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Henri Bergson nasceu em Paris em 1859. Estudou na Bole Normale Supérieure de 1877 a 1881 e passou os dezessets anos seguintes como professor de filosofia, Em 1900 tonou-se pro- fessor no Collage de France e, em 1927, ganhou 0 Prémio Nobel de Literatura. Bergson morreu em 1941, Entre outros livros, escre- veu O pensamento ¢ 0 movente, Materia e menscria, Orso e A eo0- lugto criadora (todos publicados por esta Editora). Henri Bergson Meméria e Vida Textos escolhidos por GILLES DELEUZE Mestre de conferéncias na Universidade de Paris VIII Tradugio CLAUDIA BERLINER Revisto técnica e da tradugto BENTO PRADO NETO Martins Fontes So Paulo 2006 ‘crf pint mo cone “edn err Petes Prem Prs ppt Pans Unt Pe ono sirshan Fos Ee, ‘So Ps pe ae ce Tratugio CLAUDIA RentaveR Revit Kenicn eda traagso ‘ens Pae Naa ‘Acompanherents etal, ‘Mar Ferra ines Tevises pleas Maran Roa sre ‘Sins Gai ore Dinwte Zoran Soe ‘Produgte pics ‘Gomis Papinagfftaion Slo 3 eset Eri Dd nteracinae de Caso na Png (CP (Gar ele do i SF Bal Baron Hear, TON, Mami vide / Hers enpon tse exclidos por Giles Dees radu Clie Beier revisor ‘da adugo Bento Prado Neto Paco. Mat Fee 2. = pce ‘hal ripe Meme ve Eevee 1. Flo ances? Marra 3, Vide Dees, ie, 1925195 I Tinla See cows cops Tres pare catoge dtm Tlsota acest 1 “Tes os drei desta eco pure 0 Brasil reseromios & Leraria Martins Fontes Editora Léa, Rua Consdiine Kamal, 330 01325-000. Sco Pewlo SP Brasil “a. (11) 3281 3677 Fax 03101 1012 emai infomrtnsones com ir Mp me martnsfontes.com. INDICE Bibliografia . svesniesven VEL I. A DURAGAO E O METODO....crecren 1 a) Natureza da duragio .. 1 ») Caracteristicas da duragéo. sl 9) A intuigao como métod 19 d) Ciéncia e filosofia..... 37 TI. AMEMORIA OU OS GRAUS COEXISTENTES DA DURAGAO .. ee a) Principios da memétia «ner 47 b) Psicologia da meMEtia .ecnrnrnnnnnes 60 ©) O papel do corpo... sens 70 I. A VIDA OU A PENRO DA DU- RACAO rns 95 a) O movimento da vida 95 b) Vida e matéria..... 117 IV. CONDICAO HUMANA E FILOSOFIA ........ 137 a) A filosofia... 7 b) A condigio humana e sua superacao. ©) Conclusio... Indice reMisst00 «oo. BIBLIOGRAFIA Lidée de lieu chez Aristote, 1889 (tese em latim, traduzida por M. Mossé-Bastide, Etudes bergsoniennes, vol. Tl, Albin Michel). Essai sur les données immédiates de la conscience, PUE, 1889; En- saios sobre os dados imediatos da consciéncia, Edigdes 70, 1988. “Matibre et mémoire, PUR, 1896; Matéria e memadria, Martins Fontes, 1999. Lz rire, PUR, 1900; O riso, Martins Fontes, 2001. Lévolution créairice, PUB, 1907; A evolugio criadora, Martins Fontes, 2005. énergie spirituelle, PUF, 1919. ‘Durée et simultanéité, PUE, 1 Fontes, em preparacao, Les deux sources de la morale et de la religion, PUR, 1932. La pensée et le mouvant, PUF, 1934; O pensamento eo movente, Martins Fontes, em preparagi wagio e simultaneidade, Mastins Os livros dos quais us textos citados foram extrafdas sero designados pelas seguintes abrevieturas: DL (Données immédiates, 39° ed.) MM. ene (Matiore et mémoire, 54? ed.) R vn (Le rire, 97% ed.) vu ‘MEMORIA EVIDA - Cévolution eréatrice, 52° ed.) Ceénergie spirituelle, 58° ed.) LR. rma (LES dex sources, 762 ed.) PM, nnn (Ea pensée et le mouvant, 31! ed.) __ Queremos salientar que por ocasiio do centenério do nas- cimento de Bergson a editora Presses Universitaires de France publicou uma edicéo completa de suas obras num volume cos- turado, impresso em papel biblia (I* ed,, 1959; 2° ed, 1963). Apresentado por Henri Gouhier, esse volume contém, além do texto integral das obras cuja reedicio Bergson autorizara, notas de editor, uma bibliografia completa (com mengao de todas as tradugées), um aparato critico, notas historicas e notas de lei- tura, um indice das citagées e um indice das pessoas citadas, As anotages so de autoria de André Robinet. 1.A DURACAO E O METODO a) Natureza da duragio 1A duragao como experiéncia psicolégica A existéncia de que estamos mais certos e que me- Ihor conhecemos é incontestavelmente a nossa, pois de todos 0s outros objetos temos nogdes que podem ser jul- gadas exteriores e superficiais, ao passo que percebemos a n6s mesmos interiormente, profundamente. Que cons- tatamos entio? Qual é, nesse caso privilegiado, 0 sentido preciso da palavra “existir”?... Constato em primeiro lugar que passo, de um estado para outro. Tentho calor ou tenho frio, estou alegre ou es- tou triste, trabalho ou nao faco nada, olho o que est & minha volta ou penso em outra coisa. Sensagées, senti- mentos, voligGes, representacdes, so essas as modifica- ‘ges entre as quais minha existéncia se divide e que a co- lorem altemnadamente. Fortanto, mudo sem cessar. Mas {sso ndo é tudo. A mudanga é bem mais radical do que se poderia pensar num primeiro momento. 2 MEMORIA E VIDA Com efeito, falo de cada um de meus estados como se formasse um bloco. Embora diga que mudo, parece me que a mudanga reside na passagem de um estado ao estado seguinte: no que se refere a cada estado, toma- do em separado, quero crer que continua o mesmo du- ante todo o tempo em que se produz, Contudo, um leve esforgo de atengio revelar-me-ia que nao hé afeto, ndo hé representac&o ou voligéo que nao se modifique a todo instante; se um estado de alma cessasse de variar, sua du- ragio deixaria de fluir. Tomemos o mais estavel dos es- tados internos, a percepcao visual de um objeto exterior imével. Por mais que o objeto permanega o mesmo, por mais que eu olhe para ele do mesmo lado, pelo mesmo Angulo, sob a mésma luz, a visio que tenho dele nao di- fere menos daquela que acabo de ter, quando mais nao seja porque ela esta um instante mais velha. Minha me- ‘méria esta ai, empurrando algo desse passado para den- tro desse presente. Meu estado de alma, ao avancar pela estrada do tempo, infla-se continuamente com a dura- so que vai reunindo; por assim dizer, faz bola de neve consigo mesmo. Com mais forte razo isso ocorre con 08 estados mais profundamente interiores, sensacdes, afe- tos, desejos etc., que ndo correspondem, como uma sim- ples percepcao visual, a um objeto exterior invaridvel. Mas € cémodo nao prestar atengao a essa mudanga inin- terrupta e s6 noté-la quando se toma grande o suficien te para imprimir uma nova atitude ao corpo, uma nova diregao & atengao. Nesse momento preciso, descobrimos que mucamos de estado. A verdade é que mudamos sem cessar e que o préprio estado jé é mudanga. ‘Quer dizer que nao ha diferenca essential entre pas- sar de um estado a outro e persistir no mesmo estado, Se, por um lado, 0 estado que “continua 0 mesmo” é mais ‘A DuRACAO EO. METODO 3 variado do que achamos que seja, a passagem de um es- tado a outro, pelo contrario, parece-se mais do que ima- ginamos com um mesmo estado que se prolonga; a tran- siggo é continua. Mas, precisamente por fecharmos os olhos a incessante variagdo de cada estado psicol6gico, somos obrigados, quando a variagdo se tornou to con- siderdvel que se impGe & nossa atengio, a falar como se um novo estado tivesse se justaposto ao precedente. Su- pomos que este, por sua vez, permanece invaridvel, e as- sim por diante, indefinidamente. A aparente desconti- nuidade da vida psicolégica decom, pois, do fato de que nossa atengao se fixa nela por uma série de atos descon- tinuos: ali onde hé apenas uma suave ladeira, cremos perceber, ao seguirmos a linha quebrada de nossos atos de atengao, os degraus de uma escada. £ verdade que nossa vida psicolégica € cheia de imprevistos. Surge mil e um incidentes que parecem contrastar com 0 que 08 precede e no se vincular Aquilo que os segue. Mas a descontinuidade com que aparece destaca-se sobre a continuidade de um fundo onde cles se desenhar e ao qual devem os préprios intervals que os separam: sao 08 toques de timbale ressoando de quando em quando na sinfonia. Nossa atengao se fixa neles porque a interes- sam mais, mas cada um deles vem inserido na massa fluida de nossa existéncia psicolégica inteira. Cada um deles nao é sendo 0 ponto mais bem iuminado de uma zona movente que compreende tudo o que sentimos, pensamos, queremos, tudo 0 que somos, enfim, num de- terminado momento. E essa zona inteira que, na verd: de, constitui nosso estado. Mas, de estados assim defini- dos, pode-se dizer que no so clementos distintos. Con- tinuam-se uns aos outros num escoamento sem fim. EC, 1-3. 4 “MEMORIA EVIDA 2. A duragiio € 0 eu O que prova que nossa concepgao corrente da dura~ ‘so depende de uma invasio gradual do espaco no ter- eno da consciéncia pura é que, para privar 0 ett da fa- culdade de perceber um tempo homogéneo, basta retirar aquela camada mais superficial de fatos psiquicos que ele utiliza como reguladores'. O sonho nos coloca preci- samente nessas condigdes, pois o sono, ao diminuir a ve- locidade do funcionamento das fungSes orgénicas, mo- difica sobretudo a superficie de comunicagao entre o eu € as coisas exteriores. Entao, nao medimos mais a dura- Go, mas a sentimos; de quantidade ela retorna ao estado de qualidade; a avaliagio matemética do tempo trans- comrido deixa de ser feita, mas cede lugar a um instinto confuso, capaz, como todos os instintos, de cometer er- os grosseiros e as vezes também de proceder com uma extraordinéria seguranca. Mesmo em estado de vigilia, a experiéncia didria deveria nos ensinar a diferenciar entre a duragio-qualidade, aquela que a consciéncia atinge imediatamente, aquela que o animal provavelmente per cebe, e 0 tempo por assim dizer materializado, o tempo que se tornou quantidade por um desenvolvimento no espaco. No momento em que escrevo estas linhas, um re- 6gio na vizinhanga dé as horas; mas minha orelha dis traida s6 percebe isso depois de varias pancadas jé se terem feito ouvir; portanto, nao as contei. E, no entanto, basta-me um esforgo de atencao retrospectiva para fazer a soma das quatro pancadas que jé soaram e adicion4-las 1, Essa iusto que nos faz confundir a duragio com um tempo ho- ‘mogéneo, ou seja, com “uma representacio simbélica tirada da exten: ‘sio", € constantemente denunciada por Bergson. Encontraremos wma andlise detalhada disso nos textos 6,7 ¢ 8, A DuRAGAO EO METODO 5 4s que ouco. Se, entrando em mim mesmo, interrogar- me entio cuidadosamente sobre o que acabou de aconte- cer, percebo que os quatro primeiros sons tinham atin; do meu ouvido e até impressionado minha consciéncia, ‘mas que as sensagdes produzidas por cada um deles, em vez. de se justaporem, tinham-se fundido umas as outras de maneira que dotassem o todo de um aspecto proprio, de maneira que fizessem dele uma espécie de frase musical, Para avaliar retrospectivamente o ntimero de pancadas jé soadas, tentei reconstituir essa frase por meio do pensa- mento; minha imaginagdo deu uma pancada, depois duas, depois trés e, enquanto nao chegou ao nimero exato qua- tto, a sensibilidade, consultada, respondeu que o efeito total diferia qualitativamente. Portanto, tinha constatado a sua maneira a sucesso daquelas quatzo pancadas, mas de um modo totalmente diferente de uma soma e sem fa. zer intervir a imagem de uma justaposigio de termos di ‘intos. Em suma, o ntimero de pancadas dadas foi perce- bido como qualidade e ndo como quantidade; a duragao apresenta-se assim & consciéncia imediata e conserva essa forma enquanto ndo é substitufda por uma representa: cio simbélica, tirada da extensio. — Distingamos, enti para concluir, duas formas da multiplicidade, duas ava~ liagées bem diferentes da duracgo, dois aspectos da vida consciente. Sob a duracio homogénea, simbolo extensi- vo da duragéo verdadeira, uma psicologia atenta discerne uma duragdo cujos momentos heterogéneos se penetram; sob a multiplicidade numérica dos estados conscientes, uma multiplicidade qualitativa; sob um eu com estados bem definidos, um eu onde sucesso implica fusio ¢ or- ganizagdo. Em geral, porém, contentamo-nos com o pri- meiro, ou seja, com a sombra do eu projetada no espaco homogéneo. A consciéncia, atormentada por um insacia- 6 (MEMORIA EVIDA vel desejo de distinguir, substitui a realidade pelo simbo- lo, ou 86 percebe a realidade através do simbolo. Como 0 eu assim refratado e por isso mesmo subdividido presta- se infinitamente melhor as exigéncias da vida social em geral e da linguagem em particular, ela o prefere e perde Pouco a pouco de vista o eu fundamental. DI, 94-6. 3. Para além da psicologia: a duragiio é o todo +». A sucesso é um fato incontestével, mesmo no ‘mundo material. Por mais que nossos raciocinios sobre 0 sistemas isolados impliquem que a historia passada, pre- sente e futura de cada umn deles poderia ser aberta de gol- pe, em leque, nem por isso essa histéria deixa de se de- senrolar pouco a pouco, como se ocupasse uma duracdo andloga 4 nossa. Se eu quiser preparar-me um copo de gua com agticar, por mais que faca, terei de esperar que © aglicar derreta. Esse pequeno fato é rico em ensinamen- tos. Pois 0 tempo que tenho de esperar nao é mais o tem- po matemético que continuaria podendo ser aplicado a0 longo da hist6ria inteira do mundo material, mesmo que esta se esparramasse de golpe no espaco. Ele coincide ‘com minha impaciéncia, ou seja, com uma certa porgao de minha duragao propria, que ndo pode ser prolongada ou encurtada a vontade. Nao é mais algo pensado, mas algo vivido. Jé nao é uma relagao, é um absolute”. O que sig- nifica isso, seno que 0 copo de gua, o agiicar eo proces- 80 de dissolucao do agticar na 4gua sao sem ciivida abs- 2.Ce texto 10, ‘A DURACAO FO METODO 7 tragées e que o Todo no qual foram recortados por meus sentidos e meu entendimento talvez. progrida a maneira de uma consciéncia? E-certo que a operago por meio da qual a ciéncia iso- Jae fecha um sistema nao é uma operagio de todo artifi- cial. Se nao tivesse um fundamento objetivo, nao se po- deria explicar por que ela é totalmente indicada em certos casos e impossivel em outros. Veremos que a matéria tem uma tendéncia a constituir sistemas isoléveis, que pos~ sam ser tratados geometricamente’. E até mesmo por essa tendéncia que a definiremos. Mas é apenas uma tendén- cia. A matéria nao vai até o fim e o isolamento nunca é completo. Se a ciéncia vai até o fir e isola completamen- , € para facilitar 0 estudo. Ela subentende que o sistema, dito isolado, continua submetido a certas influéncias ex- ternas. Deixa-as simplesmente de lado, seja porque as considera suficientemente fracas para desprezé-las, seja porque se reserva a possibilidade de leva-las em conta mais tarde. Nem por isso deixa de ser verdade que essas influéncias sao, todas, fios que ligam o sistema a outro mais vasto, este a um terceiro que engloba os dois ¢ as- sim por diante até que se chega ao sistema mais objetiva- mente isolado e mais independente de todos, o sistema solar em seu conjunto. Mas, mesmo nesse caso, 0 isola- mento néo é absoluto. Nosso sol imadia calor e luz para além do planeta mais distante. E, por outro lado, move-se, arrastando consigo os planetas e seus satélites, numa dire~ ao determinada. O fio que o prende ao resto do univer- so € sem dtivida bem ténue. Contudo, é por esse fio que se transmite, até a mais infima parcela do mundo onde vi- ‘vemos, a durago imanente ao todo do universo. 3.CL textos 87,60 667. 8 (MEMORIA EVIDA Q universo dura. Quanto mais nos af Pa natureza do tempo, mals COM] eee ‘Tago significa invengao, criagao de formas, elabo comin doa salut € hove’. Os sistemas delimita- {68 pela ciéncia s6 duram porque esto indissoluvelmen- te ligados ao resto do universo. £ verdade que, no proprio uuniverso, é preciso distinguir, como diremos adiante, dois movimentos opostos, um de “queda”, outro de “eleva- 40. O primeiro nada mais faz que desenrolar um rolo jd pronto. Poderia, em principio, realizar-se de maneira quase instanténea, como ocorre com uma mola que se distende. Mas o segundo, que corresponde a um trabalho interior de maturagao ou de criac&o, dura essencialmente € impée seu ritmo ao primeiro, que é insepardvel dele. EC, 9-11, 4. O todo ea vida Responderemos que nao contestamos a identidade fundamental da matéria bruta e da matéria organizada. ‘A tinica questo é saber se os sistemas naturais que cha- mamos seres vivos devem ser assimilados aos sisternas attificiais que a ciéncia recorta na matéria bruta, ou se nao deveriam, antes, ser comparados a esse sistema natural que 6 0 todo do universo. Que a vida seja uma espécie de mecanismo é algo com que devo concordar. Mas tratar- se-ia do mecanismo das partes artificialmente isoléveis 4.CE texto 74, 5.CE texto 97. 6. Alguns bidlogos acusam a filasofia da vida de postulara distin- ‘do de duas matérias. Bergson vai mostrar que o problema de uma fi- Josofia da vida preocupada em salvaguardar a especificidade de seu ‘objeto ndo trata de forma algumna dessa questi. ‘ADURACAO £0 METODO 9 no todo do universo ou do mecanismo do todo real? todo real poderia muito bem ser, diziamos, uma continu dade indivisivel: os sistemas que nele recortamos ndo se- riam ento partes suas propriamente ditas; seriam vistas parciais do todo. E, com essas vistas parciais colocadas lado a lado, vocé nao obterd nem mesmo um comego de recomposicao do conjunto, assim como no reproduzi- 14 a materialidade de um objeto multiplicando suas fo- tografias sob mil aspects diversos. O mesmo se aplica & vida e aos fendmenos fisico-quimicos nos quais se pre- tenderia resolvé-la. A andlise certamente descobriré nos processos de criagdo orgénica uma quantidade crescente de fendmenos fisico-quimicos. E é a isso que se aterao 0s uimicos e os fisicos. Mas disso nao se conclui que a qui- mica e a fisica devam nos dar a chave da vida. Um elemento muito pequeno de uma curva é quase uma linha reta. Quanto menor ele for, mais se parecerd com uma linha reta, No limite, pode-se dizer, conforme © gosto, que faz parte de uma reta ou de uma curva. Em cada um de seus pontos, com efeito, a curva se confun- de com sua tangente. Do mesmo modo, a “vitalidade” é tangente em qualquer ponto as forcas fisicas e quimicas; mas esses pontos no so, em suma, mais que vistas de um espirito que imagina paradas em tais ou quais mo- mentos do movimento gerador da curva. Na verdade, a vida 6 to pouco feita de elementos fisico-quimicos quan- to uma curva é composta de linhas retas. EC, 30-1. 5.0 todo ea coexistincia das duragies A rigor, poderia nao existir outra duracéo além da nossa, tal como poderia nao haver no mundo outra cor 10 (MEMORIA EVIDA além do laranja, por exemplo. Porém, assim como uma consciéncia a base de cor que simpatizasse internamente com o laranja em vez de percebé-lo exteriormente senti- tia estar entre o vermelho e o amarelo, pressentiria quem sabe até, abaixo desta tiltima cor, todo um espectro no qual se prolonga naturalmente a continuidade que vai do vermelho ao amarelo, também a intuigéo de nossa dura- ‘do, longe de nos deixar suspensos no vazio como faria a pura andlise, pde-nos em contato com toda uma conti- nuidade de duragées que devemos tentar seguir, seja para baixo, seja para cima: em ambos os casos, podemos nos dilatar indefinidamente por um esforgo cada vez mais violento, em ambos os casos, transcendemos a ndés mes- mos. No primero, caminhamos para uma duragéo cada vez mais dispersa, cujas palpitacoes mais répidas que as nossas, ao dividirem nossa sensagao simples, diluem sua qualidade em quantidade: no limite estaria 0 puro ho- mogéneo, a pura repetigio pela qual definiremos a ma- terialidade. Caminhando no outro sentido, vamos para uma duracio que se tensiona, se contrai, se intensifica cada vez mais: no limite estaria a eternidade. Nao mais a eternidade conceitual, que é uma eternidade de morte, mas uma etemidade de vida. Eternidade viva e, por con- seguinte, ainda movente, onde a durago que nos é pré- ptia se encontraria como as vibragdes na luz, e que seria a coalescéncia de toda duragao assim como a materiali dade é sua dispersao. Entre esses dois limites extremos a intuigo se move e esse movimento é a metafisica’. PM,, 210. 7. CE. textos 17,22 & 26 ADURAGAO EO METODO n b) Caracteristicas da duragio 6.A duragio é 0 que muda de natureza Imaginemos uma linha reta, indefinida, e sobre essa linha um ponto material A que se desloca. Se esse ponto tomasse consciéncia de si mesmo, sentir-se-ia mudando j& que se move: perceberia uma sucesso. Mas essa su- ccessao se revestiria para ele da forma de uma linha? Sem. dtivida sim, contanto que ele pudesse elevar-se de algum modo acima da linha que percorre e perceber nela simul- taneamente varios pontos justapostos: isso, porém, 0 le- varia a formar a idéia de espaco, e é no espaco que veria desenrolarem-se as mudangas que sofre e nao na pura jue fengao Se Mais néla. Mas a lembranca € rente do estado que sugere e precisamente porque a sentimos por trés da sensagio sugerida, como o hipno- tizador por trés da alucinagiio provocada, que localizamos no passado a causa do que sentimos. A sensago, com efeito, é essencialmente atual e presente; mas a lembran- 62, que a sugere do fundo do inconsciente de onde ela mal emerge, apresenta-se com esse poder sui generis de suges- to que é a marca do que nao existe mais, do que ainda queria ser. Mal a sugestio tocou a imaginagio e a coisa sugerida se desenha em estado nascente, e é por isso que 6 tao dificil distinguir entre uma sensagio fraca que sen- timos e uma sensagao fraca que rememoramos sem da- té-la. Em nenhum grau, porém, a sugestio é 0 que ela sugere, a lembranca pura de uma sensagdo ou de uma percepcao nao é, em nenhum grau, a sensago ou a per- cepcfo elas mesmas, Caso contrério, teremos de dizer que a palavra do hipnotizador, para sugerir aos sujeitos ador- mecidos que eles tém na boca aciicar ou sal, j4 tem de ser ela mesma um pouco agucarada ou salgada... 52 ‘MEMORIA E VIDA . A Jembranga aparece duplicando a cada instante a percepgio, nascendo com ela, desenvolvendo-se ao mes- mo tempo que ela e sobrevivendo a ela, precisamente porque é de outra natureza. ES, 131-3, 135. 26. Os graus da duragio Concentremo-nos, pois, no que temos de mais afas- tado do exterior e, a0 mesmo tempo, de menos penetra- do de intelectualidade. Procuremos, no mais profundo de ne mesmos, 0 ponto em que nos sentimos mais interio- res A nossa propria vida. E na pura duracao que voltamos a mergulhar entdo, uma duragao em que o passado, sem- pre em andamento, se avoluma sem cessar de um presen- te absolutamente novo. Ao mesmo tempo, porém, senti- mos esticar-se, até seu limite extremo, a mola de nossa vontade. Seria preciso que, por uma contracao violenta de nossa personalidade sobre si mesma, apanhassemos nos- 0 passado que escapa, para empurré-lo, compacto e in- diviso, num presente que ele criaré ao nele se introduzit. Bem raros sao os momentos em que nos recuperamos a és mesmos a esse ponto: eles se confundem com nossas ages verdadeiramente livres. E nem mesmo entio so- ‘mos totalmente donos de nés mesmos. Nossa sensagio da duragio, ou seja, a coincidéncia de nosso eu consigo mesmo, admite gradacSes. Mas, quanto mais profunda a sensagéo e mais completa a coincidéncia, mais a vida onde elas nos recolocam absorve a intelectualidade, su- perando-a, Pois a inteligéncia tem por fungao essencial ligar 0 mesmo ao mesmo, e inteiramente adaptaveis a0 A MEMORIA OU OS GRAUS COEXISTENTES DA DURACAO 53 ‘campo da inteligéncia so 96 os fatos que se repetem. Ora, sobre os momentos reais da duragao real a inteligéncia certamente age a posteriori, econstituindo 0 novo estado com uma série de vistas dele tomadas de fora e que se as- semelham tanto quanto possfvel ao ja conhecido: nesse sentido, o estado contém intelectualidade “em poténcia”, por assim dizer. Extrapola-a, no entanto, permanece inco- mensurdvel com ela, sendo indivisivel e novo. Distendamo-nos agora, interrompamos 0 esforgo que empurra para o presente a maior parte possivel do passa- do. Se a distensdo fosse total, ndo haveria mais mem6- ria nem vontade: ou seja, nunca caimos nessa passivida- de absoluta, assim como tampouco podemos nos tornar totalmente livres. Mas, no limite, entrevemos uma exis- téncia feita de um presente que recomecaria sem cessar ~ no haveria mais durago real, apenas o instanténeo que morre e renasce indefinidamente. Seria isso a existéncia da matéria? Nao exatamente, sem dtivida, pois a andlise a resolve em abalos elementares, os mais curtos dos quais, so de uma duraco muito infima, quase evanescente, mas nao nula, Pode-se contudo presumir que a existéncia fisi- ca tende para esse segundo sentido, assim como a exis- téncia psiquica tende para o primeiro. No fundo da “espiritualidade’, por um lado, e da “materialidade” com a intelectualidade, por outro, haveria portanto dois processos de direcdo oposta, e se passaria do primeiro para o segundo por via de inversao, quem sabe até de uma simples interrup¢ao, se for verdade que inversdo e interrupgao sao dois termos que devem ser ti- dos aqui por sinénimos, como mostraremos em detalhes ‘um pouco mais adiante. Essa suposigao se confirmard se considerarmos as coisas do ponto de vista da extenséio e nao mais apenas da duracao. 54 “MEMORIA EVIDA ‘Quanto mais tomamos consciéncia de nosso progres- so na pura duracdo, mais sentimos as diversas partes de nosso ser entrarem umas nas outras e toda a nossa per- sonalidade se concentrar num ponto, ou melhor, numa ponta, que se insere no porvir, encetando-o sem cessar. Nisso consistem a vida ¢ a ago livres. Abandonemo-nos, a0 contrério; em vez de agir, sonhemos. Imediatamente nosso eu se dispersa; nosso pasado, que até ento se con- traia sobre si mesmo na impulsao indivisivel que nos co- municava, decompde-se em mil e uma lembrangas que se exteriorizam umas com relagao As outras. Estas desis- tem de se interpenetrar a medida que vao se enrijecendo ‘mais. Nossa personalidade torna a descer assim na di- regio do espago. Na sensagio, alids, ela o ladeia ser ces- sar. Nao nos demoraremos aqui sobre um ponto que jé aprofundamos em outro lugar. Limitemo-nos a lembrar ‘que a extenso admite graus, que toda sensagio é exten- siva em certa medida e que a idéia de sensagées inexten- sas, attificialmente localizadas no espago, é uma simples construgio mental, sugerida bem mais por uma metalfisi- a inconsciente do que pela observacao psicolégica. ‘Nés, sem diivida, damos apenas os primeiros pasos na direcdo da extensao, mesmo quando nos abandona- mos o maximo possivel. Mas suponhamos, por um ins- tante, que a matéria consista nesse mesmo movimento le- vado mais longe, e que o fisico seja simplesmente o psfqui- co invertido. Seria compreensfvel, entdo, que o espirito se sinta to a vontade e circule tao naturalmente no espaco, assim que a matéria lhe sugere a representacao mais cla- ra dele, Tinha a representacao implicita dese espaco na prépria sensagao que extraia de sua eventual distensao, isto é, de sua extensdo possivel. Reencontra-o nas coisas, mas té-lo-ia obtido sem elas se tivesse tido a imaginagao poderosa o suficiente para levar até o fim a inversio de A MEMORIA OUI OS GRAUS COEKISTENTES DA DURACAO 35 scu movimento natural. Por outro lado, assim se explica- ria que a matéria acentue ainda mais sua materialidade sob 0 olhar do espirito. Comecou ajudando este titimo a descer novamente a jadeira dela, deu-Ihe o impulso. Mas, ‘uma vez langado, o espirito continua. A representagao que forma do espaco puro nao é mais que o schéma do termo aque esse movimento chegaria. Uma vez de posse da for- ma de espaco, serve-se dela como de uma rede de malhas que podem ser feitas e desfeitas ao bel-prazer, e que, jo- gada sobte a matéria, divide-a tal como as necessidades de nossa aco exigirem. Por isso, o espaco de nossa geo- metria e a espacialidade das coisas geram-se mutuamen- te pela agdo e reagao reciprocas de dois termos que sio de ‘mesma esséncia, mas que caminham em sentido inverso um do outro. Nem o espaco ¢ tdo estranho & nossa na- ‘tureza quanto pensamos, nem a matéria é téo completa- mente extensa no espago quanto nossa inteligéncia e nossos sentidos a imaginam. EC, 201-4. 27..A meméria como coexisténcia virtual dos graus Portanto, tudo acontece como se nossas lembrangas se repetissem um nuimero indefinido de vezes nessas mil ¢ uma redugGes possiveis de nossa vida passada. Adqui- rem uma forma mais banal quando a meméria se estrei- ta mais, mais pessoal quando se dilata, e dessa forma par- ticipam de uma quantidade ilimitada de “sistematizagbes’ diferentes. Uma palavra de uma lingua estrangeira, pro- rnunciada ao meu ouvido, pade me fazer pensar nessa lin- gua em geral ou em uma voz que a pronunciava outrora Ge certa maneira, Essas duas associacdes por semelhan- 56 MEMORIA EVIDA ca no se devem & chegada acidental de duas representa- des diferentes que 0 acaso teria trazido sucessivamente para 0 campo de atragao da percep¢ao atual. Correspon- dem a duas disposigées mentais diversas, a dois graus dis- tintos de tensio da meméria, aqui mais proxima da ima- gem pura, ali mais disposta 4 réplica imediata, ou seja, & cao. Classificar esses sistemas, procurar a lei que os une respectivamente aos diversos “tons” de nossa vida men- tal, mostrar como cada um desses tons est determinado pelas necessidades do momento e também pelo grau va- ridvel de nosso esforgo pessoal, seria uma tarefa diff toda essa psicologia ainda est por fazer e, por ora, nao queremos nem tentar. Mas cada um de nés sente per- feitamente que essas leis existem e que existem relagdes estdveis desse tipo. Ao ler um romance psicolégico, por exemplo, sabemos que certas associagdes de idéias que nos descrevem sao verdadeiras, que podem ter sido vivi- das; outras nos chocam ou nao nos dio a impressio de realidade, porque sentimos nelas o efeito de uma proxi- midade mecanica entre estagios diferentes do espirito, como se o autor no tivesse conseguido se manter no plano da vida mental que escolheu. A meméria tem, por- tanto, graus stcessivos e distintos de tensao ou de vita- lidade, certamente dificeis de definir, mas que o pintor da alma nao pode misturar impunemente. Aliés, a patologia vem confirmar—embora com exemplos grosseiros—uma verdade que todos conhecemos por instinto, Nas “amné- sias sistematizadas” dos histéricos, por exemplo, as lem- brangas que parecem abolidas estao na verdade presen- tes; mas estao todas decerto ligadas a um determinado tom de vitalidade intelectual no qual o sujeito ndo conse- gue mais se situar. MM,, 188-9. ‘A MEMORIA OU 0S GRAUS COEXISTENTES DA DURACAO 87 28. Os graus da memséria e a atenciio Concebemos sem dificuldade a percepgio atenta como uma série de processos que avancariam ao longo de sum tinico fio, o objeto excitando sensagdes, as sensacies fazendo surgir diante delas idéias, cada idéia abalando pontos cada vez mais recuados da massa intelectual. Ha- veria portanto ai um andar em linha reta por meio do qual o espitito se afastaria cada vez mais do objeto para nao mais voltar a ele. Afirmamos, ao contrario, que a per- cepgao refletida é um circuito onde todos os elementos, inclusive o prdprio objeto percebido, mantém-se em es- tado de tensao mitua como num circuito elétrico, de sor- te que nenhum abalo oriundo do objeto pode deter-se, no meio do caminho, nas profundezas do espitito: deve sempre retornar ao préprio objeto. Que nao se veja nisso uma mera questo de palavras. Séo duas concepgses ra- dicalmente diferentes do trabalho intelectual. De acordo com a primeira, as coisas se passam mecanicamente e pot uma série totalmente acidental de adicdes sucessivas. A cada momento de uma percep¢io atenta, por exemplo, elementos novos, que emanam de uma regio mais pro- funda do espirito, poderiam juntar-se aos elementos an- tigos sem criar uma perturbago geral, sem exigit uma transformagio do sistema. Na segunda, ao contrario, um ato de atengéo implica tal solidariedade entre o espirito e seu objeto, é um circuito tao bem fechado, que nao se poderia passar a estados de concentragdo superior sem criar um mesmo niimero de circuitos novos e completos que envolvem o primeiro e que sé tém em comum entre si o objeto percebido. Desses diversos circulos da memé- ria, que estudaremos detalhadamente mais adiante, o mais estreito, A, é o mais préximo da percepcao imediata. 58 ‘MEMORIA EVIDA Contém apenas o proprio ob- jeto O com a imagem conse- ‘cutiva, que volta para cobri-lo. Atrés dele, os circulos B, C, D, cada vez, mais amplos, corres- pondem a esforgos ctescentes de expansio intelectual. E a memiéria toda, como veremos, que entra em cada um desses ‘ircuitos, jf que a meméria es- td sempre presente; mas essa meméria, que pode ser inde- finidamente dilatada devido sua elasticidade, reflete so- bre o objeto um ntimero cres- cente de coisas sugeridas — ora detalhes do prdprio ob- jeto, ora detalhes concomi- tantes que podem contribuir para esclarecé-lo. Assim, de- pois de ter reconstituido o objeto percebido, a maneira de um todo independente, reconstitufmos com ele as con- digdes cada vez mais longinquas com as quais ele forma um sistema, Chamemos B’, C’e D’ essas causas de pro- fundidade crescente, situadas atrés do objeto e virtual- mente dadas com o préprio objeto. Nota-se que 0 pro- gtesso da atengio tem por efeito criar de novo, nao s6 0 ‘objeto percebido, mas os sistemas cada vez mais amplos, aos quais pode se vincular; de sorte que, 4 medida que os, circulos B, Ce D representam uma expansao mais elevada da meméria, o reflexo deles atinge em B’, C’e D’camadas, mais profundas da realidad Amesma vida psicoldgica se repetiria, pois, um né- mero indefinido de vezes nos estagios sucessivos da me- _A MEMORIA OU OS GRALIS COEXISTENTES DA DURACAO 59 méria, ¢ 0 mesmo ato mental poderia se dar em varias al- turas diferentes. No esforgo de atenco, o espirito sempre se dé inteiro, mas se simplifica ou se complica conforme o nivel que escolhe para realizar suas evolucées, Geral- mente, é a percepgdo presente que determina a orientagao de nosso espirito; mas, conforme o grau de tensdo que nosso espirito adote, segundo a altura onde se coloque, essa percepcao desenvolve em nés um néimezo maior ou menor de lembrangas-imagens. Em outras palavras, enfim, as lembrangas pessoais, exatamente localizadas e cuja série desenharia o curso de nossa existéncia passada, constituem, reunidas, 0 iltimo e mais amplo invéhucro de nossa meméria. Essencialmente fugazes, 36 se materializam por acaso, seja porque uma de- terminagao acidental precisa de nossa postura corporal as atraia, seja porque a propria indeterminagao dessa postura deixa campo livre para o capricho de sua manifestacio. ‘Mas esse invélucro extrero se restringe e se repete em cit- culos interiores e concéntricos, que, mais estreitos, supor- tam as mesmas lembrancas diminuidas, cada vez mais afastadas de sua forma pessoal e original, cada vez mais ca- pazes, em sua banalidade, de se aplicar & percepgio pre- sente e de determiné-la 4 maneira de uma espécie que engloba o individuo. Chega um momento em que a lem- branca assim reduzida se encaixa to bem na percepgio presente que nao se saberia dizer onde termina a percep- cdo e onde comega a lembranca. Nesse momento preci- 50, a memoria, em vez de fazer aparecer e desaparecer ca- prichosamente suas representagSes, regula-se pelos deta- Ihes dos movimentos corporais. MM, 113-6.

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