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Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3

Diagramação: Camila Alves de Cremo


Correção: Maiara Ferreira
Indexação: Amanda Kelly da Costa Veiga
Revisão: Os autores
Organizadores: Marcelo Máximo Purificação
Eduardo Gusmão de Quadros
Neusa Valadares Siqueira

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

T314 Teologia, experiência religiosa e pensamento


contemporâneo 3 / Organizadores Marcelo Máximo
Purificação, Eduardo Gusmão de Quadros, Neusa
Valadares Siqueira. – Ponta Grossa - PR: Atena, 2023.

Formato: PDF
Requisitos de sistema: Adobe Acrobat Reader
Modo de acesso: World Wide Web
Inclui bibliografia
ISBN 978-65-258-1048-5
DOI: https://doi.org/10.22533/at.ed.485231502

1. Teologia. 2. Religião. I. Purificação, Marcelo Máximo


(Organizador). II. Quadros, Eduardo Gusmão de
(Organizador). III. Siqueira, Neusa Valadares (Organizadora).
IV. Título.
CDD 215
Elaborado por Bibliotecária Janaina Ramos – CRB-8/9166

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dos mesmos, para qualquer finalidade que não o escopo da divulgação desta obra.
Caros leitores, saudações.
Apresentamos a obra “ Teologia, Experiência Religiosa e Pensamento
Contemporâneo 3”, organizada em 4 capítulos, sistematizada nos diálogos
de pesquisadores da Universidad Adventista del Plata (UAP), Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Universidade Federal do
Tocantins (UFT- Porto Nacional), Associação Latino Americana de Literatura e
Teologia (ALALITE), Sociedade de Teologia e Ciências da Religião (SOTER),
Fundação Integrada Municipal de Ensino Superior (UNIFIMES), Universidade
Estadual de Goiás – (UEG) e Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC-
Goiás). O primeiro capítulo tem como tema: Desafíos en la construcción de
una teología veterotestamentaria: breve evaluación y contribuciones, onde
os autores André L. Vasconcelos e Eduardo Rueda Neto, discutem três dos
principais desafios relacionados com o desenvolvimento de uma teologia do
Antigo Testamento: o cânon do Antigo Testamento e sua relação com o Novo
Testamento; variação literária e temática no Antigo Testamento; e a natureza
APRESENTAÇÃO

descritiva/prescritiva do Antigo Testamento. No segundo capítulo – Ensino


religioso e a Base Nacional Comum Curricular - Rosileide Batista Glória e Valdir
Aquino Zitzke -, discorrem sobre o primeiro documento curricular proposto pelo
Ministério da Educação, em nível nacional, que orienta a oferta do Ensino
Religioso, a BNCC, trazendo à tona o processo de discussão do Ensino
Religioso na legislação brasileira, considerando as diferentes discussões até
a sua implantação nas escolas após da aprovação da BNCC. No terceiro
capítulo - Contemplando o nascimento de Jesus: as representações do ícone
da Natividade na arte sacra - Wilma Steagall De Tommaso -, apresenta e
desenvolve teologicamente os simbolismos presentes na cena do Nascimento
de Jesus ( Natividade), mostrando que o ícone da Natividade já aponta para a
Ressurreição, e que esse mistério não diz respeito apenas ao ser humano, mas
se refere à toda a Criação. O quarto capítulo - Sagrado, violência escolar e
cultura de paz, na perspectiva de alunos do 9º ano do ensino fundamental de
uma escola pública em Goiás - Marcelo Máximo Purificação, Eduardo Gusmão
de Quadros e Neusa Valadares Siqueira -, investigam, como se formam ou não
os conflitos relacionais no ambiente escolar com alunos, professores e alunos,
demais profissionais da educação e alunos, segundo a percepção de alunos do
9º ano, e se o Sagrado pode contribuir para uma cultura de paz no ambiente
escolar. Tais temas, discutidos e vistos através da lupa teórica da Teologia/
Ciências da Religião, ajudam a trazer o discurso religioso e a religiosidade
para diferentes contextos. Portanto, um livro de grande contribuição reflexiva
e dialógica que pode contribuir para a ampliação do diálogo teológico e sua
sintonia com campos afins como as ciências sociais e humanas. Desejamos a
todos uma boa leitura e boas reflexões.

Marcelo Máximo Purificação


Eduardo Gusmão de Quadros
Neusa Valadares Siqueira
APRESENTAÇÃO
CAPÍTULO 1 ............................................................................. 1
DESAFÍOS EN LA CONSTRUCCIÓN DE UNA TEOLOGÍA
VETEROTESTAMENTARIA: BREVE EVALUACIÓN Y CONTRIBUCIONES
André L. Vasconcelos
Eduardo Rueda Neto
https://doi.org/10.22533/at.ed.4852315021

CAPÍTULO 2 ............................................................................ 8
ENSINO RELIGIOSO E A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR
Rosileide Batista Glória
Valdir Aquino Zitzke
https://doi.org/10.22533/at.ed.4852315022

CAPÍTULO 3 ...........................................................................24
CONTEMPLANDO O NASCIMENTO DE JESUS: AS REPRESENTAÇÕES DO
ÍCONE DA NATIVIDADE NA ARTE SACRA
Wilma Steagall De Tommaso
https://doi.org/10.22533/at.ed.4852315023

CAPÍTULO 4 ...........................................................................38
SUMÁRIO

SAGRADO, VIOLÊNCIA ESCOLAR E CULTURA DE PAZ, NA PERSPECTIVA


DE ALUNOS DO 9º ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL DE UMA ESCOLA
PÚBLICA EM GOIÁS
Marcelo Máximo Purificação
Eduardo Gusmão de Quadros
Neusa Valadares Siqueira
https://doi.org/10.22533/at.ed.4852315024

SOBRE OS ORGANIZADORES ....................................................63

ÍNDICE REMISSIVO ..................................................................65


CAPÍTULO 1

DESAFÍOS EN LA CONSTRUCCIÓN DE UNA


TEOLOGÍA VETEROTESTAMENTARIA: BREVE
EVALUACIÓN Y CONTRIBUCIONES

Data de aceite: 01/02/2023

André L. Vasconcelos Nuevo Testamento; la variación literaria


Candidato a doctor en Teología y temática en el Antiguo Testamento; y la
Universidad Adventista del Plata naturaleza descriptiva/prescriptiva de los
http://lattes.cnpq.br/7414016548758714 escritos veterotestamentarios. Después de
una breve reflexión sobre cada uno de estos
Eduardo Rueda Neto
puntos, se señalan principios que pueden
Candidato a doctor en Teología
resultar útiles en la tarea de extraer teología
Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo de las páginas de las Escrituras hebreas.
http://lattes.cnpq.br/7175612413004722 PALABRAS CLAVE: Antiguo Testamento;
teología; canon.

RESUMEN: El Antiguo Testamento CHALLENGES IN THE


contiene los fundamentos de la fe
CONSTRUCTION OF AN OLD
TESTAMENT THEOLOGY: BRIEF
judeo-cristiana. En él se encuentran los
EVALUATION AND CONTRIBUTIONS
orígenes y el sustrato más elemental de
la Teología, de modo que todo pensar y ABSTRACT: The Old Testament contains
hacer teológicos pasan obligatoriamente the foundations of the Judeo-Christian faith.
por las Escrituras veterotestamentarias. In it are found the origins and the most
Sin embargo, la lectura y la interpretación elementary substratum of Theology, so that
del Antiguo Testamento no están exentas all theological thinking and doing necessarily
de obstáculos, los cuales, si se consideran pass through the Old Testament Scriptures.
de manera adecuada y se afrontan However, reading and interpreting the Old
cuidadosamente, pueden ser superados, Testament are not free from obstacles,
de tal forma que no representen un estorbo which, if properly considered and carefully
a la labor teológica. Este ensayo discurre addressed, can be overcome so that
sobre tres de los principales desafíos they do not hinder theological endeavor.
relacionados a la elaboración de una This essay discusses three of the main
teología del Antiguo Testamento: el canon challenges related to the development of an
veterotestamentario y su relación con el Old Testament theology: the Old Testament

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 1 1


canon and its relationship with the New Testament; literary and thematic variation in the Old
Testament; and the descriptive/prescriptive nature of the Old Testament writings. After a brief
reflection on each of these points, principles are pointed out that can be useful in the task of
extracting theology from the pages of the Hebrew Scriptures.
KEYWORDS: Old Testament; theology; canon.

1 | INTRODUCCIÓN
Estudiar el Antiguo Testamento es, al mismo tiempo, una tarea simple y desafiante.
Es simple porque hasta una persona sin formación teológica puede disfrutar de su
sabiduría y de su mensaje salvífico. Sus narrativas, su prosa y poesía encantan desde
el imaginario infantil hasta el gusto apurado de los académicos más exigentes. Por otra
parte, es desafiante porque nadie es capaz de agotar su profundidad teológica en los más
variados temas que se propone a tratar. Por eso debemos acercarnos al asunto con respeto,
conscientes de los problemas que dificultan esa tarea. La conciencia de los obstáculos con
los que nos encontramos en el camino nos permite prepararnos para superarlos, de suerte
que el estudio de las Escrituras sea lo más provechoso posible.
En realidad, son numerosos los desafíos metodológicos para el quehacer de
la teología veterotestamentária, pero, por una cuestión de delimitación, este ensayo —
que no pretende ser exhaustivo, sino solo abrir caminos para la discusión— se propone
a reflexionar acerca de apenas tres de ellos: el canon veterotestamentário y su relación
con el Nuevo Testamento; la variación literaria y temática en el Antiguo Testamento; y la
naturaleza descriptiva/prescriptiva de los escritos veterotestamentários.

2 | EL CANON VETEROTESTAMENTÁRIO Y SU RELACIÓN CON EL NUEVO


TESTAMENTO
Uno de los primeros desafíos que precisan ser evaluados para la construcción de
una teología veterotestamentária es la organización del canon del Antiguo Testamento.
La secuencia de libros adoptada en la mayoría de las Biblias modernas sigue, en líneas
generales, el orden de la Septuaginta y de la Vulgata. Esa división cuádrupla (Ley,
Historia, Poesía y Profecía) refleja bien la variación de géneros y temas de la literatura
veterotestamentária, la cual también recibe una fuerte influencia cristiana posterior. Sweeney
(2011, p. 360-361) sintetizó en pocas palabras el impacto de esa estructura canónica en el
imaginario colectivo cristiano, lo que refleja directamente en el quehacer teológico:
El Pentateuco presenta el pasado lejano en la medida en que expone los
orígenes o fundación del mundo y de Israel. Los libros históricos presentan el
pasado más reciente en la medida en que exponen la historia de Israel desde
el tiempo de la conquista bajo Josué hasta el período persa representado
por Esdras-Nehemías y el libro de Ester. Los libros poéticos y sapienciales
presentan las inquietudes del presente, es decir, las preocupaciones
atemporales del espíritu humano tal como se refleja en la religiosidad de los

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 1 2


Salmos, la sensualidad del Cantar de los Cantares o la especulación intelectual
de los libros sapienciales. Finalmente, los libros proféticos se enfocan en el
futuro como fue previsto por los profetas del Antiguo Testamento. Dada su
posición en el canon cristiano, señalan naturalmente al Nuevo Testamento
como el cumplimiento de sus visiones del futuro y, por lo tanto, contribuyen a
la perspectiva general del todo.1

En otras palabras, la división cuádrupla del canon veterotestamentário favorece que


el lector presuponga, aunque inadvertidamente, que el Antiguo Testamento debe ser leído a
la luz del Nuevo; o sea, de la última revelación hacia la primera. Eso naturalmente genera un
problema epistemológico para la interpretación del texto veterotestamentário. El mensaje
que se pasa es que no se puede entender al Antiguo Testamento sin el Nuevo. ¿Pero cómo
los autores del Nuevo Testamento lograron entender el mensaje veterotestamentário?
Obviamente, el Nuevo Testamento aún no había sido escrito. Luego, si ellos fueron capaces
de interpretar el Antiguo Testamento a partir del propio texto, nosotros también deberíamos
ser capaces de hacerlo, desde que tengamos las mismas presuposiciones hermenéuticas.
Es importante resaltar aquí que, de hecho, en la comprensión cristiana, existe una
profunda interdependencia entre el Antiguo y el Nuevo Testamento, de modo que el primero
es incompleto sin el segundo, y el segundo no tiene sentido pleno sin el primero. Sin embargo,
esta insuficiencia del Antiguo Testamento en la ausencia del Nuevo, evidentemente, no lo
hace incomprensible. En realidad, desde la perspectiva del Nuevo Testamento, la revelación
veterotestamentária es la base para la construcción del mensaje judeo-cristiano (Jn 5:39,
46; cf. Hb 1:1). Eso parece implicar que el mensaje del Nuevo Testamento debe ser visto
como un desarrollo o una ampliación del mensaje veterotestamentário, y no como un atajo
interpretativo.
El problema de usar —de manera exclusiva y unilateral— las lentes neotestamentárias
para interpretar el Antiguo Testamento no necesariamente está en leer los dos conjuntos de
modo sincronizado, sino más bien en imponer conceptos teológicos ya desarrollados en el
Nuevo Testamento al texto veterotestamentário. Por ejemplo, ¿es justo decir que Job 19:25
y 26 tenía el mismo concepto de resurrección que el pasaje de 1 Tesalonicenses 4:16 y 17?
Si queremos hacer una teología bíblica que lleve en consideración la lectura de ambos los
Testamentos, pero sin incurrir en ese error epistemológico, deberíamos considerar que la
orientación correcta para leer las Escrituras es del Antiguo hacia el Nuevo Testamento. Esta
direccionalidad de la lectura está en armonía con el concepto de revelación progresiva. En
las palabras de Beale (2013, p. 51), “a la luz de la revelación progresiva, los pasajes del

1 “The Pentateuch presents the distant past insofar as it presents the origins or foundation of the world and of Israel. The
Historical Books present the more recent past insofar as they present the history of Israel from the time of the conquest
under Joshua through the Persian period as represented by Ezra-Nehemiah and the book of Esther. The Poetic and
Wisdom Books present the concerns of the present, that is, the timeless concerns of the human spirit as it is reflected in
the religiosity of the Psalms, the sensuality of the Song of Solomon, or the intellectual speculation of the Wisdom Books.
Finally, the Prophetic Books focus on the future as envisioned by the prophets of the Old Testament. Given their position
in the Christian canon, they naturally point to the New Testament as the fulfillment of their visions of the future and there-
by contribute to the overall perspective of the whole.”

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 1 3


Antiguo Testamento no reciben sentidos nuevos o contradictorios, sino que pasan por una
expansión orgánica o desarrollo de sentido”,2 tal como el potencial de una semilla resulta
en un árbol plenamente desarrollado.
Es necesario destacar que no se está proponiendo aquí un tipo de método traditivo-
diacrónico, como el defendido por Gese (1977, p. 322), en que la unidad de los dos
Testamentos se da por medio de la “historia de las tradiciones” y el Nuevo Testamento es
visto solamente como la conclusión traditiva del Antiguo. Lo que se está argumentando es
simplemente que debemos tener cuidado para no leer el Antiguo Testamento de manera
anacrónica.
Volviendo al tema del canon, hemos visto que la división cuádrupla puede favorecer
algún equivoco epistemológico, pero ¿y cuánto a la división tripartida? La división del
canon en Torah, Ketuvim y Nevi’im no es atestada en el texto del Antiguo Testamento; ella
depende de fuentes externas, como el propio Nuevo Testamento (cf. Lc 24:44), el prólogo
de Eclesiástico y la tradición. En efecto, la única división claramente presentada en el texto
veterotestamentário es la Torah (cf. Jos 8:31; 23:6; 2Re 14:6; 23:25; Ne 8:1; Ml 3:22).
Como se puede ver, el primer desafío para la construcción de una teología
veterotestamentária es definir la organización del canon —lo que implica directamente en
la forma como se ve la unidad de los dos Testamentos y la direccionalidad de su relación.
Quizá, ya que no existe una división clara del canon en el texto del Antiguo Testamento, sería
más razonable y natural admitir la tradición del canon tripartido que llegó hasta nosotros
y que fue confirmada por Jesús y sus discípulos. Esta definición puede constituir una
primera acción práctica importante para quien desea trabajar sobre la teología del Antiguo
Testamento. Adoptar esta organización del canon hebreo no disminuirá la noción de que
el Nuevo Testamento es la continuación orgánica del Antiguo, pero puede eventualmente
facilitar una interpretación más coherente de las Escrituras veterotestamentárias.

3 | LA VARIACIÓN LITERARIA Y TEMÁTICA EN EL ANTIGUO TESTAMENTO


El segundo desafío relacionado con la delineación de una teología del Antiguo
Testamento tiene que ver con la discusión referente a si existe un centro (mitte, en alemán)
suficientemente capaz de organizar y articular todos los libros del Antiguo Testamento.
Particularmente, creemos que el pacto podría servir como un tema transversal que funcione
como un eje de la historia de la redención, teniendo el gran conflicto entre el bien y el
mal como trasfondo. En este caso, se podría elaborar el siguiente cuadro conceptual: el
Pentateuco contiene el detallamiento del pacto, los profetas amonestan el pueblo de Israel
a obedecer ese pacto y los libros poéticos y sapienciales lo tienen como uno de sus asuntos
favoritos, tema a menudo estructurante. A pesar de ello, reconocemos que el pacto parece

2 “[…] à luz da revelação progressiva, as passagens do Antigo Testamento não recebem sentidos novos ou contraditó-
rios, mas, em vez disso, passam por uma expansão orgânica ou desenvolvimento de sentido.”

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 1 4


no ser lo bastante amplio para dar cuenta de una teología del Antiguo Testamento completa
en todos sus matices, aunque algunos, como Eichrodt (2004), lo hayan emprendido.
El santuario es otro tópico muy importante, que no debería ser ignorado. Como
argumentó Timm (2020) con bastante fundamentación, el tema del santuario sirve como un
factor integrador entre las principales doctrinas bíblicas. En efecto, se puede decir que toda
la historia de la redención atraviesa el ambiente del santuario y sus ceremonias típicas, ya
sea prospectiva o retroactivamente, siendo este tema un hilo de oro desde el Antiguo hasta
el Nuevo Testamento. Sin embargo, a pesar de su papel preponderante, tampoco se puede
decir que el motif del santuario/templo funcione como un principio organizador para todo el
contenido veterotestamentário.
Hasel dedicó una obra entera para decir que ningún tema o tópico cumple
satisfactoriamente este propósito, a pesar de reconocer que Dios es el centro de la
revelación en las Escrituras. El pensamiento de Hasel (2015, p. 205) es convincente:
Como ningún tema, esquema o tópico es lo suficientemente completo
para englobar todas las variedades contenidas en los puntos de vista
veterotestamentários, es necesario abstenerse de usar un determinado
concepto, fórmula, idea básica, etc. como el centro del Antiguo Testamento,
a través del cual se alcance una sistematización de los múltiples y variados
testimonios del Antiguo Testamento. Por otro lado, necesitamos ratificar que
Dios es el centro del Antiguo Testamento como su tema central. Al decir
que Dios es el centro del Antiguo Testamento, afirmamos que la Escritura
del Antiguo Testamento tiene un contenido central, sin caer en la trampa
de organizar en un sistema el carácter centrado en acontecimientos de la
revelación por la cual Dios se manifiesta. Así, se evita sistematizar lo que no se
puede sistematizar, pero no se deja de captar su naturaleza esencial.3

Por más que temas transversales como el pacto y el santuário sean importantes,
ningún de ellos es tan amplio como Dios. Y aunque se tenga Dios como principio articulador
para elaborar una teología veterotestamentária, todavía encontramos problemas con
algunos libros, como Ester (que ni siquiera menciona el nombre de Dios), Cantar de
los Cantares (que enfoca el matrimonio) y Proverbios (cuyo centro es la sabiduría y los
desdoblamientos éticos de su aceptación).
Por lo tanto, un segundo punto importante para hacer una teología veterotestamentária
arraigada firmemente en el suelo bíblico es reconocer que es imposible organizar los
múltiples temas del Antiguo Testamento por medio de un único concepto transversal y todo-
abarcante.

3 “Como nenhum tema, esquema ou tópico é suficientemente abrangente para englobar todas as variedades contidas
nos pontos de vista veterotestamentários, é preciso abster-se de usar um determinado conceito, fórmula, ideia básica,
etc. como o centro do AT, através do qual se alcance uma sistematização dos testemunhos múltiplos e variegados do
AT. Por outro lado, precisamos ratificar que Deus é o centro do AT como seu tema central. Ao dizermos que Deus é o
centro do AT, afirmamos que a Escritura do AT possui um conteúdo central, sem cairmos na armadilha de organizar num
sistema o caráter centrado em acontecimentos da revelação pela qual Deus se manifesta. Evita-se, assim, sistematizar
o que não pode ser sistematizado, mas não se deixa de captar sua natureza essencial.”

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 1 5


4 | LA NATURALEZA DESCRIPTIVA/PRESCRIPTIVA DE LOS ESCRITOS
VETEROTESTAMENTÁRIOS
El tercero y último desafío señalado en este ensayo está relacionado con el propio
rol de la teología veterotestamentária como disciplina. La idea de que la teología del Antiguo
Testamento —y por extensión la teología bíblica, es decir, la ramificación de la Teología que
se preocupa con el texto bíblico y la exégesis— es puramente histórica o descriptiva remite
a la clase inaugural de Johann Philip Gabler (1753-1826) en la Universidad de Altdorf en 31
de marzo de 1787 (HASEL, 2015, p. 267). Su objetivo era establecer una clara distinción
entre la teología bíblica y la sistemática, que es por naturaleza prescriptiva.
Sin embargo, en lo que se refiere específicamente al quehacer de la teología
veterotestamentária, ¿sería legítimo mirar el contenido del Antiguo Testamento solamente
como la “historia de la salvación”, como la Heilsgeschichte de Gerhard von Rad? En este
caso, ¿cuál sería la diferencia conceptual entre historia y teología?
Es importante reafirmar que, si queremos desarrollar una teología veterotestamentária
que esté arraigada en las Escrituras, es necesario considerar la propia naturaleza del
texto. ¿Y cómo es el texto del Antiguo Testamento: prescriptivo o descriptivo? Al parecer,
la mejor respuesta es los dos. Existen pasajes veterotestamentários, como las genealogías
y las listas de materiales usados en la construcción del templo, que tienen un carácter
principalmente, pero no exclusivamente, descriptivo. Por otro lado, las leyes apodícticas
y casuísticas del Pentateuco son, por ejemplo, esencialmente prescriptivas. También se
debe llevar en consideración que incluso las secciones históricas del Antiguo Testamento,
que narran las victorias y fracasos del pueblo y de los héroes de Israel, sirven como una
exhortación al lector.
La cuestión que todavía permanece es si el enfoque prescriptivo es una atribución
de la teología bíblica o de la sistemática. En nuestra opinión, la diferencia se encuentra
en el ámbito de actuación de cada disciplina. La sistemática debería centrarse más en
aspectos doctrinarios, mientras que la teología bíblica se centra en la teología de un libro
o sección de las Escrituras. Ambas pueden tener un enfoque prescriptivo sin comprometer
su abordaje metodológico. Al final, las dos deberían considerar la Biblia como su punto de
partida —y el texto, como ya mencionado, parece ser tanto de naturaleza descriptiva como
de naturaleza prescriptiva.
Childs (1970, p. 141) resumió bien la idea de que la teología veterotestamentária
debe contener estos dos enfoques: “Cuando vistas desde el contexto del canon, tanto la
cuestión de lo que quería decir el texto como la de lo que él quiere decir [cursivas añadidas]
están inseparablemente conectadas y ambas forman parte de la tarea de interpretar la
Biblia como Escritura.”4
Luego, el tercer factor que debe tenerse en cuenta para hacer una teología

4 “When seen from the context of the canon both the question of what the text meant and what it means are inseparably
linked and both belong to the task of the interpretation of the Bible as Scripture.”

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 1 6


veterotestamentária es considerar que el texto del Antiguo Testamento no es solamente
descriptivo e historicista, sino también prescriptivo y normativo.

5 | CONCLUSIÓN
No hay dudas de que el asunto es mucho más complejo de lo que fue presentado en este
ensayo, que reflexionó sobre tres de los varios desafíos para elaborar una teología del Antiguo
Testamento que esté embazada en el texto bíblico, a saber: el canon veterotestamentário y su
relación con el Nuevo Testamento; la variación literaria y temática en el Antiguo Testamento; y
la naturaleza descriptiva/prescriptiva de los escritos veterotestamentários.
A pesar de la evidente brevedad y objetividad de este estudio, después de analizar
esos tres desafíos, podemos señalar al menos cuatro principios que pueden ayudar en
la desafiante tarea de hacer teología veterotestamentária: (1) aunque no haya ninguna
evidencia interna conclusiva, la tradicional división tripartida parece ser la opción más
adecuada y natural de organización canónica del Antiguo Testamento; (2) no hay problema
en leer los dos Testamentos de manera sincronizada, pero es necesario prestar atención
a la direccionalidad de la lectura y cuidar para no hacer un análisis exegético anacrónico;
(3) aunque Dios sea el centro de la revelación bíblica, no hay en el Antiguo Testamento
ningún tópico ni tema transversal único que funcione como un principio articulador capaz
de organizar toda la revelación veterotestamentária; y, (4) considerando que el texto bíblico
tiene tanto naturaleza descriptiva como prescriptiva, una teología del Antiguo Testamento
que intente seguir parámetros bíblicos debería reproducir esa misma tendencia.

REFERENCIAS
BEALE, Gregory K. Manual do Uso do Antigo Testamento no Novo Testamento. São Paulo, SP:
Vida Nova, 2013.

CHILDS, Brevard S. Biblical Theology in Crisis. Philadelphia, PA: Westminster Press, 1970.

EICHRODT, Walther. Teologia do Antigo Testamento. São Paulo, SP: Hagnos, 2004.

GESE, Harmut. Tradition and Biblical Theology. In: KNIGHT, Douglas A. (ed.). Tradition and Theology
in the Old Testament. Philadelphia, PA: Fortress Press, 1977.

HASEL, Gerhard. Teologia do Antigo e Novo Testamento: Questões Básicas no Debate Atual. Santo
André, SP: Academia Cristã, 2015.

SWEENEY, Marvin A. Tanak versus Old Testament: Concerning the Foundation for a Jewish Theology
of the Bible. In: SUN, Henry T. C. et al. (ed.). Problems in Biblical Theology: Essays in Honor of Rolf
Knierim. Eugene, OR: Wipf & Stock Publishers, 2011.

TIMM, Alberto R. O Santuário e as Três Mensagens Angélicas: Fatores Integrativos no


Desenvolvimento das Doutrinas Adventistas. Engenheiro Coelho, SP: Unaspress, 2020.

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 1 7


CAPÍTULO 2

ENSINO RELIGIOSO E A BASE NACIONAL


COMUM CURRICULAR

Data de aceite: 01/02/2023

Rosileide Batista Glória toda a história da educação brasileira, a


Universidade Federal do Tocantins. BNCC foi o primeiro documento curricular
Campus de Porto Nacional. Curso de cuja escrita considerou uma consulta
Geografia. Porto Nacional, Tocantins popular. A permanência do Ensino Religioso
http://lattes.cnpq.br/1239922209289819 pode ser o primeiro passo para sanar
Valdir Aquino Zitzke dúvidas que surgiram durante o processo
de organização de seu controverso
Universidade Federal do Tocantins.
Campus de Porto Nacional. Curso de conteúdo, levando o Ministério da Educação
Geografia. Porto Nacional, Tocantins a considerar que ele, sob um algum modelo,
http://lattes.cnpq.br/4103992586860335 pode contribuir para a formação e para o
exercício da cidadania.
PALAVRAS-CHAVE: Ensino religioso;
BNCC; Recurso didático.
RESUMO: A proposta do Ensino Religioso
na Base Nacional Comum Curricular possui ABSTRACT: The proposal of Religious
um caráter não confessional, motivo que Education in the National Common
evidencia ainda mais a problemática em Curricular Base has a non-denominational
torno dos interesses que historicamente character, a reason that highlights even
contornaram e contornam a educação more the problem around the interests that
brasileira. Este artigo tem por objetivo historically circumvented and circumvents
discorrer sobre o primeiro documento Brazilian education. This article aims to
curricular proposto pelo Ministério da discuss the first curriculum document
Educação, em nível nacional, que orienta a proposed by the Ministry of Education, at the
oferta do Ensino Religioso, a BNCC. Esta national level, which guides the provision
pesquisa se justifica por trazer à tona o of Religious Education: the NCCB. This
processo de discussão do Ensino Religioso research is justified by bringing to light the
na legislação brasileira, considerando as process of discussion of Religious Education
diferentes discussões até a sua implantação in Brazilian legislation, considering the
nas escolas a partir da aprovação da BNCC. different discussions until its implementation
É interessante observar que, ao longo de in schools after the approval of the NCCB. It

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 2 8


is interesting to note that, throughout the history of Brazilian education, the NCCB was the first
curriculum document whose writing was considered a popular consultation. The permanence
of Religious Education can be the first step to resolve doubts that arose during the process of
organizing its controversial content, leading the Ministry of Education to consider that it, under
some model, can contribute to the formation and exercise of citizenship.
KEYWORDS: Religious education; ABNCC; Didactic resource.

1 | INTRODUÇÃO
Criada sob a égide da redemocratização e da legislação educacional pertinente
a este período, a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) é caracterizada pelo longo
processo de construção, permitindo consultas públicas e a docentes e especialistas de
cada área do conhecimento.
A proposta do Ensino Religioso (ER) na Base Nacional Comum Curricular (BNCC)
possui um caráter não confessional, motivo que evidencia ainda mais a problemática em
torno dos interesses que historicamente contornaram e contornam a educação brasileira.
Seu caráter não proselitista reafirma a necessidade do estudo do conhecimento religioso
na escola, a partir de pressupostos éticos e científicos (POZZER; PALHETA, 2021). Mas é
preciso ser realista: a escola não é o único lugar, sendo, porém, um dos mais vantajosos
para a transmissão dos conhecimentos e das funções e vivências da educação religiosa.
Este artigo tem por objetivo discorrer sobre o primeiro documento curricular proposto
pelo Ministério da Educação, em nível nacional, que orienta a oferta do Ensino Religioso: a
Base Nacional Comum Curricular (BNCC).
Este objetivo foi alcançado através de pesquisa documental, consultando
principalmente textos legais, diretrizes educacionais, versões preliminares da Base Nacional
Comum Curricular, Pareceres do Conselho Nacional de Educação, sítios da internet sobre
a construção da BNCC, dentre outros.
Esta pesquisa se justifica por trazer à tona o processo de discussão do E sino
Religioso na legislação brasileira, considerando as diferentes discussões até a sua
implantação nas escolas a partir da aprovação da BNCC.

2 | ENSINO RELIGIOSO NO BRASIL


Para Cury (2004) o ensino religioso é alvo de polêmicas e o único conteúdo curricular
previsto no texto constitucional brasileiro (BRASIL, 2017a), desde a sua oferta como
disciplina no período colonial, passando pelo Império, sempre sob o modelo confessional
católico (SAVIANI, 2010), mas, com a proclamação da República, teve um primeiro
momento de ousadia laicista na educação, eliminando a disciplina.
Verifica-se que sempre houve um viés político em relação à oferta ou supressão do
Ensino Religioso nas escolas públicas brasileiras. Da mesma forma, não foram considerados
os interesses e anseios da população e dos educadores ao se constituir legislação sobre

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 2 9


o tema, o que evidencia que uma das particularidades do Ensino Religioso no Brasil é,
precisamente, a construção epistemológica rudimentar (CURY, 2004).
No decorrer da história da educação brasileira, o Ensino Religioso sempre
cooperou para a manutenção de um projeto de país, aculturando e conformando os
alunos de acordo com o projeto pretendido pelas elites governantes (CUNHA, 2013). Com
a redemocratização, nos anos 1980, esse tipo de utilização não mais seria adequado,
posto que o texto constitucional valorizasse as liberdades individuais e a diversidade
cultural e étnica da população como um fator de composição da nação e, mesmo assim, a
Constituição brasileira previu a sua oferta nas escolas.
Luiz Carlos Borin (2018) organizou a história do Ensino Religioso no Brasil e, a partir
dele, apresentamos um resumo de cada período histórico até os dias atuais.

2.1 O Ensino Religioso no período colonial e imperial


Os primeiros passos para a educação religiosa no Brasil se deu com a vinda dos
jesuítas por volta do ano de 1549, com a máxima de promover, por meio dos ensinamentos
religiosos, a concordância aos costumes e à cultura dos colonizadores portugueses.
Severino (1986) defende que as verdades católicas compreendidas nesse período tinham:
[...] os princípios de uma ética individualista e social fundada na suprema
prioridade da pessoa sobre a sociedade. A qualidade moral dos indivíduos
repercutirá necessariamente sobre a qualidade moral da sociedade. Todo o
investimento da evangelização, em sentido estrito, como da educação, sob
inspiração cristã, se deu historicamente nesta linha. Foi por isso mesmo que
o Cristianismo e a Igreja conviveram pacificamente com situações sociais de
extrema opressão, com a escravidão, a exploração no trabalho etc. É como
se estas situações independessem da vontade do homem, bastando que as
consciências individuais se sentissem em paz, nada se podendo fazer contra
estas situações objetivas. (SEVERINO, 1986, p. 71)

A educação religiosa, neste período, ligava-se ao pensamento ideológico do Estado,


que privilegiava uma elite, passando a ser pensada como um ideal das classes dominantes
e, nessa perspectiva, escola e professores estão inseridos em um projeto unitário que
visava à escravidão dos nativos e dos negros escravizados.
A educação jesuítica buscava trazer seguidores para o catolicismo e o ensino
religioso era sinônimo de doutrinação, priorizando as “aulas de catequese” aos nativos e
negros considerados “pagãos”, tendo como enfoque central a promoção de uma “Verdade
de Fé” vinculada à religião cristã. Por essa opção, o ensino religioso cometeu constantes
violências simbólicas contra os educandos e professores, impondo credo e religião. O
Quadro 1 apresenta uma resumo deste período histórico.

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 2 10


1549 Os missionários jesuítas liderados por Manuel da Nóbrega chegaram ao Brasil. O colégio
da Companhia de Jesus, em Salvador, passa a ser a primeira de muitas escolas públicas e
gratuitas no nosso país. Seus propósitos catequéticos foram suas metas.
1759 Com a expulsão dos jesuítas o ensino público passa a outros setores da Igreja Católica,
sendo mais conservador e mais catequético.
1824 O Brasil passa a ter a sua primeira Constituição, conhecida como “Constituição Política do
Império do Brazil”, no qual estabelece que a Igreja Católica Apostólica Romana continue
sendo a Religião oficial do Império.
Quadro I: Primeira Fase
Fonte: Borin (2018)

2.2 O ensino religioso no período republicano


A proclamada laicidade, nas escolas, indicava que o Ensino de Religião sempre
esteve comandado pelos princípios instituídos pela Igreja Católica. A primeira redação
da Constituição da República (1824) permitia a oferta de Ensino Religioso nas escolas
confessionais, não mais nas mantidas pelo Estado. A liberdade, um dos ideais da Revolução
Francesa, foi colocada em prática por meio da laicização do Estado. Nas palavras de Cury
(2001), o Estado:
[...] se laiciza, repondo a liberdade plena de culto e a separação da Igreja e
do Estado (...) e põe o reconhecimento exclusivo pelo Estado do casamento
civil, a secularização dos cemitérios e finalmente determina a laicidade nos
estabelecimentos de ensino mantidos pelos poderes públicos. (CURY, 2001,
p. 76)

A laicidade proposta pela primeira Constituição Republicana não teve total êxito
na “República Velha” (1889 e 1930), mas a chegada da Revolução promoveu mudanças
significativas na relação entre Igreja e Estado, com uma forte pressão da Igreja para retomar
seu espaço até então sem maiores influências. A Igreja Católica aproximou-se do governo
de Getúlio Vargas e garantiu a volta facultativa da instrução religiosa às escolas públicas
em nível primário, secundário e normal. O fato de se tornar uma modalidade de ensino
facultativo representa, de certa forma, um desprezo ao conhecimento religioso, mas, os
conteúdos e a didática seriam definidos pelas autoridades eclesiásticas.
Como na Constituição de 1937, a próxima Carta Magna (1946) não teve vida longa,
definiu no artigo 168, inciso V, que o Ensino Religioso “constitui disciplina dos horários das
escolas oficiais, é de matrícula facultativa e será ministrado de acordo com a confissão
religiosa do aluno, manifestada por ele, se for capaz, ou pelo seu representante legal ou
responsável.” (BRASIL, 1946).
A Lei nº 4.024, do dia 20 de dezembro de 1961, estabeleceu que as Diretrizes e
Bases da Educação no Brasil seriam fundamentadas no princípio de liberdade com o ideal
de solidariedade humana. Assim, estabeleceu que o Ensino Religioso:
Art. 97. O ensino religioso constitui disciplina dos horários das escolas oficiais,

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 2 11


é de matrícula facultativa, e será ministrado sem ônus para os poderes
públicos, de acordo com a confissão religiosa do aluno, manifestada por ele,
se for capaz, ou pelo seu representante legal ou responsável. § 1º A formação
de classe para o ensino religioso independe de número mínimo de alunos.
§ 2º O registro dos professores de ensino religioso será realizado perante a
autoridade religiosa respectiva. (BRASIL, 1961)

O Quadro 2, a seguir, apresenta um resumo dos principais eventos relacionados ao


Ensino religioso.

1890 Com a proclamação da República Federativa do Brasil, os interesses positivistas dominam


o cenário brasileiro. Com o Decreto 119-A o presidente Manoel Deodoro da Fonseca, deixa
claro que há uma proibição dos estados, bem como das autoridades federais no que se
refere às matérias religiosas e declara plena liberdade de cultos de quaisquer manifestações
de crenças.
1891 Com a Carta Magna Republicana o Estado separa de quaisquer religiões ou cultos e declara
que o ensino será leigo sendo ministrado nos estabelecimentos públicos de ensino. A
normativa prevê que todas as religiões são aceitas no nosso país, tendo suas práticas livres
e abertas.
1931 O Ensino religioso é novamente introduzido nas escolas públicas, sendo ela de matéria
facultativa.
1934 Com a nova Constituição o Ensino Religioso terá frequência facultativa e será ministrado de
acordo com os princípios da confissão religiosa do aluno, no qual essa manifestação será
declarada pelos pais ou responsáveis. A “aula constituirá como matéria dos horários normais
das escolas públicas primárias, secundárias, profissionais e normais”.
1946 A Constituição determina que: “O ensino religioso constitui disciplina dos horários das
escolas oficiais, é de matrícula facultativa e será ministrado de acordo com a confissão
religiosa do aluno, manifestada por ele, se for capaz, ou pelo seu representante legal ou
responsável”.
1961 Esse período é marcado pela primeira Lei de Diretrizes e Bases (LDB 4024/61) e no artigo
97 propõe: O ensino religioso constitui disciplina dos horários das escolas oficiais, é de
matrícula facultativa, e será ministrado sem ônus para os poderes públicos, de acordo com
a confissão religiosa do aluno, manifestada por ele, se for capaz, ou pelo seu representante
legal ou responsável. § 1º A formação de classe para o ensino religioso independe de
número mínimo de alunos. § 2º O registro dos professores de ensino religioso será realizado
perante a autoridade religiosa respectiva.
Quadro 2 : Segunda fase
Fonte: Borin (2018).

2.3 O ensino religioso na ditadura militar


Com o golpe militar em 1964, a educação no Brasil sofreu dois traumas: a reforma
do Ensino Superior, em 1968 e, logo em seguida, em 1971, a reforma do então primeiro
e segundo graus, seguido de leis e decretos que visavam “condicionar” (ensinar) e incutir
valores considerados fundamentais para o exercício de uma “boa cidadania”, tendo a
educação um papel importante para a formatação do perfil ideal para os comandantes da
ditadura.
Entre as idéias básicas publicadas no Diário Oficial da União (1968) o item 2.6
destaca a importância dos seguintes aspectos:

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 2 12


[...] ressaltar a necessidade de a evolução nacional ser fundamentada nas
tradições cristãs brasileiras, dando ênfase à língua, aos símbolos nacionais,
às tradições culturais (inclusive o folclore), ao papel das etnias formadoras,
e às biografias sintéticas de brasileiros, já falecidos, cuidadosamente
selecionados, que se hajam constituído modelo (sic) de virtudes morais e
cívicas. (DIÁRIO OFICIAL DA UNIÃO, 1968, p. 2856)

Nesse período, novamente aconteceu uma reaproximação entre Estado e Igreja,


mas o Ensino Religioso não conseguiu espaço como disciplina obrigatória nos currículos
escolares. O artigo 176, § 3º, inciso V, da Emenda nº 01/1969 afirmava que o Ensino
Religioso é de matrícula facultativa, tendo suas aulas nos horários normais das escolas
oficiais, tanto no ensino de primeiro grau como no de segundo. Nesse período ainda foi
editada a Lei nº 5.692, de 11 de agosto de 1971, que fixou as Diretrizes e Bases da Educação
para o ensino de primeiro e segundo graus e manteve o Ensino Religioso facultativo nas
escolas oficiais.
Assim, o Ensino Religioso passou a ter a finalidade de tornar um cidadão capaz de
cumprir com suas obrigações, não desrespeitando as autoridades e vivendo os valores da
sociedade. Sua metodologia consistia em instigar a vivência de valores morais e espirituais,
combatendo toda forma de subversão, religiosa ou civil:
“projetar os valores espirituais e morais da nacionalidade na educação, tendo
em vista conter o egoísmo, a corrupção e a subversão, no trato adequado do
bem comum dos brasileiros, e eliminar os privilégios” (BRASIL, 1968, p. 2856).

O Quadro 3, abaixo, apresenta os principais momentos deste período que


influenciaram na oferta do Ensino Religioso nas escolas brasileiras.

1967 A “Constituição Militar” prevê que o Ensino Religioso continua sendo de matrícula facultativa
e será disponibilizada a disciplina nos horários normais das escolas de primeiro e segundo
graus.
1969 A emenda constitucional número 1/1969 deixa o mesmo texto da Constituição de 1967.
1971 Para manter o status quo, os militares criam disciplinas que formatará seu caráter
“alienador”. A segunda LDB (5692/71) obriga a inclusão da disciplina de Educação Moral e
Cívica, Educação Física, Educação Artística e Programas de Saúde nos currículos plenos
dos estabelecimentos de primeiro e segundo graus. Quanto o Ensino Religioso continua com
as matrículas facultativas e constituirá disciplina dos horários normais dos estabelecimentos
oficiais de primeiro e segundo graus.
Quadro 3: Terceira fase
Fonte: Borin (2018).

2.4 O ensino religioso e o período da redemocratização do Brasil


Com a promulgação da Constituição Federal de 1988 e a aprovação da Lei nº
9.394 (BRASIL, 1996), novos rumos passaram a definir as Diretrizes e Bases que regem
a educação nacional. Com a publicação Lei nº 9.475/97, que alterou o Art. 33 da LDB,
o Ensino Religioso foi formatado de maneira que privilegiasse a diversidade religiosa e

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 2 13


cultural presente na sociedade:
Art. 33. O ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da
formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários normais das
escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade
cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo.
(Redação dada pela Lei nº 9.475, de 22.7.1997).

§ 1º Os sistemas de ensino regulamentarão os procedimentos para a


definição dos conteúdos do ensino religioso e estabelecerão as normas
para a habilitação e admissão dos professores. (Incluído pela Lei nº 9.475,
de 22.7.1997) § 2º Os sistemas de ensino ouvirão entidade civil, constituída
pelas diferentes denominações religiosas, para a definição dos conteúdos do
ensino religioso. (Lei nº 9.475, de 22.7.1997).

Já no início da Lei nº 9.475/97 consta que “o ensino religioso, de matrícula


facultativa, é parte integrante da formação básica do cidadão”, parecendo ser contraditório
uma disciplina ser integrante para a formação básica do cidadão e, ao mesmo tempo, ser
facultativo.
A finalidade da proposta contida na referida Lei é ressignificar o fenômeno religioso
a partir de outras ideias que não sejam somente as do ponto de vista católico-cristão, é
trabalhar as questões do sentido da vida e da dimensão do sagrado nas diversas concepções
e tradições religiosas. Nos parâmetros estabelecidos pelo Fórum Nacional Permanente de
Ensino Religioso (FONAPER, 1998), lê-se que a finalidade do ensino religioso é:
[...] subsidiar o conhecimento através do tratamento didático de eixos de
conteúdos que incluem: culturas e tradições religiosas; escrituras sagradas e/
ou tradições orais; teologias; ritos e ethos, para ir sensibilizando para o mistério,
capacitando para a leitura da linguagem mítico simbólica e diagnosticando
a passagem do psicossocial para a metafísica/Transcendente. (FONAPER,
1998, s/n).

O Quadro 4 organiza os principais momentos do período de redemocratização


brasileira e os principais eventos que contribuíram para o Ensino Religioso:

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 2 14


1988 Proclamada a “Constituição Cidadã”. Com ela o Ensino Religioso no artigo 210, parágrafo
primeiro diz: “O ensino religioso, de matrícula facultativa, constituirá disciplina dos horários
normais das escolas públicas de ensino fundamental”. Por sua vez, o artigo 5 define: “é
inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício
dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas
liturgias”. No artigo 19, consta: É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos
Municípios: I - estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o
funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou
aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público; II - recusar fé aos
documentos públicos; III - criar distinções entre brasileiros ou preferências entre si.
1996 A Lei de Diretrizes e Bases (LDB 9394/96), de dezembro de 1996, definia pontos novos na
sua redação: O ensino religioso, de matrícula facultativa, constitui disciplina dos horários
normais das escolas públicas de ensino fundamental, sendo oferecido, sem ônus para os
cofres públicos, de acordo com as preferências manifestadas pelos alunos ou por seus
responsáveis, em caráter: I - confessional, de acordo com a opção religiosa do aluno ou
do seu responsável, ministrado por professores ou orientadores religiosos preparados e
credenciados pelas respectivas igrejas ou entidades religiosas; ou II - interconfessional,
resultante de acordo entre as diversas entidades religiosas, que se responsabilizarão pela
elaboração do respectivo programa
1997 Em julho, a lei n° 9.475 dá uma nova redação para o artigo 33 da LDB 9394/96: O ensino
religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da formação básica do cidadão e
constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental,
assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas
de proselitismo. § 1º Os sistemas de ensino regulamentarão os procedimentos para a
definição dos conteúdos do ensino religioso e estabelecerão as normas para a habilitação
e admissão dos professores. § 2º Os sistemas de ensino ouvirão entidade civil, constituída
pelas diferentes denominações religiosas, para a definição dos conteúdos do ensino religioso
2009 O Congresso Nacional Brasileiro em um acordo com Brasil – Santa Sé assinado pelo
Executivo em novembro de 2008 aprova a criação de um novo dispositivo, discordante da
LDB em vigor: Artigo 11 - A República Federativa do Brasil, em observância ao direito de
liberdade religiosa, da diversidade cultural e da pluralidade confessional do País, respeita
a importância do ensino religioso em vista da formação integral da pessoa. §1º. O ensino
religioso, católico e de outras confissões religiosas, de matrícula facultativa, constitui
disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o
respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, em conformidade com a Constituição e as
outras leis vigentes, sem qualquer forma de discriminação.
Quadro 4: Quarta Fase
Fonte: Borin (2018).

3 | DOCUMENTOS DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA


Para compreender o surgimento do Ensino Religioso da BNCC, é necessário
analisar as políticas educacionais implantadas após o processo de redemocratização do
Brasil. O primeiro documento a discorrer a respeito é a Constituição Federal (BRASIL,
2017a), seguida pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) nº 9.394 de
1996 (BRASIL, 1996) e pela Lei nº 13.005 de 2014, que estabeleceu o Plano Nacional da
Educação (PNE) (BRASIL, 2014a).
Embora os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN’s) tenham representado
um avanço na definição de conteúdos em nível nacional, a forma como os conteúdos e
metodologias de ensino e aprendizagem foram escolhidos, sem participação e atuação das
escolas, foi alvo de muitas críticas (CÂNDIDO; GENTILINI, 2017). Deve-se ressaltar que o
documento se eximiu de qualquer orientação ou direcionamento ao único conteúdo previsto

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 2 15


no texto constitucional: o Ensino Religioso.
Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN’s) constitui-se de uma coleção de
dez volumes, sendo o primeiro uma Introdução ao documento; seis livros destinados às
diferentes áreas de conhecimento e três volumes dedicados aos Temas Transversais
(Ética, Pluralidade Cultural e Orientação Sexual, Meio Ambiente e Saúde) (BRASIL, 1997).
Macedo (2014) afirma que os PCNs seriam materiais de apoio a professores e gestores,
sem qualquer obrigatoriedade de sua utilização.
Assim, ainda no ano de 1997, o Fórum Nacional Permanente de Ensino Religioso
(FONAPER) publicou uma proposta de Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino
Religioso, almejando estabelecer uma identidade única para o conteúdo. Buscando
vencer o desafio da confessionalidade, foi adotada uma definição de religião relacionada à
reconstrução de significados pela leitura dos elementos do fenômeno religioso (FONAPER,
2009). Embora esta proposição curricular tenha sido amplamente utilizada por docentes
da área, a mesma nunca usufruiu do peso da oficialidade governamental, posto que fosse
publicada como um documento paralelo, uma resposta à ausência do conteúdo nos PCN’s.
Prosseguindo na evolução da legislação educacional brasileira, o Plano Nacional de
Educação (BRASIL, 2014a) assumiu um compromisso para a eliminação das desigualdades
educacionais. Nesse propósito, estabeleceu estratégias de enfrentamento dos principais
problemas: acesso e permanência, desigualdades regionais, formação para o trabalho e
exercício da cidadania. O documento é composto por vinte metas, agrupadas no material
de divulgação do Ministério da Educação (BRASIL, 2014b) em quatro conjuntos: metas
estruturantes para a garantia do direito à educação básica com qualidade; metas de redução
da desigualdade e valorização da diversidade; metas de valorização dos profissionais da
educação; e metas para o ensino superior.
A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) organizou o Ensino Fundamental em
cinco áreas do conhecimento que englobam os componentes curriculares, a saber: área
das Linguagens, com os componentes de Língua Portuguesa, Arte, Educação Física e
Língua Inglesa; área da Matemática, com o componente de Matemática; área das Ciências
da Natureza, com o componente de Ciências; área das Ciências Humanas, com os
componentes de Geografia e História; e área do Ensino Religioso, com o componente
homólogo (BRASIL, 2018).

4 | ENSINO RELIGIOSO NA BNCC


O caráter de adaptação contextual da BNCC, longe de torná-la excessivamente
plástica, convidou as instituições escolares, redes de escolas e sistemas de ensino a adotar
suas próprias formas de organização e propostas de progressão, desde que atendam a
todos os direitos e objetivos de aprendizagem instituídos na BNCC.
O Ensino Religioso tornou-se responsável pela discussão de todas as questões

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 2 16


relacionadas ao fenômeno religioso como elemento constitutivo das narrativas de sentido
individuais e coletivas, bem como da dinâmica das sociedades humanas. Esta organização
contradiz o que havia sido deliberado nas duas primeiras versões da BNCC (BRASIL,
2018).
Os redatores da BNCC optaram por não levar a discussão sobre o conceito de
laicidade para o documento – embora não tenham, em nenhum momento, feito afirmações
contraditórias sobre essa premissa. A escolha do referencial teórico que sustenta o Ensino
Religioso escolar também não é unânime entre as versões da Base.
Na primeira versão da BNCC (BRASIL, 2015a), quando o conteúdo ainda fazia parte
das Ciências Humanas, sua proximidade e conexão com os demais integrantes da área
estimulavam diálogos e abordagens que deveriam ultrapassar suas fronteiras disciplinares.
A segunda versão (BRASIL, 2016a) compreendeu que o Ensino Religioso seria referenciado
em uma seleção de conhecimentos oriundos das Ciências Humanas e Sociais. A terceira
e definitiva versão (BRASIL, 2018) compreendeu que o conhecimento religioso, objeto do
conteúdo, é “produzido no âmbito das diferentes áreas do conhecimento científico das
Ciências Humanas e Sociais, notadamente da(s) Ciência(s) da(s) Religião(ões)” (BRASIL,
2018, p. 434).O Quadro 1 apresenta o resumo das versões dos textos:

BNCC 1 BNCC 2 BNCC 3

Conjunto de objetos de conhecimento


que favoreçam o desenvolvimento
Objeto

Estudo da existência
Vida intelectual
humana e das intervenções de habilidades e que aprimorem a
moderna.
sobre a vida. capacidade de os alunos pensarem
diferentes culturas e sociedades.

Compreender e Compreender o mundo Desenvolver raciocínio espaço-


Objetivo

problematizar as ações como processo, em temporal, estimulando a formação ética


e relações individuais e construção aberta à e o desenvolvimento da capacidade de
coletivas. intervenção humana. observação.
Conteúdos

Geografia, História, ER Geografia, História,


(apenas no EF), Filosofia Filosofia (apenas Geografia, História, Filosofia (apenas
(apenas no EM) e no EM) e Sociologia no EM) e Sociologia (apenas no EM).
Sociologia (apenas no EM). (apenas no EM).

Quadro 1: Comparação entre as versões do texto da área de Ciências Humanas na BNCC


Fonte: Santos, (2021).Elaborado com dados extraídos de Brasil (2015a, 2016a, 2018)

As aprendizagens essenciais, denominadas na BNCC como competências, podem


ser definidas como:
“a mobilização de conhecimentos (conceitos e procedimentos), habilidades
(práticas cognitivas e socioemocionais), atitudes e valores, para resolver

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 2 17


demandas complexas da vida cotidiana, do pleno exercício da cidadania e
do mundo do trabalho”. (BRASIL, 2017b, p. 4).

Através das competências torna-se possível oferecer uma identidade de


conhecimentos a todos os estudantes da Educação Básica brasileira. Conforme Cury, Reis
e Zanardi (2018), essa especificidade do documento, procurou corrigir a desigualdade
de oportunidades através da oferta de conteúdos idênticos em todas as escolas. Nesse
sentido, a BNCC apresentou um conjunto de competências específicas do Ensino Religioso
para o Ensino Fundamental como sendo (BRASIL, 2018):
1. Conhecer os aspectos estruturantes das diferentes tradições/movimentos
religiosos e filosofias de vida, a partir de pressupostos científicos, filosóficos,
estéticos e éticos.

2. Compreender, valorizar e respeitar as manifestações religiosas e filosofias


de vida, suas experiências e saberes, em diferentes tempos, espaços e
territórios.

3. Reconhecer e cuidar de si, do outro, da coletividade e da natureza,


enquanto expressão de valor da vida.

4. Conviver com a diversidade de crenças, pensamentos, convicções, modos


de ser e viver.

5. Analisar as relações entre as tradições religiosas e os campos da cultura,


da política, da economia, da saúde, da ciência, da tecnologia e do meio
ambiente.

6. Debater, problematizar e posicionar-se frente aos discursos e práticas


de intolerância, discriminação e violência de cunho religioso, de modo a
assegurar os direitos humanos no constante exercício da cidadania e da
cultura de paz. (BRASIL, 2018, p. 435).

O conteúdo a ser trabalhado em Ensino Religioso, para alcançar as competências


acima descritas, foi organizado em três unidades temáticas. A unidade Identidades e
Alteridades, que ocorre apenas nos anos iniciais do Ensino Fundamental, enfatiza a
percepção e respeito às diferenças, e construção da identidade. A unidade Manifestações
Religiosas trabalha questões referentes aos símbolos, ritos, espaços, territórios e lideranças
religiosas, visando oferecer conhecimento sobre as diversas tradições e respeito às
distintas experiências e manifestações religiosas. Por fim, a Unidade Crenças Religiosas e
Filosofias de Vida trabalha os mitos, crenças, narrativas, doutrinas e tradições dos grupos
religiosos e filosofias de vida.
A proposta do ER na BNCC, portanto, estabeleceu um requisito para que cada
indivíduo ou grupo assumisse os seus próprios limites e diferenças entre as religiões e
filosofias de vida, e isso reflete o pensamento de Fleuri (2015, p. 40), que afirma que “o
encontro entre sujeitos culturais diferentes enseja a interação entre diferentes matrizes de
conhecimento, que favorece a construção de estratégias políticas, socioculturais, ambientais
e educacionais contra hegemônicas”. Ao mesmo tempo, verifica-se que o objeto do Ensino

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 2 18


Religioso é um ponto sobre o qual não há concordância, nem entre pesquisadores da
área, nem entre docentes (SCHOCK, 2012). Um resumo dos diferentes enfoques (objeto,
objetivos e conteúdos) do Ensino Religioso proposto nas três versões da BNCC pode ser
verificado no Quadro 2.

BNCC 1 BNCC 2 BNCC 3

Conhecimento Conhecimento Conhecimento religioso, a partir de pressupostos


religioso, em uma religioso, em uma éticos e científicos.
Objeto

perspectiva de perspectiva de
diversidade. diversidade.

Assegurar o Educação para Proporcionar a aprendizagem dos conhecimentos


conhecimento o diálogo e religiosos, culturais e estéticos, a partir das
da diversidade convívio entre manifestações religiosas percebidas na realidade
religiosa, garantindo pessoas religiosas, dos educandos. Propiciar conhecimentos sobre
que ela seja agnósticas e sem o direito à liberdade de consciência e de crença,
respeitada, vedadas religião. no constante propósito de promoção dos direitos
Objetivo

quaisquer formas de humanos. Desenvolver competências e habilidades


proselitismos. que contribuam para o diálogo entre perspectivas
religiosas e seculares de vida, exercitando o respeito
à liberdade de concepções e o pluralismo de ideias,
de acordo com a Constituição Federal. Contribuir
para que os educandos construam seus sentidos
pessoais de vida a partir de valores, princípios éticos
e da cidadania.
ER próximo e Seleção de O conhecimento religioso é produzido no âmbito
conectado com conhecimentos das das diferentes áreas do conhecimento científico
História, Geografia, Ciências Humanas das Ciências Humanas e Sociais, notadamente da
Sociologia e Filosofia, e Sociais. Ciências da Religião.
Conteúdos

estabelecendo e
ampliando diálogos e
abordagens teórico-
metodológicas
que transcendam
as fronteiras
disciplinares.
Quadro 2: Comparação entre as versões do texto sobre Ensino Religioso na BNCC
Fonte: Santos (2021). Elaborado com dados extraídos de Brasil (2015a, 2016a, 2018)

Em se tratando dos pressupostos para o Ensino Religioso organizados na versão


homologada da BNCC (2018), pode-se pensar que a mudança no enfoque em direção aos
pressupostos éticos e científicos, como uma tentativa de superar o modelo confessional
que predominava no Brasil, priorizando o tratamento científico da questão religiosa,
acessível a todos os alunos Há de se registrar que, por uma decisão do Supremo Tribunal
Federal, em 2017, assegurou que o Ensino Religioso nas escolas públicas poderia ter
natureza confessional. Apesar dessa decisão, o texto não abordou a adoção de modelos
interconfessional ou ecumênico e nem problematizou o conceito de laicidade. (SANTOS,
2021).

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 2 19


A ausência da laicidade pode se dever ao fato de que a identidade e o pertencimento
dos redatores no texto da BNCC serem membros do Fórum Nacional Permanente de Ensino
Religioso (CUNHA, 2016). Um dos objetivos do trabalho do FONAPER é, justamente,
fomentar modelos laicos de Ensino Religioso escolar. Talvez, por estarem habituados à
discussão em um ambiente de formação e militância, os redatores tenham considerado
desnecessário levar a discussão ao texto, apenas aplicando os conceitos (SANTOS, 2021).
É interessante evidenciar a evolução epistemológica do FONAPER nos últimos
anos, passando de uma Teologia e Religiões Comparadas para um modelo de Ensino
Religioso cuja laicidade se fundamenta na valorização da diversidade (SANTOS, 2021).

5 | DISCUSSÃO A PARTIR DA BNCC


Atualmente, a sociedade se encontra carregada de exemplos de como utilizar o
discurso religioso de forma agressiva, preconceituosa e excludente. Nesse sentido, a
presença de um Ensino Religioso nas escolas públicas valorize a diversidade em todos
seus aspectos e promova uma construção social em que essas intolerâncias não mais
encontrem espaço.
O Ensino Religioso pode permitir aos educandos se reconhecer e construir sua
própria identidade, mas também lhes apresente outras identidades e possibilidades,
conscientizando sobre o valor da diversidade e o respeito às diferenças.
Partindo da idéia de que todo estudante possui o direito à aprendizagem e ao
desenvolvimento, incluindo a aprendizagem do conjunto de saberes e conhecimentos
religiosos produzidos pelas culturas e tradições religiosas, todas as escolas, enquanto
espaços de sociabilidade e apropriação de conhecimentos produzidos pela humanidade
precisam garantir em seus currículos o efetivo estudo e/ou abordagem das diversas
concepções e práticas religiosas e culturais, através de atividades como diálogos críticos,
autênticos e corresponsáveis (POZZER; WICKERT, 2015).
Com base nos pressupostos da BNCC, percebemos que, enquanto o Ensino
Religioso não assumir uma perspectiva decolonial, intercultural e não-confessional, a
escola pública continuará refém dos interesses de instituições religiosas predominantes,
que se reproduz e se mantém através da lógica da colonialidade. A cultura escolar tem se
configurado ao longo da educação brasileira, desde os primórdios da criação das escolas
no país, e mantido esse componente curricular como “moeda de troca” para servir aos
interesses ora do Estado, ora das igrejas (POZZER; CECCHETTI; OLIVEIRA, 2014).
Garantir o Ensino Religioso aos estudantes implica pensar metodologias de ensino
aportadas em epistemologias interativas, reflexivas e libertárias. No cenário brasileiro, o
diálogo entre diferentes sujeitos tem se mostrado uma ferramenta que tem se mostrado
capaz de (re) criar espaços e processos curriculares interculturais onde se podem refletir
outras dinâmicas de significação do conhecimento, do mundo e da própria vida (SILVA,

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 2 20


2021).
Outro ponto que precisa ser bem entendido é a necessidade da presença e do
reconhecimento da alteridade no Ensino Religioso, pois ela impede a permanência do
monólogo e da colonialidade do outro, uma vez que permite o inesperado, o desconhecido
e o diferente que tem rosto e interpela a uma atitude ética (LEVINAS, 1980).
Concluindo a análise da proposta de Ensino Religioso na BNCC, a ruptura da cultura
homogênea exige duas situações: a primeira é a necessidade de uma nova prática de vida
na escola e fora dela e, a segunda, uma postura crítica fundamentada nas alteridades
e na interculturalidade. Todos os modos de vida, incluindo culturas, religiões e filosofias
de vida, precisam estar em constante debate no currículo escolar e este deve ser parte
integrante do mundo para além do “espaço escolar”. Desta forma, descortinam-se novas
possibilidades para vivências e experiências de vida e da paz numa dinâmica intercultural.

6 | CONSIDERAÇÕES
É interessante observar que, ao longo de toda a história da educação brasileira, a
BNCC foi o primeiro documento curricular cuja escrita considerou uma consulta popular.
A permanência do Ensino Religioso pode ser o primeiro passo para sanar dúvidas que
surgiram durante o processo de organização de seu controverso conteúdo, levando o
Ministério da Educação a considerar que ele, sob um algum modelo, pode contribuir para a
formação e para o exercício da cidadania.
Na trajetória da construção da BNCC nenhum conteúdo foi tão questionado em
relação à sua permanência no documento, do que o Ensino Religioso, mas, a unificação
das diferentes propostas promovida pela BNCC se tornou importante porque conduz ao
desenvolvimento epistemológico da área bem como a diferentes processos de formação
docente e propostas metodológicas.
Observa-se que os conteúdos organizados para o Ensino Religioso na BNCC
valorizam o multiculturalismo e a diversidade religiosa, considerando, ainda, a inclusão das
filosofias de vida no debate acerca das diferentes religiosidades e promovendo a discussão
sobre a busca de sentido (religioso ou não) para construção da identidade e projeto de vida
dos educandos, a contemplação da diversidade de possibilidades, e seu reconhecimento
como igualmente válidas.

REFERÊNCIAS
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Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 2 21


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Cultura, 2016. Disponível em: http://historiadabncc.mec.gov.br/#/site/inicio. Acesso 12 maio 2022.

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2010.

SCHOCK, Marlon Leandro. Aportes epistemológicos para o Ensino Religioso na escola: um


estudo analítico-propositivo. 317 f. Tese (Doutorado) – Programa de Pós-Graduação em Teologia,
Escola Superior de Teologia, São Leopoldo, 2012. Disponível em: http://dspace.est.edu.br:8080/jspui/
handle/BR-SlFE/288. Acesso 24 jun 2022.

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 2 23


CAPÍTULO 3

CONTEMPLANDO O NASCIMENTO DE
JESUS: AS REPRESENTAÇÕES DO ÍCONE DA
NATIVIDADE NA ARTE SACRA

Data de submissão: 13/01/2023 Data de aceite: 01/02/2023

Wilma Steagall De Tommaso os dogmas da fé cristã. No ícone, porém,


Doutora em Ciências da Religião também há a preocupação em mostrar o
pela PUC-SP (2013). Atualmente é efeito do Mistério sobre a vida do mundo. Por
pesquisadora colaboradora da Associação isso, percorreremos o ícone, em primeiro
Latino-Americana de Literatura e Teologia lugar, desenvolvendo os simbolismos
(ALALITE), pesquisadora colaboradora expressos pela figura do Menino Jesus
da Sociedade de Teologia e Ciências da para, em seguida, observarmos outras
Religião (SOTER), professora convidada -
cenas presentes no ícone. Por fim, notamos
Museu de Arte Sacra de São Paulo (MAS)
que o ícone da Natividade já aponta para
e professora pesquisadora do LABÔ da
a Ressurreição, e que esse mistério não
PUC-SP
http://lattes.cnpq.br/8209900139809763 diz respeito apenas ao ser humano, mas
Site: https://wilmatommaso.com.br/ remete à toda a Criação.
PALAVRAS-CHAVE: Natividade; Presépio;
Encarnação; Andrei Rublev.

RESUMO: O presente texto tem por objetivo


CONTEMPLATE THE CHRISTMAS:
apresentar e desenvolver teologicamente
THE REPRESENTATIONS OF THE
os simbolismos presentes na cena do NATIVITY ICON IN SACRED ART
Nascimento de Jesus (Natividade).
ABSTRACT: The aim of this text is present
Para auxiliar nesta tarefa, valemo-nos
and theologically develop the symbolisms
abundantemente de autores da tradição
in the scene of the Birth of Jesus (Nativity).
ortodoxa, que tem os ícones como elemento
To assist in this task, we draw heavily on
central em sua fé. Iniciamos a nossa
authors from the orthodox tradition, who
exposição remetendo-nos ao sentido dado
have icons as a central element in their faith.
por São Francisco de Assis ao presépio,
The first step of our exposition refers to the
para, em seguida, nos determos no ícone
meaning given by St. Francis of Assisi to the
da Natividade escrito por Andrei Rublev,
nativity scene; hereafter we dwell on the icon
no século XV. O sentido central destes
of the Nativity written by Andrei Rublev, in
símbolos, naturalmente, desenvolve o
the 15th century. The core meaning of these
significado da Encarnação - testemunhando
symbols naturally develops the meaning of

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 3 24


the Incarnation itself - bearing witness to the tenets of the Christian faith. In the icon, however,
there is also a concern to show the effect of the Mystery on the life of the world. For this
reason, we will go through the icon, firstly developing the symbolisms expressed by the figure
of the Child Jesus, and then, we will observe other scenes present in the icon. Finally, we note
that the icon of the Nativity already points to the Resurrection, and that this mystery does not
only concern the human being, but refers to all of Creation.
KEYWORDS: Nativity; Crib; Incarnation; Andrei Rublev.

1 | O PRESÉPIO, MANIFESTAÇÃO DO MISTÉRIO

Figura 1: Ícone da Natividade. Século XV. Galeria Tretiakov, Moscou. Andrei Rublev.

O ano litúrgico se inicia no tempo do Advento, que é o tempo de preparação para a


celebração do Natal. A representação iconográfica deste tema, que também costumamos
chamar de Natividade, remonta aos primeiros séculos do cristianismo. A Natividade é a
cena anunciada pelo Evangelista Lucas (Lc 2, 10), uma grande alegria ao mundo.
O presépio, por sua vez, é um pouco mais recente: atribui-se a ideia de fazê-lo a São
Francisco de Assis. Sabemos, contudo, que o presépio já existia na sua época (o presépio

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 3 25


já pertencia aos hábitos de festas nas catedrais romanas e outros lugares); o seu presépio,
porém, foi o ponto alto da pregação, proporcionando a manifestação do nascimento de
Jesus, seus sofrimentos e morte.
A especificidade franciscana, portanto, é que em sua representação Jesus não era
fantasia, romantismo. A dimensão explorada aqui é aquela que une o nascimento de Jesus
ao mistério litúrgico. Para ele, Jesus é o Filho de Deus que se une ao tempo e à criação
que é boa (Gn1,25). Francisco trouxe, então, o acontecimento do passado para o presente.
No centro da liturgia está a anamnese, a memória da Encarnação, o encontro do Filho de
Deus com a humanidade.
A Encarnação é o grande Mistério de Deus revelado. Na Encarnação, “O Verbo se
fez carne e habitou entre nós” (Jo 1,14). Se pudermos falar em uma diferença substancial
entre o cristianismo e outras religiões, ela envolverá, certamente, a novidade essencial de
que no cristianismo Deus se fez Homem.
Cristo, nascido sob o reinado do imperador Augusto e morto sob Pôncio Pilatos,
viveu como homem uma vida colocada no espaço e que se desenvolveu no dinamismo do
tempo. Mas, inseparavelmente unida à Palavra de Deus, toda a sua personalidade, com
todas as suas ações, participou da eternidade de Deus. Sua carne humana é divina, divina
e eterna. Por isso, não apenas acreditamos em Deus, mas também em Deus-Homem.
Deus e o homem como revelados em Jesus Cristo são parte de nossa crença.
De fato, no Credo professamos: “Creio em um só Deus… em um só Senhor Jesus
Cristo… por nós, homens e para a nossa salvação, desceu do céu e, pelo poder do Espírito
Santo, encarnou-se no seio da Virgem Maria e se fez Homem”.
No presépio de Greccio, Francisco colocou o boi e o asno; convocou também alguns
frades e o povo, mas a manjedoura estava vazia – sem o Menino-Deus – porque, no Natal,
Ele deve nascer no coração de cada um. Este é o verdadeiro presépio! (TOMMASO, 2022,
prefácio).

2 | CONTEMPLANDO OS SÍMBOLOS DA NATIVIDADE


Para contemplarmos melhor os símbolos que perpassam este tão belo acontecimento,
gostaria de abordar o ícone da Natividade, conforme a figura 1.
O ícone da Natividade de Cristo tem dois aspectos fundamentais:
1) Revela a própria essência do evento, o fato imutável da Encarnação de Deus;
nos coloca diante de um testemunho visível do dogma fundamental da fé cristã,
salientando por seus detalhes tanto a Divindade quanto a natureza humana do
Verbo que se fez carne.

2) Mostra o efeito desse evento sobre a vida natural do mundo, dando-nos como
que uma perspectiva de todas as suas consequências (OUSPENSKY; LOSSKY,
2003, p. 143).

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 3 26


Figura 1a: Detalhe do Ícone da natividade.

Do ponto de vista do significado e composição, o centro do ícone, ao qual todos


os detalhes se relacionam de uma forma ou de outra, é o Menino Deus envolto em faixas,
deitado na manjedoura, como podemos observar na figura 1a. O ícone (1a) ainda destaca
como cenário de fundo a caverna escura onde Ele nasceu. Segundo São Máximo, o
Confessor (580-662), “A Encarnação é o centro ao qual convergem todas as linhas do
cosmo, por isso, as primeiras imagens da Natividade colocavam em evidência a manjedoura
de Jesus.” (ŠPIDLÍK, RUPNIK, 2017, p. 35).
A manjedoura e as faixas são mencionadas no Evangelho de Lucas (2, 7): “e
envolveu-o em faixas, e deitou-o numa manjedoura”. Elas ainda são o sinal distintivo dado
pelo anjo, pelo qual os pastores deveriam reconhecer o Menino, seu Salvador: “Isto vos
servirá de sinal: achareis o bebê envolto em faixas e posto numa manjedoura.” (Lucas
2, 12). O tropário1 nos diz que a manjedoura era a oferta do deserto à Criança Divina. O
significado desta oferta é revelado nas palavras de São Gregório de Nazianzeno: “Curva-te
diante das manjedouras através das quais tu, que eras mudo, és formado pela Palavra”2
(isto é, você cresce, alimentado pelo pão da Eucaristia). A manjedoura antecipa, ainda, a
dimensão eucarística: ela é o lugar aonde os animais voltam sempre para se alimentar; por
isso, Jesus nasce e ali aninhado já antecipa que se dará em alimento no sacramento da

1 Tropário: estrofe de origens antigas, que resume o mistério da festa ou as características do santo. É cantada na
liturgia eucarística e repetida em todas as Horas do Ofício divino.
2 Homilia 38. Sobre a Natividade. P.G. 36, 316 B

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 3 27


Eucaristia.
Nos deparamos, ainda, com os animais: tradicionalmente um boi e um asno. Os
Evangelhos não falam deles. No entanto, em todas as imagens da Natividade de Cristo,
eles estão próximos à Criança Divina. O lugar deles, no centro do ícone, aponta para a
importância dada pela Igreja a esse detalhe. É nada menos que o cumprimento da profecia
de Isaías (1, 3), que tem um significado instrutivo muito profundo: “O boi conhece o seu
possuidor, e o asno, o estábulo do seu dono; mas Israel não conhece nada, e meu povo
não tem entendimento”. Pela associação entre o nascimento de Jesus e a profecia de
Isaías, simbolizada pelos animais, somos chamados ao conhecimento e à compreensão
do Mistério.
No ícone, ainda tomamos conhecimento da gruta, local da Natividade, citada no
evangelho apócrifo de Tiago, 18,1 (PASSARELLI, 2005, p. 97). A montanha representa um
dos lugares privilegiados das Sagradas Escrituras para as revelações de Deus, enquanto
a gruta é o ponto mais baixo da kenosis3 divina, pois a escuridão é o símbolo do pecado.
Jesus nasce nesse lugar sombrio, aquecido pelos animais, porque veio assumir para si o
mal do mundo.
Em uma homilia de São Gregório de Nazianzeno encontramos uma comparação
feita entre o nascimento de Cristo em uma caverna e a luz espiritual resplandecendo na
sombra da morte que envolve a humanidade. A abertura negra da caverna no ícone é, em
seu significado simbólico, precisamente este mundo, atingido pelo pecado devido à falta
do homem, no qual “o Sol da justiça” resplandeceu (OUSPENSKY; LOSSKY, 2003, p. 144).

3 Kenosis: Palavra grega que significa “esvaziar-se”, “aniquilar-se”; encontrou seu significado cristão no texto da epís-
tola de São Paulo aos Filipenses: “Mas aniquilou-se a si mesmo, tomando a forma de servo, fazendo-se semelhante
aos homens; E, achado na forma de homem humilhou-se a si mesmo, sendo obediente até à morte e morte de cruz”
(Fil. 2:7-8).

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 3 28


Figura 1b: Detalhe do Ícone da Natividade. Século XV. Galeria Tretiakov, Moscou. Andrei Rublev.

Por fim, vale notar que o cenário do evento é o deserto (figura 1). Trata-se, nesse
caso, de um lugar vazio e desabitado, que ofereceu refúgio ao Salvador, que desde Seu
nascimento o mundo não aceitou, foi o cumprimento da prefiguração do Antigo Testamento
– o deserto onde o maná, símbolo da Eucaristia foi dado. Aquele que tinha feito chover
maná do céu – sobre o povo judeu, Ele mesmo tornou-se o pão da Eucaristia – o Cordeiro,
colocado sobre o altar, cujo símbolo é a manjedoura trazida pelo deserto do Novo
Testamento como uma oferta ao Menino-Deus.
Caverna, manjedoura, vestes de faixas – são indicações da kenosis da Divindade,
de Seu abaixamento, da total humildade d’Aquele que, invisível em Sua natureza, torna-
se visível na carne pelo bem do homem, nasce em uma caverna, é envolto em vestes de
faixas, assim prefigurando Sua morte e sepultamento, o sepulcro e as vestes funerárias
(OUSPENSKY; LOSSKY, 2003, p. 144).

3 | A MÃE DE DEUS
Olhando para o ícone da Natividade de Cristo, a primeira coisa que chama nossa
atenção é a posição da Mãe de Deus e o lugar que Ela ocupa. Nesta “festa de recriação”,

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 3 29


Maria é “a renovação de todos os nascidos na terra”, a nova Eva. Assim como a primeira
Eva se tornou a mãe de todos os viventes, também a nova Eva se tornou a Mãe de toda
a humanidade renovada, deificada através da Encarnação do Filho de Deus. Ela é a
mais elevada ação de graças a Deus, que o homem, dentre todos os seres criados, traz
para o Criador. Com esta oferta na pessoa da Mãe de Deus, a humanidade caída dá o
consentimento para sua salvação através da Encarnação de Deus.

Figura 1c: detalhe do Ícone da natividade. Século XV. Galeria Tretiakov, Moscou. Andrei Rublev

Este papel da Mãe de Deus é enfatizado graficamente, destacando-se entre as


outras figuras por Sua posição central e, às vezes, por Seu tamanho. Ela está deitada
próxima ao Bebê, mas comumente já fora da caverna, em uma cama, do tipo daquelas
que os judeus levavam consigo em suas viagens. A postura da Mãe de Deus é sempre
cheia de profundo significado e está imediatamente conectada com questões dogmáticas,
que surgiram em diferentes épocas ou lugares. As alterações dessa postura enfatizam, de
acordo com a necessidade, ou a natureza divina ou a natureza humana do Salvador.
Assim, em algumas imagens, Ela está meio sentada, o que aponta para a ausência
no caso d’Ela dos sofrimentos habituais e, portanto, para a natureza virgem da Natividade
e a origem Divina do Menino Deus (contra o erro nestoriano4). Mas na grande maioria das
imagens da Natividade de Cristo a Mãe de Deus está deitada, mostrando em Sua postura
uma grande lassidão, que deve lembrar aos que oram acerca da natureza indubitavelmente
4 O Nestorianismo foi uma doutrina proposta pelo Arcebispo de Constantinopla Nestório (428 – 431) que destaca as
diferenças da natureza divina e humana de Jesus Cristo. A teoria, que também foi considerada heresia pela Igreja Ca-
tólica, rejeita o título de Mãe de Deus (Theotokos) para Maria.

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 3 30


humana do Bebê, “a fim de que não se suspeite que a encarnação seja uma ilusão”, como
afirmavam os hereges (como é o caso na figura 1 e 1c).

4 | TESTEMUNHAS DA ENCARNAÇÃO
Ao redor do grupo central – a Criança Divina e Sua Mãe – estão reunidos todos os
detalhes que, como já dissemos, testemunham a própria Encarnação e seus efeitos sobre
todo o mundo criado.
Os anjos realizam um serviço duplo: eles glorificam e trazem as boas novas. Em
um ícone, isso é normalmente expresso pelo fato de alguns deles voltarem-se para cima e
cantarem glória a Deus, outros se inclinarem para baixo, para os homens, a quem trazem
as boas novas (figura 1d).

Figura 1d: Detalhe do Ícone da Natividade.

Nas figuras 1e e 1f, encontramos os pastores e os “magos”, respectivamente. Cada


grupo fica de um lado da caverna. Os pastores são mostrados ouvindo a mensagem dos
anjos; e muitas vezes um deles está tocando flauta, adicionando assim arte humana –
música – ao coro dos anjos. Do outro lado da caverna estão os magos, guiados pela estrela.
Eles são representados como caminhando ou, como no ícone Andrei Rublev, cavalgando
com presentes. De um lado estão os pastores – homens simples, rejeitados pois eram

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 3 31


impedidos de entrar no templo pela má reputação, mas com os quais o mundo do alto
entra em comunicação diretamente, em meio à vida cotidiana deles de trabalho –, do outro
estão os magos – homens do saber, que têm que realizar uma longa jornada a partir do
conhecimento do que é relativo ao conhecimento do que é absoluto, através do objeto que
eles estudam.

Figura 1e: Detalhe do Ícone da Natividade. Século XV. Galeria Tretiakov, Moscou. Andrei Rublev.

Figura 1f: Detalhe do Ícone da Natividade. Século XV. Galeria Tretiakov, Moscou. Andrei Rublev.

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 3 32


Nos pastores, os primeiros filhos de Israel a adorar o Bebê, a Igreja vê o início da
Igreja judaica, e nos magos – “o início das nações” – a Igreja dos pagãos. Na adoração
por estes magos, a Igreja testemunha que aceita e santifica toda a ciência humana que
conduz a ela, desde que a luz relativa da revelação não-cristã traga aqueles que a servem
para a adoração da luz absoluta. Deve-se notar que os magos são representados como
tendo idades diferentes, o que enfatiza o fato de que a revelação é dada aos homens
independentemente dos seus anos e experiência mundana. Outro fato a ser observado é a
presença dos cavalos ao invés de camelos, que os russos não conheciam (figura 1f).
Nos deparamos, ainda, com um longo raio da estrela que aponta diretamente para a
caverna (figura 1g). Este raio conecta a estrela com uma parte da esfera que vai além dos
limites do ícone – uma representação simbólica do mundo celestial. Dessa forma, o ícone
mostra que a estrela não é apenas um fenômeno cósmico, mas também um mensageiro
do mundo do alto, trazendo as novas notícias sobre o nascimento d’Aquele que é “celestial
sobre a terra”. É aquela luz que, de acordo com as palavras de São Leão Magno, estava
escondida aos judeus, mas que resplandeceu para os pagãos (OUSPENSKY; LOSSKY,
2003, p. 146).

Figura 1g: Detalhe do Ícone da Natividade. Século XV. Galeria Tretiakov, Moscou. Andrei Rublev.

Em um canto inferior do ícone, duas mulheres estão lavando a Criança (figura 1h).
Esta cena é baseada em uma tradição, que também nos é transmitida pelos Evangelhos

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 3 33


apócrifos de pseudo-Mateus e pseudo-Tiago. As duas mulheres são as duas parteiras que
José trouxe para a Mãe de Deus. Esse acontecimento da vida cotidiana mostra claramente
que o Menino-Deus é como qualquer outra criança recém-nascida e está sujeita às
exigências naturais da natureza humana. A cena do banho aponta para o batismo, uma vez
que a bacia tem a forma de uma fonte batismal.

Figura 1h: Detalhe do Ícone da Natividade. Século XV. Galeria Tretiakov, Moscou. Andrei Rublev.

5 | JOSÉ, O JUSTO
Outro detalhe enfatiza que na Natividade de Cristo “a ordem da natureza é superada”
– e este é José.
Ele não faz parte do grupo central do Filho e Sua Mãe; ele não é o pai e está
enfaticamente separado deste grupo. Diante dele, sob o disfarce de um pastor velho e
curvado, encontra-se o diabo tentando-o. Em alguns ícones, ele é representado com
pequenos chifres ou uma cauda curta. A presença do diabo e seu papel de tentador
adquire um significado particularmente profundo em relação a esta “festa de recriação”
(OUSPENSKY; LOSSKY, 2003, p. 146).
Aqui, com base na tradição, o ícone transmite o significado de certos textos litúrgicos
que falam das dúvidas de José e do estado inquieto de sua alma. Este estado é expresso
no ícone por sua atitude desanimada e é enfatizado pela abertura negra da caverna, que
às vezes serve de pano de fundo para sua figura.

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 3 34


Figura 1i: Detalhe do Ícone da Natividade. Século XV. Galeria Tretiakov, Moscou. Andrei Rublev.

A tradição, transmitida também pelos apócrifos, relata como o diabo tentou José
dizendo-lhe que um nascimento de uma virgem não é possível, sendo contrário às leis da
natureza. Este argumento, assumindo formas diferentes, continua reaparecendo ao longo
de toda a história da Igreja, sendo a base de muitas heresias. Na pessoa de José, o ícone
revela não apenas seu drama pessoal, mas o drama de toda a humanidade – a dificuldade
de aceitar aquilo que está “além das palavras ou da razão” – a Encarnação de Deus.
José está envolto em um manto verde, da cor da criação, porque ele é um
descendente de Adão, filho da terra. Enquanto ele aponta para a mão em sua bochecha, ele
está refletindo sobre o que aconteceu de extraordinário. Olha para o céu, para o verdadeiro
Pai do Menino-Salvador, perguntando-se: «De onde vem este menino?». Sua hesitação
representa as dúvidas de toda a humanidade, que acha difícil acreditar que o Filho de Deus
possa nascer com uma genealogia humana. É preciso ouvir a fé para poder acolher esta
criança e tornar-se sua guardiã. A fé de José – e a nossa – é necessária para que Jesus
cresça e cumpra a sua missão de Salvador (OUSPENSKY; LOSSKY, 2003, p. 146).
Em alguns ícones, a Mãe de Deus é representada olhando para José. São diversas
as possibilidades de olhar de Maria, aliás: em alguns ícones, ela olha para o Menino-
Jesus “guardando em seu coração” as palavras sobre Ele; em outros, olha diretamente
diante d’Ela para o mundo externo (como na figura 1); e ainda olha para José como se

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 3 35


expressasse por este olhar compaixão pelo estado dele. Nisso o ícone ensina uma atitude
tolerante e compassiva para com a descrença e a dúvida humana (OUSPENSKY; LOSSKY,
2003, p. 147).

6 | A CRIAÇÃO
Por fim, convém perceber que toda a criação participa deste evento: as estrelas
celestiais e as criaturas terrestres. Se antes de Cristo se pensava que todos nasciam sob
uma estrela da qual dependia o seu destino, com Cristo a estrela submete-se a ele e serve
como um indicador para mostrar o local do seu nascimento. Ou seja, Cristo nos liberta
do determinismo cósmico. Não somos filhos da terra nem mesmo do acaso: somos filhos
livres de Deus. Representando as criaturas animais estão o burro e o boi, os dois animais
“proféticos”, mencionados por Isaías (Is 1,3). Como diz a liturgia bizantina, a terra oferece
a gruta, os animais enviam seus representantes, a Virgem a humanidade.

7 | A REDENÇÃO
A Encarnação de Cristo inaugura a nova História da ascensão dos homens e do
cosmo na glória da divinização, como uma extensão da Encarnação à toda criação, a
redenção universal. Por morte de cruz, desceu ao Hades para preencher de si mesmo
todas as coisas, Cristo pôs fim às dores da morte, como diz São Basílio Magno na liturgia
do Sábado Santo (ŠPIDLÍK; RUPNIK, 2010, p. 218).
Com o pecado original, há uma queda da natureza, que em Cristo é resgatada:
“Tenho para mim que os sofrimentos da presente vida não têm proporção
alguma com a glória futura que nos deve ser manifestada. Por isso, a criação
aguarda ansiosamente a manifestação dos filhos de Deus. Pois a criação
foi sujeita à vaidade (não voluntariamente, mas por vontade daquele que a
sujeitou), todavia, com a esperança de ser também ela libertada do cativeiro
da corrupção, para participar da gloriosa liberdade dos filhos de Deus. Pois
sabemos que toda a criação geme e sofre como que dores de parto até o
presente dia.” (Rm 8, 17-22).

A partir da Encarnação, a plenitude da divindade habita entre os homens no corpo


de Cristo. N’Ele nossa humanidade entra em comunhão com o Pai. A partir daí o Reino
vem a este tempo para fazê-lo passar para o tempo eterno, do cronos ao kairós. Cristo
ressuscitado está dentro do nosso tempo, porque no momento de sua morte de cruz
rasgou-se o véu do templo e abriu-se uma brecha na plenitude do tempo que leva o nosso
tempo à sua consumação. Nesse sentido, Cristo está diante de nós, no futuro. A sua vida
histórica, tão preciosa em si mesma, é o prelúdio de uma vida muito mais ampla, a do seu
corpo – a humanidade redimida – ao longo da história do mundo. Assim, uma leitura atenta
das Escrituras nos introduz na presença viva do Ressuscitado, o Redentor Universal, que
nos mostra o nosso futuro, nos ajuda a garantir que o que vemos deixa o que ainda não

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 3 36


vemos e nos contagia com o dinamismo que vem da escatologia. Compreendemos então
por que os primeiros cristãos amaram a invocação de Maranathá e quiseram ser aqueles
que têm pressa com desejo do advento, o dia do Senhor (cf. 2 Pd 3,12; CAMPATELLI,
2009, p.209-210).
O amor faz o mundo, Cristo transfigurou secretamente o universo. Este cosmos
recordado recriado e iluminado nos é oferecido no mistério da Igreja. É o nosso enraizamento
inexpugnável, não só celestial, mas terrestre, nossa terra celeste e nosso céu terrestre,
a fonte de um pensamento eucarístico, o único capaz de dominar a revolução técnica.
(CLEMENT, 2007, p. 126).
O ícone da Natividade nos revela em sua simbologia que tudo – a humanidade e o
cosmo – é reconduzido até Cristo, o único Senhor.

REFERÊNCIAS
CAMPATELLI, Maria. Leggere la Bibbia com i Padri: per una lettura credente delle Scritture. Roma:
Lipa Edizione, 2009.

CLÉMENT, Olivier. Il senso della terra. Il creato nella visione cristiana. Roma: Lipa Edizione, 2007.

OUSPENSKY, Léonide; LOSSKY, Vladimir. Le sens des icônes. Paris: Les Éditions du Cerf, 2003.

PASSARELLI, Gaetano. Îcones: des grandes fêtes byzantines. Paris: Les Éditions du Cerf, 2005.

ŠPIDLÍK, Tomás; RUPNIK, Marko Ivan. Una conoscenza integrale: la via del simbolo. Prima
edizione, 2010. Roma: Lipa Edizione, 2018.

TOMMASO, Wilma Steagall De. A representação da Natividade na arte ao longo dos séculos. off-
lattes, 22/12/2020. Disponível em: https://offlattes.com/archives/7180.

TOMMASO, Wilma Steagall De. Prefácio. In: Adriano Cézar de OLIVEIRA. São Francisco de Assis e
o Natal: com obras de Marko Ivan Rupnik e Centro Aletti. Belo Horizonte: Espaço Frater, 2022.

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 3 37


CAPÍTULO 4

SAGRADO, VIOLÊNCIA ESCOLAR E CULTURA DE


PAZ, NA PERSPECTIVA DE ALUNOS DO 9º ANO
DO ENSINO FUNDAMENTAL DE UMA ESCOLA
PÚBLICA EM GOIÁS
Data de aceite: 01/02/2023

Marcelo Máximo Purificação contexto de violência presente nas escolas.


Fundação Integrada Municipal de Ensino A escola adquire diferentes significados, ao
Superior -UNIFIMES mesmo tempo que é um espaço onde as
pessoas partilham objetivos comuns como o
Eduardo Gusmão de Quadros
conhecimento e novas amizades, é também
Universidade Estadual de Goiás – UEG
um local onde são obrigadas a viver juntas
Neusa Valadares Siqueira todos os dias, segundo determinadas regras.
Pontifícia Universidade Católica de Goiás Nessa convivência diária também existem
- PUC-Goiás indisposições e conflitos (ABROMOVAY,
2003). Esses conflitos muitas vezes não
são resolvidos pela escola, resultando em
atos de agressão e humilhação verbal e
RESUMO: Este texto é fruto de um estudo
física entre os alunos. Este estudo foi de
desenvolvido no âmbito do Programa de
natureza qualitativa, alicerçado em pesquisa
Pós-graduação em Ciências da Religião
documental e bibliográfica, articulado em
da Pontifícia Universidade Católica de
torno das seguintes questões norteadoras:
Goiás – (PUC-Goiás) em 2014. Procurou-
quais são as concepções dos alunos sobre
se investigar em uma escola pública
a violência e como ela está presente em
de Luziânia, como se formam ou não
suas ações dentro da escola? Quais são os
os conflitos relacionais em o ambiente
fatores que compõem a construção social
escolar com alunos, professores e alunos,
desse conceito? O Sagrado pode contribuir
outros profissionais da educação e alunos,
para uma cultura de paz no ambiente
segundo a percepção dos alunos do 9º
escolar?
ano. – É indiscutível a importância de um
PALAVRAS-CHAVE: Educação, Violência
ambiente escolar que promova a convivência
Escolar, Sagrado, Cultura de Paz.
harmoniosa entre seus sujeitos, tanto para
a promoção do aprendizado quanto para a
formação do aluno em geral e o bem-estar
de todos. No entanto, a qualidade dessa
convivência vem sendo comprometida pelo

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 4 38


SACRED, SCHOOL VIOLENCE AND PEACE CULTURE, FROM THE
PERSPECTIVE OF 9TH GRADE ELEMENTARY SCHOOL STUDENTS AT A
PUBLIC SCHOOL IN GOIÁS
ABSTRACT: This text is the result of a study carried out within the scope of the Post-fraduation
Program in Religious Sciences of the Pontifical Catholic University of Goiás - (PUC-Goiás) in
2014. We sought to investigate in a public school in Luziânia, how form or not relational conflicts
in the school environment with students, teachers and students, other education professionals
and students, according to the perception of 9th grade students. – The importance of a school
environment that promotes harmonious coexistence among its subjects is indisputable, both
for the promotion of learning and for the formation of students in general and the well-being of
all. However, the quality of this coexistence has been compromised by the context of violence
present in schools. The school acquires different meanings, at the same time that it is a space
where people share common goals such as knowledge and new friendships, it is also a place
where they are obliged to live together every day, according to certain rules. In this daily
coexistence there are also indispositions and conflicts (ABROMOVAY, 2003). These conflicts
are often not resolved by the school, resulting in acts of aggression and verbal and physical
humiliation among students. This study was of a qualitative nature, based on documentary
and bibliographical research, articulated around the following guiding questions: what are the
students’ conceptions about violence and how is it present in their actions within the school?
What are the factors that make up the social construction of this concept? Can the Sacred
contribute to a culture of peace in the school environment?
KEYWORDS: Education, School Violence, Sacred, Culture of Peace.

1 | INTRODUÇÃO
O Relatório da Comissão Internacional sobre Educação (1998), realizado pela
UNESCO, aponta a convivência escolar como um dos grandes desafios do século XXI,
pois desencadeia inúmeros casos de violência. Para AQUINO (1996, p. 23), “há muito,
os conflitos deixaram de ser um evento esporádico e particular no cotidiano das escolas
brasileiras para se tornarem, talvez, um dos maiores obstáculos pedagógicos dos dias
atuais”. É irrefutável a importância de um ambiente escolar que promova a convivência
harmoniosa entre seus sujeitos, seja para a promoção da aprendizagem ou para a formação
do aluno de modo geral e o bem-estar de todos. Todavia, a qualidade deste convívio vem
sendo comprometida pelo contexto de violência presente no interior das escolas.
A esse respeito, Abromovay e Castro (2006) destacam que um dos caminhos para
melhor compreender as formas de violências que acontecem nas instituições de ensino é
apreender as distintas relações que envolvem os sujeitos que convivem cotidianamente
nas escolas. O termo é utilizado no plural, violências, para sublinhar a variabilidade da
intensidade, gravidade e permanência do fenômeno. Esses aspectos estão estritamente
vinculados ao estabelecimento escolar, a posição de quem fala (professores, direção,
alunos, funcionários, pais etc.), sexo, raça, além de estar sujeita à temporalidade e ao lugar

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 4 39


nos quais os atores a vivenciam (ABRAMOVAY & RUA, 2003).
Nesse sentido, as boas e más relações interpessoais são processos concretos nos
quais nos vemos envolvidos. A escola é um dos cenários dessa construção, espaço que
como afirmou Paulo Freire (1995) não tem fins exclusivos para o aprender, pois é um local
no qual se constituem vínculos e se criam expectativas e sentimentos. É um cenário de
convivência que tem seus efeitos na formação geral da personalidade individual e social de
seus protagonistas e agentes. A escola assume diferentes sentidos, ao mesmo tempo em
que é um espaço onde as pessoas revelam ter fins comuns como o conhecimento e novas
amizades, também é um local onde são obrigadas a conviver todos os dias, de acordo com
determinadas normas. Nessa convivência diária, também se fazem presentes indisposições
e conflitos (ABROMOVAY, 2003). Esses conflitos muitas vezes não são equacionados pela
escola, culminando em atos de agressões verbais, físicas e humilhações entre os alunos.
As razões que justificaram essa pesquisa tiveram alicerce nos seguintes aspectos:
o primeiro, aos meus interesses educacionais. Segundo, como professor de Matemática
da Secretaria do Estado de Educação de Goiás, observo que a violência entre os alunos
é um fato constante no cotidiano escolar e terceiro, por acreditar que a cultura de paz,
pode colaborar na redução de atos de violência na escola contribuindo para uma boa
convivência. A violência aqui entendida na concepção de Zaluar e Leal (2001) como o
aniquilamento dos corpos e arruína da mente dos indivíduos. Caracterizada, portanto,
pelo não reconhecimento do outro. “A violência, nessa concepção, relaciona-se com o
desaparecimento do sujeito da argumentação ou da demanda, estando preso e esmagado
pela força (física ou moral) de seu oponente que lhe nega diálogo” (Ibidem, p.30).
A cultura de paz é uma proposta para que as relações humanas sejam entremeadas
pelo diálogo, pela tolerância, pela consciência da diversidade dos seres humanos e de
suas culturas. Não se pode construir uma cultura de paz de forma isolada. Precisamos
desenvolver o senso de justiça, de solidariedade e os direitos e valorização do humano
(PURIFICAÇÃO, 2014). Assim, se desejamos fazer da cultura de paz, conforme postulou o
pedagogo guatemalteco Carlos Aldana Mendonza, “o centro indiscutível de toda educação
no mundo de hoje” (ALDANA, 1995 apud MALDONADO, 1997, p. 22), é preciso pensar
como colocar a cultura de paz no coração do currículo, entendido como conjunto de
vivências realizadas no processo educacional, superando o episódico que caracteriza,
muitas vezes, iniciativas pedagógicas em torno da paz. Muitas vezes, nas escolas e outros
ambientes educativos, com o intuito de tematizar pedagogicamente a paz, se organiza um
evento, mas não se pensa todo o ambiente educativo a partir do eixo da paz.
Ao abordar o Sagrado entramos num campo delicado e complexo, mas que, por
sua vez, nos remete a uma incrível sensação de familiaridade, um verdadeiro déjà vu,
com o qual a humanidade sempre esteve e estará envolvida. A explicação para isso pode
estar lá atrás, na história do surgimento humano narrada nas Sagradas Escrituras. No
viés bíblico o homem carrega, simbolicamente, as impressões digitais de Deus. Nesse

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 4 40


universo de simbologia que mistura fé, mito e crença, o homem aparece como imagem de
Deus, ou seja, o homem é representante de Deus na terra e, como semelhança, o reflete
(MOLTMANN, 1999).
Deus está presente em todos os lugares, inclusive na escola. A religião está no
imaginário popular. Crescemos ouvindo que fomos criados à imagem e semelhança de
Deus. Partindo desse pressuposto bíblico, Deus tem um rosto. Deus tem uma imagem. E
ela está bem mais próxima do que imaginamos, e é essa proximidade com Deus no outro
(nos colegas de classe, de escola) e na nossa própria imagem que nos leva a valorizar a
vida e respeitar meu próximo. Diante desse fato, pode a escola não pensar sua relação com
a religião? Podemos nós educadores fugir deste desafio? (PURIFICAÇÃO, 2014).
Para Bourdieu (1998), o aluno traz consigo um capital cultural herdado, ou seja, uma
visão de mundo e uma hierarquia de valores que definem sua relação com a escola e sua
atitude no processo do conhecimento. A religião é parte fundamental deste capital cultural,
muitas vezes norteando as escolhas dos pais em relação à educação de seus filhos.
O objetivo geral defendido neste estudo foi: Analisar na ótica dos estudantes do
9º ano do ensino fundamental de uma escola estadual em Luziânia - Goiás o conceito
de violência, as relações estabelecidas no ambiente escolar entre os alunos, professores
e alunos, e quais os fatores que propiciam conflitos nas relações interpessoais. Como
objetivos específicos propomos: Identificar e descrever as percepções dos atos definidos
como “violentos” e “não violentos” pelos estudantes do 9º ano do ensino fundamental, e em
que contexto essas práticas ocorrem; verificar os fatores que na concepção dos alunos
promovem as ações violentas no espaço escolar; verificar se há relação entre a violência
que ocorre na escola e o clima organizacional da instituição escolar; Identificar e descrever
os mecanismos sociais e individuais presentes na concepção de violência descrita pelos
alunos; relacionar os diferentes conceitos de violência (física, social, simbólica, psicológica)
expressos pelos estudantes com as suas práticas nos espaços internos da escola e analisar
as estratégias pedagógicas utilizadas pela escola para enfrentar as violências presentes
em seu cotidiano.
Na busca de compreender quais os elementos que constituem as representações
sociais da violência na unidade escolar, utilizou-se da pesquisa qualitativa, baseada em
material bibliográfico e documental. Foram selecionados aleatoriamente cem alunos de
ambos os sexos, dentre os 295 matriculados no 9º ano do ensino fundamental, cujas
idades variavam de 13 a 23 anos. Para participar da pesquisa os alunos deveriam estar
matriculados na unidade escolar há mais de um ano, aceitar responder às perguntas
do questionário e trazer o TCLE preenchido e assinado pelos pais e/ou responsáveis.
Utilizamos como critério de exclusão deixar fora os alunos que faltaram no dia da aplicação
dos questionários, alunos com menos de um ano de matrícula e os que se recusaram
a participar. Integraram-se também ao estudo vinte servidores, sendo treze professores
em regência e sete administrativos. Nesse caso, a forma de inclusão foi a opção pelos

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 4 41


servidores/professores que trabalham diretamente com os alunos do 9º ano e que se
dispuseram a participar da pesquisa e entregaram no prazo determinado o TCLE. Como
critério de exclusão do sujeito, a opção foi não incluir aqueles que apresentem um período
de exercício no cargo e na instituição inferior há um ano, pois o alvo eram servidores/
professores que tinham um maior conhecimento da realidade vivenciada pela instituição e
seus atores. Após a aprovação do estudo no “comitê de ética” iniciamos o trabalho de campo
e o levantamento das categorias que levaram em consideração o conteúdo do material
analisado em relação aos objetivos da investigação. Compreendido isso, segundo Silva
et al. (2009), a revisão de documentos foi dividida em dois momentos bem diferenciados:
o primeiro para a coleta de documentos e o segundo para a análise do conteúdo, que foi
desenvolvida a partir da perspectiva teórica de Bardin (2011).

2 | DIÁLOGOS SOBRE VIOLÊNCIA ESCOLAR, SAGRADO E CULTURA DE PAZ


Refletir sobre o tema violência na escola implica na escolha de um caminho permeado
por muitas tensões, pois o conceito é polissêmico, apresenta uma variedade e interação de
suas causas, e não apresenta consenso sobre sua natureza. Assim, o que é definido como
violência varia segundo os aspectos sociais, culturais e econômicos, compreendendo uma
diversidade de realidades e de especificidades. Atualmente, a violência é uma ameaça,
não somente aos estudantes, mas a toda comunidade escolar. Quando compreendemos
a violência como um comportamento que abrange formas de agressão premeditada, e
em alguns casos mortal, de um indivíduo ou grupo contra seus semelhantes, observamos
que ela não nos é estranha. A história sublinha que os atos de violência sempre estiveram
presentes na trajetória do homem.
Costa (1997), refere a origem da violência humana tem sido estudada por muitos
sociólogos e historiadores, que vêem na escassez de bens e fonte maior de conflito entre os
homens. Para esses estudiosos, entre os quais estão Hobbes, Rousseau, Marx e Engels,
a origem dos conflitos e da violência remonta às organizações humanas mais primitivas.
No entanto, o autor discorrendo sobre a origem da violência e suas distintas concepções,
apresenta uma substancial diferença entre esta e a agressividade (COSTA, 1984).
Para Ortega; Marta-Merchán (1997), Costa (1984), Ortega (1997) e Debarbieux
(1997), discernir as más relações dos verdadeiros atos de violência de separar as
manifestações de agressividade boas, salutares, que contribuem para o processo de
autoafirmação do indivíduo, daqueles que comportam um teor destrutivo. Para efeitos deste
estudo, compreendemos por violência atos que não se restrigem a sanção penal, mas
são caracterizados pelo não reconhecimento do outro, tais como: desrespeito, descaso e
humilhação. Violência, que explícita ou simbólica, é definida como incivilidades.
Charlot (2002) afirma que a violência escolar não é um fenômeno recente. No século
XIX, algumas escolas apresentavam explosões de violência. Contudo, em cada época ela

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 4 42


assume contornos próprios. Para Abramovay e Castro (2006), a discussão sobre violência
nas escolas recebeu destaque não apenas pelas mudanças ocorridas no ambiente escolar,
mas também pelos novos significados assumidos pela violência no mundo contemporâneo.
Esse tipo de violência cria um ambiente de tensão ou insegurança nos lugares públicos,
além de serem causas de agressões físicas. Tal fato, acontece porque “as pequenas
violências anulam a ideia de um mundo que pode ser dividido com o outro, comprometem a
reciprocidade e a solidariedade na vida social sem tocar na integridade física dos indivíduos”
(ROCHÉ, 2002).
René Girard (1990), que ao explicar o começo da cultura e da estrutura inerente
à violência nas sociedades começa fazendo uma consideração do que ele chama crise
mimética, ou seja, a crise da cultura, da instituição, da sociedade e dos valores. Segundo
ele, as pessoas são guiadas por um desejo que gera conflitos e rivalidades apresentando
uma estrutura mimética.

2.1 Concepções dos alunos sobre a violência e como ela está presente nas
ações dentro da escola
A importância de se investigar o conceito de violência dos alunos está pautada
também na relevância das interações na construção da subjetividade humana. Essa posição,
fundamentada nos pressupostos da teoria sócio-histórica, a respeito do desenvolvimento
humano, assevera que “a criança, desde seus primeiros anos de vida, está imersa em um
sistema de significações sociais (FONTANA, 1996, p. 122), sistema este que irá incorporar
as ações e significados produzidos e acumulados historicamente. Nessa perspectiva, a
composição humana é resultado de um processo de desenvolvimento que está densamente
enraizado nas ligações entre história individual e história social (VYGOTSKY, 1984).
Nessa direção, os atos violentos caracterizam-se como uma forma de não reconhecer
o outro como sujeito (OLIVEIRA, 1991). Costa (1984, p.103) complementa que “violência é
o emprego desejado de agressividade com fins destrutivos”, ocorrendo quando há desejo
de destruição. A vítima é abatida pela força (física ou moral) de seu oponente, que lhe nega
diálogo (ZALUAR; LEAL, 2001), tirando os sujeitos da posição de humanidade e alocando-
os na condição de objeto.
A violência silencia as pessoas, pois o diálogo é fundamental para a relação de
reconhecimento do outro. As expressões violentas fazem com que as ações características
dos seres humanos, tais como a comunicação e o diálogo, não se concretizem. Nesse
contexto, a concepção de disciplina atrelada à punição teria a função de reafirmar a
autoridade do professor e as normas instituídas no espaço escolar, colocando o culpado
em uma posição de isolamento e delimitando o espaço de “bem” e dos transgressores.

2.2 Experiência religiosa como produção de sentido para o espaço escolar


A escola é um grande espaço de diversidade no mundo moderno, e nesse ambiente

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 4 43


indivíduo de diferentes credos religiosos convivem. Por isso, mais do que simples tolerância,
espera-se que haja respeito, partilha de valores construtivos, reconhecimento da qualidade
da busca religiosa do outro. O Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso entende
que seu objeto de estudo é o fenômeno religioso. Por fenômeno religioso entende-se
o processo de busca que o ser humano realiza na busca da transcendência, desde a
experiência pessoal do Transcendente até a experiência religiosa na partilha de grupo,
desde a vivência em comunidade até a institucionalização pelas Tradições Religiosas.
(FONAPER, 2000, p. 16).
Dessa forma, a proposta mais recente do Ensino Religioso aponta para um novo
paradigma, superando o modelo catequético e proselitista, por ser reconhecido como uma
área de conhecimento e por ser parte integrante da formação básica do cidadão. O Ensino
Religioso tem por objetivo:
Proporcionar o conhecimento dos elementos básicos que compõem
o fenômeno religioso, a partir das experiências religiosas percebidas
no contexto do educando; Subsidiar o educando na formulação do
questionamento existencial, em profundidade, para que ele possa dar sua
resposta, devidamente informado; Analisar o papel das tradições religiosas
na estruturação e manutenção das diferentes culturas e manifestações
socioculturais; Facilitar a compreensão do significado das afirmações e
verdades de fé das tradições religiosas; Refletir o sentido da atitude moral,
como consequência do fenômeno religioso e expressão da consciência e da
resposta pessoal e comunitária do ser humano; Possibilitar esclarecimentos
sobre o direito à diferença na construção de estruturas religiosas que têm na
liberdade o seu valor inalienável. (FONAPER, 2000, p. 31).

Neste modelo fenomenológico, o Ensino Religioso como proposto não está


compromissado com qualquer representação confessional religiosa ou com a teologia,
e sim com o campo das ciências da religião. Entende-se que a teologia vincula-se ao
pensamento oficial das diversas confessionalidades religiosas, e a ciência da religião tem
como objeto de estudo o fenômeno religioso e suas múltiplas expressões culturais. “Seu
objeto de estudo é maior do que a confessionalidade presente em cada denominação
religiosa” (JUNQUEIRA, 2002, p. 51).
Portanto, contribui na busca de respostas aos questionamentos existenciais dos
alunos no entendimento da identidade religiosa, na convivência com as diferenças e na
alteridade, numa perspectiva de compromisso histórico diante da vida e da transcendência.
Como parte fundamental na construção da vida cidadã, o Ensino Religioso é do exercício de
direitos e deveres de pessoas, grupos e instituições na sociedade, para que, em sinergia,
em movimento cheio de energias que se trocam e se articulam, influam sobre múltiplos
aspectos, possibilitando, assim, o viver bem e a transformação da convivência do cidadão,
conforme o artigo 33 da LDBEN nº 9.394/96 (CARON, 1999).
Ao fundamentar a área de conhecimento de Ensino Religioso como relegere (reler),
contribuir-se-á para a releitura do fenômeno religioso para que na diversidade se construam

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 4 44


os elementos básicos para a sustentabilidade humana de respeito e solidariedade, deixando
de lado o proselitismo, tornando, assim, possível a transformação das informações em
conhecimento com respeito ao outro.

2.3 Cultura de Paz e Violência Escolar no campo empírico


A cultura de paz é uma proposta para que as relações humanas sejam entremeadas
pelo diálogo, pela tolerância, pela consciência da diversidade dos seres humanos e de
suas culturas. Quando analisado no ambiente escolar, muitos autores consideram o
sistema educativo uma estrutura violenta em si mesmo e discutem sobre a possibilidade
de educar para a paz na atual organização educacional. É interessante observar que tanto
a paz como a violência são processos construídos a partir das relações entre seres (des)
humanos, podendo, então, serem ensinados e/ou aprendidos (GUIMARÃES, 2004). Nessa
direção, é fundamental (re)pensarmos as ações que devem ser construídas diariamente
dentro das unidades escolares. A valorização da diferença, da identidade dos sujeitos, é
um passo importante para a promoção de uma educação para a paz. Refere Correa (2003,
p. 97):
O direito à identidade é um aspecto essencial na educação para a paz; uma
cultura e uma sociedade de paz só serão possíveis desde o reconhecimento e
integração das diferentes culturas que a conformam. Por isso, hoje, reforçamos
a reivindicação da diferença e a valorização da diferença no sentido cultural
e étnico para o enriquecimento da humanidade.

A escola como um espaço de diversidade deve promover um ambiente em que


as distintas identidades se manifestem e que os alunos se sintam orgulhosos de sua
identidade cultural. No decorrer da pesquisa vimos que no dia a dia da escola-campo é
comum a manifestação de queixas por parte dos profissionais da educação, que apontam
a dificuldade de ministrar suas aulas sem antes perder preciosos minutos resolvendo
questões de indisciplina, tentando controlar as conversas paralelas e trazer o aluno para o
universo da aula, mediando conflitos entre alunos que na maioria das vezes partem para o
xingamento e até mesmo para a violência física. Além desses, existem outros gargalos com
os quais os professores são obrigados a conviver, como por exemplo a falta de compromisso
com as atividades, ou seja, a maioria dos alunos não faz as tarefas, não valorizam o espaço
escolar. Eles arrastam e derrubam cadeiras e mesas, picham as paredes, quebram os
vidros, destroem as tomadas.
Os problemas não se limitam somente à sala de aula. O grupo gestor fez queixas
em relação ao corpo docente, como faltas de professores, atrasos, não cumprimento de
prazos, aulas não planejadas ou de má qualidade, falta de respeito às regras coletivas da
instituição. E para completar o quadro, os professores muitas vezes manifestam insatisfação
com relação ao trabalho dos seus líderes, reclamando da ausência, de falta de “pulso firme”
ou de excesso de autoritarismo.

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 4 45


Tudo isso demonstra a fragilidade das relações sociais estabelecidas entre os
agentes no ambiente escolar e aponta para a necessidade de políticas de combate.
Percebe-se a prática isolada do uso de combinados por parte de alguns professores, que
tentam firmar pactos de convivência ou acordos coletivos com os alunos. No entanto,
há um enfraquecimento, por não haver um discurso unânime estruturado em torno dos
combinados.
Tal realidade talvez seja comum a muitas escolas brasileiras, que encontram
dificuldades de estabelecer um padrão de autoridade sobre o cumprimento das normas,
e nesse contexto, muitas vezes, a visão autoritária tende a utilizar o medo como forma de
manter o controle, com uma forte tendência à punição.
Como sugestão aponta-se uma reformulação na ideia de fazer combinados, que
devem trazer uma solução não repressiva para o problema da indisciplina e da crise de
autoridade do professor. No combinado, devem-se construir coletivamente os “acordos”
necessários para criar e manter um convívio de respeito e solidariedade entre profissionais,
alunos e pais e, com isso, prevenir os problemas de violência e indisciplina na escola.
Analisando alguns aspectos extraescolares, a pesquisa demonstrou, ainda, que 74% dos
alunos não gostam do bairro em que moram, não possuem nenhuma identificação positiva
com o espaço. Esse dado é um indicador para compreendermos a crescente onda de
violência vivenciada na unidade escolar.
Aqueles que se assustam com as múltiplas manifestações de violência na escola
não percebem que a escola, de uma maneira geral, caracterizou-se como um espaço de
violência. Em primeiro lugar, física. Não podemos esquecer que há mais de cinquenta
anos, em muitos lugares, eram comuns as punições físicas. Depois, que ensinar e aprender
sempre estiveram associados a punir e premiar. Enfim, que na escola sempre se processou
a racionalização das violências, de todo tipo de violência, sejam físicas, psíquicas e
simbólicas. Trata-se, portanto, de começar a compreender a própria contribuição da
escola no processo de formação e consolidação desta razão bélica, começando a falar
da violência da escola. Sobretudo, é preciso perguntar em que medida os discursos e
as análises trabalham não apenas a violência expressa na educação, mas a violência
produzida pela educação, ultrapassando o discurso descritivo sobre a violência (nos meios
de comunicação, em sala de aula, na juventude etc.) e abrindo espaço para uma crítica e
autocrítica da própria educação como instrumento de violência.
Muito do que qualificamos de violência na escola é um protesto contra a violência da
escola. Tais colocações apontam para a importância de considerar atentamente a análise
dos mecanismos através dos quais a escola perpetua instrumentalmente a violência
e se coloca a serviço de uma sociedade violenta. Também aponta para a superação da
contradição entre o currículo legal e o currículo ação, entre o que se estipula e o que se
pratica (JARES, 1999 apud CORREA, 2008).
Estas colocações acentuam que a educação para a paz não é um processo apenas

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 4 46


intelectual ou que se estrutura numa disciplina ou numa determinada atividade. Não basta
falar de paz para constituir a educação para a paz. Daí a importância da constituição das
referências, das identidades, enfim, daquilo que poderemos chamar de simbólica. O símbolo,
mais do que expressão da realidade, possui uma dimensão de organização instauradora
da realidade. E se em todo processo educativo são os símbolos que educam, isto se aplica
muito mais em relação à educação para a paz. A dimensão simbólica impõe o imperativo de
ultrapassar as palavras. Os autores que trabalham educação para a paz fazem a distinção
entre ensinar para a paz e entre ensinar acerca da paz, postulando uma relação estreita
entre fins e métodos, conteúdo e forma. Para Jares (1999 apud CORRÊA, 2008), a forma
deve excluir não apenas a violência direta, mas também a violência estrutural.
Finalmente, uma escola para a paz implicaria também a própria redefinição dos
objetivos escolares, redefinindo-os ou apresentando novos, como a formação de um
consenso para a paz, a crítica da violência oculta e a formação e o desenvolvimento do
protagonismo para a paz.
Se, como afirmou Kant (1989, p. 32-33), “a paz não é natural e deve ser instaurada”,
o exercício da razão e das dimensões comunicativa e argumentativa assume um significado
especial. É preciso, então, operar um consenso humanitário para a paz, tal como aconteceu,
por exemplo, com a Declaração Universal de Direitos Humanos. A humanidade não nasceu
com esta noção e ela foi construída através de um intenso e conflitivo processo social até
estabelecer um consenso através dos documentos que foram sendo proclamados.
A paz somente surgirá se a humanidade concordar em viver em paz. Isto é, ela não
virá por decreto, nem mesmo virá apenas como consequência da atuação dos militantes
pacifistas, mas será fruto do estabelecimento de um consenso discutido, conversado,
negociado, entre as pessoas. Cabe à escola oportunizar um espaço para a formação desse
consenso, propiciando a definição de um projeto e uma agenda de paz para o mundo, seus
pontos essenciais, suas condições, suas consequências.

3 | DISCUSSÕES E RESULTADOS
Denominamos violência escolar todos os atos ou ações de violência, comportamentos
agressivos e antissociais, incluindo conflitos interpessoais, danos ao patrimônio, atos
criminosos, marginalizações, discriminações, dentre outros praticados pela comunidade
(alunos, professores, funcionários, familiares e estranhos à escola) no ambiente escolar.
A escola muitas vezes é vista como um fator que reproduz as experiências de opressão
de violência, de conflitos. São inúmeras as experiências sofridas pelos educadores no
âmbito escolar, e isso acaba sendo a construção da sua própria violência e indisciplina.
No ambiente escolar podemos inferir que a violência perpassa por diversos fatores, não
havendo um único preponderante. Isso porque o fator social está diretamente ligado aos
fatores econômicos, envolvendo a mídia, a moda e os novos costumes.

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 4 47


A violência na escola pode ser entendida como um processo complexo e desafiador
que requer um tratamento adequado, cuidadoso e fundamentado teoricamente, por meio
de conhecimentos científicos, desprovidos de preconceitos e discriminações. Esse tipo de
violência torna-se preocupante, pelo fato de a escola ser um espaço institucionalizado de
desenvolvimento do indivíduo pela educação, sendo esta um processo de sociabilização,
de desenvolvimento intelectual, científico e filosófico do indivíduo.
Com o objetivo de apreender as representações sociais do conceito de violência,
indagamos aos alunos qual a definição de violência que eles possuíam. As respostas
encontram-se dispostas abaixo:
A1 É tudo aquilo que venha atingir diretamente ou indiretamente a uma
pessoa. Seja por atitudes que cause dor física ou emocional ao ser humano.
A2 É um ato tão perverso que causa dor e muitas vezes perdas. A violência
afronta a paz e até Deus. A3 É o extremo da ignorância que uma pessoa pode
chegar. Para tudo na vida tem jeito, mas, em meio ao sufoco e ao stress do dia
a dia, qualquer coisinha é motivo de discussão, que muitas vezes acaba em
agressão física ou verbal. A4 É um problema que está destruindo o mundo,
acabando com a população. Isso não está certo, pois são muitas destruições,
uma atrás da outra, drogas, armas, falta de respeito ao próximo, falta de amor
aos irmãos. A5 São tapas, muros e surras. Mas pior violência são as palavras
que ferem a alma, que pode passar muitos anos que você jamais esquece
e normalmente são ditas por pessoas muito próximas. A6 É o ato social que
existe na vida de cada ser humano que vive na sociedade. A7 É um desejo que
nasce junto com o ser humano. Por isso, muitas vezes dizemos que fulano já
nasceu ruim. A8 É algo muito triste, porque todos sofrem. A9 É tudo que o ser
humano faz para prejudicar o seu semelhante. Pode ser verbal ou física. A10
É um sentimento mau que toma conta das pessoas. A11 É um ato de praticar
maldades. Como por exemplo: inveja, arrogância, mentira e outras coisas.
A12 É uma coisa muito séria e constrangedora. É um ato de desrespeito às
pessoas. A13 É tudo aquilo que está envolvendo atitude, que nos agride e
ofende. A14 É algo ruim que existe de várias formas, palavras e agressões.
A15 É tudo que, de alguma maneira, ofende, constrange o indivíduo em seu
meio familiar e social. A16 É deixar as crianças com fome, bater, violentar
sexualmente. É o pai chegar em casa bêbado e bater na mulher e nos filhos.
Ou mesmo não dar atenção. A17 É o caminho que leva uma pessoa a se
afastar de Deus e se isolar do mundo. A18 É o ato de ofender o próximo.
A19 É maneira de menosprezar o ser humano. Tanto quem pratica, quanto
que a recebe. A20 É uma palavra fácil, porém difícil de definir, afinal existem
tantas violências, uma mais terrível do que a outra. A21 É qualquer ato de
discriminação, agressão que cause dor. A22 É um ato que machuca, magoa
e muitas vezes até destrói a felicidade das pessoas. (PURIFICAÇÃO, 2014,
p. 69-70).

Os relatos revelam que os alunos possuem uma concepção de violência que


extrapola as agressões físicas. Expressam a violência como qualquer ação com
intencionalidade de provocar dor ou sofrimento no outro. Essa compreensão demonstra a
amplitude do conceito e evidencia que a violência encerra muitos elementos que não são
necessariamente passíveis de sanção penal, tais como: agressões verbais, humilhações

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 4 48


etc. Por isso, a importância de se conhecer como se institucionalizam as práticas sociais,
nesse ambiente carregado de diversidade que é a escola, visto que estas práticas são
responsáveis pela transmissão de valores e a construção de conceitos incorporados nas
subjetividades.
Abaixo apresentamos o Raio X da violência na escola, a partir das concepções dos
sujeitos:

Nº Perguntas Nunca Frequência Acontece


Acontece uma sempre
vez
01 Fui alvo de violência física 57 57% 19 19% 24 24%
(murro, empurrão, tapa etc.)
02 Meus colegas colocam 42 42% 35 35% 23 23%
apelido(s) em mim
03 Já fui ameaçado(a) por meus 35 35% 35 35% 30 30%
colegas
04 Já levaram minhas coisas sem 36 36% 21 21% 43 43%
autorização
05 Já quebrei objetos da escola 60 60% 14 14% 26 26%
06 Já briguei com colegas 51 51% 28 28% 21 21%
07 Falo muito em sala de aula, 51 51% 35 35% 14 14%
atrapalhando o professor
08 Falo palavrões em sala de 42 42% 24 24% 34 34%
aula
09 Já discuti com professores 50 50% 35 35% 15 15%
10 Distraio-me com facilidade em 30 30% 25 25% 45 45%
sala de aula
11 Estou sempre fora do lugar e 75 75% 14 14% 11 11%
Tabela: 1 - Raio X da violência na escola
Fonte: Entrevistas realizadas entre maio e junho de 2013 (Adaptado).

As informações mostram que a violência física é a face mais visível do fenômeno,


pois 57% dos participantes da pesquisa vivenciaram esse tipo de violência. Para Velho
(2000, p. 18), o individualismo e a impessoalidade são aspectos preponderantes para
que as relações interpessoais se tornem violentas, de tal forma que “a violência foi se
rotinizando, deixando de ser excepcional para tornar-se uma marca do cotidiano”. O autor
associa a violência à ideia de poder, como injunção de vontade ao outro. Por esta razão,
fundamenta que a violência não pode ser reduzida à força física, pois abrange também o
psíquico, o moral e sociocultural.
Assim, em cada contexto social no qual a violência é desempenhada temos
justificativas diferenciadas, destacando um ou outro dos fatores. Em cada caso, temos uma
construção discursiva que apresenta aspectos singulares que devem ser analisados para

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 4 49


compreensão do ato realizado. A razão disso está no fato de que, em algumas situações, a
violência é nomeada pelos adolescentes e jovens como um exemplo de ação social a ser
seguido, o que está diretamente vinculado à construção das identidades e expectativas de
vida dos sujeitos. Exemplos dessa ideia estão presentes nos relatos dos principais casos
de violências ocorridos na unidade escolar envolvendo alunos, professores ou técnico-
administrativos.
As concepções de paz relacionam-se a um estado de espírito do ser humano, a
um desejo incontestável de felicidade e realização. Trazendo isso para o universo escolar,
significa um relacionamento tranquilo e harmonioso entre os seus partícipes. No grupo
dos alunos entrevistados, as concepções de paz e do Sagrado em 33% dos casos têm a
mesma representação. No decorrer da história da humanidade percebe-se que a definição
de paz passou por várias acepções como a grega, a romana, a judaico-cristã, a platônica-
agostiniana, a romântica, a socialista etc.
A paz como figura representativa de Deus no universo escolar descreve, segundo
Zonta (2009, p. 11), “o ser humano como um lugar de teofania, a pessoa não somente tem o
Sagrado como seu horizonte e destino, mas também o Sagrado tem na pessoa humana um
lugar de representação, de realização, de epifania”. E nesse contexto, acrescenta Ribeiro
(1995, p. 15), o “ser humano, enquanto possibilidade para Deus agir no mundo, é também
uma paixão de Deus. Deus investiu no seu humano. Fez dele um “tu” divinizado, aquele
que dialoga com Deus”. Na tabela abaixo, apresentamos a concepção dos alunos sobre
o que é paz, chamando a atenção para o modo como o conceito de paz e o sagrado, se
intercruzam nas respostas.

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 4 50


O que é Paz? Sujeitos
Não necessariamente é a ausência de guerra, mas é popularmente definida como A-1
tranquilidade, calma. Defino como aquilo que desprende o pensamento do homem para
qualquer tipo de problema.
É um ato de prazer, de conformidade consigo e para com o meio. A paz nos faz ficar A-2
tranquilos com a nossa consciência, com nossa alma e com Deus.
Uma simples palavra que surge muito em seus efeitos. A paz é um momento tranquilo, A-3
reunido com a família. Significa amor, carinho, afeto, cuidado e respeito.
É amor consigo mesmo, harmonia, carinho, família, amigos, saúde. Dormir e acordar A-4
bem, junto com Deus.
É quando você se sente leve e tranquila. Quando você está com sua família, todos unidos A-5
e felizes.

É um ato de alegria, que existe na vida de quem está com Deus. A-6
É um estado de espírito. Quem está em paz consigo mesmo, transmite paz. A-7
É um sentimento muito importante, pois se vive em paz, e tem paz em sua casa, você A-8
também promoverá a paz.

É você sentir bem consigo mesmo e em meio aos outros. A-9


É tudo de bom. É a esperança que todos nós temos em termos um mundo melhor. A-10
É estar em paz consigo e viver bem com todos. A-11
É ter Deus no coração e viver com igualdade, compreensão, sentimento e harmonia. A-12
É todos viverem em harmonia, estar de bem com tudo, com todos e com Deus. A-13
É sentir-se feliz, se não há PA,z deve buscá-la em Deus. A-14
É a tranquilidade, felicidade e realizações. É cercar-se de coisas e sentimentos bons. A-15
É quando vejo toda a família unida. Aí está em paz com a família e com Deus. A-16
É um sentimento de liberdade, sensação de estar perto de Deus. A-17
É a tranquilidade que sentimos quando estamos perto das pessoas que amamos. A-18
É o sonho de cada ser humano. A-19
É o que todos queremos e o que mais nos falta. Um estado de estarmos sempre na A-20
presença de Deus.

Tabela 2: Concepção de Paz


Fonte: Entrevistas realizadas entre maio e junho de 2013.

Hoje, no terceiro milênio, a busca pela paz é uma das grandes preocupações que
envolvem a opinião pública, a esfera política, os grupos religiosos e instituições diversas,
como por exemplo a escola. A busca de responder a esta preocupação socialmente
generalizada fez e faz surgir estudos como o nosso, que transita no campo interdisciplinar
e permite uma reflexão sobre paz, violência e conflitos, com o intuito de cunhar conceitos e
objetivos metodológicos de ação prática.
Para Kant (2004, p. 54), é preciso um esforço consciente e racional dos governantes
e governados para controlar e extinguir as causas das guerras. Esse esforço se daria,
principalmente, num aperfeiçoamento das instituições humanas, como o direito, pois seriam
elas as garantidoras e mantedoras da paz.
Para isso, no campo de pesquisa procuramos entender a concepção de paz a partir
da ótica dos sujeitos e perceber quais fatores colaboraram para construção significativa
desses conceitos.
Para o aluno (A1), paz não é “necessariamente a ausência de guerra, mas é
popularmente definida como tranquilidade, calma. Defino como aquilo que desprende o
pensamento do homem para qualquer tipo de problema”.

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 4 51


A fala de nosso aluno colaborador (A1) traz chavões que apontam e justificam o seu
conceito. “Ausência de guerra” e “calma”. Tal preocupação não é recente. Nesse contexto,
Bobbio (2000, p. 511) afirma que “o homem começou a refletir sobre a paz partindo do
estado de guerra”, pois a guerra colocava em perigo o maior bem do homem, a sua própria
vida.
Para outro aluno (A5), paz é “ quando você se sente leve e tranquila. Quando você
está com sua família, todos unidos e felizes”. A ausência de perturbações e agitações
colabora para a construção do conceito de paz para muitos dos sujeitos. Isso nos remete ao
nosso campo de estudo, ambiente travado por perturbações e agitações, que afastam do
contexto educacional a sensação de paz, na concepção de alunos e professores. No plano
pessoal, paz designa um estado de espírito isento de ira, desconfiança, e de um modo geral
de todos os sentimentos negativos.
As palavras-chave retiradas das concepções dos alunos a respeito da definição de
paz estão na tabela que segue:

Palavras Percentual
Tranquilidade 02 2,5%
Família 14 18%
Deus 18 23%
Amor 13 17%
Harmonia 05 06%
União 03 04%
Felicidade 06 08%
Ato de solidariedade 10 13%
Afeto 03 04%
Carinho 04 05%
Tabela 3: Definição de paz
Fonte: Entrevistas realizadas entre maio e junho de 2013.

A Tabela 3 evidencia que 23% dos entrevistados associam em suas concepções


a paz como sendo algo próximo ou similar a Deus. Essa concepção é corroborada nos
depoimentos:
É o que todos queremos e o que mais nos falta. Um estado de estarmos
sempre na presença de Deus. (A20).

É um sentimento de liberdade, sensação de estar perto de Deus. (A17).

É um ato de prazer, de conformidade consigo e para com o meio. A paz nos


faz ficar tranquilos com a nossa consciência, com nossa alma e com Deus.
(A2).

Quando procuramos conhecer como são as relações familiares dos alunos do 9º

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 4 52


ano, como é estruturada a família desses alunos, começamos a compreender as dimensões
que envolvem a cultura de paz no ambiente escolar. Isso porque a paz é uma obrigação
primária para todos, mas em especial dos pais, pois é no lar que se aprende a viver e
construir a paz; é nesse espaço que os pais têm a enorme responsabilidade de ensinar aos
filhos a maneira de comportar-se, de tratar aos demais e de resolver os problemas.
Os depoentes (17%) também relacionaram a concepção de paz ao amor.
Uma simples palavra que surge muito em seus efeitos. A paz é um momento
tranquilo, reunido com a família. Significa amor, carinho, afeto, cuidado e
respeito. (A3).

É amor consigo mesmo, harmonia, carinho, família, amigos, saúde. Dormir e


acordar bem, junto com Deus. (A4).

Para o poeta brasileiro Machado de Assis, “o melhor modo de viver em paz é


nutrir o amor próprio dos outros com pedaços do nosso”. Tal postura é o que falta no
universo escolar, pois é exatamente essa carência de amor que torna as relações pessoais
conflituosas. A esse respeito, o apóstolo Paulo complementa: “devemos viver em paz com
todas as pessoas”.
Os elementos sociais são inúmeros e cada um colabora com menos ou mais
intensidade nesse processo de construção da identidade humana. E adentrando nesse
universo de diversidade identitária que é a escola, solicitamos aos alunos do 9º ano a
representação simbólica e subjetiva do Sagrado (Deus) e como resultado tivemos um
enumerado de concepções conforme demonstrado na Tabela 4 logo abaixo:

1-1 É um ser que está em outras dimensões, que possui contatos com o ambiente em que
vivemos. Muitos o definem como a natureza, ou o tudo, mas Ele é a essência de tudo o
que existe. Não pode ser delimitado, medido e visto.
1-2 É a verdade de nossa existência, é a paz, que tranquiliza a alma e acaba com toda a
violência. Deus é tudo, ele é único e universal.
1-3 É incondicional, supremo, companheiro, amigo. Fiel, não esquece seus filhos, guia, ajuda,
orienta, não te desampara nos momentos ruins.
1-4 É tudo em minha vida, pois Ele me criou, me trouxe ao mundo e me sustenta A-5 É um ser
superior, criador de todas as coisas. É nele que buscamos força e fé.
1-6 É o amor verdadeiro, é um ser que nos protege de todo mal. Que nos dá paz e que está em
toda parte.
1-7 É o que há de mais puro e sublime no ser humano, Deus é paz é amor.
1-8 É tudo que está em nossa volta, menos a violência. É uma fonte de paz.
1-9 É tudo que é belo, que transmite amor, paz, perdão. A imagem mais próxima para se
definir Deus é a família.
1-10 É a esperança, é a paz e o amor.
1-11 É Deus é Deus.
1-12 Deus é um sentimento puro, amor verdadeiro e incondicional.
1-13 Deus é único, é tudo na vida de uma pessoa.
1-14 É o senhor supremo, pai celestial.

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 4 53


1-15 Deus é meu PAI, minha MÃE, é aquele que me desejou, sonhou comigo e claro me criou
para adorá-lo.
1-16 É o criador do universo, e está presente em cada irmão ou irmã. Em cada rosto feliz ou
triste.
1-17 É o motivo pelo qual existo.
1-18 Explicar Deus é complexo, pois é difícil defini-lo. Mas a tranqüilidade, o amor, o conforto, a
humildade e sentimentos assim nos revelam Deus.
1-19 É tudo.
1-20 É maravilhoso, perfeito [...] meu senhor, meu salvador, minha base.
1-21 Tudo pra mim. Meu refúgio, meu porto seguro.
1-22 É o autor da vida, é aquele que nos ama muito além de qualquer sentimento existente.
Tabela 4: Concepção de DEUS Sujeitos Trechos de depoimentos – Quem é Deus?
Fonte: Entrevistas realizadas entre maio e junho de 2013.

Para entendermos as manifestações do Sagrado nas concepções dos alunos,


buscamos em Otto (2005) uma explicação. Ele aponta a revelação interna e externa do
divino. O “suprassensível”, outro nome dado pelo autor, revela-se segundo as religiões e a
própria religião, não só pela voz interior, pela consciência religiosa ou pelo sentimento, mas
também pode aparecer em certos fatos, acontecimentos e pessoas.
O quadro com os depoimentos acima é uma prova de que o fenômeno religioso
faz com que a dimensão religiosa torne-se parte do ser humano, pois ela é simbólica e
suas experiências mais fundantes são divinizadas. Analisando as respostas dos alunos
participantes (A1 a A22), não há como negar que a pessoa humana é possuída pelo
Sagrado e lhe confere várias interpretações, por não ser apenas externo, mas interno ao
homem.
Deus é um sentimento puro, amor verdadeiro e incondicional. (A12).

Explicar Deus é complexo, pois é difícil defini-lo. Mas a tranquilidade, o amor,


o conforto, a humildade e sentimentos assim nos revelam Deus. (A1).

Essas definições nos trazem à mente a afirmação de Galimberti (2003, p.12), de


que o “sagrado é o fundo inconsciente da pessoa humana. Toda pessoa emancipou a sua
consciência e tornou-a autônoma a partir do sagrado, sem, contudo, esquecer o cenário
enigmático e obscuro de sua origem”.
É nessa perspectiva que este trabalho pretende ser um objeto a mais de reflexão
para as políticas de contenção e combate à violência escolar. Acredita-se que com a
experiência de Deus que cada ser humano pode fazer, ou encontrar em si mesmo, temos o
Sentido capaz para orientar e conduzir o ser humano em seu contexto social.
Ao todo foram 100 alunos que definiram Deus. Dessas definições, transcrevemos 22
na íntegra, e das outras 78 tiramos palavras centrais. Grande parte dos alunos definiu Deus
em frases curtas, das quais selecionamos as principais palavras-chaves. Deus, em muitos
casos, pode ser definido como: paz, amor, esperança, Ser Superior, Ser Supremo etc. As

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 4 54


que mais apareceram foram:

Palavras Percentual
Alegria 01 01%
Amor 13 17%
Esperança 06 08%
Felicidade 04 05%
Paz 26 33%
Ser Superior 08 10%
Solidariedade 03 04%
Supremo 07 09%
Todo Poderoso 05 06%
Tremendo 05 06%
Tabela 5: Definição de Deus
Fonte: Entrevistas realizadas entre maio e junho de 2013.

Deus, na concepção subjetiva dos alunos do 9º ano, pode ser representado


simbolicamente por alguns sentimentos: amor, esperança, paz, alegria, felicidade etc. O que
seria nesse contexto o não Deus? O não Deus no universo escolar pode ser apresentado
como um conjunto de elementos que desagregam, desestabilizam e que podem culminar
em atos de desentendimentos, conflitos e violências. Exemplos:
1) Sentimento de inveja – é um sentimento de tristeza perante o que o outro tem e
a própria pessoa não tem. No universo escolar torna-se fonte de violência, porque
desenvolve o desejo mimético.
Para o aluno (A22), a inveja denota violência, pois ”é um ato que machuca, magoa
e muitas vezes até destrói a felicidade das pessoas”.
2) Sentimento de inutilidade – a este sentimento associam-se o fracasso, o
derrotismo, o desprezo aos outros, os quais podem provocar situações de conflitos
no universo escolar, pois tiram a esperança do sujeito.
Na concepção de outro aluno (A6), a inutilidade, quando propagada pelos agentes
promotores da educação, pode ser vista como “a pior violência, pois brota de palavras que
ferem a alma, que pode passar muitos anos e você jamais esquece e normalmente são
ditas por pessoas muito próximas”.
3) Sentimento de opressão/aflição – estes sentimentos nos deixam de sobremodo
angustiados, tristes, inquietos, tirando a nossa paz, trazendo cansaço, fadiga, não
só em vida física, mas também em vida espiritual.
A opressão e a aflição tomam forma de violência na concepção de outro sujeito (A1),
pois “é tudo aquilo que vem atingir diretamente ou indiretamente uma pessoa. Manifestada
por atitudes que causem dor física ou emocional ao seu humano”.

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 4 55


4) Sentimento de discórdia – um sentimento com imenso poder de destruição de
situações harmoniosas pode desenvolver a falta de entendimento, a desavença, o
ódio, cizânia, com forte tendência ou inclinação a agressões (de todas as formas)
entre os que estão em desavença.
Para justificar o sentimento da discórdia como agente de violência na unidade
escolar, partimos para as concepções de dois dos sujeitos da pesquisa: (A9) “é tudo que
o ser humano faz para prejudicar o seu semelhante [...]”, e (A15) “é tudo que de alguma
maneira ofende, constrange o indivíduo em seu meio familiar e social”.
Um sentimento que não foi mencionado entre os exemplos de não Deus foi o
sentimento de ignorância, no entanto apareceu intrínseco nas concepções de violência de
alguns dos sujeitos: (A3) “é o extremo [a] que uma pessoa pode chegar. Para tudo na vida
tem jeito, mas, em meio ao sufoco e o stress do dia a dia, qualquer coisinha é motivo de
discussão que muitas vezes acaba em agressão física ou verbal”; (A19) a ignorância é vista
como violência, pois é uma “maneira de menosprezar o ser humano. Tanto quem pratica
quanto quem a recebe”.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Na tentativa de compreender quais elementos constituem as representações
sociais da violência na unidade escolar, foram selecionados aleatoriamente cem alunos
de ambos os sexos entre os 295 matriculados no 9º ano do ensino fundamental. O estudo
foi organizado em três eixos centrais definidos pelo cruzamento dos objetivos com as
questões de investigação.
O primeiro eixo da pesquisa foi “identificar e descrever a forma como os alunos do
9º ano percebem a violência escolar, tanto no que diz respeito aos conflitos não resolvidos
quanto em relação à sua percepção do funcionamento da escola, da organização da
instituição, da aplicação e respeito às regras, à qualidade das relações interpessoais e
também às suas concepções de resolução de conflitos”.
Nas falas dos sujeitos, percebemos que existem diversos tipos de ambientes
violentos e a violência não pode se limitar a um único fator. Esses dados foram evidenciados
nos danos físicos ou simbólicos sofridos por pessoas ou grupos pertencentes à escola.
Também fica evidente que a violência na escola envolve seus integrantes, tanto como
agentes do ato quanto como vítimas. A violência física é a faceta mais explícita desse
fenômeno, caracterizada por brigas, ameaças, principalmente por parte dos alunos.
Observou-se também que as brigas são banalizadas e, muitas vezes, incentivadas pelos
pares.
Tais situações mostram a fragilidade do ambiente escolar e podem ser explicadas
de diversas formas. Talvez porque a escola não seja um lugar “agradável” que dê aos seus
alunos o prazer de estar ali. Outra justificativa, talvez, seja a falta de perspectiva e incerteza

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 4 56


com o futuro, do ponto de vista dos alunos. Diante disso, a violência é explicada como
alternativa às frustrações sofridas: diante dos sentimentos de insegurança, injustiça, não
reconhecimento, racismo, discriminação, ela explode em vivências violentas para esses
jovens.
Nesse contexto de tensa convivência escolar, surgem atos de vandalismo na
unidade escolar que expressam claramente o sentimento de não pertencimento ao
espaço. Embora os debates sobre o tema discutido, nos espaços acadêmicos e entre as
instituições de ensino, confirmem a necessidade de projetos educacionais voltados para
a aproximação das pessoas com a escola, indicando propostas de trabalho voltadas para
um novo modelo de formação de alunos e professores, há uma dissonância entre o que é
oferecido e a prática do cotidiano escolar. Um dos aspectos que contribui para a ineficácia
dessa proposta é a ausência de espaços educativos de escuta para os alunos.
Dar voz aos alunos, discutir com eles suas expectativas, explicar os objetivos
educacionais, desenvolver normas coletivas são ações que podem contribuir muito para a
formação de um ser social capaz de falar, de respeitar o outro.
Esta é uma informação que a literatura tem procurado mostrar, destacando que
um maior envolvimento dos alunos com a escola se traduz em atividades escolares e de
aprendizagem mais positivas.
Observou-se que a escola estudada, assim como muitas outras do país, se apresenta
em vários momentos como um espaço de exclusão social, pois reproduz desigualdades
sociais e exclui alunos devido às suas dificuldades de aprendizagem, adotando práticas
pedagógicas e disciplinares autoritárias. Exemplos são as turmas formadas por alunos
repetentes e com forte histórico de indisciplina, aplicando regras construídas sem a
participação da comunidade escolar vinda de cima para baixo, apontando aqui a retirada
do recreio no turno da tarde, o que para os alunos é uma espécie de castigo. Tais atitudes,
enraizadas no autoritarismo institucional conforme os depoimentos apresentados, podem
levar a atos de violência como forma de protesto e expressão crítica contra essa violência
simbólica vinda da escola.
Os resultados da investigação apontaram que a violência escolar é um dos motivos
do desinteresse pelos estudos e insegurança dentro da unidade escolar. Nesse processo,
os professores também sofrem quando são agredidos em seu trabalho pelo desinteresse
e apatia dos alunos. Entre os professores temos desmotivação no trabalho, medo e muitas
vezes sentimento de impotência diante da situação.
Analisando esse contexto, acreditamos que hoje existem duas formas de lidar com
a violência nas escolas: a formação continuada de professores e a implantação de uma
cultura de paz nas escolas. Desenha-se para questionar se as violências encontradas nas
escolas são atos gratuitos ou uma reação ao que a escola significa para seus alunos.
Os fatos evidenciam a necessidade de se refletir sobre um modelo de formação
docente que tenha em conta aspectos como: as diferenças na sala de aula, as dimensões

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 4 57


da violência no contexto escolar, a proximidade com a comunidade, a constituição de
valores e a formação de saberes.
Essa ação levaria a uma prática reflexiva das situações presentes nas escolas. O
complexo cenário das escolas exige uma nova concepção das ações educativas: “Uma
oficina de carpintaria que privilegie espaços de prática real em detrimento de modelos
prescritivos, mais heterogeneidade da turma do que desempenho uniforme”. Nessa
perspectiva, a problematização de acontecimentos reais nas escolas seria o instrumento
básico para que os professores desenvolvessem projetos pedagógicos de acordo com as
necessidades das unidades escolares em que atuam.
Por isso, acreditamos que a formação de professores deve incluir ações para uma
cultura de paz que enfatizem os valores sociais e humanos, a ética, a solidariedade e
o respeito aos direitos humanos na vida cotidiana. Dessa forma, os professores estarão
preparados para lidar com a violência nas escolas.
A Cultura de Paz pressupõe o combate a todas as formas de exclusão. A escola
pode ser um espaço de convivência harmoniosa. Entendemos que a construção do trabalho
colaborativo nas escolas deve vir acompanhada de uma cultura de paz, pois é uma prática
que busca a resolução de problemas por meio do diálogo, da negociação e da mediação
para inviabilizar a guerra e a violência.
Portanto, a cultura de paz deve estar presente nas ações cotidianas de professores
e alunos. Essa prática contribuirá muito para diminuir a evasão, a distorção idade/série,
a reprovação, enfim, no combate e prevenção de todas as formas de violência. Esses
passos devem ser seguidos por todos os envolvidos no processo de educação democrática
e inclusiva.
O segundo eixo explorado foi identificar e descrever a concepção das imagens do
Sagrado pelos alunos e sua relação com o conceito de Paz.
Aproximar-se do Sagrado é entrar em um campo delicado e complexo, mas que, por
sua vez, nos leva a uma incrível sensação de familiaridade, um verdadeiro déjà vu, no qual
a humanidade sempre esteve e sempre estará envolvida. A explicação para isso pode ser
encontrada na história do surgimento humano narrada nas Sagradas Escrituras. No viés
bíblico, o homem carrega simbolicamente as impressões digitais de Deus. Nesse universo
de simbologia que mistura fé, mito e crença, o homem aparece como a imagem de Deus,
ou seja, o homem é um representante de Deus na terra e, da mesma forma, o reflete.
Assim, os elementos sociais que representam e descrevem a concepção do Sagrado
para os alunos são inúmeros e cada um colabora com maior ou menor intensidade nesse
processo de construção da identidade humana, dentro desse universo de diversidade
identitária que é a escola. E seguindo essa representação simbólica e subjetiva do Sagrado
(Deus), a PAZ aparece como representação simbólica de Deus em 33% das concepções
dos alunos, o AMOR com 17%, o SER SUPERIOR com 10%, o SUPREMO com 9% e a
ESPERANÇA com 8%.

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 4 58


A força da análise do sagrado a partir da experiência dos alunos e suas relações
sociais foi o uso da perspectiva da hierofania. Conceito definido por Eliade (1992) a partir
da análise do espaço e do tempo sagrados. A escola pode ser considerada um espaço
sagrado? Para Eliade, o homem religioso pensa o espaço de forma heterogênea e o
diferencia de acordo com suas qualificações.
O terceiro eixo foi descrever se a relação do aluno da sexta série com o sagrado
(espiritualidade) pode ser vista como fator de contenção da violência no ambiente escolar.
As concepções de paz estão ligadas a um estado de espírito humano, a um desejo
inegável de felicidade e realização. Levar isso para o mundo escolar significa uma relação
serena e harmoniosa entre seus participantes. No grupo de alunos entrevistados, as noções
de paz e sagrado, em 33% dos casos, têm a mesma representatividade.
Fica claro, portanto, que a paz é uma figura representativa de Deus no universo
escolar, pois o ser humano é como um lugar de teofania, onde Deus se manifesta. A pessoa
não só tem o Sagrado como horizonte e destino, mas o Sagrado também tem na pessoa
humana um lugar de representação, de realização, de epifania. E, neste contexto, “o ser
humano, como possibilidade de Deus agir no mundo, é também paixão de Deus, Deus
investiu no seu ser humano. Isso fez dele um “tu” divinizado, aquele que dialoga com Deus”.
Foi possível identificar nesta investigação que o reconhecimento da imagem de Deus
e suas representações, seu medo e a observância de princípios religiosos influenciaram
positivamente na redução da violência nas escolas. Ou seja, quanto mais importante é
essa imagem de Deus na vida dos alunos, menos práticas violentas têm sido utilizadas na
escola, e isso, mesmo que indiretamente, acaba influenciando também no desempenho
escolar.
A escola não pode atribuir todas as suas dificuldades ao ambiente externo. No
entanto, a violência escolar encontra-se, pelo menos em parte, na organização do sistema
educacional e seu funcionamento. Assim, a análise da manifestação da violência escolar
como um todo impregnou neste trabalho os aspectos sociais, relacionais, culturais e
individuais. E o ponto de partida foi entender o fenômeno e a dinâmica da violência escolar,
e para isso partimos das concepções e representações de alunos e professores sobre
os elementos que contribuem para o fenômeno. Compreender o significado das ações
pelas raízes dos conflitos que geram violência é um fator essencial que nos permitiu
aludir à necessidade de uma cultura de paz e, portanto, implementar o Sagrado e suas
representações como fator de disseminação dessa cultura .

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Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Capítulo 4 62


MARCELO MÁXIMO PURIFICAÇÃO – Fundação Integrada Municipal de
Ensino Superior -UNIFIMES - Pós-Doutor pela Faculdade de Psicologia e
Ciências da Educação da Universidade de Coimbra - FPCE-UC Portugal (Área
de concentração: Educação Superior e Políticas Educacionais), Professor
Investigador - 2014-2016 -, supervisionado pela Dra. Teresa Pessoa; Pós-Doutor
- pelo Instituto Politécnico da Escola Superior de Educação de Coimbra - IP-
ESEC-Portugal (Área de concentração: Formação de Professores, Identidade e
Gênero) Professor Investigador - 2017- 2021 -, supervisionado pela Dra. Filomena
Teixeira. Doutor em Ensino (Educação Matemática e Tecnologia) -, (Área de
concentração: Alfabetização Científica e Tecnológica) pela Universidade do Vale
do Taquari (UNIVATES, 2018-2022), Doutor em Ciências da Religião (Área de
concentração: Religião, Cultura e Sociedade, na linha: Religião e Movimentos
Sociais) pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás - (PUC-Goiás, 2010 - 2014)
SOBRE OS ORGANIZADORES

e doutorando em Educação (Área de concentração: Estudos Culturais, na linha:


Currículo, ciências e tecnologias) pela Universidade Luterana do Brasil (ULBRA,
2020-). Mestre em Teologia: Educação Comunitária, Infância e Juventude (EST/
UFRGS, 2008) e Mestre em Ciências da Educação (UEP, 2009). Possui formação
multidisciplinar com graduação em: Ciências Sociais (Faculdade Única), Filosofia
(FBB), Matemática (UEG) e Pedagogia (ICSH). Especialista em - Gestão de Sala
de Aula no Ensino Superior (UNIFIMES), Docência do Ensino Superior (UCAM)
e em Matemática (ICSH). Atualmente é Professor Titular C-II da Fundação
Municipal Integrada de Ensino Superior (FIMES/UNIFIMES, 2014-) onde atua
em atividades de ensino, pesquisa e extensão nos cursos de graduação e pós-
graduação, vinculado a Unidade Básica das Humanidades e Professor (P-IV
Padrão E) da Secretaria de Educação do Estado de Goiás (SEDUC, 1999 -)
atuando no componente curricular de Matemática. Atua também como docente
permanente nos seguintes programas Stricto Sensu: Programa de Pós-Graduação
em Educação da Fundação Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS/
Paranaíba), na Linha 1, formação docente e diversidade (cooperação técnica),
Programa de Pós-Graduação em Educação da Faculdade de Inhumas (PPGEDU-
FACMAIS), Linha 1 Educação, Instituições e Políticas Educacionais (EIPE) e, do
Mestrado Profissional em Intervenção Educativa e Social (MPIES) da Universidade
do Estado da Bahia (UNEB) (Colaboração Técnica), na linha 2 Novas Formas
de subjetivação e organização comunitária. Orientou: 1 tese de doutorado, 15
dissertações de mestrado, 20 trabalhos de conclusão de curso de especialização,
113 trabalhos de conclusão de curso de graduação e 9 trabalhos de iniciação
científica. Atualmente orienta: 8 dissertações de mestrado, 1 trabalho de conclusão
de curso, 1 projeto de iniciação científica e supervisiona 1 projeto de pós-doutorado.
Coordena o Grupo de Pesquisa (NEPEM); Colíder do Grupo de Pesquisa em
Educação, Tecnologias Sociais e Desenvolvimento no Interior do Amazonas (IFAM).
Associado à ANPED/Nacional. Associado à APEDUC - Associação Portuguesa

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Sobre os organizadores 63


para o Ensino das Ciências. Membro da Comissão Editorial da Revista Científica
da Educação da FACMAIS (2020 -); Membro do comitê científico da Editora Atena
(2019 -) e da editora Publishing (2020-); Editor-chefe da revista científica Novas
Configurações Diálogos Plural (2020-). Avaliador do Guia da Faculdade (2020-).
Tem experiência na área da Educação atuando no eixo da Diversidade. Atualmente
interessa-me pesquisa em dois blocos temáticos: I PROCESSOS EDUCATIVOS:
Formação de Professores, Políticas Educacionais, Currículo, Desenvolvimento
Profissional, Ensino e Tecnologia; II DIVERSIDADE: Estudos Culturais, Identidade,
Representação, Gênero, Violência, Negritude, juventude, Religiosidade e Cultura.
(Países em que esteve presente para atividades acadêmicas e técnicas e/ou
manteve vínculos em trabalhos científicos: (Argentina, Alemanha, Colômbia, Cuba,
Espanha, Itália, Panamá, Paraguai, Portugal, México, Moçambique e Uruguai).
SOBRE OS ORGANIZADORES

EDUARDO GUSMÃO DE QUADROS - Universidade Estadual de Goiás – UEG


- Possui a graduação em História pela Universidade Católica do Salvador (1992),
o bacharelado em Teologia pelo Instituto Teológico da Bahia (1996) Mestrado
em Ciências da Religião pela Universidade Metodista de São Paulo (1998) e
Doutorado em História pela Universidade de Brasília (2005). É professor efetivo
da Pontifícia Universidade Católica de Goiás e da Universidade Estadual de
Goiás. Coordenou o curso de graduação em História da PUC-GO em 2009-10 e
coordenador do Mestrado em História (2010-13). Membro do Conselho Editorial
da Revista Caminhos (Ciências da Religião) e da Revista Mosaico (PUC Goiás).
Possui ênfase em História religiosa e Teoria da História, atuando principalmente
nos seguintes temas: história e religião, história do cristianismo, Teoria da história
e metodologia de pesquisa. Membro do CEHILA, da ABHR e da Rede de Pesquisa
em História e Catolicismo.

NEUSA VALADARES SIQUEIRA – Pontifícia Universidade Católica de Goiás


(PUC-Goiás) -. Doutora (2019) e Mestra em Ciências da Religião pela Pontifícia
Universidade Católica de Goiás - PUC-GO (2014), graduada em Direito pela
Pontifícia Universidade Católica de Goiás - PUC-GO (1997) e em Letras pela
Faculdade Franssinetti do Recife - FARIRE (1984), além de especialista em
literatura, língua portuguesa e direito processual civil. Foi professora concursada
de ensino médio e básico da Secretaria Estadual de Educação do Estado de Goiás
e professora do ensino superior nas Faculdades Integradas do Planalto Central
(FIPLAC) e da Faculdade de Ciências Tecnológicas (FACITEC), nas quais lecionou
diversas disciplinas nos cursos de Direito, Administração e Comunicação Social.
Exerceu a função de Coordenadora Acadêmica do Instituto de Ciências Jurídicas,
professora e coordenadora de Trabalhos de Conclusão de Curso do curso de Direito
e Assessora da Diretoria Acadêmica, na Faculdades Alfredo Nasser (UNIFAN). É
membro da comissão de Ensino Jurídico da OAB-GO e Presidente da Comissão
OAB Cidadã OAB-GO.

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Sobre os organizadores 64


A
Andrei Rublev 24, 25, 29, 30, 31, 32, 33, 34, 35
Antigo Testamento 4, 7, 29

B
BNCC 8, 9, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23
C
Canon 1, 2, 3, 4, 6, 7
Cultura de paz 18, 38, 40, 42, 45, 53, 57, 58, 59

E
Educação 8, 9, 10, 11, 12, 13, 15, 16, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 38, 39, 40, 60, 61,
63, 64, 65
Encarnação 24, 26, 27, 30, 31, 35, 36
ÍNDICE REMISSIVO

Ensino religioso 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23
N
Natividade 24, 25, 26, 27, 28, 29, 30, 31, 32, 33, 34, 35, 37
P
Presépio 24, 25, 26
R
Recurso didático 8
S
Sagrado 14, 38, 40, 42, 50, 53, 54, 58, 59, 61, 62, 65
T
Teologia 7, 20, 23, 24, 63, 64
V
Violência escolar 38, 42, 45, 47, 54, 56, 57, 59, 60

Teologia, experiência religiosa e pensamento contemporâneo 3 Índice Remissivo 65

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