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Dia 1

“Cada um de nós tem histórias únicas para contar: a história dos anos em que permanecemos na
Terra Árida, a história do nosso Despertar, e a história do caminho que percorremos para sair de lá”

Sharon Blackie

Era uma vez, ainda ontem, um mundo aparentemente igual aos outros.

Quem olhar sem atenção, poderia pensar que é um mundo com muito movimento, muito cheio,
onde está sempre a acontecer alguma coisa, como um grande mercado cheio de vozes altas, pessoas
que passam e pregões que vendem constantemente isto ou aquilo. Mas para quem vê para lá da
superfície, há algo que falta: há algo que se perdeu.

As estações passam sem ser celebradas, o dia e a noite competem em corridas tão velozes que os
perdemos de vista, e as árvores e os animais usam-se como recursos. A maioria da pessoas, bem
distraída com tarefas, ambições e desapontamentos, vai levando os seus dias, por entre cansaços e
desafios.

Outros, porém, sentem que lhes falta algo: nesse grande mercado não experimentam vitalidade nem
alma. Não encontram sentido para o caminho e, de alguma forma, sabem que uma parte de si se
esqueceu de quem são. Por isso, chamam a este lugar a Terra Árida: porque tudo ali é seco, rigido,
empedernido e a fluidez e a conexão estão ausentes.

Este pequeno grupo, com sentidos apurados, sensibilidade aguçada e um coração que late forte,
acredita que há mais do que aquilo que lhes é permitido vivenciar. Eles sentem a aridez desta Terra
e, contudo, acreditam que podem encontrar o que lhes falta. São os Buscadores, os Sonhadores, os
Jardineiros, os Curandeiros e os Artesãos.

Todos eles já experimentaram a ausência da seiva de vida. Todos eles sabem que neste lugar perdeu-
se o sentido do Mistério.

Exercício do dia 1:

Na meditação, falámos-te de alguns grupos de pessoas, aquelas que pela sua sensibilidade ou
capacidade de observação, se foram apercebendo da aridez desta Terra que habitam.

São os Buscadores, os Sonhadores, os Jardineiros, os Curandeiros e os Artesãos.

Buscadores – são os que levam a candeiam e procuram, não desistindo da busca mesmo quando esta
parece infrutífera. O seu símbolo é, por isso mesmo, a Vela ou Candeia.

Sonhadores – aqueles que têm a Visão, os guardiões do Sonho de Mistério, carregam a fé e inspiram
todo o grupo, quando este está prestes a desistir. O seu Símbolo é o livro de estórias, onde a estória
guarda o segredo da conexão.

Jardineiros – os que carregam a bondade. De uma semente permitem que cresça um plano, uma
árvore, uma peregrinação. São os que revolvem a terra para que permaneça fértil. Os que sabem
quando é altura de descansar. E os que regam com amor cada plano e cada ação. O seu Símbolo é a
pequena planta ou a semente.

Curandeiros – são os que trazem o coração aberto, a sabedoria nas palavras e a capacidade de sanar
o que foi ferido. Carregam as ervas, as canções e as estórias. Sabem que um medicamento pode ser
um abraço. Nunca deixarão de cuidar. O seu Símbolo são as ervas de cura, as poções de sanação.

Artesãos - trazem a capacidade de colocar beleza no mundo. De fazer as tarefas difíceis. De saber
que pequenos detalhes, feitos com amor e persistência, transformam-se em saberes, valores e
enraizamento. O seu Símbolo é algo feito pelas suas mãos, seja uma trança em lã, uma madeira
esculpida, uma peça modelada ou um desenho.

Desde esse lugar profundo, onde te conectaste com a tua personagem que BUSCA a magia no
caminho, qual dos grupos sentes que é o teu? Onde te revês mais? E porquê?

O que vais procurar? Qual é a natureza da tua demanda?

Hoje, escolhe o símbolo do grupo a que escolhes pertencer, ao longo destes dias, e coloca-o no teu
altar.

Toma nota destas reflexões e sentires no teu caderno e partilha com o grupo.

Dia 2
Bom dia, caminhantes!

A pouco e pouco, Buscadores e Jardineiros foram-se encontrando nos lugares onde ainda
existiam grandes árvores. Sonhadores e Artesãos eram presença comum sob os raios da lua
cheia, e os Curandeiros, esses suspiravam amiúde, enquanto passeavam nas ruas do Grande
Mercado...
Um dia houve que grupos deles deram por si percorrendo as ruas poeirentas da Terra Árida,
numa peregrinação a um lugar desconhecido, seguindo um impulso mais profundo do que o
bater do próprio coração. Caminharam muitos dias e muitas noites naquela aridez, cada vez
mais conscientes da ausência, da desconexão...
O que tornou a terra árida? Que secura se entranhou nos habitantes daquele lugar para que
este se tornasse assim?
Este é o lugar onde vemos as coisas com um olhar sem véus. Não é um lugar confortável, e
podemos ter a tendência a fugir desta confrontação, mas não afastes o olhar. É preciso
olhar primeiro para o que está seco e desprovido de vida, para que a vida possa voltar.

Cada um de nós traz no fundo de si um pequeno cemitério daqueles que amou.


Romain Rolland
Em conceito, um Cemitério é um lugar onde se guardam os mortos. Um lugar de culto e de
memória. Onde os que se foram permanecem, em frases de homenagem e flores de
saudade. Um Cemitério pode trazer-nos muita coisa. Por vezes, a sensação de que a vida não é justa.
Que se perdem sempre aqueles que amamos. Mas também, um lugar de paz e
silêncio, onde podemos sempre retornar aos que se foram, abrindo o coração e a saudade ao
Mistério da eternidade.

Exercício Dia 2
Depois de ouvires a meditação, convidamos-te a criares uma representação desse Cemitério de
Ilusões Perdidas. Podes fazê-lo sob a forma de um desenho, de uma pintura, de algo
moldado em barro ou em massa de moldar. Ou podes criar um conjunto de objetos que sejam
representativos desse Cemitério, talvez até dispostos como os imaginaste lá.
Desprende-te das noções de bonito ou de coerente. Cria o teu Cemitério, fazendo uma peça que
traga as emoções que vivenciaste.
Depois, coloca essa peça no teu altar, honrando assim tudo aquilo que sonhaste, idealizaste e, de
alguma forma, se perdeu, foi destruído ou nem chegou a ser.
Deixamos-te também três perguntas para reflexão: Como sentes a terra árida na tua vida? O que
sentes que mata, sufoca ou limita aquilo que é vibrante e vivo em ti? O que deixaste no Cemitério
das Ilusões Perdidas que te impeça de continuar em frente?
Partilha com o grupo de Peregrinos.
Dia 3

Em todas as estórias, como em todas a vidas, surgem situações que nos desafiam à mudança. Essa
abertura ao destino é assinalada pelo Trickster. Muitas vezes usado como o
trapaceiro, o bobo da corte, o brincalhão, esta figura mostra-nos que a vida não é a preto e branco,
que a rigidez nos magoa as articulações e que as certezas nos fazem perder chuvas
tropicais.
Na mitologia, o Trickster era assumido por Hermes, o mensageiro dos Deuses, e por Hécate, a
Senhora das Encruzilhadas.
Através de questões com respostas difíceis ou mesmo impossíveis, jogadas inesperadas ou uma
paisagem diferente no caminho, o Trickster, sob a forma de um mentiroso, de um mentor sarcástico
ou de uma Velha com boas questões, traz à nossa vida o desconforto sob a forma de uma nova
energia que nos obriga a reequilibrar tudo.
O Trickster diz-nos que nem tudo o que é bom faz bem e que nem tudo o que é mau nos fere. Ele
chama-nos à mudança e traz uma nova motivação para a viagem.
Hoje, pedimos-te que faças a visualização antes de avançares na estória.

Buscadores, Jardineiros, Curandeiros, Sonhadores e Artesãos dão um passo em frente.


Antes de entrar, porém, na Gruta escura, aquietam-se por instantes e inspiram profundamente. Junto
de cada um, a criança que um dia foram, as feridas abertas que se foram entranhando ao longo dos
anos, cada uma com um nome, uma memória. Não é fácil olhar de frente esse menino, essa menina,
que nos mostra os lugares de dor.
Por tanto tempo as feridas foram abafadas que acabaram por nos abafar a nós, às paisagens internas,
à Terra Árida a que pertencemos. Por tanto tempo acreditámos que poderíamos não as ver...
Mas há a fé e existe esta criança que nos olha. No meio da dor, a sua pequena mão encaixa
perfeitamente na nossa. O seu olhar diz-nos “Leva-me contigo e escolhe-me, mesmo quando
ninguém me escolheu. Eu sou tu e tu és eu.”
Esta é a Gruta Escura. Talvez seja dentro o lugar de saída da Terra Árida.
***
Quando estás pronta para a caverna do destino, para abraçar a escuridão, munes-te das tuas maiores
forças, pois nunca sabes o que poderás enfrentar. E, no entanto, a Ferida
Sagrada é fundamental, pois é o teu escudo e o teu coração. São os lugares de maior dor, mas as
fendas por onde a luz eventualmente entra.
A Criança Ferida carrega a chave para o teu destino nesta vida. Ela representa a Ferida Sagrada.
Enquanto encaras, sustentas e batalhas com os lutos e os horrores do coração da ferida, já não
consegues distanciar-te daquilo que tentas esconder. E é aí que poderás encontrar, um dia, as
maiores verdades desta vida.

Ou tu entras
Nesta porta
Ou não avançarás.
Se avançares
Haverá sempre o risco
De te lembrares do teu nome.
As coisas olham para ti em dobro
E tu tens de olhar para elas
E deixá-las acontecer.
Se não avançares
Vai ser possível
Viver valorosamente.
Manter as tuas atitudes
Agarrar a tua posição
Morrer de forma bravia.
Mas muito irá cegar-te.
Muito irá escapar-te
Quem sabe a que custo?
A porta em si
Não faz promessas
É apenas uma porta.
Adrienne Rich

Caminhamos? :)

Exercício do Dia 3
No dia de hoje, pedimos-te que faças uma aliança com a tua Criança Ferida. Ela será a tua parceira
dentro da gruta. Ela será a tua companhia, como tem sido durante tanto e tanto tempo.
Por isso, pedimos-te que vás à natureza, respires um pouco, caminhes um pouco. Pode ser uma
mata, uma praia, um pequeno jardim que tenhas perto de casa ou do trabalho. Tu escolhes onde ir.
Lá, encontra uma pequena pedra que te chame. Ela será o teu totem. A tua ligação à Criança.
Uma vez num lugar seguro, perto do teu altar, na própria natureza, se quiseres, murmura para a
pedra o Nome da tua Criança Ferida. Depois, sopra-lhe gentilmente, imbuindo-a de
vida na tua magia natural.
Trá-la contigo todos os dias, num bolso ou na tua mala. Quando a olhares ou sentires, acaricia-a,
aperta-a. Sussurra-lhe “eu levo-te comigo.”
Ao longo da noite, se quiseres, poderás colocá-la no teu altar.

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