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Os Encontros de Jesus Ao Longo Do Caminho
Os Encontros de Jesus Ao Longo Do Caminho
A moldura é solene. Jesus ergue os olhos para a comunidade dos discípulos que se
encontra reunida. Destacando, no sumário inicial, a presença de um “numeroso grupo
de discípulos” e de uma “imensa multidão de pessoas de toda a Judéia, e do litoral de
Tiro e de Sidônia”, isto é, de ouvintes que vêm não só do território da Palestina, mas
também do estrangeiro, o autor declara que o ensino de Jesus tem caráter universal e é
destinado a todos (5,17). A importância do anúncio é realçada pela insistência da
necessidade da escuta: as multidões vêm para escutar Jesus (6,18); o próprio Jesus
exorta os discípulos a escutar: “Digo a vós que me escutais” (v. 27), e conclui seu
discurso dizendo: “todo o que vem a mim, escuta as minhas palavras e as põe em
prática” (v. 47). É preciso, portanto, abrir os ouvidos para compreender a mudança
radical que Deus atua no meio dos homens, instaurando o Reino.
Por meio dele, e particularmente da sua primeira parte, o evangelista proclama que a
figura de Jesus está relacionada com o mistério de graça e de bondade que Deus está
manifestando na história. As bem-aventuranças são, pois, a declaração do grande
projeto de libertação de Deus em favor dos marginalizados da terra, dos necessitados,
dos famintos, dos que se encontram numa situação de desespero, em primeiro lugar
dos discípulos que são pessoas da baixa camada social, sem segurança material,
perseguidas, desenraizadas, e obrigadas a ficar longe da família depois da decisão de
seguir Jesus.
Não se trata de esperança vazia, de um simples consolo ilusório, mas de uma solene
promessa de Deus, que quer restabelecer a justiça. “Os pequenos, os famintos e os
pobres, os que choram, já tem o reino de Deus, têm a vida. Têm a vida e são felizes,
não em si mesmos – por serem pobres ou pequenos ou perdidos. São felizes porque
Deus se aproxima deles, porque Deus vem e veio em Jesus Cristo. O pobre não é
‘rico’ simplesmente em sua pobreza; é rico nessa nova e decisiva transparência de sua
vida que se torna, a partir de Deus, gozo e recompensa.
O texto lucano não faz, a apologia da pobreza, considerando-a como condição ideal
para alcançar o Reino, o que poderia justificar as causas da opressão que geram
situações de miséria e de injustiça; nem promete que os pobres se tornarão ricos,
porque isso não resolveria o problema, mas geraria sempre novos desequilíbrios e
criaria necessariamente pobres. O texto declara que a situação de exploração e de
miséria em que muitos se encontram termina porque, com o envio de Jesus, Deus
instaura o seu Reino, no qual haverá uma mudança total a respeito da realidade
presente marcada pelo pecado.
situações, não só com seu ensino, mas também com sua vida desprendida, entregue
aos mais carentes, mas sobretudo com sua morte e ressurreição, tornando-se fermento
da renovação do mundo. A apresentação de Jesus na sinagoga de Nazaré encontra
nesse texto seu aprofundamento.
ESTRUTURA:
Segunda cena (39-47): acontece o diálogo entre Jesus e o fariseu. É muito mais
longa e articulada: contém toda a discussão entre Jesus e Simão, o fariseu. O fato que
seja assim desenvolvida, do v. 39 até o v. 47, testemunha a importância que reveste
para o evangelista. Ao final temos ainda Jesus e a mulher.
As duas cenas de moldura são ocupadas por Jesus e a mulher, enquanto o momento
central diz respeito ao diálogo entre Jesus e o fariseu sobre como “ser justo/tornar-se
justo” diante de Deus. Esta é a construção, narrativa; as narrativas lucanas tornam-se
freqüentemente uma obra de arte.
A expressão, “eis que”... /kai idou, que introduz a entrada da mulher, atira a atenção
do leitor. Enquanto Jesus se encontra na mesa sucede que entra uma mulher, a qual
inicia a agir em certo modo, todo particular. No Oriente, durante as festas, as portas
frequentemente permaneciam abertas; ainda hoje, em Israel, durante as festas do
sábado pode suceder tal fortuna.
✓ o anonimato da mulher, o seu silêncio e os seus gestos: não se diz quem era esta
mulher; não vem chamada pelo nome, se diz somente que era uma “pecadora da
cidade”. *É a única entre as mulheres no evangelho de Lucas que recebe o perdão de
Jesus; é a única, que sem pedir, é libertada de uma “doença”, não do corpo, mas do
espírito. A mulher do “perfume” não é cega, nem leprosa, nem surda-muda, nem
paralítica, não perde sangue, não é possuída pelo demônio. O seu mal é de outra
ordem: ela viveu uma vida de pecado. E Jesus, o pedagogo, terapeuta, aplica um
remédio de eficácia instantânea. O remédio de Jesus regenera o coração destruída
desta mulher, restaura os sentimentos mais profundos: o do amor e da gratidão. “A
mulher do perfume é a mulher do grande amor, a mulher da gratidão infinita, a
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Evangelho de Lucas e Atos – 2023.2 ----- Prof. P. Claudio Roberto Buss
mulher que não sabe exprimir em palavras quanto o seu coração sente por Jesus. E já
que não sabe falar, o seu coração se move em gestos audazes.
*Esta mulher, da qual não vem revelado o nome, não diz nem mesmo uma palavra
sequer. Realiza somente gestos; alguns dos quais podiam resultar escandalosos, como
por exemplo, o fato de “soltar os cabelos”: para algumas escolas judaicas tal gesto
bastaria para requerer o divórcio, ou justificar outras punições; e o fato de tocar um
Rabi, beijar-lhe, perfumá-lo era embaraçante e incomum. Se pode perguntar como
uma mulher tal tenha chegado até Jesus. Se pode, por exemplo, perguntar se não tinha
sido tocada pelas palavras de Jesus precedentemente. Na realidade Lucas não diz
nada a respeito, e não é sempre correto encher os espaços narrativos em branco de
hipóteses.
- Interessante é dar-se conta do seu comportamento: revela o reconhecimento, a
alegria, um amor sem limite para com Jesus.
É também desconcertante como Jesus a permite realizar todos estes gestos, diante de
um público impactado e escandalizado. O contato com aquela mulher, sobretudo se é
uma prostituta, o faz impuro como tocar um porco ou um cadáver. Para Jesus, ao
contrário, significa acolhimento, comunhão com a mulher.
*O gesto corporal desta mulher: é muito eloquente. Jesus está reclinado sobre a mesa.
A mulher está no pavimento, atrás dele, e toca com a sua cabeça os pés do mestre.
Jesus está no alto e ela embaixo, o mais baixo possível. Prostrada em seus pés, a
mulher mostra um comportamento de serviço, de discípula, atitude de escuta do
Mestre, disposta a acolher a sua palavra. Fez também assim Maria de Betânia:
“Sentou-se aos pés de Jesus e escuta a sua palavra” (Lc 10,39). A mesma posição de
serviço é retomada por Jesus no lava-pés durante a última ceia (Jo 13,5). Na casa de
Simão todos estão colocados em lugares de honra. Ela está atrás. Todos veem os
rostos. Ela somente os pés de Jesus. Ela que é excluída do banquete, logo tomará o
lugar de Simão: de emarginada passará a ser a autêntica hospitante. Ora está em baixo
atrás. Não tardará, porém, a ocupar o posto central da cena.
*A linguagem do corpo: esta mulher realiza quatro ações sucessivas, que tem como
centro os pés de Jesus: os beija, banha com lágrimas, os enxuga os com cabelos e os
unge com perfume. A ternura desta mulher são a expressão corporal de um amor
sincero. Amor que tem necessidade de sair de si e ir ao encontro do outro. Este
processo requer tempo. O fez certamente longamente, tendo em mãos um objeto de
grande valor para ela: os pés de Jesus. O detalhe desta duração e insistência da ação é
advertido pelo próprio Jesus que diz a Simão: “Desde quando entrou, não parou de
beijar os meus pés” (v. 45).
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✓ a menção dos pés: por sete vezes vêem mencionados os “pés de Jesus”: três
vezes no v. 38 e outras quatro vezes nos vv. 44-46 (diálogo entre Jesus e Simão). Os
Padres da Igreja se perguntaram o porquê desta menção assim freqüente: uma boa
resposta teológica diz assim: nenhuma mulher, nenhum homem é tão pequeno de não
poder chegar aos pés. É uma resposta sugestiva, poética, que contém uma verdade
relacional: a mulher da narrativa quer colocar-se em relação com Jesus. Talvez
exegeticamente pode-se relacionar com Jo 13: “Jesus que lava os pés dos seus
discípulos”: gesto de amor (gestualidade).
• Os beija sem pretender recompensa, nem mesmo uma resposta. Beija-os
para exprimir aquilo que seu coração sente. É um gesto de amor, como o é
aquele de Maria Madalena na cena da ressurreição: o misterioso jardineiro
pronuncia o seu nome e Maria Madalena se emociona em reconhecer
Jesus ressuscitado (Jo 20,17).
✓ as “lágrimas”: porque esta mulher chora? É talvez pelo remorso à sua vida?
Não temos nenhum indicio para chegar a esta conclusão. Nos sinóticos se fala
do “choro” de Pedro, definido como “amargo”, conseqüência da “traição”.
Mas aqui o contexto é outro, isso porque junto com as lágrimas temos o
perfume que é sinal de alegria, de gratuidade. Disto alguns vêem nas lágrimas
da mulher não uma manifestação de tristeza, mas de libertação. São lágrimas
de uma mulher que encontrou Jesus no seu caminho.
✓ um último elemento: a “liberdade da mulher”: a qual, na casa de um fariseu,
age segundo aquilo que sente, sem sofrer qualquer tipo de condicionamento.
A sua liberdade é aquela de Jesus, que deixa com que ela faça... No fundo, o
encontro de Jesus com as mulheres é sempre problemático para uma
mentalidade muito puritana. As lágrimas e a liberdade da mulher provocam
desconforto e embaraço no patrão da casa; talvez para certos leitores, diante a
esta cena, pode viver o mesmo incômodo de Simão.
Onde está propriamente o embaraço? Jesus não conhece esta mulher, não sabe de
onde ela é, e por isso pode tornar-se uma acusa; se Ele fosse realmente um profeta
saberia que é esta mulher e deveria recusar os seus gestos. Se não o faz, quer dizer que
não é um profeta. Simão, então é um homem correto, que lê a situação à luz de uma
certa concepção de justiça, uma determinada concepção de Deus. O fariseu Simão é
um homem justo que lê os eventos à luz da justiça e do Deus justo, em quem crê.
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Jesus conta então uma parábola: que fala de dois devedores. Nenhum deles era
em grau de saldar a dívida; e isto já é um ensinamento, que o leitor começa a perceber.
Cada homem diante de Deus é um devedor: não somente a mulher deve restituir
alguma coisa, mas também Simão; diante de Deus nenhum ser humano é um credor.
O v. 42 é decisivo: “Como não tivessem com que pagar, ele perdoou a dívida de
ambos. Qual dos dois amará mais?” Como nenhum dos dois pode restituir, o credor
faz “graça” (charizomai) a ambos. “Quem o amará mais?” Notar aqui os dois termos:
charizomai e agapaō/ fazer graça e amar. Aqui se fala de um amor derivado da graça,
a charis: mas quem o amará mais? Simão, corretamente responde: “Aquele a quem foi
perdoada a maior dívida”.
A vida não é um débito que devemos pagar, diz Jesus a Simão, mas um dom para
amar ou, melhor ainda, um “dom de amor”. Está é a grande lição que Jesus dá ao
fariseu e a sua mentalidade. Para Lucas tudo é charis/ graça, tudo é dom.
experiência da bondade pessoal de Deus. A mulher recebeu uma realidade que falta ao
fariseu: o amor. O reconhecimento e a capacidade de amar demonstrada por esta
mulher é o sinal, a consequência e a novidade do perdão recebido. Ela na realidade
não é mais uma pecadora: o olhar de Jesus entendeu também isto!
Como podemos perceber: o fariseu não pecou contra a hospitalidade, mas lhe
falta aquele “mais” que a mulher tem em abundância, e que é sinal de conversão, de
acolhimento do anúncio de Jesus: o amor. Neste sentido, os vv. 44-46 interpretam a
narrativa dos vv. 37-39 à luz da parábola (vv. 41-42).
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“Por esta razão eu te digo, seus numerosos pecados lhe são perdoados, porque
ela demonstrou muito amor”.
Mas, o ensinamento de Jesus não parece coerente com a parábola, a qual conta
que o devedor amou muito porque foi perdoado, enquanto a mulher foi perdoada
porque amou.
Temos ainda surpresas. Jesus se volta para a mulher e diz: “Teus pecados estão
perdoados”. O uso do passivo divino indica que somente Deus pode perdoar os
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*A questão aqui se abre ao mistério: “Quem é aquele que perdoa pecados?” Com
a sua palavra Jesus atua o perdão de Deus, dá à mulher a certeza de tal “dom
escatológico” do qual ele sabe de ser o mediador.
É a fé que salva, como frequentemente Jesus diz nos evangelhos. Aqui se toca um
ponto muito denso da teologia de Lucas: a relação entre Lei e charis, entre perdão e
arrependimento, entre charis e resposta. Uma teologia muito densa, colocada em cena
nesta belíssima narrativa.
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Tomaremos como ponto central um tema muito caro a Lucas e muito presente nos
Atos dos Apóstolos: “a ética do cristão em caminho”. Podemos falar aqui de
responsabilidade do anúncio.
em testemunho contra eles”. 6Eles então partiram, indo de povoado em povoado, anunciando
a Boa Nova e operando curas por toda a parte.
O grupo dos Doze, instituídos com solenidade, dos quais se conhece também os
nomes, ora vem encarregado de partir em missão. A distância entre a narrativa da
instituição e da missão coloca em relevo a atenção pedagógica de Jesus no confronto
com este grupo que, depois de ser constituído, participa e partilha o seu ministério
messiânico e, somente depois de um tempo, estarão em grau de serem protagonistas da
atividade missionária.
Antes de orientar-se para Jerusalém, Jesus coloca a sua atenção sobre os Doze: ele
os associa à sua missão. E assim, os Doze fazem com Jesus uma experiência
antecipada da sua futura missão.
Agora revestidos do mesmo poder de Jesus, os Doze são chamados à ativa: envio
único e irrepetível: (Lc 9,3; cf. Lc 22,35s); também aqui um modelo ideal de cada
futura missão (Lc 9,5b; cf. At 13,51).
- Estes são chamados a realizar algo (nutrir a multidão, curar o doente) dos quais
não se sentem capazes.
O seu aprendizado é intimamente ligado ao Mestre. E eis aqui um outro tema que
percorre o capítulo 9: a identidade de Jesus.
A pergunta sobre quem é Jesus já foi exposta por diversas categorias de pessoas ao
longo do evangelho: a elite religiosa (Lc 5,21), João Batista (7,20), os discípulos
diante da tempestade (Lc 8,25), e agora é Herodes Antipas que se encontra diante
deste enigma (Lc 9,7ss).
ARTICULAÇÃO DO TEXTO:
- vv. 1-2: A narrativa inicia com a reunião dos Doze; faz sequência o conferir de
Jesus o “poder” e a “autoridade”, condição mediante a qual os discípulos possam
desenvolver sua missão: libertar os endemoniados, curar os doentes e anunciar o Reino
de Deus.
NOTAS DE SEMÂNTICA:
No Evangelho de Lucas, Jesus transmite a eles a sua força e o seu poder, antes de
enviar-lhes. Marcos, por exemplo, não fala de dynamis, mas somente de exousia/
autoridade. Lucas, invés, antepõe dynamis a exousia, porque quer notar a relação entre
poder e Espírito: o poder da mensagem, que vem associada ao Espírito. Essa, na
verdade, vem identificada com o dom do Espírito Santo (Lc 4,14; At 1,8), do mesmo
dom que qualifica a atividade de Jesus (Lc 4,36) e que ora os Doze recebem para a
missão pré-pascal, antes de serem investidos para a missão eclesial (At 1,8).
v. 2: o anúncio do Reino e os prodígios são duas realidades que vem associadas. Aqui,
em parte, se responde às interrogações sobre o significado dos milagres. As curas ou
as manifestações e os prodígios do reino são o sinal da salvação, do reino que é
presente. Esta é a função do milagre: o prodígio não é prova do divino, nem mesmo
uma manifestação da onipotência divina, mas o sinal de que, finalmente, o reino de
Deus é atuante em meio aos homens.
Para quanto toca a questão da hospitalidade, vem dito de acontentar-se daquilo que
vem ofertado do povo, das “casas que se abrem”. Portanto, não procurar o próprio
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No caso do não acolhimento (v. 6), os apóstolos são convidados a realizar um gesto
simbólico, aquele do pio judeu que, reentrando em uma terra pagã, sacudia a poeira
como sinal de rompimento e de reenvio ao juízo final: a cidade incrédula haverá os
evangelizadores como testemunhas contra ela.
v. 6: o conjunto se conclui com uma descrição sumária da ação missionária dos Doze,
uma atividade em conformidade com o poder e a autoridade recebidas. Estes vão de
“povoado em povoado”, em toda parte: a proclamação e o operar salvífico atingem,
mediante os enviados, todo Israel, prelúdio da difusão do Evangelho em todo o
mundo.
****Encontramo-nos diante de uma página muito radical na qual Jesus associa à sua
vida itinerante, de Filho do Homem que não há onde repousar a cabeça (Lc 9,58). No
fundo diz que o reino vai anunciado assim. É impressionante esta série de proibições
que fazem a missão dependente do poder do Espírito Santo e paradoxalmente da falta
de meios e de instrumentos. Pareceria que o reino deve ser anunciado somente com a
força da Palavra de Deus e do Espírito, sem apoiar-se sobre algum sustento humano.
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Lucas é o único dos evangelistas que apresenta não só a missão dos Doze, mas
também aquela dos setenta e dois discípulos em 10,1-12.
Porque duas missões? Porque o envio dos Doze e dos setenta/ setenta e dois?
Não se trata de uma repetição, nem de uma substituição da missão dos Doze com
outra de setenta e dois, mas de um completar...
A primeira missão, aquela dos Doze, representa o envio dos apóstolos de Israel,
enquanto o envio dos setenta e dois prefigura a missão universal aos povos. Os setenta
e dois pode-se explicar de dois modos:
a) Refere-se a Gn 10, onde a descendência dos filhos de Noé vem representada de
setenta/ setenta e dois povos;
b) Refere-se a Nm 11,24-30, onde o Espírito do Senhor esta sobre os setenta
anciãos escolhidos por Moisés, mas vai também sobre outros dois homens que
não eram escolhidos. Deste modo se explicaria a missão universal da Igreja; seja
o envio dos Doze, seja aquele dos setenta e dois representa os apóstolos e depois
todos os outros missionários. Portanto, temos os Doze, que é o grupo originário,
e depois todos os outros, que representam a universalidade do número setenta/
setenta e dois.
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Depois disso, o Senhor designou outros setenta e dois, e os enviou dois a dois à sua
frente a toda cidade e lugar aonde ele próprio devia ir. 2E dizia-lhes: “A colheita é
grande, mas os operários são poucos. Pedi, pois, ao Senhor da colheita que envie
operários para sua colheita. Ide! 3Eis que vos envio como cordeiros entre lobos.
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Não leveis bolsa, nem alforje, nem sandálias, e a ninguém saudeis pelo caminho.
caráter colegial dos Doze. Omite também “poder e autoridade”, que retém já
compreendido pelo leitor em Lc 9,1.
v. 2: a messe aqui representa não mais a iminência do Reino, mas o grande campo
da missão universal: os povos numerosos aos quais levar o Evangelho, em contraste
com o numero sempre limitado de evangelizadores. Mas, tal missão é sempre em
primeiro de Deus. Mediante a oração os discípulos fazem deles tal “realidade”,
entrando no ponto de vista de Deus: anunciar a salvação a todos.
v. 3: vem aqui formulado o explicito envio: “Ide”! Mas segue súbito o anúncio de
um destino cheio de riscos e de hostilidade para os mensageiros, expressos com a
imagem do cordeiro e do lobo. Esta oposição ocorre na literatura bíblica (Is 11,6;
65,25; Sir 13,17). Os missionários são indefesos como “cordeiros”. A afirmação de
Jesus comporta para os evangelizadores um apelo a não violência; e é possível um
implícito referimento a figura do Servo de JHWH: “como cordeiro conduzido ao
matadouro...”
5Em qualquer casa em que entrardes, dizei primeiro: ‘Paz a esta casa! ’ 6 E se lá houver um
filho de paz, a vossa paz repousará sobre ele; senão, voltará a vós. 7 Permanecei nessa casa,
comei e bebei do que tiverem, pois o operário é digno do seu salário. Não passeis de casa em
casa. 8Em qualquer cidade em que entrardes e fordes recebidos, comei o que vos servirem;
9curai os enfermos que nela houver e dizei ao povo: ‘O Reino de Deus está próximo de vós’.
10Mas em qualquer cidade em que entrardes e não fordes recebidos, saí para as praças e dizei:
11‘Até a poeira da vossa cidade que se grudou aos nossos pés, nós a sacudimos para deixá-la
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para vós. Sabei, no entanto, que o Reino de Deus está próximo’. 12Digo-vos que, naquele
Dia, haverá menos rigor para Sodoma do que para aquela cidade.
do Reino de Deus também à cidade que rejeita: é uma ameaça contra aquela cidade ou
ao contrário vem oferto uma ulterior possibilidade de conversão?
v. 12: mais que um senso de vingança contra as cidades que não acolhem o
evangelho, a sentença coloca em luz a seriedade da decisão requerida diante do
anúncio da vinda do Reino de Deus.