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A prática das atividades

teatrais na AEL
Por Leon Pires da Conceição de Barros Cordeiro
Professor Orientador de Estudos Literários e Teatrais da AEL Cora Coralina, 2018/2020. Professor do Curso de Teatro para os Professores Orientadores da DRE Penha.
Formado em Design Digital e Teatro pela Universidade Anhembi Morumbi, e em Pedagogia pela Universidade Casa Branca. Pós-Graduado em Ensino Lúdico e Cultura
Afro-Brasileira.

U
ma das principais premissas encontradas compartilhamento de suas ideias e sentimentos.
na realização do Projeto AEL são os Es- Por intermédio da coletividade, o teatro ressalta
tudos Literários e o estreitamento entre a noções de mutualidade e grupo, uma vez que toda
relação Leitor e Autor, por meio da escolha e estu- atividade depende do respeito, da comunicação e
do da biografia e obras de seu “Amigo Literário”, da escuta, para que os participantes estejam inte-
nome atribuído ao autor escolhido pelo educando de grados em prol da transmissão da mensagem por
acordo com seu apreço e identificação. meio da linguagem escolhida.
Paralelamente, surgem as Atividades Teatrais Conheci a Academia Estudantil de Letras ao
como ferramentas de aprofundamento temático e, acaso quando, logo ao entrar na Rede Municipal de
principalmente, como ferramenta de desenvolvi- Ensino, fui orientando os estudantes do Fundamen-
mento artístico, social e pessoal. tal I nas aulas de Estudos Literários na AEL Padre
Por meio da Ludicidade, o teatro permite ao Antônio Vieira, da EMEF Padre Antônio Vieira.
acadêmico, em primeiro momento, a realização de Superado o medo combinado com aquele estra-
atividades e exercícios em busca do reconhecimen- nhamento, típico de quando estamos entrando em
to de suas potencialidades, para que, pelo aperfeiço- um novo território até então desconhecido, comecei
amento pessoal, efetue a sua expressividade e visão a entender não só a dinâmica do projeto, bem como
de si, do mundo, despertando as relações e intera- as enormes possibilidades ali presentes.
ções sociais, assim como o questionamento do seu Paralelamente, acompanhei os estudos reali-
papel nos diversos meios, ou seja, tecnicamente, o zados nos frequentes encontros da Academia de
teatro permite ao educando o desenvolvimento de Letras dos Professores – ALP, que, naquela época,
diversas inteligências. tinha como Patronesse a autora Cora Coralina, que
Corporalmente, os “atores em formação”, como também nomeava a ALP e ressurgiria em minha
costumo chamá-los, buscam o reconhecimento e a vida em outro momento, mas esse assunto fica para
coordenação dos seus corpos com seus sentimentos mais adiante.
e sensações e os dos personagens, vivenciando ou- Posteriormente, ainda na AEL Padre Antônio
tras realidades e sentimentos. Vieira, atuei como Coordenador das Atividades de
Como linguagem artística, o teatro não se res- Teatro e foi quando, efetivamente, percebi a di-
tringe somente a questões relacionadas à interpreta- mensão que o projeto poderia tomar não somente
ção e ao ator. Ele permite também o envolvimento dentro da Rede, mas, principalmente, para cada
com outros fazeres artísticos, como cenografia, fi- indivíduo envolvido.
gurino, iluminação e sonoplastia. Elementos extre- Logo que conheci o grupo, observando suas
mamente importantes para a transmissão da mensa- necessidades específicas, diagnostiquei algumas
gem escolhida. questões necessárias para o desenvolvimento co-
Os Estudos Teatrais ainda são um meio de lei- letivo. Iniciamos então os estudos das potenciali-
tura, a criação e a interpretação de textos para o dades expressivas e comunicativas do corpo, por

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meio dos gestos, sensações e sentimentos, buscan- laços de amizade. Dessa forma, as músicas do grupo
do assim o reconhecimento de si, para posterior- Palavra Cantada complementaram a adaptação das
mente buscar o outro. obras de Rubem Alves, tendo como obra central o
Paralelamente, estudamos as características do livro “A Menina e o Pássaro Encantado”.
Cinema Mudo, em destaque nas obras de Charles No ano seguinte, ao tornar-me POSL na EMEF
Chaplin, atentando sempre para o trabalho corpo- Luis Washington Vita, fui convidado para nova-
ral com as técnicas de pantomima e mímica. Como mente assumir a orientação dos Estudos Teatrais da
resultado de todo desse processo, a partir dos exer- AEL Cora Coralina, na turma do Fundamental II,
cícios propostos, elaborei a dramaturgia da peça que já apresentava um histórico de estudos e exce-
“Charles Chaplin em O Gran Circus”, na qual os lente desempenho ao longo dos anos da Academia.
estudantes misturavam as linguagens do Circo e do Foi um período de recomeços e reconhecimentos,
Teatro com as características do Cinema Mudo. no qual as questões já trabalhadas na Academia an-
Dando continuidade ao trabalho iniciado no ano terior deveriam ser retomadas, principalmente, as
anterior, aprofundando os estudos, o processo e to- questões técnicas de reconhecimento de palco, voz
das as atividades foram voltados para a exteriori- e coletividade.
zação dos sentimentos e a relação com o outro, a A primeira montagem com o grupo foi a adap-
confiança e a empatia. tação da obra “Meu Pé de Laranja Lima”, de José
Se, no momento anterior, as características do Mauro de Vasconcelos, contada por um grupo mam-
Cinema Mudo foram integradas ao Teatro, nesse bembe, por meio de jogos cênicos e músicas. Os re-
processo, a linguagem musical surgiu como uma sultados foram tão positivos que, no ano seguinte, o
ferramenta extra para o desenvolvimento expressivo grupo retorna aos palcos para uma viagem ao sertão
dos educandos por meio do canto coral, destacando nordestino, em busca da sua liberdade de expressão
a importância da escuta, do trabalho coletivo e dos e identidade, em um resgate de raízes culturais, com
obras de autores, como Ariano Suassuna, Patativa
do Assaré e Braúlio Bessa.
vitalícios, e parte desse incrível Concomitantemente, a segunda turma (tam-
“Como ex-estudantes, acadêmicos
e diversas experiências guar-
projeto, nos vemos em meio a inúmeras bém do Fundamental II) estudou o universo lúdico
de nós seguimos para a área da
dadas em nossos corações. Alguns
m outro segmento relacionado, dos contos de fadas e dos personagens de Ziraldo,
escrita, atuação em teatro, ou algu
o gera l, a AEL teve grande impacto e trou- unindo-os na peça adaptada do livro homônimo
mas não podemos negar que, de mod
xe resultados na vida de todos. ro “A Bela Borboleta”.
irimos incontáveis aprendizados dent
Além de aspectos profissionais, adqu ntro s sema nais .
daquela Sala de Leitura, na qual
realizávamos noss os enco É extremamente gratificante acompanhar o de-
e crite riosa em relaç ão às obra s e,
ampla
Aprendemos a ter uma visão mais senvolvimento de um estudantes que sequer conse-
eque ntem ente , à vida . Com o disse Paulo Freire, não existe educação sem
cons . guia falar seu próprio nome e, ao final do processo,
só lemos, mas vivemos dentro da AEL
amor, e foi exatamente isso que não estu dant es, e tamb ém com
Criamos amizades que perduram até
hoje, entre nós brilha no palco, não somente tendo projeção de voz,
res que orga niza ram o projeto. Mais que colegas, criamos
os incríveis prof esso mas emocionando a plateia com sua interpretação.
uma família. - Ou ainda observar o despertar da coletividade de um
iente era tão diverso que não havia espa
Assim como na literatura, o nosso amb o, cada um com sua part i-
ou discriminaçã grupo em que a rivalidade imperava.
ço para nenhum tipo de preconceito ver
e com o temp o nece ssár io para conhecer a si mesmo e desenvol
cularidade
s, não vemos ou acreditamos, mas temo s Que esses 15 anos sejam os primeiros de vida
todo seu intelecto. Na maioria das veze liter atur a.
foi isso que fizemos por meio da longa e próspera, para que tenhamos cada vez
potencial para explorar o mundo, e
idão , noss o muit o obrigado!” mais novas academias e acadêmicos, mantendo
Com todo amor e grat
Gustavo
a Mariano, Ester da Silva Ramos, assim viva a educação transformadora, levando-a
Amanda Giovanna Lorena, Ana Paul ão, Julia Rodr igues Carreiro, Marcus
Rom
Barbosa Fortunato, Jorge William imento um número maior de pessoas, que serão marca-
osa Fortunato, Tiago de Souza Nasc
Vinícius Afonso Ricino, Tiago Barb yr Carra sco
Membros Vital ícios da AEL Walc das como as que já passaram e também como nós
DRE Itaquera
sempre seremos.

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Práticas e experiências da AEL:
Dos jogos teatrais à montagem de uma peça
Por Vanessa do Nascimento Vicentini
Foi Coordenadora das Atividades de Teatro na AEL Walcyr Carrasco – EMEF Danylo José Fernandes (DRE Itaquera). Atualmente é Coordenadora e formadora do projeto
AEL na DRE Itaquera.

"O teatro é a poesia que sai do livro tema: “sentimentos”, “adolescência”, “chegadas
e se faz humana" e partidas”, etc., e, só então, pesquisamos e cons-
(Federico García Lorca) truímos cenas independentes dentro da temática e
as unimos para contar a história. Definida a temá-

D
tica, todos – estudantes e professores – contribuem
e 2013 a 2018, atuei como Coordenado- com sugestões de poemas, contos, letras de músicas
ra das Atividades de Teatro e de Estudos que ajudem a contar a história. O texto é construído
Literários na AEL Walcyr Carrasco, da a partir de um processo colaborativo, de releituras e
EMEF Danylo José Fernandes. Em 2018, respondi adaptações de textos literários para o teatro. Assim,
ao convite da SME para participar, com nossos es- em relação ao processo criativo, desenvolvemos uma
tudantes, do Seminário Práticas e Experiências da dramaturgia coletiva, que reúne textos diversos em
AEL, na Universidade Presbiteriana Mackenzie e, uma narrativa não linear.
ao lado do professor Guilherme Cunha de Carvalho,
companheiro de jornada, compartilhar das práticas Encenação e iluminação
de estudos literários associados às atividades de tea-
tro que realizamos na AEL Walcyr Carrasco. Para as trocas de cena, o principal recurso utili-
Em apresentação com o tema “Dos jogos teatrais zado é a iluminação. A intenção é evitar a abertura
à montagem de uma peça: relato de experiência”, e o fechamento de cortinas ao fim de cada cena,
reconstruímos o percurso de criação e desenvolvi- o que seria cansativo e demorado. A luz parcial
mento de nossas peças baseadas em obras literárias. é utilizada na iluminação de uma ação específica
A apresentação foi estruturada a partir de nossas vi- no palco ou mudança de ambiente em uma mesma
vências com o teatro na escola, atividades realizadas cena; a luz ampla, que cobre a maior parte do palco
dentro do Projeto AEL. ou o palco inteiro, é utilizada em cenas que envol-
Apresentamos as etapas de trabalho em que Li- vem muitas pessoas, na alternância de iluminação
teratura e Teatro caminham lado a lado para a cria- entre ou em uma mesma cena, ou para marcar uma
ção e o desenvolvimento das peças teatrais. Para- passagem de tempo maior.
lelamente aos encontros para desenvolvimento dos Para cada peça, construímos um mapa de ilumi-
estudos literários, organizamos, nos ensaios volta- nação, no qual é importante:
dos às práticas teatrais, atividades para abordar os • indicar a iluminação no mapa a cada cena ou a
diversos elementos do teatro. cada mudança de efeito dentro da mesma cena;
• usar imagens simples e claras para indicar onde
O texto teatral devem estar os focos de luz;
(o enredo a ser representado) • ter alguém que tenha participado dos ensaios da
peça que fique responsável pela iluminação no
A escrita do texto – estrutura e organização dia da apresentação, ainda que o local possua
das cenas – dá-se a partir da escolha de um grande pessoa responsável para esta função;

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• testar os efeitos antecipadamente nos locais de trabalho com a literatura, como recurso transforma-
apresentação para saber se é possível realizar o dor de práticas educacionais.
que se pretende.
Para o trabalho com a atuação e a construção Cenário
de personagens com os estudantes, elementos como
encenação, memorização do texto, agilidade, postu- Para a construção de cenários, utilizamos blocos
ra de palco, etc., chamamos à baila referências ex- de madeira (50 cm² aproximadamente), que podem
traídas das obras “Jogos Teatrais: o fichário” (2014) ser articulados para formar diversos efeitos cênicos:
e “O Jogo Teatral no Livro do Diretor” (2017), de casas, paredes, portas, mesas, assentos, palcos, além
Viola Spolin, e “Jogos Teatrais” (2017), de Ingrid de os utilizarmos como base para alteração de planos
Dormien Koudela, que também tem sua obra inspi- (plano alto, plano médio e plano baixo) em cena, divi-
rada nos jogos de Spolin. dir espaços no palco, etc. Também adquirimos, com o
passar dos anos, objetos cênicos. A cada nova peça, os
Personagens objetos adquiridos pela escola são guardados forman-
do um acervo para a utilização em outras montagens.
Momento I: Planejamento das oficinas com jo- Todos os elementos de encenação auxiliam
gos teatrais e ensaios da peça na construção de sentidos da leitura, de forma
A seleção dos jogos depende do que aconte- mais ampla, e das obras literárias utilizadas para
ce durante os ensaios. Por exemplo, quando fica a composição das peças teatrais. A proximidade e
óbvio que os atores estão lendo suas falas e igno- a apropriação do texto literário em diversas pers-
rando as pessoas com as quais estão falando, você pectivas permitem que o estudante leitor tenha
tem uma grande variedade de jogos teatrais para uma formação que o leve a compreender critica-
jogar: Caminhadas no Espaço; Tocar e Ser Tocado; mente a realidade social e nela agir, organizando
Ver e Ser Visto. (SPOLIN, 2017, p. 33). Assim, po- suas ações.
de-se selecionar jogos para trabalhar consciência Unir e interpretar textos escritos em diferen-
corporal, agilidade, reconhecimento de emoções, tes contextos por diversos autores exige dos estu-
confiança, desenvolver estado de alerta, criação de dantes, além de criação de repertório literário, o
personagens, improviso ou outros aspectos diver- refinamento da interpretação destes textos e das
sos da atuação. discussões sobre seu sentido. Todos os elementos
Momento II: Ensaios com os textos literários se unem para que alcancemos o objetivo de que
Leitura coletiva: para que os estudantes apro- a literatura, vista como direito, faça parte da vida
priem-se do texto, escolham seus papéis e conheçam dos estudantes e, assim, que o teatro seja a poesia
toda a peça de forma detalhada, uma vez que todos que saia do livro e se faça humana, como descrito
devem estar atentos para auxiliar na montagem e na por Federico García Lorca.
desmontagem de cenários nas trocas de quaisquer
cenas, além de estarem prontos para substituições Referências
de urgência; a leitura dramática e a leitura encenada
são realizadas para que todos ouçam e deem suas KOUDELA, Ingrid Dormien. Jogos teatrais. 7. ed. São Paulo: Pers-
pectiva, 2017.
contribuições em relação à escolha dos textos, per-
POSADA, Miguel Garcia. Lorca: interpretación de Poeta en Nue-
sonagens e atuação. Os jogos teatrais acontecem na va York. Madrid: Akal Editor, 1981, p.117).
maior parte dos encontros voltados às atividades de SPOLIN, Viola. Jogos teatrais: o fichário de Viola Spolin. Tradução
Ingrid Dormien Koudela. 3. ed. São Paulo: Perspectiva, 2014.
teatro do Projeto AEL e, além de auxiliarem na di- SPOLIN, Viola. O jogo teatral no livro do diretor. Tradução In-
nâmica das ações considerando a expressão cênica, grid Dormien Koudela e Eduardo Amos. 2. ed. São Paulo:
Perspectiva, 2017.
pensamos os jogos como elementos motivadores do

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