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Agravo (Inominado - Legal) - AGRAVO INSS - 123439468
Agravo (Inominado - Legal) - AGRAVO INSS - 123439468
PROCURADORIA-GERAL FEDERAL
EQUIPE REGIONAL DE TURMAS RECURSAIS DA 5ª REGIÃO
GERENCIAMENTO DE CONTENCIOSO
EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) JUIZ(A) DO(A) TURMA RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS
DO ESTADO DE PERNAMBUCO
NÚMERO: 0502295-87.2020.4.05.8305
AGRAVANTE(S): INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
AGRAVADO(S): AROALDO BEZERRA CAVALCANTE
RAZÕES DO RECURSO
Colendo Tribunal,
Excelentíssimos Senhores Ministros,
Excelentíssimo Ministro Relator:
II - CABIMENTO DO AGRAVO
O presente agravo funda-se no art. 1.042 do Código de Processo Civil, de 2015, que assim
dispõe:
Ao comentar o art. 542, §1º, do CPC/1973 (atualmente art. 1.042, do CPC/2015), os insignes
processualistas NELSON NERY JÚNIOR e ROSA MARIA DE ANDRADE NERY assim se posicionam
precisamente a respeito do alcance desse juízo de admissibilidade[1]: Decisão do tribunal a quo. Ao
tribunal a quo cabe tão-somente verificar se estão presentes os requisitos formais do RE e do REsp. A
efetiva violação da CF ou a efetiva negativa de vigência da lei federal são o mérito do recurso, cuja
competência para decidir é dos tribunais federais superiores (STF e STJ). É vedado ao tribunal de origem
dizer se houve ou não violação da CF ou que não existiu negativa de vigência da lei federal.
Do relato feito acima, viu-se que o fundamento para a inadmissão do RE interposto pelo
INSS foi a alegação que seria incabível o referido recurso no atual estágio processual, pois, como
interposto depois da inadmissão de pedido de uniformização (PUN) nacional dirigido à TNU, estaria
encerrada a jurisdição da Turma Recursal.
Com a devida venia, a decisão agravada diverge frontalmente da tese jurídica objeto da
SÚMULA 281 do STF.
Ora, na espécie, o acórdão recorrido da Turma Recursal decidiu sobre questão de direito
que, à época, estava com RESP REPETITIVO aguardando julgamento pelo e. STJ – TEMA 1.031:
“Possibilidade de reconhecimento da especialidade da atividade de vigilante, exercida após a edição da
Lei 9.032/1995 e do Decreto 2.172/1997, com ou sem o uso de arma de fogo” - portanto, obviamente,
que o INSS elegeu viável o pedido de uniformização nacional à TNU, caminho indispensável para o
acesso ao STJ (art. 14, §4º, da Lei 10.259/2001) e, ao fazê-lo, não poderia, simultaneamente, interpor
recurso extraordinário, pois para isso precisaria antes esgotar a instância ordinária.
Este e. STF tem inúmeras decisões na qual assentou não ser cabível recurso
extraordinário interposto concomitantemente com o pedido de uniformização de jurisprudência,
devendo ser interposto somente após o julgamento do incidente para que não seja atraída a incidência
da Súmula n. 281, in verbis:
Ora, se era cabível o PUN – questão aguardava definição em RESP REPETIVO – e é vedada a
interposição simultânea deste incidente com o RE, agiu adequadamente o INSS ao interpor,
primeiramente, o incidente de uniformização à TNU e, apenas quando concretizado que este foi
definitivamente inadmitido (em decisão colegiada proferida em agravo interno) em razão de
superveniente decisão vinculante do STJ em RESP REPETITIVO com fundamentação CONSTITUCIONAL,
apresentou o recurso extraordinário.
Diante da Súmula 281/STF, não se pode confundir o regime do PU e RE com o do RESP e RE,
pois neste caso cabe a interposição simultânea e naquele não, de modo que o interesse de agir na
interposição de RE, no âmbito dos JEFs, surge em oportunidades diferentes, desde a prolação de acórdão
da Turma Recursal de Juizados Especiais Federais, ou, quando manejado PU, a partir do julgamento
definitivo deste, o que pode ocorrer perante o STJ (PUIL), a TNU ou a própria Turma Recursal de origem
se esta não admite o PU na forma do art. 14, §3º, do Regimento Interno da TNU, segundo o qual a
decisão preliminar de inadmissão de PU fundamentada em tema submetido a julgamento em regime de
repercussão geral, RESP REPETITIVO e representativo de controvérsia, desafia agravo interno que será
julgado pela turma que prolatou o acórdão impugnado, mediante decisão irrecorrível..
Assim, o presente agravo merece provimento para restar processado e julgado o recurso
extraordinário cujos fundamentos passamos a reforçar.
Ora, no âmbito do Superior Tribunal de Justiça a questão de direito examinada foi decidida
com fundamentos constitucionais. Mais do que isto. O Tema repetitivo STJ/1031 foi construído
expressamente sobre a interpretação do Superior Tribunal dos artigos 201, §1º e 202, II (este na redação
anterior à EC 20/1998) da Constituição Federal, assim como na Emenda Constitucional 103/2019.
Nesse sentido, o item 6 do Acórdão do STJ faz expressa remissão aos artigos 201, §1º e 202,
inciso II, da Lei Maior:
Outrossim, no voto do Ministro Napoleão Nunes Maia Filho (relator) foram apontados
expressamente os seguintes dispositivos constitucionais para lastreio da tese:
“Na ocasião, observou o Ministro GURGEL DE FARIA que a Emenda Constitucional 103/2019
poderia, em tese, repercutir na proposta apresentada, chamando atenção para a
necessidade de se debater o tema sob tal aspecto.
...
Não há, portanto, sob esses aspectos, nada a acrescentar.
Por outro lado, observou o Ministro GURGEL DE FARIA que a recente Emenda Constitucional
103/2019 não faz referência à integridade física, como ensejadora de condição especial de
trabalho.
De fato, o § 1º do art. 201 da Constituição Federal, antes da referida EC 103/2019, rezava
que "é vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de
aposentadoria aos beneficiários do regime geral de previdência social, ressalvados os casos
de atividades exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade
física e quando se tratar de segurados portadores de deficiência, nos termos definidos em
lei complementar".
Todavia, a EC 103/2019 deu nova redação ao § 1º do art. 201, suprimindo a expressão
"integridade física", além de acrescentar o inciso II, nesses termos:
"Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma do Regime Geral de Previdência
Social, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem
o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, na forma da lei, a:
(...)
§ 1º É vedada a adoção de requisitos ou critérios diferenciados para concessão de
benefícios, ressalvada, nos termos de lei complementar, a possibilidade de previsão de
idade e tempo de contribuição distintos da regra geral para concessão de aposentadoria
exclusivamente em favor dos segurados:
(...)
II - cujas atividades sejam exercidas com efetiva exposição a agentes químicos, físicos e
biológicos prejudiciais à saúde, ou associação desses agentes, vedada a caracterização por
categoria profissional ou ocupação".
Como destacou o Relator, o texto original da PEC 6/2019 – que resultou na EC 103/2019 –
continha, no art. 201, § 7º, II, expressa vedação à aposentadoria especial por
"enquadramento por periculosidade", in verbis:
"Art. 201. O Regime Geral de Previdência Social, de caráter contributivo e de filiação
obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, atenderá
a:
(...)
7º A lei complementar de que trata o 1º poderá estabelecer idade mínima e tempo de
contribuição distintos da regra geral para concessão de aposentadoria exclusivamente em
favor dos segurados:
- com deficiência, previamente submetidos à avaliação biopsicossocial realizada por equipe
multiprofissional e interdisciplinar;
- cujas atividades sejam exercidas com efetiva exposição a agentes nocivos químicos,
físicos e biológicos prejudiciais à saúde, ou associação desses agentes, vedados a
caracterização por categoria profissional ou ocupação e o enquadramento por
periculosidade;
(...)".
Tal referência à vedação ao "enquadramento por periculosidade", para fins de
aposentadoria especial, foi suprimida, no art. 201, antes da votação final da PEC 6/2019,
que resultou na EC 103/2019.
Assim, em que pese a atual redação do art. 201, § 1º, II, da Constituição Federal, dada pela
EC 103/2019, a matéria relativa à aposentadoria especial, na forma da EC 103/2019, não é
auto-executável, estando a depender de lei complementar regulamentadora, de tal sorte
que subsiste a legislação infraconstitucional, que prevê, no art. 57 da Lei 8.213/91,
aposentadoria especial pelo trabalho em condições que prejudiquem a integridade física,
bem como no seu § 4º, que "o segurado deverá comprovar, além do tempo de trabalho,
exposição aos agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes
prejudiciais à saúde ou à integridade física, pelo período equivalente ao exigido para a
concessão do benefício".
Deste modo, é indiscutível que qualquer decisão de última instância que adote o Tema
Repetitivo STJ/1031 enseja a interposição do Extraordinário com lastro no artigo 102, inciso III, letra A,
da Constituição.
O INSS tem que a violação constitucional se deu de forma direta e não meramente reflexa
ao texto constitucional, máxime em Tese Repetitiva de vultosa repercussão geral.
De seu turno, não se desconhece a jurisprudência do STF que não admitiu no passado
Recursos Extraordinários que versaram sobre o enquadramento do tempo especial por agentes nocivos
por se tratar de matéria infraconstitucional, nos termos do Tema 852 em Repercussão Geral, de
17/09/2015:
No entanto, note-se que o caso concreto avaliado no Tema STF/852 em Repercussão Geral,
oriundo da Turma Recursal de Pernambuco, avaliou o tema apenas no aspecto legal (artigos 57 e 58 da
Lei 8.213/91 e rol exemplificativo de agentes nocivos), e não constitucional.
Ademais, o Tema Repetitivo STJ/1031 não envolve a reapreciação de fatos e provas, por se
tratar de tese jurídica sobre os vigilantes, tanto que o STJ o conheceu em sede de Recurso Especial, em
que também é defeso o reexame de fatos e provas.
Por tudo isso, é evidente que o Tema Repetitivo STJ/1031 foi expressamente lastreado em
disposições expressas da Constituição Federal de 1988, devendo ser admitido o Recurso Extraordinário
que ainda possui enorme Repercussão Geral de âmbito econômico e jurídico, diante da multiplicidade de
ações previdenciárias da mesma natureza de milhares de vigilantes do Brasil.
Tomemos ainda outro exemplo que trata expressamente dos vigilantes. Cuida-se do ARE
1186713/DF, em que o Recurso Extraordinário do INSS contra decisão da TNU que concedeu a
aposentadoria especial em favor de um vigilante não foi conhecido pela Suprema Corte por não se tratar
de decisão com lastro na Constituição Federal de 1988.
A própria decisão da lavra do Ministro Ricardo Lewandowski narrou a decisão da TNU que se
norteou apenas na legislação infraconstitucional:
Desse modo, é evidente que estes precedentes de não admissão de Recurso Extraordinário
não se aplicam ao Tema Repetitivo STJ/1.031, pois não abordaram o enquadramento constitucional da
aposentadoria especial por risco em favor dos vigilantes.
De outro lado, conforme demonstrado, no Tema Repetitivo STJ/1031 a tese foi construída
sobre o artigo 201, §1º e 202, II, da Constituição Federal, bem como no texto do artigo 201, §1º antes e
depois da reforma implementada pela Emenda Constitucional 103/2019, em especial no voto vista da
Ministra Assusete Magalhães.
Há que se ter em conta, ainda, o impacto operacional sobre o INSS, com transtornos nas
rotinas de concessão de benefícios e consequente incremento de despesas de natureza operacional.
Acaso a tese firmada pelo STJ no Tema Repetitivo 1031 prospere todas as profissões que
exerçam atividades de risco reivindicarão ao Poder Judiciário a concessão da aposentadoria especial, a
exemplo doque se vê nos presentes autos.
Isso porque a ratio essendi da tese do Superior Tribunal não se limita aos vigilantes,
podendo ser aplicada a qualquer profissão cuja atividade seja arriscada, como infelizmente já vem
sendo concedido por diversos órgãos do Poder Judiciário.
Por fim, sob o ponto de vista social, não se pode subestimar o impacto da demanda por
revisão – cuja avaliação possui elevado grau de complexidade – sobre a análise dos demais
requerimentos de benefícios nas Agências da Previdência Social de todo o país. Trata-se de demandas
concorrentes entre si, que dependem, portanto, do mesmo conjunto de servidores. A consequência
óbvia é o aumento do volume de demandas no INSS e, por conseguinte, o represamento de benefícios.
Ainda sob o ponto de vista social, importa ressaltar que a previsão expressa na Constituição
Federal do direito à previdência social como direito social (art. 6º) e do sistema de Previdência como
componente da Ordem Social (Título VIII, Capítulo II, Seção III) já implica, por si só, existência do
requisito da repercussão social nos recursos extraordinários interpostos pelo INSS, uma vez que é essa
Autarquia a entidade que, na ordem social brasileira, tem a finalidade específica de prestar a
previdência pública, finalidade esta que será extremamente prejudicada se deferida a pretensão
deduzida em demandas como a dos presentes autos.
Por sua vez, também esbarra no texto constitucional vigente entre 05/11/1988 e 15/12/1998
(antes da Emenda 20/1998), pois previa da mesma forma o artigo 202, II, da Constituição, a concessão
de aposentadoria no RGPS“após trinta e cinco anos de trabalho, ao homem, e, após trinta, à mulher, ou
em tempo inferior, se sujeitos a trabalho sob condições especiais, que prejudiquem a saúde ou a
integridade física, definidas em lei”, não autorizando a aposentadoria no RGPS por risco, no que foi
regulamentada pela Lei 9.032/95.
Com o advento do Decreto 2.172/1997, a aposentadoria especial sofre nova alteração, pois
o novo texto não mais enumera ocupações, passando a listar apenas os agentes
considerados nocivos ao Trabalhador, e os agentes assim considerados seriam, tão-
somente, aqueles classificados como químicos, físicos ou biológicos. Não traz o texto
qualquer referência a atividades perigosas, o que à primeira vista, poderia ao entendimento
de que está excluída da legislação a aposentadoria especial pela via da periculosidade.
Essa conclusão, porém, seria a negação da realidade e dos perigos da vida, por se fundar
na crença – nunca confirmada – de que as regras escritas podem mudar o mundo e as
vicissitudes do trabalho, os infortúnios e os acidentes, podem ser controlados pelos
enunciados normativos.
Nesse sentido, como não poderia ser diferente, posto que inexiste, o Acórdão do Tema
Repetitivo STJ 1031 em nenhum momento aponta a exposição permanente do vigilante a um agente
nocivo físico, químicos ou biológico prejudicial à saúde, sendo uma clássica hipótese de aposentadoria
especial por atividade de risco profissional, que não encontra guarida no Regime Geral de Previdência
Social no texto constitucional, haja vista que somente se admite um regramento especial de
aposentação por lei complementar na situação de agentes nocivos físicos, químicos ou biológicos ou na
situação de pessoas com deficiências nos termos do artigo 201, §1º, da Constituição, quer no texto
anterior, quer no texto posterior à Emenda Constitucional 103/2019.
Da mesma forma, entende o INSS que mesmo que houvesse amparo constitucional para a
concessão no RGPS de aposentadoria especial por atividade perigosa, a sua concessão dependeria de
aprovação de lei complementar, que nunca foi editada para beneficiar os vigilantes ou qualquer outra
categoria profissional que desenvolva atividade perigosa.
Isto com lastro na própria jurisprudência do STF, posto que a aposentadoria especial é a
exceção, não podendo se tornar a regra geral de aposentação, de modo que não é possível ao Poder
Judiciário criar no RGPS novas hipóteses de aposentadoria especial sem a expressa autorização
constitucional e sem a edição da correspondente lei complementar de regulamentação, respeitada a
regra constitucional da contrapartida que rege todo o Sistema de Seguridade Social.
Por outro lado, existem profissões de risco em que não há uma exposição permanente a
agente físico, químico ou biológico acima do padrão regulamentar. É o caso da atividade dos vigilantes e
de inúmeras outras atividades categorias profissionais.
Com propriedade, à luz do artigo 201, §1º, da Constituição, a nocividade por exposição
permanente a agentes físicos, químicos ou biológicos nas situações regulamentares é que deve dar
ensejo à concessão de aposentadoria especial no RGPS, não se confundindo com as atividades perigosas
sem exposição aos citados agentes, a exemplo das atividades descritas nos anexos da NR 16, como
ocorre com os vigilantes, dando ensejo apenas à percepção do adicional trabalhista de periculosidade.
A primeira redação do §1º do artigo 201 da Constituição foi dada pela EC 20/1998 que o
inseriu. Nesta situação, o tema já era regulado pelo artigo 57 da Lei 8.213/91 que foi recebido com o
status de lei complementar.
Após a EC 20/1998, nunca foi aprovada uma lei complementar para regular a concessão de
aposentadoria especial (exceto pessoas com deficiência: LC 142/2013), de modo que seguiram em vigor
os artigos 57 e 58 da Lei 8.213/91:
“Art. 57. A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta
Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a
saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos,
conforme dispuser a lei. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)
Art. 58. A relação dos agentes nocivos químicos, físicos e biológicos ou associação de
agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física considerados para fins de
concessão da aposentadoria especial de que trata o artigo anterior será definida pelo Poder
Executivo. (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 1997)”
Dessa forma, note-se que o texto do parágrafo primeiro do artigo 201 da Constituição
seguiu a sistemática já adotada pelos artigos 57 e 58 da Lei 8.213/91, cujas condições especiais que
prejudicam a saúde ou integridade física que dão azo à concessão da aposentadoria especial são
somente pela exposição aos agentes nocivos químicos, físicos e biológicos ou a associação desses
agentes com aptidão de causar prejuízo à saúde ou à integridade física.
O mesmo ocorreu no texto anterior à Emenda 20/1998, regulamentado pela Lei 9.032/95,
pois previa da mesma forma o artigo 202, II, da Constituição a concessão de aposentadoria no RGPS
“após trinta e cinco anos de trabalho, ao homem, e, após trinta, à mulher, ou em tempo inferior, se
sujeitos a trabalho sob condições especiais, que prejudiquem a saúde ou a integridade física, definidas
em lei”, não autorizando a aposentadoria no RGPS por risco.
Ademais, mesmo que se entenda que em tese fosse possível a concessão de aposentadoria
especial por atividade perigosa no RGPS, a concessão do benefício apenas pelo risco da atividade
demandaria a edição de lei complementar, conforme determina o texto do artigo 201, §1º, da
Constituição, que jamais foi editada pelo Congresso Nacional[2].
A partir do momento em que o Colendo Superior Tribunal, ao julgar o Tema Repetitivo 1031,
estendeu a aposentadoria especial a milhares de vigilantes do país, com ou sem o manejo de arma de
fogo, permissa venia, cometeu a Corte Superior dois equívocos jurídicos que inclusive afrontam a atual
jurisprudência do Plenário do STF:
“5. Com o advento do Decreto 2.172/1997, a aposentadoria especial sofre nova alteração,
pois o novo texto não mais enumera ocupações, passando a listar apenas os agentes
considerados nocivos ao Trabalhador, e os agentes assim considerados seriam, tão-
somente, aqueles classificados como químicos, físicos ou biológicos. Não traz o texto
qualquer referência a atividades perigosas, o que à primeira vista, poderia ao entendimento
de que está excluída da legislação a aposentadoria especial pela via da periculosidade.
Essa conclusão, porém, seria a negação da realidade e dos perigos da vida, por se fundar
na crença – nunca confirmada – de que as regras escritas podem mudar o mundo e as
vicissitudes do trabalho, os infortúnios e os acidentes, podem ser controlados pelos
enunciados normativos.
6. Contudo, o art. 57 da Lei 8.213/1991 assegura, de modo expresso, o direito à
aposentadoria especial ao Segurado que exerça sua atividade em condições que coloquem
em risco a sua saúde ou a sua integridade física, dando impulso aos termos dos arts. 201, §
1o. e 202, II da Constituição Federal. A interpretação da Lei Previdenciária não pode fugir
dessas diretrizes constitucionais, sob pena de eliminar do Direito Previdenciário o que ele
tem de específico, próprio e típico, que é a primazia dos Direitos Humanos e a garantia
jurídica dos bens da vida digna, como inalienáveis Direitos Fundamentais”.
Agora, para espancar qualquer dúvida, o artigo 201, §1º, da Constituição expressamente
admite a aposentadoria especial somente em favor de segurados “cujas atividades sejam exercidas com
efetiva exposição a agentes químicos, físicos e biológicos prejudiciais à saúde, ou associação desses
agentes, vedada a caracterização por categoria profissional ou ocupação”.
Note-se que o inciso III artigo 40, §4º, da Constituição (redação da EC 47/2005) possui a
mesma redação do artigo 201, §1º (redação da EC 47/2005):
Ora, se a redação do artigo 201, §1º, da Constituição, que trata da aposentadoria especial
no RGPS, possui a mesma redação do artigo 40, §4º, inciso III (atividades exercidas sob condições
especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física), cuidando da aposentadoria especial no
RPPS, não teria razão de ser o artigo 40, §4º, inciso II da Constituição, permitir por expresso que a
atividade de risco também gerasse aposentadoria especial na Previdência do Servidor Público.
Com o advento da EC 103/2019 isso se reforçou ainda mais. Isso porque o RPPS manteve a
previsão constitucional da aposentadoria especial das atividades de risco passando a listar as carreiras
de segurança pública, agentes penitenciários/socioeducativos e policiais da Câmara dos Deputados e
Senado da República (somente estes, em rol taxativo) que farão jus ao benefício no artigo 40 da
Constituição:
“§ 4º-B. Poderão ser estabelecidos por lei complementar do respectivo ente federativo
idade e tempo de contribuição diferenciados para aposentadoria de ocupantes do cargo de
agente penitenciário, de agente socioeducativo ou de policial dos órgãos de que tratam o
inciso IV do caput do art. 51, o inciso XIII do caput do art. 52 e os incisos I a IV do caput do
art. 144. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 103, de 2019)”
De outro vértice, no RGPS o texto constitucional do artigo 201 foi ainda mais detalhado
passando a exigir a exposição a agentes físicos, químicos ou biológicos prejudiciais à saúde para a
concessão da aposentadoria especial:
A principal situação se refere aos guardas municipais. Veja-se o quanto firmado pelo
Plenário do STF no AgRg no MI 6.770, de 20/06/2018:
De efeito, nem mesmo no RPPS, que possui previsão expressa de aposentadoria especial
por atividade de risco, o STF estendeu o regramentos dos policiais (Lei Complementar 51) em favor dos
guardas municipais.
Ao revés, o STJ no Tema Repetitivo 1.031, ampliou as regras de aposentadoria especial por
agentes nocivos no RGPS aos vigilantes, sem a previsão constitucional de aposentadoria por atividade
de risco neste regime previdenciário e sem a existência de lei complementar autorizadora.
“Nós travamos essa discussão, em outro momento, relativamente a outras carreiras, uma
delas a de oficiais de Justiça, a qual os seus integrantes pontualmente estão sujeitos a
agressões físicas e até a casos de óbito.
O que decidimos naquela ocasião? Decidimos que as atividades inerentemente perigosas
são as alcançadas pelo art. 4º, II, da Constituição Federal e que o art. 40, § 4º, II, dependia
de integração pelo legislador para que aquelas carreiras fossem beneficiárias da
aposentadoria especial.
É bem verdade que criamos uma exceção, a hipótese dos guardas penitenciários, porque
consideramos ser uma atividade inerentemente perigosa.
Quanto aos guardas civis, os Ministros do Supremo Tribunal Federal sempre entenderam
que, à míngua de atuação do legislador, não era possível dar este benefício. Na verdade - e
gostaria de insistir -, reputo legítimo que o legislador faça, mas considero perigoso que o
façamos por decisão judicial.
Decidiram, no mesmo sentido do meu pronunciamento, a Ministra Cármen Lúcia, o Ministro
Edson Fachin, o Ministro Ricardo Lewandowski, a Ministra Rosa Weber, o Ministro Gilmar
Mendes e o Ministro Dias Toffoli. Portanto, reiteradamente, temos decidido nessa linha.
Eu penso que o problema de se abrir uma exceção aqui não é irrelevante. Temos adotado
no Plenário uma posição de grande autocontenção no tocante à concessão, sem lei, de
benefícios a servidores públicos. A primeira consequência, eu penso, de uma extensão
dessa benesse a uma categoria, sem lei, é que virão as próximas. Em seguida, os
motoristas do setor público irão demonstrar que eles têm um índice de morbidade e de
letalidade muito maior do que dos outros servidores do setor público e haverá o risco de,
também sem lei, estender-se. Aí virão outras categorias que vão ser capazes de
demonstrar, empiricamente, que há mais letalidade ou maior número de acidentes nessas
categorias.
Dessa forma, vamos criar um regime de concessão de aposentadoria especial por via
judicial, que eu considero perigoso.
Como os argumentos que o Ministro Alexandre de Moraes acaba de enunciar são
relevantes, acho que o legislador pode e deve fazê-lo, incluir os guardas municipais, mas a
lei recentemente editada, que cuidou de segurança pública, que poderia ter feito isso, não
o fez. Portanto, o legislador tomou a decisão política de não dar um regime diferenciado
para os guardas municipais.
Eu queria deixar claro que não tenho nada contra os guardas municipais e nada contra o
legislador reconhecer que seja uma atividade de risco e dar essa benesse, mas vejo como
um risco começarmos a conceder esse tipo de benefício por via jurisprudencial”.
Vale registrar que as decisões do STF que negaram no RPPS a concessão de aposentadoria
especial por atividade de risco também abarcam os vigilantes. Nesse sentido, transcreve-se
passagem do julgamento do MI 7.281, julgado em 21/02/2020:
“Constato que, em 11.06.2015, o Plenário desta Corte finalizou o julgamento dos MIs 833 e
844 (Informativo 789), oportunidade na qual denegou as ordens impetradas, em face de
suposta omissão referente à regulamentação do artigo 40, § 4º, da Constituição Federal.
Na ocasião do julgamento desses mandados de injunção, formou-se o entendimento de que
a expressão “atividades de risco”, contida no artigo 40, § 4º, II, do Texto Constitucional, é
aberta, ou seja, os contornos de sua definição normativa comportam relativa liberdade de
conformação por parte do Parlamento, desde que observada a forma das leis
complementares.
Assentou-se, também, que a existência de gratificações ou adicionais de periculosidade
para determinada categoria não garante o direito à aposentadoria especial, pois os vínculos
funcional e previdenciário não se confundem.
Assim, o estado de omissão inconstitucional ficaria restrito àquelas atividades em que o
risco seja inequivocamente inerente. Isto porque exposição eventual a situações de risco,
como no caso de fiscais tributários, não garante direito subjetivo constitucional à
aposentadoria especial. Este tem sido o entendimento desta Corte ao julgar mandados de
injunção impetrado por diversas categorias, como guardas municipais e vigilantes”.
Existe ainda um caso julgado pelo STF referente ao RPPS do Município de Jacareí (SP) em
que o Tribunal de Justiça de São Paulo concedeu a aposentadoria especial aos guardas municipais não
por atividade de risco, e sim por suposta atividade prejudicial à saúde e à integridade física, igualando
neste ponto a análise com o Tema Repetitivo 1.031/STJ.
“Guarda Civil Municipal. Aposentadoria especial. Documentos que comprovam que exercia
função em condições especiais prejudiciais à integridade física. Direito à aposentadoria com
critérios diferenciados prevista no art. 40, § 4º, III, da Constituição Federal. Desnecessidade
de que o dano à integridade física se concretize, bastando que as condições de trabalho
sejam aptas a possibilitá-lo. Ausência de conflito com o decidido pelo C. STF nos agravos
regimentais nos Mandados de Injunção 6770, 6773, 6780, 6874 e 6515, que trataram
somente da impossibilidade, por mora legislativa, de extensão das disposições da Lei
Complementar 51/89 aos guardas civis municipais, não impedindo que o direito à
aposentaria diferenciada seja reconhecido em situações concretas com base em provas do
enquadramento nas hipóteses do art. 40, § 4º, III, da CF”.
Neste caso, o STF rejeitou a concessão de aposentadoria especial aos guardas municipais
pelo enquadramento do artigo 40, §4º, inciso III, da Constituição (condições especiais que prejudiquem a
saúde ou à integridade física), que é o lastro constitucional da decisão do STJ no Tema Repetitivo 1.031
(artigo 201, º1º, da Constituição):
Como dito no início deste recurso, acaso a tese firmada pelo STJ no Tema Repetitivo 1.031
prospere todas as profissões que exerçam atividades de risco reivindicarão ao Poder Judiciário a
concessão da aposentadoria especial.
Dessa forma, acaso confirmada a tese firmada no Tema Repetitivo STJ/1.031, além dos
nobres vigilantes e dos entregadores de gás, também motoboys, trabalhadores da construção civil,
motoristas de ônibus e caminhões, aeroviários, limpadores de vidros de edifícios, pintores de fachadas
de edifícios, mergulhadores e todas as profissões que demandem um risco anormal no âmbito
profissional baterão às portas do Poder Judiciário em busca da aposentadoria especial pelo perigo da
atividade laboral, que poderá passar de circunstância excepcional à regra geral.
Destarte, além da tese no Tema STJ 1031 da concessão da aposentadoria especial por
periculosidade, já existem decisões judiciais perpetrando uma nova ampliação inconstitucional para as
situações de penosidade.
Mais uma vez convém transcrever passagem do voto vencedor do Ministro Roberto Barroso
no AgRg no MI 6.770, de 20/06/2018, com nítida preocupação da extensão de tese judicial a todas as
categorias profissionais de risco no âmbito do RPPS (efeito manada):
“Eu penso que o problema de se abrir uma exceção aqui não é irrelevante. Temos adotado
no Plenário uma posição de grande autocontenção no tocante à concessão, sem lei, de
benefícios a servidores públicos. A primeira consequência, eu penso, de uma extensão
dessa benesse a uma categoria, sem lei, é que virão as próximas. Em seguida, os
motoristas do setor público irão demonstrar que eles têm um índice de morbidade e de
letalidade muito maior do que dos outros servidores do setor público e haverá o risco de,
também sem lei, estender-se. Aí virão outras categorias que vão ser capazes de
demonstrar, empiricamente, que há mais letalidade ou maior número de acidentes nessas
categorias”.
Ora, os processos pendentes que versam sobre a matéria em discussão nestes autos já se
encontravam suspensos por determinação do Ministro Relator do Recurso Especial Repetitivo, a partir da
decisão de afetação. Daí porque se fala em simples reestabelecimento da suspensão outrora já
determinada.
VI- PEDIDO