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Dificuldades de Aprendizagem - Simaia Sampaio
Dificuldades de Aprendizagem - Simaia Sampaio
Este livro foi revisado por duplo parecer, mas a editora tem a política de reservar a
privacidade.
Inclui bibliografia
ISBN 978-85-7854-025-8
2019
Direitos desta edição reservados à Wak Editora Proibida a reprodução
total e parcial.
WAK EDITORA
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Tels.: (21) 3208-6095, 3208-6113 e 3208-3918
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Maia e Eunice, meus pais, pelo carinho, amor e dedicação de
sempre.
A escola:
Refletindo sobre o comportamento de professores e alunos em sala
de aula
Importância do reconhecimento das etapas do
desenvolvimento cognitivo em sala de aula
Período sensório-motor:
Período pré-operatório:
Período operatório concreto:
Período operatório formal/abstrato ou hipotético dedutivo
Enganar a quem?
Estimulando o raciocínio
Modalidades de aprendizagem do sujeito
Noção de tarefa
Repensando a metodologia em sala de aula
Comunicação em sala de aula
Aprimorando o olhar em sala de aula
A família:
Primeiras aprendizagens no âmbito familiar
Detectando problemas
Sintoma
Superproteção
Negligência ou desinformação?
Afetividade em equilíbrio
Insegurança da família em relação à escola
O sujeito:
Diferenciando transtornos de aprendizagem e problemas de
aprendizagem
TDAH – Transtorno do Deficit de Atenção e Hiperatividade
Dislexia ou má alfabetização?
Discalculia1 ou aversão à Matemática?
Disgrafia
Disortografia
Considerações finais
Referências
Nesta obra, você, leitor ou leitora, terá a oportunidade de
ampliar sua percepção acerca da Psicopedagogia, mediante a reflexão
dos múltiplos fatores que interferem no processo de aprendizagem e
de transformação do sujeito em todas as suas dimensões humanas.
Demonstrando bastante clareza, coerência e conhecimento
teórico em suas argumentações, Simaia Sampaio consegue construir
a ponte entre a teoria do desenvolvimento e a difícil prática
educativa, elo este que pode favorecer uma melhor compreensão do
tão complexo triângulo sujeito/família/escola e de suas relações
estruturais.
Para isso, a autora realiza uma concisa e oportuna retomada da
caminhada histórica da Psicopedagogia, caracterizando seu objeto de
estudo e o processo de aprendizagem, sob o enfoque da
epistemologia convergente, da visão sintomática familiar, da
instituição escolar e da dificuldade de aprendizagem, utilizando-se,
com maestria, de pressupostos teóricos que integram os contextos
socioafetivos, culturais e cognitivos.
Revendo o próprio desenvolvimento do processo educacional,
Sampaio trilha caminhos da história da Psicopedagogia, como sendo
uma ciência auxiliadora na compreensão dos processos pedagógicos
e psicológicos da educação.
A Psicopedagogia, hoje, é uma área que estuda e lida com o
processo de aprendizagem e suas dificuldades, e que, em sua ação
profissional, deve englobar vários campos de conhecimento,
integrando-os e sistematizando-os.
Os modelos teórico e prático resultantes desta visão são
fortemente influenciados pelos modelos europeu, argentino e norte-
americano. O movimento europeu acabou por originar a
Psicopedagogia, ao passo que o movimento americano proliferou a
crença de que os problemas de aprendizagem possuíam causas orgâ-
nicas e precisavam de atendimento especializado, influenciando parte
do movimento da Psicologia Escolar que, segundo Bossa (1994),
determinou a forma de tratamento dada ao fracasso escolar.
O passado e o presente da Psicopedagogia, apontados
brilhantemente por Sampaio neste livro, são válidos para ressaltar a
trajetória da educação ao longo dos séculos. É necessário que
fiquemos atentos a alguns aspectos que surgem na tentativa de
entendermos os processos educacionais, desde a Idade Média até a
modernidade.
Neste contexto histórico, surge a educação sistematizada. Os
jovens são afastados de suas famílias, para aprenderem com outros
adultos, seguindo metodologias e currículos comuns. Este novo
método de ensino trouxe consigo uma nova situação. Ao estarem os
alunos juntos, com os mesmos professores e aprendendo as mesmas
coisas, percebe-se que nem todos aprendem com a mesma rapidez.
As dificuldades de aprendizagem passaram a ser foco de
atenção, e a Medicina começou a estudar a causa desses problemas e
suas possíveis correções. No final do século XIX, educadores,
psiquiatras e neuropsiquiatras começaram a se preocupar com os
aspectos que interferiam na aprendizagem e a organizar métodos
para a educação.
Segundo a autora, a Psicopedagogia, na atualidade, é marcada
pela multiplicidade de pesquisas, muitas delas de cunho
interdisciplinar, sobre o fracasso escolar. Estes estudos não negam a
importância dos fatores não só orgânicos, mas abrem um leque de
responsabilidades intraescolares, compartilhadas entre o sujeito
aprendiz, a família e o meio social em que estão inseridos.
Simaia Sampaio nos convida a estabelecermos a distinção entre
fracasso escolar e dificuldade de aprendizagem. Esta é de ordem
mais subjetiva e individual – geralmente há algum tipo de deficiência
ou necessidade educacional específica, que compromete o
desempenho na escola e pode causar fracasso escolar; já aquele é a
conjunção de fatores que, em um determinado momento, interagem,
mobilizando o desempenho do sujeito e do sistema
familiar/escolar/social ao qual está integrado.
Como falar de Psicopedagogia é falar de aprendizagem, do que
ela é e como se processa na visão psicopedagógica, a autora se refere
a algumas questões, considerando teorias importantes.
Para Jorge Visca, a aprendizagem representa uma construção
intrapsíquica, considerando os componentes genéticos e as
diferenças advindas da evolução da espécie, resultantes das
precondições biológicas, das condições energético-estruturais
(condições afetivas) e das circunstâncias do meio, ou seja, todos os
aspectos do ser humano, convergindo para um único ponto, que é a
aprendizagem.
Piaget deixa claro que sua teoria encontra-se na introspecção da
criança (a natureza do seu pensamento e os seus estágios de
desenvolvimento). Segundo as teorias piagetianas, importa saber
como a criança pensa e que mudanças ocorrem no seu pensamento
em diferentes estágios. Contudo, o interesse principal de Piaget não
estava na criança em si, mas na epistemologia, ou seja, sua busca
girava em torno da descoberta do que é o conhecimento e das
formas por meio das quais se pode chegar a ele.
Para Piaget, o objeto de conhecimento não está no sujeito nem
no meio físico social, mas sim no espaço de troca. A interação é igual
à troca e não à inter-relação, como é para Vygotsky.
Para este, viver em sociedade é essencial à transformação do
homem de um ser biológico para um ser humano, e é por meio da
aprendizagem com as relações experimentadas que se constroem os
conhecimentos que vão permitir o seu desenvolvimento mental
(interação ser humano – ambiente físico social).
A Psicanálise também aborda questões investigativas do
desenvolvimento humano. Apesar de Freud estar interessado em
livrar as pessoas das neuroses, ele gostava de pensar nos
determinados fatores que levam alguém a ser um “desejante do
saber”.
Articulando as contribuições das teorias de Pichon Riviére
(Psicologia social), dentre outros, esses teóricos concordam que o
desenvolvimento e a aprendizagem não são resultados apenas do
meio externo nem somente das capacidades inatas do ser humano,
mas fruto das intera- ções homem – mundo.
Esses autores contribuíram de forma fundamental para uma
educação na qual a realidade seja tomada como história, portanto
mutável na história.
A partir de uma contextualização a respeito da interação
sujeito/família/escola e das contribuições da Psicopedagogia, a
autora defende que o profissional desta área deve estar envolvido
diretamente com a relação entre família e escola, de modo que
compreenda a existência do sujeito vinculada às relações que este
estabelece com as instituições a que pertence.
Pensar a família e a escola requer do psicopedagogo uma
inserção em diversos e diferentes sistemas. A Psicopedagogia, ao
considerar o processo de aprendizagem como resultante da
construção que envolve as relações do sujeito aprendente nos vários
contextos em que está inserido, não pode deixar de se preocupar
com o processo relacional que se estabelece entre a escola e a família.
A “patologia do aprender” não pode ser compreendida como
uma “falta” individual, mas como uma confluência de fatores que
envolvem o tripé sujeito/ família/escola, estabelecendo uma rede
ampla de relações sociais.
Fazem parte do desenvolvimento das relações familiares as
expectativas que vão surgindo a partir da construção das redes
sociais que se estabelecem no seu ciclo vital. No momento em que a
família tenta dar conta deste ciclo, pode ocorrer o que chamamos de
sintomas. A autora aborda os sintomas diante das necessidades de
adaptação e manutenção do sistema, o que pode levar ao
aparecimento de obstáculos que impedem a família de obter avanços
no desenvolvimento de suas relações. O sintoma, portanto, pode
surgir a partir das resistências da família em enfrentar momentos de
transição e serve de alerta para que esta elabore uma mudança de
forma mais gradual.
Quando o sintoma vem descrito a partir das dificuldades de
aprendizagem, a família encontra uma maneira de evitar a mudança e
manter o equilíbrio da forma rígida, colocando o problema no
sujeito portador do sintoma, ou seja, o filho não aprende porque é
desatento etc. A dificuldade de aprendizagem pode caracterizar-se
como sintoma que emerge em uma situação na família ou na escola.
Partindo desses pressupostos, Sampaio convida a refletirmos
um pouco sobre essa relação tão conflituosa entre esses dois
importantes âmbitos sociais.
Não é de hoje que a escola vem adquirindo um status de
sociabilizadora e responsável por grande parte do desenvolvimento e
aquisição de condutas e atitudes necessárias à sobrevivência social do
sujeito.
Por outro lado, o desenvolvimento de um comportamento
social adequado não é mais objetivo somente da família, apesar de
percebermos que a família tem requisitado da escola uma
responsabilidade que vai além do objetivo escolar.
Desta forma, muitas vezes, a relação entre escola e família vem
sendo prejudicada, pois estas duas instituições não convergem para
um contexto que prepare o sujeito para a vida. Família e escola,
quanto mais se diferenciam, mais necessitam uma da outra.
Sendo assim, o psicopedagogo tem a difícil tarefa de avaliar a
adequação das estruturas sociais e o funcionamento dessa complexa
rede de relações, a fim de melhor intervir nos processos de
aprendizagem. Saber entender as relações entre
sujeito/família/escola é, pois, um pré-requisito importante para uma
visão preventiva e terapêutica das dificuldades que se interpõem nos
processos do aprender.
Período sensório-motor:
Período pré-operatório:
Visca (1991, p. 48) explica que, no nível da inteligência pré-
operatória, já existe uma representação ou simbolização. A mera
ação motriz própria da etapa anterior interioriza-se e se transforma
em pensamento. Há neste estágio uma distinção entre significante
(imita- ção, desenho, imagem mental, jogo, palavra) e significado
(situação evocada, objeto representado). Este pensamento ainda
carece da organização dos objetos em categorias lógicas gerais. Por
exemplo: o termo flor representa o elemento da classe que é familiar
à criança (flor do jardim da escola), e não a classe a que pertence a
flor; não há reversibilidade.
Até os dois anos, o desenvolvimento é centrado na própria
criança, mas, a partir dos dois anos, a criança se volta para a
realidade exterior, tentando descobri-la e, por isso, é chamado de
estádio objetivo. É também chamado de período simbólico, pois
instala-se a representa- ção mental, conforme afirma Goulart (2007,
p. 54).
Esta representação mental, a partir dos 18 meses, permite à
criança reconstituir ações passadas por meio de narrativas, de
representar cenas assistidas por meio do jogo simbólico ou mímica.
Neste período, a criança ainda não se coloca segundo o ponto
de vista do outro, existindo o egocentrismo infantil. Para a criança,
só existe seu ponto de vista, não considerando que outras pessoas
também possuem seus próprios pontos de vista.
Neste período, o pensamento egocêntrico da criança é
caracterizado pelo animismo (quando a criança atribui vida (animal)
a todos os seres, inclusive os inanimados – por exemplo: bater a
cabeça na parede, a parede é má), artificialismo (quando atribui uma
origem artesanal humana a todas as coisas – por exemplo: pensar que
uma montanha foi feita por um homem que juntou um monte de
terra) e o finalismo (a criança pensa que todos os seres e os objetos
têm a finalidade de servi-la – por exemplo: quando perguntamos
para que serve o bolo, ela responde: É para “mim” comer, e para que
serve a cadeira, ela diz: É para “mim” sentar).
A criança pré-operatória é incapaz de descentrar o pensamento,
ou seja, centra a atenção em apenas um traço. Não é capaz de
acompanhar as transformações, sendo seu pensamento dito estático.
Na prova operatória de conservação de matéria, quando
inicialmente a criança faz duas bolas e verifica que possui a mesma
quantidade de massa e, quando uma delas é transformada em
salsicha, ela não é capaz de responder que a salsicha tem a mesma
quantidade que a outra bola porque não percebe que apenas mudou
a forma (argumento de compensação) ou que não tirou nem colocou
nada (argumento de identidade) ou que tem a mesma quantidade
porque antes era bola (argumento de reversibilidade), ou seja, a
criança fixa no produto final (forma da salsicha) como se não tivesse
acompanhado o processo de transformação. Em seu pensamento,
não existe ainda a reversibilidade, não consegue ainda entender como
esta salsicha poderá ser transformada novamente em bola e não
existe a conservação, não entende que independentemente da forma
a quantidade não se altera.
Entre cinco anos e meio e sete anos, a criança já começa a dar
respostas intermediárias, algumas conservativas outras não. Se tudo
correr bem, aos sete anos, ela já estará no período operatório
concreto.
Se a criança possui uma defasagem cognitiva encontrando-se
neste período quando já deveria estar em uma etapa posterior, será
difícil resolver problemas matemáticos, interpretação de texto,
entender o conteúdo próprio da idade.
Seber (p. 195, 1995) cita os manuais que são utilizados por
alguns professores na pré-escola, que têm como objetivo trabalhar a
noção espacial da criança, como fazer cruz embaixo do objeto que é
alto ou baixo, gordo ou magro, leve ou pesado. Mas a criança pré-
escolar ainda não raciocina relativamente, pensando que um objeto é,
ao mesmo tempo, alto e baixo em relação a outro objeto, que um
animal é, ao mesmo tempo, gordo e magro em relação a outro. “Por
desconhecerem essa etapa do raciocínio infantil, as atividades
sugeridas em vários manuais pré-escolares são orientadas no sentido
de treino de noções que expressam relatividade”.
Os conceitos são ensinados de forma absoluta: ou algo é
grande, ou pequeno; ou maior ou menor, e a criança não é
estimulada a pensar concretamente, para atingir a relatividade.
Para que a criança entenda esta relatividade, ela precisa agir
sobre os objetos e se colocar em relação ao outro. Quando
colocamos uma criança entre duas outras, ela pode perceber que é
mais alta que fulana e mais baixa que beltrana, e que, portanto, pode
ser ao mesmo tempo alta e baixa. Algumas crianças ainda não
conseguem entender que são filhos, irmãos, netos e primos ao
mesmo tempo. A criança irá alcançar a relatividade gradativamente,
ordenando objetos, como barras de madeira, recortes coloridos etc.
Atividades como estas possibilitarão o sucesso da seriação.
Enganar a quem?
Uma estudante de Pedagogia, que fazia estágio em uma escola
pública, verificou que a didática e os recursos utilizados pela
professora eram ainda bastante tradicionais. A escola já se dizia
construtivista, mas a professora não seguia as orientações por ainda
acreditar na aprendizagem pela repetição. Deste fato, nem a
coordenação da escola nem a direção tinham conhecimento.
E assim, os alunos continuam reproduzindo informações,
decoradas, “que não se constituem em uma produção do saber, em
uma construção real do conhecimento como diz Piaget, de uma
atividade que deveria despender do sujeito para organizar seu
cognitivo”. (FERNÁNDEZ, 1991)
Posso pensar que uns 50% das consultas podem ser atribuídas a uma causa que não é
sintomática de uma família e de um sujeito, mas de uma instituição socioeducativa,
que expulsa o aprendente e promove o repetente em suas vertentes (exitoso e
fracassante).
Há um repetente exitoso (que não se preocupa nem se chamam de repetente): é o
que se acomoda ao sistema, imita, não repete o ano, mas repete textos de outros,
repete consignas, submete-se, não pensa, mas triunfa porque repete o que os outros
querem. A este repetente ninguém encaminha à Psicopedagogia, ainda que devesse
estar em nossos principais objetivos de trabalho preventivo.
Há outro, a que se chama repetente por repetir de ano. O fracasso na escolarização
da maioria deles é um problema reativo a um sistema que não os aceitam, que não
reconhece seu saber e os obriga a acumular conhecimentos. (Id. Ibid, p. 88)
Estimulando o raciocínio
Noção de tarefa
Detectando problemas
Sintoma
Superproteção
Negligência ou desinformação?
Afetividade em equilíbrio
A falta de afeto dentro das famílias vem sendo cada vez mais
revelada. Certo pai me disse que não abraçava seus três filhos,
porque não teve o amor dos seus pais e, consequentemente, não
conseguia agir de outra forma. No diagnóstico, o filho, pré-
adolescente, demonstrou enorme carência afetiva e baixa autoestima.
O pai, até então, não havia enxergado isto como prejudicial ao seu
filho, tampouco imaginava que poderia estar influenciando,
negativamente, seu rendimento escolar. Foi preciso que alguém de
fora sinalizasse tal dinâmica, para o pai perceber que deveria mudar.
Piaget diz:
Em um primeiro sentido, pode-se dizer que a afetividade intervém nas operações da
inteligência; que ela estimula ou perturba; que ela é causa de acelerações ou de atraso
no desenvolvimento intelectual; mas que ela não será capaz de modificar as estruturas
da inteligência enquanto tal... Em um segundo sentido, pode-se dizer, ao contrário,
que a afetividade intervém nas estruturas da inteligência; que ela é fonte de
conhecimentos e de operações cognitivas originais. Numerosos autores têm
sustentado este ponto de vista (...); e a continuação cita os nomes de Wallom, Malrieu,
Ribot e Perelman. (apud LAJONQUIÈRE, 2002, p. 128)
Diferenciando transtornos de
aprendizagem e problemas de
aprendizagem
Dificuldades, problemas e transtornos de aprendizagem ainda
são temas que causam controvérsias, e delimitações ainda estão
sendo feitas neste sentido.
Taya (2003) define o transtorno de aprendizagem “como uma
disfunção neuropsicológica – problemas que impedem o
funcionamento integrado do cérebro em desenvolvimento”. Trata-se,
pois, de um problema de maturação, e no desenvolvimento
neuropsicológico.
Transtorno de aprendizagem ou dificuldade de aprendizagem
específica (learning disabilities) se define como “um transtorno em um
ou mais dos processos psicológicos básicos implicados na
compreensão ou no uso da linguagem falada ou escrita, que pode se
manifestar em uma habilidade imperfeita para escutar, falar, ler,
escrever, soletrar ou fazer cálculos matemáticos”, de acordo com a
oitava definição, criada em 1977, nos Estados Unidos e registrada
oficialmente em 1986 (Id. Ibid.). Encontramos entre os transtornos de
aprendizagem as dislalias, disfasias, dislexias, disgrafias, discalculias,
transtorno não verbal do aprendizado.
Os problemas de aprendizagem podem se apresentar em razão
de uma metodologia inadequada, método de alfabetização
inadequado, privação cultural e econômica, má-formação docente,
falta de planejamento das atividades, desconhecimento da realidade
cognitiva dos alunos. Desta forma, não existe uma adaptação
curricular à realidade socioeconômica do aluno.
Conforme Taya, os problemas de aprendizagem também podem
se apresentar como fatores secundários, em função:
• da depressão;
• de um Transtorno do Deficit de Atenção (TDAH);
• de deficiência mental;
• de transtornos da conduta;
• do deficit cultural;
• de problemas neurológicos;
• de deficiência sensorial.
Para traçar um perfil dos sujeitos com problemas de
aprendizagem, Sisto cita uma pesquisa do Departamento de Saúde
Mental do Texas, que demonstra as seguintes características: falhas na
escola, certa desorientação e deficiências em leitura e linguagem,
maior imaturidade do que sujeitos com desempenhos normais,
desenvolvimento social e intelectual inferior ao esperado para a
idade. Expõe, ainda, que “estas crianças vivem em ambientes com
regras rígidas e inflexíveis e que geralmente são desajeitadas,
desastradas e têm dificuldades de entender o conceito de tempo e
referências de espaço”. (SISTO, 2004, p. 107)
Muitos são os distúrbios atribuídos à criança que apresenta
algum problema na aprendizagem. Entre os mais citados no
ambiente escolar estão o TDAH (Transtorno do Deficit de Atenção
com ou sem Hiperatividade) e a dislexia. Iniciaremos falando sobre
aquele que, hoje, é apontado como um dos mais trabalhosos, para se
lidar em sala de aula, em casa e em locais públicos pela própria
inquietação, agitação, impulsividade e dificuldade de concentração –
o TDAH. Faremos uma abordagem deste transtorno como
consequência do não desenvolvimento da fala privada ou
egocêntrica, que seria responsável pela autorregulação do
comportamento. Depois falaremos sobre a dislexia, a discalculia, a
disgrafia, a disortografia de maneira breve, a fim de transmitir
algumas orientações aos pais e demais profissionais da educação.
Dislexia ou má alfabetização?
Disgrafia
• lentidão na escrita;
• letra ilegível;
• escrita desorganizada;
• traços irregulares: ou muito fortes, chegando a marcar o
papel, ou muito leves;
• desorganização geral na folha de escrita, por não possuir
orientação espacial;
• desorganização do texto, pois não observam a margem,
parando muito antes ou ultrapassando-a (de modo que se
amontoem letras na borda da folha);
• desorganização: letras retocadas, hastes malfeitas e
atrofiadas, omissão de letras, palavras e números, formas
distorcidas, movimentos contrários à escrita (um S ao invés do
5, por exemplo);
• as letras, em geral, são escritas no sentido contrário. Nos
casos de a, o, d, são escritas no sentido horário, ao invés do
sentido anti-horário. Habitualmente, os números são escritos de
baixo para cima;
• desorganização das formas: letras de tamanho muito
pequeno ou muito grande, escrita alongada ou comprida;
• o espaço que dá entre linhas, palavras e letras são
irregulares;
• liga as letras de forma inadequada;
• podem-se apresentar baixa autoestima e rejeição pela
aprendizagem, como consequência da disgrafia;
• escrita em espelho – pode acontecer quando há problema
fonológico.
Orientações:
Disortografia
Orientações:
1 Este artigo (de minha autoria) foi publicado na revista ABC Educatio nº 50 – outubro/05
2 Muitas crianças confundem inclusive maior-menor, mais-menos, igual-diferente,
acarretando erros que poderão ser melhorados com a ajuda de um professor mais atento.
3 Os jogos boole poderão ser encontrados no site: http://www.jogosboole.com.br
A família tem um importante papel no desenvolvimento do
sujeito, principalmente no que diz respeito à afetividade, condição
necessária ao crescimento integral da criança. A família que oferece
um ambiente livre de críticas, ameaças e exigências (que
correspondem aos desejos dos pais) estará proporcionando um bom
equilíbrio à criança e estabelecendo uma base firme, ajudando-a a
lidar com frustrações, fracassos, sucessos, mudanças, perdas.
Crianças e adolescentes que não conseguem conviver com perdas e
fracassos podem apresentar comportamentos agressivos, violentos,
recorrerem às drogas, dispersam-se facilmente, isolamse e,
consequentemente, têm um baixo rendimento escolar. Se formos
investigar a origem disso tudo, encontraremos, lá atrás, na infância,
situações que deveriam ter sido evitadas, e não foram.
Após o diagnóstico, o psicopedagogo acaba verificando que tão
importante quanto oferecer um tratamento psicopedagógico é a
orientação que se deve dar à família, e esta, em muitos casos, deve,
também, ser tratada com terapia. O sucesso no tratamento
psicopedagógico depende da colaboração da família, que precisa
modificar seu comportamento em relação ao sujeito, principalmente
no que diz respeito à atenção, ao afeto e à imposição de limites, se
for o caso.
Se pensarmos em crianças com problemas de aprendizagem
como aquelas que são influenciadas negativamente, por algum fator
externo, chegaremos à conclusão que alguma situação, em seu meio,
contribuiu para um prejuízo neste sentido.
A escola tem um importante papel, devendo proporcionar um
ambiente que trabalhe a autoestima, o respeito pelas diferenças, a
autoconfiança, a aceitação do erro como condição normal à
aprendizagem. Estimular a curiosidade, ouvir as crianças naquilo que
elas desejam saber e incorporar estes desejos ao currículo, realizar
projetos que possam trazer assuntos, para serem incorporados à
realidade do aluno são atitudes que ajudarão o aluno a compreender
melhor os temas abordados, fazendo sentido para sua aprendizagem.
O psicopedagogo que trata a criança poderá estar contribuindo
com a escola, propondo mudanças necessárias no currículo, na
prática pedagógica ou mesmo na avaliação, para que o tratamento
clínico tenha melhor resultado. Não é raro o psicopedagogo
encontrar barreiras na escola, impedindo que a situação seja
modificada. Algumas escolas são tão fechadas, que não admitem e
não assumem erros, e, desta forma, uma possível ajuda fica
praticamente inviabilizada. É importante que não só o professor mas
também os demais funcionários da escola se coloquem como seres
passíveis de erro, sabendo reconhecê-los, para que as devidas
modificações sejam feitas, visando ao desenvolvimento integral do
sujeito.
Trabalhar com a inclusão é algo urgente e indispensável. Não
me refiro apenas às crianças com síndrome de Down (ou outros
tipos de retardo), mas também a crianças com problemas de
aprendizagem, que muitas vezes são rotuladas de preguiçosas e
desligadas, quando, na realidade, são vítimas de situações que não
dependeram delas. Embora a inclusão e a avaliação não estejam entre
os objetos específicos do presente trabalho, são questões que devem
ser encaradas com muita seriedade pelas escolas. Como as escolas
estão cuidando, hoje, da avaliação de uma criança com transtornos
ou problemas do aprendizado? Estão as escolas, realmente, sabendo
lidar com a inclusão em sala de aula (nos casos necessários), ou
fingindo se adequar à lei da inclusão, para que não sejam excluídas
da comunidade? Com a palavra, a educação formal!
ANDRADE, Márcia Siqueira de. Psicopedagogia clínica: manual de
aplicação prática para diagnóstico de distúrbios do aprendizado. São
Paulo: Póluss, 1998.