Você está na página 1de 17

W W W. D IA R I O INS U L A R .

CO M

249 # 13.01.2008
Jornal Diário | Ano LX I | Nº18952 | 0,55 e
Fundado em 1946 | Terceira | Açores

António Nunes

Chás e mezinhas
museu aberto 058 NOTA DE ABERTURA
FOTOGRAFIA antónio araújo José Lourenço

Balança analítica
04 António Nunes
O poder dos chás
[REPORTAGEM] Tema de capa: Existem chás que
curam a febre e as dores de cabeça,

10 Bárbara Moniz
acalmam os nervos, desinflamam a gar-
[reportagem] ganta, param a tosse, afastam os males
de intestinos e de estômago, são anti-

12 Francisco Coelho e Reis Leite


cancerosas, purificam o sangue... Aos 90
[PERSPECTIVAS] anos, António Nunes detém a sabedo-
ria das ervas. Tem mais de 150 espécies

14 Maduro-Dias
de plantas curativas no quintal e, aos 90
[VELA DE ESTAI] anos, ainda recebe clientes na casa an-
tiga no Chafariz Velho, em Santa Luzia.

18 Luiz Fagundes Duarte


“Sofro da próstata há 25 anos e nunca
[FOLHETIM] fui ao médico. Tomo um chazinho to-
dos os dias e lá vou indo. Até hoje!” –

20 D. Duarte de Bragança
confessa à reportagem de Di-Revista.
[ENTREVISTA] Entrevista: D. Duarte de Bragança pas-
sou recentemente pela ilha Terceira,
por ocasião da inauguração do Centro
Porta Amiga da AMI, em Angra do He-
roísmo. O chefe da Casa Real portugue-
sa propõe a constituição de um reino
unido com Açores, Madeira e continen-
te, que, segundo diz, preservaria as au-
tonomias.
Reportagem: A cidade de Angra do He-
roísmo dispõe, desde Dezembro, de
um Centro Porta Amiga da AMI. As mu-
lheres em risco de exclusão social, a po-
pulação imigrante e os cidadãos repa-
triados são o público-alvo.
Outra reportagem: Bárbara Moniz é
uma das mais recentes e promissoras
vozes açorianas do fado. Natural da ilha

22 AMI na Terceira
de São Miguel, a estudante de enfer-
[REPORTAGEM] magem realizou o seu primeiro grande
concerto nas Sanjoaninas 2007, granje-

24 Guilherme Marinho
ando rasgados elogios do público.
[OPINIÃO] Uma história santa: Em Sua home-
nagem, o rei D. Pedro II dedicou uma

25 Arnaldo Ourique
imensa festa, na corte, em Lisboa, e
[OPINIÃO] sua esposa, D. Maria, terá mesmo que-
rido ficar com a imagem. No entanto,

26 Fábio Silva
os praienses não abdicaram do seu Me-
[DESPORTO] nino Deus. Lenda, história ou, simples-
Balança analítica. 1888), foi o inventor da balança analítica de braço curto. mente, um acto de fé, ainda hoje é ce-

28 Sugestões
Paul Bunge. Séc. XX. 20x14x33 cm. MAH.R.2007.270 As balanças analíticas mecânicas deste tipo têm, normal- lebrado a 6 de Janeiro.
mente, um alcance de 200 gramas e permitem uma apro- [AGENDA] O desporto: Produto dos escalões de
Balança analítica de braço curto, suspensão superior e pra- ximação até 0.1 de miligrama, sendo utilizadas em labora- formação do Clube de Karaté-do Sho-

29 Cartoon
tos idênticos, de grande precisão. Construído em latão, o tórios de química, farmácias e ourivesarias. tokan da Praia da Vitória, Fábio Silva
exemplar aqui documentado é representativo dos mode- [TIRO&QUEDA] respira karaté por todos os poros. Re-
los fabricados no período entre as duas grandes guerras Esta balança pode ser observada na exposição Balanças Antigas nas presentar a selecção das quinas é um
do século passado. Paul Bunge, engenheiro alemão (1839- Colecções do Museu de Angra do Heroísmo, até 27 de Janeiro. dos objectivos.

DI DOMINGO  13.janeiro.2008 DI DOMINGO  13.janeiro.2008


António Nunes

Sabedoria
Feita de ervas
Existem chás que curam a febre e as dores de cabeça, acalmam

os nervos, desinflamam a garganta, param a tosse, afastam

os males de intestinos e de estômago, têm propriedades anti-

cancerosas, purificam o sangue... Aos 90 anos, António Nunes

detém a sabedoria das ervas. »

DI DOMINGO  13.janeiro.2008
REPORTAGEM HElena fagundes fotografia antónio araújo Tem mais de 150 espécies de plan- menos. Quando posso trabalho nas minhas terras, o Desde os 19 anos que toma chás. Começou porque so-
resto do tempo passo-o aqui”. E o letreiro no exterior fria de azia e lhe “receitaram” a salva. Hoje, acredita no
tas curativas no quintal e, aos 90 anos, ainda recebe clientes. An- confirma. Recebe os clientes das 12 às 14h e das 18 poder da medicina natural. A erva de São Roberto e a
às 22h. Todos se lhe dirigem com um problema. E An- urze – diz - são anti-cancerosas. Mas há limites. “Se for
tónio Nunes conhece bem o poder dos chás e mezinhas: “Sofro da tónio estende-lhes os pequenos pacotinhos de plásti- um cancro que apenas se está adivinhar, uma coisa pa-
co com as plantas milagrosas. ra durar muitos anos, há solução. Mas se for uma coisa
próstata há 25 anos e nunca fui ao médico. Tomo um chazinho to- Tudo começou com a abertura de uma mercearia. Du- muito séria, já enraizada, morre-se. Os chás só podem
rante 41 anos, dirigiu o negócio na Rua da Sé e só o servir para melhorar um bocadinho a vida da criatura”.
dos os dias e lá vou indo. Até hoje”. deixou quando a Junta Geral quis comprar edifício. Na Mesmo assim, diz que “deve muito às ervas”. “Sofro
mercearia, António Nunes também vendia ervas. Con- da próstata há 25 anos e nunca fui ao médico. Tomo
um chazinho todos os dias e lá vou indo. Até hoje”.
As pessoas que procuram os chás de António têm, na
sua maioria, mais de 50 anos. “É de tudo um pouco,
mas sobretudo dos 50 para cima. É aí que as pessoas
começam a pensar na sua vida e a aperceber-se que
vale a pena virarem-se para as ervas”.
Ao longo dos anos, guarda as muitas histórias de pes-
soas que ajudou. “Vem cá muita gente. Uma senho-
ra dos Biscoitos veio por causa do avô, que sofria da
próstata. Já lá vão cinco anos e ela ainda me agrade-
ce, porque ele ficou mesmo curado, a viver muito me-
lhor e sem dores. E outras pessoas...Muitas”. Mas dei-
xa bem claro: “É preciso conhecer estas plantas, por-
que existem algumas venenosas. É preciso ser-se sé-
rio”, diz, acenando a cabeça com convicção.
Mesmo apesar de ainda ter “clientes”- guarda a palavra
dos tempos de mercearia - confessa que o negócio está
a diminuir. Sobretudo porque actualmente se multipli-
cam as ervanárias e os chás se vendem até nas pratelei-
ras dos super e hipermercados. “As pessoas vão lá, pen-
sam que perdem menos tempo... Algumas ervanárias
são boas, mas também existe muita coisa que não se
sabe como é cultivada e, acima de tudo, como é que é
secada. A secagem das plantas é muito importante por-
que, se apanharem chuva, perdem as propriedades”. E
António dá mais um exemplo da sua sabedoria de mais
de 70 anos de estudo das ervas. Pega num livro de ca-
pa gasta e páginas soltas, que comprou pelas “Selec-
ções”, sobre plantas medicinais. Folheia e lê um pará-
grafo que fala da malva, com propriedades emolientes,
para usar em cataplasmas, lavagens e irrigações. Boa
parar curar doenças do estômago, abcessos na pele e
como desinfectante para gastrites, colites cistites, tosse,
catarro. Pode-se ainda lavar com ela feridas, furúnculos
e úlceras. Há mais de 2000 mil anos que é usada com
fins medicinais. “Não tem novidade nenhuma. São coi-
sas que sempre estiveram entre nós”.

Vida de trabalho
Chá de macela para a febre, má digestão e cólicas. Quem passa a porta de entrada percebe logo que es- ta que tem mais de 70 anos dedicados ao estudo das António Nunes guia-nos pela casa grande, de muitos
Tomilho para as infecções da garganta. Salva para as sa é uma grande parte da sua vida. O cheiro a diversas plantas medicinais. quartos. A mobília é antiga e as paredes finas. Passa-
constipações e catarro. Cidreira para as doenças can- ervas enche o ar. Quando se entra numa das divisões, O discurso vai saindo aos poucos. António interrompe ram por ali muitas vidas. Foi onde António nasceu e
cerosas, nódulos, caroços, leucemia, problemas renais à esquerda, percebe-se porquê. Os grandes sacos de as perguntas com pequenas informações sobre as er- cresceu com os irmãos, hoje todos falecidos. Foi tam-
e intestinais, do fígado e da bexiga, doenças da boca plástico com plantas secas estão dispostos pelo chão vas que estão presentes em todo o quarto. Pega numa bém onde criou os cinco filhos e dividiu as “horas boas
e da garganta. e sobre a mesa de madeira áspera. Com as mãos gas- mão de tomilho, uma espécie granulosa e escura, e con- e más” com a mulher. “Viveu aqui muita gente”, diz.
Há décadas que António Nunes, com 90 anos, domi- tas António puxa um banco e ajeita o boné de pano ta que “há gente que vem de longe à procura disto”, pa- Abre a porta para o quintal. Seguimos pela terra ba-
na a sabedoria das ervas. Têm mais de 150 espécies escuro. Explica que é ali que passa muitas das horas ra curar a tosse convulsa. Agarra também numa mão de tida onde nos aponta a macela, a salva, as perpétuas
de plantas cultivadas nas terras que lhe rodeiam a ca- dos seus dias. “Tenho um quintal com algumas ervas perpétuas roxas. Explica que servem para desinflamar a roxas, a laranjeira, a erva-babosa, que se aplica sobre
sa antiga, no Chafariz Velho, número 18, em Santa Lu- e um pomar em cima. Também há plantas que apa- garganta. “E são muito bonitas, uma coisa linda. Tenho lá a pele para acabar com comichões e irritações. Tapa-
zia de Angra. nho em outros sítios, mas vou fazendo isso cada vez no meu quintal, mostro-lhe já daqui a bocadinho”. da por um pequeno barril está uma erva que “purifica

DI DOMINGO  13.janeiro.2008 DI DOMINGO  13.janeiro.2008


tudar e ser alguém. Estudem, que eu nunca mais lar-
go vocês. E não larguei”. Já não há tristeza na sua voz.
Apenas orgulho e dignidade.
Os filhos estudaram e tiveram sucesso. Hoje, um dos
carros caros, grandes e pesados de António, que se
tornou engenheiro químico e trabalha para uma gran-
de empresa, no Continente, está do lado de fora da
casa de Santa Luzia. Além disso, o “mais moço” é mé-
dico nas Caldas da Rainha, mas António Nunes diz
que não há qualquer discussão acerca de plantas me-
dicinais. “Ele diz que estudou para médico e que per-
cebe de medicamentos, não de ervas. São duas coisas
diferentes, cada qual com a sua utilidade”.
Uma vez mais, António Nunes interrompe a conversa
para dar mais alguns exemplos dessa utilidade. Passa-
nos uma página antiga do “Diário Insular”, com uma
entrevista sua que deu quando tinha 83 anos, onde
estão descritas as propriedades de algumas plantas.
Existe a tília, que serve como calmante e que, antiga-
mente, era muito usada pelos estudantes em perío-
do de exames. Há ainda a losna, designada cientifi-
camente como Artemísia absinthium L., que pode ser
o sangue”. Para lá do pomar, estão os pastos que An- tomada em gemadas. É um bom fortificante e o seu
tónio trabalhou ao longo de toda uma vida. chá acaba com o fastio. Já a erva limão é famosa pelo
Desde cedo que aprendeu o valor do trabalho. Come- agradável aroma a limão e a arruda é boa para o tra-
çou aos sete anos, a dar água às vacas, numa altura tamento das amenoreias provocadas pela atonia do
em que a estrada era de terra. Quando chovia o ca- útero. O poejo é um poderoso diurético, sendo reco-
minho era duro. Mas o trabalho a sério começou aos mendada a ingestão diária de um litro do seu chá.
nove anos. Passou por uma loja de fazendas, por uma Rodeado pelo seu mundo de calma, trabalho e ervas
farmácia e por uma loja de ferragens, até quando foi curativas, António Nunes não perde, porém, a capa-
chamado para a tropa, durante a II Guerra Mundial, cidade de analisar o mundo que o rodeia. Já tem um
onde permaneceu durante três anos. Depois, acabou certo receio de receber pessoas durante a noite. Me-
por abrir a mercearia na Rua da Sé. Mas não deixou do dos assaltos e da insegurança. Revolta-o também
de acordar cedo para ir para os pastos. Levantava-se a “falta de respeito”. Especialmente por parte dos mais
pela madrugada. Havia que ganhar dinheiro para sus- jovens. “ Faz-me impressão ver como certos filhos fa-
tentar a família. lam com os pais, com uma falta de respeito tremenda.
Ainda hoje, dá valor ao trabalho. Tem a noção de que Quando eu era rapaz, havia um grande respeito dos
é o facto de não parar que contribuiu para a sua lon- filhos aos pais. O meu pai nunca me tocou, mas eu
gevidade. “Há uns anos esteve um médico cá em casa nunca lhe disse nada que o ofendesse. Não sei por-
que me disse isso mesmo, que eu não parasse, que quê, mas era um amor tão grande que eu lhes tinha.
era o pior que podia fazer. Eu acredito nisso, a minha Ainda hoje, quando estou sozinho, penso neles”. Os
experiência diz-me que está certo”. olhos ficam molhados de saudade.
Acorda todos os dias por volta das seis horas da ma- Existem muitas coisas que lhe deixam saudades. O
nhã, quando a maioria das pessoas ainda está a dor- tempo mais feliz da sua vida, quando casou e criou os
mir. No Inverno, quando se levanta ainda é noite es- filhos, o tempo da mercearia de portas abertas na zo-
cura e o mundo está em silêncio, ficando só o baru- na nobre da cidade, em plena Rua da Sé. Outras dei-
lho do vento e da chuva. Trata da sua vida e pensa ne- xam menos, como a época em que dois dos seus fi-
la. Talvez pense nos filhos, em que tem tanto orgu- lhos estiveram na guerra do Ultramar e o coração se
lho. Sentado num banco de madeira, ainda na divisão apertava de medo sem notícias.
onde seca, ensaca e vende as suas preciosas plantas, Com o corpo ainda enérgico e o pensamento rápido,
não consegue impedir os olhos de se encherem de lá- António Nunes sente que a idade lhe começa a pe-
grimas quando lembra o dia em que o filho António sar, mas afasta o medo da morte com uma gargalha-
chegou a casa e lhe disse que não valia a pena estu- da. Com a ajuda dos chás, vai superando as dores de
dar. De qualquer forma, nunca iria passar do liceu e coluna, o mal dos rins e da próstata. Faz 91 anos em
ultrapassar a fronteira da ilha. Estava limitado aos tra- Abril e ainda gosta de cuidar das suas árvores de fru-
balhos menores que pagavam pouco, não era? “Ele to, das galinhas que se esgueiram entre os nossos pés
chegou a ter 20 valores a Matemática e chegou-me a no quintal de terra batida, de olhar os pastos onde tra-
casa a dizer aquilo, que não precisava de estudar tan- balhou toda uma vida. Resume tudo numa frase: “Vou
to. Eu disse-lhe que trabalhava o que fosse preciso, bem, sem grandes dores e com a ajuda das minhas
que vendia os pastos, mas que os meus filhos iam es- ervas. Ainda dá para gostar do mundo”.

DI DOMINGO  13.janeiro.2008 DI DOMINGO  13.janeiro.2008


reportagem vanda mendonça todo um leque de oportunidades para Bárbara Mo- temente, Bárbara Moniz estreou-se no fado com ape-
fotografia antónio araújo niz. “Os presentes gostaram muito, acharam fantásti- nas 14 anos de idade, por influência dos discos de vinil
co…”, recorda, com um brilho nos olhos. do pai. “Em miúda, comecei a ouvir e a cantarolar, até
Através de Bruno Walter Ferreira, a jovem conhece que alguém disse que eu tinha jeito e um bom timbre
Carlos Baptista (guitarra portuguesa), Liberal Louren- e, por brincadeira, comecei a cantar”.

bárbara moniz ço (violão) e Alberto Toste (viola baixo). “Fizemos um


ou outro ensaio e eles ficaram entusiasmados com a
Inscreve-se então num concurso de jovens talentos,
ao qual concorre com um fado. Os músicos que a

Jovem fadista
possibilidade de darmos alguns concertos juntos”. acompanham gostam da sua voz e, a partir daí, con-
No espaço de cerca de um ano, a fadista e o trio de vidam-na para cantar com eles, sobretudo, em noi-
violas realizam uma série de espectáculos em restau- tes de fado organizadas por restaurantes da ilha.
rantes, na Carmina - Galeria de Arte Contemporânea Ainda em São Miguel, frequenta, durante cinco
e nas Festas Sanjoaninas 2007, merecendo sempre anos, o Curso de Técnica Vocal no Conservatório
Regional de Ponta Delgada. “Poderia ter continua-
do o Conservatório aqui, mas o curso de Enferma-
gem é tão intensivo que preferi não me dedicar às
duas coisas ao mesmo tempo e acabar por não fa-
zer nada bem”, explica.
Mas é na ilha Terceira, onde frequenta actualmen-
te o último ano do curso de Enfermagem, que a sua
vocação de fadista ganha “maior ênfase”. “Inscrevi-
me na tuna da escola, onde sou solista, e já aí isso
começou a fazer-se notar”, refere. “O sonho de se-
guir uma carreira artística não está posto de parte”,
mas é algo que reconhece ser “difícil no meio onde
nos encontramos”. “Quero ter os pés bem assentes
na terra”, afirma.
Por agora, a prioridade vai para a conclusão do cur-
so e para a carreira, que constitui outra das suas
paixões. “Sempre tive paixão pelo cuidar, pelo con-
tacto com as pessoas, e penso que a melhor forma
de expressar esse sentimento é estar junto dos do-
entes e, com a minha alegria e a minha espontanei-
dade, ajudá-los a ter um dia melhor”, diz, com um
sorriso no rosto moreno e simpático.

Disco é meta
Para o futuro, Bárbara Moniz deseja ter “trabalho
como enfermeira nos Açores e ir cantando”. “Sem-
pre que possa, pretendo conciliar as duas coisas”,
garante.
Dentro de seis meses, a jovem fadista deverá re-
gressar à ilha que a viu nascer, mas promete vol-
tar sempre que o público a reclame: “Quando hou-
ver oportunidade para vir aqui cantar, estarei dis-
ponível”.
Bárbara Moniz é uma das mais re- Foi na Pousada de São Sebastião, em Angra do He- rasgados elogios do público pela forma como inter- Para além do fado, a jovem gostaria igualmente de
roísmo, que, por um “feliz acaso”, a ilha Terceira des- preta alguns dos maiores clássicos do fado. explorar a canção e o jazz. “Tenho também essas fa-
centes e promissoras vozes aço- cobriu o seu talento de fadista. “Fui visitar o espaço “Sinto-me muito acarinhada, elogiada e valorizada cetas, mas, para já, onde me sinto bem é a cantar o
com uns amigos e, quando passámos por um peque- pelos terceirenses, o que não acontecia em São Mi- fado”, sublinha.
rianas do fado. Natural da ilha no túnel, cantei dois ou três fados e comentei que ti- guel, talvez porque ninguém é perfeito na sua terra”, Gravar um disco é outro dos seus sonhos. “Estive
nha uma boa acústica”, conta a jovem de 25 anos, diz, reconhecendo, no entanto, que os conterrâne- recentemente na Madeira, onde gravei três canções
de São Miguel, a estudante de en- natural da ilha de São Miguel. Mas a “brincadeira” os não se esqueceram de si: “Convidam-me sempre em dueto com Bruno Walter Ferreira para o seu úl-
atraiu a atenção dos empregados e de alguns hós- para actuar no Natal dos Hospitais, mas como geral- timo disco”, conta. “A experiência de gravar num es-
fermagem realizou o seu primeiro pedes, que não resistiram a aplaudir no final do con- mente coincide com o período de aulas não tenho túdio e de todo o ambiente foi tão boa que pensei,
certo improvisado. podido aceitar”. Contudo, no seu entender, “as pes- futuramente, em gravar um disco a solo”.
grande concerto nas Sanjoaninas Alguns dias mais tarde, a estudante de enfermagem soas aqui na Terceira estão mais sensibilizadas pa- “É uma meta a atingir”, revela. “Talvez para o ano,
volta ao local, onde, por coincidência, se encontrava ra o fado”. porque trata-se de um trabalho que envolve muita
2007, granjeando rasgados elo- também Bruno Walter Ferreira. Incitado pelos empre- coisa”. Até lá, pretende sobretudo, “trabalhar mui-
gados, o músico convida-a a cantar e acompanha-a “Paixão pelo cuidar” to” e, sempre que possível, aliar as suas “duas pai-
gios do público. na guitarra. Nascia assim a amizade entre os dois e Apesar da maior atenção de que tem sido alvo recen- xões”.

DI DOMINGO 10 13.janeiro.2008 DI DOMINGO 11 13.janeiro.2008


P E R S P E C T I V A S
Francisco coelho reis leite

A RATIFICAÇÃO… O SEGREDO DA
MARIANINHA
O Primeiro-Minis- Se tal voltasse a aconte- ganhariam em poten- ma automática, seria a
tro anunciou, na últi- cer, haveriam concerteza ciar um dos principais simples marcação de um
ma quarta-feira, no Par- interpretações “salazaris- frutos do sucesso, por Referendo que, num pas-
lamento, que o Governo tas”, contando as absten- todos reconhecido, que se de mágica, despertaria
iria propor a ratificação ções como votos a favor foi a Presidência Portu- um inusitado e inespera-
do Tratado de Lisboa por e lançando dúvidas de guesa! do apetite por conhecer No início da semana qual era o segredo e as- te agora da ratificação, é tificarem este tratado por
via parlamentar. legitimidade sobre algo Mas valores mais altos todos os meandros do que terminou, o nosso sim, sem surpresa, ape- um documento secundá- referendo.
A decisão tem boas ra- de fundamental para o se alevantam. Neste ca- tratado e da União Euro- primeiro, Primeiro Minis- sar de tudo, ficámos sa- rio que se limita a insti- Só assim a Europa renas-
zões políticas a seu fa- nosso país. so, aliás, a maioria das peia. tro, evidentemente, re- bendo que o Tratado de tuir os mecanismos para ceria de umas bases se-
vor, que se prendem com De resto, não deve ser forças políticas que são Por tudo isto bem anda- solveu revelar o segredo Lisboa será ratificado, governar a Europa a 27 e guras, límpidas e demo-
uma “ética de responsa- Lisboa a criar um prece- contra a ratificação par- ram o Governo, o maior que guardava no seu ín- precisamente em Lisboa, por isso não merece as cráticas e se livraria desta
bilidade”. dente que pudesse, ain- lamentar… também são partido da oposição e o timo sobre a forma que por via parlamentar, sem honras de uma ratifica- corrida para a frente ao
Desde logo, não é ver- da que minimamente, fa- contra o Tratado. Presidente da Repúbli- escolhera para a ratifi- incómodo para os cida- ção por referendo. arrepio da vontade dos
dade que o Programa zer perigar a ratificação, E se é certo que há que ca sintonizados num am- cação do Tratado de Lis- dãos dispensados de vo- Ora, como tudo isto cidadãos.
Eleitoral do PS fixasse o pelos 27 Estados, do Tra- prosseguir e ampliar a plo consenso institucio- boa. tarem num referendo e acontece no início do Realmente do que pre-
compromisso de referen- tado de Lisboa! pedagogia sobre a Euro- nal que suporta esta de- Foi a surpresa, mas a sur- até, de preferência, dis- Carnaval, até me parece cisa a Europa neste mo-
dar este tratado – mas Pois em termos políti- pa, é vagamente ingénuo cisão de ratificação parla- presa da Marianinha ou pensados de lerem ou se que está muito bem es- mento não é de tratados
sim o já defunto e enter- cos, o governo e o PS só pensar-se que, e de for- mentar. seja, já todos sabíamos preocuparem com o seu ta espécie de ópera bufa ou de constituições. Do
rado “Tratado Constitu- conteúdo. ou comédia de enganos que precisa a Europa é de
cional”, que pretendia ser Para o comum dos mor- em que se preparam pa- varrer com esta mediocri-
a nova Constituição Eu- tais basta que saibam ra desempenhar os seus dade dos seus líderes pa-
ropeia, refundando-a, le- que o Tratado é uma es- papéis os ministros, os ra encontrar outros com
gitimando-a e revogando pécie de oitava maravi- deputados e o Presiden- carisma suficiente para
formalmente os tratados lha e fruto da superior te da República. transformarem a Europa
anteriores. capacidade diplomática Mas há uma questão que, nalguma crise credível,
O Governo e o Partido do nosso inefável Primei- apesar de tudo, muito di- com dinâmica e capaz
Socialista estavam e es- ro Ministro e da sua ex- ficilmente se pode es- então de passar desta fa-
tão livres para escolher traordinária equipa, ape- conder debaixo dos ata- se ridícula e carnavales-
qualquer uma das for- sar de dizer, no fundo, o vios mais ou menos ful- ca para uma fase adulta.
mas possíveis de ratifi- mesmo que dizia a de- gurantes de uma fantasia Talvez, por fim, nasça
cação, todas elas demo- cantada constituição eu- de bal masque. É que ci- uma Europa democráti-
cráticas – a representati- ropeia e apesar da pru- dadãos europeus, exer- ca, capaz de eleger uma
va (por via parlamentar) dência alemã, que prece- cendo o seu direito de Assembleia Constituin-
ou a referendária. deu a portuguesa, tendo soberania, já disseram te que faça ela e não os
A história dos nossos re- já conseguido os consen- que rejeitavam muitos burocratas de Bruxelas,
ferendos, por razões que sos necessários. dos preceitos que ago- uma Constituição Euro-
aqui e agora não cabe Contudo, é bom frisar ra estão de novo trans- peia.
escalpelizar, tem conta- que, em certos momen- critos no Tratado de Lis- Para já os portugueses,
fotografia inácio rosa/lusa

do sempre com relativa- tos, o Tratado, dito de boa e se os governos eu- querendo, podem come-
mente fraca participação, Lisboa, é uma inovação ropeus quisessem (que çar a contribuir para es-
ficando aquém do exigí- completa e um porten- não querem, é evidente) sa nova Europa. Basta-
vel para os mesmo se- to de equilíbrios que sal- respeitar os princípios da lhes mandar às malvas o
rem legalmente vincula- varam a Europa. Noutros Democracia não teriam nosso primeiro, nas pró-
tivos. momentos, como es- outro remédio senão ra- ximas eleições.

DI DOMINGO 12 13.janeiro.2008 DI DOMINGO 13 13.janeiro.2008


VELA DE ESTAI
Francisco Maduro-Dias
maduro.dias@mail.telepac.pt

O PARADIGMA
CONTINENTAL
Paradigma O facto é que raramente as ilhas são olhadas como
do Lat. paradigma < Gr. parádeigma, modelo um modelo de território – um paradigma – a trabalhar
s. m., modelo; norma; exemplo; padrão. e a desenvolver em si mesmo, diferente doutro, o da
terra continuada ou continental.

Portugal é um país centralista e centralizador! Deveria ser simples perceber que, se o chão é dife-
Vários o dizem e a experiência o demonstra. rente, as soluções terão de o ser também, mas não
Não o terá sido sempre mas, pelo menos desde o acontece assim!
Marquês de Pombal em diante, as coisas foram avan-
çando quase sistematicamente no sentido do “quero,
posso e mando” de um centro, em detrimento de pe- Assim e embora pareça estranho, há como que um
riferias cada vez maiores, extensas e longínquas. esforço permanente em se referir o carácter insular
destas ilhas como “mal incurável” e bloqueio ao de-
Diria, por outro lado e certamente também por isso, senvolvimento.
que Portugal se dá mal com ilhas.
Sem dúvida que a questão provém do paradigma de
Também não é uma coisa tão antiga como o País já partida.
que, por exemplo, ao invés de dominar os territórios
na América do Sul como Espanha o fez, a par e pas- Em vez de se pensar em comunicações de terceira ge-
so, no nosso caso o controlo das zonas de oiro e pe- ração, continua a pensar-se em estradas;
dras preciosas do Brasil foi realizado por manchas Em vez das decisões acordadas serem aplicadas e vi-
– quais ilhas no interior do sertão – separadas por giadas localmente, todos os dias se reduz a capacida-
quilómetros e quilómetros quadrados de uma rea- de decisória em cada ilha;
lidade de mata completamente diferente. Apenas a Em vez do sistema político reproduzir a realidade fí-
estrada e uma estreita faixa de ambos os lados liga- sica, geológica, climática, cultural das ilhas, insiste-se
vam essas “ilhas” formando aquilo que hoje consti- em querer projectar sobre estes pequenos mundos
tui um excelente exemplo de arquitectura, urbanis- insulares não a rede que lhes falta para saírem do seu
mo e arte barrocas: As cidades, vilas e povoados em olhar sobre o umbigo mas a sombra do continente e
Minas Gerais. da continuidade territorial que não existe.

O problema tem a sua raiz numa simples coisa: o mo- É assim a modos como querer tirar goiabas de uma
do como se vê o Mundo! macieira, e depois queixam-se dos custos e da inefi-
fotografia antónio araújo

À romana, onde todos os caminhos do império iam ciência.


dar à Cidade Eterna, ou às suas cópias provinciais;
Ou à grega, onde cada cidade estado se via como O que a gente precisa é do que nos faz efectivamen-
igual às outras, cada ilha do mar helénico se entendia te falta: de condições fiáveis, boas e baratas de comu-
como igual às companheiras. nicar.

DI DOMINGO 14 13.janeiro.2008 DI DOMINGO 15 13.janeiro.2008


reportagem . fotografia henrique dédalo

FÉ COM PerCALÇOS
O Menino da Praia
No Convento de Jesus, na Praia da Vitória, no local al, onde Terezinha acabou por ir parar.
onde se encontra hoje instalado o BCA, eram as freiras Por essa altura, a rainha D. Maria, esposa de D. Pedro II,
as principais devotas de Jesus, já que os Franciscanos, estava grávida em parto com algumas complicações e
em outros locais, tinham outras devoções mais predi- foi então que a Irmã Terezinha lhe contou a história do
lectas, destacando-se como é óbvio, o seu patrono São Menino Deus da Praia e aproveitou para sugerir que tu-
Francisco de Assis. do poderia correr melhor se o reino fizesse uma enco-
Na Praia da Vitória dos séculos XVI e XVII, reza uma len- mendação daquele parto ao Menino, na sua fé de que
da com diversas proveniências e formas de contar, uma a rainha teria um parto mais fácil.
das quais a de Gervásio Lima (a que agora se regista), A rainha aceitou a ideia de Terezinha e, a partir desse
que apareceu um dia no Convento de Jesus, uma ve- momento e até à hora do parto, elevou as suas preces
lhinha a pedir esmola e que foi atendida de forma mui- ao Menino Deus da Praia. O parto correu muito bem,
to carinhosa por uma tal de Irmã Terezinha, que era a ao contrário do que se esperava. nelas, prometeu aos praienses que se estes votassem tituído por uma outra imagem de dimensões maiores,
mais nova que ali habitava. Foi essa ocorrência que levou a que D. Pedro II, não ca- nele, nas eleições de 1831, que o Menino regressaria que a tal de Lucindinha usava como sendo o verdadei-
Nessa altura, as freiras adoptavam nomes de santas, bendo em si de tanta satisfação, pediu para que a ima- à Praia, e não lhe faltaram os votos. Depois de eleito, ro, porque, segundo foram contando testemunhas, era
o que era recorrente até há bem pouco tempo, sendo gem que um dia aparecera no centro da Praia da Vitória, Teotónio de Ornelas cumpriu e o Menino regressou à um Menino Jesus que chorava, fazia chichi, tal e qual
que só nas últimas duas ou três décadas esse hábito fosse recebido e alvo de grandes festividades, na corte. Praia. como se fosse de carne e osso.
deixou de ser obrigatório, apesar de ainda hoje existi- (A filha de D. Pedro II e D. Maria, acabou por fazer-se Algum tempo depois os conventos foram extintos, no O problema foi que muitas pessoas, quase todas as
rem casos de mudança de nome nas entradas para os mulher e casar com um imperador austríaco). período das lutas liberais, mas a verdade é que a ima- pessoas da Praia e do resto da ilha acreditaram nas ar-
conventos. Para que as honrarias fossem de grande monta, as que gem do Menino Deus da Praia, não voltou a abando- timanhas da Lucindinha, e se é verdade que se conse-
A Irmã Terezinha, por muito bondosa, abriu de par em os reis portugueses julgaram por bem, fizeram deslocar nar a sua morada no Ramo Grande, onde ainda hoje guiu acabar com aquela fantochada, a verdade é que
par as portas do Convento de Jesus e depois de pe- à Praia a Esquadra Real, que em meio de grandes feste- permanece. muita luta a coisa deu.
dir autorização à Madre Superiora, a velhinha acabou jos, levou o Menino Deus da Praia até Lisboa, onde, a 6 É por essa altura que foram criados os mordomos, Essa imagem usada pela Lucindinha já não existe, mas
por ali pernoitar, tendo recebido uma refeição confec- de Janeiro, decorreram as grandes celebrações que en- em mesa administrativa com provedor, que se fizeram sim outra grande, mas em louça, que se encontra tam-
cionada a capricho e depois sido convidada para dor- volveram toda a Corte, e que na altura foram das maio- substituir ao município e outras autoridades, na realiza- bém na Igreja Matriz, sendo ainda usada, por vezes, pa-
mir numa das celas, precisamente a da irmã que a re- res que ali decorreram, no que se refere a actos de fé. ção da festa de 6 de Janeiro. ra as noites de Natal na missa do Galo.
cebera à porta. A imagem foi alvo de muitas ofertas, uma das quais é Segundo Ornelas do Rego, que deixou esta parte da Quanto à imagem, em madeira, usada pela Lucindinha
Chegado o alvorecer, quando Terezinha se dirigiu à sua ma caixa de prata, onde ainda hoje o Menino Deus da história contada a Francisco Jorge Ferreira, actualmente para os seus truques de charlatanice, foi queimada numa
cela para acordar a velhinha, já não a encontrou, no en- Praia é colocado e se mantém no museu da Igreja Ma- provedor da Santa Casa da Misericórdia da Praia, e his- cerimónia em que esteve presente o bispo de então.
tanto, reparou que na sua cama fora deixada uma ima- triz da Praia da Vitória. toriador da capital do Ramo Grande, a família de João Alguns padres olharam a situação com muita suspei-
gem do Menino Jesus, precisamente a mesma que, de Por ocasião do regresso da imagem do Menino à Praia, de Ornelas, padre Cândido Ornelas e Aniceto de Orne- ta e outros acreditaram. Entre esses, o vigário da Ma-
acordo com a lenda, ainda hoje se encontra na Igreja os reis decretaram que as alfândegas de Angra e de las, presidente do município em tempos muito idos, triz, dr. Patrício, um homem tido como muito culto, foi
Matriz da Praia da Vitória e que é disponibilizada no dia Ponta Delgada, criassem um imposto com a finalidade gente de grande poder na Praia da Vitória, e por is- o primeiro a cair na esparrela e a acreditar, como diz
6 de Janeiro, Dia de Reis, de todos os anos, para o tra- de realizarem todos os anos, no dia 6 de Janeiro, a fes- so recebem das mãos do conde da Praia, a imagem Francisco Ferreira, “naquela macacada toda”, tudo is-
dicional beija-pé. ta em honra do Menino Deus. do Menino Deus, e foram eles que realizaram a festa to contado por pessoas antigas que viveram esses mo-
Esta mesma lenda, contada pela professora Regina, di- Por conta dessa lei, a festa do Menino Deus da Praia até 1909, ainda sob os desígnios da Coroa. A partir de mentos. Tido como pessoa de grande bondade, crê-se
verge um pouco, mantendo-se a velhinha, mas acres- durou até ao ano de 1909, tendo deixado de se realizar 1910 a festa deixou de se realizar, de forma oficial, ten- que o dr. Patrício, terá sido mais ingénuo do que tolo.
centando-se que quando esta entrou no convento, com o fim da monarquia em Portugal. do sido, no entanto, abraçada e continuada pelos cató- Era irmão do padre Menezes, que se tornou famoso
passou por uma cruz de prata que teria olhado demo- Anteriormente, o grande terramoto de 1614, que aba- licos que frequentavam a Igreja Matriz. por exercer o sacerdócio e ao mesmo tempo ser pai
radamente, em reflexão, sendo que a maior diferença lou e praticamente destruiu a Praia, levou a que as frei- biológico de várias filhas e filhos, ao contrário de um
se prende com a oferta da imagem em vez de esta ter ras dos conventos ali existentes mudaram-se para a CRISE DE 1919 seu outro irmão, que era juiz e tido como um homem
aparecido em lugar da velhinha. cidade de Angra, temporariamente, apesar de que se No entanto, uma enorme crise religiosa ocorrida na tão santo, tão santo, que chegou mesmo a casar com
fosse por vontade delas, o regresso teria sido mais di- Praia da Vitória, que teve início no ano de 1919, com a voto de castidade… no seu segundo casamento.
DA PRAIA À CORTE fícil. Com elas, levaram o Menino Deus da Praia, o que chegada de um homem de grande valor e saber, que Com toda a confusão que se gerou, acabou-se em
As freiras permaneciam pouco tempo nos mesmos irritou sobremaneira os praienses e as coisas estiveram tinha sido governador de Goa, mas que trouxe a acom- 1919, a festa ao Menino Deus da Praia, e a imagem ori-
conventos e a Irmã Terezinha acabou por viajar até Lis- feias durante algum tempo, gerando-se uma grande panhar a família, uma criada de nome Lucindinha, que, ginal mantém-se na Igreja Matriz, dentro da sua caixa
boa, e aconteceu ficar num convento franciscano que confusão entre Angra e Praia. de um momento para o outro, se armou em santa e o de prata, que terá sido oferta de D. Pedro II e da rainha
tinha a particularidade de ceder freiras para o Paço Re- O que é certo, é que o Conde da Praia, Teotónio de Or- Menino Deus da Praia desapareceu, tendo sido subs- sua esposa.
folhetim
luiz fagundes duarte
355

Uma história
de viagens –
e o “Erdapel”
Diz-se que os açorianos têm uma especial apetência ra termos acesso aos muitos bens que por cá se não
pelas viagens, e que o espírito de aventura seria ineren- produzem; e mesmo a Base das Lajes, paradoxalmen-
te à nossa condição de ilhéus… Bem, talvez. Mas con- te, se encontra dependente dos petroleiros que a vêm
vém que ponhamos as coisas no seu devido lugar: o abastecer, para por sua vez poder abastecer os aviões,
espírito de aventura e a necessidade de conhecer ou- estando assim também dependente das condições do
tros locais – ou seja, o impulso para a viagem – são fac- mar que nos limita. E finalmente, a memória da emi-
tores inerentes ao ser humano. O que podemos dizer gração, que desde o século XIX, e sobretudo por me-
é que o açoriano, porque vive em ilhas, e por isso es- ados do século XX, desauriu as nossas ilhas de gen-
tá naturalmente limitado nos seus movimentos, sentirá te que, para fugir às duras necessidades que por cá se
de uma maneira mais premente a necessidade de via- sentiam, foi contribuir para enriquecer países alheios,
jar, não tanto talvez por espírito de aventura, mas sim- onde acabaria por edificar novas ilhas a que, hoje, po-
plesmente pela necessidade “de sair”, de esticar as per- deríamos chamar açorianas…
nas. A isso soma-se, é claro, a memória da História do A história humana é uma história de viagens. E todas as
último meio milénio, em que os açorianos se habitua- culturas humanas têm, entre os seus mitos fundadores,
ram a conviver com os viajantes de longo curso, vindos ou nas suas narrativas de consolidação de identidade,
das Índias e das Américas e narrando histórias de gen- uma viagem: temos Adão e Eva a iniciarem uma eter-
tes estranhas e lugares desconhecidos, a sentir as nos- na viagem de expiação após a sua expulsão do Éden, e
sas ilhas como verdadeiros faróis de orientação e por- temos a Arca de Noé, a Barca de Osíris, os Judeus atra-
tos de apoio aos viajantes no meio do mar oceano. Nas vessando mares e desertos em busca da Terra Prometi-
nossas ilhas, tradicionalmente, as pessoas tinham du- da, e até a viagem de José e Maria que fez com que Je-
as opções em matéria de bens de consumo: ou se con- sus nascesse fora de casa… Temos as grandes viagens
tentavam com o que a terra dava, e era pouco e pouco narradas nos textos homéricos, sobretudo a Odisseia…
variado, ou usavam, se o podiam, aquilo que vinha nos Temos a Hégira de Maomé, que foi a sua viagem de fu-
navios de longe e que seria, naturalmente, mais apete- ga de Meca para Medina, onde fundou o Islão… Temos
cível; mas aquilo que aqui chegava a bordo dos navios as Sagas dos povos nórdicos, especialmente dos vikin-
não vinha para ficar, estava de passagem, e assim a ca- gs; as viagens de Marco Pólo, Colombo, Vasco da Ga-
minho de outro destino longínquo, que era o Conti- ma, Cabral ou Magalhães; temos a epopeia fundadora
nente, e o pouco que ficava seria, provavelmente, mais do Brasil que foram as viagens dos Bandeirantes para
por acaso ou por acidente do que por necessidades de o interior desconhecido, e as viagens dos exploradores
consumo locais… em África, onde o nosso Roberto Ivens desempenhou
Nós trazemos connosco esta memória de chegadas e o seu papel, e dos americanos a caminho do far west…
partidas, e sobretudo esta memória de ver chegar e E como se não houvesse mais coisas para descobrir cá
partir: primeiro a memória histórica, dos tempos das na Terra, ainda se foi à Lua, pensa-se ir a Marte…
grandes navegações. Depois a memória do abasteci- Ah: foi depois de ter vivido no Faial que Martim da Bo-
mento, que em muitos casos ainda perdura como re- émia, genro de Josse van Hurter, o fundador da Horta,
alidade incontornável, e que nos demonstra como es- construiu em 1492, em Nuremberg, o primeiro globo
tamos sempre dependentes da chegada do navio pa- terrestre – o “erdapel”…

DI DOMINGO 18 13.janeiro.2008 DI DOMINGO 19 13.janeiro.2008


entrevista vanda mendonça

fotografia antónio araújo

D. Duarte de Bragança
Reino protege
autonomia
D. Duarte de Bragança passou re- mos escrever ou se fizermos muitas coisas erradas,
podemos corrigi-lo. Quando se destruiu a paisagem e
centemente pela ilha Terceira, por a arquitectura é muito difícil fazê-lo. É um mamarra-
cho que está aqui durante dezenas de anos ou mais.
ocasião da inauguração do Centro O que vale é que essa construção modernista é de
muito má qualidade e provavelmente vai cair mais ce- de nós’ além de uma traição é um disparate. ra e nos Açores há muitos anos: os Açores deveriam
Porta Amiga da AMI, em Angra do do do que as antigas. ter um estatuto de reino unido com Portugal e com
Uma eventual união ibérica está então fora de questão, na a Madeira e até com outros países lusófonos que se
Heroísmo. O chefe da Casa Real por- Vivendo nós numa república, as causas sociais são o último sua opinião? quisessem juntar a esse reino unido, à semelhança do
reduto para a sua actuação? A aliança ibérica é muito importante. Uma profunda, Reino Unido de Inglaterra, Escócia e ilhas do canal ou
tuguesa propõe a constituição de Tenho colaborado com o Governo da República em íntima e fraterna aliança entre Portugal e Espanha é da Holanda com as Antilhas ou dos Estados Unidos
assuntos de interesse diplomático. Por exemplo, nas fundamental, assim como com Inglaterra e outros pa- com Porto Rico. Este estatuto de reino unido resolve o
um reino unido com Açores, Madei- relações com a Indonésia durante a ocupação de Ti- íses. Agora, integrarmo-nos num país muito maior e problema da autonomia, sem haver esta permanente
mor, nas relações com o mundo árabe, com os países mais forte representaria, obviamente, a perda com- aflição de que a autonomia pode levar a desaparecer
ra e continente, que, segundo diz, lusófonos… Geralmente, tenho tinha uma boa cola- pleta da nossa independência. Os outros povos, co- a unidade nacional. Só numa república é que estamos
boração com os ministros dos Negócios Estrangeiros mo os bascos, os catalães e até os galegos, que não aflitos com essa dicotomia. Nas monarquias esse pro-
preservaria as autonomias. e com outros ministros. A minha posição de chefe da conseguiram a sua independência, têm imensa inve- blema não existe.
Casa Real portuguesa pode servir para servir o país e ja nossa, porque gostariam de ser como nós. É pre-
os portugueses, mesmo num regime republicano. ciso ser particularmente estúpido para pôr em cau- Como é que esse reino unido funcionaria na prática?
sa um valor que custou tanto a conservar. Tanta gente Toda a gente sabe como funciona o Reino Unido in-
Como surge a sua ligação à AMI? Que mais-valia é que a Casa Real pode trazer para essas deu a vida para preservamos a nossa liberdade e inde- glês, por exemplo. Com governos totalmente autóno-
Há muitos anos que sou amigo e tenho colaborado questões? pendência, para agora nos entregarmos por interesses mos, com moeda, selos e finanças locais e legislação
com o Dr. Fernando Nobre em algumas iniciativas. Sa- Sou independente. Não recebo salário nem subsídios momentâneos e comerciais. Isso só interessa às mul- própria, mas com o mesmo chefe de Estado, que é a
bendo que eu gosto muito da Terceira, em particular, de ninguém. Portanto, posso dar as minhas opiniões, tinacionais. Como este pacto, esta constituição euro- rainha, e forças armadas e negócios estrangeiros em
e dos Açores, em geral, era uma boa ocasião para vir posso ajudar a esclarecer e a lançar o debate junto da peia… Isto interessa às multinacionais, porque é mais comum. O que é nacional é comum e o que é lo-
cá inaugurar a sede da AMI. O facto de a construção opinião pública. Por isso o Instituto para a Democra- fácil controlar um governo europeu do que ter de tra- cal é separado. Actualmente, temos leis laborais extre-
ser bonita e respeitar a arquitectura tradicional de An- cia que foi criado agora. Porque se fosse empregado tar com 25 governos europeus. Penso que é a única mamente fortes, uma fiscalidade muito alta e somos
gra do Heroísmo é um óptimo exemplo também para do Governo teria de ter cuidado com o que digo ou explicação… quase o último país europeu ao nível do desenvolvi-
todo o país. Infelizmente, por vezes, o Estado quando poderia ser despedido. Não é o caso. Há tantos portu- mento humano, enquanto antes de 1910, antes da re-
faz liceus, pousadas, bancos ou outras coisas é o pri- gueses competentes, capazes e cheios de boas ideias Considera que os portugueses deveriam ser chamados a pública, estávamos muito mais avançados em relação
meiro a demonstrar o desrespeito pela nossa identida- que não são ouvidos e têm soluções muito boas para pronunciar-se sobre este Tratado? ao resto da Europa.
de e a deixar os arquitectos à solta para fazerem os cai- os nossos problemas. Devidamente informados e elucidados, sim. É uma
xotes que eles gostam de fazer. Isso não pode ser. Se grave falha da democracia que uma decisão destas A população em geral estaria aberta a uma solução des-
destruirmos a paisagem das belas aldeias, vilas e cida- A opinião pública em geral está receptiva às suas ideias? seja tomada à revelia de um povo. Com todas as des- te tipo?
des dos Açores deixa de haver razão para vir fazer tu- Em geral, sim. Mas também há pessoas que ficam in- culpas disparatadas de que as pessoas não sabem, Tudo depende da informação que as pessoas têm. Se
rismo aqui. E mais: os nossos netos vão ficar infelizes comodadas. No outro dia, a mulher do Saramago fi- são ignorantes, não percebem o que é que iriam vo- as pessoas têm informação, têm inteligência suficien-
e vão perguntar como é possível que uma geração de cou muito zangada comigo por eu ter dito que não tar… Se não sabem e não percebem, mais vale acabar te para comparar realidades e ver o que é que funcio-
vaidosos e de irresponsáveis tenha dado cabo do nos- admitia que se pusesse em causa a independência com a democracia. Não faz sentido isto. na melhor. Não se pode continuar a ver a política em
so património arquitectónico, da nossa memória… nacional. Poderei ter usado talvez uma expressão for- termos do século XIX ou do século XVIII ou em ter-
te demais, mas foi espontânea. Ninguém nunca nos Sente-se bem acolhido nos Açores? mos de fantasias pessoais de cada um. Hoje, os paí-
Essa é uma das suas grandes preocupações? protegerá tão bem como a nossa pátria. A pátria pre- Tenho vindo às vezes no Verão, com a família. Gosto ses mais ricos e desenvolvidos da Europa são os que
É. Porque é um mal irremediável. Quando se destrói, cisa de nós e nós precisamos dela. Isto de resolver os imenso de cá vir. Tenho uma solução política que con- têm reis e rainhas e Portugal atrasou-se muito em re-
destrói-se. Se não soubermos música, se não souber- problemas dizendo ‘venham os outros e tomem conta sidero interessante e que tenho proposto na Madei- lação a esses países, desde 1910.

DI DOMINGO 20 13.janeiro.2008 DI DOMINGO 21 13.janeiro.2008


reportagem vanda mendonça poníveis serviços de apoio social, psicológico, jurídico, executivo açoriano para trabalhar com a AMI, anun-
fotografia antónio araújo médico e de enfermagem, Clube de Emprego e apoio ciando, para o início do próximo ano, a assinatura de
à inserção sócio-profissional e actividades de anima- um acordo de colaboração entre as duas entidades.
ção sócio-cultural. “A pobreza e a exclusão social são um problema que
Será também facultada neste espaço a distribuição de cumpre a todos tentar resolver”, defendeu, salientando
géneros alimentares e de peças de vestuário que, neste contexto, “o Governo Regional tem privilegia-
No caso da Porta Amiga de Angra, será dada uma es- do a realização de parcerias e o trabalho em rede” com
pecial atenção, por um lado, aos casos de mulheres as instituições particulares de solidariedade social.

Fundação AMI que estejam a vivenciar problemas relacionados com


a pobreza, violência doméstica e o crescente fenóme-
Andreia Cardoso manifestou ainda a sua “grande sa-
tisfação” com a abertura desta nova valência na ilha

porta amiga
no das famílias monoparentais femininas, e, por outro Terceira, considerando que “os Açores terão muito a
lado, à população imigrante e ao crescente número beneficiar com a experiência da AMI”.
de cidadãos repatriados que, para além de desenrai- Também o presidente da Câmara Municipal de Angra
zados do seu meio, estão em situação ilegal. do Heroísmo, José Pedro Cardoso, exprimiu a dispo-
As instalações da AMI em Angra do Heroísmo encon- nibilidade da autarquia em colaborar com a fundação
tram-se num edifício de três pisos na Rua Pêro de Bar-
celos, junto à Marina de Angra, adquirido em 2004
com fundos próprios da fundação e recuperado atra-
vés de diversos apoios, nomeadamente do co-finan-
ciamento do Governo Regional e de donativos de em-
presas como a Desejo Sem Limites/Mecenato Net,
através das receitas do Leilão das vacas da Cow Para-
de, e da Natura Selection.
O custo total do projecto (aquisição e recuperação)
atingiu os 810 mil euros. Neste primeiro ano de acti-
vidade, entre despesas de funcionamento, de estru-
tura e de pessoal, a AMI estima despender mais 281
mil euros, parcialmente financiados pela Segurança
Social.
Em 2008, a fundação espera ainda inaugurar o Centro
Porta Amiga de Ponta Delgada, cujo projecto se en-
contra já em fase de aprovação.

Desafio à democracia
O combate à pobreza e à exclusão social é o mais im-
portante desafio que a democracia terá de vencer. A
ideia foi defendida por Fernando Nobre, presidente da
AMI, na inauguração do primeiro equipamento social fernando nobre | presidente da ami
da fundação no arquipélago.
Na ocasião, Fernando Nobre considerou que “só com no “alerta contra a intolerância e a indiferença e no
um empenho total, fazendo do combate à pobreza combate à pobreza, à exclusão social, ao subdesen-
uma causa verdadeiramente nacional, que envolva volvimento e à fome”.
não só os governos, mas também as empresas e os A AMI é uma Organização Não Governamental com
cidadãos, será possível fazer com que essa vergonha estatuto jurídico de fundação, privada, apolítica e sem
seja vencida”, sublinhando que “não há nenhum ata- fins lucrativos.
vismo lusitano que nos condene aos piores índices de Desde a sua fundação por Fernando Nobre, a 5 de De-
bem-estar e qualidade de vida da Europa”. zembro de 1984, assumiu-se como uma organização
O responsável sustentou, por outro lado, que o Centro humanitária inovadora em Portugal, destinada a inter-
Porta Amiga agora inaugurado “dignifica a cidade de vir rapidamente em situações de crise e emergência,
A cidade de Angra do Heroísmo A Fundação AMI – Assistência Médica Internacio- Angra, a AMI e as pessoas que a ele recorrerão, pois tendo o Homem como centro de todas as suas preo-
nal inaugurou recentemente, em Angra do Heroísmo, as pessoas mais necessitadas devem ser assistidas em cupações.
dispõe, desde Dezembro, de um Cen- o seu primeiro equipamento social nos Açores e 11.º espaços condignos”. O seu objectivo é lutar contra a pobreza, a exclusão
no país. Trata-se de um Centro Porta Amiga destinado Fernando Nobre destacou ainda que a fundação pre- social, o subdesenvolvimento, a fome e as sequelas
tro Porta Amiga da AMI. As mulhe- a apoiar a população mais carenciada. tende “integrar no concelho e na ilha a rede solidária da guerra, em qualquer parte do mundo.
Os Centros Porta Amiga têm como principal objectivo que já existe”. Contando já com mais de 20 anos de experiência no
res em risco de exclusão social, a criar os meios necessários para a (re)inserção social, “Perante os desafios que se avizinham para o país, combate à intolerância e à indiferença, a AMI continua
colocando à disposição dos seus utentes todas as va- não tenho dúvidas de que todos somos indispensá- a transmitir ao mundo a sua mensagem de solidarie-
população imigrante e os cidadãos lências habituais nestes centros de apoio social. veis, úteis e necessários”, afirmou. dade e humanismo, sobretudo através das suas mis-
Assim, e para além de refeitório (que fornecerá 50 re- Por seu lado, a directora regional da Solidariedade sões e do desenvolvimento de técnicas e métodos de
repatriados são o público-alvo. feições diariamente) e balneário, estarão também dis- e Segurança Social manifestou a disponibilidade do intervenção em situações de crise evolutivas.

DI DOMINGO 22 13.janeiro.2008 DI DOMINGO 23 13.janeiro.2008


opinião politeia
guilherme marinho arnaldo ourique
http://chaverde.blogspot.com/ Sala da Autonomia

Morder a língua… sala da


A propósito das declarações do Deputado Nuno
Amaral (*), sobre as potencialidades financeiras da vi-
deoconferência, face aos custos das deslocações in-
tes representações políticas, ou perante o Gover-
no Regional. Autonomia
ter-ilhas dos Deputados regionais - “a videoconferên- Ou seja, esta é a defesa da Assembleia Legislativa en-
cia, com excepção dos plenários parlamentares, re- quanto órgão político. Assim, é meu entender que os Este é o primeiro de uma série de textos que aqui va-
solvia perfeitamente a situação e evitava gastos des- benefícios da videoconferência serão, exclusivos, no mos continuar a publicar. O título genérico Sala da
necessários” -, perante o perigo da mistificação dema- âmbito do trabalho parlamentar, de: a) subcomissões; Autonomia (já não Autonómicas constitucionalida-
gógica, julgo ser de fazer os seguintes sublinhados: b) questões técnicas que as comissões queiram escla- des) merece uma explicação que também serve de
a)Os Deputados com assento na Assembleia Le- recer; c) audições de entidades externas ao sistema informação.
gislativa são representantes de toda a Região e político regional, nas quais o parlamento tenha inte-
não dos círculos por que foram eleitos (artigo 21.º resse, ou obrigação, considerando o âmbito das suas Há já alguns anos, desde 1990, que temos a ideia
do Estatuto Político-Administrativo); competências. de construir uma associação para o estudo da temá-
b)As comissões parlamentares são órgãos políti- Questão conexa, a ser avaliada, no âmbito dos traba- tica das autonomias políticas portuguesas. Entretan-
cos, nascidas de outro órgão político, às quais in- lhos da Comissão para a Reforma do Parlamento, é a to, existe já, desde 1999, uma designação provisó-
cumbe, não só, a análise técnica de documentos do absentismo, ou não, dos Deputados, às reuniões ria, primeiro Associação Jurídica dos Açores (online
e questões pendentes mas, sobretudo, a constru- das comissões, especialmente, as que se realizam em em 2000), depois, em 2005, Centro de Ciência Jurí-
ção da antecâmara do debate político a ter lugar ilhas diversas das da sua residência. Para esse proble- dica dos Açores, incluindo a planificação de uma Re-
em plenário da Assembleia (só assim se explica a ma urge estipular um regime de faltas transparente e vista de Direito Regional dos Açores. Uma associação
obrigação de representatividade proporcional das fiável (com repercussão directa nos direitos e regalias que tem já um conjunto significativo de interessados,
diferentes forças políticas nas comissões - artigo dos Deputados e no exercício do seu mandato), que mas que não foi ainda constituída formalmente por-
42.º daquele Estatuto). permita que o princípio da representatividade regio- que são necessárias condições que… quase que es-
nal, enquanto pedra angular do sistema democrático tão reunidas. Em geral, aquela associação é um espa-
Como tal, a virtuosa adesão a meios tecnológicos, açoriano, esteja, convenientemente, acautelado. ço de reflexão acerca da dinâmica do Direito no or-
aliada a, eventuais, necessidades contabilísticas, ain- A actividade política na Região tem custos inerentes à denamento jurídico português e com incidência nas
da que possa justificar, casuisticamente, o uso da vi- sua condição arquipelágica. Tal, não obsta a que a ava- Regiões Autónomas. Para o efeito pretende desenvol-
deoconferência, pelo parlamento açoriano, em caso liação desses custos possa ser feita, de modo transpa- ver, entre outros projectos, além da antedita revista,
algum poderá condicionar: rente e esclarecido, pelo eleitorado, ao qual é devido inicialmente na forma digital, colóquios, conferências,
a)A obrigação de todos os Deputados conhece- um esforço de informação e justificação de todos os estudos, e cooperação técnica e científica com outras
rem, in loco, a realidade do arquipélago que se gastos. Do, eventual, excesso, na equação gastos/re- instituições para o desenvolvimento da autonomia.
conjuga com o, necessário e efectivo, exercício do sultados, caberá, sempre, reclamação para as entida-
mandato de Deputado em todas as ilhas (Em cau- des competentes no âmbito da hierarquia política ou Um dos projectos daquela associação é a criação de
sa está o que de melhor há no sistema político judicial e, em última análise, para o sufrágio quadrie- uma sala numa biblioteca da ilha, intitulada Sala da
açoriano, tal seja, a democracia de proximidade. nal (eleições). Autonomia. É uma sala dedicada exclusivamente às
Só assim se contribui para a construção de uma Concluindo, qualquer reforma parlamentar na forja questões autonómicas, em todas as áreas do conheci- Faço a mim próprio um empréstimo daquele título pa-
unidade regional, só assim se aceita que na pro- não pode esquecer os fundamentos da arquitectura mento, mas sobretudo concentrada na área do Direito ra esta rubrica aqui na Revista do Diário Insular, cuja
posta do revisão do Estatuto conste, como futuro política regional e, sobretudo, que o primeiro benefi- e da Filosofia. Sala da Autonomia, um acervo organi- cópia, bem entendido, abrange apenas o título e a te-
dever dos Deputados, uma visita a “cada uma das ciário dessa mudança deve ser o cidadão-eleitor. Sen- zado com documentação, física e virtual, sobre auto- mática, não os objectivos.
ilhas da Região, pelo menos, uma vez em cada le- do assim, em matéria de custos [como o (de)uso da nomia, incluindo a organização de documentação so-
gislatura”); videoconferência, ou outros] parametrizar a Assem- bre e dos Açores, realização de colecções com todos Feita esta entrada informativa peço ao amigo leitor
b)O eficaz cumprimento, no âmbito das comis- bleia Legislativa com uma empresa, ou um serviço pú- os estudos conhecidos e dispersos, textos legais e ju- que me acompanhe nesta sorte nos próximos textos
sões parlamentares, do mandato político de fis- blico, é um caminho, demasiado, arenoso para ser tri- risprudenciais, trabalhos preparatórios das leis e ou- e que, se estiver interessado nestes assuntos e os qui-
calização, debate, contradição e aclaramento das lhado com ligeireza. Mais vale morder a língua… tros, bem como base informática de pesquisa e dis- ser comentar, nos escreva para arnaldo.ourique@da-
questões regionais, desenvolvido entre as diferen- (*) http://www.da.online.pt/news.php?id=132058 ponibilidades. cores.com.

DI DOMINGO 24 13.janeiro.2008 DI DOMINGO 25 13.janeiro.2008


reportagem mateus rocha 58kg de peso, aderiu ao karaté aos seis anos de ida- ce a importância da presença dos atletas locais em
fotografia antónio araújo de, por influência directa de um cunhado. Foi, po- eventos nacionais e internacionais como modo de
de-se dizer, amor à primeira vista. “Encantei-me pe- adquirir a necessária rodagem e maturidade.
la modalidade logo no primeiro treino e, presente- “Pessoalmente, tive sorte, levando em linha de con-
mente, dedico, em média, cinco/seis horas por se- ta que comecei na modalidade numa boa altura.

fábio silva mana ao karaté”, informa.


Ciente das suas qualidades, Fábio Silva admite que
Ganhei experiência com a prática do kumite, o que
me possibilitou a conquista de diversos títulos re-

respira karaté
pode vingar neste desporto bastante peculiar, con- gionais e a consequente participação nos campeo-
quanto reconheça dificuldades. “Já estive muito per- natos nacionais. Também é justo reconhecer a qua-
to de representar a selecção nacional, o que só não lidade dos treinadores açorianos, algo que tem si-
aconteceu por excesso de peso. No entanto, a pré- do decisivo no crescimento do karaté por estas pa-
selecção representou uma experiência sobremanei- ragens”.

Produto dos escalões de formação Fábio Silva, de 17 anos, estudante do 11º ano ra positiva, atendendo a que convivi e aprendi com Fábio Silva assegura que não pretende abandonar a
de escolaridade, é uma das grandes esperanças do atletas de categoria internacional”. modalidade. “O karaté significa disciplina, confian-
do Clube de Karaté-do Shotokan da karaté açoriano. Atleta do Clube de Karaté-do Sho- “Desejo vestir a camisola da selecção, embora, com ça, controlo, defesa e saúde. Depois, é um despor-
tokan da Praia da Vitória, o nosso entrevistado é as alterações regulamentares previstas, suba direc- to para todas as idades e que nos permite conhecer
Praia da Vitória, Fábio Silva respira campeão regional de kata e kumite há vários anos tamente dos cadetes para os seniores, sem passar imensos lugares. No meu caso concreto, até porque
consecutivos e “Atleta do Ano” da Associação de Ka- pelos juniores. Deste modo, terei como adversários sou uma pessoa algo reservada e caseira, é um óp-
karaté por todos os poros. Repre- raté dos Açores (AKA) desde o escalão de pré-in- atletas mais experientes e de nível mundial. Por ou- timo meio de convívio. Fiz imensas amizades graças
fantil. tro lado, como na Região estamos limitados em ter- à modalidade”.
sentar a selecção das quinas é um Para além do karaté, Fábio Silva também praticou mos competitivos, é natural que aqueles que com- “Ao contrário do que algumas pessoas julgam, kara-
o chamado desporto-rei, mas depressa se dedicou petem praticamente todos os fins-de-semana te- té não é sinónimo de violência. É, sim, uma activida-
dos objectivos que persegue com em exclusivo à popular modalidade com raízes na nham uma evolução diferente”, acrescenta. de que nos transmite serenidade e paz de espírito.
cultura oriental. “Percebi que seria difícil conciliar as Enquanto sonha em ser guarda prisional ou, então, Basta dizer que, regra geral, os praticantes de karaté
afinco, embora lamente os tão bada- duas actividades e, como pretendia alcançar pódios ficar ligado a alguma actividade relacionada com não criam confusões com ninguém e têm uma pos-
nacionais no karaté, abandonei o futebol”, diz. o desporto, Fábio Silva lamenta o facto do quadro tura muito positiva em relação à vida”, afirma, em
lados custos da insularidade. O jovem cinto negro, de 1.70 metros de altura e competitivo regional ser diminuto, daí que refor- jeito de conclusão, antes de regressar ao treino.

DI DOMINGO 26 13.janeiro.2008 DI DOMINGO 27 13.janeiro.2008


rui messias

sugestões tiro&queda
LIVROS Uma mostra de fotogra-
fia sobre o Vulcão de
Secretum Santa Bárbara, da autoria
Monaldi e Sorti de Paulo Henrique Silva,
Bertrand Editora está patente na Galeria
862 Páginas do IAC, em Angra.
“Loop” é o título de uma
Roma, Julho de 1700. No exposição de pintura, da
ano do Jubileu, o carde- autoria de Paula Mota,
al Spada celebra fausto- patente na Sala Dacosta
samente na sua mansão do Museu de Angra, até
romana o casamento do 13 de Janeiro.
sobrinho. Os convidados “As Armas que Mudaram
são ilustres - entre eles fi- o Mundo” é o título de
guram as mais nobres fa- uma exposição patente
mílias italianas, um gran- na Sala de Oportunida-
de número de prelados des do Museu de Angra,
e representantes desta- até 13 de Janeiro.
cados das cortes euro- Uma mostra de balan-
peias. ças antigas está patente
Mas a festa é pano de na Sala de Destaques do
fundo de intrigas e cons- Museu de Angra, até 13
pirações... Atto Melani, de Janeiro.
castrato e espião de Lu- Uma exposição de co-
ís XIV, tem como missão, nhas de Augusto Veiga
juntamente com o seu está patente no Museu
fiel ajudante, influenciar da Graciosa, até 31 de
a eleição do próximo Pa- Janeiro.
pa e a sucessão ao trono
de Espanha. Cinema
Os luxuosos salões ro- EXPOSIÇÕES te na Sala dos Canhões
manos, repletos de obras da Pousada de São Se- “Gangster Americano” é
de arte esplêndidas, tes- Uma exposição de foto- bastião e na Sala do Ca- o filme em exibição no
temunham as engenho- grafia intitulada “Mirada pítulo do Museu de An- Centro Cultural de Angra,
sas tramas e os subtis jo- Panorâmica” está paten- gra, até 13 de Janeiro. até quinta-feira, dia 17,
gos de poder. Neste am- pelas 21h00. Hoje, do-
biente de festins e refina- mingo, o filme é exibido
das diversões, é a sorte às 18h00 e às 21h00.
de toda a Europa que es- O Centro Cultural de
tá em jogo. Angra estreia sexta-fei-
Monaldi e Sorti criaram ra, dia 18, pelas 21h00,
um enorme furor em to- “Shoot’em Up- Atirar a
do o mundo com os seus Matar”. DIÁRIO INSULAR - Ficha Técnica: Propriedade: Sociedade Terceirense de Publicidade, Lda., nº. Pessoa Colectiva: 512002746 nº. registo título 101105 Jornal diário de manhã Composição
livros e apaixonaram os e Impressão: Oficinas gráficas da Sociedade Terceirense de Publicidade, Lda. Sede: Administração e Redacção - Avenida Infante D. Henrique, n.º 1, 9701-098 Angra do Heroísmo Terceira
críticos. As três primeiras música - Açores - Portugal Telefone: 295401050 Telefax: 295214246 diarioins@mail.telepac.pt | www.diarioinsular.com Director: José Lourenço Chefe de Redacção: Armando Mendes Redacção:
obras dos autores estão Hélio Jorge Vieira, Fátima Martins, Vanda Mendonça, Henrique Dédalo, Rui Messias e Helena Fagundes Desporto: Mateus Rocha (coordenador), Luís Almeida, Daniel Costa, José Eliseu
publicadas em 45 países, Um Concerto de Ano Costa, Jorge Cipriano e Carlos do Carmo. Artes e Letras: Álamo Oliveira (coordenador) Colaboradores: Francisco dos Reis Maduro Dias, Ramiro Carrola, Claudia Cardoso, Luís Rafael do
tendo atingido os primei- Novo tem lugar hoje, Carmo, Luiz Fagundes Duarte, Gustavo Moura, Francisco Coelho, José Guilherme Reis Leite, Ferreira Moreno, António Vallacorba, Diniz Borges, Bento Barcelos, Jorge Moreira, Duarte Frei-
ros lugares dos tops de domingo, a partir das tas, Guilherme Marinho, Daniel de Sá, Soares de Barcelos, Cristóvão de Aguiar, Vitor Toste, Luis Filipe Miranda, Paulo Melo e Fábio Vieira Fotografia: António Araújo, Rodrigo Bento, João
vendas na maior parte 21h00, no Centro Cultu- Costa e Fausto Costa Design gráfico: António Araújo. Agência e Serviços: Lusa Edição Electrónica: Isabel Silva Sócios-Gerentes, com mais de 10% de capital: Paula Cristina Lourenço,
PUBLICIDADE

deles. ral da Graciosa. José Lourenço, Carlos Raulino, Manuel Raulino e Paulo Raulino. Tiragem desta edição: 3.500 exemplares,; Tiragem média do mês anterior: 3.500 exemplares; Assinatura mensal: 11 euros
PUBLICIDADE

PUBLICIDADE

PUBLICIDADE

PUBLICIDADE

PUBLICIDADE
serviço
técnico de
desinfecções

Profissionais em:
Desbaratizações * Desratizações
Tratamento de Madeiras LUÍS MONIZ
Semana Esotérica
(Combate às Térmitas) Tarot, Numerologia, Relaxamento e Meditação

Sede: Rua Vigário Geral, 5 A - 9500-443 Fajã de Baixo Consultas de Astrologia

PUBLICIDADE
Telefone 296 382 110 - Fax: 296 636 664 - Tm. 919 903 300 Consultas Kármicas
Cursos de Desenvolvimento Pessoal
2146
Inscrições:
964 551 040
PUBLICIDADE

consultas: 18, 19 e 20 de janeiro


DR.º RUI PAIXÃO
Naturopatia, Quiroprática, Iridologia, Fitoterapia, CAFÉ SNACK-BAR
Oligoterapia, Geoterapia e Correcção Osteo-articular Informamos que O SITAR além de restaurante, oferece-lhe agora serviço de
Snack-Bar, das 08H30 às 23H00

Temos mais de 40 pratos diferentes de Borrego, Frango, Peixe, Camarão grelhados,


PROF.ª DR.ª TELMA GONÇALVES PEREIRA agridoce e Vegetais, com um sortido de especiarias de boa qualidade preparado
MÉDICA pelo chefe especialmente vindo da Índia.

PUBLICIDADE
Professora da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa Segunda a sexta-feira, Prato do dia apenas P/ e 5,00 inclui bebida e café, 5 Pratos diversos
Aceitam-se reservas de grupos

Para: Todas as Patologias | - Adultos, Crianças e Idosos preços especiais


Medicação: Homeopatia, Fitoterapia, Oligoterapia e Dietética. Faz-se comida para fora. Preparamos todo tipo de festas
à segunda damos o pontapé de saída durante a semana vamos a todas relaxamos ao domingo

Horário do Restaurante, aberto todos os dias das 12H00 às 14H30 e das 18H00 às 22H30

www.diarioinsular.com Rua da Graça, 19 E- Praia da Vitória | Tel: 295 54 28 84

PUBLICIDADE
Centro Dietético de F. Pacheco
Rua de São João n.º 54 Angra do Heroísmo
Tel. 295 214 969

PUBLICIDADE

CARLOS CARVALHO
Com mais de 30 anos de experiência
Homeopatia - Iridologia - Naturopatia - Nutrição

Consultas de 5 a 17 janeiro
Peça grátis a Revista nº 5 - 100% Natural
PUBLICIDADE

Somos aqueles que em matéria de preços praticamos os mais baixos


31 anos ao serviço da sua saúde
DI DOMINGO 30 13.janeiro.2008
Venha confirmar
DI DOMINGO 31 13.janeiro.2008

Você também pode gostar