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PLATAFORMA DE PAZ

E SEGURANÇA DE
CABO DELGADO
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Sexta- feira, 21 de Julho de 2023 I Ano 2, n.º 28 I Director: Prof. Adriano Nuvunga I Português

PGR designa 43 pessoas como


terroristas, das quais 35 são
moçambicanas e 08 tanzanianas
l Mais de 30 pessoas agora designadas terroristas foram julgadas e condenadas em
2018 e 2019, o que faz acreditar que nos primeiros anos da eclosão do conflito do
tipo extremismo violento os suspeitos neutralizados pelas Forças de Defesa e Segu-
rança (FDS) eram entregues às instituições de justiça de Cabo Delgado. Entretanto,
nos de 2020 e 2021 - período em que os ataques se intensificaram com assaltos a
várias sedes distritais, a justiça não condenou nenhuma pessoa com ligação aos ata-
ques terroristas. Tudo indica que nesse período as FDS não entregavam os “terroris-
tas” neutralizados à justiça. Vale lembrar que foi nos anos de 2020 e 2021 que se assis-
tiu a graves violações de direitos humanos cometidas pelas FDS em Cabo Delgado.
C
erca de seis anos depois do início dos direitos humanos em Moçambique.
ataques dos extremistas violentos em Além de ser um dos líderes do grupo terroris-
Cabo Delgado, a Procuradoria-Geral da ta que actua em Moçambique, Bonomade Omar
República (PGR) designou, através de um Despa- faz a ligação com o exterior. O tanzaniano Abu
cho de 12 de Julho, 43 pessoas como terroristas, Yasir Hassan também actua como um dos lí-
sendo 38 homens e apenas 05 (cinco) mulheres. deres do autoproclamado Estado Islâmico em
A lista publicada no Boletim da República inclui Moçambique. Em 2017, ano em que começaram
ainda três entidades/grupos também designa- os ataques em Cabo Delgado, Abu Yasir Hassan
dos terroristas. liderava uma seita extremista islâmica e um gru-
Das 43 pessoas designadas terroristas, 41 foram po rebelde que mais tarde se juntou ao Estado
julgadas e condenadas pelo Tribunal Judicial da Islâmico.
Província de Cabo Delgado (TJPCD) pela prática Em relação aos 41 terroristas condenados, a
de crimes de terrorismo, adesão a organizações maioria foi julgada em 2018 e 2019, sendo que
ou associações terroristas, instigação ao terroris- apenas 09 (nove) processos-crime foram julga-
mo, espionagem, armas proibidas e associação dos em 2022 e 2023. O facto de a maioria (31) das
criminosa. Apenas 02 (duas) pessoas designadas pessoas agora designadas terroristas terem sido
como terroristas estão em parte incerta, nomea- julgadas e condenadas em 2018 e 2019 parece
damente Abu Yasir Hassan, de nacionalidade revelar que, nos primeiros anos da eclosão do
tanzaniana, e o moçambicano Bonomade Ma- conflito do tipo extremismo violento, os sus-
chude Omar, natural do distrito de Palma. peitos neutralizados pelas Forças de Defesa e
Tanto Abu Yasir Hassan assim como Bonomade Segurança (FDS) eram entregues às instituições
Machude Omar já tinham sido designados, em de justiça de Cabo Delgado para os devidos pro-
Março e Agosto de 2021, respectivamente, ter- cedimentos legais.
roristas pelo Departamento de Estado dos Es- Curiosamente, nos anos de 2020 e 2021, perío-
tados Unidos de América (EUA) devido às suas do em que os ataques se intensificaram – com
actividades em Moçambique e ligações com o assaltos a várias sedes distritais (da Mocímboa da
Estado Islâmico. Em Abril de 2023, a Conselho da Praia, Quissanga, Macomia, Muidumbe e Palma),
União da Europeia incluiu os nomes de Abu Ya- a justiça não condenou nenhuma pessoa com
sir Hassan e Bonomade Machude Omar na lista ligação aos ataques terroristas. Não é crível que a
de sanções da União Europeia pela responsabil- ter havido julgamentos de suspeitos da prática de
idade em ataques terroristas e sérios abusos de crimes de terrorismo nenhuma pessoa tenha sido
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condenada. Portanto, tudo indica que durante os que fazem parte do “planalto dos macondes”, e
anos do pico do conflito as FDS não entregavam foram julgados e condenados em 2018 e 2019.
os “terroristas” neutralizados à justiça. Vale aqui Os ataques dos extremistas violentos foram
lembrar que foi nos anos de 2020 e 2021 que se mais intensos e violentos nos distritos costeiros
assistiu a graves violações de direitos humanos de Cabo Delgado, maioritariamente habitados
cometidas pelas FDS em Cabo Delgado. por mwanis e macuas. No “planalto dos ma-
Em 2022 e 2023 foram julgadas e condena- condes” houve poucas investidas dos terroristas,
das 09 (nove) pessoas designadas terroristas. Os à excepção de poucos ataques verificados em
nove julgamentos ocorreram numa altura em Nangade e Muidumbe. Na verdade, quando os
que os ataques dos extremistas violentos tin- ataques começaram a ocorrer com alguma reg-
ham reduzido e a situação de segurança estava ularidade, os habitantes do “planalto dos ma-
a melhorar em Cabo Delgado, depois da inter- condes”, maioritariamente combatentes da luta
venção militar de forças estrangeiras, designa- de libertação nacional e descendentes destes,
damente as tropas do Ruanda e da SADC. E mais: receberam armas do Estado para se defenderem.
foi no mesmo período em que o Presidente da Algo que não aconteceu nos distritos costeiros,
República estava a perdoar supostos terroristas regra geral habitados por macuas e mwanis.
neutralizados pelas FDS. O grupo de combatentes que recebeu armas
As origens das pessoas designadas terroristas do Estado em 2022 para defender as suas comu-
é outra leitura que se pode fazer do documento nidades dos ataques terroristas ficou conhecido
da PGR. Das 43 pessoas, 08 (oito) tem a nacio- como “Força Local”. Numa primeira fase, a actu-
nalidade tanzaniana e 35 são moçambicanas. ação desta força não tinha nenhum enquadra-
Deste número, apenas 06 (seis) não são de Cabo mento legal. Só em Abril de 2023 o Governo
Delgado: 05 (cinco) são da província de Nampu- aprovou o Decreto n.º15/2023, de 14 de Abril,
la, concretamente dos distritos de Nacala-Porto, que estabelece a Força Local e aprova o respec-
Memba e Mossuril; e apenas um é da província tivo Estatuto. O decreto supra define a Força
do Niassa. Em termos étnicos, 19 são macuas, Local como “agrupamento excepcional e tem-
12 são mwanis e apenas dois terroristas são ma- porário constituído por cidadãos nacionais per-
condes. Os dois (um homem e uma mulher) são tencentes a uma determinada comunidade que,
oriundos de Mueda e Nangade, dois distritos de forma voluntária, se organiza para contribuir

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na sua auto-defesa contra ameaças à soberania mento e outro equipamento militar atribuído
e à integridade territorial”. pelo Estado ao membro da Força Local. Ao con-
Mas o decreto apresenta lacunas que, futura- trário das tropas regulares, os membros da Força
mente, poderão resultar em graves problemas Local não estão sujeitos ao regime de aquartela-
de segurança. A começar, desde logo, pela facil- mento, pois cada membro leva a arma e mu-
idade com que as pessoas de uma comunidade nições para a sua casa. Por essa razão, o Governo
se tornam membros da Força Local: basta a von- deveria estabelecer medidas rígidas de controlo
tade pessoal e o reconhecimento pela estrutura das armas atribuídas aos membros da Força Lo-
administrativa local. As lacunas incluem a falta cal para evitar situações de uso indevido e até
de mecanismos de controlo efectivo do arma- mesmo desvios.

INFORMAÇÃO EDITORIAL:

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Director: Prof. Adriano Nuvunga
Editor: Emídio Beula
Autor: Emídio Beula
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