Você está na página 1de 617

Revista Internacional Consinter de Direito

REVISTA INTERNACIONAL

CONSINTER
DE DIREITO

Publicação Semestral Oficial do


Conselho Internacional de Estudos
Contemporâneos em Pós-Graduação

ANO VI – NÚMERO XI

2º SEMESTRE 2020

ESTUDOS CONTEMPORÂNEOS

0026990

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 1


REVISTA INTERNACIONAL CONSINTER DE DIREITO, ANO VI, N. XI, 2º SEM. 2020

Europa – Rua General Torres, 1.220 – Lojas 15 e 16 – Tel: +351 223 710 600
Centro Comercial D’Ouro – 4400-096 – Vila Nova de Gaia/Porto – Portugal
Home page: revistaconsinter.com
E-mail: internacional@jurua.net

ISSN: 2183-6396-00011

Depósito Legal: 398849/15

DOI: 10.19135/revista.consinter.00011.00

Editor:
David Vallespín Pérez
Catedrático de Derecho Procesal de la Universitat de Barcelona. Su actividad docente abarca tanto los
estudios de Grado como los de Doctorado. Ha realizado enriquecedoras estancias de investigación en
prestigiosas Universidades Europeas (Milán, Bolonia, Florencia, Gante y Bruselas).

Diretores da Revista:
Germán Barreiro González
Doctor en Derecho por la Universidad Complutense de Madrid. Colaborador Honorífico en el
Departamento de Derecho Privado y de la Empresa – Universidad de León (España).
Gonçalo S. de Melo Bandeira
Professor Adjunto e Coordenador das Ciências Jurídico-Fundamentais na ESG/IPCA, Minho,
Portugal. Professor Convidado do Mestrado na Universidade do Minho. Investigador do CEDU –
Centro de Estudos em Direito da União Europeia. Doutor e Licenciado pela Faculdade de Direito da
Universidade de Coimbra. Mestre pela Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa.
María Yolanda Sánchez-Urán Azaña
Catedrática de Derecho del Trabajo y de la Seguridad Social de la Facultad de Derecho, UCM, de la
que ha sido Vicedecana de Estudios, Espacio Europeo de Educación Superior y de Innovación
Educativa y Convergencia Europea.

A presente obra foi aprovada pelo Conselho Editorial Científico da Juruá Editora,
adotando-se o sistema blind view (avaliação às cegas). A avaliação inominada
garante a isenção e imparcialidade do corpo de pareceristas e a autonomia do
Conselho Editorial, consoante as exigências das agências e instituições de avaliação,
atestando a excelência do material que ora publicamos e apresentamos à sociedade.

2 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Revista Internacional Consinter de Direito

REVISTA INTERNACIONAL

CONSINTER
DE DIREITO

Publicação Semestral Oficial do


Conselho Internacional de Estudos
Contemporâneos em Pós-Graduação

ANO VI – NÚMERO XI

2º SEMESTRE 2020

ESTUDOS CONTEMPORÂNEOS

Porto
Editorial Juruá
2020

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 3


Instruções aos Autores
Revista Internacional CONSINTER de Direito
1. DAS PUBLICAÇÕES
Para publicação na Revista Internacional CONSINTER de Direito os artigos científicos serão avaliados
pelo sistema double blind review, no qual dois Pareceristas do CONSINTER avaliarão os trabalhos sem nenhu-
ma identificação de autoria. O enquadramento dos textos avaliados e aprovados para fins de publicação na
Europa pelo Editorial Juruá Lda., e no Brasil pela Juruá Editora Ltda., obedecerão aos seguintes critérios:
REVISTA INTERNACIONAL CONSINTER DE DIREITO
Conforme as exigências das agências e instituições nacionais e internacionais de investigação e do-
cência que avaliam a atividade acadêmica e investigadora das Pós-Graduações, a Coordenação Executiva
do CONSINTER, ao seu melhor juízo, selecionará uma determinada quantidade de artigos aprovados que
serão agraciados com a Publicação no Periódico Revista Internacional do CONSINTER de Direito, com ISSN
de Portugal. Ainda:
a) Para cada artigo selecionado para a Revista Internacional do CONSINTER de Direito, será atri-
buído um número de registro específico e único no Sistema DOI (Digital Object Identifier);
b) Também será atribuído um registro no Sistema DOI (Digital Object Identifier) para a Revista In-
ternacional do CONSINTER de Direito.
c) Todos os artigos publicados na Revista Internacional CONSINTER de Direito estão disponíveis
gratuitamente no site da Revista CONSINTER <https://revistaconsinter.com/edicoes-anteriores/>.
d) A Revista Internacional CONSINTER de Direito está indexada em bases de dados nacionais e
internacionais como: Google Scholar, Latindex, REDIB, DOAJ, CAPES, LivRe, Diadorim, Sumários.org, Cite
Factor, Tribunal Superior Eleitoral, Rede Virtual de Bibliotecas Integradas (RVBI) e membro da Crossref.
Obs. 1: Em face das normas técnicas, para fins de qualificação do periódico, somente poderão ser
selecionados para a Revista Internacional CONSINTER de Direito os artigos aprovados nos quais pelo menos
um dos autores e/ou autor tenha a titulação de Doutor.
Obs. 2: Ficará a critério do Comitê Organizador a indicação e o número da Revista em que o artigo
aprovado será liberado para publicação.
2. PERIODICIDADE
Semestral.
3. CONDIÇÕES
a) A submissão do trabalho científico para análise está condicionada à confirmação da inscrição de
todos os autores e coautores;
b) Somente serão publicados os artigos aprovados pelo Corpo de Pareceristas/Conselho Editorial
do CONSINTER.
4. DOCUMENTOS OBRIGATÓRIOS PARA SUBMISSÃO
a) Inscrição;
b) Comprovante de pagamento da submissão/inscrição;
c) Cessão de direitos autorais assinada;
d) Artigo completo seguindo as orientações do item 5;
e) O artigo deverá ser encaminhado por um dos autores ao e-mail contato@consinter.org
5. NORMAS – OS ARTIGOS ENVIADOS DEVEM CUMPRIR OS SEGUINTES CRITÉRIOS:
a) O artigo deve adotar a norma do Código de Redação Institucional da União Europeia (Norma
Umberto Eco/EU) – ver item 06.
Esse sistema é similar às normas da ABNT, entretanto a utilização torna-se mais fácil (todos os se-
paradores são vírgula) e só destaca em itálico, nunca em negrito.

4 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Revista Internacional Consinter de Direito

b) Ser inédito (não publicado em livros, revistas especializadas ou na imprensa em geral) e apre-
sentar propriedade técnico-jurídica; relevância nacional e internacional do tema abordado, fluência redaci-
onal, correção gramatical e respeito a aspectos éticos e científicos.
Obs.: Textos inseridos em documentos de circulação restrita nas universidades serão considera-
dos inéditos.
c) Ter sido produzido por Estudantes e/ou Professores de Pós-Graduação Lato Sensu e/ou
Stricto Sensu ou por Mestres, Doutores e pós-Doutores.
d) Serão aceitos trabalhos em coautoria, até no máximo três (03) participantes devidamente
inscritos.
e) O artigo deverá estar identificado com um dos critérios de classificação conforme informa-
do em edital.
f) O(s) autor(es) que submeter(em) o mesmo artigo científico (com o mesmo título e conteúdo
ou apenas mudando o título) para mais de um dos ramos do Direito acima indicados terão ambos os
artigos científicos automaticamente eliminados da avaliação.
g) Conter no mínimo 15 páginas, e no máximo 25 páginas.
h) Ser redigido em formato Word em dois arquivos distintos, um com e outro sem identifica-
ção, ambos completos, contendo: Título em língua portuguesa, espanhola, inglesa, italiana ou francesa;
Sumário; Resumo e Palavras-chave em língua portuguesa ou espanhola e inglesa, respeitando as
normas técnicas.
i) Para o arquivo sem identificação é importante o autor certificar-se que no conteúdo do artigo
a ser avaliado não conste nenhuma informação que possibilite a identificação do autor ou a instituição, a
qual esteja vinculado direta ou indiretamente.
j) O artigo poderá ser apresentado em língua portuguesa, espanhola, inglesa, italiana ou fran-
cesa, observando que o título, resumo e palavras-chave precisam, obrigatoriamente, estar indicados em
dois idiomas, sendo peremptoriamente uma indicação no idioma inglês.
Exemplificando:
Se escrito no idioma português: o Resumo e as Palavras-chave devem obrigatoriamente ser indica-
das em português e inglês.
Se escrito no idioma espanhol: o Resumo e as Palavras-chave devem obrigatoriamente ser indica-
das em espanhol e inglês.
Se escrito no idioma inglês: o Resumo e as Palavras-chave devem obrigatoriamente ser indicadas
em inglês e português.
k) Artigos em inglês tem prioridade na análise e na publicação, desde que um dos autores con-
tenha a titulação de doutor.
l) O texto deve estar salvo em arquivo Word, em versão recente, com as seguintes característi-
cas: fonte Times New Roman; corpo 12; alinhamento justificado, sem separação de sílabas; espaço de 1,5
entre linhas; parágrafo de 1,5 cm; não colocar espaçamentos especiais antes ou após cada parágrafo;
margens superior e esquerda com 3 cm, inferior e direita com 2 cm; em papel tamanho A4; notas de
rodapé explicativas na mesma página em que for citada a referência sendo que as Referências deverão
seguir o Código de Redação Institucional da União Europeia (Norma Umberto Eco/UE) – ver item 06.
m) As páginas deverão estar numeradas.
n) Para cada título, subtítulos, todos alinhados à esquerda, deverá haver um texto correspondente.
o) Devem ser escritos de forma clara e objetiva, evitando-se parágrafos prolixos ou ex-
tenuantes e privilegiando as orações na ordem direta como: sujeito – predicado – complemento.
p) Não serão aceitos textos com figuras, ilustrações e/ou fotografias, à exceção de grá-
ficos e tabelas que sejam imprescindíveis para a compreensão do trabalho e compatíveis com a
impressão em preto e branco, sendo vedada a utilização de gráficos e tabelas se originarem de
terceiros.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 5


Instruções aos Autores

q) Conter Resumo (entre 100 e 250 palavras) em língua portuguesa ou espanhola e em


inglês, assim como a indicação de Palavras-chave (entre 3 e 10 palavras) também em português
ou espanhol e inglês.
r) Conter: Sumário a ser indicado na sequência da apresentação do Título, Resumo (entre 100
e 250 palavras – peremptoriamente com 02 idiomas), sendo um em Língua portuguesa ou espanhola e outro
necessariamente em inglês, assim como a indicação das Palavras-chave (entre 3 e 10 palavras), obedecendo
o mesmo critério de apresentação do Resumo.
s) O texto deve obrigatoriamente vir acompanhado do termo de autorização para publicação –
Cessão de Direitos Autorais/Patrimoniais – devidamente preenchido com as informações solicitadas, confor-
me modelo anexo e/ou disponível no site;
t) A qualificação do autor deverá ser em nota de rodapé e conter:
• no máximo 4 linhas;
• indicando obrigatoriamente o endereço de e-mail;
• a formação acadêmica;
• a Instituição de Ensino Superior ao qual esteja vinculado como aluno ou como professor;
• informar a cidade, estado e o país da Instituição de vínculo.
u) Todos os artigos, obrigatoriamente, deverão estar acompanhados do comprovante do paga-
mento da inscrição de cada autor e coautor.
v) Observando que o CONSINTER e uma instituição sem fins lucrativos, o valor da inscri-
ção/submissão subsidia a publicação dos artigos na Revista Internacional CONSINTER de Direito. A taxa de
submissão/inscrição é individual e exclusiva para cada autor. Portanto, cada autor deve efetuar a sua inscri-
ção e pagar a sua respectiva taxa.
w) Um autor pode enviar quantos artigos desejar, porém, deve efetuar o pagamento da taxa de
inscrição/submissão de cada um deles.
x) Observando as normas de qualificação, somente poderão ser liberados para publicação na Re-
vista Internacional CONSINTER de Direito, um artigo de cada autor. Em caso de aprovação de dois ou mais
artigos de um mesmo autor para a Revista, a comissão de avaliação, ao seu melhor juízo, escolhera um para
publicação na Revista, os outros serão direcionados para publicação no livro Direito e Justiça ou para publica-
ção nos próximos números da Revista.
→ Os artigos que não cumprirem as normas acima serão desclassificados
6. DOS SISTEMAS PARA A INDICAÇÃO DAS FONTES DAS CITAÇÕES
Para a indicação das fontes das citações, os artigos deverão adotar a norma do Código de Redação
Institucional da União Europeia (Norma Umberto Eco/EU).
Esse sistema é similar às normas da ABNT, entretanto, sua utilização é mais fácil (todos os separa-
dores são vírgula) e só destaca em itálico, nunca em negrito.
Regras gerais:
– Todos os elementos devem ser separados apenas por vírgula.
– Os elementos destacados com asterisco são obrigatórios.
1. Livro
1)* Apelido (em versalete) e Nome(s) Próprio(s) do autor,
2)* Título e subtítulo da obra (em itálico),
3) (“Coleção”),
4)* Número da edição, se houver várias,
5)* Local,
6)* Editora,
7)* Ano.
8) Dados eventuais da edição mais recente

6 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Revista Internacional Consinter de Direito

9) Número de páginas e eventual número de volumes de que a obra se compõe


10)* Tradução.
Exemplos:
a) na lista de referências
MOLINA DEL POZO, Carlos, Prácticas de Derecho de la Unión Europea, Curitiba, Juruá, 2019.
b) nas notas de rodapé
MOLINA DEL POZO, Carlos, Prácticas de Derecho de la Unión Europea, Curitiba, Juruá, 2019,
pp. 22-23.
2. Capítulo de Livro
1)* Apelido (em versalete) e Nome(s) Próprio(s) do autor,
2)* “Título do Artigo ou Capítulo” (entre aspas),
3)* in
4)* Apelido (em versalete) e Nome(s) Próprio(s) do organizador, org.,
5)* Título da Obra Coletiva (em itálico),
6)* volume (se for o caso),
7)* Local, Editora, data, páginas.
Exemplos:
a) na lista de referências
VISENTINI, Paulo Fagundes, “A Inserção da China na Ásia e a Transformação Estratégica da
Região” in PROCÓPIO, Argemiro, org., O Século da China, Curitiba, Juruá, 2010.
b) na nota de rodapé
VISENTINI, Paulo Fagundes, “A Inserção da China na Ásia e a Transformação Estratégica da
Região” in PROCÓPIO, Argemiro, org., O Século da China, Curitiba, Juruá, 2010, pp. 14-15.
3. Artigo de Periódico
1)* Apelido (em versalete) e Nome(s) Próprio(s) do autor,
2)* “Título do Artigo ou Capítulo” (entre aspas),
3)* Título da Revista (em itálico),
4)* volume e número do fascículo,
5)* data,
6)* intervalo de páginas.
Exemplos:
a) na lista de referências
VELÁZQUEZ, Victor Hugo Tejerina, “Alguns Aspectos da Função Social da Propriedade no
Novo Código Civil”, Revista Autônoma de Direito Privado, v. 1, set. 2006.
b) na nota de rodapé
VELÁZQUEZ, Victor Hugo Tejerina, “Alguns Aspectos da Função Social da Propriedade no
Novo Código Civil”, Revista Autônoma de Direito Privado, v. 1, set. 2006, p. 52.
Segue a referência da Norma Umberto Eco/UE
Referência: ECO, Umberto, Como Se Faz Uma Tese Em Ciências Humanas, 13ª ed., Barca-
rena, Editorial Presença, 2007. Trad. Ana Falcão Bassos e Luís Leitão, pp. 101-102.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 7


Instruções aos Autores

7. DA AVALIAÇÃO DOS ARTIGOS


Os artigos científicos serão analisados pelo Corpo de Pareceristas do CONSINTER, formado
somente por renomados juristas Doutores e Pós-Doutores, nacionais e estrangeiros especialmente
convidados. Os artigos científicos serão avaliados pelo sistema double blind review, no qual dois Pare-
ceristas do CONSINTER avaliarão os trabalhos sem nenhuma identificação de autoria. A apreciação
inominada dos artigos científicos afiança a imparcialidade do seu julgamento, diminui a subjetividade e
as preferências ideológicas.
Dessa forma, o autor deverá evitar referências diretas a si mesmo e citações que possibilitem
extrair da leitura do texto a sua autoria.
Em caso de admissão do artigo científico por um dos Pareceristas do CONSINTER e reprova-
ção por outro, o texto, ao melhor alvitre do conselho diretivo, poderá ser submetido à apreciação de um
terceiro Parecerista.
a) O conteúdo dos artigos científicos é de inteira responsabilidade dos autores e após sub-
metido para avaliação não poderá sofrer qualquer substituição ou alteração, salvo solicitação do Corpo
de Pareceristas;
b) Não é permitido plágio ou inserção de cópias literais.
CONSINTER – CONSELHO INTERNACIONAL DE ESTUDOS CONTEMPORÂNEOS EM
PÓS-GRADUAÇÃO
Coordenação Executiva
Ivan Winters
Marcia Teixeira
contato@consinter.org
www.consinter.org
https://revistaconsinter.com/edicoes-anteriores/
INDEXADORES DA REVISTA:
• Latindex
• Diadorim
• Sumários.org
• REDIB
• CAPES
• DOAJ
• LivRe
• Google Scholar
• Cite Factor
• Tribunal Superior Eleitoral
• RVBI
• Membro da CROSSREF

8 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Revista Internacional Consinter de Direito

Instructions To Authors
“Revista Internacional CONSINTER de Direito”
1. ABOUT THE PUBLICATIONS
For publication in the Revista Internacional CONSINTER de Direito, the scientific articles shall be
evaluated by the double-blind review system, in which two CONSINTER Referees shall evaluate the papers
without any author identification. The framework of the evaluated and accepted articles for the purpose of
publication in Europe by the Editorial Juruá Lda., and in Brazil by Juruá Ltda, will follow the following criteria:
FOR THE JOURNAL “REVISTA INTERNACIONAL CONSINTER DE DIREITO”
According to the requirements of national and international agencies of investigation and teaching
that evaluate the investigative and academic activity of Post-Graduation, the CONSINTER Executive
Coordination, at the best of their judgment, will select a certain amount of articles approved that will be
awarded with the Publication in the Journal “Revista Internacional do CONSINTER de Direito”, with ISSN from
Portugal. Also:
a) For each article selected for the journal “Revista Internacional do CONSINTER de Direito”, a
number of the specific and unique register in the DOI (Digital Object Identifier) system will be assigned;
b) A register in the DOI (Digital Object Identifier) system will also be assigned to the journal “Revista
Internacional do CONSINTER de Direito”;
c) All articles published in the “Revista Internacional do CONSINTER de Direito” will be made
available, free of charge, on the Editorial Juruá website.
d) The journal Revista Internacional CONSINTER de Direito is indexed on national and international
databases, such as Google Scholar, Latindex, REDIB, DOAJ, CAPES, LivRe, Diadorim, Sumários.org, Cite
Factor, Tribunal Superior Eleitoral and Rede Virtual de Bibliotecas Integradas (RVBI) and Crossref member.
NOTE 1: In the face of the technical rules, for the purpose of qualification of the journal, only the
articles approved in which a least one of the authors and/or author has a doctorate degree will be selected for
the journal “Revista Internacional CONSINTER de Direito”. The articles properly approved that do not fulfill this
requirement will be published in the Book of CONSINTER.
NOTE 2: The Organizing Committee will be in charge of the nomination and the issue of the journal
“Revista Internacional CONSINTER de Direito” in which the approved article will be authorized for publication.
2. PERIDIOCITY
Half-yearly
3. REQUIREMENTS
a) The submission of the scientific work for analysis is conditioned to the confirmation of subscriptions
of all authors and co-authors;
b) Only articles approved by CONSINTER Referees Board/Editorial Board will be published.
4. REQUIRED DOCUMENTS FOR SUBMISSION
a) Registration;
b) Proof of payment of the Submission/registration;
c) Assignment of copyrights signed;
d) Full Article following the guidelines of item 5;
e) The articles must be forwarded by one of the authors by e-mail contato@consinter.org
5. RULES – THE ARTICLES SENT MUST FULFILL THE FOLLOWING CRITERIA:
a) For the article, it is mandatory the adoption of the European Union’s Institutional Writing
Code (Umberto Eco/EU norm) standards – see item 06.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 9


Instructions To Authors

This system is similar to the ABNT norms; however, the use becomes easier (all tabs are
comma) and only highlights in italics, never in bold.
b) Be original (not published in books, specialized journals, or in the press in general) and
present technical–legal property; national and international relevance of the theme approached,
wording fluency, grammar correction, and respect to the ethical and scientific aspects.
Note: The texts inserted in documents of restrict circulation at universities will be considered
original.
c) Have been produced by students and/or professors of Lato Sensu and/or Stricto Sensu
PostGraduation courses, or by Masters, Doctors and Post-Doctors;
d) Works in co-authorship will be accepted, up to a maximum of three (03) participants
adequately registered;
e) Be identified with one of the criteria of classification to be informed in the public notice;
f) The author (s) that submit the same scientific article (with the same title and content or
only having the title changed) for more than one of the fields of Law above mentioned, will have both
scientific articles automatically eliminated from the evaluation;
g) Have a minimum of 15 pages, and a maximum of 25 pages;
h) Be submitted in Word format in two distinct files, one with and the other without
identification, both complete, containing: Title in Portuguese, Spanish, English, Italian or French;
Summary; Abstract and Keywords in Portuguese or Spanish and in English, respecting the technical
rules;
i) For the file, without identification the author needs to make sure that, in the content of
the article to be evaluated, there is no information that makes it possible to identify the author or the
Institution they are directly or indirectly bound to;
j) The article can be presented in Portuguese, Spanish, English, Italian, or French,
observing that the title, abstract, and keywords have to, compulsorily, be written in two languages,
being one of them, peremptorily, English.
Examples:
If written in Portuguese: the Abstract and the Keywords must be written in Portuguese and
English.
If written in Spanish: the Abstract and the Keywords must be written in Spanish and English.
If written in English: the Abstract and the Keywords must be written in English and
Portuguese.
k) English articles have priority in the analysis and publication, as long as one of the
authors has a doctorate.
l) The text must be saved in a word file, in a recent version, with the following
characteristics: Times New Roman font, size 12; justified alignment, without hyphenation; 1.5
spacing between lines; 1.5 cm paragraph spacing; do no special insert spacing before or after each
paragraph; top and left margins with 3 cm, bottom and right margins with 2 cm; A4 size document;
explanatory footnotes on the same page the reference is cited, and the references must follow the
technical rules – European Union’s Institutional Drafting Code standards (Umberto Eco/EU norm) –
see item 06.
m) The pages must be numbered;
n) For every title, subtitle, all of them aligned on the left, there must be a corresponding text;
o) The text must be written clearly and objectively, avoiding long-winded and strenuous
paragraphs, giving priority to sentences in the direct order, such as subject-predicate – complement;

10 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Revista Internacional Consinter de Direito

p) Texts with figures, illustrations and/or photographs will not be accepted, except for
graphs and tables which are indispensable for the understanding of the work, and compatible with
black and white printing, being prohibited the use of graphs and tables if originated from a third
party;
q) It must contain an Abstract (between 100 and 250 words in Portuguese or Spanish
and in English, as well as the Keywords (between 3 and 10 words), also in Portuguese or Spanish
and in English;
r) It must contain: a Summary to be indicated in the sequence of the title presentation,
Abstract (between 100 and 250 words, peremptorily in 02 languages, one of them in Portuguese or
Spanish and the other in English, just as the Keywords (between 3 and 10 words), under the same
criterion of the Abstract presentation;
s) The text must be accompanied by the copyright form – according to the model attachment
and/or available in the website;
t) The qualification of the author must be in a footnote and contain:
• a maximum of 4 lines;
• mandatorily indicating the e-mail address;
• stating the academic training;
• naming the Higher Education Institution to which he/she is linked as a student or as a teacher;
• informing the city, state, and country of the related Institution.
u) All the articles must be accompanied by the proof of payment of each author and co-
author’s registration.
v) Noting that CONSINTER is a non-profit institution, the value of the registration/submission
subsidizes the Publication of articles in the Revista Internacional CONSINTER de Direito. The
submission/registration fee is individual and exclusive for each author. Therefore, each author must
register and pay his/her respective fee. Ex: For the inclusion of an article in co-authorship with two
authors – it is necessary the registration and payment of the fee for each one of the authors;
w) An author may send as many articles as he/she wishes, but he/she must pay the
registration/submission fee for each one;
x) Observing the qualification rules, only one article from each author may be released for
Publication in the Revista Internacional CONSINTER de Direito. In case of approval of two or more
papers by the same author for the Journal, the evaluation committee, at its best judgment, will choose
one for Publication in the Journal and the others will be directed for release in the Law and Justice book
or the next issues of the Journal.
6. ABOUT THE SYSTEMS TO INDICATE THE SOURCES OF CITATIONS
For indicating the sources of the citations, the articles must adopt the European Union’s
Institutional Drafting Code standards (Umberto Eco/EU norm).
General rules:
– All elements must be separated only by a comma.
– Features highlighted with an asterisk are mandatory.
1. Book
1) * LAST NAME (in small caps) and Author’s First Name (s),
2) * Title and subtitle of the book (in italics),
3) (“Collection”),
4) * Edition number, if there are several,

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 11


Instructions To Authors

5) * Location,
6) * Publisher,
7) * Year.
8) Possible data from the most recent edition.
9) Number of pages and the potential number of volumes of which the work is composed.
10) * Translation.
Example:
a) in the reference list
MOLINA DEL POZO, Carlos, Prácticas de Derecho de la Unión Europea, Curitiba, Juruá, 2019.
b) in the footnotes
MOLINA DEL POZO, Carlos, Prácticas de Derecho de la Unión Europea, Curitiba, Juruá, 2019, pp. 22-23.
2. Book chapter
1) * LAST NAME (in small caps) and Author’s First Name (s),
2) * Title of Chapter or Essay (in quotes),
3) * in
4) * Last name (in small caps) and the Organizer’s First Name (s), org.,
5) * Title of the Collective Work (in italics),
6) * volume (if applicable),
7) * Place, Publisher, date, pages.
Example:
a) in the reference list
VISENTINI, Paulo Fagundes, “A Inserção da China na Ásia e a Transformação Estratégica da
Região” in PROCÓPIO, Argemiro, org., O Século da China, Curitiba, Juruá, 2010.
b) in the footnotes
VISENTINI, Paulo Fagundes, “A Inserção da China na Ásia e a Transformação Estratégica da
Região” in PROCÓPIO, Argemiro, org., O Século da China, Curitiba, Juruá, 2010, pp. 14-15.
3. Journal Article
1) * LAST NAME (in small caps) and Author’s First Name (s),
2) * “Title of Article or Chapter” (in quotes),
3) * Journal Title (in italics),
4) * volume and issue number,
5) * date,
6) * page range.
Example:
a) in the reference list
VELÁZQUEZ, Victor Hugo Tejerina, “Alguns Aspectos da Função Social da Propriedade no Novo
Código Civil”, Revista Autônoma de Direito Privado, v. 1, set. 2006.
b)in the footnotes
VELÁZQUEZ, Victor Hugo Tejerina, “Alguns Aspectos da Função Social da Propriedade no Novo
Código Civil”, Revista Autônoma de Direito Privado, v. 1, set. 2006, p. 52.
Umberto Eco/EU Standard
Reference: ECO, Umberto, Como Se Faz Uma Tese Em Ciências Humanas, 13 ed., Barcarena,
Editorial Presença, 2007. Trad. Ana Falcão Bassos e Luís Leitão. pp. 101-102.

12 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Revista Internacional Consinter de Direito

7.ABOUT THE ARTICLE REVIEW


The CONSINTER Editorial Board analyzes the scientific articles, formed only by renowned
Doctors and Post-Doctors, jurists, Brazilian, and foreigners, especially invited. The scientific papers will
be evaluated by the double-blind review system, in which two CONSINTER members of the board will
determine the works without any authorship identification. The assessment of scientific articles by
anonymous authors guarantees the impartiality of judgment and decreases subjectivity and ideological
preferences.
This way, authors must avoid direct references to themselves and citations that make it
possible to extract its authorship from the reading of the text.
If the scientific article is accepted by one of the CONSINTER members and failed by another,
the text, at the Director Council suggestion, can be subjected to a third-party assessment.
a) The content of the scientific articles is the authors’ full responsibility, and after subjected to
assessment, cannot go through any changes or replacements, except if requested by the Editorial Board;
b)Plagiarism or the insertion of verbatim copies are not allowed.
INTERNATIONAL COUNCIL OF CONTEMPORANY IN POST-GRADUATE STUDIES CONSINTER
– CONSELHO INTERNACIONAL DE ESTUDOS CONTEMPORÂNEOS EM PÓS-GRADUAÇÃO
Executive Coordination
Ivan Winters
Marcia Teixeira
contato@consinter.org
www.consinter.org
https://revistaconsinter.com/en/edicoes-anteriores/
INDEXERS
• Latindex
• Diadorim
• Sumários.org
• REDIB
• CAPES
• DOAJ
• LivRe
• Google Scholar
• Cite Factor
• Tribunal Superior Eleitoral
• RVBI
• CROSSREF member

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 13


Instructions To Authors

POLÍTICA EDITORIAL DO CONSINTER


Conselho Internacional de Estudos Contemporâneos em Pós-Graduação
FOCO – ESCOPO
A missão da Revista Internacional CONSINTER de Direito é:
a) promover a autonomia individual através do conhecimento e da cultura para que, de forma
construtiva e integradora, o indivíduo possa alavancar o seu próprio destino e, consequentemente, o da
sociedade em geral;
b) integrar os acadêmicos de diversas Universidades nacionais e estrangeiras proporcionando
crescimento na produção científicos de valor nos mais diversos países.
Tais desideratos serão instrumentalizados através da realização de encontros periódicos onde
os participantes poderão interagirem entre si, além de ser facultado a cada um a apresentação oral da
sua contribuição cientifica inédita, bem como divulgar seu trabalho via publicações físicas e digitais,
tanto na Europa quanto no Brasil.
Deste modo, o CONSINTER pretende impulsionar a democratização do saber, a interação en-
tre povos e a consolidação do desenvolvimento, pois no seu ver, a soma das contribuições procedentes
de diferentes culturas jurídicas permitirá a superação dos atuais limites impostos pela geografia e a
economia, ampliando em muito o conhecimento, a par de favorecer reflexões individuais comprometi-
das com os valores e princípios vetores que orientam a civilização contemporânea.
POLÍTICA DE ACESSO LIVRE
Com a finalidade de ultrapassar barreiras físicas, o CONSINTER – Conselho Internacional de
Estudos Contemporâneos em Pós-Graduação oferece acesso livre imediato ao conteúdo publicado na
Revista Internacional CONSINTER de Direito, seguindo o princípio da disponibilização gratuita do
conhecimento científico, promovendo um intercâmbio do mesmo.
Acesse https://revistaconsinter.com/edicoes-anteriores/ e tenha acesso gratuito à íntegra dos
mais de 240 artigos publicados pelo CONSINTER em edições anteriores.
PROCESSO DE AVALIAÇÃO DOS ARTIGOS CIENTÍFICOS
a) Os artigos científicos serão analisados pelo Corpo de Pareceristas do CONSINTER, forma-
do somente por renomados juristas Doutores e Pós-Doutores, nacionais e estrangeiros, especialmente
convidados;
b) Os artigos científicos serão avaliados pelo sistema double blind review, no qual dois Parece-
ristas do CONSINTER avaliarão os trabalhos sem nenhuma identificação de autoria;
c) A apreciação inominada dos artigos científicos afiança a imparcialidade do seu julgamento,
diminui a subjetividade e as preferências ideológicas;
d) Em caso de divergência entre os avaliadores, o artigo científico será submetido a um tercei-
ro Parecerista para que a divergência possa ser sanada;
e) Os Pareceristas do CONSINTER utilizarão os critérios de avaliação indicados abaixo para
avaliação do artigo científico submetido, devendo mensurá-los considerando as seguintes variáveis:
Inadequado, Regular, Bom, Ótimo e Excelente:
• O artigo é adequado ao escopo e foco da Revista CONSINTER?
• O título do artigo representa o menor resumo do seu conteúdo?
• O resumo descreve o objetivo, referencial teórico e método utilizados, principais resultados e
conclusões?
• Estruturação do texto
• Gráficos, tabelas, quadros

14 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Revista Internacional Consinter de Direito

• Objetivos
• Marco teórico
• Metodologia / procedimentos metodológicos
• Resultados / Discussão
• Considerações finais ou Conclusão
• Mérito
• O tema é atual?
• O trabalho é original?
• O artigo contribui efetivamente para o avanço do conhecimento?
f) Os artigos poderão receber um dos seguintes resultados de avaliação:
• Aceito para publicação sem restrições;
• Aceito, para publicação sob condições, com correções obrigatórias;
• Com correções obrigatórias;
• Recusado.
g) O processo de avaliação e publicação costuma levar de 7 a 10 meses.
PERIODICIDADE
A Publicação da Revista Internacional CONSINTER de Direito é Semestral.

REVISTA INTERNACIONAL CONSINTER DE DIREITO – Ano I – Número I – 2º Semestre 2015 –


Direito e Justiça – Aspectos Atuais e Problemáticos
Publicado em: 13.10.2015

REVISTA INTERNACIONAL CONSINTER DE DIREITO – Ano II – Número II – Efetividade do Direito


Publicado em: 12.09.2016

REVISTA INTERNACIONAL CONSINTER DE DIREITO – Ano II – Número III – Protección de los


Derechos Fundamentales en un Contexto Global
Publicado em: 16.12.2016

REVISTA INTERNACIONAL CONSINTER DE DIREITO – Ano III – Número IV – Derecho ante los
Desafíos de la Globalización
Publicada em: 30.06.2017

REVISTA INTERNACIONAL CONSINTER DE DIREITO – Ano III – Número V – Derecho ante los
Desafíos de la Globalización
Publicada em: 22.12.2017

REVISTA INTERNACIONAL CONSINTER DE DIREITO – Ano IV – Número VI – 1º Semestre 2018


– Estudos Contemporâneos
Publicada em: 29.06.2018

REVISTA INTERNACIONAL CONSINTER DE DIREITO – Ano IV – Número VII – 2º Semestre 2018


– Estudos Contemporâneos
Publicada em: 19.12.2018

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 15


Política Editorial do Consinter

REVISTA INTERNACIONAL CONSINTER DE DIREITO – Ano V – Número VIII – 1º Semestre 2019


– Estudos Contemporâneos
Publicada em: 28.06.2019

REVISTA INTERNACIONAL CONSINTER DE DIREITO – Ano V – Número IX – 2º Semestre 2019 –


Estudos Contemporâneos
Publicada em: 18.12.2019

REVISTA INTERNACIONAL CONSINTER DE DIREITO – Ano VI – Número X – 1º Semestre 2020 –


Estudos Contemporâneos
Publicada em: 30.06.2020
DIRETRIZES PARA PUBLICAÇÃO
AUTORES:
Ineditismo do Artigo: Cabe ao autor garantir que se trata de artigo científico inédito.
Originalidade: os autores são totalmente responsáveis pelo conteúdo (legalidade e autoria) do
artigo e garantem sua autenticidade, responsabilizando-se civil e criminalmente por qualquer comentá-
rio e/ou opiniões que venham a fazer e que possam vir a caracterizar infração a direito de terceiros, à
legislação de imprensa, ao Código de Defesa do Consumidor ou a qualquer outra legislação em vigor,
além de responsabilizar-se pelo conteúdo disponibilizado na publicação ou qualquer outro material
confeccionado, incluindo, mas não se limitando ao plágio e à veracidade das informações ali contidas.
OBS. As opiniões dos autores contidas nesta obra não representam necessariamente o en-
tendimento e compreensão do CONSINTER, da Juruá Editora Ltda ou da Editorial Juruá Lda ou do seu
Corpo de Pareceristas ou membros do Conselho Editorial.
Autoria do Artigo: No artigo científico devem constar os nomes de todos aqueles que fizeram
uma contribuição significativa para a concepção, projeto, execução ou interpretação do estudo relatado,
devendo ser enviado juntamente com o artigo, o formulário de direitos autorais preenchido e assinado
por todos os autores.
Decisão de publicação: Ficará a critério do Comitê Organizador a indicação e o número da
Revista ou do livro do CONSINTER em que o artigo avaliado e aprovado será liberado para publicação,
segundo as Diretrizes de Publicação e observando as normas de técnicas de qualificação.
Igualdade entre Participantes: Os manuscritos submetidos serão recebidos igualmente, sem
levar em conta raça, sexo, orientação sexual, crença religiosa, origem étnica, nacionalidade ou filosofia
política dos autores, consubstanciado pela política de avaliação às cegas.
Confidencialidade: Em respeito ao princípio da impessoalidade, os pareceres exarados pelo
Conselho Editorial do CONSINTER são sigilosos.
PARECERISTAS:
Qualificação dos Pareceristas: Os artigos científicos serão analisados pelo Corpo de Pare-
ceristas do CONSINTER, formado exclusivamente por juristas Doutores e Pós-Doutores, nacionais e
estrangeiros, especialmente convidados.
Sistema de avaliação de Artigos Científicos: Os artigos científicos serão avaliados pelo sis-
tema double blind review, no qual dois Pareceristas do CONSINTER avaliarão os trabalhos sem ne-
nhuma identificação de autoria. A apreciação inominada dos artigos científicos afiança a imparcialidade
do seu julgamento, diminui a subjetividade e as preferências ideológicas.

16 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Revista Internacional Consinter de Direito

Ainda, em caso de divergência de pareceres e/ou se constatadas opiniões dissonantes, o texto,


ao melhor alvitre do conselho diretivo, poderá ser submetido à apreciação de um terceiro Parecerista.
Padrões de objetividade: Os pareceres devem ser conduzidos de forma objetiva. Os parece-
ristas devem expressar seus pontos de vista de maneira clara e apoiados em argumentos.
CONSINTER
Todos os artigos são avaliados por pares para garantir a qualidade da publicação científica.
Este periódico utiliza o sistema de verificação de plágio – Plagius Detector.
OBS. Não obstante a política de cuidado e zelo do CONSINTER, submetendo todos os artigos
publicados à verificação do plágio, a autoria, legalidade e autenticidade do artigo é de exclusiva res-
ponsabilidade dos autores.
CUSTOS PARA SUBMISSÃO DO ARTIGO CIENTÍFICO
Por ser uma Instituição sem fins lucrativos, o CONSINTER tem os custos de publicação subsi-
diados através dos recursos oriundos das taxas de inscrições realizadas e pelos autores participantes,
bem como de eventuais apoiadores que desejem vincular seu nome junto aos eventos patrocinados
pelo CONSINTER.
POLÍTICA DE LICENCIAMENTO
Para fins da universalização e compartilhamento livre dos saberes a Revista do CONSINTER
está indexada sob a Licença Creative Commons 3.0
Atribuição – Uso Não Comercial – Compartilhamento pela mesma licença 3.0 Brasil.
É permitido:
– Copiar, distribuir, exibir e executar a obra
– Criar obras derivadas
Sob as seguintes condições:
ATRIBUIÇÃO
Você deve dar crédito ao autor original, da forma especificada pelo autor ou licenciante.
USO NÃO COMERCIAL
Você não pode utilizar esta obra com finalidades comerciais.
COMPARTILHAMENTO PELA MESMA LICENÇA
Se você alterar, transformar ou criar outra obra com base nesta, você somente poderá distribu-
ir a obra resultante sob uma licença idêntica a esta.
Para cada novo uso ou distribuição, você deve deixar claro para outro, os termos da licença
desta obra.
Licença Jurídica (licença integral):
https://creativecommons.org/licenses/by-nc-sa/3.0/br/legalcode
INDEXAÇÃO
A Revista Internacional CONSINTER de Direito está indexada em base de dados nacionais e
internacionais como: Google Scholar, Latindex, Sumários.org, Redib, Diadorim, CiteFactor, Tribunal
Superior Eleitoral e RVBI e é membro da CROSREF.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 17


Política Editorial do Consinter

CONSINTER’S EDITORIAL POLICY


International Council for Contemporary Studies in Graduate Studies
FOCUS – SCOPE
The mission of the CONSINTER International Law Journal is:
a) promote individual autonomy through knowledge and culture so that, in a constructive and
integrative way, the individual can leverage his destiny and, consequently, of the society in general;
b) integrate scholars from different national and foreign Universities providing value growth in
scientific production within the most diverse countries.
Such desideratum will be instrumentalized by periodic meetings, where participants will be able
to interact with each other. Also, each one will have the opportunity of an oral presentation of their
unprecedented scientific contribution, as well as disseminating their work via physical and digital
publications, both in Europe and in Brazil.
In this way, CONSINTER intends to boost the democratization of knowledge, the interaction
between peoples and the consolidation of development, since in its view, the sum of contributions from
different legal cultures will allow the current limits imposed by geography, and the economy to be
overcome, expanding much knowledge. In addition to that, it will favor individual reflections committed to
the values and principles that guide contemporary civilization.
FREE ACCESS POLICY
To overcome physical barriers, CONSINTER – International Council for Contemporary Studies
in Graduate Studies offers immediate free access to the content published in the CONSINTER
International Law Journal, following the principle of making scientific knowledge available free of charge,
promoting its exchange.
Access https://revistaconsinter.com/en/edicoes-anteriores/ and get free full access to more
than 240 articles published by CONSINTER in previous editions.
SCIENTIFIC ARTICLES ASSESSMENT PROCESS
a) The scientific articles shall be analyzed by the CONSINTER Body of Opinion, formed only by
renowned specially invited Ph.D. jurists and Post-Doctorates, national and foreign;
b) Scientific papers shall be evaluated by the double-blind review system, in which two
CONSINTER Partners will assess the works without any authorship identification;
c) The innominate assessment of the scientific articles guarantees the impartiality of his/her
judgment, decreases subjectivity and ideological preferences;
d) In case of divergence between the evaluators, the scientific article shall be submitted to a
third Reviewer so that the divergence can be resolved;
e) CONSINTER’s Partners shall use the evaluation criteria indicated below to evaluate the
submitted scientific article, and will measure them considering the following variables: Inappropriate,
Regular, Good, Great, and Excellent:
• Is the article appropriate to the scope and focus of the CONSINTER Journal?
• Does the title of the paper represent the smallest summary of its content?
• Does the summary describe the objective, theoretical framework, and methods, main results,
and conclusions used?
• Text structuring
• Graphs, tables, charts

18 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Revista Internacional Consinter de Direito

• Objective
• Theoretical framework
• Methodology/methodological procedures
• Results/Discussion
• Final considerations or Conclusion
• Merit
• Is the topic current?
• Is the work original?
• Does the article effectively contribute to the advancement of knowledge?
f) Articles may receive one of the following evaluation results:
• Accepted for publication without restrictions.
• Accepted for publication under conditions, with mandatory corrections.
• With mandatory corrections.
• Declined..
g) The evaluation process usually takes 7 to 10 months.
PERIODICITY
The publication of the CONSINTER International Law Journal is semiannual.

REVISTA INTERNACIONAL CONSINTER DE DIREITO – Yerar I – Number I – 2nd Semester


2015 – Direito e Justiça – Aspectos Atuais e Problemáticos
Published in: 13.10.2015

REVISTA INTERNACIONAL CONSINTER DE DIREITO – Yerar II – Number II – 1nd Semester


– Effectiveness of Law
Published in: 12.09.2016

REVISTA INTERNACIONAL CONSINTER DE DIREITO – Year II – Number III – Protection of


Fundamental Rights in a Global Context
Published in 16.12.2016

REVISTA INTERNACIONAL CONSINTER DE DIREITO – Year III – Number IV – Law before


the Globalization Challenges
Published in: 30.06.2017

REVISTA INTERNACIONAL CONSINTER DE DIREITO – Year III – Number V – Law before


the Globalization Challenges
Published in: 22.12.2017

REVISTA INTERNACIONAL CONSINTER DE DIREITO – Year IV – Number VI – 1st Semester


2018 – Contemporary Studies – 1º Semestre 2018 – Estudos Contemporâneos
Published in: 29.06.2018

REVISTA INTERNACIONAL CONSINTER DE DIREITO – Year IV – Number VII – 2nd


Semester 2018 – Contemporary Studies
Published in: 19.12.2018

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 19


Consinter’s Editorial Policy

REVISTA INTERNACIONAL CONSINTER DE DIREITO – Year V – Number VIII – 1st


Semester 2019 – Contemporary Studies
Published in: 28.06.2019

REVISTA INTERNACIONAL CONSINTER DE DIREITO – Year V – Number IX – 2nd Semester


2019 – Contemporary Studies
Published in: 18.12.2019

REVISTA INTERNACIONAL CONSINTER DE DIREITO – Year VI – Number X – 1st Semester


2020 – Contemporary Studies
Published in: 30.06.2020

PUBLICATION GUIDELINES
AUTHORS:
Originality of the Article: It is up to the author to ensure that this is an unpublished scientific article.
Originality: the authors are fully responsible for the content (legality and authorship) of the article and
guarantee its authenticity, being civilly and criminally responsible for any comments and/or opinions they may
make and which may characterize infringement of the rights of third parties, press legislation, the Consumer
Protection Code or any other law in force, in addition to being responsible for the content made available in the
publication or any other material made, including, but not limited to, plagiarism and the integrity of the
information contained therein.
NOTE. The authors’ opinions in this work do not necessarily represent the understanding and
comprehension of CONSINTER, of Juruá Editora Ltda, or of Editorial Juruá Lda, its Reviewers Board or
members of the Editorial Board.
Authorship of the Article: The scientific article must include the names of all those who made
a significant contribution to the conception, project, execution, or interpretation of the reported study,
and the copyright form must be completed and signed by all authors together with the paper.
Publishing decision: It shall be at the discretion of the Organizing Committee the designation
and the number of the Journal or CONSINTER book in which the evaluated and approved article shall
be released for publication, according to the Publication Guidelines and observing the qualification
techniques rules.
Equality between Participants: The submitted manuscripts shall also be received without
regard to race, sex, sexual orientation, religious belief, ethnic origin, nationality, or political philosophy of
the authors, substantiated by the blind evaluation policy.
Confidentiality: Concerning the principle of impersonality, the opinions issued by the
CONSINTER Editorial Board are confidential.
REFEREES:
Qualification of Referees: Scientific articles shall be analyzed by the CONSINTER Body of
Opinion, formed exclusively by specially invited, national and foreign jurists, PhDs, and post-doctorates.
Scientific Articles evaluation system: Scientific papers shall be evaluated by the double-
blind review system, in which two CONSINTER Referees will evaluate the works without any authorship
identification. The innominate assessment of the scientific articles guarantees the impartiality of his/her
judgment, decreases subjectivity and ideological preferences.

20 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Revista Internacional Consinter de Direito

Also, in case of opinions divergence and/or if discordant views are found, at the best
suggestion of the board of directors, the text may be submitted to a third Referee appreciation.
Standards of objectivity: Opinions must be conducted objectively. The referees must express
their points of view clearly and supported by arguments.
CONSINTER
Our articles are peer-reviewed to ensure the quality of the scientific publication.
This journal uses the Plagius Detector plagiarism verification system.
NOTE. Despite CONSINTER’s care and zeal policy, submitting all published articles to
plagiarism verification, the authorship, legality, and authenticity of the paper is the sole responsibility of
the authors.
COSTS FOR SUBMISSION OF SCIENTIFIC ARTICLE
As a non-profit institution, CONSINTER has its publication costs subsidized through resources
from registration fees and by participating authors, as well as any supporters who wish to link their name
to events sponsored by CONSINTER.
LICENSING POLICY
For universalization and free sharing of knowledge, CONSINTER Journal is indexed under the
Creative Commons 3.0 License
Attribution – Non-Commercial Use – Sharing by the same 3.0 Brazil license.
It’s allowed:
– Copy, distribute, display and execute the work
– Create derivative works
Under the following conditions:
ATTRIBUTION
You must give credit to the original author, as specified by the author or licensor.
NON-COMMERCIAL USE
You may not use this work for commercial purposes.
SHARING BY THE SAME LICENSE
If you change, transform, or create another work based on it, you may only distribute the
resulting work under a license identical to this one.
For each new use or distribution, you must make clear to others the license terms for this work.
Legal License (full license):
https://creativecommons.org/licenses/by-nc-sa/3.0/br/legalcode
INDEX
The CONSINTER International Law Journal is indexed in national and international databases
such as Google Scholar, Latindex, Sumários.org, Redib, Diadorim, CiteFactor, Superior Electoral Court,
and RVBI and is a member of CROSREF.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 21


Consinter’s Editorial Policy

CORPO DE PARECERISTAS
Adel El Tasse Ana Rachel Freitas da Silva
Mestre e Doutor em Direito Penal. Advogado em Curitiba. Doutora e Mestre em Direito das Relações Internacionais pelo
Procurador Federal. Professor na Escola da Magistratura Centro Universitário de Brasília – UniCeub. Professora no
do Estado do Paraná. Professor do CERS. Coordenador Centro Universitário de Brasília – UniCEUB, Brasília – DF.
no Paraná da NEACCRIM.
André Folloni
Adriano Marteleto Godinho Doutor em Direito pela Universidade Federal do Paraná –
Doutor em Direito pela Universidade de Lisboa – Portugal UFPR e Mestre pela Pontifícia Universidade Católica do
e Mestre em Direito pela Universidade Federal de Minas Paraná – PUC-PR. Advogado. Professor no PPGD da
Gerais – UFMG. Advogado. Professor do PPGD do Pontifícia Universidade Católica do Paraná – PUC-PR,
Centro de Ciências Jurídicas da Universidade Federal da Curitiba – PR.
Paraíba – UFPB, João Pessoa – PB.
Andréia Macedo Barreto
Albert Pastor Martínez Pós-Doutorado pelo Ius Gentium Conimbrigae, Centro de
Doutor e Mestre em Direito pela Universitat Autònoma Direitos Humanos, sediado na Universidade de Coimbra –
Barcelona – Espanha. Professor Agregado Direito do Portugal. Doutora e Mestre em Direitos Humanos pela
Trabalho do Trabalho Seguridade Social da Universitat Universidade Federal do Pará – UFPA, Belém – PA.
Autònoma de Barcelona – Espanha. Defensora pública do Estado do Pará.
Alejandro Menéndez Moreno Andreza Cristina Baggio
Professor Agregado Direito do Trabalho do Trabalho Doutora em Direito Econômico e Socioambiental pela
Seguridade Social da Universitat Autònoma de Barcelona. Pontifícia Universidade Católica do Paraná – PUC-PR.
Professora da Graduação e do PPGD na UNICURITIBA e
Alessandra Lehmen UNINTER, Curitiba – PR.
Doutora e Mestre em Direito pela Universidade Federal do
Rio Grande do Sul – UFRGS e Mestre (LL.M.) em Direito Antonio Armando Ulian do Lago Albuquerque
Ambiental pela Stanford Law School. Advogada habilitada Doutor em Ciência Política pela Universidade do Estado
em Porto Alegre – RS – Brasil e em Nova Iorque. do Rio de Janeiro – UERJ. Mestre em Teoria e Filosofia
do Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina –
Almir Santos Reis Junior UFSC. Professor Efetivo da Universidade do Estado de
Doutor em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Mato Grosso – UNEMAT, Cáceres – MT e da Universida-
São Paulo – PUC-SP. Professor adjunto dos cursos de de Federal de Mato Grosso – UFMT, Cuiabá – MT.
Direito da Universidade Estadual de Maringá – UEM – PR
e da Pontifícia Universidade Católica do Paraná – PUC- Antônio Carlos Efing
PR, Maringá – PR. Doutor e Mestre em Direito pela Pontifícia Universida-
de Católica de São Paulo – PUC-SP. Professor Titular
Aloisio Khroling da Pontifícia Universidade Católica do Paraná – PUC-
Pós-Doutor em Filosofia Política pela Universidade PR, Curitiba – PR.
Federal do Rio de Janeiro – UFRJ e em Ciências Sociais
pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC- Antônio César Bochenek
SP. Doutor em Filosofia pelo Instituto Santo Anselmo em Doutor em Direito pela Universidade de Coimbra. Juiz
Roma – Itália, reconhecido como PH.D em Filosofia pela Federal do Tribunal Regional Federal da 4ª Região.
UFES. Mestre em Teologia e Filosofia pela Universidade Professor da ESMAFE/ PR.
Gregoriana – Roma – e em Sociologia Política pela Escola
de Sociologia e Política de São Paulo. Professor Titular na Antonio Maria Javato Marín
Graduação e no Mestrado da Faculdade de Direito de Profesor Titular de Derecho Penal – Universidad de
Vitória – FDV, Vitória – ES. Valladolid.

Ana Barbuda Ferreira Antônio Pereira Gaio Júnior


Doutora em Direito pela Universidade Federal da Pós-Doutorado em Direito pela Universidade de Coimbra
Bahia – UFBA e Mestre em Família na Sociedade – Portugal e em Democracia e Direitos Humanos pelo Ius
Contemporânea pela Universidade Católica do Salva- Gentium Conimbrigae – Faculdade de Direito da Universi-
dor – UCSal. Professora na Universidade Católica do dade de Coimbra – Portugal. Doutor e Mestre em Direito
Salvador – UCSal, Salvador – BA. pela Universidade Gama Filho. Professor na Universidade
Federal do Rio de Janeiro – UFRRJ, Rio de Janeiro – RJ.

22 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Revista Internacional Consinter de Direito

Antônio Veloso Peleja Júnior mestrado Profissional da Universidade Federal do Espírito


Doutor em Direito pela PUC-SP. Professor Efetivo na Santo – UFES e da Pós-graduação da Escola Superior do
Graduação e Pós-Graduação ´Stricto Sensu´ da Faculda- Ministério Público da União – ESMPU, Vitória – ES.
de de Direito da Universidade Federal do Mato Grosso –
UFMT. Juiz de Direito do TJMT, dedicando especial Bruno Sena Martins
atenção nos seguintes temas: Direito Processual Constitu- Doutor em Grupo de Estudos Anglo-Americanos pela
cional, Direito Processual Civil, Direito Constitucional e Universidade de Coimbra. Professor da Universidade de
Direito Eleitoral. Coimbra – Portugal.

Aparecida Turolo Garcia (Ir. Jacinta) Candido Furtado Maia Neto – In Memoriam
Doutora em Filosofia pela Universidade Urbaniana – Pós-Doutor em Direitos Humanos. Doutor em Direito.
Roma – Itália. Professora da Universidade do Sagrado Procurador de Justiça do Ministério Público do Estado do
Coração – UNISAGRADO, Bauru – SP. Paraná.

Argelia Queralt Jiménez Carina Barbosa Gouvêa


Doutora pela Universitat de Barcelona. Professora de Pós-Doutora em Direito Constitucional – Universidade
Direito Constitucional da Universitat Barcelona – Espanha. Federal de Pernambuco – UFPE, Doutora e Mestre em
Direito pela Universidade Estácio de Sá – UNESA.
Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy Professora do Programa de Pós PPGD da Universidade
Pós-Doutorado em Direito Comparado na Universidade de Federal de Pernambuco – UFPE, Recife – PE.
Boston, em Direito Constitucional pela Pontifícia Universi-
dade Católica do Rio Grande do Sul – PUC-RS, em Carina Costa de Oliveira
Literatura e em História do Direito pela Universidade de Pós-Doutora pela University of Cambridge – Cambridge
Brasília – UnB. Doutor e Mestre em Filosofia do Direito e Centre for Environment, Energy and Natural Resource
do Estado pela Pontifícia Universidade Católica de São Governance – CEENRG, Doutora em Direito Internacional
Paulo – PUC-SP. Livre docente em Teoria Geral do na Universidade Paris II-Panthéon Assas e Mestre Direito
Estado pela Faculdade de Direito da Universidade de São Internacional pelo Centro Universitário de Brasília –
Paulo – USP, São Paulo – SP. UniCEUB. Professora adjunta da Faculdade de Direito da
Universidade de Brasília – UnB, Brasília – DF.
Artur Stamford da Silva
Doutor em Teoria, Filosofia e Sociologia do Direito e Carlos Edison do Rêgo Monteiro Filho
Mestre em Direito Público pela Universidade Federal de Doutor em Direito Civil e Mestre em Direito da Cidade pela
Pernambuco – UFPE. Professor Titular da Universidade Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ.
Federal de Pernambuco – UFPE, Recife – PE. Professor Titular de Direito Civil da Faculdade de Direito
da Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ, Rio
Augusto Martinez Perez de Janeiro – RJ.
Doutor em Direito do Estado e Mestre em Direito Penal Carlos Magno de Souza Paiva
pela Universidade de São Paulo – USP. Juiz Federal.
Professor Titular da Universidade de Ribeirão Preto – Doutor em Direito Público pela Pontifícia Universidade
UNIP, Ribeirão Preto – SP. Católica de Minas Gerais – PUC-Minas e Mestre em
Direito Público pela Universidade de Coimbra – Portugal.
Bruno César Lorencini Professor Adjunto do Departamento de Direito da Univer-
Doutor em Direito do Estado pela Universidade de São sidade Federal de Ouro Preto – UFOP, Ouro Preto – MG.
Paulo – USP e Doutor em Direito Processual, Administra- Carlos Marden
tivo e Financeiro pela Universidade de Salamanca – Doutor em Direito Processual pela Pontifícia Universidade
Espanha. Juiz Federal. Professor da Universidade Presbi- Católica de Minas Gerais – PUC-Minas e Mestre em
teriana Mackenzie. Professor do PPGD da Faculdade Ordem Jurídica Constitucional, epecialista em Processo
Alves Faria – ALFA, São Paulo – SP. Civil e graduado em Direito pela Universidade Federal do
Bruno Gomes Borges da Fonseca Ceará – UFC. Procurador Federal. Professor da Escola
Pós-Doutor em Direito pela Universidade Federal do Superior Dom Hélder Câmara – Belo Horizonte – MG.
Espírito Santo – UFES e Pós-doutorando em Direito pela Carlos Roberto Bacila
Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais – PUC- Pós-Doutor pela Universidade de Ottawa – Canadá.
MG. Doutor e Mestre em Direitos e Garantias Fundamen- Doutor em Direito Penal pela Universidade Federal do
tais pela Faculdade de Direito de Vitória – FDV. Procura- Paraná – UFPR. Professor de Criminologia, Direito Penal
dor do Trabalho. Professor da graduação e pós-graduação e Direito e Cinema da Faculdade de Direito da Universida-
da Faculdade de Direito de Vitória – FDV, do Programa de de Federal do Paraná – UFPR, Curitiba – PR.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 23


Corpo de Pareceristas

Carlos Roberto de Alckmin Dutra Cristina Roy Pérez


Doutor e Mestre em Direito pela Universidade de São Doutora em Direito. Professora de Direito Mercantil da
Paulo – USP. Professor na Universidade Carlos Drum- Universitat Barcelona – Espanha.
mond de Andrade, São Paulo – SP.
Danielle de Andrade Moreira
Carlyle Popp Doutora e Mestre em Direito da Cidade pela Universidade
Doutor em Direito Civil pela Pontifícia Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ. Professora Adjunta
Católica de São Paulo – PUC-SP e Mestre em Direito pela da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro –
Universidade Federal do Paraná – UFPR. Membro do PUC-RIO, Coordenadora do Grupo de Pesquisa – JUMA
Instituto dos Advogados do Paraná e da Academia do NIMA/PUC-Rio, Rio de Janeiro – RJ.
Paranaense de Letras Jurídicas. Professor Universitário
Deilton Ribeiro Brasil
Faculdades Integradas Curitiba, Curitiba – PR.
Pós-Doutor em Democracia e Direitos Humanos pelo
Cibele Fernandes Dias IGC CDH da Faculdade de Direito da Universidade de
Doutora e Mestre em Direito pela Pontifícia Universidade Coimbra – Portugal, Doutor em Estado e Direito:
Católica de São Paulo – PUC-SP. Professora de Direito Internacionalização e Regulação pela Universidade
Constitucional da Faculdade de Educação Superior do Gama Filho – RJ e Mestre pela Faculdade de Direito
Paraná – FESP e da Escola da Magistratura Federal do Milton Campos de Belo Horizonte – MG. Professor da
Paraná – ESMAFE, Curitiba – PR. Graduação e do PPGD da Universidade de Itaúna –
UIT, Itaúna – MG e das Faculdades Santo Agostinho –
Consuelo Yatsuda Moromizato Yoshida FASA, Montes Claros – MG.
Doutora e Mestre em Direito das Relações Sociais
pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – Denise Hammerschmidt
PUC-SP. Professora das Escolas Superiores da Pós-Doutora e Doutora em Direito e Ciência Política pela
Magistratura, do Ministério Público, da OAB. Professo- Universidade de Barcelona – Espanha. Juíza. Professora
ra – Mestrado do Centro Universitário Salesiano de Licenciada da Faculdade Curitiba e Professora Visitante
São Paulo, São Paulo – SP. do Programa de Mestrado e Doutorado da Universidade
Norte Pioneiro – UENP, Jacarezinho – PR.
Coral Arangüena Fanego
Catedrática de Derecho Procesal – Universidad de Dhenis Cruz Madeira
Valladolid. Doutor, Mestre e especialista em Direito Processual pela
Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais – PUC-
Cristiane Farias Rodrigues dos Santos Minas. Professor Adjunto dos cursos de graduação e pós-
Doutora em Direito pela Faculdade de Direito Universida- -graduação em Direito da Pontifícia Universidade Católica
de de São Paulo – FADUSP. Juíza Federal. Pesquisadora de Minas Gerais – PUC-Minas e da Universidade Federal
FADUSP – Políticas Públicas e Poder Judiciário. de Juiz de Fora – UFJF, Juiz de Fora – MG.
Cristiane Vieira Jaccoud do Carmo Azevedo Diego Nassif da Silva
Pós-Doutoranda no Instituto de Geociências da Universida- Doutor e Mestre em Ciência Jurídica pela UENP. Profes-
de Federal Fluminense – UFF, Doutora pela COPPE – sor universitário. Analista judiciário na Justiça Federal do
UFRJ e Mestre pela Universidade Católica de Santos – Paraná (TRF4).
UNISANTOS, Santos – SP. Advogada. Professora da
Dilson Jatahy Fonseca Neto
Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro –
EMERJ, Escola Superior de Advocacia Pública do Estado Doutor em Direito Civil e Mestre em Direito Romano e
do rio de Janeiro – ESAP, Escola de Administração Judiciá- Sistemas Jurídicos Contemporâneos pela Universidade de
ria do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro – São Paulo – USP, bacharel em Direito pela Universidade
ESAJ TJRJ, na Universidade Cândido Mendes – UCAM e Federal da Bahia – UFB, Salvador – BA, Pós-graduado
na Escola Superior de Advocacia – ESA da OAB-RJ. em Direito Tributário pelo IBET, São Paulo – SP.
Douglas Henrique Marins dos Santos
Cristiano Becker Isaia
Doutor em Ciências pela Universidade Federal de São
Pós-Doutor e Doutor em Direito pela Universidade do Vale Paulo – UNIFESP e Mestre em Direito pela Universidade
do Rio dos Sinos – UNISINOS. Professor do PPG Direito do Porto – Portugal. Professor no Centro Universitário do
da Universidade Federal de Santa Maria RS – UFSM, Programa de Mestrado do Instituto de Educação Superior
Santa Maria – RS. de Brasília IESB-DF, Brasília – DF.
Cristina Guilarte Martín-Calero
Catedratica de Derecho Civil – Universidad de Valladolid.

24 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Revista Internacional Consinter de Direito

Eder Bomfim Rodrigues Érika Bechara


Pós-Doutor em Filosofia pela Universidade Federal de Doutora e Mestre em Direito das Relações Sociais pela
Minas Gerais – UFMG, Doutor e Mestre em Direito Público Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-
pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais – SP. Professora de Direito Ambiental nos cursos de
PUC-Minas. Advogado. Professor dos Cursos de Gradua- graduação e pós-graduação em Direito Ambiental da
ção da Faculdade Minas Gerais e da Universidade Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-
Presidente Antônio Carlos – Campus Nova Lima – MG. SP, Professora de Direito Ambiental e Direito do
Consumidor na graduação da Faculdade de Direito de
Edgardo Torres Sorocaba, Sorocaba – SP.
Juiz-Presidente da Segunda Divisão Civil da Corte Superi-
or de Lima Norte – Peru. Trabalha na Oficina de Controle Everton das Neves Gonçalves
da Magistratura – OCMA, como Adjunto na Unidade de Doutor em Direito Econômico pela Universidade
Investigação e anticorrupção. Federal de Minas Gerais – UFMG e em Derecho
Edilene Lôbo Internacional pela Universidad de Buenos Aires, UBA-
Bs. As – Argentina, Mestre pela Universidade Federal
Doutora em Direito Processual pela Pontifícia Universidade de Santa Catarina – UFSC-SC. Professor Associado
Católica de Minas Gerais – PUC-Minas e Mestre em Direito do Departamento de Direito do Centro de Ciências
Administrativo pela Universidade Federal de Minas Gerais – Jurídicas da Universidade Federal de Santa Catarina –
UFMG. Advogada. Professora do Mestrado e da Graduação UFSC e Professor do Curso de Especialização em
em Direito pela Universidade de Itaúna – UIT, Itaúna – MG. Direito Empresarial na UNESC, Criciúma – SC.
Eduardo Biacchi Gomes
Everton Luiz Zanella
Pós-Doutor em Estudos Culturais pela Universidade
Federal do Rio de Janeiro – UFRJ. Doutor em Direito pela Doutor em Processo Penal (PUC-SP). Mestre em Direito
Universidade Federal do Paraná – UFPR. Advogado. Penal (PUC-SP). Professor da Universidade Mackenzie e
Professor Titular da Pontifícia Universidade Católica do da Escola Superior do Ministério Público. Professor
Paraná – PUC-PR e Professor Adjunto do Curso de Convidado de cursos de Pós-Graduação. Promotor de
Direito UNINTER – Curitiba – PR. Justiça (MPSP).

Eduardo Molan Gaban Fábio Carvalho Leite


Doutor em Direito Constitucional e Econômico pela Pontifícia Doutor em Direito Público pela Universidade do Estado do
Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP e New York Rio de Janeiro – UERJ e Mestre em Direito Constitucional
University, como Visiting Fulbrighter. Professor Doutor da e Teoria do Estado e graduado em Direito pela Pontifícia
Universidade de São Paulo – USP, São Paulo – SP. Universidade Católica do Rio de Janeiro – PUC-Rio. Profes-
sor de Direito Constitucional em cursos de graduação,
Eduardo Saldanha mestrado e doutorado da Pontifícia Universidade Católica do
Pós-Doutor em Direito pela Fordham USA, Doutor em Rio de Janeiro – PUC-Rio, Rio de Janeiro – RJ.
Direito pela Universidade de São Paulo – USP e Mestre
em Direito Universidade Federal de Santa Catarina – Fábio Resende Leal
UFSC. Professor da Pontifícia Universidade Católica do Doutor pela Instituição Toledo de Ensino – ITE-Bauru.
Paraná – PUCPR, da UNIVALI, Itajaí – SC e da Universi- Professor Adjunto da Universidade Paulista – UNIP, São
dade Estadual de Londrina – UEL, Londrina – PR. Paulo – SP. Membro do Instituto Brasileiro de Direito
Processual – IBDP, São Paulo – SP.
Elena Palomares
Doutora em Direito. Professora Associada Direito Civil da Fabrício Veiga Costa
Universitat de Barcelona – Espanha. Pós-Doutorado em Educação (UFMG). Doutorado em
Direito (Puc-Minas). Professor do Mestrado e Doutorado
Eneida Lima de Almeida em Proteção dos Direitos Fundamentais da Universidade
Doutora em Direito do Trabalho pela Universidade de de Itaúna, Minas Gerais, Brasil.
Salamanca – Espanha. Membro integrado do Instituto
Jurídico Portucalense – Portugal e do Centro de Estudios Felipe Chiarello de Souza Pinto
de la Mujer – CEMUSA – Espanha. Doutor e Mestre pela Pontifícia Universidade Católica
de São Paulo – PUC-SP. Diretor da Faculdade de
Erick Cavalcanti Linhares Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie.
Pós-Doutor em Direitos Humanos e Democracia pela Professor Titular da Faculdade de Direito e do Pro-
Universidade de Coimbra, Doutor em Relações Internaci- grama de mestrado e doutorado e Membro da Acade-
onais pela Universidade de Brasília – UnB. Juiz de Direito mia Mackenzista de Letras. Professor Colaborador do
do Tribunal de Justiça de Roraima. Professor na Universi- PPGD da Universidade de Passo Fundo – UPF, Passo
dade Estadual de Roraima – UERR, Boa Vista – RR. Fundo – RS.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 25


Corpo de Pareceristas

Felipe Dutra Asensi Fernando Sérgio Tenório de Amorim


Pós-Doutor em Direito pela Universidade do Estado do Pós-Doutor em Direito pela Université de Montréal,
Rio de Janeiro – UERJ, Doutor em Sociologia pelo Canadá – CRDP. Doutor e Mestre em Direito Univer-
Instituto de Estudos Sociais e Políticos pelo IESP UERJ, sidade Federal de Pernambuco – UFPE. Procurador
Mestre em Sociologia pelo Instituto Universitário de Judicial da Procuradoria-Geral do Município de Ma-
Pesquisas do Rio de Janeiro – IUPERJ. Advogado. ceió. Coordenador da Graduação e da Pós-graduação
Professor de mestrado e doutorado da Universidade do Lato Sensu do Curso de Direito do Centro Universitá-
Estado do Rio de Janeiro – UERJ, Universidade Católica rio CESMAC, Maceió – AL.
de Petrópolis – UCP e Universidade Santa Úrsula – USU.
Flademir Jerônimo Belinati Martins
Fernanda Ivo Pires Doutor em Direito (Sistema Constitucional de Garantia
Doutora e Mestre em Direito das Relações Sociais pela de Direitos) pelo ITE-Bauru e graduado em Odontolo-
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP. gia pela Universidade Estadual de Londrina. Juiz
Advogada. Pesquisadora. Professora dos cursos de Pós- Federal. Professor no Centro Universitário Toledo,
graduação da UCSal e da Unifacs, Professora do Centro Presidente Prudente – SP.
Universitário Jorge Amado – Unijorge, Salvador – BA e da
Faculdade Social da Bahia, Salvador – BA. Flávia Pereira Ribeiro
Doutora em Direito Processual Civil pela Pontifícia
Fernando Gaburri Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP,
Doutor em Direitos Humanos pela Universidade de São especialista em Direito Imobiliário, Execução Civil e
Paulo – USP e Mestre em Direito Civil Comparado pela Desjudicialização. Advogada. Professora em Cursos
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP. de Processo Civil na Escola Superior de Advocacia
Professor da Universidade do Estado do Rio Grande do da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção São
Norte – UERN e do Centro Universitário do Rio Grande do Paulo – SP.
Norte – UNI-RN, Natal – RN. Francisco Bissoli Filho
Fernando Gustavo Knoerr Doutor em Direito pela Universidade Federal do
Doutor, Mestre em Direito do Estado e Bacharel pela Paraná – UFPR, Mestre em Direito pela Universidade
Universidade Federal do Paraná – UFPR. Professor do Federal de Santa Catarina – UFSC. Procurador de
Programa de mestrado do Centro Universitário Curitiba – Justiça do Ministério Público catarinense. Professor
UNICURITIBA, Professor da Escola da Magistratura do Adjunto de Direito Penal e Processual Penal da
Paraná e da Fundação Escola do Ministério Público do Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC,
Florianópolis – SC.
Paraná, Curitiba – PR.
Francisco Glauber Pessoa Alves
Fernando Machado Doutor e Mestre em Direito pela Pontifícia Universida-
Doutor em Direito Constitucional pela Instituição Toledo de de Católica de São Paulo – PUC-SP. Magistrado.
Ensino – ITE Bauru e Mestre em Direito Processual pela Professor de Pós-graduação, Secretário-Geral do
Universidade Paranaense – UNIPAR. Assessor Jurídico Instituto Brasileiro de Direito Processual – IBDP, Rio
da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul. Profes- Grande do Norte. Membro da Associação Norte e
sor no Centro Universitário da Grande Dourados – UNI- Nordeste de Professores de Processo – ANNEP, do
GRAN, Dourados – MS. Instituto Potiguar de Direito Processual Civil – IPPC e
da Associação de Ciências Jurídicas e Sociais de
Fernando René Graeff Mossoró – ACJUS, Mossoró – RN.
Doutor e Mestre em Direito pela Universidade Federal do
Rio Grande do Sul – UFRGS, Porto Alegre, RS com Frederico Valdez Pereira
ênfase em Direito Civil, Direito de Família e Direito das Doutor em Processo Penal pela Università degli Studi
Sucessões. di Pavia – Itália, com período de cotutela no Doutorado
em Ciências Criminais da PUC-RS, Mestre em Direito
Fernando Rister de Souza Lima pela Universidade de Lisboa – Portugal e Mestre em
Doutor em Filosofia do Direito e do Estado pela Faculdade Ciências Criminais pela Pontifícia Universidade
de Direito da PUC-SP, com Estágio Doutoral sanduíche Católica do Rio Grande do Sul – PUC-RS. Juiz Fede-
na Università degli Studi di Macerata – Itália. Professor ral. Professor na Escola Superior da Magistratura
Doutor Período Integral – PPI da Universidade Presbiteri- Federal do Rio Grande do Sul, Bento Gonçalves – RS
ana Mackenzie, São Paulo – SP.

26 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Revista Internacional Consinter de Direito

Fulvia Helena de Gioia Inmaculada García Presas


Doutora em Direito pela Faculdade de Direito da Universi- Doutora em Direito. Profesora de Derecho Civil de la
dade Presbiteriana Mackenzie. Mestre em Teoria do Universidad de A Coruña – Espanha.
Estado, pela Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo – PUC-SP. Coordenadora Adjunta de Pesquisa e Isaac Sabbá Guimarães
TCC e Professora na graduação na Faculdade de Direito Doutor em Direito pela Università Degli Studi di Perugia –
da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Professora Itália, Doutor pela Universidade do Vale do Itajaí –
convidada da pós-graduação lato-sensu da Escola UNIVALI e Mestre pela Universidade de Coimbra –
Paulista de Direito – EPD, São Paulo – SP. Portugal. Promotor de Justiça do Ministério Público de
Santa Catarina. Professor convidado da Escola do
Gina Vidal Marcílio Pompeu Ministério Público do Estado de Santa Catarina,
Pós-Doutora em Direito pela Universidade de Lisboa – Balneário Camboriú – SC.
Portugal, Doutora pela Universidade Federal de
Pernambuco – UFPE e Mestre pela Universidade Isaar Soares de Carvalho
Federal do Ceará – UFC. Advogada. Coordenadora e Doutor em Filosofia pela UNICAMP. Pós-Doutor em
Professora do PPGD da Universidade de Fortaleza – Letras Clássicas e Vernáculas (USP). Experiência de
UNIFOR, Fortaleza – CE. 25 anos no Ensino Superior. Professor Substituto no
IFCH – UNICAMP em 2013. Professor na UEMG –
Giselle Marques de Araújo Campus de Frutal-MG, dedicando especial atenção
Doutora em Direito pela Universidade Gama Filho, nos seguintes temas: Filosofia, Filosofia e Teoria
convalidado pela Universidade Veiga de Almeida. Mestre Política, Ética, Teologia, Teodiceia, Religião, Filosofia
em Direito pela Universidade Gama Filho. Professora de da Educação e Filosofia do Direito.
Direito Público da Universidade Federal de Mato Grosso
Ivan Luiz da Silva
do Sul – UFMS, Campo Grande – MS.
Doutor e Mestre em Direito Penal pela Universidade
Giuliana Redin Federal de Pernambuco – UFPE. Procurador de Estado
Doutora em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Alagoas. Professor de Direito da Faculdade de Tecno-
do Paraná – PUC-PR. Professora do Programa de Pós- logia de Alagoas, Maceió – AL.
Graduação Stricto sensu da Universidade Federal de Jamile Bergamaschine Mata Diz
Santa Maria – UFSM. Coordenadora do MIGRAIDH, Doutora em Direito Público e Direito Comunitário pela
Santa Maria – RS. Universidad de Alcalá de Henares – Espanha. Professora
Gonçalo S. de Melo Bandeira Adjunta da Universidade Federal de Minas Gerais –
UFMG, da Fundação Universidade de Itaúna e do Instituto
Doutor pela Faculdade de Direito da Universidade de
Novos Horizontes, Belo Horizonte – MG.
Coimbra – Portugal e pela Faculdade de Direito da
Universidade Católica Portuguesa. Advogado. Professor Jane Lúcia Wilhelm Berwanger
na Escola Estatal Superior de Gestão do Instituto Doutor em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de
Politécnico do Cávado e do Ave – Portugal. São pualo – PUC-SP, Mestre em Direito pela Universida-
de de Santa Cruz do Sul. Advogada. Professora da
Gursen de Miranda
Faculdade ATAME, da Faculdade IMED, do Instituto
Doutor em Direito na Universidade Clássica de Lisboa – CENECISTA de Ensino Superior de Santo Ângelo –
Portugal e Mestre em Direito Agrário na Universidade CNEC, Pontifícia Universidade Católica do Paraná – PUC-
Federal de Goiás – UFG, Goiânia – GO. Professor PR, do Instituto Latino-americano de Direito Social – IDS,
Decano da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Centro Universitário Ritter dos Reis – UNIRITTER, da
de Roraima – UFRR, Boa Vista – RR. Universidade FEEVALE, da Escola de Magistratura
Federal do Paraná, da Escola da Magistratura Federal do
Ingo Wolfgang Sarlet
Rio de Grande do Sul, Porto Alegre – RS.
Doutor em Direito pela Ludwig Maximillians Universität
München. Coordenador do Programa de Pós-Graduação Jânia Maria Lopes Saldanha
em Direito – Mestrado e Doutorado da Pontifícia Universi- Pós-Doutora em Direito do Institut des Hautes Études sur
dade Católica do Rio Grande do Sul – PUC-RS, Professor la Justice – Paris, Doutora em Direito Público pela UNISI-
Titular da Faculdade de Direito e dos Programas de NOS e Mestrado em Integração Latino-Americana da
Mestrado e Doutorado em Direito e em Ciências Criminais UFSM. Professora do Departamento de Direito da Univer-
da Escola de Direito da Pontifícia Universidade Católica do sidade Federal de Santa Maria – UFSM e do PPGD e da
Rio Grande do Sul – PUC-RS. Escola de Direito da UNISINOS – Universidade do Vale do
Rio dos Sinos, Porto Alegre – RS.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 27


Corpo de Pareceristas

Jeferson Dytz Marins José Sérgio da Silva Cristóvam


Doutor em Direito pela Universidade do Vale do Rio dos Doutor em Direito Administrativo pela Universidade
Sinos – UNISINOS, Mestre em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC, com estágio de
de Santa Cruz do Sul – UNISC. Professor da graduação e Doutoramento junto à Universidade de Lisboa – Portugal e
pós-graduação da Universidade de Caxias do Sul – UCS, Mestre em Direito Constitucional pela Universidade
Professor da pós-graduação de diversas instituições de Federal de Santa Catarina – UFSC. Professor de cursos
Ensino Superior, Coordenador das Especializações em de Pós-Graduação no CESUSC, UNIDAVI, ENA Brasil,
Direito Empresarial e Processual da Universidade de UnC, UNOESC, UNISUL, Estácio de Sá e da Universida-
Caxias do Sul – UCS, Caxias do Sul – RS. de Federal de Santa Catarina – UFSC, Florianópolis – SC.
Jesualdo Eduardo de Almeida Junior José Osório do Nascimento Neto
Pós-Doutor em Direitos Humanos pela Universidade de Pós-doutor em Direito Político e Econômico pela Universi-
Coimbra – Portugal. Doutor e Mestre em Sistema Consti- dade MACKENZIE/SP. Doutor e Mestre em Direito
tucional de Garantia de Direitos pela ITE-Bauru. Professor Econômico e Social pela PUC Paraná. Professor com
e Coordenador da Escola Superior da Advocacia – OAB especial ênfase nas seguintes áreas: Direito Econômico e
SP. Professor visitante da pós-graduação da Universidade Administrativo, Administração Pública, Regulação, Políti-
Estadual de Londrina – UEL, da Pontifícia Universidade cas Públicas e Desenvolvimento.
Católica do Paraná – PUC-PR, Londrina – PR.
Judith Sole Resina
José Eduardo de Miranda Doutora em Direito. Professora Titular de Direito Civil da
Doutor em Direito pela Universidad de Deusto – Espanha. Universitat Autònoma de Barcelona – Espanha.
Professor Convidado da Faculdade de Direito da Universi-
dad de Deusto, em Bilbao – Espanha, da Faculdade de Júlia Gomes Pereira Maurmo
Direito da Universidad de Cantábria, em Santander – Doutora em Direito Constitucional pela Pontifícia Universi-
Espanha. Membro do Grupo de Pesquisa – CNPQ. dade Católica de São Paulo – PUC-SP. Professora
Adjunta de Direito Penal, Processo Penal e Prática
José Eduardo Figueiredo de Andrade Martins Jurídica da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro
Doutor e Mestre em Direito Civil pela Universidade de São – UFRRJ, Professora Substituta de Direito Civil da Univer-
Paulo. Advogado e Consultor Jurídico. Professor dos sidade Federal Rural do Rio de Janeiro – UFRRJ. Vice
cursos de graduação em Direito e pós-graduação Lato -Coordenadora e Professora do PPGD lato sensu em
Sensu em Direito Tributário da Pontifícia Universidade Direito Processual Contemporâneo da Universidade
Católica de Campinas – PUC-Campinas, Campinas – SP. Federal Rural do Rio de Janeiro – UFRRJ. Professora dos
Cursos de Graduação e Pós-Graduação da Universidade
José Ignacio Vásquez Márquez Santa Úrsula – USU, Rio de Janeiro – RJ.
Doutor em Direito Universidade de Los Andes. Professor
de Direito Constitucional da Universidade do Chile – Chile. Juliana Teixeira Esteves
Pós-Doutora em Economia Política no Institute de
José María Tovillas Moran Recherche Economiques et Sociales – França.
Doutor em Direito. Professor Titular de Direito Financeiro e Doutora em Direito e Mestre em Ciência Política pela
Tributário da Universitat de Barcelona – Espanha. Universidade Federal de Pernambuco – UFPE.
José Osório do Nascimento Neto Advogada. Professora Adjunta da Universidade
Federal de Pernambuco – UFPE, Recife – PE.
Pós-Doutor pela Universidade MACKENZIE-SP. Doutor e
Mestre em Direito Econômico e Social pela Pontifíca Larissa Pinho de Alencar Lima
Universidade Católica do Paraná – PUC-PR. Professor do Doutora em Ciências Políticas pela Universidade
Centro Universitário UNIBRASIL, na ESTÁCIO-Curitiba, Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS e Mestre
onde coordena a Iniciação Científica. Professor convidado em Educação pela Universidade Federal de Rondô-
da Pós-graduação da Universidade POSITIVO e da nia – UNIR. Juíza de Direito. Professora de Direito
Escola da Magistratura Federal do Paraná – ESMAFE, Constitucional no curso de pós-graduação da Escola
Curitiba – PR. da Magistratura do TJRO, Santa luzia d’oeste – RO.
José Renato Martins Lenio Luiz Streck
Doutor em Direito Penal pela Universidade de São Paulo – Pós-Doutor pela Universidade de Lisboa – Portugal,
USP. Mestre em Direito Constitucional pela Universidade Doutor e Mestre em Direito pela Universidade
Metodista de Piracicaba – UNIMEP. Advogado. Professor Federal de Santa Catarina – UFSC. Advogado.
e Coordenador da graduação e Especialização na – Professor Titular do PPGD mestrado e doutorado da
Universidade Metodista de Piracicaba – UNIMEP, Piraci- Universidade do Vale do Rio dos Sinos – UNISINOS.
caba – SP. Professor Permanente da Universidade Estácio de

28 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Revista Internacional Consinter de Direito

Sá – UNESA-RJ, da Scuola Dottorale Tulio Scarelli, Luciana Cordeiro de Souza Fernandes


Itália, da Universidad Javeriana, Colômbia e da Doutora e Mestre em Direito pela Pontifícia Universidade
Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa – Católica de São Paulo – PUCSP. Professora na Faculda-
Portugal. Membro Catedrático da Academia Brasilei- de de Ciências Aplicadas e na Faculdade de Tecnologia
ra de Direito Constitucional – ABDConst. Coordena- da Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP.
dor do Núcleo de Estudos Hermenêuticos, Porto Professora plena no Programa de Pós-graduação em
Alegre – RS. Ensino e História das Ciências da Terra no Instituto de
Geociências – UNICAMP, Limeira – SP.
Léo Brust
Doutor em Nuevas Tendencias En Derecho Constitucional Luciana Mendes Pereira
pela Universidad de Salamanca – ESPAÑA, reconhecido Doutora em Estudos da Linguagem, Mestre em Direito
pela Universidade de São Paulo – USP. Doutor em Direito Negocial e especialista em Direito Empresarial e em
do Estado e Mestre em Ciência Política pela Universidade Bioética pela Universidade Estadual de Londrina – UEL.
Técnica de Lisboa – Portugal, reconhecido pela Universi- Professora de Direito Civil no Departamento de Direito
dade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS. Advogado. Privado da Universidade Estadual de Londrina – UEL,
Professor da Facultad de Derecho de la Universidad de Londrina – PR.
Salamanca – Usal – Espanha.
Leonardo Estevam de Assis Zanini Luciano Nascimento Silva
Livre-docente e doutor em Direito Civil pela USP. Pós- Pós-Doutor em Teoria e Sociologia do Direito no Centro di
-doutorado em Direito Civil no Max-Planck-Institut für Studi sul Rischio – Dipartimento di Scienze Giuridiche della
ausländisches und internationales Privatrecht (Alemanha) e Facolta’ di Giurisprudenza dell’Universita’ del Salento,
em Direito Penal no Max-Planck-Institut für ausländisches Lecce – Itália, Doutor em Ciências Jurídico-Criminais pela
und internationales Strafrecht (Alemanha). Doutorando em Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra –
Direito Civil pela Albert-Ludwigs-Universität Freiburg (Alema- FDUC – Portugal e Mestre em Direito Penal pela Faculda-
nha). Mestre em Direito Civil pela PUC-SP. Bacharel em de de Direito do Largo de São Francisco da Universidade
Direito pela USP. Juiz Federal. Professor Universitário de São Paulo – USP. Professor na Escola da Magistratura
(Universidade de Araraquara). Pesquisador do grupo Novos do Estado da Paraíba – ESMA PB, nos cursos de Especi-
Direitos CNPq/UFSCar. Autor de livros e artigos. Foi bolsista alização da Escola Superior de Advocacia de São Paulo
da Max-Planck-Gesellschaft e da CAPES. Foi Delegado de ESA OABSP, Professor Assistente na Faculdade de
Polícia Federal, Procurador do Banco Central do Brasil, Direito do Largo São Francisco da Universidade de São
Defensor Público Federal, Diretor da Associação dos Juízes Paulo – USP, São Paulo – SP.
Federais de São Paulo e Mato Grosso do Sul e Diretor
Acadêmico da Escola de Formação e Aperfeiçoamento de Luciano Rocha Santana
Servidores da Justiça Federal em São Paulo. Doutor pela Universidade de Salamanca – USAL –
Espanha, Mestre em Filosofia Moral pela USAL – Espa-
Leonardo Nemer nha. Professor Pesquisador da ICALP/ UAB/ES e NIPE-
Doutor em Direito Internacional pela Université Paris X DA/UFBA, Salvador – BA.
Nanterre – France, Mestrado e graduação em Direito pela
Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG. Professor Luciano Velasque Rocha
Adjunto da Faculdade de Direito da Universidade Federal Doutor e Mestre em Direito pela Pontifícia Universidade
de Minas Gerais – UFMG e da PUC-Minas, Belo Horizon- Católica de São Paulo – PUC-SP. Bacharel em Direito
te – MG. pela Universidade Federal de Sergipe – UFS. Advogado,
Lourenço de Miranda Freire Neto São Paulo – SP.
Doutor em Direito Político e Econômico pela Universidade Luigi Bonizzato
Presbiteriana Mackenzie, Mestre em Direito pela Universi- Doutor e bacharel em Direito pela Universidade do Estado
dade Católica de Pernambuco. Advogado. Membro do
do Rio de Janeiro – UERJ. Professor de Direito Constituci-
Comitê de Ética em Pesquisa do Centro de Ciências
onal da Faculdade de Direito e do Curso de Pós-
Médicas da Universidade Federal da Paraíba e Professor
Graduação stricto sensu em Direito da Universidade
efetivo na Universidade Federal da Paraíba – UFPB.
Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, Rio de Janeiro – RJ.
Lucas Abreu Barroso
Doutor em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Luís Guilherme Soares Maziero
São Paulo – PUC-SP e Mestre em Direito pela Universi- Doutor em Direito pelo ITE – Bauru, Advogado. Professor
dade Federal de Goiás – UFG. Professor da Universidade na Pontifícia Universidade Católica de Campinas – PUC-
Federal do Espírito Santo – UFES, Vitória – ES. Campinas, Campinas – SP.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 29


Corpo de Pareceristas

Luís Henrique Barbante Franzé Marcelo Buzaglo Dantas


Pós-Doutor em Direito pela Faculdade de Direito da Doutor e Mestre em Direitos Difusos e Coletivos pela
Universidade de Lisboa, Doutor em Processo Civil Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-
pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – SP. Professor da Escola de Preparação e Aperfeiçoa-
PUC-SP e Mestre em Direito pela Faculdade de mento do Ministério Público de Santa Catarina –
Direito de Bauru. Professor no programa de mestrado EPAMPSC, Professor Permanente dos Cursos de
da Fundação de Ensino Eurípedes Soares da Rocha graduação, mestrado e doutorado da UNIVALI, Floria-
em Marília – UNIVEM, Marília – SP e no programa de nópolis – SC e dos Cursos de Especialização em Direito
graduação da Universidade Metodista de Piracicaba – Ambiental da PUC – SP, PUC-RJ, UNISINOS, CESUSC
UNIMEP, Piracicaba – SP. e Professor Visitante dos Cursos de Mestrado e Douto-
rado do Instituto Universitario del Agua y de las Ciências
Luiz Edson Fachin Ambientales da Universidad de Alicante e da Widener
Pós-Doutor pela Ministério das Relações Exteriores do University Delaware Law School.
Canadá. Doutor e Mestre em Direito pela Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP. Marcelo Guerra Martins
Ministro do Supremo Tribunal Federal. Professor na Doutor em Direito do Estado pela Faculdade de Direito
Universidade Federal do Paraná – UFPR, Curitiba – da Universidade de São Paulo – USP. Juiz Federal.
PR. Professor da graduação e mestrado em Direito do
Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas
Luiz Eduardo Gunther Unidas, São Paulo – SP.
Pós-Doutor em Direito pela Pontifícia Universidade
Católica do Paraná – PUC-PR. Desembargador do Marcelo Paulo Maggio
Trabalho no TRT 9 PR. Professor na UNICURITIBA, Doutor pela Faculdade de Saúde Pública da Universida-
Curitiba – PR. de de São Paulo – FSP USP, Mestre pela Faculdade de
Direito da Universidade Estadual de Londrina – FD UEL.
Luiz Henrique Sormani Barbugiani Promotor de Justiça no Ministério Público do Estado do
Doutor e Mestre em Direito pela Universidade de São Paraná. Professor de Direito Sanitário da Fundação
Paulo PUC-SP. MBA em Gestão Estratégica pela Escola Superior do Ministério Público do Estado do
Universidade Federal do Paraná – UFPR. Pós- Paraná – FEMPAR, Curitiba – PR.
graduado em Processo Civil, Arbitragem e Mediação
pela Universidade de Salamanca – Espanha. Márcia Haydée Porto de Carvalho
Doutora e Mestre em Direito do Estado pela Pontifícia
Luiz Olavo Baptista Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP. Gradu-
Doutor em Direito Internacional na Université Paris II – ada em Direito e em Ciências Econômicas pela Univer-
França, Doutor Honoris Causa pela Universidade de sidade Federal do Maranhão – UFMA. Promotora de
Lisboa – Portugal. Árbitro na Câmara de Arbitragem Justiça no Estado do Maranhão. Professora Adjunta da
Comercial Brasil (CAMARB). Advogado. Professor na Universidade Federal do Maranhão – UFMA, onde
Universidade de São Paulo – USP, São Paulo – SP. ministra para a graduação em Direito e no mestrado em
Manuel Martínez Neira Direito e Instituições do Sistema de Justiça. Professora
Doutor em Direito. Professor Universitário na Universi- Pesquisadora da Universidade Ceuma – UNICEUMA,
dad Carlos III de Madrid – Espanha. São Luiz – MA.

Mara Darcanchy Márcio Bambirra Santos


Doutora e Mestre em Direito das Relações Sociais Doutor em Administração pela Universidade FUMEC,
pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – com especializações em Política Científico – Tecnológi-
PUC-SP. Professora Visitante e PNPD-CAPES do ca – PLADES-BSB e Computação Científica pela
Programa de Mestrado em Direito Empresarial e Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais – PUC-
Cidadania do Centro Universitário Curitiba UNICURI- MG. Mestre em Economia pela Universidade Federal de
TIBA, Curitiba – PR. Minas Gerais – PUC-MG. Professor, Administrador de
Empresas, Economista, Palestrante e consultor em
Maraluce Maria Custódio empresas e grupos nacionais e internacionais, Belo
Doutora em Geografia pela UFMG em programa de Horizonte – MG.
cotutela com a Université dAvignon, Mestre e gradua-
da pela Universidade Federal de Minas Gerais – Marco Antônio César Villatore
UFMG. Master en Derecho Ambiental pela Universi- Pós-Doutor – UNIROMA II. Doutor UNIROMA, revalida-
dad International de Andalucía – Espanha. Professora do pela USFC. Mestre pela PUC/SP. Prof. Uninter.
permanente do PPGD da Escola Superior Dom Helder Gradução, Pós-Graduação, Mestrado e Doutorado pela
Câmara, Belo Horizonte – MG. UFSC. Coordenador da Especialização ABBCONST.
Advogado.

30 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Revista Internacional Consinter de Direito

Marco Aurélio Serau Júnior Professor Catedrático de direito penal na Escola de Direito
Doutor e Mestre EM Direitos Humanos pela Universida- da Universidade do Minho – Portugal.
de de São Paulo – USP. Professor na Universidade
Federal do Paraná – UFPR, Curitiba – PR. Mário Luiz Ramidoff
Pós-Doutor em Direito pela Universidade Federal de Santa
Marcos Augusto Maliska Catarina – UFSC e Doutor em Direito pelo PPGD da
Pós-Doutor pelo Instituto Max Planck de Direito Público de Universidade Federal do Paraná – UFPR. Desembargador
Heidelberg – Alemanha, Doutor e Mestre em Direito no TJPR. Professor na UNICURITIBA, Curitiba – PR.
Constitucional pela Universidade Federal do Paraná –
UFPR. Procurador Federal. Professor visitante permanen- Marta Villarín Lagos
te na Faculdade de Direito de Francisco Beltrão – Cesul, Profesora Titular de Derecho Financiero – Universidad de
Professor Adjunto do PPGD na UniBrasil, Curitiba – PR. Valladolid.

Marcus Maurer de Salles Melina de Souza Rocha Lukic


Doutor em Integração da América Latina pela Universidade Doutora e Mestre pela Université Paris III – Sorbonne
de São Paulo – USP, com estágio doutoral junto a Cátedra Nouvelle em cotutela com a Universidade Federal de
Internacional OMC Integração Regional da Universidade de Santa Catarina – UFSC. Professora da FGV-Direito Rio.
Barcelona – UB – Espanha e Mestre em Integração Latino- Pesquisadora do Centro de Pesquisa em Direito e Eco-
Americana pela Universidade Federal de Santa Maria – nomia – CPDE da FGV-Direito Rio, Rio de Janeiro – RJ.
UFSM. Professor Adjunto da Escola Paulista de Política,
Economia e Negócios – EPPEN da Universidade Federal de Melina Girardi Fachin
São Paulo – UNIFESP, São Paulo – SP. Doutora em Direito pela Pontifícia Universidade Católica
de São Paulo – PUC-SP. Professora Adjunta dos Cursos
Maria Carolina Carvalho de Almendra Freitas
de Graduação e Pós-Graduação da Universidade Federal
Doutoranda em Direito Político e Econômico pela Univer- do Paraná – UFPR, Curitiba – PR.
sidade Presbiteriana Mackenzie e mestre em Direito
Internacional e Econômico pela Universidade Católica de Milena Petters Melo
Brasília – UCB. Professora substituta na Universidade Doutora em Direito pela UNISALENTO – Itália. Professora
Estadual do Piauí – UESPI, na Faculdade Integral Dife- da Fundação Universidade Regional de Blumenau –
rencial e no Centro de Ensino Superior do Vale do Parnaí- FURB, Coordenadora do Doutorado Interinstitucional em
ba – CESVALE, Teresina – PI. Direito DINTER FURB – UNISINOS, Professora e Coor-
denadora para a área lusófona do Centro Didático Euro-
Maria Cecília Cury Chaddad Americano sobre Políticas Constitucionais – CEDEUAM,
Doutora e Mestre em Direito Constitucional pela Pontifícia UNISALENTO, Itália, Professora da Academia Brasileira
Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP, São de Direito Constitucional – ABDConst, Professora do
Paulo – SP. Advogada. Programa de Doutorado em Ciências Jurídicas e Políticas,
Universidade Pablo de Olavide – UPO – Espanha,
Maria Luiza Granziera
Professora no Programa Máster-Doutorado Oficial da
Doutora em Direito do Departamento de Direito Econômi- União Européia – Derechos Humanos, Interculturalidad y
co e Financeiro e Mestre em Direito Internacional pela Desarrollo, Universidade Pablo de Olavide – UPO Unive-
Universidade de São Paulo – USP. Professora da Escola sidad Internacional da Andaluzia – UNIA – Espanha.
Politécnica da Universidade de São Paulo – USP e
Professora associada do Programa de Mestrado e Mônica Silveira Vieira
Doutorado em Direito Ambiental da Universidade Católica Doutora e Mestre em Direito pela Universidade Federal de
de Santos – UNISANTOS, Santos – SP. Minas Gerais – UFMG. Juíza de Direito do Estado de
Minas Gerais. Professora assistente licenciada da Facul-
Marianna Almeida Chaves Pereira Lima dade de Direito Milton Campos, Belo Horizonte – MG.
Doutora em Direito Civil pela Universidade de Coimbra –
Portugal e Universidade de São Paulo – USP, São Paulo Montserrat de Hoyos Sancho
– SP. Advogada. Pesquisadora do Centro de Investigação Profesora Titular de Derecho Procesal – Universidad de
da Universidade de Lisboa e Professora, Recife, PE. Valladolid.
Nelson Finotti Silva
Mário João Ferreira Monte
Doutor em Processo Civil pela Pontifícia Universidade
Doutor em Ciências Jurídico-Criminais com título emitido
Católica de São Paulo – PUC-SP e Mestre em Direito do
pela Universidade do Minho – Portugal, Mestre e Pós-
Estado pela Universidade de Franca – UNIFRAN. Procu-
graduado e Licenciatura em ciências jurídico-criminais
rador de Estado. Professor do Curso de Mestrado em
pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 31


Corpo de Pareceristas

Direito do Centro Universitário Eurípedes de Marília – Paulo Ferreira da Cunha


UNIVEM, Marília – SP e do Curso de Graduação em Doutor em Direito pela Faculdade de Direito da Universi-
Direito do Instituto Municipal de Ensino Superior – IMES dade de Coimbra – Portugal e Doutor em Direito pela
Catanduva, Catanduva – SP. Universidade de Paris II. Professor Catedrático da Facul-
dade de Direito da Universidade do Porto – Portugal.
Nelson Flavio Firmino
Pós-Doutor em Direito Constitucional pela Universidade de Paulo Nalin
Coimbra – Portugal, Doutor em Ciências Jurídicas e Pós-Doutor pela Universidade de Basiléia – Suíça. Doutor
Sociais pela Universidad del Museo Social Argentino e em Direito das Relações Sociais e Mestre em Direito
Mestre em Direito Internacional Público pela Universidade Privado pela Universidade Federal do Paraná – UFPR.
de Wisconsin – EUA. Advogado. Professor de Pós- Professor na LLM da SILS – Suissi Internacional, Low
Graduação da Universidade Cândido Mendes, Rio de School, na Universidade Federal do Paraná – UFPR,
Janeiro – RJ. Pontifícia Universidade Católica do paraná – PUC-PR,
Curitiba – PR.
Nuno M. Pinto de Oliveira
Doutor em Ciências Jurídicas do Instituto Universitário Paulo Renato Fernandes da Silva
Europeu de Florença – Italia. Licenciatura em Direito na Doutor em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade
Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra – Federal Fluminense – UFF e Mestre em Direito Empresa-
Portugal. Professor-associado da Escola de Direito da rial pela Universidade Cândido Mendes. Advogado.
Universidade do Minho – Portugal. Professor Adjunto do Departamento de Ciências Jurídicas
da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro –
Nuria Belloso Marín UFRRJ, Rio de Janeiro – RJ.
Doutora em Direito pela Universidade de Valladolid –
Espanha. Professora Titular de Filosofia do Direito na Pilar Carolina Villar
Universidade de Burgos – Espanha. Coordenadora do Doutora e Mestre em Ciência Ambiental pela Universidade
Programa de Doutorado em Direito Público. Representan- de São Paulo – USP. Professora adjunta da Universidade
te do Dpto. de Direito na Comissão de Doutorado e dirige Federal de São Paulo – UNIFESP, SÃO Paulo – SP.
o Curso de Pós-Graduação Universitário em Mediação Rennan Faria Kruger Thamay
Familiar na Universidade de Burgos – Espanha. Pós-Doutor em Direito pela Universidade de Lisboa –
Osvaldo Ferreira de Carvalho Portugal, Doutor em Direito pela Pontifícia Universidade
Pós-Doutor e Doutor em Direito pela Faculdade de Direito Católica do Rio Grande do Sul – PUC-RS e Mestre em
da Universidade de Lisboa – Portugal, Mestre pela Direito pela UNISINOS e pela PUC-Minas. Professor
Pontifícia Universidade Católica de Goiás – PUC-Goiás. Titular do PPGD da FADISP. Professor da pós-graduação
Professor na Escola de Direito e Relações Internacionais Lato Sensu da Pontifíca Universaidade Católica de São
da PUC-GO e na Universidade Estácio de Sá unidade em Paulo – PUC-SP, do Mackenzie, da Escola Paulista de
Direito – EPD e Professor Titular do Estratégia Concursos
Goiânia – GO.
e do UNASP, São Paulo – SP.
Patrícia Regina Pinheiro Sampaio Ricardo Maurício Freire Soares
Doutora e Mestre em Direito pela Universidade de São Pós-Doutor em Direito Constitucional Comparado pela
Paulo – USP. Professora da FGV – Direito Rio – Escola Università degli Studi di Roma La Sapienza, pela Univer-
de Direito do Rio de Janeiro da Fundação Getúlio Vargas. sità degli Studi di Roma Tor Vergata e pela Università del
Pesquisadora do Centro de Pesquisa em Direito e Eco- Salento. Doutor pela Università del Salento USP, Doutor
nomia – CPDE da FGV-Direito Rio, Rio de Janeiro – RJ. em Direito Público e Mestre em Direito Privado pela
Paulo Bueno de Azevedo Universidade Federal da Bahia – UFBA. Professor da
Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia,
Doutor em Direito Penal pela Universidade de São Paulo –
da Faculdade Baiana de Direito e UNIRUY e Professor –
USP, Mestre pela Mackenzie, Especialista pela Universi-
Coordenador do Curso de Direito da Estácio de Sá – FIB,
dade de Coimbra – Portugal e pela Pontifícia Universidade Salvador – BA.
Católica de São Paulo – PUC-SP. Coordenador e Profes-
sor de cursos na Escola de Magistrados do Tribunal Roberta Corrêa de Araujo
Regional Federal da 3ª Região, Convidado como juiz Doutora e Mestre em Direito pela Universidade Federal de
formador no curso de formação inicial de magistrados do Pernambuco – UFPE. Juíza Federal do Trabalho TRT 6ª
Tribunal Regional Federal da 3ª Região. Professor convi- Região. Coordenadora do curso de Direito da Faculdade
dado de cursos de pós-graduação, São Paulo – SP. de Olinda – FOCCA, Olinda – PE.

32 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Revista Internacional Consinter de Direito

Roberto Wagner Marquesi Saulo Tarso Rodrigues


Doutor e Mestre em Direito Civil pela Faculdade de Direito Pós-Doutor em Direito pela Universidade de Uppsala –
do Largo São Francisco da Universidade de São Paulo – Suécia e Doutor em Sociologia Jurídica pela Universidade
USP. Professor dos Cursos de Mestrado e de Graduação de Coimbra – Portugal. Professor dos programas de
e Pós-Graduação em Direito Civil na Universidade Esta- mestrado em Direito Ambiental da Universidade Federal
dual de Londrina – UEL e na Universidade Católica do de Mato Grosso – UFMT e em Direitos Humanos da
Paraná na Pontifícia Universidade Católica do Paraná – Universidade Federal da Grande Dourados – UFGD,
PUC-PR, Londrina – PR. Dourados – MS.
Rogério Piccino Braga Sérgio Guerra
Pós-Doutorando no Ius Gentium Conimbrigae da Univer- Pós-Doutor Visiting Researcher, Yale Law School, Doutor
sidade de Coimbra – Portugal. Doutor e Mestre em Direito e Mestre em Direito. Pós-Doutor em Administração
Constitucional pelo Centro Universitário de Bauru – CEUB Pública. Diretor e Professor Titular de Direito Administrati-
ITE. Advogado. Professor Permanente do Curso de Pós- vo da FGV-Direito Rio. Coordenador Geral do Curso
Graduação Lato Sensu do Projuris Estudos Jurídicos, Internacional Business Law da University of California –
Professor na Faculdade de Direito da Universidade Irvine. Embaixador da Yale University no Brasil. Vogal da
Estadual do Norte do Paraná – UENP e na Universidade Comissão de Arbitragem e Árbitro da Câmara FGV de
do Norte do Paraná – UNOPAR, Bandeirantes – PR. Mediação e Arbitragem, Rio de Janeiro – RJ.
Romeu Faria Thomé da Silva Sergio Said Staut Júnior
Pós-Doutor em Direito Ambiental pela Université Laval – Pós-Doutor no Centro di Studi per la Storia del Pensiero
Canadá, Doutor e Mestre em Direito pela Pontifícia Giuridico Moderno, Università degli Studi di Firenze – Itália.
Universidade Católica de Minas Gerais – PUC-MG. Doutor, Mestre e Bacharel em Direito pela Universidade
Professor permanente do PPGD da Escola Superior Dom Federal do Paraná – UFPR. Professor Adjunto da Facul-
Helder Câmara, Belo Horizonte – MG. dade de Direito e do Mestrado em Psicologia Forense da
Romulo Palitot Universidade Tuiuti do Paraná – UTP. Professor Adjunto
de Teoria do Direito nos Cursos de Graduação e Pós-
Doutor e Mestre em Direito Penal pela Universitat de
Valéncia – Espanha. Professor de Direito Penal da Graduação de mestrado e doutorado da Faculdade de
Direito da Universidade Federal do Paraná – UFPR,
Universidade Federal da Paraíba – UFPB e do Centro
Curitiba – PR.
Universitário de João Pessoa – UNIPÊ. Professor Perma-
nente do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sergio Torres Teixeira
Jurídicas – PPGCJ UFPB, João Pessoa – PB. Doutor em Direito pela Universidade Federal de Pernam-
buco – UFPE. Desembargador do TRT 6ª Região. Profes-
Ronaldo Alves Marinho da Silva sor Adjunto da FDR UFPE e da UNICAP, Coordenador
Doutor em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie Científico e Diretor da Escola Superior da Magistratura do
– SP e Mestre em Direito pela Pontifícia Universidade Católica Trabalho – ESMATRA e professor/instrutor da Escola
do Paraná – PUC-PR. Delegado de Polícia Civil. Professor Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados
Adjunto da Universidade Tiradentes, Aracaju – SE. – ENFAM, da Escola Nacional de Formação e Aperfeiço-
Ronny Francy Campos amento de Magistrados do Trabalho – ENAMAT, da
Escola Judicial do TJPE – ESMAPE, da Escola Judicial do
Pós-Doutor pela Universidade de São Paulo – USP, TRT6, Jaboatão dos Guararapes – PE.
Doutor e Mestre pela Pontifícia Universidade Católica de
São Paulo – PUC-SP. Professor adjunto na Pontifícia Silmara Domingues Araújo Amarilla
Universidade Católica de Minas Gerais – PUC Minas em Doutora em Direito pela Pontifícia Universidade Católica
Poços de Caldas e Coordenador da Clínica-Escola e de São Paulo – PUC-SP e Mestre em Direito pela Facul-
Professor na PUC-Minas, Poços de Caldas – MG. dade Autônoma de Direito de São Paulo – FADISP, São
Roseli Borin Paulo – SP. Advogada, com especial interesse em: Direito
da Família e Sucessões, Direitos da Personalidade e
Pós-Doutora em Derecho Procesual en el Sistema Ítalo- Responsabilidade Civil.
Germano pela Università Degli Studi di Messina – Itália,
Doutora em Sistemas Constitucionais de Garantias de Suzéte da Silva Reis
Direito pela Instituição Toledo de Ensino – ITEBauru – SP, Doutora em Direito pela UNISC. Professora do PPGD –
Mestre em Direitos da Personalidade e Especialista em Mestrado e Doutorado da UNISC. Coordenadora do
Direito Civil – Sucessões, Família e Processo Civil pelo Grupo de Estudos: Relações de Trabalho da Contempo-
Centro Universitário de Maringá – UNICESUMAR. Advo- raneidade.
gada. Professora de Pós-graduação na Escola da Magis-
tratura de Paraná e na Universidade Paranaense –
UNIPAR, Maringá – PR.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 33


Corpo de Pareceristas

Sybelle Luzia Guimarães Drumond edade Intelectual – NEDAEPI do Programa de Pós-


Doutora em Direito Público e Evolução Social pela Universi- Graduação em Direito da Universidade Metodista de
dade Estácio de Sá – UNESA, Mestra em Direito Econômico Piracicaba – UNIMEP. Professor Horista e Coordenador
e Regulação pela Universidade Candido Mendes , Rio de do Núcleo de Estudo de Propriedade Intelectual – NEPI do
Janeiro – RJ, Pós-graduada em Direito Tributário e Previ- Curso de Direito do Centro Universitário Adventista de São
denciário pela Universidade Gama Filho, MBA em Gestão Paulo – UNASP, Eng. Coelho – SP.
Empresarial Fundação Getúlio Vargas e Pós-graduação em Vinicius Almada Mozetic
Métodos Estatísticos Computacionais pela Universidade
Doutor em Direito pela Universidade do Vale do Rio dos
Federal de Juiz de Fora, Juiz de fora – MG.
Sinos – UNISINOS. Professor titular do Programa de Pós-
Tânia Stoltz graduação – Mestrado em Direito da UNOESC – Dimen-
Mestre e Doutora em Educação (Psicologia da Educação) sões Materiais e Eficácias dos Direitos Fundamentais,
pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC- Xanxerê – SC.
SP e Universidade Federal do Paraná – UFPR. Pós- Vitor Hugo Mota de Menezes
Doutora pelos Archives Jean Piaget, em Genebra, Suíça e Pós-Doutor em Direito pela Universitá Federale degli Studi
pós-doutora pela Alanus Hochschule, Alemanha. Profes- di Messina – Italia, Doutor em Direito Constitucional pela
sora Titular da UFPR, Curitiba, PR, Brasil. Bolsista Produ- Faculdade de Direito de São Paulo – FADISP e Mestre
tividade do CNPq. em Direito Ambiental pela Universidade do Estado do
Tercio Sampaio Ferraz Júnior Amazonas – UEA. Professor da Graduação e Pós-
Doutor em Direito pela Universidade de São Paulo e Graduação do Centro Integrado de Ensino Superior –
em Filosofia pela Johannes Gutenberg Universität, CIESA, Manaus – AM.
Mainz – Alemanha. Professor Titular Aposentado da Viviane Coêlho de Séllos-Knoerr
Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo –
Pós-Doutora pela Universidade de Coimbra – Portugal,
USP – São Paulo-SP.
Doutora em Direito do Estado pela Pontifícia Universidade
Tiago Vinícius Zanella Católica de São Paulo – PUC-SP e Mestre em Direito das
Doutor em Ciências Jurídicas Internacionais e Europeias Relações Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de
pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa – São Paulo – PUC-SP. Professora e Coordenadora do
Portugal e Mestre em Direito Internacional e Relações Programa de Mestrado em Direito Empresarial e Cidada-
Internacionais pela Faculdade de Direito de Lisboa – nia na UNICURITIBA, Curitiba – PR.
Portugal. Professor de Direito Internacional Público e Wagner José Penereiro Armani
Direito do Mar, Belo Horizonte – MG.
Doutor em Direito Comercial pela Pontifícia Universidade
Tomás Prieto Católica de São Paulo – PUC-SP e Mestre em Direito Civil
Profesor Titular de Derecho Administrativo. Universidad de pela Universidade Metodista de Piracicaba. Professor de
Burgos – España. Direito Comercial, Processual Civil e Prática Jurídica pela
Pontifícia Universidade Católica de Campinas – PUC-
Vanessa Fusco Nogueira Simões Campinas, Campinas – SP.
Doutora em Direito pela Universidade de Barcelona.
Professora do Curso de Pós-Graduação da Fundação Willis Santiago Guerra Filho
Escola Superior do MPMG. Pós-Doutor em Filosofia pelo Instituto de Filosofia e Ciências
Sociais da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ.
Vanilda Aparecida dos Santos Doutor em Ciência do Direito pela Universidade de Bielefeld
Doutorado em Psicologia Social pela Pontifícia Universi- – Alemanha, em Filosofia pelo Instituto de Filosofia e
dade Católica de São Paulo. Professora de Psicologia do Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio de Janeiro
Trabalho, com especial destaque em: Psicologia Social, – UFRJ, em Comunicação e Semiótica e em Psicologia
Psicologia do Trânsito, Psicologia do Esporte, Direitos Social pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo –
Humanos, Corrupção. PUC-SP e Mestre em Direito pela Pontifícia Universidade
Vera Lúcia Rocha Souza Jucovsky Católica de São Paulo – PUC-SP. Professor do Programa
Doutora em Direito na Faculdade de Direito da Universi- de Estudos Pós-Graduados em Direito da Pontifícia Univer-
dade de Lisboa – Portugal e Mestre em Direito na Facul- sidade Católica de São Paulo – PUC-SP e Professor Titular
dade de Direito da Universidade de São Paulo – USP, São da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro –
Paulo – SP. Professora de Direito Civil, Processo Civil e de UNIRIO, Rio de Janeiro – RJ.
Direito Ambiental. Wilson Engelmann
Victor Hugo Tejerina Velazquez Doutor e Mestre em Direito Público pela Universidade do
Doutor e Mestre em Direito pela Pontifícia Universidade Vale do Rio dos Sinos – UNISINOS. Professor do Pro-
Católica de São Paulo – PUC-SP. Coordenador do Núcleo grama de Pós-graduação em Direito da UNISINOS.
de Estudos de Direito Ambiental, Empresarial e da Propri- Professor do PPGD da UNISINOS, São Leopoldo – RS.

34 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Revista Internacional Consinter de Direito
CORPO DE PARECERISTAS QUE AVALIARAM OS ARTIGOS DESTA OBRA
Adel El tasse Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy
Mestre e Doutor em Direito Penal. Advogado em Curitiba. Pós-Doutorado em Direito Comparado na Universidade de
Titulariza o cargo de Procurador Federal. Desempenha a Boston, em Direito Constitucional pela Pontifícia Universi-
atividade do Magistério na cadeira de Direito Penal em dade Católica do Rio Grande do Sul – PUC-RS, em
cursos de graduação e pós-graduação em diferentes Literatura e em História do Direito pela Universidade de
instituições de ensino superior. Professor na Escola da Brasília – UnB. Doutor e Mestre em Filosofia do Direito e
Magistratura do Estado do Paraná. Professor do CERS. do Estado pela Pontifícia Universidade Católica de São
Coordenador no Paraná da Associação Brasileira dos Paulo – PUC-SP. Livre docente em Teoria Geral do
Professores de Ciências Penais e do Núcleo de Estudos Estado pela Faculdade de Direito da Universidade de São
Avançados em Ciências Criminais – NEACCRIM. Autor de Paulo – USP, São Paulo – SP.
vários livros e artigos publicados em diversos livros,
revistas e periódicos. Antônio Carlos Efing
Doutor e Mestre em Direito pela Pontifícia Universidade
Almir Santos Reis Junior Católica de São Paulo – PUC-SP. Professor Titular da
Doutor em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Pontifícia Universidade Católica do Paraná – PUC-PR,
São Paulo – PUC-SP. Professor adjunto dos cursos de Curitiba – PR. CV:<http://lattes.cnpq.br/0310045675906800
Direito da Universidade Estadual de Maringá – UEM – PR
e da Pontifícia Universidade Católica do Paraná – PUC- Antônio César Bochenek
PR, Maringá – PR. CV: http://lattes.cnpq.br/347140591 Doutor em Direito pela Universidade de Coimbra –
5737365 Portugal. Mestre pela PUC-PR – Pontifícia Universidade
Católica do Paraná. Bacha-rel em Direito pela Uni-
Ana Barbuda Ferreira ver-sidade Estadual de Ponta Grossa – UEPG. Juiz
Doutora em Direito Público pela UFBA, Juíza e Professo- Federal do Tribunal Regional Federal da 4ª Região.
ra, atuando com especial destaque nas seguintes maté- Conselheiro da ENFAM – Escola Nacional de Formação e
rias: Direito Constitucional (Controle Constitucionalidade, Aperfeiçoamento de Magistrados. Professor da ESMAFE
Direito Constitucional Processual), Direito Processual Civil – Escola da Magistratura Federal do Paraná, Curitiba, PR,
(Sistema de Precedentes), Novos Direitos, Bioética, Direito Brasil.
Animal, Registros Públicos, Atividade Notarial e Registral.
Antônio Pereira Gaio Júnior
Ana Rachel Freitas da Silva Pós-Doutorado em Direito pela Universidade de Coimbra
Doutora e Mestre em Direito das Relações Internacionais – Portugal e em Democracia eCV:<http://lattes.cnpq.br/7
pelo Centro Universitário de Brasília – UniCeub. Professo- 104254683992334 Direitos Humanos pelo Ius Gentium
ra no Centro Universitário de Brasília – UniCEUB, Brasília Conimbrigae – Faculdade de Direito da Universidade de
– DF. CV: http://lattes.cnpq.br/4671120487555272 Coimbra – Portugal. Doutor e Mestre em Direito pela
Universidade Gama Filho. Professor na Universidade
André Folloni Federal do Rio de Janeiro – UFRRJ, Rio de Janeiro – RJ.
Doutor em Direito pela Universidade Federal do Paraná –
UFPR e Mestre pela Pontifícia Universidade Católica do Augusto Martinez Perez
Paraná – PUC-PR. Advogado. Consultor Empresarial em Doutor em Direito do Estado e Mestre em Direito Penal
Curitiba – PR. Professor no PPGD da Pontifícia Universi- pela Universidade de São Paulo – USP. Juiz Federal.
dade Católica do Paraná – PUC-PR, Curitiba – PR. Professor Titular da Universidade de Ribeirão Preto –
UNIP, Ribeirão Preto – SP. CV:<http://lattes.cnpq.br/022
Andréia Macedo Barreto 5022761966538
Pós-Doutorado pelo Ius Gentium Conimbrigae, Centro de
Direitos Humanos, sediado na Universidade de Coimbra – Bruno César Lorencini
Portugal. Doutora e Mestre em Direitos Humanos pela Doutor em Direito do Estado pela Universidade de São
Universidade Federal do Pará – UFPA, Belém – PA. Paulo – USP e Doutor em Direito Processual, Administra-
Defensora pública do Estado do Pará. tivo e Financeiro pela Universidade de Salamanca –
Espanha. Juiz Federal do Tribunal Regional Federal da 3ª
Alessandra Lehmen Região. Professor da Universidade Presbiteriana Macken-
Doutora e Mestre em Direito pela Universidade Federal do zie. Professor do PPGD da Faculdade Alves Faria –
Rio Grande do Sul – UFRGS e Mestre (LL.M.) em Direito ALFA, São Paulo – SP. CV:<http://lattes.cnpq.br/991380
Ambiental pela Stanford Law School. Advogada habilitada 9834674511
em Porto Alegre – RS – Brasil e em Nova Iorque.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 35


Corpo de Pareceristas que Avaliaram os Artigos Desta Obra

Carlos Magno de Souza Paiva Felipe Chiarello de Souza Pinto


Doutor em Direito Público pela Pontifícia Universidade Doutor e Mestre pela Pontifícia Universidade Católica de
Católica de Minas Gerais – PUC-Minas e Mestre em São Paulo – PUC-SP. Diretor da Faculdade de Direito da
Direito Público pela Universidade de Coimbra – Portugal. Universidade Presbiteriana Mackenzie. Professor Titular
Professor Adjunto do Departamento de Direito da Univer- da Faculdade de Direito e do Programa de mestrado e
sidade Federal de Ouro Preto – UFOP, Ouro Preto – MG. doutorado e Membro da Academia Mackenzista de Letras.
CV: http://lattes.cnpq.br/0117165544216528 Professor Colaborador do PPGD da Universidade de
Passo Fundo – UPF, Passo Fundo – RS. CV:<http://lattes.
Consuelo Yatsuda Moromizato Yoshida cnpq.br/9554142049617388
Doutora e Mestre em Direito das Relações Sociais pela Fernando René Graeff
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP.
Doutor e Mestre em Direito pela Universidade Federal do
Professora das Escolas Superiores da Magistratura, do
Rio Grande do Sul – UFRGS, Porto Alegre, RS com
Ministério Público, da OAB. Professora – Mestrado do
ênfase em Direito Civil, Direito de Família e Direito das
Centro Universitário Salesiano de São Paulo, São Paulo – Sucessões. CV:<http://lattes.cnpq.br/4494934773500234
SP.
Fernando Sérgio Tenório de Amorim
Cristiane Farias Rodrigues dos Santos Pós-Doutor em Direito pela Université de Montréal,
Doutora em Direito pela Faculdade de Direito Universida- Canadá – CRDP. Doutor e Mestre em Direito Universida-
de de São Paulo – FADUSP. Juíza Federal. Pesquisadora de Federal de Pernambuco – UFPE. Procurador Judicial
FADUSP – Políticas Públicas e Poder Judiciário. da Procuradoria-Geral do Município de Maceió. Coorde-
nador da Graduação e da Pós-graduação Lato Sensu do
Deilton Ribeiro Brasil Curso de Direito do Centro Universitário CESMAC, Maceió
Pós-Doutor em Democracia e Direitos Humanos pelo IGC – AL. CV: http://lattes.cnpq.br/0713914850305765
CDH da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra
– Portugal, Doutor em Estado e Direito: Internacionaliza- Frederico Valdez Pereira
ção e Regulação pela Universidade Gama Filho – RJ e Doutor em Processo Penal pela Università degli Studi di
Mestre pela Faculdade de Direito Milton Campos de Belo Pavia – Itália, com período de cotutela no Doutorado em
Horizonte – MG. Especialista e Bacharel pela UNIPAC – Ciências Criminais da PUC-RS, Mestre em Direito pela
Universidade Presidente Antônio Carlos. Professor da Universidade de Lisboa – Portugal e Mestre em Ciências
Graduação e do PPGD da Universidade de Itaúna – UIT, Criminais pela Pontifícia Universidade Católica do Rio
Itaúna – MG e das Faculdades Santo Agostinho – FASA, Grande do Sul – PUC-RS. Juiz Federal. Professor na
Montes Claros – MG. CV: http://lattes.cnpq.br/134254020 Escola Superior da Magistratura Federal do Rio Grande
5762285 do Sul, Bento Gonçalves – RS.
Fulvia Helena de Gioia
Eder Bomfim Rodrigues
Doutora em Direito pela Faculdade de Direito da Universi-
Pós-Doutor em Filosofia pela Universidade Federal de dade Presbiteriana Mackenzie. Mestre em Teoria do
Minas Gerais – UFMG, Doutor e Mestre em Direito Público Estado, pela Pontifícia Universidade Católica de são Pualo
pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais – – PUC-SP. Coordenadora Adjunta de Pesquisa e TCC e
PUC-Minas. Advogado. Professor dos Cursos de Gradua- Professora na graduação na Faculdade de Direito da
ção da Faculdade Minas Gerais e da Universidade Universidade Presbiteriana Mackenzie. Professora convida-
Presidente Antônio Carlos – Campus Nova Lima – MG. da da pós-graduação lato-sensu da Escola Paulista de
CV:<http://lattes.cnpq.br/8593009634497423 Direito – EPD, São Paulo – SP. CV: http://lattes.cnpq.
Edgardo Torres br/9669358241407042
Juiz-Presidente da Segunda Divisão Civil da Corte Superi- Giuliana Redin
or de Lima Norte, Peru. Trabalha na Oficina de Controle Doutora em Direito pela Pontifícia Universidade Católica
da Magistratura – OCMA, como Adjunto na Unidade de do Paraná – PUC-PR. Professora do Programa de Pós-
Investigação e anticorrupção. Graduação Stricto Sensu da Universidade Federal de
Santa Maria – UFSM. Coordenadora do MIGRAIDH,
Edilene Lôbo Santa Maria – RS.
Doutora em Direito Processual pela Pontifícia Universida-
de Católica de Minas Gerais – PUC-Minas e Mestre em Isaac Sabbá Guimarães
Direito Administrativo pela Universidade Federal de Minas Doutor em Direito pela Università Degli Studi di Perugia –
Gerais – UFMG. Advogada. Professora do Mestrado e da Itália, Doutor pela Universidade do Vale do Itajaí – UNIVA-
Graduação em Direito pela Universidade de Itaúna – UIT, LI e Mestre pela Universidade de Coimbra – Portugal.
Itaúna – MG. CV:<http://lattes.cnpq.br/6348105561410653 Promotor de Justiça do Ministério Público de Santa Catarina.
Professor convidado da Escola do Ministério Público do
Estado de Santa Catarina, Balneário Camboriú – SC.

36 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Revista Internacional Consinter de Direito

Jânia Maria Lopes Saldanha Janeiro – UFRRJ, Professora Substituta de Direito


Pós-Doutora em Direito do Institut des Hautes Études sur Civil da Universidade Federal Rural do Rio de
la Justice – Paris, Doutora em Direito Público pela UNISI- Janeiro – UFRRJ. Vice Coordenadora e Professora
NOS e Mestrado em Integração Latino-Americana da do PPGD Lato Sensu em Direito Processual Con-
UFSM. Professora do Departamento de Direito da Univer- temporâneo da Universidade Federal Rural do Rio
sidade Federal de Santa Maria – UFSM e do PPGD e da de Janeiro – UFRRJ. Professora dos Cursos de
Escola de Direito da UNISINOS – Universidade do Vale do Graduação e Pós-Graduação da Universidade Santa
Rio dos Sinos, Porto Alegre – RS. Úrsula – USU, Rio de Janeiro – RJ.
Jesualdo Eduardo de Almeida Junior Léo Brust
Pós-Doutor em Direitos Humanos pela Universidade de Doutor em Nuevas Tendencias En Derecho Constitucional
Coimbra – Portugal. Doutor e Mestre em Sistema Consti- pela Universidad de Salamanca – ESPAÑA, reconhecido
tucional de Garantia de Direitos pela ITE-Bauru. Professor pela Universidade de São Paulo – USP. Doutor em Direito
e Coordenador da Escola Superior da Advocacia – OAB do Estado e Mestre em Ciência Política pela Universidade
SP. Professor visitante da pós-graduação da Universidade Técnica de Lisboa – Portugal, reconhecido pela Universi-
Estadual de Londrina – UEL, da Pontifícia Universidade dade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS. Advogado.
Católica do Paraná – PUC-PR, Londrina – PR. CV: Professor da Facultad de Derecho de la Universidad de
http://lattes.cnpq.br/6159243179329399 Salamanca – Usal – Espanha.
José Eduardo Figueiredo de Andrade Martins Leonardo Estevam de Assis Zanini
Doutor e Mestre em Direito Civil pela Universidade de São Livre-docente e doutor em Direito Civil pela USP. Pós-
Paulo. Advogado e Consultor Jurídico. Professor dos doutorado em Direito Civil no Max-Planck-Institut für
cursos de graduação em Direito e pós-graduação Lato ausländisches und internationales Privatrecht (Alemanha)
Sensu em Direito Tributário da Pontifícia Universidade e em Direito Penal no Max-Planck-Institut für ausländis-
Católica de Campinas – PUC-Campinas, Campinas – SP. ches und internationales Strafrecht (Alemanha). Doutoran-
CV:<http://lattes.cnpq.br/5913901860114411 do em Direito Civil pela Albert-Ludwigs-Universität Freiburg
José Ignacio Vásquez Márquez (Alemanha). Mestre em Direito Civil pela PUC-SP. Bacha-
Doutor em Direito Universidade de Los Andes. Professor rel em Direito pela USP. Juiz Federal. Professor Universi-
de Direito Constitucional da Universidade do Chile – Chile tário (Universidade de Araraquara). Pesquisador do grupo
Novos Direitos CNPq/UFSCar. Autor de livros e artigos.
José Osório do Nascimento Neto Foi bolsista da Max-Planck-Gesellschaft e da CAPES. Foi
Pós-Doutor pela Universidade MACKENZIE-SP. Doutor e Delegado de Polícia Federal, Procurador do Banco
Mestre em Direito Econômico e Social pela Pontifíca Central do Brasil, Defensor Público Federal, Diretor da
Universidade Católica do Paraná – PUC-PR. Professor do Associação dos Juízes Federais de São Paulo e Mato
Centro Universitário UNIBRASIL, na ESTÁCIO-Curitiba, Grosso do Sul e Diretor Acadêmico da Escola de Forma-
onde coordena a Iniciação Científica. Professor convidado ção e Aperfeiçoamento de Servidores da Justiça Federal
da Pós-graduação da Universidade POSITIVO e da em São Paulo.
Escola da Magistratura Federal do Paraná – ESMAFE,
Curitiba – PR. Lucas Abreu Barroso
Doutor em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de
José Renato Martins São Paulo – PUC-SP e Mestre em Direito pela Universi-
Doutor em Direito Penal pela Universidade de São Paulo – dade Federal de Goiás – UFG. Professor da Universidade
USP. Mestre em Direito Constitucional pela Universidade Federal do Espírito Santo – UFES, Vitória – ES.
Metodista de Piracicaba – UNIMEP. Advogado. Professor CV:<http://lattes.cnpq.br/5076674738681657
e Coordenador da graduação e Especialização na –
Universidade Metodista de Piracicaba – UNIMEP, Piraci- Luigi Bonizzato
caba – SP. Doutor e bacharel em Direito pela Universidade do Estado
do Rio de Janeiro – UERJ. Professor de Direito Constituci-
Judith Sole Resina
onal da Faculdade de Direito e do Curso de Pós-
Doutora em Direito. Professora Titular de Direito Civil da Graduação stricto sensu em Direito da Universidade
Universitat Autònoma de Barcelona – Espanha. CV: Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, Rio de Janeiro – RJ.
http://lattes.cnpq.br/0747326127749733 CV: http://lattes.cnpq.br/8169452504332343
Júlia Gomes Pereira Maurmo
Luís Guilherme Soares Maziero
Doutora em Direito Constitucional pela Pontifícia Univer-
sidade Católica de São Paulo – PUC-SP. Professora Doutor em Direito pelo ITE – Bauru, Advogado. Professor
Adjunta de Direito Penal, Processo Penal e Prática na Pontifícia Universidade Católica de Campinas – PUC-
Jurídica da Universidade Federal Rural do Rio de Campinas, Campinas – SP.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 37


Corpo de Pareceristas que Avaliaram os Artigos Desta Obra

Luiz Eduardo Gunther Maria Cecília Cury Chaddad


Pós-Doutor em Direito pela Pontifícia Universidade Católica Doutora e Mestre em Direito Constitucional pela Pontifícia
do Paraná – PUC-PR. Desembargador do Trabalho no TRT Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP, São
9 PR. Professor na UNICURITIBA, Curitiba – PR. Paulo – SP. Advogada.
CV:<http://lattes.cnpq.br/1314611892212586
Marianna Almeida Chaves Pereira Lima
Manuel Martínez Neira Doutora em Direito Civil pela Universidade de Coimbra –
Doutor em Direito; Professor Titular da Faculdade de Portugal e Universidade de São Paulo – USP, São Paulo
Ciências Sociais e Direito da Universidade Carlos III de – SP. Advogada. Pesquisadora do Centro de Investigação
Madrid.<http://portal.uc3m.es/portal/page/portal/instituto_ da Universidade de Lisboa e Professora, Recife, PE
figuerola/directorio/mmartinez Mário Luiz Ramidoff
Mara Darcanchy Pós-Doutor em Direito pela Universidade Federal de
Doutora e Mestre em Direito das Relações Sociais pela Santa Catarina – UFSC e Doutor em Direito pelo PPGD
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP. da Universidade Federal do Paraná – UFPR. Desembar-
Professora Visitante e PNPD-CAPES do Programa de gador no TJPR. Professor na UNICURITIBA, Curitiba –
Mestrado em Direito Empresarial e Cidadania do Centro PR. CV:<http://lattes.cnpq.br/6059190960218107
Universitário Curitiba UNICURITIBA, Curitiba – PR. CV: Mônica Silveira Vieira
http://lattes.cnpq.br/2268275872437988 Doutora e Mestre em Direito pela Universidade Federal de
Minas Gerais – UFMG. Juíza de Direito do Estado de
Márcio Bambirra Santos
Minas Gerais. Professora assistente licenciada da Facul-
Doutor em Administração pela Universidade FUMEC, com dade de Direito Milton Campos, Belo Horizonte – MG.
especializações em Política Científico – Tecnológica – CV:<http://lattes.cnpq.br/8828484905276571
PLADES-BSB e Computação Científica pela Pontifícia
Universidade Católica de Minas Gerais – PUC-MG. Nelson Finotti Silva
Mestre em Economia pela Universidade Federal de Minas Doutor em Processo Civil pela Pontifícia Universidade
Gerais – PUC-MG. Professor, Administrador de Empre- Católica de São Paulo – PUC-SP e Mestre em Direito do
sas, Economista, Palestrante e consultor em empresas e Estado pela Universidade de Franca – UNIFRAN. Procu-
grupos nacionais e internacionais, Belo Horizonte – MG. rador de Estado. Professor do Curso de Mestrado em
Direito do Centro Universitário Eurípedes de Marília –
Marco Aurélio Serau Júnior UNIVEM, Marília – SP e do Curso de Graduação em
Doutor e Mestre EM Direitos Humanos pela Universidade Direito do Instituto Municipal de Ensino Superior – IMES
de São Paulo – USP. Professor na Universidade Federal Catanduva, Catanduva – SP.
do Paraná – UFPR, Curitiba – PR.
Nelson Flavio Firmino
Marco Antônio César Villatore Pós-Doutor em Direito Constitucional pela Universidade de
Professor do Centro Universitário Internacional – UNIN- Coimbra – Portugal, Doutor em Ciências Jurídicas e
TER e da Graduação e do PPGD (Mestrado e Doutorado) Sociais pela Universidad del Museo Social Argentino e
da Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC. Mestre em Direito Internacional Público pela Universidade
Coordenador da Especialização em Direitos e Processos de Wisconsin – EUA. Advogado. Professor de Pós-
do Trabalho e Previdenciário da ABDConst, Professor Graduação da Universidade Cândido Mendes, Rio de
Convidado da Especialização da PUCRS Advogado. Pós- Janeiro – RJ. CV:<http://lattes.cnpq.br/3632965751263941
doutor pela UNIROMA II – Tor Vergata, Doutor pela Nuria Belloso Marín
UNIROMA I – Sapienza e Mestre pela PUCSP. Membro
Titular da Cadeira n. 73 da Academia brasileira de Direito Doutora em Direito pela Universidade de Valladolid –
Espanha. Professora Titular de Filosofia do Direito na
do Trabalho. Membro Correspondente do Paraná da
Universidade de Burgos – Espanha. Coordenadora do
Academia Sul-Rio-Grandense de Direito do Trabalho e do
Centro de Letras do Paraná. Líder do NEATES. Programa de Doutorado em Direito Público. Representan-
CV:<http://lattes.cnpq.br/6658857270253086 te do Dpto. de Direito na Comissão de Doutorado e dirige
o Curso de Pós-Graduação Universitário em Mediação
Maria Carolina Carvalho de Almendra Freitas Familiar na Universidade de Burgos – Espanha.
Doutoranda em Direito Político e Econômico pela Univer- Osvaldo Ferreira de Carvalho
sidade Presbiteriana Mackenzie e mestre em Direito Pós-Doutor e Doutor em Direito pela Faculdade de Direito
Internacional e Econômico pela Universidade Católica de da Universidade de Lisboa – Portugal, Mestre pela
Brasília – UCB. Professora substituta na Universidade Pontifícia Universidade Católica de Goiás – PUC-Goiás.
Estadual do Piauí – UESPI, na Faculdade Integral Dife- Professor na Escola de Direito e Relações Internacionais
rencial e no Centro de Ensino Superior do Vale do Parnaí- da PUC-GO e na Universidade Estácio de Sá unidade em
ba – CESVALE, Teresina – PI. Goiânia – GO.

38 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Revista Internacional Consinter de Direito

Paulo Renato Fernandes da Silva Tercio Sampaio Ferraz Júnior


Doutor em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade Doutor em Direito pela Universidade de São Paulo e em
Federal Fluminense – UFF e Mestre em Direito Empresa- Filosofia pela Johannes Gutenberg Universität, Mainz –
rial pela Universidade Cândido Mendes. Advogado. Alemanha. Professor Titular Aposentado da Faculdade de
Professor Adjunto do Departamento de Ciências Jurídicas Direito da Universidade de São Paulo – USP – São Paulo
da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro – – SP.
UFRRJ, Rio de Janeiro – RJ. Tiago Vinícius Zanella
Roberta Corrêa de Araujo Doutor em Ciências Jurídicas Internacionais e Europeias
Doutora e Mestre em Direito pela Universidade Federal de pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa –
Pernambuco – UFPE. Juíza Federal do Trabalho TRT 6ª Portugal e Mestre em Direito Internacional e Relações
Região. Coordenadora do curso de Direito da Faculdade Internacionais pela Faculdade de Direito de Lisboa –
de Olinda – FOCCA, Olinda – PE. Portugal. Professor de Direito Internacional Público e
Rogério Piccino Braga Direito do Mar, Belo Horizonte – MG.
Pós-Doutorando no Ius Gentium Conimbrigae da Univer- Tomás Prieto
sidade de Coimbra – Portugal. Doutor e Mestre em Direito Profesor Titular de Derecho Administrativo. Universidad de
Constitucional pelo Centro Universitário de Bauru – CEUB Burgos, España.
ITE. Advogado. Professor Permanente do Curso de Pós- Vanilda Aparecida dos Santos
Graduação Lato Sensu do Projuris Estudos Jurídicos,
Professor na Faculdade de Direito da Universidade Doutorado em Psicologia Social pela Pontifícia Universi-
Estadual do Norte do Paraná – UENP e na Universidade dade Católica de São Paulo. Professora de Psicologia do
do Norte do Paraná – UNOPAR, Bandeirantes – PR. CV: Trabalho, com especial destaque em: Psicologia Social,
http://lattes.cnpq.br/4022699994172031 Psicologia do Trânsito, Psicologia do Esporte, Direitos
Humanos, Corrupção.
Roseli Borin
Vera Lúcia Rocha Souza Jucovsky
Pós-Doutora em Derecho Procesual en el Sistema Ítalo-
Germano pela Università Degli Studi di Messina – Itália, Doutora em Direito na Faculdade de Direito da Universi-
Doutora em Sistemas Constitucionais de Garantias de dade de Lisboa – Portugal e Mestre em Direito na Facul-
Direito pela Instituição Toledo de Ensino – ITEBauru – SP, dade de Direito da Universidade de São Paulo – USP, São
Mestre em Direitos da Personalidade e Especialista em Paulo – SP. Professora de Direito Civil, Processo Civil e de
Direito Civil – Sucessões, Família e Processo Civil pelo Direito Ambiental.
Centro Universitário de Maringá – UNICESUMAR. Advo- Vinicius Roberto Prioli de Souza
gada. Professora de Pós-graduação na Escola da Magis- Pós-Doutorando em Direito pela Universidade de Marília –
tratura de Paraná e na Universidade Paranaense – UNIMAR, Marília/SP. Doutor em Direito pela Instituição
UNIPAR, Maringá – PR. Toledo de Ensino – ITE, Bauru/SP. Mestre em Direito pela
Sergio Torres Teixeira Universidade Metodista de Piracicaba – UNIMEP, Piraci-
Desembargador do TRT 6ª Região. Professor Adjunto da caba/SP. Bacharel em Direito pelas Faculdades Integra-
FDR UFPE e da UNICAP, Coordenador Científico e das ´Antônio Eufrásio de Toledo´ de Presidente Prudente,
Diretor da Escola Superior da Magistratura do Trabalho – Presidente Prudente/SP. Advogado.
ESMATRA e professor/instrutor da Escola Nacional de Vitor Hugo Mota de Menezes
Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados – ENFAM, Pós-Doutor em Direito pela Universitá Federale degli Studi
da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de di Messina – Italia, Doutor em Direito Constitucional pela
Magistrados do Trabalho – ENAMAT, da Escola Judicial Faculdade de Direito de São Paulo – FADISP e Mestre
do TJPE – ESMAPE, da Escola Judicial do TRT6, Jaboa- em Direito Ambiental pela Universidade do Estado do
tão dos Guararapes – PE. Amazonas – UEA. Professor da Graduação e Pós-
Suzéte da Silva Reis Graduação do Centro Integrado de Ensino Superior –
Doutora em Direito pela UNISC. Professora do PPGD – CIESA, Manaus – AM.
Mestrado e Doutorado da UNISC. Coordenadora do
Grupo de Estudos: Relações de Trabalho da Contempo-
raneidade.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 39


Corpo de Pareceristas que Avaliaram os Artigos Desta Obra
COLABORADORES
Adriane Garcel J. Eduardo López Ahumada
Alessandra Valle Salino Jean Vilbert
Alfredo Soler del Sol Jesús Víctor Alfredo Contreras Ugarte
Anderson Ricardo Fogaça Jorge Luis Varona López
Angela Alves de Sousa José Laurindo de Souza Netto
Antonio Felipe Delgado y Jiménez José María Lombardero Martín
Carlos Francisco Molina del Pozo Juan Carlos Ortiz Pradillo
Claudia Maria Petry de Faria Luciana Gonçalves Dias
Clayton Reis Maria Celeste Cordeiro Leite dos Santos
Daniel Willian Granado María Eugenia Grau Pírez
Eduardo Manuel Val Maria Luiza de Andrade Picanço Meleiro
Eduardo Rodrigues Barcellos Mário Luiz Ramidoff
Eliana Aló da Silveira Matheus de Quadros
Evandro Fabiani Capano Mirian Pelegrino
Fabrício Bittencourt da Cruz Nancy Carina Vernengo Pellejero
Fernando Rey Cota Filho Noemí Jiménez Cardona
Flávio Couto Bernardes Paulo Muanis do Amaral Rocha
Franciele da Rocha Dias Paloma Gurgel de Oliveira Cerqueira
Francisco Javier Durán Ruiz Pedro Augusto Costa Gontijo
Francisco Javier Arroyo-Cañada Regina Vera Villas Bôas
Glaucia Maria de Araujo Ribeiro Ricardo Wypych
Glaucia Milagre Menezes Sandra Mara Franco Sette
Gonçalo S. de Melo Bandeira Sérgio Henriques Zandona Freitas
Horácio Monteschio Vinícius Almada Mozetic

40 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


El Arbitraje de Productos Financieros:la Experiencia del Consumidor Español

Integrantes do Conselho Editorial do

Alexandre Libório Dias Pereira


Doutor em Direito; Professor da Faculdade
de Direito da Universidade de Coimbra.
Antonio García-Pablos de Molina
Catedrático de Direito Penal da Universidad Complutense de Madrid.
Carlos Francisco Molina del Pozo
Doutor em Direito; Professor Titular de Direito
Administrativo e Diretor do Centro de Documentação
Europeia na Universidade de Alcalá de Henares;
Professor da Escola Diplomática e do Instituto
Nacional de Administração Pública.
Fernando Santa-Cecilia García
Profesor Titular de Direito Penal e Criminologia da Universidad Complutense de Madrid.
Ignacio Berdugo Gómez de la Torre
Catedrático de Derecho Penal en la Universidad de Salamanca.
Joan J. Queralt
Catedrático de Direito Penal da Universitat Barcelona.
Jordi García Viña
Catedrático de Direito do Trabalho e Seguridade Social da Universitat de Barcelona.
Manuel Martínez Neira
Doutor em Direito; Professor Titular da
Faculdade de Ciências Sociais e Direito da
Universidade Carlos III de Madrid.
María Amparo Grau Ruiz
Catedrática Acreditada de Derecho Financiero y Tributario –
Universidad Complutense de Madrid.
María del Carmen Gete-Alonso y Calera
Catedrática de Direito Civil da Universitat Autònoma de Barcelona.
Mário João Ferreira Monte
Doutor em Ciências Jurídico-Criminais; Professor
Associado com nomeação definitiva na Escola de
Direito da Universidade do Minho; membro integrado
do Centro de Investigação de Direitos Humanos da
Universidade do Minho e Presidente do Instituto
Lusófono de Justiça Criminal (JUSTICRIM).
Paulo Ferreira da Cunha
Doutor em Direito; Professor Catedrático da
Faculdade de Direito da Universidade do Porto.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 41


Sumário

ESSA OBRA É LICENCIADA POR UMA


LICENÇA CREATIVE COMMONS

Atribuição – Uso Não Comercial – Compartilhamento pela mesma li-


cença 3.0 Brasil.
É permitido:
– copiar, distribuir, exibir e executar a obra
– criar obras derivadas

Sob as seguintes condições:

ATRIBUIÇÃO
Você deve dar crédito ao autor original, da forma especificada pelo autor
ou licenciante.

USO NÃO COMERCIAL


Você não pode utilizar esta obra com finalidades comerciais.

COMPARTILHAMENTO PELA MESMA LICENÇA


Se você alterar, transformar ou criar outra obra com base nesta, você so-
mente poderá distribuir a obra resultante sob uma licença idêntica a esta.

– Para cada novo uso ou distribuição, você deve deixar claro para outro, os
termos da licença desta obra.

 Licença Jurídica (licença integral):


http://creativecommons.org/licenses/by-nc-sa/3.0/br/legalcode

Esta revista proporciona acesso público livre e imediato a todo seu


conteúdo em ambiente virtual.

42 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Sumário
Capítulo 01 – DIREITOS DIFUSOS, COLETIVOS E
INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS
OPENING OF THE CASE OF ACTION AND PRECLUSIVE 55-69
EFFECTIVENESS OF THE JUDGED THING
Maria Celeste Cordeiro Leite dos Santos, Paulo Muanis do
Amaral Rocha

OS DIREITOS HUMANOS COM ALCANCE UNIVERSAL: uma 71-93


Realidade Tangível ou uma Utopia Inalcançável?
Jean Vilbert, Vinícius Almada Mozetic

ESTUDIO BIBLIOMÉTRICO DE LA INVESTIGACIÓN SOBRE 95-108


LA REGULACIÓN DE INTERNET
Francisco Javier Arroyo-Cañada

IMPLICACIONES JURÍDICAS DE LA IMPLEMENTACIÓN DE 109-132


CIUDADES INTELIGENTES EN LA UNIÓN EUROPEA Y EN
ESPAÑA
Francisco Javier Durán Ruiz

JUDICIALIZAÇÃO DA SAÚDE UMA QUESTÃO DE (“IN”) 133-150


JUSTIÇA – Experiência Brasileira
Mirian Pelegrino, Eduardo Manuel Val

EL PODER DE LAS ÉLITES QUE NOS GOBIERNAN. A 151-178


Propósito de Vilfredo Pareto, Gaetano Mosca y Robert
Michels
Jesús Víctor Alfredo Contreras Ugarte

LA PROTECCIÓN DEL PATRIMONIO CULTURAL. Una Visión 179-195


Desde el Derecho Cubano
Jorge Luis Varona López, María Eugenia Grau Pírez, Alfredo
Soler del Sol

VIOLÊNCIA URBANA: Direitos Humanos e Questões 197-213


Sociais
Maria Luiza de Andrade Picanço Meleiro

Capítulo 02 – DIREITO PÚBLICO


EL ACOSO ESCOLAR DESDE LA PERSPECTIVA PROCESAL 217-236
Nancy Carina Vernengo Pellejero

_________________________________________________________________
Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020
OS ASPECTOS CONTEMPORÂNEOS DOS PRINCÍPIOS DO 237-253
CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA NOS PROCESSOS
CORRECIONAIS DO ESTADO DE MINAS GERAIS
Glaucia Milagre Menezes, Sérgio Henriques Zandona Freitas

COMENTARIO EN TORNO A LA NOTA CONJUNTA DEL 255-272


CONSEJO DE EUROPA Y DE LA AGENCIA DE DERECHOS
FUNDAMENTALES DE LA UNIÓN EUROPEA, DE 27 DE
MARZO DE 2020, SOBRE DERECHOS FUNDAMENTALES DE
LOS REFUGIADOS Y DE LOS INMIGRANTES EN LAS
FRONTERAS DE EUROPA
Carlos Francisco Molina del Pozo

O DIREITO HUMANO À SAÚDE NO CÁRCERE: 273-284


Inconstitucionalidades do Pacote Anticrime e o
Cerceamento ao Direito de Visita
Paloma Gurgel de Oliveira Cerqueira

ECONOMÍA INFORMAL, INSEGURIDAD LABORAL Y 285-303


TRABAJO DECENTE
J. Eduardo López Ahumada

Execução Penal 4.0 305-325


Fabrício Bittencourt da Cruz, Matheus de Quadros

A FUNÇÃO DA CONSTITUIÇÃO FINANCEIRA 327-349


Pedro Augusto Costa Gontijo, Flávio Couto Bernardes

A INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA SUPRALEGAL 351-364


COMO MANIFESTAÇÃO DO DIREITO NATURAL
Eduardo Rodrigues Barcellos, Evandro Fabiani Capano

O JUIZ NATURAL NA JUSTIÇA MILITAR FEDERAL 365-379


BRASILEIRA: Principais Desafios para a Efetivação do
Acesso Justo à Justiça no Processamento de Demandas
Envolvendo Civis
Luciana Gonçalves Dias, Regina Vera Villas Bôas

MECANISMOS EXTRAJUDICIAIS DO DIREITO À SAÚDE 381-398


SOB A PERSPECTIVA DO TEOREMA DE COASE
José Laurindo de Souza Netto, Anderson Ricardo Fogaça,
Adriane Garcel

PERSPECTIVAS DO FENÔMENO NACIONAL DA 399-420


JUDICIALIZAÇÃO DA SAÚDE VOLTADA PARA O
AMAZONAS
Alessandra Valle Salino, Glaucia Maria de Araujo Ribeiro

_________________________________________________________________
Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020
LA RECEPCIÓN DE LA CULTURA DEL “COMPLIANCE” Y DEL 421-450
“WHISTLEBLOWING” EN ESPAÑA
Juan Carlos Ortiz Pradillo

SEGUNDAS NOTAS À LEGISLAÇÃO DA LAVAGEM DE 451-470


CAPITAIS EM PORTUGAL-EU: Regime Sancionatório Numa
Primeira Abordagem
Gonçalo S. de Melo Bandeira

TRATAMIENTO PROCESAL DE LA COMPETENCIA OBJETIVA 471-494


DEL TRIBUNAL DEL JURADO
José María Lombardero Martín

TRIPARTIÇÃO DE PODERES NO BRASIL: Necessidade de 495-507


Realmente Torná-los Independentes e Autônomos
Horácio Monteschio

Capítulo 03 – DIREITO PRIVADO


LA COMPENSACIÓN DEL RÉGIMEN DE VISITAS, EN LOS 511-525
CASOS DE DIVORCIO CONTENCIOSO, EN LA NUEVA ERA
POST-COVID 19
Noemí Jiménez Cardona

DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA: 527-540


Requisitos Materiais e Incidente Procedimental
Ricardo Wypych, Mário Luiz Ramidoff

A JORNADA DE TRABALHO EM ÉPOCA DE COVID-19 541-556


Franciele da Rocha Dias, Claudia Maria Petry de Faria

A MASSIFICAÇÃO DOS PROCESSOS NO DIREITO 557-576


BRASILEIRO E OS INSTRUMENTOS DE CONTENÇÃO
INSERIDOS PELO ORDENAMENTO PROCESSUAL CIVIL
Daniel Willian Granado, Fernando Rey Cota Filho

LA PROPUESTA DE UNA LEY DE NAVEGACIÓN MARÍTIMA 577-604


EN BRASIL UN COMPARATIVO CON ARGENTINA
Eliana Aló da Silveira

A RESPONSABILIDADE CIVIL E A RECORRENTE 605-620


VIOLAÇÃO AOS DIREITOS DE PERSONALIDADE E AO
MEIO AMBIENTE POR GRANDES CORPORAÇÕES
Angela Alves de Sousa, Sandra Mara Franco Sette, Clayton
Reis

_________________________________________________________________
Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020
LA VIDEOVIGILANCIA DE LOS TRABAJADORES MEDIANTE 621-636
CÁMARAS OCULTAS: EL CASO LÓPEZ RIBALDA Y OTROS C.
ESPAÑA (Stedh de 17 de Octubre de 2019)
Antonio Felipe Delgado y Jiménez

_________________________________________________________________
Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020
Revista Internacional Consinter de Direito

APRESENTAÇÃO

A Revista Internacional CONSINTER de Direito é uma publicação


de cariz periódico do CONSINTER – Conselho Internacional de Estudos
Contemporâneos em Pós-Graduação que tem por objetivo constituir-se
num espaço exigente para a divulgação da produção científica de qualidade,
inovadora e com profundidade, características que consideramos essenciais
para o bom desenvolvimento da ciência jurídica no âmbito internacional.
Outra característica dos trabalhos selecionados para a Revista Inter-
nacional CONSINTER de Direito é a multiplicidade de pontos de vista e
temas através dos quais o Direito é analisado. Uma revista que se pretende
internacional tem o dever de abrir horizontes para temas, abordagens e enfo-
ques os mais diversos e, através deste espaço, colaborar com um melhor
diálogo acadêmico.
Resultado de um trabalho criterioso de seleção, este volume que agora
se apresenta destina-se a todos aqueles que pretendem pensar o Direito, ir
além da sua aplicação quotidiana, mas sem deixar de lado o aspecto prático,
tão característico das ciências.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 43


Revista Internacional Consinter de Direito

Capítulo 01

DIREITOS DIFUSOS, COLETIVOS E


INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 53


Revista Internacional Consinter de Direito

OPENING OF THE CASE OF ACTION AND PRECLUSIVE


EFFECTIVENESS OF THE JUDGED THING
ABERTURA DA CAUSA DE PEDIR E EFICÁCIA PRECLUSIVA
DA COISA JULGADA
DOI: 10.19135/revista.consinter.00011.01
Recebido/Received 30.05.2020 – Aprovado/Approved 06.10.2020
Maria Celeste Cordeiro Leite dos Santos1 – https://orcid.org/0000-0002-1835-761X
E-mail: iete73@hotmail.com
Paulo Muanis do Amaral Rocha2 – https://orcid.org/0000-0001-6263-6264
E-mail: paulo@muanis.com.br

Abstract: The objective of this paper is to show whether or not the Federal Supreme
Court of Brazil can extend the cause of action in direct (or indirect) actions of
constitutionality. How this extension can be made and whether the res judicata should be
observed, given that such extension was used in a previous case, attacking the same
infra-constitutional law. To do so, with simplicity, but not leaving the depth aside, we
will use the issue with a focus on national jurisprudence, comparative law and various
doctrines. Finally, we will address objective and subjective actions and how the “erga
omnes” effect occurs in these types of actions; whether only the parts of that particular
process suffer the effects of the decision rendered there, or if the whole society will
benefit from what was decided in that action and in what way.
Keywords: Res Judicata; Right of Action; Preclusion; Effectiveness; Pleading.
Resumo: O objetivo do presente trabalho é mostrar se o Supremo Tribunal Federal do
Brasil pode ou não ampliar a causa de pedir em ações diretas (ou indiretas) de
constitucionalidade. Como essa ampliação pode ser feita e se a coisa julgada deve ser
observada, tendo em vista que tal ampliação foi utilizada, em caso anterior, atacando a
mesma Lei infraconstitucional. Para tanto, com simplicidade, mas não deixando a
profundidade de lado, utilizaremos o tema com enfoque na jurisprudência pátria, direito
comparado e diversas doutrinas. Por fim, abordaremos ações objetivas e subjetivas e
como ocorre o efeito “erga omnes” nestes tipos de ações; se apenas as partes daquele
determinado processo sofrem os efeitos da decisão lá prolatada, ou se toda a sociedade
irá se beneficiar daquilo que naquela ação ficou decidido e de que forma.

1
É Livre Docente em Direito Penal pela USP, Professora Associada pela USP, Pós-doutora em Psicologia
Clínica pela PUC/SP, graduada em Filosofia pela PUC/SP, Licenciatura em Filosofia pela PUC/SP,
Graduada em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, é Mestre em Filosofia pela PUC/SP e em
Direito pela PUC/SP, Doutora em Direito pela PUC/SP; além de ter diversas obras escritas é Professora da
PUC/SP. E-mail: iete73@hotmail.com
2
Bacharel pela FMU, possui Pós Graduação “Lato Sensu” em Direito Processual Civil e em Direito
Empresarial pelo CEU Law School, e Direito dos Contratos pelo INSPER; atualmente é mestrando em
Direito Difusos e Coletivos pela PUC-SP. Advogado e Professor da UNINOVE, além de ser Coautor da
Obra Estudos Aplicados de Direito Empresarial – Contratos (Almedina). E-mail: paulo@muanis.com.br

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 55


Maria Celeste Cordeiro Leite dos Santos / Paulo Muanis do Amaral Rocha

Palavras-chave: Coisa Julgada; Causa de Pedir; Preclusão; Eficácia; Pedido.


Summary: Introduction. 2 Cause of action. 3 The judged thing.4 Subjective demands. 5
Objective demands. Conclusion. References.

INTRODUCTION
The present work will be limited to dealing with subjective and objective
actions without distinguishing the actions themselves that are capable of declaring
the constitutionality or unconstitutionality of an infra-constitutional law in Brazil;
such as, for example, ADIN (Direct Action of Unconstitutionality), ADC
(Declaratory Action of Constitutionality), ADPF (Pleading of Non-compliance with
Fundamental Precept), etc. – the present work will focus only on article 102, I, letter
a of the Federal Constitution of Brazil, to study what we will see below.
We cede the understanding that there is more than one way to achieve the
objective pursued in the sense of seeing a Law declared constitutional or
unconstitutional before the Federal Supreme Court (STF), or even before the State
Courts of Justice (when it comes to seeking the unconstitutionality of a State or
Municipal Law that borders the Constitution of a given State) – the declaratory
actions of unconstitutionality of the State will not be studied in this paper.
It is not the purpose of the present work to deal with the perspective of
whether the chosen route to be declared unconstitutional (nor of the types of
unconstitutionality and the requirements for such) or constitutionality of an infra-
constitutional Law (not of normative act) is main or lateral/incidental, concentrated
or diffuse, abstract or strict3, subjective or objective, individual or collective, route
of exception or indirect route, etc4.. It is worth saying that these classifications do
not have the necessary correspondence in other systems5.

3
DINAMARCO, Cândido Rangel, Instituições de Direito Processual Civil, I v, 6ª ed, São Paulo, Malheiros,
2009, p, 195/196. “The direct influence of the process on the life of the Constitution is given whenever the
constitutional rule itself is examined and concretely implemented through the activity of the judge. This
happens in the judgment of cases that include discussion on the compatibility or incompatibility between a
rule of infra-constitutional law and another located at the constitutional level (diffuse control of
constitutionality); or even when before the Federal Supreme Court is proposed a direct action of
unconstitutionality (concentrated control of constitutionality – Article 102, inc. I, letter a). in both cases, the
recognition of incompatibility means moving away from the effectiveness of the infra-constitutional rule, to
preserve the principle of supremacy of the Constitution.”.
4
MEDINA, Paulo Roberto de Gouvêa, Direito Processual Constitucional, 1, ed, Rio de Janeiro, Forense,
2003, p, 57. “The current Brazilian Constitution adopts a complex system for the control of
constitutionality. Alongside the mechanisms peculiar to the diffuse system, it institutes direct action as an
instrument of concentrated control at the federal level, authorizing its adoption also, as a restricted object, at
the state level. It also establishes a declaratory action for constitutionality. It also provides for a special form
of control by May of the claim of noncompliance with a fundamental precept. At the same time, the
Constitution maintains another type of control that is a tertium genus in the matter, distinct from the diffuse
system and different characteristics of concentrated control: it is the system that can be called instrumental,
as it serves as an instrument for the eventual intervention of the Union in the States or of these in the
respective Municipalities.”.
5
PALU, Oswaldo Luiz, Controle de Constitucionalidade, 2 ed, São Paulo, Revista dos Tribunais, 2001, p.
91. “In Europe, the U.S. system of judicial review (or judicial review os legislation) did not have

56 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Opening of the Case of Action and Preclusive Effectiveness of the Judged Thing

Nor will the present study be the object of cases in which the attacked norm
has a logical correlation of dependence with another norm or norm that is extremely
similar (or article or clause) and, therefore, this similar or dependent norm would
also have, or not, its unconstitutionality declared by drag or attraction.
Since this is a very wide-ranging issue, the present study seeks to diagnose,
with simplicity, whether at the moment the analysis of the unconstitutionality6 of an
infra-constitutional Law made by the Federal Supreme Court, which has expanded
the cause of action made ex officio by the highest body and guardian of the Federal
Constitution, for analysis of that request for a declaration of unconstitutionality, it
will be considered immutable and unassailable, after the final and unappealable
decision, considering that that particular Law was declared constitutional or
unconstitutional.
In other words, the Federal Supreme Court declares that a Law is
constitutional (or unconstitutional), taking into consideration that, for example, a
lawsuit was filed requesting a declaration of unconstitutionality in accordance with
article “x” and “y” of the Brazilian Constitution. In analyzing this request, the STF
broadens the cause of action, to declare that not only is the law constitutional in
view of the articles observed, but it is also constitutional in view of articles “w” and
“z” of the Brazilian Constitution.
Is the Federal Supreme Court, in taking this attitude and extending the right
of action for it, in some way, overstating its function? Moreover, is such decision,
which has become res judicata, covered by the cloak of the preclusive immutability
of the res judicata? Or will it be possible, in the future, to file another lawsuit
pleading a declaration of unconstitutionality of that same infra-constitutional law,
taking into account other articles of the Federal Constitution not observed in that
particular judgment, even though the cause of action has been extended? Or due to
the fact that the Federal Supreme Court has extended the right of action, would a
new action requesting a declaration of unconstitutionality of that same Law violate
the res judicata? Could the Federal Supreme Court, in due course, have extended the
cause of action on its own initiative?

repercussions, since in several countries it was difficult to hand over the control of the constitutionality of
laws to ordinary judges, for various reasons. That was when Kelsen, in the Austrian Constitution of 1920
(amended in 1929), created what can be called the European model of control of the constitutionality of
laws. It rejects the Austrian legal system (and later, with its own variants, almost all developed European
countries) of the systems of judicial review and the principle of stare decisis. The Austrian author does not
think of a diffuse system, but of a concentrated, non-judicial, but legislative (negative) and, to a certain
extent, abstract nature. Being a legislative activity, there are no theoretical difficulties in having the decision
of unconstitutionality with “force of law” and evidently erga omnes. The decision would be constitutive and
not declaratory as in the US system; that is to say, the effects would be ez nunc and not ex tunc, something
like the repeal of the law.”.
6
PALU, Oswaldo Luiz, Op. cit., p, 65. “The control of the constitutionality of normative acts is defined as
the act of submitting to the verification of compatibility rules of a given legal system, including those arising
from the derived Constituent Power, with the commands of the constitutional parameter in force, formally
and materially (form, procedure and content) those that are incompatible with it.”.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 57


Maria Celeste Cordeiro Leite dos Santos / Paulo Muanis do Amaral Rocha

The questions above that will be analyzed in the present study, are intended
to understand whether the Federal Supreme Court is acting in accordance with
constitutional principles and with the guiding principles of civil procedure, in cases
in which it extends the cause of ex-officio action in lawsuit that seek to declare the
unconstitutionality of an infra-constitutional law.
The Brazilian procedural system and the Federal Constitution are rigid7, and
cases of revisiting issues that have already been res judicata8 are rare and delicate,
both from the point of view of legal security and from the point of view of the search
for the nomophilacic function that is so much discussed today.
The new Code of Civil Procedure9 has ceased to be, to a certain extent, as
exclusive as the Brazilian Code of Civil Procedure of 197310, but this does not mean
that after a final and unappealable decision is rendered, our system easily grants the
re-analysis of that case or matter.
The Federal Supreme Court, when expanding the cause of action, observing
other articles of the Federal Constitution, in a pleading for a declaration of
unconstitutionality of an infra-constitutional law not contained in that first petition,
can say that in doing so, it extended such analysis to ALL articles in the Magna
Carta and, therefore, future request for a declaration of unconstitutionality of that
particular law, would face one of the classic constitutional principles, that is, the res
judicata.
On the other hand, if the broadening of the right of action observed other
articles and did not properly observe the Brazilian Federal Constitution in its
entirety, another action attacking the unconstitutionality of an infra-constitutional
Law already declared constitutional in a previous action, but observing other articles
of the Brazilian Federal Constitution, would not confront the res judicata, given that
the request would be the same, but not the cause of action and, consequently,
another action would not be identical and, therefore, would undoubtedly continue.
Finally, we will analyze requests for declarations of unconstitutionality of
infra-constitutional rules in objective and subjective actions; with this, we will draw
7
DELLORE, Luiz, Estudos sobre a Coisa Julgada e Controle de Constitucionalidade, 1, ed, Rio de Janeiro,
Forense, 2013, p, 223. “Thus, historically, there is only constitutionality control if we are faced with a rigid
Constitution. Therefore, the theme of the control of constitutionality of laws gains prominence from the
moment that there are rigid Constitutions, that is, at the end of the eighteenth century.”.
8
LIEBMAN, Enrico Tullio, Manual de Direito Processual Civil, v, 3. Tocantins: Intelectos, 2003, p. 169.
“With the purpose of ending the disputes and giving certainty to the rights, the legislator has set a moment
when a new pronouncement on what has been judged is prohibited. At this point, not only is the judgment
no longer open to challenge by ordinary means (cf. 298 ff.), but the decision is binding on the parties and on
the legal system and no judge can again judge the same object in relation to the same parties (except for the
distant possibility of filing extraordinary challenges). All that is expressed by saying that the sentence has
become res judicata, that is, that it has become immutable and at the same time immutable has also become
the determination contained therein, with all the effects that derive from it.”.
9
BRASIL, Código de Processo Civil, Lei 13.105, de 16 de março de 2015, Disponível em: <http://www.pla
nalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13105.htm#art1046>, Acesso em 02 jun. 2019.
10
BRASIL, Código de Processo Civil. Lei 5.869, de 11 de janeiro de 1973, Institui o Código de Processo
Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L5869.htm>, Acesso em 02 jun. 2019.

58 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Opening of the Case of Action and Preclusive Effectiveness of the Judged Thing

a small panorama about the res judicata “erga omnes” in the case of objective
actions (concentrated control of constitutionality) and the res judicata inter parts in the
case of subjective actions (diffuse control of constitutionality), and if there is the
possibility of having two different judgments (not only in different cases, but with
different decisions), based on the same right of action in two different actions, but being
one objective and another subjective.
With great clarity and sobriety, the present work will try to elucidate the theme
that is extremely arduous and complex; therefore, we will support ourselves both in
jurisprudence and doctrine, in an exhaustive way in the search for answers and solutions
proposed by the disturbing questions above.

1 CAUSE OF ACTION
Every demand requires a cause of action11. Without it, one of the most important
procedural requirements for filing a claim will not be met and the initial claim will
contain a defect.
The right of action (near or remote) in action aimed at declaring an infra-
constitutional law unconstitutional is precisely the direct or indirect affront that a given
law makes to the Federal Constitution, i.e., the basis on which that particular action is
brought is one or more articles of the Magna Carta, which have been challenged by a
given enacted infra-constitutional law.

“According to careful doctrine, 'causa petendi', is the fact or set of facts likely to produce,
by itself, the legal effect intended by the author”12.

The Federal Constitution is the highest law of our legal system and all other laws
enacted in our country can in no way go against what the Federal Constitution says13.
In view of this, there may be countless causes for a lawsuit to be declared
unconstitutional, i.e., the pleading will always be the same: to see a particular law

11
CARVALHO, Milton Paulo de, Do Pedido no Processo Civil, 1 ed, Porto Alegre, FIEO, 1992, p, 79. “It
has traditionally been indicated as elements that give identity to actions (and demands) the subjects, the
request and the cause to request. When it comes to analyzing these elements in order to identify a particular
demand, it overcomes the cause of asking as a tuning fork and greater sensitivity than the other two
elements. For this reason, and because the study of the cause of action is based on difficulties, ranging from
its very admission as an identifying element, to the determination of its content, the authors observe that this
is one of the most intricate points of Civil Procedural Law.”.
12
NEGRÃO, Theotonio, GOUVÊA, José Roberto F., Código de Processo Civil, 41ª ed, São Paulo, Saraiva,
2009, p, 438.
13
DINAMARCO, Cândido Rangel. Op. cit., p. 195. “The indirect action of the process on the Constitution is
continuously carried out in the courts and tribunals, in the day-to-day of its constant operation. Since the
Constitution is the nuance that goes back to the entire legal order of the country (tête de chapitre), and the
material infra-constitutional law is a set of developments of the way it defines the social, political and
economic order, giving action to the infra-constitutional precepts means imposing the effectiveness of the
constitutional rules themselves. The effectiveness of the national legal system as a whole, which is one of
the political scopes of the process, is basically the effectiveness of the Constitution itself.”.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 59


Maria Celeste Cordeiro Leite dos Santos / Paulo Muanis do Amaral Rocha

declared unconstitutional because it has violated the Federal Constitution. But the cause
of action may vary according to interpretation, since a certain Law may not confront
some articles carved in the Major Law, but it may confront others.
This time, a lawsuit can be decided by understanding that a certain law is
constitutional or that it may not have been declared unconstitutional, which for the
present work, as can already be seen, is the same thing14 (this issue will not be analyzed
in detail, since it is not the purpose of the present work), but later, for different cause of
action, but with the same request, may give rise to a new action, seeking the declaration
of that same law as being unconstitutional, but this time, having as right of action,
another article that borders the Federal Constitution other than the one analyzed in the
first action, but this time, having as a cause of action15, another article that borders the
Federal Constitution that is not the one analyzed in the first action.
Currently, the Federal Supreme Court has relied on the so-called “open cause of
action” institute in order to, in light of other articles of the constitution, expand the basis
of the ex-officio demand and, therefore, use other constitutional articles to assess
whether an infra-constitutional law whose declaration of unconstitutionality is being
sought is effectively unconstitutional.
It seems to us that such a manoeuvre is completely possible16, mainly because
it does not leave certain procedural and constitutional principles aside, as is the case

14
PALU, Oswaldo Luiz Op. cit, p, 182. “In the edition of this work I added: “The binding effect provided for
in article 102, paragraph 2, of the Brazilian Constitution should also apply to the case of direct action of
unconstitutionality. There is no substantial or anthological difference between a direct action for
unconstitutionality and a direct action for constitutionality: the ADIn (direct action for unconstitutionality) is
proposed, if it is unfounded and with the procedural quorum, the law will be declared constitutional; the
ADC (declaratory action for constitutionality), if it is unfounded and with the procedural quorum, the
constitutionality will be declared. Effectiveness erga omnes was already understood to be present in the
direct action for unconstitutionality. Otherwise, article 102 of the Constitution of the Republic, which states
that the STF is the primary guardian of the Constitution, is of little practical use. (...)”.”.
15
CARVALHO, Milton Paulo de, Op. cit, p, 79/80. “Being the cause of requesting element distinct from the
request, as its basis, or origo petitionis, as Lopes da Costa said, is not confused with him. While it is intimate
the relationship between these elements, and the cause of claim may arise as the one that identifies the claim
in the case of identical claims, if there is difference what changes is the basis and not the claim. As in one of
the cases provided for in art. 264 of the Brazilian CPC, if the author has another basis, in addition to that
already exposed, for the request formulated in the initial petition, through another demand may formulate
the same request, not considering identical claims. Or, still, in the example formulated by Liebman and
collected by Vicente Greco Filho: if the author claimed fraud as a vice of consent and in the course of the
cause there are references to different circumstances, which, however, compete as integral elements of the
figure of fraud, there is no change in the demand. There will be, if the allegation was of coercion, or
essential error.”.
16
MIRANDA, Francisco Cavalcante Pontes de, Comentários ao Código de Processo Civil, Tomo IV, Rio de
Janeiro, Forense, 1974, p, 192. “The petendi cause is therefore complex. Of category or legal figure, we
said. No, the category or the legal figure. Even if the author is wrong on this point, which most refers to the
realization of the objective right, he can change his way of seeing about the category or the figure, as long
as, by changing it, the new category or figure is still reconciled with his request. Both the judge and the
party are allowed to refer to another text of the Law, the category or legal figure different from that to which
the initial application refers. Two consequences of this principle of fungibility of the form of the foundation:
a) the defendant may be condemned even if the name given to the legal situation or to it is not exact, in good

60 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Opening of the Case of Action and Preclusive Effectiveness of the Judged Thing

with the principle of speed and the principle of onerosity. It is important to point out
that every time any homeland court is called upon to pacify social conflict and,
consequently, deliver the good of life to the rightful owner, the taxpayer's money is
spent in order for this movement of the State machine to occur. If in the future it will
be possible to file a new action, pleading the declaration of unconstitutionality of a
certain infra-constitutional law, alleging a new cause of action, considering that the
action with the same request, but with another right of action has already been
judged, it is easy to see that both the time and the money of the Brazilian citizen was
misused.
The Federal Supreme Court, by expanding the cause of action in actions of
this nature, ends up prioritizing public interests in order to save money and time and,
for these reasons, the expansion of the cause of action is very well used in this
tuning fork and this understanding, in our opinion, should prevail.
Another but no less important aspect is the fact that an infra-constitutional
rule is producing effects on the factual and legal mute and, sometimes, harming the
jurisdiction if, later on, this Law is considered unconstitutional. If the Federal
Supreme Court had the opportunity to examine a certain issue in light of the Federal
Constitution, of course, that for a matter of common sense, and having the
opportunity, it should analyze such Law according to other articles of the Federal
Constitution that it deems convenient for that particular claim, and which were not
part of the cause of action17 and, therefore, if using the expansion of the right of
action (such maneuver is possible also in Germany)18, brilliantly.
Having passed this point, there is still a doubt: once a lawsuit has been
decided and the Federal Supreme Court has broadened the cause of action to see an
infra-constitutional law declared unconstitutional, as being constitutional; could one
enter at a later date with another lawsuit requesting the same thing with another
cause of action? Or due to the fact that the Federal Supreme Court has broadened the

technical and adequate terminology; b) by changing the name of the relation of material law, or the text of
law, the exception of res judicata is not avoided, only for this reason.”.
17
PASSOS, Joaquim Calmon de. Comentários ao Código de Processo Civil, v. III, 8 ed, Rio de Janeiro,
Forense, 1998, p, 159. “The least jurisdiction given to that category or provision of law invoking it to
characterize it is irrelevant, if mistakenly indicated. The judge needs the fact, because it is he who knows the
law. The subsumption of the fact to the rule is the duty of the judge, that is to say, the legal categorization of
the fact is the task of the judge. If the fact narrated in the initial and what was requested are compatible with
the new legal categorization, or with the new provision of law invoked, there is no need to talk about
changing the cause of the request, or infeasibility of the request. This impracticability only occurs when the
consequences derived from the new legal category cannot be attributed to the fact narrated in the initial one,
nor are they contained in the request, or are incompatible with it.”.
18
MARTINS, Ives Gandra da Silva; e MENDES, Gilmar Ferreira, coordenadores, Ação Declaratória de
Constitucionalidade. 1, ed, São Paulo, Saraiva, 1994, p, 91. “This guidance undoubtedly corresponds to the
nature of the abstract rule control process, which is intended not only to promptly and effectively eliminate
the unconstitutional law from the legal system, but also to definitively beat up doubts that may have arisen
about the constitutionality of valid laws. Such understanding seems all the more plausible if one considers
that the Federal Supreme Court, like the Bundesverfassungsgericht, is not bound to the representation of
unconstitutionality, to the grounds invoked by the author, and may declare the unconstitutionality by
different grounds from those explained in the initial.”.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 61


Maria Celeste Cordeiro Leite dos Santos / Paulo Muanis do Amaral Rocha

cause of action, would the preclusive mantle of the res judicata stabilize and become
immutable when it comes to declaring that particular Law as being unconstitutional?

2 THE JUDGED THING


In this topic, what is sought is whether the res judicata19,20 operates in
decisions in which the unconstitutionality of a certain Law has not been declared and
that, in this process, the cause of action has been amplified; that is, the cause of
action for a certain claim brings as an affront to the infra-constitutional Law articles
“w” and “z” of the Federal Constitution. In judging the lawsuit, the Federal Supreme
Court broadens the cause of action and analyzes the unconstitutionality of that
specific law not only from the standpoint of articles “w” and “z” of the Federal
Constitution, but also in accordance with articles “n” and “m” of the Constitution.
The decision understands that such infra-constitutional law is not unconstitutional,
therefore, constitutional.
In the future, a lawsuit will be filed requesting a declaration of
unconstitutionality of the same infra-constitutional law, but now with the claim that
this particular law does not violate the articles brought by the lawsuit that already
have a res judicata, but brings as a new cause to request claims that such infra-
constitutional law violates articles “p” and “j” in the Federal Constitution.
Due to the mere fact that the Federal Supreme Court ruled that this infra-
constitutional Law was not unconstitutional, and due to the fact that in the first trial
the cause of action was broadened, the second claim could not subsist, given the
constitutional principle of the res judicata?
Now, as seen in the previous chapter, changed the cause of request, can enter
with new lawsuit21. In our understanding, in order for the res judicata to be formed

19
SICA, Heitor Vitor Mendonça, Preclusão Processual Civil, 2ª ed, São Paulo, Atlas, 2008, p, 215/216. “The
effects of the formal res judicata prevent penalties that reopen the incidental issues resolved in the same
process, and, if the effects of the material res judicata are not added to them, in principle it is not forbidden
to file an autonomous claim in which the same issues are again ventilated. Even here, the effects are merely
endo-processes. And, if the sentence is of merit, in addition to the effect of preventing the simple of the
formal res judicata, the res judicata will arise material that, within the subjective and objective limits
imposed by law, extrapolates the process in which it was launched, imposing itself in any other effect of
eadem re future, before any judge. The effects are, as we know, extra-procedural.”.
20
JUNIOR, Nelson Nery; e NERY, Rosa Maria de Andrade, Constituição Federal Comentada e Legislação
Constitucional, 4ª ed, São Paulo, Revista dos Tribunais, 2013, p, 226. “The rule protects the thing judged
material (auctoritas rei iudicatae), understood as the quality that makes unchangeable and indisputable the
command that emerges from the dispositive part of the sentence of merit no longer subject to ordinary or
extraordinary appeal (...).”
21
LIEBMAN, Enrico Tullio. Op. cit, p, 177. “The determination is enunciated in the device of the sentence
and represents the concrete provision pronounced by the judge, but in order to identify it exactly the
indispensable elements of the petendi cause and the petitum should be sought in the motivation of the
sentence. This is all the more evident since in general the provision is governed in abstract terms, which
only the motivation will allow translating into clear and concrete terms (often the provision only says:
“accepts” or “rejects the proposed demands”; “accepts” or “rejects the appeal” etc.). this does not mean,
however, that the grounds are covered by the res judicata: on the contrary, as will be seen”.

62 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Opening of the Case of Action and Preclusive Effectiveness of the Judged Thing

in cases such as the one described above, it would be necessary for the Federal Supreme
Court to have analyzed ALL the articles of the Federal Constitution to observe if none of
them would face the infra-constitutional law sub judice, which is never done.
As it would be impossible to perform this analysis with all the proceedings filed
in this sense, the res judicata only operates with respect to those specific articles
contained in that first decision; it is not forbidden to file a new claim having a new cause
to request, that is, a cause to request different from that previously used in the pleading
whose final and unappealable decision was made, even though the cause to request, ex
officio, was expanded by the judges, when analyzing that particular claim.
Just out of curiosity it is worth mentioning that our neighbor Peru, treats the res
judicata in a similar way to ours: there must be a final decision, no matter the instance in
which this decision occurs and it is necessary that there has been analysis of the
substance, that is, that there has been a judgment on the merits22.
With respect to res judicata in the case of an objective and subjective action that
fails to declare the unconstitutionality of an infra-constitutional law and its effects, we
will deal with it immediately below.

3 SUBJECTIVE DEMANDS
This topic is important because of the aspect that demands that discuss the
delivery of a certain good of life, but between private individuals, or between private
individuals and public entities (or entities compared to public entities), may also contain
a request for the infra-constitutional rule to be declared unconstitutional, but if this
occurs, the effect generated by this statement will not be “erga omnes”; the effect
generated will be only and only endo-procedural (inter parts).
Here constitutional control is diffuse and not concentrated, as we shall see ahead.
This means that a single judge has discretion to control the constitutionality23 of an infra-
constitutional rule and, thus, in that specific sub judice relationship, that particular infra-
constitutional law whose declaration of unconstitutionality has been declared cannot be
used to pacify that particular concrete case.

22
CÓRDOVA, Luis Castillo, Comentarios al Código Procesal Constitucional, Tomo I, 2 ed, Lima, Palestra,
2006, p, 388. “Con el Código Procesal Constitucional la situación cambia, aunque no radicalmente. Ahora
para que una resolución obtenida dentro de un proceso constitucional llegue a obtener la calidad de cosa
juzgada con todas las consecuencias que ello puede suponer, deben concurrir los siguientes dos requisitos:
que sea la resolución final y que haya pronunciamiento sobre el fondo. Ya no es un elemento para definir la
calidad de cosa juzgada que el fallo beneficie o no al agredido en su derecho constitucional.”.
23
DANTAS, Pulo Roberto de Figueiredo, Direito Processual Constitucional, 3, ed, São Paulo, Atlas, 2012, p,
169. “Based on the above statements, we can conclude, in a narrow introductory synthesis, that the control
of constitutionality consists precisely in the inspection of the adequacy (vertical compatibility) of the laws
and other normative acts edited by the Public Power with the principles and rules existing in a rigid
constitution, in order to ensure that such normative diplomas respect, both in terms of their content, and the
form as produced, the hierarchically superior precepts dictated by the master charter.”.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 63


Maria Celeste Cordeiro Leite dos Santos / Paulo Muanis do Amaral Rocha

“Having done so, the Brazilian Constitution grants the duty of constitutional compatibility
analysis of any normative act to all judges in their jurisdictional activities.”24.

The difficulty of the matter lies in the moment when this case is taken to the
Federal Supreme Court. The specifics of the issue will remain the same, as narrated
above, but the imbroglio would occur if the same Law in this process declared
unconstitutional, were under analysis by the same Supreme Court, but in objective
action, that is, in concentrated control of constitutionality (generating effectiveness “erga
omnes”).
It is important to explain, even briefly, the institute of effectiveness: the
effectiveness of a decision (broad sense) is the phenomenon by which that pacifying
order or understanding (decision), emanated by the State, is transferred (mirrored) in the
factual world, that is, the resolution achieved in the legal world, becomes proficient in
the phenomenal world (we are not talking about the effectiveness of the Law set). See
that for the present work, it is enough to elucidate the effectiveness of the final decisions,
not having the intention of distinguishing the effectiveness as a whole (even from the
appealable sentences or the interlocutory decisions), since it does not lend itself to the
present work. Therefore, analyzing the etymology of the word preclusion (praecludere),
coming from Latin, which means to prevent, close, shut; it is the loss of the parties, and
somehow the Judge, the possibility of practicing some act (or repeat this act)
procedural. Therefore, with the brief explanation above, we clarify the ideas of the
interlocutor so that we can move forward.
Coming back. Could the Federal Supreme Court judge the objective claim in
one way and the subjective in another? Could the Federal Supreme Court suspend
the subjective action, since if the trial of the objective action had the desired
outcome in the subjective action, the effect “erga omnis” would also benefit from
the subjective action? How would it look if the objective action were dismissed, thus
declaring that the infra-constitutional law is constitutional, but having taken into
consideration certain articles of the Federal Constitution, and in the subjective action
the articles whose declaration of unconstitutionality of the infra-constitutional law
has been searched for is others; could the Federal Supreme Court have judged the
subjective action differently? Should the Federal Supreme Court have taken into
consideration the articles mentioned in the subjective action before judging it?
In the study made in the present work, not all these answers were found, but
below our opinion will be given observing the legal hermeneutics according to the
systematic logical process and the sociological logical process.
It seems to us that since the preclusive effectiveness of the res judicata in
subjective actions covers only the parties included in that proceeding, it would be
imperative that the Federal Supreme Court suspend this proceeding until the final
decision of the objective claim that discussed the same matter.

24
BORBA, Rodrigo Esperança, Coisa Julgada versus Inconstitucionalidade – Controvérsias e Perspectivas, 1,
ed, Curitiba, Juruá, 2011, p, 69.

64 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Opening of the Case of Action and Preclusive Effectiveness of the Judged Thing

Not only would this be possible, but also the fact that the Federal Supreme
Court, for procedural economics and legal certainty, could broaden the cause of
action of the objective claim, observing the articles of the Brazilian Constitution
brought up by the subjective pleading. It seems this would also avoid discrepancies
in judgments and would respect legal certainty.
With the explanation of the previous paragraph, the issue would be resolved
with simplicity and harmoniously in accordance with the legal precepts of the
Brazilian legal system. If the causes were not contemporary, even so the problem
would have easy solution as we will see in the following topic.

4 OBJECTIVE DEMANDS
Initially, it is worth making a comparison of our legal system in relation to
Peru, which, unlike ours, has an autonomous constitutional process (and a unique
Constitutional Procedural Code) and which, basically, uses only two types of action
(one for the consolidation of fundamental rights and the other for the constitutional
processes that ensure the supremacy of the Constitution), but which independently,
somewhat resembles the national legal system in other aspects. The Peruvian
Constitutional process not only regulates the fundamental rights of its citizens, but
also grants them the possibility of promoting actions of unconstitutionality of a law
that violates constitutional rights25.
Having drawn this parallel, it is worth going into how our legislator has dealt
with the issue now being dealt with in our country, if we do not see it:

25
CÓRDOVA, Luis Castillo, Op. cit., p, 27/28. “Definido así el proceso en general, conviene volver las
llamadas por la Constitución como “garantías constitucionales”, para advertir de la necesidad de hacer una
distinción que por elemental no es ociosa. En estricto, “no es exactamente lo mismo hablar de garantías
constitucionales, también es cierto que todas las garantías constitucionales tienen por finalidad proteger
exclusivamente derechos constitucionales. Las garantías constitucionales existen a fin de proteger y afianzar
el cumplimiento efectivo de la Constitución en general, de todos y cada uno de sus preceptos. La garantía de
derechos constitucionales sólo tendrá por finalidad garantizar la efectiva vigencia de una parte de ella,
precisamente de esa parte en la que se reconocen derechos”. En palabras del Tribunal Constitucional,
“existen básicamente dos tipos de procesos constitucionales. En primero lugar, están los procesos
destinados as afianzamiento de los derechos fundamentales; y, en segundo lugar, los procesos
constitucionales que aseguran la macía de la Constitución”. Es así que todas las garantías recogidas a lo
largo del artículo 200 CP son garantías constitucionales, pero sólo tres de ellas –el hábeas corpus, el amparo
y el hábeas data- tienen desde su formulación constitucional y como se hará notar oportunamente en este
trabajo- la finalidad de proteger directamente derechos constitucionales. Esto no quiere significar –ha-brá
que dejarlo claramente expresado desde ahora- que con las demás garantías constitucionales no se pueda
eventualmente conseguir – aún indirectamente- la defensa de algún derecho constitucional. Por ejemplo,
mediante una acción de inconstitucionalidad se pude lograr la derogación de una ley que su sola vigencia
vulnera derechos constitucionales; o mediante la acción popular se puede dejar sin efecto una norma
reglamentaria que servía de base a la autoridad administrativa para vulnerar derechos constitucionales. Lo
único que se quiere decir es que el hábeas corpus, el amparo y el hábeas data tienen por finalidad proteger
directamente derechos constitucionales; las demás garantías constitucionales sólo indirectamente y en
determinadas circunstancias, podrán lograr este cometido.”.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 65


Maria Celeste Cordeiro Leite dos Santos / Paulo Muanis do Amaral Rocha

With the comparison made in the previous topic on objective demands26 and
subjective demands, we now have to deal with the objective demands regarding the
concentrated and binding control (the Federal Supreme Court is the only body that
has constitutional jurisdiction to do so) of constitutionality and, with respect to the
possibility or not of entering into a new claim requesting the declaration of
unconstitutionality of a certain infra-constitutional Law, which had its
constitutionality declared by the Brazilian Federal Supreme Court, in an action
whose cause of action was expanded, taking into account other articles of the
Brazilian Federal Constitution, not brought before the first claim.
Germany had a similar problem and the conclusion reached was that the
decision not declaring the unconstitutionality of the infra-constitutional law is not
binding and, thus, future claims could be filed in order to have that particular infra-
constitutional law declared unconstitutional27.
What was not analyzed in the German case was the possibility of
rediscussing an infra-constitutional law not declared unconstitutional in cases in
which the Supreme Court has in the first case extended the cause of action.
However, it seems to us that the logic that permeates the question can solve
the imbroglio in the same singular way. In other words, even if the Federal Supreme
Court did not declare the unconstitutionality of an infra-constitutional law in a
lawsuit whose cause of action was expanded, such decision would not have a
binding nature and, of this magnitude, a future and new lawsuit could be filed in
order to see the infra-constitutional law declared unconstitutional.
In any case, although the German judge did not mention the cause of action,
the aforementioned decision resolved the issue even more broadly: if the new
petition were to use the same constitutional article in order to declare that infra-
constitutional law unconstitutional, this would not be possible, given that one cannot
use “countless means for this purpose”28.

26
MARTINS, Ives Gandra da Silva, e MENDES, Gilmar Ferreira, coordenadores, Op. cit, p, 94. “The
declaratory action of constitutionality is a typical objective process, aimed at avoiding legal uncertainty or
the state of uncertainty about the legitimacy of the law or federal normative act. The eventual applicants act
in the interest of preserving legal security and not in the defense of a self-interest. Here, as in the direct
action for unconstitutionality, there is a procedure without parties, in which there is a plaintiff, but there is
no request. As in a direct action for unconstitutionality, the plaintiffs are entitled to a constitutional action
only for the purpose of bringing or not bringing an action against the Supreme Court.”.
27
MARTINS, Ives Gandra da Silva, e MENDES, Gilmar Ferreira, coordenadores, Op. cit, p, 94. ““The
protection for confirmatory decisions of the Constitutional Court, which transcends the res judicata itself,
would not be supported by art. 94, II of the Fundamental Law. Such protection, which would ultimately
prevent people not affected by the res judicata from claiming that the decision would be wrong and that, in
fact, the confirmed law would be unconstitutional, would require the conversion of the force of law
(Gesetzeskraft) into the force of constitution (Verfassungskraft). (...) Paragraph 31, I, of the Organic Law of
the Constitutional Court provides that the force of law also reaches decisions confirming constitutionality;
this extension only applies, however, to the duty of publication, because the law cannot confer effect that the
Constitution does not provide (...).”“.
28
MARTINS, Ives Gandra da Silva, e MENDES, Gilmar Ferreira, coordenadores. Op. cit, p, 95. ““This idea
(which reduces the force of law, in cases of declaration of constitutionality, to the mere duty of publication)

66 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Opening of the Case of Action and Preclusive Effectiveness of the Judged Thing

Therefore, it seems to us that a new lawsuit could only be filed in cases in


which the cause of action was changed, even in the case of a lawsuit in which the
cause of action was extended ex officio by the Supreme Court. For example, the
cause of action was broadened, but the new lawsuit uses constitutional articles that
were not used either in the original cause of action or in the extension of the ex
officio cause of action by the Supreme Court, so, although the matter has already
been discussed, it was not from this new standpoint, so that a new lawsuit may
persist. A new lawsuit could also be filed in cases in which the infra-constitutional
law was amended or in cases in which the Federal Constitution itself was changed.
This same conclusion was reached by Professor Gilmar Ferreira Mendes,
current Minister of the Superior Court of Brazilian Justice29.

CONCLUSION
In view of the greater speed and lower spending of taxpayer’s money, we
believe it is imperative to expand the cause of action in actions aimed at declaring
the unconstitutionality of an infra-constitutional Law.
In addition to the aspects mentioned in the previous paragraph, the
jurisdiction cannot suffer from legal insecurity, judging by the fact that a Law may
be declared as constitutional in an action that has as its cause of action a
constitutional article and, subsequently, the same Law may be the target of another
action with the same purpose, but with right of action different and, of this amount,
may be judged unconstitutional.
In this tuning fork, it is not plausible that at the same time the jurisdictions
are harmed by having had personal actions judged in accordance with that Law that
was supposedly constitutional, but was later considered unconstitutional, since the
Federal Supreme Court could have expanded the cause of action and did not do so.
If this occurs, the judiciary will again be triggered by many termination actions, in
order to see new decisions put in place of one that was motivated by an
unconstitutional law.
For this and other reasons widely linked in the present work, it is that we
understand primordial the expansion of the cause of action made by the Superior
Court of Justice in objective actions.
The social benefits of broadening the cause of action outweigh the arguments
of the opposing party, but what cannot be disregarded is that if an action that has had

only appears mandatory if the force of law is considered under § 31, II, of the Organic Law of the
Constitutional Court as an institute of material character. Indeed, a decision of the Constitutional Court
cannot transform an unconstitutional law into a law in conformity with the Constitution. However, if one
considers the force of law as a specific institute of res judicata for the control of norms, then the erga omnes
link does not mean a validation (Heilung) of eventual unconstitutionality of the law confirmed, but only that
this question can no longer be raised in the constitutional process. The idea of the Rule of Law (more
precisely, the constitutional binding of legislative activity, art. 20) requires the possibility of control of rules,
but does not impose the opening of countless avenues for this purpose.”“.
29
MARTINS, Ives Gandra da Silva; e MENDES, Gilmar Ferreira, coordenadores. Op. cit., p. 94/98.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 67


Maria Celeste Cordeiro Leite dos Santos / Paulo Muanis do Amaral Rocha

the cause of action enlarged30, but only certain constitutional articles have been
analyzed exhaustively and others have not and, subsequently, under another cause of
action another claim to be filed seeking a declaration of unconstitutionality of that
Law declared to be constitutional, the cloak of the res judicata would not operate and
another decision, if the case, could be placed in place of the previous one. We cede
the understanding in cases in which there was no expansion of the cause of action,
that another demand could be proposed, with cause of action different from that of
the first proceeding, without the need to speak of res judicata or, eventually, of its
relativization.
Drawing a parallel between objective and subjective claims it is imperative to
highlight that the subjective claims although they may be judged by the Superior
Court of Justice, the effect generated by this decision is not extra-procedural, only
making a res judicata between the parties in that process.
On the other hand, objective claims may have “erga omnes” effects generated
by their decision, that is, the declaration of unconstitutionality of an infra-
constitutional law issued by an objective claim binding the entire national territory,
and all judges of the entire country will be obliged to disregard that infra-
constitutional law when judging the claims assigned to them.
Finally, it is worth noting that if there is an amendment to the infra-
constitutional law declared constitutional or an amendment to the Constitution itself,
another lawsuit may be filed seeking the unconstitutionality of that certain law, even
if it had the same cause of action; this may occur, in the same way, if there is a
factual or social change in that determinate society31.
30
STF, ADI 1358 MC/DF, Rel. Min. Sydney Sanches, j, 18.02.1999, DJ 28.05.1999, Nesse mesmo sentido,
STF, ADI 1756 MC/MA, Rel. Min, Moreira Alves, j. 23.04.1998, DJ 06.11.1998, e STF, ADI 1358
MC/DF, Rel. Min. Sydney Sanches, j. 07.12.1995, DJ 26.04.1996: “It is the jurisprudence of the Plenary,
the understanding that, in the Direct Unconstitutionality Action, its judgment does not depend on the ‘causa
petendi’ formulated in the initial, i.e., the legal grounds deducted therein, since, in this objective process,
there is an argument of unconstitutionality, the Court must consider it in all aspects in light of the
Constitution and not only in light of those focused on by the author.”.
31
MENDES, Gilmar Ferreira, COELHO, Inocêncio Mártires, e BRANCO, Paulo Gustavo Gonet, Curso de
Direito Constitucional, 5, ed, São Paulo, Saraiva, 2010, p, 1182/1183. “Thus, the legal rule that could not be
ruled unconstitutional at the time of its issuance becomes susceptible to judicial censorship due to a
profound change in factual relations, configuring the process of incostitutionalization (der Prozess des
Verfassungswidrigwerdens). Legal dogma is limited to distinguishing between constitutional
and unconstitutional acts. The declaration of unconstitutionality supposes the simple
declaration or the simple recognition of a pre-existing situation. The unconstitutionality process
(Verfassungswidrigwerdens) is not a dogmatic alternative, except when it results from a change in
factual relations. An eventual change in the jurisprudential understanding, with the consequent
affirmation of the unconstitutionality of a situation, until then considered constitutional, does not
authorize the characterization of the supervening unconstitutionality. It strives to circumvent the
inevitable embarrassment arising from this model, affirming that the change in the jurisprudential
understanding led only to the recognition of the unconstitutionality, previously configured. Perhaps one
of the richest themes of the theory of law and modern constitutional theory is that related to the evolution
of jurisprudence and, especially, the possible constitutional mutation, resulting from a new interpretation
of the Constitution. If its repercussion on the material level is undeniable, there are countless challenges on
the level of the process in general and, above all, of the constitutional process.”.

68 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Opening of the Case of Action and Preclusive Effectiveness of the Judged Thing

REFERENCES
BORBA, Rodrigo Esperança, Coisa Julgada versus Inconstitucionalidade – Controvérsias e
Perspectivas, 1, ed, Curitiba, Juruá, 2011.
BRASIL, Código de Processo Civil. Lei 13.105, de 16 de março de 2015, Disponível em <
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13105.htm#art1046>.
BRASIL, Código de Processo Civil, Lei 5.869, de 11 de janeiro de 1973, Institui o Código de Processo
Civil, Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L5869.htm>.
BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, Disponível em
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao /constituicao.htm>.
CARVALHO, Milton Paulo de, Do Pedido no Processo Civil, 1 ed, Porto Alegre, FIEO, 1992.
CÓRDOVA, Luis Castillo, Comentarios al Código Procesal Constitucional, Tomo I, 2 ed, Lima,
Palestra, 2006.
DANTAS, Pulo Roberto de Figueiredo, Direito Processual Constitucional. 3, ed, São Paulo, Atlas, 2012.
DELLORE, Luiz, Estudos sobre a Coisa Julgada e Controle de Constitucionalidade, 1, ed, Rio de
Janeiro, Forense, 2013.
DINAMARCO, Cândido Rangel, Instituições de Direito Processual civil, I v, 6ª ed, São Paulo,
Malheiros, 2009.
JUNIOR, Nelson Nery, e NERY, Rosa Maria de Andrade, Constituição Federal Comentada e Legislação
Constitucional, 4ª ed, São Paulo, Revista dos Tribunais, 2013.
LIEBMAN, Enrico Tullio, Manual de Direito Processual Civil, v. 3, Tocantins, Intelectos, 2003.
MARTINS, Ives Gandra da Silva, e MENDES, Gilmar Ferreira, coordenadores. Ação Declaratória de
Constitucionalidade, 1, ed, São Paulo, Saraiva, 1994.
MEDINA, Paulo Roberto de Gouvêa, Direito Processual Constitucional. 1, ed, Rio de Janeiro, Forense,
2003.
MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires, e BRANCO, Paulo Gustavo Gonet, Curso de
Direito Constitucional, 5, ed, São Paulo, Saraiva, 2010.
MIRANDA, Francisco Cavalcante Pontes de, Comentários ao Código de Processo Civil, Tomo IV, Rio
de Janeiro, Forense, 1974.
PALU, Oswaldo Luiz, Controle de Constitucionalidade, 2 ed, São Paulo, Revista dos Tribunais, 2001.
PASSOS, Joaquim Calmon de, Comentários ao Código de Processo Civil, v, III, 8 ed, Rio de Janeiro,
Forense, 1998.
SICA, Heitor Vitor Mendonça, Preclusão Processual Civil, 2ª ed, São Paulo, Atlas, 2008.
STF, ADI 1358 MC/DF, Rel. Min. Sydney Sanches, j. 18.02.1999, DJ 28.05.1999, Nesse mesmo sentido,
STF, ADI 1756 MC/MA, Rel. Min. Moreira Alves, j. 23.04.1998, DJ 06.11.1998; e STF, ADI 1358
MC/DF, Rel. Min. Sydney Sanches, j. 07.12.1995, DJ 26.04.1996.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 69


Opening of the Case of Action and Preclusive Effectiveness of the Judged Thing

OS DIREITOS HUMANOS COM ALCANCE UNIVERSAL:


UMA REALIDADE TANGÍVEL OU UMA UTOPIA
INALCANÇÁVEL?
HUMAN RIGHTS AND ITS UNIVERSAL REACH: A
TANGIBLE REALITY OR AN UNFORGETTABLE UTOPIA?
DOI: 10.19135/revista.consinter.00011.02
Recebido/Received 02.04.2020 – Aprovado/Approved 17.08.2020
Jean Vilbert1 – https://orcid.org/0000-0003-0223-2211
E-mail: jeanvilbert@gmail.com
Vinícius Almada Mozetic2 – https://orcid.org/0000-0001-8801-990X
E-mail: vinicius.mozetic@unoesc.edu.br

Resumo: O presente artigo traz uma reflexão sobre o real papel dos direitos humanos na
atualidade. O objetivo do artigo é analisar a temática, dando maior enfoque a visão articu-
lada dos compromissos, exigências e dependências sociais para justificar seu alcance uni-
versalizado. O problema da pesquisa é: atuando com base em sua dimensão ética, construir
direitos humanos com alcance universal é uma realidade tangível ou uma utopia inalcançá-
vel? O método de abordagem adotado é o dedutivo, e o método de procedimento utilizado
é o monográfico. A hipótese principal responde ao problema de pesquisa de modo afirma-
tivo. A conclusão é de que a noção ética que norteia o conceito sobre direitos humanos, se
utilizada em paralelo a uma ideia de dignidade humana dúplice (dimensão básica e cultu-
ral), permitem que se estenda substantivamente a efetividade de ações práticas, incluindo
reconhecimento universal, somados a uma legislação vigente e eventuais intervenções para
garantir sua implementação.
Palavras-chave: Direitos Humanos. Ideia. Utopia.
Abstract: This article deals with the real role of human rights today. The objective of the
article is to analyze the theme, giving greater focus to the articulated vision of social
commitments, requirements and dependencies. The research problem is: acting based on
the ethical dimension, is building human rights with universal scope a tangible reality or an
unreachable utopia? The method of approach adopted is the deductive, and the method of
procedure used is the monographic. The main hypothesis answers the research problem in
the affirmative. The conclusion is that the ethical notion that drives the human rights
concept, whether used along with a notion of human dignity subdivided into two branches

1
Juiz de Direito no Tribunal de Justiça de São Paulo. Mestre em Direitos Fundamentais pela Universidade do
Oeste de Santa Catarina – UNOESC. Professor de Humanística e Direito Constitucional em cursos
preparatórios. Professor-visitante da Universidade de Wisconsin (EUA). E-mail: jeanvilbert@gmail.com
2
Advogado. Pós-Doutor em Direito Público pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos – UNISINOS-RS.
Doutor em Direito Público pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos – UNISINOS-RS. Professor do
Programa de Pós-graduação – Mestrado e Doutorado em Direito da UNOESC – Universidade do Oeste de
Santa Catarina. E-mail: vinicius.mozetic@unoesc.edu.br

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 71


Jean Vilbert / Vinícius Almada Mozetic

(basic and cultural dimensions), makes feasible to enlarge the effectiveness of practical
actions and to recognize the human rights as a universal category.
Keywords: Human rights. Idea. Utopia.
Sumário: Introdução; 1. Os direitos humanos e sua complexidade conceitual; 1.1
definições sobre os direitos humanos; 1.2 Universalismo e relativismo; 2. Argumentos
éticos que fundamentam os direitos humanos; 2.1 A fundamentação da dignidade
humana; 2.2 Os níveis de compreensão da dignidade humana; 3. da universalidade dos
direitos humanos; 3.1 Uma utopia inalcançável; 3.2 Uma realidade tangível; Conclusão.

INTRODUÇÃO
Apesar do impacto que promoveu (e ainda promove), a ideia dos direitos
humanos continua sendo vista por muitos como intelectualmente anêmica – carente
em bases, e, até mesmo, em termos de coerência e força de convicção. Há, por um
lado, um apelo inflamado, e, por outro, um profundo ceticismo. Um dos motivos
para isso talvez seja que o uso frequente da expressão “direitos para todos os seres
humanos”, que pode ser observada em muitos discursos e pronunciamentos, não tem
sido adequadamente combinada às bases e à congruência dos conceitos subjacentes.
Pensar nos Direitos Humanos como uma categoria universal, ou seja, como
algo que deva ser respeitado e efetivado em todas as culturas, tem se mostrado um
árduo desafio, tanto por conta da diversidade cultural e dos antagonismos existentes
nas diferentes sociedades pelo mundo, quanto: (a) de um lado pela crescente dissemina-
ção de teses que buscam relativizar a observância e respeito desta categoria de direitos;
(b) de outro lado pelo uso ideológico desses direitos, sem real base conceitual (teórica)
ou mesmo intenções práticas de implementar as categorias no todo.
A abordagem aqui proposta inicia com alguns questionamentos que buscam levar
a reflexão sobre o real papel dos direitos humanos na atualidade, entre os quais, desta-
cam-se os seguintes: (1) construir direitos humanos com alcance universal é uma reali-
dade tangível ou uma utopia inalcançável? (2) Será que pode existir um conjunto de
direitos que tenha por destinatários todos os seres humanos, independentemente da or-
dem jurídica ou moral em que estejam inseridos? (3) Há um limite mínimo que deve ser
observado por todas as nações na regulação de suas práticas sociais, de forma a garantir
existência digna a todas as pessoas?
Esta pretensão à universalidade tem encontrado, como já adiantado, resistências,
fundadas nas peculiaridades culturais inerentes a cada nação. Os denominados relativis-
tas culturalistas3 defendem a relativização dos direitos humanos e a sua consequente
adaptação às características de cada cultura. Fundam sua posição no argumento de que
os valores morais são variáveis no tempo e no espaço e pelo fato de que uma sociedade

3
Nesta teoria, observa Philippe Engelhard, a própria comunicabilidade das culturas é posta em causa na
medida em que, numa versão moderada, tais culturas seriam incomensuráveis, quer dizer não comparáveis.
Numa versão extrema, significa que não se pode fazer nenhum julgamento sobre qualquer cultura, sob
pretexto que cada uma está rodeada de uma opacidade que nos impede de compreender o porquê dos seus
atos e, por conseguinte, de julgar. Disponível em: <https://www.repository.utl.pt/bitstream/10400.5/1
076/1/Adelino%20Torres-Modernidade_Relativismo%20e%20Cincia.pdf > Acesso em: 03 maio 2017.

72 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Os Direitos Humanos com Alcance Universal: uma Realidade Tangível ou uma Utopia Inalcançável?

somente pode ser interpretada e julgada por suas práticas, quando se utiliza as lentes dos
próprios valores que ela elege para nortear a sua existência.
Com vistas a essa interessantíssima temática, o presente artigo tem por objetivo
contribuir para o debate por meio do estudo dos fundamentos teóricos dos direitos hu-
manos, articulando argumentos éticos e jurídicos, bem como por indicações práticas.
Para tanto, elenca as principais controvérsias e discussões existentes sobre o tema e, ao
final, concentra-se no caráter universal da categoria, que há de ser aplicável independen-
temente de realidades interculturais e da soberania dos Estados nacionais, desde que se
construa um conceito de direitos humanos ligados a uma dignidade humana interpre-
tada com efetiva densidade.

1 OS DIREITOS HUMANOS E SUA COMPLEXIDADE CONCEITUAL


Entre os diversos desafios que o estudo dos direitos humanos apresenta aos
seus pesquisadores, pode-se destacar desde logo o de sua definição – tema dos mais
complexos e controvertidos, visto que, ainda hoje, apesar de toda a literatura sobre o
mote, é objeto de polêmicas, não alcançando consenso doutrinário. Assim, malgrado
a vulgaridade do uso (ou porventura exatamente em virtude disso) o conceito não se
encontra categoricamente definido.
O problema começa pelo uso banalizado que vem se atribuindo à expressão
“direitos humanos”, empregada sem rigor técnico, mas sim para justificar qualquer
sentimento de indignação e contrariedade frente a situações de opressão, exclusão
social e injustiça, fato que contribui para o alargamento indiscriminado de sua
abrangência, passando a assumir dimensão muito mais emocional4 do que jurídica,
perdendo-se, gradativamente, a precisão sobre o seu conteúdo.
Além disso, a própria denominação do instituto é confusa, pois se usa indis-
tintamente expressões como direitos do homem, direitos inatos, direitos naturais,
direitos individuais, direitos essenciais do homem, direitos de personalidade, direitos
subjetivos públicos, direitos fundamentais, direitos humanos fundamentais, entre
outras denominações5, ora usadas como sinônimos, ora com significados diferentes,
fato que torna o estabelecimento de uma definição ainda mais complexo.
Do ponto de vista histórico, o termo “direitos do homem” (droits de l'homme)
começou a circular em francês depois de sua aparição em O contrato social (1762),
de Jean-Jacques Rousseau, embora este não os tenha definido. Já a expressão “direi-
tos humanos” apareceu pela primeira vez em 1763, significando algo semelhante a
“direito natural”. O jurista inglês William Blackstone os definiu como “a liberdade
natural da humanidade”, isto é, os “direitos absolutos do homem, considerado como

4
PÉREZ-LUÑO, Antonio Enrique, Derechos Humanos, Estado de Derecho y Constituicion. 6. ed., Madrid,
Editorial Tecnos, 1999, p. 22.
5
GARCIA BECERRA, José Antonio, Teoría de los derechos humanos, México, Universidad Autónoma de
Sinaloa, 1991, p. 11.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 73


Jean Vilbert / Vinícius Almada Mozetic

um agente livre, dotado de discernimento para distinguir o bem do mal”6. A elocu-


ção “direitos fundamentais” só surgiria muito tempo depois.
Vê-se que lidar com direitos humanos não é tarefa simples. Não há consenso
sobre a denominação e as próprias definições encontradas ao longo da história são
genéricas e abstratas, pouco contribuindo para dar clareza ao tema. Como diria
Hunt7: “os direitos humanos são difíceis de determinar porque sua definição, e na
verdade a sua própria existência, depende tanto das emoções quanto da razão”. É
importante, de toda forma, tecer uma delimitação conceitual, sob pena de o estudo
restar demasiadamente abstratizado, até mesmo desprovido de direcionamento.
Aceito o desafio, porventura o maior complicador para o estabelecimento do
conceito de direitos humanos seja a própria forma como eles são normalmente defi-
nidos pela doutrina, pois, a maior parte das formulações elaboradas mostra-se desa-
trelada ao conteúdo básico desses direitos, limitando-se a descrever os traços exter-
nos, usando exemplos de situações práticas, em prejuízo da delimitação dos seus
elementos nucleares propriamente ditos. Porventura a confusão comece quando se
afirma8 que os direitos humanos são uma categoria de direitos que os indivíduos
possuem pelo simples fato de fazerem parte da espécie humana9, sendo compartilha-
dos em condições de igualdade pelas pessoas.
Nessa mesma linha, há pesquisadores que definem os direitos humanos como
a norma mínima10 das instituições políticas, a servir de parâmetro de legitimação
para os regimes jurídicos dos Estados, fixando um último limite ao pluralismo entre
os povos. Por fim, têm-se aqueles que afirmam que os direitos humanos são aqueles
consagrados pela Declaração Universal dos Direitos Humanos11.
Como se pode observar, estas definições não esclarecem o que são direitos
humanos, restringindo-se a referir sua tarefa, função, utilidade e que os seres huma-
nos os possuem não importa o quê, devendo ser compartilhados sem discriminação
de qualquer natureza; alguns se limitam a indicar os bens jurídicos elencados na
Declaração Universal dos Direitos Humanos para apontar que os valores nela con-
signados são direitos humanos, quando, em verdade, o que se tem na espécie são
meros exemplos da categoria jurídica.
Nas palavras de Sen12:

6
HUNT, Lynn, A invenção dos Direitos Humanos: uma história, São Paulo, Companhia das Letras, 2009, p.
20-23.
7
Idem, p. 24.
8
ISHAY, Micheline, The history of human rights: from ancient times to the globalization era, California,
University of California Press, 2004, p. 03.
9
DONELLY, Jack, Universal Human Rights in Theory and Practice, 2. ed. New York, Cornell University,
2003, p. 10.
10
RAWLS, John Bordley, O direito dos povos, Tradução Luís Carlos Borges, São Paulo, Martins Fontes,
2001, p. 105.
11
PÉREZ-LUÑO, Antonio Enrique, Concepto y concepción de los derechos humanos: anotaciones a la
ponencia de Francisco Laporta, Alicante, Biblioteca Virtual Miguel de Cervantes, 2001, p. 47.
12
SEN, Amartya Kumar, Desenvolvimento como Liberdade, São Paulo, Companhia das Letras, 2000, p. 261-
263.

74 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Os Direitos Humanos com Alcance Universal: uma Realidade Tangível ou uma Utopia Inalcançável?

[...] existem três preocupações muito distintas que os críticos tendem a apresentar em
relação ao edifício intelectual dos direitos humanos. Há primeiro, o receio de que os
direitos humanos confundam consequências com sistemas normativos, que conferem
às pessoas, direitos bem definidos; com princípios pré-normativos que podem real-
mente dar a uma pessoa um direito juridicamente exigível. [...] A segunda linha críti-
ca relaciona-se à forma assumida pela ética e pela política dos direitos humanos.
Nessa concepção, direitos são pretensões que requerem deveres correlatos; se a pes-
soa A tem um direito a certo X, deve existir algum agente, digamos B, que tenha o de-
ver de fornecer X a A. Não sendo reconhecido esse dever, os direitos alegados, se-
gundo esse ponto de vista, só podem ser vazios. A terceira linha de ceticismo não as-
sume exatamente uma forma normativa e institucional, mas vê os direitos humanos
como pertencentes ao domínio da ética social. A autoridade moral dos direitos huma-
nos, por essa perspectiva, depende da natureza de éticas aceitáveis.

Considerando a insuficiência e a superficialidade destas definições, Norberto


Bobbio as denominou tautológicas13, defendendo que não há como se elaborar contor-
nos nítidos sobre o conceito de direitos humanos. A expressão “direitos do homem” é
desprovida de conteúdo e, desse modo, introduz termos avaliativos, passíveis de serem
interpretados de modo absolutamente diverso a depender da ideologia assumida pelo
intérprete. Ora, para se apontar um bem jurídico como direito humano, realiza-se um
raciocínio prévio, dentro do qual se valoram os elementos em análise, para se chegar à
conclusão de que o bem avaliado faz parte ou não desta categoria de direitos – trata-se de
verdadeiro pressuposto lógico-racional a permitir afirmar que determinado valor perten-
ce a esta categoria de direitos. Tampouco a construção da pretendida conceituação pode
se embasar em tratados, leis ou qualquer outra espécie de normatização, haja vista que o
seu conteúdo não está na regulamentação formal dos institutos, mas no conjunto de
elementos que formam estes valores.
Os direitos humanos refletem e inspiram a legislação e a sua aplicação positivista
tem se aplicado por muitas razões, cognitivas inclusive. O conceito dos direitos positiva-
dos é bem estabelecido e a linguagem dos direitos – até mesmo dos direitos humanos
– é influenciada por uma termologia positivada. Em um ensaio clássico “Há algum
direito natural?”14, publicado em 1955, por Hart15 discutiu que pessoas “falam parte

13
BOBBIO, Idem, p. 17/8.
14
HART, Herbert. L. A. Are There Any Natural Rights? The Philosophical Review, 64, April 1955,
Reimpresso por: WALDROW, Jeremy, Theories of Rights, Oxford, Oxford University Press, 1984, p. 79.
15
H. L. A. Hart was born in 1907, the son of a Jewish tailor of Polish and German descent. He was educated
at Bradford Grammar School and New College Oxford, where he obtained a brilliant first class in Classical
Greats. He practised at the Chancery Bar from 1932 to 1940 along with Richard (later Lord) Wilberforce.
During the war, being unfit for active service, he worked in MI5. During this time, his interests returned to
philosophy and in 1945 he was appointed philosophy tutor at New College. In 1952, given his chancery
background, he was persuaded by J.L. Austin to be a candidate for the Oxford chair of Jurisprudence when
Professor Arthur Goodhart resigned. He was elected and held the chair until 1969. From 1952 on he
delivered the undergraduate lectures that turned into The Concept of Law (1961). He held seminars with
Tony Honre on causation, leading to their joint work Causation in the Law (1959). His visit to Harvard in
1956-7 led to his Holmes lecture on 'Positivism and the Separation of Law and Morals' (1958) and a famous
controversy with Lon Fuller. Returning to the UK he engaged in an equally famous debate with Patrick

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 75


Jean Vilbert / Vinícius Almada Mozetic

dos seus direitos morais principalmente quando advogando sua incorporação em


um sistema normativo”16 essa é certamente uma forma na qual os direitos humanos
têm sido invocados – a defesa qualificada de Hart da ideia e utilidade para os direi-
tos humanos, neste contexto, tem sido com razão influente.
A ideia dos direitos humanos pode ser – e na verdade é – usada em muitos
contextos precipuamente jurídicos, em casos em que a legislação se encontra pro-
fundamente envolvida17. Existe, com certeza, uma conexão entre direitos humanos e
ordenamentos jurídicos. Na verdade, a legislação pode e frequentemente de maneira
eficiente, ajudar a promover exigências éticas que incidem nos direitos humanos18.

(later Lord) Devlin on the limits within which the criminal law should try to enforce morality.Hart published
two books on the subject, Law, Liberty and Morality (1963) and The Morality of the Criminal Law (1965).
A wider interest in criminal law, stimulated by Rupert (later Professor Sir Rupert) Cross was signalled by
his 'Prolegomenon to the Principles of Punishment' (1959). Hart resigned his chair in 1969, to be succeeded
by Ronald Dworkin, a severe critic of his legal philosophy. He now devoted himself mainly to the study of
Bentham, whom, along with Kelsen, he regarded as the most important legal philosopher of modern times.
Disponível em: <http://www.oxfordchabad.org/>. Acesso em: 06 nov. 2019.
16
A teoria de Hart é fundamentada na existência de uma regra de conhecimento. Esta seria a aceitação por
parte da sociedade que determinada regra jurídica existe em função de determinada prática social. Esta seria
uma das condições de validade e seria diferente em cada sistema jurídico, justificando a fundamentação
nela. A teoria Hartiana ainda propõe o conceito de predigree, seria se a norma tem reconhecimento de
validez social de acordo com a regra de conhecimento, porque é desta que todas as outras normas derivam.
Os juízes aceitam a regra de conhecimento de Hart quando aplicam o direito válido, mas como definir isto
não ficou claramente explicado, parece que se baseia apenas na vontade do juiz em acatar ou não a regra de
conhecimento. Para Hart o direito normatizado deve responder a todas as questões juridicamente suscitadas.
Se não puder resolver, o magistrado usa seu poder discricionário e cria o direito aplicável ao caso. Esta
criação, na visão de Hart, seria oriunda de uma fonte externa e alheia ao Direito. Essa liberdade de criação é
muito criticada na teoria de Hart e justamente neste ponto a teoria do Ronald Dworkin surge como forma de
resgate do direito no sentido de trazer de volta seu conteúdo de alcance às normas não positivadas, através
da compreensão que existem princípios e dentre a análise destes é que deve surgir o direito a ser aplicado,
estando a solução interna ao direito. HART, Herbert L. A. Positivism and the Separation of Law and
Morals, Harvard Law Review, v. 71, 1958, p. 593. Disponível em: <http://jusvi.com/artigos/16347>.
Acesso em: 06 nov. 2010.
17
Os direitos e deveres jurídicos são o ponto em que o direito, com os seus recursos coercitivos,
respectivamente protege a liberdade individual e a restringe, ou confere aos indivíduos, ou lhes nega, o
poder de eles próprios, recorrerem ao aparelho coercitivo do direito. Assim, quer as leis sejam moralmente
boas ou más, justas ou injustas; os direitos e os deveres requerem atenção com pontos focais nas atuações
do direito, que se revestem de importância fundamental para os seres humanos, e isto independentemente
dos méritos morais do direito. HART, Herbert L.A. O Conceito de Direito, 2. ed. Lisboa, Fundação
Calouste Gulbenkian, 1996, p. 331-333.
18
A Constituição da República Federativa do Brasil, em seu art. 5º, § 2º, estabelece que: “Os direitos e
garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela
adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”. Assim, os
tratados de direitos humanos aprovados em 2 turnos, por 3/5 dos membros da Câmara dos Deputados e do
Senado Federal, terão status de norma constitucional, passando a integrar o bloco de constitucionalidade.
Porém, os tratados de direitos humanos não aprovados com o quórum qualificado (a exemplo do Pacto San
José da Costa Rica), terão caráter supralegal – estão acima das leis (paralisam toda a legislação
infraconstitucional contrária). Segundo decidiu o Supremo Tribunal Federal (RE 466.343 e Súmula
Vinculante n. 25). O Min. Celso de Mello, isoladamente, vem decidindo que os tratados internacionais de
direitos humanos ingressam sempre como norma constitucional, independentemente do quórum de
aprovação.

76 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Os Direitos Humanos com Alcance Universal: uma Realidade Tangível ou uma Utopia Inalcançável?

A sociedade civil e Organizações Não Governamentais têm estado intensamente


envolvidas em promover legislações mais humanitárias – exigindo atuação do Esta-
do e do seu desenfreado poder legiferante. Reconhece-se que a luta – causa ética dos
direitos humanos – pode avançar por meio de uma melhor aplicação legislativa
(preferível a exigir uma nova legislação, na maioria das vezes). Mas há muito mais
na abordagem dos direitos humanos do que isto19. Sen observa que:

A abordagem dos direitos deve ser acompanhada primeiramente por uma perspectiva
relacionada à lei? Trabalhando tanto por uma legislação já estabelecida, ou exigin-
do-se uma nova legislação (...) ou por último, pensando em termos de uma legislação
ideal? Eu discutiria contra a adequação de uma abordagem de direitos baseados de
um jeito ou de outro, ao redor de uma legislação atual, proposta ou imaginada. Nós
podemos fazer mais do que restringir nossos princípios orientadores para ideias posi-
tivas, ou pré-positivas ou ideal-positivas20.

O certo é que grande parte das ações de legislação e convenções (como a


“Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos Humanos e Liberdades Funda-
mentais”)21 tem clara inspiração na crença de alguns direitos são preexistentes, inde-
pendendo de questões normativas. Na Declaração Americana da Independência em
1776 se assentou que todos são os homens dotados pelo seu criador com certos “di-
reitos inalienáveis”. Treze anos depois, em 1789, a Declaração Francesa dos “direi-
tos do homem”22 afirmou que os homens nascem e permanecem livres e com direitos
iguais. Essas são claramente exigências pré-legais – para estarem refletidas na lei.
Tanto que, ressalvada a gradativa e necessária expansão de seu conceito, não se
19
SEN, Amartya Kumar, Venice Academy of Human Rights, Veneza, 15 jul. 2010.
20
SEN, Op. cit., p. 263.
21
Adotada pelo Conselho da Europa em 04.11.1950 e entrou em vigor em 1953. A Convenção instituiu dois
órgãos para zelar pela sua aplicação e efetividade, um de natureza jurisdicional, no caso a Corte Europeia de
Direitos Humanos, outro de natureza executiva e mesmo deliberativo-normativa, o Comitê de Ministros do
Conselho da Europa.
22
Usualmente, para determinar a origem da declaração no plano histórico, é costume remontar à Déclaration
des droits de l’homme et du citoyen, votada pela Assembleia Nacional francesa em 1789, na qual se
proclamava a liberdade e a igualdade nos direitos de todos os homens, reivindicavam-se os seus direitos
naturais e imprescritíveis (a liberdade, a propriedade, a segurança, a resistência à opressão), em vista dos
quais se constitui toda a associação política legítima. Na realidade, a Déclaration tinha dois grandes
precedentes: os Bills of rights de muitas colônias americanas que se rebelaram em 1776 contra o domínio da
Inglaterra e o Bill of right inglês, que consagrava a gloriosa Revolução de 1689. Do ponto de vista
conceptual, não existem diferenças substanciais entre a Déclaration francesa e os Bills americanos, dado
que todos amadureceram no mesmo clima cultural dominado pelo jusnaturalismo e pelo contratualismo: os
homens têm direitos naturais anteriores à formação da sociedade, direitos que o Estado deve reconhecer e
garantir como direitos do cidadão. Bastante diverso é o Bill inglês, uma vez que nele não são reconhecidos
os direitos do homem e sim os direitos tradicionais e consuetudinários do cidadão inglês, fundada na
Common Law. Durante a Revolução Francesa foram proclamadas outras Déclarations (1793, 1795):
interessante a de 1793 pelo seu caráter menos individualista e mais social em nome da fraternidade, e a de
1795, porque ao lado dos “direitos” são precisados também os “deveres”, antecipando assim uma tendência
que tomará corpo no século XIX (podemos pensar nos Doveri delI’uomo, de Mazzini); a própria
Constituição italiana tem como título da primeira parte “Direito e deveres do cidadão”. Disponível em:
<http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=100515>. Acesso em: 28 fev. 2020

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 77


Jean Vilbert / Vinícius Almada Mozetic

conhece hoje em dia qualquer Estado, seja qual for a ideologia que o norteie, que
não afirme, pomposamente, em seu estatuto político, o respeito por esses direitos23.
Para Francisco Laporta24 é justamente esta característica que coloca os direi-
tos humanos fora do âmbito do sistema jurídico positivo, pois não se está tratando de
um conjunto de direitos que uns possuem e outros não, de acordo com o cumprimen-
to dos requisitos do ordenamento jurídico ao qual estão vinculados. Ao se falar em
direitos humanos, portanto, está-se a se falar em formulações éticas, não jurídicas.

2 ARGUMENTOS ÉTICOS QUE FUNDAMENTAM OS DIREITOS


HUMANOS
A ética, por sua própria natureza, permite a construção de paradigmas que podem
ser utilizados para se reconhecer os elementos que formam o núcleo dos direitos huma-
nos, independentemente da cultura em que se estejam inseridos. Na ideia da Justiça de
Amartya Sen25:

Direitos humanos são melhores vistos como articulações de um compromisso nas éticas
sociais, comparável a – mas muito diferente de – aceitar um raciocínio utilitarista. Como
outros princípios, direitos humanos podem, com certeza, ser contestados, mas a exigência
é que eles sobrevivam abertos ao público. Seja qual for a universalidade que estas exigên-
cias têm [...] são dependentes da oportunidade de discussões livres.

Mas de que forma seria possível desenvolver argumentos éticos para conceituar
os direitos humanos, diante da diversidade cultural e moral existente na sociedade con-
temporânea?
Este aparente entrave é dissipado quando se estabelece uma clara distinção
entre os sentidos das palavras ética e moral, compreendendo-se a conotação que o
fundamento ético representa nesta construção conceitual. A ética, como uma área da
filosofia, é a ciência da conduta humana26 que tem por objeto de estudo as ações
humanas. A moral, por sua vez, é o objeto de estudo da ética, pois se caracteriza
como o conjunto de normas de conduta ou de costumes que são adotadas por certo
grupo social27. Nesse contexto, cabe à ética discutir as diversas morais, buscando
estabelecer uma forma mais ampla do comportamento humano, extraindo dos fatos
morais e fundamentos comuns a eles aplicáveis28.
Como exemplo desta heterogeneidade podemos citar a moral cristã, a moral
judaica, a moral islâmica, entre outras, que estabelecem, de diferentes formas, valo-
res utilizados como diretrizes de conduta para as sociedades que as adotam. Dentro

23
SEN, Amartya Kumar, Venice Academy of Human Rights, Veneza, 15 jul. 2010.
24
LAPORTA, Francisco J. Sobre el concepto de derechos humanos, Alicante, Biblioteca Virtual Miguel de
Cervantes, 2005, p. 32.
25
SEN, Amartya Kumar, Desenvolvimento como Liberdade, São Paulo, Companhia das Letras, 2000.
26
ARISTÓTELES, Ética a Nicômaco, Tradução Edson Bini, 2. ed, São Paulo, Edipro, 2007, p. 34.
27
NALINI, José Renato, Ética geral e profissional, 2, ed, São Paulo, Revista dos Tribunais, 1999, p. 73.
28
GUISÁN, Esperanza, Introdución a la ética, Madri, Cátedra, 1995, p. 34.

78 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Os Direitos Humanos com Alcance Universal: uma Realidade Tangível ou uma Utopia Inalcançável?

desta diversidade axiológica, compete à ética desenvolver uma análise das diversas
morais, encontrando pontos de interligação e de contato entre elas, constituindo e
elaborando suas críticas.
Por todos estes elementos, é que o uso da fundamentação ética se mostra tão
apropriada para a elaboração de uma definição de direitos humanos29, pois, sua
capacidade de diálogo com as diversas morais facilita a aproximação intercultural e
o estabelecimento de valores universais que formam o núcleo conceitual desta cate-
goria de direitos, afastando-se, com o seu uso, o risco de sua inaplicabilidade em
certos contextos culturais.

2.1 A Fundamentação da Dignidade Humana


A análise das inúmeras teorias que atualmente buscam fundamentar a classe
dos direitos humanos30 evidencia que todas elas relacionam, por diferentes cami-
nhos, formas de realização da dignidade humana31, pondo em relevo que é este o
elemento ético nuclear desta classe de direitos32. No próprio preâmbulo da Declara-
ção Universal de Direitos Humanos da ONU o reconhecimento da dignidade ineren-
te a todos os membros da família humana como fundamento da liberdade, da justiça
e da paz no mundo33, ou seja, estruturado na totalidade dos direitos ali declarados.
Este alicerce valorativo é facilmente verificável, visto que não se consegue conceber
um bem jurídico ao qual queira se atribuir o status de direitos humanos que não
tenha por base a dignidade humana. Para Kant34 (1980, p. 134-141 apud BAEZ
2012, p. 9): “a dignidade humana é uma qualidade congênita e inalienável de todos
os seres humanos, o qual impede a sua coisificação”, se materializa através da capa-
cidade de autodeterminação que os indivíduos possuem por meio da razão.
Já para Dworkin35:

Este atributo, contudo, é também reconhecido aos indivíduos desprovidos de condi-


ções de se autogerirem, como, por exemplo, as crianças de tenra idade e as pessoas
que sofrem de problemas mentais, uma vez que também eles possuem o direito de re-
ceberem um tratamento digno por sua existência.

29
BIDART CAMPOS, Germán J. Teoria General de los Derechos Humanos, México, UNAM, 1993, p. 82.
30
BAEZ, Narciso Leandro Xavier; BARRETTO, Vicente, Direitos Humanos e Globalização, in _______,
(Orgs). Direitos Humanos em Evolução, Joaçaba, Unoesc, 2007, p. 18.
31
Opta-se pelo uso da expressão dignidade humana, por representar abstratamente um atributo reconhecido à
humanidade como um todo, evitando-se, com isso, o uso da expressão dignidade da pessoa humana, por
estar associado ao atributo de uma pessoa, individualmente considerada. Utiliza-se, por conseguinte, a
mesma distinção feita por Ingo Sarlet, (SARLET, Ingo, Dignidade da Pessoa Humana e Direitos
Fundamentais na Constituição Federal de 1988, Porto Alegre, Livraria do Advogado, 2001, p. 38.).
32
FERNANDEZ, Eusébio, Teoria de la Justicia y Derechos Humanos, Madrid, Debate, 1991, p. 78.
33
KANT, Immanuel, Declaración Universal de Los Derechos Humanos, Versión Comentada, México, DF,
Aministia Internacional – Seccion México, 1998, p. 23.
34
KANT, Immanuel, Fundamentação da Metafísica dos Costumes, in Os pensadores – Kant (II), Tradução
Paulo Quintela, São Paulo, Abril Cultural, 1980, p. 134-141.
35
DWORKIN, Ronald, O domínio da vida: aborto, eutanásia e liberdades individuais, Tradução Jerferson
Luiz Camargo, São Paulo, Martins Fontes, 2003, p. 309-310.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 79


Jean Vilbert / Vinícius Almada Mozetic

Segundo Baez (2012)36:


Autores como Croce37 e Luño38, atribuem um conteúdo crescente e variável ao con-
ceito da dignidade humana, pois entendem que ela é delimitada dentro de cada mo-
mento histórico, tendo como norte as necessidades humanas externadas pelos valores
morais adotados por cada sociedade.

É certo que a mesma dificuldade de delimitação conceitual encontrada quanto


aos direitos humanos pode ser estendida para a categorização da dignidade humana
– até mesmo considerando o quão entrelaçados estão os conceitos: os direitos huma-
nos densificam a dignidade, ao passo que esta é o núcleo daqueles. Cabe reconhecer,
portanto, que a formulação aqui proposta só tem efeito se a dignidade humana for
compreendida por meio de uma categorização que não elasteça o seu âmbito, sendo
entendida como a qualidade inerente à pessoa humana – elemento que diferente do
ser humano de coisas ou de outros animais, impedindo que seja tratado como meio
para qualquer fim.
Adotada essa posição, o domínio da dignidade humana e, por consequência,
dos direitos fundamentais, passa a ser preenchido apenas pelos direitos existenciais,
de modo que as demais condições de vida, não raro importantíssimas à felicidade
humana, sejam reguladas, se for o caso, pelo “direito ordinário”, ou mesmo hão de
ser deixadas ao campo da autonomia privada – reconhecendo-se que há grande difi-
culdade em divisar qual a extensão do “núcleo básico” e rememorando que o campo
dos direitos é naturalmente marcado por deslocamentos, movimentos de ida e vinda,
buscando-se o equilíbrio (como a sociedade, o direito está sempre em movimento,
acompanhando-a).
Assim, ainda que não seja objetivo deste trabalho enumerar neste momento
quais direitos efetivamente compõem o núcleo da dignidade humana, é certo que
para se levar a teoria dos direitos humanos a sério, e para se pretender sua efetiva
concretização e difusão global (ainda que sua existência independa delas), é preciso
assentar a necessidade de se traçar uma linha mais clara do que é a dignidade huma-
na e quais são seus caracteres.
De modo ilustrativo, nas palavras de Sarlet39, a dignidade humana é ao mes-
mo tempo limite e tarefa dos poderes estatais e da comunidade em geral. Como
limite implica na impossibilidade de se reduzir qualquer ser humano à condição de

36
BAEZ, Narciso Leandro Xavier, Teoria da dupla dimensão dos direitos humanos e sua utilidade prática para
a solução de hard cases envolvendo a violação de direitos fundamentais. Disponível em:
<http://www.publicadireito.com.br/artigos/?cod=123b7f02433572a0> . Acesso em: 29 fev. 2020.
37
CROCE, Benedetto, Declarações de Direitos, 2. ed. Brasília, Senado Federal, Centro de Estudos
Estratégicos, Ministério da Ciência e Tecnologia, 2002, p. 17-19.
38
PÉREZ-LUÑO, Antônio Enrique, Derechos humanos em la sociedade democratica, Madrid, Tecnos, 1984,
p. 48.
39
SARLET, Ingo Wolfgang, As dimensões da dignidade da pessoa humana: construindo uma compreensão
jurídico-constitucional necessária e possível, in SARLET, Ingo Wolfgang, (Org.), Dimensões da dignidade,
ensaios de filosofia do direito e direito constitucional, Porto Alegre, Livraria do Advogado, 2009, p. 32.

80 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Os Direitos Humanos com Alcance Universal: uma Realidade Tangível ou uma Utopia Inalcançável?

objeto; é fonte emanadora de direitos fundamentais contra atos que a ameacem ou


violem. Como tarefa, enseja deveres concretos de proteção por parte dos órgãos
estatais. Pode-se dizer também que a dignidade “não é uma criação constitucional,
pois ela é um desses conceitos a priori” – “um dado preexistente a toda experiência
especulativa, tal como a própria pessoa humana”40. De todo modo, exerce relevante
papel na arquitetura constitucional: o de fonte jurídico-positiva dos direitos funda-
mentais, sendo o valor que dá unidade e coerência a eles. Os direitos fundamentais
(derivação interna dos direitos humanos) são, nesse sentido, uma primeira concreti-
zação da dignidade41.
Aliás, segundo observa Bonavides42, abordado o vocábulo “fundamental” em
seu significado lexical tem-se o que serve de fundamento, o que é necessário, essen-
cial, definição que não difere do sentido na esfera jurídica. Logo, direito fundamen-
tal “é o mínimo necessário para a existência da vida humana”43, considerada em seu
vértice vida digna, “porque todas as pessoas têm algumas necessidades fundamen-
tais que precisam ser atendidas para que elas possam sobreviver e para que mante-
nham sua dignidade”44. Então, apesar da crítica de Canotilho, para quem reduzir o
campo dos direitos humanos ao âmbito da dignidade humana é restringir suas possi-
bilidades de conteúdo ‒ parece acertado compreender que são direitos humanos os
que se ligam de maneira intrínseca à dignidade humana, conjunto de dados que re-
presenta uma qualidade própria do indivíduo, demandando o respeito por sua vida,
liberdade e integridade física e moral, sob pena da coisificação do ser humano: um
direito somente será humano quando contiver em seu bojo valores éticos que repre-
sentem formas de realização da dignidade humana45.
Por fim, é certo que, por suas características, a dignidade humana não depen-
de de reconhecimento jurídico para existir46, tratando-se de bem inato e ético, que se
coloca acima, inclusive, das especificidades culturais e suas diversas morais, visto
que tem a capacidade de persistir mesmo dentro daquelas sociedades que não a res-
peitam – sua violação evidencia afronta a capacidade de autodeterminação do ser
humano e de sua própria condição de ser livre.

40
SILVA, José Afonso da, A dignidade da pessoa humana como valor supremo da democracia, Revista de
Direito Administrativo, v. 212, p. 84-94, abr./jun. 1998.
41
FARIAS, Edilsom Pereira de, Colisão de direitos: a honra, a intimidade, a vida privada e a imagem versus a
liberdade de expressão e informação, Porto Alegre, Sergio Antonio Fabris, 1996, p. 54
42
BONAVIDES, Paulo, Curso de direito constitucional positivo, 9. ed, São Paulo, Malheiros, 1999.
43
BREGA FILHO, Vladimir, Direitos fundamentais na Constituição de 1988: conteúdo jurídico das
expressões, São Paulo, Juarez de Oliveira, 2002, p. 66.
44
DALLARI, Dalmo de Abreu, O que são direitos da pessoa, 10 ed, São Paulo, Brasiliense, 1994, p. 07.
45
BAEZ, Narciso Leandro Xavier, Dimensões de aplicação e efetividade dos direitos humanos, in Anais do
XIX congresso nacional do Conpedi, Florianópolis, 2010, p. 7120-7134.
46
MARTINEZ, Miguel Angel Alegre, La dignidad de la persona como fundamento del ordenamiento
constitucional español, León, Universidad de León, 1996, p. 21.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 81


Jean Vilbert / Vinícius Almada Mozetic

2.2 Os Níveis de Compreensão da Dignidade Humana


É possível compreender a dignidade humana a partir de algumas teorias (...)
por exemplo, de Kant, Croce e Luño. Para Baez (2012):

[...] quando subdividida em dois níveis: 1) no primeiro, aqui denominado de dimen-


são básica, encontram-se os bens jurídicos básicos e essenciais para a existência hu-
mana, os quais são necessários para o exercício da autodeterminação de cada indiví-
duo, impedindo a sua coisificação (engloba a teoria de Kant); 2) no segundo, deno-
minado neste artigo de dimensão cultural, estão inseridos os valores que variam no
tempo e no espaço, os quais buscam atender as demandas sociais de cada tempo, em
cada sociedade (abarca as teorias de Benedetto Croce47 e Pérez-Luño).

Estruturadas estas premissas, pode-se afirmar que a dimensão básica da dig-


nidade humana é universal, ou seja, tem de ser observada em qualquer cultura, pois
representa justamente uma qualidade própria do indivíduo48, a demandar o respeito
por sua vida, liberdade e integridade física e moral49. Por tais motivos, sua violação
é facilmente constatada, pois estará caracterizada em qualquer situação em que uma
pessoa venha a sofrer a redução de seu status de sujeito de direitos.
Já quanto à dimensão cultural, representa as formas e condições com que a
dignidade humana, em sua dimensão básica, é implementada em cada grupo social
ao longo da história. Neste nível de análise, abre-se espaço para as peculiaridades
culturais e suas práticas, pois se busca uma compreensão ética das finalidades de
cada grupo-social, a fim de se construir significados que tenham capacidade de se-
rem entendidos interculturalmente50.
Dentro desse quadro, ao se entenderem os direitos humanos como o conjunto
de valores éticos que buscam proteger, garantir e realizar a dignidade humana em
suas duas dimensões, vislumbra-se, como consequência lógica, a concepção de dois
níveis de atuação dessa classe de direitos. O primeiro nível engloba os direitos hu-
manos que visam proteger a dimensão básica da dignidade humana, ou seja, aqueles
que buscam preservar os bens jurídicos básicos e essenciais à existência humana, os

47
Como líder nacional de um movimento cultural, Benedetto Croce atingiu uma geração de intelectuais
italianos e tornou-se uma figura reconhecida internacionalmente, tanto por suas contribuições no âmbito da
estética, quanto por sua teoria da história, fundamento de sua teoria política. SCHLESENER, Anita Helena,
O Pensamento político de croce: o modelo liberal. Sociedade e Estado, Brasília, v. 22, n. 1, p. 71-96,
jan./abr 2007. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/se/v22n1/v22n1a04.pdf> Acesso em: 29 fev. 2020.
48
“Gente é tudo igual. Tudo igual. Mesmo tendo cada um a sua diferença. Gente não muda. Muda o
invólucro. O miolo, igual. Gente quer ser feliz, tem medos, esperanças e esperas. Que cada qual vive a seu
modo. Lida com as agonias de um jeito único, só seu. Mas o sofrimento é sofrido igual. A alegria, sente-se
igual” (ROCHA, Carmem Lúcia, Antunes, Direito de todos e para todos, Belo Horizonte, Fórum, 2004, p.
13).
49
SARLET, Ingo Wolfgang, As dimensões da dignidade da pessoa humana: construindo uma compreensão
jurídico-constitucional necessária e possível, in ____. (Org.), Dimensões da dignidade: ensaios de filosofia
do direito e direito constitucional, Porto Alegre, Livraria do Advogado, 2005, p. 37.
50
HÖFFE, Otfried, A democracia no mundo de hoje, Tradução Tito Lívio Cruz Romão, São Paulo, Martins
Fontes, 2005, p. 77-78.

82 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Os Direitos Humanos com Alcance Universal: uma Realidade Tangível ou uma Utopia Inalcançável?

quais são necessários para o exercício da autodeterminação de cada indivíduo, im-


pedindo a sua coisificação. O segundo nível de proteção inclui a dimensão cultural
da dignidade humana, ou seja, busca assegurar novos bens jurídicos que vem sur-
gindo e se ampliando no tempo e no espaço, de acordo com as peculiaridades, avan-
ços e demandas de cada sociedade.
Como refere Andrade51, alguns direitos constituem explicitações de primeiro
grau da ideia de dignidade, que modela todo o conteúdo deles: vida, identidade e
integridade pessoal, liberdade física e de consciência, por exemplo, tal como a gene-
ralidade dos direitos pessoais. Estes são atributos jurídicos essenciais da dignidade
dos homens concretos. Porém, há outros direitos que decorrem desse conjunto de
direitos fundamentalíssimos, completando-os como explicitações de segundo grau,
mediadas pela particularidade das circunstâncias sociais e econômicas, políticas e ideo-
lógicas, dependendo de opções políticas estruturais: direito de resposta, direitos trabalhis-
tas, habitação, saúde, seguridade social, cultura.
Como decorrência, o conjunto de direitos humanos que protege a dignidade hu-
mana em sua dimensão básica é, por natureza, universal, pois permeia todos os níveis
legislativos e culturais para definir que cada ser humano tem direito de acessar os bens
básicos e essenciais para sua existência, como a vida, a liberdade e a integridade física e
moral, impedindo que o indivíduo venha a perder sua característica humana de ser um
fim em si mesmo, tornando-se um mero instrumento ou coisa.
Por outro lado, os direitos humanos que envolvem a dignidade humana em sua
dimensão cultural estão sujeitos às variações nas formas e condições com que são im-
plementados em cada sociedade, já que se destinam a atender a demandas sociais surgi-
das ao longo da história. É exatamente neste nível de proteção que os direitos humanos
não são estáticos, mas constituem uma espécie que está em permanente processo de
construção e reconstrução52.
Por tais motivos, deve-se admitir na segunda dimensão de proteção dos direitos
humanos a ocorrência de diferentes práticas culturais, muitas vezes antagônicas entre si,
que podem ser perfeitamente conciliadas por meio de um diálogo intercultural53, estabe-
lecido por critérios éticos capazes de demonstrar que certos costumes representam a
dimensão cultural da dignidade de cada indivíduo e devem ser respeitados, observando-
se sempre o limite no sentido de não reduzir a pessoa a mero instrumento ou objeto.

3 DA UNIVERSALIDADE DOS DIREITOS HUMANOS


Como ficou claro na análise dos itens anteriores, o tratamento dado aos direi-
tos humanos pode sofrer diferenças profundas a depender da adoção de uma das
linhas de pensamento em embate. Trata-se de questão de imensa magnitude. Os

51
ANDRADE, José Carlos Vieira de, Os direitos fundamentais na constituição portuguesa de 1976, 2. ed.
Coimbra,Almedina, 2001, p. 98-99.
52
ARENDT, Hannah, Origens do Totalitarismo, Tradução Roberto Raposo, Rio de Janeiro, Companhia das
Letras, 2004, p. 332-333.
53
HÖFFE, Otfried, Derecho Intercultural, Tradução de Rafael Sevilla, Barcelona, Gedisa, 2000, p. 174.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 83


Jean Vilbert / Vinícius Almada Mozetic

naturalistas (jusnaturalistas ou universalistas), por exemplo, veem os direitos huma-


nos como naturais ao homem, decorrentes de sua própria condição humana, inde-
pendentemente de tempo e espaço. Já os historicistas (positivistas ou relativistas),
por sua vez, abordam tais direitos como construções sociais, temporárias e mutáveis,
limitadas no tempo e no espaço.
Se tomada a doutrina naturalista54, os direitos humanos são a manifestação
das condições básicas e inafastáveis a que todo ser humano faz jus, devendo ser
respeitadas independentemente da sociedade ou do governo a que está adstrito o
indivíduo: são os direitos que todo e qualquer homem possui pelo tão só fato de sua
humanidade, isto é, decorrentes de sua própria natureza e pela dignidade que a ela é
inerente.
Já se adotada a doutrina historicista55 ou relativista, os direitos humanos são
conquistas sociais hauridas pelo homem no decorrer dos tempos, variando de época
para época e de Estado para Estado, pois dependem do reconhecimento social e,
principalmente, estatal, além de deverem respeitar a cultura de cada nação.
Quanto aos argumentos, para a corrente naturalista, alguns preceitos são pre-
existentes a qualquer ordenamento jurídico, acompanhando o homem em sua exis-
tência. Bastiat, à guisa de exemplo, assevera que “a vida, a liberdade e a proprieda-
de não existem pelo simples fato de os homens terem feito leis. Ao contrário, foi pelo
fato de a vida, a liberdade e a propriedade existirem antes que os homens foram
levados a fazer as leis”56. No mesmo sentido, ao analisar a obra de Locke, Pallieri
adverte que o homem não pode renunciar à sua qualidade humana e àquilo que a
caracteriza (a liberdade e a igualdade) ou que está intimamente ligado a ela (a pro-
priedade). Essas exigências humanas fundamentais devem ser necessariamente res-
peitadas pelo Estado em seu nascedouro e, depois de instalado, em seu funciona-
mento concreto57.

54
A doutrina do Direito Natural nasceu na Grécia Antiga. Entre os primeiros a defenderem esta concepção
estão o filósofo Heráclito de Éfeso (535-470 a. C.) e o escritor Sófocles (494-406 a. C.). Este último, em sua
famosa tragédia Antígona, formulou pela primeira vez a questão central que envolve a doutrina do Direito
Natural: existe um direito superior à legislação positiva estabelecida pela vontade do soberano. BEDIN,
Gilmar Antonio, A Doutrina Jusnaturalista ou do Direito Natural: Uma Introdução, Disponível em:
<https://www.revistas.unijui.edu.br/index.php/revistadireitoemdebate> Acesso em: 28 fev. 2020, p. 245
55
Esse historicismo anti-iluminista, típico do início do século XIX, adquiriu especial evidência com o
desenvolvimento da escola histórica de Gustav Hugo, que redirecionou os esforços dos juristas germânicos
para o estudo dos textos romanos e dos direitos consuetudinários. Porém, o principal representante dessas
correntes foi Wilhelm von Savigny, que desde sua grande obra da juventude (a Metodologia Jurídica, de
1802), tentou equacionar o respeito ao direito positivo com as necessidades históricas e sistemáticas. Sobre
a escola histórica, vide Hespanha, Panorama histórico da cultura jurídica europeia, pp. 179 e ss. in COSTA,
Alexandre Araújo, Do historicismo ao conceitualismo, Savigny. Disponível em: <http://www.arcos.org.br/li
vros/hermeneutica-juridica/capitulo-iii-o-positivismo-normativista/2-do-historicismo-ao-conceitualismo-
savigny#_ftn1> Acesso em: 28 fev. 2020.
56
BASTIAT, Fréderic, A lei, [Tradução de Ronaldo Da Silva Legey], 3. ed, Rio de Janeiro, Instituto Liberal,
2010, p. 11.
57
PALLIERI, Giorgio Balladore, A doutrina do Estado, v. 1 [tradução Fernando de Miranda] Coimbra,
Coimbra, 1969, p. 61-62.

84 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Os Direitos Humanos com Alcance Universal: uma Realidade Tangível ou uma Utopia Inalcançável?

Ocorre que, como anotado, não são poucos os pensadores que criticam a vi-
são de direitos naturais do homem. Ilustrativamente, Bobbio58 brada que a tarefa
mais urgente destes tempos é a efetivação dos direitos, não sua conceituação. Ainda
assim, afirma que a ideia de que tais direitos caberiam ao homem enquanto homem é
meramente tautológica, podendo levar ao desacerto de se pensar existirem direitos
essenciais e eternos. Historicista que é, entende que os direitos humanos não são
produto da natureza, mas da civilização humana: são direitos históricos e mutáveis,
amplamente suscetíveis de transformação, ampliação e eventual redução.
Mais recentemente, Sarlet59, embora reconheça a existência de direitos on-
tologicamente colimados ao homem, liga a proteção dos direitos fundamentais ao
surgimento do moderno Estado constitucional, assentando que ambas as incidên-
cias são fruto de lutas sociais contra os arbítrios estatais. Afirma que “os direitos
fundamentais são, acima de tudo, fruto de reivindicações concretas, geradas por
situações de injustiça e/ou de agressão a bens fundamentais e elementares do ser
humano”60.
Esposando posição intermediária, Canotilho61 defende que os direitos hu-
manos são aqueles válidos para todos os povos, em todos os tempos (dimensão
jusnaturalista-universalista); já os direitos fundamentais são aqueles limitados no
tempo e no espaço (dimensão jurídico-institucionalista). Os direitos humanos ligar-
se-iam à própria natureza humana – daí o seu caráter inviolável, intemporal e uni-
versal; os direitos fundamentais, em outro viés, estariam objetivamente vigentes em
uma ordem jurídica concreta.
Ao que se percebe neste ponto do debate, mesmo que adotada uma posição
historicista, a noção de que um certo grau (maior ou menor) de universalidade aos
direitos humanos é quase uma premissa no pensamento jurídico contemporâneo:
sejam os direitos humanos (aqueles ligados ao primeiro grau da dignidade humana)
declarados ou constituídos no decorrer dos tempos, há notável uniformidade doutri-
nária na defesa de que são conquistas do homem e que devem ser estendidas (con-
cretização) pelo globo terrestre. Mas isso é factível? Afinal, já se tenta alcançar tal
arquétipo há séculos.
A Declaração dos Direitos do Homem de 178962, por exemplo, é o prenúncio
da emancipação humana: a humanidade, uma invenção da Modernidade, nunca antes

58
BOBBIO, Norberto, A Era dos Direitos, Tradução de Carlos Nelson Coutinho, 10. ed, Rio de Janeiro,
Campus, 2004.
59
SARLET, Ingo Wolfgang, A eficácia dos direitos fundamentais, 10. ed. Porto Alegre, Livraria do
Advogado, 2010, p. 36 e 52.
60
“A história da humanidade parece revelar a existência de conjuntos de direitos fundamentais com diferentes
conteúdos, eficácias e titulares. Tratou-se de um reconhecimento mais ou menos progressivo, marcado, em
cada época pelo contexto histórico subjacente” (CASTILHO, Ricardo, Direitos Humanos, 2. ed, São Paulo,
Saraiva, 2013, p. 175).
61
CANOTILHO, José Joaquim Gomes, Direito constitucional e teoria da constituição, 5. ed. Coimbra,
Almedina, 2002, p. 369.
62
A declaração dos direitos colocou diversos problemas, que são a um tempo políticos e conceptuais. Antes
de tudo, a relação entre a declaração e a Constituição, entre a enunciação de grandes princípios de direito

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 85


Jean Vilbert / Vinícius Almada Mozetic

fora sujeito de direitos. Doravante o homem se torna a fonte de toda lei, não está
mais sujeito a preceitos divinos ou provenientes da tradição; passa a ser dotado de
direitos pela singela condição de ser humano.
Acontece que uma década depois da Revolução Francesa, a ditadura militar
de Napoleão Bonaparte ascenderia ao poder (1799). Pior: o raiar do Século XX
traria consigo a Primeira Guerra Mundial. E quando o mundo ainda se recuperava de
seus efeitos (ou os sentia pelo Tratado de Versalhes), teve vez a Segunda Grande
Guerra, de proporções jamais vistas. O que viria a seguir seria um mundo estarrecido
diante da revelação de sucessivos holocaustos, em sua generalidade realizados sob
os auspícios da uma legislação alemã considerada uma das mais humanitárias do
mundo à época.
É nesse mar de incertezas que se apresenta a questão prática mais relevante:
os direitos humanos têm condições concretas de alcançar uma real universalidade?
3.1 Uma Utopia Inalcançável
Para muitos, a universalidade dos direitos humanos não passa de uma utopia
inalcançável. Alguns autores são emblemáticos em suas críticas a tal pretensão de
universalidade. O pensador anglo-irlandês Edmund Burke, por exemplo, como
membro do Parlamento entre 1765 e 1780, foi um engajado defensor do liberalismo.
Porém, em vez de se entusiasmar com a Revolução Francesa, como tantos liberais da
época, insurgiu-se com veemência contra o episódio63.
Segundo o entendimento de Burke, os revolucionários franceses seguiam
uma política metafísica, como “especuladores” ‒ a especulação é a crença de que a
política, a arte do possível, deve ser guiada pela teoria, por receitas filosóficas, por
algum plano concebido pela razão. “Mas essa é a maior tolice”: nenhum aspecto da
política pode ser concebido em abstrato. O ponto de vista do absoluto, do universal,
do imutável (campo da teoria) cega o político diante das realidades do particular e

natural, evidentes à razão, e à concreta organização do poder por meio do direito positivo, que impõe aos
órgãos do Estado ordens e proibições precisas: na verdade, ou estes direitos ficam como meros princípios
abstratos (mas os direitos podem ser tutelados só no âmbito do ordenamento estatal para se tornarem
direitos juridicamente exigíveis), ou são princípios ideológicos que servem para subverter o ordenamento
constitucional. Sobre este tema chocaram nos fins do século XVIII, de um lado, o racionalismo
jusnaturalista e, de outro, o utilitarismo e o historicismo, ambos hostis à temática dos direitos do homem.
Era possível o conflito entre os abstratos direitos e os concretos direitos do cidadão e, portanto, um contraste
sobre o valor das duas cartas. Assim, embora inicialmente, tanto na América quanto na França, a declaração
estivesse contida em documento separado, a Constituição Federal dos Estados Unidos alterou esta
tendência, na medida em que hoje os direitos dos cidadãos estão enumerados no texto constitucional.
Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=100515> Acesso em:
28 fev. 2020.
63
KRITSCH, Raquel. Política, religião, revolução e soberania em Reflexões sobre a revolução em França do
conservador E. Burke. in Revista espaço acadêmico, Londrina, n. 123, p. 68-82, ago. 2011, p. 70.

86 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Os Direitos Humanos com Alcance Universal: uma Realidade Tangível ou uma Utopia Inalcançável?

do concreto e o torna metafísico e profético, repleto de hipérboles retóricas incapa-


zes de governar64.
Não só isso. Os direitos haveriam de ser os direitos de um inglês e não do
homem geral e indeterminado da Declaração. Conforme afirma Joseph de Maistre:
“já conheci italianos, russos, espanhóis, ingleses, franceses, mas não conheço um ho-
mem geral”. A abstração resultaria não só na inoperância dos direitos, mas também na
indeterminação do sujeito – um ser imaginário, cuja proteção sequer é possível65. Os
humanos são seres socialmente marcados e historicamente construídos: só existem a
partir dos preceitos primários de cada povo, isto é, da experiência acumulada por um
determinado corpo social e civil66. Corolário disso é que, exatamente pela facilidade
desordenada de mudar de regime ‒ solapando a história ‒ os direitos humanos metafísi-
cos seriam uma ameaça à composição orgânica da sociedade, podendo pô-la na poeira
das vontades individuais, uma vez carregados pelos caprichos e modismos.
Na visão de Burke, a abstração dos direitos é justamente o que provoca essas vá-
rias contradições entre a teoria e o que ocorre na prática. Logo, é preciso abandonar o
pseudo-universalismo e levar os direitos a sério. E ele não ficou sozinho. Bentham, pro-
pôs o total repúdio de todas as reivindicações revolucionárias, precisamente por que eles
não são legalmente baseados. Ele insistiu que os “direitos naturais e imprescritíveis (uma
frase americana) são simples tolices retóricas”. Ele explicava que o substantivo “direito”
é o filho da lei – das leis reais derivam dos direitos reais; já das leis imaginárias, do “di-
reito da natureza”, somente podem vir “direitos imaginários”67.
Arendt também não deixou por menos. Seu pensamento68 escancarou a precarie-
dade da abstração da noção de direitos do homem no período da Segunda Guerra Mun-
dial. Segundo ela, a ideia da existência de um ser humano em si desmoronou quando
confrontada com os judeus perseguidos – seres que perderam todas as qualidades e rela-
ções, exceto que ainda eram humanos.
Conquanto haja um aparente consenso que os direitos humanos devem iluminar a
dignidade humana e se autoafirmar onde quer que se esteja, isso não parece ocorrer
quando tomados os homens que perderam o status de cidadão. Nas palavras de Arendt69,
no momento em que os seres humanos deixam de ter um governo próprio, não resta
nenhuma autoridade para protegê-los e nenhuma instituição disposta a garanti-los. É com
supedâneo nisso que para Arendt os direitos humanos pressupõem a cidadania não ape-
nas como um fato e um meio, mas sim como um princípio, pois a privação da cidadania

64
DOUZINAS, Costas, O fim dos direitos humanos [tradução de Luzia Araújo], São Leopoldo, Unisinos,
2009, p. 161.
65
DOUZINAS, Idem, p. 166.
66
BURKE, Edmund, Reflexões sobre a Revolução em França, Brasília, UnB, 1982, p. 107.
67
SEN, Amartya Kumar, Venice Academy of Human Rights, Veneza, 15 jul. 2010, p. 161.
68
ARENDT, Hannah, Origens do totalitarismo, São Paulo, Companhia da Letras, 2007.
69
Idem, p. 325.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 87


Jean Vilbert / Vinícius Almada Mozetic

afeta substantivamente a condição humana, uma vez que o ser humano privado de seu
estatuto político perde a qualidade de ser tratado pelos outros como um semelhante70.
Em suma, o reconhecimento de direitos humanos pode ensejar, ao menos em
parte, inspirando ou ajudando a promover, mudança institucional – um valor ético
que causa ação prática. Se uma garantia completa de realização fosse realmente
aceita como uma condição para qualquer exigência para ser vista como um direito,
então não apenas a segunda geração de direitos (conectadas com desenvolvimento),
mas também a primeira geração de direitos (conectadas com liberdade e sem interfe-
rência) seria seriamente comprometida.
3.2 Uma Realidade Tangível
A sociedade contemporânea é heterogênea, sem dúvidas. Seja no plano nacional
ou internacional, o Século XXI apresenta sociedades multiculturais71. De que maneira é
possível, então, dar efetividade ao universalismo estabelecido no preâmbulo da Decla-
ração Universal dos Direitos Humanos de 1948: “o reconhecimento da dignidade
inerente a todos os membros da família humana e de seus direitos iguais e inaliená-
veis é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo”? Como compatibi-
lizar a universalidade dos direitos humanos com o característico pluralismo cultural
dos novos tempos?
A resposta está, justamente, em reconhecer o pluralismo como traço ca-
racterístico das democracias que almejamos. É comum que diferenças culturais
tragam a lume entendimentos conflitantes na órbita pública, os quais por vezes
são irreconciliáveis. Esse contexto é resultado inevitável do exercício das facul-
dades da razão humana em um ambiente de instituições livres. Em um cenário
em que as pessoas têm liberdade para adotar, e de fato adotam, diferentes con-
cepções, a menos que se recorra à violência, não há como fazer imperar uma só
visão de mundo, uma espécie de expressão única da verdade, em exclusão a
todas as demais. Ainda assim, é possível um consenso sobre elementos basilares
no trato do homem enquanto tal. É aí que se inserem os direitos humanos na
dimensão básica da dignidade humana.
Em sua primeira dimensão, a dignidade humana gera uma espécie de consen-
so sobreposto (para usar aqui uma expressão adotada por autores como John Rawls),
em que os direitos humanos se tornam, precisamente, o ponto de convergência das
diferenças existentes entre as culturas. Desse modo é possível a existência de socie-
dades livres e iguais, ainda que profundamente divididas por diferenças culturais,
religiosas, filosóficas e morais, que embora incompatíveis, não interferem na digni-
dade básica dos cidadãos.

70
LAFER, Celso, A reconstrução dos direitos humanos, um diálogo com o pensamento de Hannah Arendt,
São Paulo, Cia das Letras, 1988, p. 151.
71
PUREZA, José Manuel, Direito Internacional e Comunidade de Pessoas, da indiferença aos direitos
humanos, p. 85, In BALDI, César Augusto (Org.), Direitos Humanos na Sociedade Cosmopolita, Rio de
Janeiro, Renovar, 2004.

88 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Os Direitos Humanos com Alcance Universal: uma Realidade Tangível ou uma Utopia Inalcançável?

Tanto é assim que a despeito de todo o pessimismo, com o fim da Segunda


Guerra Mundial, o problema dos direitos básicos da pessoa humana se renovou, ou
seja, posto como prioridade nas discussões entre chefes de Estado. Com a Carta das
Nações Unidas, assinada em 26.06.1945, foi criada uma organização internacional
denominada de Organização das Nações Unidas72, voltada à permanente ação con-
junta dos Estados na defesa da paz mundial, incluída aí a promoção dos direitos
humanos e das liberdades públicas (art. 1)73. Com tais propósitos, ao menos em tese
a noção dos direitos humanos deixou de ser um compromisso de cada país, indivi-
dualmente. Passou a ser um princípio internacional a inspirar as ações dos membros
fundadores ou futuros da organização.
Também ONGs globais (Save the Children74, Fronteiras Médicas75 e outros)
passaram a se envolver em projetos voltados ao avanço dos direitos humanos, pro-
movendo programas reais para fornecer comida ou medicamentos, abrigo ou ao
ajudar a desenvolver oportunidades econômicas e sociais. Mais do que isso, muitas
entidades se engajaram na discussão política, na advocacia e até mesmo em ações
investigativas, passando a denunciar violações a direitos humanos.
Esse é um dos motivos pelos quais muitos autores acreditam que a Segunda
Guerra Mundial constitui um marco na história político-jurídica: é a partir dela que o
mundo passa a caminhar para o chamado Direito Internacional dos Direitos Humanos,
sob o pálio de que a tutela de tais direitos não pode ficar restrita ao âmbito nacional76.
A soberania não pode servir de escudo à prática de atrocidades, demandando a criação
de mecanismos supraestatais de proteção do ser humano77.
Por fim, o ampliado empenho em torno da proteção internacional dos direitos
humanos, de per si, demonstra que a efetiva universalização da categoria é sim uma
realidade tangível. A concretização dessa pretensão passa pela conscientização daque-
les que ainda se encontram céticos à ideia, pela pronta resposta àqueles que apõem o
obste do multiculturalismo e pela soma de esforços para colocar em prática as noções
nos lugares em que ainda se insiste em atentar contra a dignidade humana em sua
dimensão básica.

72
Os objetivos das Nações Unidas são: Manter a paz e a segurança internacionais e para esse fim: tomar
medidas coletivas eficazes para prevenir e afastar ameaças à paz e reprimir os atos de agressão, ou outra
qualquer ruptura da paz e chegar, por meios pacíficos, e em conformidade com os princípios da justiça e do
direito internacional, a um ajustamento ou solução das controvérsias ou situações internacionais que possam
levar a uma perturbação da paz, Júlio Marinho de Carvalho, Os direitos Humanos no tempo e no Espaço
1998, p.60.
73
ANGELO, Milton, Direitos Humanos: Carta das Nações Unidas, art. 1º, 1998, p. 92.
74
Disponível em: <http://www.savethechildren.org/site/c.8rKLIXMGIpI4E/b.6115947/k.8D6E/Official_ Site.
htm>. Aceso em: 28 out. 2010.
75
Disponível em: <http://www.msf.org/msfinternational/volunteer/>. Acesso em: 28 out. 2010.
76
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves, Direitos humanos fundamentais, 12. ed, São Paulo, Saraiva, 2010,
p. 225.
77
CASTILHO, Idem, p. 102.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 89


Jean Vilbert / Vinícius Almada Mozetic

CONCLUSÃO
Os direitos humanos espalharam-se pelo mundo (especialmente Ociden-
tal), passando a ser entendidos como base da sociedade contemporânea – esten-
deram a relevância e alcance de sua argumentação para a ética social e política,
tendente a render exigências que possam ser convenientemente chamadas de
direitos humanos.
Primeiro porque é difícil definir o que é um direito humano. Muitos tentam
ligá-los a fatores jurídicos. E nesse aspecto é certo que a precisão presumida dos
direitos positivos é frequentemente contrastada com ambiguidades inescapáveis
nas exigências éticas dos direitos humanos. Este contraste, entretanto, não é por si
só motivo de embaraço para as exigências éticas, incluindo aquelas de obrigações
imperfeitas, uma vez que uma estrutura de razão normativa pode sensivelmente
permitir variações e não podem ser facilmente acomodadas em requerimentos de
especificidades legais. Aristóteles já pontava em “nicomachean ethics”78 que te-
mos de procurar por precisão em cada classe de coisas tanto quanto a natureza do
assunto exige.
Em segundo plano, as desconfianças e críticas que se levantam contra a
aparente hegemonia dos direitos humanos se devem, também em muito, à hete-
rogeneidade da aplicação em âmbito universal, diante de sua inobservância em
diversas nações. Entretanto, eventual ineficácia fática em certo momento histó-
rico (ou local) não deve servir a desacreditar toda a categoria. Na medida em
que direitos humanos são significativamente exigências éticas, o diagnóstico
quanto a se suas exigências têm força institucional ou normativa em um recorte
temporal ou geográfico é um dado irrelevante (para fins existenciais, embora
não seja para fins práticos).
A existência dos direitos humanos independe de sua completa implemen-
tação prática a todo tempo e lugar; ao contrário, seu reconhecimento é que de-
manda a implementação de ações práticas à sua salvaguarda, inclusive por meio
de intervenções internacionais como último recurso (ultima ratio), já que o prin-
cípio da impenetrabilidade não é absoluto e a soberania deve ser vista não só
como prerrogativa internacional, mas também como responsabilidade dos Esta-
dos nacionais.
Pode parecer uma tautologia, mas não é. A análise da dignidade é mais bem
compreendida (e se torna mais objetiva e manejável na prática) quando tomada em
uma dúplice dimensão: (a) dimensão básica, em que se encontram os bens jurídicos

78
Aristóteles escreveu dois tratados éticos: Nicomachean Ethics e a Eudemian Ethics. Ele mesmo não usa
nenhum desses títulos, embora na Política (1295a36) ele se refira a um deles – provavelmente a Eudemian
Ethics – como “ta êthika” – seus escritos sobre caráter. As palavras “Eudemian” e “Nicomachean” foram
adicionadas mais tarde, talvez porque a primeira foi editada por seu amigo, Eudemus, e a última por seu
filho, Nicomachus. Disponível em: <https://plato.stanford.edu/entries/aristotle-ethics/>. Acesso em: 28
mar. 2020.

90 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Os Direitos Humanos com Alcance Universal: uma Realidade Tangível ou uma Utopia Inalcançável?

básicos e essenciais para a existência humana; (b) dimensão cultural, em que estão os
valores que variam no tempo e no espaço.
A dimensão básica é universal, devendo ser observada em qualquer cultura,
pois representa a defesa primordial do respeito à vida, à liberdade e à integridade
física e moral, isto é, dos bens jurídicos básicos e essenciais à existência humana, os
quais são necessários para o exercício da autodeterminação de cada indivíduo, im-
pedindo a sua coisificação. Já a dimensão cultural tutela as formas e condições se-
cundárias com que cada grupo social busca tutelar a dignidade, abrindo espaço para
as peculiaridades culturais e suas práticas.
Diante disso, uma defesa da aplicação universal dos direitos humanos é
plenamente possível quando vinculada à defesa da dignidade humana em sua
dimensão básica, de maneira que os direitos humanos indiquem, na espécie,
direitos que são essencialmente fundamentais, não apenas na nomenclatura, mas
na natureza ‒ protegem o que de mais basilar há no homem, isto é, o primeiro
grau da dignidade humana. Nesse caso, não pode haver confusão destes direitos
com os positivados na ordem jurídica ou mesmo com outros elementos impor-
tantes para o homem, mas que fazem parte da dimensão cultural da dignidade.
Isso não representa restringir o âmbito da dignidade, mas sim densificar a
amplitude dos direitos humanos e proceder à devida categorização dos níveis da
dignidade humana, passando a traçar uma linha mais clara daqueles direitos que
identificam caracteres essenciais ao homem (fundamentais). Nessa conjuntura, a
universalidade dos direitos humanos não é uma faculdade, nem se liga a elemen-
tos culturais, mas é, isso sim, um direito de toda e qualquer pessoa.
Em conclusão, com ajustes, por meio do debate sério e responsável, evitando
estender a dignidade humana, em especial em sua dimensão básica, para fronteiras
que a tornam irreconhecível, a ideia de direitos humanos com alcance universal sai
do âmbito de uma utopia inalcançável e passa a ser uma realidade tangível.

REFERÊNCIAS
ANDRADE, José Carlos Vieira de, Os direitos fundamentais na constituição portuguesa de 1976, 2. ed.
Coimbra, Almedina, 2001, p. 98-99.
ARENDT, Hannah, Origens do totalitarismo, São Paulo, Companhia da Letras, 2007.
ASSUMPÇÃO, Antonio, O Estado contemporâneo: aspectos formais, Revista de Direito Público, São Paulo, v.
14, p. 155-164, out./dez., 1970.
BAEZ, Narciso Leandro Xavier; BARRETTO, Vicente, (Orgs), Direitos Humanos em Evolução, Joaçaba,
Unoesc, 2007.
_________, Dimensões de aplicação e efetividade dos direitos humanos, in Anais do XIX congresso nacional do
Conpedi, Florianópolis, 2010, p. 7120-7134.
BASTIAT, Fréderic, A lei, [Tradução de Ronaldo da Silva Legey], 3. ed, Rio de Janeiro, Instituto Liberal, 2010.
BIDART CAMPOS, Germán J. Teoria General de los Derechos Humanos, México, UNAM, 1993, p. 82.
BOBBIO, Norberto, A era dos direitos, Tradução de Carlos Nelson Coutinho, Rio de Janeiro, Elsevier, 2004.
BONAVIDES, Paulo, Curso de direito constitucional positivo, 9. ed, São Paulo, Malheiros, 1999.
BREGA FILHO, Vladimir, Direitos fundamentais na Constituição de 1988: conteúdo jurídico das ex-
pressões, São Paulo, Juarez de Oliveira, 2002, p. 66.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 91


Jean Vilbert / Vinícius Almada Mozetic

BURKE, Edmund, Reflexões sobre a Revolução em França, Brasília: UnB, 1982.


CAETANO, Marcello, Manual de ciência política e direito constitucional, 6. ed. Coimbra, Almedina,
1996.
CANOTILHO, José Joaquim Gomes, Direito constitucional e teoria da constituição, 5. ed. Coimbra,
Almedina, 2002.
CASTILHO, Ricardo, Direitos Humanos, 2. ed, São Paulo, Saraiva, 2013.
DALLARI, Dalmo de Abreu, O que são direitos da pessoa, 10 ed, São Paulo, Brasiliense, 1994, p. 07.
D’ARAUJO, Maria Celina, Capital social, Rio de Janeiro, Jorge Zahar Editor, 2003.
DONELLY, Jack, Universal Human Rights in Theory and Practice, 2. ed. New York, Cornell University, 2003.
DOUZINAS, Costas, O fim dos direitos humanos [tradução de Luzia Araújo], São Leopoldo, Unisinos, 2009.
DOWBOR, Ladislau, A reprodução social, São Paulo, Vozes, 2002.
DOWBOR, Ladislau, O que é poder local, São Paulo, Brasiliense, 1999.
FERNANDEZ, Eusébio, Teoria de la Justicia y Derechos Humanos, Madrid, Debate, 1991.
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves, Direitos humanos fundamentais, 12. ed, São Paulo, Sarai-
va, 2010.
FILAS, Rodolfo Capon, Derecho del trabajo, Buenos Aires, Platense, 1998.
FIORINI, Juan Pablo, La imposibilidad de construir un orden social justo ante la muerte de la libertad,
in Aportes Hacia un Modelo Más Justo y Equitativo de Sociedad (Coord.), Equipo Federal Del Traba-
jo, 2006.
GARCIA BECERRA, José Antônio, Teoría de los derechos humanos, México, Universidad Autónoma de
Sinaloa, 1991.
GUISÁN, Esperanza, Introdución a la ética, Madri, Cátedra, 1995.
HABERMAS, Jürgen, Direito e democracia, entre facticidade e validade, Tradução de Flávio Beno
Siebeneichler, 2. ed, Rio de Janeiro, Tempo Brasileiro, 1997, (v. I).
HABERMAS, Jürgen, Era das transições, Tradução de Flávio Siebeneichler, Rio de Janeiro, Tempo
Brasileiro, 2003.
HART, Herbert L.A. O Conceito de Direito, 2. ed. Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 1996.
HART, Herbert L.A. Positivism and the Separation of Law and Morals, Harvard Law Review, v. 71,
1958, p. 593. Disponível em: <http://jusvi.com/artigos/16347>. Acesso em: 06 out. 2010.
HERMANY, Ricardo, Rediscutindo o espaço local: uma abordagem a partir do direito social de Gur-
vitch, Santa Cruz do Sul, UNISC/IPR, 2007.
HÖFFE, Otfried, A democracia no mundo hoje, Tradução Lívio Cruz Romão, São Paulo, Martins Fontes, 2005.
HUNT, Lynn, A invenção dos Direitos Humanos: uma história, São Paulo, Companhia das Letras, 2009.
ISHAY, Micheline, The history of human rights: from ancient times to the globalization era, California:
University of California Press, 2004.
KANT, Immanuel, A metafísica dos costumes, Tradução de Edson Bini, São Paulo, Folha de S. Paulo,
2010.
KRITSCH, Raquel, Política, religião, revolução e soberania em Reflexões sobre a revolução em Fran-
ça do conservador E. Burke, in Revista espaço acadêmico, Londrina, n. 123, p. 68-82, ago. 2011.
LAFER, Celso, A reconstrução dos direitos humanos: um diálogo com o pensamento de Hannah
Arendt, São Paulo, Cia das Letras, 1988.
LEAL, Rogério Gesta, Estado, administração pública e sociedade, Porto Alegre, Livraria do Advoga-
do, 2006.
MORAES, Alexandre de, Direitos humanos fundamentais, 3. ed, São Paulo, Atlas, 2000.
MORAIS, José Luis Bolzan de As crises do Estado e da Constituição e a transformação espacial dos
direitos humanos, Porto Alegre, Livraria do Advogado, 2002.
MORAIS, José Luis Bolzan de, A ideia de Direito Social: o pluralismo jurídico de Georges Gurvitch,

92 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Os Direitos Humanos com Alcance Universal: uma Realidade Tangível ou uma Utopia Inalcançável?

Porto Alegre, Livraria do Advogado, 1997, p.30.


PAES, Letícia da Costa, A política dos direitos humanos: entre paradoxos e perspectivas, 2008, Tese
(Doutorado) Pontifícia Universidade Católica do Rio De Janeiro – PUC-Rio, Rio de Janeiro, 2012.
PALLIERI, Giorgio Balladore, A doutrina do Estado, v. 1 [tradução Fernando de Miranda] Coimbra,
Coimbra, 1969, p. 61-62.
PUREZA, José Manuel, Direito Internacional e Comunidade de Pessoas: da indiferença aos direitos
humanos, p.85, In BALDI, César Augusto (Org.), Direitos Humanos na Sociedade Cosmopolita, Rio de
Janeiro, Renovar, 2004.
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, Relatório sobre a pobreza, 2000.
PÉREZ-LUÑO, Antonio Enrique, Concepto y concepción de los derechos humanos: anotaciones a la ponencia
de Francisco Laporta, Alicante: Biblioteca Virtual Miguel de Cervantes, 2001.
PÉREZ-LUÑO, Antonio Enrique, Derechos Humanos, Estado de Derecho y Constituicion, 6. ed, Madrid,
Editorial Tecnos, 1999, p. 22.
RAWLS, John Bordley, O direito dos povos, Tradução Luís Carlos Borges, São Paulo, Martins Fontes, 2001
ROCHA, Leonel Severo; SCHWARTZ, Germano; CLAM, Jean (Org.), Introdução à teoria do sistema
autopoietico do direito, Porto Alegre, Livraria do Advogado, 2005.
SARLET, Ingo, Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais na Constituição Federal de 1988, Porto
Alegre, Livraria do Advogado, 2001.
_________, A eficácia dos direitos fundamentais, 10. ed. Porto Alegre, Livraria do Advogado, 2010.
SEN, Amartya Kumar, Desenvolvimento como Liberdade, São Paulo, Companhia das Letras, 2000.
SEN, Amartya Kumar, Venice Academy of Human Rights, Veneza, 15 jul. 2010.
SILVA, José Afonso, Curso de direito constitucional positivo, 27. ed. rev. e ampl, São Paulo, Malhei-
ros, 2007.
WOLKMER, Antonio Carlos, Pluralismo jurídico, 2. ed, São Paulo, Alfa-Ômega, 1997.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 93


Os Direitos Humanos com Alcance Universal: uma Realidade Tangível ou uma Utopia Inalcançável?

ESTUDIO BIBLIOMÉTRICO DE LA INVESTIGACIÓN SOBRE


LA REGULACIÓN DE INTERNET
BIBLIOMETRIC STUDY OF THE RESEARCH ON INTERNET
REGULATION
DOI: 10.19135/revista.consinter.00011.03
Recibido/Received 02.07.2019 – Aprobado/Approved 07.07.2020
Francisco Javier Arroyo-Cañada1 – https://orcid.org/0000-0001-8987-8204
E-mail: fjarroyo@ub.edu

Resumen: El desarrollo de Internet y sus servicios asociados, han propiciado una


sociedad cada vez más conectada, la Sociedad de la Información, no solo desde un punto
de vista social, a través de múltiples redes sociales (Facebook, Youtube, Instagram, etc.) o
servicios de mensajería como Whatsapp; sino desde un punto de vista comercial, donde
millones de consumidores utilizan a diario el comercio electrónico para la adquisición de
todo tipo de bienes y servicios. No es de extrañar, por tanto, el creciente interés de la
comunidad científica por el estudio de la red, y por su regulación. Internet es un espacio
demasiado grande (más de doscientos países, más de cuatro mil millones de usuarios y
miles de millones de transacciones diarias), para ser regulado mediante una norma general.
Parece necesaria una combinación creativa de enfoques de regulación, lo que ha propiciado
diferentes puntos de vista en la gestión de Internet. Por un lado, la gobernanza a través de
múltiples instituciones que estandarizan y autorregulan ciertos aspectos de la red, y por
otro, una regulación de aspectos básicos, mediante leyes y reglamentos, procedentes de las
administraciones públicas. Es por ello, que este trabajo pone en valor el estudio de la
regulación de Internet desde una perspectiva multidisciplinar, no solo en el ámbito del
Derecho, sino desde áreas tecnológicas vinculadas al desarrollo de Internet, que han
incorporado aspectos legales y de regulación en sus trabajos.
Palabras-clave: Derecho, Estudio bibliométrico, Regulación de Internet, Sociedad de la
Información, Web of Science
Abstract: The Internet development and its associated services have led to an increasingly
connected society, the Information Society, not only from a social point of view, through
multiple social networks (Facebook, YouTube, Instagram, etc.) or messaging services such
as WhatsApp; but from a commercial point of view, where millions of consumers use e-
commerce daily for the acquisition of all kinds of goods and services. It is not surprising,
therefore, the growing interest of the scientific community for the study of the network,
and for its regulation. The Internet is too large (more than two hundred countries, more
than four billion users and billions of daily transactions), to be regulated by a general
rule. A creative combination of regulatory approaches seems necessary, which has led to
different points of view in Internet management. On the one hand, governance through

1
Francisco Javier Arroyo-Cañada es Doctor en Estudios Empresariales por la Universidad de Barcelona,
donde es profesor del Departamento de Empresa. Cuenta con numerosos trabajos de investigación en el
ámbito del marketing e Internet, que han sido publicados en libros, revistas indexadas, y conferencias
internacionales.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 95


Francisco Javier Arroyo-Cañada

multiple institutions that standardize and self-regulate certain aspects of the network, and
on the other, a regulation of basic aspects, through laws and regulations, from public
administrations. This work highlights the study of Internet regulation from a
multidisciplinary perspective, not only in the field of Law, but also from technological
areas linked to the development of the Internet, which have incorporated legal and
regulatory aspects into their studies.
Keywords: Law, Bibliometric study, Internet Regulation, Information Society, Web of
Science.
Sumario: 1. Introducción. 2. La regulación de internet. 3. Metodología. 4. Resultados. 5.
Conclusiones. Referencias.

1 INTRODUCCIÓN
El fuerte desarrollo de Internet y sus servicios asociados, ha llevado consigo la
aparición de un conglomerado de reglas diversas, que difícilmente pueden estructurarse
como una ley general, pero puede considerar este conjunto normativo como un campo
transversal del derecho (Hoffmann-Riem, 2012). El objeto del presente trabajo no es
profundizar en una revisión del estado de la cuestión del concepto de regulación de
Internet y sus paradigmas, como propone Müller (2018) en su trabajo, sino ver desde una
perspectiva bibliométrica el interés por la investigación científica en este ámbito. De esta
manera, se pretende poner en valor este campo de investigación multidisciplinar, no solo
en el ámbito del Derecho, sino desde áreas tecnológicas y de las ciencias de la
información y la computación, muy vinculadas al desarrollo de Internet, y que creen
necesario la incorporación de aspectos legales y de regulación en sus trabajos.

2 LA REGULACIÓN DE INTERNET
Internet como una red de redes de múltiples capas y compleja, es imposible de
regular completamente (Müller, 2018), por lo que su regulación es meramente un intento
sostenido y enfocado de alterar el comportamiento individual relacionado con Internet,
incluyendo el establecimiento de estándares, la recopilación de información y la
modificación de comportamiento (Black et al, 2012, p. 11). Por otro lado, Biegler et al
(2003, p. 359) sostiene que una combinación creativa de enfoques de regulación en
Internet será más efectiva que cualquier estrategia reguladora única. En esa línea, De
Nardis (2013, p. 55-8) distingue cinco temas clave de la gobernanza de Internet: recursos
críticos de Internet, diseño de IP, derechos de propiedad intelectual, seguridad y gestión
de infraestructura, y derechos de comunicación. Esta categorización ciertamente no es
concluyente, pero podría servir como un punto de partida para la discusión.
Si bien durante mucho tiempo se opta por la gobernanza de internet, entendida
como una autorregulación, que ha dado origen, entre otros, a entidades para la regulación
de los nombres de dominio (Internet Corporation for Assigned Names and Numbers –
ICANN), o la estandarización de los formatos publicitarios gráficos en Internet (Internet
Advertising Bureau – IAB), parece que el cambio hacia una regulación pública ha
ganado más influencia en los últimos años (Münkler, 2018). Tanto la Ley 34/2002 de 11
de julio de Servicios de la Sociedad de la Información y de Comercio Electrónico
(LSSI), a nivel español, como el Reglamento (UE) 2016/679 del Parlamento Europeo y

96 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Estudio Bibliométrico de la Investigación Sobre la Regulación de Internet

del Consejo de 27.04.2016, conocido como Reglamento General de Protección de Datos


(RGPD), a nivel europeo, son ejemplos de este último enfoque.
Por otro lado, se han originado múltiples conflictos entre los agentes de diferentes
sectores de actividad, al chocar la iniciativa empresarial con los operadores tradicionales
del sector y otros agentes del mercado. Así, por ejemplo, se ha asistido a múltiples
enfrentamientos entre taxistas y propietarios de licencias de Vehículos de Transporte con
Conductor (VTC), a raíz del despliegue de servicios como Uber y Cabify, en las grandes
ciudades, que han acabado con discusiones entre las Administraciones por quien tiene
que regular el servicio. También ha habido protestas del sector hotelero y los vecinos de
los apartamentos turísticos no regulados, surgidos con la aparición de plataformas como
Airbnb. No es extraño ver titulares en los periódicos e informativos sobre los fallos de
diferentes juzgados locales sobre la figura del “falso autónomo” presente en empresas de
transporte o reparto a domicilio, como Glovo o Deliveroo. Al final, multitud de empresas
de Internet operan a nivel global, con un escenario normativo diferente no solo por
países, sino por regiones o poblaciones.
Asimismo, el debate sobre la compensación del reducido pago de impuestos,
mediante una tasa digital a las grandes empresas tecnológicas como Google, Amazon,
Facebook o Netflix, pone el foco en aspectos regulatorios de Internet y sus servicios
asociados.

3 METODOLOGÍA
Con el objeto de hacer un análisis bibliométrico sobre la regulación de Internet se
ha optado por una revisión de los principales indicadores de clasificación de los trabajos
de investigación en la plataforma Web of Science de Clarivate Analytics (WOS). La
reputación de dicha plataforma, así como su sistema de indexación de revistas a través
del Journal Citation Reports, ha sido adoptado internacionalmente por la comunidad
científica como garantía de calidad de las aportaciones científicas de los autores. Es por
ello que se ha optado por esta base de datos de artículos científicos para el análisis de los
trabajos sobre la regulación de Internet. No obstante, también se ha realizado una
búsqueda en otra de las bases de datos de contribuciones científicas más relevante,
Scopus, con el objeto de tener otro punto de vista adicional en el apartado de
cuantificación de la evolución de las contribuciones científicas.
Los criterios de búsqueda de las principales aportaciones científicas han sido la
selección de palabras-clave enfocadas al tema objeto de estudio. En una primera
aproximación, se utiliza la palabra “Internet” junto con la palabra “Law”. En este
sentido, se obtiene un contexto de estudio que permite entender la magnitud de los
trabajos que incluyen referencias a aspectos legales en los estudios realizados sobre
Internet. Posteriormente, se centra el estudio de palabras-clave en “Internet regulation”,
con el objeto de poner el foco en los estudios específicos sobre la regulación de Internet.
Una vez obtenidos los resultados de las búsquedas efectuadas, se utiliza la
herramienta de análisis propia de la plataforma WOS, para ir obteniendo resultados
segmentados por los diferentes criterios que se han considerado para contextualizar la
importancia de la investigación sobre la regulación de internet. Concretamente los
Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 97
Francisco Javier Arroyo-Cañada

criterios de análisis han sido los siguientes: área de investigación de los trabajos, año de
publicación, autores, países de origen de los trabajos, fuentes donde están publicados,
principales encuentros o conferencias, idioma del trabajo, las instituciones de filiación de
los autores y las categorías generales de la WOS en la que se clasifican.
Finalmente, se lleva a cabo un análisis del contenido de los resúmenes de los 123
trabajos relacionados con la regulación de internet obtenidos en la base de datos WOS,
con el objeto de obtener los principales conceptos relacionados. A partir de los textos de
los resúmenes se hace un análisis de frecuencias mediante la herramienta Textalyser. A
continuación, se eliminan palabras de uso común como artículos, pronombres o adjetivos
que no corresponden a conceptos clave de la investigación. Una vez depurada la base de
datos de conceptos clave, se utiliza la plataforma Wordclouds para desarrollar la nube de
palabras con los principales conceptos clave y sus respectivos pesos o frecuencias de
aparición.

4 RESULTADOS
Una vez realizadas las consultas y el análisis de los datos para las bases de datos
WOS y Scopus, en junio de 2019, los datos aportados por el estudio bibliométrico se
muestran a continuación.
Un total trabajos de 11.191 en Scopus y 10.337 WOS hacen referencia a aspectos
legales en relación a estudios sobre Internet, de los cuales tan solo 79 hacen referencia a
trabajos de origen español. El interés de la comunidad científica por el uso de aspectos
legales en sus trabajos ha crecido anualmente en los últimos veinticinco años como
muestra la figura 1, pero especialmente en los últimos cinco años, llegando a cifras por
encima de las novecientas contribuciones anuales en el año 2017.
Figura 1. Evolución del número de publicaciones (1995-2019) de Internet Law

98 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Estudio Bibliométrico de la Investigación Sobre la Regulación de Internet

Las principales áreas de investigación que han aportado contribuciones


relevantes de aspectos legales en Internet son Ciencias de la computación,
Legislación gubernamental o Economía y empresa, aunque también son destacables
otras áreas como las Ingenierías, Telecomunicaciones, Ciencias de la información o
las Matemáticas. Por lo que el uso de aspectos legales por parte de investigadores de
otras áreas de investigación, diferentes a las del Derecho, queda patente a la vista de
los resultados. Especialmente, en aquellas áreas más relacionadas con el desarrollo
de Internet y sus servicios asociados, tal y como se refleja en la tabla 1.

Tabla 1. Principales áreas de investigación por número de trabajos

Áreas de Investigación Trabajos


Computer Science 4.680
Government Law 4.079
Business Economics 1.799
Engineering 1.791
Telecommunications 1.445
Information Science Library Science 1.177
Mathematics 1.031
Communication 968
Public Administration 907
Health Care Sciences Services 843

En cuanto a los principales autores, por número de aportaciones, destacan


Kennedy, Pantlin, Havlin, Turner, Liu, Wang, Wolak, Zhang, Stanley y Barabasi
en los diez primeros puestos, con un número variable de trabajos que van entre
los 44 de Kennedy a los 16 de Barabasi. Destaca precisamente este último, ya
que dos de sus principales contribuciones están entre los diez trabajos más
citados que hacen referencia a aspectos legales sobre Internet. Concretamente,
Albert and Barabasi (2002) con 11.580 citas y Ravasz and Barabasi (2003) con
1.041 citas.
A nivel de países, destaca considerablemente Estados Unidos con 2.575
trabajos, seguido por China con algo más de mil contribuciones. Un aspecto para
destacar es que España entra en el ranking de los diez países con mayor número
de trabajos, sobre todo en el ámbito de las Ciencias de la computación,
Legislación gubernamental y Ciencias de la información y la comunicación.
Como se puede observar en la tabla 2.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 99


Francisco Javier Arroyo-Cañada

Tabla 2. Principales países por número de contribuciones

Países Trabajos
USA 2.575
China 1.007
England 644
China 549
Germany 377
UK 343
Australia 290
Italy 278
Canada 254
Spain 231

Las principales fuentes de información donde se publican trabajos


relacionados con aspectos legales en Internet también relacionan este objeto de
estudio con las ciencias de la computación, la física y la estadística, aunque
obviamente existen numerosas fuentes relacionadas con el Derecho, como es el caso
de Computer Law and Security Review, Law Review o el Journal of Media Law
Ethics and Policy. Estos resultados pueden dar una perspectiva transversal al estudio
de los aspectos legales en Internet, que no es solo considerado por investigadores de
Derecho, sino de múltiples disciplinas relacionadas con el desarrollo de Internet. Se
puede ver un detalle más exhaustivo de las fuentes en la tabla 3.

Tabla 3. Ranking de las 25 fuentes con mayor contribución

Fuente Trabajos
Lecture Notes in Computer Science 226
Computer Law Security Review 212
Physical Review E 108
Computer Law and Security Review 99
Physical Review E Statistical Nonlinear and Soft Matter Physics 98
Physica A Statistical Mechanics and Its Applications 81
Plos One 79
Physica A 52
Government Information Quarterly 51
Advances in Social Science Education and Humanities Research 40

100 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Estudio Bibliométrico de la Investigación Sobre la Regulación de Internet

Proceedings of The SPIE The International Society for Optical Engineering 39


Electronic Government Proceedings 38
Law Review 35
Journal of Hongik Law Review 34
Communications of The ACM 33
Computer 33
Proceedings of The Society of Photo Optical Instrumentation Engineers 32
Journal of Korea Infomation Law 31
Sungkyunkwan Law Review 31
European Physical Journal B 30
Journal of Media Law Ethics and Policy 30
Copyright Quarterly 29
Advanced Commercial Law Review 28
Communications in Computer and Information Science 28
Kyung Hee Law Journal 27

Las principales conferencias internacionales, por número de trabajos, son la


International Conference on Electronic Government (EGOV), la International
Conference on Politics and Information Systems Technologies and Applications
(PISTA), y la IEEE International Conference on Systems Man and Cybernetics. La
temática de estas conferencias evidencia dos de los temas clave en la investigación sobre
aspectos legales en Internet, el e-gobierno y la seguridad. Las Tecnologías de la
Información y la Comunicación (TIC) están transformando las sociedades y los sistemas
políticos a una velocidad considerable, por lo que los gobiernos deben garantizar los
servicios públicos electrónicos, así como garantizar las transacciones y servicios de la
Sociedad de la Información. Es por ello que los avances en la regulación pueden mejorar
el desarrollo de la sociedad conectada. La tabla 4 refleja las principales conferencias o
encuentros internacionales sobre aspectos legales ligados a Internet.

Tabla 4. Las 10 conferencias internacionales con mayor número de contribuciones

Conferencias Trabajos
1st International Conference on Electronic Government EGOV 2002 15
International Conference on Politics and Information Systems Technologies and
Applications (PISTA) 12
3rd International Conference on Electronic Government EGOV 2004 10
Proceedings PISTA 2004 International Conference on Politics and Information
Systems 10

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 101


Francisco Javier Arroyo-Cañada

IEEE International Conference on Systems Man and Cybernetics 9


1st International Workshop on Systematic Approaches to Digital Forensic
Engineering 8
5th International Conference on Electronic Government EGOV 2006 7
Electronic Government 5th International Conference EGOV 2006 Proceedings 7
IEEE ACM International Conference on Advances in Social Networks Analysis
and Mining ASONAM 7
IEEE Systems and Information Engineering Design Symposium 7

El claro dominio de las fuentes anglosajonas evidencia la superioridad de las


contribuciones en inglés relacionadas con aspectos legales sobre Internet (8.145
trabajos). El español como 4 idioma por número de contribuciones queda muy
alejado con 168 trabajos, tal como refleja la tabla 5.

Tabla 5. Ranking de idiomas por número de trabajos

Idioma Trabajos
English 8.145
Korean 1.480
Russian 191
Spanish 168
German 132
Chinese 103
French 83
Portuguese 80
Italian 31

Asimismo, las universidades norteamericanas copan los primeros puestos en


el ranking de instituciones de investigación por número de contribuciones, cobrando
especial relevancia University of California System y Harvard. Un mayor detalle de
las primeras posiciones queda recogido en la tabla 6.

Tabla 6. Principales instituciones de investigación por número de contribuciones

Instituciones de investigación/Universidades Trabajos


University of California System 199
University of London 118
Harvard University 72

102 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Estudio Bibliométrico de la Investigación Sobre la Regulación de Internet

University of North Carolina 68


Chinese Academy of Sciences 66
State University System of Florida 62
Columbia University 57
Pennsylvania Commonwealth System of Higher Education 56
Boston University 55
Tsinghua University 55
University of Texas System 55
Centre National De La Recherche Scientifique 53
University System of Maryland 48
University of North Carolina Chapel Hill 47
University System of Georgia 47
University of California Berkeley 46
University of California Los Angeles 44
Harvard University 43
University of Cambridge 43

Predominan los trabajos publicados en fuentes vinculadas a las ciencias


sociales, todo y que la ciencia y tecnología ocupa un destacado lugar (tabla 7).
Como se vio anteriormente, las ingenierías y ciencias afines han realizado
numerosas contribuciones que incluyen aspectos legales, por lo que se vuelve a
poner énfasis en el carácter transversal del desarrollo de Internet tanto desde el punto
de vista tecnológico como social. Es por ello, que se consideraría interesante los
grupos multidisciplinares para el estudio del desarrollo de Internet y la Sociedad de
la Información.

Tabla 7. Principales categorías de investigación por número de trabajos

Categorías de investigación WOS Trabajos


Social Sciences 7.231
Science Technology 6.986
Technology 5.663
Life Sciences Biomedicine 2.539
Physical Sciences 1.470
Arts Humanities 528

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 103


Francisco Javier Arroyo-Cañada

Una vez estudiado el contexto bibliométrico de la investigación sobre aspectos


legales en Internet se procede a focalizar el análisis de las contribuciones relacionadas
con la regulación en Internet. Concretamente, 123 trabajos, que han sido citados en 461
ocasiones hasta el momento de realizar el estudio, en junio de 2019.
En primer lugar, se observa una evolución errática entre los años 1995 y 2013
llena de altibajos en la producción científica asociada a la investigación sobre la
regulación en Internet. Es a partir del 2013, que experimenta un crecimiento
significativo, tal y como se refleja en la figura 2, siendo el 2018 el año más productivo,
con veinticuatro trabajos.

Figura 2. Evolución del número de publicaciones (1995-2019) de Internet regulation

Así como los trabajos sobre aspectos legales incluidos en estudios sobre
Internet, había un claro predominio norteamericano, en el caso de los trabajos
vinculados a la regulación de Internet, son las instituciones europeas las que lideran
el ranking, como es el caso de la University of London, University of Munich, Centre
National de la Recherche Scientifique o la Goethe University Frankfurt (tabla 8).

Tabla 8. Principales instituciones de investigación por número de trabajos

Institución de Investigación/Universidad Trabajos


University of London 5
University of Munich 5

104 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Estudio Bibliométrico de la Investigación Sobre la Regulación de Internet

Centre National de la Recherche Scientifique 4


Goethe University Frankfurt 4
Renmin University of China 4
University of Pennsylvania 4
Monash University 3
Sorbonne Universite 3
University of Oxford 3
University of South Carolina 3

En cuanto a los principales autores sobre regulación de Internet destacan con


tres contribuciones los autores Fournier y Latapy, y con dos trabajos Han, Magnien,
Marques, Muller, Silva, Sipior, Take, Ward y Yu.
Los países con un mayor número de contribuciones sobre regulación en
Internet son Estados Unidos con 35, seguida por Inglaterra y Alemania con 14 y
China con 11, posteriormente vendrían Australia (10), Brasil (6), Francia (6) y
Países Bajos junto con Corea del Sur (4). España no dispone de ningún trabajo
indexado en la base de datos WOS.
La investigación sobre la regulación en Internet resalta la Legislación
gubernamental, la Comunicación, las Ciencias de la computación y las Ciencias de
la información como las principales áreas por número de aportaciones (tabla 9), de
forma similar a los resultados obtenidos del análisis de las contribuciones sobre
aspectos legales relacionados con Internet.

Tabla 9. Principales áreas de investigación por número de trabajos

Área de investigación Trabajos


Government Law 44
Communication 23
Computer Science 20
Information Science Library Science 18
Business Economics 16
Telecommunications 10
Engineering 7
International Relations 5
Social Sciences Other Topics 5
Public Administration 4

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 105


Francisco Javier Arroyo-Cañada

Finalmente, el análisis del contenido de los resúmenes de las contribuciones


sobre la regulación de Internet permite destacar unos conceptos clave que pueden
visualizarse en la nube de palabras de la figura 3 y que pone en relieve conceptos
como: media, content, users, censorship, speech, data, freedom, information,
political, policy, social, y access.

Figura 3. Palabras-clave relacionadas con la regulación de Internet

La importancia de los medios en Internet, así como la información, la


censura, los contenidos y la libertad de expresión son aspectos clave para muchos
de los estudios realizados sobre la regulación en Internet más vinculados al área de
las ciencias de la información. El usuario, como sujeto a proteger, y la protección
de datos, así como el acceso a la red y sus contenidos copan otro número
importante de aportaciones. Por último, la política y gobernanza que garantice un
acceso a la Sociedad de la Información, con garantías, supone otra línea de
contribuciones importante.

5 CONCLUSIONES
En primer lugar, se destaca el interés creciente de los investigadores de
Internet por incorporar aspectos legales en sus trabajos, especialmente en los
últimos años donde más de novecientos estudios en 2017 hacen referencia a
aspectos legales. Los investigadores en el ámbito del derecho y las nuevas
tecnologías pueden encontrar buenas oportunidades de publicación en revistas

106 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Estudio Bibliométrico de la Investigación Sobre la Regulación de Internet

indexadas de referencia internacional, en referencia a la regulación de Internet,


sobre todo en el ámbito de los siguientes conceptos: medios online, los contenidos,
los usuarios, la censura, los datos, la libertad de información, la política, los social
media y el acceso a la red.
En segundo lugar, la investigación sobre la regulación en Internet se
consolida como un campo multidisciplinar con aportaciones desde diferentes áreas
de conocimiento, más allá del Derecho, muy vinculadas al desarrollo de Internet,
como son las ingenierías, telecomunicaciones, ciencias de la computación y de la
información. Por lo que es interesante la creación de equipos de investigación o
redes de cooperación entre investigadores de diferentes disciplinas para abordar
estudios sobre Internet. Los contactos con equipos de facultades y centros de
investigación pueden plantearse en un primer momento dentro de las propias
Universidades, y en eventos con temática multidisciplinar donde puedan forjarse
relaciones de networking entre investigadores de diferentes disciplinas. En ese
sentido los espacios de aplicaciones como Academia, Researchgate, Google
Schoolar, y otras redes de investigación, también pueden propiciar el intercambio
de ideas en relación con temas comunes de investigación de alcance
multidisciplinar como las redes sociales, el comercio electrónico o la contratación
de servicios en internet.
En tercer lugar, la presencia de contribuciones españolas a este campo de
estudio está muy por detrás de Estados Unidos o China, pero ocupa una posición
dentro de los diez países con mayor número de contribuciones. El desarrollo de
alianzas o redes de trabajo con grupos multidisciplinares, de otras áreas de
conocimiento, puede mejorar las posibilidades de publicación de los
investigadores centrados en el área del Derecho y Nuevas tecnologías. La
consolidación de ciudades españolas, como Barcelona, como hubs tecnológicos,
que celebran cada año eventos de referencia internacional, como el Mobile World
Congress, y la creación de estructuras como el Barcelona Tech City, para atraer
emprendedores e inversores de compañías de base tecnológica, puede suscitar el
interés de los centros y grupos de investigación para dar respuesta a múltiples
necesidades de este ecosistema tecnológico, tanto a nivel jurídico como
tecnológico. Es por ello, relevante esta conexión Universidad-Empresa, que dirige
fondos a la investigación y que se nutre de los centros de investigación para el
desarrollo de sus negocios.
Finalmente, se puede distinguir tres ámbitos de estudio de la regulación de
Internet, teniendo en cuenta los principales conceptos claves aparecidos en los
trabajos indexados: la libertad de acceso a la información, la protección datos y
usuarios, y el acceso a la red. En este sentido, muy ligados al propio desarrollo de
los servicios de acceso a la red, por parte de los operadores, y los servicios
derivados de Internet como los portales de comunicación, las redes sociales o el
comercio electrónico.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 107


Francisco Javier Arroyo-Cañada

REFERENCIAS
ALBERT, Réka, and Albert-László Barabási, “Statistical mechanics of complex networks,” Reviews of
modern physics 74.1 (2002): 47.
BIEGLER, Stuart, Beyond our control? confronting the limits of our legal system in the age of
cyberspace, MIT press, 2003.
BLACK, Julia, Martin Lodge, and Mark Thatcher, eds, Regulatory innovation: A comparative analysis,
Edward Elgar Publishing, 2006.
DE NARDIS, Laura, “The Emerging Field of Internet Governance”, in William H, Dutton, ed, The
Oxford handbook of internet studies, Oxford University Press, 2013.
HOFFMANN-RIEM, Wolfgang, “Regelungsstrukturen für öffentliche Kommunikation im Internet,”
Archiv dês öffentlichen Rechts 137,4 (2012): 509-544.
MÜLLER, Michael W. “Mapping Paradigms of European Internet Regulation: The Example of Internet
Content Control,” Frontiers of Law in China 13,3 (2018): 329-341.
MÜNKLER, Laura, “Space as Paradigm of Internet Regulation,” Frontiers of Law in China 13.3 (2018):
412-427.
RAVASZ, Erzsébet, and Albert-László Barabási, “Hierarchical organization in complex networks,”
Physical review E 67,2 (2003): 026112.

108 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Estudio Bibliométrico de la Investigación Sobre la Regulación de Internet

IMPLICACIONES JURÍDICAS DE LA IMPLEMENTACIÓN


DE CIUDADES INTELIGENTES EN LA UNIÓN EUROPEA
Y EN ESPAÑA
LEGAL IMPLICATIONS OF THE IMPLEMENTATION OF
SMART CITIES IN THE EUROPEAN UNION AND SPAIN
DOI: 10.19135/revista.consinter.00011.04
Recibido/Received 03.07.2020 – Aprobado/Approved 29.07.2020
Francisco Javier Durán Ruiz1– https://orcid.org/0000-0001-7587-7593
E-mail: fduranr@ugr.es

Resumen: La importancia de las ciudades y su población crecen cada vez más, así como
la necesidad de aplicar las TIC en la gestión de las mismas para reducir su impacto
ambiental y mejorar los servicios que ofrecen a sus ciudadanos. De ahí surge el concepto
de ciudad inteligente, una transformación de los espacios urbanos que están promoviendo
con fuerza la Unión Europea y España mediante colaboración público-privada y que en
gran parte tiene como base el uso de los datos y su tratamiento mediante técnicas de Big
Data e Inteligencia Artificial basadas en algoritmos. Esta investigación analiza los retos a
los que se enfrentan los proyectos de ciudades inteligentes en los aspectos técnico y
jurídico, centrados estos últimos en el respeto de la Ley de transparencia y de acceso a la
información pública, así como a los mencionados algoritmos, a la normativa sobre datos
abiertos y la reutilización de los datos o la conciliación del tratamiento masivo de los datos
de los ciudadanos con el derecho a la intimidad, no discriminación y protección de datos
personales. El uso de Big data que requiere el desarrollo de proyectos de ciudades
inteligentes exige un particular respecto de la normativa de protección de datos. En este
sentido, la investigación profundiza en los peligros que pueden darse para este derecho
fundamental en el marco de las ciudades inteligentes por el uso de Big Data especialmente.
Palabras-clave: Ciudades inteligentes, transformación digital, regulación, retos
jurídicos, Big data, protección de datos.
Abstract: The importance of cities and their populations grow more and more, as well as
the need to apply ICT in their management to reduce their environmental impact and
improve the services they offer to their citizens. Hence the concept of smart city arises, a
transformation of urban spaces that the European Union and Spain are strongly promoting
through public-private collaboration and which is largely based on the use of data and its
treatment using Big data and Artificial Intelligence techniques based in algorithms. This
research analyzes the challenges that smart city projects face in the technical and legal
aspects, the latter focusing on respect for the Law on transparency and access to public
information and to the algorithms mentioned, the regulations on open data and the reuse of
data or the reconciliation of the massive processing of citizens' data with the right to
privacy, non-discrimination and protection of personal data. The use of Big data needed for
the development of smart city projects requires a particular respect to data protection

1
Profesor Titular de Derecho Administrativo. Universidad de Granada. E-mail: fduranr@ugr.es

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 109


Francisco Javier Durán Ruiz

regulations. In this sense, the research explores in depth the dangers that can arise for this
fundamental right in the framework of smart cities due to the use of Big Data, especially.
Keywords: Smart cities, digital transformation, regulation, legal challenges, Big data,
data protection
Sumario: 1. Introducción. Concepto de Smart city y mejoras que implica en la gestión
urbana. 2. El impulso de la transformación digital de las ciudades desde la Unión
Europea. Hacia una UE de smart cities. 2.1. Regulación de las ciudades inteligentes por
la Unión Europea. 3. Ciudades inteligentes en España: impulso, proyectos, regulación y
normas técnicas de estandarización. 4. Implicaciones y retos jurídicos de las ciudades
inteligentes. 4.1 Ciudades inteligentes, Big data y derecho a la protección de datos
personales de los habitantes de la ciudad.

1 INTRODUCCIÓN. CONCEPTO DE SMART CITY Y MEJORAS QUE


IMPLICA EN LA GESTIÓN URBANA
Las ciudades son grandes centros de población que, a medio plazo, se espera
que concentren aún más habitantes y porcentaje de la población. Las estimaciones de
la ONU consideran que, en la actualidad las ciudades consumen el 78% de la energía
mundial y producen más del 60% de las emisiones de gases de efecto invernadero
pese a que abarcan menos del 2% de la superficie de la Tierra2. En este sentido,
resulta fundamental tomar medidas para evitar dicha concentración de emisiones en
las ciudades y ya se están tomando a nivel mundial y por la Unión Europea.
El Pacto Verde Europeo3 plantea que, en 2050, la UE sea “climáticamente
neutra”, es decir, no contribuya a las emisiones globales considerada en su conjunto.

2
ONU-Habitat, https://www.un.org/es/climatechange/cities-pollution.shtml (recuperado el 20-6-2020).
3
Comunicación de la Comisión al Parlamento Europeo, al Consejo Europeo, al Consejo, al Comité
Económico y Social Europeo y al Comité de las Regiones sobre “El Pacto Verde Europeo”, COM/2019/640
final, aprobada el 11 de diciembre de 2019.
El Pacto Verde Europeo es la respuesta de la UE al cambio climático y medioambiental, así como a los retos
sociales que conllevan. Es un complicado reto que requiere la movilización y el apoyo de la ciudadanía y de
los gobiernos de todos los países de la UE. Este Pacto impulsa el uso eficiente de los recursos mediante el
paso a una economía limpia y circular e incorpora una hoja de ruta con una serie de acciones que la
UE propone. Además de ser climáticamente neutra de aquí a 2050, la Unión plantea reducir la
contaminación, protegiendo así la vida humana, la fauna y la flora (según los expertos estamos viviendo la
sexta extinción masiva con la perdida acelerada de especies animales, y la primera provocada por los seres
humanos. Desde el año 1500 se han extinguido más de 320 vertebrados terrestres y de las especies que
sobreviven, su población ha disminuido una media de un 25%); ayudar a las empresas a convertirse en
líderes mundiales en productos y tecnologías limpios, ya que en la industria europea se utiliza a día de hoy
solo un 12% de materiales reciclados; y contribuir a garantizar una transición justa e integradora. Algunos
de los beneficios del Pacto Verde para la ciudadanía en cuanto a bienestar y mejora de la salud serían:
menos residuos, al producirse envases reutilizables o reciclables mediante el Plan de Acción de Economía
Circular [Comunicación de la Comisión de la Comisión Europea “Cerrar el círculo: un plan de acción de la
UE para la economía circular, COM (2015) 614 final, aprobado el 2-12-2015]; alimentos más saludables y
respetuosos con el medio ambiente gracias a la reducción de plaguicidas y fertilizantes; fomentar los
vehículos no contaminantes, proporcionando más puntos de recarga para coches eléctricos;
mejores alternativas de transporte público, ya que el transporte representa un 25% de las emisiones;
renovación de viviendas, escuelas y hospitales; reducción de las facturas energéticas de los edificios, que
actualmente suponen el 40% del consumo total; mejor calidad del aire, agua y suelo a través de la
descarbonización del sector de la energía, que representa más del 75% de las emisiones de gases de efecto

110 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Implicaciones Jurídicas de la Implementación de Ciudades Inteligentes en la Unión Europea y en España

Y en eso tendrá mucho que ver el éxito de los proyectos de ciudades inteligentes o
smart cities que exponemos en este artículo.
Debido a la creciente tendencia, mencionada anteriormente, de concentración de
la población en las ciudades, se hace imprescindible contar con mecanismos y
tecnologías que garanticen la sostenibilidad de los desarrollos urbanos, el respeto por el
medio ambiente, la utilización racional de los recursos disponibles y el adecuado
tratamiento de los residuos generados. Es esencial, por tanto, una apuesta decidida y
global por las ciudades inteligentes, para mejorar la prestación de servicios públicos y
hacer frente a los retos que, a medio plazo, deben afrontarse a nivel mundial en la gestión
de los espacios urbanos.
Como aproximación al concepto, podemos decir que una ciudad inteligente es un
lugar en el que las redes y servicios tradicionales se vuelven más eficientes gracias al uso
de las tecnologías de la información y la comunicación (TIC) en beneficio de los
habitantes de la ciudad, de las empresas y del medio ambiente.
La ciudad inteligente supone ir más allá y superar el uso de las TIC únicamente
para hacer un uso más racional de los recursos, lo cual resulta positivo, que duda
cabe, al contribuir a la mejora del medioambiente y reducir las emisiones o residuos
generados en los grandes espacios urbanos. La puesta en marcha de una auténtica
ciudad inteligente supone mucho más: la optimización de las redes de transporte
urbano y de la circulación de vehículos y personas, la mejora de servicios esenciales
para los ciudadanos como el suministro de aguas, gas o energía, la reestructuración y
replanteamiento del urbanismo, llevar a cabo una gestión mucho más eficiente de los
residuos urbanos o reducir el consumo energético mediante la apuesta por una
iluminación inteligente del dominio público urbano, así como la colaboración
público-privada para que este modelo de gestión se implemente en ambos niveles de
actuación e incrementar la participación ciudadana tanto en la mejora del modelo
como en la gobernanza y transparencia del mismo.
Así, a nivel de gestión la administración en la ciudad inteligente debe
simplificarse y digitalizarse, acercándose a los ciudadanos y volviéndose a un tiempo
más interactiva, receptiva y participativa. Por otro lado los espacios públicos deben
configurarse, además de con criterios ambientales, para que sean seguros y adaptados a
las necesidades de las personas (discapacitados o población más envejecida que se está
incrementando paulatinamente en las ciudades de la UE, entre otros).
Las ciudades han empezado a aprovechar el internet de las cosas, también
denominado IoT (Internet of Things)4 y a utilizar las TIC para crear espacios más

invernadero de la UE. Por último, debemos subrayar que el Pacto Verde Europeo no es un brindis al Sol,
sino que se acompaña de una importante financiación mediante el Fondo de Transición Justa con el que se
calcula que se movilizarán hasta 100.000 millones de euros en inversiones durante el periodo de 2021-2027
en un fondo de transición para convencer a los países que dudan, sobre todo los del Este.
4
Internet de las cosas ha sido definido por el Comité Europeo de Protección de Datos (antiguo grupo de
trabajo del artículo 29), en su Dictámen8/2014 “sobre la evolución reciente de la Internet de los objetos”, de
16 de septiembre de 2014, como “una infraestructura en la que miles de millones de sensores incorporados a
dispositivos comunes y cotidianos “objetos” como tales, u objetos vinculados a otros objetos o individuos)
registran, someten a tratamiento, almacenan y transfieren datos y, al estar asociados a identificadores únicos,

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 111


Francisco Javier Durán Ruiz

eficientes como ya hemos mencionado, y no solo en el aspecto medioambiental, sino


también en los aspectos social, económico u operativo. Por otra parte, la ciudad
inteligente interactúa con los ciudadanos, de tal forma que la información generada por
los propios ciudadanos conectados facilita directamente tanto la organización y gestión
de los servicios y procesos cotidianos dirigidos a ellos por parte de las Administraciones
públicas como la eficacia y eficiencia de dicha gestión pública, cumpliendo así con tales
principios que deben de regirla recogidos tanto en el art 103 de la Constitución Española
(eficacia), como en el art. 3 de la Ley 40/2015, de 1 de octubre de Régimen Jurídico del
Sector Público (eficacia y eficiencia).
En el sector que mencionábamos anteriormente, relativo a la competencia propia
de los municipios en materia de “tráfico, estacionamiento de vehículos y movilidad” (art.
25.2.g de la Ley 7/1985, de 2 de abril, Reguladora de las Bases del Régimen Local,
LRBRL en adelante), por ejemplo, pueden establecerse aparcamientos inteligentes,
gestionados de forma automática a través de inteligencia artificial (IA) y procesos de
machine learning (ML). El Ayuntamiento del municipio gestionaría, de manera
automática y gracias a la información proporcionada tanto por los propios ciudadanos
conectados como por las tecnologías implantadas en dicha ciudad o por los datos
proporcionados por los vehículos inteligentes y conectados, las plazas de aparcamiento
disponibles, de forma que los vehículos puedan distribuirse entre los distintos
aparcamientos disponibles en la ciudad de forma mucho más eficiente. Los trayectos
recorridos por los vehículos serían de este modo mucho más cortos y directos,
reduciendo el consumo de combustible y por ende las emisiones y la contaminación, con
beneficio particular y social; y disminuyendo al mismo tiempo el volumen y la
congestión del tráfico, el nivel de contaminación acústica (aunque, en el caso de los
vehículos eléctricos este ya es prácticamente inexistente); o reduciendo los tiempos de
desplazamiento de los ciudadanos, permitiendo una mejor conciliación de su vida laboral
y personal.
Otro ejemplo similar, en cuanto a la mejora de la gestión de la movilidad y el
tráfico en las vías urbanas, sería la implantación en la ciudad de semáforos inteligentes.
Semáforos que se pongan en funcionamiento en función del número concreto de
vehículos y peatones, agilizando el tráfico y reduciendo el consumo energético. Lo
mismo puede decirse en cuanto a la iluminación del espacio urbano con un alumbrado
inteligente (el alumbrado público es uno de los servicios que deben prestar, en todo caso,
los municipios, según establece el art. 26.1.a de la LRBRL), en que las farolas o
luminarias de la localidad se encenderían únicamente en caso de que algún ciudadano

interactúan con otros dispositivos o sistemas haciendo uso de sus capacidades de conexión en red”. En
palabras de GONZÁLEZ DE ALEDO CASTILLO, se trata, en definitiva “de una serie de sensores
incorporados a dispositivos u objetos de la vida cotidiana de las personas que, conectados a internet y/o
entre sí, permiten el intercambio y la interacción de diferentes datos que hacen posible la generación de
información que puede resultar de utilidad tanto para el propietario de dichos datos como para el resto de
intervinientes en la cadena – fabricantes de dispositivos, desarrolladores de aplicaciones, proveedores de
servicios de internet, etc.-, GONZÁLEZ DE ALEDO CASTILLO, Ignacio, “Internet de las cosas”, en
RECUERDA GIRELA, Miguel Ángel, Tecnologías disruptivas. Regulando el furo, Cizur Menor
(Navarra), Thomson Reuters Aranzadi, 2019, p. 331.

112 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Implicaciones Jurídicas de la Implementación de Ciudades Inteligentes en la Unión Europea y en España

pase por la zona concreta, evitando un gasto innecesario de luz en caso de farolas
encendidas, pero innecesarias durante largas horas, permitiendo un importante ahorro
energético y económico con la consiguiente reducción de la contaminación asociada a la
generación eléctrica, aun mayoritariamente realizada mediante fuentes no renovables y
contaminantes o generadoras de residuos difíciles de tratar.
En una ciudad inteligente en la que los autobuses y/o el metro (recordemos que el
servicio de transporte colectivo urbano de viajeros deben prestarlo todos los municipios
con población superior a 50.000 habitantes según el art. 26.1.d LRBRL) estén
coordinados tanto a nivel interno como con los ciudadanos, puede saberse en tiempo real
no solo el estado del tráfico y el tiempo de espera como ya sucede en muchas ocasiones
en que existe señalización al respecto en las paradas, sino incluso el número de viajeros,
la necesidad de detenerse o no en cada parada o incluso la necesidad de que un autobús o
metro salga de la estación o realice un determinado trayecto en función de si hay viajeros
esperándolo o no. Tal información puede suponer no solo una reducción importante de
costes en el sector del transporte público, sino una considerable mejora en cuanto a su
eficiencia y una vez más un beneficio medioambiental considerable al disminuir la
frecuencia y/o el número de usos de los vehículos públicos y el consumo de combustible
o electricidad de los mismos.
Otra posible caso de uso de TICs para la mejora de los servicios públicos de una
ciudad inteligente puede ser el relativo a la gestión del agua por parte del municipio
(que debe prestar, independientemente de su población, los servicios de
abastecimiento domiciliario de agua potable y alcantarillado, según el art. 26.1.a de
la LBRL). Mediante la implementación de dispositivos que midan los caudales del
suministro domiciliario de agua y detecten en función de los mismos fugas en las
redes de suministro, podrían repararse de manera rápida (o automatizarse también
dicha reparación con materiales inteligentes ya existentes); igualmente sensores de
presión del agua u otros pueden detectar fallos en la red de alcantarillado y ayudar a
gestionarla mejor o incluso a evitar inundaciones; o pueden implantarse también
sistemas de riego inteligente para los parques públicos que reduzcan el consumo de
agua y garanticen su mantenimiento en buen estado.
Un último ejemplo, entre muchos otros que podríamos plantear, sería la
recogida de residuos, servicio que también deben prestar todos los municipios de
conformidad con el art. 26.1.a de la LBRL. La instalación de contenedores de
residuos inteligentes permitiría recogerlos únicamente cuando resulte necesario,
evitando en ocasiones la acumulación de residuos con el riesgo medioambiental y
sanitario asociado o la recogida de contenedores que se encuentran por debajo de su
capacidad real, aumentando el consumo de combustible y provocando un uso
ineficiente de los recursos públicos, en definitiva.
Son muchas las funcionalidades que hacen que una ciudad pueda ser
considerada inteligente y convertirse en smart city es una tendencia en auge en las
principales capitales del mundo. La Unión Europea trata de no perder el tren de estas
innovadoras iniciativas, como veremos a continuación.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 113


Francisco Javier Durán Ruiz

2 EL IMPULSO DE LA TRANSFORMACIÓN DIGITAL DE LAS


CIUDADES DESDE LA UNIÓN EUROPEA. HACIA UNA UE DE
SMART CITIES
De acuerdo con el Parlamento Europeo5, las ciudades inteligentes pueden ser
identificadas y clasificadas de acuerdo con seis ejes o dimensiones principales:
smart governance, smart economy, smart mobility, smart environment, smart
people, y finalmente, smart living. Por lo tanto, en palabras de Villarejo Galende6,
“una ciudad puede ser definida como ‘inteligente’ cuando las inversiones en capital
humano y social y en infraestructuras de transporte y TIC contribuyen al desarrollo
económico sostenible y a mejorar la calidad de vida, con una gestión racional de los
recursos naturales, a través de un gobierno participativo”.
Ya en 2012, la Comisión Europea puso en marcha una iniciativa específica
para el desarrollo de las ciudades inteligentes denominada “Ciudades Inteligentes y
Comunidades-Asociación Europea para la Innovación”, aportando 365 millones de
euros para ideas innovadoras y proyectos en el ámbito de la energía, el transporte y
las TIC en las zonas urbanas y demostrando el compromiso europeo con la
sostenibilidad de sus ciudades.
Más recientemente, en enero de 2020, la Unión Europea ha publicado
la declaración “Join, boost, sustain” (unir, potenciar, sostener) o “Join forces to
boost sustainable digital transformation in cities and communities in the EU” para
sentar las bases del camino hacia la transformación digital de las ciudades europeas.
Se trata de una iniciativa firmada por representantes de ciudades de la UE y apoyada
por el Comité de Regiones y la Comisión Europea.
La declaración parte de un momento en el que las ciudades y comunidades de
la Unión Europea hacen frente a un número de desafíos cada vez mayor y se unen
para ello7. Plantea afrontar estos retos mediante soluciones digitales basadas en
datos generados a escala local, imprescindibles para ofrecer mejores servicios en
ámbitos como la movilidad, los servicios públicos y la eficiencia energética,
subrayando la necesidad de cooperación entre los diferentes actores implicados (a
través de una gobernanza multinivel en la UE) en el impulso de la innovación,
permitiendo a los ciudadanos ser el centro de políticas públicas que ofrezcan
servicios eficientes y rentables. Insiste en la necesidad de una inversión pública y
privada suficiente en servicios digitales, tecnologías, infraestructuras y capacidades
con el fin de lograr este objetivo, para garantizar el liderazgo tecnológico en la UE
(en palabras de la declaración, puesto que a nivel global no existe tal liderazgo en la
5
Parlamento Europeo. “Mapping Smart cities in the EU”, documento elaborado por la Dirección General
para políticas internas del Parlamento Europeo en enero de 2014, p. 19. Disponible en
<https://www.europarl.europa.eu/RegData/etudes/etudes/join/2014/507480/IPOL-ITRE_ET(2014)50748
0_EN.pdf> (consultado el 21.06.2020).
6
VILLAREJO GALENDE, Helena, “Smart cities, una apuesta de la Unión Europea para mejorar los
servicios públicos urbanos”, Revista de Estudios Europeos n. 66, enero-junio, 2015, p. 25.
7
Algunas iniciativas europeas en este sentido son, EUROCITIES-red de grandes ciudades europeas;
Ciudades inteligentes abiertas y ágiles (Open and Agile Smart Cities – OASC); o la Red europea de
laboratorios vivientes (European Network of Living Labs – ENOLL)

114 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Implicaciones Jurídicas de la Implementación de Ciudades Inteligentes en la Unión Europea y en España

actualidad) y respetar a un tiempo los valores y la diversidad europeos, así como los
derechos digitales de las personas. Incluye en este sentido compromisos claros como la
creación de un plan de inversión conjunto centrado en soluciones digitales; la creación de
una normativa centrada en garantizar la interoperabilidad de los datos y plataformas entre
ciudades; y la superación de la brecha digital prometiendo proporcionar a todos los
ciudadanos las competencias digitales que necesitan para poder beneficiarse de los
servicios y soluciones que ofrecen la ciudades inteligentes8.
Es importante, como subraya la declaración, que el público confíe en los sistemas
que se implanten en las ciudades inteligentes, para lo cual los datos deben utilizarse de
manera responsable a través de plataformas digitales que garantice la calidad, seguridad
y privacidad de dichos datos recabados y tratados para el mejor funcionamiento de las
ciudades. En este sentido, el núcleo de la declaración es la implantación y expansión de
plataformas abiertas, interoperables, intersectoriales y transfronterizas, como medio para
impulsar la transformación digital. Se quiere dotar de garantías a la soberanía tecnológica
en la UE, y promover la creación conjunta de soluciones digitales pare evitar que
tecnologías específicas dispares y dispersas aislen y bloqueen las ciudades europeas.
Existen actualmente numerosas iniciativas europeas orientadas a potenciar la
digitalización de las ciudades y abordar con éxito la transformación de estas en ciudades
inteligentes, como las que lleva a cabo la Asociación Europea de Innovación sobre
Ciudades y Comunidades Inteligentes (EIP-SCC), la asociación de Transición Digital de
la Agenda Urbana para la UE, o los proyectos Horizonte 2020, así como las iniciativas
mencionadas incluidas en el Pacto Verde Europeo.
En el caso de Horizonte 2020, octavo Programa Marco europeo para la
investigación y el desarrollo tecnológico (H2020)9 se trata de un programa que financia
proyectos de investigación e innovación de diversas áreas temáticas en Europa, con un
presupuesto de casi 80.000 millones de euros para el período 2014-2020. Da cabida tanto
a investigadores, empresas y centros tecnológicos como a entidades públicas, y se
integran en él todas las fases de un proyecto, desde la fase de generación del
conocimiento hasta la transferencia del mismo hacia actividades más cercanas al
mercado. No obstante, al tratarse de proyectos y soluciones fragmentadas, el resultado e
impacto de las mismas es limitado y se hace necesario desarrollar soluciones globales e
integradoras de ciudades inteligentes, que aúnen bajo consumo de carbono y eficiencia
energética con la participación ciudadana y la transparencia en la gestión.
En este sentido, adquiere plena vigencia el movimiento ”Join, boost, bustain“
mencionado, y su objetivo de apoyar la creación y ampliación de plataformas digitales y
soluciones digitales abierta en toda la UE, que tengan como características ser
interoperables, intersectoriales y transfronterizas.
La mencionada Asociación Europea de Innovación sobre Ciudades y
Comunidades Inteligentes (EIP-SCC), que se creó en 2012 y desde entonces ha
contribuido a reunir a las partes interesadas en seis grupos de acción y a generar

8
Tal como recoge el Dictamen del Comité de las Regiones “Una Europa digital para todos: promover
soluciones inteligentes e integradoras sobre el terreno”(2020/C 39/18), de 05.02.2020.
9
Pueden consultarse los datos de los proyectos y financiación del Programa Horizonte 2020 en
<https://ec.europa.eu/info/funding-tenders/opportunities/portal/screen/opportunities/horizon-dashboard>

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 115


Francisco Javier Durán Ruiz

convocatorias para proyectos denominados Smart Cities Lighthouse10 en el marco del


programa Horizonte 2020, es reflejo de este esfuerzo de la UE para maximizar la
eficiencia y la flexibilidad mediante la interoperabilidad y la estandarización, como
primer paso relevante hacia una futura política de la Unión Europea sobre ciudades.
Para 2050, dos tercios de la población mundial vivirá en ciudades y en
Europa, casi el 75% de la población vive en la actualidad en núcleos urbanos de
diferentes tamaños, siendo las ciudades europeas grandes contribuyentes al consumo
energético y a las emisiones de gases contaminantes como hemos subrayado, por lo
que resulta fundamental minimizar su impacto climático. No podemos obviar, por
otra parte, que las ciudades son los principales motores de la economía de la Unión,
y las principales responsables de creación de vías crecimiento y generación de
empleo. En este sentido, las iniciativas de la UE se encaminan a promover áreas
urbanas más atractivas y competitivas, más saludables y sostenibles para vivir, que
integren la protección medioambiental y la lucha contra el cambio climático. Las
iniciativas que se están implementando son muy numerosas y diversas. Algunos
sectores en los que se han logrado avances destacables son el área de Smart Grid
(redes inteligentes), eficiencia energética y la digitalización del sector del agua.
En relación a las redes inteligentes, el grupo de trabajo de Smart Grid se
encuentra estudiando la posibilidad de establecer un formato común para el intercambio
de datos de energía a nivel de la UE como base para un marco de interoperabilidad. En
cuanto a la eficiencia energética, la UE ha definido un indicador del nivel de preparación
para edificios inteligentes, cuyo objetivo es medir la capacidad de los edificios para
utilizar tecnologías digitales y sistemas electrónicos para optimizar el funcionamiento e
interactuar con la red.
Por su parte, el Comité Económico y Social europeo ha elaborado un Dictamen11,
en el que, entre otras cuestiones, establece la necesidad de llevar a cabo la integración de
los siguientes pilares fundamentales para alcanzar un modelo más avanzado y eficaz de
las ciudades inteligentes:
• tecnologías e instrumentos para la eficiencia energética e integración de
fuentes renovables;
• difusión de plataformas tecnológicas y de conectividad para crear los
nuevos sistemas de servicios digitales;
• nuevos servicios digitales para mejorar la calidad de vida y laboral de
ciudadanos y empresas;
• modernización de las infraestructuras urbanas y rediseño urbano;
• educación y formación de los ciudadanos, las empresas y el sector público
en materia de competencias digitales;
• un modelo de sostenibilidad económica y financiera para las inversiones.

10
Pueden consultarse dichos proyectos en la web del “EU Smart cities Information Cities” disponible en:
<https://smartcities-infosystem.eu/>
11
Dictamen del Comité económico y social europeo sobre el “Las ciudades inteligentes como motor de una
nueva política industrial europea (Dictamen 2015/C 383/05).

116 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Implicaciones Jurídicas de la Implementación de Ciudades Inteligentes en la Unión Europea y en España

2.1 Regulación de las Ciudades Inteligentes por la Unión Europea


Las instituciones públicas tienen un papel fundamental a la hora de impulsar
los nuevos desarrollos y generar nuevas oportunidades para las empresas en el sector
de las ciudades inteligentes o smart cities. Evidentemente a este respecto el papel de
la UE es fundamental, por el alcance de su regulación y las posibilidades que tiene
de armonizar las legislaciones de sus Estados miembros en muchos de los aspectos
relacionados con las ciudades inteligentes, así como la capacidad, que hemos
comprobado, de financiar las iniciativas que pone en marcha. El ámbito
internacional que la UE supone y el entendimiento de su papel en este proceso,
implican abrir oportunidades a nivel internacional a las empresas que tengan
productos y servicios innovadores y valiosos a nivel de la Unión.
Consideramos, pues que las dos funciones principales de la UE en relación
con las ciudades inteligentes son promover y financiar iniciativas que faciliten el
desarrollo de proyectos en este ámbito, como hemos visto en el apartado anterior, y
en segundo lugar la función de armonización o de coordinación de la legislación de
los Estados miembros para hacer posible esta realidad.
Solo con intervención de la UE podrá crearse un marco legal homogéneo que
facilite un modelo homologable de ciudad inteligente en todo su territorio. El principal
instrumento normativo vinculante para los Estados miembros con vistas a lograr este
objetivo son las Directivas, pero también otros mecanismos como Reglamentos (para
establecer directrices comunes de homologación de determinados productos o
tecnologías, cuestión especialmente importante en el ámbito de la aplicación del internet
de las cosas o el Big data, aspectos en los que la normativa europea ya se encuentra
avanzada, como veremos), creación de seminarios o grupos de trabajo para compartir
ideas mediante la publicación de Libros Blancos/White papers12, etc.
El beneficio más inmediato de esta política es que crea un gran mercado
interno que incrementa el atractivo de negocio de la UE y a ello se orienta como veremos
el Mercado Único Digital o Digital Single Market como iniciativa paralela de la UE. Un
ejemplo de esta acción es el Marco Europeo de Referencia para la Ciudad
Sostenible (RFSC)13, una herramienta o aplicación web diseñada para permitir que todas
las ciudades europeas dispongan de un marco conceptual común a la hora de valorar y
planificar políticas orientadas al desarrollo y la sostenibilidad, campos en los que el
sector de las ciudades inteligentes es un actor fundamental. El Marco define
detalladamente 30 objetivos de sostenibilidad para las ciudades europeas, y proporciona
herramientas online para que agentes públicos y privados puedan evaluar la situación de
sus ciudades en relación a esos objetivos. Entre ellos podemos destacar:

12
Los Libros Blancos de la Comisión Europea son documentos que contienen propuestas de acciones de la
Unión Europea en un campo específico. A veces constituyen una continuación de los Libros Verdes
publicados, cuyo objetivo es iniciar un proceso de consultas a escala de la UE. El propósito de los Libros
Blancos es iniciar un debate con el público, las partes interesadas, el Parlamento Europeo y el Consejo con
el fin de alcanzar un consenso político. El Libro Blanco de la Comisión de 1985 para la realización del
mercado interior es un ejemplo de proyecto que fue aprobado por el Consejo y dio lugar a la aprobación de
una legislación de amplio alcance en este campo.
13
Vid. <http://rfsc.eu/> en relación a esta aplicación en línea.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 117


Francisco Javier Durán Ruiz

• Dimensión espacial: planificación urbanística sostenible, equidad espacial,


movilidad sostenible, resiliencia territorial, preservación del patrimonio,
espacios públicos de calidad.
• Dimensión gubernativa: procesos de mejora continua, participación
ciudadana…
• Dimensión social: inclusión, equidad, acceso a la vivienda…
• Dimensión económica: crecimiento verde, resiliencia económica local,
consumo y producción sostenibles…
• Dimensión ambiental: mitigar el cambio climático, adaptarse al cambio
climático, reducir la polución, conservar los recursos…

3 CIUDADES INTELIGENTES EN ESPAÑA: IMPULSO, PROYECTOS,


REGULACIÓN Y NORMAS TÉCNICAS DE ESTANDARIZACIÓN
Los proyectos de smart cities apoyados por la UE se extienden también al caso de
España. Uno de los ejemplos paradigmáticos la ciudad de Santander, considerada un
estandarte en lo que a smart cities se refiere y que tiene implantados, gracias al proyecto
“SmartSantander”, encuadrado dentro del programa marco de la Comisión Europea bajo
la iniciativa FIRE (Future Internet Research and Experimentation14), 12000 sensores de
todo tipo: medioambientales, de iluminación, de aparcamiento, etc., que permiten
mejorar los servicios públicos que se ofrecen y se prestan a los ciudadanos mediante el
recabo de información de dichos sensores y de los propios ciudadanos, con un destacado
ahorro económico y energético.
De acuerdo con el Plan Nacional de Ciudades Inteligentes de Julio 2015, en su
Versión 215, en consonancia con el informe citado del Parlamento Europeo “Mapping
Smart Cities in the EU”, se considera que una ciudad es inteligente si tiene al menos una
iniciativa que aborde una o más de las características a que nos referimos de smart
governance, smart economy, smart mobility, smart environment, smart people, y
finalmente, smart living.
Asimismo, la Unión Europea ha cofinanciado, a través de su Fondo Europeo de
Desarrollo Regional (FEDER), proyectos de ciudades e islas inteligente en España, que
han permitido desarrollar proyectos de ciudades inteligentes en Alicante, Cáceres,
Córdoba, Gijón, Las Palmas de Gran Canaria, Lugo, Murcia, Palencia, Zaragoza,
Madrid, A Coruña, Santiago de Compostela, Ponferrada, Santander, Segovia, Valencia,
Valladolid, Granada, Huelva, Sevilla, Toledo; Badajoz, la comarca de la Costa del
Sol, Alcalá La Real, Lepe, Martos, Valdepeñas, Almendralejo, Villanueva de la
Serena, El Hierro, Fuerteventura o Mallorca16.

14
Disponible en: <www.smartsantander.eu>.
15
Plan Nacional de Ciudades Inteligentes. Julio 2015 / Versión 2. Disponible en: <https://www.plantl
.gob.es/planes-actuaciones/Bibliotecaciudadesinteligentes/Detalle%20del%20Plan/Plan_Nacional_de_Ciud
ades_Inteligentes_v2.pdf> (consultado el 29.06.2020).
16
Véanse en: <https://www--red--es.insuit.net/redes/es/que-hacemos/ciudades-inteligentes/proyectos-en-ciuda
des>. Algunos de los proyectos financiados por los Fondos Feder relativos a estas ciudades españolas.

118 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Implicaciones Jurídicas de la Implementación de Ciudades Inteligentes en la Unión Europea y en España

El Gobierno de España participa en estos proyectos a través del Ministerio de


Asuntos Económicos y Transformación Digital y red.es, una de las entidades
públicas en la implantación de ciudades inteligentes en España que actualmente
ejecuta la convocatoria de proyectos de ciudades e islas inteligentes, una parte
esencial del Plan Nacional de Ciudades Inteligentes, dotado de un presupuesto de
188 millones de euros y cuyo objetivo es mejorar la eficacia y eficiencia de las
entidades locales en la prestación de servicios públicos a través de las TIC y avanzar en
el sistema de ciudad y destino turístico inteligente17.
Como se ha visto, el concepto de ciudad inteligente comprende múltiples
aspectos, vinculados en cuanto a su finalidad pero muy diversos en cuanto a la normativa
que los regula. Sin ánimo de exhaustividad, si analizamos la ciudad inteligente
tendremos que profundizar en aspectos como la protección de datos personales, el
mercado único digital, los datos abiertos, la contratación pública, el uso de la inteligencia
artificial y su impacto en la toma de decisiones, el impacto de las TIC en nuestro actual
modelo de democracia liberal, la participación ciudadana, el concepto de ciudad
accesible y la inclusión de las personas con discapacidad o la administración digital.
En este sentido, el concepto de smart city como expone VELASCO RICO18
puede considerarse un fenómeno transversal que puede, y debe, ser abordado desde
múltiples ramas del conocimiento. Defiende esta autora que, pese a que el concepto no
sea jurídico y tenga unos perfiles poco definidos “para los estudiosos del Derecho
Administrativo, permite ampliar los límites de la disciplina, en el sentido que las
ciudades inteligentes invitan al Derecho Administrativo a actuar en escenarios
escasamente explorados o incluso inexistentes antes de esta nueva experimentación. En
definitiva, el concepto de ciudades inteligentes acerca al Derecho administrativo al
universo de las políticas públicas”. Considera que se está imponiendo una visión
tecnocrática en este ámbito que se fundamenta en la consideración de que las políticas
que se basan en datos actualizados son más inteligentes y que la ciudad es un espacio que
se puede dirigir en tiempo real mediante el uso de las TIC y el cloud computing.
Compartimos, no obstante su opinión de que “Esta visión tecnocrática no puede
obscurecer la importancia de los derechos de los ciudadanos en dicho entorno, y,
justamente, el papel del Derecho Administrativo y de sus instituciones y categorías juega
un papel central en la tutela y garantía de aquellos”19.
Además de los aspectos jurídicos, algunos de los cuales abordaremos a
continuación, resulta necesario una homogeneización o al menos una interoperabilidad o
compatibilidad de los proyectos de ciudad inteligente, ya que las primeras experiencias
adolecían de heterogeneidad y una dimensión insuficiente de los proyectos20. Es
17
Véase, a este respecto, la web del Plan Nacional red.es <https://www.red.es/redes/es/que-hacemos/
ciudades-inteligentes>.
18
VELASCO RICO, Clara Isabel, “La ciudad inteligente: entre la transparencia y el control”, Revista General
de Derecho Administrativo, n. 50, enero 2019. Disponible en: <https://www.iustel.com/v2/revistas/detall
e_revista.asp?id_noticia=421181>.
19
Ibidem.
20
Según el Informe de AENOR “Normalización en ciudades inteligentes-España (CTN 1978), p. 3.
Disponible en: <https://portal.aenormas.aenor.com/descargasweb/normas/aenor-Spanish-standardization-on
-Smart-Cities-CTN-178.pdf>.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 119


Francisco Javier Durán Ruiz

imprescindible, pues la estandarización, y en este sentido en España, las iniciativas en


materia de ciudad inteligente deben ajustarse a las normas desarrolladas por el Comité
Técnico de Normalización de AENOR – AEN/CTN 178 “Ciudades Inteligentes”21, que
ha aprobado a día de hoy más de una treintena de normas técnicas de estandarización en
cinco ámbitos de las smart cities: infraestructuras, indicadores y semántica, gobierno y
movilidad y energía y medio ambiente22. Los 300 expertos que forman parte del Comité
CTN, pertenecientes a las diferentes Administraciones Públicas implicadas, a la industria
de este sector y a entidades asociativas públicas y privadas representativas de intereses
diversos se agrupan en 25 grupos de trabajo pertenecientes a cinco subcomités
responsables de la normalización en cada uno de los ejes temáticos analizados.
La colaboración público-privada es patente en este ámbito, pues el liderazgo del
Comité CTN 178 parte de la iniciativa pública pero el Comité en sí forma parte de UNE,
asociación de base privada. Por otra parte, las normas técnicas de estandarización que
aprueba el Comité son una surte de softlaw, en ausencia de normativa reguladora expresa
en materia de proyectos de ciudad inteligente. Debemos recordar aquí que las normas de
estandarización aprobadas por los Comités de la UNE son de cumplimiento voluntario,
si bien en determinados ámbitos la legislación sectorial o las Administraciones públicas
pueden exigir su cumplimiento. Se opta en este sentido por la colaboración entre lo
público y lo privado en el desarrollo de las ciudades inteligentes como la mejor forma de
avanzar en este ámbito en lugar de por la regulación estricta desde el sector público23.

4 IMPLICACIONES Y RETOS JURÍDICOS DE LAS CIUDADES


INTELIGENTES
El desarrollo de ciudades inteligentes puede traer consigo una serie de
implicaciones jurídicas que es importante tener en cuenta:
a) Las técnicas de Big data e Inteligencia Artificial y la normativa de protección
de datos de carácter personal (nos remitimos en este sentido al apartado 4.1)
b) La normativa sobre Administración electrónica. En este sentido debemos tener
en cuenta que, con tras la aprobación de las leyes 39/2015, de 1 de octubre, de
Procedimiento Administrativo Común, y 40/2015, de 1 de octubre, de Régimen Jurídico
del Sector Público, el uso de medios electrónicos es el instrumento principal de
gestión de los datos y de la información por las Administraciones Públicas,
quedando el papel y los trámites “físicos” cada vez más relegados. La actual situación de
teletrabajo y cierre de hecho de las sedes físicas de las Administraciones públicas

21
Su creación en 2012 se debió a la entonces Secretaría de Estado de Telecomunicaciones y para la Sociedad
de la Información (SETSI). El Comité se creó en el seno de la Asociación Española de Normalización y
Certificación AENOR, cuya actividad ha asumido en la actualidad la Asociación Española de
Normalización, UNE, entidad privada de base asociativa.
22
Véase la web de la UNE. Comité CTN 178 – Ciudades Inteligentes, <https://www.une.org/encuentra-tu-
norma/comites-tecnicos-de-normalizacion/comite?c=CTN%20178>.
23
Vid. por ejemplo, los convenios entre La red Española de Ciudades Inteligentes <www.reddeciu
dadesinteligentes.es> (asociación privada formada por representantes de las ciudades inteligentes españolas
y de la FEMP-Federación Española de Municipios y Provincias) con la entidad pública red.es.

120 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Implicaciones Jurídicas de la Implementación de Ciudades Inteligentes en la Unión Europea y en España

causada por el estado de alarma y el confinamiento declarados a raíz de la pandemia del


virus covid19, acentúa y acelera la importancia y el avance de la Administración
electrónica.
El proceso no está exento de dificultades y ha evidenciado errores graves en su
funcionamiento y desarrollo, pero una vez culminada la implantación de los medios
tecnológicos requeridos será posible acceder de manera inmediata y automatizada a los
datos que se generen en relación con cualquier trámite o gestión que realice un
ciudadano ante las Administraciones Públicas, siempre respetando la normativa sobre
protección de datos. La información así generada debe respetar los estándares
establecidos para facilitar su reutilización y los sistemas de almacenamiento y gestión
deben ser interoperables como base fundamental para el buen funcionamiento y avance
de las ciudades inteligentes.
c) Transparencia: las ciudades inteligentes deben someterse igualmente a la
disposiciones sobre transparencia y acceso a la información del sector público,
especialmente a la Ley 19/2013, de 9 de diciembre, de Transparencia, Acceso a la
Información Pública y Buen Gobierno. No se puede reutilizar la información y los datos,
base como hemos comentado de la ciudad inteligente, si no se puede acceder a ellos. La
normativa reguladora de la transparencia y el derecho de acceso a la información pública
es la base y la garantía del acceso a los datos que necesita la ciudad inteligente.
d) Reutilización de datos/información: los proyectos de ciudad inteligente deben
adaptarse también a la normativa sobre la reutilización de la información del sector
público: Ley 37/2007, de 16 de noviembre, sobre reutilización de la información del
sector público. Para ello es necesario que los datos sean abiertos24 y reutilizables. El
problema es que, mientras que los municipios pueden imponer a sus entes instrumentales
y a las empresas adjudicatarias obligaciones de apertura de datos mediante las
prescripciones técnicas de los contratos, no puede hacer lo mismo con los actores
privados implicados en los proyectos de ciudad inteligente, principalmente empresas
tecnológicas y consultoras. En este sentido Valero Torrijos opina que en cuestiones
concretas como el cumplimiento de los estándares de reutilización o las obligaciones de
datos abiertos, sería necesario ampliar el ámbito subjetivo de las normas administrativas
ya sea modificándolo directamente, ya sea extendiéndolo a través de cláusulas
contractuales. Esto cuando haya relación jurídica entre la administración municipal y los
sujetos privados en la ciudad inteligente, cuando no sea así deberá recurrirse a fórmulas
de colaboración u otras técnicas de open government que propicien la accesibilidad o la
cesión de datos para su tratamiento por terceros25.

24
Vid. en relación al marco normativo aplicable a las ciudades inteligentes desde la perspectiva de los datos
abiertos el Informe “Datos abiertos y ciudades inteligentes: una visión alternativa desde el Derecho”, del
Ministerio de Hacienda y Función Pública, Ministerio de Energía, Turismo y Agenda Digital, red.es y la
iniciativa “aporta” de julio de 2017. Disponible en: <https://datos--gob--es.insuit.net/sites/default/files/
doc/file/informe_datos_abiertos_y_ciudades_inteligentes.pdf> (consultado el 30.06.2020).
25
VALERO TORRIJOS, J. “La innovación tecnológica al servicio de la transparencia en la contratación
pública. La Plataforma PLAN como ejemplo del cambio de paradigma”, en GUERRERO MANSO,
Carmen (Coord.) y GIMENO FELIÚ, José María (Dir.), Observatorio de los contratos públicos 2017, pp.
447 y ss.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 121


Francisco Javier Durán Ruiz

e) Participación ciudadana26: las ciudades inteligentes se basan en los datos, a


partir de los cuales se gestiona la ciudad tomando decisiones con técnicas de Big data e
Inteligencia Artificial basadas en algoritmos. Existen numerosos problemas éticos,
legales y políticos derivados de la creación y utilización de estos algoritmos. Es
importante que el principio de transparencia se amplíe también a los algoritmos, y que no
se produzca una confianza ciega en los mismos por su “base científica”, ya que están
programados por personas que pueden tener sesgos (de discriminación por raza, etnia,
condición sexual, etc.) que ni siquiera ellos conocen y que pueden acabar trasladándose
al algoritmo. Resulta fundamental que los ciudadanos no solo tengan acceso a los datos
públicos, sino que también puedan participar y tengan acceso al diseño y control de los
algoritmos sobre la base de las cuales se van, por ejemplo, a elaborar perfiles de los
propios ciudadanos y tomar decisiones basadas en dichos perfiles. A este respecto, el
artículo 22 del Reglamento (UE) del Parlamento Europeo y del Consejo de
27.04.2016, relativo a la protección de las personas físicas en lo que respecta al
tratamiento de datos personales y a la libre circulación de estos datos y por el que se
deroga la Directiva 95/46/CE (Reglamento general de protección de datos o RGPD,
en lo sucesivo), bajo el título de “Decisiones individuales automatizadas, incluida la
elaboración de perfiles”, impide que puedan adoptarse decisiones con efectos
jurídicos o con efectos similares sobre las personas de forma automatizada
basándose en perfiles y sin intervención humana, al establecer que: “1. Todo
interesado tendrá derecho a no ser objeto de una decisión basada únicamente en el
tratamiento automatizado, incluida la elaboración de perfiles, que produzca efectos
jurídicos en él o le afecte significativamente de modo similar.”
Vemos que una de las implicaciones jurídicas que más preocupación causa en
cuanto a las ciudades inteligentes es la relacionada con la privacidad de los ciudadanos,
que pueden ver mermada su intimidad o la protección de su esfera más personal o
familiar por el control que las ciudades puedan hacer sobre sus datos para el correcto
desarrollo de esa smart citiy.
Un caso que en mi opinión vulnera claramente los derechos de los ciudadanos a
la intimidad, privacidad, libertad personal, protección de datos personales y no
discriminación es el “sistema de crédito social” de China, que ya se encuentra en
funcionamiento27. Este sistema otorga una puntuación a cada ciudadano en función
de sus hábitos cívicos, su estilo de vida, las páginas web por las que navega, lo que

26
Nos remitimos en este apartado a las interesantes reflexiones de VELASCO RICO, Clara Isabel, “La ciudad
inteligente (…)”, cit.
27
Estos castigos ya se están produciendo en la práctica. Por ejemplo, a 12 millones de chinos ya se les ha
prohibido de comprar billetes domésticos de avión y tren. El problema es que, aunque los castigos y
represalias son conocidas, el funcionamiento del algoritmo que determina la posición de un individuo en la
escala social es incierto, uniendo al problema de la vulneración de derechos la inseguridad jurídica para los
ciudadanos y mostrando como las TIC pueden usarse, como cualquier herramienta humana, de forma
ambivalente aportando libertad y mejoras en la vida cotidiana de las personas o todo lo contrario
(OLLERO, Daniel J. Elmundo.es “Comunismo por puntos: China activa una tecnología para medir el ‘valor
social ‘ de cada ciudadano”, 31-10-2018), disponible en <https://www.elmundo.es/tecnologia/2018.10.31/
5bd8c1bfe2704e526f8b4578.html>. Vid también DUBOIS de PRISQUE, E., “Le système de crédit social
chinois. Comment Pékin évalue, récompense et punit sa population“, Futuribles. n. 434, 2020, pp. 27-48.

122 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Implicaciones Jurídicas de la Implementación de Ciudades Inteligentes en la Unión Europea y en España

compra en internet y otras variables como sus infracciones de tráfico. La puntuación


obtenida marca la posición de los ciudadanos en la escala social del país de modo
que, aquellos con un crédito alto, tendrán derecho a un trato preferente por parte de
la Administración. Por el contrario, aquellos con una puntuación baja, enfrentan
represalias como la imposibilidad de acceder a determinados puestos de trabajo, la
prohibición de comprar billetes de tren o avión, de alojarse en los mejores hoteles,
de que sus hijos vayan a un buen colegio o, incluso, que el estado les quite a sus
mascotas. Todo eso además de ser incluidos en listas negras públicas de malos
ciudadanos. El sistema crédito social de China es posible gracias a la combinación e
integración de varias tecnologías de Big data, reconocimiento facial y la
monitorización de internet en un entorno cuyas libertades no son comparables a los
de una democracia occidental y con la ayuda por más de 600.000 cámaras de
vigilancia con inteligencia artificial. La mayor parte de los datos que otorgan la
puntuación de cada ciudadano en el sistema de crédito social proviene de los
historiales de internet de los propios ciudadanos chinos, aunque también se tienen en
cuenta factores económicos tales como retrasos en el pago de facturas o sanciones
administrativas y/o penales que castigan comportamientos incívicos.
Una ciudad inteligente funciona normalmente través de aplicaciones móviles que,
desarrolladas por el organismo público que gestiona la misma (en España normalmente
será el Ayuntamiento) permite a los usuarios compartir información sobre la ciudad en la
que habitan para que dicha información se transforme en datos útiles que permitan un
mejor y más personalizado desarrollo de los servicios públicos, un ahorro en
determinados costes o la implementación de determinadas funcionalidades o facilidades
para los ciudadanos, como ya hemos subrayado.
Asimismo, muchas ciudades implementan redes wi-fi públicas para que los
ciudadanos se registren previamente y se conecten a través de ellas, pudiendo conocer
los entes públicos a través de las mismas, cuestiones como la localización exacta de cada
usuario, los medios de transporte que utiliza o las páginas web que visita, entre otras, lo
que constituye información de gran valor para dichos entes públicos.
Esta realidad evidencia que el avance de una ciudad inteligente no puede
entenderse sin la recopilación de millones de datos de sus habitantes. Aunque en muchos
casos dichos datos se tratan por las administraciones públicas correspondientes de
manera agregada o disociada, de tal manera que no sea posible identificar al ciudadano
concreto al que pertenecen los datos (pej. con la identificación de patrones relativos a la
edad, al sexo o estado civil), lo cierto es que en muchos otros casos resultaría posible
para los organismos públicos que actúan detrás de esas ciudad conectada identificar a los
usuarios que interactúan con ella, mediante la reidentificación o inferencia.
Resulta evidente que si no se cumple con las garantías adecuadas, el desarrollo de
la ciudad inteligente podría suponer una injerencia desmesurada en la intimidad y en la
privacidad de sus ciudadanos. Dichas garantías, entre otras cuestiones, pasarían por
solicitar, a los ciudadanos que accedan (de manera voluntaria) a los servicios conectados
proporcionados por la smart city, solo aquellos datos estrictamente necesarios para la
prestación del servicio o funcionalidad concreta, sin recabar en ningún caso datos que
puedan resultar desproporcionados o excesivos para la finalidad perseguida.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 123


Francisco Javier Durán Ruiz

Además, se deberá informar de manera muy clara a los ciudadanos, entre otras
cuestiones, de para qué se van a tratar sus datos, quién lo va a hacer y durante cuánto
tiempo. Y se deberá, en la medida de lo posible, evitar la utilización de datos
individualizados: esto se consigue mediante técnicas de anonimización y
seudonimización, se utilizarán únicamente datos agregados que no permitan la
identificación directa de los ciudadanos.
4.1 Ciudades Inteligentes, Big data y Derechos Fundamentales de los Habitantes de
la Ciudad
Hablar de ciudades inteligentes sin hablar de Big data carecería de sentido. El
Big data puede ser definido como “grandes cantidades de datos digitalizados que son
controlados por las empresas, autoridades públicas y otras grandes organizaciones que
poseen la tecnología para realizar un análisis extenso de los mismos basado en el uso de
algoritmos”28. El término Big data hace referencia a una acumulación masiva de datos
tal, que supera la capacidad de las herramientas tradicionales para que sean capturados,
gestionados y procesados en un tiempo razonable29. Se considera que un conjunto de
datos entra dentro de la categoría de Big data si requiere analistas especializados al ser
demasiado grande como para manejarlo de forma apropiada con los programas
convencionales de software disponibles para el público en general. El enfoque de la
recopilación, análisis, procesamiento y visualización de cantidades masivas de datos,
no necesariamente estructurados, para la toma de decisiones, es bastante reciente,
pero está adquiriendo cada vez más relevancia y presenta un enorme potencial,
gracias a la acumulación masiva de datos favorecida por la implantación
generalizada de las TIC. La esencia del Big data radica en el uso de los datos para
resolver problemas, ya sea en el ámbito empresarial, personal o en el de las
Administraciones públicas, lo que le da un enorme potencial en el ámbito de las
ciudades inteligentes.
Entre las características comunes del Big data, independientemente del sector
del que estemos hablando, encontramos entre ellas además de la variedad, volumen
y velocidad (“las 3 v”), una cuarta “v”, la veracidad, a la que se añade también

28
Definición del International Working Group on Data Protection in Telecommunications: IWGDPT (Grupo
de Telecomunicaciones de Berlín). Según Álvarez Hernando en su Guía Práctica sobre Protección de
Datos de 2010 (p. 576), el Grupo de Berlín se constituyó en 1983, en el marco de la Conferencia
Internacional de Protección de Datos y Privacidad en la iniciativa del Alto Comisionado de Berlín de
protección de datos, a iniciativa de la autoridad de protección de datos del Länder de Berlín, donde tiene su
sede. Agrupa, junto a representantes de las autoridades de control de un gran número de estados, a
representantes de organizaciones internacionales públicas y privadas, y a representantes de los sectores
industriales implicados. Se trata en definitiva, de un foro de trabajo abierto que pretende debatir sobre las
implicaciones del uso de las telecomunicaciones en la esfera privada de los individuos y en la protección de
sus datos personales, procurando anticiparse a los problemas que se plantean en la práctica. La Agencia
Española de Protección de Datos participa regularmente en las actividades de dicho grupo que se reúne con
carácter semestral en distintos países del mundo. Asimismo, el Grupo emite dictámenes y documentos de
trabajo.
29
BALDOMINOS GÓMEZ, Alejandro, MOCHÓN MORCILLO, Francisco, NAVAS DELGADO, Ismael,
et. al., Introducción al Big Data, García-Maroto Editores, Madrid, 2016, p. 48.

124 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Implicaciones Jurídicas de la Implementación de Ciudades Inteligentes en la Unión Europea y en España

normalmente una quinta “v”, referida la valorización30. El volumen hace referencia a


la gran cantidad de datos disponibles o accesibles. Debe considerarse que muchos de
esos datos disponibles no porque no tendrán calidad o porque no tendrán utilidad
para la finalidad perseguida, no obstante, volumen de información es enorme,
continuo y creciente. En este sentido, las distintas fuentes de información de donde
pueden obtenerse datos hacen referencia a la característica de la variedad. Los datos
pueden obtenerse estructurados y organizados o datos desestructurados, ya
provengan de texto, música, imágenes, tablas, cifras, transacciones, formularios y un
largo etcétera. La variedad de la procedencia de los datos genera valor en el Big
data, pero también complejidad a la hora de trabajar con la información, por lo que
resulta necesaria la veracidad como característica de los datos. El Big data ha de ser
capaz de tratar y analizar inteligentemente el gran volumen de datos con la finalidad
de obtener una información verídica y útil que nos permita mejorar nuestra toma de
decisiones. Por último, la velocidad en la generación de datos es vertiginosa y afecta
a la toma de decisiones que se pretende mejorar con el uso del Big data, y de ahí
deriva su complejidad, de la enorme cantidad de información cambiante por su
magnitud, sobre la base de la cual hay que tomar una decisión.
Conociendo y comprendiendo la cantidad de datos disponibles a través de las
TIC, junto con las diversas acciones para obtener tales datos, el paso siguiente es
incorporar la utilidad, y a ello hace referencia el término de valorización. Es decir,
identificar, en el caso de las ciudades inteligentes cómo el gobierno municipal puede
analizar los datos y extraer conclusiones para realizar acciones como predecir
comportamientos de los usuarios de servicios públicos, identificar gustos o
necesidades por grupos de usuarios o segmentación y su posterior aplicación a la
prestación de los servicios31.
En definitiva, el Big data o macrodatos supone la recopilación de cantidades
masivas de datos por parte de organizaciones públicas o privadas que, mediante la
utilización de herramientas tecnológicas de Inteligencia Artificial y Aprendizaje
Automático (Machine Learning) basadas en algoritmos, son capaces de analizar
dichos datos de cara a obtener información que pueda resultar muy valiosa y
rentable. Y es por ello que el Big data está íntimamente ligado con las smart cities y
el IoT (IdC – Internet de las Cosas), así como con la privacidad y la protección de
datos personales, siempre que su utilización implique el tratamiento de los mismos.
En relación con el tratamiento de datos personales el marco normativo básico
de referencia es la Ley Orgánica 3/2018, de 5 de diciembre, de Protección de Datos
Personales y garantía de los derechos digitales que adapta la legislación española al
RGPD de la Unión Europea. Esta normativa establece ciertos principios de
protección de datos que son de cumplimiento obligado en todo proyecto relativo a

30
ISHWARAPPA y ANURADHA, J., “A brief introduction on Big Data 5vs characteristics and Hadoop
technology”, Procedia Computer Science, n. 48, p. 320 y 321.
31
Permítase la remisión, sobre esta cuestión, a DURÁN RUIZ, Francisco Javier, “Big data aplicado a la
mejora de los servicios públicos y protección de datos personales”, Revista de la Escuela Jacobea de
Postgrado, n. 12, 2018, pp. 33-74.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 125


Francisco Javier Durán Ruiz

una ciudad inteligente. Destacan entre otros el principio de minimización de datos,


que implica que la información recogida y procesada será la mínima imprescindible
para atender la finalidad perseguida, la obligación de seudonimización32 o el
principio de privacidad desde el diseño. No tendrán obligación de respetar esta
normativa los proyectos que se lleven a cabo a partir de datos anonimizados,
puesto que como señala el RGPD en Considerando 26 “los principios de
protección de datos no deben aplicarse a la información anónima, es decir
información que no guarda relación con una persona física identificada o
identificable, ni a los datos convertidos en anónimos de forma que el interesado
no sea identificable, o deje de serlo”.
En este sentido, y para poder determinar si existe tratamiento de datos
personales y utilización de técnicas de Big data en las smart cities, resultaría preciso
establecer primero si la información recopilada va a ser objeto de tratamiento (la
respuesta lógicamente es positiva, pues se utilizarán y se tratarán para diseñar,
mejorar y prestar servicios a los ciudadanos) y segundo, si dicha información hace o
no identificables a los usuarios finales implicados. Como bien señala la normativa de
protección de datos, existen técnicas que permiten reducir los riesgos inherentes al
tratamiento máximo de datos personales, como pueden ser la anonimización y la
seudonimización. Pero dichas técnicas no deben confundirse: mientras que la
anonimización permite que la persona en concreto no pueda ser identificable, ya que
se disocia por completo el vínculo con el dato personal, los seudonimización no
elimina esa vinculación con los datos de la persona, sino que asigna al usuario una
serie de datos que no lo hacen a priori identificable pero que, en conexión con otros
datos, permitirían asociarse a un usuario concreto.
En particular, lo que hay que tener presente en relación con la utilización de
técnicas de Big data en las smart cities es la necesidad de utilizar ciertas técnicas
que permitan que se haga un tratamiento masivo de datos de manera responsable y
segura, de cara a proteger en todo momento los derechos y libertades de los propios
usuarios, que podrían ver cómo sus datos o su información personal es
comercializada por terceras empresas en su propio beneficio, intentando evitar en la
medida de lo posible que la información recabada se identifique directamente con
cada usuario final. Y es por ello que resultaría ampliamente recomendable utilizar
técnicas de anonimización o, en su caso, de seudonimización, que hagan que no sea
posible identificar el usuario final de los servicios de la smart city y que garanticen
que la información se trate únicamente de manera agregada y disociada.
Antes de llevar a cabo un proyecto de ciudad inteligente, en relación con la
protección de datos personales, se deberá realizar, según dispone la Sección 3 del
RGPD relativa a “Evaluación de impacto relativa a la protección de datos y consulta
previa”, un análisis de varias cuestiones: 1) el volumen de la información sujeta a

32
El artículo 4.5 del RGPD de la UE establece que la seudonimización es “el tratamiento de datos personales
de manera tal que ya no puedan atribuirse a un interesado sin utilizar información adicional, siempre que
dicha información adicional figure por separado y esté sujeta a medidas técnicas y organizativas destinadas
a garantizar que los datos personales no se atribuyan a una persona física identificada o identificable”.

126 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Implicaciones Jurídicas de la Implementación de Ciudades Inteligentes en la Unión Europea y en España

tratamiento, 2) el número y tipo de fuentes que se van a utilizar para obtener los
datos o la información, y 3) el tiempo de conservación de dicha información
(artículo 35 RGPD). Esta evaluación previa, deberá incluir por lo menos “a) una
descripción sistemática de las operaciones de tratamiento previstas y de los fines del
tratamiento, inclusive, cuando proceda, el interés legítimo perseguido por el
responsable del tratamiento; b) una evaluación de la necesidad y la proporcionalidad
de las operaciones de tratamiento con respecto a su finalidad; c) una evaluación de
los riesgos para los derechos y libertades de [las personas físicas]; y d) las medidas
previstas para afrontar los riesgos, incluidas garantías, medidas de seguridad y
mecanismos que garanticen la protección de datos personales, y a demostrar la
conformidad con el presente Reglamento” (artículo 35.7 del RGDP).
Adicionalmente, debería procederse a consultar a la Autoridad de Protección de
Datos, según el art. 36.1 RGPD que dispone que el responsable del tratamiento
“consultará a la autoridad de control antes de proceder al tratamiento cuando una
evaluación de impacto relativa a la protección de los datos en virtud del artículo 35
muestre que el tratamiento entrañaría un alto riesgo si el responsable no toma medidas
para mitigarlo”.
Otra consideración previa al desarrollo de proyectos de smart cities es el
consentimiento previo de las personas afectadas para la recogida y tratamiento de los
datos. A este respecto, es importante recordar que, como regla general, las
Administraciones Públicas no necesitan el consentimiento de los titulares de los datos
cuando los recojan para el ejercicio de sus propias competencias, siempre y cuando su
uso sea lícito y conforme a derecho y los datos a utilizar sean proporcionados. Se trata de
una prerrogativa de las Administraciones que no puede aplicarse de manera directa a las
operaciones de explotación comercial de la información personal, puesto que en este
caso el es incompatible con el fin que en principio justificó su recogida y tratamiento, por
mucho que el acceso a los mismos se considere necesario para poder desarrollar el
concreto proyecto.
En las ciudades inteligentes, las operaciones de tratamiento de datos que se
realizan no son simples cesiones de datos, sino interconexiones generalizadas entre
diversos actores cuyas características fundamentales son su carácter masivo y
automatizado. Como en las ciudades inteligentes se integran servicios diversos y se
produce una gestión horizontal y no vertical de los mismos, que va más allá de cada uno
de los servicios considerados separadamente, esto afecta directamente al principio de
calidad de los datos, según el cual los mismos no podrían utilizarse para otras finalidades
incompatibles con las que justificaron su recogida.
A excepción de lo dicho respecto a los datos recabados y tratados por las
Administraciones Públicas para el ejercicio de sus competencias, todo el sistema de
protección de los datos personales, se fundamenta en la idea de que el tratamiento de
datos de carácter personal requiere el consentimiento previo e inequívoco de la persona
interesada o titular de los mismos, pues este principio permite a la persona ejercer el
control efectivo del uso de sus datos por parte de terceros. Esto se traduce en los
requisitos que recoge el RGPD para que el consentimiento del interesado permita el

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 127


Francisco Javier Durán Ruiz

tratamiento de sus datos personales: que sea libre, específico, informado e inequívoco, y
que se realice ya sea mediante una declaración o mediante una clara acción afirmativa,
nunca de forma implícita o supuesta. Así, el Reglamento General define “consentimiento
del interesado” (art. 4 apartado 11) como: “toda manifestación de voluntad libre,
específica, informada e inequívoca por la que el interesado acepta, ya sea mediante una
declaración o una clara acción afirmativa, el tratamiento de datos personales que le
conciernen”33, y del mismo modo lo reproduce el art. 6 de la nueva LOPD bajo el título
“tratamiento basado en el consentimiento del afectado”.
El RGPD ha supuesto por tanto un endurecimiento de los requisitos para que el
consentimiento otorgado pueda considerarse válido. El consentimiento tácito ya no es
válido, y no solo eso, cuando el tratamiento de los datos tenga varios fines diferentes,
el consentimiento debe darse para todos y cada uno de ellos, como recoge el art. 6.2 de la
LOPD 3/2018: “Cuando se pretenda fundar el tratamiento de los datos en el
consentimiento del afectado para una pluralidad de finalidades será preciso que conste
de manera específica e inequívoca que dicho consentimiento se otorga para todas ellas”.
El consentimiento, como bien ha subrayado el GT 2934, si se utiliza
correctamente “es una herramienta que otorga al sujeto un control sobre el
tratamiento de sus datos. Si se utiliza de manera incorrecta, el control del sujeto se
convierte en ilusorio y entonces el consentimiento constituye una base inapropiada
para el tratamiento de los datos”.
Ha quedado patente en los tiempos más recientes la insuficiencia de las políticas
de privacidad y la prestación del consentimiento por el usuario a dichas políticas,
considerando que la inmensa mayoría de los usuarios ni siquiera lee los términos de las
políticas de privacidad o si los lee no alcanza a comprenderlos. Por ello, al albur de la
implantación del principio de transparencia, que se recoge en el art. 12 RGPD y el art. 11
LOPD y juega un papel importante, se ha incorporado la necesidad de otra redacción de
las políticas de privacidad, que garantice una notificación efectiva, y de un desarrollo de
los mecanismos que permitan otorgar un consentimiento informado.
Con la introducción de nuevas tecnologías de la información como Big data, el
consentimiento resulta por sí mismo claramente insuficiente para la protección de los
datos personales, y se pone en entredicho que sea un consentimiento verdaderamente

33
El carácter específico del consentimiento “indica que el consentimiento debe referirse a una determinada
operación de tratamiento y para una finalidad determinada, explícita y legítima del responsable del
tratamiento. Su carácter informado implica como hemos mencionado que el afectado o afectada conozca
con anterioridad al tratamiento la existencia del mismo y las finalidades para las que el mismo se produce.
Por último el consentimiento debe ser inequívoco, por lo que no cabe deducirlo tácita o presuntamente de
los simples actos realizados por el afectado o afectada, siendo preciso que exista expresamente una acción u
omisión que implique la existencia del consentimiento” [DURÁN RUIZ, Francisco Javier, “Protección de
datos personales de los menores en los centros docentes”, DURÁN RUIZ, Francisco Javier y SAID HUNG,
Elías (Dirs.), TICs y Sociedad Digital: educación, infancia y derecho, Comares, Granada, 2015, p. 391].
34
Grupo de Trabajo del artículo 29, Opinion 06/2014 on the notion of legitimate interests of the data controller
under Article 7 of Directive 95/46/EC (2014); Opinion 15/2011 on the definition of consent (2011).

128 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Implicaciones Jurídicas de la Implementación de Ciudades Inteligentes en la Unión Europea y en España

informado35 e igualmente el principio de calidad de los datos, ya que los datos son
usados claramente para finalidades distintas a aquellas que motivaron su obtención,
como fácilmente puede ocurrir en los proyectos de ciudades inteligentes. No obstante,
como hemos manifestado los datos pueden usarse si por la anonimización han dejado de
considerarse datos personales y por tanto no están sometidos a la normativa sobre
protección de datos (Considerando 30 RGPD).
Aunque se han planteado soluciones a la redacción de la información para
garantizar que el consentimiento de los usuarios sea verdaderamente un consentimiento
informado. Reiteramos aquí que “El funcionamiento de nuevas TIC como Big data
dificulta enormemente esta labor, puesto que los datos se mueven de un lugar a otro, de
un receptor a otro de forma impredecible, y especialmente porque el valor que pueden
tener los datos no se conoce ni se puede conocer en el momento en que son recogidos,
convirtiendo el consentimiento en un ‘todo incluido’ y desvirtuando o vulnerando entre
otros principio esenciales de la protección de datos como el de calidad de los datos”36.
En este sentido y en relación a esta tecnología, Gil González37 pone de manifiesto
que “la cadena de emisores y receptores de datos es potencialmente infinita, e incluye
actores e instituciones cuyo rol y responsabilidades no están delimitados o
comprendidos. Así, la cesión de datos puede llegar a ser relativamente oscura”. Plantea
la pregunta de si la obligación del responsable del tratamiento de informar sobre la
recogida de los datos se circunscribe a la información que explícitamente recoge, o si
debe adoptarse un criterio más amplio y entender que este deber de información también
alcanza a aquella información que la institución pudiera obtener tras el tratamiento, como
puede suceder si se produce una reutilización o cesión de la información para su
tratamiento mediante Big data por terceros a partir de los datos recabados por la
Administración municipal en una ciudad inteligente.
La doctrina mayoritaria opina que el consentimiento y la información que se
proporciona a la persona que lo presta debe referirse también a la información que se
puede extraer de un análisis sofisticado de los datos personales, incluida la información
que pueda extraerse agregando esos datos con otros ficheros y fuentes, y no solo al hecho
de que se recaben datos primarios. Sin embargo, en la práctica, por las propias
características y naturaleza de tecnologías como Big data, en que no se pueden predecir
los resultados o relaciones que se obtendrán de los datos, esta solución parece
impracticable. Si el propio responsable del tratamiento no puede saber con antelación
que utilidad, aplicación o resultados arrojarán los datos obtenidos, no puede darse la

35
El principio de información es básico en la protección de datos personales. Aparecía en el art. art. 5 de la
LOPD de 1999 bajo el título “Derecho de información en la recogida de datos” y se ha recogido como se ha
dicho en el art. 11 “Transparencia e información al afectado” de la LOPD de 2018.
36
DURÁN RUIZ, Francisco Javier, “El tratamiento de los datos personales de los menores de edad en la
nueva normativa de protección de datos”, en GARCÍA GARNICA, María del Carmen, y MARCHAL
ESCALON, Nuria (Dirs.); QUESADA PÁEZ, Abigail y MORENO CORDERO, Gisela (Coords.),
Aproximación interdisciplinar a los retos actuales de protección de la infancia dentro y fuera de la
familia”, Cizur Menor, Thonson Reuters Aranzadi, 2019, pp.478-479
37
GIL GONZÁLEZ, Elena, Big Data, privacidad y protección de datos, Agencia Española de Protección de
Datos y Boletín Oficial del Estado, Madrid, 2016, p. 73.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 129


Francisco Javier Durán Ruiz

información con carácter previo al usuario sobre la finalidad para la que se recaban los
datos. Como plantea Gil González38 “ha surgido una nueva dificultad derivada del
hecho de que el mayor valor de la información ya no reside en un uso primario, sino que
ahora se encuentra en los usos secundarios, y esto afecta al núcleo de la protección de
datos personales”.
Esto ha llevado a los expertos, como la citada, cuya opinión compartimos39, a
plantear que la atención no puede estar tan centrada en el momento de prestación del
consentimiento para el tratamiento de los datos y en los sistemas para prestar un
verdadero consentimiento informado, sino que debe desplazarse al momento de la
utilización efectiva de los datos, y así debe hacerse en los datos que se recaben para
su tratamiento en las smart cities.

CONCLUSIONES
La tendencia a la concentración de la población en las ciudades hace
imprescindible contar con mecanismos y tecnologías que garanticen la sostenibilidad
de los desarrollos urbanos, el respeto por el medio ambiente, la utilización racional
de los recursos disponibles y el adecuado tratamiento de los residuos generados. Es
esencial, por tanto, una apuesta decidida y global por las ciudades inteligentes, para
mejoren la prestación de servicios públicos y hacer frente a los retos que, a medio
plazo, deben afrontarse a nivel mundial en la gestión de los espacios urbanos.
La Unión Europea está intentando ser un referente mundial en proyectos de
ciudades inteligentes, y está desarrollando para promoverlas: financiar iniciativas y
proyectos en este ámbito, y en segundo lugar la función de armonización o de
coordinación de la legislación de los Estados miembros y de los estándares técnicos
para hacer posible esta realidad. Solo con intervención de la UE podrá crearse un
marco legal y tecnológico homogéneo que facilite un modelo homologable de
ciudad inteligente en todo su territorio. El beneficio más directo de esta política es
que crea un gran mercado interno que incrementa el atractivo de negocio de la UE y
a ello se orienta como veremos el Mercado Único Digital o Digital Single Market
como iniciativa paralela de la UE, de la que es ejemplo el Marco Europeo de
Referencia para la Ciudad Sostenible (RFSC).
España forma parte de esta estrategia europea y está promoviendo numerosos
proyectos cofinanciados con la UE de ciudades inteligentes. Sin embargo, no lo está
haciendo de forma vertical, dictando normativa expresamente que regule este
fenómeno, sino mediante softlaw y colaboración público-privada, que es patente en
este ámbito. Así, lo demuestra el liderazgo público del Comité CTN 178, erigido

38
GIL GONZÁLEZ, Elena “Big data y datos personales: ¿es el consentimiento la mejor manera de proteger
nuestros datos?, Diario La Ley, N. 9050, 27 de Septiembre de 2017.
39
Permítase la remisión, en relación a la insuficiencia del consentimiento como fundamento de la protección
de datos en la actualidad, a DURÁN RUIZ, Francisco Javier, “TIC y protección de datos personales en la
Unión Europea, con especial referencia a los menores y el Reglamento General (UE) 2016/679 de
protección de datos”, en DURÁN RUIZ, Francisco Javier (Dir.), Desafíos de la protección de menores en
la sociedad digital. Internet, redes sociales y comunicación, Tirant Lo Blanch, 2018, pp. 87-124.

130 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Implicaciones Jurídicas de la Implementación de Ciudades Inteligentes en la Unión Europea y en España

para la estandarización técnica necesaria para desarrollar dichos proyectos de


ciudades inteligentes, que forma parte de UNE, asociación de base privada.
Las implicaciones jurídicas que en nuestro país tiene la implantación de las
ciudades inteligentes son numerosas, afectando a la normativa sobre Administración
electrónica, transparencia y derecho de acceso a la información pública,
participación ciudadana y protección de datos personales.
Resulta evidente que si no se cumple con las garantías adecuadas, el
desarrollo de la ciudad inteligente podría suponer una injerencia desmesurada en la
intimidad y en la privacidad de sus ciudadanos y una forma de control social por
parte de la Administración, como el caso expuesto de China.
Antes de llevar a cabo un proyecto de ciudad inteligente, en relación con la
protección de datos personales, se deberá realizar, según dispone la Sección 3 del
RGPD relativa a “Evaluación de impacto relativa a la protección de datos y consulta
previa”, y a nivel nacional el marco normativo básico de referencia es la Ley
Orgánica 3/2018, de 5 de diciembre, de Protección de Datos Personales y garantía de
los derechos digitales que adapta la legislación española al RGPD.
En cumplimiento de la LOPD, el desarrollo de proyectos de smart cities debe
basarse en consentimiento previo de las personas afectadas para la recogida y
tratamiento de los datos, si bien, como regla general, las Administraciones Públicas
no necesitan el consentimiento de los titulares de los datos cuando los recojan para
el ejercicio de sus propias competencias, siempre y cuando su uso sea lícito y
conforme a derecho y los datos a utilizar sean proporcionados. Sin embargo, esta
prerrogativa tiene límites y no puede aplicarse de manera directa a las operaciones
de explotación comercial de la información personal. La naturaleza y
funcionamiento de las técnicas de Big data aplicadas a los datos personales de los
ciudadanos que se recaban y tratan en una ciudad inteligente, motivan que el
consentimiento como base del tratamiento pierda sentido y que sea necesario por
tanto cambiar este paradigma.

BIBLIOGRAFÍA
ÁLVÁDEZ HERNANDO, Javier, Guía Práctica sobre Protección de Datos, cuestiones y formularios,
Lex Nova, Valladolid, 2010.
BALDOMINOS GÓMEZ, Alejandro, MOCHÓN MORCILLO, Francisco, NAVAS DELGADO, Ismael,
et. al., Introducción al Big Data, García-Maroto Editores, Madrid, 2016.
DUBOIS de PRISQUE, E., “Le système de crédit social chinois. Comment Pékin évalue, récompense et
punit sa population“, Futuribles. n. 434, 2020, pp. 27-48.
DURÁN RUIZ, Francisco Javier, “Protección de datos personales de los menores en los centros
docentes”, en DURÁN RUIZ, Francisco Javier y SAID HUNG, Elías (Dirs.), TICs y Sociedad Digital:
educación, infancia y derecho, Comares, Granada, 2015, pp. 385-405.
DURÁN RUIZ, Francisco Javier, “Big data aplicado a la mejora de los servicios públicos y protección de
datos personales”, Revista de la Escuela Jacobea de Postgrado, n. 12, 2018, pp. 33-74.
Durán Ruiz, Francisco Javier, “TIC y protección de datos personales en la Unión Europea, con especial
referencia a los menores y el Reglamento General (UE) 2016/679 de protección de datos”, en DURÁN

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 131


Francisco Javier Durán Ruiz

RUIZ, Francisco Javier (Dir.): Desafíos de la protección de menores en la sociedad digital. Internet,
redes sociales y comunicación, Tirant Lo Blanch, 2018, pp. 87-124.
DURÁN RUIZ, Francisco Javier, “El tratamiento de los datos personales de los menores de edad en la
nueva normativa de protección de datos”, en GARCÍA GARNICA, María del Carmen, y MARCHAL
ESCALON, Nuria (Dirs.); QUESADA PÁEZ, Abigail y MORENO CORDERO, Gisela (Coords.),
Aproximación interdisciplinar a los retos actuales de protección de la infancia dentro y fuera de la
familia”, Cizur Menor, Thonson Reuters Aranzadi, 2019, pp. 473-497.
ISHWARAPPA y ANURADHA, J., “A brief introduction on Big Data 5vs characteristics and Hadoop
technology”, Procedia Computer Science, n. 48, pp. 319-324.
GIL GONZÁLEZ, Elena, Big Data, privacidad y protección de datos, Agencia Española de Protección de
Datos y Boletín Oficial del Estado, Madrid, 2016.
GIL GONZÁLEZ, Elena “Big data y datos personales: ¿es el consentimiento la mejor manera de proteger
nuestros datos?, Diario La Ley, N. 9050, 27 de Septiembre de 2017.
GONZÁLEZ DE ALEDO CASTILLO, Ignacio, “Internet de las cosas”, en RECUERDA GIRELA,
Miguel Ángel, Tecnologías disruptivas. Regulando el furo, Cizur Menor (Navarra), Thomson Reuters
Aranzadi, 2019, pp. 329-356.
VALERO TORRIJOS, J. “La innovación tecnológica al servicio de la transparencia en la contratación
pública. La Plataforma PLAN como ejemplo del cambio de paradigma”, en GUERRERO MANSO,
Carmen (Coord.) y GIMENO FELIÚ, Jose María (Dir.), Observatorio de los contratos públicos 2017, pp.
441-460.
VELASCO RICO, Clara Isabel, “La ciudad inteligente: entre la transparencia y el control”, Revista
General de Derecho Administrativo, n. 50, enero 2019. Disponible en: https://www.iustel.com/v2/revistas
/detalle_revista.asp?id_noticia=421181
VILLAREJO GALENDE, Helena, “Smart cities, una apuesta de la Unión Europea para mejorar los
servicios públicos urbanos”, Revista de Estudios Europeos n. 66, enero-junio, 2015, pp. 25-51.

132 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Implicaciones Jurídicas de la Implementación de Ciudades Inteligentes en la Unión Europea y en España

JUDICIALIZAÇÃO DA SAÚDE UMA QUESTÃO DE


(“IN”) JUSTIÇA – EXPERIÊNCIA BRASILEIRA
JUDICIAL REVIEW OF HEALTH, A MATTER OF
(“IN”) JUSTICE – THE BRAZILIAN EXPERIENCE
DOI: 10.19135/revista.consinter.00011.05
Recebido/Received 28.08.2019 – Aprovado/Approved 04.08.2020
Mirian Pelegrino1– https://orcid.org/0000-0002-5297-8970
E-mail: mirianpelegrino@gmail.com
Eduardo Manuel Val2 – https://orcid.org/0000-0003-0185-2128
E-mail: eduardval11@hotmail.com / eduardo.manuel.val@gmail.com

Resumo: O texto consiste em uma análise do fenômeno da judicialização das políticas


de saúde, que visa amparar direitos fundamentais diante da escassez de recursos e a
colisão em face do princípio da isonomia e da universalidade. O protagonismo judicial
primordial na proteção individual, ao tratar conflitos de saúde pública com dogmas do
direito privado é acusado por vezes, de provocar o rompimento do acesso universal à
saúde com decisões judiciais exorbitantes. Para corrigir e garantir o acesso à saúde de
forma justa e equitativa, o Judiciário vem tentando capacitar e dar subsídios aos
magistrados no embasamento das decisões com respaldo em pareceres técnicos. Para
tanto, o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro em parceria com a Secretaria de
Estado de Saúde, criou o Núcleo de Assessoria Técnica – NAT, órgão inserido dentro do
tribunal, com o fim de auxiliar os juízes nas demandas de assistência à saúde. O
fenômeno da judicialização das políticas de saúde não é uma exclusividade brasileira.
Outros países latino-americanos também testemunham perplexos o mesmo fato social.
Nesse conjunto, verifica-se que é um desafio a reestruturação de um modelo de saúde, com
destaque para a necessidade de um envolvimento dos poderes republicanos e da sociedade
através do diálogo institucional e do debate público, destacando-se que as notas técnicas do
NAT representam uma ferramenta importante que muito tem contribuído para evitar a luta
de cidadão contra cidadão.
Palavras-Chave: Judicialização da saúde. Escassez de recursos. Decisões Judiciais.
Abstract: This text analyzes the judicial review of health policies phenomenon, which
aims at supporting fundamental rights in light of the shortage of resources and the conflict
in view of the isonomy and universality principle. The primary judicial role for individual
protection – when dealing with public health conflicts based on private health tenets –
occasionally causes injustice and disrupts the universal access to health resulting in

1
Mestre e Doutoranda em Direito Público pela UNESA. Advogada. Professora de Direito da Escola da
Magistratura e da Escola Superior da Advocacia do Estado do Rio de Janeiro. E-mail: mirianpele
grino@gmail.com
2
Doutor em Direito pela PUC-Rio. Professor Permanente do PPGD/UNESA e Professor Colaborador do
PPGDC/UFF. Professor Associado do Departamento de Direito Público da Universidade Federal
Fluminense UFF. E-mail: eduardval11@hotmail.com eduardo.manuel.val@gmail.com

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 133


Mirian Pelegrino / Eduardo Manuel Val

unenforceable court orders. In an attempt to correct this and impose access to health in a
reasonable and equitable manner, the Judicial Power has been trying to assist judges and
provide the resources for decision making based on technical advice. Thus, the Rio de
Janeiro State Court of Justice – in a pioneering partnership with the State Health Office –
has created the Technical Advisory Center (Núcleo de Assessoria Técnica, NAT), an
agency inserted within the Court of Justice focused on providing magistrates with the
resources needed to meet their health case demands. The judicial review of health policies
phenomenon is not exclusive to Brazil. Other Latin American countries are also perplexed
witnesses of this social fact. It is a challenge to restructure such a health format, with
special emphasis on the necessary involvement of the republican powers and society
through institutional dialogue and public debate. In this sense, NAT’s technical advice has
proven to be an essential asset in preventing a citizen to fight against another.
Keywords: Judicial review of health. Shortage of resources. Court orders.
Sumário: Introdução. 1. Saúde x igualdade – direitos fundamentais em colisão. 2. Suporte
e tecnologia em saúde disponível ao magistrado. 3. Direito à saúde e a reserva do possível.
4. Núcleo de assessoria técnica – NAT. Conclusão. Referências.

INTRODUÇÃO
No Brasil, assim como em outros países da América Latina, os desafios pela
efetividade dos direitos humanos parecem incontornáveis. Um deles é a inquietude entre
a teoria e a prática na garantia dos direitos fundamentais, tendo em vista que nossos
países ainda apresentam níveis de distribuição de renda limitados, com elevada pobreza e
falta de recursos em muitas áreas como educação e saúde.
O tema da judicializaçao das políticas de saúde e a “avalanche” de ações judiciais
na última década, que em uma visão reducionista garante a difusão do direito universal à
saúde, no Brasil é decidida com pouco ou nenhum critério para lidar com a falta de
recursos. Diante disso, ocorre uma interferência judicial demasiada no sistema de saúde
realizando escolhas trágicas ao proteger o indivíduo sem considerar a equidade e garantir
o direito de forma universal para toda a coletividade, comprometendo os cidadãos como
um todo, porque faz com que a “justiça” de um, se nutra da injustiça para muitos.
Todavia, não se pode negar que há uma constante busca do Poder Judiciário para
equilibrar e consagrar os direitos sociais, mas o ajuste entre o grau de essencialidade
(mínimo existencial) e o grau da excepcionalidade, aqui entendida como a razão do
Estado para deixar de atender o cidadão, não é realizado com parâmetros de direito
público e pautada no interesse coletivo, até porque, o juiz precisa dar uma resposta
ao caso concreto. Isso porque, para fazer uma escolha legítima, o juiz precisa atuar
na questão do direito à saúde com a ponderação entre as duas variáveis (essenciali-
dade/excepcionalidade) de modo que, se a essencialidade do atendimento individual
for maior que a excepcionalidade do Estado em prestar tal serviço, o direito deve ser
entregue; na hipótese contrária, não3.
Em verdade, no direito constitucional contemporâneo o juiz deixou de ter um
papel passivo. Ou seja, aquela figura lendária que apenas pronunciava a vontade do

3
AMARAL, Gustavo, Direito, escassez e escolha: em busca de critérios jurídicos para lidar com a escassez
de recursos e as decisões trágicas, 2. ed, Rio de Janeiro, Renovar, 2010, p. 216.

134 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Judicialização da Saúde uma Questão de (“In”) Justiça – Experiência Brasileira

legislador ou era o escravo da lei, cedeu lugar a um novo paradigma. “O novo juiz”
transformou-se em partícipe da sociedade e defensor da democracia porque a presta-
ção jurisdicional não é uma atividade exclusivamente jurídica, mas, também, provo-
ca transformações políticas, sociais e econômicas.
Acerca de comparação são poucos os países que possuem um sistema de
saúde público universal, entre eles: Reino Unido, Canadá, Austrália, França e Suécia
integram, junto com o Brasil, este pequeno grupo. No entanto, o orçamento brasilei-
ro dedicado ao setor de saúde é o pior dessa congregação. Isso porque, em 2014, o
Brasil investiu 6,7% do orçamento em saúde. Os outros cinco países gastaram entre
14,9% e 27,9% do orçamento do governo na área da saúde4.
Neste contexto, fica evidente que o Brasil chancela e desenvolve uma
desigualdade entre os níveis mais altos e mais baixos da população de forma assom-
brosa, e isso fica ainda mais evidente na área estudada. Além do que, a Constituição
Federal garante a todos igualmente o Direito à Saúde, mas os níveis de efetividade
desse direito são bem dissemelhantes e a desigualdade se aprofunda e agrava.
E justamente por essa razão, o debate a democratização da saúde frente as três
esferas do Poder e da sociedade é fundamental, caso contrário, o direito à saúde per-
manecerá algo restrito aos afortunados socialmente. Enquanto tal fato não ocorre,
temos que reconhecer que o Poder Judiciário ora contribui ao se posicionar como
facilitador do acesso à saúde, fortalecendo e permitindo que aqueles que ingressam
na justiça alcancem seu constitucional Direito à Saúde, ora, em prol da proteção
individual anarquiza o sistema com mandatos judiciais que impõem “furar”, por
exemplo, a “fila” organizada pelos setores de saúde como o de transplantes, além de
autorizar realização de cirurgias milionárias no exterior, sem nenhuma ou pouca
comprovação científica de cura para o pacientes desesperados. Isto no contexto de
recursos orçamentários limitados para atender a saúde pública.
Com efeito, não há sistema de saúde no mundo que suporte um modelo
extremamente protecionista e independente do custo e impacto financeiro ofertado
pelo Estado a todas as pessoas indistintamente. O Judiciário deve ser destinatário do
princípio da isonomia, buscando tratar igualmente os jurisdicionados que se encon-
trem na mesma situação fática. Com base nesta orientação, justificam-se determina-
dos instrumentos procesuais tais como: as ações coletivas e as súmulas vinculantes
que servem à ideia de um amplo acesso à justiça e à redução dos processos judiciais
repetitivos ou das causas de massa.
A partir da norma constitucional o raciocínio judicial pode ser garantir um
mínimo de cuidados à saúde como forma de garantir os direitos sociais.. Ao contrá-
rio do que muitos pensam, a judicialização da saúde não é uma forma de compensar
os danos causados pela corrupção e má gestão no setor. Com subjetivismo e desin-
formação, decisões judiciais bem-intencionadas têm gerado enormes dificuldades a
diversos setores da gestão pública da saúde e a sociedade como um todo.

4
SINDICATO DOS MÉDICOS DO RIO GRANDE DO SUL – SIMERS. Conheça o ‘SUS’ de outros cinco
países, 23 jun. 2016.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 135


Mirian Pelegrino / Eduardo Manuel Val

1 SAÚDE X IGUALDADE – DIREITOS FUNDAMENTAIS EM COLISÃO


Nas demandas que envolvem direito público, nas quais estejam no cerne da
questão o comportamento ou atuação administrativa de alcance geral, a isonomia
que decorre da prestação jurisdicional é duplamente necessária, principlamente, em
função do dever de igualdade a que sempre está vinculada a Administração Pública,
tanto na esfera material como na extrajudicial. Não é plausível que uma atuação
administrativa originariamente dirigida à coletividade, uma vez interposta em juízo,
fosse oponível tão somente aos que se dispusessem demandar; o Judiciário não deve
ser associado a uma exegese que seja capaz de romper com o princípio da isonomia
administrativa.
Na seara do direito público no atendimento à saúde, o reconhecimento judicial
apenas em favor dos demandantes pode significar fragmentar, ou mesmo desestruturar, o
sistema público de saúde, evidenciando um modelo exludente das minorias, daqueles
que mais necessitam e não tem acesso à justiça, rompendo com a ideia de um sistema de
saúde universal e igualitário. Portanto, a matéria precisa ser decidida pela autoridade
competente, uma única vez e principalmente com eficácia erga omnes.
O direito a tratamento médico demanda o emprego de recursos e esses são
escassos e finitos, a escolha pelo judiciário pode torná-los ainda mais parcos com adoção
de escolhas trágicas, onde se opta por quem atender, resultando no consumo de recursos
para poucos onde se poderia atender a muitos.
Desta forma, através da aplicação do princípio da proporcionalidade pode o Judi-
ciário operar a ponderação dos direitos fundamentais, logo, os bens jurídicos quando se
encontram em aparente estado de contradição, tal princípio oferece ao caso concreto
solução ajustadora de coordenação e combinação dos bens em colisão5.
Não podemos esquecer que na Constituição Brasileira de 1988, o princípio da
igualdade atua em duas vertentes: perante a lei e na lei. Por igualdade perante a lei
compreende-se o dever de aplicar o direito no caso concreto; por sua vez, a igualda-
de na lei pressupõe que as normas jurídicas não devem conhecer distinções, exceto
as constitucionalmente autorizadas.
É portanto através do método de ponderação de bens, aliado à aplicação do
princípio da proporcionalidade, que se confere soluções ajustadoras aos conflitos
entre normas de direitos fundamentais revestidas de princípios.
Cabe lembrar que, ao descrever o princípio da igualdade, Aristóteles afirma-
va que consistia em “tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na
medida em que eles se desigualam”.
O princípio da igualdade sofreu várias interpretações até os dias atuais, no
entanto, continua sendo princípio basilar de nossa ordem constitucional. No sentido
material ou substancial, a igualdade significa o desejável tratamento equânime de
todos os homens, proporcionando-lhes idêntico acesso aos bens da vida, conforme

5
GUERRA FILHO, Willis Santiago, Processo constitucional e direitos fundamentais, 2. ed. rev. atual, São
Paulo, Celso Bastos, 2001, p. 63-87.

136 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Judicialização da Saúde uma Questão de (“In”) Justiça – Experiência Brasileira

leciona Celso Ribeiro Bastos, trata-se da igualdade em sua acepção ideal, humanista,
mas que jamais foi alcançada6.
Hans Kelsen não proclamou com nitidez ser o legislador o destinatário
principal do princípio da igualdade, concluindo em sua obra Teoria Pura do
Direito que a igualdade constitucionalmente garantida, dificilmente poderá
significar algo mais do que a igualdade perante a lei, ou seja, no momento de sua
aplicação.
O estudo do princípio da igualdade de Celso Antônio Bandeira de Mello7,
esclarece as hipóteses que pode a lei estabelecer discriminações e em que situa-
ções, inversamente, o discrímen legal colide com a isonomia. Segundo as lições
deste reconhecido jurista, as diferenciações são admissíveis quando houver uma
correlação lógica entre o fator de desrespeito legal e a desequiparação procedida e
que esteja de acordo com os interesses delineados na Constituição Federal. Então
há necessidade da concorrência de quatro elementos, a fim de que não se viole o
princípio da isonomia: a) que a desequiparação não atinja de modo atual e absolu-
to, um só indivíduo; b) que as situações ou pessoas desequiparadas pela regra de
direito sejam efetivamente distintas entre si, vale dizer, possuam características,
traços, nela residentes, diferenciados; c) que exista, em abstrato, uma correlação
lógica entre os fatos diferenciais existentes e a distinção de regime em função
deles, estabelecida pela norma jurídica; d) que, in concreto, o vínculo de
correlação supra referido seja pertinente em função dos interesses constitucional-
mente protegidos, isto é, resulte em diferenciação de tratamento jurídico fundada
em razão valiosa ao lume do texto constitucional para o bem do público.
A existência de milhares de causas destinadas a garantir o direito à saúde
indica questões de interesse coletivo que reclamam providências judiciais compa-
tíveis. Não é possível que o Judiciário sirva de instrumento para impor à Adminis-
tração, em favor apenas dos demandantes, deveres estatais que pela própria essên-
cia deveriam ser aproveitados pelo conjunto da sociedade.

2 SUPORTE E TECNOLOGIA EM SAÚDE DISPONÍVEL AO MAGISTRADO


Para solucionar esse tipo de questões em 28.04.2011, foi publicada a Lei
12.40/20118 que alterou a Lei 8.080/1990 que dispõe sobre a assistência terapêutica e a
incorporação de tecnologias em saúde no âmbito do SUS.
A lei foi um marco para o SUS ao definir critérios e prazos para a incorporação
de tecnologias no sistema público de saúde com inovações e propostas, e ainda porque o
Ministério da Saúde, passou a ser assessorado pela Comissão Nacional de Incorporação

6
MELLO, Celso Antônio Bandeira de, O conteúdo jurídico do princípio da igualdade, 3. ed. 25 tir, São
Paulo, Malheiros, p. 23-45.
7
MELLO, op. cit., p. 23.
8
BRASIL. Lei 12.401, de 28.04.2011. Altera a Lei 8.080, de 19.09.1990, para dispor sobre a assistência
terapêutica e a incorporação de tecnologia em saúde no âmbito do Sistema Único de Saúde – SUS.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12401.htm>. Acesso em:
25 abr. 2018.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 137


Mirian Pelegrino / Eduardo Manuel Val

de Tecnologias – Conitec, com atribuições a incorporação, exclusão ou alteração de


novos medicamentos, produtos e procedimentos, bem como a constituição ou alteração
de protocolo clínico ou de diretriz terapêutica9.
A partir de então o juiz diante da postulação de acesso à saúde pode e deve
observar as disposições proferidas pela Conitec, órgão do Poder Executivo e com
critérios técnicos, salvo comprovação científica distinta, mais atual.
A segunda importante inovação da Lei 12.401/2011 foi a necessidade de ob-
servância de alguns requisitos à incorporação de novas tecnologias no âmbito do
SUS. Ou seja, verificação indispensável da avaliação econômica comparativa dos
benefícios e dos custos em relação às tecnologias já incorporadas, inclusive no que
se refere aos atendimentos: domiciliar, ambulatorial ou hospitalar, quando cabível.
Os requisitos devem ser observados e adotados quando houver a judicialização de uma
nova tecnologia, produto ou medicamento.
Caso não exista decisão técnica na via administrativa, o juiz pode consultar dire-
tamente a Conitec, que atende por e-mail, os questionamentos acerca de produtos e tec-
nologias postulados perante o judiciário. Por outro lado, se a posição da instituição é
de não autorizar a incorporação da tecnologia no âmbito do SUS, o juiz ao deferir o
pedido, deve basear sua convicção com nova prova técnica e apenas técnica rebaten-
do os argumentos do órgão. A intenção é evitar a ingerência direta e frequente do
Poder Judiciário nos serviços públicos de saúde, que algumas vezes atrapalha a
rotina de trabalho do gestor da saúde, lembrando que a base constitucional é o aces-
so universal e igualitário, determinando a norma que o direito à saúde é um direito
coletivo com atendimento similar a todos que se encontrem na mesma situação, um
direito de todos que deve ser garantido através de políticas públicas sociais e
econômicas, e não apenas através do tratamento na doença e da entrega de medi-
camentos, mas antes, e principalmente, através de medidas que visam a promo-
ção da saúde e a prevenção e redução do risco de doença.
Essa é uma das razões pela qual a decisão do juiz precisa ser criteriosa e aten-
ta à disposição dos órgãos técnicos, com avaliação econômica comparativa dos be-
nefícios e dos custos em relação às tecnologias já incorporadas, inclusive no que se
refere aos atendimentos, além de observar se o pleito autoral está em conformidade
com as Recomendações n. 31 e 36 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ)10. Esses
são requisitos do art. 196 da Constituição Federal para o demandante ter seu pedido
deferido.
No entanto, o STF não tem decidido assim e Antônio José Avelãs Nunes diz:

Fazendo tábua rasa deste preceito constitucional, o STF parece concebê-lo, porém,
como um direito individual, cujo cumprimento pode ser exigido diretamente através

9
BRASIL. Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologia no SUS (CONITEC). CONITEC abre seis
novas consultas públicas sobre medicamentos e Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas. 27 abr. 2017.
Disponível em: <http://conitec.gov.br/conitec-abre-seis-novas-consultas-publicas-sobre-medicamentos-e-pr
otocolos-clinicos-e-diretrizes-terapeuticas>. Acesso em: 25 abr. 2018.
10
Recomendação N. 31 – Atos Normativos – Portal CNJ – www.cnj.jus.br/atos-normativos?documento=877

138 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Judicialização da Saúde uma Questão de (“In”) Justiça – Experiência Brasileira

de uma ação judicial, como se os problemas relacionados com o direito à saúde fos-
sem problemas de justiça cumutativa (dos quais devem ocupar-se os tribunais) e não
problemas de justiça distributiva (cuja ponderação e solução só podem caber a ór-
gãos políticos legitimados pelo sufrágio universal).

Os Tribunais entendem que podem dispor de dinheiros públicos (mesmo que não
inscritos no orçamento da saúde) para financiar planos individuais de saúde (em regra de
indivíduos bem colocados na vida), pouco lhes importando que, deste modo, impeçam
ou dificultem o financiamento público de direitos sociais de milhares de cidadãos, de
entre os mais pobres, os mais vulneráveis e os mais desprotegidos. Na síntese de Fernan-
do Scaff, “aprisiona-se o interesse social e concede-se realce ao direito individual”11.
Se as pessoas com estatuto social e com rendimento acima da média pretendem
utilizar os recursos do SUS devem fazê-lo como toda a gente: vão aos centros de saúde e
aos hospitais, cumprem as regras estabelecidas e esperam a sua vez de ser atendidas. Os
tribunais não podem servir como porta de acesso privilegiado a uns quantos privilegia-
dos, em prejuízo dos mais pobres, violando grosseiramente o princípio constitucional da
igualdade e ofendendo a dignidade e o direito à vida e à saúde dos mais pobres, a pretex-
to de garantir o direito à vida e à saúde dos mais ricos. A meu ver, o contraste entre o
direito individual (o interesse individual) e o direito coletivo (o interesse coletivo) não é
um “falso dilema”, como alguns querem fazer crer. Invocar o ‘sagrado nome’ da Consti-
tuição para justificar o financiamento público de planos de saúde individuais, sacrifican-
do o direito de todos à saúde, mediante adequadas políticas sociais e econômicas, é guar-
dada a distância, um verdadeiro sacrilégio12.
Como se depreende nos litígios de acesso à saúde a perícia judicial de nada adian-
ta, tendo em vista, que é necessário um exame dos requisitos técnicos e do custo-
-benefício do tratamento postulado, como exigido pela Lei 12.401/2011. O que se tem
visto é procedência de pedidos fundamentados em mero atestado ou requisição médica
de clínica e médicos particulares, pouco ou nada comprometidos com a res pública.
O fato é que a excessiva judicialização das questões que envolvem os serviços
públicos de saúde e a importância de tais aparelhos para a população, exigiu uma abor-
dagem inovadora do Conselho Nacional de Justiça. O CNJ passou a emitir enunciados
que possibilitam uma maior uniformização nas decisões judiciais sobre o tema do acesso
à saúde e, atualmente há um total de 68 disponíveis no site do Conselho Nacional de
Justiça. Assim, uma das primeiras sugestões foi com base na experiência de sucesso
junto ao Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, em que a ação de espécie antes de chegar
do despacho inicial recebe um parecer técnico sobre o medicamento solicitado, se consta
ou não dos protocolos clínicos, se é disponibilizado, constando das listas públicas
(RENAME)13. Também foi proposto, que outros Tribunais de Justiça e os Tribunais
Regionais Federais celebrem convênios para assegurar apoio técnico, composto por

11
SCAFF apud Idem.
12
NUNES, op. cit., p. 30-31.
13
MINISTÉRIO DA SAÚDE (MS). Assistência farmacêutica. Medicamentos – Rename. Disponível em:
<http://portalms.saude.gov.br/assistencia-farmaceutica/medicamentos-rename>. Acesso em: 05 mai. 2018.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 139


Mirian Pelegrino / Eduardo Manuel Val

médicos e farmacêuticos, com o objetivo de auxiliar os magistrados na formação de um


juízo de valor sobre questões clínicas apresentadas pelas partes.
Tais medidas, revelam-se cada vez mais necessárias, pois os magistrados não
possuem e nem precisam ter, conhecimentos técnicos sobre questões médicas, sendo
extremamente difícil decidir a beira do leito ou em situação em que se alega risco de vida
em caso de não deferimento administrativo da medida ou do medicamento.
De fato, autorizar a cirurgia, conceder a internação, fornecer o medicamento
é a solução mais fácil, porém, nem sempre a mais acertada. E nesse contexto, o
Conselho Nacional de Justiça vem se preocupando em construir e oferecer
“organização e procedimentos”, no sentido de que os magistrados alcancem a
melhor solução para a população.

3 DIREITO À SAÚDE E A RESERVA DO POSSÍVEL


Na atualidade é necessária maior atenção para os possíveis custos que uma judi-
cialização excessiva e ilimitada do direito à proteção da saúde, possa acarretar, mais
precisamente no que concerne à determinação de tratamentos, de intervenções cirúrgi-
cas de média e alta complexidade e do fornecimento gratuito de medicamentos.
Tal preocupação tem seu respaldo na circunstância, apontada com rapidez, de
que a realização dos direitos sociais, por se destinar à cobertura coletiva, caracteriza-
se pelo seu gradual processo de efetivação, o qual depende das possibilidades finan-
ceiras do Estado. É necessário e se pressupõe uma organização, uma estrutura admi-
nistrativa e de sua manutenção financeira. Na deliberação, correta ponderação dos
vários interesses em jogo, principalmente quando a matéria pautada for de Direito
Público precisa ser praticada.
Nesse aspecto a questão da teoria da reserva do possível emerge, consolidada pe-
lo Tribunal Constitucional Federal Alemão, a qual corresponde à ideia de que a efetiva-
ção de direitos constitucionais sociais se submete à reserva da capacidade financeira do
Estado, pois depende de prestações financiadas pelos cofres públicos. Logo, reconhece a
existência de limitações orçamentárias à realização das pretensões asseguradas por dis-
positivos constitucionais, admitindo que cabe ao legislador realizar a escolha das priori-
dades, eis que, detém competência constitucional para elaborar o orçamento, estando
adstrito ao cumprimento de determinadas regras constitucionais ao realizar essa tarefa.
Como consequência, o indivíduo só pode exigir o que a sociedade pode lhe
oferecer em condições razoáveis.
Ingo Sarlet e Mariana Figueiredo14, afirmam que a reserva do possível apre-
senta uma tríplice dimensão, pois alcança a efetiva disponibilidade fática dos recur-
sos financeiros necessários à efetivação de direitos fundamentais, a disponibilidade
jurídica dos recursos humanos e materiais – que se refere à distribuição de receitas,

14
SARLET, Ingo Wolfgang, A eficácia do direito fundamental `segurança jurídica: dignidade da pessoa
humana, direitos fundamentais e proibição de retrocesso social no direito constitucional brasileiro. in
Revista Brasileira de Direito Comparado, Rio de Janeiro, Instituto de Direito Comparado Luso-Brasileiro,
n. 28, p. 30, 2005

140 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Judicialização da Saúde uma Questão de (“In”) Justiça – Experiência Brasileira

competências tributárias, orçamentárias, legislativas e administrativas – e a propor-


cionalidade e a razoabilidade da prestação postulada pelo cidadão.
Em resumo, seria um limite jurídico e fático à efetivação dos direitos funda-
mentais individuais, inclusive daqueles assegurados por normas constitucionais
programáticas. Ou seja, em algumas situações, a eficácia dessas normas pode sofrer
restrição, proveniente da falta de recursos financeiros estatais, para realizar determi-
nada providência material. Esse cenário significa que a efetivação de alguns direitos
constitucionais pode colidir com princípios constitucionais orçamentários.
Desta forma, não há como negar que o único caminho existente para resolver
esse problema é defender a aplicação da ponderação entre princípios proposta por
Alexy: “a questão acerca de quais direitos fundamentais sociais o indivíduo defini-
tivamente tem é uma questão de ponderação entre princípios”15.
De um lado está, sobretudo, o princípio da liberdade fática. Do outro lado es-
tão os princípios formais da competência decisória do legislador democraticamente
legitimado e o princípio da separação de poderes, além de princípios materiais, que
dizem respeito sobretudo à liberdade jurídica de terceiros, mas também a outros
direitos fundamentais sociais e a interesses coletivos.
Ao analisar o tema, Cristina Queiroz, extrai idêntica conclusão, ao afirmar que a
reserva do possível não significa ineficácia dos direitos fundamentais sociais. A cláusula,
segundo ela, “expressa unicamente a necessidade de sua ponderação”16.
Importa que a reserva do possível não é esvaziamento da eficácia das normas
programáticas ou até mesmo em reconhecimento da sua ineficácia. O significado
dessa construção jurisprudencial é que os direitos estabelecidos pelas normas em
estudo são direitos prima facie, razão pela qual estão submetidos a uma necessidade
de ponderação.
Em determinados casos, poderá ter peso maior um princípio orçamentário,
em detrimento de direito fundamentado em um princípio veiculado pelas normas
programáticas. Em outros, uma situação inversa poderá ocorrer, com a prevalência
do princípio consagrado pelas normas em pauta.
A atribuição de um maior peso ao direito decorrente de um princípio consa-
grado por uma norma constitucional programática deverá ocorrer quando se tratar de
direitos fundamentais sociais mínimos (minimale soziale Grundrechte), ou seja,
direito à moradia, educação fundamental, patamar mínimo de assistência médica,
enfim, a um padrão mínimo de sobrevivência. Em tais casos, o cidadão terá um
direito definitivo à prestação, pois o princípio da liberdade fática terá um peso maior
do que os demais princípios constitucionais formais e materiais colidentes, como
defende Alexy17.

15
ALEXY, Robert, Teoria dos direitos fundamentais. 5. ed. SILVA, Virgílio Afonso da (Trad.), São Paulo,
Malheiros, 2006, p. 511-512.
16
QUEIROZ Cristina, Direitos fundamentais: teoria geral, 2. ed. Portugal, Coimbra, 2010, p. 211.
17
ALEXY, Robert, Theorie der Grundrechte. Baden-Baden, Nomos, 1988, p. 468.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 141


Mirian Pelegrino / Eduardo Manuel Val

A conclusão de Ricardo Lobo Torres18 sobre o tema é de que “a proteção po-


sitiva do mínimo existencial não se encontra sob a reserva do possível, pois a sua
fruição não depende do orçamento nem de políticas públicas, ao contrário do que
acontece com os direitos sociais”.
Na situação oposta, a eficácia da norma programática que veicular um direito
com a carga de mínimo existencial, não poderá ser afastada por razões financeiras. A
reserva do possível terá, portanto, um peso menor, que impossibilita a sua aplicação.
Alexy afirma que a força do princípio da competência orçamentária do legislador
não é ilimitada. Ele não é um princípio absoluto e sempre haverá barreiras na judicializa-
ção dos direitos em estudo; contudo, isso não pode ser razão suficiente para defender a
impossibilidade do controle jurisdicional em face dessa calamitosa situação.
Diante do caso concreto, quando o Poder Público alegar a inexistência de re-
cursos financeiros para a efetivação de determinado direito previsto em norma pro-
gramática, postulando, portanto, a aplicação da reserva do possível, deverá fazer
prova concreta da alegação. Não pode a teoria ser alegada como mero pretexto para
se esvaziar a eficácia das normas constitucionais programáticas, e muito menos
respaldar ineficiência administrativa.
No artigo: “É a reserva do possível um limite à intervenção jurisdicional nas
políticas públicas?” Ricardo Perlingeiro19 faz uma separação que orienta a solução
da questão ao tratar de recursos financeiros, recursos materiais e políticas de saúde.
Para o autor: “reserva do possível, orçamento público estão relacionados, mas não
se confundem, não existindo entre eles sequer vinculação”. Conclui que para se
evidenciar a ofensa à reserva do possível, além da falta de orçamento seria necessá-
rio que não existisse lei prevendo o benefício social. Isso porque, é através da lei que
institui direito e não do orçamento que a sociedade organizada de forma democrática
debate suas ideias.
Isso significa dizer que o Poder Judiciário não precisa interferir no conteúdo
de uma lei orçamentária que define as prioridades de gastos públicos, essa função é
do Poder Executivo. Todavia, essa mesma lei orçamentária, não está isenta por de-
terminação constitucional, art. 5º, XXXV (a lei não excluirá da apreciação do Poder
Judiciário lesão ou ameaça à direito), do controle jurisdicional se existirem vícios de
conteúdo, como o desvio, abuso ou ofensa aos valores fundamentais.
O Poder Judiciário ao ser acionado para se pronunciar sobre a pretensão de efeti-
vação do direito à saúde que necessite da utilização de recurso financeiros pelo Poder
Público, deve investigar se tais direitos não estão abarcados dentro do alcance de uma
esfera política, onde os demais poderes detêm uma margem de discricionariedade.

18
TORRES, Ricardo Lobo, O direito ao mínimo existencial, Rio de Janeiro, Renovar, 2009, p. 96.
19
PERLINGEIRO, Ricardo, É a reserva do possível um limite à intervenção jurisdicional nas políticas
públicas sociais? Revista de direito administrativo contemporâneo. v. 2, p. 163-185, 2013. Disponível em:
<https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2343965>. Acesso em: 27 abr. 2018.

142 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Judicialização da Saúde uma Questão de (“In”) Justiça – Experiência Brasileira

Assim, todos os poderes devem agir dentro das suas funções típicas ou atípicas,
inicialmente com a razoabilidade e a proporcionalidade, sem deixar de observar o princí-
pio que norteia a democracia que é o interesse público.
Não é razoável, por exemplo, postular-se judicialmente o direito à saúde porque
previsto constitucionalmente para fazer uma cirurgia experimental no exterior de altíssi-
mo custo, porque por uma fatalidade da vida ocorre uma doença raríssima com pouco ou
quase nenhum diagnóstico de cura, que pode no máximo prolongar o sofrimento.
O pedido judicial pode comportar vários objetos dentro da legalidade, mas o Po-
der Judiciário pertencente a estrutura estatal, não pode onerar os cofres públicos e deferir
tratamentos extraordinários e distante da realidade brasileira.
Não está aqui retirando-se direito, ao contrário, todo ser humano tem direito ao
mínimo existencial, ou seja, cuidados à saúde e uma assistência médica com dignida-
de, com uso de todos os recursos disponíveis para uma sobrevida decente e tranquila e
isso não significa exigir do Estado que sacrifique toda uma coletividade em razão de
atendimento de apenas um cidadão. E nestes casos, seria mais razoável postular aos
órgãos competentes os cuidados e atendimento médico mínimos dentro do princípio da
razoabilidade. O Estado não poderá alegar a teoria da reserva do possível, dando con-
dições ao juiz de realizar a ponderação de interesses diante da decisão. E assim, fica
relevante o direito fundamental pleiteado, posicionado dentro dos direitos sociais mí-
nimos com maior relevância ao ser comparado a princípios financeiro-orçamentários,
caso contrário não.
Em respeito ao art. 5º, § 1º da Constituição, bem como ao princípio da máxima
efetividade constitucional, a reserva do financeiramente possível não pode ser aceita
como um obstáculo genérico à aplicabilidade dos direitos sociais, mas como um dire-
cionador da forma pela qual deverão ser alocados os recursos públicos20.
Além disso, ao tratarmos da judicialização da saúde, cabe lembrarmos da exis-
tência de outras duas reservas legais oponíveis à efetivação dos direitos sociais pela via
judicial: (i) a reserva pendente de ponderação e (ii) a reserva do politicamente oportu-
no ou adequado.
Segundo lições de Jorge Reis Novais, a primeira caracteriza-se pelo dever in-
condicional do juiz de ponderar o direito à saúde com os mais diversos outros direitos
que estiverem em conflito no caso concreto21. Afinal, como lembra o constitucionalista
alemão Martin Borowski, “os direitos garantidos como princípios são direitos limitá-
veis”22. A segunda reserva, objetiva o respeito às decisões legislativas e administrati-
vas, tomadas após longos debates, realizados com os membros eleitos pela população
para geri-la.
A própria Constituição impõe limites até mesmo à aplicação dessas reservas le-
gais. A partir do instituto do mínimo existencial, diversos constitucionalistas, como Ana
20
CLÈVE, Clèmerson Merlin, Para uma dogmática constitucional emancipatória, Belo Horizonte, Fórum,
2012, p. 29.
21
NOVAIS, Jorge Reis, Direitos sociais: teoria jurídica dos direitos sociais enquanto direitos fundamentais,
Portugal, Coimbra, 2003, p. 273.
22
BOROWSKI, Martin, La restriccíon de los derechos fundamentales, Revista Española de Derecho
Constitucional, a. 20, n. 59, mar./ago. 2000, p.40.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 143


Mirian Pelegrino / Eduardo Manuel Val

Paula de Barcellos, Clèmerson Clève, Ingo Sarlet e Ricardo Lobo Torres23, entre outros,
vêm defendendo a tese de que não cabem quaisquer alegações de restrição aos direitos
fundamentais, quando se está buscando a efetivação de seu núcleo essencial.
Enquanto se tratar dessa parcela do mínimo existencial, a doutrina de modo prati-
camente pacífico, entende existir a incidência de um direito público subjetivo oponível
ao Estado, caracterizado pela possibilidade de requerimento judicial.
O mínimo existencial como ficou conhecido esse instituto de proteção do núcleo
essencial dos direitos fundamentais, pode ser entendido como um reforço teórico a efeti-
vação do direito à saúde. Abalizado no princípio da dignidade humana, no direito à vida
e nos próprios alicerces do Estado Democrático e Social de Direito, tornando-se impres-
cindível na busca pela realização dos objetivos fundamentais da República.
Dessa forma ficou definido, nas palavras de Ana Paula de Barcellos, como o “nú-
cleo material do princípio da dignidade humana”24.
Sendo assim, por mais que o direito à saúde possa ser efetivado em menor ou
maior grau, a depender das especificidades fático-jurídicas do caso concreto, é inadmis-
sível sua concretização em uma linha inferior à da mínima dignidade humana25.
Apesar de se entender que o conteúdo jurídico da parcela mínima do direito à
saúde pode variar em razão do momento histórico, da localização geográfica e do
desenvolvimento econômico, social e cultural da comunidade analisada, pode-se
listar, com base nos estudos de Victor Abramovich e Christian Courtis, algumas
condições básicas de saúde, que parecem ser universais, tais quais: (i) o acesso in-
discriminado (principalmente aos mais carentes) a bens, centros e serviços de saúde;
(ii) o alcance a uma alimentação nutritiva e de qualidade, que não acarrete em pro-
blemas de saúde; (iii) o acesso a um lar com condições sanitárias básicas e forneci-
mento de água potável; (iv) a obtenção de medicamentos essenciais, conforme de-
terminar os protocolos do SUS e as portarias do Ministério da Saúde26.
Por oportuno, a insuficiência financeira não exime o Estado de efetivar o di-
reito à saúde em sua parcela relativa ao mínimo existencial. Mas, não podemos esquecer
que o direito à saúde é um direito integralmente fundamental, sofrendo, portanto, como
mencionamos as consequências do § 1º do art. 5º da Constituição Federal.
Em observância a tal dispositivo e ao princípio da máxima efetividade das nor-
mas constitucionais, entendeu-se, ao se analisar a teoria da multifuncionalidade do direi-
to à saúde, bem como o conteúdo da sua parcela relativa ao mínimo existencial, que o
referido direito, em sua dimensão subjetiva, pode e deve ser pleiteado pelos cidadãos

23
BARCELLOS, Ana Paula de, A eficácia jurídica dos princípios constitucionais: o princípio da dignidade
da pessoa humana. 3. ed, Rio de Janeiro, Renovar, 2011, p. 280. CLÈVE, op. cit., 2012, p. 27-28.
SARLET, op. cit., 2005, p. 411-414; TORRES, op. cit., p. 87-89.
24
BARCELLOS, op. cit., p. 247.
25
HACHEM, Daniel Wunder, Tutela administrativa efetiva dos direitos fundamentais sociais: por uma
implementação espontânea, integral e igualitária, Curitiba, 2014. 614 f. Tese (Doutorado em Direito).
Universidade Federal do Paraná, f. 90.
26
ABRAMOVICH, Víctor; COURTIS, Christian, Los derechos sociales como derechos exigibles. 2. ed.
Madrid, Trotta, 2004, p. 89-90. apud HACHEM, op. cit., p. 93.

144 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Judicialização da Saúde uma Questão de (“In”) Justiça – Experiência Brasileira

junto ao Poder Judiciário, mas apenas quando o Legislativo e o Executivo forem


omissos ou faltosos em suas ações.
Não é difícil percebermos, e repetimos, que a decisão para realização de ci-
rurgia experimental no exterior de elevadíssimo custo e sem comprovação científica
de cura, não se inclui no mínimo existencial.
A questão é bastante complexa, exigindo do Poder Judiciário uma reflexão
interdisciplinar entre a ciência do Direito e demais ramos científicos como a filoso-
fia, orientado sempre pela fórmula da ponderação (Abwägung).

4 NÚCLEO DE ASSESSORIA TÉCNICA – NAT


Os Núcleos de Assessoria Técnica (NATs), são órgãos inseridos dentro dos
tribunais, com o fim de auxiliar os magistrados nas decisões envolvendo prestações
de medicamentos.
É de reconhecimento nacional que a iniciativa pioneira do Poder Judiciário e
do Poder Executivo do Estado do Rio de Janeiro, antes mesmo da recomendação do
CNJ ocorrida na Audiência Pública n. 4/2009, vem sendo elogiada e seu modelo um
exemplo a ser implantado em outros Estados e até por países interessados na
experieência brasileira.
Contudo, pioneirismo tem o mérito de procurar resolver dilemas latentes para
problemas que antes se imagina de difícil solução, mas, como em tudo, novos
dilemas e desafios também vêm à tona. No caso do NAT do Rio de Janeiro, o corpo
técnico funciona dentro da sede da justiça em contato direto com os juízes e a equipe
oriunda da Secretaria de Saúde do Estado. Se por um lado, da questão, propicia-se
agilidade para efetivar o perecimento do direito à saúde; por outro, é questionável o
fato de um dos principais demandados nas questões de saúde, o Estado, ter um corpo
técnico próprio para apresentar pareceres no “seio” do Judiciário, e se isso
compromete o princípio da igualdade, o contraditório e a ampla defesa.
Na outra ponta, está o cidadão doente que se dirige ao mesmo Estado-Juiz à
procura de um tratamento para sua enfermidade, seja com medicamentos, seja com
internação para cirurgias contra o Estado Administrador. E, um dos maiores problemas
da Política Pública de Saúde no Brasil é exatamente a falta de isenção dos gestores da
saúde pública, sempre nomeados de forma política pelo Poder Executivo, muito deles
devedores de favor e sem o menor respaldo técnico para a função.
Com intuito de minimizar os problemas e apesar das críticas, o NAT/RJ se
consolidou e funciona em parceria com o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (2011) e
com a Justiça Federal da 2ª Região (2015), que concedem o espaço físico para
funcionamento e a Secretaria de Estado de Saúde fornece a equipe, facilitando o diálogo
democrático entre os Poderes Executivo e Judiciário e acelerando a resolução de litígios
que visam ao acesso à saúde pela via do judiciário27. A presença do NAT no Estado do
Rio de Janeiro é quase total. O órgão conta com recursos de tecnologia da informação,
27
JUSTIÇA FEDERAL, Seção Judiciária do Rio de Janeiro, Notícia, Parceria: Justiça Federal do Rio e
Secretaria de Estado de Saúde inauguram Núcleo Técnico exclusivo para ações federais. 13 nov. 2015.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 145


Mirian Pelegrino / Eduardo Manuel Val

como acesso a consultas de sites de laboratórios farmacêuticos, fabricantes de insumos e


fórmulas nutricionais, sociedades médicas e conselhos profissionais.
O trâmite dos processos que chegam ao NAT inicia-se com cadastramento no
banco de dados e distribuição aos profissionais da equipe para que estes possam
analisar os casos e proferir o parecer técnico. Em seguida, a avaliação é enviada à
coordenação para revisão, que, caso considere necessário, propõe alterações no
texto. A última etapa é o retorno do parecer para o cartório ou para a secretaria do
juiz que o encaminhou. No caso de fornecimento de medicamento, por exemplo,
caso conste na lista do Sistema Único de Saúde (SUS) e se encontre disponível, o
paciente é prontamente orientado a se encaminhar até o local onde se encontra o
medicamento e retirá-lo, sem necessitar que sua demanda se perpetue.
A finalidade principal dos núcleos é o auxílio aos magistrados no julgamento
das demandas envolvendo prestações relacionadas ao direito à saúde, viabilizando a
disponibilidade de um conhecimento técnico para o respaldo de uma decisão mais
segura, todavia, visualizamos outras atribuições, como: a) melhor atendimento do
cidadão, que pode vir a ter sua pendência resolvida em até 48 horas, deixando assim
de percorrer todo o trâmite normal do judiciário; b) ainda a capacidade de diminuir o
inchaço do Judiciário, uma vez que adota uma espécie de filtro.
O parecer do NAT, ao comprovar a necessidade do demandante, viabilizará
ao Poder Judiciário exigir a prestação da Administração Pública, abrindo uma porta
de contato entre os dois poderes e diminuindo a possibilidade da banalização de
pedidos inúteis, que só sobrecarregam o erário público. O projeto, elaborado pelo
Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em parceria com o Ministério da Saúde e outras
instituições, prevê também, a capacitação dos Núcleos de Apoio Técnico do Poder
Judiciário (NAT-JUS) vinculados aos tribunais, para uso do sistema e subsidiar os
magistrados de todo o país em ações judiciais na área de saúde.
Desde a aprovação da Resolução 238/201628 determinando regras para a
criação e a manutenção de comitês estaduais de saúde, bem como a especialização
de varas em comarcas com mais de uma vara de Fazenda Pública o auxílio aos
tribunais com a criação dos Núcleos de Apoio Técnico do Judiciário (NAT-JUS),
constituídos de profissionais da saúde, elabora pareceres acerca da medicina baseada
em evidências.

CONCLUSÃO
A contínua influência que o Judiciário tem exercido nas políticas públicas de
saúde não o isenta de contradições e desafios, além de trazer um debate sobre quais
são os limites e possibilidades em contribuir para a efetivação desse direito. Os es-
paços institucionais internos a este Poder – tais como o Conselho Nacional de Justi-

28
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, Resolução 238 de 06 setembro de 2016, Dispõe sobre a criação
e manutenção, pelos Tribunais de Justiça e Regionais Federais de Comitês Estaduais da Saúde, bem como a
especialização de vara em comarcas com mais de uma vara de Fazenda Pública. Min. Ricardo
Lewandowski. DJe/CNJ, n. 160, 09 set. 2016, p. 8-9.

146 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Judicialização da Saúde uma Questão de (“In”) Justiça – Experiência Brasileira

ça, o Fórum Nacional do Judiciário e os Comitês Estaduais – servem como instru-


mentos catalisadores de anseios e discussões em todo o Brasil.
O Conselho Nacional de Justiça nos últimos anos muito tem feito e talvez es-
te seja o momento de desenvolver ainda mais uma política judiciária para efetivação
do direito à saúde como, por exemplo: a) evitar a adoção de uma visão medicalizada
de saúde sendo fundamental o desenvolvimento de uma visão multiprofissional e
interdisciplinar dos problemas, sob risco de forte reducionismo decisório, indo além
do saber médico e ponderar os laudos técnicos; b) não ser refém da reserva do possí-
vel com o grave equívoco das contendas sobre argumentos econômicos restritivos e
seu efeito perverso que leva à “luta entre cidadãos” que se limita a operar uma vál-
vula de escape protetora de direitos individuais e incentiva um cidadão contra o
outro de maneira individualista e egoísta; c) o foco de atuação deve ser o dever do
Estado visando efetivar direitos e promover políticas públicas e cabe a quem alega
(Estado), o ônus da prova quanto ao argumento econômico de restrição e não o cor-
riqueiro uso do contexto de desobrigação, sem base concreta comprobatória da es-
cassez de recursos e a forma como são alocados.
Sem embargos, é possível deduzir que cabe ao Judiciário a importante missão
de corresponsável ao alinho das desigualdades sociais nos limites de sua atuação
criativa e promocional dos direitos, concomitante aos demais poderes e estabelecer o
diálogo interinstitucional.
Em consonância, a intervenção judicial deve promover o direito à saúde de
forma universal, com acesso equitativo, configurando-se como políticas de Estado
com atuação regular, contínua e de qualidade. O desafio referente à mudança de
governos deve ser enfrentado pelas instituições jurídicas, com estratégias suprago-
vernamentais. E para tanto, os recursos são inúmeros, e variam desde pactuações
com governos sucessores para exigência de uma política de saúde, até apuração e
punição da responsabilidade.
Não resta dúvida de que a busca no Judiciário ou nas leis processuais para a
solução ou diminuição dos conflitos em matéria de saúde pública tem sido paliativa.
Mas, enquanto os processos administrativos são morosos e a burocracia da saúde
demonstra-se insensível às insatisfações e necessidades imediatas da população,
principalmente dos hipossuficientes economicamente, a Justiça é a solução contígua
o que evidência ainda mais, que o Judiciário precisa estender sua força e alcançar o
diálogo institucional, com o incentivo de criação de uma “arena pública” engloban-
do os três poderes, mas, e principalmente, a sociedade civil.
Conclui-se, finalmente que a judicialização da saúde tem se limitado a operar
uma válvula de escape protetória apenas de direitos individuais, mas sem muito
impacto nos direitos coletivos. A esse respeito, enquanto o litígio de acesso a cuida-
dos de saúde mantiver o padrão individualista atual, será difícil desenvolver todo o
seu potencial para garantir respeito e efetivo direito à saúde. No entanto, é possível
presumir que, se a demanda individual fosse transformada em coletiva, tais conflitos
podem ocupar e promover o papel de acesso equitativo diante desse direito funda-
mental para dignidade humana. E nesse caso, de acordo com precedentes judiciais,

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 147


Mirian Pelegrino / Eduardo Manuel Val

outro resultado na intervenção seria alcançado, de forma mais dialógica e democrá-


tica pautada na proposta liberal de igualdade de oportunidades. Assim, inspirador
agir como jurista-cidadão visando a convocação do debate institucional em busca de
novos e melhores caminhos que possibilitem concretamente a proteção do acesso à
cuidados da saúde da população e principalmente dos mais carentes. Essas pessoas
merecem uma chance!

REFERÊNCIAS
ABRAMOVICH, Víctor; COURTIS, Christian, Los derechos sociales como derechos exigibles, 2.ed.
Madrid, Trotta, 2004.
AMARAL, Gustavo, Direito, escassez e escolha: critérios jurídicos para lidar com a escassez de recur-
sos e as decisões trágicas, 2. ed, Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2010.
ATIENZA, Manuel, As razões do direito: teorias da argumentação jurídica, 2. ed, São Paulo, Landy,
2002.
ARISTÓTELES, Ética a Nicômaco. Col Livro V coleção aos pensadores, São Paulo, Abril 1987.
BAHIA, Ligia, Espelho meu: a redução da desigualdade nas chances de adoecer e viver é um desafio
incontornável para o exercício do poder político, O Globo, Rio de Janeiro, 11 abr. 2016. Disponível em:
<https://oglobo.globo.com/opiniao/espelho-meu-19046230#ixzz5GeVFp7mb>. Acesso em: 14 abr. 2018.
BARCELLOS, Ana Paula de, A eficácia jurídica dos princípios constitucionais: o princípio da dignidade
da pessoa, 3. ed, Rio de Janeiro, Renovar, 2011.
BARRETTO, Vicente de Paulo, O fetiche dos direitos humanos e outros temas, Rio de Janeiro, Lumes
Juris, 2010
BARROSO, Luís Roberto, Da efetividade à judicialização excessiva: direito à saúde, fornecimento gratui-
to de medicamentos e parâmetros para a atuação judicial, Revista de Direito Social, v. 34, p 11-43, 2009.
______. O direito constitucional e a efetividade de suas normas, Rio de Janeiro, Renovar, 2005.
______. Princípios constitucionais brasileiros ou de como o papel aceita tudo, Revista da Faculdade de
Direito, Rio de Janeiro, UERJ, n 1, v. 1. 1993.
BOBBIO, Norberto, A era dos direitos. 4. tir. LYRA, Regina (Trad.), Rio de Janeiro, Campus, 2004.
BÖCKENFÖRDE, Ernst-Wolfgang, Teoria e interpretación de los derechos fundamentales, in Escritos
sobre Derechos Fundamentales, Baden-Bade, Nomos, 1993.
BOROWSKI, Martins, Los derechos garantizados mediante principios son derechos limitables. La
restriccíon de los derechos fundamentales, Revista Española de Derecho Constitucional, año 20, n. 59,
Março-Agosto 2000.
BRITO, Edvaldo, Reflexos Jurídicos da atuação odo estado no domínio econômico: desenvolvimento
econômico, bem-estar social, São Paulo, Saraiva, 1982.
CALABRESI, Guido & BOBBIT, Philip, Tragic Choices, Ney York, Norton, 1978
CANOTILHO, José Joaquim Gomes, Direito constitucional e teoria da constituição, Coimbra, Almedina,
1998.
CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant, Acesso à Justiça, Northfleet, Ellen Gracie (Trad.) Porto Ale-
gre, Sergio Antonio Fabris, 1988.
CARA, Juan Carlos Gavara de, Derechos fundamentales y desarrolo legislativo: la garantia del conteni-
do esencial de los derechos fundamentales en la ley Fundamental de Bonn, Madrid, Centro de Estudios
Constitucionales, 1994.
CITTADINO, Gisele, Judicialização da política, constitucionalismo democrático e separação de pode-
res, in VIANNA, Luiz Werneck (Org.). A democracia e os três poderes no Brasil, Belo Horizonte,
UFMG, Rio de Janeiro, IUPERJ/FAPERJ, 2002.
CLÈVE, Clèmerson Merlin. A teoria constitucional e os direitos alternativo: para uma dogmática consti-
tucional emancipatória, in Uma vida dedicada ao direito: homenagem ao editor dos juristas Carlos
Henrique Carvalho, São Paulo, Revista dos Tribunais, 1995.

148 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Judicialização da Saúde uma Questão de (“In”) Justiça – Experiência Brasileira

______. O problema da legitimidade do Poder Judiciário e das decisões judiciais no estado democrático
de direito, Debates, n. 20, A Constituição Democrática Brasileira e o Poder Judiciário, São Paulo, Funda-
ção Konrad Adenauer, 1999.
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, Judicialização da saúde no Brasil: dados e experiência, Brasí-
lia, 2015. (Coord) ASENSI, Felipe Dutra; PINHEIRO, Roseni. Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/fi
les/conteudo/arquivo/2018/02/4292ed5b6a888bdcac178d51740f4066.pdf>. Acesso em: 14 abr. 2018.
GARAY, Alberto F. La igualdad ante la ley, Buenos Aires, Abeledo-Perrot, 1989.
GEERTZ, Cliffod, O saber local: novos ensaios em antropologia interpretativa, 14. ed. Petrópolis,
Vozes, 2014.
GOUVEIA, Carina Barbosa. O direito fundamental à saúde, um olhar para além do reconhecimento,
Brasília, Livraria Gomes e Oliveira, 2015.
GRAU, Eros Roberto, A Constituição brasileira e as normas programáticas. Revista de direito constituci-
onal e ciência política. v. 3, n. 4, p. 37, jan./jun., 1985.
GRECO, Leonardo, A tutela da urgência e a tutela da evidência no Código de Processo Civil – Desven-
dando o novo CPC de 2015, in RIBEIRO, Darci Guimarães; JOBIM, Marco Félix (Orgs.). Desvendando
o Novo Código de Processo Civil, Porto Alegre, Livraria do Advogado, 2015.
GREGG, Anthony. Henry E. Sigerist: his impact on American medicine. Bull. Hist. Med., Philadelphia;
1948.
GRINOVER, Ada Pellegrini, O controle de políticas públicas pelo Poder Judiciário, Revista de Processo,
v. 164, pp. 9-28, 2008.
KELSEN, Hans, Teoria geral do direito e do estado, São Paulo, Martins Fontes, 1992.
KRELL, Andreas, Discricionariedade administrativa e conceitos leais indeterminados: limites do contro-
le judicial no âmbito dos interesses difusos. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013.
MIRANDA, Jorge, Os Direitos Fundamentais – As Dimensão Individual e Social in Cadernos de direito
constitucional e ciência política, 1:198-208, 1992.
NINO, Carlos Santiago, Ética y derechos humanos, Buenos Aires, Astrea, 1989.
NOVAIS, Jorge Reis, Direitos sociais: teoria jurídica dos direitos sociais enquanto direitos fundamen-
tais, Coimbra, Coimbra, 2003.
NUNES, António José Avelãs; SCAFF, Fernando Facury, Os Tribunais e o Direito à Saúde: Coleção
Estado e Constituição. v. 12, 8 jul. Porto Alegre, Livraria do Advogado, 2011.
OLIVEIRA, Fábio Corrêa Souza de, Eficácia Positiva das Normas Programática Revista Brasileira de
Direito, v.11. n.1, 2015.
______. Morte e vida da constituição dirigente, Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2010.
OTTO Y PARDO, Ignacio de y MARTIN-RETORRILLO, Lorenzo. Derechos fundamentales y Consti-
tuición. Madrid, Civitas, 1998.
PEGORARO, Lucio, Estudio Introductorio, Transplantes, injertos, diálogos.Jurisprudencia y doctrina
frente a los retos del Derecho Comparado, Disponível em: <http://www.corteidh.or.cr/tablas/r3’121
9.pdf>.
PERLINGEIRO, Ricardo, A tutela judicial do direito público à saúde no brasil, Revista Direito, Estado e
Sociedade, n. 41, p. 184 a 203 jul/dez, 2012.
______, É a reserva do possível um limite à intervenção jurisdicional nas políticas públicas sociais,
Revista de Direito Administrativo Contemporâneo – REDAC, São Paulo, v. 2, p. 163-185, nov. 2013.
______, Novas perspectivas para a judicialização da saúde no Brasil, Scientia Jurídica, Tomo LXII, 2013.
n. 333.
QUEIROZ, Cristina. Direitos fundamentais, teoria geral, Portugal, Coimbra, 2010.
SANDEL J. Michel, Justiça – o que é fazer justiça, Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 2011.
SARLET, Ingo Wolfgang, A eficácia do direito fundamental `segurança jurídica: dignidade da pessoa
humana, direitos fundamentais e proibição de retrocesso social no direito constitucional brasileiro. in
Revista Brasileira de Direito Comparado, Rio de Janeiro, Instituto de Direito Comparado Luso-
Brasileiro, n 28, p.89-148, 2005.
SARMENTO, Daniel, Direitos sociais: fundamentos, judicialização e direitos sociais em espécie, Rio de
Janeiro, Lumen Juris, 2008.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 149


Mirian Pelegrino / Eduardo Manuel Val

SCHULZE, Jair Clenio; GEBRAN NETO, Joao Pedro. Direito à Saúde: análise à luz da judicialização,
Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2015.
SEN, Amartya, Desigualdade reexaminada, São Paulo, Record, 2001.
SILVA, Virgílio Afonso da, O judiciário e as políticas públicas: entre transformação social e obstáculo à
realização dos direitos sociais, in SOUZA NETO, Cláudio Pereira de; STEINMETZ, Wilson Antônio,
Colisão de Direitos Fundamentais e princípio da proporcionalidade, Porto Alegre, Livraria do Advoga-
do, 2001.
STEINMETZ, Wilson Antônio, Colisão de direitos fundamentais e princípio da proporcionalidade, Porto
Alegre, Livraria do Advogado, 2001.
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, Sequestro de verbas públicas em favor de doente grave é tema de
repercussão geral, Notícias STF, 19 nov. 2012. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/cms/ver
NotíciasDetalhes.asp?idConteudo=224106.
STERN, Klaus, Derechos del estado de la república federal alemana. Madrid, Centro de Estudios, 1997.
STRECK, Lênio Luiz, Jurisdição constitucional e hermenêutica: uma nova crítica do direito, Rio de
Janeiro, Forense, 2014.
VIEIRA, Oscar Vilhena, 1. Supremocracia. Revista de Direitos do Estado, n. 12, 2008.
WOLF, Hans J; BACHOF, Otto; STOBER, Rolf, Direito administrativo, v. 1. SOUZA, Antônio E. de
(trad.). Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2006.
YOUNG, Katharine G, The minimum core of economic and social rights: a concept in search of contente,
Boston College Law School From the Selected Works, 2008.

150 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Judicialização da Saúde uma Questão de (“In”) Justiça – Experiência Brasileira

EL PODER DE LAS ÉLITES QUE NOS GOBIERNAN.


A PROPÓSITO DE VILFREDO PARETO,
GAETANO MOSCA Y ROBERT MICHELS1
THE POWER OF THE ELITES THAT GOVERN US.
ON REFERENCE TO VILFREDO PARETO,
GAETANO MOSCA AND ROBERT MICHELS
DOI: 10.19135/revista.consinter.00011.06
Recibido/Received 30.06.2020 – Aprobado/Approved 17.08.2020
Jesús Víctor Alfredo Contreras Ugarte2 – https://orcid.org/0000-0002-9148-659X
E-mail: jesuco_amag@yahoo.es

Resumen: La crisis de hoy se nota, y se nota más, en la falta de valores, en la falta de


decencia, además de en la falta de capacidad de muchos de los que nos representan y de
muchos de los que más tienen. Existe la percepción de que los que gobiernan suelen ser
los que mejor están, y que el único mayor interés de ellos es mantener su privilegiado y
particularista estado de bienestar propio y, que los gobernados, solo les importan cuando
les son útiles como instrumentos para acceder y para conservar el poder. Esto lleva a
preguntarme: ¿cómo es que los gobernantes se hacen con el poder?, ¿cómo es que lo
conservan? y ¿cómo es que lo pierden? Este trabajo da respuesta a estas tres preguntas a
partir de los lúcidos desarrollos teóricos de Vilfredo Pareto, Gaetano Mosca y Robert
Michels. Dos italianos y un alemán, respectivamente, todos ellos personajes de los
primeros ocho lustros del siglo XX, cuyas teorías se pueden aplicar perfectamente para dar
respuesta a la actualidad de nuestro siglo XXI.
Palabras-clave: Poder, gobernantes, gobernados, élites, política
Abstract: Today's crisis is noticeable, and it is more noticeable, in the lack of values, in the
lack of integrity, in addition to the lack of capacity of many of those who represent us and
many of the wealthy elites. There is a perception that those who govern us are usually the
ones with best social status, and that the only major interest of them is to maintain their
privileged and particularistic status of wealth and, that the governed, only are cared when

1
Este es un tema que desarrollé en mi Tesis Doctoral. Esta parte no ha sido publicada y la he actualizado y
adecuado para el presente trabajo académico.
2
Doctor Sobresaliente Cum Laude en Derechos Humanos, Máster en Derechos Fundamentales, Máster en
Estudios Avanzados en Derechos Humanos, Especialista en Educación para la Ciudadanía y los Derechos
Humanos, por la Universidad Carlos III de Madrid; Especialista con Matrícula de Honor en Derechos
Humanos por el Instituto de Derechos Humanos de la Facultad de Derecho de la Universidad Complutense
de Madrid; Académico Correspondiente de la Real Academia de Legislación y Jurisprudencia de España.
Abogado por la Facultad de Derecho de la Universidad de San Martín de Porres. E-mail:
jesuco_amag@yahoo.es.
Departamento de Derecho Internacional, Eclesiástico y Filosofía del Derecho. Facultad de Derecho –
Universidad Complutense de Madrid. Sección de Filosofía del Derecho y Derechos Humanos. Real
Academia de Jurisprudencia y Legislación de España. España, Madrid.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 151


Jesús Víctor Alfredo Contreras Ugarte

they are useful as instruments to access and keep power. This leads me to think about: how
is it that rulers seize power? How do they keep it? and how do they lose it? This paper
answers these three questions based on the magnificent theoretical essays of Vilfredo
Pareto, Gaetano Mosca and Robert Michels. Two Italians and a German, respectively, all
of them essayist from the first eight decades of the twentieth century, whose theories can be
perfectly applied to answer the contemporary questions of our 21st century society.
Keywords: Power, rulers, governed, elites, politics
Sumario: 1. Introducción; 2. Teoría de las élites; 3. La circulación de las élites en Vilfredo
Pareto; 4. La clase política en Gaetano Mosca; 5. La ley de hierro de las oligarquías en
Robert Michels; 6. Michels y los líderes revolucionarios surgidos del pueblo; 7. Pareto,
Mosca y Michels: diferencias y coincidencias; 8. A modo de conclusión; 9. Obras citadas.
Summary: 1. Introduction; 2. Theory of elites; 3. The circulation of elites in Vilfredo
Pareto; 4. The political class in Gaetano Mosca; 5. The iron law of the oligarchies in Robert
Michels; 6. Michels and the revolutionary leaders emerged from the town; 7. Pareto,
Mosca and Michels: differences and coincidences; 8. As a conclusion; 9. Referred essays.

1 INTRODUCCIÓN
Al hablar de élites y de cómo estas logran alcanzar el poder, sin duda alguna, hay
que referirse a tres autores principales: Vilfredo Pareto, Gaetano Mosca y Robert
Michels. Estos, son tres autores que reflexionaron, precisamente, sobre este tema y cuyas
reflexiones las podemos enmarcar en lo que se conoce como la teoría de las élites.
Es un tema que reviste significativa importancia y oportunidad ya que la reflexión
sobre los que gobiernan y sobre el cómo lo hacen, son de especial interés en nuestras
sociedades y sus democracias. La idea pues, de este trabajo académico, es traer a
colación la reflexión sobre estos temas y advertir las coincidencias que se puedan
encontrar con nuestra realidad.
Son Vilfredo Pareto y Gaetano Mosca, los que tuvieron gran ascendencia en las
ideas de Robert Michels.
Si nos enfocamos en la problemática que persiste en muchas sociedades, en la
ineficiencia de los derechos humanos, y en la falta de derechos que verdaderamente
doten a la humanidad de una objetividad material de bienestar, resulta obvio que algo
anda manifiestamente mal. Es muy posible que esta persistente mala situación se deba a
una mala gobernabilidad de quienes nos gobiernan; siendo así, parece presentarse
ostensiblemente palpable la acuciante exigencia palmaria de tener gobernantes
realmente aptos y sabedores de lo que es imperiosamente necesario en aras de
alcanzar un desarrollo social honesto, recto y respetuoso con los derechos y con la
dignidad de cada una de las personas.
Estamos ya en pleno siglo XXI y se suele usar esto como argumento para
reclamar, que pese a ello, aún se mantengan ciertas situaciones o problemáticas
sociales. Es como si por el hecho de estar en nuevo siglo, las cosas debieran cambiar
sin más. Claro está, que esto es un error o pura demagogia argumentativa. El paso
del tiempo no cambia las cosas por el solo hecho de pasar. Son los hechos concretos,
las voluntades y las decisiones las que logran los cambios sustanciales. Entonces, se
requiere de voluntades que estén bien formadas en valores y principios que sustenten

152 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


El Poder de las Élites que nos Gobiernan. a Propósito de Vilfredo Pareto, Gaetano Mosca y Robert Michels

y defiendan el respeto de los unos a los otros. De esto se necesita tener la firma
convicción, y aún más quienes deciden gobernar.
La educación y, sobre todo, la educación moral, reflexiva y crítica, es pilar de
la correcta formación de líderes, es decir, de aquellas personas que se erigen a gobernar
las sociedades. Estos deben ser líderes honestos, respetuosos, responsables y capaces de
velar por los intereses de toda la sociedad y no únicamente de los suyos propios y de sus
allegados; líderes comprometidos en conducir el presente y el futuro de la humanidad,
sabiendo que la humanidad somos todos los seres humanos. Se trate de un régimen u
otro, de una forma de gobierno u otra, la exigencia de líderes verdaderamente aptos es de
vital importancia para nuestras llamadas democracias.
Ante la ausencia de estas capacidades, la consecuencia inevitable es el
distanciamiento y el desinterés de los ciudadanos hacia sus gobernantes y, con ello, hacia
el desarrollo de la sociedad como conjunto. Es decir, se produce una desconexión de las
personas con sus líderes porque, los primeros, no creen en los segundos, ya que las
situaciones sociales, problemáticas e injustas, no encuentran remedio. Este desapego
hace que los ciudadanos se centren en resolver solamente sus propios problemas y no
tengan en cuenta las demás situaciones que suceden en su entorno y con los demás. Aquí
pues, toca entrar al tema propio de la teoría de las élites.

2 TEORÍA DE LAS ÉLITES


Enfocándome ya en la teoría de las élites, advertiré que en esta teoría
mantiene que hay mandos políticos, administrativos, militares, religiosos,
económicos y morales en las sociedades, y que estos mandos o jefaturas son
desempeñados por una organizada minoría. En esta idea, podemos recordar a Engels
quien decía que las revoluciones culminaron en el reemplazo de una establecida
dominación de clase por otra, y que todas las clases dominantes pasadas solo fueron
pequeñas minorías si se les contrasta con el conjunto del pueblo dominado. Según
Engels, una minoría dominante era echada abajo, y otra minoría se levantaba para
empuñar en su lugar la dirección del Estado, ajustando a sus intereses la
organización y los organismos estatales. Este cometido, lo ejercitaría siempre el
grupo minoritario que es capaz de dominar gracias a su desarrollo económico.
Engels, sostiene que la mayoría dominada, o bien actuaba a favor de aquella
posición en la revolución o bien aprobaba la revolución sosegadamente, pero agrega:

(...) prescindiendo del contenido concreto de cada caso, la forma común a todas estas
revoluciones era la de ser revoluciones minoritarias. Aun cuando la mayoría cooperase en
ellas, lo hacía –consciente o inconscientemente – al servicio de una minoría; pero esto, o
simplemente la actitud pasiva, la no resistencia por parte de la mayoría, daba al grupo
minoritario la apariencia de ser el representante de todo el pueblo3.

3
ENGELS, F., “Introducción a la obra de Carl Marx. Las luchas de clases en Francia de 1848 a 1850”, en
Obras escogidas. Marx y Engels, tomo I, Progreso, Moscú, 1980, pp. 98 y 99.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 153


Jesús Víctor Alfredo Contreras Ugarte

Según la teoría de las élites, las clases políticas se originan a partir de dos ideas o
pensamientos. Para empezar, se cuenta con la idea aristocrática, que surge desde arriba;
luego, y en segundo lugar, se cuenta con la idea democrática, que surge desde abajo. La
idea aristocrática se distingue, especialmente, por la organización militar burocrática; en
cambio, la idea democrática, está más determinada por una organización del sistema
electoral. El sistema electoral, impulsa un vigilado desarrollo de la circulación de las
élites dado que, generalmente, la clase política cuenta con los mecanismos e
instrumentos para encaminar la voluntad de los electores.
Las élites están conformadas por un número menor de integrantes; sin embargo,
cualitativamente, poseen superiores capacidades; asimismo, las élites están provistas de
una organización estructurada y dirigen las fuerzas sociales; también tienen
contactos y parentescos. Aunque son minoría, la élite vence, gracias a que se hacen
con el poder sirviéndose de la organización, y aprovechando la desorganización de
las mayorías. Las masas mayoritarias y desorganizadas se ven incapacitadas frente a
la posición de poder organizado que alcanza la minoría. La organización le da
preeminencia a la minoría. La élite al ser numéricamente minoritaria, logra un
recíproco entendimiento, un conveniente consenso y un concertado accionar; esto
dificulta cualquier intento en contrario de las masas numerosas. Las élites se
orientan por la razón, por el cálculo y por el conocimiento; en cambio, las masas – y,
por lo regular, quien no sea de la élite – se conducen, primordialmente, por el
sentimiento. Y de esto también sacan rédito las élites, pues cuando estas tienen algún
interés y requieren del auxilio de las masas para conseguirlo, las élites, se sustentan
en el estímulo que causa la sensibilidad de estas masas.
En la teoría de las élites, verdaderamente, la lucha por el poder tiene lugar dentro
de la propia clase gobernante. Esta lucha de dentro, no implica, inexorablemente, que las
masas o la sociedad en su conjunto acaben siendo dañadas. Si la clase que ya gobierna es
mejor o, si no lo es, se reemplaza por otra de superior calidad, la sociedad en su conjunto
también prosperará. No obstante, si la clase gobernante no mejora ni se suple por una de
mayor calidad, entonces, la sociedad se atasca, para caer luego en un insalvable declive,
que puede determinar que la misma se separe por completo.
De agredirse la preeminencia de la clase gobernante, esta última debe reaccionar
de forma recíproca, fuerza contra fuerza. De no hacerlo así, la élite terminaría desgastada
y expuesta a la implantación de cualquier otro conjunto minoritario. Para la teoría de las
élites, también puede suceder que la clase gobernante no se valga de la fuerza y utilice el
fraude, el embuste y el engaño para derrotar a su adversario; si este fuera el caso, la clase
gobernante, solo logrará que el poder se desplace de una minoría a otra o que la suya
propia se restaure con nuevos miembros. Para los autores que desenvuelven esta teoría
de las élites, cuando se habla del ideal de usar la ley en vez de usar la fuerza, esto supone
hundirse en una lamentable ilusión.

3 LA CIRCULACIÓN DE LAS ÉLITES EN VILFREDO PARETO


Vilfredo Pareto (1848-1923) recela de la teoría liberal-democrática y
desconfía de la teoría marxista. Como lo hizo Max Weber, Pareto desarrolla su
propia definición de sociología, refutando las ideas de Marx. Así, desde un enfoque

154 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


El Poder de las Élites que nos Gobiernan. a Propósito de Vilfredo Pareto, Gaetano Mosca y Robert Michels

claramente contrario a la teoría marxista sobre la lucha de clases, sostuvo su teoría


de las élites. Entonces, Pareto sostendrá que la movilización y recorrido de las élites
es la materia real con la que se forma la historia; Pareto, a este movimiento, lo
designa con el nombre de circulación de las élites. En razón de esta circulación, los
conflictos de clases no encontrarían culminación; es posible que cambiaran las
formas de confrontarse, sin embargo, sus características principales se mantendrían
inmutables.
Vilfredo Pareto y su circulación de las élites, sostienen que las personas son
desiguales, física, moral e intelectualmente. En la sociedad, enfocada como un todo,
se advierte que, en todo grupo o estrato social, siempre se encuentran personas mejor
capacitadas y aptas que otras; siendo así, algunas, las más capaces, se establecen como
la élite de ese grupo o estrato. Pareto, busca esclarecer los campos no racionales de la
conducta humana ya que él sostenía que las cuestiones humanas se encontraban guiadas
por acciones que no eran lógicas ni racionales. Habría, según este autor, en el ser
humano una proclividad natural, abierta e inevitable, tendente a la racionalización de sus
actos espontáneos y a sus creencias. Estos actos espontáneos, el ser humano, los
consolidaría a través de la sanción intelectual. Para Pareto, desde el enfoque lógico o
científico, las creencias sociales – libertad, democracia, igualdad, fraternidad, etcétera –
son carentes de sentido; son, realmente, simples y meros mitos. Empero, no son mitos
faltos de utilidad, ya que son requisitos y sirven para la vida social. Estas creencias
sociales, son derivaciones y productos de nuestra imaginación racionalizadora con la
cual verbalizamos una realidad más intensa. Para Pareto, el término élite, o bien tiene un
sentido moral, o bien tiene un sentido honorífico. Se divide en dos:
• la élite gobernante integrada por individuos que, de manera directa o
indirecta, tienen un papel importante en el gobierno, y
• la élite no gobernante que incluye al resto de los individuos más capaces.
Resulta que, entonces, para Pareto, la élite no es uniforme; está estratificada,
es decir, está dispuesta en capas o estratos. Generalmente, se observa en la élite un
centro que mando, conformado por un pequeño número de personas o de familias
que cuentan con un poder muy superior al de las demás. Este centro rector
desenvuelve las funciones de liderazgo en el seno de la élite; se erige en una forma
de élite superior dentro de la élite. El liderazgo provee a la élite de una fortaleza y
una capacidad todavía mayores. En tanto ocurre esta permanente circulación de las
élites, se mantiene con mayor robustez la concordia del sistema social dado que, esa
circulación, garantiza la movilidad ascendente de los mejores espíritus. La
circulación de élites interviene, a la vez, en los cambios sociales pues lleva consigo,
también, la circulación de las ideas. Pareto afirmaba que, en la capa superior de la
sociedad, en el estrato de la clase selecta, existen específicos agregados que son las
aristocracias. Hay ocasiones en que las mayorías cuentan con las aptitudes para
pertenecer a la aristocracia y, hay otras ocasiones, en que, un buen número de
integrantes, no; tal vez, sean parte de la clase selecta del gobierno o, tal vez, estén
marginados de ella. Afirmación interesante es la de Pareto, cuando dice que toda
aristocracia está destinada a desaparecer, por ello decía que: “La historia es un

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 155


Jesús Víctor Alfredo Contreras Ugarte

cementerio de aristocracias.”4 Las aristocracias se aminoran por el número y además


por la calidad. Merma en ellas su vigor, cuando se modifican las condiciones que
coadyuvaron a que esas aristocracias se hagan con el poder y a que puedan
sostenerlo.
Los gobernantes se recomponen en número y en calidad; según Pareto, la calidad
es lo que realmente importa. Se recomponen con familias que provienen de las clases
inferiores, suministrando de fuerza y abasteciendo las condiciones necesarias para
conservarse en el poder. Se recomponen, asimismo, por la pérdida de sus integrantes que
más se han debilitado.
Las élites y las aristocracias no se perpetúan imperecederamente; ellas, con el
pasar del tiempo, sufren una regresión a un estadio inferior o malo. Luego, la élite se
estructura organizadamente y se vigoriza con los mejores componentes que proceden de
las clases inferiores. Ocurrido el declive de la élite, una nueva, colmada de vitalidad,
robustez y empuje activo, se constituye al interior de las otras clases.
Las persistentes confrontaciones, discrepancias y la circulación de las élites,
representan el conglomerado de características permanentes que deciden la historia.
Cuando el pueblo se alza y se opone al poder dominante, el desenlace no siempre le es
favorable. Es más factible que la utilidad de su alzamiento, quede restringida a quitar los
impedimentos y dificultades para que la antigua élite expire y brote la nueva:

Gracias a la circulación de las clases selectas, la clase selecta de gobierno está en un


estado de continua y lenta transformación, fluye como un río, y la de hoy es distinta
de la de ayer. De vez en cuando se observan repentinas y violentas perturbaciones,
como podrían serlo las inundaciones de un río, y después la nueva clase selecta de
gobierno vuelve a modificarse lentamente: el río, vuelto a su cauce, fluye de nuevo
regularmente. (…) Las revoluciones se producen porque, bien por el entorpecimiento
de la circulación de la clase selecta, bien por otra causa, se acumulan en los estratos
superiores elementos decadentes que ya no tienen los residuos capaces de
mantenerlos en el poder y evitan el uso de la fuerza, mientras que crecen en los
estratos inferiores los elementos de calidad superior que poseen los residuos capaces
de ejercer el gobierno y que están dispuestos a utilizar la fuerza5.

Según Pareto, existe una diferencia entre los grupos sociales, y que esta
diferencia se manifiesta en el hecho de que las personas son física, moral e
intelectualmente diferentes. Así, sostiene que hay determinadas personas que son
superiores a otras; estas son las que Pareto llama las élites, para referirse a esa
superioridad. Estas personas son superiormente mejores –la élite – en inteligencia,
carácter, habilidad, capacidad, y poder. Esta clase superior o selecta, es la que posee
los pilares de importancia mayor, dentro de cada una de las fracciones en que se
reparten las actividades de los individuos. Pareto, como dije antes, diferencia en dos
a la élite, llamándoles también:

4
PARETO, V., Forma y equilibrio sociales, traducido por Jesús López Pacheco, Alianza, Madrid, 1980, p.
70.
5
Ibídem, p. 71.

156 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


El Poder de las Élites que nos Gobiernan. a Propósito de Vilfredo Pareto, Gaetano Mosca y Robert Michels

• la clase selecta de gobierno, y


• la clase selecta no de gobierno.
La primera clase de élite es la que interviene visiblemente en el ejercicio del
poder y, la segunda clase, es toda la demás élite que no forma parte de este ejercicio.
El nivel inferior de individuos –la no élite – está constituido por las personas sin
influencias y es la mayor parte de la comunidad.
Vilfredo Pareto explica que, siempre que exista una sociedad organizada,
existirá también una clase que gobierne, la que además será minoría. La clase que
gobierna se mantiene en el poder gracias a la fuerza y al consentimiento de los
gobernados los que, siempre, son la mayoría. De esta forma, para conservar el poder
o apropiarse de él, la élite gobernante requiere a los estratos sociales mayoritarios –a
los inferiores que no pertenecen a la élite – y les manifiesta, únicamente de forma
verbal, su admiración, respeto y estima; es decir, mangonean y usan los sentimientos
de las personas, sobre todo, valiéndose de lisonjas y adulaciones simples y de pactos
irreales e inmotivados, con tal de alcanzar sus fines políticos. La estabilidad y la
armonía de la élite, su desmoronamiento, o el nacimiento de otra nueva, lo definirá
el nivel de triunfo que se alcance con los discursos, expresiones y gestos que se
hacen con el fin de instar y engatusar el sentimiento de la capa mayoritaria de la
comunidad. La clase que gobierna se esmera por mantener su dominio y para ello
selecciona, de la clase gobernada, a determinados sujetos para el uso de la fuerza o,
también, para otras circunstancias como el desarrollo artístico. La clase gobernante
selecciona a los mejores y más ilustres de la masa de los dominados; de esta forma,
debilita a la masa ya que ella queda despojada sus mejores componentes. Esta es la
verdad que otorga solidez, estabilidad y seguridad a las sociedades. La élite que
gobierna, solo requiere cautivar, absorber y adherir a un mínimo grupo de nuevos
integrantes, con el objeto de que los dominados permanezcan continuamente faltos
de líderes y cabezas que logren posicionarse en el primer lugar de la mayoritaria
capa del nivel social inferior.
Según Vilfredo Pareto, las cualidades y circunstancias por las que una
sociedad se distingue de las otras, se determina por el conjunto de cualidades y
circunstancias de su élite. Las élites no conforman grupos completamente cerrados
ni completamente abiertos. Los gobernantes buscan mantener su poder utilizando su
habilidad para lograrlo, sobre todo mediante el engaño y cuando no pueden hacer
uso de la fuerza. La élite explota activamente los sentimientos imperturbables que
poseen las masas. La clase gobernante sabe que su legitimidad se sostiene en las
masas y, por ello, se recompone continuamente incorporando a nuevos elementos
que elige de las clases inferiores. La conservación del poder requiere de la movilidad
social pues esta es el medio más idóneo para contrarrestar, evitar y prevenir el
surgimiento de todo tipo de revueltas sociales.
Con mucho acierto, Pareto afirma que, cuanto mayor y más longeva sea la
carencia general de cultura e instrucción en las clases inferiores, cuanto menos y
peor educación y estudios reciban las masas, mayor será la capacidad de obrar de la
élite y mayor será su capacidad para lograr sus fines anhelados. Cuanto menor sea el

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 157


Jesús Víctor Alfredo Contreras Ugarte

conocimiento y la instrucción de las mayorías, menor será la oportunidad para que


estas se opongan al uso, no confesado, de medios no institucionalizados que
únicamente pretenden que las mayorías admitan la posición de poder en la que se
sitúan las élites.
Pareto dice bien que, cuando se extienden las diferencias entre las élites
gobernantes y las masas dominadas, explota la revolución. La revolución es
producto de la alteración de la circulación de las élites, o por la existencia de
desmesurados componentes negativos en las capas superiores de la sociedad que no
poseen las facultades para sostenerse en el poder y que rechazan utilizar la fuerza.
En tanto esto es así, en las capas inferiores proliferan los sujetos de calidad superior
que poseen la aptitud de gobernar y la actitud para utilizar la fuerza. Cuando los
gobernantes persisten, por mucho tiempo, en valerse del uso de la fuerza y, además,
consiguen prosperar económicamente, suelen durar gobernando, siempre que se
preocupen de pagar a los adversarios; no obstante, es un error presumir que esta
situación pueda sostenerse continuamente por sí sola y sin la utilización de la fuerza:

Las mutaciones violentas se producen bruscamente y, por tanto, el efecto no sigue de


modo inmediato a la causa. Cuando una clase gobernante o una nación se han
mantenido largo tiempo por la fuerza y se han enriquecido, pueden subsistir un poco
más todavía sin la fuerza, comprando la paz de los adversarios y pagando no solo
con oro, sino también con sacrificios, el decoro y la reverencia de que hasta entonces
habían gozado y que constituye un cierto capital. En un primer momento, el poder se
mantiene mediante concesiones, y nace el error de que se pueda seguir manteniendo
así indefinidamente. Así, el Imperio romano de la decadencia compraba la paz de los
bárbaros con moneda y con honores; así, Luis XVI de Francia, tras consumir en un
período muy breve el heredado patrimonio de amor, respeto y reverencia casi
religiosa por la monarquía, pudo ser, cediendo siempre, el rey de la revolución; así,
la aristocracia inglesa pudo prolongar su poder en la segunda mitad del siglo XIX
hasta la aurora de su decadencia (…) a comienzos del siglo XX6.

Está claro que, cuando los gobernados se apoyan en la violencia, existirán los
que la reprueben; y, asimismo, existirán otros que reprobarán la violencia si es que
esta es estimulada por los gobernantes. Según Pareto, todos los gobiernos ejercitan
la fuerza y todos aseveran que su utilización es justificada. La fuerza la utiliza el que
pretende mantener el poder existente, pero también, el que quiera romperlo. La
fuerza de uno y otro lado se oponen y, repeliéndose la una de la otra, se hacen frente.
Quien es seguidor de los gobernantes, cuando desaprueba el empleo de la fuerza, lo
que hace realmente es desaprobar su utilización por parte de los que se separan para
distanciarse del orden estatuido y homogéneo. Sin embargo, cuando este mismo
adepto de los gobernantes aprueba y disculpa el uso de la fuerza, lo que hace realmente,
es respaldar la utilización de esta fuerza que ejercen los gobernantes para coaccionar y
obligar a la homogeneidad del orden estatuido a quienes buscan emanciparse y liberarse
de él. Del otro lado, es decir, si lo vemos desde el enfoque de un partidario de los

6
Ibídem, p. 72.

158 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


El Poder de las Élites que nos Gobiernan. a Propósito de Vilfredo Pareto, Gaetano Mosca y Robert Michels

gobernados, cuando este reprueba el uso de la fuerza, lo que hace realmente, es condenar
la utilización de la fuerza que ejercen los gobernantes con el objeto de que los que
pretendan separarse de la uniformidad, no lo hagan. Si el adepto de los gobernados, da
por bueno el ejercicio de la fuerza, se está refiriendo al uso que hacen de ella los que
buscan distanciarse de determinadas uniformidades del orden estatuido.
Se puede inferir, entonces, según el desarrollo de Pareto, que la clase gobernante
que no sabe o no consigue ampararse en la fuerza, necesariamente, está destinada a
desmoronarse. No obstante, un gobierno no se mantiene en el tiempo si solo se ampara
en la fuerza. Para Pareto, la élite gobernante tiene la responsabilidad de utilizar la fuerza;
cuanto más incapaz sea de utilizarla, más incumplirá este deber. El deber de utilizar la
fuerza, es el principal deber de la clase gobernante.

4 LA CLASE POLÍTICA EN GAETANO MOSCA


Gaetano Mosca (1858-1941) declinaba de las teorías democráticas y colectivistas,
sobre todo la marxista. Esta última, directamente, la rechazaba.
En la misma línea de Vilfredo Pareto, Mosca buscó anular lo que él entendía
como la ficción o fantasía de Rousseau y Marx. La fantasía, de estos dos personajes, se
asentaría en el hecho de suponer que instaurado el colectivismo esto nos conduciría a un
tiempo de igualdad y de justicia universal mediante el cual el Estado abandonaría la
condición de ser el órgano de una clase determinada y, según ellos, desaparecerían los
explotadores y los explotados. Según Gaetano Mosca, las doctrinas proclives a abolir la
propiedad particular y a trasladar, la misma, a la colectividad, entregando al Estado el
reparto de la riqueza, solo son doctrinas que simplemente caen en la fantasía y la ficción.
Según Mosca, estas doctrinas caían en la utopía y jamás encajarían en la verdadera
realidad ya que es imposible evitar la existencia de una clase gobernante. Así pues, según
Mosca, siempre existirá un sistema basado en dos clases:
• de una parte, una minoría dominante, y
• de otra, una mayoría dirigida.
En el momento que la sociedad alcanza un determinado desarrollo, el dominio
político – y, con ello, la dirección económica, administrativa, militar, moral y religiosa –
es ejercitado, siempre y en todos los casos, por una clase especial o por una minoría
organizada. Es decir, según Gaetano Mosca, alcanzado un determinado desarrollo,
invariablemente, ha de existir una minoría dominante: la clase política, y una mayoría
dominada.
Mosca sostenía que si la ausencia de justicia y la falta de libertad fueron siempre
particularidades básicas de la condición humana, ergo, estas debían aparejarse también a
su naturaleza política. No lograba visualizar con limpidez y seriamente la posibilidad de
que transformando las instituciones sociales se modificaría la psicología de los seres
humanos7. Para Gaetano Mosca, en las democracias existe la permanente necesidad de
una organizada minoría; y, pese a que parece que esto no ocurre, la minoría organizada
7
MEISEL, J., El mito de la clase gobernante. Gaetano Mosca y la élite, Amorrortu, traducido por Flora
Serato, Buenos Aires, 1962, p. 22.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 159


Jesús Víctor Alfredo Contreras Ugarte

es la que sustenta la dirección real y efectiva del Estado. Por mucho que un gobierno se
sostenga en todo tipo de estándares y principios legales que nieguen y rechacen el
control por parte de una minoría, la realidad siempre será otra.
Para Mosca es el liberalismo el más idóneo instrumento entre la aristocracia y la
democracia. El liberalismo, sería el sistema mediante el cual los servidores públicos son
elegidos desde abajo, de forma directa o indirecta, por los subordinados. Los servidores
públicos son escogidos del conjunto limitado de seres humanos que son sabios,
experimentados, responsables y devotos, y que son los más aptos para ejercitar el
gobierno: es la minoría aristocrática la que posee autoridad, pero no un poder ilimitado.
La presencia de estos límites, frenos y equilibrios en el poder, según Mosca, es lo que,
primordialmente, determina que el liberalismo sea lo que es.
Las mayorías, especialmente las que no cuentan con recursos ni preparación,
jamás controlan a las minorías y, menos aún, cuando las minorías poseen muchos
medios económicos y son preparadas. Es claro que Mosca esta recriminando al
marxismo; además, sostiene que la pretendida dictadura del proletariado se referiría solo
para una clase muy limitada; sería una dictadura ejercida únicamente en representación
del proletariado. Los dominados sí que consiguen ejercer tensión sobre el poder y, con
ello, consiguen influir en las decisiones tomadas por el grupo dominante. El desencanto y
desilusión de las mayorías puede terminar con el declive de una clase; empero, no se
puede impedir que otra clase semejante aflore de estas mismas mayorías; esta nueva
clase sería la que ejerza las labores de la clase dominante.
Cuanto más organizada sea la minoría –en contraste con una mayoría
desorganizada – mayor será su poder y su firmeza. La ausencia de organización en las
mayorías, sitúa a los sujetos que la integran en una posición de indefensión en relación y
proporción a la minoría. La minoría organizada primará y prevalecerá por encima de la
mayoría desorganizada. La minoría organizada estructuralmente posee también
cualidades que le otorgan superioridad material, intelectual y moral, o bien, lo han
heredado de quienes los poseen. Por ello, Mosca afirma que las clases políticas son
propensas a tornarse en clases hereditarias por derecho o, al menos, sustentándose en los
hechos. Cuanto más extendida y grande sea la comunidad política, menor será la
correspondencia de la minoría gobernante en contraste con la mayoría gobernada; en esta
situación, le resultará más difícil a la mayoría gobernada organizarse para proceder en
contra de la minoría gobernante8.
La jerarquía, según Mosca, es una parte indispensable al interior de la sociedad
humana; y es por esto, que siempre habrá los que mandan y los que obedecen. Los que
mandan, por lo general, son minoría y, además, son los que ejercen las labores políticas,
los que acumulan el poder y los que disfrutan de las ventajas que él otorga. Los que

8
MOSCA, G., La clase política, traducido por Marcos Lara, Fondo de Cultura Económica, México D. F.,
2004, p. 94. Gaetano Mosca dice también que: “(…) además de la enorme ventaja que proviene de la
organización, las minorías gobernantes están constituidas por lo común de una manera tal, que los
individuos que las componen se distinguen de la masa de los gobernados por ciertas cualidades que les
otorgan cierta superioridad material e intelectual, y hasta moral; o bien son los herederos de los que
poseían estas cualidades. En otras palabras, deben poseer algún requisito, verdadero o aparente, que sea
altamente apreciado y se valore mucho en la sociedad donde viven.”

160 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


El Poder de las Élites que nos Gobiernan. a Propósito de Vilfredo Pareto, Gaetano Mosca y Robert Michels

obedecen, son, numéricamente, la mayoría y ellos son los que terminan siendo
conducidos y ordenados por los que mandan mediante procedimientos legales o
utilizando medios arbitrarios y violentos:

En la práctica de la vida, todos reconocemos la existencia de esta clase dirigente o clase


política (…) no podríamos imaginar en la realidad un mundo organizado de otra manera,
en el que todos fuesen sometidos a uno solo, en pie de igualdad y sin ninguna jerarquía
entre ellos, o que todos dirigiesen por igual los asuntos políticos. Si en teoría razonamos
de otra manera, es en parte por efecto de hábitos inveterados de nuestro pensamiento, y en
parte debido a la excesiva importancia que les asignamos a los hechos políticos, cuya
apariencia se sitúa muy por encima de la realidad9.

El sistema de gobierno según el cual la voluntad de una sola persona es la


suprema ley, según Mosca, fue lo que sustentó la organización política de los primeros
grandes conglomerados de seres humanos. Esta autocracia, al ser un orden político tan
extenso y duradero entre pueblos de civilizaciones muy diferentes y que, además, no
mantenían conexión material o intelectual entre sí, entonces, la autocracia debía ser el
resultado constante o, al menos, el más habitual de la naturaleza política de los seres
humanos. Lo erróneo o lo que no sucede regularmente, y lo ocurre inusitadamente, no
persiste en el tiempo:

En efecto, la autocracia, ya sea que el jefe supremo que está en el vértice de la pirámide
política ejerza su autoridad en nombre de Dios o de los dioses, ya que la reciba del
pueblo o de quienes presumen representarlo, proporciona una fórmula política, o sea
un principio de autoridad y una justificación del poder, que resulta, clara, simple y
fácilmente comprensible para todos. No puede haber organización humana sin
jerarquía, y cualquier jerarquía exige necesariamente que algunos manden y otros
obedezcan; y puesto que está en la naturaleza del hombre que muchos de ellos
quieran mandar y que casi todos acepten obedecer, resulta bastante útil una
institución que da a los que están arriba la manera de justificar su autoridad, y al
mismo tiempo ayuda a persuadir a los de abajo a que deben admitirla10.

En todo organismo político, según Mosca, hay siempre un sujeto superior a la


jerarquía de toda la clase política; este es el que dirige el mando del Estado. Mosca
anota, que este sujeto en ocasiones es uno que, legalmente, no tendría que disponer
del poder supremo:

(...) muchas veces ocurre que, junto al rey o al emperador hereditario, hay un primer
ministro o un mayordomo de palacio que tiene un poder efectivo por encima del
propio soberano; o que, en lugar del presidente elegido, gobierna el político
influyente que lo ha hecho elegir. Algunas veces, por circunstancias especiales, en vez
de una persona sola, son dos o tres las que toman a su cargo la dirección suprema11.

9
Ibídem, p. 91 y 92.
10
Ibídem, p. 260
11
Ibídem, p. 92.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 161


Jesús Víctor Alfredo Contreras Ugarte

Para Mosca, la historia de la humanidad civilizada se puede compendiar en la


lucha entre la predisposición que posee la clase dominante para adquirir, acaparar y
atribuirse el aprovechamiento estable de las fuerzas políticas y a transmitirle su
posesión a sus hijos en forma hereditaria, y la predisposición hacia la sustitución y
variación de estas fuerzas políticas y la salvaguarda de fuerzas nuevas. Todo ello,
produce una corriente de flujo de fuera hacia dentro y de dentro hacia fuera, entre la
clase alta y algunas fracciones de las bajas:

Las clases políticas declinan inexorablemente cuando ya no pueden ejercer las


cualidades mediante las que llegaron al poder, o cuando no pueden prestar más el
servicio social que prestaban, o cuando sus cualidades y los servicios que prestaban
pierden importancia en el ambiente social donde viven12.

Una organización política, más o menos perfecta, opina Mosca, es aquella en


donde los que gozan del poder más alto poseen, además, una situación económica no
subordinada a nada ni a nadie. En la clase política predomina, también, la actitud
para dirigir, así como las cualidades intelectuales, económicas y morales. La
preparación, la cultura científica, los grados académicos y las aptitudes especiales
corroboradas, abren las posibilidades hacia los cargos públicos, y además permite la
posibilidad de manipular, según antojo, a quienes no son profesionales o
especialistas preparados:

(...) el poder de los profesionales consiste en la capacidad de revelar los derechos y,


de paso, las injusticias o, al contrario, en la capacidad de condenar el sentimiento de
injusticia fundado únicamente en el sentido de la equidad, y, así, desanimar la
defensa judicial de los derechos subjetivos, en suma, se trata de la capacidad de
manipular las aspiraciones jurídicas, de crearlas en algunos casos, de ampliarlas o
desalentarlas en otros13.

Los sujetos que se movilizan de una posición social a otra, conservan sus
actitudes intelectuales, pero cambian sus actitudes morales, lo que se puede percibir
a través de los sentidos y del entendimiento. De esta forma, existe la posibilidad de
que el servil se vuelva arrogante y el humilde orgulloso. Es cierto, también, que
quien asciende desde abajo suele desarrollar el sentir de justicia y de equidad.
El lograr de hecho el poder, por parte de la clase política, no es suficiente. La
clase política justifica su poder, proporcionándole un sustento moral y legal. Hacen
que el surgimiento de su poder se tome como la consecuencia indispensable de
doctrinas y creencias, las que usualmente son las aceptadas y reconocidas en esa
sociedad que conduce la clase política. La clase política consigue ampliar su existencia
en el tiempo, cuando sabe gestionar la reforma oportuna de las clases dirigentes; en este

12
Ibídem, p. 108
13
BOURDIEU, P., Poder, derecho y clases sociales, traducido por Mª José Bernuz Beneitez, Desclée, Bilbao,
2001, p. 194.

162 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


El Poder de las Élites que nos Gobiernan. a Propósito de Vilfredo Pareto, Gaetano Mosca y Robert Michels

sentido, el principal mérito de la clase popular se sitúa en su capacidad connatural de


extraer de su interior nuevos sujetos capacitados para dirigirlas.
Para Mosca, si las fuerzas políticas cambian, se deben afirmar las actitudes
originales en la dirección del Estado; pero, si las antiguas fuerzas políticas no mantienen
sus actitudes, se transformará la composición de las clases políticas. La clase política no
puede evitar decaer si le resulta imposible desplegar las cualidades que la pusieron en el
poder o, simplemente, si esas cualidades dejan de tener importancia en el entorno social
en que se desenvolvían.
Como anoté antes, según Mosca, en todo organismo político siempre existe un
sujeto que es el superior de toda la jerarquía de la clase política y que es el que dirige el
timón del Estado. Este sujeto, que es jefe de Estado, logra gobernar gracias al apoyo de
la clase dirigente que hace cumplir y respetar sus mandatos. Asimismo, la clase política
requiere de una capa o nivel de la sociedad para que le ayude en el gobierno; esta capa
social, es la clase media. La clase media es, para Mosca, indispensable para que
cualquier organización tenga posibilidad de existir: la clase alta de la sociedad no sería
suficiente para enderezar y dirigir el accionar de las masas. Los que pertenecen a la clase
media cuentan con los medios para obtener una instrucción necesaria y, de su mismo
ambiente familiar toman el concepto práctico de lo que son los recursos necesarios para
lograr una carrera administrativa y burocrática.
En el conflicto entre las fracciones de la clase dirigente, una de ellas busca la
ayuda de las masas. De esta manera, se le unen los sujetos que, aún perteneciendo a las
clases bajas, supieron ponerse en una posición superior dentro de su clase gracias a su
particular inteligencia y energía o por su osadía y atrevimiento, con lo que se apartan y se
colocan por encima del común de la gente de su clase desfavorecida. La fracción de la
clase dominante que ha buscado ayuda en las masas, obtiene la simpatía de ellas
magnificando y sacando a la luz el egoísmo, la tontería y los privilegios materiales de
los ricos y poderosos, mostrando sus vicios y errores verdaderos e imaginarios,
comprometiéndose a cumplir con el sentimiento de justicia. Si una fracción de la
clase política, al propugnar renovaciones, es marginada del poder, esta intentará
echar abajo al gobierno vigente ayudándose de las mayorías que le seguirán con
facilidad si es que están en desacuerdo con el sistema constituido. De esta manera, la
clase social más baja, resulta siendo un elemento indispensable de la mayoría de las
sublevaciones y revoluciones. Es por ello, que con regularidad vemos al frente de las
manifestaciones populares a sujetos de un nivel social superior. También podría
suceder lo contrario: que la clase política que posee el poder y que es la que no
acepta las tendencias renovadoras, acuda a la plebe que aún permanece fiel a las
antiguas ideas y que no quiere la renovación14.
En las mismas clases bajas hay una minoría dirigente que no acepta a los que
están en el poder. Esta minoría logra tener mucha influencia sobre las masas, más
que la propia clase gobernante. Si crece el aislamiento de clases y el descontento
entre las clases inferiores, habrá también una creciente tendencia a que las clases
14
MOSCA, G., Histoire des doctrines politiques depuis l'Antiquité: les doctrines politiques depuis 1914,
Payot, París, 1955, pp. 328 y siguientes.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 163


Jesús Víctor Alfredo Contreras Ugarte

bajas ayuden a derribar al gobierno que exista. Finalmente, puede darse el caso que
la clase dominante que existía sea reemplazada por otra, y esto servirá de poco o nada
provechoso para las masas. Vemos pues, que para Gaetano Mosca, el aislamiento de las
masas, las contrariedades y rivalidades entre cultura, creencias y educación de las clases
sociales, podrían hacer que se constituyan – en la parte interna de la masa – una nueva
clase dirigente, la que es, por lo regular, contraria a la que viene ejerciendo el poder. Si la
clase baja se organiza debidamente, podría provocarle grandes dificultades a los
gobernantes. Las mayorías dominadas logran influir sobre sus dominadores que
conforman la clase política; es más, si el pueblo es infeliz podría lograr el derribo de su
clase política. De la misma manera, las clases dirigidas van con los dirigentes mientras
compartan opiniones y creencias. La presión de las mayorías, acrecentada por su falta de
contento, podría lograr determinada influencia en la clase política. Si la falta de contento
llega a ser muy grande y, con ello, se provocará el derrocamiento de la clase dirigente,
surgirá, indispensablemente, en la masa, una nueva minoría organizada que sustituirá a la
clase política derrocada.
Mosca, al igual que Pareto, opina que cualquier clase política tiene que
reemplazarse con sujetos de las clases inferiores puesto que ellos conservan activas las
tradicionales reacciones de lucha que contribuyen a su conservación, como individuos
que son. El aislamiento de una clase tiene como consecuencia el decaimiento de la
misma, y esto es así porque se queda sin la capacidad de operar competentemente en
sus asuntos y en los de la sociedad. Por lo tanto, por el aislamiento, frente a un
conflicto con los contrarios externos o internos, el sistema político se cae a la
primera15.
Situándome en otra cuestión, debo anotar que a Gaetano Mosca el sufragio
universal nunca le resultó real y verdadero. Por el contrario, le pareció algo
quimérico, dudoso o puramente nominal. Para él, el sufragio universal se apoya en la
engañosa creencia sobre que los electores eligen a sus representantes; no obstante, lo
que pasa realmente es una situación diferente: el representante se hace elegir por los
electores. Para Mosca, la soberanía popular –como resultado del sufragio universal –
no es más que un mito extremadamente riesgoso, con el que se busca que la
sociedad crea que es ella quien gobierna, y que los servidores públicos elegidos
están para servirle. Siendo así, la democracia parlamentaria se sustentaría en la idea
jurídica de que el representante es elegido por la mayoría de los electores; sin
embargo, la realidad de los hechos demuestra una situación muy diferente. En un
proceso electoral se sabe bien que el elegido no es determinado, como tal, por los
votos de los electores; más bien, se sabe que, en general, se hace elegir por ellos –
que es una situación muy diferente – o, si se quiere, son los amigos del elegido los
que lo hacen ser tal. La existencia de un candidato se debe a la labor de un conjunto
de sujetos unidos por un fin común, de una minoría organizada que se impone a la
mayoría desorganizada:

15
ZEITLIN, I., “Gaetano Mosca (1858-1941)”, en Ideología y teoría sociológica, traducido por Néstor A.
Míguez, Amorrortu, Buenos Aires, 1970, p. 224.

164 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


El Poder de las Élites que nos Gobiernan. a Propósito de Vilfredo Pareto, Gaetano Mosca y Robert Michels

(…) en un régimen representativo de sufragio muy amplio el poder efectivo queda en


manos de pequeñas minorías organizadas, casi todas compuestas por individuos
provenientes de clases superiores y sobre todo de clases medias, o que ya hayan
adquirido los requisitos de la clase media. (…) Es cierto que tanto, ayer como hoy, ha
sido y es posible a los intereses particulares de pequeñas minorías organizadas
predominar sobre el interés colectivo, paralizando la acción de los que deberían
tutelar a este, (…) todas las organizaciones estatales están constituidas por minorías
organizadas y que por esto toda forma de régimen político que cree basarse en la
libre expresión de la voluntad de la mayoría contiene una incurable falsedad, que a la
larga producirá su decadencia. (…) –Refiriéndose al gobierno parlamentario dice
que – un mayor conocimiento de la historia y una más vasta experiencia de la vida
nos han enseñado a considerarlo con mayor indulgencia, al comprobar que es
imposible que exista una forma de organización política que en su funcionamiento
práctico no sea contaminada por las ineludibles debilidades morales e intelectuales
de la naturaleza humana16.

Podemos advertir que, según Mosca, el Estado representativo moderno, porta


en sí mismo los gérmenes que pueden provocar su decadencia y disolución. La
presencia de una burguesía media es vital para la existencia normal de un régimen
representativo moderno. Producida la decadencia, si esta aumenta y se mantiene, es
posible que las formas de los ordenamientos representativos duren algún tiempo
más; empero, se transformará en una dictadura plutocrática, o en una dictadura
burocrática y militar, o en una dictadura demagógica de pocos cabecillas que sepan
hacer o decir cosas con la intención de agradar a las masas y provocar en ellas la
envidia y los instintos de apropiación – con daño seguro del interés general-, o
convertirse en una combinación de una y otra de las dictaduras nombradas. Todo
este riesgo que lleva dentro de sí el Estado representativo, parece agravarse con el
llamado sufragio universal, el que es consecuencia necesaria surgida de la base
moral e intelectual del sistema representativo. Nunca las mayorías –sobre todo si son
pobres e ignorantes – han mandado sobre las minorías –sobre todo si ellas son
relativamente ricas e inteligentes-. La clase dirigente, inserta en su conciencia o en
su subconciencia el saber de esta verdad, y muy posiblemente sea esto lo que
contribuye a hacerles aceptar sin mayor rechazo el sufragio universal17. Se dice que
los electores son completamente libres de elegir en un sufragio, pero esto no es algo
que se produzca en la realidad de los hechos; más bien es algo que se queda en pura
16
MOSCA, G., La clase política, cit., pp. 251 y 252
17
Ibídem, pp. 253 y 254. También es pertinente relacionar esta parte con la p. 94. En esta página dice: “Si es
claramente admisible que uno solo no puede comandar a una masa sin que exista una minoría que lo
sostenga, es más difícil postular en cambio, como un hecho constante y natural, que las minorías comandan
a las mayorías más bien que estas a aquellas. Pero este es uno de los puntos (…) en el que la apariencia de
las cosas es contraria a su verdadera realidad. (…) es fatal el predominio de una minoría organizada, que
obedece a un único impulso, sobre la mayoría desorganizada. La fuerza de cualquier minoría es irresistible
frente a cada individuo de la mayoría, que se encuentra solo ante la totalidad de la minoría organizada. Y al
mismo tiempo se puede decir que esta se halla organizada precisamente porque es minoría. Cien que actúen
siempre concertadamente y en inteligencia los unos con los otros, triunfarán sobre mil tomados uno a uno y
que no tengan acuerdo entre sí; y al mismo tiempo les será mucho más fácil a los primeros actuar
concertadamente y tener de esta manera un entendimiento, si son cien y no mil.”

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 165


Jesús Víctor Alfredo Contreras Ugarte

teoría. Verdaderamente, en la práctica, el elector tiene una libertad grandemente


limitada, y esto es así porque que si él no pretende desperdiciar su voto tendrá que
votar por uno de los candidatos con posibilidad de ganar dado que estos son los que
están apoyados por un conjunto de amigos o partidarios. Dada esta situación, el
individuo común que es parte de la gran mayoría de votantes, no puede más que
optar por no votar o votar por algún candidato con posibilidad de triunfar. En este
sentido es que para Mosca la participación política de las mayorías mediante del
sufragio universal, no es más que una completa falsedad. Los que realmente ganan
son las personas que son capaces de implantarse en ese marco tan puntual y, muchas
veces, camuflado o inventado por el sistema electoral. Ellos son los que deciden y
eligen a los representantes.

5 LA LEY DE HIERRO DE LAS OLIGARQUÍAS EN ROBERT MICHELS


Robert Michels, se inspira en las ideas de Pareto y de Mosca. En ese sentido,
tengamos en cuenta que Robert Michels (1876-1936) fue discípulo de Gaetano
Mosca y, como tal, también cuestionó los postulados de Marx; sin embargo, lo hizo
con menor hincapié que Mosca y Pareto.
Michels no aceptaba la teoría marxista, que para él era utópica; no obstante,
conservó componentes del método analítico. El no contar con los conocimientos
psicológicos convenientes, dice Michels, fue lo que hizo hundirse al socialismo en
un gran error: la mezcla de pesimismo, en relación al presente, y optimismo
exagerado y confianza sin límites en relación al futuro. Al efectuar un concepto
realista de la condición mental de las masas, se mostraría, sin duda alguna, que aun
aceptando la posibilidad de un avance moral de la humanidad, esto no justifica, por
su naturaleza, un optimismo excesivo. De los materiales humanos no pueden
prescindir los políticos y los filósofos en sus proyectos de reconstrucción social

Dentro de los límites temporales en que resulta posible formular previsiones


humanas, el optimismo seguirá siendo privilegio exclusivo de pensadores utópicos.
(…) Nada podría ser más anticientífico que la suposición de que tan pronto como los
socialistas hayan logrado conquistar el poder gubernamental, ello bastará para que
las masas ejerzan una pequeña fiscalización sobre sus conductores, a fin de lograr
que los intereses de estos coincidan perfectamente con los de los conducidos. (…) La
inmadurez objetiva de la masa no es un fenómeno meramente transitorio que
desaparecerá con el progreso de la democratización au lendemain du socialismo –
como consecuencia del socialismo-. Por lo contrario, proviene de la misma
naturaleza de la masa como tal, pues esta, aun organizada, sufre de una
incompetencia incurable para la solución de los diversos problemas que la aquejan
(la masa es, en sí misma, amorfa y necesita división del trabajo, especialización y
orientación). La especie humana precisa ser gobernada (…) El hombre como
individuo está por naturaleza predestinado a ser guiado (…)18.

18
MICHELS, R., Los partidos políticos 2. Un estudio sociológico de las tendencias oligárquicas de la
democracia moderna, traducido por Enrique Molina de Vedia, Amorrortu, Buenos Aires, 1996, pp. 191 y
192.

166 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


El Poder de las Élites que nos Gobiernan. a Propósito de Vilfredo Pareto, Gaetano Mosca y Robert Michels

Para Michels, no existe contradicción esencial entre la doctrina que postula que la
historia es el registro de una serie continua de luchas de clases, y la doctrina que postula
que las luchas de clases invariablemente culminan en la creación de nuevas oligarquías
que llegan a fundirse con las anteriores. La existencia de una clase política no contradice
los supuestos esenciales del marxismo, siempre que juzguemos al marxismo como una
filosofía de la historia y no como un simple dogma económico.
En cada caso particular el dominio de una clase política se origina como resultado
de las relaciones entre las diferentes fuerzas sociales que pugnan por la supremacía; esto
claro, si entendemos a esas fuerzas de forma dinámica y no cuantitativamente. Este
dinamismo lo podemos advertir de las distintas corrientes democráticas de la historia, las
cuales lucen como ondas sucesivas, golpean sobre la misma playa y se renuevan
constantemente. El constante espectáculo es, a la vez, alentador y depresivo:

(...) cuando las democracias han conquistado ciertas etapas de desarrollo


experimentan una transformación gradual, adaptándose al espíritu aristocrático, y en
muchos casos también a formas aristocráticas contra las cuales lucharon al principio
con tanto fervor. Aparecen entonces nuevos acusadores denunciando a los traidores;
después de una era de combates gloriosos y de poder sin gloria, terminan por
fundirse con la vieja clase dominante; tras lo cual soportan, una vez más, el ataque
de nuevos adversarios que apelan al nombre de la democracia. Es probable que este
juego cruel continúe indefinidamente19.

Estas son ideas centrales que Michels plasma en su obra de 1911, Los
partidos políticos, donde además elabora su teoría de las élites. Para Michels, Marx
no logró prever que la democracia, inevitablemente, lleva a la oligarquía; y es a esta
inevitabilidad a lo que Michels llama la ley de hierro de la oligarquía.
La especialización de las labores es un requisito de toda gran organización;
con ello, se produce inevitablemente una separación entre el pueblo –que es el
mayoritario – y sus dirigentes. Esto hace que el surgimiento de la oligarquía resulte
determinante en toda gran organización. Las minorías usan su organización para
poder controlar a las mayorías, y esto comporta la aparición de la oligarquía; así, las
grandes organizaciones terminan divididas en una minoría de dirigentes y en una
mayoría de dirigidos. Las grandes organizaciones suelen prosperar y hacerse cada
vez más fuertes y, con ello, también sus dirigentes. De esta forma, cuanto más fuerte
es la organización, mayor será la necesidad de poder de los dirigentes. Luego, la
democracia es la que termina viéndose afectada. Michels, afirma con mucha
firmeza, allá por el año 1911, cuando escribía su obra Los partidos políticos, algo
que, curiosamente, encaja muy bien en nuestra actualidad. No hay que ser muy
profundo para advertir que, en la actualidad, existe un sistema de poderes
inescrupulosos que nos impulsa a caer en un estado de dependencia innecesario, con
el único fin de lograr controlarnos para instaurar y mantener determinados intereses
de privilegio: “En la sociedad de hoy, el estado de dependencia que resulta de las

19
Ibídem, pp. 195 y 196.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 167


Jesús Víctor Alfredo Contreras Ugarte

condiciones económicas y sociales, hace imposible el ideal democrático. Es necesario


admitir esto sin reservas (...).”20
Queda claro entonces que, la aparición de oligarquías dentro de las
democracias es consecuencia directa de una necesidad orgánica y, por ello, es que
aparece en toda organización sin importar que sean socialistas o incluso anarquistas.
En ese sentido, tengamos en cuenta que, allá por al año 1816, el suizo Ludwig von
Haller, en su obra Restauración de la ciencia política o Teoría del estado social
natural opuesto a la ficción de un estado civil facticio, ya afirmaba que en la vida en
sociedad – cualquiera que sea su forma – es la misma naturaleza la que crea las
relaciones de dominio y de dependencia21.
Michels afirma que el pueblo jamás llegará a gobernar, a menos que lo haga en
abstracto. Empero, lo que importa saber es hasta qué punto y en qué grado es deseable,
posible y realizable la democracia ideal en algún momento dado. No es relevante
analizar si la democracia ideal es factible o no. No pretendo negar que los sistemas
democráticos realicen mejoras, ni tampoco seré tan carente de experiencia y de sentido
crítico, como para no saber aceptar que todo orden y toda civilización deberán mostrar
rasgos aristocráticos22.
Por su parte, la especialización, conlleva la responsabilidad que asumen los
dirigentes para guiar a las masas; por la especialización, la democracia se torna en el
gobierno de los mejores o, dicho más precisamente, en una aristocracia. Son los
dirigentes los que, material y moralmente, resultan reconocidos como los más aptos
y los más juiciosos. Sin embargo, esta oligarquía no está libre de peligros ya que,
habiendo ella nacido de la democracia, tienen patente la posibilidad de que las
mayorías se rebelen en su contra o, que de la oligarquía, se pase a una dictadura.
Estos son los dos peligros que lleva aparejada la oligarquía. Ambas se diferencian en
que, mientras la rebelión surge de las masas, la dictadura surge de la propia
oligarquía; así, se puede decir que la oligarquía conlleva el peligro de la rebelión
contra el poder y el peligro de la usurpación de poderes.

20
MICHELS, R., Los partidos políticos 1. Un estudio sociológico de las tendencias oligárquicas de la
democracia moderna, traducido por Enrique Molina de Vedia, Amorrortu, Buenos Aires, 1996, p. 56.
21
HALLER, V., Restauration der Staats-Wissenschaft, oder, Theorie des natürlich-geselligen Zustands der
Chimäre des künstlich-bürgerlichen entgegengesetzt, vol. I, Steinerischen Buchhandlung, Winterthur, 1816,
pp. 304 y siguientes.
22
MICHELS, R., Los partidos políticos 2. Un estudio sociológico de las tendencias oligárquicas de la
democracia moderna, cit., pp. 192 y 193: Michels aclara que no tiene la intención de “(…) negar que todo
movimiento revolucionario de la clase trabajadora y todo movimiento inspirado sinceramente en un espíritu
democrático, puedan tener cierto valor como contribuciones al debilitamiento de las tendencias oligárquicas.
El campesino de la fábula dice a sus hijos en el lecho de muerte que hay un tesoro escondido en el campo.
Después de la muerte del anciano los hijos escarban por todos lados para descubrir el tesoro; no lo
encuentran, pero su labor infatigable mejora la tierra y les proporciona relativo bienestar. El tesoro de la
fábula bien podría simbolizar a la democracia. La democracia es un tesoro que nadie descubrirá jamás por la
búsqueda deliberada; pero si continuamos nuestra búsqueda, al trabajar infatigablemente para descubrir lo
indescubrible, realizaremos una obra que tendrá fértiles resultados en el sentido democrático. (…) A veces
(…) los principios democráticos traen consigo, sino una cura, al menos un paliativo para el mal de la
oligarquía.”

168 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


El Poder de las Élites que nos Gobiernan. a Propósito de Vilfredo Pareto, Gaetano Mosca y Robert Michels

Un Estado, al ser una importante y gran organización, requiere de una amplia


burocracia y, por este requerimiento de amplitud, se termina convirtiendo también,
en una muy complicada burocracia. Es esta burocracia la que sostiene a las clases
dirigentes y es la que les asegura el dominio y los mantiene en el poder y en el
liderazgo del Estado. Mediante la organización política se accede al poder, a un
poder conservador. Quien alcanza el poder se esmera por tener mayores privilegios,
gracias o exenciones; se esmera por lograr un poder sólido y amplio, alejándolo del
dominio de las masas mayoritarias. Los elegidos consiguen el dominio sobre los
votantes gracias a la organización política existente, y es esta la que hace que una
persona ocupe por elección un cargo muy relevante en la gobernación y
representación del Estado, colocándolo sobre los otros mandantes.
El ideario de la organización política supone que el pueblo tiene la capacidad para
advertir la competencia de sus futuros líderes, cuando se dan las elecciones. Los líderes
deben convencer de esto al pueblo ya que de ello depende su mayor fuerza y legitimación
periódica en el poder; así, es que los líderes y los grupos con los que se postulan, necesitan
de las elecciones. Los líderes y sus grupos políticos buscan ser reconocidos como personas
atentas y preocupadas por los asuntos de todos los integrantes del pueblo, anuncian que
luchan por el bien de todos y en nombre de todos. Los líderes y sus grupos políticos,
procuran la ayuda de determinadas clases cultas y pudientes del Estado y que aún no
cuentan con privilegios políticos. De igual forma, los líderes y sus grupos políticos buscan
el soporte y ayuda de la prensa. La prensa les resulta un apoyo, muchas veces, determinante
para alcanzar, mantener y fortalecer su poder. A través de la prensa logran hacerse
conocidos para el pueblo. Los líderes usan a la prensa para ganar y preservar la aceptación
del pueblo y también para desprestigiar a sus oponentes.
De otro lado, las organizaciones requieren de una técnica especializada para ser
conducida con certera habilidad. Así, el poder de determinación se transforma en uno de
los componentes puntuales del liderazgo, con lo cual, los líderes que constituyeron los
órganos ejecutivos de las mayorías, se independizan de estas últimas y se liberan de su
fiscalización. Al final, la organización y el poder de los líderes, encuentra pocos límites y se
transforma en un poder oligárquico, que si bien se funda sobre una base democrática,
termina sofocándola: “Para Robert Michels (…) la tendencia hacia la oligarquía es un
proceso común a todas las organizaciones importantes. (…) las tendencias socialistas son
tan burocráticas y oligárquicas como las sociedades capitalistas.”23
Las masas no pueden prescindir del liderazgo ya que encuentran regocijo en el
hecho de que otros resuelvan sus asuntos. Las mayorías masificadas son grupos que tienen
una impasibilidad en el ánimo, lo que que las transforma en grupos con una dejadez y con
una falta de vigor, que las hace necesitar de un líder que los conduzca. Aquí radica la base
más fuerte que encuentran los líderes para alcanzar y conservar el poder: la falta de
competencia y la incapacidad e indiferencia que tienen las masas para los asuntos políticos.
La falta de competencia de las masas hace que los líderes cuenten con una justificación
moral y práctica. Si las masas son incompetentes y adolecen de una impasibilidad de
ánimo, entonces es lógico que tengan expertos liderando sus asuntos ya que, ellos –el
pueblo-, no podrían hacerlos. Esta impasibilidad de ánimo de las masas y la necesidad de
23
Touchard, J., Historia de las ideas políticas, traducido por J. Pradera, Tecnos, Madrid, 2007, p. 623.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 169


Jesús Víctor Alfredo Contreras Ugarte

ser dirigidos, se corresponde y concuerda bien con el impulso instintivo de los líderes por
conseguir el poder. La masa se satisface a sí misma obteniendo a un líder que la conduzca,
y esta necesidad, una vez satisfecha, hace que se le rinda culto y se le tome por héroes a los
líderes elegidos. En este mismo sentido Wrigth Mills escribirá que:

(...) el pueblo no ve claro y tiene que colocar, como un niño confiado, todo el mundo nuevo
de la política exterior y la acción estratégica y ejecutiva en manos de expertos. Es que todo
el mundo sabe que alguien debe dirigir el cotarro, y que alguien suele hacerlo. Los otros
no se preocupan realmente, y, además, no saben cómo hacerlo24.

Michels apuntará, que las masas ven como un deber sagrado el prodigar una
sincera gratitud a sus líderes; y esta gratitud, generalmente, la expresan reeligiendo
sucesivamente a sus líderes merecedores de ello, manteniéndolos en el poder por
siempre. Así, con la mayor prolongación del liderazgo, este se convertirá en una casta
cerrada. No obstante, si el pueblo se siente defraudado o conculcado en sus derechos, es
posible también que no les reconozcan ninguna gratitud a sus dirigentes y que los
depongan. Algunos líderes se colocarán como defensores y consejeros sinceros del
pueblo; estos usualmente son perseguidos, aprisionados u obligados al exilio.
Entonces, según Robert Michels, la mayor competencia y capacidad de los
líderes conlleva a la aparición de la oligarquía dado que las mayorías masificadas se
subordinan a ella otorgándole una potestad que, con el paso del tiempo, deteriora y acaba
con la democracia. Llegado a estos términos –de oligarquía – las mayorías masificadas
son manipulables y susceptibles de aceptar cualquier mentira como verdadera, e incluso
los líderes pueden llegar a convencerlas de que hacen, escriben y hablan en su nombre,
cuando realmente no es así. Y si nos ponemos en la actualidad, advertiremos que esto
sigue aconteciendo sin reparo alguno, y las masas siguen votando a quienes les manipula
abiertamente:

(...) los poderes inescrupulosos de hoy ya no buscan someter a nadie por la fuerza;
todo lo contrario, Lo que hacen es forjar a los ciudadanos a su conveniencia para
que sus capacidades de reflexión y crítica se vuelvan manipulables y mínimas,
logrando de esta manera que, incluso, por esa ceguera provocada, los ciudadanos
estén de acuerdo con ellos pese a que ponen en riesgo su propio bienestar y
menoscaban sus derechos. (...) La política estatal de hoy es más el sinónimo de
oportunismo político por el poder (...)25.

El pueblo, al tener menor preparación intelectual y cultural, no tiene la


posibilidad de advertir lo que a sus líderes realmente les interesa. Las masas, tienden
a dejarse guiar por personas comunes y mediocres, que por gente talentosa y

24
MILLS, C. W., La élite del poder, traducido por Florentino M. Torres y Ernestina de Champourcin, Fondo
de Cultura Económica, México D. F., 2001, p. 274.
25
CONTRERAS UGARTE, J. V., Las determinaciones políticas en materia de derechos humanos.
Cavilaciones a partir de la ética weberiana y de la fuerza trascendental hegeliana, Editorial Académica
Española, Berlín, 2018, pp. 137-138.

170 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


El Poder de las Élites que nos Gobiernan. a Propósito de Vilfredo Pareto, Gaetano Mosca y Robert Michels

políticamente culta. Su falta de capacidad las hace masas de poco vigor y de poca
fuerza para alcanzar una correcta organización; por ello, es que necesitan de líderes,
y por su debilidad no son capaces tampoco de resistirse con eficiencia en contra de
las decisiones de los líderes. Un ejemplo de ello es la falta de resultados concretos
en la multiplicidad de huelgas y revueltas políticas que se producen; esto es reflejo
de la debilidad y la ausencia de líderes dentro de la mayoría masificada.

6 MICHELS Y LOS LÍDERES REVOLUCIONARIOS SURGIDOS DEL


PUEBLO
Cuando el pueblo se rebela y logra resultados eficientes, no lo hace de un
momento a otro. Esto, según Michels, lo hace gracias a la aparición de líderes que
salen de su propio interior y que son los que guían a las masas en su revuelta;
empero, los nuevos líderes surgidos, una vez ganada la revuelta y obtenido el poder
en nombre del pueblo, se distancian de las masas formando un grupo que tiende a
separarse de las mayorías masificadas y, a la larga, incluso, se oponen al pueblo que
un día lideraron hacia la revuelta que los puso en el poder. Así las masas se vuelven
a quedar sin líderes propios, y la oligarquía vuelve siempre a resurgir.
Las revueltas que hace el pueblo, al final, no generan, estructuralmente,
cambios hacia su interior. Los líderes surgidos de su seno, poco a poco se alejan de
él y son seducidos hacia el entorno de la clase política gobernante. Una vez que
estos nuevos líderes – levantando en alto los derechos conculcados de su pueblo y
destronando a los perversos abusivos e impositores de sus antecesores – alcanzan el
poder y se constituyen en los nuevos gobernantes, caen en una transformación que
los hace muy parecidos a los malvados que lograron echar. Así, resulta que los
revolucionarios del presente terminan siendo los reaccionarios del futuro.
El líder sabiéndose y sintiéndose colocado en una posición necesaria e
indispensable – gracias a la incompetencia y dejadez de las masas-, sin mucho
esfuerzo, de servidor se convierte en amo de su pueblo. Al principio son líderes
atentos y preocupados por la resolución de los asuntos del pueblo, pero luego, con el
tiempo, se hacen señores del pueblo y se desligan de dicha preocupación.
Únicamente procuran mantener la preocupación en apariencia, o la retoman
calculadamente para su propia conveniencia de poder y dominación. Si surge alguna
oposición a la voluntad del líder, esta es calificada de antidemocrática porque el
líder fue elegido, al menos legalmente, para representar la voluntad general (aunque,
a la larga, esto no se refleje en sus actos reales de gobierno).
Ahora bien, desde el interior del pueblo existe la posibilidad que surja
alguien que se haga notar de manera superior al resto y que logre llegar al nivel de
líder gobernante. Este surgimiento de nuevos sujetos carismáticos pone en peligro a
los que ya poseen el poder, puesto que es posible que tengan que retirarse para dar
paso a los nuevos líderes o compartir con ellos su dominio; así, se inicia la
formación de una élite nueva.
De otro lado, ante una disputa entre el pueblo y los líderes, suelen triunfar los
últimos, siempre que sepan estar unidos. El pueblo a veces se rebela, pero, por lo
Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 171
Jesús Víctor Alfredo Contreras Ugarte

regular, termina siendo sometido. Esta situación cambia cuando la incapacidad de los
líderes es manifiestamente clara; frente a ello, el pueblo cobra un rol activo en su historia
y suele derrocar el poder de la oligarquía constituida. Las revueltas autónomas del
pueblo son consecuencia de una sustancial falta de aceptación hacia las decisiones de los
gobernantes. Las revueltas del pueblo suelen ser dirigidas por nuevos líderes que surgen
de su propio seno; sin embargo, no es raro que estos líderes se desliguen de las relaciones
que tienen con su pueblo para poder pactar con los líderes contrarios, ofreciéndoles a
estos que luego ordenaran el cese de la revuelta. El pueblo, ante esta situación se enoja,
pero nada puede hacer porque no tiene la fuerza para sancionar la traición de los que
fueron sus líderes. Cuando las revueltas del pueblo tienen éxito y logran acabar con sus
líderes, lo que realmente ha sucedido es que los líderes no han conseguido ponerse de
acuerdo y han perdido su unión, lo que les ha generado la destrucción entre ellos mismos
y con el apoyo del pueblo.
Para Michels, si el cambio social no se da a través de una revolución,
entonces se da desde la unión o mezcla de las posiciones contrarias o distintas que
hay entre los viejos líderes y los nuevos, a través de un proceso que hace llenar –con
unos y otros viejos y nuevos líderes – las vacantes que se producen en el seno de los
gobernantes y mediante el voto de ellos mismos. Aquí estamos ante un cambio de
producto de una mezcla de intereses. Los individuos más virtuosos, resultan siendo
líderes potencialmente revolucionarios y, en tiempos de calma, es decir no
revolucionarios, estos individuos se encuentran sujetos a una pluralidad de
tentaciones que buscan cautivarlos. Así, de acuerdo con Michels, la verdadera
disputa no se sitúa entre el pueblo y sus gobernantes; la verdadera disputa se da entre
los líderes que ya tienen el poder y los nuevos líderes que afloran desafiantes y en
busca de ser promovidos hacia la toma del poder:

El ascenso de nuevos aspirantes al poder siempre está sembrado de dificultades,


cerrado por obstáculos de toda clase, solo superable con el favor de la masa. Es muy
raro que la lucha entre los viejos líderes y los nuevos termine con una derrota
completa de los primeros. El resultado del proceso ya no es una circulación de élites,
sino una reunión de élites; es decir una amalgama de estos dos elementos. Quienes
representan la nueva tendencia, mientras su andar es aún inseguro, procuran
encontrar toda clase de vías laterales, para evitar que los poderosos los derriben.
Pretextan que sus divergencias de opinión con la mayoría son insignificantes (…) y
expresan su pena de que los viejos líderes muestren carencia de verdaderos
sentimientos democráticos.”26

De otro lado, Javier Barraycoa explica que existe una tendencia a generar
apoliticismo en las democracias de las sociedades de masas, es decir, como lo
sostiene Max Weber, para garantizar a la estructura de poder se debe tender a
propiciar que no todos los ciudadanos pretendan llegar al poder, de lo contrario la

26
MICHELS, R., Los partidos políticos 1. Un estudio sociológico de las tendencias oligárquicas de la
democracia moderna, cit., pp. 206 y 207.

172 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


El Poder de las Élites que nos Gobiernan. a Propósito de Vilfredo Pareto, Gaetano Mosca y Robert Michels

situación sería muy combativa, inconstante e insegura. Esta idea se reafirmaría con
lo que propone Robert Michels:

(...) toda organización social, incluyendo los partidos políticos, tiende a la oligarquización
jerárquica. La oligarquización permite apartar las masas de la dirección de los partidos y
convertirlos así en organizaciones efectivas. Igual ocurriría con la estructura de poder: en
la medida en que se oligarquiza y aleja las masas del interés y la participación política, su
gobierno se hace más efectivo27.

Es curioso comprobar que, actualmente, en nuestras democracias


contemporáneas existe una tendencia a la abstención política y electoral. Es una
suerte de desapego para comprometerse activamente en las cuestiones del poder
pues parece que al ciudadano común le resulta más cómodo dejarse llevar – mandar
– o, simplemente, ser indiferente a todo lo que tenga que ver con la estructura
democrática del poder, precisamente porque ya no cree en ella ni cree que esta le
vaya a determinar un cambio a mejor para su vida.

7 PARETO, MOSCA Y MICHELS: DIFERENCIAS Y COINCIDENCIAS


Vilfredo Pareto, Gaetano Mosca y Robert Michels, propusieron un innovador
enfoque de estudio de la llamada sociología política de finales del siglo XIX e inicios del
XX. Ellos transformaron las concepciones de la democracia liberal.
De manera general hemos visto que los tres autores coinciden en alguno de sus
postulados; así, resulta que la teoría de las élites tiene componentes de la circulación de
las élites de Pareto, de la clase política de Mosca y de la ley de hierro de la oligarquía de
Michels. Para estos tres autores del elitismo defendieron que: “la sociedad no cambia
básicamente en absoluto. (...) Como alternativa al cambio ellos describen un ciclo
eterno de aparición, dominación, degeneración y caída de las élites (...)”28.
A Gaetano Mosca y a Vilfredo Pareto se les considera los fundadores de la
ciencia política italiana. Los dos se desenvuelven en el escenario positivista, y hacen sus
comprobaciones con los hechos y con la historia.
Mosca describe a la clase política, y sienta las características que resultarían
verificables en todos los conglomerados humanos en donde haya un gobierno. Así, los
que manejan y ejercitan el poder público son una minoría a la que se someten los
gobernados. Estos últimos nunca se hacen parte del gobierno, únicamente lo aguantan.
Este autor usa los datos históricos para sostener que los que gobiernan ejercen sus
actuaciones, todas las veces, como reducida minoría que controla al conjunto de los
gobernados. Asimismo, según Mosca, la clase política nunca reconocerá que gobierna
por, meramente, estar integrada con elementos que fueron o son los más capacitados para

27
BARRAYCOA, J., Sobre el poder. En la modernidad y la posmodernidad, Homo Legens, Madrid, 2019, p.
219.
28
THERBON, G., ¿Cómo domina la clase dominante? Aparatos de Estado y poder estatal en el feudalismo,
el socialismo y el capitalismo, traducido por Fernando Valero, Siglo XXI, Madrid, 2016, p. 157.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 173


Jesús Víctor Alfredo Contreras Ugarte

gobernar. La clase política dirá que su poder se sustenta en un principio abstracto y lo


expresará mediante una fórmula política, como, por ejemplo, la voluntad popular.
Pareto considera las cosas de forma menos favorable; es un idealista
desilusionado. Para Pareto, las élites tienen que recomponerse – circulación de las élites
– si quieren sostener vigorosamente el poder que tienen.
Robert Michels, explica las proclividades oligárquicas en la matriz de los partidos
social-demócratas de su época. Michels explica estas tendencias en las democracias
modernas y cómo se plasman en los partidos políticos y en los sindicatos obreros.
Michels advirtió:

(...) la desigualdad estructural y la rígida jerarquización en el seno de las organizaciones


políticas. El análisis descansa sobre principios sociológicos, no psicológicos: es la
organización la que da origen al dominio de los elegidos sobre los electores, de los
mandatarios sobre los mandantes, de los delegados sobre los delegadores29.

Este autor alemán está vinculado con los otros dos autores italianos. Ya lo decía
Pablo Lucas Verdú: “La contribución de estos autores a la Ciencia Política italiana
soslayó el predominio, tan fuerte en las Ciencias Sociales, del idealismo italiano (...),
subsistió durante el fascismo y se replantea en nuestros días (...)”30.
Tanto Pareto, Mosca y Michels consideran que cualquier sociedad –desarrollado
o no – está compuesta por dos grupos de personas: un grupo que constituye a la élite que
lidera, y otro que integra a la masa o pueblo gobernado. El grupo de la élite es la minoría,
es el que se ocupa de los asuntos y de las labores políticas, es el que acapara en
exclusividad el poder y disfruta de las condiciones favorables que este le otorga. El
grupo de la masa gobernada, es siempre la mayoría en número y es dominada de forma
directa por el primer grupo: “Las semejanzas existentes entre estos tres autores (...)
residen en el manifiesto reconocimiento del fundamento minoritario del poder y en
su realismo metodológico.”31
Mosca y Pareto rechazan la lógica, la teoría y la filosofía del socialismo en su
versión radical y marxista; no la aceptan por su separación y exclusión de los sujetos
reales de la sociedad y por su baja utilidad práctica. En contraste con ello, Michels sí
que vuelve a tomar, para algunos supuestos, la metodología de Marx.
Mosca arma su teoría de la clase política valiéndose del método histórico-
comparativo usándolo en el ámbito político-institucional. Pareto usa el mismo método,
aunque desde un plano multidimensional; así, analiza los fenómenos sociopolíticos en
un ámbito analítico-abstracto, según la psicología social, la antropología cultural, la
estructura económica y la movilidad social.

29
PRADERA, J., Corrupción y política. Los costes de la democracia, Galaxia Gutenberg, Barcelona, 2014,
p. 166.
30
Lucas Verdú, P., Principios de ciencia política, Tomo I: Introducción. Hombre y política, ideologías, mitos
y tecnocracia, Tecnos, Madrid, 1977, p. 59.
31
ALBERTONI, E., Historia de las doctrinas políticas en Italia, traducido por José Florencio Fernández
Santillán, Fondo de Cultura económica, Méxiso D. F., 1986, p. 217.

174 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


El Poder de las Élites que nos Gobiernan. a Propósito de Vilfredo Pareto, Gaetano Mosca y Robert Michels

En cuanto a Michels, este analiza los tipos y formas de liderazgo,


fundamentalmente, en las instituciones del partido y del sindicato.
Gaetano Mosca, Vilfredo Pareto y Robert Michels, coinciden en que las élites
la constituyen las minorías y en que estas están conformadas por los que poseen los
niveles jerárquicos más elevados en su rama: los mejores en su labor. Los capacitados
con cualidades de gobierno son los que pertenecerán a la élite gobernante.
Lo cierto es que los líderes terminan velando por sus intereses, que son
consecuencia de los privilegios que han logrado gracias al poder alcanzado. Podemos
encontrar organizaciones de masas cuyas acciones se encuentran destinadas a la voluntad
y a los intereses de sus líderes y no a la voluntad y a los intereses del pueblo. Empero, las
élites deben ser conscientes que no pueden ser indiferentes al sentir del pueblo, que es la
mayoría. Esto es algo que deberían leer y tener muy en cuenta nuestros políticos y
gobernantes contemporáneos.
Advertiremos bien, si notamos que los postulados del autor italiano Gaetano
Mosca guardan mucha relación con la teoría de la circulación de las élites de Pareto.
Para Mosca la élite se compone por la minoría de personas que tienen el poder en
una sociedad. Esta minoría es asimilable a una auténtica clase social: la clase dirigente o
dominante. Esto es así porque lo que constituye su fuerza y le permite mantenerse en el
poder es, precisamente, su organización y su estructuración. Existen, en efecto, diversos
vínculos que unen entre sí a los miembros de una élite dominante. Estos vínculos
aseguran a la élite una unidad suficiente de pensamiento, además de la cohesión, propia
de los grupos de clase. Si la élite logra forjarse grandes medios económicos, se asegura,
además – gracias a su unidad – el poder político y la influencia cultural sobre la mayoría
mal organizada. Esto explica el papel histórico de la élite. Así, Mosca ve la posibilidad
de elaborar una explicación completa de la historia a partir de un análisis de las élites
rectoras. La historia la ve como animada por los intereses y las ideas de una élite
establecida en el poder.
Vemos pues, que tanto Mosca como Pareto, hablan de un grupo dirigente, frente
a otro que es el grupo dirigido; hablan de personas que monopolizan el poder político
frente al resto que queda desposeído de él. Ambos autores inciden en que un grupo
minoritario del sistema social se encargará de dirigirlo y que esta minoría se distanciará y
escapará del control de la mayoría. Para Mosca el cambio del equilibrio de poderes en las
sociedades democráticas puede influir notablemente en su composición. Pareto, sin
embargo, no presta atención al papel que juegan las condiciones sociales en la
transformación y la circulación de las élites.

8 A MODO DE CONCLUSIÓN
He procurado abordar en el espacio que corresponde a este tipo de trabajo
académico los conceptos más relevantes de la teoría de las élites y de la reflexión de esta
sobre nuestra actualidad. Es un tema que cobra peculiar notoriedad y autores como
Mosca, Pareto y Michels, deben ser nuevamente revisados y estudiados ya que en ellos
es posible que encontremos una explicación clara y real sobre nuestra realidad social y
humana, y sobre los infortunios que hoy yacen en nuestras relaciones. Si queremos
Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 175
Jesús Víctor Alfredo Contreras Ugarte

enmendar nuestra actitud social, primero hay que conocer y entender cuál es el error real
a corregir, sabiendo sus posibles, verdaderas y peores consecuencias.
Parece cierto, que las riquezas heredadas o las conseguidas sin esfuerzo y
capacidad y los nexos familiares y amicales, son las causas principales para que no haya
una libre circulación de individuos que sean realmente capaces para desenvolverse en las
élites y, más bien, se promueve la incorporación de otros, a los que podríamos identificar
como los etiquetados.
Si la élite gobernante no inserta a los sujetos competentes y extraordinarios,
provoca inestabilidad y conflicto. La historia y la actualidad evidencian que, ante esa
situación, se crea una oscilación en el cuerpo político y social. En última instancia, más
tarde o más temprano, esta circunstancia está destinada a corregirse ya sea dando
apertura a nuevos accesos de movilidad de los mejores hacia la élite o, ya sea mediante
un arrebatado abatimiento de la antigua e incapaz élite gobernante por parte de una
nueva élite que sí sea capaz de gobernar.
De otro lado, la pugna entre los líderes y el pueblo conlleva como consecuencia,
que los líderes venzan. En caso de que el pueblo se subleva, su agitación acaba siendo
sometida y apagada. Se puede aquí observar alguna concurrencia con Max Weber, lo que
resulta oportuno apuntar ahora:

La posición dominante de las personas pertenecientes a la organización (…) frente a las


'masas' dominadas se basa siempre en (…) la 'ventaja del pequeño número', es decir, en la
posibilidad que tienen los miembros de la minoría dominante de ponerse rápidamente de
acuerdo y de crear y dirigir sistemáticamente una acción societaria racionalmente
ordenada y encaminada a la conservación de su posición dirigente. De este modo, la
actuación amenazadora de las masas o de la comunidad podrá ser fácilmente reprimida
(…)32.

El alzamiento o insurrección de las masas, necesita, con antelación, que no falten


líderes que los dirijan. Los líderes de la sublevación, aparecen de la misma matriz de las
masas, pero cuando consiguen el poder en nombre del pueblo, padecen una conversión
que los transforma en una ralea algo hermética, alejada del pueblo y aún contraria a él.
Es imposible rehuir al hecho de que los que representaron a la masa se integren en la
élite. En un primer momento son líderes admitidos para representar y combatir por el
beneficio del pueblo; sin embargo, después de que estos líderes logran acceder al poder,
despliegan intereses particulares que los transmutan en una minoría organizada,
dominante y sólida. En tanto no se esté en épocas de insurrección, los más aptos
integrantes del pueblo serán los posibles líderes de las sublevaciones, y es por ello que
son siempre animados, a través de la cooptación, es decir, mediante el llenado de las
vacantes que se van produciendo dentro de la élite, a integrarse dentro de la élite
dominante.

32
WEBER, M., Economía y sociedad, traducido por José Medina Echevarría, Juan Roura Farella, Eugenio
Ímas, Eduardo García Máynes y José Ferrater Mora, Fondo de Cultura Económica, Madrid, 2002, p. 704.

176 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


El Poder de las Élites que nos Gobiernan. a Propósito de Vilfredo Pareto, Gaetano Mosca y Robert Michels

La desavenencia y oposición entre la vieja élite y la nueva, en alguna


circunstancia provoca el vencimiento de la vieja élite. En esta situación, la circulación de
las élites no se produciría, sino que habría una reunión de élites o, dicho de otra manera,
se produciría una conglomeración y mezcla de los dos elementos. El conflicto entre las
élites y su circulación es el basamento de la historia y, es por ello que las insurrecciones
populares no consiguen un triunfo venturoso para las masas. Estas luchas, realmente,
únicamente facilitan el derrumbamiento de la vieja élite y la aparición de la nueva. Las
élites usan al pueblo, ilusionando sus sentimientos, para así conseguir o mantener su
poder. La pugna, verdaderamente, se da entre dos aristocracias que compiten y riñen por
el poder, pero no se da entre la aristocracia y el pueblo. Weber le escribía a Michels
diciéndole que “(...) la voluntad del pueblo” o “la auténtica voluntad del pueblo” son
inexistentes: (...) son meras ficciones, y que la democracia consiste únicamente en la
elección libre de los dirigentes (...).”33
Del interior del pueblo puede germinar la potencial élite de la que se nutra la élite
nueva. Esto puede implicar la conexión entre la élite y el pueblo, ejerciendo, este último,
funciones menores de dirección y con lo cual se convierte en una fuente de alistamiento
para los niveles más altos de influencia.
Las élites y la aristocracia no subsisten perpetuamente; estas desfallecen con
prontitud y, por eso, requieren robustecerse y restablecerse con componentes del pueblo
que sean los más aptos. Sucedida la caída de la élite, inmediata y seguidamente se
constituye una nueva en el seno de las clases bajas, llena de lozanía y de energía.
Si la élite que gobierna pretende conservarse en el poder, este poder, debe ser
ejercitado por personas que viven para la política y que hallan en este modo de vida su
vocación; además, deben tener una holgada economía que les permita independizarse de
requerir usar la política para cubrir sus necesidades y gustos económicos; igualmente,
deberán contar con una gran calidad moral.
Si no se dan todos estos elementos, es decir, que los gobernantes sean personas
que no viven para la política, sino que viven de la política (situación que es muy
diferente, aunque muy actual) y que sean personas que vean en la política el oficio que
les proporciona los medios para poder vivir, entonces, estos gobernantes serán siempre
proclives a convertirse en una clase política hermética que obstaculice e imposibilite la
recomposición y la circulación de las élites políticas. Si la clase gobernante no es capaz
de colmar las vacantes que se surgen en su seno con las personas que se encumbran
como los líderes de clase dominada, estos, si están preparados y puestos para utilizar la
fuerza, pueden precipitar el derrocamiento de la clase gobernante. A la sazón, las élites
gobernantes que imposibilitan el paso a la renovación y no incorporan a la élite de la
clase doblegada, son élites inconsistentes y endebles que no lograrán consolidar su
dominio en el tiempo. Antes bien, si la élite gobernante es capaz de incorporar a los que
se encumbran como los líderes de la clase subyugada, entonces, mayor será su fuerza y
consistencia para preservar su situación de dominación. Logrando esta incorporación, la
élite gobernante despoja a las masas de la posibilidad de que sus líderes se conviertan en

33
ABELLÁN, J., Democracia. Conceptos políticos fundamentales, Alianza, Madrid, 2011, pp. 250-251.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 177


Jesús Víctor Alfredo Contreras Ugarte

sujetos del pueblo que luego lideren el ejercicio de la fuerza. El aferrarse en negar a una
determinada élite tendrá como consecuencia la autocracia y, con ello, el aislamiento de la
clase gobernante y su subsiguiente decadencia y desplome. Es en las clases inferiores
donde están los más eficaces, vigorosos y enérgicos líderes que necesita la élite
gobernante para renovarse; renovándose, mediante una actitud integradora y abierta, se
elude que la élite gobernante termine siendo frágil y endeble o decaer en una autocracia.

9 OBRAS CITADAS
ABELLÁN, Joaquín, Democracia. Conceptos políticos fundamentales, Alianza, Madrid, 2011.
ALBERTONI, Ettore A., Historia de las doctrinas políticas en Italia, traducido por José Florencio Fernández
Santillán, Fondo de Cultura económica, México D. F., 1986.
BARRAYCOA, Javier, Sobre el poder. En la modernidad y la posmodernidad, Homo Legens, Madrid, 2019.
BOURDIEU, Pierre, Poder, derecho y clases sociales, traducido por Mª José Bernuz Beneitez, Desclée, Bilbao,
2001
CONTRERAS UGARTE, Jesús Víctor, Las determinaciones políticas en materia de derechos humanos.
Cavilaciones a partir de la ética weberiana y de la fuerza trascendental hegeliana, Editorial Académica
Española, Berlín, 2018.
ENGELS, Federico, “Introducción a la obra de Carl Marx. Las luchas de clases en Francia de 1848 a 1850”, en
Obras escogidas. Marx y Engels, tomo I, Progreso, Moscú, 1980.
HALLER, Von, Restauration der Staats-Wissenschaft, oder, Theorie des natürlich-geselligen Zustands
der Chimäre des künstlich-bürgerlichen entgegengesetzt, volumen I, Steinerischen Buchhandlung,
Winterthur, 1816.
LUCAS VERDÚ, Pablo, Principios de ciencia política, Tomo I: Introducción. Hombre y política,
ideologías, mitos y tecnocracia, Tecnos, Madrid, 1977.
MEISEL, James, El mito de la clase gobernante. Gaetano Mosca y la élite, Amorrortu, traducido por
Flora Serato, Buenos Aires, 1962.
MICHELS, Robert, Los partidos políticos 1. Un estudio sociológico de las tendencias oligárquicas de la
democracia moderna, traducido por Enrique Molina de Vedia, Amorrortu, Buenos Aires, 1996.
– Los partidos políticos 2. Un estudio sociológico de las tendencia oligárquicas de la democracia
moderna, traducido por Enrique Molina de Vedia, Amorrortu, Buenos Aires, 1996.
MILLS, Charles Wright, La élite del poder, traducido por Florentino M. Torres y Ernestina de
Champourcin, Fondo de Cultura Económica, México D. F., 2001.
MOSCA, Gaetano, Histoire des doctrines politiques depuis l'Antiquité: les doctrines politiques depuis
1914, Payot, París, 1955.
– La clase política, traducido por Marcos Lara, Fondo de Cultura Económica, México D. F., 2004.
PARETO, Vilfredo, Forma y equilibrio sociales, traducido por Jesús López Pacheco, Alianza, Madrid,
1980.
PRADERA, Javier, Corrupción y política. Los costes de la democracia, Galaxia Gutenberg, Barcelona, 2014.
THERBON, Göran, ¿Cómo domina la clase dominante? Aparatos de Estado y poder estatal en el
feudalismo, el socialismo y el capitalismo, traducido por Fernando Valero, Siglo XXI, Madrid, 2016.
TOUCHARD, Jean, Historia de las ideas políticas, traducido por J. Pradera, Tecnos, Madrid, 2007.
WEBER, Max, Economía y sociedad, traducido por José Medina Echevarría, Juan Roura Farella, Eugenio Ímas,
Eduardo García Máynes y José Ferrater Mora, Fondo de Cultura Económica, Madrid, 2002.
ZEITLIN, Irving, “Gaetano Mosca (1858-1941)”, en Ideología y teoría sociológica, traducido por
Néstor A. Míguez, Amorrortu, Buenos Aires, 1970.

178 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


El Poder de las Élites que nos Gobiernan. a Propósito de Vilfredo Pareto, Gaetano Mosca y Robert Michels

LA PROTECCIÓN DEL PATRIMONIO CULTURAL. UNA


VISIÓN DESDE EL DERECHO CUBANO
THE PROTECTION TO THE CULTURAL HERITAGE. ONE
VISION FROM CUBAN LAW
DOI: 10.19135/revista.consinter.00011.07
Recibido/Received 20.07.2019 – Aprobado/Approved 27.05.2020
Jorge Luis Varona López1 – https://orcid.org/0000-0001-7872-0372
E-mail: jorge.varona@reduc.edu.cu
María Eugenia Grau Pírez2 – https://orcid.org/0000-0003-0474-0367
E-mail: grau.mariaeugenia@gmail.com
Alfredo Soler del Sol3 –https://orcid.org/0000-0002-4698-6384
E-mail: alfredosoler442@gmail.com

Resumen: La protección jurídica del patrimonio cultural reviste una gran importancia
para la salvaguarda de la identidad y la memoria histórica de los pueblos. Varios
instrumentos internacionales y los diferentes sistemas de derecho se proyectan en
relación al cuidado de tan significativos valores que lo integran. En Cuba, aunque se
encuentra protegido legalmente, su tutela merece ser perfeccionada a raíz de los
planteamientos de la nueva Constitución de la República de 2019, de las novedosas
concepciones que en la actualidad operan en la gestión del patrimonio en la palestra
internacional, y de las exigencias que se imponen como parte de las garantías de
derechos fundamentales, tales como: el derecho a un medio ambiente sano, el derecho a
la participación en la vida cultural de la nación, y el derecho al disfrute del patrimonio
común de la humanidad.
Palabras-clave: patrimonio cultural, protección jurídica, derechos humanos.
Abstract: The juridical protection to the cultural heritage is very important for to the
protection of the identity and the historical memory of the people. Several international
instruments and the different systems of law protect the significant values that integrated

1
Doctor en Ciencias Filosóficas (Minsk, 1988). Profesor Titular y Consultante del Departamento de Filosofía
de la Universidad de Camagüey, Cuba. Presidente del tribunal de mínimo de doctorados para el ejercicio en
materia de Ciencia, Tecnología y Sociedad en la Universidad de Camagüey. E-mail:
jorge.varona@reduc.edu.cu
2
Experto académico por la Universidad de Granada, (España, 2002). Máster en Pedagogía. Profesora auxiliar
principal de Teoría del Estado y Teoría del Derecho, y profesora de Derecho Constitucional de la
Universidad de Camagüey. Presidenta del Capítulo de Derecho Constitucional y Administrativo de la Unión
Nacional de Juristas de Cuba en Camagüey. E-mail: grau.mariaeugenia@gmail.com
3
Máster en Derecho de la Economía por la Universidad de La Habana (Cuba, 2019). Profesor principal de
Derecho Económico y profesor de Derecho Internacional de la Universidad de Camagüey. Juez Profesional
Suplente no Permanente de la Sala de lo Económico del Tribunal Provincial Popular de Camagüey.
Miembro de la Sociedades Cubanas de Derecho Constitucional y Administrativo y Derecho Mercantil.
E-mail: alfredosoler442@gmail.com

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 179


Jorge Luis Varona López / María Eugenia Grau Pírez / Alfredo Soler del Sol

it. The juridical protection to the cultural heritage in Cuba demands to be improved since
the new Constitution of the Republic, the modern conceptions about the protection of de
cultural heritage and for to guarantee fundamental rights, such as: the right to the healthy
environment, the right to the culture and the right to enjoy to the common patrimony of
the humanity.
Keywords: cultural heritage, juridical protection, human rights.
Sumario: 1. Introducción. 2. Breves consideraciones sobre el patrimonio cultural y el
desarrollo de su tutela jurídica internacional. 3. Patrimonio cultural y Derechos
Humanos. 4. Evolución histórica de la protección del patrimonio cultural cubano desde
el Derecho. 5. Principales instrumentos jurídicos para la protección del patrimonio
cultural cubano. 6. Conclusiones.

1 INTRODUCCIÓN
La salvaguarda de los valores históricos, arquitectónicos y culturales enfrenta
el reto del paso del tiempo, pero no solo el deterioro ocasionado por la longevidad,
sino también, por el desarrollo de procesos sociales como el turismo, el transporte,
etc. La protección jurídica de estos valores resulta imprescindible por la esencia del
derecho como fenómeno regulador de la conducta humana, al prescribir los
comportamientos prohibidos que son perjudiciales para el patrimonio cultural, y
promover conductas que implican su conservación, además, de que establece
sanciones para reprimir los actos lesivos que se cometen en su contra. Asimismo, a
través de su función educativa, el derecho constituye un instrumento para el
desarrollo de valores en favor de la protección de estos bienes, en varios de los
casos, de significación universal.
No existe un criterio unívoco de patrimonio cultural y son varios los bienes
que lo integran. Lo anterior depende de lo regulado por los diferentes ordenamientos
jurídicos nacionales y varios instrumentos internacionales. A partir de entonces, se
tienen como parte del patrimonio cultural los bienes culturales o patrimonio cultural
protegidos por la Convención para la Protección de Bienes Culturales en Caso de
Conflicto Armado, el patrimonio mundial (cultural y natural, a que se refiere la
Convención para la Protección del Patrimonio Mundial, Cultural y Natural de 1972),
el patrimonio cultural inmaterial referido en la Convención para la Salvaguardia del
Patrimonio Cultural Inmaterial, la diversidad cultural y las expresiones culturales
destacadas en la Convención sobre la Diversidad Cultural y las Expresiones
Culturales, y el patrimonio cultural subacuático (Convención para la Protección del
Patrimonio Cultural Subacuático).
Cuba cuenta con un conjunto de bienes expresión de su riqueza cultural
material e inmaterial, incluso, de relevancia universal, tales como: La Habana Vieja
y su sistema de fortificaciones, Trinidad y el Valle de los Ingenios, los centros
históricos urbanos de Cienfuegos y Camagüey, el Valle de Viñales, el castillo San
Pedro de la Roca en Santiago de Cuba, las plantaciones de café del Sureste de Cuba,
la Tumba Francesa, la Rumba, el Punto Cubano, y las parrandas de la región central
de la Isla, todos inscritos en la Lista del Patrimonio Mundial de la UNESCO.

180 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Protección del Patrimonio Cultural. Una Visión Desde el Derecho Cubano

La Constitución de la República de Cuba de 2019 en su artículo 13 reconoce


como fines esenciales del Estado: promover un desarrollo sostenible que asegure la
prosperidad individual y colectiva; proteger el patrimonio natural, histórico y
cultural de la nación; y asegurar el desarrollo educacional, científico, técnico y cultural
del país, entre otros, acciones todas, que exigen una actuación por parte del Estado
encaminada a la protección de los valores tangibles e intangibles de la nación.
La Carta Magna en el artículo 32 establece que el Estado orienta, fomenta y
promueve la educación, las ciencias y la cultura en todas sus manifestaciones. Por lo
tanto, en su política educativa, científica y cultural se atiene, entre otros, a los postulados
siguientes: defiende la identidad y la cultura cubana y salvaguarda la riqueza artística,
patrimonial e histórica de la nación; y protege los monumentos de la nación y los lugares
notables por su belleza natural, o por su reconocido valor artístico o histórico. También
desde el enfoque de los derechos el texto constitucional se proyecta por la protección del
patrimonio cultural cuando reconoce como fundamentales en sus artículos 79 y 75,
respectivamente, el derecho a participar en la vida cultural y artística de la nación, y a
disfrutar de un medio ambiente sano y equilibrado.
Lo anterior conlleva a contar con un marco jurídico para la tutela de los bienes
culturales del pueblo cubano y de aquellos que integran el patrimonio común de la
humanidad por afectación, es decir, que, aunque se encuentren ubicados en el territorio
de un Estado soberano, en virtud del principio de solidaridad y cooperación
internacional, deben ser salvaguardados como parte del patrimonio de toda la
civilización humana, por su valor excepcional global desde el punto de vista de la
historia, del arte, de la ciencia, estético, etnológico o antropológico.

2 BREVES CONSIDERACIONES SOBRE EL PATRIMONIO CULTURAL Y


EL DESARROLLO DE SU TUTELA JURÍDICA INTERNACIONAL
Llull Peñalba, concibe el patrimonio cultural como el conjunto de
manifestaciones u objetos nacidos de la producción humana, que una sociedad ha
recibido como herencia histórica, y que constituyen elementos significativos de su
identidad como pueblo. Tales manifestaciones u objetos constituyen testimonios
importantes del progreso de la civilización y ejercen una función modélica o referencial
para toda la sociedad, de ahí su consideración como bienes culturales. El valor que se les
atribuye va más allá de su antigüedad o su estética, puesto que se consideran bienes
culturales los que son de carácter histórico y artístico, pero también los de carácter
archivístico, documental, bibliográfico, material y etnográfico, junto con las creaciones y
aportaciones del momento presente y el denominado legado inmaterial4.
La función referencial de los bienes culturales influye en la percepción del
destino histórico de cada comunidad, en sus sentimientos de identidad nacional, en sus
potencialidades de desarrollo, en el sentido de sus relaciones sociales, y en el modo en
que interacciona con el medio ambiente. No en vano, los bienes culturales se consideran

4
LLULL PEÑALBA, Josué, Evolución del concepto y de la significación social del patrimonio cultural,
Arte, Individuo y Sociedad, Volumen 17, España, 2005, pp. 181 y 182.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 181


Jorge Luis Varona López / María Eugenia Grau Pírez / Alfredo Soler del Sol

elementos significativos del acervo cultural de toda nación, riqueza colectiva de


importancia crucial para la democracia cultural, que exige el compromiso ético y la
cooperación de toda la población para garantizar tanto su conservación como su
adecuada explotación.
Desde un punto de vista general, no existe un concepto unívoco de patrimonio
cultural en el Derecho Internacional, sino una pluralidad de definiciones que se insertan
en marcos normativos distintos. La sucesión de definiciones posibilita que un mismo
bien pueda encajar bajo el manto protector de varias convenciones. De igual forma, los
convenios han ido protegiendo bienes distintos según diferentes técnicas.
El Convenio de 1954 para la Protección de Bienes Culturales en Caso de
Conflicto Armado, se aproxima a tal definición desde una enumeración de bienes
muebles protegibles, así como de los edificios que los contienen; es decir, incluye tanto
el continente como el contenido. Se protegen tanto los edificios cuyo objeto sea
conservar los bienes culturales, como los bienes muebles e inmuebles de gran
importancia para el patrimonio cultural de los pueblos5.
La Convención para la Protección del Patrimonio Mundial Cultural y Natural de
1972 concibe el patrimonio cultural como determinados monumentos, conjuntos y
lugares, mientras que el natural son formaciones físicas y biológicas, geológicas y
fisiográficas y determinados lugares o zonas naturales. Incumbe a cada Estado, en virtud
del artículo 3, identificar y delimitar los bienes situados en su territorio que formen parte
del patrimonio cultural y natural, el que constituye un patrimonio universal. La noción de
patrimonio es imprecisa. La propia convención utiliza en distintos artículos términos
diferentes como patrimonio mundial, patrimonio universal, patrimonio mundial de la
humanidad entera. Por ello, la clave del sistema reside en la determinación de la
autoridad competente para precisar qué bienes cumplen esas características.
Este valor se da por una significación cultural o natural excepcional, que
trasciende las fronteras nacionales y es de importancia común para las generaciones
futuras de la humanidad. Para que tengan ese valor universal excepcional se deben reunir
una serie de criterios, responder a las condiciones de autenticidad e integridad y ser
objeto de un sistema de protección adaptado y de gestión para asegurar su salvaguardia.
En el momento en que un bien es inscrito recibe una “declaración de valor excepcional”
en la que se indican las razones de inclusión en la Lista del Patrimonio Mundial a cargo
del Comité de Patrimonio Mundial de la UNESCO.
La Convención sobre la Protección del Patrimonio Cultural Subacuático, de 2
de noviembre de 2001, considera que el patrimonio cultural subacuático debe
preservarse en beneficio de la humanidad. Según el artículo primero ese patrimonio
está constituido por los “rastros de la existencia humana que tengan un carácter

5
La aprobación del Protocolo de 1999 al Pacto de 1954 de protección de bienes culturales en caso de
conflicto armado introdujo un nuevo régimen de protección reforzada para determinados bienes culturales
calificados como patrimonio cultural de la mayor importancia para la humanidad. El artículo 10 del segundo
Protocolo establece las condiciones para que un bien cultural se ponga bajo la protección reforzada y, en
primer lugar, especifica qué debe ser un patrimonio cultural de la mayor importancia para la humanidad.
Además, indica, debe estar protegido por medidas nacionales adecuadas, jurídicas y administrativas, que
reconozcan su valor cultural e histórico excepcional y garanticen su protección en el más alto grado.

182 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Protección del Patrimonio Cultural. Una Visión Desde el Derecho Cubano

cultural, histórico o arqueológico y que hayan estado bajo el agua, parcial o


totalmente, de forma periódica o continua, por lo menos durante 100 años”. Además,
establece una lista numerus apertus de posibles rastros como sitios, estructuras,
edificios, objetos y restos humanos, junto con su contexto arqueológico y natural,
objetos de carácter prehistóricos, buques, aeronaves, etc.
En la Convención para la Salvaguardia del Patrimonio Cultural Inmaterial de
17 de octubre de 2003 se concibe el patrimonio cultural inmaterial como los usos,
representaciones, expresiones, conocimientos y técnicas –junto con los instrumentos,
objetos, artefactos y espacios culturales que les son inherentes – que las
comunidades, los grupos y en algunos casos los individuos reconozcan como parte
integrante de su patrimonio cultural.
Por otro lado, el Convenio sobre la Protección y Promoción de la Diversidad
de las Expresiones Culturales, de 20 de octubre de 2005, parte de la consideración
de que la diversidad cultural es una característica esencial y un patrimonio común de
la humanidad que debe valorarse y preservarse en provecho de todos. Concibe la
diversidad cultural (artículo 4) como la multiplicidad de formas en que se expresan
las culturas de los grupos y las sociedades, así como en los distintos modos de
creación artística, producción, difusión, distribución y disfrute de las expresiones
culturales. El objetivo del convenio es proteger y promover la diversidad de las
expresiones culturales, fomentar el diálogo entre culturas, la interculturalidad etc.
La Carta de Atenas de 1931 fue el primer documento con carácter
internacional donde apareció la primera referencia a la protección de los
monumentos de interés histórico, artístico o científico, a la preservación del paisaje
urbano y donde se consideraba al monumento antiguo como un elemento generador
de un sistema, poseedor de un ambiente particular que cualifica al lugar. Fue
también un primer acercamiento a la protección urbana de los contextos históricos y
el respeto intrínseco de la identidad ambiental, pues precisaba que la ciudad tiene un
carácter y fisonomía propia que debe ser respetado. Desde entonces, además de los
más representativos en la actualidad acabados de mencionar, un sinnúmero de
tratados y declaraciones internacionales se han pronunciado con respecto a la
necesidad de proteger los valores históricos y culturales que forman parte de la
identidad de los diferentes pueblos.

3 PATRIMONIO CULTURAL Y DERECHOS HUMANOS


La protección del patrimonio cultural se encuentra estrechamente ligada a los
Derechos Humanos. Garantizar ciertos y determinados derechos implica la
salvaguarda de los bienes culturales, ya que estos forman parte del ambiente, del
patrimonio común de la humanidad, y de la cultura de los diferentes pueblos.
Entonces, hablar del resguardo del patrimonio cultural desde el enfoque de los
derechos, conlleva a remembrar tres derechos en lo esencial: el derecho a un medio
ambiente sano y ecológicamente equilibrado, el derecho al disfrute del patrimonio
común de la humanidad, y el derecho a la participación en la vida cultural y artística
de una nación.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 183


Jorge Luis Varona López / María Eugenia Grau Pírez / Alfredo Soler del Sol

El artículo 27 de la Declaración Universal de los Derechos Humanos de 1948


hace expresa mención al derecho que tiene toda persona a tomar parte libremente en
la vida cultural de la comunidad, a gozar de las artes y a participar en el progreso
científico y en los beneficios que de él resulten6. Para avalar el ejercicio de los
mismos, se atribuye a los Estados la obligación de adoptar las medidas que resulten
necesarias para conservar, desarrollar y difundir la ciencia y la cultura.
El artículo 15 del Pacto Internacional de Derechos Económicos, Sociales y
Culturales de 1966 señala que los Estados Parte, reconocen el derecho de toda
persona a participar en la vida cultural; a gozar de los beneficios del progreso
científico y de sus aplicaciones; y a beneficiarse de la protección de los intereses
morales y materiales que le correspondan por razón de las producciones científicas,
literarias o artísticas de que sea autora.
El Pacto Internacional de Derechos Civiles y Políticos de igual año, en su
artículo 27 menciona el derecho que las personas pertenecientes a minorías étnicas,
religiosas o lingüísticas tienen en relación al disfrute de su propia cultura, así como a
profesar y practicar su propia religión y a utilizar su propio idioma. Similares
disposiciones contienen la Convención sobre la Eliminación de Todas las Formas de
Discriminación contra la Mujer de 1979 y la Convención sobre los Derechos del
Niño de 1989 en relación a las mujeres, niñas y niños, en sus artículos 13 y 31,
respectivamente. De igual manera, la Convención de los Derechos de las Personas
con Discapacidad de 2006, en su artículo 30, establece la obligación de los Estados
Parte a reconocer el derecho de todas las personas con discapacidad a participar, en
igualdad de condiciones con las demás, en la vida cultural. Los artículos 11, 12 y 13
de la Declaración de las Naciones Unidas sobre los Derechos de los Pueblos
Indígenas de 2007 hacen lo propio en cuanto a los derechos culturales de los
integrantes de estos pueblos.
No obstante, el patrimonio cultural, como uno de los elementos más visibles
de la vida cultural, no ha sido siempre abordado en su protección tanto internacional
como nacional desde un enfoque en derechos; por lo que, cada vez cobra mayor
importancia no solo la forma en que es protegido, sino aquella en que se
promociona, en que se pone al servicio de las personas, la forma en que todos
podemos acceder a él – especialmente los más desfavorecidos-, la forma en que se
protege no solo el objeto sino su significado, incluso, en la que el patrimonio se
convierte en derecho humano de todos a participar en la vida cultural.
Las primeras actuaciones de la UNESCO asociadas a la defensa del
patrimonio cultural se centraron en campañas de sensibilización y movilización
internacionales para salvar bienes concretos, que señalaron la necesidad de contar
con una legislación que amparara su protección a escala internacional. La

6
El derecho a participar en la vida cultural puede calificarse de libertad. Para realizarlo, es necesario que, por
un lado, el Estado se abstenga de hacer algo (no tenga injerencia en el ejercicio de las prácticas culturales y
en el acceso a los bienes culturales), y, que, por el otro, tome medidas positivas (asegurarse de que existan
las condiciones previas para participar en la vida cultural, promoverla y facilitarla y dar acceso a los bienes
culturales y preservarlos).

184 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Protección del Patrimonio Cultural. Una Visión Desde el Derecho Cubano

motivación estuvo en la interiorización de la importancia de proteger los sitios


culturales y naturales más excepcionales del planeta frente a los cambios repentinos
y radicales que conocía nuestro mundo y que operaban durante el transcurso del
siglo XX.
La Declaración sobre la Diversidad Cultural de la UNESCO de 2001,
identificó la necesidad de vincular derechos humanos y diversidad cultural,
afirmando que nadie puede invocar la diversidad cultural para vulnerar los derechos
humanos garantizados por el Derecho Internacional, ni para limitar su alcance. Si se
asume el patrimonio como parte de dichas expresiones culturales, es posible
comprender, a su vez, que su protección debe ir a la par con la defensa de los
derechos humanos.
La Convención sobre la Diversidad Cultural y las Expresiones Culturales
afirma que la Diversidad Cultural es una característica esencial de la humanidad y
constituye un patrimonio común de la humanidad que debe valorarse y preservarse
en beneficio de todos, aparte de establecer su importancia para la plena realización de
los derechos humanos.
La Declaración de Friburgo, adoptada en el año 2007, indica en su artículo
tercero, que toda persona, individual o colectivamente, tiene derecho a elegir y a que se
respete su identidad cultural en la diversidad de sus modos de expresión; a conocer y a
que se respete tanto su propia cultura como también aquellas que, en su diversidad,
constituyen el patrimonio común de la humanidad; y a acceder – en particular, a través
del ejercicio de los derechos a la educación y a la información – a los patrimonios
culturales que constituyen expresiones de las diferentes culturas y que son también
recursos para las generaciones de hoy y del mañana.
Constantemente, la UNESCO renueva sus compromisos con la defensa de los
derechos humanos, integrando el enfoque en derechos en todos sus programas, elaborado
toda una serie de textos jurídicos, que han fomentado la visión de un patrimonio común
de la humanidad, que genera a su vez responsabilidades internacionales en su protección.
Además, la ampliación de la noción de patrimonio cultural a aspectos tales como
el patrimonio inmaterial ha reforzado la relación ya existente previamente entre derechos
humanos, cultura y patrimonio, habiendo reivindicaciones patrimoniales que invocan
argumentos de derechos humanos, como ocurre con el conocimiento tradicional de las
comunidades locales, o con la restitución de determinados bienes a sus lugares de
origen7.

4 RESEÑA HISTÓRICA DE LA PROTECCIÓN DEL PATRIMONIO


CULTURAL CUBANO DESDE EL DERECHO
Una de las primeras intenciones por proteger el patrimonio cultural en Cuba
desde el punto de vista legislativo fue la promulgación durante el gobierno de
Gerardo Machado del Decreto Presidencial N. 1306, del 7.08.1928, a través del cual

7
FRANCIONI, F. Culture, heritage and Human Rights: an introduction, Ed. Martinus Nijhoff Publishers,
2008, p. 13.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 185


Jorge Luis Varona López / María Eugenia Grau Pírez / Alfredo Soler del Sol

se designó la creación de una comisión para impedir la dispersión de la riqueza


arqueológica, y donde se estipulaban los requerimientos para efectuar exploraciones
de este tipo, la formación de colecciones con esta temática, y vedaba la extracción
del país de esta clase de piezas.
En la década del 30 del pasado siglo también se dictó el Decreto N. 613. Este
constituyó el soporte jurídico para formular en La Habana la declaración de
Monumento Nacional de la Plaza de la Catedral y edificaciones adyacentes. El
Decreto, además de funcionar como una declaratoria, estableció restricciones en
cuanto a las intervenciones que pudieran practicarse en el conjunto, lo que quedó
definido en el segundo de sus artículos. Si bien es de considerar que la referida
disposición normativa constituyó un paso importante para la protección de la
herencia arquitectónica colonial en la capital cubana y que fijó la responsabilidad del
Estado respecto de este particular, el mismo, en su condición de ley presidencial,
quedó circunscrito únicamente a un conjunto determinado de edificaciones sin
alcanzar otros importantes exponentes del patrimonio monumental capitalino, hecho
donde se evidencian las insuficiencias que en materia de protección patrimonial aún
existían en Cuba en la tercera década del siglo XX.
En ese propio período se emitió el Decreto N. 116, donde se disponía la
creación de la Comisión de Monumentos, Edificios y Lugares Históricos y Artísticos
de la Ciudad de La Habana, con el que se aspiraba lograr un equilibrio entre la
ciudad existente y la que se desarrollaba. Su propósito era dejar establecido el valor
histórico de la vieja ciudad, declaraba monumentos nacionales a varios inmuebles,
como los de las Plazas de Armas y de la Catedral, y al Cementerio Santa Ifigenia de
Santiago de Cuba. Con posterioridad, en 1944, tuvo especial trascendencia la
declaratoria de Monumento Nacional otorgada a diversos edificios y lugares de La
Habana y de Trinidad por un decreto presidencial que antecedió a las actuales
declaratorias como Monumento Nacional y Patrimonio de La Humanidad.
En la cuarta década del siglo se evidenció una mayor intención de legislar la
protección del patrimonio histórico y cultural. En este sentido, el principal
instrumento fue la Constitución de 1940, la cual, en su artículo 58, estableció que el
Estado regularía por medio de la ley, la conservación del tesoro cultural de la
nación, su riqueza artística e histórica, así como también protegería, especialmente,
los monumentos nacionales y lugares notables por su belleza natural o su reconocido
valor artístico o histórico.
Uno de los principales acontecimientos de los años cuarenta fue la fundación
de la Comisión Nacional Cubana de la UNESCO (CNCU), el 17 de noviembre de
1947, mediante el Decreto Presidencial N. 4097 firmado por el presidente Ramón
Grau San Martín. Su presidencia recayó en el coronel del Ejército Libertador Cosme
de la Torriente, y entre sus miembros se encontraban destacados intelectuales como
Juan Marinello, Julio Le Riverend, Alfredo Guevara, Alejo Carpentier y Nicolás
Guillén. Esta Comisión, además de su función vinculante entre Cuba y la UNESCO,
resultó una entidad imprescindible para el fortalecimiento del desarrollo cultural,
educativo y científico del país. La creación de la CNCU constituyó el preámbulo

186 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Protección del Patrimonio Cultural. Una Visión Desde el Derecho Cubano

para la inauguración en La Habana, el 24 de febrero de 1950, del Centro Regional de


la UNESCO para el Hemisferio Occidental (CRUHO), con lo cual se cumplió uno
de los acuerdos de la Conferencia General celebrada en Beirut en 1948.
A partir del 1 de enero de 1959, las principales premisas en materia de cultura y
patrimonio se refrendaron en la Constitución de la República de Cuba de 1976. A tenor
de los postulados de sus artículos, el 4.08.1977 fueron implementadas como las dos
primeras leyes de la Asamblea Nacional del Popular la N. 1, “De Protección al
Patrimonio Cultural”, y la N. 2, “De los Monumentos Nacionales y Locales”, cuyos
reglamentos quedaron fijados en los Decretos N. 118, del 23 de septiembre de 1983, y N.
55, del 29 de noviembre de 1979, respectivamente.
La Resolución N. 1117 de 1963, había creado el Consejo Nacional de Cultura y
la Comisión Nacional de Monumentos, quienes desempeñaron un rol fundamental en la
gestión y protección del patrimonio cultural. En 1978 se emitió la declaración de
Monumento Nacional del Centro Histórico de La Habana. En las declaratorias de la
Resolución N. 03, del 6 de junio de 1978, de la Comisión Nacional de Monumentos,
también se distinguieron como Monumento Nacional los centros históricos de las siete
primeras villas fundadas en Cuba, la antigua Villa de La Asunción de Guanabacoa y el
Centro Histórico-Urbano de la ciudad de Remedios.
Otra de las disposiciones normativas de importancia significativa para la
protección del patrimonio cultural patrio fue la Resolución N. 3 de 1989, la que declaró
como patrimonio cultural todos los bienes presentes en las colecciones de los museos,
portadoras de valor arqueológico, histórico, literario, educacional, artístico, científico y
cultural en sentido general, así como los bienes de igual valor que “con una antigüedad
de más de 50 años” se encontrasen en poder de personas naturales o jurídicas dentro del
territorio nacional.
La Ley N. 106, Del Sistema de Museos de la República de Cuba, del 13.08.2009,
aprobada por la Asamblea Nacional del Poder Popular8, estipuló la organización del
Sistema Nacional de Museos de la República de Cuba (SNMRC) como mecanismo de
integración y articulación para la mejor protección de los bienes culturales patrimoniales
y museables protegidos en dichas instituciones y sus extensiones, lo cual se considera
como la principal contribución de la misma. Esta ley se hizo efectiva a través del Decreto
N. 312 dictado por el Consejo de Ministros y aprobado el 8 de abril del 2013. En sus 80
artículos se dispone el funcionamiento de los museos cubanos.
La conservación de las ciudades, y particularmente la ciudad histórica, forma
parte de la política general de conservación del patrimonio del país, y el Consejo
Nacional de Patrimonio es la institución rectora de esa política, con independencia de la
participación en ella de otras instituciones. La creación en 1938, gracias a Emilio Roig,
de la Oficina del Historiador de la Ciudad de la Habana (OHCH), como entidad con
carácter autónomo y con la responsabilidad de fomentar la cultura, ha constituido una

8
A fines de la década de 1970 estuvieron creadas las condiciones para la creación de una red de museos con
la apertura de este tipo de instituciones en cada uno de los municipios cubanos. De esta manera fue
promulgada la Ley n. 23, “De Museos Municipales”, del 18 de mayo de 1979, primer antecedente de la Ley
106/09.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 187


Jorge Luis Varona López / María Eugenia Grau Pírez / Alfredo Soler del Sol

muestra de la infatigable lucha por la conservación de la ciudad histórica,


específicamente, de La Habana Vieja. En el año 1993 les fueron asignadas nuevas
facultades y se fijaron inéditas atribuciones para los centros históricos: las posibilidades
de sustentabilidad de estos, la propia gestión del Centro Histórico como ente capaz de
generar ingresos para su autoconservación y restauración a partir de una serie de
servicios a los cuales se le dio la posibilidad de facultar, se tomaron como base.
La experiencia de la gestión en La Habana Vieja, cuyos resultados fueron visibles
con rapidez, fue secundada por otras ciudades importantes: Santiago de Cuba se unió en
1996, y en 1997 se aprobó la Oficina del Historiador para Camagüey y Trinidad. Luego,
por Acuerdo del Consejo de Estado, se creó la Red de Oficinas del Historiador para dar
al proceso un sentido más integrador, al protegerse además de las siete primeras villas,
otras ciudades y lugares importantes como el centro histórico de Cienfuegos, Jibara,
Sagua la Grande, Guanabacoa, Remedios y Matanzas. Una serie de ciudades tienen esa
protección legal y el reto radica en darles seguimiento con un esquema de protección
adecuado.
Las Oficinas del Historiador abarcan diferentes proyectos donde se imbrica, no
solo la protección del patrimonio construido. También asumen la idea de la existencia de
un patrimonio inherente a los habitantes, tan significativo como el edificado. En la
ciudad es tan importante el patrimonio construido como aquello que le aporta a sus
habitantes. El desafío es lograr programas de gestión capaces de articular unos valores
con otros y generar capacidad para el desarrollo y la mejora de las condiciones de vida de
la población, mediante el uso sostenible de ese patrimonio, lo cual exige tener también
en cuenta el factor ambiental, en específico, el medio natural.

5 PRINCIPALES INSTRUMENTOS JURÍDICOS PARA LA PROTECCIÓN


DEL PATRIMONIO CULTURAL CUBANO
La protección de patrimonio cultural cubano se garantiza a partir de la existencia
de un conjunto de disposiciones normativas encaminadas a su salvaguarda, tales como:
la Ley del Patrimonio Cultural y su Reglamento, la Ley de Monumentos Nacionales y
Locales y su Reglamento, el Código Penal, la legislación en materia de ordenamiento
territorial y urbano, la Ley del Medio Ambiente, la Constitución de la República, etc. A
continuación, se hará referencia al contenido de algunas de estas legislaciones.
Ley N. 81 de 1997, Ley del Medio Ambiente: Sobre la protección del patrimonio
cultural asociado al entorno natural se pronuncia la Ley 81, “Ley del Medio Ambiente”,
mediante su título decimosegundo. En el artículo 142 de la ley marco se establece que el
patrimonio cultural, conforme se define, declara y regula en la legislación
correspondiente, en su asociación con el entorno natural, será objeto de medidas
preventivas y correctivas, a fin de salvar o proteger los bienes culturales que estén en
peligro por obras o actividades que puedan deteriorarlos o destruirlos9.La

9
En el propio artículo se destacan: las obras de expansión o renovación urbana, en las cuales no solo deberán
respetarse los monumentos registrados, sino también el entorno histórico circundante; las obras de
modificación o reparación de edificios; la construcción o reparación de carreteras; la construcción de presas

188 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Protección del Patrimonio Cultural. Una Visión Desde el Derecho Cubano

conservación in situ de los bienes culturales se considerará priorizada a los fines de


mantener la continuidad y las vinculaciones históricas con el medio ambiente10.
Corresponde al Ministerio de Cultura (MINCULT), en coordinación con el
Ministerio de Ciencia, Tecnología y Medio Ambiente (CITMA), después de conocer el
criterio de los demás órganos y organismos competentes, la adopción de las medidas
necesarias para garantizar la preservación del patrimonio cultural asociado al entorno
natural. También la Comisión Nacional de Monumentos, tras haber escuchado el criterio
del CITMA, se encuentra facultada para realizar acciones respecto de los bienes del
patrimonio cultural a los que se refiere la propia Ley del Medio Ambiente en su título
decimosegundo11.
Ley N. 1, de 4.08.1977, Ley de Protección del Patrimonio Cultural12: En su
artículo primero, la ley especifica que tiene por objeto: “la determinación de los bienes
que, por su especial relevancia en relación con la arqueología, la prehistoria, la historia,
la literatura, la educación, el arte, la ciencia y la cultura en general, integran el patrimonio
cultural de la nación”, y hace especial referencia a la necesidad de protección del mismo.
Corresponde al Ministerio de Cultura precisar y declarar cuáles son estos bienes, los
cuales deberán inscribirse en el Registro Nacional de Bienes Culturales adscrito a dicho
Organismo de la Administración Central del Estado. En el Registro se identifica el bien y
el lugar donde se ubica, así como la persona encargada de este y la razón de su interés
cultural13. La transmisión del dominio o posesión de los bienes conceptuados como
patrimonio cultural de la nación solo puede ser autorizada por el Ministerio de Cultura,
quien también será la autoridad facultada para permitir su extracción. El Estado goza de
un derecho de tanteo para adquirir ciertos bienes culturales al precio declarado por el
vendedor o quien lo ceda, o por los criterios de los peritos designados al efecto.
Decreto N. 118, Reglamento para la Ejecución de la Ley de Protección al
Patrimonio14: En el artículo primero del Reglamento se especifica que el patrimonio
cultural de la nación está integrado por aquellos bienes, muebles e inmuebles,
representativos de la expresión o el testimonio de la creación humana o de la evolución
de la naturaleza y tienen especial relevancia en relación con la arqueología, la prehistoria,
la historia, la literatura, la educación, el arte, la ciencia y la cultura en general15.

y tendidos de líneas de transmisión eléctrica o comunicación; la ubicación de sistemas de conducción de


líquidos y gases; la ubicación y construcción de urbanizaciones, centros recreativos, deportivos y turísticos
y; la instalación de carteles publicitarios.
10
Ver artículo 144.
11
Ver artículos 146 y 143.
12
Publicada en la Edición Ordinaria de la Gaceta Oficial de la República n. 29, de 6.08.1977, entró en vigor
desde el propio día.
13
Toda persona poseedora de un bien de interés cultural se encuentra obligada a declararlo ante el Registro,
sin que esto implique modificación de su estatus legal, aunque queda obligada a garantizar su conservación
y absoluta integridad.
14
De 23 de septiembre de 1983.
15
El patrimonio cultural está integrado fundamentalmente por un conjunto de bienes que se relacionan en el
propio artículo, entre los cuales se destacan, todo centro histórico urbano, construcción o sitio merecedor de
ser conservado por su significación cultural, histórica o social, como establece la Ley 2, de 4.08.1977, Ley
de los Monumentos Nacionales y Locales, y su Reglamento.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 189


Jorge Luis Varona López / María Eugenia Grau Pírez / Alfredo Soler del Sol

Importante resulta toda regulación vinculada a la estructura y funcionamiento del


Registro Nacional de Bienes Culturales de la República de Cuba y a la declaración de los
bienes culturales, su inscripción e inventario. Asimismo, la disposición normativa rige la
transmisión de dominio de los bienes del patrimonio cultural, así como su importación y
exportación. Se entiende por protección de los bienes culturales, a partir de lo expresado
en el artículo 27, “todas las medidas de carácter legal e institucional”, incluidas las
providencias técnicas, de restauración y otras, tendientes a mantener la integridad de los
bienes culturales frente a los distintos agentes capaces de poner en peligro la
perdurabilidad de todo o parte de un bien considerado patrimonio cultural de la nación o
de valor museable.
Ley N. 2, de 4.08.1977, Ley de los Monumentos Nacionales y Locales16: La Ley
en su artículo 1 define qué se entiende como monumento nacional, monumento local,
centro histórico urbano, sitios y objetos. En el segundo artículo se describe cuáles han de
ser los valores históricos, artísticos, ambientales, y naturales o sociales necesarios para
declarar un monumento nacional o local. Mediante la presente disposición normativa fue
creada la Comisión Nacional de Monumentos, a la cual se le atribuyen una serie de
funciones para la protección de los monumentos referidos por la ley, tales como: a)
declarar cuáles construcciones, sitios y objetos son monumentos nacionales y locales
de acuerdo con las disposiciones de la propia Ley N. 2; b) autorizar, inspeccionar y
supervisar toda obra que deba realizarse en una construcción, sitio u objeto declarado
monumento nacional o local, así como declarar la necesidad de realizar en ellos
cualquier tipo de obra, etc.
Decreto. N. 55, Reglamento para la Ejecución de la Ley 2 de los Monumentos
Nacionales y Locales17: El presente Reglamento define en sus artículos 1 y 2 qué se
entiende por monumentos nacionales y locales, respectivamente. La disposición clasifica
a los monumentos nacionales en: Centros Históricos Urbanos, Construcciones, Sitios y
Objetos. Por otra parte, estima como monumentos locales las Construcciones, Sitios y
Objetos. Esta disposición normativa establece la estructura y funciones de la Comisión
Nacional de Monumentos y de las Comisiones Provinciales; estas últimas, están
adscriptas a las Direcciones de Cultura de los Comités Ejecutivos de las Asambleas
Provinciales del Poder Popular18 y subordinadas técnica y metodológicamente al
Ministerio de Cultura. En el Reglamento se regula lo relacionado con la declaración de
los monumentos nacionales y locales y su protección, así como todo lo vinculado al
Registro de Monumentos Nacionales y Locales. Con el fin de instituir definiciones y
criterios de protección de los bienes inscriptos en el Registro de Monumentos Nacionales
y Locales, se establecen distintos grados de protección a los cuales estarán sujetos

16
Publicada en la Edición Ordinaria n. 29 de la Gaceta Oficial de la República de Cuba, de 6.08.1977, está
vigente desde la misma fecha.
17
De fecha 29 de noviembre de 1979.
18
Estos pasaron con posterioridad a denominarse Consejos de la Administración Provincial. Este órgano está
sujeto a futuras transformaciones a raíz de las modificaciones que implica la entrada en vigor de la nueva
Constitución de la República de 10.04.2019.

190 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Protección del Patrimonio Cultural. Una Visión Desde el Derecho Cubano

dichos bienes de acuerdo a su valoración, estado de conservación, su relación con el


medio y demás factores que determinen su interés social y cultural.
Acuerdo del Consejo de Estado de 24 de enero de 2013, mediante el que fue
creada la Red de Oficinas del Historiador y del Conservador de las Ciudades
Patrimoniales de Cuba19: Con el presente Acuerdo no solamente fue creada la Red,
sino también se determinó su integración. Se trata de una institución de carácter
nacional con personalidad jurídica propia cuya máxima representación la ostenta el
Historiador de la Ciudad de La Habana. La misión fundamental de la Red es
fomentar el intercambio y transferencia de experiencias y conocimientos en materia
de rehabilitación urbana y recuperación patrimonial, en aras de preservar el legado
histórico y vivo del país, lo cual no limita la autonomía de cada ciudad u oficina en
las actividades propias de recuperación patrimonial.
Legislación del Sistema Nacional de Áreas Protegidas: El Decreto-Ley N.
201, “Del Sistema Nacional de Áreas Protegidas”, de 23 de diciembre de 1999, tal y
como quedó modificado por el Decreto-Ley N. 331, “De las Zonas con
Regulaciones Especiales”, de 30 de junio de 2015, regula lo relacionado con la
protección de un grupo de áreas que, por su relevancia ecológica, social e histórico
cultural para la nación, incluso para el resto del planeta, requieren ser declaradas
áreas protegidas con el propósito de alcanzar objetivos de conservación y uso
sostenible. Esta disposición normativa establece y rige el Sistema Nacional de Áreas
Protegidas, y además de regular el establecimiento de estas áreas, expresa las
categorías de manejo20, así como la metodología para su aprobación. Por su
relevancia nacional o internacional, las áreas protegidas establecidas en el país, o
algunas de sus partes o elementos componentes, podrán recibir, además de la
denominación correspondiente a su categoría de manejo, los títulos siguientes que
confieren distinción o jerarquización: Monumento Local, Monumento Nacional,
Reserva de Biosfera, Sitios de Patrimonio Mundial, Sitios RAMSAR (humedales),
etc. Uno de los objetivos del Sistema Nacional de Áreas Protegidas consiste en
conservar las áreas y sitios histórico-culturales ligados a un entorno natural.
Legislación en materia de ordenamiento territorial, urbanismo y
planificación física: De significativa importancia para la protección del patrimonio
cultural resulta la legislación en materia de ordenamiento territorial y urbanismo, la
cual, para Zaldívar (2011), se trata de una legislación viva, toda vez que está dirigida
a regular y proteger el territorio, el medio ambiente y el patrimonio construido del
país. No es menester abordar en la presente investigación toda la legislación en este
sentido, sino, solamente, hacer alusión a las más trascendentales. El Decreto N. 272,
de 20 de febrero de 2001, “De las contravenciones en materia de ordenamiento
territorial y urbanismo”, no solo está referido a las indisciplinas en materia de
ordenamiento territorial y urbanismo; además recoge las infracciones contra el

19
Publicado en la Gaceta Oficial Ordinaria n. 10, de 27 de febrero de 2013.
20
Las categorías de manejo son: reserva natural, parque nacional, reserva ecológica, elemento natural
destacado, reserva florística manejada, refugio de fauna, paisaje natural protegido, y área protegida de
recursos manejados.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 191


Jorge Luis Varona López / María Eugenia Grau Pírez / Alfredo Soler del Sol

ornato público, la higiene comunal, y los monumentos nacionales y locales. Su


aplicación no es privativa del Sistema de Planificación Física, también corresponde,
en dependencia de la infracción de que se trate, a los inspectores del Sistema de la
Vivienda, Servicios Comunales, Recursos Hidráulicos y Salud Pública. Entre las
contravenciones establecidas en esta disposición normativa contra el ornato público,
la higiene comunal y los monumentos nacionales y locales se encuentra: pintar,
limpiar, colocar carteles, manchar y escribir construcciones inscritas en el Registro
de Monumentos Nacionales y Locales, etc.
Código Penal de la República de Cuba21: El Código Penal no considera el
medio ambiente como un bien jurídico específico merecedor de tutela jurídico-
penal; sin embargo, el medio ambiente y varios de sus recursos son protegidos
mediante la tipificación de figuras delictivas asociadas a otros bienes jurídicos como
la seguridad colectiva, la economía nacional, el patrimonio cultural, y la vida y la
integridad corporal, entre otros22. El patrimonio cultural constituye un bien jurídico
independiente al cual se vinculan los delitos de: “Daños a bienes del patrimonio
cultural” (artículo 243), “Extracción ilegal del país de bienes del patrimonio
cultural” (artículo 244), “Trasmisión, tenencia ilegal de bienes del patrimonio
cultural y falsificación de obras de arte” (artículos 245 y 246), y “Exploración
arqueológica ilegal” (artículo 247). Por el primero de estos delitos se sanciona a
quien intencionalmente destruya, deteriore o inutilice un bien declarado parte
integrante del patrimonio cultural o un monumento nacional o local, mientras
mediante el segundo, es reprimido quien extraiga o intente extraer del país bienes
integrantes del patrimonio cultural sin cumplir las formalidades legales. En este
caso, si los bienes sustraídos son de considerable valor para el patrimonio cultural,
se acrecienta el marco penal sancionador. Incurre en el delito de “Trasmisión,
tenencia ilegal de bienes del patrimonio cultural y falsificación de obras de arte”
quien, sin cumplir las formalidades legales, realice cualquier acto traslativo del
dominio o posesión de un bien integrante del patrimonio cultural y adquiera o tenga
en su poder por cualquier concepto un bien declarado patrimonio cultural o que
proceda de un inmueble declarado monumento nacional o local; en perjuicio de su
creador o del patrimonio cultural, falsifique o trafique una obra de arte. Quien, sin
autorización del organismo estatal competente, realice trabajos materiales de
exploración arqueológica mediante excavaciones, remoción de tierra u otros medios,
incurre en sanción de privación de libertad de tres meses a un año o multa de cien a
trescientas cuotas.
Resolución 126/04 del Ministerio de Cultura. Con el objetivo de garantizar el
conocimiento y salvaguardia del patrimonio cultural inmaterial de la nación cubana
21
Se trata de la Ley n. 62 de 29 de diciembre de 1987, vigente desde el 30.04.1988.
22
Ejemplos de algunos de estos delitos son: genocidio (artículo 116), infracción de las normas referentes al
uso y conservación de las sustancias radioactivas u otras fuentes de radiaciones ionizantes (artículos 185 y
186), propagación de epidemias (artículo 187), exhumaciones ilegales (artículo 188), contaminación de las
aguas y de la atmósfera (artículo 194), infracción de las normas para prevenir y combatir enfermedades y
plagas de animales y plantas (artículo 237), contaminación de las aguas (artículos 238 y 239), pesca ilícita
(artículo 243), etc.

192 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Protección del Patrimonio Cultural. Una Visión Desde el Derecho Cubano

como parte esencial de la identidad cultural, mediante esta Resolución fue creada la
Comisión para la Salvaguardia del Patrimonio Cultural Inmaterial. Dentro de las
funciones específicas que debe realizar se encuentran las siguientes:
• Diseñar la política referente a la atención, preservación, promoción y
protección del Patrimonio Cultural Inmaterial, partiendo de un enfoque
multidisciplinario;
• Identificar todas las expresiones y manifestaciones que forman parte del
Patrimonio Cultural Inmaterial, a partir de la experiencia alcanzada y
teniendo en cuenta las disposiciones de los organismos internacionales en
esta materia;
• Establecer los métodos para la revisión, validación, actualización y
atención a las solicitudes de incorporación al registro oficial del
Patrimonio Cultural Inmaterial y la designación de las autoridades
nacionales competentes para estos fines;
• Insertar el tema del Patrimonio Cultural Inmaterial en los distintos tipos
de enseñanzas, teniendo en cuenta las peculiaridades de cada territorio;
• Participar en la creación de un centro de documentación nacional sobre el
Patrimonio Cultural Inmaterial;
• Elaborar los proyectos de los instrumentos jurídicos necesarios,
encaminados a la salvaguardia del Patrimonio Cultural Inmaterial.
Como resultado de la labor de la Comisión para la Salvaguardia del
Patrimonio Cultural Inmaterial, varias expresiones músico danzarías y comunitarias,
tradiciones populares festivas, y expresiones populares, que constituyen saberes y
técnicas, han sido declaradas como Patrimonio Cultural de la Nación Cubana, entre
ellas: el carnaval de Santiago de Cuba, el Changüí, las charangas de Bejucal, el Danzón,
las lecturas de tabaquería, el órgano oriental con los saberes, técnicas y usos tradicionales
asociados; las parrandas de la región central de Cuba, el Repentismo, la Rumba; los
saberes maestros roneros, el Son, la Tumba Francesa, el Punto Cubano, entre otras. De
ellos, la Tumba Francesa, la Rumba, las parrandas de la región central de Cuba y el
Punto Cubano forman parte del Patrimonio Inmaterial de la Humanidad.
Trascurridas cuatro décadas de implementada parte de esta legislación, se sugiere
una revaluación jurídica de la misma a tenor de las concepciones operantes en la gestión
actual del patrimonio en la palestra internacional. En esencia, se trata de entender que,
como cualquier obra humana, puede ser perfectible. Se hace necesario revaluar y
actualizar el cuerpo legislativo protector del patrimonio cubano de acuerdo con los
nuevos conceptos y las líneas de pensamiento contemporáneos, en cuanto a potenciar su
gestión con un enfoque crítico capaz de hacerlos marchar a la par de la práctica
desarrollada en esta materia. Ya no resultan suficientes los enfoques restrictivos a la
conservación y protección, sino precisamente para garantizar la perdurabilidad en el
tiempo es necesario prestar especial atención a la dinamización y puesta en valor de
todas las dimensiones del patrimonio en sus respectivos espacios.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 193


Jorge Luis Varona López / María Eugenia Grau Pírez / Alfredo Soler del Sol

6 CONCLUSIONES
La protección del patrimonio cultural cubano se consolidó a partir del triunfo
de la Revolución con el fortalecimiento del marco institucional y legal, la
declaración de monumentos y los centros históricos de las primeras siete villas
fundadas por los españoles como “Monumento Nacional”, así como con la
declaración de varios bienes culturales como Patrimonio de la Humanidad.
La protección del patrimonio cultural en el ordenamiento jurídico cubano se
garantiza, en lo fundamental, a partir de un conjunto de disposiciones normativas,
entre las que se destacan: la Ley de Protección del Patrimonio Cultural y su
Reglamento, la Ley de los Monumentos Nacionales y Locales y su Reglamento, la
legislación del Sistema Nacional de Áreas Protegidas, la legislación en materia de
ordenamiento territorial, urbanismo y planificación física, y el Código Penal, entre
otras. Esta regulación normativa requiere ser actualizada a partir de las nuevas
concepciones que en la actualidad operan en la gestión del patrimonio en la palestra
internacional, toda vez, que, parte de ella, posee más de cuarenta años de vigencia y
enfrenta los retos de la longevidad.

BIBLIOGRAFÍA
ALONSO, A. Legislación y patrimonio inmueble. Antecedentes y aplicación en La Habana. Arquitectura y
Urbanismo, Volumen 35, Nro. 2, La Habana, 2014, pp. 1-25.
APARICIO, A y Martínez, J. Rehabilitación y reutilización del patrimonio urbano al servicio de las funciones de
la capitalidad autonómica. Análisis comparado de Toledo y Pamplona. Boletín de la Asociación de Geógrafos
Españoles, Nro. 69, 2015, pp. 387-414.
APARICIO, E; Serrano, Ó y León, D. Rehabilitación y reutilización del patrimonio urbano. Los centros
históricos de nuevas capitales políticas españolas Patrimonio de la Humanidad. Cuadernos de Turismo, Nro. 42,
2018, pp. 15-45.
AYES, G. La Habana: maravilla patrimonial. 1ra Ed. Ed. Científico-Técnica, La Habana, 2017.
ARJONA, M. Patrimonio cultural e identidad nacional. Ed. Letras Cubanas, La Habana, 1986.
BOJ, S. Protección y conservación ante catástrofes del patrimonio cultural de la Comunidad de Madrid. Tesis
para optar por el grado científico de doctor en ciencias, Universidad Complutense de Madrid, Madrid, 2018.
FERNÁNDEZ, M. Rumbo a Hábitat III. Planificación Física Cuba, Nro. 22, La Habana, 2016, pp. 22-25.
FRANCIONI, F. Culture, heritage and Human Rights: an introduction, Ed. Martinus Nijhoff Publishers, 2008,
pp. 1-15.
GARCÍA, J. La labor museológica de la Revolución Cubana y el proceso de transformación en la proyección
social de los museos en Cuba. Intervención, Nro. 9, 2014, pp. 65-75.
GONZÁLEZ, R; Marichal, A y Perón, E. La conservación del patrimonio edificado a través de la relación entre
los servicios urbanos y turísticos. Apuntes, Volumen 29, Nro. 2, 2016, pp. 7-83.
LLULL, Josué. Evolución del concepto y de la significación social del patrimonio cultural. Arte, Individuo y
Sociedad, Nro. 17, 2005, pp. 175-204.
VALDÉS, A. Consideraciones en torno a las leyes que protegen el patrimonio cultural en Cuba. Cuadernos de
Sociomuseología, Volumen 55, Nro. 12, Cuba, 2018, pp. 3-30.
ZENDRI, L. La protección del patrimonio cultural de Argentina. De la legislación patrimonial a la consagración
de un nuevo derecho. Derecho y Ciencias Sociales, Nro. 16, 2017, pp. 40-45.
ZENDRI, L y Sesti, P. Importancia de la protección del patrimonio local: herramientas del Derecho Ambiental
aplicables al patrimonio cultural edificado. Anales de la Facultad de Ciencias Jurídica y Sociales, Nro. 47, 2017,
pp. 69-92.

194 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Protección del Patrimonio Cultural. Una Visión Desde el Derecho Cubano

Legislaciones.
Nacionales.
Constitución de la República de Cuba, Gaceta Oficial de la República de Cuba, Extraordinaria Nro. 5, de
10.04.2019.
Constitución de la República de Cuba, Gaceta Oficial de la República de Cuba, Edición Especial Nro. 2, de 24
de febrero de 1976.
Ley Nro. 106. Del Sistema Nacional de Museos, Gaceta Oficial de la República de Cuba, Extraordinaria Nro. 9
de 2009.
Ley Nro. 62. Código Penal, Gaceta Oficial de la República de Cuba, 1987.
Ley Nro. 1. Ley de Protección del Patrimonio Cultural, Gaceta Oficial de la República de Cuba, Ordinaria Nro.
29 de 1977.
Ley Nro. 2. Ley de los Monumentos Nacionales y Locales, Gaceta Oficial de la República de Cuba, Ordinaria
Nro. 29 de 1977.
Decreto-Ley Nro. 201. Del Sistema Nacional de Áreas Protegidas, Gaceta Oficial de la República de Cuba,
1999.
Decreto-Ley Nro. 331. De las Zonas con Regulaciones Especiales, Gaceta Oficial de la República de Cuba,
2015.
Acuerdo. Sobre la Red de Oficinas del Historiador y del Conservador de las Ciudades Patrimoniales de Cuba,
Gaceta Oficial de la República de Cuba, Ordinaria Nro. 10 de 2013.
Decreto Nro. 21. Reglamento sobre la planificación física, Gaceta Oficial de la República de Cuba, Ordinaria
Nro. 8 de 1978.
Decreto Nro. 272. Contravenciones en materia de ordenamiento territorial y urbanismo, Gaceta Oficial de la
República de Cuba, 2001.
Decreto Nro. 55. Reglamento para la Ejecución de la Ley Nro. 2 de los Monumentos Nacionales y Locales,
Gaceta Oficial de la República de Cuba, 1979.
Decreto Nro. 118. Reglamento para la Ejecución de la Ley de Protección al Patrimonio, Gaceta Oficial de la
República de Cuba, 1983.
Reglamento de la Ley Nro. 106. Del Sistema Nacional de Museos de la República de Cuba, Gaceta Oficial de la
República de Cuba, Ordinaria Nro. 24 de 2013.
Resolución Nro. 003. Sobre la declaración de Monumentos Nacionales, Gaceta Oficial de la República de Cuba,
Ministerio de Cultura, 1978.
Resolución N. 126. Sobre la Comisión para la Salvaguardia del Patrimonio Cultural Inmaterial Gaceta Oficial de
la República de Cuba, Ministerio de Cultura, 2004.
Internacionales.
Convención para la Protección de Bienes Culturales en Caso de Conflicto Armado de 1954.
Convención para la Protección del Patrimonio Mundial, Cultural y Natural de 1972.
Convención para la Salvaguardia del Patrimonio Cultural Inmaterial de 2003.
Convenio sobre la Protección y Promoción de la Diversidad de las Expresiones Culturales, de 20 de octubre de
2005.
Convención sobre la Protección del Patrimonio Cultural Subacuático, de 2 de noviembre de 2001.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 195


La Protección del Patrimonio Cultural. Una Visión Desde el Derecho Cubano

VIOLÊNCIA URBANA: DIREITOS HUMANOS


E QUESTÕES SOCIAIS
URBAN VIOLENCE: HUMAN RIGHTS
AND SOCIAL ISSUES
DOI: 10.19135/revista.consinter.00011.08
Recebido/Received 22.06.2020– Aprovado/Approved 18.07.2020
Maria Luiza de Andrade Picanço Meleiro1 – https://orcid.org/0000-0001-7835-7382
E-mail: luizapmeleiro@hotmail.com

Resumo: O artigo objetiva trazer à discussão a problemática da violência urbana com


ênfase nos Direitos Humanos e Cidadania. Na primeira parte faz-se uma reflexão sobre a
violência sob o prisma dos Direitos Humanos e Cidadania, enfocando a urbanização das
cidades como variável associada à violência urbana, enfatizando a tensão que há entre
violência e déficits sociais, pondo em perspectiva a cidade de Manaus, no Estado do
Amazonas. Posteriormente faz-se breves considerações sobre prisões, pobreza e
exclusão social, desde uma concepção histórica e as implicações da pobreza e sua
relação com a exclusão social, que culminaram com as primeiras raízes do Direito
Penitenciário e o nascimento das prisões. Em seguida se trata da realidade das prisões no
Brasil cujas consequências têm sido os massacres e as rebeliões. Finaliza-se com uma
discussão sobre Direitos Humanos e Garantias Legais na Execução da Pena Privativa de
Liberdade, dando enfoque às constantes violações dos direitos e das garantias legais
daqueles que estão sob tutela do Estado. Conclui-se que as prisões têm sido a resposta
para a ausência de políticas públicas, não apenas na segurança pública, mas em outras
áreas, e se tornado espaço para tortura, desigualdade social e repressão estatal. Além
disso constata-se a inter-relação da falência do sistema prisional ao modelo econômico
existente, apontando para a necessidade premente de revisão do modelo de política
econômica e social atualmente implementados em nosso país.
Palavras-chave: Violência. Pobreza. Exclusão social. Direitos humanos.
Abstract: The article aims to bring to the discussion the issue of urban violence with an
emphasis on Human Rights and Citizenship. In the first part there is a reflection on
violence from the perspective of Human Rights and Citizenship, focusing on the
urbanization of cities as a variable associated with urban violence, emphasizing the
tension that exists between violence and social deficits, putting the city of Manaus in
perspective , in the state of Amazonas. Subsequently, brief considerations are made
about prisons, poverty and social exclusion, from a historical conception and the
implications of poverty and its relation to social exclusion, which culminated in the first
roots of Penitentiary Law and the birth of prisons. Next, it is about the reality of prisons
in Brazil whose consequences have been massacres and rebellions. It ends with a

1
Doutora em Educação pela Universidad Católica Santa Fe/Arg; Mestre em Segurança Pública, Cidadania e
Direitos Humanos da Universidade do Estado do Amazonas/UEA; Professora e Coordenadora do curso de
Pós-Graduação em Gerontologia e Saúde do Idoso, da Fundação Universidade Aberta da Terceira
Idade/FUNATI . E-mail: luizapmeleiro@hotmail.com. Lattes: http://lattes.cnpq.br/2939021325682334

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 197


Maria Luiza de Andrade Picanço Meleiro

discussion on Human Rights and Legal Guarantees in the Execution of the Private
Prison of Liberty, focusing on the constant violations of the rights and legal guarantees
of those under the tutelage of the State. It is concluded that prisons have been the answer
to the absence of public policies, not only in public security, but in other areas, and have
become a space for torture, social inequality and state repression. In addition, there is an
interrelation between the failure of the prison system and the existing economic model,
pointing to the pressing need to review the model of economic and social policy
currently implemented in our country.
Keywords: Violence. Poverty. Social exclusion. Human rights.
Sumário: Introdução. 1. A violência urbana. 2. Prisões, pobreza e exclusão social. 3. A
violência nos presídios: mais insegurança pública. 4. Direitos humanos e garantias legais
na execução da pena privativa de liberdade. Considerações finais. Referências.

INTRODUÇÃO
É inexorável a relação existente entre urbanização das cidades e violência ur-
bana. O modelo de cidade excludente, no qual os Estados atuam, distribui, desigual e
seletivamente a violência em seu território. Omisso na proposição e na implantação
de políticas públicas diferenciadas que priorizem a proteção da vida da população
historicamente vulnerabilizada, especialmente a juventude pobre que habita as zonas
excluídas da cidade, os Governos têm insistido na adoção de práticas heterogêneas e
desrespeitosas na organização dos espaços urbanos. O mesmo Estado que não plane-
ja o crescimento das cidades, também não disponibiliza a todos, indistintamente, o
acesso aos meios institucionalizados para que o jovem tenha a oportunidade de cres-
cimento e desenvolvimento que necessita. Como salienta Carlos María Cárcova,
“grandes contingentes sociais padecem de uma situação de postergação, de pobreza
ou de atraso que produz marginalidade e anomia na periferia da estrutura social”.
(CÁRCOVA, 1998, p. 19).
As cidades estão distantes de oferecerem condições e oportunidades equitati-
vas aos seus habitantes. A população urbana, em sua maioria, está privada ou limita-
da – em virtude de suas características econômicas, sociais, culturais, étnicas, de
gênero e idade – de satisfazer suas necessidades básicas.
A cidade de Manaus, no Amazonas, padece dessas mazelas. Mas não apenas
disso: sua localização geográfica próxima aos principais países produtores de cocaí-
na do mundo, aliado à presença de uma bacia hidrográfica que favorece o transporte
e distribuição de drogas ilícitas, faz da principal metrópole da Região Norte um
campo fértil para a prática da ação criminosa. O crime organizado encontra aqui um
contingente de não cidadãos, habitando a não cidade. Esse contingente de crianças e
jovens pobres, desempregados, carentes de toda sorte de serviços públicos essenci-
ais, habitantes das periferias é cooptado sem pena e sem dó para o mundo do crime.
Em pouco tempo esses jovens estarão engrossando o outro contingente, que
também não para de crescer, o da população carcerária. Resolve-se o problema da
falta de diversas políticas e da (in)segurança pública encarcerando indivíduos das
classes subalternas, os mais pobres, os desprovidos dessas políticas públicas e injus-
tiçados pelo sistema econômico e social (WACQUANT, 2001).

198 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Violência Urbana: Direitos Humanos e Questões Sociais

Segundo os dados divulgados pelo Sistema Integrado de Informações Peni-


tenciárias do Ministério da Justiça (INFOPEN), no ano de 2019, o Brasil é terceiro
país com maior número de pessoas presas, atrás apenas dos Estados Unidos e da
China, sendo seguido na quarta colocação pela Rússia. A taxa de presos para cada
100 mil habitantes subiu para 352,6 indivíduos em junho de 2016, de acordo com o
mesmo relatório. Em 2014, era de 306,22 pessoas presas para cada 100 mil habitan-
tes (BRASIL, 2019).
O Ministério da Justiça e Segurança Pública, por meio do Conselho Nacional de
Política Criminal e Penitenciária, é responsável pela implementação, em todo o território
nacional, da política criminal e penitenciária, a partir de avaliações periódicas do sistema
criminal, criminológico e penitenciário, bem como a execução de planos nacionais de
desenvolvimento quanto às metas e prioridades da política a ser executada. Este colegia-
do é o órgão superior de um sistema integrado pelo Departamento Penitenciário Nacio-
nal, apoiado pelo Fundo Penitenciário e, nos Estados, pelos respectivos conselhos e
órgãos executivos.
Este Artigo está dividido em quatro partes. Na primeira fazemos uma reflexão
sobre a violência sob o prisma dos Direitos Humanos e Cidadania. Enfocamos a questão
da urbanização das cidades (ou a falta dela) como variável associada à violência urbana,
enfatizando a persistente tensão que há entre violência e déficits sociais e trazendo o
contexto da cidade de Manaus como elemento que tipifica tal situação.
Na segunda parte tecemos breves considerações sobre prisões, pobreza e exclu-
são social, desde uma concepção histórica e as implicações da pobreza e sua relação com
a exclusão social que culminaram com as primeiras raízes do Direito Penitenciário e o
nascimento das prisões. Estas, consideradas como instrumentos de exclusão e frutos de
um modelo econômico de mercado, que objetiva a mais-valia do trabalho e estimula a
ampliação das diferenças sociais.
Posteriormente nossa reflexão perpassa pela realidade das prisões no Brasil cujas
consequências têm sido os massacres e as rebeliões. O quadro é assustador quando se
constata que a relação é de aproximadamente 350 presos para cada 100 mil habitantes; o
crescimento da população carcerária se dá, segundo o diagnóstico do Depen, a um ritmo
de 8,3% ao ano e, se continuar neste ritmo, em 2022, o Brasil poderá alcançar a triste
marca de 1 milhão de presos.
Na última parte faz-se com uma discussão sobre os Direitos Humanos e as Ga-
rantias Legais na Execução da Pena Privativa de Liberdade, dando enfoque às constantes
violações dos direitos e das garantias legais daqueles que estão sob tutela do Estado.
Também se traz à reflexão a morosidade da justiça e suas consequências assim como o
trabalho hercúleo das Defensorias Públicas. Conclui-se que as prisões têm sido a resposta
para a ausência de políticas públicas, não apenas na segurança pública, mas em outras
áreas, e se tornado espaço para tortura, desigualdade social, supervalorização do capital e
repressão estatal. Além disso constata-se a inter-relação da falência do sistema prisional
ao modelo econômico existente, apontando para a necessidade premente de revisão do
modelo de política econômica e social atualmente implementados no Brasil.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 199


Maria Luiza de Andrade Picanço Meleiro

1 A VIOLÊNCIA URBANA
Há muito a violência no Brasil deixou de ser apenas um problema de segurança
pública para se configurar, não apenas numa questão social, mas, sobretudo de Direitos
Humanos e Cidadania. Poucas vezes a violência e suas consequências têm merecido
abordagem multidimensional livre de associações impressionistas, possibilitando que se
adentre em um universo de estudos mais complexo e por consequência, ter uma visão
mais holística e sistêmica. O que se vê na maioria das vezes são abordagens neófitas,
visões unilaterais marcadas por raso ou nenhum aprofundamento.
Difícil também é realizar uma abordagem sobre violência sem dissociar do contex-
to urbano. É inexorável a congruência existente entre essas duas variáveis, especialmente
em nosso país. O crescimento urbano desordenado é apontado como uma das principais
causas da violência (GIDDENS, 2001). Em razão do acelerado processo de êxodo rural, as
grandes cidades brasileiras absorveram um número de pessoas elevado, que não foi acom-
panhado pela infraestrutura urbana (emprego, moradia, saúde, educação, qualificação, entre
outros); fato que desencadeou uma série de problemas sociais graves.
Sabe-se, contudo, que a criminalidade não é um “privilégio” exclusivo dos gran-
des centros urbanos, entretanto o seu crescimento é largamente maior do que em cidades
menores. É nas grandes cidades brasileiras que se concentram os principais problemas
sociais, como desemprego, desprovimento de serviços públicos assistenciais, além da
ineficiência da segurança pública. Tais problemas são determinantes para o estabeleci-
mento e proliferação da marginalidade e, consequentemente, da criminalidade que vem
acompanhada pela violência.
Essa é mais uma situação que retrata a ineficiência do Estado. Enquanto o poder
do Estado não se impõe (e não apenas pela força, mas, sobretudo, pela falta de oportuni-
dades que deixa de proporcionar), o crime organizado se institui como um poder parale-
lo, que estabelece regras de ética e conduta própria, além de implantar fronteiras para a
atuação de determinada facção criminosa.
O Brasil possui 16.886 Km de fronteiras secas, dos quais, 7.765 Km com a Co-
lômbia, o Peru e a Bolívia. Segundo Nascimento, et al., (2017), estes países são respon-
sáveis pela quase totalidade (95%) da produção mundial de cocaína. O Estado do Ama-
zonas, localizado no norte do Brasil, possui 1/5 das fronteiras terrestres do país fazen-
do limite com esses países. Como consequência é o maior portal de ingresso de
cocaína no estado brasileiro.
Tal situação, por si só já ensejaria a necessidade que o Estado do Amazonas
possui de cuidado e atenção do poder público para a contenção do tráfico de drogas
na fronteira. Contudo, o que se vê muitas vezes é total descaso. Nascimento et al.,
(2017) enfatizam que dos 21 municípios na Faixa de Fronteira no Estado do Amazo-
nas, 16 apresentam coeficiente com menos de 1 policial para cada 1.000 habitantes,
e assevera que o ingresso de cocaína no Brasil é o fator determinante da violência
em nosso território. Para ele (2017, p. 186):
É inegável a relação entre o tráfico e o abuso de drogas ilícitas e esse quadro de re-
crudescimento da violência letal, marcado também pelo empoderamento das organi-
zações criminosas. Chama a atenção, a relação do tráfico de drogas ilícitas com o
aumento do risco social [...].

200 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Violência Urbana: Direitos Humanos e Questões Sociais

Ao adentrar em território brasileiro a droga encontra um terreno extremamen-


te fértil: um contingente de desempregados e carentes de educação, saúde, esporte,
lazer e demais serviços; menores, adolescentes e adultos pobres e moradores da
periferia tornam-se, dessa forma, presas fáceis nas mãos de poderosos traficantes.
Ao analisar os efeitos dos níveis de renda, do desemprego e da educação e a rela-
ção com a criminalidade, o economista Luiz Tadeu Viapiana conclui:

[...] o nível de renda e o desemprego podem incentivar a opção pelo crime. Quando a ren-
da média do indivíduo é baixa ou nula (desempregado), os benefícios do crime compen-
sam. Para um desempregado, o custo da renda perdida, em termos de tempo de prisão, é
zero. Da mesma forma, o nível de educação da população também afeta os custos de opor-
tunidade dos crimes (VIAPIANA, 2006, p. 39).

Afora as análises da Teoria Econômica do Crime, pela qual nutrimos certa dis-
tância teórica, não nos resta nenhuma dúvida que as condições de pobreza, carência,
exclusão e falta de oportunidades são fatores determinantes que aguçam a criminalidade,
aumentam a violência e entopem as prisões com jovens pobres da periferia.
Também é inegável, sob o ponto de vista dos Direitos Humanos e da Cidadania,
atributos inerentes a cada cidadão, que a uma parcela substancial estejam sendo usurpa-
dos: cada cidadão tem Direito à Cidade, no sentido amplo e generalizante que abrange a
compreensão dos direitos fundamentais, nos planos social e individual, que se efetivam
(ou são negados). Sobre a delimitação do conceito de Direito à Cidade, comentam Ienna-
co e Moura (2016, p. 19):

[...] é o conjunto dos direitos humanos compreendido na perspectiva da “pessoa na/da ci-
dade”. [...] é a abordagem jurídica do urbano e da urbanidade, com toda a gama de direi-
tos e garantias que lhes permeiam o acesso aos bens, produtos, serviços, comodidades e
benefícios que a cidade pode produzir – com o anseio de que a Cidade se realize para to-
dos, sem discriminação.

Os pobres em nossa cidade são expulsos para as periferias. Essa não é uma re-
alidade exclusiva local. Porém, ao analisar o espaço urbano e sua conformação do
ponto de vista do Direito à Cidade nos questionamos da relação entre urbanismo e
criminalidade. Qual seria o impacto nos índices de violência se tivéssemos uma
cidade mais inclusiva, plural e democrática? A falta de planejamento urbano, a de-
sorganização, o crescimento aleatório das grandes cidades, não seriam também res-
ponsáveis pela violência hoje instalada? Por que penalizar apenas os jovens pobres,
encarcerando-os numa prisão, como se os tais fossem os únicos responsáveis pelo
quadro de violência? Por que o Estado, em vez de tratar nossos jovens como culpa-
dos, não os vê, primeiramente como vítimas das desigualdades?
São questões que requerem estudos, aprofundamento e principalmente, res-
postas.
Para Borja (2013, p. 147), o território urbanizado das regiões metropolitanas
é “ao mesmo tempo, uma expressão da desigualdade social e um fator de seu próprio

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 201


Maria Luiza de Andrade Picanço Meleiro

agravamento”. Mas como recorda Silva (2007), a segregação não é apenas um pro-
cesso de separação dos moradores de uma cidade, ela está baseada em desigualdades
maiores, principalmente no que diz respeito a condições sociais. Para a autora, quan-
to mais a cidade cresce, mais se intensifica a segregação: ela cresce e não agrega
todos os moradores de forma semelhante, sua expansão causa a expulsão dos pobres
das regiões mais centrais e os segrega em regiões pouco desenvolvidas.
Mesmo havendo pessoas pobres em toda a cidade, é na periferia que elas se
concentram em maior número. Os níveis de criminalidade estão cada vez maiores e
a qualidade de vida, cada vez pior. É exatamente essa população que necessita de
uma atenção especial por parte do Estado com programas emergenciais que bus-
quem minimizar seus agravos. Sobre o processo de urbanização brasileiro recordam
Iennaco e Moura (2016, p. 87):

Nosso processo de urbanização pode ser resumido por um marcante descompasso en-
tre as matrizes ou ideais que alimentaram a atividade de planejamento urbano e o
rumo tomado pela produção do espaço urbano real, fazendo com que cada grande
cidade acolha, em seu interior, ou na sua periferia, uma outra cidade: a não cidade.
(Grifos do autor).

Para os autores, o papel que cabe a uma Criminologia Urbanística, no contex-


to latino-americano, é o da substituição do “paradigma da cidade” pelo da “não
cidade” – com vistas a uma revisão ecológica do território ocupado pelos excluídos
da cidade, pelo resgate da urbanidade, da Cidadania e dos Direitos Humanos. A
criminologia crítica ancorada nos direitos humanos, por seu turno, permite converter
as relações entre “poder e violência” e “direitos sociais na cidade” em diálogos ins-
truídos por várias perspectivas epistemológicas.
O que se percebe é que a população excluída dos direitos sociais básicos tem
sido seletivamente reprimida, em fenômeno que coincide com a tendência não cri-
minalizadora das ações antissociais das classes hegemônicas. Paradoxalmente, as
regiões degradadas, do ponto de vista dos instrumentos urbanísticos, condensam as
ocorrências de crimes violentos com resultado de mortes, cuja vitimização assim,
atinge quase que com exclusividade a população jovem e pobre marginalizada.
Como nos adverte Ermínia Maricato, a característica marcante dos bairros de
moradia pobre são os altos índices de violência. Estes se referem especialmente aos
jovens e, entre estes aos pardos e negros. Diferentemente do conceito formado na
opinião pública, não é nos bairros de mais alta renda que a violência mostra sua face
mais cruel. Para a autora:

A frequente morte de jovens nas ruas pode ser constatada exatamente em bairros que
apresentam os mais baixos níveis de renda e escolaridade. Não por coincidência, es-
ses bairros constituem regiões marcadas pela ilegalidade (na ocupação do solo e na
resolução de conflitos) e pela precariedade em relação aos serviços públicos e priva-
dos (MARICATO, 2000, p. 164).

202 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Violência Urbana: Direitos Humanos e Questões Sociais

Destacada como a principal metrópole da Região Norte do Brasil, a cidade de


Manaus que, de acordo com o Censo Demográfico de 2010, é o sétimo município do
país em população, está localizada em uma das regiões mais belas e vulneráveis do país.
Além de fazer parte de região de fronteira com os maiores produtores mundiais de coca-
ína, o Estado do Amazonas possui uma bacia hidrográfica que facilita o escoamento das
drogas ilícitas, fazendo de Manaus um grande centro de distribuição e, também de con-
sumo das drogas. Tal quadro traz como uma de suas nefastas consequências o altíssimo
índice de encarceramento experimentado da história. Antes de adentrarmos, porém,
sobre esse tema, faremos breve reflexão sobre prisão, pobreza e exclusão social, no con-
texto da violência urbana.

2 PRISÕES, POBREZA E EXCLUSÃO SOCIAL


Provavelmente, o primeiro relato da separação do corpo social daqueles que, de
alguma forma, cometessem algum delito2, está no livro de Levítico da Bíblia Cristã:

Será imundo durante os dias em que a praga estiver nele; é imundo, habitará só; a sua
habitação será fora do arraial (Levítico 13:46).

A ideia era manter os leprosos em um local segregado da comunidade, onde pu-


dessem ser observados e, de alguma forma, controlados.
Na Antiguidade, desconhecia-se a privação de liberdade total. A prisão dos que
cometiam delito não possuía a natureza de pena; sua finalidade era a preservação da
integridade dos réus até seu julgamento ou execução. Não havia uma arquitetura peni-
tenciária própria, por isso os acusados eram mantidos em diversos lugares até o julga-
mento, como conventos abandonados, calabouços, torres, entre outros.
Nesta época, predominava o Código de Hamurabi ou a Lei do Talião, que possu-
ía como princípio basilar o conhecido “olho por olho, dente por dente”, de base religiosa
e moral vingativa (SOUZA, 2008).
Na Idade Média o crime era considerado um grande “peccatum”. Para São To-
más de Aquino, a pobreza era geralmente uma incentivadora ao roubo. Para Santo Agos-
tinho, a pena de talião significava a justiça dos injustos.

As sanções da Idade Média estavam submetidas ao arbítrio dos governantes, que as impu-
nham em função do “status” social a que pertencia o réu. A amputação dos braços, a
forca, a roda e a guilhotina constituem o espetáculo favorito das multidões deste pe-
ríodo histórico. Penas em que se promovia o espetáculo e a dor, como por exemplo a
que o condenado era arrastado, seu ventre aberto, as entranhas arrancadas às pres-
sas para que tivesse tempo de vê-las sendo lançadas ao fogo. Passaram a uma execu-
ção capital, a um novo tipo de mecanismo punitivo (MAGNABOSCO, 1998, p. 1).

Na Idade Moderna, a pobreza se estendeu por toda Europa e contribuiu para o


aumento da criminalidade, de modo que a pena de morte deixou de ser uma solução

2
No caso, a lepra estava associada ao pecado do homem, segundo a crença cristã da época.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 203


Maria Luiza de Andrade Picanço Meleiro

diante de tanta delinquência. Assim, em meados do século XVI, iniciou-se um mo-


vimento para a criação e construção de prisões organizadas para a correção dos
apenados, com o consequente desenvolvimento das penas privativas de liberdade.
Estas prisões tinham como finalidade reformar os delinquentes por meio do trabalho
e da disciplina. E a prevenção geral era o seu objetivo, uma vez que se pretendia
desestimular outros da vadiagem.
No século XVIII, Cesare Beccaria e John Howard destacaram-se por provo-
car mudanças nas concepções pedagógicas de pena e por combater os abusos e tortu-
ras que se realizavam em nome do direito penal, conforme assinala Almeida:

Cesare Beccaria e John Howard buscaram identificar a pena com uma utilidade, de-
fendendo que o encarceramento só se sustentaria se produzisse algum benefício ao
preso, e não somente a retribuição de mal com outro mal. Com eles tem início o perí-
odo que, por alguns, se convencionou chamar de Humanitário das prisões [...] (AL-
MEIDA, 2006, p. 53).

São lançadas, dessa forma, as raízes do Direito Penitenciário, onde o conde-


nado deixa de ser o objeto da Execução Penal e passa a ter reconhecidos os direitos
da pessoa humana, e surge uma relação de Direito Público entre o Estado e o apena-
do. Um objetivo, dentre outros, é a proteção do condenado, de se respeitar a digni-
dade do homem como pessoa moral.
Contemporaneamente, a partir do impacto de trabalhos como os de Michel
Foucault, autor de fundamental importância para a construção de novas formas de
pensar a punição no âmbito da teoria social contemporânea, a questão da punição
ganha destaque nos debates da teoria social no século XX. Em Vigiar e Punir, Fou-
cault estuda as transformações das práticas penais na França, da época Clássica ao
século XIX.
Para Foucault, na Modernidade, o objeto do ato de punir desloca-se do corpo
para a alma do detento. Tanto a violência como a disciplina visam conformar um ser
humano dócil e que ocupe um lugar predeterminado na sociedade. É sobre o corpo
que a microfísica do poder atua para conseguir seus intentos. Ele explica como, na
sociedade capitalista, a prisão evolui de um aparelho marginal ao sistema punitivo, a
uma posição de centralidade como aparelho do controle social promovido pela sin-
gularidade do panóptico, modelo arquitetônico idealizado por Jeremy Bentham, cujo
principal efeito é “induzir no detento um estado consciente e permanente de visibili-
dade que assegura o funcionamento automático do poder” (FOUCAULT, 2007, p.
177). O panóptico é também o princípio de uma nova tecnologia do poder (panopti-
cismo), “um sistema de vigilância geral que se instaura na sociedade, estendendo-se
desde as prisões até as fábricas, as escolas, os hospitais, os asilos, etc.” (BEN-
THAM, 2009, p. 17).
Para Foucault (2007), a prisão:

Se constituiu fora do aparelho judiciário, quando se elaboraram, por todo o corpo


social, os processos para repartir os indivíduos, fixá-los e distribuí-los espacialmente,

204 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Violência Urbana: Direitos Humanos e Questões Sociais

classificá-los e tirar deles o máximo de tempo, e o máximo de forças, treinar seus


corpos, codificar seu comportamento contínuo, mantê-los numa visibilidade sem la-
cuna, formar em torno deles um aparelho completo de observação [...]. (FOU-
CAULT, 2007, p. 195).

Importantes teóricos da Sociologia, Filosofia, do Direito escreveram sobre os


diversos aspectos relacionados à prisão e seus conceitos (DURHAM, 1988; ADOR-
NO, 1993; SANTOS, 2018; GARLAND, 1999; CASTELLS, 1999; SALLA, 2001;
SPOSITO, 2001; WACQUANT, 2001; DE GIORGI, 2006, FOUCAULT, 2007;
SOUZA, 2008; BEATO FILHO, 2012; ZALUAR, 2002). E nos parece que há um
fato de razoável concordância, pelo menos entre a maioria deles: a evidência da
estreita relação entre a exclusão social e a prisão. Diversos grupos sociais e minori-
as, tais como pobres, negros, mulheres, ciganos, moradores de rua, homossexuais, ao
longo da história sofrem as mais variadas formas de exclusão. Nosso modelo eco-
nômico de mercado, que objetiva a mais-valia do trabalho, estimula a ampliação das
diferenças sociais (indispensável para criar necessidades e propiciar mão de obra
barata para o modelo). Nesse sentido, conforme afirma Wacquant:

Uma política de criminalização da miséria que é complemento indispensável da im-


posição do trabalho assalariado precário e sub-remunerado como obrigação cívica, as-
sim como o desdobramento dos programas sociais num sentido restritivo e punitivo que
lhe é concomitante. (2001, p. 96).

Dessa forma, o surgimento da prisão como instrumento da exclusão é uma con-


sequência lógica desse modelo. Segundo Costa, et al., (2013, p. 3).

Esta relação entre a prisão e a realidade social de exclusão, aparece muito clara no texto
de Wacquant (2001), que mostra que quando o Estado perde ou diminui seu poder sobre a
sociedade, ele se apodera da área penal para continuar exercendo controle sobre os po-
bres. Esse retrato se enquadra naquilo que chamamos da passagem de um Estado Social
para um Estado Penal, dito de outro modo, o Estado torna-se mínimo para as questões so-
ciais e máximo para a questão penal.

A prisão, então, se conforma como um retrato fiel da sociedade: excludente, ego-


ísta, onde predomina a “ausência” do Estado, punitiva e onde os direitos humanos não
são respeitados. Na esteira dessa filosofia, o sistema prisional brasileiro, e por conse-
quência, e do Estado do Amazonas configura-se, portanto, como um espaço medieval,
ilegal e de desigualdade, de violência contra os mais pobres e excluídos.

3 A VIOLÊNCIA NOS PRESÍDIOS: MAIS INSEGURANÇA PÚBLICA


O ano de 2017 iniciou com um episódio de grande violência no sistema prisional
amazonense. As rebeliões, tão contumazes no cenário nacional, dessa vez trouxeram à
lembrança a pior tragédia ocorrida no país: o massacre do Carandiru, em São Paulo, no
ano de 1992.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 205


Maria Luiza de Andrade Picanço Meleiro

No entanto, diferentemente do ocorrido em São Paulo, onde as mortes se deram


predominantemente pela ação da polícia, naquele ano, mais de 100 detentos foram assas-
sinados em chacinas comandadas por facções criminosas em guerra, dentro de presídios
brasileiros. Em Manaus, o Complexo Penitenciário Anízio Jobim, (COMPAJ), foi palco
em janeiro de 2017 do que se considera a maior rebelião ocorrida no Estado do Amazo-
nas, que resultou em 56 mortes.
As ordens para realização dos crimes, teriam partido dos presídios federais, onde
estão as principais lideranças do tráfico de drogas e armas no Brasil. O cenário de guerra
urbana localizada evidenciou que o controle das instituições penais, não estava nas mãos
do Estado, mas, nas mãos das facções; e que as cadeias superlotadas, na verdade, não
recuperam detentos, mas transformaram-se em verdadeiros sistemas de agenciamento e
escritórios do crime organizado. Em maio de 2019, mais 55 pessoas foram mortas, em
outra rebelião, no mesmo presídio, em Manaus.
Conforme dados do Infopen, em 2016 o Brasil chegou a 726,3 mil presos (BRA-
SIL, 2019). Hoje, esse número supera 812.564 pessoas, segundo o Banco de Monitora-
mento de Prisões do Conselho Nacional de Justiça (número atingido em 17.07.2019) –
(CNJ, 2018).
Os dados mostram que, do total da população carcerária, 41,5% (337.126) são
presos provisórios – pessoas ainda não condenadas, que convivem, muitas vezes, no
mesmo ambiente. Ainda há, em todo o país, 366,5 mil mandados de prisão pendentes de
cumprimento.
A linha do tempo do sistema prisional, obrigatoriamente nos leva ao ano de 2009,
quando a 3ª Sessão Legislativa da Câmara dos Deputados apresentou o Relatório da
Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) com a finalidade de investigar a realidade do
Sistema Carcerário Brasileiro. O relatório de 615 páginas retrata uma dura realidade com
destaque para a superlotação dos presídios, os custos sociais e econômicos dos estabele-
cimentos penais, a reincidência, a violência dentro das unidades, a corrupção, o crime
organizado e suas ramificações nos presídios, como aponta o trecho abaixo:

[...] deparamos-nos, ainda, com a insegurança que vem dos estabelecimentos penais, de
onde grupos organizados controlam e manipulam a massa de presos pobres e despolitiza-
dos, e de lá comandam uma rede de subordinados e aliados na prática dos mais variados
ilícitos (Brasil, 2009, p. 15).

Numa retrospectiva, o relatório da dita CPI destaca o avanço da criminalidade a


partir de 1980 gerado pelo tráfico de drogas e armas, descreve a variedade de crimes,
como roubo de carga, assaltos a bancos e empresas de valores, roubo de veículos e lava-
gem de dinheiro, além da previsão da elevação da população carcerária, caso não fossem
adotadas políticas públicas preventivas.
A partir de dados do Infopen, verificamos que a população carcerária desde 1992
apresenta-se crescente. A partir do ano 2000, (Quadro 1) a uma média estimada de
7,55%, mas houve ano em que o percentual de crescimento atingiu quase 29%.

206 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Violência Urbana: Direitos Humanos e Questões Sociais

Quadro 01 – Aumento da População Carcerária no Brasil

Sistema Penitenciário Brasileiro


Ano n. de presos Percentual Cresc. absoluto
2000 232.755 - -
2001 233.859 0,5% 1.104
2002 239.345 2,3% 5.486
2003 308.304 28,8% 68.959
2004 336.358 9,1% 28.054
2005 361.402 7,4% 25.044
2006 401.236 11,0% 39.834
2007 422.590 5,3% 21.354
2008 451.219 6,8% 28.629
2009 473.626 5,0% 22.407
2010 496.251 4,8% 22.625
2011 514.582 3,7% 18.331
2012 548.003 6,7% 33.421
2013 581.507 6,11% 33,504
2014 622.202 6,99% 40.695
2015 698.600 12,28% 76.398
2016 726.712 4,02 28.112
Fonte: Adaptado do Ministério da Justiça/INFOPEN. BRASIL, 2019

Segundo projeções do relatório Infopen, em 2022 o Brasil poderá alcançar a


marca de 1 milhão de presos. Ainda, para o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a
população carcerária do Brasil é bem maior, quando se consideram aqueles detentos
que estão em prisão domiciliar.
O Plano Nacional de Política Criminal e Penitenciária – 2015, documento
que fixa diretrizes em atendimento ao art. 64, incs. I e II da Lei 7.210, de 11.07.1994
(Lei de Execução Penal) – , aborda os problemas e o que tem levado ao atual qua-
dro, em que ocorre o crescimento contínuo da população carcerária, sem todavia,
haver percepção de melhoria dos indicadores de segurança pública.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 207


Maria Luiza de Andrade Picanço Meleiro

4 DIREITOS HUMANOS E GARANTIAS LEGAIS NA EXECUÇÃO DA


PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE
Podemos afirmar que o controle penal, a forma como se mantém e como são
tratados os prisioneiros, é um termômetro de como são observados os direitos hu-
manos em determinada sociedade. As medidas imediatas de controle predominantes
são respostas de um sistema que busca resolver tudo por meio da punição.
Importante evidenciar a questão dos direitos humanos do preso que estão
previstos em diversos estatutos legais. Internacionalmente existem várias conven-
ções, como a Declaração Universal dos Direitos Humanos, e a Declaração America-
na de Direitos e Deveres do Homem, das quais o Brasil é signatário. Além disso, os
apenados, mesmo sendo criminosos, não perdem garantias constitucionais e legais
previstas durante a execução da pena.
Na legislação específica – a Lei de Execução Penal – os incs. de I a XV do
art. 41, dispõem sobre os direitos infraconstitucionais garantidos ao sentenciado no
decorrer da execução penal.
Sob o aspecto legislativo, nosso estatuto executivo penal é tido como um dos
mais avançados e democráticos existentes. Parte do pressuposto de que a execução
da pena privativa de liberdade tenha por base o princípio da humanidade, e qualquer
modalidade de punição desnecessária, cruel ou degradante será considerada de natu-
reza desumana e contrária ao princípio da legalidade. Além disso, estabelece como
princípio a ressocialização do apenado, e prevê mecanismos para que o mesmo pos-
sa ser reintegrado à sociedade.
Contudo, o que ocorre na realidade é a constante violação de direitos do ape-
nado e a total inobservância das garantias legais a ele previstas. Ao passar para a
tutela do Estado, perde-se não apenas o direito à liberdade, mas diversos direitos
fundamentais, não alcançados pela sentença condenatória. Sofre-se um tratamento
absolutamente condenável e os mais variados tipos de castigos, que contribuem para
a degradação de sua personalidade, perda da dignidade, opressão e estado de medo,
numa trama que não oferece qualquer possibilidade para seu eventual retorno, de
forma útil e equilibrada, ao convívio social. As prisões têm sido a resposta para a
ausência de políticas públicas, não apenas na segurança pública, mas em outras
áreas, e se tornado espaço para tortura, desigualdade social, supervalorização do
capital e repressão estatal (CASTELLS, 1999; ZALUAR, 2002; TANGERINO,
2007; MOURA, 2014; SANTOS, 2018).
É comum vermos nos noticiários denúncias do apenado sofrer torturas, agres-
sões físicas e psicológicas, não apenas por parte de outros presos, membros das
chamadas facções criminosas, como também dos próprios agentes prisionais.
Tais práticas cometidas por agentes prisionais e policiais acentuam-se, prin-
cipalmente após rebeliões e tentativas de fuga. Mesmo após serem dominados, os
amotinados sofrem a chamada “correição”, que nada mais é do que o espancamento
que se segue à contenção dessas insurreições, que tem a natureza de castigo. Isso
ocorreu recentemente, quando da última rebelião no Compaj, em Manaus, em maio

208 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Violência Urbana: Direitos Humanos e Questões Sociais

de 2019, onde algumas dessas atrocidades foram gravadas em vídeos, e estes, am-
plamente divulgados nas redes sociais.
Muitas vezes há excessos, e o espancamento termina em execução, como no
caso, já citado, do “massacre” do Carandiru em São Paulo, no ano 1992, no qual
oficialmente foram executados 111 presos.
Entre os próprios presos a prática de atos violentos e a impunidade ocorrem
de forma ainda mais exacerbada. Homicídios, abusos sexuais, ameaças, espanca-
mentos e extorsões são uma prática comum dentro do ambiente prisional. Num am-
biente como este, é fácil compreender a proliferação das facções criminosas: para se
ver “protegido” dentro do cárcere, o apenado se filia à facção que domina o presídio.
Do contrário, sofrerá as agruras de não fazer parte da “família”. Uma vez dentro da
facção é obrigado a praticar os mais diversos “serviços” à mesma, tais como, roubos
e assassinatos, bem como contribuir para a manutenção de seus líderes. Interessante
também evidenciar um outro aspecto do comportamento do preso: estão lá por não con-
seguirem amoldar seu comportamento às regras de boa convivência da sociedade; no
entanto, a prisão, obrigatoriamente, molda esse comportamento. É impressionante como,
dentro da prisão, as pessoas adotam comportamentos muito mais restritos e difíceis. Caso
contrário, a punição é certa.
Sabidamente, o Poder Judiciário é lento em nosso país. Diariamente, vemos notí-
cias relativas à demora dos processos, não apenas na esfera cível, mas sobretudo na
esfera penal. Essa morosidade da justiça também contribui para o quadro do sistema
penal, uma vez que a demora em se conceder os benefícios àqueles que já fazem jus à
progressão de regime, ou em soltar os presos que já cumpriram sua pena, ou em defender
os direitos dos apenados, contribui para que a população carcerária não tenha o decrés-
cimo que deveria. Outro fato alarmante que fere os Direitos Humanos e Cidadania é o
número cada vez mais crescente de presos provisórios nos presídios. Pessoas que ainda
nem foram condenadas tratadas como se fossem; sofrendo todos os dissabores e incle-
mências do Sistema Penal decadente.
A ineficácia dos órgãos responsáveis pela execução penal pode configurar cons-
trangimento ilegal o que ensejaria, eventualmente, a responsabilidade civil do Estado, ao
manter encarcerados com evidente excesso de prazo.
Não podemos nos esquecer, ainda, da Defensoria Pública, sobrecarregada com as
mais variadas causas cíveis e ainda encarregada da defesa dos acusados que não têm
condições de pagar a um advogado. Quando verificamos que mais de 95% dos que estão
presos hoje são definidos como pobres, podemos compreender o qual hercúleo é o traba-
lho desse importante órgão de justiça.
Além desses, podemos também citar a superlotação, a falta de atividade, a ausên-
cia de assistência à saúde, educação e assistência social como exemplos claros da viola-
ção de direitos e das garantias legais daqueles que estão sob a custódia do Estado.
Destaque-se também, que o presente Artigo, não tem como premissa a visão ro-
mântica e equivocada, de que todos os apenados “são bons”, ou que devemos nos preo-
cupar apenas com os criminosos, enquanto as vítimas, na maioria das vezes, clamam por
justiça. A realidade é que buscamos provocar uma reflexão ao descrever e analisar algu-

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 209


Maria Luiza de Andrade Picanço Meleiro

mas das nuances do sistema penitenciário sob a ótica da legalidade, dos Direitos Huma-
no e da Cidadania, princípio fulcral do Estado de Direito. Além disso, não se pode perder
de vista a instrumentalidade da Lei de Execuções Penais cujo objetivo maior é a resso-
cialização e reinclusão no meio social, com o objetivo de obter-se a pacificação social.
Não defendemos que os criminosos não devam ser devidamente apenados; de-
fendemos que o cumprimento da pena se dê dentro do que prevê a legislação, fruto da
discussão com a sociedade e gestada por seus representantes. Não existe em nosso país,
pena de morte, pena de tortura, penas degradantes, de violência, de humilhação e coisas
do gênero. Quando o Estado não cumpre seu papel de fazer e de, sobretudo, ele mesmo
cumprir a legislação, batemos às portas da barbárie social. Na verdade, muito próximo
do que enfrentamos hoje.
Porém, mais importante que atuar na consequência urge a necessidade de pensar
nas causas: Por que as prisões estão superlotadas de tantos jovens pobres da periferia? O
que falar do Princípio da coculpabilidade que envolve o Estado?
O panorama apresentado evidencia que estamos numa trajetória trágica, onde as
perspectivas não são as melhores: aumento da população carcerária sem diminuição da
criminalidade, alto índice de reincidência prisional, multiplicação e fortalecimento das
facções criminosas, aumento da demanda por gastos com prisões, desrespeito sistemático
aos direitos humanos e violação do estado de direito.
De igual forma, também não podemos deixar de questionar: o que de fato não
tem dado certo em nosso modelo de sociedade? No que temos errado em nosso processo
civilizatório?

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Concordamos com Santos (2018), quando sustenta que no Brasil há uma distân-
cia abissal entre o que está pactuado nos documentos de proteção aos direitos humanos
com a realidade apresentada na sociedade, no trato com os mais pobres e necessitados e,
também em nossos presídios. As prisões têm sido a resposta para a ausência de políticas
públicas e se tornado espaço para tortura, desigualdade social e repressão estatal (TAN-
GERINO, 2007; SANTOS, 2018).
Também corroboram com tal pensamento Iennaco e Moura (2016, p. 90), quando
afirmam: “[...] o Direito Penal em sociedades marcadas pela desigualdade, é um Direito
Penal desigual, que cumpre inversa e paradoxalmente, o aperfeiçoamento de mecanis-
mos excludentes”. O sistema penal brasileiro reflete os valores vigentes em nossa socie-
dade, torna-se uma ferramenta ideológica, reflete a ideologia política, sociológica e filo-
sófica da classe dominante. Na mesma linha, Zaffaroni e Pierangeli sustentam: “[...] o
direito é sempre expressão do poder da classe dominante, que impõe seus valores do
bem e do mal às classes dominadas” (1997, p. 248). E ainda:

O criminoso é simplesmente aquele que se tem definido como tal, sendo esta definição
produto de uma interação entre o que tem o poder de etiquetar (´teoria do etiqueta-
mento ou labelling theory´) e o que sofre o etiquetamento, o que acontece através de
um processo de interação, de etiquetamento ou de criminalização. (1997, p. 320).

210 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Violência Urbana: Direitos Humanos e Questões Sociais

O Direito torna-se, portanto, instrumento para manter e perpetuar a estrati-


ficação de classes sociais. O Direito Penal e o sistema penal, como instrumentos
de controle social, muito embora apresentados como sendo de natureza igualitária,
que visam alcançar igualmente as pessoas, em função de suas condutas, na verda-
de selecionam, marginalizam e excluem, cada vez mais, os menos favorecidos
financeiramente, pois não se encaixam no modelo idealizado. Uma forma de se
obter o poder, numa visão panóptica que se centra na vigilância como adestramen-
to do corpo para alcançar a educação da alma, exatamente como preceitua Michel
Foucault, aqui já citado.
Prevalece o velho ditado: segregar os que incomodam.
A não cidade (cidade esquecida ou informal) abriga os não cidadãos (os
excluídos da cidade formal). O modelo de cidade excludente, como é o nosso,
distribui, desigual e seletivamente, a morte violenta em seu território. O Estado
tem sido omisso na implementação de políticas urbanas diferenciadas que priori-
zem a proteção da vida da população vulnerável – especialmente a juventude po-
bre que habita as zonas excluídas da cidade, os desprovidos do Direito à Cidade,
ainda que habitem em seu espaço territorial. Aos excluídos pouco lhes resta. E o
encarceramento é um destino possível.
Todavia, a pena privativa de liberdade não se revela como remédio eficaz
para ressocializar o homem preso. Não no modelo hoje existente. Os dados da
reincidência dos criminosos oriundos do sistema carcerário comprovam essa reali-
dade. Embora não haja números oficiais, calcula-se que, no Brasil, em média, 90%
dos ex-detentos que retornam à sociedade voltam a delinquir, e, consequentemen-
te, acabam retornando à prisão (VIAPIANA, 2016; IENNACO & MOURA, 2016;
HAN, 2018).
Essa realidade é um reflexo direto do tratamento e das condições a que o
condenado foi submetido no ambiente prisional, durante o seu encarceramento,
além do sentimento de rejeição, etiquetamento e de indiferença sob o qual ele é
tratado pela sociedade e pelo próprio Estado ao readquirir sua liberdade. O estig-
ma de ex-detento e total desamparo pelas autoridades fazem com que o egresso do
sistema carcerário se torne marginalizado no meio social, o que acaba levando-o
de volta ao mundo do crime, muitas vezes, por falta de melhores opções.
Por fim, também temos a compreensão que, pelo fato de estarem totalmente
inter-relacionados, dentro de uma mesma conjuntura, a falência do sistema prisio-
nal e nosso modelo econômico, não há uma expectativa de melhoria do sistema
penitenciário e nem uma redução dos índices de criminalidade se não forem revis-
tos o modelo de política econômica e social atualmente implementados pelos go-
vernantes de nosso país. Questões como Segurança Pública, Cidadania e Direitos
Humanos não comportam soluções mágicas ou fáceis, frutos de análises superfici-
ais ou de conveniências externas que levem em consideração somente as conse-
quências da violência.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 211


Maria Luiza de Andrade Picanço Meleiro

REFERÊNCIAS
ADORNO, Sergio, “A criminalidade urbana violenta: um recorte temático”, BIB – Revista Brasileira de
Informação Bibliográfica em Ciências Sociais, Rio de Janeiro, Anpocs, n, 35, pp. 3-242, 1993.
ALMEIDA, Janaina Loeffler de, Os limites e as potencialidades de uma ação profissional emancipatória
no sistema prisional brasileiro, Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal de Santa Catarina, Centro
Sócio Econômico, Programa de Pós-graduação em Serviço Social, Florianópolis, 2006.
BEATO-FILHO, Claudio Chaves, Crimes e Cidades, Belo Horizonte, UFMG, 2012.
BENTHAM, Jeremy, “Panóptico”, (1748-1832). in MATTELART, ARMAND, Un Mundo vigilado,
Gilles Multigner, (Trad). Paidós, Estado y Sociedad 161, Barcelona, 2009, p. 17.
BÍBLIA. Levítico, Leis a respeito de doenças da pele, 13: 46. Português. Bíblia Sagrada, 35 ed., Tradu-
ção da Vulgata pelo Padre. Matos Soares, Paulinas, 1979.
BORJA, JORDI, REVOLUCIón Urbana y derechos ciudadanos, Barcelona, Alianza Editorial, 2013.
BRASIL, Congresso Nacional, Câmara dos Deputados, “Comissão Parlamentar de Inquérito do Sistema
Carcerário – CPI sistema carcerário”, 620 p. Série ação parlamentar n 384 1, Brasília, Câmara dos Depu-
tados, Edições Câmara, 2009.
BRASIL, Ministério da Justiça E Segurança Pública, “Levantamento Nacional de informações penitenciá-
rias” – atualização junho de 2017, Infopen, org. Marcos vinícius Moura, Departamento Penitenciário
Nacional, 2019, Disponível em: <http://depen.gov.br/DEPEN/depen/cnpcp>. Acesso em: 29.09.2019.
CÁRCOVA, Carlos María, La opacidad del derecho, Madrid, Trotta, 1998.
CASTELLS, Manuel, Fim do Milênio: a era da informação: economia, sociedade e cultura, v. 3, 3ªed.,
São Paulo, Paz e Terra, 1999.
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ), Banco Nacional de Monitoramento das Prisões – BNMP
2.0, “Cadastro Nacional de Presos”, CNJ, Brasília, agosto de 2018.
COSTA, Aurenir Marinho et al, “Pobreza e prisão: contextualização e uma análise sobre o perfil das
mulheres do presídio Júlia Maranhão”, Ufpb, 2013, Disponível em: <http://www.prac.ufpb.br/enex/
trabalhos/3CCJDIPFLUEX2012339.pdf>, Acesso em: 06 0ut. 2019.
DE GIORGI, Lona Aniyar, Pensamento Criminlógico: resumo gráfico e seu reflexo institucional, Man-
damentos, Belo Horizonte, 2004.
DURHAM, Eunice, “A Sociedade vista da periferia”, In KOWARICK, Lúcio (org.), As lutas sociais e a
cidade, São Paulo, Paz e Terra, 1988.
FOUCAULT, Michel, Vigiar e Punir: o nascimento da prisão, tradução de Raquel Ramalhete, 34 ed.,
Petrópolis, Vozes, 2007.
GARLAND, David, Castigo y sociedad moderna. Un estudio de teoría social, Traducción Berta Ruiz de
La Concha, México, Siglo XXI editores s.a., 1999.
GIDDENS, Anthony, As consequências da modernidade, Unesp, São Paulo, 1991.
HAN, Byung-Chul, Tipología de la violencia, Helder, Buenos Aires, 2018.
IENNACO, Rodrigo; MOURA, Grégore, A Criminologia da não cidade: um novo olhar urbanístico para
o território da pobreza, Belo Horizonte, D’Plácido, 2016.
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE), Censos Demográficos, de
2000 a 2010, Disponível em: <www.ibge.gov.br>, Acesso em: 16 jan. 2020.
MAGNABOSCO, Danielle, “Sistema penitenciário brasileiro: aspectos sociológicos”, Revista Jus Navi-
gandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 3, n 27, 23 dez 1998, Disponível em: https://jus.com.br/
artigos/1010, Acesso em: 30 jun 2019.
MARICATO, Ermínia, “As Ideias fora do lugar e o lugar fora das ideias: Planejamento urbano no Brasil”,
in ARANTES, Otília et al., (org.). A cidade do pensamento único: desmanchando consensos, Petrópolis,
Vozes, 2000.
MOURA, Grégore Moreira de, Do princípio da co-culpabilidade, Belo Horizonte, D’Plácido, 2016.

212 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Violência Urbana: Direitos Humanos e Questões Sociais

NASCIMENTO, Antônio Gelson de Oliveira, JANUÁRIO, Jatniel Rodrigues, SPOSITO, Mauro, Segu-
rança Pública no Brasil: o Amazonas em perspectiva, Manaus, UEA Edições, 2017.
SALLA, Fernando, “Rebeliões nas prisões brasileiras”, Serviço social e sociedade, v. 67, pp. 18-37, 2001.
SANTOS, Raquel, “Criminalização da pobreza: uma reflexão sobre o sistema prisional brasileiro na
sociedade capitalista”, Anais do Congresso Internacional de Direito Público dos Direitos Humanos e
Políticas de Igualdade, v 1, n 1, 2018.
SILVA. Keli de Oliveira, “A periferização causada pela desigual urbanização brasileira”, in Revista
Urutuaga – Revista Acadêmica Multidisciplinar (DEC/UEM), n.11, dez/mar 2007, Maringá. Disponível
em: <http://www.urutuaga.uem.br/011/11silva.htm>. Acesso em: 19 jan. 2020.
SOUZA, Marcelo Lopes, Fabópole: o medo generalizado e a militarização da questão urbana, Rio de
Janeiro, Bertrand Brasil, 2008.
SPOSITO, Marilia Pontes, “Um breve balanço da pesquisa sobre violência escolar no Brasil”, Educ Pesq
[online], 2001, v. 27, n. 1, pp. 87-103. ISSN 1517-9702. Disponível em: <http://dx.doi.or
g/10.1590/S1517-97022001000100007>. Acesso em: 20 mar 2019.
TANGERINO, Davi de Paiva Costa, Crime e cidade: violência urbana e a escola de Chicago, Rio de
Janeiro, Lumen Juris, 2007.
VIAPIANA, Luiz Tadeu, Economia do Crime: uma explicação para a formação do criminoso, Porto
Alegre, AGE, 2006.
WACQUANT, Loic, As Prisões da miséria, Rio de Janeiro, Jorge Zahar, 2001.
ZAFFARONI, Eugênio Raúl, PIERANGELI, José Henrique, Manual de direito penal brasileiro: parte
geral, São Paulo, Revista dos Tribunais, 1997.
ZALUAR, Alba, “Violência: questão social ou institucional”. In OLIVEIRA, Nilson Viera, Org., Insegu-
rança Pública, São Paulo, Nova Alexandria, 2002.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 213


Violência Urbana: Direitos Humanos e Questões Sociais

Capítulo 02

DIREITO PÚBLICO

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 215


Violência Urbana: Direitos Humanos e Questões Sociais

EL ACOSO ESCOLAR DESDE LA


PERSPECTIVA PROCESAL
BULLYING FROM THE PROCEDURAL
LAW PERSPECTIVE
DOI: 10.19135/revista.consinter.00011.09
Recibido/Received 07.08.2020 – Aprobado/Approved 05.10.2020
Nancy Carina Vernengo Pellejero1 – https://orcid.org/0000-0002-5107-6457
E-mail: nancyxxii@icab.cat

Resumen: El bullying o acoso escolar continúa representando uno de los principales


problemas a los que han de enfrentarse nuestros jóvenes en la actualidad. De hecho, y
aunque se está intentando dotar a la Administración, a todos los niveles, de medios
suficientes para luchar contra esta problemática, somos testigos de frecuentes casos de
flagrante violencia, que nos hacen cuestionarnos si las medidas que se están adoptando
son suficientes. Este estudio tiene por objeto el análisis del acoso escolar desde una
perspectiva eminentemente procesal, pero sin obviar otros aspectos imprescindibles para
entender este fenómeno. Para ello, no solo nos aproximaremos a la regulación del
proceso penal de menores y las posibles consecuencias que de él pueden derivarse; sino
que también nos fijaremos en aquellos elementos propios de la psicología y que, en
cierto modo, pueden ayudarnos a desenmarañar el posible origen de estas situaciones y
sus secuelas sobre las víctimas.
Palabras-clave: Bullying – Responsabilidad civil y penal – Procedimiento judicial –
Prueba
Abstract: Bullying still represents one of the main problems that our young people have
to face today. In fact, and although an attempt is being made to provide the
Administration, at all levels, with enough items to fight against it, we know frequent
cases of flagrant violence, which make us questioning whether the measures being
adopted are good enough. The purpose of this study is to analyze bullying from an
eminently procedural perspective, but without ignoring other essential things to
understand this phenomena. To achieve our objective, we will not only approach the
regulation of the criminal process of minors and its possible consequences; but we’ll
also pay attention at all those elements of psychology that can help us reveal the possible
origin of these situations and their consequences on the victims.
Keywords: Bullying – Criminal liability and compensation – Trial – Evidence
Sumario: Introducción. 1. Las aulas y el acoso escolar (o bullying). 2. El acosador y su
víctima: la responsabilidad civil y penal en los casos de bullying. 3. Algunos apuntes
sobre las especialidades de los procesos por acoso escolar ante los Juzgados de Menores.
4. La sociedad frente al bullying: concienciación y educación. 5. A modo de conclusión.

1
Profesora asociada de Derecho procesal de la Universitat de Barcelona. Investigadora del Observatorio de
los Sistemas Europeos de Previsión Social Complementaria. Investigadora del REDCID. Abogada. E-mail:
nancyxxii@icab.cat

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 217


Nancy Carina Vernengo Pellejero

INTRODUCCIÓN
La sociedad actual acusa el agravio de una dolorosa lacra que inunda nuestras
aulas y golpea sin piedad a niños y adolescentes: el acoso escolar o bullying. No
resulta sencillo describir el sufrimiento que un niño/niña puede llegar a padecer,
cuando aquellos con los cuales debería compartir juegos o confidencias, se
convierten en sus torturadores con aparente impunidad. Sin embargo, la alarma
social que se ha derivado de algunos casos especialmente sangrantes, parece haber
hecho despertar de su letargo tanto a la sociedad, como a la Administración de
justicia, provocando una creciente concienciación sobre este problema. A pesar de
ello, los medios de los que disponemos no están impidiendo que estas situaciones de
abuso y violencia entre los jóvenes continúen produciéndose (a veces con
consecuencias fatales para la víctima); lo que nos aboca a preguntarnos si, aparte del
rol que juegan la Administración de Justicia y otros agentes sociales ante el
conocimiento de un caso, existe una auténtico compromiso de todos los implicados
(incluyendo a los progenitores o tutores de los menores), por evitar la reiteración
delictiva y la reparar el mal causado a las víctimas y, por extensión, a la sociedad.

1 LAS AULAS Y EL ACOSO ESCOLAR (O BULLYING)


Describir el acoso no es tarea fácil. No lo es si lo analizamos desde un punto
de vista eminentemente técnico o científico; pero tampoco si lo observamos desde la
perspectiva judicial. Largo ha sido el camino hasta llegar a cierto consenso en torno
a esta cuestión. Como resulta lógico pensar, debemos tener en cuenta que no cabe
establecer un modelo estándar al tratar el tema del acoso en sus distintos ámbitos (no
es lo mismo hablar del acoso sexual, que del acoso inmobiliario2). Sin embargo, y
con independencia de los distintos matices que presenta cada modalidad
independiente de acoso, sabemos que todas ellas incorporan elementos comunes que
se reproducen en cada situación a la que consideramos propiamente “acosadora” o
“de acoso”, y que han ayudado a delimitar ese concepto en toda su extensión.
En el caso concreto del acoso escolar (o bullying), podemos aventurarnos a
considerarlo como cualquier tipo de ataque físico o psicológico, continuado y
reiterado, sobre un/a niño o adolescente, y cuya intención es perjudicarle o causarle
un daño3. Conviene remarcar, no obstante, que al igual que podemos observar en
otras modalidades de acoso, a la hora de hablar de acoso escolar la jurisprudencia
exige que esta situación se suceda de forma reiterada en el tiempo, con
independencia de la intensidad que revistan los ataques4. De este modo, para que el

2
No podemos negar, sin embargo, que algunas modalidades de acoso presentan un modelo híbrido, como es
el caso del acoso laboral, donde también pueden darse situaciones de acoso sexual, lo que agrava más si
cabe la sensación de desasosiego y ansiedad de la víctima que lo padece.
3
Sobre este particular, coincidimos con el concepto dado, entre otros, por DOS PAZOS BENÍTEZ, G. “El
Bullying en los centros escolares”, en: Los delitos de acoso moral (Coord. por Luis Lafont Nicuesa),
Valencia, Tirant lo Blanch, 2017, p. 19.
4
Como se apunta en la Sentencia 91/2011, del JPI n. 44 de Madrid, de 25 de marzo (AC/2011/466), conviene
recordar que: “Por su parte la SAP de Madrid 611/10 de 15 de noviembre señala que “El “bullying” es un
fenómeno que ha sido objeto de observación en fechas relativamente recientes (finales de los años 70 y

218 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


El Acoso Escolar Desde la Perspectiva Procesal

bullying sea apreciado como tal, no es necesario que se trate de conductas


especialmente violentas o que hayan causado un grave daño físico o psicológico sobre la
víctima, pero sí que se trate de una conducta repetida y que se produzca con cierta
continuidad en el tiempo. Los ataques aislados no son considerados como acoso en sí
mismos, aunque ello no impide que sean conductas punibles. Sin duda, quien somete a
acoso a otra persona, lo hace con la intención de dañar o mermar la voluntad de su
víctima, y para ello no siempre basta con un incidente aislado, sino que se requiere de un
ataque continuo a la intimidad y la integridad física y psicológica de la víctima, limitando
incluso su libertad deambulatoria y sus hábitos5. Teniendo en cuenta que en el bullying
tanto el acosador como su víctima son menores, la situación se torna especialmente
compleja, ya que nos encontramos ante personas muy jóvenes que aún se encuentran en
pleno desarrollo de su personalidad y, en consecuencia, debemos atajar el problema antes
de que, por una parte, se causen graves secuelas en la víctima; y por otra, el acosador
continúe reproduciendo este comportamiento lesivo (perjudicándose con ello a sí
mismo), o decida actuar de forma más violenta.
Cuando hablamos en términos del bien jurídico protegido, y ante la ausencia
de un delito específico de acoso escolar, hasta el año 2015 era de aplicación la
regulación prevista en el art. 173.1 CP, dentro de los delitos contra la integridad
moral. Posteriormente, y tras la reforma instaurada por la LO 1/2015, los delitos de
acoso pasaron a ser regulados en el art. 172 ter CP, que comprende los tipos de
stalking, bullying o ciberbullying.
Teniendo en cuenta que tanto la normativa nacional, como internacional, se
han encargado de prever la protección de los menores y su derecho a recibir educación
en un entorno sostenible y de diálogo (como se proclama en el art. 28 de la Convención
Internacional sobre los Derechos del Niño de 1989)6, es inevitable preguntarse por qué a

principios de los 80) fundamentalmente en países del norte de Europa, y puede ser definido como una
conducta de persecución física y/o psicológica intencionada y reiterada o repetida por algún tiempo. Es así
preciso que la parte actora acredite cumplidamente la situación de acoso mantenido, para determinar si la
actuación del Centro Escolar y su profesorado fue o no negligente, pues para la apreciación del acoso
escolar no es suficiente un incidente aislado, sino varias actuaciones mantenidas en el tiempo, esto es, una
persistencia en la agresión, todos ellos presidido por la voluntad de causar un mal (daño o miedo) a la
víctima y situarla en un plano de inferioridad respecto del agresor o de un grupo”.
5
Como resulta lógico pensar, en otras modalidades de acoso, como el stalking, observamos la presencia de
comportamientos similares al acoso escolar, aunque el contexto y el entorno sean distintos. Así lo señalo en
mi estudio dedicado a esa modalidad de acoso, recientemente regulada en nuestro ordenamiento jurídico:
VERNENGO PELLEJERO, N.C. “Reflexiones en torno a la prueba en los procesos sobre stalking. Estado
de la cuestión a la luz de la reciente jurisprudencia del Tribunal Supremo”, en: Derecho y Proceso. Liber
Amicorum del Prof. Fransico Ramos Méndez, Vol. 3, Barcelona, Ed. Atelier, 2018, p. 2523: “En el caso
del stalking, conviene destacar el hecho de que, para poder hablar de la conducta punible, la
jurisprudencia insiste en que ha de demostrarse la concurrencia de un acoso insistente y reiterado sobre la
víctima, de tal forma que se vea obligada a cambiar sus hábitos”; así como también sostiene MARTÍNEZ
MUÑOZ, C.J. EL “Nuevo” delito de acoso del artículo 172 ter CP, Diario La Ley, n. 9006, 2017, p. 3: “Los
actos delictivos han de menoscabar el sentimiento de seguridad y la libertad del sujeto pasivo (...)”.
6
Al respecto, conviene mencionar también, a nivel nacional, la Ley 27/2005, de 30 de noviembre, de
Fomento de la Educación y de la Cultura de la Paz; así como la LO 8/2013, de 9 de diciembre, para la
Mejora de la Calidad Educativa (LOMCE), que modificó la Ley 2/2006, de 3 de mayo, de Educación
(LOE).

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 219


Nancy Carina Vernengo Pellejero

pesar de los intentos del legislador por proteger los intereses de los menores, subsiste aún
un nivel tan elevado de violencia en las aulas (y también fuera de ellas). No se trata de
una cuestión puntual o anecdótica si tenemos presente el número de casos de bullying
denunciados en los últimos años y la gravedad de algunos de ellos. La realidad nos ha
mostrado que nos encontramos ante un problema de gran calado, dentro y fuera de
nuestras fronteras, cuyo tratamiento a nivel de todas las Administraciones solo ha servido
para darle más visibilidad, pero no para erradicarlo del todo.
Actualmente, sin embargo, la sociedad parece haber adquirido algo más de
conciencia sobre el acoso escolar, a todos los niveles, y la necesidad de aplacar sus
efectos, dentro y fuera de las aulas. Pero, también sabemos sobradamente que no nos
encontramos ante una situación nueva o excepcional. El acoso escolar se ha venido
reproduciendo de forma habitual en el entorno educativo, afectando incluso a los propios
profesionales de la enseñanza. Lo excepcional, en todo caso, es la repercusión que las
denuncias de las víctimas están teniendo en la opinión pública7. Cuando nos referimos al
acoso escolar lo asociamos a aquellas situaciones en las cuales se llega a someter a un
niño/a o adolescente a un nivel de humillación y tortura psicológica tal, que acaba
afectando a su personalidad, pudiendo llegar a convertirlo en una persona retraída,
aislada y frágil, incluso tras alcanzar su edad adulta. Un niño/a que es sometido a una
situación de acoso escolar constante únicamente anhela ser invisible a los ojos de los
demás, para tratar de esquivar la tortura diaria a la que le someten sus agresores. Y como
veremos más adelante, uno de los problemas de los juristas que deben enfrentarse a casos
de acoso radica precisamente en demostrar estos ataques reiterados que se producen en el
entorno de la víctima. Resulta imprescindible, en cualquier caso, un seguimiento cercano
del comportamiento de los menores, así como de su entorno, tanto por parte de los
padres, como de los educadores que están en contacto constante con esos menores
durante el horario escolar y en las actividades extraescolares. Sin embargo, el problema
se torna más complejo cuando el acoso se traslada a los entornos virtuales.
Como si el acoso escolar presencial no fuera lo suficientemente cruel, en los
últimos años se ha venido produciendo otra forma específica de acoso, vinculado con los
entornos virtuales: el ciberbullying o ciberacoso, donde el acoso se traslada a Internet.
Cuando la conducta del acosador se traslada a un entorno tan ilimitado como las
redes sociales, se multiplican aún más sus efectos adversos sobre la víctima. El
ciberbullying permite participar a más personas que, en muchos casos, se valen del
anonimato que les otorgan las redes sociales para agredir con aparente impunidad.
No resulta nada sencillo probar el origen de algunas conversaciones u opiniones
vertidas en la red cuando el autor de las mismas utiliza datos identificativos falsos u
ordenadores de uso público. Esto ha supuesto sin duda otro de los mayores retos de
la Administración de Justicia, que ha debido adaptarse a estos casos, incorporando y

7
Conviene recordar que no es la única situación que ha alcanzado un nivel de notoriedad sin precedentes en
la última década. De igual modo, la violencia doméstica ha atravesado las paredes de los hogares donde
otrora se ahogaban los llantos de las víctimas, alcanzando los altavoces de los medios de comunicación y, lo
que es más importante, de las Salas de los tribunales de justicia. Ello no significa, en ningún caso, que aún
no quede camino por recorrer.

220 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


El Acoso Escolar Desde la Perspectiva Procesal

reconociendo nuevos soportes en lo relativo a las pruebas aportadas en los procesos


sobre acoso escolar8.

2 EL ACOSADOR Y SU VÍCTIMA: LA RESPONSABILIDAD CIVIL Y


PENAL EN LOS CASOS DE BULLYING
La figura del/de la acosador/a en los casos de bullying acostumbra a
corresponderse con la de un menor de la misma edad, o de edad próxima a la de su
víctima9, y que coincide o ha concidido con esta en las horas lectivas o realizando
actividades extraescolares. Conviene señalar, además, que el acoso puede ser llevado
a cabo por un grupo de varios niños o adolescentes, más o menos numerosos,
aunque siempre suele haber un líder que encabeza los ataques, mientras otros le
siguen y acaban participando también en las agresiones (físicas y/o verbales); y, de
igual modo, también encontramos casos en los que solamente uno o más agreden,
mientras otra parte del grupo se limita a jalear a los agresores directos, pero sin
agredir físicamente a la víctima (lo que no deja de ser en sí mismo una agresión); o

8
Las redes sociales y otras plataformas digitales, ha servido a los acosadores de plataforma para publicar
comentarios degradantes contra sus víctimas, incrementando notoriamente el daño producido sobre estas y
su aislamiento; como podemos deducir de esta SAP de las Palmas 209/2013 (Sala de lo Penal, Sección 1ª),
de 15 de noviembre (JUR/2014/3749): “Pues bien, la publicación de la citada fotografía, puesta en
relación con algunos de los crueles comentarios que la misma provocó entre varios de los menores
acusados ese mismo día en Tuenti (folios 8 a 16 de las actuaciones), corroboran objetivamente las
manifestaciones de la víctima en orden a que “después de la foto se agrava todo” y a que “se seguían
metiendo conmigo cada vez más, después de la foto”, hasta el punto de que el único amigo que tenía en
clase llegó a pedirle que solo se acercara a él fuera de clase. Y, la situación de constante humillación por
parte de la acusada Flora hacia Jose Daniel se puso de manifiesto no solo en la obtención de dicha
fotografía sin consentimiento de Jose Daniel (tal y como sostiene este y se revela de la forma en que se
obtuvo la misma, esto es, por detrás de Jose Daniel y mostrando este cara de sorpresa), y en subirla a
Tuenti, sino, además, en los siguientes actos: 1º) participar de manera activa y relevante en los comentarios
que tuvieron lugar ese día en tuenti (tales como, “pero gracias a ell Nos reiimos en Clasee ajaja!”; 2º) por
los reiterados comentarios despectivos que Flora dirigió a Jose Daniel en clase, diciéndole (tal y como la
misma reconoció) “Limpiabotas, maricón y gay”, 3º) por el trato de Flora hacia Jose Daniel , y que, en
palabras de este, era “humillante y con desprecio”, y , 4º), en la negativa de dicha acusada a retirar la foto
de Jose Daniel de Tuenti, pese a que este lo solicitó en diversas ocasiones. Es más, a tenor del propio
testimonio prestado por la víctima, la actitud acosadora por parte de Flora se prolongó hasta después de
presentada la denuncia que ha dado lugar a la interposición de la denuncia, personándose la misma, en
compañía de varios amigos, en el nuevo colegio en que Jose Daniel cursa su estudios y al que,
precisamente, se tuvo que trasladar por ser insostenible la situación de acoso de que esta siendo objeto, y
dicha actitud de Flora no puede más que ser interpretada como una actitud de desafío hacia la víctima y
hacia el propio sistema”.
9
Incluso pueden darse casos en los cuales intervienen jóvenes de edad superior a la de la víctima y que
mantienen algún tipo de parentesco o amistad con los acosadores de la víctima. Así sucedió en el caso
descrito en esta SAP de Madrid 241/2012 (Sala de lo Penal, Sección 25ª), de 11 de mayo (AC/2012/384):
“A los cuatro días de esa reunión Ramón sufrió nuevas amenazas, con intervención de los hermanos
mayores de los acosadores, siendo presenciado por todos los niños de la clase, grabando de nuevo la
madre de Ramón su conversación con la directora el 16-11-09, quien manifiesta que ve normal que la
hermana mayor vaya a defender a su hermano, reconociendo que los hechos se remontan a hace tres años,
que lo del año pasado había desaparecido y que habían reconocido las amenazadas de ese años de dejarle
en coma y arruinarle la vida”.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 221


Nancy Carina Vernengo Pellejero

incluso casos en los que esos otros miembros del grupo simplemente observan las
agresiones pero no participan de ninguna forma en ellas, aunque las toleran sin
mostrar rechazo. Sea cual sea el caso, y con independencia de la situación que nos
encontremos, podríamos considerar que todos ellos también participan, de una forma
u otra, en el acoso dirigido contra la víctima y podrían precisar de algún correctivo,
para reconducir su educación.
Si analizamos esta problemática desde el punto de vista de la víctima,
observamos que los motivos por los cuales un/a menor suele ser el centro de las
agresiones de los demás pueden ser tan variados como inexistentes. No es necesario
que presenten unas características físicas determinadas, una conducta específica
(más o menor retraída), o una orientación sexual distinta a la de sus agresores; sino
que es suficiente con que otro menor le tome manía, sin más, para que comience el
escarnio10. A nivel psicológico se procura educar a los niños que son objeto de acoso
en la asertividad y el control de sus emociones, con el objetivo de tratar de frenar y
dirimir sus efectos adversos. Sin embargo, ello no evita el daño psicológico (o
incluso físico) que estas víctimas inocentes arrastran durante años, de forma
permanente, incluso en forma de secuelas durante su vida adulta11. El hecho de que
nos encontremos ante comportamientos llevados a cabo por menores, no debería
representar, en ningún caso, una falta absoluta de responsabilidad sobre sus actos y frente
a la sociedad12. Asociamos la edad con la inmadurez mental, para atenuar o limitar la
10
A pesar de esta afirmación, somos plenamente conscientes que muchos casos de bullying se asocian al
racismo y la xenofobia; pero también a la homofobia y la transfobia y “los poderes públicos no pueden ser
ajenos a la violencia de género”, como se proclama en la Exposición de Motivos de la LO 1/2004, de 28 de
diciembre, de Medidas de Protección Integral contra la Violencia de Género; debiendo abogar por
programas educativos que erradiquen cualquier atisbo de discriminación. En consecuencia, a la lacra que ya
supone el acoso escolar, se une también, y como telón de fondo, la transfobia y la homofobia, muy
presentes aún en nuestra sociedad actual. Sirva como muestra de ello esta SAP de Valencia 130/2017 (Sala
de lo Penal, Sección 5ª), de 21 de febrero (ARP/2018/118): “Consta que la actitud de trato degradante
observada por Guillermo hacia Santos , no se circunscribe a un episodio aislado, sino que se trataba de
una forma de actuar ya rutinaria, podríamos decir que constituida en costumbre, profiriendo de forma
reiterada insultos vejatorios e incluso homófobos, dándose además la circunstancia de que el agredido se
trata de un adolescente con problemas de retraso mental y de identidad sexual. Ello motivó que desde el
propio centro educativo al que ambos asistían se aplicara el protocolo por acoso, sin que Guillermo cesara
en su proceder incluso después de haberse adoptado contra él medidas disciplinarias. Es obvio, pues, de un
lado, que los hechos son merecedores de reproche penal y, de otro, que el menor requiere una intervención,
ya que aparte de la conducta agresiva objeto de juicio, parece estar incurso en un estado de desmotivación
y de frustración, siendo ello preciso para asegurar su adecuado desarrollo”.
11
Respecto a las secuelas que pueden llegar a manifestarse sobre las personas que han padecido acoso escolar
en algún momento de su infancia o adolescencia, véanse, entre otros, a: GONZÁLEZ DE RIVERA, J.L. El
maltrato psicológico, Ed. Espasa Práctico, Madrid, 2002, p. 49 y ss.; NOVO, M.; FARIÑA, F.; SEIJO, D.;
ARCE, R. “Eficacia del MMPI-A en casos forenses de acoso escolar: simulación y daño psicológico”,
Psychosocial Intervention, n.22, 2013, p. 33-40; y PALOMARES-RUIZ, A.; OTEIZA-NASCIMENTO,
A.; PAZ TOLDOS, Mª.; SERRANO-MARUGÁN, I.; MARTÍN-BABARRO, J. “Bullying and
depression: the moderating effect of social support, rejection and victimization profile”, Anales de
Psicología, n.1, 2019, p. 1-10.
12
Como tan agudamente sostiene MARTÍNEZ RODRÍGUEZ, J. A. Acoso Escolar: Bullying y
Ciberbullying, Barcelona, Bosch Editor, 2017, p. 181: “El acoso escolar provoca actos que atentan contra la
dignidad e integridad física y moral de los menores agredidos, originándoles secuelas psicológicas que se

222 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


El Acoso Escolar Desde la Perspectiva Procesal

responsabilidad en aquellos menores que han presentado una conducta delictiva. Pero,
por el mismo precio, deberíamos recordar que la ley exige a los menores un
“compromiso” de educación y desarrollo personal de acuerdo con los parámetros
sociales establecidos, y como recoge el art. 9 quáter de la Ley 26/2015, de 28 de julio, de
modificación del sistema de protección a la infancia y a la adolescencia: “Los menores
tienen que respetar a los profesores y otros empleados de los centros escolares, así
como al resto de sus compañeros, evitando situaciones de conflicto y acoso escolar en
cualquiera de sus formas, incluyendo el ciberacoso”. Visto así, su incumplimiento ha de
conllevar alguna consecuencia que sea más proporcional con el daño infringido, no solo
a la víctima directa, sino también a la sociedad13 (como víctima indirecta del delito); pero
todo ello sin olvidar, por descontado, que el infractor no deja de ser un niño o
adolescente que aún debe ser educado como tal.
En la práctica, la responsabilidad penal de los menores viene limitada por la
propia LO 5/2000, de 12 de enero, de Responsabilidad Penal del Menor (a partir de
ahora LORPM), que en su Exposición de Motivos especifica que la respuesta de la
Administración de Justicia a estas agresiones ha de estar orientada a la reeducación y
rehabilitación (si fuera necesario) de los menores agresores14. En ningún caso podrá

pueden prolongar durante toda la vida del menor agredido, ya que se encuentra en un periodo de su vida en
el que no ha desarrollado su personalidad, ya que el bullying causa un grado de vulnerabilidad bastante
mayor que cuando el acoso se produce en personas adultas por causa del mobbing”.
13
Compartimos en este punto la perspectiva ofrecida por CORDENTE MARTÍNEZ, C.A. Y MONROY
ANTÓN, A.J. “La Responsabilidad de los padres en la educación de los hijos en la sociedad actual: culpa
“in vigilando” y culpa “in educando”“, Diario La Ley, n. 6944, 2008. En este caso los autores analizan la
posible concurrencia de responsabilidad solidaria entre los progenitores y los centros de enseñanza, cuando
se produce una agresión entre menores, a la luz de una sentencia de la AP de Sevilla, de 30 de noviembre de
2007. Aunque no se trate específicamente de un caso de acoso escolar, no deja de ser ciertamente
paradigmático el hecho de que la sentencia anteriormente mencionada declarare la responsabilidad solidaria
también de la madre del agresor, sobre las importantes lesiones (incluyendo, la pérdida de varias piezas
dentales), que su hijo le causó a otro menor, en horario escolar. En todo caso, merece destacarse una de las
reflexiones de estos dos juristas respecto a la responsabilidad que debería aplicarse a todos aquellos menores
cuya edad está próxima a la mayoría de edad y su capacidad para discernir lo que está bien, de lo que no lo
está (P. 4): “La legislación cada vez más proclive a defender los derechos del menor ha sido en ciertos casos
mal entendida, produciéndose un efecto consistente en otorgarle casi cualquier tipo de bienes y derechos sin
ser apenas titular de obligaciones. Sería conveniente una reforma en el sentido de responsabilizar sobre todo
a aquellos que rozan la mayoría de edad. Por ejemplo, si la legislación permite a un menor conducir un
ciclomotor con 16 años, los padres no han de responder, en nuestra opinión, por culpa in educando, pues es
la Administración la que le ha otorgado ese derecho. Sin embargo, si el menor tiene tan solo 12 años y lo
conduce, ahí si se produciría la responsabilidad de los padres, tanto por no vigilar los actos de su hijo como
por no haberle educado convenientemente para que no realice ese tipo de actos (en este sentido se pronuncia
también la Sentencia de 29 de julio de 1997 del Tribunal Supremo). Así, la Sentencia analizada en este
artículo encontraría un grave problema, cual es el de que responsabiliza a los padres por el hecho de tratarse
de adolescentes, “para los que no es precisa una labor de control y vigilancia tan rígida, dado que sus
conocimientos sobre lo que adecuadamente se puede hacer para favorecer la convivencia entre compañeros
ya debe estar inculcada”, pero, sin embargo, no explica por qué, si esos adolescentes han de conocer lo que
está bien y lo que está mal, no responden personalmente en lugar de hacerlo sus padres”.
14
En este sentido, la Exposición de Motivos de la Ley 5/2000, de 12 de enero, expresa que: “Con arreglo a las
orientaciones expuestas, la Ley establece un amplio catálogo de medidas aplicables, desde la referida
perspectiva sancionadora-educativa, debiendo primar nuevamente el interés del menor en la flexible

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 223


Nancy Carina Vernengo Pellejero

aplicarse a los menores el régimen previsto para los mayores de dieciocho años. A
salvo de los casos en los que concurra alguna causa de excepción o extinción de la
responsabilidad penal, la ley dispone que los mayores de 14 años y menores de 18,
serán responsables de los delitos que hayan cometido de conformidad con la
regulación vigente del Código Penal (art. 5º LRPM). Sin perjuicio de lo establecido
en esta ley sobre la posible responsabilidad aplicable a los menores por la comisión
de los delitos tipificados en el Código Penal, la Ley Penal del Menor remite
expresamente a lo establecido en el art. 20 CP, respecto a las causas de exención de
responsabilidad criminal por anomalía o alteración psíquica (siempre que no haya
sido expresamente provocada por el sujeto para cometer el delito); intoxicación por
consumo de bebidas alcohólicas, drogas tóxicas, estupefacientes o sustancias de
similar naturaleza; así como cualquier alteración en la conciencia del sujeto
(diagnosticada de nacimiento o desde la infancia), que altere gravemente su
percepción sobre la realidad (art. 20.1, 2 y 3 CP). Ante estos casos, el juez aplicará
medidas de tipo terapéutico, definidas en las letras d) y e) del art. 7º.1 LRPM,
consistentes en el internamiento terapéutico en régimen cerrado, semiabierto o
abierto; y el tratamiento ambulatorio (en un centro designado expresamente para
ello, al cual deberán asistir con la periodicidad que se les requiera).
Las demás medidas orientadas a la reinserción del menor infractor (no exento
de responsabilidad criminal), de conformidad con el art. 7º LRPM, pueden resumirse
en las siguientes:
• Internamiento en régimen cerrado.
• Internamiento en régimen semiabierto.
• Internamiento en régimen abierto.
• Asistencia a un centro de día.
• Permanencia en su domicilio o en un centro cerrado, durante el fin de
semana.
• Libertad vigilada.
• Prohibición de aproximación y/o comunicación con la víctima, sus
familiares o cualquier otra persona que determine el propio juez.
• Obligación de convivir con otra familia, o bajo custodia de otra persona o
grupo educativo.
• Obligación de realizar actividades en beneficio de la comunidad (regulado
en el art. 49 CP).
• Obligación de llevar a cabo tareas de perfil socioeducativo.

adopción judicial de la medida más idónea, dadas las características del caso concreto y de la evolución
personal del sancionado durante la ejecución de la medida. La concreta finalidad que las ciencias de la
conducta exigen que se persiga con cada una de las medidas relacionadas, se detalla con carácter orientador
en el apartado III de esta exposición de motivos”. Las medidas a las que alude este apartado III, van desde
las prestaciones en beneficio a la comunidad, en los casos menos graves; al internamiento forzoso y
terapéutico, en casos más graves; pasando por la libertad vigilada. La idea es proveer al ordenamiento
jurídico de distintos tipos de medidas, adaptadas a las necesidades del menor infractor y a la naturaleza del
delito cometido.

224 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


El Acoso Escolar Desde la Perspectiva Procesal

• Imposición de una amonestación.


• Retirada del permiso de conducción de vehículos a motor, o imposibilidad
para su ulterior obtención; así como para la obtención de otras licencias
administrativas, como las de caza.
• Inhabilitación absoluta para poder ejercer cargos o empleos públicos, u
obtener honores.
Dependiendo de las circunstancias del caso y de las necesidades del menor
infractor, el juez podrá optar por combinar varias medidas, siempre de forma motivada y
velando por el interés de ese menor, al que se busca reeducar y alejar del
comportamiento violento contra sus semejantes, en el que se encontraba enrocado. La
duración de las medidas a imponer dependerá también de la situación en la cual se
encuentre este menor, la infracción cometida y los informes psicológicos aportados por
los expertos llamados a participar en el procedimiento. En ello también tendrá un rol
importante el Ministerio Fiscal durante la incoación del preceptivo expediente; ya que,
teniendo en cuenta las circunstancias del caso y una vez observado el entorno del menor
acosador, podrá sugerir las medidas susceptibles de aplicarse para su reeducación o
rehabilitación, como comentaremos en el siguiente apartado.
Pero además del menor infractor, no olvidemos que la responsabilidad penal
también puede extenderse al centro educativo en el que hayan tenido lugar los episodios
de acoso. De igual modo, la reclamación de responsabilidad penal también puede
dirigirse sobre algún docente en concreto, como responsable directo de los menores en
horario escolar, cuando se acredite que no ha realizado ningún tipo de actuación frente a
los ataques de los agresores. Para ello no se requerirá que la víctima haya comunicado
directamente a ese/a profesor/a que está padeciendo una situación de bullying, sino que
será suficiente con que el propio profesor haya observado esa situación en clase o en
cualquier lugar del entorno escolar y no haya hecho nada para frenar ese conflicto y
asistir a la víctima. No es esta una cuestión carente de importancia si tenemos presente
que el/la profesor/a es una autoridad a nivel educativo y como tal, además de dar
ejemplo, no puede dar la espalda a un/a alumno/a que está siendo objeto de un delito en
su propio centro educativo; de obrar así, podría incluso estar incurriendo en un delito de
denegación de auxilio, regulado en el art. 412.3 CP: “La autoridad o funcionario público
que, requerido por un particular a prestar algún auxilio a que venga obligado por razón
de su cargo para evitar un delito contra la vida de las personas, se abstuviera de
prestarlo, será castigado con la pena de multa de dieciocho a veinticuatro meses e
inhabilitación especial para empleo o cargo público por tiempo de tres a seis años.
Si se tratase de un delito contra la integridad, libertad sexual, salud o libertad de
las personas, será castigado con la pena de multa de doce a dieciocho meses y
suspensión de empleo o cargo público de uno a tres años.
En el caso de que tal requerimiento lo fuera para evitar cualquier otro delito u
otro mal, se castigará con la pena de multa de tres a doce meses y suspensión de empleo
o cargo público por tiempo de seis meses a dos años”.
En definitiva, cuando hablamos en términos de responsabilidad penal del centro
educativo o de los profesores y otros responsables del centro (por ejemplo, el/la

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 225


Nancy Carina Vernengo Pellejero

Director/a), nos referimos a la concurrencia de culpa o negligencia de las autoridades


educativas que debían velar por los intereses de los alumnos, ya que si nos encontramos
ante un supuesto en el cual se han aplicado protocolos de actuación contra el bullying,
pero estos no han sido efectivos, no nos encontraríamos propiamente ante un ilícito penal
por parte de los educadores15, aunque pueden ser reclamados en concepto de
responsabilidad patrimonial16.
En lo relativo a la reclamación en concepto de responsabilidad civil asociada a
los casos de acoso escolar puede ser ejercitada en el momento de accionarse por la vía
penal (cuando el menor infractor es mayor de 14 años); o puede interponerse también de
forma individual ante los juzgados de lo civil, cuando el acosador es menor de 14 años;
también cuando es mayor de 14 años, pero la acusación se ha reservado la acción civil
para ejercerla de forma independiente a la penal; o bien, cuando nos encontremos
ante un caso en el cual el menor infractor también es mayor de 14 años, pero la
acusación ha optado por no reclamar por la vía penal, limitándose por reclamar
únicamente por la vía civil; y podrá procederse del mismo modo cuando el menor en
cuestión haya sido absuelto en la vía penal, quedando abierta la vía civil.
De acuerdo con el art. 61 LORPM, la acción para exigir la responsabilidad
civil deberá iniciarse por el Ministerio Fiscal (a salvo de los casos en los cuales el
perjudicado opte por renunciar a ella, la ejercite por sí mismo en el plazo de un mes
desde que se le notifique la apertura de la pieza separada de responsabilidad civil; o
bien opte por reservársela para ejercitarla ante la jurisdicción civil). Cuando se
ejercite la reclamación de la responsabilidad civil acumulada a la penal, a través del
procedimiento previsto en la LORPM, se prevé la apertura de una pieza separada de
responsabilidad civil por cada hecho imputable que es objeto de enjuiciamiento.
Conviene recordar que la responsabilidad civil que se ejercite en estos procedimientos de
acoso escolar será solidaria, ya que al tratarse de un menor de 18 años, deberán

15
Como se extrae de esta SAP de Ciudad Real 207/2017 (Sala de lo Penal, Sección 1ª), de 2 de junio
(ARP/2017/849): “Como bien indica el Ministerio Fiscal, la menor Remedios cuando fue explorada en sede
judicial, trasmitió que los episodios de presunto acoso acontecían generalmente fuera de la sede del centro
docente, lo que obviamente impedía que los denunciados tuviesen conocimiento de esos específicos hechos.
Pero es más la actuación de los denunciados no puede tener su enclave en el ámbito del derecho penal, por
más doloroso que represente para la madre el sufrimiento padecido por su hija con ocasión de actitudes para
con ella, con respecto a otra alumna del Colegio. Se han acordado las medidas oportunas como es la
incoación del correspondiente protocolo de acoso entre iguales, ha habido un seguimiento por parte del
Director y la Orientadora, bien sea que respecto a esta última fue la propia denunciante la que decidió que
no fuese atendida, por las discrepancias de criterio surgidas; y medidas adoptadas, distinto es que tales
medidas adoptadas no fuesen suficientes o proporcionadas a criterio de la denunciante, cuestión que no
puede tener en este caso concreto relevancia penal, máxime cuando finalmente la madre decidió un cambio
de centro docente y al que se por la Delegación de Educación accedió sin ningún tipo de inconveniente”.
16
Nuestro ordenamiento jurídico reconoce la posibilidad de formular reclamación patrimonial frente a los
centros públicos o concertados, como consecuencia del funcionamiento normal o anormal de las
instituciones públicas (en este caso en concreto pudiéndose reclamar por la falta de los debidos protocolos
para frenar las situaciones de acoso; o por su manifiesta ineficacia o inaplicación, en caso que sí existan), de
conformidad con la Ley de Régimen Jurídico del Sector Público (arts. 32 a 35 LRJSP), y cuyo
procedimiento se encuentra regulado en el art. 67 de la Ley 39/2015, de 1 de octubre, de Procedimiento
Administrativo Común de las Administraciones Públicas.

226 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


El Acoso Escolar Desde la Perspectiva Procesal

responder solidariamente con este sus progenitores, tutores o guardadores legales o de


hecho (art. 61.3 LORPM), por este orden, los cuales también podrán ejercer derecho de
repetición entre ellos. Y a pesar de la omisión del legislador, a esta relación de obligados
solidarios cabe asimismo añadir al centro educativo, sus responsables, y los profesores
de los menores; pues el hecho de que no se encuentren expresamente mencionados en el
texto de la ley, no impide que sean demandados como responsables civiles
solidarios; como así lo han interpretado doctrina y jurisprudencia17. En cualquier
caso, lo que sí se ha encargado de regular el texto de la ley es la moderación en la
responsabilidad de estos obligados solidarios, cuando no hayan favorecido la
conducta del menor con dolo o negligencia grave, pero siempre que este extremo sea
debidamente probado para su efectivo reconocimiento, ya que no se trata de una
facultad que pueda ser promovida de oficio18.
Por otro lado, señalamos nuevamente la posibilidad de ejercitar esta acción de
responsabilidad civil en el plazo de un año ante la jurisdicción civil, de acuerdo con la
regulación prevista en los arts. 1.968 y 1.902 CC, y frente a los progenitores, tutores o
guardadores legales o de hecho del menor, por culpa in vigilando; así como frente a los
responsables de los centros docentes, como así proclama el párrafo 5 del art. 1.903
CC, que deberán demostrar que actuaron con la diligencia debida de un buen padre
de familia, para evitar el daño generado por la situación reiterada de acoso: “Las
personas o entidades que sean titulares de un Centro docente de enseñanza no
superior responderán por los daños y perjuicios que causen sus alumnos menores
de edad durante los períodos de tiempo en que los mismos se hallen bajo el control
o vigilancia del profesorado del Centro, desarrollando actividades escolares o
extraescolares y complementarias”; sin perjuicio del derecho de repetición contra
los docentes, que proclama el art. 1.904 CC: “Cuando se trate de Centros docentes
de enseñanza no superior, sus titulares podrán exigir de los profesores las

17
PÉREZ VALLEJO, A.M. “Responsabilidad civil parental por acoso de menores y de los centros
docentes”, en: Tratamiento integral del acoso, M.P. Rivas Vallejo; M.D. García Valverde. (Dirs.), Cizur
Menor (Navarra), Ed. Thomson Reuters Aranzadi, 2015, p. 381: “Nótese que al mencionar solo a los
“padres, tutores acogedores o guardadores”, desde la entrada en vigor de la LORPM, se ha cuestionado
doctrinalmente si los Centros escolares pueden ser demandados (en pieza separada de responsabilidad
civil) en esta sede especial de la jurisdicción de menores. Al respecto, una primera observación nos lleva a
plantearnos si esta omisión responde a un olvido del legislador o a una aparente laguna legal. Esta
cuestión ha sido resuelta por la doctrina en sentido negativo”.
18
Tal y como podemos ver en el caso descrito en esta SAP de A Coruña 280/2019 (Sala de lo Penal, Sección
2ª), de 4 de junio (JUR/2019/261251); en la que se aplicó una rebaja del 50% al padre, sobre la
responsabilidad civil fijada en en un principio: “Hay que considerar que el padre no tiene relación con la
hija desde hace casi un año que ello se generó por que la menor lo denunció, en esencia hechos sobre una
agresión, si bien ya se ha acreditado que se ha sobreseído dicho procedimiento, en el que se expone que no
existen indicios de un posible delito de lesiones o maltrato, tampoco se ha considerado creíble la versión de
la menor por sus contradicciones; también el recurrente pone de manifiesto que le había llamado la
atención por su comportamiento y especialmente por las compañías que frecuentaba, y por consecuencia
de ello se generó la denuncia de la hija. En consecuencia lo que puede concluirse es que tampoco se podía
exigir una mayor atención o dedicación por parte del padre, en ese cumplimiento del deber de vigilancia
que le incumbe. Por tanto consideramos que en este caso procede la reducción de la responsabilidad civil
del padre por la infracción cometida por su hija, reducción que se cifra en un 50%”.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 227


Nancy Carina Vernengo Pellejero

cantidades satisfechas, si hubiesen incurrido en dolo o culpa grave en el ejercicio


de sus funciones que fuesen causa del daño”.

3 ALGUNOS APUNTES SOBRE LAS ESPECIALIDADES DE


LOS PROCESOS POR ACOSO ESCOLAR ANTE LOS JUZGADOS
DE MENORES
Si bien no podemos negar que en estos últimos años se ha venido observando
cierto auge en las reclamaciones judiciales y extrajudiciales asociadas al bullying, no
podemos negar tampoco que nos encontramos ante unos casos que pueden revestir
algunas dificultades debido, principalmente, a la edad de los implicados y a las
circunstancias en las cuales se desarrollan los episodios de acoso. La víctima suele
mostrarse reacia a explicar a sus mayores la situación por la que está pasando, por lo
que puede pasar mucho tiempo hasta que los hechos son denunciados y se pierden
muchos detalles sobre las agresiones padecidas. De este modo, y una vez iniciado el
procedimiento, los esfuerzos de la acusación han de centrarse, fundamentalmente, en
demostrar, por una parte, la reiteración en el comportamiento del acosador ya que;
por regla general, el acoso en todas sus formas requiere de una conducta reiterada y
continuada del acosador sobre su víctima19; y por otra, que existe una relación
directa entre ese comportamiento lesivo y el daño efectivamente causado a la
víctima (ya sea psicológico, físico, o ambos a la vez)20.

19
Este requisito resulta lógico a nivel jurisprudencial, si tenemos presente que en psicología, autores como
OLWEUS, D. Conductas de Acoso y amenaza entre los escolares, Madrid, Ed. Morata, 2004, p. 25; destaca
que “La situación de acoso e intimidación y la de su víctima queda definida en los siguientes términos: Un
alumno es agredido o se convierte en víctima cuando está expuesto, de forma repetida y durante un tiempo,
a acciones negativas que lleva a cabo uno o varios de ellos. Debemos especificar más el significado de la
expresión “acciones negativas”. Se produce una acción negativa cuando alguien, de forma intencionada,
causa un daño, hiere o incomoda a otra persona – básicamente, lo que implica la definición de conducta
agresiva. (...) La definición que hemos dado anteriormente destaca las acciones negativas que se producen
“de forma repetida en el tiempo”, aunque en determinadas circunstancias se puede considerar agresión
intimidatoria una situación particular más grave de hostigamiento. Lo que pretendemos es excluir las
acciones negativas ocasionales y no graves, dirigidas a un alumno en un momento, y a otro en otra
ocasión”. En definitiva, para que una conducta pueda ser catalogada de “acosadora”, con independencia del
contexto en el cual se produzca, se requiere de una reiteración del comportamiento por parte del agresor,
con el objetivo de humillar y someter a su víctima.
20
En consecuencia, deberá probarse que no se trata de un incidente aislado o esporádico, sino que presenta
continuidad o incluso progresividad en el tiempo (puede haberse iniciado de forma menos severa y haberse
agravado en el tiempo). De este modo, y como se expone en la Sentencia 245/2014, del Juzgado de
Menores n.1 de Barcelona, de 4 de noviembre (JUR/2015/163109): “(...) la conducta desarrollada por el
menor acusado, por el tiempo que duró de aproximadamente más de un curso escolar, por las
circunstancias concurrentes en el menor víctima de los hechos, y por los concretos actos realizados, tanto
en su conjunto, como algunos de ellos por sí mismos, excedieron de las “bromas” para adentrarse
inequívocamente en el campo de la humillación. No se trata de una conducta puntual y de una intensidad
relativa; el menor sometió a su compañero de clase a un constante escarnio y vejaciones, lanzándole
objetos, dirigiéndole insultos, expresiones, y actos vejatorios, que desembocaron en el abandono de la
víctima del centro escolar en el que cursaba sus estudios, y que, lejos de cesar persistió en el nuevo centro
escolar, siendo patente que dicha conducta (por su persistencia y por las consecuencias que produjo en el
menor Marino) esta incardinada en el ámbito del tipo penal de los delitos contra la integridad moral”.

228 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


El Acoso Escolar Desde la Perspectiva Procesal

De conformidad con el art. 2 LORPM, la competencia para el enjuiciamiento


y ejecución de los delitos cometidos por los mayores de catorce años y menores de
dieciocho años, corresponde a los Juzgados de Menores (como así proclaman
también los arts. 96 y 97 LOPJ); sin olvidar que la instrucción corresponderá, en
todo caso, a la Fiscalía de Menores (art. 16.1 LORPM). En la práctica pueden ser
frecuentes los casos en los cuales estos menores cometen los delitos aun siéndolo,
pero alcanzan la mayoría de edad durante el procedimiento judicial o incluso antes
de su celebración. Ante este panorama, el texto de la ley se ha encargado de
matizar que las edades que se fijan en el articulado son las relativas al momento de
comisión del delito (art. 5.3 LORPM). Así, el hecho de alcanzar la mayoría de
edad durante la tramitación del procedimiento o antes de que se inicie este, no
tendrá consecuencia alguna respecto a la atribución de la competencia a los
Juzgados de menores21. La víctima, por su parte, deberá ser informada de los
derechos que le asisten (art. 4 LORPM) y deberán adoptarse las medidas
cautelares necesarias para su protección y la salvaguarda de sus intereses (art. 28
LORPM).
La actividad instructora que desarrolla el Fiscal de Menores en estos
procedimientos, ha de centrarse en verificar la participación de los menores
señalados como supuestos responsables de los incidentes de acoso, pudiendo
solicitar al Juzgado de Menores la práctica de aquellas diligencias de investigación
restrictivas de los derechos fundamentales (art. 23 LORPM); pero también
pudiendo recibir la solicitud de práctica de diligencias provenientes de las partes
(art. 26 LORPM). Por extensión, la intervención del Ministerio Fiscal en esta
etapa del procedimiento también se reserva a la proposición de aquellas medidas
concretas orientadas a la sanción y educación del menor acosador, procurando
corregir su actitud. Sin embargo, también puede darse el caso que, atendiendo a la
naturaleza del delito, la causa no siga adelante por conciliación o reparación del
daño por parte del menor-agresor, en cuyo caso se procedería a acordar el
desistimiento del expediente de la Fiscalía, de conformidad con el art. 19 LORPM.
Además de las evidencias que se recaben a partir de las diligencias
practicadas, es importante remarcar la importancia que ostenta el informe del equipo
técnico del juzgado (art. 27 LORPM), el cual deberá entregarse en el plazo de 10
días (prorrogable en casos de especial complejidad), y que detallará la situación
psicológica, familiar y educativa del menor investigado, así como su entorno social
y cualquier otra circunstancia que pueda resultar relevante para la adopción de las
medidas socioeducativas concretas sobre el menor, que el mismo Equipo Técnico

21
Tampoco tendría consecuencia alguna el hecho de que concurran varios menores como autores del acoso
porque, de darse esta situación, el art. 20 LORPM dispone que el Ministerio Fiscal incoe un expediente por
cada hecho justiciable, excepto en el caso que nos encontremos ante hechos delictivos conexos, en cuyo
caso optará por incoar un único expediente, que comprenderá todos los hechos justiciables y los menores
implicados, evitándose así la posibilidad de seguir procedimientos paralelos con resultados totalmente
distintos. Para una visión más detallada de la conexión penal en los procedimientos de menores, véase, por
todos: VALLESPÍN PÉREZ, D. Conexión Penal (En la Ley de Enjuiciamiento Criminal Española. Análisis
tras su reforma por Ley 41/2015), Porto, Juruá, 2019, p. 109 y ss.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 229


Nancy Carina Vernengo Pellejero

podrá también proponer22; pues, por encima de todo, lo que intenta es reorientar los
pasos de ese menor para que a partir de ese momento se oriente en la dirección
correcta. Una vez elaborado el informe, se dará traslado del mismo al Juez de
Menores, el cual trasladará a su vez copia al letrado del menor o menores
expedientados.
Una vez finalizada la instrucción, el Ministerio Fiscal deberá resolver sobre
la conclusión del expediente (art. 30 LORPM), que notificará a las partes personadas
y remitirá al Juzgado de Menores, junto a las piezas de convicción y demás efectos
que puedan concurrir; además de un escrito de alegaciones en el que se hará constar
la descripción de los hechos, su valoración jurídica, el grado de participación del
menor, una breve descripción de sus circunstancias sociales y personales, la
proposición de alguna medida correctiva motivada y, si procede, la imposición de
responsabilidad civil. En el mismo acto, además, propondrá los medios de prueba de
los que pretenda valerse. En este momento procesal será también cuando el
Ministerio Fiscal puede pronunciarse sobre el sobreseimiento de las actuaciones, por
alguno de los motivos previstos en los arts. 637 y 641 LECrim.
Una vez recibido el escrito de alegaciones junto al expediente del Ministerio
Fiscal, las piezas de convicción y demás evidencias, el secretario del Juzgado de
Menores deberá incorporarlos a las diligencias y el Juez procederá a ordenar la
apertura del trámite de audiencia; en cuyo caso, el Letrado de la Administración de
Justicia dará traslado a los que ejerciten la acción penal y civil para que formulen sus
respectivos escritos de alegaciones y propongan sus pruebas, en el plazo común de
cinco días. Una vez evacuado este trámite, se dará traslado de las actuaciones al
letrado del menor y, si procede, a los responsables civiles, para que formulen a su
vez sus respectivos escritos de alegaciones y propongan también sus pruebas, en el
plazo común de cinco días23. Una vez presentados estos, o precluido el plazo sin que
se hayan presentado, el Juez acordará en el mismo auto de apertura de audiencia, lo
que estime conveniente sobre la pertinencia de las pruebas propuestas por las partes
(art. 34 LORPM).
Llegados a este punto, y respecto a la carga de la prueba (que recaerá en la
acusación), la misma se centrará en demostrar la existencia y la frencuencia del
acoso, así como la relación de causalidad que existe entre ese acoso y el daño
ocasionado sobre la víctima. El proceso en sí mismo gira en torno a ello, pero en la
práctica no siempre resulta sencillo demostrar la presencia constante de un acosador,
con independencia del entorno en el que actúe. En la actualidad, y como hemos
comentado al inicio del este estudio, sabemos que la forma de ejercer el acoso sobre
las víctimas ha pasado de ser puramente presencial, a mayoritariamente virtual
(ciberacoso o ciberbullying); en muchos casos propiciada por el uso de las nuevas
tecnologías en diferentes ámbitos de la vida cotidiana de los menores, así como la

22
De igual modo, y dependiendo del conflicto, el propio equipo técnico también podrá proponer alguna
medida restaurativa, reparadora o conciliadora con la víctima, de acuerdo con la previsión del art. 19
LORPM.
23
Conviene matizar que en esta etapa del procedimiento podrá promoverse la conformidad entre las partes
(art. 32 LORPM), la cual quedará plasmada en la correspondiente sentencia de conformidad.

230 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


El Acoso Escolar Desde la Perspectiva Procesal

instauración de las TIC en los planes educativos (tanto a nivel de Educación


Primaria, como Secundaria). Este hecho también ha favorecido la aparición de nuevas
evidencias de naturaleza informática o virtual, que pueden ser grabadas o rastreadas con
la finalidad de conocer su origen y autoría. Pero, de igual modo, conviene matizar que la
identificación de estos perfiles o usuarios virtuales no siempre es sencilla al tratarse de
perfiles falsos o identidades incluso usurpadas a otros usuarios24. También contamos con
otros medios de prueba, relacionados con las nuevas tecnologías de la información de las
que hacen uso los jóvenes y que forman parte ya de elenco de pruebas de nuestros
tribunales de justicia (vg. la mensajería instantánea mediante aplicaciones móviles25);
aportados de forma habitual en casos de acoso.
Por otra parte, cuando nos encontramos ante situaciones de acoso con ataques
presenciales, físicos y/o verbales, también podemos observar como algunos de estos
episodios se producen, en ocasiones, con pocos testigos o en entornos en los cuales no
queda muestra alguna de la agresión padecida; un hecho que también dificulta
notablemente su prueba. Estas situaciones se vienen reproduciendo comúnmente en
casos de acoso, como por ejemplo los asociados al acoso laboral, en el cual es muy
difícil encontrar compañeros de trabajo que presten su testimonio o bien porque no hay
testigos presenciales de los episodios de acoso; o bien, porque temen las posibles
represalias que pueden derivarse si llegan a prestar su testimonio a favor de la víctima.
Aunque podamos pensar que la mayoría de casos de acoso escolar carecen de
testigos que puedan aportar su testimonio a la causa (aparte de la propia víctima), o se
producen únicamente en presencia de testigos que son menores de edad (compañeros de
los implicados) y que no siempre están dispuestos a prestar declaración sobre los hechos
24
Es una realidad que las herramientas de control parental instauradas en muchos servidores no siempre
representan una solución a este problema, sobre todo cuando los propios progenitores no controlan
mínimamente los contenidos que visualizan o comparten sus vástagos.
25
Vg. la SAP de Ourense 600/2016 (Sala de lo Penal, Sección 2ª), de 1 de diciembre, (Tol. 5.927.257): “Las
defensas en sus escritos exponen las declaraciones del menor expedientado, señalando que este en sus
sucesivas declaraciones ante la Fiscalía y en la audiencia ha mantenido siempre la misma versión de los
hechos, denunciando las contradicciones en las que incurren tanto el menor perjudicado como los testigos
que estaban presentes en el lugar de los hechos; versión de Gabriel que resulta corroborada por los whatsapp
obrantes en la causa, hasta construir las defensas el relato de hechos probados. Argumentan que Gabriel fue
víctima de acoso escolar por parte de Doroteo, dos años mayor que él. Gabriel y Herminio habiendo
quedado ese día 27 de agosto para pelearse en la zona de la urbanización, y Gabriel sabía que al lugar de la
pelea iba a ir Doroteo, y era consciente por los ambientes que Doroteo frecuenta de que no iba a ir solo,
sospecha más que fundada derivada de los mensajes de whatsapp. Incidiendo en el miedo en el que Gabriel
le tenía a Doroteo, del cual había sido víctima de burlas e incluso collejas en el colegio, por lo que para
poner fin a esta situación trató de integrarse en su grupo de amigos. Y explicando que Gabriel tras recibir el
puñetazo de Herminio y oír risas, sacó la navaja con intención de asustarlo pero como como estaban tan
próximos, siendo además que Herminio propina un segundo puñetazo en ese momento, Gabriel no sabe
precisar lo que pasó, solo que él no le clavó la navaja y que no tenía intención de hacerle daño”; y la SAP de
Guipuzkoa 1005/2018 (Sala de lo Penal, Sección 1ª), de 11 de mayo (Tol. 6.735.236): “La misma menor
reconoció que la fotografía en la que aparece en Instragram fue colgada el 15 de noviembre de 2.016 por su
amiga Sagrario junto a la que aparece, siendo comentada por Juan, amigo de las dos, constan igualmente las
comunicaciones recibidas en el teléfono móvil de Lourdes a través de la aplicación ASK el 30 de noviembre
de 2.016 de carácter vejatorio y que según Melisa habrían sido escritas por Juan, habiendo reconocido
anteriormente en su declaración en fiscalía que este contaba con su consentimiento y habiendo declarado el
tutor de los tres menores que Melisa le reconoció que tenía que ver con dichos mensajes”.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 231


Nancy Carina Vernengo Pellejero

por temor a represalias; en realidad, en la práctica solemos encontrar casos que cuentan
con la presencia de testigos, cuyo testimonio incluso ha resultado clave para el
procedimiento26. Estos han sido sin duda de gran ayuda para conocer, de primera mano,
los detalles de distintos episodios vividos por la víctima27 (por ejemplo, desde el punto
de vista de los educadores y los familiares, puede servir para conocer si han podido
observar algún posible cambio de comportamiento en el menor acosado o en el acosador,
desde que se tiene constancia de la situación de acoso). Por otro lado, y respecto al
testimonio prestado por la víctima, compartimos sin duda la opinión de juristas como,
Dos Pazos Benítez, cuando sostiene que la declaración del menor acosado es “el eje
del sistema”; y que a la hora de valorar su testimonio, el juez deberá tener en cuenta
aspectos trascendentales como el hecho de que mantiene la misma versión de los
hechos en todas las etapas del procedimiento judicial y que no declara movido por
un sentimiento de venganza contra su agresor28.
26
Para muestra un botón, como el que encontramos en esta SAP de Barcelona 427/2009 (Sala de los Penal,
Sección 3ª), de 8 de mayo (JUR/2009/401790): “Recurre la representación de Gracia alegando error en la
apreciación de la prueba, pues considera no existe prueba de cargo ya que a su entender lo único que
quedó acreditado en el plenario fue la animadversión existente entre víctima y menor. La defensa de
Adelaida error en la apreciación de la prueba pues considera no existe prueba de cargo alguna respecto a
la participación de la menor en los hechos, así como infracción del principio de presunción de inocencia.
Esta Sala no comparte las conclusiones a las que llegan las recurrentes. La sentencia recurrida construye
su relato de hechos probados partiendo de la prueba practicada en el acto del juicio oral, valorada por el
Juez sentenciador desde la independencia e imparcialidad que le corresponden y que nadie cuestiona, y
desde la posición de privilegio que para ello ostenta en virtud de la inmediación procesal. Las conclusiones
así alcanzadas solo podrían ser objeto de revisión, de resultar ilógicas, arbitrarias o irregulares, lo que no
ocurre en el presente caso. Nada de ello ocurre en el presente supuesto, al contrario, no hay más que
repasar nuevamente las declaraciones vertidas en el plenario como así ha hecho el Tribunal para
corroborar que, efectivamente, ambas menores participaron en los hechos por los que fueron condenadas,
y ello se desprende no tan solo de la versión de la menor y su madre sino también de la declaración
testifical del profesor de las menores. Existe por tanto prueba de cargo suficiente desvirtuadora del
principio de presunción de inocencia que en modo alguno se ha vulnerado”.
27
A modo de ejemplo, ver, la SAP de Barcelona 85/2017 (Sala de lo Penal, Sección 3ª), de 1 de noviembre
(Tol 6.508.166); la SAP de Jaén 551/2018 (Sala de lo Penal, Sección 2ª), de 29 de junio (Tol 6.834.214); o
la SAP de Santa Cruz de Tenerife 733/2018/ (Sala de lo Penal, Sección 2ª), de 19 de septiembre (Tol
6.956.532), entre otras.
28
A la máxima que nos recuerda DOS PAZOS BENÍTEZ, G. “El bullying en los centros escolares”, en: Los
delitos de acoso moral: mobbing, acoso inmobiliario, bullying, stalking, escraches y ciberacoso, Ed. Tirant
lo Blanch, Valencia, 2017, p. 34; podemos añadir aún lo reiterado en la jurisprudencia; como bien se
sostiene en esta SAP de Granada 6/2018 (Sala de lo Penal, Sección 1ª), de 25 de mayo (Tol. 6.871.458): “El
juez ha valorado la prueba practicada y ha concedido valor probatorio a la declaración de la víctima, con
entidad suficiente para desvirtuar el derecho a la presunción de inocencia. La jurisprudencia ha admitido
de forma reiterada el valor probatorio de cargo de las manifestaciones de los testigos que, a la vez, son
víctimas del ilícito, siempre que no concurran razones objetivas que los invaliden, o que provoquen dudas
que impidan al Tribunal formar su convicción. Para que ello ocurra, es necesario que la declaración de la
víctima cumpla ciertas garantías. Tales garantías reseñadas, entre otras muchas, por las SSTC 173/90 y
229/91; SSTS 16 de febrero de 1998, 2 de junio de 1999, 2 de octubre de 1999, 10 de marzo de 2000 y 10
de diciembre de 2002; son las siguientes. En primer lugar, la declaración debe ser subjetivamente creíble.
La ausencia de incredibilidad subjetiva se deduce de las relaciones acusador-acusado que pudieran
conducir a la deducción de la existencia de un móvil de resentimiento, enemistad, venganza,
enfrentamiento, o interés. El segundo requisito consiste en que la declaración sea objetivamente verosímil.
Para que ello ocurra, es necesario que la versión de los hechos que constituye el contenido de la

232 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


El Acoso Escolar Desde la Perspectiva Procesal

Junto a la declaración que puedan ofrecer estos testigos, así como otras
evidencias igualmente importantes (como es el atestado policial que recoje la
denuncia interpuesta por la víctima), también contamos con la prueba pericial
psicológica; de indudable importancia en cualquier caso de acoso. El trabajo del
perito que ha de realizar el análisis psicológico sobre la víctima se basa en distintas
pruebas y observaciones, para analizar sus reacciones frente a distintas situaciones y
preguntas. Para ello, será imprescindible ahondar en la vida diaria y las rutinas del
menor, su interacción con su entorno y la relación que mantiene con su familia y amigos;
y cómo la situación de acoso ha condicionado su vida. La presencia de un menor
sometido a acoso escolar puede evidenciarse, por ejemplo, a partir de la externalización
de distintos signos (ansiedad, alteración del sueño, retraimiento, negativa a ir al colegio,
o pérdida, de apetito, entre otros). A partir de los exámenes practicados, el perito podrá
ofrecer su diagnóstico sobre el estado del menor y las posibles secuelas que la víctima
puede arrastrar consigo29.
La decisión que se adopte sobre este menor vendrá determinada por los hechos
que se consideren probados, pero también, y muy especialmente, por el informe del
Equipo Técnico que se encarga de analizar el entorno del menor, su actitud y su
comportamiento ante a la situación.

4 LA SOCIEDAD FRENTE AL BULLYING: CONCIENCIACIÓN Y


EDUCACIÓN
Al mirar atrás se nos antoja en cierto modo sorprendente el cariz que los ataques
y las agresiones entre niños o adolescentes han tomado en nuestra sociedad, y el calado
que las mismas han tenido también en términos judiciales. La sociedad ha pasado de
describir estos comportamientos como “cosas de chicos”, a definirlos como

declaración se encuentre confirmada por la concurrencia de corroboraciones periféricas de carácter


objetivo. Por último, la jurisprudencia exige que haya una persistencia en la incriminación, prologada en el
tiempo, plural, sin ambigüedades ni contradicciones sobre extremos o elementos esenciales”.
29
Como observamos en la SAP de Valencia 442/2012 (Sección 6ª), de 10 de julio (La Ley 164332/2012): “En
el caso que estudiamos, la perito explicó el método de trabajo realizado, las escalas aplicadas a María Luisa,
los síntomas observados, el historial médico de la menor, las entrevistas que tuvo con ella, para concluir que
“los resultados obtenidos ... son indicativos de una situación de acoso y violencia escolar con un alto grado
de intensidad, con presencia de daños clínicos” (folio 58 vuelto), destacando “la ausencia de indicadores de
vulnerabilidad de María Luisa que le predispongan al padecimiento de problemas psicopatológicos” (folio
59). Por ello, y porque no hay prueba ninguna que contradiga esas conclusiones, debemos confirmar la
valoración que la juez hizo de ese informe pericial”. Así como en la Sentencia 216/2005, de 23 de
noviembre, del Juzgado de Menores de Bilbao (JUR/2006/103616); en la que, además de los testigos, fue
clave el informe parcial que acreditó el estado psicológico de la víctima tras la prolongada situación de
humillación vivida: “Estimamos que la circunstancia de que Aliseda se haya manifestado enemiga de M.,
por cuando la ha escupido e insultado, y A. M. haya expresado que mantiene enemistad con él, no priva de
verosimilitud a los referidos testimonios, toda vez que además de haber sido expresados con firmeza y sin
contradicciones, resultan concordantes con lo manifestado por el testigo de referencia y Jefe de Estudios Sr.
Ortega y con la objetividad del informe pericial del Médico Forense donde se pone de manifiesto que
Sandra ha venido sufriendo un trastorno adaptativo mixto, reactivo a la situación vivencial que atraviesa, lo
cual es compatible con el mecanismo de producción: amenazas y acoso que padece, con una relación de
causalidad directa entre los mismos”.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 233


Nancy Carina Vernengo Pellejero

auténticas agresiones, incluso violentas, que merecen especial atención. En realidad,


el bullying ha estado presente en nuestra sociedad desde tiempos inmemoriales. La
diferencia entre lo que era hace unos años y lo que es ahora, radica en la
concienciación de la sociedad sobre ello, propiciada, en no pocas ocasiones, por las
noticias que han trascendido a la opinión pública sobre casos especialmente graves
de niños traumatizados que han acabado autolesionándose, lesionando a los demás, o
incluso acabando con su propia vida.
Llegados a este extremo debemos preguntarnos si las medidas que hemos estado
aplicando para neutralizar estas situaciones o contrarrestar los daños producidos, son
realmente efectivas y pueden tener una continuidad; o, en realidad, precisan de una
reformulación en su haber. En cualquier sociedad civilizada deberíamos ser capaces de
interceptar este tipo de violencia temprana, mediante la concienciación de la ciudadanía
y una regulación legal acorde a la realidad social que estamos viviendo; es nuestra
responsabilidad como juristas y como ciudadanos. Esta tarea, sin embargo, no resulta
nada sencilla, teniendo en cuenta que nos encontramos, generalmente, ante un problema
de fondo más grave. En el bullying muchos de los agresores provienen de entornos
difíciles, en ocasiones desestructurados, o en los cuales hay una evidente carencia de
autoridad u orden. En otros casos, y aunque esos menores tengan una figura paterna o
materna estable, o cualquier otra persona que ejerza como tales, en realidad no cumplen
su función de forma eficaz, otorgando amplias libertades a estos menores, para que
hagan y deshagan a su voluntad. En otros casos, y a pesar del control parental,
simplemente se trata de menores difíciles, que no atienden a razones, a pesar de los
intentos de sus progenitores o tutores por mantenerles controlados y comunicarse con
ellos. En consecuencia, para poder frenar el acoso, primero deberíamos preguntarnos qué
hace que un niño o adolescente se dedique conscientemente a torturar física y
psicológicamente a sus semejantes; y a continuación, deberíamos observar cuál es el
entorno de ese menor-agresor y si ello ha influido en su comportamiento. En la mayoría
de casos el problema radica precisamente ahí, en la falta de una figura de referencia que
sirva de ejemplo al niño o adolescente en esa etapa clave de su vida. Cuando un niño
agrede a otro, el perjudicado no solo es el menor que padece la agresión, sino también el
que la comete. La clave está en la educación y es en ella donde la Administración de
justicia, los servicios sociales que interactúan con ella y los centros educativos, han de
fijar sus esfuerzos. Precisamente por eso, a la vez que nuestra legislación aboga por la
búsqueda de medidas conciliadoras entre la víctima y el acosador, también apuesta por la
adopción de fórmulas resocializadoras y educadoras sobre el menor agresor. Pero para
que estas medidas y otras sean efectivas, es imprescindible contar con el apoyo de los
adultos responsables del menor y, en ocasiones, esto aún es una auténtica quimera.

5 A MODO DE CONCLUSIÓN
Las situaciones de acoso requieren de una respuesta enérgica por parte de
todos; no solamente de las Administraciones. De nada sirve dotar al ordenamiento
jurídico de los medios para juzgar los delitos asociados al bullying si los auténticos
responsables directos de los menores agresores no adoptan una posición activa

234 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


El Acoso Escolar Desde la Perspectiva Procesal

contra estas conductas delictivas o, incluso, las secundan. No negamos la eficacia


que las medidas resocializadoras puedan tener sobre los menores agresores, así
como el acierto de incorporar distintos protocolos de detección del acoso escolar en
los centros educativos; pero sí ponemos en duda el verdadero compromiso de los
responsables de los menores frente a su comportamiento, cuando los casos de acoso
escolar se producen de forma reiterada, al igual que otras conductas violentas o de
abuso (incluso sexual) entre jóvenes, que se están observando de forma frecuente y
que, en ocasiones, hasta son compartidas en redes sociales. Si bien la regulación
legal prevista sobre los casos de bullying apuesta, de forma acertada, por la
reeducación y reinserción de estos niños y jóvenes, carecemos de medios suficientes
para realizar un seguimiento de ese menor a largo plazo; un factor que, unido a la
posible presencia de un entorno carente de valores, o de un auténtico control
parental, puede abocar a esos menores a una reiteración de estas conductas (incluso
de forma agravada). Únicamente el esfuerzo de todos – progenitores y tutores
legales, educadores y Administraciones –, podría evitar que estas situaciones
continúen reproduciéndose, con las consecuencias que conllevan, no solo para las
víctimas y sus agresores, sino también para la sociedad.

BIBLIOGRAFÍA
BERROCAL LANZAROT, A.I. “La comunidad educativa ante el acoso escolar o bullying. La
responsabilidad civil de los centros docentes”, Diario La Ley, n.7359, 2010.
CARRETERO SÁNCHEZ, S. “Las redes sociales y su impacto en el ataque a los derechos
fundamentales: aproximación general”, Diario La Ley, n.8718, 2016.
CARRILLO IZQUIERDO, A. “El acoso escolar como forma de violencia en la enseñanza secundaria,
una visión legal del problema”, Revista sobre la infancia y la adolescencia, n.14, 2018.
CORDENTE MARTÍNEZ, C.A. y MONROY ANTÓN, A.J. “La responsabilidad de los padres en la
educación de los hijos en la sociedad actual: culpa “in vigilando” y culpa “in educando”, Diario La Ley,
n.6944, 2008.
DOS PAZOS BENÍTEZ, G. “El bullying en los centros escolares”, en: Los delitos de acoso moral:
mobbing, acoso inmobiliario, bullying, stalking, escraches y ciberacoso, Ed. Tirant lo Blanch, Valencia,
2017.
GARCÍA VALVERDE, F. “Responsabilidad penal derivada del acoso escolar”, en: Tratamiento
integral del acoso (Pilar Rivas Vallejo, Dir.), Thomson Reuters Aranzadi, Cizur Menor (Navarra), 2015.
GONZÁLEZ DE LA RIVERA, J.L. El maltrato psicológico, Madrid, Espasa Práctico, 2002.
MARTÍNEZ MUÑOZ, C.J. “El “nuevo” delito de acoso del artículo 172 ter CP”, Diario La Ley, n.
9006, 2017
MARTÍNEZ RODRÍGUEZ, J.A. Acoso escolar: Bullying y Ciberbullying, Barcelona, Bosch Editor,
2017.
MUSSEN, P.H.; CONGER, J.J.; KAGAN, J. Desarrollo de la personalidad en el niño, México, Editorial
Trillas, 1976.
NOVO, M. – FARIÑA, F. – SEIJO, D. – ARCE, R. “Eficacia del MMPI-A en casos forenses de acoso
escolar: simulación y daño psicológico”, Psychosocial Intervention, n.22, 2013.
OLWEUS, D. Conductas de acoso y amenaza entre los escolares, Madrid, Ed. Morata, 2004.
ONTIER, J. “La aportación de WhatsApps como medio de prueba en el procedimiento penal”, Diario La
Ley, n.9219, 2018.
ORTEGA BALANZA, M. “Matones en la red: cyberbullying”, Diario La Ley, n.8485, 2015.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 235


Nancy Carina Vernengo Pellejero

PALOMARES-RUIZ, A.; OTEIZA-NASCIMENTO, A.; PAZ TOLDOS, Mª.; SERRANO-MARUGÁN,


I.; MARTÍN-BABARRO, J. “Bullying and depression: the moderating effect of social support, rejection
and victimization profile”, Anales de Psicología, n.1, 2019.
PÉREZ FERRER, F. “El nuevo delito de ciberacoso o child grooming en el Código Penal español
(artículo 183 bis)”, Diario La Ley, n.7915, 2012.
PÉREZ VALLEJO, A.M. “Responsabilidad civil parental por acoso de menores y de los centros
docentes”, en: Tratamiento integral del acoso, M.P. Rivas Vallejo; M.D. García Valverde. (Dirs.), Cizur
Menor (Navarra), Ed. Thomson Reuters Aranzadi, 2015.
RUBIO ALAMILLO, J. “El ciberacoso en las redes sociales enfocado desde una perspectiva pericial
informática”, Diario La Ley, n.35305, 2017.
VALLESPÍN PÉREZ, D. Conexión penal (En la Ley de Enjuiciamiento Criminal Española. Análisis tras
su reforma por Ley 41/2015), Porto, Juruá, 2019.
VERNENGO PELLEJERO, N.C. “Reflexiones en torno a la prueba en los procesos sobre stalking.
Estado de la cuestión a la luz de la reciente jurisprudencia del Tribunal Supremo”, en: Derecho y
Proceso. Liber Amicorum del Prof. Fransico Ramos Méndez, Vol. 3, Barcelona, Ed. Atelier, 2018

236 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


El Acoso Escolar Desde la Perspectiva Procesal

OS ASPECTOS CONTEMPORÂNEOS DOS PRINCÍPIOS


DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA
NOS PROCESSOS CORRECIONAIS DO
ESTADO DE MINAS GERAIS
THE CONTEMPORARY ASPECTS OF THE PRINCIPLES OF
THE CONTRADITORY AND THE WIDE DEFENSE
IN THE CORRECTIONAL PROCESSES OF
THE STATE OF MINAS GERAIS
DOI: 10.19135/revista.consinter.00011.10
Recebido/Received 31.07.2020 – Aprovado/Approved 13.10.2020
Glaucia Milagre Menezes1 – https://orcid.org/0000-0003-1674-8032
E-mail: glauciamilagre74@gmail.com
Sérgio Henriques Zandona Freitas2 – http://orcid.org/0000-0002-7198-4567
E-mail: sergiohzf@fumec.br

Resumo: O objetivo do presente artigo é apresentar os aspectos contemporâneos no que


tange a observância dos princípios do contraditório e da ampla defesa no Processo Admi-
nistrativo Disciplinar, em comparação a processualidade do Processo Administrativo de
Responsabilização de Pessoa Jurídica, este oriundo da Lei Anticorrupção, e ambos da
competência da Controladoria-Geral do Estado de Minas Gerais. São processos diferentes,
tendo em vista que visam respectivamente apurar possíveis responsabilidades funcionais e
de atos lesivos praticados por empresas, todavia, em ambos possuem o aspecto sanciona-
dor. Visando o aprimoramento dos citados princípios no Processo Administrativo Discipli-
nar mineiro, pretende-se analisar sobre a importância do estudo da contemporaneidade
hermenêutica do direito sancionador; diferenças processuais na legislação mineira entre o
Processo Administrativo Disciplinar e o Processo Administrativo de Responsabilização de
Pessoa Jurídica e as propostas de aprimoramento do Processo Administrativo Disciplinar
mineiro. A metodologia será a jurídica-dogmática, utilizando o método hipotético-
dedutivo. O marco teórico é a “Teoria constitucionalista do processo” a qual se posiciona
pela valoração constitucional dos princípios do contraditório e da ampla defesa, tanto no
âmbito judicial quanto no administrativo, em cumprimento ao Estado Democrático de Di-
reito, que impõe em sede administrativa a isonomia entre as partes, Administração Pública

1
Mestranda em Direito Público pela Universidade Fumec. Chefe do Núcleo de Correição Administrativa da
Fundação Ezequiel Dias. Servidora Pública do Estado de Minas Gerais. E-mail: glauciamila
gre74@gmail.com. Lattes: http://lattes.cnpq.br/7367759718310512. Orcid: https://orcid.org/0000-0003-
1674-8032. Belo Horizonte, Estado de Minas Gerais, Brasil.
2
Pós-Doutor Univ. de Coimbra/UNISINOS. Doutor e Mestre em Dir. Proc. PUC Minas. Coord. do PPGD e
do PPGMCult da Univ. FUMEC. Editor Chefe da Revista MERITUM. Coord. Geral do IMDP. Assessor
TJMG. E-mail: sergiohzf@fumec.br. Lattes: http://lattes.cnpq.br/2720114652322968. Orcid:
http://orcid.org/0000-0002-7198-4567. Belo Horizonte, Estado de Minas Gerais, Brasil.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 237


Glaucia Milagre Menezes / Sérgio Henriques Zandona Freitas

e administrados, estando nestes incluídos os servidores públicos e particulares quando de-


mandados em processos sancionadores.
Palavras-chave: Contemporaneidade; Processo Administrativo Disciplinar; Processo Ad-
ministrativo de Responsabilização de Pessoa Jurídica; Estado Democrático de Direito;
Contraditório; Ampla defesa; Aprimoramento.
Abstract: This paper aims to present contemporary aspects regarding the observance of
the contradictory principles and the broad defense in the Disciplinary Administrative
Process, in comparison to the procedurally of the Administrative Process for
Accountability of Legal Entities, this one coming from the Anticorruption Law, and both
from the competence of the Comptroller General of the State of Minas Gerais. They are
different processes since they aim to determine possible functional responsibilities and
harmful acts practiced by companies, however, in both, they have the sanctioning aspect.
Aiming the improvement of the aforementioned principles in the Minas Gerais
Administrative Disciplinary Process, it is intended to analyze the importance of studying
the hermeneutic contemporaneity of the sanctioning law; procedural differences in Minas
Gerais legislation between the Disciplinary Administrative Process and the Administrative
Process for Accountability of Legal Entities and the proposals for improving the Minas
Gerais Disciplinary Administrative Process. The methodology will be legal-dogmatic,
using the hypothetical-deductive method. The theoretical framework is the
“constituticionalist Theory of the Process” which stands by the constitutional valuation of
the principles of adversarial and broad defense, both in the judicial and administrative
spheres, in compliance with the Democratic Rule of Law, which imposes isonomy
between the parties in administrative terms, Public Administration and administrators,
including public and private servants when demanded in sanctioning processes.
Keywords: Contemporaneity; Disciplinary Administrative Process; Administrative Ac-
countability Process for Legal Entities; Democratic state; Contradictory; Broad defense;
Improvement.
Sumário: 1 Introdução; 2 Da Contemporaniedade Hermeneutica do Direito Sancionador
Mineiro; 3 Diferenças entre o PAD e o PAR Quanto à Observância dos Princípios da Am-
pla Defesa e do Contraditório; 4 Propostas de Aprimoramento do Pad, de Acordo Com a
Legislação Mineira; 5 Conclusão; Referências.

1 INTRODUÇÃO
Este artigo propõe uma análise contemporânea entre o Processo Administra-
tivo Disciplinar (PAD) e o Processo Administrativo de Responsabilização de Pessoa
Jurídica (PAR), ambos mineiros, quanto aos diferentes procedimentos em que se
encontram implementados os princípios do contraditório e da ampla defesa.
Neste sentido, serão abordadas sobre a importância do estudo contemporâneo do
direito sancionador mineiro; as direnças processuais entre o PAD e o PAR na observân-
cia dos princípios do contraditório e da ampla defesa; as propostas de aprimoramento do
PAD mineiro, tendo em vista a legislação mineira. Neste caso, serão avaliados os proce-
dimentos da Lei Estadual 869, de 05.07.19523, o Projeto de Lei 39/20134, Decreto

3
MINAS GERAIS, Lei Estadual 869/1952, Disponível em: <https://www.almg.gov.br/consulte/legislacao/
completa/completa-nova – min.html?tipo=LEI&num=869&ano=1952>, Acesso em: 25 abr. 2020.
4
MINAS GERAIS, Decreto de Lei Complementar 39/2013, Disponível em: <https://www.almg.gov.br/a
tividade_parlamentar/tramitacao_projetos/texto.html?a=2013&n=39&t=PLC, Acesso em: 03 jul. 2020.

238 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Os Aspectos Contemporâneos dos Princípios do Contraditório e da Ampla Defesa nos Processos Correcionais...

Estadual 46.782, de 23.06.20155, alterado pelo Decreto 47.752, de 12.11.20196, em


vigor a partir de 12.12.2019.
A Lei Estadual 869/19527 há pouco tempo completou sessenta e oito anos de
existência. Tem a sua importância pois se constitui de um corpo normativo que
regula as condições e procedimentos na via administrativa do Estado de Minas
Gerais. Todavia, é passível de aprimoramento, em virtude da natureza democrática
dos princípios do contraditório e da ampla defesa, os quais são autoexecutáveis num
Estado Democrático de Direito.
Para alcançar o objetivo procura-se utilizar o método dedutivo, com base na
pesquisa e na revisão bibliográfica, bem como textos constitucionais e legais, em
destaque os de Minas Gerais.
Portanto, faz necessário destacar que, em âmbito correcional, pode-se con-
temporanializar a observância dos citados princípios no PAD mineiro, considerando
a sua análise conjuntural e paralela com a legislação do PAR, antes da sua alteração
legislativa pelo Decreto 47.752, de 12.11.20198, em vigor a partir de 12.12.2019,
propondo um aprimoramento do seu procedimento.

2 DA CONTEMPORANIEDADE HERMENÊUTICA DO DIREITO


SANCIONADOR MINEIRO
A Constituição Federal brasileira de 19889 dispõe no seu art. 3º sobre os
objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, estando disposto no inc. I
“uma sociedade livre, justa e igualitária”.
Ainda, na mesma Carta Constitucional10, no art. 5º, inc. LV, afirma que “aos
litigantes em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são as-
segurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”.
De acordo com Daniela Almeida da Costa e Fabiana Oliveira Bastos de Castro:

Nesse ponto específico, a Constituição Federal de 1988 inovou ao inserir diversas


garantias no corpo de seu texto, e foi além, trouxe em seu Título II os direitos e

5
MINAS GERAIS, Decreto Estadual 46.782, de 23.06.2015, Disponível em: <https://www.almg.gov.br/co
nsulte/legislacao/completa/completa.html?tipo=DEC&num=46782&comp=&ano=2015>, Acesso em: 03
jul. 2020.
6
MINAS GERAIS, Decreto Estadual 47.752, de 12.11.2019, Disponível em: <https://www.almg.gov.br/c
onsulte/legislacao/completa/completa.html?tipo=DEC&num=47752&comp=&ano=2019>, Acesso em: 03
jul. 2020.
7
MINAS GERAIS, Lei Estadual 869/1952, Disponível em: <https://www.almg.gov.br/consulte/legis
lacao/completa/completa-nova – min.html?tipo=LEI&num=869&ano=1952:>, Acesso em: 25 abr. 2020.
8
MINAS GERAIS, Decreto Estadual 47752, de 12.11.2019, Disponível em: <https://www.almg.gov.b
r/consulte/legislacao/completa/completa.html?tipo=DEC&num=47752&comp=&ano=2019>, Acesso em:
03 jul. 2020.
9
BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, Disponível em: <http://www.plan
alto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao46.htm>, Acesso em: 12 abr.2020.
10
BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, Disponível em: <http://www.pla
nalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao46.htm>, Acesso em: 12 abr.2020.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 239


Glaucia Milagre Menezes / Sérgio Henriques Zandona Freitas

garantias fundamentais, subdividindo-os em [....] direitos invidividuais e coletivos


[...]. Inegavemente uma das mais importantes garantias expressamente positivadas
pela atual Constituição foi à do princípio do devido processo legal, do qual derivam
os princípios do contraditório e da ampla defesa11.

A Administração Pública norteia a vida dos administrados através do exercício


do serviço público. O responsável pela qualidade e eficiência dessa prestação de serviço,
além dos gestores, é o servidor público, que também se inclui como parte integrante
dessa sociedade, na fruição de uma execução equilibrada das políticas públicas.
Torna-se o servidor público ao mesmo tempo um sujeito ativo pelo uso de bom
serviço público disponível, como também sujeito passivo em possível processo adminis-
trativo sancionador pelo seu irregular exercício profissional. Por isso a importância do
cidadão aos direitos e deveres funcionais a que está sujeito.
Com essas premissas, cabe questionar se o Processo Administrativo Disciplinar
(PAD), contido no Estatuto do Servidor Público em vigência no governo de Minas Ge-
rais, Lei Estadual 869/1952, encontra-se atrasado frente as necessidades contemporâneas
do direito público empregado em sede de Estado Democrático de Direito, considerando
as diretrizes contidas na Constituição Federal de 1988, e quando comparando especial-
mente ao Processo Administrativo de Responsabilização de Pessoa Jurídica (PAR),
coordenado pela mesma Corregedoria-Geral, função integrante da Controladoria-Geral
do Estado.
É importante lembrar que o citado Estatuto cumpriu há pouco tempo sessenta e
oito anos de existência e urge se atualizar, frente as garantias constitucionais a todos os
cidadãos dispostos, sendo que ao servidor público não seria diferente.
Antes de adentrar a esses questionamentos propriamente ditos, é oportuno indagar o
que seja “contemporâneo” na evolução histórica do Estado, com vistas ao direito público.
A história política brasileira caminhou de mãos dadas ao direito público na per-
sonificação de atuação do Estado. As transformações passaram por diferentes fases,
com características liberal, social e, na conteporaneidade, pelo Estado Democrático
de Direito, considerando por ponto inicial a República do Brasil.
Nesse sentido, o atual estágio político surgiu, de acordo com Vinícius Diniz
Monteiro de Barros, com “o fortalecimento do constitucionalismo, já nas ordens
jurídicas ocidentais do século XX, encontra na noção de democracia o complemento
epistemológico para a conformação hodierna do Estado. Nem liberal, nem social,
trata-se, na contemporaneidade, do Estado Democrático de Direito”12.

11
COSTA, Daniela Almeida da, CASTRO, Fabiana Oliveira Bastos de. A assistência de advogado na
investigação preliminar: garantia fundamental ou mera formalidade?, Revista Internacional CONSINTER
de Direito, vol. V, n. IX, 2º semestre de 2019, Porto, Portugal, 2019, p. 53, Disponível em:
<https://revistaconsinter.com/revistas/ano-v-numero-ix/direitos-difusos-coletivos-e-individuais-homogeneo
s/a-assistencia-do-advogado-na-investigacao-preliminar-garantia-fundamental-ou-mera-formalidade/>,
Acesso em: 12 jul 2020.
12
BARROS, Vinícius Diniz Monteiro de, “Entre democracia e (neo)liberalismo: algumas proposições crítico-
teóricas sobre mais uma “reforma da previdência” no Brasil”, in Guilherme Rojas de Cerqueira, org.,
Direito Previdenciário na visão dos defensores públicos federais, Belo Horizonte, D´Plácido, 2019, p. 300.

240 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Os Aspectos Contemporâneos dos Princípios do Contraditório e da Ampla Defesa nos Processos Correcionais...

Giogio Agamben, em “O que é contemporâneo? E outros ensaios” dispõe


que: “A contemporaniedade, portanto, é uma singular relação com o próprio tempo,
que adere a este e, ao mesmo tempo, dele toma distância; mais precisamente, é a
relação com o tempo que a este adere, através de uma dissociação e um
anacronismo”13. Acrescenta ainda que o “[...] contemporâneo é aquele que mantém
fixo o olhar no seu tempo, para nele não perceber luzes, mas o escuro. [...]”14.
Complementando a questão de contextualizar a contemporaneidade do direito
sancionador mineiro, pode-se ainda refletir sobre o “[...] objetivo da hermenêutica não é
avançar com regras para uma compreensão objetivamente válida, mas sim conceber a
própria compreensão de um modo tão lato quanto possível. [...]”15.
Menelick de Carvalho Netto, na obra “Jurisdição e Hermenêutica Constitucional
sob o paradigma do Estado Democrático de Direito” ensina que:

[...]. É a diferenciação entre um Direito superior, a Constituição, e os demais


direitos, que acopla estruturalmente os direito e política, possibilitando o
fechamento operacional, a um só tempo, do Direito e da Política. Em outros
termos, é por intermédio da Constituição que o sistema da política ganha
legitimidade operacional e é também por meio dela que a observância ao Direito
pode ser imposta de forma coercitiva. [...]16

Edward Lopes expõe ao se tratar da “[...] análise e interpretação das mensa-


gens, são o discurso: o caso é que, como os linguistas não se cansam de afirmar,
não falamos por palavras isoladas, nem por frases, nem por períodos, falamos por
discursos, formações unificadas semanticamente”17.
É nesse contexto que ora questiona-se, no meio acadêmico, quais seriam os
pontos obscuros que poderiam ser clareados na procedimentalidade democrática do
PAD, tendo em vista a experiência legislativa já ocorrida em sede de PAR, no âmbi-
to do Estado de Minas Gerais, já que o Controle Interno detém atuação essencial no
Estado e as suas atividades, como qualquer outra, estão passíveis de invalidação em
âmbito do Poder Judiciário brasileiro, quando constatam-se a não consonância com
os limites constitucionais.

13
AGAMBEN, Giorgio, O que é contemporâneo? E outros ensaios, Tradução de Vinícius Nicastro Honesko,
Chapecó, Argos, 2009, p. 59.
14
AGAMBEN, Giorgio, O que é contemporâneo? E outros ensaios, Tradução de Vinícius Nicastro Honesko,
Chapecó, Argos, 2009, p. 62.
15
LIMA, Renata Albuquerque, BRITO, Anya Lima Penha de, Uma Análise Crítica À Luz da Hermenêutica
dos Sistemas Jurídicos Inteligentes, Belo Horizonte, Revista Meritum, FUMEC, vol. 14, n. 02, julho a
dezembro, 2019, p.702.
16
NETTO, Menelick de Carvalho, Jurisdição e Hermenêutica Constitucional no Estado Democrático de
Direito, Belo Horizonte, Mandamentos, 2004, p. 25.
17
LOPES, Edward, Discurso, corpus, texto: explorações, Franca, Revista Coleção Mestrado em Linguística,
UNIFRAN, 2010, p. 36. Disponível em: <http://publicacoes.unifran.br/index.php/colecaoMestradoEmL
inguistica/article/view/328/258>, Acesso em: 08 jul. 2020.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 241


Glaucia Milagre Menezes / Sérgio Henriques Zandona Freitas

Antônio Carlos Alencar Carvalho esclarece da importância da observância do


procedimento do PAD sob o amparo da garantia isonômica constitucional aos servi-
dores públicos ao expor:

A procedimentalização significa a necessidade de que as decisões administrativas


surjam como conclusão de uma série ordenada de atos, estruturados entre si de modo
a propiciar a participação de todos os interessados, a ampla investigação da realida-
de dos fatos, a exposição dos motivos determinantes para as escolhas adotadas e a
submissão à revisão de entendimentos18.

Dando enfoque ao assunto proposto nesse artigo, em via processual o PAD


ocorre com o intuito de confirmar, por meio de processo administrativo, se aquela
possível autoria (de servidor público) seria constatada como a responsável pela irre-
gularidade funcional já detectada pela materialidade pré-produzida aos autos.
Já o PAR tem por objetivo verificar se os atos realizados por determinada
empresa poderiam ser considerados lesivos ao patrimônio público, tendo em vista o
rol contido no art. 5º da Lei Federal 12.846/201319, conhecida por Lei Anticorrup-
ção, que também se trata de um processo sancionador, porém aplicável ao particular.
A seguir, todas essas informações serão abordadas em paralelo, com o intuito
de fomentar sobre a importância da observância dos princípios ampla defesa e do
contraditório em sede de Processo Administrativo Disciplinar, e indagar sobre pos-
sibilidade de possível melhoria na tramitação desse processo, especialmente.

3 DIFERENÇAS ENTRE O PAD E O PAR QUANTO À OBSERVÂNCIA


DOS PRINCÍPIOS DA AMPLA DEFESA E DO CONTRADITÓRIO
Tanto o PAD, quanto o PAR, em nível executivo mineiro, são processos co-
ordenados pela Corregedoria-Geral, parte integrante da estrutura da Controladoria-
-Geral do Estado.
Em ambos processos pode-se ocasionar apontamentos de materialidade e in-
dícios de possível autoria, sendo que em sede de PAD, por exemplo, a comissão
processante também observará o envolvimento de entes privados na execução de
atos ilícitos e sugestionará à Autoridade máxima do Órgão/Entidade responsável
pela instauração desse competente processo o encaminhamento de uma via à Contro-
ladoria-Geral do Estado, para análise do Núcleo Técnico quanto a possível existên-
cia de elementos que venham sustentar a abertura de um PAR. Ainda, em ambos
processos poderá ocorrer danos ao erário.
Ademais, o tema responsabilidade em sede correcional do PAD/PAR inde-
pende da judicial, podendo tais decisões acumularem, todavia se decidido na esfera

18
CARVALHO, Antônio Carlos Alencar, Manual de Processo Administrativo Disciplinar e Sindicância, 3ª
ed., Belo Horizonte, Fórum, 2012, p. 127.
19
BRASIL, Lei 12.846, de 01.08.2013, Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-
2014/2013/lei/l12846.htm>, Acesso em: 31 mai. 2020.

242 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Os Aspectos Contemporâneos dos Princípios do Contraditório e da Ampla Defesa nos Processos Correcionais...

judicial pela negativa de autoria e negativa da existência material do fato, tais asser-
tivas (ou uma delas) podem influenciar na esfera administrativa.
Apesar das semelhanças, os objetivos são diferentes, bem como outras carac-
terísticas processuais.
Enquanto no PAD apura-se a responsabilidade funcional de servidor público
quanto a possível autoria, mediante a materialidade constatada em sede de sindicân-
cia ou investigação preliminar, de acordo com a Lei Estadual mineira 869/1952, no
PAR tem por pressuposto apurar ato ilícito de empresa em face do Estado, conforme
os casos arrolados no art. 5º da Lei Federal 12.876/201320.
No estudo da Lei Estadual 869/195221 é possível constatar que a responsabi-
lidade do servidor público sempre será subjetiva.
Conforme o Manual de Apuração de Ilícitos Administrativos da Controlado-
ria-Geral do Estado de Minas Gerais: “A responsabilidade disciplinar do servidor
público nada mais é do que o dever de bem exercer suas atribuições, com probida-
de, presteza, eficiência, compatibilizando-o com o compromisso assumido no termo
de posse [...]”22.
No mesmo Manual dispõe que “[...] a responsabilidade do servidor público
sempre será subjetiva, isto é, sujeita à comprovação do dolo ou da culpa”23.
Nesse sentido, preconiza na Antônio Carlos Alencar Carvalho,

O direito administrativo disciplinar não se preocupa apenas das condutas dolosas,


nas quais o agente deseja realizar o tipo infracional ou assume o risco de causar re-
sultado punível. As ações pelo infrator, que deixa de agir conforme as exigências da
cautela requeridas pelo ordenamento jurídico, também merecem censura [...]
Basta atentar para o fato de que o direito administrativo disciplinar visa a prevenir
danos ou atos impróprios para os interesses da Administração Pública, do que resul-
ta a imposição de um regime de deveres expressos de lealdade, cordialidade, pontua-
lidade, diligência, reverência e subordinação hierárquica, dentre outros, os quais po-
dem ser violados por mera culpa, a título de negligência (descaso), imprudência (fal-
ta de cuidado, realização de fato perigoso) ou imperícia (execução de ato sem a qua-
lificação técnica exigida)24.

20
BRASIL, Lei 12.846, de 01.08.2013, Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-
2014/2013/lei/l12846.htm>, Acesso em: 31 mai. 2020.
21
MINAS GERAIS, Lei Estadual 869/1952, Disponível em: <https://www.almg.gov.br/consulte
/legislacao/completa/completa-nova – min.html?tipo=LEI&num=869&ano=1952>, Acesso em: 25 abr.
2020.
22
MINAS GERAIS, Manual de Apuração de Ilícitos Administrativos, Controladoria-Geral do Estado de
Minas Gerais, p. 42, Disponível em: <http://cge.mg.gov.br/phocadownload/manuais_cartilhas/pdf/Ma
nual%20de%20Apurao%20de%20Ilcitos%20Administrativos%202.pdf>, Acesso em: 16 jun. 2020.
23
MINAS GERAIS, Manual de Apuração de Ilícitos Administrativos, Controladoria-Geral do Estado de
Minas Gerais, p. 43, Disponível em: <http://cge.mg.gov.br/phocadownload/manuais_cartilhas/pdf/Manual
%20de%20Apurao%20de%20Ilcitos%20Administrativos%202.pdf,> Acesso em: 16 jun. 2020.
24
CARVALHO, Antônio Carlos Alencar, Manual de Processo Administrativo Disciplinar e Sindicância, 3ª
ed., Belo Horizonte, Fórum, 2012, p. 175.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 243


Glaucia Milagre Menezes / Sérgio Henriques Zandona Freitas

Isto quer dizer que, enquanto servidor público, no processo deve estar carac-
terizado o dolo, a intenção de agir, ou a culpa, que se é cometida pela imprudência,
imperícia ou negligência, quando o servidor público tenha realizado um ato irregu-
lar, embora não tenha desejado o resultado.
Tanto no dolo quanto na culpa se fazem necessários os esclarecimentos dos
fatos, em face dos princípios da ampla defesa e do contraditório em sede da instru-
ção processual, que acontece entre a citação e o despacho de indiciamento, podendo
também exaurir na fase das alegações finais, com o intuito de preservar a prevalên-
cia desses princípios.
É preciso que o servidor processado tenha o cuidado em demonstrar à Comis-
são que a prova somente pode ser adquirida posteriormente à instrução. Isto porque,
tanto à Administração Pública, quanto o servidor público, não podem procrastinar/
tumultuar o processo. Muitos desses atos posteriores poderiam ensejar a oitiva de
testemunha (ainda não ouvida) ou diligências, como uma perícia, por exemplo.
Não é possível no Estado Democrático de Direito que o servidor público so-
fra uma penalidade e que, por outro lado, não se tenha nos autos a comprovação da
sua conduta irregular e o resultado advindo dela, ou seja, a clareza quanto ao nexo
de causalidade, além da caracterização do dolo ou culpa, que ensejaram a sua res-
ponsabilização, pela execução ou omissão de atos, que vão ser considerados ilícitos
em sede disciplinar.
Na explicitação dos motivos da decisão, a autoridade deverá demonstrar as
suas razões de fato e direito, incluindo nessas a valoração quanto o agir do servidor
público, ou seja, a avaliação quanto a intenção do servidor em praticar ou deixar de
exercer o ato, que, por consequência, considerou-se ilícito.
No processo relativo à responsabilização da pessoa jurídica, a regra é a res-
ponsabilidade objetiva, sendo subjetiva apenas para os administradores e sócios
administradores, em virtude o § 6º do art. 37 da Constituição Federal e da Lei Fede-
ral 12.876/201325. Considerando esse entendimento, nos autos a empresa deve de-
monstrar que não agiu com a intenção de causar dano ao Estado, podendo ainda
demonstrar o Plano de Integridade em execução ou demonstrar o interesse no acordo
de leniência.
Outra diferenciação é a constituição da Comissão, sendo que no PAD são três
servidores públicos estáveis e no PAR, dois.
Quanto ao momento de defesa preliminar, no PAD são de dez dias, enquanto
no PAR, são trinta. É possível perceber uma extensão de prazo maior no PAR.
Ainda, no PAR não há o despacho de indiciamento como acontece no PAD.
As possíveis imputações legais quanto os atos ilícitos, em tese, já estão esclarecidos
desde a notificação inicial. Não quer dizer que no PAD seja aconselhável alterar as dis-
posições legais no despacho de indiciamento, com relação à Portaria inaugural. Não seria
uma conduta prudente da Comissão, a não ser quando esta estivesse diante de uma prova

25
BRASIL, Lei 12.846, de 01.08.2013, Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-
2014/2013/lei/l12846.htm>, Acesso em: 31 mai. 2020.

244 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Os Aspectos Contemporâneos dos Princípios do Contraditório e da Ampla Defesa nos Processos Correcionais...

produzida em instrução, mediante o exercício da ampla defesa e do contraditório e que,


anteriormente, a Comissão não tivesse conhecimento. Neste caso é plenamente justificá-
vel, considerando o Estado Democrático de Direito.
Tanto no PAD quanto no PAR aconselhasse à Comissão ofertar o prazo de cincos
dias à defesa para a manifestação quando na juntada de documentos novos, preferenci-
almente, antes da oitiva de testemunhas. Porém, poderá ocorrer posteriormente, quando o
mesmo prazo será disponibilizado.
Na oitiva de testemunhas, tanto no PAD quanto no PAR a orientação dada à
Comissão é a escuta na ordem das testemunhas apresentadas pela Comissão e depois
da defesa. Por último, será colhida a declaração do servidor processado, bem como
do representante da empresa, ambos acompanhados normalmente pelos seus respec-
tivos advogados.
É oportuno esclarecer que tanto no PAD, quanto no PAR, em sede de depoi-
mento não se permite que a testemunha minta, sob pena de responder pelo art. 342
do Código Penal26 (testemunho falso). Será advertida e questionada se amiga ou
inimiga da parte processada e tais procedimentos são registrados em ata.
Na colheita do termo de declaração, a parte declarante não está obrigada a falar,
podendo se calar, visto que não pode ser coagida a produzir prova contra si mesma e este
alerta é dito antes de se iniciar a oitiva pela Comissão, e registrado em ata. Mentir em
oitiva de declaração pode ensejar a responsabilização por denunciação caluniosa, de
acordo com o art. 339 do Código Penal, dependendo da gravidade do que foi dito, po-
dendo tal fato ser reportado no relatório final, e sugerido à autoridade máxima do Ór-
gão/Entidade a dar conhecimento do fato à autoridade policial.
A Comissão do PAR antes de formalizar o relatório conclusivo, intima a empresa
para se manifestar nas alegações finais, no prazo de dez dias. Posteriormente, direciona à
Advocacia-Geral do Estado de Minas Gerais (AGE/MG) a conclusão dos seus trabalhos,
para apreciação quanto à aplicação da sanção a ser aplicada, de acordo com a redação
dada pelo Decreto 47.752, de 12.11.201927, em vigor a partir de 12.12.2019.
Na redação anterior a esse Decreto, a Comissão realizava o seu relatório conclusivo
e remetia os autos AGE/MG, para apreciação, e após essas duas manifestações, o Contro-
lador-Geral na posse dos autos, intimava a empresa para apresentar suas alegações finais.
É perceptível que o procedimento foi alterado com o Decreto 47.752/201928. O
questionamento se faz em qual deles há maior oferta da ampla defesa e do contraditório.
A alteração efetuada possivelmente trouxe maior segurança jurídica aos trabalhos
efetuados pela comissão, otimizando o fluxo do PAR.

26
BRASIL, Código Penal. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compil
ado.htm,> Acesso em: 30 jul. 2020.
27
MINAS GERAIS, Decreto Estadual 47.752, de 12.11.2019, Disponível em: <https://www.almg.gov.br/
consulte/legislacao/completa/completa.html?tipo=DEC&num=47752&comp=&ano=2019>, Acesso em:
03 jul. 2020.
28
MINAS GERAIS, Decreto Estadual 47.752, de 12.11.2019, Disponível em: <https://www.almg.gov.
br/consulte/legislacao/completa/completa.html?tipo=DEC&num=47752&comp=&ano=2019>, Acesso em:
03 jul. 2020.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 245


Glaucia Milagre Menezes / Sérgio Henriques Zandona Freitas

Tecnicamente, talvez possa se afirmar que a manifestação da AGE/MG teria mais


subsídios quanto a legalidade da instrução, após a leitura do processo, onde estão conti-
dos a defesa final da empresa e o relatório conclusivo da comissão, e se posicionará
sobre a sanção sugerida ou não, mediante as fundamentações legal e probatória contida
nos autos. Cabe esclarecer que a avaliação do mérito é da competência exclusiva da
comissão processante, apenas.
Ademais, cabe à empresa o direito de contradizer ao posicionamento da comis-
são, antes da manifestação da AGE/MG, para que esta Entidade se manifeste em atenção
aos dois posicionamentos apresentados.
Todavia, outra indagação é possível surgir quanto a observância da ampla defesa
e do contraditório na construção das alegações finais da empresa. Ao se questionar se a
ordem processual tivesse permanecido como antes de dezembro de 2019, ou seja, se a
empresa pudesse se manifestar após a emissão do parecer da AGE/MG, tendo a visão
conjunta do teor do relatório conclusivo da Comissão e dos pontos abarcados no parecer
da Procuradoria, poderia, de fato, estar ciente do teor de todas acusações e fatos a ela
imputados, considerando que a AGE/MG também faz parte do conjunto de Órgãos e
Entidades estatais.
Esse momento processual após a emissão do relatório final/conclusivo da Comis-
são até a decisão diferencia-se muito no PAD e no PAR, mesmo com a alteração do
procedimento do PAR em 2019.
Com o despacho de indiciamento, a comissão do PAD intimará o servidor pro-
cessado para apresentar a sua defesa final. A partir do recebimento desse documento, a
Comissão se reunirá para analisar os argumentos e provas que houver. O relatório final
será emitido, que em sede da central da Controladoria-Geral, emitirá um Parecer Técni-
co, sendo em seguida decidido pelo Controlador-Geral.
Em âmbito das Controladorias Setoriais (que compõe o Órgão da Administração
Pública Direta) e das Seccionais (que integram a estrutura organizacional da Entidade
Indireta da Administração Pública Indireta), após a Comissão finalizar os trabalhos, o
processo será encaminhado para o Núcleo de Correição Administrativa que, juntamente
com a respectiva Controladoria, emitirá uma Nota Técnica. Depois de finalizada essa
manifestação, o processo será direcionado respectivamente para a autoridade máxima
do Órgão ou da Entidade para decisão.
A autoridade máxima, de acordo com os princípios da discricionariedade e da
hierarquia, poderá seguir o posicionamento da comissão e/ou da Nota Técnica (se
divergirem) ou entender de maneira diferente em sua decisão, a qual dará solução ao
caso, naquele momento (caso o processado não recorra). Todavia, a supremacia do
interesse público deve ser visto com ressalvas, considerando a relevância do princí-
pio da segurança jurídica na dinâmica dos atos administrativos, bem como a exigência
pela Lei Federal 13.869, de 05.09.201929, que trata do abuso de autoridade.

29
“Art. 1º Esta Lei define os crimes de abuso de autoridade, cometidos por agente público, servidor ou não,
que, no exercício de suas funções ou a pretexto de exercê-las, abuse do poder que lhe tenha sido atribuído.
§ 1º As condutas descritas nesta Lei constituem crime de abuso de autoridade quando praticadas pelo
agente com a finalidade específica de prejudicar outrem ou beneficiar a si mesmo ou a terceiro, ou, ainda,
por mero capricho ou satisfação pessoal.

246 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Os Aspectos Contemporâneos dos Princípios do Contraditório e da Ampla Defesa nos Processos Correcionais...

Considerando a discussão acadêmica, uma alteração processualista à Lei Estadual


869/195230 quanto ao momento da apresentação da defesa final do processado poderia,
em tese, ofertar melhor amparo ao processado quando exercida, por analogia, ao proce-
dimento do Decreto Estadual 46.782/201531, antes da sua alteração pelo Decreto 47.752,
de 12.11.201932.
Nesse contexto, a manifestação da AGE/MG após o relatório conclusivo, no qual
que já tenha avaliado a defesa final, seria um reforço ao posicionamento do Estado, no
tocante à legalidade seguida naquele processo, ao passo que, se o processado tivesse
acesso e pudesse se manifestar por último, antes da decisão da autoridade máxima, pode-
ria ensejar uma visão mais sistêmica das informações, considerando uma maior abran-
gência do exercício da ampla defesa e do contraditório àquele que responde um processo
administrativo na via correcional, que, reforçasse, em momento algum deixou de aconte-
cer, considerando o Estado Democrático de Direito que rege as atuais Constituição Fede-
ral33 e do Estado de Minas Gerais34.

4 PROPOSTAS DE APRIMORAMENTO DO PAD, DE ACORDO COM A


LEGISLAÇÃO DO ESTADO DE MINAS GERAIS
Considerando as diretrizes que norteiam o Processo Administrativo de Responsa-
bilização de Pessoa Jurídica, de acordo com a Lei Federal 12.846/201335, regulamentada
pelo Decreto Estadual n. 46.782/201536, este antes da alteração dada pelo Decreto Esta-
dual 47.752/201937, e o atual procedimento aplicado ao Processo Administrativo Disci-

§ 2º A divergência na interpretação de lei ou na avaliação de fatos e provas não configura abuso de


autoridade”.
BRASIL, Lei 13.869, de 05.09.2019, Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-20
22/2019/lei/L13869.htm>. Acesso em: 30 jul. 2020.
30
MINAS GERAIS, Lei Estadual 869/1952, Disponível em: <https://www.almg.gov.br/consulte/legis
lacao/completa/completa-nova – min.html?tipo=LEI&num=869&ano=1952>, Acesso em: 25 abr. 2020.
31
MINAS GERAIS, Decreto Estadual 46.782, de 23.06.2015, Disponível em: <https://www.almg.gov.br/
consulte/legislacao/completa/completa.html?tipo=DEC&num=46782&comp=&ano=2015>, Acesso em:
03 jul. 2020.
32
MINAS GERAIS, Decreto Estadual 47.752, de 12.11.2019, Disponível em: <https://www.almg.gov.br
/consulte/legislacao/completa/completa.html?tipo=DEC&num=47752&comp=&ano=2019>, Acesso em:
03 jul. 2020.
33
BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, Disponível em: <http://www.planalto
.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao46.htm>, Acesso em: 12 abr.2020.
34
MINAS GERAIS, Constituição Estadual de Minas Gerais, Disponível em: <https://www.almg.
gov.br/export/sites/default/consulte/legislacao/Downloads/pdfs/ConstituicaoEstadual.pdf> Acesso em: 30
jul. 2020.
35
BRASIL, Lei 12.846, de 01.08.2013, Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-
2014/2013/lei/l12846.htm>, Acesso em: 31 mai. 2020.
36
MINAS GERAIS, Decreto Estadual 46.782, de 23.06.2015, Disponível em: <https://www.almg.gov.br/
consulte/legislacao/completa/completa.html?tipo=DEC&num=46782&comp=&ano=2015>, Acesso em:
03 jul. 2020.
37
MINAS GERAIS, Decreto Estadual 47.752, de 12.11.2019, Disponível em: <https://www.almg.gov.br/co
nsulte/legislacao/completa/completa.html?tipo=DEC&num=47752&comp=&ano=2019>, Acesso em: 03
jul. 2020.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 247


Glaucia Milagre Menezes / Sérgio Henriques Zandona Freitas

plinar, conforme a Lei Estadual 869/195238, bem como a importância dos trabalhos
desenvolvidos em sede de discussão acadêmica, é possível afirmar que a processualística
do PAR antes da sua alteração retrata melhor a natureza fundamental dos princípios da
ampla defesa e do contraditório, em sede de processo administrativo.
Reforçando o que já foi dito, trata-se de uma discussão acadêmica e, neste senti-
do, não desconstitui e nem retira a importância dos trabalhos desenvolvidos e nem a
maneira pela qual esses princípios são respeitados, como são exercidos no desempe-
nho das comissões processantes que tanto se desdobram em não faltar a observância
desses fundamentos constitucionais, tanto no PAD, quanto no PAR.
Para aguçar o estudo, foi pesquisado no site da Assembleia Legislativa de Minas
Gerais sobre a existência de algum projeto de lei vigente que trata do Estatuto do Servi-
dor Público de Minas Gerais. Na busca foi apresentada uma relação de atos que dentre
eles está o Projeto de Lei Complementar 39/201339. Este PLC tem atualmente a situação
de “arquivado”. Fazendo uma leitura desse documento, dos arts. 208 a 217 se faz remis-
são as fases do relatório final e julgamento. Apenas em caso de ressarcimento ao erário
os autos seriam encaminhados pela autoridade máxima à AGE/MG.
O PLC 39/201340 não diferencia em muito quanto ao PAD vigente, a não ser
quanto: 1) ao prazo de cinco dias para a iniciação do PAD, contado da publicação do
extrato do ato de instauração e tendo prazo de conclusão de até noventa dias da data de
seu início, podendo ser reconduzidos os trabalhos por igual período (art. 189). Atualmen-
te, o prazo é de três dias da referida publicação, e o prazo inicial dos trabalhos são de
sessenta dias, podendo ser reconduzidos; 2) ao número máximo de cinco testemunhas
(art. 201), o prazo de defesa, quando houver mais de um acusado, passaria de dez para
vinte dias (art. 206). Na processualística atual não se determina o número certo de teste-
munhas e o prazo de apresentação de defesa são de dez dias a cada servidor processa-
do, podendo ser concomitante ou não, ou seja, dependerá da efetivação da cita-
ção/intimação; 3) o prazo de julgamento reduziria de sessenta para trinta dias e in-
troduziu a questão de direcionar os autos, na finalização dos trabalhos, à Procurado-
ria (AGE/MG), em caso de ressarcimento (art. 217).
Todavia, como está retratado no título desse tópico, a intenção do presente estudo
é apresentar propostas de melhoria na tramitação do PAD mineiro, em meio acadêmico.
Assim, quanto as fases de instauração e instrução, até o encerramento das oitivas, inclu-
indo o despacho de indiciamento no PAD, estão bem delimitados nos dias atuais.
Dando continuidade as demais fases, a intenção é fazer um paralelo do proce-
dimento que contempla a legislação atual do PAD mineiro com a legislação que a

38
MINAS GERAIS, Lei Estadual 869/1952, Disponível em: <https://www.almg.gov.br/consulte/legislacao/
completa/completa-nova – min.html?tipo=LEI&num=869&ano=1952>, Acesso em: 25 abr. 2020.
39
MINAS GERAIS, Decreto de Lei Complementar 39/2013, Disponível em: <https://www.almg.gov.
br/atividade_parlamentar/tramitacao_projetos/texto.html?a=2013&n=39&t=PLC>, Acesso em: 03 jul. 2020.
40
MINAS GERAIS, Decreto de Lei Complementar 39/2013, Disponível em: <https://www.almg.gov.br/a
tividade_parlamentar/tramitacao_projetos/texto.html?a=2013&n=39&t=PLC>, Acesso em: 03 jul. 2020.

248 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Os Aspectos Contemporâneos dos Princípios do Contraditório e da Ampla Defesa nos Processos Correcionais...

regulamenta a Lei Anticorrupção, ou seja, o Decreto Estadual 46.782/201541, com


redação original (antes da alteração dada pelo Decreto Estadual 47.752/201942).
Para facilitar o estudo, na nova proposta legislativa, seria, após o despacho de in-
diciamento, o servidor seria intimado para se manifestar. A Comissão elaboraria o relató-
rio final e os autos seriam encaminhados à AGE/MG para emissão de seu parecer, dire-
cionando daí para o Núcleo Técnico e após, ao Controlador-Geral do Estado, caso o
processo tramite na sede Central; ou ao Núcleo de Correição Administrati-
va/Controladoria Setorial ou Seccional e, posteriormente, à autoridade máxima do Ór-
gão/Entidade. Após esse ato, intimaria o servidor público para apresentar a sua defesa
final. Com essa procedimentalidade, o processado poderia se defender de todas as alega-
ções direcionadas a ele em sede de processo administrativo.

5 CONCLUSÃO
Os atos administrativos são ações no cumprimento do interesse público, no senti-
do de que a todos os administrados possam se estender às garantias fundamentais já
impostas constitucionalmente.
No âmbito correcional não poderia ser diferente. No ambiente acadêmico, é pos-
sível discutir se a processualística relativa ao PAR antes da alteração do Decreto Estadu-
al 46.782/201543 pelo Decreto Estadual 47.752/201944, que pudesse corresponder a mai-
or abrangência de atuação dos princípios do contraditório e ampla defesa, embora em
ambos processos, PAD e PAR, há a observância atualmente desses princípios.
O administrado tem o direito de saber quais os fatos alegados em seu desfa-
vor, de ter acesso as provas, de se defender delas, para que a relação processual
estabelecida no âmbito administrativo possa ter validade.
Ainda, destaca-se a motivação e a legalidade, que são as ferramentas proces-
suais indissociáveis na elaboração da decisão válida pela autoridade máxima. Toda-
via, até a chegada desse veredicto muitos procedimentos são sucessivamente reali-
zados. Neste sentido, os atos processuais se norteiam pelo direcionamento da acusa-
ção e após, da defesa, nessa ordem.
Por mais que as comissões processantes tenham esmeros nos trabalhos de-
senvolvidos, isso é inquestionável, com a Constituição de 1988 exige-se o aprimorar

41
MINAS GERAIS, Decreto Estadual 46.782, de 23.06.2015, Disponível em: <https://www.almg.gov.br/
consulte/legislacao/completa/completa.html?tipo=DEC&num=46782&comp=&ano=2015>, Acesso em:
03 jul. 2020.
42
MINAS GERAIS, Decreto Estadual 47.752, de 12.11.2019, Disponível em: <https://www.almg.gov.br/
consulte/legislacao/completa/completa.html?tipo=DEC&num=47752&comp=&ano=2019>, Acesso em:
03 jul. 2020.
43
MINAS GERAIS, Decreto Estadual 46.782, de 23.06.2015, Disponível em: <https://www.almg.gov.br
/consulte/legislacao/completa/completa.html?tipo=DEC&num=46782&comp=&ano=2015>, Acesso em:
03 jul. 2020.
44
MINAS GERAIS, Decreto Estadual 47.752, de 12.11.2019, Disponível em: <https://www.almg.gov.br/
consulte/legislacao/completa/completa.html?tipo=DEC&num=47752&comp=&ano=2019>, Acesso em:
03 jul. 2020.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 249


Glaucia Milagre Menezes / Sérgio Henriques Zandona Freitas

o procedimento do PAD mineiro, mas nunca desmerecer tudo que já foi construído
até aqui. Seguindo esse entendimento, os princípios do contraditório e da ampla
defesa poderiam ser ensejados ao servidor após o parecer da AGE/MG, antes de ser
elaborada a decisão final do processo. A intenção é fomentar novos pensamentos de
procedimentalidade na dinâmica que exige o Estado Democrático de Direito. É o
olhar diferenciado no que pode se somar às garantias fundamentais, acrescer a de-
mocraticidade ao que já é bem empregado.
Portanto, as sugestões acadêmicas trazidas vêm de encontro ao controle da
Administração Pública à luz da Constituição de 198845, já que o Estatuto do Servi-
dor Público mineiro, neste ano, cumpriu sessenta e oito anos de existência e precisa
de uma nova interpretação, até que uma nova legislação possa ser editada. Por meio
de uma visão de alteração legislativa, é possibilitar ao Estatuto do Servidor Público a
contemporaneidade, ao que se exige uma sociedade diferenciada de quando a Lei
Estadual 869/195246 foi elaborada e publicada.

REFERÊNCIAS
AGAMBEN, Giorgio, O que é contemporâneo? E outros ensaios, Tradução de Vinícius Nicastro Hones-
ko, Chapecó, Argos, 2009.
ALEXY, Robert, Teoria dos direitos fundamentais, Tradução deVirgílio Afonso da Silva, 2ª ed., São
Paulo, Malheiros, 2011.
ALMEIDA, Débora Cristina Resende de, Repensando representação política e legitimidade democrática:
entre a unidade e a pluralidade, 2011, Tese, Universidade Federal de Minas Gerais, Faculdade de Filoso-
fia e Ciências Humanas, 2011.
ALVES, Léo da Silva, Processo disciplinar passo a passo, 2ª ed., Brasília, Brasília Jurídica, 2004.
ALVES, Léo da Silva, Direito disciplinar para concursos jurídicos: guia de controle da disciplina, 1ª ed,
São Paulo, EDIPRO, 2012.
ALVIM, José Eduardo Carreira, Teoria Geral do Processo, 8ª ed., Rio de Janeiro, Forense, 2003.
ÁVILA, Humberto, Repensando o princípio da supremacia do interesse público sobre o particular,
Revista Eletrônica sobre a Reforma do Estado, Salvador, Instituto Brasileiro de Direito Público, n. 11,
setembro/outubro/novembro, 2007, Disponível em: <https://fliphtml5.com/fdns/yvgj/basic, Acesso em:
05 abr.2020.
ÁVILA, Humberto, Teoria dos princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos, 13ª ed, São
Paulo, Malheiros, 2012.
BARROS, Vinícius Diniz Monteiro de, “Entre democracia e (neo)liberalismo: algumas proposições crítico-
teóricas sobre mais uma “reforma da previdência” no Brasil”, in Guilherme Rojas de Cerqueira, org., Direito
Previdenciário na visão dos defensores públicos federais, Belo Horizonte, D´Plácido, 2019.
BARRETO, Carolina Ferreira, O princípio do contraditório e da ampla defesa no processo administrati-
vo disciplinar, Disponível em: <https://ri.ufs.br/bitstream/riufs/4357/1/CAROLINA_PEREIRA_BAR
RETO.pdf>, Acesso em: 20 jan.2020.
BASTOS, Celso Ribeiro, Curso de Direito Constitucional, São Paulo, Celso Bastos Editor, 2002.

45
BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, Disponível em: <http://www.planalto.
gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao46.htm, Acesso em: 12 abr.2020.
46
MINAS GERAIS, Lei Estadual 869/1952, Disponível em: <https://www.almg.gov.br/consulte/legis
lacao/completa/completa-nova-min.html?tipo=LEI&num=869&ano=1952, Acesso em: 25 abr. 2020.

250 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Os Aspectos Contemporâneos dos Princípios do Contraditório e da Ampla Defesa nos Processos Correcionais...

BERTONCINI, Mateus, CUSTÓDIO FILHO, Ubirajara, SANTOS, José Anacleto Abduch, Comentários
à Lei 12.846/2013: Lei Anticorrupção, São Paulo, Revista dos Tribunais, 2014.
BINENBOJM, Gustavo, “A constitucionalização do direito administrativo no Brasil: um inventário de
avanços e retrocessos”, in Cláudio Pereira de Souza Neto e Daniel Sarmento, coord., A Constitucionaliza-
ção do Direito: Fundamentos Teóricos e Aplicações Específicas, Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2007.
BONAVIDES, Paulo, Curso de Direito Constitucional, 18ª ed., São Paulo, Malheiros Editores, 2006.
BRASIL, Lei 12.846, de 01.08.2013, Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-
2014/2013/lei/l12846.htm>, Acesso em: 31 mai. 2020.
BRASIL, Lei 13.869, de 05.09.2019, Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-
2022/2019/lei/L13869.htm>, Acesso em: 30 jul. 2020.
BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, Disponível em: <http://www.planalto.
gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao46.htm>, Acesso em: 12 abr.2020.
BRASIL, Código Penal. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848com
pilado.htm>, Acesso em: 30 jul. 2020.
BULOS, Uadi Lammêgo, Curso de Direito Constitucional. 5ª ed., São Paulo, Saraiva, 2010.
CANOTILHO, José Joaquim Gomes, Direito constitucional, 6ª ed., Coimbra, Almedina, 1993.
CARVALHO, Antônio Carlos Alencar, Manual de Processo Administrativo Disciplinar e Sindicân-
cia, 3ª ed., Belo Horizonte, Fórum, 2012.
CARVALHO, Kildare Gonçalves, Direito Constitucional, 13 ª ed., Belo Horizonte, Del Rey, 2007.
CASTRO, Carlos Roberto de Siqueira, O Devido Processo Legal e a Razoabilidade das Leis na Nova
Constituição do Brasil, Rio de Janeiro, Forense, 1989.
CHEVALLIER, Jacques, O Estado de direito, Belo Horizonte, Fórum, 2013.
COSTA, Daniel Tempski Ferreira da, Devido processo legal em face da Lei 9784/1999, Disponível em:
<https://jus.com.br/947235-daniel-tempski-ferreira-da-costa/publicacoes, Acesso em: 22 jan. 2020.
COSTA, Daniela Almeida da, CASTRO, Fabiana Oliveira Bastos de. A assistência de advogado na
investigação preliminar: garantia fundamental ou mera formalidade? , Revista Internacional CONSIN-
TER de Direito, v. V, n. IX, 2º semestre de 2019, Porto, Portugal, 2019. Disponível em:
<https://revistaconsinter.com/revistas/ano-v-numero-ix/direitos-difusos-coletivos-e-individuais-homoge
neos/a-assistencia-do-advogado-na-investigacao-preliminar-garantia-fundamental-ou-mera-formalidade/>
Acesso em: 12 jul 2020.
COSTA, José Armando da, Teoria e prática do processo administrativo disciplinar, 4ª ed., Brasília,
Jurídica, 2004.
CRETELLA NETO, José, Fundamentos principiológicos do processo civil, Rio de Janeiro, Forense,
2002.
CUNHA, Rogério Sanches, Leis Penais Especiais: comentadas artigo por artigo, Rogério Sanches
Cunha, Ronaldo Batista Pinto, Renee de Ó Souza, coord., 2ª ed., Salvador, Jus Podivm 2019.
DALLARI, Adilson Abreu, FERRAZ, Sérgio, Processo Administrativo, São Paulo, Malheiros Editores,
2001.
DANTAS, Paulo Roberto de Figueiredo, Direito constitucional. 5ª ed., São Paulo, Atlas, 2009.
DIAS, Ronaldo Brêtas de Carvalho, Processo Constitucional e Estado Democrático de Direito, 3ª ed., Belo
Horizonte, Del Rey, 2015.
FERRAZ, Sérgio Ferraz, DALLARI, Adilson Abreu, Processo Administrativo, São Paulo, Malheiros, 2001.
FREITAS, Sérgio Henrique Zandona, A impostergável reconstrução Principiológico-Constitucional do
Processo Administrativo Disciplinar no Brasil, 2014, Tese, Pontifícia Universidade Católica de Minas
Gerais, Belo Horizonte, 2014.
FILHO, José dos Santos Carvalho, Manual de Direito Administrativo, 17ª ed., Rio de Janeiro, Lumen
Juris, 2007.
FILHO, Nagib Slaibi, Direito Constitucional, 3ª ed., Rio de Janeiro, Forense, 2009.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 251


Glaucia Milagre Menezes / Sérgio Henriques Zandona Freitas

FILHO, Luiz Francisco Mota Santiago, PORTES, Louise Dias Portes, CUNHA, Um panorama da apli-
cação da Lei Anticorrupção nos estados brasileiros, in Matheus, rev., Disponível em: <https://www.jo
ta.info/wp-content/uploads/2018/10/60633e78423a649ba4f81cc39a85c97e.pdf, Acesso em: 06 jun. 2020.
K. PREUβ, Ulrich, “Os elementos normativos da soberania”, in MERLE, Jean-Christophe, MOREIRA,
Luiz, org., Direito e legitimidade. São Paulo, Landy Livraria, 2003.
LEAL, André Cordeiro, Instrumentalidade do Processo em crise, Belo Horizonte, Mandamentos, 2008.
LEAL, Rosemiro Pereira, Teoria processual da decisão jurídica, São Paulo, Landy, 2002.
LEAL, Rosemiro Pereira, Teoria geral do processo, Primeiros estudos, Belo Horizonte, Fórum, 2018.
LIMA, Arnaldo Esteves, O processo administrativo no âmbito da administração pública federal: Lei
9.784 de 29.01.1999. Belo Horizonte, Del Rey, 2014.
LIMA, Renato Brasileiro de, Manual de processo penal, Niterói, Impetus, 2011.
LIMA, Renata Albuquerque, BRITO, Anya Lima Penha de, Uma Análise Crítica À Luz Da Hermenêutica
Dos Sistemas Jurídicos Inteligentes, Belo Horizonte, Revista Meritum, FUMEC, vol.14, n. 02, julho a
dezembro, 2019.
LIVIANU, Roberto, Corrupção. 3ª ed., São Paulo, Quartier Latin do Brasil.
LENZA, Pedro, Direito constitucional esquematizado, 11ª ed., São Paulo, Método, 2007.
LOPES, Edward, Discurso, corpus, texto: explorações, Franca, Revista Coleção Mestrado em Linguísti-
ca, UNIFRAN, 2010, Disponível em: <http://publicacoes.unifran.br/index.php/colecaoMestradoE
mLinguistica/article/view/328/258>, Acesso em: 08 jul. 2020.
LUZ, Egberto Maia, Sindicância e Processo Disciplinar, 1ª ed., São Paulo, EDIPRO, 1999.
MEDINA, Paulo Roberto de Gouvêa, Direito Processual Constitucional, 3 ed. Rio de janeiro, 2006.
MENDONÇA, Henrique Gaspar Mello de, O poder discricionário e o controle de juridicidade dos atos
administrativos, in KNOERR, Fernando Gustavo e CARVALHO, Luciani Coimbra de, coord., XXVIII
Encontro Nacional do Conpedi Goiânia,GO., Florianópolis, CONPEDI, 2019, Disponível em:
<http://conpedi.danilolr.info/publicacoes/no85g2cd/582k1t95/1FW46v40t00aL93g.pdf, Acesso em: 08
mar. 2020.
MEIRELLES, Hely Lopes, Direito administrativo brasileiro, 38ª ed. São Paulo, Malheiros, 2012.
MINAS GERAIS, Manual de Apuração de Ilícitos Administrativos, Controladoria-Geral do Estado de
Minas Gerais, Disponível em: <http://cge.mg.gov.br/phocadownload/manuais_cartilhas/pdf/Manual
%20de%20Apurao%20de%20Ilcitos%20Administrativos%202.pdf>, Acesso em: 16 jun. 2020.
MINAS GERAIS, RESOLUÇÃO CONJUNTA CGE/AGE N. 4, DE 12.11.2019, Disponível em:
<http://www.age.mg.gov.br/images/stories/downloads/resolucoes/resolucoes_conjuntas/2019-resolucao
conjunta-4-cge-age.pdf>, Acesso em: 11 jun.2020.
MINAS GERAIS, Constituição Estadual de Minas Gerais, Disponível em: <https://www.almg.gov.br/
export/sites/default/consulte/legislacao/Downloads/pdfs/ConstituicaoEstadual.pdf>, Acesso em: 30 jul. 2020.
MINAS GERAIS, Lei Estadual 869/1952, Disponível em: <https://www.almg.gov.br/consulte/legis
lacao/completa/completa-nova-min.html?tipo=LEI&num=869&ano=1952>. Acesso em: 25 abr. 2020.
MINAS GERAIS, Decreto Estadual 46.782, de 23.06.2015, Disponível em: <https://www.almg.gov.br/
consulte/legislacao/completa/completa.html?tipo=DEC&num=46782&comp=&ano=2015>, Acesso em:
03 jul. 2020.
MINAS GERAIS, Decreto Estadual 47752, de 12.11.2019, Disponível em: <https://www.almg.
gov.br/comsulte/legislacao/completa/completa.html?tipo=DEC&num=47752&comp=&ano=2019>,
Acesso em: 03 jul. 2020.
MINAS GERAIS, Decreto de Lei Complementar 39/2013, Disponível em: <https://www.almg.gov
.br/atividade_parlamentar/tramitacao_projetos/texto.html?a=2013&n=39&t=PLC>, Acesso em: 03 jul.
2020.
MORAES, Alexandre de, Direito constitucional, 13ªed., São Paulo, Atlas, 2003.
NETTO, Menelick de Carvalho, Jurisdição e Hermenêutica Constitucional no Estado Democrático de
Direito, Belo Horizonte, Mandamentos, 2004.

252 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Os Aspectos Contemporâneos dos Princípios do Contraditório e da Ampla Defesa nos Processos Correcionais...

LAVINAS, Victor Okuyama, Processo administrativo de responsabilização: breve análise dos desafios
frente à Lei anticorrupção, Lei 12.846, de 2013 e ao Decreto 8.420, de 2015, Disponível em:
<https://itr.ufrrj.br/portal/wp-content/uploads/2017/10/t185-1.pdf>, Acesso em: 01 jun. 2020.
PARANHOS, Ana Paula do Vale, A imparcialidade nas decisões judiciais e sua reconstrução no Estado
Democrático de Direito, 2010, Dissertação, Universidade Fumec, Faculdade de Ciências Humanas, 2010.
OLICITANTE, Suspensão temporária e demais sanções, Disponível em: <http://www.olicitante.com.
br/suspensao-temporaria-alcance-tcu-stj/>, Acesso em: 31 mai. 2020.
PINHO, Humberto Dalla Bernardina de, Manual de direito processual civil contemporâneo, 2ª ed., São
Paulo, Saraiva, 2020.
PINHEIRO, Igor Ferreira, PINHEIRO, Tânia Mara Moreira Sales. Vade Mecum de Direito Anticorrup-
ção Comentado: aspectos gerais, São Paulo, JH Mizuno, 2019.
RIBEIRO, Adriano da Silva, MENEZES, Gláucia Milagre, “A constitucionalização do processo adminis-
trativo na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal”, in X ENCONTRO INTERNACIONAL DO CON-
PEDI, Crise do Estado Social, Universidade de Valência, Espanha, CONPEDI, 2019, Disponível em:
<http://conpedi.danilolr.info/publicacoes/150a22r2/mrnm85ol, Acesso em: 12 de jul. 2020.
SALES, Pedro Carneiro, “Direito Administrativo Constitucional: o dever de ponderação proporcional e a
relativização da supremacia do interesse público sobre o privado”, in FERREIRA, Gustavo Assed, CRIS-
TOVÁM, José Sérgio da Silva, DIAS, Maria Tereza Fonseca, coord., XXVI ENCONTRO NACIONAL DO
CONPEDI BRASÍLIA, DF., Florianópolis, CONPEDI, 2017. Disponível em, <http://conpedi.
danilolr.info/publicacoes/roj0xn13/egjonppg/Vn3v3K70CM1yMRGQ.pdf, Acesso em: 08 mar. 2020.
SCHIRATO, Vítor Rhein. “O processo administrativo como instrumento do Estado de Direito e da De-
mocracia”, in MEDUAR, Odete, SCHIRATO, Vítor Rhein, org., Atuais rumos do processo administrati-
vo, São Paulo, Revista dos Tribunais, 2010.
SANTOS, José Anacleto Abduch, BERTONCINI, Mateus, COSTÓDIO FILHO, Ubirajara, Comentários
à Lei 12.846/2013, São Paulo, Revista dos Tribunais, 2014.
SILVA, José Afonso, Curso de Direito Constitucional Positivo, 35ª ed., São Paulo, Malheiros, 2012.
SOUZA, Felipe Oliveira, O raciocínio jurídico entre princípios e regras, Disponível em:
<https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/242932/000936212.pdf?sequence=3&isAllowed=y
, Acesso em: 05 abr. de 2020.
SOUZA, Helton José Almeida de, “Dosimetria de Multa nos Processos Administrativos de Responsabili-
zação de Pessoa Jurídica: interpretações dos parâmetros legais de aplicação do art. 6º, inc. I, da Lei
12.846/2013, na União, Estados e Municípios brasileiros”, in Curso de Pós-Graduação Lato Sensu em
Corrupção: Controle e Repressão a Desvios de Recursos Públicos, Sociedade de Ensino Superior Estácio
de Sá Ltda., em parceria com o Complexo de Ensino Renato Saraiva, 2018.
STAFFEN, Márcio Ricardo, CADEMARTORI, Daniela Mesquita Leutchuk de, “A função democrática
do princípio do contraditório no âmbito do processo administrativo disciplinar: aproximações entre Elio
Fazzalari e Jürgen Habermas”, in Direitos Fundamentais & Justiça, n. 12, jul. set., 2010, Disponível em:
<http://dfj.emnuvens.com.br/dfj/article/view/423, Acesso em: 24 jan. 2020.
TEIXEIRA, Winston de Araújo, REFLEXÕES ACERCA DO DIREITO FUNDAMENTAL À DURAÇÃO
RAZOÁVEL DO PROCESSO, in FREITAS, Riva Sobrado, BEÇAK, Rubens e SILVA, Delmo Mattos da,
coord., XXVI CONGRESSO NACIONAL DO CONPEDI SÃO LUÍS – MA, Florianópolis, CONPEDI,
2017, Disponível em: <http://conpedi.danilolr.info/publicacoes/27ixgmd9/o61z9nus/w2QxYeLSp7w5V9
pw.pdf>, Acesso em: 17 abr. 2020.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 253


Os Aspectos Contemporâneos dos Princípios do Contraditório e da Ampla Defesa nos Processos Correcionais...

COMENTARIO EN TORNO A LA NOTA CONJUNTA DEL


CONSEJO DE EUROPA Y DE LA AGENCIA DE DERECHOS
FUNDAMENTALES DE LA UNIÓN EUROPEA, DE 27 DE
MARZO DE 2020, SOBRE DERECHOS FUNDAMENTALES DE
LOS REFUGIADOS Y DE LOS INMIGRANTES EN
LAS FRONTERAS DE EUROPA
COMMENTARY ON THE JOINT NOTE OF THE COUNCIL OF
EUROPE AND THE EUROPEAN UNION AGENCY
FOR FUNDAMENTAL RIGHTS, OF MARCH 27, 2020,
ON FUNDAMENTAL RIGHTS OF REFUGEES AND
MIGRANTS AT THE EUROPEAN BORDERS
DOI: 10.19135/revista.consinter.00011.11
Recibido/Received 17.06.2020 – Aprobado/Approved 26.10.2020
Carlos Francisco Molina del Pozo1 – https://orcid.org/0000-0001-5074-8322
E-mail: carlosf.molina@uah.es / carlosf.molina@hotmail.com

Resumen: El presente trabajo tiene por finalidad analizar la Nota Conjunta del Consejo
de Europa y la Agencia de Derechos Fundamentales de la Unión Europea, como
documento aclaratorio sobre el uso de normas internacionales en concordancia con los
derechos universales para la correcta aplicación de estas en la coyuntura del COVID-19.
Para ello, se ha estudiado la actualidad en las fronteras, la protección de la salud en la
práctica y la vulnerabilidad de los menores.
Palabras-clave: COVID-19, fronteras, vulnerabilidad, derechos fundamentales,
solidaridad, Unión Europea, refugiados e inmigración.
Resumen: The purpose of this work is to analyse the Joint Note of the Council of
Europe and the European Union Agency for Fundamental Rights, as a explanatory
document on the use of international regulations in line with universal rights for the
proper application of these at the juncture of COVID-19. To this end, the current
situation in frontiers, the protection of health in practice and the vulnerability of minors
have been studied.
Keywords: COVID-19, borders, vulnerability, fundamental rights, solidarity, European
Union, refugees and inmigration.
Sumario: Introducción. 1. Actualidad en las fronteras. 2. Protección de la salud frente al
principio de non-refoulement. 3. Situaciones de vulnerabilidad: menores. 4. Conclusiones.
5. Bibliografía.

1
Catedrático de Derecho Administrativo y Catedrático Jean Monnet “Ad Personam” de Derecho de la Unión
Europea. Universidad de Alcalá de Henares (Madrid). Presidente del Instituto Eurolatinoamericano de
Estudios para la Integración (IELEPI).

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 255


Carlos Francisco Molina del Pozo

INTRODUCCIÓN2
En los últimos meses, hemos vivido situaciones complicadas que tienen
como origen la pandemia del coronavirus, en concreto el virus SARS-CoV-2 que es
el que causa la enfermedad del COVID-19. Este virus ha obligado a varios Estados a
plantearse la cuestión acerca de cuál debería ser la adecuada actuación a llevar a
cabo para con la ciudadanía, aunque, en todo momento, orientando las mismas desde
una clara perspectiva tendente al estricto y cabal cumplimiento de los objetivos
sanitarios.
Como consecuencia, los gobiernos de la totalidad de países afectados han
adoptado distintas medidas tendentes a conseguir mantener los respectivos niveles
de seguridad, al mismo tiempo que a proteger la salud de la ciudadanía. En todo
caso, puede decirse que, todo el conjunto amplio de medidas tomadas revisten un
carácter marcadamente nacionalista, habiéndose llegado, incluso, al cierre de las
fronteras para tratar de eludir los contagios y el avance del temido virus.
A pesar de constatar que todo lo expuesto ha sido posible, como resultado del
ejercicio de su propio y exclusivo derecho al control de las fronteras, se deben tener
en cuenta las repercusiones que las indicadas actitudes individualistas y
gubernamentalistas han venido a producir para los migrantes y refugiados que se
hallan a la espera de entrar en la Unión Europea.
Es por ello que, la Agencia de Derechos Fundamentales de la Unión Europea,
en cuanto organismo de la Unión de carácter supranacional, y el Consejo de Europa,
en tanto que organización internacional, han elaborado y publicado una nota
conjunta, fruto de su intensa y fructífera colaboración, con la finalidad de recordar a
los Estados miembros, con cierto grado de incumbencia, su obligación de
salvaguardar y proteger los derechos fundamentales de las personas, siendo
indiferente su nacionalidad, a la hora de aplicar las normativas europeas.
Principalmente, se han centrado en la coyuntura actual de las fronteras, que
se ven superadas tanto por la afluencia masiva de inmigrantes como por la situación
sanitaria global. Observamos, también, una destacada y seria advertencia en la
utilización de las normas fronterizas en relación con el respeto a los derechos
fundamentales y a las normas sanitarias.
Así pues, antes de entrar a estudiar el tema concreto objeto de nuestro
análisis, es decir, la Nota Conjunta en sí misma, emanada de las dos entidades antes
citadas, hemos considerado conveniente reseñar, brevemente, la organización y las
funciones de ambas participantes en la aludida Nota Conjunta.
Iniciaremos la descripción del primero de los organismos señalados, es decir,
la Agencia de los Derechos Fundamentales de la Unión Europea3, conocida por sus

2
El autor quiere dejar constancia de su agradecimiento a Nuria Puentes Ruiz, colaboradora de mi Cátedra
Jean Monnet “Ad Personam” de Derecho de la Unión Europea, en la Universidad de Alcalá, por su
inestimable apoyo en la preparación de este trabajo.
3
Agencia de los Derechos Fundamentales de la Unión Europea <https://fra.europa.eu/es> [Fecha de consulta:
26 de mayo de 2020]

256 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Comentario en Torno a la Nota Conjunta del Consejo de Europa y de la Agencia de Derechos Fundamentales...

siglas en inglés como FRA. Se trata de un organismo independiente de la Unión, de


una Agencia, que proporciona a los responsables de la adopción de decisiones
nacionales y de la Unión Europea, asistencia y asesoramiento sobre diversos temas
relativos al ámbito de los derechos fundamentales, como pueden ser aspectos de
discriminación, acceso a la justicia, racismo y xenofobia, protección de datos,
derechos de las víctimas y derechos del niño. Es una de las Agencias creadas para
apoyar la labor de las instituciones de la Unión y a los Estados miembros de la
misma en la aplicación del Derecho Comunitario. En el interés de lograr la mayor
descentralización geográfica posible para el ejercicio de sus trabajos, así como de
cubrir la necesidad de hacer frente a nuevas tareas de carácter jurídico, técnico o
científico, la Agencia de los Derechos Fundamentales desarrolla su actividad en el
marco del respeto de los derechos humanos y de las libertades fundamentales, que
son un valor común que es compartido por todos los Estados miembros, de
conformidad con lo recogido por el artículo 6, párrafo 2 del Tratado de la Unión
Europea (TUE),
Pues bien, con la finalidad de cumplimentar satisfactoriamente los objetivos
que tiene encomendados, la Agencia de los Derechos Fundamentales lleva a cabo las
siguientes funciones:
• Recopilar, registrar, analizar y difundir datos objetivos y fiables;
• Desarrollar la comparabilidad y la fiabilidad de los datos mediante nuevos
métodos y normas
• Realizar o promover investigaciones y estudios en la esfera de los derechos
fundamentales;
• Formular y publicar conclusiones y dictámenes sobre temas concretos,
por propia iniciativa o a petición del Parlamento Europeo, el Consejo o la
Comisión Europea;
• Fomentar el diálogo con la sociedad civil.
Por otro lado, ya hemos reflejado anteriormente que, el Consejo de Europa4
es una organización internacional y de ámbito regional, que promueve la
configuración de un espacio político y jurídico común mediante los valores de la
democracia, los derechos humanos y el imperio de la ley. Así pues, el Consejo de
Europa, como consideramos que es bien conocido, es una organización
intergubernamental, que actúa en el marco amplio de la cooperación jurídica y
política, y de la que forman parte 47 Estados europeos, encontrando su origen en el
Tratado de Londres de 5 de mayo de 1949.
La finalidad del Consejo de Europa consiste en realizar una unión más
estrecha entre sus miembros para salvaguardar y promover los ideales y los
principios que constituyen su patrimonio común y favorecer su progreso económico
y social. Estos ideales y principios referidos se estructuran en los pilares siguientes:
Derechos Humanos, Democracia y Estado de Derecho. Todos ellos representan el
eje esencial sobre el que se encuentra articulado el núcleo más importante de la

4
Consejo de Europa <https://www.coe.int/en/web/portal/home> [Fecha de consulta: 26 de mayo de 2020]

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 257


Carlos Francisco Molina del Pozo

actividad de la Organización Los medios para alcanzar los aludidos fines no son
otros que: el examen de los asuntos de interés común, la conclusión de acuerdos y la
adopción de una acción conjunta en los campos económico, social, cultural,
científico, jurídico y administrativo, así como la salvaguarda y la mayor efectividad
de los derechos humanos y las libertades fundamentales.
Con esta pequeña exposición descriptiva que se ha trazado, puede observarse
que ambas organizaciones referidas y autoras de la Nota Conjunta, se encargan de
proteger los derechos humanos y fundamentales, ya que su objetivo no es otro que
coadyuvar a evitar incumplimientos y discriminaciones en la materia enunciada, al
mismo tiempo que asegurar, en todo momento, el asesoramiento y necesario apoyo que
se les requiera por parte de los Estados miembros y de la Unión Europea.
Ahora bien, hemos de advertir que, como quiera que las habituales funciones que
desarrollan presentan un carácter que puede definirse como de meramente de
orientación, los documentos que produzcan, elaboren y publiquen no tendrán fuerza
vinculante u obligatoria, sino que, como ocurre en el caso de la Nota Conjunta que
vamos a analizar, nos encontramos ante un conjunto de documentos aclaratorios sobre el
uso de las normas internacionales en concordancia con los derechos universales.

1 ACTUALIDAD EN LAS FRONTERAS


En este apartado analizaremos tanto los derechos como las obligaciones que
los Gobiernos de los distintos Estados miembros deben cumplir en sus actuaciones
en las fronteras. En este sentido, hemos de destacar tres puntos.
En primer lugar, es necesario hacer referencia a los derechos que poseen los
países para poder ejercer su control a la hora de proteger las fronteras exteriores.
Como consecuencia del derecho que detentan los diferentes países a controlar
sus propias fronteras, al formar estas parte integrante de su territorio, se llegó a
establecer el denominado Código de Fronteras Schengen5, el cual se encarga de
recoger todas las legislaciones vigentes sobre esta materia, de manera que se consiga
lograr que los Gobiernos puedan realizar una adecuada gestión de estas cuestiones.
Precisamente, podemos observar que, la Nota Conjunta, que en estas páginas
estamos analizando, señala cuatro preceptos de este Código que, a continuación,
vamos a detallar.
El artículo 3 del mencionado Código hace referencia al ámbito de aplicación,
disponiendo que, las medidas de control de las fronteras se deben adoptar sin afectar
de manera negativa a las personas que sean beneficiarias del derecho europeo a la
libre circulación o aquellas que sean solicitantes de cualquier tipo de protección
internacional.
Por su parte, el artículo 4 del citado Código establece otro límite a la
aplicación de estos controles, ya que determina que, en todo caso, se deben proteger
5
Reglamento (UE) 2016/399 del Parlamento Europeo y del Consejo, de 9 de marzo de 2016, por el que se
establece un Código de normas de la Unión para el cruce de personas por las fronteras, DOUE L 77, de
23.3.2016, p. 1/52

258 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Comentario en Torno a la Nota Conjunta del Consejo de Europa y de la Agencia de Derechos Fundamentales...

los derechos fundamentales. Por consiguiente, el control de fronteras es una función


que ejercen los Estados miembros, pero deben hacerlo de manera simultánea a la
protección de los derechos agrupados en el Convenio Europeo para la Protección de los
Derechos Humanos y de las Libertades Fundamentales6.
De otro lado, el artículo 5 del reiterado Código instaura la obligación de cruzar
las fronteras por aquellos puntos que hayan sido fijados como “pasos fronterizos” y en
los horarios establecidos.
Una vez que las personas lleguen a esos puntos de cruce, se deberá examinar si
cumplen los requisitos de entrada o salida, ya que si los mismos no se cumplimentan y
las solicitudes son denegadas, las autoridades competentes deberán emitir una decisión
motivada en donde se contengan y manifiesten las razones del rechazo, y todo ello en
base al contenido previsto por el artículo 14 del Código de Fronteras.
En este punto, la Nota evidencia la necesidad de realizar el examen anteriormente
aludido, de modo que quede absolutamente protegida la dignidad humana y sin
discriminar a las personas, por cualquiera de las razones que se detallan en el artículo 14
del Convenio Europeo para la Protección de los Derechos Humanos y de las Libertades
Fundamentales.
Por último, el artículo 13 del Código de Fronteras determina la creación de un
sistema de vigilancia de fronteras para monitorizar los cruces no autorizados y luchar
contra la delincuencia. Es decir, se designa una guardia especial para vigilar de manera
fija o móvil las fronteras, impidiendo la comisión de delitos como sería el originado por
el cruce ilegal de las fronteras.
En segundo lugar, habremos de detenernos para estudiar, siquiera brevemente, las
cuestiones relativas al uso de la fuerza por parte de los Estados, el cual está permitido en
el Convenio Europeo para la Protección de los Derechos Humanos y de las Libertades
Fundamentales.
Ahora bien, inmediatamente conviene advertir de que, la fuerza, debe constituir el
último recurso disponible del que los Estados hagan uso, ya que el mencionado uso del
recurso a la fuerza únicamente se podrá aplicar en situaciones de auténtica necesidad,
cuando esté totalmente justificada, siendo, además que su utilización vaya organizada y
dirigida, de manera proporcional, a la consecución de un objetivo legítimo.
En cualquier caso, habremos de tener en cuenta que, un uso excesivo del citado
recurso al uso de la fuerza, podría dar lugar a la comisión de posibles violaciones del
derecho a la vida o a la prohibición de tortura y tratos degradantes e inhumanos. Las
presuntas violaciones deberán ser investigadas por el Estado miembro de que se trate, de
manera que pueda demostrarse fehacientemente qué fue lo que ocurrió realmente y
quiénes son los responsables de las actuaciones habidas.
En el transcurso de todas esas indagaciones indicadas, no podrán actuar las
personas que se encuentren implicadas, de modo que pueda asegurarse la independencia
y efectividad de las investigaciones que se estén realizando, mientras que, por el

6
COUNCIL OF EUROPE. “European Convention on Human Rights” <https://www.echr.coe.int/Documen
ts/Convention_ENG.pdf> [Fecha de consulta: 4 de mayo de 2020]

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 259


Carlos Francisco Molina del Pozo

contrario, sí que se permitirá la participación de las víctimas con la finalidad exclusiva de


proteger sus intereses con una mayor cobertura.
En tercer lugar, queremos referirnos también, de forma sintética, al amplio
abanico normativo que nos ofrece el conjunto de las disposiciones aplicables, en las
posibles situaciones de traspaso ilegal de fronteras.
Como es bien conocido, aquellas personas que han entrado de manera ilegal en
un Estado miembro, serán detenidas y puestas a disposición para iniciar los trámites de
devolución, según determina la Directiva de Retorno7. Dichos trámites comportan, desde
la perspectiva administrativa, la preparación y emisión de una decisión individualizada,
que se encargue de informar a la persona de que va a ser objeto de devolución, así como
de las posibilidades que tiene de apelar contra la referida decisión que le afecta
directamente.
Pues bien, el artículo 2, apartado segundo, letra a) de la aludida Directiva de
Retorno, permite que los Estados no apliquen las normas en ella reseñadas en los
supuestos de denegación de entrada o de detención en los pasos fronterizos.
No obstante, a la hora de actuar, en la práctica real, los Estados miembros
deberán tener en cuenta los derechos fundamentales de estas personas. Por tal
motivo, no se puede autorizar ni producir el retorno de una persona que pueda ser
susceptible de sufrir daños en el país al que pretende ser devuelta.
Sobre todo, cabe hacer alusión ahora al hecho por el que, se deben garantizar,
tanto la protección del derecho a la vida, como la prohibición de tortura y tratos
denigrantes o inhumanos, dado que así se deriva, respectivamente, de los artículos 2 y 3
del Convenio Europeo para la Protección de los Derechos Humanos y de las Libertades
Fundamentales.
Con la finalidad descrita, el artículo 13 del mismo Convenio Europeo, constituye
el verdadero derecho a disponer de un recurso efectivo para todas aquellas personas que
consideren que, con la decisión de retorno, sus derechos mencionados ut supra han sido
vulnerados.Este recurso se encarga de establecer la suspensión automática de la decisión,
a modo cautelar, hasta que la situación haya sido esclarecida.
A continuación, también queremos destacar otra situación de las fronteras que,
actualmente, es de uso extendido para los casos de afluencia masiva. Los centros de
internamiento de extranjeros han sido establecidos por muchos puntos fronterizos como
lugares apropiados para la detención de las personas.
Pues bien, de acuerdo con el artículo 5 del Convenio Europeo de Derechos
Humanos, que establece el derecho a la libertad y seguridad, cualquier detención e
internamiento debe estar basada en el Derecho, motivo por el cual hemos de afirmar que,
tal detención e internamiento no puede, bajo ninguna circunstancia, ser arbitraria.
Para cumplimentar eficazmente lo que acabamos de exponer, la autoridad que
realice la detención y, que con posterioridad gestione el encierro en el centro, debe

7
Directiva 2008/115/CE del Parlamento Europeo y del Consejo, de 16 de diciembre de 2008, relativa a
normas y procedimientos comunes en los Estados miembros para el retorno de los nacionales de terceros
países en situación irregular, DOUE L 348 de 24.12.2008, p. 98-107.

260 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Comentario en Torno a la Nota Conjunta del Consejo de Europa y de la Agencia de Derechos Fundamentales...

asegurar ciertas condiciones para las personas implicadas, como pueden ser la
necesidad de explicitar la duración de la detención , así como el objetivo final de la
misma.
Además, los Estados miembros a través de sus autoridades de fronteras, en el
supuesto de personas consideradas más vulnerables, tales como pueden ser las personas
mayores, los enfermos o los niños, deben probar que no existe una opción menos levisa
que pueda ser aplicada a los casos en cuestión.
Con esto que terminamos de reseñar, queremos poner de relieve que, el
internamiento debe ser utilizado, asimismo, como uno de los último recursos a utilizar,
dado que tiene, como principal consecuencia, la limitación evidente de un derecho, no
solo fundamental, ya que ha sido garantizado de manera universal, lo que supone
obviamente que los Estados miembros no detenten ningún poder de restricción sobre el
mismo derecho. De ahí que sea esencial el hecho de que tenga necesidad de manifestar
una clara motivación y la explicitación de una finalidad concreta.
En todo caso y sobre todo, se debe destacar y poner de relieve bien
ostensiblemente que, el internamiento no puede ser sino una medida de carácter
absolutamente temporal. Con esto no nos referimos únicamente a que las personas
internadas tienen que conocer la duración concreta de su internamiento o encierro en un
centro, sino que, el referido internamiento no puede ser una solución para ser aplicada a
largo plazo por parte de los Estados miembros para los supuestos de las afluencias
masivas.

2 PROTECCIÓN DE LA SALUD FRENTE AL PRINCIPIO DE


NON-REFOULEMENT
Damos inicio al presente epígrafe comentando que, el principio de non-
refoulement implica que se prohíbe la puesta en peligro de los refugiados al ser
trasladados a territorios en los que su vida o libertad se vean amenazadas. Este principio
se encuentra recogido en el artículo 33 de la Convención de Ginebra8.
El mencionado precepto expone que, ningún Estado podrá poner en riesgo la vida
de ningún refugiado mediante su devolución o expulsión a un territorio cuyo Gobierno lo
persiga, ya sea por su raza, religión, opiniones políticas o pertenencia a un grupo social.
Como única excepción a la aplicación del citado principio, se prevé la
imposibilidad de acogerse al mismo si esa persona, de manera objetiva, puede ser
considerada un peligro para el país en el que esté pidiendo auxilio internacional. Es decir,
el principio non-refoulement decae únicamente frente a la garantía de seguridad del
Estado que, se supone, que tiene que recibir a dicha persona. Sin embargo, eso no
significa que, en caso de amenaza, los Estados puedan desatender a esas personas o
incluso poner en peligro sus vidas.
En las referidas situaciones, existe la alternativa de trasladar a los solicitantes de
asilo a terceros países que están clasificados como seguros. Para que esta opción sea

8
Convención sobre el Estatuto de los Refugiados, adoptada en Ginebra el 28 de Julio de 1951 por Naciones
Unidas, que entró en vigor el 22.04.1954, de ahora en adelante Convención de Ginebra.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 261


Carlos Francisco Molina del Pozo

posible, los Estados deberán realizar una investigación que asegure, verdaderamente, que
los peticionarios interesados no sufrirán ningún daño.
Cabe destacar que, para conocer si una persona supone una amenaza para la
seguridad del Estado, es necesario estudiar su caso individualmente, evitándose, de este
modo, que se lleguen a producir expulsiones que puedan ser consideradas como
contrarias a Derecho. Asimismo, es preciso insistir en que, se trata de un requisito
esencial que debe ser cumplimentado con anterioridad a la adopción de la
correspondiente decisión sobre la cuestión.
Asimismo, se observan casos en los que, son constatables las afluencias masivas,
las cuales resultan contestadas a través de la utilización práctica de las típicas
devoluciones colectivas, y ello se lleva a cabo de la forma apuntada a pesar de estar
prohibidas por el tenor del artículo 4 del Protocolo N.4 del Convenio Europeo de
Derechos Humanos. Ahora bien, hemos de manifestar que, en los últimos años se ha
apreciado que, los citados estudios individualizados, evitan la posibilidad prohibida de
las expulsiones colectivas, al entenderse que, con carácter previo, los Estados han
examinado las peticiones de entrada y las han rechazado.
De igual manera, la Nota Conjunta señala que, la mayor o menor profundización
en el estudio y evaluación de cada supuesto dependerá de varios factores, como, por
ejemplo, puede ser la forma de entrada en el país, ya que, si esta se realizó de manera
ilegal, es posible que los solicitantes pierdan su derecho a argumentar en contra de la
expulsión.
Por otra parte, debemos indicar que, aunque habitualmente se usa el término
refugiados, lo cierto es que se entiende que, la considerada denominación, posee una
opción de carácter general que permite su aplicación a cualquier persona que busque
protección, independientemente de su estatuto jurídico, con la finalidad de poder
aplicarles el artículo 33 de la Convención y evitar vulneraciones del derecho a la vida o
la prohibición de tortura y tratos inhumanos.
Hay que señalar que, también, el principio non-refoulement se encuentra
recogido en el artículo 18 de la Carta de Derechos Fundamentales de la Unión Europea9.
Estamos convencidos de que, dada la importancia de los derechos fundamentales
que este principio protege, la Unión Europea debe encontrar responsables a los Estados
miembros que hayan incumplido sus compromisos para con estas personas protegidas
por el relatado principio.
Por su parte, hemos de destacar que, asimismo, la Nota Conjunta subraya la
obligación impuesta por los artículos 3 y 4 del Código de Fronteras Schengen de respetar
los derechos de los refugiados o cualquier otro tipo de estatuto internacional.
Esta situación descrita es propiciada por el hecho constatado de que existen
ciertas protecciones de los derechos fundamentales, como es el caso del artículo 15
del Convenio Europeo para la Protección de los Derechos Humanos y de las

9
Carta de Derechos Fundamentales de la Unión Europea, DOUEC 364, de 18 de diciembre de 2000. Fue
proclamada por el Parlamento Europeo, el Consejo y la Comisión Europea el 7 de diciembre de 2000 y
reformada el 12 de diciembre de 2007, entrando en vigor el 1 de diciembre de 2009, junto con el Tratado de
Lisboa.

262 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Comentario en Torno a la Nota Conjunta del Consejo de Europa y de la Agencia de Derechos Fundamentales...

Libertades Fundamentales, que establece una total y absoluta imposibilidad de


derogación del derecho a la vida o la prohibición de tortura o tratos inhumanos y
degradantes, incluso en épocas sometidas imperativamente a los regímenes de
estados de excepción y de alarma o emergencia, como el que se está implementando
en muchos países del mundo actualmente, como consecuencia de la adopción de
decisiones políticas orientadas a frenar la expansión del COVID-19.
En este mismo sentido y, con la evidente finalidad de recalcar la indicada
imposibilidad de derogación, el Consejo de Europa envió a todos sus Estados miembros
un documento informativo10. En el citado documento se exponía que, en aquellos
supuestos en los que aparentemente sean susceptibles de poder ser derogados ciertos
derechos fundamentales, debido a la situación de emergencia instalada en el conjunto de
países europeos, los aludidos Estados miembros pertenecientes a la Organización,
tendrán que realizar, de manera obligatoria, una profunda y pormenorizada evaluación de
la situación real y objetiva en la que se encuentre su sociedad.
En el referido documento, se presenta la opción de atribuir directamente al
Tribunal Europeo de Derechos Humanos el encargo de realizar la referida y necesaria
evaluación, aunque, asimismo, dispone que las autoridades nacionales tendrán mayor
capacidad para determinar si la existente emergencia pública constituye suficiente
amenaza y, por consiguiente, si es necesario dictar derogaciones de derechos durante el
periodo de tiempo que se mantenga el auge del episodio.
No obstante todo lo detallado con anterioridad, en esta situación actual de crisis
humanitaria que estamos sufriendo, los Estados miembros están realizando actuaciones
sin precedentes. Por ejemplo, Grecia anunció a principios de marzo la suspensión del
derecho de asilo por el plazo de un mes, por lo que todas aquellas personas solicitantes
serían devueltas a sus países de origen o al Estado por el que accedieron a Grecia, sin
revisar su situación ni estudiar las consecuencias que esa actuación pudiese tener.
El Consejo de Seguridad Nacional griego fundamentó su decisión en el artículo
78, apartado tercero, del Tratado de Funcionamiento de la Unión Europea11, alegando la
emergencia en la coyuntura actual12. En este orden de ideas, el referido precepto, en su
apartado indicado, está redactado de la siguiente manera:

“Si uno o varios Estados miembros se enfrentan a una situación de emergencia


caracterizada por la afluencia repentina de nacionales de terceros países, el Consejo
podrá adoptar, a propuesta de la Comisión, medidas provisionales en beneficio de los
Estados miembros afectados. El Consejo se pronunciará previa consulta al Parlamento
Europeo.”

10
CONSEJO DE EUROPA. “Respectingdemocracy, rule of law and human rights in the framework of the
COVID-19 sanitary crisis. A toolkit for memberstates” InformationDocuments SG/Inf(2020)11 de
7.04.2020.
11
Tratado de Funcionamiento de la Unión Europea, DOUE C 326/47, de 26 de octubre de 2010, de ahora en
adelante TFUE.
12
PARLAMENTO EUROPEO “Pregunta prioritaria con solicitud de respuesta escrita P-001342/2020 a la
Comisión”, de 4 de marzo de 2020, <https://www.europarl.europa.eu/doceo/document/P-9-2020-00134
2_ES.html> [Fecha de consulta: 16 de mayo de 2020]

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 263


Carlos Francisco Molina del Pozo

Ciertamente, el apartado tercero del artículo 78 del TFUE, establece un


proceso para situaciones de carácter singular devenidas por una abundancia de
inmigrantes en las fronteras. En consecuencia, según el mencionado procedimiento,
habrá de ser el Consejo la institución de la Unión Europea encargada de decidir la
adopción de medidas que ayuden a los países afectados, siendo para ello necesario,
en todo caso, llevar a cabo una consulta previa al Parlamento Europeo.
Es decir, la Comisión notifica al Consejo que existen unos determinados
Estados miembros que están sobrecargados por la situación excepcional y, por
consiguiente, necesitan y requieren de algún tipo de asistencia por parte de la Unión
Europea. El Consejo consultará al Parlamento Europeo y, según la respuesta que
reciba, tomará unas u otras medidas, de carácter provisional, que tengan por finalidad
servir para solucionar el problema planteado en ese momento.
Sin embargo, en el caso relatado anteriormente de Grecia, podemos concluir que
se obvió completamente todo ese articulado dispositivamente y previsto proceso,
adoptando la decisión, simplemente, una entidad de ámbito nacional encargada de la
seguridad, lo que motiva que, la aludida decisión, no pueda sostenerse que se encuentre
suficientemente avalada por una fundamentación jurídica adecuada. En consecuencia,
podríamos afirmar que, en situaciones de pandemias sobrevenidas, como está sucediendo
en el contexto mundial actual, al menos en el marco de la Unión Europea, estamos
pudiendo constatar la existencia de determinadas violaciones masivas de derechos
fundamentales, que se encuentran, al parecer, suficientemente implantados y cuya
garantía de seguridad en su cumplimiento está recogida, regulada jurídicamente y
planificada con todo detalle en el territorio europeo.
En el contexto descrito, debemos apreciar que, la respuesta de la Unión, en
cambio, fue posicionarse a favor de las tesis esgrimidas por el Estado griego, al
considerar que debe entenderse que existe una posibilidad legal de modular la gestión de
solicitudes de asilo, y que esto es lo que, precisamente, recoge el artículo 78, apartado
tercero del TFUE. Sin embargo, en honor a la verdad, hay que advertir de que, Grecia, en
realidad, en todo momento se refirió a una suspensión, no aludiendo para nada a una
modulación, siendo así que, su comportamiento sobre el tema que nos ocupa, en los
momentos complicados y duros de la pandemia que nos aturde como ciudadanos
europeos que somos, resulta que debe ser calificado como contundente y
desilusionantemente contrario a las normas jurídicas y demás disposiciones de distinta
índole que están vigentes en el panorama europeo e internacional.
Con relación a la actuación de los Estados en situaciones de afluencia masiva
de personas desplazadas, existe una Directiva13, que nunca ha sido aplicada, pero
que dispone unas normas mínimas de actuación.

13
Directiva 2001/55/CE del Consejo, de 20 de julio de 2001, relativa a las normas mínimas para la concesión
de protección temporal en caso de afluencia masiva de personas desplazadas y a medidas de fomento de un
esfuerzo equitativo entre los Estados miembros para acoger a dichas personas y asumir las consecuencias de
su acogida, DOUE L 212, de 7.8.2001, p. 12-23.

264 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Comentario en Torno a la Nota Conjunta del Consejo de Europa y de la Agencia de Derechos Fundamentales...

Su artículo primero establece como objetivo la concesión de protección


temporal en coyunturas de grandes congregaciones, fomentando un esfuerzo
equitativo entre los Estados miembros.
Por ello, en el anunciado contexto, define como protección temporal un
procedimiento excepcional que garantice los derechos de aquellas personas que, no
pudiendo volver a su Estado de origen, necesiten de protección inmediata. La
excepcionalidad se basa en la imposibilidad de poder aplicar el sistema de asilo con
normalidad, debido a la llegada de un gran número de personas desplazadas.
El artículo 5 de la citada Directiva, otorga al Consejo la función de constatar
si se da la singularidad, ya que, en caso afirmativo, deberá señalar los grupos de
personas que se verán afectados por la protección temporal, que tendrá,
generalmente, la duración de un año.
A partir del Capítulo III, la reseñada Directiva estipula las obligaciones de los
Estados miembros, proporcionando una detallada lista de las mismas, entre las que
cabe destacar la autorización de ejercer una actividad retribuida, en el artículo 12; la
asistencia sanitaria, en el artículo 13; la reagrupación familiar, en el artículo 15; etc.
No es de extrañar que, como mencionábamos anteriormente, la reiterada
Directiva no haya sido aplicada nunca, dado que, tras una lectura pausada y atenta de la
misma, podemos observar con toda claridad la intención que guiaba y que se tenía a la
hora de redactar la disposición comunitaria por parte del legislador.
Puede constatarse que, más que detallar algún tipo de ayuda para los Estados que
estén sobrecargados por la afluencia masiva, requisito necesario para poder aplicar la
Directiva, esta norma viene a exponer, en cambio, las obligaciones de los Estados para
con las personas solicitantes de asistencia.
Por el contrario, como alivio para los países que se vean afectados, simplemente
la disposición aludida, sirve para fijar la obligación de cooperación entre los Estados
miembros, aunque sin disponer cómo y en qué condiciones se deberá cooperar.
Es decir, en el caso de que se aplicase esta Directiva, el Estado atisbaría que, en
lugar de recibir asistencia para gestionar el flujo de solicitantes de protección
internacional en sus fronteras, tendría que continuar resolviendo las peticiones, pero
debiendo considerar y observar, en todo momento, el contenido de las normas y
disposiciones que, con carácter de mínimas, habían sido adoptadas con la finalidad
de garantizar la seguridad de estas personas.
Como consecuencia y, dado que los Estados miembros no tienen en plenitud
la capacidad para denegar el derecho de asilo, la Nota Conjunta les recuerda que, su
derecho sobre las fronteras incluye la competencia para tomar medidas especiales
que les permitan mantener la salud pública en casos de pandemias.
Ahora bien, con base en los preceptos del Código de Fronteras Schengen,
toda decisión debe ser proporcionada y no discriminatoria, ya que en ningún caso se
puede permitir la suspensión del derecho a obtener la protección internacional.
Siguiendo estas ideas, el Comité Europeo para la Prevención de la Tortura y
de las penas o tratos inhumanos o degradantes, realizó una declaración reconociendo los
retos que la actual pandemia del COVID-19 está ocasionando para los Estados

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 265


Carlos Francisco Molina del Pozo

miembros, sobre todo para las personas encargadas del cuidado de aquellas otras que
tienen su derecho a la libertad reducido14.
La declaración reseñada orienta su atención hacia la vertebración y disposición de
diez principios considerados esenciales para proteger los derechos de las personas, a la
vez que se intenta hacer frente a la situación creada por el COVID-19.
Podemos decir que, el principio de actuación sopesado como más importante, ha
exigido emprender la puesta en marcha de todas las acciones e iniciativas plausibles para
conseguir evitar los contagios entre los trabajadores de los centros de detención y las
personas detenidas.
La mencionada declaración recomienda la incorporación de todos los
trabajadores que tengan conocimientos profesionales en la materia, al mismo tiempo que
recuerda que, cualquier medida restrictiva deberá tener una base legal, la cual habrá de
ser completamente observada antes de proceder a la adopción de cualquier tipo de
decisión en este ámbito material.
Para el tratamiento de los detenidos se indica que, resulta ser absolutamente
necesario informar de las decisiones que se vayan a tomar, e incluso evitar las
aglomeraciones mediante la puesta en utilización de alternativas, como pueden ser las de
llevar a cabo liberaciones anticipadas o la no detención de migrantes.
Asimismo, se permite la posibilidad de realizar las pruebas de COVID-19 a los
detenidos, así como aconseja prestar especial cuidado y atención con las personas que
puedan estar incursos en alguno de los denominados grupos de riesgo.
La declaración que mencionamos, en su principio número siete expone que,
aunque sea razonable la suspensión de actividades no esenciales, los derechos
fundamentales siguen vigentes, por lo que deben ser respetados, incluyéndose los
derechos de higiene personal y el derecho al aire libre.
En este mismo contexto, el texto de la declaración también hace mención al
hecho por el que, se establece que la privación de los derechos de visitas deben ser
compensados por la utilización de otros medios de comunicación, así como que, las
personas que hubieren de ser aisladas como consecuencia de la infección provocada
por el virus, también deberán poder entablar conversaciones con otras personas
diariamente, ya que no puede olvidarse que, durante estos tiempos de pandemia es
obligatorio, asimismo, proteger la salud mental de las personas.
Para finalizar, conviene destacar también el hecho de que, el Comité recuerda
a los Estados la opción de adoptar medidas de carácter preventivo, con la evidente
finalidad de intentar evitar contagios, tales como generalizar la obligatoriedad de
llevar mascarillas, así como también el deber y la responsabilidad de continuar
asegurando el acceso de los organismos de vigilancia.

14
CTP “Statement of principlesrelating to the treatment of personsdeprived of theirliberty in the context of the
coronavirus disease (COVID-19) pandemic” CPT/Inf(2020)13 <https://rm.coe.int/16809cfa4b>[Fecha de
consulta: 20 de mayo de 2020]

266 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Comentario en Torno a la Nota Conjunta del Consejo de Europa y de la Agencia de Derechos Fundamentales...

3 SITUACIONES DE VULNERABILIDAD: MENORES


Como hemos hecho mención ut supra, la pandemia que está sufriendo el
mundo actualmente presenta una mayor afectación en ciertos colectivos.
Generalmente, los menores de edad suelen ser receptores de nuestra mayor
protección, por lo que, en esta situación en concreto, no podría ser distinto.
De acuerdo con el artículo 3 del Convenio Europeo de Derechos Humanos,
los Estados miembros tienen la obligación de adoptar aquellas medidas que sean
necesarias para proteger a ciertos colectivos considerados de mayor vulnerabilidad,
destacando de entre todos ellos el de los menores de edad.
Los Estados tienen la obligación de identificar sus necesidades para que
durante el proceso de asilo y en el futuro sean tenidas en cuenta. En el caso de los
menores, esta obligación se ve acentuada por la supremacía del interés del menor.
Es decir, los Estados miembros, antes de tomar cualquier decisión, habrán de
proceder a estudiar la situación concreta de que se trate con el propósito de tener en
cuenta las necesidades del menor, tanto físicas, psíquicas y sociales, que permitan
alcanzar su total desarrollo personal.
En el supuesto de que el menor no se encuentre acompañado, esa obligación de
protección se verá acentuada y, consecuentemente, será necesario fijar y proceder a
nombrar un representante legal, a la vez que se intenta identificar y encontrar a cualquier
pariente para conseguir que sea posible la reagrupación familiar.
Por ese motivo, no existe una prohibición absoluta en la devolución de menores
no acompañados, ya que según el artículo 10 de la Directiva de Retorno, las autoridades
deben asegurarse de la eficacia de esa decisión como medida para la reagrupación.
Es decir, está permitida la devolución de menores no acompañados si con esta,
los Gobiernos se aseguran que los menores volverán con sus familiares, donde se
considera que estarán más seguros.
Estas puntualizaciones sobre la especial protección de los menores son recogidas
y desarrolladas en la Directiva de normas de acogida15. A pesar de no hacer referencia a
los menores en su objetivo, definido en el primer artículo como el establecimiento de
normas para la acogida de solicitantes de protección internacional, podemos encontrar en
el Capítulo IV un conjunto de disposiciones para las personas vulnerables.
Siguiendo el tenor de los artículos 21 y siguientes de la Directiva
mencionada, tanto los menores acompañados como aquellos que no lo están, son
considerados personas vulnerables, por lo que será completamente indispensable
llevar a cabo una evaluación de sus necesidades particulares.
En este mismo sentido y, tal como ya reseñábamos ut supra, el interés del
menor tendrá preponderancia sobre otras cuestiones, lo que obligará a los Estados

15
Directiva 2013/33/UE del Parlamento Europeo y del Consejo, de 26 de junio de 2013, por la que se
aprueban normas para la acogida de los solicitantes de protección internacional, DOUE L 180, de
29.6.2013, p. 96/116.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 267


Carlos Francisco Molina del Pozo

miembros a tener en cuenta determinados factores, como la reagrupación familiar, el


bienestar del menor o, también, ciertas consideraciones respecto al tema de la seguridad.
Como ya decíamos con anterioridad, el artículo 24 establece que, asimismo, los
Estados miembros deberán designar un representante a los menores no acompañados,
realizándose periódicamente evaluaciones sobre el avance del menor.
Pues bien, en concordancia con todos estos puntos puestos de manifiesto
en el presente trabajo hasta este momento y, transcurridos unos meses desde la
gestación y la publicación de la Nota Conjunta, la Agencia de los Derechos
Fundamentales de la Unión Europea, ha venido a crear un documento de
especialización en la cuestión relativa a la reubicación de los menores no
acompañados16, donde se destacan tres prácticas de obligado cumplimiento, si lo
que se pretende conseguir es proteger al menor.
La primera cuestión práctica que se debe poner en marcha, como también dejaba
apuntado la Nota Conjunta, no es otra que la actuación según y en función de los
intereses superiores del menor. Para ello, las autoridades deberán llevar a cabo un
proceso de determinación, que indique cuál es la solución más apropiada conforme a las
necesidades del menor.
De manera inmediata, puede decirse que, el segundo asunto que debe ponerse en
práctica, es la designación de un guardián o responsable que acompañe al menor durante
todo el proceso y le ayude a tomar las correspondientes decisiones y posicionarse ante
los puntos concretos que le afecten.
Finalmente, el tercero y último de los argumentos que debe ponerse en
práctica, consiste en la protección del principio de unidad familiar. En efecto, dicho
principio se incluye dentro del artículo 7 de la Carta de Derechos Fundamentales de
la Unión Europea, en la medida en que resulta ser un ámbito propio e identificado
con el derecho a la vida familiar.
En el marco generado por esta última práctica o actuación, destaca la
obligación que tienen las autoridades encargadas, de procurar la reubicación de los
menores en aquellos países en los que tengan algún pariente, al precisarse que debe
considerarse la familia como una prioridad de elección de destino.
No obstante lo relatado, debemos subrayar aquí que, estas tres prácticas o
actuaciones descritas, a pesar de ser las opciones más claras a la hora de llevar a
cabo y asegurar la protección de los menores, todas ellas resultan ser de difícil
aplicación, dado que conllevan e implican un proceso demasiado amplio y
distendido en el tiempo, y que, para su completa diligencia, es menester la obtención
de pruebas sólidas sobre el parentesco existente.

16
AGENCIA DE LOS DERECHOS FUNDAMENTALES DE LA UNIÓN EUROPEA. “Relocating
unaccompanied children: applying good practices to future schemes” <https://fra.europa.eu/site
s/default/files/fra_uploads/fra-2020-relocating-unaccompanied-children_en.pdf> [Fecha de consulta: 26 de
mayo de 2020]

268 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Comentario en Torno a la Nota Conjunta del Consejo de Europa y de la Agencia de Derechos Fundamentales...

4 CONCLUSIONES
Son varios los Estados miembros de la Unión Europea que resultan elegidos
por muchas personas solicitantes de protección internacional, y eso es de la manera
apuntada en función a que se trata de destinos seguros, donde dichas personas no
serán perseguidas por pensar o vivir de cierta manera y donde se reconocen unos
valores universales, inviolables e inalienables, según lo expresado y puesto de
manifiesto en el propio Preámbulo del Tratado de la Unión Europea (TUE).
Los derechos fundamentales tienen un carácter inalienable, por lo que se ha
de admitir que son inseparables de las personas, y, además, del concepto de sociedad
democrática que la Unión Europea preserva.
La sociedad europea predica unos valores esenciales, como pueden ser la
dignidad y el resto de los derechos humanos, que se configuran como absolutamente
incompatibles con posibles violaciones del derecho a la vida, así como con la
prohibición de las torturas y los tratos inhumanos y degradantes a las personas.
Por consiguiente, no se pueden aceptar ningún tipo de incumplimientos por
parte de los Estados miembros, dado que, además, estos no tienen reconocida en
parte alguna la competencia para limitar los derechos humanos, ni tampoco su
aplicación completa en el conjunto de sus respectivos territorios ni, obviamente, en
el de la Unión Europea.
En el referido orden de ideas y, con el fin de conservar la esencia que define a
la ciudadanía europea, al mismo tiempo que proteger a las personas solicitantes de
auxilio internacional, se hace imprescindible buscar y encontrar alguna solución que
sirva para poner remedio inmediato a la coyuntura vivida en los últimos años en las
fronteras europeas y, que se ha visto agravada en los últimos meses, como
consecuencia y resultado de la pandemia que dio lugar a la aparición de la crisis
provocada por el COVID-19.
Entre las medidas propuestas por la Unión Europea para tratar de solventar
estos problemas cabe destacar sobremanera la imposición reflexiva del criterio de la
solidaridad, el cual, además, constituye el punto central y neurálgico de la Política
de la Unión Europea con mayúsculas.
En efecto, puede manifestarse sin ninguna duda que, en el contexto de la
Unión Europea, la solidaridad debe ser considerada un principio rector en cualquier
normativa europea sobre materia de inmigración y asilo. La citada solidaridad es
preciso entenderla en dos ámbitos perfectamente diferenciados, a saber: primero,
para con las personas que buscan ayuda en nuestras fronteras; y, segundo, para con
los Estados que son los primeros en acudir a su encuentro al gobernar sus lindes y
límites territoriales.
Por su parte, como ya quedó fijado anteriormente, la reubicación constituye
una herramienta de solidaridad entre los Estados miembros, ya que ayuda, de un
lado, a aquellos cuyos sistemas de recepción están desbordados, y de otro, también,
a las personas solicitantes de protección internacional, al permitirles acudir a un
Estado donde podrán estudiar su caso particular más detenidamente.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 269


Carlos Francisco Molina del Pozo

Junto con el reasentamiento, todas estas medidas enunciadas, permiten crear


y organizar caminos seguros y jurídicamente válidos y eficaces para lograr, de forma
legal, la de entrada en la Unión Europea y, a su vez, aumentan la confianza en el
sistema normativo y dispositivo, reduciendo el uso de las delictivas redes de tráfico
de personas.
Debemos entender que, la presión ejercida por la masiva afluencia de
personas en las fronteras de ciertos países, hace, hasta cierto punto, comprensible
que dichos Estados no tengan la posibilidad de examinar, de manera pausada y
detenida, cada una de las solicitudes de protección internacional que se les plantean.
Por consiguiente, estamos firmemente convencidos y consideramos que, con
la aplicación racional del principio de la solidaridad interestatal a escala de toda la
Unión, los Estados fronterizos tendrán más oportunidades de analizar cada caso de
manera sosegada y, en consecuencia, será más difícil incumplir las normas o incurrir
en violaciones de derechos.
Por tanto, podemos indicar que, para conseguir todos los objetivos y tareas
enunciados, sería absolutamente imprescindible y conveniente la aplicación del
artículo 80 del TFUE, que dispone el principio de solidaridad y el reparto equitativo
de la responsabilidad entre los Estados miembros, con base en la utilización y
empleo del artículo 78, apartado tercero del TFUE, que – como se recordará – ,
permite a la Unión Europea la adopción de medidas tendentes a ayudar a los países
miembros más afectados por la problemática en cuestión.
Asimismo, para eludir inobservancias de los derechos fundamentales, sería
conveniente el establecimiento de mecanismos de revisión de los procesos de
protección internacional que los hiciesen mucho más efectivos, dado que, es
constatable el hecho de que, en demasiados supuestos de la realidad que vivimos, el
sistema actual de recursos ha demostrado su incapacidad para contener bastantes de
estas violaciones de los derechos esenciales de las personas emigrantes y en
búsqueda de asilo en los Estados miembros de la Unión Europea.
Otro de los problemas que, en nuestra opinión, encontramos hoy en día
aferrado al desarrollo de estas cuestiones que nos ocupan, consiste en la
preponderancia de la seguridad del Estado, lo cual se ha venido tratando como una
idea que, en la actualidad, ha estado inserta en el tejido mismo de la materia relativa
a la emigración en la Unión Europea, siendo un acicate más al establecimiento de
trabas a la viabilidad, progreso y expansión de una auténtica política común de
inmigración y asilo, a nivel del conjunto del territorio de la Unión.
Puede decirse que, durante los últimos tiempos, los discursos políticos y
actitudes diversas ejercidas por los diferentes Gobiernos europeos, sobre todo con la
situación de crisis sanitaria y social originada por la irrupción de la pandemia que
aportó el COVID-19, han estado propagando la idea incondicional del cierre de
fronteras para todas las personas, ciudadanos o no de la Unión, evitando
rotundamente cualquier tipo de desplazamiento entre territorios fronterizos, tanto ad
intra como ad extra, de la Unión Europea, con la finalidad de mantener a toda costa

270 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Comentario en Torno a la Nota Conjunta del Consejo de Europa y de la Agencia de Derechos Fundamentales...

la seguridad nacional en las respectivas fronteras internas y externas de todos y cada


uno de los Estados miembros de la Unión Europea.
Podemos concluir que, en nuestra opinión, los resultados de esta perversa
idea podrían resultar devastadores para el progresivo logro y consolidación de los
objetivos que la Unión Europea ha venido consiguiendo laboriosa y lentamente a lo
largo de su existencia de siete décadas, Todo ello, transportado al contexto de la
cuestión cuyo análisis nos ocupa, también nos pone en evidencia la manifestación de
los distintos trastornos y problemas que se ocasionarán en el ámbito del
cumplimiento del orden jurídico de la Unión, provocando la retroactividad de
numerosos avances obtenidos en el ámbito legal y, hasta la posible pérdida, de
algunos derechos y libertades que ya se encontraban absolutamente incardinados y
asumidos por nuestra realidad social y cultural en la Unión Europea.
En consecuencia, es necesario recordar a la ciudadanía la función que la
Unión Europea tiene que desempeñar activamente, dentro del esquema mundial,
para de este modo, comenzar un periodo de tiempo en el que intente y consiga
restablecer su confianza en los procesos democráticos, así como que esta
organización, de marcado acento supranacional, pueda seguir creciendo,
profundizando en su estructura y funcionamiento, aumentando y consolidando
fuertemente sus ámbitos de actuación, tanto a nivel interno como también a escala
internacional..

5 BIBLIOGRAFÍA
Agencia de los Derechos Fundamentales de la Unión Europea<https://fra.europa.eu/es> [Fecha de
consulta: 26 de mayo de 2020]
AGENCIA DE LOS DERECHOS FUNDAMENTALES DE LA UNIÓN EUROPEA. “Relocating
unaccompanied children: applying Good practices to future schemes” <https://fra.europa.eu/sites/
default/files/fra_uploads/fra-2020-relocating-unaccompanied-children_en.pdf> [Fecha de consulta: 26 de
mayo de 2020]
Carta de Derechos Fundamentales de la Unión Europea, DOUEC 364, de 18 de diciembre de 2000.
Consejo de Europa <https://www.coe.int/en/web/portal/home> [Fecha de consulta: 26 de mayo de 2020]
CONSEJO DE EUROPA. “European Convention on Human Rights” <https://www.echr.coe.i
nt/Documents/Convention_ENG.pdf> [Fecha de consulta: 4 de mayo de 2020]
CONSEJO DE EUROPA. “Respectingdemocracy, rule of law and human rights in the framework of the
COVID-19 sanitary crisis. A toolkit for memberstates” InformationDocuments SG/Inf(2020)11 de
7.04.2020.
Convención sobre el Estatuto de los Refugiados, adoptada en Ginebra el 28 de Julio de 1951 por
Naciones Unidas, que entró en vigor el 22.04.1954, de ahora en adelante Convención de Ginebra.
CTP “Statement of principlesrelating to the treatment of personsdeprived of theirliberty in the context of
the coronavirus disease (COVID-19) pandemic” CPT/Inf(2020)13 <https://rm.coe.int/16809cfa4b>[Fecha
de consulta: 20 de mayo de 2020]
Directiva 2001/55/CE del Consejo, de 20 de julio de 2001, relativa a las normas mínimas para la
concesión de protección temporal en caso de afluencia masiva de personas desplazadas y a medidas de
fomento de un esfuerzo equitativo entre los Estados miembros para acoger a dichas personas y asumir las
consecuencias de su acogida, DOUE L 212, de 7.8.2001, p. 12-23.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 271


Carlos Francisco Molina del Pozo

Directiva 2008/115/CE del Parlamento Europeo y del Consejo, de 16 de diciembre de 2008, relativa a
normas y procedimientos comunes en los Estados miembros para el retorno de los nacionales de terceros
países en situación irregular, DOUE L 348 de 24.12.2008, p. 98-107.
Directiva 2013/33/UE del Parlamento Europeo y del Consejo, de 26 de junio de 2013, por la que se
aprueban normas para la acogida de los solicitantes de protección internacional, DOUE L 180, de
29.6.2013, p. 96/116.
NACIONES UNIDAS. “Carta Internacional de los Derechos del Hombre”, Resolución 217 A (III), de 10
de diciembre de 1948.
PARLAMENTO EUROPEO “Pregunta prioritaria con solicitud de respuesta escrita P-001342/2020 a la
Comisión”, de 4 de marzo de 2020, <https://www.europarl.europa.eu/doceo/document/P-9-2020-
001342_ES.html> [Fecha de consulta: 16 de mayo de 2020]
Reglamento (UE) 2016/399 del Parlamento Europeo y del Consejo, de 9 de marzo de 2016, por el que se
establece un Código de normas de la Unión para el cruce de personas por las fronteras, DOUE L 77, de
23.3.2016, p. 1/52
Tratado de Funcionamiento de la Unión Europea, DOUE C 326/47, de 26 de octubre de 2010.

272 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Comentario en Torno a la Nota Conjunta del Consejo de Europa y de la Agencia de Derechos Fundamentales...

O DIREITO HUMANO À SAÚDE NO CÁRCERE:


INCONSTITUCIONALIDADES DO PACOTE ANTICRIME
E O CERCEAMENTO AO DIREITO DE VISITA
THE HUMAN RIGHT TO HEALTH IN PRISON:
UNCONSTITUTIONALITIES OF THE ANTICRIME
PACKAGE AND THE RIGHT TO VISIT
DOI: 10.19135/revista.consinter.00011.12
Recebido/Received 30.04.2020 – Aprovado/Approved 30.07.2020
Paloma Gurgel de Oliveira Cerqueira1 – https://orcid.org/0000-0002-6935-2261
E-mail: palomagurgel_adv@hotmail.com / palomagurgeladvogada@gmail.com

Resumo: O presente estudo tem como objeto a análise a Lei 13.964/2019 e as


consequências da proibição e/ou restrições de visitas aos apenados e a evidente necessidade
de tutela jurisdicional conforme os tratados de Direitos Humanos. A relevância temática
justifica-se diante da inobservância das garantias constitucionais e da carta de direitos
humanos. Os vínculos familiares, afetivos e sociais são considerados bases sólidas para
afastar os condenados da delinquência. A metodologia de pesquisa consiste na vasta
pesquisa sobre a literatura e bibliografia especializada sobre a matéria. O objetivo deste
trabalho é expor as violações de garantias constitucionais e de direitos humanos presentes
no denominado Pacote anticrime, bem como destacar as graves consequências psicológicas
e físicas sofridas pelos apenados em decorrência de algumas restrições.
Palabras-clave: Pacote Anticrime. Direito à saúde. Direito de visita.
Abstract:The purpose of this study is to analyze Law 13.964 /2019 and the consequences
of the prohibition and / or restrictions on visits to prisoners and the evident need for
judicial protection under the Human Rights treaties. The thematic relevance is justified
given the failure to comply with constitutional guarantees and the human rights charter.
Family, affective and social ties are considered solid bases to keep convicts from
delinquency. The research methodology consists of extensive research on the literature
and specialized bibliography on the subject. The purpose of this paper is to expose the
violations of constitutional guarantees and human rights present in the so-called anti-
crime package, as well as to highlight the serious psychological and physical
consequences suffered by the inmates as a result of some restrictions.
Keywords: Anticrime Pack. Right to health. Right of visit.
Sumário: Introdução; 1. O Pacote Anticrime: as alterações quanto ao direito de visita; 2.
A visita como direito constitucional: a base familiar e a ressocialização; 3. A saúde
mental e física do apenado: a importância do contato e toque humano; 4. A violação à
integridade psicofísica, à personalidade e à dignidade da pessoa humana; 5. Considerações
finais; Referências.

1
Advogada, Pós-Doutoranda pela Universidade de Salamanca (Espanha) e Pós-Doutoranda pela
Universidade de Messina (Itália).

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 273


Paloma Gurgel de Oliveira Cerqueira

INTRODUÇÃO
O presente estudo aborda o direito à saúde, considerando as alterações legis-
lativas trazidas pelo denominado Pacote Anticrime, e mais especificamente sobre o
direito de visita íntima nos presídios do Estado Brasileiro, sob as óticas constitucio-
nal e humanitária.
Antes mesmo da vigência da Lei 13.964/2019, a proibição de visitas nos pre-
sídios brasileiros já era uma realidade constante, cujas suspensões eram regulamen-
tadas por intermédio de Portarias da administração, violando uma série de normas
constitucionais e legislativas.
Apesar de situação regulamentada é importante o debate acerca de violações
constitucionais persistentes bem como de tratados de Direitos Humanos, traduzindo
o dever de punir do Estado em excessos que precisam ser debatidos e revistos.
As pesquisas bibliográfica e de campo compõem a metodologia de pesquisa.
A pesquisa bibliográfica, a partir de literatura nacional e estrangeira, pesquisas em
artigos publicados na internet através de sites especializados no tema.
A pesquisa de campo em consequência das visitas realizadas aos presídios
federais e estaduais em decorrência da atuação na advocacia criminal, que envolve
entrevistas e consequentemente a atuação em defesa de direitos objeto do tema em
comento e dispostos pela legislação em análise.
Serão abordadas neste estudo as alterações legislativas quanto ao direito de
visita; a visita sob a ótica constitucional, como base familiar e a importância da
ressocialização; a importância da saúde física e mental do apenado e a necessidade
do toque humano para a realização deste fim; as violações ao direito de visita e a
consequente mácula à dignidade da pessoa humana.
A inclusão e manutenção de presos em estabelecimentos penais não deveria
romper os laços familiares, pois a família tem sua unidade constitucional garantida.
Além disso, deveria ser observada a impossibilidade jurídica da determinação da
incomunicabilidade da pessoa privada de liberdade.
Importante ressaltar, neste ponto, que a Lei de Execução Penal (Lei
7201/1984) garante aos presos o respeito à integridade física e moral.
A partir de análise de documentos e referências sobre os temas que circun-
dam a problemática evidenciada, o presente artigo propõe o debate acerca dos aspec-
tos controversos da referida lei e de portarias do Ministério da Justiça atinentes à
execução penal.
Destaca-se neste estudo a análise da constitucionalidade das medidas legais,
sobretudo em situações discursivas de uma efetivação da justiça em clara relação
com a satisfação do clamor social presente da sociedade contemporânea e as conse-
quências físicas e psicológicas que podem afetar o apenado submetido a privações
que vão além da liberdade.

274 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


O Direito Humano à Saúde no Cárcere

1 O PACOTE ANTICRIME: AS ALTERAÇÕES LEGISLATIVAS QUANTO


AO DIREITO DE VISITA
A custódia no Sistema Penitenciário brasileiro sem garantias mínimas de di-
reitos, especialmente de visitas, pode gerar danos psíquicos e emocionais, subme-
tendo os condenados a malefícios que não se limitam à privação de liberdade.
Com a novas regras do Pacote Anticrime, resta evidente um perigoso retro-
cesso. Sendo direito fundamental, o desrespeito ao direito à saúde macula uma con-
quista histórica, garantida constitucionalmente.
A rigidez evidente em algumas alterações trazidas pelo denominado pacote
anticrime é inconstitucional, resultando em violação a direitos humanos.
A nova Lei 13.64/2019 sugere uma espécie similar ao regime disciplinar dife-
renciado, no art. 52 da Lei de Execução Penal:

Art. 52. sujeição do preso ao RDD em caso de crime doloso (falta grave) e quando
subversão da ordem ou disciplina. (...)
III – visitas quinzenais, de 2 pessoas por vez – duração 2hs
§ 6º. a visita (inc. III) será gravada em sistema de áudio ou de áudio e vídeo e, com
autorização judicial, fiscalizada por agente penitenciário.
§ 7º. após os primeiros 6 meses de RDD o preso que não receber visita (inc. III) po-
derá, após prévio agendamento, ter contato telefônico, que será gravado, com uma
pessoa da família, duas vezes por mês e por 10 minutos.

Na Lei 11.671/2008 (estabelecimentos penais de segurança máxima), o art.


3º, inc. II, § 1º prevê a supressão absoluta do direito à intimidade da pessoa que
estiver presa naquele estabelecimento, ao exigir que as visitas do cônjuge, da com-
panheira, de parentes e amigos somente ocorram “em dias determinados”. Além do
mais, prevê: a visita deverá ser “assegurada por meio virtual ou no parlatório”:

Art. 3º. Serão incluídos em estabelecimentos penais federais de segurança máxima (...)
§ 1º. A inclusão em estabelecimento penal federal de segurança máxima (...), com as se-
guintes características:
Inc. II . visita do cônjuge, do companheiro, de parentes e de amigos somente em dias de-
terminados, por meio virtual ou no parlatório, com o máximo de 2 pessoas por vez, além
de eventuais crianças separados por vidro e comunicação por meio de interfone, com fil-
magem e gravações.
§ 4º. os diretores dos estabelecimentos penais federais ou o diretor do SPF poderão
suspender e restringir o direito de visitas por meio de ato fundamentado.

Visita por meio virtual é a imposição legal. Tal “visita” será regra, enquanto a
visita “real” e necessária, a exceção. E prossegue o dispositivo: a visita acontecerá “com
o máximo de duas pessoas por vez, além de eventuais crianças”.
O detalhe é que, segundo observa Távora (2019) não para por aí o cenário de
guerra do Estado contra o apenado, de forma que todos estarão “separados por vidro e
em comunicação por meio de interfone, com filmagem e gravações”.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 275


Paloma Gurgel de Oliveira Cerqueira

Monitorar os pensamentos do detento durante todos os minutos de seu cumpri-


mento de pena e, além dos familiares, os advogados têm se sujeitado a todo tipo de cons-
trangimento em determinados estabelecimentos prisionais (TÁVORA, 2019). Nos pare-
ce evidente que esta é a intenção do legislador: monitoramento indiscriminado.
Resta clara a dominação de um clamor social a partir da ideia de que severidade e
inobservância de direitos fundamentais conquistados ao longo da história sejam a efeti-
vação da persecução criminal e a solução para afastar a criminalidade.
Tal aspecto discursivo preponderante, como leciona Vasiliki Christou (2007), re-
fere-se a diversas formas de tratamento, ainda que simbólico, contra determinados gru-
pos, sendo abusivas ou ameaçadoras.
Tais elementos acabam provocando uma reação legislativa, no sentido de agravar
as regras aplicáveis aos presos, como reflexo de uma vingança institucionalizada. As
restrições de visitas implementadas pela nova legislação, ademais, já ocorriam na prática,
quando, por intermédio de portarias, as visitas eram restringidas, desprezadas como
direito constitucional.
A Constituição Federal, no entanto, não admite direitos e garantias absolutos,
mas impõe que as limitações de ordem jurídica se destinem tanto a proteger a integridade
do interesse social quanto assegurar a coexistência harmoniosa das liberdades.
O que se pode concluir é: as constantes violações de direitos, a exemplo das
proibições de visitas aos detentos, agora mais rígidas, contrariam as normas básicas
do nosso ordenamento jurídico, e na maioria dos casos ultrapassam a medida da
razoabilidade.
Antes da vigência da Lei 13.964/2019, a restrição ao direito de visita já se re-
vestia como uma espécie de Regime disciplinar diferenciado, cujo conceito traduz-se
em sistema de medida extrema e de isolamento, cujos efeitos psicológicos e psiquiá-
tricos nos custodiados, e certamente nos familiares, são inevitáveis.
Conforme informações retiradas do banco de dados do Sistema Penitenciário
Federal, no período entre 22.06.2017 e 05.07.2017, existem 570 (quinhentos e seten-
ta) presos federais e destes 121 (cento e vinte um) estavam no Sistema Penitenciário
Federal há mais de 720 (setecentos e vinte dias) dias.
A rigidez legislativa não é o caminho. Conforme lecionam Arruda e Santin
(2019), “a violência da pena programada pelo poder constituído e racionalizada
pelo saber jurídico tem produzido um verdadeiro genocídio social pelo grande en-
carceramento e aprisionamento cautelar em massa”.
Sabe-se que a severidade das penas não reduz a quantidade de crimes; do
mesmo modo, o medo do castigo não impede que um delito seja praticado (ARRU-
DA e SANTIN, 2019).
Não se deve retirar direitos a custo de “fazer justiça”, a custo da saúde, física
e mental. Não se pode seguir distorcendo justiça e direitos humanos.
Deve-se primar pela justiça, que se faz em observância à estrita legalidade
(CERQUEIRA, 2019). Vale destacar, no dizer de Arruda e Santin (2019):

276 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


O Direito Humano à Saúde no Cárcere

“A racionalidade repressora do Projeto de Lei Anticrime se legitima pelo discurso da


autoridade que, amparado nas promessas da prevenção geral e especial que nunca
foram cumpridas, e na utilização de categorias que resgatam o odioso direito penal
do autor, oferece mais do mesmo sem qualquer investigação empírica que possibilite
projetar seu impacto no âmbito judicial e administrativo”.

Além dessas, têm-se outras arbitrariedades, fazendo do sistema penitenciário


um erro, na medida em que afronta os preceitos da Constituição Federal, principal-
mente o da dignidade da pessoa humana e da proibição de aplicação de penas cruéis
ou de banimento.
Neste sentido é importante destacar o dizer de Aury Lopes, o conceito do
Princípio da Necessidade:

Existe uma íntima relação e interação entre a história das penas e o nascimento do
processo penal, na medida em que o processo penal é um caminho necessário para
alcançar-se a pena e, principalmente, um caminho que condiciona o exercício do po-
der de penar (essência do poder punitivo) à estrita observância de uma série de re-
gras que compõe o devido processo penal.

Em complemento a tal raciocínio, Aury Lopes faz uma preciosa reflexão no


sentido de que o respeito às garantias fundamentais não pode ser confundido com a
impunidade, sendo o processo penal um caminho necessário para chegar-se, legiti-
mamente, à pena.
Algumas alterações trazidas pelo popular Pacote Anticrime são consideradas
por parte da doutrina como inconstitucionais, é o que será exposto mais adiante,
principalmente quanto ao direito de visitas aos presos, pois o apenado não deve
romper seus laços com familiares e amigos, sobretudo porque a família, base da
sociedade, tem sua unidade constitucionalmente garantida.
O denominado Pacote Anticrime, Lei 13.964/2019 trouxe algumas alterações
acerca do direito de visitas, especificamente no art. 52, inc. III da Lei de Execução
Penal e no art. 3º, § 1º, inc. II, da Lei 11.671/2008, sobre o sistema penitenciário
federal.
Os tratados de Direitos Humanos e a legislação brasileira, na Lei de Execu-
ção Penal, tutelam o direito à saúde dos presos e garantem que as prisões devem
permitir visitas tanto da família como de amigos dos detentos.
Trata-se de um direito limitado porque, além de o ordenamento jurídico não
abarcar nenhum direito de caráter absoluto, sofre uma série de restrições, tanto em
relação às condições que devem ser impostas por motivos morais, de segurança e de
boa ordem do estabelecimento, como porque pode ser restringido por ato motivado
dos diretores dos presídios.
As restrições de visitas implementadas pela nova legislação já ocorriam na
prática, quando, por intermédio de portarias, as visitas eram restringidas e despreza-
das como direito constitucional: a família como base da sociedade, o papel ressocia-

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 277


Paloma Gurgel de Oliveira Cerqueira

lizador da pena, a importância das visitas para a saúde física e mental do apenado:
nenhum desses aspectos era respeitado.
Com a nova legislação, ratificadas estão as violações, já existentes antes da
nova lei, aos Tratados Internacionais:

Art. 5.º, 6, da Convenção Americana dos Direitos Humanos.


“As penas privativas de liberdade devem ter por finalidade essencial a reforma e a
readaptação social dos condenados”.
Art. 10 do Pacto Internacional sobre os direitos civis e políticos.
“Toda pessoa privada de sua liberdade deverá ser tratada com humanidade e respei-
to à dignidade inerente à pessoa humana”.

Restam evidentes algumas questões de inconstitucionalidades e de ilegalida-


des quando analisados pontos polêmicos da nova lei, conhecida como Pacote Anti-
crime, bem como de medidas restritivas já implementadas pelo Ministério da Justiça,
como a Portaria 157/2019, que no passado restringiu as visitas íntimas nos presídios
federais brasileiros a pretexto de garantir a segurança.
Nesse panorama, ressalte-se que o discurso é uma ação capaz de produzir
efeitos graves. Cria-se um cenário de insegurança social, a partir da notícia de cri-
mes de gravidade, para influenciar a sociedade a exigir do legislativo uma resposta
mais severa.
Tal panorama de insegurança resulta na produção de leis rigorosas e que ape-
nas reproduzem uma violência das instituições formais de controle, sem efetividade
legítima, como preleciona Salo de Carvalho (2013).
Como primeira consequência negativa do ambiente penitenciário tem-se a
debilidade da saúde, agravada pelas restrições de visitas que, no conjunto se asseme-
lham a tortura.
É indispensável destacar que garantias fundamentais são ameaçadas a partir
da nova legislação: a base familiar, a ressocialização, a saúde física e mental do
apenado e a dignidade da pessoa humana.

2 A VISITA COMO DIREITO CONSTITUCIONAL: A BASE FAMILIAR E


A RESSOCIALIZAÇÃO
O apenado não deve romper seus laços com familiares e amigos, pois estes
lhe são benéficos, sobretudo porque a família, base da sociedade, tem sua unidade
constitucionalmente garantida:

Art. 226, CF.A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.
(...)
§ 4º. Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qual-
quer dos pais e seus descendentes.

No mesmo sentido, o art. 5º, inc. LXIII, assegura ao Preso a assistência familiar.

278 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


O Direito Humano à Saúde no Cárcere

A restrição ao direito de visita dos presos viola, ainda, o princípio constitucional


da intranscendência da pena, pois resta evidente a punição dos filhos do apenados, lhes
sendo vedada a convivência familiar, desconsiderando a dignidade da criança e do ado-
lescente nos termos estabelecidos no art. 19 do Estatuto da Criança e do Adolescente e
art. 227 da Constituição Federal de 1988.
É perceptível que as restrições de visitas trazem consigo uma verdadeira rup-
tura ao desenvolvimento salutar das relações matrimoniais ou de companheirismo.
São abaladas suas relações afetivas e possibilidade de ressocialização do apenado.
As restrições de visitas também rompem o desenvolvimento das relações ma-
trimoniais ou de companheirismo. O distanciamento por si só tem como efeito malé-
fico e direto a desestruturação das relações familiares.
A unidade familiar, sem dúvidas, sofre ao ter no cárcere um de seus entes e
retirar a única chance de contato entre eles e contraria a regra justa, relacionada ao
princípio da personalidade da pena.
Base da formação humana, a unidade familiar sofre ao ver o cárcere tirar de
si um de seus entes. Essa angústia, porém, tem de ser combatida. Impõe-se sua abor-
dagem crítica, reluzindo a centralidade da família e, simultaneamente, reconhecendo
seu caráter essencial para superação do cárcere.
3 A SAÚDE MENTAL E FÍSICA DO APENADO: A IMPORTÂNCIA DO
CONTATO E TOQUE HUMANO
A afetividade e inteligência são aspectos indissociáveis, segundo Piaget
(1953) intimamente ligados e influenciados pela socialização.
É cediço que a efetividade é necessária na formação de pessoas felizes, segu-
ras e capazes de conviver com o mundo que a cerca. A estudiosa Kathleen Keating
(1993) afirma: “O toque físico não é apenas agradável. Ele é necessário. A pesquisa
científica respalda a teoria de que a estimulação pelo toque é absolutamente neces-
sária para o nosso bem-estar tanto físico quanto emocional” (Keating, 1993. p.4)
Ainda segundo Keating, em muitas clínicas, faz parte do treinamento da
equipe de enfermagem o toque terapêutico, como coadjuvante na cura de pacientes,
pois o toque físico ajuda a aliviar a dor, a depressão, autopunição, isolamento social,
inibição para o trabalho, distúrbios do sono e fadiga e a ansiedade.
Keating (ibidem) sustenta ainda que o abraço é uma forma especial de tocar,
porque quando abraçamos alguém nos sentimos bem e também acaba com a solidão
e o isolamento social; faz a pessoa se sentir aceita pelo outro, melhora o equilíbrio
emocional; alivia a tensão e diminui a ansiedade.
Nesse sentido há estudos da área médica que confirmam que os toques afeti-
vos nas demonstrações cotidianas de afeição seja o abraço, a mão no rosto, o beijo,
ou mesmo o simples ato de pegar nas mãos carinhosamente liberam endorfinas no
nosso corpo.
Em outras palavras: o toque físico efetivo estimula a produção dessas endorfi-
nas principalmente a dopamina que causa bem-estar geral e sentimentos de felicidade.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 279


Paloma Gurgel de Oliveira Cerqueira

Evidente que o isolamento e a despersonalização do indivíduo são cientifica-


mente reconhecidas causas da insanidade mental dos apenados.
Percebe-se claramente que o toque é fundamental em qualquer etapa de vida
e a sua ausência provoca alterações significativas ao nível da saúde física, mental,
social e psicológica pelo que o seu uso deverá ser uma prática regular.
A ausência de contato físico humano, mais exatamente o toque afetivo de
seus familiares impede a ressocialização do apenado, inclusive afetando diretamente
a sua psique, podendo causar dano irreversível à integridade física e mental.

4 A VIOLAÇÃO À INTEGRIDADE PSICOFÍSICA, À PERSONALIDADE E


À DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA
O art. 1º, inc. III, da Constituição Federal de 1988 prescreve um postulado
central do ordenamento pátrio, um fundamento axiológico sobre o qual está constru-
ído o Estado Democrático de Direito: a dignidade da pessoa humana.
Este fundamento é parâmetro orientador de aplicação e interpretação. É um
valor constitucional que irradia luzes sobre todo o ordenamento, em todos os âmbi-
tos (civil, penal, administrativo, eleitoral, trabalhista etc.).
A dignidade da pessoa humana deve ser o parâmetro orientador de todas as
atividades estatais, inclusive dos três Poderes, Executivo, Legislativo e Judiciário
(eficácia vertical dos direitos fundamentais), bem como de todas as atividades priva-
das (eficácia horizontal dos direitos fundamentais), atuando como piso protetivo
mínimo.
Não havendo respeito pela vida e pela integridade física do ser humano, onde
as condições mínimas para uma existência digna não forem asseguradas, não haverá
espaço para a dignidade da pessoa humana.
A Constituição Federal proíbe as penas cruéis (CF/88, art. 5º, XLVII). Ain-
da, o Art. 5º, inc. XLIX, da Constituição Federal é claro em assegurar ao Apenado,
como o art. 40 da Lei de Execução Penal, respectivamente:

Art.5º, XLIX – é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral;


Art. 40. Impõe-se a todas as autoridades o respeito à integridade física e moral dos
condenados e dos presos provisórios.

Dispõe o art. 5°, inc. XLIV que estão proibidos os maus-tratos e castigos aos
presos que, por sua crueldade ou conteúdo desumano, degradante, vexatório e humilhan-
te, atentam contra a dignidade da pessoa, sua vida, sua integridade física e moral.
Prevê-se nas Regras Mínimas para Tratamento dos Presos da ONU o princípio de
que o sistema penitenciário não deve acentuar os sofrimentos já inerentes à pena privati-
va de liberdade (item 57, 2ª parte).
A justiça penal não termina com o trânsito em julgado da sentença condenatória,
mas realiza-se, principalmente, na execução. É o poder de decidir o conflito entre o direi-

280 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


O Direito Humano à Saúde no Cárcere

to público subjetivo de punir e os direitos subjetivos concernentes à liberdade do ser


humano.
Em todas as dependências penitenciárias e em todos os momentos e situações
devem ser satisfeitas as necessidades de higiene e segurança na ordem material, bem
como as relativas ao tratamento digno da pessoa humana.
Deve-se ter em foco que, como quaisquer dos direitos humanos, os direitos
do preso são invioláveis, imprescritíveis e irrenunciáveis.
Não é aceitável, mesmo que em nome dos princípios da segurança pública e
da ordem social, o Sistema Penitenciário Federal venha agindo a revés da Constitui-
ção e Tratados e Convenções de Direitos Humanos qual o Brasil é signatário.
Por mais que a segurança pública seja um valor muito caro, é imprescindível
fazer preponderar o eixo estrutural do Estado Democrático de Direito, qual seja a
dignidade da pessoa humana.
O Estado é incapaz de garantir a segurança pública, tomando medidas contrá-
rias a normas internacionais das quais o Brasil é signatário, como bem aponta o Min.
Gilmar Mendes:

Rechaço peremptoriamente qualquer possibilidade de ponderar os direitos dos con-


denados à individualização da pena e à execução da pena de acordo com a lei, com
interesses da sociedade na manutenção da segurança pública. Não se nega que o Es-
tado tem o dever de proteção aos bens jurídicos penalmente relevantes. A proteção à
integridade da pessoa e a seu patrimônio contra agressões injustas está na raiz da
própria ideia de estado constitucional. Em suma, o Estado tem o dever de proteger os
direitos fundamentais contra agressões injustas de terceiros, como corolário do direi-
to à segurança (art. 5º). No entanto, a execução de penas corporais em nome da se-
gurança pública só se justifica com a observância de estrita legalidade. Regras claras
e prévias são indispensáveis. Permitir que o Estado execute a pena de forma delibe-
radamente excessiva seria negar não só o princípio da legalidade, mas a própria dig-
nidade humana dos condenados – art. 1º, III. Por mais grave que seja o crime, a con-
denação não retira a humanidade da pessoa condenada. Ainda que privados de liber-
dade e dos direitos políticos, os condenados não se tornam simples objetos de direito,
mas persistem em sua imanente condição de sujeitos de direitos. A Constituição che-
ga a ser expletiva nesse ponto, ao afirmar o direito à integridade física e moral dos
presos (art. 5º, XLIX) (...).

A garantia da segurança pública não deve e não pode estar condicionada a viola-
ções de direitos: um não deve excluir o outro.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
São incontáveis os danos psicológicos causados. A privação de liberdade, por
si só, é mais que suficiente para corresponder ao ideal de justiça que todos tanto
clamam.
O sentimento de insegurança e o desejo por justiça devem ser respeitados. No
entanto, esse sistema punitivo é questionável.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 281


Paloma Gurgel de Oliveira Cerqueira

Seria uma alternativa ao atual sistema permitir que o preso pudesse ter na
verdade uma visita familiar, em local adequado, e durante um determinado período.
No entanto, difícil seria de se concretizar essa sugestão em nosso sistema penitenciá-
rio, o qual ainda não é capaz de propiciar nem mesmo as garantias legais mínimas
previstas ao recluso, pelo contrário, a maculam, permitindo agora, com o chamado
Pacote Anticrime, várias violações a direitos.
São inúmeras as arbitrariedades, fazendo desse sistema penitenciário um erro,
na medida em que afronta os preceitos constitucionais da Constituição da República,
principalmente o da dignidade da pessoa humana e da proibição de aplicação de
penas cruéis ou degradantes, submetendo condenados a situações que revelam o lado
mais obscuro do homem.
Dentre as conclusões deste estudo, destaca-se que os direitos fundamentais
são direitos diretamente afetados pelas restrições de visitas nos presídios brasileiros;
há preconceitos insuperáveis em relação aos presos condenados (e não condenados):
independentemente de quais erros graves tenham cometido, a sociedade e o gestores
populistas são inflexíveis e não compreendem os direitos constitucionais e internaci-
onalmente garantidos aos custodiados.
O sistema constitucional brasileiro não admite direitos e garantias absolutas,
mas impõe que as limitações de ordem jurídica se destinem de um lado, a proteger a
integridade do interesse social e de outro, assegurar a coexistência harmoniosa das
liberdades.
Preponderou-se a supremacia da segurança pública, enquanto direito social
(art. 144 da Constituição Federal), mas não se revela legítimo o sacrifício às garanti-
as individuais, como frequentemente verificamos tanto na esfera investigativa quan-
to no próprio judiciário.
A Constituição da República, como norma matriz, veda a adoção de penas
cruéis e de caráter perpétuo (art. 5º, inc. XLVII, da CF), garante a individualização
na execução da pena (art. 5º, inc. XLVIII, da CF) e assegura os presos o respeito à
integridade física e moral (art. 5º, inc. XLIX, da CF).
Deve-se encarcerar e punir o indivíduo que cometeu o delito, mas jamais pri-
vá-los dos seus direitos outros, aqueles que estão além da liberdade legalmente com-
prometida, objeto da pena.
A pena deve se limitar aos termos da sentença, atingindo exclusivamente os
direitos ali delimitados, não se prestando à execração pública, ao exílio, à vingança
ou ao sensacionalismo.
É princípio orientador do sistema penitenciário: o preso não deveria ter rom-
pidos os seus contatos com o mundo exterior, não perdendo os vínculos que os unem
aos familiares, amigos, cônjuges/companheiros, pois são laços psicológica e fisica-
mente benéficos e facilitam o processo de ressocialização e de reinserção social na
comunidade quando for colocado em liberdade.
Na prática, vislumbra-se grande discussão quanto à restrição de tais direitos.
Sob a ótica jurídica, verifica-se enorme atribuição de poderes discricionários nas
mãos dos diretores dos estabelecimentos prisionais, agora perpetuados pela nova lei.

282 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


O Direito Humano à Saúde no Cárcere

Isso gera uma série de ilegalidades disfarçadas de discricionariedade admi-


nistrativa. Decidir sobre qual direito uma pessoa poderá usufruir não é simplesmente
observar todos os preceitos concernentes aos atos administrativos.
Não é coerente admitir a restrição e a privação de direitos sob a perspectiva
da pressão social e sob o argumento de garantia da ordem pública, travestido de
efetivação da tutela jurisdicional e da concretização da justiça.
Verifica-se que a lei que traz evidente distorção dos significados de justiça e
direitos humanos, a partir da relativização de garantias estatuídas nas ordens interna
e internacional.
O Processo Penal é um caminho indispensável até a pena legítima e para tan-
to devem ser observadas com rigor as regras e garantias constitucionais.
A mera proibição de visitas, regulamentadas nos moldes da nova lei, não ga-
rante o processo de reintegração, sendo necessárias políticas carcerárias relacionadas
ao trabalho, educação, família, dentre outros.
A Lei de Execução Penal assegura determinados direitos não atingidos com a
prisão: a privação de liberdade, no sistema constitucional garantista, tem como um
de seus objetivos assegurar que ao indivíduo que ofendeu um bem jurídico individu-
al ou a ordem pública possam ser oportunizadas medidas de reintegração social, com
preservação de sua integridade física e sua saúde mental.
A Lei de Execução Penal, segundo alguns estudiosos, assegura determinados
direitos não garantidos com a prisão, visto que a privação de liberdade, em nosso
sistema garantista constitucional, tem como um de seus objetivos garantir que o
indivíduo que ofendeu a ordem pública possa refletir e ponderar sobre seus erros.
Não se busca defender o crime, mas tão somente analisar, ainda que breve-
mente, o sistema carcerário hoje existente a fim de que ilegalidades não se tornem
rotina.
Por fim, resta evidente a falência quase geral do sistema prisional nacional
frente as formas que se buscam atualmente para segregar e reprimir liberdades sem
gerar alternativas reais para ressocialização.
O preso, em regra, não sai do sistema preparado para estar inserido em um
sistema social não criminoso. Seria este um dos focos realmente importantes para
resolução da criminalidade, foco oposto ao “vício” na edição de leis cada vez mais
rigorosas.
As mudanças, seja por meio de leis, seja por meio de portarias, agravam a si-
tuação da persecução criminal, com ênfase na execução penal, em notória afronta a
princípios e direitos estatuídos em documentos internacionais de tutela de direitos
humanos, bem como do Texto Constitucional, utilizando-se de uma legitimidade
disfarçada e sob o argumento da efetivação da tutela jurisdicional.
Distanciando-se da justiça, leis como estas caminham nesse sentido de ins-
tauração de processos eivados de inconstitucionalidades, para além de retomar a
perspectiva da vingança pública e da violência institucionalizada.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 283


Paloma Gurgel de Oliveira Cerqueira

A inobservância dos protocolos internacionais e nacionais existentes, despre-


zando o fundamento da dignidade da pessoa humana evidencia, de forma incontes-
tável, o descaso do Poder Público para com a efetivação de direitos no Estado De-
mocrático de Direito, caracterizando violação a todos os preceitos normativos cita-
dos neste estudo.

REFERÊNCIAS
ARRUDA, Alexandre Almeida, SANTIN, Giovane, Projeto de Lei Anticrime, entre o punitivismo e o
desprezo pelo conhecimento acadêmico, Boletim IBCCRIM, São Paulo, junho, 2019.
BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil, Brasília-DF, Senado, 1988.
BRASIL, Lei 13.964/2019 de 24.12.2019, aperfeiçoa a legislação penal e processual penal, Brasília/DF,
Senado, 2019.
BRASIL, Decreto 678 de 6.11.1992, promulga a Convenção Americana sobre Direitos Humanos
(Pacto de São José da Costa Rica), de 22.11.1969, Brasília/DF, 1992.
BRASIL, Decreto 311 de 2009, aprova o texto do Protocolo Facultativo ao Pacto Internacional sobre
Direitos Civis e Políticos, adotado em Nova Iorque, em 16.12.1966, e do Segundo Protocolo Facultati-
vo ao Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos com vistas à Abolição da Pena de Morte,
adotado e proclamado pela Resolução 44/128, de 15.12.1989, com a reserva expressa no art. 2º. Brasí-
lia/DF, 2009.
BRASIL, Lei 11.671, de maio de 2008, Transferência e inclusão de presos em estabelecimentos penais
federais de segurança máxima. Brasília/DF, 2008.
BRASIL, Lei 7.210.07.1984, Lei de Execução Penal Brasília/DF, 1984.
CERQUEIRA, Paloma Gurgel de Oliveira, Direito humano e fundamental à saúde e a teoria da
transnormatividade, Disponível em: <http://www.brjd.com.br/index.php/BRJD/article/view/1002>,
Acesso em: 7.02.2019.
CERQUEIRA, Paloma Gurgel de Oliveira, TOURINHO, Luciano, VIDIGAL, Camila, Execução penal e
discurso do ódio, a relativização de garantias e direitos fundamentais em estabelecimentos penais fede-
rais e breves comentários ao Projeto de Lei Anticrime, Boletim do IBCCRIM, v. 27, p. 18-21, 2019.
KEATHING, Kathleen, A terapia do abraço, Disponível em: <https://indicalivros.com/pdf/a-terapia-do-
abraco-kathleen-keating>, Acesso em: 24.04.2019.
LOPES, Aury Junior, Direito processual penal, 17ª edição, São Paulo, Saraiva Educação, 2020.
MENDES, Gilmar, Recurso Extraordinário 641.320/RS, Supremo Tribunal Federal.
PIAGET, Jean, Inteligencia y afectividad, Buenos Aires, Aique 2001.
TÁVORA, Nestor, ALENCAR, Rosmar Rodrigues, Comentários ao Anteprojeto de Lei Anticrime, Jus-
podivm, Bahia, 2019.

284 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


O Direito Humano à Saúde no Cárcere

ECONOMÍA INFORMAL, INSEGURIDAD


LABORAL Y TRABAJO DECENTE
INFORMAL ECONOMY, LABOR INSECURITY
AND DECENT WORK
DOI: 10.19135/revista.consinter.00011.13
Recibido/Received 06.05.2020 – Aprobado/Approved 26.10.2020
J. Eduardo López Ahumada1 – http://orcid.org/0000-0001-7380-5932
E-mail: eduardo.lopez@uah.es

Resumen: El proceso de transición hacia la formalidad laboral es un desafío esencial en


un mundo complejo presidido por un alto grado de incertidumbre e inseguridad. El
problema laboral y social de la informalidad es una cuestión sumamente amplia y de
gran complejidad técnica, que se refiere a situaciones de distinta dimensión y que se
proyecta sobre distintas realidades nacionales. La informalidad laboral afecta al conjunto
de los sistemas de relaciones laborales y se encuentra en constante cambio y
transformación. Todas estas variables serán objeto de análisis en las siguientes páginas,
tomando como referencia la situación del problema desde una dimensión internacional
del fenómeno. Se analizarán las principales normas internacionales, que evitan el
desarrollo del trabajo informal, así como las políticas y las prácticas orientadas a su
erradicación.
Palabras-clave: Trabajo informal, economía sumergida, inseguridad laboral, derechos
fundamentales, inclusión social
Abstract: The transition to formal employment is an essential challenge for a complex
world dominated by a high degree of uncertainty and insecurity. Informality gives rise to
labor and social problems and is an extremely broad and highly technical issue, which
refers to situations of different dimensions and which is projected onto different national
realities. Labor informality affects all labor relations systems and is constantly changing
and transforming. All these variables will be analyzed in the following pages, taking as a
reference the situation of the problem from an international dimension of the
phenomenon. The main international standards that prevent the development of informal
work will be analyzed, as well as the policies and practices aimed at its eradication.

1
Doctor en Derecho por la Universidad de Alcalá, sobresaliente cum laude por unanimidad (2003) y Premio
Extraordinario de Doctorado (2005). Académico correspondiente de la Real Academia de Jurisprudencia y
Legislación. Director de la Revista “Estudios Latinoamericanos de Relaciones Laborales y Protección
Social” (ISSN: 2445-0472), publicada por Ediciones CINCA. Investigador Principal de la Línea estable de
investigación en Relaciones Laborales y Protección Social del Instituto Universitario de Estudios
Latinoamericanos de la Universidad de Alcalá (IELAT). Miembro de la Comunidad Cielo Laboral.
Profesor invitado en las Universidades Montesquieu-Bordeaux IV, Universidad de Bolonia, Universidad
Libre de Bruselas, Universidad de California-Los Ángeles y University College of Dublín. Es autor de
diversas monografías y múltiples artículos de investigación publicados en revistas de impacto científico.
Para más información http://www2.uah.es/eduardo_lopez_ahumada/ E-mail: eduardo.lopez@uah.es.
Profesor Titular de Derecho del Trabajo y de la Seguridad Social. Universidad de Alcalá.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 285


J. Eduardo López Ahumada

Keywords: Informal work, underground economy, job insecurity, fundamental rights,


social inclusion.
Sumario: 1. Introducción. 2. Trabajo informal y globalización sin controles. 3.
Informalidad y desprotección laboral. 4. La necesaria observancia de los derechos
fundamentales en el trabajo. 5. Inseguridad laboral y trabajo decente. 6. La intervención
en la informalidad y la compensación de situaciones injustas: nuevas políticas
económicas, laborales y sociales. 7. La transición a la formalidad como vía de garantía
de equidad e inclusión social. 8. Conclusiones. Bibliografía.
Summary: 1. Introduction. 2. Informal work and globalization without controls. 3.
Informality and job vulnerability. 4. The necessary observance of fundamental rights at
work. 5. Job insecurity and decent work. 6. Intervention in informality and
compensation for unfair situations: new economic, labor and social policies. 7. The
transition to formality as a way to guarantee equity and social inclusion. 8. Conclusions.
Bibliography.

1 INTRODUCCIÓN
La informalidad laboral afecta al conjunto de los sistemas de relaciones
laborales y se encuentra en constante cambio y transformación. Estos datos nos
vienen a demostrar que estamos realmente ante un problema global, siendo este uno
de los grandes problemas que afecta las sociedades del siglo XXI. En este trabajo
vamos a abordar el problema de la informalidad laboral y la exclusión social, teniendo
en cuenta cómo las nuevas formas de trabajo pretenden eludir el sistema tradicional de
trabajo declarado. Se trata de una temática interdisciplinar, de gran repercusión y siempre
de actualidad, con importantes consecuencias nacionales e internacionales.
La informalidad laboral es un problema que se está igualmente desarrollando en
los países europeos y, en especial, en España. Actualmente, en nuestro país, se estima
que existe en torno a tres millones de empleados que se encuentran en situación de
trabajo no declarado. La informalidad laboral afecta al conjunto de los sistemas de
relaciones laborales y se encuentra en constante cambio y transformación. Todas estas
variables serán objeto de análisis en las siguientes páginas, tomando como referencia la
situación del problema desde una dimensión internacional del fenómeno. Se analizarán
las principales normas internacionales, que evitan el desarrollo del trabajo informal, así
como las políticas y las prácticas orientadas a su erradicación. El enfoque de este trabajo
está canalizado eminentemente por el estudio del Derecho, que se complementa con
el análisis del problema de forma interdisciplinar.

2 TRABAJO INFORMAL Y GLOBALIZACIÓN SIN CONTROLES


Este modelo económico ha generado una reducción ciertamente limitada de
la inseguridad y la vulnerabilidad en los mercados de trabajo. Dicha situación ha
afectado muy especialmente a los mercados de trabajo de las economías en
desarrollo. En este sentido, nos encontramos ante una oportunidad perdida. Cabe
recordar que durante la primera década del segundo milenio el comercio mundial
experimentó un crecimiento considerable y las economías latinoamericanas
contribuyeron intensamente al PIB mundial. Dichas economías doblaron incluso su

286 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Economía Informal, Inseguridad Laboral y Trabajo Decente

participación respecto a la década de los ochenta. Esta contribución del comercio al


crecimiento de la región fue importante e igualmente generó nuevas perspectivas
para el empleo. Sin embargo, este crecimiento de la economía no supuso una mejora
equiparable en las condiciones de trabajo y de vida en los países de América Latina.
En efecto, no existe una relación directa y univoca entre la flexibilización y la
apertura comercial de los países, que tenga influencia en la evolución del empleo
informal. No obstante, en los supuestos de apertura económica y comercial el sector
formal de la economía suele aumentar, aunque su comportamiento será más o menos
intenso en función de la realidad del país que se analice. En cualquier caso, las
políticas comerciales y las políticas redistributivas del trabajo deben aplicarse
coordinadamente. Se trata de una combinación necesaria para compensar la acción
incondicional de los mercados. Es importante atajar la situación de la economía
informal, porque los países con grandes economías sumergidas no pueden
desarrollar una actividad de exportación importante, ni tampoco pueden diversificar
su actividad, lo que generaría nuevas expectativas positivas en el empleo (DAZA,
2005). El modelo de economía sumergida lastra ciertamente sus propias
posibilidades de crecimiento, debido a que sus empresas tienen una capacidad
limitada de expansión y de desarrollo empresarial. Asimismo, el comercio
internacional puede aumentar el bienestar de la sociedad y mejorar la tendencia de
creación de empleo. Sin embargo, también puede tener como contrapunto la
generación de nuevas situaciones de informalidad, ante la necesidad de buscar desde
el punto de vista de la competitividad, nuevos países en los que el coste laboral sea
comparativamente inferior respecto de otros mercados de trabajo de las economías
emergentes.
En Latinoamérica el comercio y el crecimiento económico han
experimentado un considerable aumento. El porcentaje de trabajadores de la
economía informal ha aumentado, según los países, o en el mejor de los casos se ha
mantenido estable. Y si atendemos a la propia configuración del trabajo declarado en
las empresas formales, podemos asegurar que la proporción entre trabajadores con
empleos dignos o empleados con trabajos no declarados arroja una importante deriva
hacia la precariedad y la desprotección laboral. Por tanto, es necesario intervenir en
la relación entre comercio y economía informal, a fin de conseguir políticas
comerciales justas, orientadas hacia el objetivo del trabajo decente. Sin duda alguna,
esta nueva concepción puede conseguir unos resultados más favorables en el ámbito
del empleo declarado y protegido. Precisamente, la presencia de grandes economías
informales en América Latina es un fenómeno que impide que los países se
beneficien plenamente de la integración de sus economías en los flujos del comercio
internacional. En este sentido, conviene apuntar que el crecimiento económico no
siempre supone transición a la formalidad laboral. No estamos ante una relación
causa y efecto. Es preciso aplicar medidas concretas para propiciar la generación del
trabajo protegido. Se deben, pues, promover políticas económicas que estimulen la
creación de empleo formal.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 287


J. Eduardo López Ahumada

3 INFORMALIDAD Y DESPROTECCIÓN LABORAL


Referirse a la informalidad laboral significa hablar de desprotección, de
fraude laboral, de inestabilidad laboral y de trabajo sin derechos y con bajo nivel de
retribuciones. En el sector informal se produce, pues, una alta concentración de
trabajadores que no tienen contrato de trabajo y que no pueden recibir la debida
protección jurídica brindada por la legislación laboral. En estas condiciones de
partida, no cabe duda que la informalidad en el trabajo se presenta como un
auténtico obstáculo en el camino hacia el progreso social y económico de los países
de Latinoamérica. Nos estamos refiriendo a los trabajadores excluidos de la
protección jurídico-laboral, que se encuentran ajenos a los modelos de
representación y a los sistemas de negociación colectiva. Se trata de un sector de la
población activa no reconocido y excluido, situado en un contexto de alta
vulnerabilidad laboral y social. Este debe ser, sin duda, el razonamiento de inicio de
este editorial, que nos debe hacer reflexionar sobre esta cuota insoportable del
mercado de trabajo, que se desarrolla en una económica sumergida y que se tolera al
margen del alcance de la legislación laboral y de los regímenes de seguridad social.
Efectivamente, se aprecia con carácter general un importante dualismo. El sector
informal engloba una actividad extralegal, que no se relaciona jurídicamente con el
sector formal, aunque en la práctica las colaboraciones entre ambos sistemas son
ciertamente irremediables.
Estas personas incapaces de acceder al empleo formal se encuentran en una
situación que no viene definida por los ordenamientos jurídicos, estando privados de
derechos y obligaciones. Ciertamente, las legislaciones laborales no prevén
definiciones concretas sobre la noción de trabajador informal, lo que ahonda en la
situación de extralegalidad. Dicha situación supone el no reconocimiento de
derechos laborales para los trabajadores del sector informal. Las leyes de trabajo no
abordan el problema y privan a estos trabajadores informales de la garantía de las
condiciones mínimas de subsistencia y descartan la aplicación del mínimo vital de
subsistencia personal y familiar. Precisamente, la OIT ha intentado alcanzar una
definición de trabajo informal, presentando las características básicas del trabajo
informal. Una definición que dote a dichos trabajos de una protección por parte de
los Estados y sus instituciones. A estos efectos, el Informe de la OIT de 1999 se
refería a cuatro objetivos clave, la promoción de los derechos laborales, la
promoción del empleo, la protección social contra las situaciones de vulnerabilidad
y el fomento del diálogo social. El programa de la OIT para la formalización de la
informalidad sigue insistiendo en la necesidad de avanzar en dicha transición y ello a
pesar de los logros producidos en la reducción del desempleo y en el aumento de la
protección social.

4 LA NECESARIA OBSERVANCIA DE LOS DERECHOS


FUNDAMENTALES EN EL TRABAJO
El problema de la informalidad laboral necesita de la observancia de los
derechos fundamentales en el trabajo. En este sentido, la Declaración de la OIT de

288 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Economía Informal, Inseguridad Laboral y Trabajo Decente

1998 es esencial para garantizar un trabajo protegido con carácter universal. Ello
asegura un trabajo declarado y tutelado por los poderes públicos, que preserve la
libertad de asociación, el reconocimiento efectivo del derecho de negociación
colectiva, la eliminación de todas las formas de trabajo forzoso, la abolición efectiva
del trabajo infantil y la eliminación de la discriminación en materia de empleo y
ocupación. El trabajo en el sector informal no es más que un régimen de actividad
impuesto por la realidad social. Las personas sumidas en este sistema de trabajo
carecen de capacidad de decisión y, por tanto, se encuentran privadas de la libertad
de trabajo. No pueden desarrollar libremente una actividad personal legítima para la
obtención de recursos económicos, que permitan asegurar las necesidades de la
persona y su núcleo familiar. Se encuentran excluidos de la posibilidad de poder
desarrollar un trabajo en condiciones dignas y justas. Ciertamente, este es un modelo
que debe ser atendido por los Estados, en la medida que el trabajo se presenta en
virtud de las Constituciones latinoamericanas como un derecho fundamental, del que
surgen unas obligaciones o responsabilidades para los poderes públicos. En
concreto, nos referimos a la obligación de promover las condiciones necesarias para
que las personas con capacidad de trabajar puedan acceder y conservar el empleo en
virtud de una serie de garantías formales y en condiciones de estabilidad laboral. Se
trata, pues, de un modelo acorde con las declaraciones formales de las
Constituciones de la región, que postulan la protección del trabajo y la garantía del
respeto por los derechos humanos.
La OIT está llamada a realizar una labor orientada a legislar y controlar el
cumplimiento de sus declaraciones, y ello debido al escaso beneficio obtenido por
los trabajadores por la omisión de los derechos fundamentales en el trabajo. Es clave
apoyar el proceso de observancia de las normas fundamentales del trabajo, como
fórmula que permita conseguir una globalización equitativa y, en definitiva, una
sociedad más inclusiva. Desde esta perspectiva, la promoción de las normas
internacionales del trabajo es crucial en un contexto de expansión del comercio
internacional. La globalización de la economía debe respetar las normas
fundamentales del trabajo reconocidas internacionalmente. La Declaración sobre
principios y derechos fundamentales en el trabajo de la OIT de 1998 es el
instrumento internacional básico, siendo dichos derechos internacionales los que
permiten asegurar el vínculo entre el progreso social y el crecimiento económico,
buscando condiciones de justicia social.
El objetivo debe ser la búsqueda de una participación justa en el trabajo
protegido, en condiciones de libertad e igualdad, permitiendo desarrollar plenamente
el potencial de la sociedad. Dichos derechos fundamentales internacionales tienen
carácter universal y todos los miembros de la OIT están llamados a promoverlos y
respetarlos, y ello a pesar de que los Estados no hubieran ratificado los convenios
que desarrollan dichos principios y derechos fundamentales. Los miembros de la
comunidad internacional tienen la obligación de respetar, promover y hacer
efectivos dichos principios y derechos. Precisamente, esta idea fue igualmente
destacada en 2008, en la Declaración de la OIT relativa a la Justicia Social. Dicha
declaración venía a garantizar que la inobservancia de los principios y derechos
Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 289
J. Eduardo López Ahumada

fundamentales “no puede invocarse ni utilizarse en modo alguno como ventaja


comparativa legítima, y que las normas del trabajo no deberían utilizarse con fines
comerciales proteccionistas”.
Recientemente la OIT ha alcanzado un logro histórico, al elaborar una nueva
norma del trabajo dirigida a hacer frente a la economía informal. Este nuevo
instrumento OIT permitirá apoyar las acciones estatales dirigidas a trasvasar a
trabajadores y a unidades económicas productivas de la informalidad a la economía
formal. Este gran logro se alcanzó en la Conferencia Internacional del Trabajo n.
104 de 2015. Se trata de una Recomendación que se configura como la primera
norma internacional del trabajo orientadas específicamente a combatir la economía
informal. En dicho texto se proponen directrices prácticas sobre las políticas y
medias que pueden facilitar la transición de la economía informal hacia la economía
formal. Es un paso más para ayudar a los países a establecer medidas que
promuevan la creación de trabajo decente y empresas sostenibles en la economía
formal. Con todo, ciertamente se trata de una recomendación. Sin duda, el gran reto
será, una vez más, aplicar y conseguir resultados efectivos (Vid. Recomendación
sobre la transición de la economía informal a la economía formal, 2015, n. 204, 12
de junio de 2015).
Las últimas reformas laborales inspiradas en la máxima de la flexibilidad
laboral no ayudan a conseguir la transición a la economía formal. Sin duda, la
informalidad laboral y la inseguridad en el trabajo vienen favorecidas por la nueva
concepción de la flexibilidad laboral, considerada como una única respuesta ante un
tiempo de incertidumbre económica (TOKMAN, 2007). Si bien es cierto que la
flexiseguridad laboral se ha desarrollado en el conjunto de los países de la Unión
Europea como un modelo de respuesta al dumping social internacional, este modelo
de atención al problema de los mercados de trabajo no encaja adecuadamente en la
idiosincrasia de los países latinoamericanos. Sin duda, el problema de vulnerabilidad
en los países latinoamericanos es mucho mayor que en Europa y las profundas
diferencias sociales distan sustancialmente desde una comparativa de ambas
realidades. Asimismo, el modelo de protección social europeo es mucho más intenso
que el latinoamericano, lo que permiten asegurar una cierta atención a las
transiciones en el empleo. Los sistemas de protección social aseguran un cierto
sistema de compensación, aunque exista cada vez más inestabilidad entre las
nociones de seguridad y flexibilidad laboral.
En América Latina la tendencia de flexibilidad y seguridad tiene efectos más
perniciosos debido a la imposibilidad de asegurar una respuesta compensadora a las
técnicas de desregulación laboral (TOKMAN, 2008). Sin embargo, el sistema de
flexibilidad laboral es necesario en la región, debido a la configuración de las
economías de los países latinoamericanos como economías abiertas e integradas en
los mercados internacionales. Los países latinoamericanos demandan mayores dosis
de flexibilidad económica y laboral para adaptarse a volatilidad de la economía
internacional. Sin embargo, especialmente en América Latina esta introducción de la
flexibilidad afecta irremediablemente al ámbito laboral, ya que su asimilación en las

290 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Economía Informal, Inseguridad Laboral y Trabajo Decente

legislaciones laborales conlleva una mayor inseguridad y afecta a las posibilidades


reales de conseguir un crecimiento justo y sostenible socialmente. Sin duda, el gran
desafío de la región es encontrar un tratamiento de dicha situación que permita
conciliar la necesidad de flexibilidad con la seguridad laboral.
Ciertamente, todo ello ahonda en la dificultad de trasladar el modelo europeo
de flexiseguriadad a los países de Latinoamérica. Ello se debe esencialmente al
grado de apertura de sus economías y a la mayor vulnerabilidad de los trabajadores,
que no se encentran protegidos adecuadamente desde el punto de vista laboral y de
Seguridad Social. Sin duda, deben compensarse dicha situación con nuevos
equilibrios, dada la proyección continua de las reformas económicas que se orientan
hacia la flexibilidad y trasladan hacia los trabajadores el coste de la flexibilidad. Un
coste que se presenta en forma de mayor inseguridad y desprotección laboral y
social. De ahí que actualmente la sensibilidad social hacia las reformas económicas
y laborales sea ciertamente combatida y genere un creciente malestar social. Dichos
cambios vienen a cuestionar los modelos sociales de convivencia. Se altera la
cohesión social y ello representa incluso un déficit social importante, que tensiona la
convivencia y altera la propia concepción de la democracia. Esta situación incide en
las bases de la propia soberanía de los Estados frente a las corrientes internacionales
de gestión de la economía.

5 INSEGURIDAD LABORAL Y TRABAJO DECENTE


Con carácter general, debemos destacar que la inseguridad en el trabajo
influye igualmente en material de informalidad laboral. Tanto la OCDE, como la
OIT, vienen advirtiendo de la existencia de una relación entre la inseguridad laboral
y la evolución de la tasa de transición entre el trabajo precario no declarado y el
trabajo decente protegido. Efectivamente, la transición a los puestos de mayor
calidad es un objetivo ciertamente deseable y cuando ello se produce es
consecuencia directa de un aumento de la productividad y de la riqueza de un país.
Ello redunda inevitablemente en el sentimiento de mejora social, encontrándose la
sociedad más protegida y cohesionada. El problema afecta igualmente a los
trabajadores ocupados en las empresas de la economía formal, que se ven afectados
por un aumento considerable de la inestabilidad y la inseguridad laboral. Asimismo,
la propia regulación y mejora de las condiciones de trabajo del sector formal pueden
contribuir a mejorar la situación del mercado informal. Por ejemplo, la subida de los
salarios legales de carácter mínimo puede contribuir asimismo a incrementar la
remuneración de los trabajadores del sector informal.
Una economía informal viene caracteriza por la menor seguridad en el
empleo, por la existencia de ingresos más bajos y por la falta de acceso a una serie
de prestaciones sociales. Asimismo, es preciso indicar que dicho modelo genera
escasas oportunidades de participar en los programas de educación y formación
profesional, lo que impide el desarrollo de carreras profesionales y la adaptación a
las fluctuaciones de los mercados de trabajo. En síntesis, podemos destacar una
situación ciertamente preocupante que choca frontalmente con los caracteres

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 291


J. Eduardo López Ahumada

esenciales del trabajo decente. Se trata de un contexto ciertamente aciago, que


impide contrarrestar la vulnerabilidad en el mercado de trabajo e imposibilita a los
países en desarrollo beneficiarse plenamente de los efectos positivos de la
globalización económica y del proceso de integración de la economía mundial. Esto
es una consecuencia de los actuales tiempos de incertidumbre y de inestabilidad
económica. Ciertamente, un tema básico en este punto es la protección del empleo
ante la evolución fluctuante de la economía. La clave está en intentar mejorar la
capacidad de las empresas de adaptarse a las recurrentes fluctuaciones de la
economía en un escenario global, así como a la necesidad de dar respuesta a la
presencia de nuevos riesgos que afectan a los negocios y que antes no existían.
La inseguridad ligada al nuevo contexto de la economía genera nuevas
condiciones de inseguridad, que se proyectan especialmente sobre los trabajadores
poco cualificados. Se trata de un problema cuyo centro de gravedad se sitúa en el
trabajo por cuenta propia, y ello con independencia del tipo de actividad laboral que
se desarrolle. Esta situación repercute con más intensidad en América Latina, donde
los sistemas de protección social no ofrecen una cobertura universal e integra, y los
trabajadores independientes no ven una relación directa entre las aportaciones
sociales que realizan a los sistemas de protección social y la cobertura social
finalmente recibida. Sin duda, ello no anima especialmente a formalizar su régimen
de actividad profesional. En este punto, los sistemas de protección social son
efectivamente indispensables para captar la actividad económica informal y debe
avanzarse en el desarrollo de la protección laboral ante los riesgos comunes y
profesionales de forma integral.
Asimismo, debemos subrayar que el empleo informal tiene una repercusión
directa en el proceso de precarización de las relaciones laborales. Como decimos, el
creciente proceso de precarización laboral que estamos viviendo en las últimas
décadas, ya no repercute exclusivamente en los trabajadores informales, sino que
también afecta a los trabajadores de las empresas declaradas y que desarrollan sus
trabajos en el ámbito de la economía formal. Se trata, pues, de un nuevo contexto
laboral y social, donde ha perdido su importancia el propio empleo estable. El
trabajo indefinido es un modelo que en gran medida se está difuminando por las
corrientes de máxima flexibilidad laboral y por el repliegue, incluso, de la
legislación laboral. Se ha dejado el desarrollo de las relaciones laborales al poder
individual del empresario y al libre juego de la autonomía individual de las partes.
En este sentido, las últimas corrientes de reformas laborales han impactado
igualmente en el sector de la informalidad, generando nuevas situaciones de trabajo
por cuenta ajena y autónoma, que difícilmente pueden ser asimiladas por el mercado
laboral. Un problema social en el que la legislación laboral se abstenido en muchos
casos de proveer controles efectivos (GONZÁLEZ ORTEGA, 2014). Estas reformas
laborales han supuesto, en definitiva, una gran pérdida de protección tanto para los
trabajadores sin contrato como para los empleados con contrato de trabajo.
Si a las personas que no tienen contrato de trabajo, unimos el dato de las
personas que no tiene un empleo indefinido, tenemos que más de la mitad de la

292 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Economía Informal, Inseguridad Laboral y Trabajo Decente

población asalariada de América Latina se encuentra en situación de informalidad.


Las cifras cambian en función de los países analizados. Así, podemos destacar,
desde esta concepción amplia de la informalidad, el aumento de las cotas de trabajo
precario. En Argentina se sitúa en el 21% y en el polo opuesto encontramos a
Bolivia con un 74%. Se ha producido un aumento progresivo del desarrollo de los
contratos atípicos y de las condiciones de inseguridad y de desprotección que su
aplicación conlleva. El desarrollo de trabajos no vinculados a contratos de trabajo
indefinidos y estables son una forma de precariedad y de abuso laboral, máxime
cuando en realidad se disfraza un trabajo estable. Se produce, en efecto, un fraude
laboral y, por ende, estaríamos hablando en sentido amplio de una nueva dimensión
de la informalidad laboral. Es decir, estaríamos ocultando una parte de la actividad
laboral de un país que igualmente debería estar declarada y considerada una
actividad que formaría parte de la economía declarada, con independencia de la
unidad productiva en que estas prácticas se desarrollen. Como hemos indicado, las
relaciones sin contrato o con contrato distinto al indefinido son usualmente aplicadas
en el ámbito de las microempresas, que tienen una menor capacidad de responder
antes los costes que genera el recurso al trabajo por cuenta ajena retribuido y
protegido mediante cotizaciones sociales a los sistemas de Seguridad Social. Los
contratos de trabajo típicos, y por tanto, con estabilidad y mayor protección jurídico
laboral se desarrollan generalmente en las empresas de mayor dimensión, que si
tienen capacidad de responder a sus obligaciones laborales.
Se debe trabajar en beneficio del empleo estable y con plenitud de protección,
a fin de compensar y proteger frente a los riesgos derivados de la actividad laboral,
tales, como el desempleo, los accidentes y enfermedades, así como la correcta
garantía de la transición a la jubilación. Existen, pues, distintas formas de
informalidad laboral, en función del status contractual del trabajador. Ello define el
propio acceso a la protección laboral y social. Todo depende finalmente del
reconocimiento de una relación laboral y de su situación contractual específica, que
indica la posibilidad de desarrollar un trabajo digno y con una adecuada protección.
Sin duda, la remuneración digna que debe recibir el trabajador es esencial, en la
medida que se trata de un índice necesario para garantizar el bienestar del trabajador
y de su familia. El salario digno define el mínimo vital de garantía y debería
informar el salario mínimo legal vigente en cada país.
Sin duda, otro factor ligado a la precariedad de gran importancia en la región
es el aumento progresivo de la subcontratación y, en general, de los procesos
múltiples de descentralización productiva. Estas nuevas fórmulas de organización
empresarial están favorecidas por el proceso de globalización e internacionalización
de la economía. Se han desarrollado cadenas de prestación de servicios, que
proliferan en el interior del mercado de trabajo, siendo ciertamente difícil controlar
los eslabones inferiores de los procesos de descentralización productiva. Sin duda, la
desprotección aumenta en esos casos, donde se evidencia una ausencia de control y
una imposibilidad manifiesta de poder controlar el conjunto de responsabilidades
empresariales (MARTÍN VALVERDE – GARCÍA MURCIA, 2011). En efecto,

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 293


J. Eduardo López Ahumada

estos procesos descontrolados y desarrollados sin garantías vienen a reducir


ostensiblemente la protección laboral y social de los trabajadores.
Las situaciones de precariedad se proyectan especialmente sobre los
colectivos más vulnerables. Es preciso avanzar en las políticas transversales para la
protección y promoción de los colectivos más vulnerables, en concreto, políticas
orientadas a la defensa del trabajo de jóvenes, mujeres, trabajadores migrantes,
minorías étnicas y raciales, las personas con discapacidad, trabajadores maduros en
situaciones de desempleo, etc. Estos colectivos vulnerables se encuentran afectados
por situaciones persistentes y casi irreversibles de pobreza. Ciertamente, la
protección de estos grupos especialmente afectados por las condiciones de la
economía informal tiene efectos beneficiosos en el conjunto de la sociedad, puesto
que la progresión del mal endémico de la pobreza presenta efectos perniciosos de
naturaleza transversal. Evidentemente, la pobreza incide en la propia vertebración de
las sociedades. El avance y la consolidación de la pobreza vienen también a limitar
la productividad de los países y sus propias posibilidades de desarrollo económico y
social.
El fenómeno injusto de la informalidad laboral ataca especialmente a los
colectivos más vulnerables. Evidentemente, la distribución del empleo no declarado
afecta a ciertos colectivos con mayor intensidad que a otros. Ello ocurre en el caso
de las mujeres, cuyas cuotas de empleo informal se sitúan en torno al 49,7% en
comparación con la cuota de los hombres que se encuentra en torno al 44,5%. Con
todo, hay que destacar una característica propia de los mercados de trabajo de la
región, en los que, a día de hoy, todavía el empleo masculino tiene una mayor
partición en el mercado laboral. Ello explica que en la actualidad el trabajo
masculino represente proporcionalmente una mayor parte del empleo informal. Con
todo, la brecha entre las tasas de informalidad de hombres y mujeres es manifiesta y
ello viene a explicar la situación constante de exclusión del empleo femenino, que
parte con una desventaja en la participación en el trabajo de dichas economías.
Sabido es, por ejemplo, que una gran parte del empleo femenino no declarado
descansa sobre el trabajo doméstico. Se trata de un ámbito de actividad laboral del
que no se disponen datos precisos, aunque se estima que puede venir a representar
entre el siete y el quince por ciento de la ocupación laboral, siendo esta una
ocupación esencialmente femenina.

6 LA INTERVENCIÓN EN LA INFORMALIDAD Y LA COMPENSACIÓN


DE SITUACIONES INJUSTAS: NUEVAS POLÍTICAS ECONÓMICAS,
LABORALES Y SOCIALES
La informalidad no se puede reducir de forma autónoma y sin intervenir en el
mercado laboral. Los países de la región tienen entre sus objetivos prioritarios la
lucha contra la informalidad laboral (BAVIERA PUIG, 2014). Sin duda, en los
últimos años se vienen desarrollando medidas concretas orientadas a facilitar la
transición desde la economía informal al trabajo declarado. Es un proceso que
incluso podríamos calificar de recurrente y con una larga tradición en el tiempo. Sin

294 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Economía Informal, Inseguridad Laboral y Trabajo Decente

embargo, estas medidas de política laboral, muchas antiguas y otras más recientes,
no están consiguiendo los resultados deseados. Efectivamente, el descenso de los
umbrales de informalidad laboral no es muy representativo. Por ello, podemos decir
que estamos ante un mal endémico en la región y, por tanto, los esfuerzos deben ir
orientados a buscar soluciones de conjunto, que de forma integral y ordenada
busquen aunar los problemas económicos y laborales como una misma realidad.
Se precisan respuestas económicas y laborales, que busquen su concreta
proyección a las circunstancias del país y que tengan en cuenta su realidad social.
Efectivamente, tolerar pasivamente dicha informalidad supone un evidente coste
social, que afecta no solo a la cohesión social, sino también a las propias
condiciones de desarrollo económico de la región. El tema ha sido objeto de
reflexión en el más alto nivel en el seno de la OIT. En el año 2014, la Conferencia
Internacional del Trabajo, realizó un análisis exhaustivo sobre la denominada
transición a la formalidad, cuyos trabajos terminaron un año después en una nueva
Conferencia Internacional del Trabajo. Precisamente, estos trabajos de debate y
discusión dieron lugar a un importante conjunto de conclusiones, que permiten
reflexionar con mayor fundamento sobre las necesarias políticas que pueden revertir
eficazmente la situación y conseguir la deseada transición a la formalidad económica
y laboral. Este debate no afectó solamente a Latinoamérica, sino que se proyectó
sobre el conjunto de la comunidad internacional, al detectarse que el problema de la
informalidad era un efecto generalizado en todas las económicas. Ello afecta
especialmente de las económicas emergentes, cuyas ratios de informalidad no se
reducían, sino que incluso aumentaban debido a los efectos derivados del proceso de
globalización económica y de la propia competitividad entre las economías. Se
produce un peligroso proceso de desregulación y de apertura de las economías, que
genera efectos perniciosos desde el punto de vista del dumping social.
Se deben promover políticas económicas y laborales que estimulen el
desarrollo productivo, permitiendo mejorar las condiciones de empleo presentes y
futuras. En este sentido, y de forma paralela, se debe recuperar el papel central de las
políticas de empleo, que pueden igualmente ser útiles para el fomento del trabajo
formal. En este sentido, podemos destacar los esfuerzos realizados, por ejemplo, en
México, que ha emprendido un ambicioso programa de formación y de capacitación
laboral orientado específicamente a la incorporación al mercado laboral formal.
Efectivamente, las políticas activas de empleo, bien enfocadas en sus objetivos,
pueden ayudar a compensar la apertura de las economías y permitir una
redistribución de los empleos. Igualmente se debe combinar de forma efectiva las
políticas de educación y formación profesional orientando sus objetivos hacia el
empleo.
Sin duda, una medida que permite la transición hacia la formalidad laboral es
la promoción de las instituciones fiscalizadoras del cumplimiento de las
obligaciones laborales y de seguridad social. En este sentido, es esencial mejorar los
instrumentos públicos de inspección laboral. Se debe prestar especial atención a los
instrumentos clásicos de control del cumplimiento de las obligaciones laborales. En

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 295


J. Eduardo López Ahumada

este sentido, por ejemplo, en Argentina se ha producido un refuerzo importante de la


inspección de trabajo, asignado más medios técnicos y tecnológicos, así como más
recursos humanos. Se intensificado el sistema de inspección laboral, poniéndolo al
servicio de un importante programa nacional de regularización del trabajo, cuyo
objetivo es la promoción del trabajo registrado y la prevención del fraude laboral. En
cambio, podemos destacar la experiencia chilena, que se ha decantado por sustituir
las multas por el incumplimiento de las normas laborales y de seguridad social por la
inversión en medidas de capacitación en el ámbito de las microempresas y pequeñas
empresas.
En el caso de Colombia se ha realizado un importante esfuerzo por aflorar
nuevos trabajos declarados y combatir la insoportable tasa de informalidad que pesa
sobre la economía. Concretamente, se han fomentado los denominados acuerdos de
formalización, suscritos entre uno o varios empleadores y las direcciones
territoriales del Ministerio de Trabajo. Estos acuerdos vienen a consignar
compromisos concretos, cuya aplicación son objeto de evaluación periódica. El
objetivo de dichos programas es la generación de contratos de trabajo declarados,
que se desarrollen en el tiempo con una cierta estabilidad. Por otro lado, podemos
destacar el ejemplo de México, que promociona un programa de trabajo, cuyas
acciones están orientadas a la formalización entre empleadores y trabajadores,
seguidas por las acciones de inspección de trabajo según los Estados. En Uruguay,
por ejemplo, se ha prestado especial énfasis en el aspecto recaudatorio, mejorando la
eficiencia de sus organismos de recaudación tanto desde el punto de vista impositivo
como desde la recaudación de las aportaciones sociales por parte de los
empleadores.
Efectivamente, es clave el control tributario de las rentas derivadas del
trabajo desarrollado por cuenta propia y ajena. En Latinoamérica se han realizado
importantes reformas tributarias, laborales y económicas con el fin de combatir las
crisis que han azotado los mercados de trabajo de la región. Sin embargo, la
situación no ha arrojado un balance positivo y sigue siendo una apuesta pendiente la
reformulación de los sistemas de protección social, que no llegan a alcanzar la meta
de ser regímenes públicos inclusivos. Dichos sistemas presentan déficits de
protección, que generan más vulnerabilidad y un acceso estratificado a la Seguridad
Social. Sigue, pues, pendiente el gran reto redistributivo de los sistemas de
protección social latinoamericanos, que sobre la base del sistema contributivo
avance en la distribución de la riqueza y en la atención a las situaciones de
necesidad. Ello pasa por articular unos sistemas de protección social que reduzcan la
vulnerabilidad con un aumento de la productividad y la participación laboral. Es
decir, una reforma que asegure el efectivo avance hacia verdaderos sistemas
universales y solidarios de protección social.
Se precisa una estrategia basada en asegurar una adecuada transición al
trabajo formal, prestando apoyo a las personas empleadas en el sector informal y
luchando de forma decidida contra las condiciones de pobreza. Los objetivos
políticos no deben ser solamente de protección, más o menos efectiva, sino que debe

296 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Economía Informal, Inseguridad Laboral y Trabajo Decente

promoverse una adecuada estrategia de inclusión social. Ello es ciertamente


necesario si se pretende realmente alcanzar la meta de la ampliación de la población
realmente protegida. En este sentido, conviene indicar que la Conferencia
Internacional del Trabajo de 2002 prestó especial atención a identificar a aquellas
actividades desarrolladas por trabajadores en unidades de producción no amparadas
o insuficientemente cubiertas desde el punto de vista de la protección jurídico-
laboral por las legislaciones nacionales.
Otro gran objetivo es la propia formalización de las empresas, como unidades
de producción y de creación de empleo. La informalidad laboral se abre camino
mayoritariamente en el ámbito de las microempresas. Esto se debe a la manifiesta
incapacidad de estas empresas informales, que actúan como unidades productivas de
pequeña dimensión. Dichas empresas desarrollan su actividad informal, puesto que
no pueden responder a las obligaciones que derivan de la existencia de las relaciones
de trabajo que desarrollan. Se trata de empresas informales, que no pueden asumir
sus obligaciones laborales como empleadores, pero que sin embargo desarrollan su
actividad económica con una reducida capacidad de pago y de asunción de sus
responsabilidades jurídicas en caso de incumplimiento u omisión de sus deberes
como empresarios. Si estas unidades empresariales estuvieran generalmente
formalizadas, el empleo que generarían igualmente sería declarado y podría contar
con la debida protección laboral y de seguridad social. Evidentemente, la
formalización de las empresas y, en suma, del empleo depende de la existencia de un
contexto adecuado que permita el desarrollo sostenible de las propias empresas.
Dichos entornos empresariales sostenibles son esenciales y dependen de la seguridad
jurídica y de la garantía de la estabilidad de las inversiones empresariales.
Concretamente, es importante la garantía de la viabilidad y el desarrollo de la
inversión extranjera, que se presenta como un factor esencial para el propio
desarrollo económico de la región. Ello consiste simplemente en aprovechar los
efectos positivos de la globalización económica, creando tejido empresarial estable y
revirtiendo esta creación de riqueza en el fomento de trabajo decente para el futuro.
La generación de empresas declaradas se consigue facilitando los
instrumentos de tributación y declaración de actividades. Dichos sistemas de
tributación deben orientarse a conseguir atraer a las unidades empresariales de
menor tamaño a la economía formal. Ello afecta especialmente a los empresarios
individuales o a los trabajadores por cuenta propia. En este sentido, tiene una
especial relevancia el empleo de procedimientos simplificados que se orienten a la
gestión flexible de la contabilidad y a la consiguiente liquidación y abono de
impuestos. En este sentido, es preciso avanzar en la región en los regímenes de
tributación simplificada. Algunos países han realizado importantes avances, como
Perú, que cuenta con un régimen único y simplificado para personas naturales y
microempresas. Dicho sistema permite fijar una tasa fija sobre los ingresos netos
mensuales de las empresas. E, igualmente, es preciso mejorar la aplicación de las
nuevas técnicas de fiscalización, aprovechando las nuevas tecnologías de la
información.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 297


J. Eduardo López Ahumada

Es importante promover la formalización de la pequeña y mediana empresa


en un entorno de desarrollo sostenible. En cierto modo, ello se podría conseguir
estableciendo y generando incentivos para el desarrollo de la formalidad, prestando
especial atención a la formalización de los trabajadores por cuenta propia. No
obstante, no siempre los incentivos generan trabajo formal, como exenciones
tributarias o reducciones de cotizaciones y aportaciones empresariales a la seguridad
social. En gran parte el éxito del modelo depende de la creación de un contexto
empresarial seguro, que anime a formalizar la actividad de la empresa como forma
de posicionamiento en el mercado. Esta nueva situación será percibida por la
empresa como una mejora en la imagen social de la actividad empresarial
desarrollada. Ciertamente, en gran medida las empresas evaluaran sus posibilidades
reales de sostenibilidad y el impacto que sus decisiones tengan en el aumento de sus
negocios. En estos casos, la propia sostenibilidad del modelo de empresa fomentará
o no la decisión de formalizar su propia actividad económica y productiva.
El trabajo independiente desarrollado en el ámbito de las microempresas es
especialmente preocupante. Ciertamente, se encuentra extramuros de la legalidad
tanto el propio empleo, como la actividad empresarial misma. Sin duda, en este
ámbito las cuotas de informalidad son acusadas, ya que se estima que la mayor parte
del empleo informal en la región viene representado por trabajadores autónomos o
trabajadores asalariados en empresas de menos de diez trabajadores. Con todo, la
transición se debe producir del trabajo autónomo no declarado a la formalidad, así
como de las pequeñas y medianas empresas informales a la economía declarada,
pero igualmente se debe seguir prestando atención a la reducción del empleo no
registrado en las consideradas empresas formales o declaradas. Es preciso vigilar
este tipo de empresas pseudoformales, que en realidad se aprovechan igualmente de
este tipo de subempleo de forma ocasional o permanente.

7 LA TRANSICIÓN A LA FORMALIDAD COMO VÍA DE GARANTÍA DE


EQUIDAD E INCLUSIÓN SOCIAL
No cabe duda de que promover la transición al trabajo declarado y protegido
supone avanzar en la inclusión social. Se deben primar las políticas de inserción
laboral y de lucha contra la informalidad como medida que permite avanzar en la
cohesión social. Esto vendría a realzar el protagonismo de la ciudadanía y aseguraría
el ejercicio de los derechos de las personas excluidas (CAMINO FRÍAS, 2013). El
desarrollo de la informalidad y la inseguridad en el empleo genera nocivas
consecuencias sobre la propia cohesión social. Se debe insistir, pues, en la necesidad
de aplicar instrumentos que consigan la inclusión social. Ciertamente, el objetivo de
la cohesión social asegura la propia integración y el bienestar de los ciudadanos,
avanzando en el sentimiento de pertenencia de las personas a la sociedad. Sin duda,
abordar este problema transciende el ámbito estricto laboral y se proyecta sobre una
cuestión social. Ello supone adentrarse y profundizar en el problema de la inserción
laboral teniendo en cuenta la repercusión de la economía informal, donde se
desarrolla una cuota importante de la población activa de los países de la región. Sin

298 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Economía Informal, Inseguridad Laboral y Trabajo Decente

duda, este proceso debe asegurar una búsqueda efectiva de los objetivos de
estabilidad laboral, seguridad y cohesión social.
Efectivamente, un desarrollo socialmente incluyente es imposible sino se
extienden los derechos, garantías y oportunidades a los trabajadores de la economía
informal. Ello es esencial para poder asegurar los objetivos del trabajo decente en la
región. En realidad, el trabajo informal nos sitúa ante la presencia de la pobreza, en
la medida que estos servicios vienen a ser desarrollado por los trabajadores pobres,
excluidos del trabajo formal protegido, y cuya actividad difícilmente admite
abandonar el régimen de economía sumergida (CASTELLS y PORTES, 1989). En
este sentido, se crea un sector de servicios mucho más económicos y competitivos
en los mercados internacionales, pero desatendiendo la cuestión social ligada al
modelo del trabajo protegido. Es cierto que el nivel de pobreza ha descendido en los
últimos años, debido generalmente a la dinámica de las económicas y a los
programas de desarrollo de la comunidad internacional. Asimismo, ha colaborado en
esta tendencia la propia iniciativa privada, esencialmente debido a la acción de las
empresas privadas y a las remesas de los trabajadores migrantes. Con todo, ello no
ha tenido un reflejo directo en las condiciones del mercado de trabajo y en la calidad
del empleo, siguiendo presente unas cotas de informalidad laboral ciertamente
desproporcionadas.
Las soluciones al problema de la informalidad pasan por la búsqueda de la
equidad social. Ello demanda la búsqueda de la eficiencia y el desarrollo de la
economía de los países, a fin de que el sector informal no se convierta en un
obstáculo para la capacidad de fomentar riqueza y desarrollo económico. Se trata de
estimular la generación de condiciones que permitan competir en el ámbito de la
economía mundial, mejorando la recaudación pública. Ello permitiría atraer a las
políticas sociales nuevos ingresos, que podrían revertir a las haciendas púbicas y a
los sistemas públicos de seguridad social. Desde esta perspectiva, no cabe duda de
que la reducción de la dimensión de la economía informal se presenta, pues, como
un objetivo esencial desde la perspectiva del desarrollo de la equidad social. En este
sentido, las reformas económicas y comerciales pueden estimular el desarrollo y el
crecimiento de un país, así como reducir el empleo del sector informal. No cabe
duda que un volumen elevado de sector informal viene a limitar el tamaño de las
empresas, afectando directamente al propio comportamiento de la productividad.
El desarrollo de un sector informal económico consolidado se configura
como un modelo estructural, que limita la debida protección e impide asegurar
condiciones de cohesión social. Difícilmente se podrá vincular adecuadamente la
relación necesaria que debe existir entre los procesos de crecimiento económico y la
protección laboral y social de la población. Se trata de una situación que merma la
capacidad de protección. El objetivo de la cohesión social se presenta como un
índice esencial que caracteriza a los países que progresan económicamente y que
consiguen distribuir con justicia los resultados derivados del proceso de crecimiento
económico en beneficio de sus ciudadanos. Ciertamente, la economía informal
disminuye los ingresos fiscales y reduce las posibilidades de dotación de seguridad

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 299


J. Eduardo López Ahumada

social, especialmente, el acceso a la salud y a las pensiones. Por otro lado, la


informalidad laboral lastra las posibilidades de aumentar la productividad laboral y
la competitividad internacional de los países, al disminuir los beneficios potenciales
del comercio. En síntesis, el sector informal impacta negativamente sobre las
posibilidades de crecimiento económico y la volativilidad de dicho crecimiento
tiende incluso a aumentar el volumen de la economía informal.
La cohesión social es el resultado de un adecuado desarrollo equitativo, en el
que deben contribuir todos los ciudadanos para conseguir dicho crecimiento
inclusivo. En este sentido, los propios sistemas públicos de Seguridad Social
descansan sobre esta premisa. Es decir, el modelo de desarrollo económico de un
país debe incluir socialmente a todas de las personas, bajo el sistema de protección
no contributivo y asistencial. Se debe primar la debida promoción y aplicación del
principio de universidad de la seguridad social. Sin duda, este es un modelo esencial
que permite dotar de seguridad a aquellas personas especialmente sometidas a
condiciones de vulnerabilidad estructural.
El objetivo de reducir el trabajo no declarado ha sido muy ambicioso, ya que
la propia estructura del empleo y de la población activa latinoamericana hacía
ciertamente difícil alcanzar dichos objetivos. Ello es una consecuencia de la
insuficiencia de asimilación de las propias economías de la región del trabajo
informal en el ámbito de la economía declarada. Las economías latinoamericanas no
han registrado un adecuado dinamismo, que permita asimilar el trabajo informal.
Asimismo, existe una dificultad manifiesta de incluir socialmente a toda la
ciudadanía, debido al crecimiento acelerado de la población, concentrada muy
especialmente en un modelo de ciudades en pleno desarrollo. La inclusión y la
seguridad se aseguran mediante la inserción laboral en plenitud y con el acceso a los
derechos laborales y de seguridad social. Se trata, pues, de asegurar el trabajo
protegido jurídicamente y desarrollado en un sistema de relaciones laborales y de
protección social solidarios.

8 CONCLUSIONES
Con carácter general, conviene indicar que el problema laboral y social de la
informalidad es una cuestión sumamente amplia y de gran complejidad técnica, que
se refiere a situaciones de distinta dimensión y que se proyecta sobre distintas
realidades. Dicha afirmación se ratifica si analizamos su problemática desde el punto
de vista internacional y teniendo presente la situación del conjunto de
Latinoamérica. Generalmente la decisión de trabajar en la economía informal viene
impuesta por la propia realidad social. Entre las razones que impiden que una
actividad productiva pueda derivar de la informalidad al trabajo protegido
destacamos que las personas afectadas no perciben los beneficios potenciales
derivados de la transición a la formalidad. Ello se debe a que en primera instancia,
las personas tienen en cuenta los altos costes sociales derivados de la incorporación
al trabajo declarado.

300 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Economía Informal, Inseguridad Laboral y Trabajo Decente

El proceso de transición hacia la formalidad laboral es un desafío esencial


para un mundo complejo presidido por un alto grado de incertidumbre e inseguridad.
En este sentido, en los países latinoamericanos avanza la percepción de una
inestabilidad a largo plazo, en gran medida ligada a la volatilidad del producto
interno bruto de América Latina, que es mucho mayor que en otros bloques de las
economías emergentes, especialmente, el sudeste asiático, y mucho mayor respecto
de los países más industrializados. Con todo, en los últimos años se ha producido
una leve disminución de la informalidad laboral, aunque las tasas de empleo no
declarado son todavía muy elevadas. La cuestión es cómo rescatar y atraer a la
economía declarada esa fuente de ingresos. Dicha transición a la formalidad
supondría finalmente alterar la relación entre pobreza y marginalidad hacia la
protección y la inclusión social.
Si pretendemos buscar las causas de la gran presencia del trabajo no
declarado, deberíamos decir que esta situación tiene un origen complejo, que
responde a un conjunto diverso de causas. Es decir, se trata de factores ciertamente
heterogéneos, que impiden mejorar la calidad del empleo y alcanzar el reto del
trabajo decente, y que nos presenta incluso un panorama acusado de déficit de
justicia social. Con todo, es preciso destacar que, en síntesis, la informalidad es un
proceso de evasión y fraude de la legislación laboral, que elude los estándares
mínimos de seguridad en el trabajo, siendo este un modelo que se genera en el
ámbito de la economía sumergida. Sin embargo, los Estados han optado por
desarrollar políticas de menor presión fiscal, tendentes a reducir los derechos
laborales y de protección social. Todo ello con vistas a fomentar la inversión
internacional en sus países. El aumento del dumping empresarial y social es, sin
duda, un efecto derivado de este proceso, que plantea problemas de hondo calado a
escala internacional.
La Recomendación aprobada en la Reunión 104 de la Conferencia
Internacional del Trabajo supone evidentemente un importante hito histórico, a pesar
de que su grado de eficacia sea de baja intensidad. El objetivo de la Recomendación
es crear una nueva conciencia internacional sobre el problema y manifestar
institucionalmente la preocupación por la necesidad de contener la insoportable
cuota de trabajo informal ligado a la nueva economía. En cierto modo, estamos ante
un dique de contención del desarrollo del libre comercio a escala mundial,
desarrollado al amparo de la Lex Mercatoria que no se manifiesta sensible a la
dimensión social del problema. Se ha desarrollado un concepto de transición hacia la
economía formal, fomentando un camino basado esencialmente en el trabajo
coordinado a medio y largo plazo. Una labor institucional que se basa en lugar de
hacer cumplir rígidamente las normas, en avanzar en las fórmulas de incentivo en la
transición hacia la formalidad, lo que en definitiva supone debilitar ciertamente la
respuesta sancionadora ante los supuestos de incumplimiento de las normas de
trabajo. Se trata de un trabajo progresivo ante un fenómeno que tiene proporciones
ingentes en determinadas áreas del mundo. En estas regiones erradicar la
informalidad supone evidentemente una auténtica quimera.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 301


J. Eduardo López Ahumada

Estamos en presencia de un programa de trabajo de la OIT sumamente


general, que únicamente puede completarse y llenarse de sentido si se acompaña con
otras acciones promovidas por la OIT. Estamos hablando esencialmente del
programa institucional de la OIT orientado al desarrollo del trabajo decente, que
irremediablemente está estrechamente vinculado con la lucha contra el trabajo
informal. Es necesario intervenir en la relación entre comercio y economía informal,
a fin de conseguir políticas comerciales justas, orientadas hacia el objetivo del
trabajo decente. Sin duda alguna, esta nueva concepción puede conseguir unos
resultados más favorables en el ámbito del empleo declarado y protegido. La
informalidad no se puede reducir de forma autónoma y sin intervenir en el mercado
laboral. Los países de la región tienen entre sus objetivos prioritarios la lucha contra
la informalidad laboral. Sin duda, en los últimos años se vienen desarrollando
medidas concretas orientadas a facilitar la transición desde la economía informal al
trabajo declarado. Es un proceso que incluso podríamos calificar de recurrente y con
una larga tradición en el tiempo. Sin embargo, estas medidas de política laboral,
muchas antiguas y otras más recientes, no están consiguiendo los resultados
deseados.
Se precisan respuestas económicas y laborales, que busquen su concreta
proyección a las circunstancias del país y que tengan en cuenta su realidad social.
Efectivamente, tolerar pasivamente dicha informalidad supone un evidente coste
social, que afecta no solo a la cohesión social, sino también a las propias
condiciones de desarrollo económico. No cabe duda de que promover la transición al
trabajo declarado y protegido supone avanzar en la inclusión social. Se deben primar
las políticas de inserción laboral y de lucha contra la informalidad como medida que
permite avanzar en la cohesión social. Esto vendría a realzar el protagonismo de la
ciudadanía y aseguraría el ejercicio de los derechos de las personas excluidas. Sin
duda, abordar este problema transciende el ámbito estricto laboral y se proyecta
sobre una cuestión social. Las soluciones al problema de la informalidad pasan por
la búsqueda de la equidad social. Ello demanda la búsqueda de la eficiencia y el
desarrollo de la economía de los países, a fin de que el sector informal no se
convierta en un obstáculo para la capacidad de fomentar riqueza y desarrollo
económico. La cohesión social es el resultado de un adecuado desarrollo equitativo,
en el que deben contribuir todos los ciudadanos para conseguir dicho crecimiento
inclusivo. En este sentido, los propios sistemas públicos de Seguridad Social
descansan sobre esta premisa. Es decir, el modelo de desarrollo económico de un
país debe incluir socialmente a todas de las personas, bajo el sistema de protección
no contributivo y asistencial. Se debe primar la debida promoción y aplicación del
principio de universidad de la seguridad social.

302 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Economía Informal, Inseguridad Laboral y Trabajo Decente

BIBLIOGRAFÍA
AA.VV. (2016): Derecho social y trabajo informal. Implicaciones laborales, económicas y de Seguridad
Social del fenómeno del trabajo informal y de la economía sumergida en España y Latinoamérica,
Comares, Granada.
BAVIERA PUIG, I (2014): “Avances en la lucha contra el empleo irregular y el fraude a la Seguridad
Social”, en Revista Doctrinal Aranzadi Social, n. 9.
BROMLEY, R. (1998): “Informality, De Soto style: From concept to pily”, en C. A. Rakowski (Eds.),
Contrapunto: The informal sector debate in Latin America. Albany, NY, Estados Unidos: State
University of New York Press.
CAMINO FRÍAS, J.I. (2013): Lucha contra el empleo irregular y el fraude a la Seguridad Social,
Valladolid, Lex Nova.
CASTELLS, M. Y PORTES, A. (1989): “El mundo sumergido: los orígenes, la dinámica y los efectos de
la economía informal”. En A. Portes (Ed.), La economía informal en los países desarrollados y menos
avanzados, Buenos Aires, Planeta.
COASE, R. (2012): “The problem of social cost”, en Encyclopedia Universalis. s. d.
DE LA VILLA, L.E. (2011): “La economía sumergida y los arañazos superficiales a la realidad social a
través de las medidas adoptadas por el Gobierno. Breve comentario al Real Decreto-Ley 5/201 1, de 29 de
abril”, Revista General de Derecho del Trabajo y Seguridad Social, n. 26.
DAZA, J.L. (2005): Economía informal, Trabajo no declarado y Administración del Trabajo,
Departamento de Diálogo Social, Legislación y Administración del Trabajo, Ginebra, OIT.
GONZÁLEZ ORTEGA, S. (2014): “Empleo irregular y Administración Laboral”, en Temas Laborales, n.
125/2014.
JIMÉNEZ FERNÁNDEZ, A. y MARTÍNEZ-PARADO DEL VALLE, R. (2013): La economía
sumergida en España, Fundación de Estudios Financieros, Documento de Trabajo, n. 4.
JESSOP, R. (2008): El futuro del capitalismo, Ed. Catarata, Madrid.
MARTÍN VALVERDE, A. y GARCÍA MURCIA, J. (2011): “Medidas y cambios legislativos para la
regularización y el control del empleo sumergido. El RDLcy 5/2011”, en Derecho de los negocios, n. 249.
LOMNITZ, L. (1988): “Informal exchange networks in formal systems: A theoretical model”, American
Anthropologist, 90.
ORSATTI, A. Y CALLE, R. (2004): La situación de los trabajadores de la economía informal en el
Cono Sur y el Área Andina Lima: OIT – Oficina Regional para América Latina y el Caribe – Oficina de
Actividades para los Trabajadores (ACTRAV), Proyecto Los sindicatos y el trabajo decente en la era de
la globalización en América Latina. Documento de trabajo n. 179.
PORTES, A. Y HALLER, W. (2004): La economía informal. Santiago de Chile: Cepal.
TOKMAN, V. (2007): Informalidad, inseguridad y cohesión social en América Latina. Santiago de
Chile: Cepal.
TOKMAN, V. (2008): Flexiguridad con informalidad: opciones y restricciones. Santiago de Chile:
Cepal.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 303


Economía Informal, Inseguridad Laboral y Trabajo Decente

EXECUÇÃO PENAL 4.0


PENAL EXECUTION 4.0
DOI: 10.19135/revista.consinter.00011.14
Recebido/Received 17.08.2020– Aprovado/Approved 09.10.2020
Fabrício Bittencourt da Cruz1 –https://orcid.org/0000-0003-0538-9193
E-mail: fabriciobittcruz@gmail.com
Matheus de Quadros2– https://orcid.org/0000-0001-7971-3799
E-mail: matheusmdq@hotmail.com

Resumo: Este artigo objetiva analisar as funcionalidades e as perspectivas do Sistema


Eletrônico de Execução Unificada (SEEU), definido como sistema padrão da Execução Penal
no Brasil pelo Conselho Nacional de Justiça e em vias de ser instalado em todos os tribunais
do país. Utilizou-se o método hipotético dedutivo no que diz respeito aos efeitos do SEEU a
partir de suas funcionalidades atuais e futuras. Para a consecução dos fins do trabalho foi
realizada pesquisa de cunho qualitativo e descritivo, tendo sido usados meios de pesquisa
majoritariamente documentais, correspondentes às resoluções, leis e relatórios que embasam a
experiência de implementação do SEEU. Conclui-se que o SEEU viabiliza uma nova
realidade na Execução Penal brasileira, fortemente caracterizada pela gestão das informações
endoprocessuais em tempo real, com o efetivo asseguramento de direitos a partir da inovação
tecnológica.
Palavras-chave: Execução Penal. SEEU. Inovação. Inovação em Direito. Direito e
tecnologia.
Abstract: This article aims to analyze the functionalities and perspectives of the Electronic
System of Unified Execution (SEEU, in portuguese), defined as the standard system of
Penal Execution in Brazil by the National Council of Justice and in the process of being
installed in all courts in the country. For this, the present work will use the hypothetico-
deductive method, from which the effects of the the Electronic System of Unified
Execution in the Brazilian reality will be verified from the present and future
functionalities of the system and their consequences. In addition, to achieve the purposes
of the present work, a qualitative and descriptive research will be carried out, using
mostly documentary research means, corresponding to the resolutions, laws and reports
that support the experience of implementing the the Electronic System of Unified
Execution. It is concluded that the treated system constitutes a new phase of the
Brazilian Penal Execution, with greater presence of the State within the chaotic national
1
Doutor em Direito do Estado na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP/BR). Juiz
Federal. Professor Adjunto no Departamento de Direito de Estado da Universidade Estadual de Ponta
Grossa PR (UEPG/BR). Professor na Escola da Magistratura Federal do Paraná (ESMAFE – PR/BR).
Professor na Escola da Magistratura do Paraná (EMAP/BR). E-mail: fabriciobittcruz@gmail.com
2
Graduado em Direto pela Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG/BR), pós-graduando em Direito
Constitucional pelo Instituto Damásio de Direito da Faculdade Ibmec SP/BR e especialista em Direito
Processual Penal e Prática Forense Penal Direto pela Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG/BR).
Assessor de Promotoria na 10.ª Promotoria de Justiça do Ministério Público do Paraná da Comarca de
Ponta Grossa/PR. E-mail: matheusmdq@hotmail.com

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 305


Fabrício Bittencourt da Cruz / Matheus de Quadros

prison system and with the assurance of rights based on technological innovations, with
growing perspectives in relation to these.
Keywords: Penal Execution. Electronic System of Unified Execution. Innovation.
Innovation in Law. Law and Technology.
Sumário: Introdução. 1. Surgimento operacional e institucional do SEEU. 2. Funcionalidades
e impactos do SEEU. 3. Perspectivas futuras. Considerações finais. Referências.

INTRODUÇÃO
Da análise histórica do surgimento da pena de prisão como ponto chave do
Direito Penal, tem-se que essa significou a consubstanciação da mudança da finali-
dade e principalmente do modus operandi do Direito Penal.
Com a institucionalização da pena de prisão, o Direito Penal passa concomitan-
temente, a partir da ascensão do Iluminismo, para uma concepção preventiva da pena,
face à visão retributiva que dominou os períodos históricos anteriores desse ramo do
Direito3.
Enquanto as penas corporais buscavam a humilhação do apenado, a prisão busca
o controle do corpo do detento; enquanto as penas corporais faziam da punição algo
público, a pena de prisão concretiza a punição de forma discreta, afastada da multidão;
enquanto as penas corporais priorizavam a vingança, a pena de prisão prioriza prevenção
e reabilitação.
Para Foucault, a prisão deve ser um aparelho de disciplina exaustiva e incessante
para o alcance dos seus fins4, visando à reestruturação comportamental do apenado, o
que ele denomina como fabricação de corpos dóceis5.
Desde sua institucionalização como principal pena criminal, a prisão sempre teve
como ponto essencial o controle, primordial para a concretização de uma vigilância
permanente do Estado e consequentemente para a consecução dos fins da pena de prisão.
Entretanto, essa não é a realidade observada na Execução Penal brasileira,
que acomoda de forma precária o crescente quantitativo de presos condenados e
provisórios6.
Nesse sentido, menciona-se a preocupação constante de órgãos nacionais e inter-
nacionais sobre a situação do sistema prisional brasileiro, conforme se afere de relatórios
de organizações como a Human Rights Watch7 e a ONU8.

3
GRECO, Rogério, Curso de Direito Penal: parte geral, v. 1, 19. ed., Niterói, Impetus, 2017, pp. 23-25.
4
FOUCAULT, Michel, Vigiar e punir: nascimento da prisão, 41. ed., Petrópolis, Vozes, 2013, p. 222.
5
Ibid., pp. 133-135.
6
De acordo com o levantamento mais recente realizado pelo Infopen, em 2019 no Brasil havia um total de
442.349 vagas no sistema prisional para acomodar as 755.274 pessoas privadas de liberdade, uma
proporção de 1,7 pessoas para cada vaga. (BRASIL, Ministério da Justiça, Departamento Penitenciário
Nacional, Levantamento nacional de informações penitenciárias: dezembro de 2019, 2020, Disponível em:
<https://app.powerbi.com/view?r=eyJrIjoiZTlkZGJjODQtNmJlMi00OTJhLWFlMDktNzRlNmFkNTM0
MWI3IiwidCI6ImViMDkwNDIwLTQ0NGMtNDNmNy05MWYyLTRiOGRhNmJmZThlMSJ9>,
Acesso em: 14 jun. 2020).
7
HUMAN RIGHTS WATCH, Relatório mundial de 2019, Disponível em: <https://www.hrw.org/pt/world-
report/2019/country-chapters/326447#112d79>, Acesso em: 14 jun. 2020.

306 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Execução Penal 4.0

Segundo o relatório de 2019 da Human Rights Watch, “a superlotação e a


falta de pessoal tornam impossível que as autoridades prisionais mantenham o
controle de muitas prisões, deixando os presos vulneráveis à violência e ao recru-
tamento por facções”9.
Conforme pontuou o Min. Dias Toffoli, presidente do Conselho Nacional de
Justiça, em 2019, ainda não havia sequer conhecimento de quantos processos de Execu-
ção Penal estavam tramitando no Brasil ou em que fase eles se encontravam10.
Menciona-se ainda que, em sede do julgamento da ADPF 347, o Min. Marco Au-
rélio, ao decidir sobre o estado de coisas inconstitucional do sistema penitenciário nacio-
nal, notou a ausência de controle do Estado sobre as próprias condições de regime
privativo de liberdade imposto por esse:

A maior parte desses detentos está sujeita às seguintes condições: superlotação dos
presídios, torturas, homicídios, violência sexual, celas imundas e insalubres, proliferação
de doenças infectocontagiosas, comida imprestável, falta de água potável, de produtos
higiênicos básicos, de acesso à assistência judiciária, à educação, à saúde e ao trabalho,
bem como amplo domínio dos cárceres por organizações criminosas, insuficiência do
controle quanto ao cumprimento das penas, discriminação social, racial, de gênero e de
orientação sexual11. (grifo nosso)

Sendo esse o contexto do sistema carcerário brasileiro, mostra-se imprescindível


o direcionamento de ações em prol de maior e efetivo controle dos rumos da Execução
Penal e do ambiente prisional, porquanto o controle eficiente do Estado consiste em
pressuposto dos fins da pena prisão.
O recente surgimento do Sistema Eletrônico de Execução Unificada (SEEU)
constitui um passo relevante rumo à efetiva presença do Estado na Execução Penal.
Instituído em 2016 pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) a partir da Resolu-
ção 223 de 27.05.2016, o SEEU foi criado “como sistema padrão de processamento de
informações e da prática de atos processuais relativos à Execução Penal” (art. 1°).
Em termos práticos, o SEEU é um sistema eletrônico que além de permitir a pa-
dronização da Execução Penal em todo o território brasileiro, viabiliza o registro, o con-
trole e a execução de atos processuais referentes à execução da pena.
Com a implementação e o uso do SEEU, o acompanhamento dos processos de
execução penal passa a ser lastreado não mais em meros registros dos atos processuais,

8
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, Visit to Brazil undertaken from 19 to 30 October:
observations and recommendations addreses to the State party, Disponível em: <https://naco
esunidas.org/wp-content/uploads/2017/01/Relatorio-SPT-2016-1.pdf>, Acesso em: 14 jun. 2020.
9
HUMAN RIGHTS WATCH, op. cit.
10
PONTES, Felipe, Desinformação sobre execução de penas é inaceitável, diz Toffoli, Disponível em:
<http://agenciabrasil.ebc.com.br/justica/noticia/2019-06/desinformacao-sobre-execucao-de-penas-e-inaceit
avel-diz-toffoli>, Acesso em: 14 jun. 2020.
11
BRASIL, Supremo Tribunal Federal, Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 347, Rel. Min.
Marco Aurélio de Mello, Brasília, DF, 09.09.2015, Diário Oficial da União, Disponível em:
<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=10300665>, Acesso em: 14 jun. 2020.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 307


Fabrício Bittencourt da Cruz / Matheus de Quadros

inerentes ao processo físico em papel e decorrentes de práticas burocráticas típicas de


séculos passados, mas na gestão da informação Disponível em: tempo real, gerando
eficiência e evitando os indesejáveis delays em relação à análise de questões importantes
como a progressão de regime prisional.
Trata-se de verdadeira quebra de paradigma e, como em qualquer ruptura
dessa magnitude, hoje se tem à disposição diversas funcionalidades impensáveis no
processo físico.
O cálculo automático das penas e da concessão de benefícios, a gestão e compila-
ção dos dados de todos os processos de Execução Penal do país e a integração de toda a
Execução Penal brasileira são três dessas funcionalidades.
Mas qual é o impacto da implementação do SEEU no Brasil? Quais são os im-
pactos das funcionalidades mencionadas em relação às deficiências do Poder Judiciário
brasileiro? Qual é o futuro do SEEU e da Execução Penal brasileira a partir dessa nova
realidade?
Em busca de respostas a esses questionamentos, neste trabalho é utilizado o mé-
todo hipotético dedutivo para aferir os efeitos do SEEU na realidade brasileira a partir
das funcionalidades presentes e futuras desse sistema.
A pesquisa desenvolveu-se de forma qualitativa e descritiva no que diz respeito à
observação e à descrição do sistema, tendo também sido realizada investigação ma-
joritariamente documental devido à ausência de relevantes análises doutrinário-
acadêmicas sobre as resoluções, leis e relatórios que embasam a experiência de imple-
mentação do SEEU.
No primeiro capítulo é abordado o surgimento do SEEU e seu processo de im-
plementação em todo o território nacional. O segundo capítulo destina-se à exploração
de possíveis resultantes do uso do SEEU no que diz respeito à realidade da execução
penal no Brasil. No terceiro capítulo, de índole tipicamente indutiva, são vislumbradas
perspectivas futuras para o SEEU e seu uso na execução penal.
As considerações finais giram em torno da plena capacidade do SEEU não ape-
nas como mero instrumento eletrônico a serviço da Execução Penal tradicional, mas
como ente catalizador de uma verdadeira revolução no trâmite dos processos de Execu-
ção Penal, na forma como são tratadas e utilizadas as informações da execução penal e
especialmente no modo como o Estado brasileiro conduz as políticas públicas de
atenção aos detentos.

1 SURGIMENTO OPERACIONAL E INSTITUCIONAL DO SEEU


A primeira inovação legislativa sobre a gestão eletrônica de processos judici-
ais no Brasil é relativamente recente.
A Lei 11.419/2006 dispôs sobre a informatização do processo judicial no pa-
ís, sendo este o primeiro passo da revolução digital do Judiciário do país:

308 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Execução Penal 4.0

Art. 8º. Os órgãos do Poder Judiciário poderão desenvolver sistemas eletrônicos de


processamento de ações judiciais por meio de autos total ou parcialmente digitais,
utilizando, preferencialmente, a rede mundial de computadores e acesso por meio de
redes internas e externas.

Desde então, iniciou-se uma revolução tecnológica do judiciário brasileiro


com a instituição dos diversos sistemas de informação judiciais brasileiros, como o
e-proc, o Projudi e o PJe.
Já em um primeiro momento foram nítidos os avanços em celeridade e efici-
ência na prestação do serviço judicial brasileiro:

A expectativa, com a chegada do novo, era a desejada celeridade. Dentre as maiores


promessas, residia a eliminação das chamadas “fases mortas” do processo como, por
exemplo, o tempo de espera entre a tomada de determinada decisão judicial e a efetiva
comunicação às partes interessadas. Tal expectativa foi definitivamente alcançada. (…)
Em média, no contexto da Justiça Federal da Quarta Região, o tempo de tramitação de
processos entre a data de protocolo da petição inicial e a data em que publicada sentença
de primeira instância, no período compreendido entre 2010 e 2011, reduziu 83,38%12.

O Brasil foi inclusive pioneiro ao permitir a adoção, em todo o território na-


cional, de processos com feição eletrônica do início ao fim13.
Contudo, a Execução Penal brasileira não foi instantaneamente contemplada.
Em 2016 praticamente nenhum estado da federação dispunha de um sistema eletrô-
nico especialmente projetado para a Execução Penal14.
Em termos normativos especificamente em relação à execução penal, a Lei
12.106/2009, ao criar Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema
Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas (DMF), estipulou
que caberia a esse órgão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) “acompanhar a
implantação e o funcionamento de sistema de gestão eletrônica da execução penal e
de mecanismo de acompanhamento eletrônico das prisões provisórias” (art. 1º, VII).
Na mesma linha, o CNJ estipulou a adoção de sistema de processamento eletrô-
nico a ser utilizado pelo Poder Judiciário na execução das penas e medidas alternativas
(art. 3° da Resolução CNJ 101/2009).
Estes são os fundamentos normativos da Execução Penal Eletrônica no Brasil.

12
CRUZ, Fabrício Bittencourt da, SILVA, Thais Sampaio, “Processo eletrônico x processo físico no contexto
do direito fundamental à razoável duração do processo: a experiência do TRF4 na redução dos tempos
médios de tramitação”, Revista do Instituto do Direito Brasileiro, v. 3, 2012, p. 1348.
13
CRUZ, Fabrício Bittencourt da, OLIVEIRA, Juliano Felipe, “E-proc do Tribunal Regional Federal da
Quarta Região: evolução sem precedentes”. Democracia Digital e Governo Eletrônico, v. 7, 2012, p. 95-
114.
14
BRASIL, Conselho Nacional de Justiça, 230ª Sessão Ordinária, Rel. Bruno Ronchetti de Castro, Brasília,
DF, 26.04.2016, Conselho Nacional de Justiça, Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/Infoju
risI2/Jurisprudencia.seam;jsessionid=8A9A7279D0C17AC01DCEABEABC24D39E?jurisprudenciaIdJuri
s=47920&indiceListaJurisprudencia=3&firstResult=5175&tipoPesquisa=BANCO>, Acesso em: 14 jun. 2020.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 309


Fabrício Bittencourt da Cruz / Matheus de Quadros

Para tornar realidade a execução penal eletrônica em âmbito nacional o DMF rea-
lizou a avaliação dos sistemas já existentes nos tribunais do país, durante o I Encontro
dos Grupos de Monitoramento e Fiscalização (GMFs) em maio de 2015.
Na ocasião o sistema desenvolvido pelo Tribunal de Justiça do Paraná (TJ PR) foi
escolhido por ser considerado como o mais completo e adequado aos fins almejados15.
Criado em 2013 a partir da Instrução Normativa Conjunta 02/2013 do Tribunal
de Justiça do Paraná (TJPR), da Corregedoria-Geral da Justiça do Paraná (CGJ PR), do
Ministério Público do Paraná (MP PR), da Secretaria da Justiça, Cidadania e Direitos
Humanos do Estado do Paraná (SEJU PR) e da Secretaria da Segurança Pública do Esta-
do do Paraná (SESP PR), o sistema, à época chamado de Projudi da Execução Penal,
desde sua gênese já continha diversas funcionalidades pensadas para aperfeiçoar a rotina
dos processos de Execução Penal no contexto de processos eletrônicos.
Vale dizer: o Projudi da Execução Penal constituía um sistema já operacional que
em muito contemplava as necessidades de uma Execução Penal moderna, eficiente e
lastreada em meio eletrônico, servindo de suporte adequado à materialização do disposto
na Lei Federal 12.106/2009 e na Resolução CNJ 101/2009.
Por essa razão, deliberou-se na 230ª Sessão Ordinária do CNJ, a partir do Termo
de Cooperação Técnica 002/2016, firmado entre o CNJ e o TJPR, proposta de Resolução
estipulando a criação de um sistema eletrônico de execução único, baseado no sistema já
existente no tribunal paranaense, o qual viria a se tornar o SEEU, sem qualquer criação
de despesa com recursos de Tecnologia da Informação. A proposta foi acolhida à unani-
midade, tendo se editado a Resolução CNJ 223, de 27.05.201616.
A Resolução CNJ 223/2016 instituiu o “Sistema Eletrônico de Execução Uni-
ficado (SEEU) como sistema de processamento de informações e práticas de atos
processuais relativos à Execução Penal” (art. 1°).
Como nessa resolução não foi estipulado prazo para a efetiva implantação do
sistema, editou-se posteriormente a Resolução CNJ 280, de 09.04.2019 do CNJ,
determinando o obrigatório trâmite via SEEU de todos os processos de Execução
Penal nos tribunais brasileiros a partir de 31.12.2019 (art. 3°).
Em paralelo e tendo por escopo a célere implantação do sistema em todos os
tribunais do Brasil, o SEEU tornou-se um dos pilares do programa Justiça Presente,
instaurado em janeiro de 2019 a partir de esforços conjuntos do CNJ e do Programa
das Nações Unidas para o Desenvolvimento e com o apoio do Ministério da Justiça
e Segurança Pública17.

15
BRASIL, Conselho Nacional de Justiça, 230ª Sessão Ordinária, Rel. Bruno Ronchetti de Castro, Brasília,
DF, 26.04.2016, Conselho Nacional de Justiça, Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/InfojurisI
2/Jurisprudencia.seam;jsessionid=8A9A7279D0C17AC01DCEABEABC24D39E?jurisprudenciaIdJuris=4
7920&indiceListaJurisprudencia=3&firstResult=5175&tipoPesquisa=BANCO>, Acesso em: 14 jun. 2020.
16
Ibid.
17
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, Justiça Presente: relatório anual 2019, pp. 6/7 e 20, Disponível
em: <https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2019/12/Relatorio_Justi%C3%A7aPresente2019_v2.pdf>,
Acesso em: 14 jun. 2020.

310 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Execução Penal 4.0

Em decorrência das opções normativas e dos esforços institucionais e inter-


institucionais realizados, em 2019 houve considerável aceleração do processo de
implantação nas comarcas do país. Ao fim desse ano mais de um milhão de proces-
sos já estavam tramitando via SEEU, cuja instalação já havia sido efetivada em 25
Tribunais de Justiça e em 4 Tribunais Regionais Federais18. Esse quantitativo é bem
superior ao do total de 9 tribunais que adotavam a sistemática de processo eletrônico
para a Execução Penal em 201619.
Na 302ª Sessão Ordinária do CNJ, o Presidente Dias Toffoli narrou dificul-
dades em algumas comarcas no tocante à digitalização de processos físicos existen-
tes e à consequente migração para o SEEU, motivo pelo qual o Plenário resolveu
postergar a data limite da efetiva implantação do sistema para 30.06.2020 (Resolu-
ção CNJ 304, de 17.12.2019)20.
A narrativa baseou-se em relatório realizado pelo CNJ com as seguintes in-
formações:

Ocorre que, durante o processo de implantação e utilização do sistema, várias foram


as reclamações relatadas, de forma que alguns impasses devem ser resolvidos, sobretudo
quando se trata de um sistema único envolvendo regiões distintas, com métodos e fluxos de
trabalho diversos. É dizer: a heterogeneidade entre os diversos Tribunais demanda
adaptações no sistema inicialmente concebido.
A integração do SEEU com os atuais sistemas eletrônicos existentes nos estados é uma
dificuldade que se apresentou em todos os Tribunais onde o sistema foi implantado, a
exemplo da interoperabilidade para emissão de certidões negativas e a alimentação do
Banco Nacional de Mandados de Prisão – BNMP, além da comunicação com os sistemas
dos Estados que controlam o pagamento das diligências realizadas pelos oficiais de
justiça (o que ocorre no Tribunal de Justiça de Minas Gerais).
Isso evidencia a importância do envolvimento da equipe de Tecnologia da Informação – TI
de cada Tribunal no projeto e a troca de informações com as equipes de TI deste
Conselho, a exemplo do que ocorre com o desenvolvimento do sistema PJe.
Com a expansão e utilização do sistema SEEU, as demandas dos estados aumentaram na
mesma proporção, o que requer uma equipe de suporte preparada dentro do CNJ para
atender essas demandas, inclusive aquelas que envolvem alterações no sistema, fato que
sobrecarregar a equipe do Tribunal de Justiça do Paraná que não conseguiu dar suporte
a todos os Tribunais onde o SEEU foi implantado21.

18
CONSULTOR JURÍDICO, CNJ adia para junho de 2020 conclusão de implantação do SEEU, Disponível
em: <https://www.conjur.com.br/2019-dez-18/cnj-adia-junho-2020-conclusao-implantacao-seeu>, Acesso
em: 14 jun. 2020
19
Id., Tribunais devem adotar sistema eletrônico unificado de execução penal, Disponível em:
<https://www.conjur.com.br/2016-abr-26/cnj-tribunais-adotem-sistema-eletronico-execucao-penal>,
Acesso em: 14 jun. 2020.
20
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, 302ª Sessão Ordinária 17 de dezembro de 2019 – Tarde,
Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=cVikSKzl2No>, Acesso em: 14 jun. 2020.
21
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, Relatório Sistema Eletrônico de Execução Unificado – SEEU, p.
32, Disponível em: <https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/conteudo/arquivo/2018/09/37fef09649e6b9
0bc8f4186d60c8441d.pdf>, Acesso em: 14 jun. 2020.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 311


Fabrício Bittencourt da Cruz / Matheus de Quadros

Por se tratar de escolha normativa pautada em ruptura de paradigma, inegável


que haja resistência por variados motivos, inclusive ideológicos. Isso certamente contri-
buiu com a postergação da data limite de instauração do SEEU.
De fato, o Tribunal de Justiça do Amazonas22, o Tribunal de Justiça de Santa Ca-
tarina23 e o Tribunal de Justiça de São Paulo foram refratários ao SEEU. A Assembleia
Legislativa do Estado de São Paulo, inclusive, propôs a Ação Direta de Inconstituciona-
lidade 6.259/DF24, sob o argumento de que a implementação do SEEU por determinação
do CNJ violaria o princípio federativo e teria usurpado a competência da União e dos
estados para legislar sobre Execução Penal25.
O Min. Alexandre de Moraes, Relator da ADI 6.259, concedeu medida liminar
em 16.12.2019 “para suspender os efeitos do arts. 2º, 3º, 9º, 12 e 13 da Resolução CNJ
280/2019”, o que na prática inviabiliza a implementação do SEEU nas unidades do judi-
ciário que ainda não o acolheram.
Observa-se, portanto, a existência de consideráveis obstáculos à digitalização
completa da Execução Penal brasileira e sua integração em um sistema único.
Apesar desses entraves, o SEEU já constitui realidade operacional em boa parte
do país, com a implementação do sistema já realizada por 25 Tribunais de Justiça e 4
Tribunais Regionais Federais.
Daí a relevância de estudo vocacionado à exploração das funcionalidades do
sistema e das consequências de sua utilização nos processos de execução penal.

2 FUNCIONALIDADES E IMPACTOS DO SEEU


Desde seu lançamento em 2016, o SEEU tem sido visto com grande expecta-
tiva, sendo atualmente um dos principais focos do Programa Justiça Presente, inicia-
tiva do CNJ em busca de soluções a problemas no sistema prisional brasileiro.
Em termos contextuais, importante destacar, como já o fez o Presidente do
CNJ em 2019, Min. Dias Toffoli26, o atual desconhecimento do quantitativo de pro-
cessos relativos a execuções penais no Brasil, bem como sobre a fase em que todos
os processos dessa classe se encontram.
22
CONSULTOR JURÍDICO, Corregedor pede explicação do TJ-AM por recusa em adotar SEEU,
Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2019-nov-20/corregedor-explicacao-tj-am-recusa-adotar-se
eu>, Acesso em: 14 jun. 2020.
23
Id., CNJ notifica TJ-SC sobre atrasos do tribunal na adoção do sistema SEEU, Disponível em:
<https://www.conjur.com.br/2019-out-13/cnj-notifica-tj-sc-atraso-adocao-sistema-seeu>, Acesso em: 14
jun. 2020.
24
BRASIL, Supremo Tribunal Federal, Ação Direta de Inconstitucionalidade 6259, Rel. Min. Alexandre de
Moraes, Brasília, DF, 16.12.2019, Diário Oficial da União, Disponível em: <http://portal.
stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5814977>, Acesso em: 14 jun. 2020.
25
CONSULTOR JURÍDICO, Assembleia Legislativa de SP move ADI contra obrigatoriedade do SEEU,
Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2019-nov-25/legislativo-sp-questiona-stf-obrigatoriedade-ade
sao-seeu>, Acesso em: 14 jun. 2020.
26
PONTES, Felipe, Desinformação sobre execução de penas é inaceitável, diz Toffoli, Disponível em:
<http://agenciabrasil.ebc.com.br/justica/noticia/2019-06/desinformacao-sobre-execucao-de-penas-e-inacei
tavel-diz-toffoli>, Acesso em: 14 jun. 2020.

312 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Execução Penal 4.0

O uso do SEEU em todos os tribunais do país, por pressupor o trâmite eletrô-


nico de informações digitalmente estruturadas, possibilitará a busca e o efetivo uso
de informações a partir de diversos cortes metodológicos, inclusive dos mais ele-
mentares como quantidade de processos e as fases em que se encontram.
Está-se diante de uma enorme ruptura paradigmática. O SEEU proporciona
um verdadeiro upgrade: da mera busca artesanal de informações em processos físi-
cos à gestão de informações eletrônicas em tempo real.
De fato, após o cumprimento da meta de instalação do SEEU em todos os tri-
bunais do país, não apenas será possível dimensionar a quantidade de processos de
execução no país, mas também em que fase esses se encontram, o que é de imensa
importância para a Execução Penal brasileira por diversas razões.
Sob o ponto de vista de políticas públicas, a obtenção de dados fidedignos e
detalhados sobre perfis dos detentos, tipos e quantidades de condenações, espécies
de crimes, entre outras informações relevantes, é essencial para o desenvolvimento
de políticas públicas lastreadas na realidade empírica.
A título de exemplo, a partir de informações estruturadas no SEEU, aferiu-se
que em 2016 havia 11.547 presos provisórios no Estado do Paraná. Desse universo,
4.313 presos ainda aguardavam sentença, sendo que 3.953 estavam encarcerados
havia mais de 180 dias27.
O corte metodológico evidencia importantes realidades no que diz respeito ao
tempo de instrução nos processos criminais com réus presos. Isso certamente passa-
ria despercebido numa perspectiva tão ampla sem o uso do SEEU.
Considerado o uso de informações estruturadas em sistema eletrônico, a res-
posta aos critérios de pesquisa é imediata e fiel aos dados inseridos seja por ocasião
da implantação dos processos no SEEU ou pela atualização de fases procedimentais
diretamente no sistema.
Isso gera ambiente adequado para decisões transcendentes ao microcosmo do
processo individual, locus para o protagonismo jurídico-hermenêutico. Em perspec-
tivas mais amplas não é difícil imaginar o cabimento de políticas públicas vocacio-
nadas a um gerenciamento mais adequado do cenário revelado via SEEU, a exemplo
da concepção de ferramentas capazes de agilizar a instrução processual penal.
Já sob a perspectiva do gerenciamento das penas de detentos, o próprio sis-
tema realiza os cálculos de pena e concessão de benefícios automaticamente.
Isto porque todas as informações que tenham relevância para a fase de execução
da pena privativa de liberdade são extraídas da sentença e inseridas de forma estruturada
no SEEU. Além disso, toda e qualquer alteração fática apta a ensejar alguma alteração no
quantitativo ou na espécie de pena também deve ser inserida no sistema.
Portanto, é possível observar, em tempo real e de forma automática – o próprio
sistema realiza os cálculos de pena e concessão de benefícios – o adequado cumprimento

27
FARIELLO, Luíza, SEEU monitora processos de 11.547 presos provisórios no Estado do Paraná,
Disponível em: <https://www.cnj.jus.br/seeu-monitora-processos-de-11-547-presos-provisorios-no-estado-
do-parana/>, Acesso em: 14 jun. 2020.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 313


Fabrício Bittencourt da Cruz / Matheus de Quadros

das penas por todos os atores processuais (juízes, membros do Ministério Público, advo-
gados e defensores públicos) e por qualquer pessoa com a chave identificadora vinculada
ao processo da execução.
O uso do SEEU evita a repetição de casos como o ocorrido em 2016 no Estado
de São Paulo, quando uma pessoa ficou presa cinco meses a mais que o necessário devi-
do ao fato de a Secretária de Administração Penitenciária de São Paulo (SAP/SP) não ter
noticiado a prisão ao Poder Judiciário28.
Noutro giro, observa-se que a mencionada função de gerenciamento de penas do
SEEU transcende previsões legislativas relativamente recentes, como a inclusão do inc.
XVI ao art. 41 da Lei de Execução Penal pela Lei 10.713/2003, segundo o qual é direito
do preso receber anualmente o atestado de pena a cumprir29.
A inovação legislativa de 2003 foi idealizada no contexto de execuções penais
cujo trâmite ocorre em processo físico. Daí a relevância de se estipular a entrega anual do
atestado de pena a cumprir.
Contudo, a partir da implementação do SEEU qualquer pessoa que acesse os
autos do processo de execução pode verificar de forma detalhada, atualizada e em
tempo real a quantia de pena restante e os períodos necessários para a obtenção de
todos os benefícios legalmente previstos ao detento.
Diante da natureza eletrônica do SEEU, há também considerável ganho em
termos de eficiência no manejo dos processos, em plena harmonia com a Lei
11.419/2006. Eis um relato sobre as dificuldades inerentes à execução penal em
meio físico:

Uma das maiores dificuldades de quem tem o primeiro contato com os autos de
execução criminal é entender seu funcionamento. Cada unidade federativa tem suas
normas de organização judiciária e, portanto, não há um padrão seguido à risca
pelos tribunais do país [...].
Basicamente, um processo físico de execução é formado de vários apensos e cada
apenso pode vir a ter mais de um volume. Por isso, a depender do número de
incidentes e de condenações que o sentenciado possua, os autos de execução criminal
podem ser extremamente extensos e de complexa análise […]30.

Numeração única para todos os processos de execução penal no Brasil, con-


sequência direta do uso do SEEU em todo o território nacional, constitui pressuposto
de essência para a gestão de políticas públicas condizentes com a realidade e para a
própria efetividade do sistema penal.

28
FUSCO, Nicole, Homem que deveria ficar preso 2 dias passa 210 atrás das grades, Disponível em:
<https://veja.abril.com.br/brasil/homem-que-deveria-ficar-preso-2-dias-passa-210-atras-das-grades/>,
Acesso em: 14 jun. 2020.
29
Art. 41. Constituem direitos do preso:
XVI – atestado de pena a cumprir, emitido anualmente, sob pena da responsabilidade da autoridade
judiciária competente.
30
MIRANDA, Rafael de Souza, Manual de execução penal, Salvador, Juspodivm, 2019, p. 111.

314 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Execução Penal 4.0

A numeração única decorre de uma das principais características do SEEU: o fato


de ele ter sido projetado também como um sistema de cadastramento único de todas as
execuções penais do país, de modo a proporcionar, por exemplo, a unificação de penas
aplicadas a detentos que cometeram crimes em mais de um Estado da Federação.
Atualmente, devido à incomunicabilidade entre os sistemas processuais eletrônicos
e físicos em diferentes Estados que ainda não aderiram ao SEEU, não é possível aferir a
priori se um detento está sendo processado ou já foi condenado em outra unidade federati-
va, sendo imprescindível a expedição de carta precatória para cada um dos tribunais em
que se deseja saber sobre os antecedentes criminais da pessoa. A escolha não deixa de ser
aleatória, normalmente baseada no histórico das residências conhecidas do detento.
Na mesma linha, sem a implantação do SEEU a aferição da existência de manda-
dos de prisão pendentes de cumprimento contra uma pessoa em outro Estado-membro
demandava checagem da qualificação dessa pessoa no Banco Nacional de Mandados de
Prisão (BNMP), não havendo informação instantânea sobre a situação da pessoa.
No contexto de apresentação do SEEU aos Conselheiros que aprovariam à una-
nimidade a já referida Resolução CNJ 223, Luís Geraldo Sant’Ana Lanfredi, juiz auxiliar
da Presidência e coordenador do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do
Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas do CNJ
destacou o seguinte:

Observamos, do diagnóstico dos mutirões carcerários, que as varas de execução


penal no país estão em crise, experimentando uma realidade delicada. Por elas
tramitam mais de 1,5 milhão de feitos, e temos oito tribunais que não apresentam
qualquer sistema operacional para lidar com a execução penal. Os demais ou
apresentam sistemas parciais ou ainda estão se valendo de experiências muito
embrionárias e pouco sedimentadas, deixando a descoberto muitas das demandas
próprias da especificidade da jurisdição de execução penal31.

No SEEU há numeração única para a execução de penas aplicadas a cada in-


divíduo, sendo concentradas todas as condenações criminais referentes a essa pes-
soa. Assim, uma vez cadastrada no sistema a primeira condenação, eventuais sen-
tenças condenatórias posteriores estarão necessariamente vinculadas a essa numera-
ção primária, independentemente do Estado em que ocorram tais condenações ou do
local onde as penas deverão ser cumpridas.
Também é possível verificar, no momento da formação do processo de exe-
cução penal ou de qualquer outro momento processual, os mandados de prisão pen-
dentes de cumprimento. Isso se deve à plena integração do SEEU com o Banco
Nacional de Mandados de Prisão (BNMP).
Essas duas características são altamente eficazes contra a impunidade, por ser
prática comum e notória, em contexto no qual predomina a ausência de comunicação

31
ZAMPIER, Deborah, Conselheiros do CNJ são apresentados a Sistema Unificado de Execução Penal,
Disponível em: <https://www.cnj.jus.br/conselheiros-do-cnj-sao-apresentados-a-sistema-unificado-de-exe
cucao-penal/>, Acesso em: 14 jun. 2020.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 315


Fabrício Bittencourt da Cruz / Matheus de Quadros

entre sistemas processuais estaduais, a simples mudança para outro Estado como
forma de se evitar o cumprimento de mandados de prisão.
Processos eletrônicos são mais céleres em comparação com os processos em
meio físico, característica inerente à prática da maioria dos atos processuais:
A expectativa, com a chegada do novo, era a desejada celeridade. Dentre as maiores
promessas, residia a eliminação das chamadas “fases mortas” do processo como, por
exemplo, o tempo de espera entre a tomada de determinada decisão judicial e a efetiva
comunicação às partes interessadas. Tal expectativa foi definitivamente alcançada.
Fenômeno interessante – e que provavelmente será objeto de muitos estudos –
consiste na percepção de que, no ambiente virtual, o que sob a ótica do processo
físico considerava-se incrivelmente veloz, acaba sendo considerado por seus
operadores diários lento, ineficaz. A noção de efetividade, antes contadas aos dias,
hoje, na seara virtual, vem sendo contada aos minutos32.

Antes da implementação do SEEU, o cálculo das penas em diversas unidades


judiciais era feito manualmente para cada condenação. Além disso, em variados
momentos durante a execução penal o cálculo manual tinha de ser novamente reali-
zado em decorrência de incidentes e alterações fáticas posteriores à condenação com
impacto na pena ou na espécie de regime de cumprimento.
Nesse sentido, insta salientar declaração dada por Andréa do Carmo Alves,
diretora criminal da Central de Processamento Eletrônico do Tribunal de Justiça de
Mato Grosso do Sul (TJMS):
Diferentemente do SAJ, a sistemática do SEEU é muito automatizada. Não precisa-
remos mais, por exemplo, de equipes com oito servidores para realizar cálculos de
pena. O retorno ao juiz após juntada de documentos também é automática. Podemos
focar o tempo e os esforços em outras atividades33.

A referida automatização, com a consequente previsão de benefícios a ser


concedidos durante o cumprimento da pena ultrapassa o contexto de otimização da
força de trabalho, viabilizando a gestão eficiente das informações disponíveis.
Conforme Relatório Justiça em Números 2019, editado pelo Conselho Naci-
onal de Justiça com base em informações referentes a 2018 enviados por todos os
tribunais do país, a maior despesa do Poder Judiciário atualmente corresponde aos gastos
com recursos humanos, ocupando 90,8% da despesa total de R$ 97.725.289.276,00

32
CRUZ, Fabrício Bittencourt da, MATTA, Gustavo Chemim, “Direito à informação e princípio da
publicidade versus processo virtual (e-proc): análise crítica do processo virtual sob as perspectivas do direito
à informação e do princípio da publicidade”, in AFFORNALLI, Maria Cecília Naréssi Munhoz,
GABARGO, Emerson, org., Direito, informação e cultura: o desenvolvimento social a partir de uma
linguagem democrática, Belo Horizonte, Fórum, 2012, pp. 185-197.
33
TÔRRES, Iuri, Migração automática de processos do SAJ para SEEU é aposta de tribunal, Disponível em:
<https://www.cnj.jus.br/migracao-automatica-de-processos-do-saj-para-seeu-e-aposta-de-tribunal/>, Acesso
em: 14 jun. 2020.

316 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Execução Penal 4.0

(noventa e sete bilhões, setecentos e vinte e cinco milhões, duzentos e oitenta e nove mil
e duzentos e setenta e seis reais)34, a maior porcentagem da série histórica35.
Dentro do supramencionado valor estão inseridas as despesas para cobrir os ven-
cimentos de uma força de trabalho total de mais de 450 mil pessoas36, número conside-
ravelmente superior proporcionalmente a países como Inglaterra, Itália, Colômbia, Chile,
Portugal e Alemanha37.
Contudo, apesar da grande força de trabalho do Poder Judiciário brasileiro, a
Execução Penal privativa de liberdade apresenta taxa de congestionamento de
88%38/39, percentual próximo dos 72,1% de taxa geral de congestionamento dos
processos brasileiros40/41.
Logo, com o SEEU sendo também eficaz na redução de tarefas cotidianas
destinadas aos servidores do Judiciário, há também a existência de economia de
força de trabalho ao possibilitar que tarefas mecânicas sejam automatizadas com
resultados eficientes.
De fato, o SEEU notifica antecipadamente o Juízo sobre a proximidade de even-
tos importantes em relação a todos os cumprimentos de pena, tais como o direito a bene-
fícios de cada detento, permitindo a concretização de direitos de maneira eficiente. Não
há justificativa alguma para que alguém submetido ao cárcere espere mais dos que os
interregnos legalmente previstos para a progressão de regime de cumprimento de pena,
para a aplicação de quaisquer outros benefícios ou para a concessão da liberdade.
Os sistemáticos delays na análise de benefícios incidentes durante o cumpri-
mento de penas privativa de liberdade42/43, típicos de processos em meio físico, tem
o potencial de ser totalmente eliminados com o correto uso do SEEU.

34
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, Justiça em Números 2019, p. 34, Disponível em:
<https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/conteudo/arquivo/2019/08/justica_em_numeros20190919.pdf>,
Acesso em: 14 jun. 2020.
35
Ibid., p. 67.
36
Ibid., p. 34.
37
ROS, Luciano Da, “O custo da Justiça no Brasil: uma análise comparativa exploratória”, Newsletter,
Observatório de elites políticas e sociais do Brasil, NUSP/UFPR, v. 2, n. 9, p. 6, jul. 2015.
38
A taxa de congestionamento é o índice utilizado pelo CNJ para medir a efetividade dos tribunais, levando
em consideração os processos novos, os processos baixados e o estoque remanescente entre os períodos
analisados.
39
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, Justiça em Números 2019, p. 131, Disponível em:
<https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/conteudo/arquivo/2019/08/justica_em_numeros20190919.pdf>,
Acesso em: 14 jun. 2020.
40
Devido aos processos de Execução Penal necessitarem permanecer no acervo durante o período estipulado
de cumprimento da pena, não é possível aferir exclusivamente com sua taxa de congestionamento a
eficiência ou ineficiência da Execução Penal brasileira. Contudo, comparando-se a Execução Penal com a
taxa de congestionamento de outros tipos de processo e a média geral desses, é possível inferir certa taxa de
ineficiência.
41
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, op. cit., p. 131.
42
CACICEDO, Patrick, “O controle judicial da execução penal no Brasil: ambiguidades e contradições de
uma relação perversa”, Revista Brasileira de Direito Processual Penal, v. 4, n. 1, jan./abr. 2018, p. 418.
43
Conforme pesquisa dos processos de execução penal do Estado de São Paulo realizada pela Fundação
Seade, 72,5% dos presos do estado que obtiveram a progressão haviam cumprido mais de um terço da pena,

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 317


Fabrício Bittencourt da Cruz / Matheus de Quadros

Salienta-se que todas as medidas citadas, efetivas de formas diversas para a


melhora do Judiciário brasileiro, atuam conjuntamente também para o incremento da
ideia de presença do Estado durante a execução da pena, o que afeta positivamente o
cumprimento da execução.

3 PERSPECTIVAS FUTURAS
O SEEU resolve parte dos problemas que anteriormente eram combatidos
com os mutirões carcerários44/45, já que o acompanhamento em tempo real das pro-
gressões de regime de cumprimento das penas privativas de liberdade, aliado aos
alertas inerentes ao sistema, tem o potencial de eliminar a existência do excesso de
prazo nas prisões.
Em vez de os mutirões carcerários serem simplesmente abandonados em decor-
rência da implementação do SEEU, estima-se viável o aprimoramento mediante a prática
dos mutirões conjugada com o gerenciamento eletrônico de informações, tornando ainda
mais efetivo o controle sobre irregularidades nas prisões dos detentos.
Não por acaso o CNJ lançou o Mutirão Carcerário Eletrônico no âmbito do Pro-
grama Justiça Presente. O mutirão eletrônico consiste em um aprimoramento do projeto
de mutirões carcerários iniciado em 2008, à medida que doravante a iniciativa estará
sedimentada no gerenciamento das informações constantes dos processos eletrônicos de
Execução Penal em trâmite no SEEU.
Como os processos em papel demandam manuseio individualizado, a condi-
ção elementar dos mutirões carcerários era a presença física de diversos profissio-
nais para a detecção in loco de irregularidades na execução penal.
Já os processos em meio eletrônico estão intimamente relacionados com a es-
truturação digital de todos os dados relevantes, o que permite prospecção desses
dados e sua consequente conversão em informações aptas a ensejar a tomada de
decisões mais precisas tanto na perspectiva micro de magistrados e servidores res-
ponsáveis pelo trâmite individualizado das execuções penais, quanto em perspecti-
vas mais abrangentes como no âmbito nos mutirões carcerários eletrônicos.

patamar muito acima da fração de um sexto exigida pela Lei de Execução Penal à época (art. 112 desse
diploma legal). (BORDINI, Eliana Blumer Trindade, TEIXEIRA, Alessandra, “Decisões judiciais da vara
das execuções criminais: punindo sempre mais”, São Paulo em Perspectiva, v. 18, n. 1, jan./mar. 2004, p.
68).
44
Iniciado em agosto de 2008, o projeto é “destinado a inspecionar os estabelecimentos prisionais, a
coordenar projetos de verificação de direitos dos presos e à informatização das varas de execução penal,
voltado para o mapeamento da realidade carcerária brasileira” (MENDES, Gilmar Ferreira, 10 anos do
projeto ‘mutirões carcerários’: uma experiência precursora, Disponível em: <https://www.jota.
info/opiniao-e-analise/artigos/10-anos-do-projeto-mutiroes-carcerarios-uma-experiencia-precursora-
05092018>, Acesso em: 14 jun. 2020).
45
De acordo com estudo realizado pelo CNJ, constatou-se que, dentre os 451,8 mil processos analisados, ao
menos 47 mil detentos estavam presos de forma irregular. Assim, cerca de dez por cento dos presos
atendidos durante os mutirões carcerários foram postos em liberdade (CONSULTOR JURÍDICO, Balanço
revela sucesso dos mutirões carcerários do CNJ, Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2014-fev-
22/mutiroes-carcerarios-cnj-libertaram-10-presos-casos-analisados>, Acesso em: 14 jun. 2020).

318 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Execução Penal 4.0

De fato, o uso das informações fornecidas através do SEEU aprimora consi-


deravelmente a eficiência na análise dos processos para fins de mutirão carcerário. A
própria seleção de casos relevantes passa a ser mais eficiente a partir da filtragem de
informações a partir de critérios específicos46. Afinal, a partir de parâmetros preesta-
belecidos, será possível que os integrantes dos mutirões verifiquem com precisão e
rapidamente o cabimento de benefícios que ainda não foram concedidos aos deten-
tos, sem a necessidade do deslocamento até as sedes das unidades jurisdicionais.
Observa-se que as possibilidades no uso do SEEU já transcendem a função
automática de alertar quando um detento alcança os parâmetros de progressão de
regime ou outros benefícios semelhantes.
Durante o primeiro Mutirão Carcerário Eletrônico, ocorrido no Estado do Es-
pírito Santo em setembro de 2019, foram analisados cerca de nove mil processos
mediante o uso do SEEU aliado a novas metodologias como a soltura qualificada,
correspondente ao acompanhamento especial dos egressos47/48.
A partir da junção das evoluções tecnológicas e dos esforços criativos dos in-
tegrantes do Judiciário, do Ministério Público e da Defensoria Pública, tem-se um
passo relevante para o SEEU, que se torna um propulsor de ações ainda não concre-
tizadas isoladamente pela inteligência artificial.
Por essa razão, uma das características relevantes a considerar para o futuro
do sistema é sua capacidade de dialogar com outras iniciativas inovadoras, como é o
caso dos Mutirões Carcerários Eletrônicos.
A exemplo desse caso, embora ainda não seja possível o sistema detectar so-
zinho todos os benefícios que os detentos têm direito, o SEEU pode facilitar o aces-
so e a filtragem das análises a ser realizadas. Logo, superam-se eventuais limitações
tecnológicas a partir de outras metodologias para a consecução de seus fins.
A vinculação do SEEU ao Programa Justiça Presente indica interessantes
perspectivas quanto a um futuro de aproximação entre diversas frentes que tendem a
dialogar em busca de inovação e eficiência à Execução Penal brasileira.
Uma dessas perspectivas de iniciativas intersistêmicas em um futuro próximo
é a utilização dos dados coletados pelo SEEU pelos Escritórios Sociais, outra ativi-
dade de destaque no Programa Justiça Presente.
Implantado inicialmente em 2016 no Espírito Santo, o Escritório Social é
uma instituição resultante da articulação dos Poderes Executivo e Judiciário com a
sociedade civil, visando ao retorno dos egressos à sociedade de forma qualificada.

46
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, Justiça Presente: relatório anual 2019, p. 60, Disponível em:
<https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2019/12/Relatorio_Justi%C3%A7aPresente2019_v2.pdf>,
Acesso em: 14 jun. 2020.
47
ZAMPIER, Débora, CNJ lança mutirão carcerário eletrônico no Espírito Santo, Disponível em:
<https://www.cnj.jus.br/cnj-lanca-mutirao-carcerario-eletronico-no-espirito-santo/>, Acesso em: 14 jun.
2020.
48
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Justiça Presente: relatório anual 2019, p. 61, Disponível em:
<https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2019/12/Relatorio_Justi%C3%A7aPresente2019_v2.pdf>,
Acesso em: 14 jun. 2020.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 319


Fabrício Bittencourt da Cruz / Matheus de Quadros

A partir da análise pormenorizada de todo o processo de execução do egresso


através do SEEU, os Escritórios Sociais podem utilizar as informações disponíveis
para auxiliar o retorno sob medida de cada um dos atendidos, maximizando a inser-
ção dos detentos à sociedade após o fim da pena.
Além do panorama de interação entre sistemas, há um horizonte que pode
significar a mais promissora funcionalidade do sistema, capaz de revolucionar em
definitivo o cumprimento das penas no Brasil.
Consta no relatório de 2019 do Programa Justiça Presente que foi “contrata-
da consultoria para desenvolver o Módulo de Alternativas Penais para o SEEU
visando à criação do Sistema Nacional de Informações das Alternativas Penais e
Monitoração Eletrônica”49.
Sendo o trecho mencionado acima sobre a eventual criação do chamado Sis-
tema Nacional de Informações das Alternativas Penais e Monitoração Eletrônica a
única informação disponível no momento, não é possível tratar com certeza sobre o
conteúdo desse sistema.
Todavia, a existência de um projeto de expansão do SEEU para as alter-
nativas penais50 não pode ser ignorada, visto que esse se coaduna perfeitamente
com dois dos objetivos da Estratégia Nacional do Judiciário 2015-2020, instituí-
da pela Resolução CNJ 198, de 01.07.2014: a busca de inovações tecnológicas
que aumentem a eficiência do Poder Judiciário brasileiro51 e a utilização de pe-
nas alternativas à prisão como forma de combate ao atual estado de coisas in-
constitucional52.
Tomando como base as aplicabilidades do SEEU quanto à execução da
pena de prisão, imagina-se que essas serão adaptadas para o cumprimento das alter-
nativas penais, sendo o sistema basicamente o mesmo do atual SEEU.
Entretanto, as alternativas penais enfrentam problemas diversos da pena de
prisão, demandando adaptações para essa nova abordagem.
No cotidiano forense, observa-se que um dos maiores problemas da aplicação
das alternativas penais é a fiscalização dessas. Por exemplo, se o apenado é exposto
à proibição de frequentar determinados lugares, não há como verificar se essa condi-

49
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, Justiça Presente: relatório anual 2019, p. 32, Disponível em:
<https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2019/12/Relatorio_Justi%C3%A7aPresente2019_v2.pdf>,
Acesso em: 14 jun. 2020.
50
Nos termos da Portaria MJ 495, de 28.04.2016, as alternativas penais abrangem as penas restritivas de
direito; a transação penal e suspensão condicional do processo; suspensão condicional da pena privativa de
liberdade; conciliação, mediação e técnicas de justiça restaurativa; medidas cautelares diversas da prisão e
medidas protetivas de urgência. Ou seja, todas as medidas de cunho coator do processo penal que não
ensejem na aplicação da prisão (o que também tende a incluir o novíssimo acordo de não persecução penal,
incluído na legislação brasileira pela Lei Federal 13.964/2019).
51
BRASIL, Conselho Nacional de Justiça, Resolução 198, de 01.07.2014, Dispõe sobre o Planejamento e a
Gestão Estratégica no âmbito do Poder Judiciário e dá outras providências, Diário da Justiça Eletrônico,
Brasília, 3 jul. 2014, Disponível em: <https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/2029>, Acesso em: 14 jun. 2020.
52
Ibid.

320 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Execução Penal 4.0

ção é realmente cumprida se não for determinada a medida da monitoração eletrôni-


ca conjuntamente.
Da mesma forma, a fiscalização de prestação de serviços à comunidade é ge-
ralmente precária, não havendo forma eficiente de fiscalizar se os serviços são cum-
pridos de forma regular e efetiva sem investir para isso considerável força de trabalho
destinada apenas à fiscalização da prestação.
Ainda, soma-se o exposto à precariedade estrutural do sistema penitenciário bra-
sileiro, vez que não há no Brasil as chamadas casas de albergado53, onde deveriam ser
cumpridas algumas das alternativas penais, como as de limitação de fim de semana.
Assim, tem-se que o problema principal das alternativas penais não é o de viola-
ção aos direitos do preso, mas da inefetividade da aplicação das medidas. Contudo, o
SEEU também pode ser útil nesse sentido, trazendo modificações adequadas à realidade
brasileira.
Nesse norte, embora seja possível apenas tratar de hipotéticas funcionalidades da
nova fase do sistema, a partir da implementação do SEEU destinado às alternativas pe-
nais seria possível verificar a viabilidade de um método de fiscalização baseado na vali-
dação de credenciais do apenado. Um exemplo seria o ponto eletrônico nos momen-
tos de entrada e saída da prestação do serviço à comunidade ou das atividades de
limitação de fim de semana.
Da mesma forma, a partir da instauração do sistema, vislumbrar-se-ia a viabi-
lidade da realização de juntada de certidões no SEEU, baseadas na fiscalização cons-
tante do cumprimento das medidas restritivas de direitos e das medidas protetivas de
urgência. Demonstrando-se a existência de fiscalização das ordens impostas pelo
Juízo, a qual poderá ser observada em tempo real por todos que tenham a efetiva
permissão de acesso aos autos.
Assim, seja a partir de medidas intersistêmicas ou da expansão do âmbito de
aplicabilidade do SEEU, observa-se que há espaço para incremento de diversas
inovações na Execução Penal, independentemente de alterações legislativas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Sistema Eletrônico de Execução Penal evidencia plena capacidade não
apenas como mero instrumento eletrônico a serviço da Execução Penal tradicional,
mas como ente catalizador de uma verdadeira revolução no trâmite dos processos de
Execução Penal, na forma como são tratadas e utilizadas as informações da execu-
ção penal e especialmente no modo como o Estado brasileiro conduz as políticas
públicas de atenção aos detentos.
Primeiramente porque alguns dos recursos trazidos pelo SEEU, como a con-
tagem eletrônica dos prazos e a notificação do Juízo sobre a iminência de benefícios
dos apenados, constituem ferramentas essenciais para a garantia do cumprimento da
pena privativa de liberdade nos termos estritos da sentença condenatória, tratando-se

53
NUNES, Adeildo, Comentários à lei de execução penal, Rio de Janeiro, Forense, 2016, pp. 233.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 321


Fabrício Bittencourt da Cruz / Matheus de Quadros

de conquista importante para assegurar os direitos dos condenados e também para


assegurar a limitação do poder estatal.
Outros recursos disponíveis como a possibilidade de agregar e integrar as in-
formações das execuções penais em trâmite em todos os Estados da Federação,
incorporando-as ao Banco Nacional de Mandados de Prisão, são mecanismos com
aptidão a resolver, em perspectiva ampla, importantes falhas do aparato penal e
processual penal brasileiro.
Observou-se, outrossim, que o SEEU carrega em seu cerne o potencial para
ser um grande aliado na concepção, na aplicação e no acompanhamento de políticas
públicas envolvendo o sistema prisional, por permitir o mapeamento preciso de um
cenário que até então era pouco detalhado no país: o das estatísticas de cumprimen-
tos de pena no Brasil em tempo real.
Portanto, o SEEU não corresponde apenas a uma alternativa digital ao pro-
cesso físico, como inicialmente propugnado na Lei 12.106/2009 e na Lei
11.419/2006. Muito mais que isso, o SEEU nasce como propulsor de várias frentes
no combate às deficiências da Execução Penal do Estado brasileiro.
Ademais, o SEEU guarda diversas potencialidades ainda não exploradas, não
se tratando de um instrumento já completamente compreendido em sua amplitude,
mas de um audacioso projeto em pleno desenvolvimento.
Entre as possíveis potencialidades em inicial exploração observam-se insti-
gantes abordagens através de iniciativas intersistêmicas, como a dos Mutirões Carce-
rários Eletrônicos; entre potencialidades a explorar sugere-se o possível uso do
SEEU no âmbito das alternativas penais: o denominado Sistema Nacional de Infor-
mações das Alternativas Penais e Monitoração Eletrônica.
Logo, não parece exagerado nomear a atual conjectura trazida pelo SEEU de
Execução Penal 4.0, pois, de pronto, nota-se uma nova configuração Execução Penal
brasileira, com maiores presença, vigilância e atuação do Estado no sistema peniten-
ciário nacional, gerando melhor asseguramento de direitos fundamentais.
De fato, com o uso do SEEU há uma inegável tendência de melhora estrutu-
ral, permitindo a concretização de direitos há muito positivados na Constituição
Federal e na Lei de Execução Penal.
O objeto de estudo neste artigo descortina um novo paradigma: a inovação
como método transformador na Execução Penal. Sendo o SEEU apenas o primeiro
passo, caminhemos otimistas rumo à definitiva existência da Execução Penal 4.0.

REFERÊNCIAS
BORDINI, Eliana Blumer Trindade, TEIXEIRA, Alessandra, “Decisões judiciais da vara das execuções
criminais: punindo sempre mais”, São Paulo em Perspectiva, v. 18, n. 1, jan./mar. 2004, pp. 66-71.
BRASIL, Conselho Nacional de Justiça, 230ª Sessão Ordinária, Rel. Bruno Ronchetti de Castro, Brasília, DF,
26.04.2016, Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=10300665>,
Acesso em: 14 jun. 2020.

322 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Execução Penal 4.0

BRASIL, Conselho Nacional de Justiça, Resolução 101, de 15.12.2009, Define a política institucional do Poder
Judiciário na Execução das Penas e Medidas Alternativas à Prisão, Diário Oficial da União, Brasília, 25 jan.
2010, Disponível em: <https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/atos-normativos?documento=161>, Acesso em: 14
jun. 2020.
BRASIL, Conselho Nacional de Justiça, Resolução 198, de 01.07.2014, Dispõe sobre o Planejamento e a Gestão
Estratégica no âmbito do Poder Judiciário e dá outras providências, Diário da Justiça Eletrônico. Brasília, 3 jul.
2014, Disponível em: <https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/2029>, Acesso em: 14 jun. 2020.
BRASIL, Conselho Nacional de Justiça. Resolução 223, de 27.05.2016, Institui o Sistema Eletrônico de Execu-
ção Unificado (SEEU) como sistema de processamento de informações e prática de atos processuais relativos à
execução penal e dá outras providências, Diário da Justiça Eletrônico, Brasília, 31 maio 2016, Disponível em:
<https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/atos-normativos?documento=2285>, Acesso em: 14 jun. 2020.
BRASIL, Conselho Nacional de Justiça, Resolução 280, de 09.04.2019, Estabelece diretrizes e parâmetros para
o processamento da execução penal nos tribunais brasileiros por intermédio do Sistema Eletrônico de Execução
Unificado – SEEU e dispõe sobre sua governança, Diário da Justiça Eletrônico, Brasília, 10 abr. 2019, Disponí-
vel em: <https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/2879>, Acesso em: 14 jun. 2020.
BRASIL, Conselho Nacional de Justiça. Resolução 304, de 17.12.2019, Confere nova redação aos arts. 3º, 9º, 12
e 13 da Resolução CNJ n. 280, de 9.04.2019, que estabelece diretrizes e parâmetros para o processamento da
execução penal nos tribunais brasileiros por intermédio do Sistema Eletrônico de Execução Unificado – SEEU e
dispõe sobre sua governança, Diário da Justiça Eletrônico, Brasília, 18 dez. 2019, Disponível em:
<https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/3123>, Acesso em: 14 jun. 2020.
BRASIL, Lei 10.713, de 13.08.2003, Altera artigos da Lei 7.210, de 11.07.1984 – Lei de Execução Penal – para
dispor sobre a emissão anual de atestado de pena a cumprir, Diário Oficial da União, Brasília, 13 ago. 2003,
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/L10.713.htm>, Acesso em: 14 jun. 2020.
BRASIL, Lei 11.419, de 19.12.2006, Dispõe sobre a informatização do processo judicial; altera a Lei 5.869, de
11.01.1973 – Código de Processo Civil; e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 19 dez.
2006, Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11419.htm>, Acesso em:
14 jun. 2020.
BRASIL, Lei 12.106, de 02.12.2009, Cria, no âmbito do Conselho Nacional de Justiça, o Departamento de
Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas e
dá outras providências, Diário Oficial da União, Brasília, 2 dez. 2009, Disponível em: <http://www.pla
nalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/lei/l12106.htm>, Acesso em: 14 jun. 2020.
BRASIL, Supremo Tribunal Federal, Ação Direta de Inconstitucionalidade 6259, Rel. Min. Alexandre de
Moraes, Brasília, DF, 16.12.2019, Diário Oficial da União. Disponível em: <http://portal.stf.jus.
br/processos/detalhe.asp?incidente=5814977>, Acesso em: 14 jun. 2020.
BRASIL, Supremo Tribunal Federal, Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 347, Rel. Min.
Marco Aurélio de Mello. Brasília, DF, 09.09.2015, Diário Oficial da União, Disponível em: <http://redir.stf.
jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=10300665>, Acesso em: 14 jun. 2020.
BRASIL, Ministério da Justiça, Departamento Penitenciário Nacional, Levantamento nacional de informações
penitenciárias: dezembro de 2019, 2020, Disponível em: <https://app.powerbi.com/view?r=eyJrIjo
iZTlkZGJjODQtNmJlMi00OTJhLWFlMDktNzRlNmFkNTM0MWI3IiwidCI6ImViMDkwNDIwLTQ0NGM
tNDNmNy05MWYyLTRiOGRhNmJmZThlMSJ9>, Acesso em: 14 jun. 2020.
BRASIL, Ministério da Justiça, Portaria 495, de 28.04.2016, Institui a Política Nacional de Alternativas Penais,
Diário Oficial da União, Disponível em: <http://www.in.gov.br/materia/-/asset_publisher/Kujrw0
TZC2Mb/content/id/22785957/do1-2016-05-02-portaria-n-495-de-28-de-abril-de-2016-22785887>, Acesso em:
14 jun. 2020.
CACICEDO, Patrick, “O controle judicial da execução penal no Brasil: ambiguidades e contradições de uma
relação perversa”, Revista Brasileira de Direito Processual Penal, v. 4, n. 1, jan./abr. 2018, pp. 413-432.
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, 302ª Sessão Ordinária 17.12.2019 – Tarde, Disponível em:
<https://www.youtube.com/watch?v=cVikSKzl2No>, Acesso em: 14 jun. 2020.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 323


Fabrício Bittencourt da Cruz / Matheus de Quadros

CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, Justiça em Números 2019, Disponível em: <https://www.cnj.


jus.br/wp-content/uploads/conteudo/arquivo/2019/08/justica_em_numeros20190919.pdf>, Acesso em: 14 jun.
2020.
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, Justiça Presente: relatório anual 2019, Disponível em:
<https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2019/12/Relatorio_Justi%C3%A7aPresente2019_v2.pdf>, Acesso
em: 14 jun. 2020.
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, Relatório Sistema Eletrônico de Execução Unificado – SEEU,
Disponível em: <https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/conteudo/arquivo/2018/09/37fef09649e6b90bc8f
4186d60c8441d.pdf>, Acesso em: 14 jun. 2020.
CONSULTOR JURÍDICO, Assembleia Legislativa de SP move ADI contra obrigatoriedade do SEEU, Dispo-
nível em: <https://www.conjur.com.br/2019-nov-25/legislativo-sp-questiona-stf-obrigatoriedade-adesao-seeu>,
Acesso em: 14 jun. 2020.
CONSULTOR JURÍDICO, Balanço revela sucesso dos mutirões carcerários do CNJ, Disponível em:
<https://www.conjur.com.br/2014-fev-22/mutiroes-carcerarios-cnj-libertaram-10-presos-casos-analisados>,
Acesso em: 14 jun. 2020.
ONSULTOR JURÍDICO, CNJ adia para junho de 2020 conclusão de implantação do SEEU, Disponível em:
<https://www.conjur.com.br/2019-dez-18/cnj-adia-junho-2020-conclusao-implantacao-seeu>, Acesso em: 14
jun. 2020.
CONSULTOR JURÍDICO, CNJ notifica TJ-SC sobre atrasos do tribunal na adoção do sistema SEEU, Dispo-
nível em: <https://www.conjur.com.br/2019-out-13/cnj-notifica-tj-sc-atraso-adocao-sistema-seeu>, Acesso em:
14 jun. 2020.
CONSULTOR JURÍDICO, Corregedor pede explicação do TJ-AM por recusa em adotar SEEU, Disponível
em: <https://www.conjur.com.br/2019-nov-20/corregedor-explicacao-tj-am-recusa-adotar-seeu>, Acesso em: 14
jun. 2020.
CONSULTOR JURÍDICO, Tribunais devem adotar sistema eletrônico unificado de execução penal, Disponível
em: <https://www.conjur.com.br/2016-abr-26/cnj-tribunais-adotem-sistema-eletronico-execucao-penal>, Acesso
em: 14 jun. 2020.
CRUZ, Fabrício Bittencourt da, MATTA, Gustavo Chemim, “Direito à informação e princípio da publicidade
versus processo virtual (e-proc): análise crítica do processo virtual sob as perspectivas do direito à informação e
do princípio da publicidade”, in AFFORNALLI, Maria Cecília Naréssi Munhoz, GABARGO, Emerson, org.,
Direito, informação e cultura: o desenvolvimento social a partir de uma linguagem democrática, 1. ed, Belo
Horizonte, Fórum, 2012.
CRUZ, Fabrício Bittencourt da, OLIVEIRA, Juliano Felipe, “E-proc do Tribunal Regional Federal da Quarta
Região: evolução sem precedentes”, Democracia Digital e Governo Eletrônico, v. 7, 2012, p. 95-114.
CRUZ, Fabrício Bittencourt da, SILVA, Thais Sampaio, “Processo eletrônico x processo físico no contexto do
direito fundamental à razoável duração do processo: a experiência do TRF4 na redução dos tempos médios de
tramitação”, Revista do Instituto do Direito Brasileiro, v. 3, 2012, pp. 1341-1357.
FARIELLO, Luíza, SEEU monitora processos de 11.547 presos provisórios no Estado do Paraná, Dis-
ponível em: <https://www.cnj.jus.br/seeu-monitora-processos-de-11-547-presos-provisorios-no-estado-
do-parana/>, Acesso em: 14 jun. 2020.
FOUCAULT, Michel, Vigiar e punir: nascimento da prisão, 41. ed, Petrópolis, Vozes, 2013.
FUSCO, Nicole, Homem que deveria ficar preso 2 dias passa 210 atrás das grades. Disponível em:
<https://veja.abril.com.br/brasil/homem-que-deveria-ficar-preso-2-dias-passa-210-atras-das-grades/>, Acesso
em: 14 jun. 2020.
GRECO, Rogério, Curso de Direito Penal: parte geral, v. 1, 19. ed, Niterói, Impetus, 2017.
HUMAN RIGHTS WATCH, Relatório mundial de 2019, Disponível em: <https://www.hrw.org
/pt/world-report/2019/country-chapters/326447#112d79>, Acesso em: 14 jun. 2020.
MIRANDA, Rafael de Souza, Manual de execução penal, Salvador, Juspodivm, 2019.

324 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Execução Penal 4.0

MENDES, Gilmar Ferreira, 10 anos do projeto ‘mutirões carcerários’: uma experiência precursora, Disponível
em: <https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/10-anos-do-projeto-mutiroes-carcerarios-uma-experiencia-
precursora-05092018>, Acesso em: 14 jun. 2020.
NUNES, Adeildo, Comentários à lei de execução penal, Rio de Janeiro, Forense, 2016.
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, Visit to Brazil undertaken from 19 to 30 October: observations
and recommendations addreses to the State party, Disponível em: <https://nacoesunidas.org/wp-
content/uploads/2017/01/Relatorio-SPT-2016-1.pdf>, Acesso em: 14 jun. 2020.
PONTES, Felipe, Desinformação sobre execução de penas é inaceitável, diz Toffoli, Disponível em:
<http://agenciabrasil.ebc.com.br/justica/noticia/2019-06/desinformacao-sobre-execucao-de-penas-e-inaceitavel-
diz-toffoli>, Acesso em: 14 jun. 2020.
ROS, Luciano Da, “O custo da Justiça no Brasil: uma análise comparativa exploratória”, Newsletter, Observató-
rio de elites políticas e sociais do Brasil, NUSP/UFPR, v. 2, n. 9, jul., pp. 1-15.
TÔRRES, Iuri, Migração automática de processos do SAJ para SEEU é aposta de tribunal, Disponível em:
<https://www.cnj.jus.br/migracao-automatica-de-processos-do-saj-para-seeu-e-aposta-de-tribunal/>, Acesso em:
14 jun. 2020.
ZAMPIER, Débora, CNJ lança mutirão carcerário eletrônico no Espírito Santo, Disponível em:
<https://www.cnj.jus.br/cnj-lanca-mutirao-carcerario-eletronico-no-espirito-santo/>, Acesso em: 14 jun. 2020.
ZAMPIER, Deborah. Conselheiros do CNJ são apresentados a Sistema Unificado de Execução Penal. Disponí-
vel em: <https://www.cnj.jus.br/conselheiros-do-cnj-sao-apresentados-a-sistema-unificado-de-execucao-penal/>.
Acesso em: 14 jun. 2020.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 325


Execução Penal 4.0

A FUNÇÃO DA CONSTITUIÇÃO FINANCEIRA


THE FUNCTION OF THE FINANCIAL CONSTITUTION
DOI: 10.19135/revista.consinter.00011.15
Recebido/Received 30.04.2019 – Aprovado/Approved 16.05.2019
Pedro Augusto Costa Gontijo1 – https://orcid.org/0000-0002-6977-3947
E-mail: pedro-acg@hotmail.com
Flávio Couto Bernardes2 – https://orcid.org/0000-0001-8180-0218
E-mail:flavio.bernardes@bernardesadvogados.adv.br

Resumo: A partir da análise do sistema do Direito como sistema comunicativo, percebe-


se a complexidade própria do fenômeno da Constituição Financeira. Esta é tomada como
o acoplamento estrutural existente entre Política e Direito e que, em seu funcionamento
orgânico, irrita diretamente o sistema da Economia. É a partir dessa visão de que a
comunicação normativa da Constituição Financeira ocupa o papel central da estrutura
estatal que o presente trabalho se apresenta no sentido de avaliar o valor da Constituição
a partir de sua interrelação com a sociedade, com a normatividade e com os clássicos.
Para construir o raciocínio, lançou-se mão de metodologia teorético-explicativa,
especificamente com a contraposição de teorias e a extração dos principais significados
de cada uma delas para revelar o que seria a Constituição Financeira.
Palavras-chave: Direito Financeiro. Constituição Financeira. Teoria dos Sistemas.
Comunicação. Estado. Clássicos.
Abstract: From the analysis of the Law system as a communicative system, one can
perceive the complexity of the phenomenon of the Financial Constitution. This is taken
as the structural coupling between Politics and Law and, in its organic functioning,
directly irritates the system of Economics. It is from this view that the normative
communication of the Financial Constitution occupies the central role of the state
structure that the present work presents itself in the sense of evaluating the value of the
Constitution from its interrelationship with society, with normativity and with the
classics. To construct the reasoning, theoretical-explanatory methodology was used,
specifically with the counterposition of theories and the extraction of the main meanings
of each of them to reveal what would be the Financial Constitution.
Keywords: Financial Law. Financial Constitution. Systems Theory. Communication.
State. Classics.

1
Bacharel e Mestre em Filosofia do Direito, Legística, Teoria dos Sistemas, Direito Constitucional e Direito
Internacional pela UFMG. Pesquisador vinculado ao Observatório para qualidade da lei. Consultor jurídico
e acadêmico em Direito Público. Professor de Direito Empresarial e Introdução ao Estudo do Direito da
PUC-MG. E-mail:pedro-acg@hotmail.com
2
Bacharel, Mestre e Doutor em Direito Tributário pela Universidade Federal de Minas Gerais. Professor
adjunto de Direito Financeiro e Tributário da UFMG. Professor de Direito Financeiro e Tributário e do
mestrado e doutorado da PUC-MG. Advogado e consultor. Procurador do Município de Belo Horizonte. .
E-mail:flavio.bernardes@bernardesadvogados.adv.br

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 327


Pedro Augusto Costa Gontijo / Flávio Couto Bernardes

Sumário: 1. Introdução; 2. A Constituição como elemento básico do Estado e da


Sociedade; 2.1. Uma visão sociológico-política da Constituição; 2.2. Uma visão
normativa da Constituição; 2.3. Uma visão doutrinária-culturológica da Constituição;
3. A Constituição Financeira e a sedimentação das práticas sociais a partir da
funcionalidade complexa; 4. Conclusão; Referências.
Summary: 1. Introduction; 2. The Constitution as a basic element of the State and
Society; 2.1. A sociological-political view of the Constitution; 2.2. A normative view
of the Constitution; 2.3. A Doctrinal-Culturological View of the Constitution; 3 The
Financial Constitution and the sedimentation of social practices from the complex
functionality; 4. Conclusion; References.

1 INTRODUÇÃO
Ao longo da história, a estrutura institucional do Estado foi se tornando cada
vez mais complexa, movimento que se deu pari passu com a própria evolução dos sis-
temas sociais. Esse ganho de complexidade interna serviu, como aborda a Teoria dos
Sistemas, como movimento de redução da complexidade em seu nível interno. Isso
demonstra o paradoxo de se enfrentar os fenômenos sociais em sua estrutura dinâmica: a
partir do aumento da complexidade interna, permite-se a diminuição da complexidade
interna em razão do meio. O motivo é o simples fato de o meio, o ambiente, conter muito
mais possibilidades de acontecimentos que o próprio sistema.
Sob a óptica da Teoria dos Sistemas, estuda-se o Direito conforme um fenô-
meno intrinsecamente comunicativo. Usa-se, para efeitos referenciais, o termo co-
municação normativa, a cingir, em algum grau, o aspecto deontológico do fenôme-
no, em que pese não ser o objeto de estudo próprio ao marco teórico adotado.
Essa comunicação normativa teve como ponto alto no devir histórico a ideia
de Constituição. Como fenômeno que engloba características políticas e normativas
de uma dada sociedade, a Constituição encarna a ideia de uma norma central, que
tem a função de estabilizar o sistema do Direito e o sistema da Política, além de dar
a marcha do ponto de partida para a possibilidade de existência desses dois níveis de
sistemas sociais intrinsecamente comunicativos. Essa pretensão de estabilizar as
expectativas vem justamente no sentido de garantir a prospecção de dado cenário, de
trazer uma redução da complexidade do futuro no presente, tendo em vista, também,
referenciais contidos no passado.
Nesse campo teórico, em razão do influxo dos movimentos iluministas e ra-
cionalistas sobre os campos do Direito e da Política, especialmente após a Revolu-
ção Francesa – que não somente propaga o ideal de Estado de Direito, República e
Constituição como fonte do pensamento jurídico-político ocidental, como também
opera a possibilidade de desestratificação social a partir da incorporação dos princí-
pios da igualdade, liberdade e fraternidade como fonte comum para o estabelecimen-
to da comunicação nos sistemas sociais – surge a necessidade de se estudar e fun-
damentar um fator que possibilita não somente a existência do Estado, como tam-
bém sua própria operacionalidade e intersecção com seu respectivo tecido social,
qual seja o Direito Financeiro.

328 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


A Função da Constituição Financeira

É no campo do Direito Financeiro que as Constituições de matriz ocidental


têm migrado suas mais fervorosas atenções no que diz respeito ao aumento de com-
plexidade de suas estruturas comunicacionais normativas. Isso se dá por um motivo
central: o elemento financeiro é a base para a existência da soberania e da autonomia
das instituições estatais e sociais, sendo que a coesão possibilitada pela Constituição
deve, necessariamente, perpassar pela ideia de garantir a higidez e a precisão de
como o Estado poderá mobilizar riquezas, crédito e capital para cumprir com as
finalidades integradas às Constituições contemporâneas.
Para enfrentar essa abordagem, recorre-se à necessária reconstrução do pró-
prio fenômeno Constitucional, para, logo após, explicitar a face da Constituição
Financeira do Estado – tomado o caso concreto, a Constituição Financeira do Estado
brasileiro, circunscrito à Constituição de 1988 – e os aspectos comunicativos mais
essenciais para a manutenção não somente da autopoiese do sistema constitucional,
mas também dos acoplamentos estruturais realizados entre Direito e Política e Direi-
to e Economia. Essa reconstrução depende, como não poderia deixar de ser, dos
clássicos do Direito Constitucional, que remontam as ideias seminais sobre o que é
uma Constituição e a sua respectiva função conjuntiva, bem como possibilitam en-
xergar a materialidade e importância da Constituição Financeira.
Ao final, traz-se os principais pontos acerca daquilo que pode ser considerado
como a função da Constituição Financeira em um sistema autopoiético, bem como
as necessárias adequações entre as abordagens realizadas pelos marcos teóricos
sociológico, normativo e doutrinário da Constituição e a Teoria dos Sistemas.

2 A CONSTITUIÇÃO COMO ELEMENTO BÁSICO DO ESTADO E DA


SOCIEDADE
A Constituição se calca em sua força constitutiva imanente. Isso significa, em
primeiro lugar, que traz em si um impulso criador, uma atividade primeva de caráter
inovador e que concretiza a realidade. A Constituição, por constituir, não simples-
mente diz algo, determina. Ao dizer, informa; ao informar, agrega; e ao agregar possi-
bilita a vida; ao determinar, linda a realidade como projeto. A sedimentação daquilo
que hoje conhecemos como Constituição Financeira é um fenômeno histórico, que tem
suas origens no processo de evolução do Direito e da Política com a derrocada do
Estado Moderno e de toda sua estrutura institucional. A Constituição Financeira é
assentada na ideia de Democracia, de coisa pública, de submissão de todos, inclusive
dos poderes constituídos pela própria Constituição, à vontade da Constituição e à von-
tade daquela ideia abstrata, o espírito e o poder do povo. É a Constituição Financeira
que possibilita a mobilização das forças estatais em todas as suas formas de manifes-
tação, que possibilita a transformação do projeto em realidade.
Mas o que é essa ação constituinte da Constituição Financeira? Constituir
pode ser visto como “ser a parte principal de algo”, aquilo que possibilita a compo-
sição de uma realidade maior. Ao mesmo tempo, significa que algo pode ser estabe-
lecido, organizado, metodizado, ou, em alguma medida, também indica a ação de
algo que concorre com outros elementos para formar um todo. Comumente, no meio

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 329


Pedro Augusto Costa Gontijo / Flávio Couto Bernardes

jurídico, vê-se constituir como ato que transmite poderes a alguém para exercer um
mandato, um cargo eletivo, uma função, sendo nomeado ou elegido para tal. Por
fim, a etimologia latina aponta para as ideias de “compor, designar, eleger, escolher,
indicar, instituir e nomear” (HOUAISS, 2009, p. 531). Tudo isso perfaz o sentido de
força constitutiva imanente da Constituição e o sentido da transformação de potência
em ato das determinações constitucionais, o que só é possibilitado, a partir de uma
lógica contemporânea, pela existência dessa Constituição Financeira. E é em contato
com esse espectro semântico que se passa a visualizar a importância da Constituição
na formatação da realidade financeira do Estado, em específico o Estado brasileiro,
bem como a sanidade dos sistemas comunicativos próprios à Economia e à Política.
2.1 Uma Visão Sociológico-Política da Constituição
O que é uma Constituição? Com essa questão, Ferdinand Lassalle fez uma
das mais fascinantes defesas teóricas na história do constitucionalismo moderno, que
repercute até hoje como um dos parâmetros mais intrigantes e espantosos para aque-
les que pretendem se mover sobre a Ciência do Direito.
Colocando-se mediante caráter “estritamente científico” (LASSALLE, 2015,
p. 25), o autor se propõe a mostrar argumentos simples, claros e sólidos para encon-
trar a verdadeira essência da Constituição. Essa essência, contudo, não residiria
meramente em um “pacto jurado entre o rei e o povo que estabelece os princípios
básicos da legislação e do governo dentro de um país” ou, logo mais genérica, en-
tendida como “a lei fundamental proclamada no país, na qual se lançam as bases
para a organização do direito público” de uma nação (Ibidem, p. 28-29). Menos
ainda é uma mera lei, mas a lei fundamental do país3 (Ibidem, p. 33), que possui
certas congruências fáticas.

3
Lassalle lança uma interessante e ilustrativa argumentação em relação a esse ponto, dizendo que “o país, por
exemplo, não protesta porque a cada etapa estão sendo promulgadas novas leis. Pelo contrário, todos nós
sabemos que é necessário que todos os anos se promulgue um número mais ou menos grande de novas leis.
Contudo, não se pode ditar uma só lei nova sem que se altere a situação legislativa vigente no momento de
promulgar-se, pois se a nova lei não introduzisse nenhuma mudança no estatuto legal vigente, seria
absolutamente supérflua e não teria o porquê promulgá-la. Mas não protestamos para que as leis se
reformem. Muito pelo contrário, nós vemos nestas mudanças, em geral, a missão normal dos organismos
governantes. Porém, em relação à Constituição, nós protestamos e gritamos: Deixe estar a Constituição!
De onde vem essa diferença? Esta diferença é tão inegável que até existem constituições, na qual se dispõe
taxativamente que a Constituição não poderá ser alterada de forma alguma; em outras, se prescreve que,
para sua reforma, não bastará a simples maioria, mas que deverão ser reunidas dois terços das partes dos
votos do Parlamento; e há algumas em que a reforma constitucional não é da competência dos órgãos
legislativos, nem associados ao Poder Executivo, mas para acometê-la, deverá ser convocada, extra, ad hoc,
expressa e exclusivamente para este fim, uma nova assembleia legislativa que decida sobre a oportunidade
ou conveniência da transformação. Em todos estes fatos se revela que, no espírito unânime dos povos,
todavia, uma Constituição deve ser algo muito mais sagrado, mais firme e mais incomovível que uma lei
comum” (Ibidem, p. 32-33). Não obstante esses argumentos tenham se modificado em razão da extrema
complexidade dos atuais modelos de sociedade ocidental – que reivindicam legítimas mudanças legislativas
em nível infraconstitucional – há que se reconhecer que as modificações constitucionais amplificam os
debates em torno da necessidade ou não de reforma. Essa constatação demonstra, em algum grau, a sutileza
do espírito que encarna a ideia de Constituição, especificamente a segurança jurídica.

330 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


A Função da Constituição Financeira

No primeiro passo de sua exposição, Lassalle destaca três noções necessárias


para se identificar a Constituição, quais sejam primeiramente que seja algo mais que
as “leves correntes” que dominam o cenário legislativo ordinário; em segundo que
constitua o estrito fundamento das demais leis do ordenamento; e terceiro que se
algo se constitui como fundamento é porque necessariamente deve ser dessa forma,
e não de outra4 (Ibidem, p. 34-35). Conclui, preliminarmente, que a Constituição se
coloca como “uma força ativa que faz, por um império de necessidade que todas as
demais leis e instituições jurídicas vigentes no país, sejam o que realmente são, de
tal modo que, a partir deste instante, não se possam promulgar-se, neste país, mes-
mo que se quisesse outras quaisquer” (Ibidem, p. 37).
Logo após, centra sua análise no ponto principal de sua teoria: a Constituição
nada mais reflete que a composição dos fatores reais de poder presentes na socieda-
de, sendo estes a “força ativa e eficaz que informa todas as leis e instituições jurídi-
cas da sociedade em questão, fazendo com que não possam ser, em essência, mais
do que são” (Ibidem, p. 38). Esses fatores reais de poder se manifestariam por meio
de fragmentos constitucionais, que em sua perspectiva estariam alocados em seis
grandes fatores sociais que carregam, em si, a essência da Constituição: 1) a monar-
quia, que exerce poder sobre o exército e os cânones; 2) a aristocracia, que possui
influência sobre o rei e sua Corte; 3) a grande burguesia, que teria instrumentais
econômicos para modelar as massas desorganizadas caso seus interesses fossem
fatalmente ameaçados; 4) os banqueiros, que possuem capital suficiente para fazer
com que o crédito circule, a economia se mova e que grandes investimentos sejam
feitos; 5) a consciência coletiva e a cultura geral e 6) a pequena burguesia e a classe
operária, no caso de o poder estatal impor o despojamento não só das liberdades
políticas, como também da liberdade pessoal desses sujeitos, o que fatalmente leva-
ria à quebra do poder político (Ibidem, p. 40-50).
Ao determinar esses fragmentos constitucionais, Lassalle pondera sobre a
existência da Constituição jurídica, que para ele nada mais seria que a formatação
desses fatores reais de poder sobre uma folha de papel e, nesse aspecto, “já não são
4
Essa última noção aponta para uma diferença singular do significado ontológico da Constituição. Enuncia
Lassalle que “porém, as coisas que possuem um fundamento não são como são por vontade própria,
podendo ser também de outra maneira, mas que são assim porque necessariamente tem de ser. O
fundamento a que respondem não lhes permite ser de outra maneira. Apenas as coisas carentes de um
fundamento que são as coisas casuais e fortuitas, podem ser como são ou de qualquer outra forma. O que
tem um fundamento não, pois aqui trabalha a lei da necessidade. Por exemplo, os planetas se movem de
determinado modo. Este deslocamento responde a causas, a fundamentos que o governam, ou não? Se não
houvesse tais fundamentos, seu deslocamento seria causal e poderia variar em qualquer instante, variaria
sempre. Mas, se realmente responde a fundamento, responde-se como pretendem os investigadores, à força
de atração do Sol, basta isso para que o movimento dos planetas esteja regido e governado de tal modo por
este fundamento, pela força de atração do Sol que não possa ser de outra forma, senão tal como é. Portanto,
a ideia de fundamento leva implícita a noção de uma necessidade ativa, de uma força eficaz que faz,
por lei de necessidade que o aprofunda-se sobre ela seja assim e não de outra forma” (Ibidem, p. 35-36
– grifo nosso). A analogia de Lassalle é feliz nesse ponto. A normatividade e a função da Constituição em
seus vários microcosmos, especialmente a Constituição Financeira, é algo inerente à própria ideia de
Constituição, pois não há Estado e, menos ainda, sociedade sem finanças públicas e todas as suas áreas
correlatas.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 331


Pedro Augusto Costa Gontijo / Flávio Couto Bernardes

simples fatores reais de poder, mas que se consolidaram em direito, em instituições


jurídicas e quem atenta contra eles atenta contra a lei e é castigado” (Ibidem, p.
51). Mas nesse caminho, quando se poderia dizer que uma Constituição em folha de
papel é boa ou perene? Para o teórico, isso somente ocorre quando a Constituição
escrita corresponda aos fatores reais de poder que regem determinado país, pois,
quando “lá onde a Constituição escrita não corresponde à real, estoura inevitavel-
mente um conflito que não há maneira de eludir e a longo prazo, cedo ou tarde, a
Constituição escrita, a folha de papel tem necessariamente que sucumbir diante do
impulso da Constituição real” (Ibidem, p. 77-78).
A abordagem lassalleana é um avanço em termos de Teoria da Constituição mas
deixa muito a desejar no que se refere à precisa separação entre direito e sociedade, entre
direito e poder político, que são matérias de análise das ciências sociais com forte imbri-
cação, mas ao mesmo tempo com conteúdo e autonomia precisamente distintas. Nesse
caminho, o fenômeno constitucional não pode ser visto somente a partir de uma correla-
ção de forças que possuem uma pretensa precedência social. A Constituição vai para
além disso. Ela fecha o sistema cognitivamente e, ao mesmo tempo, permite sua abertura
para o ambiente. Em suas referências setoriais, a partir da perspectiva de seus subsiste-
mas, sobressai o acoplamento realizado entre Direito e Economia e entre Direito e Políti-
ca, a partir da perspectiva da Constituição Financeira.
É no desenvolvimento da lógica de que o Estado é uma estrutura viva, dinâ-
mica, em contínua transformação e submetido às contingências, que paira a necessi-
dade de existência de normas constitucionais de natureza financeira. A Constituição
Financeira, para além de mera folha de papel5, assim como a própria Constituição,
se mostra como centro referencial para dar concretização à comunicação normativa
de índole constitucional. Há uma normatividade constitucional e, por derivação, da
Constituição Financeira, que não pode ser relegado a simples aspecto simbólico6.
2.2 Uma Visão Normativa da Constituição
Em famosa aula inaugural lecionada em 1959 na Universidade de Freiburg,
Konrad Hesse proferiu discurso que ficou marcado como uma das mais veementes defe-
sas da ideia de Constituição já realizadas. Basicamente, Hesse coloca as bases de funda-
mentação do conceito de Força Normativa da Constituição em contraposição à constitui-

5
Afasta-se, também aquelas concepções a respeito da Constituição Financeira como zona de encontro de
normas meramente programáticas, ou cujo conteúdo possuiria alguma espécie de confusão metodológica
com outros subsistemas constitucionais, como a Constituição Econômica e a Constituição Política.
6
Pensar de modo contrário a isso é estabelecer um paradoxo instransponível no patamar argumentativo sobre
a função e a normatividade da Constituição. Com base em Rudolf Sohm, Konrad Hesse salienta justamente
que negar a existência autônoma e nuclear da Constituição jurídica a partir de uma ascendência da
Constituição real significa a própria negação da Constituição, em outras palavras, “que o Direito
Constitucional está em contradição com a própria essência da Constituição” (1991, p. 11). O simbólico
também pode ser pensado no plano da efetividade dessas normas constitucionais que teriam essa pretensão
de alinhavar a conduta humana, mas em razão de forças externas ao próprio sistema do Direito não lograria
alcançar a autopoiese, transformando-se em um intrincado e tortuoso sistema comunicativo baseado na ideia
de alopoiese, como bem desenvolveu Marcelo Neves (2011).

332 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


A Função da Constituição Financeira

ção sociológico-política de Lassalle. O autor de Freiburg rechaça a concepção de que as


questões constitucionais sejam de natureza política, e não jurídica7, de modo que não
haveria, em sua análise, a possibilidade de identificar esse documento normativo como
mera folha de papel ou como a constituição real do país. Argumentar nessa base seria
desvirtuar o sentido de existência da Ciência do Direito, a partir da identificação da
Constituição como simples averiguação de elementos contidos no mundo do ser.
A argumentação de Hesse para verificar a hipótese de haver uma força determi-
nante única que revelasse a ideia de um dever constitucional se baseia em três premissas
iniciais: em primeiro lugar a pesquisa acerca da constatação de uma imbricação condicio-
nante entre as normas jurídicas constitucionais e a realidade político-social; em segundo
lugar, observar e considerar qual a fronteira que adstringe o alcance de atuação Consti-
tuição jurídica; em terceiro lugar, a investigação dos pressupostos de eficácia da Consti-
tuição (1991, p. 13).
No primeiro nível da exposição, vê-se que não há como cindir o viés de ordena-
ção – colocação de parâmetros para ação e para a interação, de base deontológica – do
viés da realidade social para a qual a Constituição jurídica aponta – de base ontológica.
A fragmentação entre realidade e campo normativo, entre ser (Sein) e dever ser
(Sollen) – especialmente defendida por alguns positivistas – não resolveria os proble-
mas epistemológicos a respeito da fundamentalidade da Constituição não só para o
Direito, como também para a sociedade. Nesse caminho, Hesse afirma que “a norma
constitucional não tem existência autônoma em face da realidade”, de maneira que
sua essência estaria alocada justamente na vigência, ou naquilo que o teórico chama de
“pretensão de eficácia”8 (1991, p. 14). Caso isso se configurasse de modo contrário,
haveria um vácuo normativo em relação à realidade, ou uma norma totalmente vazia
no que diz respeito ao referencial de regulação. Esse plano de interrelação entre
normatividade e realidade revela a pretensão de eficácia da Constituição, que é sempre
normatizar a sociedade e, em caminho contrário, ganhar sentido a partir da própria
sociedade. Apesar dessa interdependência, o viés normativo da Constituição deve ser

7
O Caráter jurídico da Constituição Financeira se ajusta à ideia de autopoiese do sistema do Direito,
autorreferencialidade e fechamento operativo. Somente é possível a existência da comunicação jurídica se
houver a existência de canais comunicativos eficazes e cuja decodificação dos códigos seja eficaz. Essa
zona de eficácia da comunicação jurídica determina a estruturação do sistema do Direito numa perspectiva
financeira, que permite que as instituições, conformadoras dos sistemas sociais, fluam seus papéis na
sociedade de forma estruturada. Isso tem um custo, e é nesse custo do estabelecimento da comunicação
normativa que se dá o foco do subsistema da Constituição Financeira. Obviamente que a abordagem de
Konrad Hesse perpassa uma lógica ontológica e deontológica do aspecto normativo, mas a ideia de que esse
sistema normativo tem vinculação própria e é autônomo em relação às influências dos demais sistemas
sociais, especialmente a Política, é um dos grandes ganhos evolutivos da Teoria da Constituição e que, em
alguma medida, pode ser lido através dos pressupostos teóricos da Teoria dos Sistemas, especialmente a de
base luhmanniana.
8
Assim, conclui o constitucionalista que “a força condicionante da realidade e a normatividade da
Constituição podem ser diferenciadas; elas não podem, todavia, ser definitivamente separadas ou
confundidas” (HESSE, 1991, p. 15).

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 333


Pedro Augusto Costa Gontijo / Flávio Couto Bernardes

determinante para sua identificação, porquanto não se pode relegar sua eficácia a ques-
tões contidas no mundo do ser, a depender de forças sociais e políticas9.
No segundo nível da argumentação, vê-se que o fenômeno constitucional deve
ser lido de acordo com um parâmetro, uma consideração não menos que reveladora de
sua estruturação no tempo, com base em uma dada realidade social, ou seja, o seu aspec-
to histórico. Diante disso, entender a Constituição como simples ferramenta de estrutura-
ção do Estado, de maneira abstrata e exclusivamente teórica nada mais reflete que uma
apreensão estéril desse fenômeno. Isso ocorre em razão de, em alguma medida, as coisas
já possuírem existência, sendo que a força vital da Constituição emana justamente dessa
consideração da própria realidade para a qual ela aponta, ou seja, a Norma Fundamental
não pode ser alheia à realidade sobre a qual se direciona10 (HESSE, 1991, p. 18). Esse
enunciado de correlação entre realidade e normatividade constitucional é denominado
como “princípio da necessidade”11. Mas esse princípio, por si só, não é capaz de revelar
o que seria a força normativa da Constituição. Segundo Hesse, a Constituição por si só
não realiza nada, mas pode impor tarefas, que na medida que são concretizadas acabam
por verterem-se em genuína força ativa, que movem a realidade. Essa força ativa se dá
quando os concretizadores da Constituição estão incutidos não só pela vontade de
poder (Wille zur Macht), como também pela vontade de Constituição (Wille zur
Verfassung)12 (1991, p. 19).
9
Conclui Hesse, nesse ponto, que “graças à pretensão de eficácia, a Constituição procura imprimir ordem e
conformação à realidade política e social. Determinada pela realidade social e, ao mesmo tempo,
determinante em relação a ela, não se pode definir como fundamental nem a pura normatividade, nem a
simples eficácia das condições sócio-políticas e econômicas. A força condicionante da realidade e a
normatividade da Constituição podem ser diferençadas; elas não podem, todavia, ser definitivamente
separadas ou confundidas” (1991, p. 15). Essa abordagem é de extrema relevância para debater a eficácia do
subsistema da Constituição Financeira. As normas de Direito Financeiro podem, com efeito, serem vistas
como meio para alcance de uma dada finalidade – isso se discute na busca pela própria natureza das normas
de direito positivo, qual seja hipotéticas. Contudo, a sua força normativa está para além da merca
conjugação de diretrizes políticas. As normas de Direito Financeiro estabelecem um dever, um quadro, um
cenário a ser realizado. Deve ser assim, e não de outra maneira. O fenômeno político é conjugado ao
fenômeno normativo, no momento da dinâmica jurídica, contudo não é o elemento validador, não é o
elemento que dá eficácia. A validade e a eficácia sobressaem da própria norma, em seu aspecto estruturante.
No bojo da teoria dos sistemas, alguns ajustes são necessários, contudo, a ideia permanece: comunicação
normativa depende da existência da confiança. Sem esta, não há normatividade.
10
Em decorrência disso, “se as leis culturais, sociais, políticas e econômicas imperantes são ignoradas pela
Constituição, carece ela do imprescindível germe de sua força vital. A disciplina normativa contrária a essas
leis não logra concretizar-se” (HESSE, 1991, p. 18).
11
Assim, a correspondência colocada em nível basal é traduzida de acordo com o liame que liga a hipótese
normativa e o mundo sobre o qual a Constituição incide em um contexto e tempo. Possibilita, assim, o
desenvolvimento e concretude à ordenação objetiva da natureza normológica sobre o substrato fático que a
realiza como força vital, como normatividade.
12
A partir dessa conclusão, Hesse aponta três vertentes diversas da origem da vontade de Constituição:
“Baseia-se na compreensão da necessidade e do valor de uma ordem normativa inquebrantável, que proteja
o Estado contra o arbítrio desmedido e disforme. Reside, igualmente, na compreensão de que essa ordem
constituída é mais do que uma ordem legitimada pelos fatos (e que, por isso, necessita de estar em constante
processo de legitimação). Assenta-se também na consciência de que, ao contrário do que se dá com uma lei
do pensamento, essa ordem não logra ser eficaz sem o concurso da vontade humana. Essa ordem adquire e
mantém sua vigência através de atos de vontade” (1991, p. 19-20).

334 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


A Função da Constituição Financeira

O terceiro ponto de elucidação se refere à consideração de que a força ativa


da Constituição tem como sustentação dois pressupostos fundamentais: um referente
ao conteúdo, e outro referente à práxis constitucional.
Em relação ao conteúdo da Constituição, Hesse propõe que este quanto mais
este “lograr corresponder à natureza singular do presente, tanto mais seguro há de
ser o desenvolvimento de sua força normativa” (1991, p. 20). Nesse particular, a
Constituição deve para além dos fatores sociais, políticos e econômicos preponde-
rantes, também incorporar “o estado espiritual (geistige Situation) de seu tempo”13.
A Constituição, a levar em consideração essa conformação, deve ter condições de
lidar com a contingência, ou seja, com a modificação dos fatores condicionantes do
estado espiritual do tempo em que foi constituída. Justamente por isso, Hesse ideali-
za que a Constituição, para ser duradoura e cumprir com seus pressupostos de eficá-
cia, deve conter as essenciais normatizações de natureza técnico-organizatória do
Estado e, deve “limitar-se, se possível, ao estabelecimento de alguns poucos princípios
fundamentais, cujo conteúdo específico, ainda que apresente características novas em
virtude das céleres mudanças na realidade sócio-política, mostre-se em condições de ser
desenvolvido”14 (1991, p. 21). A Constituição Financeira faz parte desse núcleo essencial
de natureza técnico-organizatória, não havendo como o Estado, a sociedade e o Direito
abrirem mão de uma normatividade mínima nesse campo, mesmo que de natureza estri-
tamente principiológica. Em relação à comunicação normativa, a Constituição Financeira
determina que o Estado e o poder político instituído ajam sempre no intuito de alcançar
as finalidades hipotéticas contidas na Constituição. A Constituição Financeira permite a
concretude, localizando-se sua funcionalidade na própria possibilidade de existência do
Direito e do Estado a partir de uma lógica financeira, do binômio ilícito/lícito influencia-
do pelos códigos de poder e ter.
Voltando-se ao raciocínio deontológico proposto por Hesse, sobre o viés da prá-
xis constitucional, o escritor apregoa que, para além do conteúdo, no sentido de que para
haver vontade de Constituição, todos os partícipes da vida constitucional devem partilhar
essa concepção, global ou singularmente (1991, p. 21). Nesse ponto, importante trans-
crever o sentido de práxis como uma ação paradoxal, que contém em si a fruição e a
cessão de direitos em prol da manutenção de garantia da própria Constituição. Citan-
do Walter Burckhardt,

13
A consequência disso seria “o apoio e a defesa da consciência geral”, visto que a Constituição incorporaria
um estado espiritual representativo de uma ordem adequada e justa (HESSE, 1991, p. 20). O grande
problema dessas considerações genéricas certamente é a dissociação com mudanças contingentes e
incontroláveis no nível das comunicações sociais, com grande penetração de visões falseadas da realidade, o
que quebra o raciocínio de existência de uma “consciência geral” realmente consciente. Essa distensão
acerca da adequada percepção dos fenômenos da realidade por parte dos atores que performatizam e
atualizam a força normativa da Constituição pode levar o sistema a um estado de anomia, com a total não
identificação de diretrizes essenciais para a conjugação de atividades comunicativas e de ações humanas.
14
Indica, então, o exemplo americano, ao afirmar em nota de rodapé que “o fato de a Constituição americana
estar assentada nesse princípio configura não a única, mas, certamente, a fonte essencial de sua
incomparável vitalidade” (1991, p. 21).

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 335


Pedro Augusto Costa Gontijo / Flávio Couto Bernardes

aquilo que é identificado como vontade da Constituição, ‘deve ser honestamente pre-
servado, mesmo que, para isso, tenhamos de renunciar a alguns benefícios, ou até a
algumas vantagens justas. Quem se mostra disposto a sacrificar um interesse em fa-
vor da preservação de um princípio constitucional, fortalece o respeito à Constitui-
ção e garante um bem da vida indispensável à essência do Estado, mormente ao Es-
tado democrático’. Aquele, que, ao contrário, não se dispõe a esse sacrifício, ‘malba-
rata, pouco a pouco, um capital que significa muito mais do que todas as vantagens
angariadas, e que, desperdiçado, não mais será recuperado’. (HESSE, 1991, p. 22).

O sistema de Direitos e Garantias Fundamentais, que compõem o núcleo das


normas constitucionais, é permanentemente interpretado e construído pela sociedade
ao longo da história. Isso significa que sua formação se dá numa ação diuturna de
sedimentação. A agregação gradual, muitas vezes lenta, depende de uma forte coe-
são social para alçar novos rumos e para a proteção de um direito materialmente
existente sob interpretações axiológicas em consonância com a forma de um direito
formalmente contido em sua deontologia, ou seja, traz em si sua natureza constituci-
onal. Entender essa necessidade temporal para que dadas conformações sociais e
realidades se transformem em garantias fundamentais é insubstituível e inarredável
se se quer construir uma sociedade onde o respeito e os valores democráticos sejam
a regra matriz do sistema. Mudanças bruscas, sem o devido preparo comunicativo e
sem o devido amadurecimento das instituições sociais muitas das vezes ameaçam
essas próprias garantias, de maneira a provocar reações que venham a mitigar muito
mais direitos do que aqueles pretensamente conquistados. Não se trata de posicio-
namento covarde em frente à realidade. É simplesmente a constatação das regras de
um jogo democrático, a não ser que o intérprete enviese a crítica por meio de um
pensamento unívoco ou revolucionário. Enquanto houver ordem democrática basea-
da em uma Constituição, as lutas sociais e os grupos de interesse devem estar em
constante atividade em seus próprios canais de participação, de maneira que as estru-
turas institucionais do Estado, no mais das vezes, sirvam sempre e exclusivamente
para corroborar e aperfeiçoar os direitos já conquistados. A marcha da razão deve se
operar nos fatores sociais de maior volatilidade, em sua própria estrutura dinâmica
comunicacional endógena, sob pena de a invasão de um código sobre o outro resul-
tar em perda substancial não somente da força normativa da Constituição, como
também na desfiguração do projeto de democracia e Estado de Direito. Por esse viés,
a práxis Constitucional apontada por Hesse exige atribuição de responsabilidades e a
especificações das funções sociais de cada uma das instituições comunicativas.
Só que, do ponto de vista da Constituição Financeira, a manutenção da pró-
pria normatividade constitucional exala um elemento importante acerca do liame
que une o Direito e a Economia: o princípio da escassez. Para que Direitos Funda-
mentais e o próprio Estado existam é necessário dinheiro, este, por natureza, um
bem escasso. Lidar com a escassez e transformá-la em elemento produtor de ordem
e prosperidade é um dos maiores desafios postos para a normatividade Constitucio-
nal. Esses elementos constitucionais diversos somente podem ser condensados e
concretizados a tomar por início a firmeza, coerência e retidão das normas e princí-
pios contidos no subsistema da Constituição Financeira.

336 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


A Função da Constituição Financeira

De mais a mais, e de acordo com a lógica de garantia da normatividade cons-


titucional, Hesse previne que a perniciosa prática de revisões constitucionais acaba
por gerar déficit de legitimidade e eficácia da Constituição. A cada reforma, o cons-
tituinte derivado mitiga a ideia de confiança da comunicação normativa que permeia
o extrato normativo sobre o qual se assenta a Constituição, de forma que sua vincu-
lação acaba sendo condicionada a forças episódicas. Esses fatores elevam a perda da
estabilidade, que “constitui condição fundamental da eficácia da Constituição”
(HESSE, 1991, p. 22). As revisões no campo da Constituição Financeira, quando
feitas sem a devida racionalidade e correspondência com a realidade social, podem
causar a desarticulação da natureza normativa imanente da Constituição, relativizando-a
em face de seus destinatários, descreditando-a de seu papel constitutivo. Perece o dado
básico da vida e da comunicação social, a confiança.
No âmbito de sua produção infraconstitucional também é importante a visão da
cogência dessa Força Normativa da Constituição em seu viés comunicativo, autorrefe-
rencial e autopoiético. As formas de manifestação do Direito Financeiro no âmbito infra-
constitucional – equalização de receitas e despesas, crédito público, dívida pública, pa-
trimônio público, etc. – devem se dar conforme máxima efetividade comunicativa da
Constituição em intrínseca correlação com a Constituição Financeira.
Por fim, dentro do pensamento de Hesse, pode-se dizer que a visão de práxis é
também salientada em relação à interpretação da Constituição. O autor dá relevo à neces-
sidade de correlação entre os fatos concretos e os fatores normativos, não se podendo
fazer tábula rasa dos primeiros. Nesse ponto, “uma mudança das relações fáticas pode –
ou deve – provocar mudanças na interpretação da Constituição” (HESSE, 1991, p. 23).
Contudo, adverte que o sentido do enunciado normativo traça uma demarcação delimita-
tiva da atuação hermenêutica, uma barreira às mutações normativas.
É essencial que, para o resguardo da força normativa da Constituição, a finalidade
da proposição constitucional não sejam modificadas em razão de contingências fáticas,
ou seja, de mudanças da situação15 (Ibidem). Essa situação há de ser verificada em
todos os subsistemas constitucionais, especialmente no que diz respeito ao subsiste-
ma financeiro.
Reconhecer a materialidade da Constituição Financeira, como núcleo da rea-
lidade constituinte, perpassa pelo respeito aos parâmetros primitivos e pelo máximo
cuidado nas modificações futuras. Sem essa metodologia de observação, a Consti-
tuição Financeira passa a ser figura retórica, desprovida de sua fundamentalidade.
Como subsistema autônomo, dotado de objeto, princípios e métodos próprios, a
figura da Constituição Financeira deve ser vista não somente como centro produtor
de normas de Direito Financeiro, mas também como fonte comunicativa que possi-
bilita a autopoiese do sistema do Direito como legítimo sistema social.

15
Expõe então que “se o sentido de uma proposição normativa não pode mais ser realizado, a revisão
constitucional afigura-se inevitável. Do contrário, ter-se-ia a supressão da tensão entre norma e realidade
com a supressão do próprio direito. Uma interpretação constitutiva é sempre possível e necessária dentro
desses limites. A dinâmica existente na interpretação construtiva constitui condição fundamental da força
normativa da Constituição e, por conseguinte, de sua estabilidade. Caso ela venha a faltar, tornar-se-á
inevitável, cedo ou tarde, a ruptura da situação jurídica vigente” (HESSE, 1991, p. 23).

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 337


Pedro Augusto Costa Gontijo / Flávio Couto Bernardes

A defesa do papel da função da Constituição Financeira estabelecida nesse


trabalho se dá justamente no sentido de observar a importância do corpo normativo
que, conforme se verá, possui peculiaridades estritas e basilares para a existência de
comunicação social em dado tempo e espaço. Sem a operacionalidade permitida pela
Constituição Financeira não há direitos, não há ordem e não há a mínima possibili-
dade de sedimentação de práticas sociais, ou seja, institucionalidade. A eficácia
substancial dos Direitos Fundamentais, o vigor da comunicação política e a dinâmi-
ca da comunicação econômica somente podem ser resguardadas a partir da preserva-
ção da força normativa da Constituição. Assim:

Se, também, em tempos difíceis, a Constituição lograr preservar a sua força normati-
va, então ela configura verdadeira força viva capaz de proteger a vida do Estado
contra as desmedidas investidas do arbítrio. Não é, portanto, em tempos tranquilos e
felizes que a Constituição normativa vê-se submetida à sua prova de força. Em ver-
dade, esta prova dá-se nas situações de emergência, nos tempos de necessidade
(HESSE, 1991, p. 25).

2.3 Uma visão doutrinária-culturológica da Constituição


Para além dos enfoques sociológico e normativo, a ciência do Direito Consti-
tucional conta também com uma abordagem da construção do conceito e da aplica-
ção da Constituição sob um aspecto doutrinário e culturológico. Para encerrar a
tríade de doutrinadores em matéria de definição do que é uma Constituição, exami-
na-se a obra do jurista alemão Peter Häberle, que nos trará importantes aportes para
a discussão da função da Constituição Financeira.
Em sua obra “Textos clássicos na vida das Constituições”, Häberle se propõe
a examinar o papel das obras clássicas sobre a interpretação dos textos constitucio-
nais e, um pouco mais além, a relação entre esses mesmos clássicos e o texto da
norma constitucional16. Clássicos, conforme o autor, geralmente se refere àqueles
autores de relevo, cuja importância os leva a serem invocados e referenciados per-
manentemente. Nesse sentido, propõe a busca sobre um “conceito material” de clás-
sico para realizar essa correlação entre o desenvolvimento teórico dado na história e
a normatividade da Constituição17.

16
Na análise de Niklas Luhmann sobre a dogmática, em sua obra Rechtssystem und Rechtsdogmatik, 1974,
pode-se observar que se interpretarmos os clássicos como aportes de dogmática sobre a argumentação
jurídica e sobre a possibilidade de revelação das faces mais densas dos conceitos jurídicos, eles são tomados
a partir da visão da inegabilidade dos pontos de partida: não há como haver construção da racionalidade
comunicativa própria à ciência do direito, à teoria do direito como um todo, sem que se recorra àqueles
trabalhos dogmáticos fundamentais, que funcionam como ponto de partida para a concepção e para a
formação de sentido do direito (LUHMANN apud LARENZ, 2012, p. 320).
17
Aponta, então, o autor, diversas indagações para fundamentar sua argumentação. “Um conceito material de
autor clássico exige um cânone de tradições garantidas, um consenso generalizado sobre o caráter modelar
(talvez também na dimensão pessoal), o caráter exemplar, proeminente, ultrativo [weiterwirkend], num
certo sentido “atemporal” [Zeitlose]. Para os “clássicos na vida das Constituições” deveríamos dispor
além disso de uma pretensão especificamente normativa com referência ao Estado constitucional. A
questão agudiza-se diante da vinculação à “lei e ao direito” ou à Constituição, esta enquanto “lei
suprema” (cf. Lei Fundamental, art. 20, § 3, art. 19, § 2, art. 79). Onde e como, graças a qual

338 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


A Função da Constituição Financeira

Dentre os inúmeros clássicos existente na história do constitucionalismo ociden-


tal, Häberle aponta para a existência de clássicos e de anticlássicos. A visão de um e de
outro dependerá do ponto a partir do qual se observa. Como exemplo de clássicos que
sustentam nossas visões acerca das constituições, pode-se colocar as visões de Locke,
Montesquieu, Burke, Mill e Tocqueville, sendo seus antípodas Rousseau e Hobbes.
Esses clássicos, de forma inegável, podem ser encarados como verdadeiras lupas, que
desvelam os conceitos que permeiam a formação do Estado e de suas respectivas insti-
tuições e fórmulas funcionais18. Alguns clássicos em matéria do significado da Consti-
tuição e sua relação com sociedade e Estado são explicitados por Häberle:

Esse breve panorama permite identificar elementos “clássicos” do Estado Democrá-


tico de Direito. A Lei Fundamental representa a constituição da sociedade política
organizada [politisches Gemeinwesen], mais especificamente, do Estado e da socie-
dade com a dignidade da pessoa como “premissa”; ela é a “restrição e racionaliza-
ção do poder político” (assim Horst Ehmke) e, como se deve acrescentar na minha
opinião, a restrição do poder social – por isso, a divisão dos poderes estatais se am-
plia na direção do âmbito social. A Constituição é a ordem jurídica fundamental do
Estado (assim Werner Kägi) e da sociedade. Ela é, no sentido da expressão de Ru-
dolf Smend, “sugestão e barreira” [Anregung und Schranke], mas, conforme penso,
também um processo público. (HÄBERLE, 2016, p. 54-55).

Em seu enfoque culturológico, Häberle associa a formação do conceito de


“clássico” à própria comunidade de recepção. Para esse autor, uma das faces que
representam a identificação de um clássico está justamente na possibilidade de um
observador constatar a presença de formação de consenso sobre uma dada obra se-
minal, que, avaliada em dado lapso temporal, acabam por transmudar “enunciados
materiais em símbolos comunitários”19 (HÄBERLE, 2016, p. 93). Contudo, o autor

legitimação e dentro de quais limites, essa vinculação juspositiva deixa espaço para os textos
clássicos? Será que os textos clássicos podem produzir no Estado Constitucional um efeito
comparável ao de “fontes jurídicas”? Qual é a sua legitimação democrática? O que nos legitima a
aduzi-los subsidiariamente “à Lei Fundamental”? Talvez o fato de a Lei Fundamental pertencer ao
tipo “Estado constitucional”? Para quem os clássicos são clássicos?” (HÄBERLE, 2016, p. 49).
18
Obviamente que a referência a textos clássicos em aspecto normativo deve ser vista cum granum salis. As
figuras institucionais e conceituais erigidas pela modernidade ocidental são variáveis de cultura para cultura
e não podem ser simplesmente transpostas de um lado para o outro. São fórmulas aptas a realizarem
diagnósticos e prognósticos em relação a um objeto de verificação empírica e conceitual, mas devem levar
em consideração as próprias modificações contidas nas realidades estritas das conformações sociais que
vivenciam esses mesmos conceitos. Como bem coloca Häberle, “Em duas palavras, tudo indica que a
cautela é recomendável quando lidamos com clássicos. Também aqui estamos ameaçados por posições
unilaterais. Textos clássicos, muitas das vezes apenas remetem a problemas; são, portanto, mais indicação
do que solução de um problema. Variam com relação à cultura específica, possuem uma história distinta de
efeitos e interpretações. Não raras vezes estão “em oposição” uns aos outros: pensemos no entendimento de
democracia na Lei Fundamental alemã, mais comprometida com Montesquieu do que com Rousseau, ao
passo que o momento plebiscitário está mais elaborado nas Constituições estaduais” (HÄBERLE, 2016, p.
51-52).
19
Assim, conclui Häberle quanto a esse ponto no sentido de abordar que “a tematização de um clássico, isto é,
de um consenso comunitário pode ser diretamente relevante para a ação ou também para a posição (do

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 339


Pedro Augusto Costa Gontijo / Flávio Couto Bernardes

declara que a ênfase no conceito de clássico não é suficiente para explicar a importân-
cia dos clássicos para a vida das Constituições20. Para elaborar um conceito material
sobre o que seriam os clássicos, o teórico parte da argumentação de que “por um lado,
os clássicos são respaldados pelas suas comunidades; por outro, a comunidade, assim
como também o clássico, está posicionada em determinada realidade social” (Ibidem,
p. 95). Derivado disso, diz-se que os clássicos em alguma medida realizaram padrões
de justificação aptos a integrarem uma resposta convincente aos problemas de sua
época, sendo que, mesmo após o tempo em que esses clássicos foram gestados, alguns
desses problemas podem persistir, a tornar a referência aos clássicos apenas uma ponte
de integração entre uma forma de estruturação e a necessidade de trabalhar numa
mesma direção para a solução daqueles problemas21 (Ibidem).
Mas como se dá essa dinâmica de vinculação dos clássicos a partir de um ponto
de vista culturológico? Primeiramente, Häberle ressalta que o enfoque jurídico strictiore
sensu não consegue realizar a fundamentação dos textos de autores clássicos. Por esse
motivo, o texto clássico não pode servir como fonte formal do direito, porquanto não tem
legitimidade democrática e nem pretensão normativa, o que o afasta das normas consti-
tucionais e da legislação infraconstitucional (2016, p. 97). Mas, visto que há uma vigên-
cia cultural inegável dos textos clássicos em relação à concepção e à prática constitucio-
nal, o teórico se propõe a investigar, numa concepção latiore sensu, como essa vigência
cultural pode ser compatível com o próprio direito positivo (2016, p. 107). Nesse ponto,
Häberle afirma que os clássicos são textos constitucionais em um outro sentido, ou seja,
inclui-se metodologicamente à interpretação os intérpretes em sentido lato, ou seja, os
cidadãos, conforme sua famosa defesa proferida no livro “A sociedade aberta dos
intérpretes da Constituição”22, aspecto material dessa vinculatividade (Ibidem).
Diante dessa argumentação, o teórico coloca em relevo:

indivíduo que tematiza em relação à sua comunidade), o que depende tanto da ação em questão quanto do
sistema normativo específico da comunidade” (2016, p. 93).
20
“Apesar da ênfase na ideia do clássico, esta não é suficiente. No autor clássico, na dimensão clássica deve
haver algo mais do que apenas a recepção formal, a saber, algo material, objetivo, pois do contrário toda e
qualquer pessoa poderia tornar-se um clássico, desde que encontrasse a correspondente comunidade de
receptores” (HÄBERLE, 2016, p. 94).
21
Karl Larenz, ao examinar a teoria dogmática de Niklas Luhmann, ensina que para o sociólogo a dogmática
não teria um sentido consistente “em fixar o que está simplesmente estabelecido, mas em possibilitar a
distância crítica, em organizar estratos de reflexões, de motivos, de ponderações, de proporção, meios
pelos quais o material jurídico é controlado para além do que é imediatamente dado e é preparado para a
sua utilização” (LARENZ, 2012, p. 321). Nesse ponto argumentativo, Häberle e Luhmann se entrelaçam,
porquanto a atividade vinculante dos clássicos serve, em última medida, para cumprir papel reflexivo sobre
o fenômeno jurídico em sua inteireza, o que possibilita a crítica refinada, argumentativa e, sobretudo,
preocupada em desvelar a melhor solução para dado problema que é posto diante, por exemplo, da
efetivação da Constituição Financeira.
22
Argumenta, então, que “a ampliação – e o aprofundamento – da Constituição enquanto objeto de
interpretação agora se dá em termos materiais, transcendendo o texto da Constituição escrita na direção da
dimensão profunda espaço-temporal da história e cultura constitucionais. Num sentido exigente, textos de
clássicos são “textos constituintes” – talvez num sentido distinto da palavra escrita da Constituição, mas
decerto com uma pretensão e eficácia nada menores” (HÄBERLE, 2016, p. 107-108).

340 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


A Função da Constituição Financeira

Quanto aos detalhes: textos de clássicos são parte tão integrante da interpretação
possível da Constituição que eles devem ser considerados textos constitucionais latio-
re sensu. Não são apenas recurso, mas objeto da interpretação. Inserem o texto cons-
titucional escrito no pertinente nexo cultural e de tradições. Assim vistos, os textos
dos clássicos não são apenas um conglomerado, mas “materiais” para a Lei Funda-
mental. (...) Resumindo: textos de normas bem como textos literários formam um
conjunto – cultural –, que perfaz a “verdadeira” Constituição de um país apenas se
considerados na íntegra. Diga-se, de passagem, que a rememoração dos textos fun-
damentais do Estado constitucional não é um fim em si mesmo. O retorno sempre ser-
ve ao avanço. (HÄBERLE, 2016, p. 108-110).

Häberle ressalta ainda que a validade material dos textos clássicos não está
envolta a uma sanção, mas a um respaldo à própria normatividade da Constituição
(2016, p. 111). Essa volta aos textos clássicos, do ponto de vista de sua vinculação
material, não limita a interpretação de maneira anacrônica, não coloca limites para
uma atualização futura de sua própria concepção. Isso porque para o autor, tanto os
textos clássicos, como os textos constitucionais positivados, são produtos culturais, sen-
do que muitas das vezes os textos clássicos possuem uma força normativa muito maior
que a dos próprios textos constitucionais. A tomar essa ideias, conjuga-se não somente a
força normativa dos clássicos, como também a força normativa da sociedade aberta dos
intérpretes da Constituição, ou seja, a atuação conjunta desses dois fatores amplia e po-
tencializa a apreensão do que é a “Constituição real”23 (2016, p. 115-116). Essa seleção
dos clássicos também é feita de maneira pormenorizada e levando em consideração que
a consulta aos clássicos é, ao mesmo tempo, fundamentada pela Constituição positiva e
pela situação atual do problema. Esses dois fatores atuarão, segundo Häberle, de maneira
seletiva na atividade de referência aos clássicos, de maneira que a utilização destes se dá
conforme critério de exclusão, pois, segundo o teórico, “onde tudo é possível, nada
vale”24 (2016, p. 120). Assim, há que se ter em mente algumas limitações dessa
forma de lidar com os clássicos, pois

23
Já prevendo futuros questionamentos, Häberle argumenta que “uma objeção possível poderia ser a tese de
que o texto da norma fundamental seria relativizado [mediatisiert] indevidamente por inserções gratuitas,
que a “vontade” do constituinte seria ignorada, que a “vinculação do juiz à lei e ao direito” seria colocada
em xeque. Ocorre que uma das descobertas das teorias da interpretação afirma que a interpretação não é
nem pode ser efetuada “em e para si”, apenas em contraposição ao texto “nu”. Reconhece-se um entorno
como “pré-compreensão” na “escolha do método”, a realidade social etc., ao menos enquanto “auxílios de
interpretação”. Na perspectiva aqui desenvolvida, esse entorno cultural é visto mais honestamente como
objeto da interpretação; por outro lado, é complementado pelos textos dos clássicos, que, no entanto,
carreiam da sua parte um “entorno” cultural adicional. O enriquecimento material da interpretação pelos
textos clássicos é uma mera continuação dos caminhos e procedimentos até agora percorridos (2016, p. 118-
119). Atenta-se, então, para o fato de que o “os clássicos nos abrem a possibilidade de relativizar a nossa
posição, por meio da consideração de entendimentos que, à primeira vista, são “anacrônicos”“ (Ibidem, p.
123).
24
Conclui que “tal fundamentação do trabalho com clássicos bem determinados pressupõe a teoria material
aqui esquematizada dos clássicos no Estado constitucional” (2016, p. 120).

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 341


Pedro Augusto Costa Gontijo / Flávio Couto Bernardes

A confiança na autoridade (material) dos enunciados dos clássicos deve ser limitada,
– pois também os clássicos foram apenas homens falíveis;
– pois sempre é possível aduzir posições alternativas de autores clássicos;
– pois as explanações dos clássicos sempre foram condicionadas historicamente, o que
sempre é também sinônimo de limitação e unilateralidade (HÄBERLE, 2016, p. 122).

Ao final, Häberle reserva três níveis de argumentação para instrumentalizar


sua defesa da vantagem do retorno aos clássicos. Em primeiro nível, os clássicos
sedimentam na teoria política e do Estado constitucional os elementos propedêuticos
de suas respectivas compreensões. Para bem além disso, argumenta que algumas
controvérsias constitucionais somente podem ser solucionadas e devidamente com-
preendidas por meio do conhecimento aprofundado de teorias clássicas. Por fim, o
terceiro viés se apresenta na função de crítica da ideologia proporcionada pelos
clássicos. Esse argumento leva em conta que essas espécies textuais seriam capazes
de prover os critérios relativos à cultura jurídica e política que de modo algum po-
dem ser perdidos. Finalizando sua obra, conclui que:

Textos clássicos formulam exigências ao Estado constitucional, que podem despertar


– e efetivamente despertam – uma “má consciência”, mas também uma “boa consci-
ência” nos cidadãos e seus representantes. Não é por acaso que somente determina-
dos Estados proíbem ou mesmo queimam textos clássicos (de Freud a Marx) – a sa-
ber, aqueles que não querem ou não podem enfrentar a discussão aberta dos critérios
dos clássicos. O estudo dos textos clássicos é, pois, a conscientização das exigências
imperdíveis ao nosso Estado constitucional – uma tarefa permanente para todos nós
(HÄBERLE, 2016, p. 128).

A ideia dos clássicos vinculados à própria realidade interpretativa e comuni-


cativa da Constituição é um fato. Não se pode desvencilhar disso. Já sua correlação
com a normatividade intrínseca ao fenômeno constitucional certamente pode ser
criticada. Entretanto, sobressai da análise realizada por Häberle a utilidade e a im-
portância que os textos clássicos têm no que diz respeito ao descobrimento do con-
teúdo, da ideia, que perpassa a razão de ser das próprias normas constitucionais, e
também no que se refere ao conhecimento dos limites imanentes à confluência polí-
tica e jurídica cristalizada na Constituição.
Mas qual a vantagem dessa abordagem para o desenvolvimento teórico acer-
ca da função da Constituição Financeira? Primeiramente atestar que este microssis-
tema normativo está em constante evolução. Certamente os textos clássicos de Direi-
to Financeiro – que remontam teóricos da ordem de Paul Leroy Baulieu, Vito Bom-
pani, Fernando Sainz de Bujanda, François Deruel, Luiz María Drago, Benvenuto
Griziotti, Louis Trotab e os grandes teóricos do Estado – permitem o conhecimento
dos institutos e seu aperfeiçoamento no tempo, mas não bastam. Em segundo lugar,
o conhecimento dos clássicos permite avaliar a lógica científica de construção do
Direito Financeiro e, a partir disso, como a Constituição Financeira se erige como o
ponto de encontro entre o Direito, a Economia, a Política e a Sociedade. É dentro da
lógica de busca dos textos clássicos que se insere um novo patamar daquilo que é

342 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


A Função da Constituição Financeira

argumentado como comunicação normativa, a partir da perspectiva da Teoria dos


Sistemas. Estes fragmentos doutrinários têm a função de não somente filtrar a inter-
pretação normativa, a partir de uma lógica autopoiética, como também possibilitam
o maior adensamento e precisão dos institutos relativos ao subsistema da Constitui-
ção Financeira, como se passa a argumentar.

3 A CONSTITUIÇÃO FINANCEIRA E A SEDIMENTAÇÃO DAS


PRÁTICAS SOCIAIS A PARTIR DA FUNCIONALIDADE COMPLEXA
Os três clássicos apresentados no capítulo anterior possuem uma função redu-
tora para nossa argumentação. A um só tempo, estabelecem inúmeras distinções
sobre o que seria a Constituição e os efeitos da Constituição sobre os sistemas soci-
ais. Além disso, amoldam aquelas características básicas do fenômeno constitucional
moderno, quais sejam a existência de um corpo normativo positivado (com maior ou
menor valor para o sistema), e sua realização enquanto norma jurídica. Obviamente há
outros clássicos de grande relevância, para além dos já citados. Contudo, parece que
esses três trazem os aportes principais de uma abordagem preliminar e elementar sobre o
presente propósito: a visão sociológica estrita, a visão normativa e a visão doutriná-
ria/culturológica. Esse é o ponto de partida para enxergar a delimitação funcional daquilo
que denominamos de Constituição Financeira, numa visão sistêmica.
A perspectiva que passamos a adotar para o estudo do sistema do Direito vai para
além das idiossincrasias dessas inúmeras abordagens e formas de observação. Em que
pese os fenômenos normativos (em sentido estrito, pela mera abordagem da antítese
existente entre ser e dever ser) serem de grande importância na tradição teórica ociden-
tal, bem como aquelas abordagens ligadas a vieses axiológicos diversos, iniciamos
numa análise encerrada pela teoria dos sistemas que se dá conforme a distinção entre
sistema e ambiente, nos moldes da teoria de Niklas Luhmann (2016, p. 54-55). Sis-
tema, conforme Luhmann, é a diferença da diferença entre sistema e o meio. (2009,
p. 81). A diferenciação existente entre o sistema e o meio não é colocada de maneira
estática, pelo contrário, observar-se que há algum nível considerável de interação
entre ambos, dentro do espectro conceitual de acoplamentos estruturais25. Nesse

25
Da interrelação entre os conceitos de fechamento operativo, autopoiese, autorreferência e unidade sistêmica,
sobressai a necessidade de estudo dos acoplamentos estruturais. Dentro desse nível argumentativo, em
relação ao Direito, Luhmann disserta: “‘quanto maior a ênfase da teoria dos sistemas no fechamento
operativo de sistemas autopoiéticos, é de modo mais urgente que se coloca a questão de como as relações
entre o sistema e o seu ambiente se formam sob essa condição, pois nem a realidade, nem a relevância
causal do ambiente são negados (se assim não fosse, não se poderia falar em diferença, diferenciação etc.).
Fechamento operativo significa tão somente que a autopoiese do sistema pode ser executada unicamente
com suas próprias operações e que a unidade do sistema pode ser reproduzida somente com as operações do
próprio sistema, e, no sentido inverso, o sistema não pode operar em seu ambiente; portanto, não pode se
ligar a seu ambiente usando as próprias operações do sistema. A vantagem teórica desse ponto de partida é
que ele demanda um montante de precisão tão atípico quanto não desenvolvido em proposições acerca das
“relações entre sistema e ambiente”. A resposta a essa demanda encontra no conceito de ‘acoplamento
estrutural’” (2016, p. 589-590). A Constituição Financeira, com efeito, se amolda a um subsistema do
sistema Constitucional. Ela funciona, a partir de uma centralização do fenômeno pelo observador de
segunda ordem, como o acoplamento estrutural existente entre o Direito e a Economia, numa lógica inserida

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 343


Pedro Augusto Costa Gontijo / Flávio Couto Bernardes

sentido, a proposta da teoria dos sistemas vai para além do estudo da estrutura pro-
priamente dita26 (corpo normativo positivado), e se centra na operação básica do
sistema, qual seja a comunicação, no caso do Direito comunicação normativa. Essa
mudança do foco epistemológico do observador de segunda ordem27 propicia a veri-
ficação da relevância da operação sistêmica em relação à própria estrutura dentro
daquilo que se poderia considerar como unidade, que passa a ser enfrentada no âm-
bito da teoria dos sistemas como a diferença entre um e o outro lado da forma, ou
seja, aquilo que está operativamente vinculado ao sistema do Direito e o que perten-
ce aos sistemas que formam o ambiente.
No contexto epistemológico da teoria dos sistemas, não há como se confun-
dir, como o faz Lassale, o fenômeno da política (Constituição Real) e o fenômeno
normativo (Constituição como folha de papel). Em nossa abordagem, a Constituição
integra a unidade do sistema do Direito, servindo-se como a força central, que con-
centra as zonas de irritabilidade recíproca e contínua entre os sistemas da Política e
do Direito, com influxo sobre o sistema da Economia. Essa figura do acoplamento
constitucional surge, conforme Luhmann, a partir da ideia de que o Estado é a figura
que absorve essa tensão entre os dois sistemas em sua institucionalidade, especifi-
camente no âmbito da Constituição (2016, p. 630-631), o que torna possível os pró-
ximos passos para a evolução dos próprios sistemas sociais28. A sedimentação de
práticas sociais, que nada mais é que o processo de institucionalização plurilocaliza-

no regime jurídico de Direito Público. Ela possui uma operação própria: comunicação normativa. Contudo,
opera diante da equalização entre a pretensão da comunicação normativa, da comunicação econômica e da
comunicação política.
26
É no nível das estruturas que a teoria do direito se moveu para analisar o sistema jurídico. A positividade do
direito aponta para o nível das expectativas normativas, que se cristalizam no nível da programação do
sistema, que por sua vez se traduz em operação, ponto redutor de identificação da autopoiese.
27
O observador de segunda ordem, nesse momento, é considerado como sistema autopoiético próprio,
heterorreferencial, que realiza suas observações a partir da dissecação do fenômeno jurídico em sua
operação básica de primeira ordem. Esse diferencial permite a superação do ponto cego da observação, vez
que o observador de primeira ordem se delimita como operação autorreferencial, ou seja, do próprio
sistema. O ganho evolutivo da consideração do observador de segunda ordem é que ele consegue ver o
sistema de cima, para além do observador de primeira ordem. Este, ao realizar a operação normativa,
cindindo aquilo que considera, ou não, formador de sentido para o sistema, seleciona. O observador de
segunda ordem vê o todo, consegue concatenar o sentido global do sistema, podendo ser encarado numa
perspectiva autorreferencial (quando o sistema observa a si mesmo), ou heterorreferencial (quando um
sistema presente no ambiente passa a observar um sistema adverso de si). Assim, pode-se enfrentar o
fenômeno da Constituição Financeira e sua funcionalidade a partir de uma dupla perspectiva. Para maior
aprofundamento sobre o conceito de observador de primeira ordem e observador de segunda ordem, ver
Niklas Luhmann (2009, p. 152 e s.; 2016, p. 35; 2016a, p. 25, 56, e 547 e s.); Gunther Teubner, 1989, p. 155
e s.; Costa Gontijo, 2018, p. 107 e s; Marcelo Neves (2009, 2011 e 2012).
28
Dessa maneira, Luhmann salienta que “essa forma de acoplamento mediante o Estado constitucional torna
possível, em ambos os lados, para o sistema político e o jurídico, a realização de graus de liberdade
superiores, assim como uma notável aceleração da dinâmica própria de cada um desses sistemas” (2016, p.
631). Pode-se dizer que a coevolução é o resultado prático da formação dos acoplamentos estruturais.
Significa que um sistema, por mais que tenha em sua composição fundamental o conceito de autopoiese,
realiza sua evolução gradualmente e, em alguma medida, a partir da coevolução dos próprios sistemas que
estão adjacentes, lhe irritando.

344 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


A Função da Constituição Financeira

do do Estado Constitucional, é a tônica do fenômeno que levou a civilização ociden-


tal a positivar a Constituição e conformar uma nova forma de Estado:

As Constituições são conquistas reais (em contraste com meros textos), por um lado,
ao restringir as influências recíprocas entre direito e política aos canais proporcio-
nados pela constituição de um Estado e, por outro lado, nas crescentes possibilidades
no contexto desses acoplamentos. Pode-se ver, não obstante, que outras possibilida-
des são efetivamente excluídas com esse tipo de acoplamento, significando, por
exemplo, a exploração de posições jurídicas no sistema econômico (riqueza, controle
de opções politicamente importantes) a fim de alcançar o poder político, ou o terro-
rismo político, ou a corrupção política. À medida que o sistema político, por um lado,
e o sistema jurídico, por outro, encontram-se vinculados pelo poder “privado” da
pressão, do terror e da corrupção, nem um, nem outro sistema, se é que é possível
distingui-los, chega a adquirir grau elevado de complexidade. Por meio de Constitui-
ções, chega-se então, em razão da limitação das zonas de contato de ambas as partes,
a um enorme incremento de irritabilidade recíproca – maiores possibilidades, por
parte do sistema jurídico, de registrar decisões políticas em forma jurídica, mesmo
havendo mais possibilidades de a política se valer do direito para implementar seus
objetivos (LUHMANN, 2016, 631-632).

Mas o que seria a Constituição financeira? E sua visão sob o viés da Teoria
dos Sistemas? A partir de uma perspectiva doutrinária, deslocada do marco teórico
da Teoria dos Sistemas, a Constituição Financeira possui vários enfoques. Heleno
Taveira Torres, por exemplo, aborda o papel estruturante das contas públicas, dos
princípios democráticos e republicanos, a efetividade dos direitos sociais, a base de
sustentação do federalismo, a efetivação de ações de fomento estatal, realização de
programas e políticas públicas, além de importantes mecanismos de controle interno
e externo da atividade financeira do Estado (TORRES, 2014)29. Na orientação da

29
Buscar essa referência sobre o que seja a Constituição Financeira é, em certo modo, perscrutar sobre a
própria definição do Direito Financeiro. Autores importantes como Régis Fernandes de Oliveira
estabelecem que o Direito Financeiro consiste em “o conjunto de princípios e regras que dispõe sobre a
arrecadação de receitas não tributárias, coloca-as no orçamento, estabelece despesas, realiza-as, controla-
as por seus órgãos e instrumentos de controle, administra receitas e despesas, distribui-as entre os diversos
entes federativos, exige responsabilidade na aplicação dos recursos e impõe sanções às infrações
cometidas” (OLIVEIRA, 2014, p. 183-184). Além disso, o doutrinador segmenta o fenômeno do Direito
Financeiro, e teoriza que este não trata dos seguintes objetos: “Em sendo assim, pode-se fazer a exclusão do
que não está afeto ao Direito Financeiro: a) os tributos; b) o câmbio; c) a moeda; e d) o sistema bancário”
(Ibidem, p. 179). Por outro lado, considera que somente está incluído no estudo do Direito Financeiro: “a)
as receitas não tributárias; b) as despesas; c) o orçamento; d) o controle orçamentário que engloba os
Tribunais de Contas; e) a dívida pública; e f) a responsabilidade fiscal” (Ibidem). Além disso, o autor
aponta que não haveria como se indicar um conjunto de princípios próprios ao Direito Financeiro (Ibidem,
p. 226). Essa concepção acerca desse ramo da dogmática jurídica somente pode ser sustentada a partir de
uma visão parcial do fenômeno financeiro dentro da lógica do Estado e do Direito. Primeiramente, há uma
contradição explícita em sua argumentação, a partir do momento em que diz que o Direito Financeiro é um
“conjunto de princípios e regras (...)”, para, logo após, negar a existência de princípios próprios ao Direito
Financeiro. Em segundo lugar, no que diz respeito ao objeto de estudo, fala-se que o orçamento é objeto do
Direito Financeiro, mas os tributos e respectivas receitas tributárias não. Como se poderia cingir o estudo do
orçamento sem o devido estudo da composição de receitas derivadas do Estado? Aliás, essa formatação

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 345


Pedro Augusto Costa Gontijo / Flávio Couto Bernardes

presente pesquisa, a Constituição Financeira encarna a sedimentação de práticas


sociais no bojo da Constituição, ou seja, institucionalização. É uma segmentação
funcional da comunicação normativa, que compõe o cerne da estrutura da Constitui-
ção. A institucionalização desse subsistema da dogmática constitucional tem como
pressuposto a ideia de que a Constituição, do ponto de vista de suas normas que
predefinem Direitos e Garantias Fundamentais e da matriz estruturante do Estado,
nada realiza. Não há direitos e Estado sem atividade financeira, concretizada medi-
ante comunicação normativa. Há que se conjugar, funcionalmente, a partir da estru-
tura, a possibilidade de concatenação mútua – possibilitada pela lógica de acopla-
mentos estruturais – entre os códigos comunicativos normativos, políticos e, em via
de consequência, econômicos. Essa conjugação atingida no nível da institucionaliza-
ção advém de lenta e constante evolução. Sem a análise financeira, poder-se-ia falar,
com efeito, na Constituição como folha de papel. Mas a Constituição Financeira
permite a existência de uma força motriz, fonte viva de garantia da eficácia das
normas constitucionais em todos os seus vieses de manifestações setoriais. É na
Constituição Financeira que se encontra a possibilidade de equacionar o poder esta-
tal, como bem coloca Juan Vogel, na análise da Constituição Financeira alemã:

A Constituição financeira, quer dizer, a regulação constitucional do poder financeiro,


dos orçamentos, do regime fiscal e da designação de receitas e despesas constitui-se
como um dos núcleos de toda a ordem federal, a par de ser um indicador inequívoco
da distribuição real do poder e da influência entre o Estado global e dos Estados
membros (Vogel in BENDA et al, 1994, p. 665 – tradução livre).

Como se chega à ideia de que a Constituição financeira, em verdade, se reali-


za autopoieticamente a partir de sua evolução funcional inserida no contexto comu-
nicativo de sistemas sociais? A resposta é complexa. Mas, ao mesmo tempo, toma
forma a partir das reflexões emanadas pelos grandes teóricos do Direito Constitucio-
nal, tais como Lassale, Hesse e Häberle, quando lidos sob a óptica da Teoria dos
Sistemas. Em primeiro lugar, sobressai a necessidade de se inserir a lógica binária
poder/não poder da comunicação política dentro da análise constitucional, mas não
com a submissão da Constituição à política. É por meio da Constituição Financeira
que o Estado ganha os contornos de seu poder efetivo, e é também no âmbito desse
subsistema constitucional que há possibilidade de limitação do próprio poder do
Estado e de suas coletividades locais. A Constituição brasileira de 1988, por exem-
plo, instaurou o princípio do federalismo cooperativo no âmbito da Constituição
Financeira: por meio de repasses constitucionais, há a implementação da descentra-

teórica tem como consequência a mitigação da própria autonomia e da operacionalidade do sistema


financeiro Estatal. Não se poderia, se essas fossem as bases epistemológicas da ciência do Direito
Financeiro, sequer falar em Constituição Financeira. Não é o caso da abordagem ora realizada,
especialmente numa construção teórica afeta à Teoria dos Sistemas. Nesse aspecto, a presente abordagem
leva em considerações autores como Villegas, para quem “El derecho financiero es el conjunto de normas
jurídicas que regulan la actividad financiera del Estado” (1995, p. 119), sendo que todos os elementos que
compõem efetivamente a realidade financeira do Estado estariam dentro do campo de estudo do Direito
Financeiro.

346 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


A Função da Constituição Financeira

lização do Poder Político a partir da implementação de autonomização do Poder


Financeiro. Em segundo ponto, a análise da Teoria dos Sistemas, dentro do espectro
teórico realizado por Niklas Luhmann, sobre a Constituição financeira se dá con-
forme a lógica da comunicação normativa, aqui devidamente adaptada para a teori-
zação desse marco utilizado30. A comunicação normativa na matriz da Constituição
Financeira deve se dar no viés da comunicação sincera31 e da confiança, em que seu
contorno operativo é delimitado pelo código binário identificado lícito/ilícito. Nesse
ponto, a questão sai da análise de “vontade de Constituição” para a ideia de que a
comunicação deve se estabelecer a partir de uma correlação entre emissor/receptor
que garanta a proteção da própria comunicação sob o viés da autopoiese. Em uma
visão sistêmica, a evolução funcional da Constituição Financeira somente é possível
graças ao papel da dogmática, dos clássicos. Luhmann advogava a tese da inegabili-
dade dos pontos de partida, de modo que alguma coisa sempre tem um princípio, e o
princípio para se construir conceitos e institutos jurídicos vem de suas próprias teo-

30
Como bem disserta Kolja Möller, “Niklas Luhmann não era um crítico do direito e sempre contrariou as
tentativas de abrir normativamente sua teoria jurídica (Luhmann, 1985). Recentemente surgiu, contudo, um
amplo espectro de discussão que trabalha no sentido de tornar as reflexões de Luhmann frutíferas para uma
crítica jurídica” (MÖLLER, 2015, p. 129). Essa problemática sobre a concepção do fenômeno jurídico
dentro da Teoria dos sistemas de Luhmann unicamente sob o viés da comunicação é assim exposta por
Luhmann, quando se contrapõe às teorias positivistas e jusnaturalistas: “Ao contrário de muitos juristas, por
“sistemas” não entendemos uma interconexão de determinadas regras, mas uma interconexão de operações
factuais, que, como ações de comunicação operacionais, devem ser comunicações, independentemente do
que essas comunicações afirmem com respeito ao direito. Ora, isso significa: não buscamos o ponto de
partida nem na norma, nem na tipologia dos valores, mas na distinção entre sistema e ambiente”
(LUHMANN, 2016, p. 54-55). A questão para Luhmann é superar a análise unicamente da estrutura
(normativa, axiológica), para poder partir a análise do Direito por meio de sua operação, qual seja
comunicação. Contudo, comunicação somente pode existir a partir do acoplamento estrutural realizado
entre a linguagem e a consciência. Se isso não existe, não há comunicação. E a linguagem do Direito é
linguagem normativa, de modo que passamos a designar, sem demais aprofundamentos teóricos, que serão
feitos em trabalhos ulteriores, a comunicação do sistema do Direito como comunicação normativa.
31
Em trabalho recentemente desenvolvido no âmbito do programa de pós-graduação em Direito da
Universidade Federal de Minas Gerais, uma dissertação de mestrado lançou mão da seguinte conceituação
para se referenciar à necessidade de estabelecer um padrão mais preciso para que a comunicação possa se
estabelecer um dado sistema social, especialmente no sistema do Direito: “A comunicação sincera pode ser
descrita como aquela que se perfaz de modo claro, preciso, transparente, inteligível, cuja finalidade do
emissor possa ser extraída sem muita dificuldade pelo intérprete, pelo destinatário. Aproxima-se, em certa
medida da ideia axiológica do imperativo categórico kantiano, mas se afasta porquanto seja princípio
epistemológico, ou seja, objetivamente verificável. Esse grau de verificabilidade é entendido a partir do
momento em que a comunicação não se pode realizar em sua negação, ou seja, por meio da emissão de
informação obnubilada, obscura, inverossímil e despregada da realidade circundante (facticidade
sistêmica) e da própria estrutura do sistema do Direito. Comunicação sincera indica aquela baseada na
boa-fé, na efetivação de que o que é transmitido pelo ato de comunicação e processado pelo ato de
entendimento se concretiza em uma zona de confiança que se aproxima da verdade, que é verossímil.
Apesar de a norma jurídica em sua estrutura comunicacional na lógica da teoria dos sistemas ser
especialmente contrafática, há que se levar em consideração que se houver uma deturpação geral do
código e da operação por meio de enviesamento e da falsidade da informação emitida, ao final o sistema se
subverte rumo a um colapso que nada mais significa que a instauração da alopoiese, ou perda de
autonomia e autorreferencialidade” (COSTA GONTIJO, 2018, p. 193-194). Sobre confiança, ver
Luhmann, 2005.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 347


Pedro Augusto Costa Gontijo / Flávio Couto Bernardes

rizações. Além disso, a análise estrita da comunicação normativa contida em uma


proposição normativa peca pela superficialidade da compreensão. Nesse aspecto, os
clássicos representariam a possibilidade se distanciar previamente dessa própria
análise superficial e, além disso, a reflexão contida, a possibilidade de assunção de
dúvidas e a adição de algumas incertezas que seriam levadas para o caminho da
previsibilidade controlável (LUHMANN apud LARENZ, 2012, p. 320-322). Por
esses vieses de análise, pode-se dizer que a Constituição Financeira emana comuni-
cação normativa, de base autopoiética, não se submetendo e não se misturando com
o código da Política. Essa autonomia, advém do estabelecimento de um nível de
comunicação sincera e que, por sua vez, é aperfeiçoado no bojo da dogmática finan-
ceira e constitucional.
Diante desses contornos gerais, pode-se dizer que a Constituição Financeira
possui uma função própria dentro do sistema do Direito, a partir da óptica da autor-
referência32: “ela concretiza a comunicação normativa, possibilita seu conhecimento
pelos demais sistemas sociais observadores com a consequente conversão em in-
formação sistêmica, irrita os sistemas da Política e da Economia, e possibilita a
existência do Estado. Essa funcionalidade específica está em ampla consonância
com a própria Constituição, que até mesmo em Kelsen é evidenciada: a função
política da Constituição é estabelecer limites jurídicos ao exercício do poder”
(KELSEN, 2007, p. 240). Ao limitar o Poder, permite a operacionalidade do próprio
poder. Além disso, reafirma a sua base comunicativa específica. Possibilita, então, a
organicidade da existência do Estado, e estabelece os parâmetros para a mitigação
do risco.

4 CONCLUSÃO
A análise da Constituição Financeira deve começar pela própria definição do
fenômeno constitucional. A partir disso, observou-se a cadência daquelas obras
clássicas, insubstituíveis e altamente influentes para a compreensão do que é a Cons-
tituição. Contudo, considerou-se que estas eram perspectivas particulares e parciais
sobre o fenômeno. Para abrir a teorização básica acerca da Constituição Financeira e
sua função dentro do sistema do Direito, evidenciou-se a necessidade de cogitar de
uma teoria não somente mais ampla, mas que também abarcasse todas as perspecti-
vas dadas pelos clássicos constitucionalistas. Essas visões foram colocadas diante de
um marco teórico próprio, que as encara diante de uma perspectiva única: a identifi-
cação da operação base do sistema e a sua funcionalidade em relação à estrutura.
A partir disso, pôde-se observar que a operação comunicação normativa de-
sempenhada pelo subsistema da Constituição Financeira se erige como meio para
alcançar a finalidade da própria existência do Estado. Esse nicho teórico possui

32
A autorreferencialidade da comunicação dos sistemas sociais é teorizada por Luhmann: “o sistema de
comunicação determina não só seus elementos – que são, em última instância, comunicação –, como
também suas próprias estruturas. O que não pode ser comunicado não pode influir no sistema. Somente a
comunicação pode influenciar a comunicação; apenas ela pode controlar e tornar a reforçar a comunicação”
(2009, p. 301)

348 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


A Função da Constituição Financeira

função híbrida, a partir da existência do acoplamento estrutural entre Política e Di-


reito, além de irritar diretamente o sistema da economia. Esse complexo ramo de
estudo do Direito Constitucional abarca então a função normativa, lançada como
informação sistêmica formadora de sentido, que alcança fins propostos autopoieti-
camente pelo próprio sistema do Direito. A função política se dá nos níveis de con-
tenção do Poder estatal, colocados sob as lógicas dos poderes vertical e horizontal,
especialmente se analisamos estruturas estatais federadas. Por fim, a função comuni-
cação normativa e comunicação política também se dá a partir da irritação da comu-
nicação econômica, no nível do código ter/não ter, tanto na perspectiva interna do
Estado (vertical e horizontal), como na perspectiva externa, influenciando os agentes
de mercado, por exemplo, com mecanismos redistributivos que são possíveis e pla-
nejados no bojo da comunicação colocada pela Constituição Financeira.

REFERÊNCIAS
BENDA, Ernesto et al., Manual de Derecho Constituciona,. Madrid, Marcial Pons, 1996.
COSTA GONTIJO, Pedro Augusto, Os tratados internacionais comuns e a proteção da confiança. Disser-
tação de mestrado. Biblioteca da Universidade Federal de Minas Gerais. 2018.
HÄBERLE, Peter, Textos clássicos na vida das constituições, São Paulo, Saraiva, 2016.
HESSE, Konrad, A força normativa da constituição. Porto Alegre: Sergio Antonio Frabris, 1991. Tradu-
ção de: Gilmar Ferreira Mendes.
KELSEN, Hans, Jurisdição Constitucional, 2. ed, São Paulo, Martins Fontes, 2007.
LARENZ, Karl, Metodologia da ciência do direito, Tradução de José Lamego, 6. ed., Lisboa, Fundação
Calouste Gulbenkian, 2012.
LASSALLE, Ferdinand, O que é uma constituição? São Paulo, Pillares, 2015.
LUHMANN, Niklas, Confianza, Introducción de Dário Rodríguez. Santiago de Chile: Instituto de Socio-
logia, Pontíficia Universidad Católica de Chile, 2005.
LUHMANN, Niklas, Introdução à Teoria dos Sistemas, Petrópolis, Vozes, 2009.
LUHMANN, Niklas, O direito da sociedade, São Paulo, Martins Fontes, 2016, Tradução de Saulo Krieger.
LUHMANN, Niklass, Sistemas sociais: esboço de uma teoria geral, Tradução de Antonio C. Luz Costa, et al.
Petrópolis, Vozes, 2016a.
MÖLLER, Kolja, Crítica do direito e teoria dos sistemas, Tempo social, São Paulo, v. 27, n. 2, p. 129-152.
NEVES, Marcelo, A constitucionalização simbólica, 3ª ed., São Paulo, WMF Martins Fontes, 2011.
NEVES, Marcelo, Entre Têmis e Leviatã: uma relação difícil: o Estado Democrático de Direito a partir
de Luhmann e Habermas, 3. ed, São Paulo, WMF Martins Fontes, 2012.
NEVES. Marcelo, Transconstitucionalismo, São Paulo, WMF Martins Fontes, 2009.
OLIVEIRA, Régis Fernandes, Curso de Direito Financeiro, 6. ed., rev. atual. e ampl., São Paulo, Revista
dos Tribunais, 2014.
TEUBNER, Gunther, O Direito como sistema autopoiético, Porto, Imprensa Portuguesa, 1993.
TORRES, Ricardo Lobo, Curso de Direito Financeiro e Tributário, 19. ed. rev. atual.,Rio de Janeiro,
Renovar, 2013.
TORRES, Heleno Taveira, Direito constitucional financeiro, São Paulo, RT, 2014.
VILLEGAS, Héctor B. Curso de finanzas, derecho financiero y tributario, 5. ed., Buenos Aires, Depal-
ma, 1995.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 349


A Função da Constituição Financeira

A INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA SUPRALEGAL


COMO MANIFESTAÇÃO DO DIREITO NATURAL
THE INEXIGIBILITY OF DIVERSE SUPRALEGAL CONDUCT
AS MANIFESTATION OF NATURAL LAW
DOI: 10.19135/revista.consinter.00011.16
Recebido/Received 16.06.2020 – Aprovado/Approved 26.10.2020
Eduardo Rodrigues Barcellos1 – https://orcid.org/0000-0001-6814-6290
E-mail: advbarcellos@gmail.com
Evandro Fabiani Capano2– https://orcid.org/0000-0001-6897-706X
E-mail:capano@capano.adv.br

Resumo: O presente texto visa conjugar a causa supralegal de inexigibilidade de


conduta diversa com a filosofia de Tomás de Aquino. Parte-se da constatação da
correlação existente entre o direito penal e a moral. Limitando-nos ao conceito de crime,
para algumas situações restará a necessidade de buscar causas exculpantes fora
daquelas previstas em lei, caso da inexigibilidade de conduta diversa. A partir da
relação da causa de exclusão da culpabilidade com fontes fora do direito posto, o estudo
analisa o conceito de prudência estabelecido por Tomás de Aquino e, principalmente,
uma de suas potencialidades, que é a gnome e sua vinculação com a epiqueia,
concluindo-se que a justa solução de determinadas condutas típicas que não mereçam
reprimenda penal se encontra na modulação da inexigibilidade de conduta diversa com a
ideia tomasiana de epiqueia.
Palavras-chave: Moral. Causa supralegal de conduta diversa. Prudência. Epiqueia.
Abstract: The present work aims to combine the supralegal cause of unenforceability of
different conduct with the philosophy of Thomas Aquinas. It is based on the verification
of the existing correlation between criminal law and morality. Limiting ourselves to the
concept of crime, for some situations there will be a need to seek exculpatory causes
outside of those provided for by law, in the event that different conduct is not required.

1
Graduado pela Universidade de São Paulo em Direito. Pós-Graduado latu sensu em Direito Processual
Penal pela Faculdade Damásio de Jesus. Mestrando pela PUC/SP em Direito Penal. E-mail:
advbarcellos@gmail.com
2
Doutor em Direito do Estado pela Universidade de São Paulo e Doutor em Direito pela Universidad de
Salamanca – Espanha, em programa de dupla titulação, com Defesa Pública de Suficiência Investigatória na
Espanha e Defesa Pública de Tese em São Paulo. Mestre em Direito Político e Econômico pela
Universidade Presbiteriana Mackenzie. Professor na Graduação e da Pós-Graduação Lato Sensu da
Faculdade de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Presidiu a Comissão de Segurança Pública
e a Comissão de Direito Militar da Secção Paulista da Ordem dos Advogados do Brasil. Atualmente é
Relator da 23ª Turma do Tribunal de Ética e Disciplina da Ordem dos Advogados do Brasil. Ocupou os
cargos públicos de Chefe de Gabinete da Secretaria de Estado da Educação de São Paulo, Coordenador de
Polícia do Gabinete do Secretário de Segurança Pública do Estado de São Paulo e Chefe de Gabinete da
Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social do Município de São Paulo. E-mail:
capano@capano.adv.br

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 351


Eduardo Rodrigues Barcellos / Evandro Fabiani Capano

Based on the relation of the cause of exclusion of culpability with sources outside the
law, the study analyzes the concept of prudence established by Thomas Aquinas and,
mainly, one of his potentialities, which is the gnome and its relationship with the epicea,
concluding the just solution for certain typical behaviors that do not deserve a criminal
reprimand is found in the modulation of the unenforceability of different conduct with
the Thomasian idea of epique.
Keywords: Moral. Supralegal cause of different conduct. Prudence. Epiqueea.
Sumário: 1 Introdução; 2 Relação Entre o Direito Penal e a Moral; 3 Breve Conceito de
Crime; 4 A Relação Conceitual Entre a Causa Supralegal de Inexigibilidade de Conduta
Diversa e a Epiqueia; 5 Conclusão; Referências.

1 INTRODUÇÃO
Em olhar atento para o passado, constata-se que o direito penal (direito
sancionador que pode impor restrições à liberdade individual) esteve, ao longo da
história, ligado à moral, nos tempos em que condutas socialmente graves eram
punidas mesmo que não causassem lesão nem ao menos expusessem perigo a um bem
jurídico. Com a evolução social, porém, passaram a ser penalmente relevantes
apenas as condutas, comissivas ou omissivas, que ocasionassem lesão ou ameaça de
lesão a um bem jurídico.
Nessa linha, se crime é, sob uma perspectiva inicialmente criada pelo
causalismo, fato típico, antijurídico e culpável, sujeitando-se a sanção, portanto, a
conduta que passar por esse filtro legal, o critério de lesão ou ameaça de lesão a bem
jurídico resta insuficiente para afastar do campo da imputabilidade penal conduta
que, a despeito de se moldar na definição de crime, não mereça a consequente
reprimenda.
A figura da inexigibilidade de conduta diversa supralegal foi, então,
criada pela doutrina para regrar conduta que: i) está prevista em tipo penal
incriminador; ii) não é abarcada por tipos permissivos (não se enquadra nas
excludentes de ilicitude nem nas excludentes de culpabilidade); e iii) se
apresenta como única ação esperável por qualquer que fosse o agente. Essa
situação, não antevista pela lei, mas criada pela doutrina e aceita pela
jurisprudência, já era prevista pelos filósofos clássicos, como Aristóteles e,
principalmente, Tomás de Aquino. Assim, realizaremos uma análise do
pensamento tomasiano sobre a prudência e iremos associar essa virtude com
uma das características da justiça que é a epiqueia.
Considerando que no âmbito penal o Estado pode atuar de maneira a violar o
direito de liberdade física do cidadão, o tema se apresenta como importante
fundamento para aplicação pelo Poder Judiciário em decisões não punitivas
referentes a situações típicas e não previstas em causas permissivas legais, porém
não reprováveis, trazendo em seu bojo, então, conceitos já definidos no século XIII
por Tomás de Aquino.

352 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


A Inexigibilidade de Conduta Diversa Supralegal Como Manifestação do Direito Natural

2 RELAÇÃO ENTRE O DIREITO PENAL E A MORAL


O direito penal e a moral tiveram sempre uma relação umbilical, sendo as
condutas tidas por imorais fonte de punição do agente. Nesse sentido, como bem
aponta Aristóteles em “Ética à Nicômaco”:

Por exemplo, supondo que alguém investido de autoridade agrida uma pessoa, não é
certo que esta revide; e se uma pessoa agride alguém investido de autoridade, o revide
deste último não bastará, cabendo também uma punição ao agressor. por outro lado,
faz uma grande diferença entre o ato ser realizado voluntário ou involuntariamente. No
intercâmbio de favores, a justiça entendida como reciprocidade é o vínculo que mantém
a associação – reciprocidade de acordo com a proporção e não com a igualdade a
própria integralidade do estado depende da reciprocidade fundada na proporção3.

Já Ana Carolina Carlos de Oliveira salienta que há uma grande dificuldade


moderna para se encontrar uma justa medida de punição de atos imorais. A autora
aponta que Hart entende que condutas imorais não poderão ser punidas sem que haja
claro prejuízo a outros, fazendo uma crítica ao conservadorismo moral tipificado
pelos ingleses que punem imoralidades que não causem mal aos outros. Nesse
sentido, a doutrinadora transcreve uma passagem de Hart que menciona Stuart Mill:
“O único motivo pelo qual o poder pode ser corretamente exercido sobre qualquer
membro de uma comunidade civilizada contra sua vontade é para impedir que ele
cause mal aos outros”4.
O Direito Penal por tempos condenou condutas que não eram socialmente
aceitas, ou conflitavam com valores religiosos, mesmo sem nenhum prejuízo a um
bem jurídico, a exemplo da antiga contravenção penal de vadiagem, antigamente
prevista no art. 60 do Dec.-Lei 3.688/1941. Outro exemplo vem da Inglaterra, onde
atos libidinosos com pessoas do mesmo sexo eram enquadrados como crime de
sodomia. Sobre o tema vale ressaltar o célebre caso de Alan Turing5, que recebeu o
perdão real somente 59 anos depois da sua morte, em 2013.
Para Roxin, a função do Direito Penal, dentro de um Estado Democrático de
Direito, é a proteção subsidiária de bens jurídicos. Se o tipo penal não protege um
bem jurídico concretamente, sua aplicação é afastada, movimento que a doutrina
convencionou chamar de funcionalismo teleológico. Essa visão, ao que parece, é a
que mais se coaduna com o Estado de Direito, evitando a condenação de meras
imoralidades sociais ou religiosas. Como escreve o doutrinador:

Eu parto de que as fronteiras da autorização de intervenção jurídico-penal devem


resultar de uma função social do Direito Penal. O que está além desta função não

3
ARISTÓTELES, Ética à Nicômaco, 4ª ed., São Paulo, Edipro, 2014, p. 193.
4
OLIVEIRA, Ana Carlina Carlos de, “Moral, imoralidades e bem jurídico no Direito Penal sexual: o delito
de ato obsceno”, Revista Justiça e Sistema Criminal, vol. 5, n. 9, 2013, p. 204, disponível em:
<https://revistajusticaesistemacriminal.fae.edu/direito/article/view/26>.
5
Sobre o tema há inclusive uma imagem da sentença original no site: <https://www.turing.org.uk
/sources/sentence.html>.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 353


Eduardo Rodrigues Barcellos / Evandro Fabiani Capano

deve ser logicamente objeto do Direito Penal. A função do Direito Penal consiste em
garantir a seus cidadãos uma experiência pacífica, livre e socialmente segura, sempre
quando estas metas não possam ser alcançadas com outras medidas político-sociais
que afetem em menor medida a liberdade dos cidadãos. Esta descrição de funções
corresponde, segundo a minha opinião, com o entendimento mesmo de todas as
democracias parlamentares atuais, por isso não necessita, então, de uma
fundamentação teórica mais ampla6.

Porém, mesmo adotando a concepção de Roxin, não dá para falarmos em


Direito Penal sem mencionarmos a moral. Mesmo que dentro do Direito Penal resida
o princípio da legalidade, não podemos ignorar situações que, apesar de previstas em
lei e causadoras de lesão a um bem jurídico relevante, caso fossem punidas, gerariam
injustiças aos olhos da sociedade.
A legislação escrita oriunda do poder legiferante estatal não é suficiente
para prever todas as situações decorrentes do plano fático. Aliás, sobre o tema
escreve Jean-Louis Bergel:

As regras formais impostas pelas autoridades públicas, em conformidade com suas


atribuições, são sempre insuficientes porque as autoridades públicas não podem pre-
ver deantemão todas as regras necessárias. Cumpre, por conseguinte, apelar para
regras não – formais que não são mandamentos expressos dos poderes públicos, mas
se apoiam na “autoridade da experiência”, como o costume, ou na “autoridade da
razão que é a doutrina”7

Reforçando essa ideia, Eduardo Carlos Bittar expõe que Tomás de Aquino,
valendo-se das lições de Aristóteles, já previa que o legislador não tinha condições
de prever todas as situações sociais no plano abstrato. Nas palavras do doutrinador:

São Tomás de Aquino, utilizando-se de profundo senso realista, em muito conseqüência


dos estudos e investigações acerca de Aristóteles, afirma categoricamente que o legislador
não pode prever todos os casos que venham a ocorrer futuramente, tendo seu alcance
limitado aos casos mais comuns. Se uma situação econômica surgir, por exemplo, deve-se
preferir a lei omissa ou defasada para que se procure o Bem Comum. É nesse momento
que a necessidade supera a lei, ensejando o nascimento do direito de desobedecer a lei,
direito este exercitável por qualquer um, não dependendo da decisão do chefe da
comunidade ou do legislador. Aqui há um ingrediente não-presente na teoria peripatética
– pois, na Ethica a lei é posta para a defesa e segurança da comunidade política (díkaion
nomimón, ou justo total), cujo desrespeito importaria na quebra do que é para todos –
ou seja, a garantia tomasiana da existência de um direito à resistência civil8.

6
ROXIN, Claus, A proteção de bens jurídicos como função do Direito Penal, 2ª ed., Porto Alegre, Livraria
do Advogado, 2009, p. 16-17.
7
BERGEL, Jean-Louis, Teoria Geral do Direito, 2ª ed., São Paulo, Martins Fontes, 2006, p. 90.
8
BITTAR, E. C. B., “Direito e Justiça em São Tomás de Aquino”, Revista da Faculdade de Direito, vol. 93,
1998, p, p. 353-356, disponível em: <https://www.revistas.usp.br/rfdusp/article/view/67407>.

354 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


A Inexigibilidade de Conduta Diversa Supralegal Como Manifestação do Direito Natural

Portanto, como será analisado a seguir, existe uma fórmula criada pela
doutrina que permite não incidir a tutela penal, mesmo que a situação em questão
seja prevista em norma penal incriminadora e não em normas permissivas (causas
excludentes de ilicitude e causas excludentes de culpabilidade legal). Ao fazer essa
análise, será estabelecida uma correlação entre esse conceito e a teoria de justiça e
prudência em Tomás de Aquino, que nos apresentou essa solução já no século XIII.

3 BREVE CONCEITO DE CRIME


O Direito, como área das ciências humanas, sempre se preocupou em fixar
conceitos. Para identificarmos o fato da vida que se enquadra na situação abstratamente
definida, processo denominado de subsunção, exige-se a prévia definição de conceitos.
Assim, é importante definirmos o crime e identificarmos as hipóteses de atipicidade, as
excludentes de ilicitude e as excludentes de culpabilidade.
O conceito analítico de crime, conforme a teoria tripartida do crime, compõe-se
de fato típico, antijurídico e culpável. O conceito estratificado ou analítico de crime
é elucidado por Eugenio Raúl Zaffaroni como sendo uma sequência analítica de
passos sucessivos. Exemplifica que:

Quando queremos averiguar se o que temos diante de nós é uma zebra, antes devemos
dispor do conceito geral de zebra, isto é, do conjunto de caracteres que deve ser um
ente para ser qualificado de “zebra”. Supondo que este conceito geral é um animal e,
só no caso de uma resposta afirmativa, nos perguntamos se seu pêlo apresenta listras
de cor mais escura. Não fará sentido que nos perguntemos se um pato (que não
responde ao conceito de cavalo) ou uma pedra (que não responde ao conceito de
animal), tem pêlo com listras de cor mais escura. As perguntas surgiram em uma certa
ordem a partir de um conceito “estratificado”, isto é, de um conceito de “zebra” que
tem estratos; que corresponde a um caráter genérico (“animal”) e outros estratos que
correspondem a caráter específico (“cavalo” e “listrado”)9.

Assim o festejado autor diz em relação ao conceito analítico de crime: “[...]


são suas características analiticamente obtidas, formando diversos planos, níveis ou
estratos conceituais, mas o delito é uma unidade e não uma soma de componentes”.
A ilicitude é o segundo substrato do conceito analítico de crime, e sua exclu-
são consiste em conduta que, apesar de descrita em um tipo penal incriminador, é
permitida pelo ordenamento jurídico. Uma das excludentes de ilicitude que o
ordenamento jurídico prevê é o estado de necessidade.
O estado de necessidade é a causa excludente de ilicitude que se manifesta na
colisão entre dois interesses jurídicos colocados em perigo, sendo necessário o sacri-
fício de um para salvar o outro por quem não provocou a situação de perigo nem tem
o dever legal de agir. O estado de necessidade exige um perigo imediato a um bem
jurídico, e o agente com a sua conduta evita, ou ao menos tenta evitar, a lesão ao

9
ZAFFARONI, Eugenio Raúl, Manual de Direito Penal Brasileiro, vol. 1, 6ª ed., São Paulo, Revista dos
Tribunais, 2006, p. 332.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 355


Eduardo Rodrigues Barcellos / Evandro Fabiani Capano

bem jurídico que se quer proteger com o sacrifício do outro. Logo, para a configura-
ção do estado de necessidade, exige-se que exista um perigo ou dano imediato que
se visa sanar.
Continuando a análise, temos o terceiro substrato do conceito analítico de
crime que é a culpabilidade. A culpabilidade, no conceito finalista, divide-se em
imputabilidade, exigibilidade de conduta diversa e potencial consciência da ilici-
tude. Ora, entre as excludentes da culpabilidade existe a vertente da causa suprale-
gal de inexigibilidade de conduta diversa. Como o legislador não é capaz de prever
todas as hipóteses de inexigibilidade de conduta diversa, é de se reconhecer a causa
supralegal, já que o comportamento, apesar de típico e antijurídico, não é reprová-
vel. Ademais, diante de circunstâncias anormais, poderá resultar a incapacidade de
autodeterminação do indivíduo e, com isso, não haverá um dos pilares da
culpabilidade (exigibilidade de conduta diversa).
Na lógica funcionalista, a inexigibilidade de conduta diversa ocupa lugar
central na teoria do crime. Como apontam os professores Gustavo Junqueira e
Patrícia Vanzolini:

Como já se viu, a exigibilidade de conduta diversa ocupa lugar central na teoria


normativa pura da culpabilidade, desde o seu nascimento. Por isso, é hoje
amplamente admitida a possibilidade de reconhecimento de situações exculpantes,
mesmo que não expressamente prevista em lei, sempre se verifica que era inexigível
ao agente motivar-se pela norma e, portanto, comportar-se conforme o direito10.

Já que o estado de necessidade e a causa supralegal de inexigibilidade de


conduta diversa exigem, portanto, o sacrifício de um bem jurídico em detrimento de
outro, qual seria a diferença entre ambos?
Alguns autores, como Rogério Greco, colocam que a diferença reside na impor-
tância do bem jurídico tutelado e do bem jurídico sacrificado. Para o mencionado autor,
quando o bem jurídico protegido for superior ou de igual valor em relação ao bem jurídi-
co sacrificado, estaríamos diante de uma hipótese de estado de necessidade, logo, exclu-
dente de ilicitude. Já se o bem jurídico protegido for de valor inferior ao bem sacrificado,
porém na situação fática não era exigível conduta diversa do agente, estaríamos diante de
uma causa supralegal de inexigibilidade de conduta diversa11
Essa não parece ser, porém, a melhor distinção dos institutos. No estado de
necessidade há um perigo imediato de perecer o bem jurídico que se pretende
proteger se não houver o sacrifício do outro bem jurídico. Já na inexigibilidade de
conduta diversa supralegal não há essa imediatidade, o sujeito avalia que, se violar
um bem jurídico no momento, no futuro irá violar outro bem jurídico. Logo, na

10
JUNQUEIRA, Gustavo, VANZOLINI, Patrícia, Manual de Direito Penal – Parte Geral, 5ª ed., São Paulo,
Saraiva, 2019, p. 472-473.
11
GRECO, Rogério, Curso de Direito Penal – Parte Geral, 11 ed., vol. 1, Rio de Janeiro, Impetus, 2009, p.
321.

356 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


A Inexigibilidade de Conduta Diversa Supralegal Como Manifestação do Direito Natural

inexigibilidade de conduta diversa há um juízo de prognose, já que o perigo ou dano


produzido pelo agente não é imediato.
Para citarmos um exemplo, vejamos a situação do empresário que comete
crime de apropriação indébita previdenciária, pois enfrenta dificuldades financeiras.
Nesse sentido, já foi decidido pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região a
possibilidade de reconhecer a inexigibilidade de conduta diversa supralegal em
crimes dessa espécie, conforme ementa:

Penal. Processo Penal. Apropriação Indébita Previdenciária. Art. 168-A, § 1º, Inc. I,
do Código Penal. Inexigibilidade de Conduta Diversa. Absolvição. 1. É pacífico nesta
Corte o entendimento de que configura exclusão da culpabilidade, no crime de
apropriação indébita previdenciária, a ocorrência de dificuldades financeiras muito
graves que impeçam o adimplemento da obrigação para com a Previdência Social. 2.
Para que as dificuldades financeiras possam configurar inexigibilidade de conduta
diversa, é necessário que a defesa demonstre cabalmente a impossibilidade econômica de
realizar o repasse da contribuição previdenciária recolhida, no prazo e forma legal ou
convencional, bem como o exaurimento de todos os meios necessários para efetivar essa
obrigação. (Tribunal Federal Regional da 4ª Região, Apelação Criminal n.
2005.72.02.005241-1/SC, Rel. Des. Fed. Márcio Antônio Rocha, j. em 21.09.2010)

A análise da situação demonstra que não dá para afirmarmos que o bem


jurídico violado seja de menor valia do que o bem jurídico protegido. Não podemos
afirmar, de maneira cartesiana, que o empresário, ao agir dessa maneira, em conflito
de deveres, sacrificou o bem jurídico de maior ou menor relevância. Ao que parece,
o caso não se enquadra no estado de necessidade, pois não havia no momento da
conduta um perigo imediato, o que afasta a hipótese do estado de necessidade.
Porém, é evidente que a conduta do agente não é reprovável, o que foi
reconhecido pela própria jurisprudência. Esse juízo de reprovabilidade integra o
conceito de culpabilidade. Qualquer um que se encontrasse na situação do agente
faria o mesmo, ou ao menos não condenaria quem o fizesse. Nesse caso, o agente
reflete e faz um juízo de prognose prevendo as consequências distintas que irão
advir da apropriação dos recursos que seriam destinados à previdência social e do
não pagamento dos salários de seus funcionários, optando pela ação ou omissão que,
moralmente, parece-lhe mais justa.
Percebe-se, portanto, que o ideal é diferenciar o estado de necessidade e a
inexigibilidade de conduta diversa sob o prisma da contemporaneidade do perigo. Se
o perigo é atual e o agente viola um bem para salvar o outro, a hipótese se enquadra
na excludente de ilicitude (exemplo dos dois náufragos em que há somente uma
tábua de salvação e um mata o outro para salvar sua vida, se não o fizer no momento
o bem jurídico, sua vida, perecerá). Já na hipótese de excludente de culpabilidade,
quando se pratica a conduta típica, não se protege de imediato o bem jurídico, mas
sim se projeta para o futuro a sua proteção.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 357


Eduardo Rodrigues Barcellos / Evandro Fabiani Capano

Superada a discussão, parece que a maior parte da doutrina admite a


existência de causas supralegais de inexigibilidade de conduta diversa. Nesse sentido
escreve Nucci:

Pode-se admitir, portanto, que em certas situações extremadas, quando não for
possível aplicar outras excludentes de culpabilidade, a inexigibilidade de conduta
diversa seja utilizada para evitar punição injustificada do agente. Convém
mencionar, pela importância que o tema exige, o ensinamento de Assis Toledo: “A
inexigibilidade de outra conduta é, pois, a primeira e mais importante causa de
exclusão da culpabilidade. E constitui verdadeiro princípio de direito penal.
Quando aflora em preceitos legislativos, é uma causa legal de exclusão. Se não,
deve ser reputada causa supralegal, dirigindo-se em princípio fundamental que está
intimamente ligado com o problema da responsabilidade pessoal e que, portanto,
despensa a existência de normas expressas a respeito12.

Independentemente da concepção adotada, seja a proporcionalidade do bem


jurídico violado e daquele protegido pela conduta ou a imediatidade do perigo, o
fundamento da absolvição em razão da causa supralegal de inexigibilidade de
conduta diversa não se encontra no direito posto, mas sim em um direito natural que
já era explicado por Tomás de Aquino, tema do qual iremos nos ocupar agora.

4 A RELAÇÃO CONCEITUAL ENTRE A CAUSA SUPRALEGAL DE


INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA E A EPIQUEIA
A “Suma Teológica”, escrita por Tomás de Aquino entre os anos de 1265 e
127313, representa, de fato, sua principal obra e tem como objetivo conciliar a fé
cristã e os ensinamentos da razão, em especial os ensinamentos do Estagirita
Aristóteles. Esse método de pensamento que concilia o cristianismo com a filosofia
dos gregos antigos se convencionou chamar escolástica14.
Essa obra é dividida em três partes: a primeira trata de Deus e o trino de Deus
como princípio das criaturas; a segunda trata da Ética e subdivide-se em outras duas,
sendo que a primeira subparte versa sobre a definição de virtudes e vícios, a graça e

12
NUCCI, Guilherme de Souza, Curso de Direito Penal – Parte Geral (Arts. 1º a 120), 3ª ed., Rio de Janeiro,
Forense, 2019, p. 554-555.
13
Edições Loyola, 5ª edição, 2001.
14
A Universidade de Salamanca (1218) foi fundamental para a consolidadação do estudo de São Tomás de
Aquino, motivo pelo qual a concessão de Capelo é realizada na cerimônia de mesmo nome. Alonso
Fernandes de Madrigal, conhecido como “el Tostado” foi um dos primeiros a realizar exegese acadêmica da
Suma Tomista. “Frente a las controversias teológicas y escolásticas, durante el siglo XV se rebusteció una
corriente de fundamentación en Las Escrituras como “corpus” de apoyo para la reflection teológica.
Existía una convicción de que en la Escritra no existía error, por estar directamente inspirada por el
Espiritú Santo y constituía, por ello, la fuente más segura. De estas ideias participa el Tostado. [...] El
Tostado apresenta un “talante a la vez tardo-medieval y prehumanista”. Nos encontramos com um
aristotélico tomista, de mente y expresión formal acomodada a las convenciones y moldes académicos.
Bezares, Luis E. Rodrigues – San Pedro. La Univesidad de Salamanca del Medievo al Renascimiento.
Salamanca, Universidad Salamanca, 2018, p. 53.

358 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


A Inexigibilidade de Conduta Diversa Supralegal Como Manifestação do Direito Natural

o pecado, e a segunda subparte traz as virtudes e os mandamentos de modo concreto;


por fim, a terceira parte discorre sobre a cristologia, mariologia e o sacramento.
O tema importante para análise da tese aqui apresentada encontra-se na
segunda subdivisão da segunda parte. No presente trabalho é imperioso analisar, das
quatro virtudes cardeais de Tomás de Aquino (Prudência, Justiça, Fortaleza e
Temperança), apenas as virtudes da Prudência e da Justiça.
A prudência é a mãe das virtudes, sendo ela que guia as demais virtudes,
representando a diretriz fundamental do pensamento de Tomás de Aquino. Antes,
porém, é importante ressaltar que houve uma mudança semântica no termo prudência,
sendo hoje por vezes encarada como algo negativo (conotação de uma pessoa que
fica em cima do muro ou que demora para agir). Na visão do filósofo, Prudência é a
virtude de tomar decisões de maneira sábia – recta ratio agibilium, em livre
tradução seria a reta razão de agir.
Na questão 47, intitulada “A prudência considerada em si mesma”, Tomás de
Aquino coloca a prudência como a virtude da faculdade (o emprego do termo é no
sentido de potencialidade) de conhecer, e não do apetite, ou seja, ela entra no plano
da razão, e não no âmbito do conhecimento sensível. A prudência é uma virtude
ligada à razão prática, e não à razão especulativa – sem ela a reta razão direcionada
ao agir se manifesta no plano fático e não meramente teórico.
A prudência deve conhecer não só os princípios universais da razão, como
também os singulares sobre os quais versam as ações. Ela utiliza juízos universais
para casos particulares.
Para Tomás de Aquino, assim como para Aristóteles, os vícios e as virtudes
são hábitos, sejam eles bons ou maus, sendo o hábito uma qualidade adquirida de
uma potência operativa que se dispõe a realizar com facilidade uma operação. Nesse
sentido, o homem justo é aquele que habitualmente prática atos de justiça, o homem
misericordioso é o que pratica atos de misericórdia.
A prudência possui o caráter de virtude intelectual e moral. Para a primeira, o
indivíduo deve saber agir bem, e para a segunda, deve ter vontade de agir bem.
Portanto, a prudência associa a razão com as virtudes morais, sendo meio para
atingir um fim, que é agir bem.
Para comandar a ação humana em direção ao bem, a prudência é composta de
três atos: Aconselhar – não no sentido de dar conselhos a outrem, mas sim de desco-
brir ou analisar as possibilidades; Julgar – avaliar o que se descobriu, sendo ato da
razão especulativa, e escolher a melhor solução; Agir – trazer essa análise para o
plano fático. Dentro desse exercício de aconselhar, julgar e agir, a solicitude integra
a prudência, isso porque, ao aconselhar e julgar, deve haver uma diligência ou mes-
mo uma análise profunda para que o sujeito possa agir rapidamente quando chegar à
conclusão.
A prudência se destina não só ao governo de si próprio, mas também ao
governo da coletividade, sendo que o objetivo da prudência é atingir o bem comum
ao agir. Logo, a prudência destina-se aos governantes e aos súditos.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 359


Eduardo Rodrigues Barcellos / Evandro Fabiani Capano

A prudência pode apresentar três sentidos: i) falsa prudência – aquela cuja


finalidade não é boa, por exemplo, ladrões prudentes sabem encontrar os meios
certos para roubar; ii) prudência verdadeira, porém imperfeita – é verdadeira pois
visa atingir um fim bom, mas sua finalidade não é o bem comum, mas sim o particu-
lar, o que a torna imperfeita; iii) prudência verdadeira e perfeita, pois, além de passar
pelas três etapas (conselho, juízo e o agir), não visa um fim particular, mas sim o
bem comum.
A prudência não está naturalmente em nós, sendo ela uma virtude intelectual,
exige aprendizado através do ensino e da experiência. Como coloca Tomás de
Aquino, quem age bem por instinto são os seres perfeitos ou celestiais, o ser humano,
para agir corretamente, deve ter prudência.
Na questão 48, intitulada “As partes da prudência”, o filósofo apresenta o
recorte metodológico ao analisar a prudência em três partes: i) parte integral, que
versa sobre os fatores que concorrem para a plenitude da potência, a saber, razão,
memória, inteligência, docilidade e sagacidade, os quais, na visão de Tomás de
Aquino, integram a Dimensão Cognoscitiva, e previdência, circunspecção e preven-
ção, esses integrantes da Dimensão Comando; ii) parte subjetiva, que são as pessoas
ou grupos a que se destina a prudência; iii) parte potencial, que são virtudes anexas à
prudência que se referem ao conselho e ao juízo – euboulía, synesis e gnome.
Já na questão 49, intitulada “As partes integrais da prudência”, o autor
começa a discorrer sobre a memória. A virtude intelectual é gerada e desenvolvida
pela experiência e pelo tempo, sendo que da prudência são necessárias muitas lem-
branças. A memória utiliza do passado (experiências pretéritas) e ajuda a desenvol-
ver o raciocínio (razão). A memória decorre da técnica, e não só da natureza. O ser
humano desenvolve a memória através de associações por semelhanças adequadas
para aquilo que se quer recordar. Exemplo: a criança que coloca o dedo na tomada
aprenderá que não mais pode fazê-lo, pois se recordará da dor. É necessário organi-
zar e dispor em ordem tudo aquilo que se quer lembrar, havendo uma associação de
lembranças por encadeamento, tendo o homem solicitude e afeto para com aquilo
que quer recordar. Para que essa se consolide no indivíduo, este precisa fazer refle-
xões, preservando a memória.
Em seguida, Tomás de Aquino trata da inteligência, vista como sinônimo de
capacidade intelectual. Sendo a prudência a reta razão aplicada ao agir, é necessário
que todo processo decorra da inteligência. Ao partir do conhecimento universal para
o caso particular, o sujeito deve conhecer o primeiro. Portanto, é necessária a inteli-
gência para conhecer a premissa maior (abstrata) e identificar, na prática, a sua
incidência (aplicação ao caso concreto).
Na sequência, ainda como partes integrantes da prudência, Tomás de Aquino
discorre sobre a docilidade, a sagacidade, a razão, a providência, a circunspecção e a
prevenção. A docilidade é a abertura para apreender, abandonando a autossuficiên-
cia e a arrogância. Nesse sentido, o filósofo italiano deixa claro que pessoas que se
julgam autossuficientes jamais poderão ser prudentes, uma vez que julgam ter todo o
conhecimento e não precisam mais aconselhar-se.

360 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


A Inexigibilidade de Conduta Diversa Supralegal Como Manifestação do Direito Natural

A sagacidade, por seu turno, é a disposição de apreender por si mesmo de


maneira rápida, sendo hábito pelo qual rapidamente se encontra a solução. Perceba
que tanto a docilidade como a sagacidade estão ligadas ao aprendizado, porém a
primeira refere-se ao aprendizado com os outros e a segunda, a aprender consigo.
Já a razão é empregada no sentido de raciocinar bem. Para seu
desenvolvimento, não basta o intelecto, sendo também necessária uma razão
demonstrativa que está em constante mutação. Os seres celestiais não agem por meio
da razão, mas sim pela intuição, pois são seres puros e perfeitos. O raciocínio é
inerente aos seres imperfeitos, que devem refletir antes de agir de maneira adequada.
A providência é a capacidade de antever situações, sendo para Tomás de
Aquino a principal parte da prudência. Alerta o filósofo italiano que, apesar de ser a
principal característica da prudência, esta não se confunde com aquela. A
previdência prevê situações e antecipa as consequências, permitindo que o ser hu-
mano atue com retidão aplicando o conselho, o juízo e o comando. Portanto, a pre-
vidência é parte da prudência, e não o seu todo.
A circunspecção, por sua vez, é a cautela de observar todas as circunstâncias
antes de agir. A circunspecção é necessária para a prudência, para que se avalie o que
conduz ao fim em função das circunstâncias.
Por último, temos a prevenção, que, nas palavras de Tomás de Aquino, é
acolher o bem evitando o mal. Ao exercer a prudência, o ser humano pode se
preparar para as adversidades do acaso e diminuir os danos.
Quanto à questão 50, intitulada “As partes subjetivas da prudência”, o filósofo
italiano identifica quatro espécies: i) a prudência de reinar – relacionada a dirigir e
mandar, ou seja, incide no ato de governar; ii) a prudência política – ao definir essa
forma de prudência, Tomás de Aquino escreve que o homem age pelo livre-arbítrio,
escolhendo ao agir, por isso os servos devem agir com retidão, obedecendo às leis e
respeitando o governante, como o governante deve dirigir os súditos de maneira reta,
buscando o bem comum; iii) a prudência doméstica – a família ocupa lugar no sin-
gular (a família é composta por indivíduos) e no coletivo (a família integra a socie-
dade), assim a prudência deve incidir no agir familiar; iv) prudência militar –
existem fatores externos que ameaçam a sociedade, logo, deve haver prudência
militar para a proteção do bem comum e das ameaças externas.
A questão de maior interesse para o nosso estudo é a questão 51, “As partes
potenciais da prudência”, pois é ela que se relaciona a uma das características da
justiça em Tomás de Aquino que é a epiqueia. Porém, convém explicar as partes
potenciais da prudência. A primeira delas é a eubolia que é aconselhar bem, ou seja,
dar bons conselhos. A eubolia é uma virtude distinta da prudência, haja vista que esta
visa agir bem, enquanto aquela visa aconselhar-se bem (deliberando entre dúvidas e
argumentos). Essa conclusão é expressa no art. 2 dessa questão quando diz: “A
função da prudência é comandar. Ora, isso não convém à eubulia. Portanto, a
eubulia é uma virtude distinta da prudência.”
A segunda característica é a sunesys, que significa julgar bem ou, em outras
palavras, proferir um juízo reto segundo as leis. Essa boa disposição da capacidade

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 361


Eduardo Rodrigues Barcellos / Evandro Fabiani Capano

cognitiva se dará de dois modos: possuindo concepções verdadeiras e retas (moral)


e, segundo, boa disposição da vontade (boa intenção).
A última das potencialidades da prudência é a gnóme, que significa julgar
superior às regras comuns, seguindo princípios mais elevados que a synesis, exigindo
maior perspicácia de juízo. Como coloca Tomás de Aquino, a gnóme assemelha-se a
uma característica da justiça que é a epiqueia.
Para Tomás de Aquino, podemos agir de infinitas maneiras. O legislador
escolhe dentre essas possibilidades aquela que teoricamente seria a mais justa e
adequada, atingindo o bem comum, porém, em determinados casos, agir conforme a
lei atenta contra a equidade da justiça e contra o bem comum. O ser que age com a
virtude da gnóme segue um espírito de justiça superior e atinge o bem comum,
mesmo que sua conduta viole a lei (é o que definimos hoje como equidade).
Essa última potencialidade da prudência está intimamente ligada a uma das
virtudes anexas à justiça que é a epiqueia (explicada na questão 120, II – II). Tomás de
Aquino, primeiramente, como de costume na sua obra, coloca as objeções à epiqueia,
citando Agostinho, que discorda ser a epiqueia uma virtude. Em seguida, Tomás de
Aquino explica a epiqueia com uma exemplificação (questão 120, art. 1º, solução):

– Como dissemos, quando tratamos das leis, os atos humanos, que as leis devem
regular, são particulares e contingentes e podem variar ao infinito. Por isso, não é
possível instituir nenhuma lei que abranja todos os casos; mas, os legisladores
legislam tendo em vista o que sucede mais frequentemente. Contudo, é contra a
igualdade da justiça e contra o bem comum, que a lei visa observá-la em certos casos
determinados. Assim, a lei determina que os depósitos sejam restituídos, porque tal é
justo na maioria dos casos; mas, pode acontecer que seja nocivo, num caso dado. Por
exemplo, se um louco, que deu em depósito uma espada, a exija no acesso da
loucura; ou se alguém exija o depósito para lutar contra a pátria. Nesses casos e em
outros semelhantes é mau observar a lei estabelecida; ao contrário, é bom, pondo de
parte as suas palavras, seguir o que pede a ideia da justiça e da utilidade comum. E a
isso se ordena a epiquéia, a que nós chamados equidade. Por onde é claro que a
epiquéia é uma virtude.

A epiqueia, que se assemelha ao termo equidade, manifesta-se quando a


melhor escolha a ser feita para atingir o bem comum é desrespeitar a lei positivada.
Como destacado inicialmente no presente trabalho, Tomás de Aquino já colocava a
impossibilidade de a lei positivada atingir a todos os casos de maneira justa. Assim,
defende o filósofo que, quando a lei se mostrar, no caso concreto, injusta, deverá o
julgador ignorá-la. E, como bem coloca Tomás de Aquino, a não obediência à lei
escrita pode, no caso concreto, representar justiça (questão 120, art. 2º, solução):

Como dissemos, toda virtude tem três partes: a subjetiva, a integrante e a potencial. A
parte subjetiva é à que essencialmente é atribuído o todo, e é menos do que ele. O que
pode dar-se de dois modos. Assim, às vezes a vários sujeitos se faz uma atribuição,
segundo uma mesma noção, como no caso de animal ser predicado do cavalo e do boi.
Outras vezes, a predicação é feita primariamente de um, e secundariamente, de outro,
como quando ente o é, da substância e do acidente. Por onde, a epiquéia faz parte da

362 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


A Inexigibilidade de Conduta Diversa Supralegal Como Manifestação do Direito Natural

justiça geralmente considerada e é uma certa justiça, como diz o Filósofo. Portanto, é
claro que a epiquéia é parte subjetiva da justiça. E a ela se atribui a justiça antes de se
atribuir à justiça legal; pois, a justiça: legal é dirigida pela epiquéia. Por onde, a epiquéia
é uma como regra superior dos atos humanos.
A leitura do presente capítulo, associada à leitura do restante do conteúdo do
presente trabalho, permite concluir que a causa supralegal de inexigibilidade de
conduta diversa é uma hipótese de epiqueia na visão tomasiana. Logo, como o
filósofo considera a epiqueia como integrante da justiça, essa causa exculpante não
prevista em lei também integra o conceito de justiça.
Nada há, desta forma, de novo, na afirmativa de que a norma penal deve ser
integrada pela moral, expecialmente como causa de excludente de condutas que
estão de acordo com a média de comportamento social, em nada diferindo, ontologi-
camernte, a norma penal enquanto ultima ratio de proteção social, a conduta moral e
a tradição canônica. Confira-se Maciver and Page em suas magistrais alocações no
campo da Sociologia:

Religion and morals are very closely interwoven. If we are to draw a proper distinction
between them it must be in terms of the autority and sanction attached to their respective
prescriptions rather than in terms of the contents of the codes themselves. (Religião e
moral estão intimamente ligadas. Se quisermos fazer uma distinção adequada entre eles,
ela deve ser em termos da autoridade e da sanção anexada às suas respectivas
prescrições, e em termos do conteúdo dos próprios códigos). Nossa livre tradução15.

Aliás, a percepção de Justiça Tomista, nascida no medievo acabou por


formatar a tradição ocidental da filosofia jurídica, sendo exemplo contemporâneo
a visão de John Rawl:

em qualquer caso, é obviamente impossível elaborar uma teoria substantiva da


justiça fundamentada apenas em verdade da lógica e em definições. A teoria moral
deve estar livre para empregar suposições contingentes e fatos gerais, conforma
lhe aprouver. Não há outro meio de analisar nossos juízos ponderados em
equilíbrio reflexivo. Esta é a concepção do objeto da teoria moral adotada pela
maioria dos autores ingleses até Sidgwick.
“26” Creio que essa perspectiva remonta em seus pontos essenciais ao método de
Aristóteles na Ética a Nicômaco. VerW.F.R. Hardie, Aristotle´s Ethics Theory, Cap.
III. Esp. Pp. 37-4516.

5 CONCLUSÃO
Diante de fontes clássicas como Aristóteles e Tomás de Aquino, é possível
encontrar soluções para questões atuais de justiça. O operador do Direito do sistema
civil law é condicionado a procurar como fonte normativa somente a lei. Porém,

15
MACIVER, Robert. M et PAGE, Charles H. Society. An Introductory Analysis, London, MacMillan & Co
LTD, 1964, p. 168.
16
RAWLS, John, Uma Teoria da Justiça, São Paulo, Martins Fontes, 2008, p. 61.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 363


Eduardo Rodrigues Barcellos / Evandro Fabiani Capano

como foi analisado, essa questão secular entre o jusnaturalismo e o positivismo já


possui solução.
Mesmo não havendo previsão legal de situações que excluam a responsabili-
dade penal do agente, deve o julgador, baseado em pensamentos doutrinários e en-
tendimentos jurisprudenciais, afastar a tutela penal do caso concreto. Esse aspecto da
justiça, denominado por Tomás de Aquino de epiqueia, é um senso transcendental
(gnome), que ultrapassa a lei positivada, no fim de atingir o senso de justiça.
No exemplo dado por Tomás de Aquino do depositário que se nega a devol-
ver a espada para o seu dono, pois sabe que este realizará um massacre, o depositário
atualmente não responderia pelo delito de apropriação indébita, pois no caso, além
de agir com prudência e justiça, estaria abarcado pela causa supralegal de inexigibi-
lidade de conduta diversa.
Torna-se fascinante perceber que já na Antiguidade clássica e na Idade Média
questões tão relevantes nos dias de hoje já eram amplamente discutidas, com
soluções tão sábias e, principalmente, justas.

REFERÊNCIAS
ARISTÓTELES, Ética à Nicômaco, 4ª ed., São Paulo, Edipro, 2014.
BERGEL, Jean-Louis, Teoria Geral do Direito, 2ª ed., São Paulo, Martins Fontes, 2006.
BEZARES, Luis E. Rodrigues ,San Pedro, La Univesidad de Salamanca del Medievo al Renascimiento,
Salamanca, Ediciones Universidad Salamanca, 2018.
BITTAR, E. C. B., “Direito e Justiça em São Tomás de Aquino”, Revista da Faculdade de Direito, v. 93,
1998, pp. 339-359, disponível em: <https://www.revistas.usp.br/rfdusp/article/view/67407>.
GRECO, Rogério, Curso de Direito Penal – Parte Geral, 11ed., v. 1, Rio de Janeiro, Impetus, 2009.
JUNQUEIRA, Gustavo, VANZOLINI, Patrícia, Manual de Direito Penal – Parte Geral, 5ª ed., São
Paulo, Saraiva, 2019.
MACLIVER, Robert. M et PAGE, Charles H. Society. An Introductory Analysis. London, MacMillan &
Co LTD, 1964
NUCCI, Guilherme de Souza, Curso de Direito Penal – Parte Geral (Arts. 1º a 120), 3ª ed., Rio de
Janeiro, Forense, 2019.
OLIVEIRA, Ana Carlina Carlos de, “Moral, imoralidades e bem jurídico no Direito Penal sexual: o delito
de ato obsceno”, Revista Justiça e Sistema Criminal, v. 5, n. 9, 2013, pp. 199-222, disponível em:
<https://revistajusticaesistemacriminal.fae.edu/direito/article/view/26>.
RAWLS, John, Uma Teoria da Justiça, São Paulo, Martins Fontes, 2008.
ROXIN, Claus, A proteção de bens jurídicos como função do Direito Penal, 2ª ed., Porto Alegre, Livraria
do Advogado, 2009.
ZAFFARONI, Eugenio Raúl, Manual de Direito Penal Brasileiro, v. 1, 6ª ed., São Paulo, Revista dos
Tribunais, 2006.

364 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


A Inexigibilidade de Conduta Diversa Supralegal Como Manifestação do Direito Natural

O JUIZ NATURAL NA JUSTIÇA MILITAR FEDERAL


BRASILEIRA: PRINCIPAIS DESAFIOS PARA A EFETIVAÇÃO
DO ACESSO JUSTO À JUSTIÇA NO PROCESSAMENTO DE
DEMANDAS ENVOLVENDO CIVIS1
THE NATURAL JUSTICE IN BRAZILIAN FEDERAL
MILITARY JUSTICE: MAIN CHALLENGES FOR THE
CONCRETIZATION OF FAIR ACCESS TO JUSTICE IN THE
PROCESSING OF CLAIMS INVOLVING CIVILIANS
DOI: 10.19135/revista.consinter.00011.17
Recebido/Received 01.06.2020 – Aprovado/Approved 17.07.2020
Luciana Gonçalves Dias2 – https://orcid.org/0000-0002-4167-5528
E-mail: lgdias@yahoo.com.br
Regina Vera Villas Bôas3 – https://orcid.org/0000-0002-3310-4274
E-mail: revillasboas1954@gmail.com

Resumo: O presente trabalho apresenta um estudo a respeito das competências


constitucionais da Justiça Militar Federal Brasileira e sua jurisdição penal, em tempos de
paz, em relação a delitos castrenses envolvendo civis – seja na condição de réus e/ou
enquanto vítimas de crimes dolosos contra a vida cometido por militares federais no
contexto de Operações Militares. A análise é construída a partir da compreensão de
correlação entre a escolha do modelo de juiz e a efetivação do acesso justo à justiça; bem
como da interpretação de inovações no ordenamento jurídico pátrio trazidas por meio de
alterações na Lei de Organização da Justiça Militar da União (LOJMU) e no Código Penal
Militar (CPM). As breves reflexões pretendem abordar o processo de modernização da
Justiça Castrense Federal enquanto ramo especializado do Poder Judiciário brasileiro,
rastreando conteúdo oculto ao postulado do Juiz Natural apreendido a partir das doutrinas
de Luigi Ferrajoli e Jürgen Habermas: a aceitabilidade social obtida por intermédio do
combate ao desconhecimento e da aproximação com a sociedade civil, incluindo os

1
Produzido no âmbito do Grupo de Pesquisa “Minorias, Vulnerabilidade e Tutela dos Direitos Individuais e
Coletivos” do Programa de Mestrado em Direito do UNISAL/SP (Lorena) e do Grupo de Pesquisa
“Fundamentos dos DD Coletivos e Efetividade dos DH e DF: Diálogo das Fontes” do PPG em Direito da
PUC-SP.
2
Mestranda em Direito pelo Centro Universitário Salesiano de São Paulo – UNISAL/SP (Lorena). Área de
Concentração: “Concretização dos Direitos Sociais, Difusos e Coletivos”. Pós-graduada em Direito Público
pela Universidade Veiga de Almeida. Graduada em Direito pela Universidade Federal de Juiz de Fora/MG.
E-mail: lgdias@yahoo.com.br. Lattes ID: 7956330817764772. Orcid ID: 0000-0002-4167-5528.
3
Bi-Doutora em Direito Difusos e Coletivos e em Direito das Relações Sociais pela PUC/SP. Pós-Doutora
em Democracia e DH pelo Ius Gentium Conimbrigae. Professora e Pesquisadora pela PUC-SP e
UNISAL/SP (Lorena) nos PG e PPG/Direito. E-mail: revillasboas1954@gmail.com. Lattes ID:
4695452665454054. Orcid ID: 0000-0002-3310-4274.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 365


Luciana Gonçalves Dias / Regina Vera Villas Bôas

próprios operadores do Direito. O método utilizado é o analítico-dedutivo, por intermédio


de pesquisa de normas, jurisprudência e doutrina especializada.
Palavras-chave: Juiz Natural. Justiça Militar Federal Brasileira. Acesso Justo à Justiça.
Civis.
Abstract: This paper presents a study on the constitutional competences of the Brazilian
Federal Military Justice and its criminal jurisdiction, during peacetime, in relation to
military offences involving civilians – whether as defendants and / or as victims of
intentional crimes against the life committed by federal military in the context of Military
Operations. The analysis is constructed from the understanding of correlation between the
choice of the judge model and the concretization of fair access to justice; as well as the
interpretation of innovations in the national legal system brought about through changes in
the Law of Organization of Military Justice of the Union (LOMJU) and the Military Penal
Code (MPC). These brief reflections intend to address the process of modernization of the
Federal Military Justice as a specialized branch of the Brazilian Judiciary, tracing hidden
content to the postulate of the Natural Justice assimilated from the doctrines of Luigi
Ferrajoli and Jürgen Habermas: the social acceptability obtained through the fight against
ignorance and the approximation with civil society, including the operators of law itself.
The method used is the analytical-deductive, through research of norms, jurisprudence and
specialized doctrine.
Keywords: Natural Justice. Brazilian Federal Military Justice. Fair Acess to Justice.
Civilians.
Sumário: 1 Introdução. 2 O Juiz Natural na Justiça Militar da União e as inovações da Lei
13.774/2018 para o processamento de demandas envolvendo civis. 3 A nova redação do
art. 9° do Código Penal Militar vs. a competência constitucional do Tribunal do Júri:
refletindo sobre a (i)legitimidade da Lei 13.491/2017. 4 Considerações Finais. Referências.
Summary: 1 Introduction. 2 The Natural Judge in the Military Justice of the Union and the
innovations of Law 13.774/2018 for the processing of demands involving civilians. 3 The
new Wording of Article 9 of the Military Penal Code vs. the constitutional competence
of the Court of the Jury: reflecting on the ligitimity/iligitimity of Law 13.491/2017. 4
Final Considerations. Reference.

1 INTRODUÇÃO
A Justiça Militar Federal Brasileira4, historicamente a mais antiga do país5, é
um ramo especializado do Poder Judiciário6, tendo seus Órgãos e sua competência
ratione legis – para “processar e julgar os crimes militares definidos em lei” – ex-

4
“As principais diferenças entre a da União e as estaduais são: as estaduais só processam e julgam crimes
militares se praticados por militares estaduais, a da União processa e julga também os crimes militares
praticados por civis e, enquanto a da União tem justiça quase estritamente penal (quase, porque também
julga a perda de posto e patentes de oficiais – art. 142, VI e VII da Constituição) as estaduais (e distrital)
também possuem competência para ações judiciais contra atos disciplinares militares.” (ALVES-
MARREIROS, 2020, p. 166).
5
“Pelo Alvará Régio com força de Lei de 1º.04.1808, D. João criou o Conselho Supremo Militar e de Justiça,
que tornou-se mais tarde o Superior Tribunal Militar e última instância da Justiça Militar da União.
Originalmente o órgão era composto por três Conselhos independentes com funções administrativas e
judiciais: o Conselho Supremo Militar, o Conselho de Justiça e o Conselho de Justiça Supremo Militar.”
Disponível em: <https://www.stm.jus.br/informacao/agencia-de-noticias/item/10479-superior-tribunal-com
pleta-212-anos-e-produz-video-sobre-sua-historia-e-funcionamento>. Acesso em: 23 maio 2020.
6
Com fulcro no art. 92, VI, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (BRASIL, 2020).

366 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


O Juiz Natural na Justiça Militar Federal Brasileira

pressamente previstos nos arts. 122 a 124 da Constituição Federal de 1988. Sem
embargo, vem buscando soluções de modernização por ainda enfrentar, hodierna-
mente, batalhas contra o desconhecimento sobre a necessidade de sua existência;
e/ou a desconfiança sobre a (i)legitimidade de suas decisões, particularmente no que
tange ao processamento de demandas envolvendo civis – não apenas na condição de
acusados, mas também enquanto vítimas de crimes dolosos contra a vida cometido
por militares federais no contexto de Operações Militares.
Buscando uma conciliação com agenda internacional de contenda pela exclu-
são de civis da jurisdição penal militar7, a Lei 13.774/20188 inovou na sistemática de
Organização da Justiça Militar da União, carreando a submissão do civil – antes
direcionada ao julgamento pelo Conselho Permanente de Justiça9 – para a atuação
monocrática do, ora denominado, Juiz Federal da Justiça Militar. Contudo, persistem
críticas em caso de concurso de agentes – civis e militares acusados no mesmo pro-
cesso; da perda da condição de militar do acusado no curso do processo – dilema do
“ex-militar”10; bem como sobre a formação do Órgão Julgador em segunda instância
– Superior Tribunal Militar (STM) também de composição mista.
Por sua vez, em movimento aparentemente inverso, a redução de competên-
cia do Tribunal do Júri trazida pela Lei 13.491/201711, tende a causar repercussão
social negativa, particularmente em situações de comoção como o “caso Guadalu-
pe”12, ocorrido em 07.04.2019. Na oportunidade, militares do Exército Brasileiro, no
exercício de função de natureza militar, alvejaram carro particular na Zona Norte do
Rio de Janeiro/RJ, ocasionando a morte de dois civis.
À luz do cenário apresentado, indaga-se – sem perder de vista as especifici-
dades axiológicas capazes de justificar e fundamentar a existência desse ramo espe-
cializado do Poder Judiciário – se as alterações citadas são suficientes para abrir
caminho para o aprimoramento da Justiça Militar da União.
A finalidade da presente pesquisa é, portanto, refletir sobre o impacto das
precitadas Leis 13.774/2018 e 13.491/2017, mormente sobre a temática do Juiz

7
Sob o argumento principal de afronta à garantia do Juiz Natural.
8
Altera a Lei 8.457, de 04.09.1992, que “Organiza a Justiça Militar da União e regula o funcionamento de
seus Serviços Auxiliares”. (BRASIL, 2018).
9
Escabinato – colegiado de julgadores – integrado por um Juiz togado e quatro Juízes leigos – militares –
dentre os quais, pelo menos, um Oficial Superior.
10
Tese uniformizada, em agosto de 2019, pelo Superior Tribunal Militar no bojo da Petição n. 7000425-
51.2019.7.00.0000 interposta pelo Procurador Geral de Justiça Militar: “Compete aos Conselhos Especial e
Permanente de Justiça o julgamento de civis que praticaram crimes militares na condição de militares das
Forças Armadas”. Disponível em: <https://www.stm.jus.br/informacao/agencia-de-noticias/item/9901-
superior-tribunal-militar-uniformiza-jurisprudencia-e-decide-que-ex-militares-serao-julgados-pelos-
conselhos-de-justica>. Acesso em: 23 maio 2020.
11
Altera o Dec.-Lei 1.001, de 21.10.1969 – Código Penal Militar. (BRASIL, 2017).
12
Breve histórico: “Os militares do Exército foram denunciados junto à Justiça Militar da União no dia 11 de
maio pelos crimes de homicídio qualificado (art. 205, § 2º, do Código Penal Militar) e por omissão de
socorro, por supostamente não terem prestado assistência às vítimas (Art. 135 do Código Penal).”
Disponível em: <https://www.stm.jus.br/informacao/agencia-de-noticias/item/10045-justica-militar-ouve-
testemunhas-de-defesa-e-reus-no-caso-de-civis-mortos-em-guadalupe-rj>. Acesso em: 21 maio 2020.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 367


Luciana Gonçalves Dias / Regina Vera Villas Bôas

Natural na Justiça Militar Federal Brasileira e seus principais desafios para efetivar o
acesso justo à justiça no processamento de demandas envolvendo civis. A metodo-
logia eleita foi o método analítico-dedutivo, por meio de investigação de normas,
jurisprudência e doutrina especializada, tendo como marcos teóricos relevantes a
obra Direito e Razão, de Luigi Ferrajoli; bem como a distinção habermasiana entre
aceitação obrigatória da ordem jurídica decorrente da positivação e sua pretensa
aceitabilidade social (a ser) perquirida no plano da legitimidade.

2 O JUIZ NATURAL NA JUSTIÇA MILITAR DA UNIÃO E AS


INOVAÇÕES DA LEI 13.774/2018 PARA O PROCESSAMENTO DE
DEMANDAS ENVOLVENDO CIVIS
Como implicação da virada linguístico-pragmática e consequente revolução co-
pernicana das posturas hermenêuticas, as decisões jurídicas – em sua nova e necessária
relação racional com os valores morais e a justiça – aproximaram-se paulatinamente dos
interesses da sociedade, restando mais afinadas à realidade histórico-social de seus desti-
natários na busca argumentativa pelo verossímil. Como ramo especializado, a Justiça
Militar Brasileira naturalmente alinhou sua práxis aos esteios castrenses da hierarquia e
da disciplina, elegendo as pré-compreensões do juiz militar não togado como fundamen-
tais para a proteção dos bens jurídicos tutelados pelo Direito Penal Militar – em essência
as instituições e os deveres militares – e para o justo acesso à justiça:

Da Justiça espera-se que tenha estrutura e formação técnica e humana suficiente para a
realizara justiça! Pois de nada adiantaria ao cidadão que lhe fossem franqueadas as
portas abertas das Casas de Justiça, se estas não puderem atender adequadamente
aos seus reclamos, não compreender a extensão de seus conflitos, se não puder vis-
lumbrar, com experiência e conhecimento, a vastidão dos elementos que permeiam os
seus dramas. (ARMANDO RIBEIRO, 2013, p. 84).

Contudo, ao analisar os pressupostos para processar e julgar na Justiça Mili-


tar da União, identifica-se que os precitados intérpretes nem sempre se conectam à
vivência das partes interessadas, pois, regularmente delimitada no texto constitucio-
nal vigente, a competência ratione legis da Justiça Militar da União – associada
classicamente a crimes militares e não a crimes praticados por militares13 – não

13
Pertinente observar a complexidade do problema analisado a partir das múltiplas e divergentes
interpretações que emergem do conceito “crime militar”. E isso não apenas na temática afeta às demandas
envolvendo civis; mas na aplicação ao caso concreto do próprio art. 9°, II, “a”, do CPM. Um exemplo
marcante a ser colacionado é o caso analisado pelo STF, em 09.04.2019, no bojo do HC 155.245/RS, tendo
por Relator o Min. Celso de Mello. A decisão restou por anular o procedimento penal transcorrido na 3ª
Auditoria da 3ª CJM – incluindo condenação do réu a 27 anos de reclusão – ao reconhecer a incompetência
absoluta da JMU para julgamento de delitos cometidos em 2015 na cidade de Santa Maria/RS: homicídio e
furto praticados por militar da ativa contra militar na mesma situação, supostamente motivados por “ritual
de magia”. Na oportunidade, fixou-se posicionamento contrário ao do STJ no Conflito de Competência
150.854/RS – Rel. Min. Felix Fischer; e ao do STM no HC n. 7000114-31.2017.7.00.0000/RS – Rel. Min.
William de Oliveira Barros. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/a
nexo/HC155245.pdf>. Acesso em: 08 jul. 2020.

368 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


O Juiz Natural na Justiça Militar Federal Brasileira

se importa sobre quem seja o autor do delito, possibilitando, inclusive, o julga-


mento de civis14.
Aderindo de forma estrita aos mandamentos dos arts. 124 e 142 da Constitui-
ção Federal Brasileira, os crimes militares são os definidos no art. 9º do Código
Penal Militar15 (CPM). Desse modo, conquanto não se apontem falhas concretas na
dita demarcação competencial da Justiça Especializada em tela – e que sejam sufici-
entes para eivá-la de vícios insanáveis – indaga-se, no cenário humanitário interna-
cional, se essa não deveria ser restrita ao julgamento de crimes essencialmente mili-
tares; e se o julgamento de civis, em tempo de paz, não deveria ser encarado como
exceção. A apreciação de mérito desses argumentos encontra-se pendente na Argui-
ção de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 28916, embora existam
diversos precedentes, sobretudo em sede de Habeas Corpus (HC), nos quais o Su-
premo Tribunal Federal (STF) já entendeu pela incompetência da Justiça Castrense
Federal para processar e julgar civis em tempos de paz, com relevante ressalva: caso
a ação não tenha infligido as instituições militares. Reiteradamente, são suscitados
nas razões de decidir os clássicos casos “Ex parte Milligan”17 – da Suprema Corte
Norte-Americana (1866) – e o “Palamara Iribarne Vs. Chile”18 – da Corte Interame-
ricana de Direitos Humanos (Audiência realizada em 9.05.2005). Outrossim, ver-
sando sobre o plano do Direito Comparado, merece transcrição parcial a ementa da
Medida Cautelar em Habeas Corpus 110.237 Pará – Rel. Min. Celso de Mello:

A Regulação do Tema Pertinente à Justiça Militar no Plano do Direito Compa-


rado. Tendência que se registra, modernamente, em sistemas normativos estrangeiros,
no sentido da extinção (pura e simples ) de tribunais militares em tempo de paz ou, então,
da exclusão de civis da jurisdição penal militar: Portugal (Constituição de 1976, art. 213,
Quarta Revisão Constitucional de 1997), Argentina (Ley Federal 26.394/2008), Colômbia
(Constituição de 1991, art. 213), Paraguai (Constituição de 1992, art. 174), México

14
“Art. 22. É considerada militar, para efeito da aplicação dêste Código, qualquer pessoa que, em tempo de
paz ou de guerra, seja incorporada às fôrças armadas, para nelas servir em pôsto, graduação, ou sujeição
à disciplina militar.” (BRASIL, 2017). Partindo desse dispositivo legal, a definição de civil seria, portanto,
construída por meio de um processo de argumentação a contrario sensu.
15
Tratando especificamente da temática de crimes militares praticados por civis, importante destacar o contido
no art. 9°, I e III, do Código Penal Militar. (BRASIL, 2017).
16
“A Procuradoria-Geral da República (PGR) ajuizou, no Supremo Tribunal Federal (STF), a Arguição de
Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 289, em que pede que seja dada ao art. 9º, incs. I e III,
do Código Penal Militar (CPM, Dec.-Lei 1.001/1969), interpretação conforme a Constituição Federal
(CF) de 1988, a fim de que seja reconhecida a incompetência da Justiça Militar para julgar civis em tempo
de paz e que esses crimes sejam submetidos a julgamento pela Justiça comum, federal ou estadual.”
Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=246326>. Acesso
em: 22 maio 2020.
17
“It is unconstitutional to try civilians by military tribunals unless there is no civilian court available.”
Disponível em: <https://supreme.justia.com/cases/federal/us/71/2/>. Acesso em: 23 maio 2020.
18
A Corte Interamericana determinou à República do Chile: “Adecuar el ordenamiento jurídico interno de
forma tal que, en caso de considerarse necesaria la existencia de una jurisdicción penal militar, esta se limite
al conocimiento de delitos de función cometidos por militares en servicio activo”. Disponível em:
<http://www.corteidh.or.cr/cf/jurisprudencia2/ficha_tecnica.cfm?nId_Ficha=313&lang=en>. Acesso em: 23
maio 2020.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 369


Luciana Gonçalves Dias / Regina Vera Villas Bôas

(Constituição de 1917, art. 13) e Uruguai (Constituição de 1967, art. 253, c/c Ley
18.650/2010, arts. 27 e 28), v.g. (BRASIL, 2013a).

Paralelamente às indispensáveis salvaguardas penais, as prerrogativas processuais


penais – com análoga monta – suscitam as (des)virtudes do modus operandi do sistema
punitivo. Nessa conjuntura, destaca-se a construção do Juiz Natural como um dos moto-
res legitimantes da aplicação justa do Direito ao caso concreto (FERRAJOLI, 2014).
Não obstante, (re)leituras garantistas – similarmente e/ou por inversão – têm a potencia-
lidade de obstaculizar o dever estatal de pacificação social:

no contexto do garantismo penal integral, a adaptação da clássica teoria garantista ao vi-


gente Estado constitucional democrático de direito traz, como seu principal reflexo, a im-
posição de que a tutela penal venha a ser aplicada não só com vistas à proteção da liber-
dade individual, mas também como instrumento de resguardo de outras categorias de di-
reitos fundamentais titulados pela coletividade, notadamente os direitos sociais e difusos
envolvidos pela ordem econômico-social desenhada pela Constituição Federal. (MAGA-
LHÃES, 2010, p. 185).

Destarte, a Lei 13.774/2018 – ao modificar a norma de Organização da Justiça


Militar da União (BRASIL, 2018a) para submeter o civil ao julgamento monocrático
pelo juiz togado – coaduna-se com congruente modelo garantista de Direito Penal e
Processual Penal, apresentando proposta factível de alinhamento da Justiça Militar da
União às demandas do Direito Internacional dos Direitos Humanos, sem encolher suas
competências constitucionais:

Art. 30. Compete ao juiz federal da Justiça Militar, monocraticamente:


I-B – processar e julgar civis nos casos previstos nos incs. I e III do art. 9º do Dec.-Lei
1.001, de 21.10.1969 (Código Penal Militar), e militares, quando estes forem acusados
juntamente com aqueles no mesmo processo. (BRASIL, 2018a).

Explica-se: tratando especificamente do postulado do Juiz Natural na Justiça Mi-


litar da União, é possível extrair da Carta Magna – em seu art. 92, VI – que o escabinato
incorpora o próprio conteúdo complexo do devido processo legal e, por conseguinte,
garantia de acesso justo à justiça para combatentes federais. Nessa hipótese, a integridade
do sistema é corroborada pela reconhecida capacidade do colegiado em assimilar o
contexto fático e a perspectiva axiológica do que é levado ao seu conhecimento e
análise. Nos dizeres de Alves-Marreiros (2020, p. 168): “o sentido de justiça busca
aquilatar a gravidade das lesões do direito sob a ótica de uma classe”.
Entretanto, e para o civil que, de forma oposta, não reconhece julgadores milita-
res como autoridades que partilham de suas experiências vitais? A nova ordem do jul-
gamento monocrático de civis na Justiça Castrense Federal, sem perder de vista as espe-
cificidades capazes de justificar e fundamentar a existência desse ramo especializado do
Poder Judiciário, teoricamente abre caminho para o aprimoramento da Justiça Militar da
União. Trata-se de marco normativo para um moderno movimento de abertu-
ra/aproximação com a sociedade civil, identificado ainda, por uma simbólica atualização

370 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


O Juiz Natural na Justiça Militar Federal Brasileira

de “designação” do antigo Juiz Auditor para Juiz Federal da Justiça Militar. Se o cerne
do debate não versa sobre a descriminalização dos crimes militares praticados por civis19,
mas tão somente sobre competência jurisdicional, a problemática resta amenizada, lem-
brando que ajustes ainda precisam ser pensados para o caso de concurso de agentes;
perda da condição de militar após o cometimento do delito; e/ou no que tange à esfera
recursal20. De toda sorte, o argumento de Tribunal de Exceção não se sustenta:

No Brasil, a Justiça Militar da União tem previsão constitucional dentro do Poder


Judiciário, assim sendo, qualquer pessoa a ela submetida será ouvida por juiz ou tri-
bunal competente, estabelecido anteriormente, sendo independente e imparcial como
parte do Poder Judiciário e será processada pelo Ministério Público Militar, compos-
to por membros do Ministério Público da União, todos civis, vitalícios e com ingresso
mediante concurso público de provas e títulos. (ALVES-MARREIROS; ROCHA;
FREITAS, 2015, p. 75).

3 A NOVA REDAÇÃO DO ART. 9° DO CÓDIGO PENAL MILITAR VS.


A COMPETÊNCIA CONSTITUCIONAL DO TRIBUNAL DO JÚRI:
REFLETINDO SOBRE A (I)LEGITIMIDADE DA LEI 13.491/2017
Desfocando do civil como acusado, lança-se agora um novo olhar tão impor-
tante quanto: o civil como vítima de um crime doloso contra a vida cometido por
militares federais no contexto de Operações Militares21. Nos moldes da redação
vigente do art. 9°, parágrafos primeiro e segundo, do Código Penal Militar:

§ 1o Os crimes de que trata este artigo, quando dolosos contra a vida e cometidos por
militares contra civil, serão da competência do Tribunal do Júri. (Redação dada pela
Lei 13.491, de 2017)
§ 2o Os crimes de que trata este artigo, quando dolosos contra a vida e cometidos
por militares das Forças Armadas contra civil, serão da competência da Justiça Mi-
litar da União, se praticados no contexto: (Incluído pela Lei 13.491, de 2017)
I – do cumprimento de atribuições que lhes forem estabelecidas pelo Presidente da
República ou pelo Ministro de Estado da Defesa; (Incluído pela Lei 13.491, de 2017)
II – de ação que envolva a segurança de instituição militar ou de missão militar,
mesmo que não beligerante; ou (Incluído pela Lei 13.491, de 2017)

19
Importante ressaltar uma grande divergência conceitual sobre a distinção entre os crimes próprios e
impropriamente militares. Propõe-se: “crime propriamente militar ou militar próprio é o que só pode ter
como autor o militar da ativa, ou o civil apenas em caso de coautoria ou participação.” (ALVES-
MARREIROS; ROCHA; FREITAS, 2015, p. 42).
20
“Art. 3° O Superior Tribunal Militar, com sede na Capital Federal e jurisdição em todo o território
nacional, compõe-se de quinze ministros vitalícios, nomeados pelo Presidente da República, depois de
aprovada a indicação pelo Senado Federal, sendo três dentre oficiais-generais da Marinha, quatro dentre
oficiais-generais do Exército e três dentre oficiais-generais da Aeronáutica, todos da ativa e do posto mais
elevado da carreira, e cinco dentre civis.” (BRASIL, 2018a).
21
Nos moldes da Lei Complementar 97, de 9.06.1999, que dispõe sobre organização, preparo e emprego das
Forças Armadas. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp97.htm>. Acesso em: 22
maio 2020.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 371


Luciana Gonçalves Dias / Regina Vera Villas Bôas

III – de atividade de natureza militar, de operação de paz, de garantia da lei e da or-


dem ou de atribuição subsidiária, realizadas em conformidade com o disposto no art.
142 da Constituição Federal e na forma dos seguintes diplomas legais: (Incluído pela
Lei 13.491, de 2017)
a) Lei 7.565, de 19.12.1986 – Código Brasileiro de Aeronáutica; (Incluída pela Lei
13.491, de 2017)
b) Lei Complementar 97, de 9.06.1999; (Incluída pela Lei 13.491, de 2017)
c) Dec.-Lei 1.002, de 21.10.1969 – Código de Processo Penal Militar; e (Incluída pe-
la Lei 13.491, de 2017)
d) Lei 4.737, de 15.07.1965 – Código Eleitoral. (Incluída pela Lei 13.491, de 2017)
(BRASIL, 2017, grifo nosso).

De inquestionável importância, a instituição do júri22 possui previsão consti-


tucional e espírito democrático, destacando-se sua dupla face: direito e garantia funda-
mental. Interessante observar que o escabinato castrense parece tentar captar essa essên-
cia, buscando conjugar o conhecimento técnico-jurídico com “uma aproximação visceral
com o mundo existencial do qual emergem os conflitos que será chamado a resolver”.
(ARMANDO RIBEIRO, 2013, p. 85). A viabilidade da sua abertura “popular” – ou seja,
a composição de Júri, mutatis mutandis, na estrutura da Justiça Militar da União – pode-
ria ser trazida à baila como fonte de legitimação de suas novas competências.
Todavia, logo após o advento da Lei 13.491/2017, as críticas a uma suposta “mi-
litarização da sociedade” (DE LARA; ROCHA, 2020, p. 177) se avolumaram. O trágico
episódio ocorrido, em 2019, no bairro de Guadalupe/Rio de Janeiro (RJ) apenas reacen-
deu a desavença, indicando uma certa sincronia entre a aprovação das mudanças no
Código Penal Militar e um momento de maior reconhecimento, pelas autoridades com-
petentes na área da segurança pública, da necessidade de emprego das Forças Armadas,
mormente em operações de garantia da lei e da ordem. Repisa-se, essa destinação encon-
tra-se expressa no art. 142 da Constituição Federal, não se tratando, portanto, de mano-
bras de quaisquer governos específicos.
A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5901, protocolada em 26.02.2018,
segue seu trâmite no Supremo Tribunal Federal com manifestação da Procuradoria-
Geral da República23 pela declaração de inconstitucionalidade da norma. Os funda-
mentos também não são novos para aqueles que acompanham os dilemas de compe-
tência da Justiça Militar da União:

a gramática de direitos prevista na CF/88, bem com as obrigações internacionais de


tratados de direitos humanos (natureza materialmente constitucional) impõem que a
jurisdição penal militar tenha competência restrita ao julgamento de crimes envol-
vendo violação à hierarquia, disciplina militar ou outros valores tipicamente castren-

22
“Art. 5°, XXXVIII – é reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, assegurados:
a) a plenitude de defesa; b) o sigilo das votações; c) a soberania dos veredictos; d) a competência para o
julgamento dos crimes dolosos contra a vida.” (BRASIL, 2020).
23
Manifestação da PGR n. 78/2018 – SDHDC/PGR – Sistema Único n. 152174/2018, de 1°.06.2018.
Andamento em 25.06.2018. Disponível em: <http://portal.stf.jus.br/processos/downloadPeca.asp?id=314
696692&ext=.pdf>. Acesso em: 25 maio 2020.

372 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


O Juiz Natural na Justiça Militar Federal Brasileira

ses. O direito ao devido processo legal e a um julgamento justo por juiz competente,
independente e imparcial, previstos na Constituição brasileira (art. 5º, LIV), no Pacto
Internacional de Direitos Civis e Políticos (art. 14) e na Convenção Americana de
Direitos Humanos (art. 8º), aliado ao princípio da proibição do retrocesso, exigem
que seja mantida a competência atual do Tribunal do Júri para julgar militares (dos
Estados membros ou das Forças Armadas) que cometerem crimes dolosos contra a
vida de civis, mantendo-se a igualdade e o juiz natural para todos. (BRASIL, 2018b).

Paralelamente, em sede de controle difuso, propalam-se precedentes24 do re-


conhecimento incidental da “inconstitucionalidade; inconvencionalidade; e/ou não
recepção” dos dispositivos do Código Penal Militar que imputam crimes militares a
civis em tempos de paz e atribuem à Justiça Militar a competência para julgá-los
nessas hipóteses. Perquirindo-se sobre a ratio essendi, despontam supostas violações
ao arts 5º, LIII25 e § 2º, da Constituição Federal de 1988, e ao art. 8.1 do Pacto de
São José da Costa Rica26.
Nessa senda, em 25.06.2019, a 2ª Turma Especializada do Tribunal Regional
Federal da 2ª Região, no julgamento do Recurso em Sentido Estrito n. 0039212-
39.2012.4.02.510127 versando sobre o caso conhecido como “Providência”28, acor-
dou em encaminhar os referidos autos ao Órgão Especial daquela Corte para apreci-
ação de inconstitucionalidade da Lei 13.491/2017. Tudo sob o unânime argumento
de que “a ampliação legislativa dos crimes militares para além dos interesses da
Administração Militar traduz evidente ofensa aos princípios constitucionais da
igualdade e do juiz natural”. Em 05.03.2020, o incidente de arguição de inconstitu-

24
Decisão do Juiz Federal Substituto Frederico Montedonio Rego – 8ª Vara Federal Criminal do Rio de
Janeiro/RJ – no bojo do Termo Circunstanciado n. 5038654-35.2019.4.02.5101/RJ, em 15.10.2019.
Disponível em: <https://www.conjur.com.br/dl/tempos-paz-justica-militar-nao-julgar.pdf>. Acesso em: 24
maio 2020.
25
“ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente” (BRASIL, 2020).
26
“Art. 8º – garantias judiciais: 1. Toda pessoa terá o direito de ser ouvida, com as devidas garantias e
dentro de um prazo razoável, por um juiz ou Tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido
anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação penal formulada contra ela, ou na determinação
de seus direitos e obrigações de caráter civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer outra natureza.” Disponível
em: <http://www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/bibliotecavirtual/instrumentos/sanjose.htm>. Acesso em:
24 maio 2020.
27
Acórdão disponível para consulta pública eletrônica a partir da informação: “nome da parte”. Rel.
Desembargador André Fontes. Recorrente: Ministério Público Federal. Recorrido: Vinicius Ghidetti de
Moraes Andrade. Disponível em: <http://portal.trf2.jus.br/portal/consulta/cons_procs.asp>. Acesso em: 07
abr. 2020.
28
Triplo homicídio registrado na cidade do Rio de Janeiro/RJ, em 14.06.2008, envolvendo militar do Exército
Brasileiro. As vítimas – civis – eram residentes no Morro da Providência. O Ministério Público Federal
recorreu de decisão da 7ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro no sentido de declinar de sua
competência para a Justiça Militar da União após a sanção da Lei 13.491/2017. Processo em curso após 12
anos dos fatos. Disponível em: <http://www.mpf.mp.br/regiao2/sala-de-imprensa/noticias-r2/caso-
providencia-mpf-pede-que-tenente-volte-a-ser-julgado-na-justica-federal.> Acesso em: 07 abr. 2020.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 373


Luciana Gonçalves Dias / Regina Vera Villas Bôas

cionalidade29 foi rejeitado por não ter sido alcançada a maioria absoluta, nos termos
do voto do Relator.
Com a devida vênia, e como suso comentado, entende-se que nenhum dos ar-
gumentos até então suscitados contra a extensão do rol dos delitos castrenses se
sustentam para a realidade da Justiça Militar Brasileira: elencada pelo Poder Consti-
tuinte como Órgão do Poder Judiciário – tanto quanto a Justiça do Trabalho e/ou a
Justiça Eleitoral, verbi gratia – e fundada, portanto, sob rígidos parâmetros constitu-
cionais e legais para salvaguarda do contraditório, da ampla defesa e do devido pro-
cesso legal.
Conquanto, diante do contexto histórico-social apresentado, seria possível de-
fender, particularmente perante a sociedade civil, que a Lei 13.491/2017 representa
um avanço em termos de garantias processuais – uma busca por expertise; e não um
uma espécie de foro especial privativo das Forças Armadas com vistas à leniência?
Na tentativa de melhor investigar essa problemática, propõe-se o estudo do “caso
Guadalupe”30.
Conforme consta nos autos da Ação Penal Militar 7000600-15
.2019.7.01.0001 – em curso na 1ª Auditoria da 1ª Circunscrição Judiciária Militar31
– na tarde do dia 7.04.2019, no bairro de Guadalupe, cidade do Rio de Janeiro/RJ,
militares do Exército Brasileiro, durante serviço de patrulhamento32 e alegando per-
seguição a criminosos, dispararam arma de fogo contra veículo particular, ocasio-
nando – indubitavelmente por erro – a morte de dois civis: o motorista do veículo e
um nacional que se aproximou do local para prestar socorro à primeira vítima.
Em caráter imediato, dez agentes33 diretamente envolvidos na operação fo-
ram presos em flagrante delito34 lavrado por autoridade de Polícia Judiciária Militar
– competência fixada nos moldes do art. 124 da Constituição Federal c/c art. 9°, §

29
Julgamento da Arguição de Inconstitucionalidade n. 0039212-39.2012.4.02.5101 disponível para consulta
pública eletrônica a partir da informação: “nome da parte”. Rel. Desembargador Poul Erik Dyrlund.
Recorrente: Ministério Público Federal. Recorrido: Vinicius Ghidetti de Moraes Andrade. Disponível em:
<http://portal.trf2.jus.br/portal/consulta/cons_procs.asp>. Acesso em: 07 abr. 2020.
30
Informações publicizadas por intermédio da Agência de Notícias do STM no sítio eletrônico do Tribunal
e/ou extraídas por meio de consulta pública junto ao E-Proc JMU. Disponível em: <https://eproc1
g.stm.jus.br/eproc_1g_prod/externo_controlador.php?acao=processo_consulta_publica.> Acesso em: 24
maio 2020.
31
Art. 2° Para efeito de administração da Justiça Militar em tempo de paz, o território nacional divi-
de-se em doze Circunscrições Judiciárias Militares, abrangendo: a) a 1ª – Estados do Rio de Janeiro
e Espírito Santo; b) a 2ª – Estado de São Paulo; c) a 3ª – Estado do Rio Grande do Sul; d) a 4ª – Es-
tado de Minas Gerais; e) a 5ª – Estados do Paraná e Santa Catarina; f) a 6ª – Estados da Bahia e
Sergipe; g) a 7ª – Estados de Pernambuco, Rio Grande do Norte, Paraíba e Alagoas; h) a 8ª – Esta-
dos do Pará, Amapá e Maranhão; i) a 9ª – Estados do Mato Grosso do Sul e Mato Grosso; j) a 10ª –
Estados do Ceará e Piauí; l) a 11ª – Distrito Federal e Estados de Goiás e Tocantins; m) a 12ª – Es-
tados do Amazonas, Acre, Roraima e Rondônia. (BRASIL, 2018a).
32
Caracterizada como operação militar de segurança de instalações militares na região dos Próprios Nacionais
de Guadalupe, na cidade do Rio de Janeiro.
33
Dentre eles: um 2° Tenente; um 3° Sargento; e oito Soldados – todos militares federais temporários.
34
APF n. 7000461-63.2019.01.0001 – Comando da 1ª Divisão de Exército.

374 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


O Juiz Natural na Justiça Militar Federal Brasileira

2°, inc. II, do Código Penal Militar. No dia 10.04.2019, após realização de audiência
de custódia, nove dos flagranteados tiveram sua prisão preventiva35 decretada por
decisão monocrática de Juíza Federal Substituta da Justiça Militar. A inicial acusató-
ria foi oferecida, em 10.05.2019, pelo Ministério Público Militar, sendo recebida em
dia subsequente. Em 23.05.2019, levados à apreciação do Superior Tribunal Militar
os requisitos do art. 255 do Código de Processo Penal Militar (BRASIL, 2019), a prisão
preventiva dos nove militares foi revogada no bojo do Habeas Corpus 7000375-
25.2019.7.00.000036, cuja sessão de julgamento foi transmitida online37, em formato
aberto e em tempo real. O Processo segue seu movimento regular em primeira instância,
já registrados no sistema de consulta processual – e-Proc JMU – um mil e quarenta e
cinco (1.045) eventos entre os dias 11.05.2019 e 14.10.202038. Conforme informado pela
Agência de Notícias do Superior Tribunal Militar, “neste momento, esta Ação Penal
contra os 12 militares está se aproximando da fase final39”.
Da breve síntese acima, extraem-se importantes conclusões para o presente traba-
lho. Primeiramente, demonstra-se a semelhança procedimental inicial entre as ações
criminais comuns e militares, com destaque para a celeridade; a rigidez e a transparência
da Justiça Militar da União. Necessário abordar, outrossim, que os fatos ocorreram em
situação de plena normalidade institucional, envolvendo a segurança de instituições
militares – não se tratando de “militarização” de crimes contra os Direitos Humanos. Por
derradeiro, faz-se mister ressaltar que todos os réus no “caso Guadalupe” são militares
temporários, na sua maioria soldados oriundos, em regra, do mesmo contexto de vulne-
rabilidades das vítimas. Jovens que, no cumprimento de dever profissional, são instados
a decidir como agir em situações críticas, de forma proporcional e compatível com dire-
trizes operacionais; regras de engajamento e/ou normas de conduta. “É evidente que,
muitas vezes, o agente executor que atua com imediatidade ou urgência elege alternati-
vas ou opções debilitadas de elementos para ações pautadas no Direito, ocasionando
ações trágicas.” (SADDY, 2014, p. 280). Ainda nesse sentido:

Na apreciatividade, seu executor normalmente não tem tempo de refletir sobre seus juízos
de valor, por isso, está influenciado por questões psicológicas, por pressões emocionais e
discriminatórias, por grau de informação, por grau acadêmico e, também, por preconcei-
tos. Ademais, o mais comum é que a eleição ou a decisão não seja reversível, inclusive se,
a posteriori, sua opção seja declarada como ilegal. Não há como regressar ao status quo.
(SADDY, 2014, p. 287-288).

35
Motivada na preservação de princípios e normas ligadas à hierarquia e à disciplina militares, nos moldes do
art. 255, “e”, CPPM. (BRASIL, 2019).
36
Disponível em: <https://www.stm.jus.br/informacao/agencia-de-noticias/item/9655-superior-tribunal-mili
tar-revoga-prisao-preventiva-dos-nove-militares-no-caso-guadalupe>. Acesso em: 25 maio 2020.
37
Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=pAYRTcOBlDs>. Acesso em: 25 maio 2020.
38
Cabe destacar o período de suspensão dos prazos processuais em todo o território nacional como medida de
contenção da propagação do COVID-19, nos termos da Resolução 313, de 19.03.2020 – CNJ. Disponível
em: <https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2020/03/Resolu%C3%A7%C3%A3o-n%C2%BA-313-5.
pdf.> Acesso em: 25 maio 2020.
39
Disponível em: <https://www.stm.jus.br/informacao/agencia-de-noticias/item/10045-justica-militar-ouve-
testemunhas-de-defesa-e-reus-no-caso-de-civis-mortos-em-guadalupe-rj>. Acesso em: 25 maio 2020.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 375


Luciana Gonçalves Dias / Regina Vera Villas Bôas

Por essa ótica, processar e julgar militares no âmbito de uma justiça especializada
não significaria endossar tolerância a excessos não escusáveis e/ou a condutas teratológi-
cas. Mas estaria justificado pela expertise garantidora de um processo efetivo e justo. Em
complemento, colaciona-se argumento pertinente à função preventiva da pena, direta-
mente atrelada à manutenção da hierarquia e da disciplina por força do exemplo:

Além dessas especificidades, ainda existe um outro fator: e de sabença que a maior parte
do efetivo das Forças Armadas brasileiras é de militares temporários, sendo que grande
parte desse efetivo presta apenas o serviço militar obrigatório, o que exige resposta rápida
da justiça, por si só. (ALVES-MARREIROS, 2020, p. 167).

E com/em respeito à narrativa das vítimas e seus familiares que – enquanto civis
– não se identifiquem com os mesmos valores e tradições da caserna? Interessados dire-
tos na reprimenda punitiva estatal, que, em relação aos julgadores militares, tendem a
não compartilhar de “um mesmo espectro de vivências, ações e sentidos historica-
mente partilhados, ou seja, de um mesmo “mundo da vida”, se quisermos usar a
expressão habermasiana”. (ARMANDO RIBEIRO, 2013, p. 86). Nesse ponto espe-
cífico, entende-se haver possibilidade de evolução, sem necessidade de descarte total
dos aspectos positivos trazidos pela Lei 13.491/2017. Uma primeira alternativa seria,
como já exposto, o estudo sobre a pertinência/viabilidade da instituição de uma
espécie de Júri Popular na Justiça Militar40, a ser potencialmente composto por mili-
tares de carreira e civis reconhecidos como concidadãos. Outro caminho, que ora se
indica, seria uma trilha para além da dogmática, baseada na persecução de conteúdo
oculto e democrático ao postulado do Juiz Natural41: sua aceitabilidade social, destacan-
do a ideia que “a aceitação da ordem jurídica é distinta da aceitabilidade dos argumen-
tos sobre os quais ela apóia a sua pretensão de legitimidade”. (HABERMAS, 1997, v.
1, p. 59). Essa legitimação poderia ser obtida principalmente por intermédio do combate
ao desconhecimento sobre a Justiça Militar da União – seus fundamentos e organização
– e de uma maior aproximação com a sociedade civil, incluindo-se como exemplos de
pautas42: divulgação de audiências públicas; inserções na mídia; publicações acadêmicas;
espaços para debates; e visitações nas escolas/universidades. Inclui-se também a perspec-

40
Em 2016, a proposta de instituição do Júri na Justiça Militar Federal Brasileira foi ventilada no Superior
Tribunal Militar pelo Min. José Barroso Filho no julgamento do Recurso em Sentido Estrito 144-
54.2014.7.01.0101/RJ. Na oportunidade, seu voto de vista foi acompanhado pelos Ministros Maria
Elizabeth Guimarães Teixeira Rocha e Odilson Sampaio Benzi. Disponível em: <https://www2.stm.
jus.br/cgi-bin/nph-brs?s1=(+%220000144%22+%2254%22+%222014%22+%227%22+%2201%22+
%220101%22)+OU+%22144-54.2014.7.01.0101%22&l=30&d=SAMU&p=1&u=l&r=2&f=G>. Acesso em:
08 jul. 2020.
41
O postulado do Juiz Natural, segundo Ferrajoli, possui tríplice conteúdo, a saber: “a necessidade de que o
juiz seja pré-constituído pela lei e não indicado post factum; a impossibilidade de derrogação e a
indisponibilidade das competências; a proibição de juízes extraordinários e especiais.” (FERRAJOLI, 2014,
p. 543).
42
Proposições em consonância com meta específica da Justiça Militar da União publicada no Boletim
Estatístico, ano de 2018. Disponível em: <https://www2.stm.jus.br/st2/index.php/ctrl_visualizacao/visua
lizar_pdf/1550156992.PDF>. Acesso em: 10 jul. 2020.

376 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


O Juiz Natural na Justiça Militar Federal Brasileira

tiva do operador do Direito, trazendo à luz a pertinência de oferta obrigatória de discipli-


nas afetas ao Direito Penal/Processual Penal Militar e à Organização da Justiça Castrense
nos cursos de formação jurídica.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O trabalho refletiu, essencialmente, sobre o Juiz Natural na Justiça Militar Fede-
ral Brasileira, identificando os seus principais desafios, hodiernamente, para a efetivação
do acesso justo à justiça no processamento e julgamento de demandas envolvendo civis.
Mostrou-se, outrossim, que a Justiça Militar da União ainda busca soluções de
modernização para ser legitimamente respeitada como ramo especializado do Poder
Judiciário – tanto no plano interno; quanto no cenário humanitário internacional.
Nesse sentido, passou-se a analisar duas relevantes inovações no ordenamento ju-
rídico pátrio. Primeiramente, a trazida pela Lei 13.774/2018: que modifica a Lei de Or-
ganização da Justiça Militar da União, mormente no que tange ao julgamento monocráti-
co de civis pelo juiz togado. Em sequência, pela Lei 13.491/2017 – que, entre outras
modificações, acresce à Justiça Castrense competência para analisar demandas versando
sobre crimes dolosos contra a vida de civis cometidos por militares da ativa no contexto
de operações militares lato sensu.
Demonstrou-se, outrossim, que críticas versando sobre inconstitucionalidade;
inconvencionalidade; e/ou não recepção por afronta a garantias e direitos fundamentais
penais e processuais são descomedidas, sobretudo se passadas pelo filtro do garantis-
mo integral.
Tratando dos crimes militares cometidos por civis, notou-se que os debates não
versam propriamente sobre sua descriminalização, pautando-se apenas na questão da
competência jurisdicional. Ponto esse que já foi habilmente solucionado pelo art. 30, I –
B, da LOJMU – embora permaneçam censuras no que tange ao concurso de agentes; o
dilema do “ex-militar”; e a composição da esfera recursal. Sobre a redução de competên-
cia do Tribunal do Júri, verificaram-se dois aspectos: para o militar enquanto réu, pode
significar um avanço na busca por acesso justo à justiça, considerando a expertise da
Justiça Castrense para tratar de ações trágicas e casos afetos aos pilares da hierarquia e da
disciplina. Para os civis enquanto vítimas – e cabendo expandir para toda a sociedade –
trata-se de debelar, pela via da abertura democrática, o desconhecimento (motivador
de desconfiança) sobre uma justiça especializada que, tradicionalmente, tem valida-
do seu compromisso em ser ágil, rígida e transparente.

REFERÊNCIAS
ALVES-MARREIROS, A.; ROCHA, G.; FREITAS, R. Direito Penal Militar, São Paulo, Método, 2015,
1437 p.
ALVES-MARREIROS, Adriano, Hierarquia e Disciplina são garantías constitucionais: Fundamentos
para a diferenciação do Direito Militar, Londrina, PR, E.D.A, 2020, 214 p.
ARMANDO RIBEIRO, Fernando José, “Justiça Militar, escabinato e o acesso à justiça justa”, Revista
Amagis Jurídica, n. 9, dez. 2013, pp. 73-94. Disponível em: <https://revista.amagis.com.br/i
ndex.php/amagis-juridica/article/view/124>. Acesso em: 27 maio 2020.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 377


Luciana Gonçalves Dias / Regina Vera Villas Bôas

ASSIS, J. C. de; CAMPOS, M. Q. A., Comentários à Lei de Organização da Justiça Militar da União, 2.
ed., Curitiba, Juruá, 2019, 186 p.
BIERRENBACH, Flávio Flores da Cunha, “Direitos humanos e a administração da justiça por tribunais
militares” in ROCHA, Maria Elizabeth Guimarães Teixeira; PETERSEN, Zilah Maria Callado Fadul,
coord.; Coletânea de estudos jurídicos: bicentenário da Justiça Militar no Brasil, Brasília, DF, Superior
Tribunal Militar, 2008.
BRASIL, Supremo Tribunal Federal, Habeas Corpus 110.237 Pará, Impetrante: Defensoria Pública da
União, Rel. Min. Celso de Mello, Acórdão de 19.02.2013 [2013a]. Disponível em: <http://redir.s
tf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=3456276>. Acesso em: 23 maio 2020.
BRASIL, Supremo Tribunal Federal, Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 289, Re-
querente: Procurador-Geral da República, Rel. Min. Gilmar Mendes, Protocolo de 14.08.2013 [2013b].
Disponível em: <http://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=4448028>. Acesso em: 22 maio
2020.
BRASIL, Dec.-Lei 1.001, de 21.10.1969, Institui o Código Penal Militar, Brasília, DF, Presidência da
República, [2017]. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del1001Compilad
o.htm>. Acesso em: 05 maio 2020.
BRASIL, Lei 8.457, de 4.09.1992, Organiza a Justiça Militar da União e regula o funcionamento de seus
serviços auxiliares, Brasília, DF, Presidência da República, [2018a]. Disponível em: <http://www.planal
to.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8457.htm>. Acesso em: 05 maio 2020.
BRASIL, Supremo Tribunal Federal, Ação Direta de Inconstitucionalidade 5901, Requerente: Partido
Socialismo e Liberdade, Rel. Min. Gilmar Mendes, Protocolo em 26.02.2018 [2018b]. Disponível em:
<https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5359950>. Acesso em: 25 maio 2020.
BRASIL, Dec.-Lei 1.002, de 21.10.1969, Institui o Código de Processo Penal Militar, Brasília, DF,
Presidência da República, [2019]. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/De
l1002.htm>. Acesso em: 05 maio 2020.
BRASIL, [Constituição (1988)], Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, Brasília, DF,
Presidência da República, [2020]. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/c
onstituicao.htm>. Acesso em: 05 maio 2020.
CORTE IDH, Caso Palamara Iribarnne VS. Chile, Sentença de 22.11.2005. Disponível em:
<http://corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_135_esp.pdf>. Acesso em: 21 maio 2020.
DE LARA, P. C.; ROCHA, A. A., “O Caso Palamara Iribarne vs. Chile e sua importância na consolidação
da garantia do Princípio do Juiz Natural em face da Jurisdição Militar”, in PILATI, Adriana Fasolo;
MCUENCA, Andrés Gascon, coord.; Efetividade dos direitos humanos, culturas jurídicas e movimentos
sociais, Florianópolis, CONPEDI, 2020, pp. 176-196. Disponível em: <http://conpedi.danilolr.info
/publicacoes/150a22r2/b52j4bl7/9E3QQ518O4iv5W2X.pdf>. Acesso em: 27 maio 2020.
DUARTE, A. P.; CARVALHO, J. C. C. de, “A reinvenção da Justiça Militar Brasileira”, Revista do
Ministério Público Militar, Brasília, DF, n. 24, nov. 2014, pp. 39-58. Disponível em:
<http://www.mpm.mp.br/portal/wp-content/uploads/2018/06/revista-24.pdf>. Acesso em: 27 maio 2020.
FERRAJOLI, Luigi, Direito e razão: teoria do garantismo penal, Tradução de Ana Paula Zomer Sica et
al, São Paulo, Revista dos Tribunais, 2014, 925 p.
JIMÉNEZ SERRANO, P.; MISSAGGIA, A. D.; PASSOS, R. R. (org.), Vade Mecum Acadêmico de
Direito Militar, Rio de Janeiro, Jurismestre, 2019, 1110 p.
HABERMAS, Jürgen, Direito e Democracia: entre facticidade e validade, Tradução de Flávio Beno
Siebeneichler, Rio de Janeiro, Tempo Brasileiro, 1997, 2 v.
MAGALHÃES, Vlamir Costa, “O garantismo penal integral: enfim, uma proposta de revisão do fetiche
individualista”, Revista da SJRJ, n. 29, nov. 2010, pp.185-199. Disponível em: <https://www.
jfrj.jus.br/revista-sjrj/artigo/garantismo-penal-integral-enfim-uma-proposta-de-revisao-do-fetiche>.
Acesso em: 27 maio 2020.
MIRANDA, Jorge, Manual de Direito Constitucional: Direitos Fundamentais, 5 ed, Coimbra, Coimbra,
t. IV, 2012, 508 p.

378 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


O Juiz Natural na Justiça Militar Federal Brasileira

NAÇÕES UNIDAS, Projeto de Princípios sobre a Administração da Justiça por Tribunais Militares,
Doc. E/CN.4/2006/58, Rel. Especial da Subcomissão de Promoção e Proteção de Direitos Humanos:
Emmanuel Decaux, 13.01.2006. Disponível em: <http://undocs.org/sp/E/CN.4/2006/58>. Acesso em: 21
maio 2020.
NEVES, Cícero Robson Coimbra, Manual de Direito Processual Penal Militar: em tempo de paz, São
Paulo, Saraiva, 2014, 904 p.
NUCCI, Guilherme de Souza, Código Penal Militar Comentado, 2. ed. rev., Rio de Janeiro, Forense,
2014a, 591 p.
NUCCI, Guilherme de Souza, Código de Processo Penal Militar Comentado, 2. ed. rev., Rio de Janeiro,
Forense, 2014b, 710 p.
RAMOS, D. T.; COSTA, I. G. da; ROTH, R. J. (coord.), Direito Militar: Doutrina e Aplicações, Rio de
Janeiro, Elsevier, 2011, 964 p.
ROSA FILHO, Cherubim, A Justiça Militar da União através dos tempos: ontem, hoje e amanhã, 5. ed.
rev., Brasília, DF, Superior Tribunal Militar, 2017, 127 p.
SADDY, André, Apreciatividade e discricionariedade administrativa, Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2014,
474 p.
SADDY, André (coord.), Discricionariedade na área policial, Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2018, 290 p.
SILVA, Luiz Felipe Carvalho, “Uma perspectiva atual da competência da Justiça Militar da União para o
julgamento de civis”, Revista do Ministério Público Militar, n. 24, nov. 2014, pp.161-187. Disponível em:
<http://www.mpm.mp.br/portal/wp-content/uploads/2018/06/revista-24.pdf>. Acesso em: 27 maio 2020.
STRECK, Lenio Luiz, Hermenêutica Jurídica e(m) crise: uma exploração hermenêutica da construção
do Direito, 11 ed. rev., Porto Alegre, RS, Livraria do Advogado, 2014, 456 p.
VILLAS BÔAS, R. V.; SOARES, D. da S., “O direito fundamental social à educação de qualidade e a
(in)efetividade das políticas públicas voltadas aos jovens e adolescentes em situação de vulnerabilidade
social”, in MARTINI, Sandra Regina; DARCANCHY, Mara; SILVA, Robert Bonifácio da, coord.;
Direitos Sociais e Políticas Públicas II, Florianópolis, CONPEDI, 2019, pp. 225-241. Disponível em:
<http://conpedi.danilolr.info/publicacoes/no85g2cd/7r02z844/b3u3kVE6dy5x53go.pdf>. Acesso em: 12
jul. 2020.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 379


O Juiz Natural na Justiça Militar Federal Brasileira

MECANISMOS EXTRAJUDICIAIS DO DIREITO À SAÚDE


SOB A PERSPECTIVA DO TEOREMA DE COASE
EXTRAJUDICIAL MECHANISMS OF THE RIGHT TO HEALTH
FROM THE COASE THEOREM PERSPECTIVE
DOI: 10.19135/revista.consinter.00011.18
Recebido/Received 23.09.2020– Aprovado/Approved 28.10.2020
José Laurindo de Souza Netto1 – https://orcid.org/0000-0002-5096-9982
E-mail: jnl@tjpr.jus.br
Anderson Ricardo Fogaça2 – https://orcid.org/0000-0001-8495-9443
E-mail:andersonfog@yahoo.com.br
Adriane Garcel3 – https://orcid.org/0000-0002-6950-6128
E-mail: adriane.garcel@tjpr.jus.br

Resumo: O objetivo do trabalho é examinar as razões teóricas que sustentam o direito à


saúde como direito prestacional oponível ao Estado, particularmente, na seara da
concessão individual que impacta sobremaneira a sustentabilidade do sistema. Parte-se
da hipótese que, na judicialização da saúde, ao se dar provimento a uma demanda
individual, os custos são repartidos para toda a sociedade. A problemática reside em
analisar o fenômeno sob a ótica do Teorema de Coase, que permite a ponderação dos
custos sociais resultantes da judicialização da saúde, buscando alternativas extrajudiciais
que não demandem recursos do orçamento público destinado ao direito à saúde. Para a
elaboração, será utilizado o método lógico dedutivo combinado aos precedentes de
pesquisa bibliográfica e documental. Em relação aos resultados alcançados, tem-se que a
principal contribuição do trabalho é que o planejamento do Estado, voltado à aplicação
dos mecanismos extrajudiciais, Parcerias de Desenvolvimento Produtivo, Fomento
Setorial e Licenciamento Compulsório, apresenta-se enquanto alternativa mais efetiva a
materialização do direito à saúde. Somado a isso, a juseconomia é importante ferramenta
que auxilia o exame das consequências práticas, fornecendo ao agente público
diagnóstico e prognóstico para a tomada da decisão mais acertada.

1
Doutor e Mestre pela Universidade Federal do Paraná. Pós-doutorado pela Faculdade de Direito da
Universidade Degli Studi di Roma – La Sapienza com Estágio de Pós-doutorado em Portugal. Professor no
Mestrado da Universidade Paranaense – UNIPAR. Desembargador e 2º Vice-Presidente do Tribunal de
Justiça do Estado do Paraná. Curitiba, Paraná, Brasil. E-mail: jln@tjpr.jus.br – ORCID id:
https://orcid.org/0000-0002-5096-9982
2
Mestre pela Universidade Internacional – UNINTER. Professor da Escola da Magistratura do Paraná –
EMAP. Juiz de Direito em 2º Grau no Tribunal de Justiça do Estado do Paraná. Curitiba, Paraná, Brasil.
E-mail: andersonfog@yahoo.com.br – ORCID id: https://orcid.org/0000-0001-8495-9443.
3
Mestranda em Direito Empresarial e Cidadania no Centro Universitário Curitiba – UNICURITIBA. Pós-
graduada pela Escola da Magistratura do Paraná – EMAP e pela Fundação Escola do Ministério Público –
FEMPAR. Assessora Jurídica do TJPR e Mediadora Judicial. Curitiba, Paraná, Brasil. E-mail:
adriane.garcel@tjpr.jus.br – ORCID id: https://orcid.org/0000-0002-6950-6128

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 381


José Laurindo de Souza Netto / Anderson Ricardo Fogaça / Adriane Garcel

Palavras-chave: Direito fundamental social à Saúde. Investimento. Análise Econômica


do Direito. Teorema de Coase. Fomento Setorial. Parcerias de Desenvolvimento
Produtivo. Licenciamento Compulsório.
Abstract: This essay aims to examine, briefly, the theoretical reasons that support the
right to health as a right to benefit and opposed to the State, a situation in which the
related syndicability (individually considered) is identified as a factor of relevant impact
on the sustainability of the system protective as a whole. It is assumed that, in the
judicialization of health, when granting an individual demand, the costs are distributed
throughout the society. Then, this phenomenon is analyzed through the lens of Coase
Theorem, demonstrating the necessity to analyze the social costs of the judicialization of
health. In the end, alternative solutions out of court that do not require resources from
the public budget destined to the right to health are ventilated, which present an
excellent cost-benefit ratio.
Keywords: Fundamental and social right to health. Investments in public health. Law
and Economics. Coase Theorem. Sector Promotion. Productive Development
Partnerships. Compulsory Licensing.
Sumário: 1. Introdução 2. A proteção constitucional do direito à saúde 3. As
externalidades do acesso à saúde sob a ótica do teorema de coase 4. Mecanismos
extrajudiciais 4.1 parcerias de desenvolvimento produtivo 4.2 atividade fomentadora e
fomento setorial 4.3 licenciamento compulsório 5. Considerações finais 6. Referências.

1 INTRODUÇÃO
A proteção do direito à saúde é garantida constitucionalmente, como corolá-
rio da dignidade da pessoa humana. Ocorre que, apesar de expressamente prevista na
Constituição de 1988, inclusive configurando cláusula pétrea, a garantia de um efe-
tivo sistema público de saúde não é tarefa simples, particularmente, em um país com
mais de 200 (duzentos) milhões de habitantes.
Neste cenário, a judicialização da saúde se mostra, muitas vezes, como meio
de garantir o atendimento a uma demanda individual, principalmente em se tratando
de medicamentos, ou serviços de alto custo, não previstos nas listas oficiais. Além
disso, a grande maioria das decisões judiciais se baseiam na proteção constitucional
e acabam por impor aos entes federativos a obrigação de satisfazer os anseios indi-
viduais extraordinários ao planejamento estatal.
Neste contexto, o presente trabalho tem como objetivo examinar, sob a ótica
do Teorema de Coase, as decisões frente aos custos sociais. Parte-se da hipótese que
a imposição por parte do Judiciário nada mais faz do que repassar o valor do medi-
camento, ou serviço, para toda a sociedade. Para além, busca-se, como resultados,
investigar alternativas extrajudiciais mais adequadas que auxiliem na promoção do
direito à saúde sem comprometer o planejamento orçamentário.
Para tanto, preliminarmente, o direito à saúde será estudado sob o prisma da
proteção constitucional. Posteriormente, adentrando na ótica do Teorema de Coase.
Por fim, serão apresentadas alternativas extrajudiciais à desoneração do erário, parti-
cularmente, as Parcerias de Desenvolvimento Produtivo, o Fomento Setorial e o
Licenciamento Compulsório.

382 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Mecanismos Extrajudiciais do Direito à Saúde Sob a Perspectiva do Teorema de COASE

2 A PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL DO DIREITO À SAÚDE


A Constituição Federal da República é Lei Fundamental que está no topo da
pirâmide normativa, fundamento de validade último de todas as demais normas
jurídicas de uma sociedade. Não obstante, foi elaborada por pessoas democratica-
mente reunidas em uma Assembleia Nacional Constituinte e não oriunda, ou por
meio, de uma divindade (BARROSO, 2009, p. 120-121).
Em decorrência disso, é dotada – em razão, dentre outros fatores, de escolhas
políticas acompanhadas de falibilidade (inerente à condição humana) – das ideologi-
as dominantes da época, vicissitudes naturais do processo. Desprovida, portanto, de
um aspecto “metafísico” que, por vezes, algumas interpretações transparecem. Des-
tarte, do resgate sociológico, dentro da concepção de Ferdinand Lassalle – que dife-
rencia, na obra “A Essência da Constituição”, a constituição escrita ou jurídica (me-
ra folha de papel) da constituição real ou material (resultante do somatório dos fato-
res reais de poder) –, percebe-se que a Constituição Cidadã de 1988, fortemente
Social e Dirigente, amplamente garantidora de direitos e programática, nada mais é
do que reflexo das escolhas, em larga medida, influenciadas por inúmeras tensões
públicas advindas dos mais variados segmentos da sociedade.
Para além do amplo rol contido na Carta de 1988, os direitos e garantias fun-
damentais ganham especial destaque, ao passo que elevados ao patamar de cláusula
pétrea. Isto, porque, apesar de o inc. IV do art. 60, § 4°, da Constituição, apontar
como cláusula pétrea os “direitos e garantias individuais”, compreende-se que os
direitos sociais se incluem entre os direitos fundamentais, atraindo o regime jurídico
destes.
A equiparação permite constatar que o rol dos direitos sociais não é taxativo,
uma vez que compreende cláusula de abertura material, ou de não tipicidade, que
permite ampliação de modo a abranger direitos materialmente fundamentais que
estejam fora do Título II, conforme traça o § 2º do art. 5º da Constituição. Afora
isso, em razão do tratamento jurídico dado pelo § 1º do art. 5º da Constituição Fede-
ral, possuem aplicabilidade imediata, condição que, por si só e de plano, não afasta
“uma série de questões controversas, amplamente debatidas nas esferas doutrinária
e jurisprudenciais” (SARLET, MARINONI, MITIDIERO, 2015, p. 602).
Neste contexto, a saúde é direito fundamental social previsto nos arts. 6º e
196, ambos da Constituição Federal, enquanto direito de todos e dever do Estado,
assegurado através de políticas sociais e econômicas que visem, dentre outros fins, o
acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e
recuperação.
Tem-se, ainda, que o direito apresenta dupla dimensão, ou perspectiva, a di-
mensão subjetiva e a objetiva. A primeira, com enfoque no próprio titular do direito,
individualmente, e que gera o direito subjetivo de proteção (negativo) face ingerên-
cias, bem como de exigência de prestação (positivo) por parte do Estado. A segunda,
por sua vez, cria dever de proteção do Estado contra agressões, à chamada eficácia
irradiante dos direitos fundamentais. A propósito, a conjugação das dimensões sub-
jetiva e positiva abre a possibilidade de as pretensões individuais serem reclamadas
Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 383
José Laurindo de Souza Netto / Anderson Ricardo Fogaça / Adriane Garcel

ao Estado, através do Poder Judiciário, ante o caráter prestacional (exige um facere


estatal) do direito, ao menos na perspectiva do mínimo existencial (SARLET, MA-
RINONI, MITIDIERO, 2015, p. 595).
Neste contexto, é sabido que aos direitos sociais deve-se garantir máxima efi-
cácia e efetividade, com obrigação solidária de implementação por parte de todos os
entes, somado ao “dever de aplicação direta de tais normas por parte dos órgãos do
Poder Judiciário” (SARLET, MARINONI, MITIDIERO, 2015, p. 595). Entretanto,
isto não quer significar a existência de um direito fundamental in abstrato, sem
limitações fáticas e jurídicas. Em contraposição, tem-se a reserva do possível, cuja
perspectiva economicamente relevante retoma a discussão do fator custo.
Em verdade, a pretensão de, por meio do Poder Judiciário, exigir da Entidade
Política a obrigação de realizar “uma prestação diretamente fundada na Constitui-
ção” mostra-se nada simples e, verdadeiramente, desafiadora (SARLET, MARINO-
NI, MITIDIERO, 2015, p. 598). O indivíduo busca o Judiciário a fim de fazer valer
sua necessidade e condição de titular do direito. Na sequência, tornada a coisa litigi-
osa, o Judiciário pode se comportar de duas maneiras, ou de forma autocontida (au-
tocontenção judicial), ou de forma expansiva, ou ativista (ativismo judicial). E qual é
a fórmula certa? Depende. Em algumas situações deve se autoconter, noutras deve
atuar de maneira expansiva.
Acerca disso, destaca-se que o ativismo judicial não é um fato decorrente da
Constituição (ou do modelo institucional vigente), mas sim uma atividade, uma
conduta proativa e ampliativa do intérprete, ou seja, o ativismo judicial é um modo
proativo e expansivo de interpretar a Lex Mater, inclusive, para levá-la a situações
que não foram expressamente contempladas, nem pelo constituinte nem pelo legis-
lador ordinário. Portanto, existem formas de manifestação desse ativismo. Adicio-
nalmente, verifica-se a autocontenção judicial como o outro lado da moeda do ati-
vismo judicial, pois, aquela reflete uma atuação antagônica a esta atitude proativa, à
medida que a postura do Poder Judiciário é contida, mais comedida, “conduta pela
qual o judiciário procura reduzir sua interferência nas ações dos outros Poderes”
(BARROSO, 2015). Para além desse imbróglio, o que se pode afirmar categorica-
mente é que a proteção individual excessiva e incoerente pode levar o sistema prote-
tivo como um todo à ruína.

3 AS EXTERNALIDADES DO ACESSO À SAÚDE SOB A ÓTICA DO


TEOREMA DE COASE
Uma vez entendida a saúde como um direito de todos e dever do Estado,
mostra-se intensa e significativa a obrigação estatal de consumar o seu núcleo essen-
cial, com necessária disponibilização de recursos pecuniários (considerando que
“Direitos não nascem em árvores”), de modo geral, previstos no orçamento público
dos entes federativos. Conforme discorre Galdino (2005, p. 211): “As escolhas trá-
gicas – na já antes aludida expressão de Calabresi e Bobbit – que são impostas pela
escassez de recursos financeiros para tutela dos direitos salientam a valoração que
uma sociedade atribui a tais ou quais direitos. Isto porque as decisões (ou escolhas)

384 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Mecanismos Extrajudiciais do Direito à Saúde Sob a Perspectiva do Teorema de COASE

acerca das alocações dos recursos para tutela de determinados direitos, enquanto ou-
tros restarão desprotegidos, espelha os valores da sociedade em questão”.
Malgrado, se de um lado não se pode visualizar a implementação de direitos de
maneira utópica (sem se considerar o “fator custo”), de outro mostra-se necessário trans-
por a concepção dos custos como mero obstáculo, uma vez que os recursos econômicos
são, na realidade, “pressupostos, que tornam possível a realização dos direitos” (GAL-
DINO, 2005, p. 213).
Eventual insuficiência de recursos constitui mais do que mero empecilho à im-
plementação do direito à saúde, revela as escolhas trágicas realizadas pela autoridade
competente, o “abandono” de certos direitos, ou políticas públicas, má gestão, desvio da
finalidade pública. Em verdade, serve como espécie de feedback que indica o redirecio-
namento da máquina pública para determinada necessidade.
Nesse cenário e em razão da escassez de recursos em face da vastidão de necessi-
dades públicas, à Administração compete efetivar as escolhas “menos trágicas” que
integrarão os projetos de Leis Orçamentárias (lato sensu), ocasião em que deverá avaliar
conveniência e oportunidade, uma vez que nem todos os direitos fundamentais alberga-
dos na Lei Maior poderão ser efetivados em sua totalidade. Posteriormente, a escolha é
ratificada pelo Poder Legislativo competente (em um verdadeiro pêndulo da harmonia
entre os poderes).
Verdade seja dita, considerando que nem todos os direitos fundamentais poderão
ser efetivados, e, quando o forem, não serão disponibilizados a todos integralmente,
surge à noção de tragicidade da escolha a ser feita pelo Poder Público. Certamente, inú-
meras pessoas acabarão desassistidas, razão pela qual, à luz da eficiência e maximização,
deve o Estado direcionar os recursos às ações que impactem o maior número de pessoas
em situações similares.
Diante deste cenário, bastante em decorrência da imperiosa racionalização dos in-
suficientes recursos financeiros, a Análise Econômica do Direito – também conhecida
por AED, juseconomia ou Direito e Economia em decorrência da acepção talhada pelos
americanos “law and economics” (MACKAAY, ROUSSEAU, 2015, p. 202) – eviden-
cia-se útil e profícua, ao possuir como vetores decisórios a eficiência, a otimização dos
recursos e o melhor manejo da relação custo – benefícios. Com efeito, a questão da ad-
ministração das infinitas necessidades, diante dos limitados recursos, reflete importante
questionamento da Economia, enquanto ciência, que lança o debate em torno da concep-
ção de eficiência, atingir grau máximo de eficiência na aplicação de recursos.
Com base nesta perspectiva, Flávio Galdino preleciona que a “questão central
na análise econômica do direito será a eficiência econômica, ou mais precisamente, a
maximização da eficiência econômica das instituições sociais e, dentre estas, também do
Direito” (GALDINO, 2005, p. 242). Destacando, ainda, que:

Antes de ser uma inimiga ou um mero artifício ideológico para denegação de direitos, a
compreensão da escassez de recursos – ao lado da correta compreensão dos custos dos
direitos – através de análises de custo-benefício, significa um meio de converter o Direito
em um poderoso instrumento de transformação social, representando também, até mesmo,
uma justificativa para o próprio Direito (GALDINO, 2005, p. 242).

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 385


José Laurindo de Souza Netto / Anderson Ricardo Fogaça / Adriane Garcel

Com base nisso, tem-se que os custos de transação podem ser concebidos como
meios, ou maneira, de precificar incertezas que impactam, em maior ou menor grau, as
operações econômicas (SZTAJN, 2004, pp. 283-302). Adiante, a dita externalidade pode
ser compreendida, grosso modo, como o efeito da atividade econômica em terceiros,
positivo/benéfico ou negativo/lesivo. Inclusive, é por este motivo que se fala em externa-
lidades positivas e negativas, “falhas de mercado”. Em outros termos, consiste na reper-
cussão favorável, ou prejudicial, que atinge agentes que não participaram diretamente da
transação, entretanto, em alguma medida, acabam sentindo os efeitos indiretamente.
Nessa toada, Mackaay e Rousseau (MACKAAY, ROUSSEAU, 2015, p. 202) ilus-
tram um caso usual de externalidade, conectando-o com os custos da transação, in verbis:

O exemplo que se costuma dar é a poluição gerada pela atividade de uma empresa em de-
trimento de vizinhos. O custo da poluição não integra os custos que entram no cálculo da
empresa. O bem ou o fato de produção (aqui o meio ambiente) não é apropriado perfeita-
mente: o poluidor o “toma” sem ser proprietário e sem pagar. Produz a um custo menor
do que o custo real. A verdade dos preços não é respeitada, e os atores econômicos orien-
tam mal suas decisões de produção e de consumo, fiando-se no preço.

Aliás, foi neste cenário que o economista inglês Arthur Pigou, a fim de re-
construir a verdade dos preços, pregoava o cabimento das “regras de responsabili-
dade, ou, também, – intervenção mais direta – impostos ditos ‘pigouvianos’ ou,
eventualmente, subvenções ou forma de regulamentação impostas ou acordadas
com aqueles que criam as externalidades negativas” (MACKAAY, ROUSSEAU,
2015, p. 204). A tese de Pigou – defendida na obra “The Economics of Welfare”,
originalmente publicada em 1920 – foi rebatida por Ronald Coase.
Para Coase, as externalidades compreendem, “no fundo, diferenças relativas
aos usos correntes e incompatíveis de um recurso que se tornara escasso”, panorama
que lhe proporcionou afirmar que a “solução a que as partes chegariam para resol-
ver tais diferenças não depende da forma pela qual os direitos são atribuídos, mas é
sempre a utilização mais valorizada (a mais proveitosa) a que prevalecerá” (MA-
CKAAY, ROUSSEAU, 2015, p. 202).
Em resposta ao caso da fábrica que gera poluição, Coase afirma que as pro-
postas de Pigou, de imposição do dever de pagamento de um tributo ou de remoção
da fábrica da área em que está instalada, são inadequadas. Nas palavras de Ribeiro e
Paganella:

Coase, ao invés, sustenta que as propostas podem ser inapropriadas, eis que nem
sempre conduzem aos resultados desejáveis. Em sua teoria, é quebrado o paradigma
segundo o qual o causador da fumaça seria sempre e simplesmente o único responsá-
vel pelo dano. No caso da fábrica, Coase pondera que não havendo a imposição do
tributo, poderia haver fumaça em demasia e pessoas nas proximidades em número in-
suficiente, mas com o tributo poderia haver pouca fumaça e pessoas em demasia e
não haveria razão para supor que um desses resultados seria necessariamente prefe-
rível ao outro. Coase considera que muito embora o problema exista porque existe a
fábrica, também decorre da existência das propriedades vizinhas. O problema, por-

386 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Mecanismos Extrajudiciais do Direito à Saúde Sob a Perspectiva do Teorema de COASE

tanto, não ocorre tão somente em função de um único causador (RIBEIRO, PAGA-
NELLA, 2019, p. 78).

Assim, para o economista, a solução deve focar em evitar o prejuízo mais


grave, independentemente de quem for o responsável pelo dano. Em um regime
hipotético, em que os custos de transações sejam iguais à zero, a eficiência alocativa
será atingida independentemente de como os direitos são distribuídos pelo Estado.
Como esse regime é apenas hipotético, o Estado deve agir para facilitar as transa-
ções entre os agentes econômicos, com o objetivo de maximizar a riqueza. Devendo
compreender, para tanto, quais as consequências econômicas de suas decisões. Nesses
termos, Coase afirma que ao se projetar e escolher entre arranjos sociais, é necessário
considerar o efeito total:

But in choosing between social arrangements within the context of which individual deci-
sions are made, we have to bear in mind that a change in the existing system which will
lead to an improvement in some decisions may well lead to a worsening of others. Fur-
thermore we have to take into account the costs involved in operating the various social
arrangements (whether it be the working of a market or of a government department), as
well as the costs involved in moving to a new system. In devising and choosing between so-
cial arrangements we should have regard for the total effect. This, above all, is the change
in approach which I am advocating (COASE, 1960, p. 44.)

Dessa maneira, por um lado, Pigou sugere a interferência corretiva da responsabi-


lização estatal (v.g., demandas judiciais, tributação extrafiscal, ou seja, a tributação com
fins não arrecadatórios, mas como meio de o Estado intervir no mercado interno,
dirigindo-o com ações públicas que incentivam ou desmotivam os atores econômi-
cos, sobre a atividade econômica em questão). Na memorial lição Torres (2004, p.
185-186), tem-se que a “extrafiscalidade, como forma de intervenção estatal na
economia [...]” quando “diluída na fiscalidade, exerce variadíssimas tarefas de
política econômica, competindo-lhe, entre outras: o desestímulo ao consumo de
certos bens nocivos à saúde, [...]; o incentivo ao consumo de algumas mercadorias
[...]; a inibição de importação de bens industrializados e o incentivo à exportação,
através dos impostos aduaneiros etc.”
Por outro lado, Coase recomenda que o problema seja resolvido pelos pró-
prios agentes econômicos. Neste cenário, a técnica de correção de preços de merca-
do deve privilegiar a utilização mais proveitosa, independentemente de quem seja o
responsável jurídico pelo dano. Para o autor, o custo de exercer um direito é sempre
a perda sofrida em consequência do exercício desse próprio direito (COASE, 1960,
p. 44). No entanto, considerando-se que o mundo ideal, sem custos de transação, é
apenas hipotético, é necessário delimitar os direitos para a diminuição dos custos de
transação, o que deve ser feito pelo Estado.
O raciocínio proposto por Coase se baseia em uma lógica consequencialista
de custo-benefício, cujas origens remontam ao utilitarismo de Jeremy Bentham e
John Stuart Mill – escola que antecedeu à Análise Econômica do Direito. A corrente
tinha como fundamento a ideia de que o ser humano toma suas decisões de forma a
Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 387
José Laurindo de Souza Netto / Anderson Ricardo Fogaça / Adriane Garcel

maximizar seu prazer e diminuir sua dor (BENTHAM, 1984). Assim, a concepção
serviu de base para as teorias jurídico-econômicas da Escola de Chicago.
Isto posto, factível a fixação de um paralelo entre as lições advindas da Aná-
lise Econômica do Direito e o debate proposto. Considerando o fato de que o Estado
possui o dever prestacional – pois o Estado figura no polo passivo de uma relação
jurídica em que o respectivo objeto constitui-se uma prestação positiva, no sentido em
que depende para sua efetivação de um fazer estatal (BARCELLOS et al., 2002) – e o
indivíduo detém a titularidade do direito fundamental à saúde, observe-se que o custea-
mento de medicamentos de valor agregado, viabilizado pela judicialização da saúde, dá
origem a uma espécie de externalidade negativa. A concessão de tecnologia de saúde de
grande monta, não constante na lista do SUS (Portaria 2.892/2009 do Ministério da Saú-
de) e, consequentemente, fora do planejamento orçamentário, tem enquanto resultado
efeito colateral financeiramente nocivo ao Estado como um todo.
Ao se deferir um pedido individual, condenando o ente público a prestar o
serviço, ou medicamento necessário, inúmeras são as externalidades que prejudicam
agentes que sequer participaram do processo. Em decorrência, o julgador deve pre-
viamente considerar as consequências quando da tomada de decisões recorrendo às
tecnologias da informação e comunicação para obtenção das informações necessá-
rias (FREITAS, BARDDAL, 2019, p. 107-126).
Dentre os aspectos negativos, as decisões procedentes acabam por atender
apenas interesses individuais e criar políticas públicas em favor de poucos, deixando
de canalizar o recurso público para as políticas coletivas. Por outro lado, propiciam a
revisão e fomento das políticas públicas, bem como inserem o debate sanitário como
pauta de destaque na realidade política brasileira, o que é de suma importância para
o enriquecimento e desenvolvimento do estudo à saúde (SCHULZE, GEBRAN
NETO, 2015, p. 154).
Neste contexto, faz-se necessário analisar alternativas que garantam eficiên-
cia no acesso à saúde, sem comprometer o planejamento orçamentário.

4 MECANISMOS EXTRAJUDICIAIS
A judicialização da saúde analisada sob a ótica dos estudos de Coase permite
concluir que condenar o Estado a conceder um medicamento, ou serviço, necessário
em uma demanda individual nem sempre é a melhor alternativa, visto que o valor
será repassado para toda a sociedade. Neste contexto e diante do crescimento exces-
sivo de demandas judiciais na área da saúde, com impacto direto no orçamento pú-
blico limitado, cumpre analisar alternativas que viabilizem o acesso à saúde, sem
impactar o orçamento previsto para a saúde pública.
Dentro da conjuntura pré-jurídica, anterior à ação judicial e cuja competência
cabe ao Administrador Público, ventilam-se, à luz da Análise Econômica do Direito,
três alternativas para desoneração do erário: Parcerias de Desenvolvimento Produti-
vo, Fomento Setorial e Licenciamento Compulsório. Cumpre-nos analisar cada uma
delas, nos termos a seguir.

388 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Mecanismos Extrajudiciais do Direito à Saúde Sob a Perspectiva do Teorema de COASE

4.1 Parcerias de Desenvolvimento Produtivo


Regulamentada pela Portaria 2.531/2014, do Ministério da Saúde, a Parceria
de Desenvolvimento Produtivo (PDP), via de regra, consiste em uma parceria tripar-
tite conjugada por uma instituição privada, empresa possuidora da tecnologia de
saúde nacional, ou multinacional, uma pública (v.g., laboratório público oficial) e o
Ministério da Saúde, objetivando o desenvolvimento, transferência e absorção de
tecnologia, produção, capacitação produtiva e tecnológica do País em produtos es-
tratégicos para atendimento às demandas do Sistema Único de Saúde (SUS), con-
forme inc. I do art. 2º. Segundo anota Pollyana de Carvalho Varrichio:

As PDPs podem ser entendidas como mecanismo de política industrial utilizadas na


saúde que envolvem uma série de contrapartidas para que sejam realizadas as com-
pras públicas de fármacos, medicamentos e equipamentos para o Sistema Único de
Saúde (SUS). Dessa forma, garante-se a internalização da produção e a transferência
de tecnologia para um produtor nacional durante o contrato de parceria em que são
concretizadas as compras governamentais do SUS (VARRICHIO, 2017, p. 188).

Por seu turno, os produtos estratégicos são aqueles dos quais o SUS necessi-
ta para ações de promoção, prevenção e recuperação da saúde, com aquisições cen-
tralizadas, ou passíveis de centralização, pelo Ministério da Saúde e cuja produção
nacional e de seus insumos farmacêuticos ativos, ou componentes tecnológicos
críticos, são relevantes para o Complexo Econômico-Industrial da Saúde (CIES). O
CIES, por sua vez, consiste no sistema produtivo de saúde que contempla as indús-
trias farmacêuticas, de base química e biotecnológica, os produtos, equipamentos,
materiais e serviços de saúde, conforme conceitos dispostos no art. 2º, incs. II e IV,
sucessivamente, da Portaria 2.531, de 12.11.2014, do Ministério da Saúde.
Com efeito, a conjugação de interesses/potenciais objetiva agrupar o alto po-
der de compra do SUS para ampliar o acesso da população aos produtos estratégi-
cos. Além, é claro, de fomentar não apenas o desenvolvimento destes produtos, da
indústria farmacêutica e das pesquisas nas áreas pertinentes em território nacional,
mas também reduzir as dependências produtiva e tecnológica.
Com relação a efetivação das Parcerias, o caminho a ser percorrido envolve
seis etapas: (a) submissão de proposta; (b) avaliação e decisão (FASE I); (c) absor-
ção e transferência de tecnologia (FASE II); (d) absorção e transferência de tecnolo-
gia com aquisição (FASE III); (e) internalização da tecnologia (FASE IV); e (f)
monitoramento.
No plano teórico, a Parceria para o Desenvolvimento Produtivo representa
grande avanço no enfrentamento da hercúlea tarefa de trazer sustentabilidade ao
Sistema Único de Saúde. Apresentando-se, no entanto, enquanto saída de médio/
longo prazo, em razão dos elevados custos industriais que a área de tecnologias de
saúde demanda, sobretudo, quando direcionada a áreas estratégicas, patologias,
tratamentos preventivos, pesquisas farmacêuticas, dentre outros. Nessa esteira, o
Ministério da Saúde pondera que a PDP propicia economia nas aquisições pelo ente
público, assim como fomenta a qualificação e desenvolvimento dos centros públicos
Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 389
José Laurindo de Souza Netto / Anderson Ricardo Fogaça / Adriane Garcel

de pesquisas que integram a cadeia de produção de fármacos, além, é claro, de in-


centivar a competitividade do setor farmacêutico e, por conseguinte, a diminuição
dos gastos produtivos.
No campo prático, entretanto, o instituto em questão é extremamente volátil,
uma vez que submetido à vontade política predominante, facilmente mutável, seja
pela substituição de ministros durante um determinado governo, seja por novas elei-
ções e, ipso facto, a própria mudança de governante. A interferência se sucede da
fase implementação até o prosseguimento das PDP’s. Como foi o caso, por exemplo,
da Portaria 704/2017, do Ministério da Saúde, que definiu a lista de produtos estra-
tégicos para o SUS, prevendo o último dia do ano anterior como data limite. O atra-
so impactou negativamente todas as fases seguintes, evidenciando desordem, geran-
do incertezas, descrédito ao setor e, como resultado, o afastamento de potenciais
investidores.
Outro exemplo dessa zona cinzenta foi à suspensão, pelo Ministério da Saú-
de, da PDP entre a Empresa Brasileira Hemoderivados e Biotecnologia e a empresa
privada Baxter/Baxalta, sucedida pela Shire Farmacêutica Brasil Ltda., para a pro-
dução e transferência de tecnologia do produto denominado Fator VIII Recombinan-
te. A medida se deu sem motivação, análise econômico-financeira em relação ao
custo de eventual inadimplemento contratual e comparação com a nova proposta.
Igualmente, a parceria se deu sem seleção e avaliação da respectiva viabilidade
econômica. O caso acabou originando litígios judiciais e administrativos – ilustrati-
vamente, cita-se, o pedido de medida cautelar apresentado pelo Ministério Público
junto ao Tribunal de Contas da União, a saber, Acórdão 2207/2017, decisão do Ple-
nário, relatoria do Min. Vital do Rêgo.
Destarte, apesar de a PDP possuir considerável potencial de redução dos gas-
tos públicos do SUS em tecnologia de saúde de áreas críticas e economicamente
mais vulneráveis, imprescindível seu manejo adequado por parte dos atores políti-
cos, sem o qual os pontos positivos do instituto se exaurem.
4.2 Atividade Fomentadora e Fomento Setorial
Ao lado da prestação de Serviço Público e do exercício de Poder de Polícia, a
atividade fomentadora constitui finalidade intrínseca e uma das razões de ser do
Estado modernamente compreendido4. No plano da norma constitucional propria-
mente dita, constata-se que

4
No plano da norma constitucional propriamente dita, constata-se que “a função administrativa de fomento
encontra respaldo constitucional de forma direta, a exemplo do art. 165, § 2º, que trata das agências públicas
de fomento. Possui também e de forma mais abrangente, uma previsão indireta, mas que capta de forma
mais concreta a natureza e objetivo da atividade. O art. 174 da Constituição de 1988 indica o papel de
agente normativo e regulador do Estado, e as suas funções de fiscalização, incentivo e planejamento,
fazendo menção ao último como “determinante para o poder público e indicativo para o setor privado” in
PAVANI, Gustavo et al, “Políticas públicas de fomento à atividade empreendedora no Brasil:
empreendedorismo por necessidade e as contradições com os fins da atividade de fomento”, Revista de
Direito do Trabalho, v. 196, 2018, p. 111-129.

390 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Mecanismos Extrajudiciais do Direito à Saúde Sob a Perspectiva do Teorema de COASE

a função administrativa de fomento encontra respaldo constitucional de forma direta,


a exemplo do art. 165, § 2º, que trata das agências públicas de fomento. Possui tam-
bém e de forma mais abrangente, uma previsão indireta, mas que capta de forma mais
concreta a natureza e objetivo da atividade. O art. 174 da Constituição de 1988 indica o
papel de agente normativo e regulador do Estado, e as suas funções de fiscalização, incen-
tivo e planejamento, fazendo menção ao último como ‘determinante para o poder público
e indicativo para o setor privado (PAVANI et al., 2018, p. 111 – 129).

Os recursos relativos as tais funções não saem daquela parcela especificamente


destinada à Saúde, de modo que se oportuniza a maximização das finalidades públicas.
Noutras palavras, na atividade fomentadora o Poder Público pode fazer mais com menos,
o que, à luz da Análise Econômica, reflete a clara noção de eficiência.
Na espécie, fala-se em fomento setorial que, em última análise, objetiva a
construção de um ambiente institucional favorável à inovação farmacêutica em terri-
tório brasileiro. Nesse contexto, entende-se por Fomento a ação de “auxiliar o de-
senvolvimento de uma atividade privada, que se supõe de interesse público, com
meios públicos” não coativos, mas sim persuasivos, sem que isso implique na “cria-
ção de serviço público ou a assunção da atividade econômica pelo Estado” (MEN-
DONÇA, 2009, p. 80-140).
À vista disso, tem-se que o desenvolvimento sustentável desse segmento in-
dustrial, sobretudo em pontos nevrálgicos, pode efetivamente contribuir para incre-
mento do acesso as tecnologias de saúde pelos brasileiros, viabilizando ao Estado
propiciar mais com menos, uma vez que os recursos financeiros em questão não
procedem da parcela disponibilizada pela lei orçamentária (lato sensu). É o caso da
Lei 10.332/2001 que instituiu, dentre outros, o Programa de Fomento à Pesquisa em
Saúde, destinando-lhe 17,5% (dezessete inteiros e cinco décimos por cento) do total
da arrecadação da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (CIDE),
conforme art. 1º, inc. II.
No mesmo sentido, a empresa pública FINEP (Financiadora de Estudos e
Projetos) vinculada ao Ministério da Ciência e Tecnologia, que tem por finalidade
institucional o apoio aos estudos, projetos e programas de interesse para o desenvol-
vimento econômico, social, científico e tecnológico do país, tendo em vista metas e
prioridades setoriais estabelecidas nos planos do Governo Federal. Na prática, a
empresa atua enquanto um dos entes executivos dos fundos setoriais.
Adicionalmente, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social
(BNDES) que, nos termos do respectivo estatuto social, consiste em um dos princi-
pais instrumentos de “execução da política de investimento do Governo Federal e
tem por objetivo primordial apoiar programas, projetos, obras e serviços que se
relacionem com o desenvolvimento econômico e social do País”. Enfim, não se
pretende esmiuçar cada plano mencionado, mas sim ilustrar o argumento de que há
recursos financeiros para implementação de fomento no setor da saúde. Isso, sem
falar nas subvenções fiscais e outros instrumentos afins. Todavia, tanto por não
serem ilimitados como por atenderem outras searas produtivas e tecnológicas, é

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 391


José Laurindo de Souza Netto / Anderson Ricardo Fogaça / Adriane Garcel

forçoso potencializar a utilização dos recursos disponíveis, inclusive, por meio da


Análise Econômica do Direito.
Para tanto, imperiosa a adoção de uma ação coordenada “extramercado”, materi-
alizada em um planejamento governamental, de médio/longo prazo, que, a partir de uma
estimativa orçamentária prévia e de uma análise sobre a conjuntura da economia interna
e externa, sopese os mais diversos fatores com o fito de direcionar adequadamente os
recursos disponíveis. A racionalização antecedente é essencial para um quadro social e
economicamente sustentável (MENDONÇA, 2009, pp. 80-140).
Não se pode olvidar, ainda, que a intervenção estatal pode agravar a situação,
ou criar problemas de outra ordem, particularmente, diante da corrupção e ausência
de planejamento. A ação do Estado não está livre de falhas, risco presente e inerente
a qualquer intervenção humana.
Também, necessária uma estruturação robusta que alinhe produção e disse-
minação de inovações tecnológicas, ponderando-as com a complexidade social e
organizacional (GADELHA, 2012, p. 14), como com a correlata composição do
Estado e sua interação com o setor produtivo, ou, ainda, o choque entre a tutela dos
direitos sociais e a salvaguarda da livre-iniciativa. O diálogo entre as dimensões
social e econômica, por sua vez, impede que as políticas estatais de mercado venham
a privilegiar uma, ou outra dimensão, sem estabelecer liame entre elas.
Ato contínuo, em sendo constatada a existência de recursos necessários para
a Ciência, Tecnologia e Inovação (CT&I), ou para Pesquisa e Desenvolvimento
(P&D), e avaliada a pertinência da intervenção estatal no segmento, deve-se definir
estrategicamente quais tecnologias de saúde serão focalizadas. A intervenção estatal
pode ter por estratégia a redução da vulnerabilidade do acesso à saúde no país, por
exemplo. Neste caso, deverão ser priorizados os aspectos mais “sensíveis”, medica-
mentos que possuam valor agregado e uma alta potencialidade de utilização por um
número considerável de pessoas em semelhantes condições, tais como, tratamento
de câncer e AIDS. Em seguida, depara-se com dois grandes problemas peculiares ao
fomento público, quais sejam, os critérios para sua concessão “e sua intensidade e
duração”.
Com relação à concessão, vislumbra-se que “o fomento pode ser inteligente
instrumento de apoio ao desenvolvimento privado em direções constitucionalmente
desejáveis – ou pode ser a enésima ajuda do Rei a seus amigos”. Quanto à intensida-
de e à duração, tendem a deturpar a substância do instituto, uma vez que a interven-
ção não pode consistir em “um auxílio indefinido, paternalismo estatal qualificado
pela bondade dos objetivos perseguidos. As atividades fomentadas devem sê-lo [...]
apenas durante o período em que seja [...] necessário à sua viabilidade econômica”
(GADELHA, 2012, p. 14).
Destaca-se, ainda, que o fomento público não se trata de uma doação (públi-
ca), porquanto lhe falta o elemento central do animus donandi, a entrega de uma
quantia ao particular decorre da performance de específica e determinada atividade.
Há flagrante incompatibilidade de um viés donativo com os fins, expressos, ou im-

392 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Mecanismos Extrajudiciais do Direito à Saúde Sob a Perspectiva do Teorema de COASE

plícitos, do Poder Público ao empregar a ferramenta. José Vicente Santos de Men-


donça elenca seis principais caracteres:

(a) seu exercício se dá, num primeiro momento, sem coerção; (b) não há qualquer
obrigação de o particular aderir a ele; (c) não se trata de liberalidade pública; (d) é
seletivo, porém não injustificadamente anti-isonômico; (e) é unilateral, isto é, não há
qualquer sujeito ativo para reclamar a execução da atividade fomentada, mas, ape-
nas, para controlar o uso da verba pública; (f) é, em princípio, transitório. (MEN-
DONÇA, 2009, pp. 80-140).

Outrossim, o autor destaca que o atuar fomentador não se resume a um “auxí-


lio econômico geral, mas ajuda concentrada em setores ou perfis específicos. O
recorte temático de conteúdo tem a ver com o próprio caráter afetado da ajuda”, a
noção de transitoriedade, que está umbilicalmente relacionada à ideia de que o fo-
mento constitui um auxílio público à atividade privada, via de regra (e em virtude do
próprio conceito deste), temporário (MENDONÇA, 2009, p. 80-140). Se assim não
o fosse, configurar-se-ia mero assistencialismo, ou atuação estatal substitutiva da
privada, na economia de mercado.
Neste diapasão, os excessos acabam por perenizar o auxílio público que de-
veria ser acessório/ secundário e não principal, além de acarretar a neutralização da
álea típica do empreendedorismo, com socialização de riscos próprios da iniciativa
privada. Inclusive, em afronta ao princípio da livre-iniciativa, dado o potencial que
tem de tornar as condições do mercado concorrencial artificiais.
Ainda que “assim não seja, pode acabar por desestimular a competitividade
empresarial da região, setor ou agente econômico, ao funcionar como um seguro
público de propostas fracassadas”. De outra banda, não pode o Estado se furtar por
completo diante de eventual crise financeira em determinado setor econômico (insu-
ficiência ou inexistência), em vias de prejudicar a coletividade.
Por isso, torna-se essencial que se insira no plano de fomento escalas prévias
de repasse de determinados valores. A chamada ação orquestrada, como é conheci-
da, deve variar de acordo com os níveis de desempenho do sujeito fomentado, perio-
dicamente prefixados, distribuindo-se proporcionalmente a duração e intensidade da
atividade fomentada conforme à finalidade perseguida.
Por seu turno, a arbitrariedade, ou patrimonialismo, podem acabar interferin-
do na seleção do agente e da própria atividade, ou setor a ser fomentado, dado o
considerável grau de discricionariedade na seleção. Considerando que sem seletivi-
dade a escolha tornar-se-ia pura e simples ajuda pública genérica (assistencialismo)
e que, por sua vez, sem objetividade dar-se-ia vasta margem a malversação de recur-
sos públicos, o ideário Aristotélico do justo meio (justa medida) apresenta-se en-
quanto melhor saída para a constituição de um fomento público republicano e demo-
crático. Nestes termos, Mendonça traça os critérios objetivos que devem fundamen-
tar à seleção:

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 393


José Laurindo de Souza Netto / Anderson Ricardo Fogaça / Adriane Garcel

Eis os critérios formais da concessão: (a) transparência e procedimentalização; (b)


competitividade; (c) objetividade. Quanto aos critérios materiais de concessão do fo-
mento público, são eles (a) a não-lucratividade, (b) a eficiência do gasto público e (c)
a razão pública. Os critérios da formulação do fomento aqui comentados são dois: (1) a
submissão ao debate público e (2) a compatibilidade entre os requisitos de acesso ao fo-
mento e o direito fundamental que se pretende fomentar. A título de completude, não se
pode deixar de comentar o maior de todos os requisitos: é a exigência de que o fomento se
faça com base no princípio da legalidade (MENDONÇA, 2009, pp. 80-140).

Destarte, quando racionalmente utilizado para atacar eventuais vulnerabilida-


des do SUS, o fomento público é mecanismo que confere eficiência e sustentabilida-
de ao sistema, ao permitir que o Estado faça uso de recursos inicialmente não previs-
tos para a Saúde Pública, mas que indiretamente beneficiam-na, atuando enquanto
verdadeiro incrementador de direitos fundamentais. Os recursos financeiros disponí-
veis ao fomento, por exemplo, podem ser racionalizados em prol de determinados
fármacos, terapias ou profilaxias, cuja incidência beneficiará um número considerá-
vel de pessoas em situações semelhantes.
Por arremate, a medida deve atingir o máximo de finalidades públicas possí-
veis. Não deve mirar apenas o desenvolvimento econômico, geração e distribuição
de renda, mas também racionalizá-los, para que, de fato, potencialize e robusteça os
direitos fundamentais.

4.3 Licenciamento Compulsório


Na sequência, o licenciamento compulsório, suspensão temporária do direito
de exclusividade patentária, apresenta-se como meio alternativo à responsabilização
judicial. Previsto no art. 71 da Lei 9.279/1996, o instrumento possibilita que o Poder
Executivo Federal, por meio de ato normativo próprio, “auto-licencie” a patente de
maneira cogente, temporária e não exclusiva, fundado em interesse público, ou
emergência nacional, desde que o detentor daquela, ou licenciado, não atenda “vo-
luntariamente” ao requisito da necessidade, resguardados os direitos do titular.
Ademais, o ato concessivo fixará o prazo de vigência e a possibilidade de prorroga-
ção, respeitado o caráter temporário.
A medida, está a serviço do Poder Executivo Federal como verdadeiro ins-
trumento de intervenção estatal na economia e de implementação de Política Públi-
ca, não se podendo cogitar, portanto, adoção sucessiva pelo Judiciário. Ainda, im-
pende ressaltar que seu uso tem uma série de implicações, sociais, políticas e eco-
nômicas, positivas e negativas, de modo que se torna essencial socorrer-se da Análi-
se Econômica do Direito para compreensão.
O caso paradigmático do licenciamento compulsório do fármaco Efavirenz,
em 2007, cuja titularidade da patente pertence ao laboratório farmacêutico Merck
Sharp & Dohme, é bem elucidativo. A Lei 9.313/1996, particularmente, seu art. 1º,
fez nascer para o SUS o dever de distribuir gratuitamente aos portadores do HIV e
de AIDS “toda a medicação necessária a seu tratamento”. No mesmo ano, por forte
pressão da política externa, foi publicada a Lei de Proteção à Propriedade Industrial

394 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Mecanismos Extrajudiciais do Direito à Saúde Sob a Perspectiva do Teorema de COASE

(Lei 9.279/1996), que entrou em vigor em 14.05.1997 (art. 243, in fine) gerando a
seguinte celeuma:

Todos os produtos que tinham sido comercializados em qualquer lugar do mundo an-
tes de 14.05.1997, quando essa nova lei entrou em vigor, se tornaram para sempre
inelegíveis para o patenteamento no Brasil. Como resultado, dez medicamentos antir-
retrovirais permaneceram sem a proteção de patentes no país e puderam ser legal-
mente reproduzidos (SOUZA, 2011).

Como resultado, por meio da utilização de métodos de engenharia reversa, o


laboratório “Far-manguinhos descobriu a fórmula da maior parte dos antirretrovi-
rais não patenteados e começou a fabricá-los, usando princípios ativos importados
principalmente da Índia e da China”. Até o ano de “2011, 9 dos 19 dos antirretrovi-
rais usados no programa nacional de AIDS têm sido produzidos localmente” (SOU-
ZA, 2011).
Ainda assim, os gastos com fármacos antirretrovirais (AVR) continuavam
onerando substancialmente os recursos públicos destinados ao tratamento de pessoas
portadoras de HIV. Nesse cenário, a combinação do uso de princípios ativos prove-
nientes da Ásia, com o emprego de engenharia reversa e a competência de laborató-
rios públicos (tais como o Far-Maguinhos) para a confecção dos fármacos isentos de
patentes, propiciou o uso do licenciamento compulsório como instrumento negocial
indutivo, o que gerou um grande poder de negociação do governo nacional com os
laboratórios importadores, fomentando em larga medida a economia.
Entretanto, a ausência de investimentos na indústria farmacêutica nacional
fez com que a barganha por descontos fosse à ruína. No ano de 2006, por exemplo, o
passivo com antirretrovirais correspondia à 80% dos custos do Ministério da Saúde
com medicamentos. Conforme afirmado por André de Mello Souza, “como resulta-
do dos descontos concedidos pelas empresas multinacionais farmacêuticas, os gas-
tos do Ministério da Saúde com terapias antirretrovirais declinaram de US$ 336
milhões em 1999 para US$ 167 milhões em 2002 apesar do aumento considerável
do número de pacientes tratados, de 79.245 para 119.500” (SOUZA, 2011, p. 15).
Diante disso, em 04.05.2007, por meio do Decreto 6.108, o governo federal,
por interesse público, concedeu licenciamento compulsório de patentes referentes ao
Efavirenz, para fins de uso público não comercial, em exclusividade, no âmbito do
Programa Nacional de DST/AIDS, durante cinco anos, prorrogáveis por igual perío-
do, pagando ao laboratório titular das patentes a remuneração de 1,5%. Particular-
mente, conforme noticiado no sítio eletrônico do Ministério da Saúde, “essa medida
provocou um impacto imediato de U$$ 31,5 milhões de economia para o país”
(SOUZA, 2011, p. 17).
Internacionalmente, a medida rendeu um grande desconforto internacional,
uma vez que “multinacionais farmacêuticas e os governos de diversos países, sobre-
tudo o dos Estados Unidos, consideraram a licença compulsória do efavirenz desne-
cessária e ameaçaram reduzir os investimentos no Brasil”. Em 2001, na Organização

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 395


José Laurindo de Souza Netto / Anderson Ricardo Fogaça / Adriane Garcel

Mundial do Comércio (OMC), o governo estadunidense esboçou um painel (espécie


de comitê de arbitragem para analisar a Lei patentária brasileira entendida por ele
como “nociva”) contra o Brasil por intervir na “produção e precificação de medica-
mentos antirretrovirais altamente lucrativos patenteados por ou licenciados exclusi-
vamente a empresas norte-americanas”.
O Brasil, por sua vez, reagiu na própria entidade internacional, assim como
através de apoio de ONGs, da mídia e imprensa internacionais, campanhas publicitá-
rias em jornais norte-americanos e manifestações populares nas respectivas unidades
diplomáticas. Após o aval da associação das indústrias farmacêuticas local, o gover-
no dos Estados Unidos recuou e pronunciou-se pela retirada da respectiva reclama-
ção em troca da garantia de que seria notificado antes que quaisquer produtos paten-
teados, ou licenciados, para empresas norte-americanas fossem compulsoriamente
licenciados Brasil.
O caso do Efavirenz expõe as variáveis que se deve considerar para pondera-
ção sobre o uso, ou não, do licenciamento compulsório. Quanto aos benefícios, tem-
se vantagem negocial (ante a ameaça do emprego da licença compulsória como meio
para conseguir descontos), o barateamento pela aquisição da fórmula, possibilidade
da criação de um estoque no caso de uma pandemia/epidemia, ampliação da cobertu-
ra de pessoas atendidas, contribuição para a sustentabilidade econômica do SUS, o
maior acesso a bens e serviços de saúde, bem como o desenvolvimento da indústria
nacional (o que repercute na economia, com geração de empregos, por exemplo).
Noutro vértice, considerando o porte e o campo de influência das companhias far-
macêuticas, o licenciamento compulsório pode ser um péssimo negócio, diante da
possibilidade de repercussão nas relações internacionais com potências mundiais,
abrindo lastro para o desencadeamento de uma série de problemas de ordem macro-
econômica, retaliação em outras áreas produtivas, embargos econômicos, redução de
novos investimentos externos no país, diminuição de inserção de novas tecnologias
de saúde e etc.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Não causa surpresa alguma a afirmação de que a Saúde Pública se encontra
na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) financeira. Isso é decorrência natural da
audaciosa tarefa incumbida pela Constituição de 1988 que, ao instituir o Sistema
Único de Saúde, passou a prever a saúde enquanto direito de todos e responsabilida-
de do Estado. Escolha louvável e hercúlea, contudo, desafiadora dada a vasta dimen-
são do país que conta com numerosa população.
Infelizmente, o atual cenário demonstra que a tarefa não tem sido bem-
sucedida. A população acaba recorrendo ao Poder Judiciário para que seus direitos
sejam garantidos. Grande parte dos pedidos é deferida, com base na fundamentali-
dade da saúde. No entanto, esta não se mostra a melhor solução para o problema da
saúde no Brasil, visto que, ao atender interesses individuais, relega-se para um se-
gundo plano o recurso público para políticas coletivas.

396 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Mecanismos Extrajudiciais do Direito à Saúde Sob a Perspectiva do Teorema de COASE

O Teorema de Coase, por sua vez, impõe a análise dos custos sociais decor-
rentes das decisões judiciais, de modo a se evitar a ocorrência de prejuízo mais gra-
ve, independentemente de quem seja o responsável pela efetivação do direito. No âmbito
da saúde, principalmente no que se refere ao fornecimento de medicamentos de alto
custo não incluídos nas listas oficiais, observa-se que a imposição – por parte do Poder
Judiciário – ao ente federativo de custear tratamentos de elevada monta gera uma série
de externalidades. Ao atender a demanda individual, cujo custo não estava previsto no
planejamento orçamentário, o valor é abatido daquele que estava destinado a outras
finalidades públicas, de modo que seus efeitos se estendem à coletividade.
Com isso em mente, necessário se pensar em alternativas das quais o Estado pos-
sa se valer, cujos recursos inicialmente não sejam previstos para a Saúde Pública, mas
que indiretamente beneficiem-na. Neste sentido, os instrumentos extrajudiciais descritos,
Parcerias de Desenvolvimento Produtivo, Fomento Setorial e Licenciamento Compulsó-
rio, apresentam-se enquanto alternativas à desoneração do Estado e à problemática da
concessão de medicamentos de alto valor não constante nas listas do SUS, além de for-
necerem novo fôlego ao erário.
Conforme preconiza Coase, o Estado deve agir para facilitar as transações entre
os próprios agentes econômicos, com o objetivo de maximizar a riqueza. Assim, o plane-
jamento do Estado, voltado à aplicação destes mecanismos com o fim de promover o
acesso à saúde, mostra-se alternativa mais efetiva e apta a maximizar a riqueza do que a
ingerência do Poder Judiciário no tema, que gera reflexos em outras políticas públicas.
Para além, considerando a conjuntura extrajudicial conjugada ao esforço de pro-
por uma resolução ao problema por intermédio da técnica do “uso mais proveitoso”
(alternativamente à responsabilização pela via judicial), vislumbra-se a juseconomia
como instrumento apto a propiciar o exame das consequências práticas, custo/risco e
benefício, fornecendo ao agente público diagnóstico e prognóstico para a tomada
coerente e racional de decisão.

REFERÊNCIAS
BARCELLOS, Ana Paula de et al., Legitimação dos Direitos Humanos, org., Ricardo Lobo Torres, Rio
de Janeiro, Renovar, 2002.
BARROSO, Luís Roberto, Curso de direito constitucional contemporâneo, os conceitos fundamentais e a
construção do novo modelo, São Paulo, Saraiva, 2009.
_________, “A razão sem voto: o Supremo Tribunal Federal e o governo da maioria”, Revista Brasileira
de Políticas Públicas, Uniceub, v. 5, número especial, 2015. Disponível em: <https://www.publicaco
esacademicas.uniceub.br/RBPP/article/viewFile/3180/pdf.> Acesso em: 09 set. 2020.
_________, O Novo Direito Constitucional Brasileiro, Belo Horizonte, Forum, 2013.
BENTHAM, Jeremy, Uma introdução aos princípios da moral e da legislação. Trad. Luís Paulo Baraú-
na, Coleção Os Pensadores, 3. ed., São Paulo, Abril, 1984.
COASE, R. H. The Problem of Social Cost. Journal of Law and Economics Vol. 3 (October 1960), p. 1-
44.
FREITAS, Cinthia Obladen de Almendra; BARDDAL, Jean Paul, “Análise preditiva e decisões judiciais,
controvérsia ou realidade?”, Revista Democracia Digital e Governo Eletrônico, Florianópolis, v. 1, n. 18,
2019.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 397


José Laurindo de Souza Netto / Anderson Ricardo Fogaça / Adriane Garcel

GADELHA, Carlos Augusto Grabois (Coord.), A dinâmica do sistema produtivo da saúde, inovação e
complexo econômico-industrial., coord., Carlos Augusto Grabois Gadelha, Rio de Janeiro, Fiocruz, 2012.
GALDINO, Flávio, Introdução à teoria dos custos dos direitos: Direitos não nascem em árvores, Lumen
Juris, Rio de Janeiro, 2005.
GUILHERME, Gustavo Calixto, SOUZA NETTO, José Laurindo de, GARCEL, Adriane, A Responsabi-
lidade Civil Pelos Riscos do Desenvolvimento no Ordenamento Jurídico Brasileiro, Revista Direito e
Justiça: Reflexões Sociojurídicas, ISSN: 2178-2466, v. 20, n. 38, 2020, p. 97-113. DOI:
https://doi.org/10.31512/rdj.v20i38.150. Disponível em: <http://san.uri.br/revistas/index.php/direitoejusti
ca/article/view/150.> Acesso em: 10 set. 2020.
LEÃO, Simone Letícia Severo e Souza Dabes., Aspectos inerentes à judicialização da saúde: um estudo
sobre a atuação da 8º Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais – TJMG. Revista Internacio-
nal Consinter de Direito. ISSN: 2183-6396. Ano VI, n. x, DOI: 10.19135/revista.consinter.00011.08.
Disponível em: <https://revistaconsinter.com/revistas/ano-vi-numero-x/.> Acesso em: 23 set. 2020.
MACKAAY, Ejan,. ROUSSEAU., Stéphane, A análise econômica do direito, São Paulo, Atlas, 2015.
MENDONÇA, José Vicente Santos de Mendonça, “Uma teoria do fomento público, critérios em prol de
um fomento público democrático, eficiente e não-paternalista”. Revista dos Tribunais, v. 890/dez. 2009.
NOVELINO, Marcelo, Curso de direito constitucional, 1. ed. Salvador, Juspodivm, 2015.
PAVANI, Gustavo et al,” Políticas públicas de fomento à atividade empreendedora no Brasil: empreen-
dedorismo por necessidade e as contradições com os fins da atividade de fomento”, Revista de Direito do
Trabalho, v. 196, dez/2018.
SARLET, Ingo Wolfgang, MARINONI, Luiz Guilherme, MITIDIERO, Daniel, Curso de direito consti-
tucional, 4. ed., São Paulo, Saraiva, 2015.
SCHULZE, Clenio Jair, GEBRAN NETO, João Pedro, “Direito à Saúde: Análise à luz da judicialização”,
Porto Alegre, Verbo Jurídico, 2015.
SOUZA, André de Mello e, Acordo sobre os aspectos dos direitos de propriedade intelectual relaciona-
dos ao comércio (TRIPS), Implicações e possibilidade para a saúde pública no Brasil, Texto para discus-
são 1615, Distrito Federal, Livraria do IPEA, 2011.> Acesso em: 23.07.2019, Disponível em:
<http://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/TDs/td_1615.pdf>.
SOUZA NETTO, José Laurindo, Garcel, Adriane., O Direito Administrativo Sobreviverá à globalização?
Um Diálogo Entre Os Princípios Constitucionais e a Revolução Virtual, Revista Eletrônica Do Centro
Universitário Do Rio São Francisco, Unirios, 2020, n.26, pp. 230-249, ISSN 1982-057. Disponível em:
<https://www.unirios.edu.br/revistarios/internas/conteudo/resumo.php?id=535>
PERALES, Viscasillas, “Contratos de permuta financiera y arbitraje: cuestiones procesales y sustanti-
vas”, Revista de Derecho del Mercado de Valores, v.17, 2015.
RIBEIRO, Marcia Carla Pereira, PAGANELLA, Genevieve Paim., “Fundamentos econômicos em deci-
são judicial no sistema brasileiro, repartição e mitigação dos danos, reciprocidade do problema: estudo de
caso”, Revista CNJ, Brasília, DF, v. 3, n. 2, jul./dez. 2019.
SZTAJN, Rachel, “A incompletude do contrato de sociedade”. Revista da Faculdade de Direito, v. 99,
2004. Disponível em: <http://www.revistas.usp.br/rfdusp/article/view/67626/70236.> Acesso em: 5 jul.
2019.
TORRES, Ricardo Lobo, Curso de direito financeiro e tributário, 11. ed., Rio de Janeiro, Renovar, 2004.
VARRICHIO, Pollyana de Carvalho, As parcerias para o desenvolvimento produtivo da Saúde, São
Paulo, Repositório do IPEA, 2017. Disponível em: <http://repositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/8944
/1/As%20parcerias.pdf>.

398 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Mecanismos Extrajudiciais do Direito à Saúde Sob a Perspectiva do Teorema de COASE

PERSPECTIVAS DO FENÔMENO NACIONAL


DA JUDICIALIZAÇÃO DA SAÚDE VOLTADA
PARA O AMAZONAS
PERSPECTIVES OF THE NATIONAL PHENOMENON
OF THE JUDICIALIZATION OF HEALTH FOCUSED
ON THE AMAZONAS
DOI: 10.19135/revista.consinter.00011.19
Recebido/Received 22.06.2020 – Aprovado/Approved 11.09.2020
Alessandra Valle Salino1 – https://orcid.org/0000-0002-1824-5685
E-mail: alesalino@hotmail.com
Glaucia Maria de Araujo Ribeiro2 – https://orcid.org/0000-0003-0695-5257
E-mail: gribeiro@uea.edu.br / glauciamariaribeiro@gmail.com

Resumo: A pesquisa teve como objeto central a judicialização da saúde no Brasil,


especialmente voltada à questão regional do Amazonas. Nesse contexto o princípio da
reserva do possível ante a judicialização da saúde não pode ser invocada como “escudo
para o Estado se escusar do cumprimento de suas obrigações prioritárias”, muito menos
ser empregado de forma indiscriminada, como dispõe o STF. Cabe assim ao poder
Judiciário inferir mecanismos para a melhoria e estruturação do Sistema Público de
Saúde – SUS – com práticas mais eficazes e efetivas são perceptíveis, embora levantar
dados estatísticos para diagnóstico desse panorama precise ser melhorado, uma vez que
as dificuldades de acesso aos dados de judicialização da saúde no campo nacional e
regional não são inexpressivas. O protagonismo do Judiciário na efetivação da saúde e
as ações do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) são sistemáticas, mas as ações judiciais
voltadas à saúde no Brasil ainda são predominantemente individuais e não resultam em
benefícios coletivos. Com relação à judicialização da saúde no Amazonas/Manaus
houvera o apoio dos dados fornecidos pela DPE/AM para se constatar um aumento nos
casos de saúde e uma tendência a superar esse crescimento em 2020, acompanhando o
quadro social desenhado nos últimos anos no país, sendo possível, no decorrer da
pesquisa, levantar hipóteses de subnotificação; desconhecimento da população
amazonense sobre a possibilidade de recorrer à Justiça; a sintomática ineficiência estatal
na prestação de serviços de saúde, fatores tais que a seguir passamos a discorrer.
Palavras-chave: Judicialização da Saúde; Brasil; Amazonas.

1
Professora da Universidade do Estado do Amazonas (UEA); Doutora em Saúde Coletiva (UERJ/IMS);
Mestre em Odontologia (UFAM); Especialista em Saúde Coletiva, Ortodontia e Auditoria dos Sistemas de
Saúde; Graduada em Odontologia. E-mail: alesalino@hotmail.com
2
Professora da Universidade do Estado do Amazonas (UEA); Doutora em Saúde Coletiva (UERJ/IMS).
Mestre em Direito Ambiental pela Universidade do Estado do Amazonas (UEA); Especialista em
Administração Pública com ênfase em Direito Público. Bacharela em Filosofia (UFAM) . E-mail:
gribeiro@uea.edu.br glauciamariaribeiro@gmail.com

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 399


Alessandra Valle Salino / Glaucia Maria de Araujo Ribeiro

Abstract: The research had as its central object the judicialization of health in Brazil,
especially focused on the regional question of Amazonas. In this context, the principle of
reserving the possible before the judicialization of health cannot be invoked as a “shield
for the State to excuse itself from the fulfillment of its priority obligations”, much less be
used in an indiscriminate manner, as provided by the STF. Thus, it is up to the Judiciary
to infer mechanisms for the improvement and structuring of the public health system –
SUS – with more effective and effective practices are noticeable, although raising
statistical data for diagnosing this panorama needs to be improved, since the difficulties
of accessing data judicialization of health in the national and regional fields are not
insignificant. The role of the Judiciary in the realization of health and the actions of the
National Council of Justice (CNJ) are systematic, but the legal actions directed to health
in Brazil are still predominantly individual and do not result in collective benefits.
Regarding the judicialization of health in Amazonas / Manaus, there was the support of
the data provided by DPE / AM to verify an increase in health cases and a tendency to
overcome this growth in 2020, following the social framework designed in recent years
in the country, being possible, during the research, to raise hypotheses of underreporting;
ignorance of the Amazonian population about the possibility of going to court; the
symptomatic state inefficiency in the provision of health services, factors such as the
following we will discuss.
Keywords: Judicialization of Health; Brazil; Amazon;
Sumário: 1. Introdução 2. O Princípio da Reserva do Possível Ante a Judicialização da
Saúde 3. Judicialização da Saúde no Brasil 3.1 Das dificuldades de acesso aos dados de
judicialização da saúde 3.2 Dos dados sobre o incremento da judicialização da saúde no
Brasil 4. Judicialização da Saúde no Amazonas/Manaus 5. Conclusão. Referências

1 INTRODUÇÃO
O princípio da dignidade humana se traduz como o mais valioso na ordem
espiritual e material e em sede de sua positividade, seja à luz dos avanços hermenêu-
ticos do direito e de sua ciência argumentativa, afasta de seu caráter formal positivo
e legal que somente interpretava regras, presente na dogmática jurídica do século
XIX, para aproximar-se de um Direito mais chegado e permeável à vida, consagran-
do formas democráticas do modelo participativo do Estado Democrático de Direito,
com emprego e a concretização de políticas públicas de saúde voltadas ao bem-estar
do cidadão.
A problemática do poder, a legitimação da autoridade estatal são considera-
ções teóricas e históricas que perpassam sobre o princípio da dignidade da pessoa
humana como limitador à ação do Estado e protetor dos direitos sociais, aqui incluí-
do o direito à saúde, componente medular de mais alto valor jurídico na ordem cons-
titucional vigente.
As políticas públicas, e dentre elas as de saúde, não continuam imunes ao sistema
de produção regular, residual e replicador de riscos e ameaças, explícitos e sem ruídos.
Este processo social impõe a todos os envolvidos, profissionais da saúde, sociedade civil,
elaboradores de leis e executores de políticas o desafio de erguer pactos sociais conside-
rando esse novo cenário da modernidade a qual estamos inseridos.
Ou seja, se a ciência progride, essa sociedade de risco se adapta na reflexivi-
dade, quer dizer, na revisão contínua desses novos dados cognitivos, em grande

400 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Perspectivas do Fenômeno Nacional da Judicialização da Saúde Voltada para o Amazonas

parte advindos dos aspectos da vida social que resultam em questionamentos entre o
novo saber científico, os defeitos e os problemas que surgem dessa realidade. Se o
debate advém do campo da ciência, em um dado momento ele provoca no movimen-
to social o debate reivindicando uma reflexão ética que desemboca num cenário
político e jurídico da judicialização da saúde com íntima vinculação entre a dignida-
de da pessoa humana e respeito aos direitos fundamentais, ainda que mínima, de
efetivação por intermédio dos órgãos jurisdicionais.
O Sistema Único de Saúde (SUS) fora criado na Constituição da República
Federativa do Brasil (CRFB/1988), advindo de um movimento social conhecido
como Reforma Sanitária, que tinha por núcleo os princípios da igualdade, universa-
lidade e integralidade. Em resumido contexto, aproxima-se da essência jurídica de
que “todos os seres humanos são iguais”, sem menosprezar as peculiaridades das
desigualdades havidas entre os homens (BRASIL, 1988; BRASIL, 1990).
Desta forma, toma o Estado a construção voltada à satisfação dos direitos
fundamentais, demandantes de uma atuação positiva, despido de falta de compro-
misso para com o ser humano. Enfim, desenvolve-se, num contexto crítico e eman-
cipatório, o debate político da judicialização da saúde.
O direito à saúde, como um direito social contemplado na Constituição da
República, desperta polêmicas quando se trata de bater às portas da Justiça para
solucionar questões burocráticas atinentes à saúde, caracterizando o fenômeno social
denominado de judicialização da saúde.
Assim sendo, inúmeros fatores contribuem para a judicialização da saúde,
dentre eles a demanda ilimitada do cidadão e os recursos orçamentários limitados do
Poder Público, e dentro desse assunto passamos a contextualizar a nossa pesquisa. O
encadeamento metodológico desta pesquisa se deu a partir do tema central, judiciali-
zação da saúde no Brasil, com enfoque no Amazonas. O referencial teórico foi pes-
quisado em documentos governamentais, artigos publicados em periódicos especia-
lizados, textos acadêmicos etc e os dados secundários coletados em publicações
nacionais, como também, dados disponibilizados pela Defensoria Pública do Estado
do Amazonas (DPE/AM).
Com relação aos dados coletados acerca da judicialização da saúde no Es-
tado do Amazonas vale destacar a dificuldade enfrentada durante a pesquisa. O
acesso digital não impõe maiores contratempos: os sites do Ministério da Saúde
(MS), do Poder Judiciário, mais precisamente do Conselho Nacional de Justiça
(CNJ), e do Tribunal de Justiça do Amazonas preservam livre acesso quanto ao
critério da transparência administrativa. O ponto nevrálgico é a forma como estão
dispostos os números. Ora o ano de ocorrência do fato detém registros de dados
genéricos, ora os dados são incompletos por quem alimenta o sistema, o que fora
registrado no Item 4 da pesquisa. Interessante que o CNJ também pontua em seus
Relatórios tais impasses.
A contenda foi dirimida com os dados fornecidos pela Defensoria Pública do
Estado do Amazonas – DPE/AM, por meio do titular do Núcleo de Saúde, Dr. Ar-
lindo Gonçalves, que colocou à disposição da pesquisa os dados coletados pela De-

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 401


Alessandra Valle Salino / Glaucia Maria de Araujo Ribeiro

fensoria Pública Especializada na Promoção e Defesa dos Direitos Relacionados à


Saúde.
A importância da contribuição da DPE/AM com dados inéditos sobre a judi-
cialização da saúde no Estado do Amazonas tem o condão de alçar o estudo a um
patamar original, visto que as informações aqui colacionadas não constam sequer em
arquivos e sites do CNJ nem do Poder Judiciário local.
Com os indicadores coletados a sistematização da pesquisa seguiu o curso
natural do movimento histórico das questões sociojurídicas ressaltando a produção
doutrinária e jurisprudencial sobre o princípio da reserva do possível e sua influência
na judicialização da saúde (Itens 2 e 3) até a análise da produção do citado fenômeno
com escrita, narrativa, contação de histórias e interpretação dos dados exibidos no
Estado do Amazonas (Item 4).

2 PRINCÍPIO DA RESERVA DO POSSÍVEL ANTE A JUDICIALIZAÇÃO


DA SAÚDE
O princípio da “reserva do possível”, da ciência das finanças, traduz a ideia
de que a atuação estatal está condicionada a existência de recursos públicos disponí-
veis. Foi introduzida no ordenamento brasileiro através de decisões exaradas por
Gilmar Ferreira Mendes em julgados do Supremo Tribunal Federal (STF), a partir de
estudos de decisões da Corte Constitucional da Alemanha.
O STF, nas questões judiciais atinentes aos direitos sociais, em especial o di-
reito à saúde, tem se manifestado no sentido de que o Estado tem o dever de prover
o mínimo para a sobrevivência do cidadão, uma vez que é revestido por razoabilida-
de da pretensão individual ou coletiva em consonância com a disponibilidade finan-
ceira do Estado para garantir recursos financeiros mínimos a serem aplicados nas
ações e serviços públicos de saúde, conforme dito na Arguição Descumprimento de
Preceito Fundamental – ADPF N. 45, o STF ressalta seu papel como “instrumento
idôneo e apto a viabilizar a concretização de políticas públicas” quando “venham a
ser descumpridas, total ou parcialmente, pelas instâncias governamentais destinatá-
rias do comando inscrito na própria Constituição da República” (BRASIL, 2004).
Por conseguinte, o Poder Público não pode se eximir das obrigações impostas
pela Constituição e lei infraconstitucional. A cláusula da “reserva do possível” tem
sua aplicação somente em decorrência de justificação plausível, aferida de maneira
objetiva, devendo ser de pronto afastada quando a sua aplicação resultar em trans-
gressão aos direitos constitucionais fundamentais, quais sejam os direitos econômi-
cos, sociais e culturais, denominados e conhecidos como direitos de segunda gera-
ção, com as liberdades positivas, reais ou concretas. A conduta estatal, seja num
facere (atuação positiva) ou non facere (atuação omissiva), pode configurar num
grave comportamento político-jurídico, ofender direitos, haja vista sua atribuição de
formular e de implementar políticas públicas de saúde.
Em outras palavras, a cláusula da reserva do possível é um reconhecimento
de que serviços públicos não podem ser prestados sem recursos financeiros. Toda-
via, essa visão utilitarista não oportuniza a discricionariedade do ente estatal de

402 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Perspectivas do Fenômeno Nacional da Judicialização da Saúde Voltada para o Amazonas

deixar de prestar ações e serviços de saúde por contingência orçamentária, visto que
a concretização de direitos sociais essenciais, inclusos no conceito de mínimo exis-
tencial, não pode ficar condicionada ao alvedrio da vontade do gestor público, po-
dendo, inclusive, o Poder Judiciário atuar como órgão de controle judicial da ativi-
dade administrativa de políticas públicas.
Em suma, a teoria da reserva do possível não pode ser invocada como “como
escudo para o Estado se escusar do cumprimento de suas obrigações prioritárias.
Não se pode deixar de reconhecer que as limitações orçamentárias são um entrave
para a efetivação dos direitos sociais. No entanto, é preciso ter em mente que o prin-
cípio da reserva do possível não pode ser utilizado de forma indiscriminada” (BRA-
SIL, 2014a).
A ausência de previsão orçamentária não é fator impeditivo para que o Esta-
do adote outras medidas, obrigando-o a adotar providências administrativas, inclusi-
ve cuidar do orçamento para não alegar sua incapacidade econômico-financeira no
presente ou em futuro próximo, afinal há evidente prognóstico constitucional de
garantia de respeito à vida, à integridade física, aos princípios da dignidade da pes-
soa humana e do mínimo existencial.
O critério discricionário do gestor público não se faz presente quando há ris-
co de vulnerabilidade a direitos e garantias fundamentais caucionados pela Carta
Maior. É poder-dever do chefe do Poder Executivo implementar, de forma concreta
e eficaz, os valores prescritos no preâmbulo da CRFB/1988 como “supremos de uma
sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos fundada na harmonia social”.
Tanto assim que o STF em sede de RE-AgR 795.749 – 2ª Turma, e no ARE AgR
639.337, bem como o STJ no Acórdão do AgRg no REsp 1.107.511-RS, reconhe-
cem a possibilidade de controle judicial em programas de políticas públicas (BRA-
SIL, 2014b; BRASIL, 2011a). Vejamos:

2. Tratando-se de direito essencial, incluso no conceito de mínimo existencial, inexis-


tirá empecilho jurídico para que o Judiciário estabeleça a inclusão de determinada
política pública nos planos orçamentários do ente político, mormente quando não
houver comprovação objetiva da incapacidade econômico-financeira da pessoa esta-
tal. (BRASIL, 2013).

A cláusula da reserva do possível sob o âmbito da teoria dos custos dos direi-
tos é evidente não ser possível invocá-la para legitimar o injusto inadimplemento,
afirma o STF (BRASIL, 2013). No mesmo sentido, o STJ afirma que a razão se
funda no fato de que a reserva do possível “não configura carta de alforria para o
administrador incompetente, relapso ou insensível à degradação da dignidade da
pessoa humana, já que é impensável que possa legitimar ou justificar a omissão
estatal capaz de matar o cidadão de fome ou por negação de apoio médico-
hospitalar” (BRASIL, 2014b).
Utilizar como justificativa recursos orçamentários limitados, sobrepondo as
prioridades estatuídas na CRFB/1988 e nas leis, ultrapassam e depreciam os “limites
do razoável, as fronteiras do bom-senso e até políticas públicas legisladas, são

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 403


Alessandra Valle Salino / Glaucia Maria de Araujo Ribeiro

plenamente sindicáveis pelo Judiciário, não compondo, em absoluto, a esfera da


discricionariedade do Administrador, nem indicando rompimento do princípio da
separação dos Poderes.” (BRASIL, 2013).
Logo, se trata de efetivação dos direitos fundamentais como mandamento ao
gestor público por força constitucional, o que refoge de juízo de valor discricionário
por não depender, de forma única, de sua vontade política. Desta maneira, “a cláusu-
la da ‘reserva do possível’ – ressalvada a ocorrência de justo motivo objetivamente
aferível – não pode ser invocada, pelo Estado, com a finalidade de exonerar-se do
cumprimento de suas obrigações constitucionais, notadamente quando, dessa con-
duta governamental negativa, puder resultar nulificação ou, até mesmo, aniquilação
de direitos constitucionais impregnados de um sentido de essencial fundamentalida-
de” (BRASIL, 2004).
Nesse sentido, não traz surpresa “o fato de que a questão dos direitos sociais
tenha sido deslocada, em grande parte, para as teorias da justiça, da argumentação
jurídica e da análise econômica do direito”, como declara Gilmar Mendes (STF) em
seu voto durante o julgamento do Recurso Extraordinário 566.471/RN3.
A citação acima sobre a teoria da justiça, de John Rawls (2002), se presta
bem ao papel da importância da saúde e nossas convicções sobre conceitos que
traçam o itinerário de uma sociedade justa, cuja argumentação se situa na confluên-
cia entre as correntes do utilitarismo e as teorias do contrato social, delineadas por
Rosseau e Kant é necessário assimilar a extensão do que vem a ser justiça.
O sentimento de justiça quando se judicializa o direito à saúde, pode ser ilus-
trado em trecho precioso de Rawls quando afirma que “o estado de direito envolve
também o princípio segundo o qual casos semelhantes devem receber tratamento
semelhante. (...) A exigência de coerência vale naturalmente para a interpretação de
todas as regras e para justificativas em todos os níveis. Fica, por fim, mais difícil
formular os argumentos racionais para julgamentos discriminatórios, e a tentativa
de fazê-lo torna-se menos convincente.” (RAWLS, 2002, p. 260) Transpondo essa
proposição para a judicialização da saúde equivale apontar o conteúdo da política
pública adotado pelo poder Executivo deve alcançar grande parte de usuários dos
serviços de saúde pública, devendo ser revertida para o plural, abrangendo assim o
maior número possível dos envolvidos.
Já a teoria da argumentação de Robert Alexy, a qual alude em seu voto Min.
Gilmar Mendes4, tem por foco uma visão procedimental da Justiça: as decisões
devem ser racionais como forma de justificar e fundamentar a aplicação dos princí-
pios, regras e direitos pelo juiz. Em linhas gerais, a decisão judicial deve valorar os
fatos e as normas (argumentação lógico-valorativa), buscando uma justificação raci-
onal e, simultaneamente, a prática do discurso jurídico. Essa argumentação lógica –

3
Disponível em: <https://www.conjur.com.br/dl/voto-ministro-gilmar-mendes.pdf>. Acesso em: 09 abr.
2020, p. 3.
4
Disponível em: <https://www.conjur.com.br/dl/voto-ministro-gilmar-mendes.pdf>. Acesso em: 09 abr.
2020, p. 3.

404 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Perspectivas do Fenômeno Nacional da Judicialização da Saúde Voltada para o Amazonas

primazia do direito positivo – , não significa que a moral esteja em papel secundário,
uma vez que os casos difíceis, a exemplo das questões envolvendo saúde, não po-
dem ser decididas unicamente à luz do direito positivo, pois entra em cena não só a
moral como também a justiça, aplicando-se, em especial, ao âmbito dos direitos
humanos e fundamentais.
A teoria da análise econômica do Direito, de Richard Posner, apresenta a re-
lação entre o direito e da insuficiência da moral, estabelecendo que as decisões judiciais
devem pautar-se com previsibilidade, levando em consideração a relação de custos e
impactos econômicos, permitindo ao juiz visualizar os reflexos oriundos de mudanças
que virão com sua decisão.
Por fim, o Min. Gilmar Mendes em seu voto5, invoca o princípio da justiciabili-
dade ou judiciariedade, afirmando “ser considerado no Brasil o terceiro princípio do
Estado de Direito, inspirado no direito anglo-saxão” e traz à tona o conceito de Manoel
Gonçalves Ferreira Filho, cujo o foco central é “a sujeição de todos, inclusive das auto-
ridades, aos mesmos juízes’, ou seja, por meio da ação judicial adequada, ‘todo aquele
– pessoa física ou jurídica – cujo direito (fundamental ou não) houver sido violado, ou
ameaçado de violação, pode obter a tutela do Poder Judiciário”6. Essa postura não
extingue os conflitos do Judiciário, mas indica parâmetros estipulados em sua decisão
proferida na sede da STA 175, posteriormente confirmada pelo Plenário do STF, que
aqui listamos os critérios em apertada síntese:
(i) De forma geral, o tratamento fornecido pelo SUS deve ser privilegiado “em
detrimento de opção diversa escolhida pelo paciente, sempre que não for comprovada a
ineficácia ou a impropriedade da política de saúde existente”7.
(ii) Caso o SUS não tem nenhum tratamento específico para determinada patolo-
gia deve “diferenciar (a) os tratamentos puramente experimentais dos (b) novos trata-
mentos ainda não testados pelo Sistema de Saúde brasileiro”8.
(iii) Tratamentos experimentais, sem comprovação científica de sua eficácia,
“realizados por laboratórios ou centros médicos de ponta, consubstanciando-se em
pesquisas clínicas. (...) o Estado não pode ser condenado a fornecê-los”9. Aqui vale um
adendo sobre tratamentos experimentais que por ocasião da I Jornada de Direito da Saú-
de do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ocorrida em 15.05.2014 na cidade de São
Paulo10 foram aprovados diversos Enunciados dentre os quais o de n. 9, onde dispõe que
“as ações que versem sobre medicamentos e tratamentos experimentais devem observar
as normas emitidas pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP) e Agência

5
Idem.
6
Disponível em: <https://www.conjur.com.br/dl/voto-ministro-gilmar-mendes.pdf>. Acesso em: 11 abr.
2020, p. 5/6.
7
Disponível em: <https://www.conjur.com.br/dl/voto-ministro-gilmar-mendes.pdf>. Acesso em: 11 abr.
2020, p. 6.
8
Idem.
9
Disponível em: <https://www.conjur.com.br/dl/voto-ministro-gilmar-mendes.pdf>. Acesso em: 11 abr.
2020, p. 6.
10
Disponível em: <http://www.saude.mppr.mp.br/pagina-874.html#I_jornada>. Acesso em: 11 abr. 2020.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 405


Alessandra Valle Salino / Glaucia Maria de Araujo Ribeiro

Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), não se podendo impor aos entes federados
provimento e custeio de medicamento e tratamentos experimentais”;
(iv) Com relação aos novos tratamentos, ou seja, ainda não incorporados pelo
SUS ou com inexistência de Protocolo Clínico no SUS, não pode representar “viola-
ção ao princípio da integralidade do sistema, nem justificar a diferença entre as
opções acessíveis aos usuários da rede pública e as disponíveis aos usuários da
rede privada”11, logo tais casos, “a omissão administrativa no tratamento de deter-
minada patologia poderá ser objeto de impugnação judicial, tanto por ações indivi-
duais como coletivas”12;
(v) Em quaisquer das hipóteses levadas à análise do poder Judiciário a caute-
la deve existir para que aja não só a adequada instrução das demandas de saúde,
como também não ocorra a “produção padronizada de iniciais, contestações e sen-
tenças, peças processuais que, muitas vezes, não contemplam as especificidades do
caso concreto, impedindo que o julgador concilie a dimensão subjetiva (individual e
coletiva) com a dimensão objetiva do direito à saúde(...)”13.
Doutra banda, em dias atuais, abril de 2020, o STF decidiu que o Estado não
é obrigado a fornecer medicamentos de alto custo requeridos na Justiça quando não
estiverem previstos na relação do Programa de Dispensação de Medicamentos em
Caráter Excepcional, ou seja, não registrados na lista do SUS. Nesse julgado, RE
566.471-RN, foram suscitados aspectos relacionados às políticas públicas, direito à
saúde, excesso de judicialização da saúde, foco principal abordado da pesquisa que
vale a pena salientar. Senão veja-se:
(i) Fator orçamentário – o Min. Alexandre de Moraes ressaltou que “não há
mágica orçamentária e não há nenhum país do mundo que garanta acesso a todos
os medicamentos e tratamentos de forma generalizada”14. Destacou assim o núcleo
central da Teoria da Reserva do Possível ao afirmar que “as decisões judiciais favo-
ráveis a poucas pessoas, por mais importantes que sejam seus problemas, compro-
metem o orçamento total destinado a milhões de pessoas que dependem do Sistema
Único de Saúde (SUS)”.
(ii) O STF também não radicalizou a questão de bater às portas da Justiça. A
decisão permitiu, em caráter excepcional, ser possível a concessão de medicamentos
não registrados na lista da Anvisa, mas as ponderações foram no sentido de prestigi-
ar “as garantias constitucionais (entre elas a concretização dos direitos fundamen-
tais, o direito à vida e à dignidade da pessoa humana), o limite do financeiramente
possível aos entes federados, tendo em vistas restrições orçamentárias, o desrespei-
to às filas já existentes e o prejuízo a outros interesses idênticos”15.

11
Disponível em: <https://www.conjur.com.br/dl/voto-ministro-gilmar-mendes.pdf>. Acesso em: 11 abr.
2020, p. 6/7.
12
Idem.
13
Disponível em: <https://www.conjur.com.br/dl/voto-ministro-gilmar-mendes.pdf>. Acesso em: 11 abr.
2020, p. 7.
14
Disponível em: <http://stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=439095>. Acesso em: 11
abr. 2020.
15
Idem.

406 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Perspectivas do Fenômeno Nacional da Judicialização da Saúde Voltada para o Amazonas

Em resumo, sacramentado junto à Corte Maior o princípio da reserva do pos-


sível, indicando serem os recursos disponíveis limitados, as necessidades humanas
ilimitadas, e que ao prestigiar uma única pessoa, o Judiciário prejudica outras, “pois
o Estado está destinando os recursos previstos para fazer face às políticas univer-
sais de saúde ao cumprimento das decisões judiciais que determinam o fornecimen-
to individualizado de medicamentos extremamente caros”16.
Desta feita, enfatiza-se ser a saúde um direito social – art. 6º –, não integrado
ao rol de direitos fundamentais dispostos no art. 5º da CRFB/88, cuja característica,
o gozo “depende da concessão particularizada do legislador infraconstitucional”17,
não podendo ser “garantido pelo Poder Judiciário”18, ante a necessidade de se ob-
servar a cláusula da reserva do possível, ou melhor, a “reserva do orçamento, haja
vista estar ao lado da saúde, também constam, como direitos sociais, a educação, o
trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à mater-
nidade e à infância e a assistência aos desamparados”19.
Diante disso, o princípio da reserva do possível não fora oposto ao princípio do
mínimo existencial, e sim conjugado a ele, afinal se preserva esse último, visto que o
SUS é um sistema de todos e para todos e só então é que se poderá discutir, relativamen-
te aos recursos remanescentes, em quais políticas públicas se deve investir.

3 JUDICIALIZAÇÃO DA SAÚDE NO BRASIL


A judicialização da saúde é um fenômeno que ocorre na convergência entre
os sistemas de justiça e o de saúde. Para suprir determinada necessidade de saúde, o
cidadão ingressa no sistema judiciário com seu pedido e se transformam em ordens
judiciais, direcionadas aos gestores públicos de saúde para conceder tratamento
terapêutico e/ou fornecimento de remédios, caso o litigante obtenha sucesso.
Como vimos, o Brasil legitimou o direito à saúde em 1988, por meio da
CFRB com a concepção e estabelecimento do SUS. De tal modo, esse direito passa a
ser garantido pelas normas constitucionais, fazendo com que o Judiciário admita a
sua efetivação.
Consequentemente a esta previsão constitucional e universal, começaram a
surgir os processos de judicialização voltados para área da saúde, visto que tanto a
saúde quanto o direito são áreas bastante politizadas. Assim sendo, as instituições
jurídicas e sanitárias têm sido testemunhas de tal característica, a qual influencia
categoricamente as sociabilidades e a implantação de estratégias de reivindicação de
direitos pelos atores sociais. O resultado desse processo é a intensificação do prota-

16
Disponível em: <http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/RE566471.pdf>. Acesso em:
11 abr. 2020, p. 142.
17
Disponível em: <http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/RE566471.pdf>. Acesso em:
11 abr. 2020.
18
Idem.
19
Idem.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 407


Alessandra Valle Salino / Glaucia Maria de Araujo Ribeiro

gonismo do Judiciário na efetivação da saúde e uma presença cada vez mais cons-
tante desse Poder no cotidiano da gestão em saúde no Brasil (BRASIL, 2015).
Devido ao crescimento do número de ações judiciais relacionadas à assistên-
cia à saúde, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) tem conduzido e estimulado de
maneira sistemática a atuação do Judiciário. Considerando os diversos elementos
que diferenciam o direito à saúde dos demais direitos sociais, como a necessidade de
celeridade das decisões, a relação direta com o direito à vida e a complexidade do
que significa tratamento e prevenção, buscou estabelecer uma política judiciária para
a saúde. (BRASIL, 2015).
Dessa forma, destacamos algumas ações do CNJ que apontam a condução
desta política. Em 2009, após consulta através da Audiência Pública n. 04, onde
foram ouvidas as opiniões de pessoas com expertise no Sistema Único de Saúde
(SUS). Instituiu um Grupo de Trabalho (GT)20, com a finalidade de “elaborar estu-
dos e propor medidas concretas e normativas referentes às demandas judiciais
envolvendo a assistência à saúde” (BRASIL, 2009).
Assim, a partir da instituição deste GT iniciaram-se ações importantes, como
por exemplo, a criação do Fórum Nacional do Judiciário para monitoramento e reso-
lução das demandas de assistência à saúde – Fórum da Saúde21 com o propósito de
aprimorar os procedimentos, reforçar a efetividade dos processos judiciais e prevenir
novos conflitos (BRASIL, 2010a)22. Atrelado a Resolução 107/2010, o CNJ de-
monstrou por meio de um relatório as demandas existentes nos Tribunais de Justiça
estaduais e nos cinco Tribunais de Justiça federais, de acordo a quantidade de pro-
cessos informados. Esse documento evidencia a existência, à época, de 240.980
processos no país, sendo que três estados não apresentaram nenhum processo (Ama-
zonas, Paraíba e Pernambuco) (BRASIL, 2010b).
Outra ação importante do CNJ, foi a formação de Comitês Executivos no
âmbito estadual23. Em sua página da internet, o CNJ disponibiliza, um link de con-
sulta das ações dos Comitês Estaduais, no que se refere às demandas judiciais na
área da saúde. No entanto, verificamos que só existem oito Comitês Executivos24
disponíveis para essa consulta.

20
Portaria 650, de 20.11.2009. Disponível em: <https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/695>. Acesso em: 10 mar.
2020.
21
Resolução 107, de 06.04.2010. Disponível em: <https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2011Dispo
nível em: /03/resolucao_107_06042010_11102012191858.pdf>. Acesso em: 10 mar. 2020.
22
Importante notar que o Fórum da Saúde, desde a sua formação, é composto por magistrados, ouvindo,
porém, a experiência de especialistas na área da saúde.
23
Art. 3º da Resolução 107, de 06.04.2010. Disponível em: <https://www.cnj.jus.br/wp-comtent/
uploads/2011/03/resolucao_107_06042010_11102012191858.pdf>. Acesso em: 10 mar. 2020.
24
Os Comitês Estaduais existentes no site do CNJ são os seguintes: Comitê Executivo do Mato Grosso do
Sul; Comitê Executivo do Rio de Janeiro, Comitê Executivo do Paraná, Comitê Executivo do Paraná
(Saúde Suplementar), Comitê Executivo de Santa Catarina, Comitê Executivo de Tocantins, Comitê
Executivo do Rio Grande do Norte e Comitê Executivo do Rio Grande do Sul. Disponível em:
<https://www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/forum-da-saude-3/iniciativas-dos-comites-estaduais/>.

408 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Perspectivas do Fenômeno Nacional da Judicialização da Saúde Voltada para o Amazonas

Dando continuidade na condução da política judiciária para a saúde, o CNJ re-


comendou expressamente na Resolução 238/2016, a criação de Núcleos de Apoio Técni-
co Judiciário (NAT-JUS) a fim de darem suporte às decisões sobre o segmento da saúde.
Dessa maneira hoje, no Brasil, o judiciário possui órgãos de assessoria visan-
do o reforço à efetividade dos processos judiciais e à prevenção de novos conflitos
na área da saúde.
3.1 Dificuldades de Acesso aos Dados
Notamos, que há dificuldade em obter dados acerca da saúde no Judiciário
brasileiro e especialmente no Judiciário do Estado do Amazonas. Com exceção da
Defensoria Pública do Estado do Amazonas – DPE/AM, que por intermédio do
titular do Núcleo de Saúde, Dr. Arlindo Gonçalves, colocou à disposição o setor da
Defensoria Pública Especializada na Promoção e Defesa dos Direitos Relacionados
à Saúde, nos concedendo os dados que dispunham, para fins deste estudo.
Esta conjuntura também fora notada pelo CNJ mencionando que:

Em praticamente todos os tribunais, observa-se uma dificuldade de acesso aos dados


processuais, tipos de ação, tempo de conclusão, etc. A 2ª instância e os tribunais su-
periores já estão mais avançados na disponibilização de dados, mas é preciso tam-
bém apresentar os dados da 1ª instância aberta e diretamente. Atualmente, estes da-
dos só são conhecidos por meio dos relatórios que as unidades jurisdicionais prestam
ao CNJ, que compõem o Relatório Justiça em Números (BRASIL, 2015, p. 60).

Segundo o Instituto de Ensino e Pesquisa (INSPER), o modo como se estru-


turam os dados dos repositórios de jurisprudência nos tribunais dificulta pesquisas
cada vez mais frequentes na academia e entre operadores do Direito nas esferas
pública e privada. Acrescentando haver conflito entre os princípios democráticos e
de publicidade da organização pública e a prática de alguns tribunais de justiça de
impedir ou dificultar o acesso às decisões judiciais por meio de captchas ou mesmo
não as disponibilizar integralmente (BRASIL, 2019a).
Araújo (2018) relatou contratempo e demora na coleta de material, expres-
sando a burocracia existente no judiciário, tendo inclusive, que modificar o escopo
do seu trabalho. Essa dificuldade prejudica estudos sobre judicialização da saúde e
consequentemente às análises referentes a essa temática.
Os números de processos judiciais relacionados à temática judicialização da
saúde no âmbito dos Tribunais de Justiça apresentam inadequação “para a consulta
e análise de dados em larga escala (big data)”25, indicando dificuldades de acesso
às informações para subsidiar a elaboração de pesquisas. Os dados são, muitas ve-
zes, inconsistentes em sua padronização, o que prejudica a compreensão e análise
dos dados, cenário que causa obstáculos, mas não impossibilitou a presente pesquisa
como veremos a seguir.
25
Disponível em: <https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2019/03/66361404dd5ceaf8c5f7049223bdc70
9.pdf>. Acesso em: 18 maio 2020.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 409


Alessandra Valle Salino / Glaucia Maria de Araujo Ribeiro

3.2 Dos Dados Sobre o Incremento da Judicialização da Saúde no Brasil


O estudo do INSPER demonstrou que o número de processos judiciais rela-
cionados à saúde, no período de dez anos (2008 e 2017), apresentou um aumento de
130% na 1ª instância, 85% na 2ª instância (Tabela 1). Não são todos os processos
que chegam a 2ª instância, mas a curva ascendente também nesse nível do Judiciário
indica um movimento generalizado no país (BRASIL, 2019a).
Um total de 136.410 processos relacionados à saúde tramitavam no judiciário
brasileiro em 2017, como demonstrado na Tabela 1.

Tabela 1 – Número de processos judiciais relacionados à saúde entre 2009 e


2017, Brasil
Anos 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017

1ª instância26 41.453 32.103 26.753 26.502 39.590 49.374 50.136 63.853 61.910 95.752

2ª instância27 2.969 22.011 22.953 27.485 27.134 26.578 29.648 33.578 36.807 40.658

Total (1ª e 2ª) 44.422 54.114 49.706 53.987 66.724 75.952 79.784 97.431 98.717 136.410

Fonte: Elaboração das autoras a partir dos dados do INSPER, 2019 (BRA-
SIL, 2019a).

Esse mesmo estudo exibe a comparação dos resultados acima descritos


com os do CNJ “Justiça em Números”, para o mesmo período (2008 a 2017),
relatando que o crescimento do número total de processos judiciais na 1ª instân-
cia foi de 50% e na 2ª instância de 40%. O que demonstra uma demanda apro-
ximadamente 300% maior para as questões voltadas à saúde na 1ª instância e um
pouco mais de 100% na 2ª instância quando comparadas ao volume total de
processos judiciais (BRASIL, 2019a)28. A Tabela 1 evidencia que com o passar
dos anos o número de ações decididas em 1ª instância aumentou durante o perí-
odo do estudo, demonstrando o amadurecimento do judiciário nas questões rela-
cionadas à saúde.
Para além do quantitativo dos processos, o Gráfico 1, nos mostra na se-
quência que a maior demanda dos acórdãos dos processos de saúde em 2ª instân-
cia, nos Tribunais Regionais Federais (TRF), versa sobre medicamentos (69,1%).

26
Os dados de primeira instância em formato passível de análise, foram obtidos dos seguintes tribunais: TJRJ,
TJMG, TJPI, TJAL, TJPE, TJSP, TJMA, TJMS, TJES, TJAC, TJCE, TJRO, TJRN, TJDF, TJMT, TJSC,
TJTO (BRASIL, 2019a).
27
Em segunda instância, os tribunais que enviaram os dados em formato passível de análise foram: TJCE,
TJMA, TJRJ, TJPE, TJES, TJSC, TJAL, TJPI, TJMT, TJMS, TJMG, TJAC, TJRO, TJRN, TJTO
(BRASIL, 2019a).
28
Disponível em: <https://www.cnj.jus.br/demandas-judiciais-relativas-a-saude-crescem-130-em-dez-anos/>.

410 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Perspectivas do Fenômeno Nacional da Judicialização da Saúde Voltada para o Amazonas

Corroborando com a revisão sistemática de Freitas et al., 2020, que aponta para as
principais questões relacionadas a judicialização de saúde no Brasil, constatando que
as mesmas estão voltadas, em sua maioria, para os medicamentos (69,5%).

Gráfico 1 – Proporção29 dos principais assuntos das decisões dos processos de


saúde em 2ª instância, Tribunais Regionais Federais30

Transplante 1,3%
Imunização 1,3%
Consultas 1,8%
Erro Médico 2,9%
Vagas 5,4%
Internação 19,2%
Insumos ou Materiais 33,1%
Leitos 46,7%
Procedimentos 47,1%
Exames 55,6%
Órtese, Prótese e meios auxiliares 63,0%
Medicamentos 69,1%

Fonte: Elaboração das autoras a partir dos dados do INSPER, 2019 (BRA-
SIL, 2019a).

Analisando os mesmos assuntos, vistos pelo prisma das regiões brasileiras


(Quadro 1), observamos que a região Norte apresenta maior demanda na maioria dos
assuntos, o que evidencia uma ineficiência maior na assistência à saúde quando
comparada as demais regiões do país. Enquanto a região Centro-Oeste, apresentou a
menor proporção de acórdãos na maioria dos assuntos. Com relação aos assuntos
mais frequentes, fica claro a maior participação de medicamentos e órteses, próteses
e meios auxiliares na maioria das regiões, exceto no Nordeste, onde a maior fre-
quência foi nos leitos. O Quadro 1 aponta uma grande variabilidade regional, ainda
assim, não podemos confirmar ao certo todas as diferenças pela falta de estudos e
dados específicos para diversos estados.

29
Como um processo de saúde pode conter mais de um assunto, a soma excede 100%.
30
Referente aos Tribunais Regionais Federais: TRF1, TRF4 e TRF5.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 411


Alessandra Valle Salino / Glaucia Maria de Araujo Ribeiro

Quadro 1 – Proporção dos principais assuntos das decisões dos processos de


saúde em 2ª instância, Regiões, Brasil31
CENTRO-
Assunto NORTE NORDESTE SUDESTE SUL
OESTE
Consultas 5,2% 0,8% 1,9% 1,7% 2,4%
Erro Médico 6,3% 2,3% 2,2% 4,5% 2,1%
Exames 67,9% 40,7% 56,6% 59,9% 33,5%
Imunização 0,4% 1,7% 1,2% 1,6% 0,6%
Insumo ou Materiais 31,0% 23,4% 42,0% 20,6% 14,9%
Insumos 0,1% 0,0% 0,0% 0,1% 0,2%
Internação 28,3% 12,2% 19,0% 19,8% 21,8%
Leitos 75,2% 69,5% 36,7% 60,3% 52,2%
Medicamentos 79,2% 56,3% 68,9% 74,6% 52,5%
Procedimentos 65,0% 42,5% 49,4% 44,4% 36,9%
Órteses, Próteses e
69,6% 45,1% 66,5% 63,4% 38,3%
Meios Auxiliares
Transplantes 2,4% 1,5% 1,5% 0,8% 1,1%
Vagas 6,5% 2,4% 6,0% 3,5% 12,1%

Fonte: Elaboração das autoras a partir dos dados do INSPER, 2019 (BRA-
SIL, 2019a).

Um fator preocupante quando tratamos da judicialização da saúde está relaci-


onado aos custos gerado pela mesma. De acordo com a pesquisa do INSPER, os
custos governo federal aumentaram mais de 10 vezes entre 2010 e 2016, chegando à
soma de R$1,3 bilhões. Consumindo a verba do SUS, dos programas de saúde, em-
bora haja pouca clareza sobre os impactos desses gastos (BRASIL, 2019a).
Outra situação a ser considerada sobre o aumento do número de processos da
saúde, é a dificuldade operacional de processar tantos pedidos judiciais, sem que
haja pessoal e tempo hábil, junto às Secretarias de Saúde, para responder às deman-
das no prazo legal (BRASIL, 2019a).
A Confederação Nacional de Municípios, no estudo realizado em 2016, abor-
da um outro aspecto que coopera para o aumento das demandas judiciais da saúde, o
subfinanciamento do SUS. Informando que esse problema é persistente e cada vez
maior, levando a consequências graves que afetam diretamente o direito à saúde,
principalmente, em Municípios de médio e pequeno porte (BRASIL, 2016a).

31
Dados referentes apenas aos Tribunais de Justiça.

412 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Perspectivas do Fenômeno Nacional da Judicialização da Saúde Voltada para o Amazonas

Isto posto, a judicialização dos processos de saúde no Brasil envolve uma sé-
rie de aspectos relevantes, além de ter aumentado aceleradamente o seu volume nos
últimos anos adicionando dificuldades a operacionalização do sistema público de
saúde. Logo, precisamos considerar a importância do tema, estimulando mais estu-
dos com o propósito de induzir a melhoria e mudança desse cenário.

4 JUDICIALIZAÇÃO DA SAÚDE NO AMAZONAS/MANAUS


Como visto anteriormente, o CNJ induziu em 201032 a formação de Comitês
Executivos no âmbito estadual que, no Amazonas, foi criado em 201133. Porém,
vale ressaltar, que o Comitê Executivo do Amazonas não está disponível para
consulta no sítio eletrônico do CNJ. Assim como, na página da internet do Tri-
bunal de Justiça do Amazonas (TJAM)34, os dados e ações do referido Comitê
Estadual, não estão disponíveis, encontrando-se apenas a sua composição35.
No contexto dos órgãos de assessoria instituídos no Amazonas, em 16.10.2018, por
meio da Resolução 16/201836, foi estabelecido pelo TJAM o Núcleo de Apoio Técnico
Judiciário (NAT-JUS). Esse Núcleo, dentre outras ações, tem o propósito de prestar asses-
soria aos magistrados da Justiça Estadual, com a finalidade de organizar e promover o
atendimento das demandas desse setor, no âmbito do Estado do Amazonas, devido à com-
plexidade das mesmas. O detalhamento sobre o funcionamento, responsabilidades e com-
posição do NAT-JUS AM foram firmadas em 05.04.2018 através do Acordo de Coopera-
ção Técnica n. 010/2018 – TJ entre o TJAM e o Governo do Estado do Amazonas por
intermédio da Secretaria de Saúde do Amazonas (SUSAM) (AMAZONAS, 2018)37.
Dessarte, constatamos que no Amazonas foram constituídos os instrumentos de
assessoramento necessários para auxiliar o judiciário na área da saúde conforme reco-
mendado pelo CNJ. Apesar disso, as ações realizadas e os dados produzidos pelos res-
pectivos órgãos não estão disponíveis para consulta e conhecimento público.
A pesquisa realizada pelo INSPER, 2019 sobre as demandas judiciais relaciona-
das à saúde, expôs que o TJAM não enviou as informações solicitadas38. Logo, não
constam nessa publicação nacional nenhum dado referente ao Amazonas.
32
Art 3º da Resolução 107, de 06.04.2010. Disponível em: <https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/
2011/03/resolucao_107_06042010_11102012191858.pdf.> Acesso em: 10 mar. 2020.
33
O Comitê Executivo do Estado do Amazonas foi criado em 06.06.2011, através da Portaria 49/2011.
https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2011/03/Portaria%20n%2049-GP.pdf.>
34
Verificamos que o Relatório Justiça em números 2019, classifica o TJAM como um tribunal de pequeno
porte (classificação baseada na população por região e no Produto Interno Bruto – PIB, por região), com o
escore igual a – 0,478, tendo 220.213 de casos novos e 741.489 de casos pendentes, totalizando 961.702
casos (BRASIL, 2019d).
35
A composição do Comitê Executivo do Amazonas, encontra-se na página da internet do TJAM, no link
“Saúde”. Disponível em: <https://www.tjam.jus.br/index.php/menu/saude. >Acesso em: 10 mar. 2020.
36
Idem.
37
Disponível em: <https://www.tjam.jus.br/images/2019/Saude/ACT_010.2018_TJ_e_SUSAM.pdf.>
38
Informação do INSPER: “Em 20.07.2018 recebemos E-mail da Ouvidoria do Tribunal informando que a
solicitação estava sendo encaminhada ao Presidente do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do
Amazonas, por meio do Ofício n. 70/18, para providências. Não recebemos nenhum retorno posterior a
esse” (BRASIL, 2019a).

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 413


Alessandra Valle Salino / Glaucia Maria de Araujo Ribeiro

Sendo assim, devido a ausência de dados sobre a saúde, no site do TJAM, nos de-
tivemos à análise das informações disponíveis nos Relatórios do CNJ “Justiça em Núme-
ros” das últimas quatro publicações (2016 a 2019)39 – Tabela 2 e aos dados fornecidos
pela Defensoria Pública do Estado do Amazonas – DPE/AM (Tabela 3).
A Tabela 2, demostra os dados do Estado do Amazonas, correspondentes ao
TJAM, no período de 2015 a 2018 (anos-base), coletados nos Relatórios do CNJ “Justi-
ça em Números”40 (BRASIL, 2016b; BRASIL, 2017; BRASIL, 2018; BRASIL, 2019d).

Tabela 2 – Quantitativo de casos novos TJAM – Assunto “Saúde”41, anos-base –


2015 a 2018 (continua)
Ano-base
Assunto
2015 2016 2017 2018
1º grau 42 0 0 0
“Unidade de Terapia
2º grau 42 0 0 0
“Tratamento Intensiva (UTI) ou
Juizado
médico-hospital” Unidade de 42 0 0 0
especial
(Cód. 11885) Cuidados
Intensivos” Turma
42 0 0 0
Recursal
Total casos novos – Cód. 11885 168 168 0 0 0
1º grau 42 0 0 0
2º grau 42 0 0 0
“Tratamento médico-hospital” Juizado
42 0 0 0
(Cód. 11883) especial
Turma
42 0 0 0
Recursal
Total casos novos – Cód. 11883 168 168 0 0 0
1º grau 28 2 2 1
2º grau 36 19 22 5
“Tratamento médico-hospital e/ou
Juizado
fornecimento de medicamentos” 42 0 0 0
especial
(Cód. 10069)
Turma
42 0 22 0
Recursal
Total casos novos – Cód. 10069 221 148 21 46 6

39
O Relatório referente ao ano-base 2019 não estava disponível até a data da nossa última consulta em
02.04.2020.
40
O Relatório Justiça em Números é regido pela Resolução CNJ 76, de 12.05.2009, e compõe o Sistema de
Estatísticas do Poder Judiciário (SIESPJ).
41
As tabelas processuais unificadas do Relatório “Justiça em Números” – CNJ possuem seis níveis
hierárquicos de assuntos, a Saúde está inclusa no Direito Administrativo e outras matérias de Direito
Público (nível 1 – Cód. 9985); em Serviços (nível 2 – Cód. 10028); e é enquadrada como nível 3.

414 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Perspectivas do Fenômeno Nacional da Judicialização da Saúde Voltada para o Amazonas

Tabela 2 – Quantitativo de casos novos TJAM – Assunto “Saúde”42, anos-base –


2015 a 2018 (conclusão)
Ano-base
Assunto
2015 2016 2017 2018
1º grau 6 0 29 28
2º grau 39 65 93 110
“Saúde” Juizado
1 0 0 66
(Cód. 10064) especial
Turma
42 1 93 11
Recursal
Total casos novos – Cód. 10064 584 88 66 215 215
Total de casos novos por ano 572 87 261 221
Total de casos novos – 2015 a 2018 1.141

Fonte: Elaboração das autoras a partir dos dados do CNJ43 – Relatórios “Justiça
em Números” (BRASIL 2016a; BRASIL, 2017; BRASIL, 2018; BRASIL, 2019d).

No Amazonas, no período de 2015 a 2018, foram impetrados e distribuídos


1.141 casos novos, relativos ao assunto “Saúde”44. O ano de maior volume de pro-
cessos novos equivalentes à saúde foi 2015 (572 ações) e o de menor volume 2016
(87 ações). O código 10064 (“Saúde”), foi o mais pleiteado no TJAM com um total
de 584 ações, sendo os maiores quantitativos nos anos de 2017 e 2018, ambos com
215 casos novos. De acordo com os dados divulgados pelo CNJ, para o TJAM, hou-
ve um declínio no total de casos novos comparando os anos estudados (2015 – 572
ações; 2018 – 221 ações). Evidenciando, que nos últimos quatro anos a procura pela
judicialização da saúde pública, no Amazonas, através da justiça paga, apresentou
um decréscimo de 71,2%.
Chama atenção das pesquisadoras, os números idênticos nas diversas instân-
cias do TJAM, tanto na justiça comum, como na justiça especial para os códigos –
11883 e 11885 em 2015 (Tabela 2).
No âmbito da justiça gratuita, no Amazonas, a Tabela 3 a seguir, demonstra
os dados da DPE/AM45.

42
As tabelas processuais unificadas do Relatório “Justiça em Números” – CNJ possuem seis níveis
hierárquicos de assuntos, a Saúde está inclusa no Direito Administrativo e outras matérias de Direito
Público (nível 1 – Cód. 9985); em Serviços (nível 2 – Cód. 10028); e é enquadrada como nível 3.
43
Os dados do CNJ retratam apenas as demandas que foram efetivamente apresentadas ao Poder Judiciário.
Na Tabela 2, não estão os dados relativos aos pedidos administrativos formulados pelos cidadãos,
Ministério Público, Defensoria Pública, Conselhos de Saúde e demais interessados.
44
Esse total corresponde à processos pertencentes aos códigos: 11885, 11883, 10069 e 10064.
45
Os dados da Tabela 3 foram cedidos pela DPE/AM, por meio do titular do Núcleo de Saúde, Dr. Arlindo
Gonçalves, através da Defensoria Pública Especializada na Promoção e Defesa dos Direitos Relacionados à
Saúde pelo Assessor Jurídico, Túlio Ricardo Oliveira, por meio eletrônico no dia 20.05.2020.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 415


Alessandra Valle Salino / Glaucia Maria de Araujo Ribeiro

Tabela 3 – Quantitativo de demandas da saúde ajuizadas – DPE/AM, 2018 a


fev./202046
Assunto 2018 2019 2020 Total por Assunto

Medicamentos 89 58 14 161
Exames 89 126 41 256
Cirurgias 62 67 10 139
Hemodiálises 40 17 17 74
Outros 78 105 10 193

Total por ano 358 373 92 823

Fonte: Elaboração das autoras a partir dos dados do DPE/AM.

No tocante aos dados da DPE/AM, verificamos que no acumulado dos três


anos foram ajuizados 823 processos relacionados à saúde. Os assuntos de maior
demanda foram: “exames” (256 ações); seguido por “outros” (193 ações); “medica-
mentos” (161 ações); e posteriormente “cirurgias” (139 ações). Do mesmo modo, o
Quadro 1 demonstrou para a região Norte, que os três assuntos de saúde mais procu-
rados foram – leitos (75,2%), exames (67,9%) e procedimentos (65,0%), respecti-
vamente. Evidenciando a ineficiência da assistência à saúde nessa região.
No Amazonas, a procura pela judicialização na justiça gratuita aumentou de
2018 (358 casos) para 2019 (373 casos). Os dados de 2020 indicam a tendência de o
total desse ano ser maior do que dos anos anteriores, visto que até fevereiro exibe 92
casos, o que representa 25% do total de casos de 2019. Assim como, o crescimento
da judicialização da saúde visto no Brasil.
Vale ressaltar que a DPE/AM informou que a grande maioria das ações foram
ajuizadas em face do Estado do Amazonas, tendo em vista sua atribuição específica
para serviços de média e alta complexidade e a maior facilidade de acesso por parte
do assistido, muito embora a repartição interna de competências do SUS não seja
oponível ao particular e não afaste a responsabilidade solidária dos entes. Além de
entender que “a grande maioria das ações diz respeitos a procedimentos e produtos
padronizados, que deveriam estar sendo disponibilizados pelo Estado (em sentido
amplo) mas não o são. Procedimentos e materiais extra SUS, ou medicamentos não
padronizados e de alto custo são a minoria, o que significa dizer que a dificuldade
de acesso da população ao sistema de saúde diz respeito primordialmente a serviços

46
Com relação ao quantitativo de demandas, faz-se necessário esclarecer que no Amazonas, conforme
informado pela DPE/AM, a Defensoria Pública Especializada em Saúde fora criada no final de 2016.
Anteriormente a esse período, as demandas relacionadas ao acesso à serviços e produtos de saúde, eram
absorvidas pelas diferentes Defensorias com atribuição cível, tornando difícil catalogar e mensurar as
demandas dessa natureza.

416 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Perspectivas do Fenômeno Nacional da Judicialização da Saúde Voltada para o Amazonas

e produtos a que o próprio Estado reconheceu como de fornecimento obrigatório,


ao incorporá-los ao SUS”.
Com relação aos municípios47, as demandas concentram-se principalmente
em Tratamento Fora de Domicílio – TDF Intermunicipal (ajuda de custo, auxílio a
deslocamentos e etc) e em razão dos problemas relacionados ao Serviço de Assis-
tência à Saúde dos Servidores Públicos do Município de Manaus (MANAUSMED).
Os TFD Intermunicipais evidenciam a carência da assistência à saúde nos municí-
pios do interior do Amazonas, visto que a população do interior do estado precisa se
deslocar para a capital – Manaus em busca de tratamento médico. Essa conjuntura,
impacta diretamente no aumento dos gastos do estado.
Constatamos, que a demanda pela justiça gratuita no Amazonas, foi maior em
66,5% quando comparada a justiça paga nesse estado, no ano de 2018. Corroboran-
do, com o estudo da Fiocruz, em andamento, “Judicialização da Política Pública de
Saúde nos Municípios Brasileiros: um retrato nacional”, onde informa que nas
regiões Sul e Sudeste, a maior parte das ações é movida por advogados privados,
enquanto nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, se sobressaem os pedidos por
meio de defensores públicos48.
É possível inferir, que a judicialização da saúde no Amazonas, representa
uma parcela muito pequena 0,2% (2017) quando comparada ao total dos proces-
sos do país.
Contudo, essa representatividade baixa do Amazonas, vai de encontro com
os resultados aferidos pelo INSPER, 2019 para a região Norte (Quadro 1), onde os
mesmos apresentaram maior demanda na maioria dos assuntos de saúde dentre as
regiões brasileiras.
Entretanto, não podemos apontar as razões do quantitativo baixo dos proces-
sos relativos à saúde no Amazonas. Não há elementos que comprovem se é pela falta
de informações, dados e/ou subnotificações ou pela ausência de informações da
população sobre a possibilidade de recorrer à justiça para pleitear os direitos relacio-
nados à saúde.
Notamos que as ações judiciais atinentes ao tema saúde no Estado do Ama-
zonas, possuem três vetores de demandas que vão de (i) disponibilização de exames
de saúde; (ii) tratamento de doenças; e (iii) fornecimento de medicamentos. Em
síntese, as razões da judicialização da saúde no Amazonas derivam de uma prestação
de serviço precária pelo Poder Público, haja vista o cidadão amazonense buscar
junto ao SUS produto/serviço que se encontra na esfera de seu fornecimen-
to/atendimento obrigatório.

47
A DPE/AM informou que com relação aos municípios do interior, é provável que as unidades da
Defensoria Pública atuantes nessas localidades possuam maiores informações sobre o total de demandas de
saúde ajuizadas em face das respectivas municipalidades.
48
Disponível em: <https://www.fiocruzbrasilia.fiocruz.br/fiocruz-brasilia-apresenta-panorama-da-judiciali
zacao-da-saude-no-brasil/>.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 417


Alessandra Valle Salino / Glaucia Maria de Araujo Ribeiro

5 CONCLUSÃO
Alguns autores argumentam que a judicialização amplia o acesso ao SUS às
populações mais pobres e desassistidas, outros afirmam que ela cria uma nova porta
de entrada ao SUS, favorecendo os mais ricos e a indústria farmacêutica. Portanto,
cabe ao judiciário através dos processos de saúde, contribuir para a melhoria e estru-
turação do sistema público de saúde, por meio da busca de práticas mais eficazes e
efetivas. No entanto, vale ressaltar que é obrigação dos entes gestores da saúde,
assegurar a assistência à saúde orientada pelos princípios norteadores do SUS.
Complementando esse raciocínio, as ações voltadas à saúde no Brasil são
predominantemente individuais e não resultam em benefícios coletivos (FREITAS et
al., 2020). Assim, há necessidade de se pensar em estratégias e soluções para modi-
ficar esse cenário, refletindo e avançando nesse debate para que a população seja
beneficiada a partir dos resultados advindos das ações individuais. É imprescindível
que as decisões judiciais gerem consequências positivas para o SUS. A justiça brasi-
leira precisa ser resolutiva, eficaz, voltada para o bem comum e de forma menos
onerosa.
Baseado em Asensi & Pinheiro, 2016 “a judicialização do direito à saúde
tende a ser pensada sob o prisma da propositura de ações judiciais, mas existe uma
série de estratégias extrajudiciais que podem ser desenvolvidas com a presença do
Judiciário”.
Corroborando com esse pensamento Vilela et al. afirmam que somente o diá-
logo institucional, como forma de interlocução entre os poderes, permite uma rela-
ção construtiva entre o sistema de justiça e o sistema de saúde, de forma a vislum-
brar a resposta judicial como um mecanismo de fortalecimento do sistema de saúde
e não de desestruturação (BRASIL, 2019b). Schulze afirma ser possível a “desjudi-
cialização”49 mesmo em meio a crise que assola o Brasil (BRASIL, 2019c).
Posto isto, é necessário refletir sobre quais arranjos podem ser desenvolvidos
no Amazonas/Manaus induzindo a organização dos entes envolvidos no cumprimen-
to das obrigações, a fim de evitar o aumento de ações judiciais referentes à saúde. É
fundamental avaliar quais atores entre os órgãos de justiça e da saúde, podem ser
chamados para contribuir no debate sobre esse tema, com o intuito de avançarmos
no diálogo, e na construção da efetivação do direito à saúde no Estado. Posto que, a
litigiosidade existe na medida em que o Poder Público falha no cumprimento de seu
dever constitucional de prestar assistência médica gratuita, universal e integral à
população.
Verificamos, que a judicialização da saúde no Amazonas representa uma
parcela muito pequena (0,2%), quando comparada ao total de ações no Brasil
(2017). Entretanto, não pudemos concluir o porquê desse quantitativo baixo no
Amazonas. Não conseguimos coletar elementos suficientes que nos embasasse a

49
Entende-se por “desjudicialização” o evitar da judicialização, incentivando a solução de conflitos por meio
de métodos alternativos extrajudiciais de autocomposição (ex: arbitragem, conciliação, mediação, mediação
prévia e Ação de Planejamento e de Gestão Sistêmicos – PGS) (SHULZE, 2017).

418 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Perspectivas do Fenômeno Nacional da Judicialização da Saúde Voltada para o Amazonas

responder essa questão. No entanto, a demanda ajuizada pelo DPE/AM evidenciou


um aumento de 66,5% dos casos de saúde (2018 e 2019) e uma tendência a supe-
rar esse crescimento em 2020, tal qual o aumento da judicialização da saúde ob-
servado nos últimos anos no país.
A seu turno, a falta de informações sobre os processos referentes à saúde no
TJAM dificultou o desfecho da análise do panorama do estado. Entretanto, podemos
levantar as seguintes hipóteses – subnotificação dos casos, visto que é notória a
precariedade da saúde pública no estado sendo, inclusive, amplamente noticiada
recentemente em virtude da pandemia do COVID 19; outra suspeita seria o desco-
nhecimento da população amazonense sobre a possibilidade de recorrer à justiça
para pleitear os direitos relacionados à saúde.
Estamos de acordo que é preciso ampliar a disponibilidade dos dados para
que se possa conhecer melhor, e com rigor científico, o Judiciário. Qualquer cida-
dão, professor, pesquisador, precisa ter acesso direto aos dados, preferencialmente
online, para contribuir a partir de propostas concretas sobre a efetivação do direito à
saúde (BRASIL, 2015).
Em suma, no âmbito da saúde no Amazonas, ratificamos o entendimento da
DPE/AM afirmando que “a judicialização não deve ser vista como uma causa em si,
que estaria resultando em problemas para o sistema de saúde, mas, ao contrário,
como efeito, sendo sintomática da própria ineficiência estatal na prestação de tais
serviços”. Reforçamos que tal fato demonstra a falta de vontade política do poder
público com a saúde da população Amazonense.

REFERÊNCIAS
ARAÚJO, Izabel Cristina de Souza, A Judicialização da Saúde em Manaus: análise das demandas entre
2013 e 2017, 2018, 80 f., (Mestrado em Saúde Pública) – Fiocruz Amazônia, Manaus, 2018.
ASENSI, Felipe; PINHEIRO, Roseni, Judicialização da Saúde e Diálogo Institucional: a experiência de
Lages (SC), R. Dir. sanit., São Paulo, v.17, n.2, p. 48-65, jul./out., 2016.
BRASIL, Senado Federal. Constituição da República Federativa do Brasil, Brasília, Senado Federal,
1988.
_______, Lei Orgânica de Saúde 8.080, de 19.09.1990, Dispõe sobre as condições para a promoção,
proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá
outras providências, Diário Oficial da União, Brasília, MS, 1990.
_______, Lei 9.961, de 28.01.2000. Cria a Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS e dá outras
providências, Brasília, 2000.
_______, Supremo Tribunal Federal – STF, Rel. Min. Celso de Mello, ADPF 45 MC/DF – Políticas
Públicas – Intervenção Judicial – “Reserva do Possível” (Transcrições), Informativo N. 345, de 26 a
30.04.2004, Brasília, STF, 2004.
________, Conselho Nacional de Justiça – CNJ, Portaria 650, de 20.11.2009. Cria grupo de trabalho
para estudo e proposta de medidas concretas e normativas para as demandas judiciais envolvendo a
assistência à saúde. Brasília, CNJ, 2009.
________, Conselho Nacional de Justiça – CNJ, Resolução 107, de 04.04.2010. Institui o Fórum
Nacional do Judiciário para monitoramento e resolução das demandas de assistência à saúde. Brasília,
CNJ, 2010a.
________, Conselho Nacional de Justiça – CNJ, Relatório da Resolução 107/2010, Brasília, CNJ, 2010b.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 419


Alessandra Valle Salino / Glaucia Maria de Araujo Ribeiro

________, Supremo Tribunal Federal – STF, Coordenadoria de Análise de Jurisprudência. DJe n. 177,
Divulgação em 14.09.2011, Publicação em 15.09.2011, Ementário n. 2587-01. Rel. Min. Celso de Mello.
Segunda Turma. AG. REG. no Recurso Extraordinário com Agravo 639.337, São Paulo, 23.08.2011,
Brasília, STF, 2011a.
________, Presidência da República, Casa Civil, Sub Chefia para Assuntos Jurídicos, Lei de Acesso à
Informação (LAI) n. 12.527, de 18.11.2011. Regula o acesso a informações previsto no inc. XXXIII do art.
5o, no inc. II do § 3o do art. 37 e no § 2o do art. 216 da Constituição Federal; altera a Lei 8.112, de
11.12.1990; revoga a Lei 11.111, de 5.05.2005, e dispositivos da Lei 8.159, de 8.01.1991; e dá outras
providências, Brasília, 2011b.
BRASIL, Supremo Tribunal Federal – STF, Revista Eletrônica do Supremo Tribunal Federal, Recurso
Especial n. 1.107.511-RS, Rel. Min. Hermam Benjamim, Segunda Turma, julgado em 21.11.2013,
Brasília, STF, 2013.
_______, Secretaria de Jurisprudência, Seção de Informativo de Jurisprudência, Informativo de
Jurisprudência de 2014 (N. 543). Rel. Min. Hermam Benjamim. Políticas Públicas. Resposta 1.389.952-
MT, Brasília, STF, 2014a.
_______, Supremo Tribunal Federal – STF, Rel. Min. Celso de Mello. Segunda Turma. AG. REG. no
Recurso Extraordinário com Agravo 795.749 Ceará, 29.04.2014, Brasília, STF, 2014b.
BRASIL, Conselho Nacional de Justiça – CNJ, Judicialização da Saúde no Brasil: dados e experiência,
Coordenadores: Felipe Dutra Asensi e Roseni Pinheiro, Brasília, CNJ, 2015.
_______, Confederação Nacional de Municípios – CNM, Análise sobre a judicialização da saúde nos
Municípios. Carla Estefânia Albert. Revista Técnica CNM, p. 151-175, 2016a.
_______, Conselho Nacional de Justiça – CNJ, Justiça em Números 2016. Brasília, CNJ, 2016b.
_______, Conselho Nacional de Justiça – CNJ, Justiça em Números 2017, Brasília, CNJ, 2017.
_______, Conselho Nacional de Justiça – CNJ, Justiça em Números 2018. Brasília, CNJ, 2018.
_______, Conselho Nacional de Justiça – CNJ, Instituto de Ensino e Pesquisa – INSPER, Judicialização
da Saúde no Brasil: perfil das demandas, causas e propostas de resolução, Brasília, CNJ, 2019a.
_______, Conselho Nacional do Ministério Público, Ministério Público, “Diálogos institucionais e a
efetividade das políticas públicas de saúde/Conselho Nacional do Ministério Público” in VILELA,
Leonardo Moura; MOLITERNO, Marcella Parpinelli; SANTOS, Alethele de Oliveira, Judicialização da
saúde: um fenômeno a ser compreendido, p. 101-11, Brasília, CNMP, 2019b.
________, Conselho Nacional do Ministério Público, Ministério Público, “Diálogos institucionais e a
efetividade das políticas públicas de saúde/Conselho Nacional do Ministério Público. in SHULZE,
Martin, A desjudicialização da saúde no Rio Grande do Sul: cabal redução do número de ações ativas e
estratégia de interiorização, p. 59-70, Brasília, CNMP, 2019c.
_______, Conselho Nacional de Justiça – CNJ, Justiça em Números 2019, Brasília, CNJ, 2019d.
FREITAS, Beatriz Cristina; FONSECA, Emílio Prado; QUELUZ, Dagmar de Paula, A Judicialização da
saúde nos sistemas público e privado de saúde: uma revisão sistemática, Interface (Botucatu), v. 24,
2020.
RAWLS, John, Uma teoria da justiça, São Paulo, Martins Fontes, 2002.

420 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Perspectivas do Fenômeno Nacional da Judicialização da Saúde Voltada para o Amazonas

LA RECEPCIÓN DE LA CULTURA DEL “COMPLIANCE” Y


DEL “WHISTLEBLOWING” EN ESPAÑA
THE RECEPTION OF THE COMPLIANCE AND
WHISTLEBLOWING CULTURE IN SPAIN
DOI: 10.19135/revista.consinter.00011.20
Recibido/Received 29.06.2020– Aprobado/Approved 28.09.2020
Juan Carlos Ortiz Pradillo1 – https://orcid.org/0000-0001-6092-6137
E-mail: juancarlosortiz@ucm.es

Resumen: El sistema elegido por el legislador español a la hora de regular la


responsabilidad penal de las personas jurídicas no solo perseguía fomentar una cultura
del cumplimiento normativo y prevenir la comisión de ilícitos en el ámbito empresarial,
sino también la colaboración de la empresa con las autoridades estatales cuando aquella
es investigada en una causa judicial. Para ello, la denominada “cultura Compliance” se
ha centrado en la persona jurídica ―pública o privada― y su adecuado modelo de
prevención delictiva.
Pero también resulta relevante atender a los otros sujetos involucrados en ese
cumplimiento normativo penal: los empleados y demás sujetos que colaboran con la
empresa o con las propias autoridades estatales aportando información esencial sobre los
hechos ilícitos y sus autores. Es la cultura del Whistleblowing, caracterizada por el
establecimiento de canales seguros de recepción de dicha información y por la
articulación de especiales medidas de protección de tales sujetos frente a las represalias
que pudieran sufrir con motivo de tal colaboración.
El presente estudio se centra en examinar en profundidad los antecedentes nacionales en
dicha materia, así como el nuevo marco legislativo procedente de la Unión Europea ―la
Directiva (UE) 2019/1937― para ofrecer cambios legislativos que brinden seguridad
jurídica, asistencia legal y protección eficaz a los alertadores de corrupción, fraudes y
malas prácticas, tanto en el sector privado como en el público.
Palabras-clave: compliance, whistleblowing, personas jurídicas, corrupción, interés
público
Abstract: The way that the Spanish legislature regulated the criminal liability of legal
persons wanted to promote a culture of regulatory compliance and preventing the
commission of crimes and misdemeanors in the business field, but also the company's
cooperation with state authorities when it is investigated in a criminal proceeding. To
this end, the so-called ‘Compliance culture’ has focused on the legal entity –public or
private– and its appropriate criminal prevention model.
But it is also relevant to attend to the other subjects involved in this criminal
compliance: employees and other people who collaborate with the company or with the
state authorities themselves by providing essential information on the wrongdoings and
their perpetrators. It is the culture of Whistleblowing, characterized by the establishment

1
Profesor Titular de Derecho Procesal. Universidad Complutense de Madrid. Instituto de Derecho Europeo e
Integración Regional (IDEIR). E-mail: juancarlosortiz@ucm.es

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 421


Juan Carlos Ortiz Pradillo

of confidential and secure reporting channels and by the articulation of special measures
to protect such subjects against the retaliation that they may suffer in connection with
such collaboration.
This study focuses on in-depth review of national backgrounds in this area, as well as the
new legislative framework from the European Union –Directive (EU) 2019/193 – to
provide legislative changes that provide legal certainty, legal assistance and effective
protection for whistleblowers of corruption, fraud and bad practice, both in the private and
public sectors.
Keywords: Compliance, Whistleblowing, Legal persons, Fraud, Public interest.
Sumario: 1. Crisis económica, reforma de la justicia y “compliance”. 1.1. “Compliance” y
justicia penal premial y: la colaboración eficaz de la persona jurídica. 1.2. “Compliance”
y “whistleblowing”: los canales internos de denuncia. 2. Crisis económica, corrupción
pública y “whistleblowing” en el sector público. 2.1. Whistleblowing y administraciones
públicas: la creación de “oficinas antifraude” y de protección al alertador. 2.2. Reformas
legales para incorporar a españa de la directiva (ue) 2019/1937 sobre whistleblowing.
2.2.1. Medidas de protección. 2.2.1.1. La reserva de identidad del alertador. 2.2.1.2. La
protección del alertador como bien jurídico penalmente tutelable. 2.2.1.3. Las medidas
antirrepresalias contra el alertador. 2.2.2. Medidas asistenciales al alertador.
2.2.2.1. Información y asesoramiento previo. 2.2.2.2. Elección del canal de
denuncia a utilizar. 2.2.2.3. asistencia jurídica. 2.2.2.4. Indemnizaciones e incentivos.
2.2.2.4.1. Reparación e indemnización por el daño sufrido. 2.2.2.4.2. Incentivos sociales
y reputacionales. 2.2.2.4.3. Incentivos económicos. 3. Bibliografía.

1 CRISIS ECONÓMICA, REFORMA DE LA JUSTICIA Y “COMPLIANCE”


El análisis de la reforma de la Justicia operada en España en los últimos años
no puede llevarse a cabo sin atender al especial contexto social y económico que
vivió nuestro país hace una década. El llamado pinchazo de la burbuja inmobiliaria y
la devastadora crisis financiera desatada a finales del año 2008 generó una
percepción social ―ciudadana y mediática― de que la vida política y económica de
nuestro país se basaba en un sistema que promovía la “corrupción” (cohecho, fraude
fiscal, malversación de caudales públicos, negociaciones prohibidas a funcionarios,
blanqueo de capitales, etc.) en el modo de actuar de las empresas privadas y
entidades públicas, hasta el punto de que la corrupción y el fraude se convirtieron en
la segunda preocupación de los españoles, solo por detrás del desempleo, según los
distintos barómetros del Centro de Investigaciones Sociológicas (CIS).
Por ello, y ante la magnitud y repercusiones sociales y económicas que
generaba la criminalidad empresarial, se dio un importante giro del discurso político
criminal de los Estados basado en la máxima societas delinquere non potest y se
apostó por la introducción de la responsabilidad penal de las personas jurídicas en
sus correspondientes Códigos Penales. Y a la hora de recepcionar dicha
responsabilidad penal empresarial en nuestra Justicia penal, se buscó instaurar un
sistema que, además de atender a los fines preventivos propios del Derecho Penal
(cumplimiento de la legalidad), también sirviera como modelo de integridad en la
gestión corporativa que, por una parte, atajase las malas prácticas y evitase la
comisión de actos delictivos en su seno, y por otra, fomentase la colaboración de la

422 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Recepción de la Cultura del “Compliance” y del “Whistleblowing” en España

entidad con la Justicia en el descubrimiento, persecución y represión de tales


conductas ilícitas.
La atribución de una responsabilidad penal a la persona jurídica al margen de
la responsabilidad de las personas físicas que la integran se residenció, entonces, en
la falta de una adecuada vigilancia y control del comportamiento de sus directivos y
subordinados jerárquicos2. Y esos deberes de vigilancia y control por parte de la empresa
son el armazón de los modelos de organización y gestión que constituyen los
denominados “Programas de Cumplimiento normativo” (comúnmente denominados
Compliance Programs), escuetamente perfilados en los distintos epígrafes del apartado
5º del art. 31 bis CP, y con los que se trata de prevenir la comisión delictiva en el seno de
las empresas o reducir de forma significativa el riesgo de su comisión.
1.1 “Compliance” Y Justicia Penal Premial Y: La Colaboración Eficaz De La
Persona Jurídica
A la hora de perseguir eficazmente y desbaratar la criminalidad económica, los
Estados no solo han tomado en consideración la visión punitivista (nuevas tipificaciones
penales o adecuación de los tipos ya existentes con el fin de ofrecer una respuesta más
adecuada a las nuevas formas de delincuencia, aumento de las penas, así como de los
plazos de prescripción, incorporación de extraordinarias medidas de investigación,…),
sino también la introducción de elementos de Derecho Premial, basada en la regulación
de incentivos y recompensas ―rebajas punitivas o excusas absolutorias― como
instrumentos igualmente utilizables en pos de la prevención general del delito, porque de
igual modo que la pena resulta útil para impedir o retener, la recompensa resulta
igualmente útil para excitar y producir, esto es, la primera sería un freno y la segunda un
aguijón, tal y como gráficamente describía BENTHAM3.
Los Códigos Penales se encuentran repletos de diversos tipos de penas y, a la par,
por múltiples ejemplos de recompensas y beneficios a favor de quien lleva a cabo alguna
acción de carácter positivo que merece su valoración de cara a la determinación de su
culpabilidad o a la delimitación y, en su caso, exoneración de su responsabilidad penal.
Y dentro de tales recompensas, interesa detenernos en el estudio de la atenuante de la
“heteroincriminación”. Nos referimos al fomento de la delación sobre los demás
partícipes4 ―llamada ahora “colaboración eficaz” con las autoridades―, pues lo que se
pretende incentivar es la cooperación del acusado con la autoridad judicial en orden al
más completo esclarecimiento de los hechos investigados que tengan que ver con los
demás acusados, facilitando información relevante sobre los otros partícipes del acto
delictivo.

2
STS, sala 2ª, n. 154/2016, de 29 de febrero de 2016.
3
BENTHAM, Jeremy, Teoría de las Penas y las Recompensas. Obra traducida al castellano. Barcelona,
Imprenta de D. Manuel Saurí, 1838.
4
Vid., por todos, el estudio recogido en ORTIZ-PRADILLO, Juan Carlos, Los delatores en el proceso penal.
Recompensas, anonimato, protección y otras medidas para incentivar una colaboración eficaz con la
Justicia, Madrid, La Ley, 2018, pp. 215 y ss.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 423


Juan Carlos Ortiz Pradillo

A diferencia de la confesión de los hechos propios, con dicha atenuante se


pretende la obtención de información sobre los hechos cometidos por otros partícipes, lo
cual se ha denominado “delación premiada” o “colaboración eficaz” con la Justicia, cuya
principal característica definitoria, además de servir de herramienta de política criminal
para aumentar la eficacia de la persecución judicial, radica en que se trata propiamente
una técnica de obtención de información trascendental para la causa, y no una simple
atenuante penal sustantiva, que desplegará su potencial campo de actuación en el
“Proceso” en el que se investiga al investigado reconvertido en colaborador eficaz y no
tanto en la “Pena” que finalmente se le imponga.
Esta delación premiada como símbolo de una Justicia premial orientada a
aumentar las capacidades de las autoridades de adquirir información esencial para la
causa de manos de uno de los copartícipes dio lugar en España a la creación
jurisprudencial de una atenuante analógica (anteriormente denominada “confesión
tardía” y ahora calificada de “colaboración eficaz o activa”, al correlacionar el apartado
7º del art. 21 CP con el apartado 4º) que ha servido de referencia a la hora de regular la
responsabilidad penal de las personas jurídicas.
En efecto, el sistema escogido con la reforma del Código Penal español en el
año 2010, enmendado nuevamente en el año 2015, tiene también como objetivo que
las propias empresas adopten una actitud colaboradora con los Tribunales de justicia a
la hora de descubrir y depurar las responsabilidades personales por los hechos
cometidos en su nombre o en su beneficio, para lo cual se ha decidido incorporar
mecanismos atenuatorios (eximentes y atenuantes) a favor de la empresa investigada
en una causa judicial que se decida a confesar la infracción antes de conocer que el
procedimiento judicial se dirige contra ella, así como también que sea la primera en
aportar pruebas nuevas y decisivas para esclarecer las responsabilidades penales
dimanantes de los hechos.
El hecho de que la colaboración de la empresa se regule expresamente como
una circunstancia atenuante, a diferencia de lo que sucede con las personas físicas,
demuestra la clara intención del legislador de promover esa cooperación, sabedor de la
dificultad a la que se enfrentan las autoridades a la hora de investigar un hecho
delictivo cometido a través de o en el seno de una entidad o de un entramado de
empresas, además del coste temporal y económico que ello puede suponer para el
Estado. Es más, dicha atenuante legal podrá aplicarse cuando dicha cooperación se
produzca en cualquier momento del proceso (es decir, sin límites cronológicos, a
diferencia de lo que sucede con la confesión), siempre que las pruebas aportadas
“fueren nuevas y decisivas para esclarecer las responsabilidades penales dimanantes de
los hechos”, y con la interpretación jurisprudencial de que es posible aplicar dicha
atenuante conjuntamente a la persona física (el directivo acusado) y a la persona
jurídica. Como vemos, es una señal inequívoca de que uno de los fines de los
Programas de Compliance es que la persona jurídica sea la primera en reaccionar,
tanto ad intra (régimen disciplinario incluido) como ad extra, informando y
colaborando con las autoridades estatales a la hora de identificar y castigar al
responsable de tal comisión.

424 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Recepción de la Cultura del “Compliance” y del “Whistleblowing” en España

Este guante lanzado por el legislador a la hora de promocionar dicha


colaboración eficaz por parte de la empresa investigada ha sido recogido firmemente
por la Fiscalía General del Estado, como así se aprecia nítidamente en las instrucciones
impartidas por la Circular 1/2016, la Fiscalía General del Estado (FGE), en la que se
considera que “la capacidad de detección de los incumplimientos lucirá como un
elemento sustancial de la validez del modelo. En consecuencia, los Sres. Fiscales
concederán especial valor al descubrimiento de los delitos por la propia corporación de
tal manera que, detectada la conducta delictiva por la persona jurídica y puesta en
conocimiento de la autoridad, deberán solicitar la exención de pena de la persona
jurídica, al evidenciarse no solo la eficacia del modelo sino su consonancia con una
cultura de cumplimiento corporativo”5.
Aunque el Código Penal lo recoge como atenuante, la Fiscalía llegó a señalar
en dicha Circular que “la colaboración activa con la investigación o la aportación
al procedimiento de una investigación interna, sin perjuicio de su consideración
como atenuantes, revelan indiciariamente el nivel de compromiso ético de la
sociedad y pueden permitir llegar a la exención de la pena”6. Con dicha afirmación,
la Fiscalía evidencia un claro deseo de dominar y disponer sobre el ejercicio de la
acción penal contra la empresa como herramienta tendente a potenciar la eficacia de
la persecución criminal incentivando el aporte de información por la propia entidad
investigada. Ello excede con mucho la previsión legal, pues guste o no, los apartados
dos a cuatro del art. 31 bis CP no son una regulación procesal que establezca los
criterios con base en los que un fiscal puede decidir perseguir o no penalmente a una
empresa, sino que excluyen la propia existencia de responsabilidad penal de la
persona jurídica7. La confesión inmediata de la empresa, aunque la Fiscalía defienda
que debe motivar la exención de la responsabilidad de aquella, es una atenuante (31
quáter CP) y no una eximente (31 bis CP), lo cual constituye una evidente
incoherencia normativa que ya ha sido denunciada por la doctrina8.
En resumen, el fundamento del Derecho premial presente en las excusas
absolutorias y atenuantes anteriormente mencionadas parece residenciarse en razones
político-criminales de utilidad, al considerarse más eficaz el hecho de rebajar o eximir de
la pena a quien colabore en su investigación. Y el terreno de la responsabilidad penal
empresarial, en donde la complejidad de la estructura actual de las organizaciones
empresariales y entidades administrativas supone un claro obstáculo en las tareas de
prevención y descubrimiento de las conductas ilícitas que pueden llegar a cometerse en
su seno, es donde mejor se evidencia la voluntad de introducir “dosis de inmunidad” a
cambio de dicha colaboración.

5
Circular 1/2016, de la Fiscalía General del Estado, sobre la responsabilidad penal de las personas jurídicas
conforme a la reforma del código penal efectuada por Ley Orgánica 1/2015, p. 53.
6
Circular 1/2016, p. 55.
7
FEIJOO SÁNCHEZ, Bernardo, “Bases para un modelo de responsabilidad penal de las personas jurídicas a
la española”, VV.AA., La responsabilidad penal de las personas jurídicas. Homenaje al Excmo. Sr. D. José
Manuel Maza Martín. Madrid, Fiscalía General del Estado, 2018, p. 173.
8
BANACLOCHE PALAO, Julio, “Dilemas de la defensa, principio de oportunidad y responsabilidad penal
de las personas jurídicas”, en VV.AA. La responsabilidad penal de las personas jurídicas: homenaje al
Excmo. Sr. D. José Manuel Maza Martín. Madrid, Fiscalía General del Estado, 2018, pp. 15 y 27.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 425


Juan Carlos Ortiz Pradillo

1.2 “Compliance” Y “Whistleblowing”: Los Canales Internos De Denuncia


La condición sine qua non para que las entidades puedan colaborar con las
autoridades en la investigación de los hechos ilícitos es que tengan un cabal
conocimiento de los mismos. Sin información, las empresas no podrían confesar los
hechos ni aportar pruebas decisivas sobre la autoría de los mismos. Por ello, y dentro de
los modelos de gestión y control que configuran los Programas de Cumplimiento
normativo, adquieren una vital importancia aquellas medidas que resulten
adecuadas y eficaces para que la entidad obtenga información acerca de las
posibles conductas que se estén llevando a cabo o planeen ejecutarse y que pongan
en riesgo esa cultura del respeto a la legalidad. Ésa es la conexión entre el
Compliance y el whistleblowing: la atenuación o exoneración de responsabilidad
penal de la empresa dependerá en gran medida de su cooperación en la
investigación del delito cometido en su seno, para lo cual aquella estará interesada
en instrumentalizar mecanismos que le permitan obtener información decisiva de
manos de quienes la posean (empleados, proveedores, mandos intermedios…). De
hecho, la obtención de información representa un elemento tan importante en las
labores de prevención de conductas criminales en el seno de la organización
empresarial que la Ley impone, como uno de los contenidos mínimos que deben
tener los Programas de Cumplimiento, que las empresas que exijan a sus
empleados “la obligación de informar de posibles riesgos e incumplimientos al
organismo encargado de vigilar el funcionamiento y observancia del modelo de
prevención”, según dispone el apartado 4º del art. 31 bis 5 CP.
Son los denominados “canales éticos de denuncia” incorporados en los
Compliance Programs de las empresas como instrumentos para mejorar la
transparencia, y por tanto, el cumplimiento por parte de las empresas de la
legislación y su implicación a la hora de prevenir la comisión de ilícitos en su seno
o para colaborar con las autoridades en la investigación de los mismos, al
constituir parte de esa política criminal tendente a fomentar la colaboración de los
propios empleados en las tareas de prevención y descubrimiento de la delincuencia
empresarial o en el seno de las instituciones públicas, lo que ha dado lugar a una
abundante legislación sobre los whistleblowers: “miembros o exmiembros de una
determinada organización pública o privada que denuncian prácticas ilícitas o
poco éticas llevadas a cabo por la propia organización o por sujetos que forman
parte de ella poniendo en conocimiento tales hechos, según los casos, de sus
superiores, de las autoridades o de terceras personas”9.

9
Definición tomada de RAGUÉS I VALLÈS, Ramón, Whistleblowing. Una aproximación desde el Derecho
Penal, Barcelona, Marcial Pons, 2013, p. 20, para quien las características definitorias del whistleblower o
informante serían: la relación existente entre el whistleblower y la entidad –ser un insider de la organización
sobre la que denuncia una determinada actuación-; no desempeñar dentro de dicha organización funciones
específicas de control, investigación o denuncia respecto de los hechos de los que informa; y que el hecho
denunciado se haya realizado en el marco de la actividad de la organización a la que pertenece el sujeto.

426 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Recepción de la Cultura del “Compliance” y del “Whistleblowing” en España

2 CRISIS ECONÓMICA, CORRUPCIÓN PÚBLICA Y


“WHISTLEBLOWING” EN EL SECTOR PÚBLICO
En el contexto económico y social de crisis financiera al que nos referíamos
al inicio de este estudio, muy pronto se relacionó el aumento de los fraudes en el
ámbito de la Administración Pública con el daño que ello causaba a la economía
nacional, provocando dolorosas medidas de recortes sociales. La evasión fiscal en
España, que se cifra en algo más de 90.000 millones de euros anuales, equivale a la
cantidad aprobada para el rescate del sistema bancario español o el doble del ajuste
que la famosa Troika europea10 impuso a España en el año 2012; la denominada
“Economía sumergida” de nuestro país se calcula alrededor de los 253.000 millones
de euros (el 25,6% del Producto Interior Bruto y casi siete puntos porcentuales más
desde que se inició la crisis en 200811), o dicho con otras palabras, el equivalente a
siete veces el ajuste acometido por el gobierno en los presupuestos generales del año
2012, y casi el doble del gasto sanitario de nuestro país.
Por ello, no solo se trata de potenciar la prevención delictiva empresarial
promoviendo la cooperación de las entidades; otras fórmulas utilizadas para prevenir
y destapar las irregularidades, fraudes y delitos que puedan estar cometiéndose en el
seno de las empresas privadas o de las administraciones públicas, consiste en potenciar
la colaboración de los empleados de tales corporaciones e instituciones para que, en caso
de que conozcan de alguna irregularidad o conducta ética o legalmente rechazable, las
comuniquen de un modo seguro a sus propios encargados internamente, a las
autoridades, o incluso públicamente ante los medios de comunicación. Esta práctica,
denominada internacionalmente como “whistleblowing”, tiene como principal exponente
legislativo a los EE.UU., a lo largo de cuya historia se han aprobado múltiples leyes y
reglamentos de potenciación de específicos procedimientos para la obtención de dichas
denuncias y de importantes medidas de protección a favor de quienes denuncian esas
irregularidades y malas prácticas (no solo conductas delictivas, sino también conductas
discriminatorias, abuso de autoridad, peligros para la salud pública, el medioambiente o
la seguridad, etc.), en el seno de las empresas privadas y de las instituciones públicas,
como eficaces mecanismos para dotar de transparencia a la actuación de las compañías y
empresas, las corporaciones, las instituciones y agencias federales.
En Europa, las aproximaciones a este fenómeno jurídico han sido
fragmentarias y sectoriales, motivo por el cual, a finales del año 2019, las
autoridades comunitarias aprobaron la Directiva (UE) 2019/1937 del Parlamento
Europeo y del Consejo de 23 de octubre de 2019 relativa a la protección de las
personas que informen sobre infracciones del Derecho de la Unión12 (denominada,

10
Expresión acuñada para designar, en el ámbito económico, a la Comisión Europea, el Banco Central
Europeo (BCE) y el Fondo Monetario Internacional (FMI).
11
Vid el informe “La economía sumergida pasa factura. El avance del fraude en España durante la crisis”
dirigido por Jordi SARDÀ (Universitat Rovira i Virgili) en colaboración con los Técnicos del Ministerio de
Hacienda (Gestha). Disponible en la página web: <http://www.gestha.es/archivos/actualidad/2014/2014-01-
29_INFORME_LaEconomiaSumergidaPasaFactura.pdf> (fecha de consulta: 10 de febrero de 2017).
12
DOUE L 305/17, de 26 de noviembre de 2019.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 427


Juan Carlos Ortiz Pradillo

en adelante, como la Directiva sobre whistleblowing): un conjunto de normas


mínimas de apoyo y protección que doten de la necesaria seguridad jurídica a
aquellos que denuncian ante las autoridades y otros organismos conductas delictivas,
malas prácticas laborales, fraudes e irregularidades de las que conocen en su entorno
laboral y profesional.
En España, por su parte, la promoción de sistemas internos y externos de
recepción de denuncias con tales fines de defender la integridad de las instituciones
y corporaciones públicas y privadas y el cumplimiento de la Ley nunca ha tenido
apenas tradición legislativa. En el sector privado, es cierto que la Ley del Mercado
de Valores de 1988 ya exigía a las empresas de servicios de inversión, las entidades
de crédito y las personas o entidades que actuasen en el Mercado de Valores, que
tuvieran “controles internos oportunos” para prevenir los incumplimientos de los
deberes y obligaciones que la normativa del Mercado de Valores les impone, pero el
verdadero boom de los canales internos de denuncias y de medidas de formación,
asesoramiento y protección al denunciante tuvo lugar con la introducción en nuestro
ordenamiento jurídico de la responsabilidad penal de las personas jurídicas antes
comentado. Y en el sector público, este fenómeno había pasado en gran medida
desapercibido, pues los canales de comunicación habilitados por las
Administraciones Públicas no obedecían en puridad, hasta hace pocos años, a esa
finalidad de prevenir y combatir eficazmente posibles irregularidades internas, sino
que se utilizaban como instrumentos para aumentar la participación ciudadana y para
la recepción de todo tipo de quejas y sugerencias o como instrumento de
transparencia, al facilitar el seguimiento y la supervisión de la actividad de los
cargos y empleados públicos13.
Pero la tendencia ha cambiado. Desde Europa se ha venido insistiendo en que
“la única manera de obtener más datos es convencer a los testigos para que
denuncien los casos de corrupción, lo que, a su vez, solo puede lograrse
protegiendo eficazmente a los denunciantes de la discriminación y las represalias
(pérdida de trabajo, amenazas personales etc.)”. Y en esa línea, en su Informe de
2014 sobre la lucha contra la corrupción en la UE14, desde Europa se reclamaba
abiertamente la implementación de canales oficiales de denuncias y mecanismos de
protección de los denunciantes dentro de las administraciones públicas porque
podían contribuir a resolver los problemas de detección inherentes a la corrupción (y
también en otros sectores).
Podemos concluir, por tanto, que el sector público está tratando de hacer lo
mismo que el sector privado ―fomento de la cultura del cumplimiento normativo y
buen gobierno, colaboración con la Justicia y protección del informante― con una
década de retraso.

13
Vid CERRILLO I MARTÍNEZ, Agustín, “La Colaboración ciudadana en la lucha contra la corrupción a
través de medios electrónicos”, Revista Aranzadi de Derecho y Nuevas Tecnologías, n. 35, Mayo-Agosto,
2014.
14
COM(2014) 38], p. 22.

428 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Recepción de la Cultura del “Compliance” y del “Whistleblowing” en España

2.1 Whistleblowing Y Administraciones Públicas: La Creación De “Oficinas


Antifraude” Y De Protección Al Alertador
Si la “cultura Compliance” tiende a configurarse como una herramienta de
lucha contra la delincuencia empresarial, la “cultura Whislteblowing” en defensa del
interés público tiende a hacer lo mismo para luchar decididamente contra la
corrupción y las malas prácticas en la órbita de actuación de la Administración
Pública, buscando sacar a la luz los casos, facilitar el intercambio de información y
la comunicación entre los órganos y las entidades responsables de la lucha y la
investigación de la corrupción (tanto judiciales como administrativos), al tiempo que
contribuye a fomentar la participación ciudadana y la colaboración social en la lucha
contra la corrupción en las instituciones públicas, el impulso de la integridad y la
cultura de buenas prácticas en la gestión de recursos públicos.
No obstante, y hasta hace pocos años, no existía propiamente una política
pública dirigida al fomento del whistleblowing en defensa del interés público
―regulación de canales o buzones de denuncias confidenciales en el sector público
y protección del funcionariado frente a represalias―, más allá de intentar fomentar
la obtención de información tolerando la recepción de denuncias anónimas en el
ámbito administrativo, laboral o fiscal15. A nivel nacional apenas se contaba con la
creación y desarrollo del Servicio Ejecutivo de la Comisión de Prevención del
Blanqueo de Capitales e Infracciones Monetarias (SEPBLAC) como unidad nacional
de inteligencia financiera en materia de prevención del blanqueo de capitales y de la
financiación del terrorismo, de modo que fueron las Comunidades Autónomas y
algunos Entes Locales quienes decidieron impulsar dicha cultura a través de la
creación de organismos específicos en materia de investigación del fraude y la
corrupción en el sector público (las denominadas “Oficinas Antifraude”) que
incluían disposiciones para la creación de canales de recepción de denuncias que
aseguraran la confidencialidad o anonimato del sujeto denunciante, así como
específicas medidas de protección al mismo para evitar que sufriera represalias en su
entorno laboral.
Avanzado ya el año 2020, el legislador estatal sigue estancado en la discusión
y aprobación de una futura ley nacional de lucha contra la corrupción y protección
de los denunciantes16, mientras que las Comunidades Autónomas no han dejado de

15
Como análisis de la denuncia anónima en el ámbito administrativo, vid. ORTIZ-PRADILLO, Juan Carlos,
Los delatores en el Proceso Penal…, op. cit., pp. 78 y ss., y la bibliografía allí citada.
16
El 15 de septiembre de 2016, el Grupo parlamentario Ciudadanos presentó una Proposición de Ley Integral
de Lucha contra la Corrupción y Protección de los Denunciantes (que ha vuelto a ser presentada ante la
Cámara Baja el 17 de enero de 2020 como Proposición de Ley de medidas de lucha contra la corrupción); el
10 de junio de 2019, el Grupo parlamentario Vox presentaba la Proposición de Ley de Protección Integral
de los Denunciantes de Corrupción, y un día más tarde lo hacía el Grupo mixto, como Proposición de Ley
de protección integral de los alertadores. Frente a ello, a nivel autonómico ya contamos con la Ley 14/2008,
de 5 de noviembre, de la Oficina Antifraude de Cataluña; la Ley 2/2016, de 11 de noviembre, por la que se
regulan las actuaciones para dar curso a las informaciones que reciba la Administración Autonómica sobre
hechos relacionados con delitos contra la Administración Pública y se establecen las garantías de los
informantes en Castilla y León; la Ley 11/2016, de 28 de noviembre, de la Agencia de Prevención y Lucha

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 429


Juan Carlos Ortiz Pradillo

aprobar específicas normas en dicho ámbito, caracterizadas por la creación de una


entidad pública supervisora de la actuación de las Administraciones y entes públicos
regionales para luchar eficazmente contra la corrupción en el sector público, así
como por la previsión de específicas medidas de protección de la identidad del
sujeto facilitador de la información.
2.2 Reformas Legales para Incorporar a España de la Directiva (UE) 2019/1937
Sobre Whistleblowing
A la necesidad de aprobar una norma estatal sobre esta materia en armonía
con las competencias legislativas autonómicas, si no se quiere incurrir en
reiteraciones y contradicciones, se suma ahora la exigencia de que esa futura norma
estatal sea conforme con la Directiva (UE) 2019/1937 del Parlamento Europeo y del
Consejo, de 23 de octubre de 2019, relativa a la protección de las personas que
informen sobre infracciones del Derecho de la Unión, y con los mínimos
establecidos en la misma para garantizar la protección de las personas que faciliten
información para la detección de delitos o infracciones legales en el seno de una
organización, ya sea privada o pública, en los ámbitos de aplicación de dicha
Directiva.
Sucede, no obstante, que el principal hándicap para la promoción del
whistleblowing en España no obedece a ninguna particularidad de nuestro sistema
jurídico, claramente alineado con las orientaciones y tendencias del Derecho
Europeo y en línea con los ordenamientos de nuestro entorno, sino que posee un
marcado carácter social. Como ya se ha advertido en otras ocasiones17, en nuestra
Sociedad pervive esa asociación mental de la delación con el pecado original y con
la traición a Jesucristo, de modo que el ciudadano que informa a las autoridades de
lo que acontece en su ciudad, barrio o puesto de trabajo es calificado como
“delator”, y el delator ha sido y es considerado un sinónimo de traidor o chivato, de
modo que la delación nunca ha sido bien recibida, no solamente por la Sociedad,
sino por los propios poderes públicos, y más en concreto por la Justicia, que siempre
han considerado la delación como una característica más propia de los sistemas
totalitarios para crear un sistema de vigilancia universal e intimidatoria.
Por ello, la Directiva en materia de protección a los denunciantes de
corrupción marcará un antes y un después en la percepción social e institucional del

contra el Fraude y la Corrupción de la Comunitat Valenciana; la Ley 16/2016, de 9 de diciembre, de


creación de la Oficina de Prevención y Lucha contra la Corrupción en las Islas Baleares; la Ley 5/2017, de 1
de junio, de Integridad y Ética Públicas en Aragón; y la Ley 8/2018, de 14 de septiembre, de Transparencia,
Buen Gobierno y Grupos de Interés del Principado de Asturias. Y a ellas habría que sumar las que, según
parece, están por venir: la Proposición de Ley sobre la creación de la Oficina de Buenas Prácticas y
Anticorrupción en el País Vasco, de febrero de 2019, y el Anteproyecto de Ley referido a la lucha integral
contra el fraude y la corrupción en Andalucía, de septiembre de 2019.
17
ORTIZ-PRADILLO, Juan Carlos, “El difícil encaje del delator en el proceso penal”, Diario La Ley, n.
5860, de 12 de junio de 2015, p. 2 y ss. Un examen en profundidad de los orígenes del uso de los términos
“soplón” y delator en nuestro idioma y su utilización por la Justicia puede consultarse en ORTIZ-
PRADILLO, Juan Carlos, Los delatores…, op. cit., p. 45 y ss.

430 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Recepción de la Cultura del “Compliance” y del “Whistleblowing” en España

ciudadano que da la voz de alarma ante la posible existencia de fraudes y corrupción. El


mayor reto de nuestras autoridades no será, por tanto, incorporar los mandatos de la
Directiva a nuestro sistema jurídico, sino impulsar un cambio terminológico y de
mentalidad que conduzca a una verdadera transformación social en esta nueva cultura de
promoción de la transparencia e integridad, a semejanza de lo operado en el Derecho
anglosajón, en donde desde las instituciones y la Sociedad civil se muestra a estos
alertadores ante el público como un ejemplo del buen ciudadano, personas con “coraje
cívico”18 y “resistencia ética”19 frente a las presiones y movidos por convicciones
morales y de conciencia social de defensa de la Democracia, la igualdad ante la Ley y el
Estado de Derecho.
Aunque la indicada Directiva utiliza la voz “denunciante”, el sistema legal
español utiliza dicha terminología para otros propósitos, al igual que sucede con la
palabra “informante”, aplicada a los confidentes policiales. Cuando la persona que
decide comunicar las irregularidades, corruptelas, malas prácticas, el incumplimiento de
normas jurídicas y hasta la comisión de actos delictivos, es uno de los propios empleados
de la entidad privada o un funcionario público de la Administración, la denominación
que mejor se acomoda a dicha actuación es la de “alertador”; Al igual que el anglicismo
“whistleblower” se emplea como sinónimo de quien sopla el silbato (acción que
representa dar la voz de alarma como sucedía, en su tiempo en España, con los serenos
que soplaban el silbato), entendemos que la mejor palabra que define a quien colabora
con las instituciones en defensa del interés público es un alertador y merece, al igual que
sucede en la cultura norteamericana, todo el apoyo y reconocimiento social por su valor
y compromiso con lo público.
La Directiva de 2019 focaliza sus medidas de protección en tres ámbitos: De una
parte, la reserva de la identidad del alertador como punto de partida para evitarle el
padecimiento de presiones y represalias por haber informado a las instancias y
autoridades competentes. Puede comprobarse como el eje central sobre el que pivota la
Directiva, lo representa la confidencialidad que debe impregnar, tanto la
configuración de los sistemas de recepción de denuncias, como el comportamiento
de los encargados de recibir esas informaciones en su trato con el alertador. De otra
parte, se articulan medidas propiamente de protección en el entorno laboral del
alertador, en donde los términos “entorno laboral” y “alertador” se configuran de un
modo sumamente amplio, como veremos más adelante. Y en tercer lugar, medidas
asistenciales, incluida la exoneración de responsabilidad ante posibles causas
judiciales en su contra por haber revelado determinada información. Veamos cómo
prevé actualmente nuestro ordenamiento jurídico tales medidas, y en qué medida
serán necesarios cambios legislativos en tales cuestiones.

18
RIQUERT, Marcelo, La delación premiada en el derecho penal, Buenos Aires, Hammurabi, 2011, p. 175.
19
GARCÍA-MORENO, Beatriz, “Whistleblowing y canales institucionales de denuncia”, en VV.AA.,
Manual de cumplimiento penal en la empresa (Dir. Adán Nieto Martín). Valencia, Tirant lo Blanch, 2015,
p. 209.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 431


Juan Carlos Ortiz Pradillo

2.2.1. Medidas de protección


2.2.1.1 La reserva de identidad del alertador
La cuestión entre optar por el anonimato o por la confidencialidad en el
tratamiento de los datos del sujeto que acuda a los canales internos del Programa de
Cumplimiento de la empresa no es una cuestión simplemente terminológica. Si,
llegado el momento, los tribunales de justicia estiman necesario conocer los datos
del sujeto que puso en marcha la investigación interna, será muy probable que las
empresas opten por un sistema de denuncias confidenciales en donde se recaben y a
la vez se reserven los datos del empleado denunciante, para así poder acreditar una
“colaboración eficaz” con la Justicia que les exima o atenúe su responsabilidad
penal, si estas fueran finalmente investigadas por los hechos denunciados.
A nivel internacional, no existe una marcada predilección legislativa que se
decante por una de dichas opciones. Así, por ejemplo, la normativa americana de
referencia ―la Ley Sarbanes-Oxley― permite tanto el anonimato como la
confidencialidad del empleado que comunica dichas irregularidades. La ONU, en su
Guía Práctica del Programa anticorrupción de ética y cumplimiento para las
empresas de 2013, permitía que “Si se considera apropiado, la empresa puede
ofrecer canales anónimos y confidenciales para los empleados o socios
comerciales”. Y en la misma línea, la Recomendación (2015) 5, del Comité de
Ministros del Consejo de Europa, sobre procesamiento de datos personales en el
contexto de las relaciones laborales, estima que cuando los empleadores están
obligados por la ley o por normas internas a implementar mecanismos internos de
presentación de denuncias, deben garantizar la confidencialidad del empleado (…),
pero en circunstancias excepcionales, pueden permitirse denuncias anónimas, si bien
“las investigaciones internas no deben llevarse a cabo únicamente sobre la base de
un informe anónimo, salvo cuando esté debidamente justificado y se refiera a
infracciones graves del derecho interno”.
La Unión Europea tampoco se decanta expresamente sobre alguna de las dos
opciones. De hecho, la Directiva 2019/1937 deja libertad a los Estados miembros a
la hora de decidir si deben aceptarse y tramitarse las denuncias anónimas. Por lo
tanto, ¿cuál será la solución por la que se opte en el Derecho español al trasponer
dicha Directiva?
En nuestra opinión, el actual desarrollo tecnológico y las múltiples fórmulas
de presentación de denuncias admitidas por la Directiva (verbal, presencial, por
escrito, postal, telefónica, telemática, etc.) permiten amparar ambas opciones. Esto
es, establecer un régimen general basado en el principio de confidencialidad, pero
admitiendo el anonimato, pues el sistema puede perfectamente ser configurado para
admitir muy diversas formas de designación de la persona alertadora (sin datos, con
un código de identificación, con datos más precisos, etc.) para que sea esta la que
decida cómo desea comunicar la información de la que dispone, cómo desea recibir
tanto el acuse de recibo como la posible respuesta a su alerta, y si desea, y de qué

432 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Recepción de la Cultura del “Compliance” y del “Whistleblowing” en España

manera, ser contactada por el receptor de la denuncia para el caso de que se


precisara su colaboración posterior.
En el ámbito de las Administraciones Públicas, empero, nos encontramos con
un régimen jurídico que rechaza la posibilidad de una denuncia administrativa
anónima, debido a la necesidad de permitir el control jurisdiccional directo de los
actos administrativos y control indirecto por parte de la ciudadanía. El art. 62.2 de la
Ley de Procedimiento Administrativo Común exige que en cualquier solicitud de
inicio de un procedimiento se identifique con nombre y apellidos al interesado, y a la
hora de interponer una denuncia en el procedimiento sancionador, el art. 11.1.d) del
Reglamento del Procedimiento para el Ejercicio de la Potestad Sancionadora
establece que las denuncias deberán expresar la identidad de la persona o personas
que las presentan.
No obstante, ello no ha impedido, en la práctica, el inicio de actuaciones
inspectoras o sancionadoras por parte de las Administraciones Públicas con base en
informaciones anónimas, sorteándose esa prohibición inicial del citado art. 62.2 de
la Ley 39/2015 a partir de la interpretación diferenciada del concepto jurídico
administrativo de “denuncia”, incardinándose tales delaciones anónimas dentro del
genérico y difuso concepto de “colaboración ciudadana”20. Esto es, la información
recibida por el whistleblower no es considerada una denuncia administrativa ni aquel
es considerado “denunciante” a los efectos administrativos ni procesales que ya
conocemos. Es la Institución u Oficina correspondiente la que está llamada a actuar,
tanto en vía administrativa como jurisdiccional, con personalidad jurídica propia y
plena independencia orgánica y funcional respecto de las Administraciones Públicas,
como garante de la recta actuación del sector público estatal frente a la corrupción
y velar por la defensa del interés público, la imparcialidad, transparencia,
responsabilidad e integridad del sector público y de las autoridades, funcionarios y
demás personal al servicio del mismo21. Dicho en otros términos, al alertador se le
reconocen una serie de derechos (entre ellos, la reserva de su identidad y otras
medidas de protección a nivel laboral) precisamente para que quede resguardado y al
margen de la contienda que tendrá lugar entre la Administración y el “interesado”
―este sí, con tal denominación, como presunto autor del ilícito denunciado y que se
trata de perseguir―.
Por otra parte, si el caso llegara a judicializarse, las medidas de reserva de la
identidad del alertador deberían verse reforzadas con específicos instrumentos en
manos de la autoridad judicial para salvaguardar dicha identidad si el alertador
tuviera que comparecer en el proceso penal en calidad de testigo. Lo recomendable
sería que la autoridad judicial se entienda con la empresa privada o la institución
administrativa receptora de la alerta, y tratar de evitar que el alertador tenga que ser
llamado a la causa judicial. Pero si se concluye la imperiosa necesidad de llamar al
proceso penal a la persona que inicialmente alertó de la conducta delictiva, porque el

20
Con mayor detalle, vid. ORTIZ-PRADILLO, Juan Carlos, Los delatores…, op. cit., pp. 107 y ss.
21
Vid. Proposición de Ley Integral de Lucha contra la Corrupción y Protección de los Denunciantes
presentada en septiembre de 2016. (BOCG, Serie B, n. 33, de 23 de septiembre de 2016).

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 433


Juan Carlos Ortiz Pradillo

testimonio del alertador resultase decisivo en la investigación y prueba de la


participación de los encausados en la trama delictiva, la única solución sería
otorgarle, en su caso, el estatus jurídico de “testigo protegido”. Se hace preciso, por
tanto, una reforma de la normativa procesal estatal en este sentido (la Ley Orgánica
19/1994, de 23 de diciembre, de protección a testigos y peritos en causas
criminales), que actualmente reserva en exclusiva a la autoridad jurisdiccional la
apreciación racional del grado de riesgo o peligro y la aplicación de todas o alguna
de las medidas legales de protección que considere necesarias, previa ponderación,
a la luz del proceso, de los distintos bienes jurídicos constitucionalmente
protegidos, tal y como reza su Exposición de Motivos.
En este punto, la solución ofrecida en este aspecto en la Directiva UE
2019/1937 resulta sumamente criticable. No solo advierte que la misma no afectará a
la aplicación del Derecho nacional en materia de las normas de enjuiciamiento
criminal (art. 3.3.d), sino que incluye como excepción a la protección de la
confidencialidad de los datos del alertador el hecho de que tal revelación resulte
necesaria en el contexto de una investigación llevada a cabo por las autoridades
nacionales o en el marco de un proceso judicial para salvaguardar el derecho de
defensa del interesado (art. 16.2), lo cual se residencia, según el considerando n. 82,
en la obligación impuesta por la Directiva 2012/13/UE, de 22 de mayo de 2012,
relativa al derecho a la información en los procesos penales. La correlación que
efectúa la Directiva entre el acceso a los datos del alertador y el derecho a la
información en los procesos penales puede generar unos efectos perniciosos en
materia de protección eficaz de los alertadores de corrupción, pues permitiría
defender la exégesis de que el acceso a los datos del alertador por parte de la parte
defensora en el proceso penal forme parte de los derechos reconocidos en el actual
art. 118 LECrim, tras la reforma operada en 2015, para permitir un ejercicio efectivo
del derecho de defensa. Por ello, y ante esa posible inferencia, resulta conveniente
establecer expresamente y como regla general, susceptible de ponderación según las
circunstancias concretas de cada caso, que los datos del alertador se tramitarán a
priori en una pieza reservada.
Llama la atención que la Directiva prevea expresamente la necesidad de que
las autoridades competentes velen por la protección de la identidad del
“interesado”22 mientras la investigación esté en curso, de conformidad con el
Derecho nacional (art. 22), pero ninguna alusión expresa haga sobre la identidad del
“alertador”, lo que significa una verdadera ocasión perdida para que se efectúe una
regulación general a nivel europeo en materia de protección de testigos y
colaboradores con la Justicia.
La protección de testigos, peritos y víctimas, en lo que a la revelación de su
identidad respecta, debería ser objeto de una regulación general a nivel de la Unión

22
De conformidad con el art. 6.10, por “interesado” de entenderse “persona física o jurídica a la que se haga
referencia en la denuncia o revelación como la persona a la que se imputa la infracción o que esté asociada a
dicha infracción”.

434 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Recepción de la Cultura del “Compliance” y del “Whistleblowing” en España

Europea23, con unas normas mínimas comunes en todo el Espacio Judicial Europeo
como ya se ha hecho, por ejemplo, en materia de los derechos a la traducción e
interpretación (Directiva 2010/64/UE, de 20 de octubre), el derecho a la información
(Directiva 2012/13/UE, de 22 de mayo), el derecho a la asistencia letrada y los
derechos del detenido (Directiva 2013/48/UE, de 22 de octubre), determinados
aspectos de la presunción de inocencia (Directiva 2016/343/UE, de 9 de marzo), las
garantías procesales de los menores sospechosos o acusados (Directiva
2016/800/UE, de 11 de mayo), o la asistencia jurídica gratuita (Directiva
2016/1919/UE, de 26 de octubre). El art. 82.2 TFUE constituye suficiente base legal
para promover unas normas comunes que ponderen el efectivo ejercicio del derecho
de defensa junto con la debida protección de los testigos, peritos, víctimas, y
también colaboradores con la Justicia durante la tramitación de los procesos penales.

2.2.1.2 La protección del alertador como bien jurídico penalmente tutelable


Aunque la Directiva no se refiera a esta cuestión, sabemos que una eficaz
medida de protección a favor de los alertadores puede consistir en la sanción de
tipos penales específicos que castiguen a quienes atenten contra dicha persona, en su
persona, su patrimonio, o la de sus familiares, por el hecho de haber colaborado con
las autoridades.
El Código Penal cuenta con algunos tipos específicamente orientados a
proteger a quienes colaboran con la Justicia (entre otros, véanse arts. 263.2, 266.2 y
464 CP), aunque lo cierto es que tales previsiones cuentan con un alcance limitado.
Los dos primeros se refieren a tipos agravados de daños cuando se lleven a cabo
“contra particulares que, como testigos o de cualquier otra manera, hayan
contribuido o puedan contribuir a la ejecución o aplicación de las Leyes o
disposiciones generales”, y esa perífrasis referida a la contribución a la ejecución o
la aplicación de las leyes se antoja excesivamente indeterminada, según los
principios generales de tipicidad y determinación del orden penal, como para
proteger a quien informa sobre una conducta irregular. Por su parte, el art. 464 CP,
además de exigir violencia o intimidación para su tipicidad, requiere que la finalidad
del autor sea influir en el alertador “para que modifique su actuación procesal”, lo
que no siempre tendrá lugar. De ahí que se haya propuesto la reforma de este último
para incluir expresamente las represalias laborales como una modalidad del delito de
obstrucción a la justicia, incluso cuando tales represalias se produzcan por denuncias
de relevancia meramente administrativa24.
Junto con la previsión de tipos penales que protejan determinados bienes
jurídicos del alertador, otra medida de Política Criminal orientada a fomentar las
denuncias por parte de alertadores consiste en su exoneración de responsabilidad

23
Sobre tal extremo, vid. ORTIZ-PRADILLO, Juan Carlos, Los delatores…, op. cit., pp. 201-204.
24
RAGUÉS I VALLÈS, RAMÓN, “¿Es necesario un estatuto para los denunciantes de la corrupción?”,
Diario La Ley, N. 9003, de 19 de Junio de 2017. En nuestra opinión, las represalias laborales que pudieran
considerarse humillantes, aunque no comporten trato degradante, deberían penarse en virtud de lo ya
establecido en el art. 173.2 CP.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 435


Juan Carlos Ortiz Pradillo

penal. Y en este sentido, la Directiva sí que incluye como norma mínima a nivel
europeo la necesidad de prever la exoneración de responsabilidad del alertador
(incluida la penal) por el hecho de revelar la información referida a la infracción
denunciada, ya que una tradicional forma de represaliar al alertador consiste en
querellarse contra el mismo, acusándolo de cometer un posible delito relacionado
con la revelación de secretos, vulneración de secretos de empresa o la infidelidad en
la custodia de documentos.
Para evitar que el temor a verse envuelto en una causa penal disuada a los
posibles alertadores de denunciar irregularidades y fraudes, la Directiva viene a
establecer una presunción de actuación conforme a Derecho25, según la cual estos
“no incurrirán en responsabilidad de ningún tipo en relación con dicha denuncia o
revelación, siempre que tuvieran motivos razonables para creer que la denuncia o
revelación de dicha información era necesaria para revelar una infracción en virtud
de la presente Directiva (art. 21.2)”. La voluntad del alertador de servir al interés
público, unido a la creencia fundada de que su actuación es acorde a la ley y de que
la información comunicada es cierta, constituyen sólidos argumentos para excluir
cualquier tipo de responsabilidad penal (al menos, el dolo26), e importantes a la hora
de exonerarle de responsabilidad civil o laboral si su actuación ha seguido los cauces
marcados en la normativa.
Ahora bien, la inmunidad penal que ofrece la Directiva se refiere a la
divulgación de la información que constituye la alerta; no a su obtención. Tal y
como se especifica en su art. 21.3, dicha inmunidad penal no resultará de aplicación
cuando la adquisición o acceso a la información por parte del alertador “constituya
de por sí un delito”. Por ello, estimamos muy conveniente que se aclare
oportunamente la causa de justificación establecida con carácter general en el art.
20.7 CP, pues la revelación de determinadas conductas antijurídicas no siempre
constituye un deber legal27.

25
A favor de incorporar esa presunción como regla general, vid. GARCÍA-MORENO, Beatriz, Los
Alertadores. Una propuesta de regulación. Tesis inédita. Castilla-La Mancha, 2019, p. 233 (URI:
http://hdl.handle.net/10578/20394. Fecha de consulta: 21 de octubre de 2019) para quien “A pesar de que se
prevea un completo catálogo de medidas que alcance todas las situaciones de riesgo, de poco sirven al
alertador si el acceso a las mismas puede decaer si se cuestiona su buena fe al denunciar o su diligencia al
evaluar la veracidad de los hechos. Para paliar los efectos de esta situación, que puede llevar a muchos
potenciales whistleblowers a desistir en su deseo de alertar y que puede causar importantes perjuicios a
quien ya lo ha hecho, se propone aquí incorporar al estatuto del alertador una presunción a favor de este,
de haber actuado conforme a derecho”.
26
La STS, sala 2ª, n. 778/2013, de 22 de octubre, aplicó la teoría del error de prohibición invencible a un
profesional que reveló determinada información protegida.
27
RAGUÉS I VALLÈS, Ramón, VV.AA., Memento Penal Económico y de la Empresa 2016-2017, Madrid,
Francis Lefebvre, Madrid, ref. 1663-1673, entiende que existe una “colisión de deberes” en la que se
encuentran los alertadores, pues por un lado tienen el deber de denunciar o evitar los delitos, y por otro lado
tienen el deber de buena fe contractual y de custodiar fielmente los documentos, de modo que una posible
solución pasaría por aplicar dicha causa de justificación cuando, para llevar a cabo su denuncia, el
trabajador hace pública no solo información estrictamente vinculada con la actividad ilícita que revela, sino
otra información merecedora de legítima protección jurídica.

436 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Recepción de la Cultura del “Compliance” y del “Whistleblowing” en España

Lo esperable de los ciudadanos es que denuncien; no que investiguen por su


cuenta28, y aunque no cabe duda de que la voluntad de colaborar con la Justicia y el
cumplimiento de la legalidad deben ser propósitos a valorar muy positivamente, nunca
pueden erigirse como habilitadores de un “cheque en blanco” ante posibles excesos
sancionables incluso penalmente. El fin no justifica los medios, de tal manera que,
aunque es cierto que nuestros tribunales han incidido en que el Código Penal no puede
proteger como secreto “información referida a actividades sospechosas de ilegalidad,
incluso constitutivas de infracciones penales (defraudación tributaria, blanqueo de
dinero, posible financiación del terrorismo…)”, de modo que la revelación de
información sobre una conducta delictiva no puede considerarse quebrantamiento de
un secreto penalmente protegido29, la manera de proceder a su obtención sí podría
rebasar los límites legales permitidos. Cuestión distinta es que, llegado el caso y
ponderadas todas las circunstancias del caso en concreto, los tribunales apreciaran
algún tipo de eximente o causa de justificación (inexigibilidad de otra conducta,
error de prohibición, etc.).

2.2.1.3. Las medidas antirrepresalias contra el alertador


La parte más importante de la Directiva Europea se centra, junto con la
previsión de específicos requisitos que deben reunir los procedimientos de denuncia
internos y externos, en las importantes medidas destinadas a evitar represalias
laborales contra los alertadores.
Para ello, la Directiva lleva a cabo una regulación destacablemente amplia
desde dos puntos de vista. Desde un punto de vista objetivo, a través de un vasto
listado de las distintas acciones ―u omisiones― que los Estados deben considerar
como “represalia” proscrita por el Derecho Europeo a partir de ahora (art. 19). Y
desde un punto de vista subjetivo, englobando un amplio listado de personas a las
que deberán reconocerse tales medidas de protección. Y es que, junto con una
definición sumamente amplia de la condición de “trabajador” que efectúa dicha
Directiva, la protección se extiende también a muchas otras categorías de personas
―físicas y jurídicas― tales como proveedores, trabajadores por cuenta propia,
voluntarios y trabajadores en prácticas ―incluidos también los becarios y quienes se
encuentren en periodo de pruebas o durante procesos selectivos―, los profesionales
independientes, los contratistas, subcontratistas y proveedores, los accionistas y
quienes ocupen puestos directivos, así como los familiares y compañeros de trabajo
del alertador y los “facilitadores” que hayan prestado apoyo al alertador (v. gr.,
Comités sindicales, asociaciones y entidades civiles, ONGs, etc.).
Esperemos que esta previsión especialmente amplia tenga una vis expansiva
que conduzca a los Estados a promover especiales medidas de generación de una
cultura de cumplimiento más allá de los contornos perfilados por la Directiva

28
La STS, sala 2ª, n. 778/2013, de 22 de octubre, critica expresamente la conducta de un cirujano que, para
denunciar un posible delito de estafa, acopió y reveló información confidencial de historiales clínicos.
29
Véase el Auto n. 19/2013, de 8 de mayo, de la Sala de lo Penal (secc. 2ª) de la Audiencia Nacional sobre la
denegación de extradición del Sr. Hervé Falciani a Suiza.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 437


Juan Carlos Ortiz Pradillo

2019/1937 en los planos objetivo y subjetivo30. La importancia de proteger al


alertador en su específico entorno laboral resulta un factor clave para potenciar su
colaboración con las autoridades, pues las represalias de la organización, además de
ser las más probables, son también las más peligrosas, ya que la organización tiene,
por definición, una posición de dominio jurídico o económico sobre el alertador y,
por tanto, también tiene una capacidad de perjudicarle mucho mayor que cualquier
otro sujeto31.
Sin embargo, y a pesar de que la importancia de proteger al alertador frente a
represalias laborales ha sido una constante en las iniciativas de las principales
instituciones internacionales (ONU, OCDE o Consejo de Europa), no existía un
nuestro país un mínimo marco jurídico de protección laboral al empleado para evitar
cualquier tipo de represalia por el hecho de denunciar o divulgar posibles
irregularidades o actividades delictivas cometidas en el seno de la empresa o entidad
pública en la cual trabaja o trabajaba.
La denominada “garantía de indemnidad” derivada de la interpretación
jurisprudencial del art. 55.5 ET obedece en puridad a una garantía laboral protectora
del trabajador en el ejercicio ante los tribunales de Justicia de sus derechos laborales
(con especial atención al ejercicio de acciones judiciales contra la empresa
motivadas por la vulneración de sus derechos laborales, como sucede principalmente
en materia de representación sindical) más que a un objetivo de promover o
garantizar la plena colaboración con la Justicia de los empleados que tengan
información esencial para la persecución de los delitos u otro tipo de ilegalidades
que terceras personas –proveedores, clientes, etc. – o integrantes de la corporación –
compañeros, directivos, etc. – cometan en el ámbito empresarial32.
No obstante, la jurisprudencia ha ido ampliando dicha garantía de
indemnidad también a las represalias sufridas por el empleado con motivo de haber
denunciado irregularidades o conductas presuntamente constitutivas de delito en su
entorno laboral33.
Pese a dicha evolución jurisprudencial, estimamos muy necesario que se
proceda a una específica reforma del Estatuto de los Trabajadores, así como de la
normativa aplicable a los empleados públicos, que incorpore las disposiciones de la
Directiva de 2019 respecto a la tutela de los trabajadores y demás alertadores en
caso de sufrir represalias por haber denunciado determinadas irregularidades en los
términos descritos en la citada Directiva.

30
BACHMAIER WINTER, Lorena, “Whistleblowing europeo y compliance: La Directiva EU de 2019
relativa a la protección de personas que reporten infracciones del Derecho de la Unión”, Diario La Ley, n.
9527, de 27 de noviembre de 2019, p. 6.
31
GARCÍA-MORENO, Beatriz, Los Alertadores…, op. cit. pp. 220 y ss.
32
ORTIZ-PRADILLO, Juan Carlos, Los Delatores…, op. cit., pp. 190 y ss.
33
Un estudio jurisprudencial en materia de tutela de los denunciantes de hechos delictivos puede verse en
RAGUÉS I VALLÈS, Ramón, Whistleblowing..., op. cit., pp. 166-195. Cuando la denuncia se refiere a
irregularidades no constitutivas de delito, la jurisprudencia también comienza a decantarse a favor del
alertador. Entre otras, vid. STSJ Comunidad Valenciana, Sala de lo Social, de 2.04.2019 (Rec. sup.
516/2019).

438 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Recepción de la Cultura del “Compliance” y del “Whistleblowing” en España

2.2.2. Medidas asistenciales al alertador


2.2.2.1 Información y asesoramiento previo
La primera premisa que debe concurrir para que los sistemas de control y
detección de irregularidades en el ámbito público y privado sean correctamente
utilizados es que los mismos sean conocidos por sus potenciales usuarios. Por ello,
la Directiva insiste en la obligación, tanto de las entidades privadas como de las
corporaciones de Derecho Público y las instituciones, de difundir y facilitar
información clara, detallada y comprensible, sobre la existencia de tales canales de
denuncia, los procedimientos a seguir, y sobre todo, los derechos que asisten a quien
decida hacer uso de los mismos.
La clave, insistimos, reside en dotar de la suficiente protección y seguridad
jurídica a quien decida colaborar con las autoridades públicas y privadas en defensa
de la legalidad, el cumplimiento ético o el interés público, de modo que lo primero a
reconocer a los alertadores es, entre otros derechos, el de obtener información
suficiente y clara sobre la existencia de los procedimientos de denuncia, su
funcionamiento, las medidas de protección y otros derechos asistenciales legalmente
previstos para quien facilite información sobre presuntas irregularidades o conductas
delictivas, el estado de la “denuncia” comunicada (v. gr., si ha sido recibida, si se ha
procedido al archivo de aquella, si ha dado lugar a la puesta en marcha de una
investigación interna y, en su caso, sus resultados y las medidas adoptadas, o si se ha
remitido a una autoridad competente externa con vistas a una posible investigación
criminal), e incluso las consecuencias y modos de solicitar asistencia en caso de
divulgación pública de la información.
En definitiva, la ley debe reconocer al alertador el derecho a recibir la
información anteriormente citada, con particular interés en el derecho a recibir una
resolución expresa y motivada sobre su denuncia presentada (y así poder saber si
deberá acudir a canales externos, en su caso), pues solo una vez se haya recibido la
oportuna y suficiente información, se estará en condiciones de tomar una decisión
fundada sobre si decide denunciar y en qué términos, la información a aportar o, en
su caso, a indicar para su recolección por el órgano competente, etc.
2.2.2.2. Elección del canal de denuncia a utilizar
Salvo la escueta alusión del aparto 4º del art. 31 bis 5 CP a que los Programas
de Cumplimiento normativo deben incluir “la obligación de informar de posibles
riesgos e incumplimientos al organismo encargado de vigilar el funcionamiento y
observancia del modelo de prevención”, la legislación española apenas se refiere al
contenido y características que deben tener dichos canales de denuncia, a diferencia
de lo que ahora viene a exigir la Directiva 2019/1937. Si deseamos conocer
pormenorizadamente los requisitos, salvaguardas y especificaciones de dichos
sistemas, debíamos acudir a las Guidelines norteamericanas, las normas UNE y los
estándares certificados ISO sobre dichos Programas de Cumplimiento.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 439


Juan Carlos Ortiz Pradillo

Además, esa escueta alusión de nuestro Código Penal a la obligación de


informar ha generado una interesante cuestión legal: ¿puede obligarse al trabajador a
acudir a esos canales internos de recepción de denuncias (por ejemplo, sancionando
en virtud del poder de dirección del empresario ―art. 20 ET― a quien omita acudir
a los órganos internos de control y gestión y decida emitir su denuncia ante un sujeto
o autoridad externa)?
Frente a la indefinición de la doctrina34, la Directiva de 2019 sí parece ofrecer
una solución al respecto, al configurar un “sistema multinivel” de promoción de las
denuncias, en donde la regla general sea el procedimiento interno ―aunque la
gestión del canal se haya externalizado a una empresa independiente―, mientras
que el procedimiento externo ante la Institución o Agencia competente, o
directamente ante la opinión pública ―a través de los medios de comunicación, por
ejemplo― solo tengan cabida ante circunstancias extraordinarias (v. gr., porque los
canales internos no hayan funcionado adecuadamente en el pasado, o los alertadores
tengan razones válidas para pensar que dichos cauces internos no serán efectivos,
por ejemplo, porque el responsable de dicho canal esté implicado en la infracción, o
exista el riesgo de que se oculten o destruyan la infracción o las pruebas conexas,
etc.). Es decir, la Directiva propone un sistema en el que acudir a los cauces internos
resulte preferente, pero opcional35.
Tal interpretación resulta conforme con la jurisprudencia del TEDH, quien ha
declarado abiertamente que “es importante que la persona en cuestión proceda a la
divulgación, en primer lugar, ante su superior u otra autoridad o instancia competente.
La divulgación al público no debe considerarse más que como último recurso, en caso de
imposibilidad manifiesta de actuar de otro modo. Por tanto, para juzgar el carácter
proporcionado o no de la restricción impuesta a la libertad de expresión del demandante
en este caso concreto, el Tribunal debe examinar si el interesado disponía de otros
medios efectivos para poner remedio a la situación que consideraba criticable36“. Y es
que uno de los criterios de ponderación tradicionalmente utilizados por el TEDH se
refiere, precisamente, a “si, habida cuenta del deber de discreción de un empleado hacia
su empleador, la información se hizo pública como último recurso, tras su divulgación a
un superior u otro órgano competente37.

34
Especialmente, vid. MASCHMANN, Frank, “Compliance y derechos del trabajador”, en VV.AA.
Compliance y teoría del Derecho Penal. Madrid, Marcial Pons, 2013, p. 160; GOÑI SEIN, José Luis,
“Programas de cumplimiento, investigaciones internas y derechos de los trabajadores”, en VV.AA.
Responsabilidad de la Empresa y Compliance. Madrid, Edisofer, 2014, p. 383.
35
Para RAGUÉS I VALLÈS, Ramón (“El tratamiento jurídico de los denunciantes antes y después de la
Directiva 2019/1937”, Diario La Ley, n. 9003, de 12 de junio de 2020), la Directiva europea ha optado por
dar preferencia a la denuncia interna pero en un sentido normativo débil, exigiendo solamente que los
estados promuevan o animen a los denunciantes a utilizar primero dicho medio, pero sin excluir de la
protección a quienes prefieran, ya de entrada, denunciar externamente.
36
Vid., por todas, la STEDH Guja c. Moldavia, de 12 de febrero de 2008, párrafo 73.
37
Los criterios de ponderación manejados por el TEDH pueden apreciarse en SSTEDH Kudeshkina c. Rusia
(26 de febrero de 2009), Heinisch c. Alemania (21 de julio de 2011), Sosinowska c. Polonia (18 de octubre
de 2011), Bucur y Toma c. Rumanía (8 de enero de 2013), y Matúz c. Hungría (21 de octubre de 2014). Con
más detalle, vid. ORTIZ-PRADILLO, Juan Carlos, Los delatores…, op. cit., p. 192 y ss.

440 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Recepción de la Cultura del “Compliance” y del “Whistleblowing” en España

2.2.2.3. Asistencia jurídica


La Directiva de 2019, al igual que lo ya previsto en muchas de las actuales leyes
autonómicas sobre esta específica materia, exige que los Estados faciliten el acceso de
los alertadores a “asesoramiento jurídico” sobre los procedimientos y recursos
disponibles para la recepción de la información que desee transmitir, los derechos que le
asistirán durante la tramitación de la denuncia, etc. Ahora bien, existe una trascendental
diferencia entre el derecho a recibir asesoramiento legal ―antes, durante y después de la
presentación de la denuncia ante el organismo competente38― y el derecho, en su caso, a
“ser asistido jurídicamente” en caso de necesitarlo.
Lo primero (asesoramiento) resulta fácilmente incardinable dentro del derecho a
la información anteriormente analizado, mientras que lo segundo (asistencia) implica un
derecho prestacional que debería incluir, en nuestra opinión, la representación y
defensa jurídica de los intereses del alertador en cualesquiera procedimientos
disciplinarios y jurisdiccionales que se deriven con motivo, precisamente, de haber
denunciado irregularidades en su entorno profesional o respecto de la actuación de las
Administraciones y otros poderes públicos, tanto en su contra (por ej., querellas por
revelación de secretos) como a su favor (reclamaciones de daños y perjuicios a los que
el alertador pudiera tener derecho).
En este punto, la Directiva tampoco ofrece una solución adecuada, pues prevé
igualmente el deber de los Estados de garantizar el acceso de los alertadores a la
asistencia jurídica en los procesos penales y civiles transfronterizos ― Directivas
2016/1919, de 26 de octubre, ya citada, y 2002/58/CE, de 12 de julio,
respectivamente―, mientras que para los asuntos domésticos lo deja al albur de lo que
decidan los ordenamientos internos. De ahí el acierto de la Proposición de Ley de
protección integral de los alertadores, presentada en el Congreso de los Diputados por
diputados del Grupo Mixto en 201939, que incluía también el derecho a la defensa
jurídica (art. 9) en todas las actuaciones relacionadas con la comunicación de una
información constitutiva de alerta y en todas las actuaciones que deriven o sean
consecuencia de la misma.
Resulta indispensable ofrecer la merecida defensa letrada al alertador que actúa
bajo la creencia de estar cooperando con la defensa del interés público conforme al
ámbito de aplicación de la Directiva, pues a buen seguro una de las represalias más

38
La norma más desarrollada en este extremo es la Ley 11/2016, de 28 de noviembre, de la Agencia de
Prevención y Lucha contra el Fraude y la Corrupción de la Comunidad Valenciana, que reconoce el derecho
de los denunciantes a “recibir inmediatamente asesoría legal para los hechos relacionados con la denuncia
(art. 14.1.d)”, el “derecho de asesoramiento sobre los procedimientos que, en su caso, se interpongan contra
la persona denunciante con motivo de la denuncia (art. 14.2.a)” y el “derecho a la asesoría legal en relación
con la denuncia realizada, que le prestará la Agencia (art. 43 del Reglamento de funcionamiento)”.
39
Dicha Proposición incluía, como Disposición adicional segunda, una Modificación de la Ley 1/1996, de 10
enero, de Asistencia Jurídica Gratuita consistente en añadir un apartado j) al artículo 2 de la Ley para
reconocer, con independencia de su situación económica, “el derecho de asistencia jurídica gratuita a los
alertadores o facilitadores que, reuniendo los requisitos previstos por la Ley de Protección Integral de
Alertadores, quieran interponer una acción judicial o sean demandados o investigados en procesos que
tengan vinculación, deriven o sean consecuencia de su condición de tales”.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 441


Juan Carlos Ortiz Pradillo

comunes consistirá en dirigir contra aquel procedimientos internos disciplinarios y


acciones judiciales de diversa índole. De ahí la necesidad de una reforma integral que
incluya, dentro de las medidas de indemnidad laboral, también a la asesoría jurídica y a
la asistencia letrada gratuita, a favor de cualquier empleado tanto del sector público como
del privado40.
Aunque los Programas de Cumplimiento de algunas entidades privadas prevean
interesantes medidas incentivadoras de la colaboración eficaz del empleado para que
utilice los canales internos de denuncia (por ej., la asunción de los gastos jurídicos de
defensa de dicho denunciante, bien porque posteriormente sea encausado por las
autoridades estatales, bien porque sea objeto de denuncia o acusación por la propia
empresa o por los otros empleados delatados; e incluso decida afrontar los costes de la
responsabilidad civil que se imponga a ese denunciante condenado), ello no puede
quedar en manos de la autorregulación empresarial: debe ser una norma estatal la que
prevea dicho derecho prestacional, y con vocación universal, tanto para el sector
privado como para el público.
Cuestión distinta será resolver si dicha defensa letrada del alertador debe ser
asumida por la asesoría jurídica de la entidad privada en la que trabaja; por un
abogado de confianza designado por aquel pero costeado por dicha entidad; por el
correspondiente cuerpo jurídico de Letrados de la Administración (Abogacía del
Estado, Letrados de la CC.AA. o de la Corporación Local) en la que el alertador
desempeñe su servicio público; por los servicios jurídicos de la Institución pública
que específicamente se cree en materia de lucha contra la corrupción o por la
correspondiente sección especializada de la Abogacía del turno de oficio.
En este sentido, llama poderosamente la atención la actual situación jurídica
en España respecto de la asistencia jurídica a directivos y altos cargos de las
Administraciones Públicas encausados por delitos relacionados con la corrupción,
para lo cual tomaremos como referencia el denominado “caso de los ERE” en
Andalucía. Junto con el art. 14 de la Ley del Estatuto Básico del Empleado
Público, que reconoce el derecho individual de cualquier funcionario “a la defensa
jurídica y protección de la Administración Pública en los procedimientos que se
sigan ante cualquier orden jurisdiccional como consecuencia del ejercicio legítimo
de sus funciones o cargos públicos, la Ley 9/2007, de 22 de octubre, de la
Administración de la Junta de Andalucía también facilita la representación y
defensa en juicio por parte del Gabinete Jurídico de la Junta a las autoridades y
personal al servicio de la Administración de la Junta de Andalucía, cuando los
procedimientos se sigan por actos u omisiones relacionados con el cargo y previo
consentimiento de la persona interesada (art. 44). Y lo más llamativo: hasta finales
del año 201141, el Reglamento de Organización y Funciones de dicho Gabinete
Jurídico permitía que el titular de la Consejería de quien dependiera el afectado

40
ORTIZ-PRADILLO, Juan Carlos, Los Delatores…, op. cit., p. 195.
41
Disposición adicional segunda del Decreto 450/2000, de 26 de diciembre, derogada en virtud del Decreto
367/2011, de 20 de diciembre, del gabinete jurídico de la Junta de Andalucía y cuerpo de letrados de la
Junta de Andalucía.

442 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Recepción de la Cultura del “Compliance” y del “Whistleblowing” en España

pudiera autorizar que se contratasen abogados privados que asumieran su defensa,


incluso en aquellos supuestos en los que “pudiera existir incompatibilidad material
por la posición procesal que la Comunidad Autónoma haya de mantener en el
mismo o en otros procedimientos”.
Nada que objetar al hecho de que la Administración correspondiente asuma la
defensa jurídica de uno de sus empleados o cargos políticos, cuando se dirijan contra
el mismo acciones judiciales derivadas de actos u omisiones realizados en el
ejercicio de sus cargos cumpliendo el ordenamiento jurídico o las órdenes de sus
superiores, así como también el que los servicios jurídicos de dicha Administración
ejercite acciones ante cualquier jurisdicción en nombre de dichos empleados,
autoridades o funcionarios. Ello es precisamente lo que defendemos.
El que se asuma también el coste económico de atribuir dicha defensa
jurídica a abogados privados resulta menos defendible, sobre todo si tenemos en
cuenta la actual formación y especialización de los Letrados de los Servicios
Jurídicos de las Comunidades Autónomas (e incluso de la Abogacía del Estado,
con quien Comunidades Autónomas y Corporaciones Locales pueden suscribir
los correspondientes convenios de colaboración y asistencia). Una cosa es que la
Ley ―entre otras, el art. 551.3 LOPJ― permita a las Instituciones de Derecho
Público contratar a un despacho privado de abogados para que asuma su
representación y defensa en procesos en defensa de los intereses de la institución
o el interés público general42, y otra cosa muy diferente es que con dinero
público se costee dicha defensa privada cuando la perjudicada sea la propia
Administración y esta se persone procesalmente contra dicho cargo, lo cual
resulta censurable. Y aún lo es más que la decisión dependa en último término
de la persona titular de la Consejería correspondiente (que pertenecerá, con gran
seguridad, al mismo partido político al que pertenece ese alto cargo encausado,
precisamente, por favorecer intereses privados del mencionado partido político,
o por lucrarse individualmente o en favor de terceros).
Tal y como gráficamente describe el considerando n.99 de la Directiva
2019/1937, “Los honorarios de abogados pueden suponer un coste significativo
para los denunciantes que tengan que defenderse de medidas de represalia
adoptadas contra ellos a través de procesos judiciales”. Por ello, al igual que se
asumen (sin perjuicio de repetición para el caso de que el encausado sea
finalmente condenado en firme) los costes de las defensas privadas de las
autoridades y altos cargos de la Administración, de igual modo debiera costearse
y asumirse el coste de la defensa letrada del alertador en cualesquiera
procedimientos administrativos y jurisdiccionales relacionados con su condición
de alertador de corrupción.

42
Nos estamos refiriendo a ejemplos como el conocido “caso Odyssey” tramitado en los EE.UU., en donde
España contrató un despacho particular (Covington & Burling LLP, dirigido por el letrado James Goold)
para litigar contra la empresa cazatesoros Odyssey Marine Exploration Inc.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 443


Juan Carlos Ortiz Pradillo

2.2.2.4. Indemnizaciones e incentivos


2.2.2.4.1. Reparación e indemnización por el daño sufrido
El acto de destapar irregularidades y conductas delictivas cometidas en el
seno de cualquier entidad, pública o privada, da lugar a un verdadero calvario. Junto
con las represalias que todos conocemos, el acoso y derribo al que se somete social y
profesionalmente al alertador y su entorno personal y familiar conlleva un desgaste
anímico ―además del económico― muy elevado.
Una vez más, la Directiva de 2019 se queda corta a la hora de fijar unos
mínimos estándares europeos a la hora de paliar y reparar eficazmente los diversos
perjuicios de índole personal y patrimonial a los que se ven abocados los alertadores,
sobre todo cuando trasciende públicamente su identidad. Su art. 20.2 faculta a los
Estados ―dice, literalmente, podrán― a prestar “asistencia financiera y medidas de
apoyo a los denunciantes, incluido apoyo psicológico, en el marco de un proceso
judicial”, lo que significa que para ello deberá existir un proceso judicial en el que
una de las partes procesales sea el alertador. Y el apartado 8º del art. 21 exige que
los Estados adopten “las medidas necesarias para garantizar que se proporcionen
vías de recurso e indemnización íntegra de los daños y perjuicios sufridos por las
personas a que se refiere el artículo 4 de conformidad con el Derecho nacional”, lo
cual tampoco supone una mejora en sí de la situación jurídica actual de nuestro país,
en donde los ciudadanos tienen reconocido el derecho a una tutela judicial efectiva y
al ejercicio de las correspondientes acciones judiciales de cesación e indemnización,
tanto contra privados como contra las instituciones públicas en caso de
responsabilidad patrimonial de la Administración.
Sin embargo, la reparación del daño causado a los denunciantes de
corrupción admite muchas otras fórmulas que harían más atractivo y eficaz el
objetivo pretendido con la Directiva, esto es, la implicación de la ciudadanía en
denunciar esos fraudes e irregularidades cometidos en el seno de las empresas e
instituciones.
Algunos ejemplos ya los hemos señalado, como el otorgamiento de legitimación
a determinados organismos e instituciones en cualesquiera procedimientos
administrativos y judiciales en representación y defensa de los intereses del alertador.
Otros se deducen necesariamente de la configuración de las medidas antirrepresalias que
deberán incorporarse a nuestro ordenamiento jurídico, como la atribución de potestad
administrativa disciplinaria y sancionadora a organismos públicos para la anulación de
cualesquiera medidas discriminatorias o represivas contra el alertador (v. gr., la nulidad
de las medidas laborales o profesionales acordadas en su perjuicio), la adopción de
medidas provisionales, etc. Y otros (v. gr., los gastos de atención psicológica o médica)
podrían ser fácilmente asumibles por las Administraciones Públicas, pues al igual que se
han reconocido diversos derechos asistenciales extraprocesales a las víctimas de delitos,
deberían reconocerse similares derechos a los represaliados por haber actuado de buena
fe y en defensa de la integridad y el cumplimiento de la Ley, con independencia de su
situación procesal. En muchas ocasiones, los alertadores no adquirirán el estatus procesal

444 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Recepción de la Cultura del “Compliance” y del “Whistleblowing” en España

de “víctima”, de modo que no podrán beneficiarse de los derechos reconocidos en la Ley


4/2015, de 27 de abril, del Estatuto de la Víctima del Delito. De ahí la necesaria
regulación legislativa de un estatuto asistencial e integral en beneficio de tales sujetos.
2.2.2.4.2. Incentivos sociales y reputacionales
Una de las fórmulas históricamente utilizadas para promover conductas cívicas
positivas ha sido el otorgamiento de distinciones, condecoraciones y recompensas de
diversa índole. Es más, el verdadero desafío de nuestro sistema legal y social pasa por
fomentar el reconocimiento y la loa social hacia el alertador como “un modelo a seguir”,
lo cual puede ser, llegado el caso, un acicate para estimular conductas ejemplares mucho
mayor que ciertas medidas de protección tradicionales.
Ojalá llegue el día en el que no haya que esconder ni ocultar a quien denuncia un
delito y cumple con su deber cívico. Mientras tanto, y como quiera que lo perseguido es
evitar precisamente que se descubra la identidad del alertador, tales premios
reputacionales deberían establecerse subsidiariamente, para aquellos supuestos en los
que trascienda dicha identidad, junto con otras medidas reparadoras (como, por ej., la
promoción laboral, la concesión de medallas al mérito en el trabajo, así como otras
reparaciones simbólicas como una disculpa pública y oficial por el daño padecido).
Desde otro punto de vista, no debemos omitir del presente debate que la
publicidad de los datos del alertador, seguida de importantes incentivos reputacionales y
sociales, también puede ser utilizado como un eficaz mecanismo protector, pues
reconocer públicamente a un sujeto como alertador, a los fines de la normativa aquí
examinada, también puede servir igualmente para disuadir a la entidad de adoptar
potenciales represalias contra aquel. Si trasciende públicamente la identidad de un
alertador, así como los hechos objeto de alerta, la empresa se verá también públicamente
sometida al escrutinio público de las medidas que adopte ―u omita― en defensa o en
perjuicio del alertador, del facilitador o de sus allegados, en un futuro inmediato.
Dado que uno de los fines por los que se pretende promover, en primer lugar, la
utilización de los canales internos de denuncia es, precisamente, para evitar los daños
reputacionales sobre la entidad, esa presión mediática puede tener su lado positivo: la
empresa que de repente se ve bajo los focos de los medios de comunicación por un
presunto fraude cometido en su seno, puede optar por la estrategia de tratar de ocultar
dicho escándalo a toda costa, pero también puede ver dicha situación como una
oportunidad para evidenciar su decidida apuesta por la cultura de la legalidad y la ética
empresarial, adoptando las necesarias medidas reparadoras, no solo respecto de los actos
indebidamente cometidos, sino también respecto de quienes con su compromiso laboral
y ético han ayudado a descubrir tales actuaciones internas indeseables. En ocasiones,
reconocer el error cometido, pedir disculpas y adoptar las necesarias reformas
estructurales internas (cese de mandos, reposición del puesto laboral al empleado
represaliado, etc.) suele ser una magnífica campaña publicitaria, además de una
oportunidad para demostrar públicamente su compromiso y reconocimiento sobre los
alertadores.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 445


Juan Carlos Ortiz Pradillo

Por tanto, la promoción social y pública de los alertadores puede servir


igualmente como instrumento para evitar represalias, e incluso más: puede servir para
obligar a la empresa privada o institución pública a reconocer déficits de control internos,
a adoptar cambios en sus programas de gestión o en su organigrama responsable de los
mismos ―incluida la cúpula directiva de la empresas o sus filiales―, a apostar por una
decidida colaboración eficaz con las autoridades, así como a reconocer y premiar la
actuación de su empleado.
2.2.2.4.3. Incentivos económicos
El ofrecimiento de recompensas económicas también constituye otro de los
instrumentos legalmente previstos en otros ordenamientos jurídicos para la
promoción jurídica de la colaboración con la Justicia, si bien representa un tema que
ha suscitado y sigue suscitando en la actualidad un importante debate, tanto desde la
óptica moral como desde su operatividad práctica43. Por ello, en el estudio de las
oportunas reformas legislativas que se acometan para incorporar la Directiva
2019/1937 a nuestro sistema jurídico no debería omitirse el análisis en profundidad,
sin prejuicios de origen, sobre la utilidad o no de establecer recompensas
económicas a favor de quien facilita información a las autoridades, en función de la
gravedad de las irregularidades denunciadas, de la calidad de la información
ofrecida, o de las cantidades que el Estado llegue a recuperar al descubrir y castigar
el fraude.
Se han realizado estudios que indican que, de entre los distintos incentivos
examinados a la hora de determinar cuáles aumentan el deseo de denunciar (v. gr.,
mejorar la reputación de nuestra honestidad y compromiso con la Sociedad, obtener
una mejora o promoción profesional, recibir recompensas económicas y de otra
índole, etc.), los económicos constituyen un factor determinante en el afloramiento
de los casos de fraude en el sector empresarial44; que el fomento de la denuncia por
parte del Estado con generosas recompensas económicas no desincentiva ni disuade
la utilización de los canales internos empresariales45, sino que aumenta la presión
sobre las mismas “para establecer mecanismos efectivos de denuncia interna46“; y

43
Un examen en profundidad de los distintos incentivos económicos actualmente existentes en los países
anglosajones, en Iberoamérica y en la normativa española lo encontramos en ORTIZ-PRADILLO, Juan
Carlos, Los Delatores…, op. cit., pp. 131-165.
44
DYCK, Alexander, MORSE, Adair, ZINGALES, Luigi, “Who blows the Whistle on Corporate Fraud?”,
The Journal of Finance, 2010, vol. 65, Issue 6; CALLAHAN, Elletta, DWORKIN, Terry, “Do good and
Get Rich: Financial Incentives for Whistleblowing and the False Claims Act”, Villanova Law Review, 1992,
vol. 37, p. 274; RAPP, Geoffrey, “Beyond protection: invigorating incentives for sarbanes-oxley corporate
and securities fraud whistleblowers”, Boston University Law Review, 2007, Vol. 87, p. 119.
45
Véase el estudio de IWASAKI, Masaki, ‘Effects of external whistleblower rewards on internal reporting’,
Harvard Law School, Discussion Paper n. 76, 05/2018. Descargado el 28 de octubre de 2019 de
http://www.law.harvard.edu/programs/olin_center.
46
FASTERLING, Björn, LEWIS, David, ‘Leaks, legislation and freedom of speech: How can the law
effectively promote public-interest whistleblowing?’, International Labour Review, 2014, vol. 153, Issue 1,
p. 87.

446 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Recepción de la Cultura del “Compliance” y del “Whistleblowing” en España

que la rebaja/aumento en la cuantía del premio tiene una repercusión directa en el


número de denuncias presentadas47.
Aunque se haya apuntado hacia los EE.UU como el país que cuenta con una
larga tradición legislativa en materia de incentivos económicos en este sentido, lo
cierto es que la opción de premiar con dinero ―y otros galardones y estímulos― a
quien informa de un determinado perjuicio contra el Estado fue objeto de una
detallada normativa en el Derecho Romano para incentivar el descubrimiento y la
persecución de determinados ilícitos que, de otro modo, difícilmente hubieran
podido ser descubiertos por un Ordenamiento que carecía de un aparato de policía,
magistrados o funcionarios encargados de la investigación delictiva48.
En España, sin embargo, el ofrecimiento de incentivos económicos para
promocionar denuncias constituye una práctica legal que se ha ido abandonando con
el paso de las décadas, aunque todavía perduran ciertos “premios por denuncia” en
determinados sectores jurídicos, como por ejemplo respecto de quien informe sobre
la existencia de bienes y derechos de titularidad pública en manos privadas o
herencias intestadas a favor del Estado o de las CC.AA.
La Directiva sobre whistleblowing no ha querido incidir en este extremo,
limitándose únicamente a facultar a los Estados a “prestar asistencia financiera y
medidas de apoyo a los denunciantes” (art. 20.2), lo cual es tanto como no decir
nada. Pero sabemos que existen otros ámbitos jurídicos en donde desde Europa sí
que se ha animado a los Estados a incluir recompensas económicas a favor de
quienes faciliten, sin estar obligados a ello por disposición legal o contractual,
información esencial y determinante para la detección de conductas ilícitas y la
imposición de sanciones. Así sucede, por ejemplo, en materia de uso de información
privilegiada y manipulación del Mercado, en donde el Reglamento (UE) n.
596/2014, del Parlamento Europeo y del Consejo, de 16.04.2014, sobre Abuso de
Mercado habilita a los Estados a que incluyan recompensas económicas a favor de
quienes faciliten información esencial en materia de lucha contra el uso de
información privilegiada y manipulación del Mercado, dado que Los confidentes
proporcionan a las autoridades competentes nueva información que permite
detectar y sancionar los casos de operaciones con información privilegiada y de
manipulación de mercado. No obstante, pueden verse disuadidos de ello por miedo
a las represalias o por falta de incentivos (...). Por ello, y además de determinadas
medidas de protección de su identidad, el art. 32.4 permite a los Estados miembros
prever la concesión de “incentivos económicos” a las personas que ofrezcan
información relevante sobre posibles infracciones del presente Reglamento, siempre
47
HOGG, William, ‘I am America (And So Can You!): Incentives, Consequences, and Reforms of the False
Claims Act (October 18, 2013)’, explica como la False Claims Act de 1863 fue modificada en 1943 para
reducir la cuantía a favor del delator, pasándose del 50% de lo recuperado a entre el 10% y el 25%, y tras
dicho cambio el número de casos denunciados descendió significativamente. Posteriormente, en 1986, el
Congreso enmendó dicha norma y elevó las recompensas a la horquilla 15% a 30% y el número de
denuncias aumentó ostensiblemente (dramatically).
48
Como estudio específico en materia de premios económicos en el Derecho Romano, vid. GARCÍA
CAMIÑAS, Jesús, “Deferre ad aerarium”, AFDUDC, n. 10, 2006 pp. 431-451.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 447


Juan Carlos Ortiz Pradillo

que esas personas no estén sometidas a otras obligaciones legales o contractuales


previas de facilitar tal información, que esta sea nueva y que dé lugar a la
imposición de una sanción administrativa o penal, o a la adopción de otra medida
administrativa por infracción del presente Reglamento49.
Si verdaderamente se desean acometer las oportunas reformas legales para
impulsar la transparencia, el buen gobierno corporativo y el cumplimiento de la
legalidad, no pueden omitirse los oportunos estudios y debates sobre la mayor o
menor eficacia del ofrecimiento de incentivos de naturaleza económica dentro del
análisis del desarrollo de los sistemas de whistleblowing en nuestro país. La
experiencia no siempre ha sido positiva y en el pasado se han producido actuaciones
espurias relacionadas con esta materia50, pero sería igualmente defendible que se
decidiera su incorporación progresiva en determinados sectores de nuestro
ordenamiento jurídico (v. gr., mercados regulados) en los que cabría fijar
recompensas en función de lo recuperado por el Estado o los organismos
correspondientes al imponer las respectivas multas51, y analizar, a partir de los datos
recabados y las experiencias desarrolladas, la eficacia y/o conveniencia de su
mantenimiento, ampliación o supresión.
No en vano, no puede negarse que muchos de los incentivos legalmente
establecidos en otros sectores para fomentar la colaboración con la propia entidad o
con las autoridades estatales tienen un evidente trasfondo económico. En lo público,
ahí están los Programas de Clemencia que operan en el sector de la competencia
(exoneración de multas) o la regularización administrativa (residencia, reunificación
familiar y permiso de trabajo) a favor de los ciudadanos extranjeros que colaboran
en la lucha contra las redes de inmigración ilegal de seres humanos y su explotación
sexual o laboral. Y en lo privado, también resultan “monetizables” los incentivos
dirigidos a sus empleados y a terceros para que detecten y comuniquen
vulnerabilidades o defectos en los productos empresariales.
Por ello, si en el entorno empresarial se ha asumido con naturalidad el
ofrecimiento de determinados complementos retributivos en especie a favor de
determinados sujetos (por ej., bonus por productividad, acciones empresariales, o

49
Como ejemplo, la autoridad británica en materia de defensa de la Competencia (Competition and Markets
Authority) ofrece recompensas de hasta 100,000 libras.
50
Nos referimos, por ejemplo, a la connivencia del alertador con el denunciado para no denunciarle a cambio
de un concreto pago, o el hecho de que solo se denuncien aquellos fraudes respecto de los que existan
recompensas económicas, en detrimento de aquellos otros sectores para los que no se prevean tales
incentivos, lo cual ya fue puesto de manifiesto por TOMÁS Y VALIENTE, Francisco, El derecho penal de
la monarquía absoluta (siglos XVI, XVII y XVIII), Madrid, Tecnos, 1992, p. 169), en donde da cuenta de
que, los Procuradores de las Cortes de 1583-1585, ya se quejaron en su momento al monarca de que el
delito de incesto “pocas veces se denunciaba ni se condenaba” porque, aunque la ley imponía por tal delito
la pena de perdimiento de la mitad de los bienes, todo su valor se ingresaba en la Cámara real y no tenían
participación alguna ni jueces ni delatores.
51
Como ejemplo concreto, la Proposición de Ley de Protección Integral de los Denunciantes de Corrupción
formulada por el Grupo Parlamentario VOX a la mesa del Congreso de los Diputados el 10 de junio de
2019 incluía, en su art. 38.g), un premio a favor del denunciante por un importe equivalente al 10% de la
cuantía efectivamente recuperada del importe total en que se cifrase el perjuicio al erario público.

448 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Recepción de la Cultura del “Compliance” y del “Whistleblowing” en España

pólizas de responsabilidad civil), no estaría de más comenzar a reconocer que


apostar por la cultura del respeto por la ética y la legalidad también puede lograrse
con el ofrecimiento de incentivos económicamente computables a favor de quien
denuncie internamente conductas inaceptables (por ej., promoción laboral, permisos
retribuidos, asistencia letrada, etc).
3 BIBLIOGRAFÍA
BACHMAIER WINTER, Lorena, “Whistleblowing europeo y compliance: La Directiva EU de 2019
relativa a la protección de personas que reporten infracciones del Derecho de la Unión”, Diario La Ley, n.
9527, de 27 de noviembre de 2019.
BANACLOCHE PALAO, Julio, “Dilemas de la defensa, principio de oportunidad y responsabilidad
penal de las personas jurídicas”, en VV.AA. La responsabilidad penal de las personas jurídicas:
homenaje al Excmo. Sr. D. José Manuel Maza Martín. Madrid, Fiscalía General del Estado, 2018.
BENTHAM, Jeremy, Teoría de las Penas y las Recompensas. Obra traducida al castellano. Barcelona,
Imprenta de D. Manuel Saurí, 1838.
CALLAHAN, Elletta, DWORKIN, Terry, “Do good and Get Rich: Financial Incentives for
Whistleblowing and the False Claims Act”, Villanova Law Review, 1992, v. 37.
CERRILLO I MARTÍNEZ, Agustín, “La colaboración ciudadana en la lucha contra la corrupción a través
de medios electrónicos”, Revista Aranzadi de Derecho y Nuevas Tecnologías, n. 35, Mayo-Agosto, 2014.
DYCK, Alexander, MORSE, Adair, ZINGALES, Luigi, “Who BLows the Whistle on Corporate Fraud?”,
The Journal of Finance, 2010, v. 65, Issue 6.
FASTERLING, Björn, LEWIS, David, ‘Leaks, legislation and freedom of speech: How can the law
effectively promote public-interest whistleblowing?’, International Labour Review, 2014, v. 153, Issue 1.
FEIJOO SÁNCHEZ, Bernardo, “Bases para un modelo de responsabilidad penal de las personas jurídicas
a la española”, VV.AA., La responsabilidad penal de las personas jurídicas. Homenaje al Excmo. Sr. D.
José Manuel Maza Martín. Madrid, Fiscalía General del Estado, 2018.
GARCÍA CAMIÑAS, Jesús, “Deferre ad aerarium”, AFDUDC, n. 10, 2006 pp. 431-451.
GARCÍA-MORENO, Beatriz, “Whistleblowing y canales institucionales de denuncia”, en VV.AA.,
Manual de cumplimiento penal en la empresa (Dir. Adán Nieto Martín). Valencia, Tirant lo Blanch,
2015.
GARCÍA-MORENO, Beatriz, Los Alertadores. Una propuesta de regulación. Tesis inédita. Castilla-La
Mancha, 2019, p. 233 (URI: http://hdl.handle.net/10578/20394. Fecha de consulta: 21 de octubre de
2019).
GOÑI SEIN, José Luis, “Programas de cumplimiento, investigaciones internas y derechos de los
trabajadores”, en VV.AA. Responsabilidad de la Empresa y Compliance. Madrid, Edisofer, 2014.
HOGG, William, ‘I am America (And So Can You!): Incentives, Consequences, and Reforms of the False
Claims Act (October 18, 2013).
IWASAKI, Masaki, ‘Effects of external whistleblower rewards on internal reporting’, Harvard Law
School, Discussion Paper n. 76, 05/2018. Descargado el 28 de octubre de 2019 de
http://www.law.harvard.edu/programs/olin_center.
MASCHMANN, Frank, “Compliance y derechos del trabajador”, en VV.AA. Compliance y teoría del
Derecho Penal. Madrid, Marcial Pons, 2013.
ORTIZ-PRADILLO, Juan Carlos, “El difícil encaje del delator en el proceso penal”, Diario La Ley, n.
5860, de 12 de junio de 2015.
ORTIZ-PRADILLO, Juan Carlos, Los delatores en el proceso penal. Recompensas, anonimato,
protección y otras medidas para incentivar una colaboración eficaz con la Justicia. Madrid, La Ley,
2018.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 449


Juan Carlos Ortiz Pradillo

RAGUÉS I VALLÈS, Ramón, “¿Es necesario un estatuto para los denunciantes de la corrupción?”,
Diario La Ley, n. 9003, de 19 de Junio de 2017.
RAGUÉS I VALLÈS, Ramón, “EL TRAtamiento jurídico de los denunciantes antes y después de la
Directiva 2019/1937”, Diario La Ley, n. 9652, de 12 de junio de 2020.
RAGUÉS I VALLÈS, Ramón, VV.AA., Memento Penal Económico y de la Empresa 2016-2017, Madrid,
Francis Lefebvre, Madrid, ref. 1663-1673.
RAGUÉS I VALLÈS, Ramón, Whistleblowing. Una aproximación desde el Derecho Penal, Barcelona,
Marcial Pons, 2013.
RAPP, Geoffrey, “Beyond protection: invigorating incentives for sarbanes-oxley corporate and securities
fraud whistleblowers”, Boston University Law Review, 2007, Vol. 87.
RIQUERT, Marcelo, La delación premiada en el derecho penal, Buenos Aires, Hammurabi, 2011.
TOMÁS Y VALIENTE, Francisco, El Derecho penal de la monarquía absoluta (siglos XVI, XVII y
XVIII), Madrid, Tecnos, 1992.

450 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Recepción de la Cultura del “Compliance” y del “Whistleblowing” en España

SEGUNDAS NOTAS À LEGISLAÇÃO DA LAVAGEM


DE CAPITAIS EM PORTUGAL-EU1: REGIME
SANCIONATÓRIO NUMA PRIMEIRA ABORDAGEM2
SECOND NOTES ON PORTUGUESE MONEY LAUNDERING
LEGISLATION-EU3: SANCTIONARY REGIME IN A FIRST
APPROACH
DOI: 10.19135/revista.consinter.00011.21
Recebido/Received 21.08.2020 – Aprovado/Approved 09.10.2020
Gonçalo S. de Melo Bandeira4 – http://orcid.org/0000-0001-8859-4023
E-mail: gsopasdemelobandeira@hotmail.com

Resumo: esta primeira abordagem do regime sancionatório da legislação que previne a


lavagem de vantagens, como por exemplo, dinheiro – branqueamento de vantagens como
p.e. capitais -, em Portugal e na UE vai ter em consideração que não é possível esquecer o
dever de formação. É preciso somar à prevenção do branqueamento de vantagens, como
capitais, os ilícitos criminais e os ilícitos contraordenacionais que constam da Lei do
Branqueamento. Embora, neste último caso, ainda não de todos os ilícitos
contraordenacionais. O que, na devida altura, iremos completar. E isto é devido a um
problema nesta legislação, como noutras: o seu tamanho cada vez maior. Neste texto são
todavia abordados problemas essenciais da parte geral dos ilícitos contraordenacionais.
Parte indispensável para a boa compreensão anotada desta legislação.
Palavras-chave: lavagem de dinheiro; branqueamento de capitais; direito penal
económico; regime sancionatório; crimes e contraordenações
Abstract: this first approach to the sanctioning regime of the legislation that prevents
laundering of advantages, such as money – money laundering such as capital, in Portugal
and the EU will take into account that it is not possible to forget the duty of training. It is
necessary to add to the prevention of the laundering of advantages, such as capital, criminal

1
União Europeia.
2
Este texto surge na sequência de, BANDEIRA, Gonçalo S. de Melo, Primeiras Notas à Legislação da
Lavagem de Capitais em Portugal-UE: O Dever de Formação, Revista Internacional CONSINTER de
Direito, Publicação Oficial Semestral do Conselho Internacional de Estudos Contemporâneos em Pós-
Graduação, Ano V – n. IX, 2º Semestre de 2019, Estudos Contemporâneos, Porto e Curitiba, 2019, pp.
727-748.
3
European Union.
4
Professor na Escola Superior de Gestão do IPCA-Minho, Portugal. Prof.-Conv. v.g. em diversas aulas em
Mestrados nas Universidades do Porto e Minho. Investigador Integrado no JusGov-Research Centre for
Justice and Governance, Escola de Direito da Universidade do Minho. Doutor em Ciências Jurídico-
Criminais desde 2009 e Licenciado pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra. Mestre pela
Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa desde 2003. Membro Eleito da Comissão de
Fiscalização e Disciplina do Sindicato Nacional do Ensino Superior. E-mail: gsopasdemelo
bandeira@hotmail.com Facebook: Gonçalo S. De Mello Bandeira (N.C. Sopas).

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 451


Gonçalo S. de Melo Bandeira

offenses and counter-administrative offenses contained in the Law of Laundering.


Although, in the latter case, not yet of all illegal administrative offenses. Which, in due
course, we will complete. This is due to a problem in this legislation, as in others: its
increasing size. In this text, however, essential problems of the general part of the
administrative offenses are addressed. Indispensable part for the good understanding noted
of this legislation.
Keywords: money laundry; money laundering; economic criminal law; sanctioning
regime; crimes and administrativ offenses
Sumário: 1. Objectivos, metodologia e pré-introdução. 2. Introdução. 3. O bem jurídico do
ilícito penal do branqueamento e a interpretação da e na criminalização; as definições da
LB-lei do branqueamento; o dever de formação na LB-lei do branqueamento. 4. O regime
sancionatório na LB-lei do branqueamento-ilícitos criminais. 5. O regime sancionatório na
LB-lei do branqueamento-ilícitos contraordenacionais, “parte geral”. 6. Conclusões.
Bibliografia.

1 OBJECTIVOS, METODOLOGIA E PRÉ-INTRODUÇÃO


Os objectivos continuam, de novo, a estar concentrados na protecção da
confiança na “origem lícita de determinados factos”, sempre num universo de
Sociedade Democrática – CEDH, Convenção Europeia dos Direitos “do Homem”-
Humanos – como orientação decisiva do próprio Estado de Direito, livre e
verdadeiro. Neste sentido, não afectando a protecção, quer da “paz pública”, quer da
“realização da justiça”, tendo também em consideração o princípio da legalidade
que está consagrado no código penal português e na respectiva “secção” na qual se
enquadra a presente criminalização lusitana do crime de “branqueamento”5.

5
Cfr. art. 368º/A do CP-Código Penal na versão da Lei 83/2017, de 18/8: “1 – Para efeitos do disposto nos
números seguintes, consideram-se vantagens os bens provenientes da prática, sob qualquer forma de
comparticipação, dos factos ilícitos típicos de lenocínio, abuso sexual de crianças ou de menores
dependentes, extorsão, tráfico de estupefacientes e substâncias psicotrópicas, tráfico de armas, tráfico de
órgãos ou tecidos humanos, tráfico de espécies protegidas, fraude fiscal, tráfico de influência, corrupção e
demais infrações referidas no n. 1 do art. 1.º da Lei 36/1994, de 29 de setembro, e no art. 324.º do Código da
Propriedade Industrial, e dos factos ilícitos típicos puníveis com pena de prisão de duração mínima superior
a seis meses ou de duração máxima superior a cinco anos, assim como os bens que com eles se obtenham. /
2 – Quem converter, transferir, auxiliar ou facilitar alguma operação de conversão ou transferência de
vantagens, obtidas por si ou por terceiro, directa ou indirectamente, com o fim de dissimular a sua origem
ilícita, ou de evitar que o autor ou participante dessas infracções seja criminalmente perseguido ou
submetido a uma reacção criminal, é punido com pena de prisão de dois a doze anos. / 3 – Na mesma pena
incorre quem ocultar ou dissimular a verdadeira natureza, origem, localização, disposição, movimentação
ou titularidade das vantagens, ou os direitos a ela relativos. / 4 – A punição pelos crimes previstos nos n.os 2
e 3 tem lugar ainda que se ignore o local da prática do facto ou a identidade dos seus autores, ou ainda que
os factos que integram a infração subjacente tenham sido praticados fora do território nacional, salvo se se
tratar de factos lícitos perante a lei do local onde foram praticados e aos quais não seja aplicável a lei
portuguesa nos termos do art. 5.º / 5 – O facto é punível ainda que o procedimento criminal relativo aos
factos ilícitos típicos de onde provêm as vantagens depender de queixa e esta não tiver sido apresentada. / 6
– A pena prevista nos n.os 2 e 3 é agravada de um terço se o agente praticar as condutas de forma habitual. /
7 – Quando tiver lugar a reparação integral do dano causado ao ofendido pelo facto ilícito típico de cuja
prática provêm as vantagens, sem dano ilegítimo de terceiro, até ao início da audiência de julgamento em 1.ª
instância, a pena é especialmente atenuada. / 8 – Verificados os requisitos previstos no número anterior, a
pena pode ser especialmente atenuada se a reparação for parcial. / 9 – A pena pode ser especialmente

452 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Segundas Notas à Legislação da Lavagem de Capitais em Portugal-EU

Criminalização, portanto, que tutela um bem jurídico poliédrico. Como em


situações pretéritas, a metodologia a ser perseguida centraliza-se numa certa
investigação comparativa maxime dogmática e doutrinal6, legal7, mas
igualmente, ainda que brevitatis causa, jurisprudencial8, que podemos analisar

atenuada se o agente auxiliar concretamente na recolha das provas decisivas para a identificação ou a
captura dos responsáveis pela prática dos factos ilícitos típicos de onde provêm as vantagens. / 10 – A pena
aplicada nos termos dos números anteriores não pode ser superior ao limite máximo da pena mais elevada
de entre as previstas para os factos ilícitos típicos de onde provêm as vantagens”.
6
BANDEIRA, G. S. de Melo, O Crime de “Branqueamento” e a Criminalidade Organizada no Ordenamento
Jurídico Português no contexto da União Europeia: novos desenvolvimentos e novas conclusões. In:
AA.VV., Coordenação de NASCIMENTO SILVA, Luciano; BANDEIRA, Gonçalo N.C. Sopas de Melo.
Lavagem de Dinheiro e Injusto Penal – Análise Dogmática e Doutrina Comparada Luso-Brasileira.
Curitiba: Juruá, Disponível em: <www.jurua.com.br>, 2009; bem como, versão portuguesa, O Crime de
“Branqueamento” e a Criminalidade Organizada no Ordenamento Jurídico Português no contexto da União
Europeia… Lisboa, 2010, pp. 563-574 e passim; BANDEIRA, G.S. de Melo / FACHIN, Z.A.,
Responsabilidade Criminal por Dinheiros Públicos, Branqueamento de Capitais/Lavagem de Dinheiro e
Direitos Sociais, Revista Internacional CONSINTER, Ano I – v. I § Direito e Justiça § Aspectos Atuais e
Problemáticos, Juruá, Curitiba, I Simpósio Congresso Internacional do CONSINTER, 6 e 8.10.2015,
Facultat de Dret da Universitat de Barcelona, Curitiba-Barcelona, passim; BANDEIRA, G.S. de Melo,
Criminalidade Económica e Lavagem de Dinheiro, Prevenção pela Aprendizagem, Revista Internacional
CONSINTER de Direito, Ano II, N. 2, Efetividade do Direito, 1º Semestre, Juruá, Curitiba-Lisboa, 2016,
pp. 15 e ss.; BANDEIRA, G.S. de Melo, Directiva (UE) 2015/849 do Parlamento Europeu e do Conselho
de 20.05.2015: a Prevenção do Branqueamento de Capitais e do Financiamento do Terrorismo e o Sistema
Financeiro Capitalista, Direito e Justiça, Juruá, 2016, pp. 129 e ss..
7
No caso português, cfr. o art. 11º do Código Penal, bem como, fruto de Portugal ser país membro da UE-
União Europeia, a LB-Lei 83/2017 de 18/8, a qual “Estabelece medidas de combate ao branqueamento de
capitais e ao financiamento do terrorismo, transpõe parcialmente as Diretivas 2015/849/UE, do
Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de maio de 2015, e 2016/2258/UE, do Conselho, de 6 de
dezembro de 2016, altera o Código Penal e o Código da Propriedade Industrial e revoga a Lei 25/2008, de
5 de junho, e o Dec.-Lei 125/2008, de 21 de julho”. Mais uma vez o equívoco permanece, pois o direito
penal não visa em Portugal o “combate”, mas sim as prevenções geral e especial positivas, a retribuição e a
justiça restaurativa, quando neste último caso, é possível: art. 18º da CRP-Constituição.
8
Em Portugal, é inevitável a referência ao Ac. do STJ de Fixação de Jurisprudência 13/2007, de 22.03.2007,
publicado no Diário da República, Série II, de 13.12.2007: “Na vigência do art. 23.º do Dec.-Lei 15/93, de
22 de Janeiro, o agente do crime previsto e punido pelo art. 21.º, n. 1, do mesmo diploma, cuja conduta
posterior preenchesse o tipo de ilícito da alínea a) do seu n. 1, cometeria os dois crimes, em concurso real”.
Assim como: o Ac. do STJ de 18.01.2017 (http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f
003fa814/fd707bf601a023798025824b0057be35?OpenDocument , 14.08.20); e o Ac. do STJ de 15 de
Fevereiro de 2017 (http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9d d8b980256b5f003fa814/3a86a12603906aa0
8025824a004a9e98?OpenDocument , 14.08.20). Acrescentando ao texto anterior, também devemos referir
a seguinte jurisprudência que tem relevância no ordenamento jurídico português: Ac. do Tribunal da
Relação de Lisboa, de 18.07.20 (http://www.dgsi. pt/jtrl.nsf/33182fc732 316039802565fa00497ee
c/801de67a309357758 0257be9003309a 3?OpenDocument , 14.08.20); Ac. do STJ, de 8.01.2014
(http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/9 54f0ce6ad9dd8b9802 56b5f00 3fa81 4/a7 ea6ac09e68eeac80257c82004b4
600?OpenDocument&Highlight=0,corrup/prct .C3/pr ct. A 7/pr ct.C3/prct.A3o,crime,precedente ,
14.08.20); Ac. do Tribunal da Relação do Porto, de 21.06.2017 (http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e71216
57f91e80257cda00381fdf/4f6dd155fdd56d2b80258152003847fa?OpenDocument , 14.08.20); Ac. do
Tribunal da Relação do Lisboa, de 6.06.2017 (http://www.dgsi.pt /jtrl.nsf/33182fc7323160398025
65fa00497eec/2426087866527eed80258147003818ea?OpenDocument , 14.08.20); Ac. do STJ, de
11.06.2014 (http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/e226 52275680718b80257d1
5004292f6?OpenDocument , 14.08.20).

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 453


Gonçalo S. de Melo Bandeira

sobre a matéria, como v.g., em países como Portugal e em toda a UE-União


Europeia, a qual é neste momento em que escrevemos composta por 27 países,
com a recente saída do Reino Unido9. Por fim, mas não por último, não podemos
esquecer que no crime de “branqueamento” ou “lavagem” de v.g dinheiro, como
refere a própria jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça Português, “O
grande patrão do crime pode ser um cidadão respeitável, de peito medalhado,
amigo do rei. Manda meter cheques na conta bancária e sereias na cama de
nababos e poderosos. Chantageia e corrompe o mais Catão”10.

2 INTRODUÇÃO
De acordo com textos anteriores, já sabemos que a Lei portuguesa 83/2017,
de 18 de Agosto, que vamos abreviar por LB-Lei do Branqueamento, “estabelece
medidas de natureza preventiva e repressiva de combate ao branqueamento de
capitais e ao financiamento do terrorismo e transpõe parcialmente para a ordem
jurídica interna a Diretiva 2015/849/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de
20 de maio de 2015, relativa à prevenção da utilização do sistema financeiro e das
atividades e profissões especialmente designadas para efeitos de branqueamento de
capitais e de financiamento do terrorismo, bem como, a Diretiva 2016/2258/UE, do
Conselho, de 6 de dezembro de 2016, que altera a Diretiva 2011/16/UE, no que
respeita ao acesso às informações antibranqueamento de capitais por parte das
autoridades fiscais. 2 – A presente lei estabelece, também, as medidas nacionais
necessárias à efetiva aplicação do Regulamento (UE) 2015/847, do Parlamento
Europeu e do Conselho, de 20 de maio de 2015, relativo às informações que
acompanham as transferências de fundos e que revoga o Regulamento (CE)
1781/2006 [adiante designado “Regulamento (UE) 2015/847”]”. Entretanto esta lei
foi ligeiramente alterada pelo Dec.-Lei 144/2019, de 23 de Setembro11.

9
Embora, “UE mantém “sérias divergências” com Reino Unido e pede “compromisso” / O regresso à mesa
das negociações não resultou no impulso final com vista a um acordo entre Bruxelas e Londres sobre a
futura relação bilateral. Barnier fala em “sérias divergências” persistentes, reitera as linhas vermelhas da
União e pede “compromisso” às autoridades do Reino Unido”, https://www.jornalde
negocios.pt/economia/europa/uniao-europeia/detalhe/ue-mantem-serias-divergencias-com-reino-uni
do-e-pede-compromisso .
10
Cfr. Ac. do STJ, de 11.06.2014.
11
O qual refere o seguinte: “Art. 9.º / Alteração à Lei 83/2017, de 18 de agosto / O art. 3.º da Lei 83/2017, de
18 de agosto, passa a ter a seguinte redação: “Art. 3.º / Entidades financeiras / 1- Estão sujeitas às
disposições da presente lei, com exceção do disposto no capítulo XI, as seguintes entidades com sede em
território nacional: (…) “e) Sociedades de investimento coletivo autogeridas e sociedades gestoras de
organismos de investimento coletivo;”.

454 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Segundas Notas à Legislação da Lavagem de Capitais em Portugal-EU

3 O BEM JURÍDICO DO ILÍCITO PENAL DO BRANQUEAMENTO E A


INTERPRETAÇÃO DA E NA CRIMINALIZAÇÃO; AS DEFINIÇÕES
DA LB-LEI DO BRANQUEAMENTO; O DEVER DE FORMAÇÃO NA
LB-LEI DO BRANQUEAMENTO
Sobre o recortar dos contornos do “bem jurídico” do crime de branqueamento
no ordenamento jurídico português, bem como sobre as definições e dever de
formação na LB-Lei do Branqueamento, os quais têm que estar sempre presentes no
contexto em que dissertamos, remetemos para um outro texto nosso12.

4 O REGIME SANCIONATÓRIO NA LB-LEI DO BRANQUEAMENTO-


-ILÍCITOS CRIMINAIS
De acordo com o art. 157º da LB, “Divulgação ilegítima de informação”, “1
– A divulgação ilegítima, a clientes ou a terceiros, das informações, das
comunicações, das análises ou de quaisquer outros elementos previstos nas alíneas
a) a d) do n. 1 do art. 54.º da presente lei e no art. 14.º do Regulamento (UE)
2015/847, é punida: / a) No caso das pessoas singulares, com pena de prisão até
três anos ou com pena de multa, nos termos gerais; / b) No caso das pessoas
coletivas ou entidades equiparadas a pessoas coletivas, com pena de multa com um
limite mínimo não inferior a 50 dias. / 2 – Em caso de mera negligência, a pena
prevista na alínea a) do número anterior é reduzida a 1/3 no seu limite máximo”13.

12
BANDEIRA, Gonçalo S. de Melo, Primeiras Notas à Legislação da Lavagem de Capitais em Portugal-UE:
O Dever de Formação, Revista Internacional CONSINTER de Direito, Publicação Oficial Semestral do
Conselho Internacional de Estudos Contemporâneos em Pós-Graduação, Ano V – n. IX, 2º Semestre de
2019, Estudos Contemporâneos, Porto e Curitiba, 2019, pp. 727-748. Sobre o tema do dever de formação
neste contexto, já antes, BANDEIRA, G.S. de Melo, Criminalidade Económica e Lavagem de Dinheiro,
Prevenção pela Aprendizagem, Revista Internacional CONSINTER de Direito, Ano II, N. 2, Efetividade do
Direito, 1º Semestre, Juruá, Curitiba-Lisboa, 2016, pp. 15 e ss.;
13
Cfr. o art. 54º/1 da LB-Lei do Branqueamento: “Dever de não divulgação / 1 – As entidades obrigadas, bem
como os membros dos respetivos órgãos sociais, os que nelas exerçam funções de direção, de gerência ou
de chefia, os seus empregados, os mandatários e outras pessoas que lhes prestem serviço a título
permanente, temporário ou ocasional, não podem revelar ao cliente ou a terceiros: / a) Que foram, estão a
ser ou irão ser transmitidas as comunicações legalmente devidas, nos termos do disposto nos arts. 43.º, 45.º,
47.º e 53.º; / b) Quaisquer informações relacionadas com aquelas comunicações, independentemente de as
mesmas decorrerem de análises internas da entidade obrigada ou de pedidos efetuados pelas autoridades
judiciárias, policiais ou setoriais; / c) Que se encontra ou possa vir a encontrar-se em curso uma investigação
ou inquérito criminal, bem como quaisquer outras investigações, inquéritos, averiguações, análises ou
procedimentos legais a conduzir pelas autoridades referidas na alínea anterior; / d) Quaisquer outras
informações ou análises, de foro ou interno ou externo, sempre que disso dependa: / i) O cabal exercício das
funções conferidas pela presente lei às entidades obrigadas e às autoridades judiciárias, policiais e setoriais; /
ii) A preservação de quaisquer investigações, inquéritos, averiguações, análises ou procedimentos legais e,
no geral, a prevenção, investigação e deteção do branqueamento de capitais e do financiamento do
terrorismo”. Refere o art. 14º do Regulamento (UE) 2015/847, “Prestação de informações”: “Os prestadores
de serviços de pagamento dão uma resposta completa e sem demora, nomeadamente através de um ponto
de contacto central nos termos do art. 45.o, n.o 9, da Diretiva (UE) 2015/849, caso esse ponto de contacto
tenha sido nomeado, e em conformidade com os requisitos processuais previstos no direito nacional do
Estado-Membro em que estão estabelecidos, aos pedidos apresentados exclusivamente pelas autoridades

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 455


Gonçalo S. de Melo Bandeira

Está portanto aqui em causa o bem jurídico da tutela da informação não consentida
no contexto do diploma legislativo. É assim punível o dolo nas suas três modalidades:
directo, necessário e eventual, bem como a negligência consciente ou inconsciente14.
De acordo com o art. 158º da LB, “Revelação e favorecimento da descoberta de
identidade”, “1 – A revelação ou o favorecimento da descoberta da identidade de quem
forneceu informações, documentos ou elementos ao abrigo dos arts. 43.º a 45.º, 47.º e
53.º da presente lei ou do Regulamento (UE) 2015/847, é punida: / a) No caso
das pessoas singulares, com pena de prisão até três anos ou com pena de multa, nos
termos gerais; / b) No caso das pessoas coletivas ou entidades equiparadas a pessoas
coletivas, com pena de multa com um limite mínimo não inferior a 50 dias. / 2 – Em caso
de mera negligência, a pena prevista na alínea a) do número anterior é reduzida a 1/3
no seu limite Máximo”. Verifica-se, pois, uma tutela do bem jurídico que poderemos
apelidar de descoberta da identidade nos termos supramencionados. Igualmente aqui é
punível o dolo nas suas três modalidades: directo, necessário e eventual, bem como a
negligência consciente ou inconsciente15.
Já o art. 159º da LB nos fala no crime de “Desobediência”, “1 – Quem se
recusar a acatar as ordens ou os mandados legítimos das autoridades setoriais,
emanados no âmbito das suas funções, ou criar, por qualquer forma, obstáculos à
sua execução, incorre na pena prevista para o crime de desobediência qualificada,
se as autoridades setoriais tiverem feito a advertência dessa cominação. / 2 – Na
mesma pena incorre quem não cumprir, dificultar ou defraudar a execução das
sanções acessórias ou medidas cautelares aplicadas em procedimentos instaurados
por violação das disposições da presente lei ou dos respetivos diplomas
regulamentares”. Crime que vem de encontro aquilo que já existe em termos mais
gerais no Código Penal Português16. Estão em causa os crimes contra o bem jurídico
autoridade pública, rectius, num ambiente de “resistência, desobediência e falsas
declarações à autoridade pública”, nos termos mais generalistas do Código Penal.
Cremos que no futuro, feita uma grande reforma de uniformização – pois o excesso
de especialização perde a noção do total real, “estupidifica a ovelha que não se
consegue aperceber por vezes do verdadeiro rumo do rebanho a que pertence”,
levando à corrupção do “Espírito da História” de que nos falava Georg Wilhelm
Friedrich Hegel -, para evitar interpretações cada vez mais diversas, não haverá
necessidade de estar a repetir ilícitos típicos demasiado similares em diferentes
diplomas legislativos.

desse Estado-Membro responsáveis pela prevenção e pelo combate ao branqueamento de capitais ou ao


financiamento do terrorismo, relativamente às informações exigidas ao abrigo do presente regulamento”.
14
Cfr. art.s 13º, 14º e 15º do Código Penal.
15
Cfr. art.s 13º, 14º e 15º do Código Penal.
16
Cfr. art. 348º do Código Penal.

456 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Segundas Notas à Legislação da Lavagem de Capitais em Portugal-EU

5 O REGIME SANCIONATÓRIO NA LB-LEI DO BRANQUEAMENTO-


ILÍCITOS CONTRAORDENACIONAIS, “PARTE GERAL”
A LB-Lei do Branqueamento procura neste contexto criar uma “parte geral
para os ilícitos contraordenacionais”. O que, no mínimo, entra em conflito
interpretativo com o já existente no ordenamento jurídico português, i.e., o RGCO-
Regime Geral das Contraordenações17. Não deixando de lembrar que, em face das
lacunas do RGCO, se aplicam, quer as normas do Código Penal, quer os Princípios
Processuais Penais e, portanto, incluindo o Código de Processo Penal e, claro está, o
próprio Código de Processo Civil18. Pelo que, é necessário destacar aqui as seguintes
normas jurídicas: art. 160º da LB: “Aplicação no espaço / O disposto na presente
secção é aplicável, independentemente da nacionalidade do agente, aos seguintes
factos que constituam infração à lei portuguesa: / a) Factos praticados em território
português; / b) Factos praticados fora do território nacional pelos quais sejam
responsáveis as entidades referidas nos arts. 3.º, 4.º e 6.º, atuando por intermédio de
sucursais, agentes ou distribuidores ou em regime de prestação de serviços, bem
como as pessoas que, em relação a tais entidades, se encontrem em alguma das
situações previstas no n. 1 do art. 163.º; c) Factos praticados a bordo de navios ou
aeronaves portuguesas, salvo tratado ou convenção em contrário”19.
Já o art. 161º da LB prescreve a “Responsabilidade / 1 – Pela prática das
contraordenações previstas na presente secção podem ser responsabilizadas,
conjuntamente ou não, pessoas singulares, pessoas coletivas, ainda que
irregularmente constituídas, e associações sem personalidade jurídica. / 2 – É
responsável como autor das contraordenações previstas na presente lei todo aquele
que, por ação ou omissão, contribuir causalmente para a sua produção”. É caso
para dizer ao legislador: obrigados! Mas, na realidade, cremos que o mencionado no
art. 161º da LB não acrescenta nada à questão da “responsabilidade”, quer ao
RGCO, quer ao Código Penal, o qual se aplica subsidiariamente. De contrário,
teríamos um CP ou RGCO profundamente incompleto e, portanto, em desacordo
com a própria Constituição-Constitucional.
O art. 162º da LB prevê a “Responsabilidade das pessoas coletivas e das
entidades equiparadas”: “1 – As pessoas coletivas e as entidades equiparadas a
pessoas coletivas são responsáveis pelas contraordenações cometidas pelas pessoas
singulares que sejam titulares de funções de administração, gerência, direção,
chefia ou fiscalização, representantes, trabalhadores ou demais colaboradores,

17
Cfr. Dec.-Lei 433/82, de 27 de Outubro, com alterações até a Lei 109/2001, de 24 de Dezembro.
18
Cfr. art. 32º e art. 41º do RGCO.
19
O que tem que ser conjugado com o art. 368º/A, n. 4 e 5 do Código Penal: “4 – A punição pelos crimes
previstos nos n.os 2 e 3 tem lugar ainda que se ignore o local da prática do facto ou a identidade dos seus
autores, ou ainda que os factos que integram a infração subjacente tenham sido praticados fora do território
nacional, salvo se se tratar de factos lícitos perante a lei do local onde foram praticados e aos quais não seja
aplicável a lei portuguesa nos termos do art. 5.º / 5 – O facto é punível ainda que o procedimento criminal
relativo aos factos ilícitos típicos de onde provêm as vantagens depender de queixa e esta não tiver sido
apresentada”.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 457


Gonçalo S. de Melo Bandeira

permanentes ou ocasionais, quando estas atuem no exercício das suas funções ou


em nome e no interesse do ente coletivo. / 2 – A responsabilidade da pessoa coletiva
ou entidade equiparada a pessoa coletiva apenas é excluída quando o agente atue
contra ordens ou instruções expressas daquela. / 3 – A invalidade e a ineficácia
jurídicas dos atos em que se funde a relação entre o agente individual e a pessoa
coletiva ou entidade equiparada a pessoa coletiva não obstam à responsabilidade
de nenhum deles”. Neste contexto, como seria de esperar, surgem alguns problemas
de interpretação e aplicação da legislação em vigor. E isto porque – como já
referimos em outras publicações20 -, os modelos de imputação da responsabilidade
penal e/ou contraordenacional que o legislador português tem consagrado no
ordenamento jurídico português diferem de legislação para legislação. O que
provoca uma inadmissível dificuldade interpretativa levando alguns intérpretes e
aplicadores a violarem sistematicamente o princípio da legalidade e, antes mesmo
disso, a teoria da interpretação consagrada no art. 9º do Código Civil português.
Uma norma constitucional fora da Constituição21. Se houver dúvidas, compare-se o
art. 162º da LB com v.g. o art. 11º do Código Penal22, ou com o art. 7º do RGCO23,
20
V.g. BANDEIRA, G. S. de Melo, Responsabilidade Penal Económica e Fiscal dos Entes Colectivos…,
2004, passim; BANDEIRA, Gonçalo S. de Melo, Abuso de Informação, Manipulação do Mercado e
Responsabilidade Penal das “Pessoas Colectivas”…, 2011/2016 (5ª tiragem), passim; BANDEIRA,
Gonçalo S. de Melo, Responsabilidade Penal e Contraordenacional das Organizações Colectivas, Boletim
da Faculdade de Direito…, 2017, pp. 129-148.
21
BANDEIRA, Gonçalo S. de Melo, Primeiras Notas à Legislação da Lavagem de Capitais em Portugal-UE:
O Dever de Formação, Revista Internacional CONSINTER de Direito…, 2019, pp. 727-748.
22
Art. 11º do CP: “Responsabilidade das pessoas singulares e coletivas”, “1 – Salvo o disposto no número
seguinte e nos casos especialmente previstos na lei, só as pessoas singulares são susceptíveis de
responsabilidade criminal. / 2 – As pessoas coletivas e entidades equiparadas, com exceção do Estado, de
pessoas coletivas no exercício de prerrogativas de poder público e de organizações de direito internacional
público, são responsáveis pelos crimes previstos nos arts. 144.º-B, 152.º-A, 152.º-B, 159.º e 160.º, nos arts.
163.º a 166.º sendo a vítima menor, e nos arts. 168.º, 169.º, 171.º a 176.º, 217.º a 222.º, 240.º, 256.º, 258.º,
262.º a 283.º, 285,º 299.º, 335.º, 348.º, 353.º, 363.º, 367.º, 368.º-A e 372.º a 376.º, quando cometidos: / a)
Em seu nome e no interesse colectivo por pessoas que nelas ocupem uma posição de liderança; ou / b) Por
quem aja sob a autoridade das pessoas referidas na alínea anterior em virtude de uma violação dos deveres
de vigilância ou controlo que lhes incumbem. / 3 – (Revogado.) / 4 – Entende-se que ocupam uma posição
de liderança os órgãos e representantes da pessoa colectiva e quem nela tiver autoridade para exercer o
controlo da sua actividade. / 5 – Para efeitos de responsabilidade criminal consideram-se entidades
equiparadas a pessoas colectivas as sociedades civis e as associações de facto. / 6 – A responsabilidade das
pessoas colectivas e entidades equiparadas é excluída quando o agente tiver actuado contra ordens ou
instruções expressas de quem de direito. / 7 – A responsabilidade das pessoas colectivas e entidades
equiparadas não exclui a responsabilidade individual dos respectivos agentes nem depende da
responsabilização destes. / 8 – A cisão e a fusão não determinam a extinção da responsabilidade criminal da
pessoa colectiva ou entidade equiparada, respondendo pela prática do crime: / a) A pessoa colectiva ou
entidade equiparada em que a fusão se tiver efectivado; e / b) As pessoas colectivas ou entidades
equiparadas que resultaram da cisão. / 9 – Sem prejuízo do direito de regresso, as pessoas que ocupem uma
posição de liderança são subsidiariamente responsáveis pelo pagamento das multas e indemnizações em que
a pessoa colectiva ou entidade equiparada for condenada, relativamente aos crimes: / a) Praticados no
período de exercício do seu cargo, sem a sua oposição expressa; / b) Praticados anteriormente, quando tiver
sido por culpa sua que o património da pessoa colectiva ou entidade equiparada se tornou insuficiente para o
respectivo pagamento; ou / c) Praticados anteriormente, quando a decisão definitiva de as aplicar tiver sido
notificada durante o período de exercício do seu cargo e lhes seja imputável a falta de pagamento. / 10 –

458 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Segundas Notas à Legislação da Lavagem de Capitais em Portugal-EU

ou com o art. 7º do RGIT-Regime Geral das Infracções Tributárias24, ou com o art.


3º do RJIAECSP-Regime Jurídico das Infracções Anti-Económicas e Contra a
Saúde Pública25, ou com o art. 401º do CdVM-Código dos Valores Mobiliários26 ou

Sendo várias as pessoas responsáveis nos termos do número anterior, é solidária a sua responsabilidade. / 11
– Se as multas ou indemnizações forem aplicadas a uma entidade sem personalidade jurídica, responde por
elas o património comum e, na sua falta ou insuficiência, solidariamente, o património de cada um dos
associados”.
23
Art. 7º do RGCO-Regime Geral das Contraordenações: “Da responsabilidade das pessoas coletivas ou
equiparadas”, “1 – As coimas podem aplicar-se tanto às pessoas singulares como às pessoas colectivas, bem
como às associações sem personalidade jurídica. / 2 – As pessoas colectivas ou equiparadas serão
responsáveis pelas contra-ordenações praticadas pelos seus órgãos no exercício das suas funções”.
24
Art. 7º do RGIT: “Responsabilidade das pessoas colectivas e equiparadas”, “1 – As pessoas colectivas,
sociedades, ainda que irregularmente constituídas, e outras entidades fiscalmente equiparadas são
responsáveis pelas infracções previstas na presente lei quando cometidas pelos seus órgãos ou
representantes, em seu nome e no interesse colectivo. / 2 – A responsabilidade das pessoas colectivas,
sociedades, ainda que irregularmente constituídas, e outras entidades fiscalmente equiparadas é excluída
quando o agente tiver actuado contra ordens ou instruções expressas de quem de direito. / 3 – A
responsabilidade criminal das entidades referidas no n. 1 não exclui a responsabilidade individual dos
respectivos agentes. / 4 – A responsabilidade contra-ordenacional das entidades referidas no n. 1 exclui a
responsabilidade individual dos respectivos agentes. / 5 – Se a multa ou coima for aplicada a uma entidade
sem personalidade jurídica, responde por ela o património comum e, na sua falta ou insuficiência,
solidariamente, o património de cada um dos associados”. Em relação a esta norma jurídica, devemos ter
em consideração a seguinte jurisprudência no seio do ordenamento jurídico português: Ac. do Tribunal da
Relação do Porto, de 8 de Maio de 2013 (http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/c3fb530030ea1c61802568d9005
cd5bb/3b820682ae38333280257b6b003a8506?OpenDocument&Highlight=0,RGIT , 14.08.20); Ac. do
Tribunal da Relação do Porto, de 20 de Fevereiro de 2013 (http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/c3fb53003
0ea1c61802568d9005cd5bb/63f9d955491708f780257b36005920c4?OpenDocument&Highlight=0,RGIT ,
14.08.20); Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa, de 8 de Maio de 2013 (http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/3
3182fc732316039802565fa00497eec/8a458eb6071edba280257c2e0058dd75?OpenDocument&Highlight=
0,RGIT , 14.08.20); Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa, de 17 de Abril de 2013 (http://www.dgsi.
pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/087761db9a39c54680257b8200399916?OpenDocument
&Highlight=0,RGIT , 14.08.20); Ac. do Tribunal da Relação de Coimbra, de 14 de Outubro de 2015
(http://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/8fe0e606d8f56b22802576c0005637dc/78282e5232db6de180257ee40037b124
?OpenDocument, 14.08.20); Ac. do Tribunal da Relação de Coimbra, de 11 de Outubro de 2017
(http://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/8fe0e606d8f56b22802576c0005637dc/d1f7e72a5357c5da802581bb0053c6f4?
OpenDocument , 14.08.20); Ac. do Tribunal Constitucional 636/2018, de 22 de Novembro de 2018
(http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20180636.html?impressao=1 , 14.08.20). Neste último
Acórdão do Tribunal Constitucional, destacámos a declaração de inconstitucionalidade pela segunda vez do
n. 5 do art. 7º do RGIT, referindo-se nomeadamente em relação aos nossos próprios trabalhos o seguinte,
entre outros aspectos: “Centrando a atenção nos entes societários de índole comercial desprovidos de
personalidade jurídica geral aqueles que relevam para o presente recurso -, verifica-se que o RGIT visa
especialmente as sociedades com atividade antes da celebração de escritura pública, seja com a criação de
falsa aparência de que existe um contrato de sociedade, seja com a efetiva celebração de acordo de
constituição, nos termos do art. 36.º, n.ºs 1 e 2 do CSC, e as sociedades com celebração de escritura pública
mas com atividade antes do registo, referidas no art. 37.º, n. 1 do CSC (nesse sentido, Gonçalo de Melo
Bandeira, “Responsabilidade” Penal Económica e Fiscal dos Entes Coletivos À Volta das Sociedades
Comerciais e Sociedades Civis sob a Forma Comercial, Almedina, p. 351)”.
25
Cfr. art. 3º do RJIAECSP: “Responsabilidade criminal das pessoas colectivas e equiparadas”, “1 – As
pessoas colectivas, sociedades e meras associações de facto são responsáveis pelas infracções previstas no
presente diploma quando cometidas pelos seus órgãos ou representantes em seu nome e no interesse
colectivo. / 2 – A responsabilidade é excluída quando o agente tiver actuado contra ordens ou instruções

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 459


Gonçalo S. de Melo Bandeira

com o art. 73º do RJC-Regime Jurídico da Concorrência27, entre outros! Se nuns


casos as redacções se assemelham, noutros casos são completamente diferentes,
criando a confusão total na interpretação e aplicação da lei. Recordamos um

expressas de quem de direito. / 3 – A responsabilidade das entidades referidas no n. 1 não exclui a


responsabilidade individual dos respectivos agentes, sendo aplicável, com as necessárias adaptações, o n. 3
do artigo anterior”. Na realidade, esta “responsabilidade criminal” também é “responsabilidade
contraordenacional”. Salvo se se defender a tese de que a responsabilidade criminal em sentido amplo inclui
a responsabilidade contraordenacional. E aí, a perspectiva estaria correcta do nosso ponto de vista.
26
Cfr. art. 401º do CdVM: “Responsabilidade pelas contraordenações”, “1 – Pela prática das
contraordenações previstas neste Código podem ser responsabilizadas pessoas singulares, pessoas coletivas,
independentemente da regularidade da sua constituição, sociedades e associações sem personalidade
jurídica. / 2 – As pessoas coletivas e as entidades que lhes são equiparadas no número anterior são
responsáveis pelas contraordenações previstas neste Código quando os factos tiverem sido praticados, no
exercício das respetivas funções ou em seu nome ou por sua conta, pelos titulares dos seus órgãos sociais,
mandatários, representantes ou trabalhadores. / 3 – A responsabilidade da pessoa coletiva é excluída quando
o agente atue contra ordens ou instruções concretas, individuais e expressas daquela, transmitidas ao agente,
por escrito, antes da prática do facto. / 4 – Os titulares do órgão de administração das pessoas coletivas e
entidades equiparadas, bem como os responsáveis pela direção ou fiscalização de áreas de atividade em que
seja praticada alguma contraordenação, incorrem na sanção prevista para o autor, especialmente atenuada,
quando, conhecendo ou devendo conhecer a prática da infração, não adotem as medidas adequadas para lhe
pôr termo imediatamente, a não ser que sanção mais grave lhe caiba por força de outra disposição legal. / 5
– A responsabilidade das pessoas coletivas e entidades equiparadas não exclui a responsabilidade individual
dos respetivos agentes”.
27
Cfr. art. 73º do RJC: “Responsabilidade”, “1 – Pela prática das contraordenações previstas na presente lei
podem ser responsabilizadas pessoas singulares, pessoas coletivas, independentemente da regularidade da
sua constituição, sociedades e associações sem personalidade jurídica. / 2 – As pessoas coletivas e as
entidades equiparadas referidas no número anterior respondem pelas contraordenações previstas na presente
lei, quando cometidas: / a) Em seu nome e no interesse coletivo por pessoas que nelas ocupem uma posição
de liderança; ou / b) Por quem atue sob a autoridade das pessoas referidas na alínea anterior em virtude de
uma violação dos deveres de vigilância ou controlo que lhes incumbem. / 3 – Entende-se que ocupam uma
posição de liderança os órgãos e representantes da pessoa coletiva e quem nela tiver autoridade para exercer
o controlo da sua atividade. / 4 – A fusão, a cisão e a transformação não determinam a extinção da
responsabilidade da pessoa coletiva ou entidade equiparada, respondendo pela prática da contraordenação: /
a) No caso de fusão, a pessoa coletiva ou entidade equiparada incorporante de outras ou a que resulte da
operação; / b) No caso de cisão, as pessoas coletivas ou entidades equiparadas que resultem da operação ou
que beneficiem de incorporações de património da sociedade cindida; / c) No caso de transformação, as
pessoas coletivas ou entidades equiparadas que resultem da operação. / 5 – No caso de extinção da pessoa
coletiva ou entidade equiparada, pelas coimas em que a mesma for condenada respondem os antigos bens
desta que tiverem sido adjudicados em partilha. / 6 – Os titulares do órgão de administração das pessoas
coletivas e entidades equiparadas, bem como os responsáveis pela direção ou fiscalização de áreas de
atividade em que seja praticada alguma contraordenação, incorrem na sanção cominada no n. 4 do art. 69.º,
quando atuem nos termos descritos na alínea a) do n. 2 ou quando, conhecendo ou devendo conhecer a
prática da infração, não adotem as medidas adequadas para lhe pôr termo imediatamente, a não ser que
sanção mais grave lhes caiba por força de outra disposição legal. / 7 – A responsabilidade das pessoas
coletivas e entidades equiparadas não exclui a responsabilidade individual de quaisquer pessoas singulares,
nem depende da responsabilização destas, nos casos de violação de deveres de colaboração. / 8 – As
empresas cujos representantes, ao tempo da infração, eram membros dos órgãos diretivos de uma
associação de empresas que seja objeto de uma coima ou de uma sanção pecuniária compulsória, nos
termos previstos nas alíneas a) a g) do n. 1 do art. 68.º, no n. 2 do art. 69.º e no artigo anterior, são
solidariamente responsáveis pelo pagamento da coima, exceto se, por escrito, tiverem lavrado a sua
oposição à decisão que constitui a infração ou da qual a mesma resultou”.

460 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Segundas Notas à Legislação da Lavagem de Capitais em Portugal-EU

determinado “professor catedrático” – cátedra da “manga de alpaca burocrática”


– que mais parece um aprendiz de direito penal ao estar sempre a dizer que “eu não
sou positivista”. Confundindo, de modo grave e irracional do ponto de vista das
ciências jurídicas, o seu próprio positivismo com o respeito pelos mínimos valores
constitucionais do princípio da legalidade criminal28. Ou, melhor dizendo,
convidando ao activismo judicial que violará o princípio da legalidade e a separação
original de poderes preconizada, entre outros, por Montesquieu: legislativo,
executivo e judicial. O que conspurca a consagração e aprofundamento do Estado de
Direito – espaço e tempo – democrático, social, livre e verdadeiro. Exemplo prático:
é mais fácil imputar, processualmente, a responsabilidade criminal por um crime de
branqueamento (lavagem no Brasil) a uma determinada empresa, sociedade
comercial (art. 11º do CP somado ao art. 368º/A do mesmo CP), do que imputar,
processualmente, a responsabilidade criminal por um crime de fraude fiscal (art. 7º
do RGIT somado ao art. 103º do mesmo RGIT). É que o nexo de imputação
consagrado no art. 11º do CP (pessoas com posição de liderança: órgãos e
representantes da pessoa colectiva e quem nela tiver autoridade para exercer o
controlo da sua actividade) é mais largo do que o nexo de imputação consagrado no
art. 7º do RGIT (órgãos ou representantes apenas)! Sendo que, por ironia, o crime de
fraude fiscal (simples ou qualificada), é um dos crimes que pode dar origem ao
crime de branqueamento previsto e punido no art. 368º/A do CP! A lógica da
interpretação e aplicação racionais jurídicas e científicas fica prejudicada.
Por outro lado, refere o art. 162º da LB, com o nosso negrito: “2 – A
responsabilidade da pessoa coletiva ou entidade equiparada a pessoa coletiva
apenas é excluída quando o agente atue contra ordens ou instruções expressas
daquela”. Ora, esta norma jurídica é p.e. similar à seguinte disposição legislativa,
entre muitas outras hipóteses que aqui poderiam ser vertidas: art. 11º/6 do Código
Penal, “A responsabilidade das pessoas colectivas e entidades equiparadas é
excluída quando o agente tiver actuado contra ordens ou instruções expressas de
quem de direito”. Mas a diferença irracional reside na palavra que colocámos acima
a negrito “apenas”! Refere o Código Penal inserido no Capítulo III, “Causas que
excluem a ilicitude e a culpa”, art. 31º, “Exclusão da ilicitude”: “1 – O facto não é
punível quando a sua ilicitude for excluída pela ordem jurídica considerada na sua
totalidade. / 2 – Nomeadamente, não é ilícito o facto praticado: / a) Em legítima
defesa; / b) No exercício de um direito; / c) No cumprimento de um dever imposto
por lei ou por ordem legítima da autoridade; ou / d) Com o consentimento do titular
do interesse jurídico lesado”: “nomeadamente”! Além do art. 21º da Constituição, o
“Direito de resistência”. Ou seja, em caso algum, em termos também
constitucionais, a responsabilidade da pessoa coletiva ou entidade equiparada a
pessoa coletiva “apenas” é excluída quando o agente atue contra ordens ou

28
Assim aconteceu no disparatado “Parecer n. 11/2013”, do Conselho Consultivo da Procuradoria Geral da
República, Ministério Público, Publicado no Diário da República, 2ª série, n. 178, de 16 de Setembro de
2013. Texto por nós anotado em BANDEIRA, Gonçalo S. de Melo, Responsabilidade Penal e
Contraordenacional das Organizações Colectivas, Boletim da Faculdade de Direito…, 2017, pp. 129-148.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 461


Gonçalo S. de Melo Bandeira

instruções expressas daquela. A responsabilidade da pessoa coletiva ou entidade


equiparada a pessoa coletiva também pode ser excluída que não apenas quando o
agente atue contra ordens ou instruções expressas daquela. Nomeadamente se
estiverem em causa outras causas que excluem a ilicitude ou a culpa, os quais,
portanto, não são taxativas. De contrário, estaríamos perante uma norma que violaria
não apenas o próprio Código Penal, como, claro está, a Constituição.
A esta grande confusão gerada por culpa exclusiva dos vários legisladores
portugueses vistos como um todo ao longo das décadas da nossa ainda jovem
democracia – desde o 25 de Abril de 1974, a acrescentar à Constituição de 25 de
Abril de 1976, com as suas, até agora, 7 Revisões -, temos a somar o art. 163º da
LB, “Responsabilidade das pessoas singulares”, “1 – A responsabilidade das
pessoas coletivas e entidades equiparadas a pessoas coletivas não exclui a
responsabilidade individual das pessoas singulares que sejam titulares de funções
de administração, gerência, direção, chefia ou fiscalização, representantes,
trabalhadores ou demais colaboradores, permanentes ou ocasionais. / 2 – Não
obsta à responsabilidade dos agentes individuais que representem outrem a
circunstância de a ilicitude ou o grau de ilicitude depender de certas qualidades ou
relações especiais do agente e estas só se verificarem na pessoa do representado, ou
de requerer que o agente pratique o ato no seu próprio interesse, tendo o
representante atuado no interesse do representado. / 3 – As pessoas singulares que
sejam membros de órgãos de administração, de direção ou de fiscalização da
pessoa coletiva ou entidade equiparada a pessoa coletiva incorrem na sanção
prevista para o autor, especialmente atenuada, quando, cumulativamente, não
sejam diretamente responsáveis pelo pelouro ou pela área onde se verificou a
prática da infração e a sua responsabilidade se funde unicamente no facto de,
conhecendo ou devendo conhecer a prática da infração, não terem adotado
imediatamente as medidas adequadas para lhe pôr termo, a não ser que sanção
mais grave lhe caiba por força de outra disposição legal”. Também aqui nos
poderíamos socorrer de normas jurídicas muito similares já existentes p.e. no
Código Penal, o qual se aplica subsidiariamente29. Quanto ao n. 3 do art. 163º da LB
será igualmente importante referir que, em caso algum, pode prejudicar as eventuais
hipóteses de acção por omissão: cfr. art. 10º do Código Penal, “Comissão por acção
e comissão por omissão”, “1 – Quando um tipo legal de crime compreender um
certo resultado, o facto abrange não só a acção adequada a produzi-lo como a
omissão da acção adequada a evitá-lo, salvo se outra for a intenção da lei. / 2 – A
comissão de um resultado por omissão só é punível quando sobre o omitente recair
um dever jurídico que pessoalmente o obrigue a evitar esse resultado. / 3 – No caso
previsto no número anterior, a pena pode ser especialmente atenuada”. E, como é

29
Cfr. art. 12º do CP. Para mais desenvolvimentos na actuação no lugar de outrem, os nossos v.g.
BANDEIRA, G. S. de Melo, Responsabilidade Penal Económica e Fiscal dos Entes Colectivos…, 2004,
passim; BANDEIRA, Gonçalo S. de Melo, Abuso de Informação, Manipulação do Mercado e
Responsabilidade Penal das “Pessoas Colectivas”…, 2011/2016 (5ª tiragem), passim.

462 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Segundas Notas à Legislação da Lavagem de Capitais em Portugal-EU

evidente, o art. 10º do CP prevalece sobre o art. 163º da LB. Assim como a
Constituição criminal prevalece sobre qualquer lei ou decreto-lei ordinários30.
Como já referido, esta LB tenta “recriar” ou “repisar” uma “parte geral do
regime geral das contraordenações” ou do próprio Código Penal, os quais já
existiam no nosso ordenamento jurídico, conforme mencionado. Ora veja-se (!): art.
164º da LB, “Tentativa e negligência / 1 – A tentativa e a negligência são sempre
puníveis. / 2 – Em caso de infração negligente, o limite máximo da coima prevista
para a infração é reduzido para metade. /3 – Em caso de tentativa, a coima
aplicável é a prevista para o ilícito consumado, especialmente atenuada”. Muito
haveria para dizer sobre esta precisa norma jurídica da LB-Lei do Branqueamento.
Já sabemos que as regras gerais constam do Código Penal Português e do RGCO-
Regime Geral das Contraordenações Português. Assim, no RGCO: art. 8º do RGCO,
“Dolo e negligência / 1 – Só é punível o facto praticado com dolo ou, nos casos
especialmente previstos na lei, com negligência. / 2 – O erro sobre elementos do
tipo, sobre a proibição, ou sobre um estado de coisas que, a existir, afastaria a
ilicitude do facto ou a culpa do agente, exclui o dolo. / 3 – Fica ressalvada a
punibilidade da negligência nos termos gerais”; art. 12º do RGCO, “Tentativa / 1 –
Há tentativa quando o agente pratica actos de execução de uma contra-ordenação
que decidiu cometer sem que esta chegue a consumar-se. / 2 – São actos de
execução: / a) Os que preenchem um elemento constitutivo de um tipo de contra-
ordenação; / b) Os que são idóneos a produzir o resultado típico; / c) Os que,
segundo a experiência comum e salvo circunstâncias imprevisíveis, são de natureza
a fazer esperar que se lhes sigam actos das espécies indicadas nas alíneas
anteriores”; art. 13º do RGCO, “Punibilidade da tentativa / 1 – A tentativa só pode
ser punida quando a lei expressamente o determinar. / 2 – A tentativa é punível com
a coima aplicável à contra-ordenação consumada, especialmente atenuada”; art.
14º do RGCO, “Desistência / 1 – A tentativa não é punível quando o agente
voluntariamente desiste de prosseguir na execução da contra-ordenação, ou impede
a consumação, ou, não obstante a consumação, impede a verificação do resultado
não compreendido no tipo da contra-ordenação. / 2 – Quando a consumação ou a
verificação do resultado são impedidas por facto independente da conduta do
desistente, a tentativa não é punível se este se esforça por evitar uma ou outra”.
Ora, veja-se agora o Código Penal Português. Art. 13º do CP, “Dolo e negligência /
Só é punível o facto praticado com dolo ou, nos casos especialmente previstos na
lei, com negligência”; art. 21º do CP, “Actos preparatórios / Os actos preparatórios
não são puníveis, salvo disposição em contrário”; art. 22º do CP, “Tentativa / 1 –
Há tentativa quando o agente praticar actos de execução de um crime que decidiu
cometer, sem que este chegue a consumar-se. / 2 – São actos de execução: / a) Os
que preencherem um elemento constitutivo de um tipo de crime; / b) Os que forem
idóneos a produzir o resultado típico; ou / c) Os que, segundo a experiência comum
e salvo circunstâncias imprevisíveis, forem de natureza a fazer esperar que se lhes

30
Cfr. art.s 18º e do 24º ao 34º da Constituição: “o sismógrafo da própria Constituição”, nas palavras do Prof.
Doutor J.J. Gomes CANOTILHO.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 463


Gonçalo S. de Melo Bandeira

sigam actos das espécies indicadas nas alíneas anteriores”; art. 23º do CP,
“Punibilidade da tentativa / 1 – Salvo disposição em contrário, a tentativa só é
punível se ao crime consumado respectivo corresponder pena superior a 3 anos de
prisão. / 2 – A tentativa é punível com a pena aplicável ao crime consumado,
especialmente atenuada. / 3 – A tentativa não é punível quando for manifesta a
inaptidão do meio empregado pelo agente ou a inexistência do objecto essencial à
consumação do crime”. Recordemos então de novo a norma jurídica em questão na
parte que aqui mais nos interessa: “art. 164º da LB, “Tentativa e negligência / 1 – A
tentativa e a negligência são sempre puníveis…”. Como já referimos noutras
publicações, o legislador português consagrou uma regra jurídica que viola a
Constituição Portuguesa, a qual assenta na dignidade do ser humano. Ora, ao ser
humano, que não é perfeito – assim como as máquinas, a matemática ou a
inteligência artificial também não são perfeitas, até porque como resulta do
pensamento de Edmund Husserl, “não há ciências mais perfeitas do que as ciências
humanas”, humanistas, diríamos -, é natural o engano, a negligência, o errar no devir
negligente ou uma série de tentativas que, inclusive, não podem ser puníveis do ponto de
vista da legitimidade constitucional. É impossível ao ser humano acertar sempre e fazer
sempre tudo a 100%, já para não falar que cada ser humano, é um ser humano. Então, se
houver desistência na tentativa, esta, mesmo assim, é punível?! Claro que,
constitucionalmente, a resposta é peremptória: não. Note-se na chamada “tentativa
impossível”, quando p.e. é “manifesta a inaptidão do meio empregado pelo agente ou a
inexistência do objecto essencial à consumação do crime”. Como é que é possível, sem
ferir a Constituição em qualquer das suas vertentes que assentam na dignidade do ser
humano31, afirmar o seguinte?! “A tentativa e a negligência são sempre puníveis”?! A
razão é simples, o “Estado Policial”, com tiques autoritários, há muito tempo que
percebeu que também é esta uma forma de punir, mas também, no caso das
contraordenações, de cobrar uma espécie de “impostos” por uma outra via, a via das
coimas. Coimas são as multas penais no mundo das contraordenações. Mais dinheiro a
entrar no Estado tirado aos bolsos dos contribuintes. Ora, todos bem sabem que nem
sempre os dinheiros públicos são bem gastos e sequer tratados com zelo.
Além do mais, ao afirmarmos que “A tentativa e a negligência são sempre
puníveis”, estamos a violar a necessidade, adequação, proporcionalidade e
intervenção (que deve começar por ser) mínima, das sanções penais e
contraordenacionais. Será mesmo necessário à prevenção geral positiva – incluindo
a retribuição -, à prevenção especial positiva (incluindo a ressocialização) e à
“justiça restaurativa”, quando possível, que a tentativa e negligência sejam sempre
puníveis?! E será adequado?! E será proporcional?! E respeitará o princípio de
intervenção mínima do Estado?! Tendo sempre em consideração a dignidade do ser
humano, na qual assenta a Constituição Portuguesa?! Como já dissemos noutra
publicação: “Será por estas e por outras que o legislador dos regimes

31
Cfr. art. 1º da Constituição da República Portuguesa: “República Portuguesa: / Portugal é uma República
soberana, baseada na dignidade da pessoa humana e na vontade popular e empenhada na construção de uma
sociedade livre, justa e solidária”.

464 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Segundas Notas à Legislação da Lavagem de Capitais em Portugal-EU

contraordenacionais especiais – laboral, tributário, segurança social, bancário, etc.


etc. etc. – passou também a declarar, preto no branco, tão positivista afinal que ele
é (mas tão pouco historicista e teleológico…), que, por regra, “a negligência é
sempre punível”? Então, onde fica o art. 18º da CRP, cujos fundamentos são tão
odiados nos regimes autoritários e totalitários?! Foi deixado na gaveta?! E o art.
13º do CP ou o art. 8º/1 do RGCO?! E o art. 32º/10 da CRP?! Ou terá passado a
“cobrança de coimas” a ser uma nova forma de cobrança de “impostos” e
“taxas”?! Mas também não estará isso mesmo a violar o Princípio da Legalidade
Tributária e por isso também o art. 103º da CRP ou o art. 104º da CRP, como um
todo?! Já para não falar no art. 165º/1, al. I) da CRP?!”32
Quanto ao “Concurso de infracções”, o art. 165º da LB, estabelece o
seguinte: “1 – Salvo o disposto no número seguinte, se o mesmo facto constituir
simultaneamente crime e contraordenação, são os agentes responsabilizados por
ambas as infrações, instaurando-se, para o efeito, processos distintos, os quais são
objeto de decisão pelas entidades respetivamente competentes. / 2 – Há lugar
apenas ao procedimento criminal quando o crime e a contraordenação tenham sido
praticados pelo mesmo agente, através de um mesmo facto, violando interesses
jurídicos idênticos, podendo o juiz penal aplicar as sanções acessórias previstas
para a contraordenação em causa. / 3 – Nos casos previstos no número anterior,
deve a autoridade setorial respetiva ser notificada da decisão que ponha fim ao
processo”. Trata-se duma solução que é no mínimo curiosa. Em lugares paralelos,
temos o art. 2º do RGIT-Regime Geral das Infracções Tributárias, “Conceito e
espécies de infracções tributárias / 1 – Constitui infracção tributária todo o facto
típico, ilícito e culposo declarado punível por lei tributária anterior. / 2 – As
infracções tributárias dividem-se em crimes e contra-ordenações. / 3 – Se o mesmo
facto constituir simultaneamente crime e contra-ordenação, o agente será punido a
título de crime, sem prejuízo da aplicação das sanções acessórias previstas para a
contra-ordenação”. A expressão “… violando interesses jurídicos idênticos…” é
absurda, pois no caso do direito penal está em causa a tutela de bens jurídicos e no
caso do direito contraordenacional está em consideração a tutela de bens
administrativos. Embora se possa considerar direito penal em sentido amplo a
conjugação de direito e processo penal e direito contraordenacional, temos que
admitir que estamos também perante áreas com especificidades próprias. Isto
significa, por conseguinte, que os interesses, quer tutelados no direito e processo
penal, quer tutelados no direito contraordenacional, não são em rigor idênticos do
ponto de vista jurídico.
Sobre a “Prescrição”, prevê a LB no seu art. 166º: “1 – O procedimento
relativo às contraordenações previstas na presente lei prescreve no prazo de cinco
32
BANDEIRA, Gonçalo S. de Melo, Responsabilidade Penal e Contraordenacional das Organizações
Colectivas, Boletim da Faculdade de Direito…, 2017, pp. 145-146. E como aí referimos, já COSTA,
António de Almeida, A propósito do novo Código do Trabalho: Bem Jurídico e pluralidade de infracções
no âmbito das contraordenações relativas ao “trabalho suplementar”, Subsídios para uma dogmática do
direito de mera ordenação social laboral, Liber Discipulorum para Jorge de Figueiredo Dias, Coimbra,
Coimbra, 2003, passim.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 465


Gonçalo S. de Melo Bandeira

anos. / 2 – Nos casos em que tenha havido ocultação dos factos que são objeto do
processo de contraordenação, o prazo de prescrição suspende-se até ao
conhecimento desses factos por parte da entidade com competência instrutória do
procedimento contraordenacional. / 3 – Sem prejuízo das outras causas de
suspensão e de interrupção da prescrição previstas na lei, a prescrição do
procedimento por contraordenação suspende-se também a partir da notificação do
despacho que procede ao exame preliminar do recurso da decisão que aplique
sanção até à notificação da decisão final do recurso. / 4 – A suspensão prevista nos
números anteriores não pode ultrapassar: / a) 30 meses, quando as infrações sejam
puníveis com coima até € 1 000 000; / b) Cinco anos, quando as infrações sejam
puníveis com coima superior a € 1 000 000. / 5 – O prazo referido no número
anterior é elevado para o dobro se tiver havido recurso para o Tribunal
Constitucional. / 6 – O prazo de prescrição das coimas e sanções acessórias é de
cinco anos, a contar do dia em que a decisão administrativa se torne definitiva ou
do dia em que a decisão judicial transite em julgado”. Também a prescrição já tinha
regras próprias, quer no direito e processo penal, CP e CPP, quer no regime geral
das contraordenações, RGCO33. Ou seja, com o acentuar da passagem dos anos
estamos a construir uma série de sub-regimes penais e contraordenacionais. Uma
“Torre de Babel” na qual chegará o dia, como a História nos ensina, na qual
ninguém se irá entender.
De acordo com o art. 167º da LB, também é importante referir que o
legislador consagrou uma “Graduação da sanção / 1 – A determinação da medida
da coima e das sanções acessórias faz -se em função da ilicitude concreta do facto,
da culpa do agente e das exigências de prevenção, tendo ainda em conta a natureza
individual ou coletiva do agente. / 2 – Na determinação da ilicitude concreta do
facto, da culpa do agente e das exigências de prevenção, atende-se, entre outras, às
seguintes circunstâncias: / a) Duração da infração; / b) Grau de participação do
arguido no cometimento da infração; / c) Existência de um benefício, ou intenção de
o obter, para si ou para outrem; / d) Existência de prejuízos causados a terceiro
pela infração e a sua importância quando esta seja determinável; / e) Perigo ou
dano causado ao sistema financeiro ou à economia nacional; / f) Caráter ocasional
ou reiterado da infração; / g) Intensidade do dolo ou da negligência; / h) Se a
contraordenação consistir na omissão da prática de um ato devido, o tempo
decorrido desde a data em que o ato devia ter sido praticado; / i) Nível de
responsabilidades da pessoa singular, âmbito das suas funções e respetiva esfera de
ação na pessoa coletiva ou entidade equiparada em causa; / j) Especial dever da

33
No RGCO, cfr. art. 27º, Prescrição do procedimento; art. 27º-A, Suspensão da prescrição; art. 28º,
Interrupção da prescrição; art. 29º Prescrição da coima; art. 30º Suspensão da prescrição da coima; art. 31º
Prescrição das sanções acessórias. Assim como no CP, Título V, Extinção da responsabilidade criminal,
Capítulo I, Prescrição do procedimento criminal, Art. 118º, Prazos de prescrição; art. 119º, Início do prazo;
art. 120º, Suspensão da prescrição; art. 121º, Interrupção da prescrição; Capítulo II, Prescrição das penas e
das medidas de segurança, art. 122º, Prazos de prescrição das penas; art. 123º, Efeitos da prescrição da pena
principal; art. 124º, Prazos de prescrição das medidas de segurança; art. 125º, Suspensão da prescrição; art.
126º, Interrupção da prescrição.

466 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Segundas Notas à Legislação da Lavagem de Capitais em Portugal-EU

pessoa singular de não cometer a infração. / 3 – Na determinação da sanção


aplicável tem-se ainda em conta: / a) A situação económica do arguido; / b) A
conduta anterior do arguido; / c) A existência de atos de ocultação tendentes a
dificultar a descoberta da infração; / d) A existência de atos do agente destinados a,
por sua iniciativa, reparar os danos ou obviar aos perigos causados pela infração; /
e) O nível de colaboração do arguido com a entidade com competência instrutória
do procedimento contraordenacional. / 4 – A coima deve, sempre que possível,
exceder o benefício económico que o arguido ou pessoa que fosse seu propósito
beneficiar tenham retirado da prática da infração”. Também neste campo de
matérias era já possível discernir, quer no direito e processo penal, CP e CPP, quer
no regime geral das contraordenações, RGCO, regras similares34. Ou seja, mais
regras, sobre temas similares ou mesmo iguais, havendo sobreposição e gerando
uma natural, e humana, confusão na tarefa de interpretar e aplicar a legislação em
vigor. O ordenamento jurídico português, como aliás outros no mundo, caminham
para o caos interpretativo, a par da manifesta falta de formação dos próprios
Magistrados. Já para não falar na ausência de Tribunais mais especializados. O que,
por outro lado, pode provocar ferimentos constitucionais.
Já no art. 168º da LB, estão consagradas as “Injunções e cumprimento do
dever violado / 1 – Sempre que a infração resulte da violação de um dever, a
aplicação da sanção e o pagamento da coima não dispensam o infrator do
cumprimento do dever, se este ainda for possível. / 2 – A autoridade setorial
competente ou o tribunal podem sujeitar o infrator à injunção de cumprir o dever
em causa, de cessar a conduta ilícita e de evitar as suas consequências. / 3 – Se as
injunções referidas nos números anteriores não forem cumpridas no prazo fixado
pela autoridade setorial competente ou pelo tribunal, o infrator incorre na sanção
prevista para as contraordenações nos termos do art. 170.º”. O Tribunal. O
Tribunal e não o tribunal, uma vez que se trata dum órgão de soberania. O qual deve
ser respeitado e fazer-se respeitar perante o poder legislativo e executivo.

6 CONCLUSÕES
De novo, também por aqui, o problema do branqueamento de vantagens,
como por exemplo capitais – ou lavagem de vantagens como por exemplo dinheiro -
, é uma questão que continua a dizer respeito à corrupção em sentido amplo e
portanto não apenas ao direito e processo penal, mas também à criminologia e à
política criminal, às ciências jurídico-criminais: “Strafrecht ohne Kriminologie ist
blind, Kriminologie ohne Strafrecht ist grenzenlos”35. Esta máxima permanece
válida, ainda que por vezes atacada na academia através da corrupção das ciências

34
Cfr. art. 18º do RGCO, Determinação da medida da coima; e o CP português, Capítulo IV, Escolha e
medida da pena, Secção I, Regras gerais: art. 70º, Critério de escolha da pena; art. 71º, Determinação da
medida da pena; art. 72º, Atenuação especial da pena; art. 73º, Termos da atenuação especial; art. 74º,
Dispensa de pena; Secção II, Reincidência, art. 75º, Pressupostos; art. 76º, Efeitos.
35
JESCHECK, Hans-Heinrich / WEIGEND, Thomas (1996). In Lehrbuch des Strafrechts § Allgemeiner Teil
§ Funfte Auflage, Duncker & Humblot • Berlin, Alemanha, p. 41.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 467


Gonçalo S. de Melo Bandeira

jurídico-criminais pelos próprios docentes ou investigadores, cada um a lutar pela


sua aldeia de vaidade, não se apercebendo da figura do ridículo que fazem… “Bem
prega Frei Tomás, olha para o que ele diz, não olhes para o que ele faz”. Mais uma
vez temos que ter em consideração a Declaração Universal dos Direitos Humanos de
1948, a Convenção Europeia dos Direitos Humanos, a Carta dos Direitos
Fundamentais da União Europeia. Mas também, no seio da UE, o Tratado da União
Europeia e o Tratado de Funcionamento da União Europeia. Mais uma vez
lembremos que para Franz Von Liszt era uma unidade orgânica das partes que
superava a parcialidade da especialização36. Demasiada especialização significa
estupidificação e/ou ignorância sobre o todo, sobre a estrutura arquitectónica, até
porque somente se pode ser um especialista de qualidade se antes se foi um
generalista de qualidade. Assim, pois, não podemos esquecer o princípio da culpa e
o princípio da presunção de inocência, entre outros, como o princípio da legalidade,
o princípio do contraditório, o princípio do acusatório ou o princípio do recurso, o
princípio da transparência e o princípio do segredo de justiça a par do princípio da
publicidade, entre outros. E, como nos diz também Hans-Heinrich Jescheck, que
tivemos o privilégio de conhecer pessoalmente em 2006 na Alemanha, e como já
tivemos oportunidade de dizer noutras publicações, o juízo de desvalor sobre a
atitude jurídica interna do autor não opera globalmente sobre a base do conjunto da
personalidade daquele, mas apoia-se na análise dos elementos da culpa determinados
legalmente37. Ou como também como já citámos noutros locais e como diria Claus
Roxin, que a responsabilidade depende dos dados que se devem adicionar ao ilícito:
da culpa do sujeito e da necessidade preventiva de sanção penal que há que deduzir
da lei38. Afinal, como igualmente nos diz Günther Jakobs, a culpa – assim que há um
autor dum facto anti-jurídico, pois há uma falta de motivação jurídica dominante,
mas também quando o autor é responsável por essa falta – é uma infidelidade ao
Direito. i.e., um conceito determinado de modo normativo39. Tendo nós também que
afirmar que não há qualquer comparação possível entre um Estado de Direito
democrático social, verdadeiro e livre e uma qualquer ditadura, de direita ou de
esquerda ou do raio que a parta, na expressão popular. Antes uma monarquia
Constitucional do que uma República ditatorial, ou alguns dos países com maior
qualidade de vida do mundo não fossem p.e. a Noruega, Suécia, Dinamarca,
Bélgica, Holanda, Reino Unido, Japão, entre outros. Sem prejuízo do Estado de
Emergência ou Estado de Sítio, o qual pode ser estabelecido nos termos
constitucionais-constitucionais. No sentido também de que pertencerá ao Povo a

36
LISZT, Franz Von (1889), ZStW, 9, a revista fundada pelo próprio e da qual era director, Zeitschrift der
deutschen Strafrechtswissenshaft – Revista da Ciência alemã do Direito Penal. Hoje chamada de Zeitschrift
für die gesamte Strafrechtswissenshaft também ZStW.
37
Jescheck, Hans-Heinrich / Weigend, Thomas. In Lehrbuch des Strafrechts § Allgemeiner Teil § Funfte
Auflage, Duncker & Humblot • Berlin, Alemanha, 1996, p. 429.
38
ROXIN, Claus, Strafrecht. Allgemeiner Teil, Band I: Grundlagen. Der Aufbau der Verbrechenslehre. Beck,
München, 1994, p. 700.
39
JAKOBS, Günther, JAKOBS, Günther, Strafrecht Allgemeiner Teil, Die Grundlagen und die
Zurechnungslehre, Studienausgabe, 2.Auflage, Walter DeGruyter, Berlin, New York, 1993, pp. 469.

468 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Segundas Notas à Legislação da Lavagem de Capitais em Portugal-EU

escolha dos seus representantes, bem como haverá uma separação nítida entre os
poderes legislativo, executivo e judicial. Sem prejuízo da fiscalização mútua
legitimada e incentivada do ponto de vista constitucional-constitucional. Finalmente,
por fim, mas não por último, não tem sentido estar a criar ex novo regimes gerais de
direito penal ou direito contraordenacional que se sobrepõem aos já existentes! De
contrário, o caos interpretativo e aplicativo da legislação já é uma realidade. Solução
alternativa possível? Criar códigos europeus democraticamente legitimados e
aplicáveis em toda a União Europeia.

BIBLIOGRAFIA
ANDRADE, Manuel da Costa, In “A “dignidade penal” e a carência de tutela penal como referência de
uma doutrina teleológica-racional do crime”, RPCC, ano 2, fascículo 2, 1992;
BANDEIRA, G. S. de Melo, Responsabilidade Penal Económica e Fiscal dos Entes Colectivos à volta
das sociedades comerciais ou sociedades civis sob a forma comercial ainda que irregularmente
constituídas, Almedina, Coimbra, 2004;
BANDEIRA, G. S. de Melo, O Crime de “Branqueamento” e a Criminalidade Organizada no
Ordenamento Jurídico Português, Ciências Jurídicas, Apresentação: Professor Catedrático Doutor A.
Castanheira Neves, Organização: Gonçalo Sopas de Melo Bandeira, Rogério Magnus Varela Gonçalves,
Frederico Viana Rodrigues, Almedina, Coimbra, 2005, pp. 271 e ss.;
BANDEIRA, G. S. de Melo, O Crime de “Branqueamento” e a Criminalidade Organizada no
Ordenamento Jurídico Português no contexto da União Europeia: novos desenvolvimentos e novas
conclusões. In: AA.VV., Coordenação de NASCIMENTO SILVA, Luciano; BANDEIRA, Gonçalo N.C.
Sopas de Melo, Lavagem de Dinheiro e Injusto Penal – Análise Dogmática e Doutrina Comparada Luso-
Brasileira, Juruá, Curitiba, 2009, pp. 563-574;
BANDEIRA, G. S. de Melo, O Crime de “Branqueamento” e a Criminalidade Organizada no
Ordenamento Jurídico Português no contexto da União Europeia: novos desenvolvimentos e novas
conclusões. In: AA.VV., Coordenação de NASCIMENTO SILVA, Luciano; BANDEIRA, Gonçalo N.C.
Sopas de Melo, Branqueamento de Capitais e Injusto Penal – Análise Dogmática e Doutrina Comparada
Luso-Brasileira, Juruá, Lisboa, 2010, pp. 563-574;
BANDEIRA, G.S. de Melo / FACHIN, Z.A., Responsabilidade Criminal por Dinheiros Públicos,
Branqueamento de Capitais/Lavagem de Dinheiro e Direitos Sociais, Revista Internacional CONSINTER,
Ano I – v. I § Direito e Justiça § Aspectos Atuais e Problemáticos, Juruá, Curitiba, I Simpósio Congresso
Internacional do CONSINTER, Facultat de Dret da Universitat de Barcelona, Curitiba-Barcelona, 6 e
8.10.2015, pp. 537 e ss.;
BANDEIRA, G.S. de Melo, Criminalidade Económica e Lavagem de Dinheiro, Prevenção pela
Aprendizagem, Revista Internacional CONSINTER de Direito, Ano II, N. 2, Efetividade do Direito, 1º
Semestre, Juruá, Curitiba-Lisboa, 2016, pp. 15 e ss.;
BANDEIRA, G.S. de Melo, Directiva (UE) 2015/849 do Parlamento Europeu e do Conselho de
20.05.2015: a Prevenção do Branqueamento de Capitais e do Financiamento do Terrorismo e o Sistema
Financeiro Capitalista, Direito e Justiça, Juruá, 2016, pp. 129 e ss.;
BANDEIRA, Gonçalo S. de Melo, Abuso de Informação, Manipulação do Mercado e Responsabilidade
Penal das “Pessoas Colectivas” – “Tipos Cumulativos” e Bens Jurídicos Colectivos na “Globalização”.
Edição Revista e Ampliada com Texto Extra. Lisboa: Juruá, 2011/2016 (5ª tiragem);
BANDEIRA, Gonçalo S. de Melo, Responsabilidade Penal e Contraordenacional das Organizações
Colectivas, Boletim da Faculdade de Direito, Stvdia Ivridica, 108, Ad Honorem – 8, Estudos em
Homenagem ao Prof. Doutor Manuel da Costa Andrade, Presidente do Tribunal Constitucional, v. I,
Direito Penal, Organizadores: José de Faria Costa, Anabela Miranda Rodrigues, Maria João Antunes,
Helena Moniz, Nuno Brandão, Sónia Fidalgo, Sersilito-Empresa Gráfica Lda, Edição Apoiada pela

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 469


Gonçalo S. de Melo Bandeira

Fundação Eng. António de Almeida, Universidade de Coimbra, Institvto Ivridico, Coimbra, 2017, pp.
129-148;
BANDEIRA, Gonçalo S. de Melo, Primeiras Notas à Legislação da Lavagem de Capitais em Portugal-
UE: O Dever de Formação, Revista Internacional CONSINTER de Direito, Publicação Oficial Semestral
do Conselho Internacional de Estudos Contemporâneos em Pós-Graduação, Ano V – Número IX, 2º
Semestre de 2019, Estudos Contemporâneos, Porto e Curitiba, 2019, pp. 727-748.
CORREIA, Eduardo H. da S., Unidade e pluralidade de infracções: a teoria do concurso em direito
criminal, Coimbra, Atlântida, 1945;
CORREIA, Eduardo H. da S., Actas do Código Penal, 1979;
CORREIA, Eduardo H. da S. (1963), Direito Criminal I, com a colaboração de Figueiredo Dias, Livraria
Almedina, Coimbra, Reimpressão-1993;
CORREIA, Eduardo H. da S. (1965), Direito Criminal II, com a colaboração de Figueiredo Dias,
Livraria Almedina, Coimbra, Reimpressão, 1997;
CORREIA, Eduardo H. da S., Os arts. 10º do Dec.-Lei 27 153, 1968;
COSTA, Afonso, Commentario ao Codigo Penal Portuguez: Introducção: Escolas e Principios de
Criminologia Moderna; Imprensa da Universidade, Coimbra, 1985;
COSTA, António de Almeida, A propósito do novo Código do Trabalho: Bem Jurídico e pluralidade de
infracções no âmbito das contraordenações relativas ao “trabalho suplementar”, Subsídios para uma
dogmática do direito de mera ordenação social laboral, Liber Discipulorum para Jorge de Figueiredo
Dias, Coimbra, Coimbra, 2003;
CUMMING-BRUCE, Nick, ISIS, Eyeing Europe, Could Launch Attacks This Year, U.N. Warns, New
York Times, 3.08.2019;
DIAS, Jorge de Figueiredo / ANDRADE, Manuel da Costa (1992), Criminologia § O Homem
Delinquente e a Sociedade Criminógena, Coimbra: Coimbra, 2. Reimpressão, 1997;
DIAS, Jorge de Figueiredo, Direito Penal § Parte Geral § Tomo I § Questões Fundamentais § A Doutrina
Geral do Crime, 2. ed. atual. e ampl. Coimbra: Coimbra, 2007;
ENRICH, David / PROTESS, Ben / RASHBAUM, William K., Deutsche Bank Faces Criminal Investi-
gation for Potential Money Laundering Lapses, New York Times, 8.07.19;
FERREIRA, Manuel Cavaleiro, Lições de Direito Penal – Parte Geral I-II, Almedina, Coimbra, 2010;
GARSIDE, Juliette, Is money-laundering scandal at Danske Bank the largest in history?-Scale of fiasco
highlights need for stricter regulation and cross-border force in Europe, The Guardian, 21.09.18;
GRONHOLT-PEDERSEN, Jacob, Danske Bank cuts Outlook as money laundering scandal weighs,
Reuters, 30.04.19;
JESCHECK, Hans-Heinrich / WEIGEND, Thomas. In Lehrbuch des Strafrechts § Allgemeiner Teil §
Funfte Auflage, Duncker & Humblot, Berlin, Alemanha, 1996;
LIMA, F. A. Pires de; VARELA, J. de M. Antunes. In: Código Civil Anotado. V. I. (arts. 1.º a 761.º), 4.
ed. rev. e atual. com colaboração de M. Henrique Mesquita, Coimbra: Coimbra, 1987;
LISZT, Franz Von, ZStW, 9, a revista fundada pelo próprio e da qual era director, Zeitschrift der
deutschen Strafrechtswissenshaft – Revista da Ciência alemã do Direito Penal. Hoje chamada de
Zeitschrift für die gesamte Strafrechtswissenshaft também ZStW, 1889;
MOREIRA, António Vasconcelos, Jornal Económico, 18.04.19; ou SANDLER, Rachel, Feds Reportedly
Investigating Deutsche Bank For Money-Laundering Violations, Forbes, 19.06.19;

470 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Segundas Notas à Legislação da Lavagem de Capitais em Portugal-EU

TRATAMIENTO PROCESAL DE LA COMPETENCIA


OBJETIVA DEL TRIBUNAL DEL JURADO
PROCEDURAL TREATMENT OF THE OBJECTIVE
COMPETITION OF THE JURY COURT
DOI: 10.19135/revista.consinter.00011.22
Recibido/Received 14.05.2020 – Aprobado/Approved 17.07.2020
José María Lombardero Martín1 – https://orcid.org/0000-0002-7264-3940
E-mail: jose.m.lombardero@gmail.com

Resumen: Este artículo aborda el tratamiento procesal de la competencia del tribunal.


Esto es, cómo y cuándo será posible poner de manifiesto o discutir en derecho procesal
español que sea el Tribunal del Jurado Popular competente para enjuiciar unos
determinados hechos delictivos. Trataremos de mostrar cómo el Tribunal llega a ser
competente con arreglo a las disposiciones de la LOTJ y la Ley de Enjuiciamiento
Criminal. Cómo se llega a ser lo que se es. Seguiremos la cuestión en las fases de
investigación, la fase intermedia y hasta la fase de juicio oral
Palabras-clave: Tratamiento procesal, Competencia objetiva, Tribunal del Jurado, Leyes
procesales, Alegaciones, Recursos, Jurisprudencia.
Abstract This article addresses the procedural treatment of the jurisdiction of the court.
That is, how and when it will be possible to reveal or discuss in Spanish procedural law
that the Court of the Popular Jury is competent to prosecute certain criminal acts. We will
try to show how the Court becomes competent under the provisions of the LOTJ and the
Criminal Procedure Law. How one becomes what one is. We will follow the matter in the
investigation phases, the intermediate phase and even the oral trial phase
Keywords: Procedural Treatment, Objective Competition, Jury Court, Procedural laws,
Allegations, Resources, Jurisprudence.
Resumo: Este artigo trata do tratamento processual da jurisdição do tribunal. Ou seja,
como e quando será possível revelar ou discutir na lei processual espanhola que o Tribunal
do Júri Popular é competente para processar determinados atos criminosos. Procuraremos
mostrar como o Tribunal se torna competente de acordo com as disposições do LOTJ e da
Lei de Processo Penal. Como alguém se torna o que é. Seguiremos o assunto nas fases de
investigação, na fase intermediária e até na fase de teste oral
Palavras-chave: Tratamento processual, competição objetiva, tribunal do júri, Leis
processuais, alegações, recursos, jurisprudência.
Sumario: I. Planteamiento. II. El tratamiento procesal en el procedimiento del jurado. 1.
La fase de investigación. 1.1. La incoación del procedimiento. 1.2. Traslado y vista para
concretar la imputación. 2. Fase intermedia. 2.1. Calificaciones provisionales. 2.2.
Audiencia preliminar. 2.3. Auto de sobreseimento o de apertura de juicio oral. 3. Fase de
juicio oral. 3.1. Examen de oficio por el magistrado presidente. 3.2. Cuestiones previas.

1
Licenciado en Derecho y en Ciencias Políticas por la Universidad de Barcelona, habiendo cursado estudios
de la diplomatura de Ciencias Empresariales y del Doctorado en Ciencias Políticas, especialidad Teoría
Política Contemporánea. E-mail: jose.m.lombardero@gmail.com

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 471


José María Lombardero Martín

Cuestionamiento a instancia de parte. III. La inadecuación de procedimiento en la lecrim.


IV. Jurisprudencia. V. Bibliografía.

I PLANTEAMIENTO
La competencia del Tribunal del Jurado ha sido una de las cuestiones a menudo
controvertidas desde que se aprobara la Ley Orgánica reguladora de esta institución en
1996 y la controversia ha generado abundante jurisprudencia y doctrina científica. Nos
hemos ocupado anteriormente del Tribunal del Jurado en un estudio comparado2, y
hemos analizado el Acuerdo no jurisdiccional del Tribunal Supremo de fecha
09.03.20173 que ha tenido importante alcance sobre su competencia en materia de delitos
conexos. Más recientemente hemos abordado el tema del Jurado y la conexión penal en
un estudio de próxima publicación.
Este artículo aborda el tratamiento procesal de la competencia del tribunal. Esto
es, cómo y cuándo será posible poner de manifiesto o discutir en derecho procesal
español que sea el Tribunal del Jurado Popular competente para enjuiciar unos
determinados hechos delictivos. En anteriores artículos hemos tratado de comprender
cuándo y porqué es competente el Jurado, y las consecuencias que su competencia
conlleva. Trataremos de mostrar en el presente cómo el Tribunal llega a serlo. Cómo se
llega a ser lo que se es. Seguiremos la cuestión en las fases de investigación, la fase
intermedia y hasta la fase de juicio oral.
Resulta necesario precisar, siguiendo a Pérez-Cruz Martín4 que los problemas de
competencia objetiva del Tribunal del Jurado se plantean “strictu sensu” tras la remisión
de las actuaciones a este órgano para el enjuiciamiento, pues con anterioridad a ese
momento en las fases de instrucción e intermedia, la competencia reside en el juez de
instrucción y la cuestión se planteará como problema de adecuación o inadecuación
de procedimiento.

2
LOMBARDERO MARTÍN, J.M. “El jurado español, el jurado anglosajón y el escabinato. Instrucciones y
veredicto. Breve análisis comparado” Revista Internacional CONSINTER año V n. IX, Porto 2019
3
LOMBARDERO MARTÍN, J.M: “La competencia del Tribunal del Jurado. Breve análisis de la cuestión
tras el acuerdo de pleno de la sala Segunda del Tribunal Supremo de 9 de marzo de 2017” Revista
Internacional CONSINTER año III n. V, Porto 2017
4
PÉREZ-CRUZ MARTÍN, A.J. “La Competencia objetiva del Tribunal del Jurado Especial consideración
de los artículos 1 y 5 de la LO 5/1995, in datada tras su modificación por la L.O. 8/1995, de 16 de
noviembre, L.O. 10/1995, de 23 de noviembre y L.O. 1/2015, de 30 de marzo”. Centro de Estudios
Jurídicos Mayo 2018. Asimismo, véase sobre los problemas de transformaciones del procedimiento
GARBERI LLOBEGAT, J. “Ley Orgánica del Tribunal del Jurado (comentarios prácticos al nuevo proceso
penal ante el Tribunal del Jurado)” – con GIMENO SENDRA, V.-. 1ª Ed. Madrid 1996, p. 62 y CERES
MONTES, J. F. “Ámbito de aplicación de la ley del jurado. Delitos y cuestiones procesales.” Madrid 1997.
p. 105-121

472 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Tratamiento Procesal de la Competencia Objetiva del Tribunal del Jurado

II EL TRATAMIENTO PROCESAL EN EL PROCEDIMIENTO DEL JURADO


1 LA FASE DE INVESTIGACIÓN
1.1 La Incoación Del Procedimiento
El Procedimiento de Jurado se incoa en los términos del Artículo 24. LOTJ5
Se iniciará el procedimiento, previa valoración judicial de verosimilitud,
desde que exista “notitia criminis” de un delito atribuido al conocimiento del
Tribunal del Jurado. Noticia que puede provenir de denuncia o querella interpuesta
en los términos previstos por la Lecrim. y en la que el presunto autor esté
determinado, o bien cuando “de cualquier actuación procesal resulte contra persona
o personas determinadas la imputación de un delito cuyo enjuiciamiento
corresponda al Tribunal del Jurado”. Por ejemplo, un testimonio deducido a tal fin
de otro procedimiento judicial y remitido al juez instructor.
Si se ha instado la incoación de Procedimiento de jurado es de aplicación el
309 bis Lecrim6 y debe el juez resolver en el plazo de una audiencia. Cuando las
partes en su denuncia o querella no especifican el procedimiento, el juez de
instrucción dictará resolución sin dilación conforme al art.198 Lecrim7.
El auto que acuerde continuar los trámites por el Procedimiento del Jurado
será recurrible en reforma, y contra la resolución de dicha reforma no cabrá
apelación, por aplicación del art. 217 Lecrim8.
Si el juez considera que el procedimiento es otro (el delito que se investiga no
es de los previstos en el art. 1.2 LOTJ) o bien rechaza la atribución subjetiva de

5
Artículo 24. LOTJ 1. Cuando de los términos de la denuncia o de la relación circunstanciada del hecho en
la querella, y tan pronto como de cualquier actuación procesal, resulte contra persona o personas
determinadas la imputación de un delito, cuyo enjuiciamiento venga atribuido al Tribunal del Jurado, previa
valoración de su verosimilitud, procederá el Juez de Instrucción a dictar resolución de incoación del
procedimiento para el juicio ante el Tribunal del Jurado, cuya tramitación se acomodará a las disposiciones
de esta Ley, practicando, en todo caso, aquellas actuaciones inaplazables a que hubiere lugar.
2. La aplicación de la Ley de Enjuiciamiento Criminal será supletoria en lo que no se oponga a los preceptos
de la presente Ley.
6
Artículo 309 bis Lecrim: “Cuando de los términos de la denuncia o de la relación circunstanciada del
hecho en la querella, así como cuando de cualquier actuación procesal, resulte contra persona o personas
determinadas la imputación de un delito, cuyo enjuiciamiento venga atribuido al Tribunal del Jurado,
procederá el Juez a la incoación del procedimiento previsto en su ley reguladora, en el que, en la forma que
en ella se establece, se pondrá inmediatamente aquella imputación en conocimiento de los presuntamente
inculpados.”
“El Ministerio Fiscal, demás partes personadas, y el investigado en todo caso, podrán instarlo así, debiendo
el Juez resolver en plazo de una audiencia. Si no lo hiciere, o desestimare la petición, las partes podrán
recurrir directamente en queja ante la Audiencia Provincial que resolverá antes de ocho días, recabando el
informe del Instructor por el medio más rápido.”
7
Artículo 198 Lecrim: “Cuando no se fije término, se entenderá que han de dictarse y practicarse sin
dilación.”
8
Artículo 217 Lecrim: “El recurso de reforma podrá interponerse contra todos los autos del Juez de
Instrucción. El de apelación podrá interponerse únicamente en los casos determinados en la Ley, y se
admitirá en ambos efectos tan solo cuando la misma lo disponga expresamente.”

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 473


José María Lombardero Martín

responsabilidad, el Auto donde así lo resuelva será recurrible en queja ante la


Audiencia Provincial (arts. 309 bis y 763 Lecrim)
También puede incoarse de oficio, entiende Pérez Marín que en los términos
del art. 303 Lecrim9 o a través de la transformación de otro procedimiento ya
iniciado10 cuando el órgano judicial entienda que los hechos constituyen un delito de
los previstos en el art. 1.2. LOTJ.
La necesidad de transformar un procedimiento en otro surge cuando a lo largo de
la investigación la calificación jurídica de los hechos se ve afectada por el resultado de
las diligencias de investigación practicadas, y los hechos pasan a considerarse
constitutivos de un delito de los previstos en el art. 1.2 LOTJ o un delito de los conexos
del art. 5 LOTJ, o, en sentido inverso, pasan a ser estimados como constitutivos de un
delito ajeno a la competencia material del Tribunal del jurado.
Un caso particular de incoación de Procedimiento de Jurado por
transformación de otro ya iniciado consiste en la práctica judicial de incoar
Diligencias Previas hasta haberse concretado la presunta autoría de los hechos, y
luego transformar el proceso en Procedimiento de Jurado. Esta práctica comenzó ya
con la Circular de la Fiscalía General del Estado n. 3/1995, de 27 de diciembre,
“sobre el proceso ante el Tribunal del Jurado: su ámbito de aplicación11,” y tiene el
inconveniente de convertir las Diligencias Previas en una especie de instrucción
preliminar antes de la tramitación del procedimiento en sí, que por tanto se deja de
incoar en un primer momento, obviando que la posición del juez instructor12 en el
Procedimiento de Jurado es diferente al resto de procedimientos de la Lecrim.
Diferencias que sin embargo la propia Fiscalía General en su Circular 3/95 sí
reconoce y aduce para limitar las transformaciones procedimentales13.

9
Véase: PÉREZ MARÍN, M. A. Procedimiento ante el Jurado. Lisboa, Juruá, 2016. El Artículo 303 Lecrim
dice: “La formación del sumario, ya empiece de oficio, ya a instancia de parte, corresponderá a los Jueces
de instrucción por los delitos que se cometan dentro de su partido o demarcación respectiva (...)”
10
Véase el Artículo 783.2.in fine Lecrim: “Al acordar la apertura del juicio oral, resolverá el Juez de
Instrucción sobre (...) En el mismo auto señalará el Juez de Instrucción el órgano competente para el
conocimiento y fallo de la causa.”
11
Que literalmente dice: “solo se incoará el procedimiento especial ante el Tribunal del Jurado cuando exista
una completa seguridad acerca de la concurrencia de los requisitos exigidos para ello”(...), “La incoación
deberá efectuarse con seguridad y cautela. Solo se dictará auto de incoación cuando se den claramente los
requisitos que se deducen del art. 24, a saber: determinación de los hechos como constitutivos de un delito
de los enumerados en la lista del art. 1.2; determinación de la persona imputada; y, por último, valoración de
todo ello como verosímil por el Juez de Instrucción que haya de resolver sobre la incoación.
En aquellos casos en que no esté clara la tipificación inicial de los hechos como comprendida en el art. 1.2;
no aparezca determinada una persona como responsable de los mismos; o los hechos o la imputación no
aparezcan a ojos del Instructor como verosímiles, aunque sin llegar a ser “manifiestamente falsos” (art. 269
de la Ley de Enjuiciamiento Criminal); no se deberá incoar el procedimiento del jurado sino el de
Diligencias Previas o, en su caso, el Sumario” “Solo una vez acreditados con seguridad tales requisitos
procederá incoar procedimiento del jurado con las consecuencias que de ello se derivan”.
12
Véase: PÉREZ MARÍN, M. A. Procedimiento ante el Jurado. Lisboa, Juruá, 2016.
13
La circular, que recomienda no incoar procedimientos de Jurado hasta tener completamente acreditadas las
exigencias del art. 24 LOTJ, dice sobre las transformaciones procedimentales: “La dificultad de
transformar el procedimiento del jurado en otro, o viceversa, se evidencia si se repara en las numerosas

474 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Tratamiento Procesal de la Competencia Objetiva del Tribunal del Jurado

Para el Consejo General del Poder Judicial parece más lógico “comenzar el
procedimiento desde que, con la verosimilitud que el Tribunal Constitucional exige,
exista una notitia criminis relativa a un delito atribuido al Tribunal del Jurado La
imputación debería determinar no la apertura del procedimiento sino el inmediato
traslado a que se refiere el art. 25 LOTJ”14.
Debe traerse a colación como contraria a esta práctica la sentencia de la
Audiencia Provincial de Barcelona de fecha 8 de septiembre de 2005: “ningún
obstáculo existe para que el procedimiento de Jurado resulte incoado desde la sola
interposición de una denuncia o querella, quedando así desmentida la tesis fiscal
encaminada a exigir sistemáticamente una anterior investigación en sede de
Diligencias Previas, como presupuesto obligado y encaminado a asegurar el
carácter indiciario del delito perseguido, su encuadre dentro de los que deberían de
ser conocidos por el Tribunal del Jurado y, en su caso, la identificación de la
persona que se aparezca como presunto responsable del mismo.”
Para este caso y no habiendo dudas sobre el delito, las partes deben instar la
incoación del Proceso ante el Tribunal del Jurado acudiendo al 309 bis Lecrim, y en
el caso de no resolver o no estimar el juez de instrucción su pretensión en plazo de
una audiencia, interponer recurso de Queja ante la Audiencia Provincial.
Una vez incoado el Procedimiento de Jurado, a lo largo de la fase de
instrucción la LOTJ contempla expresamente15 la discusión de la competencia
objetiva y la adecuación del procedimiento y su transformación en Procedimiento
Sumario o Procedimiento Abreviado desarrollándose respectivamente el juicio oral
ante la Audiencia Provincial o ante el Juez de lo Penal, en varios momentos
procesales:

• Tras la vista del art. 25 LOTJ para concretar la imputación


• Con ocasión de los escritos de calificación de las partes ex art. 29.5 LOTJ
• En la Audiencia Preliminar del art. 31.3 LOTJ

especialidades del nuevo proceso (piénsese en la singularidad de la comparecencia inicial, en los plazos
fijados para instar diligencias, en los concretos momentos para interesar el sobreseimiento, en la
singularidad de la fase intermedia, en las especialidades probatorias del art. 48, etc.). Se cuenta así en la
actualidad con dos tipos de procesos el del jurado y los restantes procesos penales que pueden ser
calificados como difícilmente cohonestables” “Lo expuesto debe llevar a evitar en lo posible las
transformaciones procedimentales.”
14
AA.VV. “Manual del Jurado.” Madrid, CGPJ 1996. p. 193.
15
La Fiscalía General del Estado entiende que la mención expresa no limita la transformación procedimental a
estos momentos y así lo dice en la Circular n. 3/1995, de 27 de diciembre, sobre el proceso ante el Tribunal
del Jurado, su ámbito de aplicación: “En todo caso, aunque la Ley no lo contemple expresamente, debe
sostenerse la posibilidad de que en cualquier momento durante la fase de instrucción del procedimiento del
jurado, las partes puedan interesar del Juez de Instrucción o este acordar de oficio, a la vista del resultado
de las diligencias practicadas, la acomodación del procedimiento. Sería contrario a la economía procesal
el que hubiera necesariamente de evacuarse la calificación provisional y celebrar la audiencia preliminar
para adoptar dicha decisión, si la pertinencia de la misma se advirtiera con anterioridad.”

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 475


José María Lombardero Martín

Sin embargo no existe en la LOTJ indicación expresa del régimen de recursos


que puedan interponerse contra las resoluciones que dicte el Juez de instrucción,
bien sea dando lugar a la adecuación del procedimiento o continuando las
actuaciones por el Procedimiento del Tribunal del jurado.
A este respecto, el criterio de la Fiscalía General del Estado en su Circular
3/95 es que “Frente a la resolución que se dicte por el Juez de Instrucción
acordando transformar o no el procedimiento, bien en cualquier momento durante
la fase de instrucción, o bien en el auto dictado tras la audiencia preliminar (art.
32.4), procederá interponer recurso de reforma y ulterior de queja ante la
Audiencia Provincial.”
Abierto el juicio oral y personadas las partes ante el Tribunal del jurado
puede discutirse la competencia del tribunal en el trámite de Cuestiones Previas del
art. 36 LOTJ16. Resuelve el Magistrado-Presidente por Auto contra el que cabe
recurso de apelación ante la Sala Civil y Penal del Tribunal Superior de Justicia.
Nótese que cuando el debate se produce en el seno de un procedimiento de la
LOTJ, no existen trámites expresos que permitan el recurso de casación ante el
Tribunal Supremo con anterioridad a la celebración del juicio, a diferencia de lo que
establece la Lecrim para el Procedimiento Sumario.
La Jurisprudencia del Alto Tribunal en procedimientos del Tribunal del
Jurado se produce a partir de los recursos de casación interpuestos contra las
sentencias dictadas en apelación por los tribunales superiores de justicia. Es
frecuente que el recurrente invoque entre otros motivos la infracción del derecho al
juez predeterminado por la ley, que no suele prosperar, y citaremos por todas la STS
688/2013 de 30 septiembre de 201317

16
ATSJ Canarias de 27 Julio de 2005 (Roj: ATSJ ICAN 1/2005)
17
STS 688/2013 de 30 septiembre de 2013 (RJ 2013\7635) “En primer lugar, como hemos dicho en SSTS.
942/2011 de 21.9, y 729/2012 de 25.9 según constante doctrina de esta Sala de casación y también del
Tribunal Constitucional, la mera existencia de una discrepancia interpretativa sobre la normativa legal que
distribuye la competencia entre órganos de la jurisdicción penal ordinaria, no constituye infracción del
derecho fundamental al Juez ordinario predeterminado por la Ley. Y dicho derecho no resulta vulnerado
cuando se trate de un mero deslinde y amojonamiento de distintos y colindantes ámbitos de actuación en
hipótesis polémicas o en situaciones problemáticas, no suponiendo por tanto la ruptura deliberada del
esquema competencial (STC 35/2000, 93/1998, ATC 262/1994, de 3 de octubre, STS de 15-3-2003, n.
370/2003 e igualmente podemos añadir en consonancia con la STS. 25.2.2010 ) que las discrepancias
interpretativas relativas a la competencia entre órganos de jurisdicción penal ordinaria no pueden dar lugar a
la infracción del derecho constitucional al juez predeterminado por la Ley. Como ha señalado el Tribunal
Constitucional las cuestiones de competencia reconducibles al ámbito de la interpretación y aplicación de
las normas reguladoras de dicha competencia entre órganos de la jurisdicción ordinaria no rebasan el plano
de la legalidad careciendo por tanto de relevancia constitucional (SSTC 43/1984, de 26 de marzo, 8/1998,
de 13 de enero, 93/1998, de 4 de mayo y 35/2000, de 14 de febrero, entre otras). El derecho al Juez
predeterminado por la ley únicamente puede quedar en entredicho cuando un asunto se sustraiga indebida o
injustificadamente al Órgano al que la Ley lo atribuye para su conocimiento, manipulando el texto de las
reglas de distribución de competencias con manifiesta arbitrariedad, como señala la Sentencia 35/2000, del
Tribunal Constitucional, de 14 de febrero, recogiendo lo ya expresado en el A.T.C 262/1994, de 3 de
octubre. Este mismo criterio lo mantiene el Tribunal Constitucional en multitud de resoluciones, de las que
es exponente la STC n. 157/2007, de 2 de julio y esta misma Sala del Tribunal Supremo lo ratifica entre

476 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Tratamiento Procesal de la Competencia Objetiva del Tribunal del Jurado

1.2 Traslado Y Vista Para Concretar La Imputación


Incoado el procedimiento, dispone el art. 25 LOTJ que el juez de instrucción lo
pondrá en conocimiento de los investigados y les dará traslado de la denuncia o querella
que fueron el origen del proceso o una relación somera de los hechos que dieron lugar a
la causa, convocándoles en plazo de 5 días18 junto con el fiscal y demás partes
personadas19 a una comparecencia cuya finalidad es fijar el objeto del proceso y
determinar si los trámites que han de seguirse son los del procedimiento del jurado.
En la vista20 el fiscal y a continuación las demás partes por su orden
concretarán la imputación ya efectuada. Son las partes quienes determinan el ámbito
subjetivo y objetivo del proceso del jurado y legitiman así la valoración realizada
por el juez tras la admisión de la denuncia o querella, o tras el conocimiento de los
hechos que dieron origen al proceso21. Además, a partir de esta vista se dota al
procedimiento de la necesaria contradicción.
Celebrada la comparecencia y como resultado de ella el juez de instrucción
debe pronunciarse22 inmediatamente (por aplicación del art. 198 Lecrim) sobre:

otras, en SS.T.S. de 14 de noviembre de 2.006, 28 de febrero de 2.007, 18 de noviembre de 2.008, 21 de


noviembre de 2.008, 1 de julio de 2.009, 25 de febrero de 2.010.
Y en el caso presente no puede sostenerse de ninguna manera que la atribución de la competencia al
Tribunal del Jurado haya sido precipitada, infundada y, mucho menos, arbitraria. (...) sin que la alegada
calificación por la defensa de homicidio culposo altere tal competencia pues no corresponde a la parte elegir
el procedimiento judicial aplicable al enjuiciamiento de los hechos, tratándose, como es, una cuestión de
orden público y olvidando que son los hechos y calificación jurídica de la acusación lo que deben servir de
base para la determinación de la competencia objetiva”
18
Dispone el art. 25.1 LOTJ el traslado de la imputación: incoado el procedimiento el Juez de Instrucción lo
pondrá inmediatamente en conocimiento de los imputados. Con objeto de concretar la imputación, les
convocará en el plazo de cinco días a una comparecencia así como al Ministerio Fiscal y demás partes
personadas. Al tiempo de la citación, dará traslado a los imputados de la denuncia o querella admitida a
trámite, si no se hubiese efectuado con anterioridad. El imputado estará necesariamente asistido de letrado
de su elección o, caso de no designarlo, de letrado de oficio.
19
Asimismo, dispone el art. 25.2 LOTJ. “si son conocidos los ofendidos o los perjudicados por el delito no
personados, se les citará para ser oídos en la comparecencia prevista en el apartado anterior y, al tiempo de
la citación, se les instruirá por medio de escrito, de los derechos a que hacen referencia los artículos 109 y
110 de la Ley de Enjuiciamiento Criminal, si tal diligencia no se efectuó con anterioridad. Especialmente se
les indicará el derecho a formular alegaciones y solicitar lo que estimen oportuno si se personan en legal
forma en dicho acto y a solicitar, en las condiciones establecidas en el artículo 119 de aquella Ley, el
derecho de asistencia jurídica gratuita.”
20
Artículo 25.3. LOTJ: “En la citada comparecencia, el Juez de Instrucción comenzará por oír al Ministerio
Fiscal y, sucesivamente, a los acusadores personados, quienes concretarán la imputación. Seguidamente,
oirá al letrado del imputado, quien manifestará lo que estime oportuno en su defensa y podrá instar el
sobreseimiento, si hubiere causa para ello, conforme a lo dispuesto en los artículos 637 o 641 de la Ley de
Enjuiciamiento Criminal. En sus intervenciones, las partes podrán solicitar las diligencias de investigación
que estimen oportunas”.
21
En caso de transformación en jurado de un ordinario o un abreviado deberá valorarse si es necesario
designar otro juez de instrucción pues el que ha optado por transformar el procedimiento estará
contaminado por la decisión y habrá practicado las diligencias que considerase necesarias en
procedimientos donde no rige como en el jurado el principio acusatorio.
22
Artículo 26 LOTJ. Decisión sobre la continuación del procedimiento.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 477


José María Lombardero Martín

1. La adecuación del procedimiento y la imputación concretada en este acto.


2. La continuación23 del procedimiento y la admisión de las diligencias pro-
puestas24
3. Alternativamente, sobre el sobreseimiento solicitado25.
Respecto al delito y los imputados, el artículo 28 LOTJ regula el caso de
surgir indicios a lo largo de la investigación de ser distinto el delito o los imputados
en el procedimiento26.

1. Oídas las partes, el Juez de Instrucción decidirá la continuación del procedimiento, o el sobreseimiento, si
hubiera causa para ello, conforme a lo dispuesto en los artículos 637 ó 641 de la Ley de Enjuiciamiento
Criminal.
2. Si el Ministerio Fiscal y demás partes personadas instan el sobreseimiento, el Juez podrá adoptar las
resoluciones a que se refieren los artículos 642 y 644 de la Ley de Enjuiciamiento Criminal.
El auto por el que acuerde el sobreseimiento será apelable ante la Audiencia Provincial.
23
Continuación del procedimiento: El juez acuerda continuar el procedimiento en virtud de las peticiones de
las partes y se pronunciará sobre las diligencias que han propuesto, valorando su relevancia, suficiencia y
pertinencia, admitiendo (u ordenando como complementarias) las que considere imprescindibles (útiles y
necesarias) para determinar si procede o no la apertura de juicio oral.
24
Artículo 27 LOTJ. Diligencias de investigación.
1. Si el Juez de Instrucción acordase la continuación del procedimiento, resolverá sobre la pertinencia de las
diligencias solicitadas por las partes, ordenando practicar o practicando por sí solamente las que considere
imprescindibles para decidir sobre la procedencia de la apertura del juicio oral y no pudiesen practicarse
directamente en la audiencia preliminar prevista en la presente Ley.
2. También podrán las partes solicitar nuevas diligencias dentro de los cinco días siguientes al de la
comparecencia o al de aquel en que se practicase la última de las ordenadas. Esta circunstancia será
notificada a las partes al objeto de que puedan instar lo que a su derecho convenga.
3. Además podrá el Juez ordenar, como complemento de las solicitadas por las partes, las diligencias que
estime necesarias, limitadas a la comprobación del hecho justiciable y respecto de las personas objeto de
imputación por las partes acusadoras.
4. Si el Juez considerase improcedentes las solicitadas y no ordenase ninguna de oficio, conferirá nuevo
traslado a las partes a fin de que insten, en el plazo de cinco días, lo que estimen oportuno respecto a la
apertura del juicio oral, formulando escrito de conclusiones provisionales. Lo mismo mandará el Juez
cuando estime innecesaria la práctica de más diligencias, aun cuando no haya finalizado la práctica de las ya
ordenadas.
Contra la resolución del juez de instrucción en materia de diligencias cabe recurso de reforma y subsidiario
de apelación en los términos de los arts. 222 y 311 Lecrim
25
Sobreseimiento: Si el fiscal y las demás partes solicitan el sobreseimiento el juez solo puede acordarlo o si
es el caso proceder conforme a los artículos 642 y 644 Lecrim. El auto acordando sobreseimiento es
directamente recurrible en apelación ante la Audiencia Provincial por disposición expresa del art. 26.2
LOTJ, sin la reforma previa del art. 222 Lecrim. Al respecto, STS 20/2004 de 19 enero. La aplicación
subsidiaria de la Lecrim solo procede cuando una circunstancia no venga expresamente prevista en la
LOTJ: “la supletoriedad (...)lo ha de ser a aquellos aspectos no resueltos directamente en la LOTJ(...)de
modo que la audiencia Provincial deberá resolver el recurso de apelación que le ha sido planteado en
tiempo y forma, pues al no hacerlo se ha denegado el derecho fundamental a la tutela judicial efectiva,
conforme ya tuvimos ocasión de pronunciarnos en nuestra Sentencia 2217/2001 de 15 de noviembre.”
26
Artículo 28 LOTJ. Indicios de distinto delito.
Si de las diligencias practicadas resultaren indicios racionales de delito distinto del que es objeto de
procedimiento o la participación de personas distintas de las inicialmente imputadas, se actuará en la forma
establecida en el artículo 25 de esta Ley o, en su caso, se incoará el procedimiento que corresponda si el
delito no fuese de los atribuidos al Tribunal del Jurado

478 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Tratamiento Procesal de la Competencia Objetiva del Tribunal del Jurado

Para el caso de ser el delito distinto pero también competencia del jurado, o
de existir más delitos también competencia del jurado (propia o que sean conexos), o
cuando existe variación o ampliación respecto a las personas inicialmente
imputadas, el 28 LOTJ ordena convocar la comparecencia del 25 LOTJ, ofreciendo
a las partes proponer nuevas diligencias, y garantizando respecto a los nuevos
imputados la contradicción bajo la cobertura del principio acusatorio.
Respecto a la adecuación del procedimiento, si se constata que el hecho
investigado finalmente no es constitutivo de delito que deba enjuiciar el Tribunal del
Jurado, ordena el art. 28 LOTJ in fine que el juez, tras la comparecencia del art. 25
LOTJ27, de oficio o a instancia de parte acordará la conversión del procedimiento de
jurado en el procedimiento adecuado al tipo de delito y la continuación de los
trámites por el mismo.

2 FASE INTERMEDIA
2.1 Calificaciones Provisionales
Una vez practicadas las diligencias de investigación propuestas por las partes
o acordadas de oficio por el juez, el art. 27.4 LOTJ dispone que el juez dé traslado a
las acusaciones por cinco días para que formulen escrito de conclusiones28 acusando
formalmente29 a los que hasta ese momento eran solo investigados y soliciten la
apertura del juicio oral30.

27
El TS convalida una comparecencia del Art. 25 LOTJ mal constituida por no cumplir sus condiciones si no
ha habido indefensión porque la vista no tuviera por objeto concretar la imputación sino proceder a la
transformación del procedimiento. STS 693/2004 de 26 de mayo, FJ.2ª: “nada obsta a su validez como una
solicitud del fiscal dirigida al juez acerca del procedimiento a seguir y sobre el órgano competente para el
enjuiciamiento, lo cual aquel puede efectuar en cualquier momento del proceso. Si el recurrente no
compartía el criterio adoptado por el juzgado en cuanto al procedimiento a seguir o en cuanto a la
competencia de la audiencia provincial para enjuiciar los hechos, pudo plantearlo en el momento
oportuno, sin que conste que lo haya hecho así.”
28
Artículo. 27.4. LOTJ Si el Juez considerase improcedentes las solicitadas y no ordenase ninguna de oficio,
conferirá nuevo traslado a las partes a fin de que insten, en el plazo de cinco días, lo que estimen oportuno
respecto a la apertura del juicio oral, formulando escrito de conclusiones provisionales. Lo mismo mandará
el Juez cuando estime innecesaria la práctica de más diligencias, aun cuando no haya finalizado la práctica
de las ya ordenadas.
29
En caso que alguna de las acusaciones entienda que procede el sobreseimiento por darse alguna de las
circunstancias del art. 637 Lecrim no presentará escrito de calificación sino escrito instando el
sobreseimiento y retirando la imputación inicial. Y si todas las acusaciones lo piden el juez de instrucción
quedará vinculado por dicha petición.
30
Artículo 29 LOTJ. Escrito de solicitud de juicio oral y calificación.
1. El escrito solicitando la apertura del juicio oral tendrá el contenido a que se refiere el artículo 650 de la
Ley de Enjuiciamiento Criminal.
2. De dicho escrito se dará traslado a la representación del acusado, quien formulará escrito en los términos
del artículo 652 de la Ley de Enjuiciamiento Criminal.
3. En ambos casos, se podrá hacer uso de las alternativas previstas en el artículo 653 de la Ley de
Enjuiciamiento Criminal.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 479


José María Lombardero Martín

Establece el art. 29.2 LOTJ que se dará traslado de los escritos de acusación a
la defensa por 5 días para formular su escrito en los términos del art. 652 Lecrim31.
La defensa puede plantear calificaciones alternativas e instar la práctica de
diligencias que no hayan sido practicadas, o que no hayan sido pedidas y denegadas
en su día32.
Respecto a la adecuación del procedimiento, siguiendo el cauce del art. 29.5
LOTJ33. las partes pueden instar en sus escritos de calificaciones provisionales la
adecuación del procedimiento si consideran que los hechos objeto de acusación no
son subsumibles en los delitos competencia del tribunal del jurado.
La Fiscalía general del Estado proporciona en su Circular 3/95 una serie de
criterios de actuación:
• Si el enjuiciamiento se estima que habrá de llevarse a cabo a través del
procedimiento abreviado y la inadecuación afecta a todos los hechos de la
causa, las partes han de evacuar el escrito de calificación y no limitarse a
pedir la acomodación del procedimiento. Ello es así porque más adelante
el 32.4 LOTJ prevé la acomodación en procedimiento abreviado con re-
misión al órgano competente, previa apertura del juicio oral, para que
“prosiga el conocimiento de la causa” lo que presupone que la califi-
cación fue formulada en el trámite del art. 29 de la Ley Orgánica 5/1995.
• Si la inadecuación se refiere solo a alguno de los delitos objeto de la
acusación, la solicitud se limitará entonces a la correspondiente deducción
de testimonio, sin que deban las partes presentar el escrito de calificación.
• Cuando los hechos (sean todos o parte de ellos) hayan de enjuiciarse por
procedimiento ordinario, tampoco procederá formular la calificación. Ello
se desprende de la necesidad de volver a la fase de instrucción para dictar
auto de procesamiento.

4. En sus respectivos escritos, las partes podrán proponer diligencias complementarias para su práctica en la
audiencia preliminar, sin que puedan ser reiteradas las que hayan sido ya practicadas con anterioridad.
31
“y a los terceros civilmente responsables (...) para que (..) manifiesten también, por conclusiones numeradas
y correlativas a las de la calificación que a ellos se refiera, si están conformes con cada una, o en otro caso
consignen los puntos de divergencia (...)”
32
Entiende PÉREZ MARTÍN, M.A. Op. cit. que en este momento y sin perjuicio de la dicción literal de la
LOTJ que permitiría pedir nuevas diligencias de investigación a practicar al inicio de la vista, en el trámite
de calificaciones lo que solicitan las partes con la solicitud de apertura de juicio oral es la práctica de
pruebas, con independencia de que también puedan proponer pruebas en otros dos momentos: en el trámite
de cuestiones previas del art. 36 LOTJ y en el trámite de alegaciones previas ante el Tribunal del Jurado, al
inicio de la vista del juicio oral, ex art. 49 LOTJ.
33
Art. 29.5. LOTJ: Las partes, cuando entiendan que todos los hechos delictivos objeto de acusación no son
de los que tienen atribuido su enjuiciamiento al Tribunal del Jurado, instarán en sus respectivos escritos de
solicitud de juicio oral la pertinente adecuación del procedimiento.
Si estiman que la falta de competencia ocurre solo respecto de alguno de los delitos objeto de la acusación,
la solicitud se limitará a la correspondiente deducción de testimonio suficiente, en relación con el que deba
excluirse del procedimiento seguido para ante el Tribunal del Jurado, y a la remisión al órgano
jurisdiccional competente para el seguimiento de la causa que corresponda.

480 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Tratamiento Procesal de la Competencia Objetiva del Tribunal del Jurado

• Si una de las partes solicitase la adecuación del procedimiento sin formular


calificación pero otra parte acusadora calificase por entender correcto el se-
guimiento del procedimiento ante el jurado y el Juez, tras la audiencia prelim-
inar, acordase la continuación del procedimiento del jurado y la apertura del
juicio oral, la parte que no hubiese calificado porque solicitaba la transfor-
mación deberá calificar, pero la Ley no prevé un nuevo traslado. La posi-
bilidad reconocida a las partes de modificar en la audiencia preliminar sus es-
critos de acusación, que se establece en el art. 31.3, no sirve a estos efectos
pues mal podrá en la audiencia preliminar “modificar” quien no calificó y
menos aún sin saber lo que vaya a resolver el Juez acerca de la transfor-
mación o continuación del procedimiento.
• La única opción posible tras la audiencia preliminar y una vez dictado auto de
apertura de juicio oral, es dar nuevo traslado para calificar a la parte que no lo
hizo antes por haber solicitado la transformación procedimental no atendida
por el Juez.
• Tras calificar esta parte, si su escrito no se aparta de los términos de la
apertura del juicio oral ya acordada, no será necesario convocar a una nueva
audiencia preliminar por estar ya resuelta la apertura del juicio sobre dicho
objeto procesal, aunque sí deberá darse traslado del escrito de calificación a
las restantes partes.
Sobre el cambio de procedimiento instado en los escritos de calificación, véase la
STS 854/2010. Las acusaciones en sus escritos de calificación solicitaron transformación
del procedimiento en Sumario y finalmente la Audiencia Provincial de Huesca dictó
sentencia condenatoria34.
Asimismo, el T.S.J. de Andalucía, en el Caso “Marta del Castillo” acordó seguir
el proceso ordinario por delitos graves correspondiendo su enjuiciamiento a la Audiencia
Provincial de Sevilla, basándose en los acuerdos no jurisdiccionales de enero-febrero de
2010, y entendiendo de los escritos de las acusaciones que el delito fin u objetivo
perseguido fueron las agresiones sexuales, y no siendo posible el enjuiciamiento por
separado de los delitos de agresión sexual y asesinato.
Cuando la falta de competencia lo sea solo para alguno de los delitos objeto de
acusación, deberán pedir las partes la deducción de testimonio y su remisión al tribunal

34
STS 854/2010 de 29 septiembre de 2010 (RJ\2010\7646) El Recurrente denuncia vulneración del derecho a
la tutela judicial efectiva en el aspecto del derecho al Juez predeterminado por la Ley, el Tribunal que
condenó al recurrente fue el de la Audiencia Provincial de Huesca, cuando debió ser juzgado por el Tribunal
del Jurado. En el caso, toda la instrucción lo fue por los trámites del Tribunal del Jurado, y solo en el último
momento de la calificación provisional se interesó por el Ministerio Fiscal, con apoyo de las Acusaciones,
Particular y Popular (que lo habían intentado con anterioridad sin éxito) el cambio de proceso; con
formación de Sumario y remisión a la Audiencia Provincial de Huesca para su enjuiciamiento. Pero se
deniega la casación porque la resolución que acordó la tramitación de la causa por los cauces del
procedimiento Sumario, y la propia sentencia recurrida lo fue con anterioridad al Pleno no Jurisdiccional de
20 de Enero de 2010: los Acuerdos de la Sala no tienen vigencia retroactiva, sino que solo se proyectan
hacia los actos procesales posteriores a la fecha del acuerdo.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 481


José María Lombardero Martín

que consideren competente, respetando las reglas sobre delitos conexos35 de los artículos
5.2 LOTJ y 17 Lecrim36, interpretados conforme a los Acuerdos no jurisdiccionales del
Tribunal Supremo.
Tratándose de delitos que inicialmente se consideraron conexos, se separará su
conocimiento y el juez ordenará la deducción de testimonio cuando sea posible dividir la
continencia de la causa.
Respecto a la divisibilidad de la continencia de la causa véase el Auto 425/2010
de 21 de mayo de la Audiencia Provincial de Granada37: En ese caso se estimó
parcialmente el recurso de apelación y se revocó el auto de transformación a Sumario,
para que se incoe respecto al homicidio el procedimiento ante el Tribunal del Jurado, y
siendo posible en el caso su enjuiciamiento por separado, la tenencia ilícita de armas
se acomode a los tramites del Procedimiento Abreviado.
Cuando no sea posible dividir la continencia de la causa y como sea que
actualmente conforme al Acuerdo no jurisdiccional de 9 de marzo de 2017 el Jurado
no puede perder la competencia sobre delitos propios por existir otros delitos
conexos a ellos, el Jurado conocerá de todos los delitos y solo excepcionalmente
perderá la competencia.

35
Vid. VALLESPÍN PÉREZ, D. El tractament dels delictes conexes davant el Tribunal del Jurat a Catalunya.
CIMS, Barcelona 2007; La conexión en el proceso penal CIMS, Barcelona 2007; Conexión penal en la ley
de enjuiciamiento criminal española. Análisis tras su reforma por Ley 41/2015. Juruá, Porto 2019.
36
Respecto a la acumulación que condicionalmente permite el actual art. 17.3 Lecrim, CUBILLO LÓPEZ, I.J.
“Las causas de conexión penal y su aplicación tras la reforma operada por la Ley 41/2015” en Estudios de
Deusto 65, 2017 nª 2 p. 39-83 realiza una importante precisión: “si concurre un motivo de los que propician
la llamada conexión “necesaria” o “sustantiva”, relativo a la seguridad jurídica, o a que se pueda
calificar como es correcto, deberá decretarse la acumulación; y solo cuando no haya una razón de genuina
necesidad, podrá atenderse –para decidir entre la acumulación o la separación de causas– a las razones de
economía procesal, razones que son siempre de conveniencia. Por ello, la conexión fundada únicamente en
la economía procesal se denomina –en la jurisprudencia que hemos examinado– como conexión
“conveniente” o “contingente” o “de mera funcionalidad procesal” (...) “solo diremos –con referencia a lo
que se acaba de señalar– que la decisión del Juez sobre el enjuiciamiento conjunto de hechos punibles con
apariencia de delitos conexos habrá de exteriorizarse y razonarse, por toda la valoración que entraña, y
debe poder impugnarse.”
37
Auto 425/2010 de 21 de mayo de la AP de Granada (JUR 2010\363825): “en el presente caso no cabe
duda que no se rompe la continencia de la causa, celebrando por separado el delito de tenencia ilícita de
armas y el homicidio, de ahí que aquel deberá verse en el Procedimiento Abreviado y por el Juzgado de lo
Penal correspondiente, y este en el ámbito de la Audiencia Provincial por el Procedimiento del Jurado.
Téngase presente según los datos obrantes en las actuaciones, aquel arma corta la poseía con anterioridad y
no estaba amparada por guía, alguna ni por licencia o permiso de armas para este tipo. Por lo que el delito
no lo comete cuando dispara sobre la víctima, de ahí que no exista problema alguno para juzgarlo
separadamente, máxime si podemos también adelantar la inexistencia de conexidad, en tanto que con el
delito de tenencia no facilitaba su ejecución, puesto que además del arma contaría de dos escopetas calibre
12 que se encontraban en su domicilio. Entiende la Sala que el procedimiento del Jurado es el adecuado
para juzgar del delito de homicidio y el procedimiento abreviado para conocer del delito de tenencia ilícita
de armas, por tanto estimando parcialmente el recurso de apelación formulado al ser posible legalmente el
enjuiciamiento por separado de cada delito en sendos procesos sin que se divida la continencia de la Causa,
se revoca el auto que acuerda la transformación a Sumario Ordinario (30.12.2009) y el de procesamiento
(04.01.2010), para que se incoe respecto al homicidio el procedimiento para ante el Tribunal del Jurado, y la
tenencia ilícita de armas se acomode a los tramites del procedimiento abreviado.”

482 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Tratamiento Procesal de la Competencia Objetiva del Tribunal del Jurado

2.2 Audiencia Preliminar


La Audiencia Preliminar se convoca en los términos del Art. 30 LOTJ38 al
objeto de decidir sobre la pertinencia de la apertura de Juicio Oral. Si se convoca
quedando pendiente alguna diligencia a practicar con anterioridad o a pesar de no
haber solicitado ninguna parte la apertura de juicio oral por entender procedente el
sobreseimiento, pueden las partes recurrir en reforma y queja por los cauces de los
artículos 216 y 218 Lecrim.
La celebración de la Audiencia Preliminar viene regulada en el art. 31
LOTJ39.
Dispone el art. 31.3 LOTJ que en ella y tras practicar las diligencias interesa-
das se oirá a las partes sobre la procedencia de la apertura del juicio oral y, en su
caso, sobre la competencia del Tribunal del Jurado para el enjuiciamiento. Las acu-
saciones pueden modificar los términos de su petición de apertura de juicio oral, sin
que sea admisible la introducción de nuevos elementos que alteren el hecho justicia-
ble o la persona acusada40.

38
Artículo 30 LOTJ. Convocatoria de la audiencia preliminar.
1. Una vez presentado el escrito de calificación de la defensa, el Juez señalará el día más próximo posible
para audiencia preliminar de las partes sobre la procedencia de la apertura del juicio oral, salvo que estén
pendientes de practicarse las diligencias de investigación solicitadas por la defensa del imputado y
declaradas pertinentes por el Juez. Una vez practicadas estas, el Juez procederá a efectuar el referido
señalamiento. Al tiempo resolverá sobre la admisión y práctica de las diligencias interesadas por las partes
para el acto de dicha audiencia preliminar.
Si el Juez no acordare la convocatoria de la audiencia preliminar, las partes podrán acudir en queja ante la
Audiencia Provincial.
2. La audiencia preliminar podrá ser renunciada por la defensa de los acusados, aquietándose con la apertura
del juicio oral, en cuyo caso, el Juez decretará esta, sin más, en los términos del artículo 33 de la presente
Ley. Para que dicha renuncia surta efecto ha de ser solicitada por la defensa de todos los acusados.
39
Artículo 31 LOTJ. Celebración de la audiencia preliminar.
1. En el día y hora señalados se celebrará la audiencia preliminar comenzando por la práctica de las
diligencias propuestas por las partes.
2. Las partes podrán proponer en este momento diligencias para practicarse en el acto. El Juez denegará
toda diligencia propuesta que no sea imprescindible para la adecuada decisión sobre la procedencia de la
apertura del juicio oral.
3. Terminada la práctica de las diligencias admitidas, se oirá a las partes sobre la procedencia de la apertura
del juicio oral y, en su caso, sobre la competencia del Tribunal del Jurado para el enjuiciamiento. Las
acusaciones pueden modificar los términos de su petición de apertura de juicio oral, sin que sea admisible la
introducción de nuevos elementos que alteren el hecho justiciable o la persona acusada.
40
No pueden alterar los hechos justiciables ni la persona acusada, porque el acusado debe saber a qué atenerse
y ello incidiría desfavorablemente en su derecho de defensa. Sí puede producirse la retirada de alguna de las
acusaciones que esperaban hacerse valer en el acto del juicio oral. Véase: VARELA CASTRO, L. en
AA.VV Manual del jurado op. cit, p. 259

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 483


José María Lombardero Martín

2.3 Auto De Sobreseimento O De Apertura De Juicio Oral


Contenido del auto: Tras la Audiencia Preliminar o en los tres días siguientes
el juez dictará Auto decidiendo sobre la apertura o no del juicio oral41. Puede
también acordar diligencias complementarias antes de resolver. La apertura de juicio
oral procederá entre otros casos cuando las defensas hubiesen manifestado su
acuerdo en sus respectivos escritos de calificaciones conforme establecen los
artículos 27.4 y 29.1 LOTJ. En sentido opuesto, puede el juez acordar el
sobreseimiento total si no se dan los requisitos para decretar la apertura de juicio
oral cuando se cumplan los requisitos del art. 637 Lecrim42, pero si el
sobreseimiento es parcial a tenor del art. 640 Lecrim43 podrá acordar la apertura del
juicio oral. Este auto de sobreseimiento es recurrible en apelación ante la Audiencia
Provincial.
Acomodación del Procedimiento: En consonancia con el resultado de lo
previsto para la Audiencia Preliminar en el artículo 31.3 LOTJ, el artículo 32.4
LOTJ permite al juez ordenar la acomodación44 de las actuaciones al Procedimiento
que corresponda si no es aplicable el Procedimiento del Jurado, dictando – por auto
– la apertura de juicio oral para que la causa sea resuelta por los trámites adecuados,
siguiendo el 783 Lecrim45 y remitiendo las actuaciones al órgano que resulte

41
Artículo 32.LOTJ Auto de sobreseimiento o de apertura de juicio oral.
1. Concluida la audiencia preliminar, en el mismo acto o dentro de los tres días siguientes, el Juez dictará
auto por el que decidirá la apertura o no del juicio oral. Si decide la no apertura del juicio oral acordará el
sobreseimiento. Podrá asimismo decretar la apertura del juicio oral y el sobreseimiento parcial en los
términos del artículo 640 de la Ley de Enjuiciamiento Criminal si concurre en alguno de los acusados lo
previsto en el artículo 637.3.º de la Ley de Enjuiciamiento Criminal.
2. La resolución por la que acuerda el sobreseimiento es apelable ante la Audiencia Provincial. La que
acuerda la apertura del juicio oral no es recurrible, sin perjuicio de lo previsto en el artículo 36 de la presente
Ley.
3. También podrá el Juez ordenar la práctica de alguna diligencia complementaria, antes de resolver, si la
estimase imprescindible de resultas de lo actuado en la audiencia preliminar.
42
Artículo 637 Lecrim. Procederá el sobreseimiento libre:
1.º Cuando no existan indicios racionales de haberse perpetrado el hecho que hubiere dado motivo a la
formación de la causa.
2.º Cuando el hecho no sea constitutivo de delito.
3.º Cuando aparezcan exentos de responsabilidad criminal los procesados como autores, cómplices o
encubridores.
43
Artículo 640 Lecrim. En el caso 3.º del artículo 637, se limitará el sobreseimiento a los autores, cómplices
o encubridores que aparezcan indudablemente exentos de responsabilidad criminal, continuándose la causa
respecto a los demás que no se hallen en igual caso. Es aplicable a los procesados a quienes se declare
exentos de responsabilidad lo dispuesto en el artículo 638.
44
Artículo 32.4.LOTJ: “En su caso, podrá el Juez ordenar la acomodación al procedimiento que corresponda
cuando no fuese aplicable al regulado en esta Ley. Si considera que el que corresponde es el regulado en el
Título II del Libro IV de la Ley de Enjuiciamiento Criminal, acordará la apertura del juicio oral, si la estima
procedente, y remitirá la causa a la Audiencia Provincial o al Juez de lo Penal competente para que prosigan
el conocimiento de la causa en los términos de los artículos 785 y siguientes de dicha Ley”
45
Artículo 783 Lecrim.

484 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Tratamiento Procesal de la Competencia Objetiva del Tribunal del Jurado

competente. Prevé el art. 33 d) LOTJ que en todo caso el auto de apertura de juicio
oral debe determinar el órgano competente46.

3 FASE DE JUICIO ORAL


3.1 Examen De Oficio Por El Magistrado Presidente
Siendo la competencia objetiva un auténtico presupuesto procesal cabe su
examen de oficio por el Magistrado-presidente del Tribunal, o a instancia de
cualquiera de las partes procesales47.
Si bien el Magistrado-presidente del Tribunal puede examinar de oficio la
competencia objetiva, por el momento en que puede proceder a dicho examen – con
posterioridad a la apertura del juicio oral y a la resolución de las cuestiones previas,
planteadas por las partes al amparo de lo dispuesto en el artículo 36 de la LOTJ48, ya

1. Solicitada la apertura del juicio oral por el Ministerio Fiscal o la acusación particular, el Juez de
Instrucción la acordará, salvo que estimare que concurre el supuesto del n. 2 del artículo 637 o que no
existen indicios racionales de criminalidad contra el acusado, en cuyo caso acordará el sobreseimiento que
corresponda conforme a los artículos 637 y 641.
Cuando el Juez de Instrucción decrete la apertura del juicio oral solo a instancia del Ministerio Fiscal o de la
acusación particular, el Secretario judicial dará nuevo traslado a quien hubiere solicitado el sobreseimiento
por plazo de tres días para que formule escrito de acusación, salvo que hubiere renunciado a ello.
2. Al acordar la apertura del juicio oral, resolverá el Juez de Instrucción sobre la adopción, modificación,
suspensión o revocación de las medidas interesadas por el Ministerio Fiscal o la acusación particular, tanto
en relación con el acusado como respecto de los responsables civiles, a quienes, en su caso, exigirá fianza, si
no la prestare el acusado en el plazo que se le señale, así como sobre el alzamiento de las medidas adoptadas
frente a quienes no hubieren sido acusados.
En el mismo auto señalará el Juez de Instrucción el órgano competente para el conocimiento y fallo de la
causa.
3. Contra el auto que acuerde la apertura del juicio oral no se dará recurso alguno, excepto en lo
relativo a la situación personal, pudiendo el acusado reproducir ante el órgano de enjuiciamiento las
peticiones no atendidas.
46
Artículo 33 d) LOTJ. El auto que decrete la apertura del juicio oral determinará: El órgano competente
para el enjuiciamiento.
47
El Acuerdo del Pleno de 29 de enero de 2008 señala que: “Conforme al artículo 240.2 apartado 2 de la
LOPJ, en todos los recursos de casación promovidos contra sentencias dictadas por las Audiencias
Provinciales o los Tribunales Superiores de Justicia, en el procedimiento del Jurado, la Sala solo examinará
de oficio su propia competencia. Las alegaciones sobre la falta de competencia objetiva o la inadecuación
de procedimiento, basadas en la vulneración del artículo 5 de la LOTJ, habrán de hacerse valer por los
medios establecidos, con carácter general, en la Ley de Enjuiciamiento Criminal y en la LO 5/1995,
reguladora del Tribunal del Jurado.”
Acogido, entre otras, por SSTS. Sala 2ª, n. 166/2007, de 16.04.2008 y 942/2016 de 16 de diciembre.
48
La STS. 2217/2001, de 26 de noviembre declara admisible que el Magistrado-Presidente del Tribunal del
Jurado la pueda cuestionar de oficio, sin necesidad que se haya planteado cuestión previa por alguna de las
partes (art. 36 LOTJ). La decisión será recurrible en apelación ante la Sala de lo Civil y Penal del TSJ
(artículos 676 y 846 bis a) a f) LECrim); no cabe casación por tratarse de una resolución interlocutoria y no
definitiva.
La STS. 830/2009, de 16 de julio declara asimismo que la inadecuación del procedimiento no conlleva
nulidad de actuaciones si no se ha producido indefensión material de alguna de las partes.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 485


José María Lombardero Martín

no es viable ningún problema de competencia objetiva que habría sido resuelto en la


“audiencia preliminar” o anteriormente49.
En relación con la apreciación de oficio de la falta de competencia véase la
STS. 315/201650. El TS deniega la casación en un sumario por delitos de asesinato,
robo con intimidación y uso de arma en grado de tentativa, y tenencia ilícita de
armas. Dicha Sentencia contiene un voto particular del Magistrado de la Sala 2ª,
Luciano Varela, a la luz de la reforma del art. 17 LeCrim y el Acuerdo no
jurisdiccional de enero-febrero de 2010. que resulta doctrinalmente relevante, por
cuanto anticipó la interpretación ampliatoria de la competencia del jurado en los
delitos conexos que. hizo el Tribunal Supremo en el Acuerdo no jurisdiccional de 9
de marzo de 2017.

3.2 Cuestiones previas. Cuestionamiento a instancia de parte


Las partes al tiempo de personarse ante el Tribunal del Jurado de la
Audiencia Provincial, ante el que son emplazadas por quince días hábiles por el juez
de instrucción tras dictar el auto de apertura de juicio oral, (que en sí mismo es
irrecurrible) podrán plantear al amparo de lo dispuesto en el artículo 36,1 a) de la
LOTJ51 como artículo de previo pronunciamiento la “declinatoria de jurisdicción”
del artículo 666, 1° de la LECrim52.
Si el Magistrado-presidente admite la cuestión previa, y firme que sea su
resolución se remitirán los autos al Tribunal o Juez competente.

49
Vid. GARBERI LLOBEGAT, J. “Ley Orgánica del Tribunal del Jurado (comentarios prácticos al nuevo
proceso penal ante el Tribunal del Jurado)” con GIMENO SEDRA,V. 1ª ed. Madrid 1996 , p. 62.
50
STS. 315/2016 de 14.04.2016 (ROJ STS 1666/2016) Entiende Luciano Varela que hay que decretar la
nulidad de oficio por falta de competencia objetiva del tribunal que dictó la sentencia recurrida. No se ha
planteado pero resulta competente el Tribunal del Jurado por aplicación del art. 5 LOTJ y acuerdo de pleno
no jurisdiccional de 20 de enero y 23 de febrero de 2010, y del que él discrepa pues limita la extensión de la
competencia por razón de conexión del art. 5 LOTJ en casos que el legislador pudo y no quiso hacerlo. El
legislador en la extensión competencial por razón del 5.2.C LOTJ no diferencia entre el objetivo principal
de la estrategia delictiva del autor y la opción adoptada de manera meramente instrumental. Sin embargo el
pleno no jurisdiccional condicionó la extensión competencial del tribunal al exigir que el delito conexo se
haya cometido teniendo como objetivo principal cometer un delito que sea competencia del Tribunal del
Jurado y con ello suplantó la voluntad del legislador. Ciertamente erradicó la aplicación indebida del 17.5
Lecrim a casos donde concurren delitos del Tribunal del Jurado con otros que no lo son. Cualquiera que sea
la relación de otros delitos que no son competencia del Tribunal del jurado con otros que si lo son, nunca
puede determinar la extensión de la competencia de la Audiencia Provincial sin jurado a los delitos que no
le están atribuidos por estarlo al Tribunal del Jurado.
51
Artículo 36 LOTJ. Planteamiento de cuestiones previas.1. Al tiempo de personarse las partes podrán: a)
Plantear alguna de las cuestiones o excepciones previstas en el artículo 666 de la Ley de Enjuiciamiento
Criminal o alegar lo que estimen oportuno sobre la competencia o inadecuación del procedimiento. 2. Si se
plantease alguno de estos incidentes se le dará la tramitación establecida en los artículos 668 a 677 de la Ley
de Enjuiciamiento Criminal.
52
Artículo 666. Lecrim Serán tan solo objeto de artículos de previo pronunciamiento las cuestiones o
excepciones siguientes: 1.a La de declinatoria de jurisdicción.

486 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Tratamiento Procesal de la Competencia Objetiva del Tribunal del Jurado

El auto que resuelva la cuestión previa del art. 36.1 a) LOTJ sobre la
competencia del tribunal podrá recurrirse en apelación ante la Sala Civil y Penal del
Tribunal Superior de Justicia (artículo 676, 3° LECrim.)53
Advierte la Fiscalía General del Estado en su Circular 3/95 que si la
acomodación procedimental se planteó en fase de instrucción y se plantea luego ante
el Magistrado-Presidente como “cuestión previa” al amparo del art. 36.1, a), y,
ulteriormente, por medio de recurso de apelación, llega ante el Tribunal Superior de
Justicia, se está en el caso de una doble vía de planteamiento del asunto (Juez de
Instrucción con recurso ante la Audiencia y Magistrado Presidente con recurso ante
el Tribunal Superior de Justicia)
Por ello entiende la Fiscalía General del Estado que el Magistrado-Presidente
no ha de resolver la cuestión previa en forma distinta a la sostenida por la Audiencia
Provincial al resolver el anterior recurso de queja en fase de instrucción, salvo que se
dieran nuevos elementos de juicio desconocidos entonces.
Además deberá ceder el criterio de la Audiencia Provincial ante la resolución
del Tribunal Superior de Justicia al que por la vía de los arts. 36.1, a) y 846 bis, a),
hubiera llegado tal cuestión.
El Tribunal Supremo en la sentencia STS 689/201254 en primer lugar aplica
el Acuerdo de Pleno no jurisdiccional la Sala de Gobierno de 29 de enero de 2008
“las cuestiones relacionadas con la competencia deben tramitarse en la instancia
hasta el agotamiento de los medios de impugnación, de forma que, en lo posible, el
asunto quede resuelto antes del comienzo del juicio oral”. y en segundo lugar, res-
pecto régimen de recursos previsto en la LOTJ expone: “En ese sentido, ha de reco-
nocerse que la regulación de los recursos en la materia presenta algunas deficien-
cias pues si la causa se tramita por las normas de la LOTJ, contra la decisión de
este tribunal respecto de las cuestiones planteadas conforme al artículo 36 de la ley
cabe recurso de apelación que será resuelto por el Tribunal Superior de Justicia,
sin que contra esa decisión quepa recurso de casación.”

53
Artículo 676. Lecrim: “Si el Tribunal no estimare suficientemente justificada la declinatoria, declarará no
haber lugar a ella, confirmando su competencia para conocer del delito. Si no estima justificada cualquier
otra, declarará simplemente no haber lugar a su admisión mandando en consecuencia continuar la causa
según su estado. Contra el auto resolutorio de la declinatoria y contra el que admita las excepciones 2.a, 3.a
y 4.a del artículo 666, procede el recurso de apelación. Contra el que las desestime, no se da recurso alguno
salvo el que proceda contra la sentencia sin perjuicio de lo dispuesto en el artículo 678.”
El Acuerdo del Pleno no jurisdiccional de la Sala 2ª, del 8 de mayo de 1998, interpreta que “el actual
artículo 676 LECrim tras su modificación por ley 5/95 de 22 de mayo debe interpretarse en el sentido de
que la apelación que en él se contempla es únicamente admisible en el ámbito competencial que la L.O.
5/95 atribuye al Jurado, y su decisión en este limitado campo corresponde al Tribunal Superior de Justicia
correspondiente. Fuera de este ámbito procesal el recurso que corresponde es el de casación ante la Sala II
del Tribunal Supremo a través de lo dispuesto en el artículo 848 LECrim.” (STS. Sala 2ª, n. 60/2004, de 22
de enero).
54
STS. 689/2012, de 20 de setiembre (Roj: STS 6092/2012)

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 487


José María Lombardero Martín

Con posterioridad al planteamiento de las cuestiones previas no será posible


el cuestionamiento de la competencia objetiva del Tribunal del Jurado55, ni siquiera
por vía de modificación de las calificaciones jurídicas en el trámite de conclusiones
definitivas, que impide que tenga como efecto el cambio de procedimiento el art.
48.3 LOTJ56..
Tampoco conllevará el cambio de procedimiento la inclusión en el objeto del
veredicto, (y siempre que se respete el hecho justiciable) de posibilidades fácticas
que se sometan a la decisión del jurado que lleven a una calificación subsidiaria o
alternativa57 y alguna de estas posibilidades sea extraña al listado del artículo 1.2
LOTJ58 (por ejemplo, propone como posibilidad subsidiaria al delito de homicidio
doloso, el de homicidio por imprudencia) No procederá, por el solo hecho señalado,
dictar resolución de incompetencia y acomodación del procedimiento, sino que el
veredicto y la ulterior sentencia se extenderán a dicha opción59.
El Auto 146/2016 de 29 de febrero del Tribunal Superior de Justicia de
Cataluña que resuelve cuestiones previas del art. 36 LOTJ, se pronuncia sobre esta
cuestión y en el mismo sentido60.

55
Artículo 678 Lecrim. “Las partes podrán reproducir en el juicio oral, como medios de defensa, las
cuestiones previas que se hubiesen desestimado, excepto la de declinatoria. Lo anterior no será de aplicación
en las causas competencia del Tribunal del Jurado sin perjuicio de lo que pueda alegarse al recurrir contra la
sentencia.”
56
Artículo 48 LOTJ. Modificación de las conclusiones provisionales y conclusiones definitivas.
1. Concluida la práctica de la prueba, las partes podrán modificar sus conclusiones provisionales.
2. El Magistrado-Presidente requerirá a las partes en los términos previstos en el apartado 3 del artículo 788
de la Ley de Enjuiciamiento Criminal, estándose, en su caso, a lo dispuesto en el apartado 4 del citado
precepto.
3. Aun cuando en sus conclusiones definitivas las partes calificasen los hechos como constitutivos de un
delito de los no atribuidos al enjuiciamiento del Tribunal del Jurado, este continuará conociendo.
57
El art. 52.g) LOTJ al tratar de la determinación del objeto del veredicto establece:
“El Magistrado-Presidente, a la vista del resultado de la prueba, podrá añadir hechos o calificaciones
jurídicas favorables al acusado siempre que no impliquen una variación sustancial del hecho justiciable, ni
ocasionen indefensión. Si el Magistrado-Presidente entendiese que de la prueba deriva un hecho que
implique tal variación sustancial, ordenará deducir el correspondiente tanto de culpa”.
58
STS 688/2013 de 30 septiembre de 2013 (RJ 2013\7635): “sin que la alegada calificación por la defensa de
homicidio culposo altere tal competencia pues no corresponde a la parte elegir el procedimiento judicial
aplicable al enjuiciamiento de los hechos, tratándose, como es, una cuestión de orden público y olvidando
que son los hechos y calificación jurídica de la acusación lo que deben servir de base para la determinación
de la competencia objetiva.”
59
Circular FGE n. 3/1995, de 27 de diciembre, sobre el proceso ante el Tribunal del Jurado: su ámbito de
aplicación.
60
El recurso discute la competencia del tribunal por una divergente calificación del tipo delictivo que solo
puede resolverse celebrando el juicio oral. El Tribunal Superior se pronuncia a favor de la competencia del
Tribunal, y sobre el alcance, contenido y sentido de las cuestiones previas ante el Tribunal del Jurado. El art.
36 LOTJ no ampara una petición de sobreseimiento, ni tampoco en el caso de plantearse conclusiones
alternativas sobre la calificación de homicidio (...) sustraer su conocimiento al Jurado, en tanto que su
decisión deja de tener contenido procesal para conformar una resolución sobre el fondo (...).Solo una vez
celebrado el juicio y que se cuente ya con el resultado de las pruebas practicadas y con las reflexiones que
su análisis sugiera a las partes, incluida también una eventual alteración de sus conclusiones provisionales,

488 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Tratamiento Procesal de la Competencia Objetiva del Tribunal del Jurado

III LA INADECUACIÓN DE PROCEDIMIENTO EN LA LECRIM.


El Acuerdo no Jurisdiccional del Tribunal Supremo de 29 de enero de 2008,
dispone que “Las alegaciones sobre la falta de competencia objetiva o la
inadecuación de procedimiento, basadas en la vulneración del artículo 5 de la LOTJ,
habrán de hacerse valer por los medios establecidos, con carácter general, en la Ley
de Enjuiciamiento Criminal y en la LO 5/1995, reguladora del Tribunal del Jurado”.
Podemos traer a colación diversos autos dictados por las Audiencias
Provinciales que resuelven a favor de la aplicación del Procedimiento de Jurado
recursos en materia de adecuación de procedimiento: AP de Granada Auto 425/2010
de 21 de mayo61; AP de Lleida auto 590/2014 de 30 de diciembre62; AP de Castellón
Auto 250/2016 de 27 de mayo63.
También puede consultarse el Auto del Tribunal Supremo 1467/2015 de
fecha 5-11-2015 (JUR 2015\291724) El recurrente considera vulnerado el derecho al
juez ordinario predeterminado por la ley porque la resolución recurrida ordena la
tramitación por el procedimiento sumario ordinario y no acuerda su tramitación
conforme a la Ley del Jurado. Como dice la STS 964/2006 la mera existencia de una
discrepancia interpretativa sobre la normativa legal que distribuye la competencia
sobre los órganos de la jurisdicción penal ordinaria, no constituye infracción del
derecho fundamental al Juez ordinario predeterminado por la Ley invocado64, por
tanto no permite casación ni tiene relevancia constitucional.

podrá el jurado popular pronunciarse. El artículo 48.3 de la Ley permite al Tribunal continuar conociendo
pese a que se produzca una eventual calificación de los hechos como integrantes de un delito ajeno a la
competencia del Jurado.
61
AAP Granada Auto 425/2010 de 21 de mayo (JUR 2010\363825). Entiende la Sala que el procedimiento
del Jurado es el adecuado para juzgar del delito de homicidio y el procedimiento abreviado para conocer del
delito de tenencia ilícita de armas, por tanto estimando parcialmente el recurso de apelación formulado al
ser posible legalmente el enjuiciamiento por separado de cada delito en sendos procesos sin que se divida la
continencia de la Causa, se revoca el auto que acuerda la transformación a Sumario Ordinario (30.12.2009)
y el de procesamiento (04.01.2010), para que se incoe respecto al homicidio el procedimiento para ante el
Tribunal del Jurado, y la tenencia ilícita de armas se acomode a los trámites del procedimiento abreviado.
62
AAP de Lleida auto 590/2014 de 30 de diciembre (JUR 2015\81189) la transformación del procedimiento
de Diligencias Previas a Jurado, que se recurre, fue correcta por cuanto la infidelidad en la custodia de
documentos cometida por el funcionario de correos es MEDIAL con la malversación, para procurar su
impunidad, y ello en aplicación del acuerdo de 23.02.2010.
63
AAP de Castellón Auto 250/2016 de 27 de mayo. (JUR 2016\151864) El Ministerio Fiscal interpone
recurso de Queja y la audiencia ordena seguir los trámites del Jurado por ser en este caso el allanamiento el
delito-fin.
64
Y sin embargo la abundante Jurisprudencia que rechaza las numerosas invocaciones de vulneración del
derecho al juez ordinario predeterminado por la ley, la STS de 26 de junio de 2009 advierte que la alteración
injustificada de la competencia del Tribunal del Jurado a favor de la Audiencia Provincial sí vulnera ese
derecho fundamental. Pues no es la mera asignación del conocimiento de una causa a otro órgano igual en
distinto territorio, o con competencia distinta en función de la pena aparejada, sino que estamos ante
órganos totalmente diferentes, con trámites procesales propios. Véase MUÑOZ CUESTA, F. J.
“Competencia del tribunal del jurado. Especial referencia a los delitos conexos: STS de 26 de junio de
2009.” En Revista Aranzadi Doctrinal n. 8/2009 Estudios. Cizur Menor, 2009.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 489


José María Lombardero Martín

El medio establecido en la LECrim para el Sumario ordinario son los artícu-


los de previo pronunciamiento del art. 666 de la LECrim.
Precisa la STS 689/2012, de 20 de setiembre que “cuando se está en un su-
mario ordinario, existe un trámite especialmente previsto para solventar la cuestión,
consistente en su planteamiento como artículo de previo pronunciamiento, contra
cuya resolución cabe recurso de casación, en el que el Tribunal Supremo resolvería
definitivamente la cuestión con anterioridad al comienzo del juicio oral”65.
Además, la STS 689/2012, de 20 de septiembre aplicando el Acuerdo de
29.01.200866 insiste en que las cuestiones relacionadas con la competencia deben
tramitarse en la instancia hasta el agotamiento de los medios de impugnación, “de
forma que, en lo posible, el asunto quede resuelto antes del comienzo del juicio
oral.”67
La Sentencia del Tribunal Supremo STS 942/201668 recuerda el
planteamiento rogado y temporáneo de la competencia. Basándose en el artículo
240.2 LOPJ en todos los recursos en asuntos del Tribunal del Jurado el tribunal
(supremo) solo examinará de oficio su propia competencia, Las alegaciones de falta
de competencia objetiva o inadecuación del procedimiento basadas en el artículo 5
LOTJ han de hacerse valer por los medios establecidos con carácter general en la
Lecrim y en la LOTJ. El Ministerio Fiscal invocó el acuerdo no jurisdiccional de 29
de enero de 2008 por extemporaneidad de la reclamación en recurso de la falta de
competencia. Aplican este acuerdo las sentencias del supremo 166/2007 de
16.04.2008, y 689/2012; Las cuestiones relacionadas con la competencia deben
tramitarse en la instancia hasta el agotamiento de los medios de impugnación, de
modo que en lo posible el asunto quede resuelto antes del comienzo del Juicio Oral.
También lo aplica la STS 822/2013 donde se planteó al inicio del Juicio Oral la falta
de competencia: El legislador ha querido que al comienzo del juicio oral cualquier
controversia acerca de la determinación de la competencia haya quedado
definitivamente zanjada. De ahí que arbitre incluso una casación anticipada contra la
resolución que resuelve sobre esta materia en la fase intermedia. Luciano Varela

65
“... de otro lado, las cuestiones relacionadas con la competencia deben tramitarse en la instancia hasta el
agotamiento de los medios de impugnación, de forma que, en lo posible, el asunto quede resuelto antes del
comienzo del juicio oral. En ese sentido, ha de reconocerse que la regulación de los recursos en la materia
presenta algunas deficiencias. Pues si la causa se tramita por las normas de la LOTJ, contra la decisión de
este tribunal respecto de las cuestiones planteadas conforme al artículo 36 de la ley, cabe recurso de
apelación que será resuelto por el Tribunal Superior de Justicia, sin que contra esa decisión quepa recurso de
casación. Sin embargo, si la causa se ha tramitado como procedimiento ordinario, la cuestión puede
plantearse al amparo del artículo 666 como artículo de previo pronunciamiento, contra cuya resolución cabe
recurso de casación, en el que el Tribunal Supremo resolvería definitivamente la cuestión con anterioridad
al comienzo del juicio oral.”.
66
aplicado por la STS.166/2007, de 16.04.2008
67
Ver además la STS 822/2013 de 6 de noviembre de 2013 (RJ 2013\7648): El legislador quiere que al inicio
de juicio oral cualquier controversia sobre determinación de la competencia haya quedado definitivamente
zanjada, de ahí que arbitre una casación anticipada contra la resolución que resuelve sobre esta materia en la
fase intermedia.
68
STS 942/2016 de 16 de diciembre de 2016 (ROJ STS 5493/2016)

490 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Tratamiento Procesal de la Competencia Objetiva del Tribunal del Jurado

plantea en voto particular la nulidad de actuaciones por falta de competencia


objetiva del Tribunal de instancia (Audiencia Provincial) y en consecuencia,
funcional del tribunal de casación.
El Tribunal Supremo admite la alegación tardía de vulneración de derechos
fundamentales, al inicio mismo del juicio oral, de posibles vulneraciones de dere-
chos fundamentales69, pero se trata de vulneraciones ajenas a las reglas de la compe-
tencia, que son cuestiones de legalidad ordinaria y por ello carecen de relevancia
constitucional. (STS 435/2008 de 25 de junio)70.
Planteada la cuestión de la adecuación de procedimiento al inicio de las se-
siones del juicio oral, la STS. 822/201371, expone que: “ existe un problema inicial
de extemporaneidad. Y es que quien ahora reivindica un cambio de procedimiento –
cuya incidencia, por cierto, en la vigencia de otros derechos fundamentales resulta-
ría irreparable, como es el caso del derecho a un proceso sin dilaciones – guardó
un estratégico silencio durante la tramitación del procedimiento. Fue en el inicio de
las sesiones del juicio oral cuando la defensa invocó esa posible vulneración de las
reglas que delimitan la competencia para el enjuiciamiento de los delitos de homi-
cidio. De hecho, como ponen de manifiesto los Jueces de instancia, cuando el Juez
de instrucción dictó el auto llamado a acomodar las diligencias previas al trámite
del procedimiento ordinario por delitos graves, la defensa formalizó entonces re-
curso de reforma con el fin de que se practicaran nuevas diligencias tendentes a
averiguar la responsabilidad de los causantes de las lesiones sufridas por sus pa-
trocinados, reforma que fue desestimada por el órgano instructor y que determinó el
desistimiento del recurso de apelación entablado con carácter subsidiario. Nada se
dijo entonces sobre la vulneración de las reglas de competencia que ahora se invo-
ca. Antes al contrario, hubo un aquietamiento por el recurrente a todas y cada una
de las diligencias y resoluciones que se sucedieron en el marco procesal del proce-
dimiento ordinario.”
La STS 428/201772 dictada tras el Acuerdo de Pleno no jurisdiccional de la
Sala 2ª del Tribunal Supremo de 9 de marzo de 2017, analiza el momento para la
determinación del órgano y el proceso a seguir para el enjuiciamiento.
Recuerda el Tribunal Supremo que el planteamiento de la cuestión en tiempo
hábil para realizarlo no es un acto procesal meramente formal y que “en el tiempo
del juicio oral debe quedar clarificada la ordenación del órgano judicial encargado
del enjuiciamiento y, por ende, el procedimiento bajo el que regir el juicio oral. De
manera que corresponde al órgano judicial designar el órgano de enjuiciamiento, y
a las partes aquietarse o plantear como artículo de previo pronunciamiento la de-
clinatoria de jurisdicción, de manera que contra la resolución cabe recurso de ca-

69
Vid. STS. 694/2011, de 24 de junio.
70
Vid. STS 464/2010, de 30 de abril, referida a un supuesto de posible vulneración del derecho a la
inviolabilidad domiciliaria; o las SSTS. núms. 1481/2002, 18 de septiembre y 640/2000, 15 de abril,
relacionadas ambas con una pretendida ilicitud probatoria.
71
STS. 822/2013, de 6 de noviembre RJ 2013\7648
72
STS. 428/2017, de 14 de junio (Roj: STS 2379/2017)

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 491


José María Lombardero Martín

sación con ese objeto: determinar el órgano de enjuiciar.” “la resolución que al
efecto se adopte, puede ser objeto de recurso de casación a partir de la previsión de
las cuestiones de previo pronunciamiento del art. 666 de la Lecrim. Esa resolución
determina el órgano de enjuiciar y lo hace como premisa necesaria para asegurar
el enjuiciamiento de acuerdo a las normas del proceso debido en tiempo razonable”
“De deferirlo a la sentencia, podría propiciar el supuesto de un doble enjuiciamien-
to, situación, en absoluto, deseable.”
En el recurso analizado, “la sentencia en la que apoya la impugnación, la
STS. 468/2005 de 14 de abril, se dicta, precisamente, contra un auto de
acomodación del procedimiento, en el que la parte había interesado el
enjuiciamiento por el Tribunal de Jurado y ante la denegación de la remisión se
acude en casación y obtiene una resolución favorable a su pretensión.” Pero “En el
supuesto de esta casación, la recurrente no planteó la cuestión en la forma debida
el recurso de casación contra el Auto que deniega la tramitación del enjuiciamiento
ante el Tribunal de Jurado por lo que, de alguna manera, se aquietó a la decisión,
por más que en el juicio oral plantease su desacuerdo con el enjuiciamiento, pero
no lo hizo en la forma dispuesta en la Ley procesal para solventar la cuestión en el
momento procesal hábil para su planteamiento.”
En el caso “el enjuiciamiento por las normas procesales del sumario
ordinario era procedente en aplicación del Acuerdo del Pleno no jurisdiccional de
20 de enero de 2010, de conformidad con la intención de los acusados al tiempo de
la ejecución de su acción.” “Ese Acuerdo interpretativo de la norma, en este caso de
la LECrim. y de la LOTJ, al versar sobre materia procesal, y concretamente sobre
el órgano competente para el enjuiciamiento, participa de la regla “tempus regit
actum”, de manera que era la interpretación vigente al tiempo de los hechos.” y
“Cualquier modificación posterior del criterio interpretativo sobre la competencia,
como se ha producido por Acuerdo, del Pleno no jurisdiccional, de la Sala 2ª del
TS, de 9 de marzo de 2017, no alcanza a actos procesales anteriores por afectar a la
seguridad jurídica y compromete la interdicción del doble enjuiciamiento.”
Cuando en un proceso ordinario o abreviado el juicio ha llegado el trámite de
conclusiones definitivas y de resultas de su cambio se plantea la cuestión de la
competencia del tribunal, sostiene73 la Fiscalía General del estado (Circular 3/95)
aplicando por analogía lo que previene el artículo 48. 3 LOTJ que preferible que el
proceso continúe por los trámites que lo venía haciendo con excepción del
Procedimiento Abreviado ante del juez de lo penal. en el que el cambio en las
calificaciones definitivas suponga que el delito excede de su competencia74 y sea de
los establecidos en el art. 1.2 de la LOTJ. En ese supuesto se transformará el
procedimiento al del Jurado, pero desde el momento del juicio, es decir, desde el
trámite de la constitución del jurado (arts. 38 y ss. LOTJ)

73
Vid. MUERA ESPARZA, J.J. “Ambito de aplicación, competencia y procedimiento para las causas ante el
tribunal del jurado.” en Anuario Jurídico de la Rioja n. 2 1996.p. 376
74
Circular FGE n. 3/1995, de 27 de diciembre, sobre el proceso ante el Tribunal del Jurado: su ámbito de
aplicación.

492 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Tratamiento Procesal de la Competencia Objetiva del Tribunal del Jurado

Llegados al momento de dictar sentencia, si la Audiencia Provincial o el


Juzgado de lo Penal rechazan la calificación inicial de las partes acusadoras y
estiman la comisión de un delito competencia del Tribunal del Jurado, ello no ha de
impedir que la Audiencia dicte la sentencia, pues el objeto del proceso penal que
determina la competencia objetiva no viene representado por los hechos probados en
la sentencia, sino por los hechos que alegan las acusaciones y superan el filtro de la
valoración indiciaria judicial (apertura del juicio oral). Es la pretensión acusatoria la
que define la competencia75.

IV JURISPRUDENCIA
STC 43/1984, de 26 de marzo ECLI:ES:TC:1984:43
STC 8/1998, de 13 de enero ECLI:ES:TC:1998:8
STC 93/1998, de 4 de mayo ECLI:ES:TC:1998:93
STC 35/2000, de 14 de febrero ECLI:ES:TC:2000:35
STS. 2217/2001, de 26 de noviembre (Roj: STS 9208/2001)
STS. 693/2004 de 26 de mayo (Roj: STS 3623/2004)
ATSJ Canarias de 27 Julio de 2005 (Roj: ATSJ ICAN 1/2005)
STC. 157/2007, de 2 de julio ECLI:ES:TC:2007:157
STS. 166/2007, (Roj: STS 1218/2007)
STS. 435/2008, de 25 de junio (Roj: STS 3769/2008)
STS. 728/2009 de 26 de junio de 2009 (Roj: STS 3938/2009)
STS. 830/2009, de 16 de julio (Roj: STS 5423/2009)
STS. 464/2010, de 30 de abril (Roj: STS 2513/2010)
AAP de Granada Auto 425/2010 de 21 de mayo (JUR 2010\363825).
STS. 854/2010 de 29 septiembre (RJ\2010\7646)
STS. 694/2011, de 24 de junio (Roj: STS 4863/2011)
STSJ 7/2011 Andalucía de 25 de enero (JUR 2011/103857)
STS. 689/2012, de 20 de setiembre (Roj: STS 6092/2012)
STS. 688/2013 de 30 septiembre (RJ 2013\7635)
STS. 822/2013, de 6 de noviembre (RJ 2013\7648)
AAP de Lleida auto 590/2014 de 30 de diciembre (JUR 2015\81189)
ATS 1467/2015 de fecha 5-11-2015 (JUR 2015\291724)
ATSJ Cataluña 146/2016 de 29 de febrero (JUR 2016/74939)
AAP de Castellón Auto 250/2016 de 27 de mayo. (JUR 2016\151864)
STS. 315/2016 de 14 de abril. (Roj STS 1666/2016)
STS. 942/2016, de 16 de diciembre (Roj STS 5493/2016)
STS. 428/2017, de 14 de junio (Roj: STS 2379/2017)

75
Circular FGE n. 3/1995, de 27 de diciembre, sobre el proceso ante el Tribunal del Jurado: su ámbito de
aplicación

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 493


José María Lombardero Martín

V BIBLIOGRAFÍA
AA.VV. Manual del Jurado. Madrid, CGPJ,1996
CERES MONTES, J. F. Ámbito de aplicación de la ley del jurado. Delitos y cuestiones procesales.
Madrid, 1997
CUBILLO LÓPEZ, I.J. “Las causas de conexión penal y su aplicación tras la reforma operada por la Ley
41/2015” en Estudios de Deusto, 65, n.2, 2017
F.G.E. Circular n. 3/1995, de 27 de diciembre, sobre el proceso ante el Tribunal del Jurado: su ámbito
de aplicación.
GARBERI LLOBEGAT, J. “Ley Orgánica del Tribunal del Jurado (comentarios prácticos al nuevo
proceso penal ante el Tribunal del Jurado)” con GIMENO SEDRA,V. Madrid,1ª Ed, 1996
LOMBARDERO MARTÍN, J.M. “La competencia del Tribunal del Jurado. Breve análisis de la cuestión
tras el acuerdo de pleno de la sala Segunda del Tribunal Supremo de 9 de marzo de 2017” Revista
Internacional CONSINTER, año III, n. V, Porto, Juruá, 2017
LOMBARDERO MARTÍN, J.M. “El jurado español, el jurado anglosajón y el escabinato. Instrucciones
y veredicto. Breve análisis comparado” Revista Internacional CONSINTER, año V, n. IX, Porto, Juruá,
2019
MUERA ESPARZA, J.J. “Ambito de aplicación, competencia y procedimiento para las causas ante el
tribunal del jurado.” en Anuario Jurídico de la Rioja, n. 2. 1996
MUÑOZ CUESTA, F. J. “Competencia del tribunal del jurado. Especial referencia a los delitos conexos:
STS de 26 de junio de 2009.” En Revista Aranzadi Doctrinal n. 8/2009 Estudios, Cizur Menor, 2009
PÉREZ MARÍN, M. A. Procedimiento ante el Jurado. Lisboa, Juruá, 2016
PÉREZ-CRUZ MARTÍN, A.J. “La Competencia objetiva del Tribunal del Jurado Especial consideración
de los artículos 1 y 5 de la LO 5/1995, in datada tras su modificación por la L.O. 8/1995, de 16 de
noviembre, L.O. 10/1995, de 23 de noviembre y L.O. 1/2015, de 30 de marzo”. Madrid, Centro de
Estudios Jurídicos Mayo 2018
VALLESPÍN PÉREZ, D. El tractament dels delictes conexes davant el Tribunal del Jurat a Catalunya.
Barcelona, CIMS, 2007.
VALLESPÍN PÉREZ, D La conexión en el proceso penal Barcelona, CIMS, 2007.
VALLESPÍN PÉREZ, D Conexión penal en la ley de enjuiciamiento criminal española. Análisis tras su
reforma por Ley 41/2015. Porto, Juruá, 2019.

494 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Tratamiento Procesal de la Competencia Objetiva del Tribunal del Jurado

TRIPARTIÇÃO DE PODERES NO BRASIL:


NECESSIDADE DE REALMENTE TORNÁ-LOS
INDEPENDENTES E AUTÔNOMOS
TRIPARTITION OF POWERS IN BRAZIL:
NEED TO REALLY BECOME US INDEPENDENT
AND AUTONOMOUS
DOI: 10.19135/revista.consinter.00011.23
Recebido/Received 22.07.2020– Aprovado/Approved 20.09.2020
Horácio Monteschio1 – https://orcid.org/0000-0002-0360-6521
E-mail: h.monteschio@uol.com.br

Resumo: Em que pese à redação contida no art. 2º da Constituição da República


Federativa do Brasil, que não deixa qualquer margem de dúvida sobre a sua extensão e
clareza ao ponderar que “são Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o
Legislativo, o Executivo e o Judiciário”, na prática tem-se verificado que o Poder
Executivo tem assumido força, protagonismo e influência sobre os demais Poderes da
república a ponto de desnaturar a essência republicana. O presente texto vem colocar um
pouco mais de luzes sobre o debate que ainda é incipiente, mas necessário, para tornar
no mínimo equilibrada a relação entre os Poderes na República Federativa do Brasil.
Não há mais como admitir que o Poder Executivo, dentro do presidencialismo de
coalizão praticado no Brasil continue sendo mantido, pois as consequências estão
ocasionando a ingovernabilidade, a quebra da isonomia.
Palavras-chave: Separação dos Poderes; presidencialismo; necessidade de garantir a
independência e harmonia entre os poderes.
Abstract In spite of the wording contained in art. 2 of the Constitution of the Federative
Republic of Brazil, which leaves no room for doubt as to its extent and clarity in
considering that “there are powers of the Union, independent and harmonious among
each other, the Legislative, the Executive and the Judiciary”, in practice it is verified that
the Executive Power has assumed force, protagonism and influence on the other powers
of the republic to the point of denaturing the republican essence. The present text has put
a little more light on the debate that is still incipient, but necessary, to make at least a
balanced relationship between the Powers in the Federative Republic of Brazil. There is
no longer any way to admit that the Executive Branch within the coalition
presidentialism practiced in Brazil continues to be maintained, because the consequences
are causing ungovernability, the breakdown of isonomy.
Keywords: Separation of Powers; presidentialism; need to ensure independence and
harmony between powers.

1
Pós doutor na Universidade de Coimbra – Portugal e pelo UNICURITIBA, Paraná – Brasil. Doutor em
Direito pela Faculdade Autônoma de São Paulo – FADISP. Mestre em Direitos da Personalidade –
UNICESUMAR. Lattes: http://lattes.cnpq.br/8861821320530256. E-mail: h.monteschio@uol.com.br

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 495


Horácio Monteschio

Sumário: Introdução. 1. Preponderância do poder executivo na federação brasileira. 2.


Presidencialismo de coalisão no brasil. 3. Aprimoramento da representação política no
presidencialismo brasileiro. Conclusões.

INTRODUÇÃO
A tripartição de poderes cuja originalidade pode ser atribuída as ideias formu-
ladas por Platão e Aristóteles, já em sua essência tinha como escopo fundamental
impedir que haja uma concentração de poderes nas mãos de uma única pessoa, ou
titular, assegurando a felicidade a todos.
Cabe destacar que dentro da própria evolução da concepção de separação de
poderes, com o intuito de assegurar um maior equilíbrio dentro do Estado foi objeto
dos pensamentos de John Locke e Montesquieu. Ao estabelecer uma separação, uma
divisão, se busca estabelecer um equilíbrio aos poderes, não assistindo razão a pre-
ponderância de um Poder sobre os outros. Neste sentido cabe destacar a doutrina de
Alexandre de Moraes.

A divisão segundo o critério funcional é a célebre “separação de poderes”, que con-


siste em distinguir três funções estatais, quais sejam, legislação, administração e ju-
risdição, que devem ser atribuídas a três órgãos autônomos entre si, que a exercerão
com exclusividade, foi esboçada pela primeira vez por Aristóteles, na obra “Políti-
ca”, detalhada, posteriormente, por John Locke, no Segundo tratado do governo ci-
vil, que também reconheceu três funções distintas, entre elas a executiva, consistente
em aplicar a força pública no interno, para assegurar a ordem e o direito, e a federa-
lista, consistente em manter relações com outros Estados, especialmente por meio de
alianças. E, finalmente, consagra na obra de Montesquieu O espírito das leis, a quem
devemos a divisão e distribuição clássica, tornando-se princípio fundamental da or-
ganização política liberal e transformando-se em dogma pelo art. 16 da Declaração
francesa dos Direitos do homem e do Cidadão, de 1789, e é prevista no art. 2º de nos-
sa Constituição Federal2.

Em que pese os pensamentos desenvolvidos por Montesquieu e Locke, assim


como outros autores, mas a ideia central de separação de poderes, ou funções, pouco
foi acrescentado tendo como parâmetro comparativo o pensamento político dos
gregos. Assim destacado por Ives Gandra Martins da Silva.

O que Locke e a Inglaterra ofertaram para o aprofundamento temático de Montes-


quieu foi a tripartição equilibrada do poder. Hoje, estamos convencidos – quanto
mais lemos os autores modernos – de que, em matéria de Direito, pouco se acrescen-
tou ao que os romanos criaram; e, em matéria de Filosofia, pouco se acrescentou ao
que os gregos desvendaram. Qualquer filósofo posterior, como Políbio, que era tam-
bém historiador, passando por Hume, Hobbes, Locke, Bacon, Maquiavel – historia-
dor, filosofo, político e sociólogo – Rousseau e outros, traz pequena contribuição ao
pensamento universal descortinado pelos gregos. Tendo a impressão de que depois
dos gregos pouca coisa se pôde criar. Criaram-se variações inteligentes, mas o tema

2
MORAES, Alexandre, Direito Constitucional, São Paulo, Atlas, 2017, p. 433.

496 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Tripartição de Poderes no Brasil: Necessidade de Realmente Torná-los Independentes e Autônomos

central de Filosofia se encontra na Grécia e o do Direito em Roma. Ora, com a tri-


partição equilibrada de poderes de Montesquieu, chega-se à discussão do sistema de
governo, já a esta altura, após a Revolução Francesa, eliminando-se de vez a possibi-
lidade de se discutir a permanência de monarquias3.

Ao avançar no cenário histórico é importante destacar que a separação e equi-


líbrio entre os poderes, deve salvaguardar a independência e a devida harmonia. No
caso específico do Brasil, como será objeto de estudo nos próximos capítulos, o art.
2º do texto constitucional é mais do que evidente ao assegurar a independência e
harmonia entre os poderes. Por hora é necessário deixar claro que no atual quadro
político e democrático brasileiro os poderes enfeixados nas mãos do presidente da
república acabam por deixar a tripartição de poderes, no que concerne ao equilíbrio,
a mera questão a ser ensinada na academia pois na prática há um evidente desequilí-
brio. Mas, dentro da moldura fática vivida e inspirada em tempos remotos cabe citar
os mestres portugueses Canotilho e Vital Moreira.

Um sistema de governo composto por uma pluralidade de órgãos requer necessaria-


mente que o relacionamento entre os vários centros do poder seja pautado por nor-
mas de lealdade constitucional (Verfassungstrue na terminologia alemã). A lealdade
institucional compreende duas vertentes, uma positiva, outra negativa. A primeira
consiste em que os diversos órgãos do poder devem cooperar na medida necessária
para realizar os objetivos constitucionais e para permitir o funcionamento do sistema
com o mínimo de atritos possíveis. A segunda determina que os titulares dos órgãos
do poder devem respeitar-se mutuamente e renunciar a prática de guerrilha instituci-
onal, de abuso de poder, de retaliação gratuita ou de desconsideração grosseira. Na
verdade, nenhuma cooperação constitucional será possível, sem uma deontologia po-
lítica, fundada no respeito das pessoas e das instituições e num apurado sentido de
responsabilidade de Estado (statesmanship)4

É possível afirmar a existência de uma hipertrofia dos poderes exercidos pelo


presidencialismo no Brasil, ainda mais diante da presença do “presidencialismo de
coalizão”. É importante ressaltar que dentro de um Estado liberal a atuação do Poder
Executivo é meramente observadora, atuando de forma negativa, portanto deixando
de atuar politicamente. Por outro lado, com a força do Estado social, com as consti-
tuições do México (1917) e de Weimar (1919) passa a impor novos formatos ao
Estado, assumindo uma feição de interesse profundamente fincados na seara social.
Como consequência mais visível do Estado social, ou seja, o Estado intervin-
do para garantir direitos fundamentais aos seus integrantes passa o Estado a desfru-
tar de um novo “status”, passa a ser entendido como garantidor, ou seja, como aque-
le que é o garante contra a intervenção do capital.

3
MARTINS, Ives Gandra da Silva, A constituição brasileira de 1988: interpretações. Rio de Janeiro, Forense
Universitária, 1990, p. 187.
4
CANOTILHO, José Joaquim Gomes, MOREIRA, Vital, Os poderes do presidente da República, Coimbra,
Coimbra, 1991, p. 71.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 497


Horácio Monteschio

Dentro desse quadro há uma bem engendrada organização política que passa
a impor uma dependência dos seus integrantes às políticas do Estado. Dentro da
baixa densidade cultural e de valores pessoais dos integrantes de determinado Estado
está criada dependência as políticas sociais.
Esse quadro fático faz com que se crie uma conjunção de fatores, em vários
casos, perversa de uma “troca” entre o titular do poder político na sua permanência
ou de seu grupo político, em troca pela concessão de benefícios aos integrantes do
Estado.
Assim, cria-se a preponderância dos Poderes nas mãos do chefe do Poder
Executivo, em razão da presença concentrada de poderes e prerrogativas dentro do
feixe de competências que lhe são conferidas pelo texto constitucional, bem como
pela legislação infraconstitucional. No Brasil essa preponderância é por demais
evidenciada nos últimos anos.
Dentro dessa temática reflexiva e introdutória deve ser pontual, já que o es-
paço ideal desse debate extrapola o permitido no atual contexto, mas sem perder a
precisão científica. Por oportuno, diante do desequilíbrio entre os poderes na Repú-
blica Federativa do Brasil, entenda-se: que há, e não é recente a constatação, a “in-
vasão” nas funções públicas.
Como não há vácuo de poder, outros “poderes” acabam assumindo preponde-
rância em face dos constituídos e descritos na tripartição constitucional. A toda
evidência, tanto o Ministério Público, quanto os Tribunais de Contas vem assumindo
funções que eram destinadas aos Poderes Legislativo e Judiciário.
Em razão da inexpressiva capacidade do Poder Legislativo em legislar, com a
aquiescência constante das Medidas Provisórias produzidas pelo Poder Executivo,
mas o que é mais grave se verifica quando ao total despreparo para fiscalizar os
outros Poderes o Legislativo cede graciosamente uma de suas funções típicas aos
Tribunais de Contas.
Sobreleva enfatizar que os Tribunais de Contas são auxiliares do Poder Le-
gislativo, mas que nos últimos anos vem assumindo à vezes daquele poder. A razão
é plenamente explicável, pois os parlamentares deixaram de ser fiscalizadores para
assumirem a posição de assistencialistas de suas bases eleitorais. Com isso, não há
um mínimo cuidado de legislar, nem tampouco de fiscalizar.
Os complexos comandos orçamentários, previstos tanto na Constituição Fe-
deral, bem como na Lei 4.320, de 17.03.1964 nãos se adéquam a atual realidade dos
representantes do Parlamento, em todas as esferas. Nos parlamentos prepondera a
prática do assistencialismo, o “deputado especialista em liberar verbas públicas”, o
deputado “despachante de luxo em Brasília”, mas nada de exercer a função de legis-
lar e fiscalizar.
Assim, alguém tem que fazer o trabalho técnico e controlar os gastos públi-
cos, então assume o controle os Tribunais de Contas, que diante da fragilidade inte-
lectual, interesse público e densidade em assuntos contábeis de órgão auxiliar passa
a desfrutar de condição principal.

498 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Tripartição de Poderes no Brasil: Necessidade de Realmente Torná-los Independentes e Autônomos

À guisa de raciocínio os Tribunais de Contas, na atualidade desfrutam de im-


portância singular a ponto de determinar a paralisação de obras, suspender certames
licitatórios, atuando como se fosse o próprio Poder Judiciário.
Por outro lado, o Ministério Público, dentro das competências fixadas no art.
129 da Constituição Federal, por igual, diante da falta de cumprimento das funções
típicas e atípicas do Poder Executivo, especialmente nos Estados e Municípios,
impõe sua vontade como se administrador fosse. O Ministério Público se arvora a
determinar a entrega de medicamentos, mesmo que para tal desiderato o gestor pú-
blico venha a comprometer consideravelmente o orçamento do ano para atender a
imposição ministerial.
A federação brasileira precisa ser repactuada! Cada qual cumprindo com a
sua função típica e atípica, não “delegando” ou se omitindo do exercício da função
precípua do respectivo Poder.
Cabe ressaltar que o Poder Executivo exerce suas funções, inclusive com a
possibilidade de desequilibrar, ainda mais, o que já está desequilibrado.

1 PREPONDERÂNCIA DO PODER EXECUTIVO NA FEDERAÇÃO


BRASILEIRA
As considerações envolvendo a elaboração de uma proposta a qual contempla
a possibilidade de impor um mediano equilíbrio de forças dentro do sistema presi-
dencialista brasileiro, além do restabelecimento da importância do poder soberano
do povo, tem um olhar focado em uma análise crítica e criteriosa sobre a história e
sobre a excessiva concentração de poderes concedidos ao Presidente da República.
Esta posição que exige uma nova análise histórica sobre a importância do pa-
pel do Presidente da República e, por extensão gravitacional de importância aos
governos dos Estados e aos Prefeitos municipais, mas, que neste momento se res-
tringe ao primeiro citado, já recebeu importante reflexão, formulada por Raul Ma-
chado Horta, a qual se faz de importância singular citar:

São conhecidas as vicissitudes e as crises intermitentes do regime presidencial no


Brasil. Pode se afirmar que o presidencialismo nasceu sob o signo de ilegitimidade e
sua existência se prolongou na sucessão de crises que reclamaram ou impuseram o
uso frequente dos poderes extraordinários, com sacrifício das liberdades constitucio-
nais e da autonomia dos Estados, como se verificou na Primeira República; na ruptu-
ra da legitimidade constitucional, provocada por movimentos revolucionários e gol-
pes de Estado, com a transformação do Presidente no Ditador e o regime presidenci-
al na ditadura, refazendo percurso habitual do presidencialismo latino-americano. O
regime presidencial como Governo de um só homem, e assim o concebe em regra de-
finidora do Poder Executivo presidencial que é constante nas Constituições Republi-
canas de 1891, 1934, 1967 e 1988 – “o poder Executivo é exercido pelo Presidente
da República” – , que a Carta de 1937 exacerbou na figura da “autoridade suprema

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 499


Horácio Monteschio

do Estado”, essa concepção constitucional da monocracia presidencial – o governo


de um só homem – atingiu sua fase de exaustão e de perecimento5.

Ao que já se tratou, o gestor público ocupante da chefia do Poder Executivo


goza de prerrogativas que tornam o cargo ocupado altamente cobiçado. As possibili-
dades e facilidades oferecidas aos ocupantes da chefia do Poder Executivo faz com
que, os demais Poderes, sejam condescendentes com as práticas perpetradas pelo
poder central.
É inegável que as funções precípuas do Poder Legislativo – legislar e fiscali-
zar – estão sendo relegadas a questões periféricas nas práxis do parlamento brasilei-
ro. Na atualidade os legisladores, em todas as esferas, estão se tornando verdadeiros
“lobistas”, pois não há preparo para fiscalizar, muito menos para legislar.
É marca indelével do parlamento federal brasileiro a prática da “chantagem”
feita perante o Poder Executivo de pagamento de emendas parlamentares para custe-
ar obras nas bases de apoio dos parlamentares e, por conseguinte, a obtenção de
dividendos políticos, ou quiçá financeiros. Neste pensar cabe destacar a doutrina
formulada por Marlon Reis:

Aí o que o deputado faz? Com a anuência do candidato à Presidência, mobiliza toda


a bancada do partido para aprovação de emendas parlamentares que levem melhori-
as – asfalto e rede de esgoto, por exemplo – ao reduto do vereador. Parte do dinheiro
é realmente destinada às obras, enquanto uma bela fatia é dividida entre os interes-
sados. O deputado é remunerado pela articulação política, e o vereador recebe um
borderô, verba que inclui seu próprio cachê e o dinheiro para afagar o eleitorado
com mimos variados. Todo mundo ganha, pois o vereador faz campanha para o can-
didato à Presidência, para o candidato ao Senado e para ele mesmo, que dali a dois
anos concorre à reeleição no município6.

Entretanto, não é essa a função do parlamentar. Não é atribuição precípua dos


parlamentares buscar recursos para as suas bases, mas sim, reitere-se, fiscalizar a
administração pública e produzir leis que venham ao encontro dos desejos da popu-
lação. Na prática, “troca-se” o voto em uma votação importantíssima, de relevância
duvidosa para o povo, pelo pagamento de uma emenda parlamentar.
Construir instrumentos de preservação do espaço institucional, pela definição
de competências e atribuições para o exercício político eleitoral, de sorte que essa
previsão legal imitadora funcione como um balizador recíproco impedindo a pree-
minência de um poder sobre o outro.
Caso contrário estar-se garantindo que continuem a se avolumar os poderes
nas mãos dos ocupantes dos cargos de Chefe do Poder Executivo, diante da força
que exercem, bem como da fraca capacidade de resistência e argumentação dos

5
HORTA, Raul Machado, Alternativas para um novo sistema de governo. in CLÈVE, Clèmerson Merlin;
BARROSO, Luís Roberto (Org.). Direito constitucional: teoria do Estado, São Paulo, Revista dos
Tribunais, 2011, p. 848.
6
REIS, Marlon, A república da propina, São Paulo, Planeta, 2016, p. 70.

500 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Tripartição de Poderes no Brasil: Necessidade de Realmente Torná-los Independentes e Autônomos

parlamentares, os quais se tornam meros “especialistas em liberações de recursos”


para as suas bases eleitorais, pouco importando que para tanto venham a reduzir
ainda mais a importância do Poder Legislativo, avolumando ainda mais o Poder
Executivo, constituindo-se no “Poder Moderador” nacional.
Faz-se por demais necessário a construção de um relacionamento mínimo en-
tre o parlamento e Poder Executivo pautado pelo equilíbrio razoável com a adoção
de uma política de gestão que torne possível a convivência entre as atuais divisões,
as quais são essenciais, e a distinção entre estado e governo e a construção de uma
burocracia profissional, com a vedação de participação partidária, que execute com
técnica e racionalidade as escolhas políticas, ou seja, sem partidarismo.
Essa ausência de uma gestão pública eficiente é que está por produzir os
enormes e incontáveis déficits públicos, os quais acabarão por inviabilizar o plano
de estabilização econômica no plano real e, tendo como consequência mais trágica o
desequilíbrio nas contas públicas o processo inflacionário no Brasil e a incapacidade
na prestação de serviços públicos essenciais.

2 PRESIDENCIALISMO DE COALISÃO NO BRASIL


Cabe reafirmar que no sistema político brasileiro há uma importância desme-
dida concedida ao chefe do Poder Executivo. Esse desequilíbrio torna-se mais evi-
dente, pelo fato de que o Presidente da República assume os contornos deste “centro
propulsor” das forças governamentais de forma concentrada. Por sua vez, esta pre-
ponderância não é verificada nos outros dois poderes da nossa Federação. Nestes
termos cabe citar João Féder:

O mais desinteressado olhar pode constatar que não há mais equilíbrio entre os
chamados poderes do Estado, rompido que foi pelo visível fortalecimento do Exe-
cutivo, que passou a manipular e até assumir tanto funções judiciais, como o de-
monstra o exemplo do contencioso administrativo, como igualmente funções legis-
lativas, estas ora pela iniciativa do processo legislativo do que se faz inclusive titu-
lar absoluto em mais de um gênero de lei, ora pela imposição de normas especiais
que tornam mais fácil obter do legislativo o referendo para atos do seu interesse.
Se antigamente predominava o Legislativo como poder, é inegável que a evolução
do Estado caminhou no sentido da ampliação das atividades do executivo, e como
isso acabou por atribuir-lhe mais poder de criação política, desequilibrando as de-
cantadas harmonia e independência da tripartição. A última, em verdade, jamais
existiu ou existirá no sentido da trilogia, pois não há como conceber a ação dos
órgãos do Estado senão através da interdependência. Foi a ideia antiga da inde-
pendência dos poderes, aliás, que deu a doutrinadores a imagem de que o Estado era
dividido em três Estados7.

Assiste ao Chefe do Poder Executivo, no Brasil, uma força política, de tama-


nha envergadura que se concretiza com a possibilidade de concentrar a maior parte

7
FÉDER, João, Estado sem poder, São Paulo, Max Limonad, 1997, p. 84.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 501


Horácio Monteschio

das receitas públicas, editar Medidas Provisórias8, nomear Ministros do Supremo Tribu-
nal Federal9, do Superior Tribunal de Justiça, do Tribunal de Contas da União10.
Este descompasso administrativo é muito mais visível no Brasil, o qual pode
ser ainda mais potencializado quando se verifica implícita, ou até mesmo explicita-
mente, a influência que o chefe do Poder Executivo exerce na concentração da arre-
cadação tributária, assim ponderado por Ricardo Victalino de Oliveira.

Não obstante os esforços do constituinte em disciplinar os mecanismos de ajustamen-


to da diversidade, na prática, quando esses recursos assimétricos começaram a ser
utilizados, viu-se o quão difícil seria a atuação concertada dos entes. A concreta apli-
cação dos referidos dispositivos da Constituição mostrou ser inapropriada para uma
Federação como a nossa, que pretende cultivar a coexistência amistosa de seus mem-
bros, pois o que se assistiu foi a exacerbada centralização de poder na União11.

Exemplo desse desequilíbrio será novamente produzido com a aprovação da


PEC 87/2015, que altera o art. 76 da ADCT12, dos atuais 20% para 30% a Desvincu-
lação de Receitas da União (DRU) que se constitui em um mecanismo que permite
ao Presidente da República usar, dentro do percentual específico, todos os tributos
federais vinculados por lei, fundos ou despesas.
Acrescente-se ainda o fato de que os partidos políticos no Brasil, salvo raras
exceções a exemplo do PMDB e do PT, são agremiações regionais desprovidas de
representação política nacional. Por conseguinte, cabe ao Chefe do Poder Executivo
Federal contemplar os respectivos regionalismos e seus interesses locais para garan-
tir a governabilidade, em claro detrimento do conjunto federativo.
Ao que tudo indica, a excessiva gama de poderes concentrados nas mãos do
Presidente da República no Brasil reflete o fato de que presidencialismo no Brasil
jamais se divorciou do “poder moderador”, a exemplo do que acontecia no período
imperial.
Em razão de desfrutar desses “superpoderes”, o Presidente da República, no
Estado brasileiro, goza de prerrogativas somente concedidas a grandes majestades,
assim descritas por Manoel Gonçalves Ferreira Filho:

8
Constituição Federal. Art. 62. Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar
medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional.
9
Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República:
XIV – nomear, após aprovação pelo Senado Federal, os Ministros do Supremo Tribunal Federal e dos
Tribunais Superiores, os Governadores de Territórios, o Procurador-Geral da República, o presidente e os
diretores do banco central e outros servidores, quando determinado em lei;
10
XV – nomear, observado o disposto no art. 73, os Ministros do Tribunal de Contas da União;
11
OLIVEIRA, Ricardo Victalino de, Federalismo assimétrico brasileiro, Belo Horizonte, Arraes, 2012, p.
203.
12
Art. 76. São desvinculados de órgão, fundo ou despesa, até 31 de dezembro de 2015, 20% (vinte por cento)
da arrecadação da União de impostos, contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico, já
instituídos ou que vierem a ser criados até a referida data, seus adicionais e respectivos acréscimos legais.
(Redação dada pela Emenda Constitucional n. 68, de 2011).

502 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Tripartição de Poderes no Brasil: Necessidade de Realmente Torná-los Independentes e Autônomos

No Brasil, adotou-o a Constituição de 1891, salvo no período entre setembro de 1961


e janeiro de 1963. Mas dele decorreu a deformação de exagerar-se o poder pessoas
do Presidente da República, que não encontra os contrapesos efetivos de um Legisla-
tivo e de um Judiciário prestigioso e prestigiados. Com apenas uma ponta de exage-
ro, já se escreveu sobre His Majesty, the President of Brazil.
Essa acentuação do poder presidencial tem fundas razões. Umas certamente podem
ser encontradas na história e na cultura do povo brasileiro, em cuja formação esteve
ausente o elemento democrático. Outras são de natureza ideológica. Dentre estas não
se pode olvidar a concepção positivista da “ditadura republicana”. De qualquer mo-
do, já Campos Sales, em conhecido pronunciamento, caracterizava o presidencialis-
mo como “o governo pessoal constitucionalmente organizado”. Não é surpreendente,
pois, que haja degenerado num “presidencialismo”.
Realmente, entre nós o presidencialismo aparece marcado pelo personalismo e pelo
autoritarismo. O primeiro traço é favorecido pela fragilidade dos partidos políticos e
é hoje acentuado pelo fato de que os meios audiovisuais de comunicação têm uma
verdadeira obsessão pelo homem-presidente. O segundo decorre de que tenda a con-
centrar o Poder, pois lhe é fácil, pela distribuição de benesses, sujeitar a seu alvedrio
a maioria parlamentar. E sob a Constituição vigente nem precisa disso, porque conta
a possibilidade de editar e reeditar medidas provisórias com força de lei. Ou seja,
além de chefe do Executivo, que nos Estados contemporâneos é o governo, também se
tornou o principal legislador13.

Todavia, o sistema de freios e contrapesos (checks and balances) na prática


brasileira não passa de um item que compõe a ementa curricular dos cursos de direito,
especificamente da disciplina de direito constitucional, pois na realidade esse equilíbrio
está muito distante. Destarte, o poder no Brasil é exercido no “toma lá dá cá”.
A base de sustentação não é formada a partir da discussão de propostas ou mes-
mo dentro de um plano de governo, mas fundada em trocas de nomeações e liberações
de recursos orçamentários, feitos sob o comando do chefe do Poder Executivo.
Por essas razões e tantas outras, as quais proporcionam esse conjunto de po-
deres é que destoam e acabam por quebrar a regra de harmonia e independência
entre os poderes.

A crescente ingerência do Estado nos diversos campos da vida da Sociedade, a trans-


formação do Estado Liberal em Estado de Bem-estar social o aumento das funções
administrativas do Poder Público, bem como de sua própria burocracia, contribuí-
ram para ao agigantamento do Poder Executivo, caracterizando, no regime presiden-
cialista sua supremacia em relação aos demais poderes do Estado14.

A concepção de um sistema denominado de “freios e contrapesos” ou Cheks


and Balances, estatuída na ideia separação dos poderes, cujo fundamento se busca
nos ideais de John Locke e de Montesquieu, e que tinha como escopo nuclear um

13
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves, A democracia no liminar do século XXI, São Paulo, Saraiva,
2001, p. 195.
14
MORAES, Alexandre de, Presidencialismo, São Paulo, Atlas, 2013, p. 127.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 503


Horácio Monteschio

mecanismo para evitar esta concentração de poderes, bem como estabelecer uma
espécie de controle por seus integrantes.
Para tanto cabe citar novamente Manoel Gonçalves Ferreira Filho, o qual se
manifesta a cerca desta discrepância existente na referida separação de poderes,
advertindo que “sua importância costuma ser minimizada; seu fim, profetizado;
sua existência, até negada.”15. Com isso, a pretendida separação, harmônica e
independente entre os poderes fica absolutamente comprometida, carecendo, por-
tanto, equilibrá-la.
É inegável que na atualidade é o ministro chefe da casa civil, auxiliar direto
do Presidente da República, quem vem a impor a pauta na Câmara dos Deputados e
no Senado Federal, atendendo às necessidades exclusivas do Poder Executivo.
Em razão da excessiva preponderância e do acúmulo de poderes nas mãos de
um único titular, o presidencialismo brasileiro carece de uma urgente modificação,
assegurando que realmente haja a perfeita harmonia e independência.
Como não há, nos moldes atuais um sistema de controle entre a prática políti-
ca em face da administração, ao tomar posse, o Presidente da República elabora sua
própria pauta de ações, esteja ela compondo ou não as propostas políticas que o
levaram à vitória nas urnas.
Destarte, a adoção de um sistema que venha a impor limites à pratica admi-
nistrativa e política somente será possível com o cumprimento dos compromissos
assumidos durante a campanha eleitoral. Para tanto se faz necessário à presença de
mecanismos democráticos de controle das práticas administrativas exercitas pelos
ocupantes de cargos políticos.

3 APRIMORAMENTO DA REPRESENTAÇÃO POLÍTICA NO


PRESIDENCIALISMO BRASILEIRO
A proposta que se formula no presente trabalho não possui o condão de limi-
tar os poderes do chefe do Executivo, tampouco estabelecer vinculações administra-
tivas exageradas. O objetivo nuclear e a pesquisa jurídica que se desenvolve têm por
escopo estabelecer um debate sobre a postura assumida pelo chefe do Poder Execu-
tivo, levando em consideração os compromissos assumidos com o eleitor na campa-
nha eleitoral e a prática administrativa.
Ainda mais dentro deste presidencialismo de coalizão, segundo o qual so-
mente em casos de total esfacelamento da credibilidade do chefe do Poder Executi-
vo, perante o parlamento é que será possível a sua retirada do cargo. Nestes termos,
cita-se Paulo Ricardo Schier:

O presidencialismo lida com as crises de formas diversas. A partir do momento em


que se atribuiu legitimação popular direta ao chefe do Poder Executivo, atribuindo-
lhe mandato fixo, só há duas formas institucionalizadas de se derrubar ou mudar o
governo; realização de novas eleições após o término do mandato ou a condenação

15
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves, Curso de direito constitucional, São Paulo, Saraiva, 1989, p. 119.

504 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Tripartição de Poderes no Brasil: Necessidade de Realmente Torná-los Independentes e Autônomos

do Presidente da República em processo de impeachment por acusação de crime de


responsabilidade. E desta, se não há crime cometido, anda pode derrubar o chefe do
Poder Executivo. O presidencialismo, portanto é um sistema de governo tendencial-
mente gerador de mais tensões. A legitimação popular do Presidente da República
impede que ele seja derrubado em qualquer momento de crise. Neste sistema, ainda
que o governo seja ruim, tome medidas impopulares, perca o apoio político no par-
lamento, ou não enfrente a crise de forma adequada, ele não será derrubado. Há co-
mo se disse um potencial conflito nas relações Executivo versus Legislativo maior no
presidencialismo16.

Esse é o panorama ideal para nossa democracia. Todavia, no Brasil quem é


eleito recebe uma espécie de prêmio ou um “cheque em branco” para fazer o que
quiser durante sua gestão. Não há compromisso, nem com os ideários federalistas
assumidos perante os Estados-Membros, ou mesmo, com o eleitor. O que é assegu-
rado constitucionalmente, pelo regime presidencialista é o mandato fixo de 4 (qua-
tro) anos, com a possibilidade de reeleição para mais um mandato.
Os institutos democráticos não estão imunes às críticas proferidas em razão
de sua precariedade, tampouco a sua prática está a salvo de ações que venham a
maculá-la. Nestes termos é importante ressaltar a posição de José Jairo Gomes:

Note-se que a chamada democracia partidária não está livre de críticas. Na verdade,
ao se investirem no mandato, os políticos fazem dele o que bem entendem. A experi-
ência tem revelado que alguns o buscam por motivos inconfessáveis, mas sempre sob
o manto de um discurso bem urdido, bem lapidado. Na verdade, jamais existiu con-
trole sério e eficaz do exercício do mandato. Os inúmeros escândalos a que se assiste
dia após dia fazem com que a população relacione o meio político à corrupção. Ava-
liações de organismos internacionais apontam o Brasil como um país com alto índice
de corrupção17.

A crítica que se faz ao atual modelo de representação política brasileira está


relacionada à total irresponsabilidade do eleito em face do eleitor. Urge salientar o
fato de que no atual quadro político há uma “eleição democrática” pautada sempre
em posturas ilegais de abuso de poder econômico e político, bem como pelo uso
reiterado e comprovado de recursos via “caixa dois”, com a formulação de promes-
sas e projetos, os quais não refletem a realidade da administração a ser exercida.
Sobre esse último aspecto, cabe citar a doutrina de Fernando Gustavo Knoerr e Vi-
viane Coêlho Séllos-Knoerr:

A transgressão de propostas pelo próprio candidato autoriza a conclusão de que


nunca considerou, ao menos não com a seriedade própria da solenidade do ato de
registro de candidatura, e por isso, operando eficácia ex tunc, torna viciado o pró-
prio registro autorizando a perda do mandato.

16
SCHIER, Paulo Ricardo, Presidencialismo de coalizão: contextos, formação e elementos na democracia
brasileira, Curitiba, Juruá, 2017, p. 95.
17
GOMES, José Jairo, Direito eleitoral, Belo Horizonte, Del Rey, 2008, p. 30.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 505


Horácio Monteschio

A imposição de boa-fé, principalmente mediante a adoção das propostas de campa-


nha como critérios de controle de legitimidade do mandato, também não autorizará a
apresentação de propostas inexequíveis ou descontextualizadas da realidade política
e econômica, prestando-se também como com critério de escolha do candidato pelo
eleitorado na medida em que se faz evidente que o candidato desprovido até mesmo
da condição de formular propostas razoáveis não reúne a mínima condição de bem
cumprir o mandato18.

Com isso, faz-se necessário criar um método de avaliação do mandato dos


ocupantes da chefia do Poder Executivo durante o seu exercício. Por sua vez, passa-
se a assegurar ao legítimo titular do poder, o povo, a possibilidade de dar o voto de
confiança ou reprovar as práticas adotadas pelo eleito.
Bem como um severo controle na arrecadação de recursos para financiar es-
sas campanhas obtidos, via de regra, por intermédio da prática de “caixa dois” a ser
implementados pelo Tribunal Superior Eleitoral contando com auxílio do Tribunal
de Contas da União.

CONCLUSÕES
Em que pese o estreito espaço de debate consubstanciado neste artigo, mas o
que se pretende é criar, ou mesmo, ampliar o debate sobre a efetiva tripartição de
poderes dentro da República Federativa do Brasil.
É importante ressaltar que a forma trinária, na qual se encontra a repartição
dos Poderes dentro da República Federativa do Brasil, está respondendo as aspira-
ções do Estado brasileiro? Efetivamente há uma harmonia e independência entre os
poderes, consoante em obediência ao art. 2º da Constituição Federal? Efetiva ou
parcialmente os direitos e garantias fundamentais estão sendo assegurados aos brasi-
leiros? Os Poderes estão cumprindo com as suas funções típicas ou atípicas?
Estas são alguns questionamentos os quais merecem a mais profunda e detida
reflexão. No Brasil não há, ao que se verifica, uma harmonia e independência entre
os Poderes pelo fato de que o Chefe do Poder Executivo extrapola os seus Poderes.
Por sua vez, o Poder Legislativo abandonou há bastante tempo a suas funções precí-
puas de Legislar e Fiscalizar, passando a se constituir em um mero poder composto
por lobistas, os quais estão mais preocupados na defesa dos seus respectivos interes-
ses, ou mesmo de liberar verbas para as suas bases eleitorais, em troca se omite do
dever de fiscalizar os outros dois poderes.
Diante desse descompasso, instituições estão buscando fazer as vezes que são
reservadas ao Poder Legislativo, esse condescendente com o Poder Executivo, como
é o exemplo das práticas garantidoras exercidas pelo Poder Judiciário, tão criticado a
ponto de ser pejorativamente classificado suas práticas como sendo um exercício de

18
KNOERR, Fernando Gustavo; SELLÓS-KNOERR, Viviane Coêlho de. Eleitor consumidor: a tutela da
boa-fé na reforma eleitoral que ainda não veio. in KEPPEN, Luiz Fernando Tomasi; SALGADO, Eneida
Desiree (Org.). Direito eleitoral contemporâneo: 70 anos da Redemocratização Pós-ditadura Vargas e da
Reinstalação da Justiça Eleitoral, Curitiba, Tribunal Regional Eleitoral do Paraná, 2016, p. 39.

506 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Tripartição de Poderes no Brasil: Necessidade de Realmente Torná-los Independentes e Autônomos

um “ativismo judicial”. Por outro lado, ao Ministério Público restou a defesa das
prerrogativas constitucionais negadas pelo Poder Legislativo. Destarte, os represen-
tantes do povo, eleitos democraticamente não estão sendo representados pelo Poder
Legislativo, sendo feita tal representação pelo Ministério Público.
Ao passo que aos Tribunais de Contas, como órgão auxiliar do Poder Legis-
lativo, o real e efetivo controle dos gastos públicos já que o Poder Legislativo que-
dou-se ou queda-se inerte desse dever inarredável.
Destarte, cabe pensar em uma limitação dos poderes dos integrantes da Re-
pública Federativa do Brasil, admitindo a sua ampliação como, por exemplo, em
uma possível divisão quinaria, incluindo o Ministério Público e o Tribunal de Con-
tas, com o objetivo de tornar mais equânime a divisão dos poderes e a carga de fisca-
lização a ser exercida diante dos excessivos poderes em que o Poder Executivo vem
amealhando nos últimos anos.
Por derradeiro, aquela tripartição harmônica, contando com um sistema de
freios e contra pesos, não mais existe, prevalecendo o poder do Chefe do Poder
Executivo, a omissão do Poder Legislativo e, ao que pode fazer, o Poder Judiciário
atuando para uma tarefa que não é sua. Os consensos necessários, competência ex-
clusiva do Legislativo e do Executivo, estão sendo desproporcionalmente exercidos
pelo último, tornando cada vez mais desigual a vida no Estado Democrático Brasi-
leiro, em face de que não dispõe de limites e quem não tem limites costuma abusar
de suas prerrogativas.

REFERÊNCIAS
FÉDER, João, Estado sem poder, São Paulo, Max Limonad, 1997.
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves, A democracia no liminar do século XXI, São Paulo, Saraiva,
2001.
______. Curso de direito constitucional, São Paulo, Saraiva, 1989.
GOMES, José Jairo, Direito eleitoral, Belo Horizonte, Del Rey, 2008.
HORTA, Raul Machado. Alternativas para um novo sistema de governo. in CLÈVE, Clèmerson Merlin;
BARROSO, Luís Roberto (Org.). Direito constitucional: teoria do Estado, São Paulo, Revista dos Tribu-
nais, 2011.
KNOERR, Fernando Gustavo; SELLÓS-KNOERR, Viviane Coêlho de. Eleitor consumidor: a tutela da
boa-fé na reforma eleitoral que ainda não veio. in KEPPEN, Luiz Fernando Tomasi; SALGADO, Eneida
Desiree (Org.). Direito eleitoral contemporâneo: 70 anos da Redemocratização Pós-ditadura Vargas e da
Reinstalação da Justiça Eleitoral, Curitiba, Tribunal Regional Eleitoral do Paraná, 2016.
OLIVEIRA, Ricardo Victalino de, Federalismo assimétrico brasileiro, Belo Horizonte, Arraes, 2012.
MORAES, Alexandre de, Presidencialismo, São Paulo, Atlas, 2013.
REIS, Marlon, A república da propina, São Paulo, Planeta, 2016.
SCHIER, Paulo Ricardo, Presidencialismo de coalizão: contextos, formação e elementos na democracia
brasileira, Curitiba, Juruá, 2017.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 507


Tripartição de Poderes no Brasil: Necessidade de Realmente Torná-los Independentes e Autônomos

Capítulo 03

DIREITO PRIVADO

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 509


Tripartição de Poderes no Brasil: Necessidade de Realmente Torná-los Independentes e Autônomos

LA COMPENSACIÓN DEL RÉGIMEN DE VISITAS,


EN LOS CASOS DE DIVORCIO CONTENCIOSO,
EN LA NUEVA ERA POST-COVID 19
COMPENSATION OF THE VISITING ARRANGEMENTS
IN THE EVENT OF CONTENTIOUS DIVORCE,
IN THE NEW ERA POST-COVID 19
DOI: 10.19135/revista.consinter.00011.24
Recibido/Received 25.05.2020 – Aprobado/Approved 7.07.2020
Noemí Jiménez Cardona1 – https://orcid.org/0000-0003-3197-4775
E-mail: njimenezcardona@ub.edu

Resumen: El presente artículo se centra en el análisis de la conveniente compensación


del régimen de visitas, en los casos de divorcio contencioso, tras la vuelta a la
normalidad tras el COVID-19. Más concretamente, se examinan diferentes acuerdos
judiciales sobre la materia, no exentos de polémica, para acabar defendiendo la
necesidad de apostar por un modelo de compensación “equilibrado y justo” para con el
interés superior del menor, pero también “sensible” para con ambos progenitores en
conflicto.
Palabras-clave: Divorcio contencioso. Régimen de Visitas. Interés del Menor. COVID-19
Abstract: This article focuses on the analysis of the convenient compensation of the
visiting arrangements in contentious divorce cases, after the return to normality after
COVID-19. More specifically, different pela bargains on the matter are examined, not
without controversy, to end up defending the need to bet on a balanced and fair
compensation model for the best interest of the minor, but also sensitive to both parents in
conflict.
Keywords: Contentious divorce. Visiting arrangements. Interest of the minor. COVID-19
Sumario: I. El régimen de visitas en los casos de divorcio (planteamiento general).
II. El procedimiento especial y sumario de familia regulado en el Real Decreto-Ley
16/2020, de 28 de abril, de Medidas Procesales y Organizativas para hacer frente al
COVID-19 en el ámbito de la Administración de Justicia. III. Los riesgos inherentes a
algunos “acuerdos judiciales” sobre la compensación de visitas. La conveniencia de
optar por un modelo equilibrado y justo para con el interés del menor y el de ambos
progenitores afectados. IV. Un ejemplo práctico de aplicación del “sentido común” en
orden a conseguir una compensación equitativa del régimen de visitas interferido con
motivo del COVID-19. V. Conclusión. VI. Bibliografía

1
Investigadora del Departamento de Derecho Privado (Sección Mercantil). Universitat de Barcelona. E-mail:
mailto: njimenezcardona@ub.edu / njimenezcardona@ub.edu.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 511


Noemí Jiménez Cardona

I EL RÉGIMEN DE VISITAS EN LOS CASOS DE DIVORCIO


(PLANTEAMIENTO GENERAL)
El Código Civil, en su Capítulo IX dedica el art. 94 a regular el llamado
“régimen de visitas” (en el caso de Cataluña, su regulación específica deriva del
juego combinado de los arts. 233 y 236 del Libro segundo del CCcat). En función de
este derecho, el progenitor que no tenga consigo a los hijos menores o incapacitados
gozará del derecho a visitarlos, comunicar con ellos o tenerlos en su compañía. El
juez determinará el tiempo y lugar del ejercicio de este derecho, que podrá limitar o
suspender si se dieren graves circunstancias que así lo aconsejen o se incumplieren
grave o reiteradamente los deberes impuestos por la resolución judicial. Igualmente,
también podrá determinar, previa audiencia de los padres y abuelos, que deberán
prestar su consentimiento, el derecho de comunicación y visitas de los nietos con sus
abuelos (art. 160 CC), teniendo siempre presente el interés del menor. La fijación de
este derecho de visitas persigue no tanto satisfacer los deseos o derechos de los
progenitores, sino más bien permitir unas relaciones entre estos y sus hijos menores
que favorezcan, en la medida de lo posible, su bienestar y estabilidad2.
Si ambos progenitores mantienen una relación “cordial” tras su divorcio no
se plantean graves problemas en cuanto a su cumplimiento específico. Sin embargo,
en no pocos divorcios contenciosos las cosas no son tan sencillas (ni en situaciones
de “normalidad”, ni tampoco en aquellas otras excepcionales como las vividas con
motivo de la pandemia del COVID-19). Para afrontar la regulación de estos
hipotéticos conflictos convendría que los progenitores tuvieren bien presente que el
progenitor custodio tiene la obligación de permitir las comunicaciones y visitas entre
los hijos comunes y el progenitor no custodio en los términos establecidos en el caso
concreto, así como que el no custodio tiene la obligación de cumplimentar dicho
régimen de visitas en los términos establecidos. De igual forma, aun no siendo
objetable que en orden a la solución de estos conflictos deba prevalecer, por encima
de todo, el interés de los menores afectados, también convendría que algunos
titulares de la potestad jurisdiccional, así como representantes del Ministerio Fiscal,
huyesen de la fácil y cómoda tentación de “solo prestar atención” a dicho interés del
menor, sin motivación específica alguna para con las circunstancias del caso
concreto, haciendo así un flaco favor a la “pacificación” de la relación entre ambos
progenitores, así como al sentimiento de justicia que alguno de estos pueda sentir en
un tema tan emocional como el que nos ocupa y que, en última instancia, puede
constituir un fenomenal caldo de cultivo en aras a recrudecer la “lucha” entre
custodio y no custodio.

2
VALLESPÍN PÉREZ, D., Asesoramiento y Praxis Judicial en el Divorcio Contencioso, Bosch, Barcelona,
2014, p. 108 y ss; ZARRALUQUI SÁNCHEZ-EZNARRIAGA, J. El frecuente incumplimiento del
régimen de estancia de los menores con el progenitor no custodio en períodos lectivos o de vacaciones,
Actualidad Jurídica Aranzadi, n. 821, 2011, p. 2 y ss; y ZARRALUQUI SÁNCHEZ-EZNERRIAGA, J. De
las relaciones con los hijos cuando los progenitores no conviven, Economist & Jurist, vol. 19, n. 150, 2011,
p. 32-37.

512 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Compensación del Régimen de Visitas, en los Casos de Divorcio Contencioso, en la Nueva Era Post-Covid 19

Conflictos que se han visto incrementados con algunas realidades propias de


la gestión de la pandemia del COVID-19. Pensemos, por ejemplo, en aquellos casos
en que los progenitores custodios, amparándose en la mera referencia a proteger la
“salud” de los menores, muchas veces sin base alguna, se han negado a que el
progenitor custodio pudiese seguir cumpliendo con su régimen de visitas con
normalidad; en aquellos otros en que los progenitores no custodios se han visto
sometidos al “alejamiento forzoso”, durante tres meses, de sus hijos por residir en
una provincia diferente de aquella en que lo hace el progenitor custodio; o también
en aquellos en que progenitores no custodios, aprovechándose del estado de alarma,
simplemente han optado por la vía fácil de no cumplir, aun cuando hubieran
podido hacerlo con casi total normalidad, con las comunicaciones y visitas para
con sus hijos a lo largo de los meses de confinamiento.
Esta realidad, que no conviene silenciar, sale a la luz con motivo del
levantamiento del estado de alarma. La declaración de dicho estado ha incidido de
modo directo en los regímenes de visitas y estancias con lo hijos en la medida en
que su cumplimiento implicó limitaciones de salida a la vía pública e, incluso,
desplazamientos y viajes entre diferentes localidades. Ante la avalancha de casos
conflictivos que sobre el particular puedan presentarse, nuestro legislador ha
pretendido tomar medidas mediante la fijación de un procedimiento especial y
sumario de familia regulado en el RDL 16/2020, de 28 de abril. Un procedimiento
especial ante el que los jueces debieran tener claro, en esta materia (régimen de
visitas), que la necesidad de “descongestionar” la Administración de Justicia no
debe camuflarse bajo la vestidura de una referencia inmotivada, en estos casos, al
interés superior del menor, para así “quitarse un problema de encima” con la
mayor agilidad posible. De ser así, no podría hablarse de una justicia acelerada,
sino “atropellada” y de difícil encaje con la correcta comprensión del derecho a la
tutela judicial efectiva y la exigencia de motivación de las resoluciones judiciales
(arts. 24 y 120 de la Constitución Española de 1978)3.

II EL PROCEDIMIENTO ESPECIAL Y SUMARIO DE FAMILIA REGULADO


EN EL REAL DECRETO-LEY 16/2020, DE 28 DE ABRIL, DE MEDIDAS
PROCESALES Y ORGANIZATIVAS PARA HACER FRENTE AL COVID-19
EN EL ÁMBITO DE LA ADMINISTRACIÓN DE JUSTICIA
La crisis originada por el COVID-19 ha cambiado de forma radical nuestras
vidas, generando “alteraciones” y “caos” en múltiples ámbitos. El Derecho de
Familia, como es fácil pensar, no ha sido una excepción4. De ahí, precisamente, que

3
VALLESPÍN PÉREZ, D., El modelo constitucional de juicio justo en el ámbito del proceso civil, Atelier,
Barcelona, 2000, p. 139 y ss.
4
PÉREZ MARTÍN, A. J. Custodia, visitas y otras medidas en tiempos de coronavirus, El Derecho, 6 de
mayo de 2020, p. 1 y ss; RODRÍGUEZ DE BRUJÓN Y FERNÁNDEZ, E. Análisis del Real Decreto-Ley
16/2020, de 28 de abril, de medidas procesales y organizativas para hacer frente al COVID-19 en el ámbito
de la Administración de Justicia, p. 5 y ss; SPINOLA PÉREZ, A. B. Menores y régimen de visitas durante
el estado de alarma acordado ante el COVID-19, Economist & Jurist, 26 de marzo de 2019, p. 1 y ss.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 513


Noemí Jiménez Cardona

con motivo del Real Decreto-Ley 16/2020, de 28 de abril, de Medidas Procesales y


Organizativas para hacer frente al COVID-19 en el ámbito de la Administración de
Justicia, el legislador español haya contemplado, ante la perspectiva del retorno a la
“nueva normalidad” tras los peores momentos de la crisis del coronavirus, un amplio
abanico de medias procesales, concursales y organizativas orientadas, aun cuando
algunas de ellas sean más que discutibles, a la reactivación de la Administración de
Justicia.
Entre las medidas procesales cabe referir, por lo que ahora interesa, la
creación de un nuevo procedimiento especial y sumario en materia de familia (arts. 3
a 5, ambos inclusive)5, respecto del cual será supletoria, como así dispone el
apartado 9 del art. 5 del RDL, la tramitación propia del juicio verbal (arts. 437 a 447
LEC). Procedimiento centrado, de una parte, en dar respuesta a la previsible
proliferación de demandas relativas a la modificación o ajuste de medidas de índole
económica (vgr. pensión de alimentos); y, de otra, en agilizar la tramitación de
aquellas peticiones de tutela judicial que tengan que ver con la “compensación de
días de visita y estancia” que hayan resultado afectados con motivo de la crisis
sanitaria.
Concretamente, durante la vigencia del estado de alarma y hasta tres meses
después de su finalización, se decidirán en dicho procedimiento especial las
demandas que versen sobre pretensiones relativas al restablecimiento del equilibrio
en el régimen de visitas o custodia compartida cuando alguno de los progenitores no
haya podido atender en sus estrictos términos el régimen establecido, como
consecuencia de las medidas adoptadas por el Gobierno y las autoridades sanitarias
en orden a evitar la propagación entre la población del COVID-19. En estos casos, el
órgano judicial competente será aquel que hubiere resuelto sobre el régimen de
visitas o custodia compartida cuyo reequilibrio se inste o que hubiera acordado las
medidas definitivas cuya revisión se pretenda.
Este proceso principiará por demanda, con el contenido y forma propios del
juicio ordinario (art. 399 LEC). El Letrado de la Administración de Justicia
examinará dicha demanda y la admitirá, si procede, por decreto. Por el contrario,
cuando el Letrado de la Administración de Justicia estime que puede faltar
jurisdicción o competencia, dará cuenta de ello al Juez para que sea este quien, en
dicho caso, se pronuncie acerca de su admisibilidad. Una vez admitida a trámite la
demanda, se citará a las partes y al Ministerio Fiscal cuando proceda, a una vista,
que deberá celebrarse dentro de los diez días hábiles siguientes a la fecha de
admisión de la demanda. Con carácter previo la celebración de esta vista, puede
intentarse que la partes lleguen a una solución pactada susceptible de ser
homologada judicialmente. En la misma línea, en aquellas demandas que versen

5
GONZALO DEL POZO, J.P. Estudio del proceso especial y sumario, en materia de familia, creado por el
Real Decreto-Ley n. 16/2020, de 28 de abril, Diario La Ley, n. 9624, Sección de Plan de Choque de la
Justicia/Tribuna, 4 de mayo de 2020, p. 1 y ss; MARTÍNEZ DE SANTOS, A. Medidas posibilistas en la
Justicia civil después del levantamiento de la declaración del estado de alarma, Diario la Ley, Sección de
Plan de Choque de la Justicia/Tribuna, de 6 de mayo de 2020, p. 1 y ss.

514 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Compensación del Régimen de Visitas, en los Casos de Divorcio Contencioso, en la Nueva Era Post-Covid 19

sobre la solicitud de compensación del régimen de visitas o custodia compartida,


también se dará audiencia reservada a los hijos menores, pero solo cuando el titular
del juzgado así lo estime necesario y, en todo caso, a los mayores de doce años6.
Llegados a la vista, cabe señalar que esta se iniciará dando la palabra al
demandante, al efecto de que ratifique la demanda o la pueda ampliar, pero sin
incorporar modificaciones sustanciales. A continuación, se dará la palabra al
demandado para que conteste la demanda, pudiéndose solicitar el recibimiento del
pleito a prueba y la reconvención. La eliminación de la contestación escrita, sin
perjuicio de poder comportar una cierta agilización de la administración de justicia,
es lo cierto que bien puede suponer una flagrante vulneración del derecho de defensa
del demandado, así como del principio de igualdad de armas u oportunidades
procesales7. Ello es así, porque en la actual praxis judicial se hace difícil vislumbrar
qué órganos jurisdiccionales se mostrarán favorables a “contestaciones orales”
detalladas por parte del sujeto pasivo de la relación procesal. Y lo mismo puede
referirse también, en paralelo, respecto al actor, pues este, ante una contestación oral
en el acto de la vista o reconvención también puede verse sorprendido, en no pocos
casos, por el conocimiento de cuál sea, en el caso concreto, el posicionamiento del
demandado.
Ambas partes podrán solicitar, al menos con cinco días de antelación a la
fecha del día de la vista, aquellas pruebas que, habiendo de practicarse en ella,
requieran de citación o requerimiento, o que se soliciten aquellos documentos que
posean instituciones públicas o privadas, y que no estén a su disposición. Las partes
tienen la obligación de acudir a la vista con aquellas pruebas de que intenten valerse,
debiendo practicarse dichas pruebas, así como aquellas que pueda acordar el juez de
oficio, en el propio acto de la vista. Tras la práctica de las pruebas, se podrá
conceder a las partes un turno de palabra para formular oralmente sus conclusiones.
El que dicho trámite de conclusiones no sea más que una simple facultad del
juzgador bien puede hacernos pensar que estamos ante una previsión de complejo
encaje en el modelo constitucional de juicio justo o proceso con todas las garantías,
pues las alegaciones finales, en cuanto manifestación del derecho de defensa,
debieran ser obligatorias, en nuestra opinión, en todo proceso judicial8.
Acabada la vista, el órgano judicial puede dictar resolución, en forma de
sentencia o auto según corresponda, oralmente o bien por escrito en el plazo de tres
días naturales. En aquellos casos en que la resolución sea dictada oralmente, esta se
documentará con expresión del fallo y una sucinta motivación. De igual forma, ante
resoluciones orales, si todas las partes en el proceso estuvieran en el acto por sí o

6
VALLESPÍN PÉREZ, D. El derecho de los menores, mayores de 12 años, a ser oídos en los
procedimientos de divorcio contencioso, Práctica de Tribunales, Revista de Derecho Procesal y Mercantil,
n. 131, marzo-abril, 2018 , p. 1 y ss.
7
VALLESPÍN PÉREZ, D. Juicio verbal en la nueva Ley de Enjuiciamiento Civil Española (Análisis tras su
reforma por Ley 42/2015, Juruá, Lisboa, 2016, p. 46.
8
VALLESPÍN PÉREZ, D. Juicio verbal en la Ley de Enjuiciamiento Civil Española (Análisis tras su
reforma por Ley 42/2015), obr, cit, p. 77-82.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 515


Noemí Jiménez Cardona

debidamente representadas y expresan su voluntad de no recurrir dicha resolución,


en unidad de acto se declarará su propia firmeza.
De todo lo expuesto en este apartado, sin perjuicio de haber constatado
ciertas deficiencias técnicas en cuanto al procedimiento especial y sumario de
familia introducido con motivo del RDL 16/2020 (algunas de las cuales, incluso,
reviste visos de inconstitucionalidad); es lo cierto que cada órgano judicial podrá, en
orden a interpretar como “compensar el régimen de visitas o de custodia
compartida”, seguir la interpretación que estime más coherente con las
circunstancias del caso concreto.
En todo caso, para unificar criterios ante ciertas inconcreciones, no son pocas
las Juntas de Jueces de Familia que en las últimas fechas se han reunido para fijar
diferentes acuerdos interpretativos acerca de cómo aplicar, en la práctica,
ponderando los intereses de los progenitores y, en especial, de los hijos implicados,
dicha opción de “compensación”. Como podrá comprobarse en el apartado siguiente
de este artículo, dichos acuerdos parecen más bien responder a “aliviar la carga de
trabajo” de los Juzgados y no tanto, por desgracia, a la justa compensación de los
regímenes de visitas y estancias.

III LOS RIESGOS INHERENTES A ALGUNOS “ACUERDOS JUDICIALES”


SOBRE LA COMPENSACIÓN DE VISITAS. LA CONVENIENCIA DE
OPTAR POR UN MODELO EQUILIBRADO Y JUSTO PARA CON EL
INTERÉS DEL MENOR Y EL DE AMBOS PROGENITORES
AFECTADOS
Sin duda, uno de aquellos “acuerdos judiciales” más polémicos sobre la
compensación de visitas es el adoptado por la Junta Sectorial de los Jueces de los
Juzgados de Familia de Madrid, de 20 de mayo, en que se incorporan un elenco
de conclusiones, tanto sustantivas como procesales, referidas al régimen de visitas y
de custodia.
Por lo que hace referencia a los aspectos sustantivos de este acuerdo se
señala, cual pórtico interpretativo, que con carácter general y para la debida
protección del menor, a fin de lograr a la mayor brevedad la normalización del
régimen de visitas o de custodia en su día establecido, no procede la compensación
de visitas no disfrutadas o estancias no realizadas. Este carta de presentación,
bastante elocuente, ya nos indica que los Juzgados de Familia de Madrid no serán
partidarios, casi nunca, de contemplar compensación alguna en relación al régimen
de visitas que se haya visto alterado con motivo del COVID-19.
Este posicionamiento se hace descansar, como no podía ser de otra forma, en
el siempre alegado “interés del menor”. Teóricamente dicho proceder resulta
irreprochable. Sin embargo, si analizamos el acuerdo con detalle, no lo es tanto. Ello
es así, en primer lugar, porque no motiva, en absoluto, porque en estos casos es
“mejor para el menor”, que quizás se ha visto privado de la compañía del progenitor
no custodio durante un mínimo de tres meses, no poder “recuperar”, por regla
general, parte del tiempo que no ha podido disfrutar con el no custodio; y, en

516 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Compensación del Régimen de Visitas, en los Casos de Divorcio Contencioso, en la Nueva Era Post-Covid 19

segundo lugar, porque no parece de recibo que se nos diga que ello debe ser así, ni
más ni menos, que para lograr a la mayor brevedad la normalización del régimen de
visitas o custodia que en su día se fijó, pues normalizar el régimen de visitas no es
incompatible con compensarlo en su justa medida y, por extensión, implica
consolidar, por la vía de facto, una anormalidad de signo contrario que bien puede
pensarse, aplicando el sentido común, que es perjudicial para el menor y el
progenitor no custodio.
Puede entenderse que ante el colapso previsible de los Juzgados de Familia
estos pretendan “aligerar” su carga de trabajo, pero no parece de recibo, desde la
perspectiva del derecho a la tutela judicial efectiva, que lo hagan mediante un
acuerdo que, sin mayor motivación, parece perseguir, aun cuando podamos estar
equivocados, aplicar automáticamente un “no” (desde luego más rápido que analizar
el caso concreto) a cualquier reclamación referida a la compensación del régimen de
visitas que pueda poner en marcha el progenitor no custodio (ese o esa que, en no
pocos casos, se ha visto privado del contacto con sus hijos menores durante más de
tres meses).
Solo, excepcionalmente, se contempla la opción de aplicar dicha
“compensación” cuando así lo aconseje, en el caso concreto, el interés superior del
menor. Y, en todo caso, teniendo presente que los tiempos de disfrute con los
menores durante el confinamiento no son equivalentes a aquellos que son propios en
situaciones de normalidad. Cuando un acuerdo de Juntas de Jueces concluye que una
opción será “excepcional”, nadie debería llevarse a engaño, pues eso en la práctica,
dada la previsible avalancha de asuntos y la conveniencia de blindarse ante
problemas y/o críticas, es más que probable que se traduzca en un brindis al sol que
nunca (o casi nunca) ponga en duda la aplicación de la regla general de la “no
compensación” antes expuesta.
De otra parte, se insta a los progenitores a alcanzar acuerdos, ya que son ellos
quienes mejor conocen las circunstancias particulares que concurren en su entorno
familiar y las necesidades concretas de sus hijos menores. Magnífica idea la de
instar acuerdos, si no fuera por qué cuando la compensación del régimen de visitas
llega a “sede judicial” es, precisamente, porque ha sido imposible, a veces por
enconamiento con tintes emocionales por parte de los ahora litigantes, alcanzar una
solución convencional a dicho conflicto.
Por último se añade que, sin perjuicio de estos hipotéticos acuerdos entre los
progenitores, cabrá seguir una serie de orientaciones generales en orden a determinar
cómo implementar la “compensación” en aquellos casos excepcionales en que se así
se acuerde judicialmente. Orientaciones generales que tienen que ver con las visitas
intersemanales, las visitas de fin de semana, las visitas de vacaciones de Semana
Santa e, incluso, con los supuestos de guarda compartida.
Por lo que hace referencia a las visitas intersemanales se acuerda que en
aquellos casos, excepcionales, en que se contemple la compensación del régimen de
visitas, estas no serán objeto de recuperación. Ello se justifica en el hecho de que son
visitas de corta duración, cuya recuperación por compensación no atiende a la

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 517


Noemí Jiménez Cardona

finalidad de las mismas, esto es, asegurar el contacto con el progenitor no custodio,
así como en que dichas visitas pueden “perjudicar al menor” en tanto que pueden
“dificultarle” la normalización de sus rutinas.
Respecto a las visitas de fin de semana, el Acuerdo de la Junta Sectorial de
Jueces de los Juzgados de Familia de Madrid dispone que podrán recuperarse,
siempre de forma excepcional, pero teniendo en cuenta que por cada dos fines de
semana no disfrutados, tendría sentido recuperar solo un fin de semana adicional
cada mes o, en su caso, añadir tres días a uno de los períodos vacacionales del año
en curso.
En orden a las vacaciones de Semana Santa, plenamente afectadas en España
por la pandemia del coronavirus, el Acuerdo refleja, en lo que será una guía a seguir
respecto al resto de períodos vacacionales correspondientes a la presente anualidad,
que pueden recuperarse añadiendo dichos días a los períodos vacacionales todavía
no disfrutados este año 2020, así como que si se ha perdido la Semana Santa
completa podría compensarse dicha situación con cinco días y que, caso de haberse
perdido parcialmente, cabría tomar en consideración un tiempo equivalente a los
efectos de su compensación.
Por último, respecto a aquellos supuestos en que rige un régimen de guarda y
custodia compartida, también se refiere un posible sistema de compensación que
variará en función de su particular modalidad en cada caso concreto. Así, cuando se
trate de custodias compartidas por períodos semanales alternos, se considera un
criterio equitativo, dado que no puede hablarse de una perfecta equivalencia entre
los tiempos de disfrute con los menores en confinamiento y normalidad, el fijar una
compensación futura de tres días, como máximo, por cada semana no disfrutada, que
se agregarían a las semanas correspondientes al progenitor afectado en los meses
consecutivos (con exclusión del período vacacional de verano). De este modo, según
la Junta Sectorial de los Juzgados de Familia de Madrid se garantizaría la necesaria
alternancia de convivencia de los menores con ambos progenitores (10 y 4 días,
respectivamente), así como se evitaría que los menores no convivan con uno de los
progenitores durante tres semanas consecutivas. En la misma línea, tampoco se
considera recomendable acumular todos los días perdidos recuperables y
adicionarlos en las vacaciones de verano, pues ello acabaría por comportar un grave
desequilibrio entre los progenitores respecto al reparto de los tiempos de ocio que no
se presenta como razonable. Si la guarda y custodia compartida se disfrutase
mediante tiempos de convivencia alterna distintos al que se corresponde con una
semana, se recomienda aplicar, a efectos de compensación, un criterio análogo al
referido respecto a las custodias compartidas organizadas por semanas.
Tras este extenso apartado PRIMERO del Acuerdo de la Junta Sectorial de
Jueces de los Juzgados de Familia de Madrid, relativo a los aspectos sustantivos, se
incorpora un apartado SEGUNDO, mucho más breve, en que se refieren dos matices
de índole procesal: el primero, que la aportación de la documentación reseñada en el
art. 5.1 del RDL es un auténtico requisito de procedibilidad y, el segundo, que las
acciones reguladas en su artículo 3 son susceptibles de acumularse entre sí.

518 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Compensación del Régimen de Visitas, en los Casos de Divorcio Contencioso, en la Nueva Era Post-Covid 19

En el caso de los Juzgados de Familia de Barcelona, tras los Acuerdos de


18 y 24 de marzo, respectivamente, en los que se señaló que el RD 463/2020, de 14
de marzo, de declaración del estado de alarma, no legitima el incumplimiento de las
resoluciones judiciales vigentes9; que los progenitores deben observar las normas de
las autoridades gubernativas y sanitarias a los efectos de evitar la propagación del
coronavirus, procurando un ejercicio responsable de la potestad parental y
alcanzando los mayores acuerdos posibles; que si alguno de los progenitores
presenta síntomas de contagio o ha resultado positivo en el test del COVID-19, en
interés de los hijos menores y para evitar su propagación, es preferible que la guarda
y custodia la ostente el otro progenitor; y que a fin de conseguir el necesario y
deseable contacto paterno-filial el progenitor custodio deberá facilitar,
particularmente por medios telemáticos, el contacto del/los hijos con el progenitor
no custodio, siempre y cuando que no perturben las rutinas u horarios de descanso
de los menores; se ha alcanzado el más reciente Acuerdo de 15 de mayo de 2020,
en orden a la unificación de criterios acerca del RDL 16/2020.
En este último de los Acuerdos de la Junta Sectorial de los Juzgados de
Familia de Barcelona junto a exhortar a los progenitores a adoptar, con sentido
común, los acuerdos que estimen oportunos sobre esta materia, pues son ellos los
que mejor conocen las particularidades de su entorno familiar, los factores de riesgo
y las necesidades específicas de sus hijos menores; así como valorar la buena o mala
fe en orden a la imposición de costas procesales en función de la conducta procesal;
se contempla un hipotético restablecimiento del equilibrio en el régimen de visitas
que parece todavía más restrictivo que el propio de los Juzgados de Familia de
Madrid.
Así, respecto a las visitas intersemanales (con pernocta o sin pernoctar) y
visitas en o a través del Punto de Encuentro (en cualquiera de sus modalidades), se
acuerda que no se recuperan. Lo mismo acontecerá en relación a los fines de semana
alternos, pues estos solo podrán recuperarse si el incumplimiento ha sido reiterado,
injustificado e interesa al menor la recuperación de dichos días. Y para cerrar el
círculo, también se acuerda que no se recuperarán las vacaciones de Semana Santa.
Respecto al restablecimiento del equilibrio en el régimen de guarda
compartida, con mayor sencillez que el Acuerdo de la Junta Sectorial de los
Juzgados de Familia de Madrid, se concluye que la falta de desarrollo de dicho
régimen por la voluntad unilateral de uno de los progenitores resulta totalmente
injustificada y contraria a Derecho, por lo que deberá recuperarse por el progenitor
que se ha visto privado de desarrollar sus períodos de custodia, en la medida de lo
posible y teniendo en cuenta el interés superior del menor. Los incumplimientos
sobre el régimen de guarda compartida se compensarán con el período vacacional de
verano en el sentido que los menores estarán un número superior de semanas de las
que le correspondería, con el progenitor que no lo haya tenido bajo su guarda en el

9
Sobre este particular véase REY GONZÁLEZ, P., Estado de alarma: ¿se incurre en incumplimiento de la
resolución judicial que regula las medidas de los progenitores para con los menores si no se cumple en sus
propios términos?, en Diario La Ley, n. 9607, 2020, p. 1 y ss.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 519


Noemí Jiménez Cardona

período ordinario durante el estado de alarma, en el bien entendido que si la


compensación se resuelve con posterioridad al período vacacional de verano cada
órgano judicial, analizando caso por caso y valorando que es lo que más interesa a la
estabilidad del menor, decidirá si se produce o no dicha compensación y en qué
forma.
En el ámbito procesal, finalmente, se acuerda que la resolución sea por
sentencia, que las partes puedan presentar en cualquier momento, anterior a la vista,
acuerdo por escrito, que se pueda ejercer acción reconvencional si la misma se
presenta por escrito cinco días antes de la vista y solo cuando la misma verse cobre
las acciones previstas en el RDL, requerir a la parte actora, como requisito previo a
la admisión de la demanda, un plan de parentalidad concreto con la propuesta de
compensación, con apercibimiento de que no se tramitará la misma hasta que se no
se presente, y requerir al demandado este mismo plan de parentalidad cinco días
antes de la vista, si se va a oponer a lo solicitado.
Centrando nuestra valoración acerca de lo acordado por la Junta Sectorial de
Jueces de Familia de Barcelona, en su acuerdo de 15 de mayo de 2020, respecto a la
hipotética compensación del régimen de visitas afectado con motivo de la crisis
sanitaria derivada del COVID-19, conviene señalar, en primer lugar, que bien está
“fomentar” los acuerdos amistosos entre las partes; en segundo lugar, que no parece
de recibo, salvo que solo estemos pensando en descargar de trabajo a los órganos
judiciales (respuestas automáticas en sentido negativo al reequilibrio), establecer que
las visitas intersemanales no se recuperan, así como tampoco las de las vacaciones
de Semana Santa, y que las de los fines de semana alternos solo se recuperarán
cuando el incumplimiento haya sido reiterado, injustificado e interese al menor la
recuperación de dichos días (lo que bien cabe pensar que no pasará casi nunca en
opinión de los titulares de la potestad jurisdiccional encargados de juzgar el caso
concreto). Si a ello añadimos que, de soslayo, se les viene a decir a los progenitores
no custodios, también en dicho Acuerdo, que si litigan con mala fe pueden verse
abocados al pago de las correspondientes costas procesales; no hace falta hacer gala
de una gran intuición para vislumbrar que los progenitores no custodios “pueden ir
olvidándose” en la práctica de ver restablecido el equilibrio en relación a las
alteraciones del régimen de visitas derivadas de la pandemia del coronavirus.
Francamente, para adoptar este acuerdo, mejor hubiere sido que la Junta de
Jueces Sectorial de los Jueces de Familia de Barcelona hubiese limitado su texto a
una sola línea que lo cubriría todo: “no se compensará de forma alguna la alteración
del régimen de visitas interferido por la COVID-19”. De este modo, los progenitores
no custodios ya lo tendrían claro y no perderían el tiempo en participar en una
“compensación ficticia”, diseñada teóricamente, pero que en la praxis judicial será
tanto como “encontrar una aguja en un pajar”.
Siendo criticable sobre este particular, como ya hemos señalado, el Acuerdo
la Junta Sectorial de los Jueces de Familia de Madrid, es lo cierto que este parece
mucho “más avanzado” que el derivado de la Junta Sectorial de los Jueces de
Familia de Barcelona, pues este último parece diseñado conscientemente para “no

520 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Compensación del Régimen de Visitas, en los Casos de Divorcio Contencioso, en la Nueva Era Post-Covid 19

perder tiempo” en determinar cómo compensar el tiempo de visitas perdido con


motivo del COVID-19 es, inconscientemente, para beneficiar a aquellos
progenitores no custodios que, sabiendo del tenor del acuerdo interpretativo, lo
tienen muy fácil para impedir, cuando así lo deseen, cualquier acuerdo de
compensación sobre el régimen de visitas: bastará con boicotear cualquier intento de
pacto entre las partes y decirle al progenitor no custodio que si lo desea plantee una
demanda judicial que será resuelta con criterios favorables a la no compensación y,
ya que estamos, que tengan cuidado, no sea que se les aprecie la mala fe en su
conducta procesal y deban hacer frente también al pago de las costas procesales.

IV UN EJEMPLO PRÁCTICO DE APLICACIÓN DEL “SENTIDO COMÚN”


EN ORDEN A CONSEGUIR UNA COMPENSACIÓN EQUITATIVA DEL
RÉGIMEN DE VISITAS INTERFERIDO CON MOTIVO DEL COVID-19
Tras haber defendido en el apartado precedente una solución “equilibrada”
acerca de la posible compensación del régimen de visitas que se haya visto alterado
con motivo de la crisis sanitaria; a continuación, partiendo de un supuesto tipo,
propondremos un modelo acerca de cómo pudiere afrontarse dicha compensación en
la realidad diaria de nuestros órganos jurisdiccionales.
Pensemos, por ejemplo, en un típico caso en que una pareja divorciada, con
una hija en común de 12 años, viene ajustándose, viviendo ambos progenitores en
idéntica provincia (o incluso en otra), pero en localidades distintas (a lo mejor
separadas por 50 kilómetros de distancia), a un régimen de visitas intersemanales (la
tarde del miércoles, con pernocta en el domicilio del progenitor no custodio), de fin
semana (fines de semana alternos desde el viernes a la salida del centro escolar y
hasta el lunes en que la menor será retornada por el progenitor no custodio al
colegio) y vacacionales (la mitad de los días de Navidad, Semana Santa y de los
meses de julio y agosto).
Este sistema de visitas, con motivo de haberse decretado el estado de alarma
el día 14 de marzo de 2020, y tomando en consideración que el mismo sea levantado
con fecha 30 de junio (como viene anunciándose), bien puede haber quedado “en
suspenso” por voluntad unilateral impuesta del progenitor custodio (ante la que poco
o nada pudo hacer el no custodio), por acuerdo entre ambos progenitores o, incluso,
por oferta de “precaución” presentada por el progenitor no custodio ante el silencio
sobre el particular por parte de aquel progenitor que ostenta la custodia en exclusiva.
Sea como fuere, a efectos prácticos, dicha situación de “suspensión” se habrá
traducido, en el caso concreto derivado del ejemplo propuesto, en que la menor y el
progenitor no custodio, cuando se alce el estado de alarma, hayan dejado de estar en
contacto durante 15 días de visita intersemanal (con su pernocta incluida); 6 o 7
fines de semana completos (desde el viernes a la salida del colegio y hasta el lunes
con el retorno de la menor al colegio, es decir, aproximadamente 21 días completos)
y la mitad de las vacaciones de Semana Santa, esto es, 5 días completos.
Si computamos todos los días de visita no disfrutados, estos suman,
aproximadamente, 41 días completos. La lógica más elemental sugiere que, ante la

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 521


Noemí Jiménez Cardona

situación que se acaba de describir, el progenitor custodio, con motivo del


alzamiento del estado de alarma, sugiera al progenitor no custodio, de buena fe y
pensando en el interés de la menor, que el progenitor no custodio pueda recuperar
dichos días progresivamente (quizás no todos, aplicando el sentido común, pero sí
una gran parte); o bien que el progenitor no custodio, es decir, aquel que no ha
podido estar en contacto directo con su hija durante casi tres meses, sugiera al
custodio un calendario de “compensación”, no total, pero si significativo. Sin
embargo, como todos podemos intuir, cada ex-pareja es un universo particular y
bien pudiera pasar que el progenitor custodio no quisiera “darle” ni un minuto de
compensación a su ex o, incluso, en algunos casos, que un progenitor no custodio,
acomodaticio, optase por dar por bueno, incluso en contra de lo que opine el
custodio, el haber perdido 41 días de contacto con su propia hija.
Por todo lo anterior, es probable que el modo de cómo “compensar” los días
perdidos acabe en sede judicial (en el mayor número de casos, aun cuando no en
todos, a instancia del no custodio que se sienta doblemente victimizado: no ha
podido disfrutar de la relación directa con su hija durante 41 días y, para más inri,
tras decretarse el alzamiento del estado de alarma ha sido penalizado por el cónyuge
custodio, consciente o inconscientemente, con no poder recuperar ni un solo
segundo de esos 41 días (difíciles, además, con motivo del confinamiento).
En estos casos, en nuestra modesta opinión, los Jueces de Familia, sin
perjuicio de valorar, caso por caso, las circunstancias particulares de cada situación
particular; no debieran partir, amparándose en una inmotivada referencia al estado
de la menor y la conveniencia de “normalizar” su situación”, en la excepcionalidad
del régimen de compensación de visitas; sino, antes el contrario, en su
generalización, pero en el bien entendido que es bastante probable que no tenga
sentido que dicha compensación incluya los 41 días íntegros que se hayan perdido
con motivo del COVID-19. Y para hacerlo, más allá de pensar en descargarse de
trabajo, lo cual es comprensible, pero no defendible, bien podrían inspirarse en la
lógica y el sentido común.
Un sentido común que bien pudiera sugerir, por ejemplo, en el caso tipo del
cual hemos partidos a efectos expositivos, que las visitas intersemanales no sean
objeto de recuperación en sus estrictos términos y totalidad, pero si computables de
alguna forma en los períodos vacacionales; que las visitas de fin de semana tampoco
sean objeto de compensación en sus estrictos términos y totalidad, pero sí tomadas
en consideración en cuanto a su recuperación gradual y parcial en tres meses (lo que
ha durado, por cierto, el estado de alarma); y que los días vacacionales que el
progenitor no custodio y su hija no hayan podido estar juntos en el período de
Semana Santa, se incorporen, automáticamente, a uno de los períodos vacacionales
de este mismo verano.
En esta línea nos atreveríamos a sugerir, en el supuesto de hecho analizado,
que el progenitor no custodio (y su hija menor) vean compensada la alteración
sufrida en el cumplimiento del régimen de visitas de la siguiente forma: las visitas
intersemanales no disfrutadas a lo largo de tres meses (que sumarían 15 días de

522 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Compensación del Régimen de Visitas, en los Casos de Divorcio Contencioso, en la Nueva Era Post-Covid 19

haberse desarrollado con normalidad) darían paso a su compensación con tres días
más en uno de los turnos vacacionales de verano de este año; el no disfrute de cinco
días correspondientes a las vacaciones escolares de Semana Santa, darían pie a su
compensación con cuatro días más en uno de los turnos vacacionales de verano de
este año; y el no haber podido gozar del disfrute de la visitas de siete fines de
semana pudiera compensarse con el hecho de permitir que en los meses de
septiembre, octubre y noviembre (ya superados los turnos vacacionales) el
progenitor no custodio gozase de tres fines de semana por uno del progenitor
custodio.
Esta forma de recuperación, no total, pero sí guiada por una cierta lógica,
bien pudiera conducir a proteger el interés prioritario de la menor (que pueda
recuperar, de alguna forma, los días de contacto directo con el no custodio de los que
no ha podido disfrutar, llegando a estar tres meses alejada de cualquier
presencialidad con dicho progenitor), el interés del progenitor no custodio (no
parece de recibo que a quien la excepcionalidad del momento ha privado del
régimen de visitas con su hija, se le quiera cargar ahora, en exclusiva, con no poder
recuperar ni un solo segundo del contacto no disfrutado con la menor) e, incluso, el
interés del progenitor custodio, que salvo que sea un amante de la “alienación
parental” también tiene sentido que pueda disfrutar de unos días en que, sin olvidar
en ningún momento a su hija, también lo haga mediante un relax que, a buen seguro,
le hará afrontar, con mayor frescura y claridad mental, la vuelta a una supuesta
normalidad tras la pandemia.

V CONCLUSIÓN
Aun cuando en cada caso debieran arbitrarse las medidas más idóneas en
función de sus particulares circunstancias, puede concluirse que la compensación
“abierta” con motivo del RDL 16/2020 respecto al régimen de visitas y estancias no
debe reducirse a un simple brindis al sol, bien intencionado o propagandístico; sino
que debiera verse reflejada en una realidad que beneficie a la estabilidad y bienestar
emocional de los menores afectados, así como haga sentir a ambos progenitores y,
en especial, a quien se haya visto privado de tener contacto alguno con sus hijos
durante tres largos meses (pero también podría decirse de aquel progenitor custodio
que se ha visto abocado, por imposición del no custodio, incluso sin comunicación o
pacto alguno al respecto, a asumir el cuidado íntegro de la menor, en circunstancias
complicadas, durante noventa días ininterrumpidos) que en el caso particular se
imparte justicia.
Hacer justicia no es “descargar rápido” de trabajo a los órganos
jurisdiccionales, sino dar una respuesta justa y equilibrada a todos los intereses en
juego (por supuesto los de la menor y el progenitor custodio, pero también los del no
custodio que, por mucho que a veces parezca que se olvida, no es de peor condición
que el custodio). Siendo esto así, quizás los acuerdos de las Juntas Sectoriales de
Jueces de Familia de Madrid y Barcelona, relativos al reequilibrio del régimen de
visitas, pudieran haber sido muy breves y haber incorporado un tenor literal y

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 523


Noemí Jiménez Cardona

teleológico bien diferente, también fundado en el interés y bienestar emocional de


los menores afectados.
Tenor literal que podría haber sido el siguiente: “La compensación o resta-
blecimiento del equilibro en el régimen de visitas debe ser de aplicación general
salvo que, en el caso concreto, el bienestar y estabilidad emocional del menor afec-
tado aconsejen, objetiva y motivadamente, lo contrario. A los efectos de dicha com-
pensación, los días perdidos de visita intersemanal y de las vacaciones de Semana
Santa se reequilibrarán, salvo pacto en contrario de las partes u otra decisión del
órgano judicial en función de las particularidades del caso concreto, mediante la
adición, para el progenitor no custodio, de una semana más en el período vacacio-
nal de verano del año en curso. Respecto a los fines de semana alternos que hubie-
ren podido verse afectados con motivo del COVID-19, su compensación tendrá
lugar mediante la atribución al progenitor no custodio de tres fines de semana (por
uno del progenitor custodio) en los meses de septiembre, octubre y noviembre”.
En condiciones normales, no parece que este “reequilibrio” suponga ningún
perjuicio emocional para un menor, tampoco perjudica al progenitor custodio y, por
extensión, permite no “castigar” de nuevo a aquellos progenitores no custodios que,
en más de una ocasión, ya han sufrido la aplicación de la doctrina del “premio al
infractor”, esto es, de una interpretación del interés del menor que, en verdad, parece
serlo más bien, aun cuando sea de forma inconsciente, del progenitor custodio
(pensemos, por ejemplo, en los custodios que, aprovechando el estado de alarma han
gozado, como en el ejemplo expuesto, de 41 días más de contacto con los hijos y,
llegada la petición amistosa del no custodio de recuperar alguno de esos días, se
limitan a responder que “no y punto”, imponiendo su voluntad a un no custodio que
sabe que no le vale la pena acudir a la justicia, no solo porque los criterios
interpretativos están en su contra, sino también porque tiene miedo a ser condenado
en costas cuando intente defender sus derechos e intereses legítimos (y también los
de los menores afectados).
En pleno siglo XXI convendría ir superando, de una vez por todas, ciertas
inercias jurisprudenciales e ir poniendo al día, con sentido común, la justicia de
familia.

VI BIBLIOGRAFÍA
DELGADO MARTÍN, J., “Incumplimiento del régimen de visitas. Especial hincapié sobre el
incumplimiento por parte del progenitor que tiene la custodia del hijo menor”, en Ejecución de
sentencias civiles, Cuadernos del Consejo General del Poder Judicial, Madrid, 1992.
GONZÁLEZ DEL POZO, J. P., Estudio del proceso especial y sumario, en materia de familia, creado
por el Real Decreto Ley n. 16/2020, de 28 de abril, Diario La Ley, n. 9624, Sección de Plan de Choque de
la Justicia/Tribuna, 4 de mayo de 2020.
MARTÍNEZ DE SANTOS, A., Medidas posibilistas en la Justicia civil después del levantamiento de la
declaración del estado de alarma, Diario La Ley, Sección de Plan de Choque de la Justicia / Tribuna, 4
de mayo de 2020.
PÉREZ MARTÍN, A. J., Custodia, visitas y otras medidas en tiempos de coronavirus, El Derecho, 6 de
mayo de 2020.

524 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Compensación del Régimen de Visitas, en los Casos de Divorcio Contencioso, en la Nueva Era Post-Covid 19

REY GONZÁLEZ, P., Estado de alarma: ¿se incurre en incumplimiento de la resolución judicial que
regula las medidas de los progenitores para con los menores si no se cumple en sus propios términos?,
en Diario La Ley, n. 9607, 2020.
RODRÍGUEZ DE BRUJÓN Y FERNÁNDEZ, E. Análisis del Real Decreto-Ley 16/2020, de 28 de abril,
de medidas procesales y organizativas para hacer frente al Covid-19 en el ámbito de la Administración
de Justicia, Economist & Jurist, 29.04.2020.
SPINOLA PÉREZ, A.B. Menores y régimen de visitas durante el estado de alarma acordado ante el
COVID-19, Economist & Jurist, 26 de marzo de 2019.
VALLESPÍN PÉREZ, D., Asesoramiento y Praxis Judicial en el Divorcio Contencioso, Bosch,
Barcelona, 2014.
VALLESPÍN PÉREZ, D., Juicio verbal en la Ley de Enjuiciamiento Civil Española (Análisis tras su
reforma por Ley 42/2015), Juruá, Lisboa, 2016.
VALLESPÍN PÉREZ. D., El derecho de los menores, mayores de 12 años, a ser oídos en los
procedimientos de divorcio contencioso, Práctica de Tribunales, Revista de Derecho Procesal y Mercantil,
Madrid, n. 131, marzo-abril, 2018.
ZARRALUQUI SÁNCHEZ-EZNARRIAGA, J. El frecuente incumplimiento del régimen de estancia de
los menores con el progenitor no custodio en períodos lectivos o de vacaciones, Actualidad Jurídica
Aranzadi, n. 821, 2011.
ZARRALUQUI SÁNCHEZ-EZNARRIAGA, J. De las relaciones con los hijos cuando los progenitores
no conviven, Economist & Jurist, v. 19, n. 150, 2011.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 525


La Compensación del Régimen de Visitas, en los Casos de Divorcio Contencioso, en la Nueva Era Post-Covid 19

DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA:


REQUISITOS MATERIAIS E INCIDENTE PROCEDIMENTAL
DISREGARD OF LEGAL PERSONALITY:
MATERIAL REQUIREMENTS AND PROCEDURAL INCIDENT
DOI: 10.19135/revista.consinter.00011.25
Recebido/Received 05.09.2019 – Aprovado/Approved 1.09.2020
Ricardo Wypych1– https://orcid.org/0000-0002-7711-7376
E-mail: ricardo@wypychadvogados.com.br
Mário Luiz Ramidoff2– https://orcid.org/0000-0002-0777-4944
E-mail: marioramidoff@gmail.com

Resumo: A Promulgação da nova lei processual fez reformular pensamentos e soluções


jurídicas estagnadas pelo transcurso temporal. A desconsideração da personalidade
jurídica não era prevista expressamente no Código de Processo Civil de 1973, o que
restou modificado com a nova processualística civil, agora, estabelecida pela Lei
13.105/2015 – novo Código de Processo Civil –, especificamente nos seus arts. 133 e
134. Não fosse isto, observa-se que com o advento da Lei 13.874, de 20.09.2019,
regulamentou-se não só os direitos de liberdade econômica, mas também as demais
garantias para o mercado. Com estas alterações legislativas tanto material quanto
processual fez com que houvesse atualização do entendimento do Superior Tribunal de
Justiça sobre as novas regras destinadas ao tratamento substancial do instituto da
desconsideração da personalidade jurídica, quanto acerca da adequada processualidade,
temas que constituem a problematização do vertente trabalho científico. O presente
estudo pretende abordar, de maneira analítica, a teoria da desconsideração da
personalidade jurídica sob o prisma dessa nova lei de regência processual civil, derivado
do resultado do Recurso Especial n. 1.729.554/SP de relatoria do Min. Luis Felipe
Salomão, então, julgado na data de 8.05.2018. Para o mais, anota-se que a metodologia
empregada no presente trabalho é caracteristicamente crítico-analítica, com aportes
dedutivos referentes à mutação legislativa que empreendeu a (re)construção sistêmica da
jurisprudência.
Palavras-chave: Desconsideração Da Personalidade Jurídica; Novo Código De
Processo Civil; Estudo De Caso.
Abstract: the promulgation of the new procedural law reformulated thoughts and legal
solutions stagnant by the passage of time. The disregard of legal personality was not
expressly provided for in the 1973 Code of Civil Procedure, which remained modified
with the new civil proceduralist, now established by Law n. 13.105/2015 – new Code of

1
Mestrando em Direito Empresarial e Cidadania no Programa de Pós-graduação em Direito do Centro
Universitário de Curitiba – PPGD-UNICURITIBA; E-mail: ricardo@wypychadvogados.com.br
2
Desembargador no Tribunal de Justiça do Estado do Paraná; Mestre (PPGD-UFSC) e Doutor em Direito
(PPGD-UFPR), com Estágio Pós-doutoral (PPGD-UFSC); Professor Titular no UNICURITIBA; E-mail:
marioramidoff@gmail.com

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 527


Ricardo Wypych / Mário Luiz Ramidoff

Civil Procedure – specifically in its arts. 133 and 134. Were this not the case, it is
observed that with the advent of Law n. 13,874, of September 20, 2019, regulated not
only the rights of economic freedom, but also other guarantees for the market. With
these legislative changes, both material and procedural, there was an update of the
Superior Court of Justice's understanding of the new rules for the substantial treatment
of the institute of disregard of legal personality, as well as about the adequate
procedurality, themes that constitute the problematization of the work aspect scientific.
This procedural affirmation led to an update of the Superior Court's understanding of the
new rules of procedure. The present study intends to approach, in an analytical way, the
theory of the disregard of the juridical personality under the prism of this new law of
civil procedural regency, derived from the result of the Special Appeal n. 1,729,554/SP
of the rapporteurship of Minister Luis Felipe Salomão, then judged on May 8, 2018. For
the rest, it is noted that the methodology used in the present work is characteristically
critical-analytical, with deductive contributions referring to the legislative mutation that
undertook the systemic (re) construction of jurisprudence.
Keywords: Disregard Of Legal Personality; New Code Of Civil Procedure. Case Study.
Sumário: Introdução; 1. Origem Histórica da Teoria da Desconsideração; 2. Teoria
Maior; 3. Teoria Menor; 4. Desconsideração Inversa; 5. Entendimento Jurisprudencial;
Considerações Finais; e Referências.

INTRODUÇÃO
O fundamento teórico da teoria da desconsideração da personalidade jurídica
é a função social da propriedade, que tem previsão constitucional, e, por isso mes-
mo, reverbera em todo o âmbito jurídico-legal que regulamenta a responsabilização
civil – e mesmo empresarial – da pessoa jurídica, de forma direta e, por vezes, tam-
bém de maneira invertida.
Nesse sentido, o art. 170 da Constituição da República de 1988 prevê que a
ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa,
tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça soci-
al, observados alguns princípios enumerados – dentre eles está a função social da
propriedade.
É interessante ainda ressaltar que a desconsideração deve apenas ser aplicada
em situações excepcionais. A regra deve ser a preservação da autonomia patrimoni-
al, a qual estimula o progresso e o desenvolvimento econômico.
A partir do pressuposto teórico-pragmático acerca de que a desconsideração
da personalidade jurídica apenas deve ocorrer no caso de abuso da personalidade
jurídica, passou-se, então, a verificar na legislação substancial – civil, consumerista,
dentre outras – os pressupostos e os requisitos materiais que serviriam como funda-
mento para tal asseguramento do crédito.
Não fosse isto, realizou-se também a análise da indispensabilidade da instau-
ração de incidente processual específico para a apuração judicial da desconsideração
da personalidade jurídica, em virtude mesmo do advento da Lei 13.105/2015 (Códi-
go de Processo Civil), e, do que restou objetivamente consignado na Lei 13.874, de
20.09.2019 (Lei de Declaração de Direitos de Liberdade Econômica) – então, decor-
rente da conversão da Medida Provisória n. 881, de 30.04.2009 –, a qual alterou o

528 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Desconsideração da Personalidade Jurídica: Requisitos Materiais e Incidente Procedimental

art. 50 da Lei 10.406/2002 (Código Civil), especificamente acerca da matéria, ao


acrescentar o § 4º a mencionada figura legislativa civil.
Eis, aqui, a concentração da problemática do vertente trabalho científico, isto
é, a mutação jurisprudencial dos Superiores Tribunais brasileiros em virtude não só
da alteração legislativa material, isto é, do Código Civil, mas, também, processual,
vale dizer, com a criação de uma procedimentalidade própria e adequada para a
instrução e o julgamento da desconsideração da personalidade jurídica.
Portanto, a desconsideração da personalidade jurídica pode ser definida como
a retirada episódica, momentânea e excepcional da autonomia patrimonial da pessoa
jurídica, a fim de estender os efeitos de suas obrigações à pessoa de seus titulares,
sócios ou administradores, com o fim de coibir o desvio da função da pessoa jurídi-
ca, perpetrado por eles.
Ademais, anota-se que a metodologia empregada parte do a priori legislativo,
material e processualmente estabelecidos, para, a seguir, debruçar-se sobre a verifi-
cação crítico-analítica de determinado caso legal (concreto), em que se identificou e
deu tratamento singular à desconsideração da personalidade jurídica, enquanto ga-
rantia patrimonial para fins de responsabilização civil.

1 ORIGEM HISTÓRICA DA TEORIA DA DESCONSIDERAÇÃO


A doutrina diverge acerca do momento exato do surgimento do Instituto da
Desconsideração da Personalidade Jurídica. Os marcos históricos considerados são o
caso julgado nos Estados Unidos envolvendo o Bank of United States v. Deveaux,
datado de 1809, e o caso julgado na Inglaterra em 1897, cujas partes eram Salomon x
Salomon Co.
Todavia, em razão do caso americano ter sido pouco difundido, o julgado in-
glês é largamente encontrado nos livros doutrinários, a exemplo de Rubens Requião
(2010), que destaca o caso em seu Curso de direito comercial a monografia intitula-
da Il Superamento della Personalità Giuridica dele Società di Capitali, do Professor
Piero Verrucoli, da Universidade de Pisa.
De acordo com o autor, a doutrina teria surgido na jurisprudência inglesa, nos
fins do século XIX. Em 1897, a justiça inglesa ocupou-se com um famoso caso –
Salomon vs. Salomon & Co. – que envolvia o comerciante Aaron Salomon. Este
empresário havia constituído uma company, em conjunto com outros seis compo-
nentes de sua família, e cedido seu fundo de comércio à sociedade que fundara,
recebendo, em consequência, vinte mil ações representativas de sua contribuição,
enquanto para cada um dos outros membros coube apenas uma ação para a integra-
ção do valor da incorporação do fundo de comércio da sociedade. Salomon recebeu
obrigações garantidas no valor de dez mil libras esterlinas.
A sociedade logo em seguida se revelou insolvável, sendo o seu ativo insufi-
ciente para satisfazer as obrigações garantidas, nada sobrando para os credores qui-
rografários. O liquidante, no interesse dos credores quirografários, sustentou que a
atividade da company era atividade de Salomon, que usou de artifício para limitar a

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 529


Ricardo Wypych / Mário Luiz Ramidoff

sua responsabilidade e, em consequência, Salomon deveria ser condenado ao paga-


mento dos débitos da company, devendo a soma investida na liquidação de seu cré-
dito privilegiado ser destinada à satisfação dos credores da sociedade.
O Juízo de Direito em primeira instância e depois a Corte acolheram essa pre-
tensão, julgando que a company era exatamente uma entidade fiduciária de Salomon,
ou melhor, um agente ou trustee, e que ele, na verdade, permanecerá como o efetivo
proprietário do fundo de comércio.
Era a aplicação de um novo entendimento, desconsiderando a personalidade
jurídica de que revestia Salomon & Co. A Casa dos Lordes reformou, unanimemen-
te, esse entendimento, julgando que company havia sido validamente constituída, no
momento em que a lei simplesmente requer a participação de sete pessoas, que havi-
am criado uma pessoa diversa de si mesmas. Não existia, enfim, responsabilidade
pessoal de Aaron Salomon para com os credores de Salomon & Co., e era válido o
seu crédito privilegiado.
Mas, as teses das decisões reformadas das instâncias inferiores repercutiram,
dando origem à doutrina do disregard of legal entity, sobretudo nos Estados Unidos.
No Brasil, a teoria foi abordada na obra Diregard Doctrine, de Rubens Re-
quião, em 1969. Contudo, a sua efetiva positivação se observa, inicialmente, no
Código de Defesa do Consumidor, isto é, na Lei 8.078/1990, e, posteriormente, no
atual Código Civil, isto é, na Lei 10.406/2002.
A partir destas positivações legislativas, adentra-se nas principais teorias dou-
trinariamente denominadas de “maior” e de “menor” aplicabilidade jurídico-legal,
salientando as palavras do supramencionado Autor que:

Quando propugnamos pela divulgação da doutrina da desconsideração da personali-


dade jurídica em nosso direito, o fazemos invocando aquelas mesmas cautelas e zelos
que revestem os juízes norte-americanos, pois sua aplicação há de ser feita com ex-
tremos cuidados, e apenas em casos excepcionais, que visem impedir a fraude ou o
abuso de direito em vias de comunicação. (REQUIÃO, 1997, p. 83-84)

Nos próximos itens, cada uma dessas denominadas teorias será analisada
acerca da sua aplicabilidade e excepcionalidade da desconsideração da personalida-
de jurídica, conforme os seus pressupostos e requisitos fático-normativos e legais.

2 TEORIA MAIOR
A autonomia patrimonial é um princípio de suma importância, o que reflete
que qualquer tipo de desconsideração deva ser aplicado com toda a cautela necessá-
ria, de maneira excepcional, e somente quando preenchidos determinados requisitos.
Ou seja, a regra geral é o respeito da autonomia patrimonial e a desconsideração é a
excepcionalidade da regra.
Não se pode aplicar a exceção apenas quando observado o simples descum-
primento de uma obrigação por parte da pessoa jurídica, deve-se ir além, caso seja
demonstrado que é houve desvio de sua função. Noutras palavras, a limitação de

530 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Desconsideração da Personalidade Jurídica: Requisitos Materiais e Incidente Procedimental

responsabilidade somente pode ser ignorada ou quiçá transposta quando o uso da


pessoa se afaste dos fins para os quais o direito a criou.
Noutro vértice, se considerarmos a aplicação descontrolada do instituto da
desconsideração da personalidade jurídica, haveria frontal perigo de extinção da
então pessoa jurídica, como concebida pelo ordenamento jurídico.
Neste sentido, o simples descumprimento das obrigações é decorrente da ati-
vidade comercial e mercantil, restando insuficientes se não correlacionado com uma
conduta desleal.
O, então, 1º Tribunal de Alçada Civil do Estado de São Paulo, à época de sua
existência, entendeu que:

percalços econômicos financeiros da empresa, tão comuns na atualidade, mesmo que


decorrentes da incapacidade administrativa de seus gerentes, não se consubstanciam
por si sós, em comportamento ilícito e desvio da finalidade da entidade jurídica. Do
contrário, seria banir completamente o instituto da pessoa jurídica.

A doutrina diverge sobre os fundamentos mínimos para a aplicação da des-


consideração da personalidade jurídica, o que divide a teoria maior em subjetiva e
objetiva.
A chamada teoria maior subjetiva considera como pressuposto fundamental
da desconsideração o desvio da função da pessoa jurídica, constatado na fraude e
também no abuso de direitos decorrentes da autonomia patrimonial, visto que a
desconsideração pode ser encarada como uma forma de limitar o uso da pessoa
jurídica para os fins estritamente destinados. Portanto, a autonomia patrimonial deve
subsistir apenas quando a pessoa jurídica é utilizada dissociadamente dos interesses
particulares dos sócios, fins estes não merecedores da tutela prevista no ordenamen-
to jurídico.
Na teoria maior objetiva, os pressupostos não são pacíficos, alguns entenden-
do que a formulação da desconsideração é equivocada, pois seria a confusão patri-
monial o requisito primordial da desconsideração, sendo tal conclusão chamada
costumeiramente de teoria objetiva (COMPARATO, 1983).
A confusão patrimonial pode ser entendida como a inexistência de separação
bem delimitada entre o patrimônio da pessoa jurídica e o patrimônio dos sócios ou
até dos administradores.
Ora, essa confusão patrimonial pode ser utilizada como justificativa para a
desconsideração, não sendo necessariamente crucial para a deflagração, pois a con-
fusão patrimonial não é suficiente para cercear todos os casos de desvio da função
da pessoa jurídica, em virtude de que não se ignora a possibilidade de casos em que
não há confusão de patrimônio, mas sim desvio de finalidade, autorizando por via de
consequência a superação da autonomia.
Em vista disto, é possível dizer então que a fraude e o abuso de direito quan-
do relacionados com a autonomia patrimonial fundamentam a aplicação da descon-

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 531


Ricardo Wypych / Mário Luiz Ramidoff

sideração da personalidade jurídica, uma vez que podem ser considerados como seus
requisitos materiais (fático-normativos).
A positivação da desconsideração da personalidade jurídica (teoria maior),
passou, assim, a ser objetivamente contemplada pela a alteração legislativa então
determinada pela Lei 13.874, de 20.09.2019, a qual instituiu não só a denominada
Lei de Declaração de Direitos de Liberdade Econômica; mas, também, estabeleceu
garantias de livre mercado, passando o art. 50 da Lei 10.406/2002 (Código Civil), a
estabelecer o rol dos requisitos materiais para tal desiderato, in verbis:

Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finali-
dade ou pela confusão patrimonial, pode o juiz, a requerimento da parte, ou do Ministério
Público quando lhe couber intervir no processo, desconsiderá-la para que os efeitos de
certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares de
administradores ou de sócios da pessoa jurídica beneficiados direta ou indiretamente pelo
abuso. (Redação dada pela Medida Provisória n. 881, de 2019)
§ 1º Para fins do disposto neste artigo, desvio de finalidade é a utilização dolosa da pessoa
jurídica com o propósito de lesar credores e para a prática de atos ilícitos de qualquer na-
tureza. (Incluído pela Medida Provisória n. 881, de 2019)
§ 2º Entende-se por confusão patrimonial a ausência de separação de fato entre os patri-
mônios, caracterizada por: (Incluído pela Medida Provisória n. 881, de 2019)
I – cumprimento repetitivo pela sociedade de obrigações do sócio ou do administrador ou
vice-versa; (Incluído pela Medida Provisória n. 881, de 2019)
II – transferência de ativos ou de passivos sem efetivas contraprestações, exceto o de valor
proporcionalmente insignificante; e (Incluído pela Medida Provisória n. 881, de 2019)
III – outros atos de descumprimento da autonomia patrimonial. (Incluído pela Medida
Provisória n. 881, de 2019)
§ 3º O disposto no caput e nos § 1º e § 2º também se aplica à extensão das obrigações de
sócios ou de administradores à pessoa jurídica. (Incluído pela Medida Provisória n. 881,
de 2019)
§ 4º A mera existência de grupo econômico sem a presença dos requisitos de que trata o
caput não autoriza a desconsideração da personalidade da pessoa jurídica. (Incluído pela
Medida Provisória n. 881, de 2019)
§ 5º Não constitui desvio de finalidade a mera expansão ou a alteração da finalidade
original da atividade econômica específica da pessoa jurídica.

3 TEORIA MENOR
Segundo Fábio Ulhoa Coelho (2006), existe uma linha de entendimento que
considera a ausência de requisitos específicos para a utilização da desconsideração
da personalidade jurídica. Conceitua-se então como teoria menor, que afirma que
não basta o não pagamento de um crédito para se aplicar a desconsideração da per-
sonalidade jurídica. Desta sorte, no caso da exclusiva solvência dos sócios em de-
trimento da sociedade, estes devem responder pelas obrigações sociais, aplicando a
desconsideração da personalidade jurídica.
A desigualdade das relações jurídicas entre consumidor e fornecedor, ou tra-
balhador e empregador, lastreou a aplicação da desconsideração da personalidade
jurídica pelo simples fato da frustração do credor, repassando o risco da atividade

532 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Desconsideração da Personalidade Jurídica: Requisitos Materiais e Incidente Procedimental

comercial para os sócios e administradores, independente da execução de atos co-


missivos ou omissivos com intuito fraudulento.
Na prática, verifica-se que não se enquadra a todos os ramos do direito e sua
aplicação ignora a autonomia patrimonial porque a mera existência da pessoa jurídi-
ca, pode impor obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores
por exemplo.
Senão, é o que se encontra expressamente disposto na Lei 8.078/1990, isto é,
no denominado Código de Defesa do Consumidor, em seu art. 28, acerca da descon-
sideração da personalidade jurídica, in verbis:

Art. 28. O juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade quando,


em detrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da
lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração
também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento
ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração.
§ 1° (Vetado).
§ 2° As sociedades integrantes dos grupos societários e as sociedades controladas,
são subsidiariamente responsáveis pelas obrigações decorrentes deste código.
§ 3° As sociedades consorciadas são solidariamente responsáveis pelas obrigações
decorrentes deste código.
§ 4° As sociedades coligadas só responderão por culpa.
§ 5° Também poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personali-
dade for, de alguma forma, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos
consumidores..

Nessas hipóteses, o órgão julgador poderá desconsiderar a personalidade ju-


rídica da empresa, enquanto medida destinada à defesa do consumidor, enquanto
vulnerável, conforme o inc. XXXII do art. 5º e inc. V do art. 170 ambos da Consti-
tuição da República de 1988, quando houver abuso de direito, excesso de poder,
violação da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou do contrato social.

4 DESCONSIDERAÇÃO INVERSA
Em regra, a desconsideração da personalidade jurídica é aplicável quando a
propriedade é utilizada de forma desvirtuada, para preservar a sua função social. Por
isso mesmo, pode-se dizer que desconsiderar a personalidade jurídica em casos nos
quais há o seu abuso é uma forma de preservar a propriedade privada (VASCON-
CELOS, 2018).
Conforme destaca Marlon Tomazette (2012), a utilização da desconsideração
da personalidade jurídica não destrói a pessoa jurídica. Não há dissolução da perso-
nalidade jurídica. A desconsideração é aplicada apenas em relação a uma situação
concreta, não estendendo seus efeitos para as demais relações jurídicas das quais a
pessoa jurídica faça parte.
A partir da premissa de que a pessoa jurídica pode ter sua personalidade afas-
tada temporariamente em situações específicas e justificadas, seja pela ocorrência de

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 533


Ricardo Wypych / Mário Luiz Ramidoff

fraude, seja pela utilização desta em desconformidade com o ordenamento jurídico,


admite-se também como válido o caminho inverso, desconsiderando-se a autonomia
patrimonial da pessoa jurídica para responsabilizá-la pelo descumprimento de obri-
gações dos sócios, coibindo o devedor de transferir seu patrimônio para a sociedade,
com o objetivo de esquivar-se de ser atingido pelas suas dívidas pessoais.
Procedimentalmente, observa-se que apenas judicialmente poderá haver in-
terferência na esfera patrimonial da pessoa jurídica, uma vez que se impõe a obser-
vância restrita das regras procedimentais que passaram a regulamentar o incidente
processual próprio para que se possa desconsiderar a personalidade jurídica.
O pedido pode ser manejado tanto na fase de conhecimento, quando se visa
buscar a constituição de crédito, quanto nas demais fases processuais ou tipos de
procedimento, inclusive, em fase de cumprimento de sentença ou processo executi-
vo, tudo, nestes últimos casos, mediante a observância das regras do incidente de
desconsideração da personalidade jurídica que se encontram expressa e especifica-
mente previstas nos arts. 133 a 137 da Lei 13.105/2015 (Código de Processo Civil).

5 ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL
O presente estudo toma por base a decisão relatada pelo Min. Luis Felipe Sa-
lomão no Recurso Especial n. 1.729.554 originário do Estado de São Paulo, no qual
firmou-se o entendimento sobre a desconsideração da personalidade jurídica à luz do
atualmente dispõe a Lei 13.105/2015 (Código de Processo Civil), segundo o qual:

Recurso Especial. Desconsideração da Personalidade Jurídica. CPC/2015. Pro-


cedimento para Declaração. Requisitos para a Instauração. Observância das Re-
gras de Direito Material. Desconsideração com Base no Art. 50 do CC/2002.
Abuso da Personalidade Jurídica. Desvio de Finalidade. Confusão Patrimonial.
Insolvência do Devedor. Desnecessidade de sua Comprovação.
1. A desconsideração da personalidade jurídica não visa à sua anulação, mas somen-
te objetiva desconsiderar, no caso concreto, dentro de seus limites, a pessoa jurídica,
em relação às pessoas ou bens que atrás dela se escondem, com a declaração de sua
ineficácia para determinados efeitos, prosseguindo, todavia, incólume para seus ou-
tros fins legítimos.
2. O CPC/2015 inovou no assunto prevendo e regulamentando procedimento próprio
para a operacionalização do instituto de inquestionável relevância social e instru-
mental, que colabora com a recuperação de crédito, combate à fraude, fortalecendo a
segurança do mercado, em razão do acréscimo de garantias aos credores, apresen-
tando como modalidade de intervenção de terceiros (arts. 133 a 137)
3. Nos termos do novo regramento, o pedido de desconsideração não inaugura ação
autônoma, mas se instaura incidentalmente, podendo ter início nas fases de conheci-
mento, cumprimento de sentença e executiva, opção, inclusive, há muito admitida pe-
la jurisprudência, tendo a normatização empreendida pelo novo diploma o mérito de
revestir de segurança jurídica a questão.
4. Os pressupostos da desconsideração da personalidade jurídica continuam a ser es-
tabelecidos por normas de direito material, cuidando o diploma processual tão so-
mente da disciplina do procedimento. Assim, os requisitos da desconsideração varia-

534 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Desconsideração da Personalidade Jurídica: Requisitos Materiais e Incidente Procedimental

rão de acordo com a natureza da causa, seguindo-se, entretanto, em todos os casos, o


rito procedimental proposto pelo diploma processual.
6. Nas causas em que a relação jurídica subjacente ao processo for cível-
empresarial, a desconsideração da personalidade da pessoa jurídica será regulada
pelo art. 50 do Código Civil, nos casos de abuso da personalidade jurídica, caracte-
rizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial.
7. A inexistência ou não localização de bens da pessoa jurídica não é condição para
a instauração do procedimento que objetiva a desconsideração, por não ser sequer
requisito para aquela declaração, já que imprescindível a demonstração específica
da prática objetiva de desvio de finalidade ou de confusão patrimonial. 8. Recurso
especial provido.
(STJ, 4ª Turma, REsp. n. 1.729.554/SP (2017/0306831-0), Rel. Min. Luis Felipe
Salomão, j. em 8.05.2018)

A problemática trazida à tona com a fixação do precedente era derivada da con-


fusão interpretativa de direito material e processual, haja vista que, por vezes, maneja-
va-se o pedido de desconsideração apenas lastreado na insuficiência e/ou na ausência
de bens da pessoa jurídica, o que além de distorcer a aplicação do instituto, causava
insegurança.
No caso concreto, constata-se que a instituição financeira (banco) propôs ação
de execução de título extrajudicial contra determinada pessoa jurídica, e as pessoas
físicas (naturais) que a constituíram, perante o competente Juízo de Direito da Vara
Cível Empresarial.
Mister esclarecer que a pessoa jurídica (empresa) estava em recuperação judi-
cial e que a lide executiva contra ela desde o primórdio se encontrava emsuspensão.
A execução versava sobre a cobrança de valores decorrentes de Cédula de Cré-
dito Bancário firmada no valor originário de R$ 315.000,00 (trezentos e quinze mil
reais), em que figuravam como devedores solidários os sócios da pessoa jurídica.
Houve a formal ordem de citação dos devedores para que efetuassem o adim-
plemento da obrigação no prazo legal, contudo, observa-se que os devedores injustifi-
cadamente deixaram de cumprir integral e fielmente o que fora anteriormente pactua-
do, uma vez que não realizaram o pagamento voluntário, e, por conseguinte, entende-
ram por bem opor embargos à execução que lhes fora judicialmente demandada.
Concomitante ao regular trâmite processual da execução de título extrajudicial,
a parte autora exequente propôs incidente de desconsideração da personalidade jurídi-
ca, nos termos do que dispõe o art. 133 da Lei 13.104/2015 (Código de Processo Ci-
vil), com o intuito de que a execução judicial fosse redirecionada para a pessoa jurídica
(empresa) e para os seus sócios.
A justificação do pedido de desconsideração fora derivada da informação de que
teria sido constituída uma nova pessoa jurídica com o mesmo objeto social e identidade
de sócios, sendo certo que esta sociedade não se encontrava contemplada pelo processo
judicial de recuperação, uma vez que fora constituída a menos de 2 (dois) anos, o que
refletiria na comprovação de abuso da personalidade jurídica, caracterizado mesmo pela
confusão patrimonial, pela existência de grupo econômico e pela fraude.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 535


Ricardo Wypych / Mário Luiz Ramidoff

Em virtude do antigo entendimento aplicável, observa-se que ao pedido de des-


consideração foi negado tutela jurisdicional em primeiro grau de jurisdição, sob o
fundamento de que não estariam preenchidos os requisitos legais para tanto; senão,
destacadamente, dentre eles, a ausência de esvaziamento de busca ativos, isto é, de
bens passíveis e suficientes para saldar a execução, in verbis:

Vistos.
O pedido de desconsideração da personalidade jurídica é prematuro, havendo a neces-
sidade de maior investigação para que se possa apurar a ausência de bens e eventual
abuso da personalidade jurídica, desvio de finalidade ou confusão patrimonial. Assim,
primeiramente, caberá à parte exequente postular a realização de diligências como: ex-
pedição de mandado de constatação na sede (para que se possa aferir se permanece em
funcionamento), pesquisa de bens, notadamente, veículos automotores e imóveis, quebra
do sigilo fiscal e bancário (para que se possa aferir a existência de ativo/passivo mo-
vimentação financeira). No caso, ausentes diligências nesse sentido, indefiro por ora
o pedido. Suspende-se o incidente de desconsideração da personalidade jurídica e
prossiga-se a execução nos autos principais.

Em contraposição ao que restou consolidado no supramencionado decisum, o


qual teria negado procedibilidade ao pleito de desconsideração sob o fundamento de
que este ainda se afigurava prematuro, interpôs-se recurso de agravo de instrumento
perante o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, aduzindo-se que houve clara
confusão patrimonial entre as empresas executadas, porque uma se aproveitou do
fundo de comércio da outra, motivo relevante dentre outros que, por si só, já autori-
zaria a desconsideração da personalidade jurídica, nos termos do que dispõem os
arts. 50, 187 e 942 todos da Lei 10.406/2002 (Código Civil).
O recurso de agravo de instrumento foi originalmente interposto e regular-
mente distribuído a uma das Câmaras de Direito Privado do Tribunal de Justiça do
Estado de São Paulo.
Inobstante a firme ponderação de argumentos dos agravantes, a decisão judi-
cial que fora combatida acabou por ser mantida à unanimidade pelo Colegiado da
supramencionada instância recursal, in verbis:

Execução de Título Extrajudicial – Desconsideração da Personalidade Jurídica –


Decisão agravada que indeferiu o pedido de desconsideração da personalidade jurí-
dica – Medida excepcional – Ausência de esgotamento dos meios para localização de
bens dos executados – Pleito de desconsideração que se mostra prematuro – Recurso
não provido. Com o devido respeito, o recurso de agravo de instrumento não merece
provimento.
A desconsideração da personalidade jurídica se trata de medida excepcional, deven-
do ser esgotados todos os meios para a satisfação do crédito exequendo antes que se
mostre pertinente a sua decretação. [...] Efetivamente, a desconsideração da persona-
lidade jurídica visa coibir o uso irregular da forma societária para fins contrários ao di-
reito, com o intuito de se evitar que o conceito de pessoa jurídica seja empregado para de-
fraudar credores, subtrair-se a uma obrigação existente, desviar a aplicação de uma lei,
constituir ou conservar um monopólio ou proteger condutas antijurídicas.

536 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Desconsideração da Personalidade Jurídica: Requisitos Materiais e Incidente Procedimental

Porém, conforme orientação jurisprudencial do Colendo superior Tribunal de Justi-


ça, para a desconsideração da pessoa jurídica nos termos do art. 50 do Código Civil,
é necessário, além do requisito subjetivo concernente no desvio de finalidade ou con-
fusão patrimonial, o objetivo de insuficiência patrimonial da devedora. Precedentes
citados: REsp. 970.635-SP, DJe 1º.12.2009; REsp. 1.200.850-SP, DJe 22.11.2010, e
REsp. 693.235-MT, DJe 30.11.2009. REsp. 1.141.447-SP, Rel. Min. Sidnei Beneti,
julgado em 8.02.2011. Desta forma, em razão da ausência de esgotamento de meios
para localização de bens, não se constata que o agravante possua interesse processu-
al, por ora, para redirecionar a cobrança de dívida com base em confusão patrimo-
nial e existência de grupo econômico fraudulento, sem que antes se proceda à efetiva
constatação quanto à ausência de bens passíveis de penhora, com o objetivo de cum-
prir o pressuposto de insuficiência patrimonial. [...] Portanto, com o devido respeito,
o recurso não merece provimento, não significando que posteriormente possa ser re-
apreciada, desde que constatada efetivamente a insolvência. Ante o exposto, nega-se
provimento ao recurso de agravo de instrumento.

Em análise das razões em que se fundamentaram a supramencionada decisão,


observa-se que foram citados precedentes jurisprudenciais – quais sejam, REsp. n.
970.635-SP, DJe 1º.12.2009; REsp. n. 1.200.850-SP, DJe 22.11.2010, e REsp. n.
693.235-MT, DJe 30.11.2009. REsp. n. 1.141.447-SP, Rel. Min. Sidnei Beneti,
julgado em 8.02.2011 – anteriores à alteração legislativa trazida pela Lei
13.105/2015 (Código de Processo Civil), o que de certa maneira não mais corres-
pondia com a realidade.
Desta forma, a discussão do tema era inerente se o pedido incidente de des-
consideração, necessitava ou não, de outros requisitos senão os estampados no art.
50 da Lei 10.406/2002 (Código Civil). O que restou pacificado mediante o voto do
Min. Luis Felipe Salomão, o qual declarou que a insolvência não se constituía em
um pressuposto para decretação da desconsideração da personalidade jurídica, pelo
que, não poderia ser considerada, por óbvio, como pressuposto para a instauração do
incidente ou condição de seu regular processamento.
Ato contínuo, esclareceu ainda que o instituto da desconsideração da persona-
lidade jurídica se apresenta como importante mecanismo de recuperação de crédito,
combate à fraude e, por consequência, fortalecimento da segurança do mercado, em
razão do acréscimo de garantias aos credores, atuando, processualmente, sobre o
polo passivo da relação, modificando ou ampliando a responsabilidade patrimonial.
Por conseguindo, o Min. Luis Felipe Salomão consignou-se, ainda, naquela
decisão que, nos termos do novo regramento (art. 134 da Lei 13.105/2015), o pedido
de desconsideração não inaugura ação autônoma, mas se instaura incidentalmente,
podendo ter início nas fases de conhecimento, cumprimento de sentença e executiva,
opção, inclusive, há muito admitida pela jurisprudência, tendo a normatização empreen-
dida pelo novo diploma o mérito de revestir de segurança jurídica a questão.
É possível afirmar, ademais, que além da constatação de insolvência não ser sufi-
ciente à desconsideração – nas hipóteses compreendidas no art. 50 da Lei 10.406/2002
(Código Civil) –, com mais razão a inexistência de bens do devedor não pode ser condi-
ção para instauração do procedimento que objetiva aquela decretação.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 537


Ricardo Wypych / Mário Luiz Ramidoff

Na verdade, pode a desconsideração da personalidade jurídica ser decretada


ainda que não configurada a insolvência, desde que verificados o desvio de finalida-
de ou a confusão patrimonial, os quais servem como critérios objetivos para caracte-
rizar o denominado abuso de personalidade.
Portanto, é possível verificar que se firmou entendimento jurisprudencial
acerca da indispensabilidade da instauração de processamento do incidente destina-
do à apuração da desconsideração da personalidade jurídica, uma vez que não pode-
ria ter sido obstado, liminarmente, sob o argumento de que não teria sido demons-
trada a insuficiência de bens e de qualquer outro ativo que pudessem assegurar o
cumprimento da obrigação e mesmo a execução judicial.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nesse estudo, buscou-se demonstrar que o instituto da desconsideração da
personalidade jurídica, em determinados casos concretos era utilizado de forma
equivocada, porque se distanciava dos requisitos legais pertinentes, de modo a obs-
taculizar a persecução do direito reparatório de credores em prol da pessoa jurídica
que teve sua personalidade abusada por desvio de finalidade ou pela confusão patri-
monial.
Com o advento da Lei 13.105/2015 (Código de Processo Civil) não só houve
a alteração do rito procedimental próprio para apuração judicial da desconsideração
da personalidade jurídica, mas, também, passou-se a dispor de novas diretrizes e
orientações principiológicas que se destinaram a perfectibilizar tanto o incidente
procedimental próprio, como também a sistemática das provas.
E isto pode ser verificado a partir mesmo do que se encontra expressa e espe-
cificamente disposto nos arts. 133 a 137 da Lei 13.105/2015 (Código de Processo
Civil), os quais passaram a regulamentar o incidente processual destinado à apura-
ção judicial da desconsideração da personalidade jurídica, o que por si só já fora
suficiente para reacender a discussão sobre a matéria, formando por via de conse-
quência, um imperativo categórico (legislação processual civil) inafastável para a
resolução dos casos relacionados com a necessidade de desconsideração da persona-
lidade jurídica, enquanto instrumentalidade para o asseguramento de crédito.
Noutro vértice, observa-se a variação da atuação hermenêutica acerca das novas
regras relativas ao instituto jurídico-legal da desconsideração da personalidade jurídica,
haja vista mesmo a concorrência legislativa acerca da sua regulamentação, isto é, tanto
fundadas no que se encontra disposto no art. 50 da Lei 10.406/2002 (Código Civil),
quanto no art. 28 da Lei 8.078/1990 (Código de Defesa do Consumidor), e, também, nos
arts. 133 a 137 da Lei 13.105/2015 (Código de Processo Civil).
No entanto, é preciso dizer que as legislações civil e consumerista, com o advento
da nova legislação processual civil, passam, assim, a descrever os elementos (pressu-
postos e requisitos) materiais para a desconsideração da personalidade jurídica,
enquanto que a procedimentalização judicial se encontra regulamentada como inci-
dente processual – exemplo disto, no caso do Código de Defesa do Consumidor, são
as diversas e não cumulativas causas, destacando que o abuso da personalidade não

538 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Desconsideração da Personalidade Jurídica: Requisitos Materiais e Incidente Procedimental

atrai a necessidade de demonstração do esvaziamento patrimonial da pessoa jurídica


que se persegue a desconsideração temporariamente.
Portanto, entende-se que a utilização do instituto da desconsideração da per-
sonalidade jurídica tanto para o asseguramento do crédito, quanto para a defesa do
consumidor, deve ser adotada com a maior cautela possível, em razão mesmo de que
deve ser concebida como uma exceção e não propriamente como regra, pois não se
confluindo qualquer uma das situações que são determinantes para uma intervenção
de tal magnitude do Poder Judiciário na autonomia patrimonial da pessoa jurídica,
como, por exemplo, nos casos de relações consumeristas e ambientais, certamente,
há de ser restringida.
Pois, na verdade, o instituto jurídico-legal da desconsideração da personali-
dade jurídica, na contemporaneidade, deve servir tanto à jurisdição (prestação juris-
dicional) quanto ao processo (garantia fundamental), para fins de impedir abuso da
personalidade jurídica, então, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confu-
são patrimonial.
Daí, pois, a indispensabilidade da instauração do incidente procedimental pa-
ra tal desiderato, enquanto observância da garantia fundamental do devido processo
legal, uma vez que a desconsideração da personalidade jurídica de uma empresa, por
exemplo, ensejará efeitos em relações obrigacionais que serão estendidos aos bens
particulares de administradores ou de sócios da pessoa jurídica que se beneficiaram
direta ou indiretamente pelo uso abusivo daquela personalidade.
E essa prospecção hermenêutica certamente se encontra contemplada nas
modificações trazidas com a Medida Provisória n. 881, de 30.04.2009, então, deno-
minada de Direito de Liberdade Econômica, uma vez que torna obrigatória a instau-
ração do incidente procedimental de desconsideração da personalidade jurídica, haja
vista que não pode ser mais presumidamente admitida como uma decorrência lógica
do eventual reconhecimento de grupo econômico (§ 4º acrescido ao art. 50 da Lei
10.406/2002 – Código Civil).
Por isso mesmo, não está mais autorizada a desconsideração da personalidade
da pessoa jurídica, de forma presumida, isto é, tão somente a simples constatação da
existência de grupo econômico, sem, que, contudo, concorra para tanto, a presença
de abuso da personalidade jurídica, isto é, o desvio de finalidade ou pela confusão
patrimonial (requisitos materiais – fático-normativos).

REFERÊNCIAS
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 05.10.1988.
BRASIL. Lei 8.078, de 11.09.1990. Código de Defesa do Consumidor
BRASIL. Lei 13.105, de 16.03.2015. Código de Processo Civil.
BRASIL, Lei 13.874, de 20.09.2019. Lei de Declaração de Direitos de Liberdade Econômica
BRASIL, Medida Provisória n. 881, de 30.04.2009.
BRASIL, STJ, 4ª Turma, REsp. n. 1.729.554/SP (2017/0306831-0), Rel.: Min. Luis Felipe Salomão, j. em
8.05.2018.
COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial. Vol. 2. 8. ed, São Paulo, Saraiva, 2005.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 539


Ricardo Wypych / Mário Luiz Ramidoff

COMPARATO, Fábio Konder. O poder de controle na sociedade anônima. 3. ed, Rio de Janeiro, Foren-
se, 1983.
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: parte geral. Vol.
1. 17. ed, São Paulo, Saraiva, 2015.
GONÇALVES NETO, Alfredo de Assis. Empresa individual de responsabilidade limitada e sociedade
de pessoas. Coord. Modesto Carvalhosa, São Paulo, Revista dos Tribunais, 2016.
MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: empresa e atuação empresarial. Vol. 1. 3. ed, São
Paulo, Atlas, 2009.
MARTINS, Fran. Curso de direito comercial. 34. ed, Rio de Janeiro, Forense, 2011.
REGO, Margarida Lima. Desconsideração da personalidade colectiva. Lisboa: UNL, 2009.
REQUIÃO, Rubens. Curso de direito comercial. Vol. 1. 23. ed, São Paulo, Saraiva, 1998.
REQUIÃO, Rubens. Curso de direito Comercial. Vol. 1. 29. ed, São Paulo, Saraiva, 2010.
REQUIÃO, Rubens. Aspectos Modernos de Direito Comercial. Vol. 1, São Paulo, Saraiva, 1997.
TARTUCE, Flávio. Direito civil: direito das obrigações e responsabilidade civil. Vol. 2. 11. ed, Rio de
Janeiro, Forense, 2016.
TARTUCE, Flávio. Direito civil: lei de introdução e parte geral. Vol. 1. 12. ed, Rio de Janeiro, Forense,
2016.
TOMAZETTE, Marlon. Curso de Direito Empresarial: Teoria Geral e Direito Societário. Vol. 1, São
Paulo, Altas, 2012.
VASCONCELOS, Fernanda Quintas. Uma análise sobre a evolução da desconsideração da personalida-
de jurídica. 2018. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2018-mar-20/opiniao-evolucao-descon
sideracao-personalidade-juridica> Acesso em: 1º maio 2019.

540 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


Desconsideração da Personalidade Jurídica: Requisitos Materiais e Incidente Procedimental

A JORNADA DE TRABALHO EM ÉPOCA DE COVID-19


THE WORKING DAY IN THE TIME OF COVID-19
DOI: 10.19135/revista.consinter.00011.26
Recebido/Received 30.06.2020 – Aprovado/Approved 18.08.2020
Franciele da Rocha Dias1– https://orcid.org/0000-0003-0339-0043
E-mail: francielerocha165@gmail.com
Claudia Maria Petry de Faria2 – https://orcid.org/0000-0002-1560-6342
E-mail: petrydefaria.advogados@yahoo.com.br

Resumo: O presente trabalho tem por escopo a análise do novo modelo de trabalho em
época de Covid-19. O presente estudo aponta as alterações sofridas nas relações de
trabalho, bem como observa, de modo mais acurado, quais as formas que estão sendo
projetadas ou utilizadas para o melhor aproveitamento dos trabalhadores. Com isso, se
observará que o teletrabalho tem se apresentado como fator importante para a
manutenção do emprego e renda, bem como para manter a economia ativa e não
estagnada. Para tanto, foi feita uma pesquisa bibliográfica e documental, como forma de
compreender os impactos do Covid-19 nas relações humanas e, especialmente nas
relações laborais trabalho. Por fim será observado a necessidade de adaptação de toda
sociedade para uma nova realidade empregatícia.
Palavras-chave: Jornada de trabalho. Teletrabalho. Covid-19.
Abstract: The present work aims to analyze the new model of work at the time of
Covid-19. The present study points out the changes suffered in labor relations, as well as
observing, in a more accurate way, which forms are being designed or used for the better
use of workers. With that, it will be observed that teleworking has presented itself as an
important factor for the maintenance of employment and income, as well as to keep the
economy active and not stagnant. To this end, a bibliographic and documentary research
was carried out, as a way to understand the impacts of Covid-19 on human relations and,
especially on labor relations. Finally, the need to adapt the entire society to a new
employment reality will be observed.
Keywords: Workday. Telework. Covid-19.
Sumário: 1. Considerações iniciais. 2. As jornadas de trabalho no Brasil.
3. Teletrabalho/trabalho remoto/home office. 4. Pandemia instaurada pelo novo
coronavírus (covid – 19). 5. A jornada de trabalho em época de covid-19.
6. Considerações finais. 7. Referências.

1
Graduada em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade Feevale (2019), Pós-graduanda em Direito do
Trabalho e Processo Trabalhista (Uninter, 2020), Pós-graduanda em Direito Empresarial (Legale, 2021),
E-mail.: francielerocha165@gmail.com.
2
Doutora em Qualidade Ambiental (Universidade Feevale, 2015), Mestre em Letras, Cultura e
Regionalidade (Universidade de Caxias do Sul, 2006), Graduada em Ciências Jurídicas e Sociais
(Universidade do Vale do Rio dos Sinos, 1981), Docente (Universidade Feevale), Advogada, Membro do
Conselho Editorial da Revista Alienação Parental – Revista Digital Lusobrasileira de Alienação Parental. E-
mail: petrydefaria.advogados@yahoo.com.br

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 541


Franciele da Rocha Dias / Claudia Maria Petry de Faria

1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS
O presente trabalho versa sobre novo modelo de trabalho, com ênfase nas
questões relacionadas a jornada de trabalho utilizada no Brasil, a partir do momento
em que se instaurou a epidemia mundial em virtude do novo coronavírus. O objetivo
principal do presente estudo é visualizar as novas formas de trabalho em razão do isola-
mento e orientação da Organização Mundial de Saúde para prevenção do Covid-19.
Assim, inicialmente será analisado a jornada de trabalho admitida no direito naci-
onal verificando os métodos aplicados antes e após a pandemia, destacando o teletraba-
lho (também conhecido como Home Office ou trabalho remoto). O coronavírus apresen-
tou seu primeiro caso no Brasil em março de 2020 e, desde então, o país vem adotando
medidas de prevenção e o isolamento social se faz necessário, inclusive no que tange ao
cumprimento da jornada laborativa, justificando, assim, a importância e atualidade do
presente estudo.

2 AS JORNADAS DE TRABALHO NO BRASIL


Primeiramente, cumpre referir que o órgão responsável pela regulamentação da
jornada de trabalho atualmente é a Secretaria de Trabalho, parte do Ministério da Eco-
nomia. As normas para as relações de trabalho estão descritas na Consolidação das Leis
do Trabalho, tratada como CLT, em seu art. 58, no qual o legislador informa que a jor-
nada máxima de trabalho será de oito horas diárias, não podendo exceder 44 horas sema-
nais3.
Ainda, a legislação consolidada, em seu art. 4º define como tempo dedicado ao
trabalho como sendo “o período em que o empregado esteja à disposição do emprega-
dor, aguardando ou executando ordens, salvo disposição especial expressamente con-
signada”4. O art. 58, § 2°, entretanto, destaca que “o tempo despendido pelo empre-
gado desde a sua residência até a efetiva ocupação do posto de trabalho e para o
seu retorno [...] não será computado na jornada de trabalho, por não ser tempo à
disposição do empregador”5. Além do tempo à disposição do empregador, é valioso
destacar que durante a jornada de trabalho é necessário observar os limites da dura-
ção, os intervalos inter e intra jornada (remunerados ou não) e a proteção à saúde do
trabalhador, para que não haja exploração em excesso da jornada de trabalho, prin-
cipalmente para menores e mulheres6.

3
BRASIL, Presidência da República, Dec.-Lei 5.452, de 1º.05.1943, Aprova a Consolidação das Leis do
Trabalho, Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm>, Acesso em: 06
jun, 2020.
4
BRASIL, Presidência da República, Dec.-Lei 5.452, de 1º.05.1943, Aprova a Consolidação das Leis
do Trabalho, Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm>, Aces-
so em: 06 jun, 2020.
5
BRASIL, Presidência da República, Dec.-Lei 5.452, de 1º.05.1943, Aprova a Consolidação das Leis do
Trabalho, Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm>, Acesso em: 06
jun, 2020.
6
OLIVEIRA, Cínthia Machado de; DORNELES, Leandro do Amaral Dorneles de, Direito do Traba-
lho, 2ª ed, Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2013, pp. 103.

542 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


A Jornada de Trabalho em Época de Covid-19

Seguindo na linha de definição e conceitos, importante destacar o entendi-


mento de Carmen Camino, a qual define que a “jornada de trabalho é o lapso máxi-
mo de tempo durante o qual o empregado pode prestar serviço ou permanecer à disposi-
ção do empregador, num espaço de vinte e quatro horas7. Na definição de Karl Marx, a
jornada de trabalho pode ser compreendida como o tempo de vida do operário, conside-
rando que o capitalista compra a força de trabalho diário dele8.
Sob essa ótica, Carmen Camino ressalta que o legislador, tendo cuidado pelo bem
estar do trabalhador, observa que o vínculo entre a duração do trabalho e a saúde do
contratado, como também o vínculo entre a extensão da jornada e o combate ao desem-
prego, se tornam fatores relevantes9. A preocupação legislativa, assume maior contorno
neste momento em que há um aumento no nível de desemprego, estando a economia em
colapso10.
Ademais, para Amauri Mascaro Nascimento, a jornada pode ser classificada de
várias formas. Assim, afirma que poderá ser classificada de acordo com o período (diur-
na, noturna ou mista); à limitação de tempo (normal e extraordinária); o desenvolvimen-
to (jornada com e sem intervalo); o regime jurídico de duração (jornada normal e especi-
al); a remuneração (jornada com adicional geral e com adicionais especiais); a prorroga-
ção (jornada com e sem permissão de horas extras); os turnos (jornada em revezamento e
fixa); a integralidade (jornada a tempo integral e tempo parcial de 25 horas por semana,
com salários proporcionais à sua duração); entre outros11.
Neste sentido, em se tratando de jornada de trabalho, abordar-se-á, no presente
estudo, apenas a jornada de trabalho noturno, de trabalho parcial, intermitente e o teletra-
balho (trabalho remoto ou Home office). Deste modo, no tocante à jornada noturna urba-
na, o legislador celetista determinou que será computada como 52 minutos e 30 segun-
dos a hora trabalhada entre 22h e 5h, havendo um acréscimo de, no mínimo, 20% do
valor da hora diurna. Com isso, os trabalhadores seguem a disposição constante no art.
73 da CLT, o qual criou uma hora ficta, permitido que haja trabalho efetivo de 7 horas,
com percepção equivalente a 8 horas12.
Na sequência, é necessário fazer menção da jornada de trabalho parcial, a qual
tem, no máximo, 30 horas semanais sem a possibilidade de horas extras; ou aquela
que tem 26 horas semanais, com até 6 horas semanais adicionais. Nesta jornada, o
salário deve ser proporcional ao daqueles que cumprem a jornada regular exercendo

7
CAMINO, Carmen, Direito individual do trabalho, 4ª ed, Porto Alegre: Síntese, 2004, pp. 381.
8
MARX, Karl, O Capital: crítica da economia política, São Paulo, Boitempo, 2013, pp. 180-184.
9
DELGADO, Mauricio Godinho, Jornada de trabalho e descansos trabalhistas, São Paulo, LTr,
2003, pp. 17.
10
ROUBICEK, Marcelo, O que diz o primeiro dado do desemprego na pandemia, Jornal nexo, de
30.04.2020, Disponível em: <https://www.nexojornal.com.br/expresso/2020/04/30/O-que-diz-o-primeiro-
dado-de-desemprego-na-pandemia>, Acesso em: 16 jun. 2020.
11
NASCIMENTO, Amauri Mascaro, Curso de direito do trabalho: história e teoria geral do direito do
trabalho, relações individuais e coletivas do trabalho, 27ª ed, São Paulo, Saraiva, 2012, pp. 792-793.
12
BRASIL, Presidência da República, Dec.-Lei 5.452, de 1º.05.1943, Aprova a Consolidação das Leis do
Trabalho, Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm>, Acesso em: 06
jun. 2020.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 543


Franciele da Rocha Dias / Claudia Maria Petry de Faria

as mesmas funções, sendo necessário que a empresa manifeste interesse nessa jorna-
da e realize um acordo por meio de negociação coletiva. Além disso, a jornada par-
cial permite que as férias sigam as mesmas regras aplicadas ao trabalhador em jor-
nada regular, havendo todas estas descrições no art. 58-A da CLT13.
Ainda na linha da jornada de trabalho, deve ser ressaltada a jornada de traba-
lho intermitente, descrita no art. 443, §3°, da CLT, classificando o trabalho intermitente
como aquele em que a prestação de serviços: “não é contínua, ocorrendo com alternân-
cia de períodos de prestação de serviços e de inatividade, independentemente do tipo de
atividade do empregado e do empregador”14.
Cumpre referir que não há períodos mínimos ou máximos da jornada de trabalho
no contrato intermitente. Entretanto, caso o mesmo se estenda por grandes períodos
temporais, poderá ser descaracterizado como intermitente, passando a uma jornada labo-
ral de 8 horas diárias ou 44 semanais. Além disso, deve ser frisado que esta modalidade
de contrato surgida com a Lei 13567/2017, prevê prazos para a comunicação prévia do
trabalho, incluindo prazo para que esta oferta de trabalho seja aceita ou não, sendo que, o
descumprimento, poderá implicar em cobrança de multa15.
O contrato de trabalho intermitente formalizou o trabalho informal, protegendo o
trabalhador e facilitando a sua contratação. Assim, aquele que aderir este contrato de
trabalho receberá o salário por hora, sendo que tal pagamento não poderá ser inferior ao
valor da hora em salário mínimo nacional. Além disso, terá direito a todos os reflexos e
adicionais legalmente previstos, devendo haver o pagamento de todas as verbas ao final
da jornada de trabalho16.
No que se refere ao teletrabalho (trabalho remoto ou Home Office), deve ser des-
tacado que sua existência vem desde o século XIX nos Estados Unidos. Naquela época
era exercida a gestão e controle de linhas ferroviárias remotamente. Outrossim, esta
jornada de trabalho trata-se de um trabalho exercido, fisicamente, em local diverso das
dependências da empresa e através dos meios telemáticos, não devendo ser confun-
dido com o trabalho à domicílio17. Embora já existisse na prática, foi a Lei 13467/17
quem inseriu tal modalidade, dispondo no art. 75-B, da CLT que, “a prestação de
serviços preponderantemente fora das dependências do empregador, com a utiliza-
ção de tecnologias de informação e de comunicação que, por sua natureza, não se
constituam como trabalho externo”18.

13
BARROS, Leonardo, Jornada de trabalho: tudo que você precisa saber, Disponível em: <https://blog.tan
gerino.com.br/jornada-de-trabalho/>, Acesso em: 06 jun. 2020.
14
BRASIL, Presidência da República, Dec.-Lei 5.452, de 1º.05.1943, Disponível em: <http://www.pla
nalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452compilado.htm>, Acesso em: 07 jun. 2020.
15
MARTINEZ, Pedro Romano, Direito do trabalho, 6ª ed, Coimbra, Almedina, 2013, pp. 520.
16
NOGUEIRA, Eliana dos Santos Alves, “O contrato de trabalho intermitente na reforma trabalhista
brasileira: contraponto com o modelo italiano”, Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª
Região, vol. 01, n. 51, jul./dez, 2017, Disponível em: <https://juslaboris.tst.jus.br/bitstream/handle/
20.500.12178/125435/2017_nogueira_eliana_contrato_trabalho.pdf?sequence=1&isAllowed=y>,
Acessado em 12 jun. 2020, p. 136.
17
MARTINS, Sergio Pinto, Direito do Trabalho, 34ª ed, São Paulo, Atlas, 2018, pp. 243.
18
BRASIL, Presidência da República, Lei 13.467, de 13.06.2017, Altera a Consolidação das Leis do Trabalho
(CLT), aprovada pelo Dec.-Lei 5.452, de 1º.05.1943, e as Leis n. 6.019, de 3.01.1974, 8.036, de 11.05.1990,

544 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


A Jornada de Trabalho em Época de Covid-19

Com o advento da Reforma Trabalhista, em novembro de 2017, o trabalho


remoto não está mais sujeito ao controle de jornada, tampouco ao pagamento de
horas extras, sendo que nessa modalidade “deverá constar expressamente no contra-
to individual de trabalho, que especificará as atividades que serão realizadas pelo
empregado”19. Os demais direitos, entretanto, permanecem protegidos pela CLT20.
As características e meios de utilização desta jornada de trabalho estão sendo
utilizados com uma frequência maior nos últimos meses, como será visto mais adi-
ante. Este aumento decorreu logo após a instauração da pandemia provocada pelo
novo coronavírus. Diante disso, torna-se pertinente um olhar mais detalhado sobre o
tema.

3 TELETRABALHO/TRABALHO REMOTO/HOME OFFICE


Imperioso mencionar a CLT modificou o caput do art. 6º igualando o traba-
lho presencial ao “trabalho a distância”. Desta forma, o teletrabalho é a modalidade
laboral que ultrapassa os conceitos e experiências, uma vez que o trabalho atua está
cada vez mais tecnológico e flexível21.
Segundo Domenico de Masi, o teletrabalho é: “um trabalho realizado longe
dos escritórios empresariais e dos colegas de trabalho, através de um uso intensivo
das tecnologias da comunicação e da informação, não necessariamente de natureza
informática”22. Denise Pires Fincato explica que o teletrabalho ganha destaque a
partir do momento que flexibiliza as relações de emprego, conforme abaixo:

[...] apreciando se a novel legislação possui o condão de evitar ou resolver os confli-


tos resultantes e apresentando, caso necessárias, alternativas, principalmente à luz
do direito comparado europeu e da experiência negocial coletiva brasileira23.

Nessa senda, especialmente no momento em que são enfrentadas dificuldades


impostas por um inimigo invisível que está dizimando milhares de pessoas, justifi-
cando a exigência de um distanciamento social, o teletrabalho surge como alternati-

e 8.212, de 24.07.1991, a fim de adequar a legislação às novas relações de trabalho, Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/lei/l13467.htm>, Acesso em: 16 jun. 2020.
19
BRASIL, Presidência da República. Lei 13.467, de 13.06.2017, Altera a Consolidação das Leis do Trabalho
(CLT), aprovada pelo Dec.-Lei 5.452, de 1º.05.1943, e as Leis n. 6.019, de 3.01.1974, 8.036, de 11.05.1990,
e 8.212, de 24.07.1991, a fim de adequar a legislação às novas relações de trabalho, Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/lei/l13467.htm>, Acesso em: 16 jun. 2020.
20
BARROS, Leonardo, Jornada de trabalho: tudo que você precisa saber, Disponível em:
<https://blog.tangerino.com.br/jornada-de-trabalho/>, Acesso em: 06 jun. 2020.
21
FINCATO, Denise, “Teletrabalho na reforma trabalhista brasileira”, Revista eletrônica do Tribunal
Regional do Trabalho da 9ª Região, vol. 8, n. 75, fev. 2019, Disponível em:
<https://juslaboris.tst.jus.br/bitstream/handle/20.500.12178/152290/2019_fincato_denise_teletrabalho_refor
ma.pdf?sequence=1&isAllowed=y>, Acesso em: 18 jun. 2020, p. 58-72.
22
MASI, Domenico de, Ócio criativo, São Paulo, Sextante, 2000, pp. 204.
23
FINCATO, Denise Pires; BITENCOURT, Manoela de, Teletrabalho transnacional: tributação da renda
dos teletrabalhadores no plano internacional, Florianópolis: CONPEDI, 2014, pp. 108.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 545


Franciele da Rocha Dias / Claudia Maria Petry de Faria

va paliativa de evitar a propagação do vírus. Outras razões, não menos importantes,


estão consubstanciadas frente a necessidade da utilização de mecanismos que com-
batam a informalidade e o desemprego. Neste teor, imperioso mencionar o texto do
art. 6º, da Lei 12.551 de 16.12.2011, conforme segue:

Não se distingue entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador, o


executado no domicílio do empregado e o realizado a distância, desde que estejam
caracterizados os pressupostos da relação de emprego. Parágrafo único. Os meios te-
lemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão se equiparam, para
fins de subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos de comando, controle e
supervisão do trabalho alheio24.

A distinção entre teletrabalho e trabalho à domicílio é importante. Sergio Pin-


to Martins defende que “todo teletrabalho é considerado trabalho à distância, mas,
nem todo trabalho à distância pode ser considerado teletrabalho”. O referido autor
informa que o trabalho em domicílio é um trabalho à distância, mas depende da
forma como é realizado que poderá ou não ser considerado como teletrabalho25.
Nessa concepção, Alice Monteiro de Barros observa que: “O teletrabalho
distingue-se do trabalho a domicílio tradicional não só por implicar a realização de
tarefas mais complexas, mas também porque abrange setores diversos como: trata-
mento, transmissão e acumulação de como informática e telecomunicações”26.De
outro lado, Carlos Henrique Bezerra Leite aponta que o teletrabalho é “trabalho a
distância e não trabalho em domicílio. A razão é simples: o teletrabalho não se
limita ao domicílio, podendo ser prestado em qualquer lugar”. Além disso, o autor
refere que “o teletrabalho ocorre em ambiente virtual e, como tal, é situado no es-
paço, não se alterando, portanto, a definição de localidade que, no Direito do Tra-
balho, é estabelecida segundo a eficácia da lei trabalhista no espaço”27.
Por conseguinte, Manuel Martin Pino Estrada alude que o teletrabalho é
aquele “realizado com ou sem subordinação por meio de uso de antigas e novas
formas de telecomunicação em virtude de uma relação de trabalho, permitindo a
sua execução à distância, prescindindo da presença física do trabalhador em lugar
específico de trabalho”28.

24
BRASIL, Presidência da República, Lei 12.551, de 15 de dezembro de 2011, Altera o art. 6º da
Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Dec.-Lei 5.452, de 1º.05.1943, para equiparar os
efeitos jurídicos da subordinação exercida por meios telemáticos e informatizados à exercida por meios
pessoais e diretos, Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l1
2551.htm>, Acesso em: 16 jun. 2020.
25
MARTINS, Sergio Pinto, Direito do Trabalho, 34ª ed, São Paulo, Atlas, 2018, pp. 148.
26
BARROS, Alice Monteiro de, Curso de Direito do Trabalho, 11ª ed, São Paulo, LTr, 2017, pp. 306.
27
LEITE, Carlos Henrique Bezerra, Curso de Direito do Trabalho, 11ª ed, São Paulo, Saraiva, 2019,
pp. 233.
28
ESTRADA, Manuel Martín Pino, “Teletrabalho: Conceitos e a sua Classificação em face aos Avanços
Tecnológicos”, in STOLZ, Sheila; MARQUES, Carlos Alexandre Michaello, org., Teletrabalho, São Paulo,
LTr, 2017, pp. 11.

546 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


A Jornada de Trabalho em Época de Covid-19

Rodolfo Pampolha Filho e Leandro Fernadez, por sua vez, acordam que “o
teletrabalho foi uma das mais importantes inovações no mundo do trabalho decor-
rentes da tecnologia da informação e comunicação”29. Ademais, Alfredo Massi
acrescenta que “o teletrabalho não se resume a um mero trabalho à distância, pois
ele agrega outro elemento: o uso de tecnologias da informação e da comunicação
na organização e na realização do labor”30. Diante da situação que se instaurou nas
relações de trabalho, em decorrência da rápida propagação do vírus, se apresentou
como uma alternativa viável para manter as relações entre patrão e empregado ou
mesmo atividades autônomas, sem a necessidade de deslocamentos e maiores riscos
de contaminação.
Assim, o teletrabalho faz-se importante, sendo que a “conduta profissional e
competente é definido em termos de adotar uma certa relação consigo mesmo, uma
postura diante da vida”31. Com isso, é possível compreender o teletrabalho como
ferramenta e produto da reestruturação dos modelos de contratação, da busca de
capitais monetários, social e cultual, visão de mercado. Isso leva a um novo olhar ao
momento contemporâneo, onde uma epidemia desafia a economia, as ciências e as
relações sócio profissionais.

4 PANDEMIA INSTAURADA PELO NOVO CORONAVÍRUS (COVID – 19)


Ao final do segundo semestre do ano de 2019, o mundo foi surpreendido pelo
surgimento de um novo coronavírus que atinge as pessoas. Com esse, chega-se ao
sexto indivíduo da mesma família que se propaga entre os humanos. A demora no
alerta por médicos da China e a falta de atenção e crédito à transmissibilidade e
letalidade oferecida pelo SARS-Cov-2 pelos organismos de saúde foram os fatores
iniciais para o atual momento de caos na saúde da população mundial. Somente no
início do ano em curso (2020) começou a ser percebido o efeito devastador que o
COVID-19 poderia causar na economia mundial32.
Assim, com a percepção de que houve uma rápida disseminação do vírus, a
Organização Mundial da Saúde (OMS) decretou em 11.03.2020º estado de Pande-

29
PAMPOLHA FILHO, Rodolfo; FERNANDEZ, Leandro, “Tecnologia da Informação e as Relações de
Trabalho no Brasil: O Teletrabalho na Lei 13.467/2017”, in FIGUEIREDO, Carlos Arthur; COSTA,
Flavio; NORONHA, Francisco; QUEIROZ. Sergio, org., Reforma trabalhista: Novos rumos do direito do
trabalho e do direito processual do trabalho, São Paulo, LTr, 2018, pp. 124-137.
30
MASSI, Alfredo, “Teletrabalho: Análise sob a óptica da saúde e da segurança do teletrabalhador”, in
STOLS, Sheila. MARQUES, Carlos Alexandre Michaello Marques, org., Teletrabalho, São Paulo, LTr,
2017, pp. 87-106.
31
COSTA, Isabel de Sá Affonso da, “Teletrabalho: subjugação e construção de subjetividades”, Revista de
Administração Pública, Rio de Janeiro, vol. 41, n. 1, Fev. 2007, Disponível em: <http://www.scielo.br/
scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034-76122007000100007&lng=en&nrm=iso>, Acesso em: 19 jun.
2020
32
MARINELLI, Natália Pereira, Evolução de indicadores e capacidade de atendimento no início da epIdemia
de COVID-19 no Nordeste do Brasil, 2020, Epidemiologia e Serviço de Saúde, Brasília, vol. 29, n. 3,
03.06.2020, Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S2237-96222020000
300303&lng=en&nrm=iso>, Acesso em: 19 jun. 2020.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 547


Franciele da Rocha Dias / Claudia Maria Petry de Faria

mia. Para tanto, justificou que “nas últimas duas semanas, o número de casos [...] fora
da China aumentou 13 vezes e a quantidade de países afetados triplicou”33. Com isso
houve o alerta mundial para os riscos que todos corriam ante esse novo inimigo.
Para que ocorresse o decreto, deve ser compreendido que a definição de pande-
mia não está vinculada ao número específico de acometidos, mas é considerado, uma
doença infecciosa que atinge grande número de pessoas em diferentes países ao redor do
mundo. Embora a OMS não use com frequência o termo, para evitar pânico ou uma
sensação de impotência, quando a situação foge do controle, as autoridades de saúde são
alertadas sobre os riscos e a rápida transmissão de uma enfermidade, no caso o Covid-19,
como passou a ser conhecido.
Com isso, o diretor geral da OMS, ao anunciar a Pandemia, afirmou que “esta-
mos chamando todos os países para ativar e intensificar mecanismos emergenciais de
resposta, buscar casos suspeitos, isolar, testar e tratar todo episódio de Covid-19, além
de traçar as pessoas que tiverem contato com ele”34. Em ato contínuo, requereu que
todos iniciassem os cuidados e a proteção, no intuito de reduzir o ciclo de transmissão.
Inclui nesse pedido atenção para detectar o vírus e o tratamento aos infectados.
Entretanto, tratando-se de um vírus que ainda não tem conhecida a forma de
combatê-lo, o mundo está buscando alternativas que possibilitem diminuir sua
transmissibilidade e letalidade. Diante disso, essa pandemia está se mostrando como
um dos maiores desafios aos sanitaristas em escala global, conforme apontam Gui-
lherme Loureiro Werneck e Marilia Sá Carvalho, apontando que “o insuficiente
conhecimento científico sobre o novo coronavírus, sua alta velocidade de dissemi-
nação e capacidade de provocar mortes em populações vulneráveis, geram incerte-
zas sobre quais seriam as melhores estratégias a serem utilizadas para enfrentar a
pandemia”35. Além disso, os referidos autores apontam que uma das alternativas
para mudanças ou mitigação do quadro de pandemia é o distanciamento social que
se torna mais difícil em muitas situações brasileiras, tendo em vista o modo que
vivem em muitas comunidades na periferia dos grandes centros. Para tanto, os espe-
cialistas em saúde apresentam a pandemia sob quatro fases compreendidas como
contenção, mitigação, supressão e recuperação36.

33
REDAÇÃO, OMS decreta pandemia do novo coronavírus, Veja saúde, 29 abr. 2020, Disponível em:
<https://saude.abril.com.br/medicina/oms-decreta-pandemia-do-novo-coronavirus-saiba-o-que-isso-signifi
ca/>, Acesso em: 19 jun. 2020.
34
REDAÇÃO, OMS decreta pandemia do novo coronavírus, Veja saúde, 29 abr. 2020, Disponível em:
<https://saude.abril.com.br/medicina/oms-decreta-pandemia-do-novo-coronavirus-saiba-o-que-isso-signifi
ca/>, Acesso em: 19 jun. 2020.
35
WERNECK, Guilherme Loureiro, CARVALHO, Marilia Sá, A pandemia de COVI-19 no Brasil: crônica
de uma crise sanitária anunciada. Caderno de Saúde Pública, vol. 36, n. 5 de 2020, Disponível em:
<http://cadernos.ensp.fiocruz.br/csp/artigo/1036/a-pandemia-de-covid-19-no-brasil-crnica-de-uma-crise-sa
nitria-anunciada>, Acesso em: 23 jun. 2020, p. 1-4.
36
WERNECK, Guilherme Loureiro, CARVALHO, Marilia Sá, A pandemia de COVI-19 no Brasil: crônica
de uma crise sanitária anunciada. Caderno de Saúde Pública, vol. 36, n. 5 de 2020, Disponível em:
<http://cadernos.ensp.fiocruz.br/csp/artigo/1036/a-pandemia-de-covid-19-no-brasil-crnica-de-uma-crise-sa
nitria-anunciada>, Acesso em: 23 jun. 2020, p. 1-4.

548 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


A Jornada de Trabalho em Época de Covid-19

Essas fases podem ser compreendidas como sendo, em primeiro plano, mes-
mo antes de surgir os primeiros casos, o cuidado em rastrear os possíveis passagei-
ros vindos de áreas externas de modo a evitar que sejam os transmissores à comuni-
dade em questão. A segunda fase, a mitigação, busca diminuir os níveis de trans-
missão da doença para os grupos de risco. Caso o primeiro caminho, ou seja a
contenção, não tenha alcançado os resultados esperados, não sendo possível evitar
a contaminação, então é necessário buscar alternativas para que ela não atinja os
mais vulneráveis. Esta prática é conhecida como isolamento vertical37.
A supressão, por sua vez, se apresenta como o próximo passo ao ser perce-
bido que as duas alternativas anteriores (contenção e mitigação) não atingiram o
resultado esperado, ou seja, não ocorreu o achatamento da curva da epidemia.
Aqui são implantadas medidas mais drásticas de distanciamento social, fazendo
com que toda a população evite a explosão de casos, ocasião em que não haveria
condições de saúde para atender todos os infectados em estado mais grave. Esse
procedimento deve permanecer até o momento que venha ocorrer uma estabiliza-
ção e/ou a testagem do maior número de pessoas, buscando novas ferramentas de
tratamento ou prevenção38.
Finalmente, quando houver sinais claros de que está ocorrendo a involu-
ção do quadro epidêmico, será o momento em que a sociedade precisará de rees-
truturação econômica e social, de modo a retomar o quanto antes à normalidade
de vida, na medida do possível. Para essa fase, existe a preocupação de verificar
até que ponto será possível modificar o quadro que restou configurado durante a
pandemia, bem como observar o que foi feito e o quais as ações positivas para
vencer o vírus ou o problema enfrentado. Embora o mundo já tenha presenciado
outras Pandemias, os acontecimentos e seus reflexos são variáveis, considerando
os diferentes aspectos sociais, culturais e econômicos, incluindo as novas tecno-
logias39.
Assim, como reportado, a rapidez de disseminação do vírus se dá, de modo
especial pelo contato entre as pessoas e as partículas de saliva que são lançadas no
ar pela respiração, tosse ou espirro das pessoas. Para tanto, como forma de evitar a
transmissão de pessoa para pessoa, além do isolamento social, a Pandemia vivenciada no
ano de 2020, será fator determinante para demonstrar a importância de cuidados básicos

37
WERNECK, Guilherme Loureiro, CARVALHO, Marilia Sá, A pandemia de COVI-19 no Brasil: crônica
de uma crise sanitária anunciada. Caderno de Saúde Pública, vol. 36, n. 5 de 2020, Disponível em:
<http://cadernos.ensp.fiocruz.br/csp/artigo/1036/a-pandemia-de-covid-19-no-brasil-crnica-de-uma-crise-sa
nitria-anunciada>, Acesso em: 23 jun. 2020, p. 1-4.
38
CHOR, Dóra; FAERSTEIN, Eduardo, Um enfoque epidemiológico da promoção da saúde: as ideias de
Geoffrey Rose, Caderno de Saúde Pública, vol. 16, n. 1, jan./marc. 2000, Disponível em:
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-311X2000000100025&lng=en&nrm=iso>,
Acesso em: 23 jun. 2020.
39
WERNECK, Guilherme Loureiro, CARVALHO, Marilia Sá, A pandemia de COVI-19 no Brasil: crônica de
uma crise sanitária anunciada. Caderno de Saúde Pública, vol. 36, n. 5 de 2020, Disponível em:
<http://cadernos.ensp.fiocruz.br/csp/artigo/1036/a-pandemia-de-covid-19-no-brasil-crnica-de-uma-crise-sa
nitria-anunciada>, Acesso em: 23 jun. 2020, p. 1-4.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 549


Franciele da Rocha Dias / Claudia Maria Petry de Faria

de higiene, especialmente a lavagem das mãos com água e sabão diminuindo a ocorrên-
cia das infecções, entre outros40.
Para tanto, conforme Adriana Cristina de Oliveira, Thabata Coaglio Lucas e Ro-
bert Aldo Iquiapaza, deve restar compreendido a necessidade de tornar um hábito que “a
higienização das mãos, considerada uma medida de baixo custo e alta efetividade, por
serem as mãos o principal veículo de contaminação cruzada, é um cuidado básico”41.
Esta conduta, aparentemente simples, é um modo de evitar a facilidade de proliferação
do vírus, quebrando a cadeia de transmissão.
As medidas de saúde pública em relação a COVID-19 também devem se tornar
referência para os ambientes de trabalho, especialmente por estar em transição para um
novo modelo de contratação de trabalhadores e de prestação de serviços. É, portanto,
fator que precisa ser observado com maior acuidade pois a complexidade de adesão a
esses cuidados é grandiosa devido a invisibilidade do risco, embora a redução da morbi-
dade possa estar relacionada a fatores de comportamento humano que precisam ser revis-
tos e introjetados criando barreiras que ajudem a evitar a propagação pandêmica do
vírus.

5 A JORNADA DE TRABALHO EM ÉPOCA DE COVID-19


Como já observado, a pandemia que ora devasta o mundo, tornou obrigatório o
isolamento social, o distanciamento social e a tomada de diferentes medidas para evitar
uma morbidade maior, a despeito de já ser possível contabilizar dos milhões de infecta-
dos e famílias que choram a perda de entes queridos. Assim, uma das formas de ativi-
dade laboral que foi implantada de modo mais firme e positivo, nesse momento foi o
trabalho em casa, pois o momento requer um maior cuidado42.

40
OLIVEIRA, Adriana Cristina de, LUCAS, Thabata Coaglio, IQUIAPAZA, Robert Aldo, O que a
pandemia da COVID-19 tem nos ensinado sobre adoção de medidas de precaução?, Texto & contexto
enfermagem, vol. 29, 2020, Disponível em: <https://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0104-0707202
0000100201&script=sci_arttext&tlng=pt>, Acesso em: 23 jun. 2020.
40
OLIVEIRA, Adriana Cristina de, LUCAS, Thabata Coaglio, IQUIAPAZA, Robert Aldo, O que a
pandemia da COVID-19 tem nos ensinado sobre adoção de medidas de precaução?, Texto & contexto
enfermagem, vol. 29, 2020, Disponível em: <https://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0104-0707202
0000100201&script=sci_arttext&tlng=pt>, Acesso em: 23 jun. 2020.
40
ALMEIDA, Ildeberto Muniz de, “Proteção da saúde dos trabalhadores da saúde em tempos de COVID-19 e
respostas à pandemia”, Revista Brasileira de Saúde Ocupacional, vol. 45, 2020, Disponível em:
<https://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0104-07072020000100201&script=sci_arttext&tlng=pt>, Acesso
em: 23 jun. 2020.
41
OLIVEIRA, Adriana Cristina de, LUCAS, Thabata Coaglio, IQUIAPAZA, Robert Aldo, O que a
pandemia da COVID-19 tem nos ensinado sobre adoção de medidas de precaução?, Texto & contexto
enfermagem, vol. 29, 2020, Disponível em: <https://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0104-070720
20000100201&script=sci_arttext&tlng=pt>, Acesso em: 23 jun. 2020.
42
FERRARI, Andrés; CUNHA, André Moreira Cunha, A pandemia de Covid-19 e o isolamento social: saúde
versus economia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Disponível em: <https://www.ufrgs.
br/coronavirus/base/artigo-a-pandemia-de-covid-19-e-o-isolamento-social-saude-versus-economia/>, Acesso
em: 25 jun. 2020.

550 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


A Jornada de Trabalho em Época de Covid-19

Além disso, surge a necessidade do uso de outros equipamentos de segurança


que antes não eram tão constantes em todos os ambientes, especialmente os de traba-
lho. Assim os equipamentos de proteção individual, chamados EPIs, se tornaram
aliados indispensáveis para a convivência social43. Entre esses, um dos que mais
chama atenção de sua importância e necessidade no convívio social e, de modo mais
próximo, no ambiente de trabalho é a máscara facial.
Quanto a máscara facial, é necessário observar que há medidas obrigatórias para
removê-las sem contaminação, a fim de que efetivamente atuem como uma barreira
mecânica. Além do seu uso e do distanciamento social, é necessário, manter as mãos
afastadas dos olhos, nariz e boca, bem como já referido, redobrar a higiene das mãos44.
Neste contexto, as empresas deverão se adequar as orientações da OMS, tomando
todas as providências e cuidados possíveis com os seus trabalhadores. Desta forma, para
cumprir o distanciamento social, o teletrabalho se torna cada vez mais frequente, sendo
que as empresas e os trabalhadores estão mais receptivos a essa opção de realização de
atividades. O cenário de pandemia, ao trazer o home-office como um benefício, assegu-
rou, em tese, benefícios ao trabalhador e ao empregador45.
Provavelmente números significativos de atividades permanecerão sendo feitas
de casa, onde o chamado home office passe a ser visto como importante aliado dos en-
volvidos. Nesta senda, para Ademir Bueno “não cabe discutir se o trabalho remoto é
positivo ou negativo, mas sim que foi possível fazer a alteração do local e tipo de traba-
lho executado até então”46.
O trabalho remoto, portanto, demonstrou que havia um paradigma que obrigava o
trabalhador a permanecer nas dependências da empresa como se esse fosse o melhor
ambiente de produção de bens e serviços. Há, no momento, o recomeço de uma nova
ocupação de espaço, outras rotinas e, provavelmente, levará as empresas a se questiona-
rem os prós e contras de serem mais flexíveis em todos os sentidos. Nesse sentido, Patrí-
cia Lauretti, defende que em meio a pandemia “surge uma oportunidade histórica: que
as sociedades repensem as formas de organização do trabalho”47.

43
ALMEIDA, Ildeberto Muniz de, “Proteção da saúde dos trabalhadores da saúde em tempos de COVID-19 e
respostas à pandemia”, Revista Brasileira de Saúde Ocupacional, vol. 45, 2020, Disponível em:
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0303-76572020000101500&lng=en&nrm=iso>,
Acesso em: 24 jun. 2020.
44
FERRARI, Andrés; CUNHA, André Moreira Cunha, A pandemia de Covid-19 e o isolamento social: saúde
versus economia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Disponível em: <https://www.ufrgs.br/
coronavirus/base/artigo-a-pandemia-de-covid-19-e-o-isolamento-social-saude-versus-economia/>, Acesso
em: 25 jun. 2020.
45
GUIMARÃES, Elaine, Em tempos de pandemia, o que será do trabalhador?,. Notícias/Educação,
Disponível em: <https://www.uninassau.edu.br/noticias/em-tempos-de-pandemia-o-que-sera-do-trabalhad
or>, Acesso em: 25 jun. 2020.
46
BUENO, Ademir, Como será a volta ao trabalho após a pandemia?, Uninter notícias, 13.05.2020,
Disponível em: <https://www.uninter.com/noticias/como-sera-a-volta-ao-trabalho-apos-a-pandemia>,
Acesso em: 25 jun. 2020.
47
LAURETTI, Patrícia, O trabalho no pós-pandemia: crise e oportunidade para a sociedade, Atualidades
Unicamp, 01.05.2020, Disponível em: <https://www.unicamp.br/unicamp/noticias/2020/05/01/o-trabalho-
no-pos-pandemia-crise-e-oportunidade-para-sociedade>, Acesso em: 25 jun. 2020.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 551


Franciele da Rocha Dias / Claudia Maria Petry de Faria

Essa oportunidade provavelmente possibilitará a construção de uma nova socie-


dade, que privilegiará a atividade que se apresentar mais útil ao bem-estar. Ao mesmo
tempo, Raisa Rodrigues afirma que “a sociedade terá que reprogramar a mente e enca-
rar a vida de forma diferente, adquirindo um novo modelo mental – ou, como dizem os
especialistas, um novo mindset”48. Dessa forma, uma das tendência é a permanência do
trabalho remoto, o que exige planejamento, disciplina e um olhar mais acurado pelos
resultados.
Ainda não se sabe ao certo o que mudará com esta pandemia, mas o mais prová-
vel é que muitas dessas mudanças que vieram, permanecerão. Serão novos paradigmas e,
para tanto, as empresas e os trabalhadores já estão se reestruturando. Deste modo, na
medida do possível, as empresas estão preservando as rendas dos trabalhadores, embora
seja necessário o retorno das atividades econômicas em grande escala, considerando que
se a crise se prolongar, faltarão alternativas suficientes para a garantia de empregos49.
Há indícios de uma retomada lenta em todas as atividades laborais, pois com o
fechamento repentino de muitos ambientes e postos de trabalho, o trabalhador ainda
enfrentará uma realidade marcada por demissões, suspensão de contratos de trabalho,
redução salarial, incertezas quanto à retomada normal das atividades. Nesta senda, Elaine
Guimarães refere que “as pessoas [...] não vão sair desesperadamente para adquirir o
que deixaram de consumir durante o período de isolamento. A gente vai ter uma reto-
mada ainda muito lenta e com muita desconfiança, principalmente, com relação aos
empregos”50.
Diante disso, a perspectiva é de um novo rumo para o trabalho durante e pós pan-
demia, havendo mudanças radicais no processo de geração de emprego. Nas condições
atuais, os trabalhadores estão repensando seu modo e sua visão acerca do trabalho, obje-
tivando melhorar sua capacidade de adaptação ao teletrabalho e as ferramentas disponí-
veis para isso51.
Por fim, é necessário destacar que o empregador, analisando sua atividade
econômica (produção, lucro, quadro de pessoal, qualidade de vida) poderá explorar
as potencialidades de seus colaboradores de modo a se adaptarem à nova formatação
da jornada de trabalho. Haverá, assim, uma adaptação à realidade laboral de cada
colaborador e em cada situação.

48
RODRIGUES, Raisa, Como ficará o mercado de trabalho após o pico da pandemia?, Notícias –FTC de
Juazeiro, 23.04.2020, Disponível em: <https://www.uniftc.edu.br/como-ficara-o-mercado-de-trabalho-apos-
o-pico-da-pandemia/>, Acesso em: 25 jun. 2020.
49
FERRARI, Andrés; CUNHA, André Moreira Cunha, A pandemia de Covid-19 e o isolamento social: saúde
versus economia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Disponível em: <https://www.ufr
gs.br/coronavirus/base/artigo-a-pandemia-de-covid-19-e-o-isolamento-social-saude-versus-economia/>,
Acesso em: 25 jun. 2020.
50
GUIMARÃES, Elaine, Em tempos de pandemia, o que será do trabalhador?, Notícias/Educação,
Disponível em: <https://www.uninassau.edu.br/noticias/em-tempos-de-pandemia-o-que-sera-do-trabal
hador>, Acesso em: 25 jun. 2020.
51
NASCIMENTO, Rodrigo, Quais são as tendências do mercado de trabalho após a Covid-19, Gazeta,
15.04.2020, Disponível em: <http://www.gaz.com.br/conteudos/regional/2020/04/15/164484-quais_sa
o_as_tendencias_do_mercado_de_trabalho_apos_a_covid_19.html.php>, Acesso em: 25 jun. 2020.

552 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


A Jornada de Trabalho em Época de Covid-19

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nesse estudo foi possível observar como um inimigo, mesmo invisível, pode
modificar as relações sociais, comerciais e de trabalho. Assim, o Coronavírus –
COVID-19 trouxe alterações que tornaram obrigatório o distanciamento social, que
redundou em afastamento dos postos de trabalho e, com isso as relações de trabalho
foram alteradas e, em muitos casos, rompidas. Como consequência imediata houve
uma retração no setor industrial/comercial havendo uma queda na produção e, ao
lado disso problemas sociais como desemprego, subempregos e maior permanência
em casa, além da ampliação do chamado trabalho remoto, também conhecido como
home office.
O teletrabalho, mesmo existindo desde a década de setenta do século passado,
foi oficializado por normativa legal no Brasil, apenas no início desse século. Essa
atividade, a despeito de diferentes opiniões tem, por um lado a necessidade de adap-
tação do empregado à realidade de permanecer afastado de seu ambiente de trabalho
costumeiro e fazer uso de tecnologia que, muitas vezes antes nem dominava. Ao
mesmo tempo, isso oferece vantagens como a possibilidade de criar seu horário de
trabalho, suas condições de empreender sem esquecer que não tem mais necessidade
de longos deslocamentos, o que, nos grandes centros, torna-se um ganho em termos de
qualidade de vida. Não menos verdadeiro também é o fato que pode demandar em
mais horas trabalhadas, não ter as condições ideais para a realização de suas ativida-
des, sem contar as possíveis maiores interferências de outras pessoas ao trabalho.
Essa alternativa de trabalho se torna muito importante quando há um risco
maior de contaminação, de infecção como ocorre no momento no Brasil e no mun-
do, com o Coronavírus. Esse inimigo, por ter um alto poder de transmissibilidade e
letalidade, exige que sejam tomadas medidas enérgicas para diminuir a curva de
contaminação e, assim, possibilitar a descoberta de alternativas de combatê-lo ou
torná-lo menos agressivo. Ainda mais quando não há uma exata dimensão do que
pode ocorrer com sua disseminação e como evitar, de forma mais efetiva a letalida-
de. Diante disso, o home office se apresentou como uma boa alternativa para evitar
demissões e procurar manter a roda da economia em movimento.
Entretanto, a grande dúvida que surge, durante a pandemia, é a preocupação
de como será a relação de trabalho durante o isolamento social e, especialmente
após. Durante, já é possível observar que ocorreram demissões em massa, negocia-
ções salariais, de horário e o trabalho remoto. O novo momento obrigou os empre-
gadores e empregados a repensarem suas atitudes já visando o retorno das atividades
após a passagem do surto.
Esse cuidado exige novo olhar sobre as relações de trabalho, os ambientes
de trabalho e até mesmo as novas exigências do mercado. Para tanto, mesmo que
não seja possível mensurar como e quando haverá a retomada das atividades con-
sideradas “normais”, é necessário repensar e rever velhos padrões e valores. O
mundo não sairá igual e isso será muito mais verdadeiro no que se refere aos mei-
os de vida, as necessidades individuais e os paradigmas empregatícios. Conclui-se
assim que, ante este quadro, cabe a cada um enxergar o outro de modo mais empá-

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 553


Franciele da Rocha Dias / Claudia Maria Petry de Faria

tico e resiliente, bem como aproveitar as oportunidades para se qualificar, se adap-


tar e procurar ter um olhar proativo estando mais bem preparado a um novo mer-
cado que se apresentará.

7 REFERÊNCIAS
ALMEIDA, Ildeberto Muniz de, “Proteção da saúde dos trabalhadores da saúde em tempos de COVID-19
e respostas à pandemia”, Revista Brasileira de Saúde Ocupacional, São Paulo, v. 45, 2020, Disponível
em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0303-76572020000101500&lng=en&n
rm=iso>, Acesso em: 24 jun. 2020.
BARROS, Alice Monteiro de, Curso de Direito do Trabalho, 11ª ed, São Paulo, LTr, 2017.
BARROS, Leonardo, Jornada de trabalho: tudo que você precisa saber, Disponível em:
<https://blog.tangerino.com.br/jornada-de-trabalho/>, Acesso em: 06 jun. 2020.
BRASIL, Presidência da República, Lei 12.551, de 15.12.2011, Altera o art. 6º da Consolidação das Leis
do Trabalho (CLT), aprovada pelo Dec.-Lei 5.452, de 1º.05.1943, para equiparar os efeitos jurídicos da
subordinação exercida por meios telemáticos e informatizados à exercida por meios pessoais e diretos,
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12551.htm>, Acesso em:
16 jun. 2020.
BRASIL, Presidência da República, Lei 13.467, de 13.06.2017, Altera a Consolidação das Leis do Traba-
lho (CLT), aprovada pelo Dec.-Lei 5.452, de 1º.05.1943, e as Leis n. 6.019, de 3.01.1974, 8.036, de
11.05.1990, e 8.212, de 24.07.1991, a fim de adequar a legislação às novas relações de trabalho, Disponí-
vel em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/lei/l13467.htm>, Acesso em: 16 jun.
2020.
BRASIL, Presidência da República, Dec.-Lei 5.452, de 1º.05.1943, Aprova a Consolidação das Leis do
Trabalho, Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm>, Acesso em:
06 jun. 2020.
BUENO, Ademir, Como será a volta ao trabalho após a pandemia?, Uninter notícias, 13.05.2020, Dispo-
nível em: <https://www.uninter.com/noticias/como-sera-a-volta-ao-trabalho-apos-a-pandemia>, Acesso
em: 25 jun. 2020.
CAMINO, Carmen, Direito individual do trabalho, 4ª ed, Porto Alegre: Síntese, 2004.
CHOR, Dóra; FAERSTEIN, Eduardo, Um enfoque epidemiológico da promoção da saúde: as ideias de
Geoffrey Rose, Caderno de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 16, n. 1, jan./marc. 2000, Disponível em:
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-311X2000000100025&lng=en&nrm=
iso>, Acesso em: 23 jun. 2020.
COSTA, Isabel de Sá Affonso da, “Teletrabalho: subjugação e construção de subjetividades”, Revista de Adminis-
tração Pública, Rio de Janeiro, v. 41, n. 1, Fev. 2007, Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.
php?script=sci_arttext&pid=S0034-76122007000100007&lng=en&nrm=iso>, Acesso em: 19 jun. 2020.
DELGADO, Mauricio Godinho, Jornada de trabalho e descansos trabalhistas, São Paulo, LTr, 2003.
ESTRADA, Manuel Martín Pino, “Teletrabalho: Conceitos e a sua Classificação em face aos Avanços
Tecnológicos”, in STOLZ, Sheila; MARQUES, Carlos Alexandre Michaello, org., Teletrabalho, São
Paulo, LTr, 2017.
FERRARI, Andrés; CUNHA, André Moreira Cunha, A pandemia de Covid-19 e o isolamento social:
saúde versus economia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Disponível em:
<https://www.ufrgs.br/coronavirus/base/artigo-a-pandemia-de-covid-19-e-o-isolamento-social-saude-ver
sus-economia/>, Acesso em: 25 jun. 2020.
FINCATO, Denise Pires; BITENCOURT, Manoela de, Teletrabalho transnacional: tributação da renda
dos teletrabalhadores no plano internacional, Florianópolis: CONPEDI, 2014.

554 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


A Jornada de Trabalho em Época de Covid-19

FINCATO, Denise, “Teletrabalho na reforma trabalhista brasileira”, Revista eletrônica do Tribunal


Regional do Trabalho da 9ª Região, v. 8, n. 75, fev. 2019. Disponível em: <https://juslaboris.t
st.jus.br/bitstream/handle/20.500.12178/152290/2019_fincato_denise_teletrabalho_reforma.pdf?sequence
=1&isAllowed=y>, Acesso em: 18 jun. 2020, pp. 58-72.
GUIMARÃES, Elaine, Em tempos de pandemia, o que será do trabalhador?, Notícias/Educação, Dispo-
nível em: <https://www.uninassau.edu.br/noticias/em-tempos-de-pandemia-o-que-sera-do-trabalhador>,
Acesso em: 25 jun. 2020.
LAURETTI, Patrícia, O trabalho no pós-pandemia: crise e oportunidade para a sociedade, Atualidades
Unicamp, 01.05.2020, Disponível em: <https://www.unicamp.br/unicamp/noticias/2020/05/01/o-trabalho-
no-pos-pandemia-crise-e-oportunidade-para-sociedade>, Acesso em: 25 jun. 2020.
LEITE, Carlos Henrique Bezerra, Curso de Direito do Trabalho, 11ª ed, São Paulo, Saraiva, 2019.
MARINELLI, Natália Pereira, Evolução de indicadores e capacidade de atendimento no início da epide-
mia de COVID-19 no Nordeste do Brasil, 2020, Epidemiologia e Serviço de Saúde, Brasília, v. 29, n. 3,
03.06.2020, Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S2237-962220
20000300303&lng=en&nrm=iso>, Acesso em: 19 jun. 2020.
MARTINEZ, Pedro Romano, Direito do trabalho, 6ª ed, Coimbra, Almedina, 2013.
MARTINS, Sergio Pinto, Direito do Trabalho, 34ª ed, São Paulo, Atlas, 2018.
MARX, Karl, Capital: crítica da economia política, São Paulo, Boitempo, 2013.
MASI, Domenico de, Ócio criativo, São Paulo, Sextante, 2000.
MASSI, Alfredo, “Teletrabalho: Análise sob a óptica da saúde e da segurança do teletrabalhador”, in
STOLS, Sheila. MARQUES, Carlos Alexandre Michaello Marques, org., Teletrabalho, São Paulo, LTr,
2017.
NASCIMENTO, Amauri Mascaro, Curso de direito do trabalho: história e teoria geral do direito do
trabalho, relações individuais e coletivas do trabalho, 27ª ed, São Paulo, Saraiva, 2012.
NASCIMENTO, Rodrigo, Quais são as tendências do mercado de trabalho após a Covid-19, Gazeta,
15.04.2020, Disponível em: <http://www.gaz.com.br/conteudos/regional/2020/04/15/164484-quais_sao
_as_tendencias_do_mercado_de_trabalho_apos_a_covid_19.html.php>, Acesso em: 25 jun. 2020.
NOGUEIRA, Eliana dos Santos Alves, “O contrato de trabalho intermitente na reforma trabalhista brasi-
leira: contraponto com o modelo italiano”, Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, v.
01, n. 51, jul./dez, 2017, Disponível em: <https://juslaboris.tst.jus.br/bitstream/handle/20.500.1217
8/125435/2017_nogueira_eliana_contrato_trabalho.pdf?sequence=1&isAllowed=y>, Acessado em 12
jun. 2020, pp. 136.
OLIVEIRA, Adriana Cristina de; LUCAS, Thabata Coaglio; IQUIAPAZA, Robert Aldo, O que a pande-
mia da COVID-19 tem nos ensinado sobre adoção de medidas de precaução?, Texto & contexto enferma-
gem, v. 29, 2020, Disponível em: <https://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0104-070720200001
00201&script=sci_arttext&tlng=pt>, Acesso em: 23 jun. 2020.
OLIVEIRA, Cínthia Machado de; DORNELES, Leandro do Amaral Dorneles de, Direito do Trabalho, 2ª
ed, Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2013.
PAMPOLHA FILHO, Rodolfo; FERNANDEZ, Leandro, “Tecnologia da Informação e as Relações de
Trabalho no Brasil: O Teletrabalho na Lei 13.467/2017”, in FIGUEIREDO, Carlos Arthur; COSTA,
Flavio; NORONHA, Francisco; QUEIROZ. Sergio, org., Reforma trabalhista: Novos rumos do direito do
trabalho e do direito processual do trabalho, São Paulo, LTr, 2018.
REDAÇÃO, OMS decreta pandemia do novo coronavírus, Veja saúde, 29 abr. 2020, Disponível em:
<https://saude.abril.com.br/medicina/oms-decreta-pandemia-do-novo-coronavirus-saiba-o-que-isso-
significa/>, Acesso em: 19 jun. 2020.
RODRIGUES, Raisa, Como ficará o mercado de trabalho após o pico da pandemia?, Notícias –FTC de
Juazeiro, 23.04.2020, Disponível em: <https://www.uniftc.edu.br/como-ficara-o-mercado-de-trabalho-
apos-o-pico-da-pandemia/>, Acesso em: 25 jun. 2020.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 555


Franciele da Rocha Dias / Claudia Maria Petry de Faria

ROUBICEK, Marcelo, O que diz o primeiro dado do desemprego na pandemia, Jornal nexo, de
30.04.2020, Disponível em: <https://www.nexojornal.com.br/expresso/2020/04/30/O-que-diz-o-primeiro-
dado-de-desemprego-na-pandemia>, Acesso em: 16 jun. 2020.
WERNECK, Guilherme Loureiro, CARVALHO, Marilia Sá, A pandemia de COVI-19 no Brasil: crônica
de uma crise sanitária anunciada, Caderno de Saúde Pública, v. 36, n. 5 de 2020, Disponível em:
<http://cadernos.ensp.fiocruz.br/csp/artigo/1036/a-pandemia-de-covid-19-no-brasil-crnica-de-uma-crise-
sanitria-anunciada>, Acesso em: 23 jun. 2020, pp. 1-4.

556 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


A Jornada de Trabalho em Época de Covid-19

A MASSIFICAÇÃO DOS PROCESSOS NO DIREITO


BRASILEIRO E OS INSTRUMENTOS DE CONTENÇÃO
INSERIDOS PELO ORDENAMENTO PROCESSUAL CIVIL
THE DEVELOPMENT OF THE MASSIFICATION OF
PROCESSES IN THE BRAZILIAN CIVIL PROCEDURAL
SYSTEM AND THE CONTAINING INSTRUMENTS OF
THE CIVIL PROCEDURAL SYSTEM
DOI: 10.19135/revista.consinter.00011.27
Recebido/Received 28.05.2020 – Aprovado/Approved 20.09.2020
Daniel Willian Granado1 – https://orcid.org/0000-0002-0867-6983
E-mail: dwgranado@hotmail.com
Fernando Rey Cota Filho2 – https://orcid.org/0000-0002-0487-3867
E-mail: frcf87@yahoo.com.br

Resumo: O objetivo do presente artigo é investigar o desenvolvimento da massificação


dos processos no sistema processual civil brasileiro, abordando, precipuamente, como a
produção legislativa acompanhou essa nova realidade jurídico-social, considerando,
como marco inicial, a promulgação da Constituição Federal de 1988. Ademais, buscar-
se-á demonstrar como o sistema processual civil, inserido pela Lei 13.105/2015, inovou
para conter a litigiosidade repetitiva, a partir da análise dos diversos instrumentos
processuais inseridos, principalmente tendo em vista o sistema de precedentes adotado,
em prol da unidade do direito, da segurança jurídica, da efetividade e da celeridade, bem
como para desafogar o Poder Judiciário brasileiro.
Palavras-chave: Direito Processual Civil; Massificação de Demandas; Litigiosidade
Repetitiva; Evolução Legislativa; Código de Processo Civil de 2015.
Abstract: The purpose of this article is to investigate the development of the
massification of processes in the Brazilian civil procedural system, approaching, in a
nutshell, how legislative production accompanied this new legal-social reality,
considering, as an initial landmark, the promulgation of the 1988 Federal Constitution.
In addition, we will seek to demonstrate how the civil procedural system, inserted by
Law n. 13,105/2015, innovated to contain repetitive litigation, based on the analysis of
the various procedural instruments inserted, mainly in view of the precedent system

1
Doutor e Mestre em Direito Processual Civil pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, professor
de Pós-Graduação lato sensu da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. E-mail:
dwgranado@hotmail.com
2
Mestre em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP, Graduado pela PUC/SP.
Professor de Pós-graduação lato sensu em Direito Processual Civil. Membro da ABDPRO. Membro do
CEAPRO. Membro da Comissão de Estudos de Direito Processual Civil da OAB/AM. Advogado. E-mail:
fernando@cotaadv.com

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 557


Daniel Willian Granado / Fernando Rey Cota Filho

adopted, in favor of the unity of law, legal security, effectiveness and speed, as well as to
relieve the Brazilian Judiciary.
Keywords: Civil Procedural Law; Massification of Demands; Repetitive litigation;
Legislative Evolution; 2015 Code of Civil Procedure.
Sumário: 1. O avanço da massificação dos processos no direito brasileiro. 2. Evolução
legislativa. 3. O sistema processual civil de 2015. 4. Conclusão. 5. Referências .

1 O AVANÇO DA MASSIFICAÇÃO DOS PROCESSOS NO DIREITO


BRASILEIRO
Desde a década de 1990 é possível notar o avanço da massificação de proces-
sos3 no País, razão pela qual os legisladores, doutrina e jurisprudência têm se debru-
çado sobre o tema, a fim de compreender e barrar o congestionamento de ações que
abarrotam o Poder Judiciário brasileiro.
Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, priorizou-se a abertura
e a consolidação do acesso dos cidadãos ao Poder Judiciário, haja vista que fora
consagrado, em seu art. 5.º, inc. XXXV, que a “lei não excluirá da apreciação do
Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”, o que contribuiu exponencialmente para
o crescimento das demandas por serviços judiciais.
Outrossim, a ampla gama de direitos e garantias individuais e coletivos asse-
gurada no seio da Constituição Federal não foi acompanhada por instrumentos e
políticas públicas aptos a possibilitar a sua ampla e integral concretização, ocasio-
nando, diuturnamente, o aumento da judicialização de direitos fundamentais, pleite-
ando a efetividade das garantias constitucionalmente resguardadas.
Na mesma medida, o art. 5.º, inc. LXXIV, do diploma constitucional, tam-
bém instituiu a gratuidade de acesso à justiça, asseverando que o “Estado prestará
assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recur-
sos”. Decerto, a gratuidade de justiça constitui importante avanço, ao passo que
garante que o Poder Judiciário poderá assegurar a pacificação social a todos que
necessitarem, sendo indiferente a possibilidade de custear a justiça e seu processo ou
não. No entanto, o amplo beneplácito da gratuidade processual, concedida muitas
vezes sem critérios específicos, piora sensivelmente o cenário de litigiosidade mas-
siva, de modo que é possível concluir que, somado ao princípio do acesso à justiça e
3
“Por força desse e de outros fatores, o Poder Judiciário brasileiro, desde meados da década de 1990, passou
a enfrentar um quadro crônico de congestionamento, que pode ser atribuído em grande medida à
litigiosidade repetitiva. Essa afirmação se baseia em alguns dados estatísticos do Conselho Nacional de
Justiça (CNJ), que se propôs a identificar os “100 maiores litigantes” do Brasil. Constatou-se que 79,23
milhões de processos (num universo de aproximadamente de 83,4 milhões),17 tem em um dos seus polos
um desse seleto grupo de litigantes habituais, destacando-se nesse universo os entes da Administração
Pública, direta e indireta, em esferas federal, estadual e municipal (51%), bancos (38%) e empresas de
telefonia (6%). Esses sujeitos seriam candidatos naturais a serem réus em processos coletivos, pois se
relacionam necessariamente com pluralidades indetermináveis de indivíduos. Contudo, em vez disso,
tornam-se parte de milhões de processos individuais.” (SICA, Heitor Vitor Mendonça. Brevíssimas
Reflexões sobre a evolução do tratamento da litigiosidade repetitiva no ordenamento brasileiro, do
CPC/1973 ao CPC/2015 in Doutrinas Essenciais – Novo Processo Civil, vol. 7/2018, Revista de Processo,
vol. 257/2016, p. 269 – 281, Jul/2016.)

558 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


A Massificação dos Processos no Direito Brasileiro e os Instrumentos de Contenção Inseridos pelo Ordenamento...

à proliferação de direitos, constitui-se como fator que contribui diretamente para o


panorama atual de asfixia judiciária.
À guisa de ilustração, segundo o Conselho Nacional de Justiça, o Poder Judi-
ciário finalizou o ano de 2018 com quase 78,7 milhões de processos em tramitação,
aguardando alguma solução definitiva4. Ademais, o Judiciário brasileiro, além de
possuir um expressivo número de processos, possui um dos maiores Poderes Judici-
ários do mundo, na medida em que é composto por 18.141 magistrados e 272.138
servidores efetivos, requisitados ou comissionados5. No entanto, ainda que fosse
possível considerar o não ingresso de novas demandas, com a média de produtivida-
de apresentada nos últimos anos, os supramencionados magistrados e servidores
precisariam de dois anos e seis meses para zerar o estoque de processos existente no
País.
Em média, a cada grupo de 100.000 habitantes, 11.796 pessoas ingressaram
com uma ação judicial no ano de 2018, cálculo que abrange tão somente os proces-
sos de conhecimento e de execução de títulos extrajudiciais, o que demonstra que os
números de litigantes são ainda maiores, considerando a existência de execuções
judiciais iniciadas.
Isso comprova como a própria cultura brasileira é notadamente favorável à li-
tigância judicial. No setor público, por exemplo, os dados oficiais demonstram o
perfil altamente contencioso da Administração Pública, seja no âmbito estadual ou
federal. O Conselho Nacional de Justiça afirma que o Poder Público é o maior liti-
gante do país, sendo responsável por 39,26% dos processos que chegam ao primeiro
grau e aos Juizados Especiais6.
Inúmeras outras causas poderiam ser apontadas como responsáveis pela ex-
cessiva massificação dos processos nos últimos anos7, dentre elas, o alto grau de
questões passíveis de judicialização. Decerto, não apenas a Constituição Federal,
4
JUSTIÇA, Conselho Nacional, Relatório Justiça em Números 2019: ano-base 2018, Brasília, CNJ, 2019, p.
79.
5
JUSTIÇA, Conselho Nacional, Relatório Justiça em Números 2019: ano-base 2018, Brasília, CNJ, 2019, p.
73.
6
JUSTIÇA, Conselho Nacional, 100 maiores litigantes 2012, Brasília, CNJ, 2012.
7
Dentre elas: “a) desinformação ou oferta insuficiente quanto a outros meios, ditos alternativos, de auto e
heterocomposição de litígios, gerando uma cultura da sentença, na expressão de Kazuo Watanabe; (b)
exacerbada juridicização da vida em sociedade, para o que contribui a pródiga positivação de novos direitos
e garantias, individuais e coletivos, a partir do texto constitucional, projetando ao interno da coletividade
uma expectativa (utópica), de pronto atendimento a todo e qualquer interesse contrariado e insatisfeito; (c)
ufanista e irrealista leitura do que contém no inc. XXXV do art. 5º da CF/1988 – usualmente tomado como
sede do acesso à Justiça – enunciado que, embora se enderece ao legislador, foi sendo gradualmente
superdimensionado (ao influxo de motes como ubiquidade da justiça, universalidade da jurisdição),
praticamente implicando em converter o que deverá ser o direito de ação (específico e condicionado) num
prodigalizado dever de ação!; (d) crescimento desmesurado da estrutura judiciária – oferta de mais do
mesmo sob a óptica quantitativa – com a incessante criação de novos órgãos singulares e colegiados, e
correspondentes recursos humanos e materiais, engendrando o atual gigantismo que, sobre exigir parcelas
cada vez mais expressivas do orçamento público, induz a que esse aumento da oferta contribua para
retroalimentar a demanda.” (MANCUSO, Rodolfo de Camargo, Acesso à justiça: condicionantes legítimas
e ilegítimas, São Paulo, RT, 2011, pp. 52-53.)

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 559


Daniel Willian Granado / Fernando Rey Cota Filho

mas também a massiva legislação infraconstitucional atua no sentido de criar uma


situação propícia tanto à judicialização como à diversidade de interpretações8, tendo
como resultado a dispersão da jurisprudência e, por essa razão, um considerável
fomento à instabilidade e à própria insegurança jurídica dos jurisdicionados, o que
também acaba por fomentar a ida ao Poder Judiciário em busca da interpretação
pacificadora.
Diante desse cenário de instabilidade e de proliferação de demandas, uma
marcante tendência começou a ser vislumbrada, notadamente no âmbito processual
civil, qual seja a edição de novos diplomas normativos, bem como alterações de
legislações existentes, na expectativa de conter a sobrecarga de ações que inundam o
Poder Judiciário, em uma tentativa árdua de reduzir a massificação dos processos,
tais alterações serão vistas no tópico seguinte.
2 EVOLUÇÃO LEGISLATIVA
As alterações legislativas que tiveram por escopo contribuir para a redução da
massificação de processos, após a promulgação da Constituição Federal de 1988, são
encabeçadas por normas de direito material e processual que visam proteger o consumi-
dor enquanto parte vulnerável da relação consumerista.
Nessa esteira, o Código de Defesa do Consumidor, Lei 8.078/19909, representa
um importante avanço para a resolução, de maneira mais célere, das questões relaciona-
das à sociedade de consumo, na medida em que, alinhado à atuação dos Procons instituí-
do pela Lei 9.192/1995, cujo objetivo é executar a política de proteção e defesa do con-
sumidor, tem por escopo a simplicidade e celeridade de procedimento extrajudicial,
considerando que muitos dos conflitos de interesses que não precisam chegar ao Poder
Judiciário, servindo, portanto, de agente pacificador social.
Ademais, à luz do diploma consumerista, instrumentos processuais foram inseri-
dos com o escopo de tornar a tutela jurisdicional efetiva e justa, a fim de que o consumi-
dor possa litigar em iguais condições ao fornecedor, tais como, a inversão do ônus da
prova em proveito do consumidor, a desconsideração da personalidade jurídica da pessoa
jurídica, a interpretação dos contratos favorável ao consumidor e a responsabilidade civil
objetiva dos fornecedores em casos de danos causados aos consumidores.
Outro importante marco temporal foi a Emenda Constitucional n. 45/04, na
medida em que, além de ter inserido no ordenamento jurídico as Súmulas Vinculan-

8
“Não é raro, no Brasil, que um tribunal de segundo grau interprete e aplique um dispositivo de lei federal de
maneira diversa da que foi conferida pelo Superior Tribunal de Justiça, órgão máximo em matéria
infraconstitucional, mesmo estando a matéria pacificada no âmbito da Corte superior. Também não é tão
incomum como deveria ser que um determinado tribunal, uma dada turma julgadora ou um julgador não se
vincule sequer às próprias decisões anteriores. Essa falta de coerência externa e interna nos tribunais, além
de atentar contra a segurança jurídica, a isonomia entre os jurisdicionados e a previsibilidade de suas
decisões, prejudica sobremaneira a imagem do Judiciário, levando – ao descrédito junto à sociedade.”
(LIMA, Tiago Asfor Rocha, Precedentes judiciais civis no Brasil, São Paulo, Saraiva, 2013, p. 135.)
9
“Art. 1° O presente código estabelece normas de proteção e defesa do consumidor, de ordem pública e
interesse social, nos termos dos arts. 5°, inc. XXXII, 170, inc. V, da Constituição Federal e art. 48 de suas
Disposições Transitórias.”

560 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


A Massificação dos Processos no Direito Brasileiro e os Instrumentos de Contenção Inseridos pelo Ordenamento...

tes, introduziu, no parágrafo terceiro do art. 102 da Constituição Federal, a repercus-


são geral do Recurso Extraordinário. A edição de uma Súmula Vinculante tem por
escopo nortear a aplicação de temas constitucionais para os demais órgãos do Poder
Judiciário e para a Administração Pública direita e indireta em todas as suas esferas,
assegurando, por conseguinte, maior segurança jurídica e trazendo mais celeridade
ao processo judicial, na medida em que facilita a deliberação do juiz ou Tribunal
quanto à temática, reduzindo, inclusive, o número de processos que podem ser leva-
dos ao Supremo Tribunal Federal10.
O microssistema dos Juizados Especiais, trazido pela Lei 9.099/1995, na me-
dida que tem competência para dirimir casos menos complexos, autorizando, inclu-
sive, que nas causas cujo valor não chegue a vinte salários mínimos, o autor inicie o
processo desacompanhado de advogado, tem por finalidade facilitar o acesso à justi-
ça. Desta feita, seus princípios norteadores são exatamente no sentido de ter um
processo judicial com o efeito substitutivo próprio da jurisdição, de uma forma me-
nos formal, orientado pelos princípios da oralidade, simplicidade, informalidade,
conciliação, economia processual e celeridade11.
Na mesma medida, as Turmas Nacionais de Uniformização, instituídas pela
Lei 10.259/01, são órgãos criados com a finalidade de uniformizar a interpretação de
lei federal no âmbito dos Juizados Especiais. Vale dizer, a função precípua da Turma
Nacional de Uniformização é a de, no sistema dos Juizados Especiais, que já possu-
em a característica de serem céleres, abreviar ainda mais o procedimento, garantindo
segurança jurídica, no sentido de diminuir interpretações divergentes sobre a aplica-
ção de determinada lei federal em casos concretos, facilitando e diminuindo o núme-
ro de recursos, dando às partes a fundamentação segura que é seguida para aquele
caso concreto12.
Buscando tutelar direitos metaindividuais, foi desenvolvido o microssistema
das ações coletivas, o qual fundamenta-se, essencialmente, em dois diplomas norma-
tivos, a Lei de Ação Civil Pública (Lei 7.347/85) e o próprio Código de Defesa do
Consumidor (Lei 8.078/1990)13, que se interpenetram e subsidiam-se. Destarte,
visam tutelar lesões a direitos que atingem a coletividade, grupos ou certa quantida-

10
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim, Súmula vinculante: figura do common law in Revista de Doutrina da 4ª
Região, Porto Alegre, n. 44, out. 2011, Disponível em: http://bdjur.stj.jus.br/dspace/handle/2011/42526,
Acesso em: 14.05.2020.
11
“Art. 2.º: O processo orientar-se-á pelos critérios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia
processual e celeridade, buscando, sempre que possível, a conciliação ou a transação”. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9099.htm>, Acesso em: 10.04.2020
12
Disponível em: <https://www.cjf.jus.br/cjf/corregedoria-da-justica-federal/turma-nacional-de-uniformizac
ao/copy_of_atos-oficiais-1/res-586-2019.pdf>, Acesso em: 28.04.2020
13
Importante salientar que muitos outros diplomas compõem o microssistema de ações coletivas, tais como a
Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/1992), Lei da Ação Popular (Lei 4.717/1965), Lei do
Mandado de Segurança Coletivo (Lei 12.016/2009), Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei
8.069/1990), Estatuto da Cidade (Lei 10.257/2001) Lei de Parcelamento do Solo (Lei 6.766/1979), Código
Florestal (Lei 4.771/1965), Lei da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938/1981); Estatuto da
Pessoa com Deficiência (Lei 7.853/1989), Lei de Licitações e Contratos Administrativos (Lei 8.666/1993),
entre outras.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 561


Daniel Willian Granado / Fernando Rey Cota Filho

de de indivíduos, de forma a exercer a jurisdição coletivamente, de modo a favorecer


a celeridade e a eficácia jurisdicional, desafogando o Poder Judiciário14.
Por fim, importante salientar a criação do Conselho Administrativo de Defesa
Econômica – CADE –, criado pela Lei 8.884/1994, revogada pela Lei 12.529/2011.
O CADE, conforme disposto no art. 4.º da Lei 12.529/2011, constitui-se como enti-
dade judicante com jurisdição em todo território nacional, a qual visa garantir a livre
concorrência, investigando e decidindo em última instância a matéria concorrencial,
com vistas à atuação mais célere e eficiente do Sistema Brasileiro de Defesa da
Concorrência15.
Um dos pontos comuns dos diplomas em apreço é a percepção de que o or-
denamento jurídico pátrio vem, gradativamente, enfatizando o caráter paradigmático
das decisões judiciais e o papel do órgãos jurisdicionais para a manutenção da coe-
rência e integridade do sistema jurídico brasileiro, por meio da criação de instrumen-
tos e órgãos que visam garantir, entre outros valores, previsibilidade, isonomia,
celeridade, segurança jurídica e efetividade.
Essa tendência ganhou ainda destaque com o advento do novo Código de
Processo Civil, cuja análise se inicia a seguir, uma vez que as maiores preocupações
que nortearam a edição do novo diploma dizem respeito à morosidade do processo e
à segurança jurídica das decisões judiciais. Isso porque, a pluralidade de ações repe-
titivas e de entendimentos sobre a mesma questão de direito, considerada a identida-
de entre as situações nas quais se encontram os jurisdicionados, resulta em um pro-
blema não só interno do Poder Judiciário, mas também social.

3 O SISTEMA PROCESSUAL CIVIL DE 2015


O cenário atual de litigiosidade em massa e incapacidade do Poder Judiciário
de absorção dessa demanda, somado à morosidade inerente ao sistema e à dificulda-
de de previsibilidade na solução de idênticas questões de direito, promoveu a pro-
mulgação de um novo Código de Processo Civil (Lei 13.105/2015), no qual foram
14
“A defesa coletiva de direitos individuais atende aos ditames da economia processual;
representa medida necessária para desafogar o Poder Judiciário, para que possa cumprir com
qualidade e em tempo hábil as suas funções; permite e amplia o acesso à justiça, principalmente
para os conflitos em que o valor diminuto do benefício pretendido significa manifesto
desestímulo para a formulação da demanda; e salvaguarda o princípio da igualdade da lei, ao
resolver molecularmente as causas denominadas repetitivas, que estariam fadadas a
julgamentos de teor variado, se apreciadas de modo singular”. (ARENHART, Sérgio Cruz, A
tutela de direitos individuais homogêneos e as demandas ressarcitórias em pecúnia in Direito processual
coletivo e o anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos, São Paulo, Revista dos Tribunais,
2007, p. 216.)
15
“[...] o novo modelo institucional adotado pela Lei, ao concentrar as principais funções em um único órgão,
o CADE, racionalizará as atividades e trará ganhos de eficiência e escala ao SBDC, evitando-se as
repetições de funções anteriormente encontradas na Lei 8.884/1994 entre SEAE, SDE e CADE. É de se
esperar, portanto aumentos de intensidade e qualidade na aplicação da Lei a partir dos ganhos que deverão
surgir com atuação do “novo-CADE”. Essa é uma das maiores novidades desta Lei.” (ANDERS, Eduardo
Caminati (org.) et al. Comentários à nova lei de defesa da concorrência: Lei 12.529, de 30.11.2011, São
Paulo, Método, 2012, p. 15.)

562 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


A Massificação dos Processos no Direito Brasileiro e os Instrumentos de Contenção Inseridos pelo Ordenamento...

inseridos diversos instrumentos para diminuição do número de processos, em prol da


busca por decisões judiciais que efetivamente solucionem o litígio e possibilitem a
convivência da sociedade de maneira pacífica.
Nesse contexto, destaca Arruda Alvim:

Outro ponto importante a ser frisado [do NCPC] é a extrema cautela do Código quanto à
ênfase e manutenção de um padrão bom de segurança jurídica, entendida como previsibi-
lidade do que se espera seja decidido e da estabilidade da jurisprudência. Procurou-se,
como se verá mais adiante, incentivar a uniformidade da jurisprudência e sua estabilida-
de16. (os itálicos são do original)

Nessa esteira, serão analisados dispositivos que, muitas vezes pautados na valori-
zação de precedentes, desestimulam a proposição desnecessária de demandas, bem como
permitem a interrupção liminar de ações judiciais, reduzindo a litigiosidade e desburo-
cratizando o processo, quando houver decisão anterior sobre a mesma temática.
3.1 A Improcedência Liminar do Pedido
Fundamentada nos princípios da efetividade e da economia processual, a impro-
cedência liminar do pedido, prevista no art. 332 do CPC/15, tem lugar quando a deman-
da do autor, de imediato e sem a citação do réu, pode ser julgada improcedente. O art.
332 prevê que nas causas que dispensem a fase instrutória, o juiz poderá julgar liminar-
mente improcedente o pedido do autor que contrariar: enunciado de súmula do Supremo
Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça; acórdão proferido pelo Supremo
Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repeti-
tivos; entendimento firmado em Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas ou de
Assunção de Competência; enunciado de súmula de tribunal de justiça sobre direito
local; e ocorrência de decadência ou de prescrição.
O julgamento de improcedência liminar mostra-se como uma solução eco-
nômica, haja vista o encerramento do processo com a realização mínima de gastos
para o autor. Nesse sentido, afirmam Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade
Nery, senão vejamos:

É medida de celeridade (CF 5.º LXXVIII) e de economia processual, que evita a citação e
demais atos do processo, porque o juízo, o tribunal local, o STF ou o STJ já havia decidido
questão idêntica anteriormente, ou por se ter verificado a decadência ou a prescrição. Se-
ria perda de tempo, dinheiro e de atividade jurisdicional insistir-se na citação e na prática
dos demais atos do processo, quando o juízo ou mesmo a jurisprudência como um todo
já tem posição firmada quanto à pretensão deduzida pelo autor, ou quando já se apu-
rou que o pedido é caduco ou prescrito17.

16
ARRUDA ALVIM, José Manoel de, Novo Contencioso Cível no CPC/2015, Revista dos Tribunais: São
Paulo, 2016, pp. 23-24.
17
NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade, Código de Processo Civil Comentado [livro
eletrônico], 4. Ed, São Paulo, Thomson Reuters Brasil, 2019.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 563


Daniel Willian Granado / Fernando Rey Cota Filho

Excetuada a última hipótese, de ocorrência de prescrição e decadência, as


inovações trazidas pela atual legislação processual civil estão diretamente ligadas ao
sistema de precedentes inserido pelo mesmo diploma, além de conferir grande des-
taque aos enunciados sumulares emanados dos Tribunais Superiores, vinculantes ou
não, e dos tribunais de justiça, quando atinente ao direito local.
Deste modo, o julgamento liminar pela improcedência da ação, quando esta
contraria o acórdão proferido em recursos repetitivos ou pronunciamento emitido em
Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas ou de Assunção de Competência,
demonstra a necessidade de respeito à tese formulada pelo sistema processual como
um todo, abrangendo não só os recursos pendentes de julgamento, como também as
ações eventualmente propostas.
3.2 A Inversão da Carga do Ônus Probatório
O fundamento da possibilidade de inversão do ônus da prova está umbilical-
mente ligado ao direito fundamental de paridade de armas, expressamente previsto
no art. 7.º do CPC/15. Em regra, consoante prevê o art. 373 do CPC/15, o ônus da
prova incumbirá ao autor quanto ao fato constitutivo de seu direito e ao réu, quanto à
existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor. No en-
tanto, diante de uma situação de desigualdade quanto à distribuição do ônus probató-
rio, em face à impossibilidade ou dificuldade de uma parte de cumprir o encargo
probante somado à maior facilidade de obtenção da prova do fato pela outra parte,
poderá o magistrado atribuir o ônus da prova de modo diverso.
Para tanto, a distribuição inversa ou dinâmica do ônus da prova deverá ser
comunicada à parte onerada, em prestígio ao contraditório, por meio de decisão
fundamentada, de forma a oportunizar que esta possa se desincumbir do ônus que
lhe foi atribuído. A intenção do legislador ordinário ao prever o sistema dinâmico de
distribuição de ônus da prova, afastando-o da distribuição estática, tem por escopo
garantir a atuação das partes na fase instrutória de maneira equilibrada, evitando a
decisão surpresa e buscando uma decisão célere e efetiva.
Ademais, o diploma processual civil também prevê a possibilidade da distri-
buição diversa do ônus da prova por convenção firmada entre as partes, o chamado
negócio jurídico processual, o qual pode ser realizado antes ou durante a demanda.
No entanto, se a distribuição recair sobre direito indisponível ou tornar excessiva-
mente difícil a uma parte o exercício do direito, serão aplicadas as regras tradicio-
nais de ônus da prova.
3.3 Tutela Provisória da Evidência
O CPC/73 trazia em seu bojo, de forma apartada, as tutelas antecipadas (art.
273) e as tutelas cautelares, por meio do processo cautelar (art. 796 e seguintes). O
objetivo era resguardar os jurisdicionados, apresentando uma tempestiva e adequada
prestação jurisdicional à luz de uma cognição sumária. No entanto, o CPC/15 unifi-
cou os institutos, os quais passaram a compor um livro próprio – Livro V – denomi-
nado de tutela provisória.

564 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


A Massificação dos Processos no Direito Brasileiro e os Instrumentos de Contenção Inseridos pelo Ordenamento...

As tutelas provisórias, em caráter geral, quando concedidas, lastreiam-se em


uma percepção sucinta dos fatos e dos fundamentos jurídicos apresentados, vale
dizer, sem o aprofundamento que só a fase instrutória possibilita. Ao conceder ou
denegar uma tutela provisória, que poderá ser fundamentada na urgência ou na evi-
dência, conforme disposto no art. 294, o magistrado se valerá da menor verticalidade
dos fatos e direitos postos.
Consoante determina o art. 311, a tutela provisória de evidência será conce-
dida, independentemente da demonstração de perigo de dano ou de risco ao resulta-
do útil do processo, quando restar caracterizado: o abuso do direito de defesa ou o
manifesto propósito protelatório da parte; quando as alegações de fato puderem ser
comprovadas apenas documentalmente e houver tese firmada em julgamento de
casos repetitivos ou em súmula vinculante; quando se tratar de pedido reipersecutó-
rio fundado em prova documental adequada do contrato de depósito, caso em que
será decretada a ordem de entrega do objeto custodiado, sob cominação de multa; e,
por fim, quando a petição inicial for instruída com prova documental suficiente dos
fatos constitutivos do direito do autor, a que o réu não oponha prova capaz de gerar
dúvida razoável.
Para Luiz Marinoni, Sérgio Arenhart e Daniel Mitidiero, o denominador co-
mum das hipóteses de tutela de evidência é a “noção de defesa inconsistente”18.
Deste modo, a hipótese de caracterização de abuso de defesa ou manifesto propósito
protelatório torna evidente a conduta abusiva da parte, demonstrando grande proba-
bilidade de confirmação da pretensão da parte contrária, razão pela qual a tutela de
evidência deve ser concedida.
Importa destacar a possibilidade trazida no inc. II do dispositivo em comento,
uma vez que se coaduna com o sistema de precedentes inserido pelo CPC/15, haja
vista que, se as alegações puderem ser comprovadas apenas documentalmente e
houver tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em Súmula Vinculante,
deverá ser concedida a tutela de evidência a fim de preservar a segurança jurídica e a
uniformidade das decisões dos Tribunais Superiores.
A terceira hipótese permite a concessão da tutela provisória de evidência com
base no contrato de depósito (art. 646 e 648 do Código Civil), de forma que estando
este devidamente comprovado, por meio de prova documental, o magistrado deverá
determinar a entrega da coisa, sob cominação de multa. Por fim, a última hipótese
leva em consideração o pedido de tutela de evidência que fora instruído com prova
documental suficiente dos fatos constitutivos do direito do autor, quando o réu não
opõe prova capaz de gerar dúvida razoável.
Diante da tutela de urgência, é notório que a tutela da evidência também exi-
ge a plausibilidade do direito invocado, no entanto, em sentido contrário, prescinde
da demonstração do risco de dano. Pautado no princípio da duração razoável dos
processos, o direito da parte requerente é tão óbvio que deve ser prontamente reco-
nhecido pelo juiz, sendo concedida a tutela de evidência.

18
MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. MITIDIERO, Daniel, Código de Processo Civil
Comentado [livro eletrônico], 4. ed, São Paulo, Thomson Reuters Brasil, 2019.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 565


Daniel Willian Granado / Fernando Rey Cota Filho

3.4 Decisão Parcial de Mérito


O CPC/15, pautado no princípio da razoável duração dos processos, expresso
em seu art. 4.º, disciplinou a hipótese de julgamento antecipado parcial de mérito em
seu art. 356. Nesse sentido, para Luiz Marinoni, Sérgio Arenhart e Daniel Mitidiero,
seria injusto “obrigar a parte a esperar pela resolução de determinada parcela do
litígio que não depende de qualquer ato processual posterior para ser elucidada”19,
sendo permitido o “julgamento antecipado da parcela de mérito que já se encontra
madura”20.
Destarte, prevê o art. 356 que “o juiz decidirá parcialmente o mérito quando
um ou mais dos pedidos formulados ou parcela deles mostrar-se incontroverso ou
estiver em condições de imediato julgamento, nos termos do art. 355”, o qual prevê
o julgamento antecipado de mérito, em sua totalidade, quando não houver necessi-
dade de produção de outras provas ou quando o réu for revel, desde que não haja
requerimento de produção de prova.
Na primeira hipótese de julgamento parcial antecipado, a possibilidade da an-
tecipação da parte incontrovertida do pedido, Nelson Nery Junior e Rosa Maria de
Andrade Nery asseguram sua ocorrência não “apenas quando o réu admite parte do
pedido – incontrovérsia absoluta –, mas também quando parte do pedido, embora
contestada explicitamente pelo réu, venha a se tornar indiscutível”21, mediante a
existência de prova inequívoca da verossimilhança da alegação. Por conseguinte,
coaduna-se com a hipótese de julgamento antecipado parcial, tendo em vista a des-
necessidade de produção de outras provas22.
Por fim, o julgamento antecipado parcial de mérito também será cabível
quando não houver contestação, é dizer, quando o réu é revel, presumindo-se verda-
deiras as alegações de fato formuladas pelo autor, desde que não haja requerimento
de prova, oportunamente apresentado, contra as alegações trazidas em inicial.
3.5 O Sistema de Precedentes
Uma das principais inovações trazidas pelo Código de Processo Civil de
2015 foi a instituição de uma sistemática de precedentes judiciais, na medida em que
19
MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. MITIDIERO, Daniel, Código de Processo Civil
Comentado [livro eletrônico], 4. ed, São Paulo, Thomson Reuters Brasil, 2019.
20
MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. MITIDIERO, Daniel, Código de Processo Civil
Comentado [livro eletrônico], 4. ed, São Paulo, Thomson Reuters Brasil, 2019.
21
NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade, Código de Processo Civil Comentado [livro
eletrônico], 4. ed, São Paulo, Thomson Reuters Brasil, 2019.
22
“Ao prever a possibilidade de julgamento imediato de parcela do mérito, o Código atual quebrou com o
dogma da unidade e da unicidade do julgamento da causa – que se encontrava à base da estruturação do
procedimento comum do direito anterior. Com isso, viabiliza não só a tutela definitiva da parcela
incontroversa da demanda como efetivo julgamento da causa, mas também amplia a possibilidade de cisão
do julgamento do mérito para todas as hipóteses em que não seja necessária prova diversa daquela já
colhida para elucidação de parte do mérito.” (MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz.
MITIDIERO, Daniel, Código de Processo Civil Comentado [livro eletrônico], 4. ed, São Paulo, Thomson
Reuters Brasil, 2019.)

566 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


A Massificação dos Processos no Direito Brasileiro e os Instrumentos de Contenção Inseridos pelo Ordenamento...

foi definido um conjunto de decisões judiciais vinculantes, com o escopo de restau-


rar a unidade do direito, salvaguardando os valores constitucionais da segurança
jurídica, isonomia e efetividade da prestação jurisdicional, buscando, na mesma
medida, desafogar o Poder Judiciário.
Desta feita, os juízes e tribunais, ao firmar sua interpretação a respeito de de-
terminada questão jurídica, têm o poder-dever de promover a unidade do sistema de
direito, concedendo aos casos idênticos o mesmo tratamento conferido anteriormen-
te, sob pena de flagrante violação à segurança jurídica e à igualdade, excetuada a
hipótese de comprovada situação diversa, seja ela fática ou jurídica.
O art. 926 do CPC/15, nessa esteira principiológica, determina que os tribu-
nais devem uniformizar sua jurisprudência e mantê-la estável, íntegra e coerente.
Ademais, conjuga a necessidade de uniformização do direito com a utilização de
mecanismos já consolidados, tais como as decisões oriundas de controle concentrado
de constitucionalidade e as Súmulas Vinculantes, somados à reformulação de meca-
nismos anteriormente previstos, os Recursos Extraordinários e Especiais repetitivos
(arts. 1.036 a 1.041), além da criação de novos instrumentos, o Incidente de Assun-
ção de Competência (art. 947) e o Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
(arts. 976 a 987).
Desta feita, por meio de uma estrutura coerente e hierarquizada, os juízes e
tribunais deverão observar: a) as decisões do Supremo Tribunal Federal em controle
concentrado de constitucionalidade; b) os enunciados de Súmula Vinculante; c) os
acórdãos em Incidente de Assunção de Competência ou de Resolução de Demandas
Repetitivas e em julgamento de Recurso Extraordinário e Especial repetitivos; d) os
enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional e
do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional; e e) a orientação do
plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados.
O legislador determina ainda, a edição de súmulas de jurisprudência domi-
nante pelos tribunais (art. 926, § 1.º), as quais deverão ser respeitadas pelos juízes de
primeiro grau vinculados ao tribunal e por este próprio, devendo a edição de enunci-
ados pautar-se em circunstâncias fáticas dos precedentes que motivaram sua criação.
O CPC/2015 também faz alusão à possibilidade de modificação do preceden-
te em seu art. 927, §§3.º e 4.º, os quais dispõem, respectivamente: “Na hipótese de
alteração de jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal e dos tribu-
nais superiores ou daquela oriunda de julgamento de casos repetitivos, pode haver
modulação dos efeitos da alteração no interesse social e no da segurança jurídica”
e “A modificação de enunciado de súmula, de jurisprudência pacificada ou de tese
adotada em julgamento de casos repetitivos observará a necessidade de fundamen-
tação adequada e específica, considerando os princípios da segurança jurídica, da
proteção da confiança e da isonomia”.
Nessa esteira, importante destacar que o sistema de precedentes não se preo-
cupa tão somente com a uniformidade e estabilidade do direito, mas também com a
sua atualização e aprimoramento, permitindo a utilização de instrumentos que possi-

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 567


Daniel Willian Granado / Fernando Rey Cota Filho

bilitam que o sistema jurídico se adapte às novas realidades, haja vista a dinamicida-
de da sociedade.
3.6 O Incidente de Assunção de Competência e o Incidente de Resolução de
Demandas Repetitivas
O sistema de precedentes delineado no tópico supra inseriu novos instrumen-
tos à dinâmica processual civil, quais sejam o Incidente de Assunção de Competên-
cia e o Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas, instituídos nos arts. 947 e
976, respectivamente.
O Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas tem por finalidade evitar
a insegurança jurídica no trato de demandas que possuam idênticas questões de
direito, na hipótese de haver o potencial de massificação daquela causa com ofensa
ao princípio da isonomia23. O Incidente de Assunção de Competência, por sua vez,
ocorre quando o julgamento do recurso, de remessa necessária ou de processo de
competência originária, envolver relevante questão de direito, com grande repercus-
são social, contudo, sem a repetição em múltiplos processos.
O objetivo do Incidente de Assunção de Competência é prevenir ou dirimir
controvérsia a respeito da matéria de grande relevância e orientar os membros do
tribunal e os juízes a ele submetidos mediante a formação de precedente ou jurispru-
dência vinculante (arts. 927, III, e 947, § 3.º). No entanto, se a questão apresentar
múltipla repetição, o incidente adequado é o de resolução de demandas repetitivas,
bem como a adoção da técnica de julgamento dos Recursos Extraordinário ou Espe-
cial repetitivos (arts. 1.036 a 1.041).
No que tange ao Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas, na prática,
ao se deparar com uma repetição de casos sobre um mesmo fato, havendo similitude
também na questão de direito, busca-se evitar decisões conflitantes, prestigiando a
isonomia e segurança jurídica, cabendo a aplicação do incidente. Assim será esco-
lhido, dentre os processos, aquele que servirá de base para análise da situação jurídi-
ca e julgamento da causa. A causa jurídica será julgada e fixará entendimento a ser
seguido pelos demais órgãos e juízos de hierarquia inferior, curvando-se, portanto,
ao princípio da isonomia e segurança jurídica.
A intenção de aludido incidente reside fortemente em garantir ao jurisdicio-
nado isonomia no tratamento do conflito de interesses levado ao Poder Judiciário e,
além disso, acena, inclusive, no âmbito extrajudicial de como os Tribunais tratam
determinada matéria, devendo seguir de norte para a pauta de conduta, a fim de
evitar a ocorrência de conflito de interesses no âmbito sociológico.

23
“O incidente de resolução de demandas repetitivas será́ instaurado no curso de um processo individual que
verse sobre controvérsia com potencial de gerar relevante multiplicação de processos fundados em idêntica
questão de direito e de causar grave insegurança jurídica diante da possibilidade de coexistência de decisões
antagônicas.” (CASTRO MENDES, Aluísio Gonçalves de; e Rodrigues, Roberto de Aragão Ribeiro,
Reflexões sobre o Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas previsto no projeto de novo Código de
Processo Civil in Revista de Processo, vol. 211/2012, p. 191 – 207, Set/2012.)

568 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


A Massificação dos Processos no Direito Brasileiro e os Instrumentos de Contenção Inseridos pelo Ordenamento...

3.7 A Vetada Conversão de Ações Individuais em Coletivas


O art. 333 do projeto do Código de Processo Civil trazia como novidade a
possibilidade de conversão de uma demanda individual em demanda coletiva, con-
tudo, o aludido dispositivo foi objeto de veto presidencial. Não obstante, cabe tecer
algumas considerações a respeito do instituto, na medida em que estabelecia um
incidente de coletivização, no qual o polo ativo da ação individual passaria a ser
integrado por um dos legitimados a ajuizar Ação Civil Pública, litigando em defesa
não somente do direito do originário, mas em prol de toda a coletividade inserida
naquele contexto.
Na prática, caberia ao magistrado converter a ação individual em coletiva,
mediante requerimento formulado por um dos arrolados no art. 82, do Código de
Defesa do Consumidor, caso o objeto da lide se enquadrasse em hipóteses específi-
cas. Vale dizer, a transformação da demanda individual dependeria dos limites da
causa de pedir e do pedido formulados, na medida em que ao juiz caberia aferir se a
ofensa atingia também a esfera da coletividade.
Na hipótese de não ter sido vetada, a coletivização de demandas que versas-
sem direitos individuais homogêneos representaria um grande avanço rumo à desa-
celeração da massificação das demandas individuais, complementando todos os
outros institutos jurídicos outrora apresentados, consolidando-se como um importan-
te instrumento para a celeridade processual. Contudo, o veto prevaleceu e em suas
razões, restou firmado que o instituto poderia ocasionar a “conversão de ação indivi-
dual em coletiva de maneira pouco criteriosa”, considerando, ainda que o “novo
Código já contempla mecanismos para tratar de demandas repetitivas”24.
3.8 A Fiscalização, pelas Agências Reguladoras, da Aplicação de Precedentes
(art. 985, § 2º e art. 1040, IV, CPC/15)
Os arts. 985, §2.º e 1.040, IV, do CPC/15 inseriram nova atribuição às Agên-
cias Reguladoras, no tocante à fiscalização da aplicação de teses advindas dos Inci-
dentes de Resolução de Demandas Repetitivas e do julgamento dos Recursos Extra-
ordinário e Especial repetitivos, em matéria de prestação de serviço público.
Desta feita, o art. 985, §2.º determina que julgado o Incidente de Resolução
de Demandas Repetitivas, se o incidente tiver por objeto questão relativa à prestação
de serviço concedido, permitido ou autorizado, o resultado do julgamento será co-
municado ao órgão, ao ente ou à Agência Reguladora competente para fiscalização
da efetiva aplicação, por parte dos entes sujeitos a regulação, da tese adotada.
Na hipótese do art. 1.040, inc. IV25, resta assegurado que, com a publicação
do acórdão paradigma no julgamento de Recurso Extraordinário ou Especial repeti-

24
Disponível em: <https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2015/03/17/novo-codigo-de-processo-civil-
recebe-sete-vetos>, Acesso em: 14.05.2020,
25
“Sabe-se que um dos fatores da litigiosidade massiva no Brasil é o da falta de diálogos institucionais entre
os ‘poderes’ e entre os agentes responsáveis pela fiscalização do cumprimento de direitos”. (NUNES,
Dierle; BAHIA, Alexandre Melo Franco, Precedentes no CPC-2015: por uma compreensão

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 569


Daniel Willian Granado / Fernando Rey Cota Filho

tivo, se os recursos versarem sobre questão relativa à prestação de serviço público


objeto de concessão, permissão ou autorização, o resultado do julgamento será co-
municado ao órgão, ao ente ou à Agência Reguladora competente para fiscalização
da efetiva aplicação, por parte dos entes sujeitos à regulação da tese adotada.
Por conseguinte, o escopo das normas jurídicas em análise tem por objeto a
imperiosa necessidade de diálogo entre o Poder Judiciário e as Agências Regulado-
ras, tendo em vista, ainda, a litigância habitual em massa dos atores públicos, de
forma a possibilitar que determinadas questões de direito possam ser decididas em
âmbito administrativo interno das entidades fiscalizadoras, em consonância com o
sistema de precedentes.
3.9 A Sucumbência Recursal
O CPC/15 trouxe expressamente a possibilidade da sucumbência recursal em
seu art. 85, §1126, sendo um dos novos institutos concebidos pelo atual diploma
processual civil, uma vez que no CPC/73, a esfera recursal não proporcionava novo
direito a honorários sucumbenciais.
A sucumbência recursal, da mesma forma que a condenação de honorários
advocatícios em ação originária, é decorrente do Princípio da Causalidade27, é dizer,
aquele que der causa a uma análise recursal, por meio da interposição de um recurso,
deverá arcar com a majoração dos honorários advocatícios, haja vista o acréscimo
das custas e demais despesas advindas de um novo julgamento.
Deste modo, o art. 85, §11 determina que “a sentença condenará o vencido a
pagar honorários ao advogado do vencedor”, sendo que “o tribunal, ao julgar re-
curso, majorará os honorários fixados anteriormente levando em conta o trabalho
adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos
§§ 2º a 6º, sendo vedado ao tribunal, no cômputo geral da fixação de honorários
devidos ao advogado do vencedor, ultrapassar os respectivos limites estabelecidos
nos §§ 2º e 3º para a fase de conhecimento”. Vale destacar, os §§ 2.º a 6.º do dispo-

constitucionalmente adequada do seu uso no Brasil In FREIRE, Alexandre; BARROS, Lucas Buril de
Macedo; PEIXOTO, Ravi. Coletânea Novo CPC: Doutrina Selecionada, Salvador: Juspodivm, 2015, p.
2.340.)
26
“O legislador criou verdadeira regra impositiva, regulamentando nova verba honorária, que não pode ser
confundida com a fixada em primeiro grau, mas com ela cumulada, tendo em vista o trabalho adicional do
advogado no segundo grau de jurisdição e nos tribunais superiores” (Superior Tribunal de Justiça, 3ª Turma.
AgInt no AREsp 370.579/RJ, Rel. Min. João Otávio de Noronha, j. 23.06.2016, DJe 30.06.2016.)
27
“A condenação pelas custas, despesas processuais e honorários advocatícios deve recair sobre quem deu
causa à ação. Se o réu deu causa à propositura da ação, mesmo que o autor saia vencido, pode o réu ter de
responder pelas verbas de sucumbência. Aplica-se o princípio da causalidade para repartir as despesas e
custas do processo entre as partes. O processo não pode causar dano àquele que tinha razão para o instaurar.
Nesta matéria, o princípio da razoabilidade reza que tanto é vencido em parte quem não ganhou parte do
que pediu, quanto é vencedor em parte quem não foi condenado no todo pedido.” (NERY JUNIOR,
Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil Comentado [livro eletrônico], 4. ed, São
Paulo, Thomson Reuters Brasil, 2019.)

570 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


A Massificação dos Processos no Direito Brasileiro e os Instrumentos de Contenção Inseridos pelo Ordenamento...

sitivo em comento, que determinam os critérios para fixação dos honorários na de-
manda originária, com a determinação de limites máximos e mínimos.
Precipuamente, a possibilidade da sucumbência recursal tem por escopo ini-
bir a interposição de recursos notoriamente protelatórios, levando em consideração a
razoável duração dos processos e o seu custo efetivo, visando combater, por conse-
guinte, a eternização das demandas no judiciário brasileiro, em busca de uma melhor
e mais efetiva prestação jurisdicional.
3.10 A Concessão de Maiores Poderes ao Relator no art. 932 do CPC/15
O Relator atua como o condutor do processo no tribunal, seja no caso de re-
cursos ou ações de competência originária, atuando por meio de atribuições de cará-
ter ordenatório, preparatório, instrutório e decisório. Considerando a notória morosi-
dade do julgamento de processos pelos tribunais, revelou-se cada vez mais necessá-
rio prestigiar a decisão monocrática do Relator, de modo a evitar a repetição de
recursos flagrantemente inadmissíveis e protelatórios ou que veiculassem teses jurí-
dicas já reiteradamente decididas pelas Cortes Superiores, desde que, contudo, não
se desprestigie a importância do julgamento colegiado, regra no sistema recursal
brasileiro.
Nessa esteira, ao art. 932 do CPC/15 coube a função de estruturar a atividade
do Relator de forma mais sistemática, sendo importante destacar, a título inicial, que
o rol não é exaustivo, haja vista que o seu próprio inc. VIII prevê que o Relator
também exercerá as atribuições expressas nos regimentos internos dos tribunais28.
Os incs. IV e V do dispositivo retro estabelecem hipóteses específicas e bem
delineadas de julgamento monocrático por parte do Relator, os chamados poderes
decisórios, afastando, especificadamente, a expressão genérica “súmula ou jurispru-
dência dominante”, prevista no antigo diploma. Para Teresa Arruda Alvim, os inci-
sos em comento vão ao encontro de uma grande tendência do Código de Processo
Civil atual, qual seja a criação de “condições para que se concretize de modo mais
pleno o princípio da isonomia, proporcionando condições e criando técnicas para
uniformização e estabilização da jurisprudência”29.
Ademais, aduz a autora que este “dispositivo prestigia súmulas, ainda que
não vinculantes, o que significa um estímulo a que os tribunais as redijam com

28
Para Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery, na prática, “pretende-se, com a aplicação da
providência prevista no texto ora analisado, a economia processual, com a facilitação do trâmite do recurso
no tribunal”, de modo que o Relator poderá “decidir monocraticamente tudo, desde a admissibilidade do
recurso até o seu próprio mérito, sempre sob controle do colegiado a que pertence, órgão competente para
decidir, de modo definitivo, sobre admissibilidade e mérito do recurso. (NERY JUNIOR, Nelson; NERY,
Rosa Maria de Andrade, Código de Processo Civil Comentado [livro eletrônico], 4. ed, São Paulo,
Thomson Reuters Brasil, 2019.)
29
Alvim, TERESA ARRUDA, et al. Primeiros Comentários ao Novo Código de Processo Civil [livro
eletrônico], São Paulo, Revista dos Tribunais, 2016.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 571


Daniel Willian Granado / Fernando Rey Cota Filho

muito mais responsabilidade, já que cientes da eficácia que podem ter”30. E, por
fim, em sentido contrário, “essa espécie de dispositivo acaba levando também a que
os tribunais fiquem inibidos de alterar bruscamente entendimentos consolidados e
sumulados”31.
Por conseguinte, o artigo em apreço acaba por dar especial relevância aos en-
tendimentos firmados no julgamento dos recursos especiais repetitivos pelos Tribu-
nais Superiores, bem como ao Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas ou
de Assunção de Competência, na medida em que estão em consonância com o sis-
tema de precedentes instituído pelo CPC/15.
3.11 A Barreira de Acesso aos Tribunais Superiores em Determinados Casos
Esculpidos em Lei (Art. 1030 do CPC/15)
A análise de um recurso pode comportar dois juízos fundamentais, o juízo de
admissibilidade, no qual são verificados os pressupostos genéricos recursais, quais
sejam, cabimento, interesse, legitimidade, preparo, tempestividade, regularidade
formal e inexistência de fato extintivo ou impeditivo do direito de recorrer, além dos
pressupostos específicos, como é o caso da repercussão geral da questão discutida,
no Recurso Extraordinário (art. 1.035, CPC/15) e o juízo de mérito, responsável pelo
julgamento efetivo da matéria discutida no recurso.
Com o advento da Lei 13.256/2016, entre outras alterações, o art. 1.030, res-
ponsável pela abolição do duplo juízo de admissibilidade nos Tribunais Superiores,
fora alterado para manter o juízo de admissibilidade no tribunal de origem e, ade-
mais, disciplinou-se de maneira pormenorizada as hipóteses de inadmissão monocrá-
tica dos recurso excepcionais, as quais representam verdadeiras barreiras de acesso
as instâncias superiores.
Deste modo, o Recurso Especial e o Recurso Extraordinário, antes de se diri-
girem ao Superior Tribunal de Justiça ou ao Supremo Tribunal Federal, respectiva-
mente, serão interpostos perante o juízo que prolatou a decisão recorrida, razão pela
qual ficará a cargo do presidente ou vice-presidente do Tribunal de Justiça ou Tribu-
nal Regional Federal proceder ao juízo prévio de admissibilidade32.

30
Alvim, TERESA ARRUDA, et al. Primeiros Comentários ao Novo Código de Processo Civil [livro
eletrônico], São Paulo, Revista dos Tribunais, 2016.
31
Alvim, TERESA ARRUDA, et al. Primeiros Comentários ao Novo Código de Processo Civil [livro
eletrônico], São Paulo, Revista dos Tribunais, 2016.
32
“A competência para o juízo de admissibilidade dos recursos é do órgão ad quem. Ao tribunal destinatário
cabe, portanto, o exame definitivo sobre a admissibilidade do recurso. Ocorre que, para facilitar os trâmites
procedimentais, em atendimento ao princípio da economia processual, o juízo de admissibilidade é
normalmente diferido ao juízo a quo para, num primeiro momento, decidir provisoriamente sobre a
admissibilidade do recurso [a regra mudou: CPC 1010 § 3.º]. De qualquer sorte, essa decisão do juízo a quo
poderá ser modificada pelo tribunal, a quem compete, definitivamente, proferir o juízo de admissibilidade
recursal, não se lhe podendo retirar essa competência.” (NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de
Andrade, Código de Processo Civil Comentado [livro eletrônico], 4. ed, São Paulo, Thomson Reuters
Brasil, 2019.)

572 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


A Massificação dos Processos no Direito Brasileiro e os Instrumentos de Contenção Inseridos pelo Ordenamento...

Ocorre, como mencionado anteriormente, que muitas das atribuições trazidas pe-
la Lei 13.256/16 configuram-se como efetivos obstáculos de acesso aos Tribunais Supe-
riores, uma vez que, para Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery, a negativa
do seguimento de um recurso, “significa proferir juízo negativo de admissibilidade, pois
tranca a via recursal e impede que o recurso seja julgado pelo mérito”33.
Desta feita, em primeiro lugar, o presidente ou vice-presidente do tribunal re-
corrido poderá negar seguimento, tendo em vista as decisões do Supremo Tribunal
Federal em matéria de repercussão geral, o qual, repita-se, constitui pressuposto
específico do Recurso Extraordinário. Assim, caso não seja reconhecida a repercus-
são geral de determinada questão constitucional pelo Supremo Tribunal Federal, o
Recurso Extraordinário que retrate a mesma questão de direito, terá seu seguimento
denegado monocraticamente.
Ato contínuo, em hipótese contrária, caso a decisão recorrida esteja em con-
formidade com o entendimento pacificado pelo Supremo Tribunal Federal em de-
terminada repercussão geral, o seguimento do Recurso Extraordinário também será
denegado, dada a supremacia da tese refletida na repercussão geral.
Na mesma esteira, caso seja verificado que o acórdão recorrido está em con-
formidade com o entendimento do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribu-
nal de Justiça exarado no regime de julgamento de recursos repetitivos dos arts.
1.036 e seguintes do CPC/2015, também será denegado seguimento ao Recurso
Extraordinário e Especial, respectivamente, haja vista que será constatado que o
tribunal de origem realizou a aplicação correta do precedente firmado no regime de
recursos repetitivos.
O art. 1.030 também prevê a hipótese do presidente ou vice-presidente do tri-
bunal de origem encaminhar o processo ao órgão julgador, a fim de realizar o juízo
de retratação, quando a decisão recorrida seja divergente do entendimento do Su-
premo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça no julgamento da reper-
cussão geral ou no julgamento dos recursos repetitivos, a fim de que o juízo a quo
realize as devidas adequações ao precedente firmado pelos Tribunais Superiores.
Por fim, o presidente ou vice-presidente do tribunal pode sobrestar o recurso
que verse sobre controvérsia de caráter repetitivo, ainda que não decidida pelo Su-
premo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça. No entanto, cabe des-
tacar que o sobrestamento somente será efetivo quando da escolha dos processos que
serão encaminhados para o Tribunal Superior para fins de afetação, conforme art.
1.036, §1.º, do CPC/2015.
É importante mencionar que qualquer das decisões supramencionadas, lastre-
adas em teses firmadas em regimes de repercussão geral e do julgamento dos recur-
sos repetitivos, implicam algum grau de paralisação do processamento do recurso
excepcional, seja por sua efetiva negativa de seguimento, agravável internamente,
seja pelo encaminhamento para juízo de retratação, ou, por fim, por meio do sobres-

33
NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade, Código de Processo Civil Comentado [livro
eletrônico], 4. ed, São Paulo, Thomson Reuters Brasil, 2019.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 573


Daniel Willian Granado / Fernando Rey Cota Filho

tamento do feito para eventual afetação no regime de julgamento dos recursos repe-
titivos, representando, em maior ou menor grau, entraves ao acesso do jurisdiciona-
do aos Tribunais Superiores.

4 CONCLUSÃO
Ainda que não seja uma questão eminentemente nova, a crise do judiciário
ainda é um assunto que suscita discussões das mais diversas ordens, sobretudo, obje-
tivando a criação e o fortalecimento de instrumentos legislativos que possam ameni-
zá-la. Destarte, o presente trabalho teve por escopo estudar o grave problema atinen-
te à proliferação de demandas que entopem o judiciário brasileiro, analisando o
desenvolvimento histórico da legislação processual civil e seus mecanismos para
redução dos processos, inclusive no âmbito dos Tribunais Superiores.
Decerto, muitas novidades foram instituídas a partir da promulgação da
Constituição Federal de 1988, desde a edição de instrumentos de contenção até a
criação de novos órgãos jurisdicionais. No entanto, os resultados, ainda que signifi-
cativos, não foram esplendorosos ante o atual estágio de litigância massiva. Contu-
do, os avanços foram melhor sedimentados com a promulgação do Código de Pro-
cesso Civil de 2015, que, sem dúvida nenhuma, constitui importante avanço na re-
dução da massificação de processos, haja vista a adoção de mecanismos processuais
que têm por escopo melhorar a efetividade das decisões judiciais e que auxiliam na
celeridade da prestação jurisdicional.
Com o objetivo de tornar o processo mais eficiente e rápido, o novel diploma
processual civil buscou atender em maior medida o princípio constitucional da razo-
ável duração do processo, haja vista que a eficiência da tutela jurisdicional somente
será preservada se resolvida em tempo hábil, razão pela qual deve ser coibido todo e
qualquer expediente protelatório ao resultado final, na medida em que ineficiente o
sistema processual, todo o ordenamento jurídico padecerá de real efetividade.
Destarte, à luz da ideologia da celeridade e da efetividade da prestação da
justiça, o CPC/2015 instituiu uma série de instrumentos, tais como a improcedência
liminar do pedido, a inversão do ônus probatório, a tutela provisória de evidência, a
decisão parcial de mérito, a sucumbência recursal e a concessão de maiores poderes
ao Relator, os quais têm por escopo evitar demandas judiciais eminentemente desne-
cessárias, protelatórias ou contrárias a entendimentos consolidados por tribunais
superiores.
Além disso, em prol do mesmo objetivo, foram estabelecidas ferramentas que
têm por escopo a uniformização do direito a partir da valorização dos precedentes,
para a promoção de um sistema que seja coerente e estável como um todo. Dente as
novidades, destacam-se os Incidentes de Assunção de Competência e o Incidente de
Resolução de Demandas Repetitivas, as barreiras de acesso aos Tribunais Superio-
res, além da fiscalização, pelas Agências Reguladoras, da aplicação de precedentes.
Os expedientes de uniformização de jurisprudência, somados a instrumentos
de indeferimento liminar e desestímulo à propositura de demanda, formam um arca-
bouço processual de grande valia para a diminuição de processos, de modo que o

574 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


A Massificação dos Processos no Direito Brasileiro e os Instrumentos de Contenção Inseridos pelo Ordenamento...

Poder Judiciário tem a possibilidade de acelerar o julgamento de ações em curso,


bem como descongestionar o estoque de processos, constituindo-se como um con-
junto que indubitavelmente trará celeridade ao processo judicial, desestimulando
meras aventuras judiciais e litigância de má-fé.
Nessa medida, o Relatório Justiça em Números, do Conselho Nacional de
Justiça, já vislumbra importantes avanços após a promulgação do diploma processual
civil, uma que vez concluiu pela redução dos casos pendentes, contrariando uma tendên-
cia observada nos últimos anos. É dizer, os atuais resultados indicam que o Poder Judici-
ário brasileiro está conseguindo vencer a barreira de julgar apenas o “número de ações
equivalentes às ingressadas, dando um salto de produtividade e avançando para a dimi-
nuição do estoque de processos”34.
O avanço se deve, em grande medida, às alterações legislativas, aqui considera-
das as de âmbito processual civil consolidadas pelo CPC/2015. Segundo os dados do
Conselho Nacional de Justiça, o ano de 2017 foi marcado “pelo primeiro ano da série
histórica em que se constatou freio no acervo, que vinha crescendo desde 2009 e se
manteve relativamente constante em 2017”35. Destarte, em 2018, pela primeira vez na
última década, “houve de fato redução no volume de casos pendentes, com queda de
quase um milhão de processos judiciais”36.
Ainda em 2018, é possível notar também um decréscimo nos casos novos, sendo
possível afirmar que a demanda pelos serviços de justiça ficou próxima ao patamar afe-
rido em 2012, em percentual inferior em 6,1% do que o ano de 201737. Ademais, durante
o ano de 2018, foram proferidas 32 milhões de sentenças e decisões terminativas, au-
mento de 939 mil casos (3%) em relação a 2017 e, em larga escala, considera-se um
crescimento acumulado de 36,% da produtividade em dez anos38.
Importa salientar que o CPC/2015 não está imune a críticas, no entanto, as
críticas não são suficientes para infirmar as vantagens práticas do aprimoramento
legislativo trazido pelo diploma processual civil na promoção da efetividade de
direitos. Nessa medida, uma técnica processual bem empregada, que atende às espe-
cificidades do direito material, é capaz de realizá-lo com mais precisão, constituin-
do-se como grande avanço para a efetividade da prestação jurisdicional e uma real
contribuição para a superação da cultura demandista e da massificação de processos.

34
JUSTIÇA, Conselho Nacional, Relatório Justiça em Números 2019: ano-base 2018, Brasília,
CNJ, 2019, p. 5.
35
JUSTIÇA, Conselho Nacional, Relatório Justiça em Números 2019: ano-base 2018, Brasília,
CNJ, 2019, p. 79.
36
JUSTIÇA, Conselho Nacional, Relatório Justiça em Números 2019: ano-base 2018, Brasília,
CNJ, 2019, p. 79.
37
JUSTIÇA, Conselho Nacional, Relatório Justiça em Números 2019: ano-base 2018, Brasília,
CNJ, 2019, p. 79.
38
JUSTIÇA, Conselho Nacional, Relatório Justiça em Números 2019: ano-base 2018, Brasília,
CNJ, 2019, p. 80.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 575


Daniel Willian Granado / Fernando Rey Cota Filho

5 REFERÊNCIAS
ANDERS, Eduardo Caminati (org.) et al, Comentários à nova lei de defesa da concorrência: Lei 12.529,
de 30.11.2011, São Paulo, Método, 2012.
ARENHART, Sérgio Cruz, A tutela de direitos individuais homogêneos e as demandas ressarcitórias
em pecúnia in Direito processual coletivo e o anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coleti-
vos, São Paulo, Revista dos Tribunais, 2007.
ARRUDA ALVIM, José Manoel de, Novo Contencioso Cível no CPC/2015, Revista dos Tribunais: São
Paulo, 2016.
CASTRO MENDES, Aluisio Gonçalves de; e Rodrigues, Roberto de Aragão Ribeiro, Reflexões sobre o
Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas previsto no projeto de novo Código de Processo Civil in
Revista de Processo, v. 211/2012, p. 191-207, Set/2012.
CRUZ E TUCCI, José Rogério. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2015-mar-17/paradoxo-corte-
veto-providencial-cpc, Acesso em: 12.02.2020.
JUSTIÇA, Conselho Nacional, Relatório Justiça em Números 2019: ano-base 2018, Brasília: CNJ, 2019.
______, 100 maiores litigantes 2012, Brasília: CNJ, 2012.
LIMA, Tiago Asfor Rocha, Precedentes judiciais civis no Brasil, São Paulo, Saraiva, 2013.
MANCUSO, Rodolfo de Camargo, Acesso à justiça: condicionantes legítimas e ilegítimas, São Paulo,
Revista dos Tribunais, 2011.
MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. MITIDIERO, Daniel, Código de Processo
Civil Comentado [livro eletrônico], 4. Ed, São Paulo, Thomson Reuters Brasil, 2019.
NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade, Código de Processo Civil Comentado [livro
eletrônico], 4. ed, São Paulo, Thomson Reuters Brasil, 2019.
NUNES, Dierle; BAHIA, Alexandre Melo Franco, Precedentes no CPC-2015: por uma compreensão
constitucionalmente adequada do seu uso no Brasil In FREIRE, Alexandre; BARROS, Lucas Buril de
Macedo; PEIXOTO, Ravi. Coletânea Novo CPC: Doutrina Selecionada, Salvador: Juspodivm, 2015. p.
2340.
SICA, Heitor Vitor Mendonça. Brevíssimas Reflexões sobre a evolução do tratamento da litigiosidade
repetitiva no ordenamento brasileiro, do CPC/1973 ao CPC/2015 in Doutrinas Essenciais – Novo Proces-
so Civil, v. 7/2018, Revista de Processo, v. 257/2016, p. 269 – 281, jul/2016.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, 3ª Turma, AgInt no AREsp 370.579/RJ, Rel. Min. João Otávio
de Noronha, j. 23.06.2016, DJe 30.06.2016.
TAVARES, André Ramos, Reforma do Judiciário no Brasil pós-88: (dês)estruturando a justiça: comen-
tários completos à EC n. 45/04, São Paulo, Saraiva, 2005.
ZAVASCKI, Teori Albino, Processo coletivo: tutela de direitos coletivos e tutela coletiva de direitos,
São Paulo, Revista dos Tribunais, 2006.
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim, et al. Primeiros Comentários ao Novo Código de Processo Civil
[livro eletrônico], São Paulo, Revista dos Tribunais, 2016.
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim, Súmula vinculante: figura do common law in Revista de Doutrina da
4ª Região, Porto Alegre, n. 44, out. 2011, Disponível em: <http://bdjur.stj.jus.br/dspace/han
dle/2011/42526> acesso em: 14.05.2020.
Disponível em: <https://www.cjf.jus.br/cjf/corregedoria-da-justica-federal/turma-nacional-de-uniformi
zacao/copy_of_atos-oficiais-1/res-586-2019.pdf>, Acesso em: 28.04.2020.

576 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


A Massificação dos Processos no Direito Brasileiro e os Instrumentos de Contenção Inseridos pelo Ordenamento...

LA PROPUESTA DE UNA LEY DE NAVEGACIÓN MARÍTIMA


EN BRASIL UN COMPARATIVO CON ARGENTINA
THE PROPOSAL OF A MARITIME NAVIGATION LAW IN
BRAZIL A COMPARATIVE WITH ARGENTINA
DOI: 10.19135/revista.consinter.00011.28
Recibido/Received 30.04.2019– Aprobado/Approved 7.07.2020
Eliana Aló da Silveira1– https://orcid.org/0000-0003-2644-4630
E-mail: ealo.advogados@ruben-eliana.com.br

Resumen: Esta investigación científica demuestra el origen y la evolución del transporte


y el inicio del sistema de logística. El trabajo tiene como objeto presentar la
conceptualización del sistema logístico. Se llevó a conocimiento la interferencia en los
contratos de los sujetos que trabajan en este campo de actividad y como sus relaciones
identifican las personas que actúan en este ramo de la actividad económica. Y cómo los
sistemas jurídicos de Brasil y Argentina los abordan y los disponen. Se ha demostrado
que el sistema normativo en Brasil, sin definición de las actuaciones de los agentes
marítimos de cargas, son un obstáculo en la necesaria seguridad jurídica en las
relaciones entre agente y transportista.
La metodología empleada considera que el derecho es interdisciplinario, dado que sigue,
como una misma y sus múltiples ramificaciones modelo de sociedad, por lo tanto sigue
esta investigación en un razonamiento jurídico lógico, inductivo, para encontrar
respuestas a las preguntas propuestas en esta investigación . El uso de un conjunto de
procedimientos y el uso de métodos científicos y legales cualitativos tales como, las
leyes, las costumbres, los tratados internacionales, la jurisprudencia sistemática, con el
objetivo de la presentación del caso presentado, de encontrar una solución al problema.
Así, para este trabajo, sigue la metodología descriptiva del tipo cualitativo, por medio
del análisis de un caso y la comparación de la jurisprudencia entre Brasil y Argentina, el
sistema legal y hermenéutica para probar la teoría presentada.
Palabras-clave: Logística del transporte internacional; Agente; Seguridad jurídica.
Abstract: This scientific research demonstrates the origin and evolution of transport and
the start of the logistics system. The purpose of the work is to present the
conceptualization of the logistics system. Interference was made to the contracts of the
subjects working in this field of activity and how their relationships identify the people
who act in this branch of economic activity. And how the legal systems of Brazil and
Argentina address them and dispose them. It has been shown that the regulatory system
in Brazil, without definition of the actions of maritime cargo agents, is an obstacle in the
necessary legal security in the relations between agent and carrier .

1
Advogada, Mestre e doutora. Graduada em direito pela Universidade Católica de Direito de Santos, em
1989. Mestre em Direito Internacional, pela Universidade Católica de Santos, em 2006. Doutora em Direito
Internacional, pela Universidad Argentina John F. Kennedy de Buenos Aires, em 2018. Sócia e
Administradora da sociedade de advogados Ruben José da Silva Andrade Viegas Eliana Aló da Silveira
Advogados Associados. E-mail: ealo.advogados@ruben-eliana.com.br

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 577


Eliana Aló da Silveira

The methodology used considers that the law is interdisciplinary, since it follows, as one
and its multiple model ramifications of society, therefore this investigation follows in a
logical, logical, inductive reasoning to find answers to the questions proposed in this
investigation. The use of a set of procedures and the use of qualitative scientific and
legal methods such as laws, customs, international treaties, systematic jurisprudence,
with the objective of presenting the case presented, to find a solution to the problem.
Thus, for this work, follow the descriptive methodology of the qualitative type, through
the analysis of a case and the comparison of jurisprudence between Brazil and
Argentina, the legal and hermeneutical system to prove the theory presented.
Keywords: Logistics of international transport; Agent; Legal security.
Sumario: 1. Introducción. 2. El derecho marítimo en brasil y la norma. 3. Derecho
logístico: concepto, introducción y elementos de la logística internacional. 4. El
ordenamiento jurídico en la relación entre transportador y agente de carga. 5. Seguridad
jurídica y agenciamiento de cargas. 6. Análisis de la seguridad jurídica en la teoría pura
de derecho de Hans Kelsen. 7. La imprevisibilidad de las decisiones judiciales. 8. El
derecho ante la subjetividad del magistrado y el ideal de justicia. 9. Propuesta para una
solución. 10. La actuación de los tribunales brasileños. 11. La legislación argentina y las
decisiones judiciales. 12. Conclusión.
Summary: 1. Introduction. 2. The brazilian maritime law and the norm. 3. Logistical
law: concept, introduction and elements of international logistics.4. The legal order in
the relationship between carrier and cargo agent. 5. Legal security and cargo agency.
6. Analysis of legal security in the pure theory of law of Hans Kelsen. 7. The
understanding of judicial decisions. 8. The right to the subjectivity of the magistrate and
the ideal of justice. 9. Proposal for a solution. 10. The action of the brazilian courts.
11. Argentine legislation and judicial decisions. 12. Conclusion.

1 INTRODUCCIÓN
Se ha establecido en la doctrina internacional que los contratos
internacionales, o sencillamente el acuerdo entre dos personas, sean ellas físicas o
jurídicas, son el elemento esencial y necesario para hacer viable el desarrollo y el
emprendimiento del comercio transfronterizo.
A través del contrato se detalla la operación para su ejecución, especificando
al máximo sus peculiaridades y se ofrecen elementos para la solución de toda y
cualquier controversia originada en esta etapa. En la práctica, la necesidad de
trasladar bienes y distribuirlos en varios puntos del mundo se hace más comúnmente
vía transporte marítimo, conforme enseña Guilherme Bergmann Borges Vieira
(2002, p. 14)2, “Se estima que el transporte marítimo es la modalidad utilizada en
más del 90% de las operaciones de comercio exterior en el mundo.” Por esta razón
este trabajo se limita exclusivamente a las cuestiones relativas al transporte
marítimo.
Las reglas que orientan este ramo de actividades se basan, en su gran
mayoría, en los usos y las costumbres. Las personas involucradas realizan por
escrito acuerdos formales en los cuales, sin embargo, no siempre están previstos
todos derechos y deberes básicos para las partes, bien como los términos y extensión

2
Transporte internacional de cargas, 2 ed., Aduaneras

578 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Propuesta de una Ley de Navegación Marítima en Brasil un Comparativo con Argentina

de la responsabilidad de cada involucrado, tal como suele pasar en contratos de otras


especies. Mientras tanto, la mayoría de las veces, lo que siempre ha predominado en
las relaciones contractuales de transporte son negociaciones, al principio por medio
de teléfono y actualmente por correo electrónico, que toman forma ya sea a través de
la emisión del conocimiento de embarque, más conocido por su denominación en
inglés “bill of lading, ya sea por medio de la carta de nombramiento, traducido del
inglés “appointment letter”.
La importancia social del tema está restringida a aquellos que actúan en este
ámbito del derecho. Sin embargo, una vez consolidado el presente estudio, consideró
que él podrá contribuir para la garantía de la seguridad jurídica en las relaciones
internacionales practicadas en el transporte marítimo y que tengan como destino
Brasil. Esta es una propuesta, cuyo objetivo es una nueva contribución en el campo
específico del derecho privado.
Esto porque, como ejemplo en un estudio de caso, en cuestiones procesales y
por orden práctico, muchas acciones de reparación de averías u otras, que
inicialmente deberían de ser interpuestas en contra del transportador, cuya sede y
bienes en su mayoría se encuentran en el extranjero, terminan siendo interpuestas en
contra de la agencia marítima.
La jurisprudencia brasileña, al principio pareció que se formaría en el sentido
de que, por tratarse del hecho de un tercero: armador o transportador y sobre el cual
el agente no ejerce ninguna injerencia, el agente marítimo o de carga estaría seguro
de no responder de acuerdo con los artículos 710 y siguientes del Código Civil, ello
así, dado en los cuales definen muy bien la actuación y responsabilidades del agente,
sea él de cualquier especie. No obstante eso, pese a estar basándose en el sentido de
justicia, algunos magistrados brasileños los han responsabilizado más allá de los
parámetros legales, lo que ha ocasionado una inestabilidad en las relaciones
económicas y comerciales entre las partes que actúan en el sector del transporte
entre fronteras.

2 EL DERECHO MARÍTIMO EN BRASIL Y LA NORMA


El derecho marítimo en Brasil se rige por la segunda parte del Código
Comercial de 1850. La primera parte del Código Comercial Brasileño ha sido
derogada, pero no la parte que regula el derecho marítimo, la cual técnicamente se
denomina Lex Mercatoria. Además de ella, el mismo se encuentra regido tanto por
normas dispersas, como por otras leyes ordinarias, decretos y tratados
internacionales, bien como por la práctica reiterada del mercado.
Así, todo un sistema no muy bien codificado permite, hasta cierto punto, la
regulación de las relaciones oriundas de la manipulación de carga y transporte de
personas por medio acuático, al igual que las relaciones resultantes de la utilización
de los puertos y aduanas, los cuales ya están regulados por resoluciones y leyes
específicas, denominados derecho portuario y aduanero. En general, las soluciones
de controversias se valen, necesariamente, del derecho procesal brasileño y del
arbitraje, siendo aún poco utilizado en el país este medio de solución entre las partes,
Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 579
Eliana Aló da Silveira

sin la intervención del Poder Judicial. Por lo tanto, actualmente en Brasil el derecho
marítimo consiste en un área extensa y de gran actividad, que se hace cada vez más
compleja por necesitar una debida codificación.
En Brasil, el Decreto 19.473 del 10 de diciembre 1930, regula los
conocimientos de transporte de mercancías por tierra, agua y aire.
Este decreto constituye el estatuto reglamentar de los conocimientos de
transporte hasta su revocación, sin cualquier criterio o fundamento, por el Decreto
000, de 26 de abril 1989, en el gobierno del presidente de la república Fernando Collor.
Esta decisión está basada sencillamente en el hecho de determinar genéricamente que se
deberían revocar todos los decretos anteriores, con el argumento de que serían “leyes
viejas”, sin embargo, aun se aplica el mencionado decreto bajo el fundamento jurídico y
de derecho admitido, ante la inexistencia de otro dispositivo legal que lo sustituya,
además del hecho que las normas con fuerza de ley ordinaria no su pueden
revocarlas solo a través de un decreto ejecutivo.
La Ley N. 556, de junio de 1850, crió el Código Comercial Brasileiro que,
en su segunda parte, trata del Comercio Marítimo y en esta, a su vez, en el
Capítulo II, de los conocimientos, regula y disciplina su emisión, tal como
previsto en los artículos 575 a 589.

3 DERECHO LOGÍSTICO: CONCEPTO, INTRODUCCIÓN Y


ELEMENTOS DE LA LOGÍSTICA INTERNACIONAL
Se puede hacer el transporte de productos de diversos modos: marítimo,
vial, ferroviario y aeroespacial. La elección depende del tipo de mercancía a se
transportar, de las características de la carga, de la urgencia y, sobretodo, de los
costos.
La característica de la carga define el tipo de transporte que se empleará.
Para la carga a granel, se utiliza una carrocería granelera y no un camión de carga.
Solo se puede transportar la carga líquida en un camión tanque. Estas
modalidades, entre otras, son variables y hacen parte de la estructura logística.
Pero al fin y al cabo qué significa la “Logística”, término que empezó a
difundirse hace más o menos dos décadas y que se lo emplea para las más diversas
manifestaciones de actividades y organizaciones cuotidianas de la humanidad.
Por fin, logística ya existía desde los tiempos bíblicos, utilizada por los
líderes militares para referirse a la preparación de las guerras, una vez que ellas
eran duraderas y ni siempre en las proximidades de los asentamientos humanos.
Por ende, se hacían grandes desplazamientos de un sitio a otro, además de exigir
que las tropas cargaran todo lo que iban a necesitar. Participaban de la logística los
grandes grupos de soldados para que los carros de guerra llegaran, y transportaban
armamentos pesados a los campos de batalla, por lo tanto se demandaba una
organización logística muy compleja. Involucraba la preparación de los soldados,
el transporte, el almacenamiento y la distribución de alimentos, munición y armas,
entre otras actividades.

580 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Propuesta de una Ley de Navegación Marítima en Brasil un Comparativo con Argentina

En los años 90, debido al proceso de globalización de la economía mundial y


el consecuente aumento de la competitividad, combinado con los avances en las
telecomunicaciones, la industria y el comercio pasan a considerar todo el mercado
mundial como proveedores y clientes, los mayoristas disminuyen el stock de
productos y giran más mercancías.
Entonces la industria pasó a adoptar la logística en su modelo organizacional
para mejor administrar los costos de materia prima, productos, transportes,
producción, stocks y plazos de entrega.
Así, el concepto de logística pasó a designar todo el conjunto de actividades
orientadas a agregar valor, optimizando el flujo de materiales desde la fuente
productora hasta el consumidor final, asegurando el suministro en la cantidad cierta
y de modo adecuado, en el menor tiempo posible con el fin de satisfacer las
necesidades del cliente.
Por estar intrínsecamente relacionada a la calidad, se verificó que en la
definición de las estrategias logísticas exitosas, era imprescindible planificar la
atención permanente de las necesidades de los clientes, tanto en la producción de los
bienes cuanto en la prestación de servicios. Por esto se hizo necesario prever la
ejecución del servicio de logística a través de los contratos o de los términos de
condiciones generales.
En el ámbito de las ventas internacionales, son diversos los factores que
componen el costo final de las operaciones, así tales factores pasan por un proceso
de racionalización con el fin de obtener precios competitivos capaces de enfrentar
las disputas en el mercado. Uno de los aspectos fundamentales son las propias
modalidades de compra y venta reconocidas internacionalmente y dictadas por la
Cámara de Comercio Internacional – los Incoterms3 pues su elección determinará las
responsabilidades sobre los gastos de flete, seguro, manipulación, desembargo aduanero
entre el Exportador y el Importador.
Se considera entonces que el comercio internacional demanda un conocimiento
de una extensa gama de legislaciones en constante mutación, procedimientos
operacionales diversificados, además de la necesidad de coordinación entre las diferentes
fases del proceso, la tendencia actual es la tercerización del proceso, delegando a las
empresas especializadas la conducción de los procedimientos logísticos que ejecutarán
diligentemente el conjunto de las operaciones caso por caso.
Brasil ofrece un amplio servicio en el área, pero carece de un sistema normativo-
hermenéutico adecuado para la fluidez de sus relaciones. En realidad el país está
enfrentando muchas dificultades que no se resumen a las cuestiones legales que
aseguran las relaciones jurídicas privadas, una vez que la propia falta de

3
Los INCOTERMS son reglas utilizadas en los contratos internacionales de comercio cuyo objetivo es
armonizar los negocios internacionales, proporcionando a las partes una mayor solidez en la relación a los
obstáculos de las relaciones comerciales. de compra y venta en el comercio internacional, y no se las puede
confundir con las relaciones establecidas en el contrato de transporte marítimo. Esto debido a que en el
primer contrato la relación se restringe al comprador y el vendedor, y posteriormente entre el exportador
(que puede o no ser el vendedor) y el transportador.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 581


Eliana Aló da Silveira

infraestructura relativa a las operaciones de exportación e importación ya son


motivos de gran preocupación, tales como puertos competitivos, malla viaria y
ferroviaria adecuadas, bienes de capital y máquinas diversificados, vehículos, etc.
Sobre todo los que operan en este medio están ansiosos por un ordenamiento
que viabilice sus operaciones. El éxito de la circulación de servicios, capitales y
bienes, sobretodo mercancías, debido a la propia naturaleza de su movilidad, exige
criterios abiertos y flexibles, tal como el ordenamiento que rige el tránsito de las
mercancías dentro del país, a través de un solo contrato para los diversos modales.
Además, para que toda operación logística se concrete es necesario que en el
contrato de transporte estén incluidos los agentes de carga, que nada más son que los
representantes de los transportadores, acreditados y autorizados ante las entidades
competentes para que se cumpla la actividad fin del transporte internacional de
mercaderías.

4 EL ORDENAMIENTO JURÍDICO EN LA RELACIÓN ENTRE


TRANSPORTADOR Y AGENTE DE CARGA
Con el crecimiento en escala global del volumen de la producción de bienes y
servicios, surge la necesidad del empresario en actuar más allá de los límites físicos
de su establecimiento, para una mejor ubicación de sus mercancías. En el principio,
se hacía tal captación a través de las figuras de los viajantes o representantes,
empleados que actuando en la búsqueda de clientes en otros sitios, y por lo tanto
alejados de la sede del establecimiento comercial, siguen vinculados al personal
permanente de la empresa a través de la subordinación oriunda del contrato de
trabajo.
Considerando que el comercio internacional se basa de modo recíproco en el
transporte marítimo de mercancías, es evidente que esto es insuficiente a las
empresas que actúan en el segmento esta vieja forma de actuación,
consecuentemente surgen nuevas entidades contractuales, quienes son exigidos por
el empresario para la obtención de colaboración en la fluidez de sus productos y/o
servicios.
En este contexto, caracterizado por el claro objetivo de expandir sus negocios
y facilitar la captación de nuevos clientes, surge la figura de la agencia marítima,
empresa que tiene por finalidad ejercer la representatividad del armador en una
determinada localidad. En síntesis, ante la condición de colaborar en la navegación,
su función es auxiliar la empresa armadora en las tareas de armación y del transporte
marítimo4, en este rol de actividades se destaca la captación de carga para espacios
disponibles en el buque (slot charters) y el control de las operaciones portuarias de
carga y descarga.
Obvio inferir que la actividad ejercida por el agente marítimo es muy
compleja e involucra diversas prestaciones disciplinadas por variadas figuras
contractuales, una vez que el contrato firmado entre armador y agencia suele incluir
4
Ob. Citada Anjos y Gomes (1991, p. 21).

582 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Propuesta de una Ley de Navegación Marítima en Brasil un Comparativo con Argentina

tareas de administración del buque, su propia representación y la del armador ante


las autoridades portuarias y gubernamental, además de la atención directa a los
clientes.
De esta presunta confusión conceptual nace la discusión sobre la naturaleza
jurídica del contrato firmado entre la armadora y la agencia marítima. Aunque
parte sustancial de la doctrina conceptúe el agente marítimo como un mandatario
del armador, hay aun entendimientos jurisprudenciales que abogan en el sentido
inverso, considerando la figura del agente en la modalidad específica del contrato
de agencia, tipificado y disciplinado en los artículos 710 y siguientes del nuevo
Código Civil.
Así se establece una paradoja: ¿Cuál es la naturaleza de la actividad
ejercida por el agente marítimo? ¿Se trata de un agente, bajo la concepción de la
nueva legislación civil? ¿O sería solo un mandatario? Además: ¿ Cuáles las
implicaciones de esta distinción en el análisis de responsabilidades? En ese ínterin,
importa evidenciar las breves consideraciones sobre la disciplina del contrato de
agencia bajo la égida del Código Civil de 2002.
De acuerdo con la nueva codificación, el contrato de agencia es aquel en el
cual una persona o agente asume, en régimen no eventual, y sin vínculos de
dependencia, la obligación de promover a cuenta de otra – el proponente o
proveedor – la realización de determinados negocios en una localidad mediante
una retribución.
Se puede deducir, por lo tanto, las siguientes características del contrato de
agencia: a) existencia de una relación entre empresarios, sin que haya entre ellos
una relación jerárquica, una vez que el representante actúa con autonomía en la
organización de su negocio y en la conducción de intermediación de los negocios
del empresario (aunque cumpla programas e instrucciones del proponente); b) el
contrato tiene como finalidad una práctica habitual y no eventual, estableciendo
entre las parte un vínculo duradero que no se astringe a un negocio aislado; c) la
representación implica actos promovidos por una de las partes a cuenta de otra, lo
que configura una intermediación en la práctica mercantil de interés del
representado; d) a la realización corresponde el derecho del representante de
percibir una remuneración, de modo a caracterizar el contrato de agencia como
bilateral, oneroso y conmutativo; e) se debe ejercitar la representación en los
límites de una zona determinada, siendo de responsabilidad del agente la práctica
de la intermediación dentro de un territorio estipulado por en el contrato o algo
que lo corresponda.
Por lo tanto, la actividad del agente en nombre y cuenta de su representado
es la intermediación, de forma autónoma, y en régimen profesional y no habitual
sin dependencia jerárquica, pero en consonancia con las instrucciones del
proponente (representado). Inconfundible pues con las figuras de mandatario, de
comisario, de empleado y del prestador de servicio en sentido estricto. El agente
presta un servicio especial, que es justamente lo de promover la colección de
propuestas o solicitaciones que se retransmitirán al representado.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 583


Eliana Aló da Silveira

Un punto importante presente en el párrafo único del art. 1º de la Ley


4.886/65 que, en el caso en que “la representación comercial incluya poderes
inherentes al mandato mercantil” “ – o sea, cuando se confieren poderes al
representante comercial relacionados a la ejecución de los negocios intermediados
– “se aplicarán en este ejercicio los preceptos propios de la legislación
comercial”. En otras palabras, el agente puede, en régimen de excepción, recibir
poderes que extrapolan la intermediación de órdenes, en general en la hipótesis
cuyo proponente le delega la práctica de actos de consecución o ejecución de los
negocios agenciados, lo que implicará la incidencia de las reglas del mandato
mercantil.
Así, independiente de la extensión de los poderes del agente, los negocios
por él intermediados o concluidos se perfeccionan directamente en el ámbito
jurídico del preponente y del tercer adquirente, y de ahí se infiere que, en la
conclusión de un negocio intermediado, el agente no es parte, una vez que en él no
está implicado en negocio jurídico de su parte sino un interés económico, ya que el
agente adquiere el derecho a la remuneración por el servicio prestado en la medida
en que los negocios se consuman por el proponente.
Esta flexibilidad relativa al alcance de las atribuciones del agente también
se verifica en el ejercicio de la actividad de la agencia marítima, una vez que el
agente marítimo podrá asumir para sí el mayor número posible de atribuciones y
realizar todos los trabajos necesarios a la atención del armador, o limitarse a actuar
como agente comercial u operacional, concentrándose en las tareas básicas de
captación de carga para los espacios del buque y el control de las operaciones
portuarias5.
Además de esto, no se puede ignorar que la práctica de la agencia es de
mandatario que detiene poderes otorgados por el mandante que le permiten
deliberar sobre el negocio y realizarlos en su nombre. Por otro lado, el agente se
limita a acercar el adquirente y proveedor, sin deliberar sobre el negocio.
Eventualmente, puede concluirlo por cuenta del proponente, pero esta posibilidad
desnaturaliza el contrato y lo hace muy complejo, esto implica la incidencia de
reglas correspondientes al mandato.
La característica esencial del contrato de agencia es la promoción, mediante
la remuneración ya mencionada, de contratos por cuenta del proponente, o sea,
negocios que se concluyan entre terceros y el proponente, o que sean concluidos
por el agente, aunque en nombre del representado. Se excluyen del ámbito de la
agencia todas las ventas o reventas promovidas por el agente a su nombre, una vez
que la operación se desarrolla y se consuma integralmente en nombre y por cuenta
del proponente.
Sin embargo, la jurisprudencia mayoritariamente se aleja de su
responsabilidad, sea en el ámbito civil, administrativo o fiscal, una vez que el
hecho es practicado por un tercero (la empresa armadora/transportadora) ante lo

5
ob citada. (2008: 325)

584 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Propuesta de una Ley de Navegación Marítima en Brasil un Comparativo con Argentina

cual no ejerce ninguna influencia. Los argumentos están basados en el hecho de


que el agente sea un mandatario del armador, o por tratarse de un agente en las
formas de los artículos 710 y siguientes del Código Civil.
En el juicio del REsp 225.820, el Ministro Franciulli Netto del Superior
Tribunal de Justicia, sin adentrar directamente en la polémica relación entre agente
marítimo y armador/transportador, alejó la responsabilidad del agente en la hipótesis
de infracción sanitaria cometida a borde del buque, tal entendimiento resultó en
otras decisiones en el mismo sentido6.
En una alusión a la Súmula (interpretación) del extinto Tribunal Federal de
Recursos (TFR)7, la Ministra Eliana Calmon también abogó por el alejamiento de
la responsabilidad del agente ante la recolección del impuesto de importación8.
En su conciso pero no menos brillante voto, la Ministra sigue un raciocinio
idéntico, alejando la responsabilidad tributaria del agente por absoluta ausencia de
amparo legal – justo por no estar en la categoría de contribuyente o responsable,
según los términos del art. 121, párrafo único e incisos del Código Civil – ,
todavía enfrenta, aunque superficialmente, la cuestión de la naturaleza de la
actividad ejercida por el agente marítimo.
Y hace una ponderación interesante: aunque se asocie al pensamiento de
que el agente no sea el mandatario del armador, se considera la hipótesis de su
responsabilización caso se acepte esta forma de representación cuando actúa con
exceso de poder o infracción a la ley o al contrato. Por fin, ante el contrato de
agencia bajo los términos del art. 721 se aplican complementariamente las reglas
correspondientes al mandato y a la comisión, de lo que se concluye que el agente
solo responde por actos practicados por exceso de poder, o sea, la actuación fuera
de los límites establecidos en el objeto del acuerdo, o por infracción al dispositivo
legal o contractual.

5 SEGURIDAD JURÍDICA Y AGENCIAMIENTO DE CARGAS


El agenciamiento se formaliza por actos propios y específicos de la práctica
en los puertos y entidades del género, que por esta peculiaridad puede generar
dudas hasta entre los que actúan en este seguimiento de actividad.
Un ejemplo de esta dubiedad, o sea, de que el contrato de agenciamiento se
formaliza por sus propios actos y su formación puede generar confusión entre las
propias partes que actúan en el transporte marítimo, como si hubiera un conflicto
de identidad de la propia parte. Esto está muy evidente en una acción judicial
juzgada por el Tribunal de Rio de Janeiro9.

6
En este sentido: STJ – RESP 826637-RS; AGRG NO RESP 584365-PE, RESP 784357-PR, RESP 170997-
SP.
7
“El agente marítimo, cuando en el ejercicio exclusivo de las atribuciones propias, no se considera
responsable fiscal, tampoco se equipara al transportador para efectos de Decreto-ley n. 37 de 1966”.
8
En este sentido: RESP 148683-SP; RESP 176932-SP
9
TJ-RJ – Apelação n. 0262352-27.2008.8.19.0001

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 585


Eliana Aló da Silveira

En la referida acción judicial, una agencia marítima de Santa Catarina


presentó una acción de indemnización contra una empresa de navegación con
quien tenía un contrato de agenciamento marítimo, debido a la resolución del
mencionado contrato.
Para la agencia marítima, autora de la acción, el demandado debería
indemnizar un valor correspondiente a 1/12 (doceava parte) sobre todas las
comisiones recibidas durante el contrato, apurado en liquidación, actualizado y
acrecido de interés. Tales comisiones, según la demandante, se refieren a la
actividad de representación comercial que tendría ejercido en favor de la
demandada a lo largo de casi 30 años de contrato, cuando había captado cargas
para la demandada.
La acción originariamente fue presentada ante el Judiciario de Santa
Catarina, pero en virtud del lugar tuvo su foro transferido para la Justicia del Rio
de Janeiro, por fuerza de las disposiciones contractuales.
Así, tras la instrucción del asunto pendiente de resolución, la Justicia de
Rio de Janeiro juzgó la acción improcedente por no contemplar la naturaleza de
una representación comercial dentro del contrato de agenciamiento marítimo
celebrado entre las partes. Disconforme, la demandante apeló al Tribunal de
Justicia de Rio de Janeiro10.
La apelación fue juzgada por la Segunda Cámara Cível (Sala de Recurso)
que, por unanimidad, negó la estimación al recurso de la agencia.
En su voto, el juez ponente subrayó que, como agente marítimo, la
demandante actuó como mandataria de la empresa de navegación, cumpliendo
funciones en la condición de agente protectora, o sea, cuando colabora con la
empresa de navegación en las actividades referentes a la armación del buque; y
aun en la condición de agente comercial, en la que bajo las orientaciones de la
empresa de navegación firmó conocimientos de transportes y contrató intereses de
la carga, no siendo posible, por lo tanto, considerar tal relación como de
representante comercial.
El referido voto comparó el contrato de representación comercial, definido
por la Ley n. 4.886/65, ejercido por el representante comercial, con lo de mandato
definido en el art. 653 del Código Civil, ejercido por el mandatario. De acuerdo
con la Ley, se clasifica un representante comercial como persona jurídica o
persona física sin relación laboral que realiza en carácter no eventual por cuenta
de una o más personas, la mediación para la realización de negocios mercantiles,
agenciando propuestas o pedidos para retransmitirlos a los representados,
practicando o no los actos relacionados con la ejecución de los negocios. Por otro
lado, el mandatario es quien recibe poderes de otro para a su nombre practicar
actos o administrar intereses.
El voto del juzgador refirió aun que en el contrato que constituyó la
sociedad, la demandante no incluye en sus objetivos sociales la actividad de

10
Idem.

586 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Propuesta de una Ley de Navegación Marítima en Brasil un Comparativo con Argentina

empresa de representación comercial y que no se encuentra registrada en el Consejo


de Clase de las empresas de representación comercial. Por fin, ella estaba
practicando actos de agente marítimo.
La referida decisión ha sido objeto de recursos extraordinarios por parte
de la demandante, los cuales se encuentran aun pendientes de juicio.

6 ANÁLISIS DE LA SEGURIDAD JURÍDICA EN LA TEORÍA PURA


DE DERECHO DE HANS KELSEN
Hans Kelsen, en su libro, Teoría pura del derecho, aborda el principio de
la seguridad jurídica al referirse sobre la creación y la interpretación del
derecho. Kelsen afirma que hay dos sistemas jurídicos, el del libre
descubrimiento del derecho, en el cual no hay una entidad legislativa central y
los tribunales deciden los casos concretos según su libre apreciación, y lo del
descubrimiento del derecho vinculado a la ley, en el cual la producción
legislativa está centralizada, reservada a una entidad legislativa.
Para el autor, el derecho consiste en un sistema de normas que regulan el
comportamiento humano. Con el término norma él quiere decir que algo debe
ser u ocurrir, que un hombre debe conducirse de una determinada manera.
La norma, al determinar la forma en la cual un individuo debe conducirse
permite que la sociedad tenga una noción, hasta cierto punto previsible y
calculable de la actuación de los individuos, o por lo menos confiere
organización a la sociedad permitiendo que se sepa perfectamente lo que el
individuo debe hacer o de que forma responderá caso se incumpla una norma, tal
como lo que se extrae de la obra de Kelsen, o sea, que la conducta humana está
reglada positivamente por un ordenamiento positivo, cuando a un individuo se
prescribe la realización o la omisión de un determinado acto.
Entonces el principio de seguridad jurídica tiene por objetivo asegurar la
estabilidad de las relaciones jurídicas, la cual se alcanzará a través de las leyes
promulgadas por el Estado que pretende el bien de los ciudadanos y el control de
la conducta social.
El principio de la seguridad jurídica es esencialmente el principio del
Estado de Derecho justo porque en esta orden jurídica la jurisdicción y
administración se someten a las normas establecidas por un poder central, tales
normas confieren a la sociedad una previsibilidad con respecto a la conducta que
los individuos deben seguir.
Además, y a modo de conclusión, el principio de la seguridad jurídica
consiste en una de las reglas constitucionales de mayor importancia, una vez que
el Estado Democrático de derecho solo puede existir cuando hay una
certidumbre irrefutable de la estabilidad de una cuestión.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 587


Eliana Aló da Silveira

7 LA IMPREVISIBILIDAD DE LAS DECISIONES JUDICIALES


Hay una realidad que se acentúa en Brasil y ha sido sentida por todas las
clases sociales, independiente de que participen de la clase del derecho, que es la
imprevisibilidad de las decisiones judiciales, la cual está sorprendiendo cada vez
más los profesionales abogados con el resultado de las demandas. Aunque algunos
lamenten o celebren el resultado de una demanda, el hecho es que se sorprenden
pues por su experiencia profesional, su conocimiento de la ley y de la jurisprudencia,
antes podían prever el resultado de un caso, pero lo que está pasando ahora es que
los casos semejantes se deciden de maneras distintas11.
La acentuada imprevisibilidad de las decisiones judiciales fortalece los males
provocados por la inseguridad jurídica y contribuye para debilitar el régimen
democrático, aun la imprevisibilidad de las decisiones judiciales, junto a la
morosidad en la solución de las demandas, pueden generar grandes perjuicios a la
estabilidad de la economía brasileña.
La ausencia de uniformidad de las decisiones judiciales, debido a la
inexistencia de causas jurídicas justificadoras para el cambio de entendimiento por
parte de los Tribunales Superiores y del Supremo Tribunal Federal genera
intranquilidad, convirtiéndose en la causa que aumenta los conflictos. Además de
ofender los principios elementales del derecho, el respecto a la dignidad humana, de
la valoración de la ciudadanía y de la estabilidad de las instituciones.
En este contexto de ideas, es necesario analizar el concepto de seguridad
jurídica, sus reflejos en las decisiones judiciales que solucionan conflictos.
Así, para que se comprenda bien la seguridad jurídica, es necesario también
examinarla como a) una garantía de previsibilidad de las decisiones judiciales; b)
una forma de asegurar las estabilidades de las relaciones sociales; c) la preservación
del fundamento jurídico de las decisiones; d) la privación al modo innovador de
pensar de los magistrados contrarios a un determinado sistema; e) establecer una
entidad fortalecedora de los precedentes jurisprudenciales vinculantes.
La consecuencia de esta concepción es que la previsibilidad jurídica siempre
será, no limitándose a esto, la de dar seguridad a las partes que recurren al judiciario
para dirimir cuestiones, bien como la seguridad en el ámbito extra judicial, cuando
ya se tiene conocimiento de la fundamentación jurídica para el caso en cuestión.
Otrosí, es cierto que la última consecuencia será la de asegurar las garantías
constitucionales, previstas en la ley magna del país.
Se concibe la seguridad como previsibilidad como un principio o un sobre
principio, una vez que es un presupuesto absolutamente necesario para la afirmación
de cualquier sistema jurídico en un Estado Democrático de Derecho.
Siguiendo la comprensión de la seguridad jurídica como principio es un
reflejo de la necesidad que el hombre tiene de conducir y planificar sus relaciones
jurídicas. Ella es un elemento que compone el Estado de Derecho, inspiradora de
11
Fábio Ulhôa Coelho, in “A Justiça desequilibrando a economia”, artigo publicado en Valor Econômico,
10.11.2006.

588 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Propuesta de una Ley de Navegación Marítima en Brasil un Comparativo con Argentina

confianza que el ciudadano siente al practicar cualquier acto jurídico de naturaleza


pública o privada.
Hay que mirar la seguridad jurídica como siendo un enunciado principista y
lógico con jerarquía superior, o sea, que contiene un valor que se debe aplicar de
modo absoluto para consagrar la fuerza del Derecho cuando vinculado a situaciones
concretas en conflicto y que exigen pronunciamientos administrativos, sobre todo
los judiciales que las estabilicen.
Así, por estas consideraciones se concluye que el principio de seguridad
jurídica es el principio que orienta el orden en las relaciones, no menos importante
que los principios de legalidad, de irretroactividad y de la igualdad y anterioridad.
Hay que considerar que la doctrina, aunque siempre se preocupa con los
efectos producidos por la seguridad jurídica, pasó a investigar más a este respecto,
justo porque observó el creciente número de decisiones judiciales distintas referentes
a la aplicación de diploma legal idéntico que incide sobre hechos iguales.
Esta es la razón determinante para que la doctrina se encuentre siempre
volviendo a la discusión de la importancia de la seguridad jurídica, insistiendo en
considerarla como un principio fundamental inspirador de conductas a ejercer por
parte de cualquier agente estatal, político o no, con el fin de que se convierta en el
máximo fortalecimiento de las líneas constitutivas del Estado Democrático de
Derecho previsto en la Constitución Federal de 1988.
Las preocupaciones que se afloran debido a la importancia que ellas tienen,
nos llevan a revisar algunos conceptos emitidos por consagrados autores sobre la
seguridad jurídica, en un intento de explicitar su función y valor en un Estado
Democrático de Derecho. Además, hay que considerar este principio como un
presupuesto para la construcción de cualquier orden jurídico de un Estado de
Derecho. Por lo tanto, es necesario poner esta magna directriz en su debido lugar, o
sea, en este eje sobre el cual gravitan todos demás principios.
El sistema ideal es el que está basado sobre un pilar del magno principio de la
seguridad jurídica. Los sistemas jurídicos en los verdaderos Estados de Derecho se
exprimen por las normas generales que, independiente de que estén expresamente
positivadas, deben ser obedecidas por las personas contempladas por el
ordenamiento jurídico. Entre estas normas generales, designadas de principios
generales de derecho, siempre despunta lo de la seguridad jurídica.
En esta línea de pensamiento afirma Aires F. Barreto(2005)12:

Independiente de lo que sea – principio o sobre principio – es necesario subrayar que


la primacía de la seguridad atraviesa e impregna el contenido de todos los demás
principios. La seguridad jurídica es la razón de ser de todos los demás vectores
prestigiados por la Constitución. De hecho, el principio de legalidad existe para que
se pueda tener seguridad jurídica. Idéntica es la razón de la existencia del principio

12
Barreto, F. Aires, in “Tributação e Conjuntura Nacional”, capítulo de su responsabilidad en la obra
colectiva “Segurança Jurídica na Tributação e Estado de Direito”, coordinación de Eurico Marcos Diniz de
Santi, NOESES e IBET, 2005, p. 4.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 589


Eliana Aló da Silveira

de igualdad; solo se habla de irretroactividad para prestigiar la seguridad jurídica,


solo se sabe cuidar para evitar el efecto de confiscación, para preservar la seguridad
jurídica; solo se prestigia el derecho de propiedad para asegurar la seguridad
jurídica.
Los vectores y directrices constitucionales se destinan a preservar la seguridad
jurídica. Emprestando una sentencia magistral de Souto Borges a propósito de la
directriz de la isonomía, en un intento de establecer una paráfrasis, es lícito afirmar
que 'la seguridad jurídica no está en la Constitución, la seguridad jurídica es la
propia Constitución'.
Con respecto al ámbito del Derecho Tributario, la Constitución no se satisface con la
inserción de los principios generales, le dedicando un cuidado especial. Juzgando
insuficientes los principios generales, otros bien específicos les fueron agregados y
puestos en un lugar especial, como el que resulta de una legalidad estricta, siempre
en el propósito final y bien demarcado por la realización de la seguridad jurídica, en
rigor la propia razón de la existencia del propio Derecho.
No es un exagero reiterar que en el ámbito del Derecho Tributario solo hay razón
para la anterioridad, de la 'noventena', de la irretroactividad entre otros, si
planteados bajo la égida de la realización de seguridad jurídica.

Por lo tanto, no hay que hablar en seguridad jurídica sino como un amparo final a
la proposición, para que de modo fundamentado, tras el análisis del derecho en todo su
contexto, se llegue a la única solución posible, en conformidad con todo el ordenamiento
jurídico.
Las expectativas normativas son efectivamente aseguradas y alcanzadas solo si se
conocen y se reducen las complejidades existentes a través de la interpretación, siendo
este el resultado del principio de la seguridad jurídica.
Definiciones de lo que sería derecho, norma, sistema, enunciados prescriptivos,
enunciados principio-lógicos y todo lo que sirve para la interpretación que se produce
por el aplicador del derecho asume una importancia medular en el camino recurrido para
la reducción de las complejidades existentes.
El jurista contemporáneo necesita aportar, independiente de su posición, al
ambiente de derecho (profesor, escritor, magistrado, miembro del Ministerio Público,
abogado, consultor, etc.) para que se aleja cualquier movimiento de debilitamiento del
principio de seguridad jurídica, con destaque para el de la modificación de la
jurisprudencia sin motivo justificado.
Aunque parezca que Brasil atraviesa una crisis por la no obediencia al paradigma
de la seguridad jurídica, no se puede alimentar tal circunstancia aislada con el fin de
aumentar la incertidumbre en la aplicación del derecho legislado.
Por lo tanto, es imperativo que todos los involucrados con la Ciencia Jurídica,
diseminen la idea de que la seguridad jurídica junto con la certeza del derecho, sean
valores fundamentales necesarios y que deben ser cultivados, para que la entrega de la
prestación jurisdiccional, que es un acto de Estado y perseguida por el ciudadano, sea
justa y solidificación de la paz entre los hombres y entre las instituciones de la Nación.
La seguridad jurídica representa confiabilidad en el sistema legal aplicado. Este
debe traducir la orden y la estabilidad basadas en el cumplimiento de los principios de

590 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Propuesta de una Ley de Navegación Marítima en Brasil un Comparativo con Argentina

igualdad, legalidad, moralidad y de la irretroactividad de las leyes, de respecto a los


derechos adquiridos, de la inexistencia de juicios parciales, de la no alteración
injustificada de la orientación jurisprudencial, de respecto a lo juzgado como
constitucional, al acto jurídico perfecto, a la concesión de amplia defensa y del
contradictorio, de la aplicación de justicia social, de la independencia del poder
judicial, de la valoración de los derechos de ciudadanía y dignidad humanas.

8 EL DERECHO ANTE LA SUBJETIVIDAD DEL MAGISTRADO Y EL


IDEAL DE JUSTICIA
El mundo jurídico es un universo de valores propios, basados en normas
jurídicas de sentido ni siempre obvio, pero comúnmente discutible. Tales valores
deben ser de la comprensión y de satisfactoria interpretación por parte operador
del Derecho, técnicamente capacitado como tal.
Particularmente dentro de la trilogía jurídica (abogado – juez – miembro
del Ministerio Público), el magistrado ejerce una función muy peculiar, pues a él
corresponde efectivamente la prestación de la tutela jurisdiccional del Estado. En
este contexto, no se trata de un mero funcionario del Estado sino uno de los
agentes responsables por la institucionalización democrática del Estado de
Derecho.
En efecto, la decisión de las entidades judiciales debe efectuarse en los
límites de su competencia otorgada por el Estado de Derecho y dentro de la
expresión de la voluntad de la soberanía popular. Así, se espera que el juez,
representante máximo del Poder Judicial, la resolución adecuada de los conflictos
que requieren la tutela jurisdiccional del Estado, lo que está asegurado por la
autonomía administrativa y funcional de sus integrantes. El propio Poder Judicial
se distingue, para el ejercicio efectivo de su función pública, de los demás poderes
que componen la tríada política del Estado, justamente debido a su característica
técnica, mientras los Poderes Legislativo y Ejecutivo son políticos en su esencia y
finalidad.
En Brasil, como se sabe, el Poder Judicial está compuesto por miembros
que le integran en función de prerrequisitos eminentemente técnicos, y
directamente relacionados al conocimiento jurídico.
El magistrado ejerce, como ninguna otra por ciertos miembros de la
Magistratura alcanza de forma inmediata las propuestas sociales que buscan, en el
seno del Poder Judicial, la satisfacción de los conflictos oriundos de las relaciones
humanas – tan comunes cuanto imperfectas en su esencia.
En relación a este problema Hans Kelsen13 extirpa toda y cualquier
influencia no-técnica y no-jurídica del Derecho, con el fin de demostrar la
necesidad de se obedecer al orden jurídico para asegurar la seguridad social.

13
KELSEN, Hans, O que é justiça? A justiça, o direito e a política no espelho da ciência, Martins Fontes,
1998, Trad. Luís Carlos Borges.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 591


Eliana Aló da Silveira

Para el positivista Hans Kelsen, y tal como está expuesto anteriormente, la


función del juez es administrar el Derecho, siempre buscando, pero no
necesariamente, promover la Justicia. Algunos críticos defienden que la función
del juez es meramente administrar a la ley tal como ella se expone, y que no le
correspondería alterarla o recrearla. Entonces su función sería “ius dicere” y no
“ius dare”.
Por otro lado, tal como expuesto en la conferencia del magistrado indiano
P. N. Bhaghwati en el Foro Mundial de Jueces14, hay los que rechazan
sumariamente esta postura dogmática y amoral, pues creen en la necesidad de se
considerar la promoción de la Justicia en el caso concreto:

Por lo tanto, es un deber de los jueces moldear y desarrollar la ley en la dirección


correcta, a través de su interpretación creativa, de modo que ella alcance su
objetivo social y su misión económica. Los jueces deben percibir que la ley
administrada por ellos debe convertirse en un instrumento poderoso para asegurar
justicia social a todos. Por justicia social, no me refiero a la limitada a pocos
afortunados sino a la contemplada por grandes extractos de desafortunados y
desprovistos, una ley que traiga una distribución igualitaria del material social y
de los recursos políticos de la comunidad.

El ideal de Justicia no se puede limitar a aristas técnicas e insensibles a los


anhelos sociales. Sin embargo, el juez no podrá extrapolar su competencia al
recorrer caminos alternativos al Derecho, y simultáneamente contrarios al
ordenamiento jurídico. Se ve pues una paradoja, he que aquí el magistrado está
atado a la ley, y así debe ser independiente del cuan perfecta o imperfecta, justa o
injusta sea la norma jurídica. Por lo tanto, estaría él sujeto a los equívocos
normativos de la entidad legislativa, pero en nombre de una seguridad jurídica y de
principios orientadores del Derecho, no pudiendo así alterarla o ignorarla aunque
convicto de su finalidad social.
Además, el propio sistema limita el poder de decisión de los jueces. Así
exempli gratia es en el artículo 4º de la Ley de Introducción al Código Civil, que
establece los principios según los cuales los magistrados deberían fundamentar sus
decisiones cuando no haya una ley que reglamenta la materia y, además, le obliga a
juzgar los casos aunque no haya una legislación específica sobre el tema, sea a
través de analogía, costumbres o principios generales del Derecho. De hecho, lo que
no puede pasar es el rechazo de la prestación de la tutela jurisdiccional con base en
la inexistencia u omisión legal, esto porque el Derecho está representado no solo por
el dispositivo legal sino también por el sistema consuetudinario.
Así, ante las limitaciones sistemáticas que le son impuestas, y de los
conflictos sociales e ideológicos propios del ejercicio de la función, el Juez debe
buscar y alcanzar su ideal de justicia respetando los principios fundamentales de un
14
BHAGHWATI P. N. Democratização de soluções e acesso à Justiça. in I FÓRUM MUNDIAL DE JUÍZES.
[Internet] [Capturado em 05.Abr.2002]:http://www.ajuris.org.br/fmundialj/Preview/artigo36.html (Porto
Alegre, 2002).

592 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Propuesta de una Ley de Navegación Marítima en Brasil un Comparativo con Argentina

Estado Democrático, con la garantía de la seguridad jurídica y de la promoción de la


justicia social, siempre que sea posible de modo de no agredir el orden jurídico
establecido.
Por fin, según la afirmación del ilustre magistrado indiano, P. N. Bhaghawati
necesitamos de leyes dinámicas y no estáticas, leyes que tengan su sostenimiento en
el pasado, pero que miren al futuro, leyes que estén listas para avanzar en un servicio
para la humanidad15.

9 PROPUESTA PARA UNA SOLUCIÓN


El área del derecho que normaliza las relaciones comerciales ha sido muy
discutida en Brasil, justo por las incertidumbres de las responsabilidades atribuidas a
las personas actúan en ella por falta de una ley más clara que las definan.
La cuestión de la responsabilidad del agente marítimo que ya desde hace
unos años se estableció en los tribunales argentinos.
Sin embargo, en Brasil esta cuestión sigue abierta, siguiendo el libre criterio
de los jueces y tribunales, mientras que la agencia reguladora y legislativa siguen sin
un criterio y sin interés político para normalizar la cuestión.
La regla general consolidada en Argentina para definir las actuaciones se
encuentra en la ley de navegación n. 20.094, que es la base legal que da a los
tribunales argentinos un precepto para mejor decidir las cuestiones de esta
naturaleza. En este país se respeta este reglamento.
En Brasil, es más que necesaria una ley ordinaria y nacional que defina las
personas, la actuación y las responsabilidades de los que actúan en el sector
marítimo privado.
Esto porque con el crecimiento del comercio exterior y sobretodo con las
facilidades de las importaciones en las últimas dos décadas, los tribunales brasileños
de un modo general pasaron a tener una gran demanda de acciones legales que
involucran cuestiones de este tema, y cuyas decisiones de los jueces están basadas
en otras leyes generales, por lo tanto, carecen de una directriz concreta, de lo que
resulta decisiones muy contradictorias.
Por esto los legisladores brasileños que intentan crear una ley actual para
regular las actividades de las personas que actúan en el área de la navegación
marítima podrían buscar un amparo no solo en el sistema de leyes internacionales
pero también y sobretodo en un sistema tradicional y equilibrado como es el
argentino, y así iniciar un proceso legislativo que tenga por objetivo definir
claramente las responsabilidades entre las personas que actúan en este sector de
actividad, en lugar de actuar solamente con el objetivo de atender al interés de un
determinado grupo económico, que es lo que parece suceder con los legisladores
brasileños.
15
Bhaghwati P. N. Democratização de soluções e acesso à Justiça. in I FÓRUM MUNDIAL DE JUÍZES.
[Internet] [Capturado em 05.Abr.2002]:http://www.ajuris.org.br/fmundialj/Preview/artigo36.html (Porto
Alegre, 2002)

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 593


Eliana Aló da Silveira

Los grupos que intentan elaborar la nueva ley comercial y marítima en


Brasil16 deberían ir más allá de los intereses políticos y económicos, y atenerse, en
primer lugar, a los principios elementales del derecho en el cual está basado el
sistema jurídico del país, añadiéndole el sentido de colectividad y unir los tres
pilares igualmente fundamentados en esta cadena de intereses: el social, el
económico y, por fin, el político.
La base de todo el sistema son los principios elementales del derecho y su
aplicación a la colectividad. Un sistema que comienza por el fin jamás será un
sistema justo y equilibrado. Un sistema legislativo que no se atiene a la clasificación
jurídica de cada parte involucrada, que no identifica claramente la importancia de las
partes involucradas y la relación jurídica entre ella no habrá creado una ley eficiente.
La búsqueda del equilibrio entre las relaciones y el impacto económico entre
las partes es que hace una ley eficiente y más próxima de permitir la aplicación de la
justicia. Sin embargo, una ley que atiende a los reclamos de la parte de un sector, sea
él económico, social o político sin buscar el conocimiento de los juristas está
condenada al fracaso, pues estará siempre sujeta a la adecuación de su eficacia
cuando llevada a los tribunales. Los jueces, a su vez, en ausencia de una norma
específica para el caso deciden aisladamente según sus propias convicciones. Esto,
infortunadamente, es cada vez más común en el sistema judicial brasileño. Tal como
es el caso de esta tesis, pues debido a la ausencia de una ley clara sobre la actuación
del agente marítimo, las cuestiones llevadas al judiciario se deciden simplemente
con el fundamento en la convicción personal del juez.
Son pocos los jueces de los tribunales brasileños que buscan en el principio
del derecho que estableció las relaciones entre los sujetos de la actividad marítima el
sentido para una mejor decisión de las acciones legales. En general esto es más
frecuente en los tribunales colegiados.
En particular, un caso en que se juzga una acción cuya discusión sea el
interés del transportador extranjero, en este acto obligatoriamente representado por
su agente marítimo y el interés de un particular, de empresa o persona, sería
necesario en primer lugar separar las partes, clasificarlas, para después analizar la
cuestión y juzgar el caso.
Si los jueces brasileños pudieran hacer esta clasificación y considerar que las
primeras agencias de navegación marítima surgieron hace más de un siglo, aun en el
tiempo de las carabelas y que el derecho que tenemos aun en Brasil viene de este
mismo periodo, quizás comprenderían mejor la actuación de los agentes, tal como
eran en este tiempo remoto, pues muy poco se alteró en su actuación. Hoy lo que
tenemos de diferente son nuevas personas y entidades pero todavía la forma de
actuar sigue siendo la misma. En aquel tiempo el capitán del buque era el
representante de los propietarios de los buques y quien les representaba en cada
puerto donde aportara.

16
Proyecto de Ley 1572 de 2011, www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposica
o=50884

594 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Propuesta de una Ley de Navegación Marítima en Brasil un Comparativo con Argentina

Con el avance del comercio marítimo internacional, los armadores sintieron


la necesidad de contratar representantes locales en los diversos puertos de cada país,
con el fin de que dieran soporte a la necesidad de los buques y cumplieran los
procedimientos burocráticos ante la aduana y las entidades locales. Así el
representante del armador se convirtió en una empresa, denominada agencia. El
agente marítimo, tal como su nombre ya lo explica, es un representante del
transportador, dueño o no del buque. Es por esto que las actividades de la agencia se
desarrollan según el contrato firmado entre ella y su representado, pero ni siempre
este es un contrato escrito y con cláusulas bien definidas, una vez que se puede
celebrar de modo verbal o por costumbre.
La representación del transportador por el agente en los puertos brasileños
ocurre por la presentación de un documento donde se indica el agente como
representante del transportista cuyo documento recibe el nombre de carta de apunte¡
Muy sencillo!

10 LA ACTUACIÓN DE LOS TRIBUNALES BRASILEÑOS


Uno de los mayores desafíos que los tribunales brasileños enfrentan y que
involucra las cuestiones de derecho marítimo privado es justamente la interpretación
de leyes antiguas. Así, los actuales jueces, al leer las leyes referidas al tema en
cuestión, en la intención de buscar amparo para la solución del caso sub judice,
acaban por encontrar muchas disparidades y aplican su propia interpretación
analógica al caso concreto.
Brasil adoptó el sistema romano-germánico cuyas bases están en los códigos
y en las leyes, o sea, no hay una regla que define la responsabilidad del agente
marítimo. El Tribunal Superior de Justicia se ha posicionado en algunas situaciones
específicas. Todavía, sobre este tema es posible encontrar entendimientos y
decisiones muy diversas y contrastantes.
En Brasil no hay un consenso, cada juez o tribunal decide según su propia
convicción, consecuentemente esto genera mucha inseguridad jurídica en las
acciones legales cuyos demandados son los agentes marítimos.
Hay acciones en las cuales el agente es excluido de la demanda o condenado
solidariamente o incluso condenado a responder solo por el acto de responsabilidad
exclusiva de su representado.
Hay acciones en las cuales el agente ya sea excluido de la demanda, ya sea
condenado solidariamente, o incluso condenado a responder solo por el acto de
responsabilidad exclusiva de su representado.
De acuerdo con el dispositivo de la ley17, por el contrato de agencia, una
persona actúa en nombre de otra. Así, si la ley define el agente como alguien que

17
artículo 710 del Código de Derecho Civil Brasileño: “Por contrato de agencia una persona asume,
en carácter no eventual y sin vínculos de dependencia, la obligación de promover, a cuenta de otra,
y mediante remuneración, la realización de determinados negocios y en área delimitada, y se encar-
ga de la distribución cuando el agente tenga a su disposición el objeto del negocio”.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 595


Eliana Aló da Silveira

actúa a cuenta y orden de tercero a través de un mandato, no hay sentido atribuir al


agente lo que es de responsabilidad exclusiva de su mandante. Cada uno responde
por los actos que generó, este es un principio básico del derecho. Responsabilizar
directamente el agente por un acto del representado es lo mismo que responsabilizar
al abogado por las obligaciones de su cliente, toda vez que este también tiene un
mandato y actúa a nombre y cuenta de su cliente, con poderes específicos o
generales. Lo que resulta más relevante aquí es que la actuación sucede siempre por
mandato.
Del mismo modo que no se cobra del abogado el pago de la condenación
atribuida a su cliente, también no se podría imputar al agente la responsabilidad por
el pago de la deuda de su representado, esto hiere los principios más elementales del
derecho en lo que dice respecto a la definición jurídica de un mandato. Obviamente
cada contrato solo obliga aquellos que lo han firmado.
En Brasil todavía no es así que los tribunales están decidiendo.
En el juzgado del REsp 246.107/SP7 se discutió la responsabilidad del agente
cuanto a la entrega del conocimiento de carga al comprador extranjero. El agente
que actuaba en nombre transportador se negó a entregar el conocimiento de
transporte al comprador en el puerto de destino. Así, la empresa que vendió los
productos no recibió el valor acordado en su contrato con el comprador. Por lo tanto,
ella inició una demanda indemnizatoria contra el transportador y su agente. El
tribunal de origen entendió que la responsabilidad del transportador y del agente era
solidaria toda vez que el agente no podría eximirse de su responsabilidad.
El Juez (Ministro) Ponente que inicialmente analizó la naturaleza jurídica del
contrato de agenciamiento marítimo concluyó que tal contrato equivalía al mandato
mercantil, en los términos del artículo 140 del Código Comercial. Se dispone a
continuación algunos extractos del voto:

(...) lo que se tiene en la agencia marítima es un mandato mercantil. En este último, el


mandatario actúa en nombre del mandante, y se vincula a estos actos (...) La
consecuencia inamovible de tal conclusión es la de que el mandatario, cuando actúa
en los límites del mandato, no tiene responsabilidad por los daños causados a
terceros, una vez que no actúa en su propio nombre sino en nombre y cuenta del
mandante. Por lo tanto, el único responsable ante terceros es el propio mandante.

Por esta decisión, se concluye que el agente no sería responsable por los actos
practicados en nombre de su mandante. Y luego complementa:

Así, es evidente que el agente marítimo, en la condición de mandatario mercantil del


armador (mandante), no se puede responsabilizar por los actos practicados por
solicitación del mandante cuando esté en los límites del contrato. Permitir tal
responsabilización sería descaracterizar la propia naturaleza jurídica del mandato
mercantil.

596 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Propuesta de una Ley de Navegación Marítima en Brasil un Comparativo con Argentina

Sin embargo, en otra demanda ante el mismo tribunal, se observó un


entendimiento diverso – REsp 404.745/SP .
En este caso el propietario de la carga presentó una acción legal de
indemnización contra el agente del transportador por la pérdida de 1.490 botellas
de vino debido al incumplimiento de la temperatura adecuada dentro del
contenedor durante el transporte. El transportador era una empresa ubicada en
España. Si bien el tribunal de origen se expidió en el sentido de que el agente no
sería parte legítima para estar en el polo pasivo de la demanda, el STJ revertió la
sentencia en una decisión con los siguientes fundamentos:

El agente marítimo, en la condición de mandatario y único representante legal de


la transportadora extranjera en Brasil, asume juntamente con esta la obligación de
transportar la mercancía, y ambos deben responsabilizarse por el cumplimiento del
contrato de transporte celebrado. Con efecto, una vez que el agente tiene derecho
de recibir todos los importes al armador del buque, además del deber de liquidar y
de responsabilizarse por todos los gastos oriundos del buque o de la carga, cuando
no haya nadie en el puerto más acreditado, es justo mantenerse en la calidad de
representante del transportador extranjero ante las acciones legales por avería u
otras consecuencias, y por las cuales se lo puede demandar como mandatario.
Legitimidad pasiva ad causan reconocida.

El Tribunal aplicó lo dispuesto en el artículo 1300 del Código Civil de


1916, pues aunque revocado, se mantuvo el mismo texto en el artículo 667 del
Código Civil de 2002, donde se lee:

(...) el mandatario se obliga a aplicar toda su diligencia habitual en la ejecución


del mandato, y a indemnizar cualquier perjuicio causado por culpa suya o de aquel
a quien se designó, sin autorización, poderes que debía ejercer personalmente”. La
decisión registra aun que el artículo 12, VIII de CPC prevé que la persona jurídica
extranjera es representada ante el tribunal de modo activo y pasivo “por el gerente
o sucursal abierta o instalada en Brasil”. De este modo el STJ consideró en este
caso el hecho de que el agente no es solo un agente sino también un representante
legal del principal y debe responder en el juzgado cualesquiera daños causados a
terceros.

Por otro lado, en el REsp 209.053/RJ, en una sentencia emitida por el


mismo tribunal, a través del análisis de los hechos prácticamente idénticos al REsp
404.745/Sp ya mencionado, hace unos años antes, había mantenido la decisión con
orientación completamente opuesta. En esta acción hubo también una acción
indemnizatoria en virtud de averías causada en la carga, y nuevamente debido a la
inobservancia de la temperatura indicada para la conservación de la carga. El
transportador era, igualmente, una empresa extranjera, y el contrato de transporte
había sido celebrado en Francia. En este caso, el tribunal de origen concluyó que
el agente marítimo no sería parte legítima para estar en el polo pasivo de la
demanda, pues no había sido él quien celebró el contrato de transporte. El STJ

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 597


Eliana Aló da Silveira

encontró un obstáculo en el análisis fáctico-probatorio, y mantuvo la decisión con la


siguiente conclusión:

Responsabilidad civil. Indemnización por daños causados en la mercancía


transportada por buque. El agente marítimo de la compañía transportadora no puede
responder en nombre propio a la postulación de indemnización – Ilegitimidad pasiva
de la demandada Embargos acogidos para que se decrete la extinción del proceso
por ilegitimidad de parte
En una comparación con las decisiones mencionadas anteriormente, es
evidente que no hay una orientación clara sobre la responsabilidad del agente
marítimo en Brasil. Decisiones divergentes se han intercalado en el STJ en los
últimos años. Cierto es que la falta una postura firme de la legislación o de la
jurisprudencia es perjudicial a las partes involucradas en estos litigios y compromete
la paz social.

11 LA LEGISLACIÓN ARGENTINA Y LAS DECISIONES JUDICIALES


La responsabilidad del agente marítimo en Argentina es estableció hace
mucho años en sus tribunales. La regla general se estableció el 1973, en la ley de
navegación n. 20.094, en su artículo 199:

El agente marítimo, en cualquiera de sus designaciones, no responde por las


obligaciones de su representado, salvo la responsabilidad que le corresponde por sus
hechos personales o la que surja de las leyes reglamentos fiscales y administrativos.

Y así lo han seguido los tribunales:

No tiene sentido accionar contra un particular que no resulta propietario de la nave,


ni su armador, calidad correspondiente a un ente diverso. Y si bien dicha persona fue
agente marítimo de la compañía, esta condición no lo hace responsable a título
personal de las obligaciones del armador. Por tanto procede la defensa de falta de
acción.(C. Nac. Civ. Y Com. Fed., sala 2ᵃ, 6.07.1970-Dentone Hnos. AS v. Costera
Argentina Cía. de Navegación, SRL y otros)18.

Así también se han seguido las decisiones judiciales argentinas:

Si bien es plausible la tendencia de proteger a los consignatarios que residen en el


país, para hacer efectiva la responsabilidad de los armadores que están en el
extranjero, ello no puede llevar a admitir que se entablen demandas con personas que
realmente ningún vínculo tienen con el armador. Ello ocurre cuando el agente
marítimo haya sido requerido de un modo aislado para el despacho de un buque. Esa
mediación solidaria no puede convertir a dicho agente en un representante del
armador, pues no puede llevarse ante los tribunales a quien no tiene ninguna relación

18
BARBADO, Patricia. Manual de jurisprudencia del transporte. 1 ed.,Buenos Aires, Lexis Nexis, 2004,
p. 285.

598 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Propuesta de una Ley de Navegación Marítima en Brasil un Comparativo con Argentina

jurídica. (C. Nac. Civ y Com. Fed., sala 2ᵃ, 21.07.1970 – Aseguradores Argentinos y
otra v. Capitán y/o armadores del buque Lassel)19.
No se insiste en imputar al agente marítimo responsabilidad por hecho propio (art.
199 L.N.), solo queda como posibilidad jurídica la citación fundada en la sola
intervención en el transporte, y esta, por exclusión del primer supuesto, solo puede
darse en los términos del art. 193, esto es, en el carácter de agente marítimo del
transportador como su mandatario o representante ex lege; supuesto en el que no
responde por las obligaciones de su representado (art. 199 cit.; confr. J. D. RAY,
Derecho de la Navegación, t. II, p. 128; L. B. MONTIEL, Curso de derecho de la
navegación, Bs. As. 1994, p. 169, punto f; W. TEJERINA, Algunos aspectos relativos
a la responsabilidad del agente marítimo – nota a fallo-, L.L. 127-576). Lo
establecido por el art. 199 de la ley 20.094, bajo este aspecto, no hace sino
reproducir lo que constituye principio general en materia de representación.(C. Nac.
Civ y Com. Fed., sala 3ᵃ, 17.05.2005 – Compañía Argentina de Seguros Victoria S/A
c/ Expeditors Internacional Ocean s/ faltante y/o avería de carga transporte mar.)20

Luego, se puede concluir que la ley que define las responsabilidades del
agente, bien como las relaciones entre armador y su agente marítimo sobretodo por
un contrato de mandato o de agencia, es lo que han dado a los tribunales para
decidir. Por ejemplo:

El agente marítimo no responde por las obligaciones de sus representados, que es-
precisamente – lo que dispone el art. 199 ley 20.094. Igual decisión debería
adoptarse con respecto a Navicon. En efecto: el carácter que reviste Navicon es el de
delivery agent, y el tribunal ha asimilado la figura del agente de transporte aduanero
a la del agente marítimo.(C. Nav. Civ. Y Com. Fed., sala 1ᵃ, 7.09.2000 – Masari SRL
v. Navicon SA y otro s/ daños y perjuicios varios)21.

Sin duda, igualmente el sistema legislativo argentino ha favorecido para las


armonizaciones de las decisiones, sobretodo la parte final del artículo 199, con el fin
de aclarar las excepciones de responsabilidad del agente marítimo:

Si bien el art. 199 de la ley 20.094 no descarta, como excepciones a la regla de


irresponsabilidad, la responsabilidad propia del agente marítimo que surja de las
leyes y reglamentos fiscales y administrativos, así como aquella que resulte de sus
‘hechos personales’, siendo esta última una referencia que solo puede aludir a hechos
ilícitos cometidos por el mismo agente, y acaso también a los supuestos en los que
haya excedido los limites de la representación, la demanda que persiga hacer efectiva
tal responsabilidad propia, debe aclararlo debidamente, precisando cuál es o son los
‘hechos personales’, que se le imputan al agente, a fin de despejar cualquier duda
sobre el particular, especialmente en supuestos en los que, al mismo tiempo, la

19
BARBADO, Patricia. Manual de jurisprudencia del transporte. 1 ed.,Buenos Aires, Lexis Nexis, 2004, p.
285.
20
jurisprudencia.pjn.gov.ar. Tema: Transporte marítimo. RESPONSABILIDAD DEL AGENTE
MARÍTIMO. Ley de navegación, Representación. Causa nr. 4.435/04
21
BARBADO, Patricia, Manual de jurisprudencia del transporte, 1 ed., Buenos Aires, Lexis Nexis, 2004, p.
286.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 599


Eliana Aló da Silveira

pretensión procesal se incoa contra otros codemandados, v. gr. El armador, el


transportista, etc., cuyas respectivas responsabilidades se asientan en plantas y
presupuestos legales diferentes de los que le atañen a aquel”(C. Nac. Civ. Y Cam.
Fed., sala 3ᵃ, 7.02.1996-Plastina, Franscisco v. J.E. Turner y Cia. SA y otros
s/demora transporte de mercadería)22.

12 CONCLUSIÓN
Es evidente que la realidad social en la cual se vive se contenta más con el
modelo individualista de las soluciones judiciales. Desde el fin del siglo pasado se
ha construido un nuevo aspecto fundamentado en la prevalencia del interés social
sobre el individual. De ahí deriva la necesidad de exigir un sistema judicial más
participativo y activista, en la búsqueda de una sociedad más eficiente, humana y
solidaria, Se deberá a tal fin utilizar los instrumentos procesales más eficientes, por
ejemplo de la acción civil pública, de las acciones colectivas, de los juzgados
especiales, del mandato de seguridad colectivo, de las acciones de control de la
constitucionalidad.
Es decir, mecanismos hábiles y eficaces que complementan la actividad
estatal priorizando lo social. En el ámbito de la justicia y en dimensiones mundiales,
la realidad demuestra la insatisfacción generalizada con la solución jurisdiccional
estatal, lo que hizo que estudiosos y organizaciones, oficiales o no, busquen
soluciones, promoviendo conferencias locales e internacionales a través de la
inversión en investigaciones y en medios alternativos para la resolución de
conflictos.
Sin embargo, mientras esto no se convierte en realidad, aún se buscan
soluciones internas a través de la creación, alteración y revocaciones de leyes, como
a ejemplo en Brasil que revocó el código comercial de 1850. Asimismo, desde el
2011 cuando se presentó el nuevo proyecto de ley para su reformulación, hasta el
momento no se llegó a un consenso con respecto a los temas propuestos, incluyendo
las cuestiones de derecho mercantil tratadas de forma superficial, sin adentrarse a
cuestiones actuales y relevantes, instituyendo un capítulo exclusivo para los
contratos de logística. No obstante, este tema se trata solo de forma muy sencilla
junto al conocimiento de transporte de carga relativo al derecho marítimo.
Por un lado, Argentina define las responsabilidades generales de las agencias
en la Ley de Navegación 20.094, la cual posibilita la actuación del país en el
comercio marítimo, dando seguridad jurídica a quien opera en este segmento de
actividad.
Por otro lado, las decisiones brasileñas no tienen una orientación consolidada,
quizás por falta de una ley para definir las relaciones con claridad, lo que lleva a
interpretaciones dudosas, quizás porque así lo desean las partes interesadas o,
simplemente porque no piensan que esto sea un prioridad dando por sentado que
esto no traerá ninguna ventaja a los legisladores.
22
BARBADO, Patricia, Manual de jurisprudencia del transporte, 1 ed., Buenos Aires, Lexis Nexis, 2004, p.
286.

600 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Propuesta de una Ley de Navegación Marítima en Brasil un Comparativo con Argentina

De cualquier modo, si fuera de interés del Superior Tribunal de justicia


uniformizar este tema, podría fácilmente hacerlo resolviendo conforme los
principios de derecho y de la ley común . De este modo se podría elaborar una sola
línea de decisiones, bien como basar la formulación de una nueva ley. Sin embargo,
desafortunadamente Brasil sigue siendo pobre en el campo de derecho marítimo,
pero si quisiera ser diferente, sin duda podría basarse en el sistema argentino para
servirlo como guía.
Por fin, para que Brasil gane seguridad jurídica en el área de las relaciones
privadas del sector marítimo, donde las carencias están presente, son sentidas y
comentadas, se muy válido estudiar el desarrollo que el derecho experimentó en
otras naciones, y en las cuales esta modalidad de comer está muy presente e
intensificada, con el fin de alcanzar la confianza y la real inclusión económica del
país en el sistema marítimo internacional y minimizar el pensamiento del “riesgo
Brasil”.
Es muy común en los días actuales observar el contexto de decadencia
generalizado de los sistemas políticos y económicos, hasta alcanzar el jurídico. Es
cierto que el ser humano está alcanzando altos niveles de conocimiento en el campo
de las ciencias y de la tecnología, con más informaciones y más rápidas, pero por
otro lado, pierde toda y cualquier energía para actuar virtuosamente.
El problema es difuso y alcanza todas las instancias de la vida moderna en la
sociedad, tanto en la corrupción en las altas esferas de poder, o sea, el poder
magnánimo de los jefes de estado, cuanto en la creciente violencia en las calles y
dentro del hogar.
Para complicar aún más este escenario, la sociedad actual padece de una
debilidad de valores, lo que resulta la depreciación en el rol de la familia, la
desvalorización de las autoridades y competencias. Cada vez más se forman
vínculos superficiales y utilitaristas, se busca siempre inmediatismo. Se observan
explosiones emocionales, falta de respeto, individualismos y carencia de la esencia
del derecho.
Los desafíos de estos tiempos exigen de los operadores del derecho la
disposición para luchar y mantener los valores.

REFERENCIAS
AMARAL, Antonio Carlos Rodrigues, (2004), Direito do Comércio Internacional, São Paulo,
Aduaneiras.
ANJOS, J. Haroldo dos, & GOMES, Carlos Rubens Caminha, (1992), Curso de Direito Marítimo, Rio de
Janeiro, Renovar.
ARAUJO, Nadia, (2004), Contratos internacionais: Autonomia da Vontade, Mercosul e Convenções
Internacionais, 3 ed., Rio de Janeiro, 2004.
_______ (2004), Direito internacional privado – Teoria e prática brasileira, (2. ed.), Rio de Janeiro,
Renovar.
AZÚA, Daniel E. Real de, (1987), Transportes e seguros marítimos para o exportador, (2ª ed.), São
Paulo, Aduaneiras.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 601


Eliana Aló da Silveira

BARBADO, Patricia, (2004), Manual de jurisprudência del transporte, (1 ed.), Buenos Aires, Lexis
Nexis.
BASSO, Maristela, (2002), Contratos internacionais do comércio, (3. ed.), Porto Alegre, Livraria do
Advogado.
BARROSO, Luís Roberto e TIBURCIO, Carmem, (organizadores), ((2006), Direito Internacional
Contemporâneo – Estudos em homenagem ao Prof. Jacob Dolinger, Rio de Janeiro, Renovar.
BATISTA, Luiz Olavo, Dos contratos internacionais – Uma visão teórica e prática, (1994), São Paulo,
Saraiva.
BHAGHWATI P. N. (2002), Democratização de soluções e acesso à Justiça. in I FÓRUM MUNDIAL
DE JUÍZES, http://www.ajuris.org.br/fmundialj/Preview/artigo36.html (Porto Alegre, 2002)
BIC – Bureau International des Conteineres, Quartely Publication – april 91, NR 22 – Paris, France.
_______. Yearly Publication – NR 26 – Paris, France.
BOBBIO, Norberto, (1995), O Positivismo Jurídico: Lições de filosofia do direito. trad. Márcio Pugliesi,
Edson Bini, Carlos E. Rodrigues São Paulo, Ícone.
BLOCH D. Roberto, (1996), Transporte multiomodal – Análisis jurídico y operativo de un sistema
integrado de transporte, Buenos Aires, Ad-Hoc.
BUTLER, William Elliot, (1985), The Law of the sea and international shipping, New York, Oceana
Publications.
CABRERA, Omar, (2014), Teoría de los contratos, Ciudad Autónoma de Buenos Aires, DyD.
CALVO CARAVACA, Afonso Luis e CARRASCOSA GONZALEZ, Javier, (2000), Derecho
internacional privado, v. I, Granada, Comares.
CÂMARA DO COMÉRCIO INTERNACIONAL, (1978), Developpement du transport international par
conteneur, Paris, Chambre de Commerce International.
CÂMARA DO COMÉRCIO INTERNACIONAL, Regras uniformes pour um document de transport
combine, Paris, Chambre de Commerce International, 1980.
CAMBI, Eduardo, (2001). Jurisprudência Lotérica. São Paulo, RT.
CASELLA, Paulo Borba, (1996), Contratos Internacionais e Direito Econômico no Mercosul, São Paulo,
LTR, 1996.
CASTRO, Amílcar de, (1987), Direito internacional privado. (4. ed.) Rio de Janeiro, Forense.
CHAMI, Diego Esteban, (2005), Régimen jurídico del transporte multimodal, Buenos Aires, Lexis.
CHAMI, Diego Esteban, (2010), Manual de derecho de la navegación. Buenos Aires, Abeledo-Perrot.
CHIRINIAN, Marianela, comp. Ley de navegación. 1 ed. Buenos Aires, Zavalia, 2014.
CIRIBELLI, Marilda Corrêa, (2000), Projeto de pesquisa: um instrumental de pesquisa científica, Rio de
Janeiro, 7 letras.
COIMBRA, Delfim Bouças, (2004), O conhecimento de carga no transporte marítimo. (3 ed.) São Paulo,
Aduaneiras.
CRETELLA JÚNIOR, José, (1995), Primeiras Lições de Direito, Rio de Janeiro, Forense.
DINAMARCO, Cândido Rangel, (2004), Instituições de direito processual civil. (v. IV). São Paulo,
Malheiros.
ECO Umberto, (2007), Como se faz uma tese, (13ᵃ ed.), Editorial Presença.
ENGELBERG, Esther, (2003), Contratos internacionais do comércio, (3 ed.), São Paulo, Atlas.
FARIA, Sergio Fraga Santos, (2001), Fragmentos da história dos transportes, São Paulo, Aduaneiras.
FARIÑA, Francisco, (1955), Derecho comercial marítimo, (v. 1 – 2.ed.) Barcelona: BOSCH.
FERRAZ JUNIOR, Tércio Sampaio. (2007). Introdução ao estudo do direito: técnica, decisão,
dominação, São Paulo, Atlas.
GILENO, G. B. (1996), Manuale di diritto della navigazione, (2.ed.), Roma, Concorsi x Tutti.

602 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Propuesta de una Ley de Navegación Marítima en Brasil un Comparativo con Argentina

FRIEDE, Reis, (2001), Ciência do direito, norma, interpretação e hermenêutica jurídica, (4 ed. – rev.
atual. ampl), Rio de Janeiro, Forense Universitária.
FUX, Luiz, (2006), Homologação de sentença estrangeira. in O direito internacional contemporâneo –
Estudos em homenagem ao Prof. Jacob Dolinger. Organizadores: BURCIO, Carmen Barroso, Rio de
Janeiro, São Paulo, Recife, Renovar.
GILBERTONI, Carla Adriana Comitre, (2005), Teoria e prática do direito marítimo. (2 ed.), Rio de
Janeiro, Renovar.
GOMES, Carlos Rubens Caminha, (1978), Direito comercial marítimo, Rio de Janeiro, Rio.
GRANZIERA, Maria Luiza Machado, (1993), Contratos internacionais: Negociação e Renegociação.
Comentários aos Incoterms-CCI-1990, São Paulo, Ícone.
HENRICH, V. R. (1998), Correlação entre a indústria de freight forwarding no Brasil e no mundo.
Trabalho de Conclusão de Curso, São Leopoldo, Unisinos.
HERRERA Enrique, (2012), Práctica metodológica de la investigación jurídica, (3 ed.) Buenos Aires-
Bogotá, Astrea, 2012.
JAVUREK, Giselle, (2009), Responsabilidad del transportador de mercaderías por agua: Actividad
riesgosa protegido o abuso del derecho? Córdoba-Argentina, Lerner.
JAVUREK, Giselle, (2009), De timones, alas y fletes. Córdoba-Argentina, Lerner.
JUNIOR, Humberto Theodoro, (2003), Do contrato de agência e distribuição no Novo Código Civil.
Disponível em: Mundo Jurídico, maio de 2003. www.mundojuridico.adv.br/sis_artigos. Acesso em:
15.07.2016.
KEEDI, S.; MENDONÇA. P. C. C. (2000), Transportes e seguros no comércio exterior, (2. ed.) São
Paulo, Aduaneiras.
KELSEN, Hans, (1979), Teoria Pura do Direito. Coimbra, Arménio Amado.
KELSEN, Hans, (1998), O que é justiça? A justiça, o direito e a política no espelho da ciência, São
Paulo, Martins Fontes,Trad. Luís Carlos Borges.
LORENZI, Mario, (1978), Transitário e o transporte internacional no Brasil, São Paulo, Revista dos
Tribunais.
LOSADA, Francisco Rubén. (2012), Hacia una teoria general del derecho del transporte, Córdoba-
Argentina, Lerner.
LUHMANN, Niklas, (1980), Legitimação pelo procedimento. Tradução de Maria Conceição Corte-Real.
Revisão de Tércio Sampaio Ferraz Jr. Brasília, Universidade de Brasília.
MAGALHÃES, José Carlos de, (2000), O Supremo Tribunal Federal e o direito internacional: uma
análise crítica. Porto Alegre, Livraria do Advogado.
MARTINS, Fran, (1981), Contratos e obrigações comerciais, ( 6.ed), Rio de Janeiro, Forense.
MIRANDA, Pontes de, (1954), Tratado de Direito Privado: Parte Especial, (Tomo XLV, 2ª ed.) Rio de
Janeiro, Borsoi.
NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade (2006), Código Civil Comentado, 4ª ed, São
Paulo, Revista dos Tribunais.
NORTH, P. & FAWCETT, J.J. (2005), Chesire and North's Private International Law, Londres, Lexis
Nexis.
NOVAES, Antonio Galvão Naclério, (1972), Evolução do transporte marítimo: Aspectos tecnológicos e
operacionais, São Paulo, Marinha do Brasil.
NUNES, Luiz Antonio Rizato, (2001), Manual da Monografia Jurídica, (3. ed.), São Paulo, Saraiva.
OCTAVIANO, Eliane Maria Martins, (2005), Curso de Direito Marítimo, (2. ed.), São Paulo, Manole.
OCTAVIANO, Eliane Maria Martins, (2008), Curso de Direito Marítimo Privado, São Paulo, Manole.
RANGEL, Vicente Mariotta, (2002), Direito e relações internacionais, (7. ed.), São Paulo, Revista dos
Tribunais.
_______ (2002), Navios em Direito Internacional, Córdoba, AR: Drnas – Lerner.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 603


Eliana Aló da Silveira

RODAS, João Grandino (coord.), (1985) Contratos Internacionais, (2ª ed.), São Paulo, RT.
RODRIGUES, Paulo Roberto Ambrosio, (2003), Introdução aos sistemas de transporte no Brasil e à
logística internacional ( 3 ed.), São Paulo, Aduaneiras.
ROMUALDI, Emilio Elias (2008), Transporte Internacional de Mercaderías, Buenos Aires, Argentina,
Aplicación.
SAMPAIO DE LACERDA, J.C. (1963), Curso de direito comercial marítimo e aeronáutico, (6. ed.), Rio
de Janeiro, Livraria Freitas Bastos.
SANTOS, José Clayton dos, (1982), O Transporte Marítimo Internacional, (2 ed.), São Paulo,
Aduaneiras.
SHIPPEY, Karla C. (1999), A short course in international contracts: drafting the international sales
contract, San Rafael, Califórnia: World Trade Press.
SHIPPEY, Karla C. (1990), International Contracts – Drafting the International sales contract – for
attorneys and attorneys, San Rafael, Califórnia: World Trade Press.
SILVEIRA, Eliana Aló, (2007), O contrato internacional de transporte de carga por via marítima e a
norma de sobreestadia de container – Aspectos de Direito Internacional Econômico, Santos-SP:
Universidade Católica de Direitode Santos.
STOUP, Luis Alejandro, (2003), Revista de Direito Internacional e do Mercosul, (2ª ed.) Buenos Aires,
Síntesep, p. 334.
STRENGER, Irineu, (2003), Contratos Internacionais do Comércio, (4 ed.), São Paulo, LTr.
_____(1996), Direito do comércio internacional e lex mercatoria, São Paulo, LTr.
_____(1996), Direito Internacional Privado, (3 ed.) SP – LTr .
VIEIRA, Guilherme Bergmann Borges, (2001), Transporte Internacional de Cargas, São Paulo,
Aduaneiras.
VIEIRA, Guilherme Bergmann Borges, (2003), Transporte internacional de cargas, (2ª ed.), São Paulo,
Aduaneiras.
WOLFF, Martin, (1958), Derecho Internacional Privado, Barcelona, Bosch.
YANGUAS MESSIA, Jose de, (1971), Derecho Internacional Privado, Madrid, Reus.
ZAPATA, Jorge Bengolea, (1991), La doctrina en el derecho de la navegación argentino, Córdoba-
Argentina, Lerner.

604 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Propuesta de una Ley de Navegación Marítima en Brasil un Comparativo con Argentina

A RESPONSABILIDADE CIVIL E A RECORRENTE


VIOLAÇÃO AOS DIREITOS DE PERSONALIDADE E AO
MEIO AMBIENTE POR GRANDES CORPORAÇÕES
THE CIVIL RESPONSIBILITY AND THE RECURRENT
INFRINGEMENT OF PERSONALITY RIGHTS AND
ENVIRONMENT BY GREAT CORPORATIONS
DOI: 10.19135/revista.consinter.00011.29
Recebido/Received 03.08.2019 – Aprovado/Approved 21.07.2020
Angela Alves de Sousa1 – https://orcid.org/0000-0003-1405-0677
E-mail: angalvsou@gmail.com
Sandra Mara Franco Sette2 – https://orcid.org/0000-0002-3606-0633
E-mail: sandrasette@bol.com.br
Clayton Reis3 – https://orcid.org/0000-0002-9263-2392
E-mail: claytonreis43@gmail.com

Resumo: Em tempos de incertezas e mudanças constantes, a questão dos danos


punitivos por lesão aos direitos de personalidade e ao meio ambiente, praticados por
grandes corporações, conduz a uma necessidade de repensar os institutos, integrando o
ordenamento jurídico pátrio em um contexto global. A presente pesquisa inseriu na
investigação as questões inerentes aos direitos de personalidade e direitos humanos, bem
como, os institutos da responsabilidade civil e a autonomia da pena civil perante o
instituto de danos morais e seus desdobramentos, face à sociedade do século XXI. Neste
contexto, buscou-se compreender o direito e seus possíveis novos papéis, em especial no
ordenamento jurídico pátrio, apontando alterações necessárias à sua evolução com a
finalidade de coibir a reincidência de condutas lesivas por parte das grandes corporações.

1
Mestre em Direito pelo Centro Universitário Curitiba – UNICURITIBA (2017). Bacharel em Direito pelo
Centro de Ensino Superior de Rondonópolis (2003). Advogada na área de Direito Civil, com ênfase em
Responsabilidade Civil e Direito Empresarial. E-mail: angalvsou@gmail.com
2
Mestre em Direito Empresarial pelo Centro Universitário Curitiba – UNICURITIBA (2018). Pós-
graduanda em Direito Previdenciário pelo Instituto de Estudos Previdenciário. Bacharel em Direito pelo
Centro Universitário Curitiba – UNICURITIBA (2006). Professora na Faculdade de Ciências Sociais e
Humanas Sobral Pinto – FAIESP/UNIC. Advogada na Área de Direito Civil e Empresarial, com ênfase em
Responsabilidade Civil. E-mail: sandrasette@bol.com.br
3
Magistrado em segundo grau aposentado do TJPR. Pós Doutor em Direito pela Universidade Central de
Lisboa, Doutor e Mestre em Direito pela UFPR. Especialista em Responsabilidade Civil pela UEM.
Professor Titular do Programa de Doutorado e Mestrado do UNICURITIBA. Professor do curso de Direito
da UTP. Professor da Escola da Magistratura do Paraná. Professor Adjunto IV aposentado da UEM.
Membro fundador da APLJ – Academia Paranaense de Letras Jurídicas. Membro do IBERC e do IAPR.
Advogado e parecerista em Curitiba-Pr. E-mail: claytonreis43@gmail.com

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 605


Angela Alves de Sousa / Sandra Mara Franco Sette / Clayton Reis

Palavras-chave: Responsabilidade Civil; Astreintes; Pena Civil; Disgorgement; Meio


ambiente.
Abstract: In times of uncertainty and constant changes, the matter of the punitive damages
for injury to the personality rights and environment, caused by great corporations, leads to
a necessity of representing the institutes, integrating the national legal system in a
international context. The presente research insert in the ivertigation the matters inherent to
the personality rights and human rights, as well as, the institutes of the civil responsability
and the autonomy of the civil penalty before the institute of the moral damage and it's
unfoldings, in face of the XXI century society. In this context, sought to comprehend the
Law and it's possible new roles, in special in the national legal system, pointing necessary
alterations to it's evolution with the finalty of restraining the recurrence of harmful conduct
by the great corporations.
Keywords: Civil responsability; Astreintes; Civil penalty; Disgorgement; Environment.
Sumário: Introdução; 1. A complexidade da sociedade atual e a recorrente violação aos
direitos de personalidade e ao meio ambiente por grandes corporações; 2. O processo de
abertura e reformulação da responsabilidade civil e o seu pluralismo funcional; 3.
Instrumentos civis com funções preventivas: as astreintes, a pena civil e o disgorgement.
Considerações finais. Referências.

INTRODUÇÃO
A sociedade contemporânea tem demandado novos contornos à responsabili-
dade civil, diante da atual limitação do alcance das leis de proteção a direitos funda-
mentais, relacionados à personalidade e ao meio ambiente, e das recorrentes violações a
esses direitos praticadas por grandes corporações. Devido a isto, torna-se importante a
compreensão do processo histórico social que ocasionou essas constantes violações,
tanto no âmbito nacional quanto internacional.
Ante a constatação da evolução científica e tecnológica que marcaram o século
anterior e continuado à luz do século XXI, o empresariado da contemporaneidade não
pode mais isolar-se dessa realidade, a única “mola propulsora” do desenvolvimento
econômico. Ao contrário, se a empresa deseja perseguir a lucratividade como meta prin-
cipal de suas atividades, deve refletir a respeito de suas responsabilidades, nos planos
ambientais, sociais e humanitários, pensando numa economia global possível a médio e
longo prazos.
A sociedade denominada “pós-moderna” (LATOUR, 1994), no momento pre-
sente, traz consigo muitas questões do passado que não foram resolvidas a contento,
entre elas a busca pelo equilíbrio que, sem dúvida alguma, deve se amparar no instituto
da responsabilidade civil, visando conter abusos e práticas ilícitas tanto locais quanto
globais.
Ao englobar tamanho patrimônio doutrinário, é possível perceber o quanto o ins-
tituto da responsabilidade civil tem sido objeto de transformação através dos tempos,
ganhando na atualidade novos contornos, os quais remetem a reflexões e a uma nova
forma de se pensar o referido instituto em face da sua eficácia.
Em constante modificação, a responsabilidade civil no ordenamento jurídico bra-
sileiro, merece sempre especial atenção, bem como, a observância de suas alterações e
questões que permeiam estes mecanismos.

606 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


A Responsabilidade Civil e a Recorrente Violação aos Direitos de Personalidade e ao Meio Ambiente...

A demanda social é crescente sob a luz da contemporaneidade recheada de incer-


tezas, em meio à necessidade de atender as exigências da classe empresarial ciente de seu
poder na movimentação, diante da “evolução” e do “crescimento econômico”.
A proposta da presente pesquisa, tem como objetivo geral refletir e colocar ques-
tões inerentes à sociedade moderna, situando o ordenamento jurídico pátrio num aspecto
amplo, inserido em um contexto global e nas particularidades desta sociedade emergente.
Como objetivo específico, se procura conhecer os institutos presentes no orde-
namento jurídico pátrio, bem como, de que maneira eles comungam os pressupostos
constitucionais no sentido de garantir proteção à cidadania, à dignidade da pessoa huma-
na e, especialmente, de que maneira cada um desses institutos fundamentais poderão
coibir a reincidência de abusos e violações recorrentes aos direitos básicos.
É importante ressaltar que os questionamentos apontados não se esgotam nas
questões ora apresentadas, mas somente levam-nos a entender os instrumentos jurídicos
disponíveis e neles encontrar possíveis lacunas que permitam violações de direitos já
conquistados, insertos nas codificações e consagrados na Constituição Federal de 1988.
A pesquisa iniciar-se-á com levantamento bibliográfico, não apenas na ótica dou-
trinária, mas, também, através de artigos e livros assinados por doutrinadores consagra-
dos na área jurídica, como igualmente com aportes inestimáveis da Sociologia, da An-
tropologia, da História e da Economia.
Desta maneira, a temática central da pesquisa terá como foco a investigação
da incidência dos danos punitivos e sua aplicabilidade no Brasil, levando-se em
conta questões muitas vezes contraditórias na doutrina e jurisprudência buscando-se,
ainda, compreender interpretações que afetam a aplicação do instituto, uma visão
desdobrada da responsabilidade civil em seu amplo espectro, considerando as altera-
ções que a permeiam.
Para tanto, será adotado o método dedutivo/indutivo, pelas razões já aponta-
das, sendo este o meio mais adequado ao desenvolvimento do presente trabalho,
tendo em vista o tema atual e suas consequentes interpretações e discussões sob os
mais diversos enfoques.

1 A COMPLEXIDADE DA SOCIEDADE ATUAL E A RECORRENTE


VIOLAÇÃO AOS DIREITOS DE PERSONALIDADE E AO MEIO
AMBIENTE POR GRANDES CORPORAÇÕES
Diante do processo de globalização, novas fronteiras e paradigmas foram criadas
em relação à defesa dos direitos humanos fundamentais. É tema que vem sendo ampla-
mente debatido, desde o final da Segunda Guerra Mundial, por organismos internacio-
nais como a Organização das Nações Unidas (ONU) (Declaração Universal dos Direitos
Humanos, aprovada pela ONU em 1948), Organizações Não-Governamentais Internaci-
onais (ONG’s Internacionais) e a sociedade civil internacional de modo geral. A discus-
são, também, influenciou o ordenamento jurídico pátrio, tendo como foco principal a
Constituição Federal de 1988, inaugurando, no plano da dogmática jurídica, o paradigma
do Estado Social e o princípio da Dignidade da pessoa Humana. E, outras normas infra-

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 607


Angela Alves de Sousa / Sandra Mara Franco Sette / Clayton Reis

constitucionais que mais tarde exerceram expressiva influência na disciplina dos Direitos
de Personalidade prescritos no Código Civil de 2002.
Mesmo com a positivação da proteção destes direitos, uma visão panorâmica da
sociedade brasileira demonstra frequentes violações de direitos fundamentais praticadas
por grandes corporações. Tais circunstâncias, nos induzem a refletir sobre qual deve ser
o papel do Direito diante da dinamicidade das estruturas sociais e qual o significado ou a
função que a responsabilidade civil deve ocupar para melhor proteção das novas deman-
das sociais.
As empresas, muitas vezes, alegam o não cumprimento das normas jurídicas que
impactam sobre os direitos de personalidade e do meio ambiente, ao argumento das
dificuldades econômicas em atender a todas as exigências governamentais e legislativas.
Porém, tais argumentos se tornam frágeis e se esgotam quando se trata do uso do bem
comum, dos quais depende a sobrevivência de toda a humanidade.
A questão ambiental, enquanto ponto crucial para a evolução econômica e desen-
volvimento geral da sociedade, possui grande relevância e preocupação, motivo pelo
qual é imprescindível delinear de que forma será possível conduzir os debates às lideran-
ças das grandes corporações. As discussões possuem a finalidade de contribuir para
alterar o modo de pensar e agir, através do viés humanitário, que sejam ao menos visua-
lizadas na direção de um futuro sustentável em curto espaço temporal, sob pena de per-
der o objeto central de sua existência consistente na lucratividade.
A partir de uma contextualização histórica e sociológica, pode-se traçar um perfil
da sociedade atual, com análise de alguns institutos que a compõem, incluindo uma visão
econômica inovadora. Mesmo constatando a evolução do ordenamento jurídico na tenta-
tiva de equilibrar interesses tão diversos, pode-se perceber a recorrente violação de direi-
tos, em especial dos direitos de personalidade por parte das grandes empresas.
Fato incontestável é que a organização social vem passando por transformações,
significativas que denotam uma ruptura com a fase inicial que foi a característica das
sociedades modernas. Essas diferenças são notadas pelo filósofo Gilles Lipovetsky
(2016, p.7):

Trata-se de uma mutação global em curso, de uma criação histórica, da combinação


sinérgica de organizações e de significações, de ações e de valores que se esboça a
partir dos anos vinte – apenas as esferas artísticas e psicanalíticas a anteciparam em
alguns decênios – e cujos efeitos não pararam de se amplificar a partir da Segunda
Guerra Mundial.

Nesse contexto de mudanças, absorver as transformações, reconhecer um novo


tipo de demanda próxima do “instantâneo”, abala não apenas as relações sociais como
um todo, mas também os alicerces que as regulam, aumentando a necessidade de ade-
quar as normas às novas demandas que surgem. Esta adequação tem o intuito preventivo
de antecipar e evitar danos. Compreender essa dinâmica sujeita às transformações cada
vez mais velozes é uma tarefa árdua dada à fragilidade dos sistemas sociais e de seus, até
então, imutáveis ordenamentos jurídicos.

608 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


A Responsabilidade Civil e a Recorrente Violação aos Direitos de Personalidade e ao Meio Ambiente...

Para tanto, se torna imperioso redefinir aspectos fundamentais de ordenamentos


jurídicos e acordos internacionais no tocante a direitos humanos e direitos de personali-
dade. Direitos estes, consolidados no século XX, mais precisamente a partir da Segunda
Guerra Mundial, quando de acordo com os teóricos, deu-se início às mudanças sociais
profundas que se refletem nos dias presentes.
Diante dessas realidades, compreender a recorrente violação de direitos de perso-
nalidade por parte de grandes empresas requer não apenas a contextualização mas, pro-
curar soluções para identificar de que modo esse tipo de delito prevalece e qual é a forma
adequada para combatê-lo.
Conciliar interesses tão diversos fica cada vez mais difícil e a já complexa estru-
tura social tem seus alicerces abalados. Vive-se em tempos de individualismo. O que se
constata é a satisfação de anseios meramente individuais, a obtenção de bens materiais
com o propósito de causar um bem-estar momentâneo que será substituído por outro e
assim por diante. Por vezes, para atingir tais objetivos, o indivíduo não hesita em ultra-
passar limites que acabam violando direitos do próximo.
O reflexo dessa assertiva acorre com frequência nas relações de poder dentro das
grandes corporações, apesar de todo um ordenamento jurídico reconhecer os direitos
fundamentais, bem como, os direitos de personalidade referendados pela Constituição de
Federal de 1988.
O reconhecimento de direitos, em especial dos direitos humanos fundamentais,
passa também pelo reconhecimento do Direito Público Internacional, considerando a
série de acordos que ao longo do tempo foram acrescidos de novas abordagens que ab-
sorveram as novas necessidades de garantias individuais. Segundo Lipovetsky (2016, p.
1), vive-se a “era do vazio” ou a perda da essencialidade, que significa um esgotamento
de princípios axiológicos e objetivos, o que contribui para uma mudança radical dos
ordenamentos e comportamentos sociais:

(...) considerando, com efeito, que o universo dos objectos, das imagens, da informa-
ção e dos valores hedonistas, permissivos e psicologistas que lhe estão ligados gera-
ram ao mesmo tempo que uma nova forma de controle dos comportamentos, uma di-
versificação incomparável dos modos de vida, uma flutuação sistemática da esfera
priva da, das crenças e dos papéis, ou, por outras palavras, uma nova fase na história
do individualismo ocidental. O nosso tempo só logrou evacuar a escatologia revolu-
cionária levando a cabo uma revolução permanente do quotidiano e do próprio indi-
víduo: privatização alargada, erosão das identidades sociais, desafecção ideológica e
política, desestabilização acelerada das personalidades, eis-nos vivendo uma segun-
da revolução individualista. Uma ideia central governa as análises que se seguem: à
medida que as sociedades democráticas se devem a sua inteligibilidade revela-se à
luz de uma lógica nova, a que chamamos aqui o processo de personalização.

A recognição de que o coletivo começa a perder importância em detrimento do


indivíduo não só denota o risco de uma falência também do capitalismo, mas de toda
uma forma de pensar que acompanhou a evolução da humanidade ao longo de milhares
de anos. O descompromisso com a ideologia e com a política dá lugar a uma forma de
ver e se posicionar cada vez mais distante do coletivo, o que gera o risco de se perder a

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 609


Angela Alves de Sousa / Sandra Mara Franco Sette / Clayton Reis

noção de que o indivíduo, para sobreviver, necessita que as demais pessoas sobrevivam,
preferencialmente de maneira digna.
Essa sociedade voltada para o individualismo, à beira de um colapso, revela uma
ruptura com o modus vivendi coletivo, conhecido até então. Uma série de transforma-
ções se desencadeiam no chamado tempo real, acelerando o já frenético ritmo que
impulsiona os avanços da civilização.
No direito internacional, são reconhecidos os direitos humanos fundamentais
e admitidas punições aos crimes de guerra. No ordenamento jurídico brasileiro,
especificamente no Código Civil, são reconhecidos os direitos de personalidade e os
direitos humanos fundamentais e, ambas as categorias estão presentes na Constitui-
ção Federal de 1988, garantindo a dignidade da pessoa humana, seus direitos básicos
e a integridade física e moral do ser humano como valores fundamentais.
A sociedade contemporânea exige uma “reconstrução” ou, segundo o pensa-
mento de Anthony Giddens (1991, p. 8) exige um “reencaixe” para que os conceitos
como dano moral e danos punitivos nela possam se reinserir. Ensina que essa “(...)
“modernidade” refere-se a estilo, costume de vida ou organização social que emer-
giram na Europa a partir do século XVII e que ulteriormente se tornaram mais ou
menos mundiais em sua influência.”
Isto significa desconstruir conceitos anteriormente considerados imutáveis e,
substituí-los por outros mais condizentes com as mudanças sociais e suas aceleradas
demandas. Esse “deslocamento” que tem um fluxo contínuo, obriga a uma reformu-
lação geral incluindo a organização social completamente. Nessa “nova ordem”,
todos os segmentos, entre eles a Ciência do Direito, passam a merecer novos contor-
nos, e se necessário, para alterar enunciados e adaptá-los aos novos tempos.
Nesse panorama, a problemática da recorrente violação de direitos de perso-
nalidade e direitos fundamentais por parte das grandes corporações, começou a to-
mar vulto a partir da década de 1970, quando a temática obteve a atenção de movi-
mentos sociais, organizações da sociedade civil, alguns centros acadêmicos, especi-
almente na Europa e pelas Nações Unidas – ONU.

Tal fato se deve ao crescente reconhecimento das empresas, notadamente transacio-


nais, como importantes violadores de Direitos Humanos, com destaque a sua atuação
nos territórios do chamado Sul global. Entretanto, a luta pela responsabilização das
empresas por violações de Direitos Humanos enfrenta diversos obstáculos que dizem
respeito, tanto à onda de globalização dominante, especialmente na década de 1990,
que pouco espaço concede às perspectivas críticas ao capital, quanto ao marco insti-
tucional de debate e negociação sobre o tema no âmbito das Nações Unidas, a qual
sofre com a captura corporativa. (HOMA, 2017, p.8).

A atenção da sociedade civil para tais violações foi, sem dúvida alguma, o
ponto de partida necessário para que o ordenamento jurídico e sua aplicabilidade
buscassem nova direção para atender as inúmeras demandas, no sentido de respon-
sabilizar as empresas em face da prática de atos ilícitos.

610 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


A Responsabilidade Civil e a Recorrente Violação aos Direitos de Personalidade e ao Meio Ambiente...

A questão do meio ambiente é um dos temas de maior relevância na atualida-


de, onde o Direito Ambiental vem obtendo destaque como um importante segmento
da ordem normativa. Tendo em vista que nas últimas décadas, observa-se a tomada
de consciência da “esgotabilidade” dos recursos naturais e sustentáveis, o que acar-
retou novos paradigmas na Ciência do Direito, com o propósito de proteção desse
bem imaterial com o máximo de eficiência possível.
A responsabilidade civil em matéria ambiental merece análise não somente
no âmbito patrimonial, como também no seu aspecto extrapatrimonial, que são as
duas modalidades de reparação civil admitidas em lei.
Nas lições de Canotilho (LEITE, 2004, p. 5) é indicado, como um dos ele-
mentos essenciais à efetivação do Estado constitucional ecológico, a criação de uma
política global:

(...) a proteção do ambiente não deve ser feita a nível de sistemas jurídicos isolados
(estatais ou não) mas sim, a nível de sistemas jurídico-políticos, internacionais e su-
pranacionais, de forma a que se alcance um standard ecológico ambiental razoável
em nível planetário e, ao mesmo tempo, se estruture uma responsabilidade global (de
estados, organizações, grupos) quanto às exigências de sustentabilidade ambiental.

Quando se trata de meio ambiente, dada sua importância para a sobrevivência


da vida em nosso planeta, é importante destacar a Encíclia Laudato Si, que traduzida
do latim significa ”Louvado Seja”. A mensagem ambiental do Papa Francisco, que
adotou tal nome deixando clara sua simplicidade e profundidade, pode ser conside-
rada a mais importante dos últimos anos.
As palavras do Papa retratadas na Encíclica causam forte impacto nas ativi-
dades ligadas a proteção do meio ambiente, tal qual os princípios extraídos do Con-
gresso de Direito Ambiental ocorrido em Estocolmo em 1972, considerado o marco
de grandes transformações. Deste documento extrai-se a importância e relevância do
tema, tornando as questões ambientais uma preocupação também da Igreja Católica.
Imperioso mencionar, ainda, que no centro decisório das empresas, bem co-
mo, entre doutrinadores e legisladores, a questão da responsabilidade civil por danos
ambientais tem sido amplamente discutida, levando-se em conta a responsabilidade
civil objetiva e solidária dos responsáveis pela degradação ambiental. No âmbito do
ordenamento jurídico pátrio, têm-se debatido a extensão do nexo de casualidade.
Para Consuelo Yatsuda Moromizato Yoshida (2017, p. 203), a questão tem outros
desdobramentos:

(...) é preciso avançar para além do sistema de comando e controles estatais e para
além da ótica corretivo – repressiva que inaugurou o combate à poluição e à conta-
minação do ambiente a partir da década de 1970, cujos marcos representativos são a
Conferência de Estocolmo (1972) e, entre nós a instituição da Política Nacional de
Meio Ambiente – PNMA (Lei 6.938/1981).

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 611


Angela Alves de Sousa / Sandra Mara Franco Sette / Clayton Reis

De acordo com a autora, as instituições financeiras, em especial aquelas que


financiam os processos de produção, são diretamente responsáveis na prevenção do
dano ambiental, bem como, nas questões sociais ligadas ao tema. Portanto, como
previsto na Lei 6.938/1981 (Política Nacional de Meio Ambiente), o financiamento
de crédito deve exigir do proponente o cumprimento das normas ambientais, a im-
plementação de controle preventivo e análises de impactos ao meio ambiente, dentre
outros requisitos.
Implantar a chamada Economia Verde, proposta da Conferência Rio-92,
unem como responsáveis diretos o Estado e as empresas. Não somente na forma
indenizatória ou punitiva, mas, especialmente, como ações preventivas para facilitar
a parceria em áreas onde a atividade estatal apresenta fragilidade como licenciamen-
to e fiscalização que se tornará maior instrumentalizada em face da parceria.
Desta forma, evidencia-se a contribuição das instituições financeiras no to-
cante à preservação da qualidade de vida e do meio ambiente, referente às conces-
sões de créditos, vinculando-os à responsabilidade socioambiental.
Por outro lado, na contramão da conduta lesiva, em parâmetro global, exis-
tem esforços no sentido de pensarem normas comuns que possam garantir a preser-
vação ambiental como o Iygu (2017) – Conselho Internacional de Ciências Naturais
e Ciências Sociais (ISSC), organismo internacional com apoio da ONU, que tem
como objetivo promover um melhor entendimento sobre o impacto global das ações
locais, estimulando políticas inovadoras que respondam às situações como: mudan-
ças climáticas, a segurança alimentar ou as migrações.
Entretanto, a violação aos direitos de personalidade e aos direitos humanos é
recorrente, em especial por parte das grandes corporações, apesar dos mecanismos
internos e internacionais que combatem, com suas leis e acordos, tais questões. O
instituto da responsabilidade civil é um desses mecanismos, que devem ser aciona-
dos para prevenir, coibir e punir tais abusos, mecanismo este, que fazem parte da
história e da evolução do ser humano no planeta.

2 O PROCESSO DE ABERTURA E REFORMULAÇÃO DA


RESPONSABILIDADE CIVIL E O SEU PLURALISMO FUNCIONAL
Para entender a responsabilidade civil no âmbito do Direito é preciso aceitar
a conceituação da sua doutrina, tanto de pessoa física quanto jurídica, enquanto
responsáveis, respectivamente, pelos danos causados a terceiros que resultam na
obrigação de indenizar.
Em latim a palavra “damnum” define o conceito de tudo aquilo que causa
prejuízo à terceiro, seja na esfera patrimonial ou extrapatrimonial. Por sua vez, a
palavra também de origem latina “moralis” representa a questão social, isto é, que se
refere aos costumes.
Antes da instituição do Estado, a regulação e punição eram estabelecidas pela
Lei de Talião, “olho por olho, dente por dente”, quando o ofendido reagia à ofensa

612 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


A Responsabilidade Civil e a Recorrente Violação aos Direitos de Personalidade e ao Meio Ambiente...

com seu próprio esforço físico, o que de fato não resolvia a questão, pelo contrário,
era objeto de agravamento dos conflitos diante das conturbadas ilicitudes.
Com o surgimento do Estado romano, a noção de responsabilidade civil é ex-
traída da Lex Aquilia de Damno, resultado de um plebiscito aprovado entre o final
dos séculos III e II a.C., que deu a possibilidade de atribuir-se ao ofendido um pa-
gamento em dinheiro daquele que houvesse destruído ou danificado seus bens. Cen-
tralizada na ideia de culpa, essa forma de reparação se traduz no dolo, na imperícia,
imprudência ou negligência. Através da chamada Lei Aquiliana, o Estado passou a
intervir nos conflitos privados, fixando monetariamente o valor a ser pago. A distin-
ção entre a Lei civil e penal se dá apenas a partir da Idade Média. (VENOSA, 2004,
p. 18-19).
A França protagonizou a noção de responsabilidade civil, aperfeiçoando e gene-
ralizando o princípio aquiliano, considerando “In Lege Aquilia et levissima culpa venit”,
em outras palavras, a obrigação de indenização é um pressuposto ligado à uma culpa
caracterizada sem importar com a sua gravidade. A concepção moderna e o modelo da
legislação atual é de 1804, quando o Código de Napoleão sistematizou e fez a distinção
entre culpa contratual e culpa extracontratual.
No Brasil Colônia o que vigorava era o ordenamento do Reino e à época não ha-
via distinção entre reparação, pena e multa. Entretanto, em 1830 é adotado o Código
Criminal, que tem preceitos que foram sendo aprimorados ao longo dos tempos e contri-
buíram para diversas formulações presentes no Código Civil e Penal brasileiros.
O que parecia estar estabilizado e controlado pelo ordenamento jurídico começa a
ser questionado de várias maneiras, e o conflito a emergir com violência manifesta, faz
lembrar Michel Foucault (1987, p. 288) em sua obra “Vigiar e Punir”. Em uma análise
social a partir do dilema do prisioneiro, o autor demonstra que todos os seres humanos
estão condenados a viver prisioneiros de si mesmos, acuados, temendo o outro ser hu-
mano, o que acabou por tornar-se uma ameaça real e virtual, vivenciado com maior
intensidade no século XXI, na chamada sociedade pós-moderna.
Para melhor compreender, tanto a questão da responsabilidade civil, quanto
as transformações sociais no chamado “tempo real”, é necessário um acompanha-
mento das demandas sociais por parte do instrumental jurídico, entendendo que
todos esses institutos, que se encontram de certa forma interligados e com objetivos
bastante semelhantes, existem em benefício da pessoa humana e de sua integridade
física e moral.
O Direito, tendo como um dos seus grandes princípios e finalidades a prote-
ção da pessoa e a procura do equilíbrio entre interesses diferenciados, deve buscar se
integrar a outras disciplinas que integram o sistema normativo, de forma a questio-
nar o mesmo tipo de indagação em busca de soluções que possam propiciar a pacifi-
cação da turbulência presentes nas relações sociais.
Sem dúvida alguma, não é tarefa fácil analisar os institutos do Direito à luz
da sociedade atual e das suas novas demandas. Isto em razão das complexidades que
necessitam de novos regramentos e, principalmente, de novas interpretações e adap-

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 613


Angela Alves de Sousa / Sandra Mara Franco Sette / Clayton Reis

tações para que o próprio direito não perca sua razão de ser diante do novo momento
histórico e transitório da sociedade humana.
A técnica reparatória tradicional da responsabilidade civil vem sendo um es-
tímulo à prática de diversos tipos de ilícitos civis. Pois o causador do dano já sabe
previamente que o lucro resultante da ilicitude será, em muitos casos, superior à
eventual indenização que precisará pagar ao lesionado. Esse uso de uma racionali-
dade econômica ardilosa, analisando o custo-benefício de arcar com uma sanção
legal, ocorre de forma reiterada em casos relacionados à violação dos direitos fun-
damentais da personalidade.
Considerando as novas demandas sociais e à mutabilidade da responsabilida-
de civil ao longo da história da nossa sociedade, alguns doutrinadores têm criticado
fortemente a função reparatória clássica, e ainda dominante, da responsabilidade
civil. Acompanhou-se o entendimento de Nelson Rosenvald (2017), de que vivemos
um momento em que é relevante a substituição da técnica da neutralidade pela ética
da efetividade. Referida efetividade do direito é diretamente subordinada à indaga-
ção sobre a realidade social que confere conteúdo e substância à ordem jurídica.
Nesse sentido, como forma de inibir condutas reprováveis e indesejadas pelo nosso
sistema, qualificadas pela malícia e pelo ardil, deve-se propor uma função da res-
ponsabilidade civil para uma função com caráter punitivo, a exemplo do instituto
dos danos exemplary damages presentes nos países da common low.
O Direito, nas palavras de Miguel Reale (1978, p. 52), “não pode deixar de
ser estável, sem ser estático; e deve ser dinâmico, sem ser frenético”. A sociedade
pós-moderna exige nova dinâmica do Direito, a partir da análise de quais modifica-
ções vêm ocorrendo no âmago da sociedade desde a Segunda Grande Guerra, opor-
tunidade em que foram reconhecidos, a nível global, os chamados Direitos Humanos
Fundamentais, que têm evoluído e conquistado novos contornos através dos tempos.
Por isso, o instrumental fornecido pelo Direito deve buscar, cada vez mais, a multi-
disciplinaridade para cumprir eficazmente com o seu papel principal de resolver
conflitos e, dentro da medida do possível, antecipar-se por meio de regramentos
reconhecíveis e adaptáveis a uma realidade social em constante mudança.
Com a evolução da sociedade, a responsabilidade civil abre novos espaços e
funções plurais no ordenamento jurídico brasileiro, bem como, também no cenário
internacional, tendo como destaque instrumentos civis com funções preventivas, tais
como a pena civil e a multa diária, visando punir e coibir abusos, tendo o disgorge-
ment como uma terceira via do vértice da ampliação do processo indenizatório.
O papel da responsabilidade civil é o de restabelecer a harmonia e o equilí-
brio das relações sociais violadas, de tal modo que aquele que prejudicar ou causar
dano, ainda que imaterial a outro, ficará obrigado a ressarcir a vítima de forma
exemplar, com o propósito de evitar a reincidência do ato ofensivo e lesivo.
O chamado processo de abertura política e redemocratização no País, que
culminou com a promulgação da Constituição Federal de 1988, representou grandes
avanços em termos institucionais e de valoração da dignidade do ser humano, com a

614 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


A Responsabilidade Civil e a Recorrente Violação aos Direitos de Personalidade e ao Meio Ambiente...

participação direta da sociedade civil, que passou a ter um papel fundamental no


processo de redemocratização do País.
A principal motivação para a abertura política no Brasil ocorreu em um con-
texto onde a economia estava em crise, nos comércios e nas fábricas, o que acabou
por desencadear uma crise política:

A saída da crise apontava para o início de um processo de liberalização da ditadura


militar, denominado de abertura política, feito de forma “lenta, gradual e segura”
pelos militares liderados por Geisel. A liberalização do país interessava, sobretudo, à
burguesia que estava fortalecida pela consolidação do capitalismo possibilitada pela
ditadura. A abertura do país substituiria mecanismos da ditadura, porém ainda ga-
rantindo que a participação populacional se daria sob controle. A pressão dos movi-
mentos sociais foi fundamental para a abertura do país nesse momento, mas não para
garantir que ela seria conduzida de forma democrática, pois isso exigiria profundas
reformas nos mecanismos políticos. (SEINO; ALGARVE; GOBBO, 2013 p. 34)

Na década de 1980, quando foi dado o início do chamado processo de abertu-


ra política, com o retorno das eleições diretas, a constituinte que resultou na Consti-
tuição “Cidadã” de 1988, com a anistia “ampla, geral e irrestrita”, a responsabilidade
civil, passou por um processo de reformulação devido aos fatos novos e à transição
de um regime de exceção para um regime Democrático.
A partir deste momento, ganharam novos impulsos os direitos de personali-
dade e os direitos humanos fundamentais, fatos que modificaram o panorama do
País, da luta pelos direitos civis e do apoio de organismos internacionais de direitos
humanos. Nasciam, no bojo dessas transformações, os movimentos sociais apoiados
pelo organismo Anistia Internacional, levando às ruas multidões ávidas por exercer
sua cidadania.
Neste cenário, é natural que o sistema jurídico também sofresse alterações
profundas e o instituto de responsabilidade civil tivesse ampliado seu raio de atua-
ção. A partir daquele momento, quaisquer atitudes que denotassem preconceito,
discriminação, dano ao meio ambiente, entre outros, passaram a ter uma resposta
efetiva da Justiça que não só coibia, mas, através de ações afirmativas, protegia as
denominadas “minorias”.
O instituto ampliou-se alcançando o âmbito empresarial, atribuindo e conso-
lidando os cuidados com o meio ambiente. O que se chama de responsabilidade
ambiental, levando-se em consideração, até então, o indiscriminado uso e desperdí-
cio de recursos naturais e comuns.
A contribuição das normas de proteção ambientais foram fundamentais para
que os preceitos constitucionais fossem cumpridos. O apelo à responsabilidade soci-
al e ambiental foram decisivas para o crescimento econômico do País que, por sua
vez, conquistou o respeito e a visibilidade internacional.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 615


Angela Alves de Sousa / Sandra Mara Franco Sette / Clayton Reis

3 INSTRUMENTOS CIVIS COM FUNÇÕES PREVENTIVAS: AS


ASTREINTES, A PENA CIVIL E O DISGORGEMENT
Historicamente, no sistema jurídico brasileiro, o Direito Civil se distanciou
do Direito Penal pelas funções atribuídas a cada um desses subsistemas. Enquanto
no Direito Penal prevalece a função preventiva de ilícitos, visando desencorajar o
ofensor específico e outros possíveis ofensores, possuindo a missão de contenção de
comportamentos, já em sede de responsabilidade civil, o foco é a contenção de da-
nos e a recomposição do equilíbrio patrimonial do ofendido.
Todavia, tem-se constatado uma tendência global, de parte das funções de de-
sestímulo de condutas ilícitas tradicionalmente atribuídas ao Estado, também serem
agora destinadas à Justiça civil. Notam-se dois instrumentos civilísticos que assu-
mem a função preventiva: a pena civil e a tutela inibitória (astreintes). Ambos os
institutos não aderem à lógica da compensação de danos e compartilham da função
de dissuadir comportamentos que não devem ser admitidos pelo sistema jurídico. A
diferença que esses institutos guardam entre si tem basicamente um viés estrutural.
A sanção da pena civil possui natureza de direito material, ao passo que as astreintes
possuem natureza processual.
A pena civil não tem como foco o dano sofrido pela vítima ou a recomposi-
ção do seu patrimônio. Ela se define pelo seu fundamento pedagógico, ou seja, a de
dissuadir o ofensor à prática de condutas socialmente reprováveis (prevenção espe-
cial), bem como, desestimular atuações semelhantes de potenciais ofensores como
forma de prevenção geral.
A astreinte é um meio de execução indireto oriunda da jurisprudência france-
sa, nos primórdios do século XIX, e que ingressou no ordenamento jurídico brasilei-
ro sob a égide do CPC de 1973, nos arts. 287, 644 e 645. (ASSIS, 2006, p. 496). É
uma sanção indireta ao inadimplemento, um instrumento executivo a serviço do
órgão judicante, que consiste na condenação do obrigado ao pagamento periódico
(por dia de atraso ou outro interregno) de uma quantia fixada por decisão judicial, a
fim de que seja cumprida uma obrigação. (DINAMARCO, 1995, p. 241).
Segundo as lições de João Calvão da Silva (1987, p. 378), o caráter comina-
tório ou coercitivo da astreinte é inquestionável, pois se trata de um meio indireto de
constrangimento incidente sobre os bens do devedor, a fim de compeli-lo a obedecer
a uma ordem judicial, em face da realização da obrigação a que está adstrito. Seu
objetivo não é obrigar o réu a pagar o valor da multa, mas coagi-lo ao cumprimento
da obrigação na forma determinada pela ordem judicial. Essa medida coercitiva é
um meio de execução indireta, pois não recai diretamente sobre o patrimônio do
ofensor.
A fixação de multa cominatória para a hipótese de descumprimento de ordem
judicial faz parte do poder geral de cautela do magistrado, isto é, ao juiz é concedida
uma vasta discricionariedade para a eleição do meio coercitivo mais adequado para a
proteção do direito. Com o propósito de conferir maior efetividade ao processo, o
CPC de 2015, no seu art. 139, inc. IV, coloca à disposição do juiz todas as medidas

616 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


A Responsabilidade Civil e a Recorrente Violação aos Direitos de Personalidade e ao Meio Ambiente...

indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar a


efetividade no cumprimento das ordens judiciais.
Quando evidenciada a impossibilidade no cumprimento da ordem judicial, o
magistrado poderá determinar o fim dessa incidência, fazendo cessar a multa, obser-
vado o princípio do contraditório. Há discussão doutrinária sobre as consequências
atribuídas ao caso do réu que, por um decurso de tempo continua descumprindo a
ordem judicial e o seu cumprimento continua sendo possível. No que se refere à
periodicidade das astreintes, vale a observação de que o art. 461, § 4º do CPC de
1973 trazia a nomenclatura de multa “diária”, palavra que foi suprimida na mesma
codificação de 2015.
Além de ser imprescindível, a determinação da periodicidade da multa atra-
vés da análise das circunstâncias do caso concreto, para que seja efetiva, é também
necessária a fixação do seu quantum pela análise da capacidade de pressionar psico-
logicamente o devedor a cumprir a ordem judicial. Como a finalidade precípua das
astreintes é compelir o réu ao cumprimento do comando judicial, sempre foi consen-
so doutrinário e jurisprudencial que o valor da multa cominatória seja expressivo.
Diante das peculiaridades do caso concreto, baseando-se nos princípios da razoabili-
dade e da proporcionalidade, o magistrado determina o valor tendo como norte a
potencialidade suficiente para influenciar a vontade do devedor em adimplir a obri-
gação. Por isso, caso constatado que o quantum total da astreinte se tornou ínfimo ou
excessivo, será possível modificá-lo.
O CPC de 1973, no seu art. 461, § 6º, previa que “o juiz poderá, de ofício,
modificar o valor ou a periodicidade da multa, caso verifique que se tornou insufici-
ente ou excessiva”. O magistrado, sob a égide do antigo CPC, promovia a redução
do valor da astreinte, englobando nela tanto as parcelas vincendas como as já venci-
das. O STJ havia consolidado a tese (tema 706)4 de que “a decisão que comina as-
treintes não preclui, tampouco faz coisa julgada”. Deste modo, a multa cominatória
não integrava a coisa julgada, podendo ser cominada, alterada ou suprimida posteri-
ormente, cuja redução do “crédito” total resultante da incidência das astreintes era
formalizada em qualquer momento processual e embasada na necessidade de se
evitar o enriquecimento indevido do credor.
Todavia, com o advento do CPC de 2015, abriu-se divergência jurisprudenci-
al quanto a possibilidade de a modificação da multa cominatória produzir efeitos ex
tunc, atingindo as parcelas já vencidas. Apesar disso, o fato é que a finalidade do
instituto da astreinte é, e sempre foi, de consenso doutrinário e jurisprudencial para
prevenir o descumprimento das ordens judiciais, de modo que o processo seja efeti-
vo. Ela tem por escopo assegurar a efetividade da prestação jurisdicional, com o
propósito de garantir a concreta observância do mens legis.

4
Apesar de não haver previsão expressa no CPC/1973 de que a multa cominatória poderia ser excluída, o
Superior Tribunal de Justiça, mediante o Tema 706 de recurso repetitivo, decidiu, dentre outros, pela
possibilidade de supressão da multa cominatória, sob o fundamento de que ela não integra a coisa julgada,
servindo apenas como um meio de coerção indireta ao cumprimento da ordem judicial.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 617


Angela Alves de Sousa / Sandra Mara Franco Sette / Clayton Reis

Todos os mecanismos até aqui apresentados têm a função de observar o novo


contorno da responsabilidade civil, na sociedade pós-moderna e, todas as transfor-
mações que ela trouxe e que forma o ordenamento jurídico atende à demanda social,
em especial, nos casos de lesão a direitos de personalidade e de direitos humanos por
parte das grandes corporações.
Na responsabilidade civil brasileira, tal como já exposto na presente pesquisa,
existem duas espécies de dano: uma de ordem extrapatrimonial (danos morais) e
outra patrimonial (danos materiais). O dano material engloba os danos emergentes e
lucros cessantes. Enquanto o primeiro consiste no efetivo prejuízo patrimonial su-
portado pela vítima, já este é um dano mediato/futuro, que corresponde aquilo que
ela razoavelmente deixará de lucrar com a violação do seu direito. Já os danos extra-
patrimoniais podem ser danos morais, estéticos, existenciais, perda de uma chance,
que não possuem expressão material, mas, abalam significativamente os direitos de
personalidade e o foro íntimo da pessoa.
Todavia, nos últimos anos, doutrina e jurisprudência têm iniciado tímida dis-
cussão sobre a possibilidade de dilação dessa função compensatória, de modo que
sejam dissuadidos comportamentos nocivos sem que isso se configure como aplica-
ção de uma pena civil.
A realidade dinâmica e complexa da sociedade pós-moderna exige que os
institutos do Direito Civil sejam compreendidos como um processo em permanente
abertura e reformulação. Diante das lacunas do direito legislado, buscou-se estudar o
instituto do common law denominado disgorgement, que se define como uma cate-
goria autônoma de dano em que o quantum debeatur indenizatório é mensurado a
partir do lucro do ofensor, obtido com a violação daquele direito. Essa terceira cate-
goria de dano não se enquadra ao conceito de danos morais, mas é aplicada, dentre
outros casos, quando a vítima tem afetado seu direito de imagem através de, por
exemplo, vinculação não autorizada ou indevida a uma determinada marca, o que
gera lucro para quem violou o direito de personalidade.
A priori, percebe-se uma barreira ao enquadramento dogmático do disgor-
gement em sede de responsabilidade civil, o que nos leva àquelas recorrentes situa-
ções em que os lucros com a violação do direito são superiores aos danos experi-
mentados pela vítima, tendo em vista que, mesmo após quantificar a “devida” inde-
nização, o ofensor encontrar-se-á em situação melhor do que estava antes de ter
violado aquele direito. Nesse caso, a técnica do disgorgement oferece uma compen-
sação a mais, pois a devolução deverá corresponder a todos os valores (lucros) inde-
vidos obtidos pelo autor do delito com a violação do direito de outrem.
Desta forma, o mecanismo citado promove uma indenização com valor bem
acima do estipulado pelo instituto da responsabilidade civil, levando em considera-
ção que a vítima precisa ser devidamente compensada com uma participação nesses
lucros obtidos de forma ilícita. E como a compensação será uma via de reparação
com a participação nos lucros, o mecanismo deverá funcionar como uma terceira via
de culpa, protegendo o indivíduo sob variados aspectos já que aplicação de uma
multa não anula a outra.

618 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


A Responsabilidade Civil e a Recorrente Violação aos Direitos de Personalidade e ao Meio Ambiente...

Algumas questões que foram ganhando dimensão e espaço cada vez mais
consolidados especialmente quando se pode observar que há incidência das lesões
aos direitos humanos, não importando mais sua classificação, se de personalidade ou
simplesmente fundamentais, que persistem na intimidade das empresas, em especial
as transnacionais.
Há na jurisprudência brasileira, diversos casos em que a violação aos direitos
de personalidade é de certa forma lucrativa ao ofensor, pois os seus lucros são supe-
riores aos valores pagos a título de indenização, a partir da ideia clássica da função
meramente ressarcitória da responsabilidade civil e da divisão em danos patrimoni-
ais e extrapatrimoniais.
A função desse terceiro vértice da culpa, denominado disgorgement, como
instrumento preventivo, é o meio mais adequado a ser adotado para materialização
de uma reparação integral, devendo ser somada a uma eficácia preventiva de novos
ilícitos, com a finalidade de desencorajar a prática ou a reiteração de infrações.
(ROSENVALD, 2017, p. 162)
Todos os institutos ora apresentados são instrumentos de efetivação e cum-
primento dos propósitos da Responsabilidade Civil e, devem ser considerados quan-
do da análise da conduta lesiva, de forma a ratificar o cumprimento de sua função
reparadora, sancionatória e pedagógica. Um novo olhar ao referido instituto passa a
ser atribuição de todos os envolvidos no sistema jurídico, quer sejam doutrinadores,
operadores do direito, integrantes do Poder Judiciário, entre outros, de forma pri-
mordial com o propósito de coibir as condutas lesivas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Devido a complexidade do tema e de seus desdobramentos, cabe ao Direito
equilibrar e promover diálogos entre seus institutos, de forma a possibilitar sua ope-
racionalidade. Através do ordenamento jurídico brasileiro se poderá apontar a fragi-
lidade nele contida que permite e corrobora para a atuação das grandes corporações
na manipulação e permanência de atitudes de atos lesivos com intuito de produções
de baixo custo.
Danos reiterados são causados pelas grandes corporações, inclusive no âmbi-
to daqueles de ordem moral e ambiental, de forma a exigir dos operadores do direito
um novo olhar para o instituto da Responsabilidade Civil, fazendo com que este
cumpra suas finalidades, especialmente a pedagógica. No que diz respeito ao dano
ambiental, somente a finalidade reparatória não seria suficiente a dar cumprimento a
responsabilidade social.
Entende-se que o nullum crime, nulla poena sine lege possui aplicabilidade
restrita às penas de natureza criminal. A sanção civil, não obstante a finalidade de
exercer coerção sobre o autor da ofensa – e atingi-lo em seu patrimônio – afasta-se
do universo penal, para atuar em campo delimitado de natureza civil.
Não se vislumbra óbices à finalidade punitiva da Responsabilidade Civil, me-
lhor interpretação do inc. V do art. 5º da Constituição Federal de 1988, justamente

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 619


Angela Alves de Sousa / Sandra Mara Franco Sette / Clayton Reis

pelo fato de a lesão ao atingir o patrimônio moral do ser humano, ofender direitos da
personalidade, a integridade psicofísica, os valores mais relevantes que compõem o
princípio Constitucional da dignidade do ser humano e o imensurável patrimônio da
consciência. A imposição de valor em pecúnia, com finalidade punitiva, no caso
analisado se justifica amplamente.
Ao Direito não cabe satisfazer apenas o papel de tornar a vítima indene, sem
danos ou de mera recomposição patrimonial, mas sim, cumprir sua função de pre-
venção, de desestímulo justa, ou seja, com uma função de elevado alcance social.

REFERÊNCIAS
ASSIS, Araken de, Manual da Execução, 10. ed, São Paulo, RT, 2006
BRASIL, Constituição Federal de 1988, Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constitui
cao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em: 01 mai.2019
_______, Código Civil Brasileiro, Lei 10.406 de 10.01.2002. Disponível em: <http://www.planalto.g
ov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm>.Acesso em: 01 jul. 2017.
_______, Código civil e legislação civil em vigor. Org. Theotonio Negrão com a colaboração de José
Roberto Ferreira Gouvêa. 22. ed. atual, São Paulo, Saraiva, 2003.
DINAMARCO, Cândido Rangel, A reforma do Código de Processo Civil, São Paulo, Malheiros, 1995.
FOUCAULT, Michel, Vigiar e punir: nascimento da prisão, Tradução de Raquel Ramalhete, Petrópolis,
Vozes, 1987.
GIDDENS, Anthony, As Consequências da Modernidade, São Paulo, UNESP: 1991.
HOMA – Centro de Direitos Humanos e Empresas, Direitos Humanos e Empresas: o estado da arte do
direito brasileiro. Disponível em: <http://homacdhe.com/wp-content/uploads/2016/10/O-ESTADO-DA-
ARTE-FINAL-VERSION1.pdf>. Acesso em: 01 mai.2019
IGREJA CATÓLICA, Papa Francisco, Carta Encíclica Laudato Si: sobre o cuidado da casa comum, São
Paulo, Paulinas, 2015.
LATOUR, Bruno, Jamais Fomos Modernos: Ensaio de Antropologia Simétrica, 34. ed. Tradução de
Carlos Irineu da Costa, Rio de Janeiro, Coleção Trans, 1994
LEITE, José Rubens Morato et all. Estado de Direito Ambiental: tendências, in José Joaquim Gomes
Canotilho, Rio de Janeiro, Forense Universitária, 2004.
LIPOVETSKY, Gilles, A Era do vazio, Ensaios sobre o individualismo contemporâneo, 70. ed. Barueri,
Manole, 2016.
REALE, Miguel, Estudos de Filosofia e Ciência do Direito, São Paulo, Saraiva, 1978.
ROSENVALD, Nelson, As Funções da Responsabilidade Civil: a Reparação e a Pena civil, 3. ed. São
Paulo: Atlas, 2017.
SEINO, Eduardo; ALGARVE, Giovana; GOBBO, José Carlos, ABERTURA POLÍTICA E REDEMO-
CRATIZAÇÃO BRASILEIRA: entre o moderno-conservador e uma “nova sociedade civil”, Araraquara, v.
2, n. 1, 2, p. 31-42, 2013. Disponível em: <https://periodicos.fclar.unesp.br/semaspas/article/download
/6922/4982. Acesso em: 30 abr.2019
SILVA, João Calvão da, Cumprimento e Sanção Pecuniária Compulsória, Coimbra, Almedina, 1987.
VENOSA, Silvio de Sávio, Direito Civil: responsabilidade civil, 3. ed, São Paulo, Atlas, 2003/2010.
YOSHIDA, Consuelo; KISHI, Sandra Akemi Shimada; PIAZZON, Renata; VIANNA, Marcelo Drugg
Barreto. Finanças Sustentáveis e a Responsabilidade Socioambiental das Instituições Financeiras, Belo
Horizonte, Fórum, 2017.

620 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


A Responsabilidade Civil e a Recorrente Violação aos Direitos de Personalidade e ao Meio Ambiente...

LA VIDEOVIGILANCIA DE LOS TRABAJADORES


MEDIANTE CÁMARAS OCULTAS: EL CASO
LÓPEZ RIBALDA Y OTROS C. ESPAÑA
(STEDH DE 17 DE OCTUBRE DE 2019)
VIDEO SURVEILLANCE OF THE WORKERS THROUGH
HIDDEN CAMERAS: THE CASE OF LÓPEZ RIBALDA AND
OTHERS C. SPAIN (STEDH OF OCTOBER 17TH, 2019)
DOI: 10.19135/revista.consinter.00011.30
Recibido/Received 19.04.2020– Aprobado/Approved 17.08.2020
Antonio Felipe Delgado y Jiménez1– https://orcid.org/0000-0002-1620-2737
E-mail: antdelgadojimenez@gmail.com / antdelga@ucm.es

Resumen: Se analiza si la grabación del empresario al trabajador con cámaras ocultas y


en el centro de trabajo vulnera la normativa. Para ello traemos a colación la reciente
sentencia de la Gran Sala del TEDH, caso López Ribalda II, que justifica la instalación
de las cámaras por la existencia de sospechas razonables con pérdidas significativas para
el empresario.
Palabras-clave: Cámaras ocultas, grabación, sospechas, irregularidades.
Abstract: This research study analyses if the recording of the employer to the employee
with hidden cameras in the workplace violates the regulations. To do so, we bring up the
recent judgment of the Grand Chamber of the ECHR, case López Ribalda II, that
justifies the installation of cameras due to the existence of reasonable suspicions with
significant losses for the employer.
Keywords: Hidden cameras, recording, suspicions, irregularities.
Sentencia objeto de comentario: STEDH, Case of López Ribalda and others v. Spain,
17th October 2019 (Applications nos. 1874/13 and 8567/13).
Sumario: 1. – Introducción 2. – Resumen de la sentencia de 17 de octubre de 2019
(López Ribalda II) 2.1. – Problema suscitado. Hechos y antecedentes 2.2. – Impacto a
nivel interno 2.3. – Doctrina básica 2.4. – Proporcionalidad 2.5. – Apunte final 2.6. –
Conclusiones 3. – Bibliografía

1 INTRODUCCIÓN
1. Si bien la celebración de un contrato de trabajo no implica, en modo
alguno, la supresión de los derechos fundamentales de los trabajadores2, sin

1
Doctor en Derecho. Facultad de Derecho, Departamento de Derecho Constitucional, Universidad
Complutense de Madrid. E-mail: antdelgadojimenez@gmail.com / antdelga@ucm.es
2
SSTC 38/1981, de 3 de noviembre, FJ 4º; 88/1985, de 19 de julio, FJ 3º; 4/1996, de 16 de enero, 98/2000,
de 10 de abril, FJ 4º; 308/2000, de 18 de diciembre, FJ 5º y 126/2003, de 30 de junio, FJ 4º.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 621


Antonio Felipe Delgado y Jiménez

embargo, ello no significa la imposición dstos a la actividad empresarial dada su


prevalente jerarquía normativa3.
En efecto, no cabe confundir el valor específico del bien jurídico con la
garantía de protección4, de forma que no existe, a priori, una jerarquía normativa que
haga prevalecer automáticamente unos derechos sobre otros, sino que habrá que
decidir, en cada caso concreto, de conformidad con la ponderación de intereses en
juego, cuál sea el más digno de protección para justificar la limitación del otro
derecho fundamental en conflicto5.
2. En consecuencia, no es posible resolver el conflicto entre derechos
fundamentales, como entiendo que se debería de hacer, desde la perspectiva de la
prevalencia jerárquica, sino desde una ponderación específica, en cada caso
concreto, en orden a la determinación del interés que deba prevalecer6.
3. Ello no obstante, parte de la doctrina entiende que sí hay derechos de carácter
prevalente frente a otros, pero no respecto a los intereses empresariales, sino entre los
propios derechos fundamentales, por entender que son portadores de otros intereses al
estar dotados de una relevancia especial, como puede ser el derecho de información7.
Cuando se produzca un conflicto en este último caso se deberá resolver mediante el
juicio de comparación. En cambio, cuando el conflicto se produce entre derechos
equiparados, se deberá resolver a través del juicio de proporcionalidad8.
Otros, en cambio, opinan que, en realidad, se trata de una misma técnica,
habida cuenta de que el juicio de comparación conlleva un juicio de
proporcionalidad, que es el que permite establecer la prevalencia en cada caso
concreto9. De este modo, el conflicto se resolverá mediante la ponderación a través
de un juicio de proporcionalidad en sentido estricto10, siempre que no hubiere otra

3
TOSCANI GIMÉNEZ, V., “La videovigilancia de los trabajadores con cámaras ocultas o clandestinas.
Comentario a las SSTEDH de 9 de enero de 2018 y 17 de octubre de 2019, caso López Ribalda”, Trabajo y
Derecho, n. 60, Diciembre 2019, p. 69.
4
JIMÉNEZ CAMPO, J., Derechos fundamentales. Concepto y garantías, Ed. Trotta, Valladolid, 1999, p. 14.
5
GOÑI SEIN, J.L., “Los derechos fundamentales inespecíficos en la relación laboral individual: ¿necesidad
de una reformulación?”, Primera Ponencia de las XXIV Congreso Nacional de Derecho del Trabajo y de la
Seguridad Social, organizadas por la Asociación Española de Derecho del Trabajo y Seguridad Social,
Pamplona, 2014, p. 11.
6
STC 320/1994, de 28 de noviembre. A respecto, véase, CASAS BAAMONDE, Mª. E., “La plena
efectividad de los derechos fundamentales: juicio de ponderación (¿o de proporcionalidad?) y principio de
buena fe”, Revista Relaciones Laborales, n. 12, 2004, p. 1.
7
GOÑI SEIN, J.L., “Los derechos fundamentales inespecíficos en la relación laboral individual: ¿necesidad
de una reformulación?”, Primera Ponencia de las XXIV Congreso Nacional de Derecho del Trabajo y de la
Seguridad Social, organizadas por la Asociación Española de Derecho del Trabajo y Seguridad Social,
Pamplona, 2014, p. 47.
8
CASAS BAAMONDE, Mª. E., “La plena efectividad de los derechos fundamentales: juicio de ponderación
(¿o de proporcionalidad?) y principio de buena fe”, Revista Relaciones Laborales, n. 12, 2004, p. 3.
9
DESDENTADO BONETE, A. y MUÑOZ RUIZ, A. B., Control informático, videovigilancia y protección
de datos en el trabajo, Ed. Lex Nova, Valladolid, 2013, p. 42.
10
SSTC 199/1999, de 8 de noviembre, FJ 4º y 126/2003, de 30 de junio, FJ 5º.

622 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Videovigilancia de los Trabajadores Mediante Cámaras Ocultas: el Caso López Ribalda y Otros c. España

forma de hacerlo11. Esto es, se habrá de llevar a cabo un juicio de proporcionalidad


en sentido estricto en orden a determinar si la limitación del derecho fundamental
del trabajador está o no justificada12.
4. En la actualidad, además, la jurisprudencia parece añadir un nuevo
elemento que, en realidad, tendría preferencia sobre los demás para dirimir el
conflicto de intereses, al menos en cuanto a la utilización de medios tecnológicos
para controlar el cumplimiento de los deberes laborales, cual es el de la expectativa
de confidencialidad derivada de las reglas de uso de esos medios que la propia
empresa hubiere establecido al efecto13, de modo que dependerá de estas reglas y de
su comunicación e información expresa a los trabajadores y de la posibilidad de
sanciones al efecto para que no exista expectativa de confidencialidad alguna y no se
vulnere el derecho a la intimidad.
5. El art. 4.2 e) ET sostiene que los trabajadores tienen derecho al respeto de su
intimidad, consagrado en el art. 18 CE. La forma más habitual en que puede verse
afectada la intimidad de los trabajadores es a través de la facultad que el empresario tiene
de controlar y vigilar el cumplimiento de las obligaciones laborales (art. 20.3 ET),
generándose, de este modo, un conflicto entre los poderes de vigilancia y control de este
y el derecho a la intimidad de los trabajadores, que debe ser resuelto fijando los límites
de esos poderes para establecer cuándo son legítimos y cuándo no.
6. Esta facultad de vigilancia de la empresa puede ser llevada a efecto a través
de diversas formas, si bien aquí nos centraremos en la posibilidad de hacerlo sin
informar a los trabajadores, esto es, a través de cámaras ocultas.
Al respecto se puede argumentar que los medios audiovisuales de vigilancia
y control deben ser conocidos por los trabajadores, tanto en su existencia, como en
su ubicación, no pudiéndose colocar, por tanto, medios ocultos para grabar a
aquellos sin que estos lo sepan14, de tal modo que tanto la existencia de aquellos

11
SSTC 99/1994, de 11 de abril, FJ 3º; 6/1995, de 10 de enero, FJ 4º; 204/1997, de 25 de noviembre, FJ 4º;
55/1998, 98/2000, de 10 de abril, FJ 5º; 186/2000, de 10 de julio, FJ 5º y 125/2007, de 21 de mayo, FJ 6º.
12
SSTC 14/2003, de 28 de enero, FJ 5º; 270/1996, de 6 de diciembre, FJ 4º; 37/1998, de 17 de febrero, FJ 3º;
186/2000, de 10 de julio, FJ 5º; 198/2003, de 10 de noviembre, FJ 4º y 173/2004, de 18 de octubre, FJ 5º.
Véase, VALDÉS DAL-RÉ, F., “Poderes del empresario y derechos de la persona del trabajador”, Revista
Relaciones Laborales, n. 8, 1990, p. 100; GARCÍA–PERROTE ESCARTÍN, I. y MERCADER UGUINA,
J., “Conflicto y ponderación de los derechos fundamentales de contenido laboral. Un estudio introductorio”,
AA. VV., Dir. SEMPERE NAVARRO, A., El modelo social en la Constitución Española de 1978, Ed.
Ministerio de Trabajo y Asuntos Sociales, Madrid, 2003, p. 258; TERRADILLOS ORMAETXEA, E.,
Principio de proporcionalidad, Constitución y Derecho del Trabajo, Ed. Tirant Lo Blanch, Valencia, 2004;
BALLESTER PASTOR, I.: “Facultades de control empresarial sobre el aspecto exterior del trabajador:
límites a la expresión del derecho a su propia imagen en el desarrollo de la prestación laboral”, TS n. 169,
2005, p. 32 y SEMPERE NAVARRO, A. V. y SAN MARTÍN MAZUZUCCONI, C., Los derechos
fundamentales (inespecíficos) en la negociación colectiva, Ed. Aranzadi, Pamplona, 2011, p. 279.
13
SSTS de 26 de septiembre de 2007, FJ 2º y 8 de marzo de 2011, FJ 3º y SSTC 241/2012, FJ 5º y 170/2013,
FJ 6º.
14
Vid. GOÑI SEIN, J.L., La videovigilancia empresarial y la protección de datos personales, Ed. Aranzadi,
Pamplona, 2007.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 623


Antonio Felipe Delgado y Jiménez

como su concreto emplazamiento habrán de ser comunicados de modo expreso tanto


a los representantes de los trabajadores como a los propios trabajadores15.
No obstante, podemos encontrar pronunciamientos judiciales que consideran
que no es necesario notificar la existencia de estos medios audiovisuales si solo se
utilizan para controlar los puestos de trabajo, ya que el trabajador debe cumplir sus
obligaciones laborales de conformidad con las reglas de la buena fe, lo que,
obviamente, excluye la realización, en horario laboral, de actividades ajenas a su
responsabilidad laboral16.
7. En este artículo se analiza, pues, la posibilidad de grabar al trabajador
mediante sistemas de videovigilancia ocultos dentro del centro de trabajo. Es decir,
sin informar previamente a aquel.
Resulta obvio que con dicha grabación se genera una fuerte tensión dialéctica
entre varios derechos que disfrutan de dimensión constitucional, a saber: por un
lado, la libertad de empresa, la propiedad privada y la tutela del patrimonio
empresarial (art. 38 CE); y, por otro, los derechos fundamentales a la intimidad (art.
18.1 CE), al secreto de las comunicaciones (art. 18.3 CE) y a la protección de datos
personales (art. 18.4 CE).
Derechos que, a su vez, deben ponerse en relación con la normativa del
CEDH, en especial, con los arts. 6 (referido al derecho a un proceso justo o
equitativo) y 8 (referido al derecho al respeto a la vida privada y familiar).
Es evidente que, en este tema, se suscitan multitud de cuestiones conflictivas
respecto al alcance y prevalencia de cada uno de los derechos, centrándonos, en este
artículo, en la solución recientemente otorgada por el TEDH en su sentencia de
fecha 17 de octubre de 2019, caso López Ribalda II, en la que se aplica también el
contenido de otros supuestos planteados como el caso Barbulescu I y II c. Rumanía
y el caso Libert c. Francia.
Identificación de la resolución judicial comentada
Tipo de resolución judicial: sentencia.
Órgano judicial: Gran Sala del Tribunal de Europeo de Derechos
Humanos.
Número de resolución judicial y fecha: 1874/13 y 8567/13 de 17 de
octubre de 2019.
Ponente. Linos-Alexandre Sicilianos (presidente), Guido Raimondi,
Angelika Nußberger, Robert Spano, Vincent A. De Gaetano, Jon Fridrik Kjølbro,
Ksenija Turković, Işıl Karakaş, Ganna Yudkivska, André Potocki, Aleš Pejchal,
Faris Vehabović, Yonko Grozev, Mārtiņš Mits, Gabriele Kucsko-Stadlmayer, Lәtif
Hüseynov, María Elósegui, judges, y Søren Prebensen.
Votos Particulares. Sí. Voto disidente de los jueces Vincent A. De Gaetano,
Ganna Yudkivska y Yonko Grozev.

15
STSJ de Madrid 20 de diciembre de 2006.
16
STSJ de Cataluña de 5 de julio de 2000.

624 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Videovigilancia de los Trabajadores Mediante Cámaras Ocultas: el Caso López Ribalda y Otros c. España

2 RESUMEN DE LA SENTENCIA DE 17 DE OCTUBRE DE 2019 (LÓPEZ


RIBALDA II)
2.1 Problema Suscitado. Hechos y Antecedentes.
1. Habiendo sido declarado procedente el despido por parte del Juzgado de lo
Social n. 1 de Granollers y, posteriormente, por el Tribunal Superior de Justicia de
Cataluña, y previa inadmisión de los recursos interpuestos ante el Tribunal Supremo
y el Tribunal Constitucional, las trabajadoras solicitaron al TEDH que se declarase
la transgresión del art. 8 – derecho al respeto de la vida privada– y del art. 6.1 –
derecho a un proceso justo o equitativo– del Convenio Europeo de Derechos
Humanos.
– Hechos
2. La empresa, tras constatar descuadres de caja en uno de sus
establecimientos, instaló cámaras de vigilancia, tanto de forma visible como oculta,
para esclarecer el origen de esta situación.
Estos dispositivos tenían objetivos distintos: (i) los visibles, que enfocaban
los accesos al centro de trabajo, determinarían si las anomalías detectadas eran
imputables a clientes de la empresa (las cámaras visibles); mientras que (ii) los
ocultos, que mediante un zoom apuntaban a los mostradores de salida que cubrían la
zona de detrás de las cajas registradoras, verificarían si la autoría de dichos
descuadres correspondía a algún trabajador que ejerciese funciones en la caja (las
cámaras ocultas). Para garantizar el éxito de la medida, la empresa solo informó a
los trabajadores sobre la instalación de las cámaras visibles, pero no de las cámaras
ocultas.
Las grabaciones de las cámaras ocultas, que se prolongaron
ininterrumpidamente durante dos semanas y a lo largo de toda la jornada laboral,
revelaron que cinco trabajadoras eran las responsables de las irregularidades
detectadas, por lo que la empresa procedió a su despido disciplinario.
Las trabajadoras impugnaron la extinción contractual alegando, por cuanto
aquí interesa, que, al no haber sido debidamente informadas sobre la instalación y
objeto de las cámaras ocultas, el uso laboral de estos dispositivos había vulnerado su
derecho a la intimidad (vida privada). Tras agotar las instancias judiciales nacionales
sin que sus pretensiones tuviesen acogida, las trabajadoras recurrieron al TEDH,
cuya resolución da lugar a la sentencia que aquí se analiza.
Fundamentos de Derecho
3. El TEDH, tras recordar que la monitorización laboral a través de las
videocámaras puede colisionar con el derecho a la vida privada de los trabajadores
(art. 8 CEDH), enjuicia si, en el caso analizado, se ponderó adecuadamente el
derecho a la vida privada de las trabajadoras y la potestad de dirección y control de
la empresa.
A estos efectos, el TEDH realiza las siguientes consideraciones:

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 625


Antonio Felipe Delgado y Jiménez

(i) La videovigilancia se adoptó al existir sospechas sobre la comisión de


un hurto en el centro de trabajo. No obstante, las sospechas no se
concretaban en las cinco trabajadoras, sino que afectaban a la
generalidad de trabajadores de las cajas registradoras.
(ii) Los datos personales obtenidos por las cámaras ocultas fueron
visualizados por parte de varios sujetos (entre otros, el representante
legal de la empresa y el delegado sindical) antes de que las trabajadoras
fuesen informadas sobre la existencia de las grabaciones.
(iii) Las trabajadoras tenían una expectativa razonable de privacidad, ya que
la empresa incumplió su deber de informar de forma previa, expresa,
precisa, clara e inequívoca a los empleados sobre la instalación y
finalidad de las cámaras ocultas (ex art. 5 Ley Orgánica 15/1999, de 13
de diciembre, de Protección de Datos de Carácter Personal e Instrucción
1/2006 de la Agencia Española de Protección de Datos, vigentes en el
momento de los hechos).
(iv) La monitorización no fue puntual, sino que se extendió,
ininterrumpidamente y a lo largo de toda la jornada laboral, durante
varias semanas.
(v) El TEDH concluye que, en vista de las circunstancias fácticas
concurrentes, (i) los derechos de las trabajadoras podían haber sido
salvaguardados si se hubiera proporcionado información (incluso de un
modo general) sobre la instalación del sistema de videovigilancia; y (ii)
la monitorización realizada a través de las cámaras ocultas no había sido
ponderada adecuadamente en relación con el derecho a la vida privada
de las trabajadoras.
– Fallo
4. El TEDH falla que el control empresarial ejercido a través de las cámaras
ocultas no es proporcional a la injerencia que su implementación produjo en la vida
privada de las trabajadoras. En consecuencia, declara, por seis votos a favor y uno en
contra, que (i) se había violado el art. 8 del CEDH y (ii) reconoce el derecho de las
trabajadoras a percibir una indemnización por daños y perjuicios (por valor de 4.000
euros), así como las costas procesales.
2.2 Impacto a Nivel Interno.
1. A la luz de los fundamentos jurídicos aducidos por el TEDH puede
concluirse que la proporcionalidad puede verse perturbada por la ausencia de
información sobre el tratamiento de los datos personales a los afectados. En efecto,
el TEDH entiende que al no haberse proporcionado la información obligatoria
conforme a la normativa de protección de datos personales, las trabajadoras gozaban
de una expectativa de privacidad que, en el presente caso, se ha visto vulnerada.
2. Sin embargo, de conformidad con el voto particular emitido por el juez
Dedov, resulta cuando menos sorprendente que pueda entenderse desproporcionada

626 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Videovigilancia de los Trabajadores Mediante Cámaras Ocultas: el Caso López Ribalda y Otros c. España

(i) la grabación de imágenes de las trabajadoras en su puesto de trabajo y durante la


jornada laboral – donde no se sobrentiende que vayan a realizarse actividades de
índole privada o personal, dado que se trata de cajas registradoras – y (ii) con un fin
claramente legítimo – como es el esclarecimiento de la autoría de hurtos cometidos
en la organización – que podría verse frustrado en caso de difusión.
En esta línea, no conforme con la decisión, el Reino de España solicita la
revisión del asunto por parte de la Gran Sala del Tribunal, la cual dicta nueva
sentencia con fecha 17 de octubre de 2019, conocida como López Ribalda II,
decidiendo, por catorce votos a favor y tres en contra, cambiar la solución adoptada:
ahora, la Gran Sala del TEDH considera que grabar a empleados con cámara oculta
no vulnera la intimidad cuando se trate de una medida proporcionada y legítima en
determinadas circunstancias. Es decir, nunca ante la más mínima sospecha de una
infracción por parte de los empleados, sino que se requiere la existencia de
sospechas razonables de que se ha cometido una infracción grave con perjuicios
importantes para la empresa.

2.3 Doctrina Básica.


1. Lo primero que hay que destacar de esta sentencia es que la misma
incorpora el Test Barbulescu de Garantía de la Privacidad (relativo al control del uso
del ordenador) al control por videovigilancia de los trabajadores en su puesto de
trabajo, de forma que los tribunales nacionales deberán tener en cuenta los siguientes
factores cuando sopesen los diversos intereses en conflicto:
i) Si el trabajador ha sido informado de la posibilidad de que el empleador
pudiera adoptar medidas de videovigilancia y de su efectiva implementación. Si bien
en la práctica los trabajadores pueden ser informados de varias maneras,
dependiendo de las circunstancias fácticas particulares de cada caso, la notificación
normalmente debe ser clara sobre la naturaleza de la vídeo vigilancia y debe ser
anterior a su aplicación.
ii) El alcance de la videovigilancia por parte del empresario y el grado de
intrusión en la privacidad del trabajador. En este sentido, se deberá tener en cuenta
el nivel de privacidad en el área que se está vigilando, junto con las limitaciones de
tiempo y espacio y la cantidad de personas que tienen acceso a los resultados.
iii) Si el empleador ha proporcionado razones legítimas para justificar la
videovigilancia y el alcance de la misma. Cuanto más intrusiva sea esta, mayor será
la justificación que se requerirá.
iv) Si hubiera sido posible establecer un sistema de videovigilancia basado en
métodos y medidas menos intrusivos. A este respecto, debe existir una evaluación a
la luz de las circunstancias particulares de cada caso en cuanto a si el objetivo
perseguido por el empleador podría haberse logrado a través de un menor grado de
interferencia con la privacidad del empleado.
v) Las consecuencias de la videovigilancia para el trabajador, debiendo
tenerse en cuenta, en particular, el uso que hace el empresario de los resultados de la

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 627


Antonio Felipe Delgado y Jiménez

supervisión y si dichos resultados se han utilizado para lograr el objetivo declarado


de la medida.
vi) Si el trabajador ha recibido las garantías apropiadas, de manera especial
cuando las operaciones de videovigilancia del empleador son de naturaleza intrusiva.
Dichas garantías pueden tomar la forma, entre otras, de proporcionar información a
los empleados interesados o a los representantes de los trabajadores en cuanto a la
instalación y el alcance de la videovigilancia, o una declaración de tal medida a un
organismo independiente o la posibilidad de presentar una queja .
En suma, se establece un riguroso control garantista de los derechos a la
intimidad y la protección de datos de las personas de los trabajadores.
2. En segundo lugar, un gran avance que ha supuesto la sentencia ha sido que
clarifica la cuestión de los controles ocultos y viene a validar y acotar la doctrina del
Tribunal Constitucional, sentada en su sentencia 186/2000, de 10 de julio, en cuya
virtud solo puede prescindirse de la información previa y la transparencia en la
videovigilancia en supuestos excepcionales, cuando consten sospechas razonables de
una infracción laboral que afecte gravemente a los intereses de la empresa y siempre
que no haya medios alternativos menos intrusivos.
El TEDH acota dicha doctrina precisando que no son válidos los controles
ocultos por el sistema de videovigilancia ante la más mínima sospecha de
apropiación indebida o cualquier otro delito por parte de los empleados, sino que
deben existir sospechas razonables de que se ha cometido una infracción grave que
atente gravemente contra los intereses de la empresa.
3. En tercer lugar, la sentencia no aprecia vulneración del art. 8 CEDH en los
controles ocultos porque los mismos fueron proporcionados, pero también porque
las demandantes podían denunciar la infracción de su derecho a la información en la
protección de datos ante la AEPD y ante los tribunales, tanto en vía civil como
administrativa, de modo que la infracción del deber de información de los
trabajadores en materia de protección de datos puede recibir su adecuada
compensación (AEPD, demanda civil en reclamación de daños y perjuicios).
4. Asimismo, el TEDH considera que la información que se debe suministrar
a los trabajadores objeto de videovigilancia constituye solo uno de los criterios a
tener en cuenta para evaluar la proporcionalidad de una medida de este tipo en un
caso dado. No obstante, si falta dicha información, las garantías derivadas de los
otros criterios serán aún más importantes.
Es decir, lo que la Gran Sala del TEDH hace en su sentencia es relativizar el
deber de información caracterizándolo como un componente más del juicio de
proporcionalidad (apartado 131 de la sentencia).
5. En definitiva, según la sentencia, la privacidad e intimidad de las personas
trabajadoras sigue exigiendo que, como norma general, el empresario les notifique
previamente las medidas intrusivas contra su intimidad y privacidad, informando
además sobre su finalidad.
6. Ahora bien, la Gran Sala admite que, en casos muy concretos en los que
existan sospechas fundadas de incumplimientos graves por parte de los trabajadores,

628 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Videovigilancia de los Trabajadores Mediante Cámaras Ocultas: el Caso López Ribalda y Otros c. España

se pueda usar, excepcionalmente, cámaras ocultas. Ello significa, según la Gran


Sala, que:
i) Cualquier mínima sospecha no justifica el uso de cámaras ocultas.
ii) Cualquier incumplimiento tampoco lo justifica, sino que este habrá de ser
grave o muy grave. E irregularidades graves o muy graves son delitos. Y no meros
actos ilícitos o simples incumplimientos laborales, que pueden ser infracciones
menos graves. Y es así, y no de otro modo, como debe interpretarse el segundo
párrafo del art. 89.1 de la Ley Orgánica 3/2018, de 5 de diciembre, de Protección de
Datos Personales y Garantía de los Derechos Digitales
iii) La medida debe de ser siempre limitada y proporcionada, no pudiendo ser
general e indiscriminada.
7. Por último, señalar que la sentencia cuenta con el voto particular
discrepante de tres Magistrados, que manifiestan su desacuerdo general con la
interpretación efectuada por los restantes magistrados por la razón de que la
sentencia “respalda una respuesta legal a una cuestión particular que surgió solo
después de los hechos y en relación con un caso particular. Si tal aproximación, que
da al juez nacional cierto margen de maniobra para elaborar una respuesta jurídica a
un conflicto que dé lugar a una controversia particular sobre derechos
convencionales concurrentes, puede ser apropiada en algunos casos, creemos que no
es apropiado para los casos de videovigilancia electrónica, precisamente por la
facilidad con la que se puede utilizar la tecnología para llevar a cabo y difundir la
vigilancia y difundir las imágenes por medios electrónicos, con las consecuencias
negativas potencialmente amplias e importantes que pueden tener sobre el derecho
de cada individuo al respeto de la privacidad. Un régimen jurídico claro y
predecible, que ofrezca garantías adecuadas y efectivas es crucial. En el presente
caso, el régimen jurídico en vigor no preveía más que una garantía específica, a
saber: la obligación de notificar a los empleados la instalación y el uso de la
monitorización, y no contemplaba ninguna excepción a esta garantía. Este elemento,
a nuestros ojos, es crucial a efectos de un análisis jurídico adecuado y de las
conclusiones a sacar en el caso en juego”.
8. En definitiva, el voto particular afirma con claridad que los tribunales
españoles no aplicaron el régimen jurídico que garantizara la protección de los datos,
ni tampoco tomaron en consideración la situación de las recurrentes de una manera
detallada e individualizada.
Con aplicación de las tesis recogidas en la sentencia Barbulescu II, y ahora
por la de 17 de octubre de 2019 (López Ribalda II), enfatiza que los tribunales
españoles deberían “haber considerado las medidas alternativas que el empleador
podría haber tomado para alcanzar su objetivo legítimo. Medidas que, al mismo
tiempo, habrían violado menos gravemente el derecho a la privacidad de los
trabajadores”, y que en ningún caso el legítimo ejercicio de acciones por parte
empresarial para tratar de encontrar respuesta a los problemas existentes de
sustracción de productos, es decir, una infracción punible en sede laboral no
justificaba una actuación privada como la que se llevó a cabo mediante la utilización

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 629


Antonio Felipe Delgado y Jiménez

de la videovigilancia que, para la sentencia de Sala, y ahora en tesis reiterada por el


voto discrepante, “constituye una medida en exceso intrusiva y un abuso de poder”
y, habiendo ahora sido aceptada por la Gran Sala, el TEDH está “animando a cada
una a tomarse la justicia por sí mismo”.
2.4 Proporcionalidad y Deber de Información
1. Para el TEDH, en orden a garantizar la proporcionalidad de las medidas de
videovigilancia en el lugar de trabajo, los tribunales nacionales habrán de tener en
cuenta los siguientes factores cuando sopesen los diversos intereses en conflicto:
i) Si el trabajador ha sido notificado de la posibilidad de que el empresario
adopte medidas de videovigilancia y de la implementación de dichas
medidas. Si bien en la práctica los empleados pueden ser notificados de
varias maneras, dependiendo de las circunstancias fácticas particulares de
cada caso, la notificación normalmente debe ser clara sobre la naturaleza
de la grabación y debe darse antes de la implementación.
ii) El alcance de la grabación por el empleador y el grado de intrusión en la
privacidad del trabajador. En este sentido, se debe tener en cuenta el nivel
de privacidad en el área que se está grabando, junto con las limitaciones
de tiempo y espacio y el número de personas que tienen acceso a los
resultados.
iii) Si el empleador ha proporcionado razones legítimas para justificar la
grabación y el alcance de la misma. Cuanto más intrusiva sea la
grabación, mayor será la justificación que se requerirá.
iv) Si hubiera sido posible establecer un sistema de grabación basado en
métodos y medidas menos intrusivas. En relación con esto, debe haber
una evaluación a la luz de las circunstancias particulares de cada caso en
cuanto a si el objetivo perseguido por el empleador podría haberse
logrado a través de un menor grado de interferencia con la privacidad del
trabajador.
v) Las consecuencias de la grabación para el trabajador. Debe tenerse en
cuenta, en particular, el uso que hace el empleador de los resultados de la
supervisión y si dichos resultados se han utilizado para lograr el objetivo
declarado de la medida.
vi) Si al trabajador se le ha proporcionado las salvaguardas apropiadas,
especialmente, cuando las operaciones de control del empresario son de
carácter intrusivo. Dichas garantías pueden adoptar la forma, entre otras,
de proporcionar información a los trabajadores interesados o a los
representantes del personal en cuanto a la instalación y el alcance de la
grabación, una declaración de tal medida a un organismo independiente o
la posibilidad de presentar una queja.
2. Asimismo, resulta necesario señalar que las tareas de las trabajadoras
demandantes se llevaron a cabo en un lugar que estaba abierto al público y en

630 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Videovigilancia de los Trabajadores Mediante Cámaras Ocultas: el Caso López Ribalda y Otros c. España

contacto permanente con los clientes involucrados. En este sentido, el TEDH


considera que es necesario distinguir, en el análisis de la proporcionalidad de una
medida de videovigilancia, los diversos lugares en los que se lleva a cabo la
supervisión a la luz de la protección de la privacidad que un empleado
razonablemente podría esperar. Esa expectativa es muy alta en lugares privados por
naturaleza, como inodoros o guardarropas, donde se justifica una mayor protección,
o incluso una prohibición total de la videovigilancia. Sigue siendo alta en áreas de
trabajo cerradas tales como oficinas. Es manifiestamente menor en lugares visibles o
accesibles para trabajadores o, como en el presente caso, para el público en general.
3. En cuanto al alcance de la medida a lo largo del tiempo, el TEDH observa
que, si bien, como argumentaron los demandantes, el empleador no había
establecido de antemano la duración de la videovigilancia, en realidad duró diez días
y cesó tan pronto como los empleados responsables habían sido identificados. Por lo
tanto, la duración de la monitorización no parece excesiva en sí misma (compárese,
por ejemplo, con el asunto Köpke, donde no se encontró que una duración de catorce
días fuese desproporcionada).
Teniendo en cuenta estos factores, el TEDH considera que la intrusión en la
privacidad de las trabajadoras no alcanzó un alto grado de seriedad.
4. En cuanto a si, por último, se informó a las trabajadoras de la instalación de
la videovigilancia, el TEDH observa que no se discute que se instalaron dos tipos de
cámaras en el supermercado donde trabajaban: por un lado, cámaras visibles
dirigidas hacia la entrada y salida de la tienda, de las cuales, el empleador había
informado al personal; y, por otro, cámaras ocultas dirigidas a las áreas de pago, de
las cuales, ni los trabajadores despedidos ni los demás miembros del personal habían
sido informados.
El TEDH observa que, si bien tanto la legislación española como las normas
internacionales y europeas pertinentes no parecen requerir el consentimiento previo
de las personas que se someten a videovigilancia o, en general, que tienen sus datos
personales recopilados, esas normas establecen que, en principio, es necesario
informar a las personas interesadas, de forma clara y previa a la implementación, de
la existencia y las condiciones de dicha recopilación de datos, aunque solo sea de
manera general.
Considera que el requisito de transparencia y el consiguiente derecho a la
información son de naturaleza fundamental, particularmente en el contexto de las
relaciones laborales, donde el empleador tiene poderes significativos respecto a los
empleados debiéndose evitar cualquier abuso de esos poderes. Sin embargo, la
provisión de información al individuo que se está monitorizando y su alcance
constituyen solo uno de los criterios a tener en cuenta para evaluar la
proporcionalidad de una medida de este tipo en un caso dado. Por tanto, si falta
dicha información, las salvaguardas derivadas de los otros criterios serán aún más
importantes.
5. En el presente caso, el TEDH observa que los tribunales del orden social
que examinaron las reclamaciones de los trabajadores llevaron a cabo un ejercicio de

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 631


Antonio Felipe Delgado y Jiménez

equilibrio detallado entre, por un lado, su derecho al respeto de su vida privada, y,


por el otro, el interés del empleador en garantizar la protección de su propiedad y el
buen funcionamiento de la empresa. Los tribunales nacionales verificaron así si la
videovigilancia estaba justificada por un objetivo legítimo y si las medidas
adoptadas con ese fin eran apropiadas y proporcionadas, observando en particular
que el objetivo legítimo perseguido por el empleador no podía lograrse con medidas
que fueran menos intrusivas para los derechos de los trabajadores.
Mientras no se puede aceptar la proposición de que, en términos generales,
una mínima sospecha de apropiación indebida o cualquier otro delito por parte de los
empleados podría justificar la instalación de videovigilancia encubierta por parte del
empleador, la existencia de sospechas razonables de que se ha cometido una mala
conducta grave y el alcance de las pérdidas identificadas en el presente caso sí
parece ser una justificación importante. Esto es aún más cierto en una situación en la
que el buen funcionamiento de una empresa está en peligro no solo por la sospecha
del mal comportamiento de un solo empleado, sino más bien por la sospecha de una
acción concertada por parte de varios empleados, ya que esto crea una atmósfera
general de desconfianza en el lugar de trabajo.
6. En virtud del art. 6 CEDH, las trabajadoras se quejaron de que las
grabaciones obtenidas en violación de su derecho al respeto de su vida privada
habían sido admitidas y utilizadas como prueba por los tribunales españoles.
Además, tres de las cinco trabajadoras despedidas alegaron que el reconocimiento de
la validez de los acuerdos de solución que habían firmado, supuestamente tras una
manipulación engañosa por parte del empleador, también había violado su derecho a
un proceso justo o equitativo.
De acuerdo con la jurisprudencia del TEDH, la videovigilancia no se había
aplicado transgrediendo el derecho de los trabajadores. Además, también señalaron
que las imágenes obtenidas de la videovigilancia no eran los únicos elementos que
evidenciaban el despido. No obstante, el TEDH observa que las grabaciones en
cuestión no fueron la única evidencia en la que los tribunales nacionales basaron sus
conclusiones. También se tuvieron en cuenta declaraciones, el testimonio del gerente
del supermercado, los representantes y del personal, e informes de expertos en las
que se acompañan las imágenes grabadas y los recibos de la caja de la empresa. En
estos últimos recibos se evidencian que un número significativo de compras habían
sido canceladas sin pago. También se basaron en la validez de los acuerdos que tres
de los cinco trabajadores habían firmado con la empresa.
A la luz de lo anterior, el Tribunal considera que el uso como prueba de las
imágenes obtenidas por videovigilancia no socavaba la imparcialidad del proceso en
el presente caso.
7. Respecto a la validez de los acuerdos de extinción de las relaciones
laborales firmado por tres de las cinco trabajadoras, el TEDH señala que los
tribunales nacionales aceptaron la validez de tales acuerdos firmados por no
encontrarse el consentimiento viciado. Se señala a este respecto que los tribunales
nacionales analizaron todos los argumentos presentados por los trabajadores

632 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Videovigilancia de los Trabajadores Mediante Cámaras Ocultas: el Caso López Ribalda y Otros c. España

despedidos y consideraron que las circunstancias del presente caso no indicaban


ninguna intimidación o engaño por parte del empleador. Examinaron las
circunstancias en que se habían firmado los acuerdos y encontraron que la presencia
del representante sindical en el momento de la firma, el reconocimiento previo de
los actos por parte de los solicitantes durante una reunión con ese representante, y el
hecho de que otros empleados que estaban despedidos no habían firmado el acuerdo
con el empresario, descartaban cualquier indicio de coacción.
8. En estas circunstancias, teniendo en cuenta las importantes salvaguardas
previstas por el marco jurídico español, incluidos los recursos que las trabajadoras
no utilizaron, y el peso de las consideraciones que justifican la videovigilancia, tal
como lo tienen en cuenta los tribunales nacionales, el TEDH concluye que las
autoridades nacionales no incumplieron sus obligaciones positivas en virtud del art.
8 de la Convención, tales como sobrepasar su margen de apreciación. En
consecuencia, no ha habido violación de esa disposición.
Tampoco hay razón para que el TEDH cuestione las conclusiones de los
tribunales nacionales en cuanto a la validez y el peso de los acuerdos firmados por
tres de los demandantes. Por lo tanto, considera que tampoco ha habido violación del
art. 6 CEDH.
9. Por todos los razonamientos anteriores, el TEDH declara lo siguiente: se
considera, por catorce votos contra tres, que no ha habido violación del art. 8 de la
Convención; se considera, por unanimidad, que no ha habido violación del art. 6 de
la Convención debido al uso en evidencia de las grabaciones obtenidas por medio de
videovigilancia; se considera, por unanimidad, que no ha habido violación del art. 6
del Convenio debido a la aceptación de los acuerdos de extinción firmados por tres
de los cinco trabajadores.

2.5 Apunte Final


1. La posición del TEDH es garantista. Lo cierto es que, en la sentencia del
TEDH de fecha 9 de enero de 2018 (asunto López Ribalda I), se declaraba que la
medida adoptada por el supermercado de instalar cámaras de grabación no superaba
el juicio de proporcionalidad por dos motivos principales: el primero, en relación
con la Ley Orgánica de Protección de Datos, por no informarse a los trabajadores de
la instalación de las cámaras ocultas; y, el segundo, por el carácter indiscriminado de
la grabación, ya que la misma afectaba a todos los trabajadores del supermercado,
abarcando la totalidad de la jornada y extendiéndose en el tiempo por varias
semanas.
2. Sin embargo, en la reciente sentencia del TEDH de fecha 17 de octubre de
2019 (caso López Ribalda II), la Gran Sala, manteniendo la misma fundamentación
jurídica anterior, llega a la conclusión contraria. En otros términos, para el TEDH ha
existido una justificación evidente que permitía a la empresa tomar la decisión de
grabar en su supermercado dado que existían acreditadas sospechas razonables de
irregularidades graves que estaban suponiendo importantes pérdidas para el

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 633


Antonio Felipe Delgado y Jiménez

empresario. No estamos, por tanto, ante una mínima sospecha o una mera suposición
(en estos casos es evidente que no se podrá grabar).
La instalación de un circuito de videograbación ha superado el test de
proporcionalidad porque existían sospechas razonables de las irregularidades que se
estaban cometiendo, lo que termina por justificar la instalación de las cámaras.
Realmente, es un problema de interpretación de cuestiones fácticas objeto de prueba,
más que de fundamentación o sustento jurídico. Pero, al tiempo, exige un
razonamiento jurídico a partir de indicios. No se olvide que se hace referencia a una
función justificativa o probatoria del indicio, cuando el indicio necesario o los
indicios contingentes –no simples sospechas aparentes sin más – sustentan una
conclusión sobre el factum probandum17.

2.6 Conclusiones
1. Como garantía de los derechos fundamentales de los trabajadores y como
recomendación a aquellos empresarios que quieran instalar un circuito de
videovigilancia, se advierte que, dado que la imagen de la persona es un dato de
carácter personal, la empresa deberá de informar, de manera previa a la instalación,
de la instalación de las cámaras a los empleados. Concretamente, la LOPD se refiere
a la obligación de informar a los afectados de la existencia de un fichero o
tratamiento de datos de carácter personal, de la finalidad de la recogida de estos y de
los destinatarios de la información. Por tanto, sí es posible instalar cámaras para
detectar irregularidades o incumplimientos por parte de los trabajadores, pero
cumpliendo los siguientes requisitos:
1) Informando a los trabajadores de que van a ser grabados. Para ello se
recomienda colocar un distintivo visible en el que se avise de la instalación de las
cámaras y de la existencia de un fichero o tratamiento de datos de carácter personal
(de conformidad con la normativa ya mencionada). Igualmente, y para ser más
prudentes, se recomendaría la notificación individual a cada trabajador y, en los
contratos que se firmen con nuevos trabajadores, incluir una cláusula concreta en la
que se informe expresamente de este contenido.
2) Avisar a los trabajadores de que las grabaciones o la videovigilancia puede
ser utilizada también para justificar incumplimientos laborales. Para ello se
recomienda incluir una nota informativa en la misma notificación individual de cada
trabajador, así como también incluirlo en los nuevos contratos que se firmen entre la
empresa y trabajadores.
¿Y qué ocurre si no se informa o avisa a los trabajadores de manera
preventiva? En caso de que los trabajadores demanden al empresario serán los
tribunales los que decidirán, caso por caso, si se supera el juicio de
proporcionalidad. Para superar el juicio de proporcionalidad cuando se está

17
Michele Taruffo, M., “Observaciones sobre la prueba por indicios”, en Nuevas tendencias de derecho
probatorio, Horacio Cruz Tejada (coord.), Bogotá, Universidad de los Andes, 2011, p. 105.

634 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020


La Videovigilancia de los Trabajadores Mediante Cámaras Ocultas: el Caso López Ribalda y Otros c. España

grabando o monitorizando a los trabajadores se realizan las siguientes


recomendaciones:
1) Que la cámara o el circuito de grabación esté instalada durante unos pocos
días, los necesarios para permitir confirmar las sospechas de los incumplimientos o
irregularidades existentes por el trabajador.
2) Igualmente, la cámara o el circuito de grabación deberá de enfocar solo el
puesto de trabajo de la persona de la que se sospecha (recordemos que deben ser
sospechas razonables).
Con dichas finalidades se recomienda que la instalación la realice una
empresa externa con capacidad para ello para que pueda certificar ambas
recomendaciones con la finalidad de que las pruebas puedan considerarse lícitas y
terminen superando el juicio de proporcionalidad.
3) La grabación o videovigilancia también deberá superar la idoneidad
necesaria del juicio de proporcionalidad, lo que significa que dicha grabación deberá
de tener la finalidad de detectar el incumplimiento o la irregularidad que se pretende
evitar y de la que se tiene sospechas razonables (no caben meras sospechas o
intuiciones, pues es evidente que tales justificaciones no superarían el juicio de
proporcionalidad). Para el cumplimiento de dicha finalidad se recomienda su
acreditación mediante cualquier tipo de documento que permita verificar estas
sospechas razonables. Por ejemplo: una auditoría de tienda que permita verificar
que, entre el dinero de caja y los productos disponibles, no hay un encuadre correcto
(a ser posible, también realizada por empresa externa).
4) La grabación o videovigilancia también deberá ser necesaria. Esto
significa que no haya sido posible adoptar cualquier otra medida que fuera menos
lesiva para la intimidad del trabajador. Con dicha finalidad se recomienda valorar
diferentes opciones y medidas a tomar, incluso por empresas profesionales externas
al propio empresario que se va a ver obligado a realizar la grabación o
videovigilancia sin informar a los trabajadores. Una vez más, derivar el encargo en
profesionales del sector o empresas externas para que así lo puedan acreditar en
juicio.

3 BIBLIOGRAFÍA
BALLESTER PASTOR, I., “Facultades de control empresarial sobre el aspecto exterior del trabajador:
límites a la expresión del derecho a su propia imagen en el desarrollo de la prestación laboral”, TS n. 169,
2005.
CASAS BAAMONDE, Mª. E., “La plena efectividad de los derechos fundamentales: juicio de
ponderación (¿o de proporcionalidad?) y principio de buena fe”, Revista Relaciones Laborales, n. 12,
2004.
DESDENTADO BONETE, A. y MUÑOZ RUIZ, A. B., Control informático, videovigilancia y
protección de datos en el trabajo, Ed. Lex Nova, Valladolid, 2013.
GARCÍA–PERROTE ESCARTÍN, I. y MERCADER UGUINA, J., “Conflicto y ponderación de los
derechos fundamentales de contenido laboral. Un estudio introductorio”, AA. VV., Dir. SEMPERE
NAVARRO, A., El modelo social en la Constitución Española de 1978, Ed. Ministerio de Trabajo y
Asuntos Sociales, Madrid, 2003.

Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020 635


Antonio Felipe Delgado y Jiménez

GOÑI SEIN, J.L., “Los derechos fundamentales inespecíficos en la relación laboral individual:
¿necesidad de una reformulación?”, Primera Ponencia de las XXIV Congreso Nacional de Derecho del
Trabajo y de la Seguridad Social, organizadas por la Asociación Española de Derecho del Trabajo y
Seguridad Social, Pamplona, 2014.
______. La videovigilancia empresarial y la protección de datos personales, Ed. Aranzadi, Pamplona,
2007.
JIMÉNEZ CAMPO, J., Derechos fundamentales. Concepto y garantías, Ed. Trotta, Valladolid, 1999.
MICHELE TARUFFO, M., “Observaciones sobre la prueba por indicios”, en Nuevas tendencias de
derecho probatorio, Horacio Cruz Tejada (coord.), Bogotá, Universidad de los Andes, 2011.
MOLINA NAVARRETE, C., “TEDH. Revisión del caso López Ribalda y otros: los cajeros de
supermercados españoles filmados encubiertamente por cámaras de seguridad no sufrieron una violación
de sus derechos de privacidad”, CEF Laboral Social, 2019.
MONEREO PÉRREZ, J.L. y ORTEGA LOZANO, P. O., “STEDH (Gran Sala) de 17 de octubre de 2019
(números 1874/13 y 8567/13) (asunto López Ribalda II)”, en Revista de Jurisprudencia Laboral, n.
8/2019.
PRECIADO DOMENECH, C.H., “Comentarios de urgencia a la STEDH de 17 de octubre de 2019. Caso
López Ribalda c. España (Gran Sala)”, www.juecesdemocracia.es
ROJO TORRECILLA, E., “Medias verdades y fake news en el mundo jurídico. No cabe todo en la
videovigilancia de una persona trabajadora. A propósito de la sentencia “López Ribalda” de la Gran Sala
del TEDH de 17 de octubre de 2019 (y recordatorio de la sentencia de Sala de 9 de enero de 2018 y del
caso Barbulescu II, sentencia de Gran Sala de 5 de septiembre de 2017)”, www.eduardorojotorrecilla.es
SEMPERE NAVARRO, A. V. y SAN MARTÍN MAZUZUCCONI, C., Los derechos fundamentales
(inespecíficos) en la negociación colectiva, Ed. Aranzadi, Pamplona, 2011.
TERRADILLOS ORMAETXEA, E., Principio de proporcionalidad, Constitución y Derecho del
Trabajo, Ed. Tirant Lo Blanch, Valencia, 2004.
TOSCANI GIMÉNEZ, V., “La videovigilancia de los trabajadores con cámaras ocultas o clandestinas.
Comentario a las SSTEDH de 9 de enero de 2018 y 17 de octubre de 2019, caso López Ribalda”, Trabajo
y Derecho, n. 60, Diciembre 2019.
VALDÉS DAL-RÉ, F., “Poderes del empresario y derechos de la persona del trabajador”, Revista
Relaciones Laborales, n. 8, 1990.

636 Revista Internacional Consinter de Direito, n. XI, 2º semestre de 2020

Você também pode gostar