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GPAH Artigo KANBAN MauroBaleeiro3
GPAH Artigo KANBAN MauroBaleeiro3
Pós-graduação
Gestão Ágil de Projetos - Turma nº 05
18/11/2020
RESUMO
É admirável como a filosofia do Sistema Toyota de Produção que nasceu nos anos 40,
alicerçada nos princípios da simplicidade, transparência, eliminação obsessiva do desperdício
e colaboração, foi transplantada com sucesso para as novas metodologias de gestão ágil
atuais. O sistema Kanban1 criado por Taiichi Ohno é a principal ferramenta de gestão à vista
utilizada nos processos de produção “Apenas a Tempo e no Tempo” (Just in Time) para
controle de fluxo dos “trabalhos, materiais e/ou recursos em curso” (Work in Progess), com o
objetivo de facilitar a sua visualização, “puxar” e regular o fluxo e permitir intervenções de
melhoria. Da manufatura enxuta e flexível (“Lean Manufacturing”) que levou a Toyota à
liderança da indústria automotiva, ao Manifesto Ágil e às modernas fábricas de software,
demonstra-se que a associação de velhos conceitos e ideias já provadas, possibilita a criação
de novas ideias (“insights”) e usos inovadores. É a velha teoria de Antoine Lavoisier, de que
“Na natureza nada se cria e nada se perde, tudo se transforma” em ação.
1 INTRODUÇÃO
A utilização dos quadros de gestão à vista, recheados de “post-its” com anotações feitas à
mão, para os mais diversos usos e finalidades, tornou-se uma característica marcante da
gestão, das metodologias e das equipes ágeis que vêm sendo adotadas por muitas empresas.
1
Kanban é um termo em japonês cuja tradução literal é “cartão”. Segundo Ohno (1978), os primeiros kanbans
eram um pedação de papel contendo instruções diversas, colocados dentro de um envelope de vinil transparente.
Mas o que está por trás dos quadros recheados de post-its, que se tornaram a marca “ágil”?
Para responder a esta questão, o trabalho de pesquisa empreendido para a elaboração deste
artigo se propõe a estabelecer uma conexão entre a filosofia de gestão implantada pela
fabricante de automóveis Toyota Motors no Japão desde 1937, conhecida como Sistema
Toyota de Produção (“TPS”), e a filosofia de gestão baseada no Manifesto Ágil de 2001, que
hoje vivenciamos. O elemento comum entre elas é o sistema Kanban, que cumpre vários
papeis, como facilitar a visualização, “puxar” e regular o fluxo de produção e permitir
intervenções de melhoria para eliminação de desperdícios e aumento da produtividade.
Em 1986, o autor participou de uma missão de estudos ao Japão, patrocinada pela JMA-Japan
Management Association, destinada a ensinar as técnicas industriais japonesas a executivos
brasileiros. Após um curso preparatório de seis meses no Brasil, a missão no Japão em si teve
duração de 4 semanas, e constou de aulas teóricas e treinamentos em chão de fábrica em dez
empresas de setores produtivos diferentes, como o setor automotivo e de autopeças, a
construção naval, o de eletroeletrônicos e a indústria de alimentos. Na ocasião, o autor teve a
oportunidade e o privilégio de ser aluno de Taiichi Ohno, o “pai” do Kanban, e Shigeo
Shingo, ambos ícones mundiais da filosofia de gestão da manufatura “Apenas a Tempo e No
Tempo” (“just in time”), que é na realidade a base do Sistema Toyota de Produção.
Na virada dos anos 80 para 90, surgiu no Ocidente o movimento “Lean” ou do Pensamento
Enxuto (“Lean Thinking”) que encampou os princípios do TPS, com a denominação de
Manufatura Enxuta (“Lean Manufacturing”), o que será explicado mais adiante.
2 REFERENCIAL TEÓRICO
A literatura básica revisada para fundamentar este artigo se atém ao tema da evolução do
sistema Kanban como ferramenta de gestão à vista, controle de fluxo e inventário, redução de
desperdício e melhoria da produtividade, com maior ênfase no estudo e compreensão da
conexão existente entre os papéis e funcionalidades desempenhados pelo Kanban no contexto
cultural e industrial do Japão, onde nasceu, e daí para os seus usos no contexto da indústria de
softwares e outras aplicações atuais, a nível global. Em paralelo, há também um interesse em
desvendar as condições de contorno e a gênese das ideias 2 subjacentes ao fenômeno Kanban,
observando-se a transformação da sociedade no curso da história, movida pela necessidade e
pela inovação3. Neste aspecto, Taiichi Ohno, considerado o “pai” do Kanban, nos traz uma
frase emblemática: “A necessidade é a mãe da invenção”. (OHNO, 1978, pg. 18)
Para isto, houve aqui e acolá, alguma digressão em relação ao objeto específico, permitindo-
se uma incursão da pesquisa por outros campos correlatos. Embora de maneira muito sintética
e própria dos artigos, pretende-se, com esta maior amplitude, evidenciar como a
engenhosidade humana é capaz de associar as ideias ou recriá-las, para responder às
necessidades de cada contexto, em cada época.
Taiichi Ohno nos oferece um manancial inesgotável sobre o tema em estudo, e diretamente na
fonte original, já que é considerado o “pai” do Kanban e um dos desenvolvedores do TPS.
Não menos relevante é a contribuição de Shigeo Shingo, que foi um renomado consultor de
engenharia industrial da Toyota e parceiro de Ohno, para aperfeiçoar o TPS, particularmente
em relação aos sistemas de trocas rápidas de ferramentas (SMED) e dos sistemas à prova de
bobeiras ou erros tolos (POKAYOKÊ). Contribuíram também para este aperfeiçoamento, as
ideias dos controles estatísticos, do ciclo PDCA 4 e da qualidade total de W. Edwards Deming,
trazidas para o Japão em 1950. (OHNO, 1978), (SHINGO, 1982), (DEMING,2020).
Taiichi Ohno nos apresenta diferentes versões na definição do Sistema Toyota de Produção,
conforme as suas múltiplas facetas, por se tratar de um conjunto de técnicas entrelaçadas,
contemplando uma ideia central, com vários corolários, conforme a perspectiva da análise.
Segundo ele, o TPS é uma filosofia, um modelo ou um método. A ideia central,
exaustivamente repetida é a seguinte:
2
Definição do MIT: uma “ideia” é um potencial par perfeito para solucionar um problema, que em geral requer
alguma experimentação e refinamento, para um encaixe perfeito. (BUDDEN e MURRAY, 2017)
3
Definição do MIT: inovação é o processo de levar uma ideia desde a sua concepção até o seu impacto na
sociedade. (BUDDEN e MURRAY, 2017)
4
O ciclo PDCA “Plan-Develop-Check-Act/Adjust” foi idealizado por Walter Shewhart no Bell Labs-EUA, como
método iterativo para gestão de mudanças e aperfeiçoamento contínuo, e posteriormente incorporado por
Deming no conjunto das ideias da qualidade total. https://kanbanize.com/lean-management/improvement/what-
is-pdca-cycle
Repetindo, os dois pilares do Sistema Toyota de Produção são o just-in-time e a
automação com um toque humano, ou autonomação. A ferramenta utilizada
para operar o sistema é o kanban, uma ideia que tirei dos supermercados
americanos”. (OHNO, 1978, pg. 27) (grifos do autor)
Ohno (1978, pg.21) enfatiza a importância da técnica de perguntar os “cinco por quês” como
ferramenta de melhoria contínua6, considerada por ele como uma abordagem científica para
que se possa de fato encontrar a causa-raiz de um problema. E isto foi de grande valor para o
aperfeiçoamento do TPS ao longo do tempo:
“...o Sistema Toyota de Produção tem sido construído com base na prática e na
evolução desta abordagem científica. Perguntando cinco vezes “por quê” e
respondendo cada vez, podemos chegar à verdadeira causa do problema, que
geralmente está escondido atrás de sintomas mais óbvios.”
a) Desperdício de superprodução;
b) Desperdício de tempo disponível (espera);
c) Desperdício em transporte;
d) Desperdício do processamento em si;
e) Desperdício de estoque disponível (estoque);
f) Desperdício de movimento;
g) Desperdício de produzir produtos defeituosos.
A eliminação completa desses desperdícios pode aumentar a eficiência de operação por uma
ampla margem.” (OHNO, 1978, pg. 23)
2.4 Sobre o controle visual e o papel do Kanban como ferramenta de comunicação direta
5
Segundo o site KANBANIZE, https://kanbanize.com/pt/gestao-lean/melhoria/5-porques-ferramenta-de-analise
a técnica dos “5 Por quês” para identificação da causa-raiz foi desenvolvida pelo industrial e inventor Sakichi
Toyoda, pai de Keijiro Toyoda, o fundador da Toyota Motor Company.
6
A melhoria continua é também denominada de Kaizen, em japonês.
“Em cada planta da Toyota Motor Company, bem como nas plantas de
produção das empresas fornecedoras que adotam o Sistema Toyota de
Produção, o controle visual é estabelecido integralmente.
Folhas de trabalho padrão são afixadas em local bem visível em cada estação
de trabalho. Quando alguém olha para cima, o andon (o quadro de indicação de
parada da linha) fica visível, mostrando rapidamente o local e a natureza das
situações problema. Além disso, caixas contendo os componentes, trazidas para
o lado da linha de produção, chegam com um kanban afixados nelas, o símbolo
visual do Sistema Toyota de Produção”. (grifo nosso)
A figura 1 abaixo, ilustra como é o “cartão” Kanban como ferramenta de comunicação típica
da Toyota, seja entre as suas diferentes linhas ou seções da produção internas, seja com os
parceiros externos, fornecedores de peças:
Todas as informações são grafadas em números e letras (modo analógico), bem como, em
códigos de barras para leitura ótica (digital), à prova de erros de transcrição. É também
comum a utilização de fichas com cores padronizadas, como um fator adicional de sinalização
e diferenciação.
A figura 2 abaixo, ilustra como são circulados os diversos “cartões” (kanbans) ao longo do
processo de produção, baseado no conceito de “puxar”, ou seja, tudo começa com os pedidos
dos clientes, que puxam o produto final, a linha de montagem final puxa os componentes
imediatamente anteriores necessários, e, assim sucessivamente:
Figura 2 – Ilustração da linha de produção puxada pelos “cartões” Kanban:
Production Production
Instruction Instruction
Use of Use of Use of
KANBAN KANBAN
material parts parts
Parts transportation Parts transportation
S2 P1 S1 S2 P2 S1 S2 P3
2.5 Sobre a máquina autônoma e inteligente que para a produção quando há problema
7
Segundo Ohno (1978) a ideia da autonomação é oriunda dos teares da indústria de tecelagem da família Toyoda
e desenvolvida por Sakichi Toyoda, que além de industrial era inventor.
8
Os conceitos de trabalho coletivo, assistência mutua e das entregas por equipe, esquivando-se simplesmente de
medir o desempenho individual, foi perfeitamente incorporado nas metodologias ágeis.
Ohno (1978, pg. 20) aponta que a ideia de estocar arroz para a subsistência, advinda dos
nossos ancestrais, embora natural e compreensível, não tem mais lugar na complexa
sociedade capitalista atual:
9
Segundo Anderson (2010), a experimentação é também um dos pilares das metodologias ágeis.
pelo qual o Sistema Toyota de Produção flui suavemente. (OHNO, 1978, pg.
14) (grifos do autor)
Schonberger (1982) complementa o repertório de autores seminais relacionados às técnicas
industriais japonesas. Ademais, foram consultados sites especializados, como o do Instituto
Deming, e blogs para esclarecimentos de detalhes históricos e enriquecimento do contexto.
Nos EUA, os gigantes automotivos ficaram atônitos e quase foram à bancarrota, tratando logo
de copiar o modelo japonês, mas esbarraram em questões culturais e estruturais da sua
economia. A solução interina dos americanos foi de impor barreiras comerciais para forçar os
japoneses a se mudarem para os EUA, para não perder o acesso àquele gigantesco mercado,
através de associações com os fabricantes locais. Foi uma maneira deles aprenderem as novas
técnicas. Logo, os americanos encamparam os princípios do TPS e o rebatizaram na versão
ocidentalizada como “lean10”, sinônimo de manufatura enxuta e flexível. (OUCHI, 1981);
(MORITA, 1982); (PASCALE e ATHOS, 1982); (CRANDALL, 2020).
Em seu relato, Anderson aponta que durante muitos anos se debatia com dois problemas
recorrentes. De um lado, como disciplinar o fluxo de trabalho das suas equipes de
desenvolvimento de software, de tal forma a aumentar a qualidade, produtividade e
previsibilidade das entregas, que resultasse numa situação ganha-ganha, isto é, atender às
demandas da empresa e ao mesmo tempo melhorar a qualidade de vida dos colaboradores. De
outro lado, como ampliar a adoção de uma abordagem ágil para a empresa toda, superando a
inevitável resistência às mudanças necessárias. Anderson estava convencido que a solução
para ambos os problemas seria um sistema de “puxar” o fluxo de produção. Depois de uma
experiência realizada com a metodologia Tambor-Pulmão-Corda13, Anderson fixou-se na
filosofia do Kanban, e, segundo suas próprias palavras, tornou-se um pregador dessa filosofia
mundo afora, em razão das suas inúmeras virtudes e benefícios.
Anderson (2010) descreve que a baixa qualidade é o maior desperdício de todos, na indústria
de desenvolvimento de software, e apresenta uma receita para o sucesso, a qual o Kanban
atende em todos os aspectos, a saber: a) Foco na qualidade; b) WIP regulado e balanceado; c)
Entregas regulares e frequentes; d) Capacidade balanceada com a demanda; e) Priorização das
atividades e tarefas; f) Ataque às fontes de variabilidade para melhorar a previsibilidade.
3 METODOLOGIA
A despeito da extensa pesquisa realizada, no âmbito de um artigo técnico não seria possível
reproduzi-la em toda a sua plenitude e profundidade, razão pela qual a apresentação dos
resultados será condensada em infográficos, quadros e diagramas, inspirados no formato de
comunicação visual do Kanban.
4 RESULTADOS E DISCUSSÃO
Morita (1986, pg. 245) descreve o Japão como um conjunto de ilhas vulcânicas, sujeitas a
todo tipo de catástrofes naturais e cuja extensão geográfica agregada é diminuta em proporção
à população14 que nela vive:
Morita (1986, pg. 246) explica o significado de mottainai, uma palavra japonesa que exprime
o sentimento religioso japonês em relação ao desperdício, que é considerado uma heresia e
uma irreverência à confiança divina. “O desperdício de qualquer coisa é considerado
vergonhoso e virtualmente criminoso”.
Segundo Ohno (1978), a saga industrial da família Toyoda começou na esteira da revolução
industrial no final do século XIX, na indústria têxtil. Sakishi Toyoda era um próspero
industrial e inventor, que sonhava em produzir carros para os japoneses, o que só foi possível
após a sua morte, pelas mãos do seu filho Keichiro Toyoda, fundador da Toyota Motors em
1937. Mas, Sakishi deixou como legado as suas ideias relativas ao método dos “cinco por
quês” e da autonomação das fábricas. Logo após a rendição dos japoneses na segunda guerra,
Keichiro lançou o “supremo” desafio da Toyota: “”. Durante a guerra, a Toyota esteve à beira
da falência. Ohno (1978) relata que se via perplexo, ao comparar a produtividade média
americana com a japonesa da época, na razão de 1 x 9. Como aumentar em 9 vezes a
produtividade para alcançar os americanos?
14
A população japonesa atual é de 127 milhões, para uma área total de 377. 801 Km2. (fonte: Mundo Educação.
Uol. https://mundoeducacao.uol.com.br/geografia/japao-1.htm ). O Estado de Minas Gerais possui uma área de
586.528 Km2 para uma população atual de 20,7 milhões. A densidade população do Japão é cerca de 40 vezes
maior que a de Minas Gerais, considerando-se que menos de ¼ do território japonês é habitável.
Morita (1986) admite que nos anos 50 e 60, os produtos Made in Japan eram sinônimos de
baixa qualidade, sendo vistos com reserva no mercado internacional. Havia escassez de tudo e
os japoneses dependiam de importações, praticamente, de todas as matérias primas que
necessitavam, principalmente petróleo, e precisavam reequilibrar a sua balança comercial com
o resto do mundo através de exportações.
Segundo Ohno (1978), a Toyota foi salva em 1950 por uma grande encomenda de caminhões
do Exército americano, durante a Guerra da Coréia. Junto com a encomenda, os americanos
estabeleceram os padrões de qualidade a serem atendidos e trouxeram o Prof. Deming para
ensiná-los. Começou aí a revolução na Toyota, construída pelas mentes brilhantes de Ohno,
Shingo e Deming, inspirados na sabedoria milenar japonesa, nas teorias de Frederic Taylor,
Henry Ford e Walter Shewhart e no legado de Sakichi Toyoda, adaptados para aquela nova
realidade. Os resultados práticos, graças ao Kanban, podem ser vistos comparando-se a
evolução do giro anual dos estoques, Quadro 1:
Quadro 1
Giro médio anual de estoques em empresas automotivas
Concorrente 1 Concorrente 2 Concorrente 3
Ano Toyota
Japão EUA EUA
1960 41 vezes 13 vezes 7 vezes 8 vezes
1965 66 vezes 13 vezes 5 vezes 5 vezes
1970 63 vezes 13 vezes 6 vezes 6 vezes
Fonte: SHINGO (1982, pg. 167)
Resumiu-se em infográfico (fig.3) os marcos históricos mais relevantes dos últimos 120 anos,
relacionados à gênese do Kanban e à sua transposição para o mundo ágil atual, que mostra
como as ideias foram evoluindo ao longo do tempo, através dos insights captados por
personagens que marcaram suas épocas, pela sua visão empreendedora e capacidade
transformadora:
ScrunBan
KANBAN KANBAN
Método KANBAN
Sistema KANBAN SCRUM
JUST-IN-TIME GESTÃO ÁGIL DE PROJETOS
Em 2005, de férias em Tóquio com a família, Anderson visitou o parque das cerejeiras no
entorno do Palácio Imperial. Ao entrar, cada membro da família recebeu um pequeno cartão
branco, com a instrução de devolvê-lo na saída. Anderson, a princípio, não entendeu qual a
finalidade do cartão e, menos ainda, quando ao sair simplesmente depositaram os cartões
numa caixa de papelão, sem nenhum outro tipo de controle. Os pontos de entrada e saída eram
distintos. Havia fila na entrada. Anderson achou que o sistema de controle era falho e sujeito a
fraude. Não havia controle rígido de fato e qualquer um poderia pegar um cartão e entrar no
parque. Até que lhe veio o insight: era o kanban. A única finalidade era a de evitar a
superpopulação de visitantes no parque e, contanto que cada entrante portasse o tal cartão
branco padronizado, a população máxima visitante estaria limitada aos cartões disponíveis!
O resultado a partir desse insight, é que Anderson vislumbrou a aplicação do Kanban, não
apenas como na manufatura da Toyota, mas para qualquer tipo de atividade produtiva, que
demanda algum tipo de gestão. "O Kanban é baseado numa ideia muito simples. As atividades
em andamento devem ser limitadas. Algo novo só deve ser iniciado quando uma peça de
trabalho existente é liberada ou quando uma função automática inicia isso. É uma iniciativa
Lean (enxuta) para moldar a cultura das organizações e encorajar a melhoria contínua.”
(ANDERSON, 2010).
Como se pode notar, o Kanban de Ohno e o Kanban de Anderson estão baseados nos mesmos
princípios, com as adaptações próprias para cada contexto, conforme o Quadro 2:
Quadro 2
SISTEMA TOYOTA DE PRODUÇÃO E MANIFESTO ÁGIL DE 2001 E O KANBAN
KANBAN DE TAIICHI OHNO DE 1950 DE DAVID ANDERSON DE 2004
1. Gestão à vista, Kanban, Andon 1. Visualizar o fluxo de trabalho
2. Sistema puxado, produção nivelada 2. Limitar trabalho em progresso
3. Visão sistêmica, sincronização 3. Gerenciar o fluxo
4. Folhas padrão de produção, transparência 4. Tornar as políticas explícitas
5. Autonomia para parar a produção, 5 por quês 5. Implementar laços de feedback
6. Trabalho em equipe, assistência mutua 6. Melhorar colaborativamente,
7. Melhoria contínua, Kaizen 7. Evoluir experimentalmente
Fonte: Elaborado pelo autor; Anderson (2010).
No novo Kanban, o conceito de desperdício que o é vilão para o TPS, foi substituído por um
conceito equivalente do modelo econômico de custo, como custos de transação, custos de
coordenação e custos de carga de falhas. Da mesma forma, a comunicação visual, física e
analógica do Kanban de Ohno, vem sendo substituída pelas plataformas digitais de gestão e
colaboração on line, como Trello, Miro, Mural, Google Jambord e outros.
O Sistema Kanban da indústria de software, desenvolvido por Anderson (2010), que faz
questão de ressaltar o “K” maiúsculo, apresenta diferentes formatações, em razão da sua
enorme flexibilidade e adaptabilidade para diferentes contextos, qualidades estas que são
muito valorizadas e ressaltadas por ele, as quais explicam a sua grande aplicabilidade.
As figuras 6 e 7 abaixo ilustram diferentes formatos de quadros Kanban para controle visual
de fluxo de processos, desde os mais simples, aos mais complexos:
Figura 6 – Ilustração do Kanban adaptando-se a diferentes contextos
A forma mais elementar do
Kanban consiste em três colunas
com três situações:
1. “To Do” = a fazer ou backlog
de tarefas em espera;
2. “Fazendo” = atividades em
andamento (WIP);
3. “Done” = pronto ou
atividades concluídas
Uma recente pesquisa sobre a utilização do Kanban no mundo ágil pelo site State of Agile,
nos traz o posicionamento relativo do Kanban com 7% de utilização em relação aos outros
métodos e práticas ágeis, conforme Figura 8 abaixo, onde se destaca o Scrum com 58%:
Figura 8
Fonte: State of Agile, 2019.
Figura 9
Em relação às técnicas da gestão ágil mais empregadas, o Kanban ocupa a 6ª posição, atrás
de: 1) Reuniões diárias (dailies); 2) Retrospectivas; 3) Planejamento de sprints; 4) Revisão de
sprints; 5) Ciclos curtos de iteração. Vide Figura 9 acima.
Entretanto, entre as ferramentas de gestão ágil de projetos, o quadro Kanban era disparado o
mais utilizado por 76% dos usuários em 2019, com 10% dos usuários planejando utilizá-lo,
conforme a Figura 10:
Figura 10
USA ATUALMENTE PLANEJA UTILIZAR
Fonte: State of Agile, 2019.
Entretanto, Anderson (2010) adverte que a mera utilização de quadros kanban de gestão à
vista, não caracteriza a condição necessária para o funcionamento do sistema Kanban, que
exige a limitação explícita de WIP e a sinalização para a “puxada” de novos itens de trabalho.
5 CONCLUSÃO
O sucesso do Kanban como ferramenta de gestão, nos vários contextos em que se insere,
decorre da sua simplicidade e adaptabilidade, da conexão transparente, direta e intuitiva que
logra estabelecer, em todo e qualquer processo de comunicação e/ou interação em que é
utilizado.
Nesse processo contínuo de transformação, poderá o novo Kanban, na versão ágil, ser
transposto de volta para o chão de fábrica, criando a “manufatura ágil” no âmbito da indústria
4.0? Como estará hoje o Kanban criado por Ohno, sendo utilizado nas fábricas da Toyota?
Estão são indagações instigantes, que ensejam a recomendação para futuras pesquisas.
REFERÊNCIAS E BIBLIOGRAFIA
ACTIVE.COLLAB. Kanban: A quick and easy guide to kickstart your project. E-book.
Publicado por Active.Collab. Disponível em https://activecollab.com/project-management-
guides/kanban-ebook Acesso em 25/10/2020.
CRANDALL, C. The effects of US Trade protection for autos and steel. pdf. Brookings
Institution. Disponível em https://core.ac.uk/download/pdf/6252262.pdf Acesso em
18/11/2020.
KANBANIZE, site. 5 Por quês: a melhor ferramenta para a análise de causa raiz.
Disponível em https://kanbanize.com/pt/gestao-lean/melhoria/5-porques-ferramenta-de-
analise Acesso em 18/11/2020.
MORITA, A. Made in Japan. 1ª. ed. Livraria Cultura Editora. São Paulo: 1986.
OUCHI, W. Teoria Z. Como as empresas podem enfrentar o desafio japonês. 6ª. ed.
Editora Fundo Educativo Brasileiro. São Paulo: 1981.
RANDLE, J.; WATANABE, M. Sua Viagem ao Japão. Cedibra Editora Brasileira. São
Paulo: 1987.