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Folhagens e Cidade: Freepik

Fotografia: Daniel Cunha

Huka-huka e
Derruba o Toco:
lutas indígenas nas aulas
de Educação Física
Everton Arruda Irias
Professor de Ensino Fundamental II e Médio – Educação Física
EMEF Raimundo Correia – DRE São Miguel
RESUMO

O
trabalho consiste num relato de experiência acerca da
tematização de duas lutas praticadas por diferentes et-
nias indígenas, nas aulas de Educação Física. Os pro-
cedimentos didáticos adotados ao longo da tematização
buscaram colocar em ação uma Educação Física culturalmente orientada a
fim de garantir o contato dos estudantes com a história e cultura dos povos
indígenas. Foi possível verificar que, a despeito de iniciarmos, eu e estudan-
tes, a atividade sem ter muito conhecimento sobre a história e cultura dos
povos indígenas que vivem no Brasil, a atividade teve resultados positivos
considerando o conhecimento adquirido ao final da atividade.

Palavras-chave: lutas indígenas; currículo cultural; cultura indígena.

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O trabalho aqui apresentado se cons- linguagem e atravessadas por práticas de
titui em um relato de prática, realizado significação acerca dos diferentes esportes,
nas aulas de Educação Física, no segundo lutas, danças, ginásticas e brincadeiras, as-
semestre de 2017, na EMEF Raimundo sim como os seus (e as suas) praticantes.
Correia, escola da DRE São Miguel, zona
leste de São Paulo. A proposta envolveu Em síntese, essa proposta busca a forma-
estudantes das turmas de 2o e 5os anos do ção de um sujeito solidário, logo, a favor
das diferenças. A seleção dos temas cul-
Ensino Fundamental I. Nessa época eu
turais2 abordados e a organização de si-
atuava como professor de módulo, ou seja,
tuações didáticas dão-se sob influência de
não era regente de turmas e ministrava princípios ético-políticos: reconhecimento
aulas na ausência dos professores regentes da cultura da comunidade, favorecimen-
ou quando era necessário parceria para to da enunciação dos saberes discentes,
realizar uma proposta de trabalho de pro- descolonização do currículo, justiça cur-
fessores regentes. ricular, rejeição ao daltonismo cultural
A definição do tema de estudo e pro- e ancoragem social dos conhecimentos
(NEIRA, 2020, p. 186).
posta aqui apresentadas foram intituladas
de Lutas Indígenas e nasceu do diálogo com O que une professores e professoras
os(as) estudantes e da importância em equi- que tentam colocar em ação um currículo
librar as práticas corporais, que são objeto culturalmente orientado “é o compromisso
de estudo das aulas ministradas ao longo com a democratização das relações viven-
do percurso escolar, a outros saberes, den- ciadas com as práticas corporais e os co-
tre os quais, a articulação entre o currículo nhecimentos que a circundam, a valoriza-
escolar e saberes oriundos de grupos sociais ção das diferenças, e a problematização do
muitas vezes negligenciados e silenciados. modo como são produzidas no meio social”
As ações didáticas descritas ao longo (NEIRA, 2019, p. 16).
do relato buscaram ancoragem nos pressu- Um trabalho fundamentado nos pres-
postos teóricos do Currículo Cultural1 de supostos teóricos do currículo cultural busca
Educação Física, que por sua vez encontra compreender a prática corporal enquanto
inspiração nas teorias pós-críticas do cur- texto, passível de leitura, interpretação e
rículo (pós-estruturalismo, pós-colonialis- reelaboração. As diferentes ações didáticas
mo, estudos culturais, multiculturalismo propostas nas atividades alinham-se às pro-
crítico e pós-modernismo). Denomina-se blematizações geradas por meio do diálogo,
de Currículo Cultural a perspectiva curri- da prática, da análise de imagens e vídeos,
cular de Educação Física que “considera a produzem a tematização da prática corporal
experiência escolar como um campo aberto estudada. “Tematizar não é ensinar. Te-
ao debate, ao encontro de culturas e à con- matizar consiste em organizar e desenvol-
fluência de práticas corporais pertencentes ver várias situações didáticas de maneira
aos vários setores sociais (NEIRA, 2018, p. a propiciar uma compreensão mais am-
9). Sob influência dessas bases teóricas, as pla, profunda e qualificada da ocorrência
práticas corporais passaram a ser entendi- de determinada prática social” (NEIRA,
das como textos, produzidas por meio da 2020, p. 191).

1 Também chamado de pós-crítico ou, simplesmente, pós-currículo (CORAZZA, 2010 apud NEIRA,
2020, p. 185). Surge a partir dos questionamentos propostos pela teorias pós-críticas sobre a noção de currículo. A
cultura passa a ser compreendida como um campo de disputa pela validação dos significados, e o conhecimento é
entendido como construção social à mercê de relações de poder (NEIRA, 2020, p.185).
2 Reterritorialização da noção de tema gerador de Paulo Freire (CORAZZA, 1997 apud NEIRA, 2020, p. 185)

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Sendo assim, a tematização das Lutas Huka-Huka, Laamb, para que os(as) estu-
Indígenas inicia-se na retomada das aulas dantes pudessem expor suas representações
após o recesso de julho do ano em questão. e suas significações acerca daquilo que ob-
Estabelecemos uma conversa com os(as) servavam. Eles e elas apresentaram muitas
estudantes buscando relembrar as manifes- falas relacionadas ao sumô, assim como al-
tações corporais estudadas até o dado mo- gumas dúvidas, isso pelo fato de terem ob-
mento. Vale considerar aqui que já era meu servado a luta na novela Carrossel3. Entre-
sétimo ano na escola e eu já havia ministra- tanto, ao observarem os povos indígenas
do aulas para todas as turmas do período realizando uma luta, mais especificamente
nos anos anteriores, e também saliento a praticando o Huka-Huka, expressaram al-
proximidade com o professor de Educação guns comentários: “de onde são estes ín-
Física regente das turmas do período, que dios?”, “índios lutam para ficar forte para
compartilhava as ações didáticas e as te- depois caçar”, “índios existem?”, “por que
matizações com cada turma, em momentos usam estas roupas?”, “por que estão pinta-
de reuniões. Enfim, diante de tudo isso, e dos?” Os comentários acabaram por des-
do diálogo estabelecido com os(as) estudan- pertar minha atenção. Vale salientar que
tes, percebemos que as lutas foram temas as crianças não tinham ideia do objetivo
que pouco havíamos estudado ao longo da dessa luta indígena, nem mesmo da forma
trajetória escolar das turmas envolvidas. de organização dos lutadores para a práti-
ca, se compararmos com os conhecimentos
Diante disso, numa aula posterior, fi-
que possuíam em relação ao sumô. No en-
zemos o levantamento das lutas estudadas
tanto, os comentários proferidos por eles e
pelos(as) estudantes de ambas as turmas até
o fato de conhecerem e reconhecerem com
aquele momento, assim como das lutas aces-
maior amplitude uma luta originada em
sadas fora do ambiente escolar. As respostas
outro continente, em detrimento de uma
obtidas foram categorizadas, coletivamente,
luta brasileira, trouxe à tona a importância
de acordo com o tipo de ação motora: lu-
de tematizarmos o Huka-Huka. Aliás, esse
tas de desequilíbrio, lutas de contusão (ou
meu último questionamento foi o conteúdo
de acertar, como denominamos), e lutas de
das discussões realizadas com as crianças
imobilização. Feita a categorização, pude-
das turmas, após a leitura das imagens.
mos observar que, em algumas turmas, as
lutas estudadas se encaixavam nas catego- Para iniciar a discussão sobre a luta
rias de imobilização e contusão e que, ainda indígena Huka-Huka, que é realizada pe-
não haviam estudado uma luta de desequi- los indígenas da etnia Kamaiurá, os quais
líbrio, já em outras turmas, as lutas de de- habitam o Território Indígena do Xingu4,
sequilíbrio pouco apareciam dentro do uni- juntamente com 16 outros povos, entre os
verso experiencial das crianças. Com isso, quais os Yalawapiti, assistimos e realizamos
na aula seguinte, seis imagens foram mos- a análise de dois vídeos5 mostrando uma
tradas para os(as) estudantes. As imagens ocorrência social da mesma. O primeiro
apresentavam a ocorrência social de di- deles, com menos de 3min30s, intitulado
ferentes lutas de desequilíbrio: Judô, Luta Xingu-Huka-Huka, apresentava brevemente
Marajoara, Luta Greco-romana, Sumô, a preparação para a luta. O segundo Luta

3 Transmitida no SBT.
4 Antes e ainda pelo costume chamado de Parque Nacional Indígena do Xingu.
5 “Xingu – Huka huka”. Programa Box Cultural. Youtube, 2010. Disponível em: https://www.youtube.
com/watch?v=gahPr4tUrHs. “Luta tradicional Huka Huka na Aldeia Multiétnica”. Encontro de Culturas. Youtube,
2012. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=wONaFbDeOOo

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Tradicional Huka-Huka na Aldeia Multiétnica, cias de informações e novas regras foram
com 1min30s, mostrava lutadores em ação. adotadas: inicialmente pensávamos que era
Em seguida, de forma coletiva, lemos um necessário derrubar o adversário de costas
texto6, que explicava algumas das caracte- no chão, depois descobrimos que qualquer
rísticas da luta: objetivo, contexto de práti- queda era válida. A princípio, os(as) estu-
ca, organização da luta, alguns rituais, etc. dantes se separavam durante o combate e
Essas atividades desencadearam novas per- depois recomeçavam o mesmo. Entretanto,
guntas e comentários por parte dos(as) es- descobrimos que toda separação na luta
tudantes: “Por que se chama Huka-huka?”; resultava em empate. Diante desses novos
“Por que eles se pintam?”; “Mulher tam- conteúdos acessados, a prática sofria modi-
bém luta?”; “Índios comem o que?”; “Eles ficações e ressignificações.
não comem as mesmas coisas que os seres
Em algumas turmas, fizemos a leitu-
humanos né?”; “Eles não se machucam
ra do livro infantil Kaba Darebu, escrito
na luta?”; “Por que eles andam pelados?”
pelo autor indígena Daniel Munduruku.
(aliás, observar indígenas com pouca ves-
O livro descreve várias características do
timenta nos vídeos causou burburinhos e
povo indígena a partir dos olhos de um
risadas entre as crianças), entre outras fa-
menino indígena chamado Kaba Darebu,
las. Alguns comentários foram problemati-
personagem principal do livro. As carac-
zados no momento, a fim de desestabilizar
terísticas de uma aldeia, os principais ali-
algumas representações, mesmo conside-
mentos do povo Munduruku, as brincadei-
rando o meu restrito conhecimento acerca
ras praticadas, as explicações das pinturas
do conteúdo da história e cultura indígena,
corporais, o motivo para alguns povos in-
e outros foram registrados, pensando em
dígenas andarem nus e também o motivo
ações futuras.
para deixaram de andar nus foram alguns
Mediante a análise dos vídeos e leitu- dos conteúdos expressos no livro. Todavia,
ra do texto, organizamos, também cole- conversamos sobre as diferenças culturais e
tivamente, a forma como realizaríamos a sociais que podem existir entre as diferen-
vivência da luta. Pensando nas caracterís- tes aldeias indígenas presentes no Brasil e
ticas do ambiente, do grupo e nos mate- que, tais características descritas no livro,
riais presentes na escola, os(as) estudantes não poderiam explicar os povos indígenas
sugeriram a utilização de tatames, tendo como um todo, tendo em vista as particula-
em vista que a luta, socialmente, ocorre ridades culturais de cada povo.
em um chão de terra batida. A luta foi pra-
Buscando aprofundar e ampliar os co-
ticada durante algumas aulas e, ao longo
nhecimentos, fizemos a leitura de uma re-
destas, conversávamos sobre as impressões
portagem7, em que dois jornalistas foram
e as sensações advindas das vivências, e
enviados ao Xingu, para acompanhar o
propúnhamos modificações na estrutura
Kuarup, ritual de homenagem aos mortos,
da luta, de acordo com os problemas e as
e a realização do Huka-Huka. Dada a con-
situações levantadas, como, por exemplo, o
dição dos jornalistas, imersos por algum
aumento da quantidade de tatames, tendo
tempo naquele grupo e espaço cultural,
em vista as quedas que ocorriam fora deles.
o texto trazia mais detalhes sobre a ocor-
Além disso, buscando novos textos e vídeos
rência da luta e sobre toda a organização
que explicassem com mais objetividade a
que antecedia esta manifestação corporal.
organização da luta, percebemos divergên-

6 “Huka-huka”. Felipe Araújo. Infoescola: navegando e aprendendo. Disponível em: https://www.infoes-


cola.com/artes-marciais/huka-huka/
7 “Huka-huka levanta a poeira na aldeia”. Folha de São Paulo. Disponível em: http://temas.folha.uol.
com.br/viagem-ao-xingu/luta/huka-huka-levanta-poeira-na-aldeia.shtml

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Conteúdos como: a preparação do lutador ação, que para algumas modalidades é corri-
durante a madrugada; a escolha dos luta- queira, da automutilação. Foi uma forma de
dores; a estrutura dos combates; duração demonstrar que tal fato não se restringia ape-
da luta; sensações dos lutadores durante e nas ao ritual de uma etnia indígena.
após o combate, apareceram no texto. No
Vale salientar que, em meio a todo
entanto, ao lermos e dialogarmos sobre a
esse processo de aprofundamento e am-
preparação do lutador de Huka-Huka nos
pliação dos saberes, as vivências da luta
meses que antecediam a luta, certo grau de
Huka-Huka continuavam ocorrendo, as-
estranhamento foi nitidamente percebido
sim como as modificações propostas pe-
no rosto de alguns e algumas estudantes.
las turmas.
O processo de preparação descrito envolvia
cortes no corpo com dentes afiados de pei- Dialogamos também sobre a partici-
xe-cachorra, uso de ardidos unguentos nas pação feminina na luta e fizemos a análi-
feridas e chás para harmonização espiritual. se de um outro vídeo8 que apresentava a
A mutilação do corpo chamou a atenção e ocorrência social de uma luta feminina.
apareceram questionamentos e comentários O vídeo retratava apenas a luta ocorren-
como: “Para que fazer tudo isso?”; “Acho do entre mulheres indígenas, sem revelar
que não precisa se machucar apenas para outras informações a respeito desta partici-
virar um lutador”. Perante essas reações e pação feminina. Por isso, realizamos novas
opiniões, numa aula posterior fizemos a pesquisas e concluímos que o Huka-Huka
observação de algumas imagens mostran- não contava com uma grande participação
do “técnicas” de mutilação ou automutila- feminina, restringindo-se a prática femini-
ção que ocorre em treinamentos de outras na apenas a algumas aldeias.
lutas, mais acessadas pelos(as) estudantes, A partir da análise de imagens e de um
tais como a chamada “orelha de couve-flor” texto que li para conhecer um pouco mais
dos(as) lutadores(as) de Jiu-Jitsu; o “caleja- sobre o Kuarup9, dialogamos sobre esse ri-
mento” nas pernas e abdomens de lutado- tual, levantando algumas das características
res(as) de muay thai; a retirada do osso do desse ritual indígena que ocorre na
nariz de lutadores(as) de boxe. região do Xingu: a preparação
A análise das imagens per- da cerimônia, as fa-
mitiu fomentar o diá-
logo sobre esta

8 “Amazon Tribes: Xingu huka-huka festival Brazil 2015/Yamurikuma”. Patricia Figueroa. Youtube,
2015. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=2rg1PYNft2E
9 Texto que está no site da Funai – Fundação Nacional do Índio.

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mílias responsáveis pela organização, os sig- Compreendida a estrutura e as regras
nificados dos troncos e seus ornamentos, e a da luta e reorganizada, para a nossa ati-
finalização da cerimônia com o lançamento vidade, a forma de ocorrência da mesma
dos troncos na água. (exemplo: o toco de madeira foi substituído
por uma bola, a fim de nos precavermos de
Para finalizar o trabalho elabora- qualquer acidente), propusemos a prática
mos, coletivamente, uma rubrica de da luta durante algumas aulas. Os proble-
autoavaliação, a fim de refletirmos so- mas e as impressões oriundos da prática le-
bre as ações e os conteúdos envolvidos varam-nos a conversas e às ressignificações
no processo de estudo do Huka-Huka. na forma e estrutura da luta, visando às
Considerando que já nos encaminhávamos futuras vivências. Devido à longa duração
para o último bimestre do ano letivo e que das lutas, foi sugerida a definição de um
ainda permaneciam várias dúvidas dos(as) tempo de duração delas.
estudantes com relação à cultura indígena, Intercalada às vivências da luta fizemos
resolvemos continuar tematizando uma a leitura de outro texto12, que explicava a
luta indígena. Escolhemos para dar conti- cerimônia de casamento na etnia Pataxó
nuidade ao trabalho o “Derruba o Toco”, até o momento em que a luta acontece.
praticada por membros da etnia Pataxó. Duas inquietações surgiram nas turmas.
A primeira delas era sobre o que ocorreria
Para essa parte da atividade, notamos caso o noivo perdesse a luta. Infelizmente,
que havia escassez de materiais que pudes- as pesquisas que fizemos por meio dos tex-
sem nos ajudar compreender aspectos re- tos e vídeos que encontramos sobre o tema
lacionados à prática de luta. Na pesquisa não me permitiram encontrar uma resposta
realizada, encontramos apenas um vídeo10, para esta pergunta. A segunda inquietação
intitulado Derruba o Toco: Luta Tradicional do dizia respeito ao tipo de relacionamento
Casamento Tradicional Indígena Pataxó, que afetivo entre indígenas: após lermos no
foi exibido em aula a fim de identificar- texto que o noivo deveria carregar uma
mos algumas das características da luta. pedra com peso equivalente ao peso da
Além disso, fizemos a leitura de um breve noiva, um dos estudantes indagou: “Mas
texto11 sobre lutas indígenas, que encontrei e se ele casar com outro noivo?”. No mo-
mento respondi que não sabia se existiam
no Portal do MEC, que descrevia algumas
casamentos homoafetivos entre indígenas.
das características da manifestação corpo-
Após me debruçar em algumas pesquisas e
ral dessa prática. A título de informação,
conversar com outras pessoas que estudam
“Derruba o Toco” é uma luta que ocorre o assunto acessei conteúdos que, ao certo,
após a cerimônia de casamento Pataxó, em não explicavam uma totalidade, mas que
que o noivo é desafiado pelos três melhores davam a entender que relações homoafe-
guerreiros da aldeia, selecionados pela lide- tivas eram comuns também entre alguns
rança espiritual do grupo, que costumamos povos indígenas (ou todos). No entanto, ne-
nomear como pajé. nhum dado foi encontrado que confirmasse

10 “Derruba o toco – Luta tradicional do casamento indígena Pataxó Carmésia 2015”. Mari Ultramarato-
nista Ultra. Youtube, 2015. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=syEJ4iCbZ50
11 “Lutas Indígenas”. Luciano Silveira Coelho. Portal do Professor, 2010. Disponível em: http://portaldo-
professor.mec.gov.br/fichaTecnicaAula.html?aula=22413
12 “Um ritual que celebra a chegada das chuvas e clama pela preservação da natureza. Aline Frazão.
Jornalistas Livres, 2015. Disponível em: https://medium.com/jornalistas-livres/um-ritual-que-celebra-a-chegada-
-das-chuvas-e-clama-pela-preserva%C3%A7%C3%A3o-da-natureza-7323adeb8136

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ou negasse a existência de casamentos in- na sua aldeia havia casamentos
dígenas homoafetivos e esta foi a resposta
para os(as) estudantes. homoafetivos. A imprevisibilidade da en-
trevista fez com que eu me esquecesse de
Como resultado das pesquisas, elabo-
perguntas importantes que com certeza
ramos um pequeno quadro comparando as
nos trariam ótimas informações como, a
lutas estudadas: etnia que praticava, mo-
participação feminina nesta luta.
mento em que ocorria e local de prática.
A entrevista foi gravada e o vídeo foi
Já encerrando o ano letivo, uma surpre-
mostrado para algumas turmas, já que não
sa bastante agradável permitiu ampliarmos
foi possível adentrar em todas as turmas que
um pouco mais nossos olhares. Visitando o
estavam na tematização da luta antes de fin-
evento intitulado Revelando São Paulo, pro-
dar o ano letivo. A observação do vídeo não
movido pelo Governo do Estado, e que
gerou muitos comentários por parte dos(as)
traz à cidade alguns e algumas represen-
estudantes. O que chamou bastante a aten-
tantes de parte do patrimônio cultural de
ção foi uma explicação de Raion sobre o
diferentes cidades do interior de São Paulo,
“Derruba do Toco”, no qual ele disse que
assim como de outras etnias, acabei por ter
para se protegerem e não se machucarem
a sorte de me deparar com um indígena da
ao serem derrubados no chão, os lutadores
etnia Pataxó. Aproveitando o momento e a
passavam barro no corpo. Não imagináva-
disponibilidade dele, que se chama Raion
mos (estudantes e eu) que tal ação poderia
Pataxó, consegui entrevistá-lo, a fim de escla-
diminuir os machucados.
recer algumas dúvidas sobre a luta estudada.
Raion confirmou muitas das informações Todo o trabalho foi planejado, aula a
que havíamos acessado em relação ao “Der- aula, a partir das considerações, comentá-
ruba o Toco”, como as regras da luta, a oca- rios e acontecimentos da prática, que tra-
sião quando ela ocorre. Além disso, trouxe ziam subsídios para que novas
outros conhecimentos importan- ações didáticas fossem traça-
tes: detalhou as vestimentas uti- das. Os registros realizados
lizadas durante a luta, como ao longo de todo o pro-
faziam para se pro- cesso, por meio de fo-
teger e não se ma- tos, vídeos, ou mesmo
chucar quando de maneira escrita,
eram derrubados permitiram ava-
no chão, explicou liarmos o percur-
o que ocorria caso o so o reorientarmos
noivo perdesse a luta, as rotas. Nesse
e se sentido, foi soli-
citado aos es-
tudantes que
registrassem
em seus ca-

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dernos o que aprenderam no projeto Lutas so, o olhar sobre os povos indígenas se
Indígenas. O registro foi compreendido como um modificou. Percebemos, por exemplo, que
procedimento didático que visa reorgani- cada etnia possui seus próprios costumes e
zar o planejamento docente, a fim de dialo- práticas culturais e que, por isso, generaliza-
gar sobre as representações e significações ções que buscam trazer uma única noção so-
dos estudantes acerca da prática corporal bre grupos indígenas se tornaram incabíveis.
estudada e de seus praticantes, buscando
Além disso, compreendemos que os conheci-
desestabilizar e desconstruir representa-
mentos oriundos de etnias indígenas são tão
ções hegemônicas. Dessa maneira, acre-
valiosos quanto tantos outros e que podem, e
dito que tanto para mim quanto para os
estudantes que compuseram esse percur- devem compor, o currículo escolar.

Referências Bibliográficas

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Disponível em: https://www.infoescola.com/artes-marciais/huka-huka/ Acesso em: 30 out. 2017.

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Jornalistas Livres - Um ritual que celebra a chegada das chuvas e clama pela preserva-
ção da natureza.
Disponível em: https://medium.com/jornalistas-livres/um-ritual-que-celebra-a-chegada-das-chuvas-e-
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