lfi I~N!"i
,,,,------------------ \~ \11.1111"" t" .IAS (:J 'lI

• testes e avaliação (testes, esquemas ou guias docimologicos), • dl,dogo em ~illl;l(;Ú(), CSIIIlIIlI:lS c cxcrcu-ios, expressões 01,,1 e CS('lllil il
Jlilllil de documentos, cstrulurução das aquisições, rCllliliz;l<;ilo 11\1<:,
Notemos, para começar, que, apesar de suas evidentes qualidades, esse
lcxlos literários (espanhol, Madrid).
tipo de análise representa um risco. Visando à exaustividade, levamos o usuá-
rio a pensar que o melhor método é aquele que integra o maior número Concluímos, inicialmente, por uma grande diversidade das ah()rclllg(,I/,~
possível dos elementos enumerados: sua vocação (determinada) para todos .ulut.ulnx, com variáveis que são, às vezes, o país de origem c, menos Ircqucu
os públicos, por exemplo, para atender aos interesses comerciais; ou então 111I1('llIe do que se imagina, a data de surgimento do método.
a presença de imagens em grande número, como histórias em quadrinhos,
vinhetas, fotos, desenhos, montagens, propagandas etc.; ou ainda textos diver- Contudo, observamos que o procedimento de exposição dos conteúdos

sificados, contos, romances, peças teatrais, poemas, canções etc. I 1IIIIilo frequentemente mais dedutivo (regra, depois aplicações) cio que in
"1111\0 (chegar a uma regra a partir de um número n de casos encontrados)
Na realidade, a questão fundamental é a da coerência pedagógica, isto
é, da compatibilidade e, melhor ainda, da convergência das ferramentas, téc- o quc confere unidade a uma aula pode ser tanto um tema ("Casloll
nicas e procedimentos postos em ação por um mesmo método, que tem de I ,ollgcl em Paris ... Nossa sala de leitura ... Uma família de mineradorcs'') do
estar, ele próprio, em coerência com uma didática de conjunto. <J1Il'IIlll ponto gramatical ("lição 15: o pretérito imperfeito"), às vezes \1111"
uiodalização ("Eu queria uma caneta ...") ou qualquer outro elemento aglllli
Um corpus ampliado deveria permitir estabelecer algumas constantes
u.ulor, com um título funcionando apenas como pretexto. Outras vezes aiu
nos próprios títulos das ferramentas. Isso vai muito além do interesse episó-
d.r, nenhuma unidade é proposta explicitamente, e a aula se intitula "I.ir •.•.
ro
dico e leva a avaliar a distância entre título e conteúdo real da ferramenta, a
I ~", ficando a cargo do aprendiz perceber sua coerência.
dar conta das tendências e da pressão comercial, a olhar de perto os títulos
metafóricos, a demarcar uma história do título motivador, do tipo O grego A LI é uma ajuda preciosa para a gramática (e evidentemente para :I
sem dificuldade, Francês fácil etc. ü.ulução), mas o "tudo em L2" é frequente, talvez sob o efeito de pressões

Sobretudo, se tomarmos como referência o desenrolar de uma aula, ob- editoriais. Poucos métodos escapam da metalinguagem em geral, o que im

temos esquemas metodológicos como: plica uma aprendizagem específica ("verbo", "sujeito" etc.), cujos problemas
veremos adiante.
• texto, tradução, vocabulário, gramática, exercícios de compreensão,
de tradução ou de gramática (holandês); Alguns métodos fazem um desvio por uma língua veicular como o in-
• diálogo, tradução, gramática e exercícios, suplemento cultural, voca- glês: a abordagem contrastiva, com exortações e exercícios específicos dirigi
bulário e exercícios (indonésio}; dos a esse ou àquele grupo linguístico, é muito rara.
• pergunta de gramática e regras, vocabulário, exercícios (autoaprendi-
Uma pcrgunta ainda sem resposta continua a ser a da língua ensinada
zagem, suaíli);
(podemos dizer quc determinada língua deve ser sempre ensinada de dele:
• texto com desenhos, vocabulário, exercícios a partir do texto, outro
minada maneira?). Pressente-se também a importância das tradições pcdagó
texto, gramática, exercícios de pronúncia, de manipulação, de tradu-
gicas e das representações mais ou menos conscientes (algumas línguas suo
ção, escrita, civilização (chinês, Beijing);
chamadas de sem gramática por aqueles que as falam ... ).
• diálogo, vocabulário por classes de palavras, leitura e escrita de sinogra-
mas, gramática com explicação e exercícios estruturais (chinês, Paris); Por outro lado, o procedimento é raramente justificado pelos autores, de
• tabela gramatical, exercícios, diálogo com explicações c exercícios, modo que as escolhas feitas não remetem abertamente a dados caractcrfsticos
canção, escrita, leitura, tabela recapituladora do léxico com tradução da aprendizagem como os objetivos, um modo de trabalho em auloapicmh-
(francês, Berlim), agem ou o ritmo do curso. Essa ausência pode ser considerada como inlcu-
,.-~
I I-Ifnn 1l"!J',-PF,1 rl"llnni'\:"'f l';lIrnr'\"Nr.r:TR'i'\""If- Ü nr"RI-'~1 "-nTrNI1Y,---------------------
- 1 •• ...--11I0-. ,..-" " "_'1 , "TI~"" .....,...,..,,-~.--rI'I'"1I

cional, permitindo o livre uso ou, ao contrário, permitindo ser eIIC,II<ldacorno 1"111'1 nem sempre vem responder (I necessidades gerais d<lso
dit'idildes. 1':1<.:
uma carência de concepção. Veremos que uma tendência contemporânea faz 1.lld,ulv, mas ~IS necessidades ele grupos ou de indivíduos usuários de línglllls
da "modularidade" dos materiais seu ponto forte: o aprendiz (ou o professor, dll\ l'slr:lIlgeiros, tanto para ir ao encontro deles (como Marco Paio na China)
em seu lugar) é convidado a selecionar em uma espécie de caixa de ferra- 1111110 porque o estrangeiro se impõe e é preciso aprender sua língua. Passa
mentas o que é tido como necessário para construir um percurso próprio de \1. então, a querer colaborar com ele ou cornbatê-lo, como escritor ou como
atividades (é o caso de um método de inglês, de 1994, que apresenta um eixo nld:ldo (é o que diz Kateb Yacine: "o poeta como um boxeador").
comum, três itinerários possíveis e "autosserviços" gramaticais, culturais ete.).
Mesmo com o risco de cair em uma simplificação excessiva, dizemos
Enfim, as condições nas quais os materiais são utilizados correspondem '111t'as melodologias tradicional, direta, áudio-oral, audiovisual, comunicativa
muito pouco às previsões originais: ausência de suporte oral como DVDS, du- dllllli liam o panorama. Mas os dispositivos didáticos não apresentam a succs-
ração do curso, possibilidade real de reutilização, ambiente social e cultural vividadc cronológica que poderíamos imaginar. Temos continuidade, recuo,
do aprendiz, motivação, utilização paralela de outros meios etc. Seria muita ('\;llI1e do que é feito em outros lugares - tanto para inspirar-se como, ao
ingenuidade nossa julgar práticas pedagógicas em seu conjunto apenas pelo rontrário, para rejeitá-lo - e adaptações a novos ambientes ideológicos e
exame dos materiais em circulação. tccnológicos. A mudança em didática não se decreta automaticamente, por
111(.!io de portarias ministeriais, prefácios de manuais ou cursos de formação c
Para iluminar um pouco essa diversidade, até mesmo confusão de pro-
t'stt'ígios para professores.
cedimentos, e em meio a opções tão contrastantes, precisamos esboçar, agora,
um quadro das metodologias que vemos em ação, inscritas nas ferramentas. Os termos metodologia e abordagem, até mesmo procedimento, encon-
E uma classificação dessas não pode ser feita sem uma volta ao passado. lrnm-sc e, às vezes, de maneira indiferenciada. Eles manifestam uma evo-
lução em busca de mais abertura, não tanto da didática, mas da ideia que
fazemos dela.
~ 2. PrérCOlldiyãeJS rxro em quadro P'Jnaân~co
das n'l0toddogias
A metodologia de ensino de línguas estrangeiras mergulha suas raízes
~ 3. As n'leJtoddogiaschanladas tradidmds
na história das necessidades da comunicação social. Não há dúvida de que Elas existem desde a Antiguidade e perduram até nossos dias. Elas estão
o mercador fenício, o hoplita grego levado pelas expedições de Alexandre fundadas em uma relação pedagógica forte: o papel do professor é central. O
Magno à extremidade do mundo conhecido, o cavaleiro árabe que chegava professor constitui um modelo de competência linguística que deve ser imi-
até Gibraltar fazem nascer as formas do multilinguismo e de sua propagação. tado. Saber uma língua é mais ou menos conhecer o sistema tanto quanto o
Por um lado, trata-se de misturas de línguas, de crioulos como o galo-romano professor. Mas o verdadeiro modelo continua a ser aquele que é encarnado
(podemos dizer que o francês é um crioulo bem-sucedido). Por outro, trata-se pelos bons autores. O sistema linguístico é, de fato, aquele que é extraído dos
do estabelecimento de meios de aprendizagem restritos quando uma língua textos literários por imitação. E, em linhas gerais, para uma língua como o
se impõe sobre outra, ou até mesmo quando provoca seu desaparecimento (o latim, o modelo é Cícero, não o Baixo Império; para o alemão, é Thornas
árabe é ensinado, o berbere não, ou é pouco ensinado, COIllOSt' couslnta na Mann, e não Heinrich Bõll. Como a abordagem visa levar ao domínio do có-
África do Norte e no Saara). digo, são o vocabulário e a gramática que representam os objetivos imediatos:
listas de palavras, com eventuais agrupamentos ternáticos, regras gramaticais
Entendamos bem, mesmo sendo frcqucntcuu-ute d('~( 1110I' .rvulindo prescritivas que insistem em uma norma ("Diga isso - não diga aquilo"). Mais
em relação com a história da educação, o cnxino dI' IIII~II,I.~1!11.lItI,1
muitas ou menos, do século XVII ao século XIX, na Europa, o estudo do latim cl,b
l'ILlIIU ~L\I\lI"'1 r

l liu grandc pcdugogo tcheco, Comêuio, pOI volta de 1(»)O, abre algu
sico, com sua gramática c sua retórica, constitui a pedra de toque de todas as
111,1\pistas proll1issoms. 1':lc vê qual é, para a aprendizagem, a importância
mclodologias de ensino de línguas em meio institueional. Uma filiação direta
d,l pVlccpção sensível paralelamente àquilo que é trazido pelas capacidadcs
entre didáticas de línguas mortas e de línguas vivas estrangeiras é perceptível
COIl1a tcorização que se faz delas, em meados do século XIX, sobretudo no 111Il'lccluais,ele esboça uma temática motivadora para o aprendiz, pensa em
u-corrcr à imagem como um recurso didático. Contudo, mesmo depois dele,
mundo germânico e anglo-saxônico, sob a classificação de método gramática-
tradução. Os objetivos fundamentais insistem em fazer conhecer uma língua ,dgllllS continuarão a insistir na validade de um modo de ensino por vezes
cscri ta de cultura e de ampliação intelectual, e os conteúdos de civilização pl'lccbido como absurdo e já ultrapassado.
estão estreitamente vinculados a eles. A presença da "bela língua" frequen- Em meados do século XIX, na Inglaterra, Prendergast insiste no interes-
temente segue emparelhada com as metodologias tradicionais, quando não Sl' de memorizar "rotinas", frases básicas r.eutilizáveis em situações originais.
se trata simplesmente de línguas de alta tradição: o pali dos textos budistas,
o sânscrito no qual são redigidos os grandes livros do hinduísmo (Vedas, epo- Na França, Claude Marcel faz um paralelo entre a língua da criança e
peias), o latim clássico, o grego em sua variedade alta, Dado que o escrito " língua ensinada, querendo "seguir, passo a passo, a marcha da natureza",
detém essa posição, é bastante natural que as línguas chamadas de mortas corno se o termo "método natural", que de vez em quando seduzirá a pedago-
dependam dessas metodologias de ensino. gia, pudesse andar sozinho. François Gouin (A arte de ensinar e de estudar as
línguas, 1880) tenta entender os mecanismos da atividade cognitiva, lutando
A abordagem é preferencialmente analítica e as ferramentas privilegia-
pela primazia do oral, convicto de que a aprendizagem de uma língua será
das serão os manuais ou antologias de textos, até mesmo obras na íntegra,
melhor se nos servirmos dela para realizar sequêneias ou "séries" de ações
a gramática e o dicionário bilíngue. O procedimento didático é, em linhas
gerais, o seguinte: um texto literário, seguido de expl icações de vocabulário e coerentes entre si.
de grarnática, geralmente com recurso à língua fonte do aprendiz; tradução, Finalmente, um foneticista de Marburgo, Wilhelm Vietbr, convoca, no
exercícios e finalmente o tema, que constitui uma retomada da língua apren- [im do século, a mudar o ensino de línguas do começo ao fim, A instituição
dida e que, às vezes, dá espaço a um reinvestimento, quando se tenta redigir escolar está longe de manifestar-se como disponível a aceitar de bom grado
algo sobre um assunto próximo, e esse é o "tema de imitação". essas propostas (C. Cerrnain, 1993).
Aqui, estamos tratando de uma pedagogia do modelo, na qual leitura,
versão, tema são feitos sob a atenta direção do professor. Em nenhuma hi-
pótese uma concepção dessas permite o desenvolvimento de uma real com-
@ 4. A abordagell) dreJta
petência de comunicação, mesmo escrita, que aliás, salvo exceção (o latim A abordagem direta vai tentar resolver algumas das questões sobre as
como língua veicular da religião católica), não constitui uma finalidade da quais o ensino patinava em vão ou que tentava ignorar. Quase contemporâ-
aprendizagem. Os méritos da abordagem tradicional são evidentes em um nea da abordagem que acabamos de evocar, ela a precede de pouco tempo,
contexto adequado, no qual o recurso à metalinguagem, em língua primeira, ousaríamos dizer, porque resulta da necessidade imediata: se em tal situa-
claro, parece desejável. ção, tal palavra parece provocar tal reação (como um "bom dia" suscita seu
equivalente), se tal enunciado parece corresponder a tal necessidade, então
Mas as evoluções que balizam o ensino de línguas inscrevemse 110curso
ensinemos essa palavra, esse enunciado em um ambiente que nos pareça
da história. Desse modo, o latim vê seu estatuto c sua illlpOllflll('i" revirados,
análogo, sem passar nem pela traclução, nem pela explicação lexical ou gra-
línguas como o francês ou o alemão são dotados de fOl1l1<lS t'sl.l\vis, logo mais
matical. Em suma, tentemos "fazer falar a língua e não falar da língua". f: isso
bem utilizáveis, e assumem novas funções; a cscolu 11111eI:IVIIISVIIconjunto e
o que faz o jovem aristocrata romano que aprende o grego de seu escravo; o
a representação da criança, especialmente do ,qHl'I\(li/, ouh o 1.111tO.
·'llIIIÀIII:A 111IINI.IIA~ I•.SIIlANCI'lllAS O l'II'IlIII·. t\IAIUINIi/.

que talvez faça o mercador gaulês, que, por sua vez, ensina a seu filho como • método inlcuogativo (jogo pl'rgllllla-resposta);
tratar com o centurião romano. • método intuitivo (pelo qual se tenta adivinhar para entender);
• método imi Iativo (o aprendiz aprende imitando O professor; o II;tha-
As metodologias de tipo direto dão prioridade ao oral, com uma escuta
1110 de produção de fonemas é um bom exemplo);
dos enunciados sem o auxílio do escrito e uma grande atenção à boa pronún-
• método repetitivo (a retenção da informação se faz por repetição. pOI
cia. Não há enunciados, apenas significantes, inscritos em uma situação ima-
impregnação, até a "assimilação".
ginável. A preocupação metalinguística, enfim, existe, mas apenas em um
segundo tempo: é da observação refletida das recorrências que são extraídas A metodologia direta alcançou grande êxito particularmente na EutOp;1 ('
as regras de funcionamento da língua. IIOSI':stados Unidos, em fins do século XIX e princípios do século XX, CIII 11111
111\11Ido que conhece o trem e as grandes linhas marítimas. É sem dúvida por C~
Sem dúvida, há a necessidade de recorrer a subsídios para mostrar 1.11ligada às viagens que sua figura emblemátiea continua a ser Maxirnilinn Ikl
diretamente do que se está tratando, livros, todos os objetos e acessórios 1111. e seus centros de línguas, mesmo que ele não utilizasse o termo metodologia
úteis à compreensão. l~ preciso pensar em dispositivos que façam um amplo direta. Essa metodologia penetra também a instituição escolar e a realidade dils
uso do oral com um vocabulário voluntariamente limitado. A gestualidade, classes, pelo menos quando os textos oficiais que marcam, entre outras, a i11\111
I
a mímica, a verbalização por parte do professor serão os adjuvantes dessa \;;ú) pública francesa são aplicados: professores frequentemente tradicionalistas l'
didática. O aprendiz é levado a repetir, a assimilar pouco a pouco elementos (,;lIcntes de formação nem sempre serão seus melhores propagandistas.
linguísticos em situação, de modo a fazê-lo pensar, assim que possível, na
Ela provocou avanços por seus pressupostos, por sua abordagem glo
língua segunda.
hnlisla da aprendizagem e por seu caráter dinâmico. Ela também pode lei
Mas essa metodologia - vejamos que ela é, em certos aspectos, com- \.1lvado aprendizes - e professores - da letargia muito frequentemen te C()I1~
plementar à primeira - logo esbarra em seus próprios limites. Se ela permite Lida antes. Mas, por fim, a falta de solidez de suas bases teóricas começo li
trabalhar facilmente temas como o fumo na classe e introduzir palavras como .t \ ir à tona: no fundo, que divisão linguística? que progressão? que escrito?
cigarro, fumar, acender etc., o que se vai fazer para trabalhar conceitos como C0l110 imaginar um nível "avançado"? Seu aspecto artificial (a identificação
intoxicação ou risco cardiovascular? CO!11necessidades de comunicação não é algo automático), a representação
sistemática dos fatos linguístieos, cujos princípios de organização não eram
De fato, a metodologia direta encontra a própria coerência em sua orga-
claros, tudo isso convocava a uma maior reflexão.
nização interna. Vamos expor uma configuração dessa metodologia segundo
o estudo mais completo de que dispomos (Puren, 1988). O núcleo duro é É quando novas concepções vêm dar ao aprendiz um papel mais impor
constituído pelos elementos seguintes, tomados de empréstimo às abordagens lunlc, particularmente no ambiente escolar, e redefinir os elementos a cnsi
ou métodos: uar com prioridade sobre o oral. Essa metodologia ativa, rica em diversidade,
.ncontra sua origem em vários lugares na primeira metade do século XX:
• diretos: sem recurso à tradução;
• orais: ou, sobretudo, áudio-ora is (o papel da percepção é tão deter- a) Na Suíça, na Alemanha, são feitas tentativas para tirar benefício ela
minante quanto o da audição) e, pelo menos de início, a escrita é didática nova, preservando na medida máxima do possível as aquisições (par
descartada; ticularmente, o caso da gramática).
• ativos: aprende-se a falar falando c agindo. b) Na França, com aquele que é chamado de "método ativo", dcscn
A presença desses elementos leva a acionar ollllm tlll'Iodm (a palavra tem volve-se toda uma série de composições entre as metodologias tradiciona I c
() sentido de conjunto de procedimentos l' 1t,(,lli(';I~olg,III1/.;l<lm (' 01 icntados): direta. Paralelamente à extensão do sistema nacional de ensino médio, CII
~ .~.

conlramos a marca desse processo ao longo das instruções publicadas para o


métodos britânicos dessa época, constata-se que duas noções assu-
N()~
ensino oficial de línguas estrangeiras, principalmente entre 1908 e 1969, o que
nu-m uma importância comparável à da prioridade do oral: a noção de "situa-
demonstra a persistência da ação pública e a perenidade da necessidade.
\.10" (que dá significação à forma linguística, ao manifestar uma intenção do
Falamos então de metodologia eclética ou mista, de síntese ou de concilia- Ld,l11tC)e a noção de estrutura iinguistica (que leva a um modelo reprodutívcl
ção e vemos, mais uma vez, nas reformas empreendidas, ruptura e continuida- t' ussimilável por parte do aprendiz). As atividades de escuta e de repetição,
de: o texto e os exercíeios escritos retomam seu lugar ao lado do oral, e não em ()~ exercícios de manipulação ou drills, inscrevem-se em uma concepção da
seguida dele. O vocabulário pode ser ensinado com a ajuda da língua primei- .iprcndizagem na qual a impressão deixada pelo conteúdo encontrado deve
ra e uma aprendizagem "racional" da gramática ocupa o lugar da abordagem poder permitir o reemprego livre posterior. E acontecerá que o ensino do
"mecânica", isto é, repetitiva, dos métodos diretos. Mas, em uma expressão fá- inglês como língua estrangeira passará no século XX por uma considerável
cil, insistimos no fato de que "a aula de língua viva deve ser viva", que os alunos expansão, e essa metodologia será o vetor "oficial" de sua difusão durante
estão ali para tomar a palavra, para dialogar, analisar e comentar. décadas, quando outros horizontes didáticos já terão sido abertos.
As condições nas quais se dá essa evolução mostram uma vontade de in- Nos Estados Unidos, a Segunda Guerra Mundial suscita, com efeito,
tegrar o ensino de línguas estrangeiras ao funcionamento geral da educação,
um considerável esforço no ensino de línguas, tanto quanto em outros cam-
tanto naquilo que diz respeito à didática como às finalidades, simultanea-
pos da educação e da pesquisa. Cinquenta e cinco universidades associam-se
mente instrumentais e culturais, da aprendizagem; certo pragmatismo diante
naquilo que toma o nome de Amly Sbecialized Training Program (ASTP),
do fracasso dos métodos diretos e também, segundo nós, muito simplesmente
para formar o pessoal na utilização de línguas estrangeiras por ocasião das
diante de sua inadequação à problemática escolar.
operações militares externas, na Ásia, no Pacífico e, sobretudo, na Europa.

Resumidamente, tudo parece estar para ser inventado em matéria de


~ f'. A at:x::rdage,rnáudio-ad didática. Recorre-se a linguistas como Bloomfield, especialista em línguas
amerfndias. Coletâneas de textos são organizadas às pressas com a ajuda de
A abordagem oral (oral approach) ainda é chamada de situationallan-
informantes que continuarão a trabalhar em seguida com o professor e os
guage teaching. Ela tem origem em diversos trabalhos de linguística aplicada,
que visam dar bases mais científicas a um ensino de línguas centrado no oral estudantes, dez horas por dia, seis dias por semana, durante dois ou três perío-
c na situacionalização dos conteúdos por ocasião da aprendizagem. Trata-se dos de seis semanas ...
de, ao mesmo tempo, selecionar elementos linguísticos, lexicais por exemplo O sucesso aparente desse método, baseado na oral idade e em intensa
(Palmer e West, 1936), e de examinar em que contextos podemos fazê-los exposição à língua, dá, no pós-guerra, ideias a uma América doravante aberta
aparecer: encontrar princípios de organização dos conteúdos e dos meios de para o mundo e segura de seu poder. Ela ensina o inglês - ou o anglo-amcri-
fazê-Ios praticar. Em outros termos, é preciso conceber uma seleção, uma
cano - em todas as partes, tanto no estrangeiro como dentro de suas fronteiras
graelação, um dispositivo ele apresentação.
a seus imigrantes, e também sabe aprender outras línguas, às vezes com ur-
Richards e Rodgers (1986) resumem a metodologia que resultará dessas gência, segundo a marcha da história contemporânea.
premissas, entre 1930 e 1960, insistindo na prioridade concedida ao oral, no
Parece que a contribuição da linguístíca aplicada ao ensino de línguas
uso exclusivo ela língua alvo em classe, no fato de que os novos elementos
se manifesta primeiramente pelo interesse em uma abordagem diferencial ou
introduzidos serem sempre introduzidos em situação. O lugar do vocabulário
contrastiva. Toma-se consciência de que os erros observados entre os aprendizes
c ela gramática não é eleixado ao acaso, leitura e escrita intervêm, tão logo os
podem provir de diferenças entre as línguas primeira e segunda, logo, de transfe-
meios linguísticos para tanto estejam assegurados.
rências erradas tanto na codificação quanto na decodificação. Quanto ao mais,
() Illéloelo ;íllelio-oral alllcricano (audiofinguaf method) está solidamente funda-
mcntado em duas bases, linguística cstrutural e psicologia comportamental. Sem dúvida, as condições de opcracionalização, C0111O Arrny Speciali-
1"(1 Tlailling Prograll1, tinham sido excepcionais. Contudo, é preciso evitar
a) Primeiramente uma linguística estrutural, na qual o valor de um termo /I li/OS de valor precipitados. A metodologia áudio-oral marcou profundarnen-
se define por oposição aos outros termos do sistema (Saussure, 1916). Essa lin- 1(;.1\ mctodologias que se seguem, mesmo que elas frequentemente se defen-
guística de tipo "distribucional" (Bloomfield, Harris, Fries) põe em evidência
d:llll do método áudio-oral.
os dois eixos da língua, o eixo paradigmático, o da distribuição dos elementos
no cnunciado, e o eixo sintagmático, o eixo da transformação.

O enunciado "ela é linda" pode ser substituído por "você é linda", depois, (j 6. As n'leJtoddogias audo\Jisuds
"você é rico", "você é rico?" etc. Procedimentos diferentes, que, aliás, não eram
Os trabalhos que haviam levado os didatas americanos e britânicos a
lotalmente novos, "mesas" ou "caixas", permitem uma apresentação, depois uma
lima abordagem áudio-oral, situacional, encontram seu correspondente na
seleção dos elementos que a didática requererá. Em outros termos, uma descrição
I':uropa do pós-guerra. No plano científico, o terreno agora está muito mais
ela língua está na origem de um dispositivo de apropriação regular dessa língua.
bem preparado para uma evolução das práticas de ensino. Aliás, as Iecnolo-
b) Em seguida, uma teoria comportamcntal tomada de empréstimo à gias de reprodução da imagem e do som (gravador, filme e cor...) chegaram a
psicologia e, particularmente, ao modelo behaviorista (Skinner, 1957), que urn nívcl de confiabilidade e de custo que permite analisar a possibilidade de
j;í mencionamos. O esquema estímulo/resposta/reforço tem com objetivo a sua entrada em sala de aula. A partir de então, parccc quase estabelecido que
reaparição de um comportamento adquirido e doravante automatizado. os métodos audiovisuais (MAV), elaborados entre 1950 e 1970, foram o resul-
lado de duas correntes de pesquisa que não se confundem, uma nos Estados
Essa metodologia se caracteriza por uma abordagem contrastiva e uma prio-
Unidos, outra na Europa, particularmente na França.
ridade reservada ao oral, Com a ajuda do gravador e, logo depois, do laboratório
c/c língua, exercícios estruturais intensivos e alheios a toela situação real, um voca- a) Para caracterizar um método como audiovisual não basta falar de
bllléírio cuidadosamente restrito às necessidades imediatas da aula. Ela é coeren. associação entre o oral e a imagem. Nesse sentido, muitas das ferramentas
te, mas vê insurgirem-se contra si críticas, a partir ele finais dos anos 1950: nas quais intervêm subsídios visuais como o csquema, o mapa, a tabela, a
\ inheta ... poderiam ser também repcrtoriados há muito tempo. Será qualifi-
• primciramente, as objeções daquelcs que vão ser chamados de "rnen- cado de método audiovisual aquele que, não se limitando apenas a associar a
talistas" e que, como Chomsky, recusam-se a ver no funcionamento imagcm e o som para fins didáticos, una-os estreitamente, de modo que é em
humano uma simples sequência causal, insistindo na criatividade ili- lomo delisa associação que se constroem as atividades. Alguns métodos audio-
mitada da pessoa humana dotada de linguagcm. A influência dessas visuais vão buscar suas bases teóricas na linguística estrutural c na psicologia
objeções será crescente, assim como as dos "cognitivistas", que logo bchaviorista. Os conteúdos linguísticos estruturados, postos em uma relação
dcmonstrarão a real complexidade das operações em jogo no proces- adequada para fazer aparecer seu valor, são apresentados segundo certa oro-
so de aquisição e do desenvolvimcnto linguístico.
gressão. Essa Ilação remete a LIma organização dos elementos reservados para
• Mas também a rejeição por parte dos próprios aprcndizcs, exaustos de ser integrados ao programa de trabalho pelo professor ou pelo criador do mé-
exercícios tediosos, pouco motivadores c apartados da realidade. Po-
todo: não se ensina qualquer coisa em qualquer ordem.
demos concordar Com a idcia segundo a qua], no método aúdio-oral,
"a superposição perfeita entre o nível da teoria c o dos materiais C .. ) b) Mas retomemos a descrição da língua. Sc trabalhos lexicológicos
provocou um empobrecimento radical das problemáticas tomadas britânicos tinham dado origem a um basic English, ele "concepção lógica
em consideração e das praticas de ensino" (Puren, 1994). e univcrsalista" (P. Rivenc), do lado francês, um elemento que também foi
detcrrninante para o estabelecimento de métodos audiovisuais terá sido o sur-
• gimento do [rançais [ondamenial (1959): uma coletânea lexical e gramatical,
1111.1 <Iv IlIlgIIH é constituída de diferenlcs
I. \,II>('lldo que os ventos da moda impulsionam
m01llenlos ou fases de dura,[ro ViII10'
fortcmcnlc lerminologia ...
estabelecida com base na frequência de aparição, na divisão em um corpus
oral gravado e na disponibilidade (a importância para um tema em particu- () desenvolvimento da aula pode ser analisado e suas fases são jusliGCil
lar) de formas básicas do francês. corpus se limitava ao oral e, no "nível 1",
O d,l\ 1:111 sua naturcza e em sua organização: em sua natureza, porque o cxa me
incluía 1.445 palavras, sendo 1.176 lexemas e 269 termos gramaticais. Os 1\ IIlslta o quanto é difícil, às vezes até inconcebível, ignorar essa ou aquela
mais frequentes eram, para fixar as ideias e em ordem decrescente: ser; ter; de; [,,~I' (por exemplo, reutilizar um elemento que não foi memorizado); em sua
eu; ele(s). Uma segunda lista veio logo depois com cerca de 1.800 palavras su- . "IV,'II\il'.ação, quer dizer, em seu lugar ou em sua maneira de se encadcar na
plementares e destinava-se a constituir o francês fundamental de nível dois.
eqlll'\1cia de operações.
Os trabalhos conduzidos conjuntamente, em finais dos 1950 na Fran- Mas como a justificação dessa estruturação continua a ser o cuidado
ça, com P. Rivenc no Centre de Recherche et d'Étude pour Ia Diffusion du 11\111uma eficácia máxima segundo as condições determinadas de aprendiza
Français (CREDIF), e em Zagreb, na então Iugoslávia, atual Croácia, pela ',1'111,ela é perfeitamente discutível, sem dúvida alguma. Ela estará sujeita a
equipe de P. Guberina, tiveram como resultado a elaboração de uma meto- IIHlclificações, sobretudo na última geração dos métodos audiovisuais. CO\1-
dologia chamada estruturo-global-audiovisual, cujos fundamentos são: IlIdo, não nos parece que essa organização tenha sido alguma vez realmenle
pvllmbada por um ou outro desses métodos. Observamos, no máximo, va
• uma teoria linguística explicitamente estrutural (inspirada na linguís-
",1,:10, fracionamento, deslocamento, transcrição em atividades cuja funda
tica da fala de C. Bally, e não no sentido de Saussure ou dos linguistas
Illl'lllação não é, em última instância e quanto ao essencial, questionada.
americanos) para os conteúdos e a progressão;
• uma clara primazia reservada ao oral (como o demonstra o francês I<:mgeral, observamos uma sequência do tipo: apresentação, explicação,
fundamental); Ivpetição, memorização e correção, exploração, transposição.
• uma forte integração dos meios audiovisuais;
• Apresentação do conteúdo novo, sob uma forma viva, em uma situa-
• uma teoria da aprendizagem fundada em uma "estruturação móvel
ção de comunicação e com suportes variados em que texto, imagcm
dos estímulos para o aperfeiçoamento" (que alguns entenderão como
exercícios behavioristas); e som se encontram associados.
• uma concepção global da comunicação aberta in fme para a prática • Explicação, termo que indica claramente que o papel determinanlc é
social. o do professor, cujo trabalho visa de fato facilitar o que será o acesso
ao sentido ou ao entendimento. Esse entendimento é, inicialmente,
c) Examinemos como, com toda a sua diversidade, as metodologias global, depois vai se tornando cada vez mais analítico. Trata-se de
audiovisuais se traduzem nas ferramentas que geralmente são chamadas de determinar o que acontece com o auxílio de índices: mobilização do
"métodos". "Situações" criadas a partir de todas as peças dão ocasião de en- conhecimento que se tem dos personagens, de seu papel, evocação
contrar nelas os elementos linguísticos apresentados. Essas situações giram do que é possível ou plausível, variação das situações e dos conlexlos,
em torno de um tema e, em geral, de uma historieta, fixada em um filme ou
paráfrase e, claro, o papel da imagem ...
em uma história em quadrinhos, associada a uma gravação: "É esse o trem
para Orléans, não é? A que horas ele parte?" Os contextos dessa situação Na dimensão do oral, uma hipótese clássica é que o material sonoro - il

visualizada são tidos como suficientemente motivadores para facilitar as dife- cadeia falada que ouvimos - é percebido por meio daquilo que se designa

rentes operações propostas ao aprendiz. como um verdadeiro crivo (onoI6gico. Os sons, ou sobretudo os fonemas da
língua, são recebidos e processados em função dos costumes sensoriais illi
Desenhada no decorrer dos anos e das tendências como capítulo, tema,
ciais. Pensemos nos tons do vietnamita ou do chinês, nos quais a variação ak
módulo de ensino didático, dossiê e, sobretudo, como "unidade didática", a
O I 'I r 1(1(1· f\,IAllIINI",
\'1I\II,IIHI\/I_I'~tI \', \:J VI
'AJ (')1 ),111,11;.\ III~ 1 INt·.I'.\~I.SII(\N(;I\IItA~
~

In O sentido da palavra (o termo chinês yu, scgundo o tom, pode ser peixe ou () enunciado é, então, suscetível de ser apreendido em sua complexida-

líllglla clc.). Em uma primeira abordagem, a divisão do enunciado torna-se de I', para começar, pode ser segmentado. Para dar um contraexemplo, é o

difícil, alé mesmo impossível. Para um brasileiro, por exemplo, ship e sheep 11111'
pode fazer uma criança que pergunta o que é blado (e explica: se tem no
muitas vezes se confundem. t:1I1/0, quarto, então tem no blado). Está claro que, isso decorre da pronún-
I)()

I i;1 "nu bladu", "nu quartu" ... ). É o que acontece com a palavra de origem
As diferentes categorias gramaticais suscitam dificuldades de língua para u.ihc "alaúde" (aIJ1aud), quando antepomos a essas palavras um artigo re-
Iíllgua. Por exemplo, em russo, um imperativo perfectivo é marca de polidez, .lnndante: o alaúde. São, portanto, a observação e a automatização, para não
um imperfectivo registra a rudeza de uma ordem. Frequentemente invoca- I.II"r da tomada de consciência ou conceitualização dos fatos encontrados,
1110S a riqueza lexical de tal língua, que dispõe de nuances para marcar a cor que vão gerar uma competência, uma regra da qual o aprendiz se apropriará,
elas árvores, da neve ou ... da cor de um vinho, o que às vezes leva a dizer que
110 sentido estrito do termo.
há coisas impossíveis de serem traduzidas. Existem séries de derivação lexical
incompletas. A extensão do pronome é posta em causa: "tu" vale para o mas-
_ Repetição e memorização com correção fonética. O trabalho consiste
t'111 fixar, depois em reter, em formas aceitáveis desde o ponto de vista da
culino e para o feminino (anta/anti); "nós" pode
em português, não em árabe
norma - de onde a correção -, os elementos apresentados e explicados,
incluir o ouvinte: (eu + tu + ele[s]), ou excluí-Ia (eu + ele[s]), como em taga-
de modo que eles possam ser evocados, ou seja, de modo que possam retor-
log (Filipinas); conhecemos a sutileza do jogo entre tutear e vosear nas línguas
nar para uma utilização efetiva. Distinguiremos entre competência passiva e
ela Europa. Poderíamos multiplicar os exemplos que causam problema para o
ativa de um elemento: seu reconhecimento, sua decodificação no momento
falante não nativo: a marca do verbo (que não é conjugado em chinês), a de-
da escuta não autorizam forçosamente sua utilização por ocasião de uma
clinação do substantivo, a ausência de distinção substantivo /verbo (crioulos,
produção pessoal.
taitiano), a ordem das palavras na frase: a ordem sujeito-verba-objeto (sov)
representa 39% das línguas, a ordem sujeito-abjeto-verbo (sov) representa Estamos falando aqui de uma abordagem universalista, na qual não se
36%, a ordem verbo-sujeita-objeto (vso) representa 15% e a ordem verbo- trata de exercícios baseados em uma descrição contrastiva das línguas. Mas
-objeto-sujeito (vos), 5% (dentre as quais o malgaxe). rapidamente muitos métodos contextualizados, isto é, adaptados a esse ou
àquele grupo linguístico, vão se liberar dessa restrição.
Em seguida, o entendimento será mais fino. A divisão do material sonoro
do enunciado leva a uma série de hipóteses sobre a comunicação, em função do A repetição se mantém como um dos meios de alcançar a fixação, por meio
intercâmbio entre os interlocutores. O procedimento é essencialmente intuiti- dc procedimentos diversificados: aprendizagem de cor, individual, em grupo, na
vo, e a explicação destaca variações fonéticas, morfológicas, lexicais, sintáticas sala de aula ou em casa, com o auxílio do gravador, do laboratório de línguas,
que geram a significação, ou seja, a tomada de sentido em um meio particular. autônoma ou não, por meio de dramatização ou do jogo de papéis etc. Vemos
que se podem combinar diversas possibilidades de repetição e de correção. Algu-
Vimos que diversos procedimentos ajudam a alcançar uma primeira
mas delas (exceto aquelas da corrente estruturo-global-audiovisual, que recorre
significação. Eles são diretos: a imagem situacional ou de transcodificação
ao método verbo-tonal, privilegiando a audição global e os contextos "aperfei-
(um ponto de exclamação marca surpresa), o gesto, o relacionamento com o
çoadores") terão mais ou menos como teoria de referência a automatização dos
ambiente local do curso. Eles podem ser indiretos também: a paráfrase ou a
comportamentos, tomada de empréstimo à psicologia behaviorista.
definição, o relacionamento do elemento novo com elementos conhecidos,
contrários ou idênticos. Em geral, a tradução é excluída da metodologia au- _ Exploração que visa à apropriação dos elementos novos por meio de
diovisual pura, considerando-se que o sistema fonte do aprendiz - por razões sua sistematização, de sua manipulação e de sua reutilização em situações
de aprendizagem - está eliminado do campo do ensino. mais ou menos próximas das situações da lição. Inscrever um elemento em
,(!)

um sistema é, por exemplo, fixar um paradigma, como uma conjugação nas • ;1 concessão de UIll lugar de maior destaque ao escrito, mesmo quc a
difercntes pessoas, uma declinação, um microssistema (em português: jomal- metodologia audiovisual tenha alardeado uma reputação de intransi-
-jomais, final-finais), um modo de marcação do gênero dos substantivos etc. gência na prioridade concedida ao oral;
A manipulação vai ser feita por meio de exercícios intensivos e variados: • um acesso a uma fala mais próxima da realidade social do que nos
enunciados estereotipados das primeiras lições. Esse acesso será facili-
• repetição de elementos simples, com eventual expansão (ele come, ele tado pelo uso daquilo que, mais tarde, será chamado de documentos
come, ele come pão); autênticos, ou "materiais sociais" (Galisson), isto é, documentos que
• substituição (ele brinca com seu irmão, ele brinca com
ou correlação inicialmente não teriam objetivos didáticos (imagens c textos: mapa,
sua irmã, nós brincamos com ... ); formulários, fotos, quadros, peças publicitárias ... );
• transformação (olhe os pássaros, olhe-os).
• uma maior autonomia reservada ao aprendiz e a sua CIi<llivid.uk pv\\(),d,
Essas operações sistemáticas podem incidir sobre o léxico (do substan- • um questionamento dos objetivos e dos procedi 11l<.'1I1m dt· "PICIHIII.,I
tivo ao verbo e vice-versa), sobre a morfologia (conjugar no passado), sobre a gem, que desloca o centro de gravidade do método: dv~t'loI \e P:I"";II',
sintaxe (reescrita em estilo indireto, resumo, narração transformada em diálo- cada vez mais, de uma competência linguística Píll" 11111,1
t;11I11luj,'\,1
go) etc. Elas deram lugar a uma abundante literatura prescritiva: os exercícios cia - a palavra está dita - comunicativa.
são técnicas, eles devem ser graduados, dosados, simples e adaptados, moti-
O que é notável, com efeito, é uma evolução elos I1ll'10t!O\ ,111.1111\ I ill:lí'lll
vados, ativos, construídos a partir de uma análise linguística, progressivos,
partir dos anos 1970, no sentido daquilo que acabamos ele 111< lu .11''1,,-",1,, 11/11 1 11 1

naturais, centrados sobre um mesmo tema, curtos, variados, rápidos ...


nível 2. A língua se torna mais variada, mais rica: ela COITl'\POIUk IIlt'l Ii", fi,!, Ii I"
- Transposição ou reutilização cada vez mais livre, em situações ori- que se pode ouvir realmente na sociedade e passa a lcv.u l'1I1t 11111"fi~ Iq!i',11
ginais, surgidas frequentemente dos eventos fortuitos da classe e consistindo específicos de alguns socioletos ou variedades regionais. COIII .I 111(\11lil I1
em jogos de língua. Alguns prefácios de métodos falam de "criação e recria- lielade, tenelemos a desenvolver preferentemente as possil>iIHl.ul,·, .I•..1'i ill\( Lli
ção". É possível, enfim, que uma avaliação seja efetuada ao final da unidade mente das aquisições, podendo falar de "dessistemaiizaçào" (1\11\1 I, II}N I1 I
didática, mas se observa, de fato, que ela pode ser facultativa ou que sua pe- designar o processo pelo qual queremos levar a uma tnlmll HIU íllllllll'!ll
riodicidade varia, com controles intermediários ou, ao contrário, situados ao que parece caminhar por si mesma em um processo de apll'lIdl Ih'l li
término de várias unidades.
Uma parte da evolução visa cornpatibilizar alguns pllllt 'I 1111'i d,,~ il!
d) Fica clara a necessidade de distinguir uma "metodologia de elabora- dos aueliovisuais com os contextos escolares. Mas, na prática, ,1\ 1I,IIP,lt'lt'tíl 1.1
ção", a dos criadores, e outra, de "aplicação", que é efetivamente induzida ocorridas em uma verdadeira comunicação social são elifí(TI\ l'~I,i' I'
pelas práticas de ensino. A observação demonstra que há distância entre uma incide sobre os objetivos e sobre a teoria da aprendizagem SltI'I,III'itl
e outra (Porquier, 1974). Não há dúvida de que tenham surgido mal-enten- coerência dos objetivos está longe de ser assegurada. Por outro l.ul'I, II I( ill
didos desde o in ício das metodologias audiovisuais, tanto a respeito dos fins zação cultural só muito raramente manifestará (e sempre 111\1110'"111.1,1li I[ 11

como a respeito dos meios que seriam próprios delas. Logo ficou claro que te) a h istória da época e as transformações sociais.
o desenvolvimento descrito acima foi adaptado ao nível dos iniciantes, e se
observa no nível mais avançado, geralmente chamado de nível 2:

• certa dissociação entre a imagem e os outros elementos na prática de


7, Ccnüusão
sala de aula, ou um menor rigor na integração dos suportes (imagem/ Se for preciso fazer um balanço, diremos que as necessidades do t II~IIIII
gravador etc.); de línguas também evoluíram. Outra doutrina já começou a se C()II\'tlllil
@
em torno da abordagem comunicativa. Mas hojc estão caducas as propostas ~)-@
didáticas que acabamos de esboçar em grandes traços e sem mencionar as
discussões bizantinas da reconstrução "posterior"? Há quem duvide que a
metodologia audiovisual se ressinta mais do peso do material do que do fato
ObCrdag~(l"
WI',uni()()ti"JO
de ser o resultado de um procedimento em última instância muito ernpírico,
situado entre uma teoria linguística herdada da abordagem áudio-oral e a
nova tecnologia da imagem e do som gravado. Puren (1994) pôde ressaltar
o quanto a evolução das metodologias audiovisuais no contexto escolar do
Capítulo 111
qual já falamos acima debilitou a coerência inicial. A metodologia audio-
visual interroga nossas práticas e ainda está em ação nas metodologias mais
recentes. Não seríamos ingênuos a ponto de achar que as tecnologias recentes
brotaram do nada. A presença do "visual", por exemplo, convém particular-
mente a alguns aprendizes, e um ensino completamente "auditivo" se priva
absurdamente dos meios de alcançar algum sucesso, como confirma a psico-
pedagogia moderna. lugar que a abordagem comunicativa conquistou na
Por fim, o desenvolvimento da aula audiovisual descrito acima (Besse, paisagem do ensino de línguas estrangeiras nos leva a
1975) não remete a um esquema anterior a ela, que também lhc sobreviveu dedicar um capítulo específico a ela, mesmo que, em
e apresenta alguns traços que são identificáveis em todo procedimento de seguida, sejamos levados a relativizar sua importância.
ensino? A mudança didática oscila entre ruptura e continuidade, mas é ne- Começaremos nossa apresentação daquela que chama-
cessário admitir que "cada metodologia é um produto não biodegradável CJue mos de abordagem nocional-funcional e/ou comunicativa
semprc deixa suas marcas" (Galisson, 1980). por alguns pontos da história.

@ 1. As aigeAls
Concordamos em dizer que a emergência de um corpo da doutrina
comunicativa, se é que podemos falar assim, procede de uma demanda ins-
titucional e política europeia datada do início dos anos 1970. Os intercâm-
bios, em forte incremento com a construção progressiva daquilo que hoje é
a Comunidade Européia, parecem ter criado a necessidade de um ensino
de línguas à altura das novas necessidades. É a análise dessas necessidades e
a determinação dos elementos linguísticos correspondentes que o Conselho
da Europa se dedica a promover. Em 1973, são publicados em Estrasburgo os
Sistemas de aprendizagem das línguas vivas pelos adultos (Trim, Richterich,
Van Ek e Wilkins), e pouco depois o Threshold Level, programa comunicati-
vo de nível mínimo definido para o inglês segundo diretrizes europeias (Van
I<:k, 1975). Vemos, digamos ele passagem, o quanto a política curopcia lerá IlIiciallllenle, que língua ensinar? Um "nível mínimo", por exemplo,
"-"
desempenhado um papel de destaque na história contemporânea do ensino ,clll\llIlli "um conjunto de enunciados [ ... ] que permitam realizar tal ato de
de línguas, ao menos no continente europeu, c o quanto as orientações atuais l.d,1 vnl tal situação dada", "a partir do qual cada um (poderá) operar suas
(com o CECRL, como veremos adiante) são o fruto de uma visão constante. cv()llltls em função de seus próprios objetivos, das coerções e do contexto es-
1"llflco". E, apesar de algumas diferenças ou matizes entre os teóricos, é efeti-
A análise das necessidades procede da heterogencidade dos públicos \ .uncule a partir de "noções" e de "funções" que vai ser definido e organizado,
que se tinha em vista nesse momento c da clareza de que seria preciso cons- 11,1 operacionalização de um "ato ele fala", o material da língua ensinada.
truir ferramentas, sem dúvida construídas a partir de modelos unitários, mas
Uma noção é uma categoria de apreensão ou, melhor, de decupagem do
adaptáveis: por exemplo, em função do contexto (escolar/não escolar, crian-
11'''1. I':videntemente, ela é variável segundo os grupos humanos para os quais
ça/adulto), do grupo linguístico de origem etc.
(I lamanho, a rapidez, a frequência, a localização, a forma ou a quantidade não
A identificação das necessidades linguístieas é, nessa época, efetuada \,10 concebidos do mesmo modo. Uma noção se traduz, então, diferentemente
por questionários (Chancerel, Richterich, 1977), e esse modo ele coleta de II.lSvárias línguas: classificadores, gênero, número, flexão do substantivo etc.
dados, que ineide sobre áreas de uso - onde, quando, como, a quem falar () interesse de uma noção está simultaneamente ligado a sua significação c a
- e sobre a natureza dos intercâmbios que se tornarão possíveis, não avança seu papel na enunciado, isto é, nas condições efetivas da comunicação.
sem dificuldade.
Uma função é "uma operação que a linguagem realiza e permite real i-
Em seguida, os didatas terão questões muito numerosas e diferentes para lar por sua operacionalização em uma práxis relacional com os outros e com
resolver: como disponibil izar dispositivos didáticos e pedagógicos real istas em o mundo" (Galisson, Coste, 1976). O que define, então, uma abordagem na-
face da urgência da formação para categorias tão diferentes, turistas e viajan- cional-funcional é que, em seu ponto de partida, encontramos uma descrição
tes, trabalhadores migrantes e suas farníl ias, especial istas e profissionais em das "funções sociais desempenhadas pelos atos de fala e por seu conteúdo
seus países, pré-adoleseentes inseridos no sistema escolar, adolescentes e jo- conceitual" (Trim). A função é, ela mesma, analisada e integrada no desenro-
vens adultos; como levar em conta a variação individual, a personalidade dos lar do evento de fala (speech event).
aprendizes, suas motivações; como reavaliar as necessidades no decorrer da A noção de ato de fala veio à luz a partir dos trabalhos de filosofia da lin-
aprendizagem e construir percursos adequados ao maior número possível. guagem de Austin (1962) e de Searle (1969). A partir de então, a linguagem
é inicialmente percebida como um meio de agir sobre o real, e as formas lin-
gUÍsticas só assumem sentido em normas partilhadas. Um bom exemplo será
@ 2.0igindidadeJ dos in\Jootários dado pelo exame dos valores de um enunciado como "A porta!" e as outras
Mas a originalidade da nova abordagem deve muito aos conteúdos e aos "maneiras de dizer" que poderiam substituí-lo para exprimir a mesma injun-
inventários nos quais os conteúdos foram recenseados: Notional Syllabuses ção (E. Roulet). Nessa visão, chamada de "pragmática" linguÍstica, os usos de
(Wilkins, 1973), Niveau-seuil (Coste e colaboradores, 1976), Way-stage (Van uma palavra encontram funções diferentes em diferentes usos que ela assumi-
Ek, Alexander, 1977). De fato, constatamos que a seleção efetuada pelos lin- rá segundo a intenção do cnunciador. "Ato de fala" designará, segundo esses
guistas da equipe de Trim não remete mais a categorias como as da gramática trabalhos, a unidade mínima da conversação: um evento de comunicação é
ou as do vocabulário, mas a divisões conceituais provenientes da sociolinguís- claramente complexo, constituído de transações, de trocas, de sequências, de
tica, da etnografia, ou até mesmo da etnometodologia, para a qual a lingua- atos enfim (Jupp, 1978) "que os aprendizes terão de realizar em certas situa-
gem comum expressa a realidade social (A. Coulon, 1987), campos aos quais ções, diante de certos interlocutores e a propósito de determinados objetos
os especialistas consultados na época se referiam. ou noções" (Adaptation d'um niveau-seuil pour des contexts scolaires, 1979).
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Por exemplo, no restaurante, somos levados a fazer o pedido, propor, aceitar, t1lldll,t"cl () sislcI11<Ilillgll,~I't"O, l~ preciso tnuibcm sabe: IIldi/.a 10 CI\I 11111<.;.10
recusar, exprimir nossa opinião etc. .\11l oulcvlo social".

Um objetivo [uncional de aprendizagem descreve em termos de capa- Naluralmcnte, essa análise deve ser aprimorada, porque existem várias
cidade o resultado de uma aprendizagem (aqui, as capacidades linguísticas "11.lhilidades" no ato de comunicar (Boyer et alu, 1990):
esperadas). Consequentemente, ele deverá responder à intenção enunciativa • componentes linguísticas (que devemos estender, evidenlelllcnte, ao
daquele que fala, operada por meio dos atos de fala. É, então, nesse ir e vir
paralinguístico: gestualidade etc.);
do ato de fala à análise das necessidades e aos inventários dos atos, noções e • componentes discursivas (relativas a mensagens organizadas c oricn-
gramática que é preciso ver a tarefa teórico-prática do didata.
íadas por um projeto);
Isso nos leva a evocar o exemplo do léxico. Sem simplificar em excesso, • componentes referenciais (isto é, relacionadas com uma cxpcriêuciu
digamos que o aprendiz geralmente trabalhe a partir de listas de palavras que "científica" do mundo);
ele tem de memorizar. O reagrupamento dessas palavras por temas e em uma • componentes socioculturais (regras sociais e normas da intcraçao. 1111
apresentação adequada constituíra um progresso. A partir disso, passou-se a mor [Moirand, 1982; Boyer et alii, 1990)).
uma abordagem mais integrativa e dinâmica dos conteúdos semânticos (no-
Mas os problemas surgem quando pensamos em "didatizar" a 110<';<10
de
ções, funções) sempre inscritos no jogo das atividades discursivas. Isso não
competência comunicativa para poder cnsinar: muitas das estratégias COIIIlI-
significa que a perspectiva "atomista" da enumeração das noções tenha de-
nieativas decorrem do individual ou do instantâneo. Elas não são Iacilmcntv
saparecido, mas o caminho está aberlo para propostas inovadoras que visem
[onnalizávcis, nem reprodutíveis. A partir de que momento uma regra socio
fazer refletir e classificar, mais que acumular.
cultural tem estabilidade suficiente para que se possa identificá-Ia c para que
Apesar de todas as suas imperfeições ou das dificuldades que eles susci- se possa integrá-Ia a uma lista de propostas?
tam, inventários e análise das necessidades linguísticas abrem perspectivas
Não obstante toda a sua flexibilidade, os limites da metodologia comu
consideráveis para uma renovação pedagógica. Mesmo assim, eles não cons-
tituem um modelo de referência fechado, seu grande mérito é priorizar a nicativa, por sua vez, serão todos postos em questão.
criatividade e a invcntividade do aprendiz em uma prática social.

Q) 4. A!gun')os~nhosce faça
Q) 3. PriaidadeJ$ Finalmente, propomos ver na abordagem comunicativa quatro gralldc\

Onde é que se dá a inversão do ponto de vista? É que, doravante, a orientações (Debyser, 1986):
prioridade passa a ser dada à aquisição dc uma competência de comunicação, • uma "retomada do sentido", com uma "gramálica nocional, grallwll
na qual as normas de uso se distinguem radicalmente das normas do sistema ea das noções, das ideias e da organização do sentido" e avanços \I\(\i\
linguístico (a "gramática"). A expressão "competência de comunicação" é
Aexíveis;
algo como uma nova forma de resposta à pergunta: "saber" uma língua quer • uma "pedagogia menos repetitiva", com menos exercícios [onnai« (;111
dizer o quê? proveito "de exercícios de coml.lnicação real ou simulada muito mais illo
terativos", porque "é comunicando que aprendemos a nos cOll1ullit";"".
Para retomar uma distinção clássica, existem normas gramaticais e nor- . .

• a "centralização no aprendiz", quando o aluno é "o agente principal dl>


mas de uso (Dell Hymes, 1972; Bachmann et alii, 1981), e doravante saber
sua aprendizagem" e "o sujeito ativo e comprometido da COlllllllica<.;;IO" >

uma língua é saber se comunicar conhecendo a regra do joe.o: "Não basta


'11II

• "aspectos sociais e pragmáticos da comunicação" inovadores, dado


que não são os saberes, mas o saber fazer que é diretamente tomado
o aprendizé posto na situação dc scr o agente autônomo de sua apl<.!1l
como "objetivo da aula". cll/.ilgcm. Falamos, então, de "conscientização", de um "despertar da atenção
Il.IIiI a língua" (Hawkins, 1984). A expressão pessoal e a "experiência", para
Há, pelo menos nas concepções, uma forte articulação dessas compo- nlomar uma palavra que estava na moda nquela época, vão encontrar lugar
nentes da situação de ensino/aprendizagem: a língua e os conteúdos cultu- vm situações que tendem a adotar um sentido social aceitável: representação
rais são tomados em uma perspectiva de comunicação social, as tarefas e os de jogos de papéis em um quadro frequentemente humorístico, simulações
modos de relação entre os participantes são redefinidos tendo como pano de (IIIC visam à resolução de um problema etc.
fundo uma teoria da aprendizagem na qual o sujeito reemerge, em ruptura
com o esquema bchaviorista. o funcionamento das redes de comunicação na classe e a dinâmica do
gtubo estão inscritos no discurso do comunicativo sobre si mesmo. Os prefã-
Vemos então qual foi a contribuição positiva da abordagem comunica- .ios dos manuais chegam até mesmo a falar de "democracia", de "conivên-
tiva para a didática de nosso tempo. É claro que a reflexão não parou por aí: cia", de "vida cooperativa permanente". Pelo menos, tem-se a aceitação do
desde o início dos anos 1980, vêm sendo publicados artigos e livros de títu- discurso do outro, das especificidades e variedades da fala circulante (inter-
los significativos como por exemplo: Polêmica em didática (Besse, Galisson, Iíngua, variedades regionais ou específicas de determinado meio social etc.).
1980) ou Reduzir velocidade, obras (Beacco, 1970).
Tem-se ainda a aceitação do bem-fundado da comunicação na classe, e é
Muitos didatas imediatamente se concentraram em apontar o dedo para por isso que os termos "contrato" e "negociação" são tão recorrentes entre os
as evidentes dificuldades com que se chocava a tendência da abordagem co- didatas da abordagem comunicativa.
municativa, e compatibilizar as ambições do "comunicacional" com os con- As tarefas e as atividades estão vinculadas à aquisição de um conteúdo
textos escolares não era a mais fácil das tarefas.
nocional/funcional imediatamente reutilizável, para as quatro habilidades
básicas, e o desenvolvimento das habilidades e do saber ser toma a dianteira
dos saberes. Em tal contexto, as ferramentas e os documentos são qualifica-
~ 8. Ap-el1del ern un'lO abadoge.rn (jcXnunicati\lO dos de autênticos.
Apoiada em teorias de referência tomadas de empréstimo às ciências hu-
Esses documentos, artigos de jornais, esquemas, fotos de publicidade,
manas, a didática faz da busca da autenticidade uma de suas palavras-chave.
histórias em quadrinhos etc. são frequentemente percebidos como mais moti-
Na classe, as finalidades da aprendizagem são explicitadas, objetivos comu-
vadores, mais capazes de fazer nascer a expressão pessoal e a autonomia. Eles
nicativos são claramente estabelecidos e figuram frequentemente em uma
também estão mais próximos do uso linguístico real, sendo, portanto capazes
tabela do manual posta à disposição do aprendiz ("Vejam o que vocês apren-
derão a fazer nessa unidade ... "), de suscitar conhecimentos e reflexão no aprendiz sobre as condições sociais c
culturais de sua produção (Bérard, 1991).
A determinação das necessidades linguísticas dirige a definição de uma
Diante disso, o papel do professor só poderia estar profundamente mo
progressão nocional-funcional. Por vezes, ela tentará, e com uma felicidade
dificado. Não há dúvida de que ele ainda continua a ser a referência lingllís
sem igual, conciliar o procedimento linguístico, fundado em uma classifica-
tica, aquele que corrige com moderação e avalia os desempenhos, em lllll
ção dos elementos, com o da urgência comunicativa, no qual formas com-
momento ou noutro. Mas ele tem perfeita consciência do "paradigma geral",
plexas podem ser prioritárias. Por exemplo, em português, a decodificação da
do pano de fundo de seu ensino: uma teoria linguística fundada na COl1llli li
expressão "vou indo", com suas diversas entonações e seus valores pragmáti-
cos, é um caso interessante. cação e uma teoria da aprendizagem baseada na diferença e na autonomia.
Ele define, organiza e faz aceitar, graças a suas intervenções, as tarcfus t' ()
rr,,"'i\ ssrt
1.'·11'7<11"1\ frf TlI'j I r•••~.01\,,- I';~ n~,,~n"'--'1('\"- U rr~ Irr"·I\~I'\"RTI"NIl"'}'" (!)

modo de funcionamento. Ele instaura um clima de trabalho e permanece 11111 ocasião do estabelecimento de uma noção, cxigência de fluência 11<1fala
à escuta do grupo-classe, dos grupos por ocasião das atividades autônomas, 11\rcmcntc cxercida. Allwright e Bailcy (1991) chcgam a ver como um objetivo
e dos aprendizes que têm seus próprios estilos e seus próprios percursos de n longo termo que os aprendizes saibam se autocorrigir e interiorizar as formas

aprendizagem. .ulcquadas, na medida em que consideram sobretudo que "tratar não é curar".

Em suma, a abordagem comunicativa pode ser considerada como um sis- c) É nessa ótica que observamos um retorno à língua primeira do aprcn
tema voltado para a integração de disposições diversificadas e para aquelas que di/., sob a dupla forma da análise contrastiva ou diferencial de LI e L2 c do
têm como finalidade envolver o aprendiz em uma comunicação orientada: IlTlIfSO à tradução. Mas a significação mudou: não imaginamos mais cxplicui
"erros" ocasionais unicamente pela interferência com o sistema fonlc, ainda
Isso significa, por exemplo, ler com a intenção de se informar, escrever na in-
tenção de satisfazer uma necessidade do imaginário, escutar com a intenção menos prever erros sistemáticos em função do grupo linguístico de pertença.
de conhecer os desejos de alguém, falar na intenção de exprimir seus próprios Trata-se, sobretudo, de despertar a consciência da especificidade, da origin,1
sentimentos (Germain, LeBlanc, 1988). Iidade até de cada língua e de assim permitir a emergência de sua história,
manifestar implicações socioculturais divergentes. A atividade metalinguísti-
c<!contribui, nessas condições, para uma abertura de mente, para uma cdu
~ 6. A ddátiw da a da cação que vai além do simples contexto de aprendizagem.
A abordagem comunicativa desloca o centro de gravidade na dupla Por estar completamente explícita nos métodos mais recentes ("Procll
operação que caracteriza a tarefa do aprendiz: trata-se não de aprender para rem no dicionário ... "), a tradução é objeto de um interesse renovado.
depois comunicar, mas de ligar intimamente o aprender ao comunicar. Na
Uma especialista romena, T. Cristea (1995), ressalta que a análise con-
realidade, em vários contextos tradicionais, a instituição continua a impor
írastiva, assim como a tradução, contribui para a elaboração de uma "hi
uma busca de equilíbrio ou uma sucessividade, quase manifesta nos textos
gramática" que permite uma melhor tomada de decisão; a tradução pode
pcdagógicos. É que, para a escola, também se trata de estruturar as aquisições
ser utilizada tanto como procedimento de aquisição quanto como teste de
por meio de exercícios aval iáveis.
competência; a tradução interlingual apresenta um grande interesse cogni-
a) É, sem dúvida, porque às vezes podemos nos sentir distanciados dos en- tivo se houver, pelo menos, "exploração sistemática e orientada dos textos
tusiasmos iniciais da abordagem comunicativa: a necessidade de certificações bilíngues", de maneira que os aprendizes realmente aprendam "como - nas
em língua estrangeira, o desejo de validar, de monetarizar a aprendizagem duas línguas - as estruturas são manipuladas em situação", ou seja, na enun-
parecem ter desencadeado exigências novas. Evidentemente, em um contexto
ciação e na discursivização.
puramente escolar, o ensino arrisca-se a se afastar ainda mais do espírito inicial
da abordagem comunicativa. Em algumas provas do ensino de línguas estran-
geiras, podemos nos perguntar se a representação de um discurso em torno do ~ 7. trn ba!anço uítico
documento desencadeador deixa algum espaço para uma expressão autêntica.
O futuro candidato parece obrigado a exprimir uma reação pessoal, quando, Para examinar rapidamente as obieçôes suscitadas contra a abordagem
na verdade, foi levado a produzir seu esforço sem sair da linha demarcada. comunicativa, retomaremos de início a eloquente enumeração, chamada
de "zonas de sombra", feita a seu respeito por Robert Galisson já no início
b) Contudo, a atenção que o professor dedica aos erros do aprendiz e a
dos anos 1980.
maneira ponderada com que procede à correção dão frequente testemunho de
um olhar diferente para as produções suscitadas. Sugerimos modular a inter- 1. "O projeto negligencia o inehamento dos custos inerentes à passagclll
venção segundo as prioridades do momento: exigência de justeza (accuracy) de um saber linguístico a um saber comunicativo."
~
2. "Os conceitos básicos, tomados de empréstimo e pauperizados, care- 1H'lglllllar O quc vem a ser a cultura do ouLro, consequenLemenLe a descoberta
cem de confiabilidade" (o autor cita as necessidades linguísticas, em 11' Il' Iuzcmos desse outro, em uma abordagem duplamente rnarcada, primei-
sua confusa articulação com as necessidades de existir ou de se reali- 111 por conceitos parcialmente herdados da etnografia da comunicação, mas,
zar; a competência comunicativa da qual não se sabe dizer se ela é ou !:Ill certos aspectos, marcada também pela valorização do comportamento do
não "ensinável" etc.). ,Ipl cndiz e, talvez, de certo narcisisrno.
3. "O ecletismo em matéria de teorias da aprendizagem também se ex-
plica por ... ignorância." Como podemos ver, a questão do indivíduo, de sua autonomia efetiva,
4. "A questão do mono- ou do bilinguismo pedagógico não foi levada às .iiuda é discutida, especialmente quando as ambições iniciais foram estabele-
últimas consequências." Em outros termos: qual deve ser a "língua da ( Idas em um patamar muito alto:
classe"? o que importa é dar ao aprendiz os meios com os quais construir para si mesmo
5. "A situação do professor é, para dizer o mínimo, desconfortável"; ou uma personalidade de sujeito falante na língua que ele está aprendendo, cio con-

ainda: nenhum professor está preparado para trabalhar a contracor- trário essa língua continuaria a ser estrangeira para ele (Martins-Ballar, 1976).

rente daquilo que ele fazia com as metodologias anteriores e ele "se Arraigamento cultural das competências comunicativas, autonomia real
vê alijado da boca de cena pedagógica". do aprendiz: de nosso lado, fazemos desses dois pontos a pedra de toque da
6. "A autonornização do aprendiz provoca algumas reservas" (ou, ainda,
metodologia. Sem isso, no fundo, para que serviria a abordagem comunica ti-
textualmente, "a autogestão não é bolinho").
va? É preciso lembrar que ela tem em sua origem a decisão do Conselho da
7. "Linguistas, psico- e sociolinguistas fincam pé em suas posições" e "os
I':uropa de facilitar a mobilidade das pessoas e sua integração nas sociedades
conflitos de influência explodem" entre eles.
chamadas de "acolhida".
8. "A abordagem chamada de funcional estilhaça-se em correntes diver-
sas (para não dizer divergentes)." Esses objetivos continuam sendo os objetivos do Velho Mundo reunifi-
cado nesse início de século: graças a um conhecimento recíproco das línguas
A abordagem comunicativa, assim como suas antecessoras, não está
estrangeiras da União Europeia ampliada, desenvolver o bem-estar social e o
imune a críticas e deu espaço a discussões a respeito das quais Oaniel Coste
melhor entendimento possível entre seus componentes.
lembra com bom humor a frase de Ionesco: "A filologia leva ao crime".

Não se pode negar que a corrente comunicativa insuflou um ar novo


em uma didática contemporânea por vezes confinada no estruturalismo e no @ 8. O quadro e.roceu ccmrn oe r0felêroa
behaviorismo e que estaria satisfeita com um conhecimento cumulativo. Con- rxro as !hguas
tudo, houve muita verborragia acerca dos objetivos fixados e talvez o desen-
Com efeito, é a partir de uma visão política que nasceu, depois de alguns
volvimento da competência linguística tenha sido, por vezes, discretamente
anos, uma "ferramenta essencial para a criação de um espaço educativo euro-
privilegiado. O sucesso dos métodos inspirados na abordagem comunicativa
peu no campo das línguas vivas". A ideia básica - "favorecer a transparência e
em ambientes extra escolares, particularmente em estágios intensivos, como
a comparabilidade dos dispositivos de ensino e das qualificações em línguas"
ocorreu com o Army Soecialized Training Program [ASTP], talvez ten ha con-
- concretizou-se rapidamente em um documento quadro, o CECRL [Ca-
duzido muito facilmente à generalização em contextos de tradições e de fina-
dre européen commun de référence pour les langues 1 e em ferramentas ime-
lidades absolutamente incompatíveis.
diatamente utilizáveis como o Portfólío Europeu de Línguas [PEL], "que per-
E depois, é possível haver centralização no aprendiz que produz sem mite ao aprendiz registrar suas competências linguísticas e suas experiências
que o próprio aprendiz tenha de se descentrar (Besse, 1980)? Podemos nos culturais" e, certamente, refletir sobre elas em proveito de suas aprendizagens
em línguas. A contribuição direta do CECRL, que visava em primeiro lugar (1I11(t'Pr,'ÓCS, nossas Ionnaçocs? O caso do "aprendiz asiático diante das [in-
intervir na avaliação indicando níveis e escalas de referência e deseritores de ;";1., estrangeiras" (O. Lee Simon [org.], 1992) é particularmente instrutivo.
competências (ser eapaz de ...), logo se viu completamente ultrapassada. Sob e modo, perguntamos o que será feito do "prêt-à-porter comunicativo",
I}(· ••••.•

risco de se tornar uma norma e não mais uma referência, o CECRL funeio- III() em atividades de debates e jogos de interpretação, quando sabemos quc,
nou um poueo como instrumento do destino para as metodologias na Europa 1111 comunicação exolíngue, "os coreanos tenderiam a alinhar seus discursos
e em sua zona de influência, a ponto de ter chegado o momento de reenqua- c 0111 o discurso do autóctone, atenuando, até mesmo esquivando-se da opo-
drá-lo (Fórum de Estrasburgo, 2006; Colóquio da Fédération Internationale \I(,-ao" (Sun llyo-Sook, Seul). No Japão, a conversação funciona no modo da
des Professeurs de Français / Centre International d'Études Pédagogiques r.onvcrgêucia emocional, de um reconhecimento mútuo da conformidade,
[FIPF/CIEP] Sevres, 2007). Clobalmente, a abordagem comunicativa (que .11t:· mesmo da afinidade entre as pessoas em relação, mas não no modo do

não é renegada pelo CECRL, mas que ele pretende superar, passando da intercâmbio argumentativo (T. Higashi).
simulação à ação social efetiva) deve ser regenerada: a dimensão acional, ba- Uma tailandesa, S. Chantkran, conclui que
seada em tarefas a realizar, visa a um "fazer conjunto"(parceiros, classe ...),
a consideração da especificidade cultural do público aprendiz apcnas preenche
com resultados observáveis, e essa dimensão está ligada a um projeto. Se ain- as carências de uma pedagogia de inovação baseada na transferência de mode-
da for muito cedo para medir o impacto desse conjunto coerente - política los concebidos em contextos culturais extremamente diferentes.
linguística, transformações curriculares e metodológicas, práticas de ensino
o estatuto do professor, seu lugar como indivíduo na classe em relação
-, é preciso evidentemente prever que em certo momento haverá profundos
ilS expectativas sociais, seu comportamento como "mestre" e como educa-
efeitos sobre o panorama educativo europeu.
dor também representam problema para as didáticas elaboradas segundo o
crivo histórico ocidental. Podemos nos perguntar, então, como a inovação
didática deveria se manifestar nesses contextos, nos quais, mesmo assim, fo-
@ 9. Ccndusão ram feitos esforços consideráveis pela educação de uns quarenta anos para
Terminaremos com uma observação geral. É preciso matizar fortemente cá, com resultados pouco expressivos. Na África, por exemplo, até mesmo
a ideia de que a abordagem comunicativa seria a didática de línguas estrangei- a escolha das línguas de ensino não está regulada. A importância cultural
ras. Primeiramente, porque ela diz respeito a uma área cultural relativamente dessa escolha suscita questões nas quais grandes organismos como a Unes-
homogênea, a do mundo ocidental. Podem-se acrescentar a essa área, como co ou a Confederação de Ministros da Educação (CONFEMEN) deveriam
vimos acontecer com o CECRL, zonas: por exemplo, os países de influência desempenhar um papel determinante: apenas agentes como esses podem
impulsionar compromissos políticos contínuos e à altura das necessidades
cultural ou aqueles que são atingidos por uma ação linguística estrangeira,
de ensino nos anos vindouros.
por meio de institutos, fundações, serviços de cooperação. Seria necessário,
então, examinar, caso a caso, o que acontece nesses países, na África, na Ásia, No próprio sistema educacional francês, a situação está mais que mati-
na Oceania ... Seriam encontradas por lá, sem dúvida, didáticas ora idênticas, zada. É certo que as fileiras universitárias de francês como língua estrangeira
ora calcadas sobre movimentos nossos, o que pode significar, mesmo depois ("FLE") e o ensino do inglês como língua estrangeira ("EFL") adotaram sem
de hipotéticas emancipações culturais, formas de hipercorreção, de exagero ambiguidade, mas não sem debates, nem acomodações, posições favoráveis ~
dos tradicionalismos como a "revolucionite" didática. abordagem nocional-funcional e comunicativa.

Por outro lado, os pressupostos de nossa didática autorizam todas as trans- Mas outros campos, como o alemão, puseram-se na defensiva contra
ferências metodológicas e não entram em conflito com os modos de sentir e os avanços do inglês ou foram questionados pelo novo ensino de iniciação
de pensar das sociedades às quais emprestamos nossas ferramentas, nossas às línguas estrangeiras na escola: "Por razões diferentes, nossa discipl ina (.
@
percebida mais como ensino do que como aprendizagem", lia, não faz muito
~d)~-@
tempo, um responsável por esse ensino.
Essa aprendizagem
quenternente
cstá mais centrada no código do quc no aluno, e conse-
é mais bem compreendida em sua dimensão linguística que em LleJStoos0.,
.
..
J...
rsoe ·-I~J\.Ja'
"
sua dimensão funcional e comunicativa.I:~ bem pouco provável que atualmcn-
te a abordagem comunicativa
línguas. Grandes conjuntos
seja estatisticamente
educativos,
dominante no planeta das
como os sistemas chineses, indianos,
japoneses e coreanos, por exemplo, são fortemente estruturados por conta de ('J'.~JlJ
~II S II ,
seu passado em matéria de educação e de cultura para aceitar sem reAexão nem
hesitação sacrificar essa eslruturação. Podemos supor, nesse início de terceiro Capítulo IV
milênio, que sua capacidade de aliar tradição c modernidade logo se demons-
trará capaz de produzir frutos. Aliás, sem dúvida alguma, eles terão muito a nos
dar e a contribuir COIll uma verdadeira didática geral das línguas do mundo,
ainda por constituir.

Vemos então o quanto estarnos longe da unanimidade, mesmo que seja


de fachada; e o professor convocado a operacionalizar suas escolhas didáticas
sabe perfeitamente que elas são tributárias de uma realidade que ultrapassa a .Iamos tentar mostrar como são atualmente abordadas ai
instância das predileções pessoais. I gumas questões importantes, sem a ambição de tratá-Ias
• • exaustivamente. Compreenderemos também que não se
" trata simplesmente de apresentar ao leitor uma manci ra e:v-
, .~ cessivamenle pessoal de ver. Dessa forma se explicarão, ao
mesmo tempo, as escol has de questões e a ordem da apre·
sentação, que não é sistemática.

Veremos, em seguida, que novas temáticas de pesquisa, portadoras de


evolução para a aula de língua, são propostas.

Para nos perguntarmos como a didática vai evoluir, também precisare


mos indagar por que ela deveria fazê-Ia. É. necessário enfatizar muito for!"
mente que ela está submetida a lógicas exteriores delimitáveis:

• em torno do aprendiz: a diferenciação dos públicos e a noção de ali


tonomia, as necessidades profissionais que aumentam o interesse pOl

uma "comunicação especializada" destinada a "públicos específicos"


e à aprendizagem em contexto não escolar;
• em torno da tecnologia: as redes de comunicação chamadas de "ru I
toestradas da informação", a multimídia, a mudança de formas de
escolarização (lugares, tempos, ritmos, percursos);
ou (!)1I111\11(;,\·III-,rN(;i""iT.ilTl(\N(~III(\SO 1'111(1(1~l\I(If'iI-1
~ 111 \101 '" I 1'1 1t"1'I ( II\'\

• em torno do político e da globalização dos intercâmbios: por exem- 'l'kcionaelos, em outras palavras, a organização sequcncial desses conteúdos,
plo, a construção da Comunidade Europeia, o esfacelamento dos '":1 ordem de aquisição constituem um problema complexo, cuja resolução
"blocos" leste-oeste, o avanço da zona Ásia-Pacífico; os equilíbrios ~eralmente não é ele todo satisfatória. Desse modo, O critério de facilidade
demográficos e as migrações; a padronização e as transferências de (ensinar, para começar, o mais simples) é frequentemente posto em primeiro
conceitos ou de produtos entre "centros" e "periferias", mas também
Iligar, apesar de sua ambiguidade: parecerá mais difícil, indica Mackey ainda,
a lógica econômica e a desigual divisão das riquezas entre os países
um elemento desconhecido que não permita analogia com o conhecido, que
consumidores, com um exemplo elaro dessas desigualdades: a produ-
l' muito longo ou que não mantenha relações com seu meio. Mas há outros
ção e a difusão dos manuais escolares e das ferramentas tecnológicas
critérios: a utilidade, a motivação do aprendiz, as dificuldades defrontadas, o
modernas de educação;
contexto etc.
• em torno do científico: o cognitivo, as ciências humanas e sociais;
• em torno do ideológico, do social ou do filosófico: a comunicação A construção de um programa de ensino em sentido amplo - espaço,
planetária, a mestiçagem das culturas, a viagem como conhecimento, tempo, objetivos, avaliação, conteúdos, meios auxiliares, ideologias - suscita
o tempo partilhado. () mesmo tipo de perguntas. Naturalmente, a ideia subjacente é sempre ligar
funcionalmente as necessidades suscitadas pelos desempenhos esperados e
Esses fatores de evolução em nada obedecem a uma lógica da circulari-
pelas contribuições do ensino organizadas em termos de objetivos e de con-
dade. O ressurgimento de elementos metodológicos ou de abordagens anti-
leúdos. Mas a própria noção de necessidades é cada vez mais percebida como
gas é sempre possível, particularmente em meio aos públicos cada vez mais
discutível, porque sua determinação é frequentemente fluida, fragmentária e
específicos que conhecemos. As predições são por demais imprudentes para
parcial, ou evolutiva e, certamente, até mesmo inexistente em determinados
ser de qualquer interesse, e nós não as faremos. A morte do manual, que havia
contextos. Por outro lado, o esclarecimento das noções também está longe
sido anunciada desde o início dos anos 1970, não aconteceu. Ferramentas
de ser feito (Coste, Lehmann [orgs.], 1995). As propostas anglo-saxônicas re-
modulares surgiram, e os manuais continuam bem vivos.
cobrem, grosso modo, o conteúdo mais a progressão, enquanto o currículo é,
Acreditamos em um reforço da didática, porque ela nunca esteve tão sobretudo, o percurso do aprendiz, um conjunto de experiências de apren-
próxima de seu objeto, jamais esteve tão bem informada dos filões de recursos dizagem em meio institucional e, por derivação, o programa determinado e
que a rodeiam e que estão a sua disposição, nunca teve tanta consciência de praticado em busca desse efeito.
seus erros e dos limites de sua ação.
Contudo, como os termos do programa, o plano de estudos, o curso pare-
cem limitadores e restritivos, é em torno da noção de propostas e de currículo

~ 1.OganizaçiJo de un eosro que modelos são desenvolvidos. Eles manifestam uma tendência integradora,
tentativas de conciliação que, pelo menos, deixem bem para trás as antigas
Para que os professores e os aprendizes possam se encontrar no objetivo de concepções de base lexical, nas quais a divisão era feita prioritariamente a
ensinar e de aprender uma língua, lembra, não sem propósito, um especialis-
partir de uma temática lexical ou dos atos de fala do turno comunicativo.
ta, a instituição deve estabelecer um programa cuja função é: prever/escolher
- descrever/explicar - propor/impor. .. os conteúdos e as modalidades de reali-
Também é necessário, segundo Richards e Rodgers (1986), considerar ()
zação das ações ele ensino que são tidas como capazes ele provocar as ações de
aprendizagem (Richterieh, in Coste, 1994). desenvolvimento de um currículo como um sistema dinâmico. A fase inicial
é a avaliação das necessidades, que deve levar em conta várias considerações
A noção de programa ultrapassa amplamente a questão linguística à qual externas: administrativas, educativas, psicossociais e logísticas. É a partir dessa
achávamos que poderíamos assimilá-Ia. Em todo ensino, indicava W. F. Ma- atualização das necessidades que se fará a definição dos objetivos de aprendi-
ckey já em 1972, o agrupamento, a sequência e a progressão dos conteúdos zagem. Por fim, intervém verdadeiramente a elaboração de um programa 110
~ UL (:)1)II)~ I li \ íilITT"i1:1I,\~ ISIII.\NI:I IIIAS -..,-- ••.---------------------~-----~-----rr)lltT'TiIi';!!!'!'ifl'1'·n'!1f't""!.;"'I"!:". 1'1"""I;,~(!J 0.'-.1;"11

qual entram em jogo, para resumir, metodologia, métodos, meios e avaliação. Uma efetiva rcavaliação das necessidades c dos resultados obtidos pode
Tal esquema de trabalho pode parecer racional, mas também excessivamente I id questionar a validade das escolhas feitas: os aprendizes não permaneeem
rígido. Prestando atenção para não cair do sistêmico no sistemático e conscien- «Iênticos a si mesmos, e os parârnetros institucionais evoluem. Um método
tes ela necessária adaptabilidade das soluções consideradas em face de necessi- \ .rlidado a partir de uma amostra limitada fracassa em um contexto ampliado
dades complexas, Richards e Rodgers não excluem um "ecletismo informado", (t' justamente esse o problema da massifieação do ensino) ou quando o empre-
ou seja, uma abertura feita com discernimento para outros métodos. iólll10S sem formação adequada. Ora, não é regra que uma mudança de método
se raça acompanhar por uma ação de formação dos usuários (Springer, 1996).
o currículo nwltidimensional proposto por Stern ([1983] 1992) abor-
da o problema de uma maneira interessante. Os objetivos são classificados
sob quatro rubricas: objetivos de competência, objetivos cognitivos, objetivos
@ 2.0o!
afetivos, objetivos de transferência. Os conteúdos figuram nos quatro compo-
nentes, posteriormente completados pela avaliação: Vimos acima que a língua oral ocupou um lugar de destaque nas meto-
dologias modernas e frequentemente constituiu o ponto de partida da apren-
• proposta de língua: pronúncia, gramática, análise funcional;
dizagem. A descrição do oral foi o objeto de vários trabalhos, e essa descrição
• proposta de atividades comunicativas;
assumiu o lugar da atitude prescritiva dos estudos anteriores, que visavam,
• proposta cultural;
sobretudo, evidenciar as marcas de distanciamento com relação à norma (au-
• proposta de educação linguística geral.
sência das segundas marcas de plural, rupturas sintáticas etc.). Víamos, então,
Estratégias de ensino serão, em seguida, definidas. Evidentemente se faz se reforçar no ensino de línguas e especialmente em sala de aula, um atitude
necessário destacar a forte integração, em torno da componente "comunica- de desvalorização de um oral autêntico.
tiva/experiencial", desse esquema operacionalizado em larga escala no Cana-
A partir de então, a variedade de documentos e de registros de língua vai,
dá. Outro ponto a enfatizar: a importância atribuída à aquisição de estratégias consequenternente, aumentar, passando a representar, claro, um problema:
linguísticas eficazes como uma componente da formação. Uma "unidade
como integrar nos parârnetros de um curso a norma social ou as variedades
zero" do programa canadense visa até mesmo conscientizar o aprendiz para da língua apresentadas pelo professor sem dar uma imagem deformada da
a nova abordagem.
sociedade? Nada mais inapreensível, entre outros exemplos, do que "a gíria

Ao termo de sua história recente, podemos dizer com R. K. Johnson da juventude", os "registros de língua" (ordinária, familiar, padrão, monitora-

(1989), que "o desenvolvimento do currículo ( ... ) inclui todos os procedi- do ... ) ou as variedades regionais.

mentos adequados de tomada de decisão por todos os participantes"? Porque, Contudo, vemos diversificarem-se as práticas de aula, tanto do lado da
em última instância, não se deveria esquecer que a operacionalização didá- compreensão como da produção: entrevistas, jogos de interpretação de papéis
tica depende de todos os participantes e não apenas daquele que a concebe. e simulações envolvendo resolução de problema ou decisão a tomar, progra-
Existe um "currículo oculto", que depende do aprendiz, e, no fundo, a cons- mas de rádio, boletins de notícias ("flashes"), boletim meteorológico, narrativa,
trução "de cima para baixo" (Nunan, 1988) de um currículo talvez seja uma instruções de trabalho etc. Algumas grandes orientações podem ser admitidas:
possibilidade puramente teórica. Admitida a possibilidade de evocar, como
- Insiste-se na "perrneabilidade" dos dois códigos, oral e escrito, c em
começamos a fazê-lo, a pluralidade de cenários curriculares diversificados,
sua necessária complementaridade, mais que em suas diferenças.
ela dificilmente resolve os problemas que presidiram sua emergência, porque
depende de uma visão literalmente política do ensino (cf. o CECRL e o pro- - A criatividade do aprendiz e sua capacidade de produzir enunciados
jeto de um plurilinguismo europeu). pessoais intervêm desde o início da aprendizagem. Os exercícios no labora-
tório de línguas, quando o professor pode eventualmente iniciar um diálogo ,I tradição em determinadas culturas, nas anglo-saxônicas, por exemplo, S\I:I
com o aprendiz em atividade, parecem desde então encontrar certo espaço, ,I JlI cndizagem como parte do currículo caracteriza outras tradições (\1<1 I''tilll

depois de um período de cansaço devido à busca, por vezes excessiva, de sis- nos países do leste). Sem dúvida, as imagens da norma prescriliva ai lida se
1,':1,

tematização. Podem-se citar várias razões para isso: 11 iscrevern em esquemas culturais e científicos mais amplos: H. Bessc (1 tJfN)

evoca uma "(pré)concepção jurídica forte" entre os professores arabólonos.


• as expectativas do aprendiz, seu desejo de estruturar suas aquisições,
Hás, é preciso ressaltar que a pesquisa empírica não conseguiu mostrar, til"
com uma perspectiva que não é mais a do behaviorismo;
hoje, uma superioridade de um sistema de apropriação sobre o outro .
• a miniaturização e a facilidade de uso dos materiais atuais;
• a busca de ferramentas que favoreçam a autoaprendizagem. Por outro lado, a metalíngua pode levar a recorrer à tradução inlci
lingual (os comandos dos exercícios serão em LI) ou abrir espaço para 11111
Em numerosos países, o trabalho de aprendizagem dos fonemas conti-
aprendizado específico. Portanto, de início, será preciso aprender a dcnomi
nua sendo um pré-requisito para uma abordagem da L2, externamente a toda
nar as categorias gramaticais e talvez seja em L2 que será necessário entender
finalidade discursiva e a todo interesse comunicativo.
() comando de um exercício. Nesse caso, uma parte da atividade é oricntudn
Provavelmente seria necessário associar tomada de consciência da im- para tarefas linguísticas em detrimento de outros objetivos; de outro lado, as
portância do oral (fonética, esquema entonacional, relação com a mímica e a categorias gramaticais em LI e L2 podem perfeitamente não correspondei
gestualidade, ritmo da frase, harmonia etc.) com atividades de correção mais à "gramática mental" do aprendiz. Um bom exemplo é fornecido por 1I111:1

ou menos sistemáticas, em função dos objetivos pretendidos e das dificulda- "gramática remota" como a do húngaro: em húngaro, só existe um tempo do
des comunicativas experimentadas. passado, com vários aspectos marcados por um "pré-verbo" (Kiss, 1989). 1':111

taitiano, uma marca enunciativa, "mai", permite indicar quem assume o dis
curso: "É linda (mai) ela" = "Ela é linda e sou eu quem o diz" (Fêve, 19(2).
@ 3.0an'lática Besse e Porquier (1984) lembraram que categorias pretensamente ausentes.

o papel desempenhado pela gramática na didática das línguas é dos na realidade, existem (caso dos classificadores: "um pé de salada, uma noz de

mais controversos. Uma razão para isso decorre sem dúvida da fluidez de sua manteiga" etc. [Cao Derning, 1983]).
definição, que abarca a descrição das regras de funcionamento geral de uma Como a gramática explícita parece apresentar dificuldades despropor-
língua, ou um conjunto de prescrições impostas àqueles que a falam, ou o cionais em comparação a seu interesse, algumas metodologias diretas e all-
sistema de regras de L2 interiorizadas pelo aprendiz (Galisson, Coste, 1996). diovisuais sistematizam a aprendizagem mediante a divisão linguística c o
exercício estrutural, nos quais o reflexo não é reflexão.
A utilização da metalingua, do comentário explícito sobre a língua
aprendida, é claramente uma herança da metodologia clássica "gramática- Durante os primeiros anos da abordagem comunicativa, frequenterncn-
-tradução". As descrições que as gramáticas tradicionais nos oferecem estão te se encontram nos manuais regras expostas na forma de boxes ou de quadros
voltadas para os grandes textos, elas negligenciam o oral. Imagina-se que elas de recapitulação, como lembrete. E se o modelo gramatical dominante cede
sejam mais convenientes para os professores e os aprendizes. terreno, como R. Vives (1989) mostrou, razões não faltam:

Todavia, é necessário lembrar que a análise da língua não ocupa o • as necessidades do aprendiz determinam os conteúdos de ensino,
mesmo lugar em todos os países. "De quanta gramática o ser humano tem quase sempre parece que a gramática não é lá muito prioritária;
necessidade?", perguntava-se brincando um especialista alemão. Se a aqui- • a noção de interlíngua leva a olhar mais de perto o processo de cons-
sição implícita da gramática em L2 (aliás, como também em LI) domina trução das regras (os termos "gramática do aprendiz" e "gramát icu
~
pedagógica" estão em voga) e não um sistema congelado e normativo.
Também poderíamos fazer valer que uma gramática "interiorizada"
@ 4. Escrito
pelo aprendiz nunca é a gramática descrita pelos linguistas; Adquirir uma dupla competência ler/escrever parece ser uma urgência
• a correção dos erros ou das incorreções, longe de ser vivida como um desde o princípio do aprendizado. Com efeito, as funções do escrito são tão
fracasso, colabora para uma pedagogia do progresso. amplas (Stern, 1983) que ele encontra seu lugar em todos os campos, na ação

De fato, a abordagem comunicativa convidava a construir uma gramáti- (carta comercial ou carta de amor, publicidade, instruções de trabalho), na

ca semântica, cujos traços foram indicados por J. CourtilIon (1989): o apren- informação (ensino, imprensa) e na diversão (jogo, literatura).

diz deveria poder escolher "a forma conveniente para veicular seu pensamen- Os trabalhos disponíveis desde os anos 1970 a respeito das línguas ma-
to sem ter de recorrer a uma regra aprendida". Em uma lógica pragmática, as lemas destacam um novo modo de definir a leitura: um processo que não se
formas são classificadas em séries comunicativas e não linguísticas, a inserção resume à decodificação de sinais gráficos, mas que manifesta uma construção
é situacional, a gradação vai do simples ao complexo. O processo de aqui- cio sentido a partir de operações físicas e cognitivas complexas (levantamento
sição faz com que se sucedam: descoberta por observação de enunciados, antecipado de índices identificados, memorização em curto c longo prazo,
intercorreção do grupo, conceitualização, ou seja, formulação pelo aprendiz antecipação, hipóteses sobre a intenção enunciativa, verificação ctc.).
(H. Besse) e síntese. Percebemos que há nisso uma posição, na melhor das
Ler não é um ato mecânico, mas implica, além de um conhecimento do
hipóteses, reflexiva, mas também é verdade que um aprendiz não é "a priori
código, uma experiência anterior, intuições e expectativas. Enfim, a leitura
nemlinguista, nem grarnático" (R. Porquier) e que sua atividade visa, inicial-
mente, à produção do sentido. oralizada (em voz alta) não constitui mais um fim em si mesmo: começamos
a admitir a preeminência do sentido sobre a simples transcodificação do gráfl
Podemos imaginar que a concepção de uma gramática recuou com- co ao sonoro (leitura gaguejada em coro ... ). Enquanto atividade social, ler se
pletamente e que o construtivismo agora é mais bem aceito. Contudo, pa- faz isoladamente, em silêncio, mais frequentemente que em alta voz.
rece-nos que a evolução é frágil. Em caso de dificuldade, para nos assegu-
Se as práticas de leitura nunca estiveram realmente ausentes, meSJ110
rarmos, voltamos a buscar a gramática "pré-construjda". Por isso pesquisas
com as metodologias audiovisuais, isso aconteceu porque diferentes varieda-
(por exemplo, Hayne e Yorio, no Canadá, 1982) mostram que um aprendiz
des de escrito subsistiram como uma passagem obrigatória, tanto através do
pode desejar simultaneamente desenvolver suas competências comunica-
manual como nos documentos de acompanhamento. A "virada metodológica
tivas e se beneficiar de uma aprendizagem gramatical tradicional. Hoje, a
dos anos 1970" (D. Lehmann, in Coste, 1994) desencadeia novas abordagens,
questão não parece ser "devemos ou não devemos ensinar explicitamente
mais globais, atuando sobre necessidades funcionais mais bem analisadas. J\
a gramática?", e sim "em que condições é possível levar a gramática a bom
termo?" (Besse e Porquier, 1984). abordagem comunicativa multiplica os documentos sociais diversificados e a
didática do escrito leva a conceber como:
Mesmo as finalidades da gramática, que não são apenas instrumen-
• desenvolver no aprendiz competências gerais em leitura. Os exerci
tais, mas também educativas e (intcr)culturais (H. Besse) fazem com que
cios propostos fazem a leitura perder seu caráter linear, com OpCI<I
reapareçam exigências, agora mais discretas. Talvez haja avanços a esperar,
ções variadas (procurar, comparar, antecipar. .. ), entendendo-se que
do lado da ferramenta computacional ou das autoaprendizagens, mas a
ler em L2 impõe uma reorganização dos esquemas adquiridos para <I
"maldição paradigmática" (J.-C. Beacco), a redução das descrições grama-
leitura em LI. Citemos, por exemplo, o sentido da leitura, segundo
ticais a listas de formas a serem aprendidas certamente continuam a pairar
ele seja inicialmente da esquerda para a direita, ou o contrário (corno
sobre a aula de língua.
no caso do árabe, do hebraico) ou do alto para baixo (mongol), o sis
• tema de escrita (alfabeto, ideogramas ... ), a ausência de vogais escritas
~
xno, de modo algum, respostas diretas às fuluras necessidades linguísticas do
(árabe) etc.; aprendiz e não há certeza de que eles possam dar pelo menos ferramentas
• dar estratégias de leitura a partir dos tipos de textos (publicitários, jor- conceituais reutilizáveis em outras circunstâncias.
nalísticos etc.) com ferramentas como grades lexicais que permitam
Em uma abordagem nocional-funcional, aprender a produzir textos di-
a localização das marcas de enunciação, das marcas do discurso (o
ponto de vista inseri to no texto), a coerência textual. vcrsificados, ligados a novas necessidades, torna-se um objetivo explícito. A
aula é doravante levada a priorizar as atividades que incidem sobre documen-
Com efeito, o texto é um tecido de formas significantes, e a leitura é uma tos autênticos que associem vários suportes: desenhos para legendar, transcri-
atividade de interpretação motivada (Moirand, 1982), que suscita uma reação ção ou reforrnulação de uma escuta, comentário de um quadro, escrever a
por parte do leitor: a leitura deve participar então de um ato útil, mas também
regra de um jogo, correspondência escolar etc.
capaz de gerar prazer. E a literatura encontra seu exato lugar nessa concepção.
As práticas de sala de aula dão lugar à criativídade do aprendiz, a sua
Stern (1992) enfatiza o quanto o texto literário está adaptado a uma
capacidade de pensar diferentemente. O "pensamento divergente" é aquele
atividade comunicativa: ele põe em contato com um falante nativo que tem
que associa, dissocia, enriquece, se revela original. Há melhor exemplo disso
algo a dizer; ele cria um meio original e estimulante; ele é o exemplo de
do que a atividade poética? Produzir decorre, então, de um prazer e de LIma
uma língua autêntica que veicula uma mensagem carregada de sentido. Na
técnica: "matrizes textuais" são propostas, a exemplo da morfologia do conlo
realidade, tudo depende do tratamento dado a esse texto em classe: análise,
(Vladimir Propp), das novelas de Italo Calvino, dos romances de Georges Pe-
crítica, discussão, dramatização ...
rec, dos poemas de Apollinaire. Jogos sociais, debates, dramatizações, simula-
Entre as pistas emprestadas pela didática, nenhuma é específica dela (J. L. ções ("Se você estivesse em uma ilha deserta ... ") associam o oral ao escrito.
Adarn, in Coste, 1994): estilística, semiótica literária, na qual a obra é um sistema
Podemos destacar vários pontos importantes:
de signos que funciona como uma língua c se inscreve na dimensão histórica e
social, polifonia do texto (Bakhtin), retórica etc. Mas o ensino da literatura na • O aprendizado deve levar em conta a relação com o escrito anterior
classe de língua estrangeira nunca ficou de fora dos grandes debates. Podemos em LI (S. Moirand), em seus aspectos proprioceptivos (treinamento
evocar (J. Verrier, in Coste, 1994) três ondas sucessivas: o consenso ideológico (o da grafia, alfabeto, motricidade, sentido da escrita com dificuldades
texto é um pretexto para a transmissão de um saber); o sonho de uma ciência da variáveis segundo as línguas), assim como o tratamento do tema em
literatura alimentada pelas ciências humanas e cujo objeto é o funcionamento sua organização discursiva.
do próprio texto; por fim, a recepção dos textos pelo leitor, o que deveria nos • Não devemos esquecer que a escrita permite escapar ao imediato e ao
interessar muito, na perspectiva de uma pedagogia intercultural. contexto, que ela estimula a abstração e o espírito crítico (G. Vignier),
Parece que, do lado da produção escrita, por sua vez, o parêntese meto- que ela é um processo simultaneamente cognitivo e interativo.
dológico foi longo. Há pouco, alguém escrevia: • Como não é possível dissociar oral e escrito, não podemos mais disso-
ciar ler e escrever. Uma didática do escrito deve ser integrativa.
De todas as competências visadas pelo ensino dc línguas estrangeiras, a expres-
são escrita é certamente aquela que teve, nos últimos anos, o mais inexpressivo • É necessário atentar para as especificidades de públicos e culturas
desenvolvimcnto (C. Kahn, 1993). e de tradições orais (trabalhadores migrantes, por exemplo, para os

Será que as coisas mudaram? quais nossas exigências de escrever suscitam grandes dificuldades)
ou, ao contrário, de tradição escrita forte aos olhos dos quais todo
É verdade que vários exercícios clássicos de produção (descrição, narra- aprendiz de língua é, em primeiro lugar, um "letrado" (como no
ção, dissertação) ou de transcrição (ditado), tanto em L2 quanto em LI, não caso do chinês).
• " \:
Para concluir, insistiremos na evolução relativa das ideias. M. Dabêne
As falhas da avaliuçào classica também são conhecidas: as expectativas
(1990) nota que geralmente não se confunde escrito e modelo normativo,
s.ro frequentemente mal cxplicitadas (caso da versão, para a qual não há nc-
que não se constata a diversidade dos escritos. O que preocupa, a partir dis-
1I h um
modelo ideal); os critérios, mal estabelecidos (em expressão escrita, a
so, é o processo de produção linguística e, por outro lado, as representações forma e o fundo); a notação desigual (a prova oral); a fraca motivação (em
sociais que estão ligadas aos tipos de escrito. Mesmo assim, ainda estamos ditado, zero para cinco ou trinta "erros") etc. Os procedimentos de avalia-
longe de um continuum escriturístico entre práticas ordinárias do escrito (o ção herdados do estruturalismo e do behaviorismo (Lado, 1961) trouxeram
utilitário) e práticas de exceção (o literário). A palavra "ler" significa sempre, tllguns avanços: avaliação do oral, caráter menos normativo, comandos mais
para a maioria, ler livros, e somente livros. Mas a classe estaria condenada a simples, por exemplo com o questionário de múltipla escolha. Mas também
reproduzir os comportamentos sociais? aqui críticas não faltam e se testes como o TOEFL ("Test of English as a l-o
reign Language") são sempre empregados, é por que se tem a impressão ele
que há uma boa correlação entre os resultados de provas fechadas (sim/não) e
@ f'. A\Ja!iaçCJo os resultados a que se chegaria com provas de produção mais livre. A questão
se apresenta de maneira diferente a partir das metodologias comunicativas.
Avaliar é dar um valor, anotar, julgar. O termo engloba toda pesquisa
dirigida a tornar objetivos os juízos de valor feitos acerca do aprendiz. A do- Também se buscou variar as ferramentas de avaliação para diversificar a
cimologia (a abordagem científica da avaliação) opera uma distinção entre observação e foram multiplicados os suportes (deslocar-se seguindo um gu ia
diferentes formas de intervenção: de estradas, telefonar, administrar a agenda). Parece, por outro lado, muito
sensato desenvolver o senso de autoavaliação e de autocorreção do aprendiz,
• somativa (ou certificativa), cuja finalidade é estabelecer a soma das
de ajudá-Io a objetivar suas referências. Surgem, então, novas formas de inlc:
aquisições e, eventualmente, estabelecer uma classificação em uma
venção: observação da interação no grupo, avaliação coletiva, negociação.
população avaliada, o que implica sucesso ou fracasso diante das exi-
gências da avaliação; Em todo caso, não se trata mais de reduzir a avaliação a um controle dos
• normativa, que compara os desempenhos de um indivíduo aos obje- conhecimentos. Mas, sobretudo, a ideia dominante é considerar os fatores
tivos demarcados no início da aprendizagem e visa, então, eventual- humanos - a qualidade ela interação comunicativa, por exemplo - e dc não
mente, a uma correção no decorrer do processo de formação. Os tes- se limitar a um procedimento formal. Em suma, é preciso ver na avaliação,
primeiramente, uma ferramenta de regulação e de aperfeiçoamento do ensino
tes de diagnóstico ou de progresso medem essas aquisições. Testes
(Porcher, 1994). Por sinal, precisaremos voltar a falar da nova importância
prognósticos ou de nível podem permitir selecionar ou orientar.
que se juntou a sua função de seleção social (entrada na universidade, mobi
O testing (um teste é uma prova padronizada) não permite verificar lidade profissional, migração), tal qual se desenha, especialmente a respeito
a existência de uma competência propriamente dita, mas apenas os traços das referências internacionais, por exemplo, do Quadro Europeu Comum de
constitutivos dessa competência, ou seja, os efeitos que ela produz. Apenas Referência para as Línguas (C. Tagliante, 2005).
uma ferramenta de avaliação válida (própria para a medição de um objeto)
e fiel (ou seja, constante no nível da construção, da aplicação e da correção,
independentemente das condições do testing) pode dar garantias de distorção @ 6. 0i\Ji!izayão
mínima entre desempenho observado e competência real. Geralmente faze-
O ensino das civilizações estrangeiras encobre um campo mal dcliuii
mos a avaliação incidir sobre as quatro habilidades, compreensão e expressão
tado. Mas existe uma demanda para que o ensino de línguas seja prcfci eu
no oral e no escrito.
temente culturalizado (C. Krarnsch, 1991). Mas, partindo dc teorias l' dv

~ IA- _I.,.IIIJKllv,-. '~•.••.••I~ •••·Vn,' n,""'V\'''\'JI',IIV''<J ....., I '''1\1'\''.1''1'\1\111''11'.1,

definições contraditórias, a didática das línguas estaria em dificuldades para .amcnto pela escola, () tuusmu). Novos modos de cducaçao e de IOlllt:l,'i!O,
propor práticas unitárias nessa matéria. particularmente as trocas escolares, mas também a correspondência cscol.u ,
íIcarta-vídeo ou o teatro também favoreceriam a socialização do sujeito, \11,1
Com efeito, observamos clivagens profundas. A civilização pode abarcar:
construção social. É evidente que a descoberta da alteridade, a percep,';)o do
• a cultura cultivada (arte, literatura, história ... ), cujo ensino foi fre- "outro" e do "estrangeiro" dão a todo indivíduo oportunidade de clabor.u l'

quentemente marcado pelo etnocentrismo, com uma cultura ambi- de desenvolver sua própria identidade. Esse é, por sinal, um dos temas 111;!i\
cionando encarnar a universalidade da cultura; importantes da "pedagogia intercultural" e do ensino de uma cultura cstruu
• a cultura cotidiana, na qual se desvela a concepção antropológica de gcira concebido como processo inierativo.
um conjunto de valores partilhados (Herskovits) e que se estende aos
c) Como articular língua e cultura na aprendizagem (G. Zarate, 19H(1)?
modos de vida, vestimentas, alimentação, lazer etc.;
Perguntamo-nos se a progressão deve ser paralela ou se podemos imagina I 11111
• a cultura como conjunto de conteúdos transmissíveis (isso englobaria
currículo dissociado. No primeiro caso, M. Byrarn (1992) propôs quc umn
os dois campos acima), ou, ao contrário, definida como estruturas,
parte do tempo de trabalho seja reservada à tomada de consciência da língll<l
modos de pensar e de agir, regras constitutivas que permitem uma
c da cultura. Efetivamente, se criaria uma dissociação se adotássemos 11111dl\
abordagem do homem em sua diversidade.
positivo global de ensino de línguas estrangeiras tal que cada uma delas rOSSl'
Perguntas não faltam. Evocaremos três delas: os estereótipos, a compe- conduzida por objetivos diferentes: por exemplo, LE 1 seria aprendida COIII
tência, a articulação língua/cultura. lima finalidade comunicativa; LE2 como língua de cultura e accssoriamcnlv
veicular, LE3 como disciplina formadora que favorecesse uma reflexão solm'
a) Na maioria dos manuais c dos métodos, observamos um esmagamen-
a noção de código linguístico. Aliás, as didáticas de línguas atualmente piO
to dos fatos culturais e a perpétua ressurgência dos mesmos estereótipos: a fa-
postas na escola já reAetem mais ou menos essa diferenciação.
mília monocelular, com dois filhos, atividades profissionais uniformes, quase
nunca desemprego, doença, deI inquência ... Quando é que os métodos de A elaboração de um ensino plural (G. Lüdi et alii, in Coste, 19(4) \t'

língua estrangeira integrarão a presença da morte, de suas causas, dos ritos impõe. Mas ele deverá estar integrado à metodologia geral e saber concili.u
para os quais ela abre espaço? as IllUito diversas exigências que evocamos:

Duas direções de trabalho são possíveis: combater os estereótipos ou lan- • A cultura cotidiana, que corresponde às necessidades dos aprendizes,
çar mão deles para reconstruir uma imagem mais objetiva dos fatos culturais. deve ser a de nossa época, Isso quer dizer que ela é muito perecível
A tarefa é árdua. Devemos sacrificar a ela toda a cultura herdada? A cultura herdada, <I
"civilização", como dizemos, também não é reivindicada por mune
Chegou-se a falar até mesmo de uma "doença no ensino da civilização".
rosos públicos?
Contudo, as pistas já estão dadas: trata-se de ensinar uma gramática dos com-
• As competências linguísticas e interacionais (Lüdi et alii, in Coslc,
portamentos culturais, de dar chaves, marcos, não produtos, mas "processos
1994) são necessárias para uma construção dos csquemas cul tura iv,
de socialização" sobre a família, a escola, a economia de mercado, a rnídia, a
porque não se concebe mais simplesmente transmitir a cultura. COl1l0
publicidade etc.
formar professores para essa tarefa? Novas tecnologias já estão ('011
b) Foi chamada de competência transcultural a capacidade de comuni- tribuindo para isso e programas de simulação multimídia convidam
car e de agir em uma língua estrangeira. Trata-se de criar uma "mobilidade" os usuários, homens ele negócios ou engenheiros, a "descobrirem o
física e intelectual "ativa" através da aquisição de uma língua estrangeira, que sistema de valores de (seus) parceiros estrangeiros, compreender seu
certamente se oporia às formas contemporâneas da mobilidade (o desenrai- impacto sobre seus comportamentos relacionais e profissionais", Nno

12l01)1J).~II(;AIlI IIN(.II.~~I.SII\~N(.III(AS 01'11100,1.1\1\11"1

há dúvida de que a escola não poderá, por mais tempo, esquivar-se • uma frequente uuscucra de preocupação puramculc lillguíslicn, d.ld()
de uma reflexão sobre as técnicas e habilidades culturais e sobre sua quc essas abordagens não derivam, em sua maioria, da pesquisa dm
aquisição (D. Coste, D. Moore, G. Zarate, 1998). linguistas;
• o trabalho sobre o processo de aprendizagem (tomada de consciêucu:
do processo ou criação de um clima favorável);
@ 7, as~ ro-rxxres 0 teATdcÇ:Js rrcoeros • a perspectiva de formação do indivíduo como sujeito social
lribuição notável do ensino anglo-saxônico
con
- e não apcnas couro
Nos canteiros da didática, ninguém para. Busca-se responder ao desgas- aprendiz;
te das palavras e das modas e à mudança das necessidades. É difícil dizer se • abordagem global, pela qual se recusa dissociar teoria c prática, 11:1
as respostas - que são inovadoras, mas que, para alguns, estão longe de ser qual se manifestam os desafios vitais do indivíduo e não Sil11pleS111t'1l
recentes - alterarão nalgum momento o ensino de línguas. Aqui, distingui- te necessidades de aprendizado, como se diria em um curso C0I111I111
remos duas grandes categorias: as abordagens centradas na pessoa humana e de línguas.
no grupo humano e as abordagens que se apoiarn nas modernas tecnologias
Devemos ponderar bem se quisermos fazer um balanço das abordagens
da informação e da comunicação.
alternativas. R. Duda (Crapel, 1993) conclui a respeito de algumas das abol
b) Essas abordagens representam para algumas pessoas nada mais que c1agens acima citadas que elas apresentam lacunas naquilo que diz rcspci 10
metodologias constituídas, outras são uma verdadeira filosofia da mente ou à compreensão oral e à formação para a aprendizagem, especialmente quun
das relações humanas. Não se conseguiria dar uma imagem honesta delas em do elas estão centradas no professor. Em contrapartida, elas lhc parcccm dv
poucas frases. Vamos mencioná-Ias, em seguida, com algumas referências, grande interesse para a dinâmica de grupo, ou ainda no plano dos princípios,
limitando-nos a destacar algumas de suas linhas de força: tal como o direito de permanecer em silêncio ou do uso da língua materna.

• aprendizagem comunitária de línguas (community language leaming) Em todo caso, sua transposição para situações didáticas escolares parect'
(C. A. Curran, 1976); difícil, dado que os públ icos e o tamanho dos grupos de aprendizagem, pOI
• aprendizagem autodirigida (CRAPEL - Centre de Recherches et exemplo, são muito diferentes em cada situação. Aceitá-Ias também não é algo
automático para todos os contextos culturais. Algumas delas provocariam U111ó1
d'Applications Pédagogiques en Langues, Universidade de Nancy);
violenta mudança, talvez até mesmo uma aculturação sentida como intolerável,
• abordagem natural (natural approach) (Krashen, Tencll, 1983);
como já vimos no caso de metodologias bem menos audaciosas. As abordagens
• método silencioso (silent way) (Gattegno, 1976);
inovadoras também podem ser positivamente "incômodas" (B. Grandcolas), ('
• resposta física total (total physical response) (Asher, 1986), ou "méto-
se questionam nossos sistemas, elas provocam uma reflexão indispensável.
do pelo movimento";
• sugestopedia (Lozanov, 1986); Pleiner e Scherfer (1983) conseguiram, mesmo reconhecendo seu Vil-

• práticas pedagógicas de conjunto: Freinet, Freire, Oury, Rogers etc.; lor, questionarem o fato de que elas frequentemente "amplificam até o erro
• pedagogia ou procedimento de projeto, que associa ao objetivo didá- um aspecto parcial da aprendizagem" e podem abrir espaço para desvios.
tico objetivos relacionais ou sociopolíticos (Boutinet, 1993); Diante disso, eles evocam três princípios diretores do trabalho didático:
• dramatização (Boal, 1977), psicodramaturgia linguística (Moreno, 1965); Partir de uma análise alicerçada em parârnetros políticos, sociais c instilucio
• aprendizagem em colaboração etc. nais do processo didático; não negligenciar a reflexão sobre as condições doi
comunicação verbal e sobre a natureza da língua ensinada; respeitar () aprcnch
E mesmo que seja impossível esgotar a criatividade dos pedagogos, podemos como um ser humano que aprende conscientemente e que é capaz de I>CIIS.II
dizer que as palavras-chave que caracterizam seu procedimento são as seguintes: e de agir livremente.

~. 96 01)IIIAIICA 111',
l.iNl;IIAS 1'.SlllANl:!';lIlAS O PII'llIlI T\.IAllIINF/,

b) Os meios técnicos e as neotecnologias abrem-nos perspectivas que pocm limitar a qu'1I1tld.lde e a diversidade das respostas possivcis, em SIIIlW,
apenas pressentimos nessa virada de século. :I riqueza do diálogo.

Sabemos que a expressão "indústrias da língua" (Degrémont, 1982) de- Por fim, seria necessário evocar a qualidade das práticas sociais ou o
signa os produtos, técnicas e atividades que exigem um processamento auto- t'mpobrecimento inevitável das representações culturais e lembrar que existe
mático das línguas naturais. De modo mais ou menos direto, as técnicas de lima relação entre custo e eficácia. O exemplo do ensino de línguas a distân
acesso à informação, a tradução automática, a lexicografia, a terminologia, cia, com o rádio e a televisão e, atualmente, a videoconferência, é esclarece
a informatização (um processador de texto inclui um corretor ortográfico) dor: o caso da classe de línguas deve ser radicalmente dissociado do caso da
interessarão à didática. conferência ou do curso magistral.

Mas uma utilização mais sistemática pode ser feita com instrumen- O uso das tecnologias modernas na aprendizagem de línguas - CVI
tos modernos da comunicação. Os suportes e ferramentas utilizados são dcntemente, como elemento de base de uma didática e não como supor
atualmente bem conhecidos ou estão em vias de se tornarem muito co- te ou meio auxiliar - evoca avanços técnicos, esforços pedagógicos c um
nhecidos: rádio e televisão, claro, vídeo (som e imagem), cd-rom, eDI aumento de reflexão. "E se determinada propensão do ensino de línguas
(compact-disk interativo), computador (ensino assistido por computador), .onsistisse, em um período de crise, em se deixar levar pelas ilusões íccno
correio eletrônico (e-mail, torpedos, blogs, fóruns ... ). Em síntese, trata-se lógicas, outrora informáticas, hoje outra vez midiáticas?", escrevia um cspc
de tudo o que o que é classificado como "multirnídia" e que pode agrupar cialista, Charles de Margerie.
os centros de recursos linguísticos, midiatecas e "casas de línguas" em um
Por sinal, é preciso relativizar seu impacto efetivo em sala de aula, em vista
número sempre mais crescente.
das realidades materiais e talvez da lentidão com que se promove uma evolução,
Quanto às metodologias elaboradas em torno dessas ferramentas, elas porque o encantamento da mudança nada vale sem formação pedagógica para
quase sempre associam vários dispositivos ou técnicas, que são garantias in- uma prática efetiva. Mas não se exclua, no futuro, a tendência a uma desesco-
dissociáveis de seus resultados. Um curso de inglês por telefone é, à primeira larização parcial do ensino de línguas, já manifestada pela importância das tro-
vista, um curso particular; um diário de classe enviado por internet é, à pri- cas linguísticas (frequentemente extraescolares) e pela abundância de materiais
meira vista, um projeto comum bem-sucedido etc. <:onsagrados à difusão das línguas (videogames, ferramentas paraescolares).

Por enquanto, a avaliação das experiências feitas aqui e ali ficou ainda Escorregaríamos para a autoformação dirigi da ou para as autoaprendiza-
mais difícil pelo caráter frequentemente limitado e deformador do campo gens e para uma mudança do papel do professor, que já teve a própria morte
escolhido (mundo dos negócios, universidade). Seria de lamentar que essas anunciada tantas vezes: de todo modo, esse papel deveria evoluir, mas não
técnicas (mais que "métodos") se revelassem decepcionantes, uma vez passa- desaparecer, desde que certa lógica comercial não se torne a cartilha única.
da a primeira onda, e carentes de bases teóricas sólidas e originais.
No caso de acontecer uma mudança das mentalidades escolares, não rcs
A questão é, primeiramente, metodológica: não podemos nos contentar la dúvida de que veríamos uma desvalorização das ferramentas tradiciona is, c
com adaptar ferramentas já existentes, às vezes editadas com o mesmo nome; o fosso entre a didática institucional e as expectativas dos aprendizcs poderia
transferir para a tela "exercícios de completar" outrora feitos em papel; vi-
se alargar ainda mais.
sualizar a fala por meio de um procedimento de reconhecimento vocal (o
que permite a avaliação de desempenhos), sem propor nenhuma correção A não ser que o interesse se concentre apenas em públicos abastados,
fonética, senão recomeçaríamos a tarefa ao infinito; falar de interatividade, motivados, que queiram aprender e sejam capazes de reinvestir suas aquisi
quando há restrições técnicas (a memória necessária, por exemplo) que im- ções, a didática deve se aplicar resolutamente a uma tarefa científica. I':ss:l

~ YU \!.lI }II)A IICA 1)1/ TTNCIT\'rSTI1\Nr.FTRA~ v I'IFRRC'''-I''ITINI

tarefa incide sobre a especificidade e sobre os atributos das ferramentas, sobre \llIillws, IlO Oceano lndico, a noçao de [rancês ou illglês COIIIOIlIlgllil se
os conteúdos, os materiais, as situações pedagógicas. I;IIIHIaleva a analisar as "funções, conteúdos, métodos reservados no sistema
edlll"alivo ( ... ) às diferentes línguas" (C. Oliviéri). A espccifieidade desses
A didática se dobra diante de uma obrigação ética: refletir sobre uma r1ikrentes terrenos começa a ser bem conhecida sob o aspecto social e insti
justa gestão dos meios reservados ao ensino, avaliar o impacto sobre o meio
IIIt'ional, depois de diferentes pesquisas (Martinez, 2008).
ambiente antes de toda e qualquer extensão.
Os estudos relativos aos problemas didáticos ainda poderiam ser <1111
pl:11llCntedesenvolvidos. O debate incide sobre o uso das línguas nacionais
@ a. Odáticc 0 geJstão !ingu'sticc • note-se que determinados países, como a Cuiné ou o Madagascar, reto
matam o ensino em francês ou estão prontos a adotar o inglês - c sobre (\
Contrariamente à gestão da aprendizagem, que tende a se individuali- l'Il1crgência de uma metodologia adaptada a esses países: definição de uuut
zar, a gestão do patrimônio linguístíco, o lugar e o estatuto das línguas de uma ..escola fundamental", levando em conta as culturas nacionais, a pedagogia
comunidade são um assunto coletivo (J.-L. Calvet, 2007). Ensinar línguas faz dos grandes grupos, o ensino a distância por satélite, a formação profissional
parte desse dispositivo, e os posicionamentos do poder político, seu interven-
segundo uma "pedagogia convergente das línguas (Maurer, 2008), em situ
cionismo ou não na matéria são deterrninantes, mesmo por omissão.
ações frequentemente difíceis". A adequação com as atitudes sociais, cspc
É a ação interna ou externa sobre as línguas que chamamos de "política cialmente as dos pais dos aprendizes em particular, é uma condição absoluta
linguística": ação interna, sobre o aparato linguístico (neologismos, termino- para o sucesso de uma didática.
logia, escrita), ação externa sobre o ambiente (estatuto oficial, leis, difusão
A demanda de escolarização em francês ou inglês é expressiva, mas ensi
por meio da escola, promoção e difusão de uma língua no estrangeiro). Exa-
nar ciências em uma língua segunda significa que essa língua se vê iuvcslida
minemos algumas questões importantes:
de uma dupla e temível missão: veicular conteúdos e ainda contribuir pma
a) Os dispositivos de ação de diiusõo no exterior oscilam, por exemplo, a formação do próprio espírito científico. A questão não está reservada ao
entre: a linguística pura, o cultural associado ao linguístico, o cultural puro. contexto do qual estamos falando, mas ela é particularmente bem estudada
A imagem das línguas e a determinação que os alunos têm em aprendê-Ias de- relativamente ao francês: foi possível falar de uma verdadeira "virada da [ran
correm, de fato, do retrato que as escolas dão dessas línguas, do trabalho das cofonia científica", e o sucesso da iniciativa dependerá muito das didáticas
associações de professores, das representações identitárias ou das aspirações
em funcionamento.
pessoais. As decisões tomadas a seguir para promover essa ou aquela didática,
Não deixaremos de assinalar a experiência muito rica que nos é tral'.idil
como é o caso da cooperação e da difusão linguística e cultural francesas,
pelo ensino de algumas disciplinas em língua segunda, por exemplo, nas se
alemãs, japonesas, devem integrar limitações orçamentárias e os parâmetros
ções internacionais dos estabelecimentos franceses e nos "programas de i11H': 1
do mercado: o espaço, a avaliação das necessidades reais e não a avaliação das
expectativas dos países demandantes, o tempo, a terceirização possível pelas são" promovidos no Canadá ou na Alemanha (L. Cajo, 2001).
instituições locais. Fica claro, portanto, que a didática, mesmo no exterior, c) Na Europa, a questão do plurílinguismo apresenta-se com intensidade
existe em interdependência e não pode ser definida in vítro. para as instituições (Parlamento, Conselho ... ): o ensino médio c SUpCIiOI, il
b) As situações sociolinguísticas que mencionamos no capítulo I (língua mobilidade intraeuropeia dos estudantes c dos profissionais. Na Europa, lilll-
segunda, no sentido coletivo) põem em contato línguas nacionais ou locais to quanto no restante do mundo (C. Zarate et alii, 2008), é necessário alellla!"
vcrnaculares e línguas de ensino, tais como o inglês ou o francês. Na África para o aumento da demanda de formação linguística nos campos cicul íflt'O,
(Snmnssékou, ACALAN [The African Academy of Languages], passim), nas comercial e técnico e para o recuo do literário, o que terá repercussões sol» ('
~ W 0nlllÁIICA 1)1',I iNCllAS I'SIIIANI,I':IIIAS li' 11111<.
MAl( IINi':1,
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as instituições, saberes e habilidades dos professores e sobre a didática. Longc «-vpcito de quais sejam os objetivos exalas da aprendizagem. Nunca sabt'''los
de se entrincheirar na prescrição de objetivos, métodos e meios de avaliação, (ou nem sempre sabemos) se se trata de sensibilizar para uma escolha Iuíuru,
um ensino de línguas que corresponda às ambições da União Europeia deve de realmente iniciar, de provocar uma abertura cultural. Perguntamos quem
estar situado em um modelo geral de ação política, linguística e axiológica. O deve ensinar e como preparar os formadores, como articular a didática 111 i
documento fundamental - já evocado em seus aspectos metodológicos no hzada com a didática que a sucederá. Em suma, as perguntas sem respostas
que diz respeito à perspectiva acional e intitulado "Quadro europeu comum continuam sendo muitas, especialmente quando se nota, de acordo C0111 os
de referência para as línguas" - traça as grandes linhas, define os campos e países, um distanciamento entre as ambições e os meios reservados a projetos
determina os projetos de uma União Europeia confrontada com uma cres- de interesse ainda considerável (Groux, Porcher, 1998).
cente diversidade de seu plurilinguismo histórico. Em todos os casos, observamos que a dificuldade, para uma instituiçào
O programa de trabalho do Conselho da Europa chega quase a balizar nacional, é chegar a uma concepção clara e aceita das finalidades de um clis
certo futuro da didática, pelo menos para uma parte do mundo: redefinição positivo. A arquitetura do plano de ação, a didática de acompanhamento <I,.
de objetivos, escolha das tecnologias e utilização da mídia, educação bilín- vem responder a restrições que nem sempre são convergentes: necessidades
gue, intercâmbios, técnicas de aprendizagem, avaliação dos níveis de compe- sociais dos aprendizes e representações que eles têm acerca de seu futuro; ca
tências permitem a comparação e a mobilidade. Não se deve esquecer que as pacidades e desenvolvimento intelectual, cultural e afetivo desses aprendizes:
línguas entram, em cada sistema escolar, em concorrência, que elas "culti- finalidades e meios reservados pela escola e pela sociedade à aprendizagem
vam" a própria imagem ou procuram mudá-Ia, e podemos nos perguntar por dessa ou daquela língua.
um instante que imagem têm o alemão, o árabe, o russo ou o japonês nesses
cenários. Os didatas têm consciência daquelas que são mais "gramaticais",
mais "comunicativas", mais "culturais", segundo os casos. A questão da esco- @ 9. oesotos atuas, peJSqusa 0 torroçóo
lha da primeira língua estrangeira e o lugar destinado às línguas minoritárias
Vimos que a didática constituía:
(grego, dinamarquês ... ) são um motivo de preocupação (D. Moore, 2006).
a) Um campo em busca de sua cientificidade. Falar da "didática" é leva,
Quanto às políticas de destinação dos migrantes, elas revelam uma ação
a entender a unicidade do campo, mas registrar a palavra no plural é sugerir a
pouco conhecida pelo restante da população, frequentemente marginal, às ve-
abertura e a necessária diversidade das problemáticas e da reflexão. A didát ica
zcs desprovida de continuidade. É verdade que a demanda é flutuante e exige
não é nem uma ciência, nem uma tecnologia, mas uma praxiologia, ou seja.
respostas rápidas, quase sempre no ritmo de conflitos e êxodos. No Québec,
uma investigação dos meios e dos fins, dos princípios de ação, das decisões.
depois de muito tempo, fala-se da "formulação de uma política global e clara"
Sua tarefa é complexa: elaborar saberes que sejam uma transposição de sabe-
(Germain, 1993). Na França, os dispositivos de acolhida de crianças ou adultos
res científicos para saberes ensinados; apropriação desses saberes; intervenção
não francófonos sobrevivem na precariedade, apesar da dedicação dos sujeitos
envolvidos. Uma reflexão profunda leva, ao mesmo tempo, às metodologias didática propriamente dita.
de ensino em língua segunda e às condições socioculturais da integração. Mas Esse campo, até esse momento, não fez mais que esboçar sua transvcr
subsistem graves problemas de formação específica dos professores, e as salas salidade: deve haver uma didática geral e, dado o caráter original da língua
de aula ainda não dispõem de ferramentas adaptadas (Migrants-Fonnation, como objeto de ensino, didáticas específicas? É preciso haver uma didát i
CNDP - Centre national de documentation pédagogique). ca para cada língua, em virtude ainda das especificidades próprias de cada
d) Por fim, o estabelecimento de um ensino precoce de línguas estrangei- uma delas? Até aqui, essa pergunta encontrou respostas teóricas mu ilo 1íllli
ras na escola é uma ideia que avança na Europa, mas que é muito hesitante a das (Lehmann [org.], 1988), mas, com notáveis exceções, nem a didálica d<:
~.


~ -102 (1)IDAIICA DI', UN(.IIAS I'SII\AN<.I' 111AS
01'11' 1110',
~1.~II1INI'l

1.1\por semana durante HI10~c aceitando como um postulado imutável qlle Il<IO
campo, nem as formações para o ensino parecem pressionadas a enLrar em
11.1necessidade de motivação rcal em um meio "cativo"? EvcnLualmcnte, mio
acordo, nem tanto para determinar uma posição universalista, mas para tra-
,Clla o caso de pensar em reorganizar a "montagem" pedagógica e didática?
balhar juntas na comparação das diferenças e refletir a partir delas.
Outro exemplo refere-se às competências e ao estatuto do professor: o que
b) A didática também é um campo de desafios e de conflitos, onde rei-
-uhsislc do professor de letras (estrangeiras) em suas funções de professor de Iín-
nam certa instabilidade (a divisão das competências entre didática e pedago-
',II<I?E, consequentemente, onde a formação didática, inicial c continuada, se
gia etc.) e efeitos de moda para disfarçar, quem sabe, a ausência de formação
vuua no percurso dos professores? As escolhas didáticas englobam, de fato, deter-
real (J.-P. Narcy, 1991). As contradições provocam uma tensão e também
.uinações institucionais e ideológicas expressivas, mas quase nunca explícitas.
uma aspiração à compatibilidade, mesmo que observemos certo desenco-
rajamento e uma tentação de ecletismo radical. Surgem, então, distorções A global idade de sua intervenção, os aspectos complementares de seu
entre a metodologia circulante, as das salas de aula, e as metodologias cons- uubalho impõem ao professor:
tituídas fora delas.
• conhecer, é claro, de maneira satisfatória a língua e a cultura cstran-
Do mesmo modo, há um discurso da didática e um discurso sobre a genas;
didática que não se articulam. D. Coste (1986) chegará a escrever que a didá- • ensinar o aluno a se comunicar;
tica poderia ser perfeitamente confundida • contribuir amplamente para uma educação geral, propondo ferrarncn-
com um conjunto de discursos orelenados em função de seis polos: a produ- tas para "ensinar a aprender" e uma abertura trans- ou intercultural.
ção de saberes, a vulgarização elos conhecimentos, o "como fazer em classe",
a comercialização de ferramentas ele ensino, a instauração de uma política Segundo a bela expressão de Jean Peytard,
linguística, o dogma ele uma corrente metodológica ou de uma panelinha ensinar a outro é alterar uma fala (... ). O professor propõe, alterando-a, uma
pedagógica ... temática original e, dessa fala alterada, ele faz outra, a sua, que, por sua vez,
transformará a ele outros.
Por enquanto, queremos agir mais rápido e melhor, porque a diversifica-
ção das necessidades e os desafios econômicos e sociais jogam todo o seu peso O professor não consegue cumprir uma função "substitutiva" (não
contra a maioria dos sistemas de formação. aprendemos no lugar do aprendiz), mas ele participa da construção que dcfi-

o êxito da aprendizagem em língua segunda para os públicos prove- 11Ca aquisição da L2.
nientes da imigração, por exemplo, condiciona o êxito de quase todas as Trata-se, inicialmente, de dar os meios de elaborar conhecimentos a
aprendizagens. Ele constitui uma aposta vital, em termos de formação pro- partir de esquemas cognitivos pessoais e com dispositivos adaptados a esses
fissional e de integração, para os interessados e para as sociedades nas quais esquemas. Isso significa que o aprendiz deve ser reconhecido em sua espcci-
eles se instalam. Desse modo, salvo talvez nas universidades livres e na apo- ficidade e que os dispositivos didáticos devem ser diversificados e adaptados.
sentadoria, alguém ainda se interessará em aprender uma língua por puro Essa conclusão leva a abrir um duplo debate sobre:
prazer? Os critérios de eficiência c de rentabilidade sociais impregnam cada
• uma pedagogia diferenciada em função dos aprendizes, que dcvc evi
vez mais as escolhas didáticas.
tar todo o tempo a armadilha do idealismo e a da impotência: o idca
c) Examinemos as consequências dessa situação sobre as instituições e lismo do sucesso permanente, a impotência que brota das condições
sobre a formação dos professores, limitando-nos a alguns exemplos. materiais próprias do ensino de línguas;
• lugares de pesquisa e de fonnação para o ensino que não separem,
A duração e o ritmo de trabalho escolar são restrições que não têm por que
como é muito comum hoje, universidades, institutos pedagógicos, cs
serem imutáveis. Pode-se aprender com muito proveito o russo ou o árabe três ho-

tágios práticos, associações profissionais de pesquisadores c pratican- @
tes, centros de pesquisa em educação comparada, revistas, colóquios
e exposições (como em Londres, Genebra ou Paris com a Expolan-
gues). Uma abordagem comparativa, em escala mundial, se impõe.

Percebemos nitidamente que é a fundamentação e a eficácia dos siste-


mas de formação que estão em jogo. Sem dúvida, também, o instrumento pri-
vilegiado de uma evolução positiva será a multiplicação de "pesquisas-ações",
incluindo inovação, descrição de práticas, validação de uma pedagogia.

Seguramente, são numerosas as vias de acesso rumo a uma didática ge-


ral, que imaginamos há de se inspirar em sua história, em seu questionamen-
to científico e em sua ética social.
contcce com a didática o mesmo que com nosso mundo: sua süua
ção é contrasianie. "Estamos no tempo da imaginação c da rclici
dade pedagógicas", escrevia um didata suíço. E também, imcdia-
tamente ao lado: "Aqui, rebenta-se de tanta opulência; lá, de tanta
fome. Tudo vai, evidentemente, ficando cada vez mais complexo".
Uma reflexão didática é, a nosso ver, cada vez mais concebível,
uma didática prescritiva e monopolista é cada vez menos aceitável.

o panorama que acabamos de pintar, por mais difícil que seja, não pre-
tende impor o menor dogmatismo. Lembremos simplesmente llue a corrida
na direção de novas metodologias frequentemente assumiu o caráter de uma
rendição incondicional aos modismos. De nossa travessia de longo curso em
didática, guardamos as palavras de um inspetor de educação africano, cu jo
discurso não era, é claro, o discurso do imobilismo:

Felizmente, não temos recursos para comprar os mais recentes métodos de vo-
cês. Vocês já os consideram como ultrapassados. Será um mal menor se lIÓS
passarmos diretamente para os métodos seguintes, que, por sinal, retomam aos
do passado.

Por esse motivo, a reflexão não se concluirá. Na expectativa das próximas


evoluções que já se esboçam, o professor de línguas está comprometido com
um processo contínuo de questionarnento. A busca da cientificidade à qual ,I
didática se inclina implica a extensão dos recursos oferecidos e o descnvolv i
mento do espírito crítico. Tudo passará, então, pela formação e informação.

A didática é justamente uma tentativa de resposta à insatisfação nascida


do aleatório, uma tentativa de formalização e uma busca do factívcl. Mas a

~ 106 (1)11)1\'11(;1\ 1)1':I.IN(i(lAS I'SII\I\NCIIHAS O I'III\!\!: I\IAHllNFi

~
definição de soluções
técnicas levaria apenas ao esquecimento das finalidades ~-@ .

ogrof a
profundas da ação, ação que se dá em um meio físico, material e, sobretudo,
humano, sempre
todo preço, continuar
único. Os professores
a serem transmissores
de línguas são educadores
de culturas e de ideias.
e devem, a
-li
Quando, em 1669, Luís XIV fundou em Paris a Escola de Línguas
Orientais, que naquele tempo se chamava "Escola das Jovens Línguas", ele
sonhava com a grande diplomacia. O Rei Sol tinha a ambição de formar "in-
térpretes", chamados à época "dragomanos" (em árabe, turgumán, tradutor,
intérprete). Os desafios atuais não são de menor envergadura.

As línguas representam meios tanto para a paz quanto para a guerra,


e a gestão que fizermos do plurilinguismo de nosso mundo condicionará o ()BRAS

futuro dele. Ora, a desigual repartição dos recursos disponíveis para a edu- \I.I.WRIGHT,O., BAILEY,V, Focus on the Language CLassroom. An Introduction to Ctassrooin
Research for Language Teachers. Cambridge: Cambridge University Press, 1991.
cação em geral confrontará alguns países com problemas insuperáveis, se I\AKER,C., PRYSJONES,S., EncycLopedia of BilinguaLism and BiLinguaL Education. Cleveclon:
eles se enfiarem - ou se forem levados a se enfiar - em sistemas de ensino Mullilingual Matters, 1998.
Ikl'ESON,C. et alii. La nouvelle communication. Org.: Y. Winkin. Paris: Le Seuil, 1981.
dispendiosos e inadaptados.
13t-:Acco,J. C., BYRAMM., Cuide pour I'élabctation des IJoLitiques Linguistiques éducatives ell
Europe. De Ia diversité Linguistique à l'éducation IJLuriLingue. Strasbourg: Conseil de
Por outro lado, os avanços tccnológicos que reconstroem o espaço didá-
l'Europe, OPL, 2003.
tico têm um impacto cultural que já é visível: uma homogeneização dos pro- BI::RARD, É., L'approche communicative. Théorie et pratiques. Paris, CLE International, 1991.
cedimentos de intervenção, que também se pode chamar de nivelamento das BI,SSE,H., PORQUIER,R., Crammaire et didactique des Langues. Paris: CREOlF-llatier, 1984.
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globalização desse processo. Não resta dúvida de que a inovação não deve ser BOURDIEU, P., Ce que parler veut dire. Economie des échanges Iinguistiques. Paris, Fayard, 1982.
recusada, mas ela deve ser escolhida e controlada. E a questão encontra seu CALVET,J.-L.,As políticas linguísticas. Trad.: 1.de O. Duarte, J. Tcnfen, M. Bagno. São Paulo:
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