Você está na página 1de 2

As trajetórias do coreógrafo Rodrigo Pederneiras e da artista nipo-brasileira Tomie

Ohtake dificilmente encontrariam um paralelo tão evidente. Com caminhos e


processos criativos muito distintos, conduziram suas linguagens e chegaram a
resultados que poderiam, num primeiro momento, possibilitar poucas sinergias.
Porém, essa hipótese não se tratava de uma equação tão simples.

Quando Pederneiras assumiu, em 1978, o papel de coreógrafo do Grupo Corpo,


comprometeu-se com o que hoje resulta em mais de 40 anos de pesquisa e
experimentação: buscou trazer ao balé clássico elementos típicos da linguagem
corporal do brasileiro. Havia nessa brasilidade, presente no xaxado, no samba, nas
danças de salão e na capoeira, uma possibilidade de tradução que fez do traço autoral
de Pederneiras e do Corpo algo próprio e evidente.

Pouco afeito a convencionalismos, Pederneiras assumia a cada novo espetáculo uma


parceria, uma pergunta, uma imersão que o fazia transitar por caminhos menos
explorados. Um deles, o espetáculo 21 (1992), tornou-se um divisor de águas na
trajetória da Grupo, buscando aliar elementos dessa brasilidade a uma escritura
coreográfica com forte dimensão matemática e geométrica. Ele desenhou uma série
de haicais coreográficos, estabelecendo com a literatura, com a música e com as festas
populares diversos paralelos.

Embora essas coincidências e pesquisas confluíssem de diferentes modos, Pederneiras


foi encontrar numa única obra todo um disparador para seu diálogo com Tomie. A tela
quadrada de 1,70 m traz a dimensão pulsante dos vermelhos da artista nipo-brasileira.
Tão pulsante e presente que a cor se tornou sinônimo de algo que lhe é inerente. O
“aka” da cultura japonesa traduz um ideograma que representa uma fogueira
queimando em brasas.
Tomie realizou uma série de trabalhos em que o vermelho intenso reforçava o caráter
erótico de grandes formas associadas a vulvas e reentrâncias. Essas formas surgem de
traços leves, muitas vezes delicados e sintéticos, que evocam associações ao corpo
feminino, à penetração e aos órgãos genitais. São pinturas pulsantes que convidam o
espectador a adentrar um universo feminino repleto de associações sinestésicas e
simbólicas, conferindo ao trabalho um caráter libidinal. Pederneiras toma partido
dessa construção para abordar a relação entre um bailarino e uma bailarina, que ora
se interpenetram, ora se repelem. Numa espécie de conversa sem conexão, suas
expressões e posturas fazem coexistir o anseio do encontro e a angústia da separação.

Você também pode gostar