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A CIÊNCIA DO DIREITO EM HANS KELSEN: ABORDAGEM

FILOSÓFICO-CRÍTICA

Felipe Kern Moreira

I - A OBRA JURÍDICA DE HANS KELSEN

1.1 - ABORDAGEM HISTÓRICA

As ciências humanas no século XX, representam um agiornamento substancial e


efetivo, quando historicamente abordada pois além do desenvolvimento das ciências já
herdadas dos séculos anteriores, principalmente no que tange a um maior rigorismo científico,
muitas outras conheceram sua gênese neste fértil período. As questões de método, as imagens
do homem, as teorias do Estado e da sociedade e as conjecturas sobre a história humana são
problemas típicos da tradição da pesquisa filosófica deste período. Ora, precisamente sobre
estes problemas exerce-se a influência de toda uma série de teorias que se costuma agrupar
sob a expressão “ciências humanas”, as quais vão da psicanálise à psicologia, da lingüística à
sociologia, da sociologia do conhecimento à antropologia cultural, da filosofia do direito à
economia.

No que se refere às ciências jurídicas, pode-se dizer que o rigorismo científico e a


sistematização foram seus os pontos de avanço. Considerando estes elementos assinalados, a
obra de Hans Kelsen representa não só o paradigma da produção das ciências jurídicas do
século XX como também a síntese de uma visão predominante (ou para outras correntes, que
veio a predominar) sobre o Estado, o Direito e a atividade jurisdicional. A saber, no século XX
predominaram substancialmente três teorias jurídicas: (a) o jusnaturalismo; (b) o positivismo
jurídico e; © o realismo jurídico.

Em síntese, o jusnaturalismo é a escola mais antiga, remontando à Sófocles e


perpassando pelos patrísticos, escolásticos1 sofre as primeiras contestações já na fase
moderna da filosofia; defendendo que uma lei só é valida se for justa: se não for justa, non est
lex sed corruptio legis. O representante mais significativo do século em discussão foi Gustav
Radbruch (1878-1949), nobre e prestigioso jurisconsulto e teórico que perdeu sua cátedra
durante o regime de Adolf Hitler. Fica contudo o questionamento se haverá critério absoluto que
nos permita estabelecer de modo definitivo e universal o que é justo e o que é injusto? Este é o
problema de fundo do jusnaturalismo e ao mesmo tempo sua esfinge devoradora.

A Escola do Realismo Jurídico também possui suas raízes longínquas e possui como
mais ilustre representante no século XIX o célebre Friedrich Carl von Savigny (1779 - 1861).
Para esta corrente, o direito surge daquela realidade social onde comportamentos humanos
fazem e desfazem as normas de conduta. Direito não é norma justa (por certa ética filosófica)
ou a norma válida (segundo e em dado ordenamento), mas sim a regra eficaz que emerge da
vida vivida pelos homens. Mais recentemente, quem defendeu o Realismo Jurídico foi o jurista
norte-americano Oliver Wendell Holmes (1841-1935), durante muitos anos juiz da Suprema
Corte dos Estados Unidos. Holmes foi, segundo a opinião de Norberto Bobbio, “o primeiro,
primeiramente no exercício de suas funções a rejeitar o tradicionalismo jurídico das cortes e a
introduzir uma interpretação evolutiva do direito, mais sensível às mudanças da consciência
social “2.

A terceira Escola, denominada de Positivismo Jurídico só pode ser compreendida


filosoficamente se inserida no contexto histórico-filosófico das duas escolas anteriormente
delineadas. Para cada uma das correntes de pensamento podemos encontrar um foco
privilegiado, um enfraquecimento conseqüente de outras abordagens ou mesmo em uma
análise mais extrema um reducionismo.
O jusnaturalismo, acaba por apregoar, genericamente falando, uma relativização da
aplicabilidade objetiva da justiça, já que pugna por não estabelecer um critério absoluto. Nesta
admite-se que na história, encontramos leis verdadeiramente válidas e eficazes mas que a
consciência de indivíduos ou grupos as consideram injustas: há uma redução da justiça
enquanto ideal teleológico. Já no Realismo, por dar posição privilegiada à situação fática, social
ou individual, acaba por reduzir a validade de uma norma à sua eficácia em uma relação de
equiparação.

O positivismo, reforçando um rigorismo metodológico na abordagem do objeto a ser


estudado, procura manter distintas os conceitos de justiça, de validade e de eficácia do direito.
Eis então a primeira abordagem necessária ao positivismo jurídico no que tange à delimitação
histórica; pode-se intelegir vivamente que a escola a ser estudada no presente trabalho pode
também ser explicada por sua herança científica.

Mais uma distinção é oportuna e necessária: o positivismo jurídico é distinto do


positivismo puramente filosófico e ainda do positivismo ideológico, sendo somente o primeiro
objeto deste trabalho. O Positivismo Filosófico foi fundado e teorizado por Augusto Conte
(1798-1857), fundamentado em sua obra em seis volumes publicada de 1830 a 1842
denominada Curso de Filosofia Positiva. Os postulados filosóficos possuem como um dogma o
fundamento de só o sensível é objeto do conhecimento, só o sensível é real3, além de em
linhas gerais, classificar e hierarquizar as ciências, formular a teoria da Lei sociológica dos três
Estados (teológico, metafísico e positivo) e tardiamente um cunho acentuadamente místico;
resultado da debilidade mental de seu postulador, que já quando dos estudos filosóficos por
uma crise de loucura teve de interromper o curso de 1826 a 1829.

O positivismo ideológico sustenta que a justiça das normas se reduz ao fato de que
elas são fixadas por quem tem a força para fazê-las respeitar. Como dizia Hobbes: iustum quia
iustum. E ordenado por quem? Por quem tem a força. Portanto para o positivismo jurídico
ideológico, o “príncipe” o é criador da justiça4.

O empirismo moderno e a filosofia analítica foram, às vezes, designados também como


positivismo ideológico. O termo positivismo procede do tempo do antigo positivismo imanente
(E. Mach e os seus seguidores), segundo o qual a função científica consiste na descrição mais
exata possível do que é dado imediatamente. Os empiristas modernos não aceitam mais este
conceito pacificamente, tornando-se errôneo associar este pensamento com esta corrente
sendo mais apropriada à escola fenomenológica. Inegavelmente, este já é um emprego
equívoco do termo positivismo.

1.2 - HANS KELSEN: ABORDAGEM BIOGRÁFICA

Hans Kelsen nasceu em Praga, no ano de 1881. Lecionou na Universidade de Viena,


antes e depois da queda da dupla monarquia (Austro-Húngara), desde 1917 até 1930. Depois
dirigiu-se a Colônia onde permaneceu até 1933, quando, com o advento do governo nacional-
socialista na Alemanha foi expulso da Universidade. Foi então para Genebra e dali para os
Estados Unidos, onde lecionou nas Universidades de Harvard e Berkeley (Califórnia), desde
1940. Morreu em 19 de abril de 1973, depois de ter se aposentado como professor em 1952. A
Escola positivista do direito, a partir dos postulados de kelsen, deixou um legado de célebres
juristas como Robert Walter na Áustria, Norberto Bobbio na Itália, Ulrich Klug na Alemanha,
Roberto José Vernengo na Argentina, Fuller nos Estados Unidos.

Considerado um dos maiores pensadores do século XX, teórico do direito, filósofo e


sociólogo, teórico do Estado e iniciador da lógica jurídica, Kelsen deixou uma vasta obra, da
qual se destaca principalmente - por ser uma espécie de condensação de seus estudos a
respeito do direito - a Teoria Pura do Direito. Esse trabalho tem quatro edições fundamentais,
sendo na verdade quatro versões distintas da mesma obra. Reine Rechtslehre foi a primeira
edição alemã, publicada em 1934 na cidade de Viena. A segunda foi a inglesa, editada pela
Universidade de Harvard em 1945 com o nome de general Theory of Law and State (com
tradução portuguesa de Luís Carlos Borges). a terceira foi a edição francesa publicada na
Suiça em 1953, chamada Théorie Pure du Droit. A quarta e definitiva edição foi a chamada
segunda edição alemã de Reine Rechtslehre, editada em Viena no ano de 1960 e reimpressa
em 1967 (com tradução portuguesa de João Batista Machado). Hoje, considerando suas
impressões e reimpressões, livros e coletâneas de artigos, temos mais de 620 títulos.

Na realidade é notório que poderia se escrever muitas e minudentes páginas sobre


diferentes pontos da vida e da obra de Kelsen, até paradoxais visto que o autor com uma
autêntica conduta científica, reiteradas vezes mudou seus pontos de vista até mesmo sobre
pontos cérnicos de sua teoria5. Este que foi autor intelectual da Constituição Republicana
Austríaca e juiz durante 9 anos ( 1921-1930) da Corte Constitucional da Áustria, desde o
aparecimento de sua primeira obra Hauptprobleme der Staatsrechslehre, já dava mostras de
uma inteligência aguda e extremamente pragmática, característica de toda uma cerpa de
geniais pensadores alemães e austríacos de origem judaica - e por isso uma infância marcada
por experiências difíceis - que possuem em seu privilegiado bojo os nomes não menos
conhecidos de Sigmund Freud e Karl Marx.

Metodologicamente Kelsen é detalhista, minucioso, repetitivo, extraordinariamente


lógico. Foi um defensor da neutralidade científica aplicada à ciência jurídica. Sempre insistiu na
separação entre o ponto de vista moral e político. A ciência do Direito não caberia fazer
julgamentos morais nem avaliações políticas sobre o direito vigente 6. Com o objetivo de discutir
e propor os princípios e métodos à teoria jurídica - até então inexistentes - aliado à
necessidade de dar ao Direito uma autonomia científica própria, capaz de superar as confusões
metodológicas da livre interpretação do direito, uma tendência à um retorno aos parâmetros do
direito natural7 ou mesmo a aplicação de critérios de livre valoração, Kelsen propõe o que
denominou princípio da pureza.

O princípio da pureza aplica-se portanto tanto ao método como ao objeto do estudo, ou


seja é instituto instrumental e delimitador da ciência jurídica, significando que a premissa
básica desta é o enfoque normativo. O direito para o jurista deveria ser encarado como norma (
e não como fato social ou como valor trancedental). 8

1.3 - AS FONTES DO PENSAMENTO

De 1919 a 1929, Kelsen foi professor na Universidade de Viena, onde esteve em


estreito contato com os pensadores neopositivistas. A distinção que Kelsen faz entre juízo de
fato e juízo de valor deixa translúcido que além do denominado Círculo de Viena, juntamente
com Max Weber, possuiu uma influência muito grande de Emmanuel Kant. “ A ciência não está
em condições de pronunciar juízos de valor e, portanto, não está autorizada a isto. O que
também se aplica à ciência do direito, ainda que esta seja considerada como uma ciência de
valores. A exemplo de toda a ciência de valores, ela consiste no conhecimento dos valores,
mas não pode produzir esses valores; ela pode compreender as normas, mas não pode criá-
las.” 9

1.3.1 - A FILOSOFIA KANTIANA

1.3.1.1 - A FILOSOFIA TRANCEDENTAL

Embora seja do interesse direto deste trabalho somente o desenvolvimento da filosofia


prática Kantiana, especialmente o fundamento da validade e da moral do direito, bem como as
idéias referidas em sua À Paz Perpétua, far-se-á necessário uma dedicação resumida do
caminho percorrido por Kant na justificação da possibilidade da ciência , desenvolvido na
Crítica da Razão Pura, sem a qual importantes comentadores, como Delbos, afirmam não
poder ser possível a compreensão básica dos postulados, dado que nesta já estão presentes
os princípios de um sistema total e definitivo, capaz de compreender os dois objetos de toda a
filosofia: natureza e liberdade. 10

Para Kant, o conhecimento pressupõe a sensibilidade e o entendimento. A


sensibilidade dá o conteúdo que é submetido às categorias do entendimento. O conceito Puro
que tem origem só no entendimento sem a participação das intuições é chamado noção.
Quando esta noção se torna transcendente, ultrapassando toda a possibilidade de experiência,
tem-se a idéia ou conceito de razão. A idéia é portanto criada pela faculdade da razão, como o
conceito é produto do entendimento aliado à sensibilidade.

A razão no sentido prático é o conceito fundamental do sistema moral Kantiano. A


razão prática é aquela que não se preocupa em traduzir as leis dos fenômenos da natureza,
mas em representar as leis segundo as quais o ser racional, dotado de liberdade deve agir. No
dizer de um comentador: “...a razão prática é a faculdade que temos de agir por princípios ou
máximas, as quais somente tornam possível uma ação entendida como um acontecimento que
tem origem na vontade. Dizer que o homem tem vontade é dizer que ele pode representar-se
uma lei e agir de acordo com ela. Essa faculdade de determinar-se na ação segundo a
representação de certas leis, ou seja, segundo máximas é a que Kant chama razão prática ou
vontade. A razão teórica detecta as leis segundo as quais os objetos da natureza se
relacionam. A razão prática ou vontade representa, a si, leis, segundo as quais o ser racional
deve agir.” 11

Neste sentido, avança-se à dicotomia entre o ser e o dever ser, já abordada pelos
gregos, nascida do método Kantiano que divide o mundo em sensível e intelegível. No âmbito
do conhecimento, a sensibilidade e o entendimento é o que tornam possível a síntese (juízos
sintéticos), enquanto no mundo intelegível não podem oferecer qualquer contribuição, pois este
pertence à esfera dos fins. No âmbito do dever ser a razão é a faculdade criadora e não
apenas reguladora. Mas, o dever ser exige uma causa originária que lhe dê fundamento: a
liberdade.

Importante para a posterior aplicação à construção kelseniana é que kant quer criar
uma Ética universal, independente da experiência, pois, se “relativamente à natureza, a
experiência dá-nos regra e é a fonte da verdade; no que toca às leis morais a experiência é
(infelizmente) a madre da aparência e é altamente reprovável extrair as leis acerca do que
devo fazer daquilo que se faz ou querer reduzí-las ao que é feito.” 12

1.3.1.2 - A ÉTICA E O DIREITO EM KANT

A Ética, como a entende Kant, não pode ser empírica, isto é, não pode fundar-se em
princípios da experiência, mas apenas em princípios a priori. Os princípios éticos tem que ser
necessariamente universais: não são fundamentados na natureza mas sim nos princípios puros
da razão. Embora a máxima da ação seja subjetiva, a lei moral é objetiva. Os princípios morais,
já que não podem ser extraídos da natureza humana (da experiência), devem ser buscados a
priori, em conceitos puramente racionais. Pelo fato do homem ser racional conhece a lei moral
mas pelo fato dual de ser também sensível, não necessariamente obedece à lei moral por
causa de sua sensibilidade.

A razão impõe regras à ação humana através dos imperativos que podem ser
hipotéticos ou categóricos. Os hipotéticos representam a necessidade de uma ação possível
como meio de se alcançar um fim. Os categóricos mandam uma ação objetivamente, sendo
esta boa por si mesma. Kant se pergunta como são possíveis esses imperativos categóricos,
ou seja, como é possível ligar a vontade o ato a priori. A resposta à esta pergunta é a busca
pelo princípio supremo da moralidade, pelo fundamento de moralidade que na obordagem
kantiana é desenvolvida na Fundamentação da Metafísica dos Costumes.

O imperativo categórico é, pois uma proposição sintética a priori, na qual a conexão


acontece através da liberdade. Uma vontade pura só pode ser representada como legisladora
se puder ser contada como parte do mundo intelegível. Só a idéia de liberdade possibilita ligar
a vontade empírica (afetada pela sensibilidade), posto que somente sob a idéia de liberdade o
homem pode pensar-se agente.

O conceito de direito em Kant , no que se refere a uma obrigação a ele correspondente,


diz respeito somente a três aspectos: primeiro, à relação externa e prática de uma pessoa com
outra; segundo, não significa a relação do arbítrio de um com o desejo de outro, mas a relação
do arbítrio de um com o arbítrio de outro, terceiro, essa relação recíproca do arbítrio não diz
respeito à matéria do arbítrio ( por exemplo, não se pergunta se alguém pode beneficiar-se ou
não da mercadoria que me compra, mas questiona-se somente a forma na relação do arbítrio
de ambas as partes, à medida que se considera unicamente como livre a ação de um dos dois
que pode conciliar-se com a liberdade do outro segundo uma lei universal).

As normas exteriores só existem no Estado civil, ou seja, após a saída do homem do


estado de natureza e estabelecer o contrato social. 13 Há pois uma legislação interna (moral) e
uma legislação externa (jurídica). A liberdade interna gera a obrigação moral, e a liberdade
exteriorizada gera a obrigação jurídica, garantida por um sistema de coação, onde o legislador
figura como alguém que busca sistematizar e positivar os princípios das categorias a priori que
fundamentam o direito. Tratando da distinção entre legislação interna e externa, da qual
decorrem deveres internos e externos, afirma Bobbio: “Como deve ser entendido o uso que
Kant faz dos atributos interno e externo referentes à distinção entre moralidade e legalidade?
Deve-se entender, neste sentido: a ação legal é externa pelo fato de que a legislação jurídica,
dita portanto legislação externa, deseja unicamente uma adesão exterior às suas próprias leis;
ou seja, uma adesão que vale independentemente da pureza da intenção, com a qual a ação é
cumprida, enquanto a legislação moral, que é dita portanto, interna, deseja uma adesão íntima
às suas próprias leis, uma adesão dada com intenção pura, ou seja, com a convicção da
bondade daquela lei.” 14

1.3.2 - AS IDÉIAS NEOPOSITIVISTAS DO CÍRCULO DE VIENA

O neopositivismo é a filosofia do Círculo de Viena, que teve seu início quando o físico e
filósofo Moritz Schick (1882-1936) foi chamado por Kiel para a Universidade de Viena, a fim de
ocupar a cátedra de filosofia das ciências indutivas. Viena constituiria um terreno
particularmente adequado para o desenvolvimento das idéias neopositivistas, em virtude do
fato de que, durante a segunda metade do século XIX, o liberalismo (com o seu patrimônio de
idéias originado do iluminismo, do empirismo e do utilitarismo) representava a orientação
política predominante. Ademais, diferentemente da maioria das Universidades alemãs, a
Universidade de Viena se mantivera graças à influência da Igreja Católica, substancialmente
imune ao idealismo. Desse modo, foi a mentalidade escolástica, que preparou a base para a
abordagem lógica das questões filosóficas.

A subida de Hitler ao poder acarretou também o fim do Wiener Kreis. Alguns membros
do grupo (como Carnap, Feigl e outros) emigraram para os Estados Unidos, onde o seu
pensamento entrou em simbiose com as correntes empírico-pragmáticas da filosofia norte-
americana.

O núcleo básico da filosofia vienense é o princípio de verificação, segundo o qual só


tem sentido as proposições que podem ser verificadas empiricamente através do recurso aos
fatos da experiência. Foi com base nesse princípio que os neopositivistas decretaram a
insensatez de toda a afirmativa metafísica e teológica, sustentando, ademais, a redução das
normas éticas a um conjunto de emoções.

As teorias fundamentais, para uma compreensão suficiente da influência do Círculo de


Viena na obra de Hans Kelsen são a saber: “1) que o princípio de verificação constitui o critério
de distinção entre proposições sensatas e proposições insensatas, de modo que tal princípio
se configura como critério de significância que delimita a esfera da linguagem sensata da
linguagem sem sentido que leva à expressão o mundo das nossas emoções e dos nossos
medos; 2) que, com base nesse princípio, só tem sentido as proposições possíveis de
verificação empírica ou factual, vale dizer, as afirmações das ciências empíricas; 3) que a
matemática e a lógica, constituem somente conjunto de tautologias, convencionalmente
estipuladas e incapazes de dizer algo sobre o mundo; 4) que a metafísica, juntamente com a
ética e a religião, não sendo constituídas por conceitos e proposições factualmente verificáveis,
são um conjunto de questões aparentes (Sheinfragen) que se baseiam em pseudo conceitos
(Sheinbegriffe); 5) que o trabalho que resta ao filósofo sério é o da análise semântica (relação
entre linguagem e realidade à qual a linguagem se refere) e da sintática (relação dos sinais de
uma linguagem entre si) do único discurso significante, isto é, do discurso científico 15; 6) por
isso, a filosofia não é doutrina, mas sim atividade: atividade clarificadora da linguagem.” 16

II - A TEORIA DO JURÍDICA DE HANS KELSEN


Como observa Garcia Amado, os escritos de Kelsen seguiram uma evolução muito
grande, tamanha a extensão de sua obra, bem como a extensão temporal que abrangeu
(quase três séculos). Podemos apontar então, ainda segundo mesmo crítico e amparado na
divisão de Paulson, que a obra de Kelsen possui quatro momentos: 1) construtivista (até 1920);
2) neokantiana forte (até 1930); 3) neokantiana débil ou empirista (até 1960) e; 4) voluntarista
(depois de 1960).

Pode-se, para fins de sistematização dividir-se o pensamento kelseniano em estruturas


fundamentais, embora o pensamento como um todo tenha inter-relações de coordenação e
dependência. Os pontos desenvolvidos posteriormente neste capítulo visam apresentar uma
idéia geral do pensamento do autor ao mesmo tempo que servem para o embasamento da
proposta deste trabalho de uma forma específica, ou seja, o foco no ordenamento internacional
e a compreensão das Relações Internacionais aplicada à uma análise fático-histórica das
Estruturas Interestatais e Supranacionais num âmbito privilegiadamente jurídico.

Paralelamente, Kelsen distingue duas possibilidades de organização de sistema de


normas: relacionando-as a partir de seus conteúdos ou a partir das regras de competência e as
demais reguladoras da sua produção. No primeiro caso dá-se origem a um sistema estático, e
no segundo a um sistema dinâmico. Os temas abordados pela teoria estática do direito são,
nesse contexto, a sanção, o ilícito, o dever, a responsabilidade, direitos subjetivos, capacidade,
pessoa jurídica etc; os compreendidos na teoria dinâmica do direito são a validade, a unidade
lógica da ordem jurídica, o fundamento último do direito, as lacunas, etc.

2.1 - TEORIA DO ORDENAMENTO JURÍDICO

Para um estudo propedêutico do Ordenamento Jurídico em Hans Kelsen a distinção


entre norma jurídica (rechtsnorm) e proposição jurídica (rechtssatz) é fundamental. Na
realidade a distinção veio a sofrer um amadurecimento progressivo desde os primeiros escritos
sobre a Teoria Pura do Direito, em que Kelsen utiliza ambos os conceitos univocamente (ou
equivocadamente?). Primeiramente, a norma jurídica prescreve a sanção que se deve aplicar
contra os agentes de condutas ilícitas. A proposição jurídica, juízo hipotético, afirma que, dada
a conduta descrita na lei, deve ser aplicada a sanção também estipulada na lei. A forma de
exteriorização do enunciado, entretanto, não é essencial; o que importa, realmente, é o seu
sentido. A norma jurídica, editada pela autoridade, tem caráter prescritivo, enquanto a
proposição jurídica, emanada da doutrina, tem natureza descritiva. Aquela resulta de ato de
vontade (a autoridade com competência quer as coisas de certo modo) e esta última decorre
de ato de conhecimento (é verdade que a autoridade com competência quer as coisas de um
certo modo).

Outra distinção entre outras, algumas vezes herméticas sua compreensão, é a de que
a proposição jurídica descreve a norma jurídica. Desta forma, por exemplo, em 1940, ao editar
o Código Penal, o legislador enunciou que o homicídio deve ser punido com reclusão de seis a
vinte anos (art. 121). Desde então, em cada aula de Direito Penal, sobre os crimes contra a
vida, professores tem enunciado que o homicídio deve ser punido com reclusão de seis a vinte
anos. O primeiro enunciado prescreve condutas, deriva do exercício da competência legislativa
por quem o titulariza. O outro se limita a descrever o art. 121 do Código Penal, no contexto do
conhecimento da ordem jurídica em vigor no Brasil. Aquele é norma jurídica e este é
proposição correspondente.

A abordagem da sanção em Kelsen nos leva a dois conceitos. O primeiro é o que o


direito só pode ser entendido como uma ordem social coativa, impositiva de sanções 17. O
segundo é o que faz diferenciar a moral por si só do direito que é justamente a punibilidade
pela desobediência da norma escrita.

Para então, a partir de um conceito de norma em Hans Kelsen partirmos para uma
compreensão de do que seria um sistema de normas, torna-se necessária a conceptualização
clara do que é a norma hipotética fundamental. Qualquer sistema, enquanto conjunto
constituído por elementos constituintes, necessita de uma base e assim também ocorre com o
sistema legal de normas. Recorrendo-se à estrutura hierárquica das normas, não
necessariamente uma norma deve sustentar todas as outras mas necessariamente uma norma
deve dar validade e eficácia a todas as outras subseqüentes e neste raciocínio, posteriores.

A escola positivista, aprofundando os postulados modernos que acabam por inaugurar


a concepção do Estado de direito, costumam enfrentar a discussão sobre justamente o
fundamento da validade do direito. Neste sentido, a terminologia: norma, validade, norma
fundamental e sistema de normas são um conjunto de conceitos interdependentes que
necessitam para uma correta interpretação, ao contrário de vários estudiosos e doutrinadores,
serem estudados na medida de sua relação e inter-dependência no sistema. Para solucionar
tal dilema doutrinário, Kelsen intenta esforços de raciocínio para teorizar um fundamento de
validade da ordem jurídica enquanto sistema integrado, ao mesmo tempo, que não tenha sido
fruto do mesmo processo legislativo, de uma autoridade. É ao mesmo tempo, dada suas
devidas proporções, o Demiurgo platônico e o Motus Imobile de Aristóteles, que dão. Uma
norma não posta, mas suposta. 18 Nota-se portanto toda a influência nas formas a priori de
Kant, na busca de um fundamento, aqui não para a moral mas para a regra escrita, a
positivada.

Não é incomum encontrar quem confunda a norma fundamental com a Constituição, já


que desta Carta Magna, emanam a validade de todas as demais normas em um Estado
Moderno. Contudo, para Kelsen, e para o criterioso estudioso, a Constituição também deve
forçosamente pressupor a existência de uma norma fundamental anterior. Aqui é oportuno
reforçar-se a idéia do caráter hipotético da norma fundamental: não necessariamente esta
obedece à cadência lógica de uma linha histórica. Neste sentido, deveríamos remontar sempre
mais e mais nas positivações constitucionais. Ao mesmo tempo que, não trata-se de
anterioridade no tempo, não trata-se de embasamento político: à norma hipotética fundamental
não é o poder constituinte.

A Teoria do Estado por si não consegue responder o que em última análise o


fundamento do direito, abordando-o como um devir lógico-histórico das teorizações dos
modernistas e da divisão dos poderes. Nem a história, nem a filosofia e talvez a relegada ao
ostracismo metafísica tenha apenas traçado contornos de uma explicação racionalmente
convincente. A bem da realidade, em sua obra póstuma, Kelsen revê o caráter hipotético da
norma fundamental. Afirma-se tratar de uma ficção, no sentido de que contraria a realidade e é
contraditória em si mesma. De fato, a norma pensada pela ciência jurídica contradiz a realidade
normativa, já que não corresponde a nenhum concreto ato de vontade, não existe enquanto
norma. E se contradiz internamente, porque descreve a outorga de poder suprema, partindo de
uma autoridade ainda superior. A ficção, no entanto, a despeito de suas inerentes contradições,
é instrumento do saber limitado. 19

2.3.1 - ORDENAMENTO JURÍDICO: NACIONAL E INTERNACIONAL

Oportunamente escreve-se este subcapítulo, para a compreensão estruturada do


raciocínio, pois no III Capítulo se retomará de forma mais ampla e aprofundada o pensamento
Kelseniano acerca da ordem jurídica internacional e suas implicações políticas. Em primeiro
lugar, o ordenamento jurídico nacional e internacional não podem ser sistemas de normas
diferentes e mutuamente independentes se as normas de ambos os sistemas forem - em uma
possibilidade fático-jurídica - consideradas válidas para o mesmo espaço e ao mesmo tempo,
assim: “É impossível logicamente supor que normas simultaneamente válidas pertencem a
sistemas diferentes, mutuamente independentes”. 20

Em relação ao conflito de normas entre os ordenamentos jurídicos nacional e


internacional, Kelsen admite duas possibilidades. Numa concepção o Direito Internacional só
vale em face de um Estado quando é reconhecido por este, com base em sua Constituição, e
então a hipótese da norma fundamental permanece válida: “Se levamos também em
consideração a ordem jurídica internacional nas suas relações com as diferentes ordens
jurídicas dos Estados e se aceitamos - como frequentemente sucede - que o Direito
Internacional só vale - se é que vale - em face de um Estado quando é reconhecido por este,
isto é, pelo seu governo, com base na Constituição do Estado, então a resposta até aqui dada
à questão do fundamento da vigência do Direito - de que é uma norma fundamental
pressuposta referida a uma Constituição do Estado e eficaz - permanece válida.” 21
Kelsen defende que neste caso, o direito internacional é apenas parte integrante do
ordenamento jurídico estatal, como ocorre no direito constitucional brasileiro quando um tratado
internacional é acolhido no ordenamento interno como lei ordinária. A norma fundamental do
Estado é o fundamento de validade do direito internacional reconhecido.

A segunda posição exposta por Kelsen é a seguinte: “A situação modifica-se, porém,


quando se considera o Direito internacional, não como parte integrante da ordem jurídica do
Estado, mas como única ordem soberana, supra-ordenada a todas as ordens jurídicas estatais
e delimitando-as, umas em face das outras, nos respectivos domínios de validade, quando se
parte , não do primado da ordem jurídica do Estado, mas do primado da ordem jurídica
internacional.” 22

Na segunda hipótese, a do direito internacional como ordem jurídica soberana, o


fundamento de validade de uma ordem estatal não é mais uma norma fundamental
pressuposta, mas uma norma posta do direito internacional. Esta norma jurídico-positiva é
apenas o fundamento imediato de validade da ordem estatal e não seu fundamento último.
Kelsen admite portanto ter defendido que o fundamento de validade do direito internacional
encontra-se na regra pacta sunt servanda, mas reformula seu pensamento: ” Rejeito a teoria,
sufragada por muitos autores - e a princípio também por mim -, segundo a qual a norma pacta
sunt servanda deveria ser considerada como fundamento do Direito Internacional, pois ela só
pode manter-se com ajuda da ficção de que o costume dos Estados é um Tratado tácito” 23

A posição de Kelsen que pode ser tida como a definitiva é a expressa na segunda
edição alemã. Nesta, Kelsen afirma a liberdade de se escolher entre qualquer construção
monista. Em relação à norma fundamental, avança além da abordagem Constitucional
nacional: “Admitindo a primazia do Direito Internacional sobre o Direito nacional, o problema da
norma fundamental desloca-se da ordem jurídica nacional para a ordem jurídica internacional.
Então, a única norma fundamental verdadeira, uma norma que não é criada por um
procedimento jurídico, mas pressuposta pelo pensamento jurídico, é a norma fundamental do
direito internacional.” 24

2.4 - CRÍTICA

Primeiramente cabe acentuar que Kelsen está preocupado basicamente com o


conhecimento do direito e dos meios, cautelas e métodos a serem utilizados para assegurar-lhe
o estatuto científico. Suas lições são dirigidas especificadamente aos doutrinadores, aos
professores de matéria jurídica. “Nenhum juiz, assim como advogado ou legislador, pode ser
Kelseniano ou não. Isto simplesmente não tem sentido. Somente aos doutrinadores se pode
atribuir ou negar tal condição.” 25

Frise-se isto porque se é certo que Hans Kelsen é um autor que possui um sistema
hermético, baseado em sistemas filosóficos definidos. É desmedido afirmar que sua obra é
superada. Cometeríamos o mesmo erro se considerássemos a obra Aristotélica como separada
colocando os volumes da Física em um mesmo patamar da Ética à Nicômaco; ou seja, na obra
de Kelsen há o posicionamento pessoal que se qualifica por posturas que juridicamente não
apresentaram uma resposta social adequada em termos de eficiência de aplicação26 e há a
síntese jurídica insuperável se comparado a qualquer outro autor. A Teoria Pura do Direito é,
assim, o ápice da trajetória típica da modernidade, no sentido da tentativa de alicerçar na
ciência o conhecimento da organização da sociedade estabelecida através de normas; é por
isso que o sociólogo Boaventura Souza dos Santos o localiza no período do modernismo27, já
que é patente um medo de um contágio pela política, moral, ou cultura de massa ou popular.

Por ocasião dos 50 anos de Kelsen, foi publicada uma obra em homenagem ao autor,
contendo diversos ensaios de pensadores do mundo todo em que se pode refletir a importância
e reconhecimento ainda em vida: “Nesta coletânea, o coreano, Tomoo Otaka exigia que a
metodologia kelseniana devesse significar , no futuro (estávamos em 1931), a única forma
possível de conhecimento autônomo do direito. E o japonês Kisaburo Yokota, o mencionava,
ao lado de Stammler, como o mais significativo filósofo do direito da atualidade. O espanhol
Luiz Legaz y Lacambra afirmava, no mesmo livro, que o pensamento jurídico do século XX
teria de ser ‘um permanente diálogo com kelsen’ ”. 28

De fato, neste ano corrente, a revista Crítica Jurídica das Universidades de Sonora e
Nacional Autônoma do México, dedicou sua edição à Hans Kelsen, publicando inclusive um
texto inédito em língua espanhola sobre a norma fundamental o que proporcionou um crítica
mordaz do editor: “ (...) Esto desesperó a buena parte de los kelsenistas, apologetas del
Estado y el derecho, malos kelsenistas, por tanto, porque el sistema jurídico quedaba
suspendido de algo tan poco elegante o respetable, como una ficción”. 29

Pode-se afirmar, portanto que os mais modernos constitucionalistas e filósofos do


Direito fazem a sua crítica à uma visão positivista, atinente somente à norma escrita em
detrimento do todos os desvelados direitos sociais, difusos, fundamentais, garantidos por várias
Constituições - dentre elas a Brasileira - presentes contingentemente na common law de uma
forma mais profícua. Esta nova corrente de pensamento, cada vez mais espraiado na cerpa
jurídica afirma: “Não devemos dizer que se alguém violou a lei, por qualquer razão que seja e
por mais honrosos que sejam seus motivos, sempre deve ser punido porque lei é lei.” 30 Esta
vertente acaba por advertir: “ Creio que está errado ( referindo-se à abordagem positivista dos
tribunais), no fim, corrompe profundamente a idéia de Estado de Direito. O argumento que
exorto os alemães a adotar, de que o direito, bem compreendido, pode apoiar o que chamamos
de desobediência civil, só pode ser um argumento efetivo quando rejeitamos este aspecto do
positivismo e insistir em que, embora os tribunais possam ter a última palavra,(sic) esta não é,
por essa razão apenas, a palavra certa.” 31

O positivismo jurídico em certa acepção, dada a explicação da norma teorética


fundamental, anda de braços dados com o relativismo: na realidade como consequência da
moral apriorística de Kant, e de uma minudente abordagem e fragmentação da ciênca jurídica
em termos linguísticos, como entre norma e pressuposto jurídico, oriundos da influência do
Círculo de Viena. Certamente este relativismo que certamente não cabe à ciência e alhures à
ciência jurídica, pois se relativizamos os valores humanos, como poderemos conceituar e
distinguir o que é justo?

A bem da verdade, Kelsen, em sua última aula, em 17 de maio de 1952, quando deu
sua última aula em Berkeley, confessou em tons de mea culpa, que não havia respondido à
pergunta : o que é justiça? Disse ele: “A minha única desculpa é que, a esse respeito, estou em
ótima companhia: teria sido muita presunção fazer crer (...) que eu teria podido alcançar êxito
onde falharam os pensadores mais ilustres. Consequentemente, não sei e não posso dizer o
que é a justiça, aquela justiça absoluta que a humanidade procura. devo me contentar com
uma justiça relativa. Assim, posso dizer apenas o que é justiça para mim. Como a ciência é a
minha profissão e, portanto, a coisa mais importante de minha vida, a justiça é para mim
aquela ordenamento social sob cuja a proteção pode prosperar a busca da verdade. A minha
justiça é portanto a justiça da liberdade, a justiça da democracia, em suma, a justiça da
tolerância.” 32

Notas

1 A síntese escolástica e a tomista por excelência neste período, apresentam uma visão
bastante madura das diversas acepções do Direito, já não podendo se falar em Direito natural
puro: “ Existe em primer lugar la igualdad natural de las cosas, que basta para fundar una
relación de derecho y por conseguiente de justicia. Yo puedo, por ejemplo, dar tanto para
recibir otro tanto. Y esto es o que se lhama el “derecho natural”, expressión que significa
primeramente lo que es naturalmente justo y, en consecuencia, de derecho. Un caso
completamente diferente es aquél en el que hay igualdad, equivalencia, en virtud de una
conveción, , sea privada o publica.(...) Estas decisiones crean relaciones de equivalencia más
flexibles que las de la estricta igualdad natural; el derecho que se origina en virtud de tales
conveciones se denomina ‘derecho positivo’. Finalmente, ciertas nociones sobre la equidad
derivan tan evidentemente de las exigencias de la razón que se las encuentra casi en todas
sociedades humanas. Fórmase asi un derecho positivo común a todos los hombres, que se
chama derecho de gentes.” (Gilson, 1951, 425-426)
2 Reale e Antiseri, 1991, 909.
3 Franca, 1928, pg. 194
4 Há neste contexto uma dúplice interpretação: uma é a concepção teológica-metafísica de um
poder temporal atrelado à um desejo divino como é o caso das monarquias ainda que
parlamentares ou constitucionais vigentes nos países ainda que culturalmente privilegiados
(Inglaterra). A outra interpretação é o caráter passivo de dominação, não poucas vezes
sedimentado culturalmente em povos ou nações como assinala Maquiavel: “Entretanto, quando
as cidades ou as províncias estão habituadas a viver sob o mando de um príncipe e que a
linguagem deste desaparece, elas, em parte por terem sido educadas à obediência, noutra
parte (morto o antigo príncipe) por não lograrem um acordo na escolha de um novo, mostram
sua inépcia para viver em liberdade. Por consequência, demoram-se a pegar em armas: um
príncipe, dessarte, delas poderá com mais facilidade apoderar-se e nelas ascentar o seu
domínio ” (Maquiavel, 2001, 27-28)
5 Coelho, 1999, 20
6 idem, 17.
7 Acentua-se aqui a idéia vigente à época de outro grande jurista, Francesco Carnelutti, que
embasa irrefutavelmente o assinalado sobre a tendência ao retretorno da escola jurisnaturalista
: “ O mérito do positivismo, tanto no campo do direito como em outro qualquer, é, sobretudo,
metodológico. (...) Neste sentido, a positividade que se encontra no coração do positivismo
consolidou a base ao caráter natural do direito. E, se hoje a ciência do direito retorna serena,
ao direito natural, fá-lo com uma consciência muito mais profunda do que a que tinha antes de
cair no erro. (...) Embora a minha informaçào sobre este movimento (nota do autor: o
neopositivista) seja, sob o aspecto filosófico, bastante reduzida, arrisco-me a afirmar que
também ele não conseguirá destruir a convicção, hoje profundamente arreigada entre os
juristas, de que o direito positivo respira o direito natural, e que não poderia sobreviver se não o
respirasse; e que, por outro lado, ajudará a ampliar aquela base de observação dos dados,
sem a qual não poderá atingir-se o que está para além do direito, como para lá de todos os
fenômenos.” ( Carnelutti, 1956, 289)
8 idem, 15.
9 Reale e Antiseri, 1991, 910
10 Gomes, 2000, 47.
11 Gomes, 2000, 55.
12 Kant, pg. 312.
13 “Na Idade Média, floresceu a idéia de que a autoridade dos governantes se fundava num
contrato com os súditos: o pactum subjectionis. Por este pacto, o povo se sujeitava a obedecer
ao príncipe enquanto este se comprometia a governar com justiça (...) No século XVII, Hobbes,
no Leviatã, e Locke, no tratado do governo civil, desenvolveram a concepção de que a própria
sociedade se funda num pacto, num acordo ainda que tácito entre os homens. A mesma idéia
foi difundida por Russeaus às vésperas da revoluçào Francesa, no Contrato Social.” ( Ferreira,
1990, pg. 5-6)
14 Bobbio, 1995, pg. 56.
15 Aqui caberia oportunamente uma digressão sobre a Filosofia da Linguagem, principalmente
a do movimento de da chamada Cambridge-Oxford Philosophy, fazendo referência clara a seus
centros de excelência. O fechamento do Wiener Kreis, é algo quase desconhecido para o
moviemto analítico de Cambridge e Oxford, onde a investigação filosófica se desenvolveu em
torno de toda uma série de grandes temas, que vão da linguagem religiosa à linguagem
metafísica, da historiografia, da ética e da política à estética e à percepção.
16 Reale e Antiseri, 1991, 991.
17 Coelho, 1999, 45.
18 Coelho, 1999, pg. 29
19 Kelsen, 1986, Sergio Fabris, pg. 329 ( Coelho, 32)
20 Kelsen, 1998, pg. 516-517.
21 Kelsen, Teoria pura do Direito, pg. 232.
22 idem, pg. 232
23 idem, pg. 234, nr. 15
24 Kelsen, 1998, pg. 178.
25 Coelho, 1999, pg. 22.
26 Aqui podemos oportunamente apontar que o puro positivismo jurídico que aborda que se a
lei existe por si só já é eficaz e válida; não conseguiram na sociedade pós-moderna
globalizada, a lei escrita e o rigoroso e moroso processo legislativo acompanhar a rapidez das
movimentaçõees sócio-econômicas internacionais. A rapidez com que surgem fatos jurídicos,
não comporta um sistema solene de criação de leis para tutelá-los.
27 Santos, 1993, 88/89.
28 Coelho, 1999, 14.
29 Critica Jurídica, 2001, Presentación.
30 Dworkin, 2000, pg. 168.
31 idem, pg. 171.
32 Reale, Giovanni e Antiseri, Dario, 1991, pgs. 913-913.

Bibliografia

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