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Nv-Amor de Milionario
Nv-Amor de Milionario
—O que qualquer pai faria em meu lugar. Vim ver se minha filha
está bem.
—Se acha que estou torturando sua garotinha, vá ver com seus
próprios olhos.
—De jeito nenhum! Se ela acordar, voltaremos à estaca zero.
—Até que não seria uma má ideia. Afinal, perdi õ fio da meada
no meio do caminho, e não sei nem em que ponto estamos. Sabe de
uma coisa, sr. Proctor? Conseguiu despertar minha curiosidade.
Por que não senta-se, enquanto vou buscar um drinque? Mal posso
esperar para ouvir suas explicações.
Jim afirmou com a cabeça e acomodou-se em uma das cadeiras da
cozinha.
— É uma velha casa — comentou casualmente.
— Mais do que pode imaginar. Meus ancestrais a construíram em
1746.
— Ah! Puritanos orgulhosas da terra?
— Não. Pioneiros orgulhosos da casa. Há uma enorme diferença,
como deve saber.
— Não, não sei. E pensei que ia me oferecer um drinque.
— Infelizmente, não temos muitas opções.
—Não vai conseguir livrar-se de mim com uma desculpa tão tola.
—Estou falando sério! Não tenho nenhuma bebida, a menos que...
—Prossiga.
—A menos que tenha muita coragem, sr. Proctor.
—Jim — ele a corrigiu. — Meu nome é James, mas as pessoas me
chamam de Jim. E por que preciso ser tão corajoso para tomar
um drinque?
—Porque só tenho licor de pêssego feito em casa. Minha avó o fez
antes de morrer.
—E há quanto sua querida vovó se foi?
—Há quinze anos. Vai arriscar?
Proctor riu como se não acreditasse no que ouvia.
— Se a bebida não quebrou a garrafa em todos esses anos, não
poderá fazer nenhum mal ao meu estômago.
—Isso é o que você pensa — ela resmungou enquanto apanhava o
saca-rolhas.
As coisas iam de mal a pior. Não tinha taças, nem cálices, nem
copos de cristal. Na verdade, os únicos copos que possuía eram os
de requeijão e massa de tomate que lavava e guardava depois de
utilizar o conteúdo. Pensando bem, talvez fosse melhor expor sua
verdadeira situação de uma vez por outras, disse a si mesma,
servindo uma dose dupla e colocando o copo grosseiro diante dele.
Proctor examinou a bebida com cautela e cheirou-a. Lucy esperou,
ansiosa. Sabia que o licor de sua avó tinha um excelente bouquet,
mas também conhecia seus efeitos.
— Minha mãe costumava usar copos como este — ele comentou.
Ah, podia apostar que sim! Como se não bastasse o constran-
gimento de receber uma visita sem as mínimas condições de con-
forto, ainda tinha de aturá-lo tentando conquistar sua simpatia
com truques ridículos.
— Sua mãe era uma mulher de bom gosto — ela respondeu com
ironia. — Beba de uma vez.
Jim ergueu o copo num brinde silencioso e esvaziou-o de um só
gole. Por um momento conservou o sorriso provocante, mas de
repente fechou os olhos e, vermelho, começou a tossir.
Lucy levantou-se de um salto e bateu em suas costas até que ele a
empurrou, lutando para recuperar o fôlego. Água! Talvez um
pouco de água o ajudasse. Rápida, correu até a geladeira e apanhou
a garrafa de leite que servia como jarra.
Em seguida voltou para perto dele e, solícita, despejou a água onde
deveria estar a boca de Jim Proctor. Deveria... mas não estava.
—Devo admitir que é um homem de coragem — Lucy reconheceu
quinze minutos mais tarde.
—Sou um homem de muita sorte, isso sim. Caso contrário, você
teria me afogado — ele resmungou, enxugando-se com uma toalha.
—Tem razão. Quer mais um pouco de licor de pêssego?
—Não quero mais nada desta casa — Proctor indicou em voz baixa,
aproximando-se com ar ameaçador. — Não me faça mais favores, está
bem? Quando a conheci, fiquei tentando imaginar por que ainda não
havia se casado. Agora sei a resposta. Você é uma catástrofe
ambulante!
—O que queria dizer a respeito de Maude? — Lucy perguntou,
disfarçando a apreensão e afastando-se alguns passos.
—Maude tem asma. Os episódios não são muito frequentes, mas
achei melhor mandar o inalador e o remédio. Acha que será capaz de
ajudá-la, se for necessário?
—Tenho certeza que sim, sr. Proctor. Normalmente consigo passar
cerca de quarenta e oito horas sem cometer grandes bobagens. Mais
alguma coisa?
—Eu... não. Só quero pedir desculpas por meus convidados. Não
imaginei que fossem tão longe. Eloise e eu planejamos uma pequena
reunião, e sugeri que ela trouxesse alguns amigos de Boston. Espero
que tenha sido apenas uma ocorrência isolada.
—Aceito suas desculpas — disse, apesar da vontade de argumentar.
Proctor também percebeu que ela só concordava para livrar-se de sua
presença, mas decidiu fingir-se convencido. Afinal, só teria a ganhar
se cultivasse sua amizade. Maude gostava dela, e agora percebia que a
vizinha não era tão sem atrativos quanto imaginara.
— O que faz para viver?
Lucy encarou-o com ar suipreso antes de responder:
—Sou professora substituta no sistema de ensino local. Durante as
férias de verão, faço um pouco de tudo.
—Qualquer coisa?
—Qualquer coisa legal... e moral. Não devia estar com seus
convidados? — ela inquietou-se. — Afinal, se vai mesmo se casar
com sua cunhada...
—O nome dela é Eloise. E as paredes realmente têm ouvidos por aqui,
não? Se quer mesmo saber, estamos pensando em nos casar pelo
bem de Maude.
—Por Maude? Ah, pelo amor de Deus!
—Por que o espanto? Não percebe que a menina precisa de uma
mãe? Ela é teimosa, rebelde, e não tenho tempo para discipliná-la.
Acho que Eloise, como irmã de sua verdadeira mãe, é a melhor
solução. E o arranjo certamente facilitaria as coisas para os avós dela.
Eles idolatram o chão que Maude pisa, sabe?
— Acho que sim.
Gostaria de insistir no assunto, mas era evidente que Proctor ficava
impaciente com suas perguntas, e não queria aborrecê-lo. Não depois
de tudo que já havia feito. Em silêncio, acompanhou-o até a varanda e
pensou se não estaria lhe prestando um favor impedindo seu
casamento com Eloise. Mas... seria capaz de roubar um homem de
outra mulher? E como se conseguia tamanha proeza?
Talvez houvesse algum livro sobre o assunto na biblioteca local.
Mas, no dia seguinte, quando saísse, Lucy não pensaria em livros. A
primeira coisa que faria ao chegar ao centro comercial seria comprar
um novo traje de banho, um maio que aderisse ao corpo como uma
segunda pele, mas mantivesse todas as partes mais importantes
cobertas.
Capitulo III
Capitulo IV
Capitulo V
—Por enquanto?
—Até o banco decidir executar a hipoteca. Tive de fazer um
empréstimo para... Bem, isso não importa. Qual é o problema?
— É verdade que está dando aulas de natação em seu quintal?
— Sim, mas infelizmente não pode participar do grupo, porque só
aceito meninas.
—Não estou interessado em fazer parte do grupo. Tem algum
lucro com as aulas?
—É difícil dizer. Era o que pretendia, mas ainda não tive
nenhum lucro, e estou começando a desconfiar que não verei a
cor do dinheiro até o final da estação.
—Acho que não entendeu, senhorita. Quero saber se cobra
pelas aulas de natação.
—É claro que sim! Mas não o suficiente, receio.
Maude havia saído da água para ouvir a conversa e agora gritava
e acenava para alguém em sua casa.
—Tem licença para operar comercialmente nesta área, senhorita?
—Licença? Por favor, pare de me chamar de senhorita. Meu
nome é Lucy Borden.
—Eu sei qual é o seu nome... senhorita. Você estudou com meu
irmão.
—É mesmo? Quem era...?
—Escute aqui, senhorita, não vim à sua casa para uma reunião
social. Tem licença para operar comercialmente numa zona re-
sidencial? Recebemos uma queixa.
Lucy encarou-o em silêncio. Sabia que soltar o cachorro em cima
de um policial era ilegal. Além do mais, não tinha um cachorro
para soltar. Mas se oferecesse alguns dólares... Não. Preferia
pagar a multa.
—Afinal, o que significa tudo isso? — perguntou, fingindo não
compreender a situação.
—Significa que tenho o dever de adverti-la. Está violando a lei de
zoneamento municipal, e vai ter de fechar sua escola. Se quiser
apelar, pode enviar uma solicitação de licença em caráter
extraordinário para o conselho da cidade.
—Acha... que não posso continuar dando as aulas de natação até
a próxima reunião do conselho? Sei que ainda vai demorar algum
tempo e... não? — O policial estava balançando a cabeça. — Aposto
que seu irmão seria mais tolerante.
—Meu irmão?
—Aquele que estudou comigo.
—Ah, sim. Talvez. Infelizmente ele está na Arábia Saudita, cavando
poços de petróleo.
—Não posso nem concluir a aula desta manhã? Falta somente uma
hora.
—Pode terminar sua aula. Mas passarei novamente por aqui às duas
da tarde, e é melhor que não haja nenhuma aluna na água.
—Sim, senhor.
Gostaria de dizer muitas outras coisas, todas grosseiras e inadequadas
a uma mulher bem educada, mas o policial olhava por cima de seu
ombro como se algo chamasse sua atenção.
— Algum problema? — Uma voz masculina e firme perguntou às suas
costas.
Sobressaltada, Lucy virou-se e viu aquele sorriso irritante nos lábios de
Jim Proctor.
— Não. Você não — gemeu.
Todas as meninas reuniram-se num semicírculo em torno dos dois e ela
sentiu-se prestes a ter um ataque.
— Sou o sr. Proctor, dono do maior banco da cidade. Está acusando
minha noiva de alguma coisa?
Lucy pensou em protestar, mas ele a abraçou e apertou seu ombro
numa mensagem silenciosa.
—Bem, recebemos uma queixa, sr. Proctor. Alguém afirma que sua
noiva está operando comercialmente numa zona residencial.
—Quem faria uma reclamação tão idiota? A velha do outro lado da
rua?
Não podia ser! A casa mais próxima ficava tão afastada da estrada, que
apenas as chaminés podiam ser vistas de onde estavam.
— Sim, foi a sra. Chase — o policial confirmou. — Ela reclamou do
barulho, de um punhado de garotas seminuas correndo pela praia, e
parece que caiu da escada quando tentava ver o que estava
acontecendo através da janela do sótão. Como torceu o tornozelo,
pretende processar sua noiva por danos físicos. É claro que isso é uma
grande bobagem — ele riu. — Mas existe realmente um problema
legal, sr. Proctor. A prefeitura é bastante rígida com relação ao
cumprimento da lei de zoneamento, e se sua noiva pretende manter
uma escola nessa área, terá de solicitar uma licença especial do
conselho municipal. Até lá...
—Não exagere, oficial. Caso não tenha percebido, isso não é
realmente um negócio. E uma espécie de... hobby, e uma ação social.
Através das aulas, Lucy mantém um punhado de meninas afastadas das
ruas. Tenho certeza de que reconhece duas ou três delas, não?
—Sim, conheço três dessas meninas. Pais ricos, filhos mimados. Não
havia pensado nisso. Mesmo assim...
—Então, tem de admitir que ela não está realmente operando
comercialmente, correto?
O policial afirmou com a cabeça.
—Sendo assim, não há necessidade de fechar a escola tão
repentinamente. De qualquer forma, ela entrará com a solicitação de
licença o mais depressa possível. Não vai querer essas crianças soltas
pelas ruas, vai?
—De jeito nenhum! — o oficial exclamou. — Mas só posso permitir o
funcionamento da escola por um ou dois dias. Espero que
compreenda, sr. Proctor — e despediu-se com um aceno.
Lucy o viu desaparecer do outro lado da casa e virou-se para Jim.
—O que significa tudo isso, afinal?
—Significa que está infringindo a lei. Além de não ter uma licença
para administrar uma escola particular, não pagou as taxas exigidas. Ou
pagou?
—Não. Por que insiste em fazer perguntas idiotas cujas respostas já
conhece? E agora, que diabos vou fazer? Eu tenho uma licença!
—Do conselho municipal?
—Da Cruz Vermelha. E o suficiente para tornar meu negócio legal,
não?
—Infelizmente, vai ter de fechar sua escola por algum tempo. Ou
continuar operando sem cobrar pelas aulas. Enquanto isso, irei
procurar os pais das meninas para conseguir apoio e pedirei instruções
ao advogado do banco. Ele deve conhecer alguma forma de
contornarmos essa situação.
—Que mundo mais estranho! Parece até que estou cometendo um
crime!
—Não quer perder a escola, quer? Conversei com Angie há alguns
minutos, e ela disse que você realmente precisa do dinheiro.
—Muito bem, garotas! — Lucy bateu palmas. — A aula ainda não
terminou. Todas para dentro da água! Você também, srta. Proctor.
Depressa!
—Mas eu queria...
—Vá se divertir enquanto pode — Jim comentou, esperando que ela
se afastasse para voltar ao assunto. — Precisa do dinheiro porque...
—Isso não é da sua conta!
—Lucy!
—Não preciso de dinheiro nenhum, sr. Proctor. E não pretendo me
casar com você, e também não vou... — As últimas palavras foram
abafadas pelo beijo quase selvagem.
Ainda estava tentando recuperar o fôlego quando Proctor indicou:
— Não me importo com um pouco de independência de vez em
quando, mas às vezes você me faz perder a paciência, Lucy. Por que
precisa de dinheiro?
Gostaria de dizer que tinha de pagar aquele maldito empréstimo, mas
o bom senso a fez silenciar. Por que provocar a fera?
—Tenho algumas dívidas acumuladas.
—Se é só isso, por que não disse antes? Faça uma lista dos seus
credores e mandarei minha secretária cuidar disso imediatamente.
Faz parte do presente de casamento.
—Por acaso é surdo? Não vou me casar com você! Não estou à venda,
e não quero nenhum presente! Está começando a me deixar
realmente furiosa!
—Era exatamente o que eu pretendia — ele riu, beijando-a
novamente e provocando as mesmas reações intensas e inexplicáveis.
— Bem, por hoje é o suficiente.
— Do que está falando? — Lucy gritou descontrolada, vendo-o afastar-
se pela praia.
— Não esqueça! Faltam cinco dias para o casamento.
Adoraria correr atrás dele, jogá-lo sobre a areia e... Afinal, de onde
vinhas imagens tão indecentes?
Perturbada, respirou fundo e foi cuidar das quatorze alunas.
—Terei de pagar a primeira parcela do empréstimo na próxima semana
— Lucy concluiu, fingindo não perceber o ar preocupado de Angie. — É
uma quantia assustadora, e as parcelas devem ser pagas
mensalmente.
—Sei que tudo isso é muito complexo, mas conheço uma solução
absolutamente simples. Pelo menos para o primeiro pagamento.
—Simples?
Angie moveu a cadeira de rodas e aproximou-se do telefone.
— Sim, muito simples — disse enquanto discava. — O bando não se
mostrou disposto a emprestar todo aquele dinheiro?
Lucy afirmou com a cabeça, os olhos cheios de desconfiança.
— Então volte ao banco e peça outro empréstimo. O suficiente para
saldar duas ou três parcelas da dívida.
Ainda estava boquiaberta quando alguém atendeu o telefone do
outro lado da linha e Angie começou a falar.
— Abigail? Abigail Chase? Aqui é Angela Moore. Escute aqui, sua velha
intrometida e desocupada, como se atreveu a registrar uma queixa
contra minha Lucy?
Durante alguns segundos, Angie ouviu em silêncio.
— Bem, não gostaria de expor uma velha conhecida ao ridículo, Abigail,
mas ainda me lembro do que costumava fazer na praia na época da
Segunda Guerra Mundial. Você e aquele... como era mesmo nome do
sujeito? Ah, você também se lembra!
Mais alguns instantes de silêncio antes de uma nova interrupção.
— Já esqueceu que tenho a hipoteca de sua casa, Abigail? O que acha
de ser obrigada a fazer as malas em menos de vinte e quatro horas?
Conheço um asilo adorável no centro da cidade Os quartos são
pequenos, sem banheiros exclusivos, mas acho que adoraria poder
contar com a companhia de mais quatro ou cinco velhinhas
doentes e surdas nas longas noites de inverno. Teria com quem
conversar e... O que disse? Bem, se pretende retirar a queixa,
também posso mudar de ideia sobre a hipoteca. Sim, até logo — e
desligou o telefone com um sorriso satisfeito. — Está vendo,
Lucastra? Você tem muitos amigos na vizinhança.
—Mas... pedir outro empréstimo? Isso não seria desonesto?
—É claro que não! A velha lei Cristã condena a usura, e seis por
cento ao mês é uma taxa bastante elevada. Os banqueiros
merecem todos os castigos do mundo!
Nesse ponto, Angie tinha razão. Talvez Jim Proctor também
merecesse o castigo de se casar com uma mulher independente,
voluntariosa e determinada.
Capitulo VI
—Sim, eu ouvi. Mas por que essas pessoas estão se glomerando à nossa
volta?
—Por que você parou o cairo no meio da estrada e impediu o trânsito
nos dois sentidos, seu idiota!
—Amável como sempre.
—Odeio esse tipo de atitude! Odeio, ouviu bem, sr. Qualquer Coisa?
—O nome é Proctor, Lucy. Continue tentando, e vai acabar se
acostumando. Afinal, esse vai ser o seu nome, também. Meu, seu e de
Maude.
—Nunca! Nem que eu viva mil anos! Não vou me casar com você! Nem
que...
Mais uma vez, Proctor conseguiu silenciá-la com um beijo.
O pequeno grupo de pessoas que os observava aplaudiu com
entusiasmo.
Vermelha como um pimentão, Lucy debateu-se na inútil tentativa de
obrigá-lo a soltá-la.
—Veja o que fez comigo! Todas essas pessoas me conhecem!
Estou totalmente embaraçada.
—Totalmente?
—Sim, totalmente! Ponha-me no chão agora mesmo.
Em vez disso, Proctor a segurou com mais força e respirou fundo.
— Senhoras e senhores, acabei de saber que todos vocês conhecem
Lucy Borden. Talvez estejam intrigados com um beijo tão apaixonado e
em público.
—Pare com isso! — ela sussurrou, encolhendo-se como se pudesse
desaparecer.
—Quero que saibam que esse beijo foi perfeitamente moral, decente e
legal. Na próxima terça-feira, Lucy vai me dar a honra de aceitar-me
como seu marido na Igreja da Congregação, e quero que todos vocês
estejam presentes. Após a cerimónia haverá uma recepção na praia, em
minha casa. Não esqueçam de avisar os amigos!
O grupo de cerca de trinta pessoas aplaudiu novamente e Jim finalmente
a colocou no chão, tomando a precaução de mantê-la entre os braços.
—Ei, você está chorando! Não precisa chorar, Lucy. De agora em diante,
prometo protegê-la em todos os sentidos. Venha, vamos embora.
—E quem vai me proteger de você?
Proctor afastou-se como se houvesse sido atingido por um raio. Depois
de fitá-la por alguns instantes, entrou no carro e partiu sem dizer nada,
deixando-a sozinha na estrada.
Lucy chegou ao banco exatamente às nove. O sr. Ledderman conversava
com um colega, mas correu para sua mesa ao vê-la entrar.
— Que maneira deliciosa de começar o dia — disse, indicando a cadeira
reservada aos visitantes.
Lucy sorriu. Ledderman era um homem gentil, mas não gostava de ser
tratada como uma boneca de porcelana.
—Sua noiva sabe que anda por aí falando desse jeito?
—Sabe, e até me encoraja. Engraçado ter perguntado. Ela e eu
recebemos uma proposta para trabalhar numa cidade do Arizona. Sol,
ar puro e toda aquela beleza natural. Mas em que posso servi-la, srta.
Borden?
—Poderia me conceder outro pequeno empréstimo, sr. Ledderman?
—Evidentemente! Na verdade, será um empréstimo histórico.
—Por quê?
—Trabalho para o banco há dois anos, e essa será minha última
transação no departamento de empréstimos. Qual é a quantia, srta.
Borden? Devemos considerá-la uma extensão da hipoteca?
—Sim... acho. Se é assim que costumam fazer — ela respondeu, antes
de revelar a quantia que tinha em mente. O suficiente para pagar
quatro prestações do primeiro empréstimo, de acordo com seus
cálculos. E depois disso? Deus proveria, Angie havia dito quando
discutiram o assunto. Mas Angie não era exatamente uma beata, e Lucy
não sabia se Deus aprovava a conduta dessa ovelha.
—Uma gota no oceano — Ledderman comentou com entusiasmo,
referindo-se à quantia reduzida. — Infelizmente meu chefe está nos
observando, e teremos de enfrentar toda aquela papelada novamente.
Resignada, Lucy assinou em três locais diferentes e esperou que o
conselho deliberativo aprovasse e assinasse seu pedido. Como o
cavalheiro que era, Ledderman a acompanhou até a porta e despediu-se
com um prolongado aperto de mão.
Grata como jamais estivera, Lucy não pôde conter-se e abraçou-o.
—Ora, ora, bem no meu nariz! — Jim Proctor exclamou às suas costas.
— E com um de meus funcionários!
—Ex-funcionário — Ledderman respondeu confiante. — Esse foi meu
último ato no banco, sr. Proctor. Vim acompanhar Lucastra até a porta,
e agora vou ao Departamento Pessoal para acertar minhas contas.
—Por quê?
—Vou para o Arizona. Sol, ar puro...
—E você vai com ele? — Proctor espantou-se, os olhos fixos em Lucastra.
—Eu não! Caso não saiba, John Ledderman já tem uma noiva. A
enfermeira Mary Norris.
—Ah, sim, a enfermeira — ele repetiu aliviado. Era evidente que jamais
ouvira falar em Mary Norris, mas o simples fato de saber sobre sua
existência era motivo de alegria. — Bem, só me resta desejar boa sorte
aos noivos, não é? Até logo, Ledderman — e estendeu a mão.
Sorrindo, o funcionário aceitou o cumprimento e aproveitou para
beijar o rosto de Lucy ao despedir-se.
—É melhor ir acertar suas contas — Jim indicou.
—Sim, é claro. Ah, antes que eu me esqueça, como vai a nossa sra.
Moore?
—Melhorando — Lucy respondeu. — Devagar e sempre.
—Bem, nem tudo é como desejamos. Adeus, srta. Borden. Adeus, sr.
Proctor.
—Que diabos ele quis dizer com esse comentário estranho?— Jim
Proctor resmungou.
—Não sei. Ele diz coisas parecidas sempre que nos encontramos.
—Não faz diferença. Escute, Lucy, acho que agi mal naquela estrada
esta manhã. Espero que possa... bem, Maude e eu vamos sair para um
passeio de barco essa tarde. Gostaria de vir conosco e respirar um
pouco de ar puro?
—Eu adoraria. Mas não posso deixar Angie sozinha.
—Mandarei um dos empregados passar a tarde com ela.
—Não sei... Não pode ser qualquer coisa. Tem de ser alguém de quem
ela goste.
—Minha governanta é uma mulher adorável, e parece que já conhece
sua... não sei qual é o grau de parentesco entre você e a sra. Moore.
—Somos apenas boas amigas. Na verdade, Angie foi uma grande
amiga de minha avó, e fiz questão de não perder o vínculo.
—Você é uma pessoa muito bondosa — ele sorriu, segurando seu
braço e levando-a novamente para o interior do banco. — Não vou
demorar — avisou,-indicando uma das cadeiras de couro de seu
gabinete. — Espera por mim?
Por que não?
Além da porta, Proctor dizia à secretária:
— Encontre o endereço de uma tal Mary Norris. É a enfermeira que
anda por aí com John Ledderman. Quando conseguir encontrá-la,
mande quatro dúzias de rosas amarelas. O cartão? Escreva apenas...
"Graças a Deus você existe."
Congelada pelo que acabara de ouvir, Lucy agarrou os braços da
poltrona e prendeu o fôlego, rezando para que ele não lembrasse de sua
presença.
A vida estava ficando mais excitante a cada dia! Seria essa a sensação
que as pessoas descreviam quando estavam apaixonadas? Não. Proctor
era um homem impertinente, um verdadeiro rolo compressor capaz de
atropelá-la e deixá-la esmagada no meio da estrada. Cuidado, Lucastra
Borden!
— Que diabos está acontecendo aqui? — Jim Proctor diminuiu a
velocidade do Cadillac.
Havia mais carros parados na porta da casa de Lucy do que transitando
na estrada.
— Não sei. Oh, meu Deus! Talvez tenha acontecido algo com Angie!
Proctor pisou no breque e Lucy desceu antes mesmo do carro parar.
Apressada, entrou pela porta da frente e atravessou a casa com um
raio até a cozinha.
Angie estava sentada na cadeira de rodas junto da porta aberta, e as
gargalhadas sacudiam seu corpo magro e encurvado.
—Angie! Você está bem?
—Oh, olá Lucy. Nunca estive melhor — ela apontou para fora. — Não
me divirto tanto desde que meu pai levou-me naquela viagem de vapor
pelos rios do país.
—E Maude?
—Está fazendo maravilhas. Por que não vai ver com seus próprios
olhos?
Maude estava parada no último degrau da escada da varanda,
encarando uma multidão de adultos furiosos.
—O que está acontecendo aqui?
—Lucy! Graças a Deus voltou para casa! Eles estão malucos!
—Pode apostar nisso, mocinha — um dos homens respondeu. —
Planejei minhas férias durante um ano, e agora você manda minhas
duas enteadas de volta para casa! Vou criar uma confusão por causa
disso, moça!
—E eu quero meu dinheiro de volta — gritou a mulher ao lado dele.
— E com juros! Vou processá-la por perdas e danos, srta. Borden!
Lucy aproximou-se da balaustrada e estranhou o súbito silêncio do
grupo. Teria sido capaz de intimidá-los com sua presença forte, segura
e confiante?
Mas então ouviu os passos às suas costas e virou-se, rindo da própria
pretensão. A presença forte, segura e confiante era de Jim Proctor,
evidentemente.
—Lamento pelos inconvenientes causados — disse, encarando o grupo
de pais e mães —, mas fui forçada a suspender as aulas de natação
sob pena de ir para a cadeia. — Um murmúrio de insatisfação brotou
da multidão e Lucy soube que era hora de um pouco de magia e
criatividade. Mentiras inocentes, como diria sua avó. — Meu noivo
negou-se a aceitar a ideia de me ver presa, e como sempre faço o
que ele diz, achei melhor fechar a escola.
—Que mentira mais descarada! — ele sussurrou em seu ou vido, antes
de dirigir-se à pequena multidão.
Apesar de manter-se atenta, Lucy não conseguia compreender quase
nada do que ele dizia. Parecia ter começado pelos artigos da
Constituição, passado para os cânticos de Jó, pela história da Nova
Inglaterra, e finalmente concluiu com terríveis ameaças veladas sobre
os inconvenientes de se colocar contra o maior banqueiro da cidade.
Todos concordaram e a multidão se dispersou rapidamente.
—E assim que se faz, minha querida noiva — ele comentou com um
sorriso satisfeito.
—Não sou sua noiva! Foi apenas um subterfúgio. E não vamos nos
casar, ouviu bem?
—Bata o pé! Você parece mais firme quando bate o pé no chão
como uma menina mimada.
—Sr. Proctor — Lucy começou, pensando numa maneira de livrar-se de
sua persistente companhia. Então lembrou o que Angie havia dito sobre
os papéis guardados no baú e disparou: — Lamento, sr. Proctor, mas
acabo de me lembrar de um problema sério e importante.
Infelizmente não poderei acompanhá-lo na
quele delicioso passeio de barco.
—Também tenho um problema, e o meu é mais importante —
Maude interferiu. — Vai se casar com meu pai?
—Maude!
—O que é, papai? Esse assunto é muito importante para mim. E então,
Lucy? Vai se casar com meu pai?
—Eu... ainda não pensei na proposta com a seriedade que o assunto
exige. Casamento é um passo muito importante, e seu pai...
—Não é o mais doce dos homens — Jim cortou. — Vamos deixar Lucy
decidir sozinha, está bem? Não queremos que ela se case comigo por
ter sido pressionada.
—É claro que queremos — Maude protestou. — Quaisquer meios são
válidos em caso de emergência. Para você é simples. Basta telefonar
para uma mulher e já tem com quem sair e passear pela cidade. Mas eu
preciso de uma mãe!
—Que história é essa dele sair com as mulheres da cidade?
—Primeiro vamos terminar de discutir o seu problema, Lucy —Jim
sugeriu apressado. — As paredes têm ouvidos. Maude, corra até
nossa casa e verifique se a sra. Winters pode preparar uma boa
refeição para todos nós. Algo portátil. Quando a comida estiver pronta,
os seguranças a trarão para a casa de Lucy.
—Mas...
—Vá!
-— Ninguém presta atenção em mim — a criança resmungou. —Lucy?
— e aproximou-se, abraçando-a com força. — Eu amo você.
—Também amo você, meu bem.
—Amanhã. Iremos velejar amanhã — Jim decidiu.
—Mas são só dez e meia da noite! — Lucy argumentou.
—Tem razão. Há mais alguma coisa nesse pacote?
—Não. Mas no outro...
—Então existem outros? — ele perguntou desanimado, olhando para a
mesa da sala de jantar e para os papéis que a cobriam.
—Só mais um. Por que não paramos um pouco e descansamos?
— Boa ideia. Olhe só para isso! Montanhas de papéis sem valor!
—Mas você disse que aquela pilha...
—Eu sei o que disse. Aqueles são bónus federais que ela pode trocar
por dinheiro quando quiser. E aquilo ali... não posso afirmar com
certeza, mas parecem cédulas do tempo da Confederação. Onde
conseguiu tudo isso, Angie?
—Os parentes foram morrendo e os papéis acabaram todos em
minhas mãos. Sabe como são essas coisas, não? — A sra. Moore
sorriu, exausta, porém feliz. Agora deixara de ser apenas uma piada.
Caso as coisas não acontecessem como esperava, agora tinha
realmente algo que podia deixar para Lucy. — Juro que não vou
apostar nem um centavo nos cavalos — prometeu.
Os outros dois riram e Lucy a levou para a cama. Quando voltou para
a sala de estar, parou junto à mesa para espreguiçar-se e flexionar os
braços.
—Dores nas costas? — Jim perguntou.
—Um pouco. Deve ser de ficar debruçada sobre a mesa. E meus
olhos ardem, também. Nunca havia percebido como a iluminação
dessa sala é fraca. Mas a felicidade de Angie compensa qualquer
sacrifício. Viu como ela melhorou nas últimas duas horas? Ultimamente
tenho me preocupado com ela. Sei que minha casa é grande, mas os
cómodos são pequenos, e às vezes tenho a impressão de que ela
sente-se presa.
—Não pode consertar o mundo, Lucastra Borden — ele sorriu, puxando-
a e obrigando-a a sentar-se sobre seu joelho. — Como um ser tão
pequeno pode querer encontrar todas as soluções?
—Não sou tão pequena.
Mas não havia a força habitual em sua afirmação. Por que sentia-se tão
plácida ultimamente? Como uma mulher que, envolvida pelo fluxo do
amor, não se preocupa em saber onde o fluxo a levará?
— E claro que não é pequena — Proctor concordou.
Estava tão satisfeito com a vida, que concordaria até que os maiores
absurdos.
—O que acha que devemos fazer depois dessa verificação?
—Acho que devemos nos beijar para sempre.
—Proctor! Não estou falando sobre nós! Refiro-me a Angie.
—Devia procurar um banqueiro para resolver esse problema.Conheço
um ou dois funcionários de um certo banco que poderiam realizar um
inventário e calcular os valores de todos esses documentos. E também
vamos precisar de um bom advogado para cuidar dos interesses de
Angie.
—Gosto quando diz... vamos precisar. Somos realmente nós, Jim?
—Realmente. Não há nada capaz de nos separar, minha adorável Lucy.
—Preferia que não estivesse rindo.
—Não faria diferença. Estou com os dedos cruzados.
—Preciso confessar uma coisa, Jim. Não sei nada sobre o
casamento. Minha mãe morreu há muito tempo e...
—Era exatamente o que eu precisava — ele riu. — Vou ensinar
tudo o que deve saber sobre o casamento, Lucy.
—É muita gentileza, mas gostaria de verificar seus dentes antes da
cerimónia. Lembra-se da história de Chapeuzinho Vermelho? Ela
acreditou na palavra de um lobo e... bem, lobos são muito melhores
que banqueiros.
—Lucy Borden, que coisa mais horrível! De onde tirou essa ideia?
—Um dia depois de conhecê-lo, você executou a hipoteca do Asilo
Merit e todos os pacientes foram despejados. Não acha que foi uma
grande crueldade?
—Acho que está me confundindo com outro banqueiro. Não executei
hipoteca de asilo nenhum. Talvez até a tivesse executado se a hipoteca
estivesse em poder de meu banco.
—Fico feliz por saber que não foi você. Mas... teria mesmo coragem
de despejar um bando de velhinhos indefesos?
—Não tenho escolha. Não tomo todas as decisões sozinho, sabe?
Existem acionistas e correntistas em meus calcanhares. Administro o
banco, tento ganhar alguma coisa para mim e para os acionistas, e uso
o dinheiro dos correntistas para trabalhar. Assim, todos os devedores
têm de pagar seus empréstimos em dia, ou...
Era difícil saber se um homem estava falando sério quando suas
mãos deslizavam ansiosas pelas costas de uma mulher.
— Essa coisa está colada? — Proctor perguntou com um brilho intenso
nos olhos.
O fecho fica na frente.
Quando as mãos dele tentaram alcançar o fecho do sutiã, Lucy
levantou-se de um salto e foi para o outro lado da sala.
—Bem... parece que é o fim do capítulo de hoje — ele suspirou.
—Pode acreditar que sim.
—Vai me fazer esperar pelo casamento?
—Droga, Jim! — ela exclamou, atirando-se em seus braços. — Não sei
o que está acontecendo comigo. Acho que estou apaixonada, e nem
ao menos gosto de você!
—Podemos passar a noite juntos e ver o que acontece.
Capitulo VII
Capitulo VIII
Cerca de uma hora mais tarde, alguém bateu na porta e Lucy foi
atender. Era o sr. Henderson, o empreiteiro.
— Ouvi dizer que a sra. Moore não está muito bem, e pensei em
interromper as obras por alguns dias para deixá-la mais sossegada. O
que acha?
—Uma excelente ideia, desde que não esqueça de nós.
—Não vou esquecer. Seus vizinhos estão se mudando?
—O quê? — ela espantou-se, aproximando-se da porta para
observar o movimento na casa ao lado.
Havia um grande caminhão estacionado na estrada, e alguns homens
carregavam móveis para dentro dele. Estava acabado. Perdera a
oportunidade de passar o resto da vida ao lado do homem que
amava por causa de um truque idiota! Ganância! Ambição!
— Lucy!
Lucastra Borden aproximou-se dos degraus inacabados da varanda
para receber a criança que corria ao seu encontro.
—Oh, Lucy! — ela gemeu, atirando em seus braços. — Ele disse que
você não vai mais ser minha mãe!
—Infelizmente não, querida. Seu pai e eu discutimos e... o
casamento foi cancelado.
Percebendo a seriedade do momento, o sr. Henderson partiu em
silêncio, sem sequer despedir-se.
—Brigaram por minha causa? Fiz algo errado?
—É claro que não, meu bem! Ainda amo você, e gostaria muito de
ser sua mãe. Mas seu pai prefere me matar a casar-se comigo.
—Mas eu quero que você seja minha mãe!
Não vou chorar. Nem por Maude, nem por Angie e nem por ele.
Acima de tudo, não choraria por ele!
—Infelizmente seu pai mudou de ideia sobre o casamento, Maude.
Ele é um bom homem, e seria capaz de tudo para fazê-la feliz. Mas
casar-se comigo não faz parte dessa lista, e temos de aceitar sua
decisão. E agora, pare de chorar e volte para casa.
Seria terrível se seu pai viesse buscá-la aqui. Seja corajosa, ouviu bem?
Algum dia nos encontraremos novamente e riremos de tudo isso.
—Não quero ser corajosa, e jamais darei risada de toda essa
tristeza. Meu pai e um ditador e... e... — e correu para sua casa,
onde Jim Proctor a esperava com os braços abertos.
Incapaz de suportar a tortura de vê-lo pela última vez, Lucy
respirou fundo e entrou. Precisava ser forte por Angie, e não
podia chorar. Não ia chorar...
Capitulo IX
—Sim, melhor para mim, mas você parece prestes a morrer de falta
de ar — ela riu.
—O que esperava? Sou um pobre banqueiro sedentário! Ou melhor,
era um pobre banqueiro sedentário.
—Você... era?
—Exatamente.
—Quer dizer que não é mais?
—O médico disse que deve tomar sopa pelos próximos dois dias.
Como prefere seu caldo de carne?
—Bem longe. Não gosto de sopa, Jim. Prefiro um bom bife com puré
de batatas e salada.
—Vài tomar sopa! Por que gastar tanto dinheiro com um médico,
se não vai seguir suas ordens?
—Como estou falida e não vou pagar essa conta, não preciso seguir
ordem nenhuma. É melhor telefonar para esse médico e avisar que
sou uma paciente inadimplente. Quem sabe ele desiste de me obrigar a
tomar sopa? Voltando à questão do seu trabalho...
—Ei, o que está fazendo? — ela assustou-se, vendo-o aproximar-se
com um brilho estranho nos olhos.
— Alguém já disse que você fala demais? Quero ver se encontro
um botão para desligá-la — e estendeu as mãos.
-Jim Proctor, não se atreva! Sua filha está conosco nesta casa e... e
se insistir nesse tipo de comportamento, não me casarei com você.
—Ah, uma ameaça? Já sei como fazer você quieta — e inclinou-se,
beijando-a com paixão. — E então?
—Então... o quê?
—Não vai protestar, gritar, espernear e me ameaçar de morte?
—Está me confundindo com outra garota, Jim. Se espera que o
ofenda depois desse beijo maravilhoso, esqueça! Que tal outra
amostra do que sabe fazer?
—Lucy, a sopa está esfriando — Maude avisou.
—É claro. Primeiro a obrigação, depois a diversão — ela suspirou.
Assim que terminou de tomar o caldo, Lucy suspirou e olhou para
Maude com ar suplicante.
—O que foi?
—Estou pensando num jeito delicado de dizer que gostaria que
fosse brincar lá fora e me deixasse conversar com seu pai. Tem
alguma ideia?
—Tenho. Diga apenas: Maude, caia fora daqui!
—Vamos ver se entendi. Maude, caia fora daqui!
—Já estou indo — ela riu, saindo como um furacão.
—E agora somos nós, Jim Proctor.
—Está falando como um juiz prestes a dar sua sentença.
—Vamos falar sério, por favor. Tem de admitir que nos despedimos
em circunstâncias bastante... desagradáveis. E de repente você está
aqui novamente, todo carinhoso e sorridente. Gostaria muito de saber
que diabos aconteceu com o mundo enquanto eu me afogava em
sofrimento e preocupações.
—Pois não, Excelência — Jim curvou-se numa reverência. — Foi
mais ou menos assim. Apesar de nunca ter me interessado por
romances e histórias de amor, acabei me apaixonando por uma
garota da vizinhança. Já havia experimentado essa coisa que chamam
de casamento, e a tentativa foi um completo desastre. Assim, era de
se esperar que tivesse medo de tentar novamente.
—Um bom começo. Vamos ao que realmente interessa, sim?
—Como já havia decidido me casar para garantir o bem estar de
minha filha, e não para suprir minhas necessidades físicas e afetivas,
achei que minha cunhada seria perfeita para o papel de sra. Proctor. E
foi por esse mesmo motivo que acabei me aproximando de Lucastra
Borden e pedindo essa encantadora jovem em casamento.
—Por sua filha, é claro.
—Por minha filha, é claro. Mas então comecei a perceber que
podia conciliar as duas coisas; garantir o bem estar de Maude e ser
feliz, também.
—Entendo. Leve dois e pague um.
—Não exatamente, porque logo descobri que estava apaixonado.
Paixão é o que pode acontecer de pior na vida de um banqueiro,
sabe?
—Ah, o banco! Sabia que o vilão acabaria aparecendo em alguma
parte da história. Prossiga.
—Achei que devia esconder esse sentimento sob uma capa de
agressividade, entende?
—Não, mas percebi a agressividade. E já que tocou no assunto, odeio
gritos. E odeio homens dominadores.
—Será que podemos ir para a sala? — ele sugeriu, evidentemente
embaraçado. — Acho que o sofá é mais confortável.
—Como quiser, desde que termine essa explicação de uma vez por
todas.
Na sala, sentaram-se lado a lado no sofá e Jim começou a
tamborilar com os dedos sobre uma das pernas.
—Não precisa ficar nervoso — Lucy sorriu, segurando a mão dele e
colocando-a sobre a perna para acariciá-la.
—Por que está fazendo isso? — ele espantou-se.
—Jim, eu...
—E quanto ao empréstimo, é evidente que não tem de pagar mais
nada. Em Massachusetts, um marido é responsável pelas dívidas de
sua esposa.
—Quer dizer que você...?
—Pare de rir e arregalar os olhos, ou vai acabar enrugada. Sim,
Lucastra Borden, eu paguei o empréstimo.
—Meu Deus! Se todas as esposas souberem disso, os homens...
—Permanecerão solteiros, e acabarão falidos. Agora que já
esclarecemos todas as suas dúvidas... Onde estávamos, mesmo?
—Aqui — e beijou-o com paixão.
Nesse instante a porta da cozinha se abriu com um estrondo e
Maude entrou correndo.
Mamãe! Papai! Encontrei a sra. Winters na praia e disse a ela que
vocês vão se casar. Ela quis saber se precisam de uma governanta, e
então respondi que sim, talvez precisem, e então ela... Mamãe? Por
que está rindo?
CapituloX
FIM