Você está na página 1de 639
FLAYEO DOS SANTOS BONES HISTORIAS DE GUILOMBOLAS: Mocanbos @ comunidades de senzalas no Rio de Janeiro —— século XIX D sertacko de Nestleado apregentada ao De~ paPtamento de Historia do institute de Fix josefia @ Ciéncias Hunanas da Universidade Estadual de Campinas coma parte das reque- sitow para a obtenc&o do titulo de em Historia. ; Orientadar® Prat. Drs ROBERT Me, SLENES ML To See Mestre Este exemplar cor recponde & redacate Final da disserte~ eX Gefendida @ aprovada pela Com ajssto dulgadora em 1, 7 AB» Dezembro de 1992 A Maus Pais, Teo Can mens rian) © Maria: pelas Ligtfes de uma histéria da vida. er Filhoy Joke Fidvio: pela que sua existénela representa para mim. RESUME ieta dissertagto constitus um estudo sobre as formagiies de quilombos na Frovincia do Rio de Janeiro ao ronge do sécalo XTX. O seu principal objetive @ reconstituir os cendrios de luta @ en frentamentos das cominidades de escravas fugitivos, assim como sua interagato no interior da secledade escravista, Frocurando resgatar os variadas sujeitos histéricos dos muncdes da escravi~ dio, destacande os cativoas e os quilembolas, @ nossa intenrio analisar as complexas relagtes que envolveran of macamhos @ as comunidades de senzalas nas draas rurais da Provincia ‘fluminense nesse periddo. A abordagem do primeira capitido centra-se no e@studo de caso a respeito das comunidades quifombolas que Se estabeleceram ho interior do Recéncave da Guanabara no intcio do sécula. Entre os anos de 1812 e IGS, autoridades @ Tazendeiros tentaram des~ truir estes quiloubolas, assim como ag solidariedades sociaisy eqondmicas @ culturais que @lae compartithavam com tabernei ros it. Ein nossa andlise outros escraves, barqueiros @ lavraderes Log avos. wie procurames destacar de que ode esses Tugitivos es vendo quase como campeneses ~~ defenderam sua autonomia contra as oxpedigies reescravizadoras, fordando praéticas econdmicas int com outros grupos soriais. gradaé A regia @ mantendo relagte Hergulhands nos mundos dos quilombolas locaisy tentamas perceber as complexas relasGes socials © EconGmicas dos tiagambos, proc rando fugir das interpretacdes histéricas anteriores que entati~ zavam apenas G seu carder de “marginaldzagite" No sequado capltuie procuramos reconstitulr o episédio ew torneo da insurrei¢Xe quilombela ecorrida na regito de Vassoura em 1858. Ao investigarmes of objetivos © as ages daqueles aui~ lombelas, examinanos a gestaga%o de uma commidade de senzalas na erasi®o. Sequinde indicios e pistas demonstramos comp a mundo das senzalas podia estar interagindo junto aos mindos que os quilom bolas procuravam forjar. No Wliime capitulo nossa inteng®e @ perceber a complexida- de da processo histdrice das transvormagtios das forma no caso a formagao de quilombos de protes= has Gltdmas dé to aserave cadas da escravidda. Examinanda algunas formas de aquilombamentos em diversas areas rurais da referida Provincia, analisamos de que mode a partir da segunda metade do século XIX, cade vez mais, Ga~ tivos &@ quilombolas buscavam com variadas estratégias conquistar suas autonomiasy que pederian ser, entre outras colsany @ acesso a terra. Enfim,s procuramos mostrar até que ponto © munda dos quan Jombelas acabou por afetar @ modificar o mundo daqueles que per maneciam escravizados. ARSTRACT 2 The present dissertation is a study about the formations of guttombox in the Province of Rie de dan@iro during the 19th century. The main objective is to reconstitute the sceneries of struggle and resistance of the communities of fugitive slaves, as well ay their interaction ingide the slavish society. While we try to recover the varied historical elements of the slavery to the slaves and the quvLombo1 worlds, with emphast 2 we in tend to analyze the complex relationships between the mocambos ters in the rural areas of the and the communities of slave qi mentioned Province during that period. The first chapter is centered in the circunstantial stuchy concerning the quizonbola communities established in the indian of Guanabaras in the beginning of that century. Between 1812 and 1885, authorities and farmers attempted to destroy those quétow bolas; as well as the social, economical and cultural solidar ties that they shared with lavern-keepers, other slaves, beatmen and local tillers. En cur analysis we have sought to pe toup the oe have way these fugitive slaves ~~ living almost as peasan defended their autonomy against the reenslaving expeditions, by fasiioning economical practices integrated to the region and by haintaining relationships with other secial groups. Through a div ve inte the complex social and economical interrelations of the mocembos, whith an effort to avoid the previous historical inter~ pratations which only emphasided their character of "outlaury". In the second chapter we try to reconstitute the “episode around the quilomboJa insurrection which tool: place in the regien of Vassouras, in 1258, As we investigated the objeetives and ace tions of those qurtombo Za. we have examined the gestation of a community of slave quarters could ba tateracting with the worlds that the qudlombelae tried to build. s to realize the co In the Last chapter, own intention plexity of the historical process of transformation of the sla~ wish ways of protest —- namely, the formation of qestlombos ~~ du- ring the final decades of slavery. We have examined some kinds oF qutlonbola settlecents in different rural areas of the referred Provinces thus analyzing the way slaves and quiJembolas, from the second half of the 19th centugy on, made continues efforts with varied stvategies te conquer their autonomies, which could bey among other things, acess to grounds. Finally, we have tried to show how much the world of the qeutombox has affected and — mori fied the world of those who continued as slaves. AGRADECANENTOS: fou daquetes que acreaditam que, de fate, tercicda ganna jom~ go. EB verdade. Pepois de alguns anos de pesquisas ~ ' olho para tras @ vejo a multicvo de desde quando ainda estava na graduagio ~ pessoas que aiudaram, de uma forma ou de outra, para que este Iho cheqasse ao fia Pesquisei em diveraos arquivos, fiz amizades @ deixei df Vidas. No Arquive Nacional, a lista de credorés talvexz sejia a major. LA realize a maior parte da pesquisa. Contei com a ajuda de Varios profissionais, desde os funciondrios da portaria, agen~ tes de galeria, arquivistas e bibliotecdrios. Receanda esquecer de mencionar os nemes de todos, fago mex agradecimanto coletivos honenageando destacadamente @ Sr. ELiseu de Arduja Lima, Ma blioteca Nacional também contrat alqumas divicas. Quanta ao apoio prestado, agradesge ao Gr. Raimundo Batista Carneire (sagta de Han nuseritos), a Tenia Amara G. Di Mota (chefe da DivieXe de Ferio~ dicos), Cleuma Trist® Gomes @ Régia Helena de Lima (da Portan ria). Passed Camb varias tardes pesquisando no Arquive Piblice do Estade, onde cantei com a ajuda o incentive da Prof® Waldecy Catharina Magalhies Pedreiva (Diretora da Divigde de Documen taco Permanente) @ ao funeiondrio Milton Noqueira. Pesquised ainda en Vassouras © agradego A Frof® Sonia Violetta que, com sua solicim tude, Eernoweme pogetvel o acesso A documentagxo carmtararia de pooitada no Fertim daquele Municdpio. Em Nova iguagu, registra mous agradeciment.s ao Pret. Ney Alberta, qua possibilitow a mir Hha pasquisa com uma documentagao inédita, sobre os quilombos da regiXe, locabizada ne Tnstituta Mistérico local. Actuniled Lambém muitas dividas intelectusis junto A prom fessores @ coleges de officio. A Moacyr Waldeck, ua grande amigon destaco minke gratid®o pela grande "ferga" dada na reta final do trabalho. 0 "Ze" Glosé Roberto France Reis}, companheiro dos “hondes da historia", ou arato pelo seu incentive © apoio cons tante. Ea "papos" sem fim, divididnes ansiedades @ expectativas e" da hiatéria sabre a Vida e G fazer bidiana. Agradego ainda ao colega histeriador "Gino" (Antonio Luigi Nedra) pela amizede @ © apoie Logistico durante nossa eslada em Campinas, A amiga Qladys Sabina Ribeiro, também historiadera e@ duble de “irme's trabalho chen agradege pelo seu incentive constante para que gasse ao Fim. Registre aqui um agradectmente especial a Dom Ma quivieta do Masteiee da SX tous Rocha, O.G.E, pesquisador @ 4 es Benet Henke @ da Congrega tina do Brasil. Mais que um grande amigo, ele foi um Letitor critica permanente deste trabalho. panheire de outras pesquisas histdricas em andamento, repassou as primeiras versties dos capttulos, ee incentivou can comentarios sugesties, Suas contribwiches Tundamentais es iit presentes se Longe de todo este trabalhe. Sou grate igualmente aos professores Lincoln de Abreu Fen- na (UPD, latcia Guaranys (JPRI) e@ Mario Maestri pelo apoie ini~ clal quando ainda cursava a graduags Ma oani®e commgeva a transtormar senhos @ vontades de estudante em uma inves tigasxa nereta através de une holga de Iniciagaa Cientitica historica concedida pelo CHP. Na UNICAMP, ende chaques em L990, canted com a @iuda de Varios professeres, em especial aquelos que compunham Ale US a linha de Pesquisa: Eseravid&o @ Trabalhe livre oa fr professores Izabel Narsony Sidney Chalhoub o Silvia Lara me in contivaran desde o dnieio da saminhada, Leram 6 proietos, as primcivos textes @ cantiributram para a realizagio deste trabalhe com criticas valingas. Ao professor Robert Ww. Slenes, arientador desta dissertagie, fica dificil agradecer. Ele ecolocou a minha dispesig®o toda a sua competéncia intelectual, assim como 9 seu profunda contecimente sabre a tema da escraviddo. Dispensando apoio constante, "Hob", cone que numa solug%o homeopatica, mist yaua cuidadosamente criticas © incentivos com comentarios insti gantes. @lyuns de seus textos mais recentes acabaram por contri~ bwin de forma decksiva para encaminharmos atgumas reflex®es con Lidas neese trabalho. Registre ainda o meu agradecimento pela ainda finaneeirs do CHEQ (L99091991) © Ga Pare (1972) com bolsas de Mestrade. 1, sem du Guanto aos mous familiares as minhas dividas Vida, ainda bem mdlores. Men arama através de longuissimes epi dulos, com citagiies @ notas interminaveis, seria capaz de trang mitir-e quanto a ajuda deles fol importante. Gomportaram-se oO tempa todo como uma grande torcida fandtica, linha me me apaiou de forma incondicional @, noe W1times momentos, no dad xou que me fallasse coragen para seguir em frente. Mais do que isto, as i iHome de vida dos maus pais deixaran em mim marcas profundas que dizem ser preciso ter muita coragem, humildade, determinagko e dignidade para conquistarmos objelivas @¢ ideais, vencende as bar reiras dos prece eitos © das dificuldades. Agradege aos meus ir fifo pola confianga depositeda. A minba irm% Olivia sou muito grate. Ela me incentivou permanentente desde os meus primaire passos. eoia lendo © criticando os princiros eseritos @ projetos, stando Livres @ diseutindo textos. Talver ela, sem 5 a empire ber, tenha embalado os meus primeiros sanhes com a histéria, en~ ginandowme ag Lighes iniciais do oficia, A Mlingy Beto, Cacihdas Clatidio, De Elza, Gabriel @ Lucas agradego pela torcida (muitas vora tilenciosa, mais Tiel) @ desculpo-me pela “ranzinice" que em algunas Scasifes tomou conta de mim nos monemtos decisivas de dedicag#o ao trabalho. Almerintda, que vit parte dos sonhes tran~ formando~se em realidades, "“roeu bastante unba", torcende até o Finale A Sonia, oS agradecer seria pouco. Ela comandou parte da torcida, sequeou algumas “harras" @ seu incentive foi fundamen tal. ‘ A dof Flavio, “Faniqo", meu Filho, chegou apressadey quando este trabalho jd estava na metade. Sem saber, entre "sus~ los", sorrisos © chores, Axo deixou que as diticuldades em meio aos trajetos @ rumos me Fizesse desistir. a ele pego desculpas pelo tempo roubade @ dedica ~~ ainda que isto seija insignificante carinho -- este trabalho. se CoRparado aa ti Rio de. daneiro, 1h de dezembro de i9?%. Hotes... hatte Meh ae TI Outras Histdvias de Liberdade fo. An trode Captiubo is A Midra de Iguagur Uma Historia de Liberdade no Rectncavo da Guanabara (1812-1885) 4 ae Netas, ture escrava pa dnsurred gto quidombola de Vassouras 80.6 Arrusande o Cendrio 0 Campo Negra de Iguagu Cenas de awtros Campos Negros stratégias e Contra~estratéqias ®@ volta da Hidra ag, Capliulo ts Algumss batalhas pela Liberdade A denugrafia do levante Comunidade @ Cultura escrava em revelta (1) Comunidade ¢ Cultura escrava em revolta (11) A cor do wedas Insurreigtes verses Auk Lombos Dialegande com os temores Epiloge AFL EMA, As Ratzes de eftmeror Commidade @ Gul~ cigse) Fag» Be 4a ae 24g 368 ago ant Gants Iiky Sob a Onda Negrar Escravos @ Quilon bolas agenciando a sua prépria emancipacko nas Wl times décadas da eseravidato 1. Algues Confrontos © Enfrentamen tos 2. Gutros Conflites e@ Embxtes Eapagos © Rarganhas 3 econdmicas 4, Entre as rogas dos cativos @ as pratic et sonhande com a terra das quilombots ao Capdtulo 11s Cons Fontes @ Bibliogratia I. Fontes Manuseri tas £1. Fontes Imprecaas ei tadas Til. Kibliogratia citada 460 464 qo4 S13 880 586 S87 se 599 Wes ERE Lees a ae ee i PAG « Fropargita de escraves homens e mulheres (i887-1840) 207 2) GRAFICO 2: Propargsto de escraves africanas X escravos criculos,homens @ mulheres (1837-1840) 2e7 5) Froporgiid de catives, entre quinze @ quarenta anos, para o total da mXo-de~obra eserava (1837-1840) 209 20.4: Distribuicko da naturalidade dos escran 4) GORI vos africancs por regite: Distribuigto da naturalidade dos eguraves partencentes ao Capi tae-for Manuel Francisco, souras (L840) : : 6) Quadro dt Pradugiio anual de otmeros alimenticios ha reyixe de Tgquagu -- 1778 (por alqueires) 12: Quilombolas (naturalidade © sexo} capturados em Pguagu,” 1016-1077 8) Quadro gt Escravos indiciados ne processe de Insurreig#o em 1838, em Vassouras 9) Quadre.4: Escraves citados no processe de Tpsurrei gio em L888, ea Vassouras, fo da regia LO) Tabelags Poputs de Tguagity 1779-89 @ 1 A Tabehe Si Populagiie da regixo de Iquaguy 1840, de embarque, Yassouras CL8S7~ 1840) arn Yasi~ a98 Bi1 B12 1880 @ 1sv2 . . BP A2iTabela.. Fopulagio escrava @ nXo-escrava da regiko de Tquagu, 1880 @ 1872 90 AS)Tabela 4: Digtribuigito entre africanas © criou~ tos em relag¥o ao plantel total, Vassouras (137-1040) zen 14)Tabola 5S: Distribuigdo dos escravos segundo faixas de tamanho dos plantéis (FTP) @ sexo, Vassouras CIBS7-1840) aso Lag: Distribuigao dos escravos sagunde grandes faixas etariasy sexo © naturalidade (crioulas @ afrin canos) LEZ 1240 aon L6)T stribuigao da naturalidade dos escray Voe africanos, em Vassouras Ui@37~1040) Shi Prameiroa Volume INTRODUGAO: BOUTRAS HISTORIAS DE LIBERDADE Fnt®o, malungo, esta — cumeando to caladinhole..falla sua verdade, isto nto 6 molhor de que comer Wma cuia de feij®o com angd, que o diabo tom pero, 14 em casa de seu senhor?. 6 com EAS VeZes Nam isso, pan Sima. Laranja com far nha era almogo de nés, @.enchada na unha de sol a sol.. eigto aqui Sim, @ Gutra cousa...e@ @4 soubesse JA a mais tempo estava c4. Viva o quilomba, mat malunga, © © mais leye tudo oO diabo". Assim Bernarde Guimar&es indicia seu- romance intitulade HISTORIA DE QUILOMBOLAS, escrito em 1871. (1) A trama por ele harrada passa-se nui quilombe lecalizado do interior da Provincia dé Minas Gerais, mais propriamente "pert da carrancuda @ negra serraria de Ttatiaya, distante como quatre légoas de Curo-freto, ew vasto grotke sambrio @ profundo, coberto de espessissima flo~ rasta", na segunda metade do sécula XIX, E a estéria de "Natheos Cabra", um escrave fugida que se tornou quilombola e@ resolveu raptar sua amaday a e@scrava “mulatinha Flarinda, levancdena para sicime no tor © @ite quilombe. Tal rapto, por conseguinte, eausou ro "milato Anselmo" Lava dela. Glids, a fuga de 1 que também gos Flateus da faxenda em que trabaihava Tai motivada por um que level, en conseque@ncia de una surra que ele aphicou em Flo~ 6 LLGO citimas: que sentia de Anselmo. rinda por causa dos 4 wstria de Ti nardo Guimarkes n®o pareu por at. Sendo partaria paixao em Zambi Cas levada para o quitembo, Florinda d Sang’, Um "preto africane" chefe daquele mocambou mais, agora quem iria sentir citmes seria Maria Conga, sua "rainha" no qui Jombo. @ partir dai, desenrola~se ua romance que mistura paixtles, meek tos @ até uma cons violéncias, martes, enforcamentosy pr Lomb» piragto" para destituir o chefe de dite qu Na descrig&o do auter da "mulatinka Flerinda" j& se esboga B— a imagem da escrava "quase branca" da seu cilebre romance 4 CRAVA ISAURA, (2) escrite posleriormenter "as feigdes, a n&o se yem os 1Abias carnesos © as narinas méveis, que se contrahixo @ dilatavXo ao arqueio vielente de seo coragao, er®o quasi de pure za caucasiana" algumas passagens deste romance, Guimartea pa~ race também quase s@ apaixonar por aquela figura. (3) Entretanto, entre preconceites, desejos @ paix®es, este romance pode servir para bem mais do que una simples epigrate e/ou metétora para a apresentagae deste nosso trabalho. (4) Ber om sua obra uma interes ante pista nardo Guimarkes nos ofere metodolégica para analisarmos historicamente as quilombas no Bra~ gil. @final, preocupada com o enredy de seu romance, ele “human you" 5 quilombolass, seus perscnayens, fazendo com que suas agiios tivessem, do fate, wignificados préprios para as experitincias de suas vidas. Com efite, no enredo dessa obra, seu autor fala de con~ flites envolvende escravos criowles @ africinos no dite quilombo, destaca as relagSes mercantis @ a proteg%o que os quitombolas po~ 6 comtaten diam tar junto eos taberneiras ¢ vendeiros da ragito, ¢ dos quilombolas com os catives ras senzalas, oo rituais de "foi~ tigaria africana" praticades no quidombo, as rolagties de solidan riedades entre grupos de quitombolas distintos, as praticas ecom nowicas dos quilambolas (principalmente saques © razias am fazon das Virinhas) @ até mesma possiveis "acordos" dos quilombolas com 4 os integrantes de uma expedi¢gXo punitiva enviada pelas autorida das coloniais. a avidito no Brasil, temos noticias das Enquante duraw a es variadas formas de resistencia dos cativos. Fugas, fustiganentos de feitores @ senhoress revolltas nas fazendas, insurreigiies urban nas, quilambos ele. constitutram algumas formas explicitas da du- ta dos escraves contra a deminagio. Digo explicitas, porque es nao foram ag formas exclusivas da resist@neia escrava. Havia for~ mas de paquenas lutas endémicas, disseminadas no cotidiano das relates entre senhores @ eseravos. & intertereng ja ativa do escrave no diawandia das variacl relagties do dominio escrayista podia se dar desde a sabotagem inm dividual na unidade produtiva até & revolta coletivas De quaiquer maneiva, $@ dava de una maneira complexa, contendo aspectos —mul~ tifacetados, no sentido de que homens @ mulheres egcravizados agenciavan suas vidas nXo como objetes passives do processe hiss tric que Vivanciavam, mas como sujeitos com ldgicas préprias forjadas em exporiéncias soviais concretas. Dentre o% varios movimentos sociais de luta dos cativos destacamos as fugas @ as formacties de comunidades de Tuyitivos come Componentes significatives da resinténcia da massa - esc ravas fo contraério do que se Lew ocorrido no Trasil, os estudes sebre ado com desenvoltura em comunidades de escraves fugides tém avang relagte As regiffes escravistas do Caribe @ Sul dos Estados tni~ "OS, no sdaulo dos. 08 quilombos no Brasil, excetuado o de Pala XVI, resseltade por sua grandioaidade @ longevidade, aparecem, de maneira geral, na historiografia brasileira como formas de le ta “uniforme" @ “repetitival ey portant, analisada como n&o ten~ do nenhun sentido politico proprio. Guontiies cone estas: Que tipo Quais de organizag&o social criaram as comunidades de fugitives? as. atégias de enfrentamente que elas adotaram com re@lagko ao sistema escravista? De que forma e como os quilumbos se tornaram Uma ameaga para senhoros @ autoridades? Come se cons~ titula a economia dos quilombolas? 63 commidades de fugitives se nantiveram to somonte isoladas @ marginalizadas? Havia solida~ edades raciais @ de classe entre escravos, Libertos @ quilombo~ las? Por que alguns catives que fugian jam para os qualombos? Qual o perfil dos escravos que procuraram malherar sua condi s pela fuga? Os quilombos eram apenas constituldos por cativos de origem africana?, sXo indagagGes, entre otras, ainda sem respos~ 6 varias situagtas de Tuga cole tag gatiefatérias com respeite midades de fugitivos ne tiva dos escraves e@ A formagaie de com Brasihe (5) For mite tempo, o debate fuleral que vigorou na trstaric grafia brasileira sobre a emeraviddo era o de saber $e esta teria sido boa ou m4, em consequancia do suposto aspecta patriarcal paternalista das relagfies entre senhores © eseravos. @ iddia da benignidade do sistema escravista brastledre encentraria nas obras de Gilberto Freire sua melhor defesa e interpretagio. (4) gualmentey este debate ganharia, ao longo do tampoy maior fale go, extendendo-se aos estudos comparativos entre a escravidao no Hrasil @ nog Estados Unidos. Também intluenciados pekas andlises de eire, histeriadores nerte-ameariganos como Stanley Eling @ Franls Tannembaun tentaram explicar as origens dos aspectos cansi~ deradas “benédvolos" do sistema escravista brasileiro com relagso avg considerados “malévolos" do sistema norte-americana. (7) As diferengas eram atribuldas aos sistemas sécio~econdmi~ co-culturais implantados: Mo Brasil vigoraria wn sistema prémce pitalicta @ catélico, enquanto que ne Sul dos Estados Unidos ado~ ® protestante. Em alti tou-se um sistema de economia capitalist ma ingtiincia, estas andlises evidenciavam que, marcadas pelo pa ternalisaa @ madiadas pela ag¥o do Estado e da Tgr@ja, as relan gtios sogiais entre sanhores @ escraves no Brasil preduziram eatin vos indolentesy prequigosas, passives e, acima de tudo, submicsos a uma grande familia patriarcal ogratia a raspeite da escravidite Nos anos 60 @ 70 a histor sofran grande impulso. @% vistas do cativeiro "brando" as int am contestadas. 8 andzises refarentes ts pretagtes anteriores for tir de novas formas de resist@ncia escrava ganharam destaque & pa interpretagtes a que desmigtificaran as vistYes relativas 4 passin vidade © cubmiss%o dos cativos,. Nessas aberdagens revisionietas, a oneravid%o no Brasil era apontada coma senda essendiaimante cruel @ Violenta, tendo per isso, entre avtras coisas, desperso~ palizade © coigificade os cativan @ as organizagth @ processos gotiain por eles vivenciados, coma a conntituigte de familias, por exemplo. (8) Parte desta reviake historiogréfica destacou ? especificamente em seus estudes os ates de rebaldia dow escravos explicando~os basicamente como reagtes ao préprio caréter vielen= to das relagi¥es socials sob o escravismo. (7) Esta nova corrente historiogratica que procurou dar enfas aos estudes a respeite da rebeldia, em parte acabou por cair no extreme oposte das reflex®es anteriores fundadas ea Freire @ ou ros. Os escraves sXo descritos pelos seus ates da bravura e@ hen reisme, apresentando-se assim uma visto romantica das formas de luta dos cativos contra a escravido. 0 bintmio senhor cruel/es~ eravo rebelde substituiu © binOmio senhor camarada/escraya sub~ ‘ misso. (10) Far outro lado, newsas andlises veriticou-se a total aun sOncia de abordagens que tivessem como objetive perceber of cati~ historicas do perisdo da vos enquanto suieitos das transformagte escravidio. Gu seja, amparada por modelos tedricos cristal izadas, nos quais a escravidda Toi tXo somente explicada pela vielencia @ pelo contole social das camadas dofinantes, essas andtises rele= garan os escraves a9 papel de figurante no processo histéricn. As o asifes de resistencia eserava foram eeduzidas a um mero pro la. O3 valoresy os ab de “Feagao" & crueldade do regime escravil jetivos @ as mediagSes multivariadag da vida @ cultura aserava n&o foram analisadas como fim de perscrutar © papel histdrico das uta: dos cativos contra a escravidXo, (11) Enfim, totalmante coisificado pela sistema e/ou pela violtncia, @ cativo ~- segundo s6 canseguia “huaanizare-se" quando se revolta~ alquns autores ~ va; fugia @ procurava reftigio nos quilombos. (LZ) Meste sentide, as fugas eletivas © ospecialmente as formagtes de quilembos to e ran visas como formas quase que Unicas da resisténcia e@ rebeldi eserava. U1 Diversos autores desde a década de SO tem pracurada anali~ gar 0 significadas histéricos das commidades de eseravos fugi~ tivoe no Brasil. Utilizanda Aqui, cam o mesmo sentido, 08 termes eapregados por JoXo Reis para analisar 08 estudes relatives At revoltas ascravas na Bahia, tamldm podemos classiticar os traba~ has sol Lomboe brarileires ain duag “correntes: eubturan Bos qu Listas © materialistas. (13) AG primeiras reflexfes relativas ao fendmeng da consti tut. 6X0 de cominidades de escravas tugidos na sociedade escravista no Bravil aparecem nos estudos afro~brasileiros das anos 30, (14) Sequindo o« caminhos da escola de Hina Rodrigues, autores coma Artur Ramos, Edison Carneira, @ mais tarde, Roger Rastide intro~ duziram @ difundiram as interpretagtes culturalistas dos quilom bos brasileiros. (18) 9 préprio Nina Rodrigues, ja no inicio do século, tendo como referdncia analitica a formagéa do Quilombo d= Palmares, havia destacada que estes quilanbolas, raprodazinda tas tradigées da ordanizagdo politica e guerreira des paves bantesn" africanos havian voltado “& barbarie africana". (16) Do fate, segundo estas andlises culturalistany as ergani- 9 zagies cos quilambes no Brasil representavam wn fenthaene “con~ ravan. OU ejay, a’ base de sua tranaculturative" des negros @ existéncia @ reprodugdo tinha Tundamantalmente. origem na "persis~ tencia da cultura africana" em resposta ao permanente precosso de edade escravista brasiloiras Haculturagso" da sey Para o antropdloga Artur Ramos, por exemplo, as comunida~ nomicos tinham coma des de fugitivos, seus arranjos objetivo tXo somente a recriagto de “estados africanos" no Bra~ sil. Em outras palavras, a organizagXo dos quilambos teria sido ago cultural que @ africano “uma desosperada reagad a desaared soTreu como regime de escravidio". C17) culturas ne~ oquide @ste autor, profunda estudioso das gras" na América, Os atricanos que vieram como escrayas para © Novo Mundo pagsaram por um processo de "aculturas®o negra" cons~ titusde pelos fentmenos de “adaptagtio" © "reagXo" cultural, En- quanto que @ processe de "adaptagwe" consistia em um fentmeno on~ de “as culturas negras combinaraa-se a padres de cultura .branm ca", © processo ‘de "reagko" era representado “nos casos em que as cul tar S reagiram mais ou menos Violentamente A aceitagte Ss negra dos tragos de outras culturas". C18) Pautande-se em tearias @ mé a Cultural, Arm todos evolucionistas entio em yoga na Antropolog tur Ramos tinha como objetiva maior compreender, através to “ne~ todo comparative das culturas nagras", ag origens @ 68 padrbes culturais dos negros’ em toda a @mérica. Dentro desta visie os “quilombes © as insurreigies negras" constituLan of mais repres sentatives exemples do proceso cantran~aculturative dos negros brasileivos durante a escravidke: 10 No Brasil, nouve também reagdo, na aculturag&o negray em dois cases onde © fandmeno pode ser nitidamente —ob~ servados nas fugas negras dos quilombos @ nos movimen- tos insurreicionais dos makes, na Bahia. No caso dos quilombes, tivemas un fate andlogo aos dos negros ‘tugin tivos das Guianas, Unindowse representantes do mesmo grupo de cultura (be no quilombo dos Palmares) eles reagiram ao contato C“folga negray branco nko ven c&", como ainda hoje cantam os negros no auto popular dos quidombos) @ mantiveram as suas culturas origind~ viass religi®o, tradigées seciais, Linguagem, cultura material". (19) fais preocupado em fornecer um quadro das “sobrevivencias africanas” das “culturas nagras" na América a partir de um modelo tedrico ainda pautado numa pgrspectiva de “evolucionismo cultu- ral" s Artur Ramos reduziu a compreensiio dos quilombos ao cardter simplismente de “reagxo" e/ou "“adaptagao" dos escravas seb G pon~ to de vista da cultura. @ lute des quilombolas contra a escravi~ d¥o ora Gimplismente a luta dos africanos negros ese ra preservarem cuss cultura longe da dominagse dos padres ch avizados pa turais dos senhoves brancos. Derivadas dos prim@iros estudos an~ tropoldgices sobre @ negro brasileiro de Nina Rodrigues, as and~ lises de Ramas ganharam forga na época. Diversos owtros autores ingorporaram suas intorpretagiies para estudar os padrdes de "cul~ tura negra" no Brasil. (20) Muase na mesma ecaside da publicag&o dos trabalhos de Ra~ nos, surgom os Estudos de Edison Garneira, também pesquisader dos padrfes culturais afro-brasileiros, em especial os cultos reli~ giosos. Inicialaente, Carneire publicou um trabalho pioneire so~ bee a organizagée politica, econdmica, militar, cultural e social A respeito de Quilombe do Palmares. (21) Em trabalho posterior ws. apontou também que a formagXe dos quilombos brasileiros era fruto ve" de entrentamentos dos afri~ de um Tendmeno “contra~acul ture canos eseravizados. (22) Procurands formular um modelo geral que oxplicasse o estabelecimanto dos quilembos no Byasil durante « escraviddo, destacavar " 0 movimento de fuga era, am Hi meamoy Uma Negag%o da sociedade oficial, que oprimia os negras escravos, eli- minando a sua Lingua, a sua religigo, o# seus estilos de vida, O quilombo, por sua vez, €ra uma reafirmag%o da cultura @ do @stilo de vida atricanos. @ tipo de or ganizagxe gocial criado pelos quitombolas estava tke préximo do tipo de organizag%o ent dominante nos Es: tacos africanos que, ainda que n&o houvesse outras ray rOes, se pode dizer, com carta dese de seguranga, que os negres por @le responsaveis eram em grande parte re~ cém-vindos da Africa, @ nXo negros grioulos, nascides © criados no Brasil. Os quilombos, d@ste modo, foram ~~ para usar A expresso agora corrente em etnologia ~r um fondmeno contraraculturative. de rebeldia contra os pa ial e@ de re dries de vida impostos pela sociedade ofic tauragto dos valores antigos". (23) O que fundamentava este tipo ce abordagen era oO aspecto da rocisténeia cultural da luta dos escravos. Em anos posterioress Rager Rastide, investigando as culturas @ religi®es "negras" nas Américas. (24) iria mais Longe, retomando ¢ generalizando @ con bAsica de todas ceito de “contavaculturagvo" como caractent st as cominidades de fugitives forjadas durante @ escravisma amari- canot “126 marronede ¢ a expressXa de uma certa resdetencia cultural, @ n¥o somente econ@micas na medida em que os bandos se formavam, tendiam a constituir segundo a ete nia, @ Uma vex que se confedaravan para formar Repdbli~ cay 0% Chementos diferencials tendiam a co@xistir pact ficaneniay mais da que fe fundir. Re® necessidacde de adaptarese a um nove meio, de er contrar solugies proéprias para uma oituagko de crise, conduziu a mudangas mais ou menos substanciais das cut— 12 turas nativass entretanto tratarse mais froqu da adaptagito do passado ao presente do que da criagko de. formas de vida intedramente novas." (25) Um dos principais problemas nestes tipos de andlises era a concepsio de cultura apresentada, vista como algo estatico @ pow Jarizado (cultura negra @ africana versus cultura branca @ euron de péia) que desconsiderava quase que completamanté os processos reelaboragtes @ transformast histérico-culturais dos pavos. Além disso, nessas interpretagtios, as lutas @ relagties sociais complexas envolvenda senhores @ escravos @ as formas de controle social sob egcravisme eram menosprezadas com vista ao entendi~ ignificado da resisténcia escrava, De mento mais abrangente do forma retlucionista, tais estudos indicavam, em Ghtima andlise, que as ages dos fugitives reunidos em comunidades n&o represen~ tavam nenhuna ameaga & integridade do sistema escravista. O con auracionistas visavaqse tedide de suas revoltas era apenas re restahelecer as "seciedades africanas". Edison Carneiro, por exemplo, ressaltava tXo somente os aspectos "da reafirmagso dos valores das ‘culturas africanas" aa formagXo dos quilembos no Bram sil. (26) JA Roger Rastide, num avango analitico @ metodologico & respeito dos principals aspectos da cultura fordada pelos cativos em toda a América escravieta, salientava que as comunidades qui~ Lonbolas eran “ao aesme tempo novas civilizag®an “nagmas’ @ civi~ Lizagties ‘africanas* @ partir dos anos 60, una nova visto do significado da re~ beldia esarava ganha destaque no debate nistérhogrético brasiledm ro. Fartinde da contestacdo das concepgGes que viam as relagtios 13 senhor/ascrave marcadas tXo somente pelo paternalismo de que fan in Lames inicialmente, uma corrente interpretativa materialis sere a discuss%o relativa A rebeldia dos escraves dentre da con texte analitico da luta de classe sob o escravisma, Este tipo de andlise, enfatizando o cardter viotento ca escravid®o, dew destaq gue & investigagta dos atos de rebeldia coletiva des cativos, com no quilombos, revoltas e@ insurreigties, baseando-se num conceito de resistincia que considerava apenas as formas “extremas" de nen gagko do sistema escravista. Produzia-se, anéim, a imagem do cravo "vielento" @ "rebelde", pols a negagko da suposta dociliday 4 ‘razia através da exaltagio da reagio de da cativeira no Brasil se dos escravas A mesma. (28) A maior parte destes estudos procurou arrolar as diversas comunidades de fugitives no Brasil, no séeulo XIX (também as & tudes a respeito do Quiloube de Palmares, que Termourse na séetle iden’ XVI1y Sempre aparecianm em destaque). (29) Registrou sua inc joy via de regra, a descrigke da cia em varias regidies & previles " end@micos" mocambos com oa Tim de organizagie dos "grandes ressalter weus Lidores, ou suposto caréter revolucionérie e@ 4 naiof consciencia dos escravos aquilombadas com relag%a a outros nos de resistincia, considerados passives e de menor valor necan histérica, (30) Um dos principais trabalhos que se destaca nesta corrente 6 a obra de Clévis Moura, Rebelises de Sengatas, publicada prin ineiranente om 195% ste autor foiy sem divida, © pioneiro cy nae andLise ficas sobre ag constituigtes de comunidades de spec fugitives tio Brasil © a sua relag%o com a resistencia negra du a4 rante a eeeraviddo. Buscando, a partir da luta dos escravers, principalmente através dos quilombos, compreander a dinamica Ua sociedade escravista brasileira, Moura s empenha em abordar as comunidades quilombolas em varias regi®es do Bragil, suas relan gtios com outros movimentos politicos e as agies de guerriihas dos quilombos. Raseando-se principalmante em fontes primérias impres~ gas e fontes secundérias, Moura analisa o que chama de "desgaste" do cistema escravista levado a 6 bo, em parte, pela mci escrava. (32) Em novas edigfes, Moura (principalmante em 1972, 19HL © 1986) far algumas alteragiies em seu texto, pordém sein modin flear a estrutura @ as conclusties da obra original, G53) Criti~ cando a interpretagko “culturalista" dos quilombes encontradas nos estudas de Nina Rodrigues, son Carneiro, Artur Ramos @ au tros, afirma pretender "restaurar a verdade histdrica e@ social desfigurada por indmeros egtudioses" a respeito da Lita e@ resis: tancia dos escravos.: (34) Para ele o quilombola era (aes) © @lomanta que, como sujeito do proprio reaime eccravista, negava~o material # secialmente, solapande © tipo de trabatho que existia e@ dinawizava a rati Picagdo social existente. Ao fazer isto, see conscien- lizaexe embora, criava as premissas para a projegao de ua ragime novo no qual @ trabalhe seria exercide pelo homem livre & que nXo era mais simples mercadoria, mas vendedor de uma: sua forga de trabalho.” (35) Fara este antors assim come para outros que analisaram a resistencia escrava entre meados da década de 60 e inteia da dé cada de 80, © quidombe era inerente & escravidio. (36) Gh havia fugitives © quilo bolas, porgue existiam homens escravizados sob a exploragio do trabalho. Nesse sentido, a resisténcia dos quir Lah Jombolas era t&o somente explicada na negagme dos mesmos ao regi~ me da cativeiro. Em owtras palavrasy ao fugir © se aquilombary of cativosy ainda que "sem conseientizayXo", acabavam por "dinamizar a estratificagXe social” sob a escravidXo, j& que sua forga de trabalho deixava de ser simples mercadoria, Pioneiras do estudo sobre o tema ¢ muito importantes num momenta politica crucial da histéria do Brasil, essas anAlises ficavamd Limitadas quando Moura procurava definir 0 sentido poli~ tico da luta dos quilombolas. Numa perspectiva marxista, ainda que ancorada em modelos evolicionistas, destacava Moura , "Uma parte deises elementos esGraves, mesmo sem cons~ cientizas%o do processo e@ som possibilidade de auto~ conscigneia social era 34 para si, criava barreiras de fensivas ao sistema, organizavaqse contra o mesmo. — Ou~ tra parte dos escraves, no entanto, vivia ainda prosta~ da seb © complexo escravista, no tinba optica para ver sequer a sua situagaa imediata, @ que Fevaria a reba Lido, @ra ainda componente de uma classe em si, sinples obiete do fato histérica.” (37) Camo s@ pode ver nesta passagem, @ grande problema dass andlise de Moura era cua percepgko de “processo historico". Na sua porspactiva parecia que as experiéncias sociais eram quase que exteriores As agBies dos sujoitos histéric ss que a vivencian vam. Ha luta dos cativos contra a dowinagto escravista existian dois Upos de escravos. Um era aquele considerado accmadado, neo resistente e que acwitava passivamente a escraviddo, pois mao tim nha nenhuma “cansci®neia® da condigie social na qual viviae 0 oun tro tipo de escrave era o "rebelde", @ quase herdi, © quilombala. es te entretanio nfo tinha uma "“autoconseitincia social". sentidey of quilombolas assim como 06 revaltosos escravas, eram 65 Uinicos Que com suas agGes podiam interagir no "proces cial" da escraviddo, poréa, crianda simplismente “barreiras de~ fensivas ao sistema" escravista. Veiamos bong para este autor, as ages dag catives niko re~ tava propriamente um processo histérica com sentido polt~ pres craves Gcon~ tico definido. As atitudes dos quilombolas @ outros es: iderados verdadeiramente “rebeldes" constitulam Xo somente sub= sidioas do “processo" em curse de "desgaste social e@ econémico do escravismo". Mowra chega a fazer uma ClassificagXo das formas de dutta dos cativos. De um lada, coloca as "formas passivas" que eram representadas, entre autras, pelo suictdia, as fugas e@ 4 formagxo dos quilombolas. (388) J& as “formas ativas" eram as re~ Voltas abertas, 0% assassinates praticados contra senhores © fei~ tores e as agties de guerrithas dos quilombolas. Nesse sentido, a formagxo de comunidades de Tugitivos gue procuravam oryanizar enha suas econonias @ madg de vida préprio, longe da dominio s rial, @ considerada come uma agao "passiva" j& que sua existéncia por ai sé no arheagava a escravidke. Caso os quilombos desenvol- vessem agties de querrilnas, entrentando @ atacando auteridades @ senhores, suas agves transformavamese em “ativas". Em titima an& lise, a atitudes de enfrentamento dos catives s&o percebidas co no formas de luta sam ideologia @ ldgica propria. (39) Os fatores que fundamantalmente contributram, de fato, para a fim da escran vidXo teriam sido aquoles muitos mais relacionados ao "desgaste economica” do sistema escravista propriamente dito, do que as agtios de resisténcia e as atitudes de enfrentamentos dos escraq vot. enquanto suieites histéricos. Alias, Moura destaca quer W “nease processo La passagem da escravidae para o trabalho livre] @ que atirmanos tee o quilembola desempenhado papel importante ng tanto pelas suas intengées ou atitudes ideoldgicas, mas pelo desgaste econdmico @ assimetria social que produzia". (40) Tais interpretagies materialistas +- pioneiras, coma j4 Langadas por Moura a respeite dos quilombos bragi~ leiros, n&e foram levadas adiante nog ostudes quo se seguiram, a nae ser nos trabalhos do préprio autor, ques em textos posterion res, tentou em certa medida, relativizar a base wn tanto quanto esquendtica de suas princiras reflextes. (41) Em 1968, ainda sob © calor dos acontecimentos politicos brasileiros, outras inter~ pretagtios materialistas a respeite dos quilombos surgem na obra do Luig Luna. (42) Mum tom marcadamente "wilitante", este autor diz pretender demonstrar em seu estudo "que a massa de escraves n&o permangcou de bragos cruzados diantea da escravidxo". (453 Com tal perspectiva, em tede o sou trabalha, Luna se preocupa apenas em apontar @ narrar ~~ enumerando casos @ opisddios diversas an algumas reqides brasileiras ~~ varias formas de resistencia e crava. Destdcamse, em suas andlises, os quilombos, as insurrei~ ados gies coletivas @ os assasinatos de senhores @ feltores prat polos cativoss “ Q negro, ao contrério do que se costuma afirmar, nun~ ca s@ submetcu pacificamente A eseravidaoe, De modo yen Pal, reagiu pelos moios de quo dispunha. Quando podia, 3 reagwo ~~ individual ou coletiva -~ era viglenta. No primgiro case, foran muitos os crimes de agressko © ho- Miekdio comstides por negros cativess na segunda, etka as revaltas @ os quilombes quo a historia da escravida registra. A maioria dos escraves, em tempo algum, —con~ formouse con o regime de cativeiro. @ fuga, frequente no comportamente do negro esacrave, desde que as primei~ 18 ea grupos aw indivie angas @ internavaa=se aa) ras levas aqui chegaram. Fugiats dualmente, homens, mulheres @ er nos matos para formar quilombos Além de quase eleger as fugas coletivas, a fermagXo dos i i quitombos © as ravaltas dos calivos como as formas, por assim di~ zer, preferenciais da resisténcia ascrava, as andlises de Luna naa acrescentam ao estude pioneiro de fowa. Felo contrérion suas interpretagies sobre a rebeldia dos catives batem na tecla de que os escravos fundamentalmente reagiram porque @ cativeiro era Cruel e Violento. Enfim, desconsiderando o pracesso histdérica € OS SeAs Componentes Sociais transfermadores, Luna destaca as varias formas de enfrentamento dos cativos tao somente dentro da ldgica da raagao deles contra os castigos @ os mans tratos do. re gime escravista, (45) Na década de 70, virions outros trabaihos voltados especi ficamente para a rebeldia @scrava reacenden o debate historiogré fico brasileiro a respeito da escravidao. Dastaca-se a obra de José Alipio Goulart, surgida em 2972. (44) Com certeza este tre balhe 6 0 mais complete sobre os quilombos brasileiros depois da obra da Moura em 1957 (alias @ tivro cle Moura teve a sua’ segunda edigio publicada justamente no mesmo ano @ na mesma editora em que foi langado o estude de Goulart). (47) Utilizande-se de um material enpirico até entae inédite (Kelatérios impresses dos Fresidentes e Chefe de Policia das Provincias no XIX)» Goulart se prop@e a fornecer una andlise o quanto possivel pano~ ramica dos "aspectos de rebaldia dos eseravos no Brasil". (48) 0 Aitulo de sua obra JA & indicative deste propdsito, uma vex que ig nhora mencione varias pretonde analisar “da fuga ao sulcidio". formas do resistencia escrava, em seu trabalho dedica-se Ga aber dar fundanentalmente as revoltas dos cativos @ a formag&o dos quiloabos. (49) Com esse obj@tive passa em revista eaBas TOFMAS de enfrentanenta escravo em todas as regifies brasileiras. Quanto im cama Moura * as comunidades quilombalas, também ele ~~ as critica as interpretagfes puraments culturalistas de reflextes anteriores a respeito do tema. Pordm as andlises deste auter Xe avangan mais da que o-argunento reducionista j4 contide nas An terpretagives de Luna de que as variadas aches de resistencia dos escraves eo explicadas basidamente pela crueldade do regime do cativeiro no qual viviam.. (50) Quanto aos fugitives @ aquitombe~ dos destacaz ito sé a vinganga, mas Lambém an necessicdadan, os im pulsionavan com maior vigor & perpetrate de crime, aun hentando a debinguéicia na medida das repressttes @ das restrigtes que se Vian submetidos, apds a evasRo, se os conpensavan ce certa Liberdade de movimentos, posto que yam Vigiada, tragiam—Lhes, por outro, sériog problemas antes inexistontes quando na companhia de Seus senhoress destarte, revigoravan n@les os instintos primitivos até ent®o represados pelas compansagiion ma~ tariais ~~ e@ até ua certe revestimante social com que contavam, pOsto que pesos -e submiggos. — Soltoss . parsavam A agir como bichos, de vez que cone tal eam cagados." C51) Pas and&lisas de Goulart emerge uma vise de rebeldia "naw turalizada" dos escraves negros. Come seres humanos @xpostos as tas condigtes sociais permeadas de crueldade @ violenciay rea e ate ge suicd fugindo, aquilombande-ses matando seu? senhorey dando. Degtacasse também am suas interpretagties —~ coma na passe gem citada aci@a ~~ uma vis&o proconceituosa a respeito da cul tun 20 Ana, Wma ver que fala de “inetintos primitives” que ravien ra ated qoravan~se@ Nos escravos africans que fugiam para o% quilombos. Ainda preocupado em rebater criticamente as interpretagtes que ressaltam a do cilidade do sistema escravista brasileire, Goulart ae esforga am destacar em sua obra que: posto que a escravid®e foi um eistema tXo desumano, os catives de variadas manedras ten~ taram reagir. Sem se preocupar com tranfarmagives sociais e@ hist ricas da resist@ncia escrava, as andlises interpretativas deste autor passan do século XVIX para o XIX como intufto de apenas apontar a ocorréncia de rebetdia dos cativos nesta ou naquela re~ gio, num cu notre perfodo. De qualquer maneira ~~ como JA apon- fundamental em tanos “- a obra de Goulart teve una importan’ apresentar ta andlise panoraémica da formag%o dos quilombos no Brasil, wtilizando farta dagimontagao ainda inedita. Em meados da década de 70, @ mais propriamente no inicto da de 00, as interprotag8es sobre os quilombos brasilelros assen- tadas numa perspectiva marxista reaparecem com toda forga nos textes de Décio Freitan. Tawbom utilizando vasta documen lackey oferece ele andlises originais sabre a resistincia escrava no Hrasil, destacando-se@ cous emtudes sobre a revoita dow Mal Auilembo de Palmares. (52), E © autor tanta formular una explicagae geral @ definiti va a respeito da resisténcia dos calives na sociedade escravista do Trasil. Eabora rossaltanda as especificidades de algunas for nactes das comunidades de fugitives (aspectos socials @ econdmi~ Freitas com © objetivo de explicar @ porque que as "dutas cos), dos eseravas n&o tiveran forga pare destruir o sistema de opres~ ay sXo © explorag&o", ressalta o seguinte “Os quilombos medravam A margem da BOGiedade eseravis~ tat marginalidads geogratica, econ@mica @ social. Naxe ofereciam, A Vista disso, qualquer risco realmente sé~ rio ao sistema. Causavan pertubagties @ preiutzos, & certa, porém deixavam=-no intacto. Contigurando uma for fa eleagntar de luta @ libertagke, mostravam-se incapay res de subiugar e transformar a sociedade inteira. & indubitavel que estas contestag8es contrébuteam para a supressiio da escravatura. Sabemos, porém, que a supre: s8o fol essencialmanta determinada pela intervengaa de um elemento externo, a saber, as presstios inglesas para a cessagio do trdfico, © Que, por mua Yer, originaw a deconposig¢&oe gradativa do sistema e sua morte por obeo~ Lescaneia.". C83) m sas andlises, calcadas nas explicag&es dos processas histéricos sob o prisma do aspecto base/superastrutura de deter minadas sociedades, as transformagives sociais aparecem subordina- das a fendmenos totalmente externos as agties e intengties dos sun igitos historicos em quest&e, no caso oF escravos. (84) Como res saltou Chalhoub, tal perspectiva analitica postulava uma "especie de exterioridade determinante dos rumas da historia, demiurga de s in wou dacting — coma se houvesse um destino histérico fora d tangtes @ das Mitas dos préprios agentes sociais”. (35) Tendo ‘como objetive analisar as formas de enfrentamentos dos escraves no contexto da luta de classes sob 0 escravismo, witas define que "os escravos proletacios formavam uma classe extraordinariamente débik, © sua mesma debitidade dava a medida da forga da classe escravista". (546) Sendo assim: - "A adog%o de quilomho como form. de Luta se a dmpoten~ cla da massa eserava para s@ Libartar coletivamente mo~ diante a derrubada do sistema escravista encontram ex~ plicago na extrema dobilidade de uma classe ~~ a Clas se escrava existenta no ordenamente estamental da so giedade escravistan" C7) lara expticar o que chamava de “impotencia revolucienaria® dos catives ado #6 no Brasil mas também em toda a @émériga escran vista (usa o exemple da revolta dos escravos do Haiti no final do século XVIII), este autor alinha como fatores: a falta de unidade étnica, a nXo organizagtio coletiva @ o baixo nivel de progresso tecnico dos eseraves. Em stay para Freitas o "nivet da duta de classe era entretanto. sumariamente baixo, em consequéncia da dem bilidade dos @ como classe social". Em outras aves proletario palavras, com esquemas reduc donistas cristalizadas, este autor define a luta dos esuraves numa perspectiva t8o eomente de subor dinaso aos modelos tedricos estruturais. (58) So pasa corrente histoeriografica relativa & resistincia eacrava no Kragil, pautada em andlises materiakiotas, teva impor— tincia téors. a, empirica e fundamentalmente pollticas eri ticande os prassupostos que caracterixavati a benevelénc a dos regimes souiais da escravidie brasileira, persistiu ela nos seus inetrun pentos da analise na idéka da "coisifleagao" do quilembola. Dente mode;-o @scrave ao invés de sujeito, aparécia apenas como uA querreiro de uma Logica inexorarel com um dnico sentide his té6ri~ co. 0 es rave “coisa~passive" gadia vez ao escrava "“coiganrebel~ de", Invertianse, asin, o6 mitos da escravid®o no Brasil. (97) Em termos gewais, tanto aa andlises, culturalistas como as andlises materialistas apontaram os principais aspectos da luwta dos quilambolas durante a escraviddo sah o prisma da sua “wargt> nalizagive" m relagto ao mistema escravigta. Para os culturabign 23 tas, por exemplo, o% cativos que fugiam para os quilombos vigavam 4Xo Gomente a reconstituir as origens afiricanas da sua "cultura". J& para os materialistas “= que procuraran rechagar totalmente tais explicagtes “a formagto dos quilombos significava, @m l- Lima instancia, a "reagto” coletiva dos escravos contra a violén- cla @ 08 maus tratos da escravidXo. Nesse sentido, para esses duag correntes, o aquilembamento como forma de luta aparecia como ln processo social que-se dava fora da sociedade escravista. Pos~ to que a eseaviddo era um muncs marcado pela vioténciay que "co @ificava” socialmente @ escravo, foi no quitombo, enftim, nua mun~ 5 do. fora da escravidao, que os escravos resistiram (culturadmente @ materialmente), de fate; A dominaga a eles impostas. Entimy $O desta maneira os escraves puderam se tornar stieitos de sua prim pria historia. in trabalho mais recente sobre a tema dee quitlomhas 10 Brasil, publicade em 1989, Carlos Magno Guimaraes retoma ~~ ainda que de forma manos esquemdtica —- alguns dos argumentos da cor rente meterialista. (60) Dentro os adritos do seu trabalho, base destacanmse, sas andlises « ado mune volumes a documentagags respétto do que chamou de “cardtor contraditério do quilombo" cam relagve ao sistema escravista. (61) Ele procura analisar de que modo of quilombos mineiras na século XVELT podiam estabelecer re~ Lagties — © que Chama de “cowtradig&e" -~ econdmicas e socials com o regtante da aeciedade escravisla. Deste modo as interpretan fies do mencionado autor se distanciaram wn pouco das abordagens anteriores qué pastulavam, de uma maneira ou de otra, somente aspecto "marginal" da lita dos quilombos no Brasik tretantey ae ao para o “cardter contraditéria’ das re ainda que chame a ateng Lagies entre o8 quilombolas @ & gociedade escravista, o referide autor continua preso se considerarmos suas conclunties ~~ aa paradiqma da "marainalizagio" « : aw No Brasil, estudes contemporineos sebre © tema eseravidso tam tentado matizar algunas andlises polarizadorasy apontanda ou~ bros caminhos para 6 entendinante mais complexe das relagies so~ @ escravos. Destacamse entudos tematicos ciais entre senhor sobre a familia escrava, Campesinato negra, espagos de autonomia economica dos cativos, cultura escrava, paternalism, controle gocial © Viol@ncia no cotidiano do cativeiro e 0 raciema entre brancos, escravos @ negros no final do século XIX. (62) fais estudos, alarganda © universe do debate Nistoriogré: Fico brasileira a respeito do tema escravidto, trouxeram novas intorpretagtios @ abordagens para a discussao, Resieténcia escra vas por exemplo, fod entendida comb uma das faces das Lutas com plexas da aspectos socials miktifacetados que eram vivenciadas peiug escravos ne cotidiane do suas experiencias histéricas © que Laboragite permanente de nevas rela~ Linha comm contraponto a re GOes com seus venhores, medificanda assim as varias formas de don

Você também pode gostar