Você está na página 1de 13

A EDUCAÇÃO ESPECIAL

NO BRASIL
JOSÉ GERALDO SILVEIRA BUENO
ALGUNS MARCOS HISTÓRICOS
• Criação:
• Imperial Instituto dos Meninos Cegos (hoje Instituto Benjamin Constant) em 1854
• Instituto dos Surdos-Mudos (hoje Instituto Nacional de Educação dos Surdos – INES) em 1857
• A criação desses institutos parecem ser resultado do interesse de figuras próximas ao poder
constituído do que pela sua real necessidade
• Os dois institutos, pouco tempo após sua criação, sofreram processo de deterioração
seguindo o mesmo percurso dos institutos franceses, porém, enquanto os institutos
parisienses se transformaram em oficinas de trabalho, os brasileiros tenderam basicamente
para o asilo de inválidos
• Reflete a pouca necessidade de utilização desse tipo de mão-de-obra, visto que a economia baseada na
monocultura de exportação não exigia a utilização dessa população pelo incipiente mercado de trabalho
• Espelha o caráter assistencialista que perpassará toda a história da educação especial no Brasil:
• Os institutos foram criados por meio de uma política de “favor”; ofereciam abrigo e proteção cumprindo a função de
auxílio aos desvalidos; na medida em que ficaram restritos a iniciativas isoladas, deixaram de fora a maior parte dos
surdos e cegos, ao mesmo tempo que, como internatos, retiraram do convívio social indivíduos que não necessitavam
ser isolados pelo incipiente processo produtivo
• Os dois institutos, pouco tempo após sua criação, sofreram processo
de deterioração seguindo o mesmo percurso dos institutos franceses,
porém, enquanto os institutos parisienses se transformaram em
oficinas de trabalho, os brasileiros tenderam basicamente para o asilo
de inválidos
• Reflete a pouca necessidade de utilização desse tipo de mão-de-obra, visto
que a economia baseada na monocultura de exportação não exigia a
utilização dessa população pelo incipiente mercado de trabalho
• Espelha o caráter assistencialista que perpassará toda a história da educação
especial no Brasil:
• Os institutos foram criados por meio de uma política de “favor”; ofereciam abrigo e
proteção cumprindo a função de auxílio aos desvalidos; na medida em que ficaram
restritos a iniciativas isoladas, deixaram de fora a maior parte dos surdos e cegos, ao
mesmo tempo que, como internatos, retiraram do convívio social indivíduos que não
necessitavam ser isolados pelo incipiente processo produtivo
• Ainda no período imperial iniciou-se o tratamento dos deficientes mentais:
• Em 1874 no Hospital Psiquiátrico da Bahia (hoje Juliano Moreira)
• Criação do Pavilhão Bourneville, no Hospital D. Pedro II, mas que só entraria em
funcionamento no início do século XX
• “A criação dessas primeiras instituições especializadas [...]não passou de
umas poucas iniciativas isoladas, as quais abrangeram os ‘mais lesados, os
que se distinguiam ou pelo aspecto social ou pelo comportamento
divergente. Os que não o eram assim a ‘olho nu’ estariam incorporados às
tarefas sociais mais simples, numa sociedade rural desescolarizada’.”
(LEMOS apud BUENO, 2004, p. 109)
• O fato de se restringirem a umas poucas iniciativas, reflete também que, da
mesma forma como na educação comum, as escolas especiais ‘não eram
necessárias como produtoras de mão-de-obra nem como fator de
ideologização’ numa sociedade rural e escravocrata.
• Após a Proclamação da República, a educação especial foi se
expandido, mas de forma muito lenta, o que aconteceu não apenas
com ela, mas com toda a educação brasileira.
• Gradativamente a deficiência mental foi assumindo a primazia da
educação especial, não só pelo maior número de instituições criadas
que se voltavam para ela, “como pelo peso que foi adquirindo em
relação à saúde (a preocupação com a eugenia da raça) e à educação
(a preocupação com o fracasso escolar)” (BUENO, 2004, p. 110)
• Surgem entidades privadas de atendimento aos deficientes, o que
espelha duas importantes tendências da educação especial no Brasil:
• A inclusão da educação especial no âmbito das instituições filantrópico-
assistenciais
• A sua privatização
• “Além do surgimento das entidades privadas, teve início também a preocupação com a
deficiência mental por parte da rede pública escolar, em decorrência da influência que a
psicologia passou a assumir na determinação dos processos de ensino” (BUENO, 2004, p.
111), o que pode ser visto pela criação de alguns laboratórios de Psicologia
• O interesse pela deficiência mental refletia também a preocupação com a higiene da
população. Pode ser interpretada como o “início do processo de legitimação da segregação
do aluno diferente pelos especialistas, pois a escolaridade passou a ser uma expectativa
social mais abrangente, principalmente em relação à população rural que se deslocava para
os centros urbanos em busca de melhores condições de vida” (BUENO, 2004, p 111-112)
• “...a preocupação da medicina com a saúde escolar, expressa na criação de serviços de
higiene escolar e na inserção da psicologia como instrumento fundamental para a
elaboração de processos pedagógicos compatíveis com as ‘potencialidades individuais’
refletia, no âmbito da educação especial nascente, que a ‘educação do povo devia ser
colocada sob o signo neutro da ciência, alcançando-se as dimensões universais’ (Monarcha,
1989, p. 55), na medida em que pregava a separação do ‘bom escolar’ daqueles que
possuíam anormalidades intelectuais, morais ou pedagógicas.” (BUENO, 2004, p. 112)
• Nas décadas seguintes, a educação especial foi se expandindo no Brasil, com o
surgimento de entidades privado-assistenciais e através da ação do poder público,
embora esta última se processasse em ritmo muito mais lento do que a das primeiras,
pelo menos em relação à quantidade de atendimentos oferecidos” (BUENO, 2004, p.
112)
• Nas décadas de 1930 e 1940 surgiram várias instituições privadas de atendimento aos
deficientes, sendo o maior número delas voltadas para a deficiência mental e visual
• Bueno relaciona quais foram as instituições criadas nesse período
• A quase totalidade das instituições criadas estavam ligadas a ordens religiosas, revestindo-se de
“caráter filantrópico-assistencial, contribuindo para que a deficiência permanecesse no âmbito da
caridade pública e impedindo, assim, que as suas necessidades se incorporassem ao rol dos
direitos de cidadania.” (BUENO, 2004, p. 113)
• Como o poder público quase que exclusivamente usava o sistema de classes especiais em escolas
regulares e se restringia à deficiência mental, o número de pessoas atendidas na rede privado-
assistencial era muito superior ao da rede pública, assim como sua abrangência ao universo das
deficiências. Isso deve ter contribuído para ampliar a influência que foram adquirindo e que
possuem até hoje no que se refere aos destinos da educação especial no pais.
• A privatização da educação especial antecipa o movimento de privatização da
escola regular, que ocorrerá a partir de 1960, “e que terá na educação especial
um grande aliado em sua defesa, sob a argumentação de que essa privatização
possui um alto significado na qualificação do ensino brasileiro.” (BUENO, 2004,
p. 114)
• A ação do Estado em relação à educação especial foi se sistematizando e
organizando através da normatização e da centralização do atendimento por
parte de órgãos públicos
• Bueno cita vários fatos como a criação de Serviços de Saúde Escolar, Laboratórios de
psicologia
• “...essa visão da educação especial, em que a cura, a reabilitação e a eliminação
dos comportamentos inadequados constituía seu núcleo central, ‘resultou
numa diluição da importância da verificação dos conhecimentos básicos a
serem transmitidos pela escola”(JANUZZI apud BUENO, 2004, p. 116-117)
• “A preocupação com a deficiência mental se instituiu principalmente pela
busca de uma maior eficiência dos processos de ensino, que, se por um lado se
desenvolveu pela crítica aos procedimentos da escoa tradicional, por outro,
não colocou em xeque as condições extra-escolares, imputando ao aluno ou ao
seu meio próximo as causas do fracasso escolar.” (BUENO, 2004, p. 117)
• Ver a 4ª conclusão do 1º Congresso Nacional de Saúde Escolar (p. 117)
• “O percurso histórico da educação especial nesse período se insere no
movimento maior de reordenamento do Estado brasileiro, que redundou nas
reformas educacionais, trabalhistas, sanitárias e previdenciárias que tinham
como objetivo fundamental impedir a participação das camadas populares nas
grandes decisões nacionais, Nesse sentido, a determinação científica e neutra
da deficiência, principalmente no que se refere à deficiência mental, contribuiu
para o acobertamento das reais determinações do fracasso escolar das
crianças dessas camadas.” (BUENO, 2004, p. 118)
• “Após a Segunda Guerra Mundial, a educação especial brasileira
distinguiu-se pela ampliação e proliferação de entidades privadas, ao
lado do aumento da população atendida pela rede pública, que foi se
configurando cada vez mais como uma ação em nível nacional, quer
pela criação de federações estaduais e nacionais de entidades
privadas, quer pelo surgimento dos primeiros Serviços de Educação
Especial nas Secretarias Estaduais de Educação e das campanhas
nacionais de educação de deficientes ligadas ao Ministério da
Educação e Cultura.” (BUENO, 2004, p. 118)
• Federação Nacional das Sociedades Pestalozzi do Brasil (1971)
• Federação Nacional das APAEs
• Novas entidades privadas de caráter filantrópico-assistencial surgiram
• Surgiram centros de reabilitação e clínicas privadas, bem como escolas
privadas
• Características da ampliação da rede privada:
• Refletiu a importância cada vez maior que essas entidades foram assumindo na
educação especial
• Distinção crescente entre “as entidades filantrópico-assistenciais, que se dirigiam à
população deficiente oriunda dos extratos mais baixos da classe média e das classes
baixas, e as empresas prestadoras de serviços de reabilitação e educação, voltadas à
população de poder aquisitivo elevado e que, no âmbito da educação especial,
representou a concretização do processo de privatização que ocorreu no país nos
campos da saúde e da educação.” (BUENO, 2004, p. 120)
• Paralelo ao crescimento da rede privada, a educação especial pública passou
por processo intenso de ampliação, com a criação de classes e escolas
especiais, que culminou, na década de 1970, na criação de Serviços de
Educação Especial nas Secretarias Estaduais de Educação
• Ainda assim, o número de pessoas atendidas era bem menor do que na rede privada
• A rede pública e privada juntas não atendiam a necessidade da população excepcional
• Período marcado por campanhas em favor dos deficientes – Campanhas Nacionais
pretendiam dar encaminhamento às grandes questões sociais como a alfabetização e as
endemias
• Campanha para a Educação do Surdo Brasileiro (1957)
• Campanha Nacional de Educação dos Cegos – CNEC (1960)
• Campanha Nacional de Educação e Reabilitação do Deficiente Mental – CADEME (1960)
• Influência e benefício conseguido pelas instituições privadas de educação especial junto
às Campanhas Nacionais
• Criação, no Ministério da Educação e Cultura, em 1971, do grupo-tarefa cuja finalidade
era estudar a problemática da educação especial que culminou na proposta de criação
de órgão autônomo, para continuidade das ações desenvolvidas pelas campanhas e para
ampliação de sua abrangência, incluindo os deficientes físicos e os superdotados
• O Plano Setorial de Educação e Cultura (1974) incorporou a educação especial no rol de
prioridades educacionais do país
• Criação do Centro Nacional de Educação Especial – CENESP (1973) – órgão autônomo
ligado à Secretaria Geral do MEC
• A análise da história da educação especial no Brasil empreendida por Bueno
procurou desvendar que, ao lado da democratização do acesso à escola para as
crianças deficientes, também respondeu a uma série de interesses:
• Crescente privatização, seja do ponto de vista do número de atendimento oferecidos,
seja pela influência que essas instituições têm exercido;
• Legitimação da escola regular no que tange á imputação do fracasso escolar às
características pessoais da criança ou ao seu meio próximo, contribuindo para a
manutenção da política educacional que dificulta o acesso ao conhecimento pelos
membros das classes subalternas;
• Incorporação de concepções sobre conhecimento científico que se pretendem
universais e transcendentes à própria construção sócio-histórica e que trazem, no
âmbito da educação especial, consequências nefastas, pois analisam as possibilidades
dos deficientes apenas pela via de suas dificuldades específicas;
• A educação especial que nasce sob a bandeira da ampliação de oportunidades
educacionais para os que fogem da normalidade, na medida em que não desvela os
determinantes socioeconômico-culturais que subjazem às dificuldades de integração do
aluno diferente, na escola e na sociedade, serve de instrumento para a legitimação de
sua segregação.

Você também pode gostar