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1
Cf. Antonio PITTA, L’evangelo di Paolo. Introduzione alle lettere autoriali, 2013, p. 11.
2
Idem.
3
Cf. Raymond BROWN, Introdução ao Novo Testamento, p. 573.
4
Cf. Como por exemplo: Jerome Murphy O’Connor, Paulo: Vida e Pensamento. São Paulo: Paulus.
5
Cf. Johan KONINGS, A Bíblia: sua origem e sua leitura, 2011, p. 124.
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Cartas Paulinas 2024.1 – Faculdade Dehoniana – Prof. Dr. P. Claudio Roberto Buss
6
Cf. Alfio Marcello BUSCEMI, San Paolo: Vita, Opera e Messaggio, 2008, p. 1.
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Com isso, como nos diz BARBAGLIO, não podemos exagerar de que podemos construir uma biografia completa da vida
de Paulo. As fontes que dispomos não são suficientes para tanto. Op. cit. p. 15.
8
Cf. Giuseppe BARBAGLIO, As Cartas de Paulo I, p. 15.
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tornar para elas e posteriormente (pelo seu status canônico)9 norma de fé e vida.10 Além disto
é preciso ainda pontuar que elas lançaram um fundamento da teologia cristã que nunca teve
rival ou substituto. Mas, sobre esta questão é preciso ler toda a Introdução que James DUNN
faz em seu “capolavoro”!11
9
O Corpus Paulinum faz parte do Cânon bíblico e, portanto, torna-se norma de fé e vida.
10
Cf. James D.G. DUNN, A Teologia do Apóstolo Paulo, 2008, p. 26-27.
11
Cf. Ao menos ler na sua obra-prima: DUNN, J.D.G., A teologia do apóstolo Paulo, Paulo, o capítulo referente:
“Prolegômenos para uma teologia de Paulo”, p. 25-54.
12
Revista SUPER-INTERESSANTE, 2003. Todo o texto em sequência parafraseia o artigo.
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faz apologia à escravidão, legitima a submissão feminina e esboça uma doutrina da salvação
distinta daquela que teria sido defendida por Jesus.
Melhor do que insistir sobre teorias anti-paulinas, seria redescobrir o valor de Paulo para a
história do cristianismo. A Igreja proclamou o ano 2008 como o “Ano Paulino”. Um “especial
ano jubilar” dedicado ao grande apóstolo, por ocasião dos 2000 anos do seu nascimento. Neste
sentido, poderíamos refletir no sentido que “Paulo não traiu Jesus, mas foi atraído por Jesus.
Paulo não viveu com Jesus, mas viveu Jesus. Paulo não inventou Jesus, mas foi reinventado
por Jesus. Sem Jesus, Paulo teria desaparecido da história”.
De forma positiva, o professor Pedro Lima Vasconcelos afirma: “creio que houve uma
transformação conservadora da mensagem de Paulo. Temos que libertá-lo das ideias errôneas
a seu respeito perpetuadas ao longo dos séculos”.
André Chevitarese também afirma: “Conservador ou radical, fiel ou não a Jesus Cristo, São
Paulo foi, sem dúvida, um dos poucos evangelizadores – se não o único – a fazer o cristianismo
passar da cultura semita à greco-romana, possibilitando que ela se tornasse uma religião
mundial. Ele criou condições para que povos não-judaicos, ao receberem a mensagem de Deus,
fossem inseridos de forma igualitária na comunidade cristã”.
Podemos afirmar que Paulo nos é conhecido, melhor do que outra personalidade do NT, por
suas Epístolas e pelos Atos dos Apóstolos, duas fontes independentes que se confirmam em
muitos pontos e se completam em outros, não obstante algumas divergências.
Paulo pode ser analisado a partir de diferentes aspectos. Ele é rabino judeu, fariseu radical,
evangelizador dos helenistas, cidadão romano, escritor exímio, missionário incansável,
fundador de comunidades, pastor dedicado, fabricante de tendas, apóstolo de Jesus Cristo e
mais.
Queremos fazer um percurso do Paulo teólogo. Inúmeras obras já fizeram dele um expoente
da teologia, o primeiro e talvez o mais importante teólogo cristão. Mas em sentido estrito,
Paulo não foi teólogo. Ele não escreveu nenhum tratado de teologia e não teve intenção de
fazer uma obra teológica. Sua preocupação foi sempre prática e pastoral. Ao procurar, porém,
soluções para os desafios concretos, o apóstolo se baseou em princípios da fé, fundamentou-
se nas Escrituras judaicas, inspirou-se na pessoa de Jesus Cristo e nele centrou toda a sua
teologia. Foi teólogo nesse sentido.
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tratava de problemas concretos, tinha importância.14 Não quero criar polêmica com R.
BROWN (aliás, não teria a mínima ousadia!), mas também é preciso dizer que os primeiros
cristãos escreveram cartas continuamente, mesmo quando uma literatura mais duradoura
(evangelhos, Atos) começaram a ser produzidos. Em uma Bíblia autenticamente cristã, no
índice encontramos listadas 21, dentre os 27 livros do NT, sob a rubrica “cartas” ou “epístolas”.
De fato, uma estatística surpreendente, ainda mais quando olhamos para o AT e nos damos
conta que nenhum dos seus 46 livros trazem tal designação.
As Cartas não nasceram para serem tratados de teologia, não são fruto de uma
escrivaninha, mas da missão. Paulo foi um missionário ardoroso, fundou comunidades do
Oriente ao Ocidente, entre os anos 40 a 60 d.C. Talvez uns poucos anos após a morte de Jesus,
Paulo já iniciou sua vida itinerante de missionário fundando comunidades e centrando a sua
pregação na universalidade da mensagem cristã, aberta a judeus e gentios. Para Paulo, a Lei
teve seu papel “pedagógico” na economia da salvação. Mas, com a vinda de Cristo,
“plenitude da Lei”, ela deixa de existir, para dar lugar ao papel único e insubstituível do
Filho de Deus.
As comunidades que ele funda, são estratégicas do ponto de vista missionário. São centros
urbanos como Corinto, Tessalônica, Filipos, Éfeso etc. Formava comunidades, e parece-nos
que as escolhia para serem estas propulsoras da missão para outras ao seu redor.
Sublinha-se que, com Paulo, há uma passagem significativa do cristianismo. Este nasce no
mundo basicamente rural de Israel, propriamente ao entorno do mar da Galileia, com Jesus de
Nazaré. Com Paulo, há uma transposição das barreiras da vida campesina para o “mundo
urbano” das grandes metrópoles da época.
Como já apontado, além da ordem de expansão (argumento geográfico), em ordem
teológica, é preciso sublinhar com dois ricos o grande papel de Paulo. Aqui cita-se Dr. P.
Antonio PITTA, que na sua obra diz que o cristianismo teria dificuldades, sem a reflexão de
Paulo de desvincular-se da Lei, já que o círculo dos Doze era estreitamente ligado por força
de origem e cultura à mesma.15 O sábio, Paulo de Tarso, elaborou com sua formação
Escriturística uma história salvífica, onde a Lei não ocupa o centro, nem mesmo é o fim pela
qual o ser humano deve viver, mas é Cristo o seu centro e fim. Sobre isto esta temática, Paulo
a desenvolve sobretudo na Carta aos Gálatas e Romanos.
Para dar curso ao nosso argumento, ao menos no que tange ao subtítulo, é importante
perceber que, de acordo com os estudiosos, Paulo também influenciou a teologia dos outros
escritos neotestamentários.
Aqui, como um incipiente estudioso da obra de Paulo, me sinto à vontade somente para
citar 4. Aceito, obviamente, outras contribuições!
- A primeira refere-se a teologia marcana (para os que não entendem, o Evangelho de
Marcos): sabemos que Marcos possui uma tônica que centra o Messianismo de Jesus no
14
Cf. Raymond BROWN, Introdução ao Novo Testamento, 2004, p. 549.
15
Cf. Antonio PITTA, L’evangelo di Paolo. Introduzione alle lettere autoriali, p. 12.
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serviço, o “servo sofredor” do Deutero-Isaías. A teologia da cruz paulina (cf. 1Cor 1,18-25)
possivelmente deu ao Evangelho de Marcos a tônica pela qual se deve ler a “Vita Christi” e
seu seguimento.
- A segunda é a teologia de Lucas. Se, de acordo com a tradição, Lucas foi companheiro
de Paulo, e se escreveu para as comunidades paulinas, suas páginas não passariam em branco
em relação ao Apóstolo por ele admirado. A teologia da graça e a soteriologia paulina fazem
estrada nos escritos do Scriba Mansuetudinis Christi, para citar Dante!
- Muitos encontram eco da teologia paulina nas tradições petrinas. Como diz Antonio
PITTA “la 1ª Pietro riprende, per grandi linee, il canovaccio e diverse tematiche
dell’epistolario paolino, come la salvezza in Cristo, la concezione dello Spirito e la
generazione dei credenti mediante la Parola”.16
- Bem, a 2ª Pedro já tem até mesmo um conhecimento direto do epistolário paulino. E os
cita com autoridade de Escritura. Interessante para tanto ler 2Pd 3,15-16.
Mas, exaltações a parte, também devemos dizer que nem tudo é Paulo. Outros escritos,
com outras teologias e “acentos” exploram outros aspectos da vida cristã, ignorados pelas
diversas circunstâncias das tradições paulinas. Sobre este aspecto é possível aprofundar em um
outro momento, para não tornar esta apostila interminável!
Ainda, para terminar este tópico, uma pequena nota sobre Hebreus. A carta aos Hebreus
que por longo tempo, sobretudo no Oriente, foi aceita como epístola paulina. 17 No Ocidente a
Epistola não era aceita sem reticências. As dúvidas quanto à sua autenticidade provocaram
hesitações quanto ao seu valor enquanto escrito inspirado. O próprio Lutero após afirmar por
longo período a autenticidade paulina da epístola18, negou ser da lavra de Paulo no último
período da sua vida. O magistério católico (Pontifícia Comissão Bíblica) pronunciou-se no
princípio do século XX, proibindo os católicos de negar a origem paulina de Hebreus, embora
consentindo se falasse de uma redação não paulina. Isso no século XX (sic!). Hoje é claro,
com as questões mais amadurecidas, e você como bom estudante pode conferir na
Introdução a Epístola aos Hebreus da monumental bíblica TEB, que os comentadores
católicos, obviamente de tendência moderada, entendem a origem paulina desta carta,
epístola ou melhor dizendo homilia, de origem paulina no seu sentido mais lato, ou seja,
que alguns temas presentes neste escrito são do círculo de reflexão paulino.19
Além disso, deve-se lembrar que a Carta aos Hebreus “não é para os judeus (mas para os
judeus cristãos da diáspora); não é de Paulo (mas de um autor anônimo); e não é uma carta
16
Ibidem.
17
Cf. TEB, Introdução à Epístola aos Hebreus. Interessante observar que Clemente de Alexandria apresenta a
epístola como sendo uma adaptação grega de um texto composto por Paulo em hebraico. Orígenes acentua a
distinção: os pensamentos são de Paulo, mas tudo indica que a epístola não é dele. Seria a obra de um discípulo
de Paulo, que exprime fielmente, porém a seu modo, o ensinamento do mestre.
18
Para Lutero, tanto nas outras epístolas como em Hebreus, Paulo “exalta a graça conta o orgulho da justiça
humana segundo a Lei”. Cf. TEB, Introdução à Hebreus.
19
Cf. TEB, Introdução à Hebreus.
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(mas um discurso homilético sobre o sacerdócio de Cristo.20 Esse belo tratado ou “discurso
sobre o sacerdócio de Cristo” foi provavelmente composto pouco antes da destruição do
segundo Templo em um ambiente itálico (65-70 d.C.).21
Um último ponto ainda é preciso dizer quanto à polêmica entre a teologia paulina e a
teologia da Carta de Tiago: “Meus irmãos, de que serve alguém dizer que tem fé, se não tem
obras? ” (Tg 2,14). Todos nós temos em mente ao menos a frase paulina: “o homem é
justificado pela fé, sem a prática da Lei”.
Fazemos questão de citar literalmente, e com muito trabalho para copiar, a explicação da
Bíblia TEB, em nota a Tg 2,14:
O autor parece considerar o reverso do princípio paulino da justificação só pela fé (cf. Rm 3,28;
Gl 2,16), pois afirma que, sem as obras, a fé não poderia salvar e que, sem elas, é morta (cf. vv.
17,26). Entretanto, as obras de que fala Tiago não são as “obras da lei” denunciadas em Gl e Rm,
mas os frutos que, também segundo o próprio Paulo, a fé deve produzir (cf. Rm2,6.15-16; Gl 5,6;
Ef 2,8-10; Cl 1,10; 1Ts 1,3). Sem jamais identificar fé com obras, Tg insiste em uma fé que se
realiza nas obras, sobretudo no amor ao próximo e na oração [...] A ênfase no agir do crente revela
um ambiente judeu-cristão semelhante ao de Mt. [...] Trata-se de um ponto de vista que parece
bem posterior à problemática paulina. Contra o judaísmo que tendia a diluir a fé entre as obras,
Paulo – às voltas com os judaizantes – reivindica o primado da fé, distinguindo-a dos seus frutos
ou de suas obras. Tg coordena fé e obras de fé, integrando a contribuição da crítica de Paulo, e,
provavelmente, reagindo contra uma interpretação extremista do ensinamento de Paulo.
20
Albert VANHOYE, Estrutura e mensagem da Epístola aos Hebreus. São Paulo: Paulinas (coleção: cadernos bíblicos).
21
Cf. Antonio PITTA, Cartas Paulinas, Petrópolis: Vozes, 2019, p. 15.