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Cleber Bianchessi

Organizador

TEMAS EM
EDUCAÇÃO
Olhares Interdisciplinares,
Reflexões e Saberes
- VOLUME 1 -
TEMAS EM EDUCAÇÃO
Olhares Interdisciplinares, Reflexões e Saberes
Volume 1
AVALIAÇÃO, PARECER E REVISÃO POR PARES
Os textos que compõem esta obra foram avaliados por pares e indicados para publicação.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


Bibliotecária responsável: Aline Graziele Benitez CRB-1/3129

E26 Temas em Educação: olhares interdisciplinares, reflexões e


1. ed. saberes – Volume 1 [recurso eletrônico] / [org.] Cleber
Bianchessi. – 1.ed. – Curitiba-PR, Editora Bagai, 2022. 291 p.

Recurso digital.

Formato: e-book

Acesso em www.editorabagai.com.br

ISBN: 978-65-5368-105-7

1.Educação. 2. Interdisciplinaridade. 3. Ensino e


aprendizagem. I. Bianchessi, Cleber.

10-2022/20 CDD 370.7


CDU 37.01

Índice para catálogo sistemático:


1. Educação: Ensino e Aprendizagem; Interdisciplinaridade. 370.7

https://doi.org/10.37008/978-65-5368-105-7.03.09.22
R

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Este livro foi composto pela Editora Bagai.

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Cleber Bianchessi
Organizador

TEMAS EM EDUCAÇÃO
Olhares Interdisciplinares, Reflexões e Saberes
Volume 1
1.ª Edição - Copyright© 2022 dos autores
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Dr. Tomás Raúl Gómez Hernández – UCLV e CUM - CUBA
Dr. Willian Douglas Guilherme – UFT
Dr. Yoisell López Bestard- SEDUCRS
SUMÁRIO

ASPECTOS SELECIONADOS DO LETRAMENTO: ENFOQUE EM


ENUNCIADOS MATEMÁTICOS...................................................................................................9
Paulo Roberto Trales | Simone Maria Bacellar Moreira

UTILIZANDO O SCRATCH COMO FERRAMENTA DE ENSINO-APRENDIZAGEM PARA


CONSCIENTIZAÇÃO SOBRE AS MEDIDAS DE PREVENÇÃO NA TRANSMISSÃO DO
NOVO-CORONAVÍRUS.............................................................................................................. 19
Luciene Morais Gonçalves da Silva | Karine Serpa Franco | Suzete Araújo Oliveira Gomes

GAMEFICAÇÃO NO ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA: A ESTÉTICA DE JOGOS DIGITAIS


ELABORADOS POR PROFESSORES DA
EDUCAÇÃO BÁSICA.................................................................................................................. 33
Shirlei Marly Alves | Andreina Kelly Sousa Vieira

O GRUPO COMO LÓCUS DE TRANSFORMAÇÃO SOCIAL: RELATO DE UMA INTERVENÇÃO


EM CONTEXTO ESCOLAR........................................................................................................ 43
Nicole Soares Resende | Luísa Guimarães Moreira | Beatrice Verdelho Lodovico

A (IN)VISIBILIDADE DOS DIREITOS HUMANOS NOS CURSOS DE LICENCIATURA EM


EDUCAÇÃO FÍSICA DE UNIVERSIDADES FEDERAIS BRASILEIRAS........................................ 55
Lana Lisiêr de Lima Palmeira | Carla Priscilla Barbosa Santos Cordeiro | Antonio Gottschlisch do Prado | Edna Cristina do Prado

A ACESSIBILIDADE E INCLUSÃO: UM ESTUDO NAS ESCOLAS PÚBLICAS NO MUNICÍPIO DE


ITABAIANA, NO ESTADO DE SERGIPE..................................................................................... 67
Micael Luiz Santos Amorim | Clécia Lima Ferreira

A IMPORTÂNCIA DE METODOLOGIAS ATIVAS PARA AULAS INTERDISCIPLINARES........... 79


Marinez dos Santos | Érika de Souza Oliveira | Dirceu Rodrigo Freire de Oliveira

DIFICULDADES DE ALUNOS SURDOS EM PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO NO


CONTEXTO PANDÊMICO......................................................................................................... 87
Maria Márcia Fernandes de Azevedo | Ananias Agostinho da Silva

VIVÊNCIAS DE ALUNOS(AS) EM UM PROJETO DA UNIVERSIDADE ABERTA DA PESSOA


IDOSA....................................................................................................................................... 99
Gislaine Cristina Vagetti | Gerson Flores-Gomes | Renata Faleiros Lopes | Lydio Roberto Silva | Breno Tomazino Jesus |
Karoline Mucellin Krug | Hermes Soares | Valdomiro de Oliveira

A SEQUÊNCIA DIDÁTICA COMO FERRAMENTA DE INTERVENÇÃO DE ENSINO E


APRENDIZAGEM DA PRODUÇÃO ESCRITA NO ENSINO MÉDIO.......................................... 107
Francisco Walisson Ferreira Dodó

ENSINO DE MATEMÁTICA DURANTE A PANDEMIA NA ESCOLA ESTADUAL GABRIEL


PRESTES................................................................................................................................. 121
Fernando Froes

TECNOLOGIA NA EDUCAÇÃO: CONTEXTO HISTÓRICO FUNÇÃO E SEU PAPEL NOS


DIVERSOS ESPAÇOS DA SOCIEDADE.................................................................................... 131
Vaneza Nascimento de Oliveira Mélo

EFEITOS DA GLOBALIZAÇÃO NA EXPANSÃO DA EDUCAÇÃO À DISTÂNCIA EM


MOÇAMBIQUE........................................................................................................................ 139
Eva Quembo

CURRÍCULO E TECNOLOGIAS: O QUE PODEMOS FALAR A RESPEITO?.............................. 145


Etiêne Cristina da Silva Ferreira
PERSPECTIVAS DE ENFRENTAMENTO DAS CRISES PESSOAIS E PROFISSIONAIS.............. 153
Érico Tadeu Xavier

O USO DE MAPAS CONCEITUAIS PARA O ESTUDO DE TEXTOS CLÁSSICOS DE FILOSOFIA


NO ENSINO MÉDIO................................................................................................................ 165
Claudio Roberto Molina Sanches

AÇÕES AFIRMATIVAS NAS UNIVERSIDADES E ESCOLAS BRASILEIRAS: POLÍTICAS E


PRÁTICAS DE REEDUCAÇÃO DAS RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS.......................................... 175
Andrio Alves Gatinho

METODOLOGIAS ATIVAS: UM CONVITE PARA A INTERDISCIPLINARIDADE..................... 185


Ana Paula Peroni | Sandra Margon

PROFESSOR PESQUISADOR DE HISTÓRIA: ARTICULANDO SABERES ACADÊMICOS AOS


FAZERES EDUCACIONAIS A PARTIR DO CONCEITO DE PROFESSOR REFLEXIVO............. 193
Alipio Felipe Monteiro dos Santos | Lisiane Almeida Ferreira | Julyana Cabral Araújo | Adriana Dourado Oliveira |
Ana Paula Durans Lopes | Janilde Amorim | Evileno Ferreira | Antônio Edilson Cardoso Linhares

PROCESSOS FORMATIVOS MEDIADOS POR TECNOLOGIAS DIGITAIS EM COMUNIDADES


EM SITUAÇÃO DE VULNERABILIDADE SOCIAL.................................................................... 205
Solange Rodrigues Bonomo Assumpção | Cecília Maria de Morais Machado Angileli | Paloma do Vale Alencar |
Fernanda Claudia Santos de Oliveira

O PAPEL DO PROFESSOR NA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA: ATÉ ONDE SOMOS RESPON-


SÁVEIS..................................................................................................................................... 235
Maria Lucia Costa de Moura

OS DESAFIOS DA DISCIPLINA DE ARTE NA ESCOLA EM TEMPOS DE PANDEMIA.............. 245


Marilia Paula de Oliveira | Fábio Junior Paes de Morais

FORMAÇÃO CONTINUADA DOCENTE: O CASO DO COLÉGIO MUNICIPAL LENILTO DE


JESUS CANELA........................................................................................................................ 253
Antonieta da Paixão Santos

DÊ UM VOTO DE CONFIANÇA NO JOVEM!............................................................................. 263


Emiliane Santana Gomes

A EDUCAÇÃO DE PESSOAS COM DEFICIÊNCIA


NO BRASIL.............................................................................................................................. 279
Helleni Priscille de Souza Ferreira Oliveira | Élida Soares de Santana Alves | Damaris Oliveira Souto | Fernanda Marcelo Souza |
Laila Lopes da Silva Ribeiro | Charlesson dos Santos Ribeiro Lopes | Léia Silva Santos | André Luiz Alcântara Brandão

NARRAR-SE NO PROCESSO: RESSIGNIFICAÇÕES DE UMA PROFESSORA QUE ATUA NA


EDUCAÇÃO ESPECIAL............................................................................................................ 289
Claudia Alexandra de Albuquerque Menezes Barros | Rosemar Eurico Coenga

SOBRE O ORGANIZADOR...................................................................................................... 301


ÍNDICE REMISSIVO................................................................................................................ 302
APRESENTAÇÃO
Este livro, que se torna público na forma de coletânea, é resultado de pesquisas
científicas, finalizadas ou em desenvolvimento que têm como enfoque diálogos inter-
disciplinares em Educação. A presente obra reúne capítulos que abordam vários temas
nas diversas áreas do conhecimento e níveis de escolaridade de modo a integrar os
conhecimentos para esclarecer e orientar recursos de aperfeiçoamento tão necessários
para auxiliar no processo de ensino e aprendizagem tanto para os profissionais evolvidos,
pais ou interessados em Educação. Com isso, entende-se que a interdisciplinaridade é
um instrumento fundamental para promover a atuação conjunta de diversos campos
do saber especialmente frutífero quando são aplicados na vivência escolar e familiar
para a construção dos conhecimentos e obter os resultados educacionais esperados.
Assim, participam capítulos dos diferentes campos do conhecimento e níveis
de escolaridade, produzidos por uma abordagem que podem considerar ou não a
inter-relação e a influência entre eles ou questionar a visão compartimentada (dis-
ciplinar) da realidade do processo de ensino-aprendizagem.
Destarte, o primeiro capítulo expressa reflexões sobre aspectos selecionados
do letramento com enfoque em enunciados matemáticos. Na sequência, o segundo
capítulo reflete sobre a importância da utilização do scratch como ferramenta de ensi-
no-aprendizagem para conscientização sobre as medidas de prevenção na transmissão
do novo-coronavírus. Por sua vez, o terceiro capítulo destaca a gameficação no ensino
de língua portuguesa. O quarto capítulo, na sequência, destaca o grupo como lócus de
transformação social e o quinto capítulo descreve a (in)visibilidade dos direitos huma-
nos nos cursos de licenciatura em educação física de universidades federais brasileiras.
Em continuidade, o sexto capítulo apresenta um estudo nas escolas públicas sobre a
acessibilidade e inclusão. No que lhe concerne, o sétimo capítulo destaca a importância de
metodologias ativas para aulas interdisciplinares, o oitavo capítulo analisa as dificuldades de
alunos surdos em programa de pós-graduação no contexto pandêmico e o nono capítulo
destaca as vivências de alunos(as) em um projeto da universidade aberta da pessoa idosa.
Em continuidade, o décimo capítulo apresenta uma sequência didática como ferra-
menta de intervenção de ensino e aprendizagem da produção escrita no ensino médio. O
décimo primeiro capítulo foca o ensino de matemática durante a pandemia em uma escola
estadual enquanto décimo segundo capítulo apresenta a tecnologia na educação e seu papel
nos diversos espaços da sociedade. Isto posto, o décimo terceiro capítulo oportuniza refletir
sobre os efeitos da globalização na expansão da educação à distância em Moçambique.

7
Já o décimo quarto capítulo analisa o currículo e tecnologias e o décimo quinto capítulo
apresenta as perspectivas de enfrentamento das crises pessoais e profissionais.
Em seguimento, o décimo sexto capítulo reflete sobre o uso de mapas concei-
tuais para o estudo de textos clássicos de filosofia no ensino médio e o décimo sétimo
capítulo apresenta ações afirmativas nas universidades e escolas brasileiras. Na sequên-
cia, o décimo oitavo capítulo apresenta as metodologias ativas no desenvolvimento
da interdisciplinaridade no processo de ensino aprendizagem no ensino superior e o
décimo nono capítulo destaca o professor pesquisador de História na articulação dos
saberes acadêmicos aos fazeres educacionais a partir do conceito de professor reflexivo.
Sendo assim, o vigésimo capítulo propõe a utilização dos processos formativos
mediados por tecnologias digitais em comunidades em situação de vulnerabilidade
social. Em prosseguimento, o vigésimo primeiro capítulo analisa o papel do professor
na sociedade contemporânea e o vigésimo segundo capítulo valoriza os desafios da
disciplina de arte na escola em tempos de pandemia. O vigésimo terceiro capítulo,
em síntese, enfatiza a formação continuada docente e o vigésimo quarto capítulo
oportuniza uma reflexão acerca da participação do jovem estudante como cidadão
consciente, crítico e agente da sociedade em que vive. O vigésimo quinto capítulo etrata
a educação das pessoas com deficiência no Brasil e destaca os fatores diferenciais que
podem facilitar ou dificultar o processo de escolarização de estudantes surdos na escola
comum. Por fim, o vigésimo sexto capítulo faz uma narrativa das ressignificações
de uma professora que atua na educação especial.
Em vista disso, o estudo exarado nos capítulos sintetizados acima, a presente
publicação contribui com textos que versem de algum modo, direta ou indiretamente, a
educação e o ensino numa perspectiva da teoria ou pela prática pedagógica com a intenção
de trazer ideias interdisciplinares e questionamentos para estimular o debate a respeito do
ensino, da aprendizagem e das políticas educacionais, etc.Tudo isso se revela por meio de
novos olhares interdisciplinares na educação e articulados pelos conhecimentos teóricos
aos práticos, possibilitando ampliar e significar os múltiplos saberes no campo da educação.
Em face do exposto, esta obra tem como premissa um novo olhar sobre os
diversos temas em educação diante do conhecimento, propõe uma mudança de ati-
tude em busca do contexto do conhecimento, ou seja, estabelece uma aprendizagem
integral. Enfim, a obra é um convite ao pensamento reflexivo, abrangente e contextual
em torno da necessidade real de análise dos diversos temas e aspectos em Educação

Equipe editorial
8
ASPECTOS SELECIONADOS DO LETRAMENTO:
ENFOQUE EM ENUNCIADOS MATEMÁTICOS

Paulo Roberto Trales1


Simone Maria Bacellar Moreira2

INTRODUÇÃO

O domínio da língua, oral e escrita, é fundamental para a participação


social efetiva, pois é por meio dela que o homem se comunica, tem
acesso à informação, expressa e defende pontos de vista, partilha ou
constrói visões de mundo, produz conhecimento. Por isso, ao ensiná-la,
a escola tem a responsabilidade de garantir a todos os seus alunos o
acesso aos saberes linguísticos, necessários para o exercício da cidadania,
direito inalienável de todos. (BRASIL, 1998, p. 15)

A qualidade da educação brasileira, sobretudo nas redes públicas de ensino,


que atende à maioria dos estudantes, ainda está longe de ser considerada aceitável.
Indicadores como PISA e SAEB constatam um fracasso escolar no ensino fun-
damental, em relação, principalmente, às disciplinas de Língua Portuguesa e de
Matemática. O fraco rendimento nesses domínios do conhecimento, em exames
nacionais e internacionais, se atribui às dificuldades de aprendizagem dos dife-
rentes conteúdos escolares e, consequentemente, a um insatisfatório desempenho
na aprendizagem daquelas disciplinas. Essas preocupações não são exclusivas dos
profissionais brasileiros ligados à educação; o incipiente aproveitamento dos alunos
europeus, revelado em avaliações recentes, levaram à adoção, em 2009, de um valor
de referência para as competências básicas na União Europeia, o qual determinava
que até 2020, a percentagem de alunos de 15 anos com fraco aproveitamento em
leitura, matemática e ciências deverá ser inferior a 15%.
Apesar de inúmeras pesquisas tentarem desenvolver teorias para compreen-
der suas causas, acreditamos que, no ensino básico, elas envolvem, especialmente,
questões nos domínios da escrita e da leitura, problemas esses que certamente
acarretarão um comprometimento nos aprendizados de todas as demais disciplinas

1
Doutorado em Ciência da Computação (PUC-RIO). Professor Titular do Instituto de Matemática e Estatística (UFF).
CV: http://lattes.cnpq.br/9914773144042812
2
Doutorado em Letras (UFF). Professora Adjunta do Departamento de Letras da Faculdade de Formação de Professores
(UERJ). CV: http://lattes.cnpq.br/8558417141034166
9
do currículo escolar. É urgente uma democratização no acesso e apropriação do
conhecimento feita, sobremaneira, pelo pleno domínio da leitura. Assim como
os documentos da BNCC e como a declaração da UNESCO, entendemos que:
A educação como direito humano e bem público permite às pessoas
exercer os outros direitos humanos. Por essa razão, ninguém pode
ficar excluído dela. O direito à educação se exerce na medida em
que as pessoas, além de terem acesso à escola, possam desenvolver-se
plenamente e continuar aprendendo. Isso significa que a educação
terá de ser de qualidade para todos e por toda a vida. (UNESCO,
2007, p. 12).

A compreensão da habilidade da leitura nos torna agentes reflexivos capazes


de reavaliar nossas próprias vidas, e mudar nosso comportamento por meio das
diferentes concepções de mundo presentes nos textos. Assim, a leitura desempenha
um papel transformador, nos levando a questionar o passado e transformando a
maneira como vemos o presente e como podemos construir o futuro.
Ensinar os estudantes a ler é tarefa de todos os professores e não somente está
restrito aos professores de língua portuguesa. Só desta forma eles serão capazes de se
apropriar do conhecimento historicamente acumulado e por meio dessa apropriação
e interação com a língua poderão produzir outros sentidos, emitir opiniões, discor-
dar, concordar, enfim, dialogar por meio da língua e criar a capacidade de mudar:
Formar leitores autônomos também significa formar leitores capazes
de aprender a partir dos textos. Para isso, quem lê deve ser capaz de
interrogar-se sobre sua própria compreensão, estabelecer relações
entre o que lê e o que faz parte do seu acervo pessoal, questionar
o seu conhecimento e modificá-lo, estabelecer generalizações que
permitam transferir o que foi aprendido para outros contextos dife-
rentes... (SOLÉ, 1998, p. 72)

A INTERDICIPLINARIDADE – LÍNGUA PORTUGUESA E


MATEMÁTICA

Nossa pesquisa é fruto de reflexões feitas com professores de matemática


do ensino básico, em escolas particulares e da rede estadual do Rio de Janeiro,
desde que atuávamos como professores do ensino básico. Há cerca de dez anos
temos desenvolvendo uma pesquisa. Paulo Roberto Trales possui uma sólida
experiência profissional nesse segmento em ensino de matemática, e como coor-
denador e diretor de escolas particulares e da rede estadual do Rio de Janeiro. Há
10
alguns anos coordena também, no ensino superior, estudos e pesquisas sobre as
imbricações entre a língua materna e a linguagem matemática, e sobre as conse-
quências dessa ligação de domínios na evasão de alunos em cursos de graduação
(licenciatura e bacharelado) em Matemática.
Nossas inquietações docentes focam, principalmente, à questão da leitura.
Observamos que muitos alunos do ensino fundamental apresentam sérias dificulda-
des nessa habilidade. Os estudantes que completam o ensino fundamental e chegam
ao ensino médio, por vezes, mal sabem ler. Entretanto, ler é mais do que decodificar
letras ou símbolos, compreende um processo ativo com estratégias de seleção,
antecipação e inferência. Muitos desses estudantes não demonstram capacidade de
selecionar em um texto as ideias mais relevantes, apenas dominam a capacidade de
decodificação simples, mas isso não significa que possuam compreensão do texto
que acabaram de ler. Sem alcançar esta habilidade, esses estudantes não terão a
capacidade de desenvolver uma leitura crítica e reflexiva, finalidade primordial:
A leitura é um processo no qual o leitor realiza um trabalho
ativo de construção do significado do texto, a partir dos seus
objetivos, do seu conhecimento sobre o assunto, sobre o autor,
de tudo o que sabe sobre a língua: características do gênero, do
portador do sistema de escrita, etc. Não se trata simplesmente
de extrair informação da escrita, decodificando-a letra por letra,
palavra por palavra. Trata-se de uma atividade que implica,
necessariamente, compreensão na qual os sentidos começam a
ser constituídos antes da leitura propriamente dita. (BRASIL,
1998, p. 41)
Como disciplinas, a Matemática e a Língua Portuguesa destacam-se em toda
a formação básica dos currículos escolares, como referências. Entretanto, se em
vários momentos existe uma estreita interação entre elas, em outros essas parecem
tomar direções contrárias. Chamam-nos sempre nossa a atenção depoimentos de
colegas, professores de Matemática, em relação à dificuldade que os estudantes
apresentam em transformar o enunciado dos problemas em língua materna em
enunciados em linguagem matemática congruentes. Observam que os alunos
apresentam dificuldades que surgem, partindo das informações contidas no texto
da situação problema, que acarretarão uma escolha errada para uma estratégia de
resolução. É de conhecimento dos professores de Matemática que a linguagem
matemática não é a responsável imediata pelo pensamento matemático. Ela par-

11
ticipa de forma secundária do processo de aquisição dos conceitos matemáticos,
pois antes estes conceitos são mediados pela linguagem natural:
A Matemática e a Língua Materna representam elementos funda-
mentais e complementares, que constituem condição de possibilidade
do conhecimento, em qualquer setor, mas que não podem ser ple-
namente compreendidos quando considerados de maneira isolada.
(MACHADO, 1998, p. 83)

Assim, cabe lembrar que para compreender textos escritos de matemática é


necessário tanto o domínio da linguagem escrita quanto do sistema de símbolos
matemáticos, o qual é exterior aos da linguagem convencional, e que pode se valer
de letras, sinais e numerais apresentados de acordo com regras específicas e, por-
tanto, diferente da Língua Portuguesa usada pelos estudantes, necessitando, pois,
de atenção para se assimilar o que se está lendo. A compreensão de enunciados
matemáticos exige do estudante mais que o simples conhecimento linguístico e
matemático; cabe a ele manipular estratégias linguística e matemática, e também
de ordem cognitivo-discursiva, com o objetivo de levantar hipóteses, validar ou não
hipóteses formuladas, preencher lacunas que o texto apresenta, enfim, participar, de
forma ativa, da construção do sentido. (Koch, 2006, p. 7). Observe o exemplo abaixo:

Gráfico 1

12
Apesar de reconhecermos que cabe aos professores de Língua Portuguesa a
maior responsabilidade no ensino da leitura, uma vez que que o texto é a unidade
de ensino da disciplina, é necessário enfatizar que essa responsabilidade deve ser
compartilhada com todos os professores, naturalmente no nosso estudo, com
os de Matemática, ao entendermos que para que se ampliem as competências
comunicativas de utilização da linguagem, devemos relacioná-las à uma reflexão
de uso aos mais variados gêneros.
Para caracterizar a impregnação entre Matemática e a Língua Materna,
referimo-nos inicialmente a um paralelismo nas funções que desem-
penham, enquanto sistemas de representação da realidade, a uma
complementaridade seja redutível à da outra, e uma imbricação nas
questões básicas relativas ao ensino de ambas, o que impede ou difi-
culta ações pedagógicas consistentes, quando se leva em consideração
penas uma das disciplinas. (MACHADO, 1998, p. 91)

LETRAMENTOS

Definição de alfabetização matemática: alfabetização matemática é


a capacidade de um indivíduo para formular, empregar e interpretar
a matemática em uma variedade de contextos. Ele inclui raciocínio
matemático e usa conceitos, procedimentos, fatos e ferramentas
matemáticas para descrever, explicar e prever fenômenos. Auxilia os
indivíduos a reconhecer o papel que a matemática desempenha no
mundo, a fazer os julgamentos bem fundamentados e nas tomadas de
decisões necessárias pelos cidadãos construtivos, engajados e reflexivos.
(OCDE Pisa, 2003)3

O fenômeno do letramento, então, extrapola o mundo da escrita tal


qual ele é concebido pelas instituições que se encarregam de introduzir
formalmente os sujeitos no mundo da escrita. Pode-se afirmar que a
escola, a mais importante das agências de Letramento, preocupa-se
não somente com o letramento prático e social, mas com o tipo de
prática de letramento, a alfabetização, o processo de aquisição de
códigos (alfabético, numérico) processo este geralmente concebido
em termos de uma competência individual necessária para o sucesso e
promoção na escola. Já, outras agências de letramento, como a família,
a igreja, a rua, o lugar de trabalho, mostram orientações de letramento
muito diferentes. (KLEIMAN, 1995, p. 20)

3
Tradução livre
13
O objetivo da interdisciplinaridade é propiciar uma aprendizagem convergente
e integrada e, portanto, mais significativa para o estudante. Assim, como vimos,
as competências integrantes da área de Língua Portuguesa extrapolam os limites
desta disciplina, assim como ocorre com a de Matemática: “comunicar-se mate-
maticamente, ou seja, descrever, representar e apresentar resultados com precisão e
argumentar sobre suas conjecturas, fazendo uso da linguagem oral, e estabelecendo
relações entre ela e diferentes representações matemáticas” (BRASIL, 1998, p. 48)
Avaliações, como o Pisa, têm mostrado que o aprendizado de Matemá-
tica se mostra tão ineficaz como o da leitura. Concluímos que a competên-
cia leitora é fundamental para estudar a Matemática. Ressaltamos fortemente
que o ensino de Matemática está relacionado à leitura, à contextualização. As
questões de Matemática analisadas por esses tipos de avaliação estão ligadas
a enunciados que recriam situações possíveis da realidade, que necessitam ser
interpretados para que sejam identificados os conteúdos matemáticos e, logo em
seguida, serem devidamente empregados.
Embora o Brasil tenha apresentado melhora desde o primeiro ciclo da
avaliação, em 2000, quando o percentual de alunos abaixo do nível 1
era de 62,6%, a situação ainda é grave, pois mais da metade de nossos
alunos não foi capaz de utilizar as habilidades matemáticas requeridas
pelas tarefas mais simples da avaliação. Portugal apresenta apenas
11% de seus alunos neste patamar. Por outro lado, ao compararmos
o percentual de alunos nos níveis mais altos, vemos que enquanto
Portugal tem 19% de seus estudantes nos níveis mais altos da escala
(4, 5 e 6), o Brasil tem apenas 3,5% de seus alunos nesses níveis.
(AGUIAR, 2008, p. 85)

Concordamos, então, que na escola é necessário ensinar aos estudantes as


especificidades dos diversos gêneros discursivos, porque eles não são aprendidos
espontaneamente nas situações do dia a dia. E, como esses textos diferem de dis-
ciplina para disciplina, os professores de cada uma delas devem assumir a função
de destacar e refletir juntamente com seus alunos as características daqueles que
foram utilizados em suas aulas.
A relação ensino-aprendizagem, a partir de uma perspectiva de letramento,
pretende ampliar questões culturais e diversas situações comunicativas, assim como
a necessidade de interação entre o conhecimento do aluno e o conhecimento
escolar que lhe é apresentado, e, a partir daí, certamente é oferecida ao aluno uma
considerável bagagem para a leitura do mundo.
14
Na escola com a disciplina da Matemática, um dos tipos de texto utilizado
é o do enunciado de problemas, que pode ser considerado como um gênero dis-
cursivo a ser apreendido pelos alunos. Sua interpretação, como vimos, vai além, da
competência que os alunos possam ter ao fazer sua leitura na língua materna, isso
porque, nesses tipos de texto, se combinam duas linguagens diferentes, as palavras
e os símbolos matemáticos, linguagens estas que apresentam certas especificidades
e que, portanto, demandam estratégias próprias de leitura:
Após resolverem os problemas matemáticos, os estudantes precisam
apresentar e justificar seus resultados, interpretar os resultados dos
colegas e interagir com eles. É nesse contexto que a competência de
comunicar-se ganha importância. Nas comunicações, os estudantes
devem ser capazes de justificar suas conclusões não apenas pelos
símbolos matemáticos e conectivos lógicos, mas também por meio
da língua nativa, realizando apresentações orais dos resultados e
elaborando relatórios, entre outros registros. (BNCC, 2018, p. 519)

Os entraves à resolução de problemas estariam também ligados à dificuldade


dos alunos em decodificarem termos matemáticos que aparecem nos enunciados
e que, muitas vezes, têm um sentido próprio, no contexto matemático, diferente
daquele com que estão mais habituados.
Assim, o ensino deixa de promover a mera reprodução de um saber letrado
e leva o aluno a mobilizar conhecimentos, habilidades e atitudes, para responder
a uma determinada situação de modo satisfatório, levando em conta o contexto
socio-comunicativo em que está inserido. Segundo Nílson Machado, em Episte-
mologia e didática, o modelo da construção do conhecimento com base na metáfora
da rede de significados pressupõe que:
• Compreender é aprender o significado;

• Apreender o significado de um objeto ou de um conhecimento


é vê-lo em suas relações com outros objetos ou acontecimentos;

• Os significados constituem, pois, feixes de relações;

• As relações entrelaçam-se, articulam-se em teias, em redes, cons-


tituídas social e individualmente, e em permanente estado de
atualização;

• Em ambos os níveis – individual e social – a ideia de conhecer


assemelha-se à de enredar. (MACHADO, 2002, p. 138)
15
Assim, cabe ao professor de Matemática promover discussões, nas suas aulas,
de textos que possam levantar questões que desenvolvam o raciocínio lógico a ser
utilizado em resolução de problemas matemáticos. É ainda importante explorar
a capacidade de interpretação dos alunos, procurando articular coerentemente a
linguagem matemática a ser empregada, e que ela traduza de forma rigorosa e
inequívoca a linguagem corrente que tenha sido apresentada em um problema.
Apresentamos a seguir uma proposta de atividade em consonância ao dire-
cionamento dado no nosso texto. Solicitamos a um aluno do 6º. Ano do Ensino
Fundamental, que explicasse o raciocínio que ele utilizou na divisão de 315 jabu-
ticabas para duas crianças. Eis o resultado:

Gráfico 2

É bastante clara a interação das duas diferentes linguagens, a Língua Por-


tuguesa e a Matemática nessa solução apresentada. Uma atividade de leitura em
sala de aula só é satisfatória e eficaz se for explorada pelos professores dessas duas
áreas, pois a combinação das linguagens presentes no texto, requer estratégias
específicas de leitura, por se tratarem de linguagens que possuem certas especifi-
cidades, concatenando essas duas importantes áreas do conhecimento.

16
CONSIDERAÇÕES FINAIS

Por ser a Matemática uma das ciências cujas análises são cada vez mais
empregadas para tomada de decisões, que influenciam diretamente a vida humana,
e por ser a escola o meio mais utilizado para difusão desse conhecimento, torná-lo
acessível aos alunos deve ser, segundo pensamos, uma preocupação constante de
todo verdadeiro educador comprometido em proporcionar educação de qualidade.
Desta forma, espera-se que este estudo contribua para uma prática de ensino
interdisciplinar que tenha como prioridade a educação do aluno para a vida, tor-
nando-o capaz de lidar com as realidades do dia a dia e assim formarmos cidadãos
mais conscientes e críticos por meio do bom uso desses dois domínios fundamentais.

REFERÊNCIAS
AGUIAR, G. Estudo comparativo entre Brasil e Portugal sobre diferenças nas ênfases curriculares de Mate-
mática a partir da análise do Funcionamento Diferencial do Item (DIF) do PISA-2003. Tese de Doutorado.
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CUNHA, Mariza Ortegoza de. (Org.). Linguagem, Epistemologia e didática. São Paulo: Escrituras, 2016.
p. 355-374.
BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília, 2018.
___________. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais: Matemática / Secretaria
de Educação Fundamental. Brasília: MEC / SEF, 1997.
___________. Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa, Vol II, Primeiro e Segundo Ciclos do
Ensino Fundamental. Brasília/DF: Ministério da Educação/Secretaria de Educação Fundamental/Programa
Fundescola, 1997.
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KLEIMAN, Angela B, OS significados do letramento: uma nova perspectiva sobre a prática social da escrita.
Campinas, SP: Mercado das Letras, 1995. São Paulo, Contexto, 2008.
KOCH, Ingedore. Ler e compreender: os sentidos do texto. 2ª. Edição – São Paulo: Editoa Contexto, 2006.
MACHADO, Nílson. Matemática e Língua Materna (Análise de uma impregnação mútua). São Paulo: Editora
Cortez: 1991.
___________. Epistemologia e didática. São Paulo: Cortez, 2002.
OCDE. PISA 2003. Technical Report. OCDE. Disponível em: http://www.pisa.oecd.org/. Acesso em: jan. 2018.
SCIENTIF AMERICAN – Aula Aberta – o prazer de Ensinar ciências no. 16, Ibep Gráfica.
ROJO, Roxane; MOURA, Eduardo (org). Letramentos na escola. São Paulo: Parábola Editorial, 2013.
SOLÉ, Isabel. Estratégias de leitura. 6ª. edição. Alegre: Artmed: Porto Alegre, 1998.

17
TRAVAGLIA, L. C. Ensino de gramática numa perspectiva textual interativa. In: AZAMBUJA, J. Q. (Org.).
O ensino de língua portuguesa para o 2° grau. Minas Gerais: UFU, 1996, p. 107-156.

Nota: esse trabalho foi parcialmente apresentado no IX SIGET – Simpósio Internacional de Gênero Textual
que ocorreu na Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS), em 06 a 08 de setembro de 2017.

18
UTILIZANDO O SCRATCH COMO FERRAMENTA
DE ENSINO-APRENDIZAGEM PARA
CONSCIENTIZAÇÃO SOBRE AS MEDIDAS DE
PREVENÇÃO NA TRANSMISSÃO DO
NOVO-CORONAVÍRUS

Luciene Morais Gonçalves da Silva4


Karine Serpa Franco5
Suzete Araújo Oliveira Gomes6

INTRODUÇÃO

Recentemente, fomos surpreendidos com a pandemia do novo coronavírus


ou SARS-CoV-2 (do inglês: Severe Acute Respiratory Syndrome Coronavirus-2)
que paralisou o mundo e o nosso país, impactando diversos setores, entre eles o da
Educação. Sendo assim, muitos docentes precisaram adaptar-se à nova realidade
de forma súbita e emergencial. Desde então, buscamos recursos tecnológicos para
desenvolver estratégias de ensino e aprendizagem remota.
Aqui abordaremos o uso do Pensamento Computacional (WING, 2006) na
programação visual, através do Scratch, como uma ferramenta para a compreensão
da transmissão e medidas de prevenção do novo-coronavírus.
O SARS-CoV-2 faz parte de uma família de vírus que causam infecções
respiratórias e é chamado de novo coronavírus causador da COVID-19 (do inglês:
Corona Vírus Disease - 19) cujo o número se refere ao ano de 2019, quando os
primeiros casos da doença foram descobertos. Este vírus se dissemina rapida-
mente, o que pode significar muitos casos com hospitalização num curto espaço
de tempo, sobrecarregando o sistema de saúde, gerando grandes impactos sociais
e econômicos. Por isso, é fundamental entender como o vírus é transmitido e
prevenir que o mesmo se espalhe.
A transmissão se dá por contato com secreções contaminadas, como gotí-
culas de saliva, espirro, tosse e catarro. Deve-se evitar o contato pessoal próximo,
4
Mestre em Diversidade e Inclusão – CMPDI (UFF). Professora da EM Julia Cortines.
ORCID: https://orcid.org/0000-0003-2744-5053
5
Doutoranda em Ciência, Tecnologia e Inclusão (UFF). Professora Coordenadora (SME / Niterói-RJ).
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-3829-5823
6
Professora Doutora (UFF). Docente-orientadora do CMPDI e do PGCTIn (UFF).
ORCID: https://orcid.org/0000-0001-7130-8254
19
como toque ou aperto de mão, e contato com objetos ou superfícies contaminadas,
seguido de contato com a boca, o nariz ou os olhos.
No mês de fevereiro de 2020, foi declarada Emergência em Saúde Pública de
Importância Nacional em decorrência do novo coronavírus no Brasil, por meio da
Portaria Federal nº188 do dia 03 de fevereiro de 2020. Conforme recomendação
da Organização Mundial da Saúde (OMS, 2020), publicada em 31 de janeiro de
2020, várias medidas de prevenção foram divulgadas e vêm sendo praticadas para
evitar a propagação da infecção respiratória pelo novo coronavírus, via gotículas
de saliva e/ ou aerossóis. Dentre elas destacam-se ações preventivas diárias como:
higiene frequente das mãos com água e sabão ou preparação alcoólica (70%);
evitar tocar olhos, nariz e boca sem higienização adequada das mãos; evitar con-
tato próximo com pessoas doentes; cobrir boca e nariz ao tossir ou espirrar, com
cotovelo flexionado ou utilizando-se de um lenço descartável; fazer isolamento
social ficando em casa e evitando contato com pessoas quando estiver doente;
limpar e desinfetar objetos e superfícies tocados com frequência e se precisar sair
de casa fazer uso de EPIs (equipamentos de proteção individual), como máscaras
faciais e os protetores faciais, do inglês face shield.
Como uma das medidas preconizadas pela OMS (2020) está o uso de más-
cara facial, indicada para ser usada em público para ajudar a impedir a propagação
do novo coronavírus. Em seu guia técnico, intitulado “Orientação sobre o uso de
máscaras no contexto da COVID-19”, o órgão diz que novas informações mostram
que elas podem fornecer “uma barreira para gotículas potencialmente infecciosas”,
porém ressalta sobre os riscos potenciais como a auto-contaminação, que pode
ocorrer quando a pessoa toca e reutiliza uma máscara contaminada. Segundo
Lima et al., (2020), a eficácia das máscaras faciais na prevenção da transmissão de
doenças respiratórias semelhantes à gripe depende de vários fatores, como uso de
forma consistente, cuidadosa e rigorosa sempre acompanhada da lavagem das mãos.
Em 2021, após vários testes experimentais, foi descoberto que enxaguantes
bucais que contém Ftalocianina, um composto químico macrocíclico aromático
de cor azul a verde e de nome comercial Dentalclean Detox Pro Antiviral, pode
ser utilizado para eliminação do vírus a partir da assepsia oral (MATEOS-MO-
RENO et al., 2021). Em decorrência deste resultado, um grupo de pesquisadores
da USP (Universidade de São Paulo) desenvolveram uma máscara impregnada
com Ftalocianina, o PHTALOX, a qual permite a eliminação de partículas virais
no momento em que o vírus entra em contato com a máscara. Os testes realizados

20
por estes pesquisadores mostraram eficácia contra variantes do Sars-Cov-2 e os
vírus da Influenza do tipo A e B (VILHENA et al., 2021).
Com o objetivo de proporcionar o aprendizado significativo sobre a transmis-
são viral e as medidas de prevenção da COVID-19, utilizamos a Plataforma Scratch
como ferramenta digital educacional, desenvolvendo por meio de programação,
sequências didáticas baseadas em estratégias como simulações e animações com a
criação de personagens que de forma dinâmica permitiram a compreensão do tema.
Neste contexto, este trabalho apresenta a ferramenta Scratch como recurso
didático que pode ser utilizado de forma remota ou presencial em diferentes dis-
ciplinas abordando conceitos de forma divertida e interdisciplinar.

SCRATCH

O Scratch é um projeto desenvolvido por Mitchel Resnick em 2007 que faz


parte do grupo Lifelong Kindergarten no Media Lab localizado no Instituto de
Tecnologia de Massachusetts (MIT) dos Estados Unidos (EUA). De acordo com
Mitchel Resnick (2007), o Scratch começou como uma espécie de comunidade
experimental; capaz de alcançar as crianças que não podem pagar pelo acesso à
tecnologia ou programas de computador. O Scratch é gratuito e disponível para
todos. Uma das preocupações do referido autor e sua equipe, ao criar a comunidade
on line, foi de garantir que seja bem-vinda e incluída todas as pessoas, de todas as
origens, idades, raças, religiões, orientações sexuais, identidades de gênero. Sendo
um espaço no qual as pessoas podem compartilhar objetos sobre tópicos que
são importantes para eles mesmos.
É um software livre que se constitui de uma programação visual baseada na
linguagem LOGO, a qual, possui códigos simples para comandar o personagem
por blocos, permitindo serem encaixados como o Leg Godt, de origem dinamarquesa,
criado pelo Ole Kirk Christiansen, em 1934 e mundialmente conhecido como LEGO,
que significa “brincar bem”. Além disso, o Scratch é fundamentado no conceito de
drag-and-drop (arrastar e largar) podendo ser utilizado em diversas plataformas,
como microcomputador, notebooks, tablets e celulares (BATISTA et al., 2015).
O Scratch permite ao usuário construir interativamente suas próprias histórias,
animações, jogos, simuladores, música, arte e ambientes virtuais de aprendizagem
(SÁPIRAS et al., 2015). Dessa forma, essa uma ferramenta permite fazer com
que cada um possa imaginar e inventar um projeto. Pode ser executado de forma
individual ou dentro de seu portal, onde os projetos ficam disponibilizados para
21
visualização, consulta e alteração. Além disso, é uma ferramenta gratuita desen-
volvida para crianças e adolescentes, mas que vem sendo utilizado por pessoas de
diferentes faixas etárias, que permite que seja aplicado em uma série de diferentes
projetos pedagógicos, possibilitando que crianças e jovens a aprendam programação
desde cedo (PINTO & NASCIMENTO, 2018).
Para manuseio do Scratch, o usuário obrigatoriamente necessita expressar seu
pensamento na forma de ações, juntando blocos gráficos como um quebra-cabeça,
configurando e orquestrando estas ações na linha do tempo para que o projeto
do aluno, quando executado, tenha um sentido lógico. Os modelos construídos
podem ser disponibilizados na internet, criando uma conexão com outras pes-
soas, proporcionando inspiração, auxílio e trabalho em grupo numa comunidade
virtual (PEREIRA & SAMPAIO, 2008).
Programar usando Scratch enfatiza um pensamento crítico, trabalha a
organização do processo de resolução de um problema e exercita a reflexão crítica
do aluno sobre o seu projeto. É um meio de tornar as pessoas fluentes, para que
se expressem por meio das novas tecnologias. Sendo assim, o que se deseja não
é transformar o aluno em um exímio desenvolvedor de software, mas ajuda-lo
a pensar como se fosse um programador. De acordo com Pinto & Nascimento
(2018), isto é a essência do pensamento computacional.
Analisando os conceitos e os princípios do pensamento computacional,
é possível encontrar ligações com a teoria de Jean Piaget. O que primeiro nos
chama a atenção diz respeito ao aprendizado através do fazer. Piaget afirma que
é necessário que o sujeito interaja com os objetos, pois a partir disso surgirão as
dúvidas e incertezas responsáveis pelo desequilíbrio, que irá desencadear uma
série de processos mentais levando à construção do conhecimento. Isso está de
acordo com a abordagem “usar-modificar-criar” (PIAGET & GARCIA, 1987a).
O pensamento computacional incorpora esta ideia, pois a codificação permite
aprender, ver sob outros ângulos e pontos de vista. Segundo esta abordagem, os
sujeitos começam realizando experimentos usando os modelos computacionais
já existentes, executando um programa que controla um robô ou jogando. À
medida que os sujeitos compreendem o funcionamento destes modelos, jogos ou
programas, eles passam a modificá-los, aumentando seu nível de complexidade e
chegando, ao final, a produtos com aparência e comportamento bem diferentes
dos produtos originais. Isso demonstra uma evolução dos processos cognitivos e

22
das habilidades dos sujeitos ao longo do processo de criação. A criatividade é o
segundo ponto em comum entre a teoria de Piaget e o pensamento computacional.

METODOLOGIA

Material tecnológico utilizado

Utilizamos o aplicativo ScratchJr, em versão gratuita para dispositivos eletrô-


nicos móveis com sistemas operacionais Android. O ScratchJr é resultante de uma
colaboração entre o grupo de Tecnologias do Desenvolvimento da Universidade de
Tufts, em Massachusetts, EUA e o grupo Lifelong Kindergarten do MIT Media
Lab e a Playful Invention Company. A Two Sigma liderou a implementação da
versão Android do ScratchJr. Os gráficos e as ilustrações para o ScratchJr foram
criados pela HvingtQuatre Company e pela Sarah Thomson.

Modelagem no ambiente computacional Scratch

No estudo deste ambiente, procurou-se implementar a seguinte situação: o


SARS-COV-2 disperso no ar se locomove aleatoriamente pelo cenário à procura de
hospedeiros para infectar. As pessoas encontram-se protegidas por máscaras faciais,
o que impede o vírus de infectá-las. Dessa forma, o vírus não consegue invadir
um hospedeiro pelas vias respiratórias e acaba morrendo, ou seja, desaparecendo.
Nesta simulação, foram utilizados os atores apresentados a seguir:
O vírus – Corona (Figura 1);
Mulher idosa de máscara facial – a avó (Figura 2);
Mulher jovem de máscara facial– a mãe (Figura 3);
Homem jovem de máscara facial – o pai (Figura 4);
Criança de máscara facial (Figura 5).

23
Figura 1 – Atores da Simulação no Scratch - Corona

Figura 2 - Atores da Simulação no Scratch - Avó

Figura 3 - Atores da Simulação no Scratch – Mãe.

24
Figura 4 - Atores da Simulação no Scratch – Pai.

Figura 5 - Atores da Simulação no Scratch – criança.

Os seguintes eventos foram implementados no ambiente: prédios ao fundo e


uma rua, mimetizando uma cidade; Coronavírus disperso no ar no centro de uma
cidade; Pessoas (avó, pai, mãe e criança) na rua no centro da cidade; Coronavírus
tenta contaminar a avó, o pai, a mãe e depois a criança, mas não consegue por
que TODOS estão usando máscaras. O quadro 1 abaixo apresenta os principais
passos que foram implementados no estudo para construção do Scratch sobre as
medidas de prevenção na transmissão do novo-coronavírus.

25
QUADRO 1:
Passo 1 – Condição Inicial Passo 2 – Decisão Passo 3 – Condição Final

1. Iniciou simulação Muda Vírus (personagem 1) Vírus gira em seu próprio eixo
por 5 segundos
2. Vírus parado e casal parado Grava voz (gravação 4) e movi- Vírus fala e expressa suas von-
menta casal (personagens 3 e 4) tades e pensamentos enquanto
o casal anda pela calçada do
cenário (anda por 3 segundos
e fica esperando por 99 + 50
segundos)
3. Vírus parado e casal andando Muda Vírus e casal Vírus anda em direção a avó
(personagem 2; por 12 segun-
dos) e casal para de andar (fica
parado por 99 + 50 segundos)
4. Vírus andando Vírus para ao encostar na avó Avó começa a se movi-
mentar e desaparece (anda
por 4 segundos e efeito de
desaparecimento)
5. Vírus parado Grava voz (gravação 1) Vírus fala e expressa seus
pensamentos
6. Vírus parado Muda vírus Vírus se aproxima do casal (gira
por 5 segundos e anda por 3
segundos)
7. Vírus andando Muda vírus e grava voz (gra- Vírus para e fala, demons-
vação 2) trando o interesse de conta-
minar o casal
8. Vírus parado Muda vírus Vírus anda em direção ao casal
(três segundos)
9. Casal parado e vírus se Muda casal e vírus Casal se movimenta ao que o
movimentando vírus se aproxima (8 segundos)
e para ao que o casal começa
a andar
10. Vírus parado Grava voz (gravações 3 e 5) Vírus expressa seus pensamen-
tos, percebe sua ineficácia e se
refere a criança (personagem 5),
que está parada desde o início
do processo

Os passos constituem as condições necessárias para a execução das interações


entre os atores da simulação. O passo 1 representa uma condição inicial do ator
no cenário, o passo 2 representa uma tomada de decisão do sistema, e o passo 3
demonstra a condição final do ator no cenário. A partir dos dados gerados, cons-
truímos um vídeo com legendas em inglês e em português.
26
Alunos e local da aplicação do Scratch

A pesquisa foi desenvolvida com o Scratch foi aplicada de forma remota


para alunos da turma do 5º ano, com idade entre 10-11anos, da Escola Muni-
cipal Júlia Cortines. Esta escola é uma das 49 Unidades Escolares da Fundação
Municipal de Niterói, esta escola fica situada no coração do Bairro de Icaraí,
banhado pela parte leste das praias da Baía de Guanabara no estado do Rio de
Janeiro. Fica a poucos minutos do arborizado parque do Campo de São Bento
e atende alunos de comunidades periféricas do município. No turno da manhã,
atende aos alunos do 3º, 4º e 5º anos e, no turno da tarde, os alunos do 1º, 2º e 3º
anos do ensino fundamental. Totalizando, no censo da Unidade escolar de 2020,
um quantitativo de 1.105 alunos.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Na última década observamos um crescente aumento no número de fer-


ramentas tecnológicas que auxiliam no processo de ensino-aprendizagem nas
escolas, permitindo inserir as TICs (Tecnologias da Informação e Comunicação)
na sala de aula. Porém, não basta o professor utilizar estas novas tecnologias com
as mesmas práticas tradicionais, onde o aluno é restrito ao conhecimento que é
transmitido a ele em sala de aula, em que não desenvolve sua capacidade de apren-
der determinado conteúdo a partir de suas próprias experiências, pois tais práticas
não caracterizam mudanças reais no processo de ensino-aprendizagem. É preciso
repensar as novas formas de ensino em um contexto que o professor é apenas um
mediador do conhecimento, permitindo a colaboração e cooperação entre a turma,
apresentando-lhes situações que desenvolvem sua capacidade de resolver problemas.
De acordo com Moran (2000), o movimento tecnológico tem influenciado
e transformado as formas do indivíduo se comunicar, transmitir informações e
consequentemente as suas relações sociais que também influem nas escolas. As
tecnologias tornam mais atraente a aprendizagem aos alunos, mas implicam no
desafio para a educação, pois essas novas tendências exigem que as escolas ino-
vem e reorganizem seu modelo de ensino. Uma das formas que pode auxiliar o
professor a estimular os alunos o aprender a aprender, é por meio de utilização
de ferramentas, como o Scratch, que permite criar jogos, animações e histórias,
desenvolvendo o raciocínio lógico, ensinando programação e permitindo que
seja utilizado de uma forma multidisciplinar. Conforme Martins (2012), entre as
metodologias de aprendizagem adotadas no Scratch estão: noções básicas sobre
27
computadores e programação, necessidade de indicar ao computador exatamente
o que deve ser feito, passo por passo, e a não exigência de perícia especial, apenas
de raciocínio claro e cuidadoso.
A elaboração e aplicação de jogos digitais voltados para o ensino de ciências
por meio da ferramenta de programação como o Scratch são relevantes conside-
rando os dados obtidos no presente estudo. Além disso, apontam a necessidade
do desenvolvimento de trabalhos que contemplem o uso das tecnologias da
comunicação e da informação, para que todos, alunos e professores, possam delas
se apropriar e participar, bem como criticá-las e/ou delas usufruir (Parâmetros
Curriculares Nacionais, 1998; Ministério da Educação, 1999).
O Scratch permite a criação de modelos bastante ricos, possuindo funcio-
nalidades específicas para a manipulação de imagens, permitindo uma mobilidade
muito grande aos atores no cenário. O ambiente também possui blocos de códigos
destinados a interação com o usuário, uma característica mais comum em jogos, mas
que abre espaço para um retorno e uma interatividade maior com o aluno, através
de perguntas ou ações interativas desejáveis em determinadas situações de ensino.
O sistema, através de programação, também permite a manipulação de variáveis,
ampliando o número de possibilidades durante a simulação (BATISTA et al.,
2015). Neste processo, as crianças aprendem a pensar criativamente, a raciocinar
sistemicamente e a trabalhar de forma colaborativa e pró- ativa, potencializando
a sua fluência tecnológica. Isto permite motivá-los na busca de sua autonomia, é
estimulá-los a serem capazes de explorar e descobrir as coisas por si mesmo.
Ao sentir-se satisfeito com a metodologia educacional, é provável que o
indivíduo perceba uma melhor aprendizagem, o que também o torna mais moti-
vado a aprender. Ao sentir-se motivado o indivíduo tem vontade e se torna capaz
de manter a atenção, a concentração e o esforço durante o tempo necessário para
atingir o objetivo proposto (BORUCHOVITCH & BZUNECK, 2010). No caso,
continuará inclinado a aprender, mantendo-se empenhado ao longo do tempo,
resistindo às dificuldades e a outros estímulos (BOCK, 1999).
Assim, satisfação, motivação, percepção e a própria aprendizagem são aspectos
inter-relacionados, que se auto influenciam. Por isso, esses fatores servirão como
critérios importantes para a escolha das metodologias de ensino, cujos objetivos
didático-pedagógicos são estimular a imaginação, intuição, colaboração e impacto
emocional que, por certo, surtirão efeito satisfatório no envolvimento dos alunos
com a aprendizagem (BONINI-ROCHA et al., 2014).
28
Utilizar a tecnologia como uma ferramenta de apoio a educação é uma
estratégia bem produtiva para os alunos, uma vez que eles normalmente adoram
celulares, tablets, computadores e outros diversos aparatos tecnológicos (MAR-
TINS, 2015) e a possibilidade de usar esses recursos aumenta sua motivação,
principalmente quando se trata do smartphone. Aparelhos que são verdadeiros
computadores portáteis ligados e interligados à internet, que filmam, tiram fotos,
produzem montagens, gravam o áudio que o seu usuário desejar (VIVIAN &
PAULY, 2012; CONCEIÇÃO & VASCONCELOS, 2018).
Apresentar elementos de diversão e prazer no processo de estudo é impor-
tante porque, com o estudante mais interessado, em geral há maior disposição para
o aprendizado (HSIAO, 2007). Neste contexto, no presente trabalho, utilizamos
o Scratch como ferramenta de metodologia de ensino para construção de um
modelo para a conscientização de uma medida de prevenção de um tema atual,
como a transmissão do novo coronavirus.
A partir dos dados gerados, como resultado construímos junto aos alunos,
de forma remota, um vídeo com legendas em inglês e em português https://drive.
google.com/file/d/1Ie2QQgR9UIVozTIZuO9zWx4SIseDv5DC/view?usp=sha-
ring e https://drive.google.com/file/d/1vJszm2qdeoBl2XHpTe5SV-rZw0XJUfJt/
view?usp=Sharing com a representação de uma história sobre uma das medi-
das de prevenção na transmissão do novo coronavírus, como o uso de máscara
facial, um dos EPIs que se tornou um acessório popular e obrigatório durante o
período de pandemia da Covid-19.
O ensino remoto está previsto na Portaria no343 (alterada pela Portaria 345)
do Ministério da Educação, autoriza a substituição das aulas presenciais por aulas
em meios digitais, enquanto durar o período de pandemia do novo coronavírus.
Neste contexto, com o intuito de demonstrar o uso de uma das ferramentas de
TICs (Tecnologias da Informação e Comunicação) como metodologia ativa para
a construção do conhecimento de forma criativa, nosso resultado aponta para a
importância e a possibilidade dos professores poderem trabalhar com seus alunos
com diversos temas sobre saúde pública de forma remota ou presencial, utilizando
o Pensamento Computacional na programação visual através do Scratch (scratch.
mit.edu), um software gratuito elaborado desde 2007, pelo grupo de pesquisa
do professor Mitchel Resnik no Media Lab do MIT (Massachusetts Institute of
Technology), para crianças e jovens entre 8 e 16 anos, mas que pode ser utilizado
por pessoas de todas as idades para programar jogos, animações e histórias inte-
rativas flexibilizando o ensino remoto/presencial. Adicionalmente, as animações
29
e os vídeos criados podem ser compartilhados em redes sociais ou em salas de
aulas virtuais para análise e avaliação.
Tais dados corroboram com dados de outros autores que afirmam o uso
do Scratch pode ser associado ao efeito motivador dos jogos digitais os quais
podem proporcionar no processo de ensino potencial para divertir e entreter,
tornando-os mais estimulantes (SAVI & ULBRICHT 2008; SILVA et al., 2016;
CONCEIÇÃO & VASCONCELOS, 2018).
Nossa proposta deste modelo de criação de um ambiente virtual com uma
ferramenta digital educacional como o Scratch, corrobora com os conceitos e os
princípios do pensamento computacional, a qual encontra ligações com a teoria
de Jean Piaget, pois favorece o aprendizado através do fazer. Piaget afirma que
é necessário que o sujeito interaja com os objetos, pois a partir disso surgirão as
dúvidas e incertezas responsáveis pelo desequilíbrio, que irá desencadear uma
série de processos mentais que levarão à construção do conhecimento. Isso está
de acordo com a abordagem “usar-modificar-criar” empregada nos modelos de
criação no Scratch. Além disso, colabora com a criação de uma cultura digital que
possibilita o estudante estar em rede e participar de comunidades de aprendizagem.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Na sociedade contemporânea em que vivemos, as tecnologias estão presentes


em nossas vidas cotidianamente. Em se tratando do contexto educacional, nas
últimas décadas houve uma ascensão das inovações em tecnologia com o objetivo
de corroborar com o processo ensino/aprendizagem.
Diante de um cenário de pandemia, com afastamento e isolamento social, tor-
nou-se imprescindível repensar as práticas pedagógicas e buscar estratégias, ferramen-
tas e metodologias que permitissem aos alunos o acesso à produção do conhecimento.
Demonstramos que o Scratch, pode ser utilizado como estratégia tecnológica
de ensino de temas multidisciplinares, assim como a conscientização de medidas de
prevenção da infecção pelo novo coronavírus (Covid-19), através da construção de
ambientes virtuais de aprendizagem, mesmo que de forma remota (não presencial).
Dessa forma, indicamos o Scratch app compatíveis com navegadores da web
como o Google Chrome e com o sistema operacional Android, como uma ferra-
menta tecnológica aliada ao processo ensino/aprendizagem, onde os professores
podem ser os mediadores do processo, incentivando seus alunos a criarem seus
projetos sobre o tema. Neste sentido, é possível trabalhar de forma virtual através
30
da utilização de dispositivos eletrônicos móveis, respeitando o sistema de ensino
remoto preconizado na Educação durante o período de pandemia.
No contexto atual, percebemos que desenvolver estratégias de aprendi-
zagem com nossos alunos, como o Scratch, voltadas para um pensamento cria-
tivo, embebido de significados, de forma colaborativa, inter e transdisciplinar,
tanto na escola, como fora dela, sem dúvida seria um grande passo a ser dado na
qualidade da educação brasileira.

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32
GAMEFICAÇÃO NO ENSINO DE LÍNGUA
PORTUGUESA: A ESTÉTICA DE JOGOS DIGITAIS
ELABORADOS POR PROFESSORES DA
EDUCAÇÃO BÁSICA

Shirlei Marly Alves7


Andreina Kelly Sousa Vieira8

INTRODUÇÃO

No contexto contemporâneo, marcado por um amplo processo de mudanças


tecnológicas, a educação também vem se transformando e se adaptando a um
cenário em que as relações sociais, econômicas, profissionais ocorrem em grande
parte através de mediação tecnológica, via artefatos digitais. Desde que os compu-
tadores domésticos passaram a fazer parte do cotidiano de uma grande parcela da
população, e a internet se tornou um ambiente de possibilidades, reconfiguraram-se
os modos de ser, de estar, de se relacionar, de aprender, de ensinar. Como observa
Kenski (2012, p. 23), as tecnologias digitais “interferem no nosso modo de pensar,
sentir, agir, de nos relacionarmos socialmente e adquirirmos conhecimentos. Criam
uma nova cultura e um novo modelo e sociedade”.
Essa nova cultura, vivenciada por muitas crianças, adolescentes e jovens,
instancia a escola a repensar sua forma de educar, visto que, como agência for-
madora, é imprescindível manter-se conectada com o mundo contemporâneo,
no qual vivem e convivem os estudantes em processos interativos que se fazem
via textos multimodais, arquitetados com palavras, sons, imagens, cores e outros
recursos semióticos. Nesse contexto, ser letrado deixa de significar ter apenas o
domínio do texto escrito, ampliando-se para a lida com uma gama diversificada
de linguagens, o que enseja a concepção de multiletramento. O termo, conforme
Rojo (2017, p. 4) remete a “[...] práticas de trato com os textos multimodais ou
multissemióticos contemporâneos – majoritariamente digitais, mas também
impressos [...] incorporam a leitura e (re)produção de imagens e fotos, diagramas,
gráficos e infográficos, vídeos, áudio etc.”.

7
Doutora em Letras/Linguística (UFPE). Docente (UESPI). CV: http://lattes.cnpq.br/7828918779492971
8
Graduanda em Letras Português (UESPI). CV: http://lattes.cnpq.br/2315079158219223
33
Observa-se ainda um colapso na hierarquia tradicional de disseminação de
conhecimentos, não mais restrita a determinados centros irradiadores, visto que
os recursos digitais da web 2 permitem aos internautas criar um produto, editar,
divulgar, compartilhar, remixar, horizontalizando-se, assim, as relações em que todos
se tornam autores, ao tempo em que se constituem como receptores/consumidores
do que circula na rede. No cenário digital, como ressalta Rojo (2017, p. 4), instala-se
um novo “ethos”, isto é uma nova maneira de ver e de ser no mundo
contemporâneo, que prioriza a interatividade, a colaboração e a (re)
distribuição do conhecimento, ao invés da hierarquia, da autoria e da
posse controlada e vigiada do conhecimento por diversas agências,
como a escola, as editoras e a universidade.

A escola então é convocada a se repensar e a se reformular, devido ao fato


de que, historicamente, se manteve afeita às tradições de ensino marcadamente
transmissivista, no qual os alunos permanecem numa posição de passividade que,
hodiernamente, já não mais se justifica em face do mundo de possibilidades que
muitos vivenciam nas interações digitais.
Atuando constantemente como interlocutores ativos e propositivos, está cada
mais difícil para a escola conter os alunos, os quais, muitas vezes, já chegam à sala
alimentados por ideias, informações, opiniões e outros saberes. Isso demanda que
os professores estejam preparados para entrar em sintonia com esses estudantes,
tirando proveito pedagógico dos saberes que essa nova geração acumula no dia
a dia, os quais vão muito além da cultura da escrita. Segundo Rojo (2017, p. 7),
a cultura digital, põe por terra todo o edifício de práticas letradas
cultuadas e perpetuadas pela escola. Nela, o leitor não é mais reverente
ao texto, concentrado e disciplinado, mas disperso, plano, navegador
errante; não é mais receptor ou destinatário sem possibilidade de
resposta, mas comenta, curte, redistribui, remixa.

Em consonância, a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) orienta:


[...] é importante que os estudantes compreendam o funcionamento
e a potencialidade dos recursos oferecidos pelas tecnologias digitais
para o tratamento das linguagens (mixagem, sampleamento, edição,
tratamento de imagens etc.), assim como as possibilidades de remidia-
ção abertas pelos fenômenos multimídia e transmídia, característicos
da cultura da convergência. (BRASIL, 2018, p. 491).

34
Diante desse rico universo de recursos, com múltiplas oportunidades de
agir e interagir, criar, consumir, disseminar, reconstruir, torna-se estratégico, no
campo da educação, considerar os potenciais educativos, de modo a se promover
um encontro proveitoso entre o que atrai, diverte, motiva e o que educa, como já
é possível constatar em muitos objetos digitais de aprendizagem disponibilizados
na web, como plataformas de jogos educativos9, ou nos sites de escrita colaborativa,
em que os internautas se engajam na produção de textos de ficção, inspirados em
filmes, animes, quadrinhos, games etc.10
Entre os objetos digitais de aprendizagem, direcionamos nosso olhar para os
jogos (games)11, cujo traço central é promover a aprendizagem de forma lúdica e
envolvente, tal como se dá em qualquer jogo. Incontestavelmente, os seres humanos são
atraídos por jogos, o que faz com que eles sejam parte de muitas culturas. Por essa razão,
buscam-se as características pertencentes aos jogos que podem ser usadas proveitosa-
mente em outras áreas, a exemplo da educação, surgindo daí a noção de gamificação.
Nesse contexto, desenvolvemos este estudo, com o objetivo geral de analisar
o potencial pedagógico de games pedagógicos digitais planejados por professores
da Educação Básica, destinados ao ensino e aprendizagem de língua portuguesa.
Para isso, classificamos esses games de acordo com o componente do ensino de
língua portuguesa contemplado e descrevemos a estética de cada um.

GAMIFICAÇÃO E APRENDIZAGEM

De acordo com Alves (2014), gamificação diz respeito a unir elementos de um


determinado jogo e de uma determinada atividade, de modo que, ao jogar, a pessoa
não apenas se divirta como também adquira conhecimentos. Ressalta-se que não
se trata de utilizar um jogo já existente para alcançar determinado objetivo, mas,
sim, de utilizar as estratégias do jogo em um objeto com o qual se visa alcançar um
objetivo. Esse objeto pode, inclusive, ser um jogo elaborado com fins pedagógicos.
A autora acrescenta que a gamificação não é um fenômeno contemporâ-
neo, citando pesquisas da década de 1980, entre as quais destaca a de Thomas W.
Malone, que já estabelecia correlação entre a mecânica dos games, a diversão e a
9
Cf. Plataforma do Letramento (disponível em: http://www.plataformadoletramento.org.br/acervo-jogos.html) Portal
do Professor (disponível em: http://portaldoprofessor.mec.gov.br/index.html) e outros.
10
Trata-se da escrita de fã, ou fanfiction, “escrita na qual os fãs usam narrativas midiáticas ou ícones culturais como inspi-
ração para criar seus próprios textos. Em tais textos, os fãs autores imaginativamente estendem o enredo ou a cronologia
original [...], criam novos personagens (...), e/ou desenvolvem novos relacionamentos entre personagens já presentes na
fonte original.” (BLACK, 2006, p. 3 apud CAVALCANTI, 2010, p. 6).
11
Em nosso trabalho, preferimos o termo game a jogo, em função de o nome do processo a ser estudado (gamificação)
ser derivado do primeiro.
35
aprendizagem. Percebe-se, pois, que, embora o termo gamificação seja considerado
novo, há muito tempo, se usam as características dos games para alcançar objetivos
de determinadas atividades, com proveito dos atrativos inerentes aos jogos.
Alves (2014) distingue os elementos que, nas atividades gamificadas, con-
seguem atrair, engajar e motivar os usuários, considerando três aspectos funcio-
nais: a mecânica, a dinâmica e os componentes, os quais constituem a estética do
game, sintetizados no quadro 2.

Quadro 2 – Estética da atividade gamificada


Mecânica Inclui os elementos que compõem a organização do jogo: desafio, cooperação
e competição, sorte, aquisição de recursos, feedback, recompensas, turnos, tran-
sações e estado de vitória.
O desafio está relacionado aos objetivos propostos aos jogadores; cooperação e
competição estimulam os jogadores a vencer os desafios e a buscarem auxílio,
para alcançar os objetivos propostos no jogo; sorte diz respeito ao fato de que
vencer um jogo inclui um componente de aleatoriedade; aquisição de recursos e
recompensa incluem os “bônus” que podem ser utilizados durante o jogo para
auxiliar na conquista dos objetivos; feedback constitui um retorno ao jogador
quanto a sua desenvoltura, conquistas e o progresso durante o jogo; transações
são ações de compra e venda dentro do jogo, o que melhora a interação do
jogador no game; turnos são as trocas entre jogadores, e o estado de vitória, fruto
do alcance dos objetivos propostos pelo jogo.
Dinâmica Diz respeito a padrões regulares de coerência responsáveis pelas experiências
que se pretende proporcionar ao gamer através da dinâmica do jogo, como
emoção, relacionamento, progressão, contrição e narrativa. Exemplos de emoções
são a empolgação diante de um desafio, a alegria de ganhar ou de passar de
fase, a frustração por ter que recomeçar. O relacionamento é o envolvimento
do jogador com outras pessoas ou comunidades, é a interação entre elas. Já a
progressão envolve os recursos utilizados para evoluir, progredir nos níveis do
jogo; as contrições restringem o alcance dos objetivos do jogo, além de também
restringirem decisões/escolhas durante o jogo; narrativa é a configuração res-
ponsável por atribuir coerência ao jogo, interligando os elementos do game,
fazendo-os ganhar um sentido.
Componentes Avatar – personalidade virtual do jogador; boss fights – desafios propostos para
avançar nos níveis; realizações – cada conquista do jogador; badges – representações
visuais dos resultados alcançados durante e no final do jogo; coleções – conquistas
dos jogadores; desbloqueio de conteúdo – nova tarefa do jogo, com liberação de
outra fase; nível – grau de dificuldade de cada fase; placar – ranqueamento entre
os jogadores ou a colocação do jogador; pontos – contagem de pontos durante
o jogo; doar – ajuda ofertada por/para outros jogadores; investigação/exploração
– busca daquilo que se almeja alcançar; bens virtuais – benefícios e ou objetos
que podem ser comprados com moeda virtual ou real; gráfico social – extensão
da vida/cotidiano dos jogadores.
Fonte: Alves (2014), adaptado.
36
Essa autora destaca ainda que fatores ambientais e emocionais contribuem
para o desenvolvimento da aprendizagem, razão pela qual os jogos são altamente
motivadores, visto que inserem o jogador em um ambiente estimulante, que pro-
voca emoções e demanda atitudes como atenção, engajamento, análise, avaliação,
tomada de decisões e outras. Desse modo, gamificar o ensino possibilita maior
engajamento daquele que aprende, por requisitar-lhe um envolvimento mais intenso
nas atividades, contribuindo para o dinamismo e o protagonismo do aluno nos
seus processos de aprendizagem.
Nesta pesquisa, os games pedagógicos digitais destinados ao ensino e apren-
dizagem de língua portuguesa foram analisados tendo-se como referência os
componentes da estética, conforme o quadro 2 (ALVES, 2014), pois possibilitam
avaliar o quantum de gamificação foi alcançado por cada jogo, bem como seus
potenciais para engajar ativamente o aluno na atividade.

GAMES EDUCATIVOS DIGITAIS NO MESTRADO


PROFISSIONAL EM LETRAS (PROFLETRAS)12

Esta pesquisa tem como objeto de estudo games pedagógicos digitais ela-
borados por professores da Educação Básica (Ensino Fundamental), os quais,
em suas pesquisas desenvolvidas no âmbito do Mestrado Profissional em Letras
(PROFLETRAS), construíram jogos pedagógicos como propostas de intervenção
para promover um ensino mais motivador e envolvente.
Quanto à pesquisa associada à solução de problemas, o modo como se conduz
o processo no PROFLETRAS corrobora o que propõe Soriano (2004, p. 41):
Estudantes e professores deveriam perguntar-se antes de tudo quais
as causas que motivam os estudos que se propõem realizar, se elas são
justificáveis, considerando a utilidade prática dos resultados para
resolver problemas concretos que afetam uma instituição ou grupo
determinado ou se propiciam avanços no conhecimento teórico das
ciências sociais. (grifo nosso).

12
O PROFLETRAS é um mestrado profissional ofertado a professores de Língua Portuguesa efetivos das redes públicas
de educação (estaduais e municipais), atuantes no Ensino Fundamental. Financiado pela Coordenação de Aperfeiçoa-
mento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), o PROFLETRAS envolve uma rede nacional de 49 universidades públicas
brasileiras, com a coordenação nacional instalada na Universidade Federal do Rio Grande do Norte. A UESPI é unidade
conveniada desde o primeiro edital, em 2013.
37
Nesse sentido, os professores mestrandos devem desenvolver pesquisas com
foco em problemáticas observadas nas escolas, apresentando uma proposta de
intervenção, conforme determina a Resolução 014/2014:
Art. 2º. A pesquisa deverá ter como tema/foco/objeto de investigação
um problema da realidade escolar e/ou da sala de aula do mestrando
no que concerne ao ensino e aprendizagem na disciplina de Língua
Portuguesa no Ensino Fundamental.

Art. 3º. A pesquisa deverá, preferencialmente, ser de natureza inter-


pretativa e/ou interventiva, ou de interpretação da realidade, ou de
elaboração de materiais pedagógicos (materiais didáticos, sequência
didática, programas educacionais, software, vídeo etc.). (UFRN, 2014,
p. 5, grifos nossos).

Com essa determinação, o Programa visa incentivar os professores a serem


pesquisadores de sua própria prática, sistematizando conhecimentos que lhes darão
respaldo para pensar em soluções para os problemas pedagógicos identificados.
No contexto do ensino de língua portuguesa, trata-se, principalmente, de aspectos
relacionados aos eixos da leitura, escrita, oralidade e análise e reflexão linguísticas/
semióticas. Assim, o PROFLETRAS já reúne um número significativo de propostas
interventivas elaboradas pelos professores pesquisadores, configuradas em mate-
riais impressos, como sequências didáticas, cadernos pedagógicos, cartilhas, e em
materiais eletrônicos, como aplicativos, podcasts, e-books, animações, sites, games etc.
Ao selecionarmos este Programa como contexto desta investigação e, mais
especificamente, um dos objetos pedagógicos elaborados por professores pes-
quisadores – o game –, vislumbramos aprofundar os conhecimentos acadêmicos
sobre a gamificação no ensino de língua portuguesa13, ao tempo em que propor-
cionamos um panorama dessas propostas que, sendo de autoria de professores,
possibilita uma ampliação de conhecimentos sobre as problemáticas presentes
no ensino de língua português, podendo contribuir para incentivar professores a
considerar, de modo refletido, a aplicação dos games em salas de aula, testando
suas possibilidades de aprendizagem.
A análise foi feita em 5 (cinco) jogos pedagógicos, sendo 4 (quatro) prove-
nientes de trabalho desenvolvido no PROFLETRAS da Universidade Estadual
do Piauí (UESPI) e 1 (um), no PROFLETRAS da Universidade Federal de
13
Desenvolvemos uma pesquisa sobre o game pedagógico virtual Pontos de Vista, proposto pela equipe da Olimpíada de
Língua Portuguesa Escrevendo o Futuro. O objetivo foi avaliar o potencial pedagógico do game para a aprendizagem da
argumentação. (Cf. ALVES; VIEIRA, 2022). Esse game está disponível na Play Store do sistema Android.
38
Pernambuco (UFPE). Primeiramente foram identificadas as seguintes carac-
terísticas: título do game, local de hospedagem com o link e o componente de
ensino de Língua Portuguesa contemplado. A análise da estética dos games se
fez com base nas três dimensões presentes no estudo de Alves (2014): Mecânica,
Dinâmica e Componentes (quadro 1).

I - Jogo Cordel Game14

Como o próprio nome indica, esse jogo foi desenvolvido para o ensino e
aprendizagem da literatura de cordel. É composto por quatro atividades, sendo
três delas contextualizadas por recitações de cordéis, havendo uma sobre lendas
piauienses. O design chama atenção por se assemelhar às imagens de xilogravura,
técnica de gravura popular no Nordeste
Há uma exploração da linguagem multimodal, com a presença de imagens,
vídeos e áudios, que facilitam o envolvimento do jogador. Em relação aos três
aspectos já citados, destaca-se a diversidade de desafios apresentados na Mecânica,
devido à presença do quizz, do jogo de rimas e do jogo de memória. Além disso,
cada tarefa traz uma missão clara e alcançável que possibilita o estado de vitória.
Quanto à Dinâmica, para a resolução das atividades, o jogador precisa,
primeiro, assistir à reprodução dos cordéis, sendo que algumas perguntas exigem
um conhecimento prévio sobre o tema, o que se chama constrição, elemento que
serve para ‘dificultar’ a experiência e tornar o jogo mais desafiador. No que se
refere aos Componentes, evidencia-se as representações visuais que caracterizam
o game, como o avatar, representado por um cordelista, reconhecido pelo chapéu,
as roupas e a viola que compõem o perfil.

II - Jogo Referenciais Game15

O jogo é dividido em três sessões que contemplam os seguintes com-


ponentes do ensino de Língua Portuguesa: gêneros textuais, coesão e coe-
rência e processos referenciais.
Acerca dos elementos presentes na Mecânica, constata-se um desafio para
cada fase, sendo ao todo dez desafios. Como recompensa pelos pontos conquistados,
o jogador é presenteado com um troféu ao fim de cada atividade.

14
Local de hospedagem: Play Store Link: https://play.google.com/store/apps/details?id=com.blackholegames.cordel
15
Local de hospedagem: Play Store Link: https://play.google.com/store/apps/details?id=com.wellmath.referenciais.game
39
Para a Dinâmica, o sistema de pontuação do jogo é a sua maior constri-
ção, pois só é possível concluir uma fase se acertar todos os exercícios, sendo
que uma resposta errada elimina 50 pontos. Isso torna a experiência desafia-
dora e instigante para o aluno.
Quanto aos Componentes, o game tem uma particularidade: seus avata-
res, são inspirados em professores de Linguística de universidades piauienses. O
elemento badges, que se refere às realizações visuais do jogador, é representado
pelos efeitos de fogos de artifícios a cada resposta certa, com a mudança de cores
de acordo com a resposta, e pelos troféus conquistados.

III - Jogo Continho16

Nesse jogo o componente de ensino contemplado é o gênero miniconto.


Com um design criativo, o game situa o jogador em um mapa com baús de tesouro
no meio do caminho, onde estão dispostas 10 atividades, cada uma contendo
quatro questões de múltipla escolha.
No tocante à Mecânica, observa- se a presença de recompensas, que ocorre
quando se conclui uma atividade e a próxima é destravada, sendo representada
por um baú do tesouro abrindo. No fim de todas as atividades concluídas, o
jogador recebe um feedback o parabenizando pelo seu desempenho, e ainda res-
saltando a importância de seu esforço.
Em relação à Dinâmica, chama atenção a narrativa construída que proporciona
sentido para o jogo. Nela o personagem Continho tem como ponto de partida a
escola e quer chegar à universidade, simbolizando um momento de transição em
sua vida. Nesse percurso, aparecem baús do tesouro, os quais o personagem vai
adquirindo à medida que o jogador acerta as questões.
Sobre os Componentes, identificam-se como principais aplicações visuali-
zadas o avatar, representado pelo personagem Continho, e as badges, retratadas
pelos baús de tesouro que devem ser destravados.

IV - Jogo Operador Argumentativo ‘mas’17

O título do game já indica o componente de ensino contemplado por esse


jogo, que é a conjunção adversativa. Diferente dos jogos já descritos, este é dis-

Local de hospedagem: Play Store Link: https://play.google.com/store/apps/details?id=alberto.com&hl=pt_BR&gl=US


16

Local de hospedagem: Plataforma Kahoot


17

Link: https://create.kahoot.it/share/operador-argumentativo-mas/442d9b87-e346-439b-9b7f-2fc3dad6f9ae
40
ponibilizado pela Plataforma Kahoot, que trabalha com jogos educacionais e já é
aliada de muitos professores da Educação Básica por ser simples e intuitiva para
a aprendizagem dos estudantes.
O jogo consiste em um quizz com 10 questões sobre o uso do operador argu-
mentativo “mas”. No que diz respeito à Mecânica, destacam-se as mensagens de
feedback que o jogador recebe ao acertar e ao errar uma questão, sendo que no caso dos
erros surgem mensagens de incentivo e motivação para o jogador tentar novamente.
Acerca da Dinâmica, nota-se a presença de um cronômetro que dispõe 90
segundos para a resolução de cada questão. Por ser algo que restringe o tempo do
jogador é considerado um elemento de constrição.
Já nos Componentes, há o desbloqueio de conteúdo, pois o participante tem
a possibilidade de conquistar um emoticon, e para isso ele precisa acertar todas as
questões e fazer uma pontuação maior que os outros jogadores que já jogaram o
quizz. Além disso, há a presença de um placar, no qual, ao fim de cada questão, é
mostrada para o jogador sua posição.

V - Jogo Palavras Terminadas em ‘am’18

O componente de ensino contemplado nesse jogo é o tempo verbal e, assim


como o game anterior, este também foi elaborado na plataforma Kahoot, consis-
tindo em um quizz de 14 questões sobre o uso de palavras terminadas em “am”.
A constituição e organização é bastante semelhante à do jogo IV, sendo
que até mesmo as mensagens do feedback são iguais. Uma diferença é o tempo
de cronômetro, que diz respeito à constrição, pois neste jogo o tempo disposto
é de 240 segundos. Constata-se que em relação aos outros jogos, os dois dis-
ponibilizados pela plataforma Kahoot apresentam estética mais simples, com
poucos elementos em cada dimensão.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Para além das especificidades em cada game, são identificáveis itens em


comum. A título de exemplificação, nota-se que os cinco jogos apresentam feedbacks
construtivos, o que está relacionado ao seu caráter educativo, e todos exigem um
conhecimento prévio do aluno para resolver as questões, tomando como base o
nível de ensino em que eles se encontram. Além disso, as emoções são exploradas,
Local de hospedagem: Plataforma Kahoot
18

Link: https://create.kahoot.it/share/palavras-terminadas-em-am/3e79813c-cd36-4a7e-9431-2044ee0d45e9
41
com recompensas e vitórias, que estimulam o desempenho do aluno e, ao mesmo
tempo, com fracassos e constrições, que não os desmotivam, mas os desafiam. Há a
exploração da linguagem multimodal, já que o jogador tem contato com imagens,
sons e vídeos, e os designs são criativos e atrativos.
Observou-se que os jogos disponibilizados pela Plataforma Kahoot dispõem
de menos elementos devido à sua estrutura mais simples, no entanto isso também
pode ser encarado como uma vantagem para o ensino-aprendizagem, já que, por
ser mais intuitivo, o aluno responderia todas as questões com menos dificuldade.
A partir dos resultados reafirmamos o impacto benéfico dos estudos como
o que desenvolvemos no ambiente educacional, visto que podem orientar profes-
sores de Língua Portuguesa da Educação Básica para a inserção dos games em
sala de aula e ainda enriquecer o processo formativo dos licenciandos dos cursos
de Letras Português – futuros professores.

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ESPecialist: Descrição, Ensino e Aprendizagem, v. 38, n. 1, p. 1-20, jan./jul. 2017.

42
O GRUPO COMO LÓCUS DE TRANSFORMAÇÃO
SOCIAL: RELATO DE UMA INTERVENÇÃO EM
CONTEXTO ESCOLAR

Nicole Soares Resende19


Luísa Guimarães Moreira20
Beatrice Verdelho Lodovico21

INTRODUÇÃO

A forma com que a educação brasileira é compreendida hoje não se dá


sem razões; e a história está aí para contar o que o cotidiano nas escolas desvela,
mesmo quando se tenta dissimulá-lo. Sua herança adaptacionista, autoritária,
religiosa, elitista e segregadora arrasta-se desde o período colonial. Desde então, a
educação “[...] serviu apenas a uma determinada camada social, em detrimento das
outras camadas da sociedade que permaneceram iletradas e sem acesso à escola”
(MARÇAL RIBEIRO, 1993, p. 28). Em todo o percurso histórico, econômico e
social galgado até então, o Brasil nunca teve a educação como prioridade em seus
investimentos, corroborando para a manutenção da classe dominante.
A figura do professor, perpassada por ferramentas tecnicistas e por uma
concepção de ensino fragmentada, constituiu-se sem criticidade do seu fazer
pedagógico na cotidianidade: preconceitos povoam o contexto do ensino e a rea-
lidade social dos indivíduos tornou-se um lugar fecundo para a culpabilização das
crianças e da família, possibilitando diagnósticos e intervenções medicamentosas.
Além disso, vê-se uma lógica mercadológica, típica do neoliberalismo, em que a
educação se tornou também um produto (COLLARES; MOYSÉS, 2011).
Frente a tais problemáticas são comuns discursos conformistas, para os quais
não existem culpados e a transformação social é utopia. Assim,
É visível, nesse discurso, a ausência de menção à exploração, à desi-
gualdade social de oportunidades, à dominação cultural e às práticas
sociais de exclusão. Nele tudo se passa como se, de um lado, o sistema
escolar fosse “eliminando os menos capazes” e, de outro, como se não

19
Mestranda em Psicologia (UFG). CV: http://lattes.cnpq.br/6085596930626159
20
Graduada em Psicologia (UFCAT). CV: http://lattes.cnpq.br/4263500982870196
21
Graduada em Psicologia (UFG). CV: http://lattes.cnpq.br/5051007343548823
43
houvesse recursos suficientes para melhorar a qualidade da educação
popular (PATTO, 1997, p. 23).

Neste sentido, o modelo de escola que impera no Brasil não é capaz de


ensinar os conteúdos escolares à grande maioria de seu público, o que faz com
que os índices de evasão escolar sejam altíssimos.
De um modo geral, nota-se que a instituição escolar foi construída nos moldes
da elite e se tornou direito de toda população apenas no processo de democratização
brasileira. Entretanto, não foram realizadas alterações estruturais nesse ambiente
e as camadas pobres da sociedade foram obrigadas a frequentar um espaço que os
coloca em posição passiva diante do processo de ensino aprendizagem, ao passo
que os responsabiliza quando não atendem às expectativas postas (SOUZA, 2008).
Lane (1984, p. 88) pondera que “na medida em que os papéis são desempe-
nhados como ‘naturais’, os indivíduos têm pouca consciência de sua participação
no grupo”. Esse processo leva à cristalização de papéis e consequentemente, à
negação de toda atividade reflexiva que questione as imposições sociais e gere
conflitos, preservando a condição de alienação do grupo.
O contexto escolar é um âmbito fecundo para a produção e reprodução
de papéis sociais consuetudinários, mas também para a sua superação, dado que
“[...] as contradições fundamentais se dão no nível da ação e da interação grupal,
onde o exercício da dominação tenderia a gerar contradição e negação da própria
dominação (através dos papéis).” (LANE, 1984, p. 86).
Considerando o exposto, pretende-se refletir, através do relato de uma
intervenção em contexto escolar, em que medida o grupo pode ser considerado
um lócus de transformação social e repensar o papel do psicólogo inserido em
tal instituição. Esta pesquisa se justifica, pois, a escola possui uma importante
função social na produção e reprodução das relações de dominação e emanci-
pação e o estudo de pequenos grupos, inseridos no âmbito escolar, impulsiona a
compreensão da relação entre indivíduo-sociedade, visto que é através deles que
as contradições sociais se materializam.
Este estudo é fruto da experiência de Estágio Curricular Obrigatório em
Processos Psicossociais e Comunidade I e II do curso de Psicologia da Universidade
Federal de Goiás, regional Catalão. Trata-se de um trabalho desenvolvido em uma
escola municipal da cidade de Goiandira, no interior de Goiás, no ano de 2019.
Por fim, o que um grupo com crianças tem a dizer sobre transformação e
emancipação social? Sabemos ouvir as crianças? Somos partícipes das mudanças
44
sociais nos contextos de pesquisa-ação? Estas ponderações perpassaram este tra-
balho e constituem um convite para a reflexão que se segue.

CAMINHANDO PELA TEORIA

A Psicologia Social, sobretudo a partir das contribuições de Lane (1984),


propôs uma redefinição em seu bojo teórico e a concepção de grupo abandonou
a oposição entre indivíduo e sociedade. Assim, adotou uma perspectiva que busca
conhecer as determinações sociais que atuam na vida cotidiana do indivíduo e sua
atividade enquanto sujeito histórico e social, visto que “[...] toda ação transformadora
da sociedade só pode ocorrer quando indivíduos se agrupam” (LANE, 1984, p. 78).
Desta forma, o plano superestrutural é reproduzido de acordo com a histó-
ria de vida de cada sujeito através de instituições que determinam papéis sociais
bem delimitados, os quais são interiorizados de forma naturalizada e alienam
o sujeito quando cristalizam seu vir a ser. Apesar da alienação fundamental do
homem, provocada pela socialização, o grupo pode ser encarado tanto como
um lócus da transformação social, quanto de reprodução e manutenção do sis-
tema vigente, de modo que para compreender o indivíduo, é sempre necessário
recorrer ao seu grupo pertencente.
Heller (1970) pondera que os papéis sociais são o resultado de fatores dados
antes mesmo da existência de sua função, de modo que é perfeitamente possível
que haja uma inadequação do sujeito frente à sua representação, fazendo com que
as relações deixem de ser “[...] elementos qualitativos para serem apenas quantita-
tivos” (HELLER, 1970, p. 93). É através da interação grupal que as contradições
fundamentais emergem, fazendo com que o sistema de poder gere contradições
e consequentemente, negue a dominação em seu cerne.
Lane (1984) assevera que a emergência de uma consciência histórica se
dá tão somente quando o nível das determinações concretas, ou seja, dos papéis
sociais, rompe com as representações ideológicas no nível das vivências subjetivas,
fazendo com que as contradições desapareçam e deem lugar a uma práxis trans-
formadora. O processo de conscientização se dá para cada sujeito em seu tempo
e à sua maneira, razão pela qual, não raro, surgem contradições difíceis de superar,
levando ao rompimento do grupo antes mesmo de alcançar a conscientização.
Neste sentido, a escola constitui, segundo Berger e Luckmann (1999), o
espaço em que a criança se insere na socialização secundária, na qual encontra novas
referências para além das interiorizadas na socialização primária, através do âmbito
45
familiar. Logo, a instituição escolar e todos os seus atores colaboram para a cons-
trução da identidade da criança, corroborando para sua alienação ou emancipação.
Em direção à alienação, não raro são os estigmas perpetuados pela instituição
escolar. Machado (2006 apud Souza, 2008) diz que os comportamentos ‘indesejados’
apresentados pelas crianças, produzem nos professores a sensação de não estarem
preparados para trabalhar com a presença destas na sala de aula, ou a sensação
de que os problemas familiares são tão intensos que não seria possível ensiná-las.
Essa compreensão de que o problema está na criança que não se adequa ao
sistema e não na inflexibilidade da instituição através dos anos, gera uma reação
em cadeia de segregações e estigmatizações sistemáticas e institucionais. Pescarolo
(2011) aponta a existência da ideia de que esses alunos que não se adequam podem
‘contaminar’ aos demais com seus comportamentos. A partir dessa concepção,
professores e famílias trabalham em uma segregação sistemática para evitar a
mudança naqueles alunos que se encaixam nas regras da escola e às suas exigências.
Além disso, também acontecem situações em que professores não investem
atenção ou energia a determinados alunos motivados por estigmas de raça, classe
ou gênero e esse tipo de atitude pode criar no aluno um sentimento de abandono,
desistência e a sensação de que sua escolarização não é relevante para seu professor.
Sobre isso, Pescarolo (2011) aponta que
A falta de investimento, até mesmo afetivo promove mudanças
significativas no eu desses alunos, no esquema de auto-imagem
que esses alunos têm de si e na forma como julgam o mundo,
como aponta Goffman (2008). Por isso, encontramos uma série
de profecias que os professores verbalizam e acabam se reali-
zando, não porque esses professores teriam o poder de antever
o futuro, mas porque ao julgarem certos alunos incapazes,
alteram a capacidade desses alunos acreditarem em si mesmos
(PESCAROLO, 2011, p. 63).
E como isso acontece sem que a instituição perceba os nexos causais entre
o comportamento institucional e a reação dos alunos, a escola sempre reforça suas
crenças e impressões sobre o perfil dos estudantes. Neste sentido,
Não cabe à escola, tentar rotular as crianças que são agitadas, ou que
não possuem uma conduta condizente com as regras estabelecidas
pela escola, para assim não produzirem ‘alunos-problemas’, mas sim
desenvolver coletivamente no diálogo com os alunos, maneiras de
envolvê-los no processo pedagógico [...]. (SOUZA, 2008, p. 34-35).
46
Moysés & Collares (1992, apud Souza, 2008) teorizam sobre a ‘patologização
do processo ensino aprendizagem’, que aponta como causa das ‘dificuldades’ dos
alunos, alguma doença ou transtorno, justificando o fracasso escolar por razões
exclusivas do aluno e da família. Assim, a escola encaminha seus alunos para
neurologistas, psiquiatras, psicólogos ou psicopedagogos, produzindo a chamada
medicalização e eliminando qualquer possibilidade de se discutir os problemas
pedagógicos e sócio-históricos da escola.
Paulo Freire (1997) tece sobre a educação bancária, na qual o aluno é um
mero receptor de múltiplas informações sobre diversas disciplinas, não tem seu
senso crítico-reflexivo estimulado, e ainda, é testado e comparado com o restante
dos alunos. Quanto mais se incentiva a adaptação e o ajustamento, menos desen-
volve-se o senso crítico, portanto, formar-se-ão, alunos ignorantes.
O autor fala em sua teoria, que a libertação do sujeito vem através da edu-
cação, que deve ser problematizadora, levando-o a entender a realidade como uma
constante transformação. Porém, o cenário que se descortina é de uma sociedade
que cada vez mais incentiva a educação do silêncio e dos comportamentos ‘ade-
quados’, e o que prevalece é a disciplina e não a educação. A ‘domesticação’ da
realidade é um fator inerte para que o aluno jamais desperte o senso crítico para
as contradições do mundo e de si mesmo (FREIRE, 1997).
É neste contexto que a Psicologia se insere. Não obstante, é necessário consi-
derar as vicissitudes sofridas pela Psicologia Escolar no Brasil no decorrer dos anos.
a regulamentação da profissão de psicólogo, em 1962 trouxe em seu bojo, o caráter
clínico com ênfase no psicodiagnóstico, na psicoterapia, nos exames psicológicos
e principalmente no atendimento individual com referencial médico (SOUZA,
2009). Desta forma, a Psicologia Escolar reduziu a nível individual, fatores sociais.
Posteriormente, a reorientação da Psicologia através da articulação com
as Ciências Sociais e a Filosofia ampliou suas considerações teóricas, fazendo
com que os embates manifestos nas relações de poder se tornassem aspectos
fundamentais para compreender a constituição da subjetividade humana. Com
isso, o homem enquanto ser abstrato foi gradativamente substituído pelo homem
concreto, sócio-histórico, não mais definido por um psicologismo reducio-
nista e mistificador (SOUZA, 2009).
Apesar de tais avanços, não é rara a condecoração exacerbada, nas escolas,
dos aspectos cognitivos envolvidos na questão pedagógica. Loureiro (1997) evi-
dencia que a Psicologia Escolar não deve ser considerada simplesmente como a
47
muleta da Educação, é imprescindível que ela atue de modo a questionar como
esta é ofertada pelas instituições. Sendo assim,
A psicologia encontra-se como uma das disciplinas que precisa
ajudar o professor a desenvolver conhecimentos e habilidades,
além de competências, atitudes e valores que o possibilite ir
construindo seus saberes-fazeres docentes a partir das neces-
sidades e desafios que o ensino, como prática social, lhes coloca
no cotidiano. (RAPOSO, 2006, p. 2).
Vê-se, portanto, que a Psicologia Escolar, enquanto ciência e profissão, deve
construir um conhecimento crítico e responsável frente aos ataques históricos à
democratização da educação, enfrentando a medicalização, a patologização e a
judicialização da vida dos estudantes e professores. Além disso, o envolvimento
da categoria com as políticas públicas possibilita a superação dos estigmas sociais,
respondendo às demandas urgentes de violência, discriminação, desigualdade,
intolerância, exclusão social e tantas outras (SOUZA, 2009).
Segundo Reboredo (1994), a atuação do psicólogo social implicado nas trans-
formações sociais, deve elevar-se à condição de práxis, assumindo uma dimensão
política e epistemológica inspirada no materialismo histórico dialético. Portanto:
[...] o trabalho com grupos assume a condição de lócus pri-
vilegiado de ação para o psicólogo social à medida que este
espaço permite reavaliar as relações sociais que podem ou não
manter estruturas sociais e políticas que facilitam a opressão e
a exploração. (REBOREDO, 1994, p. 24)
Scisleski; Maraschin e Tittoni (2006) apontam que na intervenção, a preo-
cupação do psicólogo deve estar voltada para a mudança nas condições de vida da
população em sua cotidianidade, sendo de sua própria responsabilidade, levantar
as problemáticas para a ação. Sendo assim, a atuação mais coerente constitui a
investigação a posteriori, na qual as demandas, dificuldades e problemas vividos
pelo grupo são mapeadas, para só depois haver o levantamento dos objetivos para
o trabalho de intervenção, em um processo decisório-participativo, no qual tanto
profissional quanto comunidade irão discutir horizontalmente sobre as questões
a serem consideradas e as formas de enfrentamento para elas.
Apesar da história mostrar como a educação brasileira ainda é reprodutora
de práticas arcaicas, é com o entendimento do ser humano enquanto metamorfose

48
que a ação do psicólogo se faz práxis, ao compreender que estudante, família, escola
e professor se produzem mutuamente.

QUANDO A SEXUALIDADE INCOMODA MUITA GENTE

No segundo semestre letivo de 2019, iniciou-se os trabalhos com o 5°C.Esta


turma era caracterizada pela escola como o melhor 5° ano. Tratava-se da sala na
qual estavam reunidos os alunos mais inteligentes e que obtinham as melhores
notas nas avaliações. Há que se considerar a premissa de Soares (1997) de que a
avaliação cumpre o papel de instrumento de controle das oportunidades e desi-
gualdades sociais, de modo que o mérito se torna um mantenedor da hierarquia
social, fazendo com que as crianças saibam exatamente sobre sua posição de
“melhores alunos” em relação ao 5°A e utilizem deste poder para menoscabar os
colegas da mesma sala que não consideram suficientemente bons para estar ali:
“você devia voltar para o 5°A”.
Consequentemente, a interrogação inicial que perpassou o estágio em tal
turma foi: Qual é o peso de ser o melhor 5° ano da escola? Realizou-se com a
turma uma vivência de quebra-gelo para conhecer melhor as crianças e encontrar
as demandas do grupo. O intuito era que eles se apresentassem e através de mími-
cas falassem um pouco sobre suas características pessoais. A reação das crianças,
desde o início, foi de antecipação das mímicas dos colegas, visto que elas buscavam
sempre rotular umas às outras, dificultando o processo de reflexão sobre si. Além
disso, não esperavam que a mímica terminasse para adivinhar do que se tratava.
Por fim, apresentaram mais coisas que gostam de fazer do que as características
em si, tais como escrever, dançar congo, jogar free fire, comer, dormir, desenhar,
navegar no celular, conversar, lutar, brigar, jogar videogame, jogar futebol e fazer o
passinho dos malokas. Quando foi pedido que sugerissem temas, o mais recorrente
foi bullying e destacaram que este está muito presente na turma. Via-se que as
crianças já sabiam muito bem do que se tratava a temática e inclusive relataram
que eram praticantes e/ou vítimas. A questão era, por que desejavam falar sobre
algo que já conhecem e sabem que existe entre eles?
Durante a vivência, notou-se que, assim como no 5°A, as meninas se expres-
savam muito menos que os meninos, os quais acreditavam dominar qualquer
assunto e sempre as silenciavam quando desejavam falar. Já no primeiro encontro,
observou-se muita violência de gênero, expressa em palavras como “isso não é coisa
de menino”; “menina não pode jogar futebol”. Não obstante, percebeu-se também,
49
um forte posicionamento de algumas meninas frente ao seu desejo: “eu não gosto
de brincar nem de boneca, nem de boneco, gosto de jogar futebol”.
Estas meninas demonstraram não se sentirem à vontade na alienação e
recusaram o papel social de garotas que brincam apenas de boneca. Heller (1970)
pondera que numerosos papéis sociais já estão dados na vida social do homem
e é através da imitação que ele assimila modos de conduta e ação. O indivíduo
não se coloca diante de seu conceito abstrato, mas sim do ideal representado por
ele e que garante o funcionamento da sociedade, de modo que os meninos, ao se
identificarem com o ideal de masculinidade ativa e onipotente, presente na coti-
dianidade, sequer poderiam brincar de adedonha, por considerá-la um jogo de
meninas. Essas reações mecânicas oferecidas pelo sistema de papéis, conduzem
a convivência de modo naturalizado, fazendo com que a maioria das crianças
realmente acredite que não pode subverter a ordem posta de que meninas não
devem fazer o que os meninos fazem; e vice-versa.
Considerando o exposto, optou-se por refletir sobre preconceito e as dis-
cussões foram conduzidas no sentido de repensar também sobre as relações de
gênero. Um dos encontros mais marcantes foi em uma oficina de cartazes, na qual
a turma foi dividida em 3 subgrupos e pediu-se que cada um deles criasse uma
estória que falasse sobre bullying e a encenasse. Curioso foi o fato de que todas
as cenas tinham o mesmo conteúdo, mas com finais diferentes.
O primeiro representou um grupo de meninos que queriam beijar as meni-
nas, mas que foram recusados, após uma abordagem invasiva, sendo violentados
pelas meninas com falas como “não gosto você, seu macaco”. Depois de um tempo
uma das meninas decidiu namorar com um deles, deixando outro colega nervoso,
o que fez com eles representassem uma cena de agressão física. Neste ínterim, as
meninas concluíram que o melhor era não ficar com nenhum deles, ao que um
dos meninos fugiu do combinado no roteiro criado pelo grupo e puxou uma delas
pelo braço, afirmando: “você vai ficar comigo sim”.
O segundo grupo não conseguiu concluir a sua estória, cuja narrativa ini-
ciou-se com os meninos, em uma postura totalmente ativa, pedindo as meninas
em namoro. Já o terceiro grupo, escolheu uma cena reversa das demais. Foram
as meninas quem pediram os meninos em namoro, mas foram surpreendidas
por sua recusa violenta: “não quero, você é feia”. Posteriormente, abriu-se para a
roda de conversa, a partir da qual se buscou refletir sobre o papel do homem e da
mulher nos relacionamentos. A partir disso, surgiu também o assunto de “beijo
50
roubado” e todas as crianças afirmaram que isto é algo bom, sendo ruim apenas
se a menina tiver namorado. Essa fala foi proferida por uma menina e seguida do
questionamento surpreso de um dos colegas: “isso é agressão física?”.
A pergunta repleta de espanto desta criança e o silêncio que se seguiu das
demais, demonstrou o quanto estava naturalizado no grupo, a ideia de que a mulher
deve aceitar passivamente todas as escolhas dos homens, de modo que o que baliza
a questão entre certo e errado, é a presença de outro homem (o namorado). Logo,
só é agressão se ferir a outro homem, relação na qual a mulher se quer existe, por
ser totalmente objetificada. Neste sentido percebe-se que
[...] uma função da linguagem é a mediação ideológica ine-
rente nos significados das palavras, produzidas por uma classe
dominante que detém o poder de pensar e ‘conhecer’ a realidade,
explicando-as através de ‘verdades’ inquestionáveis e atribuindo
valores absolutos de tal forma que as contradições geradas pela
dominação e vividas no cotidiano dos homens são camufladas e
escamoteadas por explicações tidas como verdades ‘universais’
ou ‘naturais’, ou, simplesmente, como ‘imperativos categóricos’
em termos de ‘é assim que deve ser’ (LANE, 1984, p. 34).
A partir da mediação ideológica provocada pela linguagem, diante da domi-
nação naturalizada exercida pela masculinidade, o cenário que se descortinava
era de meninas que sempre ficavam sentadas e em uma postura completamente
passiva, enquanto os meninos andavam pela sala, falavam alto e proferiam cantadas
desrespeitosas direcionadas a elas. Também, representaram uma figura masculina
com postura “descolada” e que fumava maconha, exteriorizando assim, a caricatura
fetichizada de homem que impera no imaginário do grupo.
Na roda de conversa, a maioria das crianças afirmou que o homem deve
assumir o papel daquele que é ativo, pedir a mulher em namoro e ter as primeiras
iniciativas na relação. Além disso, notou-se que mesmo no contexto em que o
menino não era diretamente ativo, ainda era ele quem dominava a situação, recu-
sando o pedido de namoro da menina de maneira violenta.
Portanto, foi necessário continuar trabalhando a temática equidade de gênero.
Foi realizada uma oficina de cartazes, na qual solicitou-se que cada subgrupo dese-
nhasse como deveria se portar um homem e uma mulher na sociedade, na escola, na
família e no namoro. No cartaz produzido pelo grupo majoritariamente composto
por homens, a figura feminina apareceu muito estereotipada, com papéis sociais
delimitados, de tal modo que a única garota do grupo recusou a estigmatização
51
de seu papel social enquanto mulher e afirmou: “vocês são idiotas, porque eu sou
a mulher e vocês estão colocando tudo errado”. Também, abordaram muito os
temas sexo e masturbação, com o foco sempre na atividade masculina.
Já o outro grupo, composto prioritariamente por meninas, fez um desenho
no qual a mulher aparecia sempre como aquela que cuida, que fica com a família,
que é comportada e estudiosa. Na discussão, as meninas consideraram ser “normal”
que os meninos falem sobre sexo e sexualidade, mas para elas, esse assunto só
poderá ser abordado a partir dos 18 anos. Declararam também que o sexo serve
somente para a reprodução, enquanto os meninos consideram-no como fonte de
prazer e se surpreenderam com a resposta ao questionamento de que a menina
pode se masturbar e consequentemente, sentir prazer.
Lane (1984) afirma que é justamente a partir deste questionamento da
realidade, que a contradição é enfrentada e repensada, levando o sujeito a refletir
sobre sua própria ação e consequentemente, conscientizar-se diante do confronto
com a ideologia que sustentara seu pensamento até então. É inegável o fato de
que todo ser humano é fundamentalmente alienado, entretanto, quando as con-
tradições emergiram dentro do próprio grupo, através dos questionamentos de
algumas crianças e do posicionamento de outras, viu-se, minimamente, o rom-
pimento das determinações concretas, baseadas em papéis sociais ancorados na
vivência subjetiva, pautada por ideologias que massacram, delimitam e determinam
posições masculinas e femininas.
Assim, as relações que antes estavam restritas ao permitido e fundamentas
na manutenção do status quo, foram questionadas pelas próprias crianças e, por-
tanto, repensadas no nível das vivências subjetivas, provocando novas considera-
ções sobre as determinações concretas que elas têm assumido e que podem vir a
assumir. É neste âmbito que o grupo se faz lócus de transformação social, pois
“[...] as contradições fundamentais se dão no nível da ação e da interação grupal,
onde o exercício da dominação tenderia a gerar contradição e negação da própria
dominação (através dos papéis)” (LANE, 1984, p. 86). Quando qualquer questão
incomoda muita gente e neste caso, especificamente, a sexualidade, eis a assunção
da consciência histórica, ou ainda, da práxis transformadora.

CONCLUSÃO

O trabalho desenvolvido com as crianças do 5°C permitiu analisar os papéis


sociais assumidos por estas e observar em que medida eles precedem ao grupo.
52
Notou-se que a reprodução naturalizada dos diversos preconceitos emergentes
não se originou com o grupo, visto que o ser humano nasce em um mundo já
repleto de significações (HELLER, 1970). Esta constatação é reconfortante, na
medida em que permite pensar o sujeito como um vir a ser constante, a partir
do qual pode ele se transformar.
O movimento do grupo permitiu a reflexão acerca dos papéis sociais repre-
sentados por cada um. A recusa de muitos em relação às vivências subjetivas que
não encontravam correspondência com as suas determinações concretas, fez
emergir entre o grupo, a consciência histórica. Destaca-se que as vivências não
atingiram a todas as crianças com a mesma intensidade e é justamente este fato
que corrobora as premissas da Psicologia Social Crítica, segundo a qual cada
indivíduo deve ser considerado na materialidade sempre histórica e dialética da
sua vida cotidiana (LANE, 1984).
Vê-se, portanto, a relevância de dar voz aos sujeitos historicamente silenciados
por um processo de escolarização que na atual conjuntura brasileira, visa manter toda
a estrutura consuetudinária de ideologias e papéis sociais. O sistema educacional está
em crise devido à inadequação das escolas ao ritmo mais veloz dos acontecimentos
que os rodeiam e assim, permanece sem criticidade quanto à oferta de um ensino
que acolha a diversidade cultural e socioeconômica dos alunos (PATTO, 1997).
Urge criar estratégias criativas para trabalhar em sintonia com a instituição
em oposição à concepção do senso comum de que a psicologia é um entrave ao
exercício dos outros profissionais, para assim, consolidar uma nova representação
do psicólogo acerca do trabalho desenvolvido no espaço escolar, que esteja de fato,
comprometida com as transformações sociais.

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54
A (IN)VISIBILIDADE DOS DIREITOS HUMANOS NOS
CURSOS DE LICENCIATURA EM EDUCAÇÃO FÍSICA
DE UNIVERSIDADES FEDERAIS BRASILEIRAS

Lana Lisiêr de Lima Palmeira22


Carla Priscilla Barbosa Santos Cordeiro23
Antonio Gottschlisch do Prado24
Edna Cristina do Prado25

INTRODUÇÃO

Este trabalho tem como objeto de investigação a formação dos futuros


profissionais de Educação Física no Brasil, a fim de entender se os elementos que
dão corpo à Educação em Direitos Humanos estão inseridos na referida forma-
ção e, em estando, se essa presença se dá de forma satisfatória no sentido não só
de formar pessoas para o exercício de uma profissão, aptas a desenvolverem tão
somente saberes e competências técnicas da sua atuação específica, mas sim se busca
trabalhar verdadeiramente a pessoa na sua integralidade, isto é, em uma visão mais
ampla que permita desenvolver, dentre outros aspectos, senso crítico, capacidade
reflexiva e outros fatores que geram o empoderamento individual e coletivo, capaz
de tornar essas pessoas sujeitos de direitos na acepção mais ampla do vocábulo.
Em outras palavras, significa dizer que, diante do cenário atual, em que
parece preponderar a preparação para empregabilidade, seguindo os ditames
mercadológicos do capital, nota-se por diversas vezes a existência de currículos
organizados em núcleos rígidos voltados para o ensinamento de matérias direcio-
nadas meramente à formação técnico-profissional, deixando em segundo plano a
formação humanística, razão pela qual se entendeu necessário o presente estudo,
cuja abordagem iniciou com a discussão dos conceitos mais elementares em torno
da Educação em Direitos Humanos, dando abertura a um caminho que condu-
ziu ao que está preconizado nas Diretrizes Curriculares Nacionais que regulam

22
Pós-doutorado em Educação (UFS). Doutorado em Educação (UFAL). Professora Adjunta (UFAL).
CV: http://lattes.cnpq.br/9538287578494559
23
Doutorado em Educação (UFAL). Professora CV: http://lattes.cnpq.br/8044884748837865
24
Bacharelado em Educação Física (ESEF). CV: http://lattes.cnpq.br/2965012641606246
25
Doutorado em Educação Escolar (UNESP). Pós-doutorado em Educação (IE/UL). Professora Associada (UFAL).
CV: http://lattes.cnpq.br/8158728896858544
55
os cursos de Educação Física no Brasil, chegando ao ápice do estudo, a saber: a
análise dos projetos político-pedagógicos e currículos dos referidos cursos no país.
Com as delimitações acima apresentadas e assumindo uma natureza quali-
tativa, optou-se por utilizar a Análise de Conteúdo como técnica de análise que
objetiva a inferência de conhecimentos pertinentes às condições de produção e
recepção das mensagens enunciadas e teve início o acesso ao sistema eletrônico
de acompanhamento dos processos que regulam a educação superior no Brasil
(e-MEC), no qual estão catalogadas 2131 instituições de ensino com o curso de
Educação Física, conforme tabela abaixo.

Tabela 1: Número Total de Instituições de Ensino que ofertam o curso de Educação Física, divi-
didas por categoria administrativa
Categoria Administrativa Total
Pública Municipal 39
Pública Federal 128
Pública Estadual 167
Privada sem fins lucrativos 745
Privada com fins lucrativos 1036
Especial 16
Total Geral 2131

FONTE: Ministério da Educação – Sistema e-MEC, 2021.

Todavia, partindo para uma análise pormenorizada, verificou-se que dessas


IES, existem, de fato, 1925 em atividade, sendo que, ao realizar uma subdivisão por
categoria administrativa, tem-se que 36 delas são instituições públicas municipais;
124 são públicas federais; 153 são públicas estaduais; 691 são privadas sem fins
lucrativos; 906 são privadas com fins lucrativos e 15 se encaixam na categoria de
instituições especiais de ensino.
Focando a atenção apenas nas 124 instituições Públicas Federais em ati-
vidade, passou-se a analisar cada uma delas com o intuito de verificar se a oferta
do curso acontece como bacharelado ou licenciatura. Neste sentido, no tocante
ao grau conferido, tem-se 42 cursos de bacharelado e 82 cursos de licenciatura
Ressalta-se que, diante da impossibilidade de analisar todas as instituições
de ensino que ofertam o curso de Educação Física no Brasil, adotou-se, como
critérios de seleção, apenas os projetos político-pedagógicos e matrizes curriculares
das universidades federais com cursos de licenciatura. Tal critério de escolha se
deu em face da licenciatura preparar o estudante para a docência e, assim sendo,
56
merecendo ter uma melhor fundamentação nos pilares da Educação em Direi-
tos Humanos. Mais dois critérios de seleção também foram elencados: apenas
cursos de licenciatura presenciais e os mais antigos de cada região brasileira. Dos
82 cursos de licenciatura, 72 se dão na referida modalidade e as cinco univer-
sidades que possuem os cursos mais antigos em suas regiões são: Universidade
Federal do Espírito Santo (UFES), na região Sudeste, criada em 24/09/1936;
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), na região Sul, criada em
27/05/1941; Universidade Federal do Amazonas (UFAM), na região Norte, criada
em 24/02/1969; Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), na região Nor-
deste, criada em 01/09/1972 e Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT),
na região Centro-oeste, criada em 10/12/1970.
Com o corpus delimitado, passou-se à escolha das categorias analíticas,
quais sejam: presença da disciplina Direitos Humanos ou Educação em Direitos
Humanos nos projetos políticos pedagógicos e currículos, bem como a proporção
das disciplinas de formação humanística em relação às disciplinas tecnicistas nos
referidos projetos pedagógicos e currículos.

DESENVOLVIMENTO

Inicialmente, deve-se ressaltar que a Declaração Universal dos Direitos


Humanos de 1948 foi um marco significativo na luta pelas liberdades humanas,
impulsionando uma série de preocupações em torno da necessidade de se consagrar
princípios que fossem respeitados por todas as nações.
Adentrando no panorama brasileiro, não se pode deixar de tecer algumas
considerações sobre a política nacional de direitos humanos no Brasil, visto que
ela repercute na concepção de direitos humanos difundida por vários segmentos
que tratam da matéria, desde o período marcado pela oposição ao autoritarismo
vigente no país durante a década de 70.
Recebendo forte impulso da II Conferência Mundial realizada em Viena,
a qual propugnava que os Estados membros das Nações Unidas concebessem
programas nacionais de direitos humanos, tem-se que praticamente só após quase
50 anos da promulgação da Declaração Universal de Direitos Humanos de 1948,
tais direitos foram contemplados como política oficial de governo, dissonando,
assim, da conjuntura sócio-política então vigente.
Imperioso realçar que o Brasil foi um dos países pioneiros na promoção
dessa política, tendo, em 1996, a elaboração do seu primeiro Programa Nacional
57
de Direitos Humanos (PNDH), tendo como característica preponderante a ênfase
na garantia dos direitos civis, assegurando maior proteção à integridade física, à
cidadania e, consequentemente, à liberdade.
Em 2001, foi iniciada uma série de trabalhos em prol da formatação do PNDH
II, que teve nessa versão a inclusão dos direitos sociais, econômicos e culturais de
acordo com os princípios da indivisibilidade e da interdependência dos direitos
humanos previstos na Declaração e no Programa de Ação da Conferência de Viena.
Já o PNDH III, elaborado em 2009 e que se encontra em vigor atual-
mente, diferentemente dos programas anteriores, apresentou na sua elaboração
o envolvimento de vários atores sociais, em face à realização da 11ª Conferência
Nacional dos Direitos Humanos.
No que tange à educação, objeto mais específico deste estudo, o PNDH III
estabelece cinco diretrizes basilares, a saber: efetivação das diretrizes da política
nacional em Direitos Humanos; fortalecimento dos princípios da democracia e dos
Direitos Humanos em todos os níveis da educação; reconhecimento da educação
não formal na defesa dos Direitos Humanos; promoção da Educação em Direitos
Humanos no serviço público, garantia da comunicação democrática e do acesso
à informação acerca dos Direitos Humanos.
Observa-se, dessa forma, que a educação é trabalhada no PNDH III não
só como um direito humano, mas também como uma garantia fundante à con-
secução de outros direitos, sendo visualizada como um conjunto de procedi-
mentos de educação formal e não formal, voltado à edificação de uma cultura
de respeito à dignidade humana.
No que diz respeito ao Plano Nacional de Educação, Lei nº 13.005/2014,
observa-se que seu elo de ações pelo viés da Educação em Direitos Humanos
está positivado logo no artigo 2º:
São diretrizes do PNE: [...] promoção da cidadania e na erradicação
de todas as formas de discriminação; [...] V − formação para o trabalho
e para a cidadania, com ênfase nos valores morais e éticos em que se
fundamenta a sociedade; [...] VII − promoção humanística, científica,
cultural e tecnológica do país; [...] X − promoção dos princípios do
respeito aos direitos humanos, à diversidade e à sustentabilidade
socioambiental.

Seguindo essa linha de análise e caminhando um pouco mais nas trilhas do


PNE, denota-se no § 1º do artigo 8º, que:
58
§ 1º Os entes federados estabelecerão nos respectivos planos de
educação estratégias que: [...] II − considerem as necessidades espe-
cíficas das populações do campo e das comunidades indígenas e
quilombolas, asseguradas a equidade educacional e a diversidade
cultural; III − garantam o atendimento das necessidades específicas
na educação especial, assegurado o sistema educacional inclusivo
em todos os níveis, etapas e modalidades [...].” (Grifos nossos).

Vê-se que no artigo acima há a remissão clara a pelo menos dois aspectos
de ampla discussão no contexto da Educação em Direitos Humanos, a saber:
a diversidade sociocultural e a educação inclusiva, o que já mostra a presença,
pelo menos no prisma normativo, desses elementos de importância ímpar
ao cenário educacional do país.
Também a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira de 1996, em
seu artigo 1º, já começa a evidenciar indicadores relacionados à Educação em
Direitos Humanos, ao preceituar que “[...] a educação abrange os processos forma-
tivos que se desenvolvem na vida familiar, na convivência humana, no trabalho, nas
instituições de ensino e pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade
civil e nas manifestações culturais”.
Chegando ao Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos (PNEDH),
observa-se que o referido documento estabelece diversos programas intencionando
a inserção de uma perspectiva educacional voltada à formação da cidadania ativa, ou
seja, há um ideal de se atingir a concretização de uma prática pedagógica norteada
pelos direitos humanos, na sua essência mais elementar, que corrobora, antes de tudo,
a dignidade da pessoa humana como elemento basilar de qualquer atividade social.
No tocante à educação superior, de acordo com o postulado pelo
PNEDH, sua contribuição à área da educação em direitos humanos deve
pautar-se nos seguintes princípios:
a) [...] democracia e a cidadania; b) os preceitos da igualdade, da
liberdade e da justiça devem guiar as ações universitárias, de modo a
garantir a democratização da informação, o acesso por parte de grupos
sociais vulneráveis ou excluídos e o compromisso cívico-ético com
a implementação de políticas públicas voltadas para as necessidades
básicas desses segmentos; c) o princípio básico norteador da educação
em direitos humanos como prática permanente, contínua e global, deve
estar voltado para a transformação da sociedade [...] d) a educação
em direitos humanos deve se constituir em princípio ético-político
orientador da formulação e crítica da prática das instituições de ensino
59
superior; e) [...] formação de uma cultura baseada na universalidade,
indivisibilidade e interdependência dos direitos humanos, como
tema transversal e transdisciplinar, de modo a inspirar a elaboração
de programas específicos e metodologias adequadas nos cursos de
graduação e pós-graduação, entre outros; [...] g) o compromisso
com a construção de uma cultura de respeito aos direitos humanos
na relação com os movimentos e entidades sociais, além de grupos
em situação de exclusão ou discriminação; h) a participação das IES
na formação de agentes sociais de educação em direitos humanos e
na avaliação do processo de implementação do PNEDH. (BRASIL,
2007, p. 38-39).

Depreende-se que os ideais acima propostos visam disseminar um processo


educacional diferenciado, que se afaste do “tecnicismo” e leve o estudante a ser
agente de interação e transformação social, já que, conforme se observa, vigora
ainda um modelo estrutural voltado ao formalismo, distanciado de um prisma
humanitário que se entende necessário aos paradigmas ora defendidos.
Só por meio de uma educação emancipatória, que observe os parâmetros já
trazidos à cena, poder-se-á pensar na superação do tecnicismo dominante que marca
a educação na atualidade. Afinal, como pontua Santos (2002, p. 107) ao se referir à
Universidade pós-moderna: “O conhecimento-emancipação tem de converter-se num
senso comum emancipatório: impondo-se ao preconceito conservador e ao conhecimento
prodigioso e impenetrável, tem de ser um conhecimento prudente para uma vida decente”.
Ao estabelecermos identificações entre os princípios acima e as Diretrizes
Curriculares Nacionais (DCN) do curso Educação Física, previstas na Resolução
nº 6 de 18 de dezembro de 2018, vemos que a Educação Física é trazida como uma
área de conhecimento em que os indivíduos são capazes, de um lado, de estudar e
conhecer a motricidade ou movimento humano, bem como a cultura que envolve
o movimento corporal a partir dos exercícios físicos, que abrangem, por exemplo,
todos os tipos de esporte e a dança.
Embora o estudante tenha que optar entre a formação em licenciatura
ou bacharelado, as DCN preveem um ingresso único, o que deve ser feito em
duas etapas, de acordo com seu art. 5º. Entre os saberes esperados para o egresso
encontra-se a formação ética, que de acordo com o parágrafo único do artigo 6º,
“[...] deverá incluir, ainda, a prevenção do uso de meios ilícitos e danosos à saúde no
cotidiano das práticas corporais, especialmente nas de caráter competitivo ou que visem
ao desenvolvimento físico de crianças e adolescentes”. A ética pode ser compreendida
tanto como a área responsável por estudar os hábitos sociais, que vão além das
60
manifestações biológicas, como a área que se preocupa com a forma de agir que
atinja o bem social, o coletivo.
Com a escolha pelos estudos na licenciatura em Educação Física, a formação
do futuro licenciado em Educação Física deve ser perpassada pela educação em
Direitos Humanos, estando ela prevista no art. 10:
O Licenciado em Educação Física terá formação humanista, técnica,
crítica, reflexiva e ética qualificadora da intervenção profissional
fundamentada no rigor científico, na reflexão filosófica e na conduta
ética no magistério, ou seja, na docência do componente curricular
Educação Física, tendo como referência a legislação própria do
Conselho Nacional de Educação para a área.” (BRASIL, 2017.
Grifos nossos).

São buscadas no futuro professor capacidades que permitam que os saberes


técnicos dialoguem com a realidade de forma crítica, tendo como ponto de partida o
homem e a sociedade, uma vez que todo e qualquer magistério deve ser perpassado
pela conduta ética que deve buscar a realização do máximo de bem comum a todos.
Em relação às disciplinas que devem que precisam ser oferecidas nas insti-
tuições de ensino, o art. 15 traz uma lista de conteúdos programáticos que devem
se fazer presentes na formação dos futuros profissionais, entre os quais destaca-se
a preocupação com a diversidade: “[...] k) Educação Física Escolar em ambientes
não urbanos e em comunidades e agrupamentos étnicos distintos.” São esperadas,
ainda, no art. 16 atividades de pesquisa e estudo das relações de trabalho, de
educação, diversidade, de direitos humanos, cidadania, dentre outras considera-
das valores sociais da sociedade.
Entretanto, por mais que a legislação preveja, nos 5 projetos pedagógicos
de cursos e matrizes curriculares estudadas, constatou-se a ausência da disciplina
Direitos Humanos e/ou Educação em Direitos Humanos na sua totalidade, isto
é, em 100% do corpus de análise.
Após tal análise, buscou-se ampliar o olhar para cotejar a presença das
disciplinas humanísticas e a proporção que estas representam, em contraponto às
disciplinas chamadas de tecnicistas, nesses mesmos currículos.
No projeto político pedagógico e na matriz curricular da Universidade
Federal do Espírito Santo, só foram constatadas duas disciplinas de caráter mais
humanístico, a saber: Educação e Inclusão; Educação Física, Adaptação e Inclusão,
cada uma com 60 horas aulas, ofertadas como obrigatórias. Todavia, ao fazer uma
61
análise detalhada das aludidas ementas, observa-se um conteúdo voltado a discutir
quase que tão somente elementos étnico-raciais, questões ambientais e algumas
outras diversidades de forma superficial, o que é bem diminuto em relação ao que
se concebe, de fato, como necessário para uma preparação humanística.
Ao observar a carga horária total do curso acima referido, que equivale a
3.095h, percebe-se que a vertente humanística corresponde apenas a 3,87% da
formação total ali propugnada.
Analisando o projeto político pedagógico e a matriz curricular da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul, denota-se a presença das disciplinas Sociologia
da Educação, Filosofia da Educação como obrigatórias, com carga horária de 30h
cada e, ainda, a presença de Antropologia do Corpo e da Saúde, também com
carga horária de 30h, só que em caráter eletivo.
Fazendo a leitura exploratória das ementas, a fim de perceber o nível do que
é abrangido em cada disciplina objeto de análise, é inconteste que a vinculação
das mesmas é feita com questões de corporeidade que envolve a própria natureza
do curso, deixando de fora todo eixo teórico-conceitual que se espera para uma
preparação mais cidadã do estudante.
Também se for feita comparação de carga horária, ainda que se contemple
a disciplina eletiva já apresentada, tem-se um montante de 90h de disciplinas
humanísticas em um curso cujo universo abarca a carga horária total de 3.210h,
fazendo com que essas humanísticas ocupem tão somente 2,8% da matriz curricular.
Passando-se à análise do projeto político-pedagógico e da matriz cur-
ricular da Universidade Federal do Amazonas, constata-se a presença de uma
única disciplina de cunho humanístico, a saber: Dimensões Socioantropológicas
da Educação Física e do Esporte.
Ressalta-se que a disciplina, ofertada como obrigatória e com carga horária
de 60h, possui, de acordo com o que está posto na respectiva ementa, um viés que
traz aspectos do homem e da sua vivência em sociedade atrelados à prática esportiva
como raiz de sociabilidade e elo mais forte do humano na sua concepção natural.
Tal abordagem, apesar de importante e bem interessante ao curso em questão, não
contempla, todavia, os demais postulados da Educação em Direitos Humanos,
ficando aquém do que se espera nesse aspecto específico.
No demonstrativo de comparação da carga horária, tem-se que em um currículo
que totaliza 3.140h, a disciplina suscitada, com 60h, constitui um quantum de 1,9%.

62
Chegando à região Nordeste, com o estudo do projeto político-pedagó-
gico e currículo da Universidade Federal de Pernambuco, visualiza-se a pre-
sença de três disciplinas humanísticas, quais sejam: Educação Física e Filosofia,
Bases Antropológicas aplicadas à Educação Física e Fundamentos da Sociologia,
todas ofertadas em caráter obrigatório, tendo as duas primeiras cargas horá-
rias de 45h cada e a última 60h.
Nesse caso, também percebe o que se falou anteriormente acerca do curso de
Educação Física da UFAM, a saber: há alguns conteúdos filosóficos, sociológicos
e antropológicos, mas que buscam conectar esses saberes com foco na ideia de
que o corpo tem um significado para além da estética, representando elemento
da individualidade humana, que traz em si cargas antropológicas e emocionais
que extrapolam a dimensão física.
Sem minimizar a relevância dessas abordagens, até porque a presente IES
tem, de acordo com ementas de disciplinas, uma preocupação em esboçar uma
visão mais universal do homem, não se pode deixar de demarcar que está de fora
dessas ementas uma série de conteúdos voltados à formação do estudante com
vistas à emancipação humana, calcada nos reais pilares dos Direitos Humanos. Em
dados numéricos, tem-se aqui que em um curso que totaliza 2.970h, as disciplinas
humanísticas representam 5% do currículo.
Por fim, ao realizar estudo do projeto político-pedagógico e da matriz curri-
cular da Universidade Federal do Mato Grosso, constatou-se a presença de quatro
disciplinas humanísticas, sendo duas em caráter obrigatório e duas em caráter eletivo.
Como obrigatórias, encontram-se a Filosofia da Educação e a Sociologia
do Esporte, cada uma com carga horária de 64h. Como eletivas há a presença
de “Estudos de Gênero e atividade Física” e “Tópicos em cultura e diversidade
étnico-racial”, também, com 64h cada uma.
Aqui, não se pode deixar de considerar que, embora não haja disciplina
específica de Direitos Humanos e/ou Educação em Direitos Humanos, como
não há em nenhum dos outros currículos estudados, tem-se que de vários con-
teúdos da temática são contemplados nas citadas disciplinas, mais especifica-
mente nas eletivas já nominadas. Em uma matriz que totaliza 3.224 horas e na
qual 256h são de disciplinas humanísticas, tem-se o percentual de 7,9% dedi-
cado a tal componente curricular.
Assim, após a análise de cada projeto político pedagógico e de cada currí-
culo estudado, em suas dimensões mais específicas e que se aproximam do pro-
63
blema levantado na presente pesquisa, bem como diante da ausência da disciplina
Direitos Humanos e/ou Educação em Direitos Humanos e do quantitativo de
disciplinas tecnicistas encontradas em todos os currículos, pode-se inferir que a
proporção dedicada à formação humanística é insuficiente ao perfil profissional
que se defende neste trabalho.
Não se observa na formatação curricular que as disciplinas dialogam entre si
no decorrer do curso. Ao contrário, percebe-se que há a carga inicial dedicada às já
mencionadas disciplinas humanísticas, parecendo, em seguida, existir uma barreira
para que os holofotes sejam voltados às chamadas “profissionalizantes”, às que
fecham o estudante no mundo das técnicas que farão parte da sua rotina de trabalho.
Disciplinas como Anatomia, Biomecânica, Bioquímica Fisiologia, Cine-
siologia, Controle Motor, Metodologia do Ensino do Handebol, do Ensino da
Dança, do Ensino da Ginástica Olímpica, do Ensino da Natação, do Ensino do
Futebol, do Ensino da Ginástica Rítmica e Desportiva, do Ensino do Futsal, do
Ensino do Voleibol, do Ensino do Basquetebol, dentre outras, são alguns dos
exemplos mais comuns de matérias que ocupam quase que a integralidade dos
currículos dos referidos cursos.
Nessa perspectiva, apresenta-se, a seguir, uma tabela decrescente, com as
05 (cinco) universidades cujos currículos foram analisados, acompanhadas res-
pectivamente das representações, em termos percentuais, do que corresponde às
disciplinas humanísticas em relação à carga horária total do curso.

Tabela 2 – Percentual da carga horária das disciplinas humanísticas em relação à carga horária
total do curso
IES Percentual da Carga Horária das Disciplinas Humanísticas em Relação à
Carga Horária Total do Curso
UFMT 7,9%
UFPE 5,0%
UFES 3,87%
UFRGS 2,80%
UFAM 1,9%

FONTE: Dados da pesquisa.

Observa-se, dessa forma, que das 05 (cinco) universidades cujos currículos


foram objeto de análise detalhada, pode-se detectar que apenas 02 (duas) apre-
sentam número igual ou maior a 05% de sua carga total destinadas às disciplinas
humanísticas, o que corrobora as curiosidades norteadoras das hipóteses e do
64
problema geral deste estudo, mostrando, ainda, a necessidade urgente de se (re)
pensar a formação universitária como um todo, seja nas licenciaturas, seja nas
graduações, a fim de se propagar uma educação libertária como preceituado pelos
ideias pedagógicos e humanísticos mais hodiernos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao longo do que fora declinado, com análises das estruturas curriculares dos
cursos de Licenciatura em Educação Física das Universidades Federais do Espírito
Santo, Rio Grande do Sul, Amazonas, Pernambuco e Mato Grosso, constatou-se
que os Direitos Humanos, assim como a formação humanística desses estudantes,
não são tratados como anteposição de uma realidade essencial, mostrando que
ainda são mantidos os ditames do tecnicismo.
Assim, a posição de um currículo que veja a perplexidade sua própria estrutura
é uma atitude da educação que educa a si, em que a importância de se enxergar
nessa relação o cuidado com o ato de educar é imprescindível quando se pensa a
sua dinamicidade, pois como afirma Arendt (1995, p. 190):
A tarefa educacional é intrinsecamente complexa, pois educar é
simultaneamente proteger a criança das pressões do mundo e pro-
teger o mundo contra as pressões e transformações que advêm da
capacidade humana para a ação e para o discurso em comum, própria
dos recém-chegados.

É evidente que os anacronismos presentes nesses cursos aqui trabalhados


emanam da formação básica. Que essa “criança” citada pela autora como recém-
chegada é também o aluno recém-chegado às aludidas licenciaturas, e, para maior
precisão, aos cursos de nível superior. Quando o currículo é pouco valorado na sua
essência, os agentes e receptores tornam-se o objeto dessa subalternização. Eis,
portanto, o desafio da Educação em Direitos Humanos na discussão curricular,
não como um problema inclusivo da Educação ou uma reflexão da Pedagogia,
mas um problema da universalidade humana.
O primado da Pedagogia é um legado de uma cultura que perpassa o “mundo
da vida” desde o primeiro ato antropológico da história. Pensar na formação desse
“recém-chegado” como formador da humanidade não é uma atitude restrita a
uma área específica do conhecimento, ou vaidade teórica, tampouco uma atitude
de transformação, é entender que qualquer decisão tomada no âmbito da edu-
cação, seja nos processos de ensino e aprendizagem, seja na gestão educacional,
65
é uma atitude por toda humanidade. Toda decisão humana, mesmo particular, é
uma repercussão na humanidade.
Da mesma forma, qualquer decisão sobre a configuração curricular não é um
ato isolado, mas um ato que reflete em toda uma sociedade. Eis, portanto, o que
conclama este trabalho: a necessidade de um currículo perpassado pelos Direitos
Humanos como o modelo de configuração socioeducacional capaz de buscar
garantir o equilíbrio entre o humanismo, a ciência, a técnica, as artes e, sobretudo,
capaz de romper com a desumanização tão gritante na segunda década desse século.

REFERÊNCIAS
ARENDT, H. A vida do espírito: o pensar, o querer, o julgar. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 1995.
BARDIN, L. Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70, 2016.
BRASIL. Diretrizes Curriculares Nacionais do curso Educação Física. Resolução nº 6 de 18 de dezem-
bro de 2018.
BRASIL. Comitê Nacional de Educação em Direitos Humanos. Plano Nacional de Educação em Direitos
Humanos. Secretária Especial dos Direitos Humanos. Presidência da República. Ministério da Educação.
Ministério da Justiça. Unesco, 2007.
BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei nº 9.394. 1996. Disponível em: http://
portal.mec.gov.br/seed/arquivos/pdf/tvescola/leis/lein 9394.pdf.
BRASIL. Plano Nacional de Educação, Lei nº 13.005/2014.
BRASIL. Sistema e-Mec. Disponível em: https://emec.mec.gov.br. Acesso em 02 agosto de 2021.
GONZÁLEZ, JF; FENSTERSEIFER, PE. Dicionário crítico de educação física. Ijuí/RS: Unijuí, 2014.
ONU. Assembleia Geral da ONU. (1948). Declaração Universal dos Direitos Humanos. Paris. Disponível
em https://brasil.un.org/pt-br/91601-declaracao-universal-dos-direitos-humanos.
SANTOS, BS. A crítica da razão indolente: contra o desperdício da experiência. In: Para um novo senso
comum: a ciência, o direito e a política na transição paradigmática – 4. ed. São Paulo: Cortez, 2002.

Nota: síntese do artigo publicado na Revista Brasileira de Educação Física e Esporte, São Paulo, 2021
Jul-Set;35(3):99-112. https://doi.org/10.11606/issn.1981-4690.v35i3p99-112

66
A ACESSIBILIDADE E INCLUSÃO: UM ESTUDO NAS
ESCOLAS PÚBLICAS NO MUNICÍPIO DE ITABAIANA,
NO ESTADO DE SERGIPE

Micael Luiz Santos Amorim26


Clécia Lima Ferreira27

INTRODUÇÃO

Na atualidade, notam-se diversas mudanças no ambiente urbano, realiza-


das com a finalidade de remover barreiras e facilitar o acesso das pessoas com
mobilidade reduzida28 a diversas áreas públicas ou privadas. Tais modificações
têm como objetivo possibilitar à pessoa com mobilidade reduzida viver de forma
independente e participar plenamente de todos os aspectos da vida em sociedade.
Essas adaptações se configuram como acessibilidade, definida pela Secre-
taria Especial dos Direitos da Pessoa com Deficiência (2016) como atributo
essencial do ambiente que garante a melhoria da qualidade de vida das pessoas.
Ela deve estar presente nos espaços, no meio físico, no transporte, na informação,
bem como em outros serviços e instalações abertos ao público ou de uso público,
tanto na cidade quanto no campo.
A promoção de mudanças representa um compromisso ético e surge com
vista a promover a acessibilidade. No ambiente escolar, a acessibilidade é “uma
ação política, cultural, social e pedagógica, desencadeada em defesa do direito de
todos os estudantes de estarem juntos, aprendendo e participando, sem nenhum
tipo de discriminação”. (MEC/SEESP, 2007).
A acessibilidade é amparada pela Lei nº 10.098/2000, que estabelece nor-
mas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas com
mobilidade reduzida, mediante supressão de barreiras e de obstáculos nas vias e

26
Especialista em Direito Previdenciário (Faculdade Focus). Procurador da Câmara Municipal (Campo do Brito/SE).
CV: http://lattes.cnpq.br/0985412877075395
27
Doutora em Ciência Política (UNL - Portugal). Membro Titular de FLACSO - Facultad de Derecho na Universidad
de Salamanca (Espanha). Professora do Instituto Politécnico do Cávado e do Ave (Professora do Instituto Politécnico do
Cávado e do Ave (São Martinho - Portugal). CV: http://lattes.cnpq.br/9853799367771216
28
“Art. 3º [...]: IX - pessoa com mobilidade reduzida: aquela que tenha, por qualquer motivo, dificuldade de movimen-
tação, permanente ou temporária, gerando redução efetiva da mobilidade, da flexibilidade, da coordenação motora ou da
percepção, incluindo idoso, gestante, lactante, pessoa com criança de colo e obeso”. (LEI Nº 13.146/2015).
67
espaços públicos, no mobiliário urbano, na construção e reforma de edifícios e
nos meios de transporte e comunicação. (SENADO, 2020)
No entanto, sob tais garantias legais inclusivas, questiona-se: quais as adap-
tações que estão sendo promovidas pelas escolas públicas da cidade de Itabaiana
para a acessibilidade? Estas ações estão de acordo com a legislação? A lei alcançou
a sua proposta de efetividade naquele município?
Dentre as possíveis respostas a esses questionamentos, a pesquisa apresenta
como objetivo geral analisar a aplicação da legislação que visa promover a aces-
sibilidade das pessoas com mobilidade reduzida, sob o olhar nas escolas públicas
do Município de Itabaiana, localizado no Estado de Sergipe, na região nordeste
do Brasil. Tem-se como objetivos específicos a identificação sobre as normas de
acessibilidade e sobre as possíveis adaptações implementadas para promover a
acessibilidade nas escolas pesquisadas.
Aplicou-se à projeção do trabalho a pesquisa quali-quantitativa, com o
intuito de compreender o fenômeno acessibilidade, e posteriormente, tabular os
dados decorrentes. Para isso, fez-se uso de questionário com perguntas fechadas,
utilizando o método descritivo com a proposta de colher as informações através da
entrevista aos gestores das instituições pesquisadas para a coleta de dados objetivos.
A pesquisa foi realizada em momento anterior ao período da pandemia causada pelo
coronavírus, que impôs um novo modelo de acessibilidade por via remota (on line).
Além disso, importa verificar a eficácia da legislação vigente, que tem como
foco as pessoas com mobilidade reduzida, analisadas do ponto de vista de par-
ticipação no ambiente escolar, tendo como base teórica deste estudo o Estatuto
da Pessoa com Deficiência, a Lei nº 10.096/2000 e o princípio da equidade, tal
como está apregoado na Constituição Federal de 1988.
O objeto da pesquisa foi delimitado sob a perspectiva de observar local-
mente a prática do exercício de cidadania inclusiva, para compreender globalmente
sobre as garantias de acesso e mobilidade às pessoas com mobilidade reduzida. A
pesquisa foi dividida em dois aspectos, tendo sido reservado ao primeiro deles, a
abordagem sobre a acessibilidade escolar, conceito e características e, para o segundo
aspecto, abordou-se sobre a coleta de dados colhidos e a percepção a respeito das
evidências e informações coletadas.

68
A ACESSIBILIDADE COMO DIREITO HUMANO

Em agosto de 2009, com a promulgação do Decreto nº 6.949, de 25 de


agosto, e a integralização da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pes-
soas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova York, em
30 de março de 2007, a proteção às pessoas com mobilidade reduzida foi alçada a
um novo patamar e caminhou ao encontro do verdadeiro conceito de cidadania.
É notável a difusão de movimentos pró-acessibilidade, mas, apesar albergados
na legislação e na consciência coletiva, esses movimentos carecem de um maior
engajamento e continuidade. Engajamento, pois a promoção da acessibilidade
não se trata somente da adequação de prédios e vias públicas, faz-se necessário o
envolvimento da população, a fim de viabilizar o acesso das pessoas com mobilidade
reduzida a todos os espaços de convivência. Continuidade, pois de nada adianta traçar
metas, desenvolver projetos ou políticas públicas se tais práticas não forem contínuas,
já que tornar o mundo acessível trata-se de um movimento contínuo e duradouro.
A acessibilidade se traduz, em um plano concreto, na modificação e aperfei-
çoamento dos meios físicos de determinados lugares, visando proporcionar facili-
dade de locomoção, acesso e, por conseguinte, a inclusão das pessoas com alguma
limitação que dificulte sua integração no meio social. De acordo com a Lei nº
13.146/2015, o conceito de acessibilidade se comprova ao “assegurar que a pessoa
com deficiência possa gozar ou exercer, em igualdade de condições e oportunidades
com as demais pessoas, todos os direitos e liberdades fundamentais”. Ressalte-se
que o conceito deve ser interpretado de forma extensiva, a fim de abranger tam-
bém pessoas com mobilidade reduzida por causas temporárias ou permanentes.

ACESSIBILIDADE ESCOLAR

Quando se tem como objetivo criar um ambiente de pleno acesso para as


pessoas com mobilidade reduzida, é de suma importância observar suas neces-
sidades e as particularidades de cada um. No ambiente escolar, a acessibilidade
é fundamental. Para tanto, é necessário elaborar um plano escolar de acesso e
inclusão, considerando os limites de cada grupo de indivíduos e refletir sobre os
métodos para otimizar sua integração ao ambiente educacional.
A Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Defi-
ciência (CDPD) de 2006 garantiu o direito à educação inclusiva. O Artigo 24, que
visa garantir o direito à educação das pessoas com deficiência “sem discriminação
69
e com base na igualdade de oportunidades”, estabelece o compromisso dos países
de “garantir um sistema educacional inclusivo em todos os níveis e a aprendizagem
ao longo da vida”. O Comitê dos Direitos das Pessoas com Deficiências descreveu
o direito à educação inclusiva como englobando a capacitação de comunidades,
sistemas e estruturas para “combater a discriminação, incluindo estereótipos pre-
judiciais, reconhecer a diversidade, promover a participação e superar as barreiras
à aprendizagem e à participação de todos, concentrando-se no bem-estar e sucesso
dos alunos com deficiência”. (UNESCO, 2020, p. 15).
No direito nacional, não há de se falar em “silêncios da lei”. Ampla é a
legislação que fica como objetivo estatal a acessibilidade. Um bom exemplo é a lei
nº 13.146/2015, Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência, que busca
fixar uma nova ótica no entendimento dos direitos dos deficientes e positivar esses
benefícios, com o intuito de garantir a efetividade da norma e o compromisso do
Estado com a educação para todos. No artigo 4° da citada lei, é possível extrair
que “toda pessoa com deficiência tem direito à igualdade de oportunidades com
as demais pessoas e não sofrerá nenhuma espécie de discriminação”.
A legislação brasileira vigente revela a importância da acessibilidade no
âmbito escolar, pois este é o local em que ocorrem as maiores transformações na
vida de jovens e adolescentes. Logo, garantir o acesso livre aos meios educacionais
é essencial na promoção da inclusão. De acordo com o Ministério da Educação,
dentre os diversos programas criados para atender o acesso à educação, foi criado
o Programa Escola Acessível, que visa dotar as escolas para que estejam prepa-
radas a receber todos os alunos, garantindo a acessibilidade ao ambiente escolar,
por meio de salas com recursos multifuncionais e adequação do espaço físico.
Segundo o citado Ministério, mais de 48 mil escolas foram beneficiadas com
recursos do programa. (MEC, 2020).

ESTRATÉGIAS PARA A ACESSIBILIDADE, PERMANÊNCIA E


INCLUSÃO

É impossível falar de acessibilidade sem dar ênfase à estrutura que rodeia o


ambiente educacional. É evidente a necessidade de adaptar o ambiente escolar,
tendo em vista que, de acordo com o Censo Demográfico de 2010, divulgado no
dia 16 de novembro de 2011, o Brasil possui cerca de 45 milhões de brasileiros com
deficiência e, aproximadamente 70% destas pessoas, não tiveram acesso ao ambiente
escolar devido a obstáculos tanto físicos como sociais. Com relação ao Censo
70
Demográfico de 2010 e o mapeamento das pessoas com deficiência no Brasil, em
relatório do Ministério da Saúde, o IBGE promoveu a releitura dos dados de pessoas
com deficiência no Censo 2010, alcançando a seguinte projeção: (figura 1, abaixo).

Na percepção sobre estratégias para a acessibilidade cabe, com base na Lei


nº 13.146/2015, especificamente no seu artigo 3º, definir-se acessibilidade como a:
Possibilidade e condição de alcance para utilização, com segurança e
autonomia, de espaços, mobiliários, equipamentos urbanos, edifica-
ções, transportes, informação e comunicação, inclusive seus sistemas
e tecnologias, bem como de outros serviços e instalações abertos ao
público, de uso público ou privados de uso coletivo, tanto na zona
urbana como na rural, por pessoa com deficiência ou com mobili-
dade reduzida.

Da mesma forma, deve-se compreender o conceito barreiras, previsto tam-


bém no artigo 3º da lei brasileira de inclusão, no qual se definem barreiras como
“qualquer entrave, obstáculo, atitude ou comportamento que limite ou impeça a
participação social da pessoa, bem como o gozo, a fruição e o exercício de seus
direitos à acessibilidade, à liberdade de movimento e de expressão, à comunicação,
ao acesso à informação, à compreensão, à circulação com segurança, entre outros”,
podendo ser urbanísticas, arquitetônicas, nos transportes, nas comunicações e
informação, atitudinais ou tecnológicas. Tal compreensão se faz necessária a fim
de potencializar o olhar sobre a necessidade de adequação e de mudanças no
ambiente escolar para repercutir a acessibilidade: “qualquer entrave, obstáculo,
71
atitude ou comportamento que limite ou impeça a participação social da pes-
soa, bem como o gozo, a fruição e o exercício de seus direitos à acessibilidade, à
liberdade de movimento e de expressão, à comunicação, ao acesso à informação,
à compreensão, à circulação com segurança, entre outros. Dentre as possíveis
estratégias ligadas à proposta de inclusão de pessoas com deficiência, cabe citar
o inciso XIII, do artigo 3º da Lei nº 13.146/2015, que trata sobre a presença de
um profissional de apoio escolar.
Na perspectiva das estratégias para remover barreiras e obstáculos, a Lei nº
13.146/2015, ainda no seu artigo 3º, incisos II e III, define “desenho universal” e
“tecnologia assistiva ou ajuda técnica”, respectivamente:
II - Desenho universal: concepção de produtos, ambientes, programas
e serviços a serem usados por todas as pessoas, sem necessidade de
adaptação ou de projeto específico, incluindo os recursos de tecno-
logia assistiva;

III - tecnologia assistiva ou ajuda técnica: produtos, equipamentos,


dispositivos, recursos, metodologias, estratégias, práticas e serviços que
objetivem promover a funcionalidade, relacionada à atividade e à parti-
cipação da pessoa com deficiência ou com mobilidade reduzida, visando
à sua autonomia, independência, qualidade de vida e inclusão social.

No campo legislativo, a acessibilidade encontra-se consagrada pela Consti-


tuição Federal em seu artigo 227, §2º: “A lei disporá sobre normas de construção
de logradouros e dos edifícios de uso e de fabricação de veículos de transporte
coletivo, a fim de garantir acesso adequado às pessoas com deficiência”. E, ainda,
no seu artigo 244: “A lei disporá sobre a adaptação dos logradouros, dos edifí-
cios de uso público e dos veículos de transporte coletivo atualmente existentes
a fim de garantir acesso adequado às pessoas portadoras de deficiência, con-
forme disposto no art. 227, §2º”.
O Plano Nacional de Educação (PNE), aprovado pela Lei nº 13.005/2014,
traz no seu bojo a Meta 4, com a proposta de acessibilidade e inclusão, a saber:
META 4 - Universalizar, para a população de 4 (quatro) a 17 (dezes-
sete) anos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento
e altas habilidades ou superdotação, o acesso à educação básica e ao
atendimento educacional especializado, preferencialmente na rede
regular de ensino, com a garantia de sistema educacional inclusivo,
de salas de recursos multifuncionais, classes, escolas ou serviços espe-
cializados, públicos ou conveniados.
72
No que tange à execução das atividades que viabilizam a concretude da
mobilidade nas escolas, vale salientar também a importância de equipamentos no
ambiente físico. Os sistemas de ensino devem organizar as condições de acesso aos
espaços, aos recursos pedagógicos e à comunicação que favoreçam a promoção da
aprendizagem e a valorização das diferenças, de forma a atender as necessidades
educacionais de todos os alunos.
A Lei nº 13.146/2015, no seu capítulo IV, evidencia sobre o direito à educação
para a pessoa com deficiência, traçando diretrizes no seu artigo 27 com o fito de
assegurar um “sistema educacional inclusivo em todos os níveis e aprendizado ao
longo de toda a vida, de forma a alcançar o máximo desenvolvimento possível de
seus talentos e habilidades físicas, sensoriais, intelectuais e sociais”, considerando
ainda, no seu parágrafo único, que: “é dever do Estado, da família, da comunidade
escolar e da sociedade assegurar educação de qualidade à pessoa com deficiência,
colocando-a a salvo de toda forma de violência, negligência e discriminação”.
Na proposta da pesquisa realizada perante as escolas públicas do ensino
médio na Cidade de Itabaiana, no Estado de Sergipe, buscou-se evidenciar sobre
as instalações físicas daquelas instituições que favoreçam o desenvolvimento e a
acessibilidade das pessoas com mobilidade reduzida, educandos e colaboradores.
O período de aplicação do questionário antecedeu ao momento de pan-
demia deflagrado pelo Coronavírus, que motivou o fechamento das escolas e a
aplicação do sistema remoto de ensino. Os números identificados na pesquisa, as
informações decorrentes e a avaliação dos dados foram definidas no ano de 2019.
A acessibilidade escolar, assim compreendida como possibilidade e con-
dição de alcance para utilização, com segurança e autonomia, nos termos da lei
13.146/2015, deve ser assegurada mediante a eliminação de barreiras arquitetônicas,
urbanísticas, na edificação – incluindo instalações, equipamentos e mobiliários – e
nos transportes escolares, bem como as barreiras nas comunicações e informações.
A disponibilidade de recursos estruturais é tão importante quanto a capacitação de
profissionais capazes de desenvolver estratégias que promovam o acesso de forma
integral para as pessoas com deficiências e com mobilidade reduzida.

ANÁLISE DE DADOS

A presente pesquisa foi elaborada com o objetivo de analisar a aplicação


da legislação que visa promover a acessibilidade das pessoas com deficiência ou
com mobilidade reduzida perante as escolas públicas na Cidade de Itabaiana, no
73
Estado de Sergipe. Com o intuito de traçar o perfil das escolas pesquisadas, foi
realizada uma pesquisa de campo em seis instituições escolares daquele Muni-
cípio, com o uso de questionário composto por perguntas fechadas que tratam
sobre as instalações físicas daquelas escolas, que se direcionam à acessibilidade
específica das pessoas com deficiência.

PERFIL DAS ESCOLAS PESQUISADAS

A pesquisa foi realizada nas Escolas públicas abaixo indicados, cujo perfil
encontra-se descrito no Quadro 1, a seguir.
Cabe esclarecer que os nomes das escolas foram substituídos na análise
dos dados, com o intuito de facilitar a compreensão a respeito da referida análise:
Quadro 1 - Perfil das Escolas
Nome da Escola Turnos de Quantidade de Quantidade de Séries/Atuação
Funcionamento Alunos Professores
Escola “A” Manhã/Tarde/ 1700 66 Ensino funda-
(Escola Estadual Noite mental e Médio
Murilo Braga)
Escola “B” Manhã/Tarde/ 983 44 Ensino funda-
(Escola Estadual Noite mental, médio e
D r. A u g u s t o de Jovens e adultos
Leite)
Escola “C” Manhã/Tarde/ 280 24 Ensino funda-
(Escola Estadual Noite mental maior
Eliezer Porto)
Escola “D” Manhã/Tarde 300 14 E n s i n o
(Escola Municipal Fundamental
Prof. Maria menor
Elizete Santos)
Escola “E” Manhã/Tarde 197 09 E n s i n o
(Escola Estadual Fundamental
Prof. Izabel menor
Esteves de Freitas)
Escola “F” Manhã/Tarde 165 09 E n s i n o
(Escola Estadual Fundamental
Guilhermino
Bezerra)
Fonte: Produzido pelos autores por meio de pesquisa de campo realizada entre 20/07/2016 e
10/08/2016.

Todas as Escolas estão localizados no Município de Itabaiana, trabalham


em média dois turnos, atendendo, na maioria, alunos do ensino fundamental
74
menor e médio. Sendo que, na região em que se inserem, são consideradas escolas
de médio porte, sendo este o motivo da escolha para a aplicação do questionário.

LEVANTAMENTO DOS DADOS COLHIDOS A PARTIR DO


QUESTIONÁRIO APLICADO

A fim de apurar o respeito a acessibilidade e o cumprimento da legislação,


notadamente no que se refere a Lei 13.146/2015, foram visitadas as instalações
físicas das escolas, bem como foi realizada entrevista com os gestores das escolas,
aplicando-se questionário com perguntas fechadas, a fim de auferir a presença de
recursos de acessibilidade mínimos.
O referido questionário registrou perguntas que, objetivamente, buscavam
sobre a presença de rampas, banheiros e bebedouros especialmente dispostos para o
acesso de pessoas com deficiência, corrimãos, mobiliário específico, tais quais recursos
tecnológicos para facilitação de leitura, profissionais especializados e sinalização que
promovessem a acessibilidade e a educação inclusiva previstas na legislação pátria.
No quadro 2, abaixo, foram destacados (com um “X”) os elementos perten-
centes ao questionário aplicado que dizem respeito dos recursos existentes nas
instalações físicas das instituições de ensino pesquisadas. Cabe ressaltar que não
foram considerados como existentes, os recursos de acessibilidade danificados,
incorretamente instalados ou não instalados, mesmo quando adquiridos e em
posse da instituição visitada.
Quadro 2 – Acessibilidade/mobilidade
Recursos Escola “A” Escola “B” Escola “C” Escola “D” Escola “E” Escola “F”
Rampas X X - X X X
Banheiros X X X X X X
Bebedouros X X X X X -
Corrimão X - - - - -
Mobiliário X - - - - -
Profissionais X - X - - -
Especializados
Sinalização X - - - - -
Fonte: Produzido pelos autores por meio de pesquisa de campo realizada entre 20/07/2016 e
10/08/2016.

A partir da leitura do quadro acima, observa-se que a maioria das escolas


realizou mudanças e adaptações simples em seus ambientes, tendo apenas implan-
tado rampas, banheiros e bebedouros ajustados e apenas duas delas possuem
profissionais especializados em lidar com alunos com dificuldade de mobilidade
(escolas A e C). Além disso nas escolas “A”, “C”, “E” haviam também recursos
voltados para pessoas com baixa visão, dentre os quais cabe destacar mapas tatos,
75
recursos em braile (como livros e máquinas de escrever) e profissionais especia-
lizados para atender os alunos.
Merece destaque, também, o fato de que, além desses recursos registrados
no quadro 2 (acima) foi observado que diversas escolas possuem salas especiais,
que tem como objetivo fornecer aulas de reforço para alunos com deficiências e
todas as escolas visitadas possuem ou já possuíram professores designados espe-
cialmente para fazer o acompanhamento e assistência de alunos com condições
de aprendizagem especiais. Cabe destacar que todas as escolas, objeto da presente
pesquisa, passaram por reformas, sendo que as verbas disponibilizadas para as
adaptações de recursos materiais nas instalações físicas das escolas foram origi-
nadas do poder público Municipal.
Apesar de, apenas a escola “A” atender plenamente a necessidade de seus
alunos, agindo de acordo com os preceitos estipulados na lei 13.146/2015, foi
observado um esquema de cooperação entre os diretores para, quando a falta de um
recurso impossibilita o aprendizado de um aluno, ele é direcionado para o núcleo
que dispõe do recurso adequado e, quando sofre de alguma dificuldade eventual,
o aluno é direcionado para aulas de reforço com profissionais especializados, em
horário diverso do que estuda e, se necessário, também em escola diversa da qual
se encontra regularmente matriculado.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir das questões analisadas nesta pesquisa, identifica-se que foram


feitos inúmeros avanços no campo legislativo com a diversidade de institutos
legais destinados ao atendimento dos indivíduos com deficiência. Diversas são as
conquistas da acessibilidade, tendo sido esta pauta idealizada pela Carta Magna
do Brasil, pois, segundo a Constituição, todos nascem em igualdade de direitos e
oportunidades, logo, no momento em que se busca a acessibilidade, realiza-se uma
interpretação teleológica do Texto Constitucional, isto é, buscando o real sentido
da norma, a fim de ampliar o alcance de direito a todos os cidadãos.
Percebe-se que a pesquisa revelou várias deficiências quanto à proposta de
tornar acessível e inclusivo o ambiente escolar, especialmente nas instalações físicas
das escolas públicas pesquisadas na Cidade de Itabaiana, no Estado de Sergipe,
conforme ficou descrito no quadro 2, da presente pesquisa. Ademais, a concretização
da acessibilidade, de maneira plena, também se revela um compromisso ético. Pois,

76
uma sociedade que cresça com base na sobreposição do interesse dos mais fracos aos
dos mais fortes não pode prosperar e está constantemente às beiras de desfazer-se.
No plano concreto, a acessibilidade vem ganhando cada vez mais espaço,
merecendo destaque o interesse do corpo diretivo das escolas públicas da Cidade
de Itabaiana, no Estado de Sergipe que foram objeto da pesquisa, pois, busca
atender cada vez mais às necessidades de alunos que em tempos não muito dis-
tantes eram ignorados e vistos como um problema que deveria ser afastado ou
desconsiderado pela escola. Porém, ainda há muito o que fazer, ao mesmo ponto
que cresce a implantação de novos recursos em prol da acessibilidade, também
ficam mais visíveis as deficiências das escolas em atender um quantitativo cada
vez maior e diversificado de alunos com mobilidade reduzida.
Por outro lado, o engajamento dos profissionais de educação, por meio de
projetos de cooperação entre escolas e professores, potencializa a redução das
desigualdades e do desrespeito aos direitos e garantias de humanização das pessoas
com mobilidade reduzida. Em verdade, ainda há muito o que se fazer para que se
possa dizer que o Município de Itabaiana conquistou uma educação plenamente
acessível, mas, de maneira gradativa, as escolas públicas veem se tornar espaços de
livre acesso e oportunidade onde todos, independentemente de ter dificuldade de
mobilidade ou não, podem construir seu futuro e dar passos largos para construir
uma sociedade livre, justa e solidária. Há esperança!

REFERÊNCIAS
BRASIL. Decreto nº 6.949, de 25 de agosto de 2009. Promulga a Convenção Internacional sobre os Direitos
das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova York, em 30 de março de 2007.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/decreto/d6949.htm>. Acesso
em: 04 jul. 2021.
BRASIL. Ministério da Saúde. Censo Demográfico de 2020 e o mapeamento das pessoas com deficiência
no Brasil. 2019. Disponível em: <https://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/comissoes/comissoes-
-permanentes/cpd/arquivos/cinthia-ministerio-da-saude>. Acesso em: 20 jun. 2021.
BRASIL. Lei n° 10.098, de 19 de dezembro de 2000. Estabelece normas gerais e critérios básicos para a
promoção da acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida, e dá outras
providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L10098.htm> Acesso em: 04 jul. 2021.
BRASIL. Lei nº 13.005, de 25 de junho de 2014. Aprova o Plano Nacional de Educação - PNE e dá outras
providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2014/lei/l13005.htm>.
Acesso em: 10 jun. 2021.
BRASIL. Lei n.º 13.146, de 6 de julho de 2015. Institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Defi-
ciência. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13146.htm>
Acesso em: 04 jul. 2021.
77
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão.
Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva. Disponível em: < http://
portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=16690-politica-nacional-de-edu-
cacao-especial-na-perspectiva-da-educacao-inclusiva-05122014&Itemid=30192> Acesso em: 04 jun. 2021.
BRASIL. Ministério da Educação. Plano Nacional de Educação (PNE). Disponível em: <http://pne.mec.
gov.br/18-planos-subnacionais-de-educacao/543-plano-nacional-de-educacao-lei-n-13-005-2014>. Acesso
em: 04 jun. 2021.
DIVERSA EDUCAÇÃO INCLUSIVA na Prática. Conceitos fundamentais. Disponível em: <https://
diversa.org.br/educacao-inclusiva/por-onde-comecar/conceitos-fundamentais/>. Acesso em: 29 jun. 2021.
RELATÓRIO DE MONITORAMENTO Global da Educação. América Latina e Caribe. Inclusão e
Educação: todos, sem exceção. 2020. Disponível em: <https://sedu.es.gov.br/Media/sedu/pdf%20e%20
Arquivos/375582por.pdf>. Acesso em: 20 jun. 2021.
SECRETARIA ESPECIAL DOS DIREITOS DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA. Acessibilidade.
Disponível em: <http://www.pessoacomdeficiencia.gov.br/app/acessibilidade-0>. Acesso em: 04 jul. 2021.

78
A IMPORTÂNCIA DE METODOLOGIAS ATIVAS
PARA AULAS INTERDISCIPLINARES

Marinez dos Santos29


Érika de Souza Oliveira30
Dirceu Rodrigo Freire de Oliveira31

INTRODUÇÃO

Segundo FORTES, C.C. (2009), a interdisciplinaridade se tornou polêmica


por possibilitar uma abordagem pragmática entre o fazer e o pensar. Quando se
fala de um ensino formal o qual busca transmitir o conhecimento de forma mecâ-
nica, a aprendizagem e compreensão do estudante se torna dificultada, pois, seus
estímulos e desenvolvimentos intelectuais para resolver problemas e se conectarem
em fatos se torna insatisfatórios.
Em contrapartida, a busca por metodologias nas quais incluam a interdis-
ciplinaridade, tem se tornado uma estratégia bastante aplicada nos anos atuais,
tendo em vista que, quando trabalhamos em equipe e juntamos metodologias ativas
complementando uma atividade a outra, tornamos o ensino mais interessante para
os alunos e concomitantemente a busca pelo entendimento passa a fazer sentido
(SANTOS, M.; OLIVEIRA, S.C.M. 2021).
As habilidades curriculares trabalhadas com os alunos seguem as normas
contidas na Base Nacional Comum Curricular (BNCC) (BRASIL,2017). Estas
normas possibilitam aos professores do ensino fundamental e médio planejar,
mapear e traçar as melhores estratégias, dando condições e autonomia a estes
profissionais de propor atividades relacionadas aos conteúdos a serem ministrados,
despertando maior interesse nos alunos. (BRASIL, 2017).
Os conteúdos “situações de aprendizagens” sugeridos pelos órgãos governa-
mentais citados anteriormente, possuem temas flexíveis, o que possibilita o professor
a trabalhá-los tanto individualmente “professor/alunos” quanto em parceria com
professores de outras áreas correlatas.

29
Graduação em Ciências Biológicas (UEMS). Professora (SME / Lençóis Paulistas – SP).
CV: http://lattes.cnpq.br/3137034024266009
30
Graduação em Letras - Português e Inglês (FACOL). Professora (SME / Lençóis Paulistas – SP).
CV: http://lattes.cnpq.br/0393330516296138
31
Licenciatura em Geografia. Professor (SME / Pratânia – SP).
79
No entanto, para que ocorra uma interdisciplinaridade, é necessário que
as disciplinas conversem entre si, e que os conteúdos a serem ensinados estejam
interligados. Contudo, também se torna necessário a existência de profissionais
capacitados, ou seja, um professor que conheça bem sua disciplina e esteja disposto
a trabalhá-la de modo dinâmico com as outras áreas correlatas, explorando a capa-
cidade de discernimento dos alunos o máximo possível em relação a construção
de seus conhecimentos (FORTES, C.C. 2009).
Objetivando alcançar um maior índice de desenvolvimento intelectual,
sendo este, profissional e pessoal dos estudantes, o presente projeto buscou por
meio da interdisciplinaridade e das diversas metodologias, ensinar os alunos da
Escola Estadual Virgílio Capoani / Lençóis Paulista - SP, a realizarem pesquisas
e desenvolverem técnicas experimentais em Laboratório e em Campo, com segu-
rança tanto para os monitores como para a comunidade escolar, e com seriedade e
responsabilidade. Tornando os preparados para o mercado de trabalho, capacitados
para a realização de pesquisas científicas, análises de materiais e outras atribui-
ções cabíveis no que lhes foram ensinados. Contribuindo assim, em um maior
entendimento por parte dos alunos acerca da importância do estudo de Química,
Biologia, Geografia e as línguas Portuguesa e Inglesa, para o seu desenvolvimento.

DESENVOLVIMENTO

Os estudantes aprenderam na prática diversos conteúdos, com o auxílio


de materiais disponibilizados pelos docentes, despertando assim o interesse em
trabalhar em equipe e desenvolverem trabalhos nas áreas de pesquisas.
Inicialmente, foi disponibilizado uma lista onde os alunos interessados colo-
cassem seus respectivos nomes, em seguida, realizou-se a contagem destes alunos e
montou-se 2 (dois) grupos com 10 (dez) alunos. Os grupos foram divididos de forma
em que alunos do 1º (primeiro), 2º (segundo) e 3º (terceiro) anos se encontrassem
pudessem trabalhar junto uns com os outros, com o objetivo de proporcionar uma
troca de saberes e experiências. Segundo DALGALHO, L.; MONTEIRA, C. F.S.R.
(2022), o uso de metodologias ativas as quais envolvam aulas práticas juntamente
com os conceitos teóricos obtidos em sala de aula, possibilita aos alunos antecipar
situações que futuramente podem ser reais e a desenvolverem habilidades técnicas
e não técnicas, os tornando autoconfiantes e melhorando seu desempenho.
Tendo em vista isso, o projeto possibilitou aos alunos um aprendizado de
forma lúdica em laboratório químico e a conhecer os materiais utilizados por pro-
80
fissionais da área de pesquisas laboratoriais. Ao final deste processo de aprendiza-
gem, os alunos se tornaram capacitados a realizarem experimentos químicos com o
acompanhamento de um ou mais professores responsáveis, e posteriormente estes
estudantes puderam realizar monitorias em aulas práticas, auxiliando professores e
ajudando a comunidade escolar. Em um segundo momento, os alunos aprenderam
também a realizarem pesquisas em sites seguros no laboratório de informática
conhecendo assim importantes trabalhos científicos para que pudessem citá-los
seguindo as normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT).
No decorrer dos processos citados acima, foi utilizado conteúdos de disciplinas
diversificadas, visando sempre o protagonismo juvenil. Segundo MORAN, J. (2014),
a utilização de metodologias ativas e interdisciplinares, possibilita ao aluno um maior
aprofundamento em seu conhecimento, o que os permite a desenvolverem competên-
cias socioemocionais e estarem engajados com a realidade da comunidade propondo
soluções para problemas e sendo, portanto, protagonistas da sua própria história.
Nesse sentido, as metodologias ativas refletem os novos caminhos que a escola
tem tomado, acompanhando o contexto em que estamos inseridos, onde se faz neces-
sário que ele desenvolva autonomia, capacidade de comunicação e pensamento crítico
através do protagonismo que as novas metodologias proporcionam. Assim, as ativi-
dades que foram e continuarão sendo desenvolvidas com a mediação dos professores
trazem em sua proposta o estímulo a aprendizagem dos educandos os quais poderão
posteriormente aplicar os conhecimentos adquiridos em outros âmbitos além da escola.

DESENVOLVIMENTO - RESULTADOS E DISCUSSÕES

O projeto esperava que os alunos se tornassem indivíduos com maior conheci-


mento, capazes de entender a importância da pesquisa e buscar por fontes confiáveis
sendo em casa, na escola ou em seu âmbito profissional, formando assim, sujeitos com
repertório de informações e conhecimentos, podendo contribuir para um mundo
melhor. E no futuro, se tornarem sujeitos críticos, que pensem e apoiem o trabalho
em equipe, saibam dialogar através de variadas áreas, como por exemplo, artes, estudos
biológicos, geográficos, químicos e variados idiomas. Abandonando desta forma o
individualismo e mantendo-se sempre atualizados sobre o que ocorre ao seu redor.
Adequando o registro escrito e oral em situações formais no uso da linguagem.
Ao construir e atualizar, de forma colaborativa, registros dinâmicos de pro-
fissões e ocupações de seus interesses (áreas de atuação, dados sobre formação,
fazeres, produções, depoimentos de profissionais etc.), o projeto possibilita a estes
81
alunos, vislumbrar trajetórias pessoais e profissionais, fazendo-os a levantarem
critérios para escolha do seu futuro.
Deste modo, as atividades laboratoriais de forma interdisciplinar fizeram
com que os alunos obtivessem um maior desenvolvimento, tanto dentro da sala
de aula quanto fora dela, pois aumentou sua capacidade de trabalho em equipe,
tirando-os do comodismo, e, os estimulando a questionar e irem atrás de respostas
de forma segura e confiável. O contato com o laboratório estimulou os alunos a
terem interesse em saber mais sobre os assuntos estudados em aula, pois o formato
da pesquisa foi mais amplo trazendo um leque de possibilidades.
O aumento da capacidade de trabalho em equipe por parte dos alunos,
juntamente com as experiências e resultados obtidos através de registros fotográ-
ficos, demonstraram que a integração entre eles, e as aulas práticas e dinâmicas
os ensinaram melhor de momento a momento. Com o contato ao laboratório os
motivando a realizarem na prática o que aprendem de forma teórica. Isso se deu ao
fato de o formato da pesquisa ser mais amplo, trazendo várias opções profissionais.
Os resultados alcançados até o presente momento acerca dos trabalhos
realizados entre educadores e educandos foram bastante satisfatórios, tendo em
vista que, ao iniciar o projeto, o laboratório encontrava-se desativado há anos
e atualmente ele se encontra em plenas condições de uso. Para que os alunos
pudessem iniciar a recuperação do laboratório desativado, primeiramente foram
orientados a realizarem estudos sobre as boas e más práticas, e os tipos de equi-
pamentos existentes nos laboratórios.
Segundo CHAVES (2017), os riscos à saúde das pessoas que trabalham em
laboratório são gravíssimos caso não sejam manuseados os materiais e utilizados
os Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) de forma correta.
Os riscos podem ser caracterizados da seguinte forma:
• Riscos Físicos: referem-se a peculiaridades físicas do ambiente, como:
alterações sonoras (infrassom e ultrassom), radiações ionizantes e não
ionizantes, pressão anormal, temperatura extrema, ruídos e vibrações;

• Riscos Químicos: são substâncias que podem ser absorvidas


pelo organismo, independentemente se for por contato direto,
via respiratória ou ainda ingeridos;

• Riscos Biológicos: destacam-se como formas de microrganismos


(fungos, bactérias, protozoários, vírus ou parasitas) no qual os
82
trabalhadores podem ser expostos, como: contato da pele, ingestão
ou pela via respiratória;

• Riscos Ergonômicos: são de natureza física ou psicológica, como a


não adaptação ao ambiente de trabalho ou por esforço fisiológico,
como sobrecarga de peso, postura inadequada, jornada excessiva
de peso, repetição de movimentos ou outros fatores gerando
estresse mental ou físico (CHAVES, 2017, p. 6).

Contudo, alguns dos resultados obtidos durante o desenvolvimento do projeto,


foram demonstrados por meio de aplicativos disponibilizados pela própria rede de
ensino do estado de São Paulos, como por exemplo o “Padlet” e os cartazes realizados
pelos próprios estudantes, contando com o auxílio dos professores envolvidos no projeto.
E assim sendo, pudemos observar as informações que os educandos foram
colhendo e inserindo na plataforma para que todos os integrantes do projeto
pudessem utilizá-las posteriormente. Com isso eles perceberam que o seu prota-
gonismo é fundamental na aquisição de seus conhecimentos. Como nos dizeres
de COSTA (2021), relatado a seguir.
O termo Protagonismo Juvenil, enquanto modalidade de ação edu-
cativa, é a criação de espaços e condições capazes de possibilitar
aos jovens envolverem se em atividades direcionadas à solução de
problemas reais, atuando como fonte de iniciativa, liberdade e com-
promisso. [...] O cerne do protagonismo portanto, é a participação
ativa e construtiva do jovem na vida da escola, da comunidade ou da
sociedade mais ampla (COSTA, 2001, p. 179).

Portanto, após as aulas introdutórias e de pesquisas, os alunos iniciaram as


práticas laboratoriais, desde a organização do ambiente, esterilização das vidrarias,
até o descarte de materiais os quais não eram possíveis serem reaproveitados. Para
GIROUX e SIMON, (1995, p. 95):
[...] as escolas são formas sociais que ampliam as capacidades humanas,
a fim de habilitar as pessoas a intervir na formação de suas próprias
subjetividades e a serem capazes de exercer poder com vistas a trans-
formar as condições ideológicas e materiais de dominação em práticas
que promovam o fortalecimento do poder social e demonstrem as
possibilidades de democracia (GIROUX e SIMON, 1995, p. 95).

A imagem a seguir, tem o reflexo da ampliação das inúmeras capacidades


humanas de ser expandidas e os habilitandos a serem seres humanos mais prota-
gonistas, começando pelos estudantes.
83
Figura 1. Momento em que os alunos começaram a organizar o laboratório de pesquisa.

E, evidencia como os alunos encontraram o laboratório e os equipamentos


existentes ali, bem como os compostos químicos utilizados em experimentos, as
vidrarias, e materiais de estudo. Para FREIRE (2021) formar sujeitos críticos
e ativos se faz necessário no uso de diferentes tipos de saberes e a interação de
diferentes grupos, como em sua citação abaixo.
Freire compreende que o diálogo problematizador por uma perspectiva
de comunicação forma sujeitos críticos. É preciso atentar para uma
prática extensionista cujo pressuposto de interação entre diferentes
saberes gere um conhecimento dialógico, democrático, comunicativo,
transformador. (FREIRE, 2021, p. 05).

Observou-se, o empenho e comprometimento, tanto por parte dos alunos


quanto por parte dos professores, para reaproveitar os materiais e equipamentos
já existentes no laboratório, contribuindo para uma economia circular, onde coisas
que simplesmente seriam descartadas, foram reaproveitas para usos seguintes.
Mas, o que seria a Economia circular? Através dos princípios de BENYUS,
J. M. (2002), a natureza pode ser descrita como:
• Natureza como modelo: Estuda os modelos da Natureza e imi-
ta-os ou usa-os como inspiração para o design e processos, com
o intuito de resolver os problemas humanos;

• Natureza como medida: Usa o padrão ecológico para julgar a


sustentabilidade das inovações humanas. Após muitos milhares
de anos de evolução, a Natureza aprendeu o que funciona, o que
é apropriado, o que dura;
84
• Natureza como um mentor: Considera uma nova forma de
observar e avaliar a Natureza. Introduz uma nova era baseada não
no que podemos extrair do mundo natural, mas no que podemos
aprender com ele (BENYUS, J. M., 2002, p. 5).

Verifica-se, portanto, como deve ser reaproveitados os materiais existentes


no cotidiano, seja dentro do ambiente escolar ou fora dele. Neste sentido, os mate-
riais foram embalados e puderam ser reaproveitados para a utilização de futuras
aulas práticas. Por seguinte, foi executado a reforma do laboratório pela escola,
possibilitando aos alunos a oportunidade de terem aulas práticas e de qualidade.
Durante a reforma do laboratório, todos os materiais que se encontravam
em bom estado, foram selecionados, guardados em caixas e armazenados em uma
sala reserva. Após a reforma os alunos juntamente com os professores do projeto
realizaram a higienização e organização dos materiais recuperado. Por fim, os alunos
se encontraram nas aulas práticas em laboratório, como mostra a imagem a seguir.

Figura 1: Aula prática em laboratório, sobre reações químicas.

Fonte: autoria própria.

Na imagem acima, podemos notar como o aprendizado interdisciplinar tem


aproximado os educandos em seu protagonismo, ou seja, atuantes em seu conhe-
cimento, trazendo a prática no ambiente escolar e expandindo para a sociedade.

CONSIDERAÇÕES

Tendo em vista os resultados adquiridos, podemos concluir que estas aulas foram
e continuarão sendo de grande acréscimo a comunidade em seu total e que o prota-
gonismo juvenil está sendo cada vez mais valorizado. Isso se deve ao fato de a maioria
das vezes serem os estudantes a darem grandes ideias, o que torna possível expandir os
85
seus conhecimentos através das práticas além da teoria. O progresso destes estudantes
dia após dia é visível nas aulas teóricas, em laboratório e de campo, como as visitas a
zoológicos, trilhas ecológicas e outros futuros cursos, sendo de grande aprendizado e
experiência, tornando-os preparados e capacitados para o mercado de trabalho.
O projeto teve como foco, além de contribuir de forma ativa no conhecimento
dos alunos acerca dos conteúdos ministrados em sala de aula, dar-lhes oportunidade de
pleno desenvolvimento e crescimento profissional, podendo ainda, contribuir com aqueles
que mais merecem e precisam de estímulos, incentivando-os a interação social. Visou
também, a interdisciplinaridade dos componentes curriculares envolvidos e o desenvol-
vimento do estudante, enquanto aluno e contribuidor de conhecimento na sociedade
onde se encontra. Auxiliando-o a ter um contato mais aprofundado com a o conteúdo
a ser aprendido para que consigam interpretar e compreender com mais facilidade o
objetivo da prática e seu resultado, que é positivo para sua vida e sua carreira em sociedade.

REFERÊNCIAS
BENYUS, J. M. (2002). Biomimicry: innovation inspired by Nature. Perennial.
BRASIL. Base Nacional Comum Curricular: educação infantil e ensino fundamental. Brasília: MEC/
Secretaria de Educação Básica, 2017. Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/images/
BNCC_EI_EF_110518_versaofin al_site. pdf. Acesso em: 12 ago. 2021.
CHAVES, André. A importância da utilização dos equipamentos de proteção individual e coletiva na prevenção
de acidentes. Riscos Ambientais – Identificação e Prevenção. Revista ambiente acadêmico, v.4, n.1, jan./jun. 2018.
COSTA, A.C.G. O adolescente como protagonista. In: BRASIL, Ministério da Saúde. Secretaria de Saúde.
Área de Saúde do Adolescente. Cadernos, juventude saúde e desenvolvimento. v.1. Brasília, 1999.
Dalgallo, L.; Monteiro, C. F. S. R. Metodologias Ativas no Ensino de Enfermagem: Impactos no Desempenho
dos Estudantes. Revista Contexto & Educação, 37(118), e12819. V. 37 n 118, 2022.
FORTES, C. C. Interdisciplinaridade: origem, conceito e valor. Revista acadêmica Senac on-line. 6a ed.
setembro-novembro, 2009.
FREIRE, Paulo. Centenário de Paulo Freire. Darcy, Revista de Jornalismo científico e Cultural da Univer-
sidade de Brasília. Nº26. Pág. 5. Outubro de 2021 a Janeiro de 2022.
GIROUX, Henry; SIMON, Roger. Cultura popular e pedagogia crítica: a vida cotidiana como base para
o conhecimento curricular. In: MOREIRA, Antonio Flávio; SILVA, Tomas Tadeu da (Orgs.). Currículo,
cultura e sociedade 2. ed. São Paulo: Cortez, 1995. p. 93-124.
MORAN, J. Metodologias ativas para uma aprendizagem mais profunda. Metodologias ativas para uma
educação inovadora: uma abordagem teórico-prática. Porto Alegre: Penso, p. 02-25, 2018.
PADLET. Disponível em: https://padlet.com/anapclaudia/1moytqtl3b2e5p08 Acesso em: 05 set. 2022.
TROIANI, Leonice. “IMPORTÂNCIA DO USO DOS EQUIPAMENTOS DE PROTEÇÃO INDI-
VIDUAL.” Anuário Pesquisa e Extensão Unoesc Chapecó 4 (2019): e21361-e21361.

86
DIFICULDADES DE ALUNOS SURDOS EM
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO NO
CONTEXTO PANDÊMICO

Maria Márcia Fernandes de Azevedo32


Ananias Agostinho da Silva33

INTRODUÇÃO

Este ensaio trata das dificuldades de alunos surdos de pós-graduação e


como essas dificuldades se acentuaram no atual contexto pandêmico. Utiliza-se
do método qualitativo, através de registros em vídeo das narrativas de alunos
surdos que frequentam ou que já concluíram o mestrado, nas quais os sujeitos
colaboradores têm a oportunidade de enumerar as principais dificuldades viven-
ciadas – e como foram superadas – durante a sua formação, tendo em vista a
temática da educação de surdos, focando nas dificuldades encontradas durante
os cursos em programas de mestrado.
Sobreposto às dificuldades, também refletimos sobre a condição do sujeito
surdo na busca por uma formação, ao mesmo tempo em que enfrenta as crises
geradas pelo isolamento social provocado pela pandemia do novo coronavírus.
Para a análise, os registros foram coletados em vídeo, pois, como todos os
sujeitos da pesquisa eram usuários da Língua Brasileira de Sinais (Libras) e esta,
por sua vez, é da modalidade visual, então, para o registro ser fiel ao que os cola-
boradores disseram, consideramos interessante que seja capturado em vídeo, em
sua língua materna e só depois traduzido para o português.
Por causa do distanciamento social, essa coleta de vídeos se deu por meio do
WhatsApp, com dois pesquisadores surdos que já concluíram seus respectivos mestra-
dos. O perfil dos colaboradores segue os seguintes critérios: todos são sujeitos surdos,
mestres com titulação obtida em universidades públicas no estado do Rio Grande
do Norte, professores do ensino superior com experiência no ensino da Libras.
Somam-se os diversos problemas que a pandemia do novo Coronavírus
trouxe, por ser uma doença nova e que se alastrava pelo mundo sem termos ainda

Mestranda em Ensino (UFERSA). CV: http://lattes.cnpq.br/3651499294538617


32

Doutor em Estudos da Linguagem (UFRN). Professor adjunto (UFERSA).


33

CV: http://lattes.cnpq.br/6624168203166513
87
um remédio, tratamento ou vacina conhecidos nos colocou em um momento de
crise em nível mundial, afetando-nos nas áreas de saúde, economia, política e
inclusive a educação. Alguns cuidados foram sendo tomados, como as regras de
isolamento social e de permanência em quarentena para a diminuição da prolife-
ração do vírus, que em alguns casos é mortal.
Este trabalho divide-se em três tópicos: no primeiro tópico aborda-se breve-
mente a história da educação dos surdos no Brasil, uma história de luta contínua
a fim de um direito básico, o direito à educação. Ressalta-se, neste contexto, o
reconhecimento da Libras com o status de Língua em 2002, com a regulamen-
tação da lei nº 10.436 e as mudanças impulsionadas na formação de professores
habilitados para o ensino de Libras, fato que nos move a buscar formação.
Segue um segundo tópico abordando as principais dificuldades que alunos
de programas de pós-graduação vivenciam, por meio de breves narrativas enviadas
pelos colaboradores, que nos contam as barreiras linguísticas e as dificuldades
que todos e quaisquer alunos que buscam por formação enfrentam. O terceiro
tópico trata das dificuldades relatadas anteriormente somadas à atual conjuntura
pandêmica, quando o isolamento social e o ensino remoto agravam e apresentam
novas dificuldades; como também as impressões e sentimentos aflorados pela
autora, aluna surda do programa de pós-graduação em ensino, o POSENSINO.

CONTEXTO HISTÓRICO: UM BREVE RELATO SOBRE A BUSCA


DA COMUNIDADE SURDA PELO DIREITO À UMA EDUCAÇÃO
DE QUALIDADE

A história da educação dos surdos no Brasil e no mundo é marcada por lutas.


A principal dificuldade é o direito à fala, pois sempre os ouvintes direcionaram o
que seria melhor para as pessoas surdas, principalmente, no campo educacional.
Isso se deu devido à falta de uma Língua reconhecida para a comunidade. Hoje
essa realidade é distinta, após muitas lutas, o povo surdo do Brasil tem o seu direito
linguístico reconhecido e valorizado; entretanto, a luta ainda não terminou, há muitas
batalhas a travar para que os direitos da pessoa surda sejam de fato legitimados.
No Brasil, a educação de surdos se institucionalizou com a fundação do
Instituto de Surdos-Mudos, o atual INES – Instituto Nacional de Educação de
Surdos, com sede no Rio de Janeiro. Sua criação data de 26 de setembro de 1857,
quando o professor surdo francês Ernest Huet veio ao Brasil a convite do então
Imperador D. Pedro II para fundar esta escola.
88
A metodologia da época adotava a instrução dos surdos por meio de uma
linguagem escrita, articulada e falada, datilologia e sinais. O curso tinha a duração
de seis anos e era oferecido a alunos do sexo masculino, entre as idades de sete a
dezesseis anos. A grade curricular tinha disciplinas como a de “Leitura sobre os
Lábios”, voltada aos que apresentavam aptidões a desenvolver a linguagem oral.
Havia uma seleção e, consequentemente, o trabalho era diferenciado para os que
não tivessem condições de serem oralizados. Assim se deu o primeiro contato dos
surdos brasileiros com a Língua de Sinais, a língua de sinais francesa.
Em nível global, o Congresso de Milão foi um evento internacional que
aconteceu em 1880, na Itália, e reuniu líderes e professores dos principais insti-
tutos de educação dos Surdos da época, além de líderes do movimento ouvintista.
O grupo de ouvintes presentes, que era a maioria, decidiu por votos unânimes
pelo método Oralista, afetando a perspectiva da educação dos surdos em todo
o mundo. Houve a proibição do uso de línguas gestuais, só sendo permitido
nas escolas o ensino de línguas orais. Strobel e Perlin (2008) afirmaram que se
provocou um atraso de mais de cem anos até que os marcos estabelecidos no
Congresso de Milão fossem revertidos.
Vale ressaltar que o método oralista é um modelo clínico, que visa a integra-
ção do surdo no grupo de ouvintes e percebe a surdez como deficiência. Goldfeld
(2002) aponta que, para ocorrer essa integração, o sujeito surdo deve aprender
a falar por meio de reabilitação da fala em busca da “normalidade” que a socie-
dade exige. A autora destaca que
O Oralismo percebe a surdez como uma deficiência que deve ser
minimizada pela estimulação auditiva. Essa estimulação possibilita-
ria a aprendizagem da língua portuguesa e levaria a criança surda a
integrar-se na comunidade ouvinte e desenvolver uma personalidade
como a de um ouvinte. Ou seja, o objetivo do Oralismo é fazer uma
reabilitação da criança surda em direção à normalidade (GOLD-
FELD, 2002, p. 34).

Após o Congresso de Milão, o método Oralista passou a ser utilizado tam-


bém no Brasil. Com a proibição das línguas de sinais, se deu uma luta longa e
sofrida do povo surdo. Luta essa que objetivava defender o direito linguístico ao
uso da sua língua natural, a língua de sinais, pois nem todos aprenderam a oralizar.
Foram mais de 100 anos de retrocesso até a conquista do reconhecimento das
línguas de sinais pela Linguística.

89
Nesses mais de 100 anos de Lutas, as comunidades surdas não se calaram
diante das dificuldades. Apenas em 2002, com a Lei 10.436, que se reconheceu a
Língua Brasileira de Sinais como língua e forma de comunicação das comunidades
surdas no Brasil e foi a partir dela que avanços e mudanças efetivas aconteceram,
principalmente no âmbito educacional. (BRASIL, 2002).
O Decreto 5.626, de 2005, regulamentou essa Lei, estabeleceu sobre cursos
de formação para o ensino da Libras, criou a graduação em Letras Libras, definiu
prazos e outros. Esses foram os primeiros passos para que os cursos de Letras Libras
surgissem a fim de profissionalizar professores habilitados ao ensino de Libras.
Consequentemente, as comunidades surdas puderam sonhar com uma formação
adequada e condizente com o que almejam, gerando uma popularização e maior
procura dos sujeitos surdos por uma educação de qualidade e estimulando a cria-
ção de cursos de formação em Libras e cursos em que a presença de intérpretes
garantisse a acessibilidade. As associações também fortaleceram a comunidade
Surda. Estudos linguísticos e literários em/sobre Libras surgiram, possibilitando
que estes sujeitos contem suas histórias e registrem sua forma de perceber o mundo,
em suma, a sua cultura. “A intenção de trazer para este espaço a cultura surda, uma
cultura contestada e periférica, e captar como ela adentra como espaço da história
cultural, é necessária.” (STROBEL; PERLIN, 2014, p. 24).
Mostrar esse percurso histórico fortalece nossa construção cultural, enfren-
tar as dificuldades e criar espaços para discuti-las é salutar. Apesar dos avanços
advindos com a lei, ainda há muito o que lutar até se obter uma educação bilíngue
para os surdos e a aceitação de fato da cultura surda. A necessidade de aceitação e
respeito da comunidade surda em sua especificidade corrobora com o que Strobel
(2008, p. 30-31) afirma, que “[...] uma cultura é um conjunto de comportamentos
apreendidos de um grupo de pessoas que possuem sua própria língua, valores,
regras de comportamento e tradições.”
As maiores dificuldades enfrentadas na educação e as resistências para viver
em sociedade envolvem os seguintes agravantes:
1) Quanto à comunicação: por viver em uma sociedade majoritariamente
ouvintista, a língua de sinais, que é de modalidade visual, ainda não tem o seu
espaço legitimado e é uma língua ainda bastante desconhecida pelas pessoas
ouvintes, gerando diversas barreiras comunicacionais;

2) Quanto à aquisição da linguagem: a falta de ensino adequado e a falta de


profissionais empáticos e qualificados para o ensino de libras ainda é signifi-
90
cativa em todo o país, essa situação gera defasagens no processo educacional
das crianças surdas, atraso no processo de aquisição de linguagem e diversos
prejuízos em seu desenvolvimento;

3) Professores ouvintes dando aula a surdos: Na educação de surdos, ainda


se encontra, comumente, profissionais que desconhecem a língua de sinais e
suas metodologias, ou seja, cultura surda, identidade surda e língua de sinais
não são repassadas no ensino por estes profissionais ouvintes, não alcançando
o que Strobel e Perlin (2008) indicam: “um jeito surdo de aprender requer
um jeito surdo de ensinar”;

4) A falta de profissionais intérpretes realmente qualificados para promover


uma acessibilidade adequada traz prejuízos à inserção no ambiente comuni-
cacional acadêmico, que, que por meio deste serviço, deveria estar disponível
em nossa língua materna; e

5) A falta de acesso a informações: ainda é restrito o acesso a informações


gerais em Libras nos mais diversos meios de comunicação.
Esse é um aporte geral do que enfrentam os surdos. A sociedade não vê a
pessoa surda como um sujeito capaz, que possa trabalhar ou estudar; ainda são
rotulados como pessoas deficientes, incapazes. Como Quadros e Perlin (2012)
afirmam, “os surdos muitas vezes não são vistos pela sociedade por suas potencia-
lidades, mas pelas limitações impostas por sua condição.” As autoras atestam que
a imposição das dificuldades “[...] acontece por causa de um atraso na aquisição
da linguagem que os surdos têm no seu desenvolvimento, já que, na maioria das
vezes, o acesso a ela é inexistente.”

SUJEITOS SURDOS EM PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO:


DIFICULDADES, LUTAS E CONQUISTAS

Os alunos de uma pós-graduação enfrentam diversas dificuldades, como


acompanhar o aumento gradativo no ritmo de estudo, aprender a ser efetiva-
mente um pesquisador e prezar pelos prazos e descobertas, há os que não acom-
panham o ritmo e desistem, outros seguem e se colocam à prova a todo o tempo,
nesta etapa que exige esforço e dedicação a quem se propõe. Além disso, o alto
nível das leituras exigidas e a falta de costume com o vocabulário são pontos
elencados como as maiores dificuldades pelos meus colegas de turma durante
nossas poucas aulas presenciais.

91
Sujeitos surdos, além de enfrentarem essas mesmas dificuldades dos ouvintes,
enfrentam também os percalços de fazerem uma pós-graduação em uma língua dife-
rente da sua língua materna. Elencar essas dificuldades é ponto central deste trabalho.
Acessar as respostas enviadas pelos sujeitos da pesquisa, em que expõem
suas dificuldades enquanto alunos de mestrado, nos faz perceber as dificuldades
e os anseios. Essas dificuldades são tema recorrente nas rodas de conversa, sendo
citado como fator de exclusão e sentimentos de injúria.
Ao dialogar com esses colegas, perguntamos sobre: “Da época em que você
era aluno de programas de mestrado, poderia resumir elencando as principais
dificuldades que encontrou, os sentimentos que te desafiaram?” A conversa foi
informal e registrada via Whatsapp, pois, devido à pandemia do novo coronavírus,
os contatos pessoais diretos eram desaconselhados nesse momento.
Então minhas principais dificuldades foram três, a primeira era com a
interpretação, pois os intérpretes pouco conheciam, eram novos na área e de
nível médio, então experiência com o mestrado eles não tinham, por isso seus
vocabulários eram simples. As leituras eram muitas, e exigia de mim um
esforço muito maior para as pesquisas complementares. E o tempo que era
reduzido também por causa do deslocamento para ir às aulas. Mas mesmo
com as dificuldades eu me esforcei e passei por essa fase de minha formação,
em casa eu aproveitava cada tempinho para ler e pesquisar, confesso que
não aprendi tudo, muita coisa se perdeu em meio a essas dificuldades, mas
eu consegui finalizar. (LUCIANA, 2020).

Comecei no ano de 2017, foi pelo POSENSINO, que surgiu de uma parceria
de três instituições: a UFERSA, o IFRN e a UERN, na cidade de Mossoró.
O começo pra mim foi bem difícil, eu estudava e trabalhava em cidades
diferentes, então me deslocava para conseguir conciliar as duas coisas. O
grupo de alunos e professores me conheciam e sabiam que eu sou surdo, então
as interações me ajudavam a entender melhor as aulas, porque de início
eu não entendia, mas eu buscava, pesquisava temas, realizava estudos a
fim de chegar aos conhecimentos. Com o passar do tempo, consegui também
a ajuda de intérpretes que se solidarizavam, mas eram ocupados, pois os
intérpretes de instituições tinham os seus cronogramas de trabalho, mas,
mesmo assim, voluntariamente me ajudavam. Seria bom a POSENSINO
ter em suas proposta a garantia desse auxílio contratando profissionais para
dar esse suporte, pode ser um surdo ou intérpretes próprios.

Outra dificuldade foi o tempo, sei que essa dificuldade todos passam, mas
para os usuários do português, o exercício de leitura e escrita é mais uni-
92
forme, pois já conhecem a estrutura da língua, mas para eu poder conseguir
demorou mais, mas eu não parei ou esperei ajuda, eu continuei até conseguir.
(MARCOS, 2020).

Nota-se que é comum a Luciana e a Marcos34 as seguintes dificuldades: 1) O


deslocamento de um município a outro; 2) A necessidade em fazer pesquisas com-
plementares para compreender os textos; 3) O fator tempo para conciliar trabalho e
atividades do mestrado; 4) A necessidade de ajuda de colegas, professores e intérpre-
tes nesse processo; e 5) A empatia de todos para que as dificuldades fossem sanadas.
As dificuldades foram sendo superadas e o momento de demonstrar o
dever cumprido se daria na fase de conclusão com a dissertação. Porém, no
atual contexto pandêmico, as dificuldades foram agravadas e o sentimento de
dever cumprido ficou longínquo, porque os surdos necessitam de uma rede de
apoio segura, já que as problemáticas com o distanciamento físico e as incertezas
que afloraram foram acentuados.

SUJEITOS SURDOS EM PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO


DURANTE A PANDEMIA DO CORONAVÍRUS NO ANO DE 2020:
DIFICULDADES ACENTUADAS, MAIS LUTAS E O SONHO DA
CONQUISTA

Conforme as regras da OMS em nível mundial, o isolamento social foi a


medida para diminuir o contágio e a propagação do coronavírus, diante disso,
mudanças e adaptações foram adotadas durante a pandemia. Quem atua em
contextos educacionais precisou se distanciar das aglomerações das salas de aulas
presenciais. Assim, as universidades adotaram medidas de distanciamento social
até que se permitisse um retorno seguro das atividades presenciais, inclusive,
algumas adotaram o ensino remoto.
O ensino remoto surge como opção segura diante do contexto pandêmico
e da indicação de isolamento social. Utiliza-se de recursos tecnológicos enquanto
cada um fica na segurança da sua casa e os processos de ensino e aprendizagem
não ficam totalmente paralisados. Frisamos que o ensino remoto é diferente do
que é praticado no EaD, apesar de terem semelhanças, a prática é diferente no
que se refere a metodologias, estratégias e plataformas de acesso.
O fato de não haver os encontros presenciais obriga a todos a se submeterem
a adaptações e mudanças drásticas na rotina. O Home office e o ensino remoto
34
Os nomes foram trocados para preservar a identidade dos interlocutores.
93
ficaram mais usuais e isso implicou na fusão da rotina de casa com as práticas
de trabalho e estudo, surgindo dificuldades sem precedentes na rotina de muitos
profissionais e estudantes de todos os níveis de ensino.
Foi possível elencar dois grupos de dificuldades: um referente às dificuldades
decorrentes da situação de pandemia e outro referente às dificuldades derivadas espe-
cificamente dos processos de ensino remoto e acompanhamento das aulas on-line.
1) Quanto às dificuldades pessoais derivadas da pandemia: 1.1) Ter que
se deslocar de lugar por causa da pandemia (em distanciamento social na casa
dos pais); 1.2) Se afastar do contexto de trabalho com a consequente perda da
oportunidade de receber apoio dos colegas de trabalho (dos colegas professores,
intérpretes e estagiários) para realizar seus estudos; e 1.3) O convívio com familiares
que não dominam a Libras, com a comunicação restrita às necessidades essenciais
da rotina e nenhum deles apoiando nas atividades acadêmicas.
2) Quanto às dificuldades de adaptar-se ao ensino remoto e aulas on-line:
2.1) Adaptar-se ao uso de tecnologias assistivas e plataformas online que até então
tinha-se nenhuma ou pouca familiaridade; 2.2) Ter que prestar atenção simultânea
tanto para a comunicação dos intérpretes quanto para as expressões do rosto da
professora e dos colegas da turma (e fazer ligações entre quem é o interlocutor e
o seu respectivo discurso); 2.3) Ter necessidade de usar dois aparelhos ao mesmo
tempo (celular, notebook, computador etc.) para conseguir acompanhar parcial-
mente a aula; e 2.4) Dificuldade para conseguir uma comunicação adequada tanto
com a professora quanto com os intérpretes e colegas da turma, afetando desse
modo a qualidade do aprendizado obtido.
No entanto, algumas estratégias adotadas têm favorecido uma maior adaptação
quanto aos estudos de pós-graduação: 1) Professores e colegas de algumas aulas
ajudam dando suporte nas leituras dos textos e atividades (via remota e também
via WhatsApp); 2) Participação em grupos de estudo formados por colegas da
turma, para leitura e discussão dos textos indicados pelos professores; 3) Possi-
bilidade de assistir muitos webinários que agora são oferecidos em LIBRAS; 4)
Presença de intérpretes de LIBRAS em quase todas as atividades online, com ou
sem a solicitação do professor; e 5) Disponibilidade dos intérpretes para apoio na
correção das atividades e orientação sobre os textos produzidos antes da entrega
aos professores, fato que garante maior qualidade das tarefas exigidas nas disci-
plina, mas são poucos intérpretes que se tem disponível para este tipo de suporte.

94
RELATO PESSOAL DA PRIMEIRA AUTORA DO TRABALHO

Com as notificações de casos do Coronavírus aqui no Brasil, no mês de


março de 2020, foi decretado o isolamento social e me desloquei da cidade
onde resido no estado do Rio Grande do Norte para a casa dos meus pais, no
Ceará. Lá eles moram sozinhos e, nesse contexto, ficamos nós três residindo na
mesma casa, mantendo os cuidados e respeitando as regras do isolamento social.
Surgem aí algumas dificuldades, pois eles já são idosos e com muitas limitações,
com o agravante de sermos usuários de línguas diferentes, eu uso a Libras e
eles o Português. Apesar de termos uma comunicação caseira, ela é básica e
simples, com poucos diálogos mais aprofundados já que eles não sabem Libras.
No mestrado, no ano de 2020, cursei três disciplinas, mais as orientações
do projeto que pretendo desenvolver para a minha dissertação. E as dificuldades
encontradas são: grande quantidade de material para leitura e textos cada vez mais
densos, sei que os colegas ouvintes também compartilham dessas dificuldades.
Alguns textos são densos e me faz falta o presencial, pois era costume contar
com a ajuda de professores colegas de trabalho e dos tradutores intérpretes que
trabalham na mesma instituição, fluentes em ambas as línguas, que me auxiliavam
com esse exercício de leitura. Presencialmente era costume um intérprete fazer a
tradução do texto e debatê-lo comigo. No entanto, no contexto pandêmico, não
consigo mais esses auxílios, ficando complicado sanar minhas muitas dúvidas.
Os professores estipulam prazos de envio das atividades, mas raramente
eu consigo cumpri-las. É quase impossível para mim, pois, quando realizo as
tarefas, sempre preciso do apoio de um intérprete para fazer as devidas cor-
reções e ajustes no texto que redijo. Eu entendo esse processo enquanto uma
tarefa pesada, afinal de contas, a estrutura da língua portuguesa e da Libras são
totalmente diferentes, soma-se o agravante da complexidade dos textos, que
não são de fácil leitura, o que exige mais esforço.
Costumo solicitar auxílio via WhatsApp ou por e-mail, peço aos intérpre-
tes mencionados e aguardo um retorno, as dúvidas geralmente são: quanto aos
significados de palavras e de contextos que não consigo compreender durante
essas leituras. A resposta por vezes demora, não sendo de imediato, por vezes
me gera atraso ou perda da informação que preciso.
Há bastante diferença entre as aulas remotas e as presenciais. As platafor-
mas usadas, mesmo com um bom enquadramento, se distanciam do presencial,
pois, em sala de aula, eu me sento próximo ao intérprete e tenho uma visão
95
confortável do professor, de toda a turma e do intérprete, e quando o professor
ou os colegas falam, eu consigo visualizar ao mesmo tempo quem está falando
junto ao enunciado produzido pelo intérprete, isso ajuda a compreender o
quê, como e quem está falando.
Mas na aula remota, com cada um na sua casa e a aula em telas, ainda que
haja pontos positivos, os negativos são significativos. Por exemplo, no canto
da tela, eu vejo a professora falando e, em outro canto da tela, vejo o intér-
prete e os demais alunos. Preciso fixar e aumentar a tela do intérprete, e assim
compreendo o que é falado, porém, deixo de ver os outros e nunca sei quem
enunciou a fala. Os intérpretes até tentam mostrar quem fala, mas ainda assim
não os vejo, sendo difícil distinguir se o enunciado é do professor ou de um
aluno. Às vezes, paro de ver o intérprete para procurar saber quem está falando.
Existe a opção de ficar com várias janelinhas pequenas para ver todos,
mas para compreender o intérprete tenho que me aproximar muito da tela.
Pode parecer pouco, mas essa é uma dificuldade. Quando o intérprete fica no
canto direito sempre tem algo que corta a imagem ou, quando fica na parte de
baixo, as mensagens do chat ficam sobrepondo a sua janela, impossibilitando
de ver a interpretação; ou quando o professor faz uma apresenta slide, vídeo ou
imagem essa tela fica em destaque, as outras pessoas ficam de lado e a janela
do intérprete some. Assim, preciso recorrer a uma segunda tela, a do telefone.
Tentei resolver esse problema entrando nas aulas com dois aparelhos
ao mesmo tempo. No computador, fixo a janela do intérprete e visualizo só
ele e, no celular, deixo a aula que fica alternando entre quem está falando.
Dessa forma consegui acompanhar com maior qualidade, ajudou-me a fazer
as conexões e compreender melhor a aula, entretanto só descobri essa estraté-
gia recentemente, nas últimas aulas. Para os alunos ouvintes é preciso apenas
um aparelho e o fone de ouvido, enquanto para mim são necessários mais
recursos, gerando maior trabalho.
A dificuldade com a leitura dos textos de todas as disciplinas, infelizmente,
é um grande desafio para mim, uma das maiores dificuldades que enfrento. Os
textos são todos em Português e nenhum em Libras. Contei com a criação de
um grupo de estudos de uma disciplina, de suma importância para a compreen-
são dos conteúdos de algumas aulas, quando discutíamos os textos, em caso de
dúvidas, me sentia confortável para perguntar. Interagimos bem e gostei muito.

96
Contudo, não tive a mesma ajuda nas demais disciplinas, não recebi esses apoios
tão importantes nas interações com trocas de e-mails, mensagens, etc.
Um fato interessante desse atual momento, estão acontecendo muitos
eventos on-line sobre temas diversos e interessantes com interpretação em Libras.
Diferente do que acontecia presencialmente, ao ir a eventos e palestras e, me
deparar com a falta de intérpretes. Mesmo para obter informações básicas falta
o acesso em Libras, inclusive nos eventos em que me inscrevo e indico a neces-
sidade de interpretação. A inclusão linguística não acontece ainda plenamente,
os colegas ouvintes participam e eu me sinto obrigada a participar como eles,
mas falta esse cuidado por parte de alguns eventos para com os alunos surdos.
Percebo que os eventos on-line estão buscando se adaptar para res-
peitar a inclusão linguística que os surdos necessitam. Há participação da
comunidade surda de todo o Brasil, pois há interesse em buscar informações.
Se, nas aulas e eventos locais nos programas de pós-graduação, tivessem esse
mesmo cuidado que nos eventos online, poderiam estimular os alunos surdos
a se sentirem mais incluídos e motivados, estimulando mais comprometi-
mento e diminuindo as dificuldades.

REFERÊNCIAS
BRASIL. Decreto nº 5.626, de 22 de dezembro de 2005. Regulamenta a Lei nº 10.436, de 24 de abril de
2002, e o art. 18 da Lei nº 10.098, de 19 de dezembro de 2000. Diário Oficial da União, 2005. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2005/Decreto/D5626.htm. Acesso em: 26 jul. 2022.
BRASIL. Lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002. Dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais – Libras e dá
outras providências. Diário Oficial da União, 2002. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/cCivil_03/
LEIS/2002/L10436.htm. Acesso em: 26 jul. 2022.
GOLDFELD, Marcia. A criança surda – linguagem e cognição numa perspectiva sociointeracionista. 2.
ed. São Paulo: Plexus, 2002.
LUCIANA. Narrativa Autorreferencial. 26 de Junho de 2020.
MARCOS. Narrativa Autorreferencial. 25 de Junho de 2020.
QUADROS, R. M. Educação de Surdos: a aquisição da linguagem. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.
QUADROS, R. M.; PERLIN, G. Estudos surdos II. Petrópolis: Arara Azul, 2012.
STROBEL, Karin. As imagens do outro sobre a cultura surda. Florianópolis: Editora UFSC, 2008.
STROBEL, Karin; PERLIN, Gladis. História cultural dos surdos: desafio contemporâneo. Educar em
Revista, Curitiba, Edição Especial n. 2, p. 17-31, 2014.
STROBEL, Karin; PERLIN, Gladis. Fundamentos da educação de surdos. Universidade Federal de Santa
Catarina. Florianópolis: Licenciatura em Letras/Língua Brasileira de Sinais, 2008.

97
TODOS PELA EDUCAÇÃO. Ensino a distância Educação Básica frente à pandemia da Covid-19. Nota
técnica. online. 2020. Disponível em: todospelaeducacao.org.br/_uploads/_posts/425.pdf?1730332266=&utm_
source=conteudo-nota&utm_medium=hiperlink-download. Acesso em: 23 jul. 2020.
VILLEGAS, Maria Margarita. La perspectiva histórico-cultural y su impacto sobre la investigación de la
docencia. Revista Actualidades Investigativas en Educación, v. 14, n. 1, p. 1-17, 2014.

98
VIVÊNCIAS DE ALUNOS(AS) EM UM PROJETO DA
UNIVERSIDADE ABERTA DA PESSOA IDOSA

Gislaine Cristina Vagetti35


Gerson Flores-Gomes36
Renata Faleiros Lopes37
Lydio Roberto Silva38
Breno Tomazino Jesus39
Karoline Mucellin Krug40
Hermes Soares41
Valdomiro de Oliveira42

INTRODUÇÃO

No Brasil, as pessoas chegam à fase idosa da vida aos 60 anos de idade, tendo
percorrido as fases da infância, adolescência e adulta. O envelhecimento humano
ocorre ao longo da vida da pessoa e possui características comuns e particulares
a esta população: comuns quando este processo é analisado quanto às mudanças
morfofisiológicas decorrentes do processo natural de desgaste e degeneração dos
componentes orgânicos do corpo humano e particular, num processo chamado
de diferencial, quando as características dessas degenerações ocorrem de forma
diferente para cada pessoa (PARENTE; OLIVEIRA JUNIOR; et al., 2009).
Com o avanço da ciência, em diversas áreas, a expectativa de vida humana vem
aumentando progressivamente, e o envelhecimento demanda de ações políticas, econô-
micas e sociais. Neste sentido, o envelhecimento humano possui algumas designações:
ele pode ser usual ou normal, bem-sucedido (ou ótimo) e com patologias (NERI,
1993). A depender de diversos fatores, a fase idosa da vida pode ser vivida com saúde
ou, ao contrário, caso a pessoa em desenvolvimento não tenha adotado bons hábitos
de saúde, como uma boa alimentação, atividades físicas, atividades educacionais que
35
Doutora em Educação Física (UFPR). Professora Associada do Curso de Musicoterapia da UNESPAR.
CV: http://lattes.cnpq.br/8495637038816664
36
Doutorando em Educação (UFPR). CV: http://lattes.cnpq.br/8074053185010280
37
Mestranda em Educação (UFPR). CV: http://lattes.cnpq.br/5108830728623771
38
Doutorando em Educação (UFPR). Professor Assistente do Curso de Musicoterapia (UNESPAR).
CV: http://lattes.cnpq.br/9826437349331237
39
Graduando do Curso de Musicoterapia (UNESPAR). CV: http://lattes.cnpq.br/5563267966456985
40
Graduanda do Curso de Musicoterapia (UNESPAR). CV: http://lattes.cnpq.br/4305706862894916
41
Doutorando em Educação (UFPR). Professor Assistente do Curso de Musicoterapia (UNESPAR).
CV: http://lattes.cnpq.br/1619832393419485
42 
Doutor em Educação Física (UNICAMP). Professor Associado do Curso de Educação Física (UFPR).
CV: http://lattes.cnpq.br/6294139982602854
99
possibilitem a manutenção cognitiva, estará com uma grande possibilidade de ter
uma péssima experiência na maturidade, que além dos prejuízos físicos e cognitivos,
poderá adicionar o sofrimento psíquico e depressão (GOMES, 2019).
Atividades educacionais específicas para idosos vêm sendo desenvolvidas há
muito tempo, buscando um melhor bem-estar e qualidade de vida para esta população,
e este movimento educacional é um fenômeno considerado particularmente humano.
Para Oliveira, Scortegagna e Oliveira (2015), a educação posiciona o ser humano
como um ente histórico e social no mundo, contribuindo para seu desenvolvimento.
Neste sentido, a primeira experiência ocorreu no século XVIII (em 1727), nos
Estados Unidos da América, utilizando o ensino religioso com o propósito de desenvolver
a cidadania. Por fim, em 1960 (na França) foi criada a primeira Universidade do Tempo
Livre, que buscava utilizar de diferentes atividades culturais para melhoria do bem-estar
dos idosos, que proporcionou o movimento de criação das Universidades da Terceira
Idade em todo o mundo (OLIVEIRA, SCORTEGAGNA e OLIVEIRA, 2015).
No Brasil, ainda são poucas as referências do docente nesses espaços, espe-
cialmente em relação à sua experiência e às práticas adotadas nas aulas. O primeiro
relato sobre metodologias e formação destinadas a professores de um programa de
Universidade da Terceira Idade encontra-se na dissertação de Alves (1997), em que
defende que a questão pedagógica pode ser frágil se adotada apenas a transposição
de métodos de ensino aplicados nos cursos de graduação e pós-graduação, aspecto
este inadequado ao ensino de pessoas idosas (CACHIONI, 2015).
Portanto, além da experiência dos docentes da UAPI, o intento primeiro
deste relato é fazer compreender os significados das vivências dos alunos no con-
texto educacional da universidade da pessoa idosa.

METODOLOGIA

Este estudo é um relato de experiência sobre a vivência dos alunos da UAPI,


com enfoque qualitativo e de alcance descritivo (SAMPIERI, COLLADO e
LUCIO, 2014). Foram descritas as atividades e experiências vivenciadas pelos
discentes da turma inaugural de 2021.

PROJETO DA UNIVERSIDADE ABERTA DA PESSOA IDOSA (UAPI)

O Projeto tem como objetivo desenvolver ações interdisciplinares voltadas ao


processo de valorização humana, social, e do resgate da cidadania dos idosos, buscando
100
realizar atividades que deem visibilidade a identidade da pessoa idosa em suas expe-
riências, vivências e conhecimentos. Possui carga horária mínima de 208 horas, dis-
tribuídas em 03 semestres letivos, dois dias na semana, no período da tarde, iniciando
às 15h e terminando às 16h30, de forma remota, devido à pandemia de COVID-19.
O corpo docente foi constituído por educadores da Instituição e convidados
externos, oriundos do programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade
Federal do Paraná. Ao todo foram ofertadas 70 vagas, para pessoas idosas, ou seja,
com 60 anos ou mais, de todos os gêneros. As disciplinas para o semestre inicial
foram: Canto AtivaMente; A Era do Rádio: Memórias Sonoras; Redes Sociais;
Atividade Física e idosos; As músicas das nossas vidas e Exercícios Rítmicos com
voz e corpo. No segundo semestre também foram ofertadas as disciplinas: Música
é História: Ressonâncias do Brasil na Era do Disco; Atividade Física; Oficina de
Memórias; Administração Financeira; Canto e Apreciação Musical.
O convite para o curso foi feito por meio de cartazes que traziam os detalhes da
grade curricular, dados para inscrição e QR-CODE para acesso rápido e a divulgação
foi realizada pelas redes sociais e no Facebook. As reuniões foram conduzidas com o uso
da plataforma Google Meet (GOOGLE, 2022), com acesso por computador, tablet ou
smartphone do (a) idoso (a). Foram criados 2 grupos no aplicativo WhatsApp: UAPI/
Unespar, com o propósito de garantir as relações interpessoais entre os idosos, trocas de
mensagem sobre experiências e quaisquer outros temas que os participantes sentiram
desejo de compartilhar e, o grupo UAPI – Materiais, onde ficam disponibilizados os
materiais das aulas e mensagens da coordenação aos participantes.

ANÁLISE DE DADOS

A análise de conteúdo foi realizada com o uso das ferramentas do software


IRaMuTeQ ® (Interface de R pour les analyses multidimensionnelles de textes
et de questionnaires). O software tem por base reduzir as palavras pelo método
de lematização, que se trata de reduzir as palavras até sua raiz, e pela secção de
textos, criando segmentos regulares de palavras.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

O grafo de similitude (figura 1) apresenta uma construção de palavras por


sentido de comunidade, onde as palavras mais importantes estão em negrito, com
um tamanho de fonte proporcional a sua importância e, neste caso, as palavras
fazem sentido juntas, em comunidades. As palavras estão ligadas por linhas que
101
possuem espessura. Estas linhas identificam a ligação entre as comunidades de
sentido e a distância entre elas apresenta a oposição de temas principais.

Figura 1 – Grafo de similitude das palavras que emergiram nas falas dos participantes do 1º e 2º
semestres da UAPI

Fonte: os autores (2022)

Como conduto dessas ações, sobretudo, a partir de visões educacionais liber-


tárias e inclusivas, reconhecer a voz das pessoas idosas, presenciar suas autonomias,
protagonismo e poder de transformação social, permitiu refletir a realidade cons-
truída neste momento social e histórico por qual passa a aldeia global e, especial-
mente o Brasil. Chamar os(as) idosos (as) para que contribuam com suas visões e
experiências de vida para construção de uma nova realidade, é reconhecer-se como
parte integrante e ativa da transformação social que se apresenta. Diz nos Freire que,
O homem se reconhece como sujeito que elabora o mundo; nele, no
mundo, efetua-se a necessária mediação do auto-reconhecimento que
o personaliza e o conscientiza como autor responsável de sua própria
história (FREIRE, 1987, p. 9)

A possibilidade de investir o tempo em atividades diferentes do dia-a-dia


de forma produtiva contribui para a realimentação e dos novos contratos que os
participantes tinham com seu cotidiano, por vezes mecânico e pouco motivador.
Também nesta linha pode-se ouvir:
Esse Ano está aberto a novos conhecimentos.

Professor, foi uma experiência maravilhosa para mim a tal ponto que
abandonei algumas atividades só para me concentrar na UAPI.
102
Como se vê, mais uma vez, a possibilidade de criar perspectivas também
trouxe a consciência de um tempo futuro para aprendizagens. Já sob o ponto de
vista do que fora vivenciado, o contentamento com o relato também é visível na fala:
Olá prof., gostei muito, me surpreendi positivamente com o curso. Em vários
momentos me emocionei a ponto de não conseguir segurar o choro. Lembranças
de meus pais, meu irmão falecido que amei e amo tanto. Porém, o contato com
meus sentimentos por meio dos sons, do cantar, de lembrar quando criança, meus
irmãos e meus pais sentados na cama pra escutar novela no rádio (o direito de
nascer). E tantos outros sons e músicas me fizeram me sentir melhor comigo
mesma. Conhecer a voz (bendita bacia) me ensinou o cuidado da pronúncia e no
tom de voz. Me trouxe segurança e uma sensação. Parabéns a todos professores.

As vozes dos alunos participantes, em muitos momentos carregaram signifi-


cativos teores emocionais, resgate de memórias e ressignificação de seus momentos
presentes. Não foram poucas as situações em que expressaram este contentamento,
como se vê na exposição quando um participante diz:
Bom dia, professor, de grande valia o curso, me fez desabrochar emoções e sen-
timentos perdidos no tempo. Muito agradecida por ter participado. Gratidão!

A possibilidade de aprimorar os relacionamentos intergera-


cionais também foi registrado:
Parabéns professor, vou passar pras netas também o que estou aprendendo.
Já tenho feito algumas coisas com elas, como dar dinheiro e irmos juntas
ao supermercado ver o que podem comprar. Normalmente colocam muita
coisa no carrinho e depois sentamos pra ver o que podem comprar. O que
querem mesmo e o que pode ficar pra outro dia. Uma tem 5 anos e a outra 7.

Outra questão importante levantada pelos alunos é a oferta de temáticas


variadas, de acordo com o interesse dos participantes:
Muito boa a aula!!! Obrigada UAPI por acrescentar esse tema no curso!

Compreender os interesses e as necessidades dos participantes contribuiu


para a sustentar a energia motivacional dos próprios alunos e, certamente, também
dos docentes, pois exigiu dedicação, flexibilidade e esforço na adequação didática
e metodológica durante o trabalho, como se constata em mais uma fala:
Meu coração se alegra grandemente pela oportunidade de participar desse
movimento tão intenso, prazeroso recheado de dedicação, zelo, carinho, amor
por toda equipe que fez esse encontro acontecer!! Obrigado cada um de vocês

103
professores pela entrega!! Obrigado amigos, foi lindo poder compartilhar
esse tempo!! Escrevemos um lindo capítulo da nossa história nesta data!!!

Percebe-se que além de educativas, as atividades da UAPI proporcionaram


uma importante interatividade social, oportunizando trocas de experiências signifi-
cativas a cada participante. De acordo com Baldin e Magnabosco-Martins (2015),
as Universidades Abertas representam um dos espaços que possibilitam ao idoso a
construção de novos papéis sociais, enquanto facilitadoras de reflexões sobre a velhice.
Mais uma vez, obrigada pela dedicação de cada professor. Ficará pra sempre
em meu coração e memória! E adorei conhecer vocês, mais que colegas de
turma, pessoas queridas que fazem parte de minha vida!!

A liberdade instituída com a UAPI a esses idosos, perpassa por essas situa-
ções, e em contato com outros indivíduos promove a comunhão, explícita na vida
social estabelecida pela UAPI, além das aulas (shows, festas, concertos musicais)
e, por esta razão, vai ao encontro ao que Freire diz sobre o fator “liberdade em
comunhão” ativa com outras pessoas: “Ninguém liberta ninguém, ninguém se
liberta sozinho: os homens se libertam em comunhão” (FREIRE, 1987, p. 29)
Nesta perspectiva, a construção do aprender, do ensinar, do aprender ensinando
e do ensinar aprendendo, foi uma das tônicas dos encontros educacionais na UAPI e,
certamente, a troca de percepções e saberes foram reveladoras para docentes e discentes,
um movimento de consciência coletiva a partir de uma postura inclusiva e que privile-
giou todos os possíveis níveis de interações entre todos os participantes. Os momentos
e os espaços de aprendizagem nos encontros foram marcados pelo reconhecimento dos
territórios que constituíam uma visão crítica sobre o real cenário das aprendizagens.
Observa-se que as atividades ofertadas pela Universidade Aberta da Pessoa
Idosa (UAPI), trilham por um caminho positivo enquanto espaço de socialização,
de resgate da cidadania na velhice e valorização das trocas de experiências e do
conhecimento. Diante deste panorama, a UAPI se destaca na participação e inter-
-relação ativa dos idosos e coparticipativa em suas proposições e, no decorrer de
suas atividades, principalmente nos encontros durante as aulas, buscou-se trazer
à memória questões passadas e até mesmo emocionantes para os participantes,
suas histórias criativas, suas produções, seus conhecimentos, suas potencialidades.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A UNESPAR, uma das maiores universidades estaduais, com cursos diferenciados


dos tradicionais, pode promover a qualidade de vida, bem-estar psicológico e social para a
104
população idosa de Curitiba e região, oportunizando a comunidade acadêmica a vivenciar
processos educacionais destinados à população idosa, visto que, é uma demanda social
contemporânea e ainda requer que os vários níveis de ensino trabalhem esta questão.
Assim, após a implementação e desenvolvimento das atividades da UAPI, sob
o ponto de vista dos objetivos do projeto, é possível verificar que houve êxito com
os resultados, pois foi evidente observar que o desenvolvimento de um trabalho
interdisciplinar voltado ao processo da valorização humana e social, bem como
do resgate da cidadania na velhice, deu visibilidade e enfatizou a pessoa idosa em
suas experiências, vivências e conhecimentos.
A ampliação da ação educativa da UNESPAR e a promoção dos debates inter-
disciplinares, também possibilitou perceber a modificação do perfil da pessoa idosa na
sociedade, pois destacaram questões que envolvem essa fase da vida e permitiram pensar na
integração entre gerações e entidades que atuam na comunidade em prol da pessoa idosa.
A análise da problemática da pessoa idosa a partir de enfoques biopsicos-
sociais, filosóficos, políticos, jurídicos, religiosos, econômicos, socioculturais e
outros, também contribuíram para com o reconhecimento do potencial do idoso,
seu protagonismo e contribuições para a sociedade.
A instrumentalização de pessoas para o trabalho comunitário em insti-
tuições socioculturais e assistenciais locais, da mesma forma foram realizados
e, como aspectos relevantes, destacam-se a inclusão da pessoa idosa em uma
cultura acadêmica que possibilite ampliar conhecimentos práticos por meio do
projeto extensionista da UAPI.
Assim, durante a prática docente, foi possível averiguar algumas manifestações
discentes. Dentre os comentários registrados no grupo de WhatsApp da turma,
sobre a participação no programa da UAPI, ressalta-se a satisfação dos discentes
ao registrarem positivamente suas experiências.
Em complementação aos relatos dos alunos, as experiências docentes foram
consideradas positivas, pois atingiram os objetivos propostos em dar visibilidade
às pessoas idosas, oportunizando reflexões sobre seus espaços na sociedade e sobre
o envelhecer. Ainda, os docentes relataram o desafio e a satisfação de participar
da proposta da UAPI, especialmente em relação aos encontros com uma turma
marcada por características particulares como a dos participantes.
Os diálogos entre as disciplinas e dos próprios docentes no decorrer dos traba-
lhos, de forma significativa oportunizaram fluidez sobre os mais variados conteúdos
abordados. A evidência desse aspecto estava presente nas falas, nas associações de
105
ideias, nas demonstrações de compreensão e, sobretudo, nas atividades e respostas
dadas pelos alunos participantes quando convidados a apresentar suas produções.
A UNESPAR tem no idoso, a aproximação necessária da comunidade,
enquanto cumpre seu papel institucional de fomentar debates e reflexões acerca
do bem envelhecer. Os relatos de participantes e docentes, bem como da produ-
ção científica que se desenvolve dentro da UAPI, como pela aceitação do projeto
junto à comunidade, deixam evidente a assertividade da proposta em fomentar
ações e reflexões acerca da velhice, especialmente quando se apresenta o ambiente
universitário como um território de pertencimento da pessoa idosa.

AGRADECIMENTOS

Ao apoio financeiro aos pesquisadores pela Fundação Araucária (FA),


Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).

REFERÊNCIAS
BALDIN, T.; MAGNABOSCO-MARTINS, C. R. Oficinas artísticas na universidade aberta para a terceira
idade: contribuições para a qualidade de vida de idosos. Revista Conexão - UEPG, Ponta Grossa, v. 11, n. 1,
jan./abr. 2015. Disponível em: <https://revistas2.uepg.br/index.php/conexao/article/view/6410>. Disponível
em: Acesso em: 26 jul. 2022.
CACHIONI, M., et al. Metodologias e Estratégias Pedagógicas utilizadas por Educadores de uma Uni-
versidade Aberta à Terceira Idade. Educação & Realidade [online]. 2015, v. 40, n. 1, pp. 81-103. Disponível
em: <https://doi.org/10.1590/2175-623645741>.
FREIRE, P. Pedagogia do Oprimido. 17ª Edição. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.
GOMES, G. F. Efeitos de um programa de inclusão digital nas funções cognitivas e qualidade de vida
de idosos. 2019. Dissertação (Mestrado em Educação) – Faculdade de Educação, Universidade Federal do
Paraná, Curitiba, 2019.
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NERI, A. L. Qualidade de vida e idade madura. Campinas: Papirus, 1993. ISBN ISBN 85-308-0243-8.
OLIVEIRA, R. D. C. D. S.; SCORTEGAGNA, P. A.; OLIVEIRA, F. D. S. UNIVERSIDADES ABER-
TAS À TERCEIRA IDADE: delineando um novo espaço educacional para o idoso. Revista HISTEDBR
On-line, Campinas, v. 64, p. 343-358, set. 2015. ISSN 1676-2584.
PARENTE, M. A. D. M. P. et al. Cognição e envelhecimento. Porto Alegre: Artmed, 2009. ISBN
978-85-363-2116-5.
SAMPIERI, R. H.; COLLADO, C. F.; LUCIO, M. D. P. B. Metodologia de Pesquisa. 5ª Edição. ed.
Porto Alegre: Penso, 2013.
106
A SEQUÊNCIA DIDÁTICA COMO FERRAMENTA DE
INTERVENÇÃO DE ENSINO E APRENDIZAGEM DA
PRODUÇÃO ESCRITA NO ENSINO MÉDIO

Francisco Walisson Ferreira Dodó43

INTRODUÇÃO

Discutir sobre o ensino de língua materna é uma questão que, a meu ver,
deve ser sempre pauta de discussão. Leurquin (2020) e Mendonça (2006) são
exemplos de algumas referências importantes que vêm dando suas contribuições
para o ensino de línguas; a discussão tecida, neste relato de experiência, vai, exa-
tamente, ao encontro dos estudos dessas teóricas. A temática deste relato está,
portanto, situada no campo do ensino e da aprendizagem de línguas, focalizando
o eixo de ensino da produção de texto.
As reflexões suscitadas, neste relato de experiência, são um desdobramento
de uma pesquisa de Doutoramento (DODÓ, 2020)44, cujo objetivo geral era
analisar a coesão nominal e a conexão na produção do gênero textual Redação
do Enem de alunos ingressantes no Ensino Médio, considerando os efeitos de
sentido desses mecanismos de coesão para garantir a progressão temática; e,
como perguntas norteadoras da pesquisa, elaboramos duas: I) que dificuldades
o estudante ingressante no Ensino Médio enfrenta ao produzir textos coesos,
quando é submetido a escrever textos dissertativo-argumentativos? II) de que
maneira o estudante ingressante no Ensino Médio se apropria dos elementos
linguístico-discursivos materializados na coesão nominal e na conexão e os
utiliza em textos dissertativo-argumentativos?
Para a produção deste relato, concentro-me em apresentar, em linhas
gerais, alguns dos achados revelados na Tese de Doutoramento, respondendo aos
questionamentos-chave de pesquisa, fortalecendo as discussões relacionadas ao

43 
Doutor em Linguística (UFC). Professor (SEDUC-CE). CV: http://lattes.cnpq.br/6002586478534594
44 
Este relato é um desdobramento que fazemos da Tese de Doutoramento (DODÓ, 2020), intitulada: A coesão nomi-
nal e a conexão no gênero textual redação do Enem produzido por alunos ingressantes do Ensino Médio; foi defendida
no Programa de Pós-Graduação em Linguística da Universidade Federal do Ceará, sob a orientação da professora Dra.
Eulália Leurquin; essa pesquisa contou com o apoio financeiro (Bolsa de estudo) da Fundação Cearense de Apoio ao
Desenvolvimento Científico e Tecnológico – FUNCAP.
107
ensino de língua materna, sobretudo, no que tange à aprendizagem da produção
escrita no contexto de sala de aula no Ensino Médio45.
Para investigar os usos desses elementos coesivos nos textos dos alunos,
trago como aporte teórico a epistemologia do Interacionismo Sociodiscur-
sivo representada nas ideias de Bronckart (1999), uma vez que a linguagem,
para ele, deve ser entendida como atividade que media as ações sociais, per-
mitindo a interação/comunicação entre os interactantes a partir de gêneros
textuais utilizados em seus contextos de produção específicos. Além da teoria
do ISD, para me aprofundar na caracterização, na descrição e na definição
dos tipos de coesão nominal e de conexão, recorro aos estudos propostos por:
Bronckart (1999) e, principalmente, Adam (2011)46. Para que seja possível
dar conta do objeto de estudo, na metodologia, fiz uso de uma ferramenta
importante: a Sequência Didática (DOLZ; NOVERRAZ; SCHNEUWLY,
2004), já que esta pesquisa tem caráter interventivo, a Sequência Didática é
usada, pedagogicamente, no processo de ensino e aprendizagem, visando sanar
os problemas diagnosticados na escrita dos estudantes quanto à organização
da progressão temática textual.

METODOLOGIA

O meu interesse em desenvolver este trabalho surgiu quando realizei


uma atividade diagnóstica de produção textual com alunos que ingressaram
no Ensino Médio. Observei que os alunos demonstraram ter dificuldade no
tocante à construção temática em seus textos. Por isso, decidi realizar uma pes-
quisa de intervenção, na qual utilizei a Sequência Didática. Justifico a escolha
pelo uso da Sequência Didática, uma vez que pode funcionar como um instru-
mento de intervenção pedagógica, para facilitar o processo da aprendizagem e
do desenvolvimento da escrita.
Para a escritura deste relato, foi contemplado, de um universo de 45 alunos
de uma turma de primeiro ano do Ensino Médio – a turma selecionada para
aplicação da intervenção, 1 estudante, que utilizei como recorte para apresentar e
analisar seus textos e discutir os resultados. Por questões de espaço, neste relato,
apresento, como recorte, dois textos do Aluno A: o primeiro texto chamado de
primeira escrita; e o segundo, que é a reescrita da primeira produção textual,
45 
A pesquisa foi realizada na Escola Estadual de Educação Profissional José Maria Falcão, situada no município de
Pacajus-CE.
46 
A fim de ter um estudo mais aprofundado e detalhado da fundamentação teórica, sugiro a leitura da Tese.
108
a partir das aulas de intervenção. O tema do texto era: Abuso sexual infantil
no Brasil. Assim, utilizando os resultados que foram obtidos através da análise
dos dados nas produções escritas do aluno, buscarei suscitar reflexões acerca do
trabalho com a produção escrita em sala de aula. O gênero textual trabalhado na
pesquisa foi a redação do Enem; e analisei como a coesão nominal e a conexão
são usadas para construir e desenvolver a progressão temática.

A SEQUÊNCIA DIDÁTICA

Para realizar esta etapa da nossa pesquisa, elaborei uma Sequência Didá-
tica (doravante SD) - com foco no estudo da progressão temática, especi-
ficamente no uso dos mecanismos de textualização – a coesão nominal e a
conexão no gênero redação do Enem. Sobre SD, Dolz, Noverraz e Schneu-
wly (2004) a conceituam como um:
[...] conjunto de atividades pedagógicas organizadas, de maneira
sistemática, com base em um gênero textual. Estas têm o objetivo de
dar acesso aos alunos a práticas de linguagens tipificadas, ou seja,
de ajudá-los a dominar os diversos gêneros textuais que permeiam
nossa vida em sociedade, preparando-os para saberem usar a língua
nas mais variadas situações sociais, oferecendo-lhes instrumentos
eficazes para melhorar suas capacidades de ler e escrever (DOLZ;
NOVERRAZ; SCHNEUWLY, 2004, p. 81, grifo nosso).

Entendendo que a SD é vista como uma estratégia de ensino, já que se carac-


teriza como uma “busca de intervenções no meio escolar que favoreçam a mudança
e a promoção dos alunos a uma melhor mestria dos gêneros e das situações de
comunicação que lhes correspondem” (DOLZ e SCHNEUWLY, 2004, p. 53).
Em se tratando da SD, a seguir, apresento um mapa conceitual criado
pelos autores representando a sua estrutura e composição:

109
Figura 01 – Mapa conceitual da estrutura e composição das SD

Fonte: Elaborado por Dolz, Noverraz e Schnewly (2004).

Interpretando essa estrutura, vê-se que a SD se inicia pela definição do que


será trabalhado, permitindo que o aluno se aproprie dos elementos composicio-
nais do gênero que será produzido, para, durante os processos, faça a produção
inicial, demonstrando o que sabe e, em seguida, por meio dos módulos, torne-se
preparado para a produção final (DOLZ; NOVERRAZ; SCHNEUWLY, 2004).
No terceiro momento, nos “Módulos”, o professor, depois da correção
da produção inicial, vai trabalhar com propostas de atividades que poderão
ajudar a resolver problemas diagnosticados na primeira produção. Em se
tratando da nossa pesquisa, meu foco está nos mecanismos de textualização
(coesão nominal e conexão) para a construção da progressão temática no
gênero de texto redação do Enem, como já o dissemos. Em se tratando da
quarta etapa, a “Produção final”, ela “dá ao aluno a possibilidade de pôr em
prática as noções e os instrumentos elaborados separadamente nos módu-
los; também permite ao professor realizar uma avaliação somativa” (DOLZ;
NOVERRAZ; SCHNEUWLY, 2004, p. 106).

APRESENTANDO UM RECORTE DA SEQUÊNCIA DIDÁTICA:


FERRAMENTA DE INTERVENÇÃO DE TRABALHO COM A
PRODUÇÃO ESCRITA

Nesta seção, apresentarei um recorte de um dos módulos da SD. Reforço


que cada atividade buscou intervir nos problemas diagnosticados referentes à
dificuldade de construir a progressão temática no gênero redação do Enem.

110
Análise da Atividade interventiva: a progressão temática a partir da
coesão nominal e da conexão no gênero redação do Enem

Nesta aula, analisei uma redação do Enem. Ela serviu para trabalharmos a
estrutura/composição do gênero redação do Enem e analisarmos como a coesão
nominal e a conexão são usadas no texto para construir a progressão do tema,
que era “A persistência da violência contra a mulher no Brasil47”.
Considerando o tema que motivou a produção escrita, como palavras-
-chave do tema, temos: 1. Persistência; 2. Violência contra a mulher; 3. Brasil.
Desse modo, falar somente sobre “violência contra a mulher” ou somente sobre
“violência contra a mulher no Brasil”, significa que a temática não foi bem
compreendida, pois umas das palavras-chave é persistência. Assim, para que o
aluno demonstre compreensão total, ele precisa defender uma tese que fale da
persistência da violência à mulher no país.
Tendo contextualizado essa discussão feita sobre a compreensão do tema
com os alunos, passamos para a estruturação e organização do gênero.
Fizemos uma leitura cuidadosa, a fim de analisar como o tema foi desen-
volvido no texto do autor. O tema do texto foi assim dividido: na INTRO-
DUÇÃO (contextualização do tema + estabelecimento de um ponto de vista
(Tese), a autora: contextualiza o tema, situando o problema da persistência da
violência contra a mulher no Brasil; cita onde essa violência acontece; cita os
tipos de violência; estabelece sua tese. Para a produtora do texto, a persistência
é fruto: I) da negligência do Estado e II) e da negligência de instituições for-
madoras de opinião. No DESENVOLVIMENTO (seleção e organização de
argumentos para defesa de seu ponto de vista (Tese), a autora contextualiza os
tipos de violência existentes e a cultura machista no século XX, que perdura até
os dias atuais; mostra que, de acordo com os jornais nacionais, a violência contra
a mulher vem aumentando nos dias de hoje, e o Estado é negligente quanto a
esse descuido, retomando, assim, o elemento I) da tese; a autora retoma o ele-
mento II) da tese, afirmando que, embora exista uma Lei específica para esse
tipo de violência, muitas mulheres desconhecem essa informação. Assim, afirma
que há pouco estímulo do Estado e das instituições formadoras de opinião na
divulgação dessas informações, contribuindo para a não realização de denúncias.
Na CONCLUSÃO (sugere proposta de intervenção do problema articulada

47 
Para poder ter acesso ao texto, disponibilizamos o link de acesso: https://www.imaginie.com.br/enem/
temas-de-redacao/a-violencia-contra-a-mulher.
111
à discussão do texto), a autora propõe que o Estado invista mais nos direitos
das mulheres, no sentido de punir, efetivamente, os agressores; este elemento
da proposta retoma o argumento de defesa I), que retoma o elemento I) da
tese; também é sugerido que as instituições formadoras de opinião: escolas e
universidades, juntamente às famílias, realizem palestras que debatam sobre a
existência e as consequências do feminicídio, fomentando o respeito mútuo e a
luta contra o machismo. Este elemento II) da proposta de intervenção retoma
o argumento de defesa II), que retoma o elemento II) da tese. Nesse sentido, é
que podemos falar de proposta articulada à discussão do texto.
Essa análise da composição do gênero e da organização e progressão do
tema é importante, uma vez que funciona como um bom modelo de texto para
os alunos de compreensão do tema e de construção e elaboração do gênero
redação do Enem. Após essa análise, focamos nas formas de coesão, a fim de
garantir a progressão do tema.
À guisa de demonstração, mostrarei como a autora retoma as palavras-
chave do tema ao longo dos cinco parágrafos em seu texto.
Formas remissivas
Persistência “Todos os anos” (linha 1);
“Tão vigente” (linha 7);
“não é um assunto inédito” (linhas 8 e 9);
“Décadas depois” (linha 12);
“A situação não é diferente” (linhas 12 e 13);
“O assassinato do grupo feminino aumenta a cada ano” (linhas
13 e 14);
“Diversas mulheres continuam submetidas à violência diária”
(linhas 18 e 19);

112
Violência contra a mulher “Milhares de mulheres são vítimas da violência” (linhas 1 e 2);
“Em vários casos” (linhas 2 e 3);
“Elas são agredidas” (linha 3);
“Essa situação” (linha 4);
“Tal realidade” (linha 6);
“A violência contra a mulher” (linha 8);
“brasileiras (...) que eram submetidas a abusos sexuais ou não”
(linhas 10 e 11);
“A situação” (linha 12);
“O assassinato do grupo feminino” (linha 14);
“Diversas mulheres continuam submetidas à violência diária”
(linha 18 e 19);
“Sofrimento das vítimas” (linhas 25 e 26);
“A existência e as consequências do feminicídio” (linhas 27 e 28);
“A luta pelo fim do machismo” (linha 30).
No Brasil “No Brasil” (linhas 1, 9);
“Território nacional (linha 7);
“O Estado (linhas 5, 14, 22, 23);
“Realidade de brasileiras” (linha 10);
“Jornais nacionais” (linha 14);
“Lei Maria da Penha” (linha 18);
“Instituições formadoras de opinião” (linhas 5, 23, 26);
“Esses institutos” (linha 28);
Tendo feito com os alunos tal análise do quadro, pudemos notar a riqueza
de repertório de formas remissivas das unidades fontes e como esses elementos
podem contribuir com a manutenção do tema.
Essa mesma função de manutenção do tema pode ser notada pelo uso das
conexões, conforme demonstrarei como recorte o primeiro parágrafo:
1.Todos os anos, no Brasil, milhares de mulheres são vítimas da
2.violência em ambientes domésticas, escolares e de trabalho. Em
3.vários casos, elas são agredidas, física e psicologicamente, por seus
4.parceiros, que as ameaçam constantemente, e têm medo de
5.denunciá-los. Essa situação é fruto de certa negligência do Estado e
6.de instituições formadoras de opinião no que diz respeito à
7.escassez de medidas para combater tal realidade tão vigente em
8.território nacional.

Tomando este parágrafo como exemplo dos usos de conexões, podemos citar
alguns exemplos de recursos de conexão, conforme apresentados a seguir:
113
“Todos os anos” (linha 1) Funcionado como adjunto adverbial de tempo.
“No Brasil” (linha 1) Funcionando como adjunto adverbial de lugar.
“por” (linha 3) Preposição indicando um agente de determinada ação.
“que” (linha 4) Funcionando como pronome relativo, retomando ao
termo antecedente.
“e” (linha 4) Conjunção coordenativa, com função de justaposição.
“Essa situação” (linha 5) Funcionando como encapsulamento anafórico.
“e” (linha 5) Conjunção coordenativa, com função de justaposição.
“No que diz respeito à” (linha 6) Marcador argumentativo de mudança de tópico.
“para” (linha 7) Função de subordinação, estabelecendo sentido de
finalidade.
Após ter trabalhado a compreensão temática, a composição do
gênero e os usos de coesão nominal e de conexão, passarei à análise
da primeira produção do Aluno A.

Análise da primeira produção escrita: Aluno A

1.Atualmente, o abuso sexual vem sendo o segundo maior tipo de


2.violência infantil. A maior parte das denúncias é referente aos abuso
3.sexual.
4.A maior parte das agressões ocorre na própria residência da criança.
5.Os agressores são na maior parte pais, familiares ou alguém de
6.convívio muito próximo da criança.
7.A própria mãe muitas das vezes ajudar o pai ou a pessoa próxima da
8.criança violentada ela. e as vezes criança tem medo de conta para as
9.pessoas ou falar até mesmo para sua família.
10.A denúncia é importante meio de dar possibilidade e, ao mesmo
11.tempo, oportunizar a criação de mecanismo de prevenção e
12.proteção. Para acolher e atender as crianças temos delegacias,
13.conselhos tutelares, eles estão preparados para ouvir denúncias.

Observemos, no quadro, a organização das ideias do texto:


Tema: Abuso sexual infantil no Brasil
1 parágrafo Na introdução, o aluno firma que o abuso sexual vem sendo o maior tipo de
violência infantil e a que a maior parte das denúncias se referem ao abuso
sexual.
2 parágrafo Afirma que a maior parte dos abusos ocorrem na casa da criança praticados
por pessoas próximas à vítima.

114
3 parágrafo Afirma que a própria mãe ajuda o agressor a abusar da vítima; comenta que
a criança tem medo de denunciar;
4 parágrafo Defende que a denúncia é um meio eficaz de combater, de prevenção e de
proteção contra os abusos; e lembra que existem órgãos público para acolher
a criança, vítima de abuso sexual.
A partir da análise das ideias de cada parágrafo, podemos notar que
o aluno demonstra dificuldade em desenvolver a progressão temática, uma
vez que não é o bastante apenas situar o tema do texto a partir de cadeias
anafóricas; é necessário compreender que a progressão do tema de um
texto também tem relações com a estrutura e a composição do gênero de
texto. Neste caso, o aluno, em seu primeiro parágrafo, reconhece a existên-
cia do grande número de violência sexual infantil, contudo não situou a
discussão no cenário brasileiro.
Nos parágrafos seguintes, o aluno não demarca explicitamente, em seu
texto, seu posicionamento, apenas afirma, no segundo parágrafo, que a maioria
dos casos de abuso sexual acontecem, dentro da própria casa das vítimas, e são
praticados por pessoas de seu convívio; no parágrafo seguinte, afirma que a
mãe de que quem sofre o abuso, muitas vezes, é a principal responsável, uma
vez que é conivente com a situação. E finaliza seu texto falando da necessi-
dade de denunciar e da existência de órgãos que protegem crianças e adoles-
centes vítimas de abuso sexual.
É preciso considerar que, em seu texto, o aluno, por não estabelecer um
ponto de vista que deverá ser retomado nos parágrafos de desenvolvimento,
para que seja defendido, já mostra uma fragilidade quanto ao desenvolvimento
do tema, pois não ficou claro o que ele está defendendo. Assim, a proposta de
intervenção que deveria estar articulada à discussão do texto confirma a dificul-
dade do aluno em desenvolver a temática dentro do gênero exigido.
A seguir, analisarei os processos referenciais construídos pelos usos dos
tipos de coesão nominal para articular as suas ideias, além de destacarmos os
principais usos das conexões usados pelo aluno.
Para retomar a unidade fonte: “Abuso sexual”, o aluno utiliza as seguintes
expressões: “o abuso sexual” (linhas 1,2,3) - anáfora fiel; “o segundo maior tipo
de violência” (linha 2) - anáfora infiel; “a maior parte das denúncias” (linha 2) -
anáfora associativa; “a maior parte das agressões” (linha 4) - anáfora infiel; “os
agressores” (linha 5) - anáfora associativa; “medo” (linha 8) - anáfora associativa;
“a denúncia” (linha 10) - anáfora associativa; “delegacias” (linha 12) - anáfora
115
associativa; e ainda, para retomar a unidade fonte: “Infantil”, faz uso de: “infantil”
(linha 2) - anáfora fiel; “a criança” (linhas 4,3,8) - anáfora infiel.
O quadro que segue apresenta nossa análise referente aos usos
das conexões no texto do aluno:

Quadro 01 – Os tipos de conexão na terceira produção do Aluno A


Conexão
“atualmente” (linha 1) – marcador de temporalidade.
“a maior parte das denúncias” (linha 2) – marcador de mudança de topicalização.
“a maior parte das agressões” (linha 4) – marcador de mudança de topicalização.
“os agressores” (linha 4) – marcador de integração linear de continuidade.
“ou” (linhas 5,9) – marcador de um termo aditivo.
“muitas vezes” (linha 7) – marcador de temporalidade.
“e” (linhas 8,10) – marcador aditivo.
“às vezes” (linha 8) – marcador de temporalidade.
“para” (linhas 8,12) – marcador de especificação; marcador de finalidade (linha 12)
“a denúncia é importante meio de” (linha 10) – marcador de mudança de topicalização e de
integração linear introdutor de uma série.
“ao mesmo tempo” (linha 11) – marcador aditivo.
Fonte: Elaborado pelos autores (2022).

Passemos à análise da escrita a fim de verificarmos de que modo as aulas


de intervenção contribuíram nesse processo de escrita do aluno.

Análise da reescrita da produção textual: Aluno A

1.No Brasil a violência sexual contra crianças e adolescentes é um ato


2.muito frequente. Em grande parte dos acontecimentos, as vítimas
3.são de famílias pobres, que por medo do agressor e pela falta de
4.informação acabam não denunciando os autores desses crimes.

5.A exploração sexual dentro da sociedade é um assunto que fica


6.mascarado, ou seja passa a impressão de que não existe. No entanto,
7.grande parte dos abusos sexuais acontecem dentro da própria
8.família, com padrastos e enteados, pais e filhos, funcionários
9.domésticos e membros da família, entre outros casos.

10.Buscando combater este tipo de crime, foi criado um orgão de


11.proteção para as vítimas, o ECA (Estatuto da criança e do
116
12.adolescente), que procurar amparar os violentados e puni-los como
13.auxilio do poder judiciário. Porém a atuação do ECA depende
14.muito da contribuição de cada pessoa que sofre esta violência.

15.Nesse contexto, cabe às famílias o dever de orientar corretamente


16.seus filhos sobre o abuso sexual, ter diálogos frequentes sobre tudo
17.o que acontecer durante o dia, seja na escola, na rua ou em
18.qualquer lugar frequentado por eles.

Depois das atividades de intervenção, o aluno reescreveu seu texto. Gostaria


de pontuar as seguintes considerações: A introdução do aluno está organizada
da seguinte maneira: o estudante afirma que a violência sexual, no Brasil, é
bastante frequente e que isso acontece, amiúde, nas classes sociais mais pobres;
o aluno defende ainda que a criança não denuncia, pois tem medo do agressor.
Diferente da primeira escrita, desta vez, já podemos observar que o aluno
delimitou bem a temática, iniciando seu texto com expressão “No Brasil”, além
de estabelecer um ponto de vista que deverá ser retomado, com o objetivo de
ser defendido. No desenvolvimento, afirma que este assunto é visto de modo
mascarado na sociedade, criando a falsa impressão de que há esse problema;
afirma ainda que há muitos casos de abuso sexual que acontecem, muitas
vezes, dentro de casa com pessoas que convivem com a vítima. Em seguida,
contextualiza a existência de órgãos de apoio à vítima, porém lembra que é
necessário que a vítima denuncie a violência. Apesar de as ideias retomarem
o fato de que muitos casos de abuso acontecem dentro da própria casa da
criança, o aluno precisaria considerar que, em sua tese, pontuou esse problema
como recorrente nas famílias mais pobres. Entretanto, ele não retoma essa
informação em seu argumento de defesa. Na conclusão, Como proposta de
intervenção, o aluno propõe que existam mais diálogos e acompanhamento
familiar da criança, contemplando essa temática.
A seguir, mostro como essas retomadas são feitas; que tipo de coesão é
usado para as ideias do texto poderem ser tecidas e articuladas.
Para retomar a unidade fonte “Abuso sexual”, faz uso das expressões:
“A violência sexual” (linha 1) - anáfora infiel; “um ato” (linha 1) -anáfora
inf iel; “dos acontecimentos” (linha 2) - anáfora infiel; “desses crimes” (linha 4)
- anáfora inf iel; “a exploração sexual” (linha 5) -anáfora infiel; “um assunto”
(linha 5) - anáfora infiel; “abusos sexuais” (linha 7) - anáfora fiel; “este tipo
de crime” (linha 10) - anáfora pronominal; “um órgão de proteção para as
117
vítimas” (linha 10) - anáfora associativa; “os violentados” (linha 12) - anáfora
associativa; “esta violência” (linha 14) - anáfora infiel; “nesse contexto” (linha
14) - anáfora infiel; “o abuso sexual” (linha 16) - anáfora fiel; “tudo” (linha
16) - encapsulamento anafórico. Para retomar a unidade fonte “Infantil”, faz
uso das expressões “crianças e adolescentes (linha 1) - anáfora infiel; “as víti-
mas” (linha 2) - anáfora infiel; “ECA” (linha 11) - anáfora associativa; “cada
pessoa” (linha 14) - anáfora infiel; “seus filhos” (linha 16) - anáfora associativa;
“eles” (linha 18) - anáfora pronominal. E, para retomar a unidade fonte “no
Brasil”, cria as seguintes cadeia anafóricas: “no Brasil” (linha 1) - anáfora fiel;
“famílias pobres” (linha 3) - anáfora associativa; “dentro da sociedade” (linha
5) - anáfora infiel; “dentro da própria família” (linha 8) - anáfora associativa;
“ECA” e “do poder judiciário” (linha 13) - anáfora associativa; “as famílias”
(linha 15) - anáfora associativa.
No próximo quadro, mostro exemplos de uso de conectivos
na reescrita do texto do aluno:

Quadro 02 – Os tipos de conexão na reescrita produção textual do aluno A


Conexão
“No Brasil” (linha 1) Organizador espacial.
“Em grande parte dos acontecimentos” (linha 2) Marcador de integração linear de continuidade.
“por medo do agressor” (linha 3) Marcador de um argumento explicativo.
“a exploração sexual dentro da sociedade” (linha 5) Marcador de integração linear de continuidade.
“ou seja” (linha 6) Marcador de reformulação
“no entanto” (linha 6) Marcador de um contra-argumento forte.
“entre outros casos” (linha 9) Marcador de ilustração
“Buscando combater este tipo de crime” (linha 10) Marcador de integração linear de continuação.
“para” (linha 11) Especificador.
“porém” (linha 13) Marcador de um contra-argumento forte.
“Nesse contexto” (linha 15) Marcador de integração linear de fechamento de uma série.
“cabe às famílias” (linha 15) Marcador de uma integração linear introdutor de uma série.
“ter diálogos” (linha 16) Marcador aditivo.
Fonte: Elaborado pelos autores (2022).

Tendo analisado a escrita e a reescrita e como o aluno mobilizou, em seu


texto, a coesão nominal e a conexão, apresentarei, a seguir, nosso quadro com-
parativo dos avanços e dificuldades do aluno:
118
Primeira produção Reescrita
• Dificuldade em contemplar o tema em • Passa a delimitar melhor a temática;
sua plenitude; porém, ajustes são necessários para que
• Usa diversos tipos de coesão nominal para as ideias sejam melhor desenvolvidas;
construir cadeias anafóricas em seu texto; • Amplia os usos de retomadas a partir de
• Apresenta com dificuldade a estrutura diversos tipos de anáfora;
do gênero, não delimitando de modo • Apesar de o texto apresentar a estrutura
adequado o que precisa conter em cada canônica do gênero, apresentar ponto de
parágrafo: é necessário delimitar melhor vista, defesa desse ponto de vista e pro-
qual seu ponto de vista, para nos pará- posta de intervenção, é necessário rever
grafos seguintes defendê-lo e finalizar o a argumentação criada para defender sua
texto com sua proposta interventiva arti- tese, para que haja uma melhor articulação
culada à discussão. Observamos, pois, que e desenvolvimento da progressão do tema.
é necessário rever como as ideias do texto
são desenvolvidas e articuladas, para dar
ao texto progressão do tema.

CONCLUSÕES

Vimos que esta pesquisa se focalizou no ensino e na aprendizagem da


produção escrita no Ensino Médio; logo, tem fortes pontos de relação com
a Linguística Aplicada. Exemplo disso, foi a nossa proposição da Sequência
Didática como uma ferramenta pedagógica capaz de intervir nas dificuldades
diagnosticadas na escrita dos alunos.
Os dados revelaram que, sim, o aluno ingressante no Ensino Médio faz
uso variado dos mecanismos de textualização, contudo demonstrou dificuldade:
1) na delimitação do tema; 2) na estrutura e composição do gênero estudado na
pesquisa, a redação do Enem; 3) no aprofundamento da argumentação.
Observamos, entretanto, que a Sequência Didática se mostrou
como instrumento eficaz de intervenção, já que notaram-se avanços na
escrita do aluno em sua reescrita.

REFERÊNCIAS
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São Paulo: Cortez, 2011.
ANTUNES, I. Lutar com palavras: coesão e coerência. São Paulo: Parábola Editorial, 2005.
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Tradução Anna Raquel Machado, Péricles Cunha. São Paulo: EDUC, 1999.

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120
ENSINO DE MATEMÁTICA DURANTE A PANDEMIA
NA ESCOLA ESTADUAL GABRIEL PRESTES

Fernando Froes48

INTRODUÇÃO

O Trabalho de Conclusão de Curso de Formação Pedagógica em Mate-


mática ofertado pela União Brasileira de Faculdades (UniBF) é de suma impor-
tância para a formação acadêmica, pois possibilita as reflexões acerca da reali-
dade profissional, o desenvolvimento das habilidades para a atuação docente e
o conhecimento para a formação.
A pandemia do SARS-CoV-2, que pode ocasionar dificuldade respiratória
e levar a hospitalização e morte, gerou o fechamento das escolas tanto na rede
pública quanto privada e modificou o modo de ensino nas escolas, inclusive na E.E.
Gabriel Prestes (YANG et al., 2020; ZAIM et al., 2020). Desse modo, o presente
trabalho contém informações da coordenação, e estudos dos impactos gerados, a
respeito da Escola Estadual Gabriel Prestes, situada na rua Duque de Caxias, 189,
no centro do município de Lorena-SP, que acolhe alunos que residem tanto no
centro quanto nos bairros periféricos, como Vila Nunes, Cabelinha, Nova Lorena
e Vila Hepacaré (QEDU, 2018; PAULA, 2012).
Várias notícias mostram possíveis perdas de aprendizagem, em especial em
matemática (OLIVEIRA, 2020; SOCIOEMOCIONAL, 2012). O presente
capítulo pretende entender a realidade da escola Gabriel Prestes e de seus alunos,
compreender o papel atual da coordenação e dos professores e sugerir melhorias
de modo a reduzir os impactos negativos no aprendizado dos alunos, em especial
na matéria de matemática, levando em consideração o atual cenário. A natureza da
pesquisa realizada foi descritiva, com fontes primárias e secundárias de forma qua-
litativa, contou com a entrevista da coordenadora Iracema da E.E. Gabriel Prestes
e com uma forte base teórica para analisar o cenário em outros locais, buscando
gerar uma proposta que melhore a qualidade do ensino-aprendizagem na escola.

48 
Doutorado em andamento em Ciências e Engenharia de Materiais (USP). CV: http://lattes.cnpq.br/7964319714020272
121
DESENVOLVIMENTO

A pandemia do SARS-CoV-2, vírus causador da COVID-19, que pode


ocasionar dificuldade respiratória e levar a hospitalização e morte, gerou o fecha-
mento das escolas tanto na rede pública quanto privada de 165 países em todo
mundo, deixando 87% dos estudantes sem aulas ( JOLIE, 2020; ORGANIZA-
ÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 2021). Em todo o mundo o ensino foi afetado;
no que envolve a educação no Brasil, houve a Portaria n.º 343, de 17.3.2020 que
“dispõe sobre a substituição das aulas presenciais por aulas em meios digitais
enquanto durar a situação de pandemia do Novo Coronavírus – COVID-19”
(BRASIL, 2020a), e modificou toda a forma de ensino no país. Uma matéria da
BBC (IDOETA, 2020) mostrou como o ensino de matemática, em que o país já
trazia baixo rendimento, foi afetado, e teve seu quadro agravado com o ensino a
distância sendo implementado de maneira rápida, de modo a evitar agravamento
da pandemia e mais mortes pelo país (STEFANA et al., 2020).
Na proposta da Base Nacional Comum Curricular (BRASIL, 2018), o
ensino leva em conta a formação por competências. Muitas competências são
baseadas em domínio da tecnologia, como uso de recursos digitais ou vivên-
cias digitais, isso difere da maneira que muitos educadores atuam. Mesmo
assim, a BNCC foi um grande passo para melhoria do ensino no país, pois
levou em conta a opinião de muitos especialistas em educação e da população
(AUR, 2018; SILVA; BORGES, 2020).
Com a preocupação de aprendizagem dos alunos em matemática na sala de
aula e seguindo a BNCC, a quarentena impactou no ensino. Avelino e Mendes
(2020) citam diversos problemas do ensino remoto e as dificuldades que os estu-
dantes com menor renda ou poder aquisitivo sofrem, pois quanto mais saudável
o ambiente em que o aluno se encontrar e quanto maior seu acesso à tecnologia,
maior sua vantagem no aprendizado.
Para Cortinhas (2008), o tutor presencial no polo é essencial, pois sua
formação exige conhecer o projeto político pedagógico como um todo e ainda
ter um conhecimento profundo sobre a realidade econômica e social de cada
aluno. Esse tutor participa diretamente no aprendizado do aluno e no uso de
ferramentas tecnológicas, além de elucidar dúvidas acadêmicas, também sana os
obstáculos em relação ao estudo. O protocolo de segurança que consta no site na
ANS (AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR, 2020) reduz a

122
chance de contágio e é uma opção para garantir o funcionamento seguro do polo
presencial (BRASIL, 2020b; CÂMARA MUNICIPAL DE SÃO PAULO, 2020).
No século XXI há necessidade de desenvolver autonomia nos alunos,
para que possam atuar no cenário globalizado, com foco na formação por com-
petências. Pereira (2015) confirma a importância de preparar os alunos para o
mundo atual, em que a comunicação é essencial para exercício da cidadania,
política e trabalho. Diante das necessidades do século XXI, também se faz
necessária a formação por competências (PERRENOUD, 1999), com isso, o
futuro tutor e professor deve lecionar de forma que o aluno desenvolva, além
dos saberes exigidos, a capacidade de promover a constante busca e atualização
do conhecimento e suas aplicações.
As metodologias ativas se tornam uma opção atraente para o ensino a distân-
cia, por mostrarem vários resultados positivos, pois desenvolvem o pensamento crí-
tico, valores éticos, trabalho em equipe, autonomia e protagonismo e estão de acordo
com as diretrizes curriculares nacionais (FONSECA; MATTAR NETO, 2017).
Na aplicação dessas metodologias e desses polos os educadores são peça
chave na educação a distância e adaptação na pandemia. Sua valorização, já prevista
na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB)/96 em seu artigo 3º,
inciso VII (BRASIL, 1996), necessita de um bom plano de carreira e formação
continuada adequada (CENTRO DO PROFESSORADO PAULISTA, 2018).

METODOLOGIA

A natureza da pesquisa realizada foi descritiva, com fontes primárias e


secundárias de forma qualitativa.
Inicialmente foi elaborado um roteiro de perguntas e respostas com a coor-
denadora pedagógica Iracema Silva Motta de Freitas, formada e licenciada em
física, matemática e química e mestre em física, que foi professora de física na
Escola Estadual Gabriel Prestes durante 25 anos antes de se tornar pedagoga.
Toda a entrevista seguiu os protocolos de prevenção à Covid-19. A seguir tem-se
as perguntas e respostas da entrevista:

123
Qual seria a sua rotina semanal antes da pandemia como coordenadora? E
qual sua rotina atual?

A minha rotina consiste em ver se os alunos estão aprendendo ou não, o que


os professores estão ensinando, verificar se o Projeto Político Pedagógico (PPP)
está sendo cumprido, fazer reunião periódicas com alunos e professores, organizar
a escola, intermediar e resolver conflitos escolares. As funções continuaram as
mesmas tanto antes quanto após a pandemia, a única diferença foi a forma como
foi feita, pois houve tanto a interação online (telefone, WhatsApp e Facebook)
quanto presencial, quando em casos urgentes, com alunos e professores.
Como as aulas eram dadas antes da pandemia pelos professores, principal-
mente os de matemática, e após a pandemia?
São 7 aulas semanais de 45 minutos pela manhã e às sextas-feiras as aulas são
eletivas e contam com projetos diferenciados. Nas aulas eletivas, os alunos escolhem
o conteúdo de interesse que desejam aprender, já houve aulas de comercialização
digital, culinária e outros assuntos que os alunos escolhem.
Durante a pandemia as aulas se tornaram online, mantendo-se o padrão
e o horário, só que com algumas limitações, como o caso de não ser mais possí-
vel dar aulas eletivas práticas. Essas aulas foram adaptadas com bastante apoio
de grupos externos (USP e Institutos de Psicologias). Muitos alunos ficaram
sem vontade de executar as atividades acreditando que a quarentena duraria
poucos meses, e isso dificultou um pouco no processo de ensino. O que real-
mente funcionou foi ter um driver com todo o material, tendo estudo sobre a
supervisão dos professores, seja com orientações através de e-mail ou What-
sapp. Alguns professores gravaram videoaulas, entretanto na escola houve uma
resistência maior à disponibilização desse conteúdo. Além disso, foi fornecido
um dia livre para preparar as aulas.
A coordenação pedagógica ficou responsável por organizar e gerenciar toda
essa transição e cuidar para que tudo ocorresse bem e dentro do PPP. Houve difi-
culdades em dois professores darem aulas concomitantes falando do mesmo tema.

124
A escola tem um Projeto Político Pedagógico (PPP)? Se possível, cite
alguns objetivos do PPP para o relatório. Como fez para que o projeto
fosse cumprido?

Sim. O objetivo principal é garantir a base curricular comum, para isso


buscamos: acompanhar o processo de ensino-aprendizagem; promover ações
para superar problemas didáticos-pedagógicos; estimular o aluno a construir o
conhecimento através de experimentação; execução de projetos e atuação em
situações sociais; procurar metodologias flexíveis, criativas e motivadoras; pro-
mover a democratização escolar inclusiva; combater tudo que desumaniza a
escola, colher dados entre outros.
Foi necessária uma organização prévia, conversar com os professores e sempre
estar monitorando o andamento da escola. A experiência como docente ajudou
muito na execução do projeto, é importante que o projeto sempre seja cumprido,
pois a escola é fiscalizada pela delegacia de ensino e caso haja desacordo com o
projeto, qualquer pessoa pode fazer uma denúncia, que será apurada.

Como despertar o interesse do aluno pelo conteúdo da disciplina?

O professor é apenas um facilitador no processo de aprendizagem, ele não


consegue despertar o interesse do aluno na disciplina. O grande protagonista no
processo de ensino e aprendizagem é o aluno. Nosso papel é dar tudo que ele
necessita, apoiá-lo, fornecer bibliotecas e, principalmente, manter o professor
sempre valorizado e motivado com um bom plano de carreira e um aperfeiçoa-
mento constante do profissional.
Muitos problemas que temos vêm da questão da cultura, alguns alunos sim-
plesmente não veem interesse em estudar, têm pouco cuidado com o patrimônio
da escola, problemas familiares, foram ensinados a não cuidar do próximo e serem
egoístas, falta uma cultura de sustentabilidade e vivência social, novamente o pro-
fessor pode apenas orientar o aluno e sugerir o melhor caminho e quais conteúdos
pode e deve estudar, tirar dúvidas, ter uma interação humana, entretanto a decisão
final e a dedicação aos estudos cabe apenas aos alunos.

125
Para um estudante que será um futuro professor de matemática. Qual(is)
conselho(s) daria?

Busque sempre ser o melhor na sua área. Nosso país tem


uma falta de bons professores.
É importante também fazer pedagogia e entender a aplicação prática do
conhecimento (isso pode ser em um curso de mestrado e doutorado ou até mesmo
com experiência em empresas privadas). Além disso, ter trabalhado em empresas
privadas é um diferencial, pois o professor já terá conhecimento de como é o
mundo e as aplicações do conhecimento, quais são as cobranças e como o aluno
deverá se portar no mundo profissional.
Outro conselho é nunca ficar na zona de conforto, sempre tomar cuidado
com as mudanças que estão por vir. Experiência no quadro também é importante,
o professor deve ter uma boa letra no quadro branco e treinar escrever e olhar
para os alunos ao mesmo tempo.

Gostaria de dar alguma sugestão de melhoria para a escola em que as


ações independem de você?

Melhorar o plano de carreira do professor, aumentar o salário de modo que


ele seja valorizado como um profissional de ensino superior e o salário seja com-
petitivo, também gostaria que a carreira tivesse mais prestígio social, pois muitos
não veem a profissão de professor com bons olhos.
Além da entrevista, também foi analisada a situação geral do ensino durante
a pandemia e o que tem surtido efeito e quais os impactos.

ANÁLISE DOS RESULTADOS

A rotina da coordenadora está de acordo com a LDB/96, com a BNCC


e com o PPP da escola, incentivando um ensino focado em competências
(PERRENOUD, 1999). A coordenadora elabora seu trabalho, incentivando e
auxiliando os professores a buscar atividades diferenciadas, sendo democrático ao
ouvir e respeitar a visão dos alunos e quais assuntos são pertinentes a eles, tendo
uma formação por competências que é essencial para os futuros profissionais.
Atividades como “Feira de ciências”, “Gincana estudantil” e “Literaturando”
são voltadas a chamar a atenção da comunidade e, em especial, dos alunos e estão
previstas no projeto pedagógico. Essas ações contam com o acompanhamento
126
dos pais, gestores, professores e coordenadores. Entretanto, devido à pandemia,
essas atividades não foram realizadas. Houve uma adaptação para as disciplinas
eletivas para cubrir esse déficit.
Na parte de gestão da escola, a coordenadora fez reuniões e organizou a
educação a distância, tendo contato diretamente com os alunos e com os profes-
sores. Alguns professores tiveram forte resistência a gravar videoaulas, de certa
forma impactando negativamente os alunos, pois o modelo de ensino tem se
transformado rapidamente e nem todos os professores conseguem acompanhar.
No geral, o ensino a distância com o professor como um facilitador, dando mais
liberdade ao aluno foi positivo, vale lembrar que, infelizmente, parte dos alunos
não tem acesso a computadores e nem a um ambiente familiar tranquilo, o que
impacta também negativamente na aprendizagem.
O ensino semipresencial, tomando todas as medidas de prevenção à
COVID-19, com a escola e as bibliotecas abertas para os alunos de baixa renda,
seria o melhor modelo. Aplicando o distanciamento social e o uso de máscaras de
algodão com dupla camada (que seriam distribuidas na entrada) nos polos, que
segundo LIMA et al. (2020)without any restriction in terms of language or period.
Results low coverage cloth face masks made of 100% cotton, scarf, pillowcase,
antimicrobial pillowcase, silk, linen, tea towel, or vacuum bag, present marginal/
reasonable protection against particles while high coverage cloth masks provide
high protection. Conclusion cloth face masks are a preventive measure with mode-
rate efficacy in preventing the dissemination of respiratory infections caused by
particles with the same size or smaller than those of SARS-CoV-2. The type of
fabric used, number of layers and frequency of washings influence the efficacy of
the barrier against droplets.”,”author”:[{“dropping-particle”:””,”family”:”Lima”,”-
given”:”Magda Milleyde de Sousa”,”non-dropping-particle”:””,”parse-names”:-
false,”suffix”:””},{“dropping-particle”:””,”family”:”Cavalcante”,”given”:”Francisco
Marcelo Leandro”,”non-dropping-particle”:””,”parse-names”:false,”suffix”:””},{“-
dropping-particle”:””,”family”:”Macêdo”,”given”:”Thamires Sales”,”non-droppin-
g-particle”:””,”parse-names”:false,”suffix”:””},{“dropping-particle”:””,”family”:”-
Galindo Neto”,”given”:”Nelson Miguel”,”non-dropping-particle”:””,”parse-na-
mes”:false,”suffix”:””},{“dropping-particle”:””,”family”:”Caetano”,”given”:”Joselany
Áfio”,”non-dropping-particle”:””,”parse-names”:false,”suffix”:””},{“dropping-
-particle”:””,”family”:”Barros”,”given”:”Lívia Moreira”,”non-dropping-parti-
cle”:””,”parse-names”:false,”suffix”:””}],”container-title”:”Revista Latino-Ame-
ricana de Enfermagem”,”id”:”ITEM-1”,”issued”:{“date-parts”:[[“2020”]]},”pa-
127
ge”:”1-8”,”title”:”Cloth face masks to prevent Covid-19 and other respiratory
infections”,”type”:”article-journal”,”volume”:”28”},”uris”:[“http://www.men-
deley.com/documents/?uuid=769b647c-56b4-4bba-a6bb-caa83cb1b6f3”]}],”-
mendeley”:{“formattedCitation”:”(LIMA et al., 2020 são tão eficientes quanto
as máscaras hospitalares e fornecem uma alta proteção, seria possível que alunos
tivesem apoio de tutores. Essas medidas auxiliam alunos com deficiencia,
problemas familiares ou falta de recursos, pois estes teriam acesso à educação
mesmo diante da pandemia. Vale ressaltar que, seguindo as normas e sendo
poucos alunos, o ambiente dos polos se torna seguro, tendo uma boa relação
custo-benefício para os alunos e para a sociedade.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A pandemia modificou o modo de ensino que hoje conhecemos, várias


dificuldades foram vistas e vários ações já foram tomadas para minimizá-las.
A solução ideal para o ensino na pandemia é considerar os aspectos sociais dos
alunos ao mesmo tempo que se leva em conta os riscos de infecção pelo corona-
vírus de alunos, familiares e educadores. As medidas que devem ser tomadas na
escola Gabriel Prestes dependem principalmente de ações do governo do estado
de São Paulo. Com base nos estudos, é necessário que o ensino a distância utilize
metodologias ativas, pois são as que têm apresentado o melhor resultado. Além
disso, é necessário transformar os professores (que não são do grupo de risco)
em facilitadores, com a devida formação e treinamento, e reabrir as escolas e as
bibliotecas municipais como polos de ensino que seguem as medidas de segu-
rança do COVID-19, dando acesso aos alunos carentes à tecnologia e ao apoio
necessário, inclusive para alunos com deficiência física ou mental. Estas são as
medidas ideais com base na pesquisa e a realidade da escola, que levam em conta
todos os aspectos sociais, econômicos, sanitários e educacionais, reduzindo o risco
à saúde de todos e aumentando a oportunidade de quem hoje não tem acesso à
educação na pandemia, principalmente no aprendizado de matemática, que tem
sido uma grande dificuldade do país.

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130
TECNOLOGIA NA EDUCAÇÃO: CONTEXTO HISTÓRICO
FUNÇÃO E SEU PAPEL NOS DIVERSOS ESPAÇOS DA
SOCIEDADE

Vaneza Nascimento de Oliveira Mélo49

INTRODUÇÃO

O termo tecnologia vem sido divulgado de forma intensa nos meios de


comunicações: rádio, TV, redes sociais, reportagens em revistas, livros, artigos
tudo vem girando em torno desse nome de forma bastante ampla e nos remonta
ao contexto histórico do termo tecnologia, é algo que se iniciou historicamente a
partir da evolução da escrita rudimentar, da criação do fogo e da roda, marcos da
tecnologia pré histórica, necessárias para realização de atividades essenciais para a
sobrevivência do ser humano. O avanço da tecnologia de forma progressiva ocorreu
com o passar dos séculos transformando pessoas, seus meios, suas culturas, suas vidas.
No entanto seu conceito é bem mais abrangente do que ela oferece. A dependência
da tecnologia ou seu uso constante e exagerado apresentam ambiguidades, tanto
pode ser usada para o bem como para o mal. Observaremos suas implicações no
decorrer deste escrito, que tem por objetivo realizar uma reflexão sobre o papel da
tecnologia na atualidade, contexto histórico, sua função na sociedade e diversidade,
os impactos na sociedade e educação, bem como seus aspectos políticos e sociais.
A metodologia utilizada para realizar o capítulo foi um material escrito no
ano de 2018, para fins de conclusão de trabalho acadêmico de curso em espe-
cialização publicado na Revista de Educação e Tecnologia de Curitiba parte de
um programa de curso Strictu Sensu na área de tecnologia dos centros federais
de educação tecnológica dos estados do: Paraná, Minas Gerais e Rio de Janeiro -
PPGTE promovido pela Universidade Federal Tecnológica de Curitiba, publicado
em livro pela editora Bagai, 2019 como formação docente bem como pesquisas
bibliográficas realizadas na internet por meio de consulta do Google.

Mestranda em Educação e Tecnologias Emergentes em Educação (MUST UNIVERSITY, Flórida-EUA). Professora


49 

Efetiva da Educação Básica (SME / São Lourenço da Mata - PE). CV: http://lattes.cnpq.br/9801875251250344
131
TECNOLOGIA E CONTEXTO HISTÓRICO

A tecnologia é milenar, e faz parte do processo evolutivo do ser social e do


seu desenvolvimento histórico, social e cultural. As técnicas de cada grupo social
podem ser resgatadas a partir dos desenhos rupestres, da criação da roda, a des-
coberta do fogo, e das pinturas. A globalização, um fenômeno das tecnologias da
comunicação, reduziu distâncias e aproximou pessoas. A interligação ou comu-
nicação expandiu o comércio e as relações entre pessoas, povos, nações e países.
Fala-se em conexão sem limites de idade, etnia, idioma, classe ou faixa etária.
Nesse processo, as máquinas “poderosas” são intermediadoras, e objetos de desejo
como Smartphones, notebooks, IPAD’S, computadores, televisores LED e outros.
Os cursos por correspondência e os transmitidos pelo rádio e pela televi-
são abriram o campo para as tecnologias educacionais. A educação à distância
(EAD), em 2005, foi considerada uma modalidade educativa desenvolvida em
lugares e tempos diversos. Ela se consolidou como mediadora do processo didá-
tico-pedagógico entre professor e aluno mediado por tecnologias. Materiais
didáticos adequados e o diálogo têm papéis relevantes para que o processo de
ensino e aprendizagem se consolide.
O uso dessas tecnologias reflete uma nova forma de aprendizagem
por meio da interação multimídia e da comunicação entre pessoas.
Especificamente, com esta segunda, a partir do advento da Internet,
expande-se o processo educativo para além dos muros das escolas e
das universidades com a modalidade de ensino a distância (AQUINO,
2009, p. 4).

Atualmente o processo de inovação tecnológica segue com a internet e


as redes sociais complementando a igualdade de comunicação entre os atores
da EAD. Os usos de recursos de multimídia para comunicação entre os meios
globalizados no mundo tem sido uma realidade. Os profissionais como um todo
necessitam entender essas realidades virtuais a presença virtual o espaço não real,
levando as tecnologias de informação e comunicação para atender as necessida-
des da tecnologia contemporânea.

CONTEXTO HISTÓRICO DA TECNOLOGIA NA EDUCAÇÃO

O marco inicial do desenvolvimento tecnológico aconteceu na década de


1970, com a utilização de computadores para fins educativos onde os avanços
técnicos ocorridos ao longo do século XX foram o condutor de uma revolução
132
técnico-científica com a preocupação de introduzir os meios de comunicação
social na educação. Nesse processo, as distâncias foram encurtadas e a produção e
divulgação das informações foram se tornando, em ritmo acelerado, um processo
cada vez mais dinâmico e integrado.
No Brasil, a popularização da internet está disponível desde o início dos anos
1980, o que possibilitou a ampliação dos sistemas de telecomunicações permitindo
a um número de pessoas cada vez maior ter acesso instantâneo à informação
atualizada. Nesse mesmo período, o campo da Tecnologia Educacional começou
a surgir, influenciado pelo momento de abertura política e democrática, uma
visão mais crítica e mais ampla da utilização das tecnologias no ensino como a
radiofusão, a televisão e o computador que são exemplos de novas tecnologias que
foram gradativamente inseridas na educação para otimizar o processo de ensino
e aprendizagem na sala de aula.
Em 2005, as TIC´S passaram a contribuir na elaboração de aulas e material,
assim também, como complemento às aulas presenciais (ALMEIDA, 2003). A
partir de 2008 com a popularização da internet, possibilitando o acesso instantâ-
neo à informação atualizada, as TIC´S extrapolaram os limites físicos da sala de
aula favorecendo o processo de aprendizagem virtual. Essas transformações vêm
acontecendo de forma inexorável até o momento presente. Obviamente que a
educação não poderia permanecer isolada dos acontecimentos e, pouco a pouco,
foi se apropriando dos benefícios que foram surgindo.
O uso dessas tecnologias reflete uma nova forma de aprendizagem
por meio da interação multimídia e da comunicação entre pessoas.
Especificamente, com esta segunda, a partir do advento da Internet,
expande-se o processo educativo para além dos muros das escolas e
das universidades com a modalidade de ensino a distância (AQUINO,
2009, p. 4).

Atualmente as redes sociais, a internet bem como o uso de smartphones para


comunicação em sala de aula tem sido cruciais em tempos de pandemia da covid-19
o que era proibido tornou se essencial, os ambientes virtuais, plataformas de ensino
a distância, ensino remoto, cursos EAD, formam a nova onda mundial de tecnologia
na educação fazendo os docentes repensar das práticas. Diferentes possibilidades
de explorar recursos pedagógicos de forma significativa, criativa e inteligente:
O estímulo ao pensamento criativo, lógico e crítico, por meio da
construção e do fortalecimento da capacidade de fazer perguntas e de
avaliar respostas, de argumentar, de interagir com diversas produções
133
culturais, de fazer uso de tecnologias de informação e comunicação,
possibilita aos alunos ampliar sua compreensão de si mesmos, do
mundo natural e social, das relações dos seres humanos entre si e
com a natureza. (BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR,
2018, p. 58).

Sendo assim, com os diversos meios de informação e comunicação dispo-


níveis, cabe ao professor escolher os recursos que melhor se adaptam às condi-
ções de aprendizagem de seus alunos, ou seja, deve ser levado em consideração
o tempo destinado para o estudo e características pessoais de cada aluno; o que
nos faz entender que, utilizar as novas tecnologias de informação e comunicação
(NTIC) de última geração não implica em sucesso no processo de aprendiza-
gem e sim, que sejam utilizados para que a aprendizagem aconteça de fato num
ambiente colaborativo de aprendizagem.
O contato regrado e orientado da criança com o computador em situação
de ensino aprendizagem contribui de forma positiva para seu desenvolvimento:
cognitivo e intelectual, em especial ao desenvolvimento do seu raciocino lógico e
formal, à capacidade de pensar com rigor e sistematicidade, à habilidade de inventar
ou encontrar soluções para problemas. (CHAVES, 2004 apud ANDRADE, p. 12).
Utilizar tecnologias e recursos digitais como ferramentas pedagógicas auxiliam
a criança no processo de construção do conhecimento. Para isso a capacitação e
inclusão digital do profissional da educação são de suma importância, porque pro-
fessor é a figura central da mediação do saber. Demo (2008, p. 134) ainda ressalta:
Temos que cuidar do professor, pois todas as mudanças só entram bem
na escola se entrarem pelo professor, ele é a figura fundamental. Não
há como substituir o professor. Ele é a tecnologia das tecnologias, e
deve se portar como tal. (Apud ANDRADE, p. 16)

A dinâmica da visão moderna sobre a tecnologia trata-se de uma ferra-


menta, ou um meio para o uso humano, no qual à tecnologia configura a cultura
e a sociedade. Tal dinâmica se reflete na apropriação da tecnologia nas práticas
pedagógicas. Isto se revela nos estudos que abordam a integração das tecnologias
à educação. Portanto, a proposta não é simplesmente trocar o velho pelo novo,
mas sim tornar a tecnologia um recurso eficaz, dentro do ambiente escolar. Para
isso uma mudança na postura docente se torna essencial pois a escolha de recursos
passa pelo professor e a possibilidade de torná-lo significativo também.

134
FUNÇÃO DA TECNOLOGIA E SEU PAPEL NOS DIVERSOS
ESPAÇOS DA SOCIEDADE

De forma direta ou indireta a tecnologia está adentrando em diversos espaços


da sociedade. Essa ampliação tem fomentado o desenvolvimento de pesquisas no
âmbito do uso da tecnologia, seja na educação, na indústria, no meio ambiente,
na saúde, etc., buscando evidenciar os benefícios e o uso.
Essas mudanças impactam também o comportamento do ser humano, que
tem que aprender a acompanhar essa evolução e conviver com novas tecnologias.
Essa adaptação traz consigo uma série de benefícios, como melhora na qualidade
de vida, acesso rápido e fácil ao conhecimento, simplificação da troca de informa-
ções e a quebra de várias barreiras da comunicação. Outro fator de destaque é a
inclusão social. Constantemente surgem novas tecnologias que auxiliam na rotina
de pessoas com deficiências físicas e cognitivas, ajudando que essas pessoas tenham
mais facilidade para se inserir na sociedade e tenham um padrão de vida melhor.
O incremento das tecnologias de comunicação e informação no contexto
da educação tem como objetivo promover a diversidade cultural e a quebra do
paradigma da cultura de massa. Visa a desmistificação de estigmas históricos
entre as diversas culturas, através do estreitamento de distâncias entre diversas
formas de expressões culturais presentes no planeta, beneficiando a interação
entre ambas, almejando a conservação da identidade cultural, promovendo tanto
a inclusão digital quanto a social.
A tecnologia do bem é uma educação com menos vieses, preconceitos, mais
tolerantes e inclusivas e isso tudo começa na educação. A tecnologia em sala de aula
não trata apenas da informatização/informação e suas complexidades mediante os
avanços tecnológicos mas uma educação abrangente, ela abraça culturas diversas
e sua importância. Promover uma cultura inclusiva/cultural na escola na escola é
promover atividades que visem mostrar o mundo por outras “lentes” mais ampla e
plural utilizando ferramentas digitais. Um jogo pode ser trabalhado para mostrar
a uma criança a recuperar o espaço que foi retirado por uma educação repressora
e cultura, as meninas afegãs por exemplo podem ter sua autoestima recuperada
ou sua identidade preservada conhecendo outras culturas, assim como meninos
possam estar de mãos dadas uma cultura extremamente machista não permite, o
“trabalhar juntos” por uma causa em um futuro onde a diversidade deixará de ser
peso sendo rigorosamente natural, sem distinções.

135
[...] a educação que inclui reforça o desenvolvimento das capacida-
des individuais e coletivas, ao mesmo tempo que contribui para o
exercício dos direitos humanos, princípio básico do reconhecimento
e valorização da diversidade. Ser, estar e conviver com o outro são
direitos constitucionais que garantem ao ser humano o exercício de sua
condição humana e, portanto, de sua diversidade, de suas diferenças
(REIS, 2013, p. 78).

A educação inclusiva e voltada para diversidade de culturas segundo Reis,


não exalta os grupos privilegiados em detrimento dos grupos minoritários, mas
respeita a diversidade e contribui para a efetivação dos direitos humanos. Com base
nessa premissa e diante da diversidade presente nos ambientes escolares, é preciso
reformular o modelo de escola vigente com o objetivo de oferecer igualdade de
oportunidade a todos. Reis (2013, p. 79) afirma que “pensar a diversidade é fazer
um movimento que busca repensar a escola [...] para que a escola da discriminação
e segregação dê lugar à escola aberta a todos”. Desse modo, se torna imprescindível
a busca por uma educação para a alteridade. Segundo Costa e Diez (2012, p. 9), “a
educação como alteridade ética implica na experiência educativa como resistência
a totalitarismos e aniquilamento do outro. Ao ultrapassar a visão objetiva o “eu”
assume uma atitude de abertura, de escuta à palavra que vem do outro”.
A educação com foco no respeito à diversidade estimula o exercício do
pensamento a partir de pontos de vista diversos, promove o diálogo sobre o dife-
rente, sobre o desconhecido e, com isso, efetiva o processo de inclusão para além
do simples ato de socialização. Para que isso aconteça, é primordial uma educação
que possibilite a formação humana, integral dos alunos. Na escola deve ser traba-
lhado não só o aspecto cognitivo, mas também os aspectos morais, éticos, sociais
e culturais que são igualmente essenciais à formação de qualquer ser humano.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante dos estudos e pesquisas bibliográficas realizadas, percebemos que não


é mais possível uma educação sem tecnologia e que a mesma tem se expandido
cada vez mais. As ferramentas digitais as TIC’S e todo contexto relacionado a
tecnologia não podem ser negados dentro da influência da educação. A presença
desta tecnologia na vida cotidiana tanto dos alunos como das pessoas com as quais
possuem contato seja presencial ou online é um fato irrefutável.
A sociedade tem se rendido aos encantos da tecnologia mesmos com seus
prós e contras, fake news, cyberbullying, a tecnologia está cada vez mais indis-
136
sociável, por isso os envolvidos no ato de ensinar e de aprender não podem ficar
indiferentes a essa realidade. As instituições de ensino requerem uma escola que
busque a implementação do uso das TIC como forma de aprimorar o processo
de ensino-aprendizagem, facilitando o desempenho dos alunos em geral e, em
particular, dos alunos que necessitam de inclusão cultural ou social necessário
oferecer aos alunos diferentes formas de desenvolver suas capacidades e as TIC’S
representam importante papel nesse processo. Com o uso pedagógico das tecno-
logias é possível proporcionar situações de aprendizagens significativas a fim de
desenvolver criatividades dos alunos, suas habilidades e promover seu bem estar
respeitando suas diversificações.
As TIC’S podem ser utilizadas como recursos pedagógicos promotores de uma
aprendizagem mais significativa com foco no desenvolvimento de novas habilidades
e competências. A esse respeito, Prata (2002, p. 77) afirma que, “a integração das
tecnologias [...] pode promover mudanças bastante significativas na organização e
no cotidiano da escola e na maneira como o ensino e a aprendizagem se processam,
se considerarmos os diversos recursos que estas tecnologias nos oferecem”. Dessa
forma, inúmeras possibilidades de aprendizagem surgem com o uso pedagógico
das tecnologias. Eis algumas dessas possibilidades apontadas por Libâneo (2000):
a) Contribuir para a democratização de saberes socialmente significa-
tivos e desenvolvimento de capacidades intelectuais e afetivas, tendo
em vista a formação de cidadãos contemporâneos. [...]. b) Possibilitar
a todos oportunidades de aprender sobre mídias e multimídias e a
interagir com elas. [...]. c) Propiciar preparação tecnológica comunica-
cional [...] d) Aprimorar o processo comunicacional entre os agentes
da ação docente-discente e entre estes e os saberes significativos da
cultura e da ciência (LIBÂNEO, 2000, p. 33).

A análise desses objetivos pedagógicos para o uso das novas tecnologias


da informação e comunicação na educação permite a seguinte constatação: os
ambientes educacionais precisam se reciclar e esquecer o modelo de escola onde
só se usa a lousa e o giz, pois é inevitável a presença das tecnológicas dentro dos
ambientes educacionais. Segundo Libâneo (2007, p. 95), “numa sociedade repleta
das novas tecnologias da comunicação e da informação, nenhum educador hoje
pode ignorar a presença das mídias e outros aparatos tecnológicos, seu papel, sua
utilização em sala de aula”. Não é mais possível se prender a um modelo de escola
que desenvolva um ensino estático, alheio a todas as vertentes que estão ao seu redor.

137
REFERÊNCIAS
ALMEIDA, F. J. (Cord). Projeto Nave. Educação a distância. Formação de professores em ambientes
virtuais e colaborativos de aprendizagem. São Paulo: s.n., 2001.
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professor a distância em ambiente digital. In: José Armando Valente, Maria Elizabeth B. de Almeida, Maria
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___________. ALMEIDA, F. J. Educação e informática. Os computadores na escola. São Paulo, Cortez, 1988.
ANDRADE, A. P. R. O uso das tecnologias da educação: computador e internet. 2011. 22 f. Monografia
(Licenciatura em Biologia) – Universidade de Brasília/Universidade Estadual de Goiás, Brasília, 2011.
Disponível em: Acesso em: 31 out. 2015.
AQUINO, Mirian de Albuquerque. Educação para a autonomia: um diálogo entre Paulo Freire e o discurso
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BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília, 2018.
CASALI, Alípio. Ética e Tecnologias no Currículo: fundamentos para políticas e práticas. In: VALLE,
Luiza E. Ribeiro; MATTOS, Maria José V. Marinho; COSTA, Wilson da Costa (Orgs). Educação digital:
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COSTA, Wanderleia Dalla; DIEZ, Carmem Lucia Fornari. A relação do eu-outro na educação: abertura
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LIBÂNEO, José Carlos. As tecnologias da comunicação e informação e a formação de professores. In:
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MÉLO, Vaneza Nascimento de Oliveira, Universidade de Pernambuco, Brasil N° 18, (2018) – Artigo Tec-
nologias como Recursos de Ensino e os Desafios de Implantação na Educação. Resumo, pdf. UTFPR.
PRATA, Carmem Lúcia. Gestão escolar e as tecnologias. In: ALONSO, Myrtes; et al. Formação de gestores
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REIS, Marlene Barbosa de Freitas. Política pública, diversidade e formação docente: uma interface pos-
sível. 2013. 278f. Tese (Doutorado) – Universidade Federal do Rio de Janeiro, Programa de Pós-Graduação
em Políticas Públicas, Estratégias e Desenvolvimento, Instituto de Economia, 2013.

138
EFEITOS DA GLOBALIZAÇÃO NA EXPANSÃO DA
EDUCAÇÃO À DISTÂNCIA EM MOÇAMBIQUE

Eva Quembo50

INTRODUÇÃO
O presente capítulo tem como objectivo analisar os efeitos da globalização na
educação em Moçambique, no caso concreto da educação à distância. Constituem objec-
tivos específicos do estudo: compreender a gênese da introdução e expansão do ensino à
distância no país; relacionar a expansão do ensino à distância em Moçambique à globali-
zação; e reflectir sobre as principais limitações da educação à distância em Moçambique.
A introdução e expansão da educação à distância (EaD) em Moçambique está
ligada à necessidade de acompanhamento do rápido desenvolvimento tecnológico,
que possibilita a criação de ambientes virtuais de aprendizagem com maior facilidade
e comodidade de interacção entre os actores do processo, bem como à necessidade de
expansão do acesso aos serviços de educação à outras partes do país, uma vez que o
ensino presencial sozinho não tem tal capacidade.
O capítulo foi desenvolvido sob o enfoque metodológico qualitativo, com objectivos
exploratórios. Na base deste enfoque procuramos aprofundar o conhecimento sobre a
evolução da EaD em Moçambique, seus principais contrangimentos e desafios, bem como
a influência dos modelos de educação à distância de outros países no sistema moçambicano.
Quanto aos objectivos a pesquisa classifica-se como exploratória, feita na base
análise bibliográfica de livros e artigos científicos que debruçam sobre o tema.
O capítulo encontra-se estrutura em quatro partes principais, onde na primeira
parte faz-se a introdução e apresentação do problema em estudo; na segunda parte
são desenvolvidos os principais conceitos ligados a temática em análise, bem como
faz-se a apresentação da situação empírica do caso de Moçambique; na terceira parte
são apresentadas as principais conclusões; e na quarta e última parte apresentamos
as referências bibliográficas.

FORMULAÇÃO DO PROBLEMA

Moçambique é um dos países em desenvolvimento que não está alheio a influência


da globalização. À medida que a sociedade moçambicana se transformou numa sociedade

Doutoranda em Ciência Política e Relações Internacionais na Faculdade de Ciências Sociais e Políticas da Universidade
50 

Católica de Moçambique.
139
de conhecimento e de aprendizagem, movida pela força do capitalismo global, surge uma
grande demanda por serviços de educação pautados no desenvolvimento de habilidades
e competências globalmente exigidas, de modo a formar indivíduos altamente capazes de
concorrer à vaga de empregos no mercado de recursos humanos cada vez mais globalizado.
De acordo com CAVALCANTI (2007) o desafio da educação na era da globa-
lização não é apenas o de preparar o indivíduo, mas também de prepará-lo educacio-
nalmente para o mercado global, de modo que sejam seleccionados socialmente, com
menor risco de fracasso, com maior probabilidade de realizar trabalhos complexos,
daí que as actividades curriculares e a estrutura organizacional de ensino devem ser
capazes de o capacitar a se adaptar produtivamente a ciência e a técnica transnacional,
através das tecnologias de informação e comunicação (TICs). É nesta senda que se
levanta a seguinte questão de partida: qual é a influência da globalização na introdução
e expansão da educação à distância em Moçambique?

GLOBALIZAÇÃO, A NOVA DEMANDA POR CONHECIMENTO E A


EDUCAÇÃO À DISTÂNCIA

A globalização é vista por alguns autores como sinónimo de internacionalização,


através da qual os humanos adquirem a oportinidade de viver um um mundo sem
fronteiras (CHADA E VALUNZUELA, 2000 apud SOARES, 2008). Através dela
se estabelecem interconexões entre países do mundo, se intercambiando as formas
de viver dos indivíduos, o que as pessoas fazem, criando-se uma interdependência
económica, política, cultural, científica, tecnológica, de comunicação e de hábitos de
vida e formas de expressão (SACRISTAN, apud SOARES, 2008).
Apesar de ser um fenómeno irreversível, existem duas visões antagónicas sobre
o fenómeno globalização: para uns, ela é um catalizador do desenvolvimento das
sociedades; e para outros, um dos principais factores que têm agravado a desigualdade
social, causado perda de identidade e de características particulares das nações em desen-
volvimento e criar a homogeneização política e mercadológica do mundo (VALUN-
ZUELA, 2000, CHOAMSKY, 1996 e TOSSACA, 2001 apud SOARES, 2008).
Os primeiros sinais de globalização no seio da educação ocorreu quando em finais
do século XVIII e inícios do século XIX, as potências coloniais tranferiram e impuse-
ram os seus sistemas educacionais as suas colónias (MOBASSA E ARUDA, 2018).
Mais tarde, inicia-se um processo de expansão dos EaD, que segundo Mobassa
e Aruda (2018) ocorreu em quatro etapas: (1) educação por correspondência, até os
anos 60; (2) transmissão de aulas por via de rádio e televisão, entre as décadas 60 a 70;
140
(3) educação por videoconferência, nos anos 80 e inícios dos anos 90; e (4) uso das
novas tecnologias, redes e multimídias actuais.
Com a crescente evolução da educação à distância, os efeitos da globalização passam
ser percebidos à medida que a sociedade se transforma em uma sociedade de conhecimento e
de aprendizagem, movida pela força do capitalismo global. Por causa disto são criados novos
modelos educacionais pautados em exigência de habilidades e competências globalmente
exigidas, em novos modos de treinamento técnico voltado para mercados emergentes,
redefinição da formação de trabalho necessário à economia global. Igualmente a avaliação
da qualidade dos sistemas educativos segue padrões internacionais (SOARES, 2008).
No mundo actual, há uma grande demanda por educação e conhecimento,
que associada às tecnologias desenvolveu o EaD como a modalidade do futuro. A
educação à distância é uma modalidade de ensino caracterizada pela separação física
entre o professor e o aluno, cujo contacto ocorre por meio da utilização de diferentes
meios de comunicação que podem ser tradicionais (impressos, vídeo cassetes, rádio,
televisão ou filmes) ou digitalizados (internet, multimídias e virtuais). Contudo apesar
das vantagens, não podemos descurrar da possibilidade da EaD também limitar os
que não tem acesso as novas tecnologias o que aumenta as desigualdades criando a
exclusao digital, educacional e social (GAINO e FLORINDO, 2010).

AS TECNOLOGIAS EDUCATIVAS E A GLOBALIZAÇÃO NA


EDUCAÇÃO À DISTÂNCIA EM MOÇAMBIQUE

As primeiras experiências de EaD em Moçambique remontam a altura do


pós-independência nacional, quando em 1977 foi realizado do III Congresso da Fre-
limo51 onde recém-criado Estado começa a pensar nas alternativas para formação de
quadros, principalmente de professores do ensino primário, para darem continuidade
ao projecto de formaçao da população (NEELEMAN e NHAVOTO, 2003).
Por orientação do congresso foi criado o Instituto Nacional de Desenvolvi-
mento da Educação (INDE), com um departamento do ensino à distância (DED),
que devia desenvolver estudos de viabilidade de EaD no país com objectivo de elevar
os conhecimentos dos professores primários ao nível da 6ª série do ensino primário e
garantir sua formação psicopedagógica.52

51 
FRELIMO (frente de libertação de Moçambique) foi um movimento de libertação, resultante da junção de trãs
movimentos juvenis, que mais tarde no período pós-independência tornou-se um partido político.
52 
Como resultado desta iniciativa foram elaborados materiais escritos e programas radiofônicos, que ao serem transmi-
tidos na Rádio Moçambique ganharam popularidades não só para o alvo, mas também, de aqueles que queriam elevar
seus conhecimentos mas não tinham possibilidade de regressar a escola regular (NEELEMAN e NHAVOTO, 2003).
141
Poucos anos depois veio a guerra dos 16 anos, que teve como conse-
quência a destruição de todo sistema de comunicação, agudizaram as dificul-
dades para implemetançao do EaD.
Mais tarde, nos anos 1990 novas experiências voltaram a surgir ligadas a formação
de professores, com a criação do Instituto de Aperfeiçoamennto de Professores (IAP),
com formação 100% à distância, num programa de 7ª + 1, para professores primários
com colaboração do Brasil através do CETEB53, financiado pelo Banco Mundial,
baseado em material escrito (NEELEMAN e NHAVOTO, 2003).54
No ano 2000 é criado o Ministério do Ensino Superior, Ciência e Tecnologia,
cuja prioridade na altura foi desenhar uma estratégia para introdução do ensino a
distância no ensino superior, que mais tarde se expandisse, não só do ensino primário
ao superior, mas tambem abrangesse cursos profissionais, de actualização e formação
contínua. É neste contexto que foi criado o Instituto Nacional de Educação à Distância
(INED), responsável pela coordenação do ensino à distância no país.
Nesta fase foram introduzidos conteúdos sobre tecnologias no currículo do ensino
secundário, consolidação dos programas temáticos no ensino superior e introdução da
educação à distância em instituições públicas e privadas (MOBASSA e ARRUDA, 2018).
No entanto temos que reconhecer que o ponto forte da globalizaçao é a comu-
nicação, e que a aldeia global só se forma graças à comunicação. A medida que a
comunicação desenvolve, mais globalizado o mundo. Assim, uma verdadeira educação
à distância devem sempre ser associados as tecnologias de informação e comunicação55.
Nesta modalidade de ensino, não basta apenas a incorporação dos computadores e
da internet nos conteúdos escolares, pois estas tecnologias são apenas o instrumento
de mediação entre os educadores, o educando e os saberes escolares, daí que a sua
inserção no ambiente escolar depende principalmente da formação do professor, para
que desenvolva uma proposta em que o processo se torne dinâmico e desafiador, mais
também que levar em conta os saberes do aluno, associados ao conhecimento escolar
que torna-se esssencial à construção dos saberes (GAINO e FLORINDO, 2010).
Em Moçambique o EaD é visto como uma estratégia para reduzir as assimetrias
regionais, pois reconheceu-se que o ensino presencial sozinho não seria capaz de resolver

53 
Centro de Ensino Tecnológico Brasileiro.
54 
Nesta década várias outras experiências surgem como da Universidade Pedagógica de Moçambique (UP), que iniciou a
formação de professores de inglês e francês em colaboração com instituições britânicas e francesas, e mais tarde o Instituto
de Formação Bancária (IFB) criado em 1994, que começa a formação de profissionais da banca online.
55 
Entenda-se por Tecnologias de Informação e Comunicação o conjunto de recursos tecnológicos integrados entre si, que
proporcionam por meio de funções de software e telecomunicações, automação e comunicação dos processos de ensino,
parendizagem e pesquisa científica (GAINO e FLORINDO, 2010).
142
os problemas de um país em desenvolvimento. No entanto, a situação actual do EaD em
Moçambique ainda está longe do ideal pois maior parte das instituições que oferecem cursos
nesta modalidade56, embora usem plataformas e-learrning, recorrem a materiais impressos
como suporte ao tecnológico, e os programas de ensino a distância usam, em concomitante,
programas presenciais devido a dificuldade de acesso a tecnlogia por parte dos alunos
(MOBASSA e ARRUDA, 2018). Embora parte dos alunos desta modalidade tenham
acesso aos serviços de internet, muitos deles não fazem o uso pedagógico da internet.

LIMITAÇÕES DA EXPANSÃO DA EAD EM MOÇAMBIQUE

JOANGUETE (2011 p. 67, apud LUMBELA, 2017), apresenta três (3) desafios
fundamentais do EaD em Moçambique: (1) infraestruturas físicas e de telecomunicações
deficiente e sem cobertura nacional; (2) fraca capacidade e habilidade humana trabalhar com
as TICs, dos professores, tutores e alunos, que se revela no fraco domínio dos equipamentos
informáticos, para além da exiguidade dos meios tecnológicos de hardware e software e; (3)
o preço da internet banda larga que é exorbitante, principalmete nas zonas rurais. Verifica-se
também ineficiencia na prestacao de serviços de apoio a estudantes desta modalidade.
Mais recentemente, com o surgimento a eclosão da pandemia da COVID-19,
estas dificuldades tornaram-se mais evidentes. Com o alastramento do vírus, o país foi
abrigado a fechar a porta de suas escolas e universidades, em março de 2020. O grande
desafio que se impunha era o de garantir a continuidade das aulas, nas condições que
as restrições devido a pandemia impunha. Neste cenário, o país adoptou um conjunto
de estratégias como a disponibilização de lições de aulas através dos canais de rádio
e televisão; disponibilização de fichas de exercícios e resumos de aulas através de pla-
taformas digitais especificas, adaptando suas funcionalidades aos diferentes usuários;
aulas virtuais síncronas e assíncronas, dependendo da capacidade de uso e domínios
das tecnologias e disponibilidade de internet por parte dos usuários.
Embora as medidas adoptadas para continuidade das aulas tenham-se mostrado
assertivas, a internet precária e os preços altos da ligação continuaram a ser um obstá-
culo para que esta modalidade de ensino a distância chegasse a todos em Moçambique.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Do estudo realizado chegou-se a conclusão de que com o fenómeno da globali-


zação impulsionado pelas tecnologias de informação e comunicação teve uma grande

Até 2016, cerca de 11 IES entre públicas e privadas ofereciam programas de EaD, o que representa cerca de 23%, mas
56 

nem todas tem representação fora da capital. Vide o site: www.mctestp.gov.mz


143
influência na introdução e expansão da educação à distância em Moçambique, onde
o foco é o de oferecer serviços de educação de forma cômoda e flexível, e reduzir as
assimetrias regionais de acesso a educação pela população.
No entanto, o país ainda está aquém do desejado em termos de oferta de serviços
de educação à distância na quantidade e qualidade capazes de concorrer no mercado
global, devido a fraca capacidade da infraestrutura de comunicação, falta de capacidade
técnica de alunos e professores no domínio das tecnologias, difícil acesso a internet de
qualidade principalmente nas zonas rurais, aliado ao elevado custo da internet de banda
larga, que entre outros factores constituem um limite para a expansão deste serviço.
Embora Moçambique tenha adoptado o ensino à distância com objectivo de massi-
ficar a educação, ainda não está a contribuir de forma efectiva para o alcance deste objectivo,
devido a dificuldades de acesso e domínio dos instrumentos tecnológicos necessários, dificul-
dades de acesso a internet e outras infraestruturas de telecomunicações, entre outros factores.
Deste modo, recomenda-se p além da melhoria dos aspectos arrolados, que
todos actores envolvidos na prestação destes serviços desde professores, tutores, alunos,
gestores, fazedores de políticas e planificadores estejam preparados para enfrentar com
sucesso o desafio do ensino à distância no país.
No entanto, devemos realçar que o processo de expansão do ensino à distância
com recurso as tecnologias são irreversíveis no mundo globalizado actual, pelo que o
país deve assumir este desafio.

REFERÊNCIAS
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riscos. Univeridade de Santo Amaro, p. 1 – 14, Março, 2007.
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SOARES, L. et al. Globalização e desafios contemporrâneos para a educação: Análise do PISA e os rumos da
educação no Brasil. Revista Espaço do Currículo, vol. 1, nº 1, pag. 182 - 222, Março - Setembro, 2008.
144
CURRÍCULO E TECNOLOGIAS: O QUE PODEMOS
FALAR A RESPEITO?

Etiêne Cristina da Silva Ferreira57

INTRODUÇÃO

Atualmente, as tecnologias digitais vêm demonstrando que é possível o


desenvolvimento de um novo paradigma educacional. Desde crianças, os indi-
víduos já têm certo contato com a tecnologia, um fator que pode trazer consigo
mudanças nos modos de comunicação e interação.
Na maioria das vezes, quando o assunto é a informática, uma primeira visão
se restringe à tecnologia, à automação, à comunicação de dados, entre outros. O
Brasil possui certa desvantagem em relação aos países desenvolvidos diante dos
avanços tecnológicos disponíveis à educação. Existe a necessidade de mais pesquisas
e estudos na área de informática educacional, para que possa chegar no mesmo
nível dos Países mais desenvolvidos.
Porém, introdução do computador na educação não é um ponto em que todas
as pessoas da área chegam em um consenso, o que fica claro ao observar a quantidade
de formas como a informática é interpretada nos meios educacionais. Diante desse
fato pode-se justificar a realização desta pesquisa na área de informática na educação,
visando à utilização do computador como ferramenta pedagógica e a introdução
dos alunos das séries iniciais do ensino fundamental no mundo da informática.
A tecnologia está cada vez mais presente em todas as áreas da sociedade
contemporânea, e a educação não é exceção. Nesse sentido, é difícil pensar a edu-
cação hoje sem falar das tecnologias, pois elas transcenderam os muros da escola e
surgiram no cotidiano de alunos e professores. Repensar a tecnologia nas escolas e os
currículos escolares é cada vez mais necessário, pois currículo e tecnologia são dois
conceitos desconexos que enfrentam o desafio de construir conjuntamente cami-
nhos pedagógicos na sociedade contemporânea (ALMEIDA; VALENTE, 2011).
Nesse sentido, o currículo é entendido como um discurso e, portanto, é cons-
tituído por práticas e significados culturais; denominamos essas tecnologias como
tecnologias de rede digital (TDR), entendidas como uma prática social (BUZATO,
Mestranda em Educação (USAL – AR). Professora (SME / Itapevi – SP).
57 

CV: http://lattes.cnpq.br/7081942960337328
145
2006). Integrar o TDR nos ambientes escolares por meio do desenvolvimento
contínuo de políticas públicas de inclusão digital, incluindo nacionais, Iniciativa
Nacional de Tecnologia Educacional e políticas internacionais - Metas Educacio-
nais Iberoamericana Organização). Essas políticas visam utilizar a tecnologia como
recurso didático e melhorar a qualidade da educação. Acredita-se que a introdução da
tecnologia nas escolas por si só não é suficiente para que elas integrem os currículos
escolares, passem a fazer parte da prática docente e melhorem a qualidade do ensino.

REFERENCIAL TEÓRICO

O mundo globalizado é um mundo em rede com múltiplas possibilidades de


comunicação, onde as partes são interdependentes, se entendem, se influenciam, se
apoiam ou se opõem, formando uma rede de trocas na qual realizam ações. padrões,
modelos culturais ou outros. No entanto, segundo os autores, a novidade da globaliza-
ção atual é que ela ocorre em escala maior e acelerada graças ao advento das TIC, pois
ocorre no contexto da chamada sociedade do conhecimento ou da informação. Nos
últimos anos, vários campos, especialmente a tecnologia, fizeram grandes progressos.
Segundo Gómez (2011, p. 65), “[...] as notáveis conquistas
​​ tecnológicas das
últimas décadas trouxeram mudanças fundamentais na forma como nos comuni-
camos, agimos, pensamos e nos expressamos”. Empregos que envolvem o uso da
internet pagam 50% a mais do que empregos que não usam a internet.
Diante dessas mudanças, Gomez (2011, p. 67) diz: “Não é exagero que a
sobrevivência de indivíduos, organizações e nações na era da informação dependa
em grande parte da aquisição, uso, análise e troca de em formação. Além disso, para
os autores, nesta sociedade global baseada na informação, é necessário considerar
o papel das novas tecnologias que fornecem informação, por exemplo a Internet
pode ser considerada como um facilitador da comunicação democrática, pois torna a
informação mais acessível a mais pessoas usar. Nesse contexto, a Internet torna-se um
espaço de interpretação e ação, bem como um poderoso meio de comunicação, uma
ampla teia de informações cujo conteúdo não é regulamentado e que, juntamente
com a informação, fornece material ético e politicamente tendencioso e perigoso.
Por todas essas razões, ainda segundo Gómez (2011), as sociedades da infor-
mação e do conhecimento possuem requisitos de educação diferentes das sociedades
tradicionais, o problema não é mais a quantidade de informação que os alunos rece-
bem, mas a qualidade dessa informação fragmentada, entendendo-a. capacidade de
processá-lo, selecioná-lo, organizá-lo, transformá-lo em conhecimento e aplicá-lo a
146
diferentes situações ou contextos. Por todas estas razões, a Sociedade da Informação
e do Conhecimento responde a necessidades educativas distintas das necessidades
educativas tradicionais, que estão claramente relacionadas com o desenvolvimento
de capacidades de aprendizagem ao longo da vida para todos os cidadãos.
As tecnologias digitais estão na Educação através de aplicativos educacionais
que podem ser desde simples atividades de exercício e prática, que se caracterizam
pela realização de atividades repetitivas para treinar habilidades ou recapitular con-
teúdos já trabalhados. Por isso, existem também os jogos educacionais são ferramentas
disponíveis para o professor utilizar em suas aulas, tornando-as mais divertidas e
animadas; e os softwares de testes com grau de dificuldades variadas, apresentadas
de forma randômica com ou sem referência cruzada. (LOPES e MACEDO, 2011)
Os avanços da modernização no Século XXI já são algo muito presente em
algumas escolas e universidades. Aquelas que possuem uma infraestrutura avançada,
já têm bons recursos em laboratórios de informática, salas de aula, entre outros
ambientes de uma instituição de ensino com equipamentos que influenciam na
prática pedagógica. Um exemplo básico é quando um professor explica aos alunos
sobre um determinado tema específico. Eles poderão ter muito mais acesso a esse
conteúdo ao utilizar o recurso da internet, podendo buscar saber mais sobre aquele
assunto, assistindo vídeos, ou mesmo observando imagens em outros sites de buscas
para um aprofundamento do conceito abordado nas disciplinas (MORAN, 2007).
Apesar dos antigos métodos, professores acabam convivendo com a tecnologia
de qualquer forma. Grande parte da população brasileira possui acesso à internet
através dos celulares, usando-os em todos os lugares e ambientes, inclusive nas
salas de aula. Portanto se a internet já é algo que faz parte do nosso cotidiano,
porque não utilizá-la para um fim tão importante que é a educação?
O computador pode ser um dos recursos muito importantes, transmitindo
as informações apresentadas em sala de aula de forma educativa, dinâmica, contri-
buindo para a fixação de um conteúdo, sendo uma ferramenta muito presente para
avaliar inclusive o desempenho de cada estudante, através de seus apelos visuais,
como mapas, sons, imagens, vídeos, textos, entre outros. Pode ser utilizado como
fonte de pesquisas e informações, acesso aos meios de comunicação, editores de
textos, imagens e sons, conhecidos como os softwares, e outras ferramentas de
armazenamento de conteúdo como o Google Drive, que permite o arquivo de
trabalhos em uma nuvem. Indivíduos que possuem uma deficiência podem ainda
receber um auxílio melhor com o computador. (KENSKI, 2008).
147
Normalmente, quando o termo “tecnologia” é utilizado, o foco é nos compu-
tadores, definidos por Lima Júnior (2005) como um reflexo ou extensão do modo
de pensar humano, capaz de articular abstrações em diversos contextos, mudando
o mundo ao seu redor. As funções de seu software são abstrações ou proposições,
quando utilizadas por humanos, desencadeiam uma rede de eventos e significados,
cada programa representa um determinado significado para o usuário, como referência,
permitindo que ele encontre soluções para problemas encontrados em seu contexto
experiência, modificar esse pano de fundo e a si mesmo, todo esse processo é repleto
de interesses, valores, possibilidades cognitivas, todas fugazes e variadas, mas efetivas.
Lima Júnior (2005) define tecnologia não apenas como o uso de equipamentos,
máquinas e computadores, mas também como maquinário em relação à ideia de produ-
tividade industrial, seu conceito é mais completo, e por meio do uso humano de recursos
materiais e imateriais ou a partir os recursos disponíveis na natureza e ambientes expe-
rimentais os criam para encontrar soluções para seus problemas cotidianos além deles.
De acordo com a Matriz Grega, os processos tecnológicos estão inextricavelmente
ligados e expressivos do homem e dos recursos materiais ou imateriais que ele cria e não
podem ser concebidos isoladamente. A tecnologia de criação é humana porque é o resul-
tado do comportamento imaginativo, reflexivo e motor do sujeito, enquanto o humano
é tecnológico porque significa e muda ao criar e usar recursos e ferramentas para agir ele
mesmo em seu ambiente de vida. ambiente, inventa e gera seu próprio conhecimento.
Como argumenta Pretto (2011, 110 e 111), na prática educativa esse movimento pode ser
transformado pela separação do uso de dispositivos tecnológicos como apenas um recurso.
Essas facilidades, e todos os sistemas a elas associados, compõem a cultura e,
por isso, pedimos que olhemos a educação a partir de uma perspectiva pluralista,
afastando-nos da educação, da cultura, da ciência e da tecnologia que podem ser
pensadas como meras mecanismos de transmissão.
Segundo Kenski (2011), tecnologia é um corpo de conhecimento científico e
princípios aplicáveis ​a um determinado tipo de atividade, como a construção de uma
caneta esferográfica ou de um computador. Não importa, nesta tarefa, os humanos têm
que encontrar o processo. Oliveira (2001: 101) segue o mesmo raciocínio, afirmando que,
do ponto de vista da tecnociência, a tecnologia refere-se a uma forma específica de relação
entre o homem e a matéria no processo de trabalho, que envolve o uso da produção. A
atuação nesta área baseia-se na energia, no conhecimento e no conhecimento. em formação.
Pode-se concluir que a tecnologia é influenciada e o comportamento humano
em breve coexistirá em perfeita simbiose com humanos que influenciam as rela-
148
ções sociais, simplificando a vida cotidiana e facilitando o desempenho de tarefas.
Alcançar esse processo requer dominar e aprender tecnologia, como Kenski (2011,
p. 41) afirma: “Não há mais tempo em que alguém possa dizer que não há mais
nada a aprender. para aprender mais e se refrescar.”
Hoje, quando usamos o termo “tecnologia na educação”, é difícil pensar em giz,
fotos, livros, revistas, programas, programas (entidades abstratas), sem falar que “a tec-
nologia é tão antiga quanto o ser humano, na verdade, o ser humano A engenhosidade
gerou a tecnologia mais diferenciada de todos os tempos” (KENSKI, 2011, p. 15).
Neste momento societário em que a tecnologia media a relação entre a infor-
mação e o ser humano, para garantir o uso confortável dessas tecnologias, é necessário
trabalhar e atualizar a importância da formação interdisciplinar como parte integrante
do processo global, pois facilita os objetos. informação), o assunto (educação) e a
interação entre as diferentes áreas do conhecimento (disciplinas). Há maiores possi-
bilidades de capturar, recuperar e transmitir informações, mas é preciso compreender
as “múltiplas possibilidades oferecidas pela complexidade” (PRETTO, 2011, p. 109).
Na educação interdisciplinar, a aquisição do conhecimento se dá por meio
da aprendizagem, que é um processo ativo que leva à transformação. Portanto, o
conhecimento é o comportamento e o conhecimento da produção social.
As mudanças sociais, econômicas e tecnológicas estão implementando novos
métodos de ensino e aprendizagem. Com isso, os recursos tecnológicos estão cada
vez mais integrados ao processo de ensino como ferramenta intermediária entre os
indivíduos e o conhecimento, auxiliando na formação do cidadão para atuar em seu
meio. Realizar a tarefa de conectar o mundo dos alunos com o mundo dos conteúdos
escolares e das coisas que contribuem para a formação básica da cidadania. Os profes-
sores também devem usar a tecnologia que agora é parte integrante da vida cotidiana.
O impacto das novas tecnologias não é imediato e leva tempo para que as
pessoas absorvam os avanços e aprendam a usá-los. Não basta adquirir as máquinas e
equipamentos que devem ser utilizados para reproduzir novos aprendizados e estilos
de vida. Um fato relacionado é a democratização do conhecimento em sentido amplo.
Para Bianchetti (2001), a informação pode ser inventada como matéria-prima
da qual o conhecimento pode ser derivado. A coleta de dados e informações é uma
teoria importante. Mas, segundo o autor, conhecimento é construção.
Adaptar os currículos escolares às novas realidades contemporâneas é vincular
a cidadania à “construção social do conhecimento e ao acesso aos novos avanços do
desenvolvimento científico e tecnológico” (AHLERT, 2003, p. 146). Deste ponto de
149
vista, o pleno exercício da cidadania só pode ser alcançado se cada cidadão adquirir
os conhecimentos, informações, tecnologia, ciência e saber relacional proporcio-
nados pela tecnologia de forma igualitária ao longo de todo o processo educativo.
Dada a quantidade de significado que um currículo escolar confere, achamos
necessário começar a discuti-lo com a teoria curricular, pois mais importante e
interessante do que buscar uma definição do que é um currículo, saber quais questões
uma teoria curricular ou discurso curricular procura responder, porque as Definições
não revelam o que é um currículo, mas o que uma teoria diz que é. Ou seja, o que a
teoria do currículo faz é criar um conceito de currículo específico (SILVA, 1999).
As aulas sempre existiram em atividades desenvolvidas por professores de
todos os tempos e lugares, mas não há um termo claro para nomear essa atividade.
Segundo Goodson (2001), o currículo como o conhecemos hoje não se constitui
em um determinado momento da história, mas em diálogo com o contexto his-
tórico e social de cada época até os dias atuais.
Impulsionado pela institucionalização da educação de massa, o currículo surgiu
como campo profissional e profissional de estudo e pesquisa nos Estados Unidos nas
primeiras décadas do século XX (SILVA, 1999). As discussões em torno desse campo
se desenvolveram a partir de teorias tradicionais, críticas e pós-críticas (SILVA, 1999).
Apresentaremos as teorias na ordem acima porque consideramos eventos
históricos, não porque acreditamos que as teorias ocorrem de forma linear - por-
que reconhecemos que nesses jogos políticos definidos, uma teoria não exclui
explicitamente a outra (Rubio, 2017).
A discussão a seguir descreve como o currículo foi definido em diferentes perío-
dos e em diferentes teorias. Vale ressaltar que a questão central em toda teoria curri-
cular é saber: o que deve ser ensinado? Mas tal questão nunca está separada de outra
questão importante: o que eles são ou deveriam se tornar? Segundo Silva (1999, p. 15),
O currículo é feito para mudar justamente quem vai ‘seguir’ o currículo”.
Nesse sentido, as teorias curriculares escolhem o que ensinar com base
no tipo de pessoas que pretendem formar. As teorias tradicionais “são
desenhadas para serem […] “teorias” neutras, científicas, imparciais
(SILVA, 1999, p. 16), focam-se em questões técnicas e naturalmente
focam-se na organização e desenho dos cursos. No cerne das teorias
tradicionais A questão é “como”? Ou seja, qual a melhor forma de
disseminar o conhecimento? Eles enfatizam os seguintes conceitos:
“ensino, aprendizagem, avaliação, metodologia, pedagogia, organização,
planejamento, eficiência e objetivos (SILVA, 1999, p. 17 páginas).
150
A definição do currículo estará mais relacionada ao conteúdo selecionado,
ao tipo de alunos que esse conteúdo irá produzir, ao processo de planejamento
das atividades docentes e às mudanças no comportamento do aluno. Embora as
teorias tradicionais tenham sido criticadas ao longo do tempo, elas ainda existem
nas escolas, mesmo em Nesse sentido, Dias (2016, p. 35) observa que “muitas
práticas de desenvolvimento curricular escolar ainda são prescritivas, pautadas
por metas e validadas por meio de um processo avaliativo”.

CONCLUSÃO

Durante o trabalho de pesquisa, foi possível entender que as tecnologias de


softwares educativos dentro da informática são muito necessárias no mundo atual. Os
padrões de ensino tradicionais estão de alguma forma ultrapassados. É preciso que eles
se reinventem e, para isso, o uso da tecnologia é um instrumento benéfico a favor da edu-
cação, trazendo pontos muito positivos, entre eles a busca pelo conhecimento por parte
dos alunos através da internet e uma interatividade e praticidade maior na disciplina.
Porém, muitos educadores ainda não acompanharam essas evoluções, defen-
dendo os métodos tradicionais de Ensino. De fato, as aulas presenciais e teóricas
possuem a sua relevância, mas os recursos tecnológicos podem complementá-las.
Para que isso ocorra, não depende apenas dos educadores, mas também dos estu-
dantes estarem abertos a essa mudança, além das políticas públicas que influenciam
na infraestrutura das escolas: laboratórios, equipamentos e a presença da internet.
Existem também alguns pontos negativos, tratados pelos autores, entre eles a
dependência dos mecanismos virtuais e o comodismo no qual o aluno seria inserido,
podendo levar a mais distrações e problemas de disciplina. Porém, a reinvenção do
ensino é uma demanda, que necessita ser sanada, um processo que envolve a des-
construção de instrumentos tradicionais, mas também do investimento na educação.

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152
PERSPECTIVAS DE ENFRENTAMENTO DAS CRISES
PESSOAIS E PROFISSIONAIS

Érico Tadeu Xavier58

Crise é um termo associado a diversos aspectos relacionados com mudanças,


desequilíbrio, incerteza, ausência, carência, cujo significado estão emanados da
percepção de uma alteração em um determinado evento, acontecimento ou situa-
ção, que pode afetar a parte física ou simbólica. O Dicionário Michaelis (2022)
define crise como um evento da medicina associado à melhoria da doença; mas
também como um estado emocional de desequilíbrio que provoca sofrimento ou
angústia mental, dúvida e incerteza quanto à ordem moral, política, religiosa; e
como deficiência ou escassez de algo, entre outros fatores.
As crises podem surgir em diferentes momentos e situações, quando se
menos espera, como a morte de um ente querido, uma doença que se prolonga,
uma perda financeira que reduz as condições individuais e da família. E atinge
também o campo das profissões, a formação identitária individual e profis-
sional, mesmo entre os cristãos.
Na área da educação se tem percebido que a profissão educador/professor é
avaliada como sendo uma profissão em crise, está associada a diferentes aspectos,
como: crise de identidade profissional, de caráter financeiro, de valorização da
docência, de formação acadêmica, entre outros fatores que contribuem para uma
reflexão mais aprofundada do tema.
Em meio às diferentes situações que podem ocasionar crises pessoais e
profissionais se faz relevante analisar as perspectivas de enfrentamento des-
sas crises e avaliar as oportunidades de crescimento que elas trazem às pessoas
como indivíduos e profissionais.
Nesse sentido, este capítulo tem como objetivo demonstrar que as crises
podem ser instrumentos de crescimento pessoal e profissional quando direciona-
das para a busca do equilíbrio e do conhecimento sobre os fatores que as geram.

Pós-Doutorado (FAJE). Doutorado em Ciências da Religião (Atlantic International Universit – EUA). Professor de
58 

Teologia (Seminário Adventista Latino-Americano de Teologia) e Professor conteudista (UNINGÁ).


CV: http://lattes.cnpq.br/1331886661450859
153
Mediante a pesquisa em obras que tratam da temática são apresentadas
algumas possibilidades de enfrentar as crises pessoais e profissionais que possam
assolar o professor/educador em sua vivência profissional, numa perspectiva cristã.

OS DIFERENTES TIPOS DE CRISES

De forma geral, as crises que afetam a humanidade podem ser classificadas em


diferentes tipos. Conforme Collins (1988, p. 41-42) há três tipos de crises, quais sejam:
- Crises acidentais ou situacionais, que ocorrem quando surge uma ameaça
repentina ou perda inesperada, como exemplo, a morte de um ente querido,
uma doença súbita, a descoberta de uma gravidez fora do casamento, dis-
túrbios sociais como guerra ou depressão econômica, perda da casa ou das
economias, perda súbita da reputação e posição.

- Crises de desenvolvimento, que surgem no curso do desenvolvimento


humano normal, tais como: entrada na escola ou faculdade, ajustes no casa-
mento, paternidade, aceitação de críticas, adaptação à aposentadoria, enfren-
tamento da morte de amigos, declínio da saúde.

- Crises existenciais, que surgem quando somos forçados a enfrentar verdades


perturbadoras que nos forçam a compreender fatos como: fracasso, velhice,
falta de propósito, doença incurável, falta de em que acreditar, perda de bens,
aposentadoria, rejeição, viuvez, desvalor, entre outros.
Para Ferreira (2021), essas três crises são percebidas da seguinte forma: a crise
de desenvolvimento ocorre em períodos transacionais, ou seja, quando a pessoa
para por um processo de transição, de mudanças, a nível cognitivo, emocional ou
comportamental próprio do desenvolvimento, como a transição da infância para
a adolescência, casamento, nascimento de filhos, e outros. A crise situacional é
causada por eventos traumáticos que afetam a identidade e os papéis desempe-
nhados pela pessoa, derivada de um acontecimento inesperado, como um acidente
grave, a perda súbita do emprego, morte, doença, e outros que possam afetar o
modo como a pessoa se percebe ou se aceita. Já a crise acidental é pouco comum,
mas resulta em perdas e mudanças ambientais drásticas, com desastres naturais,
guerra, inundação, eventos que causam elevado stress. E a crise existencial tem
a ver com a percepção da pessoa sobre si mesma, sobre a forma como enxerga a
vida, suas crenças e filosofias.
Einstein (2017), em seu livro “Como vejo o mundo” falou sobre uma crise que
tem afetado grandemente o mundo e, consequentemente, afeta também as pessoas:
154
a crise econômica, cujas consequências contribuem para que as demais crises sejam
exacerbadas. A crise econômica influencia a economia mundial e a vida das pessoas,
de modo que provoca mudanças que podem acarretar crises individuais e sociais.
Essas crises refletem na capacidade das pessoas de viver uma vida equilibrada,
sendo necessário o enfrentamento e a compreensão dos sentimentos, das mudanças
socioculturais e das percepções pessoais e coletivas a respeito da crise vivenciada.
As crises podem provocar diversas reações nas pessoas, de acordo com
Ferreira (2021), sendo os principais sinais de crise os seguintes: “1) irritabili-
dade; 2) raiva; 3) ansiedade; 4) apatia; 5) desesperança; 6) negação; 7) reduzida
capacidade de concentração; 8) experiência de luto/perda; 9) tendência a entrar
em conflito com outros; 10) alterações a nível do sono ou apetite; 11) depres-
são; 12) evitamento de interações sociais; 13) aumento do consumo de álcool e/
ou abuso de outras substâncias”.
As crises refletem a transformação de uma realidade já firmada para outra
em construção, necessariamente dinâmica e que requer adaptações e mudanças
para alcançar um modelo mais adequado, seja no campo afetivo, econômico, reli-
gioso, político ou profissional.
As crises que afetam o campo profissional estão relacionadas mais diretamente
com os tipos situacionais e econômicas, embora possam ter elementos dos demais
tipos. Especialmente no campo da educação, se tem percebido que a profissão
de professor/educador enfrenta uma crise a qual tem motivado reflexões sobre o
ser professor, a formação docente, a prática educativa, entre outros aspectos que
merecem um pequeno aparte a ser analisado na perspectiva da pessoa do educador/
professor em crise com sua profissão.

EDUCADOR/PROFESSOR EM CRISE

A profissão de professor/educador gera debates que, por si só, refletem


uma crise, já que a prática profissional requer uma análise mais ampla do que
é ser professor em uma conjuntura econômica que exige muito da educa-
ção, mas oferece pouco em troca.
Na compreensão de Boufleuer (2013), a crise na profissão de professor se
expressa pela manifestação de insatisfações por parte dos educadores, o que pro-
voca um “mal-estar docente” generalizado. Ao mesmo tempo, a crise se agrava
pela redução drástica de candidatos aos cursos de formação de professores nas
instituições de ensino superior. Assim sendo, se observa a existência de uma
155
crise de profissão, vinculada à ocupação, demanda de trabalho e expectativa de
remuneração, e também a uma profissão em crise, está vinculada à identidade do
profissional, à sua percepção do caráter da atividade e do seu papel na sociedade.
Sobre isso, o autor comenta o seguinte:
Uma das ideias, senão a primeira, que costuma vir à cabeça quando
se fala de uma crise de profissão da docência é que o emprego aí pro-
porcionado é mal remunerado, ou seja, que a remuneração percebida
como professor não permite um nível desejável de usufruto dos bens
materiais e culturais que o mundo de hoje oferece. A expectativa de uma
vida confortável e rica em vivências culturais, tal como oportunizada
pela sociedade atual, não teria, portanto, na profissão docente uma
via de realização, fazendo com que a opção pela docência seja pouco
considerada pelos jovens na hora de se decidirem por uma carreira
profissional, além de produzir certo desalento naqueles que já estão
atuando como docentes. (BOUFLEUER, 2013, p. 393).

Conforme Boufleuer (2013), a crise quanto à expectativa de salário não abarca


somente a profissão docente, já que muitas outras profissões possuem dificuldades
quanto a isso e nem por isso sofrem com esse tipo de crise. A carreira docente
oferece também oportunidades de ascensão, especialmente por meio da formação
continuada que possibilita melhor remuneração e reconhecimento profissional.
A questão salarial pode contribuir para configurar a crise profissional, mas não
explica a mesma. A crise apresenta um conteúdo mais amplo, vinculado ao campo
de trabalho e à identificação do professor como educador.
A educação é um direito que o Estado brasileiro garante aos cidadãos.
Para isso, o campo de atuação do professor está não apenas previsto na Cons-
tituição, mas está garantido, por ser este um profissional considerado essencial,
como destaca Gatti (2016, p. 164):
Qualquer que seja o tipo de relação estabelecida, e as formas dos
processos educativos, o professor é figura imprescindível. Os insumos,
a infraestrutura, são condições necessárias, mas, não suficientes para a
implementação de processos educacionais mais humanamente efetivos.
A formação dos professores, suas formas de participação em sala de
aula, em um programa educacional, sua inserção na instituição e no
sistema, são pontos vitais.

Como figura imprescindível, o professor/educador precisa obter uma for-


mação adequada, haja visto que “quando bem formado, ele detém um saber que
156
alia conhecimento e conteúdos à didática e às condições de aprendizagem para
segmentos diferenciados” (GATTI, 2016, p. 164).
Nas faculdades a oferta do magistério continua a ser ampla, apesar da baixa
procura apontada por Ferreira (2013), que destaca um estudo onde foram identifi-
cadas algumas situações que salientam a crise na formação de educador. Segundo
este autor, os cursos de licenciatura têm sido pouco procurados e apresentam alto
índice de desistência dos ingressantes, fato relacionado à precarização das con-
dições de trabalho e exigências do poder público e privado para com a atuação
dos professores, além da desmotivação dos licenciados com a falta de comprome-
timento dos alunos para com sua formação e não identificação com a profissão.
Um aspecto percebido pelo autor foi que a procura pelo magistério nem sempre
está ligada à vontade de ser professor, mas ao fato de ser uma opção válida para
participar de concursos públicos. O aumento do ensino superior “facilitado” e com
preços acessíveis também foi apontado como um chamariz ao campo profissional.
Discute-se nesse viés a crise no processo de formação de professores que
aponta para uma baixa qualidade de formação, o que representa um desafio a ser
superado através de políticas governamentais e de mudanças nas práticas forma-
tivas institucionais, tarefa que leva tempo se quiser reverter o quadro de formação
inadequada. Gatti (2016) chama a atenção para isso analisando a necessidade de
mudanças no processo de formação a partir do próprio corpo de formadores de
professores para adequar o processo às demandas atuais.
Não se fez avanços na formação do corpo de formadores de profes-
sores a partir de exigências mais claras quanto às suas competências e
habilidades na direção de serem detentores de saberes teórico-práticos
que lhes permitam desenvolver, criar, ampliar os aspectos formativos
específicos relativos ao desenvolvimento da educação escolar em suas
variadas facetas. Na formação continuada, oferecida sob várias con-
dições, ou procurada em vários contextos pelos próprios professores,
é que estes tentam encontrar novos caminhos e mais fundamentos e
meios para seu desempenho profissional. Nem sempre esta formação se
acha disponível, nem sempre ela é adequada. (GATTI, 2016, p. 167).

As cobranças individuais, sociais e institucionais também refletem na pro-


fissão, especialmente no ser e no fazer do professor, gerando insatisfação com a
profissão, desmotivação pessoal, pouca definição da função de educador, o que
contribui para uma má formação da identidade profissional e, consequentemente,
da baixa qualidade de vida desse profissional, senão da deficiência de ensino. Nesse
157
sentido, Freitas (2022) afirma que embora a baixa qualidade de ensino seja rela-
cionada com a deficiência do professor por algumas pesquisas veiculadas na mídia,
essas pesquisas, em geral, não levam em conta os fatores que afetam a qualidade
do trabalho do professor, fatores estes ligados a excesso de trabalho e atividades
dentro e fora das horas consideradas pelas instituições, defasagem salarial, falta
de recursos, indisciplina escolar, violências em sala de aula, excesso de cobranças
burocráticas. Esses fatores em conjunto afetam a qualidade de vida e de trabalho
do professor e influenciam no desempenho profissional.
Outro aspecto considerado como crise na profissão de professor/educador
é a formação da sua identidade profissional. Conforme explicam Silva e Chakur
(2009), a identidade profissional é formada a partir da definição da identidade
pessoal e da identidade coletiva. O processo de identidade pessoal tem início na
infância e ocorre conforme a cultura e a categoria social do indivíduo, quando este
adota papéis e atividades com as quais se identifica subjetivamente. A identidade
se forma não apenas no campo individual, mas também no coletivo, mediante
um sistema de relações que se tornam referência para o indivíduo. A identidade
profissional é construída a partir da significação social da profissão. Nesse sentido,
a identidade profissional docente é
[...] um processo contínuo, subjetivo, que obedece às trajetórias indi-
viduais e sociais, que tem como possibilidade a construção/descons-
trução/reconstrução, atribuindo sentido ao trabalho e centrado na
imagem e autoimagem social que se tem da profissão, e também
legitimado a partir da relação de pertencimento a uma determinada
profissão, no caso, o Magistério. (SILVA e CHAKUR, 2009, p. 224).

A identidade profissional tem muito a ver com a significação que o professor


confere à atividade docente a partir de seus valores, de seu modo de ver o mundo,
de suas representações, saberes, anseios, bem como o se enxergar professor. A
formação identitária do professor depende das representações que o mesmo tem
das escolas, dos currículos escolares, dos sistemas de formação, de sua percepção
das propriedades socioculturais que envolvem a escola, os alunos e a comunidade,
ou seja, de como ele interpreta espaços, tempos e representações sociais. Nessa
perspectiva, a crise de identidade profissional docente se insere num contexto de
demanda do redimensionamento dos papéis que o professor desempenha a partir
de suas percepções pessoais e sociais em confronto com as exigências que o campo
de trabalho requer do mesmo (GOMES e DE PAULA, 2012).

158
Tendo feitas essas considerações é possível perceber que a crise na profissão
de educador apresenta diversos contextos a serem avaliados. Nem por isso essa
reflexão se abstém de buscar possibilidades de enfrentar as crises que afetam o
campo de atuação do professor, especialmente quando este se propõe a se ver como
docente. Nesse aspecto, a motivação para viver o momento de crise profissional e
buscar obter proveito desse momento vem de compreender que é possível rever
práticas e construir melhorias, repensando os processos de formação e de cons-
trução da identidade docente, do ser professor.

POSSIBILIDADES DE ENFRENTAMENTO DAS CRISES

O enfrentamento de crises requer que se busque um equilíbrio. A pessoa,


como indivíduo, como ser social ou como profissional, sofre influência de fatores
psicossociais que interferem na forma como a mesma reage aos impasses.
As crises podem gerar dor e sofrimento. Mas é em meio a esses momen-
tos que se percebe que existe um processo gerado pelas crises pelo qual se pode
aprender algo que impulsiona à sobrevivência, ao crescimento. Por isso, é possível
afirmar que as crises são oportunidades para mudar, para crescer e desenvolver os
recursos internos. Essa percepção é corroborada pela Bíblia Sagrada e por estudos
cristãos sobre o enfrentamento das crises que sobrevém ao ser humano, sejam elas
de ordem existencial, de desenvolvimento, situacionais ou acidentais, podendo
esses ensinamentos serem aplicados às crises profissionais também.

A BÍBLIA E O ENFRENTAMENTO DAS CRISES

Na Bíblia Sagrada existem muitas histórias que falam de crises. Desde Adão,
Eva, Caim, Noé, Abraão, Isaque, José, Moisés, Sansão, Jefté, Saul, Davi, Elias,
Daniel, e vários outros personagens do Velho Testamento enfrentaram crises. O
exemplo de Jó vivenciando uma crise situacional nas cinco áreas vitais – saúde;
família; finanças; amigos; casamento; Abraão e Sara enfrentando mudanças
críticas; Elias em crise existencial achando que fracassou. No Novo Testamento
relata a família de Lázaro, de Jairo, a viúva de Naim, perdendo seus entes queridos,
diversos casos de doenças, dissensões. O que houve em comum, em todas essas
histórias, foi que Deus se fez presente dando a vitória completa após um período
necessário para que houvesse a compreensão e a aceitação.
Embora seja difícil aceitar, as crises da vida podem afetar até mesmo os que
se julgam mais preparados emocional e espiritualmente, inclusive os cristãos mais
159
fervorosos. Todos, um dia, passam por uma luta interna, onde são provados seus
conceitos, princípios e valores, a firmeza de caráter e a fé. Dessa crise ninguém
escapa, nem mesmo o melhor dos líderes. Nem Elias (I Re 19), nem mesmo o
próprio Jesus, especialmente antes de Sua crucificação (Lc 22:39-46) deixaram
de passar por momentos angustiosos. O mesmo ocorreu com os discípulos, com
Pedro, com Paulo e com os primeiros cristãos. Por isso muitas das epístolas foram
escritas com o intuito de auxiliar a enfrentar as crises que, certamente, eles mesmos
enfrentaram e sabiam que todos haveriam de enfrentar.
Jesus nos advertiu que, nesse mundo, teríamos aflições, mas Ele também nos
pediu para termos bom ânimo, pois, garantiu, “Eu venci o mundo”. E, se Cristo
venceu, mesmo que, por amor a Ele sejamos todos os dias entregues à morte, nada
que nos aconteça (incluindo aqui a angústia e as crises da vida) podem nos separar
do amor de Cristo, pois “em todas essas coisas somos mais que vencedores, por
aquele que nos amou” (Rm 8:35-37).
O apóstolo Paulo afirma que devemos olhar para Jesus, autor e consumador
da nossa fé, o qual suportou a cruz e desprezou a afronta para então assentar-se
à destra do trono de Deus. E aconselha a cada um de nós que perseveremos:
“Considerai, pois, aquele que suportou tais contradições dos pecadores contra si
mesmo, para que não enfraqueçais, desfalecendo em vossos ânimos. Ainda não
resististes até ao sangue, combatendo contra o pecado” (Hb 12:2-4).
Não é por serem cristãs que Deus transforma as pessoas em ferro, ao con-
trário, elas continuam a ser humanos de carne e osso, porém, revestidos do poder
do Espírito Santo, confiantemente achegados a Cristo, podem vencer todas as
crises da vida. Da salvação se obtém bênçãos maravilhosas, mas somente se pode
desfrutar dessas bênçãos à medida que ocorre a transformação e a pessoa se deixa
moldar segundo o caráter de Cristo.
Dessa maneira, se passar pelas crises firmados na fé em Cristo, qualquer pessoa
poderá entender o que o apóstolo Paulo quis dizer quando declarou que: “em tudo
somos atribulados, mas não angustiados; perplexos, mas não desesperados” (II Co 4:8).
Por mais difíceis e insuportáveis que pareçam ser as crises que sobrevém a nós,
a Palavra de Deus garante: “Não sobreveio a vocês tentação que não fosse comum
aos homens. E Deus é fiel; Ele não permitirá que vocês sejam tentados além do
que podem suportar. Mas, quando forem tentados, Ele mesmo providenciará um
escape, para que o possam suportar” (I Co 10:13).

160
É importante considerar que as crises fazem parte da vida e que depende
de cada um o como sair delas. A maioria dos cristãos exalta os profetas de
Deus e o poder do Espírito sobre eles; poucos param para pensar sobre as
crises que enfrentaram na vida.
Sepúlveda (1988, p. 86) relata que Ellen White, vista como grande escritora
adventista, mensageira, mãe, esposa, amiga, experimentou lutas e dificuldades,
como mortes de pessoas próximas, enfermidades pessoais, escassez de recursos a
ponto de passar necessidade, críticas e oposições, e tal como os profetas bíblicos,
necessitou da graça divina para continuar confiando incondicionalmente em Deus
para sua salvação. E, de acordo com Knight (1999), porque confiava incondicio-
nalmente em Deus, agia sempre com dedicação, equilíbrio e fidelidade, dando um
testemunho condizente com a fé que professava, apesar das crises que enfrentava.
Tal postura fez com que muitos de seus críticos concordassem que seu cristia-
nismo era exemplar. E é essa autora que apresenta as crises como oportunidades
de crescimento em diversos aspectos da vida. Ela afirma:
O verdadeiro sucesso em cada setor de trabalho não é resultado do
acaso, ou acidente ou destino. É a operação da providência de Deus,
a recompensa da fé e discrição, da virtude e perseverança. Finas
qualidades mentais e alto tono moral não são resultado de acidente.
Deus dá oportunidades; o sucesso depende do uso que delas se fizer.
(WHITE, 1989, p. 100).

Algumas lições que podem ser tiradas das crises possibilitam abrir novos
horizontes e perspectivas na vida. Podem revelar novos amigos, novos negócios;
podem trazer a pessoa para mais perto de Deus; podem mostrar como realmente
somos; podem mostrar com quem realmente nos relacionamos.
As crises são momentos para parar e pensar não apenas em quem ou no que
provocou a crise, mas também no que nós podemos fazer para mudar a perspec-
tiva e a continuidade acontecimentos. Muitas crises são a encruzilhada necessária
para fazer com que tomemos a decisão de mudar o que não tínhamos coragem e
passarmos a viver de uma forma diferente.
Para enfrentar as crises, sugerem-se algumas lições que servem para mostrar
oportunidades de crescimento pessoal e profissionalmente. Os textos bíblicos refor-
çam a importância que a fé em Deus tem para a busca do equilíbrio em meio às crises.

161
a. As crises são oportunidades para libertação ( Jz 6:8-9): “Do Egito eu vos
fiz subir, e vos tirei da casa da servidão; E vos livrei da mão dos egípcios,
e da mão de todos quantos vos oprimiam”;

b. As crises são oportunidades para recomeço (I Co 6:9-11): “Ou não


sabeis que os injustos não herdarão o reino de Deus? Não vos enganeis:
nem impuros, nem idólatras, nem adúlteros, nem efeminados, nem sodo-
mitas, nem ladrões, nem avarentos, nem bêbados, nem maldizentes, nem
roubadores, herdarão o reino de Deus. Tais fostes alguns de vós; mas vós
vos lavastes, mas fostes santificados, mas fostes justificados, em o nome
do Senhor Jesus Cristo e no Espírito do nosso Deus”;

c. As crises são oportunidades para enxergarmos nosso valor (I Pe 2:9):


“vós sois a geração eleita, o sacerdócio real, a nação santa, o povo adqui-
rido”; e (I Pe 1:18-19): “Sabendo que não foi com coisas corruptíveis,
como prata ou ouro, que fostes resgatados da vossa vã maneira de viver
que por tradição recebestes dos vossos pais, mas com o precioso sangue
de Cristo, como de um cordeiro imaculado e incontaminado”;

d. As crises são oportunidades para reconhecermos nossas fraquezas


(Lc 22:60-62): “Pedro respondeu: Homem, não sei do que você está
falando! Falava ele ainda, quando o galo cantou. O Senhor voltou-se e
olhou diretamente para Pedro. Então Pedro se lembrou da palavra que o
Senhor lhe tinha dito: Antes que o galo cante hoje, você me negará três
vezes. Saindo dali, chorou amargamente”;

e. As crises são oportunidades para vencer a depressão e o medo (Sl 42:


11): “Por que estás abatida, ó minha alma, e por que te perturbas dentro
de mim? Espera em Deus, pois ainda O louvarei, o qual é a salvação da
minha face e o meu Deus”.

f. As crises são oportunidades para superar nossos limites e usar a criati-


vidade ( Jz 16:28-30): “então Sansão clamou ao Senhor, e disse: Senhor
Deus, peço-te que te lembres de mim, e fortalece-me só esta vez ... Abra-
çou-se, pois, Sansão com as duas colunas do meio em que se sustinha
a casa, e arrimou-se sobre elas, ... e inclinou-se com força e a casa caiu
sobre os príncipes e sobre todo o povo que nela havia...”;

g. As crises são oportunidades para nos aproximarmos de Deus ( Jn 2:7):


“quando dentro de mim desfalecia minha alma, eu me lembrei do Senhor”;

h. As crises são oportunidades para arrependimento e conversão (II Co


7:9-10): “Agora, porém, me alegro, não porque vocês foram entristecidos,
162
mas porque a tristeza os levou ao arrependimento. Pois vocês se entris-
teceram como Deus desejava e de forma alguma foram prejudicados por
nossa causa. A tristeza segundo Deus não produz remorsos, mas sim
um arrependimento que leva à salvação, e a tristeza segundo o mundo
produz morte”.
Essas são apenas algumas das muitas oportunidades que se apresentam em
meio às crises. Cada um terá suas próprias oportunidades, que podem surgir mais
cedo ou mais tarde, dependendo de sua disposição em enxergá-las.
No que diz respeito à crise profissional, em especial a crise do professor,
é possível argumentar que, em muitos aspectos, ela está ligada à forma como o
professor se percebe em sua visão de si mesmo e de sua práxis cotidiana. Não se
quer diminuir a importância dos fatores que contribuem para que a profissão de
educador apresente dificuldades; é essencial que haja mudanças em vários aspectos,
tanto estruturais quanto formativas, mas principalmente no fator da identidade
profissional, no querer ser professor. Os conselhos de White (2007, p. 144) podem
servir para motivar ao enfrentamento da crise. Ela ensina que os professores devem
“aprender constantemente”, e precisam reformar a si mesmos “não somente em
seus métodos de trabalho, mas no próprio coração”. Ou seja, para enfrentar as
crises, primeiramente, é preciso compreender a si mesmo, avaliar a própria visão
da crise e buscar a superação, para obter então o equilíbrio diante das mesmas.

CONCLUSÃO

Por mais difícil que seja enfrentar as crises que surgem ao longo de nossas
vidas é possível tirar proveito das mesmas. Muitas histórias de superação mos-
tram que até mesmo o mal que nos sobrevém pode ser revertido em benefício. O
importante é que, diante da crise, conservemos a fé e recordemos as promessas de
Deus pra nós, tal como está escrito em Romanos 8:28: “todas as coisas contribuem
para o bem daqueles que amam a Deus” e que, “o choro pode durar uma noite,
mas a alegria vem pela manhã” (Sl 30:5).
Para enfrentar as crises é necessário buscar o equilíbrio nas mais diversas
situações de crise. Nesses momentos, a criatividade é posta em movimento,
desperta a capacidade de compreender, coloca-se o coração e o intelecto mais
próximos de Deus. Mesmo quando não sabemos para onde seguir, o processo de
sofrimento pode servir para conduzir ao despertar quando reconhecemos que,
mesmo em meio às crises, Deus sempre está presente. Desse modo, por mais que
163
a vida seja cheia de contratempos, adversidades e problemas, é possível vencer
as crises e ver nelas oportunidades para crescer em todos os aspectos da vida.

REFERÊNCIAS
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Brasil, 1999.
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EINSTEIN, Albert. Como vejo o mundo (The World as I see it). 23. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2017.
FERREIRA, Marilda de Lima Oliveira. Formar professores em tempos de crise da profissão: um olhar
sobre a atuação dos docentes do campus universitário da UEG de Iporá-Goiás. Mestrado (Educação).
15 f. 2018. Disponível em: https://sites.pucgoias.edu.br/pos-graduacao/mestrado-doutorado-educacao/
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FREITAS, Eduardo de. A situação do professor brasileiro. Disponível em: https://educador.brasilescola.
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GATTI, Bernadete A. Formação de professores: condições e problemas atuais. Revista Internacional de
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GOMES, Maria Cristina da Silva; DE PAULA, Eduardo. Crise de identidade profissional na profissão
docente. IV Congreso Internacional de Investigación y Práctica Profesional en Psicología XIX Jorna-
das de Investigación VIII Encuentro de Investigadores en Psicología del MERCOSUR. Facultad de
Psicología - Universidad de Buenos Aires, Buenos Aires, 2012. Disponível em: https://www.aacademica.
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KNIGHT, George R. Walking with Ellen White: the human-interest story. Hagerstown, MD: Review and
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WHITE, Ellen G. Mente, caráter e personalidade. Tatuí-SP: Casa Publicadora Brasileira, 1989.
______. Conselhos sobre educação. Tatuí-SP: Casa Publicadora Brasileira, 2007.

164
O USO DE MAPAS CONCEITUAIS PARA O ESTUDO
DE TEXTOS CLÁSSICOS DE FILOSOFIA NO
ENSINO MÉDIO

Claudio Roberto Molina Sanches59

INTRODUÇÃO

O ensino atual passa por uma reformulação conceitual com o advento de novas
tecnologias da informação e da comunicação – TICs, possibilitando inéditas con-
cepções pedagógicas e novas experiências didáticas. Nesse contexto de mudanças, a
aprendizagem significativa e o construtivismo ganham prestígio no meio educacional.
Vários educadores e especialistas em educação concordam que para se alcançar um
ensino de qualidade se deve promover uma aprendizagem significativa. Esse discurso
de aprendizagem significativa, no entanto conflita com a prática docente um tanto
tradicional, mas o discurso é cognitivista, construtivista e de aprendizagem significativa
(MOREIRA, 1997, p. 19). Essa mudança conceitual na prática ainda não ocorreu.
A utilização das novas tecnologias, como o software livre Cmaptools, indi-
cam possíveis recortes e novas maneiras de interagir com os problemas filosóficos
com os quais os estudantes em algum momento se depararão, despertando maior
interesse e melhor aproveitamento através de aprendizados significativos.

O USO DE MAPAS CONCEITUAIS COMO RECURSOS


DIDÁTICOS NO ENSINO MÉDIO

Para auxiliar os estudantes a, nas aulas de filosofia, superarem o senso comum


presente nos seus conhecimentos prévios, são necessários encaminhamentos meto-
dológicos de modo problematizado na forma de exercícios operatórios. Desta forma
a aprendizagem ocorrerá de forma significativa. Para que essa ação didática seja
bem necessita bem-sucedida, ela necessita ser dirigida e mediada pelo professor,
recortando, selecionando e problematizando.
Esse capítulo propõe que o recurso didático da elaboração de mapas conceituais
seja considerado um exercício operatório, de modo a contribuir na superação dos

Especialização em História e Filosofia da Ciência (IBPEX). Professor (SEED-PR).


59 

CV: http://lattes.cnpq.br/8334075705417477
165
problemas do atual modelo de ensino, anteriormente descritos – visão fragmentária,
carência de leituras textuais e dificuldades dos estudantes em interpretação de textos.
Entende-se por exercício operatório uma atividade na qual o aluno
se coloca como agente solucionador de problemas. Segundo Ronca e
Terzi (apud HONDA, 2011, p. 26):
Quando se fala em exercícios operatórios, o termo operação é definido
por (..) como uma ação mais elaborada e complexa, como, por exemplo:
analisar, classificar, comparar, conceituar, criticar, generalizar e levantar
hipóteses. Para os autores, os exercícios operatórios têm o grande mérito
de romper com as clássicas maneiras de avaliar, bloqueando a dicotomia
entre certo e errado. Esses exercícios têm a intenção de orientar passo
a passo o aluno, deixando sempre explícitos os objetivos das questões
que não são apresentadas de maneira isolada, fragmentada. As ques-
tões propiciam ao aluno que deixe de lado a memorização e comece a
estabelecer relações com base em fatos, fenômenos, ideias, percebendo
que nada disso ocorre isoladamente. Nos exercícios operatórios, os
problemas devem ter relação direta com o conteúdo estudado, sendo
que esse conteúdo não é um fim em si mesmo, mas uma ponte para
pensar e para operar. Desta maneira, há uma grande distância entre
decorar um conteúdo (por exemplo, quais são os nomes dos processos
de separação de mistura) e compreender o significado desse conteúdo
para a vida. Tais exercícios operatórios foram aplicados com o intuito
de averiguar se ocorreu ou não uma aprendizagem significativa por
parte dos alunos (HONDA, 2011, p. 26).

A elaboração de um mapa conceitual é favorecida quando há familiaridade


com uma área do conhecimento, pois o contexto auxilia na identificação das
estruturas hierárquicas presentes neste mapa. Para isso, é bom definir uma ques-
tão focal, uma pergunta-problema que o mapa conceitual deve ajudar a resolver.
O próximo passo é identificar os conceitos-chave que se aplicam a esse domínio.
Na construção de um mapa conceitual, algo em torno de 15 a 25 conceitos
é o suficiente. É interessante que o professor os identifique e liste na forma de
“estacionamento”60, uma vez que a ideia é transferir esses conceitos para o mapa
conceitual, onde devem se encaixar. Alguns conceitos podem continuar no esta-
cionamento depois que o mapa estiver pronto, sem relacioná-los a contento aos
outros conceitos no mapa, conforme exemplo abaixo:

60 
(NOVAK e CANÃS, 2010, p. 20). http://cmap.ihmc.us/docs/pdf/TeoriaSubjacenteAosMapasConceituais.pdf
166
Figura 1 – Conceito de “estacionamento” a esquerda; O mapa, a direita, disposto na forma de cascata

Fonte: NOVAK e CANÃS, 2010, p. 16.

As ligações cruzadas são importantes para demonstrar o entendimento do


estudante sobre as relações entre os subdomínios no mapa. Os conceitos são de
algum modo relacionados uns aos outros. É necessário ser seletivo ao identificar
as ligações cruzadas e ser preciso ao estabelecer palavras de interligação aos con-
ceitos. Deve-se evitar “frases nas caixas”, pois isso pode indicar que uma subse-
ção do mapa poderia ser elaborada a partir dessa frase. E os “Mapas em cascata”
revelam má compreensão do material e uma estruturação inadequada do mapa
(NOVAK e CANÃS, 2010, p. 16-17).
Segundo Novak (2010), os estudantes algumas vezes apresentam dificuldades
em selecionar bons termos de ligação às “linhas” em seus mapas conceituais. Isso
decorre da má compreensão da relação entre os significados dos conceitos. Quando
os estudantes se concentram em boas palavras de ligação, identificando possíveis
ligações cruzadas, eles percebem inúmeras possibilidades de conexão entre os
conceitos, o que gera certa frustração. A identificação de ligações cruzadas mais
evidentes e úteis resulta em níveis elevados de desempenho cognitivo em termos
de avaliação e síntese do conhecimento.

O USO DO SOFTWARE CMAPTOOLS NA ELABORAÇÃO DE


MAPAS CONCEITUAIS

O software Cmaptools61, desenvolvido no Instituto para a Cognição Humana


e Mecânica (Institute for Human and Machine Cognition - IHMC), procura aliar
as virtudes dos mapas conceituais ao poder da tecnologia, particularmente da
internet. Pelas opções de recursos que oferece como inserção de imagens, gráficos,

61 
Software disponível para download em http://cmap.ihmc.us/download/
167
vídeos, mapas, tabelas, links com textos, páginas de internet e/ou outros mapas
conceituais, essa ferramenta pode ser considerada como um recurso multimodal.
O software é de fácil manuseio para usuários de todas as idades tanto na
construção quanto na modificação dos mapas conceituais, possibilita o trabalho
colaborativo mesmo à distância, permite fazer links em fontes externas na rede
mundial de computadores, simplesmente clicando, arrastado e inserindo os ele-
mentos desejados, podendo o usuário escolher diversas configurações no processo
de criação do mapa conceitual.
Novak e Cañas (2010) apresentam resultados de pesquisas em que estu-
dantes, trabalhando em pequenos grupos cooperativamente para aprenderem um
tema, alcançam resultados cognitivos e afetivos positivos. Para esses autores, tais
estudos confirmariam a teoria de Vygotsky (1978) de que a linguagem e o diálogo
social podem auxiliar no aprendizado, especialmente quando os membros do
grupo social estão mais ou menos na mesma Zona de Desenvolvimento Proximal
(ZDP). A partir disso, o aprendiz pode progredir por conta própria, com o mínimo
de ajuda de um professor e o aprendizado resultante é significativamente maior
(NOVAK e CANÃS, 2010, p. 17-18).
As várias possibilidades do uso do programa Cmaptools para a elaboração
de mapas conceituais, em modo colaborativo, em redes ou através de produção
individual, tem favorecido o uso crescente dos mapas conceituais. Numa série de
contextos educacionais, essa produção tem se mostrado útil, desde a compreensão,
a assimilação e a aprendizagem.
O aluno precisa selecionar conceitos a partir do material de referência e
elaborar novas proposições no mapa conceitual que tragam sentido e clareza. Na
medida em que os estudantes se envolvem ativamente nesse processo de elaboração
de significados, acabam cumprindo um requisito essencial para que a aprendizagem
significativa ocorra (NOVAK e CANÃS, 2010, p. 22).

ANÁLISE DE RESULTADOS

O uso de mapas conceituais (MCs) contribuiu para o envolvimento, a inte-


ração entre os estudantes, participaram nas apresentações e nos debates, facilitando
a exposição de ideias, com aprendizagens proporcionadas pelo uso didático dos
MCs para o ensino da filosofia. Isso evidencia que o ato de aprender pode ser uma
atividade prazerosa quando construída coletivamente a partir de temas relacionados
às experiências vivenciais dos estudantes ao se explorar os conhecimentos prévios.
168
Os estudantes demonstraram apropriação dos conceitos filosóficos obtidos
na leitura dos textos clássicos de filosofia, expressos por meio da elaboração de
MCs, também expressados na produção de conceitos filosóficos, ao realizarem o
processo inverso, ao se elaborar produções textuais a partir da análise de MCs.
Essa apropriação conceitual a ser demonstrada nessa análise de resultados ao
se comparar os resultados da avaliação diagnóstica com os resultados ao término
das atividades de intervenção pedagógica, obedeceu a duas etapas: Inicialmente
foi prospectado os conhecimentos prévios e posteriormente comparados com
os conhecimentos aprendidos por meio das atividades pedagógicas. As questões
aplicadas, antes e depois, eram de múltiplas escolhas e discursivas. Esse ques-
tionário foi disponibilizado no google drive para os estudantes responderem no
laboratório de informática da escola.
O primeiro dado coletado junto aos estudantes refere-se à utilização do recurso
metodológico da elaboração de MCs, com o seguinte resultado ao término da aplicação:
75% (setenta e cinco por cento) dos estudantes responderam que aprovam
a utilização do recurso pedagógico de mapas conceituais nas aulas de filosofia,
utilizando-se do software Cmaptools para a elaboração de MCs; 16% (dezesseis
por cento) responderam que aprovam parcialmente, pois entendem que nas aulas
de filosofia esta metodologia deve se intercalar com outras possibilidades didáticas;
E 9% (nove por cento) desaprovaram, relataram que não facilitou o entendimento
do conteúdo presente nos textos de filosofia.
Em relação às dificuldades que os estudantes observaram na elaboração
dos MCs nas aulas, responderam na forma discursiva, estas respostas foram cate-
gorizadas em quatro (04) grupos:
A primeira categoria corresponde a 58% (cinquenta e oito por cento) dos
estudantes que citaram que a dificuldade vivenciada em elaborar MCs foi em
relação aos textos de filosofia serem de difícil interpretação. A segunda categoria
corresponde a 23% (vinte e três por cento) dos participantes que alegaram não
terem vivenciado dificuldades. A terceira categoria, corresponde a 11% (onze
por cento) alegando falta de familiaridade em utilizar o software Cmaptools.
E a quarta categoria correspondendo 8% (oito por cento), estes alegaram que a
dificuldade enfrentada esteve relacionada às estruturas do mapa conceitual, como
a definição dos termos de ligação.
Considerando-se as categorias básico e acima do básico na referida avaliação
de resultados, a soma dos percentuais equivalem a 54% (cinquenta e quatro por
169
cento) dos estudantes, o que pode ser considerando que esses estudantes demons-
traram possuir aprendizagem significativa. Importante destacar que esses dados
em relação a avaliação diagnóstica, considerando-se as categorias básico e acima
do básico correspondiam a apenas 7% (sete por cento). Portanto, 47% (quarenta
e sete por cento) dos estudantes obtiveram aprendizagem significativa em relação
aos conteúdos estudados, ao se elaborar MCs com a utilização do software.

ANÁLISE DOS MCS ELABORADO PELOS ESTUDANTES

Foram analisados 85 (oitenta e cinco) MCs. Desse montante, 52% (cinquenta


e dois por cento) foram avaliados como bons e excelentes, isto é, correspondem ao
percentual dos estudantes que obtiveram aprendizagem significativa; 32% (trinta e
dois por cento) foram considerados medianos, apresentando aprendizagem relevante;
no entanto, os MCs apresentaram problemas estruturais e/ou epistemológicos;
16% (dezesseis por cento) apresentaram aprendizagem mecânica, foram classifi-
cados como regulares e de qualidade não satisfatória, conforme gráfico a seguir:

Observou-se que os alunos que não conseguiram desenvolver adequada-


mente os mapas conceituais, também apresentavam dificuldades nas habilidades
de leitura, interpretação textual e na produção escrita.
Pode se considerar que os objetivos dessa pesquisa cumpriram os obje-
tivos definidos no Projeto de Intervenção Pedagógica. Os resultados demons-
tram que uma parcela significativa dos estudantes produziu MCs de qualidade
satisfatória, demonstrando ter adquirido conhecimentos filosóficos em par-
cela significativa dos educandos.
Pode-se utilizar a proposta do uso didático metodológico em se elaborar
mapas conceituais em duas vertentes possíveis na disciplina de Filosofia, mais
precisamente na leitura de textos filosóficos. A aplicação das atividades que ser-
viram de amostragem para esse capítulo, consistiu em intervenções trabalhadas
170
entre dois ensaios possíveis: uma consiste na elaboração do mapa conceitual pelos
alunos, após a leitura do texto filosófico, em especial a um recorte epistemológico,
conforme dados anteriores; a segunda estratégia consistiu na apresentação de um
mapa conceitual do texto lido. Neste caso, o mapa foi elaborado anteriormente
pelos alunos, foram selecionados os mais significativos pelo professor, os quais
serviram para nortear a leitura e interpretação do texto em questão, resultando
no exercício de produção textual.

A CRIAÇÃO DE CONCEITOS NA FORMA DE


PRODUÇÃO TEXTUAL

Os melhores mapas conceituais (MCs) criados pelos estudantes foram sele-


cionados numa coletânea, constituindo uma avaliação com a finalidade de mensurar
o quanto foi significativo a aprendizagem dos estudantes em relação aos conceitos
filosóficos presentes nos textos clássicos utilizados. Essa avaliação objetivava a criação
conceitual na forma de produção textual, analisando, comparando e sintetizando os
diversos conceitos presentes nos M.Cs. anteriormente produzidos pelos estudantes.
Na avaliação em que os estudantes produziram textos, tendo por base a análise
de MCs, o primeiro aspecto observado foi a capacidade da criação de conceitos.
O primeiro exercício foi analisar um M.C. referente a uma narrativa mítica. Ao
analisa-lo, os estudantes deveriam produzir uma definição sobre o que significaria
a mentalidade mítica. O resultado obtido foi o seguinte:

Observação: em relação ao aspecto Não atendido o resultado foi 0%

O gráfico demonstra que, das produções dos estudantes, 73% (setenta e três
por cento) produziram conceitos significativos, considerando-se as expectativas
em relação as respostas esperadas, e, assim, foram classificadas como “atendi-
das”. Treze por cento (13%) foram “consideravelmente atendidas”; no entanto,
apresentaram problemas estruturais, de ordem estilística ou de concordância.
171
Sete por cento (7%) apresentaram ideias incompletas e outros 7% (sete por
cento) não responderam a contento.
Outro aspecto observado na produção escrita ao se interpretar os MCs aponta
para uma maior dificuldade dos estudantes em realizar a produção textual partindo da
leitura de MCs com mais de 25 ligações. Em relação a esse aspecto os dados a seguir
demonstram o seguinte cenário em relação ao desempenho esperado dos estudantes:

Os dados acima revelam uma maior dificuldade na compreensão e interpretação


de MCs com mais de vinte e cinco (25) ligações. Dois aspectos a serem considerados
em relação à resposta esperada: quanto ao item atendido a melhora na interpretação
saltou de 39% para 45%, e quanto ao item não atendido, de 11% baixou para 0%.
Em vista do exposto, valendo-nos do software livre Cmaptools no processo
de ensino-aprendizagem na disciplina de Filosofia enquanto possibilidade de
superação das dificuldades, os estudantes demonstraram apropriação de conceitos
filosóficos apoiados na leitura de textos clássicos.
Nas exposições orais, os estudantes demonstraram habilidade e capacidade
da reflexão filosófica a partir da produção de mapas conceituais.
Em diversas ocasiões foi apresentada aos professores do Colégio Estadual
Benedicto João Cordeiro na cidade de Curitiba-PR (na semana de formação
pedagógica, na formação continuada e horas atividades) a possibilidade de uso
do software cmaptools como ferramenta didática para construção de mapas con-
ceituais nas diversas disciplinas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A vivência como professor de filosofia no Ensino Médio possibilitou a


constatação da dificuldade dos estudantes na interpretação de textos clássicos de
172
filosofia. Diante desse fato, propusemos a utilização do recurso de criação de mapas
conceituais a partir da leitura de textos filosóficos, sugerindo que essa elaboração
fosse realizada com o software livre Cmaptools.
A Filosofia implica conceber um ensino ativo, em que o estudante não fique
restrito a simplesmente assimilar conteúdos, a decorar ideias e sistemas. Se a Filo-
sofia consiste na experiência com o conceito, é importante que o estudante tenha
a oportunidade de fazer ele mesmo essa experiência do pensamento e não apenas
reproduzir. Assim, o uso de mapas conceituais vem a ser uma estratégia que facilita
a compreensão dos conceitos a serem abstraídos nas leituras dos textos filosóficos.
Esta pesquisa pretendeu responder algumas questões norteadoras,
obtendo as seguintes respostas:
• A criação de mapas conceituais pode contribuir para o desen-
volvimento da consciência crítica e do filosofar de modo auxi-
liar na formação ética de cidadãos autônomos, conscientes e
participativos.

• A utilização e a criação de mapas conceituais colaboraram para


um ensino significativo e problematizado na disciplina de Filosofia
enquanto instrumento de análise que contribua qualitativamente,
na interpretação de textos filosóficos no Ensino Médio.

• O recurso do Software Cmaptools pôde contribuir na superação,


das dificuldades dos estudantes, em trabalhar interpretativa-
mente com textos filosóficos por meio da elaboração de mapas
conceituais.

• As temáticas trabalhadas mostraram o forte potencial didático dos


mapas conceituais, como um recurso pedagógico, evidenciando
aprendizagem significativa; apontando para a construção de
conceitos na forma de redes semânticas que evoluem na estrutura
cognitiva do estudante, apoiados nos conhecimentos prévios.

• Os mapas conceituais foram elaborados como estratégia pedagó-


gica que podem ser utilizados para organizar conteúdos, no pro-
cesso ensino-aprendizagem, bem como instrumento de avaliação.

Quanto ao uso de textos clássicos em aula, o projeto de intervenção peda-


gógica que resultou no presente capítulo apresenta a possibilidade da inserção
de Tecnologias da Informação e da Comunicação (TICs) no processo de ensi-
no-aprendizagem. Além disso, possibilitou a compreensão da aprendizagem por
173
meio da utilização de MCs, bem como compreender as teorias que embasam a
aprendizagem por meio de mapas conceituais - a aprendizagem significativa e o
uso didático dos mapas conceituais de Novak e Cañas (2010).

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174
AÇÕES AFIRMATIVAS NAS UNIVERSIDADES E
ESCOLAS BRASILEIRAS: POLÍTICAS E PRÁTICAS DE
REEDUCAÇÃO DAS RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS

Andrio Alves Gatinho62

INTRODUÇÃO

O contexto da adoção de ações afirmativas no Brasil é recente e configura-


-se no sentido mais amplo de garantia da democratização das relações sociais e
raciais no país. Os sentidos de democratização se entrecruzam nas Universidades
e escolas brasileiras na tentativa de se estabelecer medidas mais democratizantes
no acesso aos cursos de graduação, além de considerar a necessidade de revisão e
implementação das estruturas curriculares, a fim de considerar o ensino de histó-
ria e cultura e afro-brasileira e africana e a reeducação das relações raciais como
um importante eixo de suas formações. São referenciais a adoção de cotas nas
Universidades e a Lei 10.639/2003 que estabelece a obrigatoriedade do ensino de
história e cultura afro-brasileira nos currículos dos sistemas de ensino no Brasil.
Democratização de acesso ao ensino superior, garantia legal de atividades
curriculares que mobilizam espaços e tempos escolares no sentido da reeducação
das relações raciais, exigência de formação inicial e continuada aos professores
na busca da implementação de metodologias de educação antirracistas, são ações
que tem sido demandadas pela comunidade negra ao longo de todo o século
XX. Particularmente nas últimas décadas, por conta da articulação/pressão do
movimento negro, estas demandas tem se transformado em políticas públicas
de reconhecimento da diferença e enfrentamento das desigualdades históricas
entre brancos e negros no Brasil. Com muito esforço, existe hoje no Brasil um
aparente consenso de diferentes órgãos governamentais ou não, que necessita-
mos de políticas coordenadas e intervenções simultâneas em diferentes âmbitos
para construirmos uma sociedade mais humana, justa, solidária e democrática,
livre das desigualdades raciais.
Neste texto dois referenciais de democratização, o desenvolvido nas uni-
versidades com a adoção de diferentes medidas afirmativas e o proposto para as

62 
Doutor em Educação e Contemporaneidade (UNEB). Professor (UFPA). CV: http://lattes.cnpq.br/8231924409590662
175
escolas na tentativa de se buscar reeducar as relações raciais na sociedade brasi-
leira serão analisados, buscando contribuir com o debate sobre qual o impacto da
política de igualdade racial nas práticas pedagógicas das escolas e Universidades
na medida em que esta é encarada/produzida como uma ação de democratização
dos currículos e de acesso as vagas no ensino superior.

DESENVOLVIMENTO

Em um breve espaço de tempo de pouco mais de 25 anos, localizado entre


a última década do século XX e os dias atuais, reivindicações históricas dos movi-
mentos negros pautaram o reconhecimento por parte do Estado de que o Brasil
tinha desenvolvido uma sociedade racialmente desigual e evidenciaram desta
maneira a necessidade de combater o tratamento diferenciado a que distintos
grupos sociais/raciais haviam sofrido.
Na mesma direção, o acesso a universidades públicas, condições de perma-
nência e sucesso nas escolas e nas universidades e trajetórias escolares conturbadas
foram questões de pesquisa de diferentes estudos que apresentaram ao longo
das últimas décadas variados referenciais de análise sobre as condições desiguais
dos grupos sociais no sistema de ensino. Nestes se destacaram os que buscaram
demonstrar a contribuição dos negros para o pensamento educacional brasileiro
(GOMES, 1997), (SILVA, 2005), os que tentaram desmascarar a invisibilidade
da situação dos negros no ensino superior (QUEIROZ, 2002, 2004), os que
afirmaram a importância do diálogo com as organizações do movimento negro
(GONÇALVES e SILVA, 1998, 2000), entre outros.
Sobretudo a partir da chegada de estudiosos negros ao campo da educação,
começou a emergir o entendimento da necessidade de uma reavaliação da história
do negro no Brasil; da importância da “ressignificação” da memória negra, como
uma estratégia de superação da visão preconceituosa e estereotipada sobre o negro,
sua história e sua cultura na sociedade brasileira. Por outro lado, evidenciaram-se
cada vez mais as desigualdades de condições de existência entre brancos e negros,
indicando a urgência de políticas de equalização das oportunidades de acesso à
formação. Estes estudos foram importantes para se compreender que o processo
de exclusão dos negros não acontecia somente em nível ideológico, mas também
davam conta da existência de um sistema de ensino baseado em uma estrutura
rígida e excludente que representa campo fértil para a repetência e a evasão. Estas
pesquisas apontaram inúmeras causas para a situação desigual de brancos e negros
176
com relação ao sucesso escolar. Os estudos buscando relacionar rendimento esco-
lar e relações raciais apontaram que as crianças negras não só tendem a repetir
de ano, como também são excluídas mais cedo do sistema de ensino. As análises
demonstravam que o sistema escolar interpõe ao alunado negro uma trajetória
escolar mais difícil que aquela que interpõe a crianças brancas. Grande parte das
críticas em relação aos efeitos das desigualdades raciais na educação vem dos
estudos sobre mobilidade social de brancos e negros no Brasil.
Hasenbalg e Silva (1990) demonstraram que as condições de acesso por meio
de políticas universalizantes orientadas pelo Estado, indicavam clara diferença
de oportunidade entre brancos e negros. A trajetória escolar dos negros era mais
lenta e acidentada, por variados fatores sócio-econômicos que faziam com que
as “crianças do grupo branco apresentem ritmos de progressão dentro da escola,
significativamente mais rápidos dos que as crianças pardas e pretas”. (Idem, p. 89)
Em outro momento, os mesmos autores revelaram que a proporção de brancos
que completaram os oito anos de estudo do ciclo obrigatório do primeiro grau
(29,5%), é mais de duas vezes superior à de pretos e pardos (13,6%). Por último,
verificaram que os brancos tinham uma probabilidade 4,4 vezes maior que os
não-brancos de completar o ensino superior (HASENBALG; SILVA, 1993, p.
143). Em outro estudo, Hasenbalg (2005), aponta para a limitada participação da
população negra no contingente populacional, que conclui todos os níveis educa-
cionais no país, sugerindo que isso se deve ao fato de que à medida que se elevam
os níveis de escolaridade, maiores são os efeitos da discriminação na geração de
desigualdades raciais na esfera educacional.
Henriques (2002), conclui que o padrão de discriminação, isto é, a diferença
de escolaridade dos brancos em relação aos negros se mantém estável entre as
gerações. Dados como os levantados pelo autor evidenciam que, em cinco ou seis
décadas de distanciamento temporal, o coeficiente de proximidade entre bran-
cos e negros em relação ao sucesso escolar se manteve estável. Ou seja, a mesma
diferença de sucesso e evasão escolar persiste, desde a década de 1930, até quase
a virada do século XX para o século XXI.
Hasenbalg (1987) destacou uma espécie de mecanismo de recrutamento
que leva a que o aluno negro ou o aluno pobre seja absorvido pela rede escolar de
maneira diferente do aluno de classe média ou não pobre, o que geraria um fator
que explica a diferença de rendimento escolar entre brancos e negros. Por outro
lado, uma vez constituída esta clientela “socialmente homogênea”, a escola atua-

177
ria no sentido de reforçar a crença de que os alunos pobres e negros não seriam
educáveis. (HASENBALG,1987, p. 26).
Gonçalves (1987), por sua vez, denunciou a exclusão do legado cultural
negro, afirmando que se a produção e a transmissão do saber, na escola, não forem
também mediados pela contribuição cultural (enquanto exigência totalizadora) da
população negra, as práticas pedagógicas continuarão punindo as crianças negras
que o sistema de ensino não conseguiu ainda excluir, aplicando-lhes o seguinte
castigo: reclusão ritualizada em procedimentos escolares de efeito impeditivo, cujo
resultado imediato é o silenciamento da criança negra, a curto prazo, e do cidadão,
para o resto da vida (GONÇALVES, 1987).
Munanga (2005), afirma que “não precisamos ser profetas” para compreen-
der que o preconceito incutido na cabeça do professor, sua incapacidade em lidar
profissionalmente com a diversidade, somando-se ao conteúdo preconceituoso
dos livros e materiais didáticos e às relações preconceituosas entre alunos de
diferentes ascendências étnico-raciais, sociais e outras, desestimulam o aluno
negro e prejudicam seu aprendizado. Isto, segundo o autor, explica o coeficiente
de repetência e evasão escolar altamente elevado do alunado negro, compara-
tivamente ao do alunado branco.
Estas críticas se articularam com o trabalho de reorganização do movimento
negro nas décadas de 1970-1980, que afirmava a luta pelo combate ao racismo
e o empenho pela recuperação dos valores africanos. Decorrente dessa tomada
de posição, percebe-se o início de um fenômeno que se tornaria cada vez mais
presente que é a luta pela afirmação da identidade negra.
Diversas foram as mobilizações ao longo de décadas contra a discriminação e
pela igualdade de direitos da população negra brasileira. Entre essas mobilizações,
destacam-se aquelas relacionadas ao campo educacional, no que tange à participa-
ção decisiva do movimento no debate sobre a educação das relações étnico-raciais
no nosso País. Gomes (1997, p. 20-24) sistematizou as contribuições dos negros
para o pensamento educacional brasileiro da seguinte forma: “[...] denunciando a
escola enquanto reprodutora do racismo, a ênfase no processo de resistência negra,
a centralidade da cultura, a de que existem diferentes identidades e a contribuição
no sentido de se repensar a estrutura excludente da escola”.
Todo este processo de disputa e de debates em torno da educação das relações
étnico-raciais, levou posteriormente à promulgação da Lei 10.639/2003 e culmi-
nou com a elaboração das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das
178
Relações Étnico-Raciais e para o Ensino da História e Cultura Afro-Brasileira
e Africana, em 2004, pelo Conselho Nacional de Educação, bem como pautou
diferentes políticas de combate às desigualdades, preconceitos e discriminações
raciais que foram formuladas buscando a promoção da igualdade anseiando-se
por um futuro de esperança livre das desigualdades raciais e do racismo no Brasil
em uma sociedade reeducada em suas relações étnicas e raciais. Na educação
superior, com o ingresso diferenciado a partir da reserva de vagas para negros e
outros grupos e nas escolas com a obrigatoriedade de reeducar as relações raciais,
algumas das principais bases de sustentação da democracia brasileira como a
afirmação da concepção de sociedade pluriétnica, multicultural, miscigenada,
não racista foi atacada frontalmente, o que provocou a revolta e manifestação
de intelectuais, políticos, etc.
É importante lembrar que discutir sobre os componentes étnicos-raciais
brasileiros é se envolver em um debate intenso e complicado sobre o quadro racial
brasileiro, já que a imagem e cultura cristalizada no nosso imaginário racial foi
formada por um contingente amplo e diversificado de vivências, socializações e
inter-relações culturais, étnicas, raciais que formaram a “miscigenada” sociedade
brasileira. Portanto, discutir sobre raça no Brasil é mexer com um dos aspectos
intocáveis da sociedade brasileira, que é a sua vocação para não possuir problemas de
ordem racial e a contínua (re)afirmação de que vivemos em uma “democracia racial”,
além de considerar que mitos como estes são parte fundante da identidade nacional.
Nesta direção ao tratar de ações afirmativas não se pode perder de vista que
este conjunto de ações é relacionado à afirmação da memória e identidade negra, a
luta pela superação do racismo, o enfrentamento das injustiças no sistema educa-
cional brasileiro, a desconstrução do imaginário racial formado no Brasil ao longo
do Século XX. Nesta direção, Silvério (2003) esclarece que o Governo brasileiro
ao reconhecer as especificidades da população afro-descendente, tanto no reco-
nhecimento das diferenças étnico-raciais, de inserção no mercado de trabalho e no
sistema educacional, impõe a necessidade de políticas preocupadas com reparações,
compensações e/ou ações afirmativas que visam assegurar condições de acesso e
tratamento igualitário para os afro-descendentes em todas as esferas da vida social.
O estabelecimento de ações afirmativas nas universidades e nas escolas traz
à tona muitos dos conflitos presentes na sociedade brasileira, vinculados sobretudo
a situações que ultrapassam as fronteiras do sistema de ensino brasileiro, mas que
veem neste o início de correções sistemáticas das desigualdades de reconhecimento
e de poder a que os diferentes grupos étnico-raciais estiveram submetidos.
179
CONSIDERAÇÕES

As pesquisas realizadas por Queiroz (2002, 2009) nos apresentam que as


universidades federais brasileiras eram espaços predominantemente brancos, às quais
tinham acesso estudantes oriundos de escolas privadas, que puderam manter-se
afastados do mercado de trabalho durante a escolarização básica, cujos pais têm,
em geral, elevada escolaridade, ocupação compatível com seu nível de instrução e
renda familiar acima de seis salários mínimos. Desta forma, demandas reprimi-
das por vagas, pouca presença de negros nas universidades públicas, entre outros
elementos, saltaram as vistas nas inúmeras pesquisas publicadas e que partiram
da constatação da inexistência de qualquer informação que permitisse vislumbrar
a segmentação racial nas universidades.
Nos últimos anos assistimos uma enxurrada de críticas e o acirramento das
posições na discussão do tema do acesso dos negros ao ensino superior, precisa-
mente na política de cotas. O acirramento ideológico/teórico foi sintetizado em
textos como o de Queiroz e Santos (2006) e Queiroz (2009) e apresentados com
os seguintes argumentos: a inconstitucionalidade da medida, a racialização das
relações sociais no Brasil, as desigualdades entre brancos e negros como decorrência
da condição de pobreza a que estão submetidos esses grupos, a qualidade do ensino
nas universidades medidas pelo “mérito acadêmico” etc. Outra crítica feita a este
conjunto de medidas está no ataque as políticas universalistas. Para os críticos, a
diminuição das desigualdades entre brancos e negros estaria na redução da pobreza
com a ampliação da política social do Estado, a qual baseada em critérios universais,
diminuiria a visibilidade das distinções raciais e étnicas no Brasil, substanciando
os argumentos contrários a ações específicas que passam pela necessidade de
implementação de políticas universalistas para minorar a pobreza dos negros.
Como nos diz Queiroz (2009), as políticas universalistas são medidas indis-
cutivelmente importantes em qualquer sociedade, mas que têm limites em se
tratando de grupos submetidos a desigualdades especificas. Depositar nas políticas
universalistas a tarefa de tratamento das desigualdades raciais é se recusar a enxergar
que a condição racial dos indivíduos determina realidades especificas, produzindo
distâncias sociais entre brancos e negros, nos mais distintos espaços da sociedade.
A estas críticas, devem ser adicionadas as dos que se manifestaram con-
trários a lei 10639 e as Diretrizes Curriculares citadas anteriormente, os quais
devem ser tratados conjuntamente uma vez que estas se baseiam na negativa de
adoção de ações afirmativas nas universidades e nas escolas. Nas críticas realiza-
180
das aos documentos curriculares emitidos pelo Conselho Nacional de Educação,
Maggie (2006b) apontou que as DCNERER representam nas escolas o “sistema
de classificação racial do movimento negro” e as entende como uma das peças
da nova “engenharia racial” implantada a partir da participação do Brasil na III
Conferência Mundial de combate ao racismo, realizada em 2001, na África do
Sul. Para a autora, as DCNERER cumprem um papel fundamental na formação
da consciência da raça no Brasil.
Estas diretrizes são, portanto, necessárias para a criação de uma educação
racializada, na qual o “movimento negro” tenha uma participação ativa. Maggie
(2006a, 2006b) e Fry (2005) afirmam que deste modo a persistência da raça é
um exemplo contundente do como o Estado propõe exacerbar a racialização da
sociedade em vez de debelá-la. Estes autores afirmam a necessidade de se aguçar
a percepção de que as relações raciais no Brasil são marcadas pela incorporação
do mito da democracia racial, ou seja, para eles, apesar da existência do precon-
ceito racial no Brasil, não se pode deixar de levar em consideração que este mito
é parte fundante da identidade nacional e até mesmo possibilita, enquanto valor,
a criação de uma sociedade na qual as marcas raciais sejam irrelevantes. Desse
modo, as políticas afirmativas contrariam os valores nacionais estabelecidos de
“anti-racialismo” ou da ausência de racismo no Brasil. A convivência democrática
entre as raças é uma marca presente da nossa tradição racialista, logo as alterações
nessa forma de organização provocam inúmeros debates.
Para contrariar esta concepção nos valemos da definição de Guimarães
(2002) para qual defende que raça não é apenas uma categoria política necessária
para organizar a resistência ao racismo no Brasil, mas é também categoria analítica
indispensável sendo esta a que revela que as discriminações e desigualdades que
a noção de cor enseja são efetivamente raciais e não apenas de classe. Este autor
propõe que o respaldo sociológico para reelaborar o conceito de raça está em: [...]
1) reconhecer o peso real e efetivo que tem a ideia de raça na sociedade brasileira;
2) reafirmar o caráter fictício de tal construção em termos físicos e biológicos; e 3)
identificar o conteúdo racial das “classes sociais” brasileiras. (GUIMARÃES, 2002, p.
56). Com essas atribuições, espera o autor que o movimento negro esclareça as dife-
renças deste novo racialismo e consiga contra-argumentar o que dizem seus críticos.
Diferentemente das críticas postas às ações reparatórias, Queiroz e Santos
(2006b, 2010) apontam que políticas de ação afirmativa precisam de um acom-
panhamento sistemático do desempenho dos estudantes beneficiados com as
políticas de cotas para negros para responder as críticas feitas a adoção de ações
181
afirmativas, as quais segundo seus propagandeadores resultariam na baixa qualidade
do ensino nas universidades medidas pelo “mérito acadêmico”. Esse argumento
ainda expressa a preocupação de que ingressariam estudantes sem o devido “pre-
paro”, o que ameaçaria a excelência do ensino universitário. Os pesquisadores dão
conta que não existem diferenças e apontam uma certa equivalência entre cotistas
e não cotistas. Demonstram a partir de análises da elevação do ponto de corte das
notas do vestibular, do bom rendimento dos estudantes cotistas nos dois primeiros
semestres do curso, da análise de situações de jubilamento, da eliminação do curso
por faltas e da não realização de matriculas por parte dos alunos cotistas e não
cotistas, das provas do êxito das políticas afirmativas nas universidades brasileiras
contrariando previsões de críticos do sistema de cotas, no sentido de que este
provocaria uma queda no padrão acadêmico da universidade, além de demarcar
que podemos inferir estes dados a favor dos cotistas, uma vez que os mesmos
enfrentam em suas trajetórias escolares uma maior desvantagem.
Nas escolas, as constatações da implementação de políticas afirmativas em
favor da revisão da história e cultura afro-brasileira e africana, por exemplo, a partir
das análises de Gomes (2012), dão conta que várias têm sido as práticas pedagó-
gicas voltadas para a diversidade étnico-racial existentes de norte a sul do país.
Segundo a autora, existem experiências mais enraizadas como a inserção da lei n.
10.639/03 nos Projetos Políticos Pedagógicos (PPPs), trabalhos conjuntos com a
comunidade, Movimento Negro, comunidades de terreiro, projetos interdisciplinares,
comemoração do Dia Nacional da Consciência Negra, estudos sistemáticos sobre
o continente africano, projetos realizados com a participação dos estudantes, entre
outros. Para a autora existe, em diferentes estados e municípios, um movimento
de práticas mais coletivas se constituindo; todavia no entendimento da mesma
baseando-se em inúmeras pesquisas realizadas, a atuação individual de docentes
interessados no tema é ainda a ação mais recorrente nas escolas.
A inviabilização na prática curricular de ações afirmativas tem ocorrido de
diferentes maneiras e independentemente dos inúmeros recursos utilizados para a
implementação nos últimos anos, vivenciamos um período de dúvidas em relação
a este movimento. Dada a responsabilidade dos inúmeros atores sociais envolvidos
(Estado, sistemas de ensino, gestores, professores, militantes), a concretização das
ações referentes a educação das relações étnico-raciais ainda encontra-se em um
nível distante do desejado, distante do real enfrentamento da discriminação e de
práticas racistas nas escolas. As atividades de implementação da reeducação das
relações raciais na sua grande maioria restringem-se à ação isolada de profissio-
182
nais comprometidos(as) com os princípios da igualdade racial, que desenvolvem
a experiência a despeito da falta de apoio dos sistemas educacionais. Na grande
maioria, segundo Gomes (2012) são projetos descontínuos, realizados de forma
aleatória e que precisam ser compreendidos dentro do complexo campo das rela-
ções raciais brasileiras sobre o qual incidem.
Silva (2007) na mesma direção apontada por Nilma Gomes, afirma que
as dificuldades de implementação das recomendações em torno desta temática
devem-se muito mais à história das relações étnico-raciais no Brasil e aos processos
educativos que elas desencadeiam do que a procedimentos pedagógicos, ou à tão
reclamada falta de textos e materiais didáticos.
Outro aspecto importante é a falta de apoio governamental à implementação
da política. Estão presente no Parecer que fundamenta as Diretrizes as recomenda-
ções de condições físicas, materiais, intelectuais e afetivas favoráveis para o ensino e
para aprendizagem de todos os alunos, ou seja, está expresso que a reeducação das
relações entre negros e não negros depende do trabalho conjunto, de articulação
entre processos educativos escolares, políticas públicas, movimentos sociais, visto
que mudanças éticas, culturais, pedagógicas e políticas nas relações étnico-raciais
não se limitam a escola. Gomes (2012) sabe que no cotidiano da vida social, esse
marco normativo não se efetiva de forma automática em política pública sendo
necessário que a lei se torne instrumento de gestão, base para os programas e as
ações governamentais, o que não acontece sem lutas e reivindicações.

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184
METODOLOGIAS ATIVAS: UM CONVITE PARA A
INTERDISCIPLINARIDADE

Ana Paula Peroni63


Sandra Margon64

INTRODUÇÃO

As constantes e rápidas mudanças que ocorrem na sociedade constituem


um cenário que demanda diversas transformações no campo da educação, em
especial, no ensino superior, uma vez que se fazem necessárias metodologias
educacionais que possibilitem a formação de profissionais aptos a atuar em
um mercado em crescente evolução tecnológica e informacional.
As metodologias aplicadas ao ensino superior deverão, portanto, propor-
cionar a formação de profissionais versáteis, criativos, críticos e com capacidade
de solucionar problemas. E para tal, a utilização de metodologias ativas com
atividades elaboradas a partir de situações e problemas reais, constitui uma
experiência produtiva para a prática profissional e social em diferentes contextos.
A interdisciplinaridade é potencializada com a adoção das metodologias
ativas, pois estas proporcionam aos discentes situações que permitam a cons-
trução do conhecimento por meio do processo de diálogo entre os mesmos e
entre as diversas áreas do saber.
Dentro dessa perspectiva, novos desafios e exigências se fazem presentes
nas práticas pedagógicas no ensino superior, fazendo com que os docentes
repensem e ampliem sua consciência sobre a própria prática pedagógica. É
importante destacar que esse processo envolve uma mudança de postura, a
qual ocorre por intermédio de vivências e experiências que possibilitem a
incorporação de novos conceitos e práticas.
Um dos grandes desafios da prática pedagógica é justamente promo-
ver essa mudança de postura docente, a partir de uma prática pedagógica
inovadora, interdisciplinar e crítica, que contribua efetivamente na for-
mação de um indivíduo autônomo.

63 
Mestra em Educação Profissional e Tecnológica (IFES). CV: http://lattes.cnpq.br/6749352566966219
64 
Mestra em Educação Agrícola (UFRRJ). Professora (FARESE). CV: http://lattes.cnpq.br/2533881555444177
185
Diante disso, este capítulo tem como objetivo proporcionar um espaço para
reflexão acerca das contribuições das metodologias ativas no desenvolvimento
da interdisciplinaridade no processo de ensino aprendizagem no ensino superior.

INTERDISCIPLINARIDADE

Na busca de produção de novos conhecimentos, a interdisciplinaridade


pode ser percebida como as inter-relações entre distintos campos, disciplinas
ou ramos do conhecimento na expectativa de novas respostas para problemas
prementes (Graff, 2015, in: FERNANDES; PACHECO; PHILIPPI JR, 2017).
Essa conciliação de fontes distintas pressupõe diferentes graus de integração
e articulação entre os atores do processo.
São os conceitos sociais dessas relações que associam a interdisciplina-
ridade e a institucionalização, esta última entendida como o processo central
à criação de grupos centrais duradouros, que gera uma instituição, ou seja,
um conjunto de regras, procedimentos, práticas, aceitos coletivamente que
permitem criar fatos institucionais. (Berger e Luckmam, 1967 in: FERNAN-
DES; PACHECO; PHILIPPI JR, 2017)
Pensa-se em institucionalização como processo formal de interdiscipli-
naridade, no que tange aos seus relacionamentos, e a partir dessas relações,
surgem alguns questionamentos como: é possível criar interdisciplinaridade
sem criar novas estruturas organizacionais? Quais mudanças devem emer-
gir para que a internalização da interdisciplinaridade aconteça de forma a
proporcionar interação e integração entre saberes que resultem em mudan-
ças integrativas na instituição?
Quando a interdisciplinaridade encontra espaços para se estabelecer,
traz consigo características de inovação e por consequência, mudanças em
estruturas, processos e práticas institucionais alicerçadas sob a ótica disciplinar,
ou ainda, alterando regras vigentes que por fim, acabam por construir novas
estruturas organizacionais, de natureza interdisciplinar.
Neste sentido, (FERNANDES, 2010, p. 74-75) dá voz a este cenário:
[…] a interdisciplinaridade não se apresenta apenas como método
de produção de conhecimento mais eficiente, que rompe com
o modelo reducionista, mas também, como a possibilidade de
contribuição para a reintegração da ciência e restauração da sua
capacidade de reflexão política e reintegração social.
186
A interdisciplinaridade veicula restabelecer uma visão mais abrangente e
integradora do conhecimento quando é vista como um conjunto de princípios
facilitadores do diálogo entre as disciplinas. Projetos interdisciplinares, além
de objetivarem resolver problemas complexos, são oportunidades de estabele-
cer pontes entre as disciplinas, para que essas se articulem numa perspectiva
conjunta, tanto na complexidade como nas interações desses fenômenos.
É necessário que cada disciplina amplie sua visão para além da sua própria
fronteira e passe a perceber uma visão mais completa dos fenômenos, e suas
inter-relações, em uma rede de objetos que revela, no conjunto, a complexidade
da realidade em estudo. Essa sinergia depende da escala em que se constrói a
abordagem. Neste contexto, (FERNANDES, 2010, p. 75) acrescenta:
Portanto, mais do que uma forma de se agregar conhecimentos
de áreas diversas visando uma melhor compreensão do objeto
científico, o resultado da interdisciplinaridade deve constituir no
reestabelecimento da visão do todo e revelar a complexidade deste
todo e das inúmeras teias de relações presentes.

Dessa forma, criam-se espaços onde podem surgir novos conhecimen-


tos e a indução de uma ciência integrada, que, por sua vez, pode resultar em
uma sociedade mais integrada. Esses espaços, podem ser construídos com a
implementação de projetos interdisciplinares, por meio do desenvolvimento
e aplicação das metodologias ativas.

METODOLOGIAS ATIVAS

As metodologias ativas dão ao aluno o papel de protagonista do seu


aprendizado enfatizando seu envolvimento direto, participativo e reflexivo
em todas as etapas do processo.
Segundo Moran (2018) as metodologias ativas são grandes diretrizes
que orientam o processo de ensino-aprendizagem e que se concretizam em
estratégias, abordagens e técnicas concretas, específicas e diferenciais.
Para este autor, as metodologias ativas são estratégias de ensino centradas
na participação efetiva dos alunos na construção do processo de aprendiza-
gem, e representam assim, alternativas pedagógicas que colocam o foco do
processo de ensino e aprendizagem no aluno, envolvendo-o na aprendizagem
por descoberta, investigação ou resolução de problemas.

187
Essas práticas metodológicas vão de encontro à abordagem pedagógica do
ensino tradicional, centrada no professor, que é quem transmite a informação ao
aluno. Cabe ressaltar as dificuldades a serem superadas para alcançar sucesso na
implementação das metodologias ativas, quais sejam, as adequações dos conteú-
dos curriculares previstos para o nível de conhecimento, o papel do professor,
como mediador do processo de ensino-aprendizagem e o interesse dos alunos.
O processo de ensino-aprendizagem está cada vez mais conectado ao
uso das metodologias ativas, reflexo da quantidade de informações disponíveis
nos meios digitais e também pela facilidade proporcionada pelas tecnologias
no processo de implantação de pedagogias alternativas.
No que se refere às possibilidades de implementação de metodologias
ativas, que encontram campo do ensino superior, destacam-se: a aprendizagem
baseada em projetos (project-basedlearning - PBL); a aprendizagem por meio
de jogos (game- basedlearning - GBL); o método de caso ou discussão e solução
de casos (teaching case); e a aprendizagem em equipe (team-basedlearning -
TBL). (VALENTE, 2018). Soma-se ainda a utilização de outras metodologias
como: a sala de aula invertida (flippedclassroom); ensino baseado na estrutura
conceitual (framework basedteaching); portfólio; fórum e lista de discussão.

INTER-RELAÇÕES: METODOLOGIAS ATIVAS E


INTERDISCIPLINARIDADE

Os tempos atuais exigem reformulações no processo tradicional de


ensino-aprendizagem, centrado no isolamento dos conhecimentos de cada
disciplina, ou seja, de forma “bancária” (ALVARENGA et al., 2015). Com os
avanços das discussões referentes a esta temática, pode-se compreender que
a educação bancária produz uma forte disciplinarização do conhecimento.
Frente a essa realidade, a interdisciplinaridade se apresenta como uma
proposta de transposição aos limites do conhecimento disciplinar, oferecendo
uma abordagem que envolve a interação do conhecimento na solução de pro-
blemas que, por sua natureza, extrapolam o campo do conhecimento de uma
única disciplina (OLIVEIRA & AMARAL, 2017).
Dentro desse contexto, as instituições de ensino superior vêm discu-
tindo a questão da interdisciplinaridade e a adoção das metodologias ativas
no sentido de ampliar o processo de ensino-aprendizagem em direção a uma

188
formação emancipatória. Tais questões demandam a participação e o diálogo
entre docente, discente e a instituição de ensino superior (BRISOLLA, 2020).
Segundo Brisolla (2020), a interdisciplinaridade que é caracterizada
pela integração entre as disciplinas, pressupõe a aproximação dialógica entre
docente, discente e instituição de ensino, para que assim, seja possível promover
modificações das práticas participativas e colaborativas em que os docentes
sejam protagonistas dos processos de mudança.
Sendo assim, as metodologias ativas se mostram como um caminho
para pensar estratégias de ensino nas quais os discentes possam assumir um
comportamento mais dinâmico e participativo, realizando atividades que irão
estabelecer relações entre o contexto, as estratégias cognitivas e o processo de
construção de conhecimento (VALENTE; ALMEIDA; GERALDINE, 2017).
A adoção das metodologias ativas associada à interdisciplinaridade torna o
processo de ensino-aprendizagem mais democrático e menos hierárquico, e para
que isso ocorra, é necessária uma redefinição na relação entre docentes e discentes.
De acordo com Brisolla (2020) as mudanças no campo do ensino supe-
rior caminham em direção às práticas pedagógicas inovadoras e interdis-
ciplinares, no sentido de promover rupturas com metodologias de ensino
pautadas na mera transmissão de conhecimento. Contudo, para que essas
novas práticas se concretizem é necessária uma postura acadêmica com com-
promisso, responsabilidade e autonomia.
No que se refere às metodologias ativas, Berbel (2011) afirma que são
muitas as possibilidades de metodologias ativas, contudo, é imprescindível
analisar criticamente as metodologias a serem empregadas, pois não basta
inserir novas metodologias sem que se compreendam suas potencialidades
articuladas aos conteúdos e objetivos desejados.
Além disso, há que se considerar outro ponto extremamente relevante
no ensino superior, que são os currículos engessados e distanciados da
práxis social, e que na visão de Franco (2016), tem produzido um enorme
distanciamento das esferas pedagógicas e educativas, dando a ilusão de
desarticulação entre teoria e prática.
Desta forma, observa-se que se faz necessário uma ampla mudança,
abrangendo vários aspectos, estruturas, práticas e atores, para que assim, se
possa romper paradigmas e hábitos já bastante enraizados, (PHILIPPI JR;
SILVA NETO, 2011), e neste cenário desafiador, as metodologias ativas se
189
apresentam como uma aliada às práticas interdisciplinares no ensino superior,
contribuindo para a sua internalização.

CONSIDERAÇÕES

A interdisciplinaridade não é uma ideia nova no campo da educação,


uma vez que, já no século passado, era explorada por filósofos e pedagogos
como uma reação à fragmentação do conhecimento. Porém, por muito tempo,
as discussões sobre a interdisciplinaridade ficaram restritas aos especialistas
preocupados com o desmembramento do pensamento científico.
Nas instituições de ensino superior o fracionamento do conhecimento
somente passou a ser questionado a partir de 1960, quando houve a exigência
de uma maior abertura das instituições para as preocupações da sociedade,
com criação de espaços para temáticas transversais e liberação do formalismo
rígido do recorte disciplinar.
A partir disso, a ideia da interdisciplinaridade progrediu no âmbito
teórico e prático, contudo, verifica-se no Brasil que a proposta da interdisci-
plinaridade ainda não perdeu seu caráter pioneiro, não conseguindo se impor
como alternativa viável e imprescindível para dar conta da complexidade da
realidade contemporânea, principalmente no ensino superior.
O mesmo pode ser dito quanto ao emprego das metodologias ati-
vas de ensino, que se apresentam como uma forte aliada ao estabeleci-
mento da interdisciplinaridade.
Nas instituições de ensino superior, construídas na perspectiva da abor-
dagem disciplinar, encontram-se diversos debates, contestações, resistências
ao emprego das metodologias ativas associadas à interdisciplinaridade.
Não se trata aqui de não se reconhecer a capacidade dessas instituições
em mobilizar as mais altas competências especializadas para explorar de
forma fragmentada a realidade, mas sim, de se reconhecer a inegável impor-
tância e os resultados satisfatórios das práticas interdisciplinares associadas
às metodologias ativas de ensino.
Observa-se que há um descompasso entre a necessidade de se renovar
os modos de produção do conhecimento e a imobilidade de grande parte das
instituições de ensino superior. Em geral, as iniciativas interdisciplinares asso-
ciadas às metodologias ativas ficam em uma posição institucional periférica,
190
enquanto experiências, mesmo sendo inovadoras, dificilmente se integram às
estruturas e aos processos organizacionais usuais da instituição.
Sendo assim, as iniciativas interdisciplinares associadas às metodologias
ativas se mostram incipientes, não ocorrendo efetivamente como uma ação
pedagógica. Nesse sentido, o grande desafio consiste em transformar essa
realidade por meio de ações conjuntas, com os mais diversos atores, para que
desta forma, se possa renovar profundamente e de modo durável a produção
e a disseminação do conhecimento.

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192
PROFESSOR PESQUISADOR DE HISTÓRIA:
ARTICULANDO SABERES ACADÊMICOS AOS
FAZERES EDUCACIONAIS A PARTIR DO CONCEITO
DE PROFESSOR REFLEXIVO

Alipio Felipe Monteiro dos Santos65


Lisiane Almeida Ferreira66
Julyana Cabral Araújo67
Adriana Dourado Oliveira68
Ana Paula Durans Lopes69
Janilde Amorim70
Evileno Ferreira71
Antônio Edilson Cardoso Linhares72

INTRODUÇÃO

Selma Garrido Pimenta (1996) lança mão da seguinte questão a fim de


conduzir um debate reflexivo acerca de uma re-significação da didática: “[...] como
construir a teoria no movimento prática-teoria-prática, sem ficar na tradicional
cisão entre o pesquisador e o professor?” (PIMENTA, 1996, p. 01, 02). Sua resposta,
nada simples, envolve a epistemologia da educação, mas especificamente, perceber
que a pedagogia, enquanto ciência da prática da educação, não deve mais pensar
a si mesma como um instrumento alheio aplicado a um outro discurso científico
ou disciplina, como se ela somente pudesse ser ela mesma quando aliada a um
objetivo do ensino e didática de uma outra ciência; do contrário, a autora afirma
que a pedagogia existe em todo o educador, ela é a prática do ensino, objeto his-
tórico dialético que não pode ser absorvido numa totalidade, a não ser em partes,
e nisso ela se comunica com a própria ciência e as outras ciências da educação;
assim sendo, na educação, a pesquisa é o instrumento da prática profissional do

65 
Mestre em Cultura e Sociedade (UFMA). CV: http://lattes.cnpq.br/3591041162485401
66 
Especialista em Gestão Escolar, Administração, Supervisão, Orientação e Inspeção (FAVENI).
CV: http://lattes.cnpq.br/4260708800643707
67 
Mestranda em História (UFG). CV: http://lattes.cnpq.br/1170915415048750
68 
Mestra em História (UFMA). CV: http://lattes.cnpq.br/3609647352476600
69 
Mestra em História (UFMA). CV: http://lattes.cnpq.br/9546368140230672
70 
Especialista em Ciências Humanas e Sociais Aplicadas e o mundo do trabalho (UFPI).
CV: http://lattes.cnpq.br/7275758962315151
71 
Especialista em Metodologia do Ensino da História e da Geografia (FAVENI). CV: http://lattes.cnpq.br/0642066919720460
72 
Mestrando em Educação Especial (Instituto Politécnico de Coimbra/Portugal).
CV: http://lattes.cnpq.br/5401559671648863
193
professor e não do pesquisador – prática que é si própria pesquisa: professor refle-
xivo (ZEICHNER, 1998; 2008; SCHÖN, 1992; FAGUNDES, 2016).
Partindo desse estudo citado, percebe-se um uso de um registro vocabulário
denso o bastante para que nem todos possam saber do que se trata e o que foi
concluído. Por vezes, a ciência da educação aciona um fosso desigual na comu-
nicação, acomodando a pedagogia num nicho intelectual acadêmico que não é
acessível a todos os pedagogos e estudantes, dado que aquele que não compreende
acerca da epistemologia de uma re-significação da didática, não compreenderá
os meios tomados para se concluir dado assunto, tornando, dessa maneira, a
questão inicial ainda persistente.
Com isso, parece que a pergunta lançada pela pesquisadora se mantém sem
resposta, mas pode-se simplificá-la do seguinte modo, voltado ao objetivo deste
capítulo que não envolve o universo dos pedagogos (tão somente), mas do ensino de
História: como articular aquilo que é produzido pela universidade acerca do ensino
de História e da pesquisa em História com a prática em sala de aula sem fazer
parecer que são coisas apartadas? Esta pergunta guia a escrita deste capítulo numa
tentativa de ofertar uma perspectiva que compreenda o pensamento interdisciplinar.
A metodologia empregada é de revisão bibliográfica não sistemática, esco-
lhendo artigos que tratem especificamente sobre a temática do professor pesquisador
ou professor reflexivo num âmbito. Os artigos foram coletados em plataformas de
revistas científicas, devidamente publicados, ou em Anais de eventos científicos.
Apresenta-se como resultado que o discurso acadêmico de fazer História
não possui maior relevância que o discurso pedagógico, mas deve junto com ele
fomentar e produzir um fazer científico histórico que ultrapasse os muros da
universidade, de modo interdisciplinar. Um meio de pensar tal situação começa
entendendo o papel que possui o professor reflexivo (STENHOUSE, 1981;
FAGUNDES, 2016; ZEICHNER, 1998, 2008; SCHÖN, 1992; PESCE E
ANDRÉ, 2012), pois, quando o próprio professor passa a refletir sobre a ação
docente e compreender que o Ensino de História necessita de ferramentas didá-
ticas específicas para maximizar o interesse dos alunos não-universitários pelo
modo de fazer ciência na História, ocorre o processo de reciclagem, onde se obtém
resultados qualitativos significativos.
A estrutura básica deste trabalho compreende três partes de desenvolvi-
mento textual:1) apresenta-se um breve diagnóstico sobre o tema de acordo com
a bibliografia selecionada, de modo a encontrar as principais razões/argumentos
194
que tratam do problema entre o pesquisador de História e o professor, como se
estes fossem figuras opostas. Assim, apresenta-se o problema do registro que
inviabiliza uma efetiva comunicação entre pesquisa e ensino para com o público
em geral, afetando, sobremaneira, os graduandos de licenciatura em História; 2)
Nesta segunda parte, começa-se a debater os impactos dessa diferenciação, enca-
minhando o raciocínio para a necessidade de se pensar a superação e união destes
personagens, dado que, na atualidade, os sistemas de ensino superior pensam que
a docência alia-se, necessariamente, à pesquisa; 3) por fim, reflete-se sobre como
o conceito de professor reflexivo, aquele que na ação desenvolve a sua pesquisa,
serve de pontapé para uma resolução interdisciplinar, de modo a colocar o Ensino
de História e a Didática da História em análise central.

QUANDO A FORMAÇÃO DO PROFESSOR-PESQUISADOR DE


HISTÓRIA TORNOU-SE UM PROBLEMA?

“Como formar o professor-pesquisador em História?” foi a questão levantada


no estágio supervisionado do curso de licenciatura em História da Universidade
Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), no ano de 2008, dado o afligimento em
formar professores de História que se preocupassem com a qualidade do ensino
científico da disciplina em sala de aula (AZEVEDO, 2011). Ao formando, foi
dada a missão de preparar e executar um projeto de pesquisa na escola a partir
daquilo que ele observasse como sendo problemático ou instigante no ensino de
História, “[...] fazendo da sua própria prática pedagógica um processo de inves-
tigação permanente” (AZEVEDO, 2011, p. 357).
Uma das reflexões que tal atitude proporciona, primeiro, foi a de tornar o
ambiente do estágio em algo produtivo tanto para a comunidade escolar quanto
para o formando em licenciatura em História, de modo que a atividade da pesquisa
possa intervir no currículo de maneira positiva para além das meras observações em
sala de aula, onde o formando é percebido por toda a sala, afetando-a, mas finge
não ver e elabora papeladas burocráticas sobre a didática do professor da escola
em sala de aula. Também se afere da pesquisa citada que é necessário produzir um
historiador-professor para que as pesquisas em História tenham alguma chance de
entrar em sala de aula. Ora, onde está aquele historiador bacharel, que vive mergu-
lhado nos documentos antigos, em bibliotecas esparsas, atrás de uma informação
importante sobre um fato do passado, numerando certidões de óbitos, casamentos,

195
nascimentos, ofícios e outras coisas quantitativas a mais? Os métodos e técnicas
da pesquisa em História chegam aos estudantes das escolas públicas? Como?
Azevedo (2011, p. 356) reconhece que existe uma “[...] incompatibilidade
entre as exigências de pesquisas acadêmicas com as características dos estágios
supervisionados [...]”, e afirma que o objetivo não seria esse, mas sim de fomentar
professores que investiguem seu próprio cotidiano. A própria autora reconhece
um já debatido fosso entre estes dois ofícios, preocupando-se com o professor
pesquisador de História, ou seja, para além daquele pesquisador tão somente, e
do professor unicamente, deve de existir, pela atual demanda, um professor pes-
quisador em História voltado para os problemas do ensino de História, com um
tato pedagógico mais aguçado e maior bagagem pedagógica.
Jörn Rüsen (2001), um historiador alemão bastante preocupado com o ensinar
História em sala de aula, foi um dos primeiros a perceber a cisão entre aquilo que
é discutido e produzido no ambiente acadêmico e aquilo que é ensinado pelos
professores de História em sala de aula nos ensinos fundamentais e no médio.
Mas o que significa aprender História?
Carlos Eduardo Ströher (2015), ao refletir acerca do historiador pesquisador
e do professor em uma relação simétrica, afirma que “[...] hoje é consenso que
aprender História é aprender a pensar o passado historicamente [...]” (STRÖHER,
2015, p. 02); conquanto, o autor apresenta que tal pensamento nem sempre fez
parte do ensino de História, rememorando, assim, o próprio papel da escola ao
assimilar a disciplina da História em seu currículo, um ensino de História voltado
para a manutenção do status quo de algumas classes, ou até mesmo para o rompi-
mento com um passado próximo, a fim de “renovar” toda uma identidade nacional.
Acerca do ensino de história na República nascente, pesquisas indicam
como era passada a ideia de rompimento entre o velho e o novo Brasil, como que
se pretende apagar as influências culturais e políticas da monarquia, dando vez aos
valores positivistas republicanos; como informam Schueler e Magaldi (2009, p. 37):
Esquecer a experiência do Império: este era o sentido da invenção repu-
blicana. Para realçar o tempo presente e a modernidade de suas propostas, o
novo regime apagava os significados políticos e sociais do estabelecimento do
princípio da gratuidade da instrução primária, aos cidadãos, na Constituição de
1824, e as suas repercussões nas disputas pelos significados, extensão e limites
dos direitos de cidadania [...]

196
Percebe-se, partindo de tal análise, que a preocupação com o ensino de
História era uma questão mais política do que crítica social, onde pensar uma
didática da História não cabia como possibilidade.
Aliado a isso, coexistiu uma cultura de um discurso erudito na disciplina
da História que desejava alçar seu caminho para uma ciência central nas ciências
humanas e sociais, de modo a produzir uma cisão entre o ambiente acadêmico e
escolar não acadêmico, como explicita Ströher (2015, p. 03):
O pensamento hermético produzido pelos historiadores dentro das universi-
dades trouxe consequências culturais que levaram a uma divisão social do trabalho
dentro da área da História: a pesquisa e a produção do conhecimento histórico, sob
responsabilidade dos historiadores, muitos formados como bacharéis, e a maioria
professores do ensino superior; e a docência e a reprodução do conhecimento, sob
cargo dos professores licenciados em História. Essa diferença de status, em que o
pesquisador realizaria o trabalho considerado refinado e específico e o professor
executaria uma função manual, menos nobre e significante, impregnou-se nos
discursos histórico e educacional ao longo do último século.
Essas duas razões, do conteúdo ideológico direcionado pelas elites e pelo
Estado, dando caráter oficial ao ensino de História, e o fosso produzido entre o
historiador pesquisador e o professor de História, levam a crer que existiu, por
longo tempo e ainda persiste, dois diferentes valores que acabam influenciando
no modo de ensinar História, justamente porque o pesquisador e o pedagogo
tenderiam a entrar em conflito intenso.
Os motivos desses conflitos são vários e com intensidades distintas, mas
pode ser condensado na compreensão de que os pesquisadores, historiadores
que vão à campo e se debruçam sobre a História documental (bacharéis, em sua
minoria), tendem a não concordar com a pedagogia/didática da História porque
deixa de lado as complexas e diferenciadas formas de olhar para o passado e
questioná-los, de produzi-lo, de interpretá-lo, bem como deixam de lado suas
técnicas diversas em laboratório. Assim, seria como se o Historiador fosse um
pesquisador sem campo, marcado pela “cafonisse”, e o produto gerado fosse ainda
mais “chato”, de tamanho desinteresse.
Já os professores de História estão se formando em departamentos ligados
à educação/pedagogia em sua maioria, e não nos departamentos específicos de
História. Ademais, muitos cursos de licenciatura em História estão localizados
no âmbito privado de ensino, conhecido por gerar pouca pesquisa e extensão,
197
diferente das universidades públicas (STRÖHER, 2015). Para complementar, os
docentes costumam apontar uma incomoda falta de comunicação efetiva entre
o pesquisador de História e um público estudante em geral, resultado de uso de
registro vocabular extremamente técnico e complexo voltado para uma pequena
comunidade, tornando o discurso histórico-científico inacessível para a maioria
dos professores de História e público leigo em geral.
Como resultado, obtém-se uma fórmula nada agradável: a pesquisa em Histó-
ria, suas descobertas e produções, não ultrapassam a pequena comunidade científica,
de modo que a docência em História nos ambientes escolares não superiores vai se
tornando cada vez mais genérica e desatualizada, pouco incorporada de um senso
metodológico-científico, parecendo que o professor não pode exercer a pesquisa
histórica e comunicá-la com eficácia, bem como o contrário também é válido.
Ora, metodologia científica, atualmente, é mais complexa do que a simples
absorção de rígidas regras e comportamentos em campo de pesquisa bem como do
uso agressivo do registro formal da linguagem; e fazer ciência não é mais um privilé-
gio de uma pequena camada de pessoas, visto a democratização do ensino superior.

ENCAMINHANDO A PROBLEMÁTICA: EM VEZ DE APARTAR,


UNIR

A metodologia científica deve auxiliar na reflexão e no ganho de “[...] um


“novo” olhar sobre o mundo: um olhar científico, curioso, indagador e criativo”
(GOLDENBERG, 2004, p. 11). Assim, ensinar História é muito mais do que
narrar linearmente fatos de uma determinada civilização ou povo; é, de modo
central, produzir a capacidade cognitiva autônoma do indivíduo de pensar e
resolver o mundo ao seu redor.
Logo, o ensino deve servir a uma prática social viva, ressignificando as cate-
gorias explicativas teóricas. Já na década de 80 se defendia a ideia de o professor
assumir o papel de um intelectual orgânico, consciente de seu papel histórico e
comprometido com a classe trabalhadora. Tal maneira de conceber o professor de
História baseava-se na ideologia política do pensamento gramsciano (LUCENA
CÓRDULA; CORNÉLIO DO NASCIMENTO, 2018; FAGUNDES, 2016).
Nela, o professor de História devia focar na mudança das estruturas sociais, agindo
para além do ambiente escolar, e pouco se debruçava sobre o pensamento científico
academicista. Tal forma de pensar o professor de História ganhou força no Brasil
com a tendência progressista libertadora de Paulo Freire que, baseando-se em
198
temas geradores, grupos de discussão, relação de horizontalidade entre professor
e aluno e na resolução de situações problemas, objetivava atingir um nível de
consciência da realidade em que a escola está inserida na busca da transformação
social. Portanto, a pesquisa e o ensino devem ter um compromisso mútuo com a
mudança da realidade, mas para mudá-la precisa, antes, saber comunicar-se.
Essa comunicação se expressa no esforço do professor pesquisador em
tornar ativas suas metodologias, de modo que desperte o interesse por apreender
um outro registro que não seja do seu nicho científico, como também para fazer
encantar o seu público com uma didática adequada à cultura contemporânea. Paiva
(2016) traz a ideia da sala de aula invertida, onde o aluno estuda previamente
os conteúdos da próxima aula, chegando na escola com o conhecimento prévio
e questionamentos para discutir e realizar atividades e práticas junto com o(a)
professor(a) para estruturação de sua aprendizagem, podendo até mesmo trocar
de lugar com o docente. Todavia, falando sobre a realidade nacional, os autores
reconhecem que “é notório aos educadores deste país que, na grande maioria
dos casos, os estudantes não estudam em seus lares e poucas famílias realizam
o acompanhamento diário desses estudos” (LUCENA CÓRDULA; CORNÉ-
LIO DO NASCIMENTO, 2018, p. 14).
Como, portanto, pensar um ensino de História diante dos métodos ativos
como a sala de aula invertida? Se o professor focar somente nos conteúdos, de
maneira quantitativa, haverá sempre o desestímulo para vencer tais dificuldades. Tal
como um pesquisador, deve compreender que os resultados malogrados também
fazem parte do labor e devem ser considerados para a compreensão da realidade e
seu nível cognitivo e sócio histórico. De imediato, o discurso puramente acadêmico
(academia aqui entendida como ambiente rígido de assimilação de conteúdo, no
qual tanto seu processo de entrada e saída consiste numa disputa meritocrática –
o nosso modelo nacional, portanto) não se atenta às habilidades e competências
desenvolvidas em um saber histórico amplo, percebendo-se, ao fim, que o discurso
acadêmico não tem maior relevância que o didático73.
Na atualidade, esse papel do professor envolvido na mudança das lutas de
classes de modo a não ocupar um lugar significativo na academia mudou. Como
explicita Azevedo (2012, p. 110): “nos anos de 1990 ganhavam espaço os estudos
voltados para o saber docente. Hoje, a formação docente volta-se para a concep-

73 
Complementarmente, é significativa a afirmativa de Ströher (2015, p. 06): [...] a habilidade de pesquisa adquirida na
graduação acaba desaparecendo quando se pensa em questões didáticas, pois essa atividade se torna uma mera repetição
simplista de narrativas historiográficas”.
199
ção do professor reflexivo, que pensa-na-ação. À vista disso, a docência alia-se
à pesquisa”. Por isso, é imperativo partir para a prática do ensino de História (e
sua pequisa) a fim de configurar uma teoria prática do ensino, apostando naquilo
que Pimenta (1996, p. 01) chamou de “princípio cognitivo”: “Isto é, quando
o professor, pesquisando e refletindo sobre sua ação docente, constrói saberes
que lhe permitam aprimorar o seu fazer docente”. Tal referência a autora faz ao
conceito de professor reflexivo.

O PROFESSOR PESQUISADOR OU PROFESSOR REFLEXIVO A


APARTIR DO ENSINO DE HISTÓRIA

Muitas pesquisas apontam para a necessidade e relevância de uma formação


do professor reflexivo/pesquisador no Brasil (ANDRÉ, 2005; 2006). Surgido
na Inglaterra da década de 60, o objetivo era reformular um currículo escolar
tendo por base a práxis, ou seja, aquilo que de fato ocorria em sala de aula. Nele,
era o professor que, ao vivenciar a sala de aula, observava, lançava mão de uma
problemática e construía uma hipótese ou “teoria curricular”, e dessa concepção,
Stenhouse (1981) situa a ideia de professor-pesquisador.
Esse fato deu luz a uma colaboração entre os professores, aqueles que convi-
vem com a prática curricular em ação, e os pesquisadores da educação, especialistas
que teorizam a educação no âmbito acadêmico. Tal aproximação demonstrou-se
benéfica não somente para o melhoramento da realidade escolar, mas para técnicas
de coletas de dados dentro das ciências, como o surgimento da pesquisa-ação no
campo educacional74, cuja ideia central era de produzir um conhecimento engajado
com a mudança social tendo por base um diálogo interdisciplinar com o método
etnográfico, advindo da Antropologia (DEMO, 2008; ANDRÉ, 1997).
No Brasil, a pesquisa-ação agiu de igual maneira a fim de compreender
como e por quais razões certas políticas educacionais atingiam grandes níveis de
fracasso, tendo por explicação inicial as “[...] evidências que revelavam haver certo
equívoco entre as necessidades dos professores em ensinar seus alunos em sala de
aula e o suporte teórico que vinham recebendo em sua formação [...]” (FAGUN-
DES, 2016, p. 289); assim sendo, pela primeira vez um professor-aluno foi ouvido
com seriedade e atenção de modo a debater, juntamente com o pesquisador, os
74 
Cita-se: “Elliott sustenta que as negociações e colaborações entre professores e especialistas no contexto de desenvol-
vimento desses projetos caracterizaram a forma inicial do que mais tarde se deu a conhecer como pesquisa-ação. Vê-se
então, a partir do movimento de professores ingleses, tanto o princípio do conceito de professor como pesquisador quanto
o de pesquisa-ação no âmbito da educação” (FAGUNDES, 2016, p. 287). Consultar também o que Pedro Demo (2008)
desenvolve acerca da pesquisa participante.
200
problemas da educação75. Nisso, portanto, consiste o papel do professor-reflexivo:
transformar aquele conhecimento tácito presente na ação pedagógica (“conhe-
cimento na ação”) em reflexão científica, de modo que todo o professor possa se
tornar um professor-pesquisador/reflexivo (SCHÖN, 1992).
Todavia, a reflexão por si significa pouco caso ela não venha acompanhada
de um seguro embasamento teórico por parte do professor não somente no sen-
tido pedagógico, conhecimento teórico dos pressupostos educacionais (tendências
pedagógicas, papel da escola, métodos e formas de aprendizagem, epistemologia
da didática e do ensino, etc.), mas também uma bagagem teórica em sua área de
formação específica, no caso aqui discutido, no campo da História. Logo, a natu-
reza dessa reflexão proposta pelo conceito de professor-pesquisador/reflexivo é
dupla, portanto, interdisciplinar. Nessa perspectiva, Zeichner (2008), defende que
o professor deve sistematizar sua reflexão, tornando-a investigativa; considera-se,
tendo esse raciocínio por base, que a sistematização deva ser investigativa e inter-
disciplinar de modo que o professor de História não deva agir sobre a realidade
de maneira isolada, mas sim em conjunto com a comunidade escolar e acadêmica.
Uma forma de fazer essa relação ocorrer é colocar em contato o acadêmico
de licenciatura em História com disciplinas teóricas específicas sobre métodos e
técnicas de pesquisa em acervos documentais e em campo, seus manejos e manu-
tenções, bem como aplicando e desenvolvendo projetos de história patrimonial,
cultural, oral, História vista de baixo e outros. De preferência, mantendo contato
com professores especialistas nesse assunto.
Ao mesmo tempo, o acadêmico deve aprofundar seus conhecimentos na
área pedagógica, com densa discussão sobre o Ensino de História e a Didática
da História, de uma maneira ampla, em diversos pressupostos ideológicos. Na
verdade, como bem já atentou Nóvoa (1992), as disciplinas específicas e as peda-
gógicas devem interpenetrar-se, dado que, na modernidade, todo o conhecimento
especifico é também conhecimento aplicado e vice-versa.
Estudos vêm apontando a necessidade da melhora dos estágios supervi-
sionados, de forma que os acadêmicos possam fomentar seu senso de professor
pesquisador. Contudo, acredita-se que a ressignificação deva ser ampliada para
todo o período acadêmico, ainda que de maneira transversal, discutida em eventos

75 
Como afirmam Pesce e André (2012, p. 41): “[...] A superação desse modelo significa valorizar a prática do professor,
considerando seu papel de “construtor de conhecimento”, e não mero instrutor que transmite os saberes produzidos por
outros [...]”
201
específicos, de forma a aproximar a pesquisa em História da pesquisa em Ensino
de História, do historiador para com os professores de História.
Por fim, entende-se que por mais autonomia política e emancipatória que
o professor reflexivo possa lograr na “ação-pesquisa-ação”, o discurso hegemônico
de macro políticas ainda são indispensáveis, talvez, porque não há como dele
evadir, porém, como apontam Pesce e André (2012, p. 48) ao analisar os dados de
entrevistas realizadas com professores do ensino superior:
[...] as professoras formadoras entendem que nesse nível de autonomia,
o professor se torna menos alienado e mais crítico em relação a si e
aos outros, de tal maneira que questiona as condições impostas pelo
sistema e busca novas formas de se desenvolver profissionalmente;
considerando a fala de uma das entrevistadas: “pesquisar vai fazer
com que os professores [da educação básica] possam começar a ter
consciência do seu papel e deixar de ser manipulados”. Para Fairclough
(2001), a conscientização da condição opressiva representa o primeiro
passo para a emancipação do sujeito em suas práticas discursivas, o
que ainda parece não ser evidente para os estudantes entrevistados.

Ao professor pesquisador de História resta saber que a convivência nessa


dialética formativa é essencial para sua formação crítica diante do mundo. Ao
exercer a profissão de professor, certamente se debaterão com a realidade complexa
e diversa de uma sala de aula heterogênea e marcada por amplas desigualdades,
onde o domínio de um registro teórico limitado à comunicação científica não
ajuda no processo de ensino-aprendizagem. De uma maneira ou de outra ele se
encontrará no papel de agente, ou seja, de professor-reflexivo e reconhecerá que
o ensino de História carece de encantamento. Nisso, a interdisciplinaridade com
a ciência da prática da educação é crucial para transformar o ensino de História.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Considerando que coexistiu uma cultura de um discurso erudito na dis-


ciplina da História que desejava alçar seu caminho para uma ciência central
nas ciências humanas e sociais, diferenciando-se das ciências ditas “duras”, o
que acabou por produzir uma cisão entre o ambiente acadêmico e escolar não
acadêmico, tem-se a problemática da não comunicação efetiva entre essas duas
práticas de uma mesma profissão.
A partir disso, demonstrou-se que o discurso acadêmico de fazer História
não possui maior relevância que o discurso pedagógico, mas deve junto com ele
202
fomentar e produzir um fazer científico histórico que ultrapasse os muros da
universidade, dado que a formação docente está cada vez mais voltada para a
concepção do professor reflexivo, que pensa em/a ação. À vista disso, a docência
alia-se à pesquisa para obter resultados qualitativos de modo a mudar a realidade.
Considera-se, tendo esse raciocínio por fundamento, que a sistematização
deva ser investigativa e interdisciplinar, de modo que o professor de História
não deva agir sobre a realidade de maneira isolada, mas sim em conjunto com
a comunidade escolar e acadêmica e, uma maneira de fazer essa relação ocorrer
é colocar em contato o acadêmico de licenciatura em História com disciplinas
teóricas específicas sobre métodos e técnicas de pesquisa em acervos documentais
e em campo, seus manejos e manutenções, bem como aplicando e desenvolvendo
projetos de história patrimonial, cultural, oral, História vista de baixo e melhorando
o estágio supervisionado para que se construam projetos de intervenção na sala de
aula, aperfeiçoando o senso de construção de um projeto científico. De preferência,
mantendo contato com professores especialistas nesse assunto.
Concomitantemente, o acadêmico deve aprofundar seus conhecimentos na
área pedagógica, com densa discussão sobre o Ensino de História e a Didática da
História, de uma maneira ampla, em diversos pressupostos ideológicos. Ou seja,
tais diálogos tensionam novas significações, de forma a aproximar a pesquisa em
História da pesquisa em Ensino de História, questionando a realidade e discu-
tindo-a, para que nasçam melhorias para os currículos regionais e locais a ponto
de diminuir esse fosso criado entre o pesquisador e o professor.

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204
PROCESSOS FORMATIVOS MEDIADOS POR
TECNOLOGIAS DIGITAIS EM COMUNIDADES EM
SITUAÇÃO DE VULNERABILIDADE SOCIAL

Solange Rodrigues Bonomo Assumpção76


Cecília Maria de Morais Machado Angileli77
Paloma do Vale Alencar78
Fernanda Claudia Santos de Oliveira79

INTRODUÇÃO

O Brasil, em estudo recente do Centro de Pesquisa em Economia e Negócios


do Reino Unido80 (CEBR, 2021, p. 55), figura na 11ª colocação no ranking da Liga
Econômica Mundial (WELT 2022). No entanto, a riqueza gerada no país mantém-
-se concentrada na mão de poucos, como enfatiza a pesquisa do Programa Nacional
das Nações Unidas de 2019: 1% da população mais rica detém 28,3% da renda
do país. Esse quadro coloca o Brasil entre os dez países mais desiguais do mundo
(SASSE, 2021) e alimenta a manutenção do mercado de trabalho brasileiro como
“caracterizado por baixos rendimentos, elevada desigualdade entre trabalhadores
e marcante heterogeneidade entre as atividades econômicas” (IBGE, 2021, p. 13).
Essa desigualdade afeta diferentemente o território brasileiro e a sua gente.
A Região Nordeste, seguida da Região Norte, registra os maiores índices de vul-
nerabilidade socioeconômica81 e de situação pouco favorável para alguns grupos
específicos: “mulheres, pessoas pretas ou pardas, jovens e a população com menor
nível de instrução” (IBGE, 2021, p. 22).
Para além dos desafios cotidianos de pouca ou nenhuma renda de boa parcela
da população brasileira, verifica-se um processo de exclusão educacional que acaba
76 
Doutora em Letras (PUC Minas). Educadora Popular e Pedagoga (UNILA) - Paraná.
CV: http://lattes.cnpq.br/7824241884229519
77 
Pós-doutora em Planejamento e Gestão do Território (UFABC). Doutora em Arquitetura e Urbanismo (USP). Pro-
fessora (UNILA) e coordenadora de projetos de extensão universitária em favelas e ocupações - Paraná.
CV: http://lattes.cnpq.br/1286164960957066
78 
Especialista em Gestão de Pessoas (UNIFACS). Pedagoga e coordenadora (SME / Simões Filho – BA).
CV: http://lattes.cnpq.br/3087454288137611
79 
Especialista em Metodologia do Ensino Superior. Professora (SME / Lauro de Freitas – BA) e vice-gestora (SME /
Salvador – BA). CV: http://lattes.cnpq.br/0716214535723905
80 
Tradução livre de The Centre for Economics and Business Research.
81 
De acordo com o IPEA (2018, p. 16), “as vulnerabilidades sociais decorrem de processos sociais mais amplos contra
os quais o indivíduo, por si só, não tem meios para agir e cujos rumos só o Estado, por meio de políticas públicas, tem
condições de alterar”.
205
restringindo as oportunidades de mobilidade social e a necessária melhoria das
condições de trabalho, habitação, alimentação, saúde, entre outros. As estatísticas
revelam a existência de aproximadamente 11 milhões de pessoas, isto é, 6,6% da
população brasileira, que não conseguem ler nem escrever textos simples para
atender às necessidades mais básicas de sua vida cotidiana, assim como a baixa
escolarização de grande parte das brasileiras e dos brasileiros: 38,6% não chegaram
a concluir o Ensino Fundamental (IBGE, 2020, p. 3)82.
Esse conjunto de desigualdades estruturais, pensadas sob esses e outros
ângulos, exigem políticas públicas cuidadosamente pensadas para o enfrentamento
da violação aos direitos e às garantias fundamentais de toda cidadã brasileira e
todo cidadão brasileiro, como se verifica no artigo 5º da Constituição (BRASIL,
1998): a igualdade das pessoas perante a lei, intrinsecamente articulada ao direito
à vida digna, à liberdade de expressão, de consciência e de associação e também à
garantia de acesso à informação.
Para a efetivação dessas garantias legais, afirmam-se os direitos sociais à
educação, à saúde, à alimentação, ao trabalho, à moradia, ao transporte, ao lazer,
à segurança, à previdência social, à proteção à maternidade e à infância e à assis-
tência às pessoas desamparadas.
O conhecimento desse conjunto de direitos sociais no processo de luta pela
justiça social encontra-se intimamente articulado à oferta sistematizada de edu-
cação, embora não se limite a ela, com vistas à apropriação, pela população, dos
saberes historicamente construídos, à conscientização relativa às visões de mundo
em disputa em seu cotidiano e ao uso crítico de tecnologias (de comunicação,
de informação, de produção de bens, de consumo, de lazer etc.) que deveriam
ser acessível a todas as pessoas.
O uso crítico das tecnologias em ofertas educacionais, formais ou não formais,
justifica-se pelo acesso crescente à internet no Brasil – entre as 183,3 milhões de
pessoas com 10 anos ou mais de idade no país, 78,3% utilizaram a internet no
quarto trimestre de 2019 (PNAD Contínua TIC, 2021)83 – e pela virtualização

82 
Do mesmo modo que a desigualdade afeta diferentemente as pessoas no mundo do trabalho, a condição de analfabe-
tismo é também um forte marcador entre as pessoas com idade mais avançada, pois há, nessa condição, cerca de 18% de
pessoas com 60 anos ou mais. Se ao aspecto da desigualdade da faixa etária somar-se a questão étnico-racial, verifica-se
um cenário ainda mais desfavorável: 9,5% das pessoas brancas com 60 anos ou mais não sabem ler ou escrever, percentual
cerca de três vezes menor entre as pessoas pretas e pardas (27,1%) com essa mesma idade (IBGE, 2020, p. 2).
83 
Ainda que o acesso à internet seja massivo, é preciso observar que a desigualdade, de diferentes ordens, persiste, con-
forme assevera Barros (2021), com base nos dados da PNAD Contínua TIC 2019: i) 55,6% dos domicílios na área rural
têm acesso à internet ao lado de 86,7% das residências urbanas; ii) entre os 39,8 milhões de pessoas que não acessaram a
internet em 2019, 43,8% alegaram não ter o serviço por não saber navegar na rede; iii) 88,1% de estudantes tinham acesso
206
latente em quase todas as práticas da vida social, ou seja, dos processos mais
simples, a exemplo da retirada de senhas em um totem para atendimento em
um espaço público, aos mais complexos, como uma cirurgia cardíaca executada
de forma remota com a ajuda de um robô (ROSA, 2019). Em outras palavras, é
preciso compreender o caminho sem volta do uso de tecnologias na sociedade,
mas sem deixar de problematizar o que isso representa em diferentes instâncias e
para distintos grupos de pessoas.
Isto posto, em face desse cenário de desigualdades e da premência de inclu-
são, o estudo que ora se apresenta visa a investigar possíveis contribuições da
Educação Popular e da Educomunicação, reconhecidamente voltados para a
construção popular de conhecimento, com vistas ao uso de tecnologias digitais,
segundo uma perspectiva crítica, em processos formativos junto a comunidades
em situação de vulnerabilidade social. A escolha dessas lentes teóricas revela-se
coerente com o objetivo proposto, uma vez que primam por projetos educacionais
inclusivos e participativos, o que pode resultar em maior aderência das comu-
nidades envolvidas e aprendizado para todas e todos que ensinam-aprendem-
-compartilham saberes e práticas.
Os resultados obtidos podem inspirar agentes públicos a considerar dife-
rentes formas de oferta educativa, não formal e/ou formal, que não se limitem ao
uso da linguagem escrita em papel ou na tela, pois, pelo nível de escolarização das
pessoas implicadas, nem sempre é a melhor opção. Antes pelo contrário, exclui
justamente quem mais dela precisa. Por isso, entende-se que a proposição de
ações formativas mediadas pelo uso de recursos digitais viáveis para comunidades
em situação de vulnerabilidade social coloca em relevo o caráter inclusivo que a
Educação, entendida como um bem público, deve resguardar.
Na consecução deste estudo, de caráter teórico e exploratório (GIL, 2002)84,
em primeiro lugar, destacam-se os pilares da Educação Popular, na perspectiva
freireana, e da Educomunicação, a partir da pesquisa bibliográfica (MARCONI;
LAKATOS, 2011; GIL, 2002) de trabalhos publicados por autores e autoras de
reconhecida importância nessas linhas de pesquisa para, em seguida, caracterizar
o que se entende pelo uso crítico de tecnologias digitais na Educação, o que se
encontra na primeira seção deste texto. Na seção que segue, por meio da análise

à internet naquele ano; iv) do total de estudantes sem internet, 95,9% estudavam em escolas públicas; v) o celular é o
principal meio para navegar na internet, mas somente 64,8% dos estudantes de escolas públicas possuíam um dispositivo.
84 
De acordo com o autor (2002, p. 41), a pesquisa exploratória tem “como objetivo principal o aprimoramento de ideias
ou a descoberta de intuições... Embora o planejamento da pesquisa exploratória seja bastante flexível, na maioria dos casos
assume a forma de pesquisa bibliográfica ou de estudo de caso...”.
207
de conteúdo (BARDIN, 2016; MORAES, 1999) das publicações consultadas,
como técnica de análise de dados qualitativos – adequada a pesquisas orientadas
pela abordagem qualitativa (FLICK, 2009; DENZIN; LINCOLN, 2006) –,
promove-se uma possível articulação entre os princípios da Educação Popular e
da Educomunicação com uma proposta de uso de tecnologias na Educação que
possa atender aos interesses de comunidades em situação de vulnerabilidade social.
Na seção final, apresenta-se uma síntese da pesquisa empreendida e as conclusões
das autoras, a partir das articulações consideradas fundantes de uma proposta
inclusiva de educação mediada por tecnologias.

APORTES TEÓRICOS QUE NORTEIAM O OLHAR PARA UMA


EDUCAÇÃO DIGITAL INCLUSIVA

O quadro teórico orientador do processo de investigação empreendida,


em função dos propósitos ora assumidos, transita pelos estudos do campo da
Educação Popular, da Educomunicação e da Tecnologia(s) na Educação, como
já mencionado anteriormente. Distinguimos, a seguir, os pontos centrais de cada
uma dessas abordagens educacionais, a fim de oferecermos elementos suficientes
para uma futura análise de pontos de aproximação e/ou convergência.

Bases teóricas da Educação Popular, na perspectiva freireana

A Educação, em seu sentido amplo, remete aos primórdios da civilização


com um papel de transmissão de valores, costumes e conhecimentos. Ao longo
de sua construção histórica, passou a ser entendida como direito básico universal,
que se configura elemento estratégico para impulsionar a participação cidadã
em aspectos que afetam a vida das pessoas. A educação, como um dos direitos
fundamentais de cada pessoa, também está sujeita ao campo de forças do qual
participam o Estado, o mercado, a sociedade e os movimentos sociais.
Nesse sentido, faz-se necessária a participação de diversos segmentos da
sociedade para que a educação, na qualidade de política pública, contribua para o
entendimento dos processos inclusivos e sua relevância para o contexto social atual.
Daí a ênfase em outros meios educativos, tendo em vista que, segundo Machado
(2010, p. 2), as demandas sociais, possuem origem nas questões econômicas, políticas,
sociais e culturais, e exigem outra postura educacional, diferentes dos processos peda-
gógicos tradicionais. A Educação Popular (EP) figura como uma dessas alternativas.

208
A EP origina-se como uma alternativa de educação nos espaços não escolares,
com o objetivo de incluir socialmente todos os que a educação formal não alcança.
Prioriza atividades culturais, de criação, esportes, rodas de conversas, relações de
trocas de vivências, entre diversas outras atividades educacionais. Dessa forma,
revela-se a opção política dos grupos sociais por meio de sua forma de conhecer
e atuar socialmente, de forma concreta, de determinar suas metas, seus objetivos
e suas estratégias, devendo ser extraído e compartilhado pelo coletivo (GOHN,
2007). Aprende-se a todo o instante, com muitas pessoas, a partir das próprias
experiências nos respectivos lugares de vivência. Nesse contexto, deve-se oferecer
alternativas para que as pessoas que estejam excluídas do sistema possam ter
oportunidade de se reintegrar, por meio da participação, e também de lutar pela
universalidade de direitos sociais e pelo resgate da cidadania. Para que isso seja
possível, entende-se ser indispensável a utilização de metodologias educativas
específicas para os diversos grupos envolvidos, com vistas à superação de conflitos
sociais e/ou à prevenção de situações de risco e de vulnerabilidade social.
No Brasil, a Educação Popular surge de forma a denunciar o assistencialismo
das políticas públicas, sobretudo, nos anos de 1960, período em que a sociedade civil
começou a participar dos debates realizados, ainda que restritamente, assumindo
responsabilidades e (co)participação nos projetos sociais. Converge-se, então, para
uma tendência de pensar a educação sob aspectos diversos ou integrais, pautada na
compreensão de que o processo educativo é dinâmico. Ele envolve processos sócio
institucionais, além de relações intersubjetivas, culturais, familiares e comunitárias
que subsidiam uma educação cidadã, articuladora de diferentes dimensões da vida
social como constitutivas de novas formas de sociabilidade humana nas quais o
acesso aos direitos sociais é fundamental.
O principal representante da Educação Popular, no Brasil, é o educador
Paulo Freire que, a partir de sua luta em prol de uma educação de cunho eminen-
temente político, refletida em suas propostas para a educação de pessoas adultas,
influenciou e influencia um movimento de conscientização na área educacional.
Seus estudos e suas ações mobilizaram (e mobilizam) a sociedade para a trans-
formação da educação como um todo. Nas ideias freireanas, a pessoa ocupa lugar
central na reflexão pedagógica. O ser humano é entendido como um ser inacabado,
incompleto, um ser da práxis cujo quefazer implica na ação e reflexão que opera
e transforma o mundo e a si mesmo.
Nesse sentido, Freire (1987) defendeu uma educação para a libertação, reali-
zando uma consistente crítica a uma educação chamada por ele de “bancária” – por
209
ter como característica marcante, a prática do “depósito de conteúdos” –, concebida
como domesticadora e contrária à essência humana, por promover a desumanização e
privilegiar a separação e as dicotomias, como se depreende de um trecho de sua obra:
O Brasil, em estudo recente do Centro de Pesquisa em Economia e Negócios
do Reino Unido85 (CEBR, 2021, p. 55), figura na 11ª colocação no ranking da Liga
Econômica Mundial (WELT 2022). No entanto, a riqueza gerada no país mantém-
-se concentrada na mão de poucos, como enfatiza a pesquisa do Programa Nacional
das Nações Unidas de 2019: 1% da população mais rica detém 28,3% da renda
do país. Esse quadro coloca o Brasil entre os dez países mais desiguais do mundo
(SASSE, 2021) e alimenta a manutenção do mercado de trabalho brasileiro como
“caracterizado por baixos rendimentos, elevada desigualdade entre trabalhadores
e marcante heterogeneidade entre as atividades econômicas” (IBGE, 2021, p. 13).
Essa desigualdade afeta diferentemente o território brasileiro e a sua gente.
A Região Nordeste, seguida da Região Norte, registra os maiores índices de vul-
nerabilidade socioeconômica86 e de situação pouco favorável para alguns grupos
específicos: “mulheres, pessoas pretas ou pardas, jovens e a população com menor
nível de instrução” (IBGE, 2021, p. 22).
Para além dos desafios cotidianos de pouca ou nenhuma renda de boa parcela
da população brasileira, verifica-se um processo de exclusão educacional que acaba
restringindo as oportunidades de mobilidade social e a necessária melhoria das
condições de trabalho, habitação, alimentação, saúde, entre outros. As estatísticas
revelam a existência de aproximadamente 11 milhões de pessoas, isto é, 6,6% da
população brasileira, que não conseguem ler nem escrever textos simples para
atender às necessidades mais básicas de sua vida cotidiana, assim como a baixa
escolarização de grande parte das brasileiras e dos brasileiros: 38,6% não chegaram
a concluir o Ensino Fundamental (IBGE, 2020, p. 3)87.
Esse conjunto de desigualdades estruturais, pensadas sob esses e outros
ângulos, exigem políticas públicas cuidadosamente pensadas para o enfrentamento
da violação aos direitos e às garantias fundamentais de toda cidadã brasileira e

85 
Tradução livre de The Centre for Economics and Business Research.
86 
De acordo com o IPEA (2018, p. 16), “as vulnerabilidades sociais decorrem de processos sociais mais amplos contra
os quais o indivíduo, por si só, não tem meios para agir e cujos rumos só o Estado, por meio de políticas públicas, tem
condições de alterar”.
87 
Do mesmo modo que a desigualdade afeta diferentemente as pessoas no mundo do trabalho, a condição de analfabe-
tismo é também um forte marcador entre as pessoas com idade mais avançada, pois há, nessa condição, cerca de 18% de
pessoas com 60 anos ou mais. Se ao aspecto da desigualdade da faixa etária somar-se a questão étnico-racial, verifica-se
um cenário ainda mais desfavorável: 9,5% das pessoas brancas com 60 anos ou mais não sabem ler ou escrever, percentual
cerca de três vezes menor entre as pessoas pretas e pardas (27,1%) com essa mesma idade (IBGE, 2020, p. 2).
210
todo cidadão brasileiro, como se verifica no artigo 5º da Constituição (BRASIL,
1998): a igualdade das pessoas perante a lei, intrinsecamente articulada ao direito
à vida digna, à liberdade de expressão, de consciência e de associação e também à
garantia de acesso à informação.
Para a efetivação dessas garantias legais, afirmam-se os direitos sociais à
educação, à saúde, à alimentação, ao trabalho, à moradia, ao transporte, ao lazer,
à segurança, à previdência social, à proteção à maternidade e à infância e à assis-
tência às pessoas desamparadas.
O conhecimento desse conjunto de direitos sociais no processo de luta pela
justiça social encontra-se intimamente articulado à oferta sistematizada de edu-
cação, embora não se limite a ela, com vistas à apropriação, pela população, dos
saberes historicamente construídos, à conscientização relativa às visões de mundo
em disputa em seu cotidiano e ao uso crítico de tecnologias (de comunicação,
de informação, de produção de bens, de consumo, de lazer etc.) que deveriam
ser acessível a todas as pessoas.
O uso crítico das tecnologias em ofertas educacionais, formais ou não formais,
justifica-se pelo acesso crescente à internet no Brasil – entre as 183,3 milhões de
pessoas com 10 anos ou mais de idade no país, 78,3% utilizaram a internet no
quarto trimestre de 2019 (PNAD Contínua TIC, 2021)88 – e pela virtualização
latente em quase todas as práticas da vida social, ou seja, dos processos mais
simples, a exemplo da retirada de senhas em um totem para atendimento em
um espaço público, aos mais complexos, como uma cirurgia cardíaca executada
de forma remota com a ajuda de um robô (ROSA, 2019). Em outras palavras, é
preciso compreender o caminho sem volta do uso de tecnologias na sociedade,
mas sem deixar de problematizar o que isso representa em diferentes instâncias e
para distintos grupos de pessoas.
Isto posto, em face desse cenário de desigualdades e da premência de inclu-
são, o estudo que ora se apresenta visa a investigar possíveis contribuições da
Educação Popular e da Educomunicação, reconhecidamente voltados para a
construção popular de conhecimento, com vistas ao uso de tecnologias digitais,
segundo uma perspectiva crítica, em processos formativos junto a comunidades

88 
Ainda que o acesso à internet seja massivo, é preciso observar que a desigualdade, de diferentes ordens, persiste, con-
forme assevera Barros (2021), com base nos dados da PNAD Contínua TIC 2019: i) 55,6% dos domicílios na área rural
têm acesso à internet ao lado de 86,7% das residências urbanas; ii) entre os 39,8 milhões de pessoas que não acessaram a
internet em 2019, 43,8% alegaram não ter o serviço por não saber navegar na rede; iii) 88,1% de estudantes tinham acesso
à internet naquele ano; iv) do total de estudantes sem internet, 95,9% estudavam em escolas públicas; v) o celular é o
principal meio para navegar na internet, mas somente 64,8% dos estudantes de escolas públicas possuíam um dispositivo.
211
em situação de vulnerabilidade social. A escolha dessas lentes teóricas revela-se
coerente com o objetivo proposto, uma vez que primam por projetos educacionais
inclusivos e participativos, o que pode resultar em maior aderência das comu-
nidades envolvidas e aprendizado para todas e todos que ensinam-aprendem-
-compartilham saberes e práticas.
Os resultados obtidos podem inspirar agentes públicos a considerar dife-
rentes formas de oferta educativa, não formal e/ou formal, que não se limitem ao
uso da linguagem escrita em papel ou na tela, pois, pelo nível de escolarização das
pessoas implicadas, nem sempre é a melhor opção. Antes pelo contrário, exclui
justamente quem mais dela precisa. Por isso, entende-se que a proposição de
ações formativas mediadas pelo uso de recursos digitais viáveis para comunidades
em situação de vulnerabilidade social coloca em relevo o caráter inclusivo que a
Educação, entendida como um bem público, deve resguardar.
Na consecução deste estudo, de caráter teórico e exploratório (GIL, 2002)89,
em primeiro lugar, destacam-se os pilares da Educação Popular, na perspectiva
freireana, e da Educomunicação, a partir da pesquisa bibliográfica (MARCONI;
LAKATOS, 2011; GIL, 2002) de trabalhos publicados por autores e autoras de
reconhecida importância nessas linhas de pesquisa para, em seguida, caracterizar
o que se entende pelo uso crítico de tecnologias digitais na Educação, o que se
encontra na primeira seção deste texto. Na seção que segue, por meio da análise
de conteúdo (BARDIN, 2016; MORAES, 1999) das publicações consultadas,
como técnica de análise de dados qualitativos – adequada a pesquisas orientadas
pela abordagem qualitativa (FLICK, 2009; DENZIN; LINCOLN, 2006) –,
promove-se uma possível articulação entre os princípios da Educação Popular e
da Educomunicação com uma proposta de uso de tecnologias na Educação que
possa atender aos interesses de comunidades em situação de vulnerabilidade social.
Na seção final, apresenta-se uma síntese da pesquisa empreendida e as conclusões
das autoras, a partir das articulações consideradas fundantes de uma proposta
inclusiva de educação mediada por tecnologias.

89 
De acordo com o autor (2002, p. 41), a pesquisa exploratória tem “como objetivo principal o aprimoramento de ideias
ou a descoberta de intuições... Embora o planejamento da pesquisa exploratória seja bastante flexível, na maioria dos casos
assume a forma de pesquisa bibliográfica ou de estudo de caso...”.
212
APORTES TEÓRICOS QUE NORTEIAM O OLHAR PARA UMA
EDUCAÇÃO DIGITAL INCLUSIVA

O quadro teórico orientador do processo de investigação empreendida,


em função dos propósitos ora assumidos, transita pelos estudos do campo da
Educação Popular, da Educomunicação e da Tecnologia(s) na Educação, como
já mencionado anteriormente. Distinguimos, a seguir, os pontos centrais de cada
uma dessas abordagens educacionais, a fim de oferecermos elementos suficientes
para uma futura análise de pontos de aproximação e/ou convergência.

Bases teóricas da Educação Popular, na perspectiva freireana

A Educação, em seu sentido amplo, remete aos primórdios da civilização


com um papel de transmissão de valores, costumes e conhecimentos. Ao longo
de sua construção histórica, passou a ser entendida como direito básico universal,
que se configura elemento estratégico para impulsionar a participação cidadã
em aspectos que afetam a vida das pessoas. A educação, como um dos direitos
fundamentais de cada pessoa, também está sujeita ao campo de forças do qual
participam o Estado, o mercado, a sociedade e os movimentos sociais.
Nesse sentido, faz-se necessária a participação de diversos segmentos da
sociedade para que a educação, na qualidade de política pública, contribua para o
entendimento dos processos inclusivos e sua relevância para o contexto social atual.
Daí a ênfase em outros meios educativos, tendo em vista que, segundo Machado
(2010, p. 2), as demandas sociais, possuem origem nas questões econômicas, políticas,
sociais e culturais, e exigem outra postura educacional, diferentes dos processos peda-
gógicos tradicionais. A Educação Popular (EP) figura como uma dessas alternativas.
A EP origina-se como uma alternativa de educação nos espaços não escolares,
com o objetivo de incluir socialmente todos os que a educação formal não alcança.
Prioriza atividades culturais, de criação, esportes, rodas de conversas, relações de
trocas de vivências, entre diversas outras atividades educacionais. Dessa forma,
revela-se a opção política dos grupos sociais por meio de sua forma de conhecer
e atuar socialmente, de forma concreta, de determinar suas metas, seus objetivos
e suas estratégias, devendo ser extraído e compartilhado pelo coletivo (GOHN,
2007). Aprende-se a todo o instante, com muitas pessoas, a partir das próprias
experiências nos respectivos lugares de vivência. Nesse contexto, deve-se oferecer
alternativas para que as pessoas que estejam excluídas do sistema possam ter
oportunidade de se reintegrar, por meio da participação, e também de lutar pela
213
universalidade de direitos sociais e pelo resgate da cidadania. Para que isso seja
possível, entende-se ser indispensável a utilização de metodologias educativas
específicas para os diversos grupos envolvidos, com vistas à superação de conflitos
sociais e/ou à prevenção de situações de risco e de vulnerabilidade social.
No Brasil, a Educação Popular surge de forma a denunciar o assistencialismo
das políticas públicas, sobretudo, nos anos de 1960, período em que a sociedade civil
começou a participar dos debates realizados, ainda que restritamente, assumindo
responsabilidades e (co)participação nos projetos sociais. Converge-se, então, para
uma tendência de pensar a educação sob aspectos diversos ou integrais, pautada na
compreensão de que o processo educativo é dinâmico. Ele envolve processos sócio
institucionais, além de relações intersubjetivas, culturais, familiares e comunitárias
que subsidiam uma educação cidadã, articuladora de diferentes dimensões da vida
social como constitutivas de novas formas de sociabilidade humana nas quais o
acesso aos direitos sociais é fundamental.
O principal representante da Educação Popular, no Brasil, é o educador
Paulo Freire que, a partir de sua luta em prol de uma educação de cunho eminen-
temente político, refletida em suas propostas para a educação de pessoas adultas,
influenciou e influencia um movimento de conscientização na área educacional.
Seus estudos e suas ações mobilizaram (e mobilizam) a sociedade para a trans-
formação da educação como um todo. Nas ideias freireanas, a pessoa ocupa lugar
central na reflexão pedagógica. O ser humano é entendido como um ser inacabado,
incompleto, um ser da práxis cujo quefazer implica na ação e reflexão que opera e
transforma o mundo e a si mesmo.
Nesse sentido, Freire (1987) defendeu uma educação para a libertação, reali-
zando uma consistente crítica a uma educação chamada por ele de “bancária” – por
ter como característica marcante, a prática do “depósito de conteúdos” –, concebida
como domesticadora e contrária à essência humana, por promover a desumanização e
privilegiar a separação e as dicotomias, como se depreende de um trecho de sua obra:
A concepção bancária [...] nega a realidade do denevir. Nega o homem
como um ser da busca constante. Nega a sua vocação ontológica de
ser mais. Nega as relações homens-mundo, fora das quais não se
compreende nem o homem nem o mundo. Nega a criatividade do
homem, submetendo-o a esquemas rígidos de pensamento. Nega o
seu poder de admirar o mundo, de objetivá-lo, do qual resulta seu
ato transformador. Nega o homem como um ser da práxis. Imobiliza
o dinâmico. Transforma o que está no que é, e, assim, mata a vida.
214
Desse modo, não pode esconder a sua ostensiva marca necrófila
(FREIRE, 1987, p. 14).

Em contrapartida, a EP vem ao encontro dessa concepção de educação. Nas


palavras de Brandão (2002, p. 141-142):
A educação popular foi e prossegue sendo uma sequência de ideias
e de propostas de um estilo de educação em que tais vínculos são
reestabelecidos em diferentes momentos da história, tendo como
foco de sua vocação um compromisso de ida – e – volta nas relações
pedagógicas de teor político realizadas através de um trabalho cul-
tural estendido a sujeitos das classes populares compreendidos como
não beneficiários tardios de um “serviço”, mas como protagonistas
emergentes de um “processo”.

Freire (1987) afirma ainda que, para ultrapassar uma prática educativa domes-
ticadora, bancária, deve ocorrer a “morte” da educadora e do educador, sendo que:
[...] isto não significa naturalmente que o educador desaparece
enquanto presença “indutiva”: a educação, que se trate dum instru-
mento ideológico para a preservação do status quo ou dum método
para conhecer e transformar a realidade implica sempre indução
(FREIRE, 1987, p. 27).

Entretanto, a indução, na perspectiva crítica, humanista, libertadora, vai,


aos poucos, se “desfazendo”, uma vez que, a educadora/educador-educanda/
educando e a educanda/educando-educadora/educador tornam-se agentes de
um mesmo processo. Isto ocorre no momento em que o ato de ensinar e o de
aprender passa a ser entendido não mais como algo dicotômico, mas complemen-
tares e interdependentes. Então,
[...] o educador deve realizar bem que, no momento em que começa
a empenhar-se neste processo, ele próprio se prepara para morrer.
Não é senão por esta “morte” que apenas ele pode assumir - que o
seu renascimento como aluno e o renascimento dos alunos como
educadores são possíveis (FREIRE, 1987, p. 27).

A Educação Popular representou à época e, ainda hoje representa, a pos-


sibilidade de conquista da cidadania e do resgate da dignidade humana, pois se
constitui numa ferramenta concreta, capaz de minimizar o abismo social existente,
resultante de uma sociedade desigual. Sua origem mostra o diferencial: surgiu
de experiências de base na América Latina, no calor das lutas populares em
contrapartida à situação de miséria, exploração, dominação e opressão que toca a
215
grande maioria da população. Isso tem forte relação com a questão da construção
da cidadania e da transformação social.
A EP aposta na ideia de que as práticas educativas não podem estar desvin-
culadas das práticas sociais. Dessa forma, ensinar conteúdos (e isso não significa
que estes sejam formais) e trabalhar com uma proposta de conscientização e trans-
formação social são “etapas” de um mesmo processo e, portanto, se complementam.
Ou seja, são indissociáveis e visam a promover mudanças nas estruturas social,
econômica e política, isso em um nível macro, sem desconsiderar as mudanças e
transformações na camada local e comunitária.
No que se refere à conscientização, Freire (1979) afirma,
A conscientização é [...] um ato de conhecimento. Implica um desvela-
mento da realidade com o qual vou me aprofundando [...] para desvelar
a sua razão de ser [...]. O processo de conscientização implica [...] um
ato lógico de conhecimento e não transferência de conhecimento. [...]
não se pode basear na crença de que é dentro da consciência que se
opera a transformação do mundo, a criação do mundo. É dentro do
próprio mundo que, na história, através da práxis que se dá o processo
de transformação (FREIRE, 1979, p. 114-115).

Nessa lógica, Puigróss (2003) afirma:


Um dos grandes acertos de Paulo Freire foi destacar a presença do
elemento político nos processos educacionais de nossas sociedades,
não como simples reflexo da luta de classes, ao avançar na análise da
forma específica que adquire a opressão social no interior do processo
educativo, no lugar da transmissão/criação do conhecimento. Ao
propor a possibilidade do vínculo dialógico, derrubando as teorias
reprodutivistas, Freire proporcionou elementos que nos permitem
estudar as expressões simbólicas das diferentes posições relativas
do educador e do educando, e suas consequências para a produção,
reprodução e/ ou transformação da cultura. Esta foi, provavelmente,
a descoberta mais importante do pensamento educacional popular
latino-americano na segunda metade do século XX (PUIGRÓSS,
2003, p. 24).

A ideia da EP comporta uma perspectiva crítica, questionadora das relações


de dominação e encerra também uma concepção de práxis social. Assim, existe
uma tentativa de valorizar a conscientização das pessoas no processo, adotando
o entendimento de que, nas práticas educativas, educandas/educandos e educa-
doras/educadores precisam refletir, em conjunto, de maneira a buscar a síntese
216
de suas ideias para também agirem em conjunto. A EP objetiva que por meio da
prática pedagógica desenvolvida, as pessoas recuperem a capacidade humana de
indignação, a inconformidade. Logo, ao adotar a sugestão de Gadotti e Romão
(2000, p. 30), infere-se que a educação popular alude a um processo sistemático de
“participação na formação, no fortalecimento e na instrumentalização das práticas
e dos movimentos populares com o objetivo de apoiar a passagem do saber da
comunidade ao saber de classe da comunidade”.
Por esse alinhamento, identifica-se a EP como uma concepção de caracte-
rística eminentemente sociopolítica e sociopedagógica, pois: i) parte da realidade
concreta de seus participantes; ii) privilegia a coletividade e a transformação/
superação das dicotomias; iii) tem por base o diálogo permanente e ativo, a parti-
cipação ampla e constante; iv) acompanha, apoia e inspira ações de transformação
social; v) o papel da mestra e do mestre desaparece, uma vez que é a docente ou
o docente que se adequa às expectativas, aos sentimentos e interesses dos setores
populares; vi) propõe a construção de um modelo alternativo de sociedade.
Isto posto, reforça-se o caráter político e pedagógico da proposta freireana
de educação popular na medida em que privilegia o conhecimento de mundo, os
saberes construídos em diversos espaços e em diferentes realidades, enaltecendo,
consequentemente, a cidadania. Ou seja, o pensamento freireano encontra-se
indissociavelmente ligado à questão da inclusão e da educação, sendo entendido
como a maior expressão pedagógica (brasileira) indicativa de transformação.

Bases teóricas da Educomunicação

A formação humana no interior das sociedades contemporâneas passa tam-


bém pela comunicação, em suas diversas intermediações, isto é, grupal, massiva e
interpessoal (PERUZZO, 1998). Porém, segundo (LOPES, 2009), essa formação
pode ser distorcida, já que os meios de comunicação oficiais retratam uma única
cultura e história. Reconhecer-se produtora ou produtor90 e não só espectadora
ou espectador torna as pessoas mais críticas quanto às representações midiáticas
feitas sobre elas, além de tornarem-se conscientes do processo em que vivem (a
quem eu sirvo? Quais padrões reproduzo?) e quais as conexões que por vezes estão

O que é proposto não é a junção de pessoas para fazer produtos de comunicação, o que é proposto é a produção da
90 

comunicação tendo o processo como elemento essencial. Cabe ressaltar que a participação da população nesse processo
não deve ser de forma “fabril”, com divisão de tarefas, mas, sim, buscar-se a participação de todas e todos em tudo, criando
uma atmosfera na qual a relação entre pesquisadora-pesquisador e moradora-morador se dê dentro de uma horizontali-
dade de poder, diluindo as fronteiras hierárquicas entre discípulas, discípulos, tutoras e tutores, com a defesa dos valores
máximos da democracia, sem saberes mais importantes, sem hierarquia de conhecimentos (TASSARA; ARDANS, 2005).
217
ocultas entre os fenômenos (ANGILELI, 2012). Esse é um direito, como bem
sintetiza Brandão (1999, p. 10): “(...)o direito e o poder de pensarem, produzirem e
dirigirem os usos de seu saber a respeito de si próprias”. (BRANDÃO, 1999, p. 10)
Para isso é necessário reforçar uma visão solidária91 de construção do conhe-
cimento na qual todos são igualmente produtoras e produtores desse conhecimento,
contrariando a ciência moderna92 que privilegia o conhecimento-regulação, regidos
por um certo colonialismo, transformando “o outro” em um objeto manipulável
(SOUZA SANTOS, 2011). Vale destacar que a produção do conhecimento
solidário, segundo assevera Angileli (2012), implica também a difusão, ou seja,
deve-se buscar também a inserção das pessoas no processo de comunicação
(PERUZZO, 1998, p. 13). Essa concepção mostra-se coerente com o próprio
significado de comunicação – no latim, “o que pertence a todos e a muitos” –,
palavra definida como o ato de “comungar”, “tornar comum”, “estar em relação”,
“ação em comum” (LOPES, 2009), tornando-se um importante mecanismo de
fortalecimento da partilha de saberes.
Na busca por tornar comum a produção e a difusão do conhecimento, ins-
piramo-nos nas contribuições da Educomunicação, não como mera junção das
áreas de educação e de comunicação, mas, sim, como um processo de educação
norteadora no qual a comunicação é o instrumento que materializa e torna visível
as intenções dessa educação de caráter emancipatório e libertário (LOPES, 2009).
Essa perspectiva é inerente à Educomunicação por ter raízes na comunica-
ção popular, que é um movimento de comunicação que surge no final dos anos
60 junto às atuações de fé e política das Comunidades Eclesiais de Base – CEBs
(DORNELLES, 2007). Essa forma popular de comunicação carrega valores das
pedagogias libertárias latino-americanas, desde seus fundamentos éticos e políti-
cos, até a necessidade de promover transformações sociais. Por esse alinhamento,
revelou-se resposta consistente aos contextos sociais de repressão de governos
91 
Compreensão que nos aproxima da Epistemologia da Visão proposta por Boaventura Souza Santos (2011) “Episte-
mologia da Visão é a que pergunta pela validade de uma forma de conhecimento cujo momento e forma de ignorância é
o colonialismo e cujo momento e forma de saber é a solidariedade. Enquanto, pela forma hegemônica de conhecimento,
conhecemos criando ordem, a epistemologia da visão levanta a questão sobre se é possível conhecer criando solidariedade.
A solidariedade como forma de conhecimento é o reconhecimento do outro como igual, sempre que a diferença lhe acar-
rete inferioridade, e como diferente, sempre que a igualdade lhe ponha em risco de identidade” (SANTOS, 2011, p. 246).
92 
Essa reflexão contribui para superar um modelo tradicional de ciência, baseado na separação entre o saber científico e
o saber popular, um modelo que revela intenções de dominação, historicamente construídas em sociedades marcadas pelas
desigualdades sociais. A esse respeito, Peruzzo (1998, p. 74) afirma: “... desde o período colonial, nos foi obstada ou até
usurpada a possibilidade de avançar nessa prática. Nossas tradições e nossos costumes apontam mais para o autoritarismo
e a delegação de poder do que para assumir o controle e a co-responsabilidade na solução dos problemas (...) O certo é
que o autoritarismo é resultado histórico da formação econômica, social, política e cultural brasileira e, como produtos
dessa dinâmica, estamos impregnados de alienação e de acomodação”.
218
autoritários e militares do período nos quais eram comuns o cerceamento de direi-
tos civis e as severas limitações à liberdade de expressão. Assim, essa outra forma
de comunicação seria uma oportunidade de “colocar os meios de comunicação
a serviço dos interesses populares” (PERUZZO, 2005, p. 20 apud MARQUES,
2016, p. 425), fazendo emergir um tensionamento necessário e educativo.
Essa retomada da comunicação como um direito humano e um processo
que aproxima as pessoas e as fortalece em meio a narrativas hegemônicas, alheias
a suas realidades, associada à compreensão da educação como cultura – na qual se
reconhece todo ser humano como produtor de cultura capaz da “criação, apropria-
ção, transmissão, interpretação dos bens simbólicos e suas relações” (FERREIRA
SANTOS, 2004, p. 72 apud LOPES, 2009, p. 20) – são entendimentos basilares
para a constituição do campo interdisciplinar educomunicativo.
O precursor da Educomunicação e criador deste neologismo foi o argentino
Mário Kaplún (1923-1998) que, com larga experiência em produção de televisiva,
na década de 70, iniciou um trabalho educomunicacional em rádio, voltado para
adultos de origem rural, com o objetivo de “desvelar os meios de comunicação em
relação à sua interferência na visão de mundo e no comportamento político das
pessoas e grupos” (MARQUES, 2016, p. 426). Mário, inspirado pela educação
emancipatória do educador brasileiro Paulo Freire (1921-1997), buscava uma
comunicação educativa com resultado formativo, no qual seria possível suscitar a
discussão, a reflexão e a tomada de consciência tanto das pessoas que produzem
a informação quanto das que a recebem.
Kaplún também dialogava em seu trabalho com o educador paraguaio Juan
Enrique Díaz Bordenave (1926-2012) que, na década de 1970, identificou alguns
modelos de educação por ele denominados de exógenos ou endógenos (MAR-
QUES, 2016, p. 428). Os modelos de educação exógenos teriam como ênfase os
conteúdos e a transmissão de conhecimentos, como também a ênfase nos efeitos.
Esses modelos levariam tanto a uma “educação bancária”, na acepção de Freire
(1987), quanto a uma “comunicação bancária”, atrelada a um processo de persua-
são e reprodução de estereótipos, influenciando as pessoas em seus hábitos. Já o
modelo endógeno assume a realidade das pessoas como ponto de partida e visa à
transformação das pessoas e de sua realidade social (MARQUES, 2016, p. 429).
Este segundo modelo, de acordo com Kaplún, reforça a necessidade da supera-
ção da separação histórica entre a teoria e a prática, avançando para uma práxis93
que inspira e colabora com a constituição da Educomunicação como ação e, por
93 
Para Freire (1987, p. 67), “... práxis, que implica a ação e a reflexão dos homens sobre o mundo para transformá-lo”.
219
vezes, com a força de um instrumento de resistência popular ou mesmo de luta,
emergindo junto a estruturas não formais de educação, a exemplo de movimentos
sociais e comunidades populares.
De acordo com Marques (2016), desde então, o conceito de Educomuni-
cação segue em elaboração, sendo reformulado por aquelas e aqueles que dele se
apropriam a partir de seus diferentes contextos. O autor também destaca que a
interdisciplinaridade inerente à Educomunicação – algo natural aos movimentos
de resistência libertários –, de início, foi alvo de resistência no interior nas estru-
turas acadêmicas, sendo superada, segundo Machado (2009 apud MARQUES,
2016), pelo reconhecimento da emergência da partilha de conhecimentos entre
diferentes áreas do conhecimento. Esse processo de mudança teve como marco
a publicação dos estudos do Núcleo de Comunicação e Educação da Universi-
dade de São Paulo, realizados entre 1997 e 1999, envolvendo 176 especialistas de
12 países da América Latina, nos quais se reforçou a importância de “um novo
campo – interdisciplinar e autônomo – de intervenção social, então denominado
Educomunicação” (SOARES, 2007, p.8 apud MARQUES, 2016, p. 433).
É importante destacar a atuação do coordenador desses estudos, o professor
Ismar de Oliveira Soares, pois contribuiu para a ampliação da compreensão do
campo da Educomunicação. Para ele, a Educomunicação seria constituída por
um campo de ações destinadas a integrar as práticas educativas e os estudos
sistemático dos sistemas de comunicação, além de criar e fortalecer ecossistemas
comunicativos em espaços educativos, a fim de melhorar o coeficiente expressivo
e comunicativo das ações educativas (BIBLIOTECA DA USP, 2022).
Em seus primeiros estudos, o professor apresentava alguns eixos dentro da
Educomunicação, tais como a educação para a comunicação, tecnologia na edu-
cação, gestão da comunicação no espaço educativo e reflexão epistemológica sobre
a inter-relação comunicação/educação. Atualmente esses eixos foram redefinidos
da seguinte forma: educação para a comunicação; expressão comunicativa através
das artes; mediação tecnológica na educação; pedagogia da comunicação; gestão
da comunicação; reflexão epistemológica e produção midiática para a educação
(SOARES, 2013 apud MARQUES, 2016).
Essa ampliação e mudanças e eixos, de acordo com Marques (2016), mostra-se
menos restrita a sujeitos coletivos ou a determinados lugares sociais ou políticos, pois
Seu foco está na educação pelo processo e seu campo volta-se a todos
os espaços educativos – sejam eles as salas de aula ou as salas das casas,
220
as praças e centros comunitários, ou simplesmente o espaço político
(e não físico) das relações que se dão no tecido social”. (MARQUES,
2016, p. 436)

A Educomunicação também coloca a educadora e o educador em um outro


lugar, o de mediadora ou mediador. Assim, sua ação profissional não se limitaria à
inserção de mídias e de tecnologias da comunicação na educação escolar. Sua atuação
junto às educandas e aos educandos deve ser a de utilizar as mídias como forma
de planejar e executar ações de comunicação internas ao espaço educativo formal
ou informal; e de também de se comunicar externamente com as comunidades
(MARQUES, 2016), em um processo contínuo de apropriação e comunicação
dos seus universos simbólicos.
Sob essa perspectiva, a inclusão de variadas tecnologias e diferentes linguagens
no dia a dia da escola – a partir de projetos educomunicativos no qual todas e todos
se apropriam das etapas de produção de conhecimento e comunicação –, revela-se
como uma possibilidade das pessoas se olharem, se ouvirem e se envolverem com
sua própria cultura. Nesse movimento, a consciência crítica tão buscada advém
como decorrência natural do processo (LOPES (2009, p. 22).

Tecnologias na Educação: possibilidades e desafios à inclusão

Desde o início da existência da humanidade, homens e mulheres modificam a


natureza em prol de seu conforto e bem-estar; consequentemente, produzem conhe-
cimento e deixar à mostra a sua propensão à aprendizagem (CORREIA, 2020)94.
Nesse movimento de criação-aprendizagem-aperfeiçoamento, a ação humana,
ao longo da história, lançou mão do que denominamos de tecnologia, ou seja,
o conhecimento de uma arte. A arte de buscar soluções a um número
significativo de problemas próprios de uma determinada época his-
tórica: o animal laborans desenvolveu um conjunto de ações para dar
sustentação à condição da vida humana e o homo faber empreendeu
seus esforços nas técnicas que criam instrumentos para dominar o
mundo em seu favor. Assim, a tecnologia reestruturou profundamente
a consciência, a memória humana e a busca de soluções para grandes
e pequenos problemas (HETKOWSKI, 2004, p. 94).

94 
O autor cita como exemplos de avanços, “a descoberta do fogo, a invenção da roda, o aparecimento da linguagem, a
criação da escrita, a domesticação dos animais, o desenvolvimento das ciências, o progresso da agricultura, entre outros”
(CORREIA, 2020, p. 15).
221
Desse modo, depreendemos que, desde longa data, a tecnologia esteve
presente no cotidiano da espécie humana, ancorada em sua capacidade cognitiva
e criativa de pensar soluções para resolução dos problemas e responder às suas
necessidades, como afirma Kenksi (2021, p. 9):
As necessidades básicas de sobrevivência aliada ao uso do raciocínio
e a engenhosidade das pessoas desencadearam a criação de diferentes
tipos de recursos, produtos, processos... tecnologias. Máquinas, ferra-
mentas, metodologias... são formas distintas de tecnologias.

Em concordância com Kenski (Op. cit.), mas avançando em outra direção,


Correia e Santos (2015) asseveram que pensar a tecnologia é pensar o próprio
ser humano como primado material e simbólico constituinte de sua condição
como ser pensante, uma vez que cria artifícios, mecanismos para dinamizar as
relações sociais, a exemplo da invenção da linguagem escrita, uma das mais antigas
tecnologias. Desse modo, fica claro o fato de que não se pode reduzir a(s) tec-
nologia(s) a aparelhos e ferramentas, pois é preciso incluir, nesse rol, linguagens
diversas, como a linguagem digital95, essencial no uso de celulares e notebooks,
além de metodologias e criações variadas, como os aplicativos e os ambientes
virtuais, entre outras possibilidades.
Nesse ponto é interessante observar que essa resposta tecnológica às demandas
cotidianas não só transforma a forma de pensar/agir das pessoas, mas retroage sobre
ela mesma, conduzindo a sua substituição por outra tecnologia mais potente, como é
o caso da alteração gradual da tecnologia analógica para a digital. Nesse movimento
constante de necessidades-respostas, uma infinidade de recursos é gerada – recursos
estes cada vez mais portáteis e de alta performance, a exemplo dos smartphones –,
exigindo o uso da linguagem digital, o conhecimento de novas funcionalidades
colocadas à disposição e a alteração da postura frente às relações sócio-econô-
mico-culturais que vão se desenhando nas interações mediadas pela tecnologia.
A despeito do bem-estar que emerge dessas respostas tecnológicas, os con-
trastes sociais e as ambivalências gestadas no interior da sociedade são visíveis,
como já mencionamos na abertura deste capítulo: de um lado, verificam-se avanços
científicos e tecnológicos; de outro, persistem os problemas estruturais em diversas
áreas, inclusive no âmbito educacional.

95 
Sobre a linguagem digital, Kenski (2021, p. 16) afirma: “O digital possibilita e atualiza todas as linguagens presentes em
atos de interação e comunicação. Constrói distintos sentidos em outros contextos. A mensagem em permanente renovação
gera novos significados, atualizações e diferentes formas de autoria em colaboração.”
222
Nesse contexto ambíguo, a escola, da Educação Infantil à Educação Superior,
é chamada a responder à sociedade contemporânea, por meio de um currículo
que incorpore a tecnologia (como conteúdo e também como prática), a fim de
que seja promovida a inclusão digital das estudantes e dos estudantes, assim como
uma postura cada vez mais autônoma e crítica em relação à produção tecnológica.
Prova contundente das dificuldades da escola em dar a resposta esperada,
sem mudanças estruturais na sociedade, tivemos durante o período de pandemia
de Covid-19, especialmente em 2020 e 2021, quando houve a repentina migração
da escola para os lares. Isso trouxe uma série de desafios para os quais o Estado,
a escola e as famílias não estavam preparados. Foi necessário repensar as salas de
aulas e seus formatos, as modalidades de ensino e as formas de ensinar-aprender.
Além disso, com o isolamento social, a linguagem digital foi colocada em
evidência, em detrimento de outras, o que tornou ainda mais visível a situação
das escolas de zonas periféricas nas quais estudam crianças, adolescentes, jovens
e adultos mais vulneráveis socialmente. Não raro foram os casos, amplamente
divulgados pela mídia (SOUZA, 2021) de famílias que precisaram escolher qual
dos filhos iriam assistir às aulas por meio de plataformas e/ou redes sociais que
necessitavam de aparelhos e de conectividade à internet96. Isso fez com que muitos
estudantes continuassem no mundo analógico, tendo acesso ao conhecimento
por meio de cadernos de atividades e aulas na TV, entre outras propostas, sem o
auxílio de uma professora-mediadora ou professor-mediador e sem recursos extras
para esclarecer dúvidas que surgiam durante os estudos. Somada à progressão
continuada, um significativo grupo de estudantes avançou para os anos seguintes
sem as bases necessárias, o que acentuou ainda as discrepâncias entre a realidade
de discentes das redes pública e privada (TV CULTURA, s/d).
O contexto pandêmico acentuou a necessidade de investimentos das tec-
nologias digitais na área educacional, ao impor uma nova realidade, sobretudo
para os profissionais que trabalham na educação básica (RIBEIRO et al, 2021). A
experiência vivenciada nestes últimos dois anos foi de muito aprendizado e desafios,
mas também de reflexões sobre a utilização da tecnologia na Educação, somada
a propostas metodológicas mais dinâmicas, como as metodologias ativas. Dessa

96 
A esse respeito, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2021) publicou o relatório intitulado Síntese de
Indicadores Sociais: uma análise das condições de vida da população brasileira 2021 cujo conteúdo é revelador: metade das
estudantes e dos estudantes de 15 a 17 anos da rede pública de ensino não possuíam equipamentos e/ou acesso à internet
para acompanhar as aulas remotas durante a pandemia. Essa realidade atinge também estudantes mais novos e pode ser
confirmada na reportagem de Souza (2021), ao retratar casos como o de Denise (nome fictício), de 9 anos: “Estudante da
zona leste de São Paulo diz que só estuda às terças, pois é o único dia que a mãe está em casa com celular para ela usar”.
223
vivência, fica a urgência de discussão e de formação continuada para a docência
em espaços virtuais de aprendizagem, entre outras questões que convergem para
o objetivo de capacitar profissionais quanto aos limites e às possibilidades do uso
da tecnologia digital na educação.
Urgente também é a problematização de como educadoras e educadores
populares podem incorporar a tecnologia digital em processos educativos que
atendam às demandas de comunidades vulneráveis, quer seja na educação formal
ou em programas, projetos e ações de educação informal, uma vez que, com a
criação do armazenamento em nuvem e a gradual popularização dos smartphones,
a partir de 20006, as tecnologias móveis, conforme nos informa Kenski (2021, p.
31), “já são o principal meio de acesso à internet [...] pela maioria dos brasileiros”.
Cabe destacar o fato de que a internet, considerada um dos marcos da rela-
ção entre educação e tecnologia, na década de 90, potencializou os processos em
rede e favoreceu a redução das distâncias físicas, valendo-se de uma linguagem de
protocolos comuns a um conjunto de computadores espalhados por todo o planeta.
Por meio dela foram/são mediados dados, experiências, informações, mensagens,
socializadas entre pessoas, empresas, instituições, entidades, órgãos, institutos,
dentre outros inúmeros setores que compõem as dinâmicas da vida em sociedade97.
Em face da crescente dependência contemporânea das tecnologias e das
soluções digitais98, como já esclarecido neste texto, pelo impacto social causado
pela internet e pelo crescente uso de tecnologias móveis entre pessoas de comu-
nidades socioeconomicamente vulneráveis, processos educativos mediados por
tecnologias digitais podem representar uma ação efetiva de inclusão, exigindo
uma política pública que contemple, concomitantemente: i) a universalização
do acesso (de qualidade) dessas comunidades à rede de computadores; ii) a dis-
tribuição de tecnologias móveis compatíveis com a realidade das comunidades
– doação, alocação em pontos estratégicos, entre outros; iii) a formação crítica
para o manuseio de tecnologias móveis, tanto no aspecto funcional quanto no de
seleção da informação; iv) a formação para a práxis pedagógica on-line, pautada

97 
A respeito da internet, é bom que se mencione seu duplo caráter de uso – massivo e personalizado –, afetando dife-
rentes atividades humanas: “[...] As redes interativas de computadores estão crescendo exponencialmente, criando novas
formas e canais de comunicação, moldando a vida e, ao mesmo tempo, sendo moldadas por ela” (CASTELLS, 1999 apud
HETKOWSKI, 2004 p. 25).
98 
Conforme Lévy (1999, p. 17), vivemos em uma Cibercultura, entendida como um “[...] conjunto de técnicas (materiais
e intelectuais), de práticas, de atitudes, de modos de pensamento e de valores que se desenvolvem juntamente com o
crescimento do ciberespaço”, permitindo a ligação entre pessoas através de redes, colaborando para as diferentes maneiras
de se comunicar, ensinar e aprender.
224
nos interesses das comunidades, em suas diferentes realidades e experiências,
visando a sua autonomia e tendo em mente que
as tecnologias por si só não refletem processos de ensino e aprendi-
zagem, mas relacionam-se às práticas, processos pedagógicos flexíveis
e criativos, como oportunidades para se repensar os currículos, os
conteúdos, a forma de organização de cursos e disciplinas. Os aspectos
tecnológicos precisam estar associados ao ato educativo e também
sobrelevar interfaces sociais e políticas (KNUPPEL; KNUPPEL
JUNIOR, 2021, p. 33).

TECNOLOGIA NA EDUCAÇÃO: O QUE APRENDER COM OS


APORTES DA EDUCAÇÃO POPULAR E DA EDUCOMUNICAÇÃO

A pesquisa bibliográfica realizada contribuiu para a identificação de pon-


tos fundantes da Educação Popular, na perspectiva freireana, e da Educomu-
nicação, em trabalhos publicados por autores e autoras de reconhecida impor-
tância nesses campos de estudo99.
O conteúdo resultante dessa pesquisa foi organizado em unidades temáticas
e, em seguida, categorizado para a devida descrição e interpretação, como prevê
a metodologia escolhida, ou seja, a análise de conteúdo100.
As seis categorias definidas – origem, finalidade, concepção do ato de aprender,
agentes do processo, conteúdos priorizados e orientação didático-pedagógica – são
apresentadas no quadro que segue, a fim de evidenciar possíveis convergências:

99 
De acordo com Marconi e Lakatos (2003, p.158), “a pesquisa bibliográfica é um apanhado geral sobre os principais
trabalhos já realizados, revestidos de importância, por serem capazes de fornecer dados atuais e relevantes relacionados
com o tema. O estudo da literatura pertinente pode ajudar a planificação do trabalho, evitar publicações e certos erros, e
representa uma fonte indispensável de informações, podendo até orientar as indagações”.
100 
Segundo Moraes (1999, s/p.), “a análise de conteúdo constitui uma metodologia de pesquisa usada para descrever e
interpretar o conteúdo de toda classe de documentos e textos. Essa análise, conduzindo a descrições sistemáticas, qualitativas
ou quantitativas, ajuda a reinterpretar as mensagens e a atingir uma compreensão de seus significados num nível que vai
além de uma leitura comum”. Ele esclarece que, mesmo que haja alguma variação entre os autores e as autoras sobre as
etapas a serem percorridas, de modo geral, a sequência de trabalho atinente a essa metodologia inclui: i) a preparação das
informações; ii) a transformação do conteúdo em unidades; iii) a classificação das unidades em categorias; iv) a descrição;
v) a interpretação.
225
Quadro 1 – Descritivo das categorias de análise relativas aos pilares da Educação Popular e da
Educomunicação

EDUCAÇÃO POPULAR EDUCOMUNICAÇÃO


Emerge de debates de movimentos de comunicação popular,
FINALIDADE ORIGEM

Emerge de experiências de base na América Latina, sobretudo no final dos anos 60, firmada em valores das pedagogias liber-
nos anos 60, no calor das lutas populares contra a todas as tárias latino-americanas, em resposta aos contextos sociais de
formas de violência e exploração, como alternativa de educação repressão de governos autoritários e militares do período nos
em espaços não escolares, com vistas à inclusão daquelas e quais o cerceamento de direitos civis e liberdade de expressão
daqueles que a educação formal não alcançava. eram realidade.

Educa-se para a emancipação/libertação pela integração de


Educa-se para a libertação – pela via da conscientização das práticas educativas aos sistemas de comunicação, segundo uma
pessoas no processo, fomentada pela perspectiva crítica do ato perspectiva crítica. Nessa direção, o foco reside na conscientiza-
educativo que questiona as relações de opressão e dominação – e ção tanto das pessoas que produzem a informação quanto das
para a transformação social. Em outras palavras, conscientização que a recebem e na priorização dos interesses populares, com
e transformação social são faces da mesma moeda. vistas à transformação pessoal, comunitária e social.
AGENTES DO

As pessoas são reconhecidas como produtoras e produtores, de


PROCESSO

forma solidária, crítica e contínua, de conhecimento e como


As pessoas ocupam lugar central na reflexão pedagógica e tor- atuantes no processo de apropriação de estratégias de comuni-
nam-se agentes do processo educativo, independentemente de cação desses saberes. Nesse processo construtivo e formativo, a
estarem na condição de educadoras/educadores ou de educan- educadora e o educador, na condição de mediadora ou mediador,
das/educandos. Isso decorre do entendimento de que o ato de conduzem a utilização de mídias pertinentes como forma de
ensinar e o de aprender são complementares e interdependentes. planejar e executar ações de comunicação internas e externas
à comunidade implicada.
APRENDER

Concebe a aprendizagem a partir das próprias experiências Concebe a aprendizagem como resultado da ação protagonista
ATO DE

(mas sem se limitar a elas), a todo momento, nos respectivos de todas e todos ao longo de todas as etapas da realização de
lugares de vivência, alimentada pelas relações intersubjetivas, projetos educomunicativos, isto é, da produção de conheci-
interculturais, familiares e comunitárias. Não há hierarquia mento até à comunicação das descobertas feitas, resultando
de saberes. O saber científico é tão necessário quanto aquele em envolvimento significativo com a própria cultura e a pro-
forjado na luta blematização da realidade.
PRIORIZADOS
CONTEÚDOS

Ao defender a indissociabilidade das práticas educativas com


as práticas sociais, os conteúdos que integram projetos de Ao defender a superação da clássica separação entre a teoria e a
EP não são pré-selecionados sem que haja uma participação prática, os conteúdos que permeiam projetos educomunicativos
efetiva das pessoas envolvidas na determinação dos aspectos partem da realidade das pessoas, privilegiando suas narrativas,
que afetam suas vidas, das metas e dos objetivos pretendidos vivências e culturas.
e as melhores formas de alcançá-los.
DIDÁTICO-PEDAGÓGICA
ORIENTEÇÃO

Argumenta em favor de práticas educativas específicas, de


acordo com os diversos grupos envolvidos. Em razão disso, Argumenta em favor de projetos educomunicativos que incluam
não há modelos definidos. São válidas atividades culturais, tecnologias e diferentes linguagens como potencializadoras
de criação, esportes, rodas de conversas, relações de trocas da consciência crítica e da transformação. Para isso, a aten-
de vivências, entre outras, nas quais se procura valorizar a ção se direciona para práticas educativas que conduzam as
conscientização das pessoas no processo de diálogo, adotando participantes e os participantes a se olharem, se ouvirem, se
o entendimento de que, nas práticas educativas, educandas/ envolverem com sua própria cultura e problematizarem o seu
educandos e educadoras/educadores precisam refletir, em entorno, para transformá-lo.
conjunto, de maneira a buscar a síntese de suas ideias para
também agirem em conjunto.

Fonte: elaboração das autoras, a partir do quadro teórico de referência.


226
Essa síntese comparativa conduz-nos a considerar os seguintes pressupostos
para a incorporação de tecnologias no processo de mediação pedagógica em contex-
tos educacionais inclusivos, solidários e emancipatórios, essenciais ao atendimento
das demandas de comunidades em situação de vulnerabilidade socioeconômica:
1 Não há um modelo de prática educativa nem um perfil ideal de profissional
para a educação mediada por tecnologias digitais, mas, sim, um conjunto de
princípios que direcionam o ato educativo para o aprender-significar e não
somente para o ensinar, já que o cerne é a comunhão que vai sendo construída
nos espaços educativos e que permitem que todas as envolvidas e todos os
envolvidos, criticamente, se apropriem e ampliem seus conhecimentos em
relação ao mundo digital em prol da construção de um mundo mais justo
e solidário;

2 Em cada espaço educativo em que nos inserimos para um projeto de edu-


cação mediada por tecnologias digitais, é preciso buscar, em conjunto com os
variados grupos de pessoas envolvidas (que são sempre únicos), novas formas
de organização da prática educativa. Isso exigirá de cada educadora-mediadora
e educador-mediador um constante exercício de maturidade, de flexibilidade
e amorosidade para lidar com a diversidade, assim como para lidar com a
imprevisibilidade e, ainda, o exercício constante da análise reflexiva sobre
a sua própria atuação e sobre a trajetória solidária de aprendizagem que as
educandas-participantes e os educandos-participantes vão construindo;

3 Na dinâmica cotidiana de realização de um projeto de educação mediada


por tecnologias digitais, as diretrizes norteadoras da educadora-mediadora
e educador-mediador parecem ser:

• zelo por uma relação simétrica e dialógica como condição para


que haja a construção de vínculos e o estabelecimento de uma
autoridade que é reconhecida pelo respeito e pelo acolhimento,
e não pelo autoritarismo;

• atenção à linguagem e ao tratamento despendidos em sala de aula


porque as educandas-participantes e os educandos-participantes
precisam sentir-se respeitadas e respeitados, além de valorizadas
e valorizados em seus saberes e em suas experiências diversas,
escolares e não escolares;

• ênfase, em diferentes oportunidades, de que os saberes das edu-


candas-participantes e dos educandos-participantes, advindos
de sua experiência cotidiana, são preciosos assim como o são os
227
saberes escolares. Em diálogo, esses saberes favorecem a apren-
dizagem significativa e a apropriação crítica das mídias digitais;

• dedicação de tempo e energia na construção conjunta de um


ambiente que favoreça a curiosidade pelo aprender, ou seja, a
valorização das perguntas, ao invés da clássica organização da
dinâmica da sala de aula como espaço para receber respostas. Essa
atitude, além de alimentar a curiosidade epistemológica, favore-
cem a autonomia das educandas-participantes e dos educandos-/
participantes para buscarem respostas e superarem suas dúvidas;

• ampliação das oportunidades de acesso das educandas-parti-


cipantes e dos educandos-participantes ao maior número de
fontes de informações possíveis, em diferentes mídias digitais,
para, junto com elas e eles, promover-se a sua avaliação crítica
e o reconhecimento dos efeitos de sentido pretendido em cada
diferente abordagem da informação e da comunicação;

• favorecimento, de acordo com a realidade de cada grupo e/ou


comunidade, o uso de diferentes tecnologias para buscar respostas
às questões emergentes, de forma que as educandas-participantes
e os educandos-participantes possam, paulatinamente, apropriar-
-se delas e, criticamente, opor-se à exclusão do conhecimento
científico e tecnológico que vem sendo imposta a próprio grupo
e/ou à própria comunidade, além de outras pessoas em situação
de vulnerabilidade social espalhados pelo país.

Desses aspectos resulta a convicção da provisoriedade de nosso conheci-


mento e da possibilidade de aprendermos em comunhão. Por isso, se a luta por
uma sociedade justa e inclusiva e a defesa da participação ativa, da democracia, do
respeito à diversidade, da autonomia de pensamento e de ação, da leitura crítica da
realidade e da crença em nossa capacidade de intervenção nessa realidade estiverem
vivas, somos capazes de “esperançar”, verbo muito empregado por Paulo Freire,
no sentido contrário ao de “esperar”. Esperançar é ir em busca de algo que ainda
não está dado, mas que pode “vir a ser”, pela inconformidade que não nos deixa
desistir, apesar das limitações de qualquer ordem.
Enfim, as possíveis contribuições da Educação Popular e da Educomu-
nicação para a construção de uma proposta de educação mediada por tecno-
logias digitais, destinada a comunidades em situação de vulnerabilidade social
e econômica parecem ser robustas, pois nos inspiram a considerar também as
228
práticas educativas para a apropriação do mundo digital como um processo liber-
tador, dialógico e revolucionário.

PARA UMA EDUCAÇÃO MEDIADA POR TECNOLOGIAS


DIGITAIS COMPROMETIDA COM AS PERIFERIAS:
CONSIDERAÇÕES FINAIS

Neste capítulo, propusemo-nos a investigar possíveis contribuições da Edu-


cação Popular e da Educomunicação para a construção de propostas educacionais
mediadas por tecnologias digitais, numa perspectiva crítica, destinada a comunidades
em situação de vulnerabilidade socioeconômica. Para tanto, utilizando a pesquisa
bibliográfica, discutimos alguns conceitos centrais, tomados como categorias teó-
ricas e que foram interpretados à luz da análise de conteúdo (BARDIN, 2016).
Inicialmente, apresentamos o atual contexto brasileiro no qual se desta-
cam a desigualdade social, econômica e a consequente concentração de renda.
Essas desigualdades são mais fortemente evidenciadas nas Regiões Norte e Nor-
deste do país, que apresentam, conforme dados ora destacados, altos índices de
vulnerabilidade social e econômica, baixos níveis de instrução e escolarização,
resultante da exclusão – em diversos aspectos, sobretudo educacional – que afir-
mamos ser intencional e histórica.
Esse quadro de injustiça social nos impulsiona a enfatizar a iminente neces-
sidade de formulação de políticas públicas em diferentes áreas, com destaque para
a área educacional, considerando o urgente enfrentamento da violação de direi-
tos e de garantias fundamentais que afeta a maioria da população. Do contexto
apresentado também se configura a urgência da inclusão digital, pois a tecnologia
que sustenta o mundo virtual já integra o cotidiano, de diferentes formas, quer se
queira ou não, das pessoas e das sociedades espalhadas pelo mundo
Na tentativa de trazer luz a esse debate, ao abordarmos a Educação Popu-
lar, na ótica freireana, buscamos ressaltá-la como alternativa para a inclusão,
pois, por suas bases de sustentação, agrega a inclusão social, o protagonismo, a
participação e a autonomia, para a promoção efetiva da cidadania, da dignidade
humana e da transformação social. Nessa perspectiva, as práticas educativas são
também práticas sociais por meio das quais se exercita a coletividade, o diá-
logo e as ações de caráter político-pedagógico, o que dialoga em muitos pontos
com a abordagem educomunicativa.

229
Assentada sobre princípios das pedagogias libertárias, tributárias dos movi-
mentos populares e aos seus interesses, a Educomunicação visa à transformação
social, problematizando a forma como se produz e se consome a informação em
sociedade. Seu objetivo central é a superação de narrativas hegemônicas, produ-
zidas pelos meios de comunicação de massa que geralmente costumam retratar
e enaltecer uma dada cultura e uma versão histórica única, de interesse das elites
econômico-políticas. Essa unilateralidade é fortemente combatida pela Educomu-
nicação que propõe um caminho contrário a esse, ou seja, a inserção das pessoas
no processo comunicativo, não mais de forma ingênua, intuitiva, mas pela via da
conscientização emancipadora e libertária que se compromete com a transfor-
mação social. Em síntese, a comunicação, na ótica defendida, é entendida como
direito inalienável. É mister uma perspectiva como essa, quando, diariamente,
são veiculadas narrativas que constroem e/ou reforçam os estereótipos, o nega-
cionismo da ciência e a afronta aos direitos humanos, tal qual vem ocorrendo, de
forma mais explícita, com a onda de fake news. Logo, a Educomunicação pode
constituir instrumento de resistência popular e educativa, que cria ecossistemas
comunicativos e converge para o empoderamento pela autocrítica e modificação
do processo comunicacional. Nesse bojo, o uso crítico das tecnologias digitais nos
processos educativos pode ser uma medida extremamente assertiva.
Ante o exposto nesta retomada das articulações teóricas feitas ao longo do
capítulo, reiteramos que tanto a Educação Popular quanto a Educomunicação
possuem bases políticas determinantes e convergentes para a transformação da
realidade social. Em ambas as abordagens, há o entendimento do necessário prota-
gonismo das pessoas, a todo momento – do estabelecimento de objetivos até a sua
concretização – em prol de um movimento de construção de uma outra sociedade.
Nesse movimento, as pessoas podem vir a se apropriar das tecnologias digitais
já em franco uso por uma parte privilegiada da população, mas de forma crítica,
ou seja, não reprodutora de estereótipos, exclusões e formas de dominação. Nessa
direção, a incorporação de tecnologias digitais nos processos educativos populares
pode ser um elemento a mais na composição de uma proposta que intenta a pro-
moção e o fortalecimento da construção colaborativa do conhecimento, traçada
pelos interesses das comunidades em situação de vulnerabilidade socioeconômica,
para a transformação da realidade.
Isto posto, entendemos que são inegáveis as contribuições da Educação Popu-
lar e da Educomunicação para um proposta de educação popular com a mediação
de tecnologias digitais, a saber: i) a opção por projetos educacionais inclusivos,
230
adequados às demandas e ao contexto de vida das comunidades implicadas, por
existirem por elas e com elas, o que promove maior aderência dessas propostas;
ii) a disponibilização de diferentes formas de oferta educativa, incluindo-se aí a
formulação de proposituras mediadas pelas tecnologias digitais, equipando tecno-
logicamente as instituições não formais e as escolas inseridas nas comunidades em
situação de vulnerabilidade; iii) a ampliação do acesso digital e da conectividade,
pela luta por políticas públicas destinadas à aquisição de aparatos tecnológicos, à
universalização da integração à internet, entre outras pautas.
Ressalta-se, no entanto, que não há um modelo único de oferta educativa
com a mediação de tecnologias digitais que sirva aos interesses de comunidades
em situação de vulnerabilidade socioeconômica, mas, sim, uma direção político-
-pedagógica que orienta a sua condução na direção da leitura crítica da realidade,
para transformá-la, firmada na valorização e no protagonismo das educadoras-e-
ducandas e dos educadores-educandos, assim como em práticas de comunicação
populares, na valorização da curiosidade epistemológica e na apropriação crítica
de tecnologias digitais em franco uso na sociedade.

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233
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234
O PAPEL DO PROFESSOR NA SOCIEDADE
CONTEMPORÂNEA: até onde somos responsáveis

Maria Lucia Costa de Moura101

INTRODUÇÃO

O ensino acomoda e insere um relacionamento com a política e a vida


social de um corpo coletivo, onde podemos expressar opiniões. Se o nosso sentido
de ver o mundo nos impõem mudanças precisamos buscar muito mais, pois,
parece existir uma mediocrização no ensino desde a base, já que alguns alunos
chegam no 3º grau necessitando de uma alfabetização tardia, visto o produto
das avaliações, trabalhos e pesquisas que não conseguem fazer ou se fazem, na
sua maioria é copiado e colado dos sites da Internet.
Sendo assim, dominar a faculdade de conhecer, é estar ciente de con-
jecturas que o transforma com consistência, como a competência no criar,
na investigação, a explicação exata, a qualidade de quem persevera de quem
se torna imprescindível na edificação de uma educação com igualdade de
condições. Pensando dessa maneira o alcance de apreensão na sala de aula,
apesar do esforço do professor demora a ser alcançada muito embora os pro-
fessores estejam engajados, interessados e dispostos a grandes realizações em
benefício dos alunos, da comunidade e da sociedade, não encontra quórum
e às vezes sente-se desanimado.
Visto sobre essa ótica o exercício intelectual pedagógico deverá ser imutável,
voltado para unificar propósitos, para o bem estar da sociedade, crescimento
cultural e participação efetiva na formação de uma sociedade mais justa. O
aprendizado acontece quando da definição e vontade de aprender do aluno já
que ele é a chave de uma sucessão sistemática de mudanças, onde se desencadeia
o ato de educar em uma linha progressiva e autônoma.

101
Doutorado em Patologia Ambiental e Experimental (UNIP). CV: http://lattes.cnpq.br/9567448441307792
235
FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

De acordo com Freire (2002), “Ninguém educa ninguém, ninguém educa


a si mesmo, os homens se educam entre si, mediatizados pelo mundo”. Portanto
o ambiente escolar e o ensino são resultados de atos contínuos e metódicos, pois
existe a serviço do aluno, sendo tudo mais um gesto utópico e falso, pois só irá
produzir uma universidade oca. “O professor sozinho não poderá transformar
uma sociedade. Ensinar, não é transferir conhecimento, mais criar as possibi-
lidades para a sua própria produção ou a sua construção”. (FREIRE, 1996).
No que tange ao entendimento, não é o bastante saber o que é cidadania,
precisam saber o que é ser cidadão. Uma pesquisa realizada pelo Instituto de
Cidadania com 3.501 brasileiros de 15 a 24 anos, de seis Estados e 198 municí-
pios o que mais chamou a atenção é a abstinência cultural do jovem brasileiro:
“entre os pesquisados, 23% nunca leram um livro; 30% nunca foram ao cinema;
62% nunca foram ao teatro % nunca foram a um show musical; 52% nunca
estiveram numa biblioteca fora da escola. (MORAN, 2004)”.
Outro estudo realizado através da equipe de pesquisadores do Instituto
Alfa e Beto (IAB) confirmara que quanto maior é a fluência de leitura, melhor
é a compreensão do que se lê. Os estudantes do 2º, 3º e 4º anos do ensino
fundamental que leem mais palavras por minuto e com maior quantidade de
acertos tiram melhores notas em tarefas de compreensão. Os dados da pesquisa
foram publicados na revista científica “Cadernos de Linguística”, da Associação
Brasileira de Linguística. (GAZETA DO POVO, 2022)
Por outro lado, a tecnologia serve de apoio fundamental às formas de
mudança, já que bastam alguns cliques e os processos tornam-se flexíveis, aber-
tos, facilitando a pesquisa, mas daí pensar que basta a tecnologia, para ensinar
podemos estar formando mentes lentas com dificuldade de cognição já que
necessitam de ferramentas de pesquisas para encontrar rapidamente respostas
aos questionamentos. É necessário que o docente oriente seu aluno a parafrasear
quando pedir uma pesquisa, pois adquire conhecimentos, e estimula a leitura.
Conforme Meserani (2008), “a paráfrase sempre se remete a uma obra
anterior para reafirmá-la, esclarecê-la. Recriar um texto com outras palavras
significa parafrasear”. O progresso da escrita acontece quando prolongamos
o saber, aumentando o vocabulário e a ideia do mundo em relação à posição
adquirida face aos argumentos abordados, torna-se importante para perceber

236
quando o aluno se apossa de trabalhos literários que não lhe pertencem, tra-
duzindo as formas de como eles lidam com o conhecimento.
Nesse contexto, pesquisas científicas comprovam que o hábito de ler pro-
move o desenvolvimento do cérebro como decifrar, compreender, generalizar,
sintetizar ou até mesmo propor hipóteses são funções superiores da mente,
usadas durante a leitura. Talvez por isso, pesquisas científicas realizadas nos
Estados Unidos – Universidade de Stanford –­ e na França – Unidade de Neu-
roimagiologia Cognitiva do Instituto Nacional Francês de Saúde e Pesquisa
Médica (Inserm/Comissão de Energia Atômica e de Energias) comprovam
que a leitura faz bem ao cérebro. (BRASIL, 2016).
Dando continuidade quem sabe o cerne das dificuldades seja a deficiên-
cia de compreensão do texto, já que não se pode ser conivente com esse tipo
de prática, até porque se torna um problema social, e as instituições de ensino
deverão se preocupar um pouco mais constituindo comitês de ética e pesquisa.
Visto sob essa ótica, quando se fala em ler, geralmente a reação dos alunos
do 1º ao 9º ano do Ensino Fundamental costuma ser de repúdio e descaso.
Acostumados com a obrigatoriedade de ler um livro por bimestre para preencher
fichas de leitura e posteriormente fazer provas e testes, os alunos associam os
livros a tarefas repetitivas e maçantes. Assim, o professor que pretenda estimular
os alunos a ler precisa deixar a angústia de lado e se rebelar contra as práticas
comuns no trabalho com os textos.
O problema começa muito cedo, pois se considera que a criança entra
em contato com a leitura apenas quando chega à escola. A família não tem o
hábito de ler. Livros não são considerados presentes, muito menos nos aniver-
sários! Então se remete ao professor, e somente ao professor, a tarefa de ensinar
a ler. Assim, deixa-se de lado o que ensina Paulo Freire ao dizer que a leitura
como percepção do mundo precede a leitura da palavra. Portanto, ler é conferir
significação ao que nos é apresentado, o que qualquer criança faz, ainda que o
texto não seja escrito. (SOARES, 2022)
Desta forma os alunos confiam nos sites e redes sociais, pois as informa-
ções são mais acessíveis, reduzindo sua capacidade de pesquisa e discernimento
o que contribuem para redução da aprendizagem que já não é satisfatória. É
comum nas redações, resenhas ou resumos e até mesmo na fala de um para o
outro o uso de gírias, encurtamento das palavras.

237
Partindo dessa ideia, talvez essa exploração na rede, possa deixar os alu-
nos sem elementos descritivos perdendo a relação de uma coisa com a outra,
com uma sensação de vazio na apropriação do conhecimento, quando o que se
espera seja um auxílio na sequência dos fatos, em organizar e processar a infor-
mação apreendida. Espera-se que a função do computador seja o de promover
pesquisas para aprimorar ideias e ideais, ao invés de tornar o ensino incônscio.
Nesse sentido fica aquém das expectativas que o professor idealiza, quando
percebe determina do aluno que mostrava perspicácia, participativo nas aulas
cognitivo nas suas ideias, revela-se incapaz de escrever sobre seus pensamen-
tos e ideologias. A importância da investigação científica que nos propomos
a executar, não se esgota na sua relevância enquanto área de conhecimento.
Não podemos ignorar a importância destes resultados, particularmente à
luz da evidência de que o aluno muitas vezes internaliza as expectativas dos pro-
fessores ao longo do tempo e essa interiorização, auto conceito e motivação pode
diminuir até que chega a hora de dizer por que veio, porque escolheu determinada
área, o que motivou o que espera, mas o seu potencial encontra-se danificado.
A educação é como o processo de socialização a que os indivíduos
são submetidos.Talvez essa expressão seja ampla demais, e não
corrobore com nossas angustias mais, é o fenômeno que vem acon-
tecendo em algumas realidades universitárias. (DURKEIM, 1978).

Pensando desta forma, o aperfeiçoamento das faculdades físicas intelec-


tuais e morais de um ser humano dependem de motivação pode facilitar esse
processo, estimulando as percepções dos indivíduos, facilitando a interação
tornando-se parceiros nessa caminhada “o principal objetivo da Educação é
criar pessoas capazes de fazer coisas novas e não simplesmente repetir o que
as outras gerações fizeram”. (PIAGET, 1982).
Se de um lado, já aprendemos a conviver com os velhos problemas, pre-
cisamos enfrentar os novos com propostas concretas, para que também eles
não se tornem crônicos. É necessário o interesse em discutir que profissional
pretende-se formar, e voltando ao passado, não adianta ensinar que Ivo viu a
uva, mas em que condições essa uva foi vista.
De acordo com Teixeira (1997), “Educar é crescer. E crescer é viver.
Educação é, assim, vida no sentido mais autêntico da palavra.”
Ao saber o “Projeto Pedagógico de Graduação deve estar sintonizada
com nova visão de mundo, expressa nesse novo paradigma de sociedade e de
238
educação, garantindo a formação global e crítica para os envolvidos no processo,
como forma de capacitá-los para o exercício da cidadania, bem como sujei-
tos de transformação da realidade, com respostas para os grandes problemas
contemporâneos” (FORGRAD, 1999).
Nesse contexto, é possível distinguir quatro grandes fatores de influência
dos professores sobre os alunos: o reconhecimento do estatuto do professor
pelos alunos; o reconhecimento pelos alunos da capacidade de recompensar
ou de punir do professor, através das avaliações e das estratégias de gestão da
indisciplina; o reconhecimento pelos alunos da competência do professor nos
conhecimentos que este lhes pretende ensinar; o reconhecimento de certas
qualidades pessoais e interpessoais no professor, apreciadas pelos alunos, desen-
volvendo-se processos de identificação.
Procura-se um método milagroso, ou uma técnica santa para curar todos
os males da educação, questiona-se a cura para problemas de aprendizagem,
será que a culpa é apenas do professor? Será que os professores perderam o bom
senso ou será isto um problema de má formação. (SILVA, 1982).
De fato, a Internet tornou-se uma grande ferramenta na orientação ao
educando, mas a partir do momento que esse mecanismo é usado para substituir
o raciocínio já prejudica o aprendizado, pois acreditamos que esse recurso não
substituirá a leitura e pesquisas nos livros e revistas, e nesse impasse o profes-
sor termina por culpar o aluno pela falta de interesse, e se sente desmotivado
porque a turma não avança. Onde está o problema.
A importância desse raciocínio deixa claro que o professor, o aluno a
tecnologia, ou a sociedade ou tão somente livra-se de uma obrigação que
lhe foi imposta, pois não há nenhuma identidade dele com aquela atividade.
O que a vida cotidiana requer atualmente do indivíduo é que ele saiba onde
buscar dados e informações para em seguida promover a contextualização,
seleção e relação entre tudo àquilo que, abundantemente as mídias ofe-
recem. (FREIRE e RANGEL, 2012).
Alguns estudiosos sustentam que as pesquisas escolares apresentadas
como simples cópias de textos têm origem em uma série de fatores ligados
diretamente à atuação do professor, dentre as quais destacamos:
Falta de planejamento pedagógico do professor;
Maior clareza dos procedimentos para executar uma pesquisa;

239
Maior disposição dos professores em orientar os alunos para uma
produção analítica e crítica do trabalho escolar. (CAMARGO, 2012)

Podemos afirmar que estamos, na educação, inquietos, agitados, tentando


mudar, sendo cobrados por mudanças, mas ainda sem saber o que pôr no lugar
do que temos. Fazemos algumas experiências, mas ainda são insuficientes para
enxergar uma mudança de forma estrutural. Precisamos insistir em apontar
novos cenários, testar alguns deles e avaliá-los para ir implantando-os com
mais segurança nestes próximos anos. (MORAN, 2004).
Sendo assim a prática da pesquisa da e para a escola configurou-se, a partir
de então, como uma atividade mecanizada, destituída de significação, uma mera
tarefa a ser cumprida por parte do aluno que passa a frequentar as bibliotecas, sob
a obrigatoriedade imposta pela escola. (BERNARDES e FERNANDES, 2002).
No entanto, ainda assim diante das várias atribuições agregadas ao docente,
estes, de um modo geral formam profissionais que procuram recursos para res-
ponder às imposições que a sociedade lhes determina, empregando seus saberes,
seus valores e suas habilidades para provando com fatos, todas essas tarefas.
Dando continuidade o ofício do professor constantemente esteve vincu-
lado ao ato de ensinar, ou seja, ajudando na assimilação da cultura armazenada
do autoconhecimento, do respeito e do compartilhamento criados através da
história, por determinados grupos humanos, às gerações mais novas.
Sendo assim esta atitude transmissora de conhecimentos, por sua vez, é
tão antiga quanto a incontestável origem da natureza humana, a qual indis-
cutivelmente não teria atingido o grau de evolução que nos deparamos nos
dias atuais e muito menos ter sobrevivido, caso o conhecimento adquirido não
pudesse ser repassado aos legatários.
Nesse contexto devido ao caráter central que a educação tem na vida do
homem, a temática vem aguçando a atenção de muitos estudiosos, inquietos
em não só em entender o exercício da profissão assim como procurar respostas
para suas questões, já que existem dilemas de natureza prática, em especial no
âmbito da educação inicial e continuada do docente.
Partindo dessa ideia, essas questões ou dificuldades, por sua vez, podem pro-
piciar particularidades simbólicas vindo influenciar claramente no dinamismo do
ensino, e nessa ótica surgem os estudos interessados em tornar visível as represen-
tações sociais gerando resultados pelos docentes sobre o exercício da sua profissão.

240
Nesse caso talvez possamos dizer que o conhecimento apontado como
imprescindível para a função docente compõe um conjunto de saberes que são
fundamentais no enfrentamento das situações que afloram no ato de ensinar,
por vez apresentando-se como reforço para a ocupação docente. Todavia tor-
na-se relevante ressaltar que o saber do professor não é segregado no âmbito
de sua vida pessoal e profissional.
Sabe-se que a educação passa por modificações diárias alterando o trabalho
docente frente às novas imposições profissionais, oriundas das políticas na educa-
ção produto do liberalismo econômico que ditam as características dos professo-
res, ajustando-os ao que for absolutamente necessário para o mercado do trabalho.
Diante do evidenciado, comprova-se que o trabalho do professor se tornou
multifacetado e em estado de progressivas tensões frente às ações impostas pela
sociedade contemporânea, uma vez que envolve trabalho com e sobre os seres
humanos e, por consequência, permeado por teorias e ações práticas que requer
uma constante reflexão teoria-prática, sobre sua formação.
“Evidentemente o entorno social não se resume a indivíduos e a grupos
sociais, ele também é povoado de objetos e práticas e de fenômeno, às vezes
de personagens que constituem outras tantas apostas para esses indivíduos e
grupos. Isto significa que a partir de informações que circulam a seu propósito,
uma sociedade dispõe de elementos que permitem categorizar as pessoas, definir,
legitimar tomada de posição e condutas”. (DESCHAMPS e MOLINER, 2009).
Do mesmo modo, o mundo do trabalho não admite mais a presença de
profissionais limitados apenas aos aspectos da profissão, mas sim que sejam
competentes e preparados para a vida, com capacidade de articular conheci-
mentos, com uma prática mais abrangente, sem prescindir de conhecimentos
científicos da profissão. (FERREIRA, 2003).
Reforçando esse pensamento, Delors (2003) comenta que, ao longo de
toda a vida, estas aprendizagens serão de alguma maneira para cada indivíduo,
os pilares do conhecimento, a saber: aprender a conhecer, aprender a fazer,
aprender a viver junto, aprender a ser.
Sendo assim como continuar a estruturar cursos com conteúdos que
dia a dia se tornam obsoletos e perdem a conexão com a avalanche de outros
saberes, advindos de todos os quadrantes da Terra, a cada hora que passa? Cada
centro de educação, daqui para o futuro, deverá transitar das aulas do magister
dixit para ambientes de discussão, pesquisa, consonâncias e dissonâncias em
241
que a internet e as bibliotecas se associarão, no apoio à construção do saber,
e os professores atuarão como verdadeiros maestros de orquestra, inspirando,
coordenando, articulando, assessorando e avaliando o produto final do ambi-
cionado conhecimento, sempre conectando em tempo real com as antenas do
mundo de amanhã. (SOUZA, 2011).
Com essas afirmativas, mudanças, expectativas e modelos de ensino
que apareceram atualmente, como metodologias ativas, ensino hibrido, ead,
remoto etc., onde o aluno é o protagonista. Se nos concentrarmos no processo
de ensino, podemos perceber que há um grande número de alterações neste
campo, o que vem influenciar o papel dos professores/facilitadores, definindo
metas e organizando o processo de aprendizagem em conformidade.
Continuando, a necessidade de uma geração de professores que vise
desenvolver a percepção dos alunos em vez de ensiná-los, que desperte a sua
independência e estimule o “aprender a aprender”, que oferecem aos alunos
motivação e interesse para a aprendizagem ao longo da vida e exortá-los a se
tornarem aprendizes autônomos, é essencial para a educação do futuro.

CONCLUSÃO

Acredita-se que a partir dessas colocações, evidenciam-se as dificuldades


que move o fazer do professor e a busca de novas teorias permitindo uma rele-
vância maior aproximando os diferentes níveis e extensões. O saber e a pratica
convivem em harmonia, sendo que o conhecimento do professor deverá ser
compreendido como uma relação íntima com o exercício de sua profissão seja
na coletividade, na sala de aula, ou na internet quando das aulas on line.
Os problemas da educação têm talvez um lugar importante na opinião
pública. Nos países subdesenvolvidos ou em desenvolvimento, tentamos por
todos os meios organizar a base de educação para toda a população e garantir
pelo menos, um ensino superior de elite. Nos países industrializados, repen-
sando o ensino com base em novas necessidades, questionamos os programas,
estruturas administrativas e educacionais, as tentativas de experiências, a pro-
cura de novas formas e modelos.
Diante das considerações, em todo lugar há a necessidade de uma com-
preensão maior a respeito da sociedade de hoje, e mais ainda a de amanhã,
frente às exigências sem precedências do ensino. Para que a civilização moderna
progrida, o que é uma condição para a sua sobrevivência, tornou-se necessário
242
que todos os cidadãos sem exceção recebam uma educação adequada e os muitos
benefícios de uma educação avançada.
Assim, pensamos em dizer que as agruras na educação é parte de uma crise
mais ampla da civilização. É um mundo novo em desenvolvimento buscando
através das reformas escolares propostas em todos os lugares, a resolução para o
enfrentamento de problemas que se apresentam diariamente como a formação
acadêmica, a revolução cientifica e a revolução tecnológica que nos bate a porta
insistentemente e não podemos furtar-nos a abrir.
“Não basta saber ler que ‘Eva viu a uva’. É preciso compreender qual a
posição que Eva ocupa no seu contexto social, quem trabalha para produzir a
uva e quem lucra com esse trabalho. (FREIRE, 2002)

REFERÊNCIAS
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trado do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF).
Rev. TEIAS: Rio de Janeiro, ano 3, nº 5, jan./jun. 2002.
BRASIL. Ministério da Educação. Pesquisas científicas comprovam que o hábito de ler promove o
desenvolvimento do cérebro. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/ultimas-noticias/211-218175739/
40291-estudos-comprovam-que-o-habito-de-ler-traz-beneficios-ao-cerebro
DELORS, J. Educação: um tesouro a descobrir. 2ed. São Paulo: Cortez.
DESCHAMPS JC; MOLINAR P. Psicologia Social. Dos processos identitários às Representações
Sociais. Vozes: Petrópolis, 2009.
DURKHEIM, E. Educação e Sociologia. São Paulo, Melhoramentos, 1978.
FERREIRA HM. A totalidade do conhecimento na enfermagem: uma Abordagem curricular. Acta Paul
Enferm 2003; 16(1): 56-65
FORGRAD. Plano Nacional de Graduação: um projeto em construção. Disponível em: http://www.
forgrad.org.br/. Acesso em: 19 nov. 2013.
FREIRE, P. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2002.
FREIRE, P. Pedagogia da Autonomia. 1996.
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são. Curitiba, 2022. Disponível em: https://www.gazetadopovo.com.br/vida-e-cidadania/breves/
pesquisa-confirma-que-alunos-com-fluencia-de-leitura-tem-melhor-compreensao/
MESERANI S. O intertexto escolar: sobre leitura, aula e redação. 5ª ed. São Paulo: Cortez, 2008.
MORAN MJ. A educação está mudando radicalmente. Disponível em: http://ww.eca.usp.br/moran/
mudando.htm. Acesso em: 28 out. 2013.
PIAGET J. O nascimento da inteligência na criança. 4ª Ed. Rio de Janeiro, Zahar, 1982.
SILVA, ET. Os (dês) caminhos da escola. São Paulo: Ática. 2º Edição, 1982.
243
SOARES MV. Porque nossos alunos não gostam de ler? Revista Educação Pública. Rio de Janeiro, 2022. Dis-
ponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/15/6/por-que-nossos-alunos-no-gostam-de-ler
SOUZA PMP. Caminhos e descaminhos da Educação Brasileira. Integrare. São Paulo, 2011.
TEIXEIRA A. Biblioteca Virtual Anísio Teixeira – IBICT. Disponível em: http://www.bvanisioteixeira.
ufba.br/index.html. Acesso em: 12 nov. 2013.

244
OS DESAFIOS DA DISCIPLINA DE ARTE NA ESCOLA
EM TEMPOS DE PANDEMIA

Marilia Paula de Oliveira102


Fábio Junior Paes de Morais103

INTRODUÇÃO

A educação no Brasil e no mundo foi surpreendida com a Covid19, para-


lisando as aulas, interrompendo projetos e colocando em destaque a criatividade
de professores, para se reinventar diante de um novo mundo que se apresentou.
A arte está para esse momento mais que uma disciplina, uma válvula de escape que
saiu da escola e por meio remoto, síncrono e assíncrono colaborou e colabora para mini-
mizar a angustia, ansiedade e crises nesse período de isolamento e distanciamento social.
Ainda nesse sentido a escola pesquisada, Escola Estadual Carlos Irigaray
Filho, é uma unidade de ensino que tem como finalidade promover o ensino
público de qualidade e equidade para seus estudantes, que para isso, tem em seu
corpo docente profissionais que atuam nas diferentes áreas curriculares de acordo
com sua formação. No que tange ao corpo discente é formado pelos mais diversos
grupos sociais, que trazem consigo identidades e realidades culturais diversas.
Culminantemente a escola, como ambiente de aprendizagem, é um local propício
para o desenvolvimento de habilidades e competências dos estudantes, o que, com o
advento da crise pandêmica da Covid-19, veio desafiar os fundamentos pré-existentes sobre
o único lugar para o desenvolvimento da aprendizagem, já que o ensino passou a ser ofer-
tado online e offline, sendo ministrado síncrono ou assíncrono. Logo os alunos, no entanto,
passaram a ocupar o espaço de seus lares devido a necessidade do distanciamento social.

DESENVOLVIMENTO

Ao falarmos de arte seria impossível definir um conceito único e irrefutável, pois


são inúmeras as designações para tal questionamento. Caso fosse feito uma busca do
significado da palavra Arte teríamos diferentes pontos de vistas. E ao tentarmos definir
a partir do resultado etimológico encontraríamos o seguinte resultado: “O termo
“arte” está relacionado com a palavra latina “ars” que significa habilidade ou ofício.”
Pós-graduada em Artes Visuais (FAVENI). Professora (Seduc – MT).
102

Especialista em Educação, Docência do Ensino Superior (UNIDOCTUM). Professor (SEDUC – MT).


103

CV: http://lattes.cnpq.br/5165828772886933
245
E nesse sentido podemos observamos na enciclopédia virtual wikpedia o
conceito da palavra Arte com o seguinte significado:
Arte (do termo latino ars, significando técnica e/ou habilidade) pode
ser entendida como a atividade humana ligada às manifestações de
ordem estética ou comunicativa, realizada por meio de uma grande
variedade de linguagens, tais como: arquitetura, desenho, escultura,
pintura, escrita, música, dança, teatro e cinema, em suas variadas
combinações. O processo criativo se dá a partir da percepção com o
intuito de expressar emoções e ideias, objetivando um significado único
e diferente para cada obra. (http://pt.wikipedia.org/wiki/Arte. 2022.)

Diante dessa concepção há os que julgam o significado com maior ampli-


tude, sendo assim discordam com uma única possibilidade de meramente uma
atividade que desenvolva técnicas, ou habilidades especificas ao ato de elaborar
alguma coisa que esteja relacionada a esse sentindo.
Para esses pensadores o significado da palavra Arte não estaria simplesmente
relacionado ao ato de fazer ou reproduzir um objeto artístico. Sendo assim é
importante estabelecer relações e conexões com a vida, a história e a cultura dos
povos. Pois expressa sentimentos, emoções e ideias do sujeito pensante.
Möndinger (2012) destaca:
As artes provocam a observação, a apreciação, o dissenso, a reflexão crítica,
a fruição, a curiosidade, a experimentação, a sensibilidade, o debate de
ideias, a capacidade de se surpreender, de se colocar no lugar do outro, de
imaginar, analisar, produzir e confrontar formas, palavras, cores, gestos,
sonoridade, de reconhecer qualidades estéticas em obras e em fazeres
diversos que se apresentam em seu entorno. (MÖNDINGER, 2012, p. 40)

Segundo o autor a arte pode assumir diferentes papéis no repertório e na


construção de saberes artístico-culturais e experienciais dos indivíduos. De tal
modo ressaltando a importâncias da aprendizagem por meio da experimentação,
reflexão, dialogo e aspectos que envolvam conceitos estéticos, cognitivos e criativos.
De certa maneira na tentativa de que os estudantes possam compreender
que o ponto de partida é sempre analisar todas as possibilidades existentes, e
então, chegarem a uma resposta para as suas inquietudes. Posto isso, as diferentes
linguagens artísticas são capazes de proporcionarem vários estímulos ligados a
criatividade. Logo, sabendo que o sujeito criativo é capaz de propor novos enun-
ciados para solucionarem diversos e possíveis problemas. Ressalta-se nesse sentindo
a importância do papel que as artes desenvolvem nos estudantes.
246
Assim cada vez mais o ensino da Arte nas escolas tem sido primordial para
estimular os estudantes a serem autônomos e criativos. Isso só se torna possível,
quando a aprendizagem contempla um processo de mudança dialogando novos
espaços, e motivando os estudantes na busca de seus interesses.
Barbosa (1991), aponta que:
Sabemos que a arte na escola não tem como objetivo formar artistas, como
a matemática não tem como objetivo formar matemático, embora artistas,
matemáticos e escritores devam ser igualmente bem-vindos numa sociedade
desenvolvida. O que a arte na escola principalmente pretende é formar o
conhecedor, fruidor, decodificador da obra de arte. (BARBOSA, 1991, p. 32)

O que se faz necessário a conscientização da importância em desenvolverem


esse tipo de trabalho no processo de ensino da disciplina de Arte nas escolas, e
assim estimular a aprendizagem dos estudantes de forma mais criativa.
Nesse sentido as propostas das atividades realizadas durante as aulas nas
turmas de terceiros anos do ensino médio na escola Carlos Irigaray Filho foram
pensadas e desenvolvidas de maneira que pudessem contemplar algumas áreas das
linguagens artísticas, especificamente a linguagem visual.
Contudo a linguagem representada por meio da arte visual se torna mais compacta
e papável aos olhos do observador, sendo uma ferramenta de cunho formador de opiniões
acerca dos acontecimentos, pois a mesma consegue transmitir as sensações visuais ao homem.
Em análise a citação abaixo pode-se notar tais característi-
cas na fala de Möndinger (2012):
Basta olhar mais atentamente para o mundo à nossa volta para perceber o
quanto, e cada vez mais, recebemos informações visualmente: TV (aberta,
a cabo, digital) internet, cinema, outdoors, revistas, jornais, e entre outros...
nos últimos anos, também se aceleram a disponibilidade de ferramentas,
com custos cada vez mais baixos, para produção e captação de imagens:
câmeras digitais de vários formatos, até inclusas nos aparelhos celulares;
filmadoras que permitem produzir vídeos e imagens variadas, auxiliados
ou não por programas de edições disponíveis na internet; impressoras,
fotocopiadoras, entre outros equipamentos. (MÖNDINGER, 2012, p. 55)

Entende-se que as imagens são fontes formadoras de opiniões, ainda mais


no contexto atual no qual vivencia-se a “Democratização da imagem”, e com isso a
proliferação dessas imagens tende a alcançarem números significativos de grupos
sociais. De tal modo a facilitar a exposição das mesmas.
247
Além disso, as várias ferramentas existentes hoje no mercado de consumo contri-
buí para a propagação e vinculação dessas imagens em diferenciados meios visuais. Esse
acesso facilitado a essas ferramentas tem sido um aparato no processo da democrati-
zação das imagens que a cada dia se tornam mais acessíveis a todo e qualquer público.
Essa abordagem revela a importância de trabalhar as diferentes interpretações
que uma imagem é capaz de revelar. Reforçando a necessidade de um ensino de
arte organizado a partir de pressupostos que utilizem mecanismos didáticos que
possam contribuir, e inserir os estudantes com mais conhecimentos e conscien-
tização nesse mundo de imagens.
Nesse sentido podemos destacar as inúmeras contribuições feitas por Bar-
bosa (1996), que em sua fala justifica a importância da leitura das imagens para
o ensino na disciplina de arte:
Temos que alfabetizar para a leitura da imagem. Através da leitura
das obras de artes plásticas estaremos preparando a criança para a
decodificação da gramática visual, da imagem fixa e, através da leitura
do cinema e da televisão, a prepararemos para aprender a gramática
da imagem em movimento. (BARBOSA, 1996, p. 34)

Nessa linha de raciocínio vale ressaltar que é fundamental a elaboração de


exercícios relacionados a aprendizagem da interpretação visual, enriquecendo o
repertório interpretativo dos estudantes, e atribuindo-lhes sentido as imagens de
diferentes modalidades da linguagem visual. Bem como as imagens que vinculam
em diferentes meios da comunicação digital, ou não, e que são apresentados por
meio das mais variadas ferramentas de comunicação existentes na atualidade.
Contemporaneamente a educação está vivenciando um processo de acesso
ainda maior em relação as produções visuais. Durante a pandemia da Covid-19,
o novo “normal”, tem se apresentado como uma alternativa para minimizar a
contaminação da doença, sendo possível observar que há significativamente uma
crescente busca por ferramentas midiáticas na disciplina de artes.
Enfim, a arte tem colaborado significativamente com o aumento do consumo
do uso das tecnologias, e também o uso dos recursos de mídias sociais, plataformas
e sites onde circulam diariamente inúmeras informações visuais.

RESULTADOS DA PESQUISA

A proposta de atividade foi realizada com duas turmas de terceiros anos do


ensino médio da Escola Estadual Carlos Irigaray Filho Alto Taquari-MT no ano de
248
dois mil e vinte um. Para apresentar propostas diferenciadas no ensino da disciplina de
Arte Visual no momento de isolamento social, visto que as aulas estavam acontecendo
por meio dos recursos digitais e ferramentas tecnológicas no formato de aulas on-line.
Neste ponto, a intermediação dos professores e interação entre eles e os estu-
dantes aconteciam via classroom, google meet e whatsapp. Vivenciando o momento
atual no cenário pandêmico, as novas práticas e as mudanças no processo educativo
as aulas passaram a acontecer de maneira atípica aos modelos dos anos anteriores.
Sendo assim, afim de contextualizar teoria à prática foi realizado uma interven-
ção Arte na Pandemia e Arte Contemporânea. Visando propor algumas atividades
dinâmicas e prazerosas, no intuito de estimular a busca, o gosto e a apreciação dos
estudantes pelas linguagens da arte visual, utilizando metodologias diversificadas
como por exemplo (música, vídeos, slides, produção visual, leitura de imagens e textos.

RELATOS DE EXPERIÊNCIAS

As atividades em si contemplavam despertarem a visão crítica dos estudantes, e


a leitura visual das obras de artes desse período. Introduzindo o tema Arte Contempo-
rânea, e também apresentando alguns artistas plásticos que fazem parte desse contexto.
No primeiro momento em uma das etapas de realizações das atividades foram
apresentados aos estudantes slides que traziam questionamentos dos impactos da
pandemia na arte e na cultura. Portanto refletindo sobre a amplitude e a dimensão
que a arte consegue alcançar mesmo diante desse cenário de isolamento social.
Com os eventos artísticos proibidos, museus e galerias de artes fechados, e
também a proibição de circulação de pessoas nesses tipos de eventos, foi preciso
que os artistas se reinventassem e recriassem meios de se conectarem com o público.
Diante dessa problemática diversos artistas se mostraram criativos e assertivos
na mudança de canais para manterem contato com as pessoas.
No entanto nesse novo cenário de crise mundial. Artistas do mundo inteiro tiveram
que se inovarem, ao passo que, cada vez mais continuassem conectados as pessoas por meio
das mídias socias. Dessa forma evitando perderem o contato e interação com o público.
Vivenciamos e apreciamos grandes produções artísticas durante esse período
de isolamento social, vários artistas aproveitaram o momento de crise para repro-
duzirem e demonstrarem seus talentos. E novamente apropriaram-se dos recursos
midiáticos para apresentarem suas produções artísticas.

249
Apesar do contexto histórico trazer inúmeras inseguranças e provocar
instabilidades emocionais, é possível observamos que a arte segue inovando
para aqueles que dela recorrem.
Ainda nessa etapa da atividade os estudantes puderam visualizar algumas
releituras de obras famosas de diferentes períodos artísticos e pintores, por meio
de releituras de obras famosas mundialmente, e que traziam em suas leituras temas
como a importância dos cuidados. Como o uso das máscaras faciais, e ou, o caso
de algumas dessas obras artísticas ironizarem as situações de pandemia. Nesta
etapa a atividade era somente a apreciação dessas releituras.
A segunda etapa da atividade era a observação de duas imagens apresentadas
no slide a eles. Seguindo a etapa da atividade a primeira imagem trazia uma reflexão
sobre a corrida pela vacina contra a doença Covid-19. Uma vez que, a segunda
imagem retratava ao dia em que não seria mais preciso utilizarmos máscaras de
proteção contra a contaminação pela doença. Os estudantes fizeram suas análises,
e falaram sobre o que conseguiram interpretar ao observar essas imagens.
Feito os apontamentos de cada estudante foi possível concluir que a Arte mesmo em
momentos de pandemia corona vírus, manteve-se presente em nossas vidas. Mostrando
que a arte é fundamental para desenvolver diferentes habilidades nos seres humanos.
Concluindo a etapa da atividade de análise das imagens apresentadas aos estudan-
tes, deu início a atividade de apreciação de escuta e analise da letra da música “A Cura tá
no Coração” composta pelo cantor e compositor Gabriel o Pensador em 2.020. A letra
da música aborda vários temas como por exemplo: a empatia, a solidariedade, e como
tema enfoque a questão do amor e a união para com o próximo e entre outros temas.
Após escutarem a música foi apresentado aos estudantes algumas perguntas
que eles deveriam responder sobre a composição. E assim refletirem sobre a letra da
canção respondendo, e apresentando suas respostas aos colegas de sala e professora.
As próximas atividades os estudantes leram o material apostilado, Arte em
Tempos de Pandemia compreendendo um pouco mais sobre temas abordados por
artistas de períodos diferentes que representaram outras pandemias na história da
humanidade, e, também entenderem as características e artistas contemporâneos.
Posterior a leitura do material apostilado foi apresentado aos estudantes um vídeo da
obra do artista contemporâneo Banksy intitulada de “Quem Vira o Jogo”(2020), retratando
a gratidão britânica pelos profissionais da saúde durante a crise pandêmica da Covid-19.
Esse mural retrata a imagem de um menino brincando com um boneco de
uma enfermeira como super-heroína, e não os bonecos de super heróis das his-
250
tórias em quadrinhos retratados na imagem, e que estão esquecidos pela criança
dentro de uma cesta de brinquedos.
Nesta atividade os estudantes tiveram um Desafio de Arte sobre a obra apresen-
tada, sendo preciso assistir ao vídeo com muita atenção e responderem as questões que
abordavam a temática do desenho no mural. Os estudantes chegaram a várias conclusões
e entre elas, a mais interessante foi que a Arte pode assumir diferentes papéis na sociedade.
Dos mais diversos posicionamentos a Arte pode se tornar uma língua impor-
tante na busca pelo engajamento social, mostrando por meio das suas diferentes
linguagens o talento dos artistas para transmitir seus pensamentos, suas emoções, e
suas atitudes para protestarem ou até mesmo denunciarem o que julgam pertinente.
Finalizando a proposta desta atividade, os estudantes realizaram uma produção
visual por meio do desenho em homenagem aos profissionais da saúde.
Foram apresentadas outras obras desenvolvidas durante o período de pande-
mia no país, e em outros lugares do mundo, para aumentar o repertório visual dos
estudantes. Algumas dessas artes foram feitas em grafite que compõem grandes
murais pintados em paredes de prédios em diversos centros urbanos. Ao passo em
que os estudantes foram conhecendo essas obras puderam compreender as caracte-
rísticas que compõem as técnicas, características e linguagens artísticas desse período.

CONSIDERAÇÕES

As ações realizadas em salas de aulas tiveram resultados excelentes, pois a utili-


zação de estratégias diferenciadas, e aplicadas por meio de metodologias diversificadas
favoreceram uma melhor compreensão do conteúdo trabalhado durante as atividades.
Perceptivelmente houve um engajamento por parte dos estudantes na rea-
lização das atividades. Nesse sentido a participação oral foi fator determinante na
construção conjunta do conhecimento. Uma vez que, comprovadamente a partici-
pação oral em salas de aulas potencializam a formação do conhecimento coletivo.
Entender o processo artístico e o contexto cultural de cada período histórico
nem sempre foi uma preocupação no ensino da disciplina de Arte nas escolas.
Visto que, durante muitos anos o ensino dessa disciplina resumia-se em atividades
repetitivas e pouco criativas. Seguindo um modelo tradicional de ensino, e que
nada favorece o processo criativo e crítico dos estudantes.
Essas condições, no entanto, fazem com que uma boa parcela de estudantes acredite
que aprender, e estudar Arte seja meramente pintarem cópias de desenhos impressos, imagens
que quase sempre são entregues a eles durante a carga horária letiva anual dessa disciplina.
251
Por conta disso geralmente os estudantes formam concepções distorcidas
sobre o ensino e a aprendizagem na disciplina de Arte. Desta maneira estabe-
lecendo visões que geram conceitos errôneos sobre o fazer pedagógico de Arte.
Portanto esses conceitos quase sempre são concebidos por conta da representativi-
dade dos professores, que oram são convocados para serem produtores, ou ora reproduto-
res da formação alienada, esvaziadas de conteúdo que privilegiam atividades pragmáticas.
No entanto, desenvolver propostas de atividades diferenciadas, e que utilizam
de várias linguagens artísticas favorece a desconstrução dessa imagem equivocada
sobre a concepção na construção do ensino da disciplina.
A proposta das atividades desenvolvidas nas turmas dos terceiros anos do
ensino médio na escola estadual Carlos Irigaray Filho é justamente desmitificar
essa visão que as aulas de Artes sejam meramente uma aula recreativa.
Cabe ressaltar a importância de buscar metodologias diversificadas, e que essas
estejam sempre embasadas as teorias que contextualizem as práticas desenvolvidas durante
as aulas. Nesse sentido façamos uma reflexão sobre a abordagem triangular de Barbosa,
pois essa metodologia busca contextualizar, apreciar e desenvolver o fazer artístico.
Tendo em vista a proposta da abordagem de Barbosa, logo podemos afirmar
que o ensino dessa disciplina precisa identificar as quatro linguagens existentes
das artes, ressignificando o processo de ensino e aprendizagem em questão.
Para Barbosa a “Arte promove a autoconfiança, o olhar apurado aos senti-
mentos do ser humano, incentiva a criatividade e potencializa diversas habilidades.”

REFERÊNCIAS
BARBOSA, Ana Mae. A imagem no ensino da Arte. 2. ed. São Paulo: Perspectiva, 1996.
________. A imagem no ensino da arte: anos oitenta e novos tempos. São Paulo: Perspectiva; Porto Alegre:
Fundação IOCHPE, 1991.
MARTINS, Mirian Celeste e outros. Didática no ensino de arte: Língua do Mundo, Poetizar, Fruir e
Conhecer Arte. São Paulo: FID, 1998. Mediação: provocações estéticas. Universidade Estadual Paulista,
Instituto de Artes. Pós-graduação, vol. 1, 2005.
MÖDINGER, Carlos Roberto e outros. Artes Visuais, dança, música e teatro: práticas pedagógicas e
colaboradores docentes. 1ª edição, Erechim: Edelbra, 2012.
BUORO, Anamelia Bueno. Olhos que pintam: a leitura da imagem e o ensino da arte. São Paulo: Cortez, 2002.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários á prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996.
HERNÁNDEZ, Fernando. Cultura Visual, mudança educativa e projeto de trabalho. Porto Alegre:
Artmed, 2000.

252
FORMAÇÃO CONTINUADA DOCENTE: O CASO DO
COLÉGIO MUNICIPAL LENILTO DE JESUS CANELA

Antonieta da Paixão Santos104

INTRODUÇÃO

Nas últimas décadas temos assistidos a educação como caminho certo para
o desenvolvimento do País, e dentro dela a formação docente como sendo fator
relevante para a preparação de cidadãos conscientes. Muitos estudos veem sendo
realizados sobre o desenvolvimento deste profissional, trabalhos como este pro-
piciam com que docentes reflitam sobre sua práxis.
Nessa perspectiva, a formação continuada possibilita ao docente a construção de
conhecimentos específicos da profissão, se tornando assim mais capacitados a atender as
exigências estabelecidas pela sociedade, exigências estas que se modificam temporalmente,
tendo então o(a) educador(a) estar num processo permanente atualizado e formação.
Com isso pretende-se aprofundar conhecimentos sobre o processo de for-
mação continuada docente no Brasil e a consequente ação pedagógica. Para tanto
se fez-se necessário investigar, efetivamente, a formação continuada docente do
fundamental l, no Colégio Municipal Lenilto de Jesus Canela, em Igrapiúna-BA.
Portanto, deve-se promover o desenvolvimento do educador, orientando-o e
assistindo-o na organização de um ambiente escolar e no processo ensino-aprendiza-
gem significativo para o educando. Assim, permitirá uma aprendizagem significativa
discente. A educação brasileira ainda é fruto de uma tradição quinhentista que
apresenta em sua estrutura, ações que não condizem com as exigências da educação
contemporânea. Portanto, é importante salientar que todas as ações, gestos, olhares,
omissões, tomadas de decisões entre outras questões vivenciadas no contexto escolar,
podem interferir significativamente na trajetória dos alunos. (ESTEVE 2001).
Nessa perspectiva, o ponto de partida desse trabalho foi o recolhimento de
dados que confirmam as hipóteses levantadas, uma vez que as práticas pedagógicas
ministradas na escola refletem diretamente no rendimento escolar dos discentes.
Apresenta também as fundamentações sobre essas correntes através de uma
reflexão dialética; a prática pedagógica e a questão da formação do educador, em
Pós-graduada em Gestão de Pessoas (FAZAG). Secretária de Educação e professora (SME / Igrapiúna – BA).
104

CV: http://lattes.cnpq.br/4047230028482253
253
razão disso colocam-se a questão da aprendizagem docente que enquanto sujeito
singular possui uma história de vida. É nesse sentido que Souza (2008) nos diz
que ser professor, hoje, significa não somente ensinar determinados conteúdos, mas
sobretudo um ser educador comprometido com as transformações da sociedade,
oportunizando aos alunos o exercício dos direitos básicos à cidadania.

A FORMAÇÃO CONTINUADA

A formação continuada docente é um engenho existencial no desencadeamento


de mudança em sua práxis. A tarefa docente é extremamente importante e complexa:
deve estar sempre se preparado para exercê-la, ou melhor, considerando que a prá-
tica é dinâmica e aberta, e que o(a) docente não se propõe a realizar uma atividade
mecânica e repetitiva, deve estar constantemente se qualificando para exercê-la.
Além disso, o processo de formação continua docente possibilita ter cons-
ciência das limitações da ação pedagógica bem como a busca de autonomia. A
formação continuada apresenta-se então como processo inacabado próprio da
formação de um profissional às exigências do exercício de sua profissão.
Assim sendo, o educador que dominar uma série de saberes, capacidades e
habilidades que fizeram competente no exercício da docência pode ser conside-
rado um profissional. Nesse sentido, afirma Sacistón (1995, p. 63): “Entendemos
por profissionalização a afirmação do que é especifico na ação docente, isto é o
conjunto de comportamentos, conhecimentos, destrezas, atitudes e valores que
constituem a especificidade de ser professor.”
Tal qualificação, portanto não se dá necessariamente a priori: pode se dar
antes (reflexão para ação), durante (reflexão na ação) e após a prática (reflexão
sobre a ação e sobre a reflexão para e na ação). Mesmo quem saiu dos melhores
centros universitários sabe que não domina tudo o que a atividade educativa exige,
tendo necessidade de aprimoramento continuo.
Por isso, perceber-se a si próprio com conhecimento sobre a própria prática, é
imprescindível para se adquirir novas formas de perceber, conhecer e agir em outras pers-
pectivas. O desenvolvimento de um projeto pessoal é lento, exige uma espera adequada e
este é o elemento decisivo para a construção do projeto coletivo. Entretanto, a natureza das
práticas individuais é sempre social, por isso pode ser considerada como fundamento do
saber, pois é situada num determinado espaço e num tempo historicamente determinado.
Na sociedade atual, as exigências que se impõe a profissão docente e as fun-
ções que lhe são atribuídas dependem de fatores de natureza política, institucional,
254
bem como de aspectos sociais e culturais, os quais exigem um redimensionamento
do trabalho docente. Isso implica, conforme argumentos de Sà-Chaves (2001)
(...) reflexão pessoal e coletiva, em quanto processo e instrumento de
conscientização progressiva, de desenvolvimento continuado e partilhado,
de persistência na investigação constante, enquanto fonte de informes,
de crenças, de algum modo sublime, na hipótese de o homem poder
vir a descobrir-se e a encontrar-se com sua própria humildade. (p. 89).

Desenvolver uma formação que dê conta de responder as questões exis-


tenciais inerentes à própria profissão suscita uma formação integral em que as
dimensões do pensar, do sentir, do existir e do conhecer sejam consideradas. Assim
sendo, concordo com Pimenta (1999); o trabalho com a formação do professor
é complexo, sobre tudo porque é inacabado, é uma constituição singular que vai
tomando forma no processo da própria existência.
Tal mudança não ocorre somente pela incorporação de novos paradigmas de
comportamentos da sociedade. Nesse sentido o docente, por sua própria condição
profissional na sociedade capitalista (na contemporaneidade) não tem encontrado
possibilidade para “ampliar seu conhecimento” e, portanto, superar a semi-formação
essa necessidade apontada pelo professor, expressar que todos educadores brasilei-
ros comprometido com a verdadeira cidadania almejam e luta para concretiza-la.
Todavia, enquanto sonho e meta, o projeto que se pretende lograr, que depende
muito dos fatores políticos, econômicos, sócias e de corajosas decisões que necessita se
fazer parte da consciência publica dos responsáveis pelo destino da nossa nação para
unirmos força rumo à concretização desse sonho que é uma permanente necessidade.
Esses são os princípios que precisam ser conscientizados por todos os políticos, a
fim de que se possa ir rumo a “liberdade e a felicidade de todos”. Assim sendo esses são
os princípios que precisam reger as políticas públicas educacionais de formação docente,
que se preparam para a cidadania, contra o individualismo imperante e acirrado.
Em se tratando dos aspectos administrativos, vale esclarecer que a orga-
nização federativa garante que cada sistema de ensino é competente e livre para
construir, com a respectiva comunidade escolar, seu plano de ampliação do ensino
fundamental, como também é responsável por desenvolver estudos com vistas à
democratização do debate, o qual deve envolver, portanto, todos os seguimentos
interessados em assegurar o padrão de qualidade do processo ensino-aprendizagem.
Dessa forma, é importante que o(a) docente tenha consciência de que seu
conhecimento é limitado e que seu papel é muito mais de levar o aluno a refletir
255
sobre as informações obtidas, do que simplesmente incorporá-las, tendo como
ponto de apoio o conhecimento da realidade em que se encontram inseridos.
Foi nesse contexto que surgiu a necessidade de se pensar na formação coletiva
dos docentes, de modo que todos os elementos constitutivos de um programa de ensino
e de aprendizagem fossem contemplados, desde sua concepção até sua materialização
na dinâmica da prática pedagógica. Para tanto, a relação entre teoria e prática como
fundamento básico da formação continuada de docente possa visualizar o processo de
ensino e aprendizagem através da construção e da materialização da prática pedagógica.
Vale ressaltar que segundo Garcia (1995, p. 184 a 187) é fundamental destacar
dois princípios sinalizados como orientadores para formação docente: A seguir;
a) necessidade de ligar o processo de formação de professores com o
desenvolvimento organizacional da escola, para que os problemas e as
referências do meio seja o contexto de aprendizagens dos professores em
formação, abrindo possibilidades, também, de transformação da escola.
b) Relevância da integração teoria-prática na formação do professor.
Assim salienta-se que tanto conhecimento prático quanto o conheci-
mento teórico devem integrar-se num currículo orientado para ação.

Nessa perspectiva a prática deve ser o núcleo do currículo, sendo fonte de


conhecimento, na medida em que o profissional em formação analisa e reflete “na
e sobre a própria ação” (SCHON, 1992) tendo em vista a teorização, pois deverá
ser capaz de gerar conhecimentos e valorizar os conhecimentos desenvolvidos
por outros. “(...) É verdade que o conhecimento pedagógico do conteúdo a ser
ensinado não pode ser separado do conhecimento desse conteúdo. Entretanto,
conhecer bem a matéria que se deve ensinar é apenas uma condição suficiente,
do conhecimento pedagógico,” (TARDIF, 2002, p. 120)
Mesmo sendo divergentes e contraditórias as concepções sobre a relação
educação e sociedade, educação e produção da existência, educação e atividade
econômica, ou que tipo de formação deve ter o profissional da educação, todas elas
partilham de algumas questões indubitáveis a esta condição humana que constitui
a razão de ser de toda instituição escolar.
Vale enfatizar que a formação continuada docente, via de regra, é tarefa ao
mesmo tempo árdua e aprazível. A dinâmica e o movimento que cerca o conceito
de profissionalização docente leva a refletir sobre três determinantes, assim ana-
lisado por Behrens (1996, p. 105):

256
primeiro o contexto pedagógico, que envolve as atividades da prática
docente no dia-a-dia, espaço onde determinam as funções do professor.
Segundo o contexto profissional dos professores, que estabelecem com
o grupo o conjunto de valores, ideologias, crenças, rotinas, enfim, o
comportamento profissional. E, por último, o contexto sociocultural
que aponta valoras e conteúdo a serem trabalhados como um todo.

Assim sendo, a formação continuada docente, além de outros, além de


objetivos propostos, propõe, novas tecnologias colocando os profissionais em
contato com as discussões teóricas e atuais, visando contribuir para as mudanças
que fazem urgentes para a melhoria da ação pedagógica na escola. Com relação
a esse aspecto. Arroyo comenta que o caráter antecedente de toda qualificação
é aceito como algo inquestionável, não apenas quando pensamos na formação
docente, como também quando estes pensam na educação dos seus alunos.
Não há formulas pronta a serem produzidas. É preciso criar soluções adequa-
das a cada realidade. Mesmo porque mudar a prática pedagógica não se resume a
uma tarefa técnica de implementação de novos modelos. Mudar a prática significa
reconhecer limites e deficiências no próprio trabalho. É lançar olhares questionadores
e de estranhamentos para que não sejam tão familiares que parecem verdadeiras,
evidentes ou impossíveis de serem modificadas. Significa alterar valores, hábitos,
ações e atitudes que podem constituir parte da nossa identidade pessoal e profissional.
Transformar a práxis implica também o enfrentamento inevitável e delicado de
conflitos entre os participantes (professor, aluno pais e a hierarquia do sistema escolar).
Sendo assim estas práticas podem gerar desestabilidade na estrutura de poder, riscos de
novos conflitos e desgaste e frustração para comunidade escolar. Essas dificuldades por si só
tornam compreensíveis atitudes de resistência à mudança por parte de muitos professores,
cujos resultados nos alunos são incertos, pois o(a) docente encontra obstáculo para realizar
suas atividades, sendo atropelado pelas urgências e necessidades do cotidiano escolar.

FORMAÇÃO INICIAL DOCENTE E SUAS MODIFICAÇÕES

Nas últimas décadas, pesquisas realizadas têm demonstrado, com nitidez,


a falência da formação dos educadores para uma atuação competente nas escolas
públicas do ensino fundamental e médio.
A formação das antigas escolas normais preparou de certa forma, professores
primários e de pré-escola para atuarem numa Escola Pública que era frequentada
basicamente por alunos das camadas média e média-alta da sociedade brasileira.
257
Isto significa afirmar que a competência das normalistas esteve condicio-
nada ás necessidade e expectativas de um tipo de Escola, num momento histórico
determinado, ou seja, “as escolas normais tiveram, pois, seu período áureo de
funcionamento e cumpriram, de fato, um papel importante: formaram com com-
petência o professor primário que iria trabalhar nas escolas públicas e particulares,
até mesmo nas escolas isoladas do interior, o que ocorria em muitos estados, com
os recém-formados que ingressavam no magistério” (FUSARI, 1990, p. 47).
A partir do meado dos anos 70, com a transformação da escola normal
(Curso Normal) em umas das habilitações (Magistério) do ensino técnico de 2ª
Grau – Lei Nº. 5.692/71 -, a formação dos educadores para pré-escola é para as
quatro primeiras séries da Escola fundamental entrou em decadência absoluta, na
medida em que não conseguiu formar, de maneira competente, profissionais para
trabalharem bem com a realidade das escolas públicas em geral.
Na perspectiva de transformar a Habilitação para o Magistério e superar seu
fracasso, uma das medidas concretas foi a criação, pelo MEC, em 1982, o nível
nacional, dos (CEFAMs) Centros de Formação para o Magistério, que tem como
principal objetivo formar um bom docente, tendo em vista as reais necessidades
das escolas públicas do ensino fundamental.
O CEFAM, pode-se dizer, não vai resolver o problema da formação dos docentes
brasileiros; entretanto, trata-se de uma experiência que, juntamente com outras medidas
para a valorização do Magistério, poderá apresentar resultados interessantes no futuro.
Vale ressaltar que a Associação nacional Pró-formação dos educadores –
Anfope -, que significa mais uma proposta concreta para a formação do profissional
de educação escolar. Numa outra linha, mas na mesma direção - formar melhor
o docente para as primeiras séries do ensino fundamental -, deve-se registrar o
Projeto MEC/PUC que teve como principal produto a publicação da Coleção
Magistério segundo grau (São Paulo, Cortez, 1989).
Em síntese, pode se afirmar que a formação regular docente, nos Cursos de
Habilitação para o Magistério, CEFAM, Pedagogia e Licenciatura, apesar de tantos
esforços (por parte dos educadores), ainda está conseguindo resultados quantitativos e
qualitativos que alterem, para melhor, a realidade da formação dos profissionais do ensino.
Isto justifica a necessidade de uma política para a Formação dos Educadores em Serviço,
como medida concreta para aperfeiçoar, de forma permanente, a competência docente.
Enfatizar a formação docente é função da escola, que ao longo do
século vem desempenhando sobre a importância do rompimento de paradig-
258
mas, apontando caminhos que possam contribuir efetivamente para uma prá-
tica construtiva e transformadora.

FORMAÇÃO DE PROFISSIONAIS, FINALIDADE E


FUNDAMENTOS

A Nova LDB, ao estabelecer a finalidade e os fundamentos da formação pro-


fissional, utiliza a expressão formação de profissionais da educação e, mais adiante,
refere-se à formação de docente. Para melhor compreensão dessas expressões, uti-
lizaremos o entendimento de Freitas (1992), que nos parece apropriado para isso.
Segundo esse autor, profissional da educação é “aquele que foi preparado para
desempenhar determinadas relações no interior da escola ou fora dela, onde o tratado
com o trabalho pedagógico ocupa posição de destaque, constituindo mesmo o núcleo
central de sua formação”. Portanto, não há identificação de “trabalho pedagógico com
docência, (...) Sendo este um dos aspectos da atuação do profissional da educação”.
No entanto, ainda de acordo com Freitas (1992), há que se reafirmar que a
formação profissional da educação é a sua formação como educador, com ênfase
na atuação docente. Este entendimento nos permite melhor ajuizar sobre as dis-
posições legais referentes à matéria objeto deste capítulo.
A lei coloca como finalidade da formação dos profissionais da educação “aten-
der aos objetivos dos diferentes níveis e modalidades de ensino e às características
de cada fase de desenvolvimento do educando”. Assim, criar condições e meios
para se atingir os objetivos da educação básica é a razão de ser dos profissionais
da educação. Formação com tal finalidade terá por fundamentos, segundo a Lei,
“a associação entre teorias e práticas, inclusive mediante capacitação em serviço” e
o aproveitamento da formação e experiência anteriores”, adquiridas, estas, não só
em instituições de ensino, mas também em outras atividades”, que não do ensino
Esses profissionais têm suas funções ainda mal compreendidas e mal deli-
mitadas. Com poucos parceiros e frequentemente sem apoio na unidade escolar. É
preciso vencer os medos, as inseguranças, o isolamento para ser conquistado o seu
espaço. É preciso que o(a) docente crie o seu espaço coletivo para que seja criada
proposta de ensino para responder aos desafios de sua escola, assim sendo estão
construindo sua qualificação profissional. Para tanto é preciso investir na formação
continuada desses profissionais, na medida em que ele é estimulador e articulador
desse processo, por isso é fundamental que ele tenha esse espaço coletivo para cons-
trução e troca de experiências, para que possa apresentar também as suas dificuldades
259
inerentes à sua nova função e possa partilhar angustia, refletir sobre sua prática...
E crescer profissionalmente para exercer de forma plena sua função de educador.
Quanto A Lei de Diretrizes e Bases da educação Nacional da diferentes
títulos aos profissionais da Educação escolar: professores, docentes e profissionais
do ensino. O que pode estar por trás dessa nomenclatura do ponto de vista do
legislador e dos que atua no campo educacional? No meio social professor é todo
que ensina uma Ciência, uma arte, uma técnica, uma disciplina.
É um termo bastante abrangente e equivalente a mestre, este mais utilizado no
período imperial, por força da Constituição de 1824 e da Lei de 15 de novembro de 1827,
que chamava mestre todos aqueles que exerciam uma “cátedra”. A LDB refere-se aqueles
profissionais que tem cargos efetivos de professores, chamando-os de docentes. A escola
por sua vez, zelando pela valorização Profissional de educação escolar tem a incumbência
inalienável de envolver os docentes no seu processo de construção ou gestão escolar.
O artigo 13 da LDB é reservado exclusivamente aos docentes. Pelo menos
são seis incumbências dos docentes, isto é, dos profissionais de ensino que têm
cargos ou funções especificas ou especializadas na escola.
A primeira incumbência magisterial, previsto no inciso I do artigo 13
da LDB, determina que cada docente deva participar da elaboração
da proposta pedagógica do estabelecimento de ensino.
A segunda incumbência magisterial, previsto no inciso II do artigo 13
da LDB, determina que cada docente deva elaborar e cumprir plano de
trabalho, segundo a proposta pedagógica do estabelecimento de ensino.
A terceira incumbência magisterial, previsto no inciso III do artigo
13 da LDB, prescreve que cabe ao docente zelar pela aprendizagem
dos alunos. Aqui, decerto, reforçar, no processo ensino-aprendizagem,
a aprendizagem como princípio do bom fazer pedagógico.
A quarta incumbência magisterial, previsto no inciso IV do artigo 13
da LDB, diz que cada docente deve estabelecer estratégias de recu-
peração para os alunos de menor rendimento. Mas uma vez, o aluno,
nesse inciso, é o foco da atenção do processo ensino-aprendizagem.
A quinta incumbência magisterial, previsto no inciso V do artigo
13 da LDB, traz a seguinte responsabilidade para os que atuam no
magistério: cada docente deve ministrar os dias letivos e horas-aula
estabelecidos, além de participar integralmente dos períodos dedicado
ao planejamento, a avaliação e ao desenvolvimento profissional. Um
dia é considerado letivo quando, no ambiente escolar, há a presença
do aluno e do professor, o que quer dizer a garantia da presença física
do professor e a permanência do aluno na escola.
260
A sexta incumbência magisterial, previsto no inciso VI do artigo 13
da LDB, define a responsabilidade que cada docente tem de cola-
borar com as atividades de articulação da escola com as famílias e a
comunidade. Os desafios do professor passam a ser desafios também
dos pais e da comunidade. Se o aluno deixa de aprender, a família em
tempo hábil deve ser comunicada da situação do aluno, não apenas
em se tratando das informações de avaliação escolar, mas de sua
motivação, curiosidade e interesse de aprender, para que, em regime
de corresponsabilidade educacional, participe do esforço docente de
recuperar o aluno e não permitir sua retenção no processo educacional.

A institucionalização da formação contínua docente, consignados na Lei de Bases


do sistema Educativo Português em 1986 revela a preocupação política com o aperfei-
çoamento e a atualização das competências profissionais nos vários domínios da atividade
educativa, quer em nível do estabelecimento de ensino, quer da sala de aula, tendo como
objetivo central a melhoria da qualidade do ensino, quer e das aprendizagens dos alunos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Acredita-se que vivemos um momento de mudança caracterizado pela


valorização da profissão docente. Acredita-se que, como o refere Esteve (1991),
vivemos um período em que o(a) docente será encorajado a usar a sua inspiração
e a sua criatividade como um profissional capaz de gerar autonomamente. Entre
os saberes e os princípios de ontológicos de referência sem necessidade de subor-
dinação a princípios impostos do exterior. A retórica oficial aponta, também, no
sentido da autonomia, da integridade e da responsabilidade do corpo docente.
Assim, as novas concepções de formação continuada dão ao docente uma visão
maior do papel de sua profissão na sociedade, eliminando à ideia equivocada de que
todos podem exercer a profissão de educador, já que está se apresenta de forma complexa.
Dentro dessa perspectiva nota-se que a formação continuada é um fator
essencial para uma constante ressignificação da prática pedagógica, não anulando
a importância da formação inicial, que deve servir de base para o desenvolvimento
da vida profissional, profissional este que deve dominar uma série de saberes que
o torna competente no exercício da docência.
Para tanto chegamos à conclui-se de que os educadores tem a consciência
de que é necessário a formação continuada para os profissionais que visualiza
possibilidades no desenvolvimento de habilidades necessárias a profissionalização
docente. Os quais tem o desejo de dar o melhor de si em busca da aprendizagem
261
significativa. Pois, para manter qualidade de ensino, é preciso criar uma cadeia
coerente de aperfeiçoamento cujo a base é a Formação Continuada.

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LUCKESI, Cipriano Carlos, Avaliação da aprendizagem escolar, Ed. Cortez, 16ª edição, São Paulo, 2005.

262
DÊ UM VOTO DE CONFIANÇA NO JOVEM!

Emiliane Santana Gomes105

INTRODUÇÃO

Este é um relato de experiência exitosa que tem como tema O cidadão crí-
tico, agente e consciente da sociedade em que vive: o lugar do jovem em nosso país. O
trabalho se encontra no formato de sequência didática, doravante SD, e tem como
proposta a formação cidadã por meio de uma simulação de campanha partidária.
Por isso, a SD vem promover uma abordagem reflexiva acerca da participação
do jovem estudante como cidadão consciente, crítico e agente da sociedade em
que vive e apresentar aos alunos diversas linguagens (da persuasão à multimoda-
lidade), enriquecendo a rotina escolar e estimulando a leitura e a produção dos
textos escrito, oral e imagético. Para tanto, ancoramo-nos em alguns referenciais
teóricos e documentos oficiais de educação a fim de pontuar a relevância do tema
que aqui abordamos. De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais, os
PCN, de Língua Portuguesa, o sujeito precisa “Tornar-se um pouco cidadão do
mundo sem perder suas raízes, participando ativamente da vida de sua nação e de
sua comunidade” (BRASIL,1998, p.16); nós, professores, necessitamos “Educar
fundado nos quatro pilares: aprender a conhecer, a fazer, a viver com os outros e
a ser” (BRASIL, 1998, p. 17); de modo geral,
O exercício da cidadania, que pressupõe a participação política de todos
na definição de rumos que serão assumidos pela nação e que se expressa
não apenas na escolha de representantes políticos e governantes, mas
também, na participação em movimentos sociais, no envolvimento
com temas e questões da nação e em todos os níveis da vida cotidiana,
é prática pouco desenvolvida entre nós (BRASIL,1998, p. 20-21).

Sendo assim, torna-se imprescindível a compreensão da “cidadania como


participação social e política” bem como necessariamente um “exercício de direitos
e deveres políticos, civis e sociais, adotando”, cotidianamente, “atitudes de solida-
riedade, cooperação e repúdio às injustiças, respeitando o outro e exigindo para si o
mesmo respeito” (BRASIL, 1998, p. 55). No que tange às Orientações Curriculares

105
Doutoranda em Letras (UFES). Professora (SEC – BA e SME / Itamaraju – BA).
CV: http://lattes.cnpq.br/9394256697668934
263
para o Ensino Médio: Linguagens, Códigos e suas Tecnologias (OCENEM), a
“escola deve abrir-se para os múltiplos letramentos” (BRASIL, 2006, p. 29). Ade-
mais, os conteúdos factuais precisam se dar a partir da identificação dos direitos
do jovem e do seu reconhecimento por ele próprio como cidadão; também da
identificação de características próprias dos gêneros discursivos abordados para
entender, conforme a Base Nacional Comum Curricular, as “relações de intertex-
tualidade e interdiscursividade que permitam a identificação e compreensão dos
diferentes posicionamentos e/ou perspectivas em jogo, do papel da paráfrase e de
produções como as paródias e a estilizações” (BRASIL, 2016, p. 71). Além disso, é
necessário saber lidar de forma “crítica, significativa, reflexiva e ética” com relação
às TDIC, “nas diversas práticas sociais (incluindo as escolares), para se comunicar
por meio das diferentes linguagens e mídias, produzir conhecimentos, resolver
problemas e desenvolver projetos autorais e coletivos” (BRASIL, 2016, p. 63).
Os conteúdos conceituais se dão a partir da relação entre cidadania, direitos
e deveres e do conceito de cidadania. Já os procedimentais, por meio da leitura de
textos que influenciam e circulam socialmente em época de campanhas partidárias,
levando-se em consideração a pesquisa, em grupo, sistematizada sobre o assunto
e a análise da opinião do que a comunidade jovem pensa sobre o direito ao voto e
acerca da perspectiva de mudança. É também através dos “usos e funções da música
em seus contextos de produção e circulação, relacionando as práticas musicais às
diferentes dimensões da vida social, cultural, política, histórica, econômica, esté-
tica e ética” (BRASIL, 2016, p. 207) que se forma cidadãos críticos. Por isso, um
dos gêneros propostos na SD é o jingle, breve, porém, muito rico quanto a essas
dimensões. Por fim, os conteúdos atitudinais que se dão pelo trabalho em grupo:
colaboração e participação; a elaboração de argumentos e sugestões que contri-
buam para a ampliação dos direitos e dos deveres do jovem como cidadão crítico.
De antemão, esclarecemos que serão necessários alguns recursos para a apli-
cação das SD, tais como data show, lousa, piloto, apagador, notebook; caixa de som;
microfone; textos impressos, cartolina; caderno, borracha, lápis, caneta, tesoura.
Como segmento educacional, podemos considerar como público-alvo, a depender
da maturidade, turmas dos anos finais do ensino fundamental e do ensino médio.
No que tange à estrutura deste relato de experiência, o trabalho foi desen-
volvido no formato de SD constituído em etapas, sendo cada uma destas apre-
sentadas conforme os passos de cada atividade desenvolvida e um gabarito, para
cada etapa ou passo, a fim de dar suporte sobre a temática para o professor e para
os alunos. Esse formato se encontra no Regulamento Práticas para Compartilhar
264
do Programa Ciência na Escola (doravante, PCE)106, vinculado à Secretaria de
Educação do Estado da Bahia. Este regulamento orienta para a produção de SD
como meio para uma aprendizagem significativa, sob o ponto de vista de Delia
Lerner (2002), que apresenta diversas estratégias para planejar atividades em sala
de aula. Segundo a autora, a SD tem como único propósito, o aprendizado de
um tema podendo resultar em uma avaliação do processo ou da aprendizagem.
Já para Zaballa (1998, p. 18), as SD são atividades ordenadas e articuladas para
a “realização de certos objetivos educacionais, que têm um princípio e um fim
conhecidos tanto pelos professores quanto pelos estudantes”. Vamos à SD!

PRIMEIRA ETAPA: EXPLORAÇÃO DO CONCEITO

Esta etapa se divide em três passos. Primeiramente, os jovens devem inter-


vir com ações que evidenciam como eles podem mudar os rumos de uma nação,
partindo da sua realidade local. Logo, o professor deve investigar o que a turma
sabe sobre política, numa conversa informal em classe para, em seguida, regis-
trar os conhecimentos prévios. Tais registros podem ser feitos pelo professor na
lousa, em papel ou por meio digital, a fim de utilizá-los posteriormente. Dessa
forma, o docente demonstra conhecer seus alunos, além de verificar o modo de
pensar destes sobre o assunto em pauta e contribuir para a melhoria do ser em
formação. Essa proposta pode ser realizada “através de perguntas, fazendo-lhe
novas e desafiadoras questões, na busca de alternativas para uma ação educativa
voltada para a autonomia moral e intelectual” (HOFFMANN, 2000, p. 34). Para
tanto, é necessário dispor, inicialmente, na lousa ou por meio do projetor, algumas
perguntas, tais como: O que é política? Onde ela se faz presente? Qual o espaço
do jovem na esfera política? O jovem exerce o seu papel de cidadão político no
espaço escolar? Conhece o grêmio estudantil? Como se encontra a gestão política
em nossa cidade, nosso estado e país? Como a juventude pode contribuir para
mudar, para melhor, a situação política da sociedade em que vivem – no que tange
à educação e cultura, por exemplo – como indivíduos ainda em formação? Como
participar para intervir politicamente de forma positiva no município, no que diz
respeito à educação, a partir do interior da instituição escolar?
E, para melhor problematizar o assunto, o docente deve, também, lançar as
seguintes imagens no data show para as primeiras explorações:

Além do contato com o Regulamento Práticas para Compartilhar, (da editora Atina Educação em parceria com o
106

PCE), fizemos o estudo de um material relevante denominado Autoria Docente e Produção de Sequências Didáticas,
também da editora Atina.
265
Figura 1 – Charge sobre o Brasil107. Figura 2 – Charge sobre o voto108.

Com base nas charges expostas, o docente deverá questionar os estudantes


sobre o gênero: se o conhecem, se o identificam em sua característica como gênero
textual que apresenta conteúdo do cotidiano; se percebem o jogo estabelecido
pela linguagem e pelas imagens, como aspecto de texto humorístico; se notam a
expressão de dúvida que aparece em ambos os textos; dentre outras inferências
possíveis. Consoante Ferreira e Vieira, “A charge é um texto que circula com a
finalidade de criticar, usando como estratégia o humor. Trata-se de função social.
Todo texto, ao circular socialmente, procura cumprir uma função” (FERREIRA;
VIEIRA, 2013, p. 17). Assim, o gênero é um dos mais eficazes para explicar sobre
o discurso presente nas falas de representantes políticos durante as campanhas
eleitorais e em outros momentos que as precedem; além de possibilitar a discussão,
entre os estudantes, acerca da reação dos eleitores frente às mensagens explíci-
tas e implícitas nesses textos.
No segundo passo desta etapa, o docente deve apresentar a atividade e discutir
acerca do tema política, por meio das seguintes tarefas: exibição de slides, con-
tendo orientações e exemplos de textos que circulam no meio social em referência
à temática, tais como notícias, charges, slogans, discursos, jingles e outros gêneros
corriqueiros; discussão sobre fatos presentes em nosso meio social e político, tendo
como sugestão de leitura o livro digital “Bahia, Brasil” (endereço disponível no
gabarito desta etapa), pelo docente e pelo aluno, mais especificamente os temas
e subtemas, respectivamente: Espaço – economia e sociedade; Ambiente – lixo,

107
Figura 1 – Charge. Brasil: um país de quase todos. Disponível em: <https://nahoradoamargo.blogspot.com.br/2011/10/
brasil-um-pais-de-quase-todos.html>. Acesso em: 20 jul. 2022.
108
Figura 2 – Charge. Vota Brasil. Disponível em: <https://novacharges.wordpress.com/tag/vota-brasil/>. Acesso em: 20
jul. 2022.
266
saúde, água e energia; Cultura – cultura, direitos humanos e divisão dos poderes;
e socialização das experiências vivenciadas pelos alunos. Para melhor aprovei-
tamento dos tempos de aula, os alunos terão de providenciar e ler, extraclasse,
material complementar que se trata dos assuntos referidos para ser analisado no
próximo passo dessa etapa em sala.
No terceiro e último passo, o professor deverá dividir a turma em gru-
pos de quatro ou de cinco integrantes (a depender da demanda) para que seja
realizada a discussão, dentro de cada grupo de trabalho, acerca do tema, com
base nas pesquisas109 e leituras realizadas extraclasse e nas explicações dadas
pelo docente em aula anterior.
Como gabarito desta primeira etapa, sugerimos que o aluno descreva oral-
mente como ele pode contribuir, por meios viáveis, para a melhoria do país nos
âmbitos educacional e cultural, por exemplo, partindo do local onde vive, sendo
conhecedor dos seus direitos e deveres como cidadão político, agente e capaz de
transformar a sociedade. Além disso, o indivíduo pode verificar exemplos dos
gêneros e suportes textuais que circulam em nosso espaço em época de campanhas
partidárias, observando a linguagem utilizada e a mensagem presente nestes textos.
Sendo assim, elencamos alguns estudos110.
Ademais, o docente pode contextualizar o assunto da SD, situando a sua
turma em tempo real sobre alguns direitos e deveres do cidadão, traçando um
paralelo entre o momento em que vivemos e as abordagens encontradas nos
materiais supracitados acerca do nosso meio social e político e fazer os seguintes
questionamentos: Será que sabemos, realmente, quais são os nossos direitos e
deveres eleitorais como cidadão na sociedade civil organizada contemporânea que
se intitula democrática? Quais as mensagens (subliminares) presentes nos textos
que circulam socialmente em épocas de eleições?

109
Material complementar: Sobre estudos eleitorais, pág. 09-28. (Estudos eleitorais. Disponível em:<http://www.tse.jus.
br/hotsites/catalogo-publicacoes/pdf/ estudos_ eleitorais / estudos_eleitorias_v11-n2.pdf>. Acesso em: 27 jul. 2022).
110 
Conheça alguns exemplos de direitos e deveres do cidadão. Disponível em: <http://www.brasil.gov.br/esporte/2013/04/
conheca-alguns-exemplos-de-direitos-e-deveres-do-cidadao>. Acesso em: 21 jul. 2022. Livro Bahia, Brasil: Espaço,
Ambiente e Cultura. Disponível em: <http://www.geodinamica.com.br/bahia-digital/>. Acesso em: 21 jul. 2022. Os 8
jingles mais marcantes de campanhas presidenciais no Brasil. Disponível em: <http: // super. abril. com. br / blog / super-
listas /os-8-jingles-mais-marcantes-de campanhas-presidenciais-no-brasil/>. Acesso em: 21 jul. 2022. Charge: Depois do
Tim Maia. Disponível em:<http://cardosinho.blog.br/variedades/charge-9/>. Acesso em: 21 jul. 2022. A importância dos
direitos políticos. Disponível em: <http:// www. tse. jus. br/institucional/escola-judiciaria-eleitoral/revistas-da-eje/artigos /
revista - eletronica-eje -n. -2 - ano- 4/ a- importancia- dos- direitos- politicos>. Acesso em: 21 jul. 2022. Mensagem Subli-
minar. Disponível em: <http://brasilescola.uol.com.br/curiosidades/mensagem-subliminar.htm>. Acesso em: 21 jul. 2022.
267
SEGUNDA ETAPA: INVESTIGAÇÃO DO CONCEITO

Nesta etapa, o professor deve propor o seguinte problema na lousa para os


alunos responderem: Como o jovem pode mudar os rumos de uma nação? O primeiro
passo é a pesquisa propriamente. A partir daqui os estudantes poderão, em grupo,
fazer anotações sobre o que é política e como se dá o processo eleitoral durante a
campanha partidária que ocorre na sociedade e nas redes, por meio do uso de fontes
acessadas anteriormente extraclasse, tais como: sites/internet, podendo consultar o
artigo “Cultura política, ideologia e comportamento eleitoral: alguns apontamentos
teóricos sobre o caso brasileiro”, de Julian Borba – para melhor contextualizar os
fatos presentes em nosso país, partindo do geral para o local, e se informar como
se encontra o Brasil no cenário político; o texto “Consciência política” – para um
melhor discernimento sobre o tema em questão e entendimento do que é ser um
indivíduo político; periódicos; programas da mídia televisiva divulgados na rede;
análise dos depoimentos de moradores do município em que vivem – bem como
de moradores de outras localidades –, via rede social, enquetes aos estudantes da
sua escola, entrevistas à comunidade local (principalmente ao grupo jovem), den-
tre outras. A leitura dos materiais sugeridos é imprescindível para embasamento
teórico e aquisição de informações necessárias a fim de que alunos participem com
mais segurança da apresentação final e dos debates para avaliação, entre os grupos e
mediados pelo docente, ampliando os seus conhecimentos. Os materiais de pesquisa
podem ser levados para a aula em formato impresso, gravado, manuscrito, etc.
Consoante Antônio Carlos Gil, “A pesquisa é desenvolvida mediante o
concurso dos conhecimentos disponíveis e a utilização cuidadosa de métodos,
técnicas e outros procedimentos científicos” (1999, p. 45). Por isso, resolvemos,
por meio da técnica da entrevista111, investigar a respeito da temática abordada
na SD, a partir da aplicação do roteiro aberto no qual o entrevistador introduz o
tema sobre política, e o entrevistado fica à vontade para falar a respeito.
Como gabarito desta segunda etapa, entendemos que esse passo da pesquisa é
muito importante porque, conforme a Constituição Federal Título VIII, da Ordem
Social, capítulo III, da Educação, da Cultura e do Desporto, Seção I, da Educação,
art. 205. “A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida
e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da
pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania”. Além disso, vimos no o Art. 206

111
Escolhemos este método de entrevista porque pode ser realizado por meio de conversa informacional, a qual facilita a
interação entre o entrevistador e o grupo entrevistado que, nesse caso, podem ser moradores jovens da comunidade local.
268
que “O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios”, dentre outros “II -
liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber”112.
Sendo assim, é importante reconhecer o espaço escolar como um dos pontos
de apoio à pesquisa e à ampliação do conhecimento, uma vez que este último chega
até nós de modo tão rápido e ininterrupto, a contar das diversas formas pelas quais
nos comunicamos e interagimos num mundo cada vez mais conectado. Para tal,
torna-se necessário fazer da escola um espaço real para a discussão de assuntos os
quais muitas vezes não são percebidos pela comunidade escolar, como é o caso do
tema política. Por isso, tornam-se relevantes atividades de pesquisa como a entre-
vista, dentre outras, visto que os alunos buscam trazer opiniões de outros jovens
de fora para dentro do espaço escolar. Estes últimos às vezes estudam em outras
escolas ou muitas vezes se encontram fora delas. Vejamos algumas propostas de
materiais para essa etapa em tela disponíveis no rodapé113.
Quanto ao segundo passo desta etapa, propomos síntese e análise de dados.
Depois de levantar as informações, os alunos devem, em grupo, discuti-las, compa-
rá-las e inseri-las em seus discursos escritos/orais os quais serão apresentados por
meio dos gêneros textuais (associados a outros, a saber: jingle, slogan, etc.) em diversos
suportes, integrantes do produto final. A participação do docente – nesse processo de
seleção e organização das ideias – é primordial, pois, é o momento em que se fazem
intervenções teóricas e práticas tais como tratamento dos dados obtidos e organi-
zação das informações selecionadas as quais são relevantes e orientam a formação
crítica do alunado. As ideias que surgem com as pesquisas são muito importantes
para as discussões entre os grupos, uma vez que confirmam ou reformulam o que
estes sabiam acerca do tema, ampliando os seus conhecimentos. Os registros são
complementares e podem ser feitos pelos grupos, por escrito, com base nos conteúdos
presentes nos materiais sugeridos no primeiro passo desta etapa de investigação.
Como gabarito deste segundo passo, eis alguns conceitos importantes que
podem auxiliar na organização dos dados obtidos:
a. Democracia → “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de
representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”.
112
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em 12 jul. 2022.
113 
Artigo sobre comportamento eleitoral. Disponível em: <http:// <www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pi-
d=S0104-62762005000100006>. Acesso em: 28 jul. 2022. Vídeo sobre consciência política. Disponível em: http:// bairros.
net.br/video/consciencia-politica-informe-cidadania/F7VK8e509wk/nova-londrina/ariquemes/rondonia>. Acesso em:
28 jul. 2022; Periódico de pesquisa sobre opinião pública e conjuntura política. Disponível em: <http://www.opiniaopu-
blica.ufmg.br/emdebate/nov_2009.pdf>. Acesso em: 28 jul. 2022; Vídeo sobre a possibilidade de o jovem mudar o país.
Disponível em: <http:// www.ovh. net.br/video/w-jovem-pode-mudar-a-cara-da-politica-no-brasilg-01/txqeRsEvQi4//
novauniao/ rondonia>. Acesso em: 28 jul. 2022.
269
Definição conforme o parágrafo único do artigo 1º da Constituição
Brasileira de 1988114.

b. Discurso político → “O discurso é um meio de expor problemas, oferecer


sugestões e conquistar o apoio ou a contribuição da população para as
ações a serem tomadas em benefício de todos”. Definição dada por Dr.
Carlos Matheus, artigos opinião pública115.

c. Direitos políticos → “ou direitos de cidadania é o conjunto dos direitos


atribuídos ao cidadão, que lhe permite [...] ter efetiva participação e
influência nas atividades de governo”116

d. Campanha eleitoral → “[...] designa todo o período que um partido,


candidato ou postulante a uma candidatura dedica à promoção de sua
legenda, candidatura ou postulação. [...] só começa após designados os
candidatos pela convenção partidária”117.

e. Slogan → “Um slogan já é uma frase de fácil memorização usada em


contexto político, religioso ou comercial como uma expressão repetitiva
de uma ideia ou propósito. Um slogan político geralmente expressa um
objetivo ou alvo [...]”118.

f. Jingle político → “qualquer canção com um propósito político e publici-


tário. Este objetivo pode ser tanto conseguir apoio e votos a um político
[...] quanto para criticar e diminuir apoio e votos a outro político [...]
adversário”119.
O terceiro passo cabe à formulação de hipóteses. Assim, a partir do mate-
rial coletado e analisado, dos registros de ideias e das discussões realizadas em
grupo, é importante que os estudantes pensem, nesse momento da atividade, em
respostas possíveis sobre “Como o jovem pode mudar os rumos políticos de uma
nação?”, como por exemplo, agir em parceria com os colegas com a comunidade
escolar para cobrar das autoridades competentes os direitos que lhes cabem como
cidadãos críticos e conscientes do meio social em que vivem. Além disso, devem
pensar também de que modo vão expor e transmitir as respostas possíveis para
a resolução do problema proposto, lembrando-se do recurso da argumentação.
114 
Disponível em: z <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 12 jul. 2022.
115
Disponível em: <http://carlosmatheus.org/o-discurso-politico/>. Acesso em: 12 jul. 2022.
116
Disponível em: <http://www.tse.jus.br/eleitor/glossario/>. Acesso em: 12 jul. 2022.
117
Disponível em:< http://www.tse.jus.br/eleitor/glossario/>. Acesso em: 12 jul. 2022.
118
Disponível em:<http://www.ufrgs. br/alcar/encontros- nacionais - 1/ encontros - nacionais /7o-encontro-2009-1/?b_star-
t:int=100>. Acesso em: 12 jul. 2022.
119
Disponível em: <revistas.pucsp.br/index.php/aurora/article/download/4576/3169>. Acesso em: 12 jul. 2022.
270
Como gabarito deste terceiro passo, sugerimos para hipóteses
apresentadas pelos estudantes:
a. Como estudante atual/futuro eleitor consciente, nós devemos conhecer
os nossos direitos como tal;

b. Podemos nos imaginar como possíveis candidatos/as às futuras eleições,


agindo como um grupo que poderá intervir no município, estado e/ou
país, de modo que traga benefícios à população de modo geral;

c. Somos jovens e cidadãos agentes e responsáveis pelas transformações


positivas que ocorrem em nosso meio social, por isso, a mudança deve
partir de nós de tal modo que possamos nos sentir engajados nesta tarefa.

TERCEIRA ETAPA: SOLUÇÃO DE PROBLEMAS

Como primeiro passo, para a apresentação dos resultados, os alunos devem


utilizar os elementos da criatividade e do envolvimento para que gêneros e suportes
diversos enriqueçam a apresentação do produto final da SD (conclusões, a saber:
vídeos, fotos, santinhos, jingles, cartazes, discursos, faixas, banners, dentre outros),
que devem ser produzidos em classe ou extraclasse.
Como gabarito deste passo, elencamos alguns gêneros discursivos e suportes
respectivamente: propagandas publicitária e política, discurso, slogan político, jingle,
paródia, peça teatral, entrevista, reportagem, charge; slide, faixa, cartaz ou banner,
panfleto, santinho, adesivo, placa, camiseta, boné, bandeira.
As apresentações de cunho dramático podem ser feitas, de maneira criativa,
com figurinos e personagens diversos e cenários montados, tais como: sala de estar
com tevê; residência de um eleitor; estúdio de rádio, de um jornal televisivo ou de
um programa de tevê; palanque; rua; escola; dentre outros. Por isso, ainda como
gabarito, sugerimos que o docente e os grupos assistam alguns vídeos120 como
exemplo para organização do espaço e para a apresentação dos gêneros e suportes
que auxiliarão no modo de expor o trabalho final.
No segundo passo desta terceira etapa, considerando o momento de exposição
(gênero dramático), os grupos apresentam os seus trabalhos para os demais convi-

120
Teatro sobre política. Disponível em: <https: //www.youtube. com/watch?v=VVJ6w_qsK6w>. Acesso em: 12 jul. 2022.
Projeto escolar contra a corrupção. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=EcQaMmFlZRk>. Acesso em: 12
jul. 2022. Os melhores jingles políticos do Brasil. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=kanU7nyAQYg>.
Acesso em: 12 jul. 2022. Escola faz simulação de eleição. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=P-RcG-
D3wpUg>. Acesso em: 12 jul. 2022.
271
dados (colegas de turmas e comunidade escolar, a depender do espaço escolhido e
dos recursos a serem utilizados), sendo que cada grupo tem um tempo específico
para exposição das ideias e propostas que venham colocar para os expectadores
sobre a possibilidade de o jovem mudar os rumos do país.
Como gabarito deste segundo passo, os grupos: (i) devem expor, oralmente
e por meio dos recursos e materiais disponíveis, durante as apresentações, possí-
veis soluções que demonstrem a capacidade de os jovens mudarem os rumos do
país; fazendo uso da linguagem persuasiva – por ser uma prática comunicativa
que tem como resultado o convencimento – muito utilizada no discurso político,
de tal modo que convençam o público (demais colegas e comunidade escolar)
sobre a possibilidade da melhoria da nossa sociedade; e (ii) apresentar as suas
propostas de mudança em modo de simulação de campanha eleitoral, junto aos
demais participantes dos grupos.
Para tanto, sugerimos o acesso de materiais que fornecem dicas e sugestões
de debates políticos, sobre a maneira de falar em público, bem como o exemplo
de algumas falas e comportamentos apropriados para candidatos que almejam
vencer em suas campanhas, dentre outras. Tais propostas prepararão melhor os
grupos para apresentarem os seus trabalhos e os auxiliarão na produção de frases
e textos apropriados para os seus discursos e debates, ajudando na formulação dos
argumentos. Sendo assim, é necessário que acessem materiais de apoio121.
Para o terceiro passo, podemos notar as hipóteses e os argumentos formu-
lados anteriormente, bem como as possíveis intervenções que podem ser feitas
por jovens estudantes quanto à política nacional, durante e/ou após cada apre-
sentação, verificando a sensibilidade aflorada em cada indivíduo ao participar
da socialização dos trabalhos, aceitando ou comprovando as falas ou refutando
os questionamentos que surgirem.
Como gabarito para esse passo. Sabe-se que o conhecimento é algo que se
dá a partir do que foi aprendido anteriormente. Por isso, é interessante considerar
o que os nossos alunos sabem e pensam acerca da situação política e social na qual
vivemos durante os últimos tempos, antes de definirmos os passos das próximas
aprendizagens. Consoante Ausubel (1968), “de todos os fatores que influenciam
a aprendizagem, o mais importante consiste no que o aluno já sabe. Investigue-se

Curso de expressão verbal. Disponível em: <http://reinaldopolito.com.br/categoria/comunicacao-politica-10>. Acesso


121

em: 13 jul. 2022. Vídeo Como argumentar sem discutir. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=3aUlnrN-
xmQ4>. Acesso em: 13 jul. 2022. Vídeo Simulação. Debates. Presidentes. Disponível em: <https://www.youtube.com/
watch?v=vPsDOoMMv3s>. Acesso em: 13 jul. 2022.
272
isso e ensine-se ao aluno de uma forma consequente” (AUSUBEL, 1968, Apud.
LEITE, 2008, p. 35). Por isso, torna-se imprescindível mobilizar ações nas insti-
tuições escolares que promovam o debate e a circulação de informações a respeito
de um assunto que se faz presente no contexto de quem frequenta a escolar, na
tentativa de solucionar problemas cotidianamente. Para melhor organizarem as
apresentações e as discussões que se fizerem presentes nas encenações dos grupos,
o docente e a turma podem acessar o tema “Política e democracia são temas para
a escola” e o “Guia do eleitor para garantir educação inovadora”122.

QUARTA ETAPA: AVALIAÇÃO

Como primeiro passo, dentre os critérios para avaliar, o professor observará


em cada grupo: organização de ideias, criatividade, funcionalidade e comunicação
das propostas apresentadas. Para tanto, analisará o envolvimento e concentração
dos grupos na atividade; divisão de tarefas; superação dos problemas e construção
de proposta coletiva; colaboração entre si e superação das diferenças; envolvi-
mento de todos na atividade; aceitação de ideias diferentes das suas; negociação
de propostas individuais e construção de visão coletiva que represente o grupo
todo; desenvolvimento de argumentação para defesa de proposta; exposição das
propostas em tempo determinado; utilização de materiais de registros para sin-
tetizar as propostas; e treinamento da comunicação para apresentação.
Para os critérios de avaliação, como gabarito, sugerimos o acesso dos links
adicionados em nota de referência123. Assim, acreditamos que o docente possa avaliar
com eficiência os seus alunos no processo ensino/aprendizagem por meio desta SD.
Para o segundo passo, é interessante notar nesta etapa, também, a “possi-
bilidade” de os jovens resolverem um problema que atinge a todos, e não apenas
a eles próprios. E como as escolas atendem a esse público e se preocupam com a
formação deste, devem, por isso, orientá-lo para possíveis participações sociais a
partir do interior da instituição. Isso pode ocorrer através de simulação de mani-
festações nos espaços da escola, exposição de textos escritos e imagéticos para
chamarem a atenção do público para os fatos sociais, demonstrando que as “lutas”
são realizadas em grupo e de maneira pacífica com base em argumentos verbais.

122
Disponíveis em: <http://porvir.org/politica-democracia-tambem-sao-temas-para-escola/>; e <http://porvir.org/guia-
-eleitor-educacao-inovadora/20140924/>. Ambos com acesso em: 16 jul. 2022.
123
Material de apoio disponível em: <https://issuu.com/atinaedu/docs/sd_como_transformar_sonhos_em_reali>; e <https://
issuu.com/atinaedu/docs/sd_vamos_transformar_sonhos_em_real>. Acesso em: 27 jul. 2022.
273
Como proposta de gabarito, em consonância com as palavras de Castro e
Vasconcellos (2007), “O nascimento da democracia de massas vem precedido pela
conquista de direitos (CASTRO; VASCONCELLOS, 2007, p. 81). E, “No dizer
de Nobre (2004), o estabelecimento de direitos e a criação de uma cultura política
democrática estão na base da construção do Estado de Bem-estar Social (NOBRE,
2004, apud CASTRO; VASCONCELLOS, 2007, p. 81). Por essa forma, os jovens
são desafiados a partir do espaço escolar, a verificar suas hipóteses na tentativa de
chegar a conclusões sobre a proposta inicial de agentes transformadores do seu
meio social, de modo que possam argumentar e comprovar as suas expectativas
de cidadãos críticos e conscientes no âmbito de uma política democrática e cons-
tituída por estudantes esperançosos e atuantes.
Para o terceiro passo, os alunos explicam oralmente, por meio do debate regrado
mediado pelo professor e realizado pelos representantes de cada grupo e com a par-
ticipação dos demais colegas, o que aprenderam e o que ainda precisam aprender a
aprender. Essa tarefa será realizada com base nas pesquisas prévias e nas discussões
feitas em grupo no início desta sequência, nos registros complementares realizados
durante o processo para a apresentação dos produtos finais e depois da exposição
destes. Podemos assim verificar o papel de cidadãos conscientes e de indivíduos
capazes de construírem os seus próprios conhecimentos, além de demonstrarem que
ressignificam os saberes escolares e sociais de modo a associá-los para a construção
do conhecimento e fortalecimento das aprendizagens, apoiando-se, criticamente, na
leitura do mundo, nas informações próprias e nas que se destinam ao outro.
Torna-se relevante destacar que para a realização do debate de caráter avalia-
tivo, o professor precisa demonstrar imparcialidade ao conduzir esta tarefa e estar
com suas devidas anotações registradas acerca dos conhecimentos prévios elencados
no início desta SD, comparando-os com os registros escritos complementares dos
próprios alunos os quais surgiram durante a investigação do problema. Além disso,
torna-se fundamental propor, nessa fase da SD, uma autoavaliação oral para toda
a turma, retomando as questões para a verificação da aprendizagem elencadas na
primeira etapa, a de exploração do conceito, a fim de que a classe possa averiguar
se todos conseguiram atingir o que foi proposto inicialmente nesta SD: refletir
acerca da sua participação como cidadãos conscientes, críticos e agentes transfor-
madores da sociedade em que vivem.
Como gabarito para este terceiro passo, podemos realizar a autoavaliação
para os estudantes, confirmando os resultados do processo com base nas questões
iniciais: Sabemos o que é política e onde ela se faz presente? Sabemos qual o espaço
274
do jovem na esfera política? Exercemos o papel de jovens cidadãos políticos no
espaço escolar? Conhecemos o grêmio estudantil? Descrevemos como se encontra
a gestão política em nossa cidade, nosso estado e país? Explicamos como nós, jovens,
devemos contribuir para mudar, para melhor, a situação política da sociedade em que
vivemos – no que tange à educação e cultura – como indivíduos ainda em formação?
Como participarmos para intervir politicamente de forma positiva em relação a
isso, principalmente a partir do interior da instituição escolar?. Consoante Luckesi,
Necessitamos de cuidado com a teoria que orienta nossas práticas edu-
cativas, assim como de cuidados específicos com os atos de avaliar que,
por si, em diagnosticar e renegociar permanentemente o melhor caminho
para o desenvolvimento, o melhor caminho para a vida. Por conseguinte,
a avaliação da aprendizagem escolar não implica aprovação ou reprovação
do educando, mas sim, orientação permanente para o seu desenvolvimento,
tendo em vista tornar-se o que seu SER pede (LUCKESI, 2000, p. 7).

E nessa perspectiva de redimensionamento das aprendizagens, notamos a


importância da escola como um ambiente o qual precisa colaborar na construção
dos saberes a partir do que os próprios estudantes trazem consigo. Assim, nessa
etapa, também é necessário que o indivíduo compare o que sabia sobre o tema o
cidadão crítico, agente e consciente da sociedade em que vive: o lugar do jovem em nosso
país – retomando com o professor os registros iniciais sobre o assunto e os seus
registros como aluno-pesquisador –, com o que aprendeu após os estudos realizados
em grupo, sendo agente do seu próprio conhecimento, mediante os letramentos
múltiplos. Observamos, ainda, através da exposição de todos os trabalhos as diver-
sas hipóteses e opiniões acerca da questão do lugar do jovem em nossa sociedade,
sendo este um ser capaz de suscitar mudanças inimagináveis.

CONSIDERAÇÕES

Esperamos com este relato de experiência divulgar e proporcionar aos envolvidos


no processo educativo, sobretudo professores e alunos, a importância de se trabalhar
o protagonismo juvenil na escola por meio de atividades como as que propomos na
SD. Esse formato possibilita o trabalho com diferentes gêneros discursivos, muitas
vezes, nunca estudados pelos alunos e até mesmo trabalhado pelo professor por não
estarem presentes nos livros didáticos ou simplesmente pela falta de conscientização
da comunidade escolar a respeito da importância das discussões que envolvam ques-
tões políticas as quais muitas vezes não são discutidas na escola. Salientamos que tal
proposta de atividade pode ser aplicada em instituições que são escassas quanto aos
275
materiais utilizados visto que importa o conteúdo que será abordado e repassado
durante essa atividade, tornando-os os sujeitos mais cidadãos e mais críticos.
Sendo assim, é preciso saber explicar como se dá a formação do cidadão crítico
e consciente dos seus direitos e deveres e descrever a produção e a divulgação de
textos escritos/orais/imagéticos que circulam socialmente em época de campanha
partidária; ressignificar os saberes escolares e sociais de modo a associá-los para a
construção do conhecimento e fortalecimento das aprendizagens – por meio da
participação ativa na apresentação dos trabalhos finais e nos debates –, apoiando-se,
criticamente, na leitura do mundo, nas informações próprias e nas que se destinam
ao outro; e ainda ler e produzir diferentes textos, fazendo uso das diferentes lingua-
gens (persuasão, música, fotografia, propaganda, etc.), enriquecendo a rotina escolar.

REFERÊNCIAS
BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais: terceiro e quarto ciclos
do ensino fundamental: introdução aos parâmetros curriculares nacionais / Secretaria de Educação Funda-
mental. – Brasília: MEC/SEF, 1998.
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youtube.com/watch?v=EcQaMmFlZRk>. Acesso em: 10 ago. 2022.

Nota: este trabalho foi realizado inicialmente com uma turma do ensino médio em 2014. Em 2016, fui
convidada a participar do Programa Ciência na Escola para produzir em formato de SD alguma atividade
exitosa que tenha dado certo na escola. A SD intitulada Dê um voto de confiança no/a jovem! foi submetida
ao PCE, em plataforma on-line. Nesta ocasião, o trabalho foi selecionado e anunciado em evento em Salvador
para integrar o livro Práticas para Compartilhar – Volume 2 [ainda no prelo] do programa Ciência na Escola
da Secretaria de Educação da Bahia em parceria com a editora Atina, que reúne atividades de diversos pro-
fessores. Até o momento apenas foi emitido um certificado, parabenizando-me pela proposta e avisando da
seleção. A editora Atina objetiva reconhecer experiências educativas inovadoras da rede pública de ensino do
estado da Bahia, conhecidas como atividades exitosas, das quais tive a honra em participar da edição 2016/17.

278
A EDUCAÇÃO DE PESSOAS COM DEFICIÊNCIA
NO BRASIL

Helleni Priscille de Souza Ferreira Oliveira124


Élida Soares de Santana Alves125
Damaris Oliveira Souto126
Fernanda Marcelo Souza127
Laila Lopes da Silva Ribeiro128
Charlesson dos Santos Ribeiro Lopes129
Léia Silva Santos130
André Luiz Alcântara Brandão131

INTRODUÇÃO

O direito das pessoas com deficiência e de todos os cidadãos à educação é


garantido constitucional no Brasil. A garantia de um ensino de qualidade é dever
de todos e implica, dentre outros fatores: a um redimensionamento das institui-
ções de ensino que consiste não somente na aceitação, valorização das diferenças,
respeito às singularidades linguísticas, mais a capacitação dos profissionais e
adaptação das estruturas físicas das escolas. Esta valorização se efetua pelo resgate
dos valores culturais, que fortalece identidades individuais e coletivas, bem como
pelo respeito ao aprendizado e construção.
A inclusão de pessoas com deficiência no contexto educacional, tem feito os
professores repensarem sobre suas concepções em relação ao ato de ensinar, consi-
derando a diversidade presente na sala de aula. Dessa forma, compete aos docentes

124
Mestra em Ensino e Relações Étnicas-Raciais (UFSB). Tradutora Intérprete de Libras – PROLIBRAS (IF Baiano).
CV: http://lattes.cnpq.br/0170774841922552
125
Mestra em Educação (UFRRJ). Docente EBTT do Atendimento Educacional Especializado (IF Baiano).
CV: http://lattes.cnpq.br/7236854215589810
126
Mestranda em Economia Regional e Políticas Públicas (UESC). Coordenação NAPNE (IF Baiano).
CV: http://lattes.cnpq.br/3136114193854328
127
Mestranda em Educação em Ciências e Matemática (UESC). Revisora de Texto Braille (IF Baiano).
CV: http://lattes.cnpq.br/6054329727163854
128
Especialista em Libras (FAEL) e Especialista em Educação Especial e Inclusiva (FAEL). Tradutora e intérprete de
Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS (IF Baiano). CV: http://lattes.cnpq.br/4664315257529687
129
Especialista em Libras (FAEL). Intérprete de Libras Educacional (UFRB) e Professor de Libras.
CV: http://lattes.cnpq.br/9438284949236009
130
Especialista em Libras (FAMESUL). Proficiente Libras–PROLIBRAS. Tradutora/Interprete de Libras (IF Baiano).
CV: http://lattes.cnpq.br/8873352745367684
131
Especialista em Ética e Filosofia (FINOM). Advogado sob o n° 54365 OAB/BA. Técnico em Assuntos Educacionais
(IF Baiano). CV: http://lattes.cnpq.br/3625323386735668
279
promoverem práticas e ferramentas educacionais que promovam a participação
equânime dos estudantes com deficiência no seu processo de aprendizagem.
Além disso, especialmente, às pessoas surdas, sua singularidade linguística e
cultural é desconhecida por grande parte dos educadores. Acredita-se que a presença
do do Tradutor/intérprete de Libras, por si só, já garante que a inclusão se efetive.
Este equívoco, resulta em grandes prejuízos na aprendizagem dos sujeitos surdos.
Além da presença do uso da Libras nas escolas, é necessário que as estratégias
de ensino como um todo, sejam elaboradas visando favorecer a aprendizagem,
respeitando e valorizando as questões linguísticas e culturais deste sujeito. Desse
modo, alcançaremos um modelo de educação feito para as pessoas surdas.
Dessa maneira, compete aos educadores buscar diferentes estratégias de ensino
em suas áreas de atuação, com vista a ampliar a qualidade do ensino de modo que
o educando com deficiência possa ser de fato incluído na sala de aula, e sobretudo
ter acesso ao conhecimento como os outros estudantes. Diante do exposto, este
trabalho tem por objetivo retratar a educação das pessoas com deficiência no Brasil
e compreender os fatores diferenciais que podem facilitar ou dificultar o processo
de escolarização de estudantes surdos na escola comum.

DESENVOLVIMENTO

Em uma sociedade em que a inclusão é uma pauta constante na manutenção


dos direitos das pessoas com deficiência – sejam elas surdas, ouvintes, cegas, e
das pessoas negras, brancas, índias, pesquisas com temáticas sobre a educação de
pessoas com deficiência na educação pública no Brasil, é primordial; não só para
na comunidade na qual ela está inserida, mas também a todos os indivíduos que
lutam para o desenvolvimento de uma comunidade, visto que construir resultados
sólidos na desestruturação do preconceito e exclusão, são temas que precisam ser
recorrentes na garantia de direitos, respeito e de igualdade social.
Assim, a Libras é uma abreviação da Língua Brasileira de Sinais e é reco-
nhecida como língua gestual das pessoas surdas. É utilizada pela comunidade
surda especialmente, como recurso linguístico norteador pedagógico que garante
a educação inclusiva nas escolas brasileiras.
De acordo com esta concepção, a língua de sinais, é uma língua de repre-
sentação imagética das experiências de saberes formalizadas pelos sinais e seus
significados. Os estudantes com essas vivências aprendem mais facilmente
assim como os estudantes não surdos (ouvintes) quando essas interpretações
280
dos significados do mundo estão em sua língua de comunicação, ou seja, Lín-
gua de Sinais. (QUADROS, 2013).
Além disso, é imprescindível mencionar que o grupo social de crianças
surdas que utilizam a língua de sinais (LIBRAS) tem o direito de manifestar
suas experiências e sentimentos em sua primeira língua (L1) e manifestar-se cul-
turalmente, para que possam se expressar em qualquer ambiente – formal e não
formal de educação. Além disso, usam a LIBRAS a fim de exteriorizar, através
de sua identidade cultural, condição de raça e língua em quaisquer ambientes na
sociedade de forma a serem visibilizados e respeitadas.
Por entendermos que tais proposições estruturais e sociais vêm reforçando,
ao longo dos tempos, a dupla desvantagem que esse alunado enfrenta no acesso
à escola, permanência e conclusão dos estudos no ensino público, principalmente
em cidades interioranas onde a educação é mais precarizada devido à falta de
investimento do poder público. Por isso, essa problemática motiva os pesquisa-
dores - a efetivar estudos que tem como premissas as problemáticas dos alunos
surdos no tocante da ausência da usualidade da língua Libras no processo de
escolarização nos espaços de formação.
Desta forma, como explica Monteiro (2006, p. 279), devido à sua condição de
surdez, as crianças desde muito novas conhecem a exclusão nos espaços sociais, ou
seja, em suas famílias e também nos espaços formais de ensino. Podemos destacar
algumas dessas problemáticas enfrentadas por esses indivíduos como, por exemplo,
não compreendem efetivamente a fala dos pais e irmãos, não serem estimulados a
todo tempo em uma língua “alfabética” como crianças ouvintes e serem visualizadas
muitas vezes como crianças agressivas, porque, ao tentarem se comunicar, emitem
sons altos, que os caracterizam como “inquietos”, “nervosos” e “doentes” Uma
cultura determinada pelo contexto sócio-histórico. Dessa forma, desde criança
somos empurrados pelos estigmas estrutural, que permeia as nossas relações socias.
No imaginário coletivo dos educadores o fracasso é produzido, predomi-
nantemente, por ‘culpa’ do aluno que, segundo muitos: é pouco inteligente, com
problemas de comportamento, defasado intelectualmente, é oriundo de famílias
muito pobres, desajustadas, e sem exemplos domésticos a serem seguidos, como
ideais de vida (CARVALHO, 2007, p. 124).
Diante dessa realidade e concordando com autor/autora, na maioria dos
casos, quando as crianças surdas ingressam na escola, são desafiados primeira-
mente a aprenderem a ler e escrever em português, mesmo sem nem mesmo
281
terem adquirido sua própria língua considerada materna, a língua de sinais. Além
disso, muitas também não foram ensinadas sobre igualdade racial e cultural, dessa
maneira, têm dificuldades para defenderem sua identidade enquanto sujeito
minoritário em um espaço excludente.
De acordo com esta Percepção, o conhecimento da trajetória educacional dos
surdos faz com que seja possível depreender mais sobre o processo de segregação
social ao qual muitos ainda são submetidos, sendo duplamente marginalizados: pela
sua condição auditiva e étnica. Por isso, este estudo também se refere às diferenças,
onde essas se tornam uma espécie de marca na vida dos sujeitos que as possuem;
marcas que, na maioria das vezes, os coloca em posição de desvantagem em relação
aos ditos “normais”, fazendo com o que os diferentes sejam vistos como inferiores
Nesse contexto, acentua-se ainda mais quando esses alunos surdos chegam à
escola com a idade avançada, adolescentes ou adultos e precisam lidar com situações
de preconceitos, bullying e chacotas. Escolas, predominantemente, de pessoas não
surdas, ou seja, ouvintes que desconhecem a Libras e geralmente desrespeitam sua
raça, sua cultura e sua identidade, impondo-lhes a uma padronização hegemônica
que dificulta a escolarização. Por conta disso, muitos alunos desistem antes de
concluírem o ensino básico. Dessa forma, desde criança somos empurrados pelo
racismo estrutural, que permeia as nossas relações socias, como assinala Silva (2000).
Nesse paralelo, esse processo dificulta a percepção, a construção e a valo-
rização de uma identidade étnico-racial diversificada, ao mesmo tempo que
fortalece a imposição de padrões á preestabelecidos. A linguagem é a forma do
ser humano interagir com outros sujeitos. No processo de comunicação entre
surdo e ouvinte é possível perceber que há diferenças significativas. “A visão
dicotômica centra-se na separação de teoria e da prática” dentro deste esquema,
corresponde aos ‘teóricos’ pensar, elaborar, refletir, planejar e, aos ‘práticos’ executar,
agir, fazer” (CANDAU, 2013, p. 60).
Diante disso, a marca indelével imposta socialmente que é a sua condição
de língua e comunicação, além de serem nomeados como diferentes e, em muitos
momentos, como incapazes. Esses estigmas reforçam ainda mais um processo
desigual de escolarização e contribuem para um aprendizado mais precarizado.
Dessa maneira, esse público tem necessidades abrangentes quanto à garantia de
seus direitos de inclusão, afirmação e fortalecimento de sua identidade.
Os surdos brasileiros lutaram a favor de um ensino Bilingue. No ano de
2002, a lei de libras, de n° 10.436 e o decreto n° 5626/2005, que regulamenta o
282
supracitado dispositivo legal, reconhece-se oficialmente a LIBRAS como meio
de comunicação e expressão das comunidades surdas brasileiras. Garante-se o
direito dos surdos à acessibilidade da informação através da sua língua e a difusão
da sua língua por meio do ensino. A Língua de Sinais utilizada no Brasil teve sua
legalização pela lei n° 10. 436/02, que diz em seu art. 1º.
Art. 22. As instituições federais de ensino responsáveis pela educação
básica devem garantir a inclusão de alunos surdos ou com deficiência
auditiva, por meio da organização de: I – escolas e classes de educação
bilíngue, abertas a alunos surdos e ouvintes, com professores bilíngues,
na educação infantil e nos anos iniciais do ensino fundamental […].
(BRASIL, 2002, p. 7)

Portanto, essa legislação tão duramente conquistada pela comunidade surda,


além dos direitos, também garante a comunidade surda brasileira o direito à
educação bilíngue. A problemática é que esse direito vem esbarrando na Política
Educacional Nacional que prima pela inclusão de pessoas independentemente de
suas particularidades e reforça a ideia de que estudantes, independentemente de
suas diferenças étnicas ou sociais ou mesmo em relação às necessidades especiais,
sejam incluídos no sistema regular de ensino. Isso contraria o que a comunidade
surda vem justamente lutando: uma educação em escola de surdos, com professores
bilíngues que saibam não só portugueses, mas também LIBRAS.
Diante do exposto, refletir sobre perspectiva fundamentais com temáticas
de escolas que sejam bilíngues, implica compreender essa língua espaço visual e o
papel que ela exerce dentro da instituição escola. Além disso, é necessário que os
alunos com deficiência e de diferentes raças tenham a possibilidade de conviver
com outros estudantes surdos, pois é maior a percentagem das pessoas surdas que
nascem em famílias ouvintes e são impedidas de terem uma comunicação plena e
fluída como as pessoas ouvintes uma vez que não partilham a mesma língua que
os seus familiares (CORRÊA, 2004).
Ademais, a formação de todo o currículo escolar deveria ser inclusiva, mas,
muitas vezes, tornam-se excludente, sobretudo, as atividades aplicadas em sala
de aula que precisam contribuir para o fortalecimento da identidade e da cultura
para que essas sejam mais bem difundidas. Esse público de alunos, além de pre-
cisarem vencer barreiras comunicativas, precisam vencer barreiras de preconceitos
de sua língua, de sua cultura e de sua história. Para exemplificarmos isso podemos
mencionar as provas que muitas vezes não são acessíveis, pois possuem muitos
textos em português; os diálogos também, em sua grande maioria, são dirigidos
283
ao profissional intérprete e não à pessoa surda; colegas que fazem chacotas dos
surdos com sinais, que incluem gestos obscenos para representarem a Libras.
Diante do exposto, não há dúvidas sobre a majoritariedade dos conteúdos
ministrados em aula que não são permeados pela língua própria dos estudantes
surdos durante a aula, seja porque professor fala rápido demais, seja porque o
intérprete não consegue acompanhar, de forma efetiva, as explicações, seja pelo
desconhecimento das singularidades por parte do corpo escolar. Por isso, verifi-
camos como urgência: os surdos precisam de uma escola bilíngue.

EDUCAÇÃO INCLUSIVA E O PROCESSO DE ESCOLARIZAÇÃO


DE ESTUDANTES SURDOS NA ESCOLA COMUM

Ao tomar como base os dispositivos legais que versam sobre a Educação


Inclusiva, pode-se dizer que esta é uma orientação educacional pautada nos
direitos humanos, que conjuga igualdade e diferença como valores indissociáveis,
e que avança em relação à ideia de efetivação da democracia. Como bem define
Mendes (2002, p. 61): “A educação inclusiva é uma proposta de aplicação prática
ao campo da educação de um movimento mundial, denominado inclusão social”.
Nesse contexto, conforme nos aponta Ainscow (2009), o propósito da educação
inclusiva é eliminar a exclusão social resultante de atitudes e respostas à diver-
sidade com relação à etnia, idade, classe social, religião, gênero e habilidades.
Assim, ao partir do princípio que a educação constitui direito humano básico,
tem como objetivo a democratização da escola e da sociedade com vistas a uma
sociedade mais justa e humana.
Logo, o reconhecimento da educação inclusiva, como política educacional
prioritária, postula uma reestruturação do sistema educacional, cujo objetivo é fazer
com que a escola se torne inclusiva, um espaço democrático e competente para
trabalhar com todos os educandos, sem distinção de raça, classe, gênero, ou caracte-
rísticas pessoais. (BRASIL, 2001). Nessa perspectiva, Educação Inclusiva significa
pensar numa organização de escola que busca assegurar o acesso, a permanência, e
o aprendizado de todos os estudantes e onde os mecanismos de seleção e discrimi-
nação até então utilizados, são substituídos por procedimentos de identificação e
remoção das barreiras de aprendizagem (GLAT, PLETSCH e FONTES, 2007).
Damasceno (2019, p. 7), ao conceituar educação inclusiva, sinaliza:
A educação inclusiva é um movimento cultural inserido na dimensão
social contemporânea, tendo por pressuposto a democratização tanto
284
da educação quanto da sociedade. Há, nesse movimento, a busca da
efetivação/equiparação de oportunidades de acesso à escola pública
por parte dos grupos vítimas da segregação histórica.

Por esta razão, a Educação Inclusiva não deve ser compreendida como um
novo termo associativo às determinadas modalidades de ensino, todavia, deve ser
concebida em sua abrangência: uma perspectiva educacional pautada em valores
democráticos, com vistas a obter uma sociedade mais justa e humana. Logo, não se
aplica apenas a determinados grupos isolados, mas sim, a todas as minorias excluídas.
Como podemos apreender, o debate sobre a Educação Inclusiva não se
reduz ao contexto da Educação Especial, no entanto, se aplica também a ela à
medida que os sujeitos público-alvo da Educação Especial também fazem parte
da população historicamente excluída da escola e da sociedade. Por isso, a Edu-
cação Especial é concebida como parte constituinte desse processo de Educação
democrática (Inclusiva). Diante desta temática, a partir do entrelaçamento dos
campos das políticas educacionais inclusivas e das políticas de educação bilíngue
para surdos, busca-se discutir processo de inclusão dos estudantes surdos, na
escola comum, sobretudo nas etapas e modalidades de ensino onde o embate
sobre o lócus privilegiado (escola bilíngue ou escola comum) para a escolarização
desses sujeitos não está posto.
O cenário educacional proposto pelas políticas inclusivas é o da aprendizagem
em conjunto, sendo a escola responsável por criar culturas com valores inclusivos
bem como produzir políticas e desenvolver práticas inclusivas, provendo apoios e
estabelecendo condições/recursos de acessibilidade. Todavia, na perspectiva epis-
temológica dos estudos surdos¹, para que o processo de inclusão dos estudantes
surdos seja consistente, faz-se necessário distanciar-se da concepção da Libras
enquanto recurso de acessibilidade, e portanto, desarticulada da encarnação cul-
tural, social e histórica que circula na comunidade surda e reconduzir o processo
a partir do fortalecimento e reconhecimento político da Libras como língua de
cultura. Nesse contexto, a análise sobre os pontos de contato que determinam
demandas da política linguística de Educação Bilíngue para Surdos e as ações
do planejamento educacional inclusivo, voltado aos estudantes surdos, na escola
comum torna-se necessária. Afinal, ao refletir sobre os objetivos e finalidades dos
pressupostos da educação inclusiva, torna-se oportuno o questionamento: Seria
possível lutar em prol da efetivação de tal perspectiva educacional sem considerar
a educação bilíngue para surdos enquanto programa constitutivo e integrado ao
projeto pedagógico da escola inclusiva?
285
Ao compreender que a concepção de bilinguismo adotada nas atuais políticas
inclusivas de Educação Especial atribui a Libras status de recurso de acessibilidade,
consideramos urgente pensar numa reestruturação da escola inclusiva, sobretudo,
no que tange à ampliação de um ambiente linguístico favorável ao desenvolvimento
e à aprendizagem dos sujeitos surdos. Ambiente, este, que ofereça condições ao
uso pleno da língua de sinais como primeira língua bem como reconheça e valo-
rize sua cultura - representada não apenas pelo uso da Libras, mas por um modo
de se expressar, conhecer o mundo, produzir artes e conhecimento a partir da
experiência visual. (PERLIN; MIRANDA, 2003). Nesse contexto, apontamos a
necessidade do fortalecimento político da Libras como língua e cultura como meio
de assegurar uma política inclusiva consistente, apta a desenvolver uma educação
de qualidade para os estudantes surdos.

A ESCOLA COMUM E A (NÃO) INCLUSÃO DOS SURDOS


NA BNCC

A linguagem é um imprescindível constituinte do sujeito, e seu sistema, a


língua, um elemento fundamental da condição humana que o permite se reconhe-
cer enquanto pertencente aos mais diversos grupos. Sem língua o indivíduo não
tem como fazer jus aos seus direitos. Portanto, o indivíduo não pode ser privado
de linguagem nem de usar a sua primeira língua, elemento primordial de seu
pensamento, humanidade e identidade. (RODRIGUES e BEER, 2016).
Na mesma direção, a Lei 10.098 de 2000, a Lei 10.436 de 2002 e o Decreto
5.626 de 05, que a regulamenta, determinam a inclusão da Libras como disciplina
curricular; a formação do professor de Libras e do instrutor de Libras; o uso e
a difusão da Libras e da Língua Portuguesa para o acesso das pessoas surdas à
educação; a formação do tradutor e intérprete de Libras – Língua Portuguesa;
a garantia do direito à educação das pessoas surdas ou com deficiência auditiva;
bem como o papel do poder público e das empresas e ele vinculadas, no apoio ao
uso e difusão da Libras (BRASIL, 2000, 2002, 2005).
Nesse sentido, esse documento, além de dispor sobre a Libras, dá aos estudan-
tes surdos garantias de acesso à escola regular, ressaltando que, para estes, a Língua
Portuguesa deve ser ensinada na modalidade escrita. Propondo, então, a educação
bilíngue já mencionada aqui. A qual deve ser constituída por classes de educação
bilíngue, com professores bilíngues, em escolas bilíngues ou escolas comuns da rede
regular de ensino, abertas a alunos surdos e ouvintes, para os anos finais do ensino
286
fundamental, ensino médio ou educação profissional, com corpo docente multidis-
ciplinar, cientes da singularidade linguística dos alunos surdos, bem como com a
presença de tradutores e intérpretes de Libras - Língua Portuguesa. (BRASIL, 2005)
A Base Nacional Comum Curricular (BNCC), documento aprovado em
2017, define o conjunto de aprendizagens efetivas que os alunos devem desen-
volver na Educação Básica. Trata-se de um balizador da educação no Brasil, o
qual aponta a educação infantil como a primeira etapa da educação básica, onde
o processo educacional formal tem início. Nela se faz necessária a aproxima-
ção da criança com a leitura e escrita de forma funcional e significativa. Assim,
alfabetização, não somente a aprendizagem de um código, e letramento, preci-
sam figurar paralelamente como objetivos da educação atrelados aos direitos de
conviver, brincar, participar, explorar, expressar e conhecer-se, à medida que as
pessoas surdas aprendem e se desenvolvem as interações com o outro são mais
bem mediadas pela língua (OLIVEIRA, 2018).
Pensando no sujeito em sua plenitude, este ponto do documento seria bastante
assertivo se incluísse as especificidades linguísticas da pessoa surda. Entretanto,
considerando-o, nota-se que, embora diversos direitos educacionais tenham sido
documentados, os surdos não foram incluídos em um documento que deve reger
toda a educação básica da Nação. Em nenhuma linha a Língua Brasileira de Sinais,
língua materna de considerável parcela desta população no Brasil, é colocada como
meio de comunicação, muito menos como língua de uso a ser fomentado.
Neste contexto, portanto, é imperativo e atrasado que sejam oferecidas
aos surdos condições linguísticas para aprender, ser uma pessoa autônoma e se
desenvolver. Pois ao negligenciar a comunicação dos surdos por meio da Libras, a
Base, inviabiliza-se sua alfabetização e letramento, uma vez que a comunicação e
socialização são elementos indispensáveis para a aprendizagem e desenvolvimento.

CONSIDERAÇÕES

A educação de modo geral, perpassa por valores morais e políticos em cada


período histórico, considerando que a sociedade busca constantemente um equilí-
brio entre as diversas modalidades educacionais para garantir o acesso a educação.
Nesse sentido, a educação especial tem promovido o acesso dos estudantes ao
universo acadêmico, possibilitando aos estudantes com Necessidades Educacionais
Específicas - NEE que tenham acesso e permanência em espações educacionais
através de assistência estudantil para isso basta reconhecer esse acesso como
287
direito de todo cidadão. Nesse sentido as políticas públicas têm proporcionado
mecanismos para inclusão desses sujeitos. O reconhecimento da LIBRAS é um
importante meio para afirmação dessa política.

REFERÊNCIAS
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seer.ufrgs.br/index.php/educacaoerealidade/article/view/61114/37882> Acesso em: 12 ago. 2022.
288
NARRAR-SE NO PROCESSO: RESSIGNIFICAÇÕES DE
UMA PROFESSORA QUE ATUA NA
EDUCAÇÃO ESPECIAL

Claudia Alexandra de Albuquerque Menezes Barros132


Rosemar Eurico Coenga133

INTRODUÇÃO

Ser professora. Passados anos da minha adolescência, agora, pela primeira


recupero essa memória de que sou algo que nunca desejei como profissão ou
planejei como projeto de vida. Em algum momento da adolescência, talvez aos
treze, quatorze anos, sonhava em ser musicista, mas tarde, acalentei ser arquiteta.
Mas, entre sonhos e desejos, a realidade financeira familiar foi conduzindo-me
lentamente a alternativas de sobrevivência.
Mas tive meus momentos na música. Estudei violoncelo e cursei Educação
Artística com habilitação em música pela Universidade Federal de Mato Grosso.
Habilidade e formação que agora considero importante no trabalho que busco
desempenhar com a educação especial. A graduação fortaleceu-me em dois cami-
nhos: no canto e nas artes plásticas. E foi durante a universidade que desenvolvi
o gosto pelo Canto Coral134 e participei de oficinas e cursos de extensão sobre
história da arte e música, e por tudo isso tenho gratidão.
Ao fazer essa reflexão, uma lembrança se manifesta com uma mistura de
resignação e alegria: as dificuldades. As dificuldades enfrentadas no percurso
acadêmico foram vencidas e hoje, o que prevalece é o gosto da vitória, ainda que
a luta continue. E, enquanto tento recuperar esse gosto para mantê-lo como um
guia, ele quase me escapa, o que fortalece o desejo em dedicar-me aos enfrenta-
mentos que se me apareceram, agora como ofícios da profissão de professora, que
são manifestados no trabalho com os alunos com deficiência.
É justo dizer que a educação especial surge como tema de pesquisa a partir
dessas dificuldades encontradas de ambiente em ambiente de trabalho. Tam-
bém é justo dizer que sejam rotinas que embora cotidianas “ainda conseguiram
132
Mestranda em Ensino (UNIC). CV: http://lattes.cnpq.br/8803658422199601
133
Doutor em Teoria Literária e Literaturas (UnB). Docente do Programa de Pós-graduação Stricto Sensu (UNIC).
CV: http://lattes.cnpq.br/6784437572638138
134
São mais de vinte anos cantando no Coral da Universidade Federal de Mato Grosso.
289
me sensibilizar” enquanto tinha condições de ser sensível. É mais justo dizer
ainda que essas sensibilidades respondem ao tempo. O que dá sentido hoje,
ao que nossos olhos vêm e ao que nossos ouvidos escutam é historicamente
construído e muda através do tempo.135
Atuando em sala de aula, em contato com tantas realidades diferentes, deparei
com o “ser” e sua “representação”. Eles se manifestavam através de pessoas: crianças,
adolescentes e adultos que não se comportavam conforme a dita normalidade.136
Elas quase não interagiam entre si, mal se comunicavam e, quando o faziam, não
respondiam aos processos pedagógicos planejados a partir das formações das
orientações produzidas pelas Secretarias de Educação as quais pertenço137.
Essas pessoas, como uma verdade inconveniente, estavam ali e, embora mar-
tirizadas resistiam - por diversas conforme sua deficiência - à reprodução138 de um
conjunto de saberes que se haviam me sido repassados, tendo como fonte docu-
mentos oficiais que apontavam direcionamentos adequados para àquelas situações.
O que me levou a questionar: Como ensinar os alunos com deficiência? Esse
questionamento possui um sem-número de respostas. Essa pergunta-pro-
blema acompanhou-me por bastante tempo. Na verdade, guia-me nas escolas
por onde trabalhei. Vez por outra, leva-me a pensar hipóteses de soluções que,
de lugar para lugar, se metamorfoseiam, escapam pelos meus dedos, já que o
que eu tento fazer não funciona.
A razão disso está em semelhanças e diferenças que não têm a ver com o
nome: autismo, síndrome de Dawn, defasagem intelectual, síndrome de West, esclerose
tuberosa e outros mais139. É que neste caso, corroborando a pergunta de Shakes-
peare quando diz: - “O que é que há, pois, num nome? Devemos entender que
eles escondem múltiplas realidades, pois os seres humanos são múltiplos em todos
135
No livro História Social da Criança e da Família, Philippe Ariés, mostrou como a infância foi sendo construída através
da história. Antes disso, conceito de infância não existia, a criança era como um adulto em miniatura. Com o tempo, foi-se
produzido outro olhar e agora temos: roupas de criança, leis que a protegem etc. Michel Foucault, no I volume da História
da Sexualidade também mostra, por outro viés, mudanças sociais. Esses exemplos servem para sustentar o argumento de
que a sensibilidade é historicamente construída e produzida como objeto de pesquisa.
136
É interessante que em Os Anormais, o filósofo Michel Foucault nos permitiu pensar bastante sobre o que significava
ser normal, ou seja, como é que essa ideia de anormalidade vai surgindo como discurso a partir da ordem médica para a
sociedade. Depois nos faz pensar, a partir do que ele escreve, sobre o surgimento das classificações e seus sentidos; seus
usos e abusos. Esse pensamento me marcou e ainda se remexe dentro de mim.
137
Sou professora efetiva da Secretaria de Estado de Educação de Mato Grosso e da Secretaria de educação do município
de Cuiabá.
138
BOURDIEU, Pierre; PASSERON, Jean-Claude. A reprodução. Rio de janeiro: Vozes, 2014.
139
Foram utilizadas nomenclaturas do âmbito escolar, porém, na atualidade, uma série de condições caracterizadas por
algum grau de comprometimento no comportamento social, na comunicação e na linguagem, são identificado pela sigla
TEA – Transtorno do Espectro Altista. Sobre essas questões é importante se conhecer o site da Organização Pan-Ame-
ricana da Saúde (OPAS) que apresenta dados interessantes, como pesquisas para apoio.
290
os sentidos e circunstâncias. Esse foi com esse despertar, como em Proust (2006),
fruto também de uma busca, mas não de “um tempo que se perdeu”, mas como
Benjamin (1994) de “experiências comunicáveis” é que percebo de onde estava,
como estou e o que me move a continuar.
Agora, passeando pelos jardins da minha memória140 começa a florescer a
jornada. No canteiro central encontram-se a minha vida minhas vivências; enquanto
nos laterais, estão minhas experiências profissionais voltadas ao trabalho com os
alunos com deficiência e nos caminhos circundantes a minha formação em artes
e em educação. No final do passeio, que se reconheça a proposta de apresentar o
tema da educação especial mesclado às minhas trajetórias pessoal e profissional
cuja justificativa está no processo da pesquisa em educação nos níveis seguintes:
pessoal, social e científico. A metodologia é simples: segue pela narrativa de si
num trajeto que, obviamente, mistura memórias e esquecimentos; saudades e
alegrias no processo de ensinar.

FAZ UMA LOUCURA POR MIM141

Ao buscar narrar certos eventos, dois sentimentos emergem com muita força:
o medo e a resignação. Tão fortes que não consegui deixar de falar sobre eles. Esses
sentimentos pertencem à um contexto específico, mas que retrata pontos impor-
tantes de minha vida. Eles estão ligados e representam mudanças e diferenças.
Eu nasci em Manaus. Eu, minha mãe, meu pai e meus irmãos nos mudamos
para Cuiabá, Mato Grosso, e esse acontecimento revela perdas e abandonos: foi
uma loucura que meu pai fez por amor à minha mãe. Para esclarecer melhor é
bom que eu submerja às minhas origens familiares.
Desde a infância transitei por mudanças e diferenças. E isso é lá de casa.
Meus pais são a personificação das diferenças que e se atraíram. O senhor Salo-
mão de Menezes, homem alto, boa aparência, pele negra retinta e bom-vivam;
apaixonou-se por Neida de Albuquerque, mulher pequena, magra, bem desenhada
de corpo, branca, de descendência italiana. Eles se juntaram e, por insistência de
meu pai, chegaram ao matrimônio.
O senhor Salomão, menino pobre, teve a sorte de ser criado por um padri-
nho português, um homem de posses e costumes, que gerou nele gostos e dese-
140
Faço alusão aqui ao romance do escritor turco Orhan Pamuk: Os jardins da memória, título que recebeu a edição
portuguesa do romance saiu pela editora presença em 2004. No Brasil o livro foi publicado pelo nome de “O livro negro”
pela Companhia das Letras em 2008 seguindo o nome publicado no mercado editorial latino.
141
Faz uma loucura por mim. Música de composição de Chico Roque / Sérgio Caetano. Gravada por Alcione no disco 2004.
291
jos refinados; enquanto minha mãe, de família humilde, cujo passado esconde
dramas profundos que não convêm revelar, era uma mulher simples, totalmente
enraizada na cultura amazonense: contava as estórias e as lendas do Amazonas:
do boto cor-de-rosa, da ilha encantada do Marapatá e as anedotas dos cabo-
clos do interior e até das indecências das “casas das moças bem frequentas” que
existem em qualquer comunidade142.
Do encontro dessas diferenças cinco filhos surgiram. Éramos sete: Papai,
mamãe Tereza, Suzete, Moises, Elias e eu, Claudia, a caçula. Eu fui a única que
nasceu em um hospital já que como presente ao meu pai, seu padrinho pagou o
parto em que minha mãe foi ligada por sua vontade, já que por meu pai o número
de filhos seria bem maior. Manauaras que viviam em um sobrado no centro da
cidade. Essa é a minha mais rica lembrança. Da infância em Manaus à adolescência
em Cuiabá, destaco as diferenças. Diferenças no modo de vida em comparação à
anterior; diferença nas comidas, nas bebidas e nas palavras, sem falar nas diferenças
sociais com as quais teríamos que conseguir vencer.
Em Manaus vivíamos de modo confortável. Minha família havia conse-
guido se estabelecer através da venda de bolos e salgados. Era uma banqueteira
conhecida. Tínhamos certa estabilidade financeira e nós tínhamos acesso à cultura
(peças de teatro, músicas, discos, aparelho de rádio, instrumentos musicais) e a
escolas particulares. Recordo-me como agora, sentada ao lado de meu pai ouvindo
música clássica. Nossa casa sempre havia movimentação cultural, poesias sendo
faladas, comida à mesa e literatura.
Uma das lembranças mais firmes em minha mente é o porto. Manaus é a
porta de entrada de mercadorias da Europa. Recordo-me de ver chegar os navios e
principalmente da variedade de alimentos, das caixas e caixas de frutas e do gosto
do chocolate. Por outro lado, a Amazônia também era fornecia uma variedade
de comidas: castanhas, peixes, carnes de caça, farofa de tartaruga no casco e o
pé-de-moleque, eu gostava do beiju, do salame de castanha e cupuaçu e do açaí
puro com farinha. Uma comida que nos acompanhou foi o vatapá (de pão, porque
o vatapá amazonense é com pão).
Meu pai gostava muito da boa mesa. Ele foi acostumado por seu padrinho a
coisas diferentes, comidas e modos europeus. Ele exigia fartura. E de nós, os filhos,

Sobre essas estórias, Montenegro (2010), ao tratar acerca da metodologia da história oral, recorre também à Walter
142

Benjamin e outros autores para falar dos ecos que elas possuem, dos contos de fadas e das literaturas, que vão sendo incor-
poradas e ressignificadas na cultura popular. O que nos leva a pensar nos ecos das estórias, das anedotas e das literaturas
contadas e que agora circulam e fazem parte da cultura popular.
292
ele cobrava “modos”, um tipo de comportamento social que deveria ser apresentado
à mesa em público. Minha mãe, à modo de concordância, acenava sempre à cabeça
aos gostos do papai. Havia uma regra à mesa: fartura e variedade. Dever-se-ia ter,
ao mesmo tempo, peixe, carne, frango, frutos do mar, carne de caça e as guarni-
ções. E minha mãe, por sua vez, gostava desse sinal de fartura e dinheiro, embora
não tivéssemos tanto, algo que ela lamentaria a falta anos mais tarde em Cuiabá.
Também havia a familhagem. Os titios, os primos, os avós e os agregados.
Uma boa parte dos parentes do lado do meu pai vivia em Manaus, enquanto do
lado da minha mãe, esse lado, havia migrado para o Mato Grosso na década de
1970. Dona Neida Albuquerque de Menezes, minha mãe, pertencia à uma família
de mulheres muito fortes e bastante ligadas. Quando minha avó e minhas tias
migraram para Cuiabá, o banzo, a saudade e a tristeza tomaram conta de seu coração.
Quando minha mãe se aventurou a conhecer o Mato Grosso e Cuiabá na
década de 1970, uma viagem desgastante, que poderia durar mais de três semanas.
Da chegada até o seu retorno, poderiam se passar meses. Durante esse tempo meu
pai, acostumado à presença e ao tempero de minha mãe não se conformava. E havia
nós, os filhos. Foi exatamente por esse motivo que meu pai concordou em deixar
a vida que levava para tornar-se migrante e se aventurar. Na década de 1980, após
algumas idas e vindas à Cuiabá, nossa família finalmente vendeu o que tinha para
nos mudarmos. E Cuiabá era outro clima, outro jeito, outro movimento. Recor-
do-me bem: Cuiabá tinha gosto de estranheza e Manaus tinha cheiro de saudade.
Em Manaus a chuva é constante e não atrapalha o ritmo de vida e do trabalho.
Ocorreu-me, como nesse esforço lembrar-me, de uma passagem curiosa. Entre
as idas e vindas da minha família, eu indo para escola em Manaus, depois de ter
ficado um ou dois anos em Cuiabá, e quando cheguei totalmente molhada, voltei
à professora e perguntei: - Haverá aula? Ela prontamente respondeu: - Claudia,
todos os dias chove, se fossemos parar por causa disso, ninguém mais fazia nada.
Eu já estava adaptada à Cuiabá.
Desfez-se àquela vida que levávamos e muitos personagens perderam-se
pelo caminho. Da família de meu pai, jamais tornei a ver meu primo caçula, que
hoje sabemos, não era um bobinho, como era considerado nas brincadeiras de
roda. Ele tinha Síndrome de Down. Nunca mais voltei a ver nossa vizinha de
porta e amiga de brincadeiras, talvez hoje ela fosse diagnosticada com deficiência
intelectual e, até o afilhado de meu pai, deficiente físico que ninguém sabe o que
aconteceu. Diferente dos três outros meninos filhos de minha tia por parte de pai,
293
que tiveram paralisia ou outras coisas que agora, de memória não consigo lembrar
sem a ajuda dos meus irmãos mais velhos.
Na família de meu pai, muitas pessoas poderiam na visão de hoje, serem
classificadas como pessoas com deficiência a depender da avaliação diagnóstica
de um especialista. Infelizmente, naquela época os especialistas eram raros, dife-
rentemente dos preconceitos e tabus. Mesmo hoje, após tantos anos de trabalho,
sinto-me melindrada em sugerir que uma família procure ajuda especializada. Essa
situação, essa dificuldade são tão presente que chega a ser opressora.
Aos olhos de hoje também, mudar foi uma loucura. Deixar o que se tinha,
as pessoas que faziam parte da vida e do seio familiar. Uma prova de amor de
meu pai à minha mãe. Crescer na minha família foi uma loucura, já que todas as
famílias têm suas tragédias. É como na abertura de Ana Karenina, quando Leon
Tolstói afirma das diferenças das famílias, o maior ato de amor foi a coragem de
aventurar-se para um futuro desconhecido. Assim:
Desafio quem quer que seja a descrever os arcanos da psyché sem
ceder à intuição de alguma extensão, onde ocorrem movimentos,
transferências e transformações. Apesar de pretender que, dedicada
ao espaço, nossa inteligência, não pudesse nunca aceder ao puro fluxo
temporal, reservado à consciência (SERRES, 2015, p. 91).

MINHA VIDA É UM SHOW E O ROTEIRO FOI DEUS QUEM


TRAÇOU143

Quando eu era criança e uma parte da vida de adolescente, antes de vir de


Manaus para Cuiabá vivia cercada por cultura e arte. Uma lembrança recorrente na
memória é a voz de minha mãe cantando: - Nosso amor, que não esqueço, e que teve o
seu começo... numa festa de São João (...)144, meu pai também tinha uma boa voz, um
baixo profundo, mas ele gostava era de falar poesia e de comer, é claro. Ele apreciava
uma mesa posta e à maneira europeia, como aprendeu com seu padrinho de infância.
Meus irmãos também tiveram suas ligações com a música, Moises toca
violão, Elias também é musical e minhas irmãs cantam. Eu comecei a aprender
violoncelo em Cuiabá, mas como já não podíamos comprar o instrumento tive
que parar. Mas a pintura e o desenho, veio bem antes da UFMT, em um projeto

143
Obrigada. Música. Composição de Sergio de Souza e Francisco Chico Roque, gravada por Alcione no disco: Uma
nova paixão, 2006.
144
Música: Último Desejo. Composição Rildo Alexandre Barreto da Hora e Martinho da Vila e Noel Rosa. S/d.
294
desenvolvido na antiga Residência dos Governadores, na Rua Barão de Melgaço,
número 3565, no Centro da cidade.
No ensino médio cursei magistério. Eu gostava do curso, me encontrei no
processo, mas sempre pensava em fazer algo ligado à arte e o curso universitário
foi a oportunidade mais próxima de vivenciar uma paixão: a música. O curso de
música da Universidade Federal de Mato Grosso tinha, e ainda tem, prova de
aptidão, a chamada “prova prática”. Esse era um divisor entre os que gostavam de
música, mas não sabiam seus fundamentos, e àqueles que tinham algum conhe-
cimento o suficiente para passar e prosseguir no curso, já que a prova era aplicada
após os três dias de vestibular.
Fui aprovada com sucesso, a experiência familiar foi o suficiente, afi-
nal de contas, após tantos acontecimentos, informações, superstições e práti-
cas, que até poderia considerar em excesso, só fiquei mais rica em experiên-
cias comunicáveis e aplicáveis.145
Durante o curso, apaixonei-me por história da arte, em parte por conta da
professora Rosângela Calix Coelho da Costa, professora do Departamento de Artes
da UFMT, mas, obviamente, a música era o forte da minha vida. Lembro-me dos
cursos de aperfeiçoamento e dos encontros. A primeira vez que estive num curso
de música no em Curitiba, convivendo com cantores de todo Brasil, por um lado
acanhei-me, por ver tanta projeção e extensão misturado com beleza estética da
voz, com também percebi que era possível vivenciar de diversas formas o meu canto.
É interessante nesses cursos que se pode ver de tudo. Conheci pessoas que
tinham técnicas de aquecimento vocal diversas exóticas; outros tinham simpatias,
como tomar um chá de casca de cebola para limpar a voz; mascar chiclete cons-
tantemente ou até manter o abdômen contraído o tempo todo. Tudo isso ser-
viu para permitir que eu buscasse a mim mesma, como no aforismo de Sócra-
tes, para buscar o meu caminho.
Durante a vida universitária, de 1994-1998, muitas coisas aconteceram.
Cursos, ensaios e apresentações, amigos e viagens. Foi no coral universitário onde
vivi coisas importantes e interessantes profissionalmente. E foi lá que fiz um solo
pela primeira vez146 e participei da ópera A Flauta Mágica, de Mozart, em 2006
e continuei experimentando uma variedade de estilos e propostas musicais.
145
BENJAMIN, Walter. Experiência e Pobreza. In:__. Magia e técnica, arte e política. Ensaios sobre literatura e história
da cultura. São Paulo: Brasiliense, 1987, p. 114-119.
146
Meu primeiro solo foi em um encontro de corais – Pueblos que Cantan - Córdoba, Argentina no ano de 1998, cantando
o solo Follow Jesus, um “negro espiritual”, um gênero musical norte-americano que representa o lamento dos negros
escravizados. A composição é de autor desconhecido e foi transcrita para canto coral e solo.
295
Além da técnica vocal aplicada diariamente; o coral oferecia atividades
corporais e noções de teatro, e havia as apresentações que, com certeza serviram
para me fortalecer na arte. Eu cantei as Bachiannas de Villa-Lobos para o grande
público no teatro, além disso, experimentei cantar com a Orquestra da UFMT e
uma organização menor, um octeto vocal chamado Candimba.
Cantei efetivamente até 2020 e com o advento da pandemia do Covid-
19 essas ações culturais foram diminuindo. Já não cantava nem em casamen-
tos, atividade que exercia de forma esporádica como complemento financeiro
e uma forma de manifestação artística possível e compatível com minha ativi-
dade principal, ser professora.
Ao se ver esmorecendo as apresentações musicais, o meu escape artístico foi
nas escolas onde trabalhava. Gravava vídeos artísticos para os alunos, os incentivava
a produzir, mesmo com as angústias de uma doença mortal. Os alunos passaram
a ser também o meu público, embora, à distância. Os vídeos gravados poderiam
ser acompanhados pelos pais e responsáveis, pelo menos por àqueles que que
possuíam internet e tempo para acompanhar os seus. Embora lentamente eu fui
apresentada à essa linguagem midiática e digital, que confesso, ainda não dominei.
Estar em um palco não era novidade para mim. Desde criança eu criava
palcos, encenava peças e cantava. Transportar tudo isso para à sala de aula foi
um desafio. Mas eu possuía outro aliado, além da voz e da expressão corporal,
também poderia contar com minhas habilidades plásticas. Desenhar, criar, pintar
tudo isso eu sei, mas lembrando Carlos Drummond de Andrade, “no meio do
caminho havia uma pedra”, nem todos os alunos acompanhavam os processos
que estavam sendo executados. No tempo presente, ciente de todos os aconteci-
mentos que a rede de colegas e a mundial de computadores permitiu ter acesso,
avalio agora a situação como, infelizmente, normal para todos os meus colegas
professores diante das circunstâncias.

UMA CANÇÃO EM TOM MENOR

Uma canção em tom menor traz para muitas pessoas a sensação de tristeza,
de melancolia, mas eu sempre adorei as músicas melancólicas. Elas não me fazem
recordar de momentos tristes, somente, mas de alegrias imensas que não voltam,
que podem ser replicadas, mas soam diferente na alma da gente. E considerando
as memórias trazidas até aqui, sinto muito forte a lembrança da escola Raio de Sol,
que é uma escola especializada no trabalho com estudantes com deficiência. Eu
296
trabalhei na escola muito antes de se concursada, por um ano em 1999 e depois,
muito tempo, entre 2014 e 2017.
A experiência mais significativa da minha trajetória artística relacionada ao
trabalho com alunos com deficiência foi realizada na escola estadual Raio de Sol,
em 2017, quando produzi, em conjunto com a equipe de professores e a gestão da
época, uma instalação para os alunos. Na instalação trabalhamos os cinco sentidos:
audição, visão, olfato, tato e paladar.
A instalação artística teve o objetivo de promover uma imersão artística para
alunos com variados níveis de comprometimento físico, motor e/ou cognitivo,
trazendo como proposta intensificar as experiências anteriormente apresentadas
em sala de aula, mas fazendo uso de materiais recicláveis, já buscando trabalhar
uma consciência ambiental e ensinar o reaproveitamento de materiais, além de
utilizar elementos simples que poderiam ser encontrados na cozinha de qualquer
casa, ou seja, as atividades poderiam ser replicadas por colegas professores e tam-
bém pelos pais e responsáveis dos alunos caso desejassem continuar trabalhando
com seus filhos alguma coisa relacionada à arte, também servindo como forma de
recreação entre eles. As atividades foram pensadas de forma bastante cuidadosa
para que pudesse, na medida do possível, abranger várias frentes.
Do acervo da escola foram recuperadas algumas imagens daquela ativi-
dade, que trago agora como um suporte para auxiliar a memória, que pela tem-
poralidade dos acontecimentos vai se esmoendo pouco a pouco. Embora não
deixe identificar aqui os personagens, devido a sua condição, é possível ter uma
parca ideia do trabalho realizado:

Fotos 01 e 02 - A entrada da instalação

Fonte: Fotos do acervo pessoal - Oficina na EE Raio de Sol. Foto de 2017.

297
Foto 03 – Experiências do Olhar

Fonte: Fotos do acervo pessoal. Oficina na EE Raio de Sol. Foto de 2017.

Fotos 04, 05, 06 – Experiências do sentido

Fonte: Fotos do acervo pessoal. Oficina na EE Raio de Sol. Foto de 2017.

Foto 07 – instrumentos para oficina dos sons

Fonte: Fotos do acervo pessoal. Oficina na EE Raio de Sol. Foto de 2017.


298
Essas imagens apresentam uma ínfima parte da exposição. Outras fotografias
existem, mas não há aqui, nesse esforço narrativo a intenção de expor pessoas que
são tão queridas ao meu coração. Sendo assim, também não irei apresentar as fotos
da estação paladar, mas irei aqui apenas narrar que se tratou de um esforço coletivo
de tornar o intervalo do lanche uma experiência única e artística, assim, trabalhamos
com as cores, utilizando gelatinas, corantes e outros elementos; trouxemos sabores
doces, amargos, fortes e apimentados em comidas artisticamente apresentadas.
Esse percurso foi mágico, já permitiu que pudesse retomar uma prática
bastante importante, demorada, que começou com o planejamento coletivo entre
artes e educação física, pensado para trabalhar os sentidos dos alunos. Como está-
vamos lidando com pessoas que possuíam dificuldade de locomoção, baixa visão,
movimentação limitada ou mesmo se tratava de pessoas autistas ou com outras
síndromes, muitos dos sentidos se encontravam prejudicados e o seu estímulo foi
bem aceito por todos os que participaram.
É uma canção em tom menor. É triste saber que muitos com os quais
estive, brinquei e ensinei já não se encontram mais aqui, embora, como num
musical, que sempre termina em exaltação, essa oportunidade de recordar –
fazer o tempo dobrar-se à luz de certos acontecimentos de minha vida/trajetória
artística e profissional, permitiu uma renovação das minhas forças no sentido
da formação humana e artística.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao promover esse esforço narrativo busquei perceber como, a partir das


minhas experiências pessoais e familiares, aos poucos fui tornando-me uma
professora interessada em trabalhar com alunos com deficiência a partir da arte.
A proposta do texto era, seguir pelas memórias e narrar histórias pessoais
– individuais/sociais, que levassem a uma reflexão sobre a prática, o trabalho
com a educação especial a partir da arte, disciplina e paixão na qual venho me
formando a cada dia de minha vida.
O que desejava era proporcionar um passeio através da memória apresen-
tando alguns canteiros entre os quais a educação especial - mesclado às minhas
trajetórias pessoais – possui um papel importante. A metodologia é simples:
seguiu-se pela narrativa de si, algo que mistura memórias e esquecimentos; sau-
dades e alegrias no processo de ensinar.

299
REFERÊNCIAS
BENJAMIN, Walter. O Narrador. Considerações sobre a obra de Nikolai Leskov. In: Obras Escolhidas:
Magia e Técnica, Arte e Política. São Paulo: Editora Brasiliense, 1994, p.197-221.
BENJAMIN, Walter. Experiência e Pobreza. In: Magia e técnica, arte e política. Ensaios sobre literatura e
história da cultura. São Paulo: Brasiliense, 1987, p. 114-119.
BOURDIEU, Pierre; PASSERON, Jean-Claude. A reprodução. Rio de Janeiro: Vozes, 2014.
GILL, Scherto; GOODSON, Ivor. Métodos de história de vida e Narrativa. In: SOMEKH, Bridget e
LEWIN, Cathy. Teoria e Métodos de pesquisa social. Petrópolis: Vozes, 2015, p. 2015-224.
PESSOA, Fernando. Livro do Desassossego. Lisboa: Richard Zenith, Assírio e Alvim, 1998.
MONTENEGRO, Antonio Torres. Rachar as palavras: uma história a contrapelo. In. História, Metodologia
e Memória. São Paulo: Contexto, 2010, p. 21-48.
SERRES, Michel. A grande narrativa. In: O incandescente. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2005, p.11-58.
SILVA, Domingos. Entre-Vidas: sentimentos, solitude e a poeira. Rio de Janeiro: Autografia, 2011.

300
SOBRE O ORGANIZADOR

CLEBER BIANCHESSI

Doutorando em Educação e Novas Tecnologias (UNINTER). Mestre em


Educação e Novas Tecnologias no Centro Universitário Internacional Uninter
(2017-2019). Especialização em Mídias Integradas na Educação na UFPR
(2018); Especialização em Gestão Pública na UFPR (2016); Especialização em
Desenvolvimento Gerencial na FAE Business School (2002); Especialização
em Interdisciplinaridade na Educação Básica no IBPEX (1998); Especialização
em Saúde para Professores do Ensino Fundamental e Médio na UFPR (2019).
Graduação em Administração de Empresas pelo Centro Universitário Cesumar
- UniCesumar (2017); Graduação em Filosofia, Sociologia e História pela
Pontifícia Universidade Católica do Paraná PUC PR (1997).
E-mail: cleberbian@yahoo.com.br

301
ÍNDICE Educomunicação 207, 208, 211-213,
217-221, 225, 226, 228-233
Pessoas com deficiência 8, 69, 71-75,
77, 279, 280, 294
REMISSIVO Ensino de história 175, 194-197, Políticas e práticas 138, 175
199-203
Prevenção 7, 19-21, 25, 29-31, 60,
Ensino de língua portuguesa 7, 18, 86, 114, 115, 123, 127, 129, 209, 214
33, 35, 38, 39
Processos formativos 8, 59, 205, 207,
A Ensino de matemática 7, 10, 14, 121, 211
122
Acessibilidade e inclusão 7, 67, 72 Produção textual 108, 116, 118, 171,
Ensino-aprendizagem 7, 14, 19, 27, 172
Acessibilidade escolar 68, 69, 73 42, 53, 121, 125, 137, 172, 173, 187-
189, 202, 253, 255, 260 Professor reflexivo 8, 193-195, 200,
Alunos surdos 7, 87, 97, 281-283, 202, 203
286, 287 Enunciados matemáticos 7, 9, 12
Professor-pesquisador 195, 200, 201,
Aprendizagem da produção escrita 7, Escolas brasileiras 8, 175, 280 203, 204
107, 108, 119
Escolas públicas 7, 67, 68, 73, 74, 76, Professores da educação básica 33,
Aprendizagem significativa 165, 166, 77, 196, 207, 211, 257, 258 35, 37, 41
168, 170, 173, 174, 228, 253, 261, 265
Espaços da sociedade 7, 131, 135, 180 R
Arte na escola 8, 245, 247
Experiência cotidiana 227 Redes semânticas 173
Aulas interdisciplinares 7, 79
F Reeducação 175, 182, 183
Ações afirmativas 8, 175, 179-182,
184 Fazeres educacionais 8, 193 Relações étnico-raciais 175, 178, 179,
182-184
B Filosofia no ensino médio 8, 165, 172
S
Bullying 49, 50, 282 Formação continuada docente 8, 253,
254, 256, 257 Saberes acadêmicos 8, 193
C
G Scratch 7, 19, 21-25, 27-32
Cidadania 9, 58, 59, 61, 68, 69, 100,
104, 105, 123, 149-152, 184, 196, 209, Gameficação 7, 33, 42 Sequência didática 7, 38, 107-110,
214-217, 229, 233, 236, 239, 254, 255, 119, 263, 278
263, 264, 268, 270, 277, 278 Globalização 7, 132, 139-141, 143,
144, 146 Sociedade contemporânea 8, 30, 145,
Conscientização 7, 19, 29, 30, 45, 202, 223, 235, 241
206, 209, 211, 214, 216, 226, 230, 232, I
247, 248, 255, 275 Software cmaptools 167, 169, 172,
Inter-relações 179, 186-188 173
Contexto escolar 43, 44, 253
Interdisciplinaridade 7, 8, 14, 79, 80, T
Contexto histórico 88, 131, 132, 150, 86, 185-191, 202, 220
250 Tecnologia na educação 7, 131-133,
Intervenção de ensino 7, 107 149, 220, 223, 225
Contexto pandêmico 7, 87, 93, 95, 223
J Tecnologias digitais 8, 33, 34, 145,
Coronavírus 19, 20, 25, 29-32, 68, 73, 147, 152, 205, 207, 211, 212, 223,
87, 92, 93, 95, 122, 128-130 Jogos digitais 28, 30-33 224, 227-231
Crises pessoais e profissionais 8, 153, L Tempos de pandemia 8, 133, 245, 250
154
Letramento 7, 9, 13, 14, 17, 35, 287 Textos clássicos 8, 165, 169, 171-173
Currículo e tecnologias 8, 145
Lócus 7, 43-45, 48, 52, 285 Transformação social 7, 43-45, 52,
D 60, 102, 199, 216, 217, 226, 229, 230
M
Desafios da disciplina 8, 245 U
Mapas conceituais 8, 165, 167-174
Direitos humanos 7, 10, 17, 55, 57-66, Universidade aberta 7, 99, 100, 104,
136, 230, 267, 284 Metodologias ativas 7, 8, 79-81, 86, 106
123, 128, 129, 185-192, 223, 242
E V
Moçambique 7, 139-144
Educação digital inclusiva 208, 213 Voto de confiança 263, 278
Educação física 7, 55, 56, 60-63, 65,
P
Vulnerabilidade social 8, 205, 207-
66, 99, 299 Pandemia na escola 121 209, 212, 214, 228, 229, 232
Educação popular 44, 207-209, 211- Papel do professor 8, 188, 199, 235,
215, 217, 225, 226, 228-230, 233 262
Educação à distância 7, 132, 139- Perspectiva freireana 207, 208, 212,
142, 144 213, 225
Pessoa idosa 7, 99-101, 104-106
302
ISBN 978-65-5368-105-7

9 786553 681057 >

Este livro foi composto pela Editora Bagai.

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