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Difundir a doutrina da Igreja sobre o fim último do homem, cuidando

especialmente da formação da consciência

Ao escrever-lhes, penso com alegria que a Igreja dedica o mês de novembro aos
seus filhos que já deixaram este mundo. Convida-nos a recorrer à intercessão
daqueles que já contemplam o Rosto de Deus - são bem-aventurados por causa
dessa visão e dessa alegria -, e recorda-nos o dever de oferecer sufrágios pelos que
se purificam no purgatório, antes de serem admitidos no Céu.
Com as celebrações litúrgicas dos dois primeiros dias deste mês, esta boa Mãe, a
Igreja, que sempre vela pelos seus, deseja chamar a nossa atenção mais uma vez
para o sentido último da nossa existência, que jamais devemos perder de vista:
estamos chamados a ser santos, isto é, identificar-nos eternamente com Deus,
participando da glória celestial. Se atingirmos esse fim, com a graça divina,
chegaremos à perfeição suma que o Senhor estabeleceu para nós; caso contrário,
os nossos anos terrenos perderiam todo o seu sentido: seriam um fracasso, um
enorme e definitivo fracasso. Porque, como afirma Jesus Cristo, de que serve ao
homem ganhar o mundo inteiro se vier a perder a sua alma?
Minhas filhas e meus filhos, todo o nosso apostolado resume-se em fazer ressoar
estas palavras nos ouvidos dos que convivem conosco, sem excluir ninguém. É uma
missão particularmente urgente nos nossos dias, porque muitos, embriagados pela
ânsia de um prazer temporal, agarram-se aos bens daqui de baixo e esquecem que
o nosso coração deve estar firmemente dirigido para o Céu: Afeiçoai-vos às coisas
lá do alto, e não às da terras.
Na sua recente Carta encíclica sobre algumas questões fundamentais do
ensinamento moral católico, o Romano Pontífice analisa profundamente a situação
atual da sociedade. Permitam-me uma digressão, que considero iniludível. Por meio
de vários canais, confirmaram-me como o Santo Padre, a Hierarquia, conta
esperançosamente com a luta pela santidade dos homens e das mulheres do Opus
Dei. Parece que o Senhor nos mostra claramente que estamos muito obrigados a
responder, a toda hora, com plenitude de entrega. Com essa manifestação de
confiança, pede-nos que revisemos a nossa entrega pessoal, a fim de arrancarmos
resolutamente qualquer sintoma de tibieza ou de aburguesamento. Assim,
examinemo-nos com delicadeza.
Como terão observado, nesse documento do seu Magistério o Papa sublinha o forte
contraste entre a aspiração à felicidade eterna, que se encontra em todo coração
humano, e a tendência de tantas almas de voltar-se apenas para as criaturas,
esquecendo-se do seu Criador. Não é a minha intenção glosar aqui essa Encíclica,
que todos nós, fiéis da Prelazia, devemos conhecer e meditar, mas valer-me do seu
conteúdo para expor alguns pontos de especial importância da nossa tarefa
apostólica.
Em primeiro lugar, reparem na pergunta do jovem rico do Evangelho, que o Santo
Padre comenta longamente: Que devo fazer para conseguir a vida eterna? O
Vigário de Cristo põe em evidência que se trata de uma pergunta essencial e
inescapável para a vida de todo homem, pois se refere ao bem moral que se deve
praticar e à vida eterna. Essa afirmação tem uma importância singular à hora do
apostolado, porque no coração de qualquer homem, de qualquer mulher, por muito
afastado de Deus que esteja, está presente - semeado ali pelo próprio Deus - um
profundo desejo de eternidade, que não é possível saciar aqui embaixo. Nessa
aspiração, constantemente alimentada pelos secretos e esplêndidos impulsos da
graça, sempre encontraremos um ponto de apoio para entusiasmar as almas, para
aproximá-las aos poucos - como que por um plano inclinado - da amizade com o
Senhor. Por vezes, o caminho será longo, mas devemos rejeitar as impaciências,
com a certeza de que Deus conta com a nossa colaboração - permeada de oração,
de bom exemplo, de palavras oportunas - para atrairmos os corações a Ele.
Por outro lado, não esqueçamos que, no momento atual - sem pessimismo -,
assistimos a um profundo obscurecimento dos espíritos, e que tem uma
manifestação clara: a ignorância, não só das verdades sobrenaturais, mas das
próprias verdades religiosas naturais, aquelas que a reta razão humana - sempre
sustentada por Deus - poderia chegar a conhecer por si mesma. Por isso, como é
atual o apostolado da doutrina! Como é necessário! Devemos sentir verdadeira
fome de propagar os ensinamentos do Magistério; agora, em concreto, esses
aspectos que o Santo Padre desenvolve na sua encíclica.
Como é tradição na Obra, em muitíssimos lugares serão organizados cursos e
palestras que sirvam de alto-falante para a doutrina do Romano Pontífice. É um
trabalho imprescindível; quanto mais pessoas participarem dessas reuniões, melhor
será. No entanto, não basta a doutrina para que as almas mudem. Requer-se que
cada um a interiorize, de modo que se conforme com esses critérios nos seus
pensamentos, juízos e decisões. É o que São Paulo nos lembra:
Não vos conformeis com este mundo, mas transformai-vos pela renovação do vosso
espírito, para que possais discernir qual é a vontade de Deus, o que é bom, o que
lhe agrada e o que é perfeito. É preciso que haja uma transformação radical no
modo próprio espírito da criatura humana, até que consiga da da fir completamente
com o desígnio divino que Jesus Cristo nos manifestou: Tende entre vós os mesmos
sentimentos que teve Cristo Jesus.
Nesta tarefa, tem um papel fundamental a formação da Consciência, que - como
lembra o Papa - deve ser arauto de Deus e como que o seu mensageiro no íntimo
de cada um, de modo a cumprir perfeitamente a sua missão de ser «testemunho do
próprio Deus, cuja voz e cuio juízo penetram na intimidade do homem até as raízes
da sua alma, convidando-o à obediência fortiter et suaviter, de modo forte e suave.
Na ausência de uma consciência reta e verdadeira, que acolha os impulsos do
Espírito Santo sem distorções nem interpretações subjetivas, não poderemos
conseguir uma vida interior firme nem iluminar o mundo com a luz de Cristo. Uma
pessoa com a consciência mal formada não pode ser apóstolo de forma alguma;
mais ainda, correria o perigo gravíssimo de tornar-se o pseudoapóstolo que nosso
Padre descreve em Forja, com todas as suas tristes consequências.
Minhas filhas e meus filhos, esmeremo-nos por ter uma consciência cada dia mais
reta, tirando proveito dos meios de formação que a Obra nos proporciona e pedindo
conselho sempre que for necessário. Ajudemos também os nossos amigos e
conhecidos. Ao longo do dia, surgem muitas ocasiões para que os ajudemos a
formar bem a sua consciência; basta abrir os olhos, basta termos a alma tensa,
ferida de amor a Deus, para detectar momentos em que convém que expliquemos
um critério de ação, que recomendemos a leitura de um bom livro, que ofereçamos
a sugestão oportuna..., sempre com afeto, com paciência, sem dar a impressão de
sermos os promotores da verdade, porque essa Verdade que nos preenche não é
nossa, mas de Deus, e o Senhor confiou-a à sua Igreja. Afinal, «é preciso educar,
dedicar a cada alma o tempo que seja necessário, com a paciência de um monge
medieval que enche de iluminuras, folha a folha, um códice; temos de ajudar as
pessoas a tornar-se maiores de idade, a formar a sua consciência, de maneira que
cada uma delas sinta a sua liberdade pessoal e a sua consequente
responsabilidade.
Na Encíclica, o Santo Padre refere-se a alguns pontos básicos do ensinamento
moral da Igreja, como a proibição, sempre e em todo momento, de realizar ações
intrinsecamente más. Embora essas exigências sejam de senso comum e estejam
claramente enunciadas nos Mandamentos da Lei de Deus, são muitas as pessoas
que as desconhecem. Sem esquecer a existência de casos em que uma
deformação tão grande da consciência encontra a sua origem numa vontade
desviada, que rejeita positivamente as normas ditadas por Deus, na grande maioria
dos casos essa deformação nutre-se de uma ignorância completa das verdades
morais fundamentais.
Essas pobres pessoas não encontraram ninguém que lhes mostrasse a verdade ou,
pior ainda, assimilaram ideias erradas. Só Deus conhece os corações. Por isso, o
nosso Fundador escreveu: No dia do juízo, serão muitas aImas que responderão a
Deus como respondeu o Paralítico na piscina - hominem non habeo, não houve
ninguém que me ajudasse -, ou como responderam aquele operários sem trabalho à
pergunta do dono da vinha. Nemo nos conduxit, não nos chamaram para trabalhar.
ainda que seus seus erros sejam culpáveis e a sua perseverança no mal seja
consciente, no fundo dessas almas há uma ignorância profunda, que só Deus
poderá medir.
Minha filha, meu filho, você compreende a importância do seu apostolado de
amizade e confidência? Você pode levar a luz de Cristo a tantas pessoas, de modo
que ilumine os olhos da sua alma e os abra às realidades perenes! Como eu lhes
recordava no início, pensem que em cada criatura humana, mesmo que esteja muito
mergulhada no erro, sempre se esconde pelo menos o rescaldo dessas verdades
naturais, que a graça está sempre pronta a reavivar servindo-se do exemplo singelo
de vocês, da sua palavra oportuna, do seu sorriso amigável. Você tem consciência
de que não pode ser apóstolo se não acudir aos diversos meios de formação da
Obra com fome de aprender? Está apenas fisicamente presente - seria uma grande
tristeza! -, ou luta para usar intensamente todas as suas potências e os seus
sentidos? Fomenta na sua alma o desejo constante de aprender para servir?
Para que esta grande aventura humana e sobrenatural da reevangelização da
sociedade, em que estamos empenhados junto com tantos outros cristãos, produza
os frutos que o Santo Padre espera, é imprescindível recorrer, cheios de confiança,
aos auxílios sobrenaturais: a oração, o sacrifício, a devoção à Santíssima Virgem, a
intercessão do nosso Padre. Neste mês de novembro, recorramos também às
benditas almas do purgatório e aos santos do Céu, unidos a nós pelos laços da
mesma comunhão em Cristo e no Espírito Santo. Deste modo, a Igreja, nos seus
três estados ou situações - triunfante, padecente e militante -, cumprirá a missão
que o Senhor lhe confiou para a salvação de toda a terra.

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