Você está na página 1de 3
‘UNIVERSIDADE DO PORTO — FACULDADE DE DIREITO ‘TEORIA GERAL DO Dimerro Crvit. 1* Prova — 10.01.2019 Duragio da prova: 2 horas ‘Nota prévia: Apenas é permite a consulta de eédigos no anotados. A ilepibilidade das espostas implica a sua ndo consideragio, Na resposta a cada questo deve, sempre que se justfigue, consierar as diversas ipoteses relevantes. Fundamente sempre as respostas. O rigor ea clareza de exposiglo serio factores de valorizacio da prov As par verfo constar deuma mesma fll ‘perounts Il deve consiar ‘de folha de exame separada. Deve, assim. wilizar 2 fofhas de exam, “Tenla steno ao limite de extensSo das respostas. I-4valores ‘Comente a seguinte afirmagio: O direito de propriedade sobre um animal de companhia é um poder-dever NB: Nio utilize mais do que uma pégina da folha de exame. IL-6 valores A, nascido em 1956, sofre de uma condigéo neurolégica que, além de outras manifestagdes, Ihe afecta gravemente a meméria e a percepgo da realidade. Por alturas do Natal, encontrando-se perdido num centro comercial, dirigiu-se ao supermercado onde adquiriu duas garrafas de bebidas alcodlicas por 120 euros, tendo ainda comprado um ingresso para 0 cinema, por 6 euros, feito um donativo de 60 euros numa méquina ATM para uma campanha solidéria ¢ doado 0 seu relégio a um seguranga do centro que 0 ajudou a encontrar transporte de regresso a casa, O rel6gio tinha um valor comercial de 5000 euros. B, mulher de A, 20 tomar conhecimento dos actos praticados por este pretende invalidé- los. Poderd fazé-o? I~ 10 (6 +4) valores L.Supondo que a factualidade descrita em II ocorria apés a entrada em vigor da Lei 49/2018, de 14 de Agosto, na pendéncia de processo tendente ao acompanhamento de A, pronuncie-se sobre a (in)validade dos seus actos. 2. Na hipétese do seguranga do centro comercial ter vendido, a 2/12/2018, 0 rel6gio a C, que desconhece inteiramente as circunstancias anteriores & transacgio, e de B ter intentado acco com vista & invalidagdo da doago, em 7/1/2019, refira quem terd direito a0 objecto em causa, Universidade do Porto — Faculdade de Direito ‘Teoria Geral do Direito Civil Exame — 10.01.2019 Critérios de Correcgaio 1 Nog%o de poder-dever ¢ sua relago com o direito subjectivo. Cisiio entre titularidade do direito e titularidade do interesse que 0 informa. O novo estatuto juridico dos animais, introduzido pela Lei 8/2017, e 0 reconhecimento dos animais ‘como um tertium genus entre sujeito e objecto de direito ou como uma coisa dotada de regime special. Os animais como objecto do direito de propriedade. A obrigagéo de zelo e cuidado do animal a cargo do proprietério derivada simultaneamente do interesse pr6prio do proprietério e da prossecugao do bem estar do animal. Afastamento do direito de propriedade sobre o animal da categoria do poder- dever em sentido verdadeiro e préprio ou consideragao desse direito como um quase poder-dever. u Situagio do problema no Ambito da capacidade. Breve caracterizagao da capacidade juridica e dos seus desdobramentos. A capacidade e a suas recentes alteragdes conceptuais introduzidas no instituto pela Lei 49/2018. A natureza espectral da capacidade. Inexisténcia de qualquer medida ou estatuto de proteceio de A, néio obstante a sua impossibilidade natural de entender e querer o sentido de declaragio negocial. A havido, por consequéncia, como maior capaz Pratica de actos com privagio do sentido da declaragio negocial. Enquadramento no regime da incapacidade acidental ~ art. 257° Necessidade de avaliagio casufstica dos actos praticados. Ponderagio do preenchimento dos requisitos de anulabilidade do acto, Consideragio da posig&io do declaratétio. Impossibilidade de reconhecimento da notoriedade da perturbagio de A, na hipstese de doagio em ATM. Validade do negécio. Anulabilidade da compra de garrafas e de bilhete de cinema, na hipdtese de a perturbagio no ser conhecida ou reconhecida pelos declaratérios, Doagéo do relégio: anulabilidade na hipétese de a perturbacdo ser aparente ou no sendo, possibilidade de anulago, desde que preenchidos os requisitos do art. 282°, atendendo, nomeadamente, ao valor do objecto (beneficio excessive © injustificado) Anulacio: regime ¢ legitimidade para a arguico. L 1. A Lei 49/2918, de 14 de Agosto introduz o Regime Juridico do Maior Acompanhado, substituindo os tradicionais institutos da interdigfio e da inabilitagZo previstos no CC, entrando em vigor no prazo de 180 dias a contar da data da sua publicagao (artigo 25.°, n° 1). Os maiores impossibilitados de plena, pessoal ¢ conscientemente exercer os seus direitos e cumprir os seus deveres podem, 20 abrigo desta lei (que introduz alteragdes ao CC ~ artigo 2.° da Lei 49/2018!) requerer 0 acompanhamento, podendo o mesmo ser igualmente requerido por algumas pessoas, com a autorizagio do beneficidrio da medida ou com suprimento judicial da mesma, ou pelo MP (artigo 141.%, n.°s 1 e 2 CC), © acompanhamento deve limitar-se 20 necessirio, podendo o tribunal cometer ao acompanhante algum dos regimes previstos no artigo 145.°, n.° 2 CC, ¢ aplicando-se, quanto aos negécios da vida corrente, 0 disposto na norma do artigo 147.*, n.° 1 CC. No caso de a fuctualidade descrita ter ocorrido apés a entrada em vigor desta Lei, e de se encontrar pendente um processo Judicial tendente a0 acompanhamento de A, seria de aplicar, em conjugagtio com sobredito, ¢ em fungéo do sentido da decisdo final, a norma do artigo 154.%, n.° 1, alinea b), segundo a qual sto anulaveis os actos praticados depois de anunciado 0 inicio do proceso, e que no observem as medidas de acompanhamento decretadas ou a decretar, mas apenas apés a decisio final e caso se mostrem prejudicais 20 acompanhado. Aplicagao do regime dos artigos 154.°, n.°2 e 287.° CC. 2, Tendo 0 relégio doado por A ao seguranga do centro comercial sido por este vendido a C, desconhecendo C as circunstincias anteriores & transacgio, deve colocar-se a questo de saber se so encontra verificada a fattispecie de alguma norma de proteceao de terceiros de boa fé. Com efeito, sendo a acco de anulago do contrato de doago julgada procedente, os efeitos da respectiva decisio de mérito, com a destruig&o retroactiva desta relagao juridica (artigo 289.°, n.° 1 CC), projectar- se-dio nas sucessivas transmissdes do mesmo bem, com a obrigacdo de o mesmo ser restituido a A, salvo se for de aplicar alguma daquelas normas. Normas estas, portanto, que constituem uma excepedlo ao principio “nemo plus iuris in alium transferre potest quam ipse habet” e 20 prinefpio da retroactividade daquele artigo 289.° CC. Nao aplicagao da norma do artigo 243.° CC, por nfo existir uma situagao de simulagio (absoluta ou relativa) (negécio celebrado entre A e o seguranga do centro comercial). Apesar de se encontrar verificado 0 requisito do n.° 3, do artigo 291.° CC, uma vez que C desconhecia, sem culpa, o vicio do negécio nulo ou anulavel, no & também de aplicar a norma do artigo 291.° CC, ndo apenas por falecer 0 requisito previsto no seu n.° 2, como, ¢ antes disso, pelo facto de aqueles negdcios nao terem por objecto um bem imével ou mével sujeito a registo. O bem deve regressar a esfera Juridica de A, no caso de a acgdo intentada por B ser julgada procedente (cfeito ex tune da anulagao do primeiro negécio juridico). * As normas do Cédigo Civil referidas iyfta (pergunta | do grupo IIL), com excepgio da norma do artigo 287°, correspondem as alteragdes introduzidas polo artigo 2° da Lei 49/2018,

Você também pode gostar