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Para Kelly,
Que está me ajudando a enxergar que
eu tenho asas e posso voar.
Não estou te pedindo que se apaixone
Vamos ser eternos só esta noite
Não estou te pedindo em namoro
Já que, sendo amigos, fazemos de tudo
Amigos Con Derechos – Reik ft. Maluma
Eu sou uma farsa.
E não estou dizendo isso porque uso unhas postiças ou
porque, simplesmente, uso sutiã de bojo para parecer que tenho
seios fartos. Ou porque, às vezes, uso lentes de contato azuis.
Não.
Sou uma farsa por sustentar diante das pessoas uma vida
que eu não sei levar. Uma vida que eu acho que nem quero
experimentar.
Principalmente, em momentos como este, como quando
estou diante de um cara bonito como... meu Deus, como é nome
dele mesmo? Acho que é Carlos Henrique ou Carlos Eduardo, não
me recordo direito.
A questão é que ele é dono de um sorriso sedutor e de
covinhas chamativas. Seus cabelos escuros fazem parte do charme
que combina com seus olhos verdes, um pacote arrebatador que
simplesmente não vai funcionar para mim.
Como de costume.
— Vem, gostosa. — Ele me puxa para si no ritmo da batida e
eu me esforço para não o afastar, contendo uma careta ao senti-lo
se esfregando em mim.
Não sei por que eu aceito esse tipo de coisa.
Onde está Gabriel?
Olho para os lados, procurando por Gabriel Albuquerque,
meu melhor amigo, que me trouxe a esta balada dos infernos, para
conseguirmos alguém para aliviar a nossa noite, mas é claro que
não o encontro.
Gabriel é o cara mais safado do estado de São Paulo e é
óbvio que a essa altura, ele já saiu daqui com alguma garota.
Quero contar uma coisa para vocês: Gabriel e eu somos
amigos de infância. Estudamos juntos e tivemos a oportunidade de
fazer faculdade juntos. E, por incrível que pareça, montamos uma
empresa juntos.
Só que, nem mesmo uma amizade tão forte como essa, foi
capaz de me impedir de mentir.
— Vamos sair daqui, gata. — O sujeito me puxa da pista de
dança e nós atravessamos o hall, esbarrando em várias pessoas
bêbadas.
Quero perguntar para onde vamos, mas o barulho é
ensurdecedor. Dou mais uma olhada em volta, na esperança de
encontrar Gabriel, mas não o encontro. É, já era. Agora está por
minha conta, como sempre.
Carlos Henrique ou Eduardo, não consigo me lembrar ainda,
entra em um espaço mais reservado e me encosta contra a parede.
Não tenho tempo para retrucar, nem perguntar o que diabos ele está
fazendo, porque sua boca vem direto para a minha. Ele me beija, ao
mesmo tempo que esfrega seu pau na minha barriga.
Fecho os olhos, pensando na probabilidade de conseguir
algo melhor esta noite. Não sei... Gabriel me disse que Carlos
alguma coisa era um cara legal. Acho que ele é irmão de uma das
meninas que Gabriel já ficou.
Neste caso, quero acreditar que ele seja legal. Não quero
acreditar que Gabriel ia me apresentar um cara que fosse um
completo babaca.
Abro a minha boca e tento corresponder ao beijo. Eu só
preciso relaxar...
Uma de suas mãos gruda na minha bunda, enquanto a outra
sobe para o meu peito.
É sério que ele vai tentar me comer aqui? Desse jeito?
Outra coisa que eu tenho que contar para vocês: sou virgem.
E é por isso que eu me sinto a maior fraude de todos os
tempos, porque ninguém, além de mim, sabe disso.
Sim.
Eu passei a vida toda mentindo para Gabriel que eu sou tão
“pegadora” quanto ele, quando, na verdade, sempre dou um jeito de
dispensar os caras na hora H.
Achei que com Carlos alguma coisa seria diferente. Lembro-
me de Gabriel ter dito que ele era um cara gentil, mas o que estou
vendo neste momento é que, mais uma vez, vou precisar usar dos
meus truques mais certeiros.
— Aiiii! — Empurro-o e levo as mãos à cabeça. — Minha
cabeça está doendo demais! Estou me sentindo mal!
Carlos alguma coisa me olha, atordoado.
— O quê? O que houve? — Ele se inclina em minha direção
e eu fecho os olhos com força.
— Eu vou vomitar. Estou me sentindo mal!
— Meu Deus, quer ajuda? Quer ir ao banheiro?
— Sim, banheiro. Preciso ir agora!
Carlos alguma coisa tenta me dar a mão, mas eu me afasto.
— Não precisa... vou sozinha. — Lanço um meio-sorriso. Ele
assente, ainda atordoado.
Por sorte, os banheiros ficam perto da saída. Carlos alguma
coisa já se virou para ir em direção ao bar, então aproveito para sair
da boate.
Argh...
Eu odeio ter que mentir dessa forma, mas não vou entregar
a minha virgindade a um cara como Carlos alguma coisa que trocou
apenas algumas palavras comigo e achou que já podia me comer
em pé dentro de uma boate.
Eu tenho meu orgulho.
E, no fundo, eu quero alguém especial.
Todo mundo quer... eu acho. Talvez não a minha irmã,
Isabella, que perdeu a virgindade aos 13 anos com um garoto
babaca do time de futsal da escola e que depois fingiu não a
conhecer. Eu teria ficado magoada, mas Isabella... nunca ligou para
isso, só queria perder a virgindade como se fosse uma grande pedra
em seu sapato.
O vento gelado bate contra o meu rosto assim que saio da
boate e eu me abraço para tentar me proteger. Apesar de ser
começo de agosto, ainda está frio. Que tempo louco o que temos
nesta cidade.
Maldição. Deixei meu casaco dentro da boate. Agora já era...
não vou arriscar voltar e dar de cara com Carlos alguma coisa e seu
pau sedento para se aliviar.
Se ao menos Gabriel estivesse aqui, ele teria percebido a
minha insatisfação e me ajudado a fugir. Bem, isso não quer dizer
que Gabriel se mete em meus relacionamentos. Até porque, eu
nunca tive um relacionamento de verdade. Sempre foram saídas
que nunca resultaram em nada. Mas eu continuo mentindo para
Gabriel, dizendo coisas como “Ah, a noite foi ótima”, “Uau, fizemos
sexo violento”, “Nossa, ele me deixou pendurada no teto”.
E ele sempre acredita.
Pobre ingênuo.
Pego meu celular e checo as horas. Quase duas da manhã.
Acho que Gabriel não vai se importar se eu for para o seu
apartamento. Geralmente, suas conquistas não são levadas para lá,
porque ele sempre diz que sua casa é o seu santuário e ele não
quer contaminar com pessoas que mal conhece.
É óbvio que isso não se aplica ao próprio corpo, mas enfim...
Abro o aplicativo da Uber e coloco o endereço do meu
amigo.
Agora só me resta esperar um pouco.
~
Robert está há uma hora falando sobre o desenvolvimento
da engenharia no Brasil e Gabriel já me lançou vários olhares
entediados. Tipo, eu também estou entediada, para ser sincera,
porque tudo o que ele está dizendo, nós já sabemos.
Luciana já me trouxe vários cafés e estou começando a ficar
com vontade de fazer xixi.
— Então, Robert — o interrompo. — Você disse que queria
nos mostrar alguns projetos inovadores... — Olho para Gabriel,
incerta se devo continuar. — Estamos bem curiosos.
— Ah, é claro. — Robert sorri e passa uma das mãos pelos
cabelos escuros. — Eu trouxe uma pasta com vários projetos que
realizei nos Estados Unidos, mas acho que vocês precisam analisar
com cuidado. E sei que já falei demais também.
Gabriel revira os olhos.
— Você quer deixar comigo, então? — pergunto, estendendo
a mão para pegar a pasta.
Robert sorri.
— Se Gabriel não ficar com ciúme...
Ele dá de ombros.
— Ana Clara é tão competente quanto eu. Pode analisar os
seus projetos antes de mim, sem problema algum.
Sorrio na direção de Gabriel e Robert levanta uma
sobrancelha, curioso.
É engraçado porque sempre fomos assim, para algumas
pessoas pode ser estranho, mas nunca tivemos problemas em um
passar na frente do outro.
— Se é assim. — Robert estende a pasta na minha direção.
— Fico lisonjeado que Ana Clara Aguilar será a primeira a analisar
os meus projetos. — Sua voz contém um tom malicioso que me
deixa um pouco sem graça.
Olho para Gabriel, mas ele está revirando os olhos, mais
uma vez.
Sei que ele não gosta da perspectiva de trabalhar com o
primo, mas precisamos dar uma chance ao rapaz e ver o que ele
realmente quer de nós.
— Vou olhar tudo com muito carinho.
Robert sorri.
Respiro fundo.
Escrevo:
~
O Le Travetone é um restaurante de alto padrão em São
Paulo e é aqui que eu gosto de vir quando quero fugir das baladas e
curtir um jantar mais tranquilo e uma boa conversa que,
provavelmente, vai me render uma noite de prazer intenso.
Aline e eu somos recebidos pela filha do dono do
restaurante, que assumiu os negócios quando o pai faleceu, há dois
anos.
— Gabriel, que bom vê-lo — ela me cumprimenta como
sempre, com um beijo em cada lado do rosto. — Faz um tempo que
não o vejo por aqui.
Abro um pequeno sorriso e enfio as mãos no bolso.
— Pois, é... andei um pouco ocupado.
Ela sorri e então se vira para a minha acompanhante que,
diga-se de passagem, está deslumbrante em um vestido azul-
marinho que vai até metade das coxas.
— Olá, moça... seja bem-vinda.
Faço as apresentações e Carla nos guia até uma mesa que
nos dá uma vista dos chefs trabalhando sem parar na cozinha.
— Vou deixar o cardápio com vocês e volto logo para saber
o que vão pedir. — Ela nos entrega os cardápios e se afasta,
deixando-nos à vontade.
— Sempre tive vontade de vir aqui — Aline diz, folheando o
cardápio. — É bom saber que você é um cliente fiel, assim poderá
me trazer mais vezes.
Ela sorri de forma inocente e eu engulo em seco.
Não saio com a mesma mulher várias vezes.
Depois desta noite, vai existir mais uma e, quem sabe, até
outra... mas como posso deixar isso claro, sem que ela se ofenda?
— Eles servem uma entrada ótima de salada com
mascarpone — mudo de assunto. — Tem figos flambados em vinho
Sauterne e é uma delícia. Você devia experimentar.
Aline sorri, animada.
— É, acho que vou pedir isso mesmo.
Aline continua vasculhando o cardápio e, de repente, meus
pensamentos estão novamente em Ana Clara.
Diabos.
A essas horas, ela já deve ter encontrado Robert e devem
estar indo para seja lá onde que eles marcaram de se encontrar.
Espero que meu primo tenha tido a decência de ter ido buscá-la em
seu apartamento.
As coisas seriam tão mais fáceis se Ana Clara simplesmente
não tivesse me revelado seu grande segredo.
— Gabriel? Está me ouvindo? — Aline estala os dedos em
frente ao meu rosto e eu a fito, completamente perdido.
— Perdão, eu estava...
— Ah, sim... eu só estava dizendo que... veja, aquela não é
a sua amiga... que estava com você no pub, naquele dia? — Aline
aponta na direção da porta, atrás de mim.
Viro-me lentamente e meu coração quase pula do peito ao
vê-la.
Ana Clara e Robert.
Mas por que diabos eles estão aqui?
Viro-me para Aline, frustrado. Não quero que ela me veja,
senão vai pensar que estou seguindo-a, embora eu possa muito
bem exigir saber por que ela está aqui, sendo que este é o meu
restaurante favorito.
— Está tudo bem, Gabriel?
— Sim, claro. Aquela é, sim, minha amiga. Mas é melhor
deixá-la em paz.
Aline encara meu rosto por longos instantes e depois
assente.
— Ah, ok. Então vamos fazer nossos pedidos.
— Sim, por favor.
“Você precisa encontrar um cara que saiba te ouvir, que seja o seu
amigo e não apenas o seu amante.”
É isso.
Céus, como nunca pensei nisso antes?
Meus olhos desviam para as mãos de Gabriel segurando
meus braços e, de repente, meu corpo se aquece com uma
sensação diferente.
Gabriel é um homem bonito, claro. Só que, até hoje, nunca
tinha pensado nele dessa forma e sempre achei engraçado as
outras mulheres que praticamente caíam aos seus pés assim que
ele passava.
“Se as coisas saírem do controle, você será a voz da razão para nos
trazer de volta aos eixos.”
Será que ele realmente quis dizer isso ou foi apenas o calor
do momento?
Sei que as coisas entre nós sempre foram muito fortes, uma
ligação que não é para qualquer um, mas nunca pensei que
poderíamos chegar a esse ponto. Se é que chegamos a ele.
Estou confusa.
Eu amo Gabriel, ele é o meu melhor amigo, meu porto
seguro em praticamente toda a minha vida, mas sinceramente não
sei o que pensar sobre o que aconteceu.
Não quero pensar que o forcei a fazer coisas que não queria,
e agora está confuso sobre seus próprios sentimentos. Também não
quero pensar que ele pode estar confundindo nossa amizade com
paixão.
Preciso conversar com Madalena. O problema é que ela
realmente se apaixonou pelo melhor amigo e se casou com ele.
Teve um filho com ele.
Ah, céus.
Eu nunca me apaixonei por ninguém.
Houve alguns meninos, no tempo de escola, que eu gostei.
Achava-os lindos e queria-os, mas eu nunca fui boa o suficiente
para eles. Então não acredito que cheguei a me apaixonar por
ninguém.
Rolo para fora da cama e vou até o banheiro fazer a minha
higiene pessoal. Já não dá para enrolar mais, minha barriga está
começando a doer de fome e já está tarde também.
Visto uma camiseta cinza com desenho da Minnie que
comprei em Orlando, anos atrás, quando Gabriel e eu conseguimos
fechar nosso primeiro contrato grande. Visto uma calça de moletom
e dou uma olhada no espelho.
Meu rosto praticamente grita “você não dormiu nada”.
Preciso de café.
Saio do quarto e assim que fecho a porta, olho na direção do
quarto de Gabriel.
Talvez eu devesse ir falar com ele. Resolver essa situação,
afinal, ele sempre me colocou como responsável para voltarmos aos
eixos, caso saíssemos dele.
O problema é que não tenho coragem de encará-lo no
momento.
Meu coração é uma verdadeira confusão de sentimentos e
não posso lidar com isso agora. Não aqui, no sítio de seus pais, que
sequer sonham com o que está acontecendo entre nós.
— Ana Clara? — A voz de Alicia me traz de volta e eu fecho
a porta. — Tudo bem?
— Tudo sim... — Dou alguns passos em sua direção, me
afastando do quarto.
— Ahn, achei que você queria falar com o Gabriel. — Ela
abre um meio-sorriso.
— Não... quer dizer, quero, mas não agora.
— Ele não está. Saiu com o papai — ela explica enquanto
começamos a caminhar até as escadas. — Eles foram procurar um
lugar para comprar mais gelo.
— Entendo.
Respiro um pouco aliviada de saber que não preciso lidar
com Gabriel por enquanto.
Talvez ele já nem se lembre do que aconteceu. Talvez as
coisas não estejam estranhas. Talvez tudo esteja dentro da
normalidade e eu estou paranoica à toa.
— Vem, vamos tomar café. Sua barriga está gritando.
Nem reparei que minha barriga estava fazendo barulhos,
mas dou risada e sigo Alicia escada abaixo.
A casa está silenciosa, então vamos direto para a cozinha.
— Os convidados vão começar a chegar só no final da tarde
— ela explica, pegando uma xícara no armário e me entregando. —
Como estão as coisas com Robert?
— Robert? — Estranho a pergunta, mas me concentro em
encher minha xícara de café.
— Sim, ele disse que ia convidar você para sair. Achei que
estavam ficando ou algo assim.
— Ah... É uma longa história. Estou devendo um encontro
para ele, na verdade. Ele foi convidado para a festa?
— Foi...
Solto um gemido frustrado.
Alicia sorri.
Misturo um pouco de leite no café e bebo.
— E com Gabriel?
Sua pergunta me faz engasgar.
Começo a tossir como louca e Alicia dá tapinhas em minhas
costas.
— Nossa, desculpe. Mamãe já disse que não devo
conversar enquanto as pessoas comem, mas não resisto.
Apoio minha mão no balcão e respiro fundo várias vezes.
— Não, tudo bem — digo devagar. Meus olhos estão
lacrimejando. Uma cena linda de se acompanhar. — Só não entendi
sua pergunta.
Alicia suspira.
— Só perguntei se estava tudo bem entre vocês. Meu irmão
estava com uma cara de quem foi a um velório hoje de manhã.
Achei que talvez tivessem brigado.
Meus temores se concretizam.
Gabriel está remoendo o que aconteceu e isso o deixou de
mau humor.
Ah, meu Deus.
— Não sei... — Respiro fundo. — Acho que pode ser algo de
trabalho.
Alicia me encara por longos instantes.
— Se você diz. — Ela dá de ombros. — Quer comer pão de
queijo? Tem no forno.
— Quero.
Alicia se vira, mas fico com a sensação de que ela sabe de
algo.
Será que me viu indo até o quarto de Gabriel?
Meu Deus, não posso nem pensar em uma possibilidade
dessas.
Um mês depois...
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Notas
[←1]
AutoCAD é um so ware do po CAD — computer aided design ou desenho
auxiliado por computador - criado e comercializado pela Autodesk, Inc. desde 1982.
É u lizado principalmente para a elaboração de peças de desenho técnico em duas
dimensões e para criação de modelos tridimensionais.
[←2]
Yin e Yang são conceitos do taoismo que expõem a dualidade de tudo que existe no
universo. Descrevem as duas forças fundamentais opostas e complementares que se
encontram em todas as coisas: o yin é o princípio da noite, Lua, a passividade,
absorção. O yang é o princípio do Sol, dia, a luz e a vidade