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Antologia Poética

 Poeta significativo da 2ª geração modernista;


 foi também compositor muito popular;
 um dos fundadores, na década de 1950, da Bossa
Nova;
 integra o grupo dos poetas religiosos das décadas
de 1930 e 1940.
 Lirismo:tom sentimental, subjetivo,
revelação de estados de alma;
 presença da natureza, principalmente do
mar e da praia;
 musicalidade sempre presente;
 preocupação com a forma dos poemas.
 Forma: versos longos, linguagem
abstrata e alegórica;
 temas: poesia transcendental,
religiosa, com influências
simbolistas;
 espiritualidade católica e visionária.
 Forma: linguagem simples, vocábulos do
cotidiano;
 poesia sensual: aproximação do mundo
material, temas cotidianos e forte
erotismo;
 recriação do soneto: à moda de Camões e
Shakespeare, trata das contradições do
amor e da vida;
 poesia social: linguagem simples e direta.
Agonia
No teu grande corpo branco depois eu fiquei.
Tinha os olhos lívidos e tive medo.
Já não havia sombra em ti – eras como um grande deserto de areia
Onde eu houvesse tombado após uma longa caminhada sem noites.
Na minha angústia eu buscava a paisagem calma
Que me havias dado tanto tempo
Mas tudo era estéril e monstruoso e sem vida
E teus seios eram dunas desfeitas pelo vendaval que passara.
Eu estremecia agonizando e procurava me erguer
Mas teu ventre era como areia movediça para os meus dedos.
Procurei ficar imóvel e orar, mas fui me afogando em ti mesma
Desaparecendo no teu ser disperso que se contraía como a voragem.
Depois foi o sono, o escuro, a morte.
Quando despertei era claro e eu tinha brotado novamente
Vinha cheio do pavor das tuas entranhas.
Rio de Janeiro, 1935
 Linguagem alegórica: o corpo da mulher é
comparado a um deserto, os seios são dunas,
o ato sexual é a peregrinação do eu lírico por
esse deserto;
 sugestividade simbolista: “corpo branco”,
“escuro”;
 musicalidade: assonâncias e aliterações;
 desejo e gozo sexual identificados à agonia;
 ato sexual: identificado ao pecado e à
morte.
Ausência
Eu deixarei que morra em mim o desejo de amar os teus olhos que são doces
Porque nada te poderei dar senão a mágoa de me veres eternamente exausto.
No entanto a tua presença é qualquer coisa como a luz e a vida
E eu sinto que em meu gesto existe o teu gesto e em minha voz a tua voz.
Não te quero ter porque em meu ser tudo estaria terminado
Quero só que surjas em mim como a fé nos desesperados
Para que eu possa levar uma gota de orvalho nesta terra amaldiçoada
Que ficou sobre a minha carne como uma nódoa do passado.
Eu deixarei... tu irás e encostarás a tua face em outra face
Teus dedos enlaçarão outros dedos e tu desabrocharás para a madrugada
Mas tu não saberás que quem te colheu fui eu, porque eu fui o grande íntimo
[da noite
Porque eu encostei minha face na face da noite e ouvi a tua fala amorosa
Porque meus dedos enlaçaram os dedos da névoa suspensos no espaço
E eu trouxe até mim a misteriosa essência do teu abandono desordenado.
Eu ficarei só como os veleiros nos portos silenciosos
Mas eu te possuirei mais que ninguém porque poderei partir
E todas as lamentações do mar, do vento, do céu, das aves, das estrelas
Serão a tua voz presente, a tua voz ausente, a tua voz serenizada.
Rio de Janeiro, 1935
 Angústiado eu lírico: desejo e amor vistos
como pecado;
 amor platônico e misticismo: recusa de ter a
mulher amada;
 mulher amada vista de maneira idealizada;
 lembranças finais: identificadas aos
elementos da natureza, de maneira que se
tornem infinitas.
A música das almas

"Le mal est dans le monde comme un esclave qui fait monter l’eau."
Claudel

Na manhã infinita as nuvens surgiram como a Ioucura numa alma


E o vento como o instinto desceu os braços das árvores que
[estrangularam a terra
Depois veio a claridade, o grande céu, a paz dos campos...
Mas nos caminhos todos choravam com os rostos levados para o alto
Porque a vida tinha misteriosamente passado na tormenta.

Rio de Janeiro, 1935


 Poema simbolista: sugestões musicais a partir
do título;
 elementos da natureza: manhã, nuvens,
ventos, árvores, terra, céu, campos;
 sugestividade: elementos da natureza
representam fases da vida.
Marina
E te adorava; sentia
Lembras-te das pescarias Teu cheiro a peixe, bebia
Nas pedras das Três-Marias Teu bafo de sal
Lembras-te, Marina?
E quantas vezes, precoce
Na navalha dos mariscos Em vão, pela tua posse
Teus pés corriam ariscos Não me saí mal...
Valente menina!
Deixavas-me dessa luta
Crescia na beira-luz Uma adstringência de fruta
O papo dos baiacus De suor, de alga
Que pescávamos
Mas sempre te libertavas
E nas vagas matutinas Com doidas dentadas bravas
Chupávamos tangerinas Menina fidalga!
E vagávamos...
Foste minha companheira
Tinhas uns peitinhos duros Foste minha derradeira
E teus beicinhos escuros Única aventura?
Flauteavam valsas
Que nas outras criaturas
Valsas ilhoas! vadio Não vi mais meninas puras
Eu procurava, no frio Menina pura.
De tuas calças
 Versos rimados e de forma fixa (redondilhas
maiores e menores);
 forte conteúdo erótico;
 perde-se a noção de pecado em relação à
sensualidade e ao ato sexual;
 presença de vocábulos mais simples para
descrever também um cenário mais singelo;
 elementos do mundo material, cotidiano.
Soneto do maior amor
Maior amor nem mais estranho existe
Que o meu, que não sossega a coisa amada
E quando a sente alegre, fica triste
E se a vê descontente, dá risada.
E que só fica em paz se lhe resiste
O amado coração, e que se agrada
Mais da eterna aventura em que persiste
Que de uma vida mal-aventurada.
Louco amor meu, que quando toca, fere
E quando fere vibra, mas prefere
Ferir a fenecer – e vive a esmo.
Fiel à sua lei de cada instante
Desassombrado, doido, delirante
Numa paixão de tudo e de si mesmo.
Oxford, 1938
 Soneto tradicional: versos decassílabos e
rimas alternadas;
 vocabulário despojado e simples;
 tema cotidiano: vicissitudes do
relacionamento a dois;
 tematiza as contradições do eu lírico em
face do amor.
A rosa de Hiroxima
Pensem nas crianças
Mudas telepáticas
Pensem nas meninas
Cegas inexatas
Pensem nas mulheres
Rotas alteradas
Pensem nas feridas
Como rosas cálidas
Mas oh não se esqueçam
Da rosa da rosa
Da rosa de Hiroshima
A rosa hereditária
A rosa radioativa
Estúpida e inválida
A rosa com cirrose
A anti-rosa atômica
Sem cor sem perfume
Sem rosa sem nada
 Rimas toantes e versos pentassílabos;
 conteúdo social, voltado aos acontecimentos
do seu tempo;
 metáfora da bomba: rosa, mas vista de
maneira negativa (estúpida, inválida, sem
cor, sem perfume);
 função social da poesia: alertar para os
horrores da guerra;
 questionamento acerca dos rumos que toma
a humanidade, a partir da experiência da
guerra.
Amo-te tanto, meu amor... não cante
O humano coração com mais verdade...
Amo-te como amigo e como amante
Numa sempre diversa realidade

Amo-te afim, de um calmo amor prestante,


E te amo além, presente na saudade.
Amo-te, enfim, com grande liberdade
Dentro da eternidade e a cada instante.

Amo-te como um bicho, simplesmente,


De um amor sem mistério e sem virtude
Com um desejo maciço e permanente.

E de te amar assim muito e amiúde,


É que um dia em teu corpo de repente
Hei de morrer de amar mais do que pude.
CECÍLIA
MEIRELES
Características
A LINGUAGEM
No plano estilístico – ao contrário do coloquialismo dos poetas
modernos – há em sua obra uma tendência à linguagem elevada,
sempre carregada de musicalidade. A música, algumas vezes,
parece ser mais importante que o próprio sentido dos versos.
Também a exemplo dos simbolistas, as palavras para a autora
mais sugerem do que descrevem.

A TEMÁTICA
A poesia de Cecília Meireles revela ligações com várias estéticas
tradicionais, especialmente o Simbolismo. Entre os seus motivos
dominantes figuram: O registro de estados de ânimo vagos e
quase incorpóreos.
Uma aguda consciência da passagem do tempo, da brevidade
enganosa de todas as coisas, sobremodo dos sentimentos.A
atmosfera de dor existencial que emana dos poemas de Cecília
Meireles é centrada na percepção de que tudo passa e de que o
fluir do tempo dissolve as ilusões e os amores, o corpo e mesmo a
memória..
Poemas
Tu Tens Um Medo
“Tu tens um medo:
Acabar.
Não vês que acabas todo o dia.
Que morres no amor.
Na tristeza.
Na dúvida.
No desejo.
Que te renovas todo o dia.
No amor.
Na tristeza.
Na dúvida.
No desejo.
Que és sempre outro.
Que és sempre o mesmo.
Que morrerás por idades imensas.
Até não teres medo de morrer.

E então serás eterno.”


Retrato
“Eu não tinha este rosto de hoje,
Assim calmo, assim triste, assim magro,
Nem estes olhos tão vazios,
Nem o lábio amargo.

Eu não tinha estas mãos sem força,


Tão paradas e frias e mortas;
Eu não tinha este coração
Que nem se mostra.

Eu não dei por esta mudança,


Tão simples, tão certa, tão fácil:
- Em que espelho ficou perdida
A minha face?”
Timidez
“Basta-me um pequeno gesto, - que amargamente inventei.
feito de longe e de leve,
para que venhas comigo E, enquanto não me descobres,
e eu para sempre te leve... os mundos vão navegando
nos ares certos do tempo,
- mas só esse eu não farei. até não se sabe quando...

Uma palavra caída e um dia me acabarei.”


das montanhas dos instantes
desmancha todos os mares
e une as terras mais distantes...

- palavra que não direi.

Para que tu me adivinhes,


entre os ventos taciturnos,
apago meus pensamentos,
ponho vestidos noturnos,
O Amor
“É difícil para os indecisos.
É assustador para os medrosos.
Avassalador para os apaixonados!
Mas, os vencedores no amor são os
fortes.
Os que sabem o que querem e querem o que têm!
Sonhar um sonho a dois,
e nunca desistir da busca de ser feliz,
é para poucos!”
Motivo
“Eu canto porque o instante existe
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem triste:
sou poeta.
Irmão das coisas fugidias,
não sinto gozo nem tormento.
Atravesso noites e dias
no vento.
Se desmorono ou edifico,
se permaneço ou me desfaço,
- não sei, não sei. Não sei se fico
ou passo.
Sei que canto. E a canção é tudo.
Tem sangue eterno e asa ritmada.
E sei que um dia estarei mudo:
- mais nada.”

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