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CONSTRUCTIVISMO LOGICO-SEMANTICO Volume 1 ORDENAMENTO E SISTEMA JuRiDICOS Paulo Ayres Barreto! Consideragées preliminares A busca pela compreenséo de um dado campo objetal im- pée ao estudioso a necessidade de se identificar caminhos para amelhor forma de aproximagéo do seu foco investigativo. Varias perspectivasse abrem para essa aproximagao: (i) a decomposigao analitica do objeto de estudo; (ii) a sua visdo global; (ii) a demar~ ‘cacio das influéncias do todo em relago a parte, bem assim de eadaunidade minima em cotejo com asua estrutura integral; (iv) ‘como ele se origina; (v) o que pertence ao campo de estudo; (vi) 0 dele nao faz parte; (vii) quais os critérios utilizados para se definir tal pertinéncia; (viii) qual é 0 mecanismo de ingresso saida de suas unidades ou, por outro giro, a dindmica de operagéo do objeto a ser examinado; (ix) que eritérios presidem as formas __ de organizagéo das partes em relagao ao todo e dele todo no que eoncerneas suas estruturas minimas tomadas em caréter isolado 1. Doutor em Direito pela PUCISP Livre Docente pela Universidade de Sao Paulo, Professor Associado da Universidade de Sio Paulo. Professor dos Cu $05 de Especializagio do Instituto Brasileiro de Estudos Tributarios ~ IBET. 249 CONSTRUCTIVISMO LOGICO-SEMANTICO (%) como esse campo objetal interage com aqueles que estéio ao seu recor; (xi) quais as influéncias que objetos de estudo distintos promovem reciprocamente; (xii) como controlar o trénsito entre 60s diversos dominios do conhecimento humano. Da nogo de sistema advém necessidade de dar respostas coerentes e consistentes a essas questées. Que postura assu- mir? Privilegiar a parte ou 0 todo? Nessa trilha, é constante a tensdo entre as teorias holisticas e reducionistas ora com pre- valéncia de uma ora com a com a supremacia da outra pers- pectiva. Tudo ¢ sistema, e s6 desta perspectiva (sistémiea) deve ser considerado diriam os holistas. Como afirmou Edgar Morin’, “tudo 0 que era unidade elementar, incluindo, sobretudo o dtomo, tornou-se sistema.” Em contrapartida, os reducionistas afirma- riam que nao hé conhecimento sem redugo de complexidades. Sem a precisa ¢ rigorosa identificagao da parte, de sua unida- de irredutivel, nao é possivel a adequada aproximagéio do ob- Jetoaser investigado, E assim avangam os estudos nos diversos campos do conhecimento humano, sempre influenciados por aproximagées mais analiticas ou de carter geral, com as vir- tudes e defeitos de ambas as aproximagées. Nas ciéncias juridicas nao haveria de ser diferente. Os avangos verificados com a nogao de norma juridica sao sempre acompanhados de contribuigdes em torno das nogées de orde- namento e sistema juridicos, foco tematico deste breve estudo. Anogao de sistema e a potencial distingao entre ordenamento € sistema sao as primeiras questées a serem enfrentadas. 2. Nogao de sistema A nogéo de sistema, como de resto ocorre usualmente com a maioria dos signos, enseja distintas aproximagées. Todo 2.0 método I. “A natureza da natureza”, p. 95.3% edigdo. Sintra: Publicagdes Europa-América, 1997, trad. Maria Gabriela de Braganca. 250 CONSTRUCTIVISMO LOGICO.SEMANTICO sistema juridico, antes de ser juridico é sistema, Assim como as classificagGes em direito devem se submeter aos conceitos da Teoria das Classes, 0 estudo dos sistemas exigiria plena adequacdo & Teoria Geral dos Sistemas que, como predica Cristiano Carvalho’, com supedaneo nas ligdes de Ludwig Von Bertalanffy, consistiria na “jungdo de diversas ciéncias inter- disciplinares tais como a Teoria da Comunicacdo, a Teoria da Informagdo, a Cibernética, a Autopoeisis, etc.” Haveria tragos e requisitos comuns pertinentes a todo sistema, independen- temente do campo possivel de sua aplicagéo. O qualificativo que se associa ao signo sistema (econémico, politico, social, juridico) deve, necessariamente, na conformacao de seu am- biente sistémico interno, guardar compatibilidade com esses tragos e requisitos gerais identificados pela Teria Geral dos Sistemas, Colocando foco no sistema juridico, Bobbio’, por exemplo, cita trés significados de sistema, Um primeiro significado toma em consideragao a pers- pectiva dedutiva dos sistemas. Nesse sentido: (..) um dado ordenamento é um sistema enquanto todas as normas juridicas daquele ordenamento so derivaveis de alguns prinefpios gerais (ditos “prineipios gerais do Direito), considerando da mesma maneira que os postulados de um, sistema cientifico! ‘Uma segunda vertente vai buscar a nogao de sistema na Ciéncia do Direito moderno: Aqui o termo “sistema” é usado, ao contrério, para indicar um ordenamento da matéria, realizado através do proceso feoria do Sistema Juridico, Séo Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 52. 4, Teoria do Ordenamento Juridico. 6 edig&o. Editora UnB, 1995, p. 75. 5, Teoria do Ordenamento Juridico. 6 edigéo. Editora UnB, 1995, p. 78 CONSTRUCTIVISMO LOGICO-SEMANTICO indutivo, isto é, partindo do contetido das simples normas com finalidade de construir conceitos mais gerais, e a clas sificagio ou divisées da matéria inteira (..). O proeedimen: to tipico dessa forma de sistema néo é a dedugéo, mas a classificagao. Por fim uma terceira linha associaria a nogéo de sistema ‘com uma necessdria coeréncia interna. Assi (..) um ordenamento jurfdico constitui um sistema porque podem coexistir nele normas incompativeis. Aqui “sis tema” equivale a validade do prinefpio que exelui a ineom- patibilidade das normas. (...) Nesse terceiro sentido de sistema, o sistema jurfdico nao 6 um sistema dedutivo, como no primeiro sentido: é um sistema num sentido menos inci- sivo, se se quiser, num sentido negativo, isto é, uma ordem, que exclui a incompatibilidade das suas partes simples. Vé-se, pois, que as perspectivas indutiva e dedutiva geram diferentes aproximagées do préprio sistema que se pretende erigir ou do qual queremos examinar ou descrever. De outra parte, a terceira nogdo de sistema acima referida diria mais com 08 atributos do préprio sistema. trago comum prevalecente é a nogdo de parte ou ele- mentos submetidos a certos critérios de coordenacéo. Na sempre precisa definigéo de Lourival Vilanova’, “falamos de sistema onde se encontrem elementos e relagdes e uma forma dentro de cujo dmbito, elementos e relagées se verifiquem”. Por sua vez, para Tereio Sampaio Ferraz Junior’ “sistema é 0 con- unto de elementos de repertério e as relagdes entre os elementos de estrutura.”, 6. Teoria do Ordenamento Juridico. Sio Paulo; Quartier Latin, 2005, p. 80. 1. As Estruturas Légicas ¢ 0 Sistema do Direito Positivo, p. 173. 2 edigao. Sao Paulo: Max Limonad, 1997. 8. Introdugdo ao Bsiudo do Direito, p.175, 24 Bdigéo. Sao Paulo: Atlas, 1996. 252 CONSTRUCTIVISMO LOGICO-SEMANTICO Retomemos, nesse ponto, as concepgdes reducionistas e holisticas referidas no t6pico anterior para enfrentar a duali- dade parte/todo, Os reducionistas centrarao foco na parte, na estrutura minima do sistema, dando menos relevo a sua visao global. Em contrapartida, os holistas tendem a amesquinhar a importancia dessas estruturas mfnimas, enfatizando o todo. Talvez seja posstvel afirmar que ambas as posturas so merecedoras de reparos. Cristiano Carvalho* observa que 0 “holismo acaba sendo, de certo modo, reducionista. O que que- remos demonstrar é 0 enfoque inter-relacional das partes com 0 todo, pois ambos se completam.” Com efeito, a énfase em uma ou outra linha compromete a prépria consisténcia do discurso, representando tomada de posigao a priori, que descura da necess4ria imbricacéo entre as posturas, Ha inafastavel influéncia do todo em relagéo a parte e da parte em relaco ao todo. Sao vetores que exercem continua pressfio, podendo resultar alteracéo da parte, em face das pressées advindas do sistema, bem assim modificagées sisté- micas decorrentes da forga que a unidade mfnima pode vir a exercer sobre a nogao de todo, As constantes interagdes que ocorrem dentro do sistema e na correlagao com outros siste~ mas tém a potencialidade de promover alteragées na parte € no todo. Nessa trilha, o Constructivismo Légico-Semantico, refe- rido com mais vagar no tiltimo t6pico deste ensaio, oferece, a nosso sentir, instrumental adequado para trabalhar, com rigor e consisténcia, essa dualidade. ‘Nas referéncias ao sistema normativo, sobressai a nogéo de ordem, de ordenagao de elementos. Disso deflui arecorren- te referéncia a expressio ordenamento juridico, por vezes, Paulo: 9, Teoria do Sistema Normative, direito, economia e tributagéo. § Quartier Latin, p. 48. CONSTRUCTIVISMO LOGICO-SEMANTICO adotada como sinénimo de sistema, sendo, que, em outras opor- tunidades, carrega sentido proprio e distinto do primeiro (sistema). 3. Ordenamento e sistema juridicos As expressées “ordenamento juridico” e “sistema juridi- co” so tidas, por diversos estudiosos do direito, como equiva- lentes. Refletiriam uma mesma nogao. Por todos, vale registrar a posicdo de Paulo de Barros Carvalho", para quem “as normas juridicas formam wm sistema, na medida em que se relacionam de vérias maneiras, segundo um principio unificador”. Tais relagdes nao ocorrem desorganizadamente, razao pela qual 6 possivel se dizer que “sistema” e “ordenamento” jurfdico po dem ser usadas como expressées semelhantes. Ainda na sua visdo, tanto a Ciéncia do Direito como 0 direito positivo assu- miriam foros sistémicos. Em contranota, Gregorio Robles atribui sentidos distintos a essas express6es, ao propugnar que “ordenamiento es el tex- to juridico em bruto em su totalidad, compuesto por textos con- eretos, los quales son el resultado de decisiones coneretas.”"De | outra parte, “sistema es el resultado de la elaboracién doctrinal o cientifica del texto bruto del ordenamiento”."* A distingao por | ele proposta evidencia a existéncia de dois corpos de linguagem, cada qual com suas estruturas légicas proprias: o ordenamen- to juridico como resultado da somatéria de textos de direito positivo; sistema juridico como decorréncia do esforgo de or- denagdio e depuragao (em relacéo a contradigées e ambiguida- des) do préprio ordenamento." 10. Curso de Diretto Tributdrio, 19 ed. Sdo Paulo: Saraiva, p.1L LL. Teoria del Derecho (Pundamentos de a Teoria Comunicacional del Derecho). Madrid: Civitas, vt, p. 111 12, Ibidem, p. 113, 18. Ibidem, p. 113, 254 CONSTRUCTIVISMO LOGICO-SEMANTICO Por outro giro, ALCHORRON e BULYGIN" também fazem uma diferenciagéo entre “sistema” e “ordenamento” jurfdico, colocando foco no aspecto dinamico do direito. As normas juridicas que séo modificadas com o tempo geram uma modificacao no prdprio sistema. Concluem assim que o “siste- ma do direto positivo” é o conjunto de normas estaticamente consideradas e “ordenamento juridico” é uma série de suces- sivos sistemas ao longo do tempo. Aurora Tomazini de Carvalho" reeonhece o mérito de tal posicionamento, uma vez que por intermédio dele é possivel observar o direito de forma cronolégica, conseguindo explicar, dessa forma, a sistemética da aplicagao de normas jé revogadas. Porém, afirma que esta teoria seria “apenas um ponto vista sobre objeto que enfatiza seu aspecto dindmico”, Deveras, ha diversas possibilidades de ferir o tema, Uma delas consiste em atribuir significagées distintas as expressées ordenamento e sistema, por razées diferentes, como fizeram os autores antes referidos. Registre-se, contudo, que, como acentua Paulo de Barros Carvalho, “hé sistema na realidade do direito positivo e ha. sistema nos enunciados cognoscitivos que sobre ele emite a Ciéneia Juridica.” Conquanto a ordenagao e depuragao 56 ocorram neste tiltimo sistema, nao hé como deixar de atribuir cardter sistémico, ainda que embrionério, ao direito positivo. Assim, para aqueles que entenderem necessério enfatizar as nuangas existentes entre os dois sistemas, a atribuigao de um. signo distinto para qualificar, por exemplo, 0 sistema do direi- to positive, denominando-o de mero “ordenamento” é um caminho possfvel. 14, ALCHOURRON, Carlos e BULYGIN, Eugenio. Sobre la existOncia de las normas jurtdicas. México: Distribuiciones Fontamara, 1997, 15, Curso de Teoria Geral de Direito. Sao Paulo: Noeses, 2009, p. 618. 16. Curso de Direito Tributario, 19 ed. Sao Paulo: Saraiva, p. 11. CONSTRUCTIVISMO LOGICO.SEMANTICO De nossa parte, nao atribuiremos a expressao ordena- mento juridico sentido distinto de sistema do direito posto, adotando assim ambas as expressdes como sinénimas, dado 0 inequivoco foco sistémico que esta atrelado a tais expressées, 4, Axiomas do ordenamento juridico O direito, assim como outros sistemas normativos, nio prescinde de alguns axiomas para tornar-se operacional. As- sim 6, v.g., em relagdo a norma hipotética fundamental, Trata- ~se de axioma a partir do qual deriva toda a positivagéio do direito. Nesta trilha, impende reconhecer que nao hé orde- namento juridico que se possa estruturar sem a defini ‘ao de sua hierarquia e do critério de reconhecimento de validade de suas unidades normativas. Hierarquia e validade séo dois axiomas do direito posto. Como leciona Aurora Tomazini de Carvalho", a “existéncia do ordenamento. juridico pressupée, em primeiro lugar, um conjunto de. ‘normas juridicas (i.e. postas Por um ato de autoridade) e, em segundo, que tal conjunto constitua-se numa estrutura”. Sem a definiggo de uma hierarquia entre os enunciados Prescritivos néo ha caminhos para decidir sobre a solugéo de conflitos ou antinomias entre os distintos contetidos nor- mativos. Consequentemente, a prépria nogéo de sistema, neste cenario, desaparece. & que, como predica Paulo de Barros Carvalho": “sem hierarquia ninguém poderia apontar © fundamento juridico das wnidades componentes, nao se sa- bendo qual deve prevalecer”. Hé liberdade para essa definigaéo dos métodos ¢ critérios pelos quais se reconhece a opgao hierérquica estabelecida nos diversos ordenamentos juridicos, Exemplificativamente, tratados internacionais tém posigéo 11. Curso de Teoria Geral de Direito, Sto Paulo: Noeses, 2008, p. 618. 18, Diveito tributério, nguagem e método. Séo Paulo: Noeses, 2008, p. 216. 256 CONSTRUCTIVISMO LOGICO-SEMANTICO de superioridade hierarquica em relagao ao direito interno na Franga e na Argentina. J4 nos Estados Unidos a relagdo é de paridade com o direito interno, devendo as antinomias ser resolvidas por outros critérios. O fato é que hierarquia no or- denamento juridico tem que existir, sob pena de subtragao de seu caréter sistémico. Oaxioma da validade ¢ imanente A nogéo de ordenamen- to jurfdico. A norma é valida se mantém relagao de pertinéncia com o sistema s’. Vale dizer, foi inserida no sistema por um 6rgao competente, mediante procedimento previsto pelo pré- prio ordenamento, Lourival Vilanova® esclarece: “a validade 6, assim, validade no interior do sistema do direito positivo.” (..) “Regras de outros sistemas requerem regra de regra que as juri- dicize, que as convalide.” Em sintese, sem definicéo de hierarquia e a nogao de validade um pretenso sistema no assume tal caréter (sistema- tico) em razo da sua absoluta inoperancia. 5. Sistema normativo: perspectivas estética e dindmica exame do sistema normativo pode tomar em conta a sua perspectiva estatica, bem assim consideré-lo dinamicamen- te, em virtude das constantes mutagées que diuturnamente nele ocorrem, ALCHORRON e BULYGIN” colocam foco no aspecto dinémico do Direito para propor aja aludida distingao entre ordenamento ¢ sistema. Defendem, com razao, que as normas juridicas que séio modificadas com o tempo geram uma alteragao no proprio sistema. Concluem assim que 0 “sistema do direto positive” ¢ 0 conjunto de normas estaticamente 19, Estruturas l6gicas eo sistema do direito positiva. 3 ed., Sao Paulo: Noeses, 2005, p.18. 20, Sobre la existéncia de las normas juridicas, México: Distribuiciones Fon- tamara, 1997. 257 CONSTRUCTIVISMO LOGICO-SEMANTICO consideradas e “ordenamento juridico” é uma série de suces- sivos sistemas ao longo do tempo. Deixando de lado a distingao entre ordenamento e siste- ma, é forca convir que ambas as perspectivas (estatica e dind- mica) tém o seu relevo seja no plano geral e abstrato, seja para a expedigéio dos sucessivos atos de aplicacéio do direito. Nao ha, também, como deixar de colocar certa énfase na perspec- tiva dinamica do sistema normativo, a partir da qual se obser varé o direito na sua incessante autorregulagio e autoprodugio. Como leciona Aurora Tomazini de Carvalho: Odireito vive em constante movimentacéo, transformando- -se a cada instante. Toda vez que surge uma nova lei, que © juiz produz uma sentenga, que um ato administrativo 6 publicado, que o Presidente da Repiblica emite um decre- to, que particulares realizam contratos, o sistema se renova, J& a anélise estética pode ser vista, analogicamente, como uma fotografia do sistema juridico num determinado momen- to, no tempo e no espago, sem as mutagées que séo inerentes A perspectiva dinamica. E interessante perceber quais os fatores que influenciam a modificagio constante do Direito. Para tanto é necessério reconhecer que o sistema juridico recebe influéncia de outras ciéncias do conhecimento humano como as ciéncias econémi- cas, sociais, politicas, entre outras. Por outro giro, como se dé a conversa entre essas ciéncias e quais as dificuldades que se apresentam para se proceder as devidas tradugées, no esteio das ligdes de Flusser. Além disso, os ramos didaticamente auténomos do direi- tointeragem constantemente colaborando decisivamente para tornar ainda mais complexa a avaliagao do sistema normativo em sua dinamica natural. 21, Curso de Teoria Geral do Direito. Sip Paulo: Noeses, 2009, p. 610. 258 CONSTRUCTIVISMO LOGICO-SEMANTICO 6. Norma juridica, sistema normativo e interpretacao do direito Normas juridicas sao unidades de manifestagao do deén- tico.* O conjunto dessas unidades normativas conforma o sistema juridico. Ao interpretar o direito posto, construimos estruturas normativas e as organizamos sistemicamente. Tal mister é rea- lizado mediante aplicaco dos métodos de interpretacéio do di- reito. Como salienta Vanoni: Destle que as caracteristicas jurfdicas das normas tributérias no se distinguem das demais normas de direito, a opinigo que pretende negar aplicabilidade, as leis tributérias, dos ‘mesmos métodos de interpretago que se aplicam as leis em, geral parece destitufda de qualquer fundamento.* Destarte, 08 métodos de interpretagao tradicionalmente referidos pela doutrina (literal, légico, histérico, teleolégico e sistemético)" sao aplicaveis aos diversos ramos do direito, com suas virtudes e os seus defeitos.* 22, CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributdrio —fundamentos jurtdicos da incidéncia. 3 ed. So Paulo: Saraiva, 2004, p. 20. 23. Natureza e interpretagdo das leis tribusdrias, trad, Rubens Gomes de Souza. Rio de Janeiro: Financeiras, (sd), p. 181 24, Para Luciano da Silva Amaro: “[..] intérprete deve partir do exame do texto legal, perquirindo o sentindo das palavras utilizadas pelo legislador (na chamada interpretagdo literal ou gramatical); cumpre-lhe, todavia, buscar uma inteligéncia do texto que nao deseabe para 0 absurdo, ou seja, deve preocupar-se com dara norma um sentido logico (interpretagio lgiea), qual harmonize com o sistema normativo em que ela se insere (interpretagéo sistenstica), socorrendo-se da anélise das cireunstncias histéricas que cer- caram a edigdo da lei (interpretacdo histérica), som descurar das finalidades a que a lei visa (interpretagdo finalistica ou teleolégica).” Direito tributério brasileiro, p. 208-209. 25, Sobre um visio critica dos métodos de interpretagio e sua instru. 259 CONSTRUCTIVISMO LOGICO-SEMANTICO De nossa parte, propomos uma aproximagio do direito a partir do reconhecimento de que ele se manifesta como um sistema de linguagem. Como demonstra Juan-Ramon Capella, todo direito tem por condigio de existéncia a de ser formulével em linguagem.” Fortes nessa premissa, podemos surpreender suas estruturas normativas mediante decomposigao em planos do texto juridico. Nesse sentido, Paulo de Barros Carvalho ensina que 0 texto juridico é composto por um plano de expresso e um plano de contetido. No plano de contetido, encontramos as significagdes do plano expressional, construidas pelo intérpre- te. O subsistema (S1) é composto por um conjunto de enuncia- dos, considerados no plano da expresso, A partir das formu- lagées literais existentes, o iniérprete iniciaré o proceso de construgéio de significagdo dos enunciados prescritivos. Um segundo subsistema (S2) seré o resultante do conjunto de sig- nificagdes de manifestagdes prescritivas. As normas juridicas, unidades de manifestagao do dedntico, conformam o terceiro subsistema (S3).”” O conjunto de normas juridicas “integra o texto em sentido amplo (TA). O transito do subsistema do conjunto de significagéo de enunciados prescritivos (S2) para a estrutura normativa (S3) Jé pressupée a solugao de antinomias (aparentes ou reais), bem como uma tomada de posigao diante das relagées de coorde- nagao e subordinagao sistemicamente estabelecidas. Vale dizer, nao hé como desconsiderar, de um lado, o cardter sistémico que o somatério de estruturas normativas apresenta e, de mentalizagio pela dogmitica juridica, ver Lenio Luiz Streck, Hermenéutica Juridica e(em) crise. Uma exploragéo hermenéutiea da construgdo do diretto, 88-93, 26. Bl derecho como linguaje, Barcelona: Ariel, 1968, p. 17. 21, Direito tribueério — fundamentos juridicos da ineidéncia, 3,ed, Séo Paulo: Saraiva, 2004, p. Bl © ss; 28, Curso de direito tributério, 19 ed. So Paulo: Saraiva, p.130, 260 CONSTRUCTIVISMO LOGICO-SEMANTICO outro, as pressées que a estrutura do sistema exerce sobre as unidades que o conformam. Como jé dissemos, o percurso acima descrito nos conduz A identificacdo dos contetidos normativos que, conjuntamente considerados, conformam o sistema jurfdico. Residem aqui as maiores dificuldades daquele que se poe diante do ordenamen- to juridico com pretensdes cognoscitivas: contetidos prescriti- vos postos em diferentes niveis hierérquicos; positivagao de valores e limites-objetivos; conflitos entre principios e regras, verificaveis tanto em um mesmo plano normativo, como em niveis hierarquicos diversos; necessidade de ponderagao de valores em face de tens6es internormativas; enfim, uma série de problems pretar adequadamente o direito.” serem enfrentados por quem pretende inter- 7. Sistema normativo e a interdisciplinaridade do direito O cabimento de uma anélise do direito, a partir de uma iséo interdisciplinar, suscita diferentes reacdes na comunida- de cientifica. Ha os que trilham esse caminho, vendo-o como uma condicéo mesma para alcancar 0 conhecimento; hé os que refutam peremptoriamente essa possibilidade; e, h4, por fim, aqueles que procuram gizar os limites e as condigdes para que se considere a interdisciplinaridade, em face da autonomia de que gozam os diversos campos do saber cientffico. A expressio interdisciplinaridade juridica é - como, de resto, é extremamente comum nas expressées dessa natureza ~ plurivoca. Pode ser empregada em acepeées distintas. Uma primeira possibilidade consistiria na consideragdo dos diversos ramos do Direito como disciplinas juridicas. Cogita-se, nessa perspectiva, de interdisciplinaridade dentro do préprio Direito, 29, BARRETO, Paulo Ayres, Contribuigdes ~ regime juridico, destinagao & controle. S60 Paulo: Noses, 2006, p.10. CONSTRUCTIVISMO LOGICO-SEMANTICO tendo em conta suas disciplinas ou ramos que gozam de auto- nomia apenas para fins didaticos. Assim, afigura-nos incensu- ravel o aludido exame interdisciplinar, que nada mais ¢ do que a consideracéo do ordenamento juridico numa visao unitéria, Seria um grave erro nao reconhecer essa perspectiva unitéria do sistema juridico e, consequentemente, uma necesséria in- terdisciplinaridade. Paulo de Barros Carvalho refere-se a intertextualidade no direito, que se apresentaria em dois niveis distintos, quais sejam: (..) (@) estritamente juridico, que se estabelece entre os varios ramos do ordenamento (intertextualidade, interna ou intrajuridica); e (ii) 0 chamado juridico em acepgao lata, abrangendo todos os setores que tém o direito como objeto, mas o consideram sob o Angulo externo, vale dizer, em relagdo a outras propostas cognoscentes, assim como a Sociologia do Direito, a Hist6ria do Direito, a Antropo- logia Cultural do Direito, ete (intertextualidade externa ou extrajuridica).” A expresso interdisciplinaridade juridica, que dé ense- joa grandes polémicas, refere-se exatamente ao transito entre as diversas 4reas do conhecimento humano, tais como a Cién- cia Econémica, as Ciéncias Sociais e a Ciéncia Politica. Examinando a controvérsia sobre a interdisciplinarida- de juridica dessa tiltima perspectiva,” Marcelo Neves aponta quatro sentidos para essa expressdo: (i) eneiclopedismo juri- dico, assim entendido o somatério de diversos conhecimentos sobre 0 direito, gerador de um superficialismo generalizado, de reduzida relevancia, seja da perspectiva pratica, seja sob 30, Direito tributdrio, linguagem e método. Séo Paulo: Nooses, 2008, p. 19. 31, Pesquisa interdisciplinar no Brasil: o paradoxo da interdiseiplinaridade. Revista do Instituto de Hermendutica Juridica, n. 1, p. 207-214, 262 CONSTRUCTIVISMO LOGICO-SEMANTICO um prisma te6rico; (ii) imperialismo disciplinar, em que, sob 0 manto da interdisciplinaridade, subordinam-se critérios do Direito a racionalidade de outras ciéncias, como a Sociologia, a Economia ou a Politica; (iii) metadisciplinaridade, no sentido de uma metanarrativa impositiva a partir de um plano superior, de limites e formas de intercémbio entre as 4reas do saber relacionadas com o direito; ¢ (iv) espago de comutacao discur- siva entre os diversos campos do saber jurfdico, respeitada a autonomia disciplinar, sem a qual haveria “uma miscelanea resultante de um ecletismo estéril”.* Analisando os sentidos acima apontados, estamos con- vencidos de que (i) o encielopedismo jurfdico, em razéo de seu reduzido relevo, pouco ou nada acrescenta ao saber cientffico; (ii) o imperialismo disciplinar é absolutamente incompatfvel com a autonomia da Ciéncia do Direito; (iii) a metadisciplina- ridade, como um holismo simplificador, impede a necesséria segregacao e consideracio analitica do objeto do conhecimen- to juridico, a partir do eédigo binario valido/ndo valido, eédigo esse que nao prevalece e sequer tem relevo em face de outros campos do conhecimento; e, por fim, (iv) conquanto possivel a existéncia de um espaco interdisciplinar de comutacdo diseur~ siva, hé que se reconhecer os estritos limites & consideracio dessa comutatividade para a solugéo de problemas préprios da Ciéncia do Direito. Deveras, as diversas ciéncias do conhecimento humano estéo submetidas aos seus cédigos binérios préprios. Tomam. um mesmo fato cultural e buscam reduzir as complexidades a ele inerentes, tendo em conta o que hé de relevante para o seu campo objetal. ‘Da mesma forma, dé-se em relacao a Ciéncia Juridica. Como predica Paulo de Barros Carvalho, néo € posstvel: 32, Pesquisa interdiseiplinar no Brasil: o paradoxo da interdisciplinaridade. Revista do Instituto de Hermendutica Juridica, n. 1, p. 212, 263 CONSTRUCTIVISMO LOGICO.SEMANTICO (.) isolar-se, dentro do social, o fato juridico, sem uma série de cortes e recortes que representem, numa ascese tempo- Féria, o despojamento daquele fato cultural maior de suas coloragées politicas, econdmicas, éticas, histéricas etc., bem. como dos resquicios de envolvimento do observador, no Aluxo inquieto de sua estrutura emocional.” Em precisa sintese, aponta, ainda, para o paradoxo ine- vitavel: “(...) 0 diseiplinar leva ao interdiseiplinar e este tiltimo faz retornar ao primeiro”. | Em stimula, impée-se 0 reconhecimento de um espago para investigagdes de cardter interdisciplinar, objetivando uma adequada valoracdo do fato jurfdico, que haverd de ser colhido ap6s os cortes que se fagam necessdrios, em processo redutor de complexidades, no bojo e sob os influxos do proprio sistema normativo. Sistema normativo: ramos do direito A divisdo do direito nos remete a uma sucesso de di- ficuldades cognoscitivas: (i) definir onde se inicia e onde se encerra cada ramo do direito; (ii) precisar se os ramos do Direito sao cientificamente auténomos ou se ha ciséo com Propésitos precipuamente didaticos; (iii) estabelecer, diante de regramento de fatos de contetido econdmico ou financei- To, como se da o reconhecimento de tais fatos pelos diversos ramos do direito. Paulo de Barros Carvalho salienta que “(...) 0 motivo des- se embarago esté na necessidade de reconhecermos 0 caréter absoluto da unidade do sistema, juridico. Mesmo em obséquio a 33, 0 absurd da interpretagto econémica do “fato gerador” —direto e sua ‘autonomia - 0 paradoxo da interdiisciplinaridade, Revista de direito tribute, rio, 0.97, p. 10. 34. Curso de direito tributério, 19 ed. Séo Paulo: Saraiva, p. 185. 264 CONSTRUCTIVISMO LOGICO-SEMANTICO. finalidades didéticas, nao deixaria de ser a cisio do incindével, «a segdo do inseeciondvel”. Esta totalmente superada a tese da autonomia cientifica do direito tributério.” Na verdade, buscava-se, com a alegagéo de autonomia cientifica, dar relevo a novel disciplina juridica que entao surgia, afastando-a do direito financeiro. Tratava-se, contudo, de proposicao descompassada com o carter de unici- dade do sistema juridico. Paulo de Barros Carvalho, a partir da regra-matriz. do IPTU;" demonstra, com clareza, a interdepen- déncia dos ramos didaticamente auténomos do direito e, por consequéncia, a impossibilidade de se predicar a autonomia cientifica a quaisquer desses ramos. Ressalte-se que, nos processos de reacdo a uma situacio posta, sdio comuns os exageros contidos nas proposicées ino- vadoras. Deveras, 0 esforgo retérico, por vezes desmedido, pode levar a extremo oposto t&o equivocado quanto & tese que se pretende combater. Foi o que se sucedeu com 0 esforgo de depuracdo do di- reito tributdrio, em relac&o a Ciéncia das Finangas e AC Econémic Com integral procedéncia, Alfredo Augusto Becker, en- faticamente, advertiu: A doutrina da interpretacdo do Direito Tributaério, segundo a realidade econémiea, é filha do maior equivoco que tem impedido 0 Direito Tributario evoluir como Ciéneia Juridica. Esta doutrina, inconscientemente, nega a utilidade do Diret- to, porquanto destréi preeisamente o que hé de juridico dentro do Direito Tributério.* 35, Curso de direito tributdirio, 19 ed. Séo Paulo: Saraiva, p. 13. 36. Entre os adeptos dessa tese, temos Fabio Fanucehi, Curso de direito tributdrio brasileiro, p. 16. 37, Curso de direito tributdrio, 19 ed. Séo Paulo: Saraiva, p. 14, 38, Teoria geral do direito tribuldrio. 4. ed, Séo Paulo: Noeses, 2007, p. 197-138. 265 CONSTRUCTIVISMO LOGICO-SEMANTICO Nao merece qualquer reparo a eloquente manifestacéo de Becker. No entanto, essa proscrig&o das realidades econd- mica e financeira em relagéo ao direito tributario levou, por vezes, ao extremo oposto, Vale dizer, desconsideraram-se dados econémicos e financeiros efetivamente juridicizados, sob a alegagao infundada de se tratar de realidade econémica, nao pertencente ao mundo do direito. Em outras palavras, aspectos econémicos e financeiros, que foram efetivamente positivados, continuam sendo tratados como se nao pertencessem ao mundo do direito; como se néo exercessem, por vezes, papel decisivo na demarcacéo de uma entidade jurfdica. Fomos de um extremo ao outro. Partimos de uma situacdo na qual conceitos juridicos e de Ciéneia das Fi- nangas eram tratados sem o necessério corte metodolégico, como se pertencessem a uma mesma Ciéncia, e chegamos ao estagio em que as prescrigdes normativas de direito financeiro néo sao consideradas como juridicamente relevantes. E ambas as posigbes séo equivocadas. B preciso dar consequéncia ao dado jurfdico, independentemente de sua origem e sem perder de vista a unidade do sistema normativo.”” Esse fendmeno também se operou em relacao aos aspec- tos econémicos. Da mesma forma, o dado econémico, regrado pelo direito, é desconsiderado sob o equivocado argumento de se tratar de matéria alheia as preocupagées do cientista do direito. Ambas as posturas esto equivocadas. A parcela do dado econdmico ou financeiro que ingressa no mundo juridi- Co, no bojo de regra dessa natureza, passa a ter natureza juri- dica, nao podendo ser desconsiderada por preconceitos des- compassados com 0 préprio ordenamento juridico, Outro aspecto importante relativo a diviséo do direito em ramos didaticamente auténomos diz respeito aos principios 39. BARRETO, Paulo Ayres. Contribuigdes regime jurfdico, destinago e controle. So Paulo: Noeses, 2006, p. 25. 266 CONSTRUCTIVISMO LOGICO-SEMANTICO informadores de seus diversos ramos. Reconhecer a unicidade do direito nao autoriza o baralhamento de prineipios espectfi- cos que regem cada um de seus ramos. Vale dizer, se o que se objetiva é resolver um problema de natureza tributaria, sao as regras ¢ os prinefpios informadores desse ramo do direito que, em face de sua especificidade, devem ser aplicados. A obser. vagao que pode ser tida por evidente merece destaque, uma vez que, ap6s a entrada em vigor do novo Cédigo Civil, tm sido recorrentemente encontradas na doutrina proposigées que buscam dar solugées a intrineados problemas tributarios, 8 luz dos prinefpios que inspiraram esse novo diploma legal. 9. Sistema normativo e o Constructivismo Légico-Semantico A.agio de dar foro sistémico a um determinado objeto do conhecimento passa necessariamente pela linguagem que o caracteriza, Vivemos sob 0 cerco inafastavel da linguagem. Nada existe sem uma linguagem que constitua 0 objeto. Como diz Lenio Luiz Streck® “estamos mergulhados em wm mundo que somente aparece (como mundo) na e pela linguagem.” As proposigdes desenvolvidas apresentam-se, em qual- quer sede do conhecimento humano, como uma camada de linguagem com pretenséo veritativa. No eseélio de Vilém Flusser" “conhecimento, realidade e verdade sao aspectos da Lingua”. A propria nogio de verdade surge, nesse contexto, com uma perspectiva retérica, lastreada na autorreferéncia do dis- curso. A prevaléncia de uma proposigio teérica representa, na feliz expresso de Richard Rorty", “o éxito de um discurso no mercado de ideias”. 40. Hermenéutica Jurtdica e(m) crise: wma exploraciio hermenéutica da cons: trugdo do direito, Porto Alogre: Livraria do Advogado, 1999, p. 178. AL, Lingua e realidade, 2 ed. Sio Paulo: Annablume, 2004, p. 34 42, El Giro Lingiiistico. Barcelona: Paidés, 1990, p. 65 CONSTRUCTIVISMO LOGICO-SEMANTICO Construfmos sentidos normativos. Consideramos tais sentidos para a formulagao de uma proposta sistémica do or denamento juridico. Consolidamos uma verséo das normas e dos fatos. Promovemos a nossa interpretacéio e a apresentamos & comunidade juridica. Nas palavras de Dardo Scavino“, co- nhecemos. uma “interpretacién o una version de lis hechos, y nuestra versién resulta a su vez uma versién de esa version.” A aproximagéo ao Constructivismo Légico-Semintico, em que a viséo analitica do direito e, consequentemente, do sistema normativo faz concessdes a corrente hermenéutica, longe de representar um enfraquecimento desta postura ana- Iftica, atribui-lhe maior consisténcia. Como esclarece Paulo de Barros Carvalho“, 0 ponto de vista analitico, fica “robustecide com as luzes das construgées hermenéuticas:o tom de histori- cidade, a consideracao dos valores, a interdiscursividade entre textos afins, o imergir em segmentos culturais bem desenvol- vidos, tudo isso ressalta o teor de analiticidade com que 0 ob- servador lida com 0 segmento normativo sob seus cuidados.” A énfase na linguagem oferece ainda formidavel instru- mental para uma melhor compreensio dos objetos de nossas investigagées. Tarek Moysés Mousallem* explica as reacées de subordinagao dos sistemas a partir dos atos de fala, ao re- ferir que “vista pelo espectro dos atos performativos, a hierarquia do sistema normativo é dada pela forga ilocuciondria do ato de fala.” De nossa parte, utilizamos o instrumental oferecido pela teoria dos atos de fala para explicar a necessidade inser¢ao do parégrafo tinico ao artigo 116 do Cédigo Tributario Nacional, com vistas a estabelecer limites ao planejamento tributdrio, qualificando-o com um ato perlocucionario de fala. 43, La filosofia actual:pensar sin certezas, Buenos Aires, Barcelona, México: Paidés, 1999, p. 38-39. 44, Direito tributério, linguagem e método, Séo Paulo: Noeses, 2008, p. XXIV. 45, Revogagdo em matéria tributdria. Séo Paulo: Noeses, 2005, p.159. 46. Blisdo tributéria limites normativos, p. 244, Tese de Livre-Docéneia apre: sentada na Faculdade de Direito da Universidade de Sao Paulo, 2008. Inédito, 268 CONSTRUCTIVISMO LOGICO-SEMANTICO Vé-se, com clareza, que os ganhos sao consideraveis. Sem perder o rigor, a forga e a consisténcia da postura analitica, abre-se ensanchas para aproximagées com aspectos histéricos, axiolégicos, em que a intertextualidade assume papel de ex- tremo relevo, permitindo a construgdo de um discurso sélido, com premissas claras e bem encadeadas, em que o sistema normativo exsurja com naturalidade e consisténeia.

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